Você está na página 1de 4

08/03/2023, 09:54 Leis aplicáveis na interação entre bots e pessoas | Legislação | Valor Econômico

g1 ge gshow

Legislação
PUBLICIDADE

Leis aplicáveis na interação entre bots e pessoas


Quando um governo deseja regulamentar toda a inteligência artificial em uma única
lei torna-se muito mais desafiador

Por Patricia Peck


07/03/2023 05h03 · Atualizado há um dia

Um bot é uma aplicação de software que simula ações humanas, mas obviamente
não é um humano. Seu ponto forte, além da agilidade e baixo custo, é a capacidade
de receber instruções e seguir um roteiro pré-programado, evitando cair em
situações que gerem uma experiência ruim - mas que podem acontecer. Alguns
possuem modelos que combinam árvore de decisão e sugestões para o usuário e
outros mais sofisticados têm autonomia.
https://valor.globo.com/legislacao/noticia/2023/03/07/leis-aplicaveis-na-interacao-entre-bots-e-pessoas.ghtml 1/11
08/03/2023, 09:54 Leis aplicáveis na interação entre bots e pessoas | Legislação | Valor Econômico

Enquanto evoluem as discussões sobre uma possível regulamentação de


Inteligência Artificial no Brasil, é fácil perceber a constante presença desses
assistentes robotizados nos mais diferentes atendimentos ao consumidor de todas
as idades, como situações de lazer, compras, crédito, pesquisa, estudo, saúde,
trabalho ou relacionamento.

Quando um governo deseja regulamentar toda a inteligência


artificial em uma única lei torna-se muito mais desafiador

Mas se existe interação com humanos, com o objetivo de informar ou influenciar


uma decisão, passa a ser fundamental que esses dispositivos tenham uma conduta
transparente e sigam regras bem estabelecidas. Ou seja, todo e qualquer bot deve
cumprir as leis vigentes.

Sua programação e interface precisam atender a um framework de conformidade


legal com requisitos mínimos relacionados a regulamentações, como a Constituição
Federal, o Código de Defesa do Consumidor, o Estatuto da Criança e do Adolescente,
a Lei de Proteção de Dados Pessoais, a Lei do SAC e a Lei de Acesso à Informação.
Além disso, precisam atender outras legislações específicas conforme o perfil da
aplicação e o setor que estiver inserido, como um atendimento relacionado ao setor
financeiro ou de energia, por exemplo.

Uma situação muito crítica é a proteção de dados pessoais, em que o bot precisa
seguir um código de conduta e melhores práticas, previsão que está inclusive no
artigo 4º do PL 21/20 (Marco Legal de Inteligência Artificial). Para atender à Lei Geral
de Proteção de Dados Pessoais (LGPD), o bot precisa cumprir com princípios éticos e
de transparência, não discriminação, informar sobre tratamento de dados pessoais
e dados pessoais sensíveis, fazer confirmação de autenticação e avisar sobre a
política de privacidade e o canal de contato do Encarregado de Dados (DPO) da
empresa.

https://valor.globo.com/legislacao/noticia/2023/03/07/leis-aplicaveis-na-interacao-entre-bots-e-pessoas.ghtml 2/11
08/03/2023, 09:54 Leis aplicáveis na interação entre bots e pessoas | Legislação | Valor Econômico

O estado americano da Califórnia, por exemplo, foi o primeiro a ter uma lei
específica para exigir que o bot se identifique, haja de forma transparente, proibindo
qualquer atitude ludibriosa com a intenção de enganar sobre conteúdos de
comunicação para incentivar uma compra ou transação comercial, ou mesmo
influenciar uma pessoa para votar em processo eleitoral (Senate Bill n. 1001/2018).

No Brasil, já temos várias denúncias feitas com relação ao comportamento de bots


que não estão em conformidade com as leis vigentes junto ao site Reclame Aqui e
também junto à Autoridade Nacional de Proteção de Dados (ANPD), que podem
ensejar aplicação de multas para seus controladores, desenvolvedores e/ou
proprietários.

Toda empresa que implementa um bot precisa adotar um fluxo que permita
atender direitos de titulares previstos nos artigos 18 e 19 da LGPD, assim como as
exigências específicas do artigo 20, para garantir a possibilidade de solicitar revisão
em atendimentos automatizados, cabendo ao controlador responder sobre os
critérios e fundamentos utilizados.

Logo, independentemente do tipo utilizado, é extremamente necessário que siga


um código de conduta ético definido para comportamento robótico, que esteja
treinado e habilitado nas tratativas com os usuários, para saber responder e lidar
com situações que podem envolver até assédio. Isso protege o próprio
desenvolvedor do bot e ajuda na limitação de responsabilidade.

Interessante reforçar que, diferente das situações com humanos, nas relações com
bots há muito mais documentação e evidências, além da possibilidade de
auditabilidade ao periciar o próprio bot para esclarecer e dar o depoimento dos
fatos de maneira idônea e imparcial. Portanto, a possibilidade de responsabilização
é maior.

https://valor.globo.com/legislacao/noticia/2023/03/07/leis-aplicaveis-na-interacao-entre-bots-e-pessoas.ghtml 3/11
08/03/2023, 09:54 Leis aplicáveis na interação entre bots e pessoas | Legislação | Valor Econômico

Por certo, em um futuro não muito distante, veremos ordens de prisão a bots e seus
proprietários, decisões que determinam pena de desligamento de bot (o mesmo
que uma pena de morte robótica), debate sobre censura de bot e até perda de
emprego para bots. São consequências da sua inserção social na nossa realidade
digital e que demandam transparência e responsabilização nessas relações.

De todo modo, fica a questão da complexidade de regulamentar a inovação


tecnológica. Um aspecto relevante é a capacidade de avaliação dos riscos envolvidos
como, por exemplo, a verificação de qual é a taxa de assertividade de um algoritmo,
que pode ser de 99% - ou seja, em somente 1% dos casos há erro. Mas os impactos
de uma taxa pequena de erro em uma situação de reconhecimento facial, podem
ser, por sua vez, muito mais relevantes quando se analisa a mesma taxa aplicada ao
contexto de carros autônomos ou ainda de saúde, quando são usados para decidir
sobre internação de UTI.

Ou seja, a possibilidade de viés, que significa identificar qualquer indicador de desvio


ou tratamento discriminatório que possa levar a um resultado equivocado ou
danoso, poderá ter maior gravidade dependendo do setor e do tamanho da
população envolvida.

Por isso, quando um governo deseja regulamentar toda a inteligência artificial em


uma única lei torna-se muito mais desafiador e passível de injustiças, pois faria
muito mais sentido tratar a legislação de forma setorizada, como é o modelo norte-
americano, para alcançar com mais profundidade todas estas implicações e
aumentar a eficiência e a proteção de toda a sociedade.

Patricia Peck é CEO e sócia do Peck Advogados, conselheira titular do Conselho


Nacional de Proteção de Dados (CNPD) e professora da ESPM

Este artigo reflete as opiniões do autor, e não do jornal Valor Econômico. O


jornal não se responsabiliza e nem pode ser responsabilizado pelas
informações acima ou por prejuízos de qualquer natureza em decorrência do
uso dessas informações

Links patrocinados por taboola

https://valor.globo.com/legislacao/noticia/2023/03/07/leis-aplicaveis-na-interacao-entre-bots-e-pessoas.ghtml 4/11

Você também pode gostar