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1. Introdução
O silêncio e a solitude são disciplinas espirituais que geralmente andam em conjunto, e
são essenciais para a vida cristã. Através do relato das Escrituras e da história da igreja, é
possível perceber como o hábito do silêncio e da solitude estavam presentes na vida de Jesus
Cristo, dos profetas, dos apóstolos, e também dos pais da igreja. Além disso, a Bíblia apresenta
vários motivos para a prática destas disciplinas, como expressar adoração e fé a Deus. Por
último, apesar de a sociedade contemporânea incitar o barulho e multidões, existem sugestões
práticas para tornar o silêncio e a solitude mais reais e habituais na vida do cristão.
A disciplina do silêncio é a abstenção voluntária e temporária de falar para que certos
objetivos espirituais possam ser buscados. Às vezes o silêncio é observado para ler, escrever, orar
e assim por diante. Embora não haja voz audível, há diálogos internos consigo mesmo e com
Deus. Isto pode ser chamado “silêncio externo”. Outras vezes o silêncio é mantido não apenas
por fora, mas também interiormente para que se possa ouvir mais claramente a voz de Deus.
A solitude é a disciplina espiritual de retirar-se voluntária e temporariamente à
privacidade com propósitos espirituais. O período de solitude pode durar somente alguns
minutos ou dias. Assim como o silêncio, a solitude pode ser buscada a fim de participar sem
interrupção de outras disciplinas, ou apenas para estar a sós com Deus.
1
Dallas Willard, The Spirit of the Disciplines (O Espírito das Disciplinas). São Francisco, CA: Harper and
Row, 1988, p.161.
se assente solitário e fique em silêncio, porque esse jugo Deus pôs sobre ele. Ponha a sua boca no
pó; talvez ainda haja esperança.". Em um sermão sobre este texto2, C. H. Spurgeon ensina como
não devemos minimizar o valor do silêncio diante de Deus para ajudar a evitar distrações quando
consideramos o estado da alma. A solitude e o silêncio podem nos ajudar a lidar com as
realidades de nosso pecado, da morte, do juízo, etc., temas que são frequentemente desalojados
de nossa consciência pelos sons da vida diária. Precisamos encorajar aqueles que buscam a ficar
mais "a sós com Deus" e a estudar o próprio ser à luz da Palavra de Deus.
Em sexto lugar, podemos ser fisicamente e espiritualmente restaurados através da prática
da solitude. Todos nós precisamos de tempos para afrouxar o arco de nossas tensões rotineiras e
desfrutar a restauração que o silêncio e a solitude podem prover a nosso corpo e alma. Isto foi
verdade até para aqueles que viveram mais intimamente com Jesus. Depois de se desgastarem
durante vários dias, em produção física e espiritual, observe o meio de reabastecimento que Jesus
prescreveu a Seus discípulos: "Vinde repousar um pouco, à parte, num lugar deserto" (Mc 6:31).
Assim, não devemos menosprezar as qualidades física e espiritualmente recreativas do silêncio e
da solitude que são profundamente terapêuticas.
Em sétimo lugar, as disciplinas do silêncio e da solitude são a melhor maneira de recuar
e obter uma perspectiva mais equilibrada, menos mundana, em relação às coisas. As Escrituras
relatam em Lucas 1.20-64 o caso de Zacarias, pai de João Batista, que duvidou da forma
milagrosa como sua esposa Isabel teria um filho, e por isso, ficou mudo e não pode falar até ao
dia em que o milagre aconteceu. Este foi um momento em que o Senhor mudou a perspectiva de
Zacarias a respeito do milagre durante um período de silêncio forçado. Billy Graham relata um
evento no qual ele foi questionado sobre a inspiração das Escrituras, então ele buscou por meio
da solitude obter a perspectiva de Deus sobre o assunto, meditando nas atitudes de Cristo, que
cumpriu a lei e os profetas, que os citou constantemente, nunca indicando que eles pudessem
estar errados. Esta experiência de Graham demonstra o que John Owen, prolífico teólogo
puritano, disse sobre a nossa solitude: "O que somos nela é o que somos na verdade, nada mais.
Ela é ou o melhor ou o pior de nossos períodos de tempo, na qual o princípio que predomina em
nós se mostrará e agirá".
Em oitavo lugar, podemos, em um período de silêncio e solitude, obter o discernimento
da vontade de Deus sobre um determinado assunto. As Escrituras testemunham que Jesus fez
isso ao decidir quem escolheria como discípulos que viajariam com Ele (Lc 6.12-13). Apesar de
Deus muitas vezes tornar a Sua vontade clara a nós, em público, há vezes em que Ele a revela
somente em particular, portanto, descobri-la requer as disciplinas do silêncio e da solitude.
Em último lugar, aprender a manter-se em silêncio por longos períodos de tempo pode
nos ajudar a controlar nossa língua o tempo todo. As Escrituras dizem que "tempo de calar e
tempo de falar" (Ec 3.7). Aprender a disciplina do primeiro pode ajudar você a desenvolver
controle do último, pois aquele que não sabe como ou quando ficar em silêncio não sabe como
2
C. H. Spurgeon, "Solitude, Silence, Submission" ("Solidão, Silêncio e Submissão"), em Metropolitan
Tabernacle Pulpit (Púlpito do Tabernáculo Metropolitano), 1896, vol. 42. Disponível em inglês em:
https://www.spurgeon.org/resource-library/sermons/solitude-silence-submission/. E em tradução livre
para português no vídeo da Spurgeontv disponível em: https://youtu.be/A0xKq6nCWjA
ou quando falar. Desta forma, quando praticamos o silêncio e a solitude, descobrimos que não
precisamos falar muitas das coisas que achamos que precisam ser ditas. Em silêncio, aprendemos
a confiar mais no controle de Deus em situações onde normalmente nos sentimos compelidos a
falar, ou a falar demais. Descobrimos que Ele é capaz de conduzir as situações em que antes
considerávamos indispensável a nossa intervenção. As habilidades de observação e audição
também são aguçadas naqueles que praticam o silêncio e a solitude para que quando eles
realmente falarem, haja mais novidade e profundidade em suas palavras. As Escrituras nos
ensinam que em Tiago 3.2 que a prática da disciplina do silêncio leva à semelhança com Cristo
porque ela ajuda a desenvolver o controle da língua.
Por último, a disciplina dupla do silêncio e da solitude é transformadora porque ela nos
ajuda com as outras disciplinas espirituais. Normalmente ela deve ser uma parte, por exemplo, da
absorção bíblica e da oração individual. Ela é um componente necessário da adoração privada.
Em silêncio e solitude, podemos maximizar o tempo para disciplinas como aprender e tomar
notas. É comum praticar o jejum durante os tempos de silêncio e solitude. Mas mais do que
qualquer outra coisa, a disciplina do silêncio e da solitude pode ser muito transfiguradora porque
fornece tempo para pensar sobre a vida e para ouvir a Deus.
4. Considerações Finais
O silêncio e a solitude são disciplinas espirituais essenciais para o cristão, pois assim
como o sono e o descanso diários são necessários ao corpo, a cada dia, o silêncio e a solitude são
necessários à alma. A Bíblia e a história da igreja relatam como essas disciplinas eram hábitos
presentes na vida de pessoas que tinham um relacionamento profundo com Deus.
Entre as principais razões para praticar estas disciplinas, podemos citar uma adoração
silenciosa a Deus, atentando-se para ouvir a Sua voz e discernir a vontade dEle. Em momentos
de solitude e silêncio, podem nos ajudar a lidar com as realidades de nosso pecado, da morte, do
juízo, etc., temas que são frequentemente desalojados de nossa consciência pelos sons da vida
diária. Por este motivo, muitas vezes, é necessário ficar a sós com Deus para lidar com algumas
dúvidas e indagações. Por exemplo, ao passar por uma crise de fé, o cristão pode precisar de
tempo para oração, reflexão profunda e bastante sondagem da alma.
Entretanto, o cristão não deve esperar que todo tempo de silêncio e solitude tenha o
mesmo efeito sobre sua vida que alguns que foram citados aqui, da história cristã. Nem sempre
há resultados dramáticos ou emoções intensas envolvidas. Na maior parte das vezes, eles são
emocionalmente simples e serenos. Contudo, assim como acontece com todas as disciplinas
espirituais, o silêncio e a solitude continuam sendo proveitosos mesmo em situações "normais".
Assim, um cristão verdadeiro sem dúvida tem prazer na comunhão religiosa e em
conversas cristãs, e encontra muito que afete seu coração nela; mas às vezes ele também tem
prazer em períodos de retiro de toda a humanidade, para conversar com Deus em solitude.
Referências
Whitney, Donald S. Disciplinas Espirituais Para A Vida Cristã. Editora Batista Regular, 2009.