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Sistema Atlas - conversor DOCX linearizado PNLD2018 - Copyright © 2017 Editorial 5


Geografia em rede, 3º ano
Edilson Adã o Câ ndido da Silva, Laercio Furquim Jú nior
FTD
Pá gina 1

Geografia em rede
3
ENSINO MÉ DIO
COMPONENTE CURRICULAR
GEOGRAFIA

Edilson Adã o Câ ndido da Silva

Mestre em Ciências (á rea de concentraçã o: Geografia Humana) pela Faculdade de Filosofia, Letras e
Ciências Humanas da Universidade de Sã o Paulo
Bacharel e Licenciado em Geografia pela Universidade de Sã o Paulo
Professor de Geografia no Ensino Médio e Superior

Laercio Furquim Jú nior

Mestre em Ciências (á rea de concentraçã o: Geografia Humana) pela Faculdade de Filosofia, Letras e
Ciências Humanas da Universidade de Sã o Paulo
Bacharel e Licenciado em Geografia pela Universidade de Sã o Paulo
Professor de Geografia das redes pú blica e particular de Sã o Paulo

2ª ediçã o
Sã o Paulo – 2016

FTD
Pá gina 2

FTD
Copyright © Edilson Adã o Câ ndido da Silva, Laercio Furquim Jú nior, 2016

Diretor editorial Lauri Cericato

Gerente editorial Flá via Renata P. A. Fugita

Editora Angela C. Di Cesare M. Marques

Editoras assistentes Rosane Cristina Thahira, Bá rbara Berges

Colaboradoras Suélen Rocha M. Marques, Carolina Bussolaro Marciano, Daniella Barroso, Leslie Sandes

Gerente de produção editorial Mariana Milani

Coordenador de produção editorial Marcelo Henrique Ferreira Fontes

Coordenadora de arte Daniela Má ximo

Projeto gráfico Casa Paulistana

Projeto de capa Bruno Attili

Foto de capa Thais Falcã o/Olho do Falcã o


Modelos da capa: Andrei Lopes, Angélica Souza, Beatriz Raielle, Bruna Soares, Bruno Guedes, Caio Freitas, Denis Wiltemburg,
Eloá Souza, Jardo Gomes, Karina Farias, Karoline Vicente, Letícia Silva, Lilith Moreira, Maria Eduarda Ferreira, Rafael Souza,
Tarik Abdo, Thaís Souza

Supervisores de arte Roque Michel Jr., Daniela Má ximo

Editora de arte Lidiani Minoda

Diagramação Lidiani Minoda, Anderson Sunakozawa, Dayane Santiago

Tratamento de imagens Ana Isabela Pithan Maraschin

Coordenadora de ilustrações e cartografia Marcia Berne

Ilustrações Tarumã , Aluísio C. Santos

Infográficos Casa Paulistana

Cartografia Allmaps, Alexandre Bueno, DACOSTA MAPAS

Coordenadora de preparação e revisão Lilian Semenichin

Supervisora de preparação e revisão Viviam Moreira

Preparação Claudia Anazawa, Iracema Fantaguci

Revisão Aline Araú jo, Carina de Luca, Claudia Anazawa, Fernanda Rodrigues, Fernando Cardoso, Lucila Segó via, Sô nia
Cervantes, Tatiana Jaworski
Coordenador de iconografia e licenciamento de textos Expedito Arantes

Supervisora de licenciamento de textos Elaine Bueno

Iconografia Enio Lopes, Rosely Ladeira, Izilda Canosa

Diretor de operações e produção gráfica Reginaldo Soares Damasceno

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)


(Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)
Silva, Edilson Adã o Câ ndido da
Geografia em rede, 3º ano / Edilson Adã o Câ ndido da Silva, Laercio Furquim Jú nior. – – 2. ed. – – Sã o Paulo : FTD, 2016. – –
(Coleçã o geografia em rede)
Componente curricular: Geografia
ISBN 978-85-96-00362-9 (aluno)
ISBN 978-85-96-00363-6 (professor)
1. Geografia (Ensino mé dio) I. Furquim Jú nior, Laercio. II. Título. 16-03556 CDD-910.712
Índices para catálogo sistemático: 1. Geografia : Ensino mé dio 910.712

Reproduçã o proibida: Art. 184 do Có digo Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

Todos os direitos reservados à


EDITORA FTD S.A.
Rua Rui Barbosa, 156 – Bela Vista – Sã o Paulo-SP
CEP 01326-010 – Tel. (0-XX-11) 3598-6000
Caixa Postal 65149 – CEP da Caixa Postal 01390-970
www.ftd.com.br
E-mail: central.atendimento@ftd.com.br

Em respeito ao meio ambiente, as folhas deste livro foram produzidas com fibras obtidas de á rvores de florestas plantadas, com origem certificada.

Impresso no Parque Grá fico da Editora FTD S.A.


CNPJ 61.186.490/0016-33
Avenida Antonio Bardella, 300
Guarulhos-SP – CEP 07220-020
Tel. (11) 3545-8600 e Fax (11) 2412-5375
Pá gina 3

Apresentaçã o
É com satisfaçã o que apresentamos esta obra de Geografia, fruto de intensa pesquisa e dedicação, cuja
intençã o é contribuir para que nossa disciplina possa ser melhor compreendida e discutida à luz das
transformaçõ es que caracterizam o espaço e a sociedade.

O objetivo maior da coleçã o que ora apresentamos é contribuir para que a Geografia possa ser continuamente
compreendida e aplicada ao dia a dia. As grandes transformaçõ es que permearam as duas ú ltimas décadas do
século XX e as duas primeiras do atual repercutiram decisivamente no espaço geográ fico contemporâ neo. Cabe
à Geografia traduzir esses fenô menos que se cristalizam e ao mesmo tempo dinamizam o territó rio, realizando
o ponto de encontro entre o passado e o presente.

Nos temas trabalhados aqui, a Geografia que propomos analisa os fatos geográ ficos sob uma perspectiva
dinâ mica, conectada com a realidade e com o cotidiano. A interaçã o entre os fenô menos, transformando e
produzindo o espaço geográ fico, dá a tô nica da compreensão do mundo atual e a Geografia é ferramenta
imprescindível para tal discernimento.

Esperamos que o resultado deste nosso trabalho contribua para a formaçã o de jovens críticos e conscientes de
sua cidadania para a construçã o de uma sociedade mais justa, solidá ria e menos desigual.

Bons estudos!

Os autores
Pá gina 4

Conheça o seu livro


Abertura de unidade

Questão inicial
Pergunta que estimula a reflexã o inicial, o debate e o levantamento de hipó teses sobre temas que serão
abordados na unidade.

Abertura de capítulo

Tópicos do capítulo
Apresentaçã o dos temas abordados no capítulo.

Ponto de partida
Problematizaçã o inicial que propõ e o resgate de conhecimentos prévios sobre o tema do capítulo e a
introdução de assuntos que serã o abordados. A atividade tem um tom genérico, e nã o específico.
Pá gina 5

Inserções interativas

Indicaçõ es e sugestõ es de sites, filmes, mú sicas e livros que complementam o assunto desenvolvido nos
capítulos.

Navegar
Indicaçã o de sites que apresentam informaçõ es relacionadas aos temas dos capítulos.

Ver
Indicaçã o de filmes e documentá rios que abordam temas geográ ficos.

Pauta musical
Sugestã o de mú sicas que tratam de assuntos relacionados aos capítulos.

Ler
Indicaçã o de livros relacionados aos temas desenvolvidos nos capítulos.

Interagindo

Atividade em que o aluno interage com o tema por meio de um questionamento.


Glossário

Explicaçõ es de verbetes e conceitos específicos.

Conversando com a...!

Proposta de diá logo com as outras disciplinas.


Pá gina 6

Boxe

Incursõ es eventuais quando um tema requer maior detalhamento.

Enfoque

Texto de outro autor que expõ e sua opiniã o sobre o assunto tratado no capítulo, acompanhado de uma
atividade.

Infográfico

Apresenta um tema do capítulo por meio de um esquema ilustrado e dinâ mico acompanhado de questõ es
reflexivas.
Pá gina 7

A Geografia na...!

Forma de explorar e refletir sobre o espaço geográ fico por meio de outras linguagens culturais.

Exercícios

Questõ es do Enem (com as respectivas habilidades) e de vestibulares.

Roteiro de estudo

Revisando
Questõ es dissertativas de revisã o e fixação do conteú do do capítulo.

Olhar cartográfico
Atividade de interpretaçã o e leitura de mapas, cartas, tabelas e grá ficos.

Atividade em grupo
Atividade de pesquisa e discussão coletiva sobre temas específicos.
De olho na mídia
Proposta para uma leitura crítica da mídia sobre a abordagem de temas geográ ficos.
Pá gina 8

Sumá rio
UNIDADE I – Geopolítica, geoeconomia e poder mundial 11

Capítulo 1 Geografia das relações internacionais 12


1. O sistema internacional 14
2. Estado 15
2.1 Estado e naçã o 18
2.2 A prerrogativa neoliberal 18
3. O papel da ONU 20
Roteiro de estudo 22

Capítulo 2 Geografia do poder mundial 24


1. A noçã o de ordem mundial 26
2. A ordem bipolar da Guerra Fria 28
2.1 Alemanha dividida 30
2.2 A corrida armamentista: momentos de tensã o 31
2.3 A crise dos mísseis 33
2.4 Sinais de mudanças 35
3. A nova ordem mundial 38
4. A nova ordem reorientada 40
4.1 A “guerra ao terror”
41 Roteiro de estudo 43

Capítulo 3 Estados Unidos: a hiperpotência 46


1. A Doutrina Monroe 48
2. O Corolá rio Roosevelt e a política do Big Stick 54
2.1 As intervençõ es dos Estados Unidos na América 54
3. A Doutrina Truman e o período da Guerra Fria 57
4. O poder de fogo da economia estadunidense 60
4.1 A economia contemporâ nea dos Estados Unidos 61
4.2 Estados Unidos: potência agrícola 62
4.3 Recursos naturais e energia 63
5. A sociedade estadunidense 64
5.1 A formaçã o do povo estadunidense 66
5.2 A atmosfera xenó foba 67
Roteiro de estudo 70

Capítulo 4 A globalização 72
1. Quando começou a globalizaçã o? 74
2. Globalizaçã o: um processo mú ltiplo 75
2.1 A globalizaçã o informacional 77
2.2 A globalizaçã o cultural 79
2.3 A globalizaçã o geográ fica 80
2.4 A globalizaçã o política 82
2.5 A globalizaçã o econô mica 82
3. O comércio mundial contemporâ neo 84
4. O Brasil na globalizaçã o 86
Roteiro de estudo 89

Capítulo 5 Globalização e regionalização: os blocos econômicos 92


1. Blocos de integraçã o econô mica 94
2. Uniã o Europeia: o modelo mais integrado 96
2.1 A crise da zona do euro 98
2.2 Integraçã o versus exclusã o 99
3. O Mercosul 102
Pá gina 9

3.1 A integraçã o das infraestruturas territoriais 106


Roteiro de estudo 107
Exercícios 109

UNIDADE II – Conjuntura internacional: outros espaços de poder


117

Capítulo 6 China: nova potência 118


1. A construçã o política da China 120
1.1 O jugo colonial e a Revoluçã o Chinesa 120
2. O período Mao Tsé-Tung 123
2.1 A Revoluçã o Cultural 123
3. Deng Xiaoping e as reformas econô micas 125
4. A geografia física e humana na China 132
Roteiro de estudo 134

Capítulo 7 Rússia, Japão e Índia: potências distintas 136


1. Começo, meio e fim da URSS 138
1.1 Início 138
1.2 Auge 139
1.3 Fim 140
2. Japã o: potência econô mica 142
2.1 A gênese do Japã o moderno 142
2.2 O imperialismo japonês 143
2.3 O Japã o no pó s-guerra 144
2.4 A reconstruçã o 145
3. Índia: potência econô mica, atô mica e demográ fica 147
3.1 O peso demográ fico e a geopolítica interna 147
3.2 A pujante economia 152
Roteiro de estudo 154

Capítulo 8 O espectro geopolítico do Oriente Médio 156


1. Uma regiã o geoestratégica 158
2. Turquia: entre o Ocidente e o Oriente 161
2.1 O separatismo curdo 162
2.2 A questã o cipriota 163
2.3 O anseio à Uniã o Europeia 163
3. O conflito israelo-palestino 165
3.1 A criaçã o de Israel e a primeira guerra á rabe-israelense 167
3.2 A Guerra dos Seis Dias e as implicaçõ es territoriais 168
3.3 Os Acordos de Oslo 170
3.4 A questã o no século XXI: ainda sem soluçã o 171
4. O Golfo Pérsico 172
4.1 O Irã 172
Roteiro de estudo 178

Capítulo 9 Mundo árabe, Cáucaso e Ásia Central 180


1. A Primavera Á rabe 182
2. O Estado Islâ mico: um fenô meno extremista 187
3. A Á sia Central e o Cá ucaso 188
4. Afeganistã o e Paquistã o: a morada do fundamentalismo 191
4.1 Afeganistã o 191
4.2 Paquistã o 193
Roteiro de estudo 194
Pá gina 10

Capítulo 10 África: o legado colonial 196


1. A paisagem africana 198
1.1 O quadro climatobotâ nico 199
2. Imperialismo e neocolonialismo 202
3. Questõ es geopolíticas 206
3.1 Sudã o: o norte contra o sul 206
3.2 Somá lia: guerra entre clã s 208
3.3 Angola: do trauma da guerra à reconstruçã o nacional 209
3.4 Apartheid: o horror branco que vigorou na Á frica do Sul 210
3.5 Nigéria: tensã o étnica e religiosa 214
Roteiro de estudo 216

Capítulo 11 A nova face da África: crescimento urbano e econômico 218


1. Quadro humano 220
1.1 Crescimento populacional e urbano na Á frica 222
2. Dilemas sociais 224
2.1 O problema da Aids 225
2.2 A situaçã o das mulheres 225
3. Geografia econô mica 228
3.1 Agricultura africana 230
3.2 A riqueza mineral 231
3.3 A indú stria incipiente 232
4. As relaçõ es entre a Á frica e o Brasil 234
Roteiro de estudo 236

Capítulo 12 Geopolítica da América Latina 238


1. Distú rbios no México 240
1.1 A formaçã o do EZLN 242
1.2 Fronteiras mexicanas 242
1.3 O narcotrá fico e os fluxos transfronteiriços 244
2. Geopolítica da América Central 245
2.1 Nicará gua 246
2.2 Cuba: novas perspectivas 246
2.3 Haiti: golpe e intervençã o 248
3. Geopolítica Andina 249
3.1 A Venezuela e a herança chavista 249
3.2 Colô mbia: guerrilhas e narcotrá fico 251
4. América Platina 252
Roteiro de estudo 254

Capítulo 13 Geopolítica do Brasil 256


1. Territó rio e política no Brasil 258
2. As açõ es geopolíticas brasileiras 260
2.1 Geopolítica da Amazô nia 260
2.2 A construçã o de Brasília e a integraçã o regional 262
2.3 Geopolítica platina 264
3. As relaçõ es Sul-Sul 264
3.1 O Brics 266
3.2 Unasul 267
Roteiro de estudo 268

Exercícios 270

Referências 282

Lista de siglas de exames nacionais 286

Matriz de referência de Ciências Humanas e suas tecnologias 287


Pá gina 11

Unidade

Geopolítica, geoeconomia e poder


I
mundial
Questão inicial
ESCREVA NO CADERNO

[...] para garantir que nenhuma grande potência consiga alcançar uma posição hegemô nica de dominaçã o total,
com base na intimidação, na coerção ou no uso absoluto da força, é necessá rio construir e manter uma balança
de poder militar.

JACKSON, R.; SORENSEN, G. Introdução às relações internacionais. Rio de Janeiro: Zahar, 2007. p. 23.

1. Você concorda com essa afirmaçã o?

2. De qual maneira esta imagem contesta tal afirmaçã o?


Markus Matzel/Ullstein Bild/Getty Images

Integrantes das tropas estadunidenses preparam a está tua de Saddam Hussein para derrubá -la. Bagdá , Iraque, 2003.
Pá gina 12

CAPÍTULO 1 - Geografia das relações internacionais

IMAGO/Fotoarena

Sede da Assembleia Geral das Nações Unidas com a projeção das bandeiras de seus países-membros e símbolos dos
Objetivos do Desenvolvimento Sustentável, em Nova York, Estados Unidos, 2015.
Pá gina 13

Tópicos do capítulo

Sistema internacional

Estado

Organização das Nações Unidas (ONU)

Ponto de partida
ESCREVA NO CADERNO

No site da ONU, há o seguinte trecho sobre os países-membros da organizaçã o.

O direito de tornar-se membro das Naçõ es Unidas cabe a todas as naçõ es amantes da paz que aceitarem os compromissos da
Carta e que, a crité rio da organizaçã o, estiverem aptas e dispostas a cumprir tais obrigaçõ es.

ONU Brasil, 2016. Disponível em: <https://nacoesunidas.org/conheca/paises-membros>. Acesso em: 29 mar. 2016.

• Em sua opiniã o, você considera que todos os membros da ONU sã o realmente amantes da paz, como
afirma o texto? Troque ideias com seus colegas sobre isso.
Pá gina 14

1. O sistema internacional
Chamamos de sistema internacional o conjunto de Estados existentes. Os Estados estã o
organizados em territó rios delimitados por fronteiras, onde exercem soberania e nã o obedecem a
nenhuma instâ ncia de poder.

No â mbito externo à s fronteiras dos Estados, nã o existe uma entidade soberana que detenha o
monopó lio do poder mundial, uma ú nica voz que se projete sobre o sistema internacional.

Muitos atribuem à Organizaçã o das Naçõ es Unidas (ONU) esse papel, mas é um equívoco, pois,
como veremos, a funçã o e os objetivos da ONU sã o de outra ordem, muito embora a entidade seja
importantíssima na manutençã o da paz mundial. A ONU, em tese, nã o tem o poder de interferir nos
assuntos internos de um Estado. Além disso, um Estado pode optar por nã o pertencer à
Organizaçã o, como foi o caso da Suíça, que aderiu à ONU apenas em 2002.

Uma vez que nã o há uma entidade soberana que exerça o domínio sobre o poder mundial, torna-se
necessá rio que os Estados busquem a coexistência pacífica. A necessidade de convivência em uma
sociedade global deu origem ao termo comunidade internacional. No entanto, nem sempre se
alcança êxito na busca da coexistência pacífica por meio do diá logo entre as naçõ es. O conflito de
interesses entre elas pode levar a guerras. Observe a imagem a seguir.

STR New/Reuters/Latinstock

Guerra da Bó snia (1992-1995): na ú ltima dé cada do sé culo XX, a cruel guerra civil nos Bá lcã s demonstrou a difícil
convivê ncia entre os povos. Fotografia da cidade de Brod, na Bó snia-Herzegovina, em 1995.

A atual concepçã o de Estado moderno originou-se entre os séculos XVI e XVII, na Europa, quando
foram estabelecidos os primeiros Estados soberanos, representando um povo específico sobre um
territó rio delimitado. Esses Estados passaram a ter contato entre si, a se relacionar. No ano de
1648, com a assinatura do Tratado de Westphália, também conhecido como Paz de Westphá lia,
nascia o sistema interestatal, de limites definidos entre os Estados. A Igreja e os impérios começam
a se enfraquecer. Surgia uma nova forma de organizaçã o espacial do poder político. Esse tratado
trazia consigo a concepçã o do Estado territorial, ou seja, um novo tipo de Estado, o Estado
moderno, que passou a ter territó rios demarcados por fronteiras definidas e governo desvinculado
do poder da Igreja. Surgiu entã o a noçã o de país.

O sistema internacional contemporâ neo é marcado por uma forte interdependência entre os
Estados, particularmente em questõ es econô micas num mundo em que o mercado global assume
proporçõ es antes jamais vistas. Além dos Estados, o sistema internacional é formado por uma série
de organismos internacionais, como Banco Mundial, Fundo Monetá rio Internacional (FMI),
Organizaçã o Mundial do Comércio (OMC), Organizaçã o para Cooperaçã o e Desenvolvimento
Econô mico (OCDE), entre outros.

Navegar
Opera Mundi <http://tub.im/apbejj>
O Opera Mundi é um portal de publicaçõ es sobre política e notícias internacionais em geral.
Pá gina 15

Nã o há uma interpretaçã o unâ nime quanto ao atual está gio de interaçã o que assumiu a comunidade
internacional. Para alguns estudiosos, o grau de dependência econô mica que caracteriza os Estados
é algo positivo, pois permite o aumento de riquezas e dá uma forte dimensã o de liberdade e
conectividade entre os povos, quando se pretende maximizar as relaçõ es comerciais em busca da
produtividade e eficiência. Trata-se de uma perspectiva fundamentalmente liberal.

Outros, no entanto, entendem que tal relaçã o de interdependência é negativa, pois acentua a
diferença entre os países, aumentando o fosso da desigualdade, uma vez que há uma clara relaçã o
de exploraçã o dos países pobres pelos ricos nas trocas comerciais.

No estudo das Relaçõ es Internacionais há correntes teó ricas que entendem o sistema internacional
de forma distinta, entre as quais se destacam duas escolas. A realista tem uma interpretaçã o
hobbesiana do sistema internacional, ou seja, entende-o como um campo conflituoso no qual as
relaçõ es nã o permitem maiores cooperaçõ es entre os Estados, uma vez que estes estã o sempre em
busca de poder. Nessa perspectiva, todo Estado tem dois objetivos: primeiro, a autodefesa, ou seja,
garantir a sobrevivência; segundo, sobrepor-se aos demais Estados. Essa escola advoga a tese de
que o sistema internacional traz em sua natureza uma perspectiva aná rquica.

Já a escola neoliberal entende o sistema internacional como passível de cooperaçã o entre os


Estados, em que o aspecto econô mico pode preponderar sobre o político-militar. Ou seja, os
neoliberais têm uma perspectiva cooperativa do sistema internacional, ao passo que os realistas o
entendem como em permanente conflito.

Esse é o debate central vigente nas Relaçõ es Internacionais: um mundo que flutua entre a guerra e a
paz, entre o conflito e a cooperaçã o.

Vimos, portanto, que o sistema internacional é um agrupamento de entidades políticas


independentes, os Estados. E, para melhor compreendermos como se dã o essas relaçõ es
interestatais, precisamos conhecer um pouco mais sobre o Estado – categoria política central das
ciências humanas.

Hobbesiana: Relativo a Thomas Hobbes, em cuja obra, O Leviatã, difunde a tese de que a convivência humana é repleta de
conflitos.

Anárquica: Relativo à anarquia, sem uma ordem predefinida, sem uma autoridade constituída.

Navegar
Centro Brasileiro de Relações Internacionais <http://tub.im/d7atio>
O Centro Brasileiro de Relaçõ es Internacionais (Cebri) é um interessante nú cleo de divulgaçã o de assuntos
internacionais. Possui um imenso acervo de artigos científicos e disponíveis para download.

2. Estado
O Estado é o organismo político má ximo de uma sociedade, a base de qualquer organizaçã o social.
Nos dias atuais, a maioria das sociedades está organizada em torno do Estado, que sã o unidades
políticas, territoriais e autô nomas que contemplam praticamente toda a populaçã o mundial. Todos
nó s estamos inseridos e ligados a um Estado, chamado de país, do qual somos cidadã os. Os Estados
têm o monopó lio do poder político no interior de suas fronteiras, pois sã o unidades soberanas e
autoridade má xima. Talvez você nã o perceba, mas o seu dia a dia obedece a um conjunto de regras
estabelecidas por esse agente político.
Há ao menos cinco valores bá sicos e imprescindíveis que o Estado deve defender e garantir: ordem,
segurança, liberdade, justiça e bem-estar. Por exemplo, a sociedade espera que o Estado cumpra a
funçã o de assegurar a segurança interna e externa. Internamente, o Estado deve impor leis
garantidoras da segurança, pois, senã o, pode ocorrer barbá rie. No plano exterior, vivemos em um
mundo formado por Estados armados e há o risco de uma eventual ameaça externa. A maioria dos
países apresenta um comportamento pacífico e amigá vel no sentido de coexistência perante os
demais, mas o passado e o presente estã o repletos de exemplos no sentido oposto.

O Estado tornou-se a categoria teó rica central das ciências humanas. Ele está no centro de obras
clá ssicas dos filó sofos políticos, como O príncipe, de Maquiavel, O Leviatã, de Hobbes, ou O
contrato social, de Rousseau. Uma das vertentes da Geografia, a geopolítica, foi concebida a partir
do Estado.

Geopolítica: Campo de estudo da Geografia (e também de outras ciências sociais), que trata de questõ es estratégicas ligadas ao
territó rio; nos dizeres do jurista sueco Rudolf Kjellén, criador do termo, é a “consciência geográ fica do Estado”. Porém, hoje, nã o é
mais uma ferramenta exclusiva do Estado.

Ler
Novas geopolíticas, de José William Vesentini. São Paulo: Contexto, 2000.
Livro que faz uma retrospectiva da Geopolítica e apresenta novas correntes.
Pá gina 16

A origem do Estado moderno está na Europa, particularmente na Revoluçã o Francesa (1789),


embora as primeiras manifestaçõ es de formaçã o estatal tenham ocorrido antes. Posteriormente,
esse tipo de organizaçã o social e política se tornou hegemô nico em todo o mundo. Nessa discussã o,
três sã o as categorias políticas que caminham indissociavelmente ligadas: Estado, naçã o e
territó rio. Observe a imagem a seguir.

Território: Uma dimensã o analítica da Geografia Política indissociavelmente ligada à ideia de poder. Na Geografia, nã o se concebe o
territó rio meramente como uma extensã o de terras, algo puramente físico, mas também o uso humano e político que dele se faz.

Jean-Pierre Hoü el. Séc. XVIII. Ó leo sobre tela. Museu Carnavalet, Paris. Foto: Bridgeman Art Library/Grupo Keystone

A tomada da Bastilha, 14 de julho de 1789, ó leo sobre tela de Jean-Pierre Hoü el. A Revoluçã o Francesa e seus efeitos
lançaram as bases do Estado moderno.

Apesar de encontrarmos nas civilizaçõ es grega e romana as primeiras nuances do Estado ocidental,
quando surgiram as primeiras expressõ es da política como democracia, repú blica, senado ou
tirania, é na transiçã o do feudalismo para o capitalismo durante os séculos XIII e XIV que
encontramos um delineamento mais claro da formaçã o dos Estados que perdura até os dias atuais.
A passagem do sistema feudal para o absolutismo mercantil rompeu com a fragmentaçã o territorial
de até entã o, dando origem ao Estado territorial, delimitado por fronteiras. O marco que consolida o
Estado sã o as revoluçõ es burguesas, particularmente a Francesa, que originaram uma nova noçã o
de soberania, catalisada na figura do Estado, esse instrumento da sociedade. Cai a imagem do
Estado absolutista sintetizado na má xima de Luís XIV, “O Estado sou eu”, e ascende o Estado
burguês.

Há interpretaçõ es diferentes sobre o papel do Estado no conjunto da sociedade. Muitos o veem


como o elo da naçã o e dã o a ele um sentido patrió tico. Para outros, o Estado tem funçã o
administrativa: cuidar do bem-estar, como a previdência e a saú de, por exemplo. Já numa terceira
dimensã o, é visto como o elaborador de leis e do zelo da ordem. Na prá tica, o Estado se incumbe
simultaneamente de todas essas situaçõ es, pois detém o poder político e garante a ordem, uma vez
que define a inquestionabilidade do sistema.

É importante observar a diferença entre Estado e governo, conceitos pró ximos e que geram certa
confusã o. Existem inú meras discussõ es e definiçõ es teó ricas sobre isso, mas podemos afirmar que
Estado é a estrutura de poder e representa um povo que habita um territó rio, enquanto governo é o
grupo de pessoas que está temporariamente administrando o Estado. Numa democracia, o governo
é eleito para administrar o Estado, normalmente por meio de eleiçõ es nas quais as pessoas que
pretendem governar se organizam em partidos políticos para fazê-lo. Pressupõ e-se, portanto, que o
governo seja passageiro, transitó rio, podendo ou nã o ser reeleito e permanecer mais tempo à frente
do Estado. Num regime totalitá rio, é comum o governo perpetuar-se à frente do Estado.

Ver
O Absolutismo: a ascensão de Luís XIV. Direção: Roberto Rossellini. França, 1996.
O filme aborda a trajetó ria do rei francês Luiz XIV, autor da célebre frase política “O Estado sou eu”.

Leviatã. Direção: Andrey Zvyagintsev. Rússia, 2014.


Título homô nimo à obra de Thomas Hobbes, esse filme narra a histó ria de políticos corruptos de uma pequena cidade
russa. É uma crítica velada ao Estado russo dos dias atuais.

Filme de Andrey Zvyagintsev. Leviatã . Rú ssia. 2014

O Estado pode organizar-se como regime moná rquico, como no Reino Unido e na Espanha, que sã o
monarquias parlamentaristas. A outra possibilidade é a repú blica; nesse caso, pode ser uma
repú blica presidencialista, como Brasil e Estados
Pá gina 17

Unidos, ou uma repú blica parlamentarista, como França e Israel. Reis e presidentes sã o comumente
chefes de Estado, enquanto primeiros-ministros sã o chefes de governo; no presidencialismo, o
presidente é simultaneamente chefe de Estado e de governo. As opçõ es de regimes e sistemas
variam de país para país.

Em todas as sociedades, ter o controle do Estado é ter o poder. Logo, quando um grupo de pessoas
ou um segmento da sociedade se instala no Estado, dá as diretrizes e dita a conduçã o da sociedade
por meio das vá rias funçõ es do Estado. Igualmente, o Estado tem conotaçã o de poder econô mico
por ser responsá vel pela construçã o das principais infraestruturas de um país. O mesmo vale para o
perfil ideoló gico, uma vez que por meio do Estado realiza-se a construçã o do tecido social.

Conversando com a... Filosofia, Sociologia e História!


ESCREVA NO CADERNO

Estes três filó sofos estã o entre os grandes pensadores da civilizaçã o ocidental e da formulaçã o da “arte da política”.
Eles influenciaram enormemente as disciplinas das ciências humanas, como a Histó ria, a Sociologia, a Geografia e
Filosofia.

Utilizando o conceito “Política”, produza um pequeno texto com os conhecimentos que você adquiriu por meio dessas
disciplinas. Por exemplo: o cená rio político atual e o Estado brasileiro ou outro tema similar.

Santi di Tito. Séc. XVI. Ó leo sobre tela. Palazzo Vecchio, Florença

John Michael Wright. 1669-1670. Ó leo sobre tela. Galeria Nacional do Retrato, Londres

Maurice Quentin de La Tour. 1753. Pastel. Museu de Arte e Histó ria, Genebra

O Príncipe, de Nicolau Maquiavel, O Leviatã, de Thomas Hobbes, e O contrato social, de Jean-Jacques Rousseau, sã o obras
clá ssicas da Política que discutem a Teoria de Estado.

Enfoque
ESCREVA NO CADERNO

As interpretações do Estado

Estado é sem dú vida uma palavra polissê mica, e por isso um conceito que apresenta uma diversidade de interpretaçõ es. Há
exemplos cotidianos do uso de seus mú ltiplos significados: para alguns é o sentido estritamente administrativo que conta;
para outros, Estado é sinô nimo de pá tria ou de territó rio. De outro ponto de vista, existe quem o veja como um aparelho
estritamente de repressã o; e quem o aprecie, pelo contrá rio, pelo seu papel de garantidor da liberdade [...].

O geó grafo Joan-Eugeni Sá nchez [...] tenta sistematizar estes significados [...] e propõ e quatro acepçõ es bá sicas: Estado-
naçã o, Estado-poder, Estado-territó rio e Estado-administraçã o. Quanto à primeira, [...] trata-se de uma acepçã o complexa
[...]. Se um Estado é uma instituiçã o política de soberania reconhecida pelo direito, e uma naçã o é uma comunidade formada
por pessoas que compartilham elementos histó ricos e culturais, há Estados que contê m mais de uma naçã o, como a Espanha,
por exemplo. Há naçõ es, por outro lado, que nã o sã o um Estado, tal como a Catalunha. Há ainda naçõ es divididas entre vá rios
Estados (como a Albâ nia e o Curdistã o), e inclusive há aquelas teoricamente compostas por diferentes Estados, como os
Estados Unidos da Amé rica. Enfim, uma ampla equiparaçã o entre Estado e naçã o requereria muito mais matizes do que
normalmente se apresenta.

Outro possível significado do Estado é aquele que o identifica como uma instituiçã o capaz de organizar a coaçã o, [...], bem
como a produçã o e a reproduçã o em funçã o de determinados modelos e interesses, isto é , o Estado como instrumento de
poder. Um instrumento [...] que para uns é necessá rio e para outros nã o; para uns é bené fico e para outros, prejudicial. [...]

A noçã o de Estado-territó rio parte da constataçã o de que todo Estado possui um territó rio sobre o qual exerce a soberania –
ou de que todo Estado també m é um territó rio. Esse territó rio, delimitado por uma fronteira, conté m a cidadania submetida
a tal soberania. [...].

Por fim, a acepçã o Estado-administraçã o refere-se ao Estado como mecanismo burocrá tico, organizador e gestor de
competê ncias. [...]

FONT, Joan Nogué; RUFÍ, Joan Vicente. Geopolítica, identidade e globalização. Sã o Paulo: Annablume, 2006. p. 99-100.

• Em sua opiniã o, em qual dessas concepçõ es de Estado o Brasil se enquadra? Justifique sua resposta.

Ver
Coração valente. Direção: Mel Gibson. Estados Unidos, 1995.
O filme aborda a luta pela soberania escocesa em relaçã o ao Reino Unido.

Filme de Mel Gibson. Coraçã o Valente. EUA. 1995


Pá gina 18

Ler
Era dos extremos, de Eric Hobsbawm. São Paulo: Companhia das Letras, 2000.
O livro do historiador britâ nico faz uma radiografia do breve século XX.

Editora Companhia das Letras

2.1 Estado e nação


O historiador Eric Hobsbawm, um dos maiores estudiosos sobre os significados do termo “naçã o”,
reconhece a dificuldade em defini-lo. Segundo ele, naçã o é um conjunto de indivíduos que se
reconhecem como tal e se veem como “nó s”, sabendo identificar quem sã o os que nã o pertencem ao
grupo, o “eles”. A língua, a etnia, a histó ria comum, a religiã o, entre outros elementos, propiciam a
construçã o de uma identidade.

Os ú ltimos trinta anos foram marcados por um paradoxo: ao mesmo tempo em que a globalizaçã o
anunciou certa homogeneizaçã o do espaço geográ fico por meio da integraçã o econô mica, fortes
movimentos nacionalistas afloraram e culminaram em separatismos. Europa e Á sia concentram as
ocorrências mais violentas. E é exatamente no territó rio em que o antagonismo se materializa, num
embate entre a globalizaçã o que procura a homogeneizaçã o e o nacionalismo que tende à
fragmentaçã o.

EFE/EFE

A Espanha é um exemplo de convivê ncia de vá rias naçõ es, como a Catalunha e o País Basco, em um mesmo Estado. A maioria
dos bascos e dos catalã es reivindicam a independê ncia em relaçã o à Espanha, que resiste. Na fotografia, as seleçõ es da
Catalunha (à direita) e do País Basco (à esquerda) seguram uma faixa com os dizeres “Uma naçã o, uma seleçã o”, em jogo
realizado em Bilbao, em 2014.

Interagindo
ESCREVA NO CADERNO
Suponha-se que um dia, apó s uma guerra nuclear, um historiador intergalá ctico pouse em um planeta entã o morto para
inquirir sobre as causas da pequena e remota catá strofe registrada pelos sensores de sua galá xia. Ele, ou ela [...], consulta as
bibliotecas e arquivos que foram preservados porque a tecnologia desenvolvida do armamento nuclear foi dirigida mais
para destruir pessoas que a propriedade. Apó s alguns estudos, nosso observador conclui que os ú ltimos dois sé culos da
histó ria humana do planeta Terra sã o incompreensíveis sem o entendimento do termo “naçã o” e do vocabulá rio que dele
deriva. O termo parece expressar algo importante nos assuntos humanos. Mas o que exatamente? Aqui está o misté rio.

HOBSBAWM, Eric. Nações e nacionalismo desde 1780. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1991. p.11.

• Em sua obra Nações e nacionalismo desde 1780, Eric Hobsbawm dedica parte dela à discussã o do termo “naçã o”,
enaltecendo sua importâ ncia e sua compreensã o de que se trata de um mistério. Como você entende a mensagem de
Hobsbawm?

Navegar
Mundorama <http://tub.im/jypx3s>
Neste site estã o disponíveis artigos sobre agenda internacional e da política externa brasileira, além de divulgar
livros e pesquisas científicas.

2.2 A prerrogativa neoliberal


Desde sua consolidaçã o, o Estado foi o ator central no palco das relaçõ es internacionais, o agente
hegemô nico do exercício do poder. Contudo, tal perspectiva de hegemonia passou a ser
questionada no ú ltimo quartel do século XX, particularmente com o advento da globalizaçã o, nas
décadas de 1980 e 1990. Surge outra perspectiva de interpretaçã o do sistema internacional, que
advoga o enfraquecimento do Estado e defende a tese de que este passa a ter outros componentes
que compartilham com ele o poder e a açã o sobre o sistema.
Pá gina 19

A ideia de enfraquecimento do Estado como ú nico fio condutor da sociedade passou a ganhar força
nas ú ltimas décadas do século XX. Esse momento de forte discurso contra o papel do Estado nas
vá rias instâ ncias da sociedade (sociais, econô micas e políticas) foi protagonizado pelo
neoliberalismo, doutrina econô mica que surgiu na década de 1930, quando nã o logrou êxito, mas
que foi intensamente revigorada a partir dos anos 1970-1980.

Dois eram os principais dirigentes que, criticando ferozmente a presença do Estado nos mais
variados segmentos da sociedade, davam nova força ao neoliberalismo: Ronald Reagan, presidente
dos Estados Unidos (1981-1989), e Margaret Thatcher, primeira-ministra britâ nica (1979-1990).
Os dois líderes conduziram os respectivos governos e a asserçã o que tinham sobre a esfera
internacional com forte enfoque na doutrina liberal.

No plano internacional, os neoliberais passaram a advogar, num primeiro momento, o discurso de


obsolescência do Estado e, entã o, sua retirada das relaçõ es institucionais. Defendiam a tese de
substituí-lo por instituiçõ es e organismos no palco das relaçõ es internacionais, uma vez que a era
de resoluçã o dos conflitos pela via das armas se encerrara; agora era a hora e a vez da diplomacia
corporativa. Ganhava força a crença nas instituiçõ es como regentes da paz e da organizaçã o
internacional. Os principais analistas neoliberais afirmavam que a transnacionalizaçã o da economia
interligara os países e as relaçõ es econô micas preponderavam agora sobre as políticas e, portanto,
deveriam ser conduzidas por agentes econô micos e comerciais.

Novos atores surgiram no teatro internacional: as grandes corporaçõ es transnacionais (TNCs),


organismos internacionais (OIGs), como o Banco Mundial ou a Organizaçã o Mundial do Comércio
(OMC), e as mais variadas organizaçõ es nã o governamentais (ONGs), como Human Watch Rights ou
o Greenpeace. Na visã o neoliberal, o sistema internacional assistia ao arrefecimento do poder
militar e a valoraçã o do poder econô mico. A prerrogativa neoliberal era de que “os armamentos nã o
teriam o ecletismo do dinheiro”. Anunciavam, portanto, o fim do monopó lio estatal no quadro das
relaçõ es internacionais.

A outra escola expoente de interpretaçã o das Relaçõ es Internacionais, o realismo, afirmava que, ao
contrá rio do que queriam os neoliberais, a ló gica do sistema internacional naqueles anos 1980
continuava sendo ditada pelas relaçõ es de poder político e nã o econô micas. Dessa forma, ocorria
um grande debate teó rico sobre a interpretaçã o do mundo político: os realistas defendiam a tese de
que todo Estado busca poder, logo o sistema é aná rquico, pautado por um clima de disputa de todos
contra todos, já que nã o existe uma instância má xima de poder acima dos Estados; enquanto os
neoliberais rebatiam afirmando que era possível conciliar interesses comuns entre Estados e a
busca de uma cooperaçã o por meio de mecanismos multilaterais de negociaçã o em que vigoram as
instituiçõ es como organizadoras do sistema. A tréplica dos realistas: pode até haver cooperaçã o,
mas ela terá prazo de validade, uma vez que a cooperaçã o pretendida pelos neoliberais se faz pela
ló gica de mercado e o espírito concorrencial que rege o capitalismo nã o permite uma relaçã o
simétrica entre os Estados; sempre haverá ganhadores e perdedores nas transaçõ es e um Estado
em desvantagem perde o mais importante: a soberania.

A maior contribuiçã o da escola de pensamento neoliberal foi apostar na força das instituiçõ es e
num mundo regido por elas. Podemos atestar que tal aposta se confirmou, independentemente de
concordâ ncia ou discordâ ncia do perfil das organizaçõ es internacionais, elas estã o presentes. A
escola neoliberal segue acreditando que o espírito das relaçõ es internacionais pode ser fonte de
cooperaçã o e nã o de conflito. Contudo, isso nã o significa que a perspectiva realista ruiu, pois, como
se vê, o Estado, a despeito de discursos contrá rios a ele, segue firme como ator central no palco das
relaçõ es internacionais.
Human Watch Rights e Greenpeace: São importantes ONGs. A primeira atua na á rea dos direitos humanos; a segunda, na á rea
ambiental.

Ler
Política Externa. São Paulo: Gacint-USP, 2011.
Revista de política internacional editada pelo Grupo de Aná lise de Conjuntura Internacional do Instituto de Estudos
Avançados (IEA) da Universidade de Sã o Paulo.

Logomarca Organizaçã o Mundial do Comércio

Símbolo da OMC, organizaçã o que tem o objetivo de estimular o comé rcio internacional e combater o protecionismo, um dos
atributos do neoliberalismo.
Pá gina 20

3. O papel da ONU
A Organizaçã o das Naçõ es Unidas (ONU), composta em 2015 de 193 países, foi fundada em outubro
de 1945, no contexto internacional que se abria apó s o término da Segunda Guerra Mundial. Sua
criaçã o teve como principal objetivo evitar guerras e manter a paz mundial. Antes da ONU, fora
criada a Liga das Naçõ es, durante a Conferência de Paz, em 1919, apó s a Primeira Guerra Mundial,
que, no entanto, fracassara na tentativa de evitar guerras e foi extinta. O mais recente país a
ingressar na ONU foi o Sudã o do Sul, em 2011.

A criaçã o da ONU nã o se deu de uma hora para outra. Embora tenha surgido em 1945, seu embriã o
já podia ser visto em 1942, no auge da Segunda Guerra Mundial, quando 26 países assinaram um
documento intitulado Declaraçã o das Naçõ es Unidas, em que se comprometiam a combater os
países do Eixo. Ao término da Segunda Guerra, em 25 de abril de 1945, na cidade de Sã o Francisco,
nos Estados Unidos, 51 países assinaram o documento que estabeleceu os princípios do organismo:
a Carta da ONU. Esses 51 países sã o considerados os fundadores da ONU, e o Brasil está entre eles.
Em 24 de outubro de 1945, com a ratificaçã o da Carta, era criada oficialmente a organizaçã o; o dia
24 de outubro ficou conhecido como o dia da ONU.

Países do Eixo: Aliança militar formada por Alemanha, Japã o e Itá lia.

Logomarca Naçõ es Unidas

A proposta na criaçã o do símbolo da ONU foi utilizar a projeçã o azimutal a partir do Polo Norte, que tem como propó sito
uma visã o cartográ fica baseada na neutralidade, sem nenhum centro geopolítico aparente. Contudo, essa representaçã o é
passível de crítica, pois a Amé rica do Sul e a Á frica estã o nas bordas da projeçã o.

Os princípios que regem a ONU

• A Organizaçã o se baseia no princípio da igualdade soberana de todos os seus membros.

• Todos os membros se obrigam a cumprir de boa-fé os compromissos da Carta.

• Todos deverã o resolver suas contrové rsias internacionais por meios pacíficos, de modo que nã o sejam ameaçadas a paz, a
segurança e a justiça internacionais.

• Todos deverã o abster-se em suas relaçõ es internacionais de recorrer à ameaça ou ao emprego da força contra outros
Estados.

• Todos deverã o dar assistê ncia à s Naçõ es Unidas em qualquer medida que a Organizaçã o tomar em conformidade com os
preceitos da Carta, abstendo-se de prestar auxílio a qualquer Estado contra o qual as Naçõ es Unidas agirem de modo
preventivo ou coercitivo.

• Cabe à s Naçõ es Unidas fazer com que os Estados que nã o sã o membros da Organizaçã o ajam de acordo com esses
princípios em tudo quanto for necessá rio à manutençã o da paz e da segurança internacionais.
• Nenhum preceito da Carta autoriza as Naçõ es Unidas a intervir em assuntos que sã o essencialmente da alçada nacional de
cada país.

ONU. Conheça a ONU. Disponível em: <http://www.nacoesunidas.org/conheca/principios>. Acesso em: 7 dez. 2015.

A ONU possui seis idiomas oficiais (á rabe, chinês, espanhol, francês, inglês e russo) e apresenta uma
estrutura com sete ó rgã os principais:

• Assembleia Geral;

• Conselho de Tutela;

• Conselho de Segurança;

• Conselho Econô mico e Social;

• Secretariado;

• Tribunal Internacional de Justiça;

• Tribunal Penal Internacional.

Dois desses ó rgã os possuem mais evidência na agenda internacional: a Assembleia Geral e o
Conselho de Segurança.

A Assembleia Geral da ONU reú ne anualmente, no mês de setembro, representantes de todos os


países-membros. Trata-se de uma instâ ncia consultiva e democrá tica: cada país, um voto. A funçã o
da Assembleia é discutir e encaminhar soluçõ es sobre os principais problemas internacionais,
assim como avaliar o orçamento da ONU. A Assembleia é soberana para definir se determinado
assunto será encaminhado por maioria simples ou se será submetido a uma aprovaçã o de 2/3 dos
membros.

Navegar
ONU-Brasil <http://tub.im/hy9j2n>
No site das Naçõ es Unidas no Brasil é possível encontrar diversas informaçõ es sobre o funcionamento da ONU e das
agências que atuam no Brasil.
Pá gina 21

É no â mbito da Assembleia que sã o discutidos alguns dos mais polêmicos assuntos internacionais e
que novos membros sã o admitidos ou expulsos. Tradicionalmente nas reuniõ es anuais, a
Assembleia Geral é aberta pelo chefe de Estado brasileiro, tradiçã o que vem desde a Assembleia
inicial realizada em 1947, quando o primeiro a discursar na seçã o foi o diplomata brasileiro
Oswaldo Aranha.

Já o Conselho de Segurança da ONU é tido como a entidade má xima do poder mundial, a instâ ncia
decisó ria sobre questõ es de segurança internacional. Somente ele pode aprovar resoluçõ es
relacionadas a guerras. Para entender o porquê disso, é necessá rio conhecer um pouco melhor sua
estrutura e funcionamento.

O Conselho de Segurança é constituído por 15 membros, mas com uma flagrante hierarquia de
poder: cinco sã o permanentes e têm o poder de veto; os outros dez sã o rotativos e nã o possuem tal
poder. Essa situaçã o nã o configura uma representatividade equâ nime, mas uma clara relaçã o
assimétrica de poder, por isso a reforma do Conselho é um dos temas mais debatidos nas relaçõ es
internacionais contemporâ neas.

Os cinco membros permanentes sã o: Estados Unidos, Rú ssia, China, Reino Unido e França. Os
outros dez sã o eleitos pela Assembleia Geral para um mandato de dois anos. O que justifica o status
dos membros permanentes é o fato de serem considerados os vencedores da Segunda Guerra
Mundial.

O Conselho de Segurança da ONU encontra-se em sessã o permanente, podendo ser acionado a


qualquer momento. O ó rgã o é a ú ltima palavra em guerra; é ele quem decide, por exemplo, se
haverá , ou nã o, intervençã o armada em algum lugar do globo; também decide sobre sançõ es e
embargos econô micos contra países considerados violadores dos tratados internacionais ou
tachados como agressivos; em conjunto com a Assembleia Geral, aprova ou recusa a entrada de
algum Estado que deseja tornar-se membro da ONU; aprova ou reprova o envio de “missõ es de paz”
a países em estado de guerra civil. Essas decisõ es do Conselho sã o designadas como resoluções.

Para uma resoluçã o ser aprovada no Conselho de Segurança, é necessá rio que os cinco membros
permanentes aprovem ou se abstenham (o que nã o é considerado veto) e mais quatro membros
rotativos votem favorá veis, totalizando, entã o, nove votos. Mesmo que 14 países optem por aprovar
uma resoluçã o, caso um dos cinco membros permanentes vete, a resoluçã o está reprovada. Convém
ressaltar, no entanto, que o veto é sempre indesejado e as potências evitam ao má ximo usar de tal
poder para nã o se expor a desgaste político. Logo, a atuaçã o nos bastidores é intensa para se evitar
que uma resoluçã o seja encaminhada antes de um acordo. Contudo, nem sempre há êxito em tal
empreitada. O caso da Guerra do Iraque, em 2003, é emblemá tico. Houve uma rara e incontorná vel
divergência entre Estados Unidos e França, e o país europeu anunciou antecipadamente que vetaria
uma intervençã o armada ao Iraque. Entã o, num raríssimo caso desde a criaçã o da ONU em 1945,
um país foi atacado sem uma resoluçã o específica para isso.

Por ser a instâ ncia de maior poder político da ONU e da evidente concentraçã o de poder nas mã os
de cinco países, há alguns anos o Conselho de Segurança tem sido alvo de questionamentos, mais
especificamente desde 1993, quando se iniciaram trabalhos para a ampliaçã o do Conselho.

Poder de veto: Poder de vetar uma resoluçã o internacional estabelecida pelo Conselho de Segurança da ONU, condiçã o especial que
apenas cinco países têm.
EDUARDO MUNOZ/REUTERS/Latinstock

Conselho de Segurança: entidade má xima da ONU, mas com estrutura assimé trica de poder. Na fotografia, reuniã o do
Conselho de Segurança, em Nova York, em 2015.

Navegar
Ministério das Relações Exteriores <http://tub.im/5t9f57>
A pá gina do Ministério das Relaçõ es Exteriores, o porta-voz oficial do Brasil no sistema internacional, contém
inú meros textos e informaçõ es sobre o contexto político mundial.
Pá gina 22

Foi nesse contexto que surgiu o G4, grupo de quatro países que anseiam pela reforma do Conselho e
por uma vaga como membro permanente: Alemanha, Brasil, Índia e Japã o. Paira um certo consenso
entre os países que a representatividade do Conselho, por ser inspirada no contexto da Segunda
Guerra, nã o mais responde à realidade internacional contemporâ nea, caracterizada por maior
multilateralismo político e econô mico. O Brasil é um dos mais ativos pleiteantes à vaga permanente
e brada pela mudança de estrutura de poder do Conselho, argumentando que a agenda
internacional nã o pode estar refém de uma realidade política de 1945. O G4 defende que, além da
presença dos quatro países no Conselho, a Á frica também possua um assento permanente
representado por um país do continente a ser definido. O mais prová vel seria a Á frica do Sul,
contudo o movimento perdeu força nos ú ltimos anos.

Os nó s políticos para a reforma do Conselho nã o serã o facilmente desatados. Uma eventual


aprovaçã o do aumento de membros permanentes do Conselho deverá ser submetida à Assembleia
Geral da ONU, que, por sua vez, deverá ser aprovada por 2/3 dos países que compõ em o ó rgã o.

Pauta musical
Toda forma de poder, Engenheiros do Hawaii. Álbum: Longe demais das capitais. RCA, 1986.
Pauta: Poder mundial.

LP Longe demais das capitais, dos Engenheiros do Hawaii. Brasil, 1986

A Geografia na... música!


ESCREVA NO CADERNO

Em seu clássico, A era dos extremos, Eric Hobsbawm (1917-2012) escreveu:

Nã o sabemos para onde estamos indo. Só sabemos que a histó ria nos trouxe até este ponto e por quê .

HOBSBAWM, E. A era dos extremos. Sã o Paulo: Companhia das Letras, 2000. p. 562.

Em uma linguagem mais poética, o compositor Cartola (1908-1980) cantou:

O mundo é um moinho.

• Com base no que foi discutido neste capítulo, que relaçã o você estabelece entre a afirmaçã o de um intelectual e a
letra da cançã o de um compositor popular?

ROTEIRO DE ESTUDO
ESCREVA NO CADERNO

Revisando

1. Por que dizemos que o tema “internacional” é hoje mais presente na vida das pessoas?
2. Como a Geografia pode contribuir para uma melhor compreensã o do espaço mundial?

3. Você entende que há uma voz soberana no sistema internacional que detenha o monopó lio da
autoridade? Justifique.

4. Uma das escolas expoentes de interpretaçã o das Relaçõ es Internacionais é o realismo. O que diz o
realismo sobre o sistema internacional?

5. No estudo das Relaçõ es Internacionais, outra corrente teó rica que analisa o sistema internacional é o
neoliberalismo. O que defende a prerrogativa neoliberal para o sistema internacional?

6. A Organizaçã o das Naçõ es Unidas (ONU), em 2015, era composta de 193 países. O mais recente país a
ingressar na ONU foi o Sudã o do Sul. Quando foi criada a ONU e sob qual justificativa e contexto?

7. O Conselho de Segurança da ONU é a entidade má xima do poder mundial, a instâ ncia decisó ria sobre
questõ es de segurança internacional. Somente ele pode aprovar resoluçõ es relacionadas a guerras.

Como está estruturado o Conselho de Segurança da ONU nos dias atuais?

8. A ONU vai muito além da mediaçã o internacional, cumprindo importante papel na á rea social,
econô mica, cultural, ambiental e de direitos humanos em todo o mundo por meio de suas agências,
programas ou fundos. Pesquise quais sã o as agências da ONU e relacione qual você considera a mais
importante. Justifique a sua resposta.

9. A partir da leitura do capítulo, tente explicar em poucas palavras a diferença bá sica entre Estado e
governo.

Olhar cartográfico

• Discuta a pertinência da projeçã o cartográ fica do símbolo da ONU e compare-a com as demais
projeçõ es que você conhece. Observe que, no contorno do globo, há um símbolo. O que ele representa?

Logomarca Naçõ es Unidas


Pá gina 23

Atividade em grupo

A sala será transformada na Assembleia Geral da ONU, que discutirá e decidirá pela reforma, ou nã o, do
Conselho de Segurança da ONU. Cada aluno representará um Estado (país). Assim, o aluno que
representar os Estados Unidos deverá justificar sua posiçã o em relaçã o à reforma, aquele que
representar o Brasil deverá justificar a aspiraçã o à vaga de membro permanente, tal qual Alemanha,
Japã o e Índia. Assim, sucessivamente, se posicionarã o os representantes tantos quantos forem
selecionados.

De olho na mídia

Leia o texto abaixo e, depois, responda à s questõ es.

Agência da ONU para energia atômica oferece tecnologia nuclear contra vírus Zika

Usar a radiaçã o nuclear para eliminar ou reduzir a populaçã o do mosquito Aedes aegypti, que transmite o vírus zika,
será um dos temas centrais que o diretor-geral da Agência Internacional de Energia Atô mica da Organizaçã o das
Naçõ es Unidas (Aiea), Yukiya Amano, apresentará a vá rios países em viagem pelas Américas que começa na segunda-
feira [25/01/2016].

O vírus zika está relacionado ao aumento de casos de microcefalia em bebês na América Latina.

“A tecnologia para a esterilizaçã o de insetos é muito eficaz na reduçã o ou erradicaçã o da populaçã o de mosquitos e
outros portadores de doenças”, explicou Amano em entrevista na véspera de partir para o Panamá , primeira escala
da visita de duas semanas pela regiã o da América Central e México.

O diplomata japonês recordou que a agência da ONU para energia atô mica, que zela pelo uso pacífico da tecnologia
nuclear, tem muita experiê ncia nesta técnica para o controle de pragas. Amano destacou também que a organizaçã o
tem capacidade para reagir com rapidez a crises deste tipo e deu como exemplo o surto de ebola na Á frica em 2014.

Na época, a agência enviou em poucas semanas uma missã o aos países africanos afetados. Com o uso de tecnologia
nuclear, o tempo necessá rio para diagnosticar o ebola nesses países foi reduzido de quatro dias para quatro horas.

A esterilizaçã o nuclear de insetos já teve êxito contra a mosca tsé-tsé, na Á frica, que transmite a chamada “doença do
sono” em humanos e afeta também o gado.

O diretor da agência da ONU lembrou, no entanto, que a entidade ainda trabalha na aplicaçã o desta técnica sobre os
mosquitos transmissores de outras doenças, como o zika, e advertiu que o problema “nã o será resolvido da noite
para o dia”.

Além disso, será necessá rio combinar a esterilizaçã o dos mosquitos com outras técnicas e medidas, como o uso de
produtos químicos, armadilhas e redes, destacou Amano. Além do Panamá , ele irá à Costa Rica, El Salvador,
Nicará gua, Guatemala e o México, com uma intensa agenda de contatos de alto nível.

“Estamos interessados nesta regiã o. Estamos interessados em países grandes e pequenos, em países que utilizam a
energia nuclear para gerar energia, mas também nos que a usam em doentes com câ ncer ou a ajudar pequenos
agricultores”, acrescentou.

Segundo Amano, a tecnologia nuclear pode ser ú til para estes países e sua visita servirá para a ONU entender as
necessidades de cada naçã o nessa área. “Estas tecnologias podem ser ú teis para eles. E eles têm interesse. Para fazer
isto, precisamos entendê-los e ter um bom entendimento com os líderes políticos”.

A Agência Internacional de Energia Atô mica já desenvolveu técnicas como a mutaçã o de culturas mediante raios
gama para conseguir novas variedades de plantas mais resistentes às doenças. Na Guatemala, por exemplo, a agência
lançou um projeto para combater o Hemileia vastatrix, fungo que afeta as plantas de café.
A entidade também oferece tecnologia e formaçã o médica para a luta contra o câ ncer na América Central.

Amano recordou que a agência atua como intermediá ria num programa para que oncologistas da regiã o –
profissionais e estagiá rios – possam frequentar cursos de formaçã o e especializaçã o na Espanha. “A formaçã o
perió dica é necessá ria porque a tecnologia avança muito rapidamente”.

AGÊ NCIA da ONU para energia atô mica oferece tecnologia nuclear contra vírus zika. EBC Agência Brasil, 23 jan. 2016. Disponível em:
<http://agenciabrasil.ebc.com.br/internacional/noticia/2016-01/agencia-da-onu-para-energia-atomica-oferece-tecnologia-nuclear-contra>. Acesso em: 24 mar. 2016.

1. Vimos no capítulo que as agências da ONU majoritariamente estã o a serviço de um mundo melhor. No
caso da agência em questã o, qual é sua principal finalidade? No caso em destaque, como ela pode ajudar
positivamente?

2. O texto fala em diversos países da América Latina. Por que esses países têm um problema comum?
Pá gina 24

CAPÍTULO 2 - Geografia do poder


mundial

Crédito do infográfico: Casa Paulistana

Fonte: SIPRI – Stockholm International Peace Research Institute. Disponível em:


<http://www.sipri.org/googlemaps/milex_top_15_2014_exp_map.html>. Acesso em: 2 fev. 2016
Pá gina 25

Tópicos do capítulo
Ordem mundial
Guerra Fria
Nova ordem mundial

Ponto de partida
ESCREVA NO CADERNO

1. Em sua opiniã o, quais foram as mudanças na ordem mundial que resultaram na diminuiçã o de
investimentos militares pelos Estados Unidos?

2. Por que, no início do século XXI, os gastos militares dos Estados voltaram a subir e alcançaram o
mesmo patamar de 1989?
Pá gina 26

1. A noção de ordem mundial


A expressã o nova ordem mundial tornou-se frequente em nosso cotidiano a partir das
transformaçõ es geopolíticas do final do século XX, mais precisamente quando o ex-presidente
estadunidense George Bush, apó s a derrota do Iraque na Guerra do Golfo, em 1991, empregou o
termo, ao declarar que o mundo adentrava em uma nova era regida, segundo ele, por uma nova
ordem mundial.

Podemos afirmar que ordem mundial é o contexto das relaçõ es políticas estabelecidas entre
Estados em determinado momento histó rico. Quem determina a ordem sã o as potências, que
encaminham os procedimentos nos campos da política e da economia mundial; os demais Estados
ficam restritos a se inserir nela. Uma ordem mundial é estabelecida pela segurança coletiva, pelo
equilíbrio de poder entre alguns países e pela governança do sistema internacional.

Em linhas gerais, observamos três tipos de ordem mundial:

• Ordem multipolar – quando existem algumas potências pautando as relaçõ es internacionais. É a


mais comum das ordens ao longo da histó ria. Foi vigente durante o século XIX e a primeira metade
do século XX. Os episó dios que envolveram o Imperialismo, a Primeira e a Segunda Guerra Mundial
ocorreram dentro de uma ordem multipolar. Observe o mapa abaixo.

Imperialismo: Em uma visã o restrita e objetiva, é o período histó rico que compreendeu a fase mais madura do capitalismo, quando
houve a investida europeia em busca de novas áreas para suprir o sistema que adentrava em sua fase industrial. Além do domínio
colonial, caracterizou-se pela imposiçã o dos valores ocidentais aos povos subjugados da Á frica e da Á sia. Transcorreu,
principalmente, entre a segunda metade do século XIX e meados do XX.

Bob Daugherty/AP/Glow Images

George Bush anuncia a nova ordem mundial, em Washington, Estados Unidos, 1991.
Allmaps

Fonte: BONIFACE, Pascal; VÉ DRINE, Hubert. Atlas do mundo global. Sã o Paulo: Estaçã o Liberdade, 2009. p. 32-34.

Nota: Representaçã o sem escala.


Pá gina 27

• Ordem bipolar – ocorre quando o sistema internacional é pautado pela açã o de duas potências
hegemô nicas. Foi a ordem vigente na segunda metade do século XX, marcada pelo antagonismo
entre Estados Unidos e Uniã o Soviética. Observe o mapa a seguir.

Allmaps

Fonte: PARKER, Geoffrey (Ed.). Atlas da história do mundo. Sã o Paulo: Empresa Folha da Manhã S.A., 1995. p. 292-293.

• Ordem unipolar – ordem mais rara de se sobrepor. Ocorre quando uma ú nica potência tem o
domínio mundial. Nesse caso, o sistema internacional torna-se hierá rquico, ao contrá rio da regra
geral, que é apresentar-se aná rquico e dominado por pequeno nú mero de países. Muitos entendem
que o início do século XXI se caracterizou como unipolar, pois haveria uma nítida hegemonia
estadunidense, conteú do que estudaremos no pró ximo capítulo. Contudo, nã o há consenso sobre
essa tese. Observe o mapa abaixo.

Allmaps
Fonte: Elaborado com base em: BONIFACE, Pascal; VÉ DRINE, Hubert. Atlas do mundo global. Sã o Paulo: Estaçã o Liberdade, 2009.
p. 32-34.

Interagindo

ESCREVA NO CADERNO

• Em que ordem você entende que estamos vivendo nesta segunda década do século XXI?
Pá gina 28

2. A ordem bipolar da Guerra Fria


Em 1941, no auge da Segunda Guerra Mundial, Estados Unidos, Reino Unido e Uniã o Soviética, as
três grandes potências, deixaram suas diferenças de lado para enfrentar um inimigo comum: a
Alemanha de Hitler. Contudo, essa aliança era circunstancial, pois as divergências ideoló gicas eram
muitas para que continuassem aliados apó s a guerra. E foi de fato o que se sucedeu.

Quando terminou a guerra, emergiram duas novas potências que até entã o se situavam em um
plano menos central em relaçã o ao teatro internacional, frequentemente conduzido por países
europeus, em que pese a ascensã o estadunidense ser notá vel desde o início do século XX. Podemos
entender que o término da Segunda Guerra Mundial selou o fim da hegemonia de cinco séculos da
Europa como principal protagonista do jogo geopolítico mundial.

O capítulo diplomá tico que pô s fim à Segunda Guerra na Europa e anunciou uma nova era foi a
Conferência de Potsdam, que ocorreu em julho de 1945 e reuniu as três grandes potências militares
aliadas no conflito: Estados Unidos, Uniã o Soviética e Reino Unido, representadas nas figuras de
seus líderes – Harry Truman, Joseph Stá lin e Winston Churchill, retratados na fotografia a seguir.
Potsdam consolidou o processo que dividia a Europa em dois blocos de influências distintas: o leste,
sob a ó rbita soviética, e o oeste, sob a influência estadunidense. Iniciava-se uma nova etapa da
histó ria.

Rapidamente, o cená rio do pó s-guerra prostrou-se em torno de uma nova realidade, anunciando a
divisã o do mundo em dois blocos antagô nicos, evidenciando uma ordem ditada pelo confronto
ideoló gico entre capitalismo e socialismo. O mundo convertia-se em um “tabuleiro de xadrez
geopolítico”, em que os dois jogadores seriam Estados Unidos, representantes má ximos do
capitalismo, e Uniã o Soviética, representante do socialismo. O primeiro-ministro britâ nico Winston
Churchill apresentou o novo cená rio, trazendo para o glossá rio das relaçõ es internacionais a
expressã o cortina de ferro, quando anunciou: “De Stettin, no Bá ltico, até Trieste, no Adriá tico, uma
cortina de ferro desceu sobre o continente.”.

Uma sucessã o de ameaças veladas daria o tom diplomá tico a partir de entã o. Era o embriã o de uma
guerra de propaganda entre os sistemas políticos que as duas novas potências defendiam e
difundiam, o início de uma Guerra Fria.

Se surgia uma nova ordem no pó s-guerra, qual era entã o a ordem que ruía? Resposta: a ordem
multipolar do Imperialismo, que permeou grande parte do século XIX e a primeira metade do
século XX.

Divergências ideológicas: A ideia de ideologia está relacionada a um apego a crenças e valores políticos de um determinado
sistema, no caso, o confronto entre capitalismo e socialismo.
Corbis/Latinstock

Conferê ncia de Potsdam, na Alemanha – Churchill, Truman e Stá lin (da esquerda para a direita): os gigantes se reú nem para
discutir o destino do mundo, em 1945.
Pá gina 29

A Europa saía de cena e cedia a vez para os Estados Unidos e a Uniã o Soviética, os atores centrais na
arena geopolítica; a Europa tornar-se-ia uma coadjuvante em termos de liderança. Os dois países
situavam-se, geograficamente, em polos “periféricos” em relaçã o ao velho continente: os Estados
Unidos, na América, a oeste do Atlâ ntico, e a Uniã o Soviética, euroasiá tica, na borda oriental da
Europa.

Durante a Segunda Guerra Mundial, à medida que as forças nazistas eram combatidas e expulsas do
flanco oriental da Europa, Stá lin colocava as dele. Assim, quando se encerrou a guerra, boa parte do
velho continente estava sob o domínio comunista. A Uniã o Soviética adquiriu ao seu oeste algo
pró ximo de 600 mil quilô metros quadrados (uma á rea maior que a França), conquistando
territó rios da Polô nia, países bá lticos, Romênia, Tchecoslová quia e Finlândia, apresentados no
mapa abaixo. Na verdade, o país recuperava, ali, á reas perdidas apó s a Primeira Guerra Mundial, na
época da Rú ssia czarista. Para evitar que a outra metade, destruída pela guerra, também fosse
dominada pelos soviéticos, os Estados Unidos intervieram na Europa, patrocinando sua
reconstruçã o. Essa estratégia ficou conhecida como Plano Marshall. O mapa a seguir mostra como
ficou a configuraçã o territorial da Europa apó s o término da Segunda Guerra.

Plano Marshall: Foi idealizado pelo secretá rio de Estado estadunidense George Marshall e visava reconstruir as economias
europeias abaladas pela guerra e que naquele momento constituíam presas fá ceis diante da investida soviética. Foi conduzido no
período 1948-1951 e custou à época 13 bilhõ es de dó lares, o que significa, em termos atualizados, algo pró ximo de 116 bilhõ es de
dó lares.

Allmaps
Fonte: CHALIAND, Gérard; RAGEAU, Jean-Pierre. Atlas estratégico y geopolítico: geopolítica de las relaciones de fuerza en el
mundo. Madrid: Alianza Editorial, 1984. p. 39.
Pá gina 30

O Plano Marshall, na realidade, era o desdobramento de uma iniciativa mais ampla perpetrada pelo
presidente estadunidense Harry Truman para conter e isolar a Uniã o Soviética. Essas iniciativas
compuseram uma cartilha geopolítica que levou seu nome: a Doutrina Truman. Em uma famosa
fala no Congresso estadunidense, em março de 1947, o presidente proferiu um duro discurso
contra a Uniã o Soviética, anunciando que os Estados Unidos estavam preparados para defender o
ocidente contra a “ameaça socialista”; leia-se Uniã o Soviética. No â mbito econô mico, a primeira
iniciativa foi uma concessã o de créditos à Grécia e à Turquia, países que passavam por fortes crises
no pó s-guerra.

A Doutrina Truman anunciou ao mundo qual seria a posiçã o dos Estados Unidos a partir daquele
momento, uma mensagem quase oficial de que havia uma nova potência que passaria a dar as
cartas do jogo no cená rio internacional. A Doutrina ainda pressupunha uma barreira ao
expansionismo soviético e com isso anunciava a bipolarizaçã o do mundo.

Essa doutrina orientou os Estados Unidos por longos anos. Muitas das intervençõ es estadunidenses
foram decorrência de suas diretrizes, como a Guerra do Vietnã, a Guerra da Coreia, a atuaçã o na
América Central, entre outras açõ es.

Ver
Boa noite e boa sorte. Direção: George Clooney. Estados Unidos, 2005.
O filme retrata a repressã o aos comunistas nos Estados Unidos, denominada macartismo, pois o senador
estadunidense Joseph McCarthy foi porta-voz dessa perseguiçã o.

Filme de George Clooney. Boa noite e boa sorte. EUA, 2005

2.1 Alemanha dividida


Os dois grandes derrotados da Segunda Guerra Mundial foram Alemanha e Japã o. Ambos foram
ocupados por tropas aliadas e, no caso alemã o, além da ocupaçã o, o país foi dividido em quatro
zonas.
Allmaps

Fonte: CHALIAND, Gérard; RAGEAU, Jean-Pierre. Atlas estratégico y geopolítico: geopolítica de las relaciones de fuerza en el
mundo. Madrid: Alianza Editorial, 1984. p. 40.

Quando a Alemanha se rendeu, em maio de 1945, os líderes nazistas remanescentes foram julgados
pelo Tribunal de Nuremberg. Enquanto os antigos líderes eram condenados, o país era ocupado e
partilhado por forças estadunidenses e britâ nicas, na porçã o ocidental, e soviéticas, na porçã o
oriental; posteriormente, a França também foi contemplada com uma á rea, na porçã o ocidental. As
zonas estadunidense, britâ nica e francesa foram unificadas e deram origem a um novo país, a
Repú blica Federal da Alemanha, em 1949, conhecida como Alemanha Ocidental. Cinco meses
depois, a Uniã o Soviética, igualmente, anunciou a criaçã o de um novo país: a Repú blica Democrá tica
Alemã , na porçã o oriental da “antiga” Alemanha. Observe o mapa abaixo. A capital Berlim também
ficou dividida em duas zonas, Ocidental e Oriental, porém a cidade estava localizada integralmente
Pá gina 31

na zona soviética; a ú nica forma de contato de Berlim Ocidental com a outra Alemanha era por meio
de uma ponte aérea mantida pela ocupaçã o aliada.

Tribunal de Nuremberg: Tribunal militar especial montado apó s a Segunda Guerra Mundial para julgamento de crimes de guerra
cometidos pelos principais líderes nazistas.

Mais tarde, para impedir a emigraçã o de alemã es para a parte capitalista, em 1961, a Uniã o
Soviética ergueu o Muro de Berlim, mostrado na fotografia abaixo, que se transformou no maior
ícone da Guerra Fria. Em nenhum outro lugar do mundo o conflito leste-oeste foi tã o sentido como
na Alemanha, situada no limite das duas zonas de fricçã o do confronto ideoló gico.

von Keussler/dpa/Corbis/Latinstock

Construçã o do Muro de Berlim, em 1961.

2.2 A corrida armamentista: momentos de tensão


Para intimidar o adversá rio e simultaneamente persuadir os demais países, alijados da disputa
mundial, os Estados Unidos e a Uniã o Soviética passaram a investir pesado no campo militar.
Configurou-se, entã o, intensa produçã o industrial bélica. Contudo, essa corrida armamentista
contava agora com um ingrediente tecnoló gico de altíssimo risco: o componente atô mico. Logo, o
arsenal de ogivas armazenadas pelas duas superpotências ao longo das décadas de 1950, 1960 e
1970 adquiriu tamanho porte que a humanidade corria o risco de extinçã o; essa possibilidade ficou
conhecida como holocausto nuclear. Atingia-se um verdadeiro “equilíbrio do terror”, expressã o
cunhada para representar a equidade mundial atô mica do período. A esse contexto marcado por
forte tensã o convencionou-se designar de Guerra Fria.

A Guerra Fria apresentou um cará ter contraditó rio, pois, ao mesmo tempo que a possibilidade de
destruiçã o em massa era real, foi exatamente essa possibilidade que impediu um confronto armado
entre as duas potências. A paz mundial estava, paradoxalmente, garantida pelo equilíbrio do terror.

Outra marca do período foi o alinhamento dos países em organizaçõ es econô micas ou militares. A
Europa ocidental alinhara-se em torno da Comunidade Econô mica Europeia, em 1957, e o bloco
soviético estava integrado no â mbito do Conselho Econô mico para Ajuda Mú tua (Comecon). No
â mbito militar, formara-se, em 1949, a Organizaçã o do Tratado do Atlâ ntico Norte (Otan), aliança
militar comandada pelos Estados Unidos, juntamente com os países europeus e o Canadá . A
resposta à Otan veio em 1955 com a criaçã o do Pacto de Varsó via, liderada pela Uniã o Soviética e
seus países satélites da Europa oriental.

Ogiva: Projétil ou míssil carregado com artefato nuclear para fins bélicos.

Satélite: A ideia de satélite, neste caso, vincula-se ao fato de os países da Europa oriental orbitarem em torno da Uniã o Soviética.
Nã o havia uma relação propriamente de aliança, mas sim de submissã o à potência.
Pá gina 32

Hulton-Deutsch Collection/Corbis/Latinstock

Durante a Guerra Fria, eram frequentes as paradas militares sovié ticas e a demonstraçã o pú blica de seu poder de fogo. Na
fotografia, desfile militar em Moscou, Rú ssia, em 1965.

A Geografia na... poesia!


ESCREVA NO CADERNO

A Guerra Fria foi marcada pelo “equilíbrio do terror”, quando o temor de um holocausto nuclear assombrou geraçõ es
entre as décadas de 1950 e 1980, principalmente. Em uma triste alusã o à bomba atô mica, o poeta Vinicius de Moraes
escreveu a poesia Rosa de Hiroshima em 1954, convertida em mú sica em 1973 por Gerson Conrad, do grupo Secos
e Molhados.
Nasa

Na fotografia de fundo do boxe ao lado, cogumelo atô mico de Nagasaki, formado pela bomba lançada apó s trê s dias do
bombardeio a Hiroshima, no Japã o, em 1945.

Rosa de Hiroshima

Pensem nas crianças


Mudas telepá ticas
Pensem nas meninas
Cegas inexatas
Pensem nas mulheres
Rotas alteradas
Pensem nas feridas
Como rosas cá lidas
Mas, oh, nã o se esqueçam

Da rosa, da rosa
Da rosa de Hiroshima
A rosa hereditá ria
A rosa radioativa
Estú pida e invá lida
A rosa com cirrose
A antirrosa atô mica
Sem cor sem perfume
Sem rosa, sem nada

Rosa de Hiroshima, Vinicius de Moraes. In: CÍCERO, Antonio; FERRAZ, Eucanaã (Org.). Nova antologia poética de Vinicius de
Moraes. Sã o Paulo: Cia. das Letras (Editora Schwarcz Ltda.). p. 147. 2008. VM EMPREENDIMENTOS ARTÍSTICOS E CULTURAIS
LTDA., além de: © VM e © CIA. DAS LETRAS (EDITORA SCHWARCZ).

• Analise o tom melancó lico do poeta considerando-se os riscos nucleares e o contexto em que foi escrita a poesia.
Pá gina 33

2.3 A crise dos mísseis


Em 1962 ocorreria um dos mais tensos momentos da Guerra Fria: a crise dos mísseis. Esse episó dio
envolveu três países: Estados Unidos, Uniã o Soviética e Cuba.

A Revoluçã o Cubana de 1959, liderada por Fidel Castro e Ernesto “Che” Guevara, derrubou a
ditadura pró -Washington de Fulgencio Batista, entã o presidente, que estava no poder desde 1940.
Sabedora da antipatia da potência estadunidense pela revoluçã o e temerosa de uma invasã o,
Havana estreitou imediatamente os laços com Moscou logo apó s o êxito do movimento.

Os Estados Unidos instalaram mísseis na Turquia, posiçã o estratégica para um ataque à Uniã o
Soviética, em 1961. Cuba dista apenas 200 quilô metros do inimigo dos soviéticos e, em resposta aos
estadunidenses, a Uniã o Soviética instalou na ilha mísseis nucleares apontados para o norte,
conforme apresentado no mapa a seguir. Radares estadunidenses a bordo de aviõ es U2 detectaram
as movimentaçõ es soviéticas e o presidente dos Estados Unidos John Kennedy ordenou o cerco
naval à ilha. Por sua vez, Moscou iniciou o envio de sua força naval para o mar das Antilhas. A
tensã o era nítida e as pessoas de todo o mundo acompanharam de forma apreensiva a
movimentaçã o das duas potências no á pice de sua tensa relaçã o. O presidente estadunidense
pronunciou-se oficialmente à naçã o, informando-a dos riscos. Nã o foram poucos os que, temendo
pelo pior, iniciaram construçõ es de abrigos subterrâ neos, pois os dois países dominavam a
tecnologia nuclear e um confronto entre eles era o pior cená rio possível para uma guerra.

Allmaps

Fonte: PARKER, Geoffrey (Ed.). Atlas da história do mundo. Sã o Paulo: Empresa Folha da Manhã S.A., 1995. p. 293.

Ver
Treze dias que abalaram o mundo. Direção: Roger Donandson. Estados Unidos, 2000.
O filme aborda o episó dio conhecido como a crise dos mísseis, ocorrido em 1962, que quase resultou no início de um
conflito armado entre os Estados Unidos e a Uniã o Soviética.
Filme de Roger Donandson. Treze dias que abalaram o mundo. EUA, 2000

Ambas as potências, no entanto, sabiam que precisavam de uma saída diplomá tica para a crise, pois
conheciam muito bem o significado de um confronto armado naquele momento. Seguiram-se 13
dias até uma soluçã o para o impasse.

O acordo se deu quando a Uniã o Soviética aceitou retirar seus mísseis de Cuba (apresentados na
fotografia na pá gina a seguir), exigindo como contrapartida a nã o interferência dos Estados Unidos
na Revoluçã o Cubana e, igualmente, a retirada de mísseis estadunidenses na Turquia. O nã o
cumprimento dos Estados Unidos da segunda parte do acordo deu uma conotaçã o de derrota
política para Nikita Krushev, líder soviético. A partir de entã o, a ilha caribenha passou a contar com
o apoio soviético e se viu livre das intervençõ es dos Estados Unidos, comuns na ilha desde a sua
independência em 1898.
Pá gina 34

Corbis/Latinstock

Visã o aé rea de mísseis e tanques de combustível em Sã o Cristó vã o, Cuba, durante a crise dos mísseis, em 1962.

Cuba tornou-se parceira especial da Uniã o Soviética, que passou a subsidiar a economia da ilha;
comprava praticamente toda a produçã o do açú car cubano e lhe fornecia petró leo e produtos
manufaturados a preços mó dicos. O açú car, por exemplo, era adquirido por Moscou a um preço
cinco vezes acima do mercado internacional. A parceria preferencial com os soviéticos e com os
países do Leste Europeu permitiu a Cuba um intenso desenvolvimento social que pô s o país latino-
americano em um padrã o acima dos demais. Além disso, o subsídio soviético nã o permitiu que o
embargo decretado pelos Estados Unidos contra Cuba surtisse efeito.

Durante a existência da Uniã o Soviética, Cuba teve o apoio e o patrocínio de que precisou para seu
desenvolvimento social. No entanto, dias piores estavam reservados à ilha e nã o tardaria o
momento em que o bloqueio começasse a provocar estragos.

Embargo: Proibição temporá ria de comércio. No caso cubano, o embargo foi decretado pelos Estados Unidos como retaliaçã o ao
país em optar pelo socialismo e aproximar-se do maior inimigo da potência capitalista. Foi decretado em fevereiro de 1962, e, em
dezembro de 2014, foram declaradas as primeiras medidas que podem indicar o fim do embargo, diante da histó rica reaproximaçã o
entre os dois países.

Conversando com a... Física!


ESCREVA NO CADERNO

O período da Guerra Fria, como sabemos, foi marcado pelo risco de uma guerra nuclear. A temida bomba atô mica
simbolizou esse período sombrio.
Corbis/Latinstock

Bomba atô mica – símbolo do medo latente vivido durante dé cadas – ainda assusta nos dias de hoje. Na fotografia, bomba
atô mica da variedade Fat Man, do mesmo tipo da lançada sobre Nagasaki, em 1945.

• Procure saber por que a bomba atô mica é chamada também de “nuclear” e sobre a letalidade desse tipo de artefato
bélico. A produçã o nuclear exige intenso conhecimento de Física e pode ser utilizada para fins pacíficos ou militares.
Dê exemplos das duas utilizaçõ es.
Pá gina 35

2.4 Sinais de mudanças


Além do episó dio da crise dos mísseis, a Guerra Fria teve outros momentos de tensã o. Ela,
igualmente, custou muito caro aos dois protagonistas, mas o fardo mais pesado coube à Uniã o
Soviética. Para se sustentar como superpotência, a Uniã o Soviética fez uma opçã o: priorizou a
indú stria militar e relegou o setor civil ao segundo plano, resultando no desabastecimento de bens
de consumo, conforme apresentado na fotografia a seguir. Foi exatamente essa contradiçã o entre
uma indú stria de bens de produçã o avançada (que atendia à demanda militar) e aquela de bens de
consumo, visivelmente obsoleta, um dos pilares da gravíssima crise do gigante socialista no final
dos anos 1980.

Igor Gavrilov/Time Life Pictures/Getty Images

As interminá veis filas sovié ticas: a produçã o insuficiente da economia burocratizada sovié tica nã o atendia à demanda civil,
gerando o racionamento e a escassez de produtos. Fotografia de 1990.

Em um contexto já marcado por uma transiçã o no Partido Comunista da Uniã o Soviética (PCUS) e
por uma crise econô mica e institucional cada vez mais difícil de esconder da populaçã o, é eleito
para o cargo mais alto do partido e do país o jovem político Mikhail Gorbachev.

Enxergando a delicada situaçã o do país, Gorbachev implementou um amplo programa de reformas.


No â mbito político, iniciou uma série de mudanças que se convencionou chamar de Glasnost
(transparência, em russo) e, no econô mico, igualmente, uma política de reestruturaçã o, ou, em
russo, Perestroika.

Os ares das mudanças soviéticas sopraram por todo flanco oriental da Europa (e daí para o mundo).
Um a um, os regimes pró -Moscou foram caindo, em grande parte por causa do descontentamento
popular, que clamava por reformas e liberdade.

Na Polô nia, o partido anticomunista Solidariedade foi legalizado e o líder sindical Lech Walesa, mais
tarde, alcançou a presidência. A Tchecoslová quia iniciou um tranquilo processo de separaçã o,
dando origem à Repú blica Tcheca e à Eslová quia. Já na Romênia e na ex-Iugoslá via, o processo de
transiçã o foi violento e bastante traumá tico, particularmente nos Bá lcã s, onde a Guerra da Bó snia
foi extremamente violenta. Na Romênia, o ditador Nicolae Ceausescu tentou resistir à s
manifestaçõ es populares que queriam sua destituiçã o e o fim foi melancó lico; Ceausescu foi fuzilado
e sua execuçã o, transmitida pela televisã o romena.

O momento maior das transformaçõ es no Leste Europeu ocorreria em 1989, quando os alemã es
derrubaram o maior símbolo da Guerra Fria, o Muro de Berlim. Essas mudanças anunciavam
realmente o rearranjo da ordem mundial.

Veja, no infográ fico nas pá ginas seguintes, um exemplo de como o cinema estadunidense veiculou o
conflito da Guerra Fria e sua visã o em relaçã o à vitó ria dos Estados Unidos sobre a Uniã o Soviética.

Bálcãs: Regiã o montanhosa do Sudeste Europeu. A expressã o serve para designar os países que um dia compuseram a Iugoslá via:
Bó snia-Herzegovina, Croá cia, Eslovênia, Macedô nia, Montenegro, Sérvia e as regiõ es de Kosovo e Voivodina.
Pá gina 36

Crédito do infográfico: Casa Paulistana


Pá gina 37

Atividades
ESCREVA NO CADERNO

1. O combate entre Drago e Rocky ilustra metaforicamente o embate entre quais sistemas? Caracterize-
os.

2. O infográ fico informa que “Os organizadores da luta oferecem a Rocky equipamentos com a mais
avançada tecnologia soviética”. No entanto, é sabido que a tecnologia soviética foi depauperando-se na
fase final da Guerra Fria. Você poderia explicar a razã o disso?
Pá gina 38

3. A nova ordem mundial


A ordem mundial do período da Guerra Fria foi caracterizada pelo confronto ideoló gico entre dois
blocos antagô nicos que se opuseram por quase meio século. Essa ordem internacional começou a
dar sinais de falência quando uma sucessã o de episó dios impactantes começou a eclodir. Observe a
fotografia ao lado e a apresentada na pá gina a seguir. As grandes transformaçõ es anunciavam uma
transiçã o de ordem e ocorreram, especialmente, no período 1989- 1991, embora toda a década de
1990 seja de profundas alteraçõ es no cená rio geopolítico internacional.

Michael Euler/AP/Glow Images

Está tua de Lenin ao chã o, em Bucareste, 1990. Sinais de mudança no Leste Europeu.

Veja algumas das mudanças que ocorreram no final dos anos 1980 e no início da década de 1990.

Evento Como foi?


A derrubada do Muro de Berlim No contexto das reformas oriundas da Uniã o
Soviética, no dia 8 de novembro de 1989, caía o
símbolo maior da Guerra Fria. Naquele momento de
crise do modelo socialista, soldados assistiram
inertes a milhares de manifestantes da Europa
oriental derrubando a barreira. Era a reunificação
das Alemanhas.
A queda do Leste Europeu Todos os regimes simpatizantes de Moscou caíram
nesse período. A queda do Leste Europeu significou,
na prá tica, o abandono do centralismo estatal e a
adoçã o do modelo de mercado. Alguns países dessa
regiã o integram hoje a Uniã o Europeia.
A Revolução de Veludo Separação pacífica entre Repú blica Tcheca e
Eslová quia, que se iniciou em 1989.
A Guerra do Golfo Apó s a invasã o do Kuwait pelo Iraque, em agosto de
1990, tropas da ONU lideradas pelos Estados Unidos
bombardearam, em fevereiro de 1991, as tropas
iraquianas e libertaram o pequeno país do golfo. O
mundo assistia naquele momento à açã o unilateral
dos Estados Unidos e ao silêncio da Uniã o Soviética.
O fim do Pacto de Varsóvia Em março de 1991, depois de longa agonia, uma
conferência de ministros dos países-membros do
Pacto de Varsó via anunciava a dissoluçã o da
organizaçã o militar que rivalizou com a Otan
durante a Guerra Fria.
O fim da URSS Apó s intensa crise, Gorbachev nã o conseguiu evitar
o fim do imenso país que deixava de existir em
dezembro de 1991.
A desintegração da Iugoslávia A morte do Marechal Tito, a crise do socialismo e o
fim da Uniã o Soviética foram os ingredientes que
deflagraram o processo de dissoluçã o do país, em
um traumá tico e sangrento processo que ficou
conhecido como Guerra dos Bá lcãs.

Ver
Adeus, Lenin! Direção: Wolfgang Becker. Alemanha, 2003.
Uma mulher, que reside na Alemanha Oriental e é defensora dos ideais socialistas durante a Guerra Fria, entra em
coma. Quando volta a si, o Muro de Berlim havia caído, porém sua família esconde o fato. Uma visã o bem-humorada
do fim da Guerra Fria.

Filme de Wolfgang Becker. Adeus, Lenin! Alemanha, 2003


Pá gina 39

Tom Stoddart Archive/Getty Images

Jovens alemã es destroem o Muro de Berlim, símbolo da Guerra Fria, em 1989.

A partir dessas transformaçõ es, especialmente o fim da Uniã o Soviética, o mundo deixava de
apresentar uma divisã o bipolar. As mudanças em curso, rapidamente, proporcionaram uma
alteraçã o na conjuntura do sistema internacional e reconfiguram a ordem, deixando de ser o mundo
caracterizado pela disposiçã o em duas frentes rivais, ou seja, a oposiçã o entre capitalismo e
socialismo.

A sucessã o de rupturas alterou o equilíbrio do poder mundial. Em outras palavras, rompeu-se a


ordem bipolar internacional.

A ideia imposta no princípio da década de 1990 foi a da multipolaridade econô mica. Dizia-se entã o
que houve uma substituiçã o da ordem bipolar por outra multipolar. A ideia difundida era:

• velha ordem mundial – ordem bipolar da Guerra Fria, marcada pelo confronto ideoló gico entre
Estados Unidos e Uniã o Soviética e seus respectivos modelos, capitalismo e socialismo.

• nova ordem mundial – ordem da multipolaridade econô mica, caracterizada pela formaçã o e
pela expansã o de polos econô micos de poder (os blocos regionais) e pela globalizaçã o.

Com o fim do bloco soviético, encerrou-se também a Guerra Fria. Os Estados Unidos despontavam
como a ú nica superpotência. Pairava uma atmosfera de que a ameaça global chegara ao fim, que o
modelo capitalista havia vencido o socialista. Adviria a partir de entã o um momento de paz e
harmonia entre os países, pautado pela ló gica liberal.

Os episó dios mundiais dali por diante passavam a ocorrer sob outro prisma e exigiam uma nova
leitura. Anunciava-se uma multipolarizaçã o econô mica, associada ao processo de globalizaçã o e
formaçã o de blocos, temas que serã o estudados nos capítulos seguintes desta unidade.

Francis Fukuyama, cientista político estadunidense e professor da Universidade Johns Hopkins, foi
o principal porta-voz desse momento que ele denominara de “fim da histó ria”, ou seja, depois de
longas décadas de embate entre sistemas distintos, a histó ria chegara ao fim com um vencedor: o
capitalismo; seu representante: os Estados Unidos. A grande potência lideraria um mundo por meio
de um sistema econô mico hegemô nico. Esse período dos anos 1990 coincidia com o auge de uma
vertente do capitalismo que estudamos anteriormente, o neoliberalismo.

Acontece que nem todos estavam dispostos a viver em um mundo sob controle dos Estados Unidos
e muitos discordavam do modelo de vida estadunidense ou do American way of life; de vá rias
partes viria forte oposiçã o à proposta daquilo que defendera Fukuyama.

Outro analista internacional desse período, cujas ideias muito repercutiram, foi Samuel P.
Huntington, que, além da teoria do “choque de civilizaçõ es”, apresentou uma nova leitura para a
ordem mundial que se pusera no final do século XX: a unimultipolaridade.

American way of life: Literalmente, “estilo de vida americano”, expressã o difundida a partir da segunda metade do século XX para
expressar a proposta de sociedade preconizada pelos Estados Unidos.

Pauta musical
Fora da ordem, Caetano Veloso. Álbum: Circuladô. Phonogram/Philips, 1991.
Pauta: Nova ordem mundial.

LP Circuladô . Caetano Veloso. Brasil, 1991


Pá gina 40

Enfoque
ESCREVA NO CADERNO

A unimultipolaridade

Atualmente há uma ú nica superpotê ncia. Mas isso nã o significa que o mundo seja unipolar. Um sistema unipolar teria
apenas uma superpotê ncia, nenhuma potê ncia de importâ ncia significativa e muitas potê ncias de menor grandeza. Dessa
forma, a superpotê ncia teria condiçõ es de resolver com eficá cia questõ es internacionais importantes, e nenhum tipo de
combinaçã o entre outros Estados seria capaz de evitar as decisõ es assim tomadas. Por vá rios sé culos o mundo clá ssico sob o
governo de Roma e por vezes o Extremo Oriente dominado pela China aproximaram-se desse modelo. Um sistema bipolar,
tal como verificado durante a Guerra Fria, é formado por duas superpotê ncias, e as relaçõ es entre elas sã o fundamentais
para a política internacional. [...] Já um sistema multipolar conta com vá rias potê ncias importantes de poderio compará vel,
que cooperam e concorrem entre si de acordo com modelos que apresentam variaçõ es constantes. [...]

A política internacional contemporâ nea nã o se encaixa em nenhuma dessas configuraçõ es. Em vez disso, representa um
estranho modelo de características híbridas, um sistema unimultipolar constituído por uma superpotê ncia e diversas
potê ncias altamente significativas. A resoluçã o das principais questõ es internacionais requer açã o por parte da ú nica
superpotê ncia, desde que, poré m, ela conte com a colaboraçã o de outros Estados importantes; essa ú nica superpotê ncia tem
poder, entretanto, de vetar as açõ es sobre questõ es relevantes adotadas por combinaçõ es entre outros Estados. Os Estados
Unidos, obviamente, sã o o Estado com preeminê ncia sobre os demais em todas as esferas de poder [...] sendo capaz de
promover seus interesses em praticamente todas as partes do mundo. Em um segundo nível encontram-se as principais
potê ncias regionais que predominam em determinadas á reas do planeta sem estar aptas, contudo, a expandir seus
interesses e potencialidades de modo tã o global como os Estados Unidos.

HUNTINGTON, Samuel P. A superpotência solitá ria. Política Externa. Sã o Paulo: Paz e Terra, 2000. v. 8, n. 4. p. 12-13.

• Por que, de acordo com o autor, nenhum dos modelos de configuraçã o da ordem mundial verificados previamente
(unipolar, bipolar e multipolar) se aplica à política internacional contemporâ nea?

4. A nova ordem reorientada


Diante da inegá vel superioridade dos Estados Unidos perante os demais, havia um conjunto de
países, ou ao menos grupos dentro desses países, que nã o queria sofrer interferência dos
estadunidenses e se posicionava com uma indisfarçá vel antipatia e resistência ao país. Foi
sobretudo nesses lugares que surgiram grupos extremistas que tinham nos Estados Unidos a
inspiraçã o para atos terroristas. Isso era particularmente notado em países de cultura islâ mica,
embora o islamismo seja uma religiã o baseada na paz. Em nenhum momento o islamismo advoga
apologia à violência.

Foram vá rios os atentados que despontaram no ocaso da Guerra Fria, quase sempre contra alvos
estadunidenses, porém fora de seu territó rio e frequentemente em países muçulmanos. No entanto,
foi com apreensã o poucas vezes vista na histó ria que a comunidade internacional recebeu, pasma,
os episó dios do fatídico 11 de Setembro: começava o século XXI.

Na manhã de 11 de setembro de 2001, ataques terroristas ocorreram contra os símbolos do poder


econô mico e militar dos Estados Unidos. Quatro aviõ es foram sequestrados: dois atingiram as
torres gêmeas do World Trade Center, que representava a pujança econô mica do país; um atingiu o
Pentá gono, sede do Departamento de Defesa estadunidense; e o ú ltimo, que tinha como alvo o
poder político, provavelmente a Casa Branca, caiu antes na Pensilvâ nia. Apesar de o alvo ter sido os
Estados Unidos, dentre as cerca de 2 800 pessoas que morreram no World Trade Center, 100 no
Pentá gono e 200 nos aviõ es, contavam-se cidadã os de mais de 40 países. Observe as fotografias na
pá gina a seguir.
Islamismo: Religião monoteísta surgida no século VII, criada por Muhammad (Maomé) e que tem as mesmas raízes do judaísmo e
do cristianismo. Islamismo quer dizer “submissã o a Deus” e quem segue essa religião é chamado de muçulmano, que significa
“submisso a Deus”.

Navegar
Instituto Brasileiro de Relações Internacionais <http://tub.im/dhnxxy>
O site do Instituto Brasileiro de Relaçõ es Internacionais fornece subsídios para compreensã o do cená rio político
internacional. Há um link em que o estudante pode acessar a Revista Brasileira de Política Internacional e o Boletim
Meridiano, que trazem inú meros artigos sobre a conjuntura internacional.
Pá gina 41

Fotografias: Ray Stubblebine/Reuters/Latinstock

Em 11 de setembro de 2001, pela primeira vez, os Estados Unidos foram alvejados dentro de seu territó rio contínuo.
Atribuiu-se a Osama bin Laden e sua organizaçã o, a Al-Qaeda, a autoria dos ataques. A sequê ncia de fotografias retrata o
desmoronamento da Torre Norte do World Trade Center.

4.1 A “guerra ao terror”


Os Estados Unidos estavam com um presidente recém-eleito: George Walker Bush, retratado na
fotografia abaixo, representante da ala mais conservadora do Partido Republicano e atrelado aos
falcõ es. A resposta aos ataques nã o tardou: foi rá pida e dura. Inaugurava-se ali uma nova fase da
política externa estadunidense, pautada pelo unilateralismo do pó s-Guerra Fria.

Se quem patrocinou o 11 de Setembro pretendia intimidar os Estados Unidos, o que se viu foi o
contrá rio. Com base em uma nova doutrina que se convencionou designar de “guerra ao terror”, o
governo Bush partiu para uma reaçã o altamente rígida. Uma vez identificado Osama bin Laden
como mentor dos atentados, os Estados Unidos atacaram o Afeganistã o, ainda em 2001. Esse país
vivia sob regime da organizaçã o considerada “terrorista” pelos Estados Unidos, o Talibã , e que dava
guarida à Al-Qaeda, grupo extremista fundado por Osama bin Laden. O Talibã era chefiado por Mulá
Omar, aliado e sogro de Osama bin Laden.

Os Estados Unidos obtiveram êxito no intuito de derrubar o regime Talibã e empossaram no


Afeganistã o um presidente aliado, Hamid Karzai, mas a vitó ria nã o foi acompanhada de
estabilidade, pois o grupo fundamentalista se reorganizou e partiu para a guerrilha, concentrando-
se nas montanhas afegã s e paquistanesas. Observe a fotografia abaixo, à direita. A instabilidade
segue até hoje. Na Guerra do Afeganistã o, em 2001, os Estados Unidos nã o conseguiram encontrar
Bin Laden, que seria morto no Paquistã o em 2011, em uma açã o do serviço secreto estadunidense.

Falcões: Políticos pertencentes à alta cú pula do poder estadunidense durante o governo George W. Bush (2001-2008), vinculados
ao Partido Republicano e que apresentavam uma perspectiva altamente agressiva para a resoluçã o de conflitos, inclinados à opçã o
militar em vez da diplomá tica. Também chamados de neocons (novos conservadores).

Fundamentalista: Expressã o que se tornou sinô nimo de extremismo, terrorismo. Fundamentalista é o sujeito ou grupo que,
arraigado aos seus valores, normalmente movido por uma crença religiosa, nã o aceita outra verdade que nã o a sua. Embora os
islâ micos sejam os mais conhecidos, existem movimentos fundamentalistas judaicos, hinduístas e cristã os. Também há grupos
fundamentalistas moderados que atuam na seara parlamentar, como na Turquia, em que o partido político AKP – iniciais, em turco,
para Partido da Justiça e Desenvolvimento –, de inspiraçã o islâ mica, alçou ao poder.
Shawn Thew/AFP/Getty Images

Chad Hunt/Corbis/Latinstock

A Guerra do Afeganistã o em 2001, motivada apó s os ataques em 11 de setembro de 2001, é levada a cabo pelo governo Bush
a partir da doutrina da “guerra ao terror”. Na fotografia à esquerda, George W. Bush discursa em Portland, Estados Unidos,
em 2002. À direita, soldados estadunidenses no Afeganistã o, em 2006.
Pá gina 42

Ainda no contexto da “guerra ao terror”, os Estados Unidos entenderam que o Iraque de Saddam
Hussein era uma ameaça à paz mundial e um Estado associado ao terrorismo. Aqui cabe uma
explicaçã o: Saddam Hussein nunca foi um democrata e perseguia ferozmente os seus adversá rios.
Era um tirano, nã o um terrorista, e até entã o o país era um Estado organizado e nunca esteve
atrelado ao terrorismo; pelo contrá rio, o via como ameaça. Ao que se sabe, Saddam Hussein e
Osama bin Laden eram inimigos.

Nã o tardou para que o país do Golfo Pérsico fosse atacado, invadido e colocado sob a ocupaçã o das
forças estadunidenses e britâ nicas em 2003. A alegaçã o para os ataques ao Iraque foi a acusaçã o de
que Saddam Hussein detinha perigosas armas de destruiçã o em massa. A informaçã o era garantida
pela Agência Central de Inteligência (CIA). O regime iraquiano foi derrubado em 2003, mas as tais
armas jamais foram encontradas. Anos mais tarde foi confirmado que o principal agente da CIA
envolvido no caso havia mentido e dado informaçõ es falsas para justificar a invasã o do país á rabe.
Essas informaçõ es inverídicas foram a base do discurso de Collin Powel, secretá rio de Estado dos
Estados Unidos, no discurso na ONU para justificar a Guerra do Iraque e que antecedeu os ataques
em 2003. Em livros de memó rias, o ex-chefe da CIA George Tenet afirma que a central de
inteligência se enganou, e Donald Rumsfield, ex-secretá rio de Defesa, diz que “houve um mal-
entendido”. Esse “mal-entendido” custou a vida de mais de 100 mil civis iraquianos e outros tantos
milhares de soldados estadunidenses.

A invasã o ao Iraque de 2003 nã o surtiu os efeitos desejados. Com a dissoluçã o do regime de


Saddam Hussein, o Iraque se transformou, na prá tica, em uma espécie de abrigo de terroristas de
vá rias partes do mundo. Entre eles, surgiu a AQI (Al-Qaeda no Iraque), fundada pelo jordaniano
Abu Musab al-Zarqawi, pró ximo de Osama bin Laden, a quem conhecera nas montanhas afegã s nos
anos 1980. Apó s a morte de al-Zarqawi em 2006, o grupo passou a se chamar ISI (Estado Islâ mico
do Iraque), depois Isis (Estado Islâ mico do Iraque e Síria ou Levante) e, em 2014, apenas EI
(Estado Islâ mico), cujo líder má ximo, Abu Bakr al-Baghdadi, se autointitula califa.

As açõ es terroristas do Estado Islâ mico nos ú ltimos anos têm impressionado o mundo. Em 2015, a
França sofreu duas: em janeiro, contra a sede do jornal satírico Charlie Hebdo e, em novembro,
uma série de ataques, entre eles, a uma casa de shows. Em março de 2016, o alvo foi Bruxelas,
capital da Bélgica. Os ataques ao aeroporto e a uma estaçã o de metrô deixaram mais de 30 mortos.

Califa: Palavra de origem á rabe que significa “sucessor”. Essa expressã o foi difundida especialmente apó s a morte do profeta Maomé
para designar o líder político e religioso que iria sucedê-lo.
Dan Kitwood/Getty Images

Na fotografia, marcha realizada em Paris, França, apó s o atentado à sede do jornal Charlie Hebdo, em 2015. Os
manifestantes protestavam contra o extremismo religioso e defendiam a liberdade de expressã o.

Ver
Fahrenheit: 11 de setembro. Direção: Michael Moore. Estados Unidos, 2004.
Documentá rio que aborda contradiçõ es e aspectos obscuros da família Bush e dos reais interesses que moveram
George W. Bush a declarar “guerra ao terror”, que resultou na ocupaçã o militar do Iraque e do Afeganistã o.

Filme de Michael Moore. Fahrenheit: 11 de setembro. EUA, 2004

Jogo de poder. Direção: Doug Liman. Estados Unidos, 2010.


Filme que mostra os bastidores da Guerra do Iraque em 2003, quando agentes da CIA mentiram sobre as supostas
armas de destruiçã o de Saddam Hussein.
Pá gina 43

Simultaneamente à s transformaçõ es geopolíticas que caracterizam o mundo no final do século XX e


início do século XXI, uma remultipolarizaçã o da ordem econô mica em curso trazia novas matizes
para a compreensã o de mundo. Apó s o período de flagrante unilateralismo dos Estados Unidos e
que culminou com um melancó lico fim do governo Bush, a ponto de ser considerado “o pior
presidente da histó ria dos Estados Unidos”, seguiu-se em 2008 uma grave crise econô mica mundial.
Os Estados Unidos aparentemente perdiam a condiçã o de hegemonia inconteste do sistema
internacional para passar a compartilhar decisõ es com algumas potências emergentes. Contudo, ao
contrá rio do que muito se apregoa, parece estar longe o dia em que deixarã o de ser grande
potência. A tendência mais prová vel nos pró ximos anos é de uma certa reorganizaçã o do mundo
similar ao que se viu antes da Segunda Guerra Mundial, com Estados Unidos, Europa e China na
condiçã o de atores centrais do sistema internacional, mas seguidos por potências regionais
ascendentes, como sã o o caso de Índia, Brasil e mesmo Rú ssia, ainda grande potência militar.

É esse cená rio do século XXI que estudaremos nos pró ximos capítulos.

ROTEIRO DE ESTUDO
ESCREVA NO CADERNO

Revisando

1. Como é estabelecida uma ordem mundial?

2. O primeiro-ministro britâ nico Winston Churchill apresentou o novo cená rio, trazendo para o glossá rio
das relaçõ es internacionais a expressã o cortina de ferro. O que significa essa expressã o? Qual é sua
origem?

3. Apó s a Segunda Guerra Mundial, estabeleceu-se um novo período na histó ria mundial, um cená rio
favorá vel à aplicaçã o da geopolítica como ferramenta do poder. O que foi a Guerra Fria e como a
geopolítica foi utilizada?

4. A Alemanha foi dividida em dois países apó s a Segunda Guerra Mundial. Explique por que isso
ocorreu.

5. Quais foram as transformaçõ es que levaram ao término da ordem bipolar da Guerra Fria?

6. O que diferencia a nova ordem mundial dos anos 1990 da antiga ordem do período 1945-1991?

7. O que representaram os episó dios do 11 de Setembro? Aponte causas e consequências desse atentado
que reorientou a ordem internacional.

8. A Conferência de Potsdam ocorreu em julho de 1945 e reuniu as três grandes potências aliadas:
Estados Unidos, Uniã o Soviética e Reino Unido. Por que essa conferência é considerada importante?

9. Caracterize o espaço alemã o:

a) apó s o término da Segunda Guerra Mundial;

b) apó s a queda do Muro de Berlim.


Olhar cartográfico

• Observe nos mapas a seguir a evoluçã o das fronteiras no Leste Europeu e apresente suas conclusõ es.

Allmaps

Fonte: JORDAN, David; WIEST, Andrew. Atlas da Segunda Guerra Mundial. Sã o Paulo: Escala, 2009. v. 1, p. 12.
Pá gina 44

ROTEIRO DE ESTUDO
ESCREVA NO CADERNO

Allmaps

Fonte: CHALIAND, Gérard; RAGEAU, Jean-Pierre. Atlas estratégico y geopolítico: geopolítica de las relaciones de fuerza en el
mundo. Madrid: Alianza Editorial, 1984. p. 39.
Allmaps

Fonte: ATLAS geográ fico escolar. 6. ed. Rio de Janeiro: IBGE, 2012. p. 43.
Pá gina 45

Atividade em grupo

Muitos dos grupos fundamentalistas existentes no mundo agem em nome de uma fé cega e se dizem
muçulmanos. No entanto, a grande maioria dos muçulmanos nã o se identifica com esses grupos que
deturpam os valores do islã . Pesquisem sobre esses grupos fundamentalistas, onde agem e apontem as
diferenças entre islamismo e terrorismo.

De olho na mídia

A ordem internacional do século XXI foi pautada em grande parte pelo combate à atuaçã o dos grupos
considerados extremistas. Atualmente, Estado Islâ mico e Al-Qaeda sã o considerados os mais atuantes,
mas há muitos outros. Leia o artigo a seguir e procure entender, com o auxílio do capítulo e de suas
leituras, por que tal estratégia extremista move e preocupa grande parte do mundo.

Por que a reação ocidental aos ataques terroristas do Estado Islâmico alimenta o grupo

Atentados provam que o EI sabe provocar em seus alvos reações que aumentam o número dos seus guerreiros voluntários

Previsto por analistas, comentaristas e, principalmente, pelas agências de inteligê ncia, mais um evento terrorista do Estado
Islâ mico (EI) ocorreu na noite de 13 de novembro de 2015, novamente em Paris. Homens-má rtires atiraram para matar
pessoas dentro e fora de espaços de entretenimento.

Para o EI, nada de pensamento livre e crítico como o do Charlie Hebdo; nada de costumes ocidentais de lazer, turismo, ou
outra religiã o, Estado etc. e tal. Ele forçou o governo francê s a decretar o estado de emergê ncia; tentou inibir a presença
europeia na guerra declarada contra si no Iraque e na Síria; provocou, acoplado à derrubada de aviã o russo pela Turquia, o
vazamento de informaçã o de que esta seria a maior compradora do petró leo sob sua gestã o; fez irradiar uma campanha
ocidental intensa contra o recrutamento de jovens europeus por meio de redes sociais; colocou em xeque as medidas de
integraçã o promovidas pela Bé lgica; avolumou as suspeitas sobre os refugiados que desembarcam nas praias gregas;
provocou o reaparecimento de prá ticas de Estado do nazismo no controle e translado de refugiados; calou os moderados
islâ micos pacifistas.

O EI pretende instituir seu califado unificador e para tal produz efeitos em fluxos a partir de suas investidas estraté gicas pelo
terror no ocidente. Dissemina o medo, fomenta a guerra, anula diplomacias e despreza a democracia. Sua conduta també m
acende imprescindíveis ligaçõ es diplomá ticas em blocos que opõ em adversá rios de velhos tempos como Rú ssia e Estados
Unidos (aproximados como sempre de Inglaterra e... França), alé m de almejar submeter os xiitas. Trata-se, enfim, de uma
religiã o cindida politicamente.

É um grupo que sabe o que quer e como jogar com as forças organizadas. Deseja levar ao limite as novas tecnologias de
combate e, ao mesmo tempo, glorificar seus má rtires para instituir uma religiã o exclusiva. Tem seu exé rcito recrutado de
variados modos, mas no principal nã o se diferencia das forças armadas dos demais Estados. O EI, com sua presença
terrorista em 13 de novembro, moveu os jovens franceses a se alistarem nas suas forças armadas. Evidenciou-se com isso
que os Estados, sob qualquer regime, estã o organizados para guerras, precisam de guerras para manter suas respectivas
seguranças, e contam para tal com a adesã o da grande maioria da populaçã o. Enfim, EI e seus Estados inimigos se equivalem.

As elites ocidentais estã o interessadas em fraternidade, o terceiro vé rtice do triâ ngulo equilá tero herdeiro da Revoluçã o
Francesa, e contam com o pacifismo islâ mico para levá -lo a resplandecer. O planeta cada vez mais governado para a
democracia de inspiraçã o estadunidense se manté m na rota da boa governança com sua gestã o transterritorial afiançada
pelo Conselho de Segurança da ONU, forças empresariais, sociedades civis organizadas e parlamentos conectando esforços
para a realizaçã o do desenvolvimento sustentá vel até 2030, com ou sem EI.

[...] Na Europa, assim como nos Estados Unidos, tudo depende do eficiente monitoramento de pessoas, grupos inimigos,
infiltrados, á reas de circulaçã o, controles aé reos, alvos bem delimitados para efeitos de bombas para a boa gestã o dos
combates ao inimigo declarado. Mas como essa é uma guerra nada convencional, ela produz estados de violê ncias quase
incontrolá veis, porque o EI é capaz de espantar a qualquer momento. Na manhã de 12 de janeiro de 2016, no bairro turístico
de Sultanahmet, pró ximo à Mesquita Azul, em Istambul, na ambígua Turquia, sucedeu uma terceira ofensiva com mortos –
depois de Surouç e do atentado de 10 de outubro pró ximo à estaçã o de trem de Ancara, durante manifestaçã o pró -criaçã o do
Curdistã o, deixando outros 97 mortos.
Imagina-se que as redes de segurança transterritoriais estejam mapeando possíveis outras miras do EI. Enquanto isso, as
populaçõ es temerosas clamam por mais segurança e, a seu modo, proporcionam o crescimento dos monitoramentos estatais
assim como de forças fascistas, institucionalizadas ou nã o nos parlamentos. O EI explicita como a Al-Qaeda introduziu um
programa de expansã o fundamentalista islâ mica e que ele sabe, pelo menos até agora, como produzir variadas interfaces
tornando difícil sua contençã o. Talvez busque, no futuro pró ximo, uma medida drá stica em termos políticos e ambientais. A
derrubada do tirano sírio, nesse contexto, nã o passa de um chiste para a governança planetá ria. Nã o há nada de novo no
front.

PASSETTI, Edson. Por que a reaçã o ocidental aos ataques terroristas do Estado Islâmico alimenta o grupo. Zero Hora, 16 jan. 2016. Disponível em:
<http://zh.clicrbs.com.br/rs/noticias/proa/noticia/2016/01/por-que-a-reacao-ocidentalaos-ataques-terroristas-do-estado-islamico-alimenta-o-grupo-4952783.html>. Acesso em:
2 fev. 2016.
Pá gina 46

Estados Unidos: a
CAPÍTULO 3 -
hiperpotência

Richard Ellis/Alamy/Latinstock Dieter Spears/Getty Images

Thaiview/Shutterstock.com

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Crédito do infográ fico: Casa Paulistana


Pá gina 47

Tópicos do capítulo

A Doutrina Monroe

O Corolário Roosevelt

A Doutrina Truman

A economia dos Estados Unidos

A sociedade estadunidense

Ponto de partida
ESCREVA NO CADERNO

O estilo de vida estadunidense, ou American way of life, evidencia o poder econô mico dos Estados
Unidos e a sua condiçã o de hiperpotência global construída ao longo da histó ria por meio de políticas
agressivas e controversas. Atualmente, o país apresenta grande dependência de combustíveis fó sseis e
graves problemas sociais, derivados da desigualdade econô mica e do preconceito contra negros e
imigrantes.

1. Os Estados Unidos sã o uma hiperpotência global, caracterizada pelo alto dinamismo econô mico. No
entanto, nem toda a populaçã o desse país é beneficiada pelo estilo de vida estadunidense. Explique as
causas dessa desigualdade social.

2. Por que a dependência de combustíveis fó sseis é um fator preocupante para os Estados Unidos?
Pá gina 48

1. A Doutrina Monroe
Os Estados Unidos terminaram o século XX e iniciaram o século XXI na condiçã o de maior potência
mundial, a ú nica hiperpotência. Em que pese já há algum tempo ser anunciado um possível fim da
hegemonia estadunidense, a verdade é que, mesmo ao final da segunda década do novo século, o
país segue na condiçã o de mais influente do mundo.

Os Estados Unidos construíram historicamente a posiçã o de potência completa, ou seja, é:

• potência econô mica, por apresentar o maior PIB mundial e por todo o dinamismo que caracteriza
sua economia;

• potência militar, por construir a maior máquina de guerra de todos os tempos, com o uso, por
exemplo, das ogivas nucleares;

• potência tecnoló gica, pela imensa capacidade de produçã o técnica e científica e por concentrar
algumas das melhores universidades do mundo;

• potência política, pelo poder de influência e capacidade de persuasã o no sistema internacional e


por ser membro permanente do Conselho de Segurança da ONU;

• potência cultural, pela imensa difusã o mundial de costumes e de produtos culturais de alcance
global nas á reas de cinema, mú sica e outras expressõ es artísticas e literá rias.

Essa condiçã o especial, adquirida ao longo do tempo pelos Estados Unidos, está associada à histó ria
de sua expansã o territorial: das treze colô nias iniciais, constituídas nos séculos XVII e XVIII, ao
quarto maior país do mundo em extensã o territorial.

Além da pujante economia construída desde meados do século XIX, a geopolítica interna e externa
estadunidense (em um primeiro momento isolacionista e depois intervencionista) está por trá s do
seu grau de desenvolvimento. Observe o mapa ao lado e o apresentado na pá gina a seguir e
compare as mudanças na constituiçã o territorial dos Estados Unidos, desde a formaçã o das treze
colô nias até a atual organizaçã o territorial composta por 50 estados.

A Doutrina Monroe, o mais importante conjunto de pensamentos da política isolacionista dos


Estados Unidos, foi estabelecida em 1823 pelo presidente James Monroe. É muito clara em seu
intuito de afastar qualquer cogitaçã o europeia de recolonizaçã o da América, diante do contexto de
reorganizaçã o do velho continente apó s o turbulento período das guerras napoleô nicas. Contudo,
também traz uma mençã o de premeditada dubiedade quando externa seu lema: "A América para os
americanos". Como toda mensagem velada, há um quê de indefiniçã o na frase: seria a Doutrina um
aviso para que se respeitasse a autonomia dos recém-independentes países americanos ou um
aviso subliminar das intençõ es intervencionistas do ascendente país?
Allmaps

Fonte: ALBUQUERQUE, Manoel Maurício de et al. Atlas histórico escolar. 8. ed. Rio de Janeiro: Ministério da Educaçã o: FAE, 1991.
p. 70.
Pá gina 49

Allmaps

Fonte: UNITED STATES CENSUS BUREAU. Disponível em: <http://www.census.gov/schools/facts>. Acesso em: 10 dez. 2015.

Um misto das duas intençõ es, como a histó ria tratou de mostrar, parece explicar melhor esse
documento que esboçou a cartilha geopolítica do país.

É muito comum entre os estudiosos entender a Doutrina Monroe como um marco da construçã o do
poderio estadunidense, muito embora limites histó ricos rígidos sejam sempre passíveis de
questionamento. Outros remetem ao pró prio processo de colonizaçã o, que se deu de forma
diferenciada no país e ao isolacionismo que caracterizou sua histó ria até a Primeira Guerra
Mundial. O Destino Manifesto é outro ingrediente a ser considerado no processo expansionista
estadunidense.
Séc. XX. Cartoon. Coleçã o particular. Fotografia: The Granger Collection/Otherimages

Uma bem-humorada alusã o aos dizeres da Doutrina Monroe. A charge ilustra o momento de declaraçã o da Doutrina Monroe
ao mundo, em 1823, mostrando o Tio Sam, símbolo mundialmente conhecido pela personificaçã o do sentimento nacionalista
dos Estados Unidos, como guardiã o e, também, proprietá rio do continente americano.
Pá gina 50

Destino Manifesto

A expressã o Destino Manifesto remete a uma teoria estadunidense que advoga a supremacia do povo americano
anglo-saxã o sobre os demais. Trata-se de um pensamento inspirado no puritanismo protestante que entendia que
esse povo era o escolhido por Deus para cumprir uma missã o na América. Percebe-se clara a alusã o à passagem
bíblica que narra a saga do povo hebreu, igualmente escolhido por Deus em busca da terra prometida. Em nome
dessa crença, os indígenas do Oeste foram dizimados e os povos adjacentes, subjugados, enquanto se realizavam as
conquistas territoriais.

O Destino Manifesto coincidiu histó rica e filosoficamente com uma crença similar que se propagou entre os europeus
(“o fardo do homem branco”) em relaçã o aos povos africanos e asiá ticos, dentro da concepçã o de que eram
igualmente submetidos ao imperialismo dos países da Europa.

A conquista dos territó rios que atualmente fazem parte do oeste e do sul dos Estados Unidos foi realizada sob a
ideologia do Destino Manifesto.

c. 1873. Cromolitografia. Coleçã o particular. Foto: Corbis/Latinstock

Alegoria sobre a ideia do Destino Manifesto, muito difundida no sé culo XIX. Propaga a ideia de progresso guiado pela aura
angelical da fé cristã , seguida pelos colonos, contra o suposto atraso civilizacional dos indígenas e mexicanos.

A Doutrina Monroe foi por todo o século XIX e parte do XX a pedra angular da política externa do
país. Foi invocada vá rias vezes nesse período para rechaçar pretensõ es britâ nicas, francesas e
alemã s na América. Apesar de distintas na concepçã o (uma de orientaçã o política, outra religiosa), a
Doutrina Monroe e o Destino Manifesto muitas vezes se fundiram no propó sito de assegurar a
aptidã o expansionista estadunidense. Dessa fusã o brotou a ideia de que era destino dos Estados
Unidos se sobrepor aos demais países da América, logo, ocupá -los. Muitas aquisiçõ es territoriais se
fizeram sob a aura da Doutrina: o Texas, adquirido junto ao México, em 1845; Oregon, em 1846;
Novo México, Arizona e Califó rnia, tomados do México, que perdeu metade de seu territó rio, em
1848; e o Alasca, que foi comprado junto ao Império Russo ao preço de US$ 7,2 milhõ es em 1867.
Somente a Louisiana foi adquirida junto à França antes da Doutrina, em 1803. Observe o mapa da
expansã o territorial dos Estados Unido apresentado na pá gina ao lado.

Inicialmente isolacionista, a Doutrina assumia uma clara posiçã o de defensora da América,


invocando o direito da independência das naçõ es latino-americanas perante as coroas hispâ nica e
portuguesa. Na mensagem oficial enviada ao Congresso, o presidente Monroe deixava claro que nã o
admitiria nenhuma intervençã o armada na América por parte dos europeus, pois seria encarada
como uma ameaça aos Estados Unidos. Em troca, o país renunciava, igualmente, a qualquer
intervençã o na Europa.
Pá gina 51

Allmaps

Fonte: HAYWOOD, John. Atlas histórico do mundo. Colô nia: Kö nemann, 2001. p. 181.

Apesar do tom de alerta, os Estados Unidos pouco podiam fazer em relaçã o a prá ticas
intervencionistas europeias que persistiram até o final do século XIX. A partir desse momento,
quando se viram fortalecidos economicamente, a Doutrina Monroe se tornou mais efetiva,
mudando de uma perspectiva progressista-defensiva para uma conservadora-ofensiva. Deste
momento em diante, vá rios países da América passaram a sofrer intervençõ es nã o por parte da
Europa, mas da potência emergente do Norte.

O infográ fico da pá gina a seguir apresenta o processo de formaçã o do territó - rio estadunidense e
sua configuraçã o geopolítica em uma analogia com as regras e características do futebol americano.

A Geografia na... arte!


ESCREVA NO CADERNO

A Está tua da Liberdade é um patrimô nio mundial da Unesco e também considerada uma das sete maravilhas do
mundo. O escultor Frederic-Auguste Bartholdi e os arquitetos Eugene Emmanuel Viollet-le-Duc e Alexandre-Gustave
Eiffel (o mesmo que projetou a Torre Eiffel) sã o os responsáveis pela magnífica obra de proporçõ es impressionantes.
O monumento de 1886 é um presente do governo francês ao governo estadunidense.

• Procure saber as razõ es que levaram a França a presentear os Estados Unidos com uma das maiores obras da
humanidade e o respectivo contexto histó rico.
KC Alfred/ZUMA Press/Corbis/Latinstock

Está tua da Liberdade, em Nova York, Estados Unidos, 2015.


Pá gina 52

Crédito do infográ fico: Casa Paulistana

AS CORES SÃO MERAMENTE ILUSTRATIVAS

A REPRESENTAÇÃO ESTÁ FORA DE PROPORÇÃO


Pá gina 53

Atividades
ESCREVA NO CADERNO

1. O infográ fico faz uma analogia entre o futebol americano e a formaçã o territorial dos Estados Unidos.
Busque no capítulo uma justificativa ideoló gica decisiva na composiçã o territorial do país e que de certa
forma pode ser relacionada à mensagem contida no infográ fico.

2. “Contando as jardas para o oeste”: por que para o oeste?

3. Qual foi a dinâ mica de posse realizada pelo governo no processo de formaçã o do territó rio
estadunidense?
Pá gina 54

2. O Corolário Roosevelt e a política do Big Stick


O termo corolário contém uma conotaçã o de continuidade, prosseguimento. Logo, a expressã o
Corolário Roosevelt entende-se como continuidade da Doutrina Monroe, como bem definiu o
presidente estadunidense Theodore Roosevelt (1901-1909), que a anunciou em 1904, chamando
sua política externa de um “corolá rio à Doutrina Monroe”.

Ted Roosevelt, como se tornou conhecido, assumiu a presidência em 1901 em decorrência do


assassinato do presidente William McKinley e impô s uma perspectiva agressivamente
expansionista à política externa do país. Foi ele quem difundiu o provérbio “fale suave, mas
carregue um grande porrete”. Sua “política do Big Stick”, como ficou conhecida, foi aplicada a partir
de seu governo. Anunciava-se que os Estados Unidos deveriam assumir uma posiçã o, “mesmo que
relutante”, de combate à “delinquência” de alguns Estados americanos; daí a necessidade da
intervençã o, já que o que guiava a política externa do país era a Doutrina Monroe. Como, pela ló gica
estadunidense, essa doutrina impedia a presença europeia nas Américas, era dever dos Estados
Unidos impor uma ordem ao continente para evitar turbulências.

The Granger Collection, Nova York/Glow Images

Theodore Roosevelt impõ e sua nova diplomacia à Amé rica. Charge de Louis Dalrymple, 1905.

Dentro dessa perspectiva, a intervençã o armada foi uma constante durante os dois governos de Ted
Roosevelt e também no de seu sucessor, Woodrow Wilson (1913-1921). Ambos os governos no
início do século XX sã o caracterizados pela perspectiva expansionista e interventora, embora
opostos na formaçã o política: Roosevelt era um republicano com nuances conservadoras e discurso
duro, enquanto Wilson era um humanista, democrata e professor universitá rio. De maneira
contraditó ria, Wilson acreditava que a democracia era o caminho e precisava ser levada por todos
os meios aos países que ainda nã o haviam optado por esse modelo, mesmo que à ponta de uma
baioneta. E assim se sucedeu.

Interagindo

ESCREVA NO CADERNO

• Sabemos que Barack Obama sucedeu George W. Bush na presidência dos Estados Unidos em 2008. Que pontos
comuns você enxerga entre Obama e Bush e entre Wilson e Roosevelt?
2.1 As intervenções dos Estados Unidos na América
Em 1898, no contexto da independência cubana, os Estados Unidos declararam guerra à Espanha,
alegando que um encouraçado seu, o Maine, havia sido bombardeado; posteriormente, descobriu-se
tratar de um ataque forjado para justificar a entrada na guerra que, na realidade, os cubanos
liderados por José Martí realizavam. Venceram facilmente a Espanha e substituíram a decadente
potência colonial no espaço centro-americano.

José Martí (1853-1895): Poeta revolucioná rio e líder da independência de Cuba.


Pá gina 55

Os Estados Unidos ocuparam entã o militarmente a ilha de Cuba até que se delineasse um governo
no país recém-independente. Assim, participaram diretamente de sua independência e, em 1901,
foi aprovada a famigerada Emenda Platt, pela qual Cuba aceitava constitucionalmente as
ingerências militar e econô mica dos Estados Unidos, concedendo o territó rio cubano para
instalaçõ es de bases militares. Uma das dimensõ es da Emenda Platt foi a concessã o por parte do
submisso governo cubano de um trecho da porçã o oriental da ilha aos estadunidenses,
Guantá namo, até o ú ltimo ano do século, ou seja, 1999. No entanto, como é de conhecimento
pú blico, até 2015, a base de Guantá namo continuava sob poder dos Estados Unidos, abrigando
diversos prisioneiros e funcioná rios militares e civis. Veja o mapa a seguir.

Allmaps

Fonte: CASA Branca mantém compromisso de fechar Guantánamo. Exame, 5 abr. 2011. Disponível em:
<http://exame.abril.com.br/economia/mundo/noticias/casa-branca-mantem-compromisso-de-fechar-prisaode-guantanamo--3>.
Acesso em: 10 dez. 2015.

Consolidado o domínio estadunidense sobre a ilha, Cuba converteu-se em uma economia


monocultora e exportadora de açú car aos vizinhos do norte. A United Fruit Company, uma empresa
agrícola estadunidense, chegou a deter mais da metade do espaço ará vel de Cuba. Essa situaçã o de
uma pseudorrepú blica alimentícia foi abalada nos anos 1940 por um processo revolucioná rio na
ilha, que culminou com a vitó ria do movimento liderado por Fidel Castro e Ernesto “Che” Guevara
na Revoluçã o Cubana de 1959.

Outra açã o marcante da Doutrina Monroe, e que se deu sob o governo Roosevelt, está relacionada
ao Canal do Panamá . O desejo de ligar os oceanos Atlâ ntico e Pacífico no istmo da América Central
já era bastante antigo devido à necessidade de encurtar as distâ ncias e diminuir os custos do
comércio marítimo internacional. Antes da construçã o do canal, os navios que estavam no Atlâ ntico
contornavam toda a América do Sul e enfrentavam os desafios e obstá culos gelados do Estreito de
Magalhã es, no extremo sul do continente, para chegar ao Pacífico. Para os Estados Unidos a
construçã o do canal também significava uma nova ligaçã o entre a costa leste e a oeste do país pela
via marítima. Além da importâ ncia geoeconô mica, o controle do canal também tinha valor
geopolítico.

A primeira tentativa de construçã o foi com a França, por meio da empresa de engenharia do
arquiteto Ferdinand de Lesseps, o mesmo que projetara o Canal de Suez. Em 1879, Lesseps
adquirira a concessã o junto ao governo da Colô mbia, país ao qual pertencia o atual Panamá, e no
ano seguinte iniciara a obra. Porém, uma epidemia de malá ria e o insucesso em corrigir a altimetria
do relevo para a construçã o do canal levaram à falência da empresa de Lesseps e interromperam o
projeto. Era uma época em que coincidia o declínio francês com a ascensã o geopolítica
estadunidense.
Pá gina 56

Alamy/Fotoarena

Eclusa de Miraflores no Canal do Panamá , 2014.

Dentro do espectro da Doutrina Monroe, os Estados Unidos estavam atentos à movimentaçã o na


regiã o do istmo e à construçã o do canal. Com a retirada da França, estavam certos de que deveriam
dar continuidade à obra. Para isso, ofereceram dez milhõ es de dó lares ao governo colombiano pela
concessã o do istmo, oferta que foi recusada.

Como o país vivia uma crise política, os Estados Unidos aproximaram-se dos colombianos do norte,
os panamenhos, e os estimularam a declarar a ruptura com a Colô mbia. Os panamenhos
organizaram uma revolta no mesmo dia em que um cruzador estadunidense atracou no porto de
Coló n, dando retaguarda aos revoltosos contra Bogotá , que proclamaram a Repú blica do Panamá,
imediatamente reconhecida pelos Estados Unidos. Os fuzileiros navais estadunidenses que
desembarcaram no Panamá intimidaram tentativas de reaçã o dos colombianos, que assistiram à
perda daquela estratégica fraçã o de seu territó rio.

A obra foi concluída com patrocínio dos Estados Unidos, que obtiveram junto ao novo governo uma
concessã o para uso perpétuo do canal. Tal investida foi vital na consolidaçã o geopolítica dos
Estados Unidos no continente americano, além de toda a importâ ncia econô mica que representou a
rota Atlâ ntico-Pacífico.

O canal esteve sob controle dos Estados Unidos durante todo o século XX. Devido a fortes pressõ es
populares panamenhas, que viam naquela relaçã o uma afronta à soberania do Panamá , foi assinado
em 1977 um acordo de devoluçã o do canal ao país, fato que se consumou em 1999. Observe a
localizaçã o do canal no mapa a seguir.

Apó s se consolidar como potência inconteste na América Latina – com intervençõ es em Porto Rico
(1824), Argentina (1831), México (1845 e 1847), Nicará gua (1857, 1860, 1909, 1919 e 1927),
Honduras (1903, 1905, 1919 e 1924), Haiti (1915) e Repú blica Dominicana (1916) –, os Estados
Unidos se aventuraram em territó rio asiá tico, promovendo intervençõ es no Japã o, China e Filipinas,
entre o final do século XIX e início do XX. A política do Corolá rio Roosevelt vigorou até o ano de
1930.

Atualmente há um projeto de construçã o do Canal da Nicará gua, idealizado por um consó rcio sino-
russo, rival dos interesses estadunidenses.

Allmaps

Fonte: FERREIRA, Graça Maria Lemos. Atlas geográfico: espaço mundial. 3. ed. Sã o Paulo: Moderna, 2010. p. 66.

O canal do Panamá é formado por um sistema de comportas e trê s eclusas de elevaçã o, apresentadas no mapa ao lado. Para
atravessar os 84 km de extensã o do canal, as embarcaçõ es demoram de 16 a 20 horas.
Pá gina 57

3. A Doutrina Truman e o período da Guerra Fria


Conforme já estudamos, apó s o término da Segunda Guerra Mundial se seguiu uma nova ordem
mundial pautada pela bipolaridade ideoló gica. O fio condutor desse período foi, em sua maior parte,
a Doutrina Truman, que se traduziu em uma política de contençã o da Uniã o Soviética.

Harry Truman assumiu a presidência dos Estados Unidos apó s a morte de Franklin Delano
Roosevelt, durante as conferências que davam conta de reorganizar a Europa e o mundo do pó s-
guerra. Bem diferente de Roosevelt, que pregava uma coexistência pacífica com a Uniã o Soviética,
Truman retomaria a tradiçã o estadunidense de se posicionar como vanguardistas do “mundo livre
e democrá tico” e simultaneamente assumir posturas incisivas em intervençõ es. Em sua visã o,
surgidos como a grande potência do pó s-guerra, os Estados Unidos precisavam bloquear as açõ es
dos “comunistas”.

Nesse sentido, tã o cedo anunciou-se a nova panorâ mica mundial, Truman agiu rá pido em
importante iniciativa ao término da guerra. Grécia e Turquia estavam com as economias seriamente
abaladas e com distú rbios internos, à mercê de caírem sob domínio soviético. O presidente dos
Estados Unidos solicitou a aprovaçã o ao Congresso Nacional para um auxílio imediato aos dois
países, com a declarada intençã o de conter a movimentaçã o comunista, apresentando um plano
com seu pró prio nome: Doutrina Truman.

Por trá s da argumentaçã o econô mica, havia o início de uma política que seria exitosa em seu fim: a
de conter o avanço soviético, a matiz principal da Doutrina Truman, que permearia a política
externa estadunidense por décadas e alimentaria a Guerra Fria. A Doutrina Truman deixava muito
claro que o mundo estava dividido em dois sistemas: o sistema capitalista, livre e democrá tico, e o
sistema socialista e totalitá rio.

Allmaps
Fonte: CHALIAND, Gérard; RAGEAU, Jean-Pierre. Atlas estratégico y geopolítico: geopolítica de las relaciones de fuerza en el
mundo. Madrid: Alianza Editorial, 1984. p. 44.
Pá gina 58

Essa perspectiva de um mundo bipolarizado foi exposta em março de 1947 durante o discurso de
Truman no Congresso dos Estados Unidos, momento que, para muitos, foi o início da Guerra Fria. A
ajuda ao exterior era a estratégia da política externa com o objetivo de conter o avanço comunista.
É sob esse prisma que se entendem, entre outras iniciativas, o Plano Marshall e a pró pria
constituiçã o da Otan, ambos ainda na década de 1940.

As intervençõ es militares dos Estados Unidos apó s a Segunda Guerra igualmente estã o
circunscritas ao teor da Doutrina Truman e, assim, o país se envolveu: na Guerra da Coreia, em
1950; na derrubada de um regime democraticamente eleito no Irã , em 1953, e outro na Guatemala,
em 1954; na invasã o de Cuba na frustrada tentativa de eliminar Fidel Castro e na Guerra do Vietnã,
em 1962. Esta guerra, finalizada em 1975, é considerada um dos maiores traumas na histó ria dos
Estados Unidos, pois, com as mortes de soldados estadunidenses (cerca de 58 mil) houve comoçã o
nacional e divergências sobre a necessidade da guerra.

Sgt. W. M. Compton/Corbis/Latinstock

A Guerra da Coreia, em 1950, resultou na criaçã o de dois países: Coreia do Sul (capitalista) e Coreia do Norte (comunista). Na
fotografia, soldados estadunidenses e prisioneiros norte-coreanos.

Bettmann/Corbis/Latinstock

Soldados estadunidenses em Bon Bu Dop, Vietnã , 1967.

Sob o estigma da Doutrina Truman, em 1961 os Estados Unidos criavam a Escola das Américas
em seu protetorado (Panamá ), uma iniciativa para formar militares para combater socialistas que
tentassem tomar o poder em seus respectivos países. Apó s a reviravolta política no Panamá , que
redigiu os termos dos tratados da devoluçã o do canal, a Escola também foi convidada a se retirar do
país, mudando sua sede para a Geó rgia.

Na â nsia de conter o inimigo e se sobrepor a ele, desenvolveu-se uma frenética corrida


armamentista, entre os Estados Unidos e a Uniã o Soviética, que culminou com um arsenal de armas
atô micas jamais visto. É bom lembrar que, mesmo antes de se configurar a Guerra Fria (a qual daria
o papel de
Pá gina 59

protagonista central nas relaçõ es internacionais para os Estados Unidos), foi Harry Truman quem
autorizou o lançamento das bombas atô micas em Hiroshima e Nagasaki, em agosto de 1945, o ú nico
ataque atô mico da histó ria até o início do século XXI.

Ao estudar a histó ria geopolítica dos Estados Unidos, constatamos que a potência participou de
inú meras guerras, mas sempre em territó rio alheio. Isso, aliado ao sucesso econô mico, subsidia a
compreensã o de como se tornou detentora do grande poder que tem. Observe no mapa ao lado o
poderio militar dos Estados Unidos no início dos anos 2000, período em que, pela primeira vez, o
país sofreu um ataque externo dentro de seu territó rio contíguo, em 11 de setembro de 2001.

Allmaps

Fonte: GRESH, A. et al. (Dir.). Atlas da globalização. Le Monde Diplomatique. Lisboa: Campo da Comunicaçã o, 2003.

Enfoque
ESCREVA NO CADERNO

A política externa norte-americana

[...]

Existe um consenso na aná lise internacional: o poder global dos Estados Unidos, no início do sé culo XXI, é muito superior ao
de todos os Estados nacionais que conseguiram impor sua hegemonia regional ou global desde o sé culo XVI. Fala-se cada vez
mais em impé rio, e se tornou um lugar-comum comparar os Estados Unidos com o Impé rio Romano. Os Estados Unidos
saíram da Guerra Fria na condiçã o de hiperpotê ncia vitoriosa no campo ideoló gico e econô mico e sem adversá rios
geopolíticos capazes de concorrer no campo militar. Resultado de uma estraté gia continuada e consequente de conquista do
poder global, que se delineou no início do sé culo XX, se expandiu depois da Segunda Guerra Mundial e alcançou seu pleno
sucesso depois de 1991, quando os Estados Unidos chegaram mais perto do que nunca da possibilidade de constituiçã o de
um sistema imperial mundial.

Logo apó s a queda do Muro de Berlim, o presidente Bush pai fez um pronunciamento na Assembleia Geral das Naçõ es
Unidas em 1990, num tom que lembrava a linguagem e a proposta liberal internacionalista do presidente Woodrow Wilson,
em 1918:

Nó s temos um projeto de uma nova parceria entre as naçõ es que transcende as divisõ es da Guerra Fria. Uma parceria
baseada na consulta mú tua, na cooperaçã o e na açã o coletiva, especialmente por meio das organizaçõ es internacionais e
regionais. Uma parceria baseada no princípio da lei e suportada por uma repartiçã o justa dos custos e das responsabilidades.
Uma parceria cujos objetivos sã o aumentar a democracia, a prosperidade e a paz; e reduzir as armas.

[...]

Declaraçã o que conté m todas as ideias-chave do pensamento político hegemô nico, na dé cada de 1990: a ideologia da
globalizaçã o e o projeto liberal de desregulamentaçã o e abertura de todos os mercados e das fronteiras econô micas, para
promover a democracia e a paz.

[...]

Nesse mesmo período, os Estados Unidos consolidaram e expandiram seus acordos e bases militares, incluindo a regiã o da
Europa Central, e com uma presença militar efetiva em cerca de noventa países, distribuídos por todos os continentes,
menos na Antá rtida.

[...]

Nesse sentido, parece cada vez mais claro que, apó s a Guerra Fria, constituiu-se um grande consenso em torno da estraté gia
de longo prazo dos Estados Unidos. [...] Sendo assim, do ponto de vista das expectativas dos demais países, pode-se ter
certeza de que nã o haverá um novo período de hegemonia benevolente [...] nem tampouco uma adesã o norte-americana a
qualquer tipo de “governança multilateral” do mundo, independentemente do partido que encabeçar o governo dos Estados
Unidos.

FIORI, José Luis. O poder global. Sã o Paulo: Boitempo Editorial, 2007. p. 134-138.

• De acordo com as ideias do autor, existe a possibilidade de uma adesã o dos Estados Unidos a um projeto de poder
multilateral? Justifique sua resposta.
Pá gina 60

4. O poder de fogo da economia estadunidense


O primeiro século apó s a independência dos Estados Unidos, ocorrida em 1776, foi marcado por um
crescimento econô mico impressionante. Assim como a economia, a populaçã o aumentava,
enquanto a democracia avançava. À s vésperas da Primeira Guerra Mundial (1914-1918), os Estados
Unidos já se configuravam como uma das maiores economias do globo, como mostra a tabela a
seguir.

Os Estados Unidos e seus principais rivais (1900)


EUA Rival mais próximo
Produção de carvã o (toneladas) 262 milhõ es 219 milhõ es (Reino Unido)
Exportaçõ es (libras esterlinas) 311 milhõ es 390 milhõ es (Reino Unido)
Ferro-gusa (toneladas) 16 milhõ es 8 milhõ es (Reino Unido)
Aço (toneladas) 13 milhõ es 6 milhõ es (Alemanha)
Ferrovias (milhas) 183 000 28 000 (Alemanha)
Prata (onça troy) 55 milhõ es 57 milhõ es (México)
Ouro (onça troy) 3,8 milhõ es 3,3 milhõ es (Austrá lia)
Produção de algodã o (toneladas) 10,6 milhõ es 3 milhõ es (Índia)
Petró leo (barris) 9,5 milhõ es 11,5 milhõ es (Rú ssia)

Fonte: LOWE, Norman. História do mundo contemporâneo. Sã o Paulo: Penso, 2011. p. 479.

Em muito contribuíram para o desenvolvimento estadunidense as riquezas naturais do país,


especialmente ferro, carvã o mineral e petró leo, assim como a expansã o da malha ferroviá ria.
Simultaneamente, verificava-se o incremento demográ fico proporcionado pela imigraçã o, motivada
pela imagem que o jovem país transmitia de ser o novo éden econô mico (o que representava
emprego de mã o de obra e mercado em expansã o). A emergente indú stria estadunidense teve nos
impostos sobre a importaçã o a proteçã o contra a concorrência estrangeira, tã o necessá ria ao
programa industrial embrioná rio.

A Primeira Guerra deu grande impulso à indú stria, pois os europeus envolvidos no conflito
passaram a importar gêneros industrializados dos Estados Unidos. Na Segunda Guerra, isso se
repetiria. No período pó s-Primeira Guerra, houve nova expansã o: a produçã o industrial dobrou e o
comércio e os salá rios aumentaram, embora nã o na mesma proporçã o dos lucros. Na década de
1920, o mercado consumidor do país estava inundado com gêneros de consumo dos mais variados:
rá dios, refrigeradores, lavadoras, motocicletas e, principalmente, automó veis.

Crescia a indú stria cinematográ fica estadunidense, que passaria a difundir os valores da emergente
sociedade: era o início do american way of life. O crescimento econô mico foi tã o espetacular que a
década de 1920 ficou conhecida nos Estados Unidos como “os loucos anos 1920”. O boom
econô mico era impressionante.

A crise de 1929 viria interromper esse aquecimento até entã o ininterrupto, levando o país e o
capitalismo à mais grave crise de sua histó ria, cujas causas foram:

• Superprodução: o aquecimento da economia estadunidense levou a uma superproduçã o na


agricultura. Havia excesso de trigo, mas nã o havia compradores para o cereal. A mesma situaçã o
valia para outros gêneros agrícolas e para produtos industriais.
• Encolhimento do consumo: durante anos a economia levou a superlucros dos empresá rios, mas
o mesmo nã o aconteceu aos salá rios, que, embora aumentassem, nã o acompanharam o ritmo dos
lucros. Assim, a indú stria crescia, produzia e, tal qual a agricultura, nã o encontrava compradores.

Ver
O artista. Direção: Michael Hazanavicius. Bélgica/França, 2011.
Nos "loucos" anos 1920, em plena ascensã o da indú stria cinematográfica e do cinema falado, um astro do cinema
mudo teme pelo fim de sua carreira e o esquecimento de sua obra.

Filme de Michael Hazanavicius. O artista. Bélgica/França, 2011


Pá gina 61

• Ausência de Estado: levada ao pé da letra a doutrina de Adam Smith (o liberalismo e o discurso


contra o Estado), cada empresa era praticamente livre para fazer o que bem entendia junto ao
mercado, sem ser importunada por intervençõ es estatais.

• Crack da Bolsa de Nova York: em 1929 o valor das açõ es despencou, e os investidores quiseram
vendê-las, mas nã o acharam compradores. Resultado: desvalorizaçã o total. Com as açõ es das
empresas em queda, o empresariado deixou de investir, a produçã o caiu e veio a demissã o em
massa, acompanhada de falências em efeito dominó . Indú strias recorreram a empréstimos a bancos
e nã o conseguiram pagá -los. Os bancos, que também deixaram de receber o que emprestaram,
faliram. O dó lar “virou pó ”. Empresá rios ficaram pobres da noite para o dia e muitos, nã o tendo
estrutura emocional para suportar a guinada repentina em suas vidas, suicidaram-se.

Passado o período agudo da crise e reerguidos por um novo modelo econô mico, agora com um
Estado mais atuante dentro dos moldes keynesianos, conduzido por Franklin Roosevelt, os Estados
Unidos retomaram sua produçã o ainda nos anos 1930 com a elaboraçã o do New Deal e, apó s a
Segunda Guerra, se consolidaram como a maior potência do capitalismo de todos os tempos. Tal
hegemonia econô mica vem até os dias de hoje.

Blank Archives/Getty Images

Idealizador do New Deal, o plano de reconstruçã o estadunidense apó s a crise de 1929, Franklin Roosevelt foi o ú nico
presidente dos Estados Unidos a estar à frente do governo por quatro mandatos consecutivos (1932- 1936-1940-1945);
morreu durante o ú ltimo, em 1945. Foi o presidente durante duas das maiores crises da histó ria: a Depressã o dos anos 1930
e a Segunda Guerra Mundial. Em 1947, a Constituiçã o estadunidense vetou a possibilidade de um terceiro mandato a
qualquer presidente.

4.1 A economia contemporânea dos Estados Unidos


Nesta segunda década do século XXI, os Estados Unidos continuam sendo aquilo que foram durante
quase todo o século XX: a maior economia do mundo. Essa afirmaçã o é vá lida desde 1930. Mesmo
que a China seja um real concorrente na disputa pela liderança econô mica global, nã o deixa de ser
impressionante os Estados Unidos estarem tantos anos à frente da economia mundial. Em 2015, o
PIB estadunidense era da ordem de US$ 17,9 trilhõ es de dó lares, o que representa cerca de 25% da
economia mundial. A balança comercial é igualmente grande: apresenta a terceira maior pauta
exportadora (depois de China e Alemanha), e é o maior importador.

Conversando com a... Matemática!


ESCREVA NO CADERNO

1. A que se refere o grá fico? Que período ele abrange?


2. Seus dados sã o apresentados em valores absolutos ou relativos?

3. O que significa a retraçã o observada no período 2008-2009? A média do crescimento do PIB estadunidense entre
2010 e 2014 foi suficiente para suprir as perdas dos anos anteriores?

Tangente Design

Fonte: WORLD BANK. Disponível em: <http://data.worldbank.org/indicator/NY.GDP.MKTP.KD.ZG>. Acesso em: 17 mar. 2016.
Pá gina 62

4.2 Estados Unidos: potência agrícola


Os Estados Unidos dividem com a China a condiçã o de maior potência agrícola do mundo. A grande
extensã o de terras agricultá veis, a variedade climá tica, o alto emprego de tecnologia e uma política
governamental de auxílio aos agricultores (subsídios) sã o fatores que explicam essa condiçã o.

A agricultura é essencialmente mecanizada e trabalha em sintonia com a indú stria (agroindú stria) e
com o intenso uso de sementes transgênicas, principalmente junto às planícies que se estendem
desde o oeste dos Grandes Lagos até as Montanhas Rochosas, em forma de belts (cinturõ es
agrícolas): corn belt (milho), cotton belt (algodã o) e wheat belt (trigo) estã o entre os mais
conhecidos. Associados à pecuá ria, temos ainda o dairy belt no Nordeste (laticínio) e o ranching
belt (pecuá ria extensiva do Oeste). Alguns dos principais gêneros produzidos sã o trigo, milho, soja,
algodã o, beterraba e cítricos. Na pecuá ria, destaque para o gado bovino, segundo maior rebanho
comercial do mundo, além da avicultura.

A sudoeste dos Grandes Lagos temos a associaçã o entre a grande produçã o de milho (maior do
mundo) e a pecuá ria intensiva bovina, uma vez que o milho, em grande parte, tem como destino a
raçã o de gado. Os Estados Unidos têm a segunda produçã o tritícola (trigo) do mundo, que ocorre no
Centro-Sul (trigo de inverno) e no Norte (trigo de primavera), perdendo apenas para a China,
embora sejam os maiores exportadores. O algodã o é cultivado ao sul, onde também ocorrem as
plantaçõ es de produtos tropicais, com destaque para a laranja, que é a segunda maior produçã o
mundial, perdendo apenas para o Brasil. O arroz igualmente é cultivado ao sul. Em 2015, os Estados
Unidos seguiam como o maior produtor mundial de soja (acompanhados de perto pelo Brasil),
cultivada ao sul dos Grandes Lagos, pró ximo à produçã o de milho. Observe, no mapa a seguir, a
distribuiçã o espacial dos cinturõ es agrícolas dos Estados Unidos.

A pecuá ria leiteira (dairy belt) ocorre no Norte e Nordeste, enquanto o Meio-Oeste é tradicional
á rea criadora de gado bovino em forma extensiva.

Sementes transgênicas: Sementes geneticamente modificadas.

Bill Barksdale/DPA via ZUMA Press/Easypix

Na fotografia, plantaçã o de algodã o no Texas, Estados Unidos, 2014.


Allmaps

Fonte: ATLAS National Geographic. Sã o Paulo: Abril, 2008. p. 37.


Pá gina 63

Como ocorre no Brasil, ao redor de grandes aglomerados urbanos, como Nova York ou Los Angeles,
há os “cinturõ es verdes” (green belt) que produzem gêneros bá sicos para consumo interno.

Os Estados Unidos sã o, simultaneamente, os maiores exportadores e importadores de alimentos do


mundo e apresentam importante saldo superavitá rio no setor. Apesar de ser uma potência agrícola,
as atividades agrá rias representam apenas 1,6% do PIB estadunidense, o que nã o deixa de ser
significativo diante do tamanho da economia, e o setor primá rio absorve menos de 5% da
populaçã o ativa.

Tangente Design

Fonte: CIA. The world factbook. Disponível em: <https://www.cia.gov/library/publications/the-world-factbook/geos/us.html>.


Acesso em: 15 dez. 2015.

4.3 Recursos naturais e energia


Na porçã o oriental do país, junto aos Montes Apalaches, há ocorrência de jazidas carboníferas de
altíssima qualidade devido ao teor caló rico do carvã o mineral. Já ao sul dos Grandes Lagos, verifica-
se forte concentraçã o de minério de ferro. A ocorrência desses dois minérios, indispensá veis à
primeira fase da Revoluçã o Industrial, foram fatores importantes na industrializaçã o pioneira nos
Estados Unidos, verificada no Nordeste do país.

Os Estados Unidos detêm uma das maiores concentraçõ es de cobre (atualmente é o segundo
produtor mundial). Há ainda reservas considerá veis de minérios menos nobres, como chumbo,
zinco, fosfato e enxofre.
Patrick Kelly/Craig Daily Press via AP/Glow Images

Mina de carvã o no estado do Colorado, Estados Unidos, 2015.

No Golfo do México encontra-se uma das maiores concentraçõ es de petró leo em todo o mundo. A
abundâ ncia do combustível fó ssil está por trá s da transformaçã o econô mica que sofreu o estado do
Texas, um dos mais ricos dos Estados Unidos. Inicialmente uma á rea pecuarista, na metade do
século XX converteu-se em grande polo petroquímico e, mais recentemente, também em á rea de
alta tecnologia. Além do Golfo, o petró leo é encontrado no Alasca e junto à s Rochosas. Os Estados
Unidos situam-se entre os maiores produtores mundiais de petró leo, além de deterem importantes
reservas, mas, na condiçã o de maior consumidor mundial, é altamente dependente da importaçã o.
A base energética do país está assentada no uso do petró leo, gá s natural e carvã o mineral e 70% da
matriz elétrica é baseada em centrais termelétricas.

Os Estados Unidos sã o, simultaneamente, os maiores produtores e consumidores de energia do


mundo. Contudo, o consumo supera a produçã o e o país se vê obrigado a complementar sua
necessidade energética. Em relaçã o à energia elétrica, o país a importa do Canadá, outro grande
produtor energético, cuja principal matriz é a hidrelétrica.

Ver
Terra Prometida. Direção: Gus Van Sant. Estados Unidos, 2012.
O representante de uma companhia petrolífera convence os moradores de um vilarejo na Pensilvâ nia a explorar gás
em suas terras, mas a oposiçã o de uma ambientalista poderá mudar suas intençõ es.

Filme de Gus Van Sant. Terra Prometida. EUA, 2012


Pá gina 64

Navegar
Euronews <http://tub.im/uyeaud>
O site da Euronews contém links sobre a economia dos Estados Unidos com os mais variados indicadores
econô micos e sociais do país.

No que se refere à energia primá ria, de 2010 a 2014 o ritmo de produçã o estadunidense foi
crescente e se aproximou ao consumo, diminuindo a importaçã o. Veja no grá fico a seguir a evoluçã o
dos dados dos Estados Unidos sobre produçã o, consumo, exportaçã o e importaçã o de energia
primá ria.

Além do uso doméstico e agrícola, grande parte dessa energia é destinada para suprir o imenso
parque industrial, que se apresenta polarizado em quatro macrorregiõ es principais: Nordeste,
Sudoeste, Sul e Noroeste, cada qual com sua especificidade.

Tarumã

Fonte: U.S. ENERGY INFORMATION ADMINISTRATION (EIA). Total energy. Disponível em:
<http://www.eia.gov/beta/MER/index.cfm?tbl=T01.01#/?f=A&start=1975&end=2014&charted=4-6-7-14>. Acesso em: 20 jan.
2016.

5. A sociedade estadunidense
Com aproximadamente 321 milhõ es de habitantes, em 2015 os Estados Unidos detinham a terceira
maior populaçã o da Terra. Porém, devido à extensã o territorial (9,3 milhõ es de km2), a densidade
demográ fica é considerada baixa (34,5 hab./km2). Segundo projeçõ es, o país será um dos
responsá veis pelo aumento populacional do planeta e o ú nico rico entre os dez mais populosos nos
pró ximos anos, com elevada longevidade tanto para homens quanto para mulheres, como mostra o
grá fico da pirâ mide etá ria abaixo.
Tarumã

Fonte: CIA. The world factbook. Disponível em: <https://www.cia.gov/library/publications/the-world-factbook/geos/us.html>.


Acesso em: 15 dez. 2015.
Pá gina 65

Reproduzindo aquilo que ocorre em todos os países de grande extensã o territorial, a distribuiçã o
demográ fica é irregular. Desde a colonizaçã o, verificou-se forte concentraçã o na costa leste.
Posteriormente, na porçã o oeste das Rochosas houve intenso incremento demográ fico durante o
século XX, processo que se mantém até hoje. Já as planícies centrais e do meio-oeste,
tradicionalmente, sã o á reas de baixa densidade demográ fica, como é possível verificar na imagem
abaixo.

NASA

A montagem de imagens obtidas por saté lite mostra os Estados Unidos à noite, em 2012. As á reas mais iluminadas
correspondem aos grandes adensamentos populacionais.

A á rea mais densamente povoada encontra-se entre o litoral atlâ ntico e os Grandes Lagos, no
Nordeste. Nessa regiã o, há duas megaló poles: a de Bos-Wash, entre Boston e Washington, no litoral
(apresentada no mapa a seguir), e a de Chi-pitts, no interior, entre Chicago e Pittsburgh.
Allmaps

Fonte: SIMIELLI, Maria Elena. Geoatlas. 33. ed. Sã o Paulo: Á tica, 2010. p. 48.
Pá gina 66

No sudoeste dos Estados Unidos, junto ao Estado mais rico e populoso, a Califó rnia, encontra-se o
segundo maior aglomerado humano do país. Ali, igualmente, surgiu uma importante megaló pole: a
de San-San, unindo San Francisco a San Diego. Outras duas importantes aglomeraçõ es estã o no sul,
junto ao estado do Texas, com destaque para a cidade de Houston, e no noroeste, em Washington,
onde está Seattle.

Portanto, a populaçã o estadunidense concentra-se majoritariamente nas bordas do país, junto à s


zonas costeiras, enquanto o interior apresenta baixa densidade demográ fica. Veja o mapa a seguir.

Allmaps

Fonte: UNITED STATES CENSUS BOREAU. Disponível em:


<http://www2.census.gov/geo/pdfs/maps-data/maps/thematic/us_popdensity_2010map.pdf>. Acesso em: 20 jan. 2015.

5.1 A formação do povo estadunidense


Até o final do século XVI, a costa leste dos Estados Unidos era pouco povoada. Os primeiros
aventureiros e refugiados religiosos perseguidos na Europa chegaram apenas no século XVII, com
destaque para os protestantes de língua inglesa. O progresso econô mico das treze colô nias iniciais
despertou desentendimentos com a metró pole inglesa, que culminou com a independência dos
Estados Unidos em 4 de julho de 1776.

Para ocupar o Oeste, o jovem país incentivou a imigraçã o: os Estados Unidos precisavam consolidar
o territó rio e, com o velho continente em crise, o imigrante via os Estados Unidos como o novo
horizonte de melhores perspectivas. No início do século XIX, vieram ingleses, escoceses, irlandeses,
alemães e escandinavos; já no final desse século, com as transformaçõ es políticas e econô micas na
Europa, passaram a ir para os Estados Unidos imigrantes de praticamente toda a Europa centro-
oriental.
Pá gina 67

A Primeira Guerra Mundial interrompeu esse surto migrató rio, mas, tã o logo o conflito se encerrou,
o processo foi retomado, o que levou o governo a restringir a imigraçã o a um limite anual de 360
mil pessoas e a impor uma cota discriminató ria que favorecia a entrada de ingleses, alemã es e
irlandeses e limitava os “grupos indesejá veis”: asiá ticos, latinos e judeus. A crise de 1929 e a
depressã o dos anos 1930 detiveram a imigraçã o mais que a restriçã o imposta. Em 1952, foi
reformulada a Lei de Cotas, determinando que 80% dos imigrantes deveriam ser de procedência da
Europa setentrional ou ocidental e os 20% restantes das demais á reas do mundo.

Chineses e japoneses entraram no país a partir da metade do século XIX e concentraram-se na


Califó rnia. Contudo, foram os asiá ticos os primeiros estrangeiros a sofrer discriminaçã o restritiva
ainda em 1881. Filipinos, coreanos, indonésios e indianos também compõ em o grosso dos
imigrantes asiá ticos, igualmente com concentraçã o na Califó rnia, embora a cidade de Nova York
seja uma espécie de “miniatura mundial”, concentrando inú meras comunidades estrangeiras.

Ao longo de todo esse processo, foi sempre uma constante a entrada de mexicanos nos Estados
Unidos, na maioria das vezes nã o computada. As estatísticas continuam comprometidas por dois
motivos: o U.S. Census Bureau, ó rgã o demográ fico oficial, classifica-os como “brancos”; muitos
evitam identificar-se temendo a deportaçã o, uma vez que estã o em situaçã o ilegal. Somados a
outros latino-americanos que passaram a entrar em grande nú mero apó s a Segunda Guerra
Mundial, os hispâ nicos constituem hoje a maior comunidade de imigrantes e seus descendentes.

A populaçã o negra estadunidense, que atualmente é da ordem de 14%, entrou no país a partir do
século XVII na condiçã o de mã o de obra escrava e concentrou-se especialmente no Sul, onde
trabalhou principalmente na lavoura do algodã o.

Ver
Gran Torino. Direção: Clint Eastwood. Estados Unidos, 2008.
Nos subú rbios da cidade estadunidense de Detroit, um veterano solitá rio da Guerra da Coreia inicia uma relaçã o
inusitada com uma família asiá tica que passa a morar na casa ao lado.

5.2 A atmosfera xenófoba


A formaçã o da naçã o estadunidense se processou em meio a forte diversidade, mas de forma
diversa do que ocorreu no Brasil: sem compor uma sociedade multicultural, pois lá nã o ocorreu um
processo intenso de miscigenaçã o, configurando-se, entã o, uma sociedade multiétnica, mas nã o
multicultural. Alguns entendem que justamente essa discriminaçã o declarada e a xenofobia
explícita – afinal, o governo tomou medidas oficiais (que fracassaram) para evitar a miscigenaçã o –
incentivaram os movimentos negros à eficiente organizaçã o que alcançaram e à s grandes
conquistas, pois era evidente que eles se encontravam em situaçã o de exclusã o. Observe a
fotografia abaixo.
Michael B. Thomas/AFP/Getty Images

Os distú rbios em Ferguson, Missouri, em 2014, expuseram as fissuras raciais existentes na cidade, quando um tribunal
absolveu um policial branco da acusaçã o da morte do jovem negro Michel Brown. Apó s essa decisã o judicial, a cidade
explodiu em protestos.
Pá gina 68

Violência racial, discriminaçã o e segregaçã o acompanham a histó ria do país. As diferenças sociais
estadunidenses, as maiores dentre os países ricos, estã o ligadas à origem imigrató ria e à questã o
racial. Os negros, por exemplo, até a Segunda Guerra Mundial, eram tratados como cidadã os de
segunda classe e nã o tinham direito ao voto, entre outras discriminaçõ es.

Há uma longa trajetó ria de resistência negra nos Estados Unidos. A mais famosa, o Movimento
pelos Direitos Civis, conduzida pelo reverendo Martin Luther King (1929-1968) – retrato na
fotografia no final desta pá gina – intensificou-se nos anos 1950. A bandeira era pela igualdade plena
entre negros e brancos, e a reivindicaçã o, por meios nã o violentos e desobediência pacífica, teve seu
auge nos anos 1960.

Os indicadores sociais demonstram que a populaçã o estadunidense goza de alto padrã o de vida.
Contudo, tal fato nã o é extensivo a toda a sociedade, pois os imigrantes, remanescentes indígenas,
negros e, especialmente, os hispânicos nã o apresentam o mesmo padrã o.

A atmosfera é permeada pela tensã o xenó foba, sobretudo quando se considera a difícil convivência
em uma sociedade multiétnica com uma vertente ideoló gico-religiosa na qual se compõ e a cultura
WASP. O acrô nimo diz respeito a uma parcela representativa da sociedade que entende que o
verdadeiro estadunidense é Branco, Anglo-Saxã o e Protestante, daí a sigla das iniciais (em inglês).
Trata-se de uma interpretaçã o anacrô nica, pois a preponderâ ncia da imigraçã o anglo-germâ nica
deu-se apenas até a independência. Apó s esse período, os Estados Unidos vieram a se constituir,
provavelmente, na sociedade mais diversa em todo o mundo, sendo o país que mais imigrantes
recebeu em toda a histó ria, aproximadamente 40 milhõ es. Obviamente que há entre os brancos
quem pense de forma diametralmente oposta, defendendo a pluralidade da sociedade
estadunidense e entendendo-a como uma virtude. Mas, de fato, há uma extrema-direita branca
racista, atuante e bastante ruidosa.

Grupos radicais de direita, como a Ku-Klux-Klan ou o White Power, sã o tradicionais grupos de


extermínio à s minorias no país. Constituíram-se em verdadeiros exércitos particulares, ilegais e
combatidos, nesse que é o mais armado país em todo o mundo.

Há tragédias histó ricas promovidas por grupos de extrema-direita, como o fatídico atentado contra
um prédio pú blico, em Oklahoma, em 1995, perpetrado pelo extremista Timothy McVeigh,
simpatizante do White Power. O ato, que matou 168 pessoas, foi realizado em nome de uma crença
doentia sobre a “supremacia branca” estadunidense. McVeigh foi preso e condenado à pena capital
em 2001.
AP/Glow Images

Na marcha sobre Washington, em 1963, Martin Luther King disse em seu discurso: “Eu tenho um sonho, de que meus quatro
filhos um dia viverã o em um país onde nã o sejam julgados pela cor de sua pele, e sim pelo conteú do de seu cará ter”.

Ver
Selma: uma luta pela igualdade. Direção: Ava DuVernay. Reino Unido/Estados Unidos, 2014.
Filme sobre as histó ricas marchas realizadas por Martin Luther King em 1965, evidenciando sua incansá vel luta
pelos direitos civis dos negros nos Estados Unidos.

Filme de Ava DuVernay. Selma: uma luta pela igualdade. Reino Unido, EUA, 2014
Pá gina 69

Há vá rias minorias dispersas pelos Estados Unidos. De acordo com o U.S. Census Bureau,
concentram-se sobretudo no Oeste (36%), seguido do Sul (30%) e Nordeste (23%). No Oeste há
maior concentraçã o de hispâ nicos e, em seguida, asiáticos, enquanto no Sul os afrodescendentes
compõ em a mais forte minoria. A grande presença de imigrantes mexicanos no país é vista com
hostilidade por parcela da populaçã o estadunidense. Os imigrantes em condiçõ es ilegais e mesmo
aqueles que possuem cidadania estadunidense sofrem com açõ es xenó fobas. Para reprimir a
entrada de mexicanos que buscam trabalho e melhores condiçõ es de vida nos Estados Unidos, o
governo estadunidense adota uma política de controle na fronteira com o México. Observe a
fotografia a seguir.

Norma Jean Gargasz/Alamy/Latinstock

Muro na fronteira entre Estados Unidos e Mé xico, construído pelo vizinho rico em 1994 com o intuito de conter, ou ao
menos aumentar o controle da entrada de mexicanos nos Estados Unidos. Na fotografia, parte do muro na cidade de Nogales,
no Arizona, Estados Unidos, fronteira com o estado de Sonora, Mé xico, em 2014.

A segregaçã o se reproduz no â mbito interno de cidades e bairros em todo o país. Atualmente, as


principais comunidades de minorias sã o os hispâ nicos, negros e asiá ticos. Contudo, segundo
projeçõ es do U.S. Census Bureau, o que chamamos hoje de “minorias” passará a ser “maioria” em
2042. Em 2010, isso já era realidade em Nova York, conforma mostra o grá fico a seguir.
Tangente Design

Fonte: FORNETTI, Verena. Censo mostra Nova York mais hispâ nica e asiá tica. Folha de S.Paulo, 30 out. 2011. Disponível em:
<http://acervo.folha.com.br/fsp/2011/10/30/2/5732011#zoom_in>. Acesso em: 18 mar. 2016.

Ver
Espanglês. Direção: James Brooks. Estados Unidos, 2004.
Filme que explora a fusã o da cultura mexicana com a estadunidense, dando origem a um idioma híbrido. A imigraçã o
mexicana nos Estados Unidos é o pano de fundo para o desenvolvimento do enredo.

Filme de James Brooks. Espanglês. EUA, 2004


Pá gina 70

ROTEIRO DE ESTUDO
ESCREVA NO CADERNO

Revisando

1. A Doutrina Monroe foi estabelecida em 1823 pelo presidente James Monroe. O que significou essa
Doutrina para a América Central?

2. O termo corolário contém uma conotaçã o de continuidade, prosseguimento. O que foi o Corolá rio
Roosevelt?

3. Uma das açõ es mais efetivas e marcantes da Doutrina Monroe e que se deu sob o governo Roosevelt
está relacionada ao Canal do Panamá . Explique o contexto de construçã o e uso do Canal do Panamá .

4. Em 1901, foi aprovada a Emenda Platt. O que foi essa emenda e qual sua relaçã o com a Doutrina
Monroe?

5. O Destino Manifesto é outro ingrediente a ser considerado no processo expansionista estadunidense.


Qual a visã o que muitos estadunidenses tinham da ideia de “Destino Manifesto”? Existem exemplos dessa
perspectiva nos dias de hoje?

6. Analise a dependência dos Estados Unidos em relaçã o à s matérias-primas e discorra sobre sua
disponibilidade de recursos.

7. A que conclusõ es podemos chegar ao pensar na composiçã o racial da sociedade estadunidense?

8. Com base no texto e no mapa apresentado na pá gina 62, aponte onde ocorre:

a) o dairy belt

b) o green belt

c) o ranching belt

d) o cotton belt

9. Estados Unidos e Brasil sã o dois países marcados pela diversidade cultural, fruto da contribuiçã o de
inú meros povos. Que diferença você vê entre as duas sociedades?

Olhar cartográfico

Analise a presença estadunidense no mundo e responda:

• Algum outro país apresenta a mobilidade militar dos Estados Unidos? Justifique.
Allmaps

Fonte: DÁ VILA, Sérgio. Sob polêmica, EUA reativam sua Quarta Frota. Folha de S.Paulo, 13 jul. 2008. Mundo.
Pá gina 71

Atividade em grupo

Muitas iniciativas dos Estados Unidos sã o polêmicas no cená rio internacional. Um grupo defenderá uma
dessas iniciativas, enquanto outro irá refutá -la. Por exemplo: a ingerência na independência de Cuba, o
controle do Canal do Panamá , as bombas de Hiroshima e Nagasaki, a Guerra do Vietnã . Um grupo
buscará argumentos de defesa e o outro, de refutaçã o dessas atitudes.

De olho na mídia

Leia o texto a seguir e responda: por que o autor critica a declaraçã o do entã o embaixador estadunidense
na França, Myron Herrick, a respeito de os Estados Unidos nã o cobiçarem terras ou desejarem novos
territó rios? Em sua opiniã o, a crítica do autor é coerente?

TEXTO 1

Em nome do “Destino Manifesto”

Desde o século XIX, em nome do “progresso” e da “democracia” ou das “obrigações internacionais”, forças militares e
econômicas dos EUA intervieram em países latino-americanos, quando não usurparam território, garantindo seu
controle do continente.

No dia 22 de fevereiro de 1927, data do aniversá rio de George Washington, o embaixador dos Estados Unidos na
França, Myron Herrick, reuniu num banquete, em Paris, os representantes diplomá ticos dos países latino-americanos
membros da Uniã o Panamericana. “Os Estados Unidos nã o cobiçam terras.”, declarou em seu speech. “Nã o desejam
novos territó rios. Como é do conhecimento de todas as pessoas bem-informadas, os Estados Unidos recusaram
durante os ú ltimos quarenta anos, de forma constante e deliberada, ocasiõ es frequentes e fá ceis de expandir seus
domínios. Aqueles que nos acusam de propó sitos imperialistas ignoram os fatos e nã o estã o sendo sinceros.” Com a
memó ria sem dú vida embotada pelos vinhos e joias da Cidade Luz, ele esquecia deliberadamente o México
desmembrado, Cuba acorrentada, o Haiti e a Repú blica Dominicana sob controle, o Panamá arrancado da Colô mbia, a
invasã o da Nicará gua, a anexaçã o das Filipinas...

No ano de 1823, em sua mensagem ao Congresso, o presidente norte-americano James Monroe lançou a doutrina que
iria levar seu nome. Enquanto o império ibérico desmoronava, despertando certos apetites britâ nicos, Monroe
recusava toda e qualquer intervençã o europeia em assuntos das Américas. Essa atitude poderia ser considerada
vantajosa se, sob o pretexto de lutar contra o colonialismo externo, os Estados Unidos já nã o estivessem, naquela
época, orientando sua política externa para a constituiçã o de um bloco continental a partir do qual pretendiam
instaurar sua dominaçã o.

LEMOINE, Maurice. Em nome do “Destino Manifesto”. Le Monde Diplomatique, 1º maio 2003. Disponível em: <http://www.diplomatique.org.br/acervo.php?id=784>. Acesso em:
15 dez. 2015.

TEXTO 2

Sabemos que a economia estadunidense foi fortemente afetada pela crise econô mica de 2008. No
entanto, apresentou razoá vel recuperaçã o nos ú ltimos anos.

O que diz o texto a respeito dessa retomada e em relaçã o à comparaçã o com os outros três países
citados?

PIB dos EUA cresce 2,4% no 1º trimestre de 2013, indica 2ª prévia

A economia dos Estados Unidos – a maior do mundo – cresceu a uma taxa anual de 2,4% no primeiro trimestre de
2013, em ritmo ligeiramente mais lento que o estimado inicialmente, de acordo com a segunda prévia do Produto
Interno Bruto (PIB) feita pelo Departamento de Comércio do governo norte-americano nesta quinta-feira (30). A
primeira prévia, divulgada no dia 26 de abril, indicava um crescimento de 2,5%.
Houve aceleraçã o frente ao quarto trimestre do ano anterior, quando a economia avançara 0,4%. Em 2012,
considerando todos os trimestres, o PIB, que é a soma de todas as riquezas produzidas no país, teve alta de 2,2%.

O crescimento foi pressionado pela queda nos gastos do governo e pelas empresas fora do setor agrícola, com
encomendas a um ritmo mais lento, de acordo com a agência Reuters.

A despesa dos consumidores, que nos Estados Unidos representa mais de dois terços do PIB, cresceu entre janeiro e
março a um ritmo de 3,4%, contra os 3,2% calculado pelo governo.

A economia norte-americana cresce há 15 trimestres consecutivos. No entanto, a taxa média, pouco acima de 2%, é
considerada fraca sob os padrõ es histó ricos. A ú ltima vez que o PIB norte-americano registrou queda foi no segundo
trimestre de 2009, quando recuara 0,3%.

Na véspera, o Brasil divulgou o resultado do PIB do primeiro trimestre, cujo crescimento foi de apenas 0,6%, na
comparaçã o com os três meses anteriores, e de 1,9%, em relaçã o a igual período de 2012 – resultados que vieram
abaixo da expectativa dos economistas.

A China, considerada a segunda maior economia do mundo, mostrou crescimento bem maior que o dos EUA em igual
período, de 7,7%. O Japã o, que segue na terceira posiçã o, teve crescimento anualizado de 3,5% no primeiro trimestre
de 2013, superando a expectativa dos economistas.

Tangente Design

Fonte: Departamento do Comércio dos Estados Unidos. PIB dos EUA cresce 2,4% no 1º trimestre de 2013, indica 2ª prévia. Do G1, em Sã o Paulo, 30 maio 2013. Economia.
Disponível em: <http://g1.globo.com/economia/noticia/2013/05/pibdos-eua-cresce-24-no-1-trimestre-de-2013-indica-2-previa.html>. Acesso em: 22 dez. 2015.
Pá gina 72

CAPÍTULO 4 - A globalização

Crédito do infográ fico: Casa Paulistana


Pá gina 73

Tópicos do capítulo

Globalização

Comércio mundial contemporâneo

O Brasil na globalização

Ponto de partida
ESCREVA NO CADERNO

1. Com base no infográ fico e em seus conhecimentos prévios, exponha argumentos indicando por que a
produçã o globalizada apresenta custos menores do que a produçã o em escala nacional.

2. De que maneira as inovaçõ es tecnoló gicas intensificaram o processo de globalizaçã o da produçã o ao


longo do século XX e início do XXI?
Pá gina 74

1. Quando começou a globalização?


A globalizaçã o é um processo mú ltiplo em que se verificam forte integraçã o e progressiva
interdependência entre as economias nacionais. Mas, além dessas características, outras mais
podem ser destacadas: a rapidez e a intensidade do fluxo de pessoas, de informaçõ es, de produtos,
de capital e de transaçõ es no mercado financeiro; a sensaçã o de simultaneidade, como ocorre
quando eventos internacionais sã o transmitidos mundialmente; ou outras formas de compartilhar
informaçõ es com bilhõ es de pessoas ao mesmo tempo em todo o globo em poucos minutos. Tudo
isso viabilizado pelo avançado está gio tecnoló gico em que vivemos nestes tempos de globalizaçã o.

Binsar Bakkara/AP/Glow Images

Indoné sios assistem a uma partida de futebol da Copa do Mundo, em North Sumatra, na Indoné sia, em 2014. O
desenvolvimento tecnoló gico viabilizou a transmissã o simultâ nea, para mais de um bilhã o de pessoas, de um dos maiores
eventos mundiais da atualidade.

Para alguns autores, a globalizaçã o nã o é nova. Nem novidade. Ela é apenas mais um está gio do
capitalismo, dando continuidade a um processo iniciado no século XV. Ali, sim, teria começado a
globalizaçã o, com a expansã o ultramarina e o mercantilismo, que ampliavam em muito o horizonte
geográ fico do mundo.

A Revoluçã o Industrial e a respectiva inovaçã o tecnoló gica teriam trazido mais dinamismo e
velocidade a esse processo nos séculos XVIII e XIX. O desenvolvimento do capitalismo e a constante
renovaçã o tecnoló gica teriam feito a globalizaçã o dar largos passos até os dias de hoje. Ao longo
desse percurso histó rico, aspectos internacionais e mundiais foram se realçando no cotidiano de
muitas pessoas em diversos países, mesmo que de forma desigual. Mas tornou-se muito mais nítido
nas duas ú ltimas décadas do século XX, quando as relaçõ es de interdependência econô mica entre
diferentes lugares do planeta começaram a ter forte destaque.

Pode-se dizer, entã o, que atualmente esses processos de internacionalizaçã o e de mundializaçã o


continuam ocorrendo e que sã o facetas da globalizaçã o, pois esta engloba acontecimentos que se
mundializam e que se internacionalizam, envolvendo relaçõ es entre Estados nacionais. A maneira
como ocorrem, atualmente, com intensidade global, é que é nova.

A expressã o globalizaçã o foi utilizada pela primeira vez com esse sentido em 1985, quando o
economista britâ nico Theodore Levitz lançou o livro The globalization of markets (A globalizaçã o
dos mercados). Naquele momento, o conceito de globalizaçã o era impregnado de uma conotaçã o
essencialmente econô mica, apresentando a ideia de integraçã o dos mercados mundiais e de
abertura econô mica. É interessante notar que a intensa divulgaçã o do termo globalização ocorreu
simultaneamente ao colapso das economias planificadas no mundo socialista, coincidindo com a
expansã o mundial do capitalismo e a consequente hegemonia de seu modelo no mundo do pó s-
Guerra Fria.

Navegar
Núcleo de Estudos da Globalização <http://tub.im/5pfjxc>
O portal do Nú cleo de Estudos da Globalizaçã o, ligado à Unesp e ao CNPq, disponibiliza uma infinidade de textos
sobre a globalizaçã o.
Pá gina 75

2. Globalização: um processo múltiplo


No final do século XX, surgiram muitos estudos e obras sobre o fenô meno global. A discussã o sobre
seu processo e efeitos gerou inú meros trabalhos e, consequentemente, muitas definiçõ es. Nã o
existe uma explicaçã o ú nica e consensual para o conceito. Mas o traço comum à s diversas definiçõ es
é o domínio do cará ter descentralizador e de amplitude do processo globalizante.

Enfoque
ESCREVA NO CADERNO

Globalização e Governança Global

[...]

Em The World is flat [O mundo é plano], Thomas Friedman (2005) descreve um processo de globalizaçã o que transformou
o mundo numa pista plana. Ele mencionava que houve, na verdade, trê s processos de globalizaçã o no mundo. A Globalizaçã o
de 1492 a 1800 (chamada por ele de Globalizaçã o 1.0), que fez com que o mundo passasse de um tamanho G para um
tamanho M, quando os Estados estavam competindo pela conquista imperialista e por recursos naturais. A Globalizaçã o do
ano 1800 ao ano 2000 (chamada por ele de Globalizaçã o 2.0) transformou o mundo de tamanho M para tamanho P, quando
empresas saíram numa corrida desenfreada pela conquista de mercados e competiçã o de suas mercadorias, sendo ajustadas
por teorias de livre comé rcio. Entramos numa era da Globalizaçã o 3.0, segundo Friedman, que começou por volta do ano
2000 e que tem transformado o mundo de tamanho P em tamanho PP e tem transformado sua geometria, antes
arredondada, num campo plano de fá cil acesso. Esse está gio de Globalizaçã o 3.0 tem tido como marcos a queda do muro de
Berlim, a publicizaçã o da Netscape (com o oferecimento da internet) e, posteriormente, a interconectividade entre
aplicativos e programas de computador (a revoluçã o da indú stria da informaçã o). Em Globalizaçã o 1.0, eram os Estados que
“globalizavam”. Em Globalizaçã o 2.0, eram as empresas que “globalizavam”. Em Globalizaçã o 3.0, sã o os indivíduos e
pequenos grupos que “globalizam”.

[...] Globalizaçã o nã o deixa de ser a transformaçã o do mundo numa visã o cosmopolita, que cria uma enorme
interdependê ncia entre os Estados, organizaçõ es internacionais, empresas e indivíduos.

[...] Na ausê ncia de um poder mundial [na globalizaçã o], as relaçõ es internacionais e o direito internacional têm sido
moldados por um novo fenô meno: o da governança global, que muitos têm definido como uma “nova forma de governo”.

Governança global é uma expressã o em construçã o desde os anos 1990. Diferencia-se, contudo, da expressã o “governo”. [...]

[...] Governo identifica-se com a existê ncia de Estados soberanos, refere-se, de forma específica, à legitimidade de governar,
à s instituiçõ es e representantes estatais e interestatais.

[...] a expressã o “governo” compreende atividades sustentadas por uma autoridade formal, por poderes políticos que
assegurem a implementaçã o de políticas devidamente constituídas. Por outro lado, “governança” nã o compreende uma
“instituiçã o”, mas refere-se a atividades sustentadas por objetivos comuns [...] e nã o necessariamente sustentam-se em
poderes políticos para superar seus desafios e alcançar o cumprimento de suas metas. [...]

Assim, sob a expressã o “governança”, conjugam-se tanto organismos estatais ou interestatais, como instituiçõ es privadas,
formalizadas ou nã o, como também organismos nã o governamentais e conjuntos de regras/normas que identificam alguma
á rea específica. A governança pressupõ e, pois, pluralidade de atores, pluralidades de normas, pluralidade de instituiçõ es,
pluralidade de intençõ es, pluralidade de açõ es. Nã o há poder concentrado, como no caso do Estado. Pelo contrá rio, o poder é
descentralizado e difuso. [...]

VIEIRA, Andréia Costa. O diálogo sustentável entre o direito do comércio internacional e o direito à água. 2013. 308 f. Tese (Doutorado em Direito). Faculdade de Direito,
Universidade de Sã o Paulo, Sã o Paulo, 2013. p. 68-70. Disponível em: <http://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/2/2135/tde-27012015-152818/pt-br.php>. Acesso em: 18 jan.
2016.

1. Por que Thomas Friedman afirma que a globalizaçã o transformou o mundo numa pista plana?
2. A governança global aplica-se a qual processo de globalizaçã o proposto por Thomas Friedman? Converse com
colegas e reú nam argumentos para mostrar se seria possível a governança global nos outros está gios da globalizaçã o.
Pá gina 76

Atualmente, a globalizaçã o deve ser entendida como um processo multifacetado, com forte viés
econô mico, mas que transcende o â mbito da economia, manifestando-se também em outras
dimensõ es, como a cultura, a informaçã o, a política, o esporte e a geografia. A mundializaçã o dos
Jogos Olímpicos é um bom exemplo de como esse processo contempla, mas extrapola, os aspectos
econô micos. Nos mapas a seguir, observe que, no início do século XX, os Jogos contavam com a
participaçã o de poucos países, quase todos do hemisfério norte. Atualmente, quase todos os países
do globo participam daquele que é considerado o maior evento esportivo do planeta.

Allmaps

Fonte: GILLON, P.; GROSJEAN, F.; RAVENEL, L. Atlas do esporte mundial. Negócios e espetáculo: o ideal esportivo em jogo. Paris:
É ditions Autrement, 2010. p. 10-11. Com atualizaçõ es.
Pá gina 77

2.1 A globalização informacional


A dinamizaçã o e a sofisticaçã o dos meios de comunicaçã o sã o marcas da globalizaçã o. A internet, o
telefone celular, as transmissõ es por satélite, o cabo e a fibra ó ptica tornaram a difusã o da
informaçã o muito rá pida e eficaz. A instantaneidade do fato é uma realidade da globalizaçã o. Isso
tudo fez o ritmo das coisas se alterar enormemente, transformando o mundo e o cotidiano das
pessoas; a maioria agora parece correr.

O tablet, a internet, o smartphone e as redes sociais sã o exemplos de mecanismos que tornaram


possível a comunicaçã o a qualquer hora entre diferentes lugares, pró ximos ou distantes. Temos,
entã o, o redimensionamento do tempo e do espaço. Os homens e mulheres de negó cios podem
agora andar e negociar ao mesmo tempo, pois a informaçã o os acompanha. O capital tem pressa e a
globalizaçã o informacional responde à altura. O contato entre pessoas de vá rias partes do mundo
pela internet faz a distâ ncia e o tempo parecerem mais curtos. Veja, na charge abaixo, uma crítica
bem-humorada sobre a onipresença da tecnologia na vida da maioria das pessoas.

Raphael Salimena/Folhapress

A tecnologia está intensamente presente em nossas vidas nos dias de hoje.

Além de utilizar os satélites, a comunicaçã o via internet também ocorre por meio de cabos
submarinos de fibra ó ptica, que interligam os continentes. Observe, no mapa a seguir, que em 2015
a maior densidade de cabos nos países do hemisfério norte do que nos do sul propiciava àqueles
países uma maior intensidade de fluxos de informaçã o por meio da internet via cabos submarinos.
Allmaps

Fonte: TELEGEOGRAPHY. Submarine cable mapa 2016. Disponível em: <http://submarine-cable-map-2016.telegeography.com/>.


Acesso em: 19 mar. 2016.

Pauta musical
Pela internet, Gilberto Gil. Álbum: Quanta. Warner Music, 1997.
Pauta: Rede/Globalizaçã o.

LP Quanta. Gilberto Gil. Brasil, 1997


Pá gina 78

Conversando com a... Sociologia!


ESCREVA NO CADERNO

No final da década de 1960, o professor e filó sofo canadense Marshall McLuhan difundiu o termo "aldeia global" para
expressar metaforicamente as transformaçõ es sociais ocasionadas pelo desenvolvimento dos meios de comunicaçã o
no século XX e seus impactos no cotidiano das pessoas.

Na década de 1990, o professor e soció logo brasileiro Octavio Ianni também escreveu sobre esse assunto. Leia o texto
a seguir:

Quando o sistema social mundial se põ e em movimento e se moderniza, entã o o mundo começa a parecer uma espé cie de
aldeia global. Aos poucos, ou de repente, conforme o caso, tudo se articula em um vasto e complexo todo moderno,
modernizante, modernizado. E o signo por excelê ncia da modernizaçã o parece ser a comunicaçã o, a proliferaçã o e
generalizaçã o dos meios impressos e eletrô nicos de comunicaçã o, articulados em teias multimídias alcançando todo o
mundo.

A noçã o de aldeia global é bem uma expressã o da globalidade das ideias, padrõ es e valores socioculturais, imaginá rios. [...]

Em decorrê ncia das tecnologias oriundas da eletrô nica e da informá tica, os meios de comunicaçã o adquirem maiores
recursos, mais dinamismos, alcances muito mais distantes. Os meios de comunicaçã o de massa, potenciados por essas
tecnologias, rompem ou ultrapassam fronteiras, culturas, idiomas, religiõ es, regimes políticos, diversidades e desigualdades
socioeconô micas e hierarquias raciais, de sexo e idade. Em poucos anos, na segunda metade do sé culo XX, a indú stria
cultural revoluciona o mundo da cultura, transforma radicalmente o imaginá rio de todo o mundo. Forma-se uma cultura de
massa mundial, tanto pelas produçõ es locais e nacionais como pela criaçã o diretamente em escala mundial. Sã o produçõ es
musicais, cinematográ ficas, teatrais, literá rias e muitas outras, lançadas diretamente no mundo como signos mundiais ou da
mundializaçã o. [...]

No â mbito da aldeia global, prevalece a mídia eletrô nica como um poderoso instrumento de comunicaçã o, informaçã o,
compreensã o, explicaçã o e imaginaçã o do que vai pelo mundo. [...]

A aldeia global pode ser uma metá fora e uma realidade, uma configuraçã o histó rica e uma utopia. [...]

IANNI, Octavio. Teorias da globalização. Rio de Janeiro: Civilizaçã o Brasileira, 1995. p. 93-98.

• Você concorda com o autor quando ele diz que o mundo está se transformando numa aldeia global? Por que ele
indica que a aldeia global pode ser, simultaneamente, uma metá fora e uma realidade? Como seriam as fronteiras num
mundo constituído como uma aldeia global? Você considera que existe uma sociedade global? Numa aldeia global as
classes sociais desapareceriam? Converse com seus colegas sobre o texto e essas questõ es. A seguir, registre suas
reflexõ es sobre o assunto no caderno.

A noçã o de globalizaçã o remonta à ideia de difusã o internacional da informaçã o. Por esse motivo,
muitos associam essa ideia a um mundo ú nico, o mundo das empresas multinacionais de
comunicaçã o, da internet, uma marca da globalizaçã o. Ela revolucionou a comunicaçã o mundial e
possibilitou que pessoas dos lugares mais distantes se comunicassem. Essa sociedade virtual
contava em 2003 com aproximadamente 600 milhõ es de usuá rios em todo o planeta. Note que se
tratava apenas de 10% da populaçã o mundial naquele momento. Em novembro de 2015 esse
nú mero já era bem maior: 3,36 bilhõ es de pessoas, cerca de 46% da populaçã o mundial. Essa
pesquisa também demonstra que o acesso é extremamente desigual. Desse montante, a maioria dos
internautas está na Á sia, até por causa de sua elevada populaçã o e também da expansã o da rede de
infraestruturas pelos territó rios.
Tangente Design

Fonte: INTERNET WORLD STATS. Disponível em: <http://www.internetworldstats.com/stats.htm>. Acesso em: 18 jan. 2016.
Pá gina 79

Enquanto, em média, nos países considerados desenvolvidos 71% da populaçã o tem acesso à
internet, nos países em desenvolvimento essa média é de 21%. Essa desigualdade pode ser
percebida, pelo menos sob três aspectos:

• alta concentraçã o de conexõ es no hemisfério norte, em detrimento de poucas no hemisfério sul;

• nos Estados Unidos, na Europa e no Japã o as conexõ es sã o bem distribuídas pelos territó rios, o
que mostra um bom atendimento de infraestrutura por diversos pontos de seus territó rios;

• no caso brasileiro e de outros países do Sul, pobres ou em desenvolvimento, as conexõ es se


concentram em poucos pontos, onde há mais densidades técnica e populacional, o que indica
desigualdade de atendimento dessa infraestrutura informacional e condiçõ es de acessibilidade para
os habitantes em todas as regiõ es de seus territó rios.

Os nú meros da internet sã o impressionantes e aumentam a cada dia em grande velocidade. Na


tabela ao lado, observe alguns deles relativos ao ano de 2014 e imagine a intensidade de fluxo de
informaçõ es que navegam pela rede mundial de computadores. Em 2014, o e-mail era uma
ferramenta de comunicaçã o via internet utilizada, principalmente, no meio corporativo.

Tudo isso dinamiza o processo de comunicaçã o como nunca se viu na histó ria e, inevitavelmente,
torna a vida "mais rá pida".

Interagindo
ESCREVA NO CADERNO

• Os nú meros de usuá rios da internet aumentam a cada ano. Mas até que ponto esses nú meros representam a
democratizaçã o da informaçã o? Quais seriam as contribuiçõ es da comunicaçã o instantâ nea – e-mails e redes sociais
– para a sociedade? Você já pensou nisso? Converse com seus colegas e escreva um texto em seu caderno com as suas
reflexõ es sobre o assunto.

Navegar
Internet World Stats <http://tub.im/ohbapv>
No site da Internet World Stats, é possível acessar dados quantitativos sobre a internet. Os nú meros da rede mundial
de computadores são impressionantes.

Dados da internet (2014)


E-mails enviados e recebidos por dia (média) 196,3 bilhõ es
Contas de e-mail no mundo 4,1 bilhõ es

Fonte: THE RADICAL GROUP. Statistics Report, 2014-2018. Disponível em:


<http://www.radicati.com/wp/wp-content/uploads/2014/01/Email-Statistics-Report-2014-2018-Executive-Summary.pdf>.
Acesso em: 18 jan. 2016.

2.2 A globalização cultural


Muitos termos da internet sã o difundidos em inglês. Inclusive, o pró prio nome internet, que
significa rede internacional. Alguns exemplos: endereços que começam com www (world wide
web), que significa rede de alcance mundial, e-mail (correio eletrô nico), download (baixar), site
(sítio), entre muitos outros. Esse é um ponto de partida para verificarmos se há, realmente, uma
interaçã o entre as vá rias partes do globo ou se a globalizaçã o confirma um processo anterior de
hegemonia, de imposiçã o cultural.

Os críticos da globalizaçã o reputam-na uma continuaçã o do imperialismo e da colonizaçã o cultural


que o Norte impô s ao Sul. De certa forma, é inegá vel que as principais matrizes da globalizaçã o
assim se manifestem: tanto a internet como os mercados, os agentes financeiros e os pró prios
organismos supranacionais têm um diapasã o setentrionalista.

Há um debate entre os que veem a globalizaçã o como algo positivo – acreditam que ela representa
um estreitamento das diversidades culturais – e os que a veem como um prejuízo ao humanismo –
ao potencializar aquilo que se convencionou designar de crash of cultures (choque de culturas).

Tovovan/Shutterstock/Glow Images

Com a globalizaçã o da comunicaçã o por meio da internet, seus diversos termos em língua inglesa també m se globalizam.
Muitos sã o incorporados ao vocabulá rio cotidiano dos usuá rios.
Pá gina 80

Pauta musical
Disneylândia, Titãs. Álbum: Titanomaquia. WEA, 1993.
Pauta: Globalizaçã o cultural.

LP Titanomaquia. Titã s. Brasil, 1993

A Geografia na... charge!


ESCREVA NO CADERNO

Observe e analise criticamente esta charge sobre a globalizaçã o.

dieKLEINERT.d/PictureAlliance/Otherimagespress

• Que mensagem a charge transmite? Você concorda com essa visã o? Apresente argumentos que justifiquem e outros
que desabonem a mensagem transmitida pelo autor sobre o conceito de globalizaçã o.

Ver
Encontro com Milton Santos ou O mundo global visto do lado de cá. Direção: Silvio Tendler. Brasil, 2006.
Documentá rio conduzido por uma entrevista com Milton Santos sobre a “globalizaçã o desigual”. O professor
apontava a possibilidade de uma “outra globalizaçã o”, em que países pobres também pudessem ser incorporados
pelo processo que até entã o beneficiava apenas os países ricos.
Filme de Silvio Tendler. Encontro com Milton Santos ou o mundo global visto do lado de cá . Brasil, 2006

2.3 A globalização geográfica


Nã o nos esqueçamos do aspecto concreto da globalizaçã o, isto é, o planeta em si. O espaço
geográ fico é agora mais global do que nunca. A ideia de globalizaçã o geográ fica leva muitos autores
a discutir a internacionalizaçã o dos lugares. As relaçõ es entre local e global em tempos de
globalizaçã o sã o bastante complexas. Discute-se hoje o conceito de glocalização: processo em que
um local se torna global, seja por sua localizaçã o ser instantaneamente mapeada, por satélites, por
exemplo, seja pelo grau de suas conexõ es, como a presença de empresas internacionais ou mesmo
de exportaçã o de seus produtos, marcas ou de expansã o do conhecimento de sua cultura pelo
mundo.

Por outro lado, nesse processo, podem-se gerar perdas de tradicionais identidades locais. O
indivíduo tem um laço territorial com seu espaço local, ou seja, uma identidade cultural com
determinado lugar, que vem perdendo espaço com o processo de globalizaçã o. Espaços locais
convivem ou cedem lugar para espaços globais. Contudo, em muitos lugares, a força da cultura, dos
costumes e das formas de organizaçã o social prevalece, resiste e nã o se perde. Ao contrá rio, se
beneficia das conquistas sociais e tecnoló gicas da globalizaçã o para se fortalecer. É o que o geó grafo
Milton Santos chamou de “a força do lugar”.

Em sua leitura, Milton Santos trabalha com dois conceitos geográ ficos aplicados à globalizaçã o:
horizontalidade e verticalidade. A ideia de horizontalidade está associada à noçã o de lugar, ou
seja, o espaço geográ fico apresenta-se envolto em uma relaçã o de solidariedade entre aqueles que
coabitam determinado fragmento espacial tomado por uma contiguidade territorial, uma
contiguidade física.

Já a ideia de verticalidade está associada a uma relaçã o de distâ ncia, ou seja, sã o pontos
descontínuos e de comando de açõ es globais que formam um todo gerido pelos agentes centrais da
globalizaçã o. A ligaçã o dos pontos se dá por uma intera-
Pá gina 81

çã o virtual dos agentes sociais e econô micos e nã o necessariamente é iniciada nos territó rios onde
as açõ es vã o se dar. Como exemplo, podemos citar uma decisã o de investidores estrangeiros de
retirar seus investimentos de um país e investi-los em outro. Isso pode gerar uma crise econô mica
no país que perdeu as aplicaçõ es. Sã o decisõ es tomadas em lugares distantes que interferem no
funcionamento de um país. Esta é a marca maior da globalizaçã o: uma nítida padronizaçã o pautada
pelo viés econô mico e até cultural em espaços heterogêneos de vá rias partes do globo. Os pontos e
as conexõ es de horizontalidade e verticalidade constituem verdadeiras redes de relaçõ es políticas e
econô micas que abrangem as escalas local e global.

Paradoxalmente, o mundo está muito longe de apresentar uma solidá ria padronizaçã o social, de
igualdade e boas condiçõ es de vida. Ao contrá rio, a globalizaçã o é espacialmente seletiva, nã o
ocorre da mesma forma em todos os lugares e, portanto, nã o inclui toda a populaçã o do planeta no
acesso e usufruto das conquistas e dos avanços tecnoló gicos, sociais e econô micos.

Alberto Buzzola/LightRocket/Getty Images

Interaçã o entre horizontalidade e verticalidade: jovens aborígines da tribo Taroqo utilizam telefone celular e tablet antes de
começar uma dança tradicional em Hualien County, Taiwan, 2015.

Ler
Por uma outra globalização: do pensamento único à consciência univesal, de Milton Santos. Rio de Janeiro:
Record, 2000.
A visã o do geó grafo sobre a globalizaçã o, que inspirou o documentá rio Encontro com Milton Santos ou O mundo
global visto do lado de cá.

Editora Record
Enfoque
ESCREVA NO CADERNO

A grande mutação contemporânea

Diante do que é o mundo atual, como disponibilidade e como possibilidade, acreditamos que as condiçõ es materiais já estã o
dadas para que se imponha a tã o desejada mutaçã o, mas seu destino vai depender de como as disponibilidades e
possibilidades forem aproveitadas pela política. Na sua forma material, unicamente corpó rea, as té cnicas talvez sejam
irreversíveis, porque aderem ao territó rio e ao cotidiano. De um ponto de vista existencial, elas podem obter um outro uso e
uma outra significaçã o. A globalizaçã o atual nã o é irreversível.

Agora que estamos descobrindo o sentido de nossa presença no planeta, pode -se dizer que uma histó ria universal
verdadeiramente humana está , finalmente, começando. A mesma materialidade, atualmente utilizada para construir um
mundo confuso e perverso, pode vir a ser uma condiçã o da construçã o de um mundo mais humano. Basta que se completem
as duas grandes mutaçõ es ora em gestaçã o: a mutaçã o tecnoló gica e a mutaçã o filosó fica da espé cie humana.

A grande mutaçã o tecnoló gica é dada com a emergê ncia das té cnicas da informaçã o, as quais – ao contrá rio das té cnicas das
má quinas – sã o constitucionalmente divisíveis, flexíveis e dó ceis, adaptá veis a todos os meios e culturas, ainda que seu uso
perverso atual seja subordinado aos interesses dos grandes capitais. Mas, quando sua utilizaçã o for democratizada, essas
té cnicas doces estarã o ao serviço do homem.

Muito falamos hoje nos progressos e nas promessas da engenharia gené tica, que conduziriam a uma mutaçã o do homem
bioló gico, algo que ainda é do domínio da histó ria da ciê ncia e da té cnica. Pouco, no entanto, se fala das condiçõ es, também
hoje presentes, que podem assegurar uma mutaçã o filosó fica do homem, capaz de atribuir um novo sentido à existê ncia de
cada pessoa, e, também, do planeta.

SANTOS, Milton. Por uma outra globalização: do pensamento ú nico à consciência universal. 10. ed. Rio de Janeiro; Sã o Paulo: Record, 2003. p. 173-174.

• O texto defende "outra globalizaçã o". Quais as críticas à globalizaçã o e as propostas defendidas pelo autor?
Pá gina 82

2.4 A globalização política


A dimensã o política da globalizaçã o revela-se, especialmente, na discussã o sobre o Estado: qual é
seu papel nos dias de hoje e qual sua funçã o nos ditames da globalizaçã o?

Podemos partir do princípio de que a globalizaçã o é conduzida por um agente híbrido que resulta
da relaçã o entre os Estados e as empresas transnacionais, os quais ora se complementam, ora se
chocam.

Contudo, verifica-se que, comparando o período da Guerra Fria à ascensã o da globalizaçã o, o Estado
perdeu força no cená rio das relaçõ es internacionais. Grande parte daquilo que antes era regido pelo
Estado hoje é conduzido por megaempresas transnacionais, por instituiçõ es internacionais (como o
Banco Mundial, a Organizaçã o Mundial do Comércio, o FMI, o G8 etc.) e mesmo pelas Organizaçõ es
Nã o Governamentais (ONGs), que, muitas vezes, ocupam o lugar do Estado. Na dimensã o política da
globalizaçã o, o Estado perdeu o monopó lio sobre as diretrizes nacionais e internacionais e agora as
reparte com outros agentes. Contudo, o Estado ainda é a categoria central nas relaçõ es
internacionais.

2.5 A globalização econômica


A globalizaçã o econô mica é o viés mais difundido da globalizaçã o. Refere-se à abertura global das
economias nacionais, caracterizando-se pelo intenso processo de internacionalizaçã o da economia
com a respectiva descentralizaçã o do processo produtivo e o incremento maciço do consumo
globalizado. A presença de gêneros importados torna-se cada vez mais frequente no cotidiano das
pessoas de vá rias partes do globo.

A descentralizaçã o do processo produtivo e a mundializaçã o do consumo sã o traços marcantes da


globalizaçã o. Frequentemente, a produçã o de um gênero industrial envolve diversos países. Tome-
se como exemplo uma placa de rede de computador: ela reú ne inú meros componentes produzidos
em Taiwan, México, Cingapura, Canadá etc.; será montada na China e estará dentro de um notebook
ou tablet, cuja marca pode ser japonesa, e esses, por sua vez, estarã o repletos de outras peças
produzidas em vá rias partes do globo. Sua comercializaçã o, igualmente, será feita em lugares
diversos do mundo.

Xu Xiaolin/Corbis/Latinstock
Linha de montagem de placas de computador em Hefei, China, 2014.
Pá gina 83

Assim, sob esse viés, pode-se definir globalizaçã o como um processo multidimensional que ganhou
força nas ú ltimas décadas do século XX e que se caracteriza pela internacionalizaçã o da economia
na produçã o e no consumo. Consiste numa intensa integraçã o dos mercados e também da
informaçã o, da cultura e dos meios de transporte. Tem um cará ter fortemente expansionista.

A globalizaçã o também é empregada como sinô nimo de expansã o do capital e da liberalizaçã o, ou


seja, eliminaçã o de taxas restritivas ao comércio global, uma forte marca do atual está gio do
capitalismo, o neoliberalismo.

Defende, portanto, a privatizaçã o, a desregulamentaçã o da economia e a fluidez livre e sem


barreiras do capital, realizando a apologia má xima do mercado, o fio condutor da sociedade. Esse é
o discurso central das grandes corporaçõ es transnacionais e também de alguns organismos
internacionais.

Os países em desenvolvimento estã o apresentando uma crescente importâ ncia na economia global.
Além de serem os destinos majoritá rios dos investimentos produtivos das empresas transnacionais,
eles também aumentam gradativamente seus investimentos no exterior, sobretudo entre os países
do Sul. Suas empresas transnacionais já despontam como algumas das mais importantes do mundo.

Considerando as 200 maiores empresas do globo, incluindo as dos ramos produtivo e financeiro, no
ano 2000 houve uma forte centralizaçã o de seus comandos – 191 delas possuíam sede em apenas
nove países, conforme apresentado no primeiro quadro ao lado.

Sedes das maiores transnacionais (2000)


Localização Quantidade de empresas
Japã o 62
Estados Unidos 53
Alemanha 23
França 19
Reino Unido 11
Suíça 8
Coreia do Sul 6
Itá lia 5
Holanda 4

Fonte: ENCICLOPÉ DIA do mundo contemporâ neo. Sã o Paulo: Publifolha 2000.

Doze anos depois, em 2012, o panorama mudou razoavelmente, como pode ser visto no segundo
quadro ao lado. Das 200 maiores empresas do mundo, 191 possuíam sede em 17 países (além de
Hong Kong), incluindo alguns em desenvolvimento, como Brasil, China, Rú ssia, Coreia do Sul e
Índia.

Sedes das maiores transnacionais (2012)


Quantidade Localização de empresas
Estados Unidos 61
Japã o 15
Reino Unido 14
França 14
China 13
Alemanha 11
Suíça 10
Austrá lia 7
Canadá 6
Itá lia 6
Brasil 6
Rú ssia 6
Holanda 5
Espanha 5
Hong Kong 4
Coreia do Sul 3
Índia 3
Suécia 2

Fonte: FORBES. The world’s biggest public companies. Disponível em: <http://www.forbes.com/global2000/list>. Acesso em: 19
fev. 2013.

Os governos cada vez mais cortejam as transnacionais para se instalarem em seus territó rios,
oferecendo isençõ es fiscais e outros atrativos para viabilizar a instalaçã o. Há controvérsias sobre os
benefícios das transnacionais aos países em que se instalam. Os que as defendem consideram a
transferência de tecnologia como o maior benefício que elas podem trazer a uma naçã o. Já os seus
críticos questionam os elevados lucros que elas obtêm em solo estrangeiro, quase nunca pagando
salá rios similares aos do país de origem. Criticam também a forte concentraçã o de poder das
corporaçõ es que, em sua visã o, contribui para o acirramento das desigualdades produzidas pelo
capitalismo.

Luciana Whitaker/Pulsar

Montadora de veículos em Juiz de Fora (MG), 2014. Esse município oferece incentivos fiscais para atrair empresas.
Pá gina 84

Em tempos de globalizaçã o, as grandes corporaçõ es internacionais se consolidam como


hegemô nicas e aceleram cada vez mais sua expansã o. Estudos indicam que, em 2015, as dez
maiores empresas do mundo apresentaram, juntas, o valor de mercado de 2,68 trilhõ es de dó lares.
Para se ter certo parâ metro do significado desse volume, o PIB brasileiro, sétimo do mundo em
2013 e 2014, fechou em cada um desses anos com um montante na casa dos 2,2 trilhõ es de dó lares.

Na rota da globalizaçã o, os mercados financeiros internacionais ampliam o fluxo dos investimentos,


tornando-se cada vez mais sofisticados e complexos. Aproveitam-se da aprimorada rede
cibernética, que permite transferir dinheiro de um lugar para outro com um simples clique. Essa
facilidade de transferência instantânea de capital é conhecida como volatilização (ou capital
volátil): ao menor risco de crise em um país, o dinheiro é imediatamente transportado para um
lugar mais seguro. Muitas dessas transaçõ es financeiras sã o feitas por meio das bolsas de valores,
onde a internacionalizaçã o do capital em tempos de globalizaçã o se torna mais evidente.

BRENDAN MCDERMID/REUTERS/Latinstock

Bolsa de valores de Nova York, Estados Unidos, 2016.

3. O comércio mundial contemporâneo


O comércio mundial contemporâ neo é marcado por um ritmo crescente de importaçõ es e de
exportaçõ es em todas as regiõ es do globo. Muitas delas feitas por empresas nacionais, que
difundem seus produtos pelo mundo, no caso das exportaçõ es, ou que possibilitam a entrada de
produtos estrangeiros em seus territó rios de origem. Mas uma marca fundamental do comércio
mundial contemporâ neo é o papel desempenhado pelas empresas transnacionais. Sobretudo por
sua presença espalhada por todo o globo, elas viabilizam fluxos globais de produtos e de produçã o
descentralizada que ocorrem em diversos países. Hoje, a principal forma de atuaçã o dessas
empresas se dá por um procedimento conhecido como global sourcing, ou seja, a busca de
abastecimento de uma empresa por meio de fornecedores espalhados por vá rias partes do globo,
cada um produzindo e oferecendo as melhores condiçõ es possíveis de preço e qualidade naqueles
produtos que têm maiores vantagens comparativas.
Navegar
Revista Forbes <http://tub.im/iqwwwv>
O site da revista estadunidense Forbes disponibiliza inú meros dados sobre as maiores transnacionais e a
globalizaçã o.
Pá gina 85

No início dos anos 1990, a ONU estimou existirem mais de 30 mil empresas classificadas como
transnacionais, as quais possuíam mais de 150 mil filiais dispersas pelo mundo. Dessas
transnacionais, 35% eram estadunidenses.

Segundo a Conferência das Naçõ es Unidas sobre Comércio e Desenvolvimento (Unctad), no início
dos anos 2000 um terço da capacidade produtiva mundial no setor privado estava sob o controle
direto ou indireto das empresas transnacionais (TNCs), por meio de subsidiá rias ou filiais locais. As
100 maiores entre essas corporaçõ es tinham sede em naçõ es desenvolvidas, mas 50% de suas
subsidiá rias se localizavam em países em desenvolvimento. Entre elas, 53 localizadas na Europa, 23
nos Estados Unidos e o restante no continente asiá tico.

Quatorze anos depois, em 2014, apesar de o quadro geral se manter, surgiram algumas novas
tendências. Em termos quantitativos, as transnacionais ainda se mantiveram majoritariamente em
países desenvolvidos; dados da Unctad revelam que, pela primeira vez na histó ria, a China, um país
em desenvolvimento, assumiu a liderança em investimentos estrangeiros, seguida por Hong Kong,
Estados Unidos, Cingapura e Brasil.

Em 2015, no Brasil, os investimentos de empresas estrangeiras superaram as nacionais, devido à


desvalorizaçã o do real em relaçã o ao dó lar, à s dificuldades de empresas brasileiras em obter
financiamentos, entre outros motivos.

REBECCA COOK/Reuters/Latinstock

Favorecidas pelo atual está gio das comunicaçõ es e dos transportes, as transnacionais instalam suas fá bricas em diversas
partes do globo, buscando sempre maior dinamismo, produtividade, menor custo e, claro, maior lucro. Na fotografia, painel
com propaganda de multinacional alemã em Detroit, Estados Unidos, 2011.

A pesquisa da Unctad indicava que a prioridade de investimentos estrangeiros diretos na produçã o


das transnacionais para os primeiros anos da década de 2010 era a China, e também em países
como Índia, Brasil, Estados Unidos, Rú ssia, México, Reino Unido, Vietnã e Indonésia. Em linhas
gerais, os locais destinados a esses novos investimentos sã o escolhidos em funçã o de:

• acesso aos recursos naturais (para indú strias do setor primá rio);
• tamanho do mercado local;

• ambiente político está vel e favorá vel aos negó cios;

• mercado interno em crescimento;

• presença de fornecedores e empresas parceiras nos processos produtivo e comercial;

• condiçõ es de acesso aos mercados regional e global.

Além desses itens, essas mudanças se devem, em grande parte, à procura por novas á reas de
investimento e produçã o no mercado globalizado.
Pá gina 86

4. O Brasil na globalização
Em tempos de globalizaçã o, intensifica-se o polêmico debate entre liberalizaçã o – permitir
deliberadamente a entrada de produtos estrangeiros no país – e protecionismo – limitar ao má ximo
a entrada desses produtos para fortalecer os nacionais. Muitas empresas nacionais e pesquisadores
do tema sã o contrá rios ao favorecimento político e econô mico que visa à entrada de transnacionais
no país, pois alegam que isso prejudicaria a produçã o nacional. Além disso, alegam que,
historicamente, as transnacionais preocupam-se apenas com a alta lucratividade e todo o ganho é
remetido ao país sede, pouco se comprometendo com o crescimento econô mico e social dos países
em que se instalam. Isso acontece em muitos países, em vá rios setores. Em contrapartida, as
empresas transnacionais, ao se instalarem nos mais diversos lugares do planeta, organizam-se em
redes e viabilizam os fluxos mundiais de produtos, de informaçã o e de capital. Concentram
atividades em alguns locais que se tornam, rapidamente, também mundiais ou globais.

A posiçã o do Brasil na divisã o internacional do trabalho está se redefinindo dentro desse jogo
liberalizaçã o versus protecionismo. O país vem atraindo cada vez mais investimentos
internacionais em vá rios setores produtivos. A presença crescente de empresas transnacionais (no
campo e na cidade), de grandes bancos internacionais e a política de abertura de mercado ao capital
internacional têm sido possíveis graças às linhas gerais da política econô mica e à s formas de
distribuiçã o e uso das infraestruturas territoriais.

Mas, por outro lado, muitas empresas brasileiras também se instalam em outros países e se tornam
transnacionais, atuando de modo crescente no mercado global. Assim, a economia do Brasil torna-
se cada vez mais entremeada à economia internacional.

Em 2012, pela primeira vez, entre as 200 maiores empresas do mundo em termos de faturamento
anual, seis eram brasileiras e atuavam também fora do país. Em 2014, a entrada de empresas
brasileiras em outros países superou bastante o nú mero de saída. Observe o mapa abaixo e o
apresentado na pá gina ao lado.

Allmaps
Fonte: FUNDAÇÃ O DOM CABRAL. Ranking FDC das Multinacionais Brasileiras 2015. p. 56. Disponível em:
<https://www.fdc.org.br/blogespacodialogo/Documents/2015/ranking_fdc_multinacionais_brasileiras2015.pdf>. Acesso em: 19
jan. 2016.
Pá gina 87

Allmaps

FUNDAÇÃ O DOM CABRAL. Ranking FDC das Multinacionais Brasileiras 2015. p. 57. Disponível em:
<https://www.fdc.org.br/blogespacodialogo/Documents/2015/ranking_fdc_multinacionais_brasileiras2015. pdf>. Acesso em: 19
jan. 2016.

Se considerarmos outros índices além do faturamento, como os ativos (bens e investimentos) e o


nú mero de funcioná rios, pode-se chegar ao chamado índice de transnacionalidade ou de
internacionalizaçã o de uma empresa. Em 2014, as empresas dos ramos alimentício (frigoríficos),
siderurgia, tecnologia da informaçã o (TI), metalurgia, adesivos, construçã o e de gestã o possuíam os
maiores índices de transnacionalidade entre as transnacionais brasileiras.

Embora muitas empresas estejam se instalando ou adquirindo outras em territó rios europeus, a
regiã o onde há mais empresas brasileiras é a América do Sul. Em 2013, 75,8% das transnacionais
do país declararam ter instalaçõ es em países sul-americanos, além do Brasil, é claro. Observe no
grá fico abaixo a distribuiçã o das transnacionais brasileiras por diferentes regiõ es do planeta em
2014, quando confirmou-se a hegemonia de empresas brasileiras instaladas na América do Sul.

Índice de transnacionalidade: Compreende uma escala de zero a um. Quanto mais pró ximo de um, mais transnacionalizada é a
empresa. É calculado com base no total de receita, nos ativos e no nú mero de funcioná rios de cada empresa no exterior em relaçã o
aos totais, incluindo o país em questã o. A média desses três índices resulta no índice de transnacionalidade.

Tangente Design
Fonte: FUNDAÇÃ O DOM CABRAL. Ranking FDC das Multinacionais Brasileiras 2015. p. 55. Disponível
em:<https://www.fdc.org.br/blogespacodialogo/Documents/2015/ranking_fdc_multinacionais_brasileiras2015.pdf>. Acesso em: 19
jan. 2016.

A presença das empresas brasileiras no hemisfério sul reflete uma política de aproximaçã o entre os
países nele localizados. O fortalecimento das relaçõ es entre esses países vem ocorrendo com
assinaturas de acordos e tratados de cooperaçã o entre governos e denominados por cooperaçã o
sul-sul. Essa política se acentuou a partir dos anos 2000 como uma alternativa de mercado para os
países em desenvolvimento diante das políticas protecionistas de países ricos do Norte.
Pá gina 88

Na primeira década do século XXI, houve significativo incremento no nú mero de empresas


brasileiras na Á sia. Isso reflete maiores relaçõ es comerciais do Brasil com países dessa regiã o e,
vale destacar, entre países em desenvolvimento, como China e Índia, além de acordos com países do
Oriente Médio, sobretudo no ramo da construçã o civil. Ao mesmo tempo, as empresas brasileiras
aumentaram suas instalaçõ es na América Latina, na Oceania e na Á frica. Veja no mapa abaixo a
espacializaçã o das transnacionais brasileiras no mundo.

DACOSTA MAPAS

Fonte: FUNDAÇÃ O DOM CABRAL. Ranking FDC das multinacionais brasileiras 2015. p. 50. Disponível
em:<https://www.fdc.org.br/blogespacodialogo/Documents/2015/ranking_fdc_multinacionais_brasileiras2015.pdf>. Acesso em: 19
jan. 2016.

Joerg Boethling/Alamy/Latinstock

Indú stria que produz açú car, etanol e energia elé trica a partir de biomassa, em Malanje, Angola, 2012. Esta empresa é
composta de acionistas brasileiros e angolanos.

As empresas brasileiras do ramo da construçã o civil têm ampliado consideravelmente sua


participaçã o em diversos países e se destacam como algumas das maiores representantes
brasileiras no exterior. A concentraçã o da construçã o das infraestruturas territoriais brasileiras sob
a responsabilidade de poucas empresas ao longo do século XX e início de século XXI possibilitou
elevada especializaçã o a essas empresas, que hoje competem em nível internacional com as
maiores do setor.
Pá gina 89

Contudo, foram exatamente as empresas desse setor as mais envolvidas em escâ ndalos de
corrupçã o recentemente no país. Investigaçõ es indicavam que muitos de seus executivos atuavam
como corruptores há muitos anos com o Estado brasileiro.

Com forte impulso proporcionado pelo Estado brasileiro, por financiamento do Banco Nacional de
Desenvolvimento Econô mico e Social (BNDES) e pelas açõ es diplomá ticas e políticas do governo
brasileiro por meio de acordos de cooperaçã o, as empresas de construçã o civil estã o aumentando
consideravelmente sua participaçã o mundial.

Em termos gerais, considerando todos os segmentos, embora os investimentos das empresas


brasileiras sejam grandes e tenha havido significativo aumento nos investimentos externos, muitas
delas começam a direcionar maiores investimentos no mercado interno brasileiro em vez de
ampliá -los em outros países.

De acordo com dados pesquisados pela Sociedade Brasileira de Estudos de Empresas


Transnacionais (Sobeet) em 2012, as empresas brasileiras reduziram US$ 2,4 bilhõ es de seus
investimentos no exterior. Em 2011, a reduçã o havia sido de US$ 12,6 bilhõ es. Indicadores como
lucratividade e crescimento de vendas eram maiores no Brasil do que em muitos outros países. Em
2010, a margem de lucro das transnacionais brasileiras no exterior foi de 15,6% ante 20,7% no
Brasil. A crise internacional e a lenta recuperaçã o dos Estados Unidos, mais a dinâ mica da economia
brasileira, ajudaram a explicar tal quadro. Além disso, representantes dessas empresas apontavam
o alto custo da carga tributá ria: pagam-se impostos no país de origem e, ao ingressar os recursos no
Brasil, há novas tributaçõ es.

No período entre 2012 e 2014, dados indicam que as empresas transnacionais brasileiras
obtiveram maior lucro no mercado interno, apesar das oscilaçõ es dos ganhos. Observe o grá fico ao
lado.

TARUMÃ
Fonte: FUNDAÇÃ O DOM CABRAL. Ranking FDC das Multinacionais Brasileiras 2015. p. 72. Disponível
em:<https://www.fdc.org.br/blogespacodialogo/Documents/2015/ranking_fdc_multinacionais_brasileiras2015.pdf>. Acesso em: 19
jan. 2016.

ROTEIRO DE ESTUDO
ESCREVA NO CADERNO

Revisando

1. Basicamente a globalizaçã o é um processo mú ltiplo em que se verifica forte integraçã o e uma


progressiva interdependência entre as economias nacionais. É possível estabelecer um marco para o
início da globalizaçã o? Justifique sua resposta utilizando exemplos.

2. Em que medida o conceito de glocalização relaciona o global e o local? Escolha um fato tratado ao
longo do capítulo como exemplo.

3. Há um avançado está gio tecnoló gico em que vivemos nestes tempos de globalizaçã o. Por que a
globalizaçã o é considerada um processo mú ltiplo?

4. Quais sã o as diferentes dimensõ es da globalizaçã o? Descreva as principais características de cada


uma.

5. À globalizaçã o o geó grafo Milton Santos associa outros dois conceitos: horizontalidade e verticalidade.
Defina e indique como esses dois conceitos se articulam na era da globalizaçã o.

6. O que se entende por “força do lugar”?


Pá gina 90

ROTEIRO DE ESTUDO
ESCREVA NO CADERNO

Olhar cartográfico

O mapa a seguir mostra a presença de jogadores de futebol brasileiros no mercado internacional. Os


dados sã o de 2008. Embora atualmente os dados absolutos possam se mostrar diferentes, a
característica geral desse cená rio de dispersã o de jogadores brasileiros por diferentes países pode ser
considerada atual.

• É possível afirmar que esses fluxos de jogadores simbolizam a globalizaçã o? Justifique sua resposta
utilizando argumentos sobre o conceito de globalizaçã o e o volume dos dados apresentados no mapa.

Allmaps

Fonte: GILLON, P.; GROSJEAN, F.; RAVENEL, L. Atlas do esporte mundial. Negócios e espetáculo: o ideal esportivo em jogo. Paris:
É ditions Autrement, 2010. p. 55.

Atividade em grupo
O mapa da pá gina seguinte mostra como as empresas brasileiras estã o instaladas em muitos países em
todos os continentes. Analisem esse mapa, identifiquem os países em que nã o há empresas brasileiras e
os contraponham com aqueles em que há participaçã o das transnacionais do Brasil. A partir disso:

1. Construam um grá fico de barras com o nú mero de países por continente com e sem empresas
brasileiras.

2. Identifiquem a importâ ncia econô mica mundial desses países e os relacionem com a presença ou nã o
de empresas brasileiras.

3. Agora, discutam sobre a polêmica entre as políticas liberal e protecionista no mundo atual.

4. Pesquisem em livros e sites do governo do Brasil sobre sua posiçã o. O país é protecionista ou liberal?
Pá gina 91

Allmaps

Fonte: FUNDAÇÃ O DOM CABRAL. Ranking FDC das Multinacionais Brasileiras 2015. p. 52-54. Disponível
em:<https://www.fdc.org.br/blogespacodialogo/Documents/2015/ranking_fdc_multinacionais_brasileiras2015.pdf>. Acesso em: 19
jan. 2016.

De olho na mídia

Leia a matéria do jornal Folha de S.Paulo e discuta com seus colegas qual a crítica central que o papa
Francisco faz à globalizaçã o. Identifique no texto as críticas apresentadas pelo papa e as registre no
caderno. Em que parte do capítulo que estudamos podemos encontrar ideias similares à s contidas na fala
do papa? Você concorda com o posicionamento do papa apresentado no texto?

Papa Francisco condena a "cultura do descartável" da globalização

O papa Francisco fez um novo ataque à injustiça econô mica neste sá bado (28), condenando a “cultura do descartá vel”
da globalizaçã o e pedindo novas maneiras de se pensar sobre a pobreza, assistência social, emprego e sociedade.

Em discurso para a associaçã o de movimentos cooperativos italianos, ele ressaltou o “crescimento vertiginoso do
desemprego” e os problemas que os sistemas de assistência social existentes tiveram para atender à s necessidades
da saú de pú blica.

Para aqueles que vivem “nas margens existenciais” o sistema atual político e social “parece estar fatalmente
destinado a sufocar a esperança e aumentar os riscos e ameaças”, afirmou.

O papa, de origem argentina, que tem frequentemente criticado a economia do mercado ortodoxa de estimular a
injustiça e desigualdade, disse que as pessoas sã o forçadas a trabalhar longas horas, à s vezes na economia paralela,
por algumas centenas de euros por mês, porque elas sã o vistas como facilmente substituíveis.
“‘Você nã o está gostando disso: Entã o vá para casa’. O que se pode fazer em um mundo que funciona assim? Porque
há uma fila de pessoas procurando trabalho. Se você nã o gostar disso, outra pessoa gostará”, disse, em uma mudança
espontâ nea no texto do seu discurso.

“É a fome, a fome que nos faz aceitar o que eles nos dã o”, acrescentou.

O papa Francisco disse ao pú blico que eles podem ajudar a buscar novos modelos e métodos que poderiam ser um
modelo alternativo para a “cultura do descartável, criada pelas potências que controlam as políticas econô micas e
financeiras do mundo globalizado”.

Talvez atento a um escâ ndalo de corrupçã o abrangente ligado a algumas cooperativas em Roma, no ano passado, ele
atacou aqueles que “prostituem o nome da cooperativa”.

Mas sua mensagem geral foi de que a ló gica econô mica tinha que ser secundá ria às maiores necessidades da
sociedade humana.

“Quando o dinheiro se torna um ídolo, ele comanda as escolhas do homem. E assim ele arruína o homem e o condena.
Faz dele um escravo”, disse o papa.

“O dinheiro a serviço da vida pode ser administrado de maneira certa por cooperativas, com a condiçã o que se trate
de uma cooperativa real, onde o capital nã o tem comando sobre os homens, mas sim os homens sobre o capital”,
reforçou.

PAPA Francisco condena a ‘‘cultura do descartável’’ da globalizaçã o. Folha de S.Paulo, 28 fev. 2015. Disponível em: <http://www1.folha.uol.com.br/mundo/2015/02/1596351-
papa-francisco-condena-a-cultura-do-descartavel-da-globalizacao.shtml>. Acesso em: 17 dez. 2015.
Pá gina 92

Globalização e
CAPÍTULO 5 -
regionalização: os blocos
econômicos

Genya Savilov/AFP/Getty Images

Ucranianos se manifestam na Praça da Independê ncia, em Kiev, em 2 de dezembro de 2013, a favor do ingresso da Ucrâ nia
na Uniã o Europeia.
Pá gina 93

Tópicos do capítulo

Blocos de integração econômica

União Europeia

Mercosul

Ponto de partida
ESCREVA NO CADERNO

Os blocos regionais de integraçã o econô mica nã o sã o apenas um desejo dos governos. Em dezembro de
2013, milhõ es de pessoas foram à s ruas de Kiev, capital da Ucrâ nia, para protestar contra o governo apó s
este anunciar que nã o assinaria o Acordo de Associaçã o com a Uniã o Europeia. Em um mundo cada vez
mais globalizado, é fundamental compreender a importâ ncia dos blocos econô micos regionais, suas
consequências para os países e para a vida das pessoas.

• Em sua opiniã o, qual é a importâ ncia dos blocos regionais no mundo globalizado? Cite algum bloco
regional de integraçã o econô mica.
Pá gina 94

1. Blocos de integração econômica


A formaçã o de blocos econô micos regionais, como Uniã o Europeia (UE) e Mercado Comum do Sul
(Mercosul), é uma característica da globalizaçã o que se expandiu notavelmente. Observe, no mapa a
seguir, a divisã o do mundo por blocos econô micos regionais, também chamados de economias
regionais.

A relaçã o globalizaçã o-regionalizaçã o nã o deixa de ser paradoxal. A finalidade desses blocos é


estreitar os laços econô micos entre os países-membros e dificultar a entrada de produtos e serviços
oriundos de países ou regiõ es externos a eles, num procedimento claramente protecionista. Já a
ideia de globalizaçã o tem um forte discurso de integraçã o comercial, de expansã o e
descentralizaçã o. No entanto, globalizaçã o e regionalizaçã o sã o processos simultâ neos e um incide
no outro.

Allmaps

Fonte: BAUER, Barbara. Atlas der Globalisierung. Berlin: Le Monde Diplomatique, 2009. p. 13. Com atualizaçõ es.

Nota: A Alca (Á rea de Livre-Comé rcio das Amé ricas) nã o foi implementada; é uma proposta que se encontra em negociaçã o.

Existem formas diferentes de organizaçã o dos blocos de integraçã o econô mica entre países. A
inicial é a criaçã o de uma Zona de Preferências Tarifá rias (ZPF) também conhecida como Á rea de
Tarifas Especiais (ATE), na qual os países-membros pagam taxas menores do que os nã o membros
para os produtos comercializados entre eles. A outra forma é a Á rea ou Zona de Livre-Comércio
(ZLC), que ocorre quando todas as barreiras tarifá rias e nã o tarifá rias entre os países-membros sã o
eliminadas em pelo menos 80% dos produtos comercializados no grupo. Quando os países de uma
Zona de Livre-Comércio (ZLC) criam uma Tarifa Externa Comum (TEC) para a importaçã o de
produtos de países de fora do grupo, estabelece-se nova forma de integraçã o: a Uniã o Aduaneira
(UA).
Pá gina 95

Quando, além da TEC e da livre circulaçã o de bens e de capital, acorda-se a livre circulaçã o de
pessoas nascidas nos Estados-membros, estabelece-se o Mercado Comum, outra forma de
integraçã o econô mica. As empresas de seus países-membros podem se instalar em qualquer um
deles. É mais profundo que outras formas, como a ZLC e a UA.

A Uniã o Europeia é o Mercado Comum mais avançado, pois, além de todas as características dos
outros blocos, unificou a moeda entre a maioria de seus Estados-membros e elegeu um Banco
Central para o bloco, que procura estabelecer acordos de políticas fiscais comuns. Converte-se,
assim, na mais completa forma de integraçã o: uniã o econô mica e monetá ria.

Alguns dos grandes blocos regionais de integraçã o econô mica e suas características estã o
relacionados no quadro a seguir.

Tipo Blocos
Área de Tarifas Especiais (ATE) ou Zona de Aladi – Associação Latino-Americana de Integraçã o
Preferências Tarifárias (ZPF)
Nafta – Acordo de Livre-Comércio da América do
Norte
Alca – Á rea de Livre-Comércio das Américas (nã o
Zona de Livre-Comércio (ZLC) implementada)
CAN – Comunidade Andina
Asean – Associaçã o de Naçõ es do Sudeste Asiá tico
Apec – Cooperação Econô mica Á sia-Pacífico
União Aduaneira (UA) Sacu – Uniã o Aduaneira da Á frica Austral

Ler
A unificação da Europa, de Vamireh Chacon. São Paulo: Scipione, 1993.
Obra paradidá tica que faz um retrospecto do processo de integraçã o europeia.

Editora Scipione

Conversando com a... Língua Portuguesa!


ESCREVA NO CADERNO

Além dos blocos econô micos, há outras formas de integraçã o entre os países em tempos de globalizaçã o. Em 1996, foi
formada a Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP), com o intuito de promover o aprofundamento da
amizade mú tua e de cooperaçã o entre seus membros em áreas como educaçã o, saú de, ciência e tecnologia, cultura,
defesa, agricultura, administraçã o pú blica, comunicaçõ es, justiça, segurança, desporto e comunicaçã o social. Também
tem como objetivo promover e difundir a língua portuguesa. Os Estados-membros são: Angola, Brasil, Cabo Verde,
Guiné-Bissau, Guiné Equatorial, Moçambique, Portugal, Sã o Tomé e Príncipe e Timor-Leste. Em 1990, mesmo antes
da oficializaçã o da Comunidade, países de língua portuguesa assinaram o Acordo Ortográ fico da Língua Portuguesa.
O acordo já está em vigor em alguns países e em outros ainda se aguarda a ratificaçã o por parte de seus governos.

Em 2009, o Brasil aderiu oficialmente ao acordo, mas nã o de forma obrigató ria. Em 1º de janeiro de 2016, apó s seis
anos de transiçã o, entrou em vigor a obrigatoriedade da nova regra ortográfica. A partir dessa data, as normas
definidas no acordo ortográ fico sã o obrigató rias em textos oficias, documentos, exames vestibulares e concursos.
• Você sabe o que é esse acordo ortográfico? De que forma você acha que esse acordo pode fortalecer as relaçõ es
entre os países de língua portuguesa? Converse com seus colegas, consulte o site <http://tub.im/4qnyp7>, reflita
sobre o assunto e registre suas consideraçõ es em seu caderno.
Pá gina 96

2. União Europeia: o modelo mais integrado


A Europa refez sua histó ria apó s o término da Segunda Guerra Mundial, adentrando em nova etapa
histó rica. A característica mais marcante dessa nova Europa que surgia das ruínas do grande
conflito era o desejo integrador, enterrando a era dos regimes totalitá rios. O objetivo inicial era
evitar novas guerras – uma vez que o continente envolveu-se em inú meras delas – e direcionar-se a
uma paz efetiva. Dessa forma, a integraçã o instaurada parece ter dado certo, pois desde entã o no
continente, mesmo com as guerras e conflitos nos Bá lcã s, prevaleceram grandes períodos sem
guerra. Vale lembrar que a Guerra Fria contribuiu decisivamente para a trégua continental.

O pontapé inicial fora dado com três países, ainda em 1944, quando Bélgica, Países Baixos
(Netherlands) e Luxemburgo fundaram o que viria a ser o embriã o da Uniã o Europeia, o Benelux
(palavra formada pelas iniciais dos nomes dos três países), acordo econô mico que visava,
principalmente, facilitar o escoamento da produçã o de carvã o e aço pelo porto de Roterdã . Em
1951, com o Tratado de Paris, fundou-se a Comunidade Europeia do Carvã o e do Aço (Ceca), que
visava garantir o acesso à s jazidas carboníferas e unificar a produçã o e a comercializaçã o do aço
dos seis países-membros: Alemanha, França, Itá lia e os países do Benelux. Essa iniciativa anunciava
tamanha complementaridade entre as indú strias francesa e alemã que inviabilizava qualquer
possibilidade de confronto entre as duas potências rivais que haviam travado três guerras em
menos de um século. A integraçã o era para valer.

No entanto, o momento mais marcante viria em março de 1957: o Tratado de Roma criou a
Comunidade Econô mica Europeia (CEE), que passou a ser o mais importante bloco de integraçã o
jamais visto até entã o, composto inicialmente dos mesmos países da Ceca, mas claramente liderado
por Alemanha e França. Também com o Tratado de Roma era fundada a Comunidade Europeia de
Energia Atô mica (Euratom), associaçã o formada pelos países da CEE e que buscava uma política
energética nuclear comum para fins pacíficos aos europeus.

O Reino Unido foi convidado a participar das negociaçõ es de Roma, mas manteve seu isolacionismo,
já que apostava em outra forma de relaçã o em bloco: a Comunidade Britânica de Naçõ es
(Commonwealth), formada por suas ex-colô nias e por ele liderado. O governo britâ nico reveria sua
posiçã o em 1961, quando pedira ingresso na Comunidade, sendo barrado por Charles de Gaulle,
entã o presidente francês, que afirmou ter “sérias dú vidas sobre a boa vontade britâ nica”. Os
britâ nicos repetiriam o pedido em 1967, que foi novamente vetado.

Além da busca ininterrupta por integraçã o, os objetivos mais explícitos dos membros da CEE eram
a criaçã o de uma zona aduaneira com isençã o tarifá ria, o que permitiria a livre circulaçã o de
produtos entre os países da Comunidade e o estabelecimento de uma Tarifa Externa Comum (TEC)
dos países do bloco com outros países que dele nã o participavam, processo que foi consolidado em
1968.

A ampliaçã o da Comunidade se daria em etapas, com o ingresso, em 1973, de Reino Unido, Irlanda e
Dinamarca; em 1981, da Grécia; e, em 1986, de Espanha e Portugal. É essa Europa dos 12 países que
daria um ousado passo em 1991: a criaçã o da Uniã o Europeia. De 1957 a 1991, a CEE avançou
bastante no processo de integraçã o, encaminhando medidas como: reduçã o gradual até a
eliminaçã o total de tarifas alfandegá rias; política agrícola comum, com preferência por produtos do
continente; criaçã o do Sistema Monetá rio Europeu (SME), que idealizou a moeda do bloco, o euro;
fundaçã o do Ato Ú nico, legislaçã o jurídica conjunta, reforçando a coesã o europeia; criaçã o do Banco
Europeu para Reconstruçã o e Desenvolvimento (Berd), instituiçã o destinada a auxiliar as
economias do Leste Europeu em transiçã o para a economia de mercado, entre outras iniciativas.
AFP/Otherimages

Jean Monnet: diplomata francê s, arquiteto da integraçã o europeia e primeiro presidente da Ceca, em discurso em Paris, em
1955.

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União Europeia <http://tub.im/hnzv4v>
O portal da Uniã o Europeia disponibiliza para consulta estatísticas, dados, tratados e a legislaçã o vigente. Para quem
pretende viajar ou morar em países do bloco, é possível obter informaçã o no link "Viver e fazer negó cios na UE".
Pá gina 97

Entre dezembro de 1991 e novembro de 1993, em uma série de encontros e reuniõ es, os líderes
europeus encaminharam alteraçõ es e avanços no â mbito da integraçã o por meio da assinatura do
Tratado da Uniã o Europeia, mais conhecido pelo nome da cidade holandesa que sediou o evento:
Tratado de Maastricht. Esse documento transformou a Comunidade Econô mica Europeia (CEE)
em Uniã o Europeia (UE), constituída por três instituiçõ es centrais: o Parlamento Europeu, que
representa os cidadã os e é eleito por eles; o Conselho da Uniã o Europeia, que representa os
governos e cuja presidência é rotativa entre os países-membros; e a Comissã o Europeia, que atende
aos interesses gerais do bloco.

Na ocasiã o da assinatura do Tratado de Maastricht, em fevereiro de 1992, também foi anunciado


um ousado calendá rio de atividades, tais como a unificaçã o monetá ria até 1999, a criaçã o da
cidadania europeia e de uma política externa comum: a livre circulaçã o de pessoas no â mbito dos
12 países-membros. Em 1995, integraram a Uniã o Europeia a Finlâ ndia, a Suécia e a Á ustria. Nã o foi
apenas uma troca de sigla: a partir do Tratado de Maastricht, a unificaçã o europeia passaria do
â mbito até entã o exclusivamente econô mico também para o político, modificando e ampliando o
cará ter da entidade, que buscava agora maior participaçã o no cená rio internacional.

Imago/ZUMAPRESS.com/Easypix

A disposiçã o circular das estrelas na bandeira da Uniã o Europeia representa a harmonia. O nú mero de estrelas representa os
12 países do bloco na é poca de sua criaçã o, mas atualmente nã o corresponde mais ao nú mero de Estados-membros, que, em
2015, contava com 28 membros, abrangendo mais de 500 milhõ es de pessoas. Fotografia em Bruxelas, capital da Uniã o
Europeia, em 2014.

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Banco Central Europeu <http://tub.im/pdj55i>
Esse site apresenta mapa interativo com informaçõ es sobre quando cada país se tornou Estado-membro e o ano de
adesã o à zona do euro.

A mais ambiciosa medida da Uniã o Europeia se materializaria no primeiro dia de 2002, quando a
moeda ú nica entrou em circulaçã o. O euro, que surgia para ser uma moeda forte e internacional,
passando a concorrer com o dó lar estadunidense, foi adotado por 12 dos 15 países-membros. Reino
Unido, Suécia e Dinamarca ficaram fora da “zona do euro”, em um primeiro momento, além da
Grécia. Por iniciativa do Reino Unido, que seguia resistindo ao aprofundamento da integraçã o,
inseriu-se na uniã o monetá ria uma clá usula que facultava aos países-membros a opçã o de manter
as respectivas moedas nacionais.

Em Maastricht discutiu-se também a proposta de uma aliança militar com vistas a um programa de
defesa comum, que poderia reduzir a importâ ncia da Otan e a influência estadunidense na Europa.
Contudo, esse projeto é ainda muito embrioná rio. Propuseram-se ainda a unificaçã o das leis
trabalhistas, criminais, civis e de imigraçã o e a formulaçã o de uma política externa conjunta.
Algumas das principais deliberaçõ es do Tratado de Maastricht foram as seguintes:
Pá gina 98

• Fim das fronteiras econô micas entre os 12 países-membros – depois, 15 – com a eliminaçã o total
das taxas restritivas de importaçã o;

• Estabelecimento de um calendá rio efetivo para a unificaçã o monetá ria, o que se confirmou em
2002 com a criaçã o do euro;

• Criaçã o de um fundo de assistência aos países mais pobres da Comunidade, como Portugal, Grécia
e Irlanda;

• Prioridade à importaçã o de produtos agrícolas dos países da Uniã o Europeia.

A maior ampliaçã o da Uniã o Europeia deu-se entre 2004 e 2007, quando entraram 12 novos
membros. Com exceçã o de Chipre e Malta, os demais vieram da antiga ó rbita de influência soviética:
Lituâ nia, Letô nia, Estô nia, Polô nia, Repú blica Tcheca, Eslová quia, Eslovênia, Hungria, Bulgá ria e
Romênia. A Croá cia foi o ú ltimo país a ingressar no bloco, em 2013, totalizando 28 membros até
2015.

Apesar de seu pedido ter sido feito em 1959, a Turquia em 2015 continuava de fora e, desde 2005,
espera por aprovaçã o de sua entrada pelo Conselho da Uniã o Europeia. Outros países também eram
canditatos até 2015, como Macedô nia e Montenegro. Observe, no mapa a seguir, os países que
compõ em a Uniã o Europeia e os que fazem parte da zona do euro.

Allmaps

Fonte: BANCO CENTRAL EUROPEU. Mapa da área do euro 1999-2015. Disponível em:
<http://www.ecb.int/euro/intro/html/map.pt.html>. Acesso em: 18 dez. 2015.

Ver
Do outro lado. Direção: Fatih Akin. Turquia/Alemanha/Itália, 2007.
A questã o da entrada da Turquia na Uniã o Europeia é abordada nesse filme, que evidencia a realidade de imigrantes
turcos na Alemanha.
Filme de Fatih Akin. Do outro lado. Turquia/Alemanha/Itá lia, 2007

2.1 A crise da zona do euro


A crise econô mica e financeira internacional que assolou o mundo em 2008, seguida por forte
recessã o em 2009, nã o poupou os países europeus. Itá lia, Espanha, Chipre, Irlanda, Portugal e
Grécia apresentaram grandes problemas em suas economias nacionais, o que prejudicou a
economia do bloco. Tais países apresentavam elevadíssimo grau de endividamento pú blico com
instituiçõ es financeiras e nã o conseguiam alavancar suas economias por meio da geraçã o de
recursos advindos das pró prias produçõ es para saldar as dívidas. Isso seria impossível sem a ajuda
de todo o bloco, o que causou polêmicas e divergências entre seus Estados-membros. A crise
alastrou-se pela zona do euro e chegou a resvalar na França, por causa da quantidade de
empréstimos feitos pelos bancos franceses aos países endividados.
Pá gina 99

A crise mostrou-se mais aguda na Grécia, que precisou solicitar empréstimos aos parceiros
europeus e ao FMI, mas nã o sem antes se submeter aos ajustes fiscais que atingiram toda a
sociedade grega. A grave situaçã o fiscal da Grécia é antiga. Começou antes mesmo da adesã o à
moeda ú nica europeia em 2002, quando, em um primeiro momento, o país fora recusado na zona
do euro por nã o atingir as metas fiscais.

Com a grave crise econô mica e social e os altos índices de desemprego, entre 2014 e 2015 a
situaçã o ficou praticamente insustentá vel no país. Foram realizadas eleiçõ es em que a populaçã o
elegeu um partido considerado de extrema esquerda, cuja plataforma política era dizer “nã o” à s
exigências da Uniã o Europeia. Em uma difícil negociaçã o que envolveu o novo governo grego, Uniã o
Europeia e FMI, chegou-se a um tênue acordo, porém muitos analistas entendiam que a crise grega
perduraria ainda por muitos anos (observe a fotografia ao lado). A dura realidade do país, cuja
dívida representa 170% do Produto Interno Bruto (PIB), é a principal causa desse ceticismo.

Também em 2015, logo apó s sua reeleiçã o, o premiê britâ nico David Cameron acenou para aquilo
que já havia sido adiantado em 2011 pelo Parlamento britâ nico: uma possível saída do país da
Uniã o Europeia, anunciando para os pró ximos anos a realizaçã o de um referendo sobre tal
possibilidade. Essa intençã o fez que os demais membros da UE olhassem o país com certa
desconfiança em relaçã o ao compromisso britâ nico com o bloco, o que lembra as dú vidas
levantadas por Charles de Gaulle na década de 1960.

Hannibal Hanschke/Reuters/Latinstock

A grave crise grega afetou todos os países do bloco. Na fotografia, Alexis Tsipras, primeiro-ministro da Gré cia, e Angela
Merkel, chanceler alemã , em entrevista coletiva apó s tentativa de acordo econô mico entre a Uniã o Europeia e a Gré cia, na
Alemanha, 2015.

2.2 Integração versus exclusão


A Frente Nacional, partido político francês de extrema direita, com uma plataforma nacionalista,
protecionista e xenó foba vem ganhando expressã o nos ú ltimos anos e a cada eleiçã o adquire mais
adeptos. Chegou a enviar Jean Marie Le Pen, seu líder e fundador, ao segundo turno das eleiçõ es
presidenciais de 2002. Jean Marie Le Pen dirigiu o partido até 2011 quando foi sucedido por sua
filha, Marine Le Pen. A Frente Nacional propõ e o retorno da pena de morte e compara os
muçulmanos do país à ocupaçã o nazista, clama por severas restriçõ es à imigraçã o e aos direitos de
cidadania aos estrangeiros no país, com o slogan "França para os franceses”, e sugere a saída do
país da Uniã o Europeia. Contudo, enfrentam resistências de parte da populaçã o francesa. Observe a
fotografia abaixo.
JEAN-PHILIPPE KSIAZEK/AFP

Pessoas protestam contra o racismo de Estado, a Frente Nacional e a violê ncia policial durante a realizaçã o do 15º Congresso
da Frente Liberal em Lyon, França, 2014.
Pá gina 100

Na Itá lia, Silvio Berlusconi, em 2008, durante seu governo como primeiro-ministro, associou-se à
Liga do Norte, partido de inspiraçã o neofascista e xenó fobo que tem como principal plataforma
política a separaçã o da parte rica da Itá lia, o norte, da porçã o considerada pobre, o sul. A Liga do
Norte, que dificilmente alcançará tal intento, tenta interferir na vida política do país pela via
institucional. Durante o governo Berlusconi, em troca de apoio ao primeiro-ministro, conseguiu
impor uma nova política tributá ria pautada no federalismo, que dificulta a transferência dos
impostos arrecadados no norte para o sul.

Até entã o tolerante, a Holanda assistiu, no fim dos anos 1990, à ascensã o da extrema direita com
um excêntrico político de carreira meteó rica: Pim Fortuyn. Tã o rápido como surgiu, desapareceu:
foi assassinado por um ecologista igualmente intolerante que discordava de suas propostas em
relaçã o aos animais. O assassinato de Fortuyn à s vésperas das eleiçõ es de 2002 provocou forte
comoçã o, e o tiro do ambientalista saiu pela culatra: o recém-fundado partido Lista Pim Fortuyn
teve expressiva votaçã o e chegou a compor a coalizã o que governou o país (quase sempre composta
de democratas-cristã os e social-democratas até entã o), porém de curtíssima duraçã o.

No Reino Unido, a representaçã o parlamentar da extrema direita fica por conta do inexpressivo
Partido Nacional Britâ nico (BNP), que luta por um país branco. Contudo, o controle político está
instaurado há décadas entre conservadores e trabalhistas; já os nacionalistas extremados têm
tímida participaçã o na vida política.

Apesar do grande nú mero de partidos de extrema direita europeia, seu peso político ainda é
insignificante no universo global do continente; comportam-se mais como uma minoria ruidosa,
porém impotente na via parlamentar. No entanto, nos ú ltimos anos, tem se verificado forte
tendência de crescimento desses partidos.

Há de se ressaltar que uma parcela dos ultradireitistas nã o conduz suas aspiraçõ es pela via
partidá ria e, sim, por açõ es extremistas quando a intolerâ ncia étnica abandona o campo político e
parte para açõ es violentas. No afã de defender suas convicçõ es, é assim que agem os skinheads e
diversas outras facçõ es neonazistas, atuantes, sobretudo, no Reino Unido e na Alemanha.

A Espanha é outro país que convive com a onda xenó foba. Já sã o mais de 4 mil casos racistas por
ano no país, e o nú mero de militantes neonazistas cresceu 400% nos ú ltimos dez anos. Como em
outros casos, também na Espanha o fenô meno está diretamente ligado ao aumento da imigraçã o e à
crise econô mica. Embora apenas 2% dos espanhó is se considerem adeptos de partidos de extrema
direita e esses tenham alcançado menos de 1% dos votos em eleiçõ es recentes, juntamente com
Alemanha, França, Suécia e Reino Unido, a Espanha está entre os países em que mais cresceram as
agressõ es racistas. Isso levou a reaçõ es de diversas parcelas da populaçã o contra manifestaçõ es
xenó fobas e racistas. Observe a fotografia abaixo.
Lluis Gene/AFP/Getty Images

Em diferentes momentos, nos está dios de futebol na Europa, sã o registradas açõ es racistas e xenó fobas contra os jogadores
de futebol. Na fotografia, jogadores posam com uma faixa (“Nã o ao racismo") contra o racismo em uma partida entre os
times Barcelona e Ajax Amsterdam, no está dio em Barcelona, Espanha, 2014.
Pá gina 101

O fim da bipolaridade antagô nica entre capitalismo e socialismo, que pautou a ordem do pó s-
Guerra Fria, revitalizou o nacional-populismo europeu a partir dos anos 1990 e reacendeu a chama
xenó foba, nunca extinta, mas adormecida desde os anos 1930. Partidos populistas como a Frente
Nacional, na França, a Liga do Norte, na Itá lia, ou o Partido da Liberdade, na Á ustria, conduziram
suas plataformas doutriná rias sobre dois campos ideoló gicos: um discurso antiglobalizaçã o e anti-
integraçã o, defendendo a pureza da nacionalidade e a expulsã o dos imigrantes contra o pluralismo
multinacional encaminhado pela Uniã o Europeia; e um fundamentalismo de mercado com o
má ximo de arraigamento liberal e combate ao Estado interventor – a extrema direita se opõ e ao
welfare state (Estado de bem-estar social), que assiste, entre outros, africanos e asiá ticos. A
desarticulaçã o dos socialistas, presença marcante na cena política europeia, também contribuiu
para a ascensã o populista.

Uma das principais clá usulas da Comunidade Europeia diz respeito à livre circulaçã o de pessoas
dentro do bloco, a “á rea ou espaço de Schengen”, do Acordo de Schengen, homô nimo da pequena
cidade de Luxemburgo, onde foi assinado em 1985 por Bélgica, Holanda, Luxemburgo, Alemanha e
França. Em 1997, expandiu-se para quase toda a Uniã o Europeia. Em 2007, com o Tratado de
Lisboa, que revisou diversas questõ es internas ao bloco, institui-se uma política comum de vistos e
imigraçã o a países do espaço Schengen.

Apesar de ser essencialmente uma iniciativa aos membros do bloco, a circulaçã o de pessoas
apresenta algumas exceçõ es: Reino Unido e Irlanda nã o ratificaram o Acordo Schengen, enquanto
os cidadã os da Noruega, Islâ ndia e Suíça, que nã o sã o membros do bloco, têm o direito de transitar
na Comunidade. Veja o mapa a seguir.

Allmaps

Fonte: COMISSÃ O EUROPEIA. Espaço Schengen. Disponível em:


<http://ec.europa.eu/dgs/home-affairs/what-we-do/policies/bordersand-visas/schengen/index_en.htm>. Acesso em: 18 dez. 2015.
Interagindo

ESCREVA NO CADERNO

Alguns geó grafos afirmam que a globalizaçã o atual tem também um cará ter impositivo, ou seja, que se sobrepõ e aos
acontecimentos locais, uma espécie de globalitarismo. Destacam que, nesse processo, às vezes, é necessá rio que haja
certa espetacularidade dos casos em que há vítimas da intolerâ ncia para que elas sejam consideradas.

• O que você acha dessa afirmaçã o? Você conhece algum exemplo para ilustrar essa situaçã o?

Ver
O barco da esperança (La Pirogue). Direção: Moussa Touré. França/Senegal, 2012.
Um jovem senegalês, em busca de uma vida melhor na Europa, embarca em uma piroga, embarcaçã o típica da Á frica
e Oceania, com outros imigrantes para realizar uma viagem longa e perigosa pelo oceano Atlâ ntico em direçã o à
Espanha.
Pá gina 102

A Europa assiste a uma grande onda imigrató ria, sobretudo de pessoas originá rias da Á frica e da
Á sia. Muitas tentam entrar de forma ilegal no continente, arriscando suas vidas, conforme retratado
na fotografia ao lado.

Até o início de 2013, a Europa tinha 224 casas de detençã o voltadas aos imigrantes, que
comportavam até 30 mil detentos à espera do repatriamento. Até aquele momento, o objetivo da
Europa era prender e expulsar aqueles que chegassem, para depois analisar os casos daqueles que
já haviam entrado. Esta é a parte perversa da globalizaçã o.

A questã o é que a Europa precisa do imigrante: é um difícil dilema. A queda nos índices de
natalidade indica que os idosos serã o maioria na Europa. A Itá lia, por exemplo, foi o primeiro país
da histó ria a ter uma populaçã o acima de 60 anos maior que a de jovens. Outros a seguirã o. Esta é
uma tendência inegá vel para um futuro pró ximo.

Hafidh/AFP/Getty Images

Cenas como esta, registrada em 2011, sã o comuns no mar Mediterrâ neo, que separa a Europa da Á frica. Em abril de 2015,
aconteceu uma das mais graves tragé dias quando uma embarcaçã o que transportava imigrantes africanos naufragou na
costa líbia, causando a morte de cerca de 700 pessoas.

3. O Mercosul
Em 26 de março de 1991, na capital paraguaia, foi assinado o Tratado de Assunçã o que instituiu o
Mercosul, formado inicialmente por Argentina, Brasil Paraguai e Uruguai. O Mercosul, embora traga
no nome uma forma mais complexa de integraçã o econô mica, ainda é, segundo o Ministério das
Relaçõ es Exteriores do Brasil, uma Zona de Livre-Comércio e uma Uniã o Aduaneira em fase de
consolidaçã o e que caminha para o estabelecimento de um Mercado Comum, com laços mais
profundos de integraçã o. No entanto, o Mercosul sequer consolidou-se como Uniã o Aduaneira,
devido à s divergências internas que impediram a adoçã o de uma Tarifa Externa Comum (TEC).
Observe, na imagem abaixo, os entã o presidentes dos países fundadores do mercosul
Logomarca Mercosul

O Cruzeiro do Sul compõ e o símbolo oficial do Mercosul.

Antonio Scorza/AFP/Otherimages

Os entã o presidentes dos quatro países-membros fundadores do Mercosul, que hoje conta com a presença da Venezuela. A
partir da esquerda: Luis Alberto Lacalle, do Uruguai, Fernando Collor de Mello, do Brasil, André s Rodríguez, do Paraguai, e
Carlos Menem, da Argentina. Brasília, 1991.
Pá gina 103

A viabilizaçã o das proposiçõ es comerciais também tem, necessariamente, cará ter político: só
podem ocorrer em condiçõ es de estabilidade regional, sem guerras ou conflitos entre os Estados-
membros. Nos documentos do bloco está previsto que seus países devem ter estabilidade política
garantida, democracia fortemente instituída e consolidada, respeito ao ambiente e à meta do
desenvolvimento sustentá vel, estado de paz, combate à pobreza, procurar a justiça social e o
desenvolvimento econô mico de forma igualitá ria aos seus cidadã os.

Foi por ocasiã o da derrubada do presidente paraguaio, Fernando Lugo, e com base exatamente em
argumentos relacionados à estabilidade política e à consolidaçã o da democracia que, em junho de
2012, os Estados-membros do Mercosul, Argentina, Brasil e Uruguai, suspenderam o Paraguai como
membro do bloco e das reuniõ es da Uniã o das Naçõ es Sul-Americanas, a Unasul, criada em 2008 e
formada por 12 países da América do Sul.

Os três Estados-membros entenderam que um impeachment ao entã o presidente do Paraguai fora


na realidade um golpe, visto que ele foi eleito democraticamente e seu processo de impedimento
durou menos de 24 horas. O Paraguai ficou suspenso do bloco até abril de 2013, quando ocorreram
eleiçõ es presidenciais no país. Durante o período de suspensã o foi aprovada a entrada da
Venezuela, que havia sido barrada pelo Congresso paraguaio, apesar da aprovaçã o dos outros três
países-membros. Em 2015, os Estados-membros plenos do Mercosul eram: Argentina, Brasil,
Paraguai, Uruguai e Venezuela.

Além dos chamados Estados-membros, o bloco admite a participaçã o, com direitos restritos, de
países associados, que podem vir a se tornar países-membros. Com isso e visando à intensificaçã o
das relaçõ es econô micas no Cone Sul do continente americano, outros países ingressaram no bloco
como membros associados: Bolívia e Chile (desde 1996), Peru (desde 2003), Equador e Colô mbia
(desde 2004), Guiana e Suriname (desde 2013). Veja o mapa abaixo.

Em 2015, a promoçã o da Bolívia de Estado associado a Estado-parte acelerou o processo de adesã o


do país andino à condiçã o de membro do Mercosul, fato que poderá se consolidar em breve.

Allmaps

Fonte: MERCOSUL. Os países do Mercosul. Disponível em: <www.mercosul.gov.br>. Acesso em: 21 dez. 2015.
O Mé xico nã o pertence ao Mercosul, mas ocupa posiçã o de país observador. Já se cogitou a sua entrada no bloco, o que
ampliaria a participaçã o para países latino-americanos.

Navegar
Mercosul <http://tub.im/ytqoe8>
O site oficial do Mercosul disponibiliza diversos textos e notícias sobre as discussõ es que envolvem os países-
membros.
Pá gina 104

A admissã o, em 2012, da Venezuela no Mercosul levantou uma série de discussõ es polêmicas. No


â mbito eminentemente geográ fico, mais especificamente geoeconô mico, questionava-se o fato de a
Venezuela estar ao norte da América do Sul, fazendo fronteira apenas com o Brasil e nã o com os
demais membros, o que poderia beneficiar comercialmente esses dois países em detrimento dos
outros. Contudo, os estados do norte do Brasil viram a possibilidade de real integraçã o, já que eram
eles que acusavam distanciamento do Mercosul por causa da concentraçã o das atividades no Cone
Sul do continente.

Membro da Organizaçã o dos Países Exportadores de Petró leo (Opep), a Venezuela concentra a
sexta maior reserva de petró leo do mundo, o que é um fator econô mico de extremo valor político e
logístico para a regiã o e para o bloco.

Enfoque
ESCREVA NO CADERNO

O texto a seguir é um documento do Ministério das Relaçõ es Exteriores do Brasil que apresenta, em linhas gerais, um
posicionamento oficial quanto ao comércio internacional brasileiro e ao Mercosul. Leio-o e responda.

1. O teor do texto é uma defesa da opçã o brasileira no cená rio comercial mundial? Qual é essa opçã o?

2. De acordo com o Itamaraty, por que é importante para o Mercosul ampliar globalmente suas parcerias comerciais?

Por que negociar acordos extrarregionais de comércio?

A OMC autoriza seus membros a integrar acordos de livre comé rcio, com base no princípio do “regionalismo aberto” – ou
seja, desde que o mecanismo para liberalizar exportaçõ es e importaçõ es entre as partes de um acordo nã o desvie
excessivamente o comé rcio com os nã o-membros do grupo.

Os países-membros do Mercosul se comprometeram a negociar em conjunto os acordos de comé rcio que envolvam
concessõ es tarifá rias. Tomada por meio da Decisã o nº 32/2000 do Conselho Mercado Comum do Mercosul, essa decisã o
decorre do objetivo maior de preservar a uniã o aduaneira entre os países do bloco, o que demanda uma política comercial
externa comum.

Tendo em vista os objetivos de aumentar o acesso a mercados estrangeiros e incrementar a competitividade interna, o Brasil
contribui ativamente para as negociaçõ es de acordos de comé rcio entre o Mercosul e parceiros extrarregionais. Entre as
modalidades desses acordos estã o os de “livre comé rcio” (reduçã o das tarifas de importaçã o a zero sobre a grande maioria
dos bens) e os de “preferê ncias tarifá rias” (outorga de preferê ncias nas tarifas de universo menos amplo de bens para os
membros do acordo), os ú ltimos podendo ser celebrados por países em desenvolvimento ao amparo da clá usula de
habilitaçã o da OMC.

No Itamaraty, a negociaçã o desses acordos é responsabilidade do Departamento de Negociaçõ es Internacionais e das


Divisõ es de Negociaçõ es Extrarregionais do Mercosul, unidades subordinadas à Subsecretaria de Assuntos Econô micos e
Financeiros.

A negociaçã o de acordos comerciais leva em conta a necessidade de preservar e promover políticas pú blicas dedicadas ao
desenvolvimento nas á reas econô mica, social, ambiental, industrial, da ciê ncia e tecnologia e da agricultura familiar, entre
outras. Para tanto, é fundamental o constante diá logo entre o governo, os setores produtivos e a sociedade civil.

Acordos comerciais podem contribuir para fortalecer a competitividade interna e externa dos setores produtivos nacionais e
dos demais países do Mercosul. No plano interno, atraem investimentos estrangeiros diretos, aumentando a oferta de
empregos e promovendo transferê ncia de tecnologia. No plano externo, contribuem para expandir nossas exportaçõ es e
para a integraçã o do Brasil à economia global – o que possibilita nã o apenas adquirir insumos a custos mais acessíveis, como
també m exportar a preços mais competitivos.

O engajamento do Mercosul nas negociaçõ es de acordos comerciais tem grande significado político, pois contribui para
consolidar o bloco como protagonista no cená rio internacional. Desde sua criaçã o, o Mercosul concluiu acordos comerciais
com importantes parceiros extrarregionais: Índia (2004); Israel (2007); Uniã o Aduaneira da Á frica Austral – SACU (2009);
Egito (2010) e Palestina (2011). Foram també m firmados Acordos-Quadro com diversos outros países em desenvolvimento,
o que é a primeira etapa para negociaçã o de um acordo comercial.

As negociaçõ es extrarregionais do Mercosul tê m contribuído para a diversificaçã o e a ampliaçã o de mercados para as


exportaçõ es do Brasil, alé m de estreitarem as relaçõ es econô micas e políticas com parceiros nã o tradicionais.

Acordo de Associação entre o Mercosul e a União Europeia

O Brasil confere prioridade à s negociaçõ es para um Acordo de Associaçã o entre o Mercosul e a Uniã o Europeia. As
negociaçõ es foram lançadas em 1995, quando os blocos firmaram um Acordo-Quadro de Cooperaçã o Inter-regional,
estabelecendo que as relaçõ es birregionais se desenvolveriam em trê s pilares: diá logo político, cooperaçã o e livre comé rcio.
Em 2010, atingiu-se consenso sobre os parâ metros para o relançamento dessas negociaçõ es, havendo um compromisso
mú tuo de que o acordo seja abrangente, equilibrado e ambicioso. Consultas pú blicas realizadas em 2012 revelaram o firme
apoio do setor privado brasileiro em favor da conclusã o das negociaçõ es com a Uniã o Europeia. Até o momento, as
negociaçõ es permitiram avanços importantes na definiçã o das regras do futuro acordo e devem passar em breve a uma nova
etapa, com a troca das respectivas ofertas de acesso a mercados.

MINISTÉ RIO DAS RELAÇÕ ES EXTERIORES. Por que negociar acordos extrarregionais de comércio? Disponível em: <http://www.itamaraty.gov.br/index.php?
option=com_content&view=article&id=692&catid=130&Itemid=593&lang=pt-BR>. Acesso em: 4 fev. 2016.
Pá gina 105

Além das relaçõ es comerciais de automó veis, minérios, alimentícios e têxteis, principais produtos
negociados entre os países, uma importante e polêmica negociaçã o bilateral dentro do bloco foi
realizada em 2010 entre Brasil e Argentina, na primeira gestã o da presidente argentina Cristina
Ferná ndez Kirchner: um acordo para a produçã o conjunta de energia nuclear para fins pacíficos.
Esse tema sempre levanta discussõ es sobre os possíveis usos bélicos, o que chocaria frontalmente
com os princípios do Mercosul.

Do ponto de vista comercial, a Argentina é o maior parceiro do Brasil dentro do bloco. Muito disso
se deve ao fato de os dois países serem os mais industrializados da América do Sul e, também,
concentrarem os maiores PIBs no bloco. Observe, no grá fico abaixo, a balança comercial de
produtos manufaturados entre o Brasil e os outros países-membros do Mercosul.

Tarumã

Fonte: CNI DEFENDE que países do Mercosul permitam flexibilidade para negociar acordos comerciais. Agência de notícias CNI, 16
jul. 2015. Disponível em: <http://www.portaldaindustria.com.br/cni/imprensa/2015/07/1,66612/cni-espera-quepaises-do-
mercosul-permitam-flexibilidade-paranegociar-acordos-comerciais.html>. Acesso em: 4 fev. 2016.

A Geografia na... arte!


ESCREVA NO CADERNO

A imagem abaixo é de uma obra de Leslie Shows, a instalaçã o Exibição das propriedades, na qual a artista
estadunidense mostra diversas bandeiras das quais parecem escorrer tintas de vá rias cores que se misturam com
brasõ es de famílias pela parede, sugerindo uma separaçã o de questõ es nacionalistas, ideoló gicas e histó ricas das
bandeiras dos países, marcas geográ ficas também com significados ideoló gicos. Essa obra foi instalada em Porto
Alegre, na 8ª. Bienal do Mercosul, em 2011, intitulada Ensaios de geopoética. O tema dessa bienal foi a redefiniçã o
crítica da territorialidade pela arte. O evento promove a integraçã o entre os países por meio da arte.
Cristiano Sant'Anna/Indicefoto.com

Exibição das propriedades, instalaçã o de Leslie Shows, em Porto Alegre (RS), 2011.

• Em sua opiniã o, como essa obra questiona a relaçã o política entre os países e, consequentemente, suas
organizaçõ es em blocos econô micos? O que você acha da proposta da Bienal do Mercosul de integrar os países por
meio da arte? Converse com os colegas sobre essas questõ es e registre suas conclusõ es no caderno.
Pá gina 106

Apesar dos esforços de integraçã o desde a sua criaçã o e da adesã o de novos países, o futuro do
Mercosul é colocado em xeque por diversos setores econô micos e financeiros dos países-membros
em razã o da baixa quantidade de trocas comerciais, que ocorrem, sobretudo, em momentos de
turbulência política em um dos países. Nesses momentos, os Estados acabam por tomar medidas
unilaterais com vistas a proteger suas economias nacionais, como suas indú strias, por exemplo.
Algumas dessas açõ es tornam-se medidas protecionistas, o que causa desconfiança entre os demais
membros e a comunidade internacional, além de desequilíbrio nas trocas comerciais entre os
Estados-membros.

Alguns analistas indicam que o destacado cará ter comercialista do bloco é responsá vel por essa
dinâ mica. Essas aná lises sã o fortalecidas ao se verificar a criaçã o de outro bloco de integraçã o
regional que, para muitos, tende a substituir o Mercosul no futuro, por ser mais amplo
geograficamente e em seus princípios: a Uniã o das Naçõ es Sul-Americanas, criada em 2008.

3.1 A integração das infraestruturas territoriais


A integraçã o comercial do Mercosul está propiciando a intensificaçã o de transportes no Cone Sul do
continente. O chamado Corredor Comercial Sul pretende ampliar a utilizaçã o do transporte
intermodal (ou multimodal – quando se utilizam mais de duas vias). No entanto, o transporte
rodoviá rio ainda predomina intensamente na circulaçã o das mercadorias do bloco. No que se refere
à s ferrovias, isso se deve a fatores como a diferença de bitolas, que inviabiliza a efetivaçã o da rede
ferroviá ria. As hidrovias, em fase de ampliaçã o de seus usos, encontram como obstá culos: os altos
custos portuá rios no Brasil; a Usina Hidrelétrica de Itaipu, que dificulta a ligaçã o hidroviá ria entre
Brasil e Argentina; a falta de investimentos de longo prazo e planejamento; a predominâ ncia do
sistema de transporte rodoviá rio; e os movimentos contrá rios à construçã o de hidrovias, devido
aos impactos ambientais causados pela construçã o dos portos e pela intensificaçã o dos fluxos de
embarcaçõ es, como a poluiçã o e a erosã o em trechos do rio e o desaparecimento de vá rias espécies
de animais.

Na regiã o que se situa na Bacia do rio da Prata, duas hidrovias possibilitam o transporte de
produtos e enfrentam movimentos contrá rios dos ambientalistas: a Paraná -Paraguai e a Tietê-
Paraná . A hidrovia Paraná -Paraguai começa em Cá ceres (MT) no rio Paraguai, que conflui com o rio
Paraná na fronteira do Paraguai com a Argentina, e termina no estuá rio do rio da Prata,
percorrendo um trecho de 3 442 km, servindo de via de escoamento de mercadorias do interior do
continente para os portos. No territó rio brasileiro, a hidrovia percorre 1 278 km, por onde sã o
transportados, principalmente, minérios de ferro, minério de manganês e soja. A hidrovia Tietê-
Paraná interliga Conchas (SP) a Sã o Simã o (GO) e a Itaipu, divisa com o Paraguai, totalizando um
trecho de 2 400 km. Sã o transportados produtos como soja, cana-de-açú car, combustíveis,
fertilizantes, areia e cascalho no interior do Brasil.

Bitola: Largura entre os trilhos de uma via férrea.


Mario Friedlander/Pulsar

Embarcaçõ es no rio Paraguai, Corumbá (MS), 2014.


Pá gina 107

ROTEIRO DE ESTUDO
ESCREVA NO CADERNO

Revisando

1. A formaçã o de blocos regionais, como Uniã o Europeia e Mercosul, é uma característica da globalizaçã o
que se expandiu notavelmente. Como você explica a existência de tantos blocos regionais em pleno
processo de globalizaçã o? Justifique sua resposta com exemplos.

2. A Uniã o Europeia é o bloco mais avançado do ponto de vista da integraçã o econô mica e política.
Contudo, passa por grandes dificuldades. Aponte três dificuldades e os perigos que representam para a
continuidade do bloco.

3. Reino Unido, Suécia e Dinamarca ficaram fora da zona do euro, assim como a Grécia, em um primeiro
momento. Qual é a diferença entre zona do euro e Uniã o Europeia?

4. Por que alguns países nã o entraram para a zona do euro? Quais sã o as suas justificativas?

5. Em 1991, em Assunçã o, capital paraguaia, os entã o presidentes do Brasil, da Argentina, do Uruguai e


do Paraguai assinaram um acordo que visava à formaçã o de um Mercado Comum do Sul, o Mercosul.
Explique por que o Mercosul, mesmo tendo mercado comum no nome, nã o é um mercado comum na
prá tica.

6. Aponte outras experiências de integraçã o regional que você conhece.

7. A crise do euro, que afeta a maior parte da Europa, tem na dívida fiscal de alguns países a causa
principal. Explique resumidamente o que é “dívida fiscal”.

Olhar cartográfico

O mapa abaixo apresenta as principais organizaçõ es de integraçã o regional.

1. Indique uma organizaçã o regional que congregue países de mais de um continente.

2. Quais sã o os três tipos de integraçã o regional apresentados no mapa? Dê exemplos.


DACOSTA MAPAS

Fonte: DURAND, Marie-Françoise; COPINSCHI, Philippe; MARTIN, Benoît; PLACIDI, Delphine. Atlas da mundialização. Sã o Paulo:
Saraiva, 2009. p. 47. Com atualizaçõ es.
Pá gina 108

ROTEIRO DE ESTUDO
ESCREVA NO CADERNO

Atividade em grupo

Em grupos, escolham dois blocos econô micos apresentados no mapa da pá gina 94 e pesquisem sobre as
relaçõ es existentes entre eles nos â mbitos comercial e político. Considere os seguintes itens:

1. as trocas comerciais entre eles;

2. a afinidade política no â mbito das relaçõ es internacionais entre os países-membros de cada bloco;

3. a existência de iniciativa de reduçã o tarifá ria entre os blocos;

4. a posiçã o comum ou divergente nos fó runs da OMC entre os países-membros de cada bloco.

De olho na mídia

O texto a seguir apresenta o relato de um médico sobre a crise de refugiados na Europa em 2015 e as
medidas adotadas pelo governo alemã o. Leia o texto e responda.

1. O médico em seu depoimento aponta como correta a política para refugiados adotada pela chanceler
alemã . Considerando aspectos sociais, políticos e econô micos, discuta com seus colegas sobre o
posicionamento de Angela Merkel. Vocês concordam com as medidas adotadas? Justifique a resposta.

2. Como as redes sociais podem contribuir para a difusã o mundial da realidade dos refugiados que
chegam à Europa? Extraia do texto uma passagem que mencione tal fato.

“Nunca vi tanta miséria e desespero”

Raphaele Lindemann havia se disposto a escrever um relato de seu trabalho no front da crise migrató ria: em primeira mã o,
mas neutro. No entanto, logo o mé dico alemã o percebeu que isso era impossível.

Nas ú ltimas quatro semanas, ele vem prestando os primeiros cuidados a requerentes de asilo recé m-chegados, num abrigo
de emergê ncia. E o que tem presenciado o convence de que a Alemanha está certa em abrir suas fronteiras aos que buscam
abrigo da guerra e da misé ria.

[...]

Lindemann é uma das poucas pessoas que presenciam o estado em que os migrantes chegam à Alemanha – antes de serem
cadastrados, antes de receberem roupas doadas para se vestir, antes mesmo de poderem tomar uma ducha.

“Posso assegurar a você s que é totalmente impossível, por exemplo, tratar de um pé com frieiras, que marchou mais de 500
quilô metros pelo inverno adentro com sapatos estragados, com meias molhadas, e ver pela perspectiva dos ‘ingê nuos ó culos
cor-de-rosa de gente boazinha’.”

“Gente boazinha” (Gutmensch) é um termo empregado pelos detratores dos que defendem e se ocupam dos refugiados – e foi
consagrado como “despalavra do ano” em 2015.

O relato do jovem profissional de medicina, formado na Universidade de Mainz, prossegue: “Essas pessoas chegam aqui num
estado absolutamente desolado e digno de piedade. Certamente vai espantar algumas pessoas que 90% deles nã o sejam
homens jovens e saudá veis. [...] A cada expediente, eu vejo entre 300 e 500 refugiados. Pelo menos a metade sã o crianças! Há
famílias, há idosos e, sim, també m há jovens. Por que nã o? O que todos têm em comum é estarem totalmente esgotados e
exaustos. Até entã o eu nunca tinha visto tanta misé ria e desespero de uma vez só .”

A certa altura, em sua extensa postagem, ele descreve o tratamento de uma mulher chegada ao abrigo com ambas as pernas
inteiramente queimadas.

“Nã o tenho ideia de como ela sequer conseguiu chegar até nó s. Precisamos de uma hora só para desprender, das feridas
cheias de pus, as bandagens coladas nelas, sujas e malcheirosas. Mas nã o houve reclamaçã o e nã o houve nenhuma exigência.
Essa mulher irradiava gratidã o, por finalmente estar em segurança e por ter quem cuidasse dela.”

Lindemann publica suas experiê ncias num momento em que a opiniã o pú blica sobre a política para refugiados da chefe de
governo alemã está mudando.

Quando, numa coletiva de imprensa no fim de agosto, Merkel proferiu a já famosa frase “vamos conseguir”, a maioria da
populaçã o ficou orgulhosa de ter uma líder tã o comprometida em fazer o que é moralmente correto. Contudo, o afluxo de
refugiados nã o arrefeceu, e ainda nã o há um consenso no nível da Uniã o Europeia sobre como lidar com a crise.

Para muitos alemã es, a guinada ocorreu no Ano Novo: os ataques sexuais em larga escala contra mulheres na cidade de
Colô nia – imputados, em primeira linha, a jovens migrantes do norte da Á frica – despertaram temor em relaçã o à imigraçã o
descontrolada. Desde entã o, a popularidade de Merkel está despencando: segundo uma pesquisa de opiniã o recente, 40%
dos alemã es prefeririam que ela renunciasse.

Mas Lindemann nada contra a corrente. “Com o ‘vamos conseguir’ dela, pela primeira vez eu senti algo assim como respeito
e reconhecimento pela chanceler federal. Porque, sem pestanejar, ela arriscou a pró pria carreira política para nã o deixar
aquelas pessoas morrerem diante das nossas fronteiras; e porque ela assumiu o enorme desafio, em vez de jogar seu usual
‘jogo de teflon’ da espera passiva.”

O mé dico postou o texto em [uma rede social] [...] na quinta-feira. Até a manhã desta segunda-feira (01/02), ele já fora
partilhado mais de 275 mil vezes, acompanhado por comentá rios basicamente positivos, enfatizando a importâ ncia de
preservar a crença de que a Alemanha continua no caminho certo na questã o dos refugiados.

O relato de Lindemann se encerra com um apelo veemente à solidariedade – e um eco do slogan da chanceler democrata-
cristã : “Tem gente sofrendo e morrendo. Agora. E nó s podemos evitar isso. Vamos conseguir.”

CORBETT, Deanne. “Nunca vi tanta miséria e desespero”. Carta Capital, 3 fev. 2016. ©Deutsche Welle. Disponível em: <http://www.cartacapital.com.br/internacional/nunca-vi-
tanta-miseria-e-desespero>. Acesso em: 4 fev. 2016.
Pá gina 109

EXERCÍCIOS
ESCREVA NO CADERNO

ENEM

1. Uma mesma empresa pode ter sua sede administrativa onde os impostos sã o menores, as unidades de
produçã o onde os salá rios são os mais baixos, os capitais onde os juros sã o os mais altos e seus executivos
vivendo onde a qualidade de vida é mais elevada.

SEVCENKO, N. A corrida para o século XXI: no loop da montanha russa. Sã o Paulo: Companhia das Letras, 2001 (adaptado).

No texto estã o apresentadas estratégias empresariais no contexto da globalizaçã o. Uma consequência social
derivada dessas estratégias tem sido

a) o crescimento da carga tributá ria.

b) o aumento da mobilidade ocupacional.

c) a redução da competitividade entre as empresas.

d) o direcionamento das vendas para os mercados regionais.

e) a ampliaçã o do poder de planejamento dos Estados nacionais.

H17 Analisar fatores que explicam o impacto das novas tecnologias no processo de territorializaçã o da
produçã o.

2. Na democracia estadunidense, os cidadã os são incluídos na sociedade pelo exercício pleno dos direitos
políticos e também pela ideia geral de direito de propriedade. Compete ao governo garantir que esse direito
nã o seja violado. Como consequência, mesmo aqueles que possuem uma pequena propriedade sentem-se
cidadã os de pleno direito. Na tradiçã o política dos EUA, uma forma de incluir socialmente os cidadã os é

a) submeter o indivíduo à proteção do governo.

b) hierarquizar os indivíduos segundo suas posses.

c) estimular a formaçã o de propriedades comunais.

d) vincular democracia e possibilidades econô micas individuais.

e) defender a obrigaçã o de que todos os indivíduos tenham propriedades.

H7Identificar os significados histó rico-geográ ficos das relaçõ es de poder entre as naçõ es.

3. Em 2006, foi realizada uma conferência das Naçõ es Unidas em que se discutiu o problema do lixo eletrô nico,
também denominado e-waste. Nessa ocasião, destacou-se a necessidade de os países em desenvolvimento
serem protegidos das doaçõ es nem sempre bem-intencionadas dos países mais ricos. Uma vez descartados ou
doados, equipamentos eletrô nicos chegam a países em desenvolvimento com o ró tulo de “mercadorias
recondicionadas”, mas acabam deteriorando-se em lixõ es, liberando chumbo, cá dmio, mercú rio e outros
materiais tó xicos.

Internet: <g1.globo.com> (com adaptaçõ es).


A discussã o dos problemas associados ao e-waste leva à conclusã o de que

a) os países que se encontram em processo de industrializaçã o necessitam de matérias-primas recicladas


oriundas dos países mais ricos.

b) o objetivo dos países ricos, ao enviarem mercadorias recondicionadas para os países em desenvolvimento, é
o de conquistar mercados consumidores para seus produtos.

c) o avanço rá pido do desenvolvimento tecnoló gico, que torna os produtos obsoletos em pouco tempo, é um
fator que deve ser considerado em políticas ambientais.

d) o excesso de mercadorias recondicionadas enviadas para os países em desenvolvimento é armazenado em


lixõ es apropriados.

e) as mercadorias recondicionadas oriundas de países ricos melhoram muito o padrã o de vida da populaçã o
dos países em desenvolvimento.

H28 Relacionar o uso das tecnologias com os impactos socioambientais em diferentes contextos histó rico-
geográ ficos.

O Exame Nacional do Ensino Mé dio (Enem), realizado anualmente, é pautado em um conjunto de competê ncias e
habilidades. A prova de Ciê ncias Humanas e suas tecnologias, na qual se insere a Geografia, é baseada em um programa de
31 tó picos, circunscritos em cinco eixos do qual se extraem as competê ncias e habilidades. Cada exercício do Enem contido
nesta obra vem acompanhado da respectiva habilidade (H). Muitas vezes, um exercício circunscreve-se em mais de uma;
nesse caso, indicamos a principal. O quadro completo das competê ncias e habilidades encontra-se nas pá ginas 287 e 288.
Pá gina 110

4. Do ponto de vista geopolítico, a Guerra Fria dividiu a Europa em dois blocos. Essa divisã o propiciou a
formaçã o de alianças antagô nicas de cará ter militar, como a Otan, que aglutinava os países do bloco ocidental,
e o Pacto de Varsó via, que concentrava os do bloco oriental. É importante destacar que, na formaçã o da Otan,
estã o presentes, além dos países do oeste europeu, os EUA e o Canadá . Essa divisã o histó rica atingiu
igualmente os â mbitos político e econô mico que se refletiam pela opçã o entre os modelos capitalista e
socialista. Essa divisã o europeia ficou conhecida como

a) Cortina de Ferro.

b) Muro de Berlim.

c) Uniã o Europeia.

d) Convençã o de Ramsar.

e) Conferência de Estocolmo.

H7Identificar os significados histó rico-geográ ficos das relaçõ es de poder entre as naçõ es.

5. Um certo carro esporte é desenhado na Califó rnia, financiado por Tó quio, o protó tipo criado em Worthing
(Inglaterra) e a montagem é feita nos EUA e México, com componentes eletrô nicos inventados em Nova Jérsei
(EUA), fabricados no Japão. [...]. Já a indú stria de confecçã o norte-americana, quando inscreve em seus
produtos “made in USA”, esquece de mencionar que eles foram produzidos no México, Caribe ou Filipinas.

Renato Ortiz, Mundializaçã o e Cultura

O texto ilustra como em certos países produz-se tanto um carro esporte caro e sofisticado, quanto roupas que
nem sequer levam uma etiqueta identificando o país produtor. De fato, tais roupas costumam ser feitas em
fá bricas – chamadas “maquiladoras” – situadas em zonas francas, onde os trabalhadores nem sempre têm
direitos trabalhistas garantidos.

A produçã o nessas condiçõ es indicaria um processo de globalizaçã o que

a) fortalece os Estados Nacionais e diminui as disparidades econô micas entre eles pela aproximaçã o entre um
centro rico e uma periferia pobre.

b) garante a soberania dos Estados Nacionais por meio da identificaçã o da origem de produçã o dos bens e
mercadorias.

c) fortalece igualmente os Estados Nacionais por meio da circulaçã o de bens e capitais e do intercâ mbio de
tecnologia.

d) compensa as disparidades econô micas pela socialização de novas tecnologias e pela circulaçã o globalizada
da mã o de obra.

e) reafirma as diferenças entre um centro rico e uma periferia pobre, tanto dentro como fora das fronteiras dos
Estados Nacionais.

H18 Analisar diferentes processos de produçã o ou circulaçã o de riquezas e suas implicaçõ es socioespaciais.

Texto para a pró xima questã o:

Você está fazendo uma pesquisa sobre a globalizaçã o e lê a seguinte passagem, em um livro:
A sociedade global

As pessoas se alimentam, se vestem, moram, se comunicam, se divertem, por meio de bens e serviços
mundiais, utilizando mercadorias produzidas pelo capitalismo mundial, globalizado.

Suponhamos que você vá com seus amigos comer Big Mac e tomar Coca-Cola no McDonald’s. Em seguida,
assiste a um filme de Steven Spielberg e volta para casa num ô nibus de marca Mercedes.

Ao chegar em casa, liga seu aparelho de TV Philips para ver o videoclipe de Michael Jackson e, em seguida, deve
ouvir um CD do grupo Simply Red, gravado pela BMG Ariola Discos em seu equipamento AIWA.

Veja quantas empresas transnacionais estiveram presentes nesse seu curto programa de algumas horas.

Adap. Praxedes et alli, 1997. O Mercosul. Sã o Paulo: Á tica, 1997.

6. A leitura do texto ajuda você a compreender que:

I. a globalizaçã o é um processo ideal para garantir o acesso a bens e serviços para toda a populaçã o.

II. a globalizaçã o é um fenô meno econô mico e, ao mesmo tempo, cultural.

III. a globalizaçã o favorece a manutençã o da diversidade de costumes.

IV. filmes, programas de TV e mú sica sã o mercadorias como quaisquer outras.

V. as sedes das empresas transnacionais mencionadas são os EUA, Europa Ocidental e Japã o. Destas
afirmativas estã o corretas:
Pá gina 111

a) I, II e IV, apenas.

b) II, IV e V, apenas.

c) II, III e IV, apenas.

d) I, III e IV, apenas.

e) III, IV e V, apenas.

H17 Analisar fatores que explicam o impacto das novas tecnologias no processo de territorializaçã o da
produçã o.

7. Os 45 anos que vã o do lançamento das bombas atô micas até o fim da Uniã o Soviética nã o foram um período
homogêneo ú nico na histó ria do mundo. [...] dividem-se em duas metades, tendo como divisor de á guas o início
da década de 70. Apesar disso, a histó ria deste período foi reunida sob um padrã o ú nico pela situaçã o
internacional peculiar que o dominou até a queda da URSS.

(HOBSBAWM, Eric J. Era dos extremos. Sã o Paulo: Cia das Letras, 1996).

O período citado no texto e conhecido por “Guerra Fria” pode ser definido como aquele momento histó rico em
que houve

a) corrida armamentista entre as potências imperialistas europeias ocasionando a Primeira Guerra Mundial.

b) domínio dos países socialistas do sul do globo pelos países capitalistas do Norte.

c) choque ideoló gico entre a Alemanha Nazista/Uniã o Soviética Stalinista, durante os anos 30.

d) disputa pela supremacia da economia mundial entre o Ocidente e as potências orientais, como a China e
Japã o.

e) constante confronto das duas superpotências que emergiam da Segunda Guerra Mundial.

H7Identificar os significados histó rico-geográ ficos das relaçõ es de poder entre as naçõ es.

8. Projetado na Itá lia e montado em Indiana, México e França, usando os mais avançados componentes
eletrô nicos, que foram inventados em Nova Jérsei e fabricados na Coreia. A campanha publicitá ria é
desenvolvida na Inglaterra, filmada no Canadá , a ediçã o e as có pias, feitas em Nova York para serem veiculadas
no mundo todo. Teias globais disfarçam-se com o uniforme nacional que lhes for mais conveniente.

REICH, R. O trabalho das nações: preparando-nos para o capitalismo no século XXI. Sã o Paulo: Educator, 1994 (adaptado).

A viabilidade do processo de produçã o ilustrado pelo texto pressupõ e o uso de

a) linhas de montagem e formaçã o de estoques.

b) empresas burocrá ticas e mã o de obra barata.

c) controle estatal e infraestrutura consolidada.

d) organizaçã o em rede e tecnologia de informaçã o.


e) gestã o centralizada e protecionismo econô mico.

H17 Analisar fatores que explicam o impacto das novas tecnologias no processo de territorializaçã o da
produçã o.

9. Até o fim de 2007, quase 2 milhõ es de pessoas perderam suas casas e outros 4 milhõ es corriam risco de ser
despejadas. Os valores das casas despencaram em quase todos os EUA e muitas famílias acabaram devendo
mais por suas casas do que o pró prio valor do imó vel. Isso desencadeou uma espiral de execuçõ es hipotecá rias
que diminuiu ainda mais os valores das casas. Em Cleveland, foi como se um “Katrina financeiro” atingisse a
cidade. Casas abandonadas, com tá buas em janelas e portas, dominaram a paisagem nos bairros pobres,
principalmente negros. Na Califó rnia, também se enfileiraram casas abandonadas.

HARVEY, D. O enigma do capital. Sã o Paulo: Boitempo, 2011.

Inicialmente restrita, a crise descrita no texto atingiu proporçõ es globais, devido ao(à )

a) superprodução de bens de consumo.

b) colapso industrial de países asiá ticos.

c) interdependência do sistema econô mico.

d) isolamento político dos países desenvolvidos.

e) austeridade fiscal dos países em desenvolvimento.

H18 Analisar diferentes processos de produçã o ou circulaçã o de riquezas e suas implicaçõ es socioespaciais.
Pá gina 112

10. No final do século XX e em razã o dos avanços da ciência, produziu-se um sistema presidido pelas técnicas
da informaçã o, que passaram a exercer um papel de elo entre as demais, unindo-as e assegurando ao novo
sistema uma presença planetá ria. Um mercado que utiliza esse sistema de técnicas avançadas resulta nessa
globalizaçã o perversa.

SANTOS, M. Por uma outra globalização. Rio de Janeiro: Record, 2008 (adaptado).

Uma consequência para o setor produtivo e outra para o mundo do trabalho advindas das transformaçõ es
citadas no texto estã o presentes, respectivamente, em:

a) Eliminação das vantagens locacionais e ampliaçã o da legislaçã o laboral.

b) Limitaçã o dos fluxos logísticos e fortalecimento de associaçõ es sindicais.

c) Diminuição dos investimentos industriais e desvalorização dos postos qualificados.

d) Concentraçã o das á reas manufatureiras e reduçã o da jornada semanal.

e) Automatizaçã o dos processos fabris e aumento dos níveis de desemprego.

H16 Identificar registros sobre o papel das técnicas e tecnologias na organizaçã o do trabalho e/ou da vida
social.

11. O jovem espanhol Daniel se sente perdido. Seu diploma de desenhista industrial e seu alto conhecimento
de inglês devem ajudá -lo a tomar um rumo. Mas a taxa de desemprego, que supera 52% entre os que têm
menos de 25 anos, o desnorteia. Ele está convencido de que seu futuro profissional nã o está na Espanha, como
o de, pelo menos, 120 mil conterrâ neos que emigraram nos ú ltimos dois anos. O irmã o dele, que é engenheiro-
agrô nomo, conseguiu emprego no Chile. Atualmente, Daniel participa de uma “oficina de procura de emprego”
em países como Brasil, Alemanha e China. A oficina é oferecida por uma universidade espanhola.

GUILAYN, P. Na Espanha, universidade ensina a emigrar. O Globo, 17 fev. 2013 (adaptado).

A situaçã o ilustra uma crise econô mica que implica

a) valorizaçã o do trabalho fabril.

b) expansã o dos recursos tecnoló gicos.

c) exportaçã o de mã o de obra qualificada.

d) diversificaçã o dos mercados produtivos.

e) intensificaçã o dos intercâ mbios estudantis

H16 Identificar registros sobre o papel das técnicas e tecnologias na organizaçã o do trabalho e/ou da vida
social.

12. Em 1961, o presidente De Gaulle apelou com êxito aos recrutas franceses contra o golpe militar dos seus
comandados, porque os soldados podiam ouvi-lo em rá dios portá teis. Na década de 1970, os discursos do
aiatolá Khomeini, líder exilado da futura Revoluçã o Iraniana eram gravadas em fitas magnéticas e
prontamente levados para o Irã , copiados e difundidos.

HOBSBAWM, E. Era dos extremos: o breve século XX (1914-1991). Sã o Paulo: Cia. das Letras, 1995.
Os exemplos mencionados no texto evidenciam um uso dos meios de comunicaçã o identificado na

a) manipulação da vontade popular.

b) promoção da mobilizaçã o política.

c) insubordinaçã o das tropas militares.

d) implantaçã o de governos autoritá rios.

e) valorizaçã o dos socialmente desfavorecidos

H16 Identificar registros sobre o papel das técnicas e tecnologias na organizaçã o do trabalho e/ou da vida
social.

VESTIBULARES

13. (Fuvest-SP) Logo apó s a entrada de milhares de imigrantes norte-africanos na Itá lia, em abril deste ano, o
presidente da França, Nicolas Sarkozy, e o primeiro-ministro da Itá lia, Silvio Berlusconi, fizeram as seguintes
declaraçõ es a respeito de um consenso entre países da Uniã o Europeia (UE) e associados.

Queremos mantê-lo vivo, mas para isso é preciso reformá -lo.

Nicolas Sarkozy.
Pá gina 113

Nã o queremos colocá -lo em causa, mas em situaçõ es excepcionais acreditamos que é preciso fazer alteraçõ es,
sobre as quais decidimos trabalhar em conjunto.

Silvio Berlusconi.<http://pt.euronews.net>. Acesso em: julho/2011. Adaptado.

Sarkozy e Berlusconi encaminharam pedido à UE, solicitando a revisã o do

a) Tratado de Maastricht, o qual concede anistia aos imigrantes ilegais radicados em países europeus há mais
de 5 anos.

b) Acordo de Schengen, segundo o qual Itá lia e França devem formular políticas sociais de natureza bilateral.

c) Tratado de Maastricht, que implementou a Uniã o Econô mica Monetá ria e a moeda ú nica em todos os países
da UE.

d) Tratado de Roma, que criou a Comunidade Econô mica Europeia (CEE) e suprimiu os controles alfandegá rios
nas fronteiras internas.

e) Acordo de Schengen, pelo qual se assegura a livre circulaçã o de pessoas pelos países signatá rios desse
acordo.

14. (PUCCamp-SP) A ideia de dona do mundo sempre esteve latente na política externa dos Estados Unidos
da América, desde o processo de consolidaçã o de sua independência. Ao longo dos séculos XIX e XX, os
governos dos Estados Unidos exerceram intervençõ es econô micas e político-militares em vá rios países da
América Latina. Os fundamentos teó ricos utilizados como justificativas para essas intervençõ es estavam
delineados, entre outros,

a) na Emenda Platt, no Corolá rio Polk e no Plano Ayala.

b) na Doutrina Truman, na Emenda Platt e na Doutrina Sandinista.

c) no Destino Manifesto, no Corolá rio Roosevelt e no Bolivarismo.

d) na Doutrina Monroe e no Corolá rio Roosevelt.

e) no Plano Ayala, na Doutrina Monroe e no Bolivarismo.

15. (PUC-SP) “A revoluçã o militar é movida pelos EUA fundindo: planejadores do Pentá gono, o complexo
industrial-militar americano e a tecnologia do Vale do Silício. Os EUA sã o responsá veis por 40 a 45% dos
gastos militares de 189 países do mundo”.

KENNEDY, Paul. Poderio bélico dos EUA nã o garante segurança. Folha de S.Paulo, 12 de setembro de 2002.

Considerando-se essa informaçã o é INCORRETO afirmar que

a) as guerras sã o inerentes à política internacional dos estados modernos; a força militar é argumento decisivo
em ú ltima instâ ncia.

b) o uso da força militar organizada como meio de defesa do territó rio e da sociedade é um dado da soberania
nacional no mundo moderno.

c) os EUA usam seu poderio militar como meio de persuasã o na política internacional, alegando a defesa de sua
nação e dos valores da liberdade.
d) a força militar, embora represente um meio não político de se fazer política internacional, sempre foi
utilizada pelas potências, apó s decisã o política na ONU.

e) as atuais açõ es dos EUA em relaçã o ao Iraque sã o uma demonstraçã o nítida do uso da força militar como
meio presente e aceito de se fazer política internacional.

16. (Fuvest-SP)

“... a morte da URSS foi a maior catá strofe geopolítica do século. No que se refere aos russos, ela se tornou uma
verdadeira tragédia”.

Vladimir Putin, presidente da Rú ssia, abril de 2005

“Para mim, o maior evento do século XX foi o colapso da URSS, que completou o processo de emancipação das
naçõ es”

Adam Rotfeld, chanceler da Polô nia, abril de 2005

As duas declaraçõ es

a) coincidem, a partir de pontos de vistas opostos, sobre a importâ ncia do desaparecimento da Uniã o Soviética.

b) revelam que a Polô nia, ao contrá rio da Rú ssia e dos demais ex-países do Pacto de Varsó via, beneficiou-se
com o fim daUniã o Soviética.

c) mostram ainda ser cedo para afirmar que o desaparecimento da Uniã o Soviética nã o foi historicamente
importante.

d) consideram que o fim da Uniã o Soviética, embora tenha sido uma tragédia, beneficiou russos e poloneses.

e) indicam já ser possível afirmar, em cará ter definitivo, que o fim da Uniã o Soviética foi o acontecimento mais
importante da histó ria.
Pá gina 114

17. (Fuvest-SP)

Jean Galvã o/Folhapress

Folha de S.Paulo, 19 dez. 2014.

Tendo em vista o que a charge pretende expressar e a data de sua publicação, dentre as legendas propostas
abaixo, a mais adequada para essa charge é:

a) Suspensão do embargo econô mico a Cuba por parte dos EUA.

b) Devoluçã o aos cubanos da á rea ocupada pelos EUA em Guantá namo.

c) Fim do embargo das exportaçõ es petrolíferas cubanas.

d) Retomada das relaçõ es diplomá ticas entre os EUA e Cuba.

e) Transferência de todos os presos políticos de Guantá namo, para prisõ es norte-americanas.

18. (Fuvest-SP) O local e o global determinam-se reciprocamente, umas vezes de modo congruente e
consequente, outras de modo desigual e desencontrado. Mesclam-se e tencionam-se singularidades,
particularidades e universalidades. Conforme Anthony Giddens, “A globalizaçã o pode assim ser definida como
a intensificaçã o das relaçõ es sociais em escala mundial, que ligam localidades distantes de tal maneira que
acontecimentos locais sã o modelados por eventos ocorrendo a muitas milhas de distâ ncia e vice-versa. Este é
um processo dialético porque tais acontecimentos locais podem se deslocar numa direçã o inversa à s relaçõ es
muito distanciadas que os modelam. A transformaçã o local é, assim, uma parte da globalizaçã o”.

Octá vio Ianni, Estudos Avançados. USP. Sã o Paulo, 1994. Adaptado.

Neste texto, escrito no final do século XX, o autor refere-se a um processo que persiste no século atual. A partir
desse texto, pode-se inferir que esse processo leva à

a) padronizaçã o da vida cotidiana.

b) melhor distribuição de renda no planeta.

c) intensificação do convívio e das relaçõ es afetivas presenciais.

d) maior troca de saberes entre geraçõ es.

e) retraçã o do ambientalismo como reaçã o à sociedade de consumo.


Leia o excerto para responder à s questõ es de nú meros 19 e 20.

O comércio internacional tem sido marcado por uma proliferaçã o sem precedentes de acordos preferenciais
de comércio regionais, sub-regionais, inter-regionais e, em especial, bilaterais (denominados Acordos
Preferenciais de Comércio – APC). Atualmente, sã o poucos os países que ainda nã o fazem parte desses acordos.
Com o impasse nas negociaçõ es da Rodada Doha da OMC, a alternativa das principais economias do mundo,
como Estados Unidos, Uniã o Europeia e China, foi buscar a celebraçã o de APC como forma de consolidar e ter
acesso a novos mercados. O receio de boa parte dos países desenvolvidos, de economias em transiçã o e em
desenvolvimento de perderem espaço em suas exportaçõ es levou-os a aderir maciçamente aos APC.

Umberto Celli Junior e Belisa E. Eleoterio. O Brasil, o Mercosul e os acordos preferenciais de comércio. In: Enrique Iglesias et al. (Orgs.). Os desafios da América Latina no século
XXI, 2015.

19. (Vunesp-SP) É correto afirmar que a Rodada Doha, iniciada pela Organizaçã o Mundial do Comércio em
2001, constitui

a) um encontro multipolar que procura orientar o modo de produçã o e as questõ es relativas à organização,
distribuiçã o e consumo nos países centrais e periféricos.

b) uma reuniã o eletiva que busca regularizar os fluxos comerciais entre blocos econô micos e o seu período de
duraçã o.

c) um conjunto normativo que procura regularizar a exportaçã o de produtos desenvolvidos pelas economias
periféricas sem o pagamento de royalties.

d) uma cartilha de diretrizes que busca padronizar os custos de produção e os preços finais de produtos
agrícolas bá sicos.

e) um fó rum internacional que objetiva solucionar impasses em questõ es tarifá rias, sobre patentes e açõ es
protecionistas entre países desenvolvidos e em desenvolvimento

20. (Vunesp-SP) Considerando o contexto dinâ mico apresentado pelo excerto, compreende-se a proliferaçã o
dos acordos preferenciais de comércio como resultado
Pá gina 115

a) dos pactos internacionais de mú tuo desenvolvimento econô mico, o que leva a investimentos na qualificaçã o
da mã o de obra em países periféricos.

b) do endividamento interno dos países subdesenvolvidos, o que provoca forte pressã o internacional pela
comercialização de seus produtos primá rios.

c) da crise de superproduçã o dos antigos centros industriais, o que demanda rá pidos acordos para evitar
fechamentos de empresas e demissõ es em massa.

d) do enfraquecimento dos antigos blocos econô micos, o que provoca divergências políticas e econô micas em
setores produtivos estratégicos de cada país.

e) da globalizaçã o da economia, o que alimenta uma crescente integraçã o e uma relativa uniformização das
condiçõ es de existência das sociedades.

21. (Vunesp-SP) O Brics – Brasil, Rú ssia, Índia, China e Á frica do Sul – vem negociando cuidadosamente o
estabelecimento de mecanismos independentes de financiamento e estabilizaçã o, como o Arranjo Contingente
de Reservas (Contingent Reserve Arrangement – CRA) e o Novo Banco de Desenvolvimento (New
Development Bank – NDB). O primeiro será um fundo de estabilizaçã o entre os cinco países; o segundo, um
banco para financiamento de projetos de investimento no BRICS e outros países em desenvolvimento.

www.cartamaior.com.br. Adaptado.

O Arranjo Contingente de Reservas e o Novo Banco de Desenvolvimento procuram suprir a escassez de


recursos nas economias emergentes. Tais iniciativas constituem uma alternativa

a) às instituiçõ es de crédito privadas, encerrando a sujeição econô mica dos países emergentes e evitando a
assinatura de termos regulató rios coercitivos sobre as prá ticas de produçã o.

b) aos bancos centrais dos países do BRICS, reduzindo os problemas econô micos de curto prazo e
maximizando o poder de negociaçã o do grupo.

c) às instituiçõ es criadas na Conferência de Bretton Woods, definindo novos mecanismos de autodefesa e


estimulando o crescimento econô mico.

d) ao norte-americano Plano Marshall, elegendo com autonomia o destino da ajuda econô mica e os
investimentos pú blicos em á reas estratégicas.

e) à hegemonia do Banco Mundial, deslocando o centro do sistema capitalista e os fluxos de informaçã o para os
países em desenvolvimento.

22. (UFMG) Leia este trecho:

Eurocopa & eurocrises

Sempre gostei da Eurocopa. O futebol é um pormenor. As minhas razõ es são políticas. Gosto da Eurocopa
porque ela é a expressã o tangível (e bem ruidosa) da diversidade nacional europeia que nenhuma construçã o
federal será capaz de suprimir.

Dias atrá s, a chanceler Angela Merkel [alemã] declarou em entrevista: a solução para os problemas do euro
passa por mais “integraçã o” dos países da zona do euro. [...]

Angela Merkel, claro, nã o lê a imprensa portuguesa. Se lesse, veria o que escreveram a respeito do jogo
Alemanha x Portugal (que os portugueses, injustamente, perderam por 1 a 0). A retó rica antigermâ nica era
violenta, o que se entende; o país está sob resgate financeiro internacional, com a bênçã o punitiva da
Alemanha.

Mas as rivalidades que a Eurocopa oferece nã o sã o apenas explicadas por crises econô micas momentâ neas.
Existem também memó rias histó ricas que persistem em retornar à superfície.

Jogos como Polô nia x Rú ssia ou França x Inglaterra sã o evocaçõ es fantasmagó ricas de lutas seculares que
deixaram sua pegada arqueoló gica. Quando essas equipes se voltarem a enfrentar na Eurocopa, nã o será
apenas de futebol que a mídia irá falar.

[...]

Na Europa, nã o existe um ú nico país; nem sequer, como pretendem os federalistas, diferentes “regiõ es” que
podem fazer parte de um super Estado com capital em Bruxelas.

O que existe sã o naçõ es mú ltiplas que, na hora do confronto desportivo, regressam a um sentimento
primordial de pertença: a uma língua, uma cultura, uma identidade.

Coutinho, Joã o Pereira. In: Folha de S.Paulo. p. E6. Ilustrada. 12 de junho de 2012. (Adaptado).

A partir da aná lise e interpretaçã o desse trecho, FAÇA o que se pede:

a) O jornalista português Joã o Pereira Coutinho estabelece uma relaçã o entre o comportamento das torcidas, a
histó ria e a situaçã o econô mica europeia atual. APRESENTE dois argumentos que comprovam a relaçã o
estabelecida pelo autor.

b) Pode-se perceber pela leitura do trecho que o jornalista tem uma posiçã o com relaçã o à integraçã o
europeia. EXPLIQUE qual é essa posiçã o, justificando-a.
Pá gina 116

23. (UEG-GO) Uma das faces da globalizaçã o é a criaçã o de mercados comuns entre grupos de naçõ es
chamados de megablocos ou blocos regionais; é uma forma de regionalizaçã o dentro do espaço mundial e, ao
mesmo tempo, uma forma de aumentar as relaçõ es em escala global, pois os países participantes de um bloco
têm acesso a vá rios mercados consumidores, dentro e fora de seu bloco. Sobre alguns dos blocos da América,
responda:

a) Cite os países que compõ em o NAFTA e explique quais sã o os reflexos dessa organização para o país
representante da América Latina.

b) A criação da ALCA sofreu vá rias críticas em funçã o dos prejuízos que pode representar para o Mercosul.
Explique.

24. (Fuvest-SP) Se nã o conseguirmos uma distribuiçã o justa dos refugiados, muitos vã o questionar Schengen
e isso é algo que nã o queremos. [Declaraçã o da chanceler alemã , Angela Merkel.]

O Estado de S. Paulo, 1º set. 2015.

A Europa vive uma das mais graves crises migrató rias de sua histó ria recente. Segundo a Agência das Naçõ es
Unidas para Refugiados (Acnur), sã o esperados ao menos 1,4 milhão de refugiados entre 2015 e 2016.

O Estado de S. Paulo, 19 out. 2015.

Considerando o contexto da Uniã o Europeia (UE), as informaçõ es acima e as respectivas datas de publicaçã o,
responda:

a) O que é o Espaço Schengen?

b) O que é a Zona do Euro? Cite um país da UE que nã o faz parte dessa zona.

c) Explique qual foi o posicionamento da UE e o papel da Alemanha frente à intensificaçã o desse fluxo
migrató rio.

25. (Fuvest-SP) Observe o mapa.

Allmaps

Atlas geográfico escolar. IBGE, 2012.

Com base no mapa e em seus conhecimentos sobre os EUA,

a) aponte duas razõ es da importâ ncia geopolítica desse país, na atualidade, considerando sua localizaçã o e
dimensã o territorial;
b) explique a importâ ncia econô mica, para esse país, da regiã o circundada no mapa, considerando os recursos
naturais e os aspectos humanos.

26. (Unicamp-SP)

a) Apresente dois fatores explicativos para a difusã o das zonas francas no mundo contemporâ neo.

b) Mencione a principal Zona Franca existente no Brasil e aponte uma intençã o do Estado brasileiro ao
implantá -la como instrumento de uma política territorial.

Allmaps

François Bost (Org.). Atlas Mondial des Zones Franches. France: La Documentation Française, 2010. p. 23.
Pá gina 117

Unidade II
Conjuntura internacional: outros
espaços de poder
Questão inicial
ESCREVA NO CADERNO

“[...] as hegemonias regionais sã o extremamente raras. Com exceçã o da China, no extremo oriente, na maioria
das vezes elas nã o foram muito duradouras.”

HOBSBAWM, Eric. O novo século. Sã o Paulo: Cia. das Letras, 2000.

• Quais países podem ser considerados potências mundiais nos dias de hoje? E potências regionais?
Aluísio C. Santos
Pá gina 118

CAPÍTULO 6 - China: nova potência

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Tópicos do capítulo

Revolução Chinesa

O período Mao Tsé-Tung

As reformas econômicas

Geografia física e humana da China

Ponto de partida
ESCREVA NO CADERNO

• A China é um país de proporçõ es continentais que abriga grande diversidade cultural, ambiental e
econô mica. Identifique as principais características de cada regiã o chinesa.
Pá gina 120

1. A construção política da China

Katie Garrod/JAI/Corbis/Latinstock

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A Grande Muralha da China é uma das obras mais espetaculares da humanidade. Ela foi construída durante o Impé rio Quin,
no sé culo II a.C., para evitar as invasõ es dos grupos nô mades mongó is. Na fotografia à esquerda, trecho da muralha na regiã o
de Pequim, 2014; à direita, parte da muralha fotografada por um saté lite, 2011.

Há aproximadamente 30 anos, as previsõ es indicavam que, se mantido o ritmo em que se


encontrava, a China seria a grande potência econô mica do século XXI. Atualmente, o país é a
segunda maior economia mundial e, se as novas projeçõ es forem comprovadas, o gigante asiá tico
deverá assumir a dianteira em 2025, ou mesmo um pouco antes.

Sua performance dos ú ltimos anos nã o deixa dú vidas: nenhum país cresceu tanto, mesmo em
tempos de crise. Para melhor entender o caminho percorrido pelo "dragã o asiá tico", faz-se
necessá rio focar em três momentos decisivos que perpassaram pelo país no século XX: o jugo
colonial, a Revoluçã o Chinesa e as reformas econô micas de 1978.

Navegar
Rádio Internacional da China <http://tub.im/25nhc9>
Portal em português da Rá dio Internacional da China (CRI), emissora estatal chinesa que transmite sua programaçã o
em diversos idiomas. A missã o dessa rá dio é apresentar a China ao mundo.

1.1 O jugo colonial e a Revolução Chinesa


O Reino Unido e o Japã o subjugaram a China entre o final do século XIX e início do XX. Os japoneses
iniciaram sua investida imperialista no Oriente e ocuparam parte da China em 1895. Já os
britâ nicos, desde a primeira Guerra do Ó pio (1839-1842), declararam guerra aos chineses por
impedirem o negó cio da droga comercializada por eles. O resultado foi a vitó ria britâ nica que, entre
outras reparaçõ es de guerra impostas à China, se apropriaram de Hong Kong por meio do Tratado
de Nanquim, de 1842.

Contra a dominaçã o estrangeira explodiu, entre 1899 e 1901, forte levante popular: a Revolução
dos Boxers. O movimento foi reprimido com êxito por britâ nicos e japoneses, que em nada
julgavam ú til aos seus interesses a rebeliã o camponesa. Uma outra resistência chinesa surgiria em
1900, quando nacionalistas fundaram o Kuomitang (Partido Nacionalista), liderado pelo médico
Sun Yat-Sen. O partido combatia nã o somente a cambaleante dinastia imperial, mas também a
presença estrangeira, criando uma repú blica, em 1912, regime que nã o foi reconhecido pelas forças
de ocupaçã o britâ nica e japonesa.

Pouco mais tarde, uma nova frente de resistência surgiria: em 1921, foi fundado o Partido
Comunista Chinês, o PCCh. Ascendia entre as fileiras comunistas a imagem do líder, Mao Tsé-Tung.
Pá gina 121

Além da dominaçã o estrangeira, a China experimentava um momento de instabilidade interna,


caracterizada pelas relaçõ es incertas entre nacionalistas e comunistas, ora aliados contra o invasor,
ora em confronto entre si.

Nesse primeiro momento da ambígua resistência chinesa, os nacionalistas organizaram-se e,


liderados por Chiang Kay-Shek, priorizaram a perseguiçã o aos comunistas, cujo crescimento entre
os camponeses incomodava o Kuomitang. Em 1934, fugindo dessa perseguiçã o, Mao Tsé-Tung e
seus seguidores marcharam pelo interior do país, ao norte, percorrendo nove mil quilô metros, em
uma das mais conhecidas tá ticas de guerrilha de todos os tempos, nomeada como a Longa Marcha,
também conhecida como a Grande Marcha.

Keystone/Getty Images

Mao Tsé -Tung (à frente) e Zhou Enlai, líderes do Partido Comunista Chinê s, durante a Longa Marcha em 1935.

Conversando com a... História!


ESCREVA NO CADERNO

Veja um trecho do discurso de Mao Tsé-Tung logo apó s a vitoriosa empreitada de sua marcha:

A Longa Marcha é a primeira deste tipo nos anais da histó ria. Ela é um manifesto, uma força de propaganda, uma
semeadeira. Ela proclamou ao mundo que o Exé rcito Vermelho [o exé rcito comunista da China, ainda em formaçã o] é um
exé rcito de heró is, enquanto os imperialistas e seus vassalos, Chiang Kay-Shek e os de sua laia, sã o impotentes.

MAO, Tsé-Tung. In: SPENCE, Jonathan D. Em busca da China moderna. Sã o Paulo: Companhia. das Letras, 2000. p. 394-395.

Pouco antes, aqui no Brasil, em 1925, acontecia um evento similar ao que Mao iria empreender na China: a Coluna
Prestes. Muitos historiadores fazem um paralelo entre esses dois eventos histó ricos, similares nos objetivos, mas em
países tã o distantes. As marchas chamam atençã o pelo longo trecho percorrido em dois países continentais.

1. Procure saber o que foi a Coluna Prestes e veja se é, ou nã o, pertinente a comparaçã o entre os eventos, resumindo
suas conclusõ es em um pequeno texto.
2. Tanto Mao como Luiz Carlos Prestes e Miguel Costa, os líderes da Coluna Prestes, empreenderam uma estratégia
territorial infiltrando-se por áreas de domínios naturais de difícil acesso. Analise o aspecto geopolítico da opçã o
estratégica desses líderes por áreas com essas características. Há , nos dias de hoje, atuaçõ es similares no mundo?

A invasã o japonesa na Manchú ria, regiã o rica em minérios localizada no norte da China, seguida da
eclosã o da Segunda Guerra Mundial, suspendeu os embates entre nacionalistas e comunistas que,
em 1937, selaram uma aliança para combater o invasor, pois, apesar das divergências, eles tinham
um agressivo inimigo comum.

Enquanto combatiam os japoneses, os comunistas chineses aumentaram consideravelmente seu


efetivo militar e territorial, promovendo reformas agrá rias nas terras conquistadas e, assim,
ganhando cada vez mais o apoio da populaçã o, majoritariamente rural. As hostilidades entre
comunistas e nacionalistas estavam suspensas, mas Chiang Kay-Shek dava mostras de incomodar-
se mais com o avanço das tropas de Mao Tsé-Tung e seus companheiros do que com o dos
japoneses. Os camponeses, por sua vez, assumiam distintas posturas na guerra. Enquanto Chiang
Kay-Shek, conhecedor da inferioridade militar chinesa, nã o empreendia grandes esforços na
resistência aos japoneses, conformando-se em manter algumas á reas longe do domínio nipô nico,
Mao e seus generais incitavam a populaçã o a resistir e a lutar com afinco. Outro fato que contribuiu
para a desconfiança camponesa foi ver seus senhores, majoritariamente nacionalistas, selarem
acordos com os japoneses, em uma clara colaboraçã o com o invasor. A fama da corrupçã o
nacionalista espalhava-se pela China. Em contrapartida, corriam rumores dos atos de heroísmo
comunista, como a Longa Marcha e a forte resistência aos japoneses.

Apó s o desfecho da Segunda Guerra Mundial, com a rendiçã o japonesa e o enfraquecimento das
forças britâ nicas de ocupaçã o, a aliança conjuntural entre nacionalistas e comunistas se encerrou.
Teve início uma guerra civil que perdurou de 1945 até 1949.
Pá gina 122

Ver
O último imperador. Direção: Bernardo Bertolucci. China/Inglaterra/França/Itália, 1987.
Com apenas 3 anos, Pu Ye é condecorado imperador de uma China totalmente subjugada e dominada pelas potências
imperialistas. O filme narra os antecedentes da Revoluçã o de 1949.

Filme de Bernardo Bertolucci. O ú ltimo imperador.


China/Inglaterra/França/Itá lia, 1987

Os comunistas foram vitoriosos e, em 1º de outubro de 1949, na Praça da Paz Celestial, Mao Tsé-
Tung anunciou a fundaçã o da Repú blica Popular da China, uma naçã o socialista de acordo com a
acepçã o marxista; era o fim de quase 5 mil anos de império. Os nacionalistas, liderados por Chiang
Kay-Shek, se deslocaram para a ilha de Taiwan, onde anunciaram a Repú blica Nacionalista da China,
“Estado” nã o reconhecido até hoje. Veja a localizaçã o das duas repú blicas no mapa a seguir.

Allmaps

Fonte: ATLAS geográ fico escolar. 6. ed. Rio de Janeiro: IBGE, 2012. p. 47.

Apesar de a China continental nã o aceitar a "pseudorrepú blica", os comunistas priorizaram a


organizaçã o do novo país. Ademais, para eles seria difícil, naquele momento, vencer os
nacionalistas dentro da ilha, que estavam circunscritos a um anel de proteçã o pelo mar, tornando a
logística militar para um ataque à “ilha rebelde” inviá vel. Essa contenda estende-se aos dias atuais.
Mondadori Portfolio via Getty Images

Revoluçã o Chinesa: milhõ es de chineses atenderam ao chamado de Mao Tsé -Tung. Na fotografia, Mao e outros líderes
desfilam para a multidã o na Praça da Paz Celestial, Pequim, em 1950.
Pá gina 123

2. O período Mao Tsé-Tung


Apó s séculos, havia agora na China um poder central e ú nico de fato. Depois de uma rá pida
reestruturaçã o dentro dos princípios socialistas, realizaram-se amplas reformas, que tinham como
mote central a planificaçã o e estatizaçã o da economia. A reforma agrá ria foi o evento central nas
inovaçõ es, uma vez que a China era majoritariamente rural. Grandes propriedades foram
confiscadas pelo Estado e redistribuídas entre os pequenos agricultores. Estimam-se em torno de
300 milhõ es o nú mero dos camponeses contemplados com mó dicas á reas – a maior reforma
agrá ria da histó ria. Posteriormente, seriam instituídas cooperativas agrícolas, as comunas,
aumentando a produçã o no campo.

A estatizaçã o atingiu companhias, bancos, meios de comunicaçã o e demais setores. Também na


á rea de infraestrutura houve forte investimento em desenvolvimento: construçã o em larga escala
de estradas de ferro, usinas hidrelétricas e diques. Na primeira etapa da gestã o de Mao Tsé-Tung,
foram criados 24 ministérios, com base em uma lista de temas prioritá rios: agricultura, educaçã o,
indú stria de bens de produçã o, indú stria leve etc. Assim iniciou-se a fase de planos quinquenais na
China.

A industrializaçã o nesse país desenvolveu-se a partir da Revoluçã o Chinesa, concentrando-se na


Manchú ria, onde já existia uma indú stria embrioná ria. No plano político, a China estreitou laços
com a Uniã o Soviética, apesar do incô modo que Mao causava a Stá lin. Os soviéticos buscavam
deixar claro quem estava na liderança mundial do socialismo, sendo exatamente essa postura que
provocou os primeiros atritos entre os dois países. É bem verdade que, apesar de aliados
circunstanciais, Mao e Stá lin há décadas divergiam sobre a “revoluçã o do proletariado”. Os dois
líderes estavam mais interessados em defender as tradiçõ es histó ricas de seus países do que com as
afinidades ideoló gicas. Mesmo contrariado, Stá lin apoiou a causa chinesa, mais do que queria e
menos que podia. Enviou técnicos e burocratas para subsidiar a reconstruçã o da China. Um Tratado
de Aliança foi assinado em 1950 e a Uniã o Soviética estendeu à China um programa de
financiamentos.

A ingerência soviética na China incomodou Mao. O país dependia da assistência soviética para a
industrializaçã o, expansã o das redes de comunicaçã o e energia, mas nã o queria ver sua soberania
ameaçada. Afinal, apó s anos de luta pela expulsã o dos invasores imperialistas e dos pró prios
nacionalistas, os chineses nã o pretendiam submeter-se aos soviéticos. Nas reuniõ es socialistas
internacionais, as divergências entre os dois países sobre os rumos do sistema político tornavam-se
flagrantes. Outro ponto de discordâ ncia: Mao queria a todo custo obter sua bomba nuclear, intençã o
que a Uniã o Soviética refutava.

Nã o tardou para que as hostilidades chegassem a um ponto insustentá vel. Em 1960, Moscou retirou
mais de 1 300 técnicos e consultores soviéticos que prestavam serviço na China; 250 projetos
foram cancelados, assim como centenas de contratos. Dois cientistas que cuidavam do projeto
atô mico chinês, e que tiveram de se retirar do país, antes do embarque recusaram-se a entregar os
papéis da pesquisa.

Planos quinquenais: Planos econô micos nos quais eram estabelecidas metas a serem atingidas em cinco anos. Típica conduta de
economia planificada.

Ler
Em busca da China moderna, de Jonathan Spence. São Paulo: Companhia das Letras, 2000.
O historiador Jonathan Spence é uma das autoridades mundiais em China e nessa obra faz um resgate desde os
primó rdios da civilizaçã o chinesa até as reformas econô micas de 1978.
2.1 A Revolução Cultural
Durante os desentendimentos com os soviéticos, Mao Tsé-Tung encaminhou um programa
econô mico que se revelou um fiasco: o Grande Salto para Frente. O projeto baseava-se em uma
tentativa de industrializaçã o forçada, com a instalaçã o de fornos siderú rgicos em á reas rurais, em
um híbrido de produçã o industrial-agrá ria. Como consequência, houve um grande retrocesso do
avanço do primeiro plano quinquenal; contabilizaram-se milhõ es de mortes em virtude da queda
da produçã o agrícola.
Pá gina 124

Ver
Adeus, minha concubina. Direção: Chan Kaige. China, 1993.
Aborda os excessos da Revoluçã o Cultural de 1966, mostrando o trabalho de artistas teatrais.

Filme de Chan Kaige. Adeus, minha concubina. China, 1993

Nem todos os líderes do Partido Comunista Chinês (PCCh) aprovaram o desentendimento com
Moscou. Muitos também estavam desapontados com os rumos tomados pela economia desde o
fracasso do Grande Salto para Frente e da campanha anterior, das Cem Flores, uma iniciativa de
Mao vista como tentativa de composiçã o com as vá rias vertentes ideoló gicas do PCCh, mas que, na
prática, levou a um confronto com os intelectuais do país, provocando forte convulsã o social. Esses
reveses, somados à s manobras da ala opositora do PCCh, levaram ao afastamento parcial de Mao do
poder: ele perdeu a presidência da repú blica, mas manteve-se como secretá rio-geral do PCCh.

Mao nã o aceitou esse afastamento e tratou de reagir. Como estratégia política, soube canalizar, para
benefício pró prio, a insatisfaçã o popular que pairava sobre a China no que tangia à conduçã o do
país, particularmente dos estudantes, desejosos de maior participaçã o na vida política nacional.
Nesse momento, a alta cú pula do PCCh dividia-se, genericamente, entre a linha dura e os
revisionistas. Na atmosfera esquerdista reinante na sociedade chinesa, os revisionistas foram
acusados de “condescendentes aos valores burgueses” e, por isso, julgados como uma ameaça à
revoluçã o.

Mao soube aproveitar o contexto em seu favor orquestrando uma campanha contra os revisionistas.
O líder chinês iniciou a chamada Revoluçã o Cultural, que a princípio se dizia em prol do
proletariado e que propunha aprofundar os valores socialistas contra as tradiçõ es chinesas e os
ideais burgueses. Formou o numeroso exército vermelho composto majoritariamente por jovens,
entre eles milhõ es de estudantes secundaristas e universitá rios. Seus soldados invadiam casas à
procura de pistas sobre atos e objetos considerados suspeitos e contrá rios ao socialismo.
Instaurou-se um clima de muita tensã o, com filhos entregando pais e professores aos soldados de
Mao. Políticos e artistas foram perseguidos e diversas obras foram proibidas de serem exibidas no
país. Milhares de livros foram queimados, prédios milenares foram destruídos.

A revolta explodiu em 1966 e as massas populares se viraram contra os opositores de Mao.


Frequentemente, a Revoluçã o Cultural é interpretada como “radical”, em funçã o da violência dos
atos. Os adeptos do movimento pró -Mao e a denominada “guarda vermelha” – a vanguarda
revolucioná ria maoísta – sagraram-se vitoriosos. O que se observou, entã o, foi um verdadeiro
expurgo comunista, com a maioria dos adversá rios de Mao Tsé-Tung destituídos dos principais
cargos da vida pú blica: alguns exilados, outros presos ou até executados. Tudo que fosse visto como
ameaça ao sistema socialista chinês deveria ser eliminado, inclusive as pessoas. A ordem foi
retomada no início de 1967 e, dali por diante, Mao governou a China com relativa tranquilidade por
mais nove anos.
Hsinhua/AP/Glow Images

Os jovens constituíram a base da Revoluçã o Cultural. Na fotografia, manifestaçã o em apoio a Mao Tsé -Tung, Pequim, 1966.
Pá gina 125

Com a intençã o de contrabalançar a hegemonia soviética no mundo socialista, a China reorientou


suas relaçõ es com os Estados Unidos, buscando uma aproximaçã o política e comercial. O auge desse
movimento se deu em 1972, quando o presidente estadunidense Richard Nixon visitou a China
(veja a fotografia abaixo). Pouco antes, em 1971, o país havia conquistado a vaga de membro
permanente do Conselho de Segurança da ONU, desbancando Taiwan, que lá estava desde 1949. Em
1979, Estados Unidos e China reataram relaçõ es diplomá ticas, nã o sem antes a potência ocidental
romper relaçõ es com Taiwan.

Bettmann/Corbis/Latinstock

O entã o presidente dos Estados Unidos, Richard Nixon, com dirigentes chineses em Pequim, em 1972.

3. Deng Xiaoping e as reformas econômicas


A morte de Mao Tsé-Tung, em 1976, desencadeou um processo de disputa no Partido Comunista
Chinês entre os seguidores maoístas e os revisionistas, que se reorganizaram nos anos que
antecederam a morte do líder chinês e gradativamente reocuparam importantes cargos pú blicos,
ou seja, estavam fortalecidos. A disputa polarizou-se entre um grupo designado Bando dos Quatro,
liderado pela viú va de Mao, Chiang Ching, versus Deng Xiaoping, líder revisionista.

Deng Xiaoping, heró i da Revoluçã o de 1949 e antigo rival de Mao, perseguido na Revoluçã o Cultural
por ser considerado extremamente liberal, ou arquirrevisionista, capitalizou os dividendos políticos
desse novo momento e emergiu como o grande vencedor da disputa interna do PCCh, enquanto os
maoístas do Bando dos Quatro foram para a prisã o. A China entraria em uma nova era e o sucessor
de Mao recontaria a histó ria chinesa por outros caminhos.

Em 1978, Deng deu início a um amplo programa de reformas econô micas que revolucionaria o país.
Eram reformas liberalizantes, basicamente concessõ es ao capitalismo, iniciativa jamais admitida
durante o período Mao. Fora retomado o programa das quatro modernizaçõ es, concebido ainda nos
idos dos anos 1950, enfatizando a agricultura, a indú stria, a ciência e tecnologia e a defesa.
Pá gina 126

A nova política econô mica estabeleceu, por exemplo:

• dissoluçã o parcial das comunas agrícolas e uso privado da terra pelos camponeses;

• diferenciaçã o salarial entre os operá rios nas fá bricas, com base no critério de produtividade;

• criaçã o da Bolsa de Valores de Pequim (Beijing);

• inversã o da prioridade industrial, uma vez que a ênfase a partir de entã o seria na indú stria de
bens de consumo, ao invés da de bens de produçã o (que, contudo, também continuou a crescer);

• criaçã o das Zonas Econô micas Especiais (ZEE), que, em um primeiro momento, foram quatro,
depois vá rias outras;

• abertura controlada a investimentos estrangeiros em zonas determinadas;

• priorizaçã o das exportaçõ es e busca de mercados externos.

Allmaps

Fonte: FERREIRA, Graça M. Lemos. Atlas geográfico: espaço mundial. 3. ed. Sã o Paulo: Moderna, 2010. p. 105.

Interagindo
ESCREVA NO CADERNO

Enquanto viveu, Mao Tsé-Tung pautou-se por “construir a igualdade, mesmo que sacrificando o desenvolvimento”.
Deng Xiaoping inverteu a premissa, colocando em primeiro plano o desenvolvimento, mesmo que isso levasse ao
comprometimento da igualdade. Essa é a China de hoje: mais forte, mais rica, mais desigual.
• Qual a sua percepçã o sobre a reorientaçã o ideoló gica encaminhada por Deng Xiaoping? Você entende que ela está
correta ou concorda mais com a perspectiva de Mao Tsé-Tung?

Wally McNamee/Corbis/Latinstock

Deng Xiaoping: “Nã o importa a cor do gato, importa que apanhe o rato”. Com essa frase, Deng dava demonstraçõ es da
reorientaçã o ideoló gica que seguiria a China. Fotografia de 1979.
Pá gina 127

No contexto de mudanças, a mais importante medida foi a reformulaçã o das orientaçõ es


econô micas no plano externo. A partir desse momento, a prioridade seria a abertura da economia
chinesa, permitindo a entrada de empresas estrangeiras no mercado chinês. A China pretendia com
isso modernizar seu defasado processo produtivo e ter acesso a novas tecnologias, por meio de uma
associaçã o entre o Estado e o capital externo. Para isso, nã o hesitou em realizar inú meras joint
ventures com empresas estrangeiras. Nesse sentido, foi decisiva a implementaçã o das ZEE, pois era
sobretudo ali que se dava esse processo. Inicialmente, elas se concentraram no Sudeste do país, mas
depois subiram por toda a franja litorâ nea da China.

A mais abundante e barata mã o de obra do mundo foi, provavelmente, o forte atrativo aos capitais
estrangeiros, somados, logicamente, a um mercado em expansã o. Grandes empresas internacionais
deslocaram para a China as fases produtivas a fim de utilizar a mã o de obra, minimizar custos e
maximizar lucros, de acordo com a acepçã o do capitalismo global.

O país encerrava uma etapa, em que se priorizou o desenvolvimento interno, para iniciar nova fase
de expansã o externa, que vem até os dias atuais. Contudo, é bom frisar: essas mudanças chinesas
nã o ocorreram de forma drá stica, tudo foi feito em cará ter gradual. Assim devem ser entendidas
suas mudanças econô micas.

O resultado dessas mudanças na primeira década pode ser resumido em uma palavra: crescimento.
Foi isso o que se verificou no país. Diante dos ó timos resultados econô micos, em 1984, o 12º
Congresso do Partido Comunista Chinês aprovou as aceleraçõ es das reformas, o que passaria a ser
uma constante nas sucessivas reuniõ es do partido. E os resultados se repetiram: crescimento na
década de 1990 e de 2000, quase sempre em torno da casa de dois dígitos.

Desde 1978, a economia chinesa foi a que mais cresceu em todo o mundo, com uma média em torno
de 9% ao ano até 2011. Daí em diante, embora o crescimento tenha se mantido alto em relaçã o à
média mundial, houve sucessivos decréscimos. O país cresceu 7,7% em 2012 e em 2013; 7,3% em
2014 e 6,9% em 2015.

Em determinado momento, o governo chinês assumiu o novo modelo econô mico como “socialismo
de mercado”, eliminando a ideia anterior de compartilhamento da produçã o entre os que
trabalhavam bem e os que trabalhavam mal. A ordem passou a ser o estímulo à produtividade. Em
uma populaçã o de mais de um bilhã o de habitantes, nã o é difícil entender o que isso significa:
aumento de produçã o. No início do século atual, a China demonstrava sua força na produçã o
mundial. Veja a tabela na pá gina seguinte.

Joint venture: Associação entre empresas por um certo período sem que nenhuma delas perca a autonomia jurídica.
Imaginechina via AP/Glow Images

Os sinais de crescimento estiveram por todos os cantos da China nos ú ltimos tempos: caem velhos edifícios, sobem novos.
Tianjin, 2013.
Pá gina 128

Produção chinesa (participação no montante mundial no começo do século XXI)


Produto % da participação Produto % da participação
mundial mundial
Brinquedos 75 Micro-ondas 30
Reló gios 75 Televisores 30
Calçados 55 Aço 27
Câ meras digitais 50 Geladeiras 20
Contêineres 50 Caminhõ es 19
Monitores 42 Têxteis 17
Celulares 35 Carros 14
Ô nibus 33 Navios 13

Fonte: EXAME. Sã o Paulo: Abril, ed. 842, n. 9, maio 2005.

Navegar
Embaixada da República Popular da China no Brasil <http://tub.im/842j88>
O portal da embaixada da China no Brasil traz as mais variadas informaçõ es sobre o país, com destaque especial para
as relaçõ es sino-brasileiras.

No processo de abertura que se iniciou no final dos anos 1970, os primeiros a investirem na China
foram os “chineses do ultramar”, expressã o traduzida do inglês overseas chinese, utilizada para
designar os chineses residentes em Hong Kong, Taiwan, Macau e Indonésia, que tinham se tornado
promissores empresá rios no exílio. A maior parte dos Investimentos Diretos Externos (IED) no país
veio deles.

Durante o período de introduçã o da nova economia, o Estado chinês foi remodelado, uma vez que
na vigência do socialismo maoísta ele era absoluto. Contudo, em nenhum momento se cogitou seu
enfraquecimento; ao contrá rio, o Estado foi o condutor do remodelamento da economia chinesa e
segue forte na condiçã o de ator central do país. Por exemplo, foi o Estado que patrocinou a nova
agricultura chinesa, adquirindo a maior parte da produçã o dos novos proprietá rios e destinando-a
à populaçã o urbana. Vá rias empresas pú blicas realizaram associaçõ es com empresas estrangeiras e
se desenvolveram enormemente. Ressalta-se que as reformas econô micas nã o foram
acompanhadas de reformas políticas.

O centralismo do Partido Comunista Chinês segue vigente e é imenso o descompasso entre as


mudanças econô micas e políticas. Essa é uma diferença capital entre o que aconteceu na China e o
que se verificou na Rú ssia e nos países do Leste Europeu, onde as reformas políticas antecederam
as econô micas; muitos atribuem a esse fator o colapso verificado naquela parte da Europa.

As políticas internas do PCCh nã o agradam todos os chineses. Apesar da grande repressã o, foram
surgindo diferentes formas de protesto contra os rumos do governo, como obras de artistas e a
ocupaçã o de á reas pú blicas por parte da populaçã o que reivindicava transformaçõ es. Muitas dessas
manifestaçõ es culminaram em verdadeiros massacres pelo uso das forças armadas. Em 1988 ficou
mundialmente conhecido o ato de um homem que se colocou à frente de uma fileira de tanques de
guerra, fazendo parar o comboio e arriscando sua pró pria vida. Abaixo, na seçã o “A Geografia na...
arte!”, conheça mais um exemplo de protesto ao governo chinês.

A Geografia na... arte!


ESCREVA NO CADERNO

O artista plá stico chinês Ai Weiwei, opositor do regime comunista no país, foi preso em 2011 por criticar o governo.
Seus trabalhos e seu ativismo social o levaram a ser considerado nos ú ltimos anos um dos mais influentes artistas do
mundo. Nessa sequência de fotografias, ele questiona a apropriaçã o e a usurpaçã o da arte chinesa por um governo
totalitá rio: Ai Weiwei deixa cair um vaso, símbolo da cultura milenar chinesa.

• Analise a manifestaçã o do artista e faça um paralelo entre a arte e a política, nas suas mais variadas dimensõ es.
Compare a posiçã o de Ai Weiwei com a de outros artistas em outros países e/ou em diversos momentos. Em relaçã o
à nossa realidade, houve em algum momento da histó ria do Brasil a apropriaçã o da cultura do país por regimes
totalitá rios?

Crédito das imagens: Smithsonian’s Hirshhorn Museum/AP/Glow Images


Pá gina 129

Peter Turnley/Corbis/Latinstock

Em 1989, os protestos na Praça da Paz Celestial, em Pequim, reivindicavam reformas també m políticas, mas nã o lograram
êxito.

Leia o texto abaixo, da seçã o “Enfoque”, sobre o mecanismo de escolha dos líderes políticos
chineses. A seguir, no infográ fico, veja os fatores que levaram a China a se tornar um país com uma
produçã o gigantesca de bens de consumo.

Enfoque
ESCREVA NO CADERNO

Por que o Partido Comunista Chinês desafia a democracia

[Em 2011] Na cerimô nia de abertura do 18º Congresso do Partido Comunista Chinês (PCCh), o líder chinês Hu Jintao,
que conclui seu mandato, declarou, “Nó s nã o seguiremos o antigo caminho do passado, rígido e estreito, nem
tomaremos o mau caminho de mudar nossa bandeira.”. A declaraçã o decepcionou os que esperavam gestos em
direçã o à reforma política e algumas mídias e pessoas voltaram os olhos esperançosos para o novo líder chinês Xi
Jinping.

No final de 1990, a China entrou num período, que ainda dura, em que pessoas de poder começaram a pilhar fortunas
implacavelmente com pouco risco. O sistema atual na China garante o controle total do grupo de interesse do PCCh
sobre todos os recursos do Estado em nome do (ou para o) povo. (Os recursos incluem a terra urbana e rural,
florestas, rios, minas e outros recursos naturais, bem como os direitos de decisã o sobre indú strias especiais.)

O Estado, entã o, decide como alocar receitas desses recursos pú blicos. A porçã o que o Estado chinês usa do PIB
cresceu de um quarto para um terço, mesmo com o aumento do PIB. Portanto, bens pú blicos se tornaram uma fonte
de riqueza para uns poucos privilegiados e as pessoas pró ximas a eles.

Nas ú ltimas duas décadas, o crescimento da China veio principalmente da terra, mineraçã o, serviços financeiros e do
mercado de açõ es, enquanto os projetos pú blicos ofereceram inú meras oportunidades para subornar os oficiais. De
“aristocratas vermelhos” e oficiais provinciais aos camaradas das aldeias locais, todos no sistema tem se aproveitado
destes recursos pú blicos. [...]

O PCCh é o fazedor das regras, um jogador neste jogo de monopó lio, assim como o juiz do comportamento do
mercado. Por que razã o eles desejariam mudar este sistema ú nico que protege seu pró prio grupo?

Portanto, os comentá rios de Hu Jintao sobre nã o tomar o “antigo caminho do passado, rígido e estreito” dirigia-se ao
grupo privilegiado. Na era Mao, embora o governo estivesse no controle total de todos os recursos, os oficiais nã o
foram abençoados com um mercado em que podiam negociar poder por dinheiro e as diferenças entre altos oficiais e
populares ainda eram pequenas.

Mas agora, a diferença aumentou exponencialmente com a combinaçã o atual de regime totalitá rio e economia de
mercado, enquanto o regime tem todos os recursos do país sob seu rígido controle. Em tal sistema, os oficiais
convenientemente fazem parceria com pessoas de negó cios para negociar poder por riqueza e depois escondê-la no
exterior. As elites poderosas e privilegiadas têm acumulado uma fortuna grande o suficiente para sustentarem uma
vida de luxo por vá rias geraçõ es.

HE, Qinglian. Por que o Partido Comunista Chinês desafia a democracia. Epoch Times, 17. nov. 2012. Disponível em: <https://www.epochtimes.com.br/por-que-partido-comunista-
chines-desafia-democracia/#.Vq-qsbIrLIU>. Acesso em: 1º fev. 2016.

1. Com base na leitura do texto, qual é a opiniã o da autora sobre a democracia na China? Ela concorda com os rumos
políticos e econô micos que o país está tomando?

2. Segundo a autora, quais as relaçõ es entre a fala de Hu Jintao sobre nã o tomar o “antigo caminho do passado, rígido
e estreito” com o título do artigo: “Por que o PCCh desafia a democracia”?

Ler
Sobre a China, de Henry Kissinger. Rio de Janeiro: Objetiva, 2011.
Livro escrito por diplomata estadunidense que atuou na reaproximaçã o da China com os Estados Unidos trata das
relaçõ es internacionais contemporâ neas e analisa a presença da China na balança do poder mundial.

Editora Objetiva
Pá gina 130

Crédito do infográfico: Casa Paulistana

Fontes: IBIS World. Toy Manufacturing in China: Market Research Report. Disponível em:
<http://www.ibisworld.com/industry/china/toy-manufacturing.html>. Acesso em: 4 jan. 2016. MINISTÉ RIO do
Desenvolvimento, Indú stria e Comé rcio Exterior. Balança comercial brasileira: dezembro 2015. Disponível em:
<http://www.mdic.gov.br//portalmdic/sitio/interna/interna.php?area=5&menu=5266&refr=1161>. Acesso em: 11 jan.
2016. MINISTÉ RIO do Desenvolvimento, Indú stria e Comé rcio Exterior. China: comé rcio exterior, jan. 2015. Disponível em:
<www.brasilglobalnet.gov.br/ARQUIVOS/IndicadoresEconomicos/INDChina.pdf>. Acesso em: 12 jun. 2015.

Atividades
ESCREVA NO CADERNO

1. Nã o parece um contrassenso que, no país em que o partido comunista está há mais tempo no poder, os
trabalhadores tenham condiçõ es de trabalho similares à época de exploraçã o capitalista que fez Karl
Marx se rebelar e teorizar sobre esse sistema? Qual sua opiniã o a respeito?

2. Extraia do infográ fico uma informaçã o que revele um aspecto positivo e um negativo da economia
chinesa.
Pá gina 131
Pá gina 132

4. A geografia física e humana da China


Com uma á rea de 9,5 milhõ es de km2 e uma populaçã o de 1,37 bilhã o de habitantes (2015), a China
é o terceiro maior país do mundo e o mais populoso. Em linhas gerais, esse país apresenta uma
disposiçã o geomorfoló gica que gradativamente se rebaixa de oeste para leste. Assim, temos a China
das terras altas, com cadeias montanhosas e elevados planaltos na vertente ocidental, e a China das
terras baixas, com suaves colinas e extensas planícies na porçã o oriental. Essa disposiçã o do relevo
interfere na distribuiçã o de seus 1,37 bilhã o de habitantes, com aproximadamente 90% dessa
massa demográ fica concentrada na fachada leste. Veja os mapas a seguir.

Allmaps

Fonte: ATLAS geográ fico escolar. 6. ed. Rio de Janeiro: IBGE, 2012. p. 46.

Allmaps
Fonte: BONIFACE, Pascal; VÉ DRINE, Hubert. Atlas do mundo global. Sã o Paulo: Estaçã o Liberdade, 2009. p. 99.
Pá gina 133

Os chineses têm, nos registros de sua civilizaçã o, uma histó rica convivência com os rios, que, em
sua maioria, drenam o territó rio em direçã o ao leste. Por causa de recursos hídricos e solos férteis,
há uma imensa populaçã o rural concentrada no entorno dos rios. Destacam-se os rios Xi-Jiang (das
Pérolas), ao Sul; Yang-Tsé-Kiang (Azul), na faixa central; e Hoang-Ho (Amarelo), ao Norte, que
correm paralelos, de oeste para leste, desaguando no oceano Pacífico. É no Yang-Tsé-Kiang que foi
concluída, em 2012, a maior usina hidrelétrica do mundo, a Três Gargantas.

Na condiçã o de grande potência agrícola mundial, a China tem sua agricultura concentrada junto à s
planícies e suaves colinas do leste do país, associada aos grandes rios que correm para esse sentido,
fertilizando o solo. Há também o solo de loess, muito fértil, formado por sedimentaçã o eó lica,
encontrado principalmente no entorno do rio Hoang-Ho.

Apresentando uma agricultura com forte emprego de mã o de obra, destacam-se o trigo no Norte, o
arroz no Sul e uma variada gama de gêneros entre essas duas culturas, como milho, algodã o,
cítricos, cana-de-açú car, soja, batata, beterraba açucareira etc.

Olaf Schubert/Image broker/Glow Images

A tradicional agricultura chinesa. Na imagem, terraços de arrozais cultivados nas encostas, em Guangxi, 2012.

A baixa utilizaçã o da mecanizaçã o vincula-se a uma questã o social, pois mecanizar o campo
significaria lançar milhõ es de camponeses ao desemprego, acentuando o já avançado êxodo rural.

Como o país tem a maior populaçã o da Terra, o governo chinês impô s um severo e eficiente
controle demográ fico ao país a partir dos anos 1970, que resultou em uma expressiva diminuiçã o
da natalidade e reduçã o do crescimento demográ fico. As projeçõ es apontam para uma estabilizaçã o
da populaçã o em torno de 1,5 bilhã o de habitantes, que deve se manter uniforme no futuro.
Segundo a Agência Nacional de Estatísticas da China, em 2011, a populaçã o urbana superou a rural
no país pela primeira vez. A pesquisa, realizada em 2012, constatou que, no final de 2011, 51,27%
da populaçã o chinesa vivia em cidades. O país conheceu nas duas ú ltimas décadas um
impressionante êxodo rural e a mobilidade demográ fica é uma característica marcante da China
moderna: aproximadamente 20% dos chineses sã o migrantes e vivem mais de seis meses longe do
registro de residência.

Essa migraçã o interna é fruto das transformaçõ es verificadas nos ú ltimos anos e está diretamente
ligada à s melhores perspectivas que as cidades apresentam e à flagrante discrepâ ncia social
existente entre o camponês e o citadino. A China vive um paradoxo social: ao mesmo tempo em que
é o país que mais contribuiu em todo o mundo para a reduçã o da pobreza e da miséria, segundo o
Banco Mundial, igualmente foi onde a desigualdade mais cresceu.
Pá gina 134

A China apresenta clima bastante variado. No Sudeste predomina o clima subtropical, onde os
ventos monçô nicos de verã o provocam, eventualmente, inundaçõ es de grandes proporçõ es. Por
conviver milenarmente com essa oscilaçã o entre períodos chuvosos e de estiagem, os chineses
tornaram-se autênticos mestres na arte de construir drenagens e sistemas de controle de cheias;
por isso sã o designados como a “civilizaçã o hidrá ulica”.

À medida que nos dirigimos para o Nordeste, caem as temperaturas até a á rea de predomínio do
clima continental frio nas imediaçõ es da Manchú ria. Essa alternâ ncia climá tica é responsá vel
também pela distribuiçã o agrícola dos dois principais cereais produzidos no país: arroz, ao Sul, e
trigo, ao Norte. No interior, surgem os climas de montanha, semiá rido e á rido. Observe essa
distribuiçã o no mapa abaixo.

Ventos monçônicos de verão: Ventos sazonais que sopram do oceano Índico em direçã o ao sul e sudeste asiá tico nos meses de
verã o.

DACOSTA MAPAS

Fonte: PHILLIPSON, Olly. Atlas geográfico mundial. Curitiba: Fundamento, 2011. p. 84.

ROTEIRO DE ESTUDO
ESCREVA NO CADERNO

Revisando

1. Na Revoluçã o Chinesa, milhõ es de chineses atenderam ao chamado de Mao Tsé-Tung. Explique o que
foi a Revoluçã o Chinesa.

2. Taiwan é a Repú blica Nacionalista da China. Explique seu surgimento como unidade política e seu
status nos dias atuais.
3. Os comunistas sagraram-se vitoriosos e, em 1º de outubro de 1949, diante de um palanque na Praça
da Paz Celestial, Mao Tsé-Tung anunciava a fundaçã o da Repú blica Popular da China, uma naçã o
socialista segundo a acepçã o marxista. Cite medidas tomadas durante o período Mao Tsé-Tung na China.

4. Frequentemente, a Revoluçã o Cultural é interpretada como “radical”, em funçã o da violência dos atos.
O que foi a Revoluçã o Cultural?

5. Em 1978, Deng Xiaoping deu início a um amplo programa de reformas econô micas que revolucionaria
o país. Eram reformas liberalizantes, basicamente concessõ es ao capitalismo. Em seguida, vieram outras.
As reformas econô micas na China se deram de forma acelerada ou gradual? Por quê?

6. As ZEE, em um primeiro momento, eram quatro. Depois, surgiram diversas outras. O que sã o as ZEE?

7. Quais sã o as perspectivas econô micas para a China nas pró ximas duas décadas?

8. A China é um grande parceiro comercial do Brasil. Comente as relaçõ es comerciais entre os dois
países.

Olhar cartográfico

Elabore um mapa da China, em seu caderno, contrastando as porçõ es ocidental e oriental; explique-as
com legendas. Considere aspectos populacionais e físico-territoriais.
Pá gina 135

Atividade em grupo

A comunidade chinesa está representada em sua cidade? Se sim, procure entrevistar alguns membros e
descobrir o que os motivaram a viver no Brasil. Se nã o houver representantes da comunidade em sua
cidade, pesquise sobre a imigraçã o chinesa no Brasil.

De olho na mídia

O texto a seguir faz uma aná lise conjuntural da desaceleraçã o do crescimento econô mico da China
verificado em meados da década de 2010. Apó s a leitura do texto, responda à s questõ es.

1. Por que o texto afirma que “a China espirra e o mundo adoece”?

2. Quais as implicaçõ es do cená rio apontado no texto ao Brasil?

Por que o mundo tem medo da desaceleração chinesa?

Entenda o que a China provoca nos mercados de ações e de câmbio e quais os impactos no Brasil

A China espirra e o mundo adoece. Pode parecer jargã o de economistas, mas a frase reflete de alguma forma o que acontece
hoje no mundo, particularmente nesta segunda-feira 4 [janeiro de 2016], primeiro dia ú til do ano em que o mercado de
açõ es foi surpreendido por um dado da segunda maior economia do planeta, a China.

O governo chinê s divulgou o Índice de atividade dos gerentes de compra (PMI) do setor industrial da China, que recuou para
48,2 pontos em dezembro, de 48,6 pontos em novembro. O resultado marcou o dé cimo mê s consecutivo de leitura abaixo da
linha dos 50,0 pontos, o que indica contraçã o da atividade econô mica chinesa.

Foi o suficiente para colocar os mercados em polvorosa, com queda nos índices das principais bolsas no mundo. No Brasil, o
efeito colateral també m foi sentido na BM&FBovespa, que caía 1,75% por volta das 16h30, e no câ mbio, cuja cotaçã o
ultrapassou os R$ 4,00.

O que está por trá s desse tropeço chinê s é na verdade uma das grandes preocupaçõ es dos economistas e analistas do
mundo: uma desaceleraçã o da atividade econô mica muito maior do que se imaginava na China.

PIB

Dona de um PIB de US$ 10,35 trilhõ es segundo o Banco Mundial, e uma populaçã o de 1,364 bilhã o de habitantes (2014), cuja
expectativa de vida é de 75 anos, a China tem dominado a cena do comé rcio internacional, particularmente nas ú ltimas duas
dé cadas.

Ainda segundo dados do Banco Mundial, o crescimento anual do PIB chinê s dá uma dimensã o clara do fenô meno da
desaceleraçã o. Em 2010, a economia chinesa cresceu 10,5% em relaçã o ao ano anterior; em 2011, 9,3%; em 2012, 7,7%; em
2013, novamente 7,7%. No ano passado, a estimativa foi de um crescimento de 7,4% do Produto [Interno Bruto], com
perspectivas menores para os anos subsequentes: 7,1% em 2015, 7% em 2016 e 6,9% em 2017.

Uma chave para entender o problema está na balança comercial chinesa. Em novembro do ano passado, as exportaçõ es
chinesas subiram 4,7%, enquanto as importaçõ es caíram 6,7%. Ainda assim, os nú meros deixaram o país com superá vit
recorde de US$ 54,5 bilhõ es.

O detalhe é que os remé dios usados para suavizar a contraçã o nas importaçõ es chinesas parecem até aqui ineficazes. Apó s
afirmar publicamente por meses que a China nã o precisava de nenhum grande estímulo econô mico, o banco central do país
surpreendeu ao cortar os juros em novembro em 0,25 ponto percentual, para 4,35%. A medida tomada à é poca foi uma
tentativa de suavizar o resultado trimestral do PIB naquele momento, 6,9% no trimestre, a expansã o trimestral mais fraca
desde 2009, no auge da crise financeira.

Brasil
A desaceleraçã o chinesa nã o exclui o Brasil. Em 2014 as exportaçõ es do país à China somaram US$ 40,6 bilhõ es,
representando um declínio de 12% em comparaçã o com o ano de 2013. Já as importaçõ es da China para cá totalizaram US$
37,3 bilhõ es, refletindo um pequeno aumento de 0,1%. Com estes resultados, o saldo da balança comercial entre os dois
países fechou o ano de 2014 com US$ 3,2 bilhõ es favorá veis ao Brasil.

O Brasil exporta aos chineses principalmente soja, miné rio de ferro e ó leos brutos de petró leo, que, somados, representam
79,8% da pauta. E importa má quinas e aparelhos elé tricos e mecâ nicos, que, somados, corresponderam a 48,4% do
montante da pauta.

O miné rio de ferro é um capítulo à parte, cujo sinô nimo no Brasil é a Vale, maior exportadora do produto à China. Os ú ltimos
dados disponíveis mostram que a China respondeu por 51,6% das vendas de miné rio de ferro da Vale no segundo trimestre
de 2014, que somaram 83,642 milhõ es de toneladas no período. A Á sia foi destino de 66,4% das vendas no segundo
trimestre da mineradora.

Um outro setor que merece ressalva é o de veículos automó veis, tratores, ciclos e suas partes, apresentou, também, um
declínio em dó lares de 3,1% em 2014. Entre os produtos desta categoria, cabe ressaltar a forte diminuiçã o nas importaçõ es
de automó veis de passageiros e veículos automó veis para usos especiais, que encerraram o ano com quedas, em dó lares, de
35,7% e 35,1%, respectivamente.

DIAS, Carlos. Por que o mundo tem medo da desaceleraçã o chinesa? IstoÉ Dinheiro, Online, 4 jan. 2016. Disponível em:
<http://www.istoedinheiro.com.br/noticias/economia/20160104/por-que-mundo-tem-medo-desaceleracao-chinesa/330888>. Acesso em: 13 abr. 2016.
Pá gina 136

Rússia, Japão e Índia:


CAPÍTULO 7 -
potências distintas

Cré dito do infográ fico: Casa Paulistana

Fonte: SIPRI - Stockholm International Peace Research Institute. Disponível em:


<http://www.sipri.org/yearbook/2015/11>. Acesso em: 11 jan. 2016.

Ponto de partida
ESCREVA NO CADERNO

• Em sua opiniã o, por que Rú ssia, Japã o e Índia sã o potências distintas?


Pá gina 137

Tópicos do capítulo

A evolução política da URSS

Rússia: herdeira da União Soviética

Japão: da gênese do Estado aos dias atuais

Índia: demografia, política e economia


Pá gina 138

1. Começo, meio e fim da URSS


A Uniã o Soviética foi uma superpotência e rivalizou com os Estados Unidos durante a Guerra Fria.
Porém, a Rú ssia, sua sucessora, nã o apresenta o mesmo status e convive com instabilidades. Sua
importâ ncia nas relaçõ es internacionais deve-se ao seu poderio militar e ao assento permanente no
Conselho de Segurança da ONU.

A Uniã o das Repú blicas Socialistas Soviéticas (URSS) foi oficialmente extinta em dezembro de 1991.
Em seu lugar, criaram-se novos países e redesenharam-se fronteiras, porém o espaço outrora
ocupado pela poderosa Uniã o Soviética ainda guarda as marcas de um longo passado comum entre
esses novos Estados e a Rú ssia, também denominada Federaçã o Russa, que tenta a todo custo
mantê-los sob sua esfera de influência geopolítica, mas assiste incomodada à penetraçã o
estadunidense, chinesa e até europeia.

Ver
Dr. Jivago. Direção: David Lean. Estados Unidos, 1965.
Filme produzido pelo cinema estadunidense no auge da Guerra Fria e que mostra uma visã o contrá ria à Revoluçã o
Bolchevique de 1917.

1.1 Início
O surgimento da URSS em 1922 foi uma consequência direta da Revoluçã o Russa de 1917, também
chamada de Revoluçã o Bolchevique. Em fevereiro desse ano, os mencheviques (minoria), ala
moderada dos revolucioná rios, derrubaram o czarismo, mas nã o obtiveram êxito em seu projeto
político, que se baseava na construçã o de uma nova Rú ssia com administraçã o burguesa, como uma
etapa de transiçã o para alcançar o socialismo num futuro pró ximo.

Os bolcheviques, ala mais arraigada à ortodoxia marxista, eram opositores a essa perspectiva e
defendiam que o poder deveria ser exercido diretamente pelos trabalhadores. Eram liderados por
Vladimir Ilich Ulianov, conhecido por Lênin, e eram organizados por meio dos soviets (comitês).

Os bolcheviques tomaram o poder dos mencheviques em outubro de 1917, consolidando-se como


os vencedores da Revoluçã o Russa. O Partido Bolchevique, depois rebatizado como Partido
Comunista, assumiu definitivamente o poder; surgia o primeiro país socialista da histó ria.

Sob a liderança de Lênin e tendo o marxismo como norte ideoló gico, as diretrizes clá ssicas do
socialismo foram introduzidas na Rú ssia: estatizaçã o total; planificaçã o econô mica e adoçã o dos
planos quinquenais; coletivizaçã o das terras com a formaçã o de kolkhozes (cooperativas agrícolas)
e sovkhozes (fazendas do governo); entre outras medidas socialistas. Em 1922, Lênin incorporou as
repú blicas em torno da Rú ssia estabelecida desde o período czarista e formou a Uniã o das
Repú blicas Socialistas Soviéticas (URSS).

Com a morte de Lênin, em 1924, teve início uma disputa entre dois outros importantes líderes da
Revoluçã o Russa: Josef Stá lin e Leon Tró tski, que tinham perspectivas marxistas divergentes.
Tornaram-se inimigos e Stá lin venceu a disputa interna pelo poder do aparelho comunista.

Uma vez no poder, Stá lin tornou-se absoluto, centralizador e totalitá rio. Iniciou uma perseguiçã o a
seus opositores, especialmente a partir da instalaçã o dos Processos de Moscou. Líderes políticos,
intelectuais, membros do Partido Comunista e qualquer pessoa que fosse identificada como
“inimiga da revoluçã o”, entre elas camponeses que recusavam a estatizaçã o da terra, foram presos,
exilados ou executados. Milhares de pessoas foram mortas por serem consideradas opositoras ao
regime. Incluem-se nessa lista Leon Tró tski, que, temendo a perseguiçã o, exilou-se no México, mas
foi assassinado por um agente russo, em 1940, a mando de Stá lin.

Czarismo: Tipo de monarquia que vigorou por séculos na Rú ssia até a derrubada do ú ltimo czar, Nicolau II, da Dinastia Romanov,
em fevereiro de 1917. Czar é o mesmo que “imperador”. No Império russo, o czar era o chefe de Estado e da Igreja ortodoxa.

Processos de Moscou: Julgamento e execuçã o sumá ria durante os anos 1930 de pessoas que eram tachadas de opositores do
regime, acusadas de conspiração ou subversão.

Biblioteca do Congresso, Washington D.C.

Biblioteca do Congresso, Washington D.C.

Do czarismo de Nicolau II (à esquerda) à repú blica socialista de Lê nin (à direita), a Rú ssia mudou drasticamente sua histó ria
no início do sé culo XX.
Pá gina 139

Apesar dos métodos questioná veis, é sob a liderança de Stá lin que o país passou pelo grande
desenvolvimento industrial ao longo das décadas de 1930 e 1940, convertendo-se em
superpotência na nova ordem que se iniciaria na segunda metade do século XX.

No transcorrer da Segunda Guerra (1939-1945), Uniã o Soviética e Estados Unidos foram aliados
contra um inimigo comum: a Alemanha liderada por Adolf Hitler. Mas se sabia que essa era uma
aliança circunstancial e, tã o logo findou a guerra, iniciou-se a intensa disputa que caracterizou a
Guerra Fria.

1.2 Auge
Durante a Guerra Fria, a Uniã o Soviética conheceu seus dias de gló ria e alçou a condiçã o de
superpotência, disputando a hegemonia mundial com os Estados Unidos. Neste período, a URSS
sediou os Jogos Olímpicos de 1980. Observe a fotografia ao lado.

No entanto, essa disputa trouxe consequências graves. Durante a segunda metade do século XX, a
Uniã o Soviética priorizou totalmente sua indú stria de base, pois ela produzia para o setor militar-
estratégico. Assim, indú strias dos setores siderú rgico, petroquímico, aeroespacial, militar, entre
outras, prosperavam e a URSS figurava entre os grandes produtores mundiais nessas á reas. Para
sustentar a posiçã o de superpotência, alguns segmentos foram negligenciados, tornando-se
extremamente defasados em relaçã o a outras á reas industrializadas do globo. Esses setores
estavam vinculados à indú stria de bens de consumo, que atende à demanda civil, e a Rú ssia sofre as
consequências até os dias de hoje.

Tony Duffy/Getty Images

Cerimô nia de abertura dos Jogos Olímpicos disputados na URSS, em 1980. Na arquibancada, a imagem de Lê nin; no
gramado, a foice e o martelo, símbolos do período sovié tico.
Allmaps

Fonte: CHALIAND, Gérard; RAGEAU, Jean-Pierre. Atlas estratégico y geopolítico: geopolítica de las relaciones de fuerza en el
mundo. Madrid: Alianza, 1997. p. 91.
Pá gina 140

O arsenal militar da URSS era suficiente para destruir vá rias vezes o mundo; seus satélites
orbitavam no espaço e suas aeronaves investigavam os céus; seu exército contava 1 milhã o de
soldados; e seu territó rio, de 22 milhõ es de quilô metros quadrados, era mais que o dobro do
segundo maior país do mundo, o Canadá .

Os problemas começaram a surgir nos anos 1980. Os setores industrial e agropecuá rio, sucateados
tecnologicamente, começaram a dar mostras de fragilidade. O custo de sustentaçã o do aparato
bélico e espacial, assim como o da pró pria máquina burocrá tica do Partido Comunista, era alto. As
interminá veis filas para adquirir gêneros bá sicos, a quase ausência de bens de consumo, como
eletrodomésticos, e a demora em responder a essa demanda fomentavam uma insatisfaçã o popular
que nã o tardaria a explodir.

Robert Maass/Corbis/Latinstock

Gorbachev, líder que mudou o final do sé culo XX, ao lado de uma reproduçã o da capa da revista Time, que o considerou o
Homem da Dé cada. Fotografia de 1990.

1.3 Fim
É nesse clima de crise já deflagrada, porém nã o anunciada, que, em 1985, Mikhail Gorbachev, um
dirigente reformulador, assume o governo. Rompendo com o tradicionalismo arcaico e com os
burocratas do Partido Comunista, Gorbachev logo enxergou que era preciso intervir imediatamente
no andamento estrutural do Estado, sob o risco de o país tornar-se totalmente obsoleto diante das
inovaçõ es tecnoló gicas em curso em outras partes do globo.

Para tirar a Uniã o Soviética do ostracismo tecnoló gico no qual se encontrava e para realizar aquilo
que denominou de “modernizaçã o do socialismo”, Gorbachev lançou mã o de duas revolucioná rias
medidas. No plano político, encaminhou um processo de abertura e democratizaçã o do país,
admitindo o pluripartidarismo, as eleiçõ es diretas, a abertura dos arquivos stalinistas, entre outras
iniciativas. Esse pacote de mudanças políticas recebeu o nome de Glasnost (transparência, em
russo).

No â mbito econô mico, Gorbachev entendeu que era preciso frear a indú stria bélica e transferir toda
a prioridade para o setor de bens de consumo. A essas reformas econô micas ele denominou
Perestroika (reestruturaçã o, em russo). Essas duas iniciativas mudariam o curso da histó ria da
Uniã o Soviética e do mundo.

Como essas medidas nã o atingiam apenas a Uniã o Soviética, mas todo o sistema internacional,
Gorbachev teve de dialogar com seu maior rival, os Estados Unidos. Esse país recebeu
positivamente as iniciativas, pois a Guerra Fria também era muito custosa a Washington, que
assistia de forma incomodada ao espetacular crescimento econô mico do Japã o, que estava à parte
da disputa hegemô nica, nã o tinha pesados gastos militares como os Estados Unidos e a URSS.
Portanto, Glasnost e Perestroika foram tanto medidas internas como externas.

Porém, nem tudo ocorreu como Gorbachev pretendia. No â mbito político, surgiram dois grupos de
oposiçã o que passaram a inviabilizar seu governo. De um lado, a ala stalinista boicotava Gorbachev,
acusando-o de irresponsá vel e de criar medidas incompatíveis com o modelo federativo e de
multinaçõ es que compunha a Uniã o Soviética. Na visã o desse grupo, era preciso interromper
imediatamente a Glasnost e a Perestroika e retomar o curso anterior, instituído desde 1922. Para
isso, era preciso destituir Gorbachev, fato que tentaram, mas fracassaram.

De outro lado, surgiram os ultrarreformistas, catalisados na figura de Boris Iéltsin. Eles viam em
Gorbachev um empecilho na aceleraçã o das reformas; acusavam-no exatamente do contrá rio que
faziam os conservadores: era muito lento nas transformaçõ es que exigia a Uniã o Soviética e,
igualmente, entendiam que era preciso se desfazer do presidente da federaçã o para impor um
ritmo mais acelerado à s mudanças.
Pá gina 141

E, assim, Gorbachev viu-se no meio de uma disputa antagô nica que engessou seu governo. Essa
situaçã o foi agravada pela crise econô mica que se seguiu e pela eclosã o de inú meras manifestaçõ es
populares que viam na aproximaçã o com o capitalismo a possibilidade de um futuro melhor. Outro
aspecto decisivo foi o estouro de uma crise separatista: pedidos de independência começaram a
surgir entre as repú blicas que compunham a Uniã o Soviética; as primeiras foram as repú blicas
bá lticas, Lituâ nia, Letô nia e Estô nia, e depois vieram outras. A Uniã o Soviética era composta de 15
repú blicas e dentro delas havia inú meras nacionalidades.

Assim, atestando uma indisfarçá vel situaçã o de ingovernabilidade diante dos imensos protestos e
problemas, Mikhail Gorbachev renunciou ao cargo de presidente em 25 de dezembro de 1991. Era o
fim da Uniã o Soviética.

Observe a fotografia abaixo, que retrata a sede do poder russo, e leia a seguir o texto de um
historiador brasileiro sobre a renú ncia de Gorbachev.

N.Chutchikov/Shutterstock.com

Kremlin, em Moscou, na Rú ssia, 2015. Construído na é poca dos czares, foi sede do poder da Uniã o Sovié tica e, nos dias de
hoje, da Rú ssia.

Ler
O fim da URSS, de Jacob Gorender. 11. ed. São Paulo: Atual, 2003.
O livro explica o apogeu e a desintegraçã o da Uniã o Soviética.

Enfoque
ESCREVA NO CADERNO

Fim da URSS e queda de Gorbachev


Do ponto de vista político-social, a vitó ria de Ié ltsin deu sinal verde à nova burguesia e aos adeptos em geral da substituiçã o
da economia e planejamento central por uma economia de mercado livre. Uma missã o do FMI se instalou em Moscou com a
tarefa de ajudar as autoridades e os economistas russos a preparar o caminho de implantaçã o da economia de mercado de
tipo capitalista.

Logo em seguida, as trê s repú blicas bálticas se declararam independentes e separadas da Uniã o Sovié tica. A iniciativa de
liquidaçã o da Uniã o Sovié tica partiu da Ucrâ nia. Com 603 mil km2 e 52 milhõ es de habitantes, a Ucrâ nia tem uma economia
industrial e agrícola equivalente a cerca de um quarto da economia total da antiga Uniã o Sovié tica. Em 1º de dezembro, os
eleitores da Ucrânia foram à s urnas e deram 90% dos votos a favor da separaçã o. A 9 de dezembro, numa reuniã o em Minsk,
os presidentes Boris Ié ltsin, da Rú ssia, Leonild Kravtchuk da Ucrâ nia e Stanislaw Shushkevitch da Bielo-Rú ssia assinaram
um documento conjunto no qual declaram que a URSS deixava de existir.

Ao mesmo tempo, anunciaram a criaçã o da Comunidade de Estados Independentes (CEI). A CEI nã o teria cará ter estatal,
nem poder supranacional. Seria apenas um ó rgã o para a realizaçã o de reuniõ es eventuais entre os representantes de cada
país associado. Aberta a adesõ es, à CEI se associaram as demais repú blicas que ainda integravam a ex-URSS, com exceçã o da
Geó rgia. Por conseguinte, um total de onze repú blicas.

Na noite de 25 de dezembro de 1991, em pronunciamento transmitido pela televisã o, Mikhail Gorbachev tornou pú blica a
renú ncia à presidê ncia da Uniã o Sovié tica, entidade já inexistente. A bandeira vermelha da foice e do martelo foi descida do
mastro do Kremlin, onde tremulou durante dezenas de anos e, ao seu lugar, subiu a bandeira tricolor da Rú ssia.

GORENDER, Jacob. O fim da URSS. Sã o Paulo: Atual, 1992. p. 97-98.

• Qual a relaçã o entre o fim da URSS e a "substituiçã o da economia e planejamento central por uma economia de
mercado livre"?
Pá gina 142

Apó s longa crise que atingiu a Rú ssia por toda década de 1990, fruto da turbulenta transiçã o de
uma engessada economia planificada para uma precipitada economia de mercado, o país viu sinais
de recuperaçã o no início do século XXI, já sob a presidência de Vladimir Putin. Parte dessa
recuperaçã o econô mica deveu-se à alta internacional do petró leo, commodity em que a Rú ssia é
muito rica e que se tornou o maior produto de exportaçã o do país. No entanto, tal qual muitos
países, sua economia foi atingida pela crise internacional de 2009. Até 2015, o país apresentava
dificuldades internas, como a desvalorizaçã o de sua moeda, o rublo, e sofria com a queda do preço
no mercado internacional de dois de seus principais produtos de exportaçã o, o petró leo e o gá s.

Os pró ximos anos dirã o se esse membro do Brics terá capacidade de reaçã o econô mica. É
imprescindível que a Rú ssia obtenha êxito na á rdua tarefa de transferir tecnologia do setor da
indú stria pesada para a indú stria de bens de consumo; esse é o grande desafio do país.

Interagindo

ESCREVA NO CADERNO

• A Rú ssia é a maior herdeira da Uniã o Soviética. Considere essa herança no campo territorial, político, militar e
social e faça uma comparaçã o entre a Uniã o Soviética do passado e a Rú ssia do presente. Discuta e compare sua
resposta com a de seus colegas.

2. Japão: potência econômica


Como China e Rú ssia, que estudamos anteriormente, o Japã o também apresenta uma histó ria de
fortes mudanças ao longo do século XX. De país quase colonizado pelos Estados Unidos, converteu-
se em potência imperialista até o desfecho da Segunda Guerra Mundial. Naquele momento, foi palco
de truculência bélica jamais vista: o lançamento de bombas atô micas sobre seu territó rio. Desde
entã o, o país renunciou à guerra e transformou-se numa das maiores potências econô micas do
mundo.

2.1 A gênese do Japão moderno


Desde o século XII até meados do século XIX, o Japã o esteve sob o sistema do xogunato, uma
espécie de “feudalismo japonês”, em que o poder era dividido em vá rios nú cleos e cada um era
liderado pelo xogum, chefe político e militar. Havia um imperador, mas ele estava vinculado à
liderança espiritual e era desprovido de poder político efetivo. Formalmente, os xoguns estavam
submetidos ao imperador, mas quem tinha o poder de fato era o patriarca do clã .

O mais importante xogum em oito séculos foi Ieyasu Tokugawa, que unificou os demais clã s e deu
corpo de Estado ao Japã o no século XVI: iniciava-se a Era Tokugawa, que durou dois séculos e meio
e caracterizou-se pelo isolacionismo total em relaçã o ao resto do mundo; nem sequer trocas
comerciais o Japã o realizava – era um sistema fechado.

Esse isolamento foi quebrado em 1853, quando as canhoneiras do navio estadunidense


Commodore Perry bombardearam o Japã o e, invadindo a baía de Tó quio, impuseram um tratado
que anunciava a chegada do imperialismo estadunidense.

Nesse momento da histó ria japonesa, havia um grande descontentamento popular no país por
causa da cobrança de altos impostos. Os populares desejavam a restituiçã o do poder total ao
imperador, pois temiam a submissã o ao imperialismo. Os camponeses, os samurais e uma
embrioná ria classe liberal uniram-se para derrubar o xogunato. Esse período ficou conhecido como
Revoluçã o Meiji. Em 1867, os revoltosos venceram e entregaram o poder absoluto e supremo ao
imperador da Dinastia Meiji, o jovem Mutsuhito, de apenas 15 anos. Iniciar-se-ia uma
transformaçã o revolucioná ria no Japã o.

Samurai: A casta militar da sociedade do sistema xogunato.

Autor desconhecido. Séc. XVII. Coleçã o Particular

Imagem artística de Tokugawa, o xogum que deu forma de Estado ao Japã o.

Navegar
Fundação Japão <http://tub.im/a93453>
Fundaçã o vinculada ao Ministério das Relaçõ es Exteriores do Japã o, tem como missã o difundir a cultura japonesa.
Pá gina 143

Uma rápida modernizaçã o foi iniciada. Criou-se um sistema constitucional com os poderes
Executivo, Legislativo e Judiciá rio sob a égide do imperador e da cultura hierá rquica nipô nica: ele
era o á rbitro supremo de todos os poderes. A estrutura política e social do Japã o estava amparada
na imagem do imperador, à semelhança do pró prio Estado e sob um regime assumidamente
personalista e hereditá rio.

Criou-se também um sistema de ensino com ênfase na educaçã o, cultura que vem até os dias de
hoje. Foi estabelecido, em 1871, um atuante ministério da educaçã o. A industrializaçã o tomou conta
do país em inú meras regiõ es e o Japã o aderiu ao capitalismo nos moldes da cultura asiá tica,
pautado na disciplina e no má ximo respeito à s hierarquias. O que se via era um misto da cultura
ocidental com a oriental no capitalismo tardio, porém extremamente eficiente.

Introduziram-se na Era Meiji um moderno sistema bancá rio e financeiro, claramente inspirado no
modelo europeu, e a modernizaçã o dos meios de transporte.

Nesse contexto, a indú stria atingiu rapidamente o conjunto militar. A combinaçã o industrializaçã o-
militarizaçã o estimulou o país a dar passos maiores. O Japã o também iria candidatar-se ao posto de
potência imperialista, tendo bem delimitada a á rea à qual pretendia levar adiante seu incipiente
expansionismo: a Á sia.

Pauta musical
Do Japão, Gilberto Gil. Álbum: O eterno deus Mu dança. Warner Music, 1989.
Pauta: Cultura japonesa.

LP O eterno deus Mu dança. Gilberto Gil. Brasil, 1989

2.2 O imperialismo japonês


Apó s ter organizado uma infraestrutura industrial e militar em prazo recorde, o Japã o empreendeu
nos ú ltimos anos do século XIX e primeiros do XX duas guerras: contra China e Rú ssia,
respectivamente. Derrotou as duas e lhes tomou territó rios: Taiwan, da China, e as Ilhas Sakalinas,
antiga pendência com a Rú ssia no Pacífico norte. A vitó ria contra a Rú ssia em 1905 nã o deixou de
ser surpreendente, afinal esse país era uma das potências à época, enquanto o Japã o era um jovem
Estado recém-reorganizado. O êxito japonês nessas duas guerras marcou o início de seu
imperialismo. Em seguida, invadiu a Coreia (1910) e participou da Primeira Guerra Mundial, ao
lado dos aliados contra os alemã es. Foi contemplado na partilha do pó s-guerra com algumas ilhas
no Pacífico.

A fase mais agressiva do imperialismo japonês deu-se sob o período de Hiroito, que assumira em
1926. Em 1931 ocorreu uma nova e violenta invasã o à Manchú ria, regiã o chinesa que o Japã o
unilateralmente declarou sob sua soberania, fundando a repú blica de Manchukuo, uma base militar
criada para estender o imenso império nipô nico sobre a Á sia. Essa invasã o à Manchú ria é motivo de
desavenças com a China até hoje. Convém ressaltar que a Manchú ria é rica em minérios, elementos
ausentes em territó rio japonês. O Japã o invadiu ainda a Indonésia, a Malá sia, as Filipinas e a
Península da Indochina; parte dessas invasõ es deu-se sob a Segunda Guerra Mundial, que explodiu
em meio ao expansionismo japonês. Observe o mapa ao lado.
Enquanto a Segunda Guerra assistia nos arredores da Europa a um confronto entre Alemanha
versus França, Inglaterra e Rú ssia, no Pacífico a contenda era entre Japã o e Estados Unidos, pela
hegemonia nos territó rios banhados pelo oceano.

Allmaps

Fonte: CHALIAND, Gérard; RAGEAU, Jean-Pierre. Atlas estratégico y geopolítico: geopolítica de las relaciones de fuerza en el
mundo. Madrid: Alianza, 1997. p. 37.
Pá gina 144

Seguro de seu bom desempenho, em 1941 o Japã o atacou a base militar estadunidense de Pearl
Harbour, no Havaí, forçando a entrada dos Estados Unidos na guerra. A partir de 1943, no entanto,
ataques fulminantes e ininterruptos da potência ocidental foram minando a resistência nipô nica até
o fatídico agosto de 1945, quando foram lançadas sobre Hiroshima, no dia 6, e em Nagasaki, três
dias depois, duas bombas atô micas. Saldo: 200 mil mortes, milhares de feridos e contaminados pela
radiatividade. Terminava ali o expansionismo japonês.

Navegar
Embaixada do Japão no Brasil <http://tub.im/pag6fs>
O site da embaixada do Japã o no Brasil divulga importantes notícias sobre a política externa japonesa.

A Geografia na... história em quadrinhos!


ESCREVA NO CADERNO

O mangá Gen: pés descalços, do quadrinista japonês Keiji Nakazawa – vítima, em 1945, da bomba de Hiroshima,
onde vivia – é um clássico mundial. Nakazawa perdeu pai, irmã os e irmã s no ataque e manifestou sua dor nessa obra
que ganhou o mundo, sendo traduzida para vá rios idiomas. Ele e sua mã e sobreviveram à bomba, mas
desenvolveram câ ncer. Quando sua mã e morreu, em 1966, Nakazawa desabafou: "Quando o corpo dela foi cremado,
nã o sobraram seus ossos. Geralmente, eles resistem à cremaçã o, mas o césio tinha devorado seu esqueleto. O ó dio
ferveu dentro de mim".

Foi apó s esse episó dio que surgiu o clá ssico Gen, quase uma autobiografia. Veja um fragmento ao lado.

• Nos dias de hoje, existe a possibilidade de a realidade retratada na tira se repetir? Se sim, quais seriam os países
que poderiam fazê-lo? O que você pensa sobre o possível uso de armas nucleares?

Keiji Nakazawa
2.3 O Japão no pós-guerra
A rendiçã o japonesa fora anunciada em rede nacional por um Hiroito humilhado e bastante solícito
à s exigências dos vencedores. O anú ncio se dera dentro de uma fragata dos Estados Unidos,
ancorada no litoral japonês. Em troca da colaboraçã o, Hiroito manteve o trono, mas perderia o
poder; a monarquia japonesa se tornaria meramente decorativa. O imperador também renunciou à
divindade.

Em seguida, as forças comandadas pelo general estadunidense McArthur ocuparam o Japã o e


mantiveram-se ali até 1952. Nesse período o país passou por uma adaptaçã o à s condiçõ es do
Ocidente.

O Japã o foi democratizado. Redigiu-se nova constituiçã o inspirada na estadunidense e criaram-se


partidos políticos. O regime passou à monarquia parlamentar e eleiçõ es regulares começaram a
fazer parte da vida dos japoneses. Há pontos marcantes que foram inseridos na constituiçã o
japonesa, como a renú ncia constitucional à guerra e a limitaçã o em investimentos militares.
Também foi realizada uma reforma agrá ria.
Pá gina 145

Durante a Era Meiji, o desenvolvimento industrial japonês foi monopolizado pelos zaibatsu,
grandes conglomerados privados familiares que estavam à frente do processo desenvolvimentista
do Japã o. Eles eram poucos e fortes, um claro sistema oligopolístico. Os zaibatsu foram dissolvidos
apó s a Segunda Guerra Mundial, mas continuaram a existir na forma de seus sucessores, os
keiretsu, também conglomerados oligopolísticos, porém nã o mais da forma anterior, quando foram
criados de forma indissociá vel ao pró prio Estado.

O fato de o Japã o renunciar oficialmente à guerra e de limitar em apenas 1% do PIB os


investimentos militares nã o quer dizer que nã o invista em defesa. Pelo contrá rio, é um dos países
que mais empregam recursos em todo o mundo no campo militar.

No novo ordenamento geopolítico que se desenhava apó s 1945, o Japã o alinhou-se politicamente
aos Estados Unidos de forma incondicional.

Ver
Rapsódia em agosto. Direção: Akira Kurosawa. Japão, 1991.
O filme mostra as feridas abertas entre Estados Unidos e Japã o desde a bomba de Hiroshima.

Filme de Akira Kurosawa. Rapsó dia em agosto. Japã o, 1991

2.4 A reconstrução
A reconstruçã o econô mica japonesa foi um fenô meno: em 20 anos o país arrasado pela guerra alçou
a posiçã o de segunda maior economia do mundo; esse processo ficou conhecido como o “milagre
japonês”. A doutrina econô mica que orientou essa reconstruçã o foi o liberalismo clá ssico, com o
país apostando todas as fichas na agressiva exportaçã o, política que resultou numa ampla rede de
parceiros comerciais em todos os continentes, conforme demonstrado no mapa a seguir.
Allmaps

Fonte: GRESH, A. et al. (Dir.). Atlas da globalização Le Monde diplomatique. Lisboa: Campo da Comunicaçã o, 2003. p. 153.

Nos primeiros anos da retomada, o Japã o contou com investimentos estadunidenses, pois a
potência tinha muitos interesses no país. Em 1951, foi lançado o Plano Colombo, programa de
auxílio à reorganizaçã o social e estímulo ao desenvolvimento econô mico para os países do sul e
sudeste da Á sia.
Pá gina 146

O programa contava com forte auxílio financeiro dos Estados Unidos e o Japã o era um dos países
beneficiados. O país fazia parte da geoestratégia estadunidense de contençã o do inimigo soviético,
especialmente pela sua localizaçã o. Bases e dezenas de milhares de marines foram alocados ao
redor do arquipélago japonês, onde estã o até hoje. No â mbito econô mico, o Japã o também tinha
atrativos: contava com um imenso mercado consumidor e era detentor de mã o de obra
privilegiada: qualificada, numerosa, disciplinada e barata.

No processo de reorganizaçã o econô mica, o Japã o refez sua indú stria de base, tornando-a a maior
do mundo. Incorporou e aperfeiçoou a tecnologia ocidental, optando por uma política de câ mbio
fixo, mantendo a moeda japonesa, o iene, desvalorizado para facilitar as exportaçõ es.

Com as medidas e as opçõ es econô micas tomadas, o Japã o atingiu um ritmo impressionante de
crescimento econô mico e o manteve por bastante tempo em torno de 9% ao ano. Assim, em meados
da segunda metade do século XX, ocupava a posiçã o de segunda força da economia mundial.

O sucesso econô mico japonês coincidiu com a Guerra Fria. Impedido de participar das questõ es
estratégicas globais, o país apostou tudo na competitividade e na tecnologia, o que incomodou os
Estados Unidos, alvo preferido do Japã o na agressiva política de conquista de mercados externos.
Observe, no mapa abaixo, a cartografia das disputas japonesas e americanas para conseguir êxito
comercial em países banhados pelo oceano Pacífico. O que se viu durante as décadas de 1970, 1980
e 1990 foi uma invasã o de produtos japoneses no mercado estadunidense.

Porém, parece ter sido sintomá tico o fim da Guerra Fria e o início de dias difíceis para os japoneses.
Em 1991, o país mergulhou em uma crise econô mica sem precedentes, que, embora com certa
recuperaçã o, estende-se até os dias atuais.

Marines: Corpo de fuzileiros navais dos Estados Unidos.

Câmbio fixo: Câ mbio é uma operação financeira baseada em vender ou trocar moedas de outros países. Essencialmente, há dois
tipos de controle cambial: fixo e flutuante. O câ mbio fixo tem a intervençã o das autoridades monetá rias, que estabelecem um valor de
troca; no flutuante, a moeda oscila de acordo com a dinâ mica dos mercados.
Allmaps

Fonte: VÉ DRINE, Hubert; BONIFACE, Pascal. Atlas do mundo global. Sã o Paulo: Estaçã o Liberdade, 2009. p. 100. Apesar de
alinhados politicamente, Estados Unidos e Japã o travaram acirrada disputa comercial ao longo das dé cadas de 1970 e 1980.
Pá gina 147

3. Índia: potência econômica, atômica e demográfica


A Índia é um país emergente e um dos componentes do Brics. No esteio chinês, apresentou um dos
melhores desempenhos econô micos em todo o mundo nos ú ltimos anos. Com esse ritmo,
provavelmente vai figurar entre as cinco maiores economias mundiais nos pró ximos dez anos. Deve
converter-se também no mais populoso país nas duas pró ximas décadas. Além disso, é um dos
raros detentores da bomba atô mica. Tudo isso credencia o país a um papel de destaque no plano
das relaçõ es internacionais. Observe a localizaçã o e a divisã o política da Índia no mapa ao lado.

3.1 O peso demográfico e a geopolítica interna


Com 1,2 bilhã o de habitantes e ainda contando com alto crescimento demográ fico (em torno de
1,3% em 2015), a Índia deverá superar a China em nú mero absoluto de habitantes nos pró ximos 20
anos. A campanha de controle da natalidade conduzida pelo governo desde o início dos anos 1950,
sugerindo apenas dois filhos por casal, nã o obteve êxito. A demografia indiana assume proporçõ es
preocupantes, nã o apenas pelo nú mero absoluto, mas pelas precariedades sociais que caracterizam
esse país de contrastes.

Semelhante ao Brasil em vá rios aspectos geográ ficos, a desigualdade é característica marcante. Mas,
ao contrá rio de nosso país, a desigualdade indiana tem origem religiosa e está arraigada em valores
difundidos pelo hinduísmo. Essa religiã o propõ e uma sociedade estamental, hierarquizada e
fechada, pautada nas castas, que estabelecem os grupos e a organizaçã o social. O sistema de
castas foi oficialmente abolido pelo governo indiano, mas a cultura prevalece sobre ditos oficiais e
os hinduístas seguem atrelados a ela.

O bramanismo, a doutrina hinduísta, estabelece quatro castas principais com base no corpo do deus
Brahma. No topo da pirâ mide social estã o os brâmanes, de origem nobre e sacerdotal, que se
originaram da cabeça de Brahma. Logo abaixo vêm os xátrias, oriundos dos braços e descendentes
de antigos guerreiros, a casta militar. Os vaixás, que provêm das pernas, compõ em a classe dos
comerciantes e dos agricultores; e os sudras, que descendem de antigos escravos e vieram dos pés.
A maior parte da populaçã o, no entanto, é composta dos párias, também chamados de dalits ou
intocáveis. Sem uma casta definida, eles estã o à margem da sociedade e ocupam-se das funçõ es
mais desqualificadas; eles estariam abaixo dos pés, ou seja, sã o o pró prio pó . Existem ainda
inú meras outras castas derivadas dessas e que compõ em subgrupos. A colocaçã o social através das
castas está ligada à crença hindu da reencarnaçã o, o eterno retorno da alma à vida.
Allmaps

Fontes: ATLAS geográ fico escolar. 6. ed. Rio de Janeiro: IBGE, 2012. p. 47; MAPS OF INDIA. India political map, 2011. Disponível em:
<http://www.mapsofindia.com/culture/indian-languages.html>. Acesso em: 5 jan. 2016.

Ver
Um casamento à indiana. Direção: Mira Nair. Índia, 2001.
A partir da narrativa de uma festa de casamento, o filme explora características sociais da Índia.

Filme de Mira Nair. Um casamento à indiana. Índia, 2001


Pá gina 148

De acordo com essa crença, os que se situam nas castas inferiores estã o ali por terem cometido
erros em vidas passadas e devem se recolher à sua situaçã o social, se abstendo de melhorá -la. A
organizaçã o social é rigidamente hierarquizada há mais de 4 mil anos; e os excluídos se conformam
com essa condiçã o, se sujeitando aos piores trabalhos e atividades, como um acaso divino. Situaçã o
ainda mais difícil é a vivida pelas mulheres das castas socialmente mais baixas. As dalits ficam com
as atividades de trabalho mais desvalorizadas e insalubres na luta pela sobrevivência. Observe a
imagem a seguir.

Tsering Topgyal/AP/Glow Images

Dalits, em Nova Dé lhi, Índia, 2013.

A populaçã o indiana é marcada pela diversidade linguística. Somam-se ao menos 22 línguas


reconhecidas e centenas de dialetos, mas esses nú meros variam tanto diante da falta de consenso
quanto ao reconhecimento linguístico. O mapa ao lado apresenta a principal língua adotada em
cada estado da Índia. Essa diversidade descende basicamente de dois troncos étnico-linguísticos
principais: o ariano, de onde surgiu o tronco indo-europeu, e o dravídico. A língua mais falada é o
híndi, mas o inglês também é reconhecido como língua oficial. A constituiçã o indiana aceita e
estabelece línguas oficiais distintas aos estados, já que, apesar de maioria, o híndi nã o se firmou
como língua nacional diante da resistência das demais.

Na Índia, há também a diversidade religiosa, que traz tensã o ao país. A maioria das pessoas, 73% da
populaçã o, é hinduísta. Há também uma minoria muçulmana (13%) e ainda 5% de cristã os, 2% de
sikhs, além de outras minorias.
Allmaps

Fonte: MAPS OF INDIA. India political map, 2011. Disponível em: <http://www.mapsofindia.com/culture/indianlanguages.html>.
Acesso em: 5 jan. 2016.

A convivência entre essas religiõ es é bastante tensa e fator de instabilidade constante, particular-
Pá gina 149

mente entre hinduístas e muçulmanos. A diversidade cultural tem fomentado uma rivalidade
praticamente irreversível e que se coloca como o grande desafio indiano em busca da estabilidade.
A maior consequência dessa realidade é uma infinidade de conflitos regionais e movimentos
separatistas.

No norte do país está a Caxemira, habitada majoritariamente por muçulmanos que nã o se


identificam com a Índia hinduísta e reivindicam a separaçã o para pertencer ao Paquistã o, simpá tico
ao movimento separatista. A Caxemira é motivo de discó rdia entre os dois países, que já travaram
três guerras ao longo da segunda metade do século XX, antes de possuírem as armas atô micas que
agora detêm: a Índia, desde 1974; o Paquistã o, desde 1998.

Também na fronteira com o Paquistã o, pouco mais ao sul, há outro foco separatista: o Punjab,
regiã o habitada por sikhs, que reivindicam a independência. Observe, no mapa a seguir, os
principais focos separatistas na Índia. O separatismo é violento e já vitimou a primeira-ministra
indiana Indira Gandhi. Veja o texto na pá gina a seguir, que noticiou o fato em 1984.

Allmaps

Fonte: ÍSOLA, Leda; CALDINI, Vera. Atlas geográfico Saraiva. Sã o Paulo: Saraiva, 2005. p. 97.
A regiã o da Caxemira é compartilhada pela Índia, pelo Paquistã o e, em menor parte, pela China. É um ponto que causa
tensã o, uma vez que os trê s países sã o detentores da bomba atô mica.
Pá gina 150

Ver
Gandhi. Direção: Richard Attenborough. Inglaterra/Índia, 1982.
O filme mostra a liderança de Gandhi na independência da Índia.

Filme Gandhi. Richard Attenborough. Inglaterra/Índia. 1982

Enfoque
ESCREVA NO CADERNO

Assassinato de Indira agita a Índia

A primeira-ministra indiana Indira Gandhi foi assassinada a tiros, na manhã de ontem [31 de outubro de 1984], em Nova
Déli, diante da residê ncia governamental, por dois agentes de sua pró pria guarda de segurança. Os assassinos – um deles
servia há dez anos na segurança da primeira-ministra – pertenciam à seita sikh e foram mortos por outros agentes. Apó s o
anú ncio do atentado, os sikhs foram caçados nas ruas das principais cidades do país por multidõ es que incendiaram lojas e
restaurantes. Uma pessoa morreu e centenas ficaram feridas. Rajiv Gandhi, filho de Indira, assumiu a chefia do governo.

Como o Mahatma Gandhi, em 1948, Indira foi assassinada num jardim. Ela saía de casa para dar uma entrevista ao ator
inglê s Peter Ustinov, quando um dos guardas disparou à queima-roupa em seu peito. “Ela tropeçou e caiu”, relatou Sharda
Prasad, seu secretá rio de imprensa. O segundo guarda descarregou entã o sua submetralhadora contra a primeira-ministra. A
agê ncia Associated Press recebeu telefonema anô nimo informando que o atentado fora uma vingança contra a sangrenta
invasã o, ordenada por Indira em junho, do Templo Dourado de Amritsar, quando morreram 800 sikhs.

Em todo o mundo, as reaçõ es à tragé dia foram de pesar, condenaçã o e indignaçã o. O [entã o] presidente norte-americano,
Ronald Reagan, acentuou que “este crime insensato é uma vívida recordaçã o da ameaça terrorista que todos nó s
enfrentamos”. Em Moscou, a agência Tass acusou a CIA norte-americana de estar implicada no atentado. Washington reagiu,
classificando a acusaçã o de “repugnante e irresponsá vel”. No Vaticano, o Papa fez uma veemente condenaçã o do terrorismo.
Em Brasília, o [entã o] presidente Figueiredo decretou luto oficial de trê s dias.

O corpo de Indira Gandhi ficará exposto à visitaçã o pú blica até sá bado, quando será cremado, numa praça da capital,
segundo a tradiçã o hindu.

ASSASSINATO de Indira agita a Índia. Folha de S.Paulo, 1º nov. 1984. Disponível em: <http://almanaque.folha.uol.com.br/mundo_01nov1984.htm>. Acesso em: 5 jan. 2016.

Mahatma Gandhi: Líder espiritual e político indiano que pregava a tolerâ ncia e convivência harmoniosa entre hinduístas e
muçulmanos.

• Esse tipo de conflito étnico-religioso nã o faz parte do cená rio social e político brasileiro; dessa forma, notícias como
a retratada no texto podem causar estranhamento. Analise e compare os tipos de violência que ocorrem no Brasil
com esse retratado no texto.

Navegar
Embaixada da Índia <http://tub.im/nso2m2>
O site da embaixada indiana no Brasil apresenta informaçõ es e notícias sobre a Índia.
Wally McNamee/Corbis/Latinstock

Encontro entre Indira Gandhi e o entã o presidente dos Estados Unidos, Richard Nixon, em Washington, em 1971.

O novo primeiro-ministro anunciado na matéria acima, Rajiv Gandhi, assim como a mã e, seria
assassinado em 1991, em atentado terrorista cometido por outro grupo separatista: os Tigres
Tâ meis. O separatismo tâ mil ocorre ao norte da ilha de Sri Lanka, vizinha à Índia, mas parte da
populaçã o indiana do sul é de origem tâ mil e o país envolveu-se na questã o durante os anos 1980. O
Sri Lanka é composto basicamente de duas etnias rivais: os cingaleses e os tâ meis. O governo de
Nova Délhi apoia o governo cingalês e, em troca, recebe o ó dio tâ mil.
Pá gina 151

No leste-nordeste do país, no Assam, há outros focos separatistas, tendo como protagonista a


Frente Unida de Libertaçã o do Assam (Ulfa, em inglês), grupo surgido nos anos 1970 e que
frequentemente realiza atentados terroristas. Sua bandeira é a independência dos assameses. Além
da Ulfa, apenas na regiã o nordeste, existem cerca de 20 grupos extremistas que lutam pela
independência de outras unidades indianas.

Como vimos, manter a integridade territorial diante de tantas reivindicaçõ es separatistas tem sido
um grande mérito da Índia, que, apesar desse cená rio de tensã o nacional e territorial, configura-se
como a maior democracia do mundo, realizando eleiçõ es regulares, tanto nacional como regional. O
país tenta combater os focos separatistas pelo caminho da democracia: em vez de nã o reconhecer
as identidades nacionais, respeita-as e lhes concede o má ximo de autonomia possível. Mas nã o
aceita a separaçã o de nenhuma delas. Da autonomia à independência há uma grande distâ ncia
política.

Dependendo da regiã o, esses focos separatistas têm tanto bandeira religiosa como linguística.

Conversando com a... Filosofia!


ESCREVA NO CADERNO

O sagrado, o profano e a geopolítica

A Filosofia difere da Teologia quanto ao método, às perspectivas e ao objeto. Contudo, nas humanidades a discussã o
religiosa está frequentemente presente. Na Geografia isso é particularmente notado na aná lise dos conflitos
territoriais, muitas vezes impregnados de religiosidade, como sã o os que se passam na Índia, no Paquistã o e em
Bangladesh, por exemplo.

Logo apó s a independência, em 1947, o Império Britâ nico da Índia (Raj Britâ nico) fragmentou-se primeiramente em
dois, depois em três novos Estados: Índia, Paquistã o e Bangladesh. O ingrediente religioso foi determinante nessa
reorganizaçã o territorial que originou novos Estados. A intolerâ ncia religiosa levou ao assassinato de Mahatma
Gandhi, em 1948, por um fundamentalista de sua pró pria seita. Igualmente motivada pela religiã o, verificou-se o
maior fluxo migrató rio da histó ria: hinduístas migravam do novo Paquistã o para a Índia e muçulmanos faziam o
caminho contrá rio.

Allmaps

Fonte: DURAND, Marie-Françoise; COPINSCHI, Philippe; MARTIN, Benoît; PLACIDI, Dephine. Atlas da mundialização. Sã o Paulo:
Saraiva, 2009. p. 136.
Índia, Paquistã o e Bangladesh formaram, um dia, uma só unidade.

1. Considerando o mapa acima, a questã o religiosa e alguns pressupostos da Filosofia, pesquise e discuta com os
colegas sobre a importâ ncia da religiã o nessa regiã o do globo e seu impacto sobre o territó rio.

2. Pesquise e discuta com seus colegas sobre a independência de Bangladesh e suas razõ es.

3. Apesar da distinçã o entre Teologia e Filosofia, sã o conhecidos filó sofos religiosos na histó ria da Filosofia. Procure
saber sobre o assunto e discorra, em poucas linhas, sobre os trabalhos desses filó sofos.
Pá gina 152

3.2 A pujante economia


Com um PIB em torno de 2 trilhõ es de dó lares, em 2014, a Índia inclui-se entre as dez maiores
economias do mundo, porém o elevado ritmo de crescimento econô mico provavelmente a colocará
entre as quatro ou cinco maiores num prazo curto. Economistas falam em 2025, mesmo ano que a
China assumiria a dianteira da economia mundial. Essas projeçõ es sã o feitas com base no ritmo de
crescimento que têm apresentado esses dois países, os dois de melhor desempenho nos ú ltimos
anos.

Em linhas gerais, podemos dividir a Índia em cinturõ es regionais que, genericamente, podem ser
identificados da seguinte maneira:

• Norte: cinturão agrícola – regiã o de grande produtividade agrícola, que faz da Índia um dos
maiores produtores mundiais, particularmente no Vale do Ganges. Representa 23% do PIB indiano.

• Leste: cinturão natural – regiã o com as principais riquezas naturais do país, tais como ferro,
manganês, carvã o e tó rio. Representa 18% do PIB.

• Oeste: cinturão financeiro – onde se localizam as principais instituiçõ es bancá rias e financeiras
do país. Responde por 27% do PIB.

• Sul: cinturão tecnológico – no entorno da regiã o de Bangalore, há os principais centros


tecnoló gicos indianos. Conhecido como o Vale do Silício Asiá tico, representa 27% do PIB.

• Centro: nã o há um cinturã o específico e é a regiã o de menor peso na economia do país. Compõ e


os restantes 5% do PIB indiano.

A Índia é uma potência agrícola, com grande produtividade em diversos gêneros. Destaca-se o
cultivo de jardinagem, especialmente no Vale do Ganges, uma das principais á reas agrícolas em
todo o mundo. Observe a fotografia a seguir. É grande produtora mundial de arroz, feijã o, trigo,
milho, algodã o, chá , tabaco e diversas frutas, como laranja, limã o, banana e mamã o. Nas á reas de
plantation, surge ainda a cana-de-açú car e a produçã o de borracha.

Ritesh Shukla/NurPhoto/ZUMA Wire/Easypix Brasil

Plantaçã o de arroz no Vale do rio Ganges, principal á rea agrícola da Índia, 2015.
A Índia possui o maior rebanho bovino do mundo, mas ressalte-se que, por crenças religiosas, sua
populaçã o nã o se alimenta desse tipo de carne; logo, o gado nã o é abatido. A produçã o de carne na
Índia, uma das maiores do mundo, está vinculada ao rebanho bubalino (bú falos asiá ticos).

Apesar de ser ainda um país com maioria da populaçã o rural (cerca de 65% está no campo), a Índia
é industrializada e já se configura como um grande destaque mundial em alguns setores, como o
siderú rgico, o farmacêutico e o têxtil. Mas o grande destaque da Índia nos ú ltimos anos tem sido no
setor tecnoló gico, e é de suma importâ ncia para isso a excelência acadêmica e científica que o país
alcançou nos ú ltimos anos, assim como grande nú mero de mã o de obra qualificada. O setor de
serviços na Índia acompanha o crescimento econô mico e já representa mais da metade do PIB do
país.

Jardinagem: Sistema de agricultura de subsistência asiá tico baseado em pequenas propriedades, grande nú mero de mã o de obra e
baixa mecanizaçã o, mas com forte produtividade.

Navegar
Consulado da Índia em Minas Gerais <http://tub.im/i3angi>
O portal do consulado apresenta informaçõ es sobre a economia indiana e suas relaçõ es comerciais com o Brasil.
Pá gina 153

A industrializaçã o indiana iniciou-se logo apó s a independência, nos anos 1950, e teve o Estado
como condutor do processo desenvolvimentista, com fortes aplicaçõ es governamentais em
indú strias de infraestrutura. Nesse período, os investimentos pú blicos respondiam por mais de
50% de todo o capital nacional e 90% dos novos projetos. O governo indiano também reduziu
drasticamente as importaçõ es e a prioridade era a busca da autossuficiência industrial.

Num está gio seguinte, que se deu ao longo dos anos 1980, a Índia introduziu um sistema de
licenciamento à s empresas estrangeiras que contava com maior participaçã o do capital privado na
vida econô mica do país, com a formaçã o de joint ventures de capital misto (pú blico e privado
estrangeiro). Também passou a importar máquinas e equipamentos, visando maior dinamizaçã o e
modernizaçã o de seu parque tecnoló gico.

A crise econô mica dos anos 1990 levou a Índia a realizar reformas econô micas e abrir-se à
importaçã o, quebrando o protecionismo inaugurado desde o início de sua industrializaçã o. Se, por
um lado, isso reduziu a participaçã o do capital nacional na economia, por outro, deu acesso a novas
tecnologias e mais competitividade a seus produtos. Foi nesse período que o país percebeu que
precisava modernizar-se para defender-se da ameaça chinesa com seus gêneros baratos que
invadiam os mercados mundiais.

No século XXI, a Índia assumiu definitivamente uma posiçã o de global player, participando da
competitividade mundial com papel de destaque. Iniciou-se um processo de aquisiçã o das empresas
estrangeiras pelas nacionais, atestando a solidez de seu desenvolvimento, conferindo identidade
global à s empresas indianas.

Com boa parte de sua mã o de obra qualificada (a Índia é o país que mais fornece engenheiros ao
mundo, por exemplo) e a alta competitividade que adquiriu, a Índia vai tornando-se
gradativamente uma força econô mica e referência na á rea tecnoló gica. O peso demográ fico e os
investimentos na educaçã o, na ciência e na tecnologia serã o componentes importantíssimos nos
pró ximos anos, pois a Índia tem alto percentual de jovens que, uma vez educados, formarã o os
profissionais qualificados do amanhã . Observe a fotografia a seguir.

No entanto, há sérios desafios sociais a serem superados, como a disparidade regional, a forte
concentraçã o de renda, o analfabetismo, que, somados aos violentos distú rbios separatistas,
representam ameaça à continuidade do desenvolvimento do país.

Global player: Designaçã o atribuída aos principais atores no cená rio geoeconô mico em escala global. Para ser considerado um
global player um país precisa ter economia fortalecida e muitas de suas empresas atuando com destaque no mercado global.
MANJUNATH KIRAN/AFP

Universitá rias programam um modelo de carro autô nomo durante um campeonato de robó tica, Bangalore, Índia, 2015. O
país está na vanguarda da informá tica.

Ler
Kim, de Rudyard Kipling. Belo Horizonte: Autêntica, 2014.
Por meio das aventuras do pequeno Kim, o autor retrata a Índia do começo do século XX e apresenta detalhes de sua
geografia.

Editora Autêntica
Pá gina 154

ROTEIRO DE ESTUDO
ESCREVA NO CADERNO

Revisando

1. A atualmente denominada Rú ssia já passou por profundas transformaçõ es territoriais e regimes


políticos. Em que momento histó rico ela deixou de ser monarquia para se tornar repú blica?

2. O surgimento da URSS em 1922 é uma consequência direta da Revoluçã o Russa de 1917, também
chamada de Revoluçã o Bolchevique. A qual período histó rico está vinculado o auge da Uniã o Soviética?

3. A Uniã o Soviética era composta de 15 repú blicas e dentro delas havia inú meras nacionalidades.
Aponte fatores que levaram à dissoluçã o da Uniã o Soviética.

4. A Rú ssia é herdeira da Uniã o Soviética. Dos 22 milhõ es de quilô metros quadrados que compuseram o
maior país que existiu até hoje, 17 milhõ es ficaram para a Rú ssia e os 5 milhõ es restantes para as demais
14 repú blicas. Compare a Rú ssia de hoje com a Uniã o Soviética de “ontem”.

5. O Japã o apresenta uma histó ria de fortes mudanças ao longo do século XX. De país quase colonizado
pelos Estados Unidos, converteu-se em potência imperialista até o desfecho da Segunda Guerra Mundial.
Muitos países asiá ticos guardam rancores histó ricos do Japã o. Por quê?

6. A doutrina econô mica que orientou a reconstruçã o do Japã o foi o liberalismo clá ssico, com o país
apostando todas as fichas na agressiva exportaçã o. O que foi o “milagre japonês”?

7. A Índia é um país emergente e um dos componentes do Brics. Por que consideramos esse país uma
potência emergente?

8. Quais sã o as perspectivas da Índia para os pró ximos anos e seu prová vel peso nas relaçõ es
internacionais?

9. Quais os maiores problemas enfrentados pela Índia para alcançar a estabilidade política?

Olhar cartográfico

O mapa a seguir mostra a distribuiçã o da taxa de fertilidade na Índia, por estado. Compare-o com as
informaçõ es sobre os cinturõ es regionais, apresentadas na pá gina 152. Analise a alta taxa de fertilidade
no norte da Índia e a taxa mais baixa no sul e relacione com as atividades econô micas desenvolvidas
nessas regiõ es.
DACOSTA MAPAS

Fonte: CENSUS OF INDIA. SRS Statistical Report 2013. p. 48. Disponível em:
<http://www.censusindia.gov.in/vital_statistics/SRS_Reports_2013.html>. Acesso em: 28 maio 2015.

*O Estado Telangana foi formado em junho de 2014.


Pá gina 155

Atividade em grupo

Neste capítulo, estudamos, entre outras coisas, as transformaçõ es na antiga Uniã o Soviética.
Anteriormente já havíamos estudado as transformaçõ es na China.

• Comparem as transformaçõ es histó ricas que sofreram esses dois países ao longo do século XX e
apontem possíveis causas do sucesso de um e fracasso do outro.

De olho na mídia

TEXTO 1

A matéria a seguir traz subsídios para melhor entendimento sobre o contexto da crise que assolou o
Japã o a partir de 1991.

Apó s a leitura do texto, responda:

1. Quais sã o as causas apontadas pelo texto para o início da crise econô mica no Japã o?

2. Por que a dívida pú blica japonesa é tã o alta? Procure saber se acontece o mesmo em outros países.

3. Que tipo de países tem dívida tã o alta?

Japão: início da crise econômica

[...]

Crise econômica – O Japã o enfrenta uma crise de grandes proporçõ es nos anos 1990. O crescimento da década
anterior – assentado na acelerada automaçã o da indú stria – levara os bancos a dispor de muitos recursos, que,
investidos no mercado imobiliá rio e na Bolsa de Tó quio, propiciam a supervalorizaçã o de ativos (imó veis, açõ es etc.)
conhecida como bolha especulativa. A crise eclode em 1991, quando os preços desses ativos desabam, dificultando o
pagamento dos empréstimos feitos. Sem conseguir receber os créditos, o setor bancá rio é o mais prejudicado. No
decorrer da década, o Produto Interno Bruto (PIB) japonês apresenta baixo crescimento. O país nã o acompanha a
revoluçã o tecnoló gica da informaçã o e das telecomunicaçõ es que leva à criaçã o de empresas gigantes nesse setor,
sobretudo nos EUA, na Coreia do Sul e em outros países do Sudeste Asiá tico. Em 1997, os efeitos da crise financeira
na regiã o se fazem sentir no Japã o, grande investidor nessas naçõ es.

[...]

À beira da recessão – O panorama econô mico se deteriora em 2001, com a queda das exportaçõ es e do consumo
interno e o aumento do desemprego, que chega, em meados de 2002, ao recorde de 5,7%. Com o país à beira da
recessã o, o PIB, em lugar de repetir a taxa de 1,7% de 2000, cai 0,4% em 2001 e 0,7% em 2002. Internamente, as
dificuldades sã o causadas porque o país sofre os efeitos dos sucessivos pacotes de estímulo à economia adotados na
década de 1990, que falharam na tentativa de reativar o desenvolvimento e aumentaram a dívida pú blica – 140% do
PIB, a mais alta entre os países industrializados. [...]

CONHEÇA o país – Japã o. Veja on-line. Disponível em: <http://veja.abril.com.br/idade/exclusivo/conheca_pais/japao/cronologia.html>. Acesso em: 12 jan. 2016.

TEXTO 2

O texto abaixo aborda o impacto da crise de 2008 no Bric: Brasil, Rú ssia, Índia e China (a Á frica do Sul foi
inserida em 2011, quando a sigla passou a ser Brics). Dois desses países foram discutidos nesse capítulo
e a China foi estudada no capítulo anterior.
• Leia o texto e aponte os diferentes reflexos da crise nesses três países e, depois, faça uma comparaçã o
com o Brasil.

Brasil foi o segundo país dos BRICs mais afetado pela crise, diz CNI

O setor industrial da Índia e da China não foi afetado, registrando crescimento de 14,7% e 24,3%, respectivamente.

A indú stria brasileira foi a segunda mais afetada pela crise econô mica internacional entre os quatro países dos BRICs
(Brasil, Rú ssia, Índia e China), com a queda na produçã o de 2,5% entre setembro de 2008, véspera do início da crise,
e junho ú ltimo. A Rú ssia foi a mais prejudicada, com o produto industrial decrescendo 32,1% no período, revela o
documento Indú stria Brasileira em Foco, divulgado pela Confederaçã o Nacional da Indú stria (CNI) nesta terça-feira,
31 de agosto.

De acordo com o documento, que compara o comportamento da indú stria nos países integrantes do BRIC diante da
crise econô mica internacional, o setor industrial da Índia e da China nã o foi afetado, registrando crescimento de
14,7% e 24,3% respectivamente. A CNI assinala, na nota, que tais desempenhos demonstram que a retomada da
atividade industrial nos BRICs, apó s a crise, está sendo diferenciada.

Diz o documento que depois de forte queda na produçã o, a indú stria russa enfrenta dificuldades para se recuperar.
“As indú strias do Brasil, da China e da Índia, por outro lado, apontam ritmo de crescimento similar. A diferença, no
caso do Brasil, é que o impacto da crise internacional, no final de 2008, foi muito mais intenso do que na indú stria dos
outros dois países”, destaca a CNI.

O economista da CNI Marcelo de Á vila explica a queda mais acentuada da indú stria russa pela alta insegurança
jurídica existente no país, devido ainda aos efeitos do regime de transiçã o do comunismo, que ocasionou a retirada
de investimentos internacionais. “Houve fuga de capitais na Rú ssia para cobrir perdas no mercado internacional”,
informa.

Á vila assinala que, no polo oposto à Rú ssia, os efeitos praticamente nulos da crise na China se devem, sobretudo, à
adoçã o do câ mbio desvalorizado, que nã o afetou as exportaçõ es do país.

[...]

BRASIL foi o segundo país dos Brics mais afetado pela crise, diz CNI. Redação Carta Capital, 1º set. 2010. Disponível em: <www.cartacapital.com.br/economia/brasil-foi-o-
segundo-pais-dos-brics-mais-afetado-pela-crise-diz-cni>. Acesso em: 12 jan. 2016.
Pá gina 156

O espectro geopolítico do
CAPÍTULO 8 -
Oriente Médio

Crédito do infográfico: Casa Paulistana

Borna_Mirahmadian/Shutterstock.com

Pankaj Nangia/AP/Glow Images


Pá gina 157

Tópicos do capítulo

• Configuração territorial do Oriente Médio

• Turquia: posição geoestratégica

• O conflito israelo-palestino

• A geopolítica do Golfo Pérsico: Irã e Iraque

Ponto de partida
ESCREVA NO CADERNO

• Discuta com seus colegas por que o Oriente Médio é considerado uma regiã o geoestratégica.
Pá gina 158

1. Uma região geoestratégica


O Oriente Médio é uma espécie de “nó geográ fico”, pois entrelaça os continentes Á sia, Á frica e
Europa. Situa-se fundamentalmente no sudoeste asiá tico, porém é ligado à Á frica pela Península do
Sinai. A maior parte da Turquia está em territó rio asiá tico, mas ela tem também uma pequena
porçã o situada na Europa; por isso, esse país do Oriente Médio é classificado como euro-asiá tico.
Observe o mapa abaixo.

Allmaps

Fonte: ATLAS geográ fico escolar. 6. ed. Rio de Janeiro: IBGE, 2012. p. 49.

A regiã o é circundada pelo mar Negro, ao norte; mar Mediterrâ neo, a noroeste; mar Vermelho, a
oeste; Golfo de Á den e mar da Ará bia, ao sul; golfos de Omã e Pérsico, pró ximos ao centro; e mar
Cá spio, a nordeste. Todos eles dispõ em de passagens estratégicas que muitas vezes foram motivo
de guerras: o Canal de Suez, o Estreito de Bó sforo, o Estreiro de Ormuz, o estuá rio Chat el Arab e o
Estreito el Mandeb sã o pontos de precisã o estratégica e estã o na rota marítima do comércio
internacional.

Relevo acidentado e paisagem desértica dominam a regiã o, embora haja algumas poucas á reas
menos castigadas pela aridez, como a orla mediterrâ nea ou a planície da Mesopotâ mia, no Iraque,
entre os rios Tigre e Eufrates, drenados em grande parte pelo derretimento das neves das
montanhas turcas. Observe a fotografia abaixo.
Andrew Grant/Dreamstime/Isuzu Imagens

Rio Eufrates na Síria, 2011. A presença do rio soma-se à paisagem desé rtica que caracteriza grande parte do Oriente Mé dio.

Ver
Syriana: a indústria do petróleo. Direção: Stephen Gaghan. Estados Unidos, 2005.
O filme apresenta a visã o ocidental sobre a relaçã o entre os negó cios do petró leo, o terrorismo internacional e a CIA.

Filme de Stephen Gaghan. Syriana: a indú stria do petró leo. EUA, 2005
Pá gina 159

Por causa da pobre rede de drenagem – os rios Tigre, Eufrates e Jordã o sã o verdadeiras exceçõ es
em disponibilidade hídrica –, a á gua assume importâ ncia vital para povos e Estados. Assim, sã o
muitos os desentendimentos em relaçã o ao controle dos mananciais, como vemos na disputa entre
Israel e Síria pelas colinas de Golã ou na tensã o que já envolveu Turquia e Iraque pelo controle das
á guas do rio Tigre. (Observe o mapa a seguir). Muito pró ximo do Oriente Médio, o Nilo, no Egito,
encontra-se na mesma situaçã o, o que tem causado grandes conflitos entre Egito, Sudã o e Etió pia,
conforme estudaremos mais adiante.

Allmaps

Fonte: GRESH, Alain et al. (Dir.). Atlas da globalização Le Monde Diplomatique. Lisboa: Campo da Comunicaçã o, 2003. p. 168.

Navegar
BBC Brasil <http://tub.im/7xh4z6>
O site da BBC (em português) traz matérias e artigos interessantes sobre a conjuntura internacional em geral. Há
links especiais sobre o Oriente Médio e a Á frica.
Pá gina 160

Um emaranhado de povos habita essa regiã o. O povo á rabe é predominante e presente em vá rios
países, abrangendo, além do Oriente Médio, longos trechos do norte africano. Há também os povos
turco (Turquia), judeu (Israel), persa (Irã ), curdo (vá rios países), entre outros.

Judaísmo, cristianismo e islamismo sã o religiõ es abraâ micas e surgiram no Oriente Médio, nessa
ordem. A mais recente delas, o islamismo, é também a predominante.

O islamismo surgiu no século VII, criado por Muhammad (Maomé), que difundiu sua crença em
grande parte da Península Ará bica. Muhammad morreu em 632 sem deixar um sucessor (califa), e
isso provocou uma cisã o na comunidade muçulmana, que nã o chegou a um consenso quanto à
indicaçã o do substituto do profeta.

Data desse fato a divisã o religiosa entre sunitas e xiitas, pois os que defendiam que alguém ligado à
família do profeta deveria ser seu sucessor queriam empossar o primo e genro de Muhammad, Ali,
casado com sua filha Fá tima. Eles ficaram conhecidos como “os partidá rios de Ali”, ou xiitas, do
á rabe shi’at’Ali.

Outra corrente defendia que o sucessor nã o deveria ser necessariamente alguém ligado a
Muhammad por laços sanguíneos, mas sim filosó ficos e espirituais, ou seja, que seguisse o “exemplo
de vida” do profeta, a suna, do á rabe ahl as-sunnah, ou “os que seguem as prá ticas proféticas”.
Assim surgiu a corrente hoje majoritá ria do Islã , o sunismo. Veja, no mapa a seguir, a distribuiçã o
dos seguidores das três religiõ es abraâ micas no Oriente Médio.

Abraâmico: Termo relativo a Abraã o, o patriarca das três religiõ es: judaísmo, cristianismo e islamismo.

Allmaps
Fonte: CHALIAND, Gérard; RAGEAU, Jean-Pierre. Atlas estratégico y geopolítico: geopolítica de las relaciones de fuerza en el
mundo. Madrid: Alianza Editorial, 1984. p. 40.

Ler
Uma história dos povos árabes, de Albert Hourani. São Paulo: Companhia das Letras, 2006.
Clá ssico de Albert Hourani que faz um amplo resgate dos povos á rabes desde a Arábia pré-islâ mica até o século XX.

Editora Companhia das Letras


Pá gina 161

2. Turquia: entre o Ocidente e o Oriente


Situada na zona de contato entre Europa e Á sia, a Turquia configura-se como uma espécie de
“península” do Oriente Médio. O destaque que teve ao longo dos anos, desde tempos remotos, está
relacionado a essa posiçã o geoestratégica. Observe o mapa a seguir.

A Turquia atual é produto do rearranjo territorial realizado apó s o desfecho da Primeira Guerra
Mundial, quando um dos mais duradouros reinos de todos os tempos ruiu: o Império Otomano.
Nascia a Turquia moderna, com os contornos atuais. O país estava fadado, simplesmente, a
desaparecer, mas Mustafa Kemal, o Atatü rk (em português, pai dos turcos), liderou uma revolta (a
Revoluçã o dos Jovens Turcos) que resguardou a sobrevivência turca, mas com um territó rio bem
menor. O líder que emergia com o novo país aproximou a Turquia do Ocidente, dando as costas ao
Oriente.

A Turquia de Atatü rk, diferentemente do que se viu durante os oito séculos do Império Otomano,
separou o Estado da Igreja, tornando-o laico perante a naçã o majoritariamente muçulmana. Nos
ú ltimos tempos, o país tem sido governado por um partido religioso moderado, e essa
reaproximaçã o entre política e religiã o preocupa grande parte da sociedade turca.

A Turquia do século XX optou pela neutralidade, mas nã o conseguiu resistir à pressã o dos Estados
Unidos para que integrasse a Organizaçã o do Tratado do Atlâ ntico Norte (Otan), pois sua posiçã o
geográ fica era demasiadamente importante para lhe conferir imparcialidade no mundo da Guerra
Fria: os Estados Unidos queriam a Turquia na aliança militar antissoviética como forma de
dificultar a saída do inimigo pelos mares a oeste.

Allmaps

Fonte: ATLAS geográ fico escolar. 6. ed. Rio de Janeiro: IBGE, 2012. p. 49.

Os estreitos de Bó sforo e Dardanelos sã o de natureza estraté gica, pois permitem o acesso aos mares Negro e Mediterrâ neo.
Keystone/Getty Images

Atatü rk: líder da Revoluçã o dos Jovens Turcos, que criou a Turquia moderna, em fotografia de c. 1916.

Ler
O expresso Berlim-Bagdá, de Sean McMeekin. São Paulo: Globo, 2011.
O projeto da estratégica ferrovia Berlim-Bagdá é o tema desse livro, que mostra as pretensõ es germâ nicas na disputa
territorial pelo espó lio otomano durante a Primeira Guerra Mundial.

Editora Globo

Conversando com a... Sociologia!


ESCREVA NO CADERNO

Secularismo é um conceito amplo que reflete as relaçõ es entre religiã o, cultura, vida social e política. Uma de suas
definiçõ es se refere a um sistema de doutrinas que defendem a separaçã o institucional entre a Igreja e o Estado na
conduçã o de um país. Isso significa que quem defende o secularismo nã o aceita um Estado teocrá tico ou que seja
governado por um partido religioso. Aqueles que defendem a ideia o fazem ressaltando que a crença dos indivíduos é
um elemento estruturante da vida social e que, portanto, deve ser considerada nas definiçõ es políticas do Estado.

• Qual é a sua opiniã o sobre isso? Converse com seus colegas sobre as relaçõ es entre religiã o e política e entre Igreja
e Estado na construçã o de políticas e açõ es estruturadoras da sociedade.
Pá gina 162

• 2.1 O separatismo curdo


Os curdos formam a maior naçã o do mundo sem Estado. Estima-se em 26 milhõ es de habitantes o
total de curdos vivendo na mesma regiã o há aproximadamente 5 mil anos e com forte tradiçã o
tribal. Trata-se de um povo do tronco etnolinguístico persa, igualmente derivado do tronco indo-
europeu.

Quando as fronteiras foram constituídas no Oriente Médio, logo apó s a Primeira Guerra Mundial,
esse povo assistiu, decepcionado, à criaçã o de novos países á rabes, persa e judeu, nã o sendo
contemplado com um Estado pró prio. Isso é fruto direto da intervençã o franco-britânica no
rearranjamento territorial da regiã o nos anos 1920 e que selou o destino histó rico-territorial do
Oriente Médio, cujas consequências perduram até os dias de hoje.

Os curdos sã o majoritá rios na regiã o que ocupam, hoje distribuídos naquilo que se convencionou
pertencer a Turquia, Irã , Iraque, Síria e Armênia. (Observe o mapa a seguir). Entretanto, eles estã o
nesse local bem antes da existência dessas delimitaçõ es. Há ainda minorias curdas no Líbano, na
Geó rgia e na Europa.

O sonho desse povo é ver a criaçã o do pró prio Estado: o Curdistã o. Há até mesmo um movimento
separatista antigo que luta por isso. Os curdos sã o perseguidos na Turquia, no Irã e no Iraque. Nos
anos 1940, organizou-se no Iraque um movimento nacionalista duramente reprimido pela
monarquia da época. Nos anos 1980, o movimento foi retomado, dessa vez de forma mais intensa
na Turquia. Com os desdobramentos da Guerra do Iraque em 2003 e o consequente esfacelamento
do regime vigente, os curdos reorganizaram-se em Kirkuk, onde o movimento tornou-se mais bem
aparelhado, porém com forte objeçã o turca à s pretensõ es de independência. Um dos principais
argumentos curdos reside no fato de esse povo viver naquele lugar há bem mais tempo que os
turcos, que lá chegaram por volta do século X. A Turquia nã o aprova a criaçã o do Curdistã o, e tudo
indica que essa contençã o ainda irá durar por muitos anos.

No norte do Iraque, os curdos sã o uma força de resistência à s ofensivas do Estado Islâ mico,
iniciadas em meados da década de 2010. À medida que os combatentes curdos resistem ao avanço
do Estado Islâ mico, eles ganham força e simpatia local e internacional, que sã o incentivos para as
pretensõ es de independência curda, aumentando as preocupaçõ es turcas com essa possibilidade.
Allmaps

Fonte: SMITH, Dan. O atlas do Oriente Médio: conflitos e soluçõ es. Sã o Paulo: Publifolha, 2008. p. 91.

Ver
Lawrence da Arábia. Direção: David Lean. Reino Unido, 1963.
É pico que narra o front oriental da Primeira Guerra Mundial, quando os á rabes lutaram ao lado da Inglaterra contra
os otomanos, acreditando que, apó s o desfecho do conflito, teriam sua independê ncia.

Filme de David Lean. Lawrence da Ará bia. Reino Unido, 1963


Pá gina 163

• 2.2 A questão cipriota


Outro tema latente na geopolítica turca é a questã o cipriota. O Chipre é um país independente
reconhecido pela ONU e membro da Uniã o Europeia (UE). No entanto, guarda conflitos histó ricos
com a Turquia, que mantém uma presença militar no norte da ilha, onde, de acordo com os turcos,
localiza -se a Repú blica Turca do Chipre do Norte, um Estado autodeclarado desde 1975, mas
reconhecido apenas por Ancara. (Observe o mapa ao lado.) Trata-se de uma questã o nacional, já
que em toda a ilha do Chipre 80% da populaçã o tem ascendência grega, diferentemente dessa
minoria turca do norte do país. Por causa desse problema histó rico, Turquia e Grécia mantêm
tensas relaçõ es. Contudo, os ú ltimos anos mostraram uma reaproximaçã o entre os países rivais,
ambos inseridos em um novo contexto geopolítico: a Turquia, governada por um partido
fundamentalista islâ mico moderado, redesenha sua estratégia, tentanto se firmar como potência
regional; a Grécia, atravessando grave crise econô mica, busca conter gastos militares e a sua
sobrevivência como naçã o.

Por trá s dessa questã o está o ingrediente religioso, uma vez que a Turquia é um país cuja populaçã o
é 99% muçulmana, enquanto na Grécia a maioria das pessoas é cristã -ortodoxa. Observe, na
fotografia abaixo, a influência grega em Chipre.

Allmaps

Fonte: CENTRAL INTELLIGENCE AGENCY (CIA). Cyprus: Physiography. Disponível em:


<https://www.cia.gov/library/publications/resources/cia-mapspublications/map-downloads/Cyprus_Physiography.pdf>. Acesso
em: 6 jan. 2016.
Roberto Contini/Alamy/Latinstock

A influê ncia da cultura grega pode ser vista na arquitetura (construçõ es pintadas de branco e azul), na culiná ria e na religiã o
cipriotas. Igreja grega no Chipre, em 2013.

Ver
O tempero da vida. Direção: Tassos Boulmetis. Turquia/Grécia, 2005.
O filme aborda a cultura turca e a relaçã o histó rica entre gregos e turcos.

Filme de Tassos Boulmetis. O tempero da vida. Turquia/Grécia, 2005

• 2.3 O anseio à União Europeia


A Turquia é o mais antigo pleiteante à Uniã o Europeia, bem antes da ampliaçã o dos anos 1990.
Ainda na década de 1960, quando a entã o Comunidade Econô mica Europeia tinha pouco mais de
dez anos, a Turquia iniciou as negociaçõ es para fazer parte do bloco. Entretanto, o que a histó ria
mostrou é que o país muçulmano nã o é bem-vindo a essa comunidade de maioria cristã. Apesar
disso, a Turquia jamais desistiu.
Pá gina 164

Os obstá culos sã o vá rios, entre eles:

• a questã o cultural entre a Turquia muçulmana e a Europa cristã ;

• a distribuiçã o das cadeiras do Parlamento europeu, que é realizada de acordo com o peso
demográ fico de cada país. O eventual ingresso turco já lhe daria a condiçã o de segundo país mais
populoso da Uniã o Europeia, em razã o do alto crescimento vegetativo; em poucos anos, a populaçã o
turca deve superar a da Alemanha;

• a Turquia faz fronteira com o Iraque e o Irã . Isso significa que a Uniã o Europeia, igualmente,
passaria a fazer fronteira com regimes pouco democrá ticos;

• a questã o cipriota, já que o Chipre é membro pleno da Uniã o Europeia e sua relaçã o com a Turquia
é tensa;

• o histó rico de intervençõ es militares no governo, sempre uma sombra ao regime parlamentar
turco;

• a questã o da imigraçã o: contam-se aproximadamente 1 milhã o de turcos e outras centenas de


milhares de curdos na Alemanha. “Como seria entã o a imigraçã o turca caso a Turquia entrasse na
Uniã o Europeia?”, perguntam os alemã es. Observe a fotografia abaixo.

U. Baumgarten via Getty Images

A grande quantidade de imigrantes turcos na Alemanha levanta muitas dú vidas a respeito do futuro desse processo se a
Turquia fosse incluída na Uniã o Europeia. Na fotografia, feira turca em Berlim, Alemanha, 2015.

Nos ú ltimos anos, a Turquia retomou sua importâ ncia por meio de uma agressiva política externa,
apó s um período em que manteve uma postura de mera expectadora. Essa recente expressã o que o
país adquiriu pode ser resultado dos anos de crise do bloco europeu.

Nessa nova fase, a Turquia, que sempre foi, entre os países muçulmanos, aquele com melhor relaçã o
com o Estado de Israel, afasta-se cada vez mais do país judeu e tem sido, no universo islâ mico, o
maior questionador da política israelense. Isso se tornou mais claro apó s os incidentes ocorridos
em 2010 envolvendo uma fragata turca que levava ajuda humanitá ria a palestinos e pretendia
chegar à Faixa de Gaza, mas foi interceptada por forças israelenses que invadiram a embarcaçã o,
deixando vá rios mortos.

A Turquia guarda uma histó ria de rivalidade com o Irã desde os tempos dos embates entre o
Império Otomano (turco) e o Império Persa (iraniano). Contudo, nessa nova fase da diplomacia
turca, o país tem procurado uma reaproximaçã o com o regime dos aiatolá s.
Pá gina 165

3. O conflito israelo-palestino
Durante séculos, a regiã o hoje conhecida como Oriente Médio esteve sob o domínio do Império
Otomano. No fim da Primeira Guerra Mundial, o fragilizado império foi o grande derrotado ao lado
da Alemanha. Reino Unido e França assumiram o comando de grande parte da regiã o e, no auge do
imperialismo, estenderam seus domínios, estabelecendo mandatos. O mandato da Palestina coube
ao Reino Unido, assim como o do Iraque e o da Transjordâ nia; a França herdou a Síria e o Líbano.

Palestina: Parte do Oriente Médio que abarca atualmente o Estado de Israel, mas chamada de Palestina pelos á rabes.

Conversando com a... História!


ESCREVA NO CADERNO

O período final do Impé rio Otomano aconteceu durante a Segunda Era Constitucional do Impé rio Otomano. Durante a
Primeira Guerra Mundial, na regiã o do Oriente Mé dio, a batalha aconteceu entre as Forças Aliadas, formadas pela Grã -
Bretanha, França e Rú ssia, e as Forças Centrais, formadas basicamente pelo Impé rio Otomano. O Impé rio Otomano foi bem-
sucedido no início da guerra. Os Aliados foram derrotados nas batalhas de Galipoli, Iraque e Bá lcã s. No entanto, alguns
territó rios anteriormente perdidos foram reconquistados. A Revoluçã o Russa també m foi um fator favorá vel para a
reconquista de territó rios Otomanos, como Trabzon e Erzurum. As ofensivas incessantes dos ingleses mostraram-se
decisivas e o Impé rio Otomano acabou sendo derrotado em 1917.

ALTMAN, Max. Hoje na Histó ria: 1920 – Império Otomano e naçõ es aliadas da Primeira Guerra Mundial assinam tratado de paz. Opera Mundi, 10 ago. 2010. Disponível em:
<http://operamundi.uol.com.br/conteudo/noticias/5582/conteudo+opera.shtml>. Acesso em: 6 jun. 2016.

Retome seus estudos de Histó ria, converse com seus colegas e responda à s questõ es.

1. Quando se constituiu o Império Otomano?

2. Qual é a importâ ncia do Império Otomano para os á rabes muçulmanos?

3. Quais foram os impactos na configuraçã o territorial á rabe com o fim do Império Otomano?

Simultaneamente aos acontecimentos no Oriente Médio, durante a Primeira Guerra Mundial


desenvolvia-se na Europa uma articulaçã o bem-sucedida entre líderes da comunidade judaica: o
projeto para a criaçã o de um Estado judeu. Esse movimento ficou conhecido como sionismo, uma
referência ao monte Siã o, em Jerusalém, na Palestina, cujo idealizador foi o jornalista austríaco-
judeu Theodor Herzel.

O sionismo era uma tentativa de viabilizar a criaçã o de um “lar nacional” para reunir esse povo que
há séculos vivia disperso por toda a Europa, onde muitas vezes era violentamente perseguido. A
elite judaica concluiu que chegara a hora de dar fim àquela situaçã o de discriminaçã o e penú ria à
qual estava submetido o seu povo. Também era motivo de preocupaçã o que esse preconceito
pudesse chegar até ela.

A competente mobilizaçã o política e a força econô mica da comunidade judaica europeia


estreitaram os laços com o alto gabinete britâ nico e, em 1917, um histó rico documento era
divulgado pelo ministro das relaçõ es exteriores do Reino Unido da Grã -Bretanha, a Declaraçã o
Balfour.

Secretaria do Ministério das Relações Exteriores


2 de novembro de 1917
Estimado Lord Rothschild:
[…]

O governo de sua majestade vê com beneplá cito o estabelecimento na Palestina de um lugar nacional para o povo judeu e
fará o quanto estiver em seu poder para facilitar a realiazaçã o desse objetivo, ficando claramente entendido que nã o se
tomará nenhuma medida que possa prejudicar os direitos civis e religiosos das comunidades nã o judaicas da Palestina, ou
dos direitos e estatuto político de que gozam os judeus em qualquer outro país.

Lhe agradecerei se puser esta declaraçã o a conhecimento da Federaçã o Sionista.

Atenciosamente,

Arthur James Balfour

GOMES, Aura Rejane. A questão da Palestina e a fundação de Israel. 2001. Dissertaçã o (Mestrado em Ciência Política)–Faculdade
de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, Sã o Paulo, 2001. p. 20-21. Disponível em:
<http://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8131/tde-24052002-163759/pt-br.php>. Acesso em: 6 jan. 2016.

Navegar
Ministério das Relações Exteriores – Departamento do Oriente Médio <http://tub.im/4injrt>
O site do Departamento do Oriente Médio, do Ministério das Relaçõ es Exteriores (Itamaraty), traz documentos
oficiais da relaçã o Brasil-Oriente Médio, informaçõ es sobre a regiã o, acervo bibliográ fico e links.
Pá gina 166

O passo seguinte do sionismo foi organizar a migraçã o de judeus europeus para a Palestina. Veja na
tabela abaixo a evoluçã o dessa migraçã o. Observe como os nú meros aumentam apó s a remodelaçã o
territorial imposta ao Oriente Médio depois da Primeira Guerra Mundial.

Migração de judeus europeus para a Palestina


Período Número de imigrantes
1822-1903 20000-30 000
1904-1914 35000-40000
1919-1923 35000
1924-1931 82000
1932-1938 217 000
1939-1945 92000
1946-1948 61 000

Fontes: SALEM, Helena. Palestinos, os novos judeus. Rio de Janeiro: Eldorado, 1977; DAVIS, J. A paz evasiva. Rio de Janeiro: DLEA,
1970.

Notas: 1882-1918: administraçã o turca na Palestina; 1919-1948: administraçã o britâ nica na Palestina.

Allmaps

Fonte: GRESH, Alain et al. (Dir.). Atlas da globalização Le Monde Diplomatique. Lisboa: Campo da Comunicaçã o, 2003. p. 175.

No começo do sé culo passado, havia uma nítida maioria á rabe na Palestina.

As migraçõ es aumentaram muito nos anos 1920 e 1930, e nã o tardaram a eclodir os primeiros
conflitos entre os nativos e os judeus imigrantes. Os camponeses palestinos nã o aceitaram bem
aquela chegada repentina e numerosa de judeus europeus à sua terra, diferentes daqueles judeus
com os quais conviviam há séculos. Muitos palestinos vendiam suas propriedades ao judeu que
chegava sem saber do projeto que estava por trá s daquela apropriaçã o gradual de terras.
Diante da hostilidade á rabe contra o judeu imigrado, o Reino Unido tentou intervir, mas nã o obteve
êxito. Simultaneamente, desenhavam-se os preparativos para a Segunda Guerra Mundial, e a
ascensã o nazista na Alemanha foi o pior dos mundos para os judeus europeus. Isso resultou em um
aumento da emigraçã o, conforme mostra a tabela anterior. Com o maior nú mero de migraçõ es,
aumentou também a tensã o na Palestina por causa da revolta dos á rabes, inconformados com a
absorçã o gradativa de sua terra pelos judeus. O Reino Unido ia se perdendo no cená rio que armara:
prometer uma terra já habitada a outro povo que anseia em ter seu tã o sonhado Estado. Observe o
mapa ao lado.

A Segunda Guerra Mundial durou de 1939 a 1945. Nesse período, travou-se uma “guerra” particular
na Palestina entre os contrastantes interesses á rabes e judeus. Convém ressaltar que a organizaçã o
judaica era bem maior: apresentava ampla vantagem nos campos político, econô mico e militar. Os
judeus eram poucos, mas organizados; já os á rabes, muitos, porém desorganizados.
Pá gina 167

• 3.1 A criação de Israel e a primeira guerra árabe-israelense


O término da Segunda Guerra Mundial anunciou uma nova ordem mundial – ascendia a era da
bipolaridade e dos interesses antagô nicos entre as duas potências que surgiam: Estados Unidos e
Uniã o Soviética. Outro ícone decisivo do novo ordenamento que se anunciava era a criaçã o da
Organizaçã o das Naçõ es Unidas (ONU), para onde se transferiram as decisõ es mais importantes do
sistema internacional. Assim, a tensa situaçã o entre á rabes e judeus na Palestina inseriu-se na nova
ló gica internacional e foi encaminhada para o â mbito da ONU, a pedido do Reino Unido, que
anunciava sua retirada da regiã o.

Em 1947, a ONU encaminhou uma soluçã o propondo a partilha da Palestina em dois Estados: um
Estado judeu, com 14,1 mil quilô metros quadrados, correspondendo a 56% da Palestina e
compreendendo uma populaçã o de 995 mil habitantes, sendo uma metade composta de á rabes e a
outra de judeus; e um Estado á rabe, correspondendo a 43% da Palestina, com 11,5 mil quilô metros
quadrados e 735 mil habitantes: 725 mil á rabes e 10 mil judeus. Observe o mapa ao lado e veja nos
grá ficos a seguir a balança demográ fica na época da partilha. Logo apó s a retirada das tropas
britâ nicas da Palestina, em 15 de maio de 1948, o judeu polonês David Ben-Gurion declarou a
independência de Israel e tornou-se o primeiro chefe de governo israelense.

Com a recusa á rabe à partilha da ONU, os países da regiã o declararam guerra a Israel no dia
seguinte de sua independência. A vitó ria nessa primeira guerra, em 1948, seria a primeira de
muitas conquistas israelenses perante os á rabes. Para os israelenses, ela é celebrada como a Vitó ria
da Independência; já os palestinos a consideram a al Nakba (a catá strofe).

Allmaps

Fonte: LE MONDE DIPLOMATIQUE. Cartes e Graphiques. Disponível em:


<www.monde-diplomatique.fr/cartes/annexionisraelienne95>. Acesso em: 6 jan. 2016.
Tangente Design

Tangente Design

Fonte dos grá ficos: CENTRO DE INFORMACIÓ N DEL CONSEJO MUNDIAL POR LA PAZ, 1987.
Pá gina 168

Com a vitó ria, os israelenses incorporaram uma vasta á rea do territó rio á rabe-palestino definido
pela ONU; apó s a guerra, Israel passou de 14 mil para 20 mil quilô metros quadrados. O Estado
palestino desapareceu do mapa, sendo o restante incorporado por Jordâ nia e Egito. Os palestinos
tornaram-se apá tridas, vivendo sob a custó dia israelense (60%). Os que partiram refugiaram-se nos
países á rabes vizinhos, e alguns poucos foram para a Europa e a América.

Em relató rio de 2012, a Agência das Naçõ es Unidas de Assistência aos Refugiados Palestinos
(UNRWA), da ONU, criada especialmente para atender os refugiados palestinos, revelou novos
dados, mostrados na tabela ao lado.

Número de refugiados palestinos registrados na UNRWA até janeiro de 2012


País de refúgio Refugiados registrados
Jordâ nia 1 979 580
Líbano 436 154
Síria 486 946
Cisjordâ nia 727 471
Faixa de Gaza 1 167 572
Total 4 797 723

Fonte: UNRWA – Agência das Naçõ es Unidas de Assistência aos Refugiados Palestinos. Disponível em:
<http://www.unrwa.org/userfiles/20120317152850.pdf>. Acesso em: 28 mar. 2016.

No exílio, os palestinos organizaram-se para voltar à Palestina, o que, na interpretaçã o israelense,


seria a destruiçã o de seu Estado. Primeiro surgiu o movimento designado Al Fatah, embriã o da
Organizaçã o para Libertaçã o da Palestina (OLP), principal entidade representativa desse povo,
fundada em 1964 e que, a partir de 1969, estaria sendo chefiada pelo mais importante líder
palestino: Yasser Arafat. A OLP congregava as mais diversas correntes e facçõ es (diplomá ticas ou
armadas), muitas vezes divergentes. No entanto, todos viam na organizaçã o a entidade ú nica e
representativa dos interesses palestinos. A identificaçã o entre palestinos e OLP foi imediata.

AP/Glow Images

Os palestinos refugiaram-se, em sua maioria, na Jordâ nia, no Líbano e na Síria. Na fotografia, campo de refugiados de Jabalia,
em Gaza, em 1957.
Navegar
UNRWA <http://tub.im/v82ewj>
A Agência das Naçõ es Unidas de Assistência aos Refugiados Palestinos (UNRWA) é um organismo que ampara os
palestinos desde 1948. Acesse o site, disponível em inglês, para conhecer o trabalho da UNRWA.

• 3.2 A Guerra dos Seis Dias e as implicações territoriais


Os á rabes nunca aceitaram as derrotas para Israel (em 1956, na Guerra de Suez sofreram nova
derrota). Ao longo dos anos 1960, pairava sobre o Oriente Médio um forte desejo de revanche. Os
principais líderes regionais tentavam atrair os trunfos políticos da insatisfaçã o á rabe, produto da
nítida sensaçã o de inferioridade militar. Havia também um intenso sentimento de comoçã o e
solidariedade para com os palestinos. Gamal Abdul Nasser, presidente do Egito, foi quem melhor
tirou proveito desse clima político.

Com um discurso agressivo, propagando a “vingança á rabe”, o líder egípcio ocupava as rá dios do
Oriente Médio para contagiar o mundo á rabe e islâ mico. Alardeava que a “vitó ria á rabe estava
pró xima”: os judeus seriam “atirados ao mar”. Simultaneamente, aumentavam as incursõ es da
guerrilha palestina em territó rio israelense.

Guerra de Suez: Guerra ocorrida em 1956 que envolveu egípcios, israelenses, britâ nicos e franceses pelo controle do Canal de Suez.
Pá gina 169

Os á rabes ameaçavam, mas quem agiu foi Israel: em 5 de junho de 1967, fez ataques-surpresa
simultaneamente ao Egito, à Síria e à Jordâ nia, os países á rabes mais fortes, destruindo quase toda a
aviaçã o á rabe no solo. Depois, mobilizou sua força terrestre com centenas de tanques, infantaria,
guarniçõ es bem armadas; paraquedistas dominaram o Canal de Suez. Foi uma açã o fulminante e
humilhante. O nome do conflito, Guerra dos Seis Dias, revela a dimensã o da disparidade de forças
entre os dois lados. Houve nova derrota á rabe, mas agora com implicaçõ es bem mais sérias.

Allmaps

Fonte: Elaborado com base em: ATLAS geográfico escolar. 6. ed. Rio de Janeiro: IBGE, 2012. p. 49.

Israel impô s sua superioridade militar. Além de incorporar uma vasta á rea territorial, ocupou as
colinas de Golã (Síria), a Cisjordâ nia (Jordâ nia), a Faixa de Gaza (Egito) e a Península do Sinai
(Egito). Observe essas á reas no mapa ao lado e uma cena da guerra na fotografia abaixo.
David Rubinger/GPO via Getty Images

Guerra dos Seis Dias: a inconteste supremacia israelense. Na fotografia, soldados israelenses capturam palestinos, em 1967,
em Rafah, na Faixa de Gaza.

Nesses territó rios ocupados, Israel iniciou, em 1967, um processo de colonizaçã o com judeus de
vá rias partes do mundo. Esse processo continua até hoje e é a razã o de um dos principais conflitos
no Oriente Médio. Os palestinos e os demais povos á rabes jamais aceitaram esse fato e reivindicam
a devoluçã o desses territó rios. Esse é um dos conflitos mais ativos em todo o mundo. A guerra de
1967 acabou semeando ó dio em uma regiã o já envolta em problemas antigos.

As colô nias judaicas multiplicaram-se na Cisjordâ nia, em Gaza, Golã e no Sinai. A Península do Sinai
foi posteriormente devolvida aos egípcios, em 1979, conforme os Acordos de Camp David, mantidos
entre o primeiro-ministro israelense Menahen Begin e o presidente egípcio Anwar al Sadat, a quem
os á rabes acusaram de traidor. Sadat foi assassinado anos depois.

Ver
Lemon tree. Direção: Eran Riklis. Israel/Alemanha/França, 2008.
Uma viú va palestina vê sua plantaçã o de limõ es ameaçada quando um dirigente político do governo israelense torna-
se seu vizinho e sua plantaçã o passa a representar um risco à segurança do político.

Filme de Eran Riklis. Lemon tree. Israel/Alemanha/França, 2008


Pá gina 170

A ONU condenou a ocupaçã o israelense por meio da Resoluçã o nº 242, aprovada em 1967, que
exigia o pronto restabelecimento das fronteiras anteriores à guerra. Essa resoluçã o passaria a ser o
guia das reivindicaçõ es palestinas desde entã o.

Ver
Promessas de um novo mundo. Direção: B. Z. Goldberg, Justine Arlin e Carlos Bolado. Israel/Estados Unidos,
2001.
O documentá rio apresenta relatos de crianças palestinas e judias que expõ em sua visã o sobre o conflito israelo-
palestino.

Filme de B. Z. Goldberg, Justine Arlin, Carlos Bolado. Promessas de um novo mundo. Israel/EUA, 2001

Enfoque
ESCREVA NO CADERNO

A Resolução nº 242

O Conselho de Segurança [...], enfatizando a inadmissibilidade da aquisiçã o de territó rio pela guerra e a necessidade de
trabalhar por uma paz justa e duradoura na qual cada Estado na regiã o possa viver em segurança [...] afirma a aplicaçã o dos
seguintes princípios:

(I) evacuaçã o das forças armadas israelenses dos territó rios ocupados no recente conflito;

(II) encerramento de todas as reivindicaçõ es ou estados de beligerâ ncia e respeito pelo reconhecimento da soberania,
integridade territorial e independê ncia política de cada Estado da regiã o e de seu direito a viver em paz dentro de fronteiras
seguras e reconhecidas [...].

Naçõ es Unidas, 22 de novembro de 1967.

CENTRO DE INFORMAÇÃ O DAS NAÇÕ ES UNIDAS NO BRASIL. Rio de Janeiro: Naçõ es Unidas, 1988. p. 11.

• Com base no texto, redija um pará grafo sobre as determinaçõ es da Resoluçã o nº 242 e a evoluçã o da ocupaçã o por
Israel na Guerra dos Seis Dias.

• 3.3 Os Acordos de Oslo


O problema palestino remonta ao início do século XX, mas podemos afirmar que as tensõ es
contemporâ neas estã o diretamente relacionadas aos desdobramentos da Guerra dos Seis Dias, sem
desconsiderar, contudo, outros momentos importantes desde 1947, quando houve a partilha da
Palestina.

Em 1993, realizou-se pela primeira vez nos jardins da Casa Branca, Estados Unidos, um acordo
envolvendo os dois lados em litígio: Yitzhak Rabin, primeiro-ministro israelense, e Yasser Arafat,
presidente da OLP. Eles assinaram o Plano de Paz, cujas negociaçõ es iniciaram-se em Oslo, Noruega.
Na realidade, esse foi o desfecho de uma rodada de negociaçõ es iniciada em Madri, em 1991,
intitulada Conferência pela Paz no Oriente Médio, mas que na época nã o obteve êxito.

O pano de fundo dos acordos era “trocar terra por paz”, ou seja, Israel se comprometia a devolver
gradualmente as terras ocupadas, e os palestinos reconheceriam o direito de existência do Estado
judeu. Desse processo, nasceu a Autoridade Nacional Palestina (AP), que passou a ser a voz oficial
dos palestinos. Rabin tentava assim evitar as violentas açõ es dos grupos extremistas, como o Hamas
e a Jihad Islâ mica, cujas açõ es em solo israelense causavam graves transtornos e muitas mortes.

O Plano de Paz suscitou descontentamentos de ambos os lados. Muitos palestinos afirmavam que
ele nã o trazia a tã o sonhada soberania e que nã o teriam autonomia para administrar as regiõ es
previstas na devoluçã o.

Do lado de Israel, judeus fundamentalistas acusaram o primeiro-ministro de traidor por acenar com
a devoluçã o (mesmo que parcial) de territó rios. Rabin foi assassinado por um desses
fundamentalistas judeus em 1995, durante um comício na Praça da Paz, em Tel Aviv, justamente
designado “Sim à paz, nã o à violência”. Em seu ú ltimo discurso, Rabin proferiu as seguintes
palavras, antes de ser morto:

Gary Hershorn/Reuters/Latinstock

Acordos de Paz de 1993: os dois proponentes foram agraciados com o Prê mio Nobel da Paz daquele ano. Mas o que se viu de
fato foi muita celebraçã o e pouca eficá cia. O Plano de Paz nã o passou de uma carta de intençõ es nã o cumpridas. Na
fotografia, o entã o presidente dos Estados Unidos, Bill Clinton, com os líderes de Israel, Yitzhak Rabin, à esquerda, e da
Palestina, Yasser Arafat, à direita, apó s assinatura dos Acordos de Paz, nos Estados Unidos, em 1993.
Pá gina 171

Permitam-me dizer que estou profundamente emocionado. Eu gostaria de saudar a cada um de você s, que vieram nesta
noite para se manifestar contra a violê ncia e pela paz. Este governo, que eu tenho o privilé gio de chefiar, com meu amigo
Shimon Peres, tomou a decisã o de dar uma chance à paz – uma paz que solucionará a maior parte dos problemas de Israel.

PAZ AGORA. O último discurso de Rabin. Disponível em: <http://www.pazagora.org/1995/11/o-ultimo-discurso-de-rabin/>. Acesso em: 6 jan. 2016.

Interagindo

ESCREVA NO CADERNO

Na Assembleia Geral da ONU, ao se pronunciar, em 2011, o líder palestino Mahmoud Abbas afirmou:

Os assentamentos sã o o â mago da política colonialista e a causa primá ria do colapso do processo de paz.

NA ONU, líder palestino diz que ‘chegou a hora de ganhar a liberdade’. Rede Brasil Atual, 23 set. 2011. Disponível em: <www.redebrasilatual.com.br/mundo/2011/09/na-onu-
lider-palestino-diz-quechegou-a-hora-de-ganhar-a-liberdade>. Acesso em: 5 maio 2016.

• Os palestinos consideram essa prá tica o maior entrave à paz, enquanto o governo israelense nã o entende assim e
afirma ser um direito do povo judeu resolver seu problema de moradia. E você, o que pensa sobre isso?

• 3.4 A questão no século XXI: ainda sem solução


Mesmo apó s a assinatura dos Acordos de Paz de 1993, a tensã o só aumentava em Israel e nos
territó rios ocupados. Partidos contrá rios à devoluçã o de terras ganharam força do lado israelense,
enquanto a alternativa extremista se fortaleceu do lado palestino. Ainda assim, a situaçã o
continuava indefinida.

Nesse contexto, durante a realizaçã o da Assembleia Geral da ONU de 2011, o presidente da


Autoridade Nacional Palestina (AP), Mahmoud Abbas, solicitou a adesã o do Estado palestino como
membro pleno da ONU, possibilidade repudiada por Israel e pelos Estados Unidos, seu principal
aliado. Depois de anunciar que defendia um Estado palestino com as fronteiras anteriores a 1967, o
presidente Barack Obama hesitou, afirmando que o caminho aos palestinos é o diá logo com Israel e
nã o uma declaraçã o unilateral no â mbito da ONU. Em dezembro de 2012, a Palestina foi
reconhecida por maioria na Assembleia Geral da ONU como Estado observador nã o membro das
Naçõ es Unidas. Dos 138 votos, de um total de 193, apenas Estados Unidos, Canadá , Repú blica
Tcheca, Palau, Nauru, Micronésia, Ilhas Marshall e Panamá foram contrá rios ao reconhecimento da
Palestina.

Em 2011, os palestinos já haviam alcançado importante vitó ria diplomá tica, conseguindo a adesã o à
Organizaçã o das Naçõ es Unidas para a Educaçã o, a Ciência e a Cultura (Unesco), agência da ONU.
Essa conquista foi repudiada e retaliada pelos Estados Unidos, que suspenderam sua contribuiçã o
financeira à agência.

A maior reivindicaçã o palestina é a devoluçã o da Cisjordâ nia, atualmente composta de


aproximadamente 2,7 milhõ es de habitantes, sendo 2,3 milhõ es de palestinos e aproximadamente
470 mil judeus. Essa devoluçã o é a maior relutâ ncia israelense, e esse conflito israelo-palestino
tende a prosseguir. Entre outros, os principais obstá culos para um acordo de paz sã o:

• a persistente construçã o de assentamentos judaicos em terras consideradas palestinas nos


Acordos de 1993;
• a questã o de Jerusalém, cidade sagrada para judeus e palestinos. Os palestinos reivindicam a
porçã o oriental da cidade para capital do futuro Estado, possibilidade rechaçada por Israel, que
considera Jerusalém a capital indivisível do Estado judeu;

• o retorno dos refugiados palestinos do exílio, calculado em aproximadamente 4,8 milhõ es,
condiçã o nã o aceita por Israel. Isso alteraria profundamente a balança demográ fica da regiã o. Por
sua vez, nenhum dirigente palestino pretende negar o direito do retorno de seu povo;

• boa parte dos aproximadamente 300 mil colonos judeus que vivem na Cisjordâ nia, alguns desde
1967, quando se iniciou a colonizaçã o, é da linha ultraortodoxa do judaísmo e nã o aceita viver sob
um governo palestino. Foi um desses colonos, Ygal Amir, quem assassinou Yitzhak Rabin;

• trata-se de uma regiã o extremamente á rida, onde a questã o da á gua é vital. A principal fonte
hídrica é o rio Jordã o, que seria, em grande parte, de soberania palestina;

• as açõ es terroristas de grupos extremistas palestinos sã o outro forte fator de instabilidade.

Ver
Paradise now. Direção: Hany Abu-Assad. França/Alemanha/Holanda/Palestina, 2005.
Filme que demonstra, pela lente do cinema, o sentimento interior de um palestino angustiado que opta por
transformar-se em um homem-bomba.

Filme de Hany Abu-Assad. Paradise now. França/Alemanha/Holanda/Palestina, 2005

Navegar
Paz Agora <http://tub.im/35xxby>
O movimento judaico Paz Agora tem uma perspectiva pacifista sobre as turbulências do Oriente Médio e
posicionamento crítico em relaçã o aos principais líderes israelenses. No site está disponível um mapa interativo da
colonizaçã o da Cisjordâ nia.
Pá gina 172

4. O Golfo Pérsico
O Golfo Pérsico é uma imensa bacia sedimentar e, como estudamos anteriormente, o petró leo está
associado a esse tipo de província geoló gica. O hidrocarboneto é a principal fonte energética da
humanidade, em que pese a polêmica sobre seus efeitos ao ambiente. E, no caso desse golfo,
estudos indicam que ele guarda cerca de 47,7% das reservas mundiais, o que o torna uma regiã o
estratégica e imprescindível ao mundo contemporâ neo; em grande parte, o petró leo foi o
combustível do capitalismo no século XX. É sobretudo sob essa ó tica que devemos analisar os
acontecimentos do Golfo Pérsico nas ú ltimas décadas, marcado por fatos impactantes.

Allmaps

Fonte: ATLAS geográ fico escolar. 6. ed. Rio de Janeiro: IBGE, 2012. p. 49.

• 4.1 O Irã
Em um passado mais recente, podemos buscar as raízes do Irã moderno no pó s-Primeira Guerra
Mundial. Logo apó s essa guerra, eclodiu um movimento nacionalista que pô s fim ao longevo
Império Persa da Dinastia Kadjar. O líder desse movimento foi o general do exército persa Reza
Khan, que rebatizou o país de Irã , tornando-se a autoridade má xima, o novo xá .

Reza Khan se autorrebatizou Reza Pahlavi (do persa, Pelvi, que significa “iraniano”) e iniciou um
regime constitucional. O novo regime mostrou-se fortemente nacionalista e avesso à presença
estrangeira no país; a petrolífera britâ nica Anglo Iranian Oil Company, mais tarde British Petroleum
(BP), foi a primeira empresa a explorar o petró leo na regiã o, apó s a descoberta de jazidas.

Seu estilo autoritá rio e nacionalista incomodou as potências. Quando eclodiu a Segunda Guerra
Mundial, Pahlavi optou pela neutralidade, mas nã o obteve êxito: Reino Unido e Uniã o Soviética,
alegando supostas proximidades do Irã com os nazistas, invadiram o país em 1941 e forçaram o xá
a abdicar em favor de seu filho, Mohammad Reza Pahlavi, líder mais solícito à vontade estrangeira,
que nã o hesitou em contribuir com as potências em troca de apoio e consentimento de suas
atitudes tirâ nicas.

Na Guerra Fria, o líder iraniano alinhou o país aos Estados Unidos, que passariam a ter forte
influência sobre o Irã e todo o Golfo Pérsico. Contudo, houve um empecilho à s potências e a
Mohammad Reza Pahlavi: a eleiçã o para primeiro-ministro de Mohammad Mossadegh, que
nacionalizou a exploraçã o do petró leo iraniano. Um acordo entre as potências e o xá levou à queda
de Mossadegh em 1953. Foi decisiva nesse episó dio a atuaçã o da CIA, que fez uma intervençã o no
Irã conhecida como Operação Ajax, uma das primeiras açõ es da central de inteligência
estadunidense. Mossadegh foi deposto e enviado à prisã o perpétua, onde morreu em 1967.

Ao longo da segunda metade do século passado, Mohammad Reza Pahlavi tornou-se um dos mais
conhecidos déspotas em todo o mundo.

Xá: Título da nobreza persa dado à autoridade suprema; similar a imperador ou rei.

Déspota: Líder que exerce o poder de forma tirâ nica, sem sucessã o e quase sempre contra a vontade popular.
Pá gina 173

4.1.1 Revolução Islâmica (1979)

A importâ ncia que o petró leo adquiriu ao longo do século XX, o fato de o Irã deter a segunda maior
reserva mundial do combustível e as ó timas relaçõ es do xá com o Ocidente favoreceram a tirania de
Mohammad Reza Pahlavi, que transformou o país em um dos mais desiguais em todo o Oriente
Médio: ele nã o demonstrava nenhum constrangimento em deixar evidente o contraste entre a sua
riqueza, a luxú ria do palá cio imperial e a pobreza da populaçã o; o xá era conhecido por suas
extravagâ ncias. Esse regime autá rquico era amplamente apoiado pelos Estados Unidos; vinha daí,
em grande parte, o ó dio que as camadas populares nutriam por essa potência. Essa camada popular
era, igualmente, a mais arraigada aos valores tradicionais do xiismo.

Era nos líderes religiosos e nos comunistas que Reza Pahlavi via a maior ameaça ao seu poder e nã o
hesitou em persegui-los. Comunistas, liberais e religiosos foram presos. O líder espiritual dos xiitas,
o aiatolá Ruhollah Khomeini (retratado na fotografia ao lado),exilou-se na França, depois de uma
tentativa frustrada de se refugiar no Iraque, que, como o Irã , é um país de maioria xiita.

Nos anos 1970, o clima de descontentamento com o regime era intenso. Entre as correntes
oposicionistas ao governo, foi a vertente religiosa do xiismo que canalizou de forma mais robusta
essa insatisfaçã o popular. Da França, o aiatolá Khomeini conduzia a fú ria popular que acabou
levando, em 1979, a uma guerra civil que ficou conhecida como Revoluçã o Islâ mica. Durante os
embates, o exército iraniano, a principal base de apoio ao xá, hesitou em reprimir os populares, o
que facilitou a vitó ria das tropas xiitas perante as tropas leais ao xá.

O clero xiita venceu, e o xá Reza Pahlavi refugiou-se no Egito, onde morreu em 1980, depois de um
tratamento contra um câ ncer. O aiatolá Khomeini assumiu o poder e rebatizou o país de Repú blica
Islâ mica do Irã , que desde 1979 apresenta um regime teocrá tico. Igualmente, desde a revoluçã o, o
Irã adotou uma postura antiocidental e antiestadunidense, com quem manteve sérios problemas
diplomá ticos por três décadas e meia. A situaçã o só amenizou em 2015 com a reaproximaçã o entre
o Irã e o ocidente por meio de negociaçõ es que envolveram o país persa, Estados Unidos, Reino
Unido, França, Alemanha, Rú ssia e Uniã o Europeia. A Revoluçã o Islâ mica é considerada um marco
do fundamentalismo islâ mico, pois a ortodoxia xiita adotada serviu de inspiraçã o para muitos
outros movimentos islâ micos, xiitas e sunitas. Também significou uma grande ameaça aos demais
regimes do Oriente Médio, sobretudo na regiã o do Golfo Pérsico.

Aiatolá: Título má ximo do clero xiita, líder religioso.


Bettmann/Corbis/Latinstock

Aiatolá Ruhollah Khomeini, líder da Revoluçã o Islâ mica, ora durante seu exílio na França. Fotografia de 1982.

Ler
Os iranianos, de Samy Adghirni. São Paulo: Contexto, 2014.
Livro que retrata a geografia, a histó ria e a cultura do Irã , desde o Império Persa, passando pelo período do xá Reza
Pahlavi e a Revoluçã o Islâ mica até os dias atuais.

Editora Contexto

A Geografia na... fotografia!


ESCREVA NO CADERNO

Observe esta fotografia feita pelo fotó grafo iraniano Jalal Sepehr. Os tradicionais tapetes persas estã o estendidos em
um píer voltado para o horizonte, em uma perspectiva de diá logo.

• Em sua opiniã o, como essa fotografia questiona a relaçã o entre a tradiçã o e as possibilidades de transformaçõ es
sociais, políticas e religiosas no Irã do mundo atual?

Jalal Sepehr/Silk Road Gallery

Obra de arte de Jalal Sepehr, da sé rie Á gua e Tapetes Persas.


Pá gina 174

4.1.2 A Guerra Irã-Iraque (1980-1988)

Ao mesmo tempo que o Irã passava pelas turbulências da Revoluçã o Islâ mica, também no ano de
1979, no Iraque, o general Saddam Hussein aplicava um golpe de Estado e assumia o poder.

Saddam Hussein tinha grandes pretensõ es, entre elas a de assumir a liderança regional do Oriente
Médio. Ele havia aniquilado as demais lideranças do país, especialmente as comunistas. Entretanto,
enxergava o Irã como um problema: via na liderança espiritual que Khomeini detinha sobre as
massas uma grande ameaça ao seu poder. O temor justificava-se, pois a maioria dos iraquianos é
seguidora da vertente xiita, enquanto Saddam era sunita. Ele sabia que essa parcela xiita do Iraque
olhava com simpatia os acontecimentos do outro lado da fronteira.

As pretensõ es de Saddam, somadas ao temor a Khomeini, explicam o surpreendente ataque do


Iraque ao Irã em 1980 cujo pretexto foram as reivindicaçõ es territoriais sobre o Chat el Arab,
estuá rio do encontro entre os rios Tigre e Eufrates, na divisa entre Irã e Iraque, até entã o navegado
em comum acordo entre os dois países. Saddam reivindicava a soberania sobre o canal.

O líder do Iraque pressupunha que seria uma guerra fá cil e rá pida, diante de um Irã bastante
enfraquecido por causa da guerra civil recente. E realmente foi o que pareceu no início: o Iraque,
bem mais preparado em estrutura militar, contando com mísseis soviéticos, tanques e aviõ es de
combate, contra um Irã fragilizado, avançou e ocupou províncias desse país.

Contudo, Saddam Hussein nã o contava com um fato inusitado. Khomeini demonstrou toda a sua
liderança ao conclamar o povo iraniano a uma jihad contra o Iraque. O líder supremo do Irã ,
acreditava-se, seria descendente do profeta Muhammad (Maomé), e seu chamado foi prontamente
atendido. Milhõ es de xiitas alistaram-se para o que acreditavam ser uma ”resistência santa”. O Irã
reequilibrou a guerra e aconteceu o inesperado: partiu para a ofensiva. Foi nesse momento que,
temendo gravemente a vitó ria iraniana, os Estados Unidos e as monarquias do golfo, nem um pouco
interessadas em assistir a uma nova vitó ria fundamentalista, apoiaram o Iraque. Com os apoios
militar dos Estados Unidos e financeiro do Kuwait, o Iraque se recompô s, e a guerra entrou em sua
fase mais cruel, com centenas de milhares de mortos de ambos os lados, em um conflito fratricida. A
guerra terminou apenas em 1988, com um saldo de aproximadamente 1 milhã o de mortos, os dois
países arrasados e as fronteiras nos mesmos lugares de 1980.

Jihad: Traduzido equivocadamente como “guerra santa”, na realidade seria mais correto designar como “resistência santa”, uma vez
que o termo adaptado ao português apresenta controvérsias. Em textos de política e geopolítica, normalmente o termo está
associado aos momentos de conflito, mas ele tem uma conotação mais ampla e presente no cotidiano muçulmano.
C. Sappa/De Agostini/Getty Images

Está tuas que homenageiam os soldados iraquianos mortos na Guerra Irã -Iraque, 2014. As figuras apontam em direçã o ao
estuá rio Chat el Arab, na divisa entre os dois países.

Ver
Persépolis. Direção: Marjane Satrapi e Vincent Paronnaud. França, 2008.
Animaçã o, com forte teor político, que retrata a infâ ncia da cineasta Marjane Sartrapi no contexto da Revoluçã o
Islâ mica.

Filme de Marjane Satrapi e Vincent Paronnaud. Persépolis. França, 2008


Pá gina 175

4.1.3 A Guerra do Golfo (1991)

Irã e Iraque ficaram arrasados em virtude da guerra. O Iraque encontrava-se em situaçã o pior, pois,
além de destruído, estava endividado com seu grande credor: o Kuwait.

Durante a Guerra Irã -Iraque, as monarquias do Golfo Pérsico nã o escondiam sua preferência pelo
Iraque, mas o Kuwait foi o ú nico país a apoiá -lo e, por isso, foi declarado inimigo pelo Irã . Durante a
guerra, os petroleiros kuwaitianos navegavam nas á guas do golfo com a bandeira estadunidense,
temendo os ataques do Irã .

Terminada a guerra e diante da situaçã o na qual se encontrava, Saddam Hussein voltou-se contra o
pequeno país do golfo: queria que o Kuwait perdoasse a dívida e ainda o acusou de explorar
petró leo no lado iraquiano da fronteira, cobrando por isso indenizaçõ es. Saddam também recorreu
a uma pendência histó rica desde o período do Império Otomano, alegando que, na realidade, o
Kuwait nã o passava da 19ª província iraquiana: nunca existira como Estado, logo era direito
iraquiano readquiri-lo. Além de todos esses fatores, devemos lembrar que o Kuwait era detentor da
quarta maior reserva de petró leo na época. Por isso, o Iraque invadiu o Kuwait em agosto de 1990.

A ONU deu um ultimato a Saddam Hussein para retirar suas tropas do país, o que nã o foi cumprido
pelo líder iraquiano. Assim, em fevereiro de 1991, eclodiu a Guerra do Golfo, que consistiu em um
ataque à s tropas iraquianas estacionadas no pequeno país do golfo; o apelo era pela libertaçã o do
Kuwait.

A guerra foi rá pida. Os Estados Unidos lideraram uma coalizã o de 32 países; foi uma preocupaçã o
da potência dar conotaçã o de “coalizã o internacional” à operaçã o denominada “Tempestade no
deserto”, mas, na prá tica, foram as forças estadunidenses que comandaram as operaçõ es. Observe a
fotografia a seguir.

As tropas iraquianas foram expulsas, o Iraque, derrotado e colocado sob sançõ es da ONU, o que
gradativamente arruinou sua economia. Essa situaçã o levou o Iraque a se tornar um dos países
mais pobres da regiã o, apesar de suas privilegiadas reservas de petró leo e á gua. Entretanto,
Saddam Hussein continuou no poder; os esforços para derrubá -lo foram parcos. Tornar -se-ia o
Iraque, a partir de 1991, um Estado pá ria no sistema internacional.

Estado pária: País colocado no isolamento, normalmente sob embargo econô mico.
Dominique Mollard/AP/Glow Images

Guerra do Golfo, uma guerra televisionada: na realidade, a guerra durou trê s dias, embora o Iraque só tenha aceitado o
cessar-fogo seis semanas apó s os primeiros bombardeios. Na fotografia, mísseis antiaé reos riscam o cé u de Bagdá , em 1991.
Pá gina 176

4.1.4 A Guerra do Iraque (2003)

Apó s os ataques terroristas de 11 de setembro de 2001, o entã o presidente dos Estados Unidos,
George W. Bush, iniciou uma série de discursos insinuando que o Iraque produzia armas de
destruiçã o em massa.

Esses discursos estavam inseridos nas diretrizes de sua política externa, na época pautada pela
“guerra ao terror” e combate ao chamado “eixo do mal”, expressã o cunhada por Bush para se referir
aos “Estados vilõ es”, Irã , Iraque e Coreia do Norte, com os respectivos programas nucleares. Tudo
isso levou a primeira década do novo século a um forte unilateralismo praticado pela ú nica grande
potência. O jornalista paquistanês Tariq Ali relata no texto a seguir a propaganda de medo que
antecedeu a invasã o estadunidense ao Iraque.

US Army, HO/AP/Glow Images

Saddam Hussein foi capturado em 2003, julgado e executado por um tribunal que ele negou reconhecer até o momento de
sua morte. Problemá tico sob o domínio de Saddam, o Iraque nã o vivenciou dias melhores desde entã o.

Ler
Bush na Babilônia: a recolonização do Iraque, de Tariq Ali. Rio de Janeiro: Record, 2003.
Essa obra do escritor paquistanês radicado na Inglaterra apresenta detalhes da histó ria recente do Iraque e de como
Saddam Hussein passou de aliado a inimigo estadunidense.

Enfoque
ESCREVA NO CADERNO

O presidente Bush, apoiado pelas redes de televisã o domesticadas, viera reforçando a questã o das armas nos sete
meses anteriores à invasã o. A propaganda caiu sobre o pú blico estadunidense como uma tonelada de tijolos, mas fora
do país poucos acreditaram nos exageros. Ainda assim, a Casa Branca persistiu e os redatores dos discursos de Bush
ficaram muito ocupados com esse tema, como se revela na seguinte compilaçã o:

Agora mesmo o Iraque está expandindo e melhorando as instalaçõ es que foram usadas para a produçã o de armas bioló gicas.

Discurso nas Naçõ es Unidas, 12 de setembro de 2002.

O Iraque acumulou armas químicas e bioló gicas e está reconstruindo as instalaçõ es usadas para fazer mais dessas armas.

Temos fontes que nos revelam que Saddam Hussein autorizou recentemente os comandantes de tropas iraquianas a usar
armas químicas – as mesmas que o ditador diz nã o ter.
Discurso no rádio, 5 de outubro de 2002.

O regime iraquiano [...] possui e produz armas químicas e bioló gicas. Está procurando armas nucleares.

Discurso em Cincinati, estado de Ohio, 7 de outubro de 2002.

Nossos agentes de serviço de informaçõ es estimam que Saddam Hussein tinha maté rias-primas para produzir até 500
toneladas de sarin, gá s mostarda e agentes dos nervos VX.

Discurso do Estado da Uniã o, 28 de janeiro de 2003.

As informaçõ es [...] nã o deixam dú vida de que o regime do Iraque continua a possuir e esconder algumas das armas mais
letais já inventadas.

Discurso à Naçã o, 17 de março de 2003. ALI, Tariq. Bush na Babilônia: a recolonizaçã o do Iraque. Rio de Janeiro: Record, 2003. p. 159-160.

• Em sua opiniã o, como a propaganda política pode convencer a populaçã o a apoiar uma guerra?

Tariq Ali dizia na época que George W. Bush havia preparado um clima de demonizaçã o mundial
contra Saddam Hussein para justificar os ataques, considerando-o uma grande ameaça à paz
mundial. Especialistas também afirmavam que o Iraque nã o tinha condiçõ es de desenvolver armas
de destruiçã o em massa por causa do estado de penú ria em que o país se encontrava apó s o
embargo.

Essas armas alardeadas por Bush jamais foram encontradas.

Mesmo nã o tendo conseguido a aprovaçã o de uma resoluçã o específica no Conselho de Segurança


da ONU para atacar o Iraque, os Estados Unidos iniciaram os ataques ao país do golfo no dia 19 de
março de 2003. Era a primeira vez que acontecia um ataque dessa ordem sem a aprovaçã o da ONU
desde sua criaçã o, em 1945. Na realidade, Bush já havia avisado anteriormente sobre suas
intençõ es:

Os Estados Unidos irã o se empenhar incessantemente para angariar apoio da comunidade internacional; no entanto, nã o
hesitaremos em agir sozinhos, se necessá rio, para exercer nosso direito de autodefesa, agindo de forma preventiva [...] para
evitar que eles causem danos ao nosso povo e a nosso país.

BUSH, George W. A estratégia de segurança nacional dos EUA: documento enviado ao Congresso dos Estados Unidos em 20 de setembro de 2002. Revista Política Externa, v. 11, n.
3, p. 78, 2002/2003.
Pá gina 177

Bush foi alertado pelo chefe das inspeçõ es da ONU no Iraque, o sueco Hans Blix, de que nã o tinha
elementos para afirmar a existência dessas terríveis armas no país; ainda assim, os Estados Unidos
iniciaram a guerra. “Nenhuma arma ou substâ ncia proibida foi encontrada. Nã o posso saltar para a
conclusã o de que elas existam”, afirmou Blix, em fevereiro de 2003. Anos mais tarde, seriam
contestadas as denú ncias da CIA, pondo um fim dramá tico no governo Bush.

Em menos de um mês, Bagdá foi bombardeada. As tropas iraquianas nã o tinham condiçõ es de


resistir à aliança estadunidense-britâ nica, principais protagonistas da “aliança”. O Estado iraquiano
ficou completamente destruído, transformando -se em um abrigo das mais variadas vertentes
terroristas, que viram nesse país o lugar ideal para se estruturarem. Milhares de mortes foram
contabilizadas desde entã o, e o país foi entregue a uma luta fratricida interna envolvendo os vá rios
grupos lá presentes, com frequentes atentados terroristas, seja contra alvos britâ nicos e
estadunidenses, seja entre os pró prios grupos rivais. No meio dessa violência, estava a sociedade
civil.

O Iraque é marcado pelas hostilidades entre três grupos rivais: os á rabes xiitas, os á rabes sunitas e
os curdos. Os á rabes xiitas, concentrados no sudeste do país, sã o a maioria e representam
aproximadamente 60% da populaçã o de 35 milhõ es de habitantes. Os á rabes sunitas somam 20% e
habitam a porçã o intermediá ria, no centro do Iraque. Já os curdos sunitas representam 15% da
populaçã o iraquiana e vivem ao norte, na zona de contato com outros países que também
apresentam minoria curda. Os demais grupos somam 5% da populaçã o. A convivência entre eles é
litigiosa, e por essa razã o nã o está afastada a possibilidade da fragmentaçã o do Iraque. O mapa a
seguir retrata a diversidade étnica e a localizaçã o dos grupos populacionais no Iraque.

Em 18 de dezembro de 2011, sob o governo de Barack Obama, entã o presidente dos Estados
Unidos, ocorreu a retirada das ú ltimas tropas estadunidenses do territó rio iraquiano. Era o fim de
quase nove anos de ocupaçã o militar, desde a derrubada de Saddam Hussein.

Allmaps
Fonte: SMITH, Dan. O atlas do Oriente Médio. Sã o Paulo: Publifolha, 2008. p. 87.
Pá gina 178

ROTEIRO DE ESTUDO
ESCREVA NO CADERNO

Revisando

1. A Turquia ascende como destaque regional e por sua política externa bastante atuante. Aponte alguns
problemas internos da geopolítica turca.

2. Os á rabes nunca aceitaram as derrotas para Israel, e o conflito á rabe-israelense é intenso na regiã o.
Pelo que você aprendeu neste capítulo, quem tem direito à s terras que os judeus chamam de Israel e os
á rabes, de Palestina? Ou você entende que é plenamente possível uma conciliaçã o e convivência entre os
lados envolvidos?

3. Em 1947, a ONU encaminhou uma soluçã o propondo a partilha da Palestina em dois Estados. Qual é a
importâ ncia da ONU no problema israelo-palestino?

4. Em 5 de junho de 1967, Israel realizou ataques-surpresa simultaneamente ao Egito, à Síria e à


Jordâ nia, os países á rabes mais fortes. Discuta a importâ ncia territorial da Guerra dos Seis Dias.

5. Os Estados Unidos intervieram no conflito Irã -Iraque. Como o Irã tornou-se inimigo dos Estados
Unidos e por quê?

6. A guerra Irã -Iraque durou oito anos, deixou um saldo de aproximadamente 1 milhã o de mortos, e os
dois países saíram arrasados. O que motivou essa guerra?

7. O Iraque invadiu o Kuwait em agosto de 1990. Quais foram os motivos alegados por Saddam Hussein
para invadir o Kuwait?

8. A Guerra do Golfo foi uma guerra televisionada: na realidade, durou três dias, embora o Iraque só
tenha aceitado o cessar-fogo seis semanas apó s os primeiros bombardeios. Como ficou a situaçã o do
Iraque depois da Guerra do Golfo?

9. Mesmo sem a aprovaçã o de uma resoluçã o específica no Conselho de Segurança da ONU para atacar o
Iraque, os Estados Unidos iniciaram os ataques ao país do golfo no dia 19 de março de 2003. Era a
primeira vez que acontecia um ataque dessa ordem sem o consentimento da ONU desde sua criaçã o, em
1945. Analise o contexto internacional que antecedeu a Guerra do Iraque em 2003.

Olhar cartográfico

Observe o mapa abaixo sobre a ocupaçã o da Cisjordâ nia e, em seguida, responda à s questõ es.

1. Por que a Cisjordâ nia está sendo cercada por muros?

2. Observe a localizaçã o de Jerusalém e explique por que a cidade ocupa uma á rea estratégica.
Allmaps

Fonte: FERREIRA, Graça Maria Lemos. Atlas geográfico: espaço mundial. 4. ed. Sã o Paulo: Moderna, 2013. p. 103.
Pá gina 179

Atividade em grupo

Qual é a posiçã o do Brasil quanto à criaçã o de um Estado palestino? Pesquisem essa questã o e, apó s
chegarem a uma conclusã o, apresentem um parecer, favorá vel ou contrá rio, sobre a posiçã o oficial do
país, com justificativas.

De olho na mídia

A política externa do presidente estadunidense Barack Obama (2009-2016) alcançou ao menos duas
importantes iniciativas histó ricas: a reaproximaçã o dos Estados Unidos com Cuba e com o Irã ; essa
ú ltima é tema da matéria a seguir. Os acordos sobre o programa nuclear iraniano e o fim das sançõ es
econô micas contra o Irã também envolveram Rú ssia, Alemanha, França, Reino Unido e Uniã o Europeia.
Leia o texto, retome as informaçõ es apresentadas no capítulo e responda: em sua opiniã o, a
reaproximaçã o do Ocidente com o Irã foi acertada? Justifique sua resposta abordando aspectos
econô micos e geopolíticos.

EUA e UE revogam sanções após Irã cumprir acordo nuclear

Os EUA e a Uniã o Europeia anunciaram neste sá bado [16/1/2015] a revogaçã o de sançõ es econô micas em vigor há anos
contra o Irã , abrindo caminho para o país persa se integrar à economia mundial.

A decisã o foi tomada como consequê ncia de acordo nuclear fechado no ano passado, e apó s a Agência Internacional de
Energia Atô mica (AIEA), braço da ONU, certificar que o país persa cumpriu as obrigaçõ es a que se comprometeu.

O anú ncio ocorreu horas depois de o Irã ter libertado quatro americanos, incluindo o repó rter do The Washington Post
Jason Rezaian, em troca de sete iranianos presos ou indiciados nos EUA.

O estudante americano Matthew Trevithick també m foi solto, mas sem relaçã o com o acordo, segundo os EUA.

“As sançõ es econô micas e financeiras multinacionais estã o revogadas”, anunciou a chefe de política externa da Uniã o
Europeia, Federica Mogherini, durante entrevista em Viena com o chanceler iraniano, Mohammad Javad Zarif.

O secretá rio de Estado dos EUA, John Kerry, que liderou as negociaçõ es nos ú ltimos anos com Zarif, afirmou: “Hoje marca o
momento em que o acordo nuclear passa de uma promessa ambiciosa para uma açã o direta”.

Com a revogaçã o das sançõ es, o Irã voltará a ter acesso a US$ 100 bilhõ es de bens congelados. A medida também permitirá
ao país se beneficiar de novas oportunidades comerciais, financeiras e no setor do petró leo.

Para o diretor-geral da AIEA, Yukiya Amano, a certificaçã o dada pela agê ncia a Teerã significa que “as relaçõ es entre o Irã e a
AIEA entram em uma nova fase”.

Sob o acordo de 14 de julho, o Irã concordou em desmantelar programas que poderiam ser usados para fabricar armas
atô micas em troca do fim das sançõ es. O pacto coloca vá rias atividades da naçã o sob supervisã o da AIEA por 15 anos, com a
opçã o de que puniçõ es sejam reimpostas se o Irã descumprir os compromissos.

[...]

EUA E UE REVOGAM sançõ es apó s Irã cumprir acordo nuclear. Folha de S.Paulo, 16 jan. 2015. Fornecido pela Folhapress. Disponível em:
<http://www1.folha.uol.com.br/mundo/2016/01/1730377-eua-e-uniao-europeiamlevantam-sancoes-contra-o-ira.shtml>.Acesso em: 22 fev. 2016.
Leonhard Foeger/Reuters/Latinstock

O chanceler iraniano, Mohammad Javad Zarif, e a chefe de política externa da Uniã o Europeia, Federica Mogherini, durante
entrevista coletiva em Viena, Á ustria, em 2016. Na ocasiã o, Mogherini anunciou a revogaçã o das sançõ es econô micas ao Irã .
Pá gina 180

Mundo árabe, Cáucaso e


CAPÍTULO 9 -
Ásia Central

Crédito do infográ fico: Casa Paulistana

Lefteris Pitarakis/AP/Glow Images

Kate Brooks/Corbis/Latinstock

Aamir Qureshi/Getty Images

Michael Evstafiev/AFP/Getty Images

Ponto de partida
ESCREVA NO CADERNO

• Identifique quais aspectos inserem o mundo á rabe, o Cá ucaso e a Á sia Central, o Afeganistã o e o
Paquistã o no cená rio geopolítico mundial.
Pá gina 181

Tópicos do capítulo

Primavera Árabe

Estado Islâmico

Cáucaso e Ásia Central

Afeganistão, Paquistão e o fundamentalismo islâmico


Pá gina 182

1. A Primavera Árabe
Em 2011, eclodiu uma série de levantes em diversos países do norte africano e Oriente Médio, que
ficaram conhecidos como Primavera Á rabe. Essencialmente, o movimento foi fruto da indignaçã o
popular contra regimes totalitá rios havia décadas no poder no mundo á rabe e que pouco
contribuíram para conquistas sociais.

O processo iniciou-se na Tunísia, em dezembro de 2010, quando um jovem ambulante teve suas
frutas e legumes apreendidos pela polícia local. Inconformado com sua situaçã o de desempregado,
com a corrupçã o e com a repressã o que imperava no país, ateou fogo ao pró prio corpo, o que o
levou à morte. O episó dio escancarou o clima de indignaçã o e penú ria pelo qual passava o país,
presidido por uma ditadura familiar desde 1987. Esse fato levou a uma onda de revolta contra o
regime que saqueava o país havia anos: o ditador Zine el Abidine Ben Ali cairia no início de 2011. A
partir daí, o movimento alastrou-se de forma rá pida e contagiante por todo o mundo á rabe.
Observe a fotografia ao lado e o mapa a seguir.

Fethi Belaid/AFP/Getty Images

Tunísia, berço do levante á rabe. Apó s os episó dios, o país assistiu à s primeiras eleiçõ es livres promovidas pela Primavera
Á rabe, vencidas pelos partidos islâ micos. Na fotografia, manifestaçã o popular em Tú nis, em 2011.
Allmaps

Fonte: HAYWOOD, John. Atlas histórico do mundo. Colô nia: Kö nemann, 2001. p. 220-221.

Mundo á rabe: mais de 250 milhõ es de habitantes no Oriente Mé dio e no Norte da Á frica.
Pá gina 183

A segunda mobilizaçã o da Primavera Á rabe ocorreu no Egito, contra o regime de Hosni Mubarak,
líder apoiado pelos Estados Unidos. Foi um movimento espontâ neo e aná rquico que causou a queda
do ditador meses depois.

Ao contrá rio da Tunísia, o Egito é um país central na geopolítica do Oriente Médio e de todo o
mundo á rabe. Desde tempos remotos esteve no centro da histó ria dos povos á rabes. Exerceu papel
de mediador no conflito israelo-palestino, o que foi visto com desconfiança por grande parte da
populaçã o crítica das açõ es israelenses. Na visã o de muitos egípcios, Mubarak era condescendente
demais com Israel e Estados Unidos.

O Egito é marcado por um interessante mosaico estratégico. Como “ponte geográ fica" entre Á frica e
Á sia, o país faz parte do cená rio regional do Oriente Médio e da Á frica setentrional. O Canal de Suez,
construído no final do século XIX, ainda hoje é uma importante rota do petró leo mundial, apesar de
sua obsolescência. Internamente, a sombra do fundamentalismo é problema antigo. Apó s o
assassinato do presidente Anwar al Sadat, em 1981, Hosni Mubarak, o entã o vice-presidente que
assumiu o comando do país, também foi vítima de atentado do terror islâ mico, em 1995; ele
escapou por pouco. Com o objetivo de prejudicar as finanças do país, os extremistas realizaram
atentados contra turistas nas pirâ mides do Egito nos anos 1990.

Al-Gama’a al-Islamiyya, Jihad Islâ mica e a tradicional Irmandade Islâ mica (ou Fraternidade
Muçulmana) sã o os mais importantes grupos. Os dois primeiros sã o fundamentalmente
extremistas, enquanto o ú ltimo tem uma longa trajetó ria política na histó ria do Egito. Apesar da
atuaçã o parlamentar, a Irmandade foi colocada na clandestinidade tanto por Gamal Abdul Nasser
(presidente do Egito de 1956 a 1970) como por Mubarak. Sua bandeira é a construçã o de um
Estado islâ mico no Egito. Foi taxado como grupo terrorista por esses governos, mas tem respaldo
popular. Já recorreu a métodos extremistas, porém renunciou a tais propó sitos. Com a realizaçã o
das eleiçõ es parlamentares apó s a queda de Mubarak, o partido ligado à Irmandade foi o mais
votado e elegeu o presidente Muhammad Mursi em 2011. Seu slogan: “o Islã é a soluçã o”. No
entanto, o presidente eleito ficou apenas um ano no poder e foi derrubado por um golpe de Estado
(veja a fotografia abaixo). Questioná veis eleiçõ es foram convocadas, e os militares, maior força
política do país, voltaram ao poder em 2013 na figura do general Abdul al-Sisi.

A Líbia é outro país inserido nesse contexto de transformaçõ es no mundo á rabe. Lá se configurou o
lado mais violento das revoltas, culminando com a execuçã o do líder líbio, Muammar Kadafi, que
estava há mais de 40 anos no poder.

Kaled Desouji/AFP/Getty Images


Egípcios em rua do Cairo na é poca do golpe de Estado realizado por militares, em 2013.
Pá gina 184

Nesse período, Kadafi (retratado na fotografia ao lado) oscilou entre a inimizade e a proximidade
com as potências ocidentais. Chamado de “cachorro louco” pelo ex-presidente dos Estados Unidos,
Ronald Regan (1981-1989), e colocado no isolamento ao longo dos anos 1990, encaminhou uma
reaproximaçã o com líderes europeus e com outro ex-presidente estadunidense, George W. Bush
(2001-2009). Além do interesse pelo petró leo do país, a busca por obtençã o de informaçõ es sobre a
rede terrorista Al-Qaeda foi uma justificativa dada por líderes ocidentais para a reaproximaçã o com
Kadafi, apó s os atentados terroristas aos Estados Unidos em 2001.

Kadafi foi derrubado por um movimento armado que se iniciou na parte oriental do país. Os
insurgentes foram gradativamente se organizando e contaram com o apoio da Organizaçã o do
Tratado do Atlâ ntico Norte (Otan), que lhes dera retaguarda aérea enquanto as forças terrestres
avançavam até Trípoli, sede do poder. Kadafi fugiu para o interior até ser capturado e, em seguida,
executado.

Mark III Photonics/Shutterstock/Glow Images

O vié s violento da Primavera Á rabe mostrou-se intensamente na Líbia, onde seu excê ntrico ditador foi executado. Na
fotografia, Muammar Kadafi em visita à Ucrâ nia, em 2008.

A Geografia na... charge!


ESCREVA NO CADERNO

A charge ironiza os interesses ocidentais na intervençã o da crise líbia que levou à queda do regime de Muammar
Kadafi.

• Que interpretaçã o você faz dessa imagem?


Rice

Charge de Rice, publicada em 2011.

Outro país importante na histó ria dos povos á rabes é a Síria, cuja capital, Damasco, foi sede do
primeiro califado á rabe, o Omíada. O país também foi atingido pela Primavera Á rabe em ondas de
protestos contra o governo de Bashar al-Assad, que assumira o poder em 2000, substituindo seu
pai, Hafez al-Assad, que, por sua vez, ficara 30 anos no comando do país.

Os protestos iniciaram em março de 2011 e tomaram, rapidamente, forma de uma guerra civil que
se estende até os dias atuais (2016). O conflito sírio envolveu diretamente os Estados Unidos e a
Rú ssia, convertendo-se em uma questã o estratégica global. O regime pró -Moscou de al-Assad
contava com a antipatia dos Estados Unidos e da França. A interferência e a divergência dos
interesses das potências mundiais na Síria levou à crise chamada de “mini guerra mundial”. A
Rú ssia realizou diversos ataques, em 2015 e 2016, contra opositores do regime de al-Assad,
enquanto Estados Unidos e Turquia apoiavam rebeldes anti-Damasco. Ao mesmo tempo, os curdos,
que vivem em uma á rea entre o norte do Iraque, Síria, Irã e Turquia, aproveitavam o momento de
instabilidade para organizar uma possível independência. Mas os governos desses países,
principalmente da Turquia, nã o admitem essa possibilidade.

Ver
Kadafi, nosso melhor inimigo Direção: Antoine Vitkine. França, 2011.
Documentá rio baseado na figura lendá ria do general Muammar Kadafi.

Pauta musical
Primavera Árabe, Wado. Álbum: Vazio Tropical. Oi Música, 2013.
Pauta: Primavera Á rabe.

LP Vazio Tropical. Wado. Brasil, 2013


Pá gina 185

De acordo com estimativas do Alto Comissariado das Naçõ es Unidas para os Refugiados (Acnur),
até 2015, a guerra civil síria gerou quatro milhõ es de refugiados e sete milhõ es deslocados dentro
da Síria. Os nú meros de mortos sã o desencontrados: enquanto a ONU divulgou 250 mil, o jornal
britâ nico The Guardian mencionava 470 mil, calculados com base nos dados do Centro Sírio para
Pesquisa Política.

A Síria é um complexo mosaico cultural, onde há vá rias comunidades religiosas e a distribuiçã o do


poder nã o reflete essa realidade. O presidente sírio é membro de um clã minoritá rio, os alauitas,
enquanto o país é majoritariamente sunita, embora haja outras comunidades islâ micas e cristã s.

Tal qual o Egito e ao contrá rio da Líbia, a Síria é fundamental para o equilíbrio do Oriente Médio,
pois está localizada no centro da regiã o nã o apenas geograficamente, mas também no que se refere
à s questõ es culturais e políticas: é rival de Israel, com o qual, inclusive, tem pendências territoriais
em relaçã o à s Colinas de Golã . Além disso, tem uma aliança velada com o Irã contra Israel; apoia o
regime do Hezbollah, força política e militar no Líbano, igualmente anti-israelense, além de ter uma
histó rica influência no país libanês.

A importâ ncia estratégica da Síria a colocou no centro das preocupaçõ es das revoltas á rabes e o
confuso cená rio geopolítico tinha nesse país um elemento decisivo para o futuro da regiã o. No
primeiro semestre de 2016, os principais atores envolvidos na Síria tentavam delinear um acordo
para por fim à guerra.

Inicialmente vista como esperança por dias melhores ao mundo á rabe, a Primavera Á rabe síria,
somada aos distú rbios do Iraque, trouxe à cena o grupo Estado Islâ mico (ou Organizaçã o do Estado
Islâ mico), novo protagonista na geopolítica do Oriente Médio.

Karm Seif/Shaam News Network/Reuters/Latinstock


Mesquita danificada na Síria, país central na geopolítica do Oriente Mé dio. Fotografia de Douma apó s bombardeio em
dezembro de 2012.

Navegar
Revista Fórum <http://tub.im/fjbigt>
O site da revista Fórum contém um texto de Immanuel Wallerstein, soció logo estadunidense, que analisa os rumos
da Primavera Á rabe.
Pá gina 186

Enfoque
ESCREVA NO CADERNO

O professor John V. Pavlik, da Universidade Estadual de Nova Jersey, nos Estados Unidos, publicou em 2011, um texto
que trata de uma temática cada vez mais atual: as relaçõ es entre as mídias sociais, o jornalismo e a democracia. O
trecho apresentado abaixo aborda a questã o citando a utilizaçã o das mídias sociais durante a Primavera Á rabe. Leia-
o atentamente e, a seguir, responda às questõ es.

A Primavera Árabe e as mídias sociais

[...] A mídia social desempenhou um papel central nestes movimentos sociais e protestos políticos. [...] Os cidadã os
utilizaram as mídias sociais e os telefones celulares para comunicar e compartilhar informaçõ es alé m de organizar as suas
atividades, e à s vezes passar a perna nas autoridades. [...]

As mídias noticiosas tradicionais funcionaram para colocar o fluxo da consciê ncia das mídias sociais num contexto e numa
perspectiva mais amplos, alé m de fornecerem informaçõ es adicionais. As mídias noticiosas impressas e eletrô nicas
entregaram as notícias dos distú rbios na regiã o para o resto do mundo e enquadraram o conflito no contexto histó rico,
político etc. Os jornalistas profissionais fizeram entrevistas com uma gama de fontes diversas, incluindo fontes oficiais do
governo, fontes dos rebeldes e fontes de cidadã os particulares, para adicionar a coerê ncia à s imagens fragmentadas e à s
vezes conflitantes vindas de lugares como a Praça Tahrir, no Cairo.

William H. Dutton, diretor do Oxford Internet Institute, realizou uma pesquisa que indica que os indivíduos conectados na
rede estã o se tornando o que ele chama um “quinto estado” (Dutton, 2009). Da mesma forma que a mídia noticiosa vem
atuando historicamente como um quarto estado, na fiscalizaçã o dos trê s estados ou poderes do governo, o pú blico
capacitado pelas mídias mó veis e sociais age atualmente muitas vezes independentemente - como uma fiscalizaçã o do
governo pelos cidadã os com base na reportagem das notícias. Alé m disso, uma pesquisa realizada em Moscou, na Rú ssia,
indica que as mídias noticiosas tradicionais tê m dificuldade na concorrê ncia com as mídias sociais em termos de velocidade
com relaçã o à s notícias “quentes” (Zassoursky, 2010). [...] O enorme nú mero de jornalistas/cidadã os que colhem e
distribuem notícias com seus dispositivos mó veis e outras mídias digitais capacitadas pela internet frequentemente supera
muito a força de trabalho das mídias noticiosas tradicionais. Naturalmente, os jornalistas/cidadã os podem muitas vezes
errar na apresentaçã o dos fatos, e daí dependem dos mecanismos de autocorreçã o da internet e das mídias sociais.

Esta histó ria de sinergia entre as mídias sociais e a transparê ncia on-line na Primavera Á rabe continuou na Síria, na Líbia e
em outros lugares na regiã o. No Egito, as autoridades tentaram acabar com os distú rbios ao cortar o serviço da internet.
Ironicamente, esta açã o poderá ter alimentado ainda mais a revolta, ao tornar os cidadã os mais raivosos. Num estudo da
situaçã o na Praça Tahrir, Navid Hassanpour, da Universidade de Yale, achou que

a interrupção da cobertura celular e da internet no dia 28 exacerbou os distúrbios de três maneiras principais. Implicou muitos
cidadãos apolíticos que não sabiam ou não se interessavam nos distúrbios; obrigou mais comunicação cara a cara, i.e., mais
presença física nas ruas; e finalmente descentralizou efetivamente a rebelião no dia 28 através de novas táticas híbridas de
comunicação, produzindo um atoleiro muito mais difícil de controlar e reprimir que uma única reunião enorme em Tahrir
(Hassanpour, 2011).

Com um bilhã o de pessoas usando as mídias sociais e uma estimativa de cinco bilhõ es de telefones celulares em uso no
mundo inteiro (World Bank, 2011), o potencial impacto cumulativo das mídias mó veis noticiosas e sociais na democracia é
profundo. As provas sugerem que esta tã o espalhada tecnologia digital poderia promover nã o apenas o desenvolvimento
econô mico, mas també m a participaçã o política onde outra infraestrutura fica limitada. As quase onipresentes mídias
digitais mó veis podem dar poder ao indivíduo, e potencialmente acabar com a divisã o digital e a brecha de informaçõ es. Com
um diá logo ativo e interativo entre os jornalistas profissionais e os indivíduos conectados à rede, chamados de jornalistas-
cidadã os por algumas pessoas, é possível diminuir a brecha de conhecimentos em assuntos de importâ ncia pú blica. Há a
possibilidade de fazer com que os cidadã os se dediquem à democracia digital.

PAVLIK, John V. A tecnologia digital e o jornalismo: as implicaçõ es para a democracia. Brazilian Journalism Research. v. 7, n. II, 2011. p. 107- 109; 111-112. Disponível em:
<http://bjr.sbpjor.org.br/bjr/article/viewFile/340/314>. Acesso em: 12 maio 2016.

1. Por que William H. Dutton indica que os indivíduos conectados à rede internacional de computadores estã o se
tornando um “quinto estado”? Em sua resposta, utilize exemplos do texto sobre o uso das redes sociais nos eventos
da Primavera Á rabe.
2. Tomando como exemplo os casos mencionados na Primavera Á rabe, qual é a importâ ncia das redes sociais na
divulgaçã o de bandeiras políticas e ideoló gicas ou como instrumento de mobilizaçã o? Você participa de debates
políticos on-line ou já foi a manifestaçõ es que foram divulgadas por meio de postagens em redes sociais?
Pá gina 187

2. O Estado Islâmico: um fenômeno extremista


O frá gil governo iraquiano que se seguiu apó s a queda do regime de Saddam Hussein, em 2003, nã o
foi reconhecido pelos principais grupos que formam a populaçã o do Iraque: os á rabes xiitas, os
á rabes sunitas e os curdos. A ausência de um Estado organizado e de um ponto de equilíbrio entre
esses grupos rivais levaram à divisã o do país e a uma guerra sectá ria: entre 2003 e 2006 mais de
seis mil civis foram mortos em atentados.

Nesse cená rio instá vel, novos grupos extremistas se instalaram no territó rio iraquiano, como o
Jamma Jamma’ at al Tawhid, de orientaçã o sunita, fundado pelo jordaniano Abu Musab al-Zarqawi,
seguidor de Osama bin Laden, que lutava contra a monarquia jordaniana e contra o novo governo
iraquiano. Quando irrompeu a guerra civil no Iraque, al-Zarqawi rebatizou seu grupo como AQI
(Al-Qaeda no Iraque) e passou a realizar diversos atentados contra alvos estadunidenses, britâ nicos
e xiitas. Com a morte de al-Zarqawi em 2006, em uma açã o das forças dos Estados Unidos, o grupo
passou a se chamar ISI (Estado Islâ mico do Iraque) e se distanciou da Al-Qaeda.

Na Síria, entre 2011 e 2012, diversos grupos se rebelaram contra o governo de Bashar al-Assad no
contexto da Primavera Á rabe. Dentre eles estava uma frente da Al-Qaeda que atuava no territó rio
sírio, a milícia al-Nusra. Essa selava uma aliança com o ISI. No entanto, com os desdobramentos da
guerra civil síria as relaçõ es entre o ISI e a Al-Qaeda se deterioraram e surgiu o Isis ou Isil (Estado
Islâ mico do Iraque e da Síria ou Levante). O novo grupo tem como principal proposta a criaçã o de
um califado entre os territó rios sírio e iraquiano. Ele nã o reconhece as fronteiras atuais do Oriente
Médio, pois as considera delimitaçõ es de uma ordem colonial ainda vigente e contra a qual lutam.

Em 2014, o líder do Isis, Abu Bakr al-Baghdadi, anunciou a mudança da nomenclatura do grupo
para Estado Islâ mico e a fundaçã o de um califado do qual ele se autoproclamou o califa, ambos nã o
reconhecidos pela comunidade internacional. Como vimos anteriormente, a expressã o “califa” tem a
conotaçã o político-religiosa de sucessor do profeta Maomé.

Handout/Alamy/Latinstock

As açõ es do Estado Islâ mico aterrorizam a populaçã o da Síria e do Iraque. Na fotografia, integrantes do Estado Islâ mico
exibem tanques militares e bandeiras do grupo em cidade no norte da Síria, 2014.

Interagindo
ESCREVA NO CADERNO
• Vimos nesse capítulo e no anterior que a ordem política do mundo árabe foi bastante modificada nos ú ltimos anos.
O que aconteceu com muitos dos países dessa regiã o em termos de estabilidade? Em sua opiniã o a queda dos regimes
totalitá rios, como aconteceu no Iraque, na Líbia e na Tunísia, foi benéfica aos povos á rabes? Justifique a sua resposta.
Pá gina 188

3. A Ásia Central e o Cáucaso


Desde a dissoluçã o soviética, em 1991, a estratégica regiã o que se estende desde o Cá ucaso, limite
leste europeu, até a Á sia Central tornou-se alvo de disputa entre quatro gigantes da geopolítica
mundial: Rú ssia, Estados Unidos, China e Uniã o Europeia. Entre o Cá ucaso e a Á sia Central,
encontra-se o mar Cá spio. Observe essa regiã o no mapa abaixo.

Allmaps

Fonte: ATLAS geográ fico escolar. 6. ed. Rio de Janeiro: IBGE, 2012. p. 32.

Navegar
Mundorama <http://tub.im/dcb65s>
O site Mundorama realiza divulgaçã o científica na área de relaçõ es internacionais. No link indicado há um bom
texto sobre a geopolítica na Á sia Central.

A chamada Á sia Central compreende centralmente Cazaquistã o, Quirguistã o, Tadjiquistã o,


Uzbequistã o e Turcomenistã o. Já o Cá ucaso compreende Geó rgia, Armênia, Azerbaijã o e parte do
territó rio russo, incluindo também a Chechênia, uma repú blica separatista russa. Mapas anteriores
a 1991 trazem as duas á reas incluídas nos domínios da Uniã o Soviética.

Durante a Guerra Fria, o Cá ucaso, o mar Cá spio e a Á sia Central, na prática uma contiguidade
geográ fica, formavam uma indiscutível zona de influência soviética. A falência da superpotência em
dezembro de 1991 lançou incertezas sobre o futuro da regiã o, que se tornou momentaneamente
ó rfã de uma potência dominante num momento em que se anunciava forte demanda energética
mundial e redescobria-se a importâ ncia petrolífera do mar Cá spio. Assim, Estados Unidos e Europa
(sob severa vigilâ ncia chinesa) trataram de acomodar-se da melhor forma possível nos arredores
da regiã o, para desconforto da Rú ssia, ocupada em administrar suas crises internas.

Além das potências mundiais, potências regionais também se circunscrevem à regiã o: Índia,
Paquistã o e Irã têm interesse nos arredores do mar Cá spio. Há uma explicaçã o estratégica para isso:
especula-se que a bacia sedimentar caspiana seja o segundo maior reduto petrolífero do mundo.
Em um mundo cada vez mais dependente de energia, a cobiça pelas principais fontes petrolíferas e
por gá s natural pautam os passos das potências. É nesse contexto que devemos entender o
interesse que têm nessa regiã o Estados Unidos, China, Uniã o Europeia e também a Rú ssia, que a
considera sua zona de influência geopolítica desde a época do Império Russo.
Pá gina 189

Conversando com a... Biologia!


ESCREVA NO CADERNO

Entre o Cazaquistã o e o Uzbequistã o situa-se o mar de Aral. Durante a vigência da Uniã o Soviética, seus principais
tributá rios, Sir Daria e Amu Daria, tiveram suas águas desviadas para projetos de irrigaçã o do cultivo do algodã o. Até
entã o, a pesca era a principal atividade da populaçã o local, mas desde os anos 1940 o cultivo do algodã o passou a ter
prioridade em detrimento da atividade pesqueira. Essa regiã o, entã o, foi dominada pela aridez.

Essa iniciativa causou um dos maiores desastres ambientais do mundo e é claramente um exemplo a jamais ser
seguido: de quarto maior lago interior do mundo o Aral esteve à beira do desaparecimento. A tragédia é fruto
exclusivamente de uma equivocada intervençã o humana na natureza.

Sinô nimo de tragédia ambiental do século XX, notícias recentes veiculam que, por intervençã o do governo do
Cazaquistã o com obras de recuperaçã o ambiental, o mar de Aral apresentou considerá vel diminuiçã o da salinidade,
retomada lenta de seu volume e reaparecimento de aves nativas: o mar recusou-se a desaparecer e vem se
revitalizando.

1. Uma intervençã o como essa pode causar quais danos à vida marinha?

2. A recomposiçã o da vida marinha pode ser refeita com a retomada do volume das á guas do mar de Aral?

Xinhua/Photoshot/Easypix

Navios encalhados naquilo que um dia foi mar: o leito do Aral hoje se confunde com as areias dos desertos da Á sia Central.
Fotografia de 2015, Uzbequistã o.

A Europa é dependente do fornecimento de gá s natural russo, em grande parte colhido extraído à


bacia do Cá spio. Um sistema de dutos interliga o mar Cá spio ao mar Negro, possibilitando o
abastecimento europeu. Esses dutos passam por territó rio russo, onde há cobrança de taxas, que
representam importante captaçã o de recursos para Moscou.

Como parte de uma manobra geopolítica estadunidense-europeia, formou-se um consó rcio, com o
propó sito de desviar a rota dos dutos do territó rio russo, minimizando a dependência europeia,
porque, apesar de remota, existe sempre a possibilidade de a Rú ssia “fechar as torneiras do gá s”
durante o inverno, quando o consumo é maior. Esse temor muitas vezes está nas veladas ameaças
russas quando da negociaçã o do preço do gá s. A Rú ssia, por sua vez, atua contrariamente à
construçã o de novos dutos que possam minar esse seu trunfo estratégico.

No entanto, o gigante euro-asiá tico tem sérios problemas no Cá ucaso, rota dos dutos. A Chechênia é
uma repú blica separatista que, desde a desintegraçã o soviética, reivindica sua independência. Duas
guerras já foram travadas por esse motivo: uma vencida pela Chechênia, em 1996, outra pela
Rú ssia, três anos mais tarde, quando o país russo já estava sob a égide de Vladimir Putin. A
Chechênia segue sob soberania russa, mas os distú rbios sã o constantes e promovidos por violentos
grupos separatistas, na maioria, vinculados ao terror islâ mico.

Outro imbró glio russo refere-se à difícil relaçã o com a Geó rgia, com a qual travou uma guerra em
2008. Há uma disputa territorial entre os dois países envolvendo duas províncias: a Abkhá zia e a
Ossétia do Sul, que se recusam a pertencer à Geó rgia. Esta, por sua vez, estreitou os laços com
Europa e Estados Unidos, oferecendo seu territó rio para passagem dos dutos até o Velho
Continente. A Rú ssia, naturalmente, tem feito tudo para inviabilizar o intento.
Pá gina 190

Yuri Tutov/AFP/Getty Images

Os trá gicos atentados em Beslan, Ossé tia do Norte, em 2004, sã o sintomá ticos da tensã o no Cá ucaso. Esse foi um entre tantos
atentados na Rú ssia realizado pelos grupos separatistas da Chechê nia.

A Europa percorreu o caminho da diplomacia do dinheiro, oferecendo apoio econô mico e buscando
captar a Geó rgia para sua esfera de influência, considerando, inclusive, a possibilidade de o país
integrar a Uniã o Europeia. Mas a Rú ssia já se manifestou contrá ria à entrada da Geó rgia e da
Ucrâ nia no bloco europeu e dificilmente assistirá calada à investida, pois considera que da Uniã o
Europeia à Otan a distâ ncia é muito curta.

Apesar da resistência russa, em 2005 foi inaugurado o oleoduto Baku-Tbilisi-Ceyhan, um sistema de


dutos desde o Vale do Baku, no Azerbaijã o, até o Mediterrâ neo turco, atravessando territó rios da
Geó rgia e da Turquia e contornando o territó rio russo. Veja o mapa abaixo. Esse projeto de US$ 3,5
bilhõ es e 1 700 km de extensã o, foi encabeçado pela British Petroleum e custeado por um consó rcio
intercontinental (Estados Unidos-Europa). Atualmente escoa um milhã o de barris de petró leo por
dia. Uma inconteste derrota geopolítica para a Rú ssia.

A Geó rgia está envolvida ainda em três outros projetos estratégicos europeus: a Traceca (iniciais
em inglês de Transport Corridor Europe-Caucasus-Asia), um complexo de transportes intermodais
ligando a Europa à Á sia; o Corredor Energético Transcaucasiano; e a Rede de Telecomunicaçõ es
Transcaucasiana.
DACOSTA MAPAS

Fonte: FERREIRA, Graça M. L. Atlas geográfico. 3. ed. Sã o Paulo: Moderna, 2010. p. 98.
Pá gina 191

4. Afeganistão e Paquistão: a morada do fundamentalismo


Afeganistã o e Paquistã o tiveram seus nomes, nos ú ltimos tempos, atrelados ao fundamentalismo
islâ mico, particularmente apó s os episó dios do 11 de Setembro. O terrorista Osama bin Laden
estava ligado à histó ria recente dos dois países. Ao Afeganistã o, pois a organizaçã o por ele criada, a
Al-Qaeda, responsá vel pelos atentados, nasceu e se fortaleceu nesse país; foi de lá que partiram as
ordens para os ataques aos alvos estadunidenses. Ao Paquistã o, porque era lá , em 2011, que o líder
terrorista estava refugiado e foi executado em uma açã o das tropas dos Estados Unidos.

• 4.1 Afeganistão
Ao sul da Á sia Central e a leste do Oriente Médio, o Afeganistã o situa-se em uma zona montanhosa,
junto à cordilheira do Himalaia e estende-se do Irã à China. É um país localizado em uma á rea de
transiçã o entre o Oriente Médio, a Á sia Central e a Á sia de Monçõ es. Alguns mapas o situam no
Oriente Médio, outros na Á sia Central.

Do ponto de vista cultural, o Afeganistã o é marcado por uma forte tradiçã o tribal e dividido em
vá rios grupos: Pashtuns (grupo majoritá rio), Tadjiques, Hazará s, Uzbeques, entre outros, todos de
tradiçã o islâ mica. Veja no mapa ao lado onde estã o localizados esses grupos que compõ em o
mosaico étnico afegã o.

O país entrou para a cena geopolítica do mundo ao sofrer uma invasã o da Uniã o Soviética em 1979.
Naquele contexto da Guerra Fria, os Estados Unidos nã o hesitaram em apoiar os guerrilheiros
muçulmanos que resistiam à invasã o comunista. Além dos Estados Unidos, Paquistã o, China, Ará bia
Saudita e Irã forneceram armas e dinheiro aosmujahedins, como sã o conhecidos esses guerrilheiros,
que venceram os soviéticos. Surpreendendo o mundo, a Uniã o Soviética se retirou do país em 1989.

No contexto dessa invasã o soviética e da resistência afegã , um novo ingrediente foi adicionado ao
cená rio regional: para financiar a frente, os guerrilheiros passaram a contar com o trá fico
internacional de drogas, tornando-se o Afeganistã o o maior produtor mundial de papoula, matéria-
prima do ó pio e da heroína, duas drogas produzidas no país desde entã o.

Ao período da invasã o soviética seguiu-se uma guerra civil e o Afeganistã o ficou dividido entre
grupos inimigos armados, mas o grupo que emergiu dos mujahedins, o Talibã , outrora apoiado
pelos Estados Unidos, passou a dominar a maior parte do país e instaurou um regime
fundamentalista, com base na corrente sunita, altamente violento e arbitrá rio, tornando-se um dos
maiores violadores dos direitos humanos, particularmente dos direitos das mulheres, em todo o
mundo.
Allmaps

Fonte: ALMANAQUE ABRIL 2011. Sã o Paulo: Abril, 2011. p. 379.

Ver
Jogos do poder. Direção: Mike Nichols. Estados Unidos, 2007.
Aborda a intervençã o secreta dos Estados Unidos quando apoiaram milicianos islâ micos no Afeganistã o, invadido
pela Uniã o Soviética, em 1979.

Filme de Mike Nichols. Jogos do poder. EUA, 2007


Pá gina 192

Ler
O Afeganistão depois do Talibã, de Adriana Carranca. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2011.
O livro, por meio de 11 histó rias afegãs, retrata o período entre a invasã o dos Estados Unidos até a morte de Osama
bin Laden.

Editora Civilizaçã o Brasileira

A expressã o talibã (ou taleban) provém do dialeto Pasthun e significa “estudante de religiã o”. A
origem do famoso grupo remonta à época da invasã o soviética, quando Estados Unidos e o serviço
de inteligência do Paquistã o recrutaram inú meros desses estudantes para fazer frente à invasã o
soviética.

No entanto, o grupo cresceu demais e fugiu ao controle. No dilacerado Afeganistã o, alcançaram o


poder em 1996 e eliminaram as demais frentes que igualmente combateram a Uniã o Soviética;
alguns líderes de outros grupos capturados pelo Talibã foram executados violentamente em praça
pú blica. Templos remanescentes budistas, bibliotecas, televisores, vídeos e tudo aquilo que fugia à
crença ortodoxa muçulmana no país foram destruídos. Os homens foram proibidos de raspar a
barba, e as mulheres, as maiores vítimas desse obscuro regime, tiveram todo tipo de direito
eliminado, sendo-lhes imposta a padronizaçã o da vestimenta, o uso da burca. Observe a fotografia
abaixo.

WAKIL KOHSAR/AFP

Burca, marca registrada no obscuro Afeganistã o talibã . Na fotografia, mulheres afegã s em um mercado em Shirin Tagab,
2015.
Durante a expansã o talibã rumo ao interior, diplomatas iranianos foram presos e assassinados,
quase provocando uma guerra entre o Irã , xiita, e o Afeganistã o, sunita, o que seria catastró fico para
o mundo islâ mico. Nesse período de ascensã o, o Talibã tinha o apoio dos Estados Unidos e do
Paquistã o, enquanto o Irã era seu maior inimigo.

Já no final dos anos 1990, ficou claro para os Estados Unidos que de aliados os talibã s passavam a
inimigos: o saudita Osama bin Laden, refugiado no Afeganistã o dominado pelo Talibã , cujo chefe
supremo, o mulá Omar, era seu sogro, foi o principal suspeito de vá rios atentados contra alvos
estadunidenses: embaixadas no Quênia e na Tanzâ nia.

Apó s os eventos de 11 de Setembro, quando a responsabilidade dos atentados de 2001 foi atribuída
ao terrorista da Al-Qaeda, os Estados Unidos atacaram o Afeganistã o. Apesar de, inicialmente, nã o
capturarem Osama bin Laden nem o mulá Omar, conseguiram êxito em derrubar o regime
extremista do Talibã . Contudo, nã o conseguiram a estabilizaçã o do país, que ficou marcado por
constantes atentados e um frá gil regime pró -Estados Unidos. Em maio de 2011, apó s uma década
de perseguiçõ es, o governo dos Estados Unidos anunciou que suas tropas assassinaram Osama bin
Laden dentro de sua casa, no Paquistã o.

Ver
A caminho de Kandahar. Direção: Mohsen Makhmalbaf. França/Irã, 2001.
Documentá rio que retrata a guerra civil que levou o Talibã ao poder antes dos ataques estadunidenses ao
Afeganistã o em 2001.
Pá gina 193

• 4.2 Paquistão
Situado na mesma zona montanhosa que o Afeganistã o, o Paquistã o pode ser considerado um dos
mais perigosos países do mundo. Veja sua localizaçã o no mapa ao lado. Essa afirmaçã o tem três
motivos: é um país marcado pela instabilidade política, com governos frá geis e um histó rico de
golpes militares e assassinatos dos principais líderes; abriga diversos grupos extremistas islâ micos;
detém a bomba atô mica.

Allmaps

Fonte: ATLAS geográ fico escolar. 6. ed. Rio de Janeiro: IBGE, 2012. p. 47.

O país é fruto da divisã o político-religiosa que se seguiu à independência, ao fim do domínio


britâ nico na Índia, em 1947. Naquele momento, ocorreu a divisã o do vasto territó rio sob jugo
britâ nico em dois novos países: Índia e Paquistã o. Por causa da intolerâ ncia religiosa, nã o foi
possível a convivência pacífica entre hinduístas e muçulmanos, contrariando os ideais de tolerâ ncia
defendidos por Mahatma Gandhi. O Paquistã o foi composto de duas porçõ es territoriais separadas
pela Índia: Paquistã o e Paquistã o Oriental. Em 1971, o Paquistã o Oriental deu origem ao atual
Bangladesh.

O país é permeado por tensõ es e convive com uma paz muito tênue. Inimigo histó rico da Índia, com
a qual já travou três guerras ao longo da segunda metade do século XX, disputa com a rival a regiã o
da Caxemira.

A preocupaçã o da comunidade internacional refere-se à perigosa combinaçã o entre extremismo


islâ mico e capacidade atô mica. Muitos entendem que a presença dos Estados Unidos no Afeganistã o
se deve em grande parte ao temor de que a Al-Qaeda ou o Talibã, presentes no Paquistã o, tenham
acesso às bombas atô micas do país.

Simultaneamente a essa realidade, o Paquistã o é o país que apresenta o maior nú mero de


madrassas em todo o mundo, de onde saiu grande parte, por exemplo, dos militantes talibã s.
Observe a fotografia a seguir.
Apó s os atentados do 11 de Setembro e a consequente “guerra ao terror”, o país entrou para a linha
de frente do contencioso por fazer parte do mesmo conjunto geopolítico que o vizinho Afeganistã o;
sabe-se que, apesar de ter governado o Afeganistã o por anos, as raízes talibã s estã o no Paquistã o.
Aliado dos Estados Unidos desde os tempos da Guerra Fria, essa amizade enfraqueceu-se
recentemente. Argumentando combater terroristas da Al-Qaeda e do Talibã , os Estados Unidos com
frequência invadem o territó rio paquistanês sem consulta ao governo. A açã o dos Estados Unidos
que executou Osama bin Laden comprova isso. Militares estadunidenses entraram no espaço aéreo
paquistanês sem pedir autorizaçã o ao governo do país.

Madrassas: Escolas religiosas islâ micas.

AAMIR QURESHI/AFP

Em razã o da ausê ncia do Estado paquistanê s, muitas vezes as mã es recorrem à s madrassas para a educaçã o das crianças.
Embora o Islamismo seja uma religiã o baseada na paz, a memorizaçã o acrítica do Alcorão pode produzir futuros
extremistas. Na fotografia, crianças em seminá rio religioso, em Islamabad, Paquistã o, 2015.
Pá gina 194

ROTEIRO DE ESTUDO
ESCREVA NO CADERNO

Revisando

1. Em 2011, explodiu a chamada Primavera Á rabe. O que foi esse movimento?

2. O processo da Primavera Á rabe iniciou-se na Tunísia, em dezembro de 2010, e se estendeu por


diversos países. Destaque um caso da Primavera Á rabe em particular e discorra sobre ele.

3. A Primavera Á rabe pode ser entendida como o fato novo que surgiu para reorientar alguns países do
Oriente Médio. Qual era o temor das potências de que a Primavera Á rabe atingisse o Golfo Pérsico?

4. Explique as circunstâ ncias do surgimento do Estado Islâ mico.

5. O Cá ucaso compreende Geó rgia, Armênia, Azerbaijã o e parte do territó rio russo, incluindo também a
Chechênia, uma repú blica separatista russa. Quais questõ es estratégicas envolvem o Cá ucaso?

6. Uma das consequências dos ataques estadunidenses ao Afeganistã o, em 2001, é a desestabilizaçã o


desse país, que ficou marcado por sofrer constantes atentados e pelo frá gil regime pró -Estados Unidos.
Quais as razõ es de os Estados Unidos terem atacado o Afeganistã o em 2001?

7. Situado na mesma zona montanhosa que o Afeganistã o, o Paquistã o pode ser considerado um dos
mais perigosos países do mundo. Por que afirmamos ser o Paquistã o um país perigoso?

Olhar cartográfico

O surgimento do Estado Islâ mico resulta dos episó dios geopolíticos da Guerra do Iraque, em 2003, e da
guerra civil na Síria, agravada especialmente a partir de 2012. O grupo, que se organizou rapidamente,
assombra o Ocidente com suas açõ es extremamente violentas.

O mapa abaixo apresenta a origem de estrangeiros recrutados pelo Estado Islâ mico. Estima-se que 12
mil combatentes de quase 80 países viajaram para a Síria e para o Iraque. Observe o mapa e responda à s
questõ es.

1. Qual a procedência desses combatentes e a situaçã o política de seus países de origem?

2. Pela conjuntura do que estudamos, em sua opiniã o há possibilidade de o Estado Islâ mico fazer o
caminho inverso, ou seja, migrar de sua á rea de origem, países do Oriente Médio, para a á rea de
fornecimento principal de combatentes, principalmente países do Norte da Á frica?
DACOSTA MAPAS

Fonte: MAPAS explicam batalha do “EI” pela Síria e pelo Iraque. BBC Brasil, 16 out. 2014. Disponível em:
<http://www.bbc.co.uk/portuguese/noticias/2014/10/141015_mapas_siria_lab>. Acesso em: 7 jan. 2016.
Pá gina 195

Atividade em grupo

A Al-Qaeda é uma organizaçã o criada por Osama bin Laden e, até onde se sabe, responsá vel pelos
atentados de 2001 contra os Estados Unidos. O Talibã surgiu no contexto da invasã o soviética no
Afeganistã o, quando os Estados Unidos e o serviço de inteligência do Paquistã o recrutaram inú meros
estudantes para combater a invasã o soviética.

Reú nam-se em grupos e discorram sobre:

1. Quais as relaçõ es atuais da Al-Qaeda e do Talibã com o Afeganistã o e o Paquistã o?

2. E com os demais países da Á sia Central e do Oriente Médio?

3. Quais as principais justificativas desses grupos para as suas açõ es terroristas? Quais suas principais
reivindicaçõ es?

4. Qual a relaçã o dos Estados Unidos com o surgimento do Talibã ?

5. Apó s responder à s questõ es acima, apontem as consideraçõ es do grupo sobre as justificativas que
essas organizaçõ es dã o para suas açõ es. Ao final, registrem no caderno a síntese da discussã o.

De olho na mídia

A matéria abaixo permite uma reflexã o sobre as diferentes versõ es apresentadas de um fato quando o
assunto é política nacional e internacional. Leia o texto, atente para o conflito da informaçã o sobre a
morte de Osama bin Laden e expresse sua opiniã o ao responder à pergunta: quem traz uma versã o mais
plausível, o jornalista, ou o governo estadunidense?

EUA desmentem artigo sobre papel do Paquistão em morte de Bin Laden

[...]

A Casa Branca rejeitou de forma categó rica nesta segunda-feira as afirmaçõ es “sem fundamento” do jornalista
americano Seymour Hersh, que afirmou que o governo americano mentiu a respeito das condiçõ es nas quais matou
em maio de 2011 Osama bin Laden no Paquistã o.

“Há muitas inexatidõ es e afirmaçõ es sem fundamentos neste artigo para responder ponto por ponto”, afirmou Ned
Price, porta-voz do Conselho de Segurança Nacional (NSC).

No ú ltimo domingo (11/5), Hersh revelou que a operaçã o foi trabalho conjunto entre os governos dos Estados
Unidos e do Paquistã o, que teria mantido o líder da Al-Qaeda prisioneiro desde 2006.

Na versã o oficial da Casa Branca, Bin Laden estava foragido e se escondia na cidade de Abottabad, no norte do
Paquistã o. De acordo com o relato de Hersh, as autoridades paquistanesas mantinham Bin Laden preso para ser
usado em negociaçõ es com dois grupos terroristas que atuam no país, a Al-Qaeda e o Talibã . O paradeiro do líder
teria sido revelado ao governo americano por um oficial de inteligência paquistanês em troca de recompensa de US$
25 milhõ es.

A operaçã o, segundo Hersh, nã o foi uma situaçã o de perigo para os oficiais da marinha americana, mas um cená rio
controlado. Havia um combinado com as autoridades do Paquistã o para que nã o interferissem; um oficial do país
acompanhou os agentes dos Estados Unidos durante a missã o para mostrar o caminho dentro da mansã o em que Bin
Laden estava. Hersh também afirma que, durante os cinco anos em que o terrorista ficou escondido em Abottabad, os
gastos foram financiados pela Ará bia Saudita, país de origem de Osama.
Ao reafirmar que esta investigaçã o foi “uma operaçã o americana de cabo a rabo”, Ned Price ressalta que “apenas um
pequeno círculo” de autoridades americanas estava ciente e que o presidente Barack Obama havia decidido, desde o
início, nã o informar outros governos, incluindo o paquistanês.

Seymour Hersh se destacou no passado, entre outros, por ter revelado dados sobre o massacre de My Lai durante a
guerra do Vietnã o escâ ndalo da prisã o de Abu Ghraib no Iraque, mas as controvérsias que vá rios de seus artigos
recentes afetaram sua imagem nos Estados Unidos.

Polêmica antiga

Em 2012, o WikiLeaks divulgou ao jornal espanhol Pú blico e-mails que contestam a versã o oficial da disposiçã o do
corpo de Bin Laden. A empresa privada de segurança, a Stratfor global intelligence, conhecida como “CIA na sombra”,
foi o alvo do vazamento. Um dos diretores, Fred Burton, enviou mensagem dizendo que fora informado que
“trouxemos o corpo. Graças a Deus”. O e-mail estava intitulado como OBL. Ainda de acordo com as informaçõ es
vazadas no WikiLeaks, o corpo teria sido transportado em um aviã o da CIA. Na versã o oficial relatada em 2011.

EUA DESMENTEM artigo sobre papel do Paquistã o em morte de Bin Laden. AFP, 11 mai. 2015. Disponível em:
<http://www.correiobraziliense.com.br/app/noticia/mundo/2015/05/11/interna_mundo,482741/eua-desmentem-artigo-sobrepapel-do-paquistao-em-morte-de-bin-
laden.shtml>. Acesso em: 24. fev. 2016.
Pá gina 196

CAPÍTULO 10 - África: o legado colonial

Peter Horree/Alamy/Latinstock

Mercado de especiarias na cidade de Marrakech, Marrocos, 2013.


Pá gina 197

Eric Lafforgue/Alamy/Latinstock

Processo de secagem do café em Jimma, Etió pia, 2013. O café é um dos principais produtos de exportaçã o desse país.

Pete Jones/Reuters/Latinstock

Mineraçã o de ouro na Repú blica Democrá tica do Congo, 2014. Essa mina, denominada Kibali, é explorada por uma empresa
inglesa e uma sul-africana.
Tópicos do capítulo

A paisagem africana

Imperialismo e neocolonialismo

Questões geopolíticas

Ponto de partida
ESCREVA NO CADERNO

• As fotografias desta abertura mostram alguns aspectos da herança imperialista europeia na Á frica.
Quais sã o eles? Que outros legados você poderia citar?
Pá gina 198

1. A paisagem africana
Por ser o ú nico continente atravessado simultaneamente pela linha do equador e pelo meridiano de
Greenwich, a Á frica possui terras em todos os hemisférios. A natureza de seus 30 milhõ es de
quilô metros quadrados apresenta singularidades pró prias, como compartimentaçã o compacta,
uniformidade na distribuiçã o bioclimá tica e litoral pouco recortado.

Allmaps

Fonte: ATLAS geográ fico escolar. 6. ed. Rio de Janeiro: IBGE, 2012. p. 34.

O que separa a Á frica da Europa é o mar Mediterrâ neo. Nas imediaçõ es do Estreito de Gibraltar, os
dois continentes estã o tã o pró ximos que de um lado se avista o outro. Em relaçã o à Á sia, é o mar
Vermelho que delimita os dois continentes. Na verdade, nã o há uma separaçã o física entre Á frica e
Á sia, mas sim artificial: o Canal de Suez. A oeste, a Á frica é banhada pelo oceano Atlâ ntico e, a leste,
pelo Índico. No extremo sul do continente, ocorre o encontro entre esses oceanos, proporcionando
uma posiçã o estratégica privilegiada à Á frica do Sul, localizada na confluência entre eles.

A homogeneidade geomorfoló gica do relevo africano é interrompida por algumas formaçõ es


montanhosas, como a Cadeia do Atlas, no Magreb, regiã o noroeste da Á frica, cujas altitudes
representam um empecilho à entrada de ventos marítimos ú midos. Na porçã o oriental, junto aos
maciços Etíope e Oriental, localizam-se as maiores altitudes, como o monte Quilimanjaro (5 895 m),
ponto culminante do continente, e o monte Quênia (5 199 m), enquanto na vertente ocidental as
altitudes sã o mais modestas. É também na vertente oriental africana que estã o situadas as grandes
fossas tectô nicas. Por se localizarem em zonas superú midas, ao longo dos séculos foram
preenchidas com as á guas das chuvas, dando origem aos grandes lagos africanos, que se diferem na
origem dos grandes lagos americanos ou finlandeses; estes de origem glacial, aqueles, tectô nica.

A hidrografia africana é marcada pela distribuiçã o irregular, isto é, ao mesmo tempo que concentra
dois dos dez maiores rios do mundo – o rio Nilo, na franja oriental, e o rio Congo, na Á frica
equatorial –, apresenta vasta á rea com carência hídrica. O terceiro rio mais importante é o Níger. No
geral, a Á frica dispõ e de uma rede hidrográ fica modesta em razã o da extensa zona á rida, ao norte e
ao sul.

Com 6 825 km, o rio Nilo nasce no Lago Vitó ria, em uma zona climá tica superú mida, mas depois
atravessa uma vasta á rea á rida com afluentes intermitentes, em especial os da margem esquerda.
Nasce com o nome de Nilo Branco e, no maciço etíope, recebe vasta quantidade de á gua de seu
afluente Nilo Azul, fluindo para o norte em direçã o ao Egito, onde tem sua foz no Mediterrâ neo em
forma de delta.

Magreb: Expressã o á rabe que significa “ocidente”, em contraposiçã o a Mashreq, “oriente”. Essa regiã o compreende o Marrocos, a
Argélia e a Tunísia.
Pá gina 199

A zona do delta tem uma á rea de 23 mil km2 com uma extensa rede de canais. Em boa parte de sua
extensã o, o Nilo é navegá vel e, ao longo da histó ria, sempre foi importante via de trá fego fluvial.
Cerca de 90% da populaçã o do Egito vive à s margens do Nilo, incluindo os habitantes da capital,
Cairo.

Seu regime hidroló gico apresenta duas cheias anuais: o início da subida das á guas ocorre em junho,
atingindo a intensidade má xima em setembro; o nível mais baixo ocorre entre fevereiro e junho.
Isso determina a produçã o agrícola local, pois, ao transbordar e ocupar a vá rzea, o Nilo deposita ali
grande parte dos sedimentos e detritos orgâ nicos carreados ao longo de seu trajeto, adubando
naturalmente o solo. Quando a á gua reflui, o solo está pronto para o cultivo. No entanto, desde a
construçã o da Usina de Assuã no início dos anos 1970, esse regime natural foi comprometido
levando à perda da qualidade do solo.

Ver
As montanhas da lua. Direção: Bob Rafelson. Estados Unidos, 1990. No filme, um geó grafo britâ nico em busca da
nascente do Nilo envolve-se em aventuras no continente africano no século XIX.

Filme de Bob Rafelson. As montanhas da lua. EUA, 1990

1.1 O quadro climatobotânico


Costuma-se dizer que a linha do equador é “o espelho da Á frica” por “refletir”, tanto ao norte
quanto ao sul, as mesmas paisagens naturais. Isso se deve ao fato de o continente estar dividido
pela linha imaginá ria e, de modo geral, de o clima e a vegetaçã o apresentarem relativa simetria ao
longo das latitudes ao norte e ao sul do equador.

A Á frica é atravessada pela linha do equador, pelo Tró pico de Capricó rnio e pelo Tró pico de Câ ncer.
Cerca de dois terços do territó rio situam-se na zona tropical; portanto, as variaçõ es sazonais sã o
pequenas e as temperaturas médias apresentam-se sempre acima dos 20 ºC, ou seja, o continente
africano apresenta um clima predominantemente tropical, com algumas variaçõ es. Observe os
mapas a seguir que mostram a localizaçã o intertropical da Á frica.
DACOSTA MAPAS

DACOSTA MAPAS

Fonte: ATLAS geográ fico escolar. 6. ed. Rio de Janeiro: IBGE, 2012. p. 61.

Fonte: PHILLIPSON, Olly. Atlas geográfico mundial. Curitiba: Fundamento, 2011. p. 72.
Pá gina 200

Apesar da uniformidade das temperaturas, o mesmo nã o ocorre com a pluviosidade, que apresenta
forte variaçã o regional e de ano para ano. O continente convive com estiagens cíclicas.

Nas imediaçõ es da linha do equador, ocorrem o clima equatorial e sua exuberante floresta, que se
estendem praticamente do Índico ao Atlâ ntico, apesar de mais rarefeitos no leste. Ao redor do
Congo, de Ruanda, do Gabã o, entre outros, surge uma combinaçã o fisiográ fica entre o clima
equatorial, a floresta equatorial e a bacia hidrográ fica do Congo.

Contornando a zona equatorial, existe um clima tropical mais ú mido, onde também ocorre a
floresta tropical africana. No entanto, é o clima tropical típico e com menor pluviosidade que
predomina na maior parte do continente. Nessas á reas, chove durante o verã o, enquanto o inverno
se apresenta seco. É no clima tropical que se desenha a formaçã o mais característica da Á frica: as
savanas, que cobrem a maior parte do territó rio e sã o o hábitat da rica fauna africana, como leõ es,
girafas, zebras, elefantes, rinocerontes, entre tantos outros animais.

Prisma Bildagentur AG/Alamy/Latinstock

Girafa e zebras na savana, Tanzâ nia, 2014.

Os climas á rido e semiá rido ocorrem nos dois hemisférios, onde se destacam dois grandes desertos:
o Saara, ao norte, e o Kalahari, ao sul. No clima semiá rido, há as estepes, enquanto no á rido há
formaçõ es desérticas e até mesmo ausência de vegetaçã o nas partes hiperá ridas. O que difere o
clima á rido do semiá rido é a pluviosidade. No semiá rido, a pluviosidade fica entre 250 mm e 500
mm, enquanto no clima á rido ela nunca atinge 250 mm, podendo, até mesmo, ficar abaixo de 100
mm.

Na orla setentrional e, predominantemente, no extremo sul do continente, ocorre o clima


mediterrâ neo, com vegetaçã o homô nima. A principal característica desse clima sã o verõ es secos e
invernos chuvosos, exatamente o oposto do clima tropical.
Pá gina 201

1.1.1 As zonas áridas da África

O deserto do Saara, o maior do mundo, abrange uma imensa á rea de 9 milhõ es de quilô metros
quadrados na porçã o norte da Á frica. Sua existência é uma combinaçã o entre a geomorfologia e a
dinâ mica atmosférica. A Cadeia do Atlas barra a umidade oriunda do oceano, enquanto a presença
de uma zona de alta pressã o atmosférica (centro dispersor de umidade) faz que os ventos sejam
predominantemente secos.

Praticamente só existe vegetaçã o nos arredores do Saara, junto aos oá sis. Trata-se de um deserto
quente, onde a temperatura por volta das 13 horas pode atingir mais de 50 ºC, dificultando ou
mesmo inviabilizando a vida humana. A amplitude térmica é altíssima, pois, como a areia nã o retém
calor, à meia-noite a temperatura cai para pró ximo de 0 ºC.

Na periferia sul do Saara, verificou-se um dano ambiental há alguns anos. A populaçã o local retirou
grande parte das estepes para cultivo de subsistência, provocando a ampliaçã o do Saara, ou seja,
um processo de desertificaçã o. A essa á rea expandida do Saara dá -se o nome de Sahel. Contudo,
imagens recentes de satélites mostram que o Sahel estaria retrocedendo e uma recolonizaçã o da
vegetaçã o nativa estaria ocorrendo, minimizando o dano ambiental.

No sul da Á frica, junto à Namíbia e a Botsuana, localiza-se o deserto de Kalahari, que é consequência
direta da atuaçã o da corrente fria de Benguela, a qual atua na costa ocidental africana e é a principal
responsá vel pela formaçã o desse deserto de aproximadamente 600 mil km2.

Allmaps

Fonte: WORLD Atlas: essential. London: Dorling Kindersley, 2011. p. 69.

O Kalahari é produto direto da atuaçã o da corrente fria de Benguela, reproduzindo aquilo que acontece nas baixas latitudes
do hemisfé rio sul. O mesmo fenô meno ocorre com a corrente de Humboldt, que atua na Amé rica do Sul, responsá vel pela
formaçã o do deserto do Atacama; e com a corrente circumpolar Antá rtica, que atua na Oceania, responsá vel pela formaçã o
do Grande Deserto Vitó ria, na Austrá lia.
Imago/Imagebroker/Fotoarena

Saara, o maior deserto do mundo. Argé lia, no norte da Á frica, 2015.


Pá gina 202

2. Imperialismo e neocolonialismo
A Revoluçã o Industrial promoveu o desenvolvimento do capitalismo, o que tornou a Europa
pequena demais para suas demandas. O sistema precisava de novas fontes de matéria-prima, mã o
de obra, novos mercados, fontes energéticas, enfim, daquilo que a Europa nã o mais podia suprir
sozinha. Esse contexto anunciaria o á pice do imperialismo, fazendo da Á frica e da Á sia as vítimas
desse novo momento histó rico que se tornou conhecido como neocolonialismo.

Quase todos os pesquisadores que se dedicam ao estudo da Á frica, pelos mais variados caminhos
metodoló gicos, identificam no neocolonialismo a raiz dos problemas contemporâ neos africanos.
Esse nã o é o ú nico fator que explica os problemas sociais, econô micos e políticos do continente, mas
é o mais importante. É impossível entender a Á frica atual sem considerar o aspecto decisivo legado
pelo imperialismo.

Neocolonialismo: Nome dado à colonizaçã o da Á frica e da Á sia no fim do século XIX, que difere historicamente do colonialismo do
século XV, aplicado, especialmente, ao continente americano. Este esteve atrelado ao mercantilismo, primeira fase do capitalismo,
enquanto o neocolonialismo é produto direto da Revoluçã o Industrial e do capitalismo financeiro.

Data do período neocolonial a difusã o da ideia “o fardo do homem branco”, expressã o cunhada por
Rudyard Kipling, considerado “o poeta do imperialismo”. Leia a seguir um trecho do poema “The
White man’s burden”, publicado em 1899.

Tomai o fardo do homem branco –


Envia teus melhores filhos –
Vã o, condenem seus filhos ao exílio
Para servirem aos seus cativos;
Para esperar, com arreios
Com agitadores e selvá ticos –
Seus cativos, servos obstinados,
Metade demô nio, metade criança.
[...]

Tomai o fardo do homem branco –


As guerras selvagens pela paz –
Encha a boca dos famintos,
E proclama, das doenças, o cessar;
E, quando seu objetivo estiver perto
O fim que todos procuram,
Olha a indolê ncia e loucura pagã
Levando sua esperança ao chã o.
[...]

KIPLING, Rudyard. O fardo do homem branco. Fordham University: New York, 1997. (Traduçã o nossa). Disponível em: <http://legacy.fordham.edu/halsall/mod/kipling.asp>.
Acesso em: 2 dez. 2015.

Pauta musical
Sodade, Cesaria Evora. Álbum: Anthology. RCA Victor Europe, 2003.
Pauta: Paisagem e cultura africana.
Capa do LP Anthology. Cesaria Evora. Rú ssia, 2003

Interagindo
ESCREVA NO CADERNO

No Capítulo 3, vimos que o Destino Manifesto justificava, de certa forma, o extermínio dos indígenas no afã da
conquista e da expansã o territorial dos Estados Unidos. Que semelhanças você percebe entre essa ideologia
estadunidense, o poema de Kipling (acima) e a ilustraçã o de Keppler (abaixo)?

Do Cabo ao Cairo, ilustraçã o de Udo J. Keppler, 1902. A figura alegó rica da Britâ nia, mulher vestida de branco, empunhando
uma bandeira com a inscriçã o “Civilizaçã o”, guia os britâ nicos contra os nativos africanos, que seguram uma bandeira com a
palavra “Barbá rie”, durante a Guerra dos Bô eres (1889-1902).

Udo J. Kepler.1902.Cromolitografia. Biblioteca do Congresso, Washington

Bôeres: A palavra holandesa boer significa “fazendeiro”. Os bô eres, portanto, eram descendentes de holandeses que viviam no
campo.
Pá gina 203

Embora a presença europeia na Á frica se fizesse notar desde o século XV, é especialmente a partir
do século XIX que essa dominaçã o se tornaria mais intensa. Entre 1884 e 1885, ocorreu o evento
histó rico mais significativo dessa fase do capitalismo, que praticamente selou o destino africano: a
Conferência de Berlim, encontro entre as potências europeias e os Estados Unidos com o objetivo
de realizar a partilha da Á frica. Entre os participantes, os principais colonizadores da Á frica foram
Reino Unido, França, Bélgica, Alemanha, Espanha, Portugal, Itá lia e Holanda. Veja a seguir o mapa à
esquerda. Outros nã o chegaram a adquirir territó rios, como Estados Unidos (enviaram ex-escravos
para a Libéria), Suécia, Império Otomano (que já detinha o controle sobre parte da Á frica
mediterrâ nea) e Império Austro-Hú ngaro. Essa partilha entre os países europeus traçou fronteiras
arbitrá rias que nã o respeitaram limites naturais nem culturais, ou seja, os povos africanos foram
totalmente desprezados. Uma das consequências foi juntar povos inimigos no mesmo país e separar
povos irmã os. Muitos dos conflitos étnico-tribais existentes na Á frica hoje estã o diretamente
ligados a esse fato histó rico.

Navegar
Centro de Estudos Africanos <http://tub.im/cv7wns>
O Centro de Estudos Africanos, da Universidade de Sã o Paulo, divulga a realidade africana por meio de cursos,
publicaçõ es e palestras.

Allmaps

Fonte: ATLAS da histó ria do mundo. Sã o Paulo: Folha da Manhã , 1995. p. 236.
Allmaps

Fonte: ATLAS geográ fico escolar. 6. ed. Rio de Janeiro: IBGE, 2012. p. 45. Com atualizaçõ es.

Conversando com a... História!


ESCREVA NO CADERNO

A Revoluçã o Industrial produziu uma aceleraçã o do capitalismo com a consequente necessidade de novas fontes de
matéria-prima, de mercados consumidores e de formas de exploraçã o da mã o de obra. Esse cená rio deu corpo ao que
se convencionou designar como imperialismo, tendo a Á frica e a Á sia como os novos alvos da expansã o do capital.

• Com base no que foi estudado anteriormente e em seus conhecimentos de Histó ria, discuta a colonizaçã o europeia
na Á frica a partir do século XIX, considerando as causas e as consequências desse fato.

Akg-Images/Latinstock

Gravura em madeira de Adalbert von Rö ssler, representando a Conferê ncia de Berlim [s.d.].
Pá gina 204

A instauraçã o do sistema colonial na Á frica atendeu a interesses exclusivamente europeus. Nos


melhores solos, introduziu-se a plantation visando produzir gêneros tropicais para abastecer a
Europa. Com uma infinita riqueza mineral, os recursos africanos foram expropriados pelas
companhias europeias em ritmo alucinante. As estradas de ferro eram construídas para ligar
diretamente as jazidas aos portos sem nenhuma preocupaçã o de integraçã o regional.

Ler
História geral da África. Brasília: Unesco, Secad/MEC, UFSCar, 2010.
Coleçã o composta de oito volumes que apresenta a histó ria geral da Á frica desde a Pré-Histó ria, passando pelo
imperialismo e neocolonialismo até chegar ao século XX.

Enfoque
ESCREVA NO CADERNO

Neocolonialismo e imperialismo na África

[...]

Se algué m merece o título de pai do novo imperialismo, esse homem é provavelmente Leopoldo II, rei da Bé lgica. Em 1876
Leopoldo tomou posse do rico territó rio do rio Congo, na Á frica (aproximadamente dez vezes maior que a Bélgica), e
conservou praticamente sob seu domínio pessoal até 1908, quando o vendeu por gorda quantia ao governo belga. Pouco
depois de Leopoldo II ter dado o exemplo, a Inglaterra e a França começaram a mostrar um interesse mais profundo que
nunca pelo desmembramento da Á frica. A primeira estabeleceu um protetorado no Egito por volta de 1882 e
subsequentemente apossou-se do Sudã o Egípcio, da Rodésia, de Uganda e da Á frica Oriental Inglesa a título de colô nias. Em
1902, ao cabo de trê s anos de guerra, os ingleses lograram conquistar as repú blicas dos bô eres (Estado Livre de Orange e
Transval), que em 1909 foram anexadas à Colô nia do Cabo e a Natal para formar o domínio da Á frica do Sul, com governo
pró prio. Os planos da França relativos ao territó rio africano já vinham de 1830, quando esse país estabeleceu o controle
sobre alguns portos argelinos. Em 1857 os franceses tinham conseguido conquistar e anexar o resto da Argé lia. Mas os seus
esforços para fundar um impé rio no Continente Negro nã o tomaram realmente vulto senã o em 1881. Nesse ano ocuparam a
Tunísia e a partir de entã o se instalaram progressivamente no Saara, no Congo Francê s, na Guiné Francesa, no Senegal e no
Daomé . Em 1905 quase todos os melhores territó rios da Á frica achavam-se monopolizados pelos belgas, ingleses e
franceses.

A entrada da Alemanha e da Itá lia na competiçã o pelas colô nias africanas foi retardada pela complexidade dos seus
problemas internos. Ambas essas naçõ es tinham recentemente completado longas campanhas de unificaçã o e ainda estavam
envolvidas em sé rias disputas com o papado. [...] Em 1884 [a Alemanha] proclamou o protetorado alemã o sobre o Sudoeste
Africano, feito que apossou-se, em rá pida sucessã o, da Á frica Oriental Alemã , do Camerum [Camarõ es] e da Togolâ ndia.
Cerca de 1888 os italianos chegaram à conclusã o de que eles também precisavam ter uma parte do que ainda restava da
Á frica. Estabeleceram uma cabeça de ponte na Somá lia, situada na costa oriental, e dali tentaram reduzir a um protetorado a
Abissínia, país limítrofe. O resultado foi uma das derrotas mais desastrosas já sofridas por uma naçã o moderna. As forças
italianas foram tã o completamente destroçadas pelos abissínios em Á dua, no ano de 1896, que até 1935 a Itá lia nã o fez
novas tentativas para conquistar o Leão de Judá. Suas ú nicas aquisiçõ es importantes em territó rio africano, entre 1896 e
1914, foram Trípoli e a Cirenaica, que conquistou aos turcos em 1912 e uniu sob a nova denominaçã o de Líbia.

BURNS, Edward M. História da civilização ocidental. Porto Alegre: Globo, 1964. p.752-753.

Rodésia: Atual Zimbá bue.

Abissínia: Atual Etió pia.

Leão de Judá: Expressão bíblica metafó rica que tem conotaçã o de “esperança”. Segundo estudiosos cristã os, “Leã o de Judá ” é o
pró prio Jesus.
Séc. XIX. Coleçã o particular. Foto: Look and Learn/Elgar Collection/Bridgeman Images/Keystone

Cartã o-postal com foto mostrando uma plantaçã o de abacaxi em Natal, Á frica do Sul, sé culo XX.

• Por que o autor afirma ser o rei da Bélgica o “pai do novo imperialismo”?
Pá gina 205

A presença europeia na Á frica perdurou até o fim da Segunda Guerra Mundial. Com a nova ordem
erigida apó s 1945 e o surgimento da Organizaçã o das Naçõ es Unidas (ONU), os domínios coloniais
começaram a ruir, por causa do enfraquecimento das antigas potências coloniais e também da
melhor organizaçã o e articulaçã o dos movimentos pró -independência dentro das colô nias. As
jovens naçõ es que emergiram, porém, saíam da condiçã o de colô nia para a de país dependente e
acabaram se endividando.

Apó s conquistar a independência, a partir dos anos 1950, boa parte dos líderes que ascenderam ao
poder selou acordos com os antigos colonizadores, como foi o caso do antigo Zaire, atual Repú blica
Democrá tica do Congo, onde a ditadura de Joseph-Desiré Mobutu sempre esteve atrelada aos
interesses das grandes multinacionais da mineraçã o. Quando o governo Mobutu caiu, em 1997, sua
fortuna pessoal era avaliada em mais de 5 bilhõ es de dó lares, depositada no exterior. Ele manteve
por anos o controle das jazidas de diamantes do país, as maiores reservas mundiais. À medida que
enriquecia, porém, o povo mergulhava na miséria.

A independência dos países africanos ocorreu em meio à Guerra Fria; logo, nã o é difícil concluir que
esse continente se inseriu no contexto da bipolaridade ideoló gica que pautou a segunda metade do
século XX. A maioria dos conflitos que surgiram na Á frica passou a mesclar rivalidades tribais e
disputas ideoló gicas do capitalismo versussocialismo. Assim, foram inevitá veis as guerras civis que
eclodiram por todo o continente.

Karsten Thielker/AP/Glow Images

Campo de refugiados ruandeses na Tanzâ nia, 1994. Muitas guerras tribais da Á frica atual sã o produto da intervençã o
europeia no continente, como é o caso do conflito entre tutsis e hutus em Ruanda.

Pauta musical
Canto das três raças, Clara Nunes. Álbum: Canto das três raças. EMI-Odeon, 1976.
Pauta: Exploraçã o africana.
Capa do LP Canto das três raças. Clara Nunes. Brasil, 1976

A Geografia na... tira!


ESCREVA NO CADERNO

O heró i idealizado pelo Ocidente no continente negro, que enfrentava de forma destemida os perigos da selva, era
branco. O personagem criado por Edgard Rice Burroughs, em 1912 popularizou-se logo apó s o período das
independências africanas.

• Qual é a sua interpretaçã o desse contexto? Que tipo de relaçã o você percebe entre esse heró i e o imperialismo?

Editora Ebal

Capa do gibi Tarzan, editado na dé cada de 1970.

Ver
Hotel Ruanda. Direção: Terry George. Reino Unido/África do Sul/Itália, 2004.
O filme aborda o conflito entre tutsis e hutus na Á frica central nos anos 1990.
Pá gina 206

3. Questões geopolíticas
Durante a segunda metade do século XX, era difícil encontrar algum lugar da Á frica que nã o
estivesse sob guerra civil. Praticamente todos esses casos estavam, de uma forma ou de outra,
atrelados à herança colonial, aos conflitos étnico-tribais e à inserçã o no confronto ideoló gico da
Guerra Fria.

No entanto, apesar da manutençã o de um quadro generalizado de tensõ es na maior parte do


continente, a primeira década do século XXI apontou para uma reduçã o significativa dos conflitos.
Dois fatores contribuíram para o relativo otimismo de alguns estudiosos da Á frica: o crescimento e
o melhor desempenho econô mico, além do avanço no processo de democratizaçã o.

Como ainda há muitos conflitos no continente que nã o foram solucionados, pode parecer estranho
falar em “melhor desempenho econô mico” e “avanço no processo de democratizaçã o”. Contudo,
para melhor entendermos a realidade atual da Á frica, é necessá rio abordar alguns dos principais
conflitos e suas raízes histó ricas.

3.1 Sudão: o norte contra o sul


Em 8 de julho de 2011, o mundo assistiu ao nascimento de um novo país: o Sudã o do Sul. Esse
evento liga-se histó rica e geograficamente ao fato de que o Sudã o sempre esteve dividido em duas
partes: o norte, muçulmano, e o sul, cristã o-animista.

Ex-domínio britâ nico, a sociedade sudanesa é das mais diversas: há mais de 500 grupos étnicos
distintos falando mais de 100 idiomas. Á rabes e nú bios, seguidores do Islã , concentram-se no norte
e somam aproximadamente 50% do conjunto demográ fico. Na outra metade está distribuído
grande nú mero de grupos minoritá rios.

A convivência entre o norte e o sul nunca foi amistosa e é tensa desde a independência do país, em
1956, mas se deteriorou ainda mais nos anos 1980, quando o governo resolveu adotar a sharia em
todo o país.

As regiõ es nã o muçulmanas ao sul nã o aceitaram a imposiçã o da lei corâ nica e, em 1983, surgiu na
porçã o meridional do país um grupo de unidade nacional para se contrapor ao norte muçulmano, o
Movimento Popular de Libertaçã o do Sudã o (MPLS), anti-islâ mico e socialista. Sua bandeira é o
respeito à pluralidade religiosa e o combate à proposta teocrá tica do governo. Derivou-se um braço
armado do MPLS, o Exército Popular de Libertaçã o do Sudã o (EPLS).

O país mergulhava em uma guerra civil com um claro contraste regional: norte versus sul. O
governo central assumia uma postura fundamentalista ao impor os valores do Islã a toda a
sociedade. Aí residiam o furor e a reaçã o das demais comunidades contrá rias ao governo, levando a
guerra civil a tomar proporçõ es violentas.

Animista: Crença religiosa que parte do pressuposto de que todos os seres vivos e outros elementos da natureza têm anima (alma).
Há vá rios tipos de rituais animistas presentes em grande parte das tribos africanas, que creem na divindade de rios, chuvas,
montanhas, animais ou florestas.

Sharia: Lei do Alcorão que rege algumas sociedades islâ micas.


Crédito do mapa: Alexandre Bueno

Crédito da imagem de satélite: © 2015 Landsat, Data SIO, NOAA, U.S. Navy, NGA. GEBCO, Dados do mapa © 2015 Auto Navi, Google, Inst. Geogr. Nacional, Mapa GISrael, ORION-ME

Fonte: SUDÃ O do Sul se torna o mais novo país do mundo. BBC Brasil, 8 jul. 2011. Disponível em:
<http://www.bbc.com/portuguese/noticias/2011/07/110708_sudao_do_sul_independencia_mm.shtml>. Acesso em: 2 mar. 2016.

Observe na imagem de saté lite de 2015 as características da vegetaçã o presente no Sudã o e no Sudã o do Sul. O Sudã o
abrange uma regiã o desé rtica, cortada pelo vale do Nilo, enquanto no Sudã o do Sul predominam as á reas verdes com
florestas tropicais.
Pá gina 207

O quadro sudanês inseriu-se no contexto internacional do fim do século XX. Os Estados Unidos
viram-se diante de um dilema, pois a frente opositora tinha inspiraçõ es marxistas, que a potência
tanto combatera, mas era a ú nica opçã o ante um governo que estreitava os laços com a Al-Qaeda,
liderado entã o por Osama bin Laden.

Durante os anos de guerra civil, milícias cristã s atacavam aldeias muçulmanas do norte. Por sua vez,
o governo central realizava uma política de isolamento das comunidades cristã s e animistas,
dificultando sua sobrevivência em uma á rea de natureza desfavorá vel por causa das frequentes
estiagens.

No decorrer deste conflito, o Sudã o também enfrentou longas secas que prejudicaram a produçã o
agrícola, principal meio de subsistência da populaçã o. O que se seguiu a essa triste combinaçã o foi
uma crise humanitá ria de proporçõ es assustadoras: de 1983 até 2005, aproximadamente 2 milhõ es
de pessoas morreram no Sudã o vítimas da guerra civil e da seca, enquanto outros 6 milhõ es
tornaram-se refugiados. Somados, esses nú meros representavam 25% da populaçã o do país.

Apó s 20 anos de guerra civil, em 2005, foi assinado um efetivo acordo de paz entre o governo e os
rebeldes do sul, que tiveram como porta-voz o MPLS. A negociaçã o surpreendeu a comunidade
internacional pela plena aceitaçã o das duas partes envolvidas quanto ao que parecia impossível: a
divisã o do Sudã o em dois Estados distintos. O acordo previa que essa decisã o caberia a um
plebiscito soberano, cuja realizaçã o seria marcada para dali a seis anos, em que a porçã o sul
decidiria pela independência ou nã o em relaçã o ao norte. Enquanto isso, cada parte do Sudã o
manteria leis e exércitos pró prios, embora tendo de conviver no mesmo territó rio.

Foi fator decisivo para a realizaçã o dos acordos a descoberta de petró leo no país, com grande parte
localizada no sul. Para uma exploraçã o conjunta, os líderes de ambos os lados optaram por uma
reaproximaçã o. A decisã o do plebiscito realizado em 2011 nã o deixou dú vidas quanto ao futuro:
99% dos sul-sudaneses votaram pela independência.

Apesar do clima de euforia, o Sudã o do Sul nasceu como um dos mais pobres países do mundo, com
90% de sua populaçã o de 9 milhõ es de habitantes vivendo com meio dó lar por dia, taxa de
mortalidade infantil em torno de 10%, índice de analfabetismo feminino de 84%, a maior parte das
crianças fora da escola, a mais alta taxa de mortalidade em partos do mundo, entre outros
preocupantes indicadores sociais. Nas questõ es geopolítica e territorial, seguiam indefinidos os
pontos mais tensos da fronteira com o Sudã o ao norte, especialmente quanto à s á reas ricas em
petró leo na regiã o de Abyei: o sul tem a maior parte do petró leo (85% das reservas), mas é o norte
que detém os oleodutos, além da infraestrutura para o refino e o transporte.

Em menos de dois anos, o recente país já mergulhava em profunda crise política e humanitá ria,
fruto da disputa pelo poder entre os líderes nacionais de etnias distintas. O Sudã o do Sul é um
emaranhado de grupos étnicos e dois deles estavam representados no poder: o presidente do país
(Salva Kirr) era do grupo dinka, enquanto seu vice, Riek Machar, do grupo nuer. Os
desentendimentos e as divergências levaram a uma retomada da guerra civil similar à outrora pré-
independência, mas agora exclusiva da porçã o sul. Membros da etnia nuer partiram para a luta
armada com formaçã o de milícias e conquistaram algumas cidades estratégicas.

Desde 2014 o jovem Sudã o do Sul mergulhou em um cená rio de caos com inconclusivas tréguas
entre rebeldes e governo. No meio desse embate a populaçã o civil era vítima do ó dio étnico que
teve como consequências assassinatos em massa, estupro de meninas, castraçã o de meninos.
Fugindo da violência, os deslocados internos já somavam mais de 1,5 milhã o em 2016, de acordo
com o Alto Comissariado das Naçõ es Unidas para os Refugiados (Acnur); a ONU acusava ambos os
lados de cometer atrocidades. A sonhada independência nã o trouxe dias melhores àquele povo.
Roberto Schmidt/AFP/Getty Images

Comemoraçã o durante cerimô nia de independê ncia do Sudã o do Sul, em Juba, capital do novo país, 2011.
Pá gina 208

3.2 Somália: guerra entre clãs


A Somá lia localiza-se no leste africano, na regiã o conhecida como Chifre da Á frica, que engloba
ainda Etió pia, Eritreia e Djibuti, países marcados nas ú ltimas décadas por instabilidade política. As
cenas degradantes da condiçã o humana que comumente sã o vistas nessa regiã o estã o
indissociavelmente ligadas a uma triste combinaçã o: guerra e seca. Nos ú ltimos anos, na Somá lia,
além desses dois elementos, a situaçã o foi agravada pela chegada do extremismo islâ mico.

O país é afetado por estiagens cíclicas. Depois da seca de 1997, que levou milhares de somalis à
morte e suscitou um breve cessar-fogo entre os clã s que disputavam o controle do país, ocorreu,
entre 2011 e 2012, a mais severa seca dos ú ltimos 50 anos, tornando a situaçã o ainda mais caó tica.

Durante os longos anos de guerra civil, muitos clã s autodeclararam suas independências, fazendo
surgir pseudopaíses nã o reconhecidos pela ONU nem por nenhum país. Diante da total ausência do
Estado e do cená rio posto, a navegaçã o marítima nas imediaçõ es do litoral da Somá lia tornou-se
zona de risco por causa da proliferaçã o de piratas somalis realizando frequentes assaltos, inclusive
de petroleiros.

É possível identificar como marco na histó ria contemporâ nea da Somá lia o ano de 1991, quando,
em uma transiçã o entre ordens internacionais, caía o regime militar pró -Moscou no país. A aliança
entre rebeldes durou somente até a derrubada do governo: o ú nico ponto que os unia era o ó dio
que nutriam pelo antigo regime. Uma vez derrubado o governo, partiram para uma intensa disputa
pelo poder.

Os aproximadamente 20 clã s que habitam a Somá lia nã o entraram em um acordo sobre a


composiçã o de um novo governo e, armados, partiram para o confronto. Aqui cabe um registro: nã o
se trata de uma guerra étnica, pois a Somá lia é um raro caso de uniformidade étnico-linguística no
continente africano. A populaçã o é majoritariamente somali, e apenas uma pequena parte fala
á rabe, embora pertença ao mesmo tronco étnico dos demais, ou seja, é o mesmo povo falando
línguas distintas. Apesar da homogeneidade, o país vive em uma guerra civil há mais de 20 anos, e
os protagonistas centrais sã o os clã s rivais.

Uma conferência em 2004, que contou com quase todos os chefes dos clã s, levou a um acordo mais
consistente e elegeu um parlamento. Criou-se um governo transitó rio, cuja composiçã o obedeceria
à proporcionalidade demográ fica das tribos, mas que, por motivos de segurança, permaneceria
instalado provisoriamente no Quênia, país que patrocinou o mais bem-sucedido acordo de paz até
entã o.
Feisal Omar/Reuters/Latinstock

Aldeia devastada pela guerra no distrito de Bakara, Somá lia, 2011. Assim como ocorre no Sudã o e na Etió pia, guerra e seca
també m afligem os somalis.

Allmaps

Fonte: U. S. DEPARTMENT OF ESTATE. Horn of Africa: map. Disponível em:


<http://www.state.gov/p/af/rt/hornofafrica/169532.htm>. Acesso em: 2 mar. 2016.
Pá gina 209

Um plebiscito para impor uma ordem institucional estava previsto para os anos seguintes, mas a
violência extrema nã o permitiu sua realizaçã o.

Passados mais de 20 anos desde o início do conflito, persiste a guerra civil, que levou o país ao
colapso, sem a mínima infraestrutura administrativa. Há um governo eleito, fruto dos acordos de
2004, mas está refugiado no Quênia, pois nã o conseguiu assumir.

O quadro tornou-se ainda mais obscuro nos ú ltimos anos com o fortalecimento da organizaçã o
extremista Al-Shabab (“A juventude”, em á rabe), que, ligada à Al-Qaeda, domina boa parte do país e
impõ e a sharia nas regiõ es que controla.

3.3 Angola: do trauma da guerra à reconstrução nacional


Enquanto foi colô nia portuguesa, Angola assistiu ao surgimento de dois importantes grupos
contestató rios e de libertaçã o nacional, porém de orientaçõ es ideoló gicas distintas. De um lado, de
inspiraçã o marxista, estava o Movimento Popular de Libertaçã o de Angola (MPLA), liderado por
Agostinho Neto, cujo discurso era o de contemplar toda a populaçã o com a proposta de uma Angola
plural, ou seja, além das origens tribais. De outro, surgiu a Uniã o Nacional pela Independência Total
de Angola (Unita), liderada por Jonas Savimbi, cujo apoio maior vinha da tribo ovimbundu, do sul
do país. Havia ainda uma terceira força, a Frente Nacional pela Libertaçã o de Angola (FNLA), porém
de atuaçã o mais modesta que as outras duas.

Assim que findou o domínio português, em 1975, os dois principais grupos entraram em atrito, e
Angola ingressou em uma longa guerra civil, opondo as organizaçõ es e inserindo o país no contexto
da Guerra Fria. Quando eclodiu o conflito, o marxista MPLA passou a ter apoio logístico direto de
Cuba e indireto da Uniã o Soviética. Para nã o permitir a vitó ria do MPLA, os Estados Unidos
financiaram e apoiaram a FNLA usando como intermediá rio o general Joseph-Desiré Mobutu e a
Unita, por meio da Á frica do Sul, através de um corredor territorial pela atual Namíbia, na época um
domínio sul-africano. Estava nítida em Angola uma reproduçã o em pequena escala da Guerra Fria.
Em confrontos no sul, o MPLA, com a ajuda de soldados cubanos, derrotou o exército sul-africano. O
desfecho dessa primeira fase da guerra civil angolana foi a vitó ria do MPLA, de Agostinho Neto, que
assumiu a Presidência do país, depois sucedido por José Eduardo dos Santos. A Unita aderiu à luta
armada contra o novo governo, e a FNLA dissolveu-se.

Os conflitos persistiram ao longo das décadas de 1970 e 1980.

As transformaçõ es internacionais do início dos anos 1990 refletiram-se em Angola. A dissoluçã o


soviética e a imediata crise cubana, assim como o fim do apartheid na Á frica do Sul e a
independência da Namíbia, reconfiguraram o contexto angolano e culminaram no Acordo de Paz de
Lisboa, em 1991, que definiu um imediato cessar-fogo entre o governo do MPLA e a Unita, além de
propor eleiçõ es, sob a supervisã o da ONU. As eleiçõ es ocorreram em 1992 e apontaram a vitó ria de
José Eduardo dos Santos, do MPLA, contra Jonas Savimbi, da Unita.

Mesmo sob a observaçã o de mais de 400 inspetores internacionais, Savimbi nã o aceitou o resultado
do pleito e retomou entã o os combates. A violência instaurou-se de novo em Angola, para a
frustraçã o da maioria da populaçã o, transformando-o no país de maior nú mero de mutilados em
todo o mundo, pois o uso frequente de minas, armas proibidas pela Convençã o de Genebra, foi uma
das estratégias utilizadas nas guerrilhas. O recrudescimento da guerra teve como consequência
uma média de mil mortes diá rias no auge do conflito, que apresentou uma média de 20 mil mortes
por ano.
Convenção de Genebra: Nome genérico para uma série de acordos e tratados firmados entre 1864 e 1949 com o intuito de
minimizar conflitos e preservar a integridade de soldados e reféns capturados.

Ver
Capitão Phillips. Direção: Paul Greengrass. Estados Unidos, 2013. O filme conta a histó ria real do sequestro do
navio cargueiro, comandado pelo capitã o Phillips, por piratas somalis.

Filme de Paul Greengrass. Capitã o Phillips. EUA, 2013


Pá gina 210

jbdodane/Alamy/Latinstock

Essa construçã o atingida por balas na á rea rural de Angola, em 2014, é um testemunho da violê ncia das guerras civis
angolanas.

A partir desse momento, a guerra civil de Angola nã o era mais produto da ingerência internacional,
mas sim de responsabilidade exclusiva da Unita e de seu líder, Jonas Savimbi, um autêntico “senhor
da guerra”, alcunha para designar alguns líderes tribais africanos marcados pela agressividade
militar. Savimbi controlava boa parte das jazidas de diamantes angolanos e, com isso, comprava
armas para a guerra.

O conflito perdurou até 2002, quando Savimbi morreu em combate e a Unita se rendeu. Seus
combatentes foram anistiados e muitos deles aceitos no exército oficial angolano. Um clima
contagiante de reconciliaçã o nacional pairou no país.

Desde entã o, Angola, um país que enfrentou longa guerra civil, tenta retomar seu curso normal de
vida e, movida pelo clima de reconstruçã o nacional, apresentou o notá vel crescimento de, em
média, dois dígitos ao longo da primeira década do século XXI. A exploraçã o de diamantes e outros
recursos minerais, o setor de serviços e as boas perspectivas de prospecçã o de petró leo sã o os
destaques da economia angolana. No entanto, esses mesmos diamantes têm suscitado a prá tica de
um crime bastante conhecido na Á frica: o trá fico das pedras.

Angola apresenta em seu litoral condiçõ es geoló gicas similares à s da Bacia de Santos, onde
recentemente foram descobertas grandes riquezas petrolíferas. A expectativa é que ocorra o
mesmo por lá. A China tornou-se sua grande parceira comercial.

Ler
Apartheid: o horror branco na África do Sul, de Francisco José Pereira. São Paulo: Brasiliense, 1985.
Relançamento da clássica coleçã o Tudo é Histó ria, que aborda, didaticamente, a questã o do apartheid.
Editora Brasiliense

3.4 Apartheid: o horror branco que vigorou na África do Sul


A Á frica do Sul é a segunda maior economia do continente. No entanto, apresenta grandes
problemas sociais, em grande parte consequência da forte herança do apartheid, regime racista
institucionalizado que vigorou de 1948 ao início dos anos 1990. Condenado pela ONU, que manteve
durante anos o Comitê Especial Antiapartheid, e pela comunidade internacional, esse regime
causou terror pela truculência policial contra os civis africanos e pela dominaçã o de uma minoria
branca perante a maioria negra.

Durante a maior parte da vigência desse regime, a populaçã o sul-africana apresentou uma
composiçã o de 70% de africanos (também denominados negros ou, nos dizeres do regime, “pessoas
de cor”), 18% de brancos e 12% de asiá ticos e mestiços. Nos dias atuais, mudou um pouco essa
configuraçã o, com um ligeiro aumento de negros e diminuiçã o percentual dos brancos. Da
populaçã o negra, as etnias zulu e xhosa sã o as mais numerosas, seguidas por inú meras outras,
enquanto os brancos sã o de descendência europeia, principalmente holandesa, mas também
inglesa, francesa e alemã . Durante anos pairou a pergunta sobre a opiniã o pú blica: como uma forte
maioria deixou-se dominar por uma flagrante minoria?
Pá gina 211

Para entender isso, é necessá rio um resgate histó rico do processo de colonizaçã o e do contexto da
chegada dos europeus à Á frica do Sul.

Os primeiros foram os portugueses, quando o navegador Vasco da Gama, na busca de um caminho


alternativo para as Índias, contornou o Cabo da Boa Esperança, no fim do século XV. Os portugueses
fundaram Durban, mas nã o se fixaram no sul da Á frica.

O efetivo processo de colonizaçã o começaria mais tarde, com a chegada dos holandeses e de sua
Companhia Holandesa das Índias Orientais, em 1652. Os holandeses, conhecidos como bô eres,
fundaram colô nias e estabeleceram empreendimentos agropastoris, nã o sem antes entrar em atrito
com os nativos e os expulsarem para o interior, onde ficavam as piores terras. Posteriormente
também foram para o interior, apropriando-se das terras férteis ocupadas pelos xhosas. Os
africanos que tinham suas terras tomadas eram convertidos em trabalhadores dos bô eres em
condiçã o de semiescravidã o. Esse domínio holandês vigorou até 1795, quando os ingleses
chegaram e entraram em atrito com os holandeses pela posse da atual Á frica do Sul.

A regiã o do Cabo da Boa Esperança foi dominada em 1814 e tornou-se parte do Império Britâ nico,
atraindo a partir de entã o muitos colonos britâ nicos e iniciando um longo período de conflito entre
holandeses e britâ nicos.

Insatisfeitos e enfraquecidos, os bô eres iniciaram uma migraçã o para o norte, porçã o ocupada pelos
zulus, que foram expulsos. Nesse processo, os holandeses fundaram duas autodeclaradas
“repú blicas”: Transvaal e Orange, entre 1835 e 1846. O Reino Unido nã o reconheceu as
pseudorrepú blicas, ainda mais porque estavam sendo descobertas imensas riquezas de ouro e
diamante no norte. O choque de interesses entre os britâ nicos e os descendentes de holandeses
resultou na Guerra dos Bô eres, vencida pelo Reino Unido, que se apropriou das jazidas, mas
conservou as terras para os bô eres.

Em 1910, todas essas á reas (Cabo, Durban, Orange e Transvaal) tornaram-se um só país: a Uniã o
Sul-Africana, sob o domínio do Império Britâ nico, obtendo a mesma condiçã o de autonomia do
Canadá e da Austrá lia. Cinquenta anos depois, em 1961, o país seria convertido em repú blica,
cortando os laços moná rquicos com o Reino Unido.
Allmaps

Fonte: ATLAS geográ fico escolar. 6. ed. Rio de Janeiro: IBGE, 2012. p. 45.

Entre o Atlâ ntico e o Índico: a Á frica do Sul está em uma posiçã o geográ fica estraté gica de confluê ncia oceâ nica.

Ver
Um grito de liberdade. Direção: Richard Attenborough. Estados Unidos/Reino Unido, 1987. O filme narra a
resistência do líder antiapartheid Steve Biko, preso e assassinado pela polícia do regime, e do jornalista Donald
Woods, ambos sul-africanos, que eram contrá rios ao regime racista.

Filme de Richard Attenborough. Um grito de liberdade. EUA/Reino Unido, 1987


Pá gina 212

3.4.1 Surge o apartheid

O desenvolvimento da economia mineira sul-africana conduziu o país a um forte aporte financeiro


que melhorava o nível de vida dos colonizadores e de seus descendentes. O restante da populaçã o,
porém, nã o era beneficiado por esse desenvolvimento.

A histó rica divergência entre bô eres e britâ nicos nã o interferiu no desejo comum de explorar a mã o
de obra africana, ou seja, as diferenças ficavam de lado quando o assunto era oprimir os negros.
Desde o princípio da presença europeia na Á frica do Sul, foram os bô eres os mais intolerantes e
contrá rios à igualdade racial. Quando o Reino Unido aboliu o trabalho escravo, em 1835, os bô eres
se revoltaram, pois eles sempre acreditaram na “supremacia branca” como uma vontade divina; a
Igreja Reformada Holandesa, oficial na Á frica do Sul, corroborava essa crença com um discurso
espiritual pautado na supremacia do homem branco perante os demais, citando até mesmo
passagens bíblicas que justificavam a diferença. Outras igrejas cristã s foram contrá rias a essa
postura.

Esse discurso racista arraigado e a perseguiçã o aos nã o brancos eram diretrizes do Partido
Nacional, que aglutinava a populaçã o bô er. De maioria rural, conservadores extremados,
nacionalistas, os bô eres apresentavam maior crescimento demográ fico em relaçã o aos britânicos
urbanos. E foi no momento em que houve aumento do contingente populacional bô er (60%, na
época) que ocorreram as eleiçõ es de 1948. A partir daí a histó ria sul-africana sofreria uma
alteraçã o, com um forte golpe para os africanos.

Como o sistema eleitoral nã o permitia que os negros votassem, o Partido Nacional venceu as
eleiçõ es para nã o mais perdê-las durante a vigência do regime segregacionista, com o mote
eleitoral: “preservar a raça branca da ameaça negra”. Uma vez no poder, o novo governo
encaminhou uma nova Constituiçã o pautada no apartheid, que se tornou a política oficial da Á frica
do Sul e institucionalizou o desenvolvimento em separado entre “brancos” e “nã o brancos”. A
fundamentaçã o ideoló gica do regime partia do pressuposto de que a raça branca é superior. Isso
definiria as novas relaçõ es sociais a partir de entã o.

A estrutura que sustentou o apartheid se baseava em três pilares principais:

a) educação – o negro africano quase nã o tinha acesso à educaçã o e, quando o tinha, era em
condiçõ es muito precá rias;

b) política – o negro africano era totalmente alijado do processo eleitoral e, portanto, da


participaçã o política;

c) terra – os brancos de origem europeia detinham as maiores e melhores terras do país. Veja no
boxe abaixo algumas das atrocidades que existiram na Á frica do Sul de 1948 a 1992.

Pauta musical
Kizomba, Martinho da Vila. Álbum: Festa das raças. CBS, 1988.
Pauta: Resistência antiapartheid e antirracismo.
Capa do LP Festa das raças. Matinho da Vila. Brasil, 1988

Soweto, Djavan. Álbum: Não é azul, mas é mar. Sony BMG, 1987.
Pauta: Resistência antiapartheid.

Capa do LP Nã o é azul, mas é mar. Djavan. Brasil, 1987

Algumas características do apartheid

• O voto era permitido apenas aos brancos e asiáticos (sobretudo trabalhadores indianos), ou seja, 70% da populaçã o
do país nã o participava do processo eleitoral.

• Havia total separaçã o entre negros e brancos em todos os níveis: bairros, praias, praças, bancos pú blicos, ô nibus,
vagõ es de trens, escadas de acesso, cafés, banheiros pú blicos.

• As crianças brancas e negras estudavam em escolas separadas e, obviamente, de qualidade muito distinta. O alto
índice de analfabetismo da populaçã o negra na Á frica do Sul nos dias atuais é uma consequência disso.

• Nas zonas rurais, foram criadas “reservas” aos negros, que nã o poderiam sair delas sem a autorizaçã o dos patrõ es.

• Lei de passe: qualquer deslocamento dos negros fora de sua “reserva rural” ou de seu distrito urbano só era
permitido com o devido passe; caso contrá rio, eles poderiam ser presos.

• Era ilegal uma pessoa branca e outra negra tomar chá juntas, em lugares pú blicos, a nã o ser com autorizaçã o oficial
para fazê-lo.

• Os casamentos inter-raciais eram proibidos e nã o eram reconhecidos na Á frica do Sul.

• Os negros eram proibidos de participar de jú ris populares.


Pá gina 213

3.4.2 O fim do apartheid

Desde o início da colonizaçã o, a populaçã o africana resistiu, mas a superioridade econô mica e,
sobretudo, bélica dos europeus foi determinante para garantir a posse e o domínio da Á frica do Sul,
como, aliá s, ocorreu em todo o continente. A histó rica rivalidade tribal africana também contribuiu
para enfraquecer a populaçã o nativa. O colonizador conseguiu manipular muito bem os
desentendimentos entre xhosas e zulus.

Contudo, organizou-se ainda no início do século XX uma forte entidade negra, o Congresso Nacional
Africano (CNA). Havia outras, mas essa foi a mais atuante. No entanto, na Á frica do Sul, fazer
oposiçã o ao sistema sempre foi muito difícil em razã o da extrema violência das autoridades, que
nã o hesitavam em executar os manifestantes. Foi o que ocorreu nos massacres de Sharpeville, em
1960, e de Soweto, em 1976, quando a polícia, simplesmente, abriu fogo contra os manifestantes,
matando dezenas de pessoas. Igualmente, as leis do apartheid dificultavam a mobilizaçã o, uma vez
que era proibida a reuniã o de mais de dez africanos em lugares pú blicos, pois se configurava
suspeita de conspiraçã o contra o regime.

Líderes antiapartheid eram presos, torturados ou assassinados. Foi assim com Nelson Mandela,
detido de 1962 a 1990, acusado de subversã o; e com Steve Biko, preso, torturado e executado pela
polícia sul-africana, que alegou suicídio de Biko na prisã o. A ONU e muitos países tentaram, sem
sucesso, boicotar a Á frica do Sul. As maiores potências discursavam contra o apartheid, mas faziam
altos negó cios com o país, especialmente os Estados Unidos e o Reino Unido. A Á frica do Sul é um
dos países mais ricos do mundo em minérios, e este era o grande trunfo de seus dirigentes brancos.

No entanto, no fim dos anos 1980 o regime começou a dar sinais de que nã o suportaria as pressõ es
internacionais e internas. A mobilizaçã o popular estava chegando a um nível insustentá vel, e
mesmo uma parcela branca nã o defendia mais aqueles preceitos, pois os considerava uma
legislaçã o obsoleta.

Depois de 28 anos preso, Nelson Mandela foi solto, durante o governo de Frederik de Klerk,
trazendo mudanças para a Á frica do Sul e o mundo. Nã o que fosse desejo do presidente, no entanto
ele entendeu que chegara a hora de pô r fim ao regime do apartheid. A alternativa a isso era a
perspectiva de uma guerra civil. Assim foram convocadas eleiçõ es para 1994 e dado o direito de
voto aos negros. Aconteceu o que todos imaginavam: no dia em que os negros africanos votassem, a
Á frica do Sul seria governada pelo representante da maioria. Nelson Mandela foi eleito como
candidato do CNA, que se convertera em partido.

Era o fim do apartheid, mas as injustiças e os problemas sociais estabelecidos por esse regime ainda
perduram na Á frica do Sul.
Keystone-France/Gamma-Keystone via Getty Images

Massacre de Soweto, em 1976: uma triste lembrança do regime racista.

AP/Glow Images

Mandela discursa em está dio de futebol em Soweto, Johanesburgo, apó s sua libertaçã o, em 1990.
Pá gina 214

3.5 Nigéria: tensão étnica e religiosa


A Nigéria está localizada na parte oeste da Á frica, junto ao Golfo da Guiné. Possui grandes riquezas
petrolíferas, sendo, inclusive, membro da Organizaçã o dos Países Exportadores do Petró leo (Opep).
O país detém a maior economia do continente, sendo considerado uma potência regional. Apesar
dos bons indicativos econô micos, a Nigéria convive há décadas com tensõ es internas.

Essencialmente, duas sã o as razõ es principais dos conflitos nigerianos: o ó dio entre cristã os e
muçulmanos e os interesses divergentes das inú meras etnias que vivem no país. Estima-se que haja
aproximadamente 200 etnias, sendo os hauçá s, os fulâ nis e os iorubá s os mais numerosos. Outra
forte minoria sã o os ibá s, que, em 1966, tentaram alçar sua regiã o, Biafra, à condiçã o de país
independente, porém sem sucesso. O resultado dessa tentativa de separaçã o foi uma violenta
guerra civil que perdurou até 1970.

Os cristã os, os muçulmanos e os animistas sã o os principais grupos religiosos da Nigéria, nos quais
estã o distribuídas centenas de etnias. Os cristã os e os muçulmanos praticamente se equivalem em
nú mero, com 45% de seguidores do total da populaçã o de aproximadamente 182 milhõ es; o
restante é animista.

Desde sua independência, em 1960, a Nigéria tem alternado governos democraticamente eleitos
com sucessivos golpes militares. Nas duas ú ltimas décadas, o país se mostrou mais está vel
politicamente: o nú mero de golpes diminuiu e a via eleitoral se fortaleceu, mas as tensõ es por causa
das diferenças étnicas e religiosas persistem.

Os muçulmanos estã o concentrados no norte, enquanto o sul é predominantemente cristã o; há uma


zona intermediá ria designada “cinturã o do meio”. Apesar da aparente liberdade de rito, paira uma
atmosfera de intolerâ ncia religiosa no país, sobretudo naqueles estados que adotaram a sharia e
que contam com minorias cristã s insatisfeitas com essa iniciativa.

Além da tensã o étnica e religiosa, o aspecto econô mico também contribui para a instabilidade.
Detentora de grandes reservas petrolíferas, a Nigéria nã o conseguiu ao longo de cinco décadas de
exploraçã o do combustível oferecer uma qualidade de vida satisfató ria à populaçã o. As cifras
oriundas do petró leo sã o razoá veis, cerca de US$ 250 bilhõ es anuais; contudo, em torno de 70% da
populaçã o (segundo a ONU) vive na linha da pobreza, ao passo que algumas elites locais
constituíram imensas fortunas.
Allmaps

Fonte: AFROBAROMETER. Bad luck for Nigeria. The Economist, 7 fev. 2015. Disponível em:
<http://www.economist.com/news/middle-east-and-africa/21642236- discredited-ruling-party-faces-its-greatestelectoral-test-yet-
bad-luck>. Acesso em: 4 mar. 2016.

Navegar
Centro Brasileiro de Estudos Africanos <http://tub.im/pqdw8z>
O centro de pesquisa vinculado à Universidade Federal do Rio Grande do Sul apoia os estudos acadêmicos
relacionados à Á frica e apresenta um interessante portal com notícias relacionadas à política e à economia do
continente.

3.5.1 Boko Haram

É nesse contexto de instabilidade e de forte polarizaçã o étnico-religiosa, somado ao crescimento do


extremismo em vá rias partes do mundo islâ mico, que o terrorismo também chegou à Nigéria,
representado pelo Boko Haram, que na língua hausa significa “a educaçã o ocidental é proibida”. O
grupo foi fundado por Mohammed Yusuf em 2002, mas hoje é liderado por Abubakar Shekau.
Depois de estar filiado à Al-Qaeda, recentemente jurou fidelidade ao Estado Islâ mico. Age com a
tradicional característica do terror, espalhando o pâ nico e a incerteza. Estima-se que o grupo tenha
executado mais de dez mil vítimas, principalmente na Nigéria, mas também em países vizinhos
como Camarõ es e Chade, além de ser a causa de mais de um milhã o de deslocados internos no país.
Pá gina 215

O Boko Haram tem praticado atentados violentíssimos com frequência. Por exemplo, durante as
celebraçõ es natalinas em 2011, realizou vá rios atentados simultâ neos a igrejas cató licas, matando
dezenas de fiéis. Três anos mais tarde, o grupo chocou o mundo com o sequestro de centenas de
meninas entre 16 e 18 anos de um colégio no estado de Borno, onde o Boko Haram nasceu.

Assim como o Estado Islâ mico no Iraque e na Síria, o Boko Haram proclamou o estabelecimento de
um estado islâ mico no nordeste da Nigéria em uma á rea que compreende aproximadamente 15
cidades. Muitos entendem que o Boko Haram é fruto das frá geis instituiçõ es políticas nigerianas,
um país com tradiçã o de golpes militares e casos de corrupçã o. Somente em 2016, a Nigéria
conseguiu pela primeira vez em sua histó ria fazer a transiçã o democrá tica de um governo
derrotado nas urnas por outro. A pobreza extrema da populaçã o muçulmana da porçã o norte do
país associada a governos militares com histó rico de violência contra a populaçã o civil é outro
agravante.

Stringer/AFP

Milhares de nigerianos sã o obrigados a deixar suas casas em consequê ncia das açõ es do Boko Haram. Na fotografia,
deslocados internos (pessoas deslocadas dentro do pró prio país) aguardam a entrega de alimentos no campo de Dikwa, no
estado de Borno, Nigé ria, 2016.
REUTERS/Latinstock

Um natal em lá grimas: atentado terrorista, reivindicado pelo Boko Haram, em igreja cató lica em Abuja, Nigé ria, 2011. A
difícil convivê ncia entre cristã os e muçulmanos é um dos fatores de desestabilizaçã o no país.
Pá gina 216

ROTEIRO DE ESTUDO
ESCREVA NO CADERNO

Revisando

1. O continente africano apresenta particularidades pró prias, como compartimentaçã o territorial


maciça, uniformidade na distribuiçã o bioclimá tica, litoral pouco recortado. Destaque outros pontos da
geografia física africana, mencionando relevo, clima, hidrografia e vegetaçã o.

2. Costuma-se afirmar que a linha do equador é “o espelho da Á frica”. Por quê?

3. “O Egito é uma dádiva do Nilo.” (Heró doto, século V). Reveja no capítulo o trecho que trata sobre o rio
Nilo e justifique a frase do historiador grego.

4. Embora a presença europeia na Á frica fez-se notar desde o século XV, é especialmente a partir do
século XIX que essa dominaçã o se tornou mais intensa. Que relaçã o você vê entre a presença europeia na
Á frica e a situaçã o política, econô mica e social do continente nos dias de hoje?

5. Escolha um problema geopolítico africano e discorra sobre ele em poucas linhas, expondo sua opiniã o
sobre a questã o.

Olhar cartográfico

Observe a distribuiçã o pluviométrica africana nos mapas abaixo e aponte a razã o de as chuvas
ocorrerem em períodos distintos nos hemisférios norte e sul do continente.

Allmaps

Fonte: ATLAS geográ fico escolar. 6. ed. Rio de Janeiro: IBGE, 2012. p. 59.

Atividade em grupo
Organizem-se em grupos de quatro alunos. Cada equipe ficará responsá vel por uma das regiõ es africanas
a seguir.

• Á frica setentrional (Marrocos, Argélia, Mauritâ nia, Tunísia, Líbia)*

• Vale do Nilo (Egito e Sudã o)

• Á frica ocidental (Costa do Marfim, Gana, Nigéria, Camarõ es, Gabã o)*

• Á frica oriental (Quênia, Tanzâ nia, Uganda, Burundi)

• Chifre da Á frica (Etió pia, Somá lia, Eritreia, Djibuti)

• Á frica central (Repú blica Democrá tica do Congo, Congo, Ruanda, Repú blica Centro-Africana)*

• Á frica austral (Angola, Zâ mbia, Zimbá bue, Moçambique, Botsuana, Á frica do Sul)*

* Alguns dos países dessa regiã o.

O produto dessa pesquisa resultará em um dossiê composto de um conjunto de quatro relató rios
abordando aspectos ambientais, sociais, econô micos e geopolíticos da regiã o escolhida. Cada grupo fará
uma breve apresentaçã o de 15 ou 20 minutos sobre as principais constataçõ es observadas na regiã o
pesquisada.
Pá gina 217

De olho na mídia

Leia a matéria a seguir sobre o Boko Haram e depois relacione o significado do nome do grupo com a
notícia. Se necessá rio, retome o item 3.5.1 deste capítulo.

Grupo radical Boko Haram impede um milhão de crianças de ir à escola

A açã o do grupo radical Boko Haram impede mais de um milhã o de crianças de ir à escola, informa o Fundo das
Naçõ es Unidas para a Infâ ncia (Unicef), acrescentando que a questã o educacional vai alimentar ainda mais o
radicalismo na Nigéria e nos países vizinhos.

Mais de duas mil escolas estã o fechadas na Nigéria, em Camarõ es, no Chade e Níger – os quatro países mais afetados
pelos ataques do grupo – e centenas de outros estabelecimentos foram atacados ou incendiados pelos jihadistas,
segundo a instituiçã o.

O presidente da Nigéria, Muhammadu Buhari, tinha dado ao exército prazo até o fim deste ano para controlar o grupo
islamita.

A pouco tempo do fim do prazo, os radicais do Boko Haram, que juraram fidelidade ao grupo radical Estado Islâ mico,
continuam os ataques tanto na Nigéria quanto nos países vizinhos.

Há duas semanas, no entanto, ele advertiu que as operaçõ es militares contra a rebeliã o do Boko Haram – cujo nome
significa “a educaçã o ocidental é proibida” – poderã o durar mais tempo que o previsto.

Mas, mesmo no caso de o exército ser bem-sucedido, analistas lembram que o governo terá de lidar com o tumulto
social decorrente de uma geraçã o de crianças que nã o têm ido à escola.

“Quanto mais tempo [as crianças] nã o forem à escola, maior é o risco de serem maltratadas, raptadas e recrutadas
por grupos armados”, disse Manuel Fontaine, diretor regional do Unicef para a Á frica Ocidental e Central.

A açã o do Boko Haram e a repressã o por parte das forças de segurança deixaram 17 mil mortos e 2,6 milhõ es de
deslocados desde 2009, informa a agência France Presse.

GRUPO radical Boko Haram impede 1 milhã o de crianças de ir à escola. EBC Agência Brasil, 22 dez. 2015. Disponível em:
<http://agenciabrasil.ebc.com.br/internacional/noticia/2015-12/grupo-radical-boko-haram-impede-1-milhao-de-criancas-de-ir-escola>. Acesso em: 16 maio 2016.
AFOLABI SOTUNDE/REUTERS/Latinstock

Crianças frequentam a escola no campo para deslocados internos localizado na cidade Yola, no nordeste da Nigé ria, 2015.
Este campo abriga pessoas que fugiram de ataques realizados pelo Boko Haram.
Pá gina 218

A nova face da África:


CAPÍTULO 11 -
crescimento urbano e econômico

AFP

Lagos, capital da Nigé ria, 2015.


Pá gina 219

Tópicos do capítulo

Quadro humano

Dilemas sociais

Economia

Relações África-Brasil

Ponto de partida
ESCREVA NO CADERNO

1. Uma característica atual da Á frica é que vá rios países estã o apresentando forte ritmo de crescimento
urbano. Como Lagos, na Nigéria, retratada na fotografia, apresenta-se nesse cená rio?

2. Que elementos da paisagem de Lagos você destacaria nessa imagem?


Pá gina 220

1. Quadro humano
Com 1,2 bilhã o de habitantes, a Á frica é o segundo continente mais populoso do mundo, mas, em
linhas gerais, apresenta baixa densidade demográ fica. A populaçã o se concentra majoritariamente
nas bordas litorâ neas, em especial nas costas setentrional e ocidental, enquanto os maiores vazios
demográ ficos estã o no interior. Os principais aglomerados populacionais estã o localizados na orla
mediterrâ nea, no Baixo Nilo, no litoral do Golfo da Guiné, no sul da Á frica do Sul, no litoral
moçambicano e no interior da Etió pia. Observe, no mapa a seguir, a desigual distribuiçã o da
populaçã o africana.

Allmaps

Fonte: UNDESA. World Urbanization Prospects: the 2009 Revision, 2010; CIESIN. Socioeconomic Data and Applications Center
online database, jan. 2011. Disponível em: <http://www.grida.no/graphicslib/detail/population-distributionin-africa_1709>.
Acesso em: 21 jan. 2016.

Há no continente duas macrorregiõ es delimitadas pelo deserto do Saara: ao norte, a chamada Á frica
branca ou setentrional, composta essencialmente de povos á rabes, mas também tuaregues,
berberes e abissínios; ao sul, a Á frica negra ou subsaariana, com uma variada gama de povos e
línguas.

Os negros constituem aproximadamente dois terços da populaçã o africana. Pertencem ao tronco


melanoafricano e sã o divididos em inú meros grupos étnico-linguísticos, sendo os bantos e os
sudaneses os dois principais. Entre os bantos há aproximadamente 275 línguas distintas; entre os
sudaneses, 400. Os grupos bantos ocupam a vertente atlâ ntica e todo o centro-sul africano; os
sudaneses se concentram ao sul do Saara. Existem ainda outros grupos com raízes distintas, como
pigmeus, hotentotes, bosquímanos e hovas, cada qual com suas respectivas derivaçõ es linguísticas.
Como vemos, a Á frica é um emaranhando de vasta riqueza cultural.
Em geral, a prá tica religiosa dos povos subsaarianos é constituída de rituais tribais, como o
animismo e o totemismo, enquanto na Á frica setentrional predomina o islamismo, presente na
regiã o desde a expansã o islâ mica no século VII. Já a presença europeia na Á frica legou forte
influência do cristianismo, que se manifesta por meio de suas diversas vertentes em muitos países,
como Nigéria, Sudã o, Egito e Á frica do Sul.

Totemismo: Crença e prá ticas rituais que se baseiam na existência de uma ligaçã o espiritual entre as pessoas e um totem.
Pá gina 221

Ainda hoje os brancos remanescentes da colonizaçã o europeia formam minorias em vá rias partes
da Á frica. Ao norte, esses “africanos de origem europeia” descendem essencialmente de franceses e
italianos e sã o cató licos, enquanto, ao sul, a presença maior é de descendentes de ingleses e
holandeses, protestantes em sua maioria. Angola, Moçambique e Guiné-Bissau apresentam
descendentes de portugueses cató licos. Na vertente índica, há pequenos grupos remanescentes de
indianos.

Philippe Lissac/Godong/Corbis/Latinstock

Celebraçã o cató lica em Tú nis, Tunísia, 2013.

Anadolu Agency/Getty Images

Muçulmanos em mesquita, Tú nis, Tunísia, 2015.

ERIC LAFFORGUE/Alamy/Latinstock

Homens guiando um zangbeto, guardiã o do espírito da noite para os animistas, Porto-Novo, Benin, 2015.
dianajarvisphotography.co.uk/Alamy/Latinstock

Totens simbolizando antepassados, Guiné -Bissau, 2015.

Interagindo
ESCREVA NO CADERNO

O neocolonialismo do século XIX e a consequente arbitrariedade na constituiçã o das fronteiras, somados às lutas
nacionais de independência, provocaram uma série de conflitos entre povos diferentes, muitas vezes rivais, que
foram obrigados a conviver no mesmo territó rio. O resultado foi uma infinidade de guerras étnicas e tribais que se
alastram pela Á frica até os dias de hoje. Compare o mapa ao lado com o da partilha da Á frica, que está na pá gina 203
do capítulo anterior. Qual é a sua conclusã o sobre o estabelecimento das fronteiras na Á frica?

Allmaps

Fonte: ALMANAQUE Abril. São Paulo: Abril, 2015. p. 351.


Pá gina 222

1.1 Crescimento populacional e urbano na África


Pauta musical
Dumbanengue, Dice. Álbum: Dumbanengue. Maning Mose, 2015.
Pauta musical: Desigualdades socioespaciais urbanas em Moçambique.

Entre 2010 e 2015, a Á frica teve um incremento populacional de 2,55% ao ano, a maior taxa de
crescimento entre as principais regiõ es do planeta no período, o que levou o continente a abrigar
cerca de 1,2 bilhã o de pessoas, ou seja, 16% da populaçã o mundial. As previsõ es da ONU para as
pró ximas décadas indicam continuidade nessa tendência: mesmo que a taxa de fecundidade caia,
como se prevê, da média atual de 4,7 filhos por mulher para 3,1 em 2050 e para 2,2 em 2100,
estudos indicam que a maior parte do crescimento da populaçã o mundial entre 2015 e 2050
ocorrerá no continente africano.

Na segunda metade do século XXI, a Á frica será a ú nica grande regiã o do planeta a apresentar
significativo crescimento populacional, ultrapassando a marca de 4,3 bilhõ es de habitantes ou cerca
de 40% da populaçã o mundial em 2100. Observe, na tabela a seguir, as projeçõ es de crescimento
populacional em grandes regiõ es do planeta feitas pela ONU para o século XXI.

Anton_Ivanov/Shutterstock.com
SAUL LOEB/AFP

O acelerado ritmo de urbanizaçã o segue acompanhado da falta de planejamento e da ineficiente política pú blica de
distribuiçã o de renda. As grandes cidades africanas, como Luanda, capital de Angola, crescem em meio a contrastes
socioespaciais, com concentraçã o de riqueza e muitos bolsõ es de pobreza. Em cima, regiã o pró spera em Luanda, 2013.
Embaixo, bairro pobre na capital angolana, 2014.

População mundial e grandes regiões


População (milhões)
Região
2015 2030* 2050* 2100*
Mundo 7 349 8 501 9725 11 213
Á frica 1 186 1 679 2 478 4387
Á sia 4393 4923 5 267 4 889
Europa 738 734 707 646
América Latina e Caribe 634 721 784 721
América do Norte 358 396 433 500
Oceania 39 47 57 71

* Projeçã o.

Fonte: UNITED NATIONS. World Population Prospects: the 2015 Revision. New York: United Nations, 2015. p. 1. Disponível em:
<http://esa.un.org/unpd/wpp/publications/files/key_findings_wpp_2015.pdf>. Acesso em: 7 mar. 2016.

Além do acelerado crescimento populacional, os países africanos vêm apresentando nas ú ltimas
décadas fortes índices de concentraçã o urbana. Em 1990, 24 cidades africanas tinham mais de um
milhã o de habitantes; em 2015, esse nú mero dobrou. Naquele ano, a Nigéria era o país mais
populoso da Á frica, com mais de 182 milhõ es de habitantes. Estima-se que chegue a 2050 com cerca
de 400 milhõ es de habitantes, desigualmente distribuídos pelo territó rio, mas com grande
concentraçã o urbana, sobretudo em Lagos.

Estudos das Naçõ es Unidas preveem que, entre 2015 e 2100, as populaçõ es de Angola, Burundi,
Malawi, Mali, Níger, Repú blica Democrá tica do Congo, Tanzâ nia, Somá lia, Uganda e Zâ mbia
aumentarã o pelo menos cinco vezes. Especialistas da ONU indicam que o crescimento populacional
se concentrará nos países mais pobres e, sobretudo, nas cidades.
Pá gina 223

Na passagem do século XX para o XXI, apenas 36% dos habitantes do continente viviam em cidades.
Em 2025, serã o 48% e, até o final do século, a Á frica terá uma populaçã o majoritariamente urbana.
Observe o grá fico ao lado. A cada ano o contingente populacional nos grandes aglomerados urbanos
ao redor das principais cidades aumenta em decorrência da migraçã o. É o que ocorre, por exemplo,
no Cairo (Egito), em Lagos (Nigéria) e em Kinshasa (Repú blica Democrá tica do Congo). Em 2015,
essas cidades já estavam entre os 30 aglomerados urbanos mais populosos do planeta, como é
possível observar na tabela a seguir.

África: aglomerados urbanos mais populosos (2016)


Ranking mundial Área urbana/país População estimada Densidade demográfica
(hab./km2)
17º Cairo/Egito 15 910 000 9,0
24º Lagos/Nigéria 12 830 000 9,0
27º Kinshasa/Repú blica 11 380 000 19,5
Democrá tica do Congo
53º Luanda/Angola 6 955 000 7,1
81º Nairó bi/Quênia 4 930 000 8,9

Fonte: DEMOGRAPHIA World Urban Areas: 12th Annual Edition: 2016. p. 21-22. Disponível em: <http://www.demographia.com/db-
worldua.pdf>. Acesso em: 7 mar. 2016.

Tarumã

Fonte: UNITED NATIONS ENVIRONMENT PROGRAM (UNEP). Africa: Atlas of Our World Changing Environment. Nairobi: Unep,
2008. p. 14. Disponível em: <http://www.unep.org/dewa/africa/africaAtlas/PDF/en/Africa_Atlas_Full_en.pdf>. Acesso em: 7 mar.
2016.

A Geografia na... arte!


ESCREVA NO CADERNO

Uma das consequê ncias do acelerado processo de urbanizaçã o na Á frica é o surgimento de um novo estilo de vida em
decorrê ncia da migraçã o de milhõ es de pessoas que partem do campo em direçã o às cidades. Costumes e tradiçõ es
sã o afetados, dando origem a novos conflitos e interaçõ es socioculturais.

A fotografia ao lado, registrada em Johanesburgo, na Á frica do Sul, mostra duas torres de refrigeraçã o cujas
superfícies aparecem decoradas com grafite. Para ter uma ideia de suas dimensõ es, compare-as com o homem que
caminha e com os veículos automotores, que parecem minú sculos diante de sua grandiosidade.

Nas torres de refrigeraçã o, veem-se manifestaçõ es artísticas que expressam visõ es sobre a cidade sul-africana.
Analise a imagem e indique elementos ligados ao meio rural e outros que se referem ao meio urbano. Depois,
relacione-os com o processo citado no primeiro pará grafo.

Jonathan Irish/National Geographic Creative/The Bridgeman Art Library/KEYSTONE BRASIL

Torres de refrigeraçã o em Johanesburgo, Á frica do Sul, 2013.


Pá gina 224

Ler
E se Obama fosse africano?: ensaios, de Mia Couto. Companhia das Letras: São Paulo, 2011.
O livro do escritor moçambicano reú ne artigos que apresentam uma crítica sobre o cená rio contemporâ neo da Á frica.

Companhia das Letras

2. Dilemas sociais
A Á frica subsaariana é a regiã o mais pobre do planeta e a ú nica que regrediu economicamente se
comparada aos anos 1960. É possível detectar vá rios problemas nessa regiã o: interminá veis
guerras civis, altos índices de pobreza extrema, de acordo com agências da ONU, agricultura
estagnada, fome e subnutriçã o crô nica, elevada taxa de mortalidade infantil, doenças tropicais
epidêmicas e o crescimento da Aids, a maior tragédia dos ú ltimos 40 anos.

O quadro de penú ria social revela-se anualmente com os dados do IDH divulgados pelo Pnud: os
países da Á frica ocupam as piores posiçõ es, mesmo comparados a países muito pobres de outras
regiõ es, como o Haiti e o Afeganistã o, os mais pobres da América Latina e da Á sia, respectivamente.
Em 2014, dos 44 países que faziam parte do grupo com os nú meros do IDH mais baixos, 36 eram
africanos.

Fonte: UNDP. Human Development Report 2015: Work for Human Development. Disponível em:
<http://hdr.undp.org/sites/default/files/2015_human_development_report_1.pdf>. Acesso em: 8 mar. 2016.

IDH 2014: os dez piores


Ranking País IDH
179º Mali 0,419
180º Moçambique 0,416
181º Serra Leoa 0,413
182º Guiné 0,411
183º Burkina Faso 0,402
184º Burundi 0,400
185º Chade 0,392
186º Eritreia 0,391
187º Repú blica Centro-Africana 0,350
188º Níger 0,348

Essa situaçã o nã o se delineou de uma hora para outra – é produto da histó ria. E, mais uma vez, é
necessá rio ressaltar: está vinculada ao neocolonialismo, somada a outros fatores intrínsecos ao
continente.

A situaçã o dos países subsaarianos é mais grave se considerarmos que a populaçã o ainda é, em
grande parte, rural e nã o tem as condiçõ es necessá rias para ser autossuficiente: a produçã o
agrícola nã o supre a necessidade desses países, que acabam recorrendo à importaçã o de alimentos,
mesmo sem ter condiçõ es econô micas.

Sã o vá rias as razõ es da produçã o deficitá ria, que interfere na questã o alimentar e leva a fome à
populaçã o mesmo no campo: condiçõ es desfavorá veis às colheitas, prejudicadas em razã o das
extensas zonas á ridas; relevo acidentado em longos trechos; solos pobres com muitas florestas;
técnicas rudimentares; escassos solos férteis com cultivos voltados à exportaçã o, e nã o à produçã o
de gêneros bá sicos; plantaçõ es destruídas por milícias inimigas nos conflitos civis que assolam o
continente.

Edwin Remsberg/Corbis/Latinstock

O uso de instrumentos rudimentares é um dos fatores que influenciam na baixa produtividade da agricultura africana. Na
fotografia, lavrador utilizando arado, Somenkong, Lesoto, 2015.
Pá gina 225

Meio século apó s a independência dos países da Á frica subsaariana, essa regiã o continua sendo
essencialmente exportadora de gêneros agrícolas e minérios e importadora de gêneros
industrializados. Comparada com a segunda regiã o mais pobre do mundo – o Sul e o Sudeste
asiá ticos –, fica evidente sua situaçã o crítica: os rendimentos per capitacorrespondem a apenas um
terço dos da regiã o asiá tica e sã o menores ainda que os do terceiro bolsã o de pobreza mundial – a
América Latina. No quesito desigualdade, no entanto, a América Latina supera a Á frica subsaariana.

Embora as Naçõ es Unidas venham se mobilizando para enfrentar o desafio de reduzir a pobreza no
continente africano por meio de iniciativas como a Declaraçã o do Milênio, a Agência das Naçõ es
Unidas de Luta contra a Aids (Unaids) ou a Comissã o Econô mica das Naçõ es Unidas para a Á frica
(CEA), elas têm se mostrado ineficazes na reversã o do quadro social estabelecido.

O quadro social africano foi agravado nos ú ltimos anos pela epidemia do ebola. Causada por vírus,
essa doença tropical provoca febre hemorrá gica com alto grau de letalidade. Afetou, sobretudo, a
parte ocidental do continente africano, atingindo especialmente Libéria, Serra Leoa, Nigéria e
Guiné. Por causa da gravidade do surto em 2014, a Organizaçã o Mundial da Saú de (OMS) decretou a
epidemia do ebola como caso de emergência pú blica sanitá ria mundial. No entanto, espera-se que
esse degradante quadro social possa ser minimizado nos pró ximos anos com o bom desempenho
macroeconô mico que tem se verificado no continente, como será melhor explicitado no item 3.

Zoom Dosso/AFP

Outdoor com campanha de combate ao ebola, Monró via, Libé ria, 2015.

2.1 O problema da Aids


Desde a descoberta da Aids nos anos 1970, a Á frica foi o continente mais assolado pela doença. O
relató rio de 2011 da Unaids apontou que dos 34 milhõ es de soropositivos no mundo quase 70%
encontravam-se em solo africano. É na porçã o austral da Á frica subsaariana que esse quadro é mais
dramá tico: Botsuana, Zimbá bue, Zâ mbia e Á frica do Sul estã o entre os países que enfrentam os
maiores problemas com a doença. Em Botsuana e Zimbábue, 25% da populaçã o estava
contaminada com o vírus HIV, enquanto a Á frica do Sul tinha o maior nú mero de infectados em todo
o mundo: quase 6 milhõ es, pouco mais de 10% da populaçã o de 50 milhõ es de habitantes.

Na Zâ mbia, a expectativa média de vida foi reduzida de 65 anos para 35 por causa dessa doença. Na
maioria dos países da Á frica austral, a pirâ mide etá ria tem se redesenhado por causa da Aids, que
aumenta a mortalidade e diminui a perspectiva de vida, provocando, portanto, um afunilamento na
pirâ mide.
Entretanto, apó s três décadas de dados pessimistas e agravamento da situaçã o, as estatísticas do
relató rio de 2011 apontam para uma melhora sutil do quadro geral, com reduçã o do nú mero de
infectados no mundo e também na Á frica, embora nesse continente a situaçã o ainda seja
preocupante.

Navegar
Unaids <http://tub.im/2vb4o3>
A Unaids é uma agência da ONU de luta contra a Aids que divulga dados e estudos, assim como planos para o combate
e a prevençã o dessa doença.

2.2 A situação das mulheres


Outra característica do continente africano é a situaçã o de desigualdade das condiçõ es sociais entre
mulheres e homens. Conheça, no infográ fico a seguir, algumas das dificuldades enfrentadas pelas
mulheres e suas conquistas.
Pá gina 226

Crédito do infográ fico: Casa Paulistana

Casa Paulistana

Fontes: Escolaridade e casamento: ONU. The World’s Women 2010: Trends and Statistics. Nova York: ONU, 2010. p. 50 e 14
(respectivamente). Mã o de obra: Organizaçã o para a Cooperaçã o e Desenvolvimento Econô mico (OCDE). Disponível em:
<www.oecd.org/dev/poverty/womeninafrica.htm>. Acesso em: 5 maio 2016.
Pá gina 227

Atividades
ESCREVA NO CADERNO

1. Que analogia você faria entre a situaçã o da mulher africana e a da brasileira?

2. Nã o é só na Á frica ou no Brasil que a mulher está ausente das grandes decisõ es, isso ocorre no mundo
todo: há uma inegá vel hegemonia masculina à frente das grandes corporaçõ es e organismos
internacionais, por exemplo. Em sua opiniã o, por que isso ocorre? Reflita e discuta com seus colegas
sobre como seria o mundo se houvesse maior presença feminina à frente das decisõ es econô micas,
ambientais, políticas e militares.
Pá gina 228

3. Geografia econômica
A Á frica adentrou o século XXI demonstrando notá veis índices de crescimento econô mico. Segundo
organismos como o Pnud, OCDE e o Banco de Desenvolvimento Africano (2015), enquanto nas duas
ú ltimas décadas do século XX a média de crescimento do continente girava em torno de 2%, o
período 2001-2014 registrou um crescimento médio de 5%, acima da média mundial de 4%,
perdendo apenas para as economias emergentes asiá ticas que registraram 8%. O principal fator
desse desempenho deve-se à demanda mundial por commodities minerais, principal produto de
exportaçã o africana. No entanto, a queda inesperada do preço do petró leo e de outros minérios
apó s a crise de 2008-2009 diminuiu esse fluxo. O principal destino das exportaçõ es africanas sã o
China e Europa, essa ú ltima bastante atingida pela crise. Outro fator que prejudicou o desempenho
africano foi a epidemia de ebola na porçã o ocidental do continente, assim como as interminá veis
guerras civis que assolam muitos países do continente. Mas, em linhas gerais, no â mbito econô mico
o continente africano apresentou uma perspectiva favorá vel.

Tarumã

Fonte: AFRICAN DEVELOPMENT BANK, ORGANISATION FOR ECONOMIC CO-OPERATION AND DEVELOPMENT, UNITED NATIONS
DEVELOPMENT PROGRAMME. Regional Development and Spatial Inclusion. African Economic Outlook, 2015. New York:
UNDP, 2015. p. 1.

Com um histó rico de intensa exploraçã o no período neocolonial, a complicada inserçã o no contexto
da Guerra Fria e as inconclusas guerras civis, a Á frica tornou-se o mais pobre dos continentes ao
longo dos ú ltimos séculos, mas o ressurgimento econô mico africano verificado recentemente faz
muitas organizaçõ es acreditarem na sustentabilidade do desenvolvimento desse continente. Some-
se ao cená rio otimista as projeçõ es de crescimento demográ fico e de sua populaçã o
economicamente ativa, enquanto nas demais regiõ es do mundo irá acontecer o contrá rio. A
tendência é que tal perspectiva contribua para o aquecimento das economias e do mercado de
trabalho. No entanto, a Á frica nã o é homogênea e esses índices econô micos mostram-se bastante
desiguais, com algumas economias se destacando muito, como em Angola, na Guiné, na Á frica do
Sul e na Nigéria, enquanto outras permanecem estagnadas, como nos países da regiã o do Sahel e da
Á frica central.
Pá gina 229

Tarumã

Fonte: AFRICAN DEVELOPMENT BANK, ORGANISATION FOR ECONOMIC CO-OPERATION AND DEVELOPMENT, UNITED NATIONS
DEVELOPMENT PROGRAMME. Regional Development and Spatial Inclusion. African Economic Outlook, 2015. New York:
UNDP, 2015. p. 14.

Convém lembrar que esse desempenho econô mico está associado ao crescimento chinês. A China
investiu solidamente em muitos países africanos em busca de commodities, mas também tem
patrocinado o desenvolvimento industrial de alguns deles, com claras intençõ es geopolíticas e
econô micas em se estabelecer como hegemô nica na Á frica. Um exemplo dessa parceria sino-
africana foi o anú ncio em 2016 de um fundo bilioná rio de investimento da ordem de US$ 10 bilhõ es
focado na aplicaçã o de recursos na indú stria, no desenvolvimento tecnoló gico e de infraestrutura,
evidenciando a cooperaçã o entre as partes. Antes a China já havia anunciado um recurso de US$ 20
bilhõ es para investir em obras estruturais no continente, como portos, ferrovias, usinas, exploraçã o
mineral, entre outras.

No entanto, os progressos obtidos nas duas ú ltimas décadas nã o foram suficientes para alcançar a
desejada estabilidade econô mica nem tampouco solidificar postos de trabalhos que garantissem o
pleno emprego. Muito ainda há que se construir em termos de desenvolvimento estrutural e essa é
a prioridade de dirigentes e organizaçõ es.
WANG ZHAO/AFP

Os presidentes de Angola, José Eduardo dos Santos, e da China, Xi Jinping, em Pequim, 2015: a parceria China-Á frica
alavancou a economia do continente.
Pá gina 230

3.1 Agricultura africana


A agricultura é a atividade mais importante para os africanos, pois absorve 60% da mã o de obra e
representa 25% do PIB continental. No entanto, essa atividade enfrenta problemas. Veja alguns
deles a seguir.

• Condiçõ es naturais adversas: grandes superfícies á ridas, extensas á reas em processo de


desertificaçã o, relevo montanhoso nas bordas continentais e solo de baixa fertilidade prejudicam o
bom desempenho agrícola.

• Precariedade tecnoló gica: métodos arcaicos de produçã o e ausência de mecanizaçã o.

• Guerras civis: muitas vezes milícias inimigas destroem reciprocamente a produçã o do grupo rival.

• Monocultura: os melhores solos sã o utilizados quase sempre para a produçã o de gêneros de


exportaçã o em detrimento dos gêneros bá sicos.

Temos, portanto, na Á frica, duas formas bá sicas de agricultura: a de subsistência e a comercial. A


maior parte da populaçã o volta-se à agricultura de subsistência com técnicas rudimentares e quase
sempre utilizando o método da agricultura itinerante, que esgota rapidamente o solo. Os principais
produtos cultivados sã o aqueles consumidos localmente, como a mandioca, o milho, o arroz e a
batata. Já a agricultura comercial traz alguns problemas por nã o priorizar a populaçã o africana, e
sim a exportaçã o, quase sempre para a Europa. Os europeus, tal qual fizeram na América colonial,
introduziram na Á frica a cultura da plantation, baseada na exploraçã o de gêneros tropicais em
grandes propriedades, com produçã o voltada à exportaçã o. Esse tipo de agricultura se mantém nos
dias de hoje, sobretudo, na regiã o do Golfo da Guiné. Os principais produtos da agricultura
comercial africana sã o o café, o cacau, o algodã o e o amendoim. Convém lembrar que, até a
introduçã o da plantation, essas á reas eram produtoras de mandioca, milho e banana. Outra
importante regiã o agrícola é o Baixo Nilo, onde a associaçã o entre solos férteis e a agricultura de
irrigaçã o torna-o uma importante á rea produtora de algodã o e cereais.

Quanto à pecuá ria, o continente africano nã o prima por importantes rebanhos nem apresenta
tradiçã o nessa atividade, restringindo-se a casos isolados como a criaçã o de gado ovino para
subsistência.
Allmaps

Fonte: OLLY, Phillipson. Atlas geográfico mundial. Sã o Paulo: Fundamento, 2014. p. 74.
Pá gina 231

3.2 A riqueza mineral


A Á frica possui um dos maiores redutos minerais do mundo, e a indú stria extrativa é uma das
principais fontes de divisas. Para encaminhar uma exploraçã o mineral sustentá vel está em processo
de constituiçã o o Centro Africano de Desenvolvimento de Recursos Minerais (AMDCC), que faz
parte de um processo de consolidaçã o de uma estratégia comum dos países africanos de catalisar
em uma entidade ú nica o controle dessa exploraçã o. Uma vez que o continente é considerado a
grande reserva mineral do planeta, dirigentes esforçam-se para alcançar um ambiente favorá vel à
exploraçã o e que seja revertida em benefício dos povos africanos.

Muitos países detêm um papel de destaque na exploraçã o mineral. Guiné, por exemplo, concentra a
maior reserva mundial de bauxita, matéria-prima para produzir alumínio. A Repú blica Democrá tica
do Congo tem a maior concentraçã o mundial de cobalto, sendo grande fornecedora da China, o
maior refinador. Congo e Botsuana possuem a segunda e a terceira maiores reservas mundiais de
diamantes, respectivamente, ficando atrá s apenas da Austrá lia. A Á frica do Sul é um dos países mais
ricos em todo o mundo em recursos minerais, configurando-se aquilo que os geó logos consideram
uma “anomalia geoló gica”, tamanha a riqueza e a diversidade de minerais. O país concentra 80% de
todo manganês mundial, 72% do cromo, 88% da platina, 40% do ouro e 27% do vaná dio e ainda
possui grandes reservas de minério de ferro, carvã o, urâ nio, cromo, entre outros.

Allmaps

Fonte: OLLY, Phillipson. Atlas geográfico mundial. Sã o Paulo: Fundamento, 2014. p. 74.

Conversando com a... Química!


ESCREVA NO CADERNO
A Á frica surge como uma das principais áreas do mundo em reservas de diamantes. Países como Repú blica
Democrá tica do Congo, Botsuana e Serra Leoa, entre outros, possuem as maiores reservas mundiais logo apó s a
Austrá lia, primeira colocada.

O diamante é o mineral com maior grau de dureza encontrado na natureza. Em que camada da Terra ele se forma?
Qual sua composiçã o química? Qual sua importâ ncia econô mica e geopolítica para os países africanos?

Chris Ratcliffe/Bloomberg via Getty Images

Diamantes extraídos de mina em Botswana, 2012.


Pá gina 232

Entre as muitas riquezas minerais do continente, destacamos:

• ouro: Á frica do Sul, Serra Leoa, Costa do Marfim e Zimbá bue;

• diamante: Repú blica Democrá tica do Congo, Botsuana, Serra Leoa, Libéria, Costa do Marfim e
Senegal;

• petró leo: Líbia, Nigéria, Argélia, Angola, Gabã o e Sudã o;

• gá s natural: Egito, Líbia, Argélia e Guiné Equatorial;

• carvã o: Á frica do Sul, Zimbá bue e Zâ mbia;

• bauxita: Guiné-Bissau, Serra Leoa e Gana;

• urâ nio: Marrocos, Níger e Á frica do Sul.

RIEGER Bertrand/Hemis/Corbis/Latinstock

Plataforma de petró leo em Port Gentil, Gabã o, 2014.

3.3 A indústria incipiente


A Á frica nã o é um continente industrializado. As condiçõ es histó ricas nã o permitiram o
desenvolvimento industrial e, a partir da segunda metade do século XX, as poucas indú strias que se
estabeleceram foram dos ramos mais modestos: alimentos, bebidas, têxtil e fumo, sempre atrelados
à matéria-prima agrícola africana. As indú strias têxteis e as que se voltam para a demanda interna
desenvolveram-se no Egito, no Quênia, na Repú blica Democrá tica do Congo e na Á frica do Sul. A
indú stria de bebidas estabeleceu-se na Argélia e a do fumo, na Á frica do Sul e no Egito.
Atualmente, as principais indú strias africanas estã o atreladas ao setor de mineraçã o, com fortes
investimentos chineses na indú stria e em obras de infraestrutura. Na Etió pia, a China patrocina a
construçã o da maior represa do continente. No Congo, atua na indú stria da extraçã o do cobalto e,
em Uganda, na indú stria têxtil. Angola se tornou um dos principais parceiros chineses na Á frica cuja
atuaçã o é forte na á rea petrolífera. O mesmo ocorre na Nigéria e no Sudã o. Destacam-se nos dias de
hoje no continente a indú stria extrativa, têxtil, moveleira e de calçados.

A Á frica do Sul é o país mais industrializado do continente (embora seja a segunda economia; a
primeira é a Nigéria) com forte destaque para a indú stria extrativa e para a presença de
multinacionais desde a época do apartheid. Destacam-se como centros industriais a Cidade do
Cabo, Pretó ria e Johanesburgo. O grá fico na pá gina seguinte mostra a participaçã o de cada setor na
economia da Á frica do Sul.
Pá gina 233

Tarumã

Fonte: CONSULADO GERAL DA REPÚ BLICA DA Á FRICA DO SUL, 2015. Disponível em:
<http://www.africadosul.org.br/comercio.html>. Acesso em: 9 mar. 2016.

Um setor em forte expansã o na Á frica em termos tecnoló gicos é a telefonia mó vel: sã o mais de 600
milhõ es de africanos que possuem ao menos um celular e com acesso a serviços de internet no
aparelho. O impacto de tal fenô meno é considerá vel, pois afeta diretamente a dinâ mica da
comunicaçã o, além dos serviços financeiros, integrando a economia africana ao resto do mundo. A
previsã o de indú strias do setor é que até 2019 a Á frica tenha 930 milhõ es de aparelhos (mais de
quatro vezes a populaçã o brasileira). No entanto, ao menos nos dias de hoje, os celulares sã o
fabricados fora da Á frica.

Uma inovaçã o tecnoló gica em fase de testes no continente que desperta o interesse de
transnacionais estrangeiras é a utilizaçã o de aviõ es-robô s para transportar cargas de até 10 kg e
que podem percorrer até 120 quilô metros. O objetivo é levar medicamentos e alimentos para as
aldeias isoladas.
Simon Maina/AFP

A tecnologia chegou: cena comum na Á frica de hoje, mesmo nos vilarejos mais distantes. Na fotografia, homem da etnia
Massai usa o celular, Kajiado, Quê nia, 2015.
Pá gina 234

Enfoque
ESCREVA NO CADERNO

José Flá vio Sombra Saraiva, professor de Relaçõ es Internacionais da Universidade de Brasília, é um dos principais
africanistas brasileiros. No artigo a seguir, ele tece um tom bastante otimista sobre o continente. Leia o texto e extraia
dele alguns trechos com abordagens positivas sobre mudanças econô micas e sociais e compare com o que você
estudou no capítulo, afirmando se as posiçõ es do autor sã o ou nã o pertinentes.

A África na ordem internacional do século XXI: mudanças epidérmicas ou ensaios de autonomia decisória?

[...]

A Á frica subsaariana, ou Á frica negra, considerada a regiã o mais pobre do mundo, cresce entre 5% e 6% ao ano desde 2003.
Adaptaçõ es macroeconô micas à globalizaçã o moveram as economias de todo o continente para equilíbrios na á rea da gestã o
dos negó cios dos Estados. Alvissareiras sã o as inflaçõ es mé dias, contidas na faixa de 6% desde 2003, e as exportaçõ es que
avançam, em 2006 e 2007, na proporçã o de 43% a 45% do PIB. Reformas econô micas liberalizantes e reduçã o de
vulnerabilidades externas geradas por saldos exportadores e crescente atraçã o de investimentos externos diretos sã o fatos,
entre outros, celebrados como de sinalizaçã o de sustentabilidade econô mica pelos africanos e que ainda surpreendem os
elaboradores dos relató rios das agê ncias internacionais, como o Fundo Monetá rio Internacional e o Banco Mundial.

Há razõ es para otimismo em todas as regiõ es da Á frica. O ambiente anima a confiança dos mercados. Na mé dia da Á frica
negra, os investimentos internos equivalem a 19,4% do PIB, percentual muito pró ximo do Brasil, embora considerado baixo
para a sustentabilidade do crescimento econô mico. O vetor da elevaçã o do crescimento interno é visível desde 2002 e tende
a crescer nos pró ximos anos, mesmo ante a crise financeira que se desenha no contexto do capitalismo norte-americano. A
Á frica vem sendo escolhida como parte das prioridades para novas á reas e carteiras de empré stimos do Banco Mundial.

Há preocupaçõ es, no entanto, no campo social, que variam de país a país, por meio de políticas de construçã o de metas de
reduçã o da pobreza. Há també m a atençã o dos setores financeiros em alguns países africanos com a eventualidade de um
novo ciclo de endividamento interno advindo principalmente das políticas financeiras engendradas pela política chinesa na
Á frica, que tem interesse estraté gico no continente para compra de petró leo, commodities agrícolas e exploraçã o de
recursos minerais.

Mas há , sobretudo, o sentimento de que nos ú ltimos sete anos, justamente os primeiros do novo sé culo, a Á frica vem
superando o drama histó rico das guerras intestinas e internacionais. O nú mero de países africanos com conflitos armados
internos caiu de 13 para 5, nos ú ltimos seis anos, apesar da dramaticidade do caso do Darfur. Os conflitos foram a mais
importante causa imediata da pobreza no continente. A reduçã o dramá tica dos mesmos faz pensar que os recursos, quase da
ordem de US$ 300 bilhõ es queimados nos conflitos entre 1990 e 2005, podem agora ser dirigidos à s políticas de reduçã o da
pobreza e da misé ria.

Há , ao mesmo tempo, uma onda democratizante dos regimes políticos em vá rias partes da Á frica. Um processo tardio, mas
relevante, de consolidaçã o de instituiçõ es e governos na Á frica com bases menos autocrá ticas e com algum apelo à s noçõ es
da democracia é fato relevante para a elevaçã o da confiança internacional.

SARAIVA, José Flá vio Sombra. A Á frica na ordem internacional do século XXI: mudanças epidérmicas ou ensaios de autonomia decisó ria? Revista Brasileira de Política
Internacional. Brasília: Ibri, 2008. v. 51, n. 1.

Ver
Atlântico negro: na rota dos orixás. Direção: Renato Barbieri. Brasil, 1998.
O documentá rio aborda raízes culturais comuns no Brasil e em países africanos, como Benin e Nigéria. Mostra como,
ao longo do tempo, essas raízes vêm se transformando, em uma dinâmica e movimento pró prios da cultura viva. De
um lado, o documentá rio apresenta a intensa influência africana na religiosidade brasileira, mostrando as raízes da
cultura jeje-nagô na origem do candomblé e do Tambor de Minas. De outro, mostra influências brasileiras em países
africanos, como o caso dos descendentes de escravos baianos que, em Benin, procuram manter aspectos das
tradiçõ es religiosas adquiridas no Brasil colonial.

4. As relações entre a África e o Brasil


Os primeiros contatos entre o Brasil e a Á frica ocorreram no século XVI com a introduçã o da mã o de
obra escravizada via trá fico negreiro, trazida das ilhas do Atlâ ntico, como Sã o Tomé e Príncipe,
Madeira, Cabo Verde e Açores. Em decorrência da chegada de milhares de africanos escravizados ao
longo de três séculos, o Brasil é o segundo país em nú mero de afrodescendentes do mundo, só
superado pela Nigéria. Por si só essa informaçã o já traduz a importâ ncia que a Á frica tem para o
país. No entanto, a aproximaçã o entre os dois é recente: no â mbito diplomá tico, a primeira visita de
um presidente brasileiro à Á frica ocorreu apenas em 1983, quando Joã o Baptista Figueiredo foi à
Nigéria, Guiné-Bissau, Senegal, Argélia e Cabo Verde; estreitamentos comerciais e políticos mais
só lidos só ocorreram a partir de 2003, quando o Brasil redirecionou sua política externa para uma
nova perspectiva Sul-Sul.

Embora as relaçõ es entre o Brasil e a Á frica tenham aumentado substancialmente nas duas
primeiras décadas deste século, elas ainda sã o tímidas. Basta lembrar que até hoje nã o há uma linha
aérea nacional direta entre o Brasil e aquele continente; todos os voos entre o Brasil e a Á frica sã o
feitos por companhias estrangeiras.
Pá gina 235

Para melhor entender as relaçõ es Brasil-Á frica, faz-se necessá rio desconstruir a visã o negativa e
calamitosa que se consolidou no país a respeito da Á frica. Nã o que se devam omitir os problemas
que efetivamente existem no continente, mas há uma perspectiva ascendente da realidade africana
que é pouco explorada. O Brasil tem importante participaçã o e muito a ganhar com esse novo
momento africano. As relaçõ es econô micas sã o promissoras, e as iniciativas empresariais podem
ser muito bem-sucedidas naquele mercado emergente. Os graves problemas sociais nã o devem
ofuscar o atual momento de estabilizaçã o e de crescimento econô mico, ou mesmo as diversas
iniciativas de reduçã o da pobreza que ocorreram no â mbito da ONU em relaçã o à Á frica.

Com o crescimento da perspectiva Sul-Sul, o comércio entre o Brasil e a Á frica aumentou


consideravelmente: de US$ 6 bilhõ es em 2003 para US$ 26 bilhõ es em 2014. Mais de seiscentos
projetos de cooperaçã o técnica foram assinados entre 2003 e 2014 em 43 naçõ es africanas, e 19
embaixadas foram abertas ou reabertas. Mesmo antes disso, nos anos 1990, foi encaminhada uma
importante iniciativa com o intuito de constituir um bloco composto de Brasil, Índia e Á frica do Sul,
o Ibas. Essa inserçã o brasileira recente na Á frica fez que o país fosse visto pelos africanos como um
soft power.

Soft power: “Poder brando”, termo criado pelo teó rico Joseph Nye Jr., utilizado nas relaçõ es internacionais para inferir a capacidade
diplomá tica de atuaçã o e convencimento de um Estado sobre outro. A atuaçã o “branda” se opõ e ao estilo hard power, mais
caracterizado por intervençõ es drá sticas e militares.

Cortesia da Embaixada Dar es Salam, Tanzâ nia

Embaixada brasileira em Dar Es Salaam, Tanzâ nia, 2016.

Navegar
Instituto Brasil África <http://tub.im/qhkmd8>
O Instituto Brasil Á frica é uma organizaçã o autô noma que visa promover, por meio de iniciativas privadas e
governamentais, açõ es no âmbito da integraçã o entre o Brasil e a Á frica nos mais variados campos: social, político,
comercial, cultural. Entre seus membros diretivos constam professores universitá rios, líderes empresariais e
políticos.

Nos ú ltimos dez anos, aproximadamente 500 empresas brasileiras instalaram-se na Á frica
contando com a retaguarda de bancos pú blicos como o BNDES e o Banco do Brasil. Um dos
objetivos dessa aproximaçã o era alcançar maior projeçã o internacional, apostando no apoio do
grande nú mero de países africanos, e, com isso, buscar uma vaga permanente no Conselho de
Segurança da ONU. Essa estratégia nã o obteve êxito, mas os países do continente ajudaram a eleger
brasileiros para outros cargos internacionais importantes, como a presidência da Organizaçã o das
Naçõ es Unidas para Alimentaçã o e Agricultura (FAO) e a Organizaçã o Mundial do Comércio (OMC).

No comércio bilateral, o petró leo continua sendo o principal produto comercializado entre os dois
lados: 71% de todo o conjunto importado da Á frica vem do hidrocarboneto. O Brasil, por sua vez,
exporta essencialmente produtos industrializados para o continente.

O Ibas

O Ibas é uma iniciativa para o estreitamento das relaçõ es entre três países emergentes: Índia, Brasil e Á frica do Sul.
Entre as metas do grupo destacam-se a açã o conjunta em instâ ncias internacionais, a cooperaçã o comercial, científica
e cultural dentro da perspectiva Sul-Sul. Debates sobre questã o de gênero também estã o contemplados. O Ibas atua
como um fó rum de diá logo governamental e desde que foi oficializado em 2003 na Declaraçã o de Brasília já
ocorreram cinco fó runs de debates entre as três naçõ es. Nos encontros internacionais, o Ibas busca posiçõ es
conjuntas nas reuniõ es de chefes de Estado. Um exemplo ocorreu durante a Rodada de Doha quando os três países
atuaram conjuntamente (no â mbito do G-20) na questã o do combate ao dumping e aos subsídios agrícolas
praticados por países ricos.

IBAS – Fó rum de Diá logo Índia, Brasil e Á frica do Sul


Pá gina 236

ROTEIRO DE ESTUDO
ESCREVA NO CADERNO

Revisando

1. A Á frica se caracteriza, de modo geral, pela concentraçã o da populaçã o no litoral e pela baixa
densidade demográ fica no interior. Cite um obstá culo de ordem natural e uma causa de origem histó rica
que dificultaram a ocupaçã o do interior do continente.

2. Costuma-se identificar o deserto do Saara como um divisor natural das duas macrorregiõ es africanas
onde se originaram ou vivem historicamente diferentes povos. Indique quais sã o essas regiõ es e alguns
dos povos que as habitam.

3. Desde a década de 1990 até 2015, em média, os países africanos apresentaram elevadas taxas de
crescimento populacional que contrastavam com a baixa expectativa de vida e, também, com as elevadas
taxas de mortalidade infantil. Contudo, é no continente africano que se encontra o maior ritmo de
crescimento populacional do mundo. Sendo assim, responda:

a) Por que a comparaçã o entre essas taxas pode ser considerada um contraste?

b) O que explica o intenso e acelerado crescimento populacional africano diante da elevada taxa de
mortalidade infantil e da expectativa de vida?

4. Estudos da ONU projetam que a Á frica abrigará o segundo maior contingente populacional do planeta
em 2100 e que no continente ocorrerá mais de 50% do crescimento da populaçã o mundial no século XXI.

a) Do ponto de vista populacional e econô mico, indique, com base no que já se verifica hoje em alguns
países, o que isso pode significar para o continente.

b) Em sua opiniã o, quais políticas devem ser adotadas para que nã o se reproduzam as profundas
contradiçõ es socioespaciais verificadas em outros países pobres que já entraram em tal processo de
crescimento?

Olhar cartográfico

O mapa abaixo mostra, segundo dados do Banco Mundial, a média de idade dos habitantes de todos os
países em 2010. Analise-o e, a seguir, responda à s questõ es.
Allmaps

Fonte: THE WORLD BANK. Building Human Capital in Africa. Washington, D.C: The World Bank, s.d. p. 2. Disponível em:
<http://siteresources.worldbank.org/INTHUMDEV/Resources/WBHDbrochureweb.pdf>. Acesso em: 10 mar. 2016.

1. Identifique quais grupos de idade prevalecem nos países africanos.

2. Em relaçã o ao envelhecimento da populaçã o, qual a principal comparaçã o que pode ser feita ao
analisarmos a situaçã o da Á frica com as demais regiõ es do mundo?
Pá gina 237

Atividade em grupo

Organizem-se em grupos para pesquisar sobre a temá tica das relaçõ es Brasil-Á frica. Para isso, sigam as
orientaçõ es a seguir.

1. Consultem os Capítulos 10 e 11 deste livro. Na internet, busquem informaçõ es sobre relaçõ es


diplomá ticas, comerciais, histó ricas e culturais em ó rgã os oficiais brasileiros e africanos, como o
Ministério das Relaçõ es Exteriores do Brasil ou de países da Á frica para ampliar os conhecimentos
relativos à s possibilidades de pesquisa.

2. Pode-se escolher temas como: programas de apoio à cooperaçã o científica; relaçõ es comerciais
bilaterais ou entre blocos econô micos; conexõ es e frequência de transportes entre o Brasil e os países
africanos; intercâ mbios artísticos e culturais; relaçõ es étnico-raciais e religiosas; políticas sociais; entre
outros temas.

3. Com a orientaçã o do professor, organizem a produçã o e a apresentaçã o do trabalho e exponham-no


para a turma.

De olho na mídia

Leia o texto abaixo e, a seguir, responda à s questõ es.

Economia africana melhor do que a global em 2015

Apesar da queda do preço das matérias-primas e de novos conflitos, a Á frica continua a ter um melhor desempenho
econô mico do que quase todas as regiõ es do mundo, de acordo com uma aná lise feita pelo FMI [Fundo Monetá rio
Internacional].

A economia africana deverá ter crescido 3,62% em termos reais ao longo de 2015. Este valor fica bem abaixo das
previsõ es de abril, que apontavam para 4,17%, mas ainda assim acima da média global, que é de 3,12%. Apesar de os
nú meros do crescimento africano terem sido revistos em baixa, continuam a ser relativamente fortes, sobretudo
quando comparados com outras regiõ es. Melhor do que o continente africano, só mesmo a regiã o Á sia-Pacífico.

O crescimento da Á frica em 2015 foi conduzido por Marrocos (4,37%), Egito (4,19%) e Nigéria (3,96%). Juntas, estas
três economias representam mais de um terço do PIB do continente.

Alguns dos países africanos menos desenvolvidos também deverã o registrar, ainda assim, um forte crescimento –
casos da Etió pia (8,67%) ou da Repú blica Democrá tica do Congo (8,44%), que sã o também as duas economias do
continente que mais crescem.

Duas mudanças importantes que levaram à revisã o das previsõ es ainda mais otimistas de abril estã o no Burundi, que
caiu dos +4,76% para os -7,71%, e na Líbia, que passou dos +4,6% para os -6,09%. Ambos os países sã o palco de
instabilidade e violência crescentes. Outras quedas relevantes foram registadas na Serra Leoa (-12,76% para -
23,92%), no Sudã o do Sul (+3,59% para -5,33%) e no Congo (+5,16% para +0,99%).

A Líbia, juntamente com o Congo e o Sudã o do Sul, foi também vítima da queda dos preços do petró leo. O valor do
Brent caiu 50% em 2015. Há um ano, estava nos 100 dó lares. Por outro lado, a exposiçã o econô mica do Congo à
China – que representou 35% do comércio entre ambas as partes em 2014, de acordo com dados do Comtrade – está
também a fazer sofrer a sua economia.

No caso da Serra Leoa, já se sabia que a economia se iria contrair devido ao ebola. No entanto, à epidemia juntou-se a
queda do preço do ferro, o que precipitou uma queda muito mais abrupta da economia deste país, de acordo com o
FMI.
E ainda apesar da queda em termos globais relativamente à s primeiras previsõ es, alguns países africanos tiveram
pequenas melhorias nas suas perspectivas de crescimento. Na maioria dos casos trata-se de países que nã o
dependem da exportaçã o do petró leo. Contam-se nesta lista a Costa do Marfim (6,5% para 7%), Senegal (4,65% para
5,10%) e novamente Marrocos (4,37% para 4,87%).

ECONOMIA africana melhor do que a global em 2015. África21 online, 8 jan. 2016. Disponível em: <http://www.africa21online.com/artigo.php?a=18375&e=Economia>. Acesso
em: 10 mar. 2016.

1. O crescimento econô mico africano ocorreu de maneira homogênea em todo o continente? Responda
utilizando exemplos citados no texto.

2. Segundo o texto, qual fator central ajuda a explicar o crescimento econô mico africano mais elevado do
que a média mundial em 2015?

3. Quais fatos estã o ligados à s dificuldades ou até mesmo à queda no crescimento econô mico de alguns
países africanos?
Pá gina 238

CAPÍTULO 12 - Geopolítica da América


Latina

Louie Palu/Zuma Press/Glow Images

Cerca na fronteira entre o Mé xico e os Estados Unidos, em Tijuana (Mé xico), construída pelo governo estadunidense para
evitar a entrada de imigrantes ilegais mexicanos. Fotografia de 2012.
Pá gina 239

Tópicos do capítulo

• Movimentos revolucionários

• Fronteiras e narcotráfico

• Herança chavista

• América Platina

Ponto de partida
ESCREVA NO CADERNO

• Muitos dos que defendem um mundo mais harmô nico sustentam a premissa de que “precisamos de
mais pontes e menos muros”. Qual é a sua percepçã o sobre essa frase e a relaçã o dela com a imagem?
Pá gina 240

1. Distúrbios no México
Ao longo da ú ltima metade do século XX e início do XXI, duas regiõ es do México ganharam destaque
internacional em decorrência das conflitantes situaçõ es geopolíticas que nelas se desenrolam.
Chiapas é uma delas, um estado mexicano localizado no sul do país e que faz fronteira com a
Guatemala. A outra, no extremo norte, é toda a faixa de fronteira entre o país latino e os Estados
Unidos. Observe a localizaçã o dessas regiõ es no mapa a seguir.

Há mais de 500 anos, desde a colonizaçã o espanhola, os povos indígenas padecem com a violência
que assolou todo o territó rio que corresponde, hoje, ao México. Mas a resistência desses povos
sempre esteve presente. Em diversos momentos eles se indignaram contra as imposiçõ es
colonizadoras e fizeram levantes contra o governo e a elite, pois eram escravizados para o trabalho
nos grandes latifú ndios do país.

Pode-se considerar que foi a partir dos anos 1930 que as atuais bases da estrutura dos movimentos
políticos de Chiapas começaram a se formar. Naquele momento o México, de economia
eminentemente rural, passava por grandes transformaçõ es políticas. As turbulências eram,
sobretudo, resultado dos movimentos revolucioná rios que buscavam firmar políticas nacionalistas.
Na época, o entã o presidente Lá zaro Cá rdenas nacionalizou empresas estrangeiras que atuavam no
país, sobretudo as de petró leo, o que aumentou o histó rico de conflitos com os Estados Unidos, que
detinham grande parte dessas empresas.

Allmaps
Fonte: GIRARDI, Gisele; ROSA, Jussara Vaz. Atlas geográfico do estudante. Sã o Paulo: FTD, 2011. p. 94.
Pá gina 241

Na década de 1910, por meio de intensas lutas, uma açã o política marcou a histó ria do país: a
Revolução Mexicana, que levou à reforma agrá ria. Daí até a década de 1930, mais de 70 milhõ es
de hectares de terra foram redistribuídos a pequenos produtores. Mudara, assim, de maneira
radical, a estrutura fundiá ria do país.

As grandes descobertas científicas apó s a Segunda Guerra Mundial resultaram em grandes avanços
tecnoló gicos, que propiciaram o surgimento de fertilizantes industriais e maquinaria agrícola
especializada, o que possibilitou um significativo aumento na produtividade do campo. Esse
processo ficou conhecido como Revoluçã o Verde. Apesar disso, a economia rural em Chiapas foi
decrescendo e perdendo importâ ncia, especialmente a partir das décadas de 1960 e 1970.

As pequenas propriedades rurais (os ejidos) nã o conseguiam aplicar as novas técnicas de produçã o
agrícola e, por conseguinte, nã o obtinham bons resultados financeiros. Assim, concorrer com os
grandes proprietá rios ficou cada vez mais difícil, e os latifú ndios começaram a predominar no
espaço agrá rio do país. Só que, dessa vez, com a utilizaçã o de avançadas tecnologias e,
consequentemente, com menos trabalhadores rurais, o que contribuiu fortemente para o aumento
do desemprego no campo.

A partir dos anos 1970, Chiapas se tornou uma regiã o de grande exploraçã o de petró leo e de
geraçã o de eletricidade. Muitos trabalhadores rurais buscavam emprego nas atividades
correlacionadas, enquanto outros se dirigiram à s florestas da regiã o para tentar sobreviver sem
serem assalariados.

Richard Melloul/Sygma/Corbis/Latinstock

Refinaria de petró leo, no Mé xico, na regiã o de Chiapas, em 1979.

No início da década de 1970, por decreto presidencial, metade da floresta de Chiapas (cerca de 614
mil hectares) foi entregue a apenas uma etnia quase extinta, os lacandones, em detrimento das
demais (muito mais numerosas) que viviam na regiã o. Ao mesmo tempo, foi criada, por políticos e
madeireiros, a Companhia Florestal Lacandona S.A., que iniciou uma intensa e exclusiva exploraçã o
de madeira por meio de acordos com os lacandones. Essa açã o política foi orquestrada pelo governo
federal mexicano e por grandes empresá rios que ambicionavam explorar a floresta e, para isso, era
necessá rio retirar os indígenas do caminho.
Com ajuda governamental, a Companhia começou a expulsar os indígenas e os demais habitantes da
á rea, na maioria mestiços migrantes de outras regiõ es, propondo realocá -los em lugares distantes
da floresta. Muitos fugiram, mas a maioria ficou e enfrentou a situaçã o. A partir daí teve início um
grande conflito por terras e contra a exploraçã o capitalista da madeira, que perdura até os dias
atuais.
Pá gina 242

• 1.1 A formação do EZLN


Aos habitantes de Chiapas se uniram diversos líderes: políticos de oposiçã o, religiosos e indígenas
de vá rias etnias. Esses grupos se organizaram politicamente e logo suas posiçõ es extrapolaram as
questõ es regionais. Muitos desses ativistas políticos vinham de movimentos organizados, como o
Forças de Libertaçã o Nacional (FLN), criado na década de 1960. Seus integrantes acusavam o
governo e o Partido Revolucioná rio Institucional (PRI), que ficou décadas no poder, de serem
subservientes e de estarem entregando o territó rio mexicano aos interesses político-econô micos
dos Estados Unidos.

Durante a década de 1980 ocorreu a formaçã o de um grupo armado revolucioná rio na floresta de
Chiapas: o Exército Zapatista de Libertaçã o Nacional (EZLN), constituído por ampla maioria de
indígenas, seguida por mestiços, e sob a liderança, dentre outras, de um ex-professor universitá rio,
o subcomandante Marcos.

A gota-d’á gua para o início das açõ es ocorreu em 1994, no dia em que foi anunciado o Tratado
Norte-Americano de Livre Comércio (Nafta). O Exército Zapatista de Libertaçã o Nacional declarou
guerra ao governo do México, presidido por Carlos Salinas, e seguiu tomando algumas localidades
estatais. A intençã o era ocupar a capital Cidade do México, o que foi impedido pelo exército.

Apó s dias de conflito, com dezenas de mortos, feridos, prisõ es e sequestros, iniciaram-se as
tentativas de acordos de paz. Esses tensos episó dios deixaram o país politicamente frá gil, o que
levou seu vizinho do norte, os Estados Unidos, a reforçar suas á reas de fronteira com o México.
Desde o início dos conflitos até os anos 2010, diversos acordos e negociaçõ es ocorreram entre os
sucessivos governos do México e o EZLN, que pleiteia reforma constitucional pautada, segundo eles,
em valores democrá ticos, de justiça social, liberdade e paz e buscam a autogestã o para o estado de
Chiapas.

AFP/Getty Images

AP/Glow Images

Emiliano Zapata (à esquerda) foi um líder revolucioná rio que lutou nas dé cadas de 1920 e 1930 pela libertaçã o do Mé xico
das interferê ncias e invasõ es estadunidenses. O subcomandante Marcos (à direita), nome adotado por um ex-professor
universitá rio, uniu-se à causa indígena e resgatou, junto com outros líderes, os ideais de Zapata e estraté gias de guerrilhas,
em busca de uma política mexicana autô noma e independente dos Estados Unidos.
Keith Dannemiller/Corbis/Latinstock

A açã o do EZLN com o slogan "Hoje dissemos basta!" (janeiro de 1994), em resposta ao Nafta, teve uma reaçã o imediata do
exé rcito mexicano. Na fotografia, guerrilheiros zapatistas, em 1994.

Ver
A jaula de ouro. Direção: Diego Quemada-Díez. México/Espanha, 2013.
O filme conta a histó ria de três adolescentes que saem da Guatemala com o objetivo de atravessar o México e entrar
ilegalmente nos Estados Unidos.

• 1.2 Fronteiras mexicanas


O México faz fronteira apenas com três países: Guatemala e Belize, ao sul, e Estados Unidos, ao
norte. As duas fronteiras sã o á reas de intensas preocupaçõ es geopolíticas. Pela fronteira sul,
sobretudo com a Guatemala, os principais motivos de tensã o sã o as acusaçõ es de trá fico de drogas,
de armas e de pessoas, especialmente mulheres e crianças. Ao contrá rio da fronteira norte,
fortemente vigiada, principalmente pelos Estados Unidos, a defesa da fronteira sul é destituída de
grandes aparatos fiscalizadores. Sã o poucos os pontos de fiscalizaçã o ao longo da fronteira do
México com a Guatemala. Por suas matas há rotas clandestinas por onde transitam traficantes,
contrabandistas e imigrantes ilegais.
Pá gina 243

A fronteira do México com os Estados Unidos é uma das que mais simbolizam a rigidez da drá stica
marca de limites territoriais no mundo atual. Ela é configurada por uma cerca que separa os países
ao longo de toda sua extensã o e começou a ser construída em 1991 como tentativa de impedir o
intenso fluxo de entrada de imigrantes ilegais mexicanos para os Estados Unidos.

Ano apó s ano a migraçã o de mexicanos para os estados localizados ao norte do país aumentava. Na
década de 1990 viviam nas á reas fronteiriças 15% da populaçã o do país. Nos anos 2000, já eram
20%. Uma das açõ es que dispararam essa concentraçã o populacional foi a instalaçã o, em territó rio
mexicano, de empresas dos Estados Unidos, asmaquiladoras, em cidades-gêmeas. Essas empresas
têm suas sedes administrativas nas cidades estadunidenses e as unidades de produçã o nas cidades
mexicanas vizinhas. Esse mecanismo proporciona às empresas um custo menor, pois a mã o de obra
e os impostos em territó rio mexicano sã o mais baixos do que os praticados do lado estadunidense
da fronteira. Além disso, essas empresas podem transportar equipamentos e peças para os Estados
Unidos sem pagar taxas nem impostos de importaçã o, pois tais produtos nã o serã o comercializados
no México.

Além da atraçã o populacional gerada pelas maquiladoras, estudiosos sobre o tema chamam a
atençã o para o fato de que esses intensos e crescentes fluxos para o norte do país estã o atrelados à
pretensã o de mexicanos de migrarem clandestinamente para o vizinho rico do norte. Segundo
Censo realizado em 2010 nos Estados Unidos, a populaçã o de hispâ nicos no país era de quase 51
milhõ es, a maioria composta de mexicanos.

Cidades-gêmeas: Cidades de diferentes países, mas com á reas urbanas contínuas.

Alfredo Estrella/AFP/Getty Images

Imigrantes guatemaltecos cruzando a fronteira em direçã o ao Mé xico, em 2013.


Frederic J. Brown/AFP/Getty Images

A fotografia mostra um trecho da fronteira entre o Mé xico e os Estados Unidos: a cidade mexicana de Tijuana (à esquerda) e
a estadunidense de San Diego (à direita). A fronteira é marcada por um muro que separa a riqueza da pobreza. Fotografia de
2013.

Ver
Minha família. Direção: Gregory Nava. Estados Unidos, 1995.
Três geraçõ es veem a histó ria de uma família de imigrantes mexicanos se transformar no territó rio da Califó rnia.

Interagindo

ESCREVA NO CADERNO

Milhares de mexicanos já morreram tentando atravessar ilegalmente a fronteira com os Estados Unidos.
Aproximadamente 20 milhõ es de mexicanos vivem ilegalmente no país, subempregados e sob o constante risco de
serem detidos e deportados.

• Que razõ es você acredita que levam pessoas a migrar em situaçõ es precá rias de um país para outro?
Pá gina 244

• 1.3 O narcotráfico e os fluxos transfronteiriços


Outra preocupaçã o dos Estados Unidos com os fluxos transfronteiriços tem sido o crescente trá fico
de drogas. Isso porque grandes cartéis produtores de drogas vêm usando cada vez mais o territó rio
mexicano para produçã o e escoamento de drogas que adentram o territó rio estadunidense.

Os Estados Unidos e a Europa sã o os principais destinos da cocaína originada do Peru, Bolívia e


Colô mbia, seus maiores produtores mundiais. O México é uma importante rota para a droga chegar
aos consumidores estadunidenses. Veja o mapa a seguir.

Allmaps

Fonte: UNODC. World Drug Report, 2015. p. 51. Disponível em:


<https://www.unodc.org/documents/wdr2015/World_Drug_Report_2015.pdf>. Acesso em: 8 jan. 2016.

Além da crescente participaçã o mexicana, na geografia mundial do narcotrá fico sã o três os grandes
centros produtores de drogas. A Colô mbia responde por 80% da produçã o mundial de cocaína, cuja
matéria-prima – a folha de coca – é nativa da regiã o andina. Já a regiã o denominada Triâ ngulo
Dourado, na Península da Indochina, e o Afeganistã o sã o os maiores produtores de papoula,
matéria-prima da heroína. Os principais destinos sã o países com elevada renda per capita, como os
Estados Unidos e os europeus.

O narcotrá fico, isto é, a produçã o, a distribuiçã o e o comércio de drogas, converteu-se nas duas
ú ltimas décadas em um dos mais rentá veis negó cios do planeta. Segundo estimativas do Programa
das Naçõ es Unidas para o Controle Internacional de Drogas (UNDCP), ó rgã o ligado à ONU, o negó cio
da droga no mundo movimenta algo em torno de US$ 500 bilhõ es por ano. Mas a pró pria ONU
afirma que essa quantia pode estar subestimada, pois, como o narcotrá fico é uma atividade
clandestina, a apuraçã o de dados é imprecisa. Segundo especialistas, a tendência da cifra é sempre
aumentar. Alguns falam em US$ 750 bilhõ es, e outros, em US$ 1 trilhã o.
Pá gina 245

2. Geopolítica da América Central


Desde que os Estados Unidos desenvolveram sua projeçã o externa, a América Central foi a primeira
á rea a cair sob sua esfera de influência geopolítica. Além da proximidade da potência, sua
privilegiada posiçã o geográ fica entre os oceanos Atlâ ntico e Pacífico lhe confere interessante status
geoestratégico, conforme é possível observar no mapa a seguir.

Allmaps

Fonte: ATLAS geográ fico escolar. 6. ed. Rio de Janeiro: IBGE, 2012. p. 39.

A situaçã o geográ fica centro-americana foi particularmente valorizada no contexto da Guerra Fria,
quando o confronto ideoló gico capitalismo versus socialismo estendeu-se pela regiã o. É nessa
conjuntura que devemos circunscrever a leitura geopolítica regional das guerras civis em Cuba
(1959), Nicará gua (chamada de Revoluçã o Sandinista – 1979-1988), El Salvador (1979-1991) etc. O
Canal do Panamá , construído no início do século XX, foi igualmente peça-chave no jogo
geoestratégico e uma das prioridades estadunidenses na geopolítica regional.

Em El Salvador, a estrutura fundiá ria marcada pela concentraçã o de terras em mã os de poucos


fazendeiros foi o motivo dos distú rbios geopolíticos. Houve forte acirramento envolvendo, de um
lado, a oligarquia rural apoiada por um governo militar e, de outro, movimentos sociais apoiados
pela Igreja Cató lica, que tem naquela regiã o o berço daTeologia da Libertaçã o, e a guerrilha de
esquerda FMLN (Frente Farabundo Martí de Libertaçã o Nacional).

Contudo, os levantes contrá rios à presença estadunidense na regiã o e os respectivos movimentos


de libertaçã o nacional sã o anteriores à Guerra Fria, como sã o os casos de El Salvador, com o líder
Farabundo Martí, e da Nicará gua, com Augusto César Sandino, ambos marxistas e que militaram
juntos por uma América Central socialista mesmo antes da Guerra Fria.

Teologia da Libertação: Vertente da Igreja Cató lica que difundiu uma leitura marxista da Bíblia, realizando uma clara opçã o pelos
pobres. Apresenta forte perspectiva política em sua atuaçã o religiosa e incomodou severamente o Vaticano devido ao seu cará ter
ativista. O Papa Joã o Paulo II perseguiu duramente essa corrente religiosa.
Pá gina 246

• 2.1 Nicarágua
A Nicará gua dos anos 1970 e 1980 foi marcada pela guerra civil que envolveu de um lado o regime
totalitá rio de Anastá cio Somoza (1936-1979), apoiado pelos Estados Unidos, e de outro o
movimento Sandinista, amparado nas ideias de Augusto César Sandino, líder revolucioná rio dos
anos 1930. Em 1979, o movimento revolucioná rio Frente Sandinista de Libertaçã o Nacional (FSLN)
tomou o poder, apoiado pelos intelectuais do país, pela ala progressista da Igreja Cató lica – a
Teologia da Libertaçã o –, e por liberais descontentes com a ditadura familiar de Somoza.

A Nicará gua sandinista passou a sofrer ingerência externa: de um lado, com o apoio cubano e, do
outro, dos Estados Unidos, que patrocinaram um grupo contrarrevolucioná rio com o claro objetivo
de derrubar o governo. Assim, o país mergulhou num clima duradouro de guerra civil que se
encerrou no final dos anos 1980, quando foi assinado um acordo envolvendo as partes. As eleiçõ es
de 1990 puseram fim ao conflito.

Alain Dejean/Sygma/Corbis/Latinstock

Combate nas ruas de Leó n, Nicará gua, em 1979, durante a guerra civil, que opô s sandinistas e contrarrevolucioná rios.

• 2.2 Cuba: novas perspectivas


Cuba foi o ú nico regime propriamente socialista do continente americano. O sistema foi adotado
apó s a Revolução Cubana, de 1959, liderada por Fidel Castro e Ernesto Guevara, quando foi
derrubado o regime de Fulgencio Batista, o ú ltimo dos muitos tiranos cubanos apoiados pelos
Estados Unidos.

Era o auge da Guerra Fria e, apó s tornar-se socialista e aproximar-se da Uniã o Soviética, Cuba
entrou definitivamente na celeuma central da Guerra Fria, no embate capitalismo-socialismo,
esquerda-direita. Os Estados Unidos, contrá rios à opçã o cubana, lideraram em 1962 um embargo
contra a ilha caribenha e a expulsã o do país da Organizaçã o dos Estados Americanos (OEA),
constituindo-se como o mais duradouro no mundo contemporâ neo. No entanto, na condiçã o de
aliada da outra superpotência, a URSS, Cuba pouco sentiu o boicote, pois os soviéticos atendiam a
maior parte de suas necessidades industriais, além de se comprometerem com a compra de
praticamente todo o estoque de açú car cubano, o principal produto de sua pauta de exportaçã o, e
outros gêneros agrícolas, pagando acima do preço do mercado internacional.
Esquerda e direita: As expressõ es remontam à Revoluçã o Francesa (1789), quando os jacobinos, tidos como revolucioná rios e
desejosos de transformaçõ es sociais e políticas, sentaram-se à esquerda na Assembleia, enquanto os gerondinos, contrá rios à
monarquia, mas com o intento de assegurar o poder à burguesia, sentaram-se à direita. Convencionou-se designar desde entã o quem
tem perspectiva revolucioná ria como “esquerdista”, enquanto o ró tulo de “direitista” ficou com aqueles de postura conservadora.
Muitos entendem que quem tem uma perspectiva socialista é de esquerda e quem defende o capitalismo, de direita. Mas essa visã o é
um tanto quanto simplista.

Embargo: Boicote, bloqueio e sançõ es comerciais com a intenção de isolar determinado país.

Harold Valentine/AP/Glow Images

Fidel Castro discursa para a multidã o, em frente ao palá cio presidencial em Havana, Cuba, em 1959.
Pá gina 247

Durante anos o subsídio por parte da Uniã o Soviética rendeu à ilha condiçõ es para investir na á rea
social. O país avançou nessa á rea entre as décadas de 1960 e 1980; os indicadores confirmavam o
alto padrã o alcançado pelo país nas á reas da saú de, educaçã o e esportes.

Contudo, as transformaçõ es dos anos 1990, que levaram ao fim da Uniã o Soviética e à queda dos
regimes socialistas aliados do Leste Europeu, repercutiram fortemente no país. Com o
desaparecimento do grande aliado, o embargo imposto pelos Estados Unidos começou a surtir
efeito, somado a uma precá ria estrutura manufatureira; a economia do país foi gradativamente
entrando em colapso e encontra-se ainda numa situaçã o bastante delicada.

Verificou-se uma tímida abertura do regime cubano nos ú ltimos anos, como a aceitaçã o da
propriedade privada dos meios de produçã o e o funcionamento de pequenos negó cios, ou mesmo a
demissã o de funcioná rios pú blicos. Em 2006, alegando motivos de saú de e idade avançada, o líder
Fidel Castro afastou-se da presidência da Repú blica e foi substituído por seu irmã o, Raú l Castro.

No final de 2014, os Estados Unidos e Cuba iniciaram um processo inédito de reaproximaçã o. O


“descongelamento das relaçõ es diplomá ticas”, termo diplomá tico utilizado nas relaçõ es
internacionais, foi recebido com otimismo pelo governo brasileiro, Uniã o Europeia, países latino-
americanos e Vaticano.

O grande passo para a reaproximaçã o reside na retomada das relaçõ es diplomá ticas promovidas
pelos Estados Unidos. Entretanto, o fim do embargo econô mico nã o cabe ao presidente
estadunidense e sim ao Congresso dos Estados Unidos. Na Assembleia Geral da ONU de 2015, 191
países votaram a favor do fim do embargo e apenas dois países foram contra: Estados Unidos e
Israel. Até o início de 2016, essa medida ainda nã o havia sido encaminhada para a aprovaçã o dos
congressistas. No entanto, um importante passo foi dado: embaixadas foram abertas nos
respectivos territó rios depois de vá rios meses de negociaçõ es, e Obama realizou a primeira visita
de um presidente estadunidense em quase 90 anos. Possivelmente esteja na política externa seu
maior legado: a reaproximaçã o com Cuba e Irã , inimigos declarados da grande potência.

Jonathan Ernst/Reuters/Latinstock

O histó rico aperto de mã o entre Raú l Castro e Barack Obama no encontro da Cú pula das Amé ricas, em 2015, no Panamá .

Ver
Che. Parte 1: O argentino e Parte 2: Guerrilha. Direção: Steven Soderbergh. Estados Unidos/França/Espanha,
2008.
O filme, dividido em duas partes, destaca os momentos importantes da vida de Ernesto “Che” Guevara, líder
revolucioná rio que atuou ao lado de Fidel Castro na Revoluçã o Cubana.

Conversando com a... Sociologia!


ESCREVA NO CADERNO

Em uma clá ssica obra, o cientista político italiano Norberto Bobbio, defensor da dicotomia esquerda-direita, afirmou:

[...] nesses ú ltimos anos, tem sido repetidamente afirmado, ao ponto mesmo de se converter em lugar-comum, que a
distinçã o entre direita e esquerda – que por cerca de dois sé culos, a partir da Revoluçã o Francesa, serviu para dividir o
universo político em duas partes opostas – nã o tem mais nenhuma razã o para ser utilizada.

BOBBIO, Norberto. Direita e esquerda: razõ es e significados de uma distinçã o política. Sã o Paulo: Unesp, 1995. p. 32.

A síntese da tese do pensador no transcorrer do livro é que nos dias de hoje quem luta por transformaçã o social e
pela igualdade pode ser considerado de esquerda, enquanto aqueles que a combatem, de direita. Outros questionam
sua tese, afirmando nã o mais haver lugar para “essa visã o restrita”.

• E você, o que pensa? Ainda está vivo o debate político esquerda versus direita ou foi ultrapassado pelas grandes
transformaçõ es internacionais e os debates atuais se fazem de outra maneira? Como Cuba se insere no debate
contemporâ neo?
Pá gina 248

• 2.3 Haiti: golpe e intervenção


Desde a renú ncia imposta ao presidente Jean-Bertrand Aristide, em 2004, o Haiti está sob
intervençã o das tropas internacionais da ONU (a Minustah – Missã o das Naçõ es Unidas para a
Estabilizaçã o do Haiti), lideradas pelo Brasil. O Haiti tem uma longa tradiçã o de regimes totalitá rios
e insere-se no contexto intervencionista estadunidense na América Central. Trata-se de um país
com aproximadamente 98% da populaçã o composta por negros, porém com as elites políticas
brancas, essas, quase sempre alinhadas com as Forças Armadas.

Durante boa parte da segunda metade do século XX, o Haiti (país insular cuja fronteira ú nica ocorre
com a Repú blica Dominicana, conforme pode ser visto no mapa abaixo) foi governado pela ditadura
familiar dos Duvalier, apoiada pelos Estados Unidos. François Duvalier, o “Papa Doc”, governou de
1957 até sua morte, em 1971, e, posteriormente, seu filho, Jean-Claude Duvalier, o “Baby Doc”,
governou de 1971 até 1985, quando se exilou na França. A ditadura dos Duvalier caracterizou-se
pela extrema violência e perseguiçã o a qualquer tipo de oposiçã o. Tradicional aliado dos Estados
Unidos, o governo do Haiti era considerado uma espécie de contraposiçã o ao regime socialista
cubano.

As crises internas e a onda liberalizante trazida pela nova ordem internacional levaram o país à s
eleiçõ es livres em 1990, vencidas pelo ex-padre Jean-Bertrand Aristide, marxista ligado à Teologia
da Libertaçã o. A extrema miséria, a falta de recursos e de apoio externo e, principalmente, o
incô modo causado pelo presidente às elites locais levaram o país a um golpe militar e a uma intensa
crise social e política. O embargo da ONU forçou o governo golpista de Raul Cedras a renunciar e
Aristide retornou do exílio. Porém, nã o teve o direito de recomeçar seu governo, apenas deu
sequência ao tempo que faltava (pouco mais de um ano) para finalizar o mandato, em 1995. Na
realidade, o governo golpista ficara mais tempo no poder.

O ex-padre retornaria à presidência nas eleiçõ es de 2000, quando venceu com mais de 90% dos
votos. Contudo, forças contrá rias e herdeiros políticos de Duvalier produziram nova crise no país
em 2004, que culminou com a renú ncia e o exílio de Aristide na Á frica do Sul. O ex-presidente nunca
admitiu a renú ncia e afirma que foi, na realidade, deposto.

O país mergulhou novamente no caos e adentrou ao clima de guerra civil, com uma violenta e
interminá vel luta entre facçõ es rivais dos guetos haitianos. A ONU interveio no mesmo ano. O que
muito se afirma nos meios acadêmicos, intelectuais e mesmo midiá tico é que a comunidade
internacional calou-se perante o golpe que destituiu um presidente democraticamente eleito e nada
fez para reempossá -lo, inclusive o governo brasileiro. Em vez disso, compô s-se uma coalisã o
internacional de forças (os capacetes azuis da ONU), liderada pelo Brasil, e convocou-se novas
eleiçõ es.

As eleiçõ es presidenciais que elegeram Michel Joseph Martelly, em 2011, foram marcadas pelo
retorno ao país dos ex-presidentes Jean-Bertrand Aristide e Jean-Claude Duvalier.
Allmaps

Fonte: ATLAS geográ fico escolar. 6. ed. Rio de Janeiro: IBGE, 2012. p. 39.

Edwin Remsberg/VW Pics/ZUMAPRESS.com/Easypix Brasil

O Haiti é um país com Estado muito fraco e faltam quase todos os serviços de saneamento bá sico, como é possível ver nesta
fotografia de uma á rea de periferia em Porto Príncipe (2013)
Pá gina 249

3. Geopolítica Andina
A América Andina é o conjunto regional sul-americano que tem como traço comum a Cordilheira
dos Andes. É formada por seis países: Venezuela, Colô mbia, Equador, Peru, Bolívia e Chile. Veja o
mapa ao lado.

Historicamente, essa regiã o é marcada por fortes turbulências geopolíticas e a presença de


governos militares foi recorrente. Nas ú ltimas três décadas ocorreram esforços rumo à
democratizaçã o, mas a instabilidade frequentemente ameaça tal bandeira.

Entre os países andinos, o Chile vem se convertendo no mais está vel deles, bem como o de melhores
indicadores sociais, comprovados pelos índices de distribuiçã o de renda, mortalidade infantil, entre
outros. Depois de vivenciar durante 17 anos a ditadura de Augusto Pinochet, o país assistiu à
redemocratizaçã o nos anos 1990.

Peru e Equador sã o países pobres e basicamente exportadores de gêneros primá rios: o Peru se
destaca pela pesca e exportaçã o de chumbo, enquanto o Equador é grande exportador de banana.

Ambos assistiram a mudanças políticas nos ú ltimos anos: o Equador com correntes mais à esquerda
e o Peru com governos de centro. No caso peruano, elas ocorreram por caminhos distintos do que
pregavam, nos anos 1980, as guerrilhas peruanas de esquerda, Sendero Luminoso e Tupac Amaru,
que propunham a luta armada como forma de instaurar regimes marxistas.

Tradicionalmente dominada por uma classe política conservadora e pela presença constante de
governos militares antidemocrá ticos, a Bolívia, país de populaçã o majoritariamente indígena,
sempre teve à frente dos governos a minoria branca, inferior a 20% da populaçã o do país. Foi Evo
Morales, um índio aimará , quem quebrou a hegemonia da elite boliviana e chegou ao poder em
2005. Líder cocalero, socialista e pró ximo do ex-presidente da Venezuela, Hugo Chá vez, tã o logo
assumiu a presidência adotou medidas polêmicas, como a nacionalizaçã o dos recursos naturais do
país. Governou com forte perspectiva popular e reformas sociais e por isso envolveu-se em atritos e
polêmicas, nã o só com a elite local, mas, à s vezes, com outros países, como a Colô mbia e o Brasil. Em
2016, Evo Morales fracassou na tentativa de se prolongar no poder quando a proposta de alteraçã o
constitucional para sua reeleiçã o nã o foi aprovada.
Allmaps

Fonte: ATLAS geográ fico escolar. 6. ed. Rio de Janeiro: IBGE, 2012. p. 41.

Pauta musical
América do Sul, Ney Matogrosso. Álbum: Água do céu-pássaro. Continental, 1975.
Pauta: Unidade latino-americana.

Capa LP Á gua do céu-pá ssaro. Ney Matogrosso. Brasil, 1975

• 3.1 A Venezuela e a herança chavista


A Venezuela possui a maior reserva mundial de petró leo e situa-se entre os maiores produtores.
Tudo o que acontece no país tem de ser compreendido à luz dessa realidade e de toda a importâ ncia
que o petró leo ainda representa para o mundo atual.

Inegavelmente, é com a figura do líder Hugo Chá vez a partir dos anos 1990 que o país tornou-se
tema constante nas relaçõ es internacionais. Seu estilo de fazer política reconfigurou o cená rio
regional latino-americano, especialmente o tom desafiador que teceu à potência estadunidense
enquanto esteve à frente do poder. O polêmico presidente morto em 2013 roubou a cena no debate
"direita-esquerda" na América Latina, com uma parte enaltecendo sua posiçã o e outra criticando-o
veementemente.
Pá gina 250

Hugo Chá vez chegou à presidência da Venezuela em 1998. Uma vez eleito, convocou um referendo
sobre eleiçõ es constituintes, que ocorreram em 1999, e redigiu-se uma nova Constituiçã o. A nova
carta impô s uma série de mudanças ao país, tais como o direito à reeleiçã o presidencial, ampliaçã o
do mandato do presidente de quatro para seis anos, convocaçã o de novas eleiçõ es e mudança do
nome do país para Repú blica Bolivariana da Venezuela. Hugo Chá vez seria ainda eleito mais três
vezes: em 2000, 2006 e 2012. Verificava-se que o líder carismá tico contava com forte respaldo
popular, embora sob uma ferrenha oposiçã o de setores tradicionais, como a Fedecá maras
(sindicato patronal do país) e a mídia local.

No plano internacional, Hugo Chá vez teve uma série de controvérsias com os Estados Unidos,
particularmente durante os governos de George W. Bush, e estreitou os laços diplomá ticos do país
com Cuba, China, Rú ssia e Irã , numa clara demonstraçã o de afastamento dos Estados Unidos.
Entretanto, as celeumas políticas em nada afetaram as firmes relaçõ es comerciais entre Venezuela e
a potência estadunidense, que seguiu sendo seu principal parceiro comercial e cliente na compra de
petró leo. Para se ter uma ideia, as relaçõ es comerciais entre Brasil e Venezuela em 2013 giraram
em torno de US$ 5 bilhõ es, enquanto a relaçã o Venezuela-Estados Unidos, em US$ 56 bilhõ es.

Quando se reelegeu pela ú ltima vez, em 2012, Hugo Chá vez já estava se tratando de um câncer.
Venceu as eleiçõ es, mas nã o assumiu, pois a doença se agravara. Foi transferido para Cuba, onde
realizou seus tratamentos médicos, mas dessa vez nã o resistiu, falecendo em 2013. Foram
marcadas novas eleiçõ es vencidas por seu vice, Nicolá s Maduro. Começava uma nova era para a
Venezuela: a do chavismo sem Chá vez. Em 2016, a crise persistia no país com a possibilidade de um
referendo revogató rio que poderia interromper o mandato de Maduro.

Cuba Debate/Xinhua Press/Corbis/Latinstock

Fidel Castro e Hugo Chá vez conversam em Havana, 2011.

Enfoque
ESCREVA NO CADERNO

Só o diálogo salva a Venezuela

[...] O apoio ao chavismo, expresso em votos, saiu reduzido a menos da metade (na verdade, um terço ou menos) do total do
eleitorado [eleiçõ es parlamentares em dezembro de 2015 na Venezuela].
As pé ssimas condiçõ es econô micas por que passa a Venezuela, com inevitá vel impacto social – à s quais os erros de gestã o e
os exageros doutriná rios do atual governo nã o sã o obviamente estranhos –, seguramente afetaram a base de sustentaçã o do
modelo (se é que se pode chamá -lo assim) que vinha prevalecendo até aqui.

Mas as demandas por maior equidade e por autonomia política, que inspiraram o chavismo, continuarã o a existir, ainda que
de modo subjacente por algum tempo.

O grande desafio que se coloca para o povo venezuelano e, especialmente, para os líderes das vá rias facçõ es será encontrar
formas de conciliar os anseios legítimos por democracia e liberdade com as aspiraçõ es por reformas sociais efetivas.

Para isso, será necessá rio superar as animosidades que se criaram ao longo dos ú ltimos anos e pelas quais os dois lados sã o
responsá veis. Afinal, o fracassado golpe de 2002 nã o foi uma criaçã o do imaginá rio chavista. [...]

De nada adiantará [...] reviver conflitos ideoló gicos do passado, que tanto mal causaram à nossa regiã o, responsá veis que
foram por dé cadas de obscurantismo.

Um acordo propiciado pelo diá logo deverá permitir o prosseguimento do embate democrá tico, sem demonizaçõ es, de ideias
e programas sobre o futuro do grande país, a um tempo andino, amazô nico e caribenho.

AMORIM, Celso. Só o diá logo salva a Venezuela. Carta Capital, 16. jan. 2016. Disponível em: <http://www.cartacapital.com.br/revista/884/so-o-dialogo-salva-a-venezuela>. Acesso
em: 2 abr. 2016.

• Por que o autor afirma que “conciliar os anseios legítimos por democracia e liberdade com as aspiraçõ es por
reformas sociais efetivas” se configura como desafio para o povo venezuelano e para os chefes das facçõ es?
Pá gina 251

• 3.2 Colômbia: guerrilhas e narcotráfico


Para entendermos o cená rio colombiano precisamos considerar o envolvimento dos seguintes
atores políticos: o governo, as guerrilhas, os paramilitares e o narcotrá fico. O atrito entre eles
mergulhou o país numa profunda e violenta instabilidade nas ú ltimas décadas.

A instabilidade colombiana remonta a um passado já distante, os anos 1930, quando os partidos


Conservador (PC) e Liberal (PL) travavam ferrenha disputa se alternando no poder. Desde entã o, a
Colô mbia teve raros momentos está veis.

Assassinatos recíprocos de candidatos aos postos políticos mais importantes levaram o país a uma
guerra civil. Essa crise adentrou as décadas de 1930, 1940 e 1950. Em 1958 foi assinado um acordo
em que se estabeleceu uma alternâ ncia oligá rquica no poder entre conservadores e liberais,
compondo conjuntamente com uma junta militar.

Ao contrá rio de outros países sul-americanos, como Argentina, Brasil e Uruguai, a Colô mbia nunca
teve uma tradiçã o de partidos socialistas ou comunistas. Essa ausência de partidos populares
acabou por produzir, paradoxalmente, o surgimento de bandoleiros locais e uma espécie de
banditismo social, uma forma espontâ nea e aná rquica de demonstrar a insatisfaçã o do povo. Tal
cená rio agravava o já confuso quadro político.

É nesse contexto caó tico que surgem em 1964 as Forças Armadas Revolucioná rias da Colô mbia
(Farc), peça-chave nos acontecimentos políticos do país na segunda metade do século XX.
Configurou-se como uma nova opçã o política, mas nã o pela via partidá ria e sim pela luta armada,
por meio de uma guerrilha organizada nas á reas rurais. As Farc tinham uma bandeira política clara
para a Colô mbia: instaurar uma repú blica marxista, nos moldes cubanos. Eram tempos de Guerra
Fria e tal surgimento tem de ser analisado sob esse prisma. Nesse período aparecem outras duas
facçõ es da luta armada: o Exército de Libertaçã o Nacional (ELN), de inspiraçã o guevarista (de Che
Guevara), e o Exército Popular de Libertaçã o (ELP), de inspiraçã o maoísta (de Mao Tsé-Tung).

O cená rio ficou ainda mais nebuloso quando, nos anos 1970, instalaram-se na Colô mbia alguns dos
mais importantes cartéis da droga, transformando o país no maior produtor mundial de cocaína.
Beneficiando-se do tradicional cultivo da coca na regiã o andina, seu refino tornou-se um negó cio
lucrativo para as quadrilhas internacionais, que focam no maior mercado consumidor de drogas do
mundo: os Estados Unidos. Os cartéis das cidades de Cali e Medellín tornaram-se poderosos. A ONU
estima em muitos bilhõ es de dó lares os negó cios movimentados pelo narcotrá fico em todo o
mundo, os chamados “narcodó lares”. A Colô mbia é presença marcante nesse cená rio.

O espectro geopolítico colombiano tornou-se cada vez mais confuso. Em determinado momento
pairou sobre as guerrilhas a acusaçã o de que, para conseguir fundos para patrocinar sua luta
armada, elas passaram a vender serviço de proteçã o para que os traficantes pudessem escoar a
produçã o de droga. Patrocinada por fazendeiros locais, surge uma alternativa armada para se
contrapor à s guerrilhas de esquerda: os paramilitares das Autodefesas Unidas da Colô mbia (AUC),
organizaçã o de extrema direita. Nã o sã o poucas as denú ncias de que o pró prio exército colombiano
(e por vezes até membros do governo) contribuiu para o crescimento desse grupo, uma vez que o
propó sito era o mesmo: atacar as guerrilhas de esquerda. Uma espécie de “força paralela” para
atuaçã o conjunta, daí a expressã o “paramilitares”. As relaçõ es entre a AUC e o narcotrá fico,
igualmente, sã o fortíssimas.

Este é o imbró glio geopolítico colombiano, que resultou em um dos países mais violentos do mundo
e com taxas altíssimas de homicídio.
Jaime Saldarriaga/Reuters/Latinstock

Guerrilheiros das Farc em treinamento nas montanhas de Jambalo, na província de Cauca, Colô mbia, em 2012.

Navegar
Memorial da América Latina <http://tub.im/nacefb>
O portal do Memorial da América Latina disponibiliza as mais variadas informaçõ es culturais sobre essa regiã o, com
destaque especial para o acervo bibliográ fico disponível on-line.

Os Estados Unidos, o maior centro receptor da droga produzida na Colô mbia, envolveram
diretamente no conflito em 2000, quando Andrés Pastrana e Bill Clinton, na época presidentes da
Colô mbia e dos Estados Unidos, respectivamente,
Pá gina 252

selaram uma aliança de combate ao narcotrá fico: o Plano Colô mbia, estimado em US$ 5 bilhõ es de
dó lares. Nã o sã o poucos os analistas que denunciam ser mera fachada o interesse dos Estados
Unidos no combate ao narcotrá fico. A verdadeira razã o seria a instalaçã o de bases pró ximas à
estratégica regiã o amazô nica.

Notadamente, as Farc se enfraqueceram nos ú ltimos anos. No auge de suas açõ es, chegaram a
dominar 40% do territó rio colombiano, conforme apresentado no mapa ao lado, mas a organizaçã o
parece ter sentido duramente as transformaçõ es dos anos 1990 e a perda do paradigma ideoló gico
da Guerra Fria. Isolando-se na selva e partindo para atos questioná veis, como o sequestro de civis,
foi perdendo apoio popular e no universo da esquerda. Denú ncias do envolvimento com o
narcotrá fico para arrecadar fundos também tornaram-se constantes, embora a organizaçã o as
negue. As mortes dos principais líderes da organizaçã o, como o fundador Pedro Antonio Marin, o
Tirofijo (2008), e Alfonso Cano (2011), igualmente contribuíram para o declínio, além de uma
investida mais agressiva do governo colombiano apoiado pelos Estados Unidos.

Em março de 2013, rodadas de negociaçõ es realizadas em Havana (Cuba) para um definitivo


acordo de paz entre as Farc e o governo encontravam-se bastante avançadas. Até entã o, estas eram
as conversaçõ es mais promissoras realizadas em décadas. Em janeiro de 2016, tais negociaçõ es
ainda estavam em andamento. Em face disso, o Conselho de Segurança da ONU estabeleceu a
formaçã o de uma missã o política na Colô mbia para acompanhar o processo de desarmamento em
caso de assinatura de acordo de paz entre as Farc e o governo colombiano.

Allmaps

Fonte: ALMANAQUE ABRIL 2015. Sã o Paulo: Abril, 2015. p. 435.

4. América Platina
O subconjunto regional da América Platina é constituído por Argentina, Uruguai e Paraguai. O traço
comum desses três países é a bacia hidrográ fica do rio da Prata (Platina). Sob esse aspecto, o Brasil
também pode, parcialmente, ser considerado platino, pois boa parte de seu territó rio está
circunscrito a essa bacia hidrográ fica. Contudo, devido à s suas dimensõ es territoriais e, além de
platino, ser igualmente amazô nico e atlâ ntico, o Brasil forma uma unidade à parte nessa subdivisã o
sul-americana.

Argentina e Uruguai têm mais semelhanças culturais entre si, já o Paraguai possui um outro viés
cultural, fortemente marcado pela presença indígena, com boa parte da populaçã o, inclusive,
falando o guarani.

Esses três países têm um passado recente igualmente marcado por regimes antidemocrá ticos;
conviveram com ditaduras militares ao longo dos anos 1970-1980. Mas nos dias de hoje, sem
dú vida, é o Paraguai que mais convive com ameaças à democracia. Argentina e Uruguai, em que
pese problemas de ordem social, apresentam razoá vel estabilidade democrá tica. Já do vizinho
platino nã o se pode dizer o mesmo.

Em 2012, o Paraguai teve mais um sombrio capítulo em sua jovem e frá gil democracia, quando o
governo eleito de Fernando Lugo foi deposto. Ao vencer as eleiçõ es em 2008, Lugo pô s fim a uma
hegemonia de sessenta anos do conservador Partido Colorado no poder. Ex-padre, com viés
socialista e igualmente
Pá gina 253

ligado à Teologia da Libertaçã o, Lugo realizava um governo popular, porém em clima tenso.

O Congresso paraguaio era de maioria oposicionista e dominado por latifundiá rios incomodados
com a política agrá ria do presidente, que apoiava o pequeno camponês e pressionava o latifú ndio
que caracteriza esse país platino; o Paraguai apresenta uma das piores distribuiçõ es de terras em
todo o mundo, com 80% dos camponeses ocupando apenas 6% das terras, enquanto o agronegó cio
da soja e o gado dominam a maior parte. Logo, o nú cleo do conflito assenta-se na questã o da terra.
Nos ú ltimos anos, o agronegó cio esteve em crescimento no Paraguai e, à medida que a soja se
expandia, os pequenos camponeses eram expulsos de suas terras, engrossando o nú mero de
miserá veis nas cidades. Lugo foi eleito em meio à tensã o social exatamente para frear esse
processo.

Uma polêmica lei aprovada pelo ex-presidente, que proibia a venda de terras num raio inferior a 50
quilô metros da fronteira paraguaia e as nacionalizava em nome da segurança e soberania do país,
levou ao aumento da tensã o e foi o mote para uma votaçã o em prazo recorde, 24 horas, instituir um
impeachment a ele.

O impeachment foi entendido por muitos como um golpe disfarçado, e assim, muitos líderes latino-
americanos nã o reconheceram o novo governo de Frederico Franco. O Paraguai foi imediatamente
suspenso do Mercosul, fato que levou à entrada da Venezuela, pois era exatamente o Congresso
paraguaio que barrava a entrada do país andino no bloco. Com exceçã o da Colô mbia, os demais
países latino-americanos condenaram a destituiçã o. A Comissã o Interamericana de Direitos
Humanos (CIDH), atrelada à OEA, afirmou em documento: “É uma paró dia da justiça e um
atropelamento do Estado de direito remover um presidente em 24 horas sem garantias para se
defender”.

O Brasil viu-se em uma desconfortá vel situaçã o, pois ao mesmo tempo que condenou o “golpe” e
deu apoio a Lugo, a política de Estado brasileiro defendeu os “brasiguaios”, agricultores brasileiros
no Paraguai que estavam envolvidos na questã o e, contrá rios à política agrá ria de Lugo,
reconheceram imediatamente o novo governo.

Allmaps

Fonte: ATLAS geográ fico escolar. 6. ed. Rio de Janeiro: IBGE, 2012, p. 41.
A Geografia na... arte!
ESCREVA NO CADERNO

Esta é a escultura Mão, de Oscar Niemeyer (1907- 2012), um dos mais respeitados arquitetos de todos os tempos.
Fica exposta no saguã o do Memorial da América Latina, em Sã o Paulo. A cartografia artística em baixo-relevo
utilizada por Niemeyer, representando a América Latina, traz no vermelho o sangue a escorrer de um passado de
exploraçã o colonial. A palma da mã o estendida significa uniã o, solidariedade e esperança aos povos latino-
americanos, uma palma aberta para acolher os povos irmã os. Os seguintes dizeres de Niemeyer acompanham a
escultura:

“Suor, sangue e pobreza marcaram a histó ria desta América Latina tão desarticulada e oprimida. Agora urge reajustá -
la num monobloco intocá vel, capaz de fazê-la independente e feliz”.

• Qual a sua interpretaçã o da afirmaçã o de Niemeyer? E da imagem? Você concorda com o que afirma o arquiteto?
Existem na América Latina tentativas em rumar na contramã o do que ele afirma ser “tã o desarticulada e oprimida”?

Douglas Cometti/Folhapress

Mão, escultura de Oscar Niemeyer, Sã o Paulo (SP), fotografia de 2012.


Pá gina 254

ROTEIRO DE ESTUDO
ESCREVA NO CADERNO

Revisando

1. A América Andina é formada por seis países – Venezuela, Colô mbia, Peru, Equador, Chile e Bolívia. A
América Latina envolve todos os países da América, com exceçã o de Canadá e Estados Unidos. Destaque
uma característica geopolítica central da América Latina e descreva os principais aspectos que
assemelham os países da América Central e da América Andina.

2. A Missã o de Paz pelo Haiti, conhecida como Missã o das Naçõ es Unidas para a Estabilizaçã o no Haiti
(Minustah), foi instituída em 2004. Qual o papel do Brasil na Missã o de Paz no Haiti?

3. O clima de tensã o que ronda a Colô mbia decorre de longa data. Identifique as raízes dos distú rbios e
como evoluiu o país a partir de entã o.

4. Como se encontra a Venezuela nos dias atuais, apó s a morte de Hugo Chá vez?

5. A Teologia da Libertaçã o é considerada uma vertente progressista da Igreja Cató lica. Busque no
capítulo qual foi a participaçã o dessa corrente nas tensõ es centro-americanas e porque ela foi
importante.

Atividade em grupo

Escolha, com o seu grupo, um país da América Central ou da América Andina e faça uma pesquisa
considerando os tó picos a seguir. Depois, apresente os resultados aos demais colegas.

1. Conflitos atuais da política interna do país escolhido.

2. Histó rico de guerras de que o país participou.

3. Posicionamento do país em algumas das principais resoluçõ es da ONU, como a Guerra do Iraque,
sançõ es a Cuba etc.

4. Histó rico das relaçõ es políticas com os Estados Unidos.

5. Com base nesses dados, tente elaborar características centrais dos perfis geopolíticos do país indicado.

Olhar cartográfico

De 1879 a 1893, ocorreu a Guerra do Pacífico, confronto armado entre Chile e Bolívia, envolvendo
também o Peru. Os países disputavam o controle da exploraçã o do deserto do Atacama, de onde se
extraía o salitre usado como fertilizante. Embora o territó rio fosse de posse boliviana, a exploraçã o se
iniciou com trabalhadores chilenos contratados por empresas inglesas. O porto de Antofagasta, que à
época também era posse territorial da Bolívia, garantia aos bolivianos saída para o mar.

• Compare os dois mapas e indique as alteraçõ es territoriais na Bolívia, no Chile e no Peru, destacando as
consequências sofridas pela Bolívia nessa configuraçã o territorial.
Allmaps

Allmaps

Fonte: KINDER, Hermann; HILGEMANN, Werner. The Penguin Atlas of World History: From the French Revolution to the Present.
London: Penguin Books Ltd., 2003. v. 2. p. 92.

Fonte: GIRARDI, Gisele; ROSA, Jussara Vaz. Novo atlas geográfico do estudante. Sã o Paulo: FTD, 2005. p. 87.
Pá gina 255

De olho na mídia

Leia o texto a seguir, que trata dos motivos da reaproximaçã o dos Estados Unidos de Cuba, e responda à s
questõ es abaixo.

1. Quais sã o os motivos apontados para a reaproximaçã o entre Estados Unidos e Cuba?

2. Você concorda com a perspectiva do autor do texto? Justifique sua resposta.

Uma guinada imprevista

Aconteceu nesta semana a mais profunda transformaçã o em décadas nas relaçõ es entre os Estados Unidos e Cuba.
Elas foram anunciadas simultaneamente pelos presidentes Barack Obama e Raú l Castro. Mas por que agora? Por que
esta mudança histó rica – numa política vigente há mais de meio século – nã o aconteceu há três anos, ou há cinco, ou
por que nã o esperou outros cinco anos a mais?

A resposta curta é que a mudança foi impulsionada por uma convergência surpreendente entre a biologia e a
tecnologia. A primeira determinou o envelhecimento tanto dos irmã os Castro e de outros líderes da revoluçã o como
de seus opositores exilados na Fló rida, além de alterar os equilíbrios políticos dentro do regime cubano e da pró pria
política eleitoral norte-americana. A biologia também interveio com o câ ncer que causou a morte do presidente
venezuelano Hugo Chá vez. Seu desaparecimento contribuiu para aumentar o caos institucional que fez desse país
petroleiro um benfeitor menos seguro para Cuba.

O outro elemento, a tecnologia – especialmente as inovaçõ es na extraçã o de petró leo e gás de xisto – permitiu que os
Estados Unidos revolucionassem o mapa energético mundial, provocando uma queda no preço do petró leo e
minando a capacidade venezuelana de sustentar um país em bancarrota. Cuba precisava de uma alternativa
econô mica e, surpreendentemente, acabou por encontrá -la em seu arqui-inimigo, os Estados Unidos. Isso diz muito
sobre o prognó stico a respeito da Venezuela que os bem-informados cubanos fazem quando decidem abandonar seu
generoso e incondicional país-títere para se abrir aos investimentos, ao comércio e ao turismo provenientes dos EUA.

Os Estados Unidos instituíram em 1961 o embargo econô mico a Cuba, numa resposta à s expropriaçõ es de empresas
e cidadã os norte-americanos. A pretensã o de derrubar o regime de Fidel Castro se tornou explícita na Lei Helms-
Burton, que endureceu o embargo ao submeter a ditadura a sançõ es internacionais. Nã o funcionou. A Lei Helms-
Burton nã o só nã o alcançou seus objetivos como, além disso, reduziu as opçõ es de política externa da Casa Branca.
Tanto o Governo de Bill Clinton como o de Bush viram tolhida a sua capacidade de modificar uma lei elaborada mais
em funçã o de estreitos cá lculos da política interna norte-americana do que de uma visã o mais ampla dos interesses
nacionais dos Estados Unidos no continente.

A avançada idade dos irmã os Castro (Fidel tem 88 anos, e Raú l, 83) e o surgimento do debate sobre uma sucessã o
cada vez mais pró xima contribuíram para modificar os cá lculos do regime. O envelhecimento do exílio cubano nos
Estados Unidos (cuja média etá ria é de 40 anos, comparados aos 27 anos do conjunto da populaçã o hispâ nica)
também criou condiçõ es mais favorá veis para uma aproximaçã o entre os Estados Unidos e Cuba.

Na Fló rida, essa mudança demográ fica deu lugar a uma nova paisagem política. A geraçã o de exilados cubanos que se
opunha ferozmente a qualquer liberalizaçã o da política com relaçã o a Cuba se viu substituída por um novo grupo
populacional de eleitores cubano-americanos mais jovens e mais dispostos a explorarem novas opçõ es na relaçã o
entre seu antigo país e seu país atual. A mudança de atitude é evidente, especialmente entre cubano-americanos de
segunda e terceira geraçã o, que chegaram depois de 1980 procurando mais uma oportunidade econô mica do que um
lugar onde se refugiar das perseguiçõ es políticas, como havia sido o caso de grande parte da onda imigrató ria
anterior.

Os mais jovens, que chegaram aos EUA há menos tempo, sabem que a arruinada economia cubana precisa
desesperadamente de um reajuste. Poucos acreditam que Cuba irá se abrir tã o cedo ao livre mercado, muito menos
se transformar numa democracia. Mas o presidente Raú l Castro foi muito explícito em suas críticas ao sistema
econô mico atual, expressando sua preferê ncia pelo “modelo chinês”, em que uma economia mais aberta coexiste com
um sistema político fechado.
O regime de Castro está há muito tempo adiando reformas que fortaleceriam a economia da ilha, mas que
significariam admitir o fracasso da revoluçã o. Adotar as mesmas políticas que passou tanto tempo denunciando
continua sendo um passo grande demais para muitos membros da cú pula cubana, especialmente para Fidel. [...]

NAÍM, Moisés. Uma guinada imprevista. El País, 21 dez. 2014. © Moisés Naím/Ediciones El País, sl 2014. Disponível em:
<http://brasil.elpais.com/brasil/2014/12/20/internacional/1419110260_325676.html>. Acesso em: 8 jan. 2016.
Pá gina 256

CAPÍTULO 13 - Geopolítica do Brasil

Pedro França/AFP/Glow Images

Soldados brasileiros patrulham o rio Oiapoque, na fronteira entre o Brasil e a Guiana Francesa, 2014.

Kiko Sierich/Futura Press

Ponte da Amizade, entre as cidades de Foz do Iguaçu, no Brasil, e Ciudad del Este, no Paraguai, em 2015.
Pá gina 257

Chiba Yasuyoshi/AFP/Getty Images

Rodovia que interliga as cidades gêmeas Corumbá e Puerto Quijarro, na fronteira entre Brasil e Bolívia, 2013.

Tópicos do capítulo

• Amazônia: projetos de proteção

• Brasília e a integração regional

• Geopolítica na bacia Platina

• Relações Sul-Sul: Brics e Unasul

Ponto de partida
ESCREVA NO CADERNO

1. As fronteiras sã o importantes para a defesa da soberania de um país. Nas imagens sã o apresentadas


três á reas fronteiriças brasileiras. Identifique as diferenças entre elas e explique por que devem ter
atençã o do Estado.

2. Por que, do ponto de vista geopolítico, a Amazô nia pode ser considerada estratégica para o Brasil?
Pá gina 258

1. Território e política no Brasil


Para muitos estudiosos do tema, é a assinatura do Tratado de Tordesilhas o marco inicial da
geopolítica brasileira, uma vez que foi a partir da disputa da Coroa portuguesa com a hispâ nica que
se iniciou a formaçã o territorial do Brasil.

Desde a época em que o Brasil era colô nia de Portugal, passando pelo período em que se tornou
independente, primeiro com o Império e depois já como uma Repú blica, as disputas territoriais
sempre estiveram na perspectiva da elite política brasileira, em busca da ampliaçã o do territó rio.
Isso envolve estratégias desenvolvidas no campo da diplomacia e, assim, ao longo do tempo foi
elaborada uma verdadeira geopolítica brasileira. Nesse sentido, entre os que estiveram na
vanguarda dessa perspectiva, pode-se destacar a importâ ncia do pensamento e das proposiçõ es de
Alexandre de Gusmã o, no período colonial, de José Bonifá cio, no Brasil Imperial e, no Brasil
Repú blica, de José Maria Paranhos Jú nior, o Barã o do Rio Branco. Esses homens sã o considerados
os pioneiros da geopolítica brasileira, pois traçaram projetos territoriais que visavam à soberania e
à integraçã o territorial brasileira. Alexandre Gusmã o teve atuaçã o decisiva no Tratado de Madri de
1750, contornando as desavenças entre Portugal e Espanha, pelas imprecisas fronteiras da época, e
definindo grande parte dos atuais limites fronteiriços da porçã o ocidental do Brasil. José Bonifá cio
foi o primeiro a propor a transferência da capital para o interior do Brasil, o que resultaria, em
meados no século XX, na construçã o de Brasília. Barã o do Rio Branco solucionou pela via
diplomá tica os graves problemas de delimitaçã o das fronteiras do territó rio brasileiro, ainda
pendentes nos primeiros anos do século XX.

É a partir da década de 1930, com os estudos que destacavam a projeçã o continental brasileira na
América do Sul, elaborados pelo acadêmico Everardo Backheuser e pelo militar Má rio Travassos,
que o pensamento geopolítico brasileiro começou a se apresentar de forma sistematizada.

Na década seguinte, influenciada pela Segunda Guerra Mundial, a atençã o geoestratégica brasileira
se voltava mais detidamente à proteçã o mais eficiente de nossas fronteiras. Assim, o brigadeiro
Lysias Rodrigues propunha reforçar a presença brasileira nas regiõ es fronteiriças. Para isso, seria
necessá rio focar em três pontos geopolíticos fundamentais: a regiã o do Iguaçu, com destaque para a
fronteira entre Brasil e Argentina; a fronteira entre Brasil e Bolívia; e a fronteira em Letícia, nome
da cidade colombiana localizada na tríplice fronteira amazô nica entre Brasil, Peru e Colô mbia. Veja
o mapa ao lado, que mostra esses pontos estratégicos.
Allmaps

Fonte: ATLAS geográ fico escolar. 6. ed. Rio de Janeiro: IBGE, 2012. p. 90.

Interagindo

ESCREVA NO CADERNO

• Qual a importâ ncia da definiçã o e defesa das fronteiras no processo de formaçã o territorial?

Navegar
Grupo Retis <http://tub.im/7d74cz>
Na pá gina do Grupo Retis, vinculado ao departamento de Geografia da Universidade Federal do Rio de Janeiro, há
informaçõ es sobre projetos de geopolítica, limites e fronteiras na América do Sul e faixas de fronteira no territó rio
brasileiro.
Pá gina 259

Do ponto de vista militar, da década de 1950 até a de 1980, Golbery do Couto e Silva, reconhecido
general do exército brasileiro, teve forte influência na geopolítica do Brasil. Seu pensamento é
considerado bastante polêmico por muitos estudiosos, pois Golbery foi mentor do regime militar no
país, tendo sido o principal articulador da geopolítica brasileira. Internamente, ele elaborou um
amplo arcabouço teó rico que cuidava das questõ es mais sensíveis, como a guarda das fronteiras e a
Amazô nia. Nesse sentido, também os trabalhos do general apontam para a busca da hegemonia no
sul do continente americano. No â mbito global, Golbery nã o hesitou em tomar partido ao lado dos
Estados Unidos no clima da Guerra Fria. Assim, as ideias do general, e que se sobressaíram no
pensamento estratégico brasileiro, tiveram forte influência na política externa brasileira, que
adotou uma postura de franco alinhamento com os Estados Unidos ao longo dos anos 1960 e 1970,
naquilo que ficou conhecido como “aliado preferencial” na busca de uma liderança sul-americana.

Folhapress

O militar Golbery do Couto e Silva durante entrevista, em Brasília (DF), em 1979.

O Brasil na Guerra Fria

Durante a primeira fase da Guerra Fria, o Brasil alinhou-se incondicionalmente com os Estados Unidos, assumindo
uma clara postura anticomunista. No entanto, a partir da segunda metade dos anos 1970, passou a trilhar uma
posiçã o mais autô noma e neonacionalista em sua política externa e a recusar o alinhamento automá tico com a
potência, em que pese o governo autoritá rio brasileiro da época seguir com uma ideologia francamente de direita e
repressora dos movimentos de esquerda. Isso nã o significou, contudo, um afastamento dos Estados Unidos, mas sim
um redirecionamento da política externa, saindo de uma postura de alinhamento automático vigente até entã o para
um alinhamento bilateral com poder de barganha local e que atendia aos interesses brasileiros e estadunidenses na
esfera regional. Essa política externa ficou conhecida como pragmatismo responsável e ganhou contornos mais
nítidos a partir do governo Geisel (1974-1979).

O Itamaraty seguia no plano internacional as prerrogativas geopolíticas formuladas pela Escola Superior de Guerra
(ESG), a principal instâ ncia de elaboraçã o estratégica do país. O grande ícone geopolítico dessa época eram as ideias
do general Golbery do Couto e Silva. Nesse período, o Brasil avançou em direçã o à hegemonia latino-americana e ao
Atlâ ntico Sul, contando com o apoio velado dos Estados Unidos. Nesse contexto, os governos brasileiro e
estadunidense davam amplo apoio à sucessã o de golpes militares que ocorreram na América Latina. Regionalmente,
o Brasil buscava neutralizar a influência da Argentina, atraindo para sua ó rbita geopolítica a Bolívia, o Paraguai e o
Uruguai. Apesar de o regime militar ter se encerrado em 1985 com a posse de José Sarney, o pragmatismo
responsá vel ditou o direcionamento da política externa brasileira até meados dos anos 1990.
A política externa nacional atuava simultaneamente em três frentes: o multilateralismo global, o bilateralismo e o
regionalismo latino-americano. Nessa década, o Brasil apresentou mudanças graduais em sua política externa, como:

• a aproximaçã o com os países do, à época, denominado Terceiro Mundo;

• o distanciamento gradual em relaçã o aos Estados Unidos e a aproximaçã o com a Europa, particularmente a
Alemanha;

• o reconhecimento de potência média, abandonando o discurso anterior de Brasil Potência;

• o estreitamento das relaçõ es com outras potências médias do mundo.


Pá gina 260

2. As ações geopolíticas brasileiras


Pelo histó rico de ocupaçã o territorial do Brasil e por seu longo litoral, o país apresenta uma forte
concentraçã o demográ fica em sua porçã o oriental e, consequentemente, baixa densidade
demográ fica na parte centro-ocidental, onde se acelera o processo de ocupaçã o, seja por
crescimento vegetativo seja por migraçã o inter-regional.

Nessas regiõ es mais afastadas do interior brasileiro, localizam-se as fronteiras com diversos países,
o que influencia a elaboraçã o da geopolítica interna nacional e as relaçõ es com os países limítrofes.

Ler
Geopolítica da Amazônia, de Bertha Becker. Revista Estudos Avançados, São Paulo, v. 19, n. 53, jan./abr.
2005.
Nesse artigo, disponível no site <http://tub.im/ubwsk2>, são ressaltadas as mudanças estruturais que ocorrem na
Amazô nia, além do papel decisivo de novos atores, da sociedade civil organizada e da cooperaçã o internacional.

Amazônia: geopolítica na virada do III milênio, de Bertha Becker. Rio de Janeiro: Garamond, 2004.
Neste livro, a autora aponta os aspectos que reestruturaram as relaçõ es de ocupaçã o, exploraçã o e poder na
Amazô nia na entrada do novo milênio.

Editora Garamond

• 2.1 Geopolítica da Amazônia


Atualmente a Amazô nia é considerada uma das regiõ es mais importantes do mundo, tanto por sua
importâ ncia ambiental quanto por sua relevâ ncia econô mica. Afinal, trata-se da maior floresta
tropical e onde, igualmente, se localiza a maior bacia hidrográ fica do planeta. Além da grande
quantidade de riquezas minerais em seu subsolo e de sua rica vegetaçã o, sabe-se da crescente
importâ ncia da floresta como fornecedora de matéria-prima para diversos tipos de indú strias,
como a química e a farmacêutica. Como a Amazô nia também se localiza em outros países, muitas
políticas que dizem respeito a questõ es nacionais internas sobre a regiã o sã o decididas em funçã o
do uso que se faz da floresta e de seus rios naqueles países. Vale lembrar que muitos rios que
cortam essa regiã o, inclusive o Amazonas, têm nascentes em territó rios externos ao Brasil.

Outra questã o importante é no que se refere aos fluxos de transporte de pessoas e de mercadorias
na regiã o. Um aspecto geopolítico central é a imensa á rea de fronteira do Brasil que corta o
territó rio amazô nico. Mesmo com o uso de satélites, é difícil o monitoramento dos fluxos de
transporte de pessoas e de mercadorias na regiã o. Por seus rios, trilhas e pistas de pouso passam
diversas pessoas de diferentes nacionalidades e tipos de produtos de maneira clandestina, o que
indica certa vulnerabilidade.
A imensa riqueza amazô nica leva a uma crescente cobiça internacional. A floresta é alvo das
grandes potências e de empresas multinacionais que visam à sua exploraçã o persistentemente,
utilizando diferentes métodos, seja por meio da conquista de patentes de produtos cuja matéria-
prima está na floresta, seja pela disseminaçã o de um discurso que traz consigo elaboradas
armadilhas geopolíticas, como o que difunde a necessidade da defesa da internacionalizaçã o da
Amazô nia, supostamente em nome da salvaçã o do planeta. Segundo esse discurso, o detentor da
maior parte da floresta nã o teria capacidade técnica, econô mica, científica e política de protegê-la,
daí a necessidade de internacionalizar seu controle e seus usos.

Essa cobiça nã o é nenhuma novidade, pois ocorre desde o período colonial. Nos dias de hoje, faz-se
necessá ria uma açã o mais firme do governo brasileiro no combate à açã o de garimpeiros e
mineradoras clandestinas, narcotraficantes e grupos guerrilheiros de países vizinhos, traficantes de
pedras preciosas, plantas e animais.

2.1.1 Programa Calha Norte (PCN)

É nesse contexto de proteçã o à Amazô nia que o Governo Federal brasileiro implantou, em 1985, o
Projeto Calha Norte (PCN), atualmente chamado Programa Calha Norte. É um plano brasileiro
territorial de defesa baseado na ocupaçã o da faixa fronteiriça amazô nica, junto à calha setentrional
do rio Amazonas.
Pá gina 261

A á rea de ocupaçã o se estendia por uma faixa de 160 km de largura ao longo das fronteiras com
Guiana Francesa, Suriname, Guiana, Venezuela e Colô mbia, o que representava uma á rea de 1,2
milhã o de km2, ou seja, 25% da Amazô nia Legal. Como a idealizaçã o e a concepçã o do PCN sempre
estiveram a cargo dos militares, inicialmente ficou estabelecido que seriam instaladas 84 bases
controladas pelo exército brasileiro ao longo dessa zona de fronteira. Segundo o Ministério da
Defesa, até 2015 o Programa Calha Norte expandira sua á rea de atuaçã o. Naquele ano, o PCN
abrangia uma á rea correspondente a 32% do territó rio brasileiro e abarcava 194 municípios de seis
estados: Acre, Amapá , Amazonas, Pará , Rondô nia e Roraima. Sua política englobava, até entã o, cerca
de 8 milhõ es de habitantes, incluindo 30% da populaçã o indígena. Observe o mapa a seguir.

Allmaps

Fonte: MINISTÉ RIO DA DEFESA. Disponível em:<http://www.defesa.gov.br/index.php/programas-sociais/programacalha-norte/


8325-area-de-atuacao-do-programa-calha-norte>. Acesso em: 20 fev. 2016.

Os principais argumentos do governo brasileiro para justificar a instalaçã o das bases envolvem
estratégias de defesa e manutençã o da soberania brasileira na guarda das fronteiras e a diminuiçã o
da vulnerabilidade de proteçã o da Amazô nia. A princípio, o projeto era estritamente militar, mas
recebeu diversas críticas de parcelas da populaçã o brasileira que temiam que as estratégias
exclusivamente militares pudessem desconsiderar importantes questõ es culturais e
socioambientais na regiã o. Ao longo de sua implantaçã o, o programa foi incorporando novas
políticas e ampliou seus objetivos, considerando que, nesse processo de defesa por meio da
estratégia da ocupaçã o do territó rio, é importante desenvolver políticas referentes à s questõ es
socioambientais, de sustentabilidade e de apoio à s populaçõ es ribeirinha e indígena. Os objetivos
centrais do PCN sã o:

• aumentar a presença brasileira na regiã o;

• ampliar as relaçõ es bilaterais com os países vizinhos;

• expandir a infraestrutura viá ria complementar ao transporte fluvial, o mais importante fator de
integraçã o regional;

• fortalecer a açã o dos ó rgã os governamentais na regiã o, como o Incra e a Funai;


• intensificar a demarcaçã o e a fiscalizaçã o das fronteiras;

• promover a assistência e a proteçã o à s populaçõ es indígenas, ribeirinhas e à atividade


extrativista.

Incra: Instituto Nacional de Colonizaçã o e Reforma Agrá ria, ó rgã o oficial criado em 1970, que tem como principal funçã o
administrar a política agrá ria da União.

Funai: Fundaçã o Nacional do Índio, criada em 1967; ó rgã o oficial responsá vel pela política indigenista do Brasil que promove a
demarcaçã o de terras e a preservaçã o da cultura indígena.
Pá gina 262

2.1.2 Sistema de Vigilância da Amazônia (Sivam)

Nos anos 1990, outro projeto de proteçã o amazô nica surgiria, porém com destacado arrojo
tecnoló gico. O Sistema de Vigilâ ncia da Amazô nia (Sivam) conta com sensores e radares, uma
complexa rede de coleta e de processamento de informaçõ es sobre a regiã o. O Sivam foi criado com
vistas a controlar o trá fego á ereo, monitorar o meio ambiente e combater as açõ es criminosas na
Amazô nia por meio de uma rede de sensores remotos e radares, aeronaves e equipamentos de
telecomunicaçã o. A instalaçã o e o monitoramento do sistema ficaram a cargo de uma empresa
estadunidense, a Raytheon, o que levou o projeto a ser alvo de polêmica, pois alguns setores da
sociedade afirmavam que estrangeiros teriam acesso privilegiado a dados sobre a regiã o em nosso
territó rio. Entretanto, como os softwares que fazem o sistema funcionar trazem informaçõ es
sigilosas, sua propriedade intelectual e os respectivos direitos patrimoniais estã o a cargo do
governo brasileiro: da Secretaria de Assuntos Estratégicos, dos Ministérios da Justiça e o de Ciência,
Tecnologia e Inovaçã o e do Comando da Aeroná utica. Eles sã o responsá veis pelo controle das
operaçõ es dos sensores e das informaçõ es contidas nos softwares.

Nas ú ltimas décadas, porém, diversas falhas do governo brasileiro no monitoramento ambiental da
floresta, como mostra o imenso desmatamento atual, têm gerado críticas que contribuem para o
discurso internacionalizante da Amazô nia.

• 2.2 A construção de Brasília e a integração regional


Há bastante tempo, independentemente do regime de governo, a classe política brasileira
considerou a real possibilidade da transferência da capital do país para o centro do territó rio, numa
á rea equidistante entre as três maiores bacias hidrográ ficas brasileiras – Amazô nica, Platina e do
Sã o Francisco – e, também, das fronteiras do país. Em diferentes momentos do século XIX, desde o
Império, esse assunto era discutido nas instâ ncias diplomá ticas, mas ganhou grande força apó s a
instauraçã o da Repú blica.

José Bonifá cio defendia uma geopolítica dos transportes para o Brasil na busca de uma consistente
e necessá ria integraçã o regional. O nome Brasília foi sugerido por ele em 1823, quando também
defendia que a nova capital deveria se localizar no Centro-Oeste do país. Essa visã o reforçava a tese
surgida em 1810 que defendia que a capital deveria manter maior distanciamento dos portos e,
assim, ser mais protegida de eventuais ataques estrangeiros na costa brasileira. Localizando-se no
Centro-Oeste, a grande distância até de fronteiras terrestres e marítimas propiciaria uma situaçã o
de defesa natural à capital e aos governantes do país.

Contudo, foi apenas em meados do século XX, durante o governo do presidente Juscelino
Kubitschek, que enfim se concretizou a ideia da transferência da capital brasileira para o planalto
central e o consequente plano de interiorizaçã o territorial. Em 1956, Brasília começou a ser
construída para, em 1960 ser, finalmente, a nova capital brasileira.
Benedito Calixto. s.d. Ó leo sobre tela. Museu Paulista da Universidade de Sã o Paulo, Sã o Paulo

José Bonifá cio de Andrade e Silva: defensor da ideia de levar a capital federal para o interior do Brasil.

Arquivo Pú blico do Distrito Federal, Brasília

Congresso Nacional em construçã o. Brasília (DF), 1957.


Pá gina 263

Nelson Antoine/Fotoarena

Rodovia Belém-Brasília, em Aliança do Tocantins (TO), 2011. Ligando o Cerrado à Amazô nia.

A nova capital foi fator determinante na promoçã o da interiorizaçã o e da integraçã o territorial na


regiã o Centro-Oeste, proporcionando grande impulso econô mico e revolucionando o interior do
Brasil. A abertura das estradas, a consequente expansã o agrícola, a dinamizaçã o industrial, as
migraçõ es e os fluxos de negó cios ampliaram a rede de integraçã o entre o Centro-Oeste e as demais
regiõ es.

Apó s a construçã o de Brasília, inaugurou-se a rodovia Belém-Brasília (BR-153) que, cortando o


territó rio central brasileiro, permitiu a ampla ligaçã o terrestre entre a Amazô nia, o eixo político em
Brasília e o eixo econô mico do Sudeste. A partir desse momento, o acesso e a ocupaçã o amazô nica
nã o mais cessariam.

A construçã o de Brasília é um projeto geopolítico com dois alvos que se complementam: um de


ordem política interna que, por certo tempo, blindou os governantes do país, pois a transferência do
poder para uma á rea com baixíssima densidade demográ fica, longe das massas e das pressõ es
políticas populares, o oposto do que ocorria no Rio de Janeiro, facilitaria o exercício do poder e
outro de ordem geoeconô mica (pois proporcionou a integraçã o regional do Centro-Oeste e a
interiorizaçã o do territó rio brasileiro).
A Geografia na... música!
ESCREVA NO CADERNO

A banda brasileira Paralamas do Sucesso é de Brasília. O cantor e compositor Herbert Viana escreveu:

Brasília é uma ilha, eu falo porque eu sei


Uma cidade que fabrica sua pró pria lei
Aonde se vive mais ou menos como na Disneylâ ndia
Se essa palhaçada fosse na Cinelândia
Ia juntar muita gente pra pegar na saída

PARALAMAS DO SUCESSO. Luís Iná cio (300 picaretas). In: ______. Vamo batê lata. Sã o Paulo: EMI, 1994.

1. Qual a mensagem subliminar sobre a localizaçã o de Brasília, quando o compositor escreve “Se essa palhaçada
fosse na Cinelâ ndia”?

2. Qual a ló gica geopolítica que pode ser depreendida da transferê ncia da capital federal do Rio de Janeiro para o
Centro-Oeste? Quem foi o primeiro a cogitar tal possibilidade e quando ela se concretizou?

3. O que o compositor quis dizer com a frase: "A cidade fabrica sua pró pria lei"?
Pá gina 264

• 2.3 Geopolítica platina


O Brasil conta com o maior litoral do oceano Atlâ ntico e tem em seu territó rio grande parte da
maior floresta tropical do planeta. Além disso, seu eixo econô mico e político está majoritariamente
situado na bacia Platina, o que lhe confere uma posiçã o geoestratégica especial no cená rio
geopolítico sul-americano. Isso praticamente o leva a assumir uma posiçã o de liderança hemisférica
no Atlâ ntico Sul. No entanto, a pretensã o de hegemonia brasileira esbarrou, historicamente, na
Argentina, vizinho platino cuja rivalidade circunscreve-se predominantemente junto à bacia
Platina, onde a balança de poder pendeu favoravelmente ora para um, ora para outro país. Contudo,
verifica-se que, a partir dos anos 1970, ela vem pendendo favoravelmente para o Brasil. Mesmo
com a integraçã o econô mica proporcionada pelo Mercosul, Brasil e Argentina mantêm forte
rivalidade regional.

Durante o período denominado “milagre econô mico”, em que o Brasil apresentou forte crescimento
econô mico (final dos anos 1960 e início da década de 1970), o país alardeava o status de Brasil
Potência. De fato, o país implementou políticas regionais que infeririam em algumas naçõ es
vizinhas. Termos como subimperialismo brasileiro surgiram no cená rio da política nacional e
sul-americana.

Na disputa que se verificou entre os dois maiores países sul-americanos na segunda metade do
século XX, o Brasil introduziu duas obras de grande envergadura geopolítica e geoeconô mica que o
colocaram na dianteira, atraindo Bolívia e Paraguai para sua ó rbita de influência: a estrada de ferro
Brasil-Bolívia, oferecendo uma saída para o mar à Bolívia, e a binacional usina hidrelétrica de
Itaipu. O Brasil satelitizava, assim, os dois modestos países.

Allmaps

Fonte: ATLAS geográ fico escolar. 6. ed. Rio de Janeiro: IBGE, 2012. p. 41.
Bolívia e Paraguai apresentam problemas naturais de saída para o mar, enquanto o Uruguai configura-se como Estado-
tampã o entre Brasil e Argentina.

3. As relações Sul-Sul
O Brasil é signatá rio da Zona de Paz e Cooperaçã o do Atlâ ntico Sul (ZPCAS), criada em 1986 e
composta de 24 países banhados pelo Atlâ ntico Sul na América e na Á frica. Como visto no Capítulo
11, o Brasil busca, assim, estreitar os laços com países africanos, possibilitando a criaçã o de uma
zona de livre comércio numa regiã o em que o país tenciona exercer liderança regional.

O Brasil possui vínculos histó ricos, culturais, geográ ficos e linguísticos com diversos países
africanos. Além da Á frica do Sul, também tem dispensado maior atençã o à queles que falam a língua
portuguesa. Dentre esses, Angola se destaca nã o só pelo vínculo linguístico, mas por suas imensas
riquezas minerais, como diamante e petró leo. Em troca, empresas brasileiras trabalham na
reconstruçã o de infraestruturas desse país, que passou longos anos imerso
Pá gina 265

numa sangrenta guerra civil. Contudo, nitidamente, o Brasil tem perdido espaço para os chineses
em Angola.

Allmaps

Fonte: CIN-UFPE. Disponível em: <http://www.cin.ufpe.br/~rac2/portugues/mundo.html>. Acesso em: 11 jan. 2016.

A cada ano vem ganhando força a visã o de defensores de uma relaçã o Sul -Sul, que é uma nova
perspectiva geopolítica e geoeconô mica para as pró ximas décadas. É nesse contexto que se pode
entender a formaçã o do Ibas, grupo formado em 2003 por Índia, Brasil e Á frica do Sul. A criaçã o do
grupo faz parte da política externa brasileira de incrementar a relaçã o entre países em
desenvolvimento. Veja o mapa a seguir.

Outra regiã o de interesse estratégico no hemisfério sul é a Antá rtida, onde o Brasil e mais 28 países
possuem bases científicas. Em 1984, foi construída a Estaçã o Antá rtica Comandante Ferraz, base
brasileira que abriga pesquisadores. Em 2013, foi ampliada apó s um incêndio que destruiu parte da
instalaçã o.
Allmaps

Fonte: BRASIL. Ministério das Relaçõ es Exteriores. Brasília. Disponível em: <http://www.itamaraty.gov.br/index.php?
option=com_content&view=article&id=3673:forum-de-dialogo-india-brasil-e-africa-do-sul-ibas&catid=170:chamada-1&lang=pt-
BR&Itemid=436>. Acesso em: 11 jan. 2016

Ler
África parceria do Brasil Atlântico: relações internacionais do Brasil e da África no início do século XXI, de
José Flávio Sombra Saraiva. Brasília: Fino Traço, 2012.
O livro explica as novas relaçõ es diplomáticas, comerciais, culturais e sociais do Brasil com a Á frica.

Fino Traço Editora


Pá gina 266

• 3.1 O Brics
Desde que o economista Jim O’Neill criou o termo Brics para se referir à s economias de Brasil,
Rú ssia, Índia, China e, posteriormente, Á frica do Sul, a expressã o vem sendo adotada
constantemente e é notá vel a importâ ncia que assumiu nos ú ltimos anos. Alguns estudiosos
entendem que o Brics é muito importante e o consideram, mesmo com a crise econô mica que se
abatera sobre Brasil e Rú ssia e da desaceleraçã o de crescimento econô mico da China em meados da
segunda década do século XXI, o primeiro redirecionamento do eixo econô mico mundial
estabelecido desde a Conferência de Bretton Woods, em 1944, e que trouxe uma nova ordem
monetá ria ao sistema internacional. Em outras palavras, o Brics seria uma alternativa e até mesmo
um desafio à hegemonia do poder mundial estabelecida pela conexã o Estados Unidos, Europa,
Japã o a partir da segunda metade do século XX.

Para o Brasil, a alternativa Brics insere-se no aprofundamento das relaçõ es Sul-Sul. Em julho de
2014 foi dado um importante passo durante a sexta reuniã o de Cú pula, realizada na cidade de
Fortaleza, com a proposta da criaçã o de um fundo monetá rio, o Novo Banco de Desenvolvimento
(NBD), comum aos cinco países e com uma reserva inicial de US$ 100 bilhõ es. A contribuiçã o inicial
de cada país seria: Brasil, US$ 18 bilhõ es; Rú ssia, US$ 18 bilhõ es; Índia, US$ 18 bilhõ es; Á frica do
Sul, US$ 5 bilhõ es; China, US$ 41 bilhõ es.

O texto a seguir traz importantes informaçõ es da visã o do governo brasileiro sobre o estreitamento
com o Brics.

Enfoque
ESCREVA NO CADERNO

Brics – Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul

O que faz o Brics?

Desde a sua criaçã o, o Brics tem expandido suas atividades em duas principais vertentes: (i) a coordenaçã o em reuniõ es e
organismos internacionais; e (ii) a construçã o de uma agenda de cooperaçã o multissetorial entre seus membros.

Com relaçã o à coordenaçã o do Brics em foros e organismos internacionais, o mecanismo privilegia a esfera da governança
econô mico-financeira e també m a governança política. Na primeira, a agenda do Brics confere prioridade à coordenaçã o no
âmbito do G-20, incluindo a reforma do FMI. Na vertente política, o Brics defende a reforma das Naçõ es Unidas e de seu
Conselho de Segurança, de forma a melhorar a sua representatividade, em prol da democratizaçã o da governança
internacional. Em paralelo, o Brics aprofunda seu diá logo sobre as principais questõ es da agenda internacional.

Cinco anos apó s a primeira Cú pula, em 2009, as atividades intra-Brics já abrangem cerca de 30 á reas, como agricultura,
ciê ncia e tecnologia, cultura, espaço exterior, think tanks, governança e segurança da internet, previdê ncia social,
propriedade intelectual, saú de, turismo, entre outras.

Entre as vertentes mais promissoras do Brics, destaca-se a á rea econô mico-financeira, tendo sido assinados dois
instrumentos de especial relevo na VI Cú pula do Brics (Fortaleza, julho de 2014): os acordos constitutivos do Novo Banco de
Desenvolvimento (NBD) – voltado para o financiamento de projetos de infraestrutura e desenvolvimento sustentá vel em
economias emergentes e países em desenvolvimento –, e do Arranjo Contingente de Reservas (ACR) – destinado a prover
apoio mú tuo aos membros do Brics em cená rios de flutuaçõ es no balanço de pagamentos. O capital inicial subscrito do NBD
foi de US$ 50 bilhõ es e seu capital autorizado, US$ 100 bilhõ es. Os recursos alocados para o ACR, por sua vez, totalizarã o US$
100 bilhõ es.
A coordenaçã o política entre os membros do Brics se faz e continuará a ser feita sem elementos de confrontaçã o com demais
países. O Brics está aberto à cooperaçã o e ao engajamento construtivo com terceiros países, assim como com organizaçõ es
internacionais e regionais, no tratamento de temas da atualidade internacional.
Pá gina 267

Histórico do Brics

A coordenaçã o entre Brasil, Rú ssia, Índia e China (Bric) iniciou-se de maneira informal em 2006, com reuniã o de trabalho à
margem da abertura da Assembleia Geral das Naçõ es Unidas. Em 2007, o Brasil assumiu a organizaçã o do encontro à
margem da Assembleia Geral e, nessa ocasiã o, verificou-se que o interesse em aprofundar o diá logo merecia a organizaçã o
de reuniã o específica de chanceleres do entã o Bric (ainda sem a Á frica do Sul).

A primeira reuniã o formal de chanceleres do Bric foi realizada em 18 de maio de 2008, em Ecaterimburgo, na Rú ssia. Desde
entã o, o acrô nimo, criado alguns anos antes pelo mercado financeiro, nã o mais se limitou a identificar quatro economias
emergentes, passando o Bric a constituir uma nova entidade político -diplomá tica.

Desde 2009, os Chefes de Estado e de Governo do Brics se encontram anualmente. Nos ú ltimos seis anos, ocorreram seis
reuniõ es de Cú pula, com a presença de todos os líderes do mecanismo:

• I Cú pula: Ecaterimburgo, Rú ssia, junho de 2009;

• II Cú pula: Brasília, Brasil, abril de 2010;

• III Cú pula: Sanya, China, abril de 2011;

• IV Cú pula: Nova Dé lhi, Índia, março de 2012;

• V Cú pula: Durban, Á frica do Sul, março de 2013;

• VI Cú pula: Fortaleza, Brasil, julho de 2014.

• [...]

BRASIL. Ministério das Relaçõ es Exteriores. BRICS – Brasil, Rú ssia, Índia, China e Á frica do Sul. Disponível em: <http://www.itamaraty.gov.br/index.php?
option=com_content&view=article&id=3672&catid=159&Itemid=436&lang=pt-BR>. Acesso em: 18 jan. 2016.

• Em sua opiniã o, o Brasil deve estreitar ainda mais seus laços com o Brics ou deve assegurar seu tradicional
alinhamento aos Estados Unidos e Europa? É possível compor as duas opçõ es ou você entende que elas são
contrastantes e excludentes?

• 3.2 Unasul
Em maio de 2008, foi criada a Uniã o das Naçõ es Sul-americanas (Unasul) com o objetivo de
promover uma política regional de segurança e defesa visando o fortalecimento da democracia nos
países que compõ em a América do Sul. Sua criaçã o tem importante significado geopolítico para a
regiã o, já que a segurança era um tema tratado no â mbito da Organizaçã o dos Estados Americanos
(OEA), entidade com bastante influência política dos Estados Unidos. A criaçã o da Unasul pode ser,
portanto, um passo de autonomia regional dos países sul-americanos.

A primeira açã o da Unasul ocorreu no mesmo ano de sua criaçã o ao atuar na crise separatista de
Pando, na Bolívia. Em 2010, agiu na crise entre Colô mbia e Venezuela. Em 2012, o Paraguai foi
suspenso da Unasul devido à deposiçã o do entã o presidente Fernando Lugo. A suspensã o foi
mantida até a organizaçã o considerar que fora restabelecida a ordem em territó rio paraguaio, o que
ocorreu em 2013, com as eleiçõ es democrá ticas no país.

Além de questõ es relacionadas à segurança e à defesa, a Unasul também discute temas regionais
sobre ciência, tecnologia e inovaçã o, cultura, desenvolvimento social, economia e finanças,
educaçã o, eleiçõ es, infraestrutura, problemas relacionados ao trá fico e consumo de drogas, saú de e
segurança cidadã e coordenaçã o de açõ es contra o crime organizado internacional.
Joedson Alves/AFP

Cú pula de chefes de Estados para a criaçã o da Unasul, em Brasília (DF), 2008.


Pá gina 268

ROTEIRO DE ESTUDO
ESCREVA NO CADERNO

Revisando

1. Qual a importâ ncia do pensamento de Golbery do Couto e Silva na geopolítica brasileira? Qual foi seu
posicionamento durante a Guerra Fria e como influenciou a posiçã o brasileira?

2. O avanço tecnoló gico e o monitoramento via satélite alteram a forma de fiscalizaçã o das fronteiras
brasileiras. Nesse sentido, qual a importâ ncia do Programa Calha Norte e do Sivam para o
monitoramento das fronteiras no Norte do país?

3. Pode-se considerar que a implantaçã o das faixas de fronteira, o Programa Calha Norte e o Sivam sã o
projetos de ocupaçã o do territó rio brasileiro. O que você acha dessa afirmaçã o? Justifique sua resposta.

4. O que significou, do ponto de vista geopolítico, a transferência da capital brasileira para Brasília na
metade do século XX? Qual era a antiga capital?

5. A Argentina já foi a maior economia sul-americana, mas na metade do século XX perdeu essa posiçã o
para o Brasil. Quais episó dios de distú rbios geopolíticos envolveram as duas naçõ es ao longo do século
XX? Como a construçã o de Itaipu se enquadra nesse contexto?

6. O que significa afirmar que o Brasil exerce uma política externa multilateralista? Dê exemplos de
açõ es multilateralistas e bilateralistas na política externa brasileira.

7. A cada ano vem ganhando força a visã o de defensores brasileiros de uma relaçã o Sul-Sul. Quais sã o as
principais estratégias da política de integraçã o Sul-Sul desenvolvidas pelo governo brasileiro?

8. A Antá rtida é uma regiã o de crescente interesse estratégico para o Brasil. Por quê? Fale sobre a
presença brasileira na Antá rtida.

Olhar cartográfico

Analise o mapa abaixo e, a seguir, explique por que a criaçã o de Brasília serviu como política de
integraçã o territorial.
Allmaps

Fonte: BRASIL. Ministério dos Transportes. Disponível em:


<http://www2.transportes.gov.br/bit/01-inicial/07-download/concessoes2013.pdf>. Acesso em: 11 jan. 2016.
Pá gina 269

Atividade em grupo

Reú na-se com seu grupo e:

1. Pesquisem na internet, em livros, jornais e revistas declaraçõ es de importantes líderes mundiais que
destacam o relevante papel do Brasil hoje nos principais fó runs internacionais.

2. Pesquisem na internet, em livros, jornais e revistas eventos que minimizam a importâ ncia do Brasil no
cená rio internacional.

3. Apresentem sua pesquisa aos demais grupos e contextualizem as situaçõ es em que as declaraçõ es
aconteceram.

4. Debatam com os demais grupos as diferentes concepçõ es e, ao final, os principais pontos dos dois
posicionamentos.

De olho na mídia

Na crise europeia que assolou o continente em 2010 e 2011, o Brasil foi convidado por líderes europeus
a emprestar dinheiro a um fundo destinado a socorrer economias do velho continente. Leia o texto e
discuta com seus colegas em que medida aumentar o poder de voto no FMI pode ser importante para os
países emergentes.

FMI aprova maior poder de voto para países emergentes, inclusive Brasil

O FMI (Fundo Monetá rio Internacional) disse [...] que seu conselho aprovou reformas que irã o transferir um poder de
voto maior a países emergentes.

“Isso resultará em uma transferência de mais de 6% das parcelas de voto para países emergentes dinâmicos e em
desenvolvimento, e mais 6% de países representados demais para os menos representados”, disse o FMI em
comunicado.

Ter poder de voto no credor mundial é importante porque dá aos países a chance de influenciar decisõ es sobre como
usar o capital do fundo, composto de contribuiçõ es de seus membros.

O FMI afirmou que os 10 membros com a maior parcela de voto no futuro serã o Estados Unidos, Japã o e as
economias emergentes China, Brasil, Índia e Rú ssia, assim como França, Alemanha, Itá lia e Reino Unido.

Ao dar mais poder de voto a naçõ es emergentes, “essa reforma resultará em um Fundo que reflete melhor as
realidades”, disse o FMI.

As economias emergentes já vinham ganhando mais espaço no FMI ao longo dos ú ltimos cinco anos, mas essa
transferência de poder de voto significa uma ampla reforma na ordem econô mica global estabelecida quando o FMI
foi criado, apó s a Segunda Guerra Mundial. De acordo com o FMI, as mudanças fortalecerã o a “legitimidade e a
efetividade” da instituiçã o. […]

FMI APROVA maior poder de voto para países emergentes, inclusive Brasil. Folha de S.Paulo/Reuters,18 dez. 2010. Disponível em:
<http://www1.folha.uol.com.br/mercado/847182-fmi-aprova-maior-poder-de-voto-para-paises-emergentes-inclusive-brasil.shtml>. Acesso em: 11 jan. 2016.
Joker/Hartwig Lohmeyer/Ullstein Bild/Getty Images

Bandeiras de todos os membros do Fundo Monetá rio Internacional (FMI) em pré dio do Grupo Banco Mundial em
Washington, Estados Unidos, em 2008.
Pá gina 270

EXERCÍCIOS
ESCREVA NO CADERNO

ENEM

1. No mundo á rabe, países governados há décadas por regimes políticos centralizadores contabilizam metade
da populaçã o com menos de 30 anos; desses, 56% têm acesso à internet. Sentindo-se sem perspectivas de
futuro e diante da estagnaçã o da economia, esses jovens incubam vírus sedentos por modernidade e
democracia. Em meados de dezembro, um tunisiano de 26 anos, vendedor de frutas, põ e fogo no pró prio corpo
em protesto por trabalho, justiça e liberdade. Uma série de manifestaçõ es eclode na Tunísia e, como uma
epidemia, o vírus libertá rio começa a se espalhar pelos países vizinhos, derrubando em seguida o presidente
do Egito, Hosni Mubarak. Sites e redes sociais – como o Facebook e o Twitter – ajudaram a mobilizar
manifestantes do norte da Á frica a ilhas do Golfo Pérsico.

SEQUEIRA, C. D.; VILLAMÉ A, L. A epidemia da Liberdade. Istoé Internacional. 2 mar. 2011 (adaptado).

Considerando os movimentos políticos mencionados no texto, o acesso à internet permitiu aos jovens á rabes

a) reforçar a atuaçã o dos regimes políticos existentes.

b) tomar conhecimento dos fatos sem se envolver.

c) manter o distanciamento necessá rio à sua segurança.

d) disseminar vírus capazes de destruir programas dos computadores.

e) difundir ideias revolucioná rias que mobilizaram a populaçã o.

H9 Comparar o significado histó rico-geográ fico das organizaçõ es políticas e socioeconô micas em escala local,
regional ou mundial.

2. Os chineses nã o atrelam nenhuma condição para efetuar investimentos nos países africanos. Outro ponto
interessante é a venda e compra de grandes somas de á reas, posteriormente cercadas. Por se tratar de países
instá veis e com governos ainda nã o consolidados, teme-se que algumas naçõ es da Á frica tornem-se
literalmente protetorados.

BRANCOLI, F. China e os novos investimentos na África: neocolonialismo ou mudanças na arquitetura global? Disponível em: <http://opiniaoenoticia.com.br>. Acesso em: 29 abr.
2010 (adaptado).

A presença econô mica da China em vastas á reas do globo é uma realidade do século XXI. A partir do texto,
como é possível caracterizar a relaçã o econô mica da China com o continente africano?

a) Pela presença de ó rgã os econô micos internacionais, como o Fundo Monetá rio Internacional (FMI) e o Banco
Mundial, que restringem os investimentos chineses, uma vez que estes nã o se preocupam com a preservaçã o
do meio ambiente.

b) Pela açã o de ONGs (Organizaçõ es Nã o Governamentais) que limitam os investimentos estatais chineses,
uma vez que estes se mostram desinteressados em relação aos problemas sociais africanos.

c) Pela aliança com os capitais e investimentos diretos realizados pelos países ocidentais, promovendo o
crescimento econô mico de algumas regiõ es desse continente.
d) Pela presença cada vez maior de investimentos diretos, o que pode representar uma ameaça à soberania
dos países africanos ou manipulação das açõ es destes governos em favor dos grandes projetos.

O Exame Nacional do Ensino Mé dio (Enem), realizado anualmente, é pautado em um conjunto de competê ncias e
habilidades. A prova de Ciê ncias Humanas e suas tecnologias, na qual se insere a Geografia, é baseada em um programa de
31 tó picos, circunscritos em cinco eixos do qual se extraem as competê ncias e habilidades. Cada exercício do Enem, contido
nesta obra, vem acompanhado da respectiva habilidade (H). Muitas vezes, um exercício circunscreve-se em mais de uma;
nesse caso, indicamos a principal. O quadro completo das competê ncias e habilidades está nas pá ginas 287 e 288.
Pá gina 271

e) Pela presença de um nú mero cada vez maior de diplomatas, o que pode levar à formaçã o de um Mercado
Comum Sino-Africano, ameaçando os interesses ocidentais.

H7 Identificar os significados histó rico-geográ ficos das relaçõ es de poder entre as naçõ es.

3. Em 1947, a Organizaçã o das Naçõ es Unidas (ONU) aprovou um plano de partilha da Palestina que previa a
criaçã o de dois Estados: um judeu e outro palestino. A recusa á rabe em aceitar a decisã o conduziu ao primeiro
conflito entre Israel e países á rabes. A segunda guerra (Suez, 1956) decorreu da decisã o egípcia de
nacionalizar o canal, ato que atingia interesses anglofranceses e israelenses. Vitorioso, Israel passou a
controlar a Península do Sinai. O terceiro conflito á rabe-israelense (1967) ficou conhecido como Guerra dos
Seis Dias, tal a rapidez da vitó ria de Israel. Em 6 de outubro de 1973, quando os judeus comemoravam o Yom
Kippur (Dia do Perdão), forças egípcias e sírias atacaram de surpresa Israel, que revidou de forma arrasadora.
A intervençã o americano-soviética impô s o cessar-fogo, concluído em 22 de outubro.

A partir do texto acima, assinale a opçã o correta.

a) A primeira guerra á rabe-israelense foi determinada pela açã o bélica de tradicionais potências europeias no
Oriente Médio.

b) Na segunda metade dos anos 1960, quando explodiu a terceira guerra á rabe-israelense, Israel obteve rá pida
vitó ria.

c) A guerra do Yom Kippur ocorreu no momento em que, a partir de decisã o da ONU, foi oficialmente instalado
o Estado de Israel.

d) A açã o dos governos de Washington e de Moscou foi decisiva para o cessar-fogo que pô s fim ao primeiro
conflito á rabe-israelense.

e) Apesar das sucessivas vitó rias militares, Israel mantém suas dimensõ es territoriais tal como estabelecido
pela resoluçã o de 1947 aprovada pela ONU.

H7 Identificar os significados histó rico-geográ ficos das relaçõ es de poder entre as naçõ es.

4. A América Latina dos ú ltimos anos insere-se num processo de democratização, oferecendo algumas
oportunidades de crescimento econô mico-social num contexto de liberdade e dependência econô mica
internacional. Cuba continua caracterizada por uma organizaçã o pró pria com restriçõ es à liberdade econô mica
e política, crescimento em alguns aspectos sociais e um embargo econô mico americano datado de 1962. Em
1998, o Papa Joã o Paulo II visitou Cuba e depois disse ao cardeal Jaime Ortega, arcebispo de Havana, e a 13
bispos em visita ao Vaticano que apreciou as mudanças realizadas em Cuba apó s sua visita à ilha e espera que
sejam criados novos espaços legais e sociais, para que a sociedade civil de Cuba possa crescer em autonomia e
participação. A resposta internacional ao intercâ mbio com Cuba foi boa, mas as autoridades locais mostraram
pouco entusiasmo, nã o estando dispostas a abandonar o sistema socialista monopartidá rio.

A maioria dos países latino-americanos tem se envolvido, nos ú ltimos anos, em processos de formaçã o
socioeconô micos caracterizados por:

a) um processo de democratização à semelhança de Cuba.

b) restriçõ es legais generalizadas à açã o da Igreja no continente.

c) um processo de desenvolvimento econô mico com restriçõ es generalizadas à liberdade política.

d) excelentes níveis de crescimento econô mico.


e) democratizaçã o e oferecimento de algumas oportunidades de crescimento econô mico.

H8 Analisar a açã o dos Estados Nacionais no que se refere à dinâ mica dos fluxos populacionais e no
enfrentamento de problemas de ordem econô mico-social.
Pá gina 272

5. Com a perspectiva do desaparecimento das geleiras no Polo Norte, grandes reservas de petró leo e minérios,
hoje inacessíveis, poderã o ser exploradas. E já atiçam a cobiça das potências.

KOPP, D. Guerra Fria sobre o Á rtico. Le monde diplomatique Brasil. Setembro, n. 2, 2007 (adaptado).

No cená rio de que trata o texto, a exploraçã o de jazidas de petró leo, bem como de minérios – diamante, ouro,
prata, cobre, chumbo, zinco – torna-se atraente nã o só em funçã o de seu formidá vel potencial, mas também
por

a) situar-se em uma zona geopolítica mais está vel que o Oriente Médio.

b) possibilitar o povoamento de uma regiã o pouco habitada, além de promover seu desenvolvimento
econô mico.

c) garantir, aos países em desenvolvimento, acesso a matérias-primas e energia, necessá rias ao crescimento
econô mico.

d) contribuir para a reduçã o da poluiçã o em á reas ambientalmente já degradadas devido ao grande volume da
produçã o industrial, como ocorreu na Europa.

e) promover a participação dos combustíveis fó sseis na matriz energética mundial, dominada,


majoritariamente, pelas fontes renová veis, de maior custo.

H7 Identificar os significados histó rico-geográ ficos das relaçõ es de poder entre as naçõ es.

6. A singularidade da questã o da terra na Á frica colonial é a expropriaçã o por parte do colonizador e as


desigualdades raciais no acesso à terra. Apó s a independência, as populaçõ es de colonos brancos tenderam a
diminuir, apesar de a proporçã o de terra em posse da minoria branca nã o ter diminuído proporcionalmente.

MOYO, S. A terra africana e as questõ es agrá rias: o caso das lutas pela terra no Zimbá bue. In: FERNANDES, B. M.; MARQUES, M. I. M.; SUZUKI, J. C. (Orgs.). Geografia agrária: teoria e
poder. Sã o Paulo: Expressã o Popular, 2007.

Com base no texto, uma característica socioespacial e um consequente desdobramento que marcou o processo
de ocupaçã o do espaço rural na Á frica subsaariana foram:

a) Exploraçã o do campesinato pela elite proprietá ria – Domínio das instituiçõ es fundiá rias pelo poder pú blico.

b) Adoção de prá ticas discriminató rias de acesso à terra – Controle do uso especulativo da propriedade
fundiá ria.

c) Desorganizaçã o da economia rural de subsistência – Crescimento do consumo interno de alimentos pelas


famílias camponesas.

d) Crescimento dos assentamentos rurais com mã o de obra familiar – Avanço crescente das á reas rurais sobre
as regiõ es urbanas.

e) Concentraçã o das á reas cultivá veis no setor agroexportador – Aumento da ocupaçã o da população pobre em
territó rios agrícolas marginais.

H9 Comparar o significado histó rico-geográ fico das organizaçõ es políticas e socioeconô micas em escala local,
regional ou mundial.

7. Voz do sangue
Palpitam-me
os sons do batuque
e os ritmos melancó licos do blue.
Ó negro esfarrapado
do Harlem
dançarino de Chicago
ó negro servidor do South
Pá gina 273

Ó negro da Á frica
negros de todo o mundo
Eu junto

Ao vosso magnífico canto


a minha pobre voz
os meus humildes ritmos.
Eu vos acompanho
pelas emaranhadas á fricas
do nosso Rumo.
Eu vos sinto
negros de todo o mundo
eu vivo a nossa histó ria
meus irmã os.

Disponível em: <www.agostinhoneto.org>. Acesso em: 30 jun. 2015.

Nesse poema, o líder angolano Agostinho Neto, na década de 1940, evoca o pan-africanismo com o objetivo de:

a) incitar a luta por políticas de açõ es afirmativas na América e na Á frica.

b) reconhecer as desigualdades sociais entre os negros de Angola e dos Estados Unidos.

c) descrever o quadro de pobreza apó s os processos de independência no continente africano.

d) solicitar o engajamento dos negros estadunidenses na luta armada pela independência em Angola.

e) conclamar as populaçõ es negras de diferentes países a apoiar as lutas por igualdade e independência.

H7 Identificar os significados histó rico-geográ ficos das relaçõ es de poder entre as naçõ es.

8. O principal articulador do atual modelo econô mico chinês argumenta que o mercado é só um instrumento
econô mico, que se emprega de forma indistinta tanto no capitalismo como no socialismo. Porém os pró prios
chineses já estã o sentindo, na sua sociedade, o seu real significado: o mercado nã o é algo neutro, ou um
instrumental técnico que possibilita à sociedade utilizá -lo para a construçã o e edificaçã o do socialismo. Ele é,
ao contrá rio do que diz o articulador, um instrumento do capitalismo e é inerente à sua estrutura como modo
de produção. A sua utilização está levando a uma polarizaçã o da sociedade chinesa.

OLIVEIRA, A. A Revoluçã o Chinesa. Caros Amigos, 31 jan. 2011 (adaptado).

No texto, as reformas econô micas ocorridas na China sã o colocadas como antagô nicas à construçã o de um país
socialista. Nesse contexto, a característica fundamental do socialismo à qual o modelo econô mico chinês atual
se contrapõ e é a

a) desestatizaçã o da economia.

b) instauraçã o de um partido ú nico.

c) manutençã o da livre concorrência.

d) formação de sindicatos trabalhistas.

e) extinçã o gradual das classes sociais.

H18 Analisar diferentes processos de produçã o ou circulaçã o de riquezas e suas implicaçõ es socioespaciais.
Pá gina 274

9. Texto I

Allmaps

Disponível em: <http://twistedsifter.com>. Acesso em: 5 nov. 2013. Adaptado.

Texto II

A Índia deu um passo alto no setor de teleatendimento para países mais desenvolvidos, como os Estados
Unidos e as naçõ es europeias. Atualmente mais de 245 mil indianos realizam ligaçõ es para todas as partes do
mundo a fim de oferecer cartõ es de créditos ou telefones celulares ou cobrar contas em atraso.

Disponível em: www.conectacallcenter.com.br. Acesso em: 12 nov. 2013 (adaptado).

Ao relacionar os textos, a explicação para o processo de territorializaçã o descrito está no(a)

a) Aceitaçã o das diferenças culturais.

b) Adequação da posiçã o geográ fica.

c) Incremento do ensino superior.

d) Qualidade da rede logística.

e) Custo da mã o de obra local.

H17 Analisar fatores que explicam o impacto das novas tecnologias no processo de territorializaçã o da
produçã o.

VESTIBULARES

10. (Unicamp-SP) A longa presença de povos á rabes no norte da Á frica, mesmo antes de Maomé, possibilitou
uma interaçã o cultural, um conhecimento das línguas e costumes, o que facilitou posteriormente a expansã o
do islamismo. Por outro lado, deve-se considerar a superioridade bélica de alguns povos africanos, como os
sudaneses, que efetivaram a conversã o e a conquista de vá rios grupos na regiã o da Nú bia, promovendo uma
expansã o do islã que nã o se apoia na presença á rabe.

(Adaptado de ARNAUT, Luiz; LOPES, Ana Mô nica. História da África: uma introduçã o. Belo Horizonte: Crisá lida, 2005. p. 29-30)
Sobre a presença islâ mica na Á frica, é correto afirmar que:

a) O princípio religioso do esforço de conversã o, a jihad, foi marcado pela violência no norte da Á frica e pela
aceitaçã o do islamismo em todo o continente africano.
Pá gina 275

b) Os processos de interaçã o cultural entre á rabes e africanos, como os propiciados pelas relaçõ es comerciais,
sã o anteriores ao surgimento do islamismo.

c) A expansã o do islamismo na Á frica ocorreu pela ação dos á rabes, suprimindo as crenças religiosas
tradicionais do continente.

d) O islamismo é a principal religiã o dos povos africanos e sua expansã o ocorreu durante a corrida
imperialista do século XIX.

11. (Unicamp-SP) Em discurso proferido em 20 de maio de 2011, o presidente dos EUA, Barack Obama,
pronunciou-se sobre as negociaçõ es relativas ao conflito entre palestinos e israelenses, propondo o retorno à
configuraçã o territorial anterior à Guerra dos Seis Dias, ocorrida em 1967. Sobre o contexto relacionado ao
conflito mencionado, é correto afirmar que:

a) A criaçã o do Estado de Israel, em 1948, marcou o início de um período de instabilidade no Oriente Médio,
pois significou o confisco dos territó rios do Estado da Palestina que existia até entã o e desagradou o mundo
á rabe.

b) A Guerra dos Seis Dias insere-se no contexto de outras disputas entre á rabes e israelenses, por causa das
reservas de petró leo localizadas naquela regiã o do Oriente Médio.

c) A Guerra dos Seis Dias significou a ampliaçã o territorial de Israel, com a anexaçã o de territó rios, justificada
pelos israelenses como medida preventiva para garantir sua segurança contra açõ es á rabes.

d) O discurso de Obama representa a postura tradicional da diplomacia norte-americana, que defende a


existência dos Estados de Israel e da Palestina, e diverge da diplomacia europeia, que condena a existência dos
dois Estados.

12. (Unifesp-SP) No continente africano encontramos focos de guerras civis e entre países. No chamado
Chifre da Á frica, nos ú ltimos anos, foram registrados violentos conflitos entre

a) países pela definiçã o de fronteiras, envolvendo Burundi e Ruanda.

b) países pelo acesso à á gua, por parte do Egito e do Sudã o.

c) brancos e negros na Á frica do Sul.

d) lideranças locais na Somá lia.

e) grupos étnicos em Ruanda.

13. (UFRGS-RS) Observe o mapa a seguir.


Allmaps
Pá gina 276

As afirmaçõ es a seguir retratam algumas das características atuais da á rea assinalada no mapa.

1. A incidência de indivíduos soropositivos é alta.

2. A maioria da população é negra e professa a religiã o islâ mica.

3. Há grandes reservas de diamantes e ouro.

4. Há atualmente conflitos pela independência, contrá rios à s potências colonizadoras.

As duas afirmaçõ es que correspondem a características da maioria dos países que integram a á rea assinalada
no mapa sã o as de nú meros

a) 1 e 2.

b) 1 e 3.

c) 2 e 3.

d) 2 e 4.

e) 3 e 4.

14. (UFRGS-RS) Uma das á reas marítimas de tensã o do Oriente Médio liga o Golfo Pérsico ao Golfo de Omã .
Por situar-se junto ao litoral do Irã , passa por ali boa parte do petró leo que abastece o Ocidente.

Essa passagem é o

a) Estreito de Ormuz.

b) Estreito de Bab el Mandeb.

c) Canal de Suez.

d) Estreito de Bó sforo.

e) Estreito de Gibraltar.

15. (UEL-PR) Os conflitos entre á rabes, judeus e palestinos têm origem milenar, como milenar é a questã o da
soberania sobre os escassos recursos hídricos no Oriente Médio. Com base nos conhecimentos sobre o tema
“tensõ es, conflitos, guerras”, é correto afirmar que, na atualidade, há

a) conflitos entre os judeus e curdos pelo controle das á guas na escassa regiã o do Sahel, dominada por
vegetaçã o de savana, que recebe uma precipitação entre 150 e 500 mm por ano.

b) conflitos entre as naçõ es palestina e israelense, pelo controle do aquífero localizado no Rift Valley, com
altitudes elevadas e depressõ es ou fossas tectô nicas que deram origem a extensos lagos como o Tanganica, o
Vitó ria e o Niassa.

c) conflitos entre israelenses e palestinos pelo domínio das á guas da bacia do rio Jordão e conflitos entre
turcos, sírios e iraquianos pelo controle das bacias hidrográ ficas dos rios Tigre e Eufrates.
d) conflitos entre israelenses, sírios e libaneses, pelo domínio dos recursos hídricos das bacias hidrográ ficas
dos rios Níger e Congo.

e) conflitos entre turcos, á rabes e palestinos pelo controle das á guas dos sistemas lacustres do Tanganica e do
Baikal.

16. (Mack-SP) Assinale a alternativa INCORRETA sobre a regiã o do Cáucaso.

a) O extremismo islâ mico é responsá vel por movimentos separatistas, como os ocorridos na Tchetchênia.

b) A regiã o tem grande importâ ncia para a Rú ssia devido à produçã o de petró leo.

c) Trata-se da principal á rea produtora de cereais da Rú ssia.

d) Anteriormente integrante da ex-URSS, é atualmente dividida em países independentes e á reas vinculadas à


Rú ssia.

e) Marcada por rivalidades étnicas e religiosas, é uma das regiõ es mais conturbadas do mundo.
Pá gina 277

17. (Unimontes-MG) A América Latina nã o é homogênea. As transformaçõ es territoriais importadas pela


globalizaçã o atingem, de forma diferenciada, cada um dos países. Sobre essas transformaçõ es advindas da
globalizaçã o na América Latina, podemos afirmar que

a) o Brasil, principal interlocutor para intermediar os conflitos na América Latina, perdeu espaço para o
México.

b) a Colô mbia fortaleceu suas relaçõ es diplomá ticas com o Equador, pois ambos produzem e exportam
petró leo em grande escala.

c) a Venezuela se firmou como oposiçã o à internacionalizaçã o da economia latino-americana.

d) a economia cubana cresceu devido ao aumento das relaçõ es comerciais com os outros países da América
Central.

18. (UFPR) Para se compreender a divisã o do territó rio brasileiro em estados e, consequentemente, a
existência dos estados federados e a desigualdade de seu desenvolvimento, torna-se necessá rio compreender
também o processo de transformaçã o do espaço brasileiro em territó rio, o processo de povoamento, as
motivaçõ es que o provocaram e os percalços encontrados durante cinco séculos de povoamento.

Fonte: ANDRADE, M. C. de. A Federação brasileira: uma aná lise geopolítica e geossocial. Sã o Paulo: Contexto, 1999.

Com base nesse texto, assinale a alternativa correta.

a) Mesmo apó s cinco séculos de ocupação e povoamento, a divisã o dos estados brasileiros e sua configuraçã o
atual resultam da implantaçã o das capitanias hereditá rias.

b) As motivaçõ es para o povoamento do territó rio estiveram ligadas à existência dos estados federados e à
desigualdade de desenvolvimento existente entre eles.

c) Alguns estados brasileiros têm maior populaçã o e sã o considerados mais desenvolvidos pela forma como
ocorreu sua divisã o.

d) A divisão do territó rio brasileiro e suas características podem ser compreendidas pela forma histó rica como
ocorreu a ocupaçã o e o povoamento do espaço.

e) A forma como foram criados os estados federados gerou um país com distribuiçã o populacional e
desenvolvimento desiguais.

19. (UFSM-RS) “A viagem terminou num lugar que seria exagero chamar de cidade. Por convençã o ou
comodidade, seus habitantes teimavam em situá -lo no Brasil; ali, nos confins da Amazô nia, três ou quatro
países ainda insistem em nomear fronteira um horizonte infinito de á rvores; naquele lugar nebuloso e
desconhecido para quase todos os brasileiros, um tio meu, Hanna, combateu pelo Brasã o da Repú blica
Brasileira.”

No trecho de “Relato de um certo Oriente”, de Milton Hatoum, a referência à “fronteira” associa-se ao(à )

a) perspectiva de considerar o Oriente um espaço bem-delimitado geograficamente.

b) preocupaçã o de cará ter ecoló gico, denunciada pela precá ria marcação de limites.

c) confinamento de imigrantes, particularmente sírio-libaneses, praticado pelo Brasil naquela época.

d) percepçã o de um espaço flutuante com limites imprecisos.


e) legislaçã o de que os limites sã o demarcados pelos pró prios habitantes, no caso, indígenas e seringueiros.

20. (Cesgranrio-RJ) A criaçã o de Brasília, na década de 60, representa uma ação que teve fortes
consequências na organizaçã o do espaço brasileiro. Assinale a afirmativa que NÃ O corresponde a este fato.

a) Colocou em pleno Planalto Central uma cidade, hoje com cerca de 1,5 milhã o de habitantes, de alto poder de
consumo, ampliando o mercado regional.
Pá gina 278

b) Permitiu melhor planejamento econô mico das diversas regiõ es brasileiras, feito de acordo com as
peculiaridades de cada á rea (Sudene, Sudam, por exemplo).

c) Gerou uma malha rodoviá ria, que dela parte e que permitiu a melhor integraçã o das diversas regiõ es
brasileiras e do conjunto do territó rio nacional.

d) Valorizou espaços como os do sul de Goiás, Triâ ngulo Mineiro, leste de Mato Grosso, que desenvolveram
suas cidades e sua produçã o.

e) Facilitou, a longo prazo, a ocupaçã o agrícola das á reas dos cerrados, hoje um dos novos espaços
incorporados a uma agricultura mais moderna.

21. (Fuvest-SP) O grupo Boko Haram, autor do sequestro, em abril de 2014, de mais de duzentas estudantes,
que, posteriormente, segundo os líderes do grupo, seriam vendidas, nasceu de uma seita que atraiu seguidores
com um discurso crítico em relaçã o ao regime local. Pregando um islã radical e rigoroso, Mohammed Yusuf, um
dos fundadores, acusava os valores ocidentais, instaurados pelos colonizadores britâ nicos, de serem a fonte de
todos os males sofridos pelo país. Boko Haram significa “a educaçã o ocidental é pecaminosa” em haussa, uma
das línguas faladas no país.

www.cartacapital.com.br. Acessado em: 13 maio 2014. Adaptado.

O texto se refere

a) a uma dissidência da Al Qaeda no Iraque, que passou a atuar no país apó s a morte de Sadam Hussein.

b) a um grupo terrorista atuante nos Emirados Á rabes, país economicamente mais dinâ mico da regiã o.

c) a uma seita religiosa sunita que atua no Sul da Líbia, em franca oposiçã o aos xiitas.

d) a um grupo muçulmano extremista, atuante no Norte da Nigéria, regiã o em que a maior parte da populaçã o
vive na pobreza.

e) ao principal grupo religioso da Etió pia, ligado ao regime político dos tuaregues, que atua em toda a regiã o do
Saara.

22. (Unicamp-SP) No mapa abaixo estã o indicados por nú meros três países do Continente Africano. Assinale
a alternativa que apresenta corretamente a localização e características desses países.
Allmaps
Pá gina 279

a) Angola (1) e Moçambique (2) foram colonizados por franceses, enquanto a Á frica do Sul (3) integra
atualmente o NAFTA.

b) Angola (3) e Moçambique (1) foram colonizados por ingleses, enquanto a Á frica do Sul (2) integra
atualmente o G7.

c) Angola (1) e Moçambique (2) foram colonizados por portugueses, enquanto a Á frica do Sul (3) integra
atualmente os BRICS.

d) Angola (2) e Moçambique (3) foram colonizados por portugueses, enquanto a Á frica do Sul (1) integra
atualmente os BRICS.

23. (Vunesp-SP) Os espaços à margem da economia mundial sã o igualmente pouco integrados regionalmente,
e a desintegraçã o nacional limita a integraçã o. O comércio intrarregional africano se situa em torno de 10% do
que é movimentado e é polarizado em alguns países. Fora a Á frica do Sul, cinco países representam três
quartos das exportaçõ es intra-africanas.

Philippe Hugon. Geopolítica da África, 2009.

A inexpressividade do comércio intrarregional africano deve-se, em parte,

a) ao acesso exclusivo a matérias-primas importadas e ao baixo mercado consumidor.

b) à pouca diversificaçã o das estruturas produtivas e às divergências socioculturais.

c) à manutençã o das colô nias europeias e à obrigatoriedade da exportaçã o.

d) às fronteiras flexíveis e à generalizaçã o de economias nã o monetarizadas.

e) aos altos custos no transporte de mercadorias e à ausência de centros urbanos.

24. (Vunesp-SP) Há grande diversidade entre aqueles que procuram inspiraçã o em sua fé no Islã . A
monarquia vaabita da Ará bia Saudita e os líderes religiosos xiitas do Irã têm profundas discordâ ncias políticas
e divergem igualmente em questõ es socioeconô micas. Em termos mais amplos, ocorre nos movimentos
islamitas um debate sobre se a meta correta é mesmo chegar ao poder estatal, assim como sobre a democracia,
a diversidade social, o papel das mulheres e da educaçã o e sobre a maneira de interpretar o Corã o. E, embora a
maioria dos islamitas aceite a realidade da existência dos atuais Estados e suas fronteiras, uma minoria mais
radical procura destruir todo o sistema e estabelecer um califado que abarque a regiã o inteira [do Oriente
Médio].

Dan Smith. O atlas do Oriente Médio, 2008.

O argumento principal do texto pode ser ilustrado por meio da comparaçã o entre

a) o respeito a todas as orientaçõ es sexuais nos países que vivem sob regime islâ mico e a perseguiçã o a
homossexuais no Paquistã o e na Índia.

b) o apoio unâ nime dos grupos islâ micos ao atentado ao World Trade Center, em Nova Iorque, e a invasã o
militar norte-americana no Iraque.

c) a situação e os direitos das mulheres nos países do Ocidente e nas á reas em que prevalecem regimes
políticos islâ micos.

d) a invasão norte-americana no Afeganistã o e o apoio soviético ao regime liderado pelo Talibã naquele país.
e) os islâ micos que protestaram contra o atentado à redaçã o do jornal Charlie Hebdo, em Paris, e a açã o militar
do Estado Islâ mico.

25. (Unicamp-SP) Desde o fim dos governos militares, a América do Sul tem tido um dos mais baixos gastos
militares no mundo. Mas o fim das crises econô micas que assolaram o subcontinente entre os anos 1997 e
2000 propiciou condiçõ es financeiras para a reemergência de projetos das Forças Armadas e o crescimento
dos orçamentos militares para a segurança e defesa em diversos países da regiã o.

Adaptado de VILLA, Rafael Duarte. Corrida armamentista ou modernizaçã o de armamentos na América do Sul: estudo comparativo dos gastos militares. Estudos e Cenários, dez.
2008, p. 48-49. Disponível em: <http://observatorio.iuperj.bre http://necon.iuperj.br>. Acesso em: 25 out. 2010.

a) De quais assuntos se ocupa a agenda de segurança e defesa dos governos nacionais?


Pá gina 280

b) Quais as principais motivaçõ es para a modernização das Forças Armadas por parte dos países sul-
americanos?

26. (Unicamp-SP) Leia o trecho e responda às questõ es:

A prá tica do crime é tã o antiga quanto a pró pria humanidade. Mas o crime global, a formação de redes entre
poderosas organizaçõ es criminosas e seus associados, com atividades compartilhadas em todo o planeta,
constitui um novo fenô meno que afeta profundamente a economia no â mbito internacional e nacional, a
política, a segurança e, em ú ltima aná lise, as sociedades em geral. A Cosa Nostra siciliana (e suas associadas La
Camorra, Ndrangheta e Sacra Corona Unita), a má fia norte-americana, os narcotraficantes colombianos, os
cartéis mexicanos, as redes criminosas nigerianas, a Yakuza do Japã o, as tríades chinesas, a constelaçã o
formada pelas mafiyas russas, os traficantes de heroína da Turquia, as posses jamaicanas e um sem-nú mero
de grupos criminosos locais e regionais em todos os países do mundo uniram-se em uma rede global e
diversificada que ultrapassa fronteiras e estabelece vínculos de todos os tipos.

Adaptado de CASTELLS, Manuel. Fim de milênio. A era da informação: economia, sociedade e cultura. v. 3. Sã o Paulo: Paz e Terra, 1999, p. 203-204.

a) Com a exceçã o dos narcó ticos, quais são os principais produtos que as organizaçõ es criminais
transnacionais (ou com conexõ es internacionais) comercializam?

b) A Colô mbia apresenta um histó rico de violência, com forte presença do crime organizado. Além do
narcotrá fico, existem grupos guerrilheiros e grupos paramilitares. Entre os grupos guerrilheiros ressaltam-se
as FARCs (Forças Armadas Revolucioná rias) e o ELN (Exército de Libertaçã o Nacional), que se confrontam
com o exército, a polícia e grupos paramilitares. Qual a relaçã o da guerrilha com o narcotrá fico? O que é um
grupo paramilitar?

27. (UFRJ)

As três faces marítimas da África

O continente africano se abre a leste para o oceano Índico, a oeste para o oceano Atlâ ntico e ao norte para o
mar Mediterrâ neo, o que possibilitou no passado – e continua a permitir no presente – a formaçã o das mais
diversas redes de relaçõ es culturais, econô micas e migrató rias com diferentes partes do mundo. No passado,
pelo oceano Índico, indianos exploravam rotas comerciais anos antes dos europeus; pelo Atlâ ntico, o oeste
africano foi fonte importante para o trá fico negreiro. Mas foi por meio do mar Mediterrâ neo que as redes de
relaçõ es sempre foram mais intensas e conflituosas.

Descreva dois tipos atuais de relaçõ es entre a Á frica e a Europa, um de natureza conflituosa, outro de natureza
nã o conflituosa.

28. (UFU-MG) Na atualidade, o Oriente Médio representa uma grande regiã o de conflito, sendo denominada
pela imprensa como “barril de pó lvora”. Sobre esta regiã o, responda: Qual é a importâ ncia
estratégica/geopolítica e econô mica do Oriente Médio para o Ocidente?

29. (UFG-GO) O Estado de Israel foi criado pela ONU em 1948. Desde a sua criaçã o, Israel mantém um conflito
permanente com os palestinos. Sobre esse conflito, explique

a) a expansã o de Israel sobre os territó rios palestinos;

b) o papel estratégico dos Estados Unidos nesse conflito.

30. (UFRJ) É comum a afirmativa de que a capital brasileira tem uma localizaçã o geográ fica que se justifica
mais pela intençã o de centralizaçã o espacial do governo do que pelas manifestaçõ es populares, tã o necessá rias
aos grandes debates que devem preceder as decisõ es do Congresso Nacional. Explique por que essa situaçã o
atual é inversa à situaçã o vivida pela capital brasileira anterior, tratando da localização geográ fica das duas
capitais e da ló gica demográ fica da afirmativa.

31. (Fuvest-SP) Considere o mapa na pá gina a seguir, que representa uma regiã o com histó rico de migraçõ es
e disputas territoriais e que já abrigou, desde antes da Era Cristã , vá rias civilizaçõ es.
Pá gina 281

Allmaps

Folha de São Paulo, 15 nov. 2015. Adaptado.

a) Mencione duas características da bacia hidrográ fica dos rios Tigre/Eufrates, relacionando-as com sua
ocupaçã o na Antiguidade. Justifique.

b) Identifique um importante conflito que, atualmente, ocorre na á rea indicada no mapa e apresente uma
motivaçã o político-religiosa para esse conflito.

32. (Unicamp-SP) A construçã o de Brasília liga-se à questã o regional do Brasil, que se colocou com
intensidade na década de 1950, indicando a necessidade de se corrigirem desequilíbrios regionais. Mas, no
Plano Piloto, vive uma minoria da população total de Brasília. O Plano Piloto nã o existiria sem as cidades-
satélites, onde reside a maior parte dos trabalhadores, um contingente de pedreiros, motoristas, auxiliares de
escritó rios, serventes, encarregados de segurança, balconistas, etc. Brasília, dessa forma, é uma só cidade, do
Plano Piloto à s cidades-satélites. Assim, torna-se difícil aceitar a ideia de que Brasília foi projetada para
antecipar um futuro mais igualitá rio.

José William Vesentini. A capital da geopolítica. Sã o Paulo: Á tica, 1986, p. 116-117, 144-145 e 148. Adaptado.

a) Quais os objetivos oficiais para a construçã o de Brasília?

b) Segundo o texto, por que é “difícil aceitar a ideia de que Brasília foi projetada para antecipar um futuro mais
igualitá rio” para a sociedade brasileira?

33. (Unicamp-SP) A Regiã o Autô noma da Rojava é um dos poucos pontos brilhantes a emergir da tragédia
dos conflitos que ocorrem no Oriente Médio. Depois de expulsar os agentes do regime de Bashar al-Assad, em
2011, e apesar da hostilidade de quase todos os seus vizinhos, Rojava nã o só manteve a sua independência
como constitui uma experiência democrá tica notá vel. Todavia, mais uma vez os curdos estã o cercados: os
jihadistas do Estado Islâ mico e a maior potência da OTAN na regiã o, a Turquia, querem afogar em sangue a
semente da liberdade dos curdos e provar que nã o pode haver na regiã o um povo livre em que as mulheres e
os homens sejam iguais. A defesa da cidade de Kobani é, atualmente, expressã o cabal da histó rica luta de toda a
nação curda para fazer valer seu direito à autodeterminaçã o.

N. R. de Almeida, Os curdos numa armadilha histó rica. http://outraspalavras.net/posts/os-curdos-numa-armadilha-dahistoria. Acessado em 28/09/2015. Adaptado.
a) O povo curdo totaliza hoje aproximadamente 30 milhõ es de pessoas. Em quais países estã o
majoritariamente distribuídos? Qual a principal reivindicaçã o política dos curdos?

b) Dê duas características da organizaçã o denominada Estado Islâ mico e aponte os países em que ela controla
territó rios e recursos.
Pá gina 282

REFERÊNCIAS

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LISTA DE SIGLAS DE EXAMES NACIONAIS


Cesgranrio-RJ – Fundaçã o Cesgranrio

Fuvest-SP – Fundaçã o Universitá ria para o Vestibular

Mack-SP – Universidade Presbiteriana Mackenzie

PUC-SP – Pontifícia Universidade Cató lica de Sã o Paulo

PUCCamp-SP – Pontifícia Universidade Cató lica de Campinas

UEG-GO – Universidade Estadual de Goiá s

UEL-PR – Universidade Estadual de Londrina

UFG-GO – Universidade Federal de Goiá s

UFMG – Universidade Federal de Minas Gerais

UFPR – Universidade Federal do Paraná

UFRGS-RS – Universidade Federal do Rio Grande do Sul

UFRJ – Universidade Federal do Rio de Janeiro


UFSM-RS – Universidade Federal de Santa Maria

UFU-MG – Universidade Estadual de Urbelâ ndia

Unicamp-SP – Universidade Estadual de Campinas

Unifesp-SP – Universidade Federal de Sã o Paulo

Unimontes-MG – Universidade Estadual de Montes Claros

Vunesp-SP – Fundaçã o para o Vestibular da Universidade Estadual Paulista


Pá gina 287

MATRIZ DE REFERÊNCIA DE CIÊNCIAS HUMANAS E


SUAS TECNOLOGIAS

Competência de área 1
Compreender os elementos culturais que constituem as identidades.

H1 - Interpretar histó rica e/ou geograficamente fontes documentais acerca de aspectos da cultura.

H2 - Analisar a produção da memó ria pelas sociedades humanas.

H3 - Associar as manifestaçõ es culturais do presente aos seus processos histó ricos.

H4 - Comparar pontos de vista expressos em diferentes fontes sobre determinado aspecto da cultura.

H5 - Identificar as manifestaçõ es ou representaçõ es da diversidade do patrimô nio cultural e artístico em


diferentes sociedades.

Competência de área 2
Compreender as transformações dos espaços geográficos como produto das relações
socioeconômicas e culturais de poder.

H6 - Interpretar diferentes representaçõ es grá ficas e cartográ ficas dos espaços geográ ficos.

H7 - Identificar os significados histó rico-geográ ficos das relaçõ es de poder entre as naçõ es.

H8 - Analisar a açã o dos Estados Nacionais no que se refere à dinâ mica dos fluxos populacionais e no
enfrentamento de problemas de ordem econô mico-social.

H9 - Comparar o significado histó rico-geográ fico das organizaçõ es políticas e socioeconô micas em escala local,
regional ou mundial.

H10 - Reconhecer a dinâ mica da organizaçã o dos movimentos sociais e a importâ ncia da participaçã o da
coletividade na transformaçã o da realidade histó rico-geográ fica.

Competência de área 3
Compreender a produção e o papel histórico das instituições sociais, políticas e econômicas,
associando-as aos diferentes grupos, conflitos e movimentos sociais.

H11 - Identificar registros de prá ticas de grupos sociais no tempo e no espaço.

H12 - Analisar o papel da justiça como instituiçã o na organizaçã o das sociedades.

H13 - Analisar a atuaçã o dos movimentos sociais que contribuíram para mudanças ou rupturas em processos
de disputa pelo poder.
H14 - Comparar diferentes pontos de vista, presentes em textos analíticos e interpretativos, sobre situação ou
fatos de natureza histó rico-geográ fica acerca das instituiçõ es sociais, políticas e econô micas.

H15 - Avaliar criticamente conflitos culturais, sociais, políticos, econô micos ou ambientais ao longo da histó ria.
Pá gina 288

Competência de área 4
Entender as transformações técnicas e tecnológicas e seu impacto nos processos de
produção, no desenvolvimento do conhecimento e na vida social.

H16 - Identificar registros sobre o papel das técnicas e tecnologias na organizaçã o do trabalho e/ou da vida
social.

H17 - Analisar fatores que explicam o impacto das novas tecnologias no processo de territorializaçã o da
produçã o.

H18 - Analisar diferentes processos de produçã o ou circulaçã o de riquezas e suas implicaçõ es socioespaciais.

H19 - Reconhecer as transformaçõ es técnicas e tecnoló gicas que determinam as vá rias formas de uso e
apropriação dos espaços rural e urbano.

H20 - Selecionar argumentos favorá veis ou contrá rios à s modificaçõ es impostas pelas novas tecnologias à vida
social e ao mundo do trabalho.

Competência de área 5
Utilizar os conhecimentos históricos para compreender e valorizar os fundamentos da
cidadania e da democracia, favorecendo uma atuação consciente do indivíduo na sociedade.

H21 - Identificar o papel dos meios de comunicaçã o na construçã o da vida social.

H22 - Analisar as lutas sociais e conquistas obtidas no que se refere à s mudanças na legislaçã o ou nas políticas
pú blicas.

H23 - Analisar a importâ ncia dos valores éticos na estruturaçã o política das sociedades.

H24 - Relacionar cidadania e democracia na organizaçã o das sociedades.

H25 - Identificar estratégias que promovam formas de inclusão social.

Competência de área 6
Compreender a sociedade e a natureza, reconhecendo suas interações no espaço em
diferentes contextos históricos e geográficos.

H26 - Identificar em fontes diversas o processo de ocupação dos meios físicos e as relaçõ es da vida humana
com a paisagem.

H27 - Analisar de maneira crítica as interaçõ es da sociedade com o meio físico, levando em consideraçã o
aspectos histó ricos e/ou geográ ficos.

H28 - Relacionar o uso das tecnologias com os impactos socioambientais em diferentes contextos histó rico-
geográ ficos.
H29 - Reconhecer a função dos recursos naturais na produçã o do espaço geográ fico, relacionando-os com as
mudanças provocadas pelas açõ es humanas.

H30 - Avaliar as relaçõ es entre preservaçã o e degradaçã o da vida no planeta nas diferentes escalas.

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