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SINOPSE:

Jenny começa a receber telefonemas aterrorizantes e logo fica claro que


Julian está solto no mundo real. Cada vez mais, Jenny cai sob seu fei ço,
permi ndo-se a liberdade de fazer o que quiser, independentemente das
consequências.

Parece que Jenny escolheu Julian em vez de Tom. Mas então seus amigos
começam a desaparecer, sugados para as Terras das Sombras e com
bonecos de papel deixadas em seus lugares. Agora Jenny poderá superar
Julian sem ceder inteiramente a suas exigências?

"Ele está de volta e veio reivindicá-la de uma vez por todas."


Para Joanne Finucan, uma verdadeira heroína
e inspiração ao longo da vida.
CAPÍTULO 01

Não era tanto a caça. Era o assassinato.


Era isso que levava Gordie Wilson ao sopé de Santa Ana em uma manhã
ensolarada de maio como esta. Era por isso que ele estava matando aula,
embora não vesse certeza de que conseguiria forjar a assinatura de seus
responsáveis em outra suspensão. Não eram as colinas salpicadas de flores
silvestres, os tremoços azul-celeste ou o sábio roxo perfumado. Era o som
molhado e estridente quando o chumbo encontrava a carne.
A morte.
Gordie preferia animais grandes, mas os coelhos sempre estavam
disponíveis - se você soubesse desviar dos guardas florestais. Ele nunca
nha sido pego.
Ele sempre gostou de matar. Quando nha sete anos, ele matara
passarinhos com uma pistola de ar comprimido. Quando nha nove,
haviam sido esquilos com uma espingarda. Aos doze, seu pai o levou em
uma verdadeira viagem de caça, perseguindo veados de cauda branca com
um velho rifle Winchester calibre 243.
Isso nha sido tão especial. Mas toda matança era especial. Era como o pai
dissera: "Boas caçadas nunca terminam". Todas as noites na cama, Gordie
pensava nas melhores, lembrando-se da perseguição, do roteio, do
momento elétrico da morte. Ele caçava até em seus sonhos.
Por um instante, enquanto caminhava pelo leito seco do riacho, uma
lembrança cin lou, como uma pequena língua de fogo. Um pesadelo.
Apenas uma vez, Gordie sonhou que estava do outro lado da mira do rifle,
com cachorros pulando atrás dele, que estava sendo caçado. Uma
perseguição que só terminou quando ele acordou pingando suor.
Sonho estúpido. Ele não era um coelho, era um caçador. O topo da cadeia
alimentar. Ele até conseguira um alce no ano passado.
Vale a pena observar um alvo grande como esse, estudar e planejar. Mas
coelhos não. Gordie só gostava de vir ali e expulsá-los dos arbustos.
Este era um bom lugar. Uma encosta coberta de sálvia subindo em direção
a um bosque de carvalhos e sicômoros, com algumas boas pilhas de
arbustos por baixo. Vinculado a ser um coelho sob um desses.
Então ele viu. Bem ao ar livre. Um coelhinho do deserto tomando sol sob a
grama. Estava ciente de Gordie, mas ainda assim permaneceu ali.
Congelado de medo. Ó mo, pensou Gordie. Ele sabia como se aproximar
de um coelho, chegar tão perto que podia pegá-lo pra camente com as
mãos.
O truque era fazer o coelho pensar que você não o vira. Se você apenas
olhasse para o lado, andasse em zigue-zague enquanto se aproximava cada
vez mais...
Contanto que suas orelhas fiquem abaixadas, em vez de giradas, você
estará seguro.
Gordie se aproximou cuidadosamente de um arbusto de bagas, olhando
pelo canto do olho. Estava tão perto agora que podia ver os bigodes do
coelho. A pura felicidade o encheu, o calor acumulando em seu estômago.
Ficaria quieto para ele.
Deus, essa era a parte emocionante, a parte boa. Respirando, ele ergueu o
rifle, centrou a mira. Preparou-se para apertar suavemente o ga lho.
Houve uma explosão de movimento, um borrão marrom-acinzentado e o
lampejo de uma cauda branca. O coelho estava fugindo!
O rifle de Gordie la u, mas a bala a ngiu o chão logo atrás do coelho,
levantando poeira. O coelho saltou para o leito seco do riacho, perdendo-
se entre as taboas.
Porra! Ele desejou ter trazido um cachorro. Como o beagle do pai, Aggie.
Os cães eram loucos pela perseguição. Gordie adorava vê-los fazê-lo,
adorava rá-lo, esperando o cachorro trazer o coelho em círculos. Era uma
pena terminar uma boa perseguição cedo demais. Às vezes, seu pai soltava
um coelho se ele corresse uma distância suficientemente boa, mas isso era
loucura. De que adiantava uma caçada sem matar?, Gordie sempre se
perguntava.
Ele sen a vagamente que sua caça era de alguma forma diferente da do
pai. Fizera coisas quando estava sozinho, sobre as quais nunca contou a
ninguém. Quando nha cinco anos, costumava derramar álcool em insetos,
como tesourinhas. Eles se contorciam muito tempo antes de morrerem.
Mesmo agora, ele se atrevia a atropelar um gambá ou um gato na estrada,
se pudesse.
Matar era tão bom. Qualquer po de matança.
Esse era o pequeno segredo de Gordie Wilson.
O coelho se foi. Ele o assustou. Ou...
Talvez outra coisa vesse.
Uma sensação estranha estava crescendo em Gordie. Ela se desenvolveu
tão lentamente que ele nem percebeu quando começou, e não era como
nada que ele já sen ra antes - pelo menos acordado. Um... sen mento de
coelho, de ser a caça. Como quando um coelho congela de medo,
agachado, com os olhos do caçador nele. Como quando um esquilo pode
sen r quando vê algo grande se aproximando lentamente.
Um sen mento... assim.
A pele na parte de trás do pescoço de Gordie começou a se arrepiar.
Havia olhos olhando para ele. Ele sen u isso com a parte do cérebro que
não havia mudado em cem milhões de anos. A parte dos répteis.
Cautelosamente, a carne ainda tremendo, ele se virou.
Diretamente atrás dele, três galhos velhos de sicômoros cresceram
próximos o suficiente para formar uma sombra. Mas a escuridão atrás
deles estava escura demais para ser apenas uma sombra. Era mais como
um vapor preto pendurado ali.
Algo estava debaixo daquelas árvores. Outra coisa estava observando o
coelho.
Agora estava observando ele.
O vapor preto pareceu se agitar. E dentes brancos brilhavam na escuridão,
tão brilhantes quanto a luz do sol na água.
Os olhos de Gordie se arregalaram nas órbitas.
O que era aquilo?
O vapor voltou a se mover e ele viu.
Só que não poderia ser. Não podia ser o que ele pensava ter visto, porque
simplesmente não podia ser. Porque não havia nada assim no mundo,
então simplesmente não podia ser. Estava além de qualquer coisa que ele
alguma vez vesse imaginado. E quando se moveu, se moveu rápido.
Gordie disparou um ro em sua direção, então se virou e correu.
Ele seguiu o caminho do coelho, escorregando e deslizando ladeira abaixo,
rasgando o jeans e as mãos no cacto de pera espinhosa. A coisa que ele viu
estava logo atrás dele. Gordie podia ouvir a respiração. Seu pé bateu em
uma pedra e ele caiu pesadamente, os braços agitando.
Ele rolou e viu sob a luz do sol. A boca dele se abriu. Ele tentou fugir de
costas, mas o terror paralisou seus músculos, deixando-o quase como
congelado.
Um lamento solto e gordo veio dos lábios de Gordie. Seu úl mo
pensamento selvagem foi Não sou, não sou, não sou um coelho, não sou...
Seu coração parou antes mesmo da coisa colocar os dentes nele.

Jenny estava escovando o cabelo, escovando-o de verdade, sen ndo-o
estalar e se erguer sozinho para encontrar as cerdas plás cas na
eletricidade está ca dessa tarde dourada de maio. Ela olhou
distraidamente para seu próprio reflexo, vendo uma garota com olhos
verdes-floresta, escuros como agulhas de pinheiro e sobrancelhas retas,
como duas pinceladas decisivas. Os cabelos que se erguiam para encontrar
a escova eram da cor do mel à luz do sol.
— Eles não fizeram isso.
Jenny parou abruptamente. Uma garota foi refle da atrás dela no espelho.
A menina nha cabelos escuros e olhos escuros, avermelhados de tanto
chorar. Ela parecia pronta para fugir do banheiro.
— Desculpe?
— Eu disse que eles não fizeram isso. Slug e PC. Eles não mataram sua
amiga Summer.
Oh. Jenny se pegou segurando a escova com força, incapaz de virar a
cabeça. Ela só podia olhar para os olhos da garota refle dos no espelho,
mas agora ela entendia.
— Eu nunca disse que eles fizeram isso. — ela disse suavemente e com
cuidado. — Apenas disse à polícia que eles estavam lá naquela noite. E que
roubaram algo da minha sala de estar. Uma casa de papel. Um jogo.
— Eu te odeio.
Chocada, Jenny se virou.
— Você e seus amigos que se acham perfeitos. Vocês fizeram isso; vocês a
mataram. E um dia todo mundo saberá e vocês pagarão por isso. — A
garota estava torcendo um lenço de papel entre os finos dedos
bronzeados, rasgando-o em pedacinhos. Os cabelos compridos eram
absolutamente lisos, exceto pela leve ondulação das pontas, e os olhos
escuros estavam pensa vos. Ela não era aluna da Vista Grande High; Jenny
nunca a nha visto antes.
Jenny largou a escova e foi até ela, encarando-a diretamente. A garota
pareceu surpresa.
— Por que você estava chorando? — Jenny perguntou gen lmente.
— Por que você se importa? Você é uma patricinha. Veste suas roupas
extravagantes para a escola e sai com seus amigos ricos...
— Ricos? E o que minhas roupas têm a ver com isso? — Jenny podia sen r
suas sobrancelhas se unirem. Ela olhou para o jeans de marca esfarrapado
da garota.
A garota falou de mau humor.
— Você é uma vadia...
Jenny a agarrou.
— Eu não sou uma vadia — disse ela ferozmente. — Eu sou um ser
humano. E você também. Qual é o seu problema?
A menina não disse nada. Ela torceu sob as mãos de Jenny, e Jenny sen u
os pequenos ossos em seus ombros. Finalmente, quase cuspindo no rosto
de Jenny, ela disse:
— PC era meu amigo. Ele nunca fez nada com aquela garota. Você e seus
amigos fizeram, algo tão ruim que você teve que esconder o corpo dela e
contar essas men ras. Mas você não perde por esperar. Eu posso provar
que o PC não a machucou. Posso provar.
Apesar do dia quente, os pêlos nos braços de Jenny arrepiaram-se. Seus
dedos formigaram.
— O que você quer dizer com isso?
Algo em seu rosto deve ter assustado a garota.
— Deixa pra lá.
— Não, agora você vai me dizer. Como você pôde provar isso? Você...
— Me solta!
Estou sendo rude, Jenny percebeu. Eu nunca sou rude. Mas ela não
conseguia parar. Calafrios a varriam, e ela queria rar as informações da
garota.
— Você o viu ou algo assim? — ela exigiu. — Ele chegou em casa sozinho
na manhã seguinte? Você viu se ele nha uma casa de pap...
A dor explodiu contra sua bia. A garota a chutara. Jenny perdeu o
controle e a garota se afastou, correndo para a porta do banheiro.
— Espere! Você não entende...
A garota abriu a porta e saiu correndo. Jenny pulou atrás dela, mas quando
olhou para cima e para baixo na passarela do segundo andar, a garota nha
sumido. Havia apenas alguns pedaços de Kleenex torcidos no piso de
concreto.
Jenny mancou até o armário mais próximo e olhou ao redor. Nada além de
estudantes e armários. Então ela mancou para trás e olhou por cima do
parapeito da passarela aberta para o pá o principal. Nada além de
estudantes com seus almoços.
Jovem. A menina era jovem, provavelmente da nona série. Talvez ela
vesse vindo do Magnolia Junior High. Era uma curta distância.
Quem quer que fosse, Jenny nha que encontrá-la. Quem quer que fosse,
ela nha visto alguma coisa. Ela pode saber...
Deixei minha bolsa no banheiro, Jenny percebeu e lentamente retornou.
O telefone público ao lado do banheiro estava tocando. Jenny olhou em
volta - dois professores estavam trancando uma sala de aula, os alunos
estavam descendo as escadas em cada extremidade do edi cio. Ninguém
parecia estar esperando uma ligação, ninguém parecia notar o toque.
Jenny levou o fone ao ouvido.
— Alô — disse, sen ndo-se tola.
Ela ouviu um silvo eletrônico, um ruído branco. Então houve um clique e na
está ca, Jenny pareceu ouvir um sussurro baixo de uma voz masculina. Era
distorcido, prolongado, e havia algo estranho na maneira como as sílabas
eram expressadas. Parecia uma palavra sussurrada repe damente.
Algo como minto.
Então, um suspiro arrastado e sibilante: nto. Um... nto...
Não nha sen do.
— Alô?
ntontontontonto. Um clique. No fundo, ela ouviu algo que poderia ter sido
discurso, um agudo, estacado. Novamente, o ritmo era estranho. Parecia
uma língua muito estrangeira.
Má conexão, Jenny pensou e desligou.
Seus dedos estavam formigando novamente. Mas ela não teve tempo para
pensar nisso agora. Aquela garota nha que ser encontrada.
É melhor eu chamar os outros, pensou Jenny.
CAPÍTULO 02

Jenny examinou a turma de direito comercial de Tom primeiro, mas ele não
estava lá. Ela desceu as escadas. Então começou a abrir caminho pelo
campus, andando em torno de colegas estudantes que estavam vigiando
seus bancos favoritos. Ela podia ouvir sacos de papel farfalhando e sen r o
cheiro do almoço de outras pessoas.
O grupo de Jenny não estava comendo juntos nas úl mas duas semanas -
isso causava muito burburinho. Mas hoje eles não teriam escolha.
Agora preciso achar Audrey, Jenny pensou. Ela passou pelo anfiteatro com
seus bancos de madeira cheios de bolhas e olhou para um dos quartos da
casa. Audrey estava no interior, decorando algo.
Jenny ficou parada na porta até Audrey, que estava com a professora,
levantar o olhar e vê-la. Ela fechou a pasta, largou-a na mochila e veio até
Jenny.
— O que é isso?
— Temos que juntar todos. — disse Jenny. — Você vai almoçar?
— Sim. — Audrey não perguntou por que eles nham que pegar todo
mundo. Ela apenas sacudiu a franja espetada de cobre dos olhos com um
movimento experiente da cabeça e apertou os lábios com brilho de cereja.
Elas atravessaram o centro do campus em direção ao ginásio feminino. O
sol brilhava na cabeça de Jenny, enviando um pouco de umidade pela parte
de trás do pescoço. Estava muito quente para maio, mesmo na Califórnia.
Então, por que ela sen u tanto frio por dentro?
Audrey e ela espiaram o ves ário. Dee ainda nem estava ves da, pegando
uma toalha e rindo com algumas garotas da equipe de natação. Ela estava
nua e completamente inconsciente, bonita e flexível como uma pantera
negra. Quando viu Jenny e Audrey olhando-a significa vamente, ela
ergueu uma sobrancelha para elas e depois assen u. Ela pegou uma
camiseta cor de granada e juntou-se a elas um minuto depois.
Elas encontraram Zach no bloco de arte, sozinho do lado de fora do
laboratório de fotografia. Isso não foi surpreendente - Zach geralmente
estava sozinho. O que surpreendeu Jenny foi que ele não estava dentro do
laboratório, trabalhando. O rosto magro e intenso de Zach sempre fora
pálido, mas ul mamente parecia quase giz, e nas úl mas semanas ele
passara a usar camisas de algodão preto. Ele mudou, Jenny pensou. Bem,
não é de se admirar. O que eles passaram teria mudado qualquer um.
Ele viu Jenny, que inclinou a cabeça na direção geral do estacionamento
dos funcionários. O lugar de sempre. Ele deu um breve puxão de cabeça
que significava concordância. Ele as encontraria lá.
Elas encontraram Michael perto do quarteirão inglês, pegando papéis e
livros espalhados no chão de concreto.
— Idiotas, porcos, incompetentes, neandertais. — Ele murmurava.
— Quem fez isso? — Jenny perguntou quando Audrey procurou por
hematomas em Michael.
— Carl Vertman e Steve Matsushima. — O rosto redondo de Michael
estava vermelho e seus cabelos escuros ainda mais desgrenhados do que o
normal. — Ajudaria se você beijasse aqui. — disse ele a Audrey, apontando
para o canto da boca.
Dee deu um soco em punho fechado na própria mão.
— Eu vou cuidar deles — disse, exibindo o seu sorriso mais primi vo.
— Vamos, precisamos conversar. — disse Jenny. — Alguém viu o Tom?
— Acho que ele matou aula hoje — disse Audrey. — Ele não estava na aula
de história, nem de inglês.
Maravilha, Jenny pensou enquanto Michael almoçava. Zachary usava um
preto mórbido, Michael estava sendo espancado e Tom, o super-aluno,
estava matando aula - exatamente quando ela mais precisava dele.
Sentaram-se no estacionamento, no que era comumente conhecido na
Vista Grande High como a colina gramada. Zach chegou e largou primeiro
seu saco de almoço, depois se jogou no chão, dobrando as pernas longas e
finas em um movimento fácil.
— O que está acontecendo? — Dee ques onou e Jenny respirou fundo.
— Tem essa garota — ela disse e fez o possível para descrever a Garota
Chorona. — Provavelmente é aluna da nona série. Algum de vocês a
conhece?
Todos balançaram a cabeça nega vamente.
— Porque ela disse que matamos Summer e escondemos seu corpo, e que
sabia que o PC não nha feito isso. Parecia alguém que realmente sabia, e
não apenas porque ela acredita nele ou algo assim.
Os olhos negros de Dee se estreitaram.
— Você acha...
— Eu acho que talvez ela o tenha visto naquela manhã. E isso significa...
— Que ela sabe aonde está a casa de papel. — disse Michael, parecendo
mais alarmado do que animado.
— Se ela souber, temos que encontrá-la. — disse Jenny e Michael gemeu.
Ela não o culpou. Tudo sobre a situação deles era horrível. A maneira como
as pessoas olhavam para eles agora, as perguntas nos olhos delas.
E o perigo. O perigo que ninguém, exceto o grupo, conhecia.
Muito disso foi culpa de Jenny. Tinha sido sua própria ideia brilhante.
Vamos dizer à polícia a verdade...
Havia duas policiais. Uma delas era havaiana ou polinésia e era bonita
como uma modelo. A outra era como uma pessoa materna
sobrecarregada. Ambas examinaram a pilha de fragmentos ao redor da
porta de vidro deslizante.
— Mas isso não tem nada a ver com Summer. — Jenny dissera, e então ela,
Tom, Michael e Audrey explicaram tudo novamente.
Não, não nha sido um OVNI. Bem, parecia que Juliano era um alienígena,
tudo bem, mas ele não nha quebrado a porta. Ele havia saído de um jogo
- ou pelo menos os sugou para um jogo. Ou pelo menos... Tudo bem. Desde
o começo novamente.
Jenny havia comprado o jogo na Avenida Montevidéu, em uma loja
chamada More Games. Tudo bem? Ela o comprou e o trouxe para casa e
eles o abriram. Sim, todos eles estavam aqui, os seis, e Summer. Foi uma
festa para o aniversário de dezessete anos de Tom.
Dentro havia um modelo de casa de papelão e eles haviam montado-o,
uma casa vitoriana, três andares e uma torre. Azul.
Em seguida, eles colocavam esses bonecos de papel dentro da cor que
pareciam com eles mesmas. Sim, certo, eles eram um pouco velhos para
brincarem com bonecos de papel. Mas não era apenas uma casa de
bonecos. Era um jogo.
O jogo era desenhar o seu pior pesadelo e colocá-lo em um cômodo da
casa e, a par r de baixo, seguir seu caminho até o topo. Passando pelo
pesadelo de cada pessoa até chegar lá.
Parecia um bom jogo. Só que se tornou real.
Sim, real. Real. Quantas maneiras diferentes de dizer "real"? Real!
Todos desmaiaram e, quando acordaram, estavam na casa. Dentro dela.
Não era mais papelão. Era sólido, como uma casa comum. Então Julian
apareceu.
Quem era Julian? O que era Julian, essa devia ser a pergunta. Se você
pensasse nele como um príncipe demônio, não estaria muito longe. Ele se
chamava de Homem das Sombras.
O Homem das Sombras. E como o Sandman, ele traz pesadelos.
A questão era que Julian havia matado Summer. Ele a fez encarar seu pior
pesadelo, que era um quarto bagunçado, com pilhas de lixo e baratas
gigantes. Sim, parecia engraçado, mas não era...
Não, nenhum deles nha lido Ka a.
Não era engraçado porque matara Summer. Ela foi enterrada em um
depósito de lixo horrível, debaixo de pilhas de sujeira e coisas podres. Eles a
ouviram gritando e gritando, e então finalmente os gritos pararam.
O corpo? Pelo amor de Deus, onde mais estaria o corpo? Estava lá,
enterrado no lixo, na casa de papel, no Mundo das Sombras.
Não! A porta de vidro deslizante não nha nada a ver com isso. Isso
aconteceu depois que eles escaparam do Mundo das Sombras. Jenny
enganou Julian e o trancou atrás de uma porta com uma runa de restrição
nela. Quando eles voltaram ao mundo real, Jenny colocou a casa de papel
de volta na caixa de jogos e depois chamaram a polícia. Sim, foi a ligação
feita às 6:34 desta manhã. Enquanto estavam no telefone, eles ouviram o
vidro quebrando e saíram para ver dois caras pegando a caixa por cima da
cerca dos fundos.
Por que alguém iria querer roubar a caixa? Bem, esses caras estavam
seguindo Jenny quando ela comprou o jogo. E ver o jogo fez algo com você.
Depois de ver a caixa branca brilhante, você a quer, não importa o quê. Os
caras provavelmente haviam seguido Jenny até sua casa para roubar a
caixa.
NÃO, SUMMER NÃO SE FOI COMO A CAIXA! SUMMER NÃO ESTAVA LÁ!
SUMMER JÁ ESTAVA MORTA ANTES DE ELES VOLTARAM!
Foi só depois de contar que Jenny viu como a história parecia louca. No
começo, a polícia não acreditava que Summer realmente estava
desaparecidA, não importa quantas vezes Tom exigisse um teste de
detector de men ras.
A polícia finalmente começou a acreditar quando ligou para os pais de
Summer e descobriu que ninguém a nha visto desde a noite passada. A
essa altura, Jenny e os outros estavam sentados no departamento de
dete ves em torno de uma mesa grande com mesas de dete ves ao redor.
Jenny já havia iden ficado fotos dos dois caras que haviam roubado o jogo.
PC Serrani e Sco Martell, mais conhecido como Slug, um nome que ele
mesmo havia escolhido. Ambos nham registros de furtos em lojas e dirigir
em alta velocidade com carros roubados. PC era o que usava a bandana e a
jaqueta de couro preto, e Slug uma camisa xadrez com aspecto velho.
E aconteceu que eles também estavam desaparecidos.
A pior parte foi quando os pais de Summer desceram à delegacia para
perguntar a Jenny onde a filha realmente estava. Eles não entenderam por
que Jenny, que conhecia Summer desde a quarta série, não contava a
verdade. Finalmente, as crianças fizeram um teste com detector de
men ras porque o pai de Summer insis u que a história soava exatamente
como as coisas que ele nha visto nos anos sessenta. Como uma viagem
muito, muito louca.
A senhora Parker-Pearson con nuou dizendo:
— O que Summer fez não importa. Apenas nos diga onde ela está.
Foi horrível.
Aba foi quem finalmente parou àquilo.
Bem no momento em que o barulho ficou maior e mais barulhento, ela
apareceu. Usava uma roupa laranja brilhante que mais parecia uma túnica
do que um ves do, e uma touca laranja como um turbante. Ela era a avó
de Dee, mas parecia visitar a realeza. Ela pediu à polícia que a deixasse
sozinha com as crianças.
Então Jenny, tremendo por todo o lado, contou a história novamente. Do
começo.
Quando acabou, ela olhou para cada um deles. Para Tom, o atleta
campeão, sentado com seus cabelos escuros normalmente arrumados e
desgrenhados. Audrey, a sempre chique, com o rímel estragado pelos
soluços. Zach, o fotógrafo inabalável, cujos olhos cinzentos estavam
vidrados de choque. Michael, com a cabeça pendida nos braços. Dee, a
única delas ainda sentada ereta, orgulhosa, tensa e furiosa, com os cabelos
brilhando pelo suor.
E Jenny, que olhou para ela com um pedido mudo de compreensão.
Então Aba olhou para os próprios dedos entrelaçados, os dedos de
escultora, longos e bonitos, mesmo que es vessem atados à idade.
— Eu já contei muitas histórias — disse ela a Jenny. —, mas há uma famosa
que acho que vocês não ouviram. É uma história da língua Hauçá. Meus
ancestrais eram quem falavam a língua, e minha mãe me contou isso
quando eu era pequena.
Michael lentamente levantou a cabeça da mesa.
— Certa vez, havia um caçador que saiu para o mato e encontrou uma
caveira caída no chão. Ele disse, embora es vesse realmente falando
consigo mesmo: "Por quê e como você chegou aqui?", e para sua surpresa,
o crânio respondeu: "Cheguei aqui conversando, meu amigo."
Tom se inclinou para frente, ouvindo. Audrey ficou olhando. Ela não
conhecia Aba tão bem quanto o resto deles.
Aba con nuou.
— O caçador estava muito animado. Ele correu de volta para sua vila e
disse a todos que nha visto uma caveira falante. Quando o chefe da vila
ouviu, ele pediu ao caçador que o levasse até a maravilhosa caveira. Então
o caçador levou o chefe até a caveira. "Fale", disse ele, mas a caveira não o
fez. O chefe ficou tão bravo por ter sido enganado que cortou a cabeça do
caçador e a deixou no chão. Depois que o chefe se foi, o crânio disse à
cabeça decepada ao lado: "Por quê e como você chegou aqui?" E a cabeça
respondeu: "Cheguei aqui conversando, meu amigo."
No longo silêncio depois, Jenny ouviu telefones distantes tocando e vozes
do lado de fora da sala.
— Você quer dizer que estamos conversando demais? — Michael disse
finalmente.
— Quero dizer que vocês não precisam contar tudo o que sabem à todos.
Há um tempo para ficar em silêncio. Além disso, vocês não precisam
insis r que a opinião de vocês é a única, mesmo que acreditem
honestamente. Aquele um caçador poderia ter vivido se dissesse: "Acho
que uma caveira falou comigo, mas posso ter sonhado".
— Mas nós não sonhamos. — Jenny sussurrou.
O que Aba disse, então, fez toda a diferença. Tornou tudo mais fácil, de
alguma forma.
— Eu acredito em vocês — disse ela calmamente e colocou uma mão gen l
e atada na de Jenny.
Quando a polícia voltou, todos estavam calmos. O grupo agora admi a
que, embora pensassem estar dizendo a verdade, poderia ter sido algum
po de sonho ou alucinação. A polícia agora teorizou que algo realmente
havia acontecido com Summer, algo tão horrível que as crianças
simplesmente não podiam aceitar o que nham visto, e então criaram uma
história histérica para encobrir a memória. Os adolescentes eram
especialmente propensos à alucinação em massa, explicou o inspetor
Somebody à Aba. Se eles pudessem passar no teste do detector de
men ras, provando que não haviam feito nada com Summer...
Eles passaram.
Então a polícia os libertou sob a custódia de seus pais, e Jenny foi para casa
e dormiu por dezesseis horas seguidas. Quando ela acordou, era domingo
e Summer, PC e Slug ainda estavam desaparecidos.
Foi assim que a nova teoria começou.
Ela era de que Slug e PC nha fugido com Summer ou que alguém nha
fugido com os três. O shopping local doou espaço para um centro de
pesquisa e centenas de voluntários saíram procurando em canos de
esgoto, valas e lixeiras.
Não havia nada que Jenny pudesse fazer para impedir isso. Todos os dias os
voluntários faziam mais, a busca aumentava.
Ela se sen u horrível. Mas então percebeu algo.
O corpo de Summer não estava em uma lixeira, mas a casa de papel podia
estar. Não traria resultados procurar por Summer, mas por Slug e PC sim.
— Porque — ela apontou tristemente para Dee e os outros. — se assim
como nós, eles entrarem na casa de papel, podem chegar ao terceiro
andar. E isso significa que eles podem abrir uma certa porta e deixar Julian
sair.
Depois disso, eles saíam todos os dias com os outros voluntários,
procurando uma pista de onde Slug Martell e PC Serrani pode ter aceitado
o jogo. Era uma corrida contra o tempo, pensou Jenny. Para chegar à casa
antes de Slug e PC chegassem a Julian. Porque depois do que ela fez com
Julian, enganando-o e trancando-o atrás daquela porta, e depois do que
havia prome do a ele - dizendo que ele ficaria ali para sempre - e depois
fugindo...
Se Julian saísse, a encontraria. Ele a caçaria. E se vingaria.
Na colina de gramas, Michael ainda estava gemendo ao pensar em
encontrar a garota que chorava.
— Ela provavelmente não sabe de nada. — disse Zach, os olhos cinzentos
como nuvens no inverno. — Ela provavelmente se pergunta se talvez nós
tenhamos feito isso. No fundo, acho que todo mundo se pergunta.
Jenny olhou em volta para o grupo: Dee esparramada preguiçosamente na
grama, os membros escuros brilhando; Audrey empoleirando-se sob uma
pasta para salvar seu smoking branco; Michael com seu corpo de ursinho
de pelúcia e olhos sarcás cos de spaniel; e Zach sentado como uma
espécie de monge betano com um rabo de cavalo. Eles não pareciam
assassinos. Mas ela sabia ue o que Zach disse era verdade.
— Temos que distribuir cartazes hoje, de qualquer forma. — disse Audrey.
— É melhor procurarmos essa garota enquanto es vermos fazendo nisso.
— Não vai fazer nenhuma diferença. — disse Zach, categoricamente.
CAPÍTULO 03

Os outros se viraram para Jenny. Ele é seu primo; você lida com ele, diziam
os olhares.
Jenny respirou fundo outra vez.
— Você sabe perfeitamente bem que isso fará, sim, diferença — disse ela
com firmeza. — Se não conseguirmos a casa de papel de volta, você sabe o
que pode acontecer.
— E o que você vai fazer se conseguirmos? Queimar? Destruir? Com eles lá
dentro? Não é assassinato, ou PC e Slug não contam?
Todos começaram a falar.
— Eles não se importariam conosco... — Audrey começou.
— Apenas se acalme aí — disse Dee, de pé sobre Zach como uma leoa.
— Talvez eles não estejam lá dentro. Talvez tenham apenas fugido da
cidade ou algo assim. — Michael opinou.
Jenny reuniu todo o seu autocontrole, depois se levantou, olhando
diretamente para Zach.
— Se você não tem nada ú l a dizer, é melhor ir embora.
Ela viu os olhares de surpresa dos outros. Zach não pareceu surpreso. Ele
ficou de pé, com o rosto fino e pontudo ainda mais intenso do que o
normal, encarando-a. Então, sem uma única palavra, ele se virou e saiu.
Jenny sentou-se novamente, sen ndo-se abalada.
— Que merda. — murmurou Michael suavemente.
— Ele mereceu. — disse Dee.
Jenny sabia que o ponto não era se Zach merecia ou não isso, mas que
Michael estava surpreso pelo jeito que ela tratara o primo.
Eu mudei, Jenny pensou. Ela tentou afastar o conhecimento com um "E
daí", mas isso a incomodava. Ela teve a sensação de que, no fundo, poderia
ter mudado mais do que sequer sabia.
— Temos que encontrar a casa de papel. — disse ela.
— Certo — disse Dee. — Mesmo que eu não ache que exista alguma
chance do PC e do Slug chegarem ao terceiro andar, onde Julian está. Não
com aquela cobra e aquele lobo por lá...
— A Rastejadora e o Espreitador. — Audrey disse com precisão.
— ...mas podemos muito bem estar seguros. — Dee con nuou e um sinal
tocou. — Te vejo em fisiologia. — acrescentou a Jenny, pegou sua lata de
energé co Carbo-Force vazia e correu para o bloco de arte.
Michael rou migalhas de biscoito do colo, levantou-se e começou a
caminhada para o ginásio.
Jenny sabia que deveria estar se apressando também. Ela e Audrey veram
que trocar de roupa. Mas no momento ela realmente não se importava se
estava atrasada ou não.
— Quer matar aula? — Ela ques onou Audrey.
Audrey parou no meio da reaplicação do batom. Então terminou, fechou o
estojo compacto e guardou o batom.
— O que aconteceu com você?
— Nada... — Jenny estava começando, quando percebeu que alguém
estava caminhando na direção delas.
Era um cara, um veterano, colega de literatura de Jenny. Brian De linger.
Ele olhou para Audrey incerto, mas quando ficou claro que ela não iria
embora, ele disse oi para as duas. Jenny e Audrey disseram oi de volta.
— Só estava pensando... — disse ele, olhando uma abelha pairando sobre
um grupo de lírios mexicanos. — se você tem, sabe, um par para o baile.
O baile acabou, Jenny pensou estupidamente. Então percebeu que é claro
que ele queria dizer o baile de formatura.
Os olhos castanhos de Audrey se arregalaram.
— Não, ela não tem. — disse ela instantaneamente, com a ligeira
contração dos lábios que destacaram sua marca de beleza.
— Mas eu namoro — disse Jenny, surpresa.
Todo mundo sabia disso. Todo mundo sabia que ela e Tom estavam juntos
desde a escola primária, que há anos as pessoas conversavam sobre eles
como Tom e Jenny, uma única pessoa, como se fossem o mesmo ser.
— Ah, sim — disse Brian De linger, parecendo vagamente envergonhado.
— É que pensei que... como ele não está mais por perto...
— Obrigada — disse Jenny. — Eu não posso ir. — Ela sabia que parecia
irritada e que Brian não merecia isso. Ele estava apenas tentando ser legal.
Mas ela ficou desequilibrada por toda a situação.
Obviamente, ela não poderia ter sido sua primeira escolha, já que hoje era
segunda-feira e o baile era neste sábado, mas ter sido convidada por ele foi
um elogio. Brian De linger não era apenas uma opção para um encontro
no úl mo minuto: ele disputado, o capitão do me de futebol com uma
legião de seguidoras líderes de torcida. Ele era uma estrela.
— Ma epazzo? — Audrey disse quando ele se foi. — Você está louca? Era
Brian De linger.
— O que você esperava que eu fizesse? Ir com ele?
Audrey sacudiu a cabeça e inclinou-a para trás, olhando Jenny de maneira
avaliadora através de cílios pontudos e pretos.
— Você mudou, sabe. É quase assustador. É como se você vesse
florescido, e todo mundo notou. Como uma luz se acendeu dentro de você.
Desde...
— Temos que ir para Educação Física — Jenny a cortou.
— Eu pensei que você queria matar aula.
— Não mais. — Jenny não queria que mais nada mudasse. Ela queria estar
segura, do jeito que estava antes. Queria ser uma aluna de ensino médio,
ansiosa pela férias de verão em mais ou menos um mês. Ela queria Tom. —
Vamos lá.
Por um momento, quando elas saíram, jogando garrafas de chá gelado na
lata de lixo de metal do corredor de inglês, Jenny teve a sensação de que
alguém a estava observando. Ela virou a cabeça rapidamente, mas não
conseguia ver nada

Tom a observou par r.
Ele se sen a mal à espreita na sombra do edi cio de inglês, atrás dos
pilares de metal com cicatrizes que sustentavam o teto em forma de
varanda. Mas ele não conseguia ir embora.
Ele a perdera, e a culpa era dele.
A questão era que Tom já nha estragado tudo. Ele estragara tudo. A coisa
mais importante de sua vida - e ele sequer percebera que era a coisa mais
importante até dezessete dias atrás. 22 de abril. O dia do jogo. O dia em
que Julian chegou e levou Jenny embora.
Claro que ele amava Jenny. Amá-la era fácil. Mas ele nunca pensou sobre
como seria estar sem ela, porque sempre soube que ela estaria lá. Você
não senta e pensa: "Eu me pergunto como seria se o sol não surgisse
amanhã".
Ele presumira tudo, que as coisas estavam garan das. Tinha sido
desleixado. Era isso que acontecia quando tudo era entregue a você em
uma bandeja. De nunca ter que provar nada a si mesmo, de ter pessoas
bajulando você por causa de sua boa aparência, seu carro quente e sua
habilidade no baseball. De, essencialmente, ser Tom Locke. Você pensa que
não precisa provar nada.
Então você descobre o quanto está errado.
O problema era que, quando ele começou a perceber o quanto precisava
de Jenny Thornton, ela descobriu que não precisava dele.
Ele a vira naquele Outro Lugar, dentro daquela casa de papel que se
tornara real. Ela nha sido tão corajosa e tão bonita que fazia sua garganta
doer. Ela funcionou absolutamente perfeitamente sem ele.
Ainda poderia estar tudo bem, exceto Julian. O Homem das Sombras. O
cara com olhos da cor das piscinas das geleiras, o cara que havia
sequestrado todos porque queria Jenny. O que nha sido uma coisa
indiscu velmente má, mas na opinião de Tom, completamente
compreensível a se fazer.
Jenny havia mudado desde que Julian tentara tê-la. Talvez os outros ainda
não vessem notado ainda, mas Tom sim. Ela estava diferente agora, ainda
mais bonita. Haviam momentos em que ela se sentava com um olhar
distante, como se es vesse ouvindo coisas que ninguém mais podia ouvir.
Ouvindo a voz de Julian em sua mente, talvez.
Porque Julian a amava. Julian disse isso, disse todas as coisas que Tom
nunca pensou em mencionar. E Julián nha o charme do diabo.
Como Jenny resis ria a isso? Especialmente sendo tão inocente como era.
Jenny poderia realmente pensar que conseguiria mudar Julian ou que ele
não era tão mau quanto parecia. Tom sabia que era o contrário, mas de
que adiantava contar a ela? Ele os viu juntos, viu os olhos de Julian quando
a olhou. Viu o po de fei ço que Julian poderia lançar. Quando Julian
procurasse Jenny na próxima vez, Tom ia perder.
Então agora tudo o que ele podia fazer era espreitar nas sombras,
observando-a. Percebendo como as mechas de seu cabelo sopravam sobre
o resto, leves como o sândalo e a cor do mel à luz do sol. Lembrando de
seus olhos, um verde escuro tocado com ouro. Tudo nela era dourado, até
a pele. Engraçado que ele nunca se preocupou em dizer isso a ela.
Talvez fosse isso que De linger estava fazendo agora. Tom não ficou
surpreso que a estrela do futebol vesse vindo conversar com Jenny; ele
ficou surpreso com a rapidez com que Brian foi embora. Ele desejou poder
ter ouvido a conversa.
Isso não importava. Não importava quantos caras se aproximassem de
Jenny. Tom estava preocupado apenas com um - e era melhor tomar
cuidado.
Tom não podia mais tê-la, mas poderia protegê-la. Quando Julian voltasse -
não se; Tom estava pra camente certo de que sim - quando Julian voltasse
para Jenny e tentasse brincar com sua inocência novamente, Tom estaria lá
para detê-lo. Ele não sabia exatamente como, mas ele iria pará-lo.
Mesmo que isso o matasse.
E se isso fizesse Jenny odiá-lo, que assim fosse. Ela o agradeceria um dia.
Movendo-se silenciosa e propositalmente, Tom seguiu a cabeça de cobre e
a de ouro, perseguindo as meninas até a quadra.
Poderia ter sido sua imaginação, mas ele nha a estranha sensação de que
algo mais os perseguia também.
Eles dirigiram para o centro de buscas no shopping em dois carros; Jenny e
Audrey no pequeno Alpha Spider vermelho de Audrey, e Dee e Michael no
Fusca VW de Michael.
Não importava como ela se preparasse, algumas paredes ainda eram um
choque. Estavam cobertas de fotos de Summer.
Centenas delas. Não apenas os folhetos e pôsteres.
Os pais de Summer também trouxeram dezenas de fotografias para
mostrá-la sob diferentes ângulos ou talvez apenas para lembrar às pessoas
o que era realmente toda essa eficiência e empacotamento de envelopes.
Alguém nha colado uma das fotos em uma monstruosa impressão de
outdoor, de modo que os cachos loiros e macios de Summer mediam um
metro e meio e os olhos azuis os encaravam como os de Deus.
— Onde está o Tomcat1? — Uma dos voluntários perguntou a Jenny. Ela
era uma universitária e sempre perguntava por Tom.
— Eu não sei. — Jenny disse brevemente. A mesma pergunta a esfaqueava
desde o almoço.
— Se eu fosse você, saberia. Ele é um pedaço de mau caminho. Eu ficaria
de olho nele... — Jenny parou de ouvir. Como sempre, ela queria se afastar
do centro o mais rápido possível. Era um lugar quente, sério e ocupado,
cheio de esperança e bom ânimo - e era uma farsa.
Havia uma sensação de mal-estar no estômago de Jenny quando ela se
virou para o grande mapa na parede. O mapa mostrava quais áreas já
haviam do buscas e quais não. Jenny fingiu estudá-lo, embora já soubesse
para onde nha que ir. Se a garota que chorava fosse amiga de PC, poderia
morar perto dele.
Ela mal percebeu quando a porta do Centro se abriu e um dos voluntários
sussurrou:
— Foi essa médium que ligou. Ela é de Beverly Hills.
— Você vai olhar para aquela Mercedes? — Michael disse.
Jenny se virou e viu uma mulher com cabelos loiros foscos, decorada com
cordas de correntes de ouro caras. No mesmo momento, a médium se
virou e a viu - e ofegou.
Os olhos dela ficaram muito grandes. Ela deu vários passos em direção a
Jenny, até que seu perfume Giorgio dominou o Chloe Narcisse, de Audrey.
Ela olhou para o rosto de Jenny.
— Você os viu. — ela sussurrou. — Os do outro lado.
Jenny ficou paralisada, como se vesse sido eletrocutada.
— Eu tenho uma mensagem para você — disse a médium.
CAPÍTULO 04

— Que mensagem? — Dee disse, franzindo a testa. A médium ainda estava


encarando Jenny atentamente.
— Você tem a visão. — disse ela. — Você os viu, o povo das fadas.
Audrey disse bruscamente:
— O povo das fadas?
Na casa de papel, o pior pesadelo de Audrey nha sido um conto de fadas.
Uma história sobre os Erlking, um espírito que assombrava a Floresta
Negra e roubava crianças. O rei elfo. Julian desempenhou o papel com
perfeição, até afirmou ser o verdadeiro Erlking.
Os homens das sombras. O povo das fadas. Nomes diferentes para
diferentes idades.
Ai, meu Deus, Jenny pensou, ela sabe a verdade. Eu deveria estar feliz, ela
pensou loucamente. Mas havia um nó em seu estômago. A mulher estava
respondendo a Audrey.
— A raça mais an ga. Algumas pessoas têm o dom de vê-las onde todo
mundo só vê um vento na grama, ou uma sombra, ou um reflexo da luz.
Algo no tom da mulher trouxe Jenny à tona. A médium parecia muito
sa sfeita com o assunto, e não assustada.
— Como eles são?
A mulher deu-lhe um olhar, rindo. Como se você não soubesse.
— São as coisas mais bonitas que se pode imaginar. Criaturas de luz e
felicidade. Costumo vê-las dançando no riacho Malibu. — Ela levantou uma
das correntes e Jenny viu o encanto, uma linda jovem com asas brilhantes
e cor nas flutuantes.
— Duendes em jacinto. — disse Dee, absolutamente séria. Os músculos de
Jenny ficaram frouxos. Essa mulher não sabia nada sobre os Homens das
Sombras. Era apenas mais um maluco.
A médium ainda estava sorrindo.
— A mensagem é: desaparecidos. Eles me disseram para lhe contar isso.
— Desaparecidos? Ah. — disse Jenny. — Bem, obrigada. — Ela supôs que
fosse uma mensagem tão boa quanto qualquer outra, considerando a
situação de Summer.
— Desaparecidos — repe u a mulher. — Pelo menos, acho que foi isso. Às
vezes, só consigo ouvir os sons das vogais. Pode ter sido... — Ela hesitou,
depois balançou a cabeça e voltou para o Mercedes.
— Por um momento, pensei que ela vesse alguma coisa. — murmurou
Audrey.
Jenny pegou um punhado de folhetos e um mapa.
— Vamos.
Lá fora, eles fizeram seus planos.
— A casa de PC fica na Street Ramona, nº 1313. — disse Jenny. Ela sabia
isso de cor. Foi o primeiro lugar que eles checaram, junto com a casa de
Slug. É claro que eles não foram capazes de procurar diretamente, mas um
dos dete ves mais gen s os informou que não havia uma casa de papel em
nenhuma das duas casas.
— Dee, você e Michael podem começar por aqui e cobrir tudo a oeste até,
digamos, Anchor Street. Audrey e eu podemos cobrir tudo a leste até onde
Landana se transforma em Sycamore. Lembre-se, é a garota que queremos
agora.
— Em outras palavras, estamos inves gando todo o lado sul da cidade. —
disse Michael com um gemido. — De porta em porta.
— Obviamente, não vamos conseguir inves gar tudo hoje — disse Jenny.
— Mas con nuaremos depois até terminarmos. — Ela olhou para Dee, que
assen u levemente. Dee manteria Michael no plano.
Audrey também não parecia par cularmente feliz.
— Já es vemos em muitas dessas casas antes. O que devemos dizer
quando eles nos disserem que já têm folhetos?
Dee sorriu.
— Diga a eles que você está vendendo enciclopédias. — E empurrou
Michael para o Fusca.
Audrey balançou a cabeça quando ela e Jenny voltaram para o Spider e
foram embora. A parte superior do carro estava abaixada e o vento soprou
mechas cor de cobre de seu cabelo preso. Jenny fechou os olhos, sen ndo
o ar correndo no rosto.
Ela não queria pensar em nada. Nem na médium, nem em Zach, nem em
Tom. Especialmente em Tom. Em seu interior, ela nha uma leve esperança
de que ele aparecesse no Centro depois da escola. Mas ele a estava
evitando, era isso.
O nariz e os olhos ardiam. Jenny o queria com ela. E se pensasse mais nele,
nos olhos cor de avelã com manchas verdes, sobre o calor, a força e o
sorriso capaz de encantar qualquer um, ela iria chorar.
— Vamos passar por Eastman e Montevidéu. — Jenny se ouviu dizendo. As
palavras saíram de sua boca, do nada.
Audrey lançou-lhe um olhar ques onador, mas virou-se para o sul.
A Eastman Avenue, palco de tantos tumultos recentes, estava quase
deserta. Jenny não es vera lá desde o dia do aniversário de Tom, quando
fora até lá para comprar um jogo de festa.
Quando se aproximaram da Rua Montevidéu, tudo o que Jenny havia
experimentado na úl ma vez em que esteve aqui - o crepúsculo azul, os
passos atrás dela, o medo - voltou. Ela quase esperava ver PC com sua
jaqueta de couro e Slug com sua camisa xadrez andando pela calçada.
Audrey virou a esquina em Montevidéu e parou.
O mural na parede em branco ainda mostrava uma cena de rua. No meio
do mural, havia uma loja de aparência realista com uma placa dizendo:
Mais jogos. Mas era apenas nta e concreto. Um desenho. Não havia uma
maçaneta real na porta.
Por trás daquela parede em branco que ela conhecera Julian, em um lugar
que não era um lugar real, no fim das contas.
Pedaços de papel jaziam na rua. Um era o amarelo brilhante de um folheto
de Summer.
Jenny sen u-se subitamente muito vazia. Ela não sabia o que a fizera ir até
ali ou o que esperava encontrar.
Audrey estremeceu.
— Eu não gosto deste lugar.
— Nem eu. Foi uma má ideia.
Elas dirigiram para o norte, voltando. Na verdade, estavam perto da casa
de Summer agora, no po de bairro em que os carros costumavam ser
levemente amassados, em blocos ou em pedaços no pá o lateral. A tarde
parecia mais brilhante aqui, e nas calçadas as crianças habituais com
cabelos clareados pelo sol e membros sardentos ou cabelos pretos
noturnos e membros marrons estavam correndo por aí.
Eles estacionaram o carro na escola primária George Washington e subiram
a tampa. Em todas as casas, o discurso era o mesmo.
— Olá, somos do Comitê de Pesquisa dos cidadãos em pról de Summer
Parker-Pearson. Podemos dar-lhe um panfleto...?
Se as pessoas na casa pareciam agradáveis, elas tentavam ser convidadas a
entrar. Então vinha a transição de "Estamos procurando por Summer" para
"Estamos procurando uma pista importante no desaparecimento dela", o
que significava a casa de papel. E hoje, "Estamos procurando alguém que
possa saber alguma coisa sobre ela", significando a Garota Chorona de
longos cabelos escuros e olhos assombrados.
Acima de tudo, elas tentaram conversar com crianças.
Crianças sabiam coisas. Viam coisas. Normalmente, os adultos nas casas
ouviam educadamente, mas as crianças estavam sempre ansiosas por
ajudar. Eles seguiam de bicicleta, sugerindo lugares para procurar,
lembrando que pensavam ter visto alguém que poderia ter sido Summer
ontem, ou talvez tenha sido no dia anterior.
— A casa de papel é realmente importante, mas pode ser perigosa.
Qualquer um poderia pegá-la, pensando que era um brinquedo. —
explicou Jenny à um menino de nove anos, enquanto Audrey man nha sua
mãe ocupada.
O garoto assen u, com os olhos brilhantes e alertas. Atrás dele, em um
sofá de couro rachado, uma menina de quatro ou cinco anos estava
sentada com um livro no colo.
— Esta é Nori. Ela não sabe ler ainda.
— Eu posso, sim! — Inclinando o rosto na direção do livro, embora seus
olhos ainda es vessem no irmão, Nori disse: — Então Chapeuzinho
Vermelho diz: "Vovó, que olhos grandes você tem." Então o lobo diz: "É pra
te ver melhor, minha querida."
Jenny sorriu para ela, depois se voltou para o garoto.
— Então, se você vir a caixa branca, não a toque, mas ligue para o número
no folheto e deixe uma mensagem para mim.
— "...Vovó, que orelhas grandes você tem..."
— Vou saber o que fazer se você ligar e dizer "encontrei".
O garoto assen u novamente. Ele entendeu as coisas como pistas e
mensagens secretas.
— "...É para te ouvir melhor, minha querida."
— Ou se um de seus amigos souber de uma garota de cabelos escuros que
amiga de PC Serrani...
— "...Vovó, que dentes grandes você tem..."
Audrey terminou com a mãe. Jenny deu um rápido toque no braço do
garoto e virou-se para a porta.
— "...É para te COMER!" — Nori gritou de repente, pulando do sofá.
Jenny girou e largou os panfletos. Nori estava de pé, olhos arregalados,
boca puxada em uma careta. Por um instante, Jenny viu não uma criança,
mas um pequeno duende deformado. Então a mãe gritou: "Nori!" e Jenny
voltou à realidade.
Ela se sen u ficar vermelha enquanto recolhia os panfletos. Nori começou
a rir e a mãe a repreendeu enquanto Jenny pedia desculpas. Finalmente
elas saíram de casa.
— Eu nunca vou ter filhos. — disse Audrey, do lado de fora.
Elas con nuaram. Algumas pessoas eram amigáveis, outras eram rudes.
Um homem sem camisa riu cruelmente quando começaram o discurso
sobre Summer e disse:
— Você checou o shopping? — Quase todos eles já nham ouvido falar
sobre a garota desaparecida.
A hora do jantar chegou e se foi. Eles ligaram para os pais para dizer que
ficariam fora por mais um tempo, enquanto ainda estava claro.
Jenny olhou de soslaio para Audrey, um pouco surpresa. Audrey não era do
po que sofre em silêncio. Jenny esperava ter que convencê-la a ficar de
fora por tanto tempo. A amiga nha muito mais do que o exterior digno de
uma capa de revista revelava.
Elas chegaram a uma rua onde muitas crianças estavam brincando. Jenny
reconheceu a cabeça loira e branca daquele que cobria seus olhos contra
uma árvore. Era o irmão de dez anos de Summer.
— Cam! — ela disse assustada. Ele não a ouviu e con nuou contando,
apoiando-se nos braços cruzados. Outras crianças estavam se espalhando,
escondidas em garagens abertas, atrás de arbustos, em hera. Jenny
reconheceu mais dois deles. Uma era a irmã mais nova de Dee, Kiah, e a
outra era seu próprio irmão mais novo, Joey.
Eles vieram brincar com Cam depois do jantar, ela percebeu. Foi um longo
caminho para Kiah, mesmo de bicicleta.
— Do quê eles estão brincando? — perguntou Audrey.
— Parece policía e ladrão. — Na expressão vazia de Audrey, Jenny se
lembrou. Audrey crescera em todos os lugares, menos na América; seu pai
estava era um diplomata. Se ele não vesse se aposentado cedo, ela nem
estaria na Califórnia agora.
— É um jogo de perseguição. Você captura os ladrões e os leva de volta à
sua base como prisioneiros. Ei, cuidado! — Jenny pegou uma pequena
figura que surgiu da hera próxima, tropeçou e voou.
Era Kiah, e Cam estava de pé. Kiah olhou para cima. Ela nunca seria alta
como Dee, mas nha os ossos finos e selvagem de Dee, saltando beleza.
Cam nha cabelos parecidos com um dente-de-leão, ainda mais claros que
os de Summer. Isso o fazia parecer estranhamente indefeso, embora Jenny
soubesse que ele era um garo nho durão.
Ao contrário de Summer. Jenny pensou: "Summer era tão frágil quanto
vidro."
Desde a noite do jogo, as emoções de Jenny eram como barcos batendo
em uma barreira de lona grossa - cortadas dela, mas ainda cutucando. Mas
de repente, ao ver Cam, elas a invadiram. Luto por Summer. Culpa.
Lágrimas encheram seus olhos.
O que diabos ela poderia dizer a ele? "Sinto muito" era tão inadequado
que chegava a ser paté co.
Outras crianças estavam saindo de seus esconderijos, reunindo-se com
curiosidade em torno de Audrey e Jenny. Jenny ainda não conseguia falar e
Audrey veio ao resgate, improvisando.
— Então, do quê vocês estão brincando?
— Ovelhas e monstros. — disse Cam. — Eu sou o monstro.
— Ah. E como se joga?
Kiah falou.
— Se você é uma ovelha, se esconde, e o monstro vem procurá-lo. Se ele o
marcar, você é capturado e tem que voltar para o covil dos monstros. E tem
que ficar lá até outra ovelha vir e deixá-lo sair.
— Ou até que o monstro coma você. — Cam colocou, duramente.
Os olhos de Kiah brilharam.
— Mas ele não pode comê-lo até que tenha todas as ovelhas lá. To-das.
Polícia e ladrão, Jenny pensou. Com apenas um policial e muitos ladrões. O
novo nome parecia um pouco selvagem, no entanto, assim como o olhar
nos olhos de Cam-o-monstro. Deus, me pergunto como deve ser para ele
em casa.
— Cam — ela disse e seus duros olhos azuis se fixaram nela. — Cam, seus
pais lhe disseram o que dissemos que aconteceu com Summer?
Ele assen u com força.
— Bem... — Jenny nha a sensação de que Aba não aprovaria o que ela
faria em seguida. Mas todas essas crianças conheciam Cam, elas se
importavam. Jenny sen u mais uma conexão aqui do que em qualquer
outro lugar.
— Eu sei que parece loucura. Sei que seus pais não acreditam nisso. Mas,
Cam, é verdade. Nós não machucamos Summer, e não pretendemos deixar
ninguém mais machucá-la. Você simplesmente não sabe o quanto
sen mos... — As lágrimas caíram de repente, embaraçosamente. Cam
desviou o olhar e Jenny tentou se controlar.
— E o que estamos fazendo agora é tentar impedir que a pessoa que a
machucou machuque mais alguém. — ela sussurrou, sen ndo-se
estupidamente como na série de TV America's Most Wanted.
Joey se juntou ao grupo e ficou corado com as raízes dos cabelos amarelos
com a humilhação de ter uma irmã adolescente berrando na calçada. Mas
o olhar tenso de Cam diminuiu um pouco.
— Você quer dizer que tudo o que as crianças estão dizendo sobre vocês
que procuram uma casa de papelão é verdade?
— Eles estão dizendo isso? Que bom. — Está funcionando, pensou Jenny. A
esperança das crianças. Havia algo encorajador nas expressões delas. Eles
não eram fechados como adultos, mas abertos, interessados,
especula vos. — Escutem, ainda estamos procurando aquela casa e agora
estamos procurando outra coisa. Uma garota que era amiga de PC Serrani.
Pela centésima vez naquele dia, ela descreveu a Garota Chorona. As
crianças ouviram.
— Nós realmente queremos conversar com ela.
Então ela explicou o porquê. Por que eles precisavam da menina e da casa.
Ela explicou, mais ou menos, sobre Julian. Uma versão diluída, mas a
verdade.
Quando terminou, Jenny soltou um longo suspiro e viu algo como
determinação se fundindo nos olhares firmes e jovens. Eles avaliaram suas
reivindicações e estavam dispostos a lhe dar o bene cio da dúvida. Até
Joey, que estava fugindo dela nas úl mas duas semanas, parecia meio
convencido.
— Vamos procurar a garota amanhã. — ele disse brevemente. — Vamos
conversar com crianças que têm, po, irmãos ou irmãs no ensino médio.
Porque elas podem conhecê-la.
— Exatamente! — Jenny disse, sa sfeita. Ela poupou-lhe a humilhação de
ser beijado pela irmã em público. — Apenas tomem cuidado. Se vocês
virem a casa de papel, não toquem nela.
Os úl mos ves gios de dúvida foram apagados dos rostos jovens, e houve
acenos sombrios. Sua urgência havia sido passada. Ela sen u como se
vesse recrutado uma equipe de pequenos dete ves par culares.
— Obrigada. — disse ela, e, sen ndo que era hora de irem, ges culou para
Audrey em direção à casa seguinte.
— Mais um jogo! — alguém atrás dela disse e outro disse: — Quem vai ser
o monstro?
— Cam de novo, se não adivinhar quem desenhar nele. — a doce voz de
Kiah soou. Na porta, Jenny olhou para a rua. Cam era virado, passando por
um ritual elaborado para escolher o próximo monstro. — Eu desenho uma
cobra nas suas costas — Kiah cantou, traçando a forma de uma. — Quem
vai colocar nos olhos?
Alguém pulou para frente e cutucou Cam entre as omoplatas.
— Courtney! — Cam gritou.
— Errado! Você é o monstro de novo!
A porta se abriu às ba das de Audrey.
— Sim?
Jenny tentou desviar sua atenção do jogo. Algo sobre aquilo... e sobre
aquela coisa de cobra... todos os jogos infan s e as histórias deles eram
horríveis?
É pra te comer!
Talvez as crianças saibam algo que os adultos não sabem, Jenny pensou,
gelada, quando uma dama os convidou para entrar em casa.
Quando eles saíram, o céu estava azul pervinca e perdendo sua cor para o
leste. A luz estava desaparecendo e a rua estava vazia.
Que bom que Joey está à caminho de casa, pensou Jenny. Talvez já até
esteja em casa agora.
— Deseja terminar este bloco? — Audrey a surpreendeu.
— Claro, por que não?
Elas desceram um lado da rua e subiram o outro. Jenny podia sen r-se
cada vez mais superficial em cada casa. O céu estava azul da meia-noite e a
luz se fora. Ela não sabia o porquê, mas estava começando a se sen r
ansiosa.
— Vamos parar por aqui. Acho que deveríamos voltar agora. — disse,
quando ainda havia mais três casas pela frente.
O azul da meia-noite lentamente se tornou preto. As luzes da rua pareciam
distantes e ela se lembrou de repente das pequenas ilhas de luz no
pesadelo de Zach. Um pesadelo em que um caçador os perseguira através
da escuridão sem fim.
— Ei, espere! — Audrey protestou.
Jenny agarrou o braço dela.
— Não, se apresse. Vamos, Audrey, vamos voltar para o carro.
— Porque? O que há de errado com você?
— Eu não sei. Apenas temos que voltar!
Um aviso primi vo estava disparando no cérebro de Jenny. Um aviso desde
o momento em que as meninas pegavam bolsas de pele para conseguir
água, ela pensou loucamente, lembrando-se de algo que havia sen do com
Julian. Um momento em que as panteras andavam na escuridão do lado de
fora das cabanas de barro. Quando a escuridão era o maior perigo de
todos.
— Jenny, isso é totalmente diferente de você! Se houvesse algo para se
assustar, eu é quem ficaria com medo. — disse Audrey, resis ndo
enquanto Jenny a arrastava. — Você é quem sempre costumava ir para as
partes ruins da cidade...
— Sim, e veja onde isso me levou! — Jenny disse. Seu coração estava
batendo forte, sua respiração acelerada. — Vamos!
— ...e eu odeio dizer isso, mas não posso correr com esses sapatos. Eles
estão me matando há horas agora. — A luz piscando da rua mostrava os
saltos italianos apertados de Audrey.
— Ai, Audrey, por que você não disse algo antes? — Jenny estava
consternada. Algo a fez sacudir a cabeça, olhando para trás. Algo farfalhou
nos oleandros.
Onde todo mundo vê apenas um vento na grama ou uma sombra...
— Audrey, re os sapatos. Agora!
— Eu não posso correr descal...
— Audrey, há algo atrás de nós. Temos que sair daqui, rápido. Agora,
vamos! — Jenny estava puxando-a novamente quase antes que Audrey
vesse arrancado os saltos. Andando o mais rápido que podia sem correr.
Se você correr, eles te perseguem, Jenny pensou loucamente.
Porque havia algo lá atrás. Ela podia ouvir os pequenos sons. Estava
rastreando-as, por trás do arbusto coberto de arbustos à sua direita. Ela
podia sen r olhando para eles.
Talvez seja Cam ou uma das outras crianças, ela pensou, mas sabia que não
era. Fosse o que fosse, ela sabia em seu coração que queria machucá-las.
Estava se movendo rapidamente, levemente, mantendo o ritmo com elas,
talvez só seis metros atrás.
— Audrey, se apresse.
Em vez disso, Audrey parou. Jenny apenas conseguiu dis nguir seu olhar
de medo enquanto estava de pé, ouvindo.
— Ai, meu Deus, há algo!
O farfalhar estava mais próximo.
Deveríamos ter corrido para uma casa, Jenny percebeu. Seu único
pensamento nha sido chegar ao carro. Mas agora eles passaram pelas
úl mas casas antes do recinto da escola e o carro de Audrey estava muito à
frente. Elas não iam conseguir.
— Vamos! — Não corra, não corra, não corra, disseram as marteladas
dentro de Jenny. Mas seus pés, úmidos em seus tênis de correr, queriam
bater na calçada.
Estava aproximando-se delas.
Não pode ser que uma pessoa aparecesse acima dessas sebes, pensou
Jenny, lançando um olhar para trás. De repente, o cérebro de Jenny lhe
mostrou uma imagem terrível: a pequena Nori correndo como uma
aranha, atrás dos arbustos, seu rosto contorcido em uma careta.
Não corra, não corra, não corra...
O carro estava à frente, parecendo preto em vez de vermelho na escuridão
além de uma luz da rua. Jenny pareceu ouvir uma respiração
estranhamente rápida atrás dela.
Nãocorranãocorranãocorranãocorra...
— Pegue as chaves — ela ofegou. — Pegue as chaves, Audrey...
Aqui estava o carro. Mas o farfalhar estava ao lado de Jenny agora, do
outro lado da cerca viva. Iria atravessar a cerca, ela concluiu. Direito
através da cerca e agarrá-la.
Audrey estava mexendo na bolsa. Ela largara os sapatos e Jenny agarrou a
maçaneta da porta do carro.
— Audrey! — ela chorou, sacudindo a maçaneta.
Audrey jogou o conteúdo de sua bolsa na calçada e espalhou a pilha com
uma mão desesperada, pegando as chaves.
— Audrey! Abra! — Jenny assis u em agonia enquanto Audrey corria para
o lado do motorista, deixando o conteúdo de sua bolsa espalhado.
Mas era tarde demais. Houve um estrondo na cerca diretamente atrás de
Jenny.
No mesmo momento, uma forma escura surgiu das sombras na calçada em
frente à ela.
CAPÍTULO 05

Jenny gritou.
Ou saiu algo como um grito. O resto foi cortado quando algo a derrubou no
chão. Era a figura sombria à sua frente e estava gritando alguma coisa.
— Jenny, abaixe-se!
Seu cérebro só deu sen do às palavras depois que ela caiu. Houve uma
ba da maçante e uma ba da e correria que poderia ter sido o sangue em
seus ouvidos. Então o acidente parou.
— Espere, fique abaixada até ver eu se desapareceu. — disse a voz de Tom.
Jenny levantou-se assim mesmo, olhando-o com espanto. O que você está
fazendo aqui?, ela pensou. Mas o que disse foi:
— Você viu?
— Não, eu estava olhando para você. Eu ouvi e então...
— ...me derrubou — disse Jenny. — Você viu, Audrey?
— Eu? Eu estava tentando abrir minha porta e depois tentando abrir a sua.
Ouvi passar, mas quando olhei, a coisa se foi.
— Ela "não se foi" — disse Tom. — Acho que passou por cima... passou por
cima do capô do seu carro.
— Não pode ter sido. — disse Jenny. — Uma pessoa não... — Ela parou.
Mais uma vez uma imagem horrível de Nori, correndo como aranha,
entrou em sua mente.
— Não acho que era uma pessoa — Tom começou em voz baixa. — Eu
acho...
— Olha! — Audrey o interrompeu. — Lá embaixo, além da luz da rua,
algum po de animal... — Sua voz estava alta de medo.
— Ligue os faróis — disse Tom. Uma cunha de luz branca atravessou a
escuridão. O animal foi capturado diretamente nas vigas, os olhos
refle ndo em verde.
Era um cachorro.
Algum po de mistura de laboratório, Jenny deduziu. Preto o suficiente
para se misturar à noite ou às sebes. Ele olhou para eles com curiosidade,
então seu rabo deu uma sacudida rápida e incerta. Farfalhar nos arbustos,
Jenny pensou. Aquela cauda abanando! E a respiração rápida e ofegante.
— Bafo de cachorro — ela ofegou alto, quase histericamente. Após a
tensão, o alívio foi extremamente doloroso.
— E por isso eu perdi meus sapatos? — Audrey encostou a cabeça ruiva no
volante, soando ofendida. Então sentou-se encarou Jenny, que soluçava
fracamente.
— Vamos voltar e buscá-los. Sinto muito, de verdade. Mas estou feliz que
você esteja aqui — disse Jenny a Tom. Ele estava olhando para o cachorro.
— Eu não acho... — ele começou novamente. Então balançou a cabeça e
virou-se para ela. — Eu não quis te machucar.
— Não? — Jenny disse, não significando que o perdoava. Ela olhou para o
rosto dele. Tom se afastou para ajudar Audrey a pegar seus pertences
espalhados na calçada. Eles só conseguiram encontrar um sapato.
— Ah, deixe pra lá. — disse Audrey com nojo. — Não me importo mais. Só
quero chegar em casa e mergulhar na banheira por cerca de uma hora.
— Pode ir. Tom pode me levar para casa — disse Jenny. Tom a olhou,
parecendo assustado. — Você está com seu carro, não é? Ou caminhou?
— Meu carro está na rua. Mas...
— Então você pode me levar — Jenny o interrompeu, categoricamente.
Audrey levantou as sobrancelhas, entrou no carro e foi embora com um
"Ciao" resolvendo o assunto.
Tom e Jenny caminharam lentamente até o RX-7 dele. Uma vez lá dentro,
porém, Tom não ligou o motor. Eles apenas sentaram.
— Bem, você se tornou muito escasso hoje. — disse Jenny. — Enquanto o
resto de nós estava trabalhando. — Isso não parecia certo. Ela estava
chateada, esse era o problema.
Tom estava mexendo no rádio, ficando está co.
— Sinto muito, Jenny. Eu nha coisas a fazer.
Onde estava o sorriso dele, aquele sorriso maroto, conspirador e de lado?
Ele a estava tratando educadamente, como qualquer um.
Pior, ele a chamava de Jenny. Quando estava feliz, ele a chamava de Thorny
ou algum outro nome bobo.
— Tom, o que diabos está acontecendo?
— Nada.
— Nada? Do que você está falando? Tom, olhe para mim! Você está me
evitando o dia todo. O que devo pensar? O que está acontecendo?
Tom apenas balançou a cabeça levemente.
— Você mesmo está me evitando. De propósito. — Jenny não nha
acreditado até colocar em palavras. — Não apenas hoje, aliás. Está desde
que... — Ela parou. — Tom. Não é por... não tem nada a ver com... — Ela
não conseguiu dizer; era ridículo demais. Mas que outra explicação havia?
— Não tem nada a ver com o que aconteceu no jogo, tem? Com ele?
Ela percebeu pelo silêncio que estava certa.
— Você está louco? — Jenny disse em uma espécie de explosão silenciosa.
— Vamos apenas não falar sobre isso.
— Vamos apenas não falar sobre isso? — Em algum lugar dentro de Jenny,
a histeria estava aumentando, pronta para ser liberada.
— Olha, eu sei o placar. Melhor do que você. — À fraca luz do painel de
instrumentos, ela podia ver que a boca dele estava sombria. Jenny a pegou
e disse cuidadosamente:
— Tom, eu sou sua namorada. Eu te amo. Sempre es vemos juntos. E
agora de repente você mudou completamente, e você está agindo
como...como...
— Não fui eu quem mudou — disse ele. Então, virando-se totalmente para
ela, con nuou: — Você pode me olhar nos olhos e dizer que não pensa
nele?
Jenny ficou sem palavras.
— Pode me dizer isso honestamente? Que você nunca pensa nele?
— Só por ter medo dele — Jenny sussurrou, com a garganta seca. Ela teve
uma sensação terrível, como se terremotos e maremotos es vessem à sua
frente.
Ah, Deus, Jenny pensou. Sua mente estava cheia de imagens de pânico. Os
dedos de Julian em seus cabelos, leves como o tapinha macio da pata de
um gato. Julian inclinando o rosto para cima, Jenny fluindo em sua direção.
Julian sustentando seu peso, beijando sua nuca.
Mas Tom não nha visto tudo isso. Ele só nha visto ela e Julian juntos no
final, quando os pensamentos de Jenny estavam em rar seus amigos da
casa de papel.
— Eu estava tentando salvar a todos nós — disse ela, com segurança em
alto nível moral. — Você sabe disso.
— E isso significa que você não sen u nada por ele?
Men ra, Jenny pensou. Não havia razão para ela ter que men r. Ela não
sen a nada por Julian, mas estava tão confusa, tão assustada e confusa,
que não sabia mais o que sen a e o que estava acontecendo.
— Não — ela disse.
— Eu te conheço, Jenny; sei quando algo chega até você. Vi você responder
a ele. Ele traz um outro seu, a faz diferente.
— Tom...
— E eu vi o que ele pode fazer, tudo o que ele pode fazer. Ele é sobre-
humano. Como posso compe r com isso?
Ali estava o problema, Jenny pensou, com clareza. Se Tom Locke, o
Impecável, nha um defeito, era isso. Ele estava acostumado a sempre
vencer, e com facilidade. Tom não fazia nada que não pudesse fazer certo
da primeira vez. Ele não tentaria se pensasse que iria falhar.
— Além disso, você não precisa mais de mim.
Então era isso que ele pensava. Jenny fechou os olhos.
— Você está errado — ela sussurrou. — Eu precisei de você o dia todo
hoje. E você não estava...
— Ei, não, Jenny, não chore. Ei, Jen. — Sua voz mudou. Ele colocou a mão
no ombro dela, depois um braço em volta dela. Fez isso sem jeito, como se
fosse a primeira vez.
Jenny não conseguiu conter as lágrimas.
— Não chore. Eu não quis fazer você chorar. — Ele se inclinou para segurar
o outro ombro dela com a outra mão. Jenny abriu os olhos molhados.
Ele estava olhando no rosto dela, e estava tão perto. A expressão sombria
se foi, e em seu lugar havia preocupação e amor. Amor angus ado.
Naquele instante, Jenny viu por baixo do exterior liso e polido das defesas
de Tom Locke.
— Tommy... — ela sussurrou, e sua mão encontrou a dele, os dedos
travando juntos.
Então, um ou outro deles fez um movimento - Jenny nunca se lembrava de
qual - e ela estava nos braços dele. Eles estavam se segurando
desesperadamente.
O alívio inundou Jenny e ela soluçou um pouco. Era tão bom ter Tom a
abraçando novamente. Em um momento ele a beijaria, e tudo ficaria bem.
Mas então algo aconteceu. O interior do RX-7 era pequeno, como um
cockpit de avião, e o console central curvado para fora. Tom se afastou um
pouco para beijá-la, e sua mão ou cotovelo bateu nos botões do rádio.
Deve ter, porque de repente a música caiu no carro.
Era uma música que a mãe de Jenny tocava às vezes, uma música an ga de
Dan Fogelberg. Ela nunca nha notado as palavras antes, mas agora elas
ecoavam claramente através do carro.
"...Como as músicas que a escuridão compõe para adorar a luz..."
Jenny recuou, com o coração disparado. Deus, quem pensou nisso? Quem
já pensou nisso? O que alguns compositores dos anos setenta sabiam sobre
a escuridão adorando a luz?
Ela estava olhando para o rádio, paralisada. Pelo canto do olho, viu Tom
olhando para ela.
Jenny estendeu a mão e apertou o rádio, e o carro mergulhou em silêncio.
Ela nha que dizer alguma coisa, mas sua mente estava em branco. Tudo o
que ela podia ouvir era o eco da voz de Julian dizendo: "Eu a quero como...
luz para a minha escuridão.".
— Está vendo? — pressionou Tom.
O silêncio ficou terrível.
— É melhor eu levá-la para casa. — Ele con nuou, com uma voz tão vazia e
educada quanto havia começado. — Está tarde.
— Era apenas uma música — Jenny explodiu, mas sabia que a música não
era o problema. O problema foi a reação dela.
— Você mudou, Jenny.
— Estou tão cansada de ouvir isso! — Jenny respirou fundo e acrescentou:
— Se mudei tanto, talvez você não me queira mais. Talvez devêssemos
terminar.
Ela nha dito isso para chocar. Atordoada, ela percebeu que ele não a
contradizia.
— Melhor chegar em casa — ele disse novamente.
Jenny queria desesperadamente recuperar as palavras, mas era tarde
demais. Era tarde demais para qualquer coisa, e seu orgulho não a deixava
chorar ou falar. Ela ficou congelada enquanto dirigiam-se para sua casa.
Tom fez o mesmo.
A mãe de Jenny estava de pé no limiar da sala de estar.
— E onde você esteve? — ela exigiu. Sra. Thornton nha cabelos dourados
escuros e um temperamento rápido.
— É minha culpa, senhora Thornton. — disse Tom.
— Não é culpa dele. Eu sou responsável por mim — rebateu Jenny.
— Pelo menos você já está em casa. — disse a sra. Thornton, com um
suspiro. Seu temperamento, como o de Jenny, aumentou rapidamente e
morreu mais rapidamente ainda. — Você está com fome? Você jantou,
Tom?
Tom balançou a cabeça negra.
— É melhor eu chegar em casa — disse ele, evitando os olhos de Jenny.
— Sim, é melhor. — o Sr. Thornton disse suave, mas intencionalmente, da
poltrona. O pai de Jenny era um homem pequeno, mas nha um olhar
irônico que poderia matar do outro lado da sala. — Tenho certeza que seus
pais estão esperando você. E da próxima vez, voltem antes de escurecer.
Quando a porta se fechou atrás dele, Jenny disse com energia imprudente:
— Provavelmente não haverá uma próxima vez.
— Jenny? — A mãe dela ficou assustada. Jenny virou-se para a cozinha,
mas não antes de ver seus pais trocarem olhares. O pai balançou a cabeça
e voltou à revista Time. A mãe a seguiu até a cozinha. — Querido, você não
pode ficar chateada porque a queremos em casa mais cedo. Estamos
apenas tentando manter você e Joey a salvo.
— Não é isso. — Jenny estava lutando contra as lágrimas. — É só que acho
que Tom e eu vamos terminar.
A mãe dela ficou olhando.
— Ah, querida!
— Sim. E eu simplesmente não sei... Ah, mãe, tudo está mudando! — De
repente, Jenny se jogou nos braços da mãe.
— As coisas mudam, querida. Você está na idade em que tudo começa a
acontecer. Sei o quão assustador isso pode ser, e sinto muito por Tom...
Jenny balançou a cabeça silenciosamente. Ela e a mãe já haviam
conversado sobre crescer antes. Ela sempre se sen u secretamente um
pouco convencida de como estava lidando com tudo isso. Planejara tudo: o
ensino médio com Tom e depois a faculdade com Tom, e então, em algum
futuro confortável, o casamento com Tom, uma carreira interessante e uma
turnê mundial. Após a turnê, bebês. Um menino e uma menina.
Ela já havia mapeado o "crescer": sabia exatamente como seria.
Mas agora não mais. Seu futuro acolhedor estava desmoronando ao seu
redor.
Ela se afastou da mãe.
— Jenny... não há nada que você não esteja nos dizendo, digamos, sobre
Zach? Porque sua a Lily está realmente preocupada. Ela diz que ele está
agindo de maneira tão diferente... Ele até parece ter perdido o interesse
em fotografia...
— Que po de coisa? — Jenny sen u-se enrijecer.
— É claro que sabemos que Zach não machucou Summer de forma
alguma. Mas não ele foi quem inventou essa história, foi? E todos vocês
acreditaram porque se preocupam com ele. — Foi formulado como uma
teoria e Jenny ficou horrorizada.
— Não — ela disse. "Primeiro de tudo, ninguém inventou a história. —
Embora a sra. Thornton con nuasse a encará-la, Jenny notou que os olhos
castanho-dourados de sua mãe ficaram mais escuros com isso e pareciam
murar.
Era assim que todos os pais pareciam quando as crianças conversavam
sobre a realidade do que havia acontecido naquela noite. Eles estavam
ouvindo, mas não estavam ouvindo. Eles acreditavam em você porque
você era filho deles, mas não podiam acreditar em você. Então acabavam
olhando para você como zumbis educados e dando desculpas por trás dos
olhos deles.
— Ninguém inventou a história — Jenny repe u cansada, já derrotada. —
Olha, eu realmente não estou com fome. — Ela escapou para a sala da
família, onde Joey estava jogando videogame, mas não concluiu a fuga.
O telefone tocou e ela o alcançou automa camente.
— Olá?
ntontontontontontontonto.
Calafrios tomaram conta de Jenny.
O ruído indecifrável con nuou, mas por cima havia um sussurro. "Uma...
ishhshhshht ..."
— Joey, desligue a TV!
O sussurro veio novamente e Jenny ouviu a voz da médium em sua mente.
Desaparecidos...
— Desa-ppppareeeciiiidos. — A voz sussurrou.
Jenny apertou o telefone, esforçando-se para ouvir.
— Quem é? — De repente, ela ficou com raiva e não com medo. Ela nha
visões da médium loiro fosco do outro lado. Mas a voz parecia ser de
homem e nha uma qualidade distorcida que ia além do estrangeiro. A
palavra parecia desaparecidos, mas...
O telefone clicou, então houve um tom de discagem.
— O que há de errado? — a mãe dela disse, vindo da cozinha. — Alguém
ligou?
— Você não ouviu tocar?
— Não consigo ouvir nada com essa TV. Jenny, o que houve? Você está tão
pálida.
— Nada. — Ela não queria falar sobre isso com a mãe. Não suportava mais
perguntas - ou mais coisas estranhas, ou mais nada. — Estou muito
cansada — disse e foi para os fundos da casa antes que a mãe pudesse
detê-la.
Na privacidade de seu próprio quarto, Jenny caiu na cama. Era uma sala
agradável, e normalmente sua familiaridade a teria confortado. Michael
sempre dizia que parecia um jardim por causa do edredom Ralph Lauren
em rosa, papoula, ouro e azul empoeirado, e as cestas na cômoda
enfeitadas com flores de seda. No parapeito da janela, havia vasos de
petúnias e alyssum.
Agora mesmo, Jenny se sen a estranha. Como se não pertencesse mais à
sua familiaridade. Ela ficou ouvindo a casa. Ouviu os sons distantes da TV
da sala da família serem interrompidos e, depois, barulhos no banheiro.
Joey indo para a cama. Vozes no corredor e uma porta se fechando. Os pais
dela indo para a cama. Depois disso, tudo ficou quieto.
Jenny ficou ali por um longo tempo. Não conseguia relaxar para dormir;
nha que fazer algo para expressar a estranheza que sen a por dentro. Ela
queria - ela precisava - pensar em algo para relaxar e purificar-se. Sozinha.
Então pensou. Ela foi até a porta e cuidadosamente girou a maçaneta.
Entrou no corredor escuro, ouvindo. Silêncio. Todo mundo estava
dormindo; a casa nha aquela sensação silenciosa no meio da noite.
Silenciosamente, ela abriu o armário de roupas de cama e pegou uma
toalha. Ainda cuidadosa para não emi r o menor som, destrancou a porta
de vidro da sala da família e a abriu.
Uma lua de três quartos estava nascendo sobre o sopé. Jenny olhou para o
quarto dos pais, mas as venezianas estavam escuras e uma fileira de
arbustos altos de oleandros bloqueava a vista da piscina. Ninguém a veria.
Ela caminhou fur vamente para uma alcova da parede de blocos, onde
girou um interruptor. A luz da piscina acendeu.
Magia. Ele transformou um vazio sinistro em uma joia verde-azul
fluorescente.
Jenny suspirou.
Mantendo-se bem atrás da fileira de arbustos, rou a roupa. Então se
ajoelhou na beira da piscina, sentou-se nela, colocando as pernas na água.
Podia sen r o convés poroso de concreto nas costas de suas coxas e a água
fria nas panturrilhas. Ela olhou para os pés, verde pálido e ampliada na
água brilhante. Com um giro cuidadoso e um deslize, ela entrou.
Um leve choque de frieza. Jenny saiu da beira da piscina com os pés e
flutuou de costas, abrindo os braços. O cheiro de cloro encheu suas
narinas. A lua era pura prata no céu e muito distante. Agora mesmo, se
sen a tão distante das emoções comuns.
Então, o que você fez, pensou, flutuando, quando vendeu sua alma ao
diabo?
Esse era o problema. Ela deixou Julian colocar o anel em seu dedo. Um
anel de ouro com uma inscrição no interior: À tudo me recuso e a Ti
escolho.
Palavras mágicas, inscritas no interior do anel, para que descansassem
contra a pele dela e a ligassem à promessa.
Quando eles voltaram do Mundo das Sombras, Jenny havia colocado o anel
na caixa branca, aquela com a casa de papel, que PC e Slug roubaram.
Agora ela desejava tê-lo de volta. Ela deveria tê-lo derre do ou
estraçalhado.
A água deslizou agradavelmente entre as pontas dos dedos. Ela embalou
todo o seu corpo, tocando toda a sua pele. Era uma sensação muito
sensual, ser abraçada assim, sair em qualquer direção e sen r a frieza
passar por você.
Jenny sen u coisas mais agora. Descobrira isso na primeira semana depois
de voltar. Ela percebeu, para sua perplexidade e um pouco para seu horror,
que achava as coisas mais bonitas do que antes. O ar da noite estava mais
perfumado do que costumava ser, o pelo de seu gato era mais suave. Ela
notou pequenas coisas - pequenos detalhes delicados que nunca nha
visto antes.
Algo no tempo que passou com Julian a abriu para as coisas. Para sua
sensualidade, seu imedia smo. Talvez fosse isso que as pessoas estavam
percebendo quando disseram que ela havia mudado.
Ou talvez sempre tenha sido diferente. Porque ela fora escolhida. Julian a
escolheu, apaixonou-se por ela, começou a observá-la aos cinco anos de
idade. Porque quando ela nha cinco anos, abrira um armário secreto no
porão de seu avô, um armário esculpido com o símbolo Nauthiz, uma runa
de contenção.
Tinha sido uma coisa natural a se fazer. Deixe uma criança sozinha em um
porão onde uma estante foi movida para expor uma porta secreta, e o que
alguém esperaria? Qual seria o dano?
Isso dependia. Se o seu avô era como qualquer avô, um velhinho que
gostava de jardinagem e golfe, não fazia mal. Mas se o seu avô era um
aborrecedor nas artes negras, podia ser outra história. E se o seu avô
vesse realmente conseguido a ambição de chamar espíritos de outro
mundo, prendê-los... e se a porta que você abriu foi a que os segurava...
As consequências foram inimagináveis.
Jenny abriu a porta e viu uma mistura rodopiante e fervente de gelo e
sombras. E nas sombras-olhos. Olhos escuros, observadores, sardônicos,
cruéis, diver dos. Olhos an gos. Os olhos dos Outros, os Homens das
Sombras.
Eles foram chamados nomes diferentes em diferentes idades, mas sempre
sua natureza essencial era revelada. Eles foram os que assis ram das
sombras. Que às vezes levava as pessoas para seu próprio lugar.
A coisa de que Jenny mais se lembrava dos olhos era que eles estavam com
fome. Mal, poderoso e faminto.
— Eles adorariam ter um dente em você — Julian dissera a Dee. — Todos
os meus ancestrais, aqueles fantasmas an gos, sugadores de ossos e que
lambem os lábios.
De repente, a água parecia mais fria que fria. Jenny nadou até os degraus e
saiu, tremendo. Em seu quarto, se esfregou até parar de tremer. Então
ves u uma camiseta e se arrastou para a cama. Mas a visão de olhos
brilhantes a assombrou até que ela adormeceu de pura exaustão.
---
Ela acordou de repente quando o telefone tocou. O alarme, pensou,
confusa, e alcançou o relógio ao lado da cama. Mas o toque con nuou.
A janela dela estava escura. O relógio na mão mostrava um vermelho
brilhante às 3:35 da manhã. O toque con nuou assustadoramente alto,
como uma sirene.
Seus pais atenderiam a qualquer momento agora. Mas eles não o fizeram.
Jenny esperou. O toque con nuou. Eles nham que atender. Nem Joey
dormia profundamente. Cada explosão de barulho era como um raio
branco na casa escura e silenciosa.
Um calafrio percorreu a pele de Jenny. Ela descobriu que estava contando
inconscientemente. Nove toques. Dez. Onze. Doze. Quebrando a quietude.
Talvez fosse Dee; talvez ela e Michael vessem descoberto algo importante
e, por algum mo vo, não pudessem ligar até agora.
Com o coração disparado, Jenny pegou o fone.
— Fom — uma voz sussurrou.
Jenny congelou.
— Fom... Fa... into...
O ruído eletrônico sem forma embaçou a palavra. Jenny só conseguiu
dis nguir os sons de algumas letras e o suave silêncio no final. Fa e depois
int. Não parecia mais exatamente "desaparecido".
Ela queria falar, mas não conseguiu. Ela só podia segurar o telefone e ouvir.
— Fa... mim...
Famin? Não, era algo maior. F-int. Fom. Fa-into. Fa-min.
Ai, meu Deus, meu Deus, meu Deus, Meu Deus...
Puro terror a varreu, e todos os cabelos de seu corpo se ergueram. Jenny
sen u seus olhos arregalarem e lágrimas brotando neles. Naquele instante,
ela ouviu, realmente ouviu o que a voz estava dizendo. Ela sabia.
Não era desaparecidos. Parecia ser, mas não era. Era algo muito pior. A voz
sussurrada e distorcida com a cadência estranha dizia fome.
Faminto.
Jenny jogou o telefone o mais forte que pôde do outro lado da sala. Ela
estava de pé, a pele arrepiada, o corpo lavado com adrenalina. Faminto.
Faminto. Os olhos no armário. Os homens das sombras.
Aqueles olhos maus e vorazes...
É pra te comer!
CAPÍTULO 06

— Foi tão psíquico — disse Dee prontamente. — Ela parecia um caso de


peróxido no cérebro para mim.
— Não — disse Michael. — Sabe o que foi realmente? — Jenny pensou que
ele ia fazer uma piada, mas pela primeira vez ele falava sério. — É estresse
pós-batalha. Todos nós estamos assim. Estressados ao máximo, e vendo e
ouvindo coisas que não existem.
Era o dia seguinte. Todos estavam sentados na colina gramada - todos
menos Tom, é claro. Jenny ficou surpresa. Zach apareceu. Depois do que
dissera para ele no almoço de ontem, ela teria pensado que ele se afastaria
deles, mas ele estava em seu lugar, pernas longas dobradas, cabeça loira e
cinzenta inclinada sobre seu almoço.
A própria Jenny não nha ape te.
— As ligações não foram alucinações — disse ela. Era tudo o que podia
fazer para manter a voz firme. — Ok, o úl mo pode ter sido um sonho;
acordei meus pais gritando e eles disseram que não ouviram o telefone
tocar. Mas nas outras vezes, eu estava andando por aí, Michael. Eu estava
acordada.
— Não, não estou dizendo que as ligações não foram reais. Estou dizendo
que o telefone tocou e talvez alguém tenha sussurrado algo para você, ou
talvez a linha tenha ficado está ca, mas você imaginou o que ouviu. Você
pôs sua própria interpretação nos sons. Você não ouviu desaparecido até
que seu psíquico dissesse desaparecido, certo?
— Sim — Jenny disse lentamente. No sol brilhante de maio, o terror da
noite passada parecia menos real. — Mas... não foi como imaginar. Ouvi os
sons da primeira vez em que o telefone tocou na escola e no final eles
ficaram claros. E a palavra fez sen do. Não desaparecido, mas faminto... Se
encaixa naqueles olhos.
— Mas é exatamente por isso que você imaginou. — Michael estava
acenando com uma caixa de bolachas Jack, aquecendo o assunto. — Talvez
não imaginou a palavra certa. Veja, seu cérebro é como um sistema de
modelagem. Ele pega a entrada que recebe de seus sen dos e cria o
modelo mais razoável possível. Mas quando você está realmente
estressada, ele pode pegar essa entrada - como alguém sussurrando
besteiras no telefone - e criar o modelo errado. Seu cérebro ouve algo que
não existe.
— Sim, mas isso não é real. — Dee estava franzindo a testa, claramente
não gostando da ideia de não confiar no próprio cérebro.
— É tão real quanto qualquer outro modelo que seu cérebro faz o dia todo.
Como ontem à noite, eu estava fazendo lição de casa na minha sala de
estar, e meu cérebro imaginou uma mesa de café da manhã. Era o que eu
pensava nas imagens que meus olhos viam. Ele pegaram a madeira
retangular e a transformaram em uma mesa com café, e percebi isso. Mas
se eu es vesse realmente estressado, poderia ter feito meu cérebro
imaginar a madeira como um caixão. Especialmente se eu es vesse
dormindo ou se já es vesse pensando em caixões. Entenderam? — Jenny
nha, mais ou menos.
— Mas o caixão ainda não seria real — argumentou Dee. — Como eu
poderia saber disso?
— Fácil. Você poderia tocar...
— Tocar é apenas outro sen do. Também pode enganar. Se o modelo
criado é bom o suficiente, não há como dizer que não é real. — disse
Michael.
Fazia sen do, pensou Jenny. Era como o cachorro ontem à noite. Ela estava
pulando nas sombras porque estava tão assustada. Ela sentou-se na colina
gramada e soltou um suspiro profundo. O nó em seu estômago havia
diminuído um pouco, e agora ela podia se preocupar com outras coisas.
Como Tom. Enquanto ele não es vesse com eles, as coisas não estariam
certas. Os outros estavam conversando ao seu redor.
— Cobrimos cerca de metade das ruas ontem — Dee estava dizendo. —,
mas não encontramos nada...
— Eu encontrei uma cartela de remédios. — Michael a interrompeu.
— ...E se eu con nuar perdendo minhas aulas de kung fu, não vou para
viver a próxima compe ção — concluiu Dee.
— Você acha que está com problemas? Eu encontrei arranhões por todo o
capô do Spider hoje de manhã — disse Audrey. — Meu pai vai me matar
quando ver. — Ela contou a história do cachorro que as havia seguido.
Michael derramou suas bolachas, vangloriando-se.
— Está vendo? Mais modelagens — disse. Mas Audrey empurrou seus
óculos de sol de grife com um dedo para encará-los.
— Jenny? — ela disse. — O que foi?
Jenny podia sen r seus lábios tremerem um pouco, mas tentou parecer
fora de mão.
— É só que Tom e eu brigamos. E nós meio que... — Ela encolheu os
ombros. — Bem, não sei se estamos mais juntos ou não. — Todos olharam
como se ela vesse dito que o mundo estava acabando em alguns minutos.
Então Michael assobiou e passou as mãos pelos cabelos, desarrumando-os
ainda mais. Dee, que normalmente desprezava tudo a ver com romance,
colocou a mão esbelta como a noite escura no braço de Jenny. As
sobrancelhas de Audrey estavam levantadas em sua franja espetada de
cobre. Zach balançou a cabeça, um lampejo distante do gelo em seus olhos
cinza-inverno.
Audrey foi a primeira a se recuperar.
— Não se preocupe, cheri — disse ela, rando os óculos escuros e
encaixando-os rapidamente em um estojo. — Não é permanente. Tom só
precisa de um pouco de agitação. Os caras precisam ser lembrados de seu
lugar de vez em quando. — acrescentou ela com um olhar severo para
Michael, que gaguejava.
— Não. Não foi uma briga normal. Foi sobre ele, Julian. Tom acha que eu
pertenço a Julian ou algo assim, como num daqueles filmes horríveis e
an gos. Noiva do Diabo. Ele acha que já me perdeu, então por que
compe r? — Ela contou a eles o melhor que pôde.
Audrey ouviu, seus olhos estreitados virados na direção do edi cio inglês.
De repente, seus lábios se curvaram em um sorriso felino.
— Claramente, medidas drás cas são necessárias. E eu tenho uma ideia.
— Que ideia?
Audrey acenou com a cabeça em direção ao prédio. Preso ao jolo, estava
um grande cartaz: Venha para o Baile de Máscaras da Meia-Noite. — Voilá.
— Voila? — Jenny disse inexpressivamente.
— O baile. Brian De linger. Ontem. Lembra?
— Sim, mas...
— Você disse que Tom acha que não pode compe r com um amante
demoníaco. Mas talvez se ele vir que tem uma compe ção humana, ficará
um pouco mais mo vado.
Jenny olhou para ela. Era loucura. Mas poderia funcionar.
— Mas eu disse não a Brian. Ele já deve ter outro par agora.
— Acho que não — murmurou Audrey. — Eu ouvi Amy Cheng fofocando
ontem em álgebra. Brian terminou com Karen Lalonde para te convidar.
Jenny piscou. Karen Lalonde era uma líder de torcida. Bela. Brilhante.
Magné ca.
— Ele a largou por mim?
— Eles estavam indo mal há um tempo. Karen estava dando mole pra
Davoud Changizi. Mas Brian aguentou até agora.
— Mas...
— Me ouça, Jenny. Depois do que Tom fez, quem pode culpá-la por
procurar em outro lugar? Além disso, você provavelmente se diver rá; é
Brian De linger, pelo amor de Deus. Eu até topo ir com você. Sei que posso
conseguir um par em algum lugar.
— O que? — Michael uivou em protesto.
— Não se preocupe, Michael. Não vou para me diver r; é como as
ins tuições de caridade que nossas mães ajudam: tudo por uma boa
causa. Você não quer que Jenny e Tom voltem a ficar juntos?
Michael estava cuspindo novamente. Mas Dee estava sorrindo seu sorriso
mais selvagem.
— Vai lá, garota — disse ela. — Faça isso.
— Agora, vamos lá — disse Audrey. — Se nos apressarmos, poderemos
encontrá-lo antes que o sinal toque. Allez2! Será moleza.
E foi. Brian pareceu surpreso quando Jenny se aproximou, mas uma luz se
acendeu em seus olhos. Vendo essa luz, Jenny de repente soube que ele
não havia achado outro par.
Era estranho um formando olhar para ela assim. De repente ela se
perguntou novamente se era justo fazer isso. Pensou nos ditados de Aba,
os que a avó de Dee havia colado no espelho em seu banheiro. Um simples
cartaz com letras à mão dizendo:
Não faça o mal. Ajude quando puder. Pague o mal com o bem.
No jogo, Jenny havia entendido o quanto essas regras eram necessárias se
o mundo não se tornasse o po de lugar que Julian disse que era. Ela
resolveu viver de acordo com eles. Aquilo não iria dar certo.
Mas já era tarde demais agora. Audrey conversara com Brian, provocando-
o, deixando-o saber para o quê Jenny estava ali. Tudo estava sendo
arranjado.
— Vou buscá-la às sete — Brian estava dizendo e havia algo como emoção
em seu rosto. Ele estava olhando para os olhos dela, para os cabelos sobre
os ombros. Jenny não conseguia dizer a ele que havia mudado de ideia
agora.
— Tudo bem — Ela disse fracamente e deixou Audrey levá-la embora.
O que eu fiz? Eu nem tenho um ves do.
O sinal tocou. Ela, Michael e Audrey nham álgebra juntos, e depois Jenny
ia para Aplica vos de Computador. Foi aí que a teoria de Michael sobre
modelagem cerebral foi posta à prova.
Tudo começou com o teclado se sujando. O parceiro de Jenny estava
ausente, então ela estava sozinha em seu computador, um IBM tão lento
quanto uma geladeira velha.
Ela estava digitando o próprio nome quando a tecla J ficou presa. Ela mal a
tocara com o indicador direito, mas os Js con nuaram do outro lado da
linha. Eles chegaram à margem direita e con nuaram, chegaram à borda
da tela e con nuaram.
A tela digitalizou para a direita e o restante do documento de Jenny se
moveu para a esquerda, desaparecendo. Ela olhou horrorizada, seu
primeiro pensamento de que havia quebrado o computador. Jenny amava
computadores, diferentemente de Dee, que odiava tecnologia, mas nha
que admi r que havia algo um pouco estranho neles, um pouco enervante.
Como se as coisas pudessem acontecer inesperadamente na tela. Quando
criança, depois de um dia brincando com o PC do pai, ela às vezes sonhava
com cenas bizarras e jogos impossíveis aparecendo no monitor. Como se
um computador não fosse apenas uma máquina, mas algum po de
conexão que pudesse se conectar ao desconhecido.
Agora seus olhos se arregalaram quando os Js con nuaram. E assim por
diante. Isso não estava certo, não poderia estar. Onde estava a quebra de
linha? As letras devem cair na próxima linha.
Elas não fizeram. Elas con nuaram. Uma linha de S a ngiu a borda da tela
e depois recuou quando a tela digitalizou para a direita, depois subiu
novamente para a borda.
Como uma cobra. Ou algo pulsando.
Os dedos de Jenny estavam formigando; havia um rastejamento entre as
omoplatas. Isso estava errado. Ela nha uma terrível sensação da distância
sica que a linha de Js havia percorrido. Era como se ela es vesse no
espaço em algum lugar, muito à direita do documento original e indo mais
longe. Estava perdida em algum lugar do espaço virtual e estava
aterrorizada com o que poderia ver lá.
JJJJJJJJJJJJJJJJJJJJJJJJJJJJJJJJJJJJJJJJJJJJJ
Jenny estava pressionando Escape con nuamente desde que a tecla estava
emperrada. Agora ela apertou Enter para dar um duro retorno, para
quebrar a linha. Mas nada aconteceu.
JJJJJJJJJJJJJJJJJJJJJJJJJJJJJJJJJJJJJJJJJJJ
Ai, Deus, o que havia ali? Para onde estavam indo? Já estavam passando da
borda do documento original, algo que não podia acontecer naturalmente
porque não havia espaço. Elas estavam além de qualquer margem possível.
Era como velejar pela borda do mundo.
Jenny buscou na mente o código de reescrita da tela e o digitou. Nada. Ela
apunhalou a tecla Break. Nada. Então, com os dentes afundados no lábio,
pressionou Control / Alt / Delete.
A combinação deveria ter reiniciado o computador. Isso não aconteceu. A
tela brilhava em um azul profundo e bonito. Jenny nunca nha notado
antes o quão azul aquela tela realmente era. Uma cor vívida além da
imaginação.
Os S brancos subiam sem parar. Jenny sen a o próprio corpo a ponto de
cair. Ela estava muito longe...
Ela estendeu a mão e fez algo que o professor de computação os nha
ameaçado de morte se fizessem. Desligou o provedor principal do
computador. Privando-o de eletricidade, matando-o no meio do
executamento, para fazê-lo falhar.
Só que ele não apagou.
O interruptor estava desligado, a luz da CPU estava apagada - mas os S
con nuavam indo, pulsando e disparando.
A respiração de Jenny parou. Ela olhou incrédula. A mão foi para o monitor
e se atrapalhou frene camente com o botão de ligar. Ele estalou sob seus
dedos; a luz do monitor se apagou.
— O que você está fazendo? — a garota à esquerda dela ofegou.
O monitor ainda brilhava em azul. Os Js sumiram e Jenny arrancou o
teclado da tomada.
Ela teve que parar isso. Algo estava terrivelmente, inimaginavelmente
errado, e ela teve que parar aqueles J antes que...
— Sr. Godfrey! — a garota à esquerda dela choramingou. — Sr. Godfrey, a
Jenny...
Jenny teve apenas um instante para ver o que aconteceu a seguir. Mesmo
com o teclado desligado, os S con nuaram - ou pelo menos ela achou que
sim. Era di cil dizer, porque tudo aconteceu muito rápido. Houve um flash
brilhante, a tela ficou incrivelmente branca, e uma pós-imagem azul fixou-
se em suas re nas. Então o monitor ficou escuro.
O mesmo aconteceu com as luzes da sala, e todos os outros computadores.
— Veja o que você fez! — a garota ao seu lado sibilou.
Jenny sentou-se, mal respirando. Puxar o cabo do teclado não poderia ter
causado um blecaute. Mesmo travar o computador não deveria ter feito
isso. A sala não estava totalmente escura, mas estava muito escuro; as
janelas eram escuras para proteger o equipamento. Impressionada com a
escuridão, Jenny viu cata-ventos e filamentos de azul brilhante.
Ah, por favor, ela pensou, mantendo-se o mais imóvel possível. Ela podia
sen r seu coração batendo na garganta. Então ouviu algo debaixo das
mesas do computador.
Suave como uma ba da de par da, mas audível. Um som em movimento,
como uma corda sendo arrastada. Como algo deslizando pelo chão. Em sua
direção.
Jenny girou a cabeça, tentando localizá-lo. A voz do professor parecia
distante. O som deslizante estava se aproximando, ela podia ouvir
claramente agora. Como uma folha seca soprando no chão. Iniciando e
parando. Ondulando-se. Como os S. Vindo direto para suas pernas.
Estava quase aqui. Quase debaixo da mesa de Jenny. E ela não conseguia
se mexer; estava congelada.
Ela ouviu um assobio como está ca. Como...
Algo roçou sua perna.
Jenny gritou. Livre de sua paralisia de uma só vez, ela pulou, batendo o pé.
A coisa a escalhou novamente, e Jenny a agarrou, estrangulando-a,
tentando matá-la...
...e se viu segurando o fio do teclado.
Deve ter caído sobre a borda da mesa quando ela a puxou e ficou
pendurado lá. Jenny estava segurando seu comprimento em espiral com
tanta força que podia sen r os dentes nas palmas das mãos. Tão perto que
ela podia ver claramente. Apenas uma corda.
As luzes se acenderam. As pessoas estavam reunidas ao seu redor,
colocando as mãos nela, fazendo perguntas.
É apenas o seu cérebro fazendo modelos, ela disse a si mesma
desesperadamente, ignorando todos os outros. O computador funcionou
mal e você pirou. Ouviu uma está ca quando a energia foi desligada, e se
assustou mais e transformou-a em um silvo. Mas não era real. Eram
apenas modelos no seu cérebro.
— Acho melhor você ir para casa agora. — disse Godfrey. — Você parece
precisar descansar um pouco.
---
— Eu entendi agora — disse ela à Michael naquela noite. — Deve ter sido
algo a ver com o no-break, a fonte de alimentação ininterrupta. É um po
de bateria que mantém os computadores funcionando mesmo quando a
energia acaba.
— Ah, sim — disse Michael, que sabia muito pouco sobre computadores
mas nunca admi a isso.
— Foi isso que manteve o computador funcionando, mas de alguma forma
consegui explodir todo o sistema — disse Jenny. — Isso derrubou a
energia, e todo o resto estava em minha mente.
— Deve ter sido muito engraçado você segurando esse cordão — riu
Michael.
Eles conversaram sobre o que havia acontecido com ele e os outros
naquela tarde. Ele, Dee e Audrey haviam saído juntos e cobriram a maior
parte da área entre Ramona e Anchor Street, mas não encontraram nada.
Jenny contou o que havia dito à Dee e Audrey antes. Estava bem agora. Ela
dormiu a tarde toda. Sua mãe queria levá-la ao médico, mas Jenny disse
que não. Estava muito orgulhosa de si por perceber que tudo estava em
sua mente e planejava ficar mais calma no futuro.
— Bem, isso é bom — disse Michael. Sua voz soou surpreendentemente
fraca para alguém cuja teoria havia sido confirmada. — Hã, Jenny...
— O quê?
— Ah, nada. Vejo você amanhã. Se cuida.
— Você também — Jenny disse, um pouco alarmada. — Tchau.

Michael olhou para o celular que nha acabado de desligar. Então olhou
inquieto para a janela do quarto. Ele se perguntou se deveria ter contado a
Jenny, mas ela nha muito para se preocupar. Além disso, não havia razão
para manchar sua própria teoria brilhante. Era apenas estresse pós-jogo, e
ele estava tão sujeito à isso quanto qualquer outra pessoa.
Estresse. Tensão. No seu caso, combinado com um temperamento
bastante nervoso. Michael sempre alegou sem vergonha ser um covarde.
Isso explicaria a sensação que teve o dia todo de estar sendo vigiado. E não
havia nada realmente se movendo para fora daquela janela. Afinal, seu
quarto era no segundo andar.

Audrey se es cou em sua camisola Chris an Dior e se depositou o mais


aleatoriamente possível nos lençóis de ce m de pêssego. Mesmo depois
de quarenta e cinco minutos na jacuzzi, seus pés ainda doíam. Ela nha
certeza de teria calos. Pior, não conseguia se livrar da sensação estranha
que vera desde aquela tarde. Era o sen mento que costumava ter ao
entrar em uma sala de olhos nela. Mas esses olhos não estavam
admirando-a. Eram vigilantes e maliciosos.
Ela sen u como se algo a es vesse seguindo. Perseguindo-a.
Provavelmente apenas sen mentos remanescentes do susto de ontem.
Não havia nada com o que se preocupar; ela estava a salvo em casa. Na
cama. Audrey se es cou novamente e sua mente vagou. C'est ok. Va bine.
Ela fechou os olhos e dormiu.
E sonhou, agradavelmente. Era uma gata. Não é uma desajeitada e
repulsiva como o de Jenny, mas um elegante da raça abissínio. E estava
enrolada com outro gato, que a banhava.
Audrey sorriu responsivamente, abaixando a cabeça, expondo a nuca à
sensação sedutora. A língua do outro gato era áspera, mas agradável. Deve
ser um gato grande, ela pensou, meio acordada. Talvez um gre. Talvez...
Com um grito agudo, Audrey acordou. Podia jurar que a sensação a seguira
para fora do sonho. Ela sen u uma língua áspera lambendo seu pescoço.
Audrey bateu a mão na nuca e sen u a umidade lá. Um cheiro estranho e
almiscarado encheu o quarto e ela quase bateu no abajur ao ligá-lo. Então
olhou ao redor descontroladamente, procurando a coisa que estava em
sua cama.
Dee acordou assustada. Pelo menos pensou que nha acordado, mas não
conseguia se mexer. Alguém estava debruçado sob ela.
O quarto estava muito escuro. Não deveria estar, porque Dee gostava de
dormir com a janela aberta, as cor nas fechadas. Respirar ar fresco, não o
velho e refrigerado que saía de ares-condicionados.
Esta noite ela deve ter esquecido de abrir as cor nas. Dee não sabia dizer
porque não conseguia mexer a cabeça. Só podia ver o que estava
diretamente acima dela. A figura.
Era uma escuridão espessa contra a escuridão mais fina do quarto. Era uma
forma humana, de cabeça para baixo, porque estava inclinada do lado da
cabeceira da cama.
O coração de Dee estava batendo como um martelo. Ela podia sen r seus
lábios se afastarem de seus dentes selvagemente. Então ela percebeu algo
horrível.
CAPÍTULO 07

O lado da cabeceira - a figura estava inclinada sobre ela do lado da


cabeceira. Mas havia uma parede lá. Estava encostado na parede.
— Saia de perto de mim!
Gritar quebrou sua paralização. Dee saltou da cama, aterrissando em um
emaranhado de lençóis no meio do quarto. Chutou os lençóis livres e
estava no interruptor de luz perto da porta em um movimento. A luz
encheu o quarto, brilhando nas paredes ocres.
Não havia figura sombria em lugar nenhum.
Em cima da cama, entre uma máscara africana e um pedaço de pano
bordado da Síria, estava um cartaz. Um pôster de Bruce Lee. Era
exatamente onde a figura estava.
Dee aproximou-se devagar, cautelosamente, pronta para qualquer coisa.
Ela chegou perto e olhou para ele. Apenas um pôster comum. A imagem
de Bruce Lee olhou brilhando sobre sua cabeça. Havia algo quase
presunçoso em sua expressão...
Dee abruptamente estendeu a mão e arrancou o pôster da parede,
espalhando alfinetes. Ela o amassou com as duas mãos e o jogou na
direção geral da cesta de lixo. Então se recostou na cabeceira da cama,
respirando com dificuldade.
---
Zach estava deitado por horas, incapaz de dormir. Muitos pensamentos
lotavam seu cérebro. Pensamentos e imagens.
Ele e Jenny quando crianças. Brincando de índios no pomar de cerejas.
Brincando de piratas no riacho. Sempre bricando de alguma coisa, perdidos
em algum mundo imaginário. Porque mundos imaginários eram melhores
que o real. Mais seguros, Zach sempre pensou.
Zach respirou com dificuldade. Seus olhos se abriram e ele gritou.
Suspenso no ar acima dele estava a cabeça de um veado de doze pontas.
Estava pendurada a cen metros do nariz, tão perto que seus olhos escuros
podiam vê-lo claramente. Mas ele estava paralisado. Ele queria torcer para
o lado, se afastar, mas seus braços e pernas não obedeciam.
Estava caindo sobre ele!
Todo o seu corpo deu um empurrão terrível e adrenalina estourou através
dele. Seu braço se levantou para afastar a coisa. Seus olhos se fecharam,
antecipando o golpe.
Isso nunca veio. Ele largou o braço, abriu os olhos.
Ar vazio acima dele.
Zach atacou de qualquer maneira. Só acreditando que nha sumido
quando sua mão não encontrou resistência.
Ele se levantou e acendeu as luzes. Não ficou olhando ao redor do quarto,
no entanto. Desceu as escadas, para a sala, acendendo as luzes lá.
Na parede de painéis de madeira onde pendiam os troféus de seu pai, a
cabeça de doze pontos descansava em seu lugar habitual.
Zach olhou nos olhos de vidro líquido-escuro. Seu olhar percorreu os
esplêndidos chifres, o focinho chocantemente delicado, o brilhante
pescoço marrom.
Tudo era real e sólido. Muito pesado para se mover, preso à parede.
O que significa que talvez eu esteja enlouquecendo. A imaginação se
tornou completamente selvagem. Seria uma risada, não seria, passar pelo
jogo e depois voltar para casa e perder a cabeça por nada?
Haha.
A cabeça do veado estava imóvel como uma fotografia ao seu redor.
Ele não iria dormir esta noite. Normalmente, ele teria ido ao seu quarto
escuro na garagem e feito algum trabalho. Era o que sempre fazia antes,
quando não conseguia dormir.
Mas isso nha sido antes. Hoje à noite, Zach prefere apenas olhar para o
teto. Nada mais servia para nada.

— Alucinação hipnopômica — disse Michael a Dee na manhã seguinte. — É
quando você pensa que acordou, mas sua mente ainda está sonhando. A
figura sombria no seu quarto é um exemplo clássico. Eles até têm um
nome para ela - a Síndrome da Velha Hag. Porque algumas pessoas
pensam que é uma velha senhora sentada sob seu peito, paralisando-os.
— Certo — disse Dee. — Bem, é assim que deve ter sido, então. Claro.
— O mesmo com você, Zach. — con nuou Michael, virando-se para olhá-
lo. — Mas a sua foi uma alucinação hipnagógica. Você pensou que ainda
não estava dormindo, mas seu cérebro já estava na terra dos lalala.
Zach não disse nada.
— E quanto a mim? — Audrey ques onou. — Eu estava dormindo, mas
quando acordei, meu sonho era verdadeiro. — Ela tocou as unhas polidas
na parte de trás do pescoço, logo abaixo do toque francês de cobre polido.
— Eu estava molhada.
— Suor. — Michael disse sucintamente.
— Eu não suo.
— Bem, transpiração feminina, então. Está fazendo muito calor.
Jenny olhou para o grupo na colina. Todos pareciam tão calmos e racionais.
Mas o sorriso de Michael estava tenso e Zach estava mais pálido do que
nunca. A energia nervosa de Dee era como um campo elétrico. Os lábios
de Audrey estavam pressionados juntos.
Apesar das palavras corajosas, todas estavam no limite.
E onde está Tom?, Jenny pensou. Ele deveria estar aqui. Não importa o que
pensa de mim, ele deveria estar aqui pelo bem dos outros. O que ele está
fazendo?
— Ouvi dizer que havia um corpo encontrado no sopé de Santa Ana —
disse Dee. — Um cara desta escola.
— Gordon Wilson — disse Audrey, franzindo o nariz. — Vocês sabem,
aquele veterano com as botas de caubói. As pessoas dizem que ele
atropela gatos.
— Bem, ele não vai atropelar mais. Eles acham que um leão da montanha
o pegou.
---
Tom ouvira falar do corpo ontem à tarde e seu primeiro pensamento
irracional fora: Zach? Michael?
Mas os dois estavam seguros. E Jenny estava segura na escola hoje -
embora talvez a escola também não fosse tão segura. Ontem, ela foi
mandada para casa durante a aula de aplica vos de computador depois
que algo - era di cil descobrir exatamente o quê pelas histórias conflitantes
- aconteceu.
Um breve pensamento passou por sua mente que ele poderia ligar para ela
e perguntar, mas Tom já havia escolhido seu curso. Ele não podia mudar
isso agora, e ela provavelmente não iria querer que ele mudasse. Ele a viu
no carro, aquele olhar quando a música começou. Assustado, sim, mas
com algo por baixo do medo. Ela nunca nha sido assim para ele.
Isso não importava. Ele a protegeria de qualquer maneira. Mas ontem,
sabendo que ela estava em casa para sempre, ele rou a tarde de folga e
foi para a delegacia. Ele usou charme em uma dete ve e aprendeu
exatamente onde o corpo fora encontrado.
Hoje ele estava matando aulacompletamente. Os professores começariam
a fazer perguntas sobre isso em breve.
E daí?
Tom encontrou o leito seco do riacho. Não era muito longe da famosa
trilha Bell Canyon, onde uma criança de seis anos havia sido atacada por
um leão da montanha. O ar estava perfumado com sálvia.
Havia uma fita amarela de "cena do crime" enrugada ao longo do leito do
riacho e pequenas bandeiras de várias cores plantadas no chão. Tom
desceu a encosta e ficou onde minúsculos traços de uma mancha escura
nas rochas ainda apareciam.
Ele olhou ao redor. Um lugar na margem oposta nha visto muita
a vidade. O cacto havia sido quebrado, a erva daninha do abacaxi
arrancada. Havia pegadas na terra.
Tom seguiu a trilha até uma encosta coberta de sálvia roxa. O carvalho vivo
costeiro e os sicômoros espalhados lançam uma sombra convida va nas
proximidades.
Ele estudou o chão.
Depois de um momento, começou a andar devagar em direção às árvores.
Ele contornou a helva e chegou a três sicômoros velhos, tão próximos que
seus galhos estavam entrelaçados.
O ar estava mais pesado aqui. Tinha um cheiro estranho. Muito fraco, mas
perturbador. Feral.
Como um predador.
Às vezes, havia enormes manchas de hera venenosa sob essas árvores
velhas. Tom olhou com cuidado, depois mexeu os galhos no chão com o pé.
O cheiro ficou mais forte. Algo pesado permaneceu aqui por algum tempo.
Ele se virou e refez os passos lentamente.
Então, ele viu. Em uma rocha empoeirada diretamente entre as árvores e o
local onde a margem do riacho foi perturbada. Um respingo de preto como
piche. Uma substância espessa e viscosa que parecia borbulhar nas bordas.
A respiração de Tom assobiou e ele se ajoelhou, olhos estreitados.
Não havia sinal de que nada vesse sido raspado. Ou a polícia não nha
visto ou não se importava. Claramente, não era o sangue de nada na terra.
Não parecia nada importante.
Mas era. Isso era muito importante. Tom pegou um canivete suíço e mexeu
um pouco no lixo para examiná-lo. Tinha um cheiro estranho e
almiscarado, e se espalhava muito fino, não era preto, mas vermelho.
Então ele se sentou sobre os calcanhares e fechou os olhos, tentando
manter o controle pelo qual era famoso.
---
Na quinta-feira, Jenny percebeu que Zach nha olheiras e Dee estava mais
sal tante do que nunca. O rosto de Michael estava manchado, e uma das
unhas de Audrey parecia realmente mordida.
Todos estavam caindo aos pedaços.
Por causa dos sonhos. Isso era tudo o que eram. Nada realmente
aconteceu à noite, nada os machucou. Mas os sonhos foram suficientes.
Na sexta-feira, eles estavam programados para irem distribuir panfletos,
mas Jenny teve que parar primeiro na Associação Cristã de Jovens, a alguns
quarteirões do Centro. E foi aí que algo realmente aconteceu finalmente.
Jenny estava esperando tanto tempo, procurando por tanto tempo, que ela
deveria estar preparada. Mas quando chegou a hora, ela descobriu que
não estava preparada.
Estava conversando com a sra. Birkenkamp, a treinadora de natação. Jenny
era voluntária às sextas-feiras para a aula de natação para crianças
deficientes. Ela adorava isso e odiava perdê-la.
— Mas preciso faltar — ela disse miseravelmente. — E talvez na próxima
sexta-feira também. Eu deveria ter lhe contado antes, mas esqueci...
— Jenny, está tudo bem.
Jenny levantou os olhos para os azuis claros que a olhavam com firmeza.
Havia algo tão sábio neles, que Jenny teve o repen no impulso de se jogar
nos braços da mulher e contar tudo a ela.
A senhora Birkenkamp era a heroína de Jenny há anos. Ela nunca desis u
ou perdeu a fé. Ela ensinou uma criança sem braços a nadar. Talvez vesse
uma resposta.
Mas o que Jenny poderia dizer? Nada em que um adulto acreditasse. Além
disso, cabia a Jenny fazer as coisas por si mesma agora. Ela não podia mais
confiar em Tom; ela nha que cuidar de si mesma.
— Eu vou ficar bem — disse ela, instável. — Diga a todas as crianças que
mandei um "Oi"...
Foi quando Cam entrou.
Dee estava atrás dele. Ela estava esperando lá fora em seu jipe.
— Ele veio do Centro. Ele não fala com ninguém além de você — disse ela.
Cam disse simplesmente: — Eu a encontrei.
Jenny ofegou. Ela realmente ficou tonta por um instante. Então disse: —
Onde?
— Eu peguei o endereço dela. — Cam enfiou a mão no bolso de seus jeans
justos e puxou um pedaço de papel sujo.
— Certo — disse Jenny. — Vamos.
— Espere — disse a sra. Birkenkamp. — Jenny, o que é isso tudo...
— Está tudo bem, Sra. Birkenkamp — Jenny disse, girando e abraçando o
treinador esbelto. — Tudo vai ficar bem agora. — Ela realmente se sen a
assim.
Cam os levou até a casa.
— O nome dela é Angela Seecombe. A irmã mais velha de Kimberly Hall,
Jolie, conhece um cara que a conhece. Esta é a rua.
Filbert Street. À leste da Ramona Street, onde PC morava, ao sul de
Landana. Audrey e Jenny es veram lá, distribuindo panfletos.
Mas não entraram nesta casa amarela de dois andares com a cerca de ferro
preto lascada por nta. Jenny não conseguia se lembrar o porquê, mas elas
não haviam sido autorizadas a entrar ali.
— Você fica aqui — disse ela. — Eu tenho que fazer isso sozinha. Mas,
Cam, obrigada. — Ela se virou para olhá-lo, aquele garoto durão, com
cabelos finos como dentes-de-leão, cuja vida mudara porque a irmã havia
ido a uma festa.
Ele deu de ombros, mas seus olhos encontraram os dela, gratos pelo
reconhecimento.
— Eu queria ajudar.
Ninguém respondeu à porta da casa amarela. Jenny apertou a campainha.
Ainda sem resposta. Mas fracamente, por dentro, ouvia-se o som de um
aparelho de TV.
Jenny olhou para a garagem. Não nha carro lá. Talvez não tenha adultos
em casa. Ela acenou para Dee e Cam para ficarem no carro, depois deu a
volta na lateral da casa. Destrancou o portão de ferro rangente e caminhou
através de espigas conhecidas como "rabo de raposa" na altura da coxa até
a varanda dos fundos.
Ela agarrou a maçaneta da porta dos fundos com firmeza. Então lançou um
olhar para o céu, respirou fundo e tentou.
Estava aberta. Jenny entrou e seguiu o som da TV até uma pequena sala da
família.
Sentada em um sofá cor de ferrugem estava a Garota Chorona. Ela pulou
de espanto ao ver Jenny, derramando pipoca de microondas no tapete.
Seus longos cabelos escuros balançavam sobre os ombros. Seus olhos
assombrados estavam arregalados e sua boca estava aberta.
— Não tenha medo — disse Jenny. — Eu não vou te machucar. Já disse
antes, preciso falar com você.
O ódio passou pelo rosto da garota.
— Eu não quero falar com você! — Ela correu para o telefone. — Estou
chamando a polícia; você está invadindo minha casa.
— Vá em frente e ligue para eles — Jenny disse com uma calma que não
sen a. — E eu direi que você sabe de coisas que não contou sobre a
manhã que o PC desapareceu. Você o viu, não é? Você sabe para onde ele
foi.
Ela estava blefando. Angela havia ameaçado contar no começo; no
banheiro, ela disse que poderia provar que PC não matara Summer. Mas
ela não contou - o que significava que não queria. Jenny estava apostando
que Angela preferia contar a ela do que a polícia.
A garota não disse nada, sua mão esbelta e bronzeada descansando no
telefone frouxamente.
— Angela. — Jenny foi até ela como havia feito quatro dias atrás no
banheiro da escola. Ela colocou as mãos nos ombros da garota,
gen lmente desta vez. — Você viu PC, não viu? E viu o que ele nha
consigo. Angela, você tem que me dizer. Você não entende o quanto é
importante. Se não me disser, o que aconteceu com o PC pode acontecer
com outras pessoas.
Os pequenos ossos sob as mãos de Jenny se ergueram quando Angela
soltou um suspiro trêmulo.
— Eu odeio você.
— Não, você não odeia. Você quer algo para odiar porque isso te machuca.
Eu entendo. Mas não sou sua inimiga, e não sou uma vadia ou uma
patricinha. Sou apenas outra garota como você, tentando lidar, tentando
impedir que algo ruim aconteça. E eu também me machuco.
Olhos escuros e pensa vos estudaram seu rosto.
— Sério?
— Sim. Até demais. E se você não acredita, não é tão inteligente quanto
parece. — O nariz e os olhos de Jenny estavam ardendo. — Summer
Parker-Pearson foi uma das minhas melhores amigas. Eu a perdi. Agora
também perdi meu namorado por isso. Só não quero que algo pior
aconteça - o que acontecerá, se você não me contar. Me ajude.
Os olhos de Angela caíram, mas não antes que Jenny visse o brilho das
lágrimas. Jenny falou suavemente:
— Se você sabe onde o PC foi naquela manhã, precisa me dizer agora.
Angela encolheu os ombros nas mãos de Jenny e se virou. Seu corpo
inteiro ficou tenso por um momento, depois caiu.
— Eu não vou te contar, mas eu vou te mostrar — disse ela.
— Jenny? Você está aí?
A voz de Dee, da porta dos fundos. Quando Dee apareceu, de olhos
estreitos e se movendo como uma onça, Jenny estendeu a mão
rapidamente para Angela.
— Está tudo bem. Ela é minha amiga. Você pode mostrar à nós duas.
A garota hesitou, depois assen u, cedendo.
Para surpresa de Jenny, ela não foi até a porta da frente, mas as conduziu
para fora. Cam as seguiu através dos rabos de raposa. O quintal descia para
uma densa vegetação; havia muito mais terra aqui do que Jenny imaginara.
Ao lado de um amontoado de árvores, havia um galpão de ferramentas
deformado e inclinado.
— Pronto — disse Angela. — Foi para onde o PC foi.
— Ah, não, você não vai abrir. — Jenny pegou Dee no meio da caminhada e
a segurou. — Não é hora de abrir as portas. Lembra do jogo?
Angela estava mexendo com um grande medalhão an quado que enfiara
na blusa.
— Você precisa disso para abri-la, de qualquer forma. Eu tranquei
novamente. Depois. Era o nosso lugar secreto, meu e do PC. Ninguém mais
a queria.
Jenny pegou a chave.
— Então você o viu ir naquela manhã. E depois...?
— Slug entrou também. PC subiu na varanda e me acordou para pegar a
chave. Aquele é o meu quarto. — Ela apontou para uma janela do segundo
andar acima do telhado da varanda. — Então ele e Slug desceram,
destrancaram o galpão e entraram. Eu pude ver tudo do meu quarto.
Esperei que eles saíssem - geralmente eles apenas escondiam coisas lá e
saíam.
— Mas desta vez não.
— Não... então eu esperei e esperei, e fui me ves r. Quando vim aqui, a
porta ainda estava fechada. Então a abri, mas eles não estavam lá dentro.
— Ela virou Jenny de repente, seus olhos escuros enormes e brilhantes
com lágrimas não derramadas. — Eles não estavam lá dentro! E não havia
janelas e não saíram pela porta. E a chave estava no chão. O PC nunca
deixava a chave no chão; ele sempre trancava e me devolvia. Para onde
eles foram?
Jenny respondeu com uma pergunta.
— Havia algo mais no chão, não havia? Além da chave?
Angela assen u devagar.
— Uma... — Jenny respirou. — Uma casa de papel.
— Sim. Uma coisa de bebê. Não era nem nova, estava meio amassada, e
presa com fita adesiva do eletricista do galpão. Não sei por que eles
pegaram. Eles geralmente pegavam coisas como... — Ela Interrompeu. Dee
olhou para Jenny, diver da com a admissão.
— Não importa — disse Jenny. — Pelo menos sabemos tudo agora. E ainda
deve estar lá dentro, se este lugar es ver trancado desde aquela manhã.
Angela assen u. — Eu não toquei em nada, apesar de... bem, eu meio que
queria olhar a casa. Mas não olhei; deixei lá no chão. E ninguém mais tem
uma chave.
— Então vamos buscá-la. — disse Jenny. No fundo, ela estava tremendo. A
casa de papel estava aqui. Eles a encontraram. E não é de admirar que os
tenha escapado por tanto tempo, escondida em um depósito de
ferramentas trancado usado por delinquentes juvenis para esconder bens
roubados.
— Posições contra monstros? — Dee sugeriu com um flash de dentes
brancos. Ela estava claramente gostando disso.
— Certo. — Jenny assumiu uma posição ao lado da porta. Dee ficou na
frente dela em uma posição de kung fu, pronta para chutá-la. Foi assim que
elas aprenderam a abrir portas na casa de papel. — Afaste-se, Angela. Você
também, Cam.
— Agora. — Jenny girou a chave e abriu a porta.
Nada de assustador aconteceu. Um retângulo de luz solar caiu no galpão
empoeirado. Jenny bloqueou com sua própria sombra enquanto entrava
na porta. Então entrou e Dee bloqueou a luz.
— Entre, eu não posso ver...
Então ela viu, e sua mente girou.
A caixa branca em branco estava no chão, aberta. Ao lado, estava a casa de
papel que Jenny havia descrito para a polícia. Uma casa vitoriana, três
andares e uma torre. Azul.
Dee fez um som gutural.
Quando Jenny viu a casa pela úl ma vez, ela fora esmagada para caber na
caixa. Agora estava diferente. Tinha sido endireitada e reforçada com fita
preta. Mas não foi isso que fez a cabeça de Jenny girar e prender a
respiração. Não foi isso que fez seus joelhos começarem a ceder.
A casa de papel fora explodida.
Em pedaços. O telhado se fora. Paredes exteriores em farrapos. Pisos
estripados.
Como se algo muito grande vesse explodido por dentro.
No chão próximo, arranhada impossivelmente profundamente no
concreto, havia uma marca. A runa Uruz. Uma letra de um alfabeto mágico,
um fei ço para perfurar o véu entre os mundos. Jenny já nha visto isso
antes no interior da caixa que os levou ao Mundo das Sombras. Tinha o
formato de um U angular e inver do, com um golpe mais curto que o
outro.
Agora ela estava olhando de cabeça para baixo, de modo que deveria
parecer um U normal. Mas essa runa em par cular era muito desigual,
muito pequena. De onde ela estava, parecia quase um quadrado.
Como uma assinatura.
Mesmo quando Jenny se virou para Dee, ela se sen u caindo.
— Estamos muito atrasados — ela sussurrou. — Ele está livre.
— Tudo bem — disse Dee, alguns minutos depois, ainda a segurando. —
Ok, ok...
— Não está tudo bem. — Jenny viu Cam e Angela espiando pela porta e
sua cabeça ficou um pouco mais clara. — Vocês dois precisam voltar.
Mas eles avançaram.
— É isso? O que você estava procurando? — Cam agachou-se junto à casa
em ruínas, seus olhos tão grandes e azuis quanto os de Summer. A luz da
porta fazia seus cabelos brilharem nas bordas. — O que aconteceu com
isso?
Os olhos escuros de Angela eram enormes e desesperados.
— O que aconteceu com PC?
Jenny olhou para a casa. Tinha sido destruída, todos os andares desfiados.
— Eu acho que ele provavelmente está morto — ela disse suavemente. —
Sinto muito.
A visão do sofrimento Angela clareou um pouco sua cabeça e a rou de si
mesma.
— Você vai contar à polícia? Sobre o PC, eu e este lugar?
— A polícia é inú l. — Jenny disse sombriamente. — Nós aprendemos isso.
Não há nada que eles possam fazer. Talvez nada que alguém possa fazer...
— Ela parou quando uma ideia lhe ocorreu. Uma esperança desesperada.
— Angela, você disse que não tocou em nada aqui, mas você tem certeza?
Você não viu nada no chão, viu? Tipo uma joia? — Angela balançou a
cabeça.
Jenny procurou de qualquer maneira. Estava dentro da caixa; talvez vesse
acabado de rolar. Isso não faria a polícia acreditar neles, mas poderia salvá-
la, se elas pudessem encontrá-lo e destruí-lo. Ela olhou na caixa aberta e
ao redor no chão de concreto, sacudiu as ruínas da casa de papel.
Mas não estava em lugar nenhum. O anel de ouro que Julian colocara em
seu dedo, o que ela tentou jogar fora, se foi.

CAPÍTULO 08

— O que vamos fazer?


Eles estavam na casa de Audrey, na segunda melhor sala da família, onde
nenhum adulto os perturbaria. Michael estava olhando para Jenny, com os
olhos de spaniel vidrados.
— Bem, essa é a questão, não é? — Zachary disse secamente. — O que
podemos fazer?
— Eu não sei — Jenny sussurrou.
A casa de papel - ou melhor, seus restos mortais - estava sobre a mesa de
café. Jenny trouxera com elas, para mantê-los seguros. Embora o que eles
fariam com isso, ela não nha ideia.
Ela pegou Angela e Cam pela mão antes de saírem da casa da garota.
Assustada como estava, queria agradecer-lhes e dar-lhes o conforto que
pudesse.
— Eu sei que não foi fácil nos ajudar — disse ela. — Agora você precisa
esquecer tudo isso, se puder. Somos nós que precisamos cuidar disso. Mas
sempre me lembrarei do que vocês fizeram, os dois.
Então ela e Angela, a vadia e a Garota Chorona, se abraçaram.
Lá fora, na Filbert Street, ela e Dee encontraram Tom. Seu RX-7 estava
estacionado atrás do jipe de Dee. Claramente, ele as estava seguindo,
embora Jenny ainda não entendesse o porquê. Agora ele estava sentado
ao lado de Jenny, seus olhos castanhos pensa vos.
— Eu não acho que eles vão machucá-la. — ele disse a ela. A ênfase na
úl ma palavra foi leve, mas percep vel.
— O que você quer dizer com eles?
— O lobo e a cobra. Como Julian os chamava? A Rastejadora e o
Espreitador.
— Tom, do que você está falando?
— Eles também saíram. Foi o lobo que seguiu você e Audrey na segunda-
feira. O Lobo das Sombras. Só ve um vislumbre disso naquela noite, mas
não era um cachorro.
Audrey engasgou.
— Eu tenho arranhões de lobo no meu carro?
— E aquela cobra, acho que talvez esteja rondando por aí também.
Jenny fechou os olhos, lembrando-se do deslizamento seco no chão da sala
de computadores. A escova contra a perna dela. O assobio.
— Ai, Deus, então tudo tem sido real — disse ela. — E os telefonemas - ai,
meu Deus, ai, meu Deus. Eles eram reais. Eles realmente estavam
dizendo... — Ela não conseguiu terminar.
— Modelos em seu cérebro uma ova. — disse Dee a Michael, que parecia
acabado. Ele inclinou a cabeça, segurando o cabelo desgrenhado com as
mãos.
— E os sonhos? — Audrey disse em voz baixa. — Você acha que eles eram
reais também? Havia algo na minha cama comigo?
— Parece que sim — disse Zach, com sa sfação mórbida. — Ou talvez
Julian possa nos fazer sonhar com o que ele quer.
— Temos que fazer alguma coisa — falou Dee.
— Como o quê? — Os olhos cinzentos de Zach brilhavam com uma lógica
devastadora. — O que podemos fazer contra Julian? Ainda mais com
aquela cobra e aquele lobo. Você não lembra como eles eram?
— Acho que foram eles que pegaram Gordie Wilson, aliás — disse Tom
calmamente. — Fui até o local onde o encontraram.
— Ah, ó mo. Não temos chance. — disse Michael.
— Olha, estamos todos em choque agora — opinou Dee. — Vamos nos
reunir neste fim de semana na casa de alguém e fazer planos. Podemos
passar o sábado todo pensando.
— Na do Tom talvez — disse Michael. — Vou estar lá de qualquer forma;
meu pai está indo para Nova York por uma semana.
Audrey olhou para Jenny, depois para Tom. Sua pele de camélia era rosa e
ela esfregou os cílios pon agudos com uma mão.
— Eu odeio dizer isso, mas não podemos — disse ela. — Pelo menos Jenny
e eu não podemos. Você está esquecendo o baile de formatura.
Tom olhou para cima.
— ...O quê?
— Jenny e eu vamos ao baile de formatura. — disse Audrey, impotente.
— Com Brian De linger e Eric Rankin — disse Michael, numa voz de a
miséria adora companhia.
Tom estava olhando para Jenny. Seu rosto estava perfeitamente branco e
as manchas verdes em seus olhos pareciam brilhar. Algo parecia ter dado
errado com sua boca - estava tremendo. Jenny olhou para ele com horror
absoluto, sua mente em branco. Então Tom disse lentamente:
— Entendo.
— Não — Jenny sussurrou, magoada. Ela nunca nha visto Tom assim.
Nem quando a avó morreu, nem quando o pai teve um ataque cardíaco.
Tom Locke, o invulnerável, não nha um rosto assim.
— Está tudo bem. Eu deveria ter esperado isso. — Ele levantou.
— Tom...
— Você deve estar segura o suficiente. Como eu disse, não acho que eles
vão machucá-la.
— Tom, ah, Deus, Tom...
Ele estava saindo pela porta. Jenny virou-se para Audrey e Michael,
irritada:
— Você estão felizez agora? O fizeram ir embora!
— Você acha que isso significa que ele não me quer no fim de semana? —
Michael perguntou, mas Dee falou seriamente.
— Ele não estava realmente aqui, Jenny. Ele não está mais conosco, Gata, e
você não pode fazê-lo ficar.
Jenny esperou um momento enquanto as palavras de Dee afundavam
lentamente. Era verdade. Não havia como negar. Jenny não nha perdido
nada agora, porque não nha mais nada a perder.
Ela se sentou e disse, sem expressão:
— Obviamente, não. E de alguma forma, eu também não acho que ir ao
baile com Brian vai ajudar. — Ela olhou para Audrey. Audrey, no entanto,
recusou-se a ficar perturbada.
— Quem sabe? Ele pode se sen r diferente quando vê você realmente
fazendo isso.
— Eu não vou fazer isso.
— Então você vai ligar para Brian e dar um fora nele no úl mo minuto?
— Sim. — Jenny procurou o número na agenda e discou.
— Olá, Brian? É Jenny...
— Jenny! Estou tão feliz que você ligou.
— Está? — Jenny vacilou.
— Sim, eu ia ligar para você, olhe, sou tão burro. Esqueci de perguntar qual
a cor do seu ves do.
— Meu ves do?
— Eu sei que deveria ter perguntado antes. — Sua voz estava cheia de
ansiedade e, ah, um entusiasmo quase angelical. — Não é que eu não
tenha pensado em você. A limusine está pronta e fiz reservas no L'Avenue.
Você gosta de comida francesa?
— Ah... — Jenny se sen u mole como algas. — Ah, com certeza.
— Ó mo. E seu ves do é de que cor?
Audrey se aproximou e estava inclinando a cabeça de cobre perto do fone
de ouvido.
— Diga a ele dourado. — ela sussurrou.
— Dourado — Jenny repe u automa camente, depois olhou para Audrey.
— Ah, não, não esse — sussurrou ferozmente.
— O quê? Dourado é ó mo. Te você amanhã.
Jenny desligou atordoada. Ela não nha sido capaz de dispensá-lo.
— Viu? — Audrey disse sombriamente. — Eu também estou presa. Pare de
me olhar assim, Michael. Eu nem gosto muito do Eric.
Dee se espreguiçou.
— Que diferença faz onde vamos estar? Eles podem entrar em nossas
casas, se quiserem.
Era verdade. E nada reconfortante. Jenny ainda não via como poderia ir ao
baile - ou como poderia sair disso agora.
---
— Não posso usar esse ves do — disse ela a Audrey. — Tom não me
deixou usá-lo nem com ele. Se ele ouvir que usei com Brian, ele terá um
ataque... — A voz dela sumiu quando uma nova esperança acendeu de
repente em seu peito.
Audrey sorriu sabiamente.
— Então, talvez, o baile fará algum bem no final. — disse ela
maliciosamente.
Jenny pegou o ves do que parecia ouro líquido e largou-o novamente. Ela
não podia acreditar que estava fazendo isso.
Por outro lado, Dee estava certa. Que diferença faria aonde Jenny
es vesse? Não havia lugar seguro. Pelo menos o Monarch Hotel era um
grande local público. Ela e Audrey estariam cercadas por pessoas.
Ontem à noite e hoje fora tudo muito quieto. Sem sonhos, sem
perturbações. A calmaria antes da tempestade? Ou talvez... talvez algum
milagre vesse acontecido e todas as coisas ruins vessem desaparecido.
Espontaneamente voltaram ao Mundo das Sombras. Talvez Julian a
deixasse em paz a par r de agora.
Não seja ridícula, Jenny. Ela suspirou e balançou a cabeça. Muita
preocupação havia exaurido sua energia e a colocava em um humor
fatalista.
Ela pegou o ouro líquido novamente. Era o ves do. O material era folha de
ouro, que mostrava um padrão su l de flores e folhas quando a luz ba a
no caminho certo - quase como uma tapeçaria. As cores eram ricas e
cin lantes, e o tecido fino era macio como a seda. Audrey estava louca por
ele, mesmo quando usava apenas preto e branco.
— Você precisa usar ele. — ela disse a Jenny, inclinando o tecido brilhante
de um lado para o outro sob as luzes e ignorando o bando de vendedoras e
vendedoras que sempre seguiam quando Audrey fazia compras.
— Mas Tom...
— Esqueça o Tom. Quando você vai parar de deixá-lo dizer o que ves r?
Você deve comprar este ves do. Com sua pele e cabelos dourados, será
extraordinário.
Então Jenny comprou. Mas ela estava certa; Tom não a deixaria usá-lo no
baile de formatura. Era muito curto, muito aderente, moldando-se a ela
como uma pele brilhante. Suas pernas pareciam tanto quanto as Dee
quase sempre.
Mas Jenny o ves u e pegou uma escova. Ela se inclinou, escovando, depois
se levantou, jogando o cabelo para trás. Passou os dedos pelos fios para
afofar e então foi até o espelho de bordo. Tinha que admi r; o ves do era
uma obra-prima. Uma obra de arte brilhante e sem vergonha. O cabelo
dela era uma massa de ouro escuro em volta do rosto, diferente da
aparência suave de sempre. Sua imagem inteira parecia tocada com ouro.
Ela parecia uma princesa. Se sen u como uma virgem pronta para o
sacri cio.
— Jenny. — Sua mãe estava batendo na porta do quarto. — Ele está aqui.
— Jenny olhou para si mesma por outro momento, irremediavelmente.
— Certo — ela disse e saiu. O queixo de Brian caiu quando a viu.
Infelizmente, o mesmo aconteceu com o Sr. Thornton.
— Jim, vamos, Jim — disse a mãe. Ela levou o pai de Jenny para a cozinha,
conversando com ele sobre o quão responsável Jenny era e como Brian
era.
— Essas flores são minhas? — Jenny perguntou, já que Brian ainda estava
boquiaberto. Ele estendeu a caixa do corpete, mudo. O plás co estava
nublado de névoa, mas quando Jenny o abriu, viu um buquê etéreo de
rosas em miniatura de limão. — Elas são lindas!
— Hã... — Brian piscou para as flores e depois balançou a cabeça
levemente. Ele as rou, olhou para o decote baixo dela. Ele a alcançou
duvidosamente, afastando-se. — Hã...
— Eu faço isso — Jenny disse e as colocou no ombro. Então colocou a flor
na lapela dele e eles foram embora.
A limusine era cor de champanhe e eles não estavam compar lhando com
ninguém. Brian estava bonito, loiro e bonito, com uma gravata-borboleta
azul royal. Todo o caminho até o restaurante, Jenny se concentrou nos
minúsculos botões brilhantes de seu smoking para não chorar. Ela nunca
nha saído com nenhum garoto além de Tom.
O jantar foi sem intercorrências. Brian ficou impressionado com tudo o que
ela disse e fez, o que o facilitou a se dar bem. Ele não era inteligente como
Tom, mas era um legal. Um cara muito legal.
Palmeiras ladeavam o caminho par cular do hotel. Era um cenário bonito e
onírico, um penhasco acima do mar. Mercedes e Cadillacs estavam
estacionados em todos os lugares e guardas de uniforme vermelho
corriam.
Quando Jenny saiu da limusine, começou a perceber algo. O baile de
formatura parecia um baile que alguma madrinha de fadas havia criado
com uma varinha. Tudo maior, melhor e mais brilhante. Mais adulto. Era
assustador, mas maravilhoso.
Eles caminharam entre colunas de mármore em um mundo encantado.
Acres de mármore italiano. Enormes urnas de flores - todas dispostas em
bom gosto requintadamente simples. Tapetes persas, reves mentos de
parede de seda, lustres de cristal boêmios.
Audrey deve estar adorando isso, pensou Jenny, parando em algum lugar
ao longo dos quilômetros do corredor para ver uma pintura a óleo.
Quando eles finalmente chegaram ao salão, Jenny respirou fundo.
Foi... fabuloso. No melhor sen do, como algo saído de um conto de fadas.
Como um castelo. Os tetos eram incrivelmente altos, com enormes lustres
em recessos profundos. Árvores em vasos - árvores de tamanho completo
entrelaçadas com pequenas luzes - ficavam aqui e ali entre as mesas. Em
uma das extremidades da sala, cor nas esguias foram fechadas para
revelar uma varanda, que Jenny imaginou olhar para o oceano.
— Está lindo. — Jenny respirou, esquecendo tudo por um momento.
— Com certeza é. — Quando ela olhou, Brian estava olhando para ela.
As mesas eram tão incríveis quanto todo o resto. Havia flores frescas em
bancadas de vidro soprado que chegavam acima da cabeça de Jenny
quando ela estava sentada. Em cada lugar havia uma pequena máscara
metálica como decoração.
— O Baile Mascarado da Meia-Noite — disse Brian, segurando um
prateado nos olhos. — Não ponha a sua, você é bonita demais sem ela.
Jenny desviou o olhar.
— Essas flores são lindas — disse ela às pressas. Elas eram. As rosas nham
um brilho dourado pálido diferente de tudo que ela já vira, e cheiravam tão
doce que quase a deixou tonta.
— Tenho que confessar, não posso aceitar o crédito por eles. Pedi rosas
brancas. A florista quase estragou tudo, mas ficou ó mo.
Jenny se mexeu. Por alguma razão, espinhos de inquietação a tocavam
delicadamente.
Nesse momento, alguns amigos de Brian apareceram. Um deles olhou para
Jenny, piscou e sussurrou algo para Brian que terminou com "Aposto que
você está planejando ficar até tarde!".
Brian corou. Jenny se inclinou sobre ele e disse diretamente para o outro
cara: "Vada via, cre no". Audrey havia lhe ensinado isso. Era algo como
"vai se ferrar, idiota", e parecia isso.
O cara saiu, murmurando:
— E eu que ouvi dizer que ela era fofa!
Brian, ainda corando, estava envergonhado e se desculpando. Um cara
legal, Jenny pensou, sen ndo pena dele. Um cara muito, muito legal...
Eles conversaram. Jenny olhou para a toalha branca de neve e os brilhantes
copos de cristal, brincou com seu programa de baile e seu bilhete de rifa.
Ela olhou para a borda oriental do tapete. Finalmente, porém, não havia
como evitar a falta de assunto que pairava sobre os dois.
— Você quer dançar? — Brian disse.
O que ela poderia dizer?
Tudo bem, ela pensou enquanto eles caminhavam no chão. Não é como se
você nunca vesse dançado com outro cara antes. Mas ela não nha,
obviamente. Tom não gostava. Além disso, ela sempre esteve com ele, e
qualquer garoto sempre soube disso.
Naturalmente, a próxima dança acabou sendo lenta. O salão estava escuro
o suficiente para ser român co. Os braços de Brian se acomodaram ao
redor dos ombros de Jenny, e ela apertou sua cintura o mais levemente
possível. Jenny descansou a cabeça no peito dele e olhou atentamente
para a mesa de bebidas. Era um buffet com tampo de mármore e enormes
urnas de flores de cada lado. Jenny concentrou-se em iden ficar as flores,
uma por uma. Então viu um vislumbre de cobre polido.
— Olhe, ali está Audrey! — ela disse. — Vamos vê-la!
Audrey estava usando um ves do preto atrevido com uma faixa de ce m
rosa nas costas. Diamantes brilhavam em seus ouvidos. Seus olhos
castanhos se arregalaram ao ver Jenny.
— Olha só você! Jenny, você está sensacional. Wunderschon3!
Elas conversaram um pouco. Outras pessoas passaram. Jenny viu ves dos
de todas as cores do arco-íris; viu gravatas-borboletas verde-limão, rosas e
xadrez. Mas finalmente Eric e Audrey saíram para dançar, e ela não teve
escolha a não ser seguir com Brian.
Quando a próxima dança lenta chegou, ela descansou rigidamente nos
braços de Brian, olhando para a madeira escura da pista de dança. Ele
estava muito interessado. Jenny nha visto a noite toda: o olhar em seus
olhos, a maneira como ele a segurava, a maneira como ele falava com ela.
Ele era um cara tão legal, tão bonito, e ela não sen u nada.
— Mais tarde, podemos ir à praia — ele estava dizendo.
— Aham — Jenny disse, pensando que ela nha que se afastar do cheiro
de loção pós-barba e se odiando por isso. Ela desejava desesperadamente
que alguém a resgatasse.
Alguém o fez.
Era outro cara, e ele queria interromper. Jenny tentou esconder sua
gra dão enquanto se transferia para o ombro do novo cara. Ele parecia um
veterano, embora ela não o reconhecesse porque ele estava realmente
usando uma daquelas máscaras temá cas. Uma preto.
Jenny não se importava com quem ele era. Ele a salvou de Brian e de sua
culpa por ter vindo com ele sob falsos pretextos. Ela viu agora que teria
que se desculpar com Brian antes que a noite terminasse, pedir desculpas
e explicar tudo. Ele provavelmente a odiaria. Provavelmente a deixaria
presa no hotel. Jenny meio que esperava que sim; isso a faria se sen r
melhor.
O novo cara a abraçou com muita leveza. Jenny flutuou em seus braços e
deixou sua mente voltar ao baile do ensino fundamental. Ela usava renda
de marfim, macia, român ca e an quada, do po que Tom gostava. Audrey
usava um ves do preto clássico diferente. O verão estava em água-marinha
pálida, com franjas por toda parte, como uma palheta. Tom parecia
maravilhoso em preto e branco severo. Depois, todos foram ao McDonald's
com suas roupas chiques, rindo e brincando. Tinha sido uma noite
maravilhosa, porque eles estavam juntos.
Agora aqui estava ela no país das fadas, cercada por estranhos. Esse
pensamento foi um pouco perturbador.
Ela e o novo cara se afastaram um pouco dos outros dançarinos. Na
verdade, ele parecia saber algo sobre dança, ou pelo menos era
semimóvel. Era mais escuro aqui perto da varanda. Jenny sen u-se
estranhamente isolada.
E, era curioso, mas tudo parecia ter diminuído. A música mudou. A banda
parecia ter começado em outra dança lenta, uma melodia assustadora de
uma vocalista que Jenny sabia, mas não conseguiu iden ficar no momento.
Sobrenatural. Estranho da parte deles fazer isso sem dar às pessoas a
chance de mudar de parceiro.
Melodia estranha também, mas linda. Foi a música que entrou no seu
sangue, que fez você se sen r estranho.
Jenny estava se sen ndo muito estranha. O tempo parecia estar se
es cando.
Ela não queria olhar para cima, porque isso era falta de educação, a menos
que você quisesse ser beijada. E Jenny não queria, independente do po
de música que fosse. Era mais seguro apenas manter a cabeça baixa.
Eles estavam no limiar da varanda agora e Jenny podia olhar para o
oceano. Era ainda mais escuro aqui, para que você pudesse ver o oceano
abaixo. Os holofotes refle am a água, parecendo um punhado de luas.
Estranhamente, não havia ninguém na varanda. Jenny pensaria que seria
apertada corpo a corpo pela mul dão, mas não havia ninguém aqui - ou
pelo menos ninguém que ela pudesse ver no escuro. Seu parceiro a estava
levando para o canto mais escuro.
Eu não deveria ir. Deus, vou ter que dizer Vada via cre no de novo.
Mas ela não conseguia resis r.
Ali, na varanda, ela podia sen r o ar noturno, um pouco frio nos braços e
na nuca. A música parecia distante. Ela não conseguia mais entender
palavras, apenas notas simples, puras e claras como gotas de água caindo
em uma piscina parada. Caindo lentamente. Jenny teve a estranha
sensação de que ela mesma estava caindo.
Tão alto quanto a música era o rugido do oceano. Eles estavam perto da
borda da varanda agora. As ondas estavam assobiando e quebrando na
praia abaixo. Um som misterioso, Jenny pensou, sua mente estranhamente
confusa. Um som sem forma, sem caracterís ca e sem fim. Como um
barulho branco...
mint-to....
De repente, ela estava acordada. Acordada, com calafrios a percorrendo e
um terror gelado no estômago. Não apenas seus dedos, mas os lados de
suas mãos estavam formigando.
Saia daqui!
Então, finalmente, tentou se afastar. Mas seu parceiro não a deixou. Jenny
estava presa em um punho de aço. Um dos braços dele estava prendendo
os braços dela, o outro estava segurando a parte de trás da cabeça.
Ela não conseguia se mexer. Não havia dúvida de gritar. Ela estava sozinha
com ele na varanda, separada pelo que pareciam quilômetros do resto da
dança. Ela não podia mais ouvir música, apenas o vento nas palmeiras e o
oceano batendo abaixo. Eles estavam muito perto de uma queda muito
longa.
Ela podia ver uma mecha do cabelo de seu parceiro agora, acima de uma
gola da camisa preta como o smoking. Ela não nha percebido isso antes -
ele estava todo de preto e seus cabelos eram louros. Mais louro que o de
Brian, mais louro que o de Cam. Quase branco - branco como geada ou
gelo ou névoa, branco como inverno. Branco como morte.
Uma voz sussurrou em seu ouvido:
— Faminto.
Não é assim. Mais longo.
— Faaaminnnnnto...
CAPÍTULO 09

Tudo ficou cinza.


O sangue rugiu nos ouvidos de Jenny como o oceano. Ela foi jogada de
volta, em um instante, para o momento em que ela e Tom e os outros
foram sugados para o Jogo, arrastados para o Mundo das Sombras. Ela
sen u a mesma correnteza arrastando-a agora, a mesma névoa escura
superando seus sen dos. O mesmo terror irracional e desamparado. Ela
estava caindo no vazio.
Ela não desmaiou. desejou poder, mas não o fez. Ficou nos braços dele,
mal suportando seu próprio peso, sen ndo a escuridão ao seu redor, e
permaneceu consciente.
Ele estava indo para matá-la. Ele era a voz no telefone. Ele enviou o Lobo
das Sombras atrás dela e Audrey, ele enviou a cobra atrás dela na aula de
informá ca. Ele matou Gordie Wilson.
Ela ainda podia ouvir o sussurro distorcido e maligno em sua cabeça:
— Faminto...
Jenny soluçou. O puro terror deu-lhe forças para recuperar seu próprio
peso, para tentar se libertar novamente. Para sua surpresa, ele deixou. Ela
deu dois passos para trás e subiu contra o parapeito da varanda. Então
apenas olhou para ele.
Seu primeiro pensamento foi que ela deveria estar mais preparada - mas
não havia como se preparar para Julian. Ele sempre foi um choque para os
sen dos.
Seus olhos atrás da máscara negra eram como cobalto líquido. Todo o seu
rosto estava sombreado. Seu cabelo brilhava na penumbra, tão branco
quanto a luz da lua na água.
Ele não era como um humano. Ele era mais afiado, mais feroz, mais
brilhante do que qualquer humano poderia ser. Mais real,o que era
estranho, já que era para ser o mundo real.
Ele estava no mundo dela agora, nem mesmo em algum lugar a meio
caminho como a loja More Games, que parecia exis r entre os mundos. Ele
estava aqui, andando por aí, capaz de qualquer coisa.
E agora irradiava ameaça. Perigo.
O coração de Jenny estava batendo tão forte e erra camente que ela
pensou que poderia quebrar.
— Rosas amarelas significam infidelidade, sabia? — ele disse casualmente.
Ela lembrou a voz dele agora. Uma vez longe, ela nha esquecido. Só se
lembrava do que pensara sobre isso, que era musical e elementar, como a
água correndo sobre rochas, mas isso realmente não dava nenhum sen do
de sua beleza ou de sua frieza.
Ela colocou a mão no buquê de rosas em miniatura no ombro. As lindas
flores pálidas com seu brilho dourado. Em sua mente, viu Brian piscando
ao vê-los, ouviu-o dizer: "Pedi rosas brancas. A florista quase estragou
tudo...".
— Você as enviou — disse ela. Sua voz saiu estranhamente sufocada e tão
abertamente assustada que ela teve vergonha. Ela queria arrancar as rosas,
mas suas mãos estavam tremendo.
— Claro. Você não sabia?
Ela deveria saber, mas nha sido muito estúpida; a noite toda nha sido
muito estúpida. Ela saiu com um garoto de máscara porque ele não se
parecia com Julian, esquecendo que Julian podia se parecer com qualquer
um que ele quisesse. Ou ela esqueceu? Talvez uma parte dela soubesse e
quisesse acabar logo com isso.
Com um bom mo vo. A úl ma vez que esteve com Julian, o traiu. Men u
para ele, o fez acreditar nela - talvez até confiasse nela. E então bateu uma
porta nele, pretendendo prendê-lo atrás dela para sempre. Jenny o deixou
preso como um gênio em uma garrafa. Ela só podia imaginar o que ele
deve ter sen do quando percebeu o que ela havia feito. Agora ele viera
por sua vingança.
— Por que você simplesmente não faz logo isso? — ela disse. Ficou mais
sa sfeita com sua voz dessa vez; estava claro, se não completamente
estável. Jenny morreria com dignidade. — Vá em frente e me mate.
Ele inclinou a cabeça loira-prateada levemente.
— Acha que é isso que quero fazer?
— Foi o que você fez com Gordie Wilson.
Ele sorriu. Ah, Deus, ela nha esquecido aquele sorriso, como um lobo
faminto. O po de sorriso para fazer você correr e gritar - ou fazer você cair
em uma pilha no chão.
— Não pessoalmente — disse ele.
— Mas foi para isso que você me trouxe aqui, não é? — Jenny olhou para a
queda atrás dela. Sua frágil compostura estava se fragmentando. A histeria
estava borbulhando dentro dela, e ela não conseguia pará-la. Se ele não
fosse jogá-la, talvez ela devesse pular, porque morrer rápido seria melhor
do que o que ele faria com ela... — Apenas vá em frente e faça. Termine
logo com isso.
— Tudo bem — ele disse, e a beijou.
Ah.
Ela pensou que lembrava como era com Julian, como era ser beijada por
ele. Suas memórias haviam men do. Ou talvez esse po de coisa fosse
forte demais para que a memória não fosse uma sombra disso. Em um
instante, Jenny foi transportada de volta para a casa de papel, de volta ao
choque que sen ra ao seu primeiro toque. Quando Tom a segurava nos
velhos tempos, quando Tom ainda a amava, seus braços a faziam se sen r
segura. Cuidada.
Julian não a fazia se sen r segura. Ela estava tremendo instantaneamente.
Caindo. Subindo. A eletricidade que ele carregava consigo a inundava,
formigando em cada terminação nervosa. Choques doces que fizeram sua
mente cambalear.
Ah, Deus, não posso; é errado. É errado, ele é mau. Não sinto nada por ele.
Eu disse a Tom que não sen a nada...
O corpo dela não.
Ele quer me matar.
Mas ele a estava beijando tão suavemente quanto o crepúsculo, pequenos
beijos doces e longos que se tornaram selvagens. Como se fossem amantes
reunidos, em vez de caçadores e presas.
E Jenny estava beijando-o de volta. Os braços dela estavam em volta do
pescoço dele. Ele mudou a pressão de seus lábios nos dela e a luz brilhou
através de Jenny. Ela abriu os olhos em choque.
— Jenny — disse Julian, sem se afastar, falando com os lábios roçando os
dela. Ele parecia feliz e exaltado. Cheio de descobertas. — Você vê como
está conosco? Você não pode lutar contra isso mais do que eu. Você
tentou; fez tudo o que pôde para matá-lo. Mas você não pode matar meu
amor por você.
— Não — Jenny sussurrou. Seu rosto estava tão perto, a máscara fazendo-o
parecer mais perigoso do que nunca. Ele era assustador e bonito. Ela não
conseguia desviar o olhar dele.
— Nós fomos feitos para ficar juntos. É o nosso des no. Você lutou muito,
mas acabou agora. Desista, Jenny. Deixe-me te amar.
— Não! — Com força repen na, ela o empurrou com força. Empurrando-o
para longe. A força a mandou para trás contra a grade. A fúria varreu seu
rosto. Então, diminuiu e ele suspirou profundamente.
— Você vai lutar até o fim, não é? Tudo bem. Você é excitante quando está
com raiva, e pessoalmente sou faminto por esse seu lado. Na verdade,
você pode dizer que sou faminto...
— Não.
— Gosto do ves do — con nuou ele, como se ela não vesse falado. —
Em um sen do puramente esté co, é claro. E gosto do seu cabelo assim.
Faz você parecer selvagem e bonita.
Terrivelmente, Jenny se sen u selvagem e bonita. Sen a-se desejável. Não
estava certo, mas seus olhos nela a fizeram sen r como se ninguém vesse
sido tão bonito como ela, desde o início dos tempos. Mas ela também
nunca deixou de se assustar.
Ele pegou a mão dela e Jenny sen u - não viu, porque não conseguia rar
os olhos dos dele - algo deslizando em seu dedo. Um círculo frio. Um anel.
Sen u o frio ao redor dela como se vesse sido enrolada em gelo.
O anel de ouro que ela jogou fora.
Julian disse, como se citando:
— Este anel, o símbolo do meu juramento, vai me segurar nas palavras que
falo: À tudo me recuso e a Ti escolho.
Jenny fechou os olhos.
— Você não se lembra? Eu lhe disse que a promessa era irrevogável. Você
é minha, Jenny. Agora e para sempre.
Se a Escuridão assumisse um rosto e uma voz, se os poderes da noite se
reunissem e se transformassem em seres humanos, eles teriam feito algo
como Julian.
E ela era dele.
Como um filme horrível, sim. Noiva do diabo. Ela prometeu a si mesma a
ele, e agora não nha escolha.
Ou pelo menos uma parte dela acreditava nisso. Uma parte que ela nem
sabia que exis a antes de conhecer Julian. Uma parte que a mudou
recentemente, ao ponto de as pessoas perceberem. Uma parte selvagem,
que ansiava riscos. Como a em Dee que amava o perigo.
Foi essa parte que respondeu a ele, que encontrou o resto do mundo
domado em comparação. A parte que fez seu coração bater forte e seu
estômago derreter. Seus joelhos estavam literalmente fracos, como
estavam depois do úl mo grande terremoto em Los Angeles, quando o
chão fazia coisas que o chão sólido não deveria fazer, quando ela pensava
que ia morrer. Depois, suas pernas pareciam cera. Como agora.
— Só vim reivindicar o que é meu. Você lançou seu próprio des no, Jenny,
e se condenou. É assim que funciona com runas e juramentos. Você falou
as palavras, deixou que fossem escritas e foi isso. Você pensou que teria
como mudar?
Jenny não sabia o que nha pensado. Ela fez isso para salvar Tom e os
outros; teria feito qualquer coisa para salvá-los naquele momento.
— Era... Eu não podia... não era justo — disse ela, atrapalhada. Estava em
desvantagem; não conseguia pensar direito.
— Justo, não vamos falar sobre isso de novo. A vida não é justa. Esse não é
o ponto. Você prometeu a si mesma para mim.
Jenny abriu a boca para explicar, mas não conseguia reunir palavras.
Porque o pior era que ele estava certo. Não havia como jus ficar o que ela
havia feito. Ela dera sua palavra. Fez o juramento, sabendo que isso os
ligaria para sempre. E supôs que a verdade vergonhosa era que ela
esperava se livrar de Julian para que ele não pudesse usá-la.
Com um dedo, Julian esboçou algumas linhas no ar, com a forma de um
vaso virado de lado.
— Esse é Perthro, a runa do jogo e da adivinhação. É o cálice que segura as
runas ou os dados quando eles são lançados.
— Sério? — Jenny disse fracamente, sem ter a primeira idéia do que ele
estava falando.
— Vou lhe contar uma coisa interessante sobre as pessoas que
descobriram essas runas. Eles adoravam jogar. Eram loucas por isso.
Apostariam tudo, incluindo a liberdade delas em um lançamento dos
dados. E se perdessem, entrariam na escravidão alegremente, porque
haviam feito uma promessa e sempre cumpriam as regras. Honra
significava mais do que tudo para eles.
Jenny desviou o olhar, abraçando os próprios braços. Estava com muito
frio. Desejava que houvesse um lugar para se esconder.
— Você vai manter sua promessa?
O que ela poderia dizer? Prometer que ela nunca deveria ter que fazer?
Julian a forçara a jogar o jogo no começo, mas Jenny o procurara atrás um
jogo; algo assustador e sexy, algo que proporcionasse animação em uma
festa. Ele dera o que ela havia pedido, a culpa era sua por mexer com
coisas proibidas, mas ela não podia, não podia.
Com os dentes afundados no lábio inferior, ela olhou para Julian. Mal podia
olhá-lo nos olhos, mas o fez. Ela balançou a cabeça. Ali. Agora estava
exposta. Jenny não nha desculpas, mas não queria manter sua palavra.
— Você sabe que posso fazer você aceitar.
Jenny assen u. Era o que ela esperava. Mas pelo menos ela não o aceitaria
de bom grado.
Ele se virou para olhar o oceano e Jenny esperou.
— O que você acha de jogamos outro jogo?
— Ah, não. — Jenny sussurrou, mas ele con nuou.
— Eu poderia apenas forçá-la, mas vou lhe dar uma chance espor va. Um
lançamento dos dados, Jenny. Mais um jogo. Se você vencer, estará livre da
promessa. Se perder, a manterá. — Ele se virou para olhá-la, e nos buracos
da máscara ela podia ver azul-escuro. — Você quer jogar ou simplesmente
resolvemos isso aqui e agora?
Não entre em pânico. É sua única chance. É melhor que nenhuma.
E a parte selvagem nela estava respondendo ao seu desafio, subindo para
Perigo. Risco. Excitação.
— Um lançamento dos dados — disse suavemente. — Eu vou jogar.
Ele deu a ela o sorriso de lobo.
— Não há impedimentos, então. Cada um com seu me de jogadores.
Jenny congelou.
— Espere um minuto... — ela começou.
— Você achou que eu ia brincar? Esse jogo é muito sério, como o úl mo.
— Mas é entre nós — Jenny disse desesperadamente. — Só você e eu...
— Não — Os olhos atrás da máscara eram estreitos. — Este é um jogo para
os jogadores originais, para todos que estavam na casa de papel. Nem
mais, nem menos. Do meu lado, eu, a Rastejadora e o Espreitador. Do seu,
todo mundo que ajudou a me enganar e me trair. Vou pegá-los um por um,
começando com a Chapeuzinho Vermelho.
— Não — disse Jenny, aterrorizada. Deus, o que ela fizera? Summer morreu
no úl mo jogo...
— Sim. E isso começa agora. Prontos ou não, aqui vou eu. Encontre minha
base e você pode me impedir de levá-los ao Mundo das Sombras.
— Eles quem?
— Seus amigos. Encontre-os depois que eu os levar e todos vocês se
libertarão. Se não — ele sorriu. —, eu ganho todos eles.
Jenny não entendeu. O pânico estava revoltando-se dentro dela. Não
estava pronta, não conhecia as regras. Nem sabia que jogo eles estavam
jogando.
— Julian...
Rápido como um gato, como uma cobra, ele a beijou. Um beijo duro, e
Jenny estava respondendo antes que percebesse. Quando acabou, ele a
segurou com força contra o peito por um momento. Ela podia ouvir o
coração dele batendo; exatamente como um coração humano, ela pensou
tonta.
Então ele sussurrou em seu ouvido:
— O novo jogo é Ovelhas e Monstros.
E ele se foi.
Sumiu da varanda, num piscar.
O calor se dissolveu nos braços de Jenny e ela estava sozinha. Podia ouvir a
música novamente. Tudo poderia ter sido um sonho, mas ela ainda podia
sen r o beijo duro de Julian em sua boca.
As sombras na varanda haviam se iluminado em sua ausência. Jenny olhou
em volta com medo. Julian havia dito que o jogo começaria agora. Julian
não dizia coisas que não queria dizer.
Mas ela não podia ver nada incomum. A dança estava acontecendo dentro
do salão de baile. Jenny virou-se e agarrou a grade da varanda, olhando
por cima. Holofotes suavemente iluminavam a praia abaixo. Um deles
captou o brilho do cobre.
Audrey! Aquela era Audrey lá embaixo, e a figura de cabelos escuros ao
lado dela devia ser Eric. Eles estavam a alguns metros das outras pessoas
na areia, caminhando de mãos dadas pela praia. Na escuridão.
O jogo começa agora... Vou pegá-los um por um, começando com a
Chapeuzinho Vermelho.
Cabelo vermelho de Audrey.
— Audrey! Audrey! — Jenny gritou. Sua voz desapareceu no fundo da
música sem sequer uma ondulação. Ela podia sen r o quão pequeno e
fraco era comparado ao rugido do oceano. Jenny olhou em volta
loucamente; não havia caminho da varanda até a praia.
Audrey e Eric estavam saindo do alcance das luzes agora, indo para as
sombras.
— Audrey!
Audrey não a ouviu.
---
Algo sobre bailes sempre mudava Audrey.
Por exemplo, ela realmente não gostava de Eric, o garoto que estava
beijando atualmente. Mas simplesmente não podia evitar, algo sobre
bailes a a ngiam. Todas as luzes e os cantos escuros. Os ves dos
brilhantes, os elogios e a música. Era melhor do que fazer compras.
E Eric era um bom beijador, para um garoto americano.
Não é tão bom quanto Michael, no entanto. Michael Cohen era um ó mo
beijador, embora você nunca desconfiasse ao olhar para ele. Era um dos
segredos mais bem guardados da Vista Grande High, e Audrey queria que
con nuasse assim.
Ela sen u uma leve pontada de culpa, pensando em Michael. Bem, mas ela
disse a ele que não se importava com Eric. Estava fazendo isso para ajudar
Jenny. Que estava no hotel tentando lidar com Brian e suas atenções
indesejadas. Talvez es vesse na hora de Audrey fazer algo sobre isso.
— Eric — disse ela, interrompendo o beijo e arrumando o cabelo. — É
melhor voltarmos.
Ele começou a protestar, mas Audrey já estava se virando. Ela não nha
percebido o quão longe eles se afastaram das luzes do hotel.
— Vamos — disse, inquieta. Ela havia dado apenas alguns passos quando
percebeu o movimento pelo canto do olho. Estava à sua esquerda, no lado
da terra. Algo nas sombras, uma rápida piscada brilhante. Talvez apenas
um pequeno animal ou pássaro. — Eric, vamos.
Ele estava de mau humor.
— Vá, se quiser.
Ah, tudo bem. Ela começou a andar o mais rápido que pôde. Seus pés
descalços afundavam a cada passo na areia macia, quebradiça e levemente
úmida. Os holofotes do hotel pareciam quilômetros de distância e o
oceano se estendia à sua direita, inimaginavelmente vasto. À esquerda, a
escuridão cobria uma ladeira coberta de gelo. Entre a escuridão e o mar,
Audrey se sen u pequena e vulnerável em comparação. Foi um sen mento
ruim.
Ela se virou de repente e olhou para a escuridão. Ela não podia ver nada
agora. Talvez não vesse nada ali. Então ela ouviu um misto de grito e
choro atrás de si. Audrey girou, esforçando-se para ver na escuridão. Algo
estava acontecendo lá atrás, algum po de a vidade.
— Eric? Eric!
Outro choro. E, mais alto, um som terrível que ela podia ouvir sobre o
oceano. Um rosnado gutural e vibrante. Um barulho bes al. Areia estava
pulverizando. Audrey podia ver algum po de surra.
— Eric! Eric, o que está acontecendo? — O som havia parado. Audrey deu
um passo incerto para a frente. — Eric?
Algo brilhou, vindo em sua direção.
Não era Eric. Era algo azul e brilhante. Como uma ilusão de ó ca, estava lá
e depois se foi. Audrey tentou focar, e o tempo perdido foi fatal. Quando
viu claramente, estava quase nela.
Meu Deus, era inacreditável. No Mundo das Sombras, o lobo parecia um
lobo. Enorme, enorme, mas apenas um lobo. Essa coisa... era um fantasma.
Como algo pintado com nta luminosa no ar. Nada entre as pinceladas.
Não é exatamente um esqueleto - algo pior. Um espectro. Um lobo
fantasma.
Mas o rosnado era real.
Audrey se virou e correu. Estava logo atrás dela. Ela podia ouvir o rosnar
sobre o rugido do oceano, sobre o próprio hálito soluçando. Suas pernas já
estavam começando a doer. A areia grossa a puxava, arrastando-a para
baixo. Era como correr em câmera lenta.
Ela estava mais perto das luzes. Se pudesse apenas chegar lá, mas era
muito longe. Ela nunca conseguiria. O chão se abriu na frente dela.
Era assim que parecia. Um buraco, preto contra a areia cinza. Preto com
bordas azul-elétrico tremeluzentes. A areia que nha sido sua inimiga a
ajudou agora, permi u que ela se pegasse e caísse de joelhos. Ela caiu à
beira do buraco, olhando incrédula.
Deus, Deus. Não era como nada que ela já nha visto. Escuridão sem fim
para sempre. Lá no fundo, poderia ter havido o brilho de uma chama azul.
Audrey não queria mais ver. Ela cambaleou e correu em direção à encosta
à esquerda. Se ela pudesse subir pela usina de gelo, talvez pudesse se
perder lá.
Mas foi mais rápido. Veio do lado esquerdo, cortando-a, forçando-a a
desviar. Ele virou com ela, forçando-a a desviar novamente. Para circular de
volta em direção ao buraco.
Audrey tropeçou novamente e ouviu um rosnado logo atrás dela. Hálito
quente no pescoço.
Ela não nha fôlego para gritar, embora houvesse um grito em seu cérebro.
Ela subiu e estava correndo de novo. Do jeito que ela queria que fosse. Ela
percebeu isso tarde demais. O buraco estava na frente dela, quase sob
seus pés. Ela não conseguiu se conter dessa vez.
CAPÍTULO 10

No ar, ela foi derrubada para o lado com uma força impressionante. Um
brutal bloqueio. Ela caiu com o rosto esmagado na areia. Não no buraco,
mas na praia.
O caos estava acontecendo sob dela. Em cima dela. Era como um me de
futebol inteiro lutando. Rosnados grossos, respiração ofegante, e de
repente um grito. Areia chacoalhou ao seu redor.
Então tudo parou.
Audrey ficou imóvel por mais um momento, depois se virou para olhar.
Tom estava meio sentado, meio agachado na areia, seu cabelo escuro
desarrumado, o rosto arranhado. Ele respirava ofegante. Na mão nha um
canivete suíço, a lâmina não brilhando, mas escura. O lobo se fora. O
buraco também.
— Está morto? — Audrey ofegou. Ela podia ouvir a histeria em sua própria
voz.
— Não. Entrou naquele buraco. Então, o buraco desapareceu.
— Ah — disse Audrey. Ela olhou para ele e piscou. — Sabe, precisamos
parar de nos encontrar assim. — Então caiu de volta na areia.
— Audrey! Audrey, onde você está? Audrey!
Audrey raramente ouvia uma voz cheia de tanto terror, mas estava
flutuando em uma nuvem de excesso de esforço por endorfina. Mal podia
levantar a mão para acenar.
— Estamos aqui! Aqui! — Tom gritou. No momento seguinte, Jenny estava
de joelhos ao lado deles.
— Meu Deus, o que aconteceu? Você está bem?
— O lobo aconteceu — disse Tom. — Ela está bem, é apenas reação do
susto.
— Você está bem? Ah, Tom, você está sangrando!
Audrey ouviu o som do abraço. Normalmente, deixaria que eles se
reencontrassem em paz, mas agora ela disse:
— Eric ficou para trás. Não sei se ele está bem.
— Eu vou ver. — Tom se soltou dos braços de Jenny e foi embora. Jenny
virou-se para Audrey, ves do dourado brilhando na escuridão.
— O que aconteceu?
— Algo tentou me empurrar em um buraco. Um buraco. — Ela repe u,
antes que Jenny pudesse perguntar, e descreveu o que nha visto. — Não
sei por que, mas queria que eu caísse.
— Ah, meu Deus — Jenny sussurrou. — Meu Deus, Audrey, é tudo minha
culpa. E se Eric es ver morto...
— Ele não está — disse Tom, voltando. — Ele está respirando, e não
encontrei nenhum sangramento ou algo assim. O lobo não o queria; queria
Audrey.
Foi só então que Jenny perguntou:
— O que você está fazendo aqui?
Tom olhou para o oceano.
— Não achei que algo iria acontecer aqui, mas não nha certeza. Fiquei no
hotel por precaução. Quando vi Audrey indo para a praia, fiquei de olho
nela do convés lá em cima.
— Ah, Tom — Jenny disse novamente.
— Graças a Deus que você fez isso. — disse Audrey, levantando-se. Ela
estava machucada, mas tudo parecia estar em boas condições. Seu novo
Oscar de la Renta, no entanto, era outra questão. — É uma pena que você
não possa ter salvado o ves do também. — Enquanto subiam a rampa
arenosa do oceano até o terreno do hotel, ela disse pensa va: — Na
verdade, suponho que você salvou minha vida. O ves do não importa
realmente.
— Não podemos contar à polícia sobre Eric, porque não podemos perder
tempo e eles podem nos separar. — disse Jenny. — Mas também não
podemos deixá-lo lá.
Havia um tremor fino em todos os seus músculos, sua reação quase tão
severa quanto a de Audrey. Em seu interior, porém, havia um núcleo
determinado como aço. Ela sabia o que nha que ser feito.
— Por que não podemos perder tempo? — Tom perguntou.
— Porque temos que pegar os outros — disse Jenny. — Todos nós
precisamos ir a algum lugar e conversar. — Ela viu Audrey, que estava
lentamente fazendo reparos no cabelo e no ves do, lançar-lhe um olhar
afiado. — Vou explicar mais tarde. Por enquanto apenas confie em mim,
Tom.
Os olhos castanhos de Tom estavam escuros, perplexos, mas depois de um
momento ele assen u.
— Vou só me limpar um pouco e dizer na recepção que há alguém
inconsciente na praia. Então podemos ir.
Quando ele foi, levou também um aviso para entregar no salão do baile.
Foi de Jenny para Brian, explicando que ela nha que ir embora sem ele e
que sen a muito. Jenny fechou os olhos e se encostou na parede. Pense,
disse a si mesma. Não desmaie ainda, pense.
— Audrey, nós duas precisamos ligar para nossos pais. Temos que dizer a
eles alguma desculpa para não voltarmos para casa hoje à noite. E então
precisamos pensar em algum lugar para onde possamos ir. Quanto custa
um quarto de hotel?
Audrey, com dois grampos na boca, apenas a olhou. Ela não conseguia
falar, mas o olhar era suficiente.
— Não estamos fazendo nada perigoso — Jenny assegurou. — Mas
precisamos conversar. E acho que só estaremos seguros quando
es vermos todos juntos.
Audrey removeu os alfinetes e lambeu os lábios.
— E o apartamento de Michael? — ela disse. — O pai dele viajou por uma
semana.
— Audrey, você é brilhante. Agora pense no que dizemos aos nossos pais e
ficaremos bem.
No final, elas se decidiram pelo velho blefe duplo. Jenny ligou para casa e
disse à mãe que ficaria na de Audrey; Audrey ligou para a sua e disse à
Gabrielle, a governanta, que ela ficaria na de Jenny. Então elas ligaram para
Dee e a mandaram para o hotel em seu jipe, enquanto Tom levou o RX-7
para sua casa para buscar Michael. Finalmente, Tom foi até Zach, e depois
par ram para o apartamento de um Michael irritado pela interrupção de
seu sono.
Eram quase uma e meia da manhã quando estavam todos juntos.
— Cafeína — Michael murmurou. — Pelo amor de Deus.
— Impede o seu crescimento. Te deixa cego. — disse Dee.
"Por que não há nada nesta geladeira, exceto maionese e Coca Diet? —
Audrey ques onou.
— Deve haver requeijão em algum lugar — disse Michael. — E tem cream
cracker no armário; papai comprou uma caixa no mercado. Se você me
ama, me dê uma coca-cola e me diga o que está acontecendo. Eu estava
dormindo.
— E eu quase fui morta — disse Audrey, virando a tempo de ver os olhos
de Michael arregalarem-se. — Aqui. — Ela distribuiu coca-cola e bolachas
para todos, exceto Dee, que apenas bufou.
Que grupo incomparável somos, pensou Jenny, olhando para eles. Michael
e Audrey estavam no sofá, Michael no suéter cinza desbotado que usava
como pijama e Audrey nas ruínas do atrevido ves do preto. Dee estava do
outro lado de Audrey, ves da para a ação em shorts de ciclismo e uma
blusa cáqui, as pernas longas estendidas à frente.
Tom, no sofá de dois lugares, usava jeans e uma camisa azul escura. Zach
estava sentado no chão, junto à mesa, ves ndo uma roupa preta
vagamente oriental - talvez um pijama ou um moletom, pensou Jenny. Ela
própria estava empoleirada no braço do sofá de dois lugares, com seu
ves do dourado cin lante e totalmente inapropriado. Não nha pensado
em rá-lo, podia ver os olhos de Dee no ves do, mas não conseguiu
devolver o olhar diver do. Ela estava muito confusa.
— Alguém não vai explicar o que está acontecendo? — Michael disse,
quebrando uma bolacha.
— Audrey pode começar — disse Jenny, juntando as mãos e tentando
mantê-las paradas.
Audrey descreveu rapidamente o que havia acontecido.
— Mas o que tem nesse buraco? — Michael disse quando ela terminou. —
Desculpe perguntar, mas por que o lobo não a matou? Se foi o mesmo que
atacou Gordie Wilson.
— Porque é um Jogo — disse Jenny. — Um novo Jogo.
O penetrante olhar escuro como a noite de Dee estava nela.
— Você viu Julian — disse sem hesitar e Jenny assen u, apertando as mãos
ainda mais firmemente.
Tom se virou para olhá-la bruscamente, depois virou novamente, os
ombros tensos. Zach a encarou com uma expressão inescrutável, a roupa
preta acentuando sua palidez. Michael assobiou. Audrey, de costas muito
retas, disse:
— Nos conte.
Jenny contou. Nem tudo, mas a essência do que aconteceu, deixando de
fora os pedaços que ninguém precisava saber. Como o beijo.
— Ele disse que me daria a chance de me libertar da minha promessa. —
Ela terminou. — Que ele iria começar um novo jogo conosco e que todos
éramos jogadores. E no final, disse que o novo jogo era Ovelhas e
Monstros.
Audrey respirou fundo, franzindo a testa.
— Como aquela coisa que vimos as crianças brincando?
— Como assim Ovelhas e Monstros? — Michael exigiu. — Nunca ouvi falar
disso.
— É como Polícia e Ladrão. — explicou Jenny. — Começa como esconde-
esconde. Se você é o monstro, conta enquanto todos as ovelhas se
escondem. Então quando encontra uma, a persegue e se a marcar, ela está
presa. Você a leva de volta para sua base e a mantém como prisioneira até
que alguém se esgueire para libertá-la.
— Fofo. — disse Zach, depois caiu em silêncio.
— Se estamos jogando, é melhor descobrirmos as regras — disse Dee.
— Talvez não tenhamos que brincar — disse Jenny. Todos eles a olharam.
Ela sabia que estava corada. Pensava nisso desde que olhara por cima do
parapeito da varanda para ver a minúscula figura de Audrey desaparecer
na escuridão e à essa altura, já estava em um estado bastante estranho.
— O que você quer dizer? — Dee disse, estreitando o olhar.
Jenny ouviu-se dar uma risada estranha e pouco treinada.
— Bem, talvez eu deva acabar com isso agora.
Ela ficou surpresa com o volume do protesto.
— Não! — Audrey choramingou. — Ceder a um cara? Absolutamente não.
Nunca.
— Temos que enfrentá-lo — disse Dee, batendo com um punho fino na
palma da mão. — Você sabe disso, Jenny.
— Nós vamos lutar com ele — disse Tom sombriamente.
— É, olhe — disse Michael e sen u o cotovelo de Audrey nas costelas. —
Quero dizer, é melhor você não se entregar.
— É isso mesmo, você não vai — disse Audrey. — E fui eu quem foi
perseguida hoje, então sou eu quem tem o direito de decidir isso.
— Não vamos abandonar você — disse Dee, ambas as pernas compridas
no chão agora, inclinando-se para a frente na intensidade de sua emoção.
— Isso também é problema nosso.
Jenny podia sen r-se corando mais profundamente quando uma onda de
culpa a varreu. Eles não entenderam; não sabiam que ela quase se rendera
por vontade própria.
— Ele é mau — dizia Tom. — Você não pode simplesmente desis r e deixar
o mal vencer por nossa causa. Não pode, Jenny.
A voz seca de Zach cortou a atmosfera apaixonada.
— Não vejo muito sen do em discu r sobre isso. Porque pelo que Jenny
disse antes, parece que ela concordou com o novo jogo.
— Eu concordei. — disse Jenny. — Eu não sabia. Quando concordei, pensei
que ele deixaria vocês em paz. Não achei que vocês es vessem envolvidos.
— E ele disse que o Jogo havia começado. O que significa...
— Não há nada que ela possa fazer para mudar isso agora, mesmo que
quisesse. — Audrey terminou a frase de Zach com firmeza.
— Como eu disse.
Todos se entreolharam. Jenny viu o consenso em todos os rostos. Eles
estavam todos juntos agora, até Tom. Como nos velhos tempos. Um por
todos e todos por um.
Ela se sentou na poltrona ao lado de Tom.
— Então, o que precisamos fazer para vencer? — perguntou Audrey.
— Evitar sermos pegos — disse Zach laconicamente. Michael, revirando
tristemente sua bolacha, disse:
— Como? Não podemos ficar aqui para sempre.
— Não é tão simples assim — disse Dee. — Olhe, existem diferentes pos
de jogos, certo? O primeiro Jogo, o da casa de papel, foi como um de
corrida. Em um jogo de corrida, o obje vo é ir do início ao obje vo em um
certo período de tempo ou antes que todo mundo faça isso.
— Como Parcheesi. — disse Jenny.
— Não, como Rampas e Escadas! — Michael disse, olhando
animadamente. — Lembra-se disso? Você joga os dados e atravessa o
tabuleiro, e às vezes você pode subir uma escada, do jeito que subimos as
da casa de papel. E às vezes você cai em uma rampa...
— ...o que fizemos, no terceiro andar. — disse Dee.
— Tivemos esse jogo quando crianças — Zach olhou para Jenny. — Mas o
nosso se chamava Serpentes e Escadas.
— Tudo bem, o ponto é que muitos jogos são de corrida. — con nuou Dee.
Ela pulou e começou a andar pela sala. — Mas também existem os de caça;
esses são os jogos mais an gos de todos. Como esconde-esconde. Isso
começou como uma prá ca para perseguir animais selvagens.
— Como você sabe?
— Vovó Aba me disse. E Ovelhas e Monstros é para capturar animais
domés cos. Esse novo Jogo que Julian está fazendo é um de caça e
captura.
Tom deu de ombros sombriamente.
— Então ele está planejando caçar e capturar cada um de nós como
animais.
— Troféus — disse Zach em voz baixa. — Como o do meu pai.
— Não é como ele. — disse Dee, olhando-o. — O do seu pai está morto. É
mais como um jogo em que você pega cada um dos animais e os coloca em
uma fila para esperar o abate.
Michael engasgou com a coca-cola.
— Bem, é verdade — con nuou Dee. — Ele não disse que ia nos matar um
por um. Ele disse que iria nos capturar, até que alguém encontre a base e
nos livre.
Limpando a boca, Michael disse com a voz rouca:
— Vamos encontrá-lo agora e evitar isso.
— Mas esse é o ponto — Dee sentou-se no parapeito da janela. — Como o
encontramos?
— Como podemos? Não há esperanças. — Zach disse.
Tom ainda olhava para longe.
— Pode haver outra maneira — ele começou, então parou e balançou a
cabeça. Jenny não gostou da expressão em seu rosto. Não gostou da
maneira como as manchas verdes em seus olhos estavam.
— Tom... — ela começou, mas Audrey a interrompeu.
— Ele não te contou nada, Jenny? Aonde é a base dele?
— Não — Jenny negou. — Só que era um lugar para nos manter antes de
nos levar ao Mundo das Sombras.
— O que significa que não está no próprio Mundo das Sombras — Dee
concluiu.
— Graças a Deus. — Michael murmurou.
— Mas onde quer que esteja, você chega lá por aquele buraco? — Audrey
estremeceu. — Ah, maravilha. Eu desisto, obrigada.
— Agora esse buraco parece interessante. — disse Michael, pensa vo.
— Talvez porque você tenha um no lugar do cérebro. — Audrey mostrou
uma irritação que não usava com Michael há semanas e ele lançou-lhe um
olhar assustado, bem diferente de seu olhar ferido comum.
— Não, sério — ele disse. — Sabe, eles me fazem pensar em algo. Há uma
história de Ambrose Bierce... o livro provavelmente está por aqui em algum
lugar. — Ele virou a cabeça em direção às estantes de parede a parede que
eram a principal caracterís ca da sala de estar.
O pai de Michael escrevia ficção cien fica e o apartamento estava cheio de
coisas estranhas. Modelos de naves espaciais, pôsteres de filmes obscuros,
máscaras estranhas, mas principalmente livros. Livros transbordando das
prateleiras e empilhados no chão. Como sempre, Michael não conseguiu
encontrar o que procurava.
— Bem, de qualquer forma — prosseguiu ele. — Ambrose Bierce escreveu
esta trilogia sobre desaparecimentos estranhos e havia a história de um
garoto de dezesseis anos. Seu nome era Charles Ashmore e uma noite
depois de nevar, ele saiu para a primavera para pegar água. Mas o
problema foi que ele nunca mais voltou. Depois, sua família saiu para ver
qual era o problema e viram seus rastros na neve. E os rastros iam até
certo ponto, mas depois sumiam. — Michael abaixou a voz
drama camente. — Ninguém nunca mais o viu.
— Ó mo. Mas o que isso tem a ver com a gente? — Jenny ques onou.
— Bem, a história deveria ser ficção, certo? Mas havia outra parte do livro,
onde um médico alemão, Dr. Hern ou algo assim, nha uma teoria sobre
como as pessoas desapareciam. Ele disse que "no mundo visível existem
lugares vazios, como os buracos de queijo suíço".
— E aquele cara caiu em um? — Dee parecia intrigada.
— Caiu. Ou foi arrastado. Como eu disse, as histórias deveriam ser ficção.
Mas e se realmente houver vazios como esse? E se Julian puder, bem,
controlá-los?
— Essa é uma ideia sórdida — disse Dee. — Gostei.
— Você está dizendo que todas as pessoas que desaparecem caem no
Mundo das Sombras? — perguntou Audrey.
— Talvez não todos, mas alguns. E talvez não até o fim, apenas
parcialmente. Na história, quando a mãe de Charles Ashmore passou pelo
local onde ele desapareceu no dia seguinte, ela pôde ouvir a voz dele.
Ouviu isso cada vez mais fraco, todos os dias, até que finalmente
desapareceu completamente.
— Um espaço entre os mundos. — Jenny sussurrou. — Como a loja More
Games, em algum lugar entre o Mundo das Sombras e aqui.
Dee estava olhando para ela astutamente.
— Serviria como a base de Julian, hein? Um lugar para nos manter até que
ele nos leve ao Mundo das Sombras.
— E você ouve coisas sobre vór ces em Stonehenge e Sedona, no Arizona.
— disse Michael. — Foi como um vór ce, Audrey?
— Era grande e preto — Audrey detalhou brevemente. — Não sei o que
mais vór ce que isso pode ser para você. — Mas ela deu a Michael o
brinde que viera em seu pacote de bolachas Jack, uma lupa de plás co
azul. Ele a colocou ao lado do seu, um mini cartão de beisebol.
Jenny estava jogando distraidamente seu próprio brinde, sem realmente
abrir o pacote.
— Mas isso não nos ajuda a encontrar a base. A menos que pulemos em
um desses buracos, mas aí talvez nem voltemos.
— Fechou completamente — Tom os lembrou. — Depois que o lobo pulou
para dentro, ele simplesmente desapareceu. Acho que não poderíamos
encontrar sequer o lugar novamente.
— De qualquer forma, aposto que ele pode movê-los. — Michael estava
começando, quando Jenny ofegou.
Ela abrira seu pacote de prêmios. Estava brincando com o prêmio,
completamente preocupada com a questão dos buracos, até que algo
chamou sua atenção.
— O que é isso — Dee pulou do parapeito da janela.
— É um livro de poesia ou algo assim. — Era um livro muito pequeno, em
papel barato e com letras grandes. Uma frase por página. Mas eram
poemas muito estranhos para serem brindes de bolachas Jack.
Jenny leu:
— "No meio da palavra que estava tentando dizer, no meio de sua risada e
alegria, ela desapareceu suave e subitamente, pois o Snark era um
Boojum."
Houve um silêncio mortal na sala.
— Pode ser uma coincidência. — disse Zach lentamente. Michael estava
balançando a cabeça amarrotada.
— Mas essas linhas estão erradas. Eu tenho o livro e não é assim que elas
aparecem nele. — Ele entrou no quarto e saiu com um exemplar de Alice
no País das Maravilhas e Outros Contos. — Elas são de um poema, A Caça
ao Snark, sobre caras que saem para caçar esses animais imaginários. Mas
alguns Snarks são Boojums, e esses caçam você. No final, um deles
encontra um Snark e acaba sendo um Boojum. Mas é ele no poema: "No
meio da palavra que ele estava tentando dizer, no meio de sua risada e
alegria...".
— O fabricante das Jack não cometeria esse erro. — disse Tom, com um
sorriso irônico.
— Não — Jenny sussurrou. — É de Julian. Mas é sobre o que quase
aconteceu hoje à noite ou sobre algo que ainda vai acontecer?
O silêncio se estendeu. As sobrancelhas de Tom estavam juntas e Dee
estava com seu olhar felino, andando de um lado para outro. Os olhos
cinzentos de Zachary eram estreitos, seu corpo magro tenso e imóvel.
Michael largou o livro.
— Você acha que ele está nos dando pistas com antecedência?
— Seria um es mulo compe vo, eu acho — disse Jenny. — E ele me deu
uma pista na varanda, lembram? Ele disse que iria atrás da "Chapeuzinho
Vermelho" primeiro.
Todo se olharam especula vamente. De repente, Dee se virou e deu um
soco e chute veloz e fluente.
— Então isso pode ser uma. — A excitação passava de um para o outro
como faíscas viajando por um fusível. — Se pudermos descobrir mais
pistas... Não será um jogo injusto. — concluiu Dee.
— Eu sei que podemos! Sempre quis ser como Sherlock Holmes. — disse
Michael.
— Acho que pode dar certo — disse Tom. Uma nova luz acendeu em seus
olhos castanhos.
— Claro que vai funcionar! Nós vamos vencê-lo. — Dee riu animadamente.
Jenny ficou presa no fervor. Talvez eles pudessem superar Julian.
— Não vai ser fácil...
— Mas vamos fazer isso — disse Audrey. — Porque precisamos. — Ela deu
a Jenny um olhar inquisidor e pegou várias latas de Coca-Cola vazias para
levar até cozinha.
— É melhor começarmos com o que temos, então — Zach olhava
fixamente para o livro de charadas de Jenny.
— A menos que esse já tenha terminado — disse Michael. — Quero dizer,
se era sobre Audrey, ou devo chamá-la de Chapeuzinho Vermelho? — ele
gritou para a cozinha.
— Me chame de madame. — disse Audrey ao virar o corredor, seu bom
humor claramente restaurado. — Call me Al. I can call you Be y, and Be y,
when you call me, you can call me... — Ela cantava uma música de Paul
Simon.
— Do quê? — Michael gritou quando ela não terminou. — Do quê posso
chamá-la? — Audrey não respondeu e ele bufou: — Mulheres!
Zach estava dizendo:
— Certo, mas e se for uma pista nova? Diz ela, então também pode ser...
Jenny ouviu o primo como ele es vesse longe. Ela estava ouvindo, mas de
repente não conseguia respirar.
— Audrey? — Ela chamou. O som de latas chocalhando na cozinha havia
parado. — Audrey? Audrey?
Todo mundo estava olhando-a, assustados com algo em sua voz. O som do
pânico cru, Jenny adivinhou. Ela olhou para eles e suas imagens pareciam
tremer. Um silêncio absoluto veio da cozinha.
Então ela estava de pé e correndo. Dobrou o corredor antes de qualquer
um deles, até mesmo Dee. Jenny olhou para a cozinha e seus gritos
tocaram a luminária no teto.
— Não! Não! Meu Deus, não!
CAPÍTULO 11

A cozinha estava vazia. Uma gota de água escorreu da torneira e havia um


cheiro estranho e afiado. Sentada grotescamente no meio do piso de
linóleo verde, havia uma boneca de papel.
Estava dobrado para permi r que ela se sentasse e um braço estava torcido
como se a mão es vesse na cintura. Como se Audrey es vesse dizendo:
— Estou aqui. Onde você esteve? — Foi maldoso.
As mãos de Tom estavam nos ombros de Jenny, tentando acalmá-la. Ela se
afastou dele e pegou a figura macabra. Era a boneca que Audrey usara no
jogo, na casa de papel. A própria Audrey desenhara o rosto, colorira os
cabelos e as roupas com os giz de cera de Joey. Jenny não a via desde que
empacotara tudo com o resto do jogo na caixa branca. Ela percebeu
subitamente que não estava no depósito de ferramentas de Angela.
Nenhum dos bonecos estavam.
O rosto ceroso olhou para Jenny com um terrível sorriso astuto. O batom
rosa brilhante. Como se essa boneca soubesse o que havia acontecido com
a verdadeira Audrey e es vesse feliz com isso.
— Meu Deus, meu Deus — Jenny estava ofegando, quase chorando. A
boneca amassou na mão dela. Tudo na cozinha estava tremendo.
— Eu não acredito — disse Michael, passando pelos outros. — Onde ela
está? — Ele olhou para Jenny e agarrou seus braços. — Onde ela está?
— Solte-a. — Tom o afastou.
— Cadê a Audrey?
— Eu já disse, solte-a!
— Calmem, vocês dois! — A voz de Dee soou perigosamente.
— Mas como ela saiu da cozinha? — Michael estava descontrolado. —
Estávamos aqui do lado, não ouvimos nada. Nada poderia ter acontecido
com ela. Estávamos ali.
Dee estava ajoelhada no chão, passando os dedos pelo linóleo.
— Está mais escuro aqui, estão vendo? Toda essa área é mais escura. E
cheira a queimado.
Jenny podia ver agora, um círculo de verde mais escuro com vários metros
de diâmetro. Tom ainda segurava Michael, mas sua voz estava baixa.
— Você não viu aquela coisa na praia; aquele vazio, Mike. Não faz nenhum
barulho. Foi assim que ela saiu da cozinha.
— "No meio da palavra que ela estava tentando dizer, no meio de sua
risada e alegria." — recitou Zachary, atrás deles. Jenny se virou
bruscamente para vê-lo parado ali.
Com seu rosto magro e intenso e seus olhos escuros, ele parecia um
profeta da destruição. Mas quando seus olhos cinzentos encontraram os
de Jenny, ela sabia que ele se importava. Ele ainda estava segurando o
poema.
A úl ma nebulosidade na cabeça de Jenny desapareceu. Lágrimas e
histeria não ajudariam Audrey. Elas não iam ajudar ninguém. Ela olhou
para a boneca de papel amassada na mão.
A culpa era dela. Audrey caíra em um buraco negro e a culpa era de Jenny,
assim como a morte de Summer. Mas Audrey ainda não estava morta.
— Eu vou encontrá-la — Jenny disse suavemente para a coisa de papel que
segurava. — Vou encontrá-la e depois rasgarei você em pedaços. Vou
ganhar este jogo.
A boneca con nuou com seu sorriso astuto, suave e malévolo.
Michael estava fungando e esfregando o nariz. Dee estava inves gando o
chão como uma caçadora de ébano.
— É como as marcas que um OVNI pode deixar. — comparou ela. —
Quando pousa, quero dizer. Um círculo perfeito.
— Ou um círculo de fadas — Michael disse densamente. — Ela estava com
tanto medo desse po de coisa de lenda... — Tom deu um tapinha nas
costas dele.
— O Erlking — Jenny murmurou sombriamente. Ela alcançou Tom para
agarrar a manga da blusa de Michael. — Mas nós a recuperamos da úl ma
vez, Michael. E vamos mais uma.
— Acho que é melhor ficarmos juntos a par r de agora — Dee levantou-se
em um movimento fluido e gracioso.
Zach havia ido para trás de Jenny. Os cinco estavam juntos, de pé em um
nó conectado no centro da cozinha. Jenny sen u-se rar força de todos os
outros.
— Podemos dormir na sala, no chão. É só afastarmos os móveis. — sugeriu
Michael.
Eles invadiram os quartos em busca de cobertores e colchões e
encontraram sacos de dormir no armário. No banheiro, Jenny rou o
ves do dourado e ves u um velho moletom do Michael. Ela enfiou o
material cin lante no cesto de roupa suja, nunca querendo vê-lo
novamente.
Assustou-a ficar sozinha, mesmo por um minuto. Mas não vemos outra
pista, ela pensou. Ele não podia ter feito mais nada sem outra pista. Não
fora justo.
— Não teria sido diver do — concluiu Jenny entre dentes.
De repente, ocorreu-lhe que Julian poderia ouvi-la. Até vê-la; já ele a
observara das sombras por anos. Era um pensamento perturbador saber
que nenhum lugar era privado, mas agora Jenny esperava que ele es vesse
ouvindo.
— Não é um jogo se não vermos uma chance. — disse ela à parede, suave
mas ferozmente.
Na sala, ela se sentou em um colchão ao lado de Tom. Ele a abraçou, e ela
descansou contra ele, contente com seu calor e solidez. Se havia um
pequeno conforto nisso tudo, era que Tom estava com ela novamente.
Jenny se aconchegou no braço dele e fechou os olhos. Era aqui que podia
esquecer Julian, esquecer tudo que era sombrio e terrível. A mão forte e
quente de Tom apertou a dela, segurando-a com força.
Então ela sen u a pressão liberada e a mudança no corpo de Tom. Tensão
inundando-o. Ele estava segurando a mão dela, olhando para ela.
Não, não a mão dela. O anel.
A faixa dourada que parecia gelo no dedo dela naquela noite havia
esquentado até a temperatura corporal. Ela nem o nha notado por horas.
Agora, horrorizada, ela re rou a mão da de Tom e tentou rar o anel. Não
saía. Sabão, ela pensou. Jenny puxou frene camente, torcendo o aro,
avermelhando o dedo. Sabão ou manteiga não adiantariam.
Ela sabia que nem deveria tentar. O anel estava para ficar. Poderia fazer o
que quisesse, mas ele não sairia até que Julian quisesse. Se ela conseguisse
re rá-lo, poderia ser capaz de mudar as palavras escritas por dentro, e
Julian não correria esse risco. Ele havia dito que falar e escrever as palavras
as tornavam verdadeiras. Nunca daria à Jenny a chance de mudá-las e
alterar seu des no.
— Nós vamos ganhar o Jogo — disse ela à escuridão nos olhos de Tom. —
Quando vencermos, estou livre da promessa. — Ela disse quase suplicante,
mas o rosto de Tom permaneceu fechado. Ele foi embora novamente,
entrando no modo estranho educado.
— É melhor dormirmos — disse e virou-se para sua própria pilha de
cobertores. Jenny ficou sentada ali, sen ndo a inscrição no interior do anel,
como se as letras es vessem queimando sua pele.

Nada é tão assustador quanto acordar e não saber quem você é, sem saber
que é você quem está acordando.
Aconteceu com Jenny no domingo de manhã. Ela abriu os olhos e não
sabia em que direção ir. Não conhecia seu lugar no mundo, onde estava no
tempo e no espaço. Então lembrou.
Sala de estar de Michael. Eles estavam lá por causa de Julian. Jenny sentou-
se tão de repente que ficou tonta e procurou frene camente os outros.
Estavam todos lá. Michael quase enrolado em uma bola debaixo do
cobertor; Dee esparramada preguiçosamente no sofá como uma leoa
adormecida. Zach de costas no chão, seu rabo de cavalo loiro escorrendo
pelo travesseiro. Tom ao lado dela, o rosto virado para Jenny, uma mão
es cada em sua direção. Como se vesse estendido-a durante o sono, sem
se dar conta.
Jenny ficou um momento olhando-o. Ele parecia adormecido, muito jovem
e vulnerável. Às vezes, ela o amava tanto que era como uma dor sica, uma
dor no peito.
Dee bocejou e se espreguiçou, sentando-se.
— Todo mundo aqui? — ques onou, instantaneamente alerta e orientada.
— Então vamos chutar Michael e fazê-lo preparar um café da manhã.
Somos convidados.
Tom afastou a mão quando acordou e evitou os olhos de Jenny.
— Você realmente acha que podemos nos safar? — Michael perguntou
duvidoso.
— Nós precisamos — disse Jenny. — O que mais vamos dizer a eles? "Sinto
muito; sua filha foi sequestrada, mas não se preocupe, porque vamos
recuperá-la?"
— Vai dar tudo certo, desde que enrolemos a governanta. Eu falo com ela
enquanto você sobe até o quarto. — mapeou Dee.
— Então vamos a sua casa e você pode dizer aos seus pais que vai ficar
comigo. E Zach pode dizer aos pais que ficará com Tom, e Tom...
— Mas a questão é: eles acreditarão? — Michael levantou a dúvida. —
Quero dizer, não estamos falando apenas de uma noite aqui. Pode levar
dias até encontrarmos essa base.
— Vamos dizer que temos um projeto escolar e podemos levar algumas
noites trabalhando nele. Vamos fazê-los acreditarem. Temos que conseguir.
— disse Jenny.
Ela, Dee e Zach entraram no jipe de Dee, enquanto Tom e Michael
seguiram no RX-7. Tom não disse uma palavra para ela a manhã toda e
Jenny tentou esconder a mão esquerda sempre que podia. Sen u como se
o anel fosse uma insígnia de vergonha.
Eles decidiram ir à todos os lugares juntos a par r de agora. Ninguém
jamais deveria estar sozinho e, sempre que possível, os cinco deveriam
estar no mesmo lugar. Pararam na casa de Audrey, e Dee e Jenny bateram
na porta enquanto os meninos observavam da calçada.
— Oi, Gabrielle — disse Dee à governanta que respondeu e as deixou
entrar. — O Sr. e a Sra. Myers estão aqui? Ah, que pena. Bem, você poderia
dizer a eles que Audrey vai passar algumas noites comigo e Jenny na casa
dela?
Enquanto isso, Jenny rapidamente subiu as escadas da imponente casa e
voltou alguns minutos depois com uma braçada de roupas.
— Audrey apenas me pediu para pegar algumas coisas para ela. — explicou
para Gabrielle, e fez uma saída rápida com Dee.
— Ufa! — Dee disse quando elas estavam de volta no jipe. Jenny piscou
para afastar as lágrimas. Lidar com as roupas de Audrey trouxe de volta a
sensação de culpa. Mas nha que ser feito. Audrey nunca iria a lugar
nenhum da noite para o dia sem algumas roupas diferentes.
— Nós provavelmente deveríamos ter pegado o carro dela — disse Dee. —
Ela o leva para todos os lugares também.
— Talvez mais tarde. Peguei as chaves dela enquanto estava no quarto
dela. — Jenny revelou.
— Próxima ví ma — disse Zachary do banco de trás.
Tom descartou os pais rapidamente; ele e Michael saíram de sua casa de
es lo espanhol com uma trouxa de roupas cada um.
— E alguns livros didá cos. Para dar auten cidade. — disse Michael.
A mãe de Jenny estava na igreja. Jenny gritou sua mensagem para o pai,
que estava curvado sobre a piscina, lutando com o limpador flutuante.
— Vou ficar com Dee por alguns dias, pai! Estamos trabalhando em um
grande projeto de fisiologia!
— Ligue para nós ocasionalmente para nos informar que você está viva. —
ordenara o pai, erguendo os óculos, curvando o ombro e não soltando o
limpador de piscina.
Jenny deu-lhe um rápido olhar assustado antes de perceber que era uma
brincadeira. Sr. Thornton referia-se ao fato de ser pai de uma adolescente
com agenda social a va. Ela o surpreendeu correndo e beijando sua
bochecha suada.
— Irei, papai. Eu te amo. — Então fugiu novamente.

Foi na casa de Zach que eles veram problemas.


Eles estavam tontos com seus sucessos anteriores e não estavam
preparados quando pararam na casa es lo Tudor, em Quail Run. Jenny
entrou na garagem com Zach enquanto os outros conversavam com a a
de Jenny, Lily.
— Você mantém seus livros aqui?
— Os de arte. E acho que precisamos de uma lanterna. — Ele rou uma de
um gancho na parede.
Jenny olhou ao redor do estúdio que Zach havia feito na garagem. Estar
aqui a fez pensar em Julian, no tempo na casa de papel em que ele fingira
ser Zach. Atordoada, ela olhou para uma impressão na parede. Era um
mural gigante mostrando mesas de refeitório escolar empilhadas em uma
gloriosa pirâmide, quatro metro de altura e de profundidade, quase
bloqueando a saída. Zach fez a foto no ano passado depois que ela, Tom e
Dee e ele empilharam as mesas na madrugada. Eles as deixaram assim
para que os funcionários da escola encontrassem-nas na manhã seguinte.
Jenny tentou se concentrar na diversão daquela noite, sua mente
acrescentando cor aos tons de cinza da imagem, mas um ataque suave a
todos os seus sen dos havia começado. Ela con nuou vendo o rosto de
Zach em sua mente, observando-o virar o de Julian. Sen ndo a suavidade
dos cabelos de Julian sob os dedos.
— Você está bem, Jenny? Parece meio vermelha.
— Ah, não, não, estou bem. — Mais confusa do que nunca, ela
acrescentou apressadamente: — Então, o que você fez ul mamente? Você
não me mostra novas fotos faz um tempo.
— Eu es ve ocupado com outras coisas — Os ombros de Zach se curvaram
um pouco e ele desviou o olhar. Jenny piscou. Esse era novidade. Zach
muito ocupado para preterir suas fotos? Mas ela teve que puxar outro
assunto; estava com medo de o silêncio dominá-los.
— O que é isso? — ques onou, tocando um livro que estava aberto sobre a
mesa.
— Magri e — disse Zach sucintamente.
— Magri e? Ele era um pintor, certo?
— Um surrealista belga. — Subitamente focado, Zach pegou o livro. O
olhou quase ferozmente, suas feições afiadas. — Olhe para isso — disse,
abrindo-o em uma nova página. — Eu estava pensando em fazer algo que
pegasse esse mesmo humor. Só queria... — Sua voz sumiu.
Jenny olhou e viu uma imagem extremamente estranha. Mostrava um
cachimbo marrom, do po que o pai de Audrey fumava, com as palavras
"Não é um cachimbo debaixo dele". Jenny olhou para ela, sen ndo-se
estúpida. Ao seu lado, Zach estava tenso, esperando por sua resposta.
— Mas... é um cachimbo — ela disse midamente, batendo o dedo na
gela marrom.
— Não, não é. — Os olhos cinzentos de Zach ainda estavam no livro.
— É sim.
— Não, não é. Uma foto de um cachimbo não é um cachimbo.
Por um momento, ela entendeu e depois se afastou. Isso fez sua cabeça
doer, mas também lhe deu uma sensação vagamente excitada. Mís co.
— A imagem não é uma realidade. — disse Zach calmamente, mas com
força. — Mesmo que estejamos acostumados a pensar assim a maior parte
do tempo. Mostramos a uma criança a foto de um cachorro e dizemos
"isso é um cachorrinho", mas não é. É apenas uma foto. — Ele a olhou de
lado e acrescentou: — Uma casa de papel não é uma casa.
— A menos que exista alguém que possa transformar uma imagem em
realidade. — Jenny disse, dando-lhe um olhar significa vo para trás.
— Talvez ele seja um ar sta, de certa forma — disse Zach. Ele virou para
outra página. — Está vendo isso? É uma pintura famosa.
Era outra imagem extremamente estranha, mas você levava um momento
para notar isso. Mostrava uma janela em uma sala e, através da janela, um
panorama. Colinas, árvores e nuvens. Só que... era estranho. Embaixo da
janela havia três coisas de metal, como as pernas de um suporte. As pernas
de um cavalete, Jenny percebeu de repente. Na verdade, havia um cavalete
com uma tela em frente à janela, mas a pintura na tela combinava tão
exatamente com a paisagem atrás dela que era quase invisível.
Ficou pensando: onde estava o ar sta que havia deixado o cavalete? E
quem poderia ter pintado uma imagem que se misturasse exatamente à
realidade?
— É bizarro. Eu gosto disso. — Ela disse e sorriu para Zach, sen ndo como
se eles vessem um segredo. Ela viu a expressão dele mudar e então ele
desviou o olhar, os olhos cinzentos distantes.
— É importante saber a diferença entre imagem e realidade — Zach disse
suavemente. Olhou para ela de novo, como se es vesse pensando em
contar outro segredo. Considerando se ela era confiável. Então disse quase
casualmente: — Sabe, eu pensava que os mundos imaginários eram mais
seguros que o real. Então vi um mundo imaginário real. E foi... — Ele
parou.
Jenny ficou assustada com a expressão dele. Ela colocou a mão no braço
dele.
— Eu sei.
Ele olhou para ela.
— Lembra-se de como brincávamos no pomar quando éramos crianças?
Não parecia importante saber a diferença entre o que era real e o que não
era. Mas agora é importante. É importante para mim.
Ah, Jenny entendeu, de repente. Não era de se admirar que Zach es vesse
tão mal-humorado ul mamente. Sua fotografia, sua arte... não era mais
segura. Fora contaminada por sua experiência no Mundo das Sombras.
Pela primeira vez em sua vida, Zach estava enfrentando a realidade.
— É por isso que você não fez novas impressões. — sussurrou ela. — Não
é, Zach? É... é um bloqueio ar s co.
Ele curvou um ombro novamente.
— Eu simplesmente não veja nada que queira fotografar. Eu costumava ver
coisas o tempo todo e queria fotografá-las, mas ul mamente
simplesmente não me importo.
— Sinto muito, Zach. — Mas fico feliz que você tenha me contado, pensou
Jenny. Se sen u muito perto de seu primo naquele momento. Ela
con nuou em voz baixa: — Talvez quando tudo acabar...
Ela foi cortada pelo estrondo de uma porta. O momento de silêncio foi
quebrado. O pai de Zach estava parado na porta. Ele cumprimentou
brevemente Jenny, depois se virou para Zach.
— Então aqui está você. O que foi àquilo de sobre você sair sem contar a
ninguém ontem à noite?
Jenny nunca nha certeza se gostava de seu o Bill. Ele era um homem
grande e nha mãos grandes e peludas. Seu rosto sempre parecia bastante
corado.
— Eu só fui passar a noite em um lugar. Isso é crime? — A voz de Zach era
fria.
— É quando você não conta para sua mãe ou para mim.
— Eu deixei um bilhete.
— Não estou falando de um bilhete. — O rosto do Sr. Taylor ficou mais
vermelho. — Não sei mais o que está acontecendo com você. Você
costumava passar a maior parte do tempo escondido aqui — ele ges culou
em torno da garagem. —, e agora você se foi. E sua mãe disse que você vai
passar mais uma noite.
— Eu tenho um projeto para fazer...
— Então pode fazê-lo aqui. Você não vai passar a noite em uma escola. Se
você acha isso, é porque tem outra intenção em mente.
O estômago de Jenny nha parecia cair como um elevador desregulado.
Ela abriu a boca, tentando pensar em algo, qualquer coisa para dizer. Mas
podia ver pelo rosto de seu o que isso não faria nenhum bem. Ele era tão
teimoso quanto Zach; mais ainda.
Jenny virou-se consternada quando o o se fora.
— O que vamos fazer?
— Nada. — Com o rosto virado para ela, Zach fechou o livro de arte e o
colocou de volta na prateleira de madeira prensada.
— Mas, Zach, temos que...
— Olha, se você discu r com ele, ele ficará mais louco e pode ligar para
seus pais. Você quer isso? — Ele se virou e seu rosto magro estava calmo,
embora Jenny pensasse que seus olhos pareciam um pouco doloridos. —
Não vamos piorar isso, Jenny. Talvez ele me deixe ir amanhã.
— Mas durante hoje à noite...
— Eu vou ficar bem. Você apenas... apenas tome cuidado, tudo bem? —
Ele se moveu quando Jenny tentou colocar a mão em seu braço e
acrescentou: — Diga aos outros o que aconteceu, certo? Ficarei aqui um
pouco. Tentar fazer algum trabalho.
A mão de Jenny caiu.
— Ok, Zach, — ela disse suavemente e piscou. — Adeus. Quero dizer, te
vejo mais tarde. — Jenny se virou e saiu rapidamente da garagem.

— E agora? — Dee ques onou quando eles estavam de volta ao


apartamento. Todos estavam calados, o triunfo esvaziado.
— Agora pedimos pizza e esperamos. — disse Michael.
— Pode ser. — concordou Jenny. — Nós temos que descobrir onde essa
base é.

Jenny acordou assustada e pensou: alucinação hipnopômica? Acho que


estou acordada, mas ainda estou sonhando.
Mian estava debruçada sobre ela.
— Tom! — Jenny choramingou, virando-se para vê-lo deitado no chão ao
seu lado, a respiração profunda e regular. O choro dela não o acordou.
— Não se preocupe. É apenas um sonho. Entre na outra sala, onde
podemos ter um pouco de privacidade.
Jenny, que usava seu próprio pijama esta noite, em vez do de Michael,
levantou o cobertor mais alto. Como uma garota vitoriana em uma
camisola de renda.
— Você é louco. — ela disse com calma dos sonhos. — Se eu for lá, você
vai me seqüestrar.
— Eu não vou. Eu prometo. — Seus dentes brilhavam brevemente para ela,
como um lobo. — Lembra de Perthro?
A runa do jogo, Jenny pensou, vendo em sua mente as linhas que ele
esboçara no ar na noite do baile. A runa de fair play; de ser é co com os
concorrentes em esportes. Significando que ele cumpriu suas promessas,
ela supôs. Ou que ele manteria isso. Ou que disse o quê faria.
Mas ele pode me dar uma pista sobre a base, Jenny pensou, já que ela e os
outros não veram do muita sorte tentando descobrir por si mesmos. E
era um sonho, pelo menos. Ela se levantou e o seguiu até o quarto de
Michael, onde o relógio marcava 4:33 da manhã.
— Onde está Audrey? — Exigiu assim que ele se virou para ela. Se isso
fosse realidade, Jenny teria medo dele, talvez até medo de falar. Mas era
um sonho, e tudo o que ela fazia era governado pela lógica dos sonhos.
— Segura.
— Mas onde ela está?
— Isso seria revelador demais. — Seus olhos a percorreram e ele sorriu. —
Tenho que dizer; você parece igualmente bem no grunge e na alta moda.
Não era um sonho. A maneira como ele perturbava e excitava Jenny era
muito real. Por conta da lâmpada de cabeceira de Michael, ela podia ver os
olhos dele, que no baile haviam sido sombreados por sua máscara.
Finalmente descobriu qual era a cor deles. Era o azul que você vê quando
lava o rosto no chuveiro e pressiona os dedos nas pálpebras fechadas. Você
vê filamentos de brilho gravados no preto, mais vibrantes que o azul
elétrico. Uma cor que não está realmente nos comprimentos de onda da
luz que o olho humano pode perceber. A cor que Jenny nha visto na
imagem posterior quando o computador piscou.
Ela desviou o olhar, estendendo simultaneamente a mão para ele.
— Eu quero isso, por favor. Pelo menos até o Jogo acabar, re o anel.
Ele pegou a mão dela, acariciando a palma com o polegar.
— Ele está deixando Tommy nervoso?
— Não... eu não sei. Eu não gosto dele. — Ela olhou para ele novamente,
tentando afastar a mão. Seus dedos eram mais frios que os de Tom, mas
igualmente fortes. — Eu te odeio — disse Jenny sinceramente. Não
conseguia entender por que ele nunca parecia aceitar isso. — Você me faz
te odiar.
— É isso que você está sen ndo? Ódio?
Jenny estava tremendo. Teimosamente, ela assen u.
Muito gen lmente ele prendeu sua mão, puxando-a para ele. Ela estava
errada. Ele não era tão forte quanto Tom; era mais forte. Lutar ou gritar?
Jenny pensou. Mas ele estava tão perto agora. Ela podia sen r o
movimento da respiração dele. Seu coração estava batendo na base da
garganta. Ela podia sen r seus olhos se arregalarem quando olhou para
ele. A expressão dele fez o estômago dela vibrar.
— Eu vou te beijar...
Oh, isso foi tudo?
— ...até você desmaiar.
Então as sombras pareciam preencher todos os cantos do quarto e se
aproximar de Jenny.
Mas uma parte de sua mente ainda nha forças. Não desmaiaria, embora
suas pernas es vessem fracas novamente. Ela o empurrou.
— Você é mau — Ela sussurrou. — Como você acha que eu poderia amar
alguma coisa má? A menos que eu também fosse má...
Ela estava começando a se perguntar sobre isso. Mas ele riu.
— Não existe apenas bem e mal, preto e branco. O preto e branco por si só
é chato, Jenny. Se você os mistura, obtém muitas cores, tantas cores...
Ela negou. O ouviu pegar algo, um dos livros de Michael.
— Aqui. Você já leu este?
Era um poema. A Condição Humana, de Howard Nemerov. Os olhos de
Jenny deslizaram sobre ele, sem realmente entender nada disso. Ele a
confundia.
— É sobre o mundo e pensamento — explicou Julian. — O mundo é o
mundo e o pensamento é tudo o resto. Imagem. Ao contrário da realidade.
— Ele sorriu para ela. — Essa é uma dica, aliás.
Jenny ainda estava confusa. Não conseguia se concentrar no poema e
estava estranhamente cansada. Como um hipno zador ordenava, seus
olhos estavam pesados. Todo o seu corpo estava quente e pesado.
Julian a abraçou, apoiando-a:
— É melhor você acordar agora.
— Você quer dizer que é melhor eu ir dormir.
— Quero dizer acordar. Você não quer se atrasar.
Ela teve que abri-los... teve que abrir os olhos... Mas estava à deriva, em
algum lugar escuro, silencioso e quente.
Apenas flutuando... flutuando...
Algum tempo depois, Jenny abriu os olhos. Pestanejou. Estava deitada no
chão da sala de Michael.
Afinal, nha sido um sonho.
Mas ao lado dela havia um livro aberto, de bruços. Poesia Contemporânea.
Jenny o pegou e viu o poema que Julian havia lhe mostrado.
Agora que estava acordada e pensando com clareza, o poema fazia mais
sen do; foi até vagamente empolgante, mas ela não teve tempo de
apreciar. Seus olhos se fixaram em certas palavras e seu coração começou
a bater forte.
Certa vez, vi o mundo e pensei conhecê-lo de verdade, mas apenas uma
imagem de Magri e.
O poema era sobre a imagem de uma pintura de Magri e, a que Zach
havia lhe mostrado. A de uma pintura que estava na frente de uma janela
aberta, combinando exatamente com a paisagem do lado de fora. Se
encaixando como uma peça de quebra-cabeça, sozinho em uma sala vazia.
Magri e, Jenny pensou. Meu Deus! Uma sala vazia.
Soltando o livro, ela agarrou o ombro de Tom.
— Tom! Tom, levante-se! Dee! Michael! Zach é o próximo!
CAPÍTULO 12

Zach estava dormindo quando sen u o rastejar em suas pernas. Ou meio


adormecido, de qualquer forma. Não dormia há dias. Não nha sonhado.
Seus pensamentos diurnos con nuaram, mesmo quando ele ficou lá, com
os olhos fechados por horas.
Ele se perguntou o que acontece com você quando não se sonha por dias.
Alucinações enquanto anda por aí?
Esta noite, porém, ele estava defini vamente à deriva quando sen u o
toque no tornozelo. Uma sensação suave e emborrachada. Por um
momento Zach ficou paralisado, e esse momento foi o suficiente. A
sensação de borracha subiu por sua perna, estômago, peito. O apertou
como uma corda viva, bloqueando sua respiração.
Os olhos de Zach se abriram e ele viu claramente a cabeça da cobra
olhando para seu rosto. Os olhos eram dois pontos de luz brilhante; sua
boca estava tão aberta que a mandíbula parecia estar deslocada. Como se
fosse comê-lo. Daquela boca aberta surgiu um interminável som
ameaçador.
Incapaz de se mover, Zach olhou para a forma oscilante. Então, de alguma
maneira, sua perspec va mudou. Seus olhos doíam por tentar, mas ele não
conseguia mais ver a cabeça da cobra. Os dois pontos de luz pareciam mais
estrelas que ele colara no teto quando nha oito anos e que brilhavam no
escuro. Ele raspara a maioria delas quando seu pai ordenou aos gritos, mas
ainda restavam algumas.
Ele não podia ouvir o sibilar agora também. Apenas o shhshhshhshh do ar
condicionado. Seus braços e pernas estavam parecendo colados na roupa
de cama. Deus, Zach pensou, e chutou o lençol e o cobertor. Se levantou e
acendeu a luz. Agora sabia o que acontecia quando você passava dias sem
sonhar.
Claro que não havia uma cobra em sua cama.
Mesmo assim, a úl ma coisa que ele queria era deitar-se novamente.
Podia muito bem ir para a garagem. Mesmo que não pudesse trabalhar,
isso poderia distraí-lo.
Quando Zach chegou à garagem, a cobra estava esperando por ele.
Mas não era como uma cobra de verdade. Foi a ideia de um pintor
surrealista ao pintar um redemoinho de serpentes na escuridão que se
amontoava e subia em um movimento de cobra. Luz azul-branca conectava
segmentos obscuros do corpo. Uma espécie de combinação entre uma
cobra e um raio em uma tempestade.
Veio em sua direção com o pressen mento cego de um verme de tomate.
Tinha pelo menos três metros de comprimento.
Se eu pudesse colocá-lo no canto, Zach pensou, com a mente fria e clara.
Ele olhou para o canto da garagem onde sua SLR 6x6 estava em um tripé.
Se pudesse levá-lo até lá, ele nha quase certeza de que poderia rar uma
foto.
Ele não era estúpido. Via o perigo em que estava. Mas a ideia de fotografar
essa coisa, ver como seria no filme, levou todos os outros pensamentos de
sua mente. Era a primeira vez que Zach se importava em rar uma foto
desde o dia do jogo. De repente, o bloqueio ar s co desapareceu e sua
cria vidade voltou rapidamente. Isso quase irreal. Soava algo inseguro,
mas estranhamente bonito também. Era a Arte.
Zach estava desesperado para capturá-lo. Tente os 35 milímetros primeiro,
sua mente lhe disse. Está mais perto. Com os olhos fixos no monstro
maravilhosamente ar s co, ele pegou a câmera na mesa.

O relógio no jipe de Dee marcava 5:45. Mais de uma hora depois do que o
relógio no sonho de Jenny no quarto de Michael apresentava.
— Ah, Deus, vamos antes que seja tarde demais. — ela sussurrou. E era
sua culpa. Ela não nha acordado a tempo. Mesmo com o aviso de Julian,
ela não nha acordado a tempo. — Depressa, Dee! Depressa!
As árvores estavam em silhueta contra o amanhecer de um flamingo
quando chegaram à casa de Zach.
— Vamos pela garagem. — Tom disse, enquanto todos pulavam do jipe. —
A úl ma vez que es ve aqui, a porta estava destrancada.
Zach não seria tão estúpido hoje à noite, mas não havia tempo para
discu r, Jenny pensou. Ela estava seguindo os outros correndo para a porta
lateral da garagem. A porta se abriu sob a mão de Tom e todos entraram.
A luz da garagem estava acesa. Havia um cheiro forte e estranho no ar. Um
círculo escuro de fuligem no chão.
No centro, havia um boneco de papel com olhos cinzentos.
— Chegamos muito tarde. — Jenny disse estupidamente, olhando para o
boneco de papel de Zach que estava segurando. Ele olhou para ela, as
linhas finas de seu rosto sombreadas pela mão de ar sta do primo. Os
olhos a lápis pareciam vagamente surpresos.
Dee estava esfregando a fuligem entre os dedos. Tom estava em pé na
frente da esquina onde a câmera de Zach e um holofote de tungstênio
estavam derrubados.
— Houve uma briga — ele afirmou, e Michael apenas lambeu os lábios e
estremeceu.
— Seus pais não devem ter ouvido nada — Jenny disse lentamente, depois
de um momento. — Se não, estariam aqui embaixo. Então é melhor
escrevermos um bilhete para eles, como se fosse de Zach, dizendo que ele
já foi para a escola.
A voz de Michael foi moderada.
— Você está louca. Nós não podemos con nuar com isso. Eventualmente,
alguns dos pais vão conversar uns com o outro...
— Como vai ajudar meus os descobrirem que Zach sumiu? O quê eles
podem fazer?
— Nos colocar em macacões laranjas" — disse Dee, do chão. — Já são
muitos desaparecimentos. Se perdermos mais amigos, vamos para a
cadeia. Agora, vamos, vamos sair daqui. — acrescentou sucintamente.
De volta ao carro, Tom disse:
— Não vejo como podemos ir à escola. Não temos os mesmos horários.
— Então teremos que rar o dia de folga — disse Dee. — Poxa, que pena.
— Você está gostando disso, não é? — Michael a olhou com tristeza, do
banco do passageiro da frente.
Ela lhe deu um sorriso ni damente incivilizado.
— Temos que descobrir onde está a base — Jenny estava dizendo no banco
de trás. Desta vez, ela se controlara muito bem, pensou. Sem gritar ou
chorar, mesmo quando viu o boneco de papel de Zach. Mas o sen mento
de culpa ainda estava consigo. — Não tenho sido muito boa em descobrir
as pistas até agora. — Manteve a voz nivelada para que os outros não
pensassem que queria que sen ssem pena dela.
— Porque Julian quer assim — disse Dee. Jenny lhes contou sobre o sonho
no caminho até a casa de Zach, deixando de fora o beijo. — Ele não está
jogando limpo. Recebemos a primeira pista com antecedência, mas não
era clara o bastante. A segunda foi fácil, mas não nhamos tempo para
fazer algo.
— Eu deveria ter acordado mais cedo — Jenny disse em voz baixa. Ao lado
dela, Tom começou a alcançá-la e Jenny viu seu rosto, todos os aviões e
sombras à luz da manhã. Tom Locke até parecia o raiar do dia; ele acordava
assim.
Mas a mão de Tom voltou para o lado de seu corpo e Jenny sabia o que era
sem perguntar. Ela estava sentada à direita dele no carro e a mão
esquerda, com o anel, estava entre eles. Ela olhou pela janela ferozmente e
fingiu que não se importava.
— Há uma razão pela qual eu queria ir para a escola hoje — disse ela. —
Para saber algo sobre Eric, o cara com quem Audrey estava. Ver se ele está
bem.
— Eu poderia ligar para a casa dele e perguntar. Eu o conheço um pouco —
disse Tom, para mostrar que ainda estava conversando com ela, mesmo
que não a tocasse. Ah, somos terrivelmente corteses; sempre nos
ajudando, pensou Jenny, com ironia.
— Podemos ligar do apartamento — disse Michael. — Nós deveríamos
pegar comida primeiro.
— Não, eu digo o que temos que fazer — retrucou Dee, a voz com
excitação. — Vamos ver minha avó Aba.
— Tão cedo assim?
— Nem todo mundo dorme como você, Mikey. Além disso, ela pode nos
dar café da manhã.
No banco de trás, Jenny se inclinou para frente. Um peso gigante parecia
ter saído de seu peito, pelo menos por um momento.
— Você está certa. Vamos ver Aba. Talvez ela saiba o que devemos fazer.

Aba morava em uma casa ao lado da de Dee. Os dois edi cios estavam na
mesma propriedade, mas a casa de Aba nha um caráter dis ntamente
diferente. Dee e os amigos sempre a chamavam de Casa das Artes de
Jardim. Uma ala inteira era dedicada à arte de Aba, centrada no estúdio
onde ela fazia suas esculturas. A sala ampla e arejada era toda em paredes
e clarabóias assimétricas.
Aba estava trabalhando quando eles chegaram, pegando argila cinza úmida
de uma gela e batendo em uma armadura de arame.
— O que isso vai ser? — Dee perguntou, aproximando-se da avó.
— Bom dia — disse Aba com firmeza e quando todos a responderam, ela
con nuou: — Um vaso de Neetu Badhu, manicure de sua mãe. Ela tem um
rosto muito interessante e deve chegar aqui às sete.
— Então é melhor nos apressarmos. Tudo bem se usarmos o seu telefone,
vó? E tomarmos café da manhã?
— Há bolinhos de caramelo na cozinha. Peguem-os e depois voltem e me
digam por que estão aqui. — disse Aba.
Enquanto os outros foram para a cozinha, Tom pegou o telefone.
— Eric está bem — disse ele quando desligou. — Estava em casa hoje, mas
não há nada realmente errado com ele. A polícia está interessada em
conversar com quem viu o ataque, o que significa Audrey.
Michael parou de comer seu pão.
— O que significa que eles podem estar tentando localizá-la. Ó mo! —
bufou.
— Não se preocupe, Mikey — disse Dee confortavelmente. — Você
provavelmente será o próximo, então não estará aqui quando nossa
Grande Encenação desmoronar.
— Dee, você está men ndo? — disse Aba.
— Sim. Nossa vida inteira nos úl mos dias tem sido um teor de men ras.
Aba balançou a cabeça e enxugou as mãos manchadas de barro na bata de
brim.
— Agora, me digam. — ordenou ela ao grupo.
E eles fizeram. Contaram a verdade sobre o que estava acontecendo desde
que foram libertados da delegacia; como estavam procurando a casa de
papel, como a encontraram, o que Julian havia dito a Jenny sobre o novo
jogo. E o que aconteceu com Zach e Audrey.
Aba ouviu tudo, seu lindo rosto velho, sério e atento. Quando a manicure
chegou às sete horas, ela cobriu o vaso com um pano e a mandou embora,
con nuando a ouvi-los.
Quando terminaram, ela ficou em silêncio por um momento. Jenny meio
que esperava que ela dissesse algo sobre o quão errado era enganar seus
pais - Aba era um adulto, afinal. Ela meio que esperava que Aba dissesse
que Dee não podia ficar com o resto deles porque era muito perigoso. E,
embora não esperasse, desejava desesperadamente que Aba dissesse
"Aqui está a resposta" e resolvesse todos os problemas deles.
Aba não fez nada disso. Em vez disso, depois de vários minutos de silêncio,
disse: "Ontem à noite, sonhei com a história de Hausa que minha mãe
costumava me contar. Fazia muito, muito tempo que isso não acontecia.
Me pergunto se não sonhei com ela por causa de vocês".
— Por nossa causa?
— Sim. Talvez eu devesse contar a vocês. — Ela sentou-se e pensou por um
momento, depois começou: — A história é sobre um garoto e uma garota
apaixonados. Mas um dia, enquanto estavam sentados juntos no tapete,
Iblis apareceu e cortou a cabeça do garoto. O matou.
— Iblis? — O nome parecia vagamente familiar para Jenny. — Quem é
essa?
— Esse. É o príncipe das trevas. — disse Aba gravemente. — O príncipe dos
aaljunnu...
— Dos gênios — disse Dee, seus olhos brilhando para Jenny.
— Sim — confirmou Aba. — Mas em nosso folclore, os aljunnu não eram
gênios gen s. Eram covardes poderosos e maus, e Iblis era o líder deles.
Minha mãe nunca me disse por que ele cortou a cabeça do garoto. Mas
como Iblis sempre gostou de fazer apenas o mal... De qualquer forma, Iblis
matou o garoto e a garota não pôde fazer nada além de sentar no tapete e
chorar. Depois de um tempo, os pais do garoto apareceram e quando viram
o que acontecera, começaram a chorar também.
— "Então Iblis voltou. Ele acenou com a mão e o chão tremeu. Diante do
garoto, apareceu um rio de fogo, um rio de água e um rio de cobras. E Iblis
virou-se para a mãe do menino e disse: 'Se você gostaria de trazer seu filho
de volta à vida, tudo o que você precisa fazer é nadar pelos três rios para
pegá-lo'".
— Certo... — Michael murmurou quase inaudível. Aba sorriu para ele e
con nuou.
— "Mas a mãe do menino estava com medo. Ela se virou para o marido,
mas ele também estava com medo. Então a menina deu um salto. 'Eu vou
fazer isso', ela disse. Naturalmente, também estava com muito medo, mas
seu amor pelo menino era mais forte. Sem outra palavra, ela mergulhou no
rio de fogo. O fogo a queimava, é claro, mas ela nadou através dele mesmo
assim e pulou no rio de água. E a água a sufocava, mas a garota lutou
contra ela e foi para o rio de cobras. E as cobras a a ngiram..."
— ...como cobras fazem. — Dee interrompeu a avó, sorrindo.
— "Mas a garota conseguiu tropeçar nelas e a próxima coisa que soube era
que havia chegado ao garoto. Assim que o tocou, a cabeça do garoto voou
para seus ombros e ele levantou-se, vivo e bem. Iblis foi embora, xingando,
para fazer suas travessuras em alguma outra parte do mundo. E suponho
que o menino e a menina se casaram, embora eu realmente não me
lembre do que minha mãe disse sobre isso."
— Bem, essa é a história que minha mãe me contou. — finalizou Aba,
olhando-os. — Não sei que significado ela tem para vocês, talvez nenhum.
Mas você já a ouviram agora.
— Talvez signifique que o amor pode ser mais forte que o medo. — Jenny
arriscou suavemente.
— Talvez signifique que você não pode confiar em seus pais — Michael
opinou, absolutamente impassível, e Aba riu.
— Eu gosto mais da interpretação de Jenny. Mas como disse, pode não
haver sen do. Ou possivelmente é apenas uma história sobre os poderes
rela vos do bem e do mal.
— Você acredita no bem e no mal? — Jenny olhou rapidamente.
— Ah, sim. Fortemente. E acredito que o mal às vezes precisa ser
comba do pessoalmente. De mão para mão. Se você se importa o
suficiente para fazê-lo.
Michael se mexeu.
— Você sabe o que dizem sobre pessoas da nossa idade. Que não nos
importamos com o certo, errado ou algo assim. Que não nos importamos
com o futuro.
— Sim, que somos fúteis e alienados. — Dee os imitou, sorrindo.
— Que não nos importamos com nada nem ninguém a não ser nós
mesmos.
— Não é verdade. Nós nos importamos. — Jenny o olhou. — Você é
atencioso com todos, Michael, mais do que qualquer pessoa que eu já
tenha conhecido. Você finge que não, mas é. E é por isso que Audrey ama
você... — Ela parou porque Michael estava olhando para longe, os olhos
sarcás cos de spaniel agora quase marejados. — Vamos encontrá-la. —
prometeu, com a própria garganta apertada.
— Eu sei — concordou Michael e esfregou a ponta do nariz com os dedos.
Aba falou:
— Gostaria de poder ajudar, mas sou uma mulher velha. Meus dias de luta
terminaram.
— Bem, os meus não. — Dee ergueu um braço magro para examinar o
músculo duro sob a pele de veludo. — Os meus estão apenas começando.
Aba a olhou e sorriu levemente. Durante anos, ela e Dee brigaram por Dee
preferir o kung fu à faculdade e insis r em que não queria fazer nada
inteligente como a mãe ou ar s co como a avó. Mas naquele momento
Jenny sabia que Aba estava orgulhosa de sua neta guerreira.
— É a nossa luta de qualquer maneira — Jenny afirmou. — Ele não deixará
ninguém novo entrar no jogo. Apenas os jogadores originais, ele disse.
— Eu acho que se alguém puder encontrar seus amigos, será você, Jenny.
— disse Aba, olhando diretamente para ela. Os olhos da senhora eram
muito gen s e tristes; lembraram a Jenny as fotos de Albert Einstein.
— Eu vou tentar — disse Jenny.
Quando a velha se virou, Jenny apenas captou as palavras murmuradas:
"Mas me pergunto qual será o custo".

Antes de par rem, Aba os deixou invadir a cozinha. Eles pegaram queijo
co age e peitos de frango frios; brownies de cereais e uvas e maçãs. No
caminho de volta, pararam na casa de Audrey e pegaram seu carro.
A sala de Michael estava começando a parecer o resultado de uma festa
muito longa, pensou Jenny enquanto entravam no apartamento. Os móveis
foram empurrados para as extremidades do local para dar espaço aos
colchões e sacos de dormir. O sofá xadrez era um ninho de cobertores
amarrotados. Latas de coca-cola vazias estavam espalhadas por toda parte
e a maioria das super cies planas estava cheia de livros, roupas ou pilhas
de louça suja.
— Tudo bem — disse Dee, voltando da cozinha com Michael. — Agora, e a
base? — Ela se sentou em um banquinho com um pote de requeijão e
maçãs picadas.
— Não temos informações suficientes. Ele não me contou o suficiente. —
relembrou Jenny.
Toda vez que ela mencionava o sonho, Tom murchava. Não havia ajuda
para isso, assim como não havia para a coisa brilhante em seu dedo. Ele
captou todos os reflexos da luz do sol da primavera entrando pela janela da
frente de Michael, e ela jurou que podia sen r as palavras no interior do
anel.
— Tenho tentado pensar sobre prédios abandonados ou coisas assim;
lugares por aqui que ele pode tomar para si. Mas isso não parece certo.
— Nos mistérios, as coisas estão sempre escondidas no lugar menos
provável. — disse Michael, pensa vo. — Ou no lugar mais óbvio, porque
você sempre acha que é o menos provável. Acho que não poderia ser a
casa de papel.
— Estava um lixo. Acho que não aguentaria nada. — discordou Jenny. —
Além disso, como poderíamos entrar por conta própria? Foi Julian quem
nos levou da úl ma vez.
Ela sabia, de alguma maneira, que a base de Julian não estava na casa de
papel. E sabia de outra coisa: Julian não acharia o jogo diver do a menos
que houvesse uma chance deles encontrarem a base. Ele a colocara em um
lugar que eles poderiam chegar se fossem inteligentes o bastante para
descobrir para onde olhar.
— Acho que a loja More Games é muito óbvia. — Michael murmurou.
— Muito óbvia e sumiu. — suspirou Jenny. — É apenas um mural agora.
Não, Julian colocaria em algum lugar inteligente.
— O que foi, Tom? — Dee o olhou. — Você tem alguma ideia?
Tom estava com um ar de preocupação, o visual que usava atualmente.
Agora mesmo também parecia perturbado. Ele se levantou e caminhou em
direção à cozinha, com os dedos nos bolsos traseiros.
— Se você acha que sabe alguma coisa... — Dee insis u.
— Não. Nada. — Tom balançou a cabeça e sentou-se novamente.
— Ok, vamos voltar ao começo. — disse Michael.
Mas não ajudou. Conversaram inu lmente durante a manhã e a maior
parte da tarde, até que uma mulher idosa chegou e tocou a campainha,
exigindo que Michael movesse o carro de Audrey.
Dee saiu com ele. Tom andava devagar pelo corredor, enquanto Jenny
estava sentada no sofá, olhando sem rumo pela janela. Eles estavam
presos, nem perto ainda de descobrirem aonde estava a base. E ela estava
cansada. Jenny fechou as pálpebras, vendo a luz do sol dourada da tarde
em suas pálpebras fechadas. Então, de repente, a luz ficou escura.
Seus olhos se abriram. Embora vesse sido um dia claro e sem nuvens,
havia algum po de névoa cobrindo a janela. Impedindo-a de ver. Jenny
olhou para ela, pulsando rapidamente, depois respirou fundo e se inclinou
para mais perto.
Não era névoa - e isso já teria sido estranho o suficiente. Mas era algo
ainda mais estranho. Era gelo.
Impulsionada pelo Rei do Gelo, a mãe de Jenny costumava dizer que
pareciam estar na Pensilvânia quando as janelas congelavam assim. Jenny
não via isso desde os cinco anos de idade. Naqueles dias, ela adorava achar
as coisas no gelo com o calor do dedo...
Algo estava aparecendo na janela como se es vesse traçado por um dedo
invisível. Uma letra.
P.
Jenny não conseguia respirar. Sua boca se abriu para chamar Tom, mas
nenhum som saiu.
E.Q.U.E.N.A...
Pequena. As letras pareciam lentamente, como se a ponta de um dedo as
es vesse traçando na janela gelada.
C.O.M.I.L.O.N.A...
Jenny observou, os cabelos no couro cabelo arrepiando-se. Ela não
conseguia se mover. Era muito estranho estar aqui sentado à luz do dia e
ver algo que simplesmente não podia acontecer.
C.O.M.E.N.D.O...
Sou eu, Jenny pensou, dominada por uma certeza irracional. Desta vez sou
eu que ele está atrás. Sou a pequena comilona.
Q.U.E.I.J.O.E.M.P.O.T.E.A.O.R.E.D.O.R...
Ainda incapaz de se mover, os olhos de Jenny se moveram para cima. Uma
aranha. Ela nha medo de aranhas, grilos e todas as coisas rastejantes e
agitadas. Ela esperava ver um fio descendo do teto, mas não havia nada.
V.E.I.O.U.M.A.A.R.A.N.H.A.E.S.E.N.T.O.U.A.O.S.E.U.L.A.D.O...
Uma aranha.
The Spider, Jenny pensou. O carro de Audrey.
— Tom — ela sussurrou. E então de repente estava se movendo,
arrancando os olhos das letras que ainda estavam aparecendo. — Tom,
venha aqui. Tom!
Enquanto corria, quase caiu sobre o banquinho onde Dee es vera sentada
antes.
Comendo requeijão, que vinha em um po nho. Queijo em pote.

CAPÍTULO 13

— Velha ridícula. — Michael grunhiu enquanto Dee re rava o Spider de


Audrey do estacionamento solar. — Ela nem usa esse espaço mas vai
deixar mais alguém estacionar aqui? Claro que não. Agora temos que ir até
a garagem... vire à esquerda lá em cima e contorne as latas de lixo.
— Eu nem sabia que aqui nha garagem.
— Papai e eu nunca usamos — explicou ele quando Dee passou por uma
entrada escura e desceu uma rampa. — Os estacionamento solares são
muito mais prá cos.
— Sim, mas agora é provavelmente uma boa ideia guardar carro de Audrey
nela. Na verdade, podemos querer colocar todos os carros aqui, porque se
alguém os notar do lado de fora do seu apartamento, saberão que estamos
todos aqui. Deveríamos ter pensado nisso antes.
— Talvez — disse Michael sem entusiasmo. — Não sei; quando eu era
criança, sempre odiava esse lugar. Achava que havia um dragão no escuro.
— É apenas uma garagem, Mikey. — Dee sorriu. Mas ele estava certo, ela
pensou. Havia algo desagradável na garagem. Era sombria e mal
iluminada, e ela podia ver como uma criança com uma imaginação fér l
poderia pensar em dragões.
Não seja ridícula, ela disse a si mesma. Era manhã, mas o tempo estava
nublado. Eles haviam virado a esquina para o nível mais baixo da garagem
e ali estava tão escuro quanto o crepúsculo, as cin lantes lâmpadas
azuladas no teto. Um crepúsculo estranho e não natural.
No momento em que ela pensava, as luzes ao redor deles tremiam
loucamente e se apagavam.
Era como mergulhar no túnel de uma montanha-russa. Dee sen u
subitamente que tudo estava acontecendo muito rápido - enquanto ao
mesmo tempo tudo acontecia em câmera lenta, quadro a quadro. Seus
olhos ainda não estavam adaptados às sombras. Naquele primeiro instante
ela não viu nada. Mas ouviu o rosnado da parte de trás do carro
claramente.
Era um som grosso, coágulo e animal. Um som grande, só o mbre
informava que apenas algo grande poderia ter produzido-o. Tão baixo e
arrastado que parecia uma trilha sonora em câmera lenta. Parecia uma
alucinação.
— O quê... — Michael estava quase rasgando o cinto de segurança,
virando-se para olhar. Dee viu o branco de seus olhos. Então, quando ela
girou a cabeça por cima do ombro, teve um vislumbre do que havia na
traseira do carro.
Olhos pálidos e dentes brancos em mandíbulas escancaradas. A visão de
Dee estava se adaptando. Ela viu uma forma enorme se materializando
naquele espaço incrivelmente pequeno, como se es vesse entrando por
uma porta na área entre a cabine e o porta-malas. Chegando e saindo
como um gênio emergindo de uma garrafa. Ainda não está totalmente
claro, ela percebeu. Mas não havia tempo para pensar em nada.
— Saia! — ela gritou. Michael estava congelado, segurando o assento e
ofegando. Dee estendeu a mão sobre ele, apertando os dedos na
maçaneta da porta do Spider. Ela abriu a porta e o empurrou, freando
automa camente no mesmo instante.
Michael caiu e bateu com força. Dee sen u uma onda de ar quente e
molhado em seu rosto, como a explosão de um microondas. Um odor feroz
e almiscarado fez suas narinas se dilatarem. O rosnado estava diretamente
em seu ouvido.
Mexa-se, garota!
Ela apertou o acelerador. O rosnado caiu para trás e ela ouviu o arranhar
de garras logo atrás dela. Rapidamente, abriu sua própria porta e saltou
para fora, conseguindo a proeza de cair de lado no chão duro. Dee
conseguiu rolar e ficou de pé a tempo de ver o Spider cruzando a parede
da garagem.
Alguma parte distante de sua mente observava o impacto com uma
espécie de reverência alegre. Uma ba da e tanto, pensou, e deu um
sorriso bárbaro para o nada.
Então ela viu movimento. Algo estava emergindo do Spider, com um
rosnado crescente. Dee girou nos calcanhares e correu. Ela podia ver a luz
da escada à sua frente.
Se pudesse chegar lá...
Ela sen u seus Nikes ricochetearem no concreto, os braços balançando e
os pulmões bombeando. Seus dentes recuaram novamente em um sorriso.
Naquele momento, Dee Eliade estava cheia de uma alegria por viver tão
intensa que sen u que podia voar.
— Vamos lá, seu saco de pulgas! — ela gritou por cima do ombro e se
ouviu rir loucamente. — Venha me pegar! — Ela nunca havia lutado com
um oponente de quatro patas antes, mas com certeza tentaria. Veria como
um lobo reagia a um chute circular de karatê.
Ela alcançou a escada e girou, ainda rindo. O sangue estava cantando em
suas veias, cada respiração que ela soltava era doce. Seus músculos
estavam elétricos com uma energia vibrante. Ela se sen a equilibrada,
dinâmica e pronta para qualquer coisa.
Michael estava se levantando quando Jenny e Tom dobraram a esquina,
olhando para as profundezas da garagem escura. Ele estava segurando um
tornozelo.
— E Dee? — Jenny ofegou. Ecos de um estrondo metálico ainda estavam
reverberando em sua mente. Michael acenou em direção ao fundo da
garagem e então ela viu. Uma forma grande e escura contra a parede. O
Spider.
As luzes piscaram e acenderam, e ela viu com claridade.
A parte dianteira do Spider estava amassado. Não havia sinal de Dee.
— Vamos! — Tom já estava correndo em direção ao carro. Então ele olhou
para a esquerda e gritou: — A escada!
A porta estava se fechando. Jenny ouviu o barulho e sen u o peito tremer
enquanto corriam. Tom chegou e segurou a maçaneta com as duas mãos,
puxando-a com força. A porta se abriu, batendo contra a parede. Um único
painel fluorescente tremeluzia acima da escada e Jenny podia ouvir ecos
de sua própria respiração ofegante na pequena sala. Mas nada se moveu,
exceto as sombras.
A boneca de papel de Dee estava no chão, em um círculo levemente
chamuscado no concreto.

— Ele vai pegar todos nós. — Jenny apertou a gaze em torno do tornozelo
de Michael, que murmurava. — Se Dee não conseguiu fugir dele, que po
de chance nós temos?
Ela colocou pequenos esparadrapos no cura vo e recostou-se.
— As pistas não são justas. — Ele protestou. Ainda estava respirando com
dificuldade, e seus olhos estavam muito arregalados, mostrando branco
em volta das íris escuras. — Você disse que Tom e você correram direto
para lá quando você conseguiu essa, o que significa que você não teve
tempo. Ele não vai dar tempo para nenhum de nós. E nunca vamos
encontrar a base.
Jenny fechou o kit de primeiros socorros de plás co. A boneca de papel
estava sobre a mesa de café ao lado. Caindo de costas, o que não era
caracterís co de Dee. Os olhos pretos de giz de cera encaravam o teto com
um olhar astuto.
Eles empurraram o carro de Audrey para o fundo da garagem, onde
esperavam que ninguém o encontrasse. Jenny supôs que veram sorte de
ninguém ter vindo inves gar o acidente, mas isso realmente importava
mais? Alguma coisa realmente importava?
— Estou falando sozinho mesmo? Vocês não vão dizer nada?
Jenny olhou para Michael e depois para Tom, que estava andando pelo
corredor, sem olhar para eles. Ela voltou-se para Michael e seus olhos
encontraram os dele. Seus olhares travaram uma batalha momentânea,
então ele afundou de volta no sofá, a raiva diminuindo.
— O que há para dizer? — Jenny devolveu.
Eles passaram a noite em silêncio; Tom andando e Michael e Jenny
sentados. Olhando para a tela da TV desligada.
Tudo iria desmoronar em breve, a men ra deles cuidadosamente
construída. Jenny ligou para a a Lily para dizer que Zach estava chateado e
passaria a noite com Tom. Ligou para a mãe de Dee e disse que Dee estava
com ela. Nenhuma mãe estava feliz. Era apenas uma questão de tempo até
que uma deles ligasse para a casa de Tom ou de Jenny e tudo viesse à tona.
E Michael estava certo. Eles não iriam encontrar a base, não com míseras
informações que nham. Precisavam de mais.
Por isso, Jenny ficou realmente feliz quando Julian apareceu em seus
sonhos naquela noite.
Levou um longo tempo para dormir - ela ficou deitada olhando horas para
o sofá vazio onde Dee deveria estar. A úl ma coisa clara de que se
lembrava era de decidir que não iria dormir àquela, e então deve ter
fechado os olhos. Quando os reabriu, soube que não havia aberto
realmente e que estava sonhando de novo.
Ela estava em pé em uma sala branca. Julian estava em pé na frente de
uma mesa, com a coisa mais estranha es cada na frente dele. Era uma
espécie de maquete, com casas e árvores, estradas e luzes da rua. Como
uma maquete ferroviária, só que sem o trem, pensou Jenny. Mas era a
maquete mais elaborada que ela já vira; as árvores e arbustos em
miniatura eram feitos com requinte e as casinhas nham várias janelas
acesas.
Não é apenas uma maquete, Jenny percebeu. É Vista Grande... é o meu
bairro. Ali está minha casa.
Julian estava segurando uma pequena figura de um lobo acima de uma das
ruas. A pousou na maquete com cuidado, olhou para Jenny e sorriu. Jenny
não sorriu de volta. Embora es vesse sonhando, sua cabeça estava limpa e
ela nha um obje vo em mente. Iria obter todas as informações que
pudesse dele.
— É assim que você diz a eles o que fazer? O lobo e a cobra?
— É possível — Ele foi vago, mas a olhava sério quando perguntou: — O
que é preto por dentro, branco por fora e quente?
Jenny, com a boca aberta para falar novamente, fechou-a e deu a ele o po
de olhar que Audrey freqüentemente dava para Michael.
— O que é? — disse ela firmemente.
— Um lobo em pele de cordeiro.
— É isso o que você é?
— Eu? Não, eu sou um lobo em pele de lobo. — Ele a olhou e a luz brilhou
em seus selvagens e exó cos olhos azul-safira.
Não sei como o confundi com um humano, pensou Jenny. Julian era de uma
raça mais velha e selvagem. Uma que fascinou e aterrorizou os seres
humanos desde o início. Não vou me distrair, ela disse a si mesma. Não
dessa vez. Vou lembrar o que quero dele.
— O que você achou do novo Jogo?
— Não é justo — disse Jenny prontamente. — Não é espor vo. —
acrescentou, lembrando o que Julian pensava sobre algo ser justo. — Não
é um jogo se não vermos a chance de encontrar sua base.
— Mas você achava mesmo que nha uma chance?
— Não com essas míseras informações.
Julian jogou a cabeça para trás e riu, seus cabelos brilhando como uma
pedra jade branca.
— Você quer uma dica? — Ele a olhou com aqueles olhos velados de um
azul líquido.
— Sim — Jenny foi categórica. — E você me daria se quisesse que fosse
algum po de compe ção limpa. Mas não é.
Ele estalou a língua nela.
— Você acha mesmo que sou um ogro, não é? Mas não sou tão ruim. Sabe,
se eu quisesse, poderia manipular o jogo para não perder. Por exemplo...
— Ele pegou o lobo e levou-o criteriosamente para outra rua. Jenny
reconheceu a casa de madeira cinza-clara e a minúscula figura de cabelos
na frente dela.
— Cam! — Ela olhou para Julian. — Você não faria! Você disse...
Seus longos cílios piscaram.
— Eu disse que manteria esse Jogo para os jogadores originais, e farei isso.
Só estou lhe dizendo o que eu poderia fazer. Assim, você vê que não sou
tão ruim, afinal.
— Gordie Wilson não era um jogador.
— Ele enfiou o nariz onde não devia.
— E o PC e o Slug?
O sorriso de Julian era arrepiante.
— Ah, eles eram jogadores, sim. Jogaram o próprio jogo. E perderam.
Então agora eu sei, Jenny pensou. Acho que terei que contar a Angela, se
eu viver para fazer isso.
Ela estava olhando para a figura minúscula de Cam quando algo mais lhe
ocorreu. Ela olhou para cima.
— Foi você quem fez aquelas crianças brincarem de Ovelhas e Monstros?
— Eu? — Ele deu sua risada de veludo preto novamente. — Ah, Jenny, eles
não precisam de mim. As crianças são assim naturalmente. Os jogos
infan s são assim. Você não percebeu?
Jenny nha, mas não disse nada. Ela se virou.
— Guerra, caça e perseguição; é tudo o que existe. É a vida, Jenny;
ninguém pode escapar. — Ele estava de pé atrás dela agora. — E por que
deveríamos tentar? Há emoção na perseguição, Jenny. Faz o sangue correr.
Envia calafrios pelo corpo...
Jenny se afastou. Seu sangue estava correndo. Sua voz, estranha e
assustadora como a melodia que ela ouvira na varanda do hotel no baile,
enviou um arrepio de consciência através dela.
Silencioso como um gato, ele a seguiu. Não vou me virar, ela pensou. Não
vou.
— Amor e morte são tudo, Jenny. O perigo é a melhor parte do jogo.
Pensei que você soubesse disso.
Uma parte dela sabia. A parte selvagem que ele havia mudado. A parte,
Jenny pensou de repente, que sempre pertenceria à ele.
— E eu pensei que você fosse me dar uma dica — ironizou ela.
— Claro, se você quiser. Mas nada é de graça.
Jenny assen u sem se virar. Ela esperava isso.
— Dê a dica primeiro — disse, sem rodeios.
— Você pode encontrar seus amigos atrás de uma porta.
Jenny franziu a testa.
— Que po de porta? Eu já a vi?
— Sim.
— Eu já passei por ela?
— Sim. E não.
— Que po de resposta é essa? — ela disse, brava o suficiente para virar-
se. Poderia enfrentá-lo quando estava furiosa.
— É tão claro quanto o preto e o branco, se você souber a maneira certa de
olhar. Agora — disse ele. —, o preço.
Julian foi até ela e inclinou a cabeça. Levou todo o autocontrole de Jenny
para permanecer rígida e sem resposta nos braços dele. Por fim, ela ofegou
e se afastou.
— Ah, Jenny. Vamos parar de fingir; não precisamos mais jogar este jogo.
Você pode ter seus amigos de volta... Você quer Dee de volta, não é?
— Eu vou recuperá-la. — Jenny disse trêmula. Ainda sen a formigamentos
de eletricidade em todos os lugares que Julian a tocara. — Vou pegar todos
de volta, do meu jeito.
— Como sempre, admiro sua confiança — disse ele. — Mas você não pode
vencer. Não contra mim, Jenny. Eu sou o jogador principal.
— Uma porta pela qual passei, mas não entrei — disse ela. — Uma porta
que precisa ser vista da maneira certa.
Ele sorriu.
— Uma porta nas sombras. Mas você não a encontrará até que eu a leve
através dela.
Vamos ver, pensou Jenny. As coisas estavam ficando embaçadas ao seu
redor, as sombras estavam crescendo. O sonho estava desaparecendo.
— Aqui. Para você lembrar de mim. — Julian colocou uma rosa de prata na
mão dela.
Jenny reconheceu. Era a rosa que ele lhe dera na caverna de Erlking, uma
flor semi-aberta cin lante, perfeita até nos mínimos detalhes. As pétalas
eram frias, mas macias na palma da mão.
Havia algo como um pedaço de papel branco enrolado no caule.
Desta vez vou acordar imediatamente, ela pensou.
E o fez. A rosa de prata estava no travesseiro dela. Ela levantou-se
rapidamente para olhar os sacos de dormir no chão da sala. Tom e Michael
estavam lá. Duas cabeças escuras em travesseiros brancos. Jenny se
inclinou e balançou o ombro mais próximo.
— Michael, Tom, acordem. Eu tenho a próxima pista.
Mas quando desenrolou o pedaço de papel da flor, não nha mais tanta
certeza.
— É francês — disse Michael. — E nenhum de nós fala francês. Não é
justo!
— A vida não é justa — Jenny murmurou, encarando com frustração as
palavras no papel. Haviam apenas seis.
Pas de lieu Rhone que nous.
— Se ao menos véssemos Audrey — disse ela. — Nous significa "nós, eu
acho... Ou é "você"?
— Talvez meu pai tenha um dicionário de francês-inglês em algum lugar. —
Michael respondeu, mas Tom nem tentou entrar na conversa. Ele olhou
para a rosa prateada e depois para Jenny, e depois se recostou. Agora
estava olhando para as próprias mãos.
Jenny começou a falar com ele, depois parou. Como havia dito a Michael
antes, o que havia para dizer?
O anel parecia tão frio e pesado quanto gelo e chumbo em seu dedo.

Michael encontrou o dicionário na manhã seguinte, mas Jenny ainda não


conseguia entender muito bem a pista. As palavras eram francesas, mas
não pareciam fazer sen do quando você as reunia.
— É sobre mim, sei que é — disse Michael. — Porque é francês e Audrey
está conectada com francês, e estou conectado com ela. Eu sou o próximo.
— Você está neuró co — disse Jenny. — Não sabemos qual de nós é, mas
se ficarmos juntos...
— Ficar juntos não ajudou muito Michael e Dee — Tom a cortou, no que
havia se tornado sua posição habitual, andando pelo corredor.
— Ele vai pegar todos nós. Um por um. — Michael disse suavemente. — E
eu sou o próximo.
Jenny olhou para o dicionário e esfregou os olhos. Estava escuro e abafado
no apartamento. Lá fora, o céu estava nublado, cinza como concreto. Ela
sen u-se como um rato em uma ratoeira.
Tentou pensar na base em vez da pista francesa. Ela contou a Michael e
Tom o que Julian havia dito sobre a porta, mas nenhum deles entendeu
também. Agora Tom estava andando sem parar, Michael olhando para o
nada, e Jenny muito cansada. Sua cabeça estava abafada e os olhos doíam.
Ela quase não dormiu a noite passada.
Talvez, se fechasse os olhos, pudesse pensar melhor. Se os fechasse apenas
por alguns minutos...

A ba da a acordou com um empurrão.


— Desculpe — Michael sussurrou culpado, pegando uma bandeja de pés
dobráveis. Ele parecia ainda mais nervoso do que o habitual, quase
selvagem. O cabelo estava arrepiado por toda a cabeça e os olhos
lembraram Jenny de um hamster que vera, um hamster frené co que
sempre tentava fugir dela.
— Que horas são? — Jenny sussurrou de volta, tentando clarear a mente.
Estava quase tão escuro quanto a noite.
— Quatro e pouco. Você dormiu por um tempo.
Jenny se perguntou vagamente por que eles estavam sussurrando, depois
viu o monte de cobertores no chão no lugar de Tom. Ele estava
embrulhado como uma múmia, até a cabeça da sra.
Ele também precisava descansar, Jenny pensou, se mexendo. O pedaço de
papel farfalhou em seu colo. Os olhos turvos de Jenny concentraram-se na
escrita, seu cérebro enevoado vendo as palavras não como palavras, mas
apenas como letras sonoras. Pas de lieu...
Ela se endireitou de repente, sua respiração sibilando. Michael quase
pulou fora de sua pele.
— O que foi isso? — Ele mancou apressadamente até ela. — O que você
descobriu? Sou eu?
— Sim; ah, fomos tão burros, Michael. Não precisamos do dicionário. Não
é francês.
— Até eu consigo reconhecer que isso é francês.
Jenny agarrou o braço dele.
— As palavras são francesas, mas não é uma frase francesa. Descobri isso
no dicionário; as palavras não fazem sen do quando você as reúne. Só faz
sen do em inglês.
— Em inglês? Do quê você está falando? — Michael esqueceu de sussurrar.
— Diga as palavras para si mesmo, Michael. Pronuncie da maneira
francesa, mas tente juntá-las.
— Pas... de...lieu... Rhone... que... nous... não significa nada!
— Significa, sim. "Sem remador para nós". Significa reme seu própria
canoa.
Os lábios de Michael formaram as palavras silenciosamente enquanto ele
olhava para o papel, então bateu na própria testa.
— Ai, meu Deus. Você está certa. Mas, Jenny... — ele desceu a mão e a
olhou. — O que isso quer dizer?
— Eu não sei — Jenny olhou pela janela, onde grandes gotas estavam
penduradas nos beirais da passarela e outras pequenas ba am no
concreto. — Mas tem algo a ver com água, aposto. Para que nenhum de
nós possa ir lá fora. Mas você não percebe, Michael?! — Ela se virou para
ele animadamente — Nós conseguimos! Finalmente conseguimos! Temos
uma pista e estamos aqui, sã e salvos. Podemos vencer desta vez!
Algo na expressão de Michael fez seu coração tremer. E então Jenny
percebeu. Ela e Michael não estavam sussurrando há um tempo; estavam
até quase gritando. Mas os cobertores de Tom não se mexeram.
— Michael...
Ele estava olhando para ela aterrorizado. O olhar como do hamster
novamente. Em um único movimento, Jenny correu para agarrar os
cobertores de Tom, puxando-os para longe. Ela apenas olhou para os
travesseiros amontoados ali. Podia sen r-se dobrando por dentro. Tendo
um colapso.
— Michael — Jenny falou sem se mexer, ainda segurando os cobertores.
Então levantou a cabeça e olhou para ele. Ele se encolheu, o olhar culpado.
— Onde ele está, Michael? — ela soava erroneamente calma.
— Ele me obrigou, Jenny. Eu disse para ele não ir, mas ele não me ouviu...
— Michael, onde ele está? — De alguma forma, Jenny havia conseguido
dois punhados do moletom cinza de Michael e os sacudiu. — Para onde ele
foi?
Sem falar, Michael olhou para a janela cinza. Havia lágrimas em seus olhos
escuros de spaniel.
— Ele foi para as montanhas — Michael ofegou depois de um momento. —
O lugar que ele nos contou, aonde encontraram Gordie Wilson. Ele pensou
que poderia encontrar a base lá, ou talvez apenas matar o lobo ou a cobra.
Ele disse que matá-los poderia ajudar você e eu, mesmo que ele... — Ele
parou e começou de novo. — Eu disse para ele não ir, Jenny, eu disse...
Jenny ouviu a própria voz, soando estranhamente quieta e desapegada.
Quase musical.
— Para as montanhas. Onde eles encontraram Gordie Wilson. em um leito
aquá co. Não é, Michael?
Michael piscou para as linhas cinza inclinadas do lado de fora.
— Em um riacho... — sussurrou. Então eles apenas se entreolharam.
— Vamos — Jenny disse finalmente. — Temos que encontrá-lo.
— Ele me pediu para mantê-la aqui...
— Nada vai me manter aqui. Eu vou, Michael. — Ela o interrompeu. — A
única questão é se você vai comigo.
Michael engoliu em seco.
— Eu vou.
— Então vamos. Antes que seja tarde demais.
CAPÍTULO 14

Tom nunca nha disparado uma arma antes. Ele roubara do pai de Zach o
rifle que segurava. O Sr. Taylor não ficaria feliz quando descobrisse que ele
estava faltando. Ou quando encontrasse a porta dos fundos aberta,
também.
Mas Tom não estaria por perto para ser punido. Ele não nha esperanças
quanto à isso. Se estavisse certo, essa era apenas uma viagem de ida.
Claro, a base de Julian poderia não estar aqui, no fim das contas. Não havia
portas naquela encosta da montanha e Julian havia dito a Jenny que os
outros estavam atrás de uma porta. Mas esse era defini vamente o lugar
aonde o lobo e a cobra ficavam juntos, e Tom não esperava que eles
perdessem a chance de atacá-lo.
Se ele conseguisse matar um deles, as chances de Jenny seriam melhores.
Se matasse os dois, talvez ela pudesse realmente conseguir.
A idéia surgiu pela primeira vez na noite em que Audrey desapareceu,
quando todos estavam conversando na sala de estar de Michael. Michael e
Dee estavam dizendo que a única maneira de ganhar o jogo de Julian era
encontrar a base e Tom havia dito: "Pode haver outro caminho", e então
parou. A outra maneira que ele pensava era muito perigosa. Muito
perigosa para Jenny, pelo menos. Não era uma viagem que ele queria que
ela fizesse.
Ele pensou em sua ideia durante os dois dias seguintes, analisando-a,
debatendo se deveria contá-la a Dee. Ela gostaria de par cipar. Mas isso
significaria deixar Jenny pra camente desprotegida. Esse era o problema
da ideia: se Tom deixasse Jenny, ela ficaria vulnerável.
Então Dee desapareceu, e de repente a situação piorou. Logo, Jenny não
teria ninguém para protegê-la... e Julian poderia invadir seus sonhos.
Foi isso que mo vou Tom. Ele não conseguia manter Julian fora do
apartamento - o que significava que ficar lá não ajudaria em nada. O que
ele poderia fazer, talvez, era lhe dar um inimigo a menos para lutar.
Aposto que os dois, o lobo e a cobra, levaram Dee, pensou, caminhando
pelo leito aquá co do riacho. Dee poderia ter enfrentado qualquer um
deles sozinha, mas não os dois. Talvez Jenny também vesse uma chance
se lutasse só contra um. Ou talvez, se a sorte de Tom realmente se
man vesse, ele poderia matar os dois antes que Julian o matasse.
Ninguém mais nha sugerido ir atrás dos animais. Simplesmente não lhes
ocorreu. Todos pensavam nas criaturas como fantasmas - e, Deus, não era
de admirar. O lobo das sombras que Tom vira na praia parecia um pesadelo
em movimento, um espectro luminoso. Mas era de carne e osso. Foi o que
a primeira viagem de Tom aqui mostrara.
As coisas negras e alcatroadas que ele raspara naquela rocha eram sangue.
Gordie deve ter ferido um dos animais antes do outro pegá-lo. As criaturas
podiam sangrar, como Tom havia provado na praia. Ele cortou o lobo e sua
faca ficou escura.
Eles podiam sangrar e deixar marcas sicas para trás, como os arranhões
no carro de Audrey. Eles nham algum po de existência material. Então,
talvez pudessem morrer. Tom ia descobrir.
A chuva estava pingando em seu rosto. Chuva fria, gotas ardentes; não
como um banho de primavera. As tranças no leito do riacho balançavam e
pingavam. Tudo estava cinza. Ele estava chegando perto do lugar agora.
Tom vinha do sul, na direção dos três sicômoros. Talvez até pudesse
surpreendê-los.
No frio cinzento, ele se confortou com uma foto de Jenny. Jenny, que era
todo o calor e luz do sol. Seus cabelos dourados e brilhantes contra o
vento. Jenny no verão, segura, feliz e rindo. Era isso que Tom queria, que
Jenny pudesse ver outro verão. No mundo deles, ao invés do mundo de
gelo e sombras. Mesmo que ele não es vesse lá para vê-lo com ela.
Algo moveu-se mais à frente. Tom olhou de soslaio para a chuva, depois
sorriu sombriamente. Sim, estava ali. Preto contra o fundo cinza,
impossivelmente grande, brilhando com sua própria luz preta como um
tronco de árvore podre e queimado. Uma criatura que parecia um lobo
pintado com nta luminosa na escuridão. Só aquela visão era suficiente
para fazer um humano gritar e correr.
Porque não era real, era sobrehumano. Era como um lobo comum; do po
que as crianças sonhavam, que inspirara histórias como Chapeuzinho
Vermelho. Do po que espreitava na parte de trás do cérebro humano,
eternamente agachado e pronto. Lembrando as pessoas de como o mundo
fora uma vez, um lugar selvagem onde os humanos eram a presa. Quando
dentes e garras chegavam até você à noite e você era comido.
Engraçado como a maioria das pessoas hoje em dia achava que não seria
comida, pensou Tom. Não fazia muito tempo - alguns milhares de anos,
talvez - que àquilo nha sido um problema real. Um perigo constante,
como ainda era para pássaros, ga nhos, ratos e gazelas.
A visão do Espreitador, o Lobo das Sombras, trouxe tudo de volta
claramente. Uma olhada e seu tronco cerebral lembrava de tudo. Como foi
ser perseguido por algo que queria invadir suas entranhas. Por algo que
você não pode negociar, não pode argumentar, algo sem piedade para
ouvir seus apelos. Algo interessado apenas em rasgar sua carne em
pedaços.
Tom não podia deixar algo assim perto de Jenny.
Ele estava quase perto o suficiente agora. Estava se movendo em sua
direção, lentamente, agachado. Ele podia ouvir os rosnados guturais sobre
o tamborilar da chuva.
Tom levou a arma ao ombro. Tenha cuidado. Ele era muito bom no Tiro ao
alvo, um excelente a rador. O lobo estava quase ao alcance. Tom
centralizou a mira. E ouviu um barulho atrás dele.
Um ruído deslizante e arrastado.
A Rastejadora. A cobra.
Mas Tom não se virou. Sabia que estava quase nele, que se não corresse
agora, neste instante, ela o pegaria. Mas ele não se virou. Com toda a sua
vontade, manteve os olhos no lobo.
Na mira. Agora! Agora!
Um sibilo horrível veio logo atrás dele.
Ignorando-o, Tom apertou o ga lho.
O recuar do corpo que a ação provocou o surpreendeu. As armas de Tiro
ao alvo não eram assim. Mas o lobo estava cambaleando; a força da bala o
fez cair.
Consegui! Consegui! Consegui...
A cobra atacou. Tom sen u o golpe no meio das costas. Já desequilibrado,
ele caiu. Mas tentou enquanto caía.
Se ele conseguisse disparar só mais um ro...
Tom estava deitado na lama. A cobra estava se erguendo sobre ele, uma
coluna de escuridão oscilante. Enorme e extremamente poderosa. Olhos
brilhando com uma luz sobrenatural, a boca aberta em um sibilo, a cabeça
escura gigante elevando-se de volta ao ataque.
Agora! Por Jenny!
Tom a rou direto na boca aberta e a cabeça da cobra explodiu.
Foi terrível. Sangue escuro jorrou por toda parte, sujando o rosto de Tom,
cegando-o. Bobinas pesadas, chicoteando em seus esparmos, caíram em
cima dele, açoitando-o. Ele não conseguiu rá-los. Tudo era um misto de
sangue, escuridão e terror.
Mas eu consegui, pensou Tom, arranhando loucamente a extensão da
serpente. Ah, Deus, se eu puder sair daqui... consegui. Eles estão mortos.
Foi quando ele ouviu o barulho.
Um rugido como uma cachoeira ao longe. Ou um rio. Aproximando-se
rapidamente. E ele não podia ver, não conseguia se levantar.
Jenny, Tom pensou. E então, a água o alcançou.
— Jenny, você está me assustando. — Michael disse quase em um gemido.
Ma Jenny não estava assustada.
A ideia de que a base de Julian poderia estar no riacho passou por sua
mente uma ou duas vezes, mas ela a dispensou ontem à noite porque não
se encaixava com a porta.
Tom obviamente pensou diferente.
— Con nue andando — disse ela. Parecia que eles estavam andando há
anos. Jenny sabia que eles estavam na área certa porque haviam
encontrado o carro de Tom, mas onde estava o leito aquá co do riacho?
Michael estava mancando muito.
— O que é isso?
Era um som líquido e apressado, mais alto que a chuva. Jenny sabia o que
veria antes mesmo de subirem ao chão e olharem para baixo.
Uma visão incomum para o sul da Califórnia, onde a maioria dos leitos de
riacho eram áridos e lentos. Já este estava cheio de água escura e
movendo-se rapidamente, cheio demais para a pouca chuva que caíra. Não
havia explicação natural para isso. Foi um evento assustador, uma
inundação repen na que deveria ter sido impossível.
Mas estava ali. Um rio inchado por uma encosta coberta de sálvia, levando
a três grandes plátanos. E em um pequeno redemoinho logo abaixo de
Jenny, girando e girando entre algumas pedras, havia um barquinho de
papel dobrado ordenadamente, tripulado por um boneca de papel de
cabelos escuros.

Ela não percebeu que o barco era a próxima pista até voltarem ao
apartamento.
Jenny es vera brincando com ele o tempo todo. Colocou o boneco de Tom
na de pés dobráveis com os outros, organizando-os com uma precisão
louca ao lado das chaves do carro que Michael jogara lá. Uma pequena
linha de bonecos de papel à sua frente, como se a olhassem enquanto
sentava-se no sofá. Ela estava virando o barco várias vezes enquanto
Michael se aconchegava em um cobertor no sofá de dois lugares.
Então, Jenny viu a escrita no papel ceroso.
Era muito simples, um enigma infan l. A pista mais simples de todas.
O que é que quanto mais ra, maior fica?
Ela ouvira aquela no jardim de infância, e eles sabiam a resposta.
Um buraco.
— Não diz quem é o próximo, mas acho que nem precisa. — Michael
puxou o cobertor para mais perto. — Ele vai te deixar por úl mo: o melhor
sempre fica para o final. Então sou o próximo. Não diz como vai acontecer,
mas isso não importa, né?! Contanto que saibamos que vai acontecer, e
vai. Sabemos disso, certo, Jenny?! Vai acontecer, e não há nada que
possamos fazer para impedir. — Ele riu como um luná co. — Julian é que
nem os Moun es4 e vai recrutar seus combatentes...
— Michael, acalme-se...
— Então há um buraco em algum lugar, e vou cair nele. É tudo o que
precisamos saber. Isso é tudo, pessoal!
— Talvez não. Você disse que Tom foi para matar a cobra ou o lobo. Talvez
ele tenha conseguido.
— Pode ser, pode ser... Ainda é maio, não é? — Ele olhou para a janela com
cor nas. Estava totalmente escuro lá fora. Ele voltou-se para Jenny. — Você
sabe que nunca vamos encontrá-lo.
— Não podemos ser nega vos. — As mãos de Jenny estavam geladas, mas
sua voz era feroz. — Eu tenho uma ideia, outra coisa que Julian disse. Algo
sobre a dica ser tão clara quanto preto e branco. E antes, no meu primeiro
sonho, ele disse algo sobre imagem e realidade.
— O que é essa "realidade", afinal? Como sabemos que saímos mesmo da
casa de papel? Talvez tudo isso seja uma ilusão, como quando você pensa
que acordou, mas ainda está sonhando. Talvez ainda estejamos no Jogo
an go. Talvez nada seja sólido. — Michael se inclinou, bateu na mesa de
café e riu de novo.
— Michael, por que você não se deita? Vou pegar um pouco de água...
— Não! Não me deixe! — Ele a agarrou enquanto Jenny passava. — Se
você me deixar, ele vai me pegar! O Homem das Sombras vai me pegar!
— Tudo bem, Michael. Tudo bem. — Jenny olhou para os olhos escuros
aterrorizados e acariciou os cabelos de Michael como se ele fosse mais
jovem que Joey.
— Não está tudo bem. Tenho que ir ao banheiro, mas ele pode me levar de
lá também.
— Não, olhe, eu vou com você. Vou ficar do lado de fora da porta.
— Ele vai me pegar. Você nunca ouviu falar de cobras saindo do vaso? Ele
vai me pegar, mas tenho que ir... Que dilema, não?! Deixo ele me pegar ou
faço xixi nas calças. — Michael estava em um misto de choro e riso.
— Michael, pare com isso. Pare com isso! — Pela segunda vez naquele dia,
Jenny o sacudiu. — Acalme-se! O Monstro do Vaso5 não vai pegar você, eu
prometo. Vamos procurar cobras antes de você entrar. Vamos acabar logo
com isso; então poderemos pensar na base.
Michael fechou os olhos e respirou fundo. Quando expirou, parecia mais
calmo.
— Tudo bem. — concoordou mas ainda cambaleou como alguém meio
adormecido quando Jenny o levou ao banheiro.
— Está vendo? Não há cobras aqui. E vou ficar aqui do lado de fora.
— Deixe uma fresta da porta aberta.
— Tudo bem. — Ela concordou, pacientemente.
— Jenny? — A voz dele atrás da porta parecia muito pequena. — Um
banheiro é muito parecido com um buraco...
— Vá logo, Michael!
— Certo.
Jenny ouviu o barulho de água da torneira correndo.
— Viu? Você está bem.
Mas Michael não respondeu; apenas o som da torneira era audível.
— Michael?
O som da água correndo.
— Michael, não é engraçado! Saia daí ou vou entrar.
Ainda apenas o som da água.
— Droga, Michael! Tudo bem, eu avisei... — Ela abriu a porta.
O banheiro estava vazio, enchendo-se loucamente, a água jorrando de
dentro do vaso sanitário.
Empoleirado na beira do assento de porcelana, havia um boneco de papel.

Cinco bonequinhos seguidos.


Audrey, sentada com o braço torcido, como se dissesse: "Podemos
conversar?". Zach, com o rosto sombreado a lápis parecendo afiado e
malicioso. Dee, que con nuava caindo de costas, não importa como Jenny
a dobrasse. Tom, com uma gota ou duas de chuva ainda pingando em sua
cera. E Michael, cujos olhos de cera pareciam encará-la em acusação.
Ela prometeu que Julian não iria pegá-lo, mas aconteceu. Jenny era
culpada, assim como era da morte de Summer.
Não do modo que a polícia achava - como se vesse cortado a cabeça de
Summer e enterrado o corpo no quintal -, mas porque foi ela quem
colocou Summer nisso. Jenny que a convidou para jogar um jogo que
acabou sendo mortal. Jenny saiu viva e ela não. O Jogo de Jenny matara
Summer.
Agora poderia ter matado o resto de seus amigos e ela estava sozinha. O
apartamento pra camente ecoou com solidão. Não havia som desde que
ela enfiara um livro dentro do vaso sanitário para impedir que ele
escorresse mais.
O resto deles fora escolhido um a um. Como em Dez índiozinhos, uma
can ga infan l. Agora, ela era a única que restava e era a próxima.
A base. Eu tenho que encontrá-la. Tenho que rá-los antes que Julian me
pegue. Mas como?
As dicas. Tinha que se lembrar delas. Mas sua mente estava tão confusa.
Jenny estava sozinha; podia sen r o ar ao seu redor. Podia sen r como
cada quarto do apartamento estava vazio. O vazio estava esmagando-a.
As dicas. Pense nelas, nada mais. Ponha-as em mente.
Mas estou sozinha...
Uma imagem em oposição à realidade.
Uma porta que ela viu. Uma porta pela qual havia passado, mas não havia
passado.
Em algum lugar entre o Mundo Real e o Mundo das Sombras.
O que mais havia entre eles? Como a loja More Games...
Preto e branco.
Uma pequena luz se acendeu na mente de Jenny. Sim, era isso! Uma porta
que ela viu e atravessou, mas que não poderia ter atravessado,
dependendo de como você a via.
Uma porta em preto e branco.
Foi então que o pedaço de papel caiu agitado. Do nada, como se alguém o
vesse jogado do teto. Ele deslizou e caiu quase no colo de Jenny. Ela o
pegou e olhou para a escrita.
Sou alguma coisa. Não sou nada.
Sou pequeno. Sou alto.
Quando você pra ca esportes, eu tropeço e caio. Nunca fui visto antes de
uma lua nova.
Eu prospero à noite, mas desapareço ao meio-dia. Sou mais leve que o ar,
peso menos que uma respiração. A escuridão me destrói e a luz é a minha
morte.
Há três semanas atrás, Jenny poderia ter do problemas para decifrar
àquilo. O que poderia ser destruído pela luz e pelas trevas? O que poderia
ser baixo e alto? O que era algo e nada ao mesmo tempo?
Mas desde 22 de abril, o dia do jogo, o assunto desse enigma em par cular
estava em sua mente. Ela era assombrada por isso, não pensava em quase
nada mais. Ela via sombras em todos os lugares nos dias de hoje.
Também não nha dúvidas sobre o significado do enigma. Uma sombra
estava chegando para pegá-la - a sombra. O Homem das Sombras. Julian
cuidaria disso pessoalmente.
Ela mal pensara nisso quando todas as luzes do apartamento se apagaram.
Calafrios tomaram conta de Jenny. Dedos gelados agitaram os pelos da
nuca. Suas palmas estavam formigando loucamente.
Estou em apuros; em uma enrascada. Mas acho que sei a resposta agora.
Sei onde está a base. Se eu puder chegar lá... Se eu puder chegar antes que
ele chegue até mim...
Mas primeiro precisava encontrar a saída do apartamento.
Havia uma luz entrando pelas cor nas. Tudo bem, a porta da frente estava
ali. Jenny pegou as chaves de Michael e foi até lá, os braços estendidos.
Quando ela alcançou a passarela, as luzes se apagaram.
Gato e rato. Ele está jogando comigo. Tudo bem, jogue! Este rato está indo.
A mão de Jenny deslizou no corrimão de ferro molhado enquanto ela
descia as escadas correndo. Na garagem, o Fusca de Michael estava
envolto em sombras. Ela abriu a porta e entrou, girando a chave na ignição
quase antes que a porta fosse fechada. O carro deu par da no momento
que as luzes da garagem se apagaram.
Está bem atrás de mim...
Jenny apertou o volante e saiu do complexo de apartamentos.
A chuva recomeçara, go culas respingando no pára-brisa. Di cil dirigir com
segurança. Jenny acelerou, esperando que ninguém es vesse em seu
caminho. Ela viu um semáforo quase no ul mo segundo e os freios
guincharam. Por favor, Deus, não me deixe bater em ninguém. Por favor...
A luz vermelha piscou, mas a verde não acendeu. O semáforo ficou escuro,
balançando na chuva. Jenny pisou o acelerador.
Terei uma multa no cruzamento da Canyonwood Avenue com a Sequoia
Street.
O motor do Fusca tossiu. Não, me deixe fazer isso. Tenho que fazer isso.
Estou tão perto...
O motor tossiu novamente e Jenny fez a curva perigosamente rápida, os
pneus derrapando, como um piloto de fuga. O Fusca deu um solavanco e
um som horrível de trituração veio do motor. Ainda derrapando, a ngiu o
meio-fio e parou.
Frene camente, Jenny girou a chave. Ela pegou um guincho de metal que
deixou os dentes no limite. Então silêncio.
Saia! Rápido!
Abandonando a chave, ela se atrapalhou com a porta e pulou na chuva.
Deixou a porta aberta e correu rua acima, apenas mais algumas casas de
distância.
Vá, vá! Ela fez as pernas bombearem, voando sobre a calçada molhada.
Não olhe para trás! Não pense! Apenas vá! Ali está! Você pode vê-la!
Alguns metros depois e com os pulmões queimando, Jenny alcançou a
pista de entrada para automóveis da casa es lo Tudor. A casa de Zach.
A entrada da garagem estava vazia. Jenny cambaleou até a garagem,
agarrou a maçaneta no meio da grande porta e puxou o mais forte que
pôde. Estava trancada.
Ah, Deus! Não entre em pânico. A porta lateral, rápido!
Quando correu, ela pôde ver o deserto um pouco longe da rua abaixo e do
Fusca, encostado no meio-fio sob o poste de luz.
A luz do poste se apagou.
E do próximo. E do próximo. E do próximo.
Uma onda de escuridão vinha em sua direção. Correndo para ela.
A porta lateral também estava trancada. Jenny se virou e correu em
direção à porta da frente. Ela agarrou a maçaneta enquanto tentava abri-la
e, para sua surpresa, ela virou. Estava aberta. Eles eram loucos?
— Tio Bill! Tia Lily! Sou eu! — Ela gritou porque não queria que eles a
matassem pensando ser um ladrão e porque não se importava mais em
manter o segredo.
Ela queria desesperadamente ver pessoas, qualquer pessoa.
A casa ecoou enfa camente em resposta.
— Tio Bill! Tia Lily!
O silêncio foi pesado, uma presença tangível. Não havia ninguém ali. Por
alguma razão insondável, eles foram embora, deixando a porta da frente
destrancada. Jenny estava sozinha.
Não vou chorar, nem gritar. Só tenho que chegar na garagem, só isso.
Nada mudou. Posso chegar lá facilmente. É apenas o comprimento da
casa.
Seu coração estava congelado em pânico.
Apenas vá! Um pé na frente do outro. É apenas uma casa vazia!
A luz do corredor se apagou.
Ah, meu Deus, ele está aqui! Ah, Deus, ele está aqui, ele está na casa, ele
vai me pegar...
Vá!
Jenny tropeçou na escuridão, indo para a sala iluminada. Suas pernas
tremiam tanto que ela mal conseguia andar. Suas mãos estavam
dormentes.
Ela teve um vislumbre da sala de estar, depois a lâmpada de bronze ao lado
do sofá de couro se apagou. Jenny bateu em uma cesta de lixo feita de pé
de elefante, que sempre a enchia de horror. Ela mal pôde deixar de gritar.
Cada cen metro de sua pele estava formigando. Encolhendo, como se
es vesse esperando um ataque de qualquer lado.
Estava escuro como breu. Ele poderia estar em qualquer lugar ao seu
redor. Em qualquer lugar na escuridão, movendo-se silenciosamente como
uma sombra. Se ela desse um passo, poderia correr contra ele.
Mas ela nha que fazer isso. Tinha que encontrar a garagem. Por Tom, por
Dee. Eles estavam esperando-a resgatá-los. Ela nha prome do a
Michael...
Soluçando sem fazer barulho, Jenny deu um passo.
Agora outro, ordenou a si mesma. Sinta o caminho. Mas era quase mais do
que ela podia fazer para alcançar a escuridão. Qualquer coisa podia pegar
sua mão. Ela precisava estender a mão e sen r alguma coisa...
Faça!
Ela deu outro passo, tateando cegamente, andando devagar. A mão de
Jenny bateu em uma parede, com o vazio ao lado.
A entrada para a sala de jantar. É isso aí. E a garagem fica do outro lado,
através da cozinha. Você consegue!
Ela entrou na sala de jantar, uma mão na suavidade do papel de parede.
Podia sen r a imensidão da escuridão em seu lado exposto. Algo poderia
lhe acontecer daquele lado, ou da parede. Ah, Deus, ele faz as coisas
saírem das paredes. Jenny afastou a mão do papel de parede. Nada era
seguro. Ele poderia agarrá-la de qualquer direção.
Apenas vá!
Ela cambaleou para a frente no escuro e encontrou outro espaço vazio, a
porta da cozinha. Graças a Deus. Agora, mais alguns passos. Vire à
esquerda em volta da geladeira. Boa. Agora o caminho estava livre até a
garagem. Mas ela se deparou com algo quente e duro na escuridão e
gritou.
— Você não achou — A voz disse gen lmente, como água caindo sob uma
rocha. — que eu realmente deixaria você chegar lá, não é?
Ele estava segurando-a pelos braços, não grosseiramente, mas sem
chances de ela escapar. Os olhos de Jenny estavam cheios de escuridão e o
pulsar da própria corrente sanguínea encheu seus ouvidos.
— Na verdade, estou surpreso que você tenha chegado tão longe. Não
achei que você conseguiria, mas rei seus os do caminho só por
precaução. Uma mensagem urgente do filho desaparecido.
Vou desmaiar. Realmente vou desta vez.
Jenny não conseguia manter os joelhos firmes. Ele estava meio segurando-
a agora.
— Shh, não precisa chorar. Você perdeu o Jogo, só isso. Acabou agora.
Escuridão. Ela estava na escuridão completa. Jenny olhou em volta
loucamente, virando-se o tanto quanto ele deixava. Se pudesse apenas ver
uma pequena luz... mas não havia nada. O lobo e a cobra não estavam
aqui; ela teria visto seu brilho doen o e fosforescente.
Estava sozinha com o Homem das Sombras. E ele estava aqui para levá-la.
— Ah, Deus, onde estamos? Já estamos lá, na base? — ela disse
histericamente. Era impossível saber nessa completa escuridão.
— Não. Shh, shh, Jenny. Vamos daqui a pouco. Veja, aqui está o caminho.
Então Jenny viu uma luz, apenas um vislumbre. Uma luz estranha, como
eletricidade azul. Criando uma abertura no espaço atrás de Julian. Uma
lacuna, um vór ce.
Um buraco.
Não..., Jenny não suportava olhar para ele. Ela virou e escondeu o rosto no
peito de Julian.
— Está tudo bem. Apenas um pequeno passo. Então estaremos juntos,
Jenny. — Ele levantou o rosto dela na escuridão, tocando-o com as pontas
dos dedos frias como mármore.
Seu toque, tão leve, tão certo. Dominante. Como se ele pudesse ver
facilmente nessa escuridão absoluta. Muito bem. As pontas dos dedos
traçaram sua bochecha molhada, o polegar enxugando as lágrimas. Jenny
fechou os olhos involuntariamente.
— Juntos para sempre.
As pontas frias dos dedos roçaram seus cílios, afastando os cabelos da
têmpora. Ela sen u um traçar sua sobrancelha.
— Como é para ser, Jenny. Você sabe disso. Não pode mais lutar contra
isso.
O dedo correu por sua bochecha como uma lágrima fria. Traçou o contorno
de seus lábios, a junção entre superior e inferior. Um toque tão leve que
ela mal podia sen r. Como se rasse a firmeza de suas pernas.
Escorregando, caindo...
— Venha comigo agora, Jenny. — As pontas dos dedos roçaram a linha de
sua mandíbula, provocando arrepios deliciosos através dela. Ela percebeu
que sua cabeça havia caído para trás. Seu rosto estava virado como se
esperasse um beijo. — Eu vou com você. É hora de se render e encerrar o
Jogo.
Uma pequena luz se acendeu na mente de Jenny.
Nenhum lobo ou cobra. E ainda estavam na cozinha de Zach, que ela
conhecia muito bem. O buraco estava atrás de Julian, antes da porta da
garagem...
— Tudo bem — ela sussurrou. — Tudo bem, mas me solte. Eu posso andar.
Dee sempre disse que a surpresa era o elemento mais importante de
qualquer ataque. Não dê ao seu oponente um segundo para considerar.
No instante em que o aperto de Julian afrouxou, Jenny o empurrou. Ela
não pensou nisso, apenas empurrou o mais forte que pôde. E ele foi pego
de surpresa. Mesmo seus reflexos rápidos como serpentes não puderam
salvá-lo. Com um grito, o Homem das Sombras caiu para trás em seu
próprio vór ce preto.
Jenny pulou sobre o buraco no mesmo momento.
Um salto direto para a escuridão. Se vesse calculado mal, se jogaria
contra a parede. Suas mãos bateram na porta, quase jogando-a para trás,
mas ela manteve o equilíbrio. Seus dedos se fecharam na maçaneta da
porta, ela a apertou e depois estava na garagem.
A lanterna de Zach estaria na parede. Pelo menos, ela rezou para que ainda
es vesse. Jenny correu pelo comprimento da garagem de forma
imprudente, procurando-a. Julian não demoraria muito para se recuperar;
ele poderia estar aqui a qualquer momento...
Lanterna! Jenny apertou o botão. Ela nunca nha ficado tão feliz em ver
algo como estava ao ver o raio circular branco que disparou. Luz,
finalmente, luz.
Ela balançou a viga na parede, mirando com certeza absoluta o que ela
procurara. A fotografia mural que Zach havia rado da lanchonete do
ensino médio.
Julian havia dito a ela que preto e branco misturados produzem muitas
cores. Mas não em uma fotografia. Uma fotografia, uma imagem de uma
realidade, que incluía uma porta. A porta de saída que a pirâmide de
mesas quase bloqueava, uma porta nas sombras atrás das mesas.
Uma porta pela qual Jenny passara na vida real muitas vezes. Mas ela
nunca havia passado por essa, porque não se pode abrir a foto de uma
porta.
A menos que, como o mural da Avenida Montevidéu, fosse uma porta para
a irrealidade. Um lugar no meio do caminho para o Mundo das Sombras,
como a loja More Games. Julian poderia transformar imagens em
realidade. Poderia fazer cartazes e murais ganharem vida. Se Jenny olhasse
para esta foto do jeito certo...
Enquanto ela olhava para a porta, a maçaneta parecia saltar para ela.
Tridimensional. Como a maçaneta da loja More Games, que havia se
destacado no mural.
— Jenny! — A voz de Julian atrás dela, aguda e perigosa.
A lanterna se apagou, mas Jenny nha visto aonde estava a maçaneta. Ela
a alcançou na escuridão. Os dedos dela roçaram, estava frio. Metal de
verdade na mão dela. Ela nha achado!
Jenny puxou.
O vento a rodeava. O metal frio parecia derreter sob os dedos e ela estava
caindo. Seu grito foi arrebatado pelo trovão do ar.

Ela nunca nha visto alguém parecer tão surpreso quanto Audrey, Zach,
Dee, Tom e Michael. Os cinco rostos estavam virados para ela, olhando
fixamente, bocas e olhos abertos, enquanto ela cambaleava para frente e
caía de joelhos.
O que aconteceu?, Jenny pensou, mas antes que pudesse olhar para trás,
eles estavam ao seu redor.
— Você entrou pela porta — disse Audrey, muito animada. Ela ainda usava
o ves do preto de Oscar de la Renta em que Jenny a vira pela úl ma vez, e
estava mais bagunçado do que nunca. Seu cabelo cobre estava solto.
— Você está bem? — Tom perguntou. Havia manchas lamacentas em suas
maçãs do rosto. Ele estendeu a mão para pegar a mão dela, a mão
esquerda, sem parecer se importar com o anel.
— Claro que ela está bem. Ela entrou pela porta — disse Dee alegremente.
Ela bateu na cabeça de Jenny em um frenesi de carinho. — Toma essa,
monstro!— gritou para o teto.
— Você men u para mim — Michael acusou. Ainda nha a aparência de
hamster, mas agora seu lábio inferior também estava emburrado
pate camente. — Você disse que ele não me pegaria e ele pegou.
Jenny se apoiou no calor e solidez de Tom e fechou os olhos, o que fez suas
lágrimas escorrerem. Nunca nha ficado tão feliz em ouvir Michael
reclamando em sua vida.
— É você; são todos vocês! — Ela abriu os olhos com um pequeno soluço
que soou estranho até para si mesma. — Vocês estão realmente aqui.
— Claro que estamos aqui — disse Audrey. Ela parecia zangada, o que
significava que estava se sen ndo carinhosa. — Onde mais estaríamos?
— Nós estávamos esperando você vir nos buscar, Gata. Eu não disse que
ela viria? — Dee sorriu.
Jenny olhou para Zach. Ele nha círculos pretos sob os olhos e sua pele
nha um tom de cera, mas havia algo estranhamente calmo em sua
expressão.
— Você está bem? — perguntou. — Vocês estão bem?
Zach deu de ombros.
— Estamos vivos. Parece que faz uma semana que estamos aqui, mas Tom
diz que são apenas alguns dias. Quero poder voltar e revelá-las. — Ele
balançou a câmera em volta do pescoço e Jenny olhou para ele surpresa.
— Consegui ó mas fotos daquela cobra. — Seus olhos encontraram os de
Jenny e ele sorriu. Jenny sorriu de volta.
— Eu es ve aqui sozinha primeiro — dizia Audrey. — Por mais de um dia
inteiro. Isso foi diver do.
— Não é tão ruim. — concordou Dee. — É como no exército. Nós
dormimos nas mesas; veja, há cobertores ali. E há um banheiro e a comida
sai por ali. Um refeitório é realmente um bom lugar para manter as
pessoas. Mas não conseguimos abrir a porta desde que chegamos aqui.
Jenny olhou em volta. Era como um refeitório, claro. O refeitório da Vista
Grande High School. Exatamente como na foto, exceto que as mesas
haviam sido empilhadas e as seis estavam em pé. A única coisa realmente
peculiar era que havia apenas uma porta em todas as quatro paredes, a
única porta que havia sido visível na foto.
— Então, como vocês chegaram aqui?
— Através do teto — revelou Michael, sombrio e Jenny olhou para cima.
Havia um grande buraco negro no centro. Eletricidade azul estalou na
escuridão.
— Não conseguimos alcançá-lo. — Tom falou baixinho ao lado dela. — Já
tentamos, mas não há mesas suficientes, e algo muito estranho acontece
quando se chega perto do ponto alto. O tempo parece desacelerar e você
começa a desmaiar.
Jenny olhou de volta para eles.
— Mas vocês estão todos bem. A cobra e o lobo não os machucaram?
— Não — negou Dee. — Eles só queriam que caíssemos nos vór ces. E
estão mortos agora. Tom os matou.
— Acho que consegui — disse Tom cautelosamente. — Michael disse que
vocês não os nham visto hoje à noite.
— Você os pegou. Deve ter conseguido, porque eles se foram. —
considerou Jenny. — Foi uma coisa muito estúpida de se fazer, sair sozinho
assim — Ela apertou a mão de Tommy com força. —, mas estou feliz que
você conseguiu, porque se não eu não estaria aqui. Tive que pular em um
buraco - ou um vór ce, seja lá como vocês chamam - e se eles es vessem
por perto, tenho certeza que teriam me perseguido.
— E aonde Julian estava quando você pulou? — Dee parecia interessada.
— No vór ce. Eu o empurrei.
Dee olhou para ela, então bufou de rir. Em um minuto, todos estavam
rindo histericamente. Até Zach. Dee deu um soquinho no braço de Jenny.
— Ele deve estar muito bravo. — Michael soluçou fracamente quando a
histeria diminuiu.
— Ele está. Mas que diferença faz? — Jenny disse friamente. — Encontrei a
base. Ganhei. — Ela acenou com a mão para eles. — Todos as ovelhinhas
dele estão livres.
Então olhou em volta e esperou. Mas nada aconteceu.
Eles sentarem-se no chão e o frenesi alegre mostrou as primeiras
rachaduras enquanto se encaravam, ainda esperando. As sobrancelhas de
Tom estavam se unindo sombriamente. Os lábios lindamente esculpidos de
Dee levantaram para mostrar os dentes.
— Você não trapaceou, não é?! — ela disse suave e perigosamente.
— Talvez tenhamos que gritar — disse Michael. — Tudo limpo! Podem sair!
— Não seja idiota — disse Zach. — Nós é que estamos dentro e precisamos
sair.
— E ele tem que nos deixar sair. — disse Jenny. Ela se levantou, olhando
para o buraco no teto. — São as regras do jogo. A menos que ele esteja
planejando trapacear. — acrescentou ela em voz alta, sen ndo-se
imprudente e ousada com a mão de Tom na dela.
— Eu nunca trapaceio — disse Julian, por trás deles. — Eu pra co
Habilidades de jogo, a arte de ganhar jogos mas sem trapaças.
Jenny se virou. Julian estava parado em frente à porta, que agora estava
aberta. O sinal vermelho de saída piscou e brilhou loucamente acima dele,
parecendo que iria queimar um fusível a qualquer momento. Isso deveria
ter sido um bom presságio, mas a expressão no rosto de Julian não era
nada animadora. Seus olhos estavam brilhando como vidro azul, e havia
algo cruel e predatório em sua boca.
— Então você vai nos deixar ir — disse Jenny, mas sem a ousadia de antes.
Ela firmou a voz e se obrigou a encontrar os olhos dele, erguendo o queixo
com orgulho. — Consegui por conta própria, Julian. Encontrei a base.
— Sim, você encontrou. — Mesmo aqui, no refeitório bem iluminado,
parecia crepúsculo ao seu redor. Um crepúsculo estranho e encantado, que
de alguma forma era mais brilhante e mais real do que qualquer dia que
Jenny já vira. — Você encontrou a base. Você venceu o jogo. Agora, tudo o
que você precisa fazer é sair.
— Enquanto você bloqueia a porta — Dee desdenhou. — Parece que terá
que fazer isso sozinho desta vez, já que seus amigos animais não estão aqui
por você.
— Bloquear a porta? — Julian arregalou os olhos inclinados de gato
inocentemente, de alguma forma parecendo mais perturbadoramente
bonito do que nunca. E mais triunfante. — Eu nem sonharia com isso. —
Ele se afastou da saída, ges culando com graça lânguida e descuidada,
como se quisesse introduzi-los. — Con nuem. Tudo o que precisam fazer é
andar por ela e estarão do lado de fora da foto. Na garagem de Zach. Sã e
salvos.
— Eu não confiaria nele tão facilmente. — Michael sussurrou no ouvido de
Jenny.
Mas Dee, sempre ansiosa por um desafio, já estava se movendo em
direção à porta. Ela lançou um olhar de desdém para Julian quando passou
por ele, e ele se curvou graciosamente. Então ele levantou a cabeça e
sorriu para Jenny, que estava de pé na proteção do braço de Tom.
— Eu disse uma vez para você não brincar comigo. — disse ele. Sob os
cílios pesados, seus olhos eram azuis como chamas.
Um alarme disparou através de Jenny.
— Dee — ela começou. Mas já estava acontecendo.
No momento em que Dee chegou à porta, houve um som tremendo; alto e
suave ao mesmo tempo. Era quase como o som que a boca de um fogão
emite quando você a liga e o gás acende. Um whopf abafado.
Só que isso era cem vezes mais alto e vinha de todos os lados. Os ouvidos
de Jenny estalaram. O calor a a ngiu de todas as direções ao mesmo
tempo e uma rajada de ar ardente fez seus cabelos correrem para cima.
Dee foi jogada para trás pela força da explosão, quebrando a própria queda
ao a ngir o chão primeiro com os antebraços e as palmas das mãos. No
instante seguinte, Jenny a segurava, a voz dura com ansiedade.
— Você está bem? Você está bem?
Os cílios fuliginosos de Dee tremeram. Seu peito magro estava arrepiado e
seu pescoço, longo e gracioso como o de um cisne negro, estava arqueado
no braço de Jenny.
— Dee!
— Eu vou dar à ele algumas Habilidades de jogo — Dee ofegou finalmente.
Seus olhos se abriram em estreitas fendas de ônix, a respiração ainda
engatada. — Vou dar agora mes...
— Ele se foi — Zach interrompeu categoricamente. — E temos problemas,
então poupe seu fôlego.
Por um momento, Jenny ficou tão feliz em ver Dee ilesa que não se
importou. Então olhou para cima e entendeu o que Zach queria dizer.
Eles estavam dentro de um anel de fogo.
Era apenas um pouco menor do que as dimensões do refeitório, e pelo que
Jenny sabia, as paredes ainda estavam do lado de fora dele. Mas não se
podia ver através do círculo para dizer. Era tão alto quanto o teto do
refeitório e estava quente.
E barulhento.
Incrivelmente barulhento. Jenny percebeu que ela e os outros estavam
gritando para serem ouvidos. Ele fazia um rugido inacreditável e
incessante. Como o estrondo das Cataratas do Niágara ou a explosão de
um furacão.
Que estranho, pensou ela, parte de sua mente examinando esse fato com
uma calma curiosa. Acho que quando você chega a um certo extremo,
todos os elementos soam igual; o fogo soa como a água, que soa como o
ar. Vou ter que lembrar disso.
Havia algo mais sobre o som. Era mortal. Dalguma forma, ficar ouvindo-o
seria absolutamente letal. Se a destruição nha uma voz, era aquele som.
— Suponho que é por isso que as pessoas pulam pelas janelas, mesmo do
vigésimo andar. — disse ela a Tom, quase sonhadora. — Sabe, de um
prédio em chamas, quero dizer.
Ele lançou-lhe um olhar penetrante, depois a levantou, pra camente
carregando-a para uma das mesas.
— Deite-se.
— Eu estou bem...
— Jenny, deite-se antes que você desmaie.
Jenny, de repente, percebeu que era melhor. Ela tremia violenta e
totalmente, pequenos tremores que pareciam vir do seu interior. Seus
dedos e lábios estavam dormentes.
— Ela está em choque — disse Audrey enquanto ela deitava em um banco.
— E não é de admirar, depois de tudo o que aconteceu. Jenny, feche os
olhos por um tempo. Tente relaxar.
Jenny fechou os olhos obedientemente. Podia ver o fogo tão bem quanto
com eles abertos. Uma onda de tontura a envolveu. Podia ouvir os outros
falando, mas seus gritos pareciam finos e distantes.
— ...Não vamos durar muito com esse calor — dizia Tom.
— Não, mas o que podemos fazer? — Esse era Zach.
— Nós vamos assar. — E esse era o Michael. — Melhor encontrar um
pouco de molho de pimenta.
— Cale a boca ou eu mesmo vou te obrigar, Mikey — Dee ameaçou.
Não posso deixá-los assarem, pensou Jenny. Seus pensamentos eram vagos
e oníricos, unidos pelas mais finas cordas flutuantes. Era um estado quase
como os momentos antes de dormir, quando as bobagens parecem
perfeitamente sensatas e palavras e imagens vêm do nada.
Agora ela estava experimentando algo como se afogar. Sua vida passou
diante dela - ou pelo menos as úl mas três semanas, ou alguns pequenos
momentos dela. Imagens desconectadas e confusas, cada uma ní da como
um clipe de um vídeo caseiro de alta qualidade.
Julian apareceu, lindo como uma manhã de dezembro, seus olhos como
safira líquida, seus cabelos molhados como a lua. "Eu nunca trapaceio.
Pra co Habilidades de jogo."
E Aba, seu rosto velho com seus ossos finos sob a pele aveludada e negra
da noite. "Ontem à noite sonhei com a história de Hausa..."
E Michael, o doce Michael, com o cabelo desarrumado, olhos escuros
brilhando de entusiasmo: "Seu cérebro é como um sistema de modelagem.
Ele pega a entrada que recebe de seus sen dos e cria o modelo mais
razoável possível..."
E Zach, olhos finos, de nariz pontudo e acinzentado brilhando com um
brilho feroz. "Uma imagem de um cachimbo não é um cachimbo."
Enquanto Jenny flutuava, ouvidos cheios do barulho do fogo, todas as
imagens pareciam flutuar juntas, mesclando e entrelaçando-se. Como se
Aba, Michael e Zach es vessem falando ao mesmo tempo.
"Sem outra palavra, a garota mergulhou no rio de fogo..."
"Tocar é apenas outro sen do. Também pode enganar."
"A imagem não é uma realidade. Mesmo que estejamos acostumados a
pensar assim a maior parte do tempo..."
"O fogo a queimava, é claro, mas ela nadou através dele mesmo assim..."
"Se o modelo criado é bom o suficiente, não há como dizer que não é real...
"
" Mostramos a uma criança a foto de um cachorro e dizemos "isso é um
cachorrinho", mas não é..."
Jenny sentou-se. O fogo ainda estava queimando ferozmente, como se
todas as fogueiras de praias do mundo es vessem fundidas em uma. Tom,
Dee e os outros estavam parados em uma espécie de grupo de futebol a
alguns metros de distância. Jenny sen u-se tonta, mas bem. Na verdade,
sen a toda a luz, como se bolhas carbonatadas a es vessem levantando
em direção ao teto, estourando dentro dela. Ela sen a-se gloriosa.
— É isso — Ela sussurrou. — É isso — Teve que gritar para fazê-los
ouvirem-na. — Tom. Tom, venha aqui; todos venham aqui. Eu entendi. Sei
como sair.
Eles se amontoaram ao seu redor. "Como?" "Você está brincando!" "Nos
diga."
Jenny riu pelo puro prazer de rir, sen ndo-se cristalina e brilhante. Como
uma esfera cheia de luar. Ela levantou os braços alegremente, sacudiu os
cabelos para trás e riu de novo. Os outros trocaram olhares, suas
expressões mudando de excitação para consternação.
— Não, está tudo bem — ela assegurou. — Eu sei como sair. Basta
caminharmos. Vocês não perceberam? O fogo não é real! É um modelo
que nosso cérebro está fazendo.
Eles não pareciam tão felizes quanto ela nha pensado. Olharam para ela,
depois um para o outro. Michael abriu a boca e depois fechou novamente,
olhando nervosamente para Audrey. Ela suspirou.
— Ah... — Dee olhou para os outros, depois deu um tapinha no ombro de
Jenny. — Tudo bem, Gata. Você volta a dormir, e depois falamos sobre isso.
— O quê, você acha que estou brincando? Não estou. Estou dizendo;
podemos sair daqui.
— Gata... — Dee olhou por cima do ombro para o fogo, depois de volta ela.
— Odeio dizer, mas esse fogo não é um modelo no meu cérebro. Está
quente. Tenho até queimaduras. — Ela mostrou a Jenny vários inchaços
cheios de líquido na mão.
Jenny olhou para eles, brevemente abalada. Então, se recuperou:
— Isso é porque você acreditou. Acreditou no calor e isso causou as
queimaduras. — disse ela. — Não, Dee, sem brincadeira, droga! Estou
falando sério. Você sabe como as pessoas hipno zadas podem ter uma
queimadura se lhes disser que estão tocando algo quente, mesmo que não
estejam. Acontece.
Michael passou as mãos pelos cabelos.
— Mas, Jenny, é muito quente. Não dá nem pra se aproximar.
— Isso é porque você acredita que está quente. Foi você quem disse,
Michael: se um modelo é bom o suficiente, você não consegue dizer se é
real ou não. — Ela olhou de um rosto para outro. A gloriosa leveza
desapareceu; agora Jenny sen a uma decepção esmagadora. — Vocês
acha que estou louca, não é?! Todos vocês.
— Jenny, você já passou por tanta coisa...
— Não quero sua pena, Audrey! Quero que você me escute. Você acredita,
Zach? — Ela se virou para ele desesperadamente. — Lembra-se de
Magri e? Você me disse que a imagem não é a realidade, e eu disse: "A
menos que exista alguém que possa transformá-la em realidade." Mas e se
não é isso que Julian faz? E se ele não transforma uma imagem em
realidade, mas nos faz pensar que é realidade? Se mostra aos nossos
sen dos algo tão convincente que nossos cérebros fazem um modelo e
acreditam nele, mesmo que seja só uma ilusão? Como um sonho?
— E se? — Zach citou de volta para ela. — Isso é um E se? muito grande,
Jenny. E se você es ver errada?
— Então estaremos torrados. — Michael murmurou.
— Mas é a única coisa que faz sen do — insis u Jenny. — Lembrem, Julian
disse que nunca trapaceava. Se o fogo é real e não há como escapar, então
isso é uma trapaça, não acham?!
— Eu acho que sua fé nele é encantadora — disse Audrey acidamente, as
sobrancelhas cor de cobre levantadas. Ela olhou para Tom, mas ele desviou
o olhar. Recusando-se a apoiar Jenny e sem coragem de assumir isso.
— Não é fé nele. Isso faz sen do — Jenny con nuou. — Você não veem?!
Aba teve um sonho quase exatamente assim. E a garota da história venceu.
Sua vontade foi forte o suficiente.
— Mas o fogo a queimou — apontou Michael.
— Mas não a matou. Não estou dizendo que não vai doer, tenho certeza
que vai, pelas queimaduras de Dee. Mas não acho que vai nos matar a
menos que deixemos. Temos forças o suficiente para passar por ele.
Mas Jenny podia ver pelos rostos deles que ainda não estavam
convencidos. O desespero agarrou seu peito.
— Dee? — Ela quase implorava. Dee mudou desconfortavelmente.
— Gata, se houvesse alguma chance... mas eu o toquei. Pareceu um fogo
de verdade para mim. E mesmo que eu me convencesse a entrar, o que
aconteceria se ao entrar, de repente, a vontade não fosse forte o
suficiente?
— ...torrada. — simplicificou Michael.
— É um risco muito grande. — Audrey falou decisivamente.
— Quando uma ilusão é muito boa pode ser muito real. — disse Zach. —
Ainda pode nos matar.
— Certo, eu entendo — Jenny ficou de pé. — Eu entendo; se não fosse
minha própria ideia, provavelmente também pensaria que era loucura. E
fui eu quem colocou todos vocês nisso, então é justo que eu os re. Eu vou
sozinha.
A cabeça de Tom virou-se.
— Ei, espere... — disse ele ao mesmo tempo que Zach: — Não, veja...
— Não, está decidido — Jenny con nuou. — Eu tenho a melhor chance, já
que sou eu quem acredita que posso superar isso.
— Isso só se sua teoria es ver certa — Dee ficou à frente de Jenny,
bloqueando-a. — Se você es ver errada, morre. Não, você não vai a lugar
nenhum.
— Sim, eu vou. — Jenny inclinou-se para frente, encarando Dee, ambas
com raiva. — A decisão é minha. Eu vou e ninguém vai me parar.
Entendeu?
Dee soltou a respiração bruscamente. Ela a olhou furiosa, mas recuou para
Jenny passar. Michael, de olhos arregalados, afastou-se apressadamente,
puxando Audrey com ele. Até Zach, embora seu rosto es vesse branco e
furioso, recuou, incapaz de segurar o olhar de Jenny.
Foi Tom quem pegou seu braço.
— Espere um minuto — pediu, sua voz razoável.
Jenny virou-se para ele, erguendo a cabeça como uma rainha porque
estava morrendo de medo, porque ele era o único aqui que poderia minar
sua determinação. Em sua mente, ela podia ver-se parada ali, es cada até
a altura máxima, com os cabelos soltos nos ombros à luz do fogo. Ela
esperava que parecesse dominadora. Se sen a alta, orgulhosa e bonita.
— Eu disse que ninguém vai me impedir, Tom. Nem você.
— Não estou tentando impedi-la — ele disse, ainda quieto e razoável. Seus
olhos castanhos eram firmes, quase luminosos à luz do fogo, e o rosto
estava limpo. Tranquilo, com um olhar de total convicção. — Eu vou com
você.
Jenny sen u uma onda de calor e gra ficação que a deixou tonta. Ela
agarrou a mão dele e apertou com força.
— Você acredita em mim!
— Vamos. — Ele apertou a mão dela de volta, depois a olhou e pegou a
outra mão, a com o anel. Seus dedos se entrelaçaram aos dela e Jenny se
sen u forte o suficiente para pular sobre o fogo.
— Vamos.
Eles se viraram para enfrentar o fogo juntos.
Era bom que Jenny es vesse se sen ndo invulnerável naquele momento,
porque o fogo era terrível. Mais quente do que ao colocar a mão no forno.
Ela podia sen r o suor escorrer pelos lados ao se aproximarem; a pele de
seu rosto tensa, quente e formigando.
— É melhor fazermos isso rápido! — Tom gritou sobre o rugido.
— Eu acho que a porta está ali. — Jenny apontou com a mão livre.
— Ei, esperem, gente! Esperem... — Michael gritava.
— Um, dois, três... — Jenny olhou para a luz do fogo refle da nos olhos de
Tom. Eles assen ram um para o outro e começaram e pularam nas chamas,
ignorando os gritos de pânico atrás deles.
— Grama fresca e molhada! Grama fresca e molhada! — Tom gritou e
então o fogo estava ao redor deles.
A pele de Jenny queimou. Era assim que parecia. Como se es vesse
esfolando-se em rar. Queimado tanto, que ficava preta e se abria.
Torrando. Fritando como bacon. Seu cabelo inflamava, queimando como
uma tocha na cabeça.
Tinha sido fácil dizer "Basta atravessar o fogo; é um modelo, não é real".
Mas no momento em que entrou, ela entendeu o que Dee quis dizer sobre
parecer real. Se ela vesse chegado perto o suficiente antes para sen r
algo desse calor, nunca teria ousado sugerir isso.
Aquele primeiro segundo foi a coisa mais horrível que já lhe aconteceu. Foi
angus ante e ela entrou em pânico. Perdeu a cabeça completamente.
Ela estava errada, não era uma ilusão, afinal, e ela estava no meio de um
incêndio. Estava pegando fogo. Tinha que correr para fugir disso. Mas não
sabia que caminho seguir. As chamas rugindo, crepitando e matando
estavam ao seu redor, queimando-a como uma boneca de cera jogada em
uma fornalha, assando-a viva.
Estou morrendo, ela pensou loucamente. Estou morrendo...
Então ouviu o fraco grito do seu lado:
— Grama fresca e molhada! Grama fresca e molhada!
E sen u a mão de Tom na dela. Tom estava puxando-a, arrastando-a.
Tenho que fazer isso por Tom, ela pensou. Se eu desmoronar, ele não vai
me deixar. Ele vai morrer também. Temos que con nuar.
De alguma forma, ela fez as pernas se moverem, disparando
desesperadamente pelas chamas na direção em que Tom estava levando-a.
Jenny apenas rezou para que fosse a certa.
"Ela também estava com muito medo, mas seu amor pelo menino era mais
forte."
— Grama fresca e molhada! — Tom gritava.
Então, uma grande frescura apressada invadiu Jenny. Ela caiu de cabeça na
escuridão e depois na luz. Bateu em algo duro e inflexível, e ela e Tom
estavam rolando.
Eles passaram.
Estavam no chão da garagem de Zach. O concreto estava frio como gelo, e
ela pressionou a bochecha contra ele. Es cou todo o corpo, absorvendo o
frio abençoado, querendo beijá-lo. Em vez disso, Jenny se apoiou em um
cotovelo e olhou para Tom. A luz da garagem estava acesa; ela podia vê-lo.
Ele estava bem, seus olhos se abrindo, seu peito arfando. Ela o beijou.
— Conseguimos — ele sussurrou, olhando para o teto, depois para ela. Sua
voz estava assombrada. — Conseguimos. Estamos realmente vivos.
— Eu sei, eu sei! — Jenny o abraçou e o beijou novamente, em uma agonia
de alegria. — Estamos vivos! Estamos vivos! — Estava loucamente
emocionada. Ela nunca pensou o quão bom era estar viva até que pensou
que estava morrendo.
Tom estava balançando a cabeça.
— Mas, quero dizer, era impossível. Ninguém poderia ter passado por
aquele incêndio.
— Tom... — Ela parou e olhou para ele. — Tom, era uma ilusão. Você sabia
disso, não é?!
— Hã... — Ele olhou em volta, depois bufou midamente, por um
momento parecendo Michael. — Na verdade não.
— Você não acreditou em mim?
— Bem...
— Então por quê veio comigo?
Ele olhou para ela, então, com olhos verdes, dourados e marrons como
folhas de outono rodopiando em uma piscina.
— Porque eu quis — disse simplesmente. — O que quer que vesse
acontecido, eu queria estar com você.
Jenny apenas o encarou por um momento. Estupefata.
— Ah, Tom! — sussurrou. E então estava nos braços dele, soluçando sem
fôlego. Apenas dizendo o nome dele, repe damente. Ela pensou que seu
coração iria explodir.
Eu poderia tê-lo perdido. Eu poderia tê-lo perdido para sempre. Toda a sua
coragem, todo o seu amor por mim. Eu poderia tê-lo perdido... Eu poderia
ter me perdido na escuridão de Julian.
Nunca mais, pensou ferozmente consigo mesma, agarrando-se a Tom
como se algo es vesse tentando arrancá-la. As sombras não têm mais
poder sobre mim.
Era como se o fogo, o grande fogo purificador, vesse queimado todos os
pensamentos sombrios dela. Queimando a parte que respondera a Julian,
que ansiava seu perigo e selvageria. Tomado essa parte como um sacri cio.
Agora que Jenny passara pelo fogo, sen a-se purificada e renovada. Uma
fênix renascida.
Mas a força que ganhou ao lutar contra Julian ainda estava com ela, isso
não havia mudado. Ela estava mais forte do que nunca desde que
atravessara o fogo.
E poderia amar Tom ainda mais causa dessa força. Eles eram iguais. Podiam
ficar lado a lado, sem ofuscar um ao outro. E agora ela sabia que podia
confiar nele até o fim. Só esperava que ele soubesse o mesmo sobre ela,
ou que ela pudesse provar isso à ele. Ela ficaria feliz em passar as próximas
décadas tentando.
O aperto de Tom na mão dela mudou. Ele estava segurando-a com muita
força; depois virou e se afastou para olhar. Jenny levantou a cabeça do
ombro dele.
— Acabou", disse Tom, pensa vo. — O anel.
— Claro — Jenny disse e mordiscou o queixo dele. Nada poderia
surpreendê-la agora. Tudo ficaria bem. — Acabou, porque vencemos.
Estou livre. Conhece alguém que quer uma namorada com pouca
manutenção e bom senso de humor?
— Ah, Jenny. — Os braços dele se comprimiram apressadamente. — Acho
que você terá que colocar um anúncio nos classificados — brincou ele sob
os cabelos dela. — Ah, Thorny, eu amo você.
— Deve mesmo, já que me chamou de Thorny — Jenny piscou para afastar
as lágrimas. — Eu também te amo, Tommy. Para todo o sempre.
Então, no meio de sua euforia, ela pensou em algo.
— Temos que pegar os outr... Meu Deus! — Jenny nha acabado de olhar
para a fotografia mural na parede.
Estava pegando fogo.
— Fique aqui! — Tom estava de pé, rando a jaqueta. Ele alcançou a
maçaneta de metal da porta na imagem infalivelmente.
— Eu vou com você!" — Jenny gritou de volta. Ela agarrou a mão dele
quando ele puxou a maçaneta. — Você nunca mais vai a algum lugar sem
mim de novo.

A escuridão os pegou, os sugou. Os Deitou no fogo.


Desta vez não foi tão ruim. Jenny abaixou a cabeça, agarrou-se à mão de
Tom e correu. Vai acabar em um minuto, disse a si mesma enquanto a
agonia a cercava. Vai acabar em um minuto, em um minuto...
Então acabou. Ar fresco estava ao seu redor. Dee, Zach, Audrey e Michael
estavam ao redor deles, encarando-os e estendendo as mãos para pegá-
los.
— Estão vendo?! — Jenny ofegou para Dee, que era a mais próxima dela.
— Está tudo em nossas mentes.
— Ah, Deus, você está viva! — O abraço de Dee a machucou como o de
Tom.
— É bem óbvio — ironizou Tom. — Então, é o seguinte. É quente e dói, mas
não mata você. É só contar até dez e acaba. Tudo bem?
Até dez? Jenny pensou, afundando um pouco a cabeça nos ombros de Dee.
— Parece cem — ela confidenciou à amiga.
— Gritem "grama fresca e molhada" — disse Tom. — Apenas con nuem
gritando isso e sairão sã e salvos.
— Vamos fazer isso! — Dee assen u, mas os olhos de Michael estavam
arregalados e inquietos, e Audrey recuou um passo.
Zach permaneceu muito quieto, olhando para Jenny. Então, ele soltou o ar:
— Tudo bem. É apenas uma ilusão. Irrealidade, aqui vamos nós.
— Depressa, mexam-se — disse Tom aos outros. — Temos que sair antes
que essa maldita fotografia queime de vez. Quem sabe o que vai acontecer
depois. — Ele agarrou Michael pela camiseta e segurou firmemente sua
mão, estendendo a outra para Dee.
Jenny agarrou a de Audrey.
— Não! — ela gritou. — Eu não quero...
— Só faça o que eu disse. — Tom gritou para Michael. — Vá! Vá! — Ele deu
um empurrão no amigo, que o fez tropeçar para frente. Dee es cou a mão
para trás de si e pegou a mão de Audrey para puxá-la consigo. Jenny
empurrou Audrey e estendeu a mão livre para Zach. Ela sen u os dedos
finos e fortes dele se fecharem sobre os dela. Sen u o calor subir ao seu
redor.
Então foi como um jogo selvagem de rasgar chicotes, com todos subindo,
correndo e puxando. Até que Audrey correu na direção errada. O fogo
encheu os olhos e os ouvidos de Jenny. Ela tentou contar até dez, mas era
impossível. Sua mente estava ocupada tentando guiar Audrey para a
direção correta.
Fogo, dor, calor e puxões em seus braços...
Então, Zach tropeçou e soltou-se dela.
Jenny não sabia como acontecera. Sua mão estava subitamente vazia. Ela
tateou loucamente e não encontrou nada. Virou a cabeça, olhando
frene camente para trás. Por um instante, pensou ter visto uma silhueta
negra no inferno laranja, depois as chamas apagaram-na.
Zach...
Ela abriu a boca para gritar e o ar ardente encheu seus pulmões. Ela
engasgou. Estava sendo puxada para frente. Não havia nada que ela
pudesse fazer, a menos que deixasse Audrey ir. Ela estava sendo arrastada
e perdera Zach completamente.

Então ela explodiu em uma frieza e caiu.


Caiu em cima de Audrey, que choramingava. Jenny ainda estava engasgada,
incapaz de respirar.
Ela estava tão quente, exausta e dolorida. Tudo doía. Seus ouvidos estavam
pulsando, seus olhos e nariz ardiam, e quando tentou levantar, suas pernas
caíram sob ela.
Mas ela estava viva. E Audrey também, porque estava fazendo barulho.
Michael estava vivo, tossindo, batendo em suas roupas para rar a fumaça.
Dee estava viva, batendo no chão e gritando alegremente. Tom estava vivo
e de pé. Alto, bonito e severo.
— Onde está o Zach?
A garganta de Jenny estava crua.
— Ele se soltou — disse ela, quase num sussurro. — Ele tropeçou e soltou
minha mão...
O sorriso de Dee entrou em colapso. Ela olhou para a foto na parede. As
chamas estavam lambendo-a.
— Não consegui segurá-lo — disse Jenny, envergonhada. — Não consegui
ajudá-lo...
— Eu vou buscá-lo. — disse Tom.
— Você está louco? — Michael gritou. Ele parou, curvando-se em um
acesso de tosse. Então cuspiu e levantou a cabeça novamente. — Você está
louco? Isso vai te matar!
Audrey rolou para olhar a foto com olhos aterrorizados, seus cílios
pontudos emaranhados.
— Deveríamos pegar um ex ntor de incêndio... — Dee começou.
— Não! Não até voltarmos. — Tom a interrompeu. — Isso pode fazer
alguma coisa, fechar a porta ou algo assim. Apenas espere por nós,
voltaremos em um minuto.
Jenny engoliu em seco. O fogo nha sido pior desta vez; deve estar
piorando a cada segundo. Mas Zach... O primo de olhos cinzentos. Estava
perdido em algum lugar naquele incêndio. Ela não podia simplesmente
deixá-lo...
— Ah, Deus — ela soluçou. — Tom, eu vou com você. — Ela tentou se
levantar novamente, mas suas pernas simplesmente não obedeciam. Ela
olhou para eles com espanto.
— Não! — Tom respondeu. — Dee, cuide dela!
— Tom... — Jenny gritou.
— Eu voltarei. Prometo. — Ele estava alcançando a imagem, puxando a
maçaneta.
Então ele simplesmente desapareceu. As chamas dispararam e pareciam
agarrá-lo como mãos famintas, arrebatando-o para dentro. Ele se foi, e a
fotografia estava em chamas. Cada cen metro dele estava queimando
agora, chamas estourando e se espalhando. Saltando tão alto que em
qualquer outro momento Jenny ficaria aterrorizada à simples vista, com
medo da casa de Zach. Nunca nha visto um incêndio descontrolado tão
alto.
Nesse momento, ela só se importava com a fotografia. A imagem inteira
estava pegando fogo, escurecendo e descascando. Desaparecendo sob as
chamas.
— Não! Tom! Tom! — ela gritou.
— Temos que pegar água! — Dee também gritou.
— Não! Ele disse para não... Meu Deus, Tom!
Estava queimando. Queimando. Queimando todo o reconhecimento.
Transformando-se em uma bagunça negra. A pirâmide de mesas
desapareceu enquanto chamas lambiam sob elas. A porta se fora agora. O
sinal de saída se foi.
— Tommeeeeeee!
As mãos fortes de Dee seguraram Jenny, impedindo-a de tentar pular na
fotografia.
De nada adiantou. Não havia mais alça saindo da imagem. Não havia mais
nada. As chamas começaram a morrer quando a úl ma parte foi
consumida. Pedaços dela caíram. Outros flutuavam no ar, descendo
lentamente. Faíscas dançavam no ar.
Então era apenas um retângulo carbonizado e ardendo na parede.
Jenny caiu de joelhos, as mãos sobre o rosto. Ela não sabia que podia
emi r sons assim.
— Jenny, não. Não. Ah, Deus, Jenny, por favor, pare. — Dee também estava
chorando, pingando lágrimas pelo pescoço. Dee, que nunca chorou.
Audrey se arrastou do outro lado, passando os braços em volta delas.
Todos estavam chorando.
— Olhem, pessoal... Pessoal, não... — Michael ofegou. Jenny sen u um
novo par de braços ao seu redor, tentando sacudir todos eles. — Jenny...
Jenny, pode não ter sido tão ruim. Ele pode ter conseguido.
Jenny não parava de soluçar, mas levantou a cabeça um pouco. O rosto de
Michael estava sombrio, ansioso e sério.
— Vamos pensar nisso. Demorou mais de dez segundos para que a foto
queimasse. E ele poderia ir mais rápido sem que todos nós o
segurássemos. Então ele provavelmente conseguiu, e isso significa que
pelo menos ele está vivo.
— Mas, mas Zach... — Houve um tremor no meio de Jenny.
— Ele também pode ter voltado — Michael disse desesperadamente. —
Ele pode estar bem.
Jenny olhou para ele. O tremor não parou, mas diminuiu. Ela se sen u mais
conectada ao mundo.
— Mesmo? — ela sussurrou. — Você acha que...?
Então Dee fez um som estranho, como se algo a vesse mordido.
— Vejam!
Jenny torceu o pescoço e seguiu o olhar de Dee para a fotografia. Então,
ela assobiou e se virou para encará-lo.
Letras apareciam na super cie enegrecida, assim como letras haviam
aparecido na janela de Michael no gelo an natural. Mas estas eram
graciosas, sendo escritas com uma fluídez que corria ao longo da imagem.
Como se um pincel gigante de caligrafia as es vesse pintando na escuridão.
Elas brilhavam vermelhos como brasas, e tufos de fumaça subiam quando
elas apareciam.
Seus amigos estão comigo no Mundo das Sombras. Se você os quiser, faça
uma caça ao tesouro. Mas lembre-se: se você perder, é ao Diabo que tem
que pagar.
— Ah, não — Michael sussurrou.
— Eles não estão mortos — disse Audrey, um pouco trêmula. As letras
vermelhas já estavam desaparecendo. — Viram?! Eles não estão mortos.
Julian está mantendo-os para barganhar.
— Deus. — Dee apenas murmurou.
Jenny, no entanto, sentou-se sobre os calcanhares, as mãos abrindo e
fechando. Trabalhando, se preparando para a ação. Ela pensou no Mundo
das Sombras, no turbilhão de gelo e escuridão no armário, e nos olhos
cruéis, an gos e famintos lá. Tom estava em algum lugar entre aqueles
olhos, e seu primo também.
Ela sabia disso, mas não estava mais tremendo. Toda a sua fraqueza e
confusão haviam evaporado. Ela ouviu o desafio e entendeu.
Não nha medo de Julian agora. Era mais forte do que jamais fora antes,
mais forte do que sabia que poderia ser.
— Certo — ela disse e ouviu a própria voz, clara e fria, como uma
trombeta. — Ele quer um novo jogo? Ele vai conseguir. Eu sei que posso
vencê-lo agora.
— Jenny... — Michael começou, olhando-a com medo.
Jenny balançou a cabeça, endireitou os ombros.
— Eu posso vencê-lo — disse ela novamente com total confiança. Para a
fotografia esfumaçando, preta e vazia de novo, ela disse: — En garde6,
Julian. Isso ainda não acabou.

FIM DO LIVRO 2
A AUTORA:

L .J. Smith tem inúmeros livros para jovens publicados, muitos deles
frequentaram a lista de mais vendidos do New York Times e foram
inspirados em seus próprios pesadelos. Seu primeiro romance, The night of
the sois ce, foi lançado no ano em que ela se formou na faculdade. É
autora das séries "Diários do Vampiro" - que deu origem à série de
televisão Vampire Diaries -, "O Círculo Secreto" e "Mundo das Sombras".
Atualmente, vive na Califórnia com seu cachorro, Victor, três gatos e
aproximadamente dez mil livros.

Para mais no cias sobre a trilogia e a futura série de TV, siga-nos no


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NOTAS:
1. Trocadilho com um so ware americano, que possui um gato como
símbolo.
2. Vamos, em francês.
3. Linda, em alemão.
4. É como a Polícia Real Montada do Canadá, maior força de segurança do
país, é conhecida popularmente.
5. The Po y Monster, no original. Uma fábula americana contada à
crianças para ajudá-las a superar o medo de usar vasos sanitários sozinhas.
6. Cuide-se, em francês.

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