Você está na página 1de 20

Reflexões sobre o uso da categoria gênero nos estudos de História Medieval no

Brasil (1990-2003)

Andréia Cristina Lopes Frazão da Silva∗

É visível, nos últimos 13 anos, o desenvolvimento dos estudos medievais no Brasil.1


Até o fim da década de 90 haviam poucos doutores especializados em Idade Média atuando
nas instituições de ensino superior no Brasil; eram raros os títulos sobre o medievo
publicados por editoras brasileiras; não circulavam periódicos nacionais especializados
exclusivamente no medievalismo; as bibliotecas universitárias praticamente não possuíam em
seus acervos periódicos e livros sobre temáticas medievais; não existia uma associação que
agregasse, em nível nacional, os interessados no ensino e na pesquisa da Idade Média;
núcleos de medievalistas locais e/ou regionais eram praticamente inexistentes.2
Este quadro começou a mudar no início dos anos 90, quando os estudos medievais
começaram a ter maior visibilidade nos ambientes acadêmicos do Brasil. Em trabalho
apresentado em 1991, na XI Reunião da Sociedade Brasileira de Estudos Medievais, Maria
Sonsoles Guerras apontava dois fatores que, certamente, em muito estimularam o incremento
do medievalismo nacional: os principais órgãos de fomento no Brasil, CNPq e CAPES,
começavam a conceder Bolsas e Auxílios para os interessados em investigar sobre a Idade
Média e diversas revistas acadêmicas abriam espaço para a publicação de artigos sobre o
medievo.3
Assim, a despeito das muitas dificuldades, cresceu o número de estudiosos que nos
últimos anos buscaram desenvolver projetos de caráter acadêmico sobre o período em
questão. Segundo dados reunidos sob a coordenação do Prof. José Rivair Macedo,4 de 1990 a
2002, 257 dissertações de mestrado, 71 teses de doutorado e 5 teses de livre docência sobre
temas referentes ao medievalismo foram redigidas e aprovadas em nosso país. Segundo
informações publicadas pelo Jornal da Abrem em seu número 11, podemos contabilizar ainda
mais 4 dissertações de mestrado e 6 teses de doutorado, apresentadas e aprovadas em diversas
universidades do país durante o primeiro semestre de 2003.
Examinando os dados reunidos por Macedo, é possível verificar que em muitos
casos houve uma continuidade na especialização na área de Idade Média, já que muitos dos
que obtiveram o grau de mestre, posteriormente alcançaram o de doutor.5 Neste sentido,
diferentemente do que ocorria no período anterior, há que destacar que se encontram atuando
2

no ensino e na pesquisa de temas medievais, ao menos nas universidades públicas de todo o


Brasil, professores especialistas, em sua maioria já doutores ou doutorandos, que,
efetivamente, obtiveram a sua formação acadêmica desenvolvendo investigações nesta área.
Não só cresceu o número de especialistas e interessados nos estudos medievais no
Brasil, como se ampliaram, ou foram criados, espaços para o intercâmbio, o diálogo e a
divulgação das pesquisas. Neste sentido, destaca-se a fundação, em 1996, da Abrem,
Associação Brasileira de Estudos Medievais, que reúne hoje mais de 400 medievalistas
nacionais e estrangeiros das mais diversas áreas do conhecimento.6 A Abrem promove, bi-
anualmente, os Encontros Internacionais de Estudos Medievais (EIEM),7 organizados em
parceria com as universidades que sediam o evento; coordena projetos coletivos de pesquisa,
como o levantamento das fontes medievais escritas e impressas presentes nas bibliotecas das
cidades mais importantes do país 8 e das dissertações e teses defendidas no Brasil;9 estimula o
intercâmbio com associações internacionais também dedicadas a temas medievais; apóia
eventos realizados por núcleos locais em todo o país; é responsável pela publicação
semestral, desde 1998, do Jornal da Abrem, um boletim informativo sobre as atividades da
associação e de tudo o que é desenvolvido no Brasil na área dos estudos medievais, e, desde
1999, da revista anual Signum, o primeiro periódico nacional a dedicar-se exclusivamente ao
medievalismo.
Outros indicadores também apontam para o desenvolvimento do medievalismo no
Brasil: a organização de centros locais e/ou regionais de ensino, pesquisa e extensão, tais
como na UFSC, UFPR, UEL, UEM, PUCRS, UFRGS, UFBA, UNICAP, UFPA, UNB,UFG,
UFES, USP, UNESP, UNICAMP, PUCMinas, UERJ, UFF e UFRJ;10 multiplicaram-se as
publicações, tanto de autores nacionais quanto traduções, de trabalhos que tratam sobre
aspectos diversos do medievo, incluindo as edições críticas de fontes;11 com a popularização
da internet no Brasil, diversos núcleos de estudo e pesquisa em temas medievais construíram
homepages, contendo materiais disponíveis on line,12 e encontra-se ativa, desde 1999, uma
lista de discussão de caráter acadêmico coordenada pelo Programa de Estudos Medievais
(Pem) da UFRJ; a cada ano são organizados, em todo o país, eventos de caráter científico ou
atividades de extensão sobre temáticas medievais, tais como o Ciclo A tradição Monástica e
o Franciscanismo, realizado de 7 a 11 de outubro de 2002 na UFRJ, evento promovido pelo
Pem e o Instituto Teológico Franciscano de Petrópolis, ou o Curso de Extensão As
reminiscências medievais no Brasil Colonial, realizado de 13 a 15 de maio de 2003 na
Biblioteca Pública do Estado do Rio Grande do Sul, para só citar dois exemplos.13
3

Contudo, a despeito do crescimento dos estudos medievais no país, ainda há muito


caminho a ser percorrido. Além dos problemas de ordem mais geral, que afetam outras áreas
do conhecimento, tais como a escassez de materiais atualizados e específicos nas bibliotecas
universitárias, a ausência de concursos públicos que reverte na falta de professores nas IES,
os constantes cortes de auxílios e de bolsas de estudo, há muitos outros problemas de caráter
específico. Para citar apenas alguns: as temáticas medievais não são valorizadas no ensino
fundamental e médio, o que não só leva a um desconhecimento quase total do período como
também não estimula o interesse pelos estudos medievais ainda na infância ou na
adolescência; a grande maioria das escolas não inclui, em sua matriz curricular, disciplinas
como o latim, não propiciando aos alunos uma formação básica fundamental para um
posterior aprofundamento dos estudos sobre o medievo em diversas áreas; salvo no caso dos
cursos de Graduação em História, em que há pelo menos uma disciplina obrigatória dedicada
à Idade Média, os estudos medievais concentram-se nos programas de pós-graduação, com
raras exceções.14 E mesmo na pós-graduação ainda representam uma minoria. Segundo
dados apresentados por Lênia Márcia Mongelli no III EIEM, referentes ao Programa de Pós-
graduação em História Social da USP, e que acredito serem uma importante amostragem do
que ocorre em outras universidades e continuam retratando a situação atual, até 1997 só 2,5%
do total de trabalhos, entre dissertações e teses defendidas, eram sobre temas medievais.15
Destaco ainda a desigual distribuição dos centros dedicados aos estudos medievais
pelo território nacional; estes se localizam nos principais centros urbanos do Brasil, com
realce para as regiões sudeste e sul, e encontram-se em universidades públicas, sobretudo
federais, com exceção das universidades católicas.
A desigualdade também faz-se presente no tocante às áreas de conhecimento em que
o medievalismo é estudado. Há um claro predomínio dos estudos de literatura e linguística,
seguidos pelos históricos.16 E quanto às temáticas de estudo e abordagens desenvolvidas
nesses trabalhos? Todos os temas têm sido trabalhados ou há alguns predominantes e outros
esquecidos?
Neste artigo, discuto um pouco esta questão. Devido à minha formação acadêmica
em história, vou me deter no estudo dos trabalhos desenvolvidos nesta área do conhecimento.
Desejo verificar se, face ao crescimento dos estudos medievais no Brasil nos últimos anos,
foram desenvolvidas investigações adotando a categoria gênero.17 Estas preocupações
surgiram no decorrer da pesquisa que venho realizando com o financiamento do CNPq, da
qual tratarei de forma específica em outro ponto deste texto. Neste sentido, estou interessada
em rastrear as regiões do país e o momento em que tais estudos foram realizados, se foram
4

elaborados por pessoas isoladas ou por equipes, a natureza destes trabalhos (artigos,
monografias, dissertações, teses, projetos de pesquisa etc), as concepções de gênero e os
teóricos que tais materiais utilizam, analisando e discutindo os dados levantados.
Faz-se importante ressaltar que é grande o número de textos de História Medieval
publicados nos últimos anos no exterior e que empregam a categoria gênero.18 Explorando
documentos de variadas naturezas e tratando de aspectos tão diferenciados como santidade,
vida religiosa, cruzadas, pobreza, reprodução, travestismo, alcoolismo, sexualidade, política
etc, estes estudos discutem como tais fenômenos perpassam as construções culturais de
gênero em diferentes momentos e espaços. Mais do que obras de síntese, os trabalhos
mergulham em reflexões sobre temas particulares, formando grandes coletâneas, cujos textos
foram redigidos, em sua maioria, por historiadores ligados a centros de estudo anglo-saxões19
e, portanto, tratam preferencialmente de temáticas relacionadas à Inglaterra medieval.20 Os
medievalistas brasileiros têm sido influenciados por tais trabalhos?
Antes de apresentar e discutir a produção dos medievalistas brasileiros que elaboram
suas pesquisas em História utilizando a categoria gênero, faz-se importante destacar o que
entendo por estudos de gênero, visto que não há consenso entre os especialistas sobre tal
ponto.21
Seguindo as propostas teóricas de Joan Scott e Jane Flax,22 considero estudos de
gênero aqueles que partem de paradigmas pós-modernistas e estão atentos à análise de como,
em diversas sociedades e momentos, um dado grupo ou indivíduo dá significação ao
feminino e ao masculino. São estudos qualitativos que elegem o particular, sem buscar leis
causais e universais para a explicação das diferenças sexuais, tratando homem-mulher ou
feminino-masculino não como categorias fixas, mas constantemente mutáveis. A categoria
gênero, portanto, rejeita o determinismo biológico e sublinha que a distinção sexual não é
natural, universal ou invariante, a despeito das diferenças anatômicas entre machos e fêmeas
na espécie humana, mas constrói-se discursivamente de forma inter-relacional, pressupondo
relações hierárquicas de dominação.
Os estudos de gênero configuram-se como um campo da História Cultural e detém-
se em discutir como uma dada visão de gênero construiu-se e impôs-se discursivamente num
determinado grupo num certo momento, apontando para a sua historicidade, desconstruindo-
a. Não são sinônimos da História das Mulheres nem da História Social das relações entre os
sexos e visam, mais do que descrever e interpretar, analisar e explicar as construções de
gênero, que implicam na configuração de instituições, representações e práticas pelas quais os
5

grupos elaboram o masculino e o feminino, legitimando-as; em relações de dominação, em


símbolos, em normas, em papéis sociais e em identidades subjetivas e coletivas.
Gênero, dentro desta perspectiva teórica, não é sinônimo de sexo.23 É uma categoria
que denomina a construção cultural da diferença sexual que está presente em todos os
aspectos da experiência humana, constituindo-os parcialmente, e que, portanto, pode ser
relacionado a outras categorias, como etnia, idade, religião etc.
Esta reflexão sobre o uso da categoria gênero na produção histórica sobre o medievo
no Brasil fundamenta-se, prioritariamente, em dados qualitativos. Não encontrei uma base de
dados que contenha o registro de todas as produções bibliográficas em História da Idade
Média elaboradas no Brasil de 1990 até 2003.24 Para as reflexões apresentadas aqui, utilizei
um material que se encontra disperso, mas que representa uma amostragem significativa do
que tem sido produzido pelos historiadores brasileiros sobre o medievo. Desta forma,
consultei: o Jornal da Abrem, a Revista Signum e as Atas de eventos cuja temática referia-se
unicamente ao medievo, que consideramos as principais publicações nacionais especializadas
sobre o tema; informações variadas disponíveis na internet; dados enviados através das listas
de discussão mantidas pelo Programa de Estudos Medievais da UFRJ e pela Anpuh;25
publicações sobre estudos de gênero; e o já citado catálogo de dissertações e teses. Em alguns
casos, localizei somente a referência da publicação, sem ter tido acesso direto aos textos.26
Só reuni dados quantitativos seguros sobre as dissertações e teses produzidas no
período, reunindo os dados presentes no catálogo já citado, a Plataforma Lattes e o Jornal da
Abrem. Estas informações, por si só, podem ser consideradas uma importante amostragem da
produção em História Medieval no Brasil nos últimos anos e é por elas que vamos começar.
Encontrei dados referentes a 125 dissertações e teses apresentadas e defendidas em
Programas de Pós-graduação em História do país entre 1990 até o primeiro semestre de 2003.
Destas, somente 4 empregam a categoria gênero, perfazendo somente 3,2% do total de
trabalhos. A seguir, vou apresentar uma síntese de cada um desses trabalhos, por ordem
cronológica das defesas.
Segundo os dados encontrados, a Profª Drª Dulce Oliveira Amarante dos Santos, da
Universidade Federal de Goiás, é a pioneira no uso da categoria gênero em pesquisa de
História Medieval no Brasil. Em um artigo publicado nas Atas do I Encontro Internacional de
Estudos Medievais, Imagens de mulheres nos reinos ibéricos de Leão, Castela e Portugal
(1250-1350), afirma que sua pesquisa “insere-se num projeto mais amplo de composição de
uma história global das mulheres e das relações de gênero”, pautando-se nas reflexões de
Joan Scott, presente em seu artigo, já clássico, Gênero: uma categoria útil de análise
6

histórica, citado em nota.27 Entretanto, sua abordagem do gênero, em certos aspectos,


aproxima-se da Sociologia.28
Como informa neste artigo, em sua pesquisa, a referida professora analisaria
documentos de naturezas diversas, como o Fuero real, as Siete Partidas, o penitencial de
Martim Perez, o corpus satírico delimitado por Manuel Lapa. Sua investigação dividir-se-ia
em duas etapas. Na primeira, faria um estudo do imaginário masculino sobre as mulheres. Em
um segundo momento, sua preocupação recairia na delimitação sexual dos campos de
trabalho masculino e feminino.
Como resultados desta pesquisa, a autora publicou alguns trabalhos,29 além de concluir a
sua própria tese, em 1997, O corpo dos pecados: representações e práticas sócio-culturais
femininas nos reinos ibéricos de Leão, Castela e Portugal (1250-1350), que foi orientada
pelo Prof. Dr. Victor Deodato Silva e desenvolvida junto ao Programa de Pós-graduação em
História Social da USP. Na tese, segundo o Catálogo de dissertações e teses,30 são estudados
diversos elementos que referendaram a construção de representações corporais masculinas e
femininas, bem como dos pecados do corpo, através da análise de textos eclesiásticos de
caráter modelador.
Nos últimos anos, a professora Dulce tem explorado novos objetos e fontes. Contudo,
as suas preocupações relacionadas às mulheres, ao imaginário masculino sobre o feminino e
ao corpo permanecem. Neste sentido, em seu trabalho Egéria a peregrina numa carta de
Valério de Bierzo, ressalta, dentre outros elementos, a contraposição pautada no gênero
realizada por este autor eclesiástico entre o corpo frágil feminino e o corpo vigoroso
masculino.31
Faz-se importante ainda ressaltar que esta pesquisadora participa do grupo de pesquisa
cadastrado no CNPq Historia, Política e Cultura, o único em que uma das linhas de pesquisa
é Gênero e Cultura na Idade Média Ocidental.
Em 1999, Milton José Zamboni obteve o grau de mestre junto ao Programa de Pós-
Graduação em História da ciência da PUCSP, ao ter sua dissertação, O Fuero de Cuenca:
uma interpretação das relações de gênero em fins do século XII, orientada pela Profª Drª Ana
Maria Alfonso-Goldfarb. Infelizmente, só tivemos acesso a um resumo do trabalho.
Na dissertação, Zamboni analisou as relações de gênero e o controle do corpo a partir
da análise do Fuero de Cuenca, texto jurídico ibérico do século XII. Como não tivemos
acesso ao texto completo nem conseguimos contatar o autor, não sabemos que autores
teóricos fundamentaram suas reflexões.
7

Em fevereiro de 2001, a Profª Ms. Valéria Fernandes da Silva teve sua dissertação de
mestrado, Relações de gênero no processo de construção do Mosteiro de São Damião, por
mim orientada, apresentada e aprovada no Programa de Pós-graduação em História Social
(PPGHIS) da UFRJ. Acompanhando a professora Valéria desde a graduação, juntas
aceitamos o desafio de empregar a categoria gênero em seu trabalho de mestrado. Neste
sentido, devo a esta minha ex-orientanda o despertar do meu interesse pelos estudos de
gênero.
Em seu trabalho, desenvolvido junto ao Programa de Estudos Medievais da UFRJ,
Valéria F Silva voltou-se para os primórdios da Segunda Ordem Franciscana a partir do
estudo das normas que o papado impôs à primeira comunidade de seguidoras de Francisco
que se fixaram na Igreja de São Damião, em Assis, desde o início da comunidade até alguns
anos após a morte de Clara. Ela analisa, em perspectiva comparativa, as regras beneditina e
franciscana e as formas de vida32 de Hugolino, de Inocêncio IV e de Clara de Assis,
empregando a categoria gênero tal como a define Joan Scott.
Segundo destaca a autora, a tensão entre estes documentos é evidente, já que as
regras, escritas originariamente para grupos de homens, apresentam normas que se chocam
com as adaptações presentes nas formas de vida redigidas especificamente para as mulheres e
que respondiam a necessidades históricas imediatas.
Valéria F. Silva conclui que na primeira metade do século XIII foram estabelecidas
interdições comportamentais diferenciadas para os seguidores de Francisco com vistas ao
controle da prática religiosa, criando um discurso de gênero que buscava integrar homens e
mulheres em um sistema de regras construídas, assimétricas e hierarquizadas.33
Atualmente ela cursa o doutorado no Programa de Pós-graduação em História da
UNB, pesquisando sobre a orientação da Profª Drª Tânia Navarro Swain. Como o título
provisório de sua pesquisa revela, A Maternidade nos Escritos Franciscanos do Século XIII –
Uma Abordagem de Gênero, continua a refletir sobre o medievo empregando a categoria
gênero. Ainda em estágio inicial, a pesquisa tem como objetivo estudar o processo de
construção e disseminação de um modelo ideal de maternidade, e por extensão de um
feminino, através dos textos hagiográficos, em especial aqueles produzidos no seio da Ordem
Franciscana durante o século XIII.
Em março de 2003, a dissertação de mestrado Os atributos masculinos das santas na
Legenda Áurea: os casos de Maria e Madalena, redigida pela Profª Ms. Carolina Coelho
Fortes sob a orientação da Profª Dr.ª Leila Rodrigues da Silva, foi apresentada e aprovada no
Programa de Pós-graduação em História Social (PPGHIS) da UFRJ. Como esta pesquisa foi
8

desenvolvida no âmbito do Programa de Estudos Medievais da UFRJ, pude acompanhá-la


sistematicamente.
Em sua dissertação, Carolina Fortes analisou a obra Legenda Áurea de Tiago de
Vorágine, frade dominicano do século XIII. Seu objetivo era discutir como este autor
caracterizou as santas e santos em sua obra. Para tanto, estudou as vidas de dois homens,
Domingos e Vicente, para depreender seu perfil de santidade e contrapô-lo ao das santas
Madalena e Maria, consideradas pela autora como representativas dos modelos do feminino
no cristianismo.
A autora defendeu que em sua caracterização da santidade feminina, Tiago acabou por
masculinizar as santas, ou seja, atribuiu a elas traços considerados masculinos na sociedade
medieval ocidental, ainda que as tenha mantido com várias de suas características femininas.
A autora concluiu que o padrão de santidade apresentado pelo hagiógrafo dominicano
pressupunha uma valorização dos elementos considerados masculinos naquela sociedade, que
foram alçados à esfera de perfeição. Assim, o único meio das mulheres serem reconhecidas
por sua santidade seria negando os atributos considerados como naturalmente femininos
naquela sociedade e incorporando, à sua conduta, os masculinos.
Há que ressaltar que, em sua introdução, fica clara a sua cautela em empregar a
categoria gênero, seguindo as propostas teóricas de Joan Scott. Nesse sentido, questionou: “é
possível aplicar o conceito gênero ao período medieval, já que a quase totalidade das obras
escritas o foram por homens?” A autora saiu deste impasse apontando que estudar gênero em
perspetiva histórica, sobretudo em um período em que a documentação é escassa e em sua
grande maioria de autoria de homens, não significa que o pesquisador tenha que contemplar,
necessariamente, tanto a visão da mulher quanto a do homem sobre um determinado assunto,
mas comparando perspectivas diferenciadas sobre os gêneros. No caso, vidas de santos e de
santas.34
Além das dissertações e teses apresentadas, destaco o desenvolvimento de dois
projetos de pesquisa. O primeiro, A ginecofobia medieval: mulher, sexualidade e relações de
gênero nos contos dos séculos XIII e XIV, realizado entre março de 1997 a fevereiro de 1999,
pelo Prof. Dr. José Rivair Macedo, da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, com o
apoio financeiro do CNPq através de uma Bolsa de Produtividade em Pesquisa.
O objetivo da pesquisa era analisar a forma como as relações entre homens e mulheres
são representadas nos fabliaux, nos contos narrativos cômicos dos séculos XIII e XIV, dando
destaque à sexualidade feminina e ao tratamento dado ao adultério.
9

Segundo informações remetidas pelo pesquisador, como principais resultados desta


investigação já foram publicados dois trabalhos e um terceiro está no prelo.35 O artigo A face
das filhas de Eva: os cuidados com a aparência num manual de beleza do século XIII,36
analisa o manual de beleza Ornatus mulierum, datado do século XIII. A partir desse
documento, que apresenta diversas receitas de beleza, realizando uma verdadeira confluência
entre os saberes circulantes no período, tanto formais como populares, estes últimos
dominados, sobretudo, pelas mulheres, discute-se a visão feminina sobre seu próprio corpo.
Neste trabalho a categoria gênero não é empregada e não é feita uma análise relacional ou
comparativa contrapondo a visão de homens e mulheres quanto aos seus corpos. Sua
abordagem, portanto, aproxima-se da história das mulheres.
No texto Transgressão conjugal e mutilação sexual nos fabliaux do Século XIII,37 a
partir da análise do conto Des treces, o autor traça considerações sobre as relações de gênero
no casamento, discutindo as diferentes respostas sociais na punição dos adúlteros, realçando o
caráter conflituoso, violento e desigual destas relações. Apesar de usar o termo gênero como
sinônimo de sexo e não citar, no corpo do texto ou na bibliografia final, autores teóricos que
aplicam tal categoria, o autor analisa uma obra literária, aponta para as relações
hierarquizadas de gênero e demonstra como, na sociedade ocidental em fins da Idade Média,
as diferenças culturais entre os sexos estavam bem marcadas, mas também haviam pessoas
que transgrediam as regras de gênero hegemônicas.
O segundo projeto de pesquisa que desejo apresentar, Santidade e Gênero na
hagiografia mediterrânica do século XIII: um estudo comparativo, é de minha autoria. Desde
1998, em função da decisão de orientar a pesquisa de mestrado desenvolvida por Valéria
Fernandes da Silva, como já assinalado, comecei a estudar a categoria gênero.38 Só a partir de
2001 incorporei tal conceito como uma das diretrizes teóricas de minhas pesquisas
individuais. Assim, encaminhei para o CNPq o projeto de pesquisa citado, sendo agraciada
com uma bolsa PQ nível 2C em agosto do mesmo ano.
A pesquisa analisa, em perspectiva comparativa, as obras redigidas por dois
contemporâneos: Gonzalo de Berceo, clérigo secular e poeta que viveu no Reino de Castela, e
Tomás de Celano, natural do Reino de Sicília e franciscano. Dentre o conjunto da produção
destes hagiógrafos, optamos por analisar os poemas berceanos Vida de Santo Domingo de
Silos (VSD) e a Vida de Santa Oria (VSO) e as obras Vida I (1 Cel), a Vida II (2 Cel) e a
Legenda de Santa Clara (LSC), redigidas por Celano.
A VSD narra a biografia de Domingo, que foi, sucessivamente, clérigo secular,
eremita, prior do mosteiro emilianense e abade reformador do cenóbio de Silos. Já a VSO
10

relata a vida de Oria, que, muito jovem, tornou-se reclusa no mosteiro de la Cogolla. A 1 Cel
e 2 Cel apresentam a biografia e milagres de Francisco de Assis, fundador da Ordem
Franciscana, e a LSC, a trajetória e os feitos milagrosos de Clara, a primeira mulher a seguir
os ideais franciscanos.39
A biografia e a produção hagiográfica de Berceo e Celano possuem traços comuns:
ambos viveram e produziram suas obras na primeira metade do século XIII; eram cultos;
escreveram sobre santos e santas que foram contemporâneos e atuaram na mesma área
geográfica. Porém, não obstante as diversas semelhanças, faz-se necessário destacar, também,
as particularidades. O hagiógrafo ibérico compôs suas obras em romance, em forma de
versos, a pedido de um mosteiro que seguia a regra beneditina, celebrizando santos locais que
viveram dois séculos anteriores à redação dos poemas e voltadas para um grande público.
Quanto às obras de Celano, foram escritas em latim; em prosa; a pedido de autoridades
eclesiásticas; narra a biografia e os feitos maravilhosos de santos que conheceu e para os
quais aspirava o reconhecimento universal e tinham, como principal objetivo, divulgar,
sobretudo entre o corpo eclesial e os próprios membros da nascente Ordem Franciscana, o
culto aos santos recém canonizados oficialmente pela Igreja.
Nossa pesquisa tem como principal objetivo relacionar o espaço de produção das
VSD, VSO, 1 Cel, 2 Cel e LSC, a formação intelectual e a inserção na Igreja de Gonzalo de
Berceo e Tomás de Celano e os discursos de gênero, à luz dos seguintes aspectos: as
mudanças nas concepções de santidade verificadas entre os séculos XII - XIIII, a propagação,
no século XIII, do projeto de sociedade idealizado pela Igreja sob a liderança papal, o
crescimento da vida religiosa feminina e a sistematização do pensamento misógino
eclesiástico ocidental neste mesmo período.
Em nosso estudo, estamos articulando as categorias gênero e santidade. Entendemos
por santidade o conjunto de comportamentos, atitudes e qualidades que num determinado
lugar e tempo são critérios para considerar um indivíduo como venerável, seja pelo
reconhecimento oficial pela Igreja ou não. Ou seja, trata-se de um saber, uma construção
histórica, que ganha nuanças e particulariza-se em diferentes culturas, espaços e períodos,
assim como o gênero. No caso específico de nossa investigação, queremos discutir como uma
dada concepção de santidade, que estava ao alcance de homens e mulheres nas sociedades
mediterrânicas ocidentais no século XIII, foi apreendida e direcionada a cada gênero. Quanto
à categoria gênero, adotamos a definição, pautada em Joan Scott e Jane Flax, já apresentada
neste artigo.
11

Trata-se de uma pesquisa original, já que não existem trabalhos que se preocuparam
em comparar, de forma sistemática, a obra destes dois hagiógrafos, nem os analisaram sob a
abordagem que escolhemos.40
Defendemos, como hipótese principal, que nas obras em análise, os hagiógrafos
ressaltam as nuanças e particularidades da vida de homens e mulheres considerados santos,
apontando que o caminho para a santidade pressupunha condutas específicas para cada
gênero culturalmente instituído.
Como resultado do desenvolvimento destas pesquisas foram produzidas
comunicações apresentadas em eventos científicos41 e realizada uma conferência,42 bem
como foram redigidos textos,43 dois já publicados.44 Vamos nos deter nas conclusões parciais
presentes nesses textos já publicados.
Em Reflexões metodológicas sobre a análise do discurso em perspectiva histórica:
paternidade, maternidade, santidade e gênero, o objetivo era traçar algumas reflexões sobre
o conceito de discurso, em especial dos discursos de gênero, apontando um possível caminho
para a sua análise histórica. Neste sentido, incluí no texto um exemplo prático de estudo dos
discursos, escolhendo como unidade de análise o relacionamento dos santos e santas com
seus pais, ou seja, a paternidade e a maternidade.
Verificamos que, em sua enunciação, Gonzalo de Berceo materializa um discurso de
gênero, no qual há uma associação entre a santidade dos genitores e a de seus filhos, e que só
se faz possível devido à liderança, moral e espiritual, dos homens na família, seguindo o
topos hagiográfico da santidade herdada, típico de tais obras, e que reafirma o caráter
hierárquico das relações de gênero no seio das organizações familiares na Idade Média.
Quanto a Celano, na 1 Cel, utilizando o topos da santidade herdada às avessas, o autor
adverte sobre a má influência dos pais na formação dos filhos, defendendo que o pecado do
pai, como o da mãe, é a raiz dos pecados dos filhos. Na 2 Cel, a figura da mãe de Francisco é
realçada, mas não é feita nenhuma associação entre a santidade do filho e a santidade da
mãe.45 Assim, sem associar a santidade de Francisco à educação recebida por seu pai, parece
preferir omitir este elemento. O discurso de gênero, neste caso, materializa-se por meio do
silêncio.
Na LSC, obra voltada para um público feminino, há destaque para a mãe da santa,
que, apesar de casada, é vista como uma mulher piedosa. Segundo a obra, ela teria imprimido
tal piedade à filha, que se tornou uma virgem consagrada a Deus, aperfeiçoando, de certa
forma, a vivência da fé ensinada por sua mãe. Assim, na relação entre Clara e Hortolana os
dois modelos ideais de comportamento feminino, a mulher casada devotada à fé e aos filhos e
12

a virgem dedicada a Deus, fazem-se presentes na enunciação de Celano, voltada


prioritariamente às mulheres, seguindo os discursos de gênero presentes naquela sociedade.
No artigo Moda, santidade e gênero na obra hagiográfica de Tomás de Celano, o
objetivo é analisar os textos deste hagiógrafo contemporâneo ao nascimento da moda no
Ocidente,46 a partir das duas categorias principais de análise que temos empregado em nossas
investigações: santidade e gênero.
Mesmo tendo ingressado em uma ordem mendicante, e talvez até por ter abraçado os
ideais franciscanos, Tomás de Celano não pôde ignorar esta conjuntura. A forma como ele
apreendeu o surgimento da moda e os atos de Francisco e Clara face à produção, comércio e
consumo das indumentárias ficaram registradas em suas obras. Como outros hagiógrafos
contemporâneos, ele considerou a renúncia à moda como uma expressão de santidade.
Contudo, ele interpretou esta renúncia com diretivas de gênero: para Francisco, abandonar as
vestes suntuosas foi, sobretudo, um símbolo de sua opção pela pobreza; para Clara, foi signo
da negação de sua sexualidade.
Finalizando esta apresentação, gostaria ainda de destacar as conclusões do artigo Entre
a Pintura e a Poesia: o nascimento do Amor e a elevação da condição feminina na Idade
Média, escrito pelo Prof. Dr. Ricardo da Costa, do Departamento de História da Universidade
Federal do Espírito Santo e por Priscilla Lauret Coutinho, aluna do curso de graduação em
História desta mesma universidade. Sem utilizar o termo ou a categoria gênero, os autores
estudam o nascimento do amor nos séculos XII-XIII. Ao fazê-lo, apresentam diferentes
construções culturais sobre as relações entre homens e mulheres, a partir da análise de
documentos iconográficos (iluminuras e uma tapeçaria) e escritos. Sem configurar-se como
um estudo de gênero, o mérito deste trabalho é justamente questionar a "monocórdia imagem
misógina no período", contribuindo, assim, para desconstruir os discursos de gênero
hegemônicos no período medieval que enfatizam apenas a produção clerical, oferecendo
assim uma visão parcial da imagem feminina do período em questão.
Fazendo um balanço dos dados encontrados, podemos apontar que, a despeito do
avanço dos estudos medievais, esta área ainda não está definitivamente consolidada em nosso
país. No campo específico da História da Idade Média, no qual nos detivemos, ainda há muito
o que ser explorado, tanto em termos temáticos, quanto em formas de abordagem,
documentos a serem analisados, e na aplicação de diferentes teorias, métodos e técnicas de
pesquisa, incluindo aí o uso da categoria gênero.
Pelos dados inventariados, que representam uma amostragem qualitativa do que vem
sendo pesquisado no Brasil no campo da História Medieval, podemos concluir que as
13

pesquisas que incorporam a categoria gênero começaram a surgir em meados da década


passada, mas ainda são quase pontuais. Em muitos casos, são trabalhos de conclusão de
curso, como dissertações e teses, realizados como etapas da formação intelectual e nos quais
há, efetivamente, a motivação para estudar temáticas ainda pouco desenvolvidas e aplicar
teorias e métodos ainda não convencionais. Muitos destes trabalhos já ganham visibilidade
nacional, já que suas conclusões foram apresentadas em eventos como os EIEM ou
publicadas em periódicos de circulação nacional ou na internet, porém ainda não
ultrapassaram as fronteiras nacionais.
As pesquisas encontradas foram desenvolvidas por pesquisadores isolados e dispersos
espacialmente (USP, UFG, PUCSP, UFRGS, UFRJ, UNB). O Pem da UFRJ é o núcleo que
concentra o maior número de trabalhos, 3 dentre os 7 citados, ainda que não se configure
como um centro específico para os estudos medievais de gênero.
Nestas investigações, Joan Scott apresenta-se como a teórica mais influente, o que
pode ser explicado pelo fato dela ser uma historiadora e ter sido uma das primeiras autoras a
refletir, de forma sistemática, sobre o uso da categoria gênero nas investigações históricas.47
Entretanto, é marcante a oscilação teórica, em muitos destes trabalhos, entre os estudos de
gênero de matriz sociológica e os de caráter filosófico e literário. Em outros casos, ainda que
a abordagem se aproxime da dos estudos de gênero pós-modernistas, isto é feito de forma
tímida, já que a categoria sequer figura nos textos.
Como explicar o desinteresse dos historiadores brasileiros dedicados ao estudo da
Idade Média pelo uso da categoria gênero? Em primeiro lugar, destaco o próprio caráter
ainda marginal dos estudos medievais em muitas universidades do país. Mantendo os velhos
argumentos de que no Brasil não houve Idade Média, ou que não há documentação e
bibliografia disponíveis para a realização de pesquisa, muitos de nossos colegas historiadores
desqualificam as pesquisas desenvolvidas sobre o medievo no Brasil. As próprias
dificuldades inerentes à formação do medievalista nacional também levam a que muitos
desistam no meio do caminho. Assim, se há poucos trabalhos sobre a Idade Média, logo
teremos também poucos trabalhos que priorizem o gênero.
Em segundo lugar, os estudos de gênero estão ainda associados, mesmo nos meios
acadêmicos, aos movimentos feministas ou a grupos de homossexuais e lésbicas, e não são
vistos como uma opção teórica. Além disso, muitos questionam a aplicabilidade desta
categoria para os estudos medievais, pautados, sobretudo, no caráter relacional dos estudos de
gênero e na ausência de documentação em que a voz feminina possa ser ouvida. Estes
autores, porém, esquecem que o gênero está presente em todos os aspectos da experiência
14

humana, constituindo-os parcialmente, e portanto, possível de ser analisado a partir de


qualquer vestígio do passado. Em terceiro lugar, aponto para a pouca discussão e
aprofundamento das questões teóricas nos trabalhos. O termo gênero é utilizado, mas as
análises oscilam entre as abordagens pós-modernistas e iluministas.48 Esta inconsistência
teórica, em grande parte, pode ser explicada pelo fato de que os historiadores brasileiros são
profundamente influenciados pelos medievalistas franceses e, como já assinalamos neste
artigo, os estudos de gênero não tiveram grande acolhida na França. Grande parte dos
trabalhos desenvolvidos no país sobre a temática gênero repousam suas reflexões em obras
como as de George Duby, Cavaleiro a mulher e o padre, Idade média, idade dos homens,
Eva e os padres, Heloísa, Isolda e outras damas do século XII. Tais estudos, porém, não
questionam as categorias de mulher e homem culturalmente construídas e privilegiam o
estudo das mulheres e do feminino, em abordagens generalizantes e descritivas, o que é
rejeitado pelos estudos de gênero.49 Em contrapartida, pouca acolhida ainda tem entre os
medievalistas brasileiros a historiografia anglo-saxã, que efetivamente tem produzido estudos
de gênero. Acredito que com a expansão da internet, este quadro tenderá a ser superado nos
próximos anos. E sinais desta mudança começam a aparecer. Assim, já é possível encontrar,
em alguns textos nacionais, reflexões e citações de trabalhos de medievalistas americanos que
utilizam a categoria gênero em suas pesquisas, como Caroline Bynum, Catharine M. Mooney
e Sarah Salih.
Concluindo, ainda há um grande campo para os estudos medievais no Brasil e o
emprego da categoria gênero poderá revolucionar as pesquisas. Pautando-se no estudo do
qualitativo e do particular, valorizando a perspectiva do investigador e o trabalho analítico,
dialogando com os especialistas estrangeiros, os estudos de gênero podem ser desenvolvidos
no Brasil e ganhar respeitabilidade internacional a despeito das muitos dificuldades que se
impõe aos medievalistas em nosso país.50

Professora do Departamento de História e do Programa de Pós-graduação em História
Comparada (PPGHC) da UFRJ; Co-coordenadora do Programa de Estudos Medievais (Pem)
da UFRJ; Pesquisadora do CNPq (www.ifcs.ufrj.br/~frazao).
1
Considero como estudos medievais todos aqueles desenvolvidos nas diversas áreas do
conhecimento, tais como História, Literatura, Filosofia, Linguística, Teologia, Arte, Música
etc, e que analisam temas referentes a diversos aspectos do medievo.
2
Sobre os estudos medievais no Brasil desenvolvidos até o início da década de 90 ver
GUERRAS MARTIN, M. S. A situação da pesquisa de História Geral no Brasil: História
Medieval. In: WESTPHALEN, C. M. (Org.). Reunião da Sociedade Brasileira de Pesquisa
Histórica, 11, São Paulo, 1991. Anais... Porto Alegre: Sociedade Brasileira de Pesquisa
Histórica, 1992. p. 13-14; PEDRERO-SÁNCHEZ, M. G. Los estudios medievales en Brasil.
15

Medievalismo, v. 4, n. 4, p. 223-228, 1994; MELLO, J. R. de A. O pesquisador em História


Medieval e o público brasileiro. In: RIBEIRO, M. E. de B. (Org.). Semana de Estudos
Medievais, 2, Brasília, Outubro de 1994. Anais... Brasília: UNB, 1994. p. 43-46.
3
GUERRAS MARTIN, M. S. op. cit, p. 14.
4
MACEDO, J. R. (Org.). Os Estudos Medievais no Brasil. Catálogo de dissertações e teses:
Filosofia, História, Letras (1990-2002). Porto Alegre: Editora da UFRGS, 2003. p. 8.
5
Há que ressaltar também que muitos medievalistas brasileiros obtiveram o grau de doutor
no exterior. Para só citar alguns exemplos de pesquisadores da área de História: Prof.ª Dr.ª
Maria Cristina Correia Leandro Pereira (UFES), Prof.ª Dr.ª Fátima Regina Fernandes
(UFPR), Prof. Dr. Renan Friguetto (UFPR) e Prof. Dr. Marcelo Candido da Silva (USP),
Prof.ª Dr.ª Maria Filomena da Costa Coelho (UPIS-DF).
6
Segundo dados apresentados na assembléia geral da Associação Brasileira de Estudos
Medievais (Abrem) durante o V Encontro Internacional de Estudos Medievais, cerca de 410
pessoas já se associaram a Abrem.
7
Os trabalhos apresentados durante os EIEM e selecionados são publicadas nas atas do
evento. Cf. as Atas do I, III e IV EIEM. A única exceção foram as atas do II, quando só as
conferências foram publicadas.
8
MONGELLI, Lênia Márcia (Org.). Fontes Primárias da Idade Média. Séculos V-XV.
ABREM Associação Brasileira de Estudos Medievais. São Paulo: Íbis, 1999. 2 v.
9
MACEDO, J. R. (Org.). Os estudos Medievais no Brasil..., op. cit.
10
Sobre os diversos núcleos locais/regionais dedicados ao medievalismo no Brasil ver o
editorial do Jornal da Abrem número 10, publicado em 2002.
11
Para só citar alguns exemplos recentes: OLIVEIRA, T. (Org.). Luzes sobre a Idade Média.
Maringá: Editora da Universidade, 2002; FERNANDES, F. R. Sociedade e poder na Baixa
Idade Média portuguesa. Dos Azevedos aos Vilhena: as famílias da nobreza medieval
portuguesa. Curitiba: Universidade Federal do Paraná, 2003; PEREIRA, R. H. S. Avicena. A
viagem da alma. São Paulo: Perspectiva- Fapesp, 2002; LAUAND, J. Em diálogos com
Tomás de Aquino. São Paulo: Mandruvá, 2002; LE GOFF, J., SCHMITT, J-C. Dicionário
Temático do Ocidente Medieval. São Paulo: Imprensa Oficial de São Paulo/ Edusc, 2002. V.
2; SILVA, A. C. L. F. et. al. A Vida de Santa Maria Madalena. Rio de Janeiro: Programa de
Estudos Medievais, 2002; MONGELLI, L. M., VIEIRA, Y. F. A estética medieval. Cotia:
Íbis, 2003; COSTA, R. (Org.). Testemunhos da História. Vitória: Editora da UFES, 2003;
FRANCO JÚNIOR, H. Legenda Áurea. São Paulo: Companhia das Letras, 2003.
12
Para só citar alguns sites: www.pem.ifcs.ufrj.br; http://jean_lauand.tripod.com;
www.hottopos.com; www.abrem.he.com.br; www.brathair.cjb.net; www.ricardocosta.com;
www.geocities.com/pjchronos; www2.fe.usp.br/~cemoroc, www.revistamirabilia.com.
13
Para informações sobre os principais eventos locais e regionais organizados no país desde
1998 ver os diversos números já publicados do Jornal da Abrem.
14
Sobre estas questões ver LEÃO, A. V. Os estudos medievais na atualidade brasileira:
região sudeste e RIBEIRO, M. E. de B. Os estudos medievais no Distrito Federal publicados
em MALEVAL, M. A. T. (Org.). Encontro Internacional de Estudos Medievais, 3, 7 a 9 de
julho de 1999, UERJ. Atas... Rio de Janeiro: Ágora da Ilha, 2001. p. 138-145, 155-158.
16

15
MONGELLI, M. L. de M. A quem se destinam os estudos medievais no Brasil? In:
MALEVAL, M. A. T. (Org.). Encontro Internacional de Estudos Medievais, 3, 7 a 9 de julho
de 1999, UERJ. Atas...Rio de Janeiro: Ágora da Ilha, 2001. p. 146-154.
16
Os dados presentes no Catálogo de dissertações e teses, já mencionado, apresentam uma
importante amostragem dessa desigualdade. Dos 333 trabalhos listados, 147 são da área de
Língua e Literatura (44%); 121 de História (36, 5%); 60 de Filosofia (18 %); 1 de Música
(0,3 %); 2 de Direito (0,6 %) e 2 de Teologia (0,6 %). MACEDO, J. R. (Org.). Os estudos
Medievais no Brasil..., op. cit. p. 9.
17
Também é inquestionável a expansão dos estudos de gênero no Brasil nos últimos anos:
crescem os centros de pesquisa, multiplicam-se as publicações, são organizados eventos. Para
um balanço referente aos estudos de gênero e a história ver MATOS, M. I. S. de. Por uma
história da Mulher. Bauru: Edusc, 2000. Faz-se importante ressaltar que nenhum título sobre
História Medieval é citado pela autora.
18
Utilizando como palavra chave o termo gênero e delimitando os anos de 2003 a 2001,
realizamos uma pesquisa no site Feminae: Medieval Women and Gender Index
(http://www.haverford.edu/library/reference/mschaus/mfi/mfi.html), um banco de dados on
line, organizado em 1996, que seleciona e reúne dados provenientes de artigos, resenhas de
livros, capítulos de livros, teses e ensaios dos trabalhos considerados mais significativos
sobre as mulheres e gênero publicados em todo o mundo e em várias línguas. Foram listados
817 títulos, entre resenhas, obras coletivas, artigos em periódicos, e teses. Faz-se importante
ressaltar que nenhuma referência de trabalho elaborado em português figurou como resposta
à pesquisa.
19
Os medievalistas franceses elaboram, sobretudo, trabalhos de História da Mulher, como um
campo da História Social ou da História do Imaginário. Um claro exemplo desta tendência
pode ser verificada na obra organizada por J. C. Schmitt e O. G. Oaxle, Les tendances
actuelles de l’histoire du Moyen Âge en France et en Allemagne, atas referentes aos
colóquios de Sèvres (1997) e de Gottingen (1998) publicada em 2002. Dentre os temas
selecionados para debate encontra-se “Pour une histoire des femmes”. O termo gênero não
figura.
20
Para só citar alguns trabalhos recentes: BENNETT, Judith M. England: Women and
Gender. In: RIGBY, S. H. (Ed.) A Companion to Britain in the Later Middle Ages. Londres:
Blackwell Publishing, 2003. p. 87-106; CLARK, Anne L. The priesthood of the Virgin Mary:
gender trouble in the Twelth Century. Journal of Feminist Studies in Religion, v. 18, n.1 p.5-
24, 2002; RICHES Samantha J. E., SALIH, Sarah (Ed.). Gender and Holiness: Men, Women,
and Saints in Late Medieval Europe. Routledge, 2002; RASMUSSEN, Ann Marie. Gendered
Knowledge and Eavesdropping in the Late-Medieval "Minnerede". Speculum, v. 77, n. 4, p.
1168-1194, Oct./ 2002; MCCLANAN; Anne L., ENCARNACIÓN, Karen Rosoff (Ed.) The
Material Culture of Sex, Procreation, and Marriage in Premodern Europe. Nova York:
Palgrave, 2002; SALIH, Sarah. Queering "Sponsalia Christi": Virginity, Gender, and Desire
in the Early Middle English Anchoritic Texts. New Medieval Literatures, n. 5, p. 155-175,
2002; ASHLEY, Kathleen and CLARK, Robert L. A. (Ed.) Medieval Conduct. Minessota:
University of Minnesota Press, 2001; LAMBERT, Sarah, EDGINGTON, Susan B. (Ed.)
Gendering the Crusades. University of Wales Press, 2001; CLARK, Elizabeth A. Woman,
Gender, and the Study History. Church History, v. 70, n. 3, p. 395-426, 2001; MARTIN, A.
L. Alcohol, Sex, and Gender in Late Medieval and Early Modern Europe. Nova York:
Palgrave, 2001; FARMER, S. Surviving poverty in medieval Paris. Gender, Ideology, and the
daily lives of the poor. Ithaca: Cornell University Press, 2002.
17

21
VARIKAS, E. Gênero, experiência e subjetividade: a propósito do desacordo Tilly-Scott.
Cadernos Pagu, n. 3, p. 63-84, 1994; POMATA, G. Histoire des Femmes et "Gender
History" (note critique). Annales ESC, n. 4, p. 1019 - 1026, julho-agosto de 1993; TILLY, L.
A. Gênero, História das Mulheres e História Social. Cadernos Pagu, n. 3, p. 29-62, 1994;
DIERKS, K. Men’s History, Gender history, or cultural History? Gender & History, v. 14, n.
1, p. 147-151, 2002.
22
SCOTT, W. J. Prefácio a Gender and Politics of History. Cadernos Pagu, n. 3, p. 11-27,
1994; ___. El género: una categoría útil para el análisis histórico. In: LAMAS, M. (Org.). El
género: la construccion cultural de la diferencia sexual. Cidade do México: PUEG, 1996.
FLAX, J. Pós-modernismo e relações de gênero na teoria feminista. In: HOLLANDA, H. B.
(Org.) Modernismo e Política. Rio de Janeiro: Rocco, 1991, p. 217-50.
23
Sobre as distintas construções culturais sobre sexo e gênero ver LAQUEUR, T. Inventando
o Sexo. Corpo e Gênero dos gregos a Freud. Rio de Janeiro: Relume-Dumará, 2001 e
BUTLER, J. Problemas de gênero: feminismo e subversão da identidade. Rio de Janeiro:
Civilização Brasileira, 2003.
24
Há um levantamento sendo feito pelo Prof. Dr. Ruy de Oliveira Andrade para o
International Medieval Bibliography mantido para a University of Leedes, cuja consulta,
porém, é restrita aos associados. Também consultamos a Plataforma Lattes, mantida pelo
CNPq. Tomando a Idade Média como palavra chave e limitando-nos à área de História e ao
período posterior a 1990, chegamos a 1230 entradas, entre artigos completos em periódicos,
resumos, trabalhos completos em anais, participações em congressos, como palestrante ou
ouvinte, bancas, artigos em revistas e jornais de grande circulação etc.. Contudo, muitas
entradas figuram mais de uma vez, são contabilizados como trabalhos historiográficos
aqueles provenientes de outras áreas, em especial literatura e filosofia, muitos dados foram
informados pelos pesquisadores de forma incorreta ou incompleta.
25
Quero agradecer aos colegas Dulce O. Amarante dos Santos, José Rivair de Macedo,
Ricardo da Costa, Valéria Fernandes da Silva, Carolina Coelho Fortes, que gentilmente
enviaram dados para que eu pudesse utilizar neste artigo.
26
Refiro-me especificamente aos trabalhos SCHWEINBERGER, Maria Luisa Tomasi. A
mulher entre o individual e o coletivo no final da Idade Média. Varia Scientia, Cascavel, v.1,
n.1, p.139 - 146, 2001; SANTOS, G. S. A Santa e o Lavrador: gênero e poder na Baixa Idade
Média portuguesa (1282-1325). Acervo: Revista do Arquivo Nacional, Rio de Janeiro, v.9,
n.01-02, p. 69 - 84, 1997; ___. A Rainha e os Pares do Rei. Arrabaldes Cadernos de História,
Niterói, v.1, p.79 - 89, 1996. Nossas tentativas de contatar as autoras foram infrutíferas até o
momento de finalizarmos este artigo.
27
SANTOS, Dulce O. Amarante dos. Imagens de mulheres nos reinos ibéricos de Leão,
Castela e Portugal (1250-1350). In: Encontro Internacional de Estudos Medievais, 1, 4 a 6 de
julho. Atas...São Paulo: USP-UNICAMP- UNESP, 1995. p. 157-160.
28
Verificando o currículo da prof.ª Dr.ª Dulce O. Amarante dos Santos, disponível na
Plataforma Lattes, nota-se, através das palavras-chaves que acompanham a sua produção
acadêmica, uma oscilação teórica em sua produção entre uma história de gênero de matriz
sociológica e outra de caráter mais filosófico e linguístico, o que é muito frequente entre os
que se dedicam ao estudo de gênero em todo o mundo. Esta questão, inclusive, tem sido tema
de diversos artigos, como os citados na nota 20.
29
Dentre outros, O corpo dos pecados: as representações femininas nos reinos ibéricos.
Textos de História. Brasília, v.9, n.1/2, p.13 - 30, 2001; Outros olhares sobre a jograria
18

ibérica urbana. História Revista. Goiânia, v.5, n.1/2, p.71 - 88, 2000; Práticas mágicas nos
reinos ibéricos medievais. Estudos de História. Franca- SP, v.6, n. 2, p.11 - 22, 1999.
30
Op. cit., p. 120.
31
SANTOS, D. O. A. dos. Egéria a peregrina numa carta de Valerio de Bierzo. In:
MALEVAL, Maria do Amparo Tavares (Org.). Encontro Internacional de Estudos
Medievais, 3, Rio de Janeiro, 7 a 9 de julho de 1999. Anais... Rio de Janeiro: Ágora da Ilha,
2001. p. 566-569.
32
A diferença entre regras e formas de vida é um aspecto destacado na dissertação da
professora Valéria F. Silva. As regras são textos reconhecidos oficialmente pela Igreja e que
apresentam as normas de como um determinado grupo de pessoas, dedicados a vida
religiosa, devem viver. Elas também fornecem base jurídica para o reconhecimento formal
deste grupo. As formas de vida também são textos de caráter jurídico, exigido o
reconhecimento oficial da Igreja, que porém pode ser concedido por um bispo ou cardeal
Possui caráter complementar, funcionando como uma espécie de complemento à regra,
adaptando-a a situações específicas ou complementando-as nos casos em que aquela é
omissa.
33
Como etapas do desenvolvimento desta pesquisa ou seus desdobramentos, a professora
Valéria F. Silva publicou Gênero e discurso: desconstruindo as fontes do primeiro século
francicano. In: Tecendo Saberes. Rio de Janeiro: CFCH-UFRJ, 2000 (CD-ROM); No limiar
da exclusão: das relações entre damianitas e o papado (1215-1223). In: MALEVAL, M. A.
T. (Org.). Encontro Internacional de Estudos Medievais, 3, 7 a 9 de julho de 1999. Anais...
Rio de Janeiro: Ágora da Ilha, 2001. p. 609-613; Saber e gênero: discutindo o lugar do
“saber intelectual” para os franciscanos nos escritos de Tomás de Celano. In: SILVA,
Andréia Cristina Lopes Frazão da, SILVA, Leila Rodrigues da (Org.) Semana de Estudos
Medievais, 4, 14 a 18 de maio de 2001. Rio de Janeiro: Programa de Estudos Medievais,
2001. p. 304-309; O poder da fala e a imposição do silêncio: exercício da religiosidade
laica e restrições de gênero no século XIII, em co-autoria com o Prof. Ms. Marcelo Pereira
Lima, In: COSTA, S., SILVA, A. C. L. F., SILVA, L. R. A tradição monástica e o
franciscanismo. Rio de Janeiro: Programa de Estudos Medievais – Instituto Teológico
Franciscano, 2003, p. 153-161; Gênero e Hagiografia: Clara de Assis e a Construção de um
novo modelo de santidade feminina no século XIII. In: Seminário Nacional Mulher e
Literatura, 9, 22, 23 e 24 de agosto de 2001. Atas... Belo Horizonte: UFMG, 2002. CD-ROM.
34
Enquanto realizava sua dissertação de mestrado, Carolina Coelho Fortes teve seu texto, O
corpo e o sagrado, publicado. Nele, a autora discute como, durante o medievo, os homens e
mulheres utilizavam seu corpo de forma diferenciada na busca pelo sagrado. Cf. In: Jornada
Científica do CMS Waldyr Franco, 3, 22 a 26 de outubro de 2000, Rio de Janeiro. Atas das 3ª
e 4ª Jornadas Científicas do CMS Waldyr Franco. Rio de Janeiro: Prefeitura da Cidade do
Rio de Janeiro - Secretaria Municipal de Saúde, Centro de Estudos do CMS Waldyr Franco,
2002. (CD-ROM)
35
Amor e adultério no Tristan, de Béroul, a ser publicado no livro organizado por Hilário
Franco Jr , O adultério na Idade Média, em preparação.
36
A face das filhas de Eva: os cuidados com a aparência num manual de beleza do século
XIII. História (UNESP), v. 17-18, p. 293-314,1998-1999. Disponível on line em
www.abrem.he.com.br
19

37
Transgressão conjugal e mutilação sexual nos fabliaux do Século XIII". In: MALEVAL,
M. A. T. (Org). Atualizações da Idade Média. Rio de Janeiro: UERJ - PPG de Letras, 2000.
p. 187-222 Disponível on line em www.abrem.he.com.br.
38
Antes de 2001 eu já havia feito algumas incursões pelo campo da História das Mulheres.
Assim publiquei A mulher segundo os clérigos medievais: reflexões acerca de uma exceção
no Boletim do Núcleo de Estudos de Gênero e Pesquisa sobre a Mulher, Uberlândia, ano 6, n.
12, p. 1-2, 2º semestre de 1998; e resenhas das obras M. BARTOLI, Clara de Assis, na
Signum, São Paulo, ano 1, n.º 1, p. 235 -239, 1999, e Hambly, Gavin R. G., ed, Women in the
Medieval Islamic World: Power, Patronage, Piety, em português em Gênero em Pesquisa,
Uberlândia, n. 14, ano 7, p. 3-8, 2º semestre de 1999 e em inglês em The Medieval Review,
University of Michingan, 99.08.15 [www.hti/umich.edu/b/bmr/]. No ano passado voltei à
temática, escrevendo Hildegarda de Bingen e as Sutilezas da Natureza das Diversas Criaturas,
trabalho apresentado na IV Jornada Científica do Waldyr Franco e publicado nas Atas do
evento em CD-ROM ( Atas das 3ª e 4ª Jornadas Científicas do CMS Waldyr Franco. Rio de
Janeiro: Prefeitura da Cidade do Rio de Janeiro - Secretaria Municipal de Saúde, Centro de
Estudos do CMS Waldyr Franco, 2002).
39
Discutiu-se, durante algum tempo, quem seria o autor desta legenda. Pelas características
estilísticas, concluiu-se que foi Tomás de Celano, hipótese que hoje é consenso entre os
pesquisadores. Sobre o debate quanto a autoria da LSC ver BARTOLI, M. Clara de Assis.
Petrópolis: Vozes, 1998, p. 17, nota 24, e URIBE, F. Introducción a las hagiografías de San
Francisco y Santa Clara de Asís (siglos XIII y XIV). Murcia: Espigas, 1999. p. 461-462.
40
Em nosso levantamento bibliográfico preliminar não encontramos nenhum trabalho que
compare as obras de Gonzalo de Berceo e Tomás de Celano. Localizamos alguns textos,
sobretudo artigos, que comparam aspectos isolados da obra de Gonzalo de Berceo com a de
outros hagiógrafos, sobretudo ibéricos. No caso da obra de Celano, os trabalhos comparativos
são ainda mais raros. Encontramos alguns poucos exemplares que, em sua maioria,
contrapõem as obras de Celano às de outros hagiógrafos franciscanos. Estes trabalhos,
contudo, não objetivam conhecer o pensamento do hagiógrafo, mas reconstruir a biografia do
santo de Assis. Quanto a estudos empregando o conceito de gênero, encontramos alguns
poucos trabalhos. O interessante é que os autores dos materiais encontrados só se detiveram
na análise das vidas das santas selecionadas. Além disso, tratam de aspectos isolados, não se
configurando como trabalhos sistemáticos.
41
Reflexões sobre os discursos de gênero e a representação do corpo na hagiografia
mediterrânica do século XIII, comunicação apresentada no Ciclo de Debates do LHIA-UFRJ,
em novembro de 2002; A vida monástica e as diretrizes de gênero na obra berceana,
comunicação apresentada no V EIEM na UFBA, em julho de 2003.
42
Gênero, Corpo e Sexualidade na Península Ibérica Medieval: uma leitura das obras Vida
de Santo Domingo de Silos e Vida de Santa Oria, palestra proferida na UERJ em novembro
de 2002.
43
Encontra-se no prelo Representações da morte em Tomás de Celano, publicado pelo Centro
de Memória do Oeste de Santa Catarina nos Cadernos do CEOM, nº 16, no dossiê
Representações do corpo e da morte. Este artigo foi escrito em parceria com minha
orientanda Elisabeth da Silva Passos e discute a forma como o hagiógrafo Tomás de Celano
representa as mortes de Francisco e Clara de Assis, um homem e uma mulher considerados
santos, a partir de diretivas de gênero e à luz das relações de poder no seio da Ordem
Franciscana e da Igreja Romana.
44
Reflexões Metodológicas sobre a análise do discurso em perspectiva histórica...., op. cit.;
20

Moda, santidade e gênero na obra hagiográfica de Tomás de Celano. In: COSTA, S., SILVA,
A. C. L. F., SILVA, L. R. A tradição monástica e o franciscanismo. Rio de Janeiro:
Programa de Estudos Medievais – Instituto Teológico Franciscano, 2003, p. 230-239.
45
Há que destacar que fazer uma relação entre a santidade de Francisco com a de seu pai era,
certamente, impossível, já que os conflitos entre os dois eram de conhecimento geral.
46
Dentre outras acepções, moda pode ser definida como “conjunto de usos coletivos que
caracterizam o vestuário de determinado grupo humano num dado momento; a indústria ou o
comércio da roupa; história, desenvolvimento e produção da roupa”. É neste sentido, de
fenômeno associado à produção, comércio, consumo e transformações na indumentária, que
podemos afirmar que a moda surgiu na chamada Baixa Idade Média. NOVO Aurélio. O
Dicionário da Língua Portuguesa. Século XXI. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2000 (CD-
ROM); DICIONÁRIO eletrônico Houaiss da língua portuguesa 1.0 . Rio de Janeiro:
Objetiva, 2001 (CD-ROM).
47
Os trabalhos de Joan Scott são a principal referência teórica para os historiadores em geral
que estudam as questões de gênero no Brasil.
48
Sobre os paradigmas ilumistas e pós-modernistas em História ver CARDOSO, C. F.
História e Paradigma Rivais. In: ___. e VAINFAS, R. Domínios da História: ensaios de
teoria e metodologia. Rio de Janeiro: Campus 1997. p. 1-23.
49
Uma interessante critica pós-modernista aos trabalhos de George Duby pode ser encontrada
no texto SILVA, Paulo Thiago S. Gonçalves Idade Média, idade das "trevas"? Uma análise
sobre a historiografia das mulheres medievais, publicado on line no número 1-2, julho/
dezembro 2002, da revista Labrys, Estudos Feministas, disponível em
www.unb.b/ih/his/gefem.
50
Agradeço aos professores Elias Nunes Frazão, Leila Rodrigues da Silva, e Maria Cristina
Correia Leandro Pereira, que gentilmente leram os originais deste artigo e deram excelentes
sugestões.

Você também pode gostar