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02/03/2017 Além 

do Cotidiano ­ Roteiro ­ Cinema ­ Videogames ­ Antropologia ­ Quadrinhos

Além do Cotidiano
tópicos sobre narrativa, roteiros e mundos virtuais

A Estrutura de Uma História


Por Sandro Massarani

Para um melhor entendimento deste texto leia antes Elementos


Fundamentais de uma História.

Não esqueça de usar para o rascunho e planejamento de sua obra a Ficha


de História (PDF).

INTRODUÇÃO

Chega uma hora que o fã de cinema, quadrinhos, literatura e outros tipos


de arte, deseja contar a sua própria história. Por achar que já leu diversas
obras e que viu bastantes ⏍�lmes, acha que basta sentar em sua cadeira e
começar a escrever que a inspiração irá lhe abençoar e que apenas sua
experiência como leitor/espectador será su⏍�ciente. O resultado na
maioria das vezes é desastroso.

A escrita de uma história não deve ser feita somente por instinto. O
verdadeiro escritor cria o seu método, e planeja com detalhes sua obra
antes de começar a efetivamente escrevê-la. É lógico que há exceções,
mas é cada vez mais raro uma obra de qualidade ser feita de forma
amadora e sem planejamento.

O trabalho do escritor é muito mais transpiração do que inspiração.


Inspiração vem como consequência de você ter a disciplina para analisar
centenas de histórias, de todo dia criar pelo menos uma página, de
pensar na escrita como algo constante. Pode parecer um discurso batido,
mas na vida é a persistência junto com o estudo que realmente lhe dá
maiores chances.

Portanto, escrever uma história não é simplesmente sentar e colocar no


papel ou no computador o que vier na sua cabeça. Deve haver uma
estrutura por trás de tudo. Aristóteles, um dos mais antigos ⏍�lósofos e pai

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da construção narrativa já dizia: toda história deverá ter início, meio e ⏍�m.
Vamos então desenvolver as idéias de Aristóteles e de outros estudiosos
da escrita.

Só nunca esqueçam de que as regras são feitas para serem quebradas, e


que nunca devemos nos tornar escravos dessas regras. Aprenda a teoria
ensinada nas universidades, livros e cursos de escrita, mas aplique seu
próprio método e estilo.

A ESTRUTURA DOS ATOS

À partir da premissa de que toda história tem início, meio e ⏍�m, podemos
transformar essas etapas em atos: Ato I (início), Ato II (meio) e Ato III
(큾�m). Alguns autores, como Shakespeare, utilizam outras estruturas como
a de cinco atos, mas acredito que toda história possa ser, de uma forma
ou de outra, sintetizada em apenas três atos, nem que seja para facilitar o
aprendizado e ser nosso ponto de partida.

Esquema da Estrutura dos Atos

ATO I (30%)
|
Mundo Ordinário e/ou Gancho (Hook)
|
O Incidente - Distúrbio (Inciting Incident) e/ou Gancho (Hook)
|
Estabelecer situação e con��ito
|
Primeiro Ponto de Transição (Plot Point)
|
ATO II (55%)
|
Desenvolver e complicar a situação
|
Ponto Central (Midpoint - opcional)
|
Desenvolver e complicar a situação
preparando para o Clímax
|
Segundo Ponto de Transição (Plot Point)
|
ATO III (15%)
|
Eventos iminentes que levam ao Clímax
|
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Clímax - Impacto Visual Destacado


|
Epílogo (Denouement) ou Cli旂�hanger (Gancho para a continuação)

O Ato I

É o Ato introdutório, que não deve durar mais do que 30% da história (às
vezes bem menos), senão corre o risco da audiência perder o interesse na
obra devido à falta de um con��ito central bem de⏍�nido.

O introduzir do Ato I pode ser marcado pela descrição do Mundo


Ordinário do personagem principal. No início de sua história, você
começa descrevendo o personagem em seu mundo comum, na sua vida
cotidiana. O que ele geralmente faz no dia-a-dia.  E é nesse lugar que ele
vai ⏍�car a não ser que algo faça ele mudar. Então bem cedo no Ato I, algo
tem que perturbar (algum incidente) o Status Quo (a situação estática).
Alguma coisa sempre tem que estar acontecendo, alguma ameaça ou
con��ito para o personagem, senão o leitor/escpectador ⏍�cará entediado.

Se você não quiser começar a história com o Mundo Ordinário do


personagem, comece-a utilizando um Gancho (Hook). O Gancho é algo
que aparece no início da obra e faz a história se mover (sempre mova a
história) e prende o leitor a continuar assistindo ou lendo. Por exemplo,
um assassinato misterioso pode ser o Gancho inicial de uma história, e só
depois é que seremos apresentados ao personagem principal e ao seu
mundo cotidiano. Geralmente, o Gancho deve vir o mais rápido possível,
para manter a audiência atenta. Outro Gancho interessante é começar a
obra com uma imagem tão impactante que prenda a atenção de todos.

O personagem deve ter sempre um objetivo na história. E o que o faz


inicialmente ir atrás desse objetivo é um Incidente (Inciting Incident),
um Distúrbio que acontece em sua vida que o obriga a agir. O Incidente é
evento que faz o personagem principal reagir e ir atrás de seus desejos.
Uma ligação no meio da noite, um rapto, um chamado. O distúrbio não
precisa ser algo grandioso e impactante. Pode ser sutil como uma
campainha sendo tocada. Ele cria um interesse para a audiência,
prometendo um desenvolvimento interessante no futuro. O Gancho, se
não tiver sido utilizado anteriormente, pode ser incorporado junto com o
Incidente. Podemos inclusive começar a história com um Incidente junto
com o Gancho, se optarmos por não retratar o Mundo Ordinário. Muitas
vezes, em seriados e revistas sequenciadas, não há a necessidade
constante de expormos o Mundo Ordinário do personagem, pois este já é
bem conhecido. Logo, é mais comum este tipo de história se iniciar já com
o Incidente junto do Gancho.

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O Ato I estará perto do ⏍�m quando o escritor já estiver situado sua


audiência na obra. Quando os leitores/espectadores souberem quem é o
personagem principal, onde ele está, o que ele quer e contra quais
obstáculos ele irá lutar, será o momento de transição para o Ato II. Esse
Primeiro Ponto de Transição deve marcar a passagem do personagem
de seu Mundo Ordinário para um novo mundo, desconhecido e
permeado por mudanças. O ideal é agora não haver chance de retorno do
protagonista para sua antiga vida, ou seja, uma linha divisória foi cruzada.
É comum esse Ponto de Transição vir acompanhado de uma cena ou
imagem impactante (impacto visual destacado).

O Ato II

Provavelmente, a escrita do Ato II seja a tarefa mais complicada de se


fazer em uma obra. Correspondendo
a praticamente mais da metade de uma história, o Ato II deve ser
construído de maneira que mantenha o interesse da audiência e prepare
terreno para o grande ⏍�nal. Não é tarefa fácil.

O escritor deve começar a intensi⏍�car e desenvolver os obstáculos


enfrentados pelo protagonista. Deixe-o com muitos problemas. Você deve
tentar convencer a audiência de que o personagem principal está em
apuros e não vai conseguir o seu objetivo. Escreva cenas que estiquem a
tensão, aumente o que está em disputa e mantenha os
leitores/espectadores preocupados, caminhando em direção ao Ato III de
forma inevitável. É o princípio da Ação Crescente (Rising Action), ou
seja, a cada cena, o enredo vai  tornando-se mais intenso, a ação maior,
cada perigo mais ameaçador, cada di⏍�culdade mais complicada, tudo
mais complicado do que veio anteriormente. Lembre-se que ação nem
sempre signi⏍�ca luta física.

Outra maneira de desenvolver o Ato II é trabalhar com Subenredos


(Subplots), dando mais destaque para personagens secundários e suas
relações entre si e com o personagem principal. Os Subenredos mostram
outros lados da vida do protagonista, e também são utilizados para
construir maior credibilidade para o mundo ⏍�ccional retratado pelo autor,
dando uma dimensão de variedade e às vezes desvinculando um pouco a
história do seu objetivo principal, fornecendo fôlego para a audiência.
Esses Subenredos devem ser tratados da mesma maneira que o enredo
principal, sempre caminhando em direção a uma conclusão. Não caia no
erro de, por exemplo, iniciar um Subenredo de romance e no ⏍�nal da obra
não conclui-lo. Só não esqueça que em algumas ocasiões, o ideal não é
acrescentar personagens e subenredos, e sim retirar.

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Muitas obras acrescentam no Ato II uma nova reviravolta chamada de


Midpoint (Ponto Central), fazendo com que basicamente a estrutura
tenha 4 atos, acelerando e intensi⏍�cando os con��itos. É como se fosse o
ponto central do Ato II.

Quando o escritor desenvolver as situações e complicações, e houver


preparado o caminho para o ⏍�nal, chega-se ao ⏍�m do Ato  II. É hora do
Segundo Ponto de Transição, que é o caminho sem volta para o Clímax.
Novamente, o Ponto de Transição pode ser marcado com uma cena ou
imagem impactante (impacto visual destacado). É bom salientarmos que
o enredo pode ter inúmeros Pontos de Transição, ou seja, pontos de
mudança na história. Porém, de todos esses pontos, o ideal é apenas dois
terem grande destaque.

Ato III

O início do Ato III é literalmente o início do ⏍�m. O protagonista começa a


decidir o seu principal problema.  É sempre interessante fazer uma cena
⏍�nal de confronto, chamada de Clímax. Deve ser algo grandioso para o
personagem, o momento de de⏍�nição. A luta contra um inimigo mortal ou
a simples resposta da pessoa amada. O Clímax deve ser recheado de
suspense e tensões.

O Ato III deve ser curto, no máximo 15% da obra, e no ⏍�m praticamente
todos os con��itos mostrados na história devem alcançar um desfecho,
mesmo que seja um desfecho misterioso ou aberto, mas que deve ser
pelo menos sugerido. Nunca deixe a audiência na dúvida sobre
exatamente como ou porque algo aconteceu (a não ser que seja sua
intenção).

Após o Clímax, muitas histórias acabam com um Epílogo (Denouement),


uma cena breve que lentamente desliga a audiência do mundo ⏍�ccional.
O Epílogo pode ser também utilizado para responder algumas questões
deixadas pra trás, destacar as mudanças realizadas nos personagens
(arcos dos personagens), ou indicar o que acontecerá com eles depois.
Mas seja sempre breve. Um dos erros mais incômodos é quando o
escritor prolonga o epílogo além do necessário, arrastando a obra por
minutos aparentemente intermináveis.

Quando uma história não se encerra totalmente com o Ato III, como no
caso de algumas histórias em quadrinhos e séries continuadas, o escritor
tem a opção de deixar um Gancho no ⏍�nal para atiçar a curiosidade da
audiência e fazer com que ela assista a sequência. Esse Gancho ⏍�nal é
chamado tecnicamente de Clihanger. Um dos exemplos mais
conhecidos de Cli旂�hanger no cinema é o ⏍�nal do primeiro De Volta para o

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Futuro, que já deixa o caminho aberto para uma continuação.

CONCLUSÃO

O que foi detalhado acima é apenas o esqueleto, a base de uma obra. Seu
recheio deve vir com a habilidade do escritor e de seu estudo sobre
personagens, cenários, diálogos, ⏍�nais, etc. De forma alguma essa
estrutura deve ser seguida de forma rígida, mas sim deve ser vista como
um ponto de partida para a sua criatividade. Tente identi⏍�car nas obras
(⏍�lmes, livros e histórias em quadrinhos) os Atos e os Pontos de Transição.
Muitas vezes você vai ⏍�car na dúvida, mas isso é normal pois nem sempre
o escritor de⏍�ne estas etapas conscientemente. Lembre-se: não há uma
maneira exata de fazer uma história, mas quanto mais você estudar e ler,
mais fontes de "inspiração" terá.

Bons Estudos!

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