Você está na página 1de 9

1

ASPECTOS EMOCIONAIS DA HOSPITALIZAÇÃO DE


LACTENTES*

JOSÉ OTTONI OUTEIRAL **


PAULO PEREZ ***

* Trabalho realizado no Departamento de Pediatria e Puericultura da Faculdade de Medicina da


Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, RS., 1971. Primeiro trabalho
publicado.

** Médico residente no Centro Psiquiátrico Melanie Klein e aluno do Curso de Especialização


em Clínica Psiquiátrica do Departamento de Psiquiatria e Medicina Legal da Faculdade de
Medicina da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre.

*** Médico Graduado pela Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Rio Grande do
Sul, Porto Alegre.

**** R. AMRIGS, Porto Alegre, 16 (3) : 263-8, set. 1972.

RESUMO: Os autores fazem uma revisão bibliográfica sobre a importância das perturbações
emocionais ocasionadas pela carência do afeto materno na hospitalização de lactentes e sua
relação com o desenvolvimento da personalidade e com casos extremos de deteriorização total
progressiva. Apresentam um minucioso estudo da influência da proximidade da mãe no
desenvolvimento da personalidade do indivíduo, destacando as definições de “síndrome de
privação materna”, “depressão anaclítica ou privação efetiva parcial” e “hospitalismo ou
privação efetiva total”. As conclusões incluem sugestões que visam atenuar a ansiedade
despertada na criança pela separação da mãe e pelo ambiente da equipe de atendimento em
relação ao desenvolvimento normal e patológico, assim como de um maior contato possível da
criança com a mãe.

UNITERMOS: Síndrome de privação materna*; Depressão anaclítica*; Hospitalismo*;


Hospitalização de lactentes.

I. INTRODUÇÃO

A necessidade de hospitalização de crianças requer ser analisada sob vários ângulos.


Não só a situação econômica da família ou os problemas hospitalares, como a maior
exposição a infecções, por exemplo, possuem significância. O aspecto emocional deve
ser também considerado, o que não ocorre com freqüência.

A estrutura emocional do grupo familiar experimentará modificações determinadas por


suas fantasias acerca do afastamento de um de seus membros, sobre a doença e sobre a
morte. Ocorrerão alterações tanto nos pais e irmãos (temores, falsos conceitos, etc.)
como na criança hospitalizada (ansiedade de separação, sensação de abandono,
sentimentos de culpa e castigo, etc.)
2

Deve-se levar em consideração que “doença” não é apenas a existência de uma lesão
e/ou disfunção orgânica mas também a reação global da personalidade do paciente a
esta lesão e/ou disfunção orgânica².
Com esta conceituação podemos compreender o quanto será suscetível emocionalmente
uma criança “doente”, separada de seus pais e irmão e hospitalizada.

Nosso objetivo neste trabalho de revisão é o enfoque de alguns aspectos emocionais da


hospitalização de lactentes. Utilizando os conceitos e conhecimentos da Psiquiatria
Dinâmica, abordaremos duas hipóteses:

a. a importância das primitivas relações objetais, a relação mãe-filho, como padrão para
o desenvolvimento posterior da personalidade.

b. a importância da perturbação emocional ocasionada pela carência do afeto materno –


ausência ou deficiência de relações objetais – quando da separação do lactente de sua
mãe ocasionada pela hospitalização.

II. REVISÃO DA LEITURA

FREUD7 em “Três ensaios sobre a sexualidade” (1905) introduziu o estudo das relações
mútuas entre mãe e filho, entre o objeto e sujeito, observando que os fenômenos
psicológicos são baseados sobre a interação entre um fator congênito e um fator
ambiental (o papel da série complementar na etiologia das neuroses). Seus estudos o
levaram a descobrir que as causas iniciais dos distúrbios mentais de seus pacientes
tinham uma origem remota na sua história individual, encontravam-se em fatores que
influenciaram as fases iniciais do desenvolvimento da personalidade.

MELANIE KLEIN¹¹ através da análise de crianças pequenas utilizando a “técnica do


jogo” (play therapy) criada e desenvolvida por ela, aprofundou ainda mais o estudo das
primitivas relações d objeto. Observou que na medida em que psicóticos agudos
regridem aos primeiros meses de infância, eles retornam a uma fase do desenvolvimento
que já apresentava características patológicas15. Assim, a exploração do
desenvolvimento do indivíduo conduz de volta, através de estágios graduais, à infância.

KANNER¹, ¹° em seu livro “Child Psychiatry” descreveu uma patologia infantil


estreitamente ligada com a relação mãe-filho. A esta situação a que Kanner chamou de
“Autismo Infantil Precoce” – 1943 – corresponderia uma espécie de esquizofrenia
infantil ligada à influência materna. Estas crianças desde o nascimento parecem
retiradas do contato social, falam de maneira pouco compreensiva e são incapazes de se
relacionar significativamente com pessoas. Kanner constatou que as mães destas
crianças eram inteligentes, mas frias e emocionalmente muito afastadas de seus filhos.

MARGARET MEAD¹² estudando grupos primitivos da Nova Guiné, observou relações


entre a maneira como cada um desses grupos lidava com suas crianças e o
comportamento dos adultos. O Grupo dos Arapesh que apresentava um caráter pacífico,
amoroso e comunitário dava aos bebês uma afetuosa, contínua e constante sensação de
segurança física.
3

As crianças eram sempre carregadas pelas mães contra o corpo ou em pequenas sacolas
feitas de fibras macias, que lhes permitia a mesma percepção do corpo vivo onde se
apoiavam. Mais tarde, quando as crianças já podiam andar e correr e, portanto, tropeçar
e cair, Mead viu que os adultos Apareshes esforçavam-se por estar sempre por perto e
evitar acidentes. Um outro grupo, os Mundugumor, caracterizavam-se por belicosidade,
violência, individualismo e medo. As mulheres em geral não desejavam filhos e
pareciam detestá-los desde o nascimento. Os bebês eram tratados, alimentados e
ninados de modo rígido e abrupto. Raramente eram embalados nos braços das mães e
eram carregados em cestas duras e ásperas. Recebiam alimentação em posição
desconfortáveis e com palavras rudes.

ANNA FREUD18 observou crianças britânicas durante a guerra, notando que as que
podiam permanecer com suas mães suportaram os bombardeios e outras situações de
“stress” de forma satisfatória, enquanto que as separadas de suas mães apresentavam
perturbações emocionais em situações menos significativas.

JOHN BOWLBY³ em 1958, chamou a reação emocional que a criança experimenta


quando separada da mãe de “ansiedade de separação”. Ele acentua que a criança
separada da mãe passa por três fases – protesto, desespero e, finalmente, isolamento
(Síndrome de Separação de Bowlby). Na fase de protesto a criança fica zangada porque
a mãe foi embora; depois começa a perder a confiança de que ela volte; finalmente seu
desespero se transforma em isolamento e a criança se torna indiferente. Ele estabelece
relação entre estas fases e o luto, sustentando que a psicopatologia do lactente é
semelhante às formas patológicas dos adultos descritas por Freud em “Luto e
Melancolia” – 1917. Concorda com Melanie Klein em que a maneira como a criança
reage na época da privação determina a maneira como reagirá posteriormente na vida à
perda de um ente querido. Bowlby revisando a literatura sobre a privação parental e o
desenvolvimento posterior da personalidade encontrou que há uma associação
significativa entre a privação precoce dos pais (devido à morte, hospitalização ou outras
causas) e a formação de uma personalidade psicopática ou a uma conduta anti-social¹°,
²°.

SCHAFFER e CALLENDER4 notaram que crianças com menos de cinco meses


mostram uma reação global à hospitalização. Alterações nos padrões de alimentação,
apetite e perda de peso, são respostas quando as crianças são manejadas diferentemente
da rotina utilizada pela mãe. Os autores descrevem que, em torno dos seis meses de
idade, os bebês desenvolvem uma ansiedade despertada por novos ambientes e pessoas
estranhas seguida, logo após, por uma “ansiedade de separação” que alcança seu ponto
máximo nos dois anos de idade. Eles escrevem que “a criança após os três anos de idade
experimenta uma espécie de ansiedade baseada no medo de perder a mãe, reforçada pela
capacidade limitada da criança para compreender a realidade, sua incapacidade para
julgar a passagem do tempo e sua tendência para interpretar o desaparecimento da mãe
como punição para mau comportamento. A regressão é comum nesta idade. A sucção
dos dedos, dificuldade na alimentação, necessidade em retornar à mamadeira e a perda
do controle dos esfíncteres (vesical e anal) são exemplos de regressão freqüentemente
observados*.

SILVER16 afirma que o desenvolvimento das primeiras relações emocionais provém do


íntimo contato entre a criança e mãe no ato da alimentação. A amamentação será
somente a satisfação das necessidades físicas e uma interação emocional com uma
4

pessoa. A ausência prolongada dessa relação, se não satisfatoriamente substituída, é


prejudicial à personalidade. Se permanente, continua Silver, leva à restrição do
desenvolvimento da personalidade e mesmo a um retardamento em todas as áreas. Ele
escreve que “tal comportamento pode ocorrer também numa situação doméstica, mas
PE mais grave e mais comum em crianças que permanecem por longos períodos de
tempo no hospital ou em outras instituições onde o pessoal de enfermagem é
inadequado (seja em número ou habilidade) para dar atenção carinhosa e
individualizada para cada criança. Se a criança sofre privação da segurança e afeição
necessária para produzir sentimento de confiança ela poderá responder com letargia,
imobilidade, apetite indiferente, aparência de infelicidade e insônia. Em outros casos a
privação continuada de cuidado consistentes pode não se tornar evidente até a vida
adulta, quando o indivíduo poderá sentir que não tem razão para confiar as pessoas.
Pode resultar então que ele não sinta responsabilidade sobre seus semelhantes**.

PATTON E GARDNER¹³ num trabalho (Síndrome de Privação Materna) em que foram


estudadas seis crianças trazidas à consulta médica por retardo de crescimento e
desenvolvimento e nas quais as queixas haviam se desenvolvido durante a vida em casa
com as mães, notaram um síndrome de severo retardo no crescimento, maturação
esquelética atrasada e pobre desenvolvimento motor e intelectual que estava associado
com um distúrbio específico do comportamento maternal e da organização familiar
chamado “provação materna”. Esta privação consistia de negligência, rejeição e
isolamento de contatos sociais normais.

Consideraram esses autores que o retardo do crescimento pode ser considerado como
uma desordem psicossomática e forneceram, numa revisão da literatura a respeito,
diversas hipóteses para explicar o fato Em primeiro lugar à criança nutrientes
adequados. Isto, indubitavelmente, ocorre em alguns casos, mas não é tido, por esses
autores e outros que estudaram este síndrome, como o fator limitante na maioria das
crianças. Em segundo lugar uma redução do apetite e mesmo da procura de alimentos
pode resultar da letargia e depressão que estas crianças freqüentemente apresentam.
Uma terceira possibilidade é que a motilidade intestinal e taxas de absorção poderiam
estar alternadas de tal maneira que chegariam a impedir a assimilação de nutrientes
ingeridos. As observação de ENGEL e col.6 mostraram a associação entre secreção
gástrica e estado emocional em crianças. Finalmente há a possibilidade de que
distúrbios emocionais poderiam ter um efeito direto no metabolismo intermediário de
tal maneira que interfeririam com processos anabólicos. É bem conhecido que a
produção e liberação de vários hormônios da neurohipófise são influenciados pelos
centros hipotalâmicos, os quais, por sua vez, recebem estímulos nervosos que vêm dos
centros mais altos, particularmente do córtex límbico e dos núcleos amidalóides. Isto se
reveste de importância pelo fato de que se pensa atualmente ser o córtex límbico o
“lócus” das emoções do comportamento. PATTON e GARDNER¹³ notaram ainda que
os aspectos clínicos deste síndrome parecem quase idênticos com aqueles previamente
descritos em crianças hospitalizadas e chamados de “hospitalismo e “depressão
anaclítica”.

*BURLING, K. A. COLLIP, P. J. Emotional responses of hospitalized children. Results of a


pulse moniton study. Clin Pediat New York. Buffalo, N. Y., 8(11): 644, 1969.
** SILVER, Henry K. Handbook of Pediatrics – Califórnia – Lange Medical Publication, 1969
– p33.
5

Essa última observação está de acordo com a feita por Coleman e Provence que, numa
trabalho6 apresentado em 1957, observaram duas crianças hospitalizadas por “retardo do
desenvolvimento”. O estudo das mães destas crianças mostrou que o retardo era devido
a dificuldades experimentadas pelas mães. Eles ressaltam a importância de se identificar
sintomas de hospitalismo mesmo em crianças que vivem com suas famílias.

Nos últimos vinte anos têm sido desenvolvidas observações em torno da Psicologia
Experimental. Esses estudos têm sido realizados tanto em animais como em seres
humanos. No primeiro grupo destacam-se os trabalhos de Harlow, enquanto que as
experiências com seres humanos foram realizadas principalmente por Spitz.

HARLOW9, 14 estudando grupos de macacos Rhesus observou que a separação de


filhotes de suas mães, durante um período de duas semanas ocasionou modificações no
comportamento desses animais semelhantes aos encontrados por Bowlby em crianças
separadas de suas mães. Nesta experiência utilizou dois grupos de macacos; num deles
os filhotes eram separados das mães logo após o nascimento, sendo colocados em
contato com outros macacos somente após oito meses. No outro grupo os filhotes foram
criados com a mãe desde o nascimento e separados dela por volta do sexto mês. No
primeiro grupo, Harlow observou que a privação de um contato físico, durante seus
primeiros oito meses, tinha afetado a capacidade desses filhotes em desenvolver um
padrão de afeição normal. Nos macacos do segundo grupo, não houve perda de resposta
afetiva mesmo depois de dezoito meses de separação.

RENÉ SPITZ17, 18 descreveu duas entidades: uma resultante da privação parcial do afeto
materno – a Depressão Anaclítica – e outra resultante da privação afetiva total – o
Hospitalismo.

II. DEPRESSÃO ANACLÍTICA E HOSPITALISMO

Privação afetiva parcial – Depressão Anaclítica

SPITZ17 observou 34 crianças que depois de um período mínimo de seis meses de


relações boas com as mães foram separadas delas por um tempo mais ou menos longo.
Essas crianças apresentavam um quadro clínico, progressivo de mês a mês, em função
da duração da separação. Ele descreve que “no primeiro mês as crianças tornam-se
chorosas, exigentes e agarram o observador que entra em contato com elas. No segundo
mês os choros transformam-se em gritos. Há perda de peso e parada de
desenvolvimento. No terceiro mês recusam contato, permanecem a maioria das vezes
deitadas sobre o ventre (“posição patognomônica”) e têm insônia. A perda de peso
continua. Há tendência em contrair doenças intercorrentes. Generalização do retardo
motor. Rigidez da expressão facial. Após o terceiro mês a rigidez do rosto fica
estabelecida. O choro cessa e é substituído por gemidos raros. O retardamento aumenta
e ocorre a letargia”.

Ele observou que a depressão desaparecerá se antes de um período crítico, que este situa
entre o fim do terceiro e o fim do quinto mês, a criança reencontre a mãe ou se esta for
substituída por outra aceitável para o bebê.
6

Spitz denominou o quadro que essas crianças apresentavam de “Depressão Anaclítica”


pela similitude que apresenta com o quadro clínico adulto. Observou também que uma
das condições necessárias para que a criança apresente o quadro de Depressão
Anaclítica e que ela tenha tido boas relações maternas prévias, sendo que as crianças
que apresentavam relações maternas más, quando separadas de suas mães desenvolviam
perturbações de natureza diferente.

Privação afetiva total – Hospitalismo

O material de estudo consistiu de 91 lactentes residentes em um orfanato que, durante


os três primeiros meses de vida, foram criados ao seio pelas mães. Durante o período de
aleitamento essas crianças comportaram-se e se desenvolveram de acordo com a média
das crianças normais da região onde se encontrava o orfanato. Após o terceiro mês
foram desmamados ficando sob os cuidados de uma enfermeira que tinha a seu cargo
cerca de dezenove crianças. Recebiam cuidados perfeitos (nutrição, cuidados higiênicos
e outros).

Spitz considerou que como a enfermeira se ocupava de dez ou mais crianças, cada uma
delas recebia apenas um décimo das provisões maternais, o que para ele constitui
carência afetiva completa.

Depois de separadas das mães, essas crianças apresentaram os estados que ele havia
descrito Omo de privação parcial. Superada esta situação o retardo motor tornou-se
evidente. As crianças mostravam passivas, prostradas no leito, com o rosto vazio e
expressão, geralmente com um “ar imbecilizado” e com a coordenação ocular muitas
vezes defeituosa. Depois de algum tempo a motricidade se manifestou sob a forma de
movimentos bizarros dos dedos, lembrando os movimentos dos catatônicos ou dos
descerebrados. P nível de desenvolvimento mostrou, ao fim do 2º ano, uma média de
45% do normal, representando o nível de idiotia. Essas crianças foram observadas até a
idade de 4 anos, sendo que certo número delas, nessa idade não chegava a andar, se pôr
de pé ou falar. A resistência diminuída contra as infecções e a deteriorização
progressiva conduziu uma porcentagem elevada dessas crianças ao marasmo e à morte.
Das 91 crianças observadas durante dois anos neste orfanato, 37% morreram. Em
contraste, ele observou que em uma outra instituição de características semelhantes,
onde porém as crianças eram cuidadas pelas próprias mães, durante quatro anos de
observação, com um total de 200 crianças, não houve nenhum caso de morte. Ele
conclui que “parece que a carência afetiva completa conduz a uma deteriorização
progressiva, que está em proporção direta com a duração da carência à qual o lactente
está submetido”*.

III. CONCLUSÕES E SUGESTÕES

A importância do trauma emocional a que é submetida uma criança de pouca idade,


quando separada de sua mãe, durante uma hospitalização por período longo, como
catalizador de modificações patológicas na personalidade juntamente com modificações
orgânicas, consideradas por PARRON e GARDNER¹³ como alterações psicossomáticas,
é observação sistemática na experiência clínica e na psicologia experimental.

* Ibid, p. 52.
7

Há, em realidade, dificuldades de ordem prática que impedem que a mãe acompanhe a
criança durante a hospitalização. Ainda que as crianças estejam sob cuidado da equipe
hospitalar é importante observar que Spitz considerou que a relação de uma enfermeira
para dez crianças, em rotina de atendimento hospitalar, já constitui provação afetiva
total.

Muitas vezes, durante “discussões de casos” ou “visita aos leitos” é abordada de


maneira profunda a história relatada pela mãe, os achados do exame físico e os
resultados laboratoriais, descuidando-se do aspecto emocional da criança. Acreditamos
que isto se deve à dificuldade que o clínico enfrenta, resultante de sua formação
organicista (que cria uma dicotomia entre soma e psique), em lidar com fatores (afetivos
e/ou emocionais) que constituem um desafio a seu conhecimento terapêutico (e ao
sentimento da onipotência) que ele lhe fornece, e a sua própria dificuldade em lidar com
aspectos de sua personalidade.

Algumas sugestões iniciais podem ser feitas visando atenuar a ansiedade despertada na
criança pela separação de sua mãe e pelo ambiente hospitalar.

1. Possibilitar um maior contato entre as crianças e suas mães por um período que,
sendo maior do que o atualmente concedido às visitas, não prejudique a rotina
hospitalar.

2. melhor formação da equipe de atendimento (médicos, estudantes de medicina e


enfermagem) em relação ao desenvolvimento normal e patológico – de crianças. Esse
item sugere a importância da introdução de conhecimentos de Psiquiatria Infantil nos
cursos de pós-graduação em Pediatria. Na realidade, como nos mostra CAPLAN5 em
seu livro “Principles of Preventive Psychiatry”, o pediatra pode colaborar nos
programas de Psiquiatria Comunitária e Psiquiatria Preventiva (prevenção primária).
Desta forma, o pediatra poderá estabelecer o diagnóstico precoce, fazer o
encaminhamento adequado e mesmo tratar algumas perturbações emocionais das
crianças, ajudando também na informação do grupo familiar sobre aspectos de saúde
mental.

3. organizar “grupos de mães”, que funcionando em nível operativo terão como tarefa
básica o relacionamento mãe-filho, em todos os seus aspectos. Nos grupos serão
abordadas tanto as situações derivadas das necessidades emocionais das crianças e das
mães como os problemas de nutrição, imunização, higiene, etc. Estes grupos (nos quais
aflotarão com bastante freqüência aspectos emocionais dos participantes) deverão ser
liberados por técnicos com experiência em Puericultura e Pediatria e sob a supervisão
de um Psiquiatra.

4. programação de atividades de recreação (ambientoterapia) com a colaboração de


voluntários (alunos do ciclo básico de Medicina, Psicologia e Enfermagem). Em
algumas universidades norte-americanas existe o Junio Public Health Intern, um
programa de oportunidades educacionais dos dois primeiros anos do curso.
8

SUMMARY: The authors present a bibliographic review on the importance of the emotional
disturbances caused by lack os mothering care in cases of hospitalization of nursling infants and
their relationship with the personality development as well as cases os extreme progressive
deteriozation. A thorough study of the influence of the proximity to the mother in the
personality development is made, focusing the definitions of “maternal deprivation syndrome”,
“anaclitical depression of partial affective deprivation”, and “hospitalismo r total affective
deprivation.. The conclusions include suggestions to minimize the child’s anxiety wich is
caused by separation from the mother and by the hospital environment. There is na emphasis
upon the necessity of a better formation of the hospital staff concerning normal and pathological
development, as well as the need of a maximal contact between mother and child.

UNTERMS: Maternal deprivation syndrome*, Anaclitical depression”; Hospitalism”;


Hospitalization of nusling infants.

BIBLIOGRAFIA CONSULTADA

1. ALEXANDRE, F. G & SELESNICK, S. T. História da Psiquiatria. São Paulo,


Ibrasa, 1968.

2. BLAYA, M. Aspectos da relação paciente-médico com o doente crônico. Revista


Médica, Porto Alegre, 2 : 453-60, 1967.

3. BRANSTETTEN, E. The Young child’s responde to hospitalization: separation


axiety or lack of mothering care. American Journal of Public Health, Tempe, Ariz,
59(1) : 92-7, 1969.

4. BURLING, K. A. & COLLIPP, P. J. Emotional responses of hospitalized children:


results of s apulse monitor study. Clinic Pediatrics, New York, N. Y., 8(11) : 641-6,
1969.

5. CAPLAN, G. Princípios de psiquiatria preventiva. Buenos Aires, Paidós, 1966.

6. ELMER, E. Failure to thrive: role of the mother. Pediatrics, Springfield, III., 25(4) :
717-25, Apr. 1960.

7. FREUD, S. “Una teoria sexual”. In: Id. Obras completas. Madrid, Biblioteca Nueva,
1948. V. I. p. 767-818.

8. GERARD, M. W. “Transtornos emocionales de la infancia”. In: ALEXABDER, F. et


alii. Psiquiatria dinâmica. 2. Ed. Buenos Aires, Paidós, 1962. Cap. 7. p. 157-96.

9. HARLOW, H. F. “O amor em filhotes de macacos”. In: McGAUCH, J. L., et alii.


Psicobiologia: as bases biológicas do comportamento. São Paulo, Universidade de São
Paulo, 170. Cap. 3. p. 111-7.

10. KANNER, L. Psiquiatria infantil. 2, Ed. Buenos Aires, Paidós, 1971.

11. KLEIN, M. “A técnica psicanalítica através do brinquedo: sua história e


significado”. In: Id. Novas tendências na psicanálise. Rio de Janeiro, Zahar, 1969. p.
25-48.
9

12. MEAD, M. Sexo e temperamento. São Paulo, Perspectiva, 1969.

13. PATTON R. & GARDNER, L. I. Influence of family environment on growth: the


syndrome of “maternal deprivation”. Pediatrics, Springfield, III., 30(6) : 957-62, Dec.
1962.

14. SEAY, B. & HARLOW, H. F. Maternal deprivation in the rhesus monkey. The
Journal of Nervous and Mental Disease, Baltimore, Md., 140(6): 434-41, Jun. 1965.

15. SEGAL, H. Introdução à obra de Melanie Klein, São Paulo, Ed. Nacional, 1966.

16. SILVER, H. K. Handbook of pediatrics. Los Angeles, Lange Medical Publication,


1969.

17. SPITZ, R. Desenvolvimento emocional do recém-nascido. Rio de Janeiro, Pioneira,


1960.

18. STONE, J. L. & CHURCH, J. Niñez y adolescencia. 4. Ed. Buenos Aires, Ed.
Hormé SAE, 1967.

19. TIETZ, W. The pediatrican and child psychiatry: problems of in role identification.
Clinical Pediatrics, Los Angeles, Calif., 8(7) : 430-2, 1968.

20. WARNER, Silas & SAUL, Leon. Significação da experiência infantil precoce na
personalidade do adulto e da sociedade. Arquivos da Clínica Pinel, Porto Alegre, 2(3) :
104-15, Set. 1962.

Você também pode gostar