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EU, UMA FICÇÃO?

Antigamente, mulheres foram vítimas de opressão, retiradas do direito de escolher o seu


próprio destino, vistas como loucas, histéricas, simplesmente por buscarem o diferente
daquilo que a sociedade determinou como “papel da mulher”.

Não que hoje em dia algo tenha mudado de fato, ainda existe uma forte linha de pensamento
que determina que mulheres não possam fazer certas coisas por serem mulheres, algumas
continuam no papel de esposa, mãe, dona de casa, cuidadora. E não, todas essas coisas não
são fáceis de se lidar diariamente, por exemplo, penso que ser mãe é uma das coisas mais
trabalhosas do mundo, e inclusive, para a maioria das mulheres não existem pais presentes
ativamente na criação dos filhos, nas tarefas do dia a dia e na rede de apoio.

Durante muito tempo fui ensinada de que o meu papel seria dentro de casa, arrumando,
cuidando, resolvendo, etc. Nunca existiu esse tipo de cobrança pro meu irmão, por exemplo,
pra ele simplesmente não fazer nada e esperar que uma mulher faça pra ele é algo muito
comum. E o engraçado é que isso é algo tão cultural que as pessoas simplesmente não acham
errado o fato de os homens não serem designados a certas tarefas, porque dizem que são
“coisas de mulher”.

Eu acredito que essa linha de pensamento foi trazida dos nossos antepassados, e até hoje as
pessoas usam como um tipo de “verdade absoluta”. Como se as coisas simplesmente não
pudessem ser modificadas, que “se foi assim durante muito tempo, porque mudar agora?!”.

Segundo o filósofo Nietsche, não existe uma verdade absoluta, tudo que conhecemos como
verdade é a construção de um pensamento sobre aquele fato. Por exemplo, cada um tem um
ponto de vista sobre as coisas, as experiências são formadas de forma diferente, e tudo isso
contribui para construção acerca de um pensamento.

“Não será o instinto do medo que nos obriga a conhecer, porque o que é familiar é conhecido,
erro dos erros, o que é conhecido é o habitual, e o habitual é o mais difícil de conhecer, isto é,
de ver como problema, isto é, de ver como estranho, afastado, fora de nós.” (A origem do
nosso conceito de conhecimento, Nietzche, 1882).

Com base nesse trecho do livro do Nietzche, obtive uma linha de pensamento de que, os
homens acreditam e corroboram esse tipo de pensamento durante séculos, porque isso não
lhes tiram o comodismo de serem quem são. Se o pensamento de que as mulheres podem
tudo fosse “aceito” pela sociedade, os homens teriam que assumir seus próprios erros e
responsabilidades em vez de ter uma mulher para resolverem para eles, como é o habitual.

O habitual é mais fácil de ser aceito porque isso os beneficia de todas as formas, sejam na falta
de compromisso com a paternidade, relacionamentos, responsabilidade afetiva, e no apoio
dentro de casa. O habitual é confortável, cômodo, sem cobranças, sem prejuízos...

O número de mulheres na área da ciência e tecnologia ainda são minoria, porém, a cada ano
aumenta-se a procura pelos cursos de graduação nessas áreas. Quantas mulheres nós
conhecemos que são cientistas?

“A universalidade cientifica traz o homem como representante da humanidade, considerando


a mulher como uma variação humana, inferior e incapaz de ocupar esse lugar, devendo ser
representada por homem.” (Elizabete Rodrigues da Silva,” A invisibilidade das mulheres no
campo cientifico.)
Até o início do século XX, milhares de mulheres foram mutiladas e trancafiadas em manicômio,
e o motivos foram: excitamento político, más companhias, maus hábitos, leitura de romance,
fraqueza de intelecto, dentro outros absurdos...

Suely Rolnik traz em ‘Uma insólita viagem a subjetividade’ que “o viciado em identidade tem
horror ao turbilhão das linhas do tempo em sua pele. A vertigem dos efeitos do fora o
ameaçam a tal ponto que para sobreviver a seu medo ele tenta anestesiar-se: deixa vibrar em
sua pele, de todas as intensidades do fora, apenas aquelas que não ponham em risco sua
suposta identidade.”

Rolnik fala muito sobre a “Subjetividade”, mas o que seria isso? Pelo o que eu entendi, as
pessoas criam um padrão de si mesmo para que as outras comprem essa verdade. Isso
acontece muito em redes sociais, muitos modos de viver, sorrisos e momentos expostos são
apenas a idealização do que a pessoa quer que você veja, até porque, ninguém gosta de
mostrar a parte ruim da vida, todos querem ser felizes, amados, perfeitos, mas isso para que
as outras pessoas vejam. Na realidade, todos são depressivos e infelizes.

A Paula Sibilia, antropóloga e pesquisadora brasileira, cita em uma entrevista, exatamente


isso: o que somos senão um poço de aparências? Tudo hoje em dia é voltado pelo quanto você
possui, o valioso é aquilo que se pode ser mostrado, comprado, invejado. Como ser feliz sem
ter a necessidade de expor?

Nietzche fala muito sobre o medo do homem da morte, então ele procura formas de viver a
vida para que não pense muito sobre, ou existem pessoas que realmente acreditam que existe
um “paraíso” onde elas serão mais felizes.

Com base em todos esses filósofos, concluímos que de fato, a construção do pensamento se
dá a partir de uma linha inicial, e essa linha beneficia um tipo de gênero em particular, fazendo
com que a sociedade se prenda a isso como algum tipo de “verdade universal”, como se não
existisse outros direcionamentos, outras opiniões, outros caminhos. As mulheres provam
todos os dias que são muito capazes de tudo o que homem faz, e até melhor inclusive. O
caminho é entender que existe um espaço para todos, os homens podem aprender com a
mulheres, dar espaço, ouvi-las e respeitá-las acima de tudo. Só nos basta continuar lutando e
conquistando os nossos espaços todos os dias.

Espero que as meninas das próximas gerações queiram ser cientistas, engenheira,
tecnológicas...

Porque nós podemos mudar o mundo através do pensamento. O que nos resta é ter esperança
e continuar lutando!

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