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08/04/2024, 21:19 Saiba quais são as brechas na lei sobre redes sociais e por que é difícil regular o ambiente

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ESTADÃO

Saiba quais são as brechas


na lei sobre redes sociais e
por que é difícil regular o
ambiente digital
KARINA FERREIRA 08 ABRIL 2024 | 5min de leitura

Os recentes embates entre o bilionário Elon Musk, dono do X (antigo


Twitter), e o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de
Moraes reacenderam a discussão sobre a internet ser ou não uma “terra
sem lei” no Brasil. De um lado, o empresário criticou a restrição de perfis
no X e chegou a dizer que não cumpriria decisões judiciais. Em reação,
Moraes incluiu Musk no inquérito das milícias digitais, afirmando que
“as redes sociais não são terra de ninguém”. Especialistas ouvidos pelo
Estadão apontam fragilidades no ordenamento jurídico brasileiro que
abrem brechas para esse tipo de impasse entre big techs e o Poder
Judiciário.

Jonas Valente, integrante da organização Direito à Comunicação e


Democracia e da Coalizão Direitos na Rede, elenca pelo menos seis
brechas nas regulamentações existentes. São elas:

1. Falta de obrigações às redes sociais tanto de combate a riscos


sistêmicos quanto medidas emergenciais em situações de graves
riscos;

2. Falta de obrigações de transparência para que autoridades possam


acompanhar o que elas fazem ou não fazem e tomar providências;

3. Falta de garantias de liberdade de expressão e devido processo aos


usuários;

4. Falta de um modelo de instituições regulatórias participativo;


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5. Responsabilização das redes sociais em casos objetivos (como


quando elas recebem dinheiro por conteúdos que geram danos a
terceiros, por exemplo);

6. Sanções claras para guiar o Judiciário em suas decisões.

Jonas afirma que já há leis que regulam o ambiente digital, como o Marco
Civil da Internet, a Lei Geral de Proteção de Dados, entre outras
disposições, mas é importante pontuar que há um vácuo sobre tipos de
obrigações ainda não previstos em lei, e isso tem aberto espaço para a
atuação do Judiciário.

Elon Musk e Alexandre de Moraes Foto: Gonzalo Fuentes/Reuters e Pedro Kirilos/Estadão

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Em questões que versam sobre quais conteúdos devem ser retirados do


ar, por exemplo, a maioria das plataformas segue seus próprios
parâmetros e políticas. Segundo Caio Vieira Machado, pesquisador em
Harvard e diretor-executivo do Instituto Vero, não há uma lei que
regulamente de forma clara as bases legais para moderação de conteúdo
e suspensão de contas, somente jurisprudência para casos em que crimes
já foram cometidos.

“Quando a gente fala de um crime é bem fácil, porque a Justiça pode


emitir uma ordem para que aquela prática seja prevenida ou para a
proteção de direitos. Já a moderação de conteúdo passa por o que é
flagrantemente ilegal e por coisas mais cinzentas, em que a gente não
tem uma certeza clara naquele momento”, afirma.

Legislação atual
A legislação atual sobre a regulação do uso da internet no País, em vigor
desde 2014, prevê que as plataformas digitais não podem ser
responsabilizadas por conteúdos de terceiros. O artigo 19 do Marco Civil
da Internet entende que elas servem para conectar diferentes pessoas,
que têm a possibilidade de compartilhar conteúdo de forma livre.

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A única exceção, comenta João Victor Archegas, coordenador do grupo de


pesquisa em constitucionalismo digital e moderação de conteúdo
ModeraLab e pesquisador sênior do ITS Rio, é quando existe alguma
decisão judicial que entende que aquele conteúdo é ilegal, ou seja, que
causa um dano a outra pessoa, e aí se determina judicialmente pela
exclusão do conteúdo. “A partir daquele momento, se a plataforma não o
remover, ela passa a ser responsável por eventuais danos causados pelo
conteúdo”, afirma.

Para ele, a discussão sobre o Projeto de Lei 2630/2020, popularmente


conhecido como PL das Fake News, atualiza o ordenamento jurídico em
questões que ainda não eram relevantes em 2014, quando o Marco
Regulatório foi promulgado – como práticas de deep fake, por exemplo
– e estabelece três eixos: responsabilização, transparência e fiscalização.

O projeto tramita pelo Congresso desde 2020. Iniciativa do senador


Alessandro Vieira (MDB-SE), a proposta foi aprovada em menos de dois
meses no Senado, mas desde 2021 segue na Câmara, atualmente sem
previsão de votação. Mesmo após o embate entre Musk e Moraes neste
final de semana, líderes partidários da Câmara, tanto do Centrão, quanto
da esquerda, veem poucas chances de o projeto de lei das fake news ser
votado no curto prazo.

Para Archegas, no entanto, mesmo se o PL das Fake News já estivesse


valendo como lei, não impediria que o embate protagonizado por Musk e
Moraes ocorresse. “Isso não muda a natureza do problema que é uma
relação entre Estado e plataformas digitais. Essas big techs estão se
desprendendo da órbita gravitacional do Estado. Os instrumentos
regulatórios clássicos que o Estado tem à sua disposição, como
responsabilização, imposição de deveres, fiscalização, entre outros, já
não dão mais conta do problema porque essas plataformas atuam no
plano transnacional e muitas vezes entram em conflito com o Estado,
inclusive desafiando essas decisões.”
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Dificuldade de regulamentar
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Para o especialista em Direito Digital e coordenador do curso de Direito


da ESPM, Marcelo Crespo, a principal dificuldade de melhor
regulamentar o ambiente digital no Brasil, atualmente, é o lobby dessas
grandes plataformas.

“Também não acho que a alteração deva ser de qualquer jeito, e


simplesmente responsabilizar as empresas a qualquer custo. Mas, sem
dúvida nenhuma, eu acredito que esse modelo estabelecido pelo Marco
Civil em 2014 está datado e precisa ser atualizado”.

Outro ponto é o frequente argumento de que a regulamentação se choca


com a liberdade de expressão, o que dá ares polêmicos para a discussão e
é refutado pelos especialistas. “A liberdade de expressão no Brasil não é
um conceito individual, mas sim jurídico. Eu não posso ser racista, eu
não posso ser preconceituoso, caluniar, difamar, apresentar acusações
sem ter provas, tanto no ambiente virtual como fora dele”, comenta o
professor.

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No embate entre Musk e Moraes, Caio Machado afirma que, de um lado,


o ministro tem tentado conter ameaças à democracia, mas com ausência
de uma base legal clara para isso, enquanto do outro, o bilionário
contesta essas medidas e capitaliza a agenda política.

“A pergunta que tem que estar presente nesse debate é se Musk deveria
ter o direito de tratar a plataforma como o quintal da casa dele, porque a
plataforma é uma empresa privada, mas com serviço de interesse
público, de comunicação. O que ele tem feito, diferente das outras redes
sociais, é tratar isso como um espaço estritamente dele, desbloqueando
contas quando interessa, bloqueando quando interessa”, questiona o
professor.

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