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Marco Civil da Internet: Cinco anos depois, o que mudou?
25 MAR 2019
Em abril de 2014, a então presidente Dilma Roussef sancionou o Marco Civil da Internet,
uma lei que apresenta os direitos e deveres de usuários e provedores da rede mundial
de computadores no Brasil. Entre os pontos presentes na legislação estão a neutralidade
de rede, a privacidade e proteção de dados, a obrigação da retirada de conteúdos
ofensivos, entre outros pontos.
Mas agora, quase cinco anos após a sua assinatura, “a lei pegou”? Como está sendo
feita a fiscalização destas regras? Será que precisamos atualizar a legislação? Fizemos
estes questionamentos para seis especialistas em direito digital para conhecer seus
pontos de vista a respeito do funcionamento do Marco Civil da Internet. Confira quem são
os entrevistados e as suas opiniões abaixo:
Do ponto de vista prático, tivemos um grande impacto no Judiciário, vez que muitas
informações que eram fornecidas administrativamente, passaram a ser disponibilizadas
apenas por ordem judicial. Também ganhamos mais efetividade nas decisões cujo meio
em que ocorreu o fato é a Internet, como por exemplo, nos casos de postagens de nudes.
Para as empresas, porém, provedores de aplicação e de conexão, tais como são
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chamadas pela Lei, as mudanças têm sido adotadas aos poucos, sobretudo no que se
refere à guarda de logs pelo tempo determinado na legislação.
Cinco anos depois, há alguma mudança na nossa relação com a internet que
exigiria uma atualização no Marco Civil?
Barbara Simão -
Marco Civil da
Internet
O que mudou na internet brasileira quase cinco anos após a assinatura do
Marco Civil?
O Marco Civil da Internet foi uma importante lei para definir os princípios e direitos do uso
da Internet no Brasil. Ele é como uma Constituição do uso da Internet, gerando uma
referência utilizada como exemplo em todo o mundo. Esse conjunto de regras deu muito
mais segurança aos usuários, empresas e Poder Público sobre o que deve o que não
deve ser feito na Internet. Entre os pontos de destaque, estão os pilares de defesa da
liberdade de expressão e da neutralidade da rede. O fato de operadoras não poderem
discriminar o acesso à internet é uma garantia muito importante de qualidade de acesso
aos usuários. Além disso, o Marco Civil trouxe algumas regras também importantes
relacionadas à privacidade dos usuários. De certa maneira, esse conjunto de princípios
tornou o acesso à internet mais seguro, garantindo esse serviço também como essencial
aos cidadãos brasileiros.
A regra foi desenhada assim para que não houvesse incentivos para que qualquer
conteúdo fosse removido de imediato pelas plataformas – o que provavelmente ocorreria
caso elas pudessem ser responsabilizadas antes mesmo de uma decisão judicial sobre o
caso. Mas há exceções para casos mais graves, por exemplo, de compartilhamento de
conteúdo com cenas de nudez ou atos sexuais.
Cinco anos depois, há alguma mudança na nossa relação com a internet que
exigiria uma atualização na lei?
Mudanças na relação com a Internet com certeza existiram. De maneira geral, acredito
que as pessoas hoje tenham uma visão mais pessimista da Internet do que na época.
Surgiram questões novas como fake news, por exemplo, e uma preocupação maior com a
concentração econômica de grandes plataformas e regulação. Há também desafios que
com certeza irão surgir com relação à Internet das Coisas e dispositivos conectados. Mas
muito ainda está sendo debatido e pesquisado, existem poucos consensos e muitas
dúvidas. Por isso é difícil afirmar com certeza que atualização da Lei, nesse momento,
seria adequada, já que qualquer medida apressada pode ter mais efeitos negativos que
positivos. Há muitos projetos de lei bastante questionáveis que pretendem modificar o
Marco Civil sem uma análise detida de suas consequências – no caso de fake news,
muitos deles abririam margem para possibilidade de censura política na Internet, por
exemplo.
Uma das maiores preocupações, no início, era para que a Lei não criasse censura nas
relações entre usuários num meio bastante conhecido pela sua liberdade, seja de
expressão, manifestação de pensamento, de imprensa, entre outras. Podemos dizer que
um dos principais objetivos do Marco Civil é regularizar o uso da Internet no Brasil, além
de garantir, aos usuários, direitos e deveres. Além disso, observamos que os principais
pontos tratados pelo Marco Civil são: privacidade, Internet livre, dados pessoais,
vigilância, liberdade de expressão, armazenamento de dados.
Dentre as mudanças que o Marco Civil trouxe para os usuários da Internet no Brasil nos
últimos cinco anos, entendo que as quatro mais importantes (sem desmerecer qualquer
outra mudança) são: a neutralidade da rede; o armazenamento de dados; a liberdade de
expressão e responsabilidade; e as obrigações do Poder Público.
A implementação da Lei que regula a Internet no país é uma grande vitória dos
brasileiros, na medida em que garantiu, como dito, diversos direitos e deveres, não
apenas dos usuários da Internet, mas também do Poder Público e de empresas que
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Assim, podemos dizer que qualquer interessado, com o intuito de formar conjunto
probatório em processo judicial cível ou penal, poderá requerer ao Juiz que ordene ao
responsável pela guarda o fornecimento de registros de conexão ou de acesso a
aplicações de Internet, nos termos do artigo 22 do Marco Civil da Internet.
Cinco anos depois, há alguma mudança na nossa relação com a internet que
exigiria uma atualização no marco civil?
Dessa forma, acredito que as novas legislações que estão surgindo, tal qual a Lei Geral
de Proteção de Dados e, até mesmo, o Decreto 8.771/2016, que regulamentou o Marco
Civil, já estejam suprindo essas necessidades de uma eventual atualização da lei.
Por isso, acredito que, apesar de haver espaço, sim, para incremento na referida
legislação, o meio mais adequado, rápido e ético é que cada indivíduo tenha ciência não
apenas de seus direitos sobre o uso da Internet no Brasil, mas também que cumpram
com os deveres impostos pelo Marco Civil, assim como pelas outras legislações aplicáveis
e relacionadas a tal uso.
Em termos institucionais, mudou muita coisa porque nós temos garantidos direitos
fundamentais, como a liberdade de expressão, direito de não ser discriminado e direito a
privacidade. O Marco Civil da Internet estabeleceu direitos básicos ao internauta,
reconheceu o serviço de conexão à internet como um serviço essencial para o exercício
da cidadania e, consequentemente, conferiu expressamente o caráter universal desses
serviços. Isso significa dizer que o Estado tem que desenvolver e aplicar medidas
públicas que tornem o acesso a esse serviço possível e democrático. Outra questão
fundamental que está expressa no Marco Civil foi a garantia de neutralidade da rede, que
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é um mecanismo que evita discriminação por aplicação, por temas, por religião, questões
políticas. A gente ganhou com o Marco Civil a garantia de que não deve haver
discriminação no tráfego de dados por qual motivo for. O que mudou foi que a gente tem
um espaço, um setor regulado e com garantias bastante fortes que são expressas
inclusive no que diz respeito à proteção de dados pessoais. Todas essas garantias
colocaram o Brasil num outro patamar no que diz respeito ao uso da internet.
Então, o grande problema está aí. Apesar de o decreto que regulamentou o Marco Civil
ter especificado o controle e fiscalização dos direitos expressados ali, esses organismos
pouco têm atuado. Que órgãos são esses? A Anatel, no que diz respeito a suas
atribuições relacionadas à infraestrutura de redes de telecomunicações, o Cade, nas
questões de competição, e a Senacon, que também recebeu atribuições pela defesa do
consumidor nesse campo. E todos esses órgãos deveriam agir em contribuição com o
Comitê Gestor da Internet no Brasil.
Ocorre que esses organismos não fizeram até hoje um esforço para criar um mecanismo
que coordene ações para dar concretude aos direitos expressos no Marco Civil e aí a
gente termina assistindo ações e práticas das empresas que são bastante questionáveis.
Mais recentemente, a Senacon instaurou um processo envolvendo a Google por conta de
questões de uso de dados para publicidade, mas é muito incipiente ainda a atuação do
Estado tendo em vista a série de abusos que tem acontecido, como ocorreu
recentemente nas eleições com o Whatsapp.
Uma série de iniciativas podem, a meu ver, afetar a garantia da neutralidade de rede,
como é o caso de operadores de internet que estão dando acesso mais rápido a serviços
da Google e do Facebook. Nós temos muitas coisas acontecendo que mereceriam ser
controladas e observadas com mais transparência, mas que infelizmente os organismos
brasileiros que tem atribuição para fazer não estão agindo.
Cinco anos depois, há alguma mudança na nossa relação com a internet que
exigiria uma atualização no marco civil?
Eu não acho que o Marco Civil tenha que ser alterado. Acho que as garantias que estão
ali sequer foram implementadas, sequer estão sendo aplicadas. Mas eu acho que há
fatos novos, porque as coisas na internet acontecem muito rápido, que demandariam, até
com base no que está expresso no Marco Civil e também em outras leis, uma reanálise
da responsabilidade das plataformas em relação a desinformação e de garantias dos
direitos de liberdade de expressão. Isso não significa que você deveria alterar o Marco
Civil, muito pelo contrário, mas a gente deveria reanalisar essas práticas e ver se é
necessário ou não criar regulações adicionais. Esse é um tema que tem sido discutido
internacionalmente.
registros eletrônicos que podem viabilizar a identificação dos responsáveis por condutas
ilícitas e anônimas na internet. Além disso, impõe obrigações de respeito à privacidade,
sigilo das comunicações e proteção dos dados pessoais, dentre outros pontos
importantes como a neutralidade da rede, a qualidade da internet contratada, a livre
concorrência, livre iniciativa, dentre outros.
No que se refere à fiscalização, não foi criado um órgão próprio para esta finalidade.
Contudo, o Decreto nº 8.771/2016, que regulamenta o Marco Civil da Internet, afirma que
compete a Anatel, a Secretaria Nacional do Consumidor, ao Sistema Brasileiro de Defesa
da Concorrência e a Administração Pública Federal a função de fiscalizar e apurar as
infrações praticadas, sendo certo que o Ministério Público também pode realizar este
papel.
Além disso, o próprio usuário pode zelar pela proteção de seus direitos por meio de
denúncias perante os órgãos responsáveis pela fiscalização, perante os provedores e,
ainda, mediante as ações judiciais cabíveis. Em relação ao questionamento sobre a
punição para quem publica o conteúdo ofensivo, neste caso, competirá ao Judiciário
valorar a indenização e ainda determinar a remoção do conteúdo, caso isso não tenha
sido feito pelo provedor, no âmbito extrajudicial.
Cinco anos depois, há algum mudança na nossa relação com a internet que
exigiria uma atualização no marco civil?
A preocupação mais recente era em relação à proteção dos dados pessoais, culminando
na Lei nº 13.709/2018, Lei Geral de Proteção de Dados, com vigência prevista para o
ano de 2020, a qual atualizou trechos do Marco Civil da Internet sobre a questão.
Entretanto, o Marco Civil da Internet merece sim algumas atualizações, no que diz
respeito à remoção de conteúdo ilícito pelo provedor extrajudicialmente, evitando a
judicialização da questão, e também sobre a lacuna deixada pelo próprio Marco Civil da
Internet em relação à proteção dos direitos autorais, questão diretamente ligada a
internet. Outras questões poderão ir surgindo conforme o desenvolvimento tecnológico
for repercutindo na sociedade. Contudo, de um modo geral, o Marco Civil da Internet foi
um importante avanço para a disciplina do direito digital.
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14/03/2022 16:26 NIC.br - Na Mídia - Marco Civil da Internet: Cinco anos depois, o que mudou?
Cinco anos depois, há alguma mudança na nossa relação com a internet que
exigiria uma atualização no marco civil?
Como advogada atuante em direito digital, lido diariamente com ações em face de
provedores de aplicação, visando à remoção de conteúdos da internet. Atualmente, o
entendimento majoritário da jurisprudência é de que o autor do pedido deve informar ao
Judiciário a URL específica contendo o conteúdo ilícito, para que seja proferida uma
ordem judicial de remoção.
No entanto, esse mesmo conteúdo pode ser facilmente replicado em diversos sites/URLs
diferentes, mesmo depois de finalizado o processo judicial. Dessa forma, não seria
economicamente inteligente, tampouco célere, que o autor da ação antecedente tenha
que ingressar com nova ação judicial para remoção do mesmo conteúdo, replicado em
outra URL específica.
Sendo assim, vislumbro que seria ideal que os provedores de aplicação pudessem
remover conteúdo idêntico a conteúdo que já foi objeto de ordem judicial de remoção, de
forma extrajudicial, mediante simples notificação do usuário, a fim de trazer efetividade e
celeridade ao processo de seleção de conteúdo na internet, bem como a fim de minimizar
a movimentação da máquina Judiciária.
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