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AGOSTO-DEZEMBRO DE 2015, ISSN: 1679-9313
BOLETIM DO NÚCLEO DE ESTUDOS VIKINGS E ESCANDINAVOS
DOSSIÊ: SÉRIE VIKINGS
Conselho Editorial:
Prof. Dr. Neil Price (Universidade de Uppsala/NEVE)
Prof. Dr. Terry Gunnell (Universidade da Islândia/NEVE)
Prof. Dr. Teodoro Manrique Antón (Universidade de Castilla-La Mancha,
Espanha/NEVE)
Prof. Dr. Hélio Pires (Universidade Nova de Lisboa/NEVE)
Prof. Dr. Eduardo Fabbro (Universidade de Toronto/NEVE)
Prof. Dr. André Szczawlinska Muceniecks (UFOP/NEVE)
Prof. Dr. Johnni Langer (UFPB/NEVE)
Equipe Editorial:
Ma. Luciana de Campos (PPGL-UFPB/NEVE)
Me. Pablo Gomes de Miranda (UFRN/NEVE)
Me. André de Oliveira (PPGH-UFMT/NEVE)
Me. Munir Lutfe Ayoub (NEVE)
Ricardo Wagner Menezes de Oliveira (PPGCR-UFPB/NEVE)
José Lucas Cordeiro Fernandes (PPGH-UECE/NEVE)
Andressa Furlan Ferreira (PPGCR-UFPB/NEVE)
Sumário 2016
SUMÁRIO
Editorial................................................................................................................4
André Szczawlinska Muceniecks
ARTIGOS
Acorde Groa, acorde boa mulher: a prática necromântica na Edda Poética
pela Grógaldr...................................................................................................137
Bárbara Rebecca Baumgartem França
Literatura e cristianismo: aspectos da cristianização da Escandinávia e
seus reflexos n´A saga de Eirik, o vermelho...............................................146
Letícia Santos
Repensando os vikings em sala de aula: uma experiência do PIBID
História e(m) imagens....................................................................................157
Bruno Ercole
Thiago Natário
Reminiscências do sagrado e as origens nórdicas do Black Metal
norueguês.........................................................................................................168
Lauro Ericksen
EDITORIAL
André Szczawlinska Muceniecks
André Szczawlinska Muceniecks é doutor em História pela USP, professor da UFOP e membro
do NEVE.
A RELIGIÃO EM VIKINGS
Robert A. Sauders
(Tradução de Andressa F. Ferreira)
— que cobiça Lagertha — conspire contra ele, aliando-se ao inflexível Jarl Borg
(Thorbjørn Harr), que maquina contra o rei aparentemente afável.
A religião é um componente fundamental de quase todos os episódios; a
maioria do drama emocional depende de questões de fé. De acordo com um
crítico, “A religião dos povos nórdicos […] é apresentada não como uma
fachada, mas como uma força dirigente em suas decisões — a noção de Valhalla
e de uma boa morte, por exemplo, está em todo lugar”. Na cena de abertura do
episódio 1, Rites of Passage (“Ritos de passagem”), Ragnar vê um Odin austero, o
Pai-de-Todos e deidade suprema do paganismo nórdico, vagando por um
campo de batalha repleto de cadáveres ao leste da região báltica. Ele é
acompanhado pelas valquírias fantasmagóricas, as quais reivindicam as almas
dos heróis mortos. A comunhão com o mundo invisível também é apresentada
logo de início, sinalizada pelo seiðmaðr (“vidente”) desfigurado do clã
adivinhando o futuro de forma precisa, assim como pela reivindicação
aparentemente sincera de Floki ser capaz de “olhar dentro das árvores” para
encontrar a madeira certa para seu navio. No segundo episódio, Wrath of the
Northmen (“A ira dos nórdicos”), há um recontar do conto de Jörmungandr, a
Serpente do Mundo, e sua batalha cataclísmica com o deus dos trovões Thor.
Posteriormente, na passagem do mar para o oeste, uma tempestade ameaça
afundar marinheiros intrépidos. Rollo se aflige, dizendo que “Thor está batendo
sua bigorna. Ele está furioso conosco. Ele quer nos afundar”. Entretanto, Floki
arrisca uma interpretação diferente face à intervenção divina: “Thor está
celebrando. Ele está mostrando que ele não pode afundar este navio!”. Esse
igualitarismo religioso é contrastado diretamente com uma cena mostrando as
estruturas autoritárias da fé no monastério de Lindisfarne, onde o medo dos
cenobitas são silenciados por um prelado ditatorial. A fluidez da crença pagã e
Robert A. Sauders é doutor em História e professor no Farmingdale State College em Nova York.
VIOLÊNCIA E RITUAL
Larissa Tracy
(Tradução de Gustavo Braga)
filhos”, Hirst contou a Daniel Fienberg da HitFix em 2014. “Nós meio que
estabelecemos que Ragnar é um cara que ama sua família, e a pior punição de
todas no mundo viking é a águia de sangue”.
Mas será? Essa é simplesmente a mais brutal punição num catálogo de
atrocidades vikings, ou uma presunção moderna? É aí que a autenticidade de
Hirst sofre com as errôneas concepções modernas sobre a prática real.
A águia de sangue usualmente não figura no catálogo de violência
atribuída aos vikings; ela somente aparece em pequenos trechos de textos, entre
os quais quase todos têm a ver com o lendário Ragnar Loðbrók, que é dito por
crônicas e sagas ter sido ativo no século IX como um invasor, um rei, e um
conquistador da Inglaterra. Pode ser que essa seja a associação que levou Hirst
a acreditar que esse seria um autêntico ato de seu Ragnar.
Por décadas, contudo, estudiosos têm debatido a precisão de relatos
sobre o uso desta forma de punição — falhando vastamente em chegar a
qualquer conclusão definitiva. De acordo com Saxo Grammaticus em sua Gesta
Danorum e as sagas islandesas Ragnars saga loðbrókar e Ragnarssona þáttr, a águia
de sangue é uma punição determinada ao Rei Ælle de Northumbria pelos filhos
de Ragnar em resposta a ter mandado lançar Ragnar numa cova de víboras
venenosas. Ælle é sujeito a variações dessa horrível execução em várias versões
dos textos sobre Ragnar como forma de vingança.
É inteiramente possível que este ritual tenha sido uma característica da
sociedade nórdica; é igualmente possível que este seja um motivo literário onde
os piores criminosos são submetidos às piores punições que a mente pode
imaginar.
A evidência textual é contraditória e frequentemente subjetiva —
especialmente em relação à águia de sangue. Parece existir pouca evidência de
que ela de fato existiu, ou, se existiu, de que era uma prática comum.
A cena da “águia de sangue” em Vikings é feita com cuidado e
sentimento, mas é provavelmente baseada numa fantasia.
Então, enquanto a série Vikings se esforça em representar uma visão
mais completa da sociedade escandinava, uma que não é exclusivamente
sanguinária nem excessivamente passiva, ela ainda sucumbe ao que se tornou
uma imagem indelével na imaginação moderna — aquela do viking estoico que
se dispõe à pior brutalidade possível quando necessário. Mas as evidências
textuais e históricas sugerem que crueldade desnecessária não era enraizada no
seio da sociedade nórdica da Era Viking. Na verdade, se é isso que você quer
ver, assista Game of Thrones.
similaridades e diferenças nos modos pelos quais estas duas visões religiosas
entendem as categorias fundamentais da existência — vida e morte, sacrifício e
regeneração, deus e natureza — que estruturam todas as perspectivas éticas”.
O artigo “PlasticPagans: Viking Human Sacrifice in Filmand Television”
é um dos catorze artigos incluídos nesta edição de Studies in Medievalism XXIII
(Estudos em Medievalismo XXIII). Outros artigos lidam com Beowulf, o jogo
eletrônico Elder Scrolls IV, e até mesmo a ficção histórica de Margaret Frazer.
Harry Brown é professor associado de inglês na De Pauw University.
Figura 1: Cena do episódio Warrior's fate (Série Vikings, terceira temporada), reconstituindo a
morte de um bovídeo para o deus Freyr. Fonte da imagem:
https://www.youtube.com/watch?v=Ykh5RuBLJTw
A realização de sacrifício (blót) a Freyr para obter boas colheitas (til árs) é
algo respaldado em algumas fontes medievais, destacando seu aspecto de deus
da fertilidade e fecundidade (BOYER, 1997, p. 58). A prosperidade devido a
Figura 2: Cena do episódio Warrior's fate (Série Vikings, terceira temporada), momento em que
Lagertha é banhada em sangue sacrificial. Fonte da imagem:
https://www.youtube.com/watch?v=Ykh5RuBLJTw
A cor branca tem sido uma opção canônica para os artistas europeus
representarem os sacerdotes e sacerdotisas das religiosidades pré-cristãs em
geral, desde o romantismo oitocentista, até mesmo para os druidas. Nas
pinturas Ofring til Tor (1831, de Johan Lund) e Nerthus (1909, de Carl Emil
Doepler), ambos os sacerdotes nórdicos possuem longas barbas e indumentária
branca, este último um detalhe também presente na profetisa ressuscitada por
Odin em uma pintura de Carl Doepler de 1900. Na cena da série Vikings, essa
cor certamente foi utilizada não somente pela referência canônica da arte
ocidental, mas para causar impacto cênico — logo depois do sacrifício, dois
ajudantes despejam parte do sangue sobre o corpo de Lagertha, originando
duas imensas manchas vermelhas por todo o comprimento da roupa. Algo que
recorda a primeira cena da série televisiva Roma (HBO, 2005), quando a
personagem Átia é aspergida com o sangue de um boi sacrificado, em
Referências:
BOYER, Régis. Le blót. In: Le monde du double: la magie chez les anciens
Scandinaves. Paris: Berg, 1986, p. 176-187.
BRAY, Daniel. Sacrifice and Sacrificial Ideology in Old Norse Religion. In:
HARTNEY, Christopher; MCGARRITY, Andrew (eds.). The Dark Side:
Proceedings of the Seventh Australian and International Religion, Literature and the
Arts Conference, 2002. Sydney: RLA Press, 2004, p. 123-135.
DAVIDSON, Hilda. The cult of Freyr. In: The lost beliefs of Northern Europe.
London: Routledge, 2001, p. 103-107.
HEDEAGER, Lotte. Iron Age myth and materiality. London: Toutledge, 2011.
PIRES, Hélio. Vaningi: o javali e a identidade dos Vanir. In: Revista Brasileira de
História das Religiões – Dossiê: Mito e Religiosidade Nórdica, n. 23, 2015, p. 11-22.
REAVES, William. The Cult of Freyr and Freyja, 2008. Disponível em:
<www.academia.edu/9715739>.
VERDON, Jean. Camponeses: heróis medievais. In: História Viva 34, 2006, p. 46-
48.
vista que seu pai é o gigante Fárbauti (LINDOW, 2002, p. 216). No passado
mitológico, Loki tem três filhos que desempenham papéis importantes ao longo
da mitologia viking: a serpente Midgard, o lobo Fenrir e a terceira filha, Hel,
deusa do mundo dos mortos, sendo que todos os três filhos são frutos de sua
relação com a giganta Angrboda (no decimo episódio da segunda temporada,
Floki decide chamar sua filha de Angrboda, a exaltando como uma grande
giganta).
O mitólogo holandês Jan de Vries foi o primeiro a considerar a figura de
Loki dentro do conceito de trickster (LANGER, 2015, p. 283). Segundo Queiroz
(1991, p. 94):
Em geral, o trickster é o herói embusteiro, ardiloso, cômico,
pregador de peças, protagonista de façanhas que se situam,
dependendo da narrativa, num passado mítico ou no tempo
presente. A trajetória deste personagem é pautada pela sucessão
de boas e más ações, ora atuando em benefício dos homens, ora
prejudicando-os, despertando-lhes, por consequência,
sentimentos de admiração e respeito, por um lado, e de
indignação e temor, por outro.
Na mitologia vemos que Odin fez uma irmandade de sangue com Loki
— Lindow (2002, p. 218) entende tal atitude como uma tentativa de adiar o
conflito mortal entre os dois —, e ambos aparecem em jornadas, juntos, em
algumas narrativas. Por exemplo, no poema Reginsmál, junto de Hönir, ou no
Haustlong, onde Loki chega a ser referido pelo seguinte kenning: “o amigo de
Odin, de Hoegni e de Thor” (LANGER, 2015, p. 281).
Floki afirma, no nono episódio da primeira temporada, em uma conversa
com o rei Horik, Loki “é apenas um ancestral antigo”. Vale notar que na cena
eles observam uma aranha em sua teia atacando uma presa, sendo uma
possível relação com a etimologia de Loki. Em diversos momentos, a série
indica Ragnar como descendente de Odin. Ao relacionarmos as descendências
de Ragnar e Floki com os mitos relativos a Odin e Loki, podemos ver aí,
novamente, representações de Loki em Floki.
Eldar Heide (2011, p. 63) discute sobre a existência de dois Lokis: “o
personagem mitológico e um vätte (espirito doméstico) vivendo embaixo ou ao
lado da lareira. O personagem mítico seria derivado desse vätte”. O’Donoghue
(2007), relaciona Loki com o fogo em diversas ocasiões, desde o personagem
Loge da ópera de Wagner até mesmo uma recente representação do deus em um
romance para crianças de 1975. A autora ainda argumenta sobre a relação de
Loki com o fogo, pautada no mito da viagem à Utgarda-Loki: em uma série de
disputas, Loki é desafiado em uma competição de comilança, a qual perde para
o gigante Logi (chama), pois o fogo tudo devora. Vale lembrar que no Ragnarok,
Loki combate os deuses aliado aos gigantes, e tudo será consumido pelo fogo.
Na série, dois momentos de Floki com o fogo merecem destaque. No
segundo episódio da primeira temporada, após o massacre em Lindisfarne,
Floki brinca com o fogo, queimando pedaços de manuscritos até o ponto de
atear fogo no mosteiro inteiro. Ragnar, já sabendo a resposta, indaga a Floki
Figura 3: Floki acorrentado na caverna (cena do trailer da quarta temporada do seriado). Fonte:
https://www.youtube.com/watch?v=IARD01_FEq0
Referências:
HEIDE, Eldar. Loki, the Vätte, and the Ash Lad: A Study Combining Old
Scandinavian and Late Material. Viking and Medieval Scandinavia, v. 7, 2011, p. 63-
106.
LINDOW, John. Norse Mythology: A Guide to the Gods, Heroes, Rituals, and Beliefs.
New York: Oxford University Press, 2002.
Figura 1: Floki demonstra a Ragnar o barco que constrói sozinho em sua oficina (RITES..., 2013)
Conclusão
mesmo rei Horik que é traído e entregue a Ragnar para que este possa levar a
cabo sua execução. É inegável que os produtores tenham se baseado em Loki na
construção do personagem e tenham tentado captar todas as suas dualidades, e
talvez tenham conseguido se sair muito bem, desviando boa parte da carga
negativa que o ser mitológico possui em outras mídias.
Figura 2: Horik tenta cooptar Floki. A segunda temporada apresentou o lado mais ardiloso de
Floki, combinando assim as várias facetas do mitológico Loki no epicentro da narrativa
(BONELESS, 2014).
Referências:
BILL, Jan. Viking Ships and Sea. In: BRINK, Stephan; PRICE, Neil (org.). The
Viking World. New York: Routledge, 2008, p. 170-180.
LUND, Niels. Naval Forces in the Viking Age and High Medieval Denmark. In:
HATTENDORF, John B.; UNGER, Richard W. War at Sea in the Middle Ages and
Renaissance. Rochester: Boydell Press, 2003, p. 25-34.
MYHRE, Bjørn. The Iron Age. In: HELLE, Knut (org.). The Cambridge History of
Scandinavia, Vol. 1. Cambridge: Cambridge University Press, 2008, p. 60-93.
RITES of passage. Direção: Johan Renck. Roteiro: Michael Hirst. In: Vikings. 46
minutos e 38 segundos. Disponível em:
<http://www.netflix.com/watch/70301854?trackId=200257859>. Acesso em 10
de fevereiro de 2016.
nome como prova de seu ato de honra, passando a ser denominado Fáfnisbani
(“Aquele que matou Fafnir”). Dessa forma, Reginn aparece como o mestre da
iniciação do herói Sigurd (HEDEAGER, 2011, p. 142; MOTZ, 1993, p. 83).
Lotte Hedeager conclui assim sua análise de Reginn por dizer que
mesmo o mais forte dos reis dependia de suas habilidades como ferreiro,
mágico e artesão. Reginn é um ser que não pertence àquela sociedade, não
tendo nenhuma mulher em sua família e sendo impossibilitado de se
reproduzir, um ser liminar responsável pela iniciação de heróis e pela produção
de artefatos únicos (HEDEAGER, 2011, p. 142). Contudo, ainda resta ressaltar
que Reginn é caracterizado também como uma figura traiçoeira, personagem
que pretendia matar o herói Sigurd e roubar as riquezas de seu irmão Fafnir,
sendo necessário um controle forte sobre o mesmo que, ao fim, por um ato de
defesa do herói, acabou por ser morto.
Para terminarmos essa breve análise sobre o ferreiro nos mitos e nas
sagas, ainda devemos citar também o nome de Völund, um dos mais famosos
ferreiros do mundo nórdico, citado pela Edda poética no poema Völundarkvida.
Historiadores como Andy Orchard estudam também a figura do ferreiro
Völund em fontes germânicas e anglo-saxônicas demonstrando a variação de
seu nome por Wayland, Weland e Welund (ORCHARD, 2002, p. 389). Uma das
fontes mais antigas para o mito de Völund provém de um relevo presente em
um relicário do mundo anglo-saxônico datado do século VIII, mas fontes
arqueológicas desse mesmo século no mundo escandinavo também foram
apontadas como apresentando o mito do ferreiro como, por exemplo, uma das
estelas de Gotland (JAKOBSSON, 2003, p. 149).
Völund é apresentado como irmão de Égil e Slágfid, e os três são
apontados como filhos de um rei Finn. Os Finns ou Saamis são comumente
O mito de Völund está, por fim, marcado por fatos que conduzem a
trama por episódios de vingança. O ferreiro teria matado os dois filhos homens
do rei Nídud, que, ao visitarem Sevarstad atrás de joias e bens valiosos,
acabaram por ser decepados. Os corpos dos filhos de Nídud serviram, assim, a
Völund como matéria prima na confecção de duas taças que foram feitas de
seus crânios, joias que foram feitas de seus olhos e broches que foram feitos com
seus dentes. As taças teriam sido enviadas ao rei, as joias teriam sido enviadas à
rainha e os broches teriam sido enviados a Bódvild.
A vingança do ferreiro, no entanto, iria ainda mais além, em um dia que
foi visitado por Bódvild, que o procurava para que consertasse o anel de ouro,
que havia quebrado. O ferreiro se aproveitou e a estuprou, fazendo na filha do
rei um filho. Em seu ato final, Völund produz em sua forja asas para que
pudesse voar e escapar da tirania do rei, fato que leva a historiadora Lotte
Hedeager a apontar o personagem como um típico mestre ferreiro que tem a
habilidade de se metamorfosear como um xamã, sendo, por consequência,
responsável pela mediação entre o mundo dos homens e o mundo dos deuses
(HEDEAGER, 2011, p. 143).
Contudo, variações das interpretações apresentadas por Lotte Hedeager
podem também ser apontadas, interpretações como as apresentadas pelo
historiador Johnni Langer em seu verbete sobre Völund presente no Dicionário
de Mitologia Nórdica. Langer aponta para compreensões como as de um mito
sazonal, onde o inverno seria representado pela partida de Hervör-Alvitr, e o
verão representado pela fuga de Völund, que recupera sua liberdade, sua
espada e o anel que havia sido dado a Bódlvid, ou ainda como um mito
representativo de relatos sobre vinganças de criaturas sobrenaturais contra
seres humanos que subestimaram suas habilidades, relato esse que significaria
Considerações finais
Concluimos, assim, por uma breve análise que a imagem do ferreiro nos
mitos nórdicos está marcada por uma incapacidade de reprodução social e um
pertencimento exterior às famílias dos deuses e dos homens, sendo esses
apontados como pertencentes a esferas como a dos anões ou ainda, como no
caso de Völund, à esfera dos Finns, povos exteriores ao mundo escandinavo,
característica um pouco diversa da apresentada pela série Vikings, onde o
ferreiro é pai de uma menina, portanto possuidor de uma família com membros
femininos.
O ferreiro é ainda uma figura central na produção de bens
importantíssimos como as armas ou até mesmo como as joias, que marcavam
um pertencimento aristocrático do período, mas deveria ser controlado pelos
poderosos dessas sociedades para que não viessem a cometer traições, como as
pretendidas por Reginn ou as realizadas por Völund. Nesse sentido, o ferreiro
da série Vikings se aproxima do ferreiro dos mitos como sendo uma figura de
extrema necessidade para a produção de bens importantíssimos, como a já
citada âncora da embarcação de Ragnar. Além disso, o ferreiro da série é
percebido pelo earl Haraldson como um traidor, se aproximando, assim, da
figura mitológica de Reginn, sendo ambos, ao fim, mortos pela mão dos
poderosos de suas sociedades.
Assim, aspectos das relações sociais, como aquela estabelecida entre os
Referências:
MOTZ, L. The Wise One of the Mountain: Form, Function and Significance of the
Subterranean Smith. Göppingen: Kümmerle, 1983.
SCHJØDT, Jens Peter. Contemporary Research into Old Norse Mythology. In:
HERMANN, Pernille; SCHJØDT, Jens P.; KRISTENSEN, Rasmus T. (eds.).
Reflections on Old Norse Myths. Turnhout: Brepols, 2007. p. 1-16.
MALDITAS SERPENTES:
UM COMENTÁRIO SOBRE A CENA DO SUPLÍCIO DO POÇO
Leandro Vilar Oliveira
Nórtumbria.
No primeiro episódio, a história ocorre no ano de 793, data que na
historiografia é aceita como sendo o ano em que ocorreu o primeiro ataque
viking à Inglaterra, mais especificamente ao mosteiro da ilha de Lindisfarne na
Nórtumbria. Na história, Ragnar tenta convencer o jarl Haraldson (Gabriel
Byrne) a empreender no verão uma campanha para o oeste, pois normalmente
ele fazia isso para leste, mas Ragnar acreditava que ganhariam muito mais se
cruzassem o mar até a Inglaterra.
A relação entre Haraldson e Ragnar é bastante tensa, pois Ragnar é
petulante e diferente de outros, não se submete facilmente ao jarl. Com isso,
Haraldson não aceita a proposta de Ragnar, o qual decide procurar a ajuda dos
deuses, indo falar com o ancião, e, por sua vez, Ragnar decide procurar seu
amigo Floki (Gustaf Skarsgård), o qual é um artesão que constrói navios.
Ragnar acredita que, caso possua seu próprio navio e tripulação, conseguiria
convencer Haraldson a permitir a expedição, e isso vem a ocorrer no Episódio 2:
Wrath of Northemen, o qual conta a história do ataque à Lindisfarne.
Ao retornar para Kattegat, vila onde mora o jarl Haraldson, Ragnar e sua
tripulação retornam triunfantes, o que acaba tornando-o famoso no local,
atiçando a inveja e revolta de Haraldson, o qual esperava que Ragnar morresse
afogado ou fracassasse. Com o êxito, Ragnar planeja uma nova expedição à
Inglaterra, ainda mais incentivado após o relato do monge Athelstan (George
Blagden), o qual Ragnar trouxe como prisioneiro e, posteriormente, se torna seu
amigo. Athelstan lhe diz que a Inglaterra é cheia de reinos ricos, e isso leva
Ragnar a retornar para lá, indo atacar uma pequena cidade chamada de Haxam.
O ataque ocorre no Episódio 4: Trial.
Novamente ele obtém êxito, o que não apenas enfurece o jarl Haraldson,
(ormagarðr).
Diferente das cobras, que são animais da fauna britânica, leões não o são,
e é muito improvável que no século XII houvesse algum leão mantido em
cativeiro, logo, ormagarðr parece ter sido uma metáfora para uma cova de
suplício ou uma “cova da morte”, independente de conter ou não víboras.
Sendo assim, talvez a morte de Ragnar Lodbrok num poço de serpentes
tenha sido uma metáfora (kenning), como sugere uma das opiniões de
Guðmundsdóttir, ou talvez um acontecimento inspirado na tradição escrita do
Norte da Europa entre os séculos XII e XV, onde Guðmundsdóttir localizou
várias histórias que dizem respeito a tal suplício.
Nesse ponto, devemos recordar que a Gesta Danorum (XII-XIII) e a Ragnar
saga Loðbrokar (XIII) consistem em manuscritos datados do período que
compreende a maioria das citações sobre poços de serpentes.
Inclusive, não se encontram menções a sua história antes disso, embora
se diga que ele tenha supostamente vivido no século VIII ou IX. Por outro lado,
as referências à lenda de Gunnar e Atli são anteriores à Idade Média Central,
remontando, em termos iconográficos, ao século IX, o que significa que a ideia
de um poço de serpentes é bem anterior à tradição literária, remontando a uma
tradição oral, cuja origem é desconhecida. E talvez possa ter servido de modelo
para outras histórias, o que incluiu a de Ragnar Lodbrok, pois, embora a Ragnar
saga ofereça mais detalhes do que a narrativa da Gesta Danorum quanto à vida
de seu herói, ambas concluem que ele foi executado pelo rei Ælla II num poço
de serpentes.
Referências:
GRAMMATICUS, Saxo. The first nine books of the Danish history. Translated by
Oliver Elton. London: Nutt, 1894.
MCGUIGUAN, Neil. Ælla and the Descendants of Ivar: Politics and Legend in
STAECKER, Jörn. Heroes, kings, and gods. In: ANDRÉN, Anders; JENNBERT,
Kristina; RAUDVERE, Catharina (eds.). Old Norse religion in long-term
perspectives: origins, changes, and interactions. Lund: Nordic Academy Press, 2006.
cultural. Entretanto, Ragnar reside com sua família perto de Kattegat, região
localizada entre a Dinamarca e a Suécia. Ademais, buscou-se evidenciar,
principalmente, às filmagens das cenas externas, das paisagens físicas e
geográficas irlandesas, somando-se a uma linguagem de cunho mais coloquial,
de fácil compreensão, apresentada no desdobramento desse enredo. É, a partir
desse contexto sociocultural e geográfico, que se encontra inserido o
trecho/fragmento, objeto de nossa análise, o qual trata, como já mencionado, a
respeito da narrativa de Ragnarök e os seus personagens, cenas que serão
descritas em sequência.
Ao iniciar a cena que se reporta a essa narrativa, além do guerreiro e
fazendeiro Ragnar Lothbrok e sua família (a esposa Lagertha e o filho Bjorn),
encontravam-se reunidos, no salão, seu irmão Rollo, Floki — o artesão
construtor de barcos de guerra —, o monge cristão Athelstan, entre outros. Com
a morte do Earl Haraldson, em um duelo com Ragnar, que fora aclamado Earl
Ragnar, este passou a governar aquelas terras.
Após a descrição do cenário, observemos o trecho do diálogo de Ragnar
com o monge cristão em que esse indaga a Ragnar sobre o significado do mito
de Ragnarök:
— Ragnar eu já conheço muita história do seu povo. Mas, me
conte o que é Ragnarök? Já ouvi falar sobre isso várias vezes. Mas,
ninguém nunca explicou o significado.
Ragnar retruca:
— Vamos mostrar a esse cristão ignorante o que é Ragnarök.
Peguem as folhas.
Diante dos que estavam ali presentes, as folhas são amassadas e jogadas
sobre o fogo. Nesse momento, a águia faz um voo por sobre o salão. Em
seguida, a cena apresenta um seiðmaðr, um vidente que descreve os sinais do
Ragnarök, vejamos:
— O crepúsculo dos deuses acontecerá assim: Haverá três anos
de terríveis invernos... E verões de sol completamente negro.
Pessoas perderão toda a esperança e se renderão à ganância, ao
incesto e à guerra civil. Miðgarðsormr, a serpente do mundo, virá
se debatendo do oceano, arrastando as marés e inundando o
mundo. O lobo, o gigante Fenrir, quebrará suas correntes
invisíveis... os céus se abrirão, e, Surt, o gigante do fogo,
queimará as pontes para destruir os deuses. Odin cavalgará pelos
portões de Valhalla para lutar com o lobo, pela última vez. Tor
matará a serpente, mais morrerá do seu veneno. Surt espalhará o
fogo sobre a terra. E por fim, Fenrir engolirá o sol.
(estrofe 47) alude sobre o parente de Surt, o fogo, como aquele que logo
devoraria o cosmos. Descreve ainda que, da direção oeste (estrofe 51), virão
pelo mar, de barco, os filhos de Múspel, o mundo do fogo, com Loki ao leme; e,
do sul (estrofe 52), desponta Surt trazendo o fogo. Já no Vafþrúðinismál há
breves referências (estrofes 50 e 51) aos deuses que sobreviveriam a Surt.
Retomando a fala do vidente, no diálogo, “Odin cavalgará pelos portões
de Valhalla para lutar com o lobo pela última vez”, o Völuspá (estrofe 53)
menciona esse evento como a “segunda dor de Frigga”, em que Odin será
devorado pelo Lobo Fenrir, porém Vidar cravará no peito de Fenrir a sua
espada, vingando a morte de Odin. A “primeira dor de Frigga” se reporta a
morte de seu filho, o deus Balder, pelo irmão Hoder que, enganado por Loki,
atira-lhe um visco em forma de flecha (estrofes 31, 32 e 33). O Vafþrúðinismál
(estrofe 53) comunica, apenas, que Odin será devorado por Fenrir e vingado por
Vidar.
Ao fazer referência à passagem do diálogo, “Tor matará a serpente, mais
morrerá do seu veneno,” o poema Völuspá (estrofe 55) afirma que Tor, possuído
de raiva, principia uma luta com a terrível serpente. Logo após a façanha de
matá-la, deu nove passos, caindo morto (estrofe 56). Em suma, a morte de
outros deuses é anunciada, a saber: Odin (estrofe 53), Balder (estrofes 54) e o
fim dos deuses de um modo geral (estrofes 47 e 55). No Vafþrúðinismál, há
apenas uma breve referência à morte de Tor (estrofe 51).
A partir dessas considerações, é possível afirmar que a narrativa chega
ao seu ápice anunciando o fim do cosmos em que “Surt espalhará fogo sobre a
terra”. O Völuspá (estrofe 52) descreve que, do encontro entre o fogo e o vento,
“o céu racha-se”, dando início a uma guerra em Midgard; depois, o sol
desaparece, a terra submerge nas águas, as estrelas caem do firmamento e o
narrativa que descreve a respeito dos sinais, o que, claramente, poderiam ter
enriquecido o próprio texto, reproduzindo mais que uma citação desses
eventos, precipuamente, aludindo o significado do fim do mundo para essa
cultura. Da mesma forma, as falas/texto dos atores que fizeram parte dessa
plateia não conseguiram repassar a perplexidade sugerida pelo momento do
anúncio da destruição do mundo, restringindo-se a olhares mútuos apenas.
Diante da expectativa da continuidade desse seriado, visto à relevância
dessa tônica, defendemos que um evento a respeito da concepção apocalíptica
da crença nórdica pré-cristã sobre o fim do cosmos e de alguns deuses
mereceria um maior aprofundamento dessa discussão, com vias a melhor
compreensão e caracterização no que se refere à sua descrição textual.
Angela Albuquerque de Oliveira é mestranda em Ciências das Religiões pela UFPB e membro
do NEVE.
E-mail: gel-oliveira1@hotmail.com
Referências:
Se eu não tivesse lido essas duas frases em entrevistas, não acho que teria
arrumado o tempo para escrever este artigo. Segundo Michael Hirst, não se
poderia esperar uma série séria, ou que tentaria ser como tal. Teria sido melhor
abster-se de qualquer entrevista. Em um lado temos o canal History Channel que
é especializado nessas programações ditas “históricas”, com mais ou menos
seriedade, e no outro Michael Hirst que é conhecido pelas suas séries
aproximadamente históricas (“Os Tudors”, “Os Bórgias”), e não seria seu
consultor histórico (e produtor associado) Justin Pollard (“Piratas do Caribes: A
fonte da Juventude”, “Alice no País das Maravilhas” de Tim Burton, “Os
Tudors”) que levantaria a qualidade. O trailer é apenas os créditos da série,
então não tivemos escolha a não ser esperar o lançamento para ver se os nossos
medos eram justificáveis. Desde o primeiro episódio, o tom é dado e a
proporção da discussão sobre a primeira temporada só fica pior.
Com base em alguns textos, como o Gesta Danorum de Saxo
Grammaticus, ou a Saga de Ragnar Calças-peludas, a história começa,
coincidentemente, em 793 e acompanha a história de Ragnar Calças-peludas e
sua família. Atenção, qualquer semelhança com pessoas ou situações existentes
no norte antigo.
A configuração geográfica é supostamente a região do Kattegat, ou a área
que se estende a partir de hoje de Jutland à província sueca de Halland. Um
ponto problemático para a filmagem: essa região não possui zonas
montanhosas. Nem os personagens deveriam atravessar uma montanha para
chegar em Uppsala. Sobre animais, Frédéric Hanocque confirmou que as raças
equinas usadas durante as filmagens são incorretas. É o mesmo para as cobras
no poço do rei Ella que são Boas e Pythons. As ovelhas não são da raça correta, e
o mesmo para os gansos. As encenações com o sacrifício de cabras em Uppsala
deveriam ter pelos longos e grandes chifres. Os suínos da Era Vikings também
estão incorretos, sendo que tinham pelos compridos como javalis. E o Irish
Wolfhound somente chegaria na Escandinávia após suas viagens ao oeste.
A análise espiritual é menos crítica do que se poderia pensar. Algumas
partes são muito interessantes e até surpreendentes no contexto da série. No
templo de Uppsala, o escravo cristão Athelstan é surpreendido com a visão de
animais e pergunta o que eles são. Ragnar explica que eles são usados em um
quadro de sacrifício e há nove de cada tipo (cordeiro, porco, cabra e humano).
Essa parte, embora sujeita à controvérsia por anos, é consistente com as
descrições de vários autores como Adão de Bremem, Saxo Grammaticus e
Snorri Sturluson. A cena do sacrifício humano é apresentada como uma
interpretação livre, mesmo se a suspensão do corpo para as árvores se reflete
nos textos e na tapeçaria de Oseberg.
Os detalhes legais de ordem jurídica são cumpridos. Na série, durante a
segunda incursão na Inglaterra, Lagertha mata o homem de confiança enviado
pelo Jarl — homem de confiança que é igualmente um irmão bastardo do Jarl.
Ela se opôs a uma tentativa de estupro de uma mulher local, e ele se virou para
ela, tentando fazê-la sofrer o mesmo destino. Mas ela o matou. Entretanto,
quando o Jarl perguntou onde está o seu meio-irmão, Ragnar explica o que
ocorreu e é acusado de assassinato. Conforme a lei de Vestrogothie, uma das
peças mais antigas da legislação que temos a nossa disposição para a Suécia, os
casos de homicídio voluntário e involuntário são altamente regulamentados e
previu-se múltiplos cenários. O julgamento na série é bem longe de apresentar a
cultura processual do Norte antigo. Na verdade, basta ler qualquer saga para
perceber. A lei de Vestrogothie estipula que “se uma mulher matar qualquer um,
deve-se buscar seus parentes mais próximos; eles devem pagar a multa ou fugir
para salvar a paz”. As notas de Ludovic Beauchet falam um pouco mais: “A
mulher é, do ponto de vista penal, considerada menor. A mulher não tem nem
uma responsabilidade pessoal e a reparação do delito é, por consequência,
responsabilidade de seu responsável civil”. Finalmente, no duelo judicial
(hómlganga). Essa prática aparece em numerosas sagas islandesas, o mais
conhecido caso é narrado na saga de Kormak. Se os três escudos apareceram na
tela, o resto é, como a série, muito longe da descrição dos textos.
Texto original em francês escrito por François Dontaine e publicado no boletim Valland, n. 6,
2013. Disponível em: <https://www.academia.edu/3828789>.
Introdução
aparece nas sagas, poemas antigos e no livro Gesta Danorum, história sobre as
tradições e os feitos dos heróis dinamarqueses, escrita por volta do século XII-
XIII pelo historiador dinamarquês Saxo Grammaticus. Segundo os estudiosos,
não há comprovação sobre a existência histórica do herói Ragnar. Os demais
personagens em destaque também foram estudados e apresentados.
Posteriormente, foram mostrados aspectos sobre a tecnologia militar e naval
utilizadas pelos nórdicos. A respeito da tecnologia náutica, foi ilustrado como
seria a cadeia operatória da construção de diferentes barcos, algo de extrema
importância para os nórdicos expansionistas. Sobre o assunto tratamos do
personagem Floki, que é o responsável por criar um novo protótipo de barco
que permitiu que os vikings do seriado desbravassem o mar aberto.
Aconteceram também apresentações de comunicações sobre religião e mitologia
nórdica, sociedade e questões de gênero. Para finalizar, encerramos com a
discussão sobre a expansão marítima e territorial dos nórdicos da Era Viking.
Em 2015 dois novos ciclos foram organizados, o primeiro (2ª temporada
da série) no final de julho e início de agosto e o segundo (3ª temporada da série)
no mês de novembro. Com a inserção de uma coordenadora participante de
eventos e grupos de pesquisas sobre Antiguidade e Idade Média foi observada
a necessidade de se estabelecer contato com especialistas brasileiros na temática
a fim de aprofundar os debates. Assim, foi convidado o Prof. Dr. Johnni Langer
(UFPB/NEVE) e realizada a conferência virtual “O imaginário dos Vikings no
cinema”, chegando a ter mais de cem participantes presentes para assistir a
mesma. As comunicações do segundo ciclo versaram sobre os contatos entre
anglo-saxões e escandinavos na Grã-Bretanha medieval, funerais vikings, as
valquírias e a representação de gênero, dragões na cultura viking, os
estereótipos vikings no ensino de História Medieval, berserkir e ulfhednar, a
Considerações finais
Referências:
BURKE, P. O que é História Cultural? Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 2004.
supostamente viveu no século IX, sendo líder da expedição viking que saqueou
a cidade de Paris em 845 d.C., vindo a morrer em 865 d. C. As aventuras de
Ragnar foram registradas na Ragnars Saga Loðbrókar e Ragnarssona þátt. Ele
também é mencionado na Heinskringla saga e na Gesta Danorum, não havendo
nenhuma destas obras em português. Uma breve observação no tocante às
datas em que ocorreram o ataque à Lindisfarne em relação à invasão à Paris, é
suficiente para percebermos a incongruência da série, já que existe um lapso de
setenta anos entre uma data e outra. No tocante a isso ainda temos a conquista
da Normandia, realizada por Rollo em 911 d.C., que embora ainda não tenha
sido mencionada em nenhum episódio, possivelmente será tema da quarta
temporada. Relacionando o ataque à Lindisfarne com a conquista da
Normandia, o lapso é ainda maior, sendo de cento e dezoito anos.
De maneira geral fica claro que o roteirista não tem nenhuma
preocupação com a cronologia dos acontecimentos históricos. Seu escopo é
elencar os acontecimentos mais audazes e impressionantes da história e da
mitologia da Era Viking, objetivando incrementar o enredo da série e
atribuindo-os a Ragnar. O objetivo do roteirista fica bem evidenciado no
episódio em que se desenrola o cerco de Paris. Depois de algumas tentativas
frustradas, Ragnar finge estar gravemente ferido, pede para ser batizado; caso
morra, para ser enterrado na igreja. Após seu suposto falecimento é levado ao
local onde sai de seu caixão conseguindo obter êxito. O engodo apresentado na
realidade foi supostamente feito por Hasting e não Ragnar, segundo o
historiador Johannes Brøndsted. Em seu livro “Os Vikings”, Hasting chega à
cidade italiana de Luna acreditando ter chegado em Roma; lá seus
companheiros contam que ele havia morrido como cristão e reivindicam o
sepultamento na igreja da cidade. Durante o velório Hasting levanta do caixão,
lo. Na maioria das cenas em que os guerreiros estão reunidos no salão, Siggy
faz sua voz ser ouvida por meio de seu esposo de forma a não sobrepor sua
autoridade.
Se de início o papel das mulheres é bem representado, o mesmo não
ocorre no decorrer do seriado, que se envereda pelo fantástico e fantasia.
Referente às representações cinematográficas relacionadas às mulheres nórdicas
medievais, dispomos do estudo de Josyleia Almeida no estudo “Ficção e
História: aspectos e representações das mulheres escandinavas nas apropriações
cinematográficas” (2012, p. 355-389).
No decorrer do seriado Lagertha se divorcia de Ragnar, se casa
novamente e passa a ser jarl (conde) de uma região. Tais fatos realmente
poderiam acontecer entre os nórdicos, onde diversos historiadores atestam que
as mulheres poderiam pedir divórcio, ter propriedades e bens legais, bem como
havia a possibilidade de se tornarem poderosas com a herança de seus maridos.
No entanto, o fato de ela se tornar guerreira e participar de incursões é algo não
comprovado nas sociedades da Era Viking. Como salientamos anteriormente, as
relações de gênero eram bem definidas nessa época e região.
A jornada de Siggy também comete muitos equívocos, do ponto de vista
histórico. Após Ragnar matar seu esposo, o jarl Haraldson, e assumir o poder,
as hipóteses mais compatíveis com o destino de Siggy na série seriam ela ter
sido assassinada junto com seu marido, pedir para que fosse sacrificada para
acompanhá-lo na morte, se tornar escrava ou ser exilada. Porém, ela se torna
aldeã livre e vira amante de Rollo. No decorrer da trama Siggy tem uma série
de relações adúlteras, buscando vingança ou a volta ao poder. Diversos
historiadores descrevem que embora pudessem haver adultério entre os
vikings, eles eram raríssimos por parte das mulheres, já que a punição para isso
Considerações Finais
A série “Vikings”, como toda obra produzida pela indústria cultural, não
pode ser vista como um instrumento de formação educacional, não assume fins
didático-pedagógicos, ela utiliza a História como um produto de
entretenimento. Embora a série demonstre certos aspectos condizentes com os
dados históricos, fica claro que ela produz e reproduz um conjunto de pseudo
informações, projetando valores, crenças, preceitos, modos de agir, pensar e
valorizar dentro de uma visão de mundo atual e de forma massificadora.
Uma enorme quantidade de sites na internet tem postado entrevistas
com o produtor Michael Hirst, nas quais ele é enfático ao dizer que se a série
fosse um relato histórico, atingiria apenas centenas de pessoas, como produto
da cultura pop ela atinge milhares. Ele também relata que muitas cenas foram
produzidas erroneamente do ponto de vista histórico de propósito, justamente
para abranger um público maior, o que a torna mais atraente para as mais
variadas faixas etárias.
Embora a série apresente uma pseudo representação sobre o passado,
fazendo com que o público leigo acredite ser uma representação realista da
história, ela também está suscitando cada vez mais informações sobre a
sociedade nórdica, basta uma breve observação no número de acessos de blogs
sobre o assunto para confirmarmos a alegação. Se por um lado as imprecisões
históricas apresentadas transmitem uma idéia errônea aos expectadores sobre
os vikings, por outro a popularização nunca foi tão abrangente, e apesar de boa
parte da comunidade acadêmica criticar de maneira incisiva a série, ela está
abrindo espaço para que mais pessoas se interessem pelo tema, dando a
oportunidade para futuros estudos sérios e elucidativos para o público.
Referências:
_____. Odin. In: LANGER, Johnni (org.) Dicionário de Mitologia Nórdica: símbolos,
mitos e ritos. São Paulo: Hedra, 2015.
tratamento ou de tingimento.
O surcôte, ou avental, que podia ser colorido, era confeccionado em lã ou
linho e preso por broches de metal trabalhado em filigranas dos quais pendia
um colar de contas de vidro, metal, ossos, conchas, pedras preciosas e âmbar.
Essa vestimenta típica feminina era utilizada por todas as mulheres de todas as
idades: o colar e os broches, quanto mais trabalhados fossem, quanto mais raros
fossem as contas utilizadas na sua confecção, demonstravam que a sua
proprietária era rica, e os tecidos utilizados também eram um distintivo que,
além de refletir a riqueza da mulher que o usava, proporcionava conforto e
calor suficiente para enfrentar o inverno — diferentemente dos vestidos mais
rústicos utilizados pelas mulheres mais pobres, que muitas vezes forneciam
pouca proteção e calor. Um vestido de tecido fino e que cobrisse o corpo
convenientemente para protegê-lo do frio era inviável, mesmo que esse fosse
um grande distintivo social.
A indumentária de Siggy chama a atenção não somente pela
extravagância dos tecidos e dos acessórios, mas principalmente por estar em
discordância do restante do vestuário feminino, colocando dessa forma a sua
personagem em evidência. A licença poética dos figurinistas no contexto da
série — e apenas nele — é perfeitamente aceitável pois trata-se de uma ficção, e
também é preciso levar em conta que uma das intenções da série nesse
momento é reforçar a importância política e social da personagem, além de
conferir a esta um exotismo que a torna diferente das outras mulheres, o que
condiz perfeitamente com o seu status. Ao jarl e à sua família tudo é permitido!
Abaixo analisamos duas imagens da personagem Siggy portando o
vestido que descrevemos acima. Podemos observar que na primeira imagem a
personagem também utiliza uma espécie de adorno na cabeça, fazendo lembrar
uma coroa que circunda toda a cabeça e, no alto da testa, sobe ao alto,
prendendo os cabelos e deixando que as madeixas caiam soltas pelos ombros,
conferindo à personagem um adorno exótico a mais e contrariando os adornos
capilares costumeiramente utilizados pelas mulheres casadas — que é o caso
específico de Siggy —, que eram tranças variadas e muito elaboradas, muitas
vezes combinadas com nós e pequenas tiras de couro ou tecido. O uso do véu,
ou mesmo lenço, que observamos em reconstituições contemporâneas podem
ser uma variação regional, o que necessariamente não explica se a mulher que o
usa é solteira ou casada, e, apesar de serem citadas nas sagas islandesas, até o
presente momento não foram detectadas pela Arqueologia. Uma outra
explicação para o uso desse adorno seria uma possível influência cristã já no
final do período viking.
roupas ficassem secas e protegê-los do frio. Mas aqui o xale ganha uma outra
conotação com a personagem: de velar/revelar o corpo como uma peça a mais
no jogo de sedução que a esposa do jarl parece querer jogar com os homens e
até com o próprio esposo que está presente no salão.
Na outra imagem que analisamos, que se encontra abaixo, é possível
observar como o contraste entre a indumentária feminina usada por Siggy que
remete à sensualidade e leveza e de forma alguma combina com os rigores do
inverno nórdico com a do jarl que está ao seu lado. Já o esposo de Siggy, o jarl
Haraldson, está totalmente coberto e agasalhado mesmo dentro dos salões onde
o ar é aquecido pelas lareiras e fogões e também pela presença das pessoas
troando o ambiente quente e abafado. O jarl tem sobre os ombros uma pele
negra que parece ser de ovelha, que lhe serve como manto e está preso com dois
grandes e bem trabalhados broches de metal, que reforçam o seu poder e
riqueza. Ele veste uma túnica grossa e bordada que além de aquecê-lo também
pode ser vista como um traje de luxo que alia conforto, beleza e riqueza.
Observamos também que o jarl está sentado em uma grande cadeira, e no
encosto há uma pele de animal que oferece conforto e calor. Ao contrastarmos
as duas personagens, podemos observar que há uma discrepância entre a
indumentária masculina e feminina do casal mais poderoso e rico desse
momento da série: Siggy usa um vestido leve com adornos metalizados que não
eram utilizados na Era Viking — muito menos uma esposa e mãe apareceria em
público com os longos cabelos soltos sem aos menos estarem trançados com as
tradicionais tranças utilizadas pelas mulheres mais poderosas daquela
sociedade, e que já foi tema de pesquisa de nossa parte. O vestido
confeccionado com um tecido leve e preso por colares de metal que lembram
correntes finas deixando à mostra os braços não é adequado para o clima frio e,
Referências:
Os vikings da série
Arqueologia
Literatura
mais abaixo. Esse paralelo, contudo, é terreno fértil para estudos outros que não
concernem nosso ensaio no presente momento.
Strickland (2005, p. 56) ainda nos traz exemplos de arqueiros em diversas
outras sagas nórdicas, como a saga de Njall, cujo autor desconhece-se, em que o
personagem Gunall precisa defender sua moradia de atacantes e o faz
utilizando uma lança e então um arco. Ademais, temos também mencionada a
saga do rei Olaf Trygvasson, escrita pelo islandês Snorri Sturluson e parte da
problemática Heimskringla. Nela, a última batalha travada pelo rei Olaf possui
grande destaque para o uso do arco em combate naval. Nesta batalha, as forças
de Olaf enfrentam guerreiros suecos e daneses, ambos os lados atirando flechas
de seus navios.
Ressaltamos, no entanto, que ambas as sagas, embora registrem
acontecimentos relativos aos séculos X e XI, estas foram escritas tardiamente no
século XIII. Poderíamos ainda questionar a confiabilidade dos escritos de
Snorri, porém, para o fim de demonstrar a presença e o lugar da arquearia entre
os povos escandinavos, os relatos acima nos servem. Todavia, para Strickland
(ibidem), “o uso do arco nessa e em outras batalhas navais é confirmado pela
poesia mais antiga do décimo e décimo primeiro século, conhecidas como verso
skáldico, contido como moscas em âmbar dentro dessas sagas posteriores”.
Entre os exemplos dos poemas em períodos anteriores, conforme
mencionado acima, está um excerto de seu Sexstefja, do skald islandês Þjóðólfr
Arnórsson, tendo este vivido no século XI nas cortes dos reis Magno I e Haroldo
III (Harald Hardrada):
O valente rei de Uppland retesou seu arco por toda a
noite; o senhor fez com que flechas chovessem contra os
escudos brancos. As pontas encharcadas de sangue
causavam ferimentos sobre os homens com cotas de
Considerações finais
Referências:
CLARK, J.G.D. Neolithic bows from Somerset, England and the prehistory of
archery in north-western Europe. In: Proceedings of the Prehistoric Society.
Cambridge, v. 29, 1963.
POOLE, R. G. Viking poems on war and peace: A study in skaldic narrative. Toronto:
University of Toronto Press, 1991.
STRICKLAND, M.; HARDY, R. The great warbow: from Hastings to the Mary Rose.
Gloucestershire: Sutton Publishing, 2005.
ARTIGOS
XII que a ampla participação das reflexões de Agostinho de Hipona será muito
importante, pois passa a defender que era impossível qualquer comunicação
entre os vivos e os mortos, defendendo a ideia de um banimento de qualquer
culto material dos mortos. (SCHMITT, 1999, p. 11-37).
Segundo Santo Agostinho, como dissemos, o corpo morto
não merece nenhum “cuidado” (cura), a não ser por
razões de conveniências sociais. Em compensação, a alma,
o princípio divino que está no homem (animus, spiritus)
não morre: apenas “separada” do corpo, a alma, a menos
que seja imediatamente salva ou condenada, sofre provas
“purgatórias” (ou mesmo, a partir do século XII, ganha o
purgatório depois de um julgamento particular) na espera
da salvação definitiva. (SCHMITT, 1999, p. 25)
Menglöð.
entoa nove estrofes, dedicadas a levar benefícios para seu filho e malefícios para
tudo ou qualquer coisa que pudesse feri-lo ou atrapalhá-lo na jornada. Ao
utilizar nove canções entoadas por Groa é possível perceber a referência ao
número Odínico (LANGER, 2009, p. 78). Além disso, ao entoar proteção ao
filho, Groa realça mais uma vez a particularidade da Galdr, ou seja, a de
proporcionar benefícios. Em várias das estrofes, Groa menciona elementos da
natureza, como montanhas, rios, ventos, mais uma vez mostrando o domínio
sobre o clima, característica proveniente da Galdr, e também das próprias sagas
islandesas (LANGER, 2009, p. 74).
A título de curiosidade, na segunda parte do poema, intitulada
Fjölsvinnsmál, após a longa jornada, o jovem chega em um castelo no topo de
uma montanha, guardado por um gigante chamado Fjölsviðr. No poema, se
passa um longo jogo de perguntas e respostas entre Svipdag e Fjölsviðr, em que
o ponto crucial da trama é o fato de Fjölsviðr insistir para que Svipdag revele
seu nome, porém o faz somente no final do poema. Ao revelar seu nome, as
portas são abertas e lá se encontra com Menglöð.
Através desta sondagem inicial, podemos concluir que a necromancia,
como uma atividade que envolvia os mortos, fazia parte da sociedade
escandinava, na qual as práticas mágicas estavam presentes no cotidiano,
principalmente em seu conjunto de crenças. É interessante notar que o termo
“necromancia” o qual entendemos hoje, assim como na Idade Média
Cristianizada, compreendia a prática da “nigromancia” como uma modalidade
demonizada, nos faz refletir como a Escandinávia, assim como outras
sociedades, viam essa prática e como a compreendiam. Mesmo que o conceito
tenha origem na Antiguidade, não podemos caracterizar a prática específica
como modelo realizado em outras sociedades. O que procuro demonstrar é que
Referências:
Eirik took coldly to the proposal to forsake his religion, but his
wife, Thjodhild, promptly yielded, and caused a church to be
built not very near the houses. The building was called
Thjodhild’s Church; in that spot she offered her prayers, and so
did those men who received Christ, and they were many. After
she accepted the faith, Thjodhild would have no intercourse with
Eirik, and this was a great trial to his temper. (ANÔNIMO, 20__,
p. 6)
As ações dos personagens nessa saga não raramente são vistas de forma
subjetiva, sob a lente da religião cristã, a qual condena fortemente toda prática
contrária aos dogmas cristãos. Além disso, um propósito até certo ponto
cruzadístico, como vimos, também permeia a obra, pois se salienta sempre a
importância de levar o Cristianismo aos povos que ainda não conheciam essa
“Verdade” pela força do diálogo e do convencimento por meio dele ou da
espada. Em algumas passagens, é evidente também a presença de
acontecimentos que pertencem à ordem do sobrenatural.
No interior da narrativa, vê-se o Deus dos cristãos operando seus
prodígios milagrosos ou miraculas, revelando-se, então, muito mais poderoso e
benéfico que os deuses nórdicos e do que qualquer rito de evocação aos
mesmos. Nesse sentido, o Deus cristão revela-se como soberano. Há, em
diversos momentos, uma mensagem implícita de que só Ele, ao contrário das
demais divindades, possui pleno poder para auxiliar os guerreiros em suas
empreitadas.
A sorte e a bem-aventurança parecem estar, com bastante frequência, do
lado daquelas pessoas que decidem se converter aos ensinamentos da Igreja
cristã. Todas as vezes que uma prática "pagã" choca-se com as cristãs, não
Referências:
PEREIRA, Valéria Sabrina. Die küneginne rîch: o mundo feminino em A Canção dos
Nibelungos e A Saga dos Völsung. Disponível em:
<http://www.dominiopublico.gov.br/download/cp030738.pdf>. Acesso em: 5
de janeiro de 2016.
Introdução
Conclusão
Referências:
FEBVRE, Lucien. A Europa: Gênese de uma Civilização. Bauru, SP: EDUSC, 2004.
VERGUEIRO, Waldomiro. Uso das HQs no ensino. In: Como usar as histórias em
quadrinhos na sala de aula, v. 4, 2005, p. 7-30.
Introdução
um grau ainda mais elevado, cabe ao poeta nomear o sagrado, ou seja, é o poeta
quem, em última instância, estabelece os valores essenciais para uma sociedade,
é ele quem coloca algo ou algum posicionamento como digno de respeito ou,
inversamente, busca retirar aquele valor como correspondente a uma boa
conduta dentro do aspecto comunal.
O poeta, nessa perspectiva, trilha o caminho de um “crítico de gosto”
contemporâneo. Por meio do seu julgamento do que é valorativamente
relevante, o poeta, retoricamente, estabelece os padrões de conduta e de
convivência na sociedade. Ele não define, estruturalmente, por meio de
definições sobre o “ser”, o que é ontologicamente adequado ou verdadeiro. De
uma maneira artística, o poeta nomeia quais os valores que são devidos e como
eles devem ser ritualisticamente entranhados na sociedade.
Heidegger (2008, p. 12), na primeira fase de seu pensamento, assumia
uma perspectiva anti-metafísica (rejeição de conceitos e de sistemas filosóficos);
na segunda fase assumia uma postura anti-filosófica (rejeitava a possibilidade
de uma totalidade e de uma essência); na terceira fase, utilizada
metodologicamente na presente abordagem, Heidegger acaba por assumir uma
perspectiva pós-filosófica. Por pós-filosofia não deve se entender que ele rejeita
todo o conteúdo filosoficamente apreensível pelo homem. Aliás, pelo contrário,
ao se falar em pós-filosofia deve-se sempre ter em relevo que ela se orienta pelo
norte filosófico de toda a história ocidental. A pós-filosofia só pode ser
compreendida na mesma medida em que se compreende a filosofia como uma
forma de explicar o mundo desde a antiguidade.
A perspectiva pós-filosófica tem como definição principal que a
filosofia não é mais o centro das atenções do pensamento humano. Ela não é a
pedra de toque de todas as definições relevantes, tampouco é a única capaz de
Considerações finais
Referências:
GARDELL, Mattias. Gods of the Blood: The Pagan Revival and White Separatism.
Durham: Duke University Press, 2003.
WAGNER, Jeff. Mean Deviation: Four Decades of Progressive Heavy Metal. New
York: Bazillion Points, 2010.
PATTERSON, Dayal. Black Metal: Evolution of the Cult. Port Townsend: Feral
House, 2013.
WESTON, Donna; BENNETT, Andy. Pop Pagans: Paganism and Popular Music.
Durham: Acumen, 2013.
Blog:
http://neve2012.blogspot.com.br/
Facebook:
http://www.facebook.com/#!/groups/gruponeve/
Academia.Edu:
http://ufma.academia.edu/NEVEN%C3%9ACLEODEESTUDOSVIKINGSEES
CANDINAVOS
Notícias Asgardianas:
http://neveufpb.wix.com/noticiasasgardianas
V.: III.
Semestral
ISSN: 1679-9313
CDU 931(05)
Expediente