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Organizador
Excesso de
exercício físico?
1° Edição
Conselho Editorial:
AUTORES
CAPÍTULO 01 ............................................................................................................. 1
PARADOXO: INATIVIDADE FÍSICA x EXCESSO DE EXERCÍCIO
Thiago Teixeira Guimarães
CAPÍTULO 02 ............................................................................................................. 6
TERMOS E DEFINIÇÕES PARA O EXCESSO DE EXERCÍCIO
Thiago Teixeira Guimarães
CAPÍTULO 03 ........................................................................................................... 13
PREVALÊNCIA
Thiago Teixeira Guimarães
CAPÍTULO 04 ........................................................................................................... 19
OVERTRAINING NO FISICULTURISMO
Marcos Vinicios Craveiro de Amorim
DOI: 10.35587/brj.ed.0001380
CAPÍTULO 05 ........................................................................................................... 32
OVERTRAINING NO AMBIENTE MILITAR
Daniel Costa Alves da Silva
DOI: 10.35587/brj.ed.0001381
CAPÍTULO 06 ........................................................................................................... 53
ORIGEM DO OVERTRAINING: SISTEMA IMUNE
Patrícia Maria Lourenço Dutra
Thiago Teixeira Guimarães
DOI: 10.35587/brj.ed.0001382
CAPÍTULO 07 ........................................................................................................... 74
ORIGEM DO OVERTRAINING: ESTRESSE OXIDATIVO
Wagner Santos Coelho
DOI: 10.35587/brj.ed.0001383
CAPÍTULO 08 ........................................................................................................... 86
ORIGEM DA FADIGA AGUDA: CÉREBRO
Thiago Teixeira Guimarães
Thais Cevada
DOI: 10.35587/brj.ed.0001384
CAPÍTULO 09 ......................................................................................................... 104
SINTOMAS CLÍNICOS DO EXCESSO DE EXERCÍCIOS
Thiago Teixeira Guimarães
CAPÍTULO 10 ......................................................................................................... 116
VARIABILIDADE DA FREQUÊNCIA CARDÍACA
Ercole da Cruz Rubini
DOI: 10.35587/brj.ed.0001385
CAPÍTULO 11 ......................................................................................................... 124
PERIODIZAÇÃO E ESTRATÉGIAS DE TREINAMENTO
Elaine Cristina da Silva Pinto
DOI: 10.35587/brj.ed.0001386
CAPÍTULO 12 ......................................................................................................... 155
TÓPICOS ESPECIAIS: METABOLÔMICA
Ricardo Moreira Borges
DOI: 10.35587/brj.ed.0001387
CAPÍTULO 01
PARADOXO: INATIVIDADE FÍSICA x EXCESSO DE EXERCÍCIO
1
Tabela 1. Doenças crônicas não transmissíveis mais prevalentes no mundo decorrentes da
inatividade física.
Por outro lado, pessoas que se exercitam dez vezes acima de 150
minutos semanais em intensidade moderada ou acima de 75 minutos semanais
em intensidade vigorosa apresentam o mesmo risco de morte em relação a
2
pessoas pouco ativas fisicamente8. O exercício parece produzir benefícios à
saúde em doses moderadas8. Ainda que o esforço intenso seja capaz de
aperfeiçoar o desempenho e a saúde9; 10, cargas extenuantes de estresse físico
e mental podem os comprometer. Atletas amadores, profissionais ou de
recreação são frequentemente acometidos por desordens de origem
metabólica, imunológica, neurológica, endócrina, cardiovascular, muscular e
esquelética11; 12.
A linha tênue entre prejuízos e benefícios de sucessivas sessões
fatigantes de esforço não depende exclusivamente do entendimento de
conceitos e princípios metodológicos do treinamento. O exercício físico pode
apresentar uma relação paradoxal e sua prescrição consistente depende de
uma melhor compreensão sobre seus mecanismos celulares11; 13; 14.
3
REFERÊNCIAS
8 AREM, H. et al., Leisure time physical activity and mortality: a detailed pooled
analysis of the dose-response relationship. JAMA Intern Med, v. 175, n. 6, p.
959-67, Jun 2015. ISSN 2168-6114. Disponível em: <
https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/25844730 >.
9 GOHIL, K.; BROOKS, G. A. Exercise tames the wild side of the Myc network:
a hypothesis. Am J Physiol Endocrinol Metab, v. 303, n. 1, p. E18-30, Jul 2012.
ISSN 1522-1555. Disponível em:
<http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/22535747 >.
4
12 MEEUSEN, R. et al., Prevention, diagnosis, and treatment of the
overtraining syndrome: joint consensus statement of the European College of
Sport Science and the American College of Sports Medicine. Med Sci Sports
Exerc, v. 45, n. 1, p. 186-205, Jan 2013. ISSN 1530-0315. Disponível em: <
https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/23247672 >.
5
CAPÍTULO 02
TERMOS E DEFINIÇÕES PARA O EXCESSO DE EXERCÍCIO
6
de outros estímulos estressores não relacionados ao treinamento (sono, dieta,
família, estudos, trabalho, lazer e outros) podem explicar porque cada
praticante apresenta uma resposta diferente para uma mesma rotina ou
planejamento de treinamento10.
Uma importante definição de overtraining é o acúmulo de treinamento
e/ou estresse sem treinamento que pode resultar, a longo prazo, no
decréscimo da capacidade de desempenho, com ou sem sinais fisiológicos e
psicológicos relacionados, além de sintomas de má adaptação, cuja
restauração pode levar várias semanas ou meses3. Enquanto overtraining
caracteriza um processo de treinamento intensificado, a expressão "síndrome"
é utilizada para enfatizar a etiologia multifatorial de forma a reconhecer que o
exercício (treinamento) não é necessariamente o único fator causal da
síndrome11.
Entretanto, o exercício físico, através de durações prolongadas, cargas
extremas e/ou frequência elevada pode apresentar benefícios, caracterizando
um paradoxo6; 12
. Há uma linha tênue entre riscos e benefícios induzidos por
excesso de exercício. Como benefícios potenciais, há praticantes que podem
experimentar ativações no sistema límbico de recompensas cerebral,
sensações de prazer e bem-estar, além de aumentos no gasto energético e
reduções ou manutenções na distribuição da gordura corporal12; 13
. Se a
perturbação da homeostase for devidamente programada, monitorada e
avaliada ao longo de um ciclo de treinamento, ainda que ocorra uma exaustão
temporária induzida pelo excesso de treinamento, é possível reverter o status
de esgotamento, recuperar a constância fisiológica interna e aprimorar o
rendimento através da supercompensação de adaptações fisiológicas6.
Overreaching é justamente a exaustão temporária seguida da
supercompensação, porém, ao contrário do overtraining que requer meses, sua
recuperação é relativamente fácil de ocorrer em curto prazo, entre uma a
quatro semanas14, período conhecido como tapering ou polimento.
Segundo o Colégio Europeu de Ciências do Esporte4, o overtraining
pode ser resultado de dois estados diferenciados em relação ao desempenho:
overreaching de curta duração, funcional, ou overreaching extremo, não-
funcional. O estado funcional é caracterizado por uma queda rápida no
desempenho seguido por uma eventual melhora, em um processo que se
7
assemelha à teoria da supercompensação de adaptações fisiológicas4. Ainda
de acordo com o posicionamento, no estado não-funcional, a queda na
performance tem recuperação mais prolongada. Normalmente, é acompanhada
de fadiga e alterações bioquímicas, imunológicas, fisiológicas e
comportamentais4. O estado não-funcional desencadearia a síndrome do
overtraining, que por sua vez afetaria negativamente diversos sistemas
biológicos, sendo de recuperação muito lenta4.
Apesar dos inúmeros esforços para tentar classificar operacionalmente
os diferentes termos, a distinção entre o overreaching não-funcional e a
síndrome do overtraining é muito difícil e depende do resultado clínico e
diagnóstico por exclusão3; 6. Ainda assim, de acordo com um comunicado
especial publicado pelo Colégio Americano de Medicina do Esporte e Colégio
Europeu de Ciências do Esporte em 2013, não existe evidência científica para
se confirmar ou refutar essa sugestão3.
No Reino Unido, o termo síndrome inexplicável do baixo desempenho
(unexplained under performance syndrome – UUPS) tem sido adotado, ao
invés de síndrome do overtraining, para descrever um episódio de baixo
desempenho com fadiga persistente, ou seja, má adaptação. Esse constructo,
síndrome inexplicável do baixo desempenho, reflete a complexidade da
síndrome, a etiologia multifatorial e o supertreinamento ou um desequilíbrio
entre a carga de treinamento e a recuperação pode não ser a principal causa
do desempenho insuficiente15. A Tabela 2 apresenta um resumo sobre as
definições de termos e seus significados.
8
Tabela 1. Resumo de definições relacionadas ao excesso de exercício físico.
Termos Definições
Supertreinamento Processo de treinamento intensificado com possíveis resultados
ou como overreaching funcional, overreaching não funcional ou
overtraining síndrome do overtraining3.
Overreaching Após a intensificação do treinamento ocorre o decréscimo do
funcional desempenho em curto prazo. Através de duas a quatro semanas
de recuperação a supercompensação fisiológica promove a
melhora do condicionamento quando comparada ao início do
treinamento3.
Overreaching não Overreaching extremo, quando o treino intensificado continua e a
funcional recuperação não é adequada. Há estagnação ou redução do
desempenho, assim como o surgimento dos primeiros sinais e
sintomas fisiológicos de estresse prolongado. São necessárias
semanas ou meses para se recuperar3.
9
proteínas, carboidratos, minerais, vitaminas (por exemplo, D), deficiência de
ferro (anemia), doença celíaca; outras condições como menorragia, abuso de
anti-inflamatório não esteroidal, abuso de drogas, concussão, estresse mental,
ansiedade e depressão15.
É muito difícil determinar crenças e hábitos, baseando-se
exclusivamente no tipo de conhecimento científico, compatíveis com o
desenvolvimento do esgotamento físico e mental. Pode-se sugerir, a partir de
observações empíricas, investigações futuras sobre alguns comportamentos e
circunstâncias:
• Temor do destreinamento;
• Excesso de motivação e resiliência;
• Vício pelo exercício;
• Treinamento não periodizado;
• Estresse mental;
• Restrição dietética (ainda que com o treino em volume reduzido);
• Restrição de sono (ainda que com o treino em volume reduzido);
• Achar que todos reagem da mesma forma ao estresse;
• Crer que apenas a inatividade física gera prejuízos;
• Desconhecer os efeitos colaterais do exercício;
• Excesso de confiança e soberba;
• Drogas que mascaram a fadiga e exaustão;
• Desconhecimento conceituais;
• Negligência profissional;
• Dismorfismo corporal e vigorexia;
• Monotonia e strain (tensão) não monitorados;
• Pressão de patrocinadores, treinadores e competições.
10
REFERÊNCIAS
11
11 MEEUSEN, R. et al., Hormonal responses in athletes: the use of a two bout
exercise protocol to detect subtle differences in (over)training status. Eur J Appl
Physiol, v. 91, n. 2-3, p. 140-6, Mar 2004. ISSN 1439-6319. Disponível em:
<https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/14523562 >.
12
CAPÍTULO 03
PREVALÊNCIA
13
Entre crianças e adolescentes, o sucesso de jovens atletas pode ser
definido por convites para competições nacionais ou internacionais, ou para
bolsas de estudo. Apesar de apenas 0,02 % a 0,5 % dos atletas do ensino
médio continuar a participar em nível profissional, o número de jovens atletas
que se torna especialista em único esporte continua a crescer9. O aumento da
dedicação a regimes intensos de treinamento apresenta desafios físicos,
emocionais e cognitivos ao jovem atleta que podem colocar em risco a saúde
geral9. Não é do nosso conhecimento a existência de dados na literatura que
permitam uma discussão mais aprofundada sobre a epidemiologia do
supertreinamento nessa população.
Entre iniciantes, um dos tipos mais comuns de danos sofridos, através
de observações empíricas, é a dor muscular de início tardio fora de controle. A
dor muscular de início tardio é caracterizada como uma sensação de
desconforto na musculatura esquelética, que ocorre algumas horas após o
exercício físico, desencadeada por processo inflamatório a partir de
sobrecargas não habituais1011. Especula-se que a dor seja um importante fator
para reduzir a adesão ao exercício nessa população, contribuindo ainda mais
para a inatividade física.
No imaginário social entre treinadores e atletas de competição, o estado
de supertreinamento, seus sinais e sintomas deletérios à saúde são condições
não muito aceitas, afinal de contas, prevalece a cultura “no pain, no gain”. Além
disso, o temor do destreinamento que acomete atletas e treinadores, resulta
em contínua e precoce realização de sessões adicionais de treinamento físico
estabelecendo condição inflamatória crônica semelhante à observada entre
indivíduos obesos e em pacientes com diabetes melitus tipo 2 (DM-2), que
configura as bases para o desenvolvimento da resistência à insulina e da
disfunção do endotélio vascular12; 13.
Apesar de controverso o assunto em função de dados ainda
inconsistentes, o exercício de endurance praticado por pessoas com diferentes
níveis de aptidão física pode induzir o remodelamento patológico de estruturas
do coração e artérias adjacentes14. Maratonas, ultramaratonas, triátlons,
corridas de bicicleta muito longas, podem causar sobrecarga aguda de volume
nos átrios e ventrículo direito, com reduções transitórias na fração de ejeção do
ventrículo direito e elevação de biomarcadores cardíacos. Cronicamente, o
14
estresse repetitivo pode resultar em fibrose do miocárdio, fibrilações e
arritmias14.
Embora haja evidências de que o exercício físico intenso possa
promover o desempenho e a saúde15; 16, e seja considerado uma “polipílula”17
capaz de promover inúmeros benefícios biológicos e funcionais, não se pode
descartar a existência de uma linha tênue entre seus riscos e benefícios.
Existem efeitos colaterais, inclusive entre as populações mais frágeis
fisicamente, ainda que estudos epidemiológicos sejam escassos. Sinais e
sintomas de overtraining, rabdomiólise, dores e lesões musculoesqueléticas,
síndrome da mulher atleta envolvendo distúrbios na alimentação, ciclo
menstrual e densidade mineral óssea18, doenças crônicas não transmissíveis,
infecções bacterianas e virais (doenças transmissíveis)19 são alguns exemplos
de seus efeitos colaterais.
Como exemplo de que sintomas de exaustão física e mental não
acometem exclusivamente a população de atletas de alto rendimento, um
estudo envolvendo 186 universitários de diversas áreas da saúde evidenciou
que o grupo de insuficientemente ativos apresentou maior pontuação no
Questionário de Sintomas Clínicos do Overtraining em relação aos grupos de
moderadamente ativos e superativos6. Os autores sugerem que existem
questões relacionadas ao desenvolvimento da síndrome do overtraining que
não são justificadas exclusivamente pela frequência, intensidade, duração e o
intervalo das sessões de exercício físico6. Dados ainda não publicados pelos
mesmos autores, de dois diferentes estudos com universitários do curso de
medicina e militares, respectivamente, revelaram resultados semelhantes.
Existe ainda a recomendação de que pacientes com doenças neuromusculares
de caráter crônico, progressivo e muitas vezes inexorável, necessitem de uma
abordagem com enfoque no gerenciamento da fraqueza muscular, e não no
incremento da força, para evitar o estado de overtraining20.
Um programa de condicionamento ou treinamento físico, portanto, se
mal gerenciado pode provocar sinais e sintomas de exaustão ou esgotamento
físico e mental, lesões celulares e funcionais, redução da adesão ao exercício
físico e, consequentemente, aumento das estatísticas de inatividade física e
doenças crônicas não transmissíveis21; 22
. A Tabela 3 apresenta um breve
15
comparativo entre os potenciais riscos e benefícios do exercício físico em
excesso.
Tabela 1. Paradoxo do exercício físico em excesso: linha tênue entre riscos e benefícios de
durações prolongadas, intensidades extremas e/ou frequências elevadas21; 22.
16
REFERÊNCIAS
17
8, Oct 2009. ISSN 1538-2990. Disponível em: <
https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/19726972 >.
15 GOHIL, K.; BROOKS, G. A. Exercise tames the wild side of the Myc network: a
hypothesis. Am J Physiol Endocrinol Metab, v. 303, n. 1, p. E18-30, Jul 2012. ISSN
1522-1555. Disponível em: < http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/22535747 >.
18 JAVED, A. et al., Female athlete triad and its components: toward improved
screening and management. Mayo Clin Proc, v. 88, n. 9, p. 996-1009, Sep 2013.
ISSN 1942-5546. Disponível em: <
https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/24001492 >.
18
CAPÍTULO 04
OVERTRAINING NO FISICULTURISMO
1. INTRODUÇÃO
19
A prática da musculação de forma recreativa, tão difundida e
amplamente praticada pelas academias ao redor do mundo, também pode,
obviamente, resultar no desenvolvimento muscular. Portanto, pode-se concluir
que o Fisiculturismo é um degrau profissionalizado dentre os praticantes do
treinamento de resistência e que seus assuntos pertinentes possuem alta
relevância, não se tratando apenas de um nicho quando relacionado tal treino
também à prática da musculação amadora.
Neste capítulo, será explorada a preocupação exacerbada em relação à
estética corporal, que representa a base do Fisiculturismo, através de estudos
científicos sobre seus possíveis impactos na saúde da população. Brevemente,
além disso, serão abordados seus fatores associados, como o estresse
psicológico, personalidades que induzem autoimagem negativa, efeitos sobre a
massa muscular e as reações fisiológicas aos exercícios desmedidos.
Quanto ao Overtraining, a aderência entre a modalidade esportiva alvo
deste capítulo e a síndrome vai além da crença de que os excessos de treinos
resultam em melhores resultados. Ou seja, a errônea ultrapassagem da linha
tênue entre benefícios e prejuízos não se dá somente pela busca em atingir um
nível competitivo acima dos demais.
20
submeterem-se também ao uso indiscriminado de esteroides anabolizantes.
Com isso, o impacto em suas vidas pode afetar prejudicialmente a rotina social
e ocupacional4; 5.
Os sentimentos de baixa musculosidade em homens e suas
consequências começaram a ser estudados há pouco mais de vinte anos,
quando pesquisadores procuraram correlacionar o excesso de preocupação
nesse aspecto e possíveis impactos na saúde. A maioria de suas conclusões
aponta até hoje resultados maléficos significativos, onde essa condição faz
com que a rotina diária dessas pessoas seja tomada por comportamentos que
objetivam o crescimento e desenvolvimento muscular, como o treinamento de
resistência, dieta rica em proteínas e uso de recursos ergogênicos ilícitos5; 6.
Cabe ressaltar que existem parâmetros que incorrem sobre a
composição corporal, regulados pela individualidade biológica. Mesmo que
todo o potencial genético seja atingido, o desenvolvimento da massa muscular
ainda pode não ser o suficiente para atender às expectativas. Sendo assim, um
fisiculturista ou um praticante recreativo do treinamento de resistência pode
almejar um físico que possivelmente jamais poderá ser atingido7; 8.
Existem algumas investigações científicas voltadas a observar e
interligar grupos de fisiculturistas e traços de preocupações obsessivas em
manter um físico com predominância de Mesomorfia e baixo percentual de
gordura corporal, representando o ápice do perfeccionismo em relação à
estética. Um deles sublinhou que justamente praticantes desse esporte se
sentem menores e mais fracos em relação a outros grupos, como praticantes
Fitness, por exemplo, demonstrando maior prevalência de um complexo de
inferioridade, mesmo que não represente a nítida realidade4.
Ainda sobre esse estudo, não houve distinção no que diz respeito ao
envolvimento em sessões intensivas de treinamentos na comparação de
grupos de fisiculturistas e praticantes do treinamento de resistência recreativos.
Assim, ambos os grupos são suscetíveis a experimentar emoções negativas ao
não alcançar o desenvolvimento muscular planejado e ansiedade ao expor
essa suposta fragilidade em situações de contato social4. A baixa autoestima,
menor atividade sexual e depressão podem também estar relacionados à
Vigorexia2; 9.
21
A necessidade de alguns atributos são tradicionalmente impostos ao
homem como parte de sua aceitação na sociedade. Força física e mental,
competência e dominância são condicionantes para a afirmação de sua
identidade. O exercício físico, sob essa ótica, só reforça ainda mais a busca por
uma posição sólida de destaque social. O insucesso nessa afirmação pode
criar comportamentos desesperados e compensatórios, como uma obsessão
por desenvolver seus músculos6; 10.
Corroborando com isso, outros estudos transcreveram que a adoção de
exercícios físicos desmedidos e dietas restritas podem ser originadas por
pressões socioculturais, uma vez que a boa forma é vinculada à autoestima e
felicidade. A sociedade, com isso, cria um padrão de imagem corporal que é
difundido através das relações interpessoais contemporâneas. Assim, a
tecnologia faz com que cada vez mais pessoas sejam hipersensibilizadas por
imagens com pessoas felizes e corpos perfeitos2; 11.
Treinos com cargas elevadas e intervalos de recuperação curtos podem
ocasionar fadiga extrema e perda de desempenho esportivo, quadro
denominado Síndrome de Overtraining (SOT). Essa condição pode ser predita
através de estados relacionados, o Overreaching Funcional e Overreaching
Não Funcional, que se diferem, principalmente, no período de incidência dos
sinais e sintomas e na restauração do desempenho12; 13, mesmo sendo difícil
estabelecer uma definição inquestionável e limites precisos entre eles14.
Volume e intensidade excessivos compondo as sessões de exercícios, o
que exige grande demanda de energia, em junção com uma dieta voltada ao
baixo aporte de calorias, dificultando a restauração fisiológica pós-treino, são
atribuídos aos principais gatilhos da SOT. Os comportamentos são
incompatíveis e acarretam respostas anormais do organismo12; 13.
Uma das razões da dificuldade em notar características relativas à
Vigorexia é que a preocupação das pessoas em praticar exercícios físicos e se
engajar em uma dieta saudável pode ser vista como indicadores positivos de
atenção com a saúde, sem perceberem os prejuízos que isso pode causar se
submetidos de maneira obsessiva. Em decorrência de um sentimento de
vergonha em relação à sua forma física, elas podem também buscar
distanciamento social, o que dificulta ainda mais em se observar traços desse
transtorno e sua influência negativa no bem-estar6.
22
O Questionário do Complexo de Adonis é amplamente utilizado como
um instrumento de investigação da Vigorexia pela comunidade científica, já que
possui validação para tal. Sua composição é direcionada a apontar, por
exemplo, quanto tempo a pessoa se dedica a exercícios físicos para melhorar
sua aparência, assim como possui questões sobre dieta restritiva e
comportamentos que exprimem, possivelmente, fobia social2; 15.
23
Outro hormônio sensível e que pode ter sua atividade basal alterada é a
Testosterona22.
O estresse pode ser mensurado de forma subjetiva, através de uma
avaliação psicométrica, como a aplicação de questionários, ou objetivamente
através de marcadores fisiológicos, obtidos em tecidos ou fluidos, como
sangue, urina e saliva16; 21.
Assim, a percepção de uma situação estressante pode depender da
personalidade de cada pessoa, sendo diversas também em suas reações
biológicas subsequentes. Portanto, identificar individualidades que provocam
respostas fisiológicas excessivas pode ter importância na manutenção da
saúde22.
24
estresse e provocar respostas exageradas, ou não. Por exemplo, uma menor
resposta ao Cortisol pode fazer com que a pessoa se sinta mais confiante e
aceita socialmente. Já a alta reatividade pode provocar uma autopercepção
negativa16; 26.
25
e densos, com intervalos de recuperação curtos, são os que mais elevam de
forma aguda as concentrações do Cortisol, Hormônio do Crescimento e
Testosterona31; 32.
As lesões teciduais provocadas pela sobrecarga mecânica desses
treinos induzem tais respostas hormonais responsáveis pelas adaptações
fisiológicas. Esses hormônios anabólicos e catabólicos têm as funções de
reparação, remodelamento e hipertrofia muscular, evolvendo processos de
síntese e degradação do tecido proteico33; 34; 35
. O Cortisol, especificamente,
atua também como um anti-inflamatório31; 34. Assim, a atuação dos hormônios
secretados prepara o tecido muscular para suportar gradativamente maiores
cargas, aumentando a demanda metabólica33; 34.
Essas respostas hormonais podem servir de parâmetro para medir a
eficiência de um estímulo no processo de treinamento, sendo suas magnitudes
diretamente proporcionais ao esforço físico exigido. Sua importância prática se
orienta na readequação do estímulo caso sejam identificadas respostas agudas
distintas das utilizadas como base e suficientemente necessárias para induzir o
processo de adaptação fisiológica positiva, ou para observar o excesso31.
Um dano estrutural na fibra muscular provido pelo exercício causa,
inicialmente, um processo inflamatório, sendo que uma degeneração intensa
no local pode permitir o extravazamento anormal de constituintes celulares
para a corrente sanguínea33; 36
. Assim, exercícios físicos extenuantes que
incitam perda de integridade e acentuada lise do tecido muscular podem
desencadear um quadro gravemente nocivo à saúde, como a insuficiência
renal aguda, denominado Rabdomiólise37.
7. CONSIDERAÇÕES FINAIS
26
imagem corporal com o sucesso pessoal. O problema ocorre quando há um
exagero, tanto em relação à distorção da autoimagem, quanto à adesão em
dietas excessivamente restritivas e exercícios desmedidos, mesmo o
crescimento muscular estando submetido aos parâmetros da individualidade
biológica.
Esse quadro característico à Vigorexia pode ocasionar riscos à saúde e
qualidade de vida dessas pessoas, referente, principalmente, ao alto nível de
estresse psicológico em decorrência do seu descontentamento quanto à
aparência física. A literatura aponta fatores ambientais atrelados, como a busca
pela aceitação social.
No âmbito biológico, esse agente perturbador, o estresse, quando
exacerbado, pode impactar também a composição corporal através da redução
da massa magra, sendo prejudicial à própria busca incessante pelo
desenvolvimento muscular. Além disso, respostas fisiológicas podem resultar
em um recorrente estado de atenção e vigília, baseado na mobilização de
substratos energéticos oriundos também do catabolismo do tecido proteico,
sobretudo concomitante aos treinos extenuantes e dietas restritas, como
consequências.
A adesão ao treinamento sem o devido controle de suas tantas variáveis
para que haja a necessária adaptação fisiológica gradativa estaria relacionada
à consequente dor muscular e dano tecidual, que, em casos extremos,
representam efeitos maléficos ao organismo. Seja no esporte ou na prática
recreativa de exercícios, a sobrecarga não deve exceder limites.
27
REFERÊNCIAS
28
11. ELGIN, J.; PRITCHARD, M. Gender Differences in Disordered Eating and
its Correlates. Eating and Weight Disorders. Estados Unidos, v. 11, n. 3, p. e96-
101, set. 2006. ISSN 1590-1262. Disponível em: <
https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/17075236/ >.
15. POPE Jr., H. G.; PHILLIPS, K. A.; OLIVARDIA, R. The Adonis Complex:
The Secret Crisis of Male Body Obsession. Nova Iorque: Touchstone, 2002.
29
21. NATER, U. M.; SKOLUDA, N.; STRAHLER, J. Biomarkers of Stress in
Behavioral Medicine. Current Opinion in Psychiatry. Alemanha, v. 26, n. 5, p.
440-445, set. 2013. ISSN 0951-7367. Disponível em: <
https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/23867656/ >.
23. SADEGHI, A. et al., Relationship between Personality Types and Job Stress
among Teachers at First Period (Guidance Schools) and Second Period of High
School (Secondary Schools). Creative Education. Irã, v. 7, n. 3, p. 544-553, jan.
2016.
30. BOSE, M.; OLIVÁN, B.; LAFERRÈRE, B. Stress and Obesity: The Role of
the Hypothalamic-Pituitary-Adrenal Axis in Metabolic Disease. Current Opinion
30
in Endocrinology, Diabetes and Obesity. Estados Unidos, v. 16, n. 5, p. 340-
346, out. 2009. ISSN 1752-2978. Disponível em: <
https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/19584720/ >.
31
CAPÍTULO 05
OVERTRAINING NO AMBIENTE MILITAR
1. INTRODUÇÃO
No ambiente desportivo, atletas buscam aumentar a performance
mediante o treinamento físico; este, por sua vez, é capaz de produzir a melhora
das aptidões físicas (velocidade, força, potência, resistência, etc.). Para ser
bem sucedido, sob o ponto de vista do treinamento, o atleta necessita de uma
rotina de atividades distribuídas ao longo de um período – a periodização – no
qual são aplicadas as cargas de treinamento cujo objetivo é promover a quebra
da homeostase. As cargas de treinamento aplicadas produzem o que
chamamos de efeito do treinamento: respostas orgânicas adaptativas como
consequência do estresse do treinamento. O devido equilíbrio entre estresse e
32
recuperação pode ser capaz de proporcionar ao organismo um fenômeno
denominado supercompensação, essencial para aumentar o desempenho1.
Por outro lado, alguns atletas podem experimentar situações nas quais
exista uma rotina de treinamento, entretanto, com estagnação ou queda do
desempenho e alterações de humor. Os efeitos do treinamento podem estar
relacionados a má adaptação orgânica do atleta ao exercício, o que alguns
pesquisadores denominam excesso de exercícios ou overtraining, ou ainda,
em casos mais graves, Síndrome do Overtraining. Sinais e sintomas também
podem surgir, como gripes e resfriados, ansiedade, insônia etc2.
Militares podem ser considerados como atletas em tempo integral, pois,
além de desempenharem diversas funções ao longo da carreira, destacando-se
as atividades burocráticas e as operativas, também devem estar prontos para o
combate; essa capacitação advém do treinamento físico, assim como realizado
pelos atletas. Dada a imprevisibilidade de seu emprego: podem ser
convocados para quaisquer missões a qualquer momento, militares devem, por
isso, adquirir condicionamento compatível com a demanda de tarefas, além da
manutenção de performance durante o ano inteiro – a prontidão.
Os treinamentos necessários ao desenvolvimento ou manutenção da
aptidão física normalmente são realizados durante os cursos de formação ou
cursos complementares realizados ao longo da carreira, incluindo treinamentos
específicos, visando capacitar ou aprimorar procedimentos militares –
denominados adestramentos – em menor tempo que os cursos, ou ainda pelo
“treinamento físico livre”, em suas respectivas unidades.
A necessidade de constante manutenção das aptidões físicas aplicadas
ao contexto do combate, o qual, por vezes, inclui condições exaustivas sob o
ponto de vista psicofisiológico, caracteriza o pessoal militar como um grupo
diferenciado sob os aspectos físico e mental (ex.: resiliência). Sendo assim, o
pessoal militar deve ter uma rotina regular de exercícios, periodizada,
delimitada pelos princípios do treinamento desportivo e com recuperação e
aporte nutricional suficientes, a fim de se evitar, entre outras mazelas, o
desenvolvimento da Síndrome do Overtraining, a qual pode impactar
negativamente a saúde e o desempenho do combatente.
33
2. CONCEITOS BÁSICOS
34
Quadro 1 - Possível apresentação das diferentes etapas do treinamento, OR e SOT (adaptado
de Meuseen et al.,, 2013).
Treinamento
Processo (Excesso de Intensificação do treinamento
carga)
OR de curto SOT
Resultado Fadiga aguda OR extremo (NFOR)
prazo (FOR)
Decréscimo Estagnação ou
Desempenho Aumenta Diminuição
temporário diminuição
Fonte: O autor.
35
Taylor et al.,, (2008) identificaram que a aptidão aeróbia elevada auxilia
no controle da ansiedade e melhora a resiliência, mitigando o impacto
psicológico de eventos estressantes ocorridos durante treinamentos militares,
sendo, por isso, essa aptidão muito valorizada pelos militares12.
No ambiente militar, a periodização deve ser elaborada com base nos
princípios do treinamento desportivo (individualidade biológica, adaptação,
sobrecarga progressiva, continuidade, especificidade e interdependência
volume e intensidade) a fim de que haja adaptações positivas, tais como no
meio desportivo. Vale ressaltar que o princípio da especificidade deve ser
cuidadosamente aplicado, pois o militar deve treinar, também, sob as mesmas
condições em que poderá ser empregado nas missões. Sendo assim, os
treinamentos militares devem estar relacionados com os objetivos e atividades
de sua respectiva unidade militar, tropa, cargo, função ou especialidade. Na
prática, militares que exercem funções predominantemente burocráticas, por
exemplo, não necessitariam, a princípio, dos exigentes treinamentos realizados
pelos grupos operativos13.
Os grupos operacionais merecem destaque nesse contexto, porque,
além de necessitarem de treinamento físico rigoroso, devem ser preparados
psicologicamente (resiliência mental e a versatilidade), objetivando o equilíbrio
psicológico, a tomada de decisão sob estresse e outros fatores específicos os
quais são necessários durante essas atividades. Alguns autores sugerem que
militares operativos devem treinar em ambientes e sob condições
psicofisiológicas semelhantes às condições peculiares de operações militares,
por exemplo: diferentes climas e tipos de terrenos, sob variadas umidades
relativas do ar, em diferentes horários do dia, e em condições fisiológicas
desfavoráveis (restrição à alimentos, água e sono), transportando carga
elevada e sob estresse psicológico14,15.
Quanto à periodização, há poucas informações acerca de modelos e
distribuições de cargas ideais dada a grande variedade de condições
psicofisiológicas que devem suportar e da multiplicidade de capacidades físicas
devem desenvolver16,17.
A quantificação das cargas de treinamento pode ser obtida por meio de
avaliações e cálculos matemáticos os quais possibilitam identificar os efeitos do
treinamento nos praticantes de exercícios físicos18. A necessidade da
36
quantificação da carga ideal decorre da importância em se acompanhar os
impactos psicofisiológicos do exercício visando o aumento do desempenho
cronicamente – adaptações positivas –, visto que alguns cursos de formação
militares possuem cargas de treinamento tão altas, as quais podem se
equiparar àquelas de atletas profissionais19. Por outro lado, atletas têm maiores
possibilidades e recursos para equilibrar a relação entre estresse e a
recuperação das sessões visando a máxima performance com baixo risco de
adaptações negativas (lesões e overtraining): possuem um período
considerado de baixa temporada no qual descansam e se recuperam de lesões
musculoesqueléticas; realizam profilaxia; e utilizam, quando necessário, de
fisioterapia. Já alguns grupos militares podem não possuir esse “período de
descanso” devido sua a prontidão para o combate e o treinamento árduo e
constante, cujo pico de performance deve ser mantido durante o ano inteiro20.
Outro princípio do treinamento desportivo muito importante sob o ponto
de vista do overtraining é a interdependência volume e intensidade. O TFM
geralmente contém bastante volume de treino como atividades de endurance
(natação ou corrida), treinamentos de combate (incluindo o tiro de combate) e
exercícios realizados durante muitas horas. Essas atividades, quando
associadas ao estresse psicológico do treinamento militar, podem resultar em
overtraining20 e interferir no desenvolvimento da capacidade aeróbia (VO2máx) e
na força muscular21.
A adaptação aos estímulos do exercício durante e após o TFM ocorre
por meio da aplicação de cargas de treinamento, as quais devem ser
suficientes para alterar a homeostase – o equilíbrio interno dos sistemas –, mas
também condizentes com os princípios da individualidade biológica e da
adaptação, além de respeitar a devida recuperação. Esse mecanismo de
adaptação foi sugerido por Seyle (1956) com a Síndrome da Adaptação
Geral22. Sua interpretação sob o contexto do exercício prevê que o estímulo
aplicado é o agente estressor capaz de modificar padrões homeostáticos, cujas
percepções no cérebro produzem como resposta a ativação dos sistemas
fisiológicos de luta ou fuga, ativando o eixo hipotálamo-pituitária-adrenais e o
sistema nervoso simpático, liberando cortisol, adrenalina e noradrenalina, por
exemplo. Esses e outros hormônios, quando secretados, são altamente
benéficos em doses controladas e em fase aguda, pois gera adaptação positiva
37
aos estímulos; todavia, pode ocorrer o oposto quando secretados em altas
doses ou, principalmente, de modo crônico23.
Outro conceito relevante e muito aplicado em atividades de treinamento
militar é a teoria Hormesis. Ela afirma que “os estímulos potencialmente
nocivos podem gerar adaptações positivas no organismo por meio da
exposição adequada e controlada desses estímulos24. Por isso, durante a
periodização do TFM, deve haver sessões com altas cargas de estresse físico,
mas também psicológico para que ocorram as devidas adaptações, ainda que
esses estímulos sejam “potencialmente nocivos”. Talvez, o segredo de uma
preparação física militar de combate seja o devido equilíbrio entre estímulos e
recuperações física e psicológica, para que haja adaptações positivas ao longo
do tempo (cronicamente).
Portanto, sugere-se que sejam observados os possíveis sinais e
sintomas da SOT apresentados por militares ao longo da periodização, e
também planejada, periodicamente, a avaliação das respostas orgânicas
daqueles que necessitarem de rotinas de treinamento com altas demandas
físicas e mentais25.
38
Figura 1 – Alguns sistemas fisiológicos possivelmente associados à SOT e os marcadores
utilizados para diagnóstico e monitoramento para prevenção.
Síndrome do
Overtraining
Sistemas Marcadores
Composição
Fisiológico
corporal
Hormonal Desempenho
Psicológico e
Bioquímico
cognitivo
Fonte: o autor.
39
presença desses sinais e sintomas, pois eles podem indicar que haja a
presença do NFOR ou da SOT.
Os sinais e sintomas apresentados por militares que estejam em OT de
longo prazo (crônico) devem ser acompanhados durante a periodização, a fim
de evitar maiores comprometimentos da saúde e do desempenho. Abaixo
destaco aqueles que, segundo alguns estudos, são os mais simples de serem
utilizados e que podem indicar má adaptação aos estímulos:
• Fisiológico: frequência cardíaca de repouso pela manhã20;
• Comportamental: estado de humor17; e
• De desempenho: testes físicos padronizados17.
Talvez, o indicador fisiológico mais simples que pode representar má
adaptação orgânica à rotina de exercícios extenuantes seja a frequência
cardíaca de repouso obtida pela manhã, um pouco antes de sair da cama. Os
registros desse monitoramento ao longo do tempo podem fornecer informações
importantes relacionadas ao exercício e a fadiga: indivíduos em OT
apresentarão variação entre 10 a 15 batimentos por minuto mais elevada
quando medida por vários dias. A redução aos níveis basais pode ocorrer em
um ou dois dias de repouso; contudo, caso haja continuidade das atividades de
resistência (endurance), o militar ficará apenas em overtraining, não
promovendo benefícios do ponto de vista de desempenho20, ou então, pode
evoluir para o NFOR3.
Questionários de autorrelato para a avaliação do estado de humor
(POMS) e questionário específico do overtraining (versão brasileira), baseado
no Questionário de Sintomas Clínicos do Overtraining, da Sociedade Francesa
de Medicina do Esporte podem ser aplicados e reaplicados no mesmo
indivíduo ao longo do tempo para verificar se há alterações significativas no
estado de humor, ou ainda, na pontuação final obtida por meio do Questionário
do OT: neste caso, quanto maior o escore, mais sinais e sintomas relatados.
Outro protocolo simples destinado ao monitoramento dos sinais e
sintomas do OT em militares consiste na avaliação do desempenho físico por
meio da aplicação de testes físicos padronizados da unidade militar ou força a
qual pertencem17. Caso a aplicação do treinamento ao longo do tempo esteja
produzindo estagnação ou piora no rendimento físico, há um sinal de alerta e
esse militar deve ser observado para excluirmos a NFOR ou a SOT.
40
Além dos meios sugeridos para a prevenção, podemos verificar se o
exercício é extenuante a ponto de prejudicar a saúde por meio de alterações
fisiológicas da variabilidade da frequência cardíaca26 (utilizando-se um monitor
cardíaco específico com esse recurso); por marcadores bioquímicos, como a
relação glutamina-glutamato27; por marcadores hormonais28 , como a relação
testosterona e cortisol; ou por marcadores imunológicos, os quais podem
resultar em infecções do trato respiratório superior (gripes e resfriados), muito
comum em militares que combinam excesso de exercícios com restrição de
sono29. Ainda que sejam importantes marcadores relacionados à SOT,
necessitam de logística, pessoal treinado e geralmente possuem alto custo,
tornando-se, portanto, inviáveis para avaliar grandes grupos, como os militares.
Sendo assim, quando observar algum militar apresentando algumas
dessas alterações, deve-se, primariamente, reduzir a excessiva sobrecarga
orgânica causada pelo treinamento físico30. No entanto, tal procedimento pode
ser incompatível com o momento da periodização do TFM, evidenciando que
há uma linha tênue entre a preparação física militar de alto desempenho e a
SOT.
5. CONCLUSÃO
41
da performance, se e somente se, houver recuperação condizente com os
estímulos aplicados. Simplificando, não é a presença do OT que define e
crucifica o treinamento extenuante com altas cargas de estresses físicos e
psicológicos do TFM, mas sim se esse mesmo treinamento ocorrer sem o
monitoramento dos sinais e sintomas, visando a prevenção da SOT. Embora a
fisiologia do exercício forneça informações acerca das horas necessárias à
recuperação dos sistemas (fosfagênico, anaeróbio lático e oxidativo), quando
observamos a rotina do treinamento militar, torna-se difícil e complexo
determinar as horas necessárias ao repouso do organismo, visto que, a
individualidade biológica será a determinante nesse processo de adaptação.
Sendo assim, sugiro que a prevenção por meio do monitoramento dos
marcadores mencionados seja o melhor “termômetro” utilizado numa
periodização de militares que necessitem de treinamento com muitas
atividades físicas. A aplicação prática dos conceitos descritos neste capítulo
pode ser útil no ambiente militar para o controle do OT e prevenção do NFOR e
da SOT. De modo prático, resumimos os procedimentos mais importantes a
serem adotados no planejamento do TFM:
• Planejar com base nos princípios do Treinamento Desportivo;
• Periodizar o TFM e, sempre que possível, prescrever os exercícios de
modo individualizado ou em grupos tão homogêneos quanto possíveis;
• Monitorar os efeitos das cargas de treinamento com os marcadores
fisiológicos, comportamentais e de desempenho sugeridos neste capítulo ou
quaisquer outros marcadores recomendados pela literatura aplicável ao
contexto do grupo; e
• Divulgação dos possíveis efeitos indesejáveis do excesso de
exercícios, provenientes de uma rotina de exercícios mal planejada e mal
executada não só aos instrutores militares, mas também aqueles que apenas
realizam o TFM.
Todas as informações aqui apresentadas não limitam nem esgotam os
assuntos sobre este tema, o qual é amplo. Meu desejo é que, ao tomar
conhecimento dessas informações, o leitor se incline a pesquisar outras
informações em livros e artigos científicos, inclusive com diferentes pontos de
vista dos aqui apresentados, pois assim, acredito, haverá a construção do
conhecimento científico aplicado à prática, pois a ciência baseia-se no
42
questionamento de ideias. Assim, a prescrição de exercícios em ambiente
militar será cada vez mais fundamentada em ciência, promovendo a melhora
da tropa e reduzindo os riscos de efeitos indesejáveis com o exercício.
Título: Serum Sex Hormone–Binding Globulin and Cortisol Concentrations are Associated
with Overreaching during Strenuous Military Training.
Autores: Tanskanen et al.,, 2011.
43
Objetivos: (1) estudar o efeito de um período de treinamento básico militar (BT) finlandês
de 8 semanas na aptidão física, na composição corporal, no estado de humor e nos
parâmetros bioquímicos séricos; (2) determinar a incidência de overreaching (OR) durante o
BT entre novos recrutas; e (3) avaliar se os níveis iniciais ou respostas de treinamento da
aptidão física, da composição corporal e dos parâmetros bioquímicos séricos diferem entre
os indivíduos com OR e não-OR.
Resultados: o VO2max melhorou durante as quatro primeiras semanas do BT. Durante a
segunda metade do BT, foi observada uma estagnação do aumento de VO2máx, aumento
da globulina basal de ligação ao hormônio sexual sérico (SHBG), aumento do fator de
crescimento semelhante à insulina-1 (IGF-1) e também aumento do cortisol. Além disso, os
aumentos induzidos pelo exercício submáximo no cortisol, na frequência cardíaca máxima e
no aumento pós-exercício no lactato sanguíneo, foram atenuados. Dos 57 sujeitos, 33%
foram classificados como OR. Eles apresentaram a SHBG basal mais alta antes e após a
quarta e a sétima semanas de treinamento e o cortisol sérico basal mais alto no final do BT,
quando comparados com os indivíduos não-OR. Além disso, ao contrário do não-OR, os
indivíduos com OR não exibiram aumento na razão basal de testosterona/cortisol, mas
apresentaram uma diminuição na proporção máxima de Lactato/Classificação do esforço
percebido (La/RPE) durante o BT.
Conclusão: um terço dos recrutas estavam em OR, portanto, o treinamento após o BT deve
envolver recuperação adequada para impedir o desenvolvimento da síndrome do
overtraining. Os resultados confirmam que as taxas séricas de SHBG, de cortisol e de
testosterona/cortisol e La/RPE máximas podem ser ferramentas úteis para indicar se o
treinamento é muito extenuante.
Título: Seasonal weather conditions affect training program efficiency and physical
44
performance among special forces trainees: A long-term follow-up study.
Autores: Dhahbi et al.,, 2018.
Objetivos: acompanhar o efeito dos ciclos de treinamento específicos de comandos (SCTCs),
na resistência muscular da parte superior do corpo e no desempenho de corrida de
resistência, bem como determinar se a variação nos parâmetros sazonais tem algum efeito
no desempenho físico.
Resultados: houve redução significativa da massa corporal em todos os grupos após os
SCTCs; houve aumento significativo nas flexões de braço, nas flexões na barra e abdominais
de 70 segundos; houve um decréscimo significativo no tempo de corrida de 5 km entre
todos os formandos. Com relação a influência dos parâmetros sazonais, os resultados dos
testes de flexão de braço, de flexões na barra e de abdominais de 70 segundos foram
significativamente maiores no inverno e primavera em comparação com as outras duas
estações, enquanto as melhorias no desempenho de corrida de 5 km foram
significativamente maiores na primavera e no verão, em comparação com as outras duas
estações.
Conclusão: os autores concluíram que 14 semanas de SCTCs melhoraram a resistência
muscular da parte superior do corpo e o desempenho de endurance nos comandos. As
melhorias no desempenho de resistência muscular foram maiores durante o clima frio
(inverno e primavera), enquanto as melhorias no desempenho de resistência de corrida
foram maiores durante as estações mais quentes (primavera e verão).
Título: Effect of Long-term Elite Military Training and Operations on Hormonal Profile.
Autores: Jensen et al.,, 2018.
Objetivos: o objetivo deste estudo foi determinar os efeitos crônicos do estresse
multifatorial, incluindo o treinamento e operações militares, sobre o perfil hormonal de
operadores militares de elite.
Resultados: houve uma correlação positiva significativa entre testosterona total (TT) e
cortisol. Além disso, 43% dos participantes (n=28) apresentaram TT abaixo dos intervalos de
referência normativa baseados na idade. Aqueles com TT abaixo do normal também tiveram
menores testosterona livre, cortisol e triiodotironina (T3).
Conclusão: os resultados indicam que os treinamentos e as operações militares podem
colocar tamanha carga sobre os operadores a ponto de deprimir ou alterar os eixos
hipotalâmico, hipofisário, adrenal, gonadal e da tireóide, sugerindo que mais pesquisas
precisam ser realizadas de modo que sejam verificadas as consequências dessas alterações.
45
capacidade aeróbica máxima. Os programas de treinamento devem ser bem periodizados
para que a carga total de treinamento aumente progressivamente, mas também inclua
períodos de recuperação suficientes. Além disso, é necessária alguma programação
individualizada para evitar lesões desnecessárias e overreaching, pois as diferenças na
aptidão física inicial dos militares podem ser muito altas.
Título: Increased Risk of Upper Respiratory Infection in Military Recruits Who Report
Sleeping Less Than 6 h per night.
Autores: Wentz et al.,, 2018.
Objetivos: o objetivo deste estudo foi descrever a duração do sono autorreferida em um
grande grupo de recrutas militares e avaliar a relação entre a duração relatada do sono e a
incidência de infecções do trato respiratório superior (ITRS).
Resultados: a duração do sono autorreferida diminuiu significativamente entre o período
anterior ao treinamento e durante o mesmo. Antes do treinamento, 13% dos participantes
relataram dormir menos que 7 horas de sono por noite; no entanto, isso aumentou para
38% durante o treinamento. No geral, 49 participantes (8%) foram diagnosticados por um
médico com pelo menos uma infecção no trato respiratório superior (ITRS) e 3 participantes
(<1%) foram diagnosticados com duas ITRS. Depois de controlar o sexo (masculino e
feminino), o índice de massa corporal, a temporada de recrutamento, o tabagismo e o uso
de álcool, os participantes que relataram dormir menos de 6 horas por noite, durante o
treinamento, tiveram quatro vezes mais chances de serem diagnosticados com ITRS em
comparação aos participantes que dormiram de 7 a 9 horas noite. Em média, cada ITRS
resultou em aproximadamente 3 dias de treinamento perdidos. Os participantes que foram
diagnosticados com ITRS tiveram mais dias de treinamento perdidos para qualquer doença
em comparação com os participantes que não relataram uma ITRS durante o treinamento
militar básico.
Conclusão: em uma grande população de recrutas do Exército britânico, essas descobertas
mostram que mais de um terço dos participantes não cumpriram as recomendações de
duração do sono durante o treinamento. Além disso, aqueles que relataram dormir menos
de 6 horas por noite tiveram quatro vezes mais chances de serem diagnosticados com uma
ITRS e perderam mais dias de treinamento devido a ITRS. Uma vez que a restrição do sono é
considerada um elemento necessário do treinamento militar, estudos futuros devem
examinar intervenções para reduzir quaisquer efeitos negativos sobre a imunidade e a
defesa do hospedeiro.
Título: The Overtraining Syndrome in Soldiers: Insights from the Sports Domain.
Autores: Vrijkotte et al.,, 2018.
Objetivos: o objetivo desta revisão foi fornecer informações acerca do overreaching
funcional (FOR), do não-FOR (NFOR) e da síndrome de overtraining (OTS) nas forças
armadas.
Resultados: sete estudos que investigaram os efeitos do OT durante os cursos de
treinamento foram selecionados. As definições usadas para o OT variaram amplamente e
não há uso sistemático de marcadores para determinar o FOR, NFOR ou OTS nas forças
armadas.
Conclusão: muitas pesquisas sobre NFOR e OTS foram conduzidas no domínio esportivo e os
militares poderiam usar essas ideias para promover um equilíbrio mais eficiente entre carga
de treinamento e recuperação. Sugere-se que os militares testem regularmente o
desempenho físico, a velocidade psicomotora e o humor usando, idealmente, um teste
46
específico militar ou uma corrida de 2,4 quilômetros, teste de vigilância psicomotora e
Profile of Mood States (POMS), respectivamente. O teste de esforço de duas sessões pode
ser usado como teste específico se testes anteriores indicarem o desenvolvimento de NFOR
/ OTS e podem ser combinados com testes metabólicos e imunológicos para excluir causas
patológicas.
Título: Effects of military training on plasma amino acid concentrations and their
associations with overreaching.
Autores: Ikonen et al.,, 2020.
Objetivos: investigar os efeitos do treinamento militar de 10 semanas nas concentrações de
19 aminoácidos.
47
Resultados: os resultados sugerem que alterações nos níveis de três aminoácidos
importantes: alanina, glutamato e arginina e, possivelmente, a tirosina neuroativa e o
triptofano, podem explicar alguns dos sintomas físicos e psicológicos do overreaching. O
presente estudo também confirma o uso potencial da razão glutamina-glutamato como uma
ferramenta para detectar o overreaching.
Conclusão: os presentes achados podem ajudar a detectar e impedir o overreaching e
oferecer uma abordagem diagnóstica confiável. Para evitar a síndrome do overtraining, o
treinamento militar deve ser periodizado e individualizado, especialmente durante as
primeiras quatro semanas de serviço militar.
48
REFERÊNCIAS
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50
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Exercise-Induced Autonomic and Fitness Changes Measured After 12 and 20
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35. DHAHBI, W.; SELLAMI, M.; CHAOUACHI, A.; PADULO, J.; MILIC, M.;
MEKKI, I.; CHAMARI, K. Seasonal weather conditions affect training program
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follow-up study. Plos One, [s.l.], v. 13, n. 10, p.1-16, 18 out. 2018.
52
CAPÍTULO 06
ORIGEM DO OVERTRAINING: SISTEMA IMUNE
53
resposta imune inata é muito eficiente na discriminação entre células
hospedeiras e patógenos, proporcionando as defesas iniciais e também
contribuindo para a indução da resposta imune adaptativa através da ação das
células apresentadoras de antígenos (APCs)6.
Podemos dizer que a resposta imunológica a uma infecção inicial ocorre
em três fases: resposta imune inata, resposta imune induzida precocemente e
resposta imune adaptativa. As primeiras duas fases fazem o reconhecimento
do patógeno por meio dos PRRs. Na terceira fase, o reconhecimento é feito por
meio de receptores variáveis para antígenos específicos formados por um
processo de rearranjo gênico nas células somáticas que produz um enorme
repertório de receptores de antígenos, os quais são capazes de distinguir
perfeitamente entre moléculas muito relacionadas. Deste modo, a imunidade
adaptativa ocorre posteriormente, porque as poucas células B e células T
precisam sofrer expansão clonal antes de se diferenciarem em células efetoras
que eliminam a infecção. Contudo, os mecanismos efetores que eliminam os
agentes infecciosos são similares ou idênticos em todas as fases4; 7.
Apenas os mecanismos que envolvem os componentes solúveis e
celulares da imunidade inata não são capazes de promover uma memória
imunológica protetora de longo tempo. Deste modo, a imunidade inata, quando
o patógeno rompe as duas primeiras fases de sua resposta, é responsável pela
indução da resposta imune adaptativa, a terceira fase da resposta à infecção
inicial por um patógeno. Essa indução leva à expansão dos linfócitos antígeno-
específicos que têm como alvo os patógenos específicos e a formação de
células de memória, que proporcionam uma imunidade específica
persistente4;7.
54
As primeiras defesas apresentadas incluem várias classes de moléculas
solúveis pré-formadas presentes no sangue, nos líquidos extracelulares e nas
secreções epiteliais. Podemos citar as enzimas antimicrobianas, como a
lisozima, que inicia a digestão da parede celular bacteriana; os peptídeos
antimicrobianos, como as defensinas, que são capazes de lisar diretamente a
membrana da célula bacteriana; e um sistema de proteínas plasmáticas muito
importantes, conhecido como sistema do complemento, que promove a lise do
microrganismo ou a sua fagocitose por células fagocíticas do sistema imune
inato, tendo os macrófagos, neutrófilos e células dendríticas como importantes
exemplos4.
3. RECONHECIMENTO
55
Tabela 1 - Moléculas presentes em microrganismo (PAMPs) reconhecidas pelos receptores de
reconhecimento de padrões (PRRs) presentes em células do sistema imune inato.
Tabela 2 - Moléculas presentes em células com danos (DAMPs) reconhecidas pelos receptores
de reconhecimento de padrões (PRRs) presentes em células do sistema imune inato.
Padrões moleculares associados a danos
Cristais Urato monossódico
Proteínas induzidas por Proteínas de choque términco (HSPs)
estresse
Proteínas nucleares HMGB1
Fonte: O autor.
4. MACRÓFAGOS
56
para o desenvolvimento da resposta imune adaptativa. Estas células foram
identificadas pela primeira vez pelo zoólogo russo Elie Metchnikoff em 1883,
que descobriu que muitos microrganismos poderiam ser engolfados e digeridos
por células fagocíticas8.
Os macrófagos expressam vários PRRs que os permitem reconhecer
componentes específicos dos microrganismos. Aqueles que se ligam a
carboidratos da parede celular das bactérias, das leveduras e dos fungos são
os receptores de manose e de glicano e os receptores de varredura. Os
receptores semelhantes ao Toll (TLRs, do inglês Toll-like receptors) são uma
importante família de receptores PRRs que estão presentes nos macrófagos e
em outras células imunes. Os TLRs são capazes de se ligarem a diferentes
tipos de microrganismo, como por exemplo, TLR-2 liga-se aos componentes da
parede celular das bactérias gram-negativas, enquanto TLR-4 se liga aos
componentes da parede celular das bactérias gram–positivas. O CD14 é o
receptor de LPS, o lipopolissacarídeo presente na parede celular de bactérias
gram-negativas8 (Figura 1). O LPS é muito utilizado experimentalmente para a
ativação clássica de macrófagos.
57
5. CLASSES DE MACRÓFAGOS
58
capacidade de eliminar patógenos e apresentar seus antígenos aos linfócitos T
virgens, iniciando o desenvolvimento de respostas adaptativas. Assim, eles
expressam moléculas do complexo principal de histocompatibilidade de classe
II (MHC-II), ciclooxigenase 2 (COX-2) e óxido nítrico sintase induzível (iNOS) e
CD 14, o receptor de LPS. Eles também produzem altos níveis de citocinas
inflamatórias, como TNF, IL1-β, IL-6, IL-12 e IL-23 e induzem respostas do tipo
Th110; 11 (Figura 2).
Macrófagos M2 são alternativamente ativados por ação das citocinas IL-
4 ou IL-13 secretadas por mastócitos, basófilos (imunidade inata) e linfócitos
Th2 (imunidade adaptativa)10; 11
. Esse fenótipo é caracterizado por um perfil
anti-inflamatório, que permite a resolução da inflamação e a reparação tecidual.
Eles expressam altos níveis de receptor de manose (CD206), bem como o
antagonista da IL-1R, e produzem fatores pró-fibróticos, como o fator de
crescimento e transformação beta (TGF-β) e fator de crescimento semelhante à
insulina 1 (IGF-1), suprimindo ativamente a inflamação e promovendo o reparo
tecidual. Macrófagos M2 induzem angiogênese e linfangiogênese por produção
do fator de crescimento endotelial vascular A (VEGF-A), fator de crescimento
endotelial (EGF), fator de crescimento derivado de plaquetas (PDGF) e IL-811.
O fenótipo M2 pode ser subdividido em 4, dependendo do estímulo que
promova sua diferenciação. Esse fenótipo induzido por IL-4/IL-13 é conhecido
como M2a. Outros estímulos, incluindo imune complexos/ligantes de
TLR/agonistas de IL-1R (M2b), glicocorticóides/IL-10 (M2c) ou ligantes de
TLR/agonistas de A2R/IL-6 (M2d) também promovem a polarização deste
fagócito (Figura 2)11. Considerando a complexidade do microambiente tecidual
e a plasticidade dos macrófagos, uma visão estática da polarização M1 – M2
adotada em experimentos in vitro pode não descrever completamente a
polarização de macrófagos in vivo, o que deve ser considerado um processo
extremamente dinâmico e específico do organismo vivo11.
59
Figura 2 – Polarização de macrófagos – Os fenótipos dos macrófagos são formados
dependendo do estímulo que promova sua diferenciação. A polarização se divide em
macrófagos classicamente ativados (M1), com perfil inflamatório, estimulados por IFN-γ, TNF e
ligação ao LPS bacteriano, e macrófagos alternativamente ativados (M2), com perfil anti-
inflamatório, estimulados por IL-4, IL-13, complexos imunes, dentre outros. Dependendo do
fator ativador, o fenótipo M2 pode ser subdividido em M2a, M2b, M2c e M2d.
60
TCD4+ são chamados de auxiliares (helper - Th) enquanto os linfócitos TCD8+
são os conhecidos linfócitos T citotóxicos13.
61
estimulando a expressão da enzima óxido nítrico sintase induzida (iNOS ou
NOS2), a qual oxida o átomo de nitrogênio guanidínico terminal da L-arginina à
citrulina com a concomitante liberação de óxido nítrico (NO)18. O óxido nítrico
representa o principal mecanismo microbicida capaz de destruir
microrganismos cuja célula hospedeira seja o macrófago, como por exemplo
vários patógenos, incluindo T. cruzi19, T. musculis20, M. avium21, M. leprae22,
Toxoplasma gondii23, Candida albicans24 e L. major25.
Além do NO, as espécies reativas de oxigênio (ROS) também podem
participar como mecanismo microbicida em macrófagos induzidos por IFN-γ ou
receptores do tipo Toll. ROSs derivam da redução de oxigênio, gerando um
grupo de íons, moléculas e radicais altamente reativos e podem ser geradas
nas mitocôndrias como produtos da cadeia respiratória e podem participar da
sinalização celular e destruição de patógenos intracelulares. Deste modo, em
resumo, as células Th1 produzem predominantemente IFN-γ que ativam
classicamente os macrófagos, e estão relacionadas à resposta imune celular e
ao controle de infecções causadas por microrganismos intracelulares1; 14.
O padrão apresentado pelo fenótipo Th2 inclui as citocinas IL-4, IL-5, IL-
10 e IL-13, e está associado com a resposta às infecções extracelulares, sendo
tipicamente uma resposta imune humoral. A diferenciação neste fenótipo
ocorre por estímulo pela IL-4 em decorrência da interação com helmintos e
bactéria extracelulares26. A IL-4 pode ser produzida por mastócitos, eosinófilos
e, possivelmente, outras populações de células (como células linfoides inatas)
ou as próprias células TCD4+ estimuladas pelo antígeno que secretam
pequenas quantidades de IL-4 a partir de sua ativação inicial26. A diferenciação
em Th2 passa pela ativação dos fatores de transcrição GATA3 e STAT6. A
resposta imune humoral está associada às respostas anti-inflamatórias,
promovendo a ativação alternativa de macrófagos, além da ativação de
mastócitos e de eosinófilos, que auxiliam na defesa contra helmintos26 (Figura
3). A transformação de Th0 em Th17 é estimulada pelas citocinas IL-1, IL-6 e
IL-23 produzidas em resposta às infecções por bactérias e fungos27. Essas
citocinas ativam o fator de transcrição órfão gama relacionado a RAR (RORγt),
fazendo com que os linfócitos diferenciados em Th17 secretem as citocinas IL-
17, IL-21, IL-22. A IL-17 tem um papel protetor contra infecções a bactérias
62
extracelulares e fungos, devido a sua capacidade de recrutar neutrófilos para
as áreas de infecção27; 28; 29 (Figura 3).
A diferenciação de Th0 em linfócitos T regulatórios (Treg) ocorre a
partir da ativação do fator de transcrição FoxP3 realizada pelas citocinas IL-2,
IL-10 e TGF-β30. Esses linfócitos foram inicialmente descritos na década de
1970, como linfócitos T supressores. Posteriormente, essas células foram
redescobertas por Sakaguchi e colaboradores (1995), os quais mostraram que
havia um pequeno grupo de linfócitos T helper que co-expressavam o
marcador CD25 e exibiam atividade supressora em cobaias adultos. Desde
então, vários grupos descreveram linfócitos TCD4+CD25+ com ação regulatória
em humanos30.
As células Treg são encontradas na periferia e suas citocinas são
responsáveis por inibirem a proliferação de Linfócitos T efetores. Inibem a
secreção de IL-12 e prejudicam sua capacidade de promover a ativação de
células T e diferenciação em Th1. Sua deficiência está envolvida no
desenvolvimento de síndromes autoimunes severas30.
63
A diferenciação das células T CD4 é mais variada do que as células T
CD8, que possuem um fenótipo citotóxico uniforme. Células T citotóxicas
contêm lisossomas especializados chamados de grânulos líticos, que
apresentam proteínas citolíticas. As células T CD8+ citotóxicas efetoras são
essenciais na defesa do hospedeiro contra os agentes patogênicos que vivem
no citosol, como os vírus, por exemplo. As células T citotóxicas podem induzir
as células-alvo a sofrer morte celular programada, exterminando seletivamente
e de forma seriada os alvos que expressam um antígeno específico. O principal
mecanismo de ação das células T citotóxicas é a liberação, dependente de
cálcio, de proteínas citotóxicas (granzinas e perforinas, por exemplo) após o
reconhecimento do antígeno na superfície de uma célula-alvo. As células T
citotóxicas também atuam liberando citocinas IFN-gama e TNF, por exemplo26.
64
Enquanto o exercício de intensidade moderada promove proteção contra
infecções causadas por microrganismos intracelulares, pois direciona a
resposta imune para um perfil predominantementedo tipo Th1, atividades
vigorosas geram concentrações crescentes de citocinas anti-inflamatórias e
induzem o predomínio do perfil Th21; 40; 41; 42. Apesar de multifatorial, os sinais e
sintomas da sídrome do overtraining podem ser decorrentes da ação
autrócrina, parácrina e/ou endócrina das citocinas, que orquestram não apenas
a imunidade específica, como também atuam na interação entre os sistemas
nervoso, endócrino e cardiovascular34. Além disso, exercícios prolongados e
extenuantes diminuem a expressão de toll-like receptors (TLRs) em
macrófagos e comprometem a apresentação de antígenos para os linfócitos T
impedindo, sobretudo, a resposta inflamatória Th11; 43.
Dados obtidos pelo nosso grupo mostraram que células de linfonodos de
camundongos submetidos à natação em dose moderada, por 12 semanas,
apresentaram elevação nas concentrações de IFN-γ e TNF, enquanto IL-4 e IL-
10 diminuiram significativamente em relação ao grupo sedentário. A razão IL-
10/IFN-γ evidenciou o predomínio do perfil Th1. Além disso, macrófagos
isolados de camundongos exercitados produziram mais IL-12 e TNF, após
estímulo com lipopolissacarídeo (LPS). A infecção desses macrófagos por
Leishmania major resultou em maior produção de IL-12 do que foi observado
com os macrófagos do grupo controle. A produção de NO também foi
aumentada em macrófagos, estimulados com LPS, oriundos do grupo
exercitado. Esses dados sugerem que exercícios moderados promovem a
predominância de uma resposta imune protetora tipo Th1 em camundongos41.
Por outro lado, a revisão clássica de Smith (2000) sugere que o trauma
gerado no sistema musculoesquelético, a partir do estresse extremo provocado
pelo exercício, produz grandes quantidades de citocinas pró-inflamatórias,
como IL-1β, IL-6 e TNF34. A retroalimentação positiva dos componentes anti-
inflamatórios torna-se iminente e o desequilíbrio no perfil Th1 e Th2 pode
refletir uma condição perturbadora da homeostase. Os estímulos crônicos
sucessivos do treinamento excessivo, sem uma recuperação adequada do
estado fisiológico estável, podem desenvolver sintomas deletérios à saúde,
como por exemplo, os distúrbios neuroendócrinos e comportamentais44; 45; 46
.
Especula-se também que os microtraumas gerados nas membranas das
65
células musculares, com extravasamento do seu conteúdo para o meio
extracelular, bem como o aumento da secreção de cortisol, favorecem o
desequilíbrio com predominância de resposta humoral anti-inflamatória,
desenvolvendo a imunossupressão celular43.
Poucos estudos, no entanto, testaram a hipótese de que os perfis Th1 e
Th2 são cronicamente alterados pelo overtraining. De fato, ensaios clínicos
randomizados e controlados podem permitir maior robustez quanto à hierarquia
de evidência científica. Entretanto, experimentos com humanos devem proteger
o seu bem-estar físico e emocional, sendo imprescindível a utilização de
modelos animais. Apesar dos diferentes protocolos de exaustão crônica, tipos
de pesquisas e populações utilizadas, uma revisão sobre o assunto42 sugere a
predominância da resposta Th2 sobre Th1.
No estudo de Ceddia e Woods (1999), foi verificado que camundongos
experimentam uma supressão na apresentação de antígenos por macrófagos
após quatro dias de treinamento exaustivo, quando comparados aos
camundongos do grupo que treinou moderadamente. Especula-se que, uma
vez comprometidos, os macrófagos podem perder a capacidade de estimular a
diferenciação de linfócitos T CD4+ virgens em Th1, provocando
47
imunossupressão celular . Estudos com maior tempo de intervenção, como o
de Ru e Peije (2009), onde oito ratos foram submetidos a nove semanas de
treinamento com distribuição progressiva de cargas, seis dias por semana,
também verificaram imunossupressão celular por predominância da resposta
Th248. A relação Th1/Th2 pelas citocinas IFN-γ/IL-4 foi desequilibrada,
destacnado-se o perfil Th248.
Gholamnezhad e colaboradores (2014) investigaram o efeito de oito
semanas de treinamento moderado e onze semanas de treinamento severo
(overtraining) na concentração plasmática de citocinas de ratos. O treinamento
moderado promoveu a imunidade celular, enquanto em outros grupos,
incluindo o controle, foi observada uma imunossupressão celular. A
imunossupressão observada nesses grupos foi associada ao direcionamento
da resposta ao perfil Th2, enquanto no grupo moderado houve um
direcionamento da resposta imune para o perfil do tipo Th149. No entanto, neste
trabalho não estão publicados os resultados dos testes de capacidade e os
animais não foram submetidos a nenhum tipo de infecção.
66
Em relação ao período de polimento ou tapering, Gholamnezhad e
colaboradores (2014) verificaram que duas semanas de redução gradual nas
cargas de treinamento não foram suficientes para reverter a imunossupressão
celular49. O tapering é caracterizado como um período de recuperação ativa
que varia entre duas e quatro semanas antes de algum evento importante.
Esse período pode provocar efeitos de supercompensação fisiológica e
melhorar o desempenho, a partir do overreaching funcional50.
Jà no estudo de Farhangimaleki e colaboradores (2009), o grupo de
ciclistas que realizou o polimento durante três semanas, após oito semanas de
treinamento, experimentou um melhor desempenho em relação ao grupo
controle, que treinou onze semanas com sobrecarga progressiva. As citocinas
IL-1 β, IL-6 e TNF no grupo controle apresentaram concentrações mais altas.
Embora os autores não tenham avaliado o perfil Th2, os achados reforçam a
necessidade do período de polimento para evitar distúrbios na homeostase
fisiológica, risco de infecções e fadiga51.
Em 2019, o 31º Congresso Brasileiro de Medicina do Exercício e do
Esporte premiou nosso trabalho sobre excesso de exercício na imunidade
celular de macrófagos de camundongos52. Observamos que o treinamento
aeróbio de muito alto volume, além de prejudicar o desempenho físico da
amostra, aumentou a suscetibilidade de infecções por protozoários em
macrófagos, paralelamente à predominância da resposta imune extracelular,
condições semelhantemente observadas no grupo fisicamente inativo52. Já o
treinamento moderado, mostrou-se protetor contra infecções celulares e
apresentou predominância deste perfil52, corroborando achados anteriores do
próprio grupo41; 53.
9. CONSIDERAÇÕES FINAIS
67
físicos, químicos ou ambientais, com potencial lesivo em quantidades mais
elevadas, parecem induzir efeitos crônicos positivos às células, tecidos, órgãos
e sistemas fisiológicos54. Logo, o exercício físico pode ser remédio ou veneno,
dependendo da dose. O aumento da predisposição do organismo humano à
inúmeras doenças, a partir do exercício enquanto veneno, é incompatível com
os valores e postulados da saúde.
68
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http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/19461936 >.
73
CAPÍTULO 07
ORIGEM DO OVERTRAINING: ESTRESSE OXIDATIVO
74
Posteriormente, Harman propôs que a taxa de envelhecimento celular está
diretamente relacionada aos danos celulares ocasionados por radicais livres,
criando a hipótese de correlação entre o envelhecimento e os radicais livres12.
Apesar de essa hipótese ser muito interessante a época, a indisponibilidade de
tecnologias que permitissem medir e, portanto estabelecer as relações entre os
radicais livres e os processos de envelhecimento manteve muitos
pesquisadores céticos e relutantes em aceitar essa ideia. Por outro lado, essas
evidências estimularam e motivaram muitos cientistas a investigar os efeitos
dos radicais livres em organismos vivos e assim, em 1969 Joe McCord e Irwin
Fridovich fizeram uma importante descoberta, e demostraram que uma
proteína recém-descoberta era capaz de catalisar uma reação de dismutase de
superóxidos e deram o nome a essa enzima de superóxido dismutase
(SOD)13,14. Essa revelação é aceita como a primeira evidência convincente de
que ROS biológicos existem em solução e que podem apresentar papel
relevante na biologia celular.
Os primeiros estudos que evidenciaram as relações entre o exercício físico
e a indução do estresse oxidativo datam do final dos anos 1970. Dillard e
colaboradores demonstraram que 60 minutos de exercício de endurance a
50 % do VO2máx provoca aumento na expiração de pentano, um biomarcador
da peroxidação de lipídios, e que a suplementação com vitamina E é capaz de
reduzir a produção deste biomarcador, em repouso ou no exercício5. Logo em
seguida, Brady e colaboradores confirmaram esses achados, demonstrando
que o exercício de natação também está associado ao aumento da
peroxidação lipídica em ratos4.
Esses estudos iniciais representam um “divisor de águas” no conhecimento
dos efeitos do exercício físico sobre o estresse oxidativo e desde então vários
investigadores têm demonstrado que sessões de exercício prolongado ou de
curta duração com moderada ou alta intensidade resultam em aumento de
biomarcadores de estresse oxidativo no plasma sanguíneo e no músculo
esquelético de humanos e de outros modelos animais, associados a danos
celulares.
No início dos anos 1980, foi demonstrado que a contração do músculo
esquelético leva a produção de ROS e que a deficiência em vitamina E
potencializa esse efeito, promovendo um aumento exacerbado na produção de
75
ROS no músculo esquelético e fígado15 e esses agentes estressores induzidos
pelo exercício aumentam a suscetibilidade a danos nas membranas celulares.
Esses estudos levaram a investigações para a compreensão do papel de
sistemas biológicos de proteção contra o estresse oxidativo e logo em seguida
foi demonstrado que o treinamento de endurance promove aumento nos níveis
de enzimas antioxidantes nos músculos cardíaco e esquelético. Além disso,
ficou evidente que a vitamina E tem um papel importante na proteção das
membranas biológicas contra danos celulares induzidos pelo exercício16,
indicando assim a capacidade dos sistemas biológicos em se adaptar frente
aos estímulos provocados pelo treinamento desportivo. Essas adaptações no
aumento da expressão de enzimas antioxidantes ocorrem de forma
proporcional à intensidade e duração do exercício nos músculos esquelético e
cardíaco17. Por outro lado, sessões agudas de exercício de alta intensidade
levam a depressão na atividade de diversas enzimas antioxidantes18.
Ao longo da década de 1990, vários estudos independentes, lançaram luz
sobre as relações entre a produção de ROS mediada pelo exercício físico e a
fadiga tanto em modelos animais quanto em humanos. Reid e colegas,
demonstraram que os oxidantes produzidos pelo exercício contribuíam para a
fadiga muscular durante o exercício prolongado, através de estimulação
elétrica de membros inferiores19, permitindo aos autores postularem que o
estado redox das fibras musculares tem um importante papel na modulação da
produção da força muscular. Essa predição foi baseada em experimentos que
indicaram que a produção de força máxima nas fibras de músculo esquelético
ocorre em um estado redox ótimo, levando a proposição de um modelo de
curva “U” invertido que descreve as relações entre o estado redox e a geração
de força muscular. Durante esse período, foi descoberto ainda que a produção
de radicais livres ocorre no próprio músculo esquelético, de forma proporcional
ao percentual de produção da força máxima, liberando esses agentes no
espaço intersticial20. Ainda hoje, o sítio de produção de ROS no músculo
esquelético em contração não está completamente esclarecido e permanece
controverso. Por muitos anos as mitocôndrias são apontadas como o principal
local de produção de ROS, contudo os avanços de técnicas analíticas e
experimentais, hoje disponíveis indicam que as mitocôndrias não representam
o local dominante de produção de ROS e que a enzima NADPH oxidase é
76
apontada como agente chave na produção de ROS nos músculos esqueléticos
durante a contração muscular21. De fato, a mitocôndria produz mais ROS
durante o estado de repouso do que durante a respiração estimulada por
ADP22 sustentando a ideia de que a mitocôndria não é a fonte primária de
produção de ROS durante a contração muscular.
O exercício físico é capaz de promover um fenótipo que se relaciona a uma
maior capacidade do músculo cardíaco em resistir a lesões isquêmicas, uma
condição de cardioproteção. Os mecanismos metabólicos desse efeito incluem
o aumento da expressão da enzima superóxido dismutase 2 (SOD2) mediado
pelo exercício físico e assim esse agente antioxidante tem papel chave na
proteção que o tecido cardíaco desenvolve contra eventos isquêmicos como
fruto das adaptações positivas promovidas pelo treinamento físico23.
O óxido nítrico (NO) é outro ROS produzido pelo músculo esquelético
durante o exercício. As fibras musculares esqueléticas expressam duas
isoformas da enzima óxido nítrico sintase (NOS) e suas atividades aumentam
durante a contração muscular resultando em aumento na formação do NO,
produto de sua reação24. A localização celular das duas isoformas da enzima
está diretamente associada às funções biológicas do NO. Uma das isoformas
está mais expressa no sarcolema e a outra está associada ao complexo
distrofina e disfunções na sua expressão e atividade têm implicações em
algumas formas de distrofia muscular25.
A descoberta do NO representou uma mudança de paradigma sobre a visão
do papel biológico dos ROS. Desde a descoberta de que o exercício induz o
estresse oxidativo, os ROS foram considerados moléculas deletérias e que
causam danos aos tecidos do organismo. Contudo, o NO foi reconhecido como
uma molécula de sinalização responsável por induzir a vasodilatação, alterando
o conceito das funções biológicas dos ROS26.
Em seguida a essa descoberta, uma ampla gama de evidências demonstra
que moléculas específicas participam como intermediários na comunicação
celular, além disso, são capazes de controlar a expressão gênica e tem papel
na manutenção da homeostase celular. Em fibras musculares esqueléticas
intactas, o H2O2 não compromete a liberação de cálcio do retículo, contudo
reduz a sensibilidade miofibrilar ao cálcio deprimido a força gerada pela
formação das pontes cruzadas27,28.
77
Esses achados levaram a várias tentativas de aprimorar a performance
através do uso de suplementos antioxidantes. Apesar disso, muitos
antioxidantes comuns na dieta, como a vitamina C e E não se comprovaram
capazes de melhorar o desempenho desportivo29. Contudo, a administração de
outro agente antioxidante, a N-acetilcisteina foi capaz de promover aumento no
desempenho desportivo em humanos durante o exercício submáximo, entre
60-80 % do VO2 de pico. Apesar desses efeitos, esse agente não é capaz de
aumentar a tolerância ao exercício durante atividades de alta intensidade,
acima de 90 % do VO2 de pico30,31.
A ideia de que a produção de ROS poderia servir de estímulo para as
adaptações musculares ao exercício físico remonta a década de 1980 e ao
longo dos anos que se seguiram as descobertas iniciais, com o esforço de
muitos cientistas, essa noção inicial tem sido confirmada indicando que os ROS
são necessários para promover as respostas nos músculos esqueléticos frente
ao exercício físico. Por exemplo, a inibição da atividade da enzima xantina
oxidase in vivo em ratos durante o exercício agudo previne a ativação de vias
de sinalização envolvidas em adaptações induzidas pelo exercício em células
musculares ativas32. Adicionalmente, estudos in vitro demostraram que a
exposição de H2O2 a miotubos em cultura promove aumento na expressão de
vários genes, incluindo a indução da expressão, mediada pela contração
muscular, do gene do co-ativador 1α do receptor γ de proliferação ativado por
peroxissomo (PGC-1α), uma proteína que faz parte de uma classe de
reguladores da transcrição que levam ao aumento de genes envolvidos na
biogênese mitocondrial com aumento da capacidade do metabolismo aeróbio,
levando ao aumento da capacidade enzimática associada a β-oxidação de
ácidos graxos, ao ciclo de Krebs e a fosforilação oxidativa33,34. Essas
evidências são confirmadas com a observação de que a administração de
agentes antioxidantes, como a vitamina C, previne os efeitos do exercício sobre
o aumento da expressão de PGC-1α e consequentemente reduz a biogênese
mitocondrial promovida como resposta adaptativa ao exercício, reforçando a
ideia de que a produção de ROS induzida pelo exercício é necessária para as
adaptações observadas pelo treinamento desportivo e ainda indicando que a
suplementação com agentes antioxidantes pode deprimir as respostas
adaptativas ao exercício físico32.
78
A noção de que os ROS atuam como mediadores da sinalização celular,
participam no controle do metabolismo, seja através do controle alostérico da
atividade enzimática ou por meio da expressão gênica e que tem papel
importante nas adaptações biológicas desencadeadas pelo exercício físico
estão de acordo com o conceito de hormese. A hormese é uma resposta
adaptativa da célula frente à estimulação de estressores, como substâncias
químicas, toxinas, radiação, incluindo os ROS; que quando em baixas doses
leva a efeitos adaptativos positivos e benéficos, ao contrário do que se
esperaria para altas doses que leva a efeitos tóxicos35. Nesse contexto, a
produção de ROS mediada pelo exercício segue os princípios da hormese
onde exercícios de intensidade baixa a moderada, promovem respostas
adaptativas no músculo esquelético decorrente a produção de ROS que
servem justamente para proteger o tecido contra a oxidação e manter a
homeostase entre os efeitos oxidantes-antioxidantes durante o exercício36,37.
Uma sessão aguda de exercício leva ao aumento na expressão da enzima
SOD2 em mitocôndrias de músculo esquelético de ratos resultando em um
aumento da atividade da SOD2 durante o treinamento físico38. Assumindo que
SOD2 tem um papel central na prevenção do acúmulo de superóxidos nas
células, o aumento da expressão gênica de SOD2 no músculo esquelético
induzido pelo exercício ilustra o princípio adaptativo postulado pelo conceito de
hormese. Assim, esses ajustes biológicos ocorrem no sentido de aprimorar a
capacidade do tecido muscular em suportar a ação de oxidantes produzidos ao
longo do treinamento desportivo.
Atualmente a ciência continua perseguindo o aumento da compreensão
sobre o equilíbrio entre os danos oxidativos induzidos pelo exercício e a
sinalização dependente de ROS que promove respostas adaptativas positivas
sobre os tecidos dos músculos esquelético e cardíaco. Um novo campo de
investigação tem surgido com o avanço nos estudos em epigenética. A
epigenética é uma área das ciências biológicas que estuda as alterações no
fenótipo de uma célula, tecido ou organismo que leva a alterações na
expressão gênica provocadas como resultado de exposição a fatores externos
ou ambientais. O termo epigenética pode se referir a heranças genéticas, mas
no contexto dos ROS refere-se a mudanças autônomas; onde alterações
funcionais relevantes no genoma ocorrem sem que haja modificações na
79
sequência do DNA. Em uma analogia, é possível pensar no DNA como uma
biblioteca com um grande repertório de informações, algumas são acessadas e
outras não; e através da exposição a diferentes fatores e condições ambientais,
pequenos “postes” de sinalização são adicionados ao DNA nas regiões onde
as informações necessárias para o ajuste a certos estímulos podem ser
acessadas e assim a célula passa a ter um marcador que indica o local onde
um gene para a expressão de uma proteína importante para o funcionamento
celular se localiza. Os mecanismos de marcação do DNA envolvem a metilação
e modificação em histonas no DNA, alterando como os genes serão expressos,
sem alterar a sequência dos nucleotídeos no DNA. De fato, o estado redox
pode regular vias epigenéticas através da metilação do DNA e por mudanças
pós-traducionais de histonas, sugerindo que a produção de ROS mediada pelo
exercício pode ser um importante agente em eventos epigenéticos, embora os
mecanismos ainda não estejam completamente esclarecidos39. Dessa forma,
esse é um campo de grande interesse no futuro da ciência que investiga os
efeitos do exercício sobre o estado redox do organismo.
O esforço da ciência nos últimos 30 anos permitiu esclarecer vários
aspectos relevantes para a compreensão das relações entre o exercício a os
ROS. Entretanto, muitas questões ainda continuam sem entendimento e
representam lacunas no conhecimento desse assunto. Os locais precisos de
produção de ROS, bem como as relações desses compostos como agentes de
controle das vias de sinalização celular, inclusive envolvidas nas adaptações
musculares promovidas pelo exercício ainda necessitam de investigações para
melhor compreensão dos mecanismos envolvidos. O crescente interesse da
ciência sobre os efeitos do exercício nas respostas epigenéticas representam
um campo fértil de investigações e podem contribuir para o conhecimento e
fomentar descobertas que revelem os mecanismos de produção e ação de
ROS no controle do metabolismo do músculo esquelético, cardíaco e outros
tecidos.
Finalmente, fica claro que a produção de ROS, associada ao exercício físico
só representa uma ameaça para a homeostase celular, agindo como estresse
oxidativo e podendo provocar danos celulares, em circunstâncias onde há
excesso de exercícios e que a prática regular de atividade física de forma
adequada à saúde fisiológica tem maior probabilidade de promover respostas
80
positivas sobre a biologia dos tecidos musculares esqueléticos e cardíaco e
estão associadas a adaptações provocadas pelo exercício que promovem a
melhoria do próprio desempenho desportivo.
81
REFERÊNCIAS
4 BRADY PS, BRADY LJ e ULLREY DE. Selenium, vitamin E and the response
to swimming stress in the rat. J Nutr 109, 1103–1109, 1979. ISSN: 1541-6100
Disponível em: < https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/448449 >
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exercise, vitamin E, and ozone on pulmonary function and lipid peroxidation. J
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82
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83
Disponível em: < https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/23050834 >
84
2003. ISSN: 1522-1601 Disponível em: <
https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/12496140 >
85
CAPÍTULO 08
ORIGEM DA FADIGA AGUDA: CÉREBRO
1. INTRODUÇÃO
Thiago Teixeira Guimarães
86
causado pelo esforço físico produz uma série de eventos químicos periféricos e
centrais, e o hipotálamo é crucial para o restabelecimento da homeostase e
preservação do funcionamento normal das células, tecidos, órgãos e sistemas.
Se o ser humano não tivesse uma estrutura capaz de realizar essa leitura em
detalhes, integrando e coordenando várias funções, certamente o estresse
físico severo seria mais fatal do que o número registrado de mortes súbitas por
esforço, de até 13 por 100.000 praticantes anualmente4.
O hipotálamo é capaz de projetar sinapses excitatórias e inibitórias para
outras regiões do cérebro, como o núcleo accumbens, amígdala, hipocampo,
tálamo, área ventraltegmentar, locus coerelus, núcleos da rafe, sistema límbico,
regiões motoras e demais estruturas corticais e subcorticiais3. A sinalização
orexigênica e anorexígena em condições de estresse, como os distúrbios do
sono e síndrome metabólica, por exemplo, são essenciais para a integração do
metabolismo em funções expressas como o alerta, sono, motivação e
comportamento3. Essas vias parecem conectar sistemas periféricos e centrais
permitindo que o cérebro tome decisões apropriadas para a preservação da
vida.
O peptídeo YY e os hormônios leptina, grelina e insulina são os
principais controladores dos neurônios anorexígenos e orexígenos descritos na
literatura5. O peptídeo YY, secretado no trato gastrointestinal distal, tem a
função de inibir neurônios orexígenos que expressam o neuropeptídio Y (NPY)
e o agouti-related peptide (AGRP) através de receptores Y2R. A leptina,
secretada no tecido adiposo, tanto pode inativar neurônios orexígenos que
expressam NPY/AGRP, como ativar neurônios anorexígenos que expressam
proopiomelanocortin (POMC) e cocaine- and amphetamine-related transcripts
(CART). A grelina, secretada no estômago, ativa neurônios orexígenos que
expressam NPY/AGRP através de receptor secretagogo do hormônio do
crescimento (GHS-R). A insulina, secretada no pâncreas, ativa neurônios
anorexígenos que expressam POMC/CART e inibe neurônios orexígenos que
expressam NPY/AGRP. Além disso, uma vez ativados, os neurônios
orexígenos que expressam NPY/AGRP podem inibir a expressão de
POMC/CART pelos neurônios anorexígenos via GABA, conhecido por ser o
principal neurotransmissor inibitório no SNC5; 6; 7.
87
A deficiência na atuação dos peptídeos orexígenos está associada à
narcoplesia (sono excessivo) e cataplexia (atonia muscular, queda,
incapacidade de falar e mexer)8;9;10. Durante o estado de vigília seu fluido
cerebroespinhal é máximo, e a infusão desses peptídeos gera vigília11. Animais
knockout dos peptídeos orexígenos apresentam comprometimento em
respostas de luta ou fuga12. Por outro lado, roedores que tiveram essas vias
superativadas apresentaram um comportamento exagerado em recompensa a
alimentos e drogas, como a dependência de opióides13. A partir de uma
dinâmica irregular em vias regidas pelo hipotálamo, a inabilidade de modulação
das vias de motivação e recompensa torna-se iminente, através do aumento de
sensibilidade do glutamato, conhecido como neurotransmissor excitatório no
SNC, em sinapses na área tegmentar14.
O hipotálamo pode ter inputs de informações periféricas provenientes de
vias aferentes. Entretanto, alterações no próprio cérebro, como o aumento na
concentração de adenosina, decorrente do aumento da demanda energética
imposto pelo exercício15, a partir do fracionamento da molécula de ATP, pode
ditar o ritmo de desenvolvimento de fadiga. A consequência do acúmulo de
adenosina é a inibição da excitabilidade neuronal e transmissão sináptica,
reduzindo o alerta, suprimindo a atividade espontânea e estimulando o sono15.
Essas funções são comandadas pelo hipotálamo e suas projeções sinápticas
interagem com outras estruturas, especialmente as que compõe o sistema
límbico.
Ainda que a fadiga seja uma manifestação capaz de preservar a
integridade orgânica, podendo gerar dor, sofrimento, medo ou riscos, o atleta
profissional, amador ou de recreação tende a repetir inúmeras vezes estímulos
severos. O estudo biológico do comportamento hedônico16, capaz de elucidar a
integração entre vias como a dopaminérgica, anorexígena e orexígena em
áreas como o hipotálamo e outras que compõe o sistema límbico, pode gerar
desdobramentos importantes não apenas na ciência dos esportes, como no
tratamento de doenças neurodegenerativas e diversos tipos de vício (ex.
drogas e o próprio exercício físico - vigorexia).
O que diferencia o ser humano de outros animais é a capacidade de
processar informações cognitivas complexas através do córtex cerebral17; 18; 19;
20; 21
. O córtex responde por processos como o planejamento e a integração
88
das necessidades corporais e culturais. Se por um lado o hipotálamo projeta
informações para outras estruturas no cérebro a fim de provocar
comportamentos específicos e preservar a homeostase, por outro, é possível
que o córtex pré-frontal seja capaz de exercer um controle vertical sobre o
sistema límbico de recompensas, regiões motoras e o próprio hipotálamo17; 22;
23; 24
. No contexto da obesidade, por exemplo, existe uma hipótese de que a
falha do córtex em inibir o hipotálamo seja uma de suas causas principais17. A
estrutura cerebral responsável por regular esses impulsos é o córtex pré-
frontal. Estratégias terapêuticas que estimulam a conscientização, como os
suportes conferidos em programas de reeducação comportamental, parecem
ser justificadas por esses mecanismos17. No contexto do exercício, é
especulado que o encorajamento verbal ou outras estratégias similares possam
promover a performance motora por mecanismos semelhantes. Ou seja,
embora em um dado momento crítico do exercício o hipotálamo esboce uma
sinalização para a fadiga, o córtex pré-frontal teria a capacidade de inibi-lo,
permitindo que mais energia fosse gasta para a manutenção ou aumento do
trabalho por uma valiosa fração superior de tempo, resultando em melhores
desempenhos físico/motores.
Além disso, estudos com espectroscopia no infravermelho (NIRS)
permitem discutir as alterações da hemodinâmica no córtex cerebral durante o
esforço físico25; 26; 27
. A oxigenação do córtex pré-frontal aumenta durante o
exercício de leve a moderada intensidade, mas durante esforços extenuantes
parece haver um redirecionamento do fluxo sanguíneo cerebral do córtex pré-
frontal para áreas do córtex motor26; 27; 28; 29
, de acordo com dados que
corroboram a hipótese da hipofrontalidade. Como o córtex pré-frontal mostra
uma ligação entre sentimentos e cognição3, aspectos cognitivos como
percepção visual, atenção, memória, movimentos programados e resolução de
problemas (funções executivas) podem influenciar o desenvolvimento da
fadiga. A fadiga, enquanto sensação, pode ser derivada da redistribuição do
fluxo sanguíneo no córtex frontal (pré-frontal) em direção ao córtex parietal,
comprometendo o desempenho das tarefas cognitivas. Estudos futuros
ajudarão a investigar os efeitos agudos do exercício físico no controle cognitivo,
oxigenação e conectividade cerebral.
89
3. SISTEMA LÍMBICO E DE RECOMPENSA
Thais Cevada
90
inúmeras vias cerebrais e está associada a sentimentos de prazer, sono e
fome. Doenças como depressão, fobias específicas, transtornos de ansiedade
e alimentares apresentam em suas fisiopatologias alterações na concentração
serotoninérgica em áreas especificas do cérebro35. Por outro lado, a dopamina
é uma catecolamina, liberada pela área tegmentar ventral e conhecida por
executar uma função essencial no sistema de recompensa e no complexo
sistema de network neural associado à produção de movimentos. É provável
que adaptações em mecanismos dopaminérgicos possam influenciar nossa
capacidade de se movimentar e de se exercitar6. Uma desregulação desse
sistema pode estar relacionada à distúrbios neurológicos, como as doenças de
Parkinson e esquizofrenia36. Alterações dopaminérgicas afetam agudamente
também as sensações de fadiga e exaustão, e cronicamente, podem prejudicar
a execução de movimentos, o humor, o controle das emoções, a cognição, o
sono, a memória e a capacidade de aprendizagem.
Em relação à fadiga, durante a prática do exercício físico extenuante, a
liberação desses neurotransmissores varia de acordo com as condições do
exercício e as regiões cerebrais. Dessa forma, parece que a serotonina no
cérebro está associada à diminuição do débito neural e consequentemente,
resulta em um menor recrutamento muscular durante o exercício. A dopamina
cerebral, por outro lado, está associada ao aumento de execução do período
de exercício. A "Hipótese de Fadiga Central" utiliza desse conhecimento e
afirma que a relação serotonina/dopamina no cérebro pode ser um dos
indicadores de fadiga. Dessa forma, quanto maior o resultado da relação
serotonina/dopamina (5HT/DA) maior o estado de fadiga da pessoa37. De fato,
um estudo com ratos observou que, à medida que o tempo de fadiga se
aproximava, os níveis de dopamina cerebrais diminuíam e se igualavam aos
valores de início de exercício, enquanto que, os níveis de serotonina ainda
permaneciam altos38. Além disso, deve-se levar em consideração que o
exercício físico realizado de forma crônica tem a capacidade não apenas de
estimular a plasticidade cortical nas vias monoaminérgicas, mas também de
alterar as concentrações basais, a síntese de neurotransmissores e a ativação
de seus receptores pós sinápticos de membrana39. Dessa forma, talvez exista
também uma modulação da sensação de fadiga, a partir da concentração
monoaminérgica cerebral, de acordo com a "Hipótese de Fadiga Central".
91
As explicações neurofisiológicas sobre a "Hipótese de Fadiga Central"
alegam que, durante a fadiga na prática do exercício físico, a alta concentração
do nível de serotonina pode ser o originador para a interrupção/término do
exercício. Nesse caso, o aumento da serotonina estaria relacionado ao
aumento da taxa metabólica e a diminuição da eficiência mecânica40,
contribuindo para o ato de cessar da prática exercida. Por outro lado, a
dopamina exerce um importante papel para a realização do ato motor. De um
modo interessante, foi visto que indivíduos que possuem maior circulação
dopaminérgica no córtex estriado parecem ter uma capacidade aumentada
para realizar exercícios físicos41. No entanto, além da predominância para a
melhor função motora, a liberação de dopamina no cérebro apresenta também
relação direta com a motivação para se executar o exercício. Dessa forma, é
sabido que, com o aumento da motivação intrínseca, a sensação de fadiga e o
final da prática de exercícios apresentam grandes chances de serem
retardados pelo indivíduo. Isso pode ser explicado pelo fato de que a
recompensa de se executar ou finalizar a tarefa pode ser, em alguns casos,
mais importante do que o conjunto de situações nocivas enfrentadas no
momento pelo indivíduo, como por exemplo, a dor e o desconforto durante a
fadiga42.
Outros fatores neuroquímicos que podem ser liberados durante o
exercício físico são os opioides e os endocanabinóides, como as endorfinas e a
anandamida, respectivamente. Essas substâncias causam nos seres humanos
sentimentos de euforia e bem-estar, produzem efeitos ansiolíticos, de sedação
e diminuem a sensibilidade à dor43. A explicação fisiológica para tais efeitos
remete à característica inibitória dos receptores canabinóides (CB1 e CB2), que
costumam também ativar os receptores opioides, principalmente nas áreas
mesolímbica e fronto-límbica cerebrais associadas ao processamento
emocional44. A ação desses receptores pós-sinápticos de membrana pode
modular o sistema de liberação dopaminérgicano circuito de recompensa e
diminuir a concentração de dopamina em áreas corticais responsáveis pela
cognição, como o córtex pré-frontal, já que receptores de dopamina (D1 e D2)
parecem estar colocalizados com os receptores CB1 e CB2. Nesse sentido, um
estudo com humanos mostrou que os exercícios de alta intensidade e
extenuantes aumentaram a ativação do sistema opioide em grandes áreas do
92
sistema límbico cerebral, com destaque para o córtex insular. Os autores
concluem que a ativação desse sistema está relacionada com a intensidade de
trabalho executada durante o exercício e com o desenvolvimento do estado de
fadiga durante intensidades extenuantes45.
O sistema límbico e o sistema de recompensas cerebrais, representados
pelas emoções e motivações, apresentam uma gama de explicações neuro-
anatômicas e neurofisiológicas com o estado de fadiga durante o exercício.
Diferentes são as teorias com embasamento empírico ou científico que
relacionam essas variáveis. No entanto, parece que fatores interoceptivos
aumentados (sensação de dor, sudorese, hiperventilação, taquicardia) com o
exercício extenuante podem gerar sensações e afetos negativos favoráveis à
interrupção do exercício no momento de fadiga46. Esse conjunto aferente
interoceptivo (sensações negativas) aumenta a ativação de áreas cerebrais,
como o córtex pré-frontal ventro-medial e amídala, presentes no sistema
límbico. Uma alternativa para se controlar a percepção desse conjunto de
sensações negativas durante o estado de fadiga é alterar o foco de atenção
para fatores externos, através de processamentos cognitivos (via cortéx pré-
frontal) e motivação para alcançar objetivos (ativação do sistema de
recompensa). Como exemplo, praticantes que preferem utilizar músicas
durante o exercício com o intuito de distração e sensações mais prazerosas.
Dessa forma a percepção negativa dos fatores interoceptivos pode ser
minimizada e a sensação de fadiga postergada47. De acordo com essa
explicação, podemos concluir que o sistema límbico, ativado pelas vias bottom-
up (corpo-cérebro) interoceptivas, teria uma ação negativa e antecipatória do
estado de fadiga. Já o sistema de recompensa, em conjunto com áreas
corticais cognitivas, via top-down (cérebro-corpo), poderia retardar o momento
de fadiga durante o exercício físico extenuante48.
93
esforço percebido, diminuição do controle autonômico cardiovascular e
desempenho durante o exercício49; 50; 51; 52
. A predominância vagal está
associada à diminuição da frequência cardíaca e à ativação do córtex pré-
frontal, e essas associações indicam melhor adaptação do controle autonômico
cardiovascular. O mecanismo oposto é promovido pela ativação da amígdala,
aumento do processo inflamatório, diminuição do desempenho durante o
exercício e desenvolvimento de doenças cardiovasculares e metabólicas53; 54;
55; 56; 57
.
A amígdala, estrutura relacionada com as emoções, agressão,
sexualidade, raiva, ansiedade, medo, sistema límbico e resposta de luta ou
fuga58; 59; 60; 61
, participa de funções integradoras do subconsciente e
consciente, para promover uma resposta emocional que determinará ajustes
contínuos no exercício. Além disso, está associada à aprendizagem, pois
modula o potencial de longa duração59; 62 e, consequentemente, a formação de
memórias no hipocampo61; 63; 64.
A regulação autonômica cardiovascular também pode ser influenciada
por características como ansiedade e humor pré-competitivos, que diminuem a
ativação vagal65; 66; 67. A ansiedade, do ponto de vista fisiológico, pode ser um
produto da inibição de influências vagais que aumentam a atividade simpática e
ativam o eixo hipotálamo-pituitária-adrenal (HPA). Essas ativações impedem o
controle inibitório do córtex pré-frontal na amígdala, que uma vez ativada inibe
o circuito de retroalimentação, impedindo o retorno do controle inibitório tônico.
A predominância do ramo simpático sobre o parassimpático promove aumento
do custo metabólico, reduz a eficiência do controle homeostático e pode levar
ao desenvolvimento de fadiga68.
O sistema vagal é um fator neuroprotetor que ajusta os mecanismos
centrais e periféricos de acordo com as demandas metabólicas exigidas pelo
ambiente68; 69. Nos atletas, a conversão do predomínio vagal para o simpático
está associada à fadiga, sobrecarga70; 71
e estresse da competição72. Além
disso, o aumento da modulação parassimpática está associado a uma maior
capacidade de continuar a uma maior taxa de trabalho durante o exercício
máximo50.
Os circuitos neurais que regulam o controle cardiovascular central são
os mesmos em situações estressantes que envolvem exercícios ou não52. No
94
entanto, há uma diferença na ativação desses circuitos que estaria relacionada
à experiência anterior (memória) ou à intensidade do estímulo. A ativação
diferencial do sistema vagal depende da capacidade do indivíduo de perceber
características ambientais, como, segurança ou risco iminente de morte73. No
esporte, são observadas essas distinções na percepção do indivíduo quando
comparado a condição de treinamento com a de competição74. As diferentes
mudanças observadas antes das competições denotam a influência de
aspectos psicológicos nas respostas adaptativas dos circuitos neurais. Nesse
caso, quanto maior a capacidade dos circuitos neurais em se adaptarem à
demanda metabólica necessária, melhor é o desempenho.
Uma questão observada com frequência na prática é a subestimação ou
superestimação da percepção subjetiva de esforço. Por exemplo, normalmente,
pessoas com alto nível de aptidão física tendem a subestimar a percepção
subjetiva de esforço, enquanto pessoas com baixo nível de aptidão física
tendem o contrário. Assim podemos questionar: um atleta que, por senso
comum, acredita na necessidade de superar seus limites diariamente, e por
evocar memórias muito positivas da vitória, acaba por burlar suas próprias
percepções de cansaço? Por outro lado: será que uma pessoa que
experimentou um infarto agudo do miocárdio, seguido de uma experiência de
quase morte, formaria uma memória muito negativa do evento, desenvolvendo
medo durante o exercício, ainda que controlado e em baixa intensidade? A
sensação é o conhecimento, consciente ou subconsciente, dos estímulos
externos ou internos, enquanto a percepção é o conhecimento consciente e
interpretação do significado das sensações3. Quanto maior a consciência do
profissional e, sobretudo, do praticante sobre o processamento fisiológico da
percepção de fadiga, provavelmente, maiores as chances de sucesso na
distribuição e controle das cargas de exercício ao longo do tempo.
5. INTEGRAÇÃO DE ESTRUTURAS
Thiago Teixeira Guimarães
95
Figura 1. Integração de diferentes estruturas no desenvolvimento da fadiga.
Fonte: O autor.
6. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Thiago Teixeira Guimarães
96
REFERÊNCIAS
97
12 KAYABA, Y. et al., Attenuated defense response and low basal blood
pressure in orexin knockout mice. Am J Physiol Regul Integr Comp Physiol, v.
285, n. 3, p. R581-93, Sep 2003. ISSN 0363-6119. Disponível em: <
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21 MILLER, E. K. The prefrontal cortex and cognitive control. Nat Rev Neurosci,
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98
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brain activation elicited by food stimulation. Proc Natl Acad Sci U S A, v. 106, n.
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99
Disponível em: < https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/21672029 >.
100
<http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed >.
101
55 THAYER, J. F. et al., A meta-analysis of heart rate variability and
neuroimaging studies: implications for heart rate variability as a marker of stress
and health. Neurosci Biobehav Rev, v. 36, n. 2, p. 747-56, Feb 2012. ISSN
1873-7528. Disponível em: < https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/22178086>.
102
66 MATEO, M. B.-L., C. et al., Heart Rate Variability and Pre-Competitive
Anxiety in BMX discipline. Eur J Appl Physiol, v. 112, n. 1, 2012.
103
CAPÍTULO 09
SINTOMAS CLÍNICOS DO EXCESSO DE EXERCÍCIOS
1. INTRODUÇÃO
104
O monitoramento de cargas remete a algumas responsabilidades
básicas do profissional de educação física, como avaliar, planejar, intervir de
forma eficaz, reavaliar e manter-se atualizado tecnicamente. No que diz
respeito às avaliações físicas, as mais tradicionais são a anamnese,
antropometria, funcional (estática e dinâmica) e de performance (valências da
aptidão física). Quanto aos marcadores de exaustão, citam-se os de
desempenho/performance, bioquímicos, fisiológicos, morfológicos e de
sintomas clínicos.
Quanto aos marcadores de desempenho, além da limitação abordada no
primeiro parágrafo deste capítulo, destaca-se o fato de que, dependendo do
protocolo a ser utilizado e do período específico do treinamento, seu estresse
induzido pode ser indesejável (distress) e aumentar o risco de lesões. Uma
solução simples e prática, cada vez mais disseminada, é a realização do salto
vertical. O My Jump é um exemplo de aplicativo que pode ser empregado em
diferentes modalidades esportivas, pois reflete a progressão da força e
potência de grandes grupamentos musculares, certamente requeridos em
diversas modalidades. Como os marcadores de desempenho por si só não
esgotam as possibilidades de diagnóstico da SOT, prossigamos para as
possibilidades bioquímicas.
Com frequência, análises de hormônios anabólicos e catabólicos,
mioglobina, lactato desidrogenase e outras enzimas, mediadores do estresse
oxidativo e sistema imune, além de áreas mais recentes como as ômicas, são
investigados na tentativa de se de determinar “com precisão” o grau de fadiga e
exaustão decorrente do exercício. Entretanto, até o momento, não existe uma
única variável precisa e confiável para tal1;4. Um exemplo corriqueiro é a
avaliação da enzima creatinoquinase (CK) plasmática, utilizada como principal
biomarcador de diagnóstico para a rabdomiólise (processo de lesão e ruptura
das membranas de células musculares, com extravasamento de seus
componentes para a corrente sanguínea). O problema é quando seus níveis
críticos não são acompanhados de sinais ou sintomas clínicos de rabdomiólise
e vice-versa5; 6; 7.
Por esse motivo, trabalhar com múltiplos marcadores pode ser a
solução. Por que não eleger, com base na relação custo-benefício, um ou outro
marcador de desempenho, um ou outro marcador bioquímico, alguns
105
marcadores fisiológicos (como a variabilidade da frequência cardíaca, que será
abordada no capítulo seguinte) e um ou outro marcador morfológico (como a
termografia, que cada vez mais se mostra eficiente, diga-se de passagem)?
Porém, como agir se não houver a menor possibilidade de investimento
(capital)? Existem soluções ainda mais práticas, com base na teoria? A seguir
serão discutidas possibilidades relacionadas aos sintomas clínicos e
comportamentais associados à exaustão.
As alterações da SOT podem ser manifestadas através de sinais clínicos
e comportamentais, como por exemplo, perturbação do humor, transtorno de
ansiedade, instabilidade emocional, apatia ou agressividade1;8. Essas
condições são possíveis reflexos do estresse crônico na modulação molecular,
celular e tecidual, impactando diferentes sistemas fisiológicos (nervoso,
endócrino, cardiovascular, renal, digestório, respiratório, gonadal e
imunológico) e suas respectivas funções9. Nesse contexto, aspectos
psicofisiológicos recebem cada vez mais atenção por parte da comunidade
científica, sob a justificativa do conteúdo abordado no capítulo sobre a origem
da fadiga aguda e cérebro, além do argumento de que a prevenção da SOT e o
rendimento esportivo dependem da interação entre fatores físicos, técnicos,
táticos, cognitivos e comportamentais.
Apesar de aparentemente paradoxal o assunto, sintomas
psicofisiológicos associados à SOT também podem ser observados em
pessoas inativas fisicamente quando comparadas com congêneres ativos e
muito ativos10, reforçando a necessidade de se contemplar fatores muito além
das habituais variáveis do treinamento (frequência, duração, intensidade e
intervalo das sessões). Sendo assim, destacam-se os seguintes quesitos:
estresse mental e situações decorrentes ou que impactam a sua administração
(ex. ansiedade, motivação, tempo disponível para o lazer, percepção de saúde,
felicidade e qualidade de vida, fé, finanças, pensamentos ruminantes e
negativos/positivos); estado nutricional, nível de hidratação e consumo de
drogas (lícitas ou ilícitas); qualidade do sono, percepção de fadiga acumulada,
vigor e recuperação entre as seções; condições climáticas; libido; dores no
corpo, frequência de infecções, resfriados e gripes (desequilíbrio imunológico).
Repare como o profissional de educação física carece de uma interação com
106
profissionais de outras áreas quando o assunto é saúde integral e otimização
do rendimento.
Constituem protocolos que se propõem a avaliar quesitos além da forma
física: World Health Organization Quality of Life Instrument (WHOQOL) e Short-
Form Health Survey 36 (SF-36) para qualidade de vida; Questionário de
Sintomas Clínicos do Overtraining (QSCO), questionários de Burnout e bem-
estar, questionários de estresse e recuperação para atletas e treinadores
(RESTQ); questionários sobre dor aguda, dor muscular de início tardio,
percepção subjetiva de esforço (PSE) e percepção subjetiva de recuperação
(PSR); cruzamento de cargas internas e externas (Monotonia e Strain, por
exemplo); coloração da urina e imunidade. Salienta-se, mais uma vez, o
trabalho em equipe e o papel articulador do profissional de educação física
para a integração entre diferentes áreas da saúde através de uma abordagem
holística.
Na prática do profissional da saúde é crucial levar em consideração não
somente a ciência, como também a experiência na aplicação do conhecimento
e o respeito às crenças do beneficiário de suas intervenções11;12. Além disso,
há quem concorde que um toque de arte seja necessário. Já concluímos
previamente que a aplicação de um protocolo isolado (seja ele qual for), em um
dado momento aleatório, talvez não faça o menor sentido, podendo gerar
conclusões enviesadas inclusive. Consegue imaginar um atleta sendo
indevidamente diagnosticado com SOT, quando na verdade se encontra em
overreaching? Outros questionamentos são inevitáveis: quantos atletas
realizam testes e têm inúmeras medidas e informações coletadas, mas ficam
sem o principal passo do processo que é o feedback, a avaliação?
Avaliar é determinar a importância ou valor da informação coletada,
crucial para a tomada de decisões, classificação, comparação com algum
padrão13. A avaliação informa sobre o progresso, reflete a filosofia, metas e
objetivos de uma intervenção13. Ora, se o atleta e a equipe técnica recebem um
papel cheio de informação (quando recebem), mas não refletem em conjunto
sobre o processo, isso significa dizer que não houve avaliação! Então, para que
testar e medir? Consegue imaginar, na prática profissional, a quantidade
existente desses exemplos? Agora então, com o arsenal crescente de
tecnologia, quantas informações são coletadas, porém, mal contextualizadas?
107
Com base nessas e outras reflexões, foi desenvolvida uma proposta de
avaliação crônica e periodização do monitoramento de cargas, provisoriamente
intitulada Modelo do Farol14, descrita a seguir através de um caso concreto.
2. CASO CONCRETO
108
treinos, a atleta deveria retornar ao farol verde, indicando sua recuperação, na
expectativa de desenvolver a supercompensação de adaptações fisiológicas.
Fonte: O autor.
Fonte: O autor.
109
discutimos nos capítulos anteriores, o estresse em excesso pode gerar
imunossupressão celular. Na semana 20, uma nova gripe acometeu a atleta,
após seis avaliações acumuladas de amarelo e vermelho.
Embora o resultado no evento-alvo tenha sido louvável (prata no double
peso leve e bronze no four skiff pesado), a atleta concluiu que ficou abaixo de
suas potencialidades, reforçando a compatibilidade entre a sua percepção de
rendimento e o monitoramento através do Modelo do Farol. A atleta não
retornou à sua zona de conforto durante o período pré-competitivo, sugerindo o
não desenvolvimento da supercompensação de adaptações fisiológicas no
polimento (tapering).
3. MACROCICLO 2
Tabela 3. Macrociclo 2.
Fonte: O autor.
110
consciência em relação a paradigmas que certamente interferem no resultado,
como por exemplo, a “síndrome no pain, no gain”. O treinamento desportivo
serve para construir, manter ou reduzir a capacidade física ao longo do tempo.
A periodização serve para distribuir as cargas de estresse ao longo da
temporada. Há tempos de estresse leve, outros de estresse moderado a alto, e
outros de estresse severo. Viver fora da zona de conforto não é compatível
com o melhor desempenho possível. Um atleta pode até vencer uma
importante competição nessas condições, mas consegue imaginar seus
resultados de médio a longo prazo vivendo dessa forma? O que é mais
importante, vencer uma batalha ou uma guerra?
Contabilizadas 15 semanas consecutivas fora de sua zona de conforto,
sendo 13 faróis amarelos e dois vermelhos, sem tempo adequado para
regenerar através do período transitório no macrociclo 1, a atleta desenvolveu
uma forte gripe e se afastou por 15 dias dos treinamentos. Na semana 6, um
desabafo (Imagem 1).
Fonte: O autor.
111
O tal convite para a conscientização havia sido apurado. O que
inicialmente foi discutido genericamente passou a ser trabalhado de forma mais
organizada. Foram realizadas breves apresentações conceituais sobre
treinamento esportivo, fisiologia do estresse com ênfase no sistema nervoso e
imunológico, além de hábitos e estímulos ambientais que influenciam
diretamente a atividade celular.
Um dos pontos mais curiosos durante esse processo foi o levantamento
e análise de informações sobre o sono (Imagem 2) através do aplicativo Polar
Vantage M®. Simplesmente, nos últimos meses, a atleta não apresentava a
fase mais importante do sono, a fase REM (do inglês rapid eye movement).
Uma das rotinas mais sacrificantes de sua modalidade é justamente a
necessidade de acordar de madrugada para navegar em águas calmas e sem
vento.
Imagem 2. Análise do sono pelo aplicativo Polar Vantage M®.
Fonte: O autor.
4. CONSIDERAÇÕES FINAIS
112
Pôde-se prever, qualitativamente, o desenvolvimento ou não da
supercompensação de adaptações fisiológicas.
O organismo humano foi projetado para manifestar sinais e sintomas de
exaustão, logo, espera-se que o desenvolvimento dessa percepção, no nível do
consciente, esteja associado à superação de limites. Protocolos com
componentes subjetivos e qualitativos, normalmente negligenciados pela
fisiologia do exercício tradicional, podem fornecer informações preciosas. Na
era da tecnologia de ponta e super softwares inteligentes para o
processamento simultâneo de centenas de informações, com frequência, a
avaliação integral do ser humano atleta não é realizada. Tal qual o simples e
imprescindível Teste de Apgar, desenvolvido em 1953, continua sendo utilizado
em pleno anos 2020 para avaliar o ajuste imediato do recém-nascido à vida
extrauterina, ferramentas dessa natureza no treinamento esportivo são muito
bem-vindas.
113
REFERÊNCIAS
114
76, 2018.
11 VAN DIJK, N.; HOOFT, L.; WIERINGA-DE WAARD, M. What are the
barriers to residents' practicing evidence-based medicine? A systematic review.
Acad Med, v. 85, n. 7, p. 1163-70, Jul 2010. ISSN 1938-808X. Disponível em:
<http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/20186032 >.
115
CAPÍTULO 10
VARIABILIDADE DA FREQUÊNCIA CARDÍACA
1. BREVE INTRODUÇÃO
116
Nervoso Visceral tem vias aferentes que recebem estímulos provenientes de
receptores localizados nas vísceras espalhadas pelo corpo humano. O
coração, especificamente falando, é modulado por informações oriundas
principalmente de receptores atriais e ventriculares, barorreceptores,
quimiorreceptores, sistema respiratório, sistema vasomotor, sistema
termorregulador e sistema renina-angiotensina-aldosterona. Essas fibras
aferentes conduzem os estímulos recebidos para o Sistema Nervoso Central
que interpreta, analisa e se necessário através de vias eferentes envia
estímulos em direção dos efetores para que alguma resposta seja produzida
adaptando assim, às necessidades de cada momento específico, a cada nova
sístole. Quanto mais rápido esse ajuste acontece mais protegido o indivíduo
encontra-se. A via eferente do Sistema Nervoso Visceral é chamada de SNA e
se subdivide em dois outros sistemas: Sistema Nervoso Simpático (SNS) e
Sistema Nervoso Parassimpático (SNP) que estão em constante e permanente
atividade, que chamamos de tônus simpático/parassimpático.
As fibras nervosas do SNS originam-se entre as regiões localizadas
entre T1 e L2 enquanto as fibras do SNP originam-se nos seguintes nevos
cranianos: Nervo Oculomotor (3º. par), Nervo Facial (7º. par), Nervo
Glossofaríngeo (9º. Par) e Nervo Vago (10º. par). Além disso, surgem também,
dos seguintes nervos sacrais localizados entre S2 e S3. No entanto, a maior
parte de suas fibras (75%) originam-se no Nervo Vago tendo esse nervo
imensa importância para o SNP e sobretudo, para o coração.
No coração, especificamente, terminações simpáticas atingem todo o
miocárdio e as parassimpáticas o nodo sinusal, o miocárdio atrial e o nodo
atrioventricular.
Um aumento da estimulação simpática gera uma elevação da frequência
cardíaca e um aumento da estimulação parassimpática gera uma diminuição
da frequência cardíaca. As sístoles não têm a mesma duração e é isso que
caracteriza a VFC, as oscilações constantes no comprimento do segmento R-
R. Tais oscilações são fisiológicas e esperadas pois traduzem a capacidade
que o SNA tem de produzir respostas aos milhares de estímulos internos e
ambientais que sempre estão ocorrendo. Pode-se destacar como importantes
estímulos a respiração, o exercício físico, o estresse, alterações
117
hemodinâmicas e metabólicas, sono, dieta, posição do corpo e até
compensações induzidas por doenças5.
Uma alta VFC em repouso é um indicador de excelente prognóstico de
saúde significando que os mecanismos autonômicos estão se ajustando com
muita velocidade e eficiência às alterações fisiológicas e ambientais tendo o
indivíduo, inclusive, uma baixa expectativa de mortalidade. Já uma baixa VFC
em repouso é normalmente um indicador de péssimo prognóstico de saúde
significando que os mecanismos autonômicos estão se ajustando muito
lentamente e de forma insuficiente às alterações ocorridas. Nesse caso, o
indivíduo necessita de maiores investigações para poder se entender o que
está ocorrendo e ter um bom diagnóstico6.
Desta forma, a VFC constitui um potente e independente indicador de
saúde cardiovascular e risco de mortalidade. Sabe-se que a diminuição do
tônus paras simpático e da VFC ocorre depois do infarto do miocárdio7, na
hipertensão arterial sistêmica8 e na síndrome da insuficiência cardíaca9.
Modificações autonômicas no coração, evidenciadas com uma
diminuição do tônus vagal e da VFC em repouso também ocorrem com o
aumento da idade10 e que o condicionamento físico exerce papel protetor
importantíssimo no sentido contrário, aumentando o tônus vagal e a VFC em
repouso10.
A VFC tem um importante significado clínico e vem sendo cada vez mais
utilizada nos estudos envolvendo exercício físico11 para avaliar a função
autonômica após os mais variados tipos de exercícios12;13. Sabe-se que os
exercícios físicos podem influenciar positivamente o SNA, reduzindo a
atividade simpática e aumentando a atividade parassimpática14;15. Uma boa
recuperação da frequência cardíaca após um exercício físico é sabidamente
associada a uma maior saúde cardiovascular e menor risco de doenças
cardiovasculares16;17 e neuropatias diabéticas18. Portanto, conhecer o
comportamento da VFC é extremamente relevante para uma melhor prescrição
dos exercícios físicos considerando a saúde dos beneficiários podendo ser
118
uma excelente ferramenta profilática e/ou terapêutica visando uma melhoria da
função autonômica e cardiovascular.
Entretanto, nunca é demais lembrar que a prescrição do exercício físico
é muito semelhante a prescrição de remédios pois depende diretamente da
dose prescrita. A prescrição acima da dose “ideal” prejudicará o beneficiário
podendo levá-lo, em casos extremos, ao óbito e a prescrição abaixo da dose
“ideal” não surtirá todos os efeitos esperados. No Brasil o profissional que mais
estuda sobre o exercício físico é o Profissional de Educação Física. Esse
profissional prescreve exercícios físicos para qualquer ser humano, que podem
ser indivíduos com as mais diferentes características, que vão de nenéns a
idosos, de indivíduos aparentemente saudáveis a doentes e, inclusive, atletas
que buscam melhorar o desempenho.
Entretanto, atletas muitas vezes estão envolvidos em atividades
extremamente extenuantes e que nem sempre são muito saudáveis e, assim,
muitas vezes a dose do exercício físico a que seus beneficiários é submetido
foge muito ao que seria a dose ideal pensando exclusivamente na saúde deste
beneficiário. Nesses casos, o exercício físico que seria o “remédio” passa a ser
o “veneno” para esses indivíduos por ser excessivo.
119
com um progressivo aumento da atividade do SNS e uma maior incidência de
lesões quando comparados ao treino de endurance21. Preocupados com a SO
em atletas de endurance pesquisadores compararam 9 atletas com SO com 10
sem SO e encontraram diferenças significativas entre o comprimento dos
intervalos R-R e a modulação vagal dos atletas com a SO quando comparados
com os que não tinham SO. Os atletas com SO tinham um menor comprimento
dos intervalos R-R e uma menor atividade vagal22.
A função autonômica tem um significado clínico importantíssimo no
desenvolvimento da SO e na manifestação de seus sintomas23; 24. Atletas que
treinam vigorosamente diariamente, algumas vezes apresentam uma
diminuição da atividade vagal e um aumento da atividade simpática que muitas
vezes pode caracterizar overloading ou overreaching25; 26; 27.
Finalizando, já existem muitos estudos investigando anormalidades no
controle autonômico do nodo sinusal em atletas como overreaching ou
overtraining. O fato de a investigação da VFC ser um método relativamente
simples e não invasivo torna-o interessante. No entanto, os resultados obtidos
até o momento necessitam de maior consistência para um melhor
entendimento do fenômeno. Mas, parece que associado a outros marcadores,
a VFC seja um instrumento importante para a detecção e a recuperação de
atletas com SO através da análise da função autonômica.
120
REFERÊNCIAS
2 HON, E.H.; LEE, S.T. Electronic evaluations of the fetal heart rate patterns
preceding fetal death, further observations. Am J Obstet Gynecol, v. 87, p. 814-
26, 1965.
3 WOLF S. The end of the rope: the role of the brain in cardiac death. Can Med
Assoc J. 1967; 97: 1022-1025. Disponível em: <
https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/6052902 >.
5 RAJENDRA ACHARYA, U. et al., Heart rate variability: a review. Med Bio Eng
Comput, v. 44, n. 12, p. 1031-51, 2006.
10 TULPPO, M.P. et al., Vagal modulation of heart rate during exercise: effects
of age and physical fitness. Am J Physiol, v. 274, n. 2, p. H424-9, 1998.
Disponível em:< https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/9486244>.
11 DONG, J.G. The role of heart rate variability in sports physiology (Review).
Exp Ther Med, v. 11, n. 5, p. 1531-6, 2016. Disponível em: <
https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/27168768>.
121
12 GOLDBERGER, J.J. et al., Assessment of parasympathetic reactivation after
exercise. Am J Physiol Heart Circ Physiol, v. 290, n. 6, p. H2446-52, 2006.
Disponível em: < https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/16415073>.
16 HUANG, P.H. et al., Heart rate recovery after exercise and endothelial
function–two important factors to predict cardiovascular events. Prev Cardiol,
v.8, n. 3, p. 167-70, 2005. Disponível em: <
https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/16034220 >.
122
22 KIVINIEMI, A.M.Altered relationship between R-R interval and R-R
interval variability in endurance athletes with overtraining syndrome. Scand J
Med Sci Sports, v. 24, n. 2, p. 77-85, 2014. Disponível em:
<https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/24024550 >.
123
CAPÍTULO 11
PERIODIZAÇÃO E ESTRATÉGIAS DE TREINAMENTO
124
planejamento inicia com a elevação do nível de treinamento, passando pela
acomodação deste nível às exigências de cada competição, encerrando com o
acompanhamento dos resultados obtidos com o intuito de avaliar se houve um
acúmulo satisfatório dos efeitos das cargas competitivas, assim como de
preparar o atleta para o próximo ciclo, conforme descreve Gomes (2009)4,
classificando tais períodos em preparatório, competitivo e transitório,
respectivamente.
Através de um sistema estruturado de desenvolvimento gradual das
aptidões físicas, planeja-se a periodização de um treino, que é definida por
Tubino (2003)5 como “a divisão do mesmo, em etapas, para se atingir objetivos
específicos”, e que Salo e Riewald (2008)6 entendem como “um método
comprovado para obter picos de desempenho nos momentos mais importantes
do ano”. Os autores ainda listam os benefícios que consideram mais relevantes
sob a perspectiva do treinamento periodizado, que incluem: o desenvolvimento
de capacidades físicas tais como força e resistência; intervalos de descanso e
recuperação entre os ciclos, que favorecem a prevenção de lesões; prevenção
de platôs de desempenho, com o acréscimo de estímulos variados em cada
período, escalonados em uma progressão lógica através da construção de uma
base de força que irá sustentar o incremento de outras valências dentro de
uma progressão lógica e proporcional; e redução do risco de overtraining
(SALO e RIEWALD, 2008)7.
Sendo assim, a periodização nada mais é do que a divisão da
preparação física em períodos, em que serão determinadas as progressões
das inúmeras variáveis do treinamento, tais como volume, intensidade,
velocidade, frequência, densidade, etc., sempre respeitando as bases
fisiológicas do indivíduo.
125
um conjunto de atributos ou características que um indivíduo tem ou alcança e
que se relaciona com sua habilidade de realizar uma atividade física (ACSM,
2014)8. O conceito é tratado tanto na medicina quanto no treinamento
esportivo, sob a perspectiva de seus componentes essenciais, através de duas
abordagens: a primeira é relacionada à saúde e discute a influência de
características físicas na realização de atividades diárias, assim como a
ocorrência de lesões relacionadas a elas, e podem ser melhoradas através de
um programa que desenvolva essas funcionalidades; a segunda é relacionada
à habilidade e discorre sobre a performance no desempenho esportivo, sendo
menos sensíveis à intervenção exclusiva do treinamento pois sofrem
interferência de questões genéticas. Para Guedes (1996 apud ARAÚJO e
ARAÚJO, 2000)9, a aptidão física pode ser associada ao estado de energia e
vitalidade, ocupação ativa nas horas de lazer, realização de tarefas diárias e
enfrentamento de emergências imprevisíveis sem fadiga excessiva, prevenção
de doenças hipocinéticas, capacidade intelectual e alegria de viver.
Os cinco componentes da aptidão física relacionados à saúde são a
capacidade aeróbica, a flexibilidade, a composição corporal, a força muscular e
a resistência muscular. Já os componentes da aptidão física relacionados à
performance são: agilidade, coordenação, equilíbrio, potência e tempo de
reação.
126
exercício, além de caracterizar baixa aptidão física, também pode ser sintoma
de doenças graves como distúrbios cardiovasculares, por exemplo.
Em fisiologia do exercício, existe um método para aferir e mensurar a
capacidade cardiorrespiratória através do consumo máximo de oxigênio, que
possibilita quantificar esse gasto durante um exercício de intensidade máxima.
A potência aeróbica máxima, dada pelo símbolo VO2máx, é determinada pela
“maior taxa de consumo de oxigênio possível de ser atingido durante o
exercício máximo ou exaustivo” (WILMORE & COSTILL, 2001 apud
HARTMANN el al., 2016)11, sendo um “fator de importância na definição do
ritmo ou da intensidade do exercício que o indivíduo pode suportar”
(HARTMAN et al.,, 2016)12.
1.2 Flexibilidade
127
reabilitação de problemas posturais e lesões, especialmente nas regiões
lombar e dorsal.
128
consequentemente previne a osteoporose (BOUCHARD et al.,, 1994 apud
GLANER, 2003)19.
O processo de ganho de força provoca algumas respostas fisiológicas,
tais como hipertrofia20, adaptações neurais e alterações bioquímicas. Com um
programa de treinamento bem planejado21 é possível aprimorá-la e colher os
benefícios para a saúde global e/ou para a performance, se for o caso, como
por exemplo, redução da gordura corporal e aumento da massa magra. Dentre
as inúmeras alternativas, podem ser realizados com a mesma eficiência tanto
os exercícios com carga externa ou somente com o peso corporal.
1.6 Agilidade
129
de acidentes, exercendo influência positiva no processo de envelhecimento do
indivíduo. Notadamente, a prática regular de atividade física apresenta
excelente meio para desenvolver esta capacidade física.
A agilidade pode ser examinada de forma global, compreendendo a
agilidade geral, ou seja, do corpo como um todo, ou de forma isolada,
abarcando os segmentos corporais separadamente. A primeira proporciona
maior eficiência na locomoção e na movimentação geral do corpo, enquanto a
segunda oferece maior qualidade na execução das tarefas específicas de cada
segmento.
1.8 Equilíbrio
130
Se refere à captação de informações externas e às respectivas e contínuas
respostas provenientes dos sistemas nervoso e musculoesquelético, que
permanecem em constante adaptação, garantindo o desenvolvimento da
propriocepção e a organização dos movimentos com sincronicidade e
coordenação. Pode ser classificado em dois tipos: estático e dinâmico.
1.9 Potência
131
forma funcional quanto estrutural, os sistemas orgânicos do indivíduo
submetido ao treinamento esportivo.
Segundo Tubino (1984)25, são cinco os Princípios do Treinamento
Esportivo:
• O Princípio da Individualidade Biológica estabelece que cada pessoa é
um ser individualizado, logo não existem pessoas iguais. Nesse sentido, o
estímulo aplicado terá um efeito diferente em cada corpo. Portanto, para um
treinador, é importante aproveitar as respostas individuais do atleta para
incrementar sua performance através da prescrição mais adequada para
atender suas características.
• O Princípio da Adaptação trata das mudanças biológicas, funcionais e
estruturais que acontecem em decorrência do treinamento. O desequilíbrio
provocado pelo estresse fisiológico faz com que o corpo automaticamente
procure reorganizar suas funções metabólicas em busca da homeostase.
Como resposta a este estímulo, cria-se uma condição favorável para o
progresso do condicionamento físico e do rendimento do atleta.
• O Princípio da Sobrecarga pressupõe a variação de carga como
determinante para a evolução do treinamento. Como visto anteriormente, após
a aplicação de um estímulo, o corpo reage no sentido de recuperar a
homeostase. Ao encontrar esse ponto de “conforto”, a sobrecarga aplicada
anteriormente pode não mais exercer o efeito desejado no treinamento e com
isso o atleta pode ser prejudicado na progressão dos níveis de performance.
• O Princípio da Continuidade institui a necessidade na constância do
treinamento por um determinado período ideal para cada preparação, para que
as capacidades físicas sejam desenvolvidas de forma satisfatória. Este interage
bastante com o Princípio da Adaptação, visto que, como não há adaptação
sem treinamento contínuo. Logo, para alcançar os resultados desejados, o
treinador deve trabalhar a periodização do atleta conjugando os estresses
metabólicos provocados pelo treinamento e pela sobrecarga com um período
proporcional de recuperação.
• O Princípio da Interdependência Volume-Intensidade esclarece a
relação inversamente proporcional entre volume e intensidade, prevendo que o
aumento em uma dessas variáveis provocará a diminuição da outra, e vice-
versa.
132
Atualmente, alguns autores reconhecem ainda, a influência de mais
quatro princípios:
• O Princípio da Especificidade norteia as questões acerca das
características particulares de cada esporte, considerando que o resultado será
mais facilmente alcançado com exercícios que tenham alguma similaridade e
promovam melhora na performance do atleta. Vale ressaltar que tal
similaridade não está atrelada à reprodução do gesto desportivo em si, mas
sim em atingir um ponto de rendimento ótimo através de um trabalho conjunto
das qualidades físicas necessárias com o sistema energético predominante e
as coordenações psicomotoras, assim como o segmento corporal envolvido na
atividade.
• O Princípio da Reversibilidade está intimamente ligado aos princípios
da continuidade e da adaptação, pois revela que a interrupção ou redução
drástica do nível de treino leva a uma perda significativa dos ganhos adquiridos
na performance. Ao deixar de receber os estímulos do treino, o organismo
entende como obsoletos aqueles ajustes funcionais conquistados e passa a
eliminá-los gradativamente.
• O Princípio da Variabilidade questiona a eficiência de um treino a partir
de um determinado tempo de execução, por duas razões. Primeiro porque após
algumas sessões da mesma série de exercícios, aquele treino já não faz mais
o mesmo efeito sobre o corpo do atleta, respeitando o Princípio da Adaptação.
Segundo porque o Princípio da Variabilidade se fundamenta na ideia de
treinamento físico integrado, em que se procura trabalhar o corpo do indivíduo
em sua totalidade, o mais completo possível, o que só é conseguido com
variedade de estímulos atingindo todos os sistemas energéticos e
desenvolvendo diversas capacidades físicas.
• O Princípio da Saúde está ligado à importância da atividade física para
a saúde do indivíduo e é fundamentado na interdisciplinaridade, sendo visto
como princípio norteador, já que a manutenção da saúde deve ser primordial
dentre os objetivos relacionados à prática de exercícios.
Tubino (1984)26 salienta que os princípios se “inter-relacionam em todas
as suas aplicações”, o que Gomes da Costa (1996)27 chamou de Princípio da
Inter-relação dos Princípios, que expressa o caráter integrado da orientação
destes princípios dentro do treinamento e de sua aplicação prática no dia-a-dia
133
do atleta no sentidodeatingir os pontos de performance desejados dentro do
período programado, com a maior eficiência28possível. Ao tratar das Leis e
Regras da preparação desportiva, Matveev (1991, ApudGomes, 2009)29
esclarece que esses são os princípcios norteadores da educação física, pois o
desenvolvimento motor está associado à alternância de cargas, intervalos de
descanso, construção cíclica de sessões e orientação adaptável a diferentes
obejtivos. Durante todo o ciclo, o corpo do atleta vai receber a variação de
estímulos e o organismo vai trabalhar no sentido compensatório a fim de
retornar à homeostase e, assim, responder às demandas fisiológicas. Cabe ao
treinador regular todas as variáveis do treinamento para que essa
compensação não chegue a um nível excessivo a ponto de provocar sintomas
de supertreinamento.
134
indivíduo, aqueles que apresentarem alguma aptidão esportiva, recebam um
treinamento maisespecializado.
Amparado pela Síndrome Geral da Adaptação30, o planejamento
esportivo de alto rendimento começa então a tomar forma, sendo descrito
pela variação ondulatória das cargas e é dividido em três fases:
• Preparação
Neste período devem ser implementadas as estratégias para que o
indivíduo atinja a sua melhor forma física. Matveev sugere que essa fase seja
dividida em duas etapas: a preparação geral, quando o haverá predominância
do volume sobre a intensidade e o foco será no componente geral do
treinamento, sendo trabalhadas as valências físicas requisitadas para as
necessidades do indivíduo, tais como força, resistência, potencia, agilidade,
flexibilidade, etc; e a preparação específica, quando a intensidade predomina
em relação ao volume, as habilidades técnicas são enfatizadas e o treinador
trabalha as características físicas específicas para atender à pratica do
esporte, combinadas com estratégias e táticas que o favoreça, quando for o
caso.
• Competição
É nesse período que o atleta atinge o pico de performance. O corpo do
indivíduo já se encontra pronto para o esporte, com nível máximo de
desempenho. Aqui a relação volume x intensidade tende a estabilizar, porém
em períodos competitivos de longa duração, podem sofrer pequenas
oscilações ondulatórias para evitar a perda de treinabilidade, dando pequenos
estímulos para que o corpo continue reagindo positivamente à progressão de
cargas, sempre com cuidado para não sobrecarregar o organismo do atleta.
• Transição
Período de restauração do organismo entre macrociclos, no qual deve
ser proporcionada uma recuperação tanto física quanto psicológica. Prioriza-
se o descanso ativo como forma de evitar que o efeito acumulativo se traduza
em supertreinamento, ao mesmo tempo em que oferece manutenção ao nível
de treino a fim de reiniciar novo ciclo com mais preparo que o ciclo anterior. É
um excelente momento para tratar lesões e avaliar os resultados da
temporada anterior, assim como realizar trabalhos com intuito de melhorar a
mobilidade e a flexibilidade do atleta.
135
3.2 Modelo modular
136
competição. Aqui os mecanismos do processo de adaptação – tais como
controle de volume e intensidade – são ativados, com destaque para a
especialização morfológica e funcional do organismo e para adaptação ao
treinamento.
• Bloco B
Enfoque na preparação técnico-tático, com aumento gradual – porém
significativo – da intensidade de carga da atividade competitiva, redução do
volume, combinada com a assimilação da capacidade de utilizar o potencial
locomotor para a execução dos exercícios específicos.
• Bloco C
Conclusão do ciclo, auge das adaptações orgânicas, com pico de
performance. Momento em que o indivíduo deve estar preparado levar o
organismo à sua máxima capacidade.
Este modelo foi criado por Forteza De La Rosa como uma adaptação ao
conceito pendular de Arojsev, e que propunha dar mais ênfase às cargas
específicas. Seguindo o princípio de redução das cargas gerais e aumento das
cargas específicas ao longo do processo, em cada mesociclo. De La Rosa
defende, entretanto que as cargas específicas estejam desde o início em um
nível maior do que as cargas gerais.
De La Rosa (2004)34 restaura o fundamento da diferenciação de cargas
proposto por Matveev, porém sugere a substituição dos termos “geral” e
“específico”, respectivamente, pelos conceitos de Direções Condicionantes do
Rendimento (DCR) e Direções Determinantes do Condicionamento (DDR), de
modo que as cargas da DDR serão maiores que as da DCR, seguindo o
princípio de estruturação em sinos do modelo. “O mais importante é identificar
os objetivos e as ações que são condicionantes e determinantes para a
melhora do rendimento” (apud De La Rosa, 1999, 2001b). Vários sinos podem
ser estruturados ao longo de um ano de treinamento ou em um macrociclo
(BOSSI, 2010)35.
137
3.6 Modelo de estado de rendimento prolongado
138
continuadas, porém pouco intensas, o objetivo é conservar as capacidades de
performance elevadas ao longo da temporada.
139
Nesse sistema de cargas seletivas, a exemplo do anterior
sistema de cargas em bloco, o alvo do aperfeiçoamento no treino
está nas capacidades de velocidade.
(…) No futebol moderno, o técnico tem dificuldades de prescrever
o conteúdo do treinamento, pois o calendário apresenta uma
grande quantidade de jogos em âmbito regional, nacional e
internacional que devem ser disputados com alto rendimento
devido aos sistemas utilizados na classificação.
140
proveito das capacidades motoras e técnicas somente sob o ponto de vista
específico competitiva, promovendo a máxima performance para a competição
(TAVARES JUNIOR, 2014)40. Pode ser planejado em macrociclos curtos, de
seis semanas, em esportes cujos calendários apresentam muitas provas. “Esse
sistema prevê de 4 a 9 macrociclos por temporada, de acordo com as
necessidades e especificidades de cada modalidade” (TAVARES JUNIOR,
2014)41.
A ideia geral do modelo se fundamenta na concentração de cargas
sobre capacidades específicas ou objetivos concretos de treinamento e no
desenvolvimento consecutivo de determinadas capacidades e objetivos em
blocos de treinamento especializados ou mesociclos, apresentando as
seguintes características:
• O treinamento deve iniciar-se desenvolvendo aquelas capacidades que
gerem o maior efeito residual. A fase posterior deve orientar-se no
desenvolvimento de capacidades com efeitos residuais médios tais como força
resistente e capacidade anaeróbia. O mesociclo final deve incluir as cargas de
menor efeito residual, anaeróbias aláticas, competição, etc.
• A concentração de uma determinada orientação específica de carga de
treinamento em atletas de elite é assegurada com 40 % do trabalho total. Os
60% restantes da carga do mesociclo se distribuem em cargas de diferentes
orientações, prevalecendo aquelas cujo trabalho foi realizado anteriormente.
• A distribuição racional de macrociclos no plano anual depende do
número e duração de cada um, da fase específica dentro da temporada, do
nível e do rendimento do atleta e a especificidade do esporte.
• No final de um mesociclo de desempenho, o atleta será capaz de
alcançar altos recordes, razão pela qual as competições devem ser incluídas
neste momento.
141
treinamento individualizado que atenda as características e demandas de cada
indivíduo.
4.1 Frequência
4.2 Intensidade
142
4.3 Tipo
4.4 Tempo
143
regularidade suficiente para não provocar um estado de supertreinamento e,
assim, comprometer a performance, também é importante ter em mente o
tempo real necessário para restaurar o organismo, se será necessário repouso
total ou se a recuperação ativa será suficiente, para não perder o timing da fase
de supercompensação.
Quanto aos intervalos intra-sessões, a medida em que o atleta vai
apurando suas capacidades físicas, a necessidade de intervalos vai se
reduzindo, visto que as fontes de energia conseguem se restabelecer com mais
rapidez, e os mesmos podem ser programados com menos frequência e
menos tempo, sem provocar fadiga e sem comprometer sua recuperação. Para
tanto, é interessante realizar avaliações periódicas para programá-los de forma
eficiente.
144
das capacidades adaptativas do desportista, ou seja, aquelas às
quais ele é capaz de se adaptar sem ter índices de tensão
excessiva, ou de supertreinamento. A partir disso, as cargas
elevadas adquirem o controle minucioso de seu efeito
acumulado, o fato de determinar, segundo seus índices, as
tendências do desenvolvimento da preparação desportiva e de
corrigir (enquanto surgir a necessidade) a carga somada em
várias sessões ou semanas de treinamento para evitar tal estado,
resultado do supertreinamento.
145
paralelamente à diminuição no tempo do nível de cargas que
foram acrescidas com a atividade principal. Em primeiro lugar,
isso é necessário para excluir a transformação do efeito
acumulado das cargas crônicas47no estado de treinamento
excessivo e em outros fenômenos parecidos, para não entrar em
contradição perigosa com as possibilidades adaptativas do
organismo, para facilitar a evolução dos processos adaptativos
no estágio de “adaptação estável” e para garantir, com isso, as
condições para assimilação dos novos parâmetros das cargas de
treinamento para o desenvolvimento no mesociclo seguinte.
Assim, a dinâmica está coordenada com as regras da
transformação da acumulação das cargas preparatórias a longo
prazo, no efeito do incremento dos resultados desportivos.
146
levar à estagnação da evolução dotreinamento.
Cabe ressaltar aqui que, de acordo com o Princípio da Interdependência
Volume-Intensidade, o volume de treinamento é inversamente proporcional à
intensidade. Portanto, o alcance do estado ótimo de desenvolvimento da
treinabilidade implica no equilíbrio adequado entre as duas variáveis.
7. CONCLUSÃO
147
REFERÊNCIAS
1
BOMPA, Tudor O. Periodização: teoria e metodologia do treinamento. 4a ed.
São Paulo: Phorte, 2002. p. 3.
2
GOMES, A. C. Treinamento desportivo: estruturação e periodização. 2a ed.
Porto Alegre: Artmed,2009. p. 20.
3
Tradução livre do original: “The overtrainng syndrome describes a chronic
imbalance between training and recovery in athletes with accumulation of fatigue,
diferente physical and psychological symptoms and performance incompetence
over weeks and months. It has to be differentiated from short-term overtraining
(over-reaching) and local muscular overstrain”. p. 233. Aqui o autor trata de fadigas
musculares de forma pontual. Ver mais em LEHMANN, M et al., Training –
Overtraining: performance, and hormone levels, after a defined increase in training
volume versus intensity in experienced middle- and long-distance runners. Br J
Sports Med, 1992 26: 233-242.
4
GOMES, A. C. op. cit, loc. Cit.
5
TUBINO, M.; MOREIRA, S. B. Metodologia do treinamento desportivo. 1a ed.
Rio de Janeiro: Shape, 2003. p. 86.
6
SALO, D.; RIEWALD, S. A. Complete Conditioning for Swimming. Illinois:
Human Kinetics, 2008. p. 187.
7
Ibidem.
8
AMERICAN COLLEGE OF SPORTS MEDICINE. Diretrizes do ACSM para os
testes de esforço e sua prescrição. 9a Ed. Rio de Janeiro: Guanabara, 2014. p.
19.
9
ARAUJO, Denise S. M. Soares de; ARAUJO, Claudio G. S. de. Aptidão física,
saúde e qualidade de vida relacionada à saúde em adultos. Rev Bras Med
Esporte, Niterói, v. 6, n. 5, p. 194-203, Oct. 2000.
10
HARTMANN, C. et al.,, Capacidade Cardiorrespiratória. The FIEP Bulletin,
Maceió, v. 86, p.27-30, 2016. p. 27.
11
Ibidem.
12
Ibidem. p. 28.
13
GLANER, M. F. Importância da aptidão física relacionada à saúde. Revista
Brasileira de Cineantropometria e Desempenho humano, Florianópolis, v.5,
n.2, p.75-85, 2003.
14
Ibidem.
15
MINATTO, G. et al., Idade, maturação sexual, variáveis antropométricas e
composição corporal: influências na flexibilidade. Revista Brasileira de
148
Cineantropometria e Desempenho Humano, Florianópolis, v. 12, n. 3, p. 151-
158, Jun. 2010
16
MATSUDO, S. M. et al., Impacto do envelhecimento nas variáveis
antropométricas, neuromotoras e metabólicas da aptidão física. Rev. Bras. Ciên. e
Mov., Brasília, v.8, n. 4, p 21-32, Set., 2000.
17
BARBANTI, V. J. Teoria e prática do treinamento esportivo. 2a ed. São
Paulo: Blücher, 1997. p. 5.
18
GLANER, M. F. op cit. p. 81.
19
Ibidem.
20
O treino resistido provoca microlesões no tecido muscular que
desencadeiam um processo inflamatório no tecido conjuntivo e resulta na
chamada “dor muscular tardia”, que é a sensação de desconforto muito
comum após a prática de exercícios.
21
Mais adiante veremos que o princípio da sobrecarga é o que deve
prioritariamente ser levado em consideração no que diz respeito ao
treinamento visando o desenvolvimento de força.
22
AMERICAN COLLEGE OF SPORTS MEDICINE. Diretrizes do ACSM para os
testes de esforço e sua prescrição. 9a Ed. Rio de Janeiro: Guanabara, 2014. p.
26.
23
Ibidem.
24
DAL PUPO, J. et al., Potência muscular e capacidade de sprints repetidos em
jogadores de futebol. Rev. Bras. Cineantropom. Desempenho Hum.,
Florianópolis, v.12, n. 4, p. 255-261, Ago., 2010.
25
TUBINO, Manoel José Gomes. Metodologia científica do treinamento
desportivo. 3a edição. São Paulo: Ibrasa, 1984.
26
Ibidem. p. 104.
27
COSTA, Marcelo Gomes da. Ginastica localizada: grupos heterogêneos. Rio
de Janeiro: Sprint, 1998. p. 21.
28
Como eficiência, aqui, entende-se o alcance do máximo de resultados com o
mínimo de risco possível para o atleta, evitando desgastes fisiológicos
desnecessários.
29
GOMES, A. C. op cit. p. 22-24.
30
O Princípio Geral da Adaptação é definido como um complexo de alterações
orgânicas que ocorrem durante ocasiões de estresse e obtém um
procedimento de resposta padrão, que acontece em três fases: a fase de
alerta (quando o indivíduo tem contato com o estímulo estressor), a fase de
resistência (quando o corpo reage no intuito de retornar à homeostase) e fase
149
de exaustão (quando o estímulo estressor desencadeia comprometimento
físico).
31
O professor cubano Forteza De La Rosa, seguidor do modelo de Arosjev,
propôs uma adaptação à estrutura pendular, conforme veremos adiante.
32
LIMA PAULO, Luiz Fernando de. Treinamento desportivo: da saúde e
emagrecimento ao alto rendimento. Timburi: Cia do E-book, 2015. p. 40.
33
O formato em três blocos é estabelecido via de regra, entretanto podendo
variar. Em alguns casos específicos, o treinador pode criar subdivisões em
cada ciclo que determinem maior quantidade de blocos, ou até mesmo
reduzindo para dois blocos, caso haja necessidade para o objetivo do atleta.
De uma forma geral, o bloco C se apresenta em todos os ciclos, favorecendo o
rendimento máximo doatleta.
34
O nome sugerido para o modelo se deve ao fato de que quando disposto em
gráficos, as curvas de evolução da DCR e da DDR se apresentam em formato
de sino. Ver mais em DE LA ROSA, A. F. Treinar para ganhar. 1a Ed. São Paulo:
Phorte Editora, 2004.
35
BOSSI, L. C. P. Treinamento funcional para mulheres: força, potencia e
agilidade. 1a ed. São Paulo: Phorte, 2014. p. 51.
36
GOMES, A. C. op cit.p. 220.
37
Ibidem. 185- 222.
38
Ibidem p. 91-148.
39
THIENGO, C. R. et al., Efeito do modelo de periodização com cargas seletivas
sobre capacidades motoras durante um mesociclo preparatório em jogadores de
futsal. Revista Brasileira de Ciências do Esporte, Porto Alegre, v. 35, n. 4, p.
1035-1050, Dec. 2013.
40
JUNIOR, A. C. T. A formação profissional e a aplicação dos modelos de
periodização do treinamento desportivo, por treinadores de judô de atletas
de elite. 2014. 81f. Dissertação (Mestrado em Ciências da Motricidade) –
Universidade Estadual Paulista, Rio Claro, SP, 2014.
41
Ibidem. p. 80.
42
GOMES, A. C. op cit. p. 23.
43
Ibidem. p. 27.
44
Deload é a fase do treinamento em que o volume e a intensidade são
reduzidos sobremaneira a fim de proporcionar um tempo maior de descanso
entre os ciclos e a consequente recuperação do organismo. O deload pode ser
programado na forma de descanso ativo ou passivo.
45
GOMES, A. C. op cit. p. 29.
150
46
Ibidem. 29-31.
47
O conceito de cargas crônicas está ligado ao nível de condicionamento do
atleta e é medido entre a 3a e a 6a semana anteriores à ocorrência de cargas
agudas (relacionadas à fadiga). Esta relação tem sido bastante utilizada como
parâmetro avaliativo por preparadores em diversas modalidades esportivas,
tanto para aumento de performance quanto para controle e prevenção de
lesões. Ver mais em Hulin, B. T., Gabbett, T. J., Lawson, D. W., Caputi, P., &
Sampson, J. A. The acute:chronic workload ratio predicts injury: high chronic
workload may decrease injury risk in elite rugby league players. British
Journal of Sports Medicine, 50(4), 2015. p.231–236.
48
GOMES, A. C. op cit. p. 42-47.
49
GENTIL, P. Bases científicas do treinamento de hipertrofia. 5a ed. São Paulo:
Martins Fontes, 2014. p. 138.
151
CUSHION, E. et al., A process for error correction for strength and conditioning
coaches.Strength Cond J., v. 39, n.6, p.84-92. Dec. 2017.
152
HOMRICH, L. M. (Org.) Caderno de referência do esporte: fisiologia do
exercicio. Vol. 2. Brasília: Fundação Vale, Unesco, 2013.
153
ROSA, R. P. Preparação física no futebol: seletividade e aplicação das cargas
durante o período competitivo. 2010. 49f. Monografia (Bacharelado em
Educação Física) – Departamento de Educação Física da Universidade Federal do
Rio Grande do Sul, 2010.
154
CAPÍTULO 12
TÓPICOS ESPECIAIS: METABOLÔMICA
155
A Metabolômica é uma abordagem que parte do entendimento de que a
ocorrência de cada metabólito em um organismo é dinâmica, de modo que
apenas faz sentido a aplicação desta abordagem quando se comparam grupos
de fenótipos diferenciados. Esta é diferente de uma abordagem reducionista,
onde é estudada apenas a variação de concentração de um ou poucos
metabólitos e seu efeito.
Por se tratar de uma comparação entre resultados obtidos a fim de
desenvolver maior entendimento sobre o sistema estudado, a avaliação
estatística se faz necessária para que o resultado propriamente dito seja de
fato confiável. Por sua vez, para a avaliação estatística de um resultado é
necessário que o experimento seja realizado de forma planejada com um
número de amostras replicadas, suficiente para uma conclusão de qualidade
satisfatória. De forma mais técnica, visando um entendimento mesmo que
basal, vamos descrever a abordagem Metabolômica desde o planejamento do
estudo até o tratamento dos dados. Lembramos que a etapa de maior
importância é a interpretação dos dados obtidos, logo, ao se planejar um
estudo de tamanha abrangência, a confiança nos dados obtidos deve ser
considerada. Tal confiança será refletida nos parâmetros de significância
estatística encontrados. Vamos listar aqui algumas definições fundamentais
enquanto descrevemos a abordagem. Por fim, esperamos que o leitor tenha
adquirido uma visão mais crítica sobre as etapas de planejamento de um
experimento e as conclusões passíveis de serem atingidas por estes.
156
musculares e renais, leucócitos), inclusive aquele lactato, a interpretação será
condizente com todas as respostas obtidas ao mesmo tempo. Neste caso, a
distribuição das respostas em relação à distinção das amostras indicará quais
são aquelas mais relevantes, positiva ou negativamente, e ANOVA não será
mais a técnica estatística de escolha. Note que todo sistema complexo requer
uma avaliação multivariada e, para isso, técnicas que permitam a detecção dos
parâmetros necessários.
Como exemplo mais comum, podemos citar aqui a avaliação de um
exame de sangue de um paciente por um médico. Neste exemplo, o médico
não vai considerar apenas a taxa de leucocitose para sugerir um diagnóstico
positivo de infecção, mas também de Velocidade de Hemossedimentação, de
proteína C reativa e de desidrogenase láctica, que são marcadores clínicos de
inflamação. Neste caso, o médico está promovendo uma análise multivariada
intuitiva de dados quantitativos produzidos pela análise do plasma. Este é um
procedimento comum que todos nós já fizemos e ainda faremos muitas vezes.
Menos comum e encaminhado por grupos de pesquisas mais específicos,
podemos citar uma análise com cromatografia líquida de alta eficiência ligada a
espectrometria de massas (LC-MS, do inglês liquid chromatography coupled
with mass spectrometry) de amostras de plasma considerando todos os sinais
detectados para o melhor entendimento da evolução de um câncer, por
exemplo. Neste caso, cada ponto dos resultados analíticos (em muitos casos
atingindo centenas ou milhares de pontos) produzidos é uma variável, cada
intensidade de cada ponto é uma resposta e o estudo vai considerar todas as
respostas de uma vez.
157
grupo, os biomarcadores1. Em geral, análises-alvo são feitas com resultados
quantitativos de concentrações calculadas em relação a uma curva de
calibração e com procedimento devidamente validado seguindo documentação
indicada. Por outro lado, análises não-alvo desconsideram a expectativa de um
biomarcador definido e tem como objetivo intrínseco a produção de dados para
construção de hipóteses. Neste caso, a análise é feita de modo qualitativo e as
concentrações obtidas são apenas relativas à concentração total do que foi
detectado.
Seguindo os exemplos anteriores, a análise do hemograma pelo médico
pode ser classificada como análise-alvo e aquele estudo encaminhado pelo
grupo de pesquisa para criação de uma hipótese sobre a ocorrência de um
câncer, uma análise não-alvo. Observe que métodos quantitativos são
utilizados em análises-alvo e puramente qualitativa em análises não-alvo.
3. PCA
1
Biomarcadores são aquelas substâncias apontadas experimentalmente (ou por expectativa
baseada em dados prévios) responsáveis por uma classificação distintiva entre dois ou mais
grupos estudados. Por exemplo, se o lactato é visto como indicação de treinamento intenso,
podemos dizer que o lactato é um biomarcador; eventualmente, um estudo tem mais do que
um único biomarcador.
2
Métodos não-supervisionados em estatística são aqueles onde os grupos não são
previamente classificados. Logo, supervisionados são aqueles onde as informações de
classificação são consideradas para o desenvolvimento. Por exemplo, em um método não-
supervisionado, nós não diríamos que as amostras pertencentes ao grupo A ou ao grupo B; tal
informação poderia ser obtida como parte do resultado do próprio método.
158
ele não produz nenhum dado de significância estatística para o agrupamento
observado.
Figura 1: Representação esquemática da redistribuição das amostras em novos eixos (PC’s)
observando os maiores valores de variância.
Fonte: O autor.
4. PLS
Fonte: O autor.
159
5. AMOSTRAGEM
3
O poder estatístico é a probabilidade de se detectar um efeito, desde que ele de fato exista.
160
conhecido é power analysis)5. Dois grupos bem distintos irão requerer um
número de réplicas menor para distinção entre eles, e vice-versa. A forma mais
indicada de se prosseguir seria realizar um estudo-piloto com um número
reduzido de amostras e utilizá-lo para calcular a medida de confiança do
método em destacar o efeito estudado. O cálculo do poder estatístico nos dirá
o poder do estudo-piloto e o número de amostras necessárias para se atingir
um poder satisfatório (em geral, maior do que 0,8) para garantir significância
estatística. Por exemplo, se um estudo que compara dois grupos apresenta um
poder estatístico de 0,8, é esperado que em 80 % dos outros estudos iguais
atinjam um resultado tão significativo quanto o original. Podemos então dizer
que o poder estatístico é resultado de (1) tamanho do efeito estudado, (2) o
grau de confiança estabelecido para significância estatística (valor de p) e (3)
número de amostras. Certamente, a disponibilidade de indivíduos estudados
assim como o custo do experimento irá limitar o poder estatístico. Dessa forma,
a definição do número ideal de réplicas deverá ser parte do planejamento do
estudo e o poder estatístico deverá ser documentado junto ao resultado
analítico.
Todas as amostras coletadas devem ser organizadas de forma aleatória
para evitar possíveis efeitos de bloco4. E amostras de controle de qualidade
devem sempre ser utilizadas6. Amostras-branco devem ser adicionadas em
intervalos regulares de amostras para controle do procedimento de extração e
brancos técnicos (ou de análise) devem ser posicionados em intervalos
maiores para controle das condições analíticas. Ainda, amostras combinadas
com 10-20 % de cada amostra original de cada grupo também devem ser
analisadas conjuntamente para validação da diferenciação dos grupos e
verificação dos procedimentos de preparo de amostra e analíticos7.
4
Efeitos de bloco são resultado de tendências, em grande parte, do preparo de amostra em
variações não biológicas.
161
chromatography coupled with mass spectrometry) e a (2) ressonância
magnética nuclear (RMN ou NMR, do inglês nuclear magnetic resonance).
CL-EM: Certamente, a CL-EM é a técnica analítica mais utilizada em
metabolômica e análise de perfil químico de amostras8. Trata-se de uma
técnica que usa um fracionamento cromatográfico ligado a uma detecção em
espectrometria de massas (EM). Diferentes configurações podem ser
adquiridas e a escolha deverá ser feita à luz do objeto que se deseja estudar e
do investimento previsto. Vamos descrever a técnica de modo geral para
entendimento didático apenas.
A EM é a técnica analítica de maior sensibilidade desenvolvida até o
momento, e tem como característica fundamental a separação de moléculas
conforme suas massas moleculares sob o valor de razão massa-carga (m/z);
quando a carga (z) é igual a 1, o valor de m/z reflete o valor da massa
molecular detectada. Com o objetivo de estudar amostras de urina e/ou
plasma, esta descrição será direcionada ao uso da cromatografia em fase
líquida e da aplicação da interface tipo eletronebulização (ESI, do inglês
electrospray). Então, a amostra injetada no espectrômetro será ionizada pela
técnica ESI e um potencial eletrônico (e de pressão reduzida) direcionarão e
acelerarão os íons para o interior do EM onde está o analisador. Um
instrumento de EM pode ser setorizado em quatro partes: (1) interface ou fonte
de íons; (2) analisador(es); (3) detector; e (4) controle e processamento dos
sinais adquiridos8.
A ionização em ESI ocorre via protonação5 (em modo positivo) ou
desprotonação (em modo negativo) durante a passagem da amostra por um
capilar carregado com voltagem oposta à entrada do EM. Note que em ESI, a
ionização ocorre na fase líquida tal como uma reação tipo ácido-base Brönsted-
Lowry (protonação/desprotonação) e/ou como via mecanismo de Lewis
(formação de adutos)9. A formação de espécies não radicalares de baixa
energia caracteriza a ESI como sendo uma técnica branda onde a
fragmentação na interface tende a não acontecer6; diferente de sistemas de
ionização eletrônica onde a fragmentação na fonte de íons é regra. A
5
A formação de outros adutos além do aduto de H+ é bem conhecida. Adutos de Na+ e de K+
são os segundo e terceiro mais comuns.
6
Em algumas ocasiões tal fragmentação na interface pode acontecer, mas estas são menos
comuns e indesejáveis e, muitas vezes, resultado de parâmetros de voltagens muito altos.
162
nebulização ocorre com auxílio de gazes para a formação de um aerossol com
gotículas que serão reduzidas por evaporação (o termo dessolvatadas7 é
utilizado) por aplicação de calor no compartimento local. Eventualmente, as
gotículas serão secas e as espécies ionizadas estarão suspensas, estas serão
direcionadas para dentro do compartimento do(s) analisador(es).
O analisador é a parte responsável pela separação dos íons de acordo
com seus valores de m/z. Diferentes analisadores estão disponíveis
comercialmente e a capacidade de resolução e acurácia são os parâmetros de
maior importância e de maior efeito no custo do instrumento8. Ainda, podemos
utilizar instrumentos de EM sequencial (EMn), onde a configuração do
analisador é mais complexa com dois os mais analisadores em sequência para
fragmentação selecionada.
Vamos usar o caso mais comum para explicitar um instrumento de EM2,
o triplo-quadrupolo. Com este, podemos seguir um tipo de análise que nos
permite analisar fragmentos moleculares de espécies únicas selecionadas. No
primeiro quadrupolo, podemos selecionar uma espécie ionizada pela sua m/z,
excluindo todas as outras. No segundo quadruplo, podemos aumentar a
voltagem e, com isso, aumentar a energia cinética da espécie selecionada
levando a fragmentação molecular. E no terceiro quadrupolo, podemos analisar
os fragmentos característicos daquela espécie selecionada. Considerando que
uma substância pode ser caracterizada pela sua massa molecular e por seus
fragmentos característicos, a EM2 nos leva a identificação de substâncias
conhecidas com relativa facilidade.
Fonte: O autor.
7
Dessolvatadas: termo técnico para fazer referência à evaporação de solventes em uma
gotícula.
163
Não menos importante, o fracionamento cromatográfico prévio a EM
garante uma redução de um efeito indesejável de supressão iônica e leva a
uma análise de EM mais limpa. Como resultado prático, temos um ganho de
sensibilidade e seletividade quando usamos sistemas de CL-EM.
RMN: A espectroscopia por RMN ocorre a partir da atividade de um
campo magnético externo à amostra responsável pela degeneração de dois ou
mais níveis de energia de um núcleo ativo (Figura 4). A saber, aqueles núcleos
com número de spin igual a ½ apresentam 2 níveis de energia degenerados
quando submetidos a um campo magnético externo. Os núcleos mais comuns
de serem observados para estudos tipo metabolômica são 1H (isótopo do
13
hidrogênio de massa atômica 1) e C (isótopo do carbono de massa atômica
13). Na RMN, cada substância apresenta um número de sinais
correspondentes ao número de spins não equivalentes quimicamente
detectados de modo que uma substância com três 1H não equivalente mostrará
três sinais diferentes. Ainda, caso estes estejam a 2 ou 3 ligações de distância
entre si, eles compartilham um fenômeno de acoplamento escalar homonuclear
(nJHH, n=1,2,3 ou 4) que leva a divisão dos sinais em dupletos sequenciais
conforme o número de interações. Se por um lado moléculas mais complexas
podem ter espectros com muitos sinais e difíceis de serem interpretados, essa
complexidade é característica daquela molécula tal como uma seletividade
inequívoca; uma impressão digital.
A maior desvantagem da RMN é sua inerente baixa sensibilidade. Essa
limitação é resultado da pequena diferença de energia entre os estados de
energia o que leva a um excesso muito pequeno de spins no nível de menos
energia segundo a distribuição de Boltzmann. Essa diferença de energia é
resultado direto da potência do campo magnético externo, mas mesmo em
instrumentos mais potentes de 28 Tesla (ou 1200 MHz em 1H)8 a sensibilidade
ainda é uma questão a ser resolvida. Entretanto, como o número de spins
magneticamente ativos é relacionado com a intensidade dos sinais, ou melhor,
um sinal de uma substância é relacionado com a quantidade molar dela na
amostra. Dessa forma, uma quantificação relativa entre as substâncias
presentes em uma amostra pode ser obtida diretamente via integração de
8
28 Tesla é a potência do instrumento de RMN mais potente já construído (2019).
164
sinais característicos de spins de suas estruturas. O potencial da RMN como
ferramenta quantitativa em metabolômica é reconhecido como sendo uma
vantagem10, principalmente, para casos onde não há padrões disponíveis para
quantificação por CL-EM.
Fonte: O autor.
165
autores, as vias mais relevantes relacionadas ao metabolismo energético
corroboram seus achados e justificam diferentes níveis de aptidão física entre
homens jovens sedentários assintomáticos12.
Além de estudos observacionais sobre perfis metabolômicos que
caracterizam diferentes populações quanto ao nível de condicionamento,
também é possível destacar pesquisas sobre os efeitos agudos e crônicos do
exercício. Para comparar as mudanças metabólicas induzidas por diferentes
níveis de aptidão, Schader et al.,, (2020) investigaram o plasma de 76
corredores adultos, com idade entre 33 e 51 anos, antes e após uma
maratona13. Os autores verificaram que o exercício prolongado está associado
a uma perturbação nas concentrações de metabólitos plasmáticos, que é maior
em corredores com menor condicionamento aeróbio13. Outro estudo agudo,
com 30 jogadores de futebol profissional do sexo masculino, investigou os
metabólitos do sangue e urina antes e após uma partida, revelando que a
hipoxantina e seus produtos relacionados foram regulados positivamente na
urina, sugerindo que a desaminação do monofosfato de adenosina estava
aumentada14.
Quanto ao efeito crônico em variáveis metabolômicas, Sakaguchi et al.,
(2020) submeteram 28 ciclistas, com idade entre 20 e 40 anos, a diferentes
intensidades de treinamento muscular respiratório, de forma randomizada,
durante 11 semanas15. Os autores verificaram uma melhora geral da força
muscular inspiratória, entretanto, essa mudança não foi acompanhada de
alterações significativas de metabólitos sanguíneos15. Apesar de relevante, o
treinamento de músculos respiratórios, por si só, não ajuda a explicar as
importantes e necessárias alterações fisiológicas relacionadas ao
desenvolvimento da aptidão cardiorrespiratória. Empregar métodos de
treinamento que estimulem as diferentes vias e rotas energéticas (“aeróbicas” e
“anaeróbicas”) continua sendo essencial nesse contexto. Certamente, futuros
estudos proporão discussões mais robustas, permitindo conclusões objetivas e
práticas.
Em 2020, uma revisão sobre o estado da arte nesse assunto sinalizou
possibilidades de investigações para as ciências do exercício e esporte no
mundo11. Dentre elas, destacam-se o efeito crônico de atividades físicas
diversas, possíveis diferenças entre sexos, influências do estado de saúde e
166
condições patológicas, papel do estilo de vida, integração com outras áreas
ômicas e aplicabilidade prática11. Outras perspectivas envolvem o
aprofundamento da temática na compreensão das características femininas,
resultados estratificados, quando apropriados, por etnia e nível
socioeconômico, além das próprias validações metodológicas e protocolares
envolvendo as atividades físicas entre diferentes populações11.
Se você é entusiasta do movimento humano, aguarde as cenas dos
próximos capítulos científicos!
167
REFERÊNCIAS
168
Performance: A Substudy of the Enzy-MagIC Study. Metabolites, v. 10, n. 3,
Mar 01 2020. ISSN 2218-1989. Disponível em:
<https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/32121570 >.
169
Agência Brasileira ISBN
ISBN: 978-65-81028-24-4