Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
19 de abril de 2021
3 A Escolha Colectiva
1
• nem sempre é verificável (ou desejável, por parte do Governo), tal como se
afirma na abordagem da escolha pública a la Buchanan.
Aqui iremos considerar a abordagem da escolha colectiva, que se torna par-
ticularmente interessante perante a questão dos bens públicos, na medida em
que, para estes, tal como visto nos capítulos anteriores, a quantidade (fornecida)
é única, mas existem diversos preços.
Quanto aos tipos de regras, temos:
• Ditadura – Um (único) agente decide isoladamente;
• Maioria Simples/Relativa – A opção que tiver mais votos é a escolhida;
• Maioria Absoluta – A opção que tenha mais de 50% dos votos é a escolhida;
• Maioria Qualificada – A opção que obtiver mais de 2/3, 3/4, 7/8, ..., dos votos
é a escolhida;
• Unanimidade – A opção escolhida tem que obter o voto favorável de todos.
Colocam-se, então, duas questões:
• que tipo de regra se deve usar?;
• existe alguma regra que não apresente problemas?.
Os tipos de regras desejáveis dependem do problema em causa. Como é sa-
bido, perante:
• problemas de eficiência – já que se está perante melhoramentos/melhorias
de Pareto, todos podem/têm que melhorar (ou, pelo menos não piorar) a sua
situação;
• problemas de equidade – já que se está perante uma redistribuição, uns
ficarão melhor e outros ficarão pior.
A questão da eficiência é bem evidente em Barbosa (1997: 56-57). Reproduzam-
se os quadros 1.5 e 1.6 e verifique-se que um resultado ineficiente seria aprovado
(por maioria simples), o que também levantaria problemas de equidade.
2
Estes dois exemplos mostram como uma regra democrática, no caso a maio-
ria simples, pode dar origem a um resultado algo paradoxal. Na verdade, outros
paradoxos são relevantes na matéria, nomeadamente o paradoxo de Condorcet
(em homenagem ao nome de quem o terá apresentado em primeiro lugar). Na
verdade o paradoxo de Condorcet não é o único a colocar-se nestas questões da
escolha colectiva. Ainda antes deste ter sido apresentado por Condorcet, um ou-
tro autor francês, Borda, apresentou um outro paradoxo, o qual ficou conhecido,
precisamente, por paradoxo de Borda, que se ilustra de seguida.
Ordem 1 votante 7 votantes 7 votantes 6 votantes
1.a A A B C
2.a B C C B
3.a C B A A
Conforme é evidente, a opção A é a preferida por mais votantes, ou seja 8. É,
no entanto, também a opção mais detestada pela maioria dos votantes, i.e por 13.
O mesmo se poderia concluir com este outro exemplo:
3
Este quadro pode ser condensado no seguinte:
votos 1 3 3 3
1.o lugar A A B C
2.o lugar B C C A
3.o lugar C B A B
De acordo com o método da pluralidade, ganha a proposta que tiver mais vo-
tos em 1.º lugar. De acordo com este método, ganharia a proposta A. Todavia, a
comparação par-a-par mostra que, efectivamente, 4 em 10 preferem a proposta A
à proposta C, mas que, obviamente, 6 em 10 preferem a proposta C à proposta A.
O critério de Condorcet pretende ser um critério de justiça. Assim, a proposta C
é preferível à proposta A e é, também, preferível à proposta B, já que, 6 em 10 vo-
tantes a preferem, em relação a B. Logo, de acordo com aquele critério, a proposta
C deverá ser a escolhida.
Tal como atrás se referiu, o paradoxo de Condorcet associa-se ao teorema de
Arrow.
Em termos mais rigorosos, o teorema de Arrow afirma que “Não há forma de
passar das preferências individuais para as preferências colectivas”, sem que se
viole, pelo menos uma, das seguintes condições, perfeitamente aceitáveis/desejá-
veis:
• Postulado de Pareto – As preferências sociais devem valorizar mais os me-
lhoramentos de Pareto;
• Inexistência de ditadura – As preferências sociais devem reflectir as prefe-
rências de todos e não somente de um (único) indivíduo;
• Racionalidade das preferências – As preferências devem respeitar o princí-
pio da transitividade;
• Domínio irrestrito das preferências – Por exemplo, da mesma forma que
se admite que alguém prefira despesa pública em saúde ou educação a des-
pesa em defesa nacional, não se pode, à partida, impedir que outro alguém
prefira despesa pública em defesa nacional do que em saúde ou educação;
• Independência em relação às alternativas irrelevantes – Se, em termos so-
ciais, X é preferível a Y, esta preferência não se deve alterar se se introduzir
ou eliminar uma alternativa Z.
Por outras palavras, o teorema de Arrow afirma que, salvo raras excepções, não
há nenhuma regra de escolha colectiva que satisfaça, simultaneamente, aquelas 5
condições. Este resultado parece suscitar dúvidas sobre a possibilidade de se pro-
ceder à escolha colectiva, por via da dificuldade/impossibilidade de se agregarem
as preferências individuais numa única que traduza, fielmente, os interesses co-
lectivos. Conforme iremos ver, no próximo ponto, nem sempre é impossível re-
solver o problema da escolha colectiva, tal como acontece quando se aplica o, cha-
mado, teorema do votante/eleitor mediano.
4
3.2 Análise de Alguns Tipos de Votação
Eventualmente, a primeira referência à melhor regra de votação, como suporte à
escolha colectiva, foi feita por Wicksell, em princípios do século XX, o qual de-
fendeu o uso da regra da maioria qualificada em problemas de afectação. Mais
tarde, Buchanan & Tullock (1962) formalizaram o problema de acordo com a Fi-
gura 1 [cf. Pereira et al. (1992: 95)]. De acordo com a proporção de votantes que é
necessária para a aprovação de uma determinada opção – em que 0% = 0 repre-
sentaria a ditadura e 100% = 1 a unanimidade – existirão custos, ditos de decisão,
os quais aumentam com aquela proporção, e custos, ditos externos, que serão os
suportados pelos votantes que saem derrotados, os quais diminuem com aquela
proporção.2
Querendo determinar a proporção que minimize a soma dos dois custos, há
que determinar o ponto em que a curva dos custos totais (i.e. de decisão + externos)
atinge o seu mínimo, tal como se pode verificar na Figura 1.
Custos externos
Custos de decisão
Custos totais
Custos
Os custos externos chamam a atenção que as regras de votação podem ter im-
plicações sobre a eficiência ou sobre a equidade.
Em relação aos problemas de redistribuição, quanto maior o número de votos
favoráveis à aprovação de uma mudança (em relação ao status quo), mais difícil é a
sua aprovação. A propósito desta questão, considere-se a Figura 2, [cf. Pereira et
al. (1992: 95)].
2
Por exemplo, se se tratar da unanimidade, será, em princípio, esta a situação que poderá envol-
ver mais tempo na tomada de decisão, logo maiores custos de decisão, mas será também aquela em
que, em princípio, não haverá derrotados, logo os custos externos deverão alcançar o seu nível mais
baixo.
5
UB
Y
X
Status Quo
0 UA
6
Utilidade
G̃ Despesa Pública
Por hipótese, admita-se que G̃1 < G̃2 < G̃3 < G̃4 < G̃5 .
Suponha-se agora que se colocam à votação dois níveis de despesa pública, GA
e GB (sendo GB > GA ), de tal forma que GB está mais próximo de G̃3 do que GA
está. Neste caso, obviamente, haverá 3 votos a favor de GB e 2 a favor de GA . Pode
concluir-se, então, que o votante mediano é o determinante.
Veja-se, para terminar, uma aplicação do teorema do eleitor/votante mediano,
tendo por base as votações em bens públicos financiados diferenciadamente.3
Admita-se que cada votante votará no nível de despesa pública que lhe ma-
ximiza os benefícios líquidos, ou seja no ponto onde os benefícios marginais são
iguais aos custos/sacrifícios marginais, tal como mostra a Figura 4 [cf. Pereira et
al. (1992: 106)].
3
Note-se que as figuras que se seguem não devem ser entendidas como perfeitamente rigorosas,
do ponto de vista matemático, porque não se dispõe do conhecimento do valor da utilidade, se Q = 0
– por isso mesmo não se apresenta a sua escala, nem a origem dos eixos – mas, obviamente, são
suficientemente rigorosas para ilustrar a questão em análise.
7
SM g; BM g
SM g
BM g
Q
Q̃
8
SM g; BM g
SM gP
SM gM
SM gR
BM g
Q
Q˜P Q˜M Q˜R
9
SM g; BM g
SM g
BM gP
BM gM
BM gR
Q
Q
Q˜R Q˜M Q˜P
Finalmente, uma hipótese ideal seria a de todos os indivíduos terem como va-
lor ideal de quantidade de bem pública a mesma. Tal obrigaria a que os benefícios
e sacrifícios marginais fossem distintos, de indivíduo para indivíduo, o que se po-
deria obter com os chamados imposto à Lindhal, conforme se mostra na Figura 7
[cf. Pereira et al. (1992: 111)].
10
SM g; BM g
SM gP
SM gM
BM gP
SM gR
BM gM
BM gR
Q
Q
Q˜R = Q˜M = Q˜P
11