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VIVENDO COMO O BEM-AMADO DE DEUS por Paula Rinehart

Uma entrevista com Brennan Manning

Por mais de 40 anos, Brennan Manning tem orientado a sua vida e ministério no
sentido de ajudar os outros a experimentarem a realidade do amor de Deus. Como
lhe disse um sábio frade franciscano no início de sua jornada: “Uma vez que você
conhece o amor de Jesus Cristo, nada mais no mundo lhe parecerá muito lindo ou
importante”.

Essas palavras se tornaram, na prática, uma descrição profética do ministério que


Manning iria desenvolver. Embora tenha vivido seus primeiros anos de conversão
como um frade franciscano, Brennan agora faz palestras e dirige retiros sobre o
amor de Deus para públicos de maioria evangélica.

A sua própria jornada espiritual o tem levado por uma grande variedade de
caminhos. Ele já ensinou a seminaristas, trabalhou com os pobres na Espanha e
ministrou para pescadores de camarão e suas famílias no Alabama (EUA). Além
disso, Brennan é também um alcoólatra recuperado e um membro ativo dos
Alcoólicos Anônimos.

Paula: Quais as coisas mais importantes que você aprendeu a respeito do amor de
Deus?

Brennan: Como homem, eu adoro as praias de Jersey, o Messias de Haendel,


sundae com calda de chocolate e minha esposa Roslyn. Amo as coisas que
considero atraentes ou que tenham afinidade comigo. Gosto de alguém por causa
do que vejo nele ou nela. Mas Deus não é assim.

O Deus e Pai de Jesus ama os homens e as mulheres não por aquilo que podem lhe
oferecer, mas por achar neles algo de si mesmo. Não é porque os homens e as
mulheres são bons que ele os ama – pois ele não ama só quem é bom. É por ser
incomparável, inimaginavelmente BOM que ele ama homens e mulheres, mesmo
nos seus pecados.

Não é que Deus viu em nós algo que achou atraente ou compatível com sua
natureza e, por isso, decidiu nos conceder seu favor. A fonte de amor é ele. Ele
age, não reage. Ele é amor sem qualquer motivo. É por isso que Agostinho podia
escrever aquelas linhas incríveis: “Por me amares, tu me tornas amável”.

Será que Deus me ama porque dedico meu tempo para vítimas da AIDS e do álcool
ou porque passo uma hora em oração todos os dias? Ou seria porque sou
rigorosamente fiel à minha esposa Roslyn? Se é nisso que acredito, sou um fariseu
que se acha no direito de ficar confortavelmente ao lado de Cristo por causa das
boas obras.

O evangelho da graça diz que sou amado por somente uma razão: porque Deus me
ama – ponto final.

Cada página da Escritura cristã declara que ele nos ama de uma maneira que
desafia a compreensão humana e foge às limitações humanas. É por isso que posso
dizer com certeza teológica: Deus ama você incondicionalmente como você é e não
como deveria ser, porque você nunca vai ser o que deveria ser. Deus o ama no sol
da manhã e na chuva da tarde, sem cautelas ou remorso. Se Deus deixasse de ser
amor, deixaria de ser Deus.
Quando experimentamos o que é ser profundamente amado por Deus, ficamos
chocados porque o amor de Deus é tão radicalmente diferente da nossa maneira
natural de amar. Na igreja, infelizmente, produzimos mais teólogos amadores do
que testemunhas de Jesus que o tenham experimentado de verdade.

Paula: O que você quis dizer quando falou em seu livro Abba’s Child (Filho de Abba)
sobre “ser amado na sua pecaminosidade”?

Brennan: De certa forma, tem a ver com a aceitação da nossa condição de seres
humanos feridos que foram feitos à imagem de Deus, mas que falharam
miseravelmente. Por algum motivo, pensamos que psicologia popular, pensamento
positivo ou conseguir que bastante gente corresponda à nossa bondade é que vão
nos garantir uma posição de auto-aceitação. Não é assim que funciona.

Auto-aceitação vem quando aceitamos de coração a obra de Jesus Cristo no


Calvário. E quando nos rendemos a ele com a confiança de criança, sabendo que
nos aceita assim como somos – mesmo na nossa pecaminosidade –, encontramos
uma base para nossa auto-aceitação. A partir daí, paradoxalmente, ficamos livres
para nos esquecermos de nós mesmos e volvermos os nossos olhos para Jesus e
para as outras pessoas.

Lembro-me da idéia ingênua que eu tinha quando criança, por causa da minha
formação católica. Se eu pecasse, achava que Deus franziria a testa. Mas quando
eu me confessasse e me arrependesse do meu pecado, Deus sorriria. De algum
modo, a minha confissão provocava uma mudança em Deus, o que é absurdo. A
confissão somente provoca uma mudança em mim mesmo.

Se a luz do sol que sinto nos ombros é o amor de Deus, e eu opto por pecar e
andar na escuridão, eu me mudo – mas não mudo Deus. Quando me arrependo,
volto a andar na luz que nunca parou de brilhar o tempo todo.

Só caiu a ficha sobre o que é viver pela graça e não pelo meu próprio desempenho
quando tive que enfrentar minha vida de alcoólatra destruído, subsistindo com uma
garrafa de vodca por dia em Fort Lauderdale, na Flórida. Foi ali que descobri que
Deus me amava tanto no estado de desgraça como no estado de graça. Aprendi
que o amor nunca é baseado em desempenho. Não depende dos nossos humores.
O amor verdadeiro não oscila nem sofre alterações. Jesus, de fato, cumpriu a
promessa de Isaías de que não esmagaria a cana quebrada das nossas vidas.

Paula: Como é que você aprendeu a experimentar o amor de Deus e não somente
saber sobre ele?

Brennan: Essa jornada começou, no sentido mais completo, num inesperado


encontro com Cristo, em 1956, numa pequena capela na Pensilvânia (EUA). Tive
uma poderosa experiência do amor de Jesus que selou a chamada de Deus na
minha vida. Naquele momento, toda a vida cristã passou a significar para mim um
relacionamento íntimo, de coração com Jesus.

Sinto-me como um menininho que se ajoelha na beira da praia. No começo, eu


podia sentir as ondas do amor de Cristo chegando suavemente nas minhas pernas,
batendo contra os tornozelos. Com o tempo, essas ondas me varreram da praia e
me levaram para mais e mais fundo no coração de Jesus Cristo. Minha fé foi
transformada de uma coisa meramente conceitual para uma experiência de amor
apaixonado.
Quando olho para trás e me pergunto: “O que foi responsável por levar-me mais e
mais fundo no amor de Cristo?”, eu apontaria para a fidelidade em separar um
período de oração todos os dias e um período mais longo de silêncio e solitude
todos os anos – um retiro individual e direcionado de cinco a dez dias.

Não entendo as pessoas que dizem: “Eu amo a Deus com todo o meu coração e
minha alma” e, no entanto, não lhe dão tempo algum. As pessoas que são
importantes na minha vida sempre terão um espaço importante no meu tempo, não
por obrigação ou necessidade – mas porque eu quero. A verdade pura e simples é
que nos movemos em direção àquilo que queremos. E quando você encontra um
desejo que transcende todos os demais desejos, isso realmente toma conta da sua
vida.

O que geralmente não se percebe é que a oração, em primeiro lugar, não é para se
obter algum novo entendimento na Palavra ou uma experiência intensa e
emocional. Antes de tudo, é um ato de amor. Passar tempo com Deus pode ser
uma experiência dinâmica, um dia, e totalmente monótona, no dia seguinte.
Contudo, aparecer lá para falar com ele, todos os dias, é um ato de amor.

Preciso resistir à tentação de avaliar o meu tempo com Deus pela maneira como
me sinto. Não se trata de entrar num período de oração e esperar que Deus me
apareça e se faça presente. Entro em oração esperando me aperceber de que ele já
está ali.

Se ficarmos em silêncio, começaremos a experimentar Deus. A sabedoria de Deus é


aprender a ficar em silêncio. Precisamos silenciar o barulho, o clamor e o palavrório
das nossas vidas e simplesmente esperar. Ele nos tornará conscientes da sua
presença, e aprenderemos a experimentar o seu amor.

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