Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
3Araújo Macedo
e Galzuinda de
Ancestrais e Descendentes
Impressum
© 2022 Rainer Pfeiffer Novelli.
Este livro é dedicado ao resgate e à preservação da história da familia Novelli de Calcinaia e da família Araújo
Macedo de Minas Gerais e São Paulo.
Ele não tem fins comerciais.
Contato:
Rainer Pfeiffer Novelli
Schwangauer Strasse 16, 87629 Füssen, Alemanha
Email: rainer.p.n@gmail.com
Imagem de capa: A Torre Fiorentina de Castelfranco di Sotto (século XIII) por volta de 1960.
Imagem na folha de rosto: Escudo da familia Novelli de Florença (1696 na igreja San Pietro a Sieve de
Scarperie e San Piero, FI), que equivale ao escudo dos Novelli de Castelfranco di Sotto.
4
A meu pai Luiz Antônio Novelli
Das Kloster Steingaden um 1550 Stich von Caspar Amordt und Georg Andreas Wolfgang von 1664.
Índice
. 1
2
Prefácio
Alte Katasterkarte mit dem Lech und dem Steingadener Ortsteil Riesen, wo die Geisenberger herkommen.
Johann Moritz Rugendas, gravura de uma lavra de ouro com Vila Rica ao fundo por volta de 1820,
época em que os Araújo ainda viviam nas redondezas como mineradores.
Este livro é dedicado em primeira linha aos descendentes de meus bisavós Giovanni
Novelli e Galzuinda de Araújo Macedo, que nasceram respectivamente em 1855 em
Calcinaia, Toscana, Itália e em 1872 na cidade sul-mineira de São Gonçalo do Sapucaí,
Brasil. Eles se casaram em 1888 em São José do Rio Pardo, Estado de São Paulo.
Giovanni e Galzuinda têm hoje mais de 300 descendentes em todo o Brasil, no México,
nos USA, Canadá e na Europa. Naquele breve tempo de apenas poucos anos em que
viveram juntos na pequena cidade de São José do Rio Pardo, criaram inúmeras
existências individuais.
Este livro resgata suas raízes brasileiras, italianas e portuguesas e esboça como eles e
seus ancestrais viveram. Além disso retrata alguns descendentes de Giovanni e
Galzuinda além de tentar reunir o máximo possível de dados dos seus descendentes,
algo nada fácil visto que algumas linhas dos Novellis se perderam de vista faz quase um
século.
1
Netos e bisnetos de Luiz Antônio Novelli em 2021 em
Füssen na Alemanha. Luiz Antônio foi um de ao
menos 41 netos de Giovanni e Galzuinda.
Esse trabalho nunca estará pronto, visto que sempre haverá algo que poderá ser
acrescentado, tanto na genealogia como na árvore dos descendentes de Giovanni e
Galzuinda. Mas mesmo assim, este livro tenta fixar um marco na memória dos
familiares, para que a história familiar não seja esquecida e para que nós possamos
definir e reforçar nossa identidade, tanto italiana quanto portuguesa e brasileira.
Neste mundo cada vez mais globalizado e no qual o tempo parece correr cada vez mais
rápido, possuir uma identidade nos ajuda a nos orientar no tempo e espaço e nos dar a
fé, de que somos parte de algo maior do que nossas vidas individuais. Somos parte de
uma grande familia. Temos centenas de parentes que descendem desse casal que se
casou por volta de 135 anos atrás e temos milhares de parentes espalhados no mundo
todo, formando uma rede invisível de relacionamentos.
Dedico este livro a meu pai Luiz Antônio Novelli, artista plástico, historiador e escritor,
que faleceu em 2021 com 84 anos de idade. Mesmo não tendo visto o livro pronto, ele
vibrava com todo achado na pesquisa genealógica e se entusismava infinitamente pela
história da nossa família. A ele devo meu interesse não só pela genealogia, mas pela
história em geral.
2
A cidade de Florença, capital da Toscana.
3
Giovanni Novelli com
aproximadamente 30
anos de idade.
Podemos considerar muitas cidades nas províncias italianas de Pisa, Lucca, Florença
e Pistoia como cidades ancestrais nossas por exemplo, temos ancestrais de
Calcinaia, Bientina, Pontedera, Ponsacco, Spianate, Castelfranco, Buggiano, Cevoli,
San Giovanni alla Vena, Vicopisano, Santa
Croce, Montecalvoli, Monte Vettolini,
Florença e ainda outras. A maioria dessas
cidades fica a menos de 10 km de Santa
Maria a Monte. E entre essas localidades,
nossas famílias ancestrais estão
concentradas nas três cidades de Bientina,
Calcinaia e Santa Maria a Monte. Portanto,
vamos nos concentrar nessas três cidades
no curso da história dos Novelli. Além
destas, levaremos especialmente
Castelfranco em consideração durante a
Idade Média, já que nossa família ancestral
dos Pacini-Novelli se mudou de lá por volta
de 1545 para Staffoli em Santa Croce.
6
Nossa regiâo ancestral na Toscana.
À esquerda vemos Lucca e Pisa,
as grandes potências medievais que
dominavam esta área.
É uma região de alta
concentração de his-
tória, e de grandes
artistas, escritores e
cientistas. Já na anti-
guidade, o general
cartaginense Aníbal
perdeu um olho ao
atravessar com seus
elefantes de guerra os
pântanos de Bientina
a caminho de Roma.
O escultor medieval
Andrea Pisano nasceu
na próxima Pontedera. O genial artista e arquiteto Brunelleschi construiu o burgo
de Vicopisano, logo ao lado de Calcinaia. Leonardo da Vinci nasceu pertinho de
nossa região ancestral e por volta de 1500 trabalhou no planejamento da mudança
do curso do rio Arno em Calcinaia e Bientina. A familia Bonaparte da qual descende
Napoleão veio de San Miniato, O pai de Galileu Galilei nasceu em Santa Maria a
Monte e sua mãe era de familia tradicional de lá. Machiavelli escreveu
pessoalmente os estatutos da cidade de Montopoli, vizinha de Castelfranco. A
7
A cidade de Altopascio, próxima a
Santa Maria a Monte, de onde também
temos ancestrais aqui era o centro
da importante Ordem dos Cavaleiros
do Tau na Idade Média
Até o ano 1000, relativamente poucas pessoas viviam em nossa área ancestral. Naquela
época, não havia cidades aqui, apenas algumas pequenas aldeias e povoados isolados.
Naquela época, todos os moradores
dessa área eram nossos ancestrais e
seus parentes. Entre 900 e 1200, a
população da Europa dobrou, um
desenvolvimento que certamente
também pôde ser observado no vale
do Arno. Na baixa Idade Média, por
volta de 1300, certamente temos
milhares de ancestrais na área do basso
Val d´Arno, mesmo se levarmos em
conta a perda ancestral, o fenômeno do
encolhimento do número de ancestrais
9
A cidade de Pisa por volta de 1500. Note-se as Casas-torre medievais, onde residiam os nobres.
As duas cidades-Estado mais importantes para nós na Idade Média são primeiramente
Pisa, que controlava Calcinaia, Bientina e Vicopisano e também Lucca, que controlava
Santa Maria a Monte, Castelfranco e Santa Croce. Essas duas cidades estão separadas
geograficamente pela serra dos Monti Pisani que formavam uma fronteira natural entre
os seus estados. Ambas cidades distam em torno de 20 quilômetros de nossa região
ancestral, podendo assim ser alcançadas em apenas um dia de caminhada.
Pisa foi durante a Idade Média uma poderosa potência marítima e tinha postos
comerciais e colônias em todo o Mediterrâneo e até mesmo no Mar Negro. E Lucca foi
uma poderosa potência mercantil e industrial, detendo o monopólio da produção de
sêda na Europa durante toda a Idade Média. Ambas cidades tinham em torno de 25.000
a 30.000 habitantes por volta de 1300, sendo assim em têrmos populacionais
metrópoles para a época. Nossas cidadezinhas ancestrais por sua vez tinham em
comparação apenas algumas poucas centenas de habitantes. Santa Maria a Monte, a
maior entre elas, tinha entre 700 a 1000 habitantes.
Entre as cidades quase não havia povoados, pois durante a Idade Média a vida fora das
muralhas de proteção era perigosa demais para os camponeses.
10
Pisa (acima à esquerda), Lucca (à direita) e Florença (abaixo) em gravuras medievais.
Mesmo Pisa e Lucca tendo algumas vezes forjado alianças para juntas guerrearem um
inimigo comum, como fizeram com os árabes saracenos que aterrorizavam a região por
volta do ano 1000, elas eram grandes rivais e ambas fortificaram suas cidades-posses
para assegurarem seu domínio contra a respectiva inimiga. Assim, entre 1100 e 1250,
Pisa fortificou Bientina, Vicopisano e Calcinaia e Lucca as nossas outras cidades
ancestrais com muralhas, fossas, torres e pontes. Santa Maria a Monte, por estar
estrategicamente bem localizada no alto de uma colina, e ter tido 3 cintas de muralhas,
era considerada inexpugnável na época.
11
Savonarola sendo queimado em
Florença em 1498.
Lucca, de início na
desvantagem ante à potência
rival pisana, acabou por fazer
um pacto com a cidade-
Estado de Florença para
poder se defender melhor
contra Pisa. Ambas, Lucca e
Florença eram do partido dos
Guelfos e Pisa era da facção
Gibelina. Estes dois partidos,
um apoiando o Papa e o
outro apoiando o imperador,
foram os grandes opositores
políticos na Europa, e
principalmente na Italia, durante a Idade Média.
Mas fazer um pacto com Florença era como fazer um pacto com o diabo, pois essa
cidade, que dista uns 60 quilômetros de nossa região ancestral, sempre teve interesse
em conquistar cada vez mais terras para si e aumentar seu poder nessa área, que estava
no caminho para Florença ter acesso ao mar e com ele ao lucrativo comércio marítimo.
Florença era riquíssima por causa de seus negócios com linho, sêda, algodão, devido
aos seus artesãos e aos negócios bancários e tinha por volta de 100.000 habitantes,
sendo assim uma das maiores cidades da Europa na época.
No decorrer dos séculos XIII, XIV e XV nossas cidadezinhas ancestrais foram várias vezes
conquistadas ora por uma, ora por outra destas três cidades-Estado, sendo que no
início os conflitos eram mais entre Pisa e Lucca e no final deste período básicamente
entre Pisa e Florença. Por final foi Florença a grande vitoriosa na Toscana, conquistando
em 1327 Santa Maria a Monte e logo após, em 1331, Castelfranco e Santa Croce. Na
época, o prefeito de Castelfranco era Peratto di Novello, o provável patriarca da família
Novelli de Castelfranco. Em 1402 Florença conquista Bientina, e finalmente em 1509
Calcinaia, junto com a derrota definitiva de Pisa.
CASTELFRANCO DI SOTTO
A nossa familia Novelli, que antes de 1680 ainda se chamava Pacini, vivia na Idade
Média na cidade de Castelfranco di Sotto. Essa cidade foi fundada pela Republica de
Lucca por volta de 1250 unindo quatro
aldeias da planície entre os rios Arno e
Usciana para fins de defesa de seu
território contra suas rivais Pisa e
O sobrenome Pacini 13
é bem toscano.
Castelfranco em um mapa antigo de 1400.
À esquerda sobre as colinas, vemos
Montecalvoli e Santa Maria a Monte.
Florença. Essas quatro aldeias originais, chamadas San Bartolomeo a Paterno, San Mi-
chele in Caprugnana, San Piero a Vigesimo e San Martino in Catiana, formaram a partir
de então quatro bairros próprios dentro da cidade que foi fortificada com uma alta
muralha e aberta por 4 portas que eram trancadas durante a noite para maior proteção
dos cidadãos.
14
Lukas pesquisando no arquivo histórico de
Castelfranco, no qual há jóias arquivísticas que
datam de 1350. Para poder fazer esta pesquisa
obtivemos uma permissão especial do
Ministério da Cultura da Toscana.
15
6. Iacopo Pacini nato ca. 1430 em Castelfranco di Sotto. Mencionado em vários
Estimos. Tinha um irmão chamado Giovanni Pacini, notário da comuna de
Castelfranco, que foi o Capoccia (chefe da família) dos Pacini.
7. Piero Pacini nato ca. 1470 em Castelfranco di Sotto. É mencionado em vários
Estimos em torno de 1490-1520.
9. Piero Pacini nato em 1541 em Castelfranco di Sotto. Morou no Lischeto desde ca.
1545. Não se pode excluir que nossa família tenha descendido de um irmão deste Piero
Pacini, como p.ex. Pacino (*1544) porque os documentos têm lacunas aqui. Ele
possivelmente foi casado com uma mulher da família Novelli de Castelfranco.
As Armas dos Franciosini, na Via Imagem acima: O Estimo mais antigo de Castelfranco, de 1400,
Matteotti 2, em Castelfranco. que menciona duas gerações de nossos ancestrais Pacini.
16
Acima: Uma lista de ca. 1395. Será que o Pacino Capucci foi o pai de Pardino Pacini? Pacino di
Pardino aparece várias vezes em registros de impostos de Castelfranco. O abaixo data de 1435
Abaixo podemos ver o Estimo de Castelfranco de ca. 1400-1420 com a parte de Pacino di Pardino.
17
Antonio di Francioso * ca. 1390 (de Prato?) Além dos Pacini temos
outras linhas ancestrais
muito antigas de
Castelfranco di Sotto.
Por exemplo nossa linha
ancestral Rossi, que pode
ser seguida em
Castelfranco até ca. 1350
com Taddeo di Domenico
di Ceccho Rossi e os
Franciosini (esquerda)
ou nossa linha dos
Cavallini, da qual
descendemos três vezes e
que pode ser seguida até
Michele Cavallini (1400).
Abaixo vemos a
proveniência dos antenati
de Gaspero Gaetano, o
bisavô de Giovanni No-
velli, o neto.
Ainda temos as
famílias Bracci e
Ceccharini de
Castelfranco.
Esta última acredito
descender de um
dos dois ou três
homens de nome
Ceccho que viveram
em Castelfranco por
volta de 1400.
Dos Ceccharini
descendemos duas
vezes atravéz das
filhas de Domenico,
Maria e Caterina.
Acima: um registro
de 1496 com um
patronínico
extremamente longo
atravéz do qual
podemos reconstruir
4 geracôes dos
18Rossi.
O Castello Franco = castelo livre. Plano da cidade de Castelfranco de 1600 com seu desenho
retângular medieval projetado por Lucca.
Os PACINI de Castelfranco
Até aqui no final da Idade Média a nossa familia não tinha um sobrenome próprio.
Estes foram só se formando
por volta de 1400 (algumas
familias só mais tarde
ainda). É por isso que não
conhecemos os
sobrenomes de
personalidades ilustres
como Leonardo da Vinci
só significa que
ele veio da cidade de Vinci)
ou do escultor Andrea Pisa-
no (oriundo de Pisa).
Torre medieval em
Castelfranco. 19
Ao lado: Árvore
genealógica de Piero
Pacini. Abaixo. Seu
nome em um registro de
ca. 1523.
Assim o Cappu-ccio
era conhecido
como Cappuccio
Mattei (de Matteo),
e seu filho Pacino
era Pacino
Cappucci (de
Cappuccio) e assim
em diante: o
Pardino se chamava
Pardino Pacini (=
filho do Pacino) e
seu filho, que também se chamou Pacino era Pacino Pardini (= filho do Pardino).
Esse hábito de ter como sobrenome o nome do pai se chama como
já vimos
Sâo Pedro em uma gravura
medieval de de Castelfranco
Mas foi agora, nessa quinta geração (contada desde o Mat-
teo) que os sobrenomes se fixaram. O filho de Pacino Pardini
se chamou Iacopo PACINI e viveu por volta de 1440 e a
partir de então todos seus descendentes se chamariam
PACINI, independentemente do nome do pai.
20
Homem batendo em um carvalho para que seus
frutos caiam para alimentar seus porcos.
Abaixo: Mapa , as
cinco terras, designação antiga para essa
parte do Valdarno inferior (as cinco terras
eram: Fucecchio, Santa Croce, Castelfranco,
Santa Maria a Monte e Montecalvoli).
21
cercadas, assediadas, pilhadas e até mesmo incendiadas. Muitas vezes conseguiram
se defender dos agressores. Ora era Pisa, ora Florença e ora Lucca que vinha com
suas tropas, dependendo de quem detinha o poder no momento. Muitas vezes
vinha uma tropa inimiga, conquistava a cidade e no ano seguinte a cidade era
reconquistada pela republica anterior. Essa situação se manteve durante os séculos
XIV, XV e XVI.
22 ão de
Iacopo Pacini sendo mencionado em 1436 em Castelfranco
Ao lado: Brasão dos Novelli de Castelfranco sobre um portal de uma casa
antiga da cidade na Via Matteotti 11. (ca. 1600).
nome da avó paterna e a segunda o da avó materna. Assim existe uma certa
continuidade nos nomes tradicionais da familia, muitas vezes passados de geração a
geração durante séculos. Além de Piero, o segundo Iacopo também teve o filho Pacino
e a filha Dorothea, todos nascidos em Castelfranco. Enquanto não sabemos quem foi o
padrinho de Piero, os outros dois filhos tiveram os irmãos Francesco e Agnolo di
Marcho Guerrazzi como padrinhos e a parteira Sandra como madrinha. Os Guerrazzi
foram uma importante família de Castelfranco.
Ao sul da cidade havia outra praça aberta e não pavimentada, hoje a Praça XX de
Setembro, onde o mercado de gado era realizado certa época do ano e que servia de
campo para o jogo Pallone. Aqui está uma breve descrição do jogo na Internet: Pallone
era um esporte de equipe da península italiana que pertence à categoria de jogos de
retorno. O objetivo do jogo é colocar uma bola de couro pesando aproximadamente um
quilo na metade oposta do campo.
Imagem na página esquerda: A Porta Fiorentina em Castefranco em um postal antigo (ca. 1900).
Imagem acima: Pianora e Staffoli marcados dentro da
área dos bosques da Cerbaie (dentro do círculo em
vermelho) e as outras cidades ancestrais nossas da
regiâo. Ao norte da Cerbaie já era o Estado de Lucca e
de Pistoia e à direita e esquerda estavam o lago di
Bentina e os pântanos de Fucecchio. A cidade de Lucca
pode ser vista no canto esquerdo superior do mapa.
26
Essa área de Staffoli está
dentro dos bosques da
Cerbaia. Nós podemos
imaginar a Cerbaia
naquela época como
uma floresta bem densa,
cheia de castanheiras e
carvalhos. Dizia-se que
era tão densa que em
alguns lugares a luz do
sol nunca entrava. Para
que os peregrinos que
caminhavam pela Via Francigena indo ou voltando de Roma não se perdessem, toda
noite os sinos de Altopascio ao norte da Cerbaia tocavam, chamando-os.
Como o terreno é acidentado e a área foi durante séculos área fronteiriça entre as
repúblicas de Pisa, Lucca e Florença, foi uma região onde durante toda a Idade Média
se escondiam bandidos, moravam eremitas, viviam foragidos e soldados desertores.
Podemos imaginar a floresta como se fosse um palco de filmes de Robin Hood ou de
contos de fadas. E agora, findados os conflitos e organizado o novo estado toscano,
pôde-se limpar a floresta destes elementos e abrir novos caminhos e desmatar áreas
criando novos campos para a agricultura.
In data 09/09/1543 vengono concesse dal Comune di Santa Croce a Iacopo di Piero
Pacini da Castelfranco stiora 100 di terra
Tradução ao português:
Stiora de terra no local
Esses 100 Stiora de terra devem equivaler a uns 5 ou 10 hectares. E como podemos ver,
os Pacini tiveram que pagar 9 Staia (estimado em cerca de 180 litros) de grãos a cada
ano ao município de Santa Croce pelo arrendamento. A área do Lischeto e a via para
Greppi pode ser encontrada a apenas algumas centenas de metros a nordeste de
Staffoli, em direção a Galleno, na antiga Via Francigena. Lischeto é também o nome de
um pequeno riacho que flui um pouco a nordeste de Staffoli. A Via Francigena era uma
das vias antigas que cortavam a região de norte a sul ligando o norte da Europa a Ro-
ma. Nela circulavam comerciantes e peregrinavam muitos devotos em seu caminho ao
Papa.
Essa área dentro dos bosques da Cerbaia estava atraindo pessoas para colonização
neste momento do século XVI. É que depois da conquista definitiva de Pisa por
Florença em 1509 a regiao passou a ser cada vez mais segura. Antes disso quase
ninguém vivia fora dos muros das cidades, pois bandos de soldados passavam de tem-
pos em tempos saqueando e queimando as terras inimigas e aconteciam batalhas
sangrentas o que mataria todos que vivessem nos campos e destruiria tudo que se
construiu e plantou. Ainda mais após a conquista de Siena por Florença em 1557 a
Toscana passou a ser um lugar pacífico onde não era mais necessário viver confinado
dentro dos muros das cidades. Assim, em muitas cidades as muralhas foram
desmanchadas e os seus tijolos vendidos como material de construção barato.
28
A Cerbaie já havia sido habitada na Idade Média. Mas após a terrível peste negra de
1348 a região se despovoou quase que por completo. E como a partir de 1450 houve
um forte crescimento populacional, as cidades passaram a ficar apertadas demais para
tanta gente. Em Fucecchio, por exemplo, a população, que em 1427 era de 858
habitantes, mais que dobrou até 1552, incluindo 1958 almas; o aumento demográfico
foi semelhante em Santa Croce (de 536 para 1214 almas) e em Castelfranco (de 351
para 910) no mesmo período.
Assim cidadãos de cidades próximas como Santa Croce, Castelfranco e Santa Maria a
Monte passaram a se dirigir para as áreas livres dos bosques da Cerbaia e a derrubar as
matas para formar lavouras e campos. Por volta de 1540 já havia lá algumas casas, ou
melhor, cabanas dos novos colonos, espalhadas em intervalos regulares. A distribuição
de terras para as famílias das cidades vizinhas com o objetivo de assentamento pode
ser vista ainda hoje no traçado das aldeias de Orentano, Galleno e Staffoli. Essas aldeias
não têm um centro antigo medieval,
como as antigas cidades da região, mas
os povoados e casas formam uma
espécie de rede urbana uniforme na
paisagem. As propriedades agrícolas
antigas têm quase sempre uma área que
corresponde a cerca de 5 ou 10 hectares,
ou seja, a área de terra que foi arrendada
aos colonos na época, como é o caso dos
nossos Pacini em 1543.
29
Vista da região do Arno na Toscana em San Miniato, a cidade de origem dos Buonaparte.
Depois que Iacopo Pacini e sua familia deixaram Castelfranco passando por volta de
1550 para a sua terra arrendada em Staffoli, existe uma lacuna na história da familia. O
contrato de arrendamento do arquivo histórico de Santa Croce Sull´Arno de 1543 será
por décadas o último documento onde a familia foi mencionada. Os livros mais antigos
das igrejas de Staffoli e da Pianora se perderam e o arquivo municipal de Santa Croce
não nos fornece mais informações até que finalmente surgem vários casamentos de
Pacini em Santa Croce e Santa Maria a Monte na década de 1630 e uma contagem das
familias de Santa Croce do ano de 1640 para fins da distribuição de sal onde aparece
um senhor chamado Novello Pacini vivendo no piano (planície) de Santa Croce. A
partir deste Novello Pacini (hexavô de Giovanni Battista Novelli 6ª geração de avó),
que deve ter nascido por volta de 1570, podemos reconstruir a nossa história familiar
sem lacunas e sem dúvida alguma, nos baseando nos registros paroquiais das cidades
de Santa Croce, Santa Maria a Monte, Calcinaia e Bientina.
O brasão dos
Novelli sobre um
portal em uma
casa de Castel-
franco di Sotto.
30
Lista de distribuição de sal de Santa Croce de 1640. A seta branca indica o nome de Novello Pacini
que nesta época vivia
Vista da Fortezza di Pozzo em direção ao Piano de Castelfranco e Santa Croce, onde os Pacini
viveram no início do século XVII
31
O nome Iacopo entre os Pacini: Batismo de Agniolo de Jacopo Pacini em Santa Maria a Monte em
1686. Note-se que neste registro se riscou o sobrenome original para escrever o sobrenome
novo por cima, o que ocorreu com toda nossa familia.
Próxima página acima: O nome Piero entre nossos Pacini: Batismo de Domenica, uma filha de Piero
de Gio Batta (Giovanni Battista) Pacini em Santa Maria a Monte em 1686
32
Outro indício é que os nossos Pacini aparecem na década de 1630 já em grande
número e morando ao mesmo tempo na Pianore, na Fattoria dos Medici e em San-
ta Croce. Novello Pacini tinha 4 ou 5 filhos já adultos na década de 1630-1640. E
em nenhum registro aparece a informação de que eles vieram de outro lugar, o
que era praxe nos registros paroquiais. O padre teria anotado isso, principalmente
se viessem de outro bispado como das cidades de Calcinaia e Bientina (bispado de
Pisa) ou de Altopascio ou Montecarlo (bispado de Lucca). Santa Croce, assim como
Castelfranco fazem parte do pequeno bispado de San Miniato. Assim, a omissão de
um lugar de origem externo nos registros paroquiais de Santa Maria a Monte e
Santa Croce pode ser visto como uma pista de que eles eram dalí mesmo, pois
Staffoli é um distrito de Santa Croce. E a Pianora dista apenas 2 ou 3 quilômetros
de Staffoli.
33
desde a Idade Média, sendo que nossos
ancestrais são da familia Pacini. Por mais
confuso isso seja, temos que distinguir
essas duas familias em Castelfranco sem
cair na tentação de pensar que quando
aparece um Novelli nos registros, se trate
de nossa familia. Eu tenho uma teoria, que
Novello
em nossa familia e que ao mesmo tempo
fundamenta a proveniência de nossos
Pacini dos Pacini de Castelfranco: Eu
suponho que a mãe ou a avó de Novello
Pacini era dessa familia Novelli de
Castelfranco. E essa hipotética Signora No-
velli deu o nome tradicional de sua familia
ao filho. Como não havia outra familia No-
velli nas redondezas e menos ainda outra
familia que desse esse nome muito raro ao
seus membros, acredito que essa teoria seja
quase irrefutável. É por isso que eu também
considero os Novelli de Castelfranco como
nossos prováveis ancestrais.
Eu não quero detalhar demais esse assunto, mas acho importante deixar isso
registrado aqui na crônica da familia Novelli, para fins de esclarecimento e
transparência e também para que o leitor interessado possa ver onde há certeza e
onde há um resto de insegurança na nossa história familiar. Isso demostra ao
mesmo tempo com quais problemas temos que lidar na pesquisa genealógica de
um período tão longínquo e com tamanhas lacunas nas fontes de pesquisa.
34
Gravura acima: Ilustração de Santa Croce na época na qual ainda tinha sua muralha.
NOVELLO PACINI
35
soa que vai dar o novo sobrenome à familia, que algumas décadas mais tarde
passará a se chamar Novelli. Novello viveu e trabalhou por volta de 1630 num
quer dizer na planície, de Santa
Croce sull´Arno, cidade vizinha e irmã de Castelfranco. Infelizmente temos poucos
documentos sobre a familia nessa fase. Na lista de distribuição de sal de Santa
Croce de 1640 Novello aparece como chefe de uma casa onde viviam seis pessoas
(6 = bocas, a medida para a quantidade de sal que iria receber). O sal era
um produto muito importante e valioso na época. Como não se tinha técnicas
avançadas de armazenar os alimentos perecíveis, usava-se muito salgar os
alimentos. E o estado da Toscana e suas comunas detinham o monopólio do sal e
registravam minunciosamente a sua distribuição na população. Essas listas de
distribuição do sal são muito valiosas para a pesquisa genealógica.
Diferentemente de
Castelfranco, a ci-
dade de Santa Cro-
ce está localizada
diretamente na
margem do rio
Arno e possui até
algumas terras no
outro lado do rio.
Como Castelfranco,
a soberania de San-
Santa Croce
36 hoje (acima) e
antigamente
(ao lado).
ta Croce passou de Lucca para Florença em 1331, após a destruição de Santa Maria
a Monte numa guerra terrível. Essas cidades eram originalmente todas de Lucca,
mas após Florença cercar, invadir e arrasar a cidade de Santa Maria a Monte em
1327, as cidades lucanas vizinhas decidiram se entregar para Florença
voluntáriamente. É por isso que nossos ancestrais de Santa Maria a Monte,
Castelfranco e Santa Croce já eram florentinos antes dos nossos ancestrais de
Calcinaia e Bientina, que continuaram a pertencer a Pisa por pelo menos mais um
século.
Imagem acima: Santa Croce e seus arredores por volta de 1300. A planície acima de
No fundo à esquerda vemoss Staffoli.
Na página ao lado: Santa Croce atual vista de cima. Quase nâo se vê mais a divisa
37
entre ela e a vizinha Castelfranco.
Os habitantes da área de Santa Croce parecem ter vindo originalmente do Vale do
Rio Elsa ao norte, que fugiram para cá antes do ano 1000 devido aos ataques dos
Godos e dos Langobardos. A cidade de Santa Croce foi fundada por Lucca do
mesmo modo que Castelfranco por volta de 1250 unindo 4 aldeias que existiram
aqui na alta Idade Média para protegê-las dos ataques de seus inimigos Pisa e
Florença. Essas aldeias foram San Vito, e San Donato. A
santa da cidade é a Santa Cristiana, que se chamava (1237-
1310) da família Menabuoi, que também pode ser encontrada nos registros mais
antigos de Castelfranco. Oringa adotou o nome de Cristiana homenageando o
nome de sua cidade natal. Hoje Santa Croce é referência nacional na industria de
couro e seus curtumes são famosos.
Pode ser que Novello Pacini veio para a planície de Santa Croce logo após a peste
de 1631-1632. Pode ser que uma propriedade agrícola tenha ficado vaga após a
morte dos camponeses que nela viviam, assim ele e sua familia puderam se
estabelecer aqui. Aqui no piano de Santa Croce, que ficava nos campos entre a
cidade de Santa Croce e o rio Usciana, a terra era mais fértil do que em Staffoli, o
que rendia melhores colheitas. E logo foram encontrados aqui cônjuges para dois
de seus filhos. Em 29 de maio de 1639 a filha Caterina di Novello Pacini se casou
com Paolo, filho de Rinaldo di Stefano Donati, de Santa Croce sull´Arno.
Casamento de Giovanni Battista Pacini com Christiana Donati em 14 de junho de 1639, Santa Croce
38
GIOVANNI BATTISTA PACINI
39
Acima: A linda mansâo da Pianora hoje.
Ela foi projetada como casa de caca dos Duques da Toscana.
Os PACINI na Pianora
Como vimos, alguns filhos de Novello passaram a viver por volta de 1635 em uma
, uma fazenda da nobre e famosa familia Medici no municipio de Santa
Maria a Monte. Essa fattoria se chama Pianora e fica dentro da floresta Cerbaia e
existe ainda hoje. Eles certamente eram = meieiros dos Medici, algo
u-
rante séculos na Italia setentrional: os nobres detinham a terra e os camponeses
cultivavam-na dividindo os lucros com o proprietário que geralmente vivia em
palácios em uma grande cidade como Pisa ou Florença.
40
Como as guerras
entre as cidades-
Estado haviam
diminuido depois
da conquista de
Pisa por Florença
em 1509, as terras
desabitadas da
Cerbaia passaram
a ser interessantes
para a agricultura
e colonização. Em
1592, a comuna A pequena igeja de Santa Cristina na Pianora.
de Santa Maria a
Monte arrendou
um grande pedaço de floresta na Pianora e partes de Cerreti, a cerca de 6 a 7
quilômetros ao norte da cidade, ao Grão-Duque da Toscana Ferdinando I Medici e
sua esposa Cristina de Lorena. A Grã-duquesa Cristina era a legítima arrendatária,
mas as terras pertenciam praticamente aos Medici de Florença.
Casamento de
Andrea di Novello
Pacini (entâo já
viúvo de Hortentia
del Rosso) com
Ippolita di Matteo
em Santa Maria a
Monte em 1645.
43
A vida na Cerbaia
Os Medici construíram um belo palácio para eles, que eles usavam como casa de
caça. E a Grã-duquesa Cristina, de acordo com sua consciência cristã, construiu
uma pequena igreja em frente à sua mansão, sobre as ruínas da antiga igreja
medieval de S. Maria di Moriglioni. Mas a qual santo deveria ser dedicada a nova
igreja? Não deve ter sido por acaso que foi escolhida a Santa Cristina, homônima
da duquesa. A consagração foi celebrada em 10 de maio de 1596. Infelizmente,
todos os documentos desta pequena
igreja, que ainda existe hoje, foram
perdidos na segunda Guerra Mundial,
o que significa uma perda séria para
a pesquisa da nossa família.
Placa comemorativa da
inauguração da Igreja da
Pianore de 1596.
44
Apesar da limpeza, das novas casas dos camponeses, dos campos, da igreja e das
ruas recém-criadas, a área deve ter sido algo selvagem e original. A maior parte da
região certamente ainda era floresta e pouco povoada. Amplos bosques de
castanheiros e carvalhos cobriam a planície, que passava a oeste e leste aos
pântanos e aos lagos e chegava ao
norte até a distante aldeia de
Orentano e Altopascio.
A estrada principal da
Pianora com os típicos 45
ciprestes toscanos.
casas dos sítios à beira da planície de Bientina, elevando-se sobre as vinhas e olivais de
colina a essa casas parecem seres misteriosos que vivem lá e é impossível se
aproximar delas. As casas são muito distantes e as pessoas só se reúnem na igreja aos
domingos, durante a semana há um grande silêncio, uma calma solene que só é
interrompida pela voz de um
camponês que tira as castanhas e
bolotas da floresta, o som sobe
alto e bruscamente no céu como
mágica. Se pode dizer que se
ouve o trigo quando ele
.
Neste capítulo sobre a história dos Novelli vamos tratar da segunda metade do
século XVII, época na qual Giovanni Battista Pacini e seu filho Stefano Pacini
viveram em Santa Maria a Monte. Não podemos dizer com exatidão onde
exatamente Stefano viveu durante
certo tempo e onde se casou, mas
certamente passou a maior parte de
sua vida dentro do território de San-
ta Maria a Monte. Seu pai Giovanni
Battista Pacini ainda estava vivendo
na Pianora e Stefano pode também
ter vivido lá. Foi durante sua vida
que o nome de nossa familia passou
de Pacini para Novelli. A familia foi
aumentando e se difundindo em
Santa Maria a Monte, essa
importante cidade ancestral nossa,
da qual trataremos no próximo
episódio mais detalhadamente.
47
Campos de trigo com a cidade de
Santa Maria a Monte ao fundo.
Nosso ancestral Stefano Pacini nasceu em 28 de dezembro de 1646 e foi o quarto
filho de Giovanni Battista Pacini. Mas, em vez da Christiana Donati, o padre de San-
ta Maria a Monte registrou Caterina como
mãe no registro batismal. Eu tenho certeza
que isso foi um erro. É provável que o pastor
tenha confundido o nome Christiana com
Caterina, pois é possível que o batismo de
Stefano só tenha sido anotado
posteriormente. O registro foi escrito no
rodapé inferior da página, e quem sabe,
talvez dias ou semanas após o batismo. Com
a exceção desse registro, o nome
nunca mais aparece nos registros, assim
podemos ter certeza que o padre tinha
memória curta e se enganou.
Piero pode ter recebido seu nome em homenagem ao bisavô Piero Pacini. A família
cresceu, e isso não era incomum para a época. Naquela época, uma mulher
costumava ter um filho a cada dois anos e meio e mesmo com uma mortalidade
infantil muito alta, as famílias tinham uma média de 4 a 5 filhos. Após o acentuado
declínio da população devido à peste de 1630-40, ela passou a aumentar
novamente. Santa Maria a Monte voltara a ter entre 1000 e 1500 habitantes.
Outro fator que fez a população crescer acentuadamente nessa época foram as
muitas pessoas de fora que se mudaram para Santa Maria a Monte, provavelmente
para viver e trabalhar nos novos sítios que iam surgindo nos distritos de Pozzo,
Tavolaia, Cerretti, Pianora e Colombaia. Os registros de casamento desta época
costumam mencionar cônjuges das cidades vizinhas que se casaram com pessoas
de Santa Maria a Monte. Quase todo quarto casamento tem um parceiro de fora.
Comparado com Bientina, onde os pescadores quase só se casavam entre si, o
número de novos residentes de Santa Maria é enorme.
Imagem acima: O
casamento de Giovanni
Pacini com Domenica
Perondi (1649)
Ao lado: A cidade de
Santa Maria a Monte
com sua forma circular
em cima do cume de um
morro.
49
Lukas, Raphael e Aurora nas ruelas
de Santa Maria a Monte.
Talvez o jovem Stefano Pacini tenha trabalhado fora por um certo tempo em um
sítio nas vizinhanças de Santa Maria a Monte. Lá, por volta dos vinte anos, ele
provavelmente conheceu e se casou com sua futura esposa Maria, filha de Giuliano
Mei. A família Mei não é de Santa Maria a Monte, pode ter vindo de Cappannori, na
província de Lucca, ou de Buggiano, na província de Pistoia, cerca de 10 a 30 km ao
norte de Pianora, onde encontramos o sobrenome Mei. Em 1669, Stefano, já casado
com Maria Mei, volta a Santa Maria a Monte, onde seus filhos nasceriam. Maria por
volta de 1670, Andrea em 02.03.1671, Michele em 29.09.1673, Giovanni em
19.09.1675, Christiana em 27.06.1678, Cammilla em 30.12.1680, Giuliano em
22.01.1682 e nosso antepassado Giovanni Battista em 15.01.1684 todos batizados
na igreja de Santa Maria a Monte.
51
O jovem Stefano provavelmente se tornou
meieiro como seu pai e, antes dele, seu avô e
cultivou a terra com grande dedicação para
alimentar sua família. Maria cuidava das
crianças, da casa e da horta e ajudava Stefano
o quanto podia. Stefano deve ter notado ao
longo dos anos que sua renda da colheita e da
venda dos animais tinha cada vez menos valor.
Ele e os outros agricultores apenas
gradualmente perceberam que a Toscana
estava entrando em uma longa crise que
perduraria por muito anos.
A Itália em crise
52
A galeria degli Uffizzi em Florença nos anos 1700
A Toscana tornou-se política e militarmente cada vez mais dependente das gran-
des potências, principalmente da França e da Espanha, e estava cada vez mais sob
a influência da Igreja. Para satisfazer o clero, a igreja exigia tributos cada vez mais
altos e o próprio estado aumentou muito os impostos, que uma população cada
vez mais pobre dificilmente conseguia suportar. Além disso, os oficiais do estado e
o clero superior eram quase sem exceção filhos das famílias nobres decadentes e
estavam mais interessados em seu próprio enriquecimento e em satisfazer suas
necessidades de luxo do que em uma boa administração. Teremos esse quadro
básico de pobreza do povo na Itália até o início do século XX, já na era da
imigração em massa para as Americas. Ocasionalmente houveram tempos menos
ruins, como os anos entre 1730 e 1760, ou entre 1820 e 1850, mas a vida
geralmente permaneceu difícil para as pessoas comuns durante vários séculos.
53
Acima: Batismo de Giovanni de Stefano Pacini / Novelli de 1675
Detalhe do registro de batismo acima de Giovanni de 1675, onde o sobrenome original PACINI foi
riscado e o novo sobrenome NOVELLI foi escrito por cima
Essa mudança também pode ser visto nos registros de seus sobrinhos e primos.
Toda a família mudou seu sobrenome por volta de 1680. O filho mais novo de Ste-
fano, nosso ancestral direto Giovanni Battista, já foi oficialmente chamado de No-
velli quando foi batizado em 15 de janeiro de 1684. Desde então, nossa família se
chama Novelli, graças ao nono Novello Pacini, um ancestral que viveu cerca de 400
anos atrás.
Registro de batismo de Serafino de 1687, filho de Maria Mei com pai desconhecido. E logo abaixo dele o
batismo de Stefano di Piero Pacini. Livro paroquial de Santa Maria a Monte.
55
O Mastio de Bientina com a
Piazzeta del´Angiolo
(A pracinha do anjinho).
O fato do filho Michele Novelli (nascido em 1673) aparecer em um Stato delle Anime de
Bientina de 1701 como ajudante no podere do Puntone pertencente a um Signore del
Grande, indica que o trabalho pode não ter sido suficiente para todos na família
numerosa. Os Stati delle Anime m registros
compilados pelos padres na época da Páscoa e eram uma espécie de lista de todos os
fregueses da paróquia, com atenção especial às crianças e jovens, para que eles
recebessem a confirmação no tempo certo. Esses livros são uma bênção para o
pesquisador da família, se ainda estiverem intactos.
O sítio Puntone ficava a apenas algumas centenas de metros da Pianore. Pode ser que
Maria Mei o tenha deixado como
trabalhador do rico senhor del Gran-
de para que ele pelo menos tivesse
uma renda estável. Michele se casou
com Caterina Guarini em Bientina
em 13 de janeiro de 1704. Ele parece
ter tido apenas um filho, também
batizado de Michele, que por sua vez
deixou descendência em Bientina.
Pode ser que esse ramo familiar em
Bientina também tenha sido um
auxílio adicional para a posterior
mudança dos nossos Novelli para
Bientina.
Infelizmente, o filho de Michele Junior, Giovanni Novelli, morreu muito jovem e este
ramo da família empobreceu. Naquela época, uma família passava rapidamente
necessidades sem um pai saudável que trabalhasse. Em 1740, encontramos essa familia
de aluguel em uma casa em Bientina. E por volta de 1750, o já idoso Michele Júnior
morava com a nora e os netos no spitale de Bientina, que servia de asilo para pobres.
Talvez ele tenha tido contato com seu tio Giovanni Battista, de Santa Maria a Monte,
que mais tarde moraria em Bientina por um certo tempo. Sobre ele leremos mais para
frente. Antes vamos ler um pouco sobre a história da cidade de Santa Maria a Monte.
57
Santa Maria a Monte em uma pintura de ca. 1750, época em que nossos ancestrais ainda viviam lá
Santa Maria a Monte, dista apenas poucos quilômetros a oeste das vizinhas
Calcinaia e Bientina, e a leste de Castelfranco e fica localizada sobre uma colina da
Cerbaie, o que lhe oferece ao sul uma vista aberta para o vale do Arno, que corre
pela planície a cerca de 2 km da cidade. Entre o Arno e Santa Maria, corre a
Usciana, um pequeno riacho que vem do Lago di Fucecchio mais a leste e deságua
no Arno em frente a Montecalvoli, a oeste. Montecalvoli é uma cidade pequenina
sobre a última colina da Cerbaia e esteve historicamente sempre muito ligada a
Santa Maria a Monte.
58
Imagem acima: Antiga gravura de Santa Maria a Monte vista da ponte sobre o rio Usciana por volta
de 1750. E abaixo: Uma pintura da igreja de Santa Maria a Monte de 1700 com a crucificação de
Jesus, na qual podemos ver a paisagem de Santa Maria a Monte naquela época.
Por volta de 800 dC, no momento em que os vikings e húngaros ainda ameaçavam
nossa região, Santa Maria a Monte ainda devia parecer uma vila com pequenas casas
rudimentares ao redor de uma igreja românica (uma das primeiras igrejas cristâs de
nossa região ancestral, datada de ca. 400 dC). Essa igreja se parecia mais com um
castelo do que com um templo. Ao redor das casas e da igreja, os habitantes haviam
construído uma paliçada de proteção
feita de troncos de madeira e ao redor
dela, cavado uma vala. Naquela época,
a área ainda pertencia formalmente ao
bispo de Lucca. Por volta de 1000 dC.,
mesmo sem terem recebido uma
permissão oficial do soberano, os
habitantes de Santa Maria a Monte
construíram um primeiro muro de
pedras ao redor de sua igreja. Dessa
primeira construção, surgiu uma
espécie de forte no topo da colina da
cidade. Em caso de guerra, os
habitantes da vila buscavam proteção
nesta fortaleza.
59
Imagem acima: a antiquíssima cidade de Lucca.
Em 941, Santa Maria a Monte era subordinada à Igreja de Lucca, mas já em 1001 a
cidade se emancipou e passou a pagar apenas uma tributo anual a Lucca. Em 1101,
o bispo de Lucca comprou todas as cidades da região, incluindo Santa Maria a
Monte. A partir de então, a pressão dos soberanos sobre seus súditos aumentou.
Talvez isso esteja relacionado ao maior crescimento populacional e à pressão resul-
tante da rivalidade entre as cidades-república Pisa e Lucca. Houve uma crescente
concorrência de cidades-estados e soberanos por receitas alfandegárias e
tributárias e por recursos materiais.
Imagem na página ao lado, acima: Localização de Santa Maria a Monte e Bientina em azul junto ao
Arno em um mapa antigo (ca. 1500). Em vermelho as cidades-Estado Lucca, Pisa e Florença.
60
Devido à sua localização estratégica, a colina foi fortificada por volta de 1252, para
se tornar um dos mais importantes castelos (rocca) do vale de Arno e teve grande
importância militar. Os pisanos conquistaram a fortaleza em 1261, mas só
conseguiram segurá-la por um curto período de tempo. Ela voltou para Lucca,
cujas forças eram lideradas pelo famoso general Castruccio Castracani.
Em 1327, Santa Maria a Monte caiu em uma guerra contra Florença que havia
mandado um exercito de 16.000 homens para conquistar a cidade, na época algo
incrível. Eles botaram fogo na cidade e usaram as mulheres que haviam sido presas
como reféns. A antiga fortaleza foi quase que completamente destruída e grande
parte dos habitantes
morreu nesta guerra. Por
volta de meados do século
XIV, os florentinos
reconstruíram a cidade
com três anéis de
muralhas ainda hoje
reconhecíveis e usaram a
fortaleza como ponto de
partida para conquistar
todo o vale do baixo Arno
no século XV.
62
Assim, Florença estava totalmente ocupada com os assuntos internos da cidade e
não conseguiu recuperar a rebelde Santa Maria a Monte. Mas a vitória de Santa
Maria a Monte foi uma liberdade temporária que só durou seis anos.
As galerias da rede de
corredores subterrâneos
medievais de Santa Maria a
Monte, que eram utilizadas como
Rainerem
refúgio emcaso
2012deno arquivo
guerra. Atrás
daparoquial da cidade
biblioteca atual de
da comuna
pode-se ver também um tanque
onde a água pluvial é
armazenada para servir no
abastecimento durante um63 cerco.
Santa Maria a Monte com o livro mais antigo de casamentos de ca. 1540. Este livro é especial, pois
nele quase nâo aparecem sobrenomes, fazendo a pesquisa se igualar a um jogo de Sudoku.
64
Registro de batismo de Giovanni Battista Novelli de 1684 Santa Maria a Monte. No registro está
65
Dois Novelli
sentados
sobre a
antiga fonte
de Bientina
do século
XVIII
Cosimo III de
Medici
66
Imagem acima: Durante muito tempo o trigo foi o cereal mais importante na Italia. Isso começou a
se mudar a partir de 1700, quando o milho que provém das Américas passou a ser o grão mais
cultivado e consumido pelos italianos
Imagem abaixo: O casamento de Gio Batta Novelli com Cammilla Isolani em 1711
67
1702 em Santa Maria a Monte com Maria Maddalena Pierucci e finalmente nosso
antepassado Giovanni Battista se casou em 26 de outubro de 1711 também em
Santa Maria com Cammilla Angiola Isolani. No registro de seu casamento, está
escrito que ele veio da paróquia de Bientina, onde estava vivendo com o irmão.
Como dote para o casamento, Cammilla trouxe um pedaço de terra cerca de 1,5
hectares na área chamada . No entanto, eles viviam sob
condições difíceis. Em uma lista de distribuição de sal de Santa Maria a Monte, de
1720, eles são contados entre os , ou seja, entre os pobres da
comunidade. Outros parentes da cidade estavam em melhor situação, como os
numerosos descendentes de Agniolo Pacini, especialmente Bastiano e Iacopo No-
velli, que eram trabalhadores da rica família nobre Albizzi, para quem também os
descendentes de Salvestro Chiti, outro antepassado nosso, estavam trabalhando.
Abaixo: Os Novelli em uma lista de distribuição de sal de Sta Ma. a Monte de 1720.
68
Imagem acima: Sta. Maria a Monte. Ao
lado: Registro de óbito de Cammilla
Isolani de 1722.
69
Acima: A igreja de San Giovanni em Santa Maria a Monte. Nesta igreja há um porão onde há uma
porta secreta que leva às galerias subterrâneas da cidade.
Giovanni Battista se casou sem demora novamente no dia 29 de agosto de 1722, com
nossa antepassada Maria Antonia Puccini, de 26 anos, filha de Iacopo Puccini e Maria
Maddalena Rossi. Maria Antonia, nascida em 19 de setembro de 1695, também era de
Santa Maria a Monte, mas alguns de seus avós vieram de Castelfranco di Sotto, Santa
Registro de
casamento de
Giovanni
Battista No-
velli com
Maria Anto-
nia Puccini,
Santa Maria a
Monte, 1722
70
Jolanda Pfeiffer Novelli frente à cidade de
Santa Maria a Monte em 2012
71
ca.1731, Valentino ca.1733 e Diana 13.03.1735. Duas de suas filhas se casaram com
membros da família Isolani: Maria Angiola com Valentino Isolani e Maria Domenica
com Mattia Isolani.
Os tempos estavam ficando melhores para a população rural, mesmo que eles
ainda vivessem muito modestamente. A família de Gio Batta Novelli cresceu e eles
tinham trabalho. Por volta de 1730, Giovanni Battista trabalhou para um tal de
Zaccharia di Ippolito em Santa Maria a Monte. Agora ele não é mais contado entre
os pobres da comuna. Ele certamente era esforçado e pode sustentar sua crescente
família com seu trabalho. Em 16 de julho de 1743, Maria Caterina, uma sobrinha de
Giovanni Battista, filha de Giovanni, se casou em Bientina com Valentino Lotti.
Assim, além do irmão Michelle e
seu filho, outra conexão foi
estabelecida com Bientina. Por
volta de 1750, nosso Giovanni
Battista ficou sabendo da
possibilidade de assumir um sítio
em Bientina.
72
Localização do podere Bucaia em Quatro Strade entre Bientina e Santa Maria a Monte
Eles tocavam o sítio Bucaia de Gio Batta Pacchi, provavelmente como mezzadri
(meieiros). Esse sítio ficava a meio caminho entre Bientina e Santa Maria a Monte,
no que é agora o lugar
Quattro Strade (quatro
estradas). O sítio ainda
fazia parte da Cerbaia e
não ficava longe da
Pianore, aonde uma das
estradas levava rumo ao
norte. Mas já no início dos
anos 1760, eles já não
estavam morando mais lá.
74
Maria Antonia Puccini e seus três filhos já
adultos Valentino e Gaspero Gaetano e a
filha Diana cuidando das terras. Giovanni
foi enterrado em Santa Maria a Monte na
cripta da Compagnia della Santa Croce.
Até aquela época era costume de os
mortos serem sepultados debaixo do piso
das igrejas, o que acabou por ser proibido
por motivos de higiene. Eu gosto de
imaginar os rituais que os italianos
celebravam naquela época quando um
ente querido falecia. Um destes rituais era
a ceia fúnebre após o sepultamento. Nela
não se comia carne. Se bebia o forte
vinho tinto da região, mas só de copos de
cerâmica e só se brindava e falava das
coisas boas que o finado fez e de seu
lado bom. Eu imagino que muitas pessoas
vieram ao seu funeral e à sua ceia.
Acima: O interessante
púlpito medieval da igreja
de Santa Maria a Monte
75
Nossa família Novelli é
mencionada no stato delle
anime mais antigo do
município do ano 1767. Mas
agora havia apenas quatro
pessoas na familia: a viúva
Maria Antonia Puccini, os
filhos Valentino e Gaspero
Gaetano e a filha Diana
(todos entre 25 e 30 anos).
No stato delle anime, pode-
se ver clara-mente que
Gaspero, embora mais jovem
que Valentino, administrava
o sítio depois da morte do
pai. Os italianos levavam o
papel do capo di famiglia
(chefe da familia) a sério. Em
caso de inadimplência, a
familia toda arcava com as
consequências. Em caso de
um dos membros da familia
ter que pagar uma multa, a familia toda pagava. E somente o capo podia assinar
contratos e decidir sobre uma questão importante. Uma pessoa solteira só se tornava
independente, se fosse capo pu fizesse uma declaração notarial se separando de sua
familia, mesmo se vivesse em outra cidade.
Acima: Maria Antonia Puccini morreu em 10 de março de 1768 em Santa Maria a Monte
Abaixo: Nossa família Novelli no Stato delle Anime de Santa Maria a Monte de 1770
76
Acima: Afrescos da igreja de Santa Maria a Monte (pintados por volta de 1700)
Maria Antonia Puccini faleceu alguns anos mais tarde em 10 de março de 1768
também em Santa Maria a Monte com cerca de 75 anos. Essa mulher forte e seu
marido, que havia falecido sete anos antes, tiveram que lutar muito no decorrer de
suas vidas. Devemos a eles e à força de seus pais o fato de que a família superou
todas as crises de pobreza e da fome.
77
A localização do sítio Girella em Santa Maria
a Monte seta de cima.
Como vimos, nessa época entre 1670 e 1770 a familia mudou constantemente de
domicilio. Talvez eles estivessem sempre à procura de terras melhores, talvez por um
contrato de arrendamento e de meieiro melhor, e as mudanças constantes podem
sugerir que ainda não estavam satisfeitos. E além disso o século XVIII não foi fácil na
Toscana. Foi só com as reformas do grão-duque Pedro Leopoldo de Lorena que essa
situação começou a mudar no final do século XVIII.
O trajeto que os Pacini-Novelli fizeram na região do Basso Val dArno, começando em Castelfranco, indo para
Staffoli, depois para Santa Croce, depois para a Pianora, depois para Santa Maria a Monte e por final Calcinaia
78
Gaspero Gaetano Novelli no
i Ronchi em Calcinaia
Em 1770, nosso antepassado Gaspero Gaetano e e seu irmão mais velho Valentino
ainda estavam vivendo no sítio da Girella em Santa Maria a Monte onde eles eram
meieiros. Como eles tinham apenas alguns parentes próximos aqui, passaram a
pensar em voltar para Bientina, onde haviam vivido quando eram jovens e
conheciam muita gente e onde eles também tinham parentes e amigos. Por
exemplo, as irmãs
Maria Caterina e Diana
haviam se casado com
calcinaioli, com
moradores de Calci-
naia.
79
Santa Maria a Monte, onde os Novelli viveram por mais de 100 anos e de onde têm inúmeros
ancestrais. A torre da igreja era na Idade Média uma das torres da muralha da cidade, é por isso que
ela tem um aspecto bélico. O palácio ao lado esquerdo da igreja foi da família Maffei, uma das mais
importantes da cidade.
Mas Gaspero não queria continuar solteiro. Além disso os irmãos necessitavam de
uma mulher para os apoiar nas tarefas do dia a dia. Gaspero e Valentino
provavelmente eram amigos da família Luschi de Santa Maria a Monte. Uma filha
da familia, Diana Luschi, de 32 ou 33 anos de idade, ainda estava solteira e, assim,
os Novelli e os Luschi arranjaram um casamento. Por volta de 1772, Gaspero Gae-
tano casou-se com Diana Luschi. Mas infelizmente, não conseguimos encontrar o
registro deste casamento.
Os ancestrais de Diana Luschi, a grande maioria dos quais veio de Santa Maria a Monte
80
O casamento dos pais
de Diana Luschi
Francesco di Piero
Luschi e Maria Anto-
nia di Domenico
Giovannetti em 1738
em Santa Maria a
Monte
Diana Luschi nasceu em 2 de novembro de 1739 em Santa Maria a Monte, assim como
seu pai Gio Francesco em 19 de setembro de 1708 e sua mãe Maria Antonia Giovannetti
em 25 de março de 1709. Diana descendia de familias tradicionais de Santa Maria a
Monte. E a familia Luschi também tinha laços com Calcinaia. Diana tinha um parente,
talvez um tio, chamado Pier Domenico Lucchi (ambas as grafias Luschi e Lucchi eram
usadas na época) que deu uma dica ao novo casal Novelli. Ele havia sido meieiro de um
sítio em Calcinaia nos idos de 1750 e ouvira dizer que seus sucessores, a familia de
Francesco Pavolini, estava querendo deixar o sítio devido às fortes inundações que
haviam ocorrido em 1772.
Com vontade de viver próximo dos irmãos, tios e primos que estavam em Calcinaia e na
vizinha Bientina, os Novelli decidiram conversar com a proprietária do sítio, a senhora
Baglioni de Florença para ver se eles poderiam assumir o sítio. E felizmente tudo deu
certo, fizeram um acordo e entre o final de 1772 e o início de 1773 passaram para
Calcinaia iniciando uma nova e importante etapa na história da nossa familia Novelli.
81
A área do i Ronchi em Calcinaia com os Monti Pisani ao fundo.
Estrada rural
em Calcinaia
assim
podemos
imaginar a via
Marrucco no
verão
82
O lago di Bientina, hoje só visível
quando chove muito, pois foi
drenado a mais de 150 anos atrás
para dar lugar à campos e
pastagens.
Mapa de Bientina, Calcinaia e Vicopisano por volta de 1750. Os Medici possuíam grandes
propriedades na área. As áreas amarelas à esquerda pertenciam à Fattoria de Cascine di Bientina,
onde viviam nossos ancestrais da família Chiarini, e as áreas vermelhas pertenciam à Fattoria de
Vicopisano, ambas propriedade dos Medici. A terra de cor púrpura era a área da comune de
Bientina, a terra amarela à direita era de Calcinaia e a terra verde de Vicopisano. Na extrema
esquerda está o pântano de Bientina (Padule). A seta aponta para o posterior sítio dos Novelli no i
Ronchi (a partir de 1772).
83
Stato delle anime de Calcinaia de 1773
Gaspero Gaetano Novelli é mencionado pela primeira vez no Stato delle Anime de
Calcinaia da Páscoa de 1773, onde já estava tocando o podere della Signora
Baglioni aos 38 anos de idade com sua esposa Diana de 34 anos, e seu irmão Va-
lentino de 40 anos. Mais tarde, em 1788, a família Baglioni acabou vendendo suas
terras para uma família Vannucchi. No entanto, os Novelli permaneceram como
meieiros no local. Essa casa vai ser onde a familia passará a viver nos próximos 200
anos. Essa propriedade rural é denominada em certos mapas de
Calcinaia, o que mostra como a familia marcou esse local. Até hoje vivem
descendentes de Gaspero Gaetano e Diana Luschi no local. Aqui as terras eram
melhores que em Santa Maria a Monte o que motivou a familia a deixar as
frequentes mudanças de sítio para sítio e se erradicar definitivamente aqui. E a
partir de agora os tempos melhorariam para nossos ancestrais.
Antigo mapa de ca. 1880 com o antigo leito do Arno, onde está registrada a Casa Novelli
84
Ao lado: Uma das casas Novelli
no i Ronchi. E abaixo vista para
as Case Novelli na Via
Marrucco.
85
As Case Novelli e os Novelli no stato delle anime de Calcinaia de 1774
86
A planície de Bientina
em época de cheia.
Assim pode ter sido
quando os Novelli
foram para Calcinaia,
depois da grande
enchente de 1772
Os três passaram a
infância nos cam-
pos do i Ronchi. Giovanni e seu irmão, como era habitual na época, ajudavam os pais
nos trabalhos do campo. Provavelmente não frequentaram a escola ou talvez apenas
por um curto período de tempo, pois os filhos dos agricultores dificilmente
frequentavam a escola naquela época. Apesar de uma vida difícil, Giovanni deve ter
adorado viver lá, em meio a sua pequena família e junto com a comunidade dos
moradores sítios ao seu redor, entre eles a numerosa familia Morelli da Sardina, que
mais tarde vai ter um papel importante na nossa história.
Abaixo: Mapa de ca. 1700, extraído de um ainda mais antigo, provavelmente de 1450.
O Arno ainda tinha sua antiga curva entre Calcinaia (enquadrada em vermelho) e Bientina. A área
da casa dos Novelli está marcada com um ponto vermelho. Castelfranco e Santa Croce podem ser
vistos abaixo como castelos. Santa Maria a Monte demostra-se particularmente grande e fortificada
(Archivio di Stato di Lucca)
87
CALCINAIA e BIENTINA na idade média
As cidades de Bientina e Calcinaia estão localizadas dentro de uma pequena
planície que é delimitada a leste pelas colinas da Cerbaie e a oeste pelos Monti
Pisani. No norte, o grande Lago di Bientina, com seus pântanos, formava uma
fronteira natural com a República de Lucca e no sul, onde a planície se estende um
pouco além do rio Arno, havia outras pequenas cidades, que pertenciam a Pisa.
Bientina, Calcinaia e a cidade vizinha de Vicopisano estão tão próximas uma das
outras que até hoje um ditado local diz: ina e Vico, todos se
. Hoje é difícil diferenciá-las uma da outra, pois elas
cresceram juntas nesse meio tempo formando uma só malha urbana que faz parte
da região metropolitana de Pisa.
Apesar de termos dezenas de ancestrais de Bientina, o costume local de não se utilizar sobrenomes
mas só os patronímicos, dificulta extremamente a pesquisa. Abaixo: lista de habitantes de 1535.
88
À esquerda: Calcinaia às margens do Arno
hoje. Na parte plana superior à direita da
cidade podemos ver os campos do I Ronchi
89
Tentativa artistica de reconstruir como era o aspecto de Bientina na idade média
90
cidades de Bientina e Calcinaia, separando-as. Foi o famoso Leonardo da Vinci (que
nasceu na cidade próxima de Vinci) que recebeu a tarefa de planejar uma mudança
de seu curso para diminuir o perigo das frequentes inundações e para facilitar a
navegabilidade do rio que era uma verdadeira auto-estrada entre Florença e o
porto de Pisa no Mar Mediterrâneo. Centenas de pequenos navios de carga,
chamados navicelli, trafegavam todos os dias no rio para trazer e levar mercadorias
para a grande metrópole. Em 1503 Leonardo da Vinci fez um estudo para o
governo de Florença sobre a possibilidade de desviar o curso do rio Arno, o que foi
realizado algumas décadas depois por volta de 1560-1580. No rascunho acima de
Leonardo da Vinci vemos o rio Arno como era antes da mudança e as cidades de
Calcinaia e Bientina marcadas de vermelho.
91
Antiga imagem de
Vicopisano com o
Arno em primeiro
plano
Do outro lado do
Arno, a poucas
centenas de met-
ros de Calcinaia,
encontra-se o
antigo mosteiro
de Montecchio,
mencionado
como Villa di
Monticelo por volta de 800 dC. Naquela época, Montecchio era mais um castelo do
que um mosteiro. Abredita-se que a cristianização da população pagã original se
iniciou provavelmente por volta de 400 ou 500 dC partindo de Montecchio e da
primitiva igreja de Santa Maria a Monte, os primeiros templos da região.
Até a Idade Média, Calcinaia era chamada de Vico Vitri, que pode derivar Vico
Vecchio
vizinha de Vicopisano, fundada mais tarde. O nome Calcinaia, que aparece a partir
de 1074, vem das muitas oficinas de produção de calcário que existiram aqui na
idade média. Entre 1000 e 1200 o
nome Calcinaia substituiu o
antigo Vico Vitri. Naquela época,
Calcinaia, assim como Vicopisano
tinha grande importância
econômica para muitas famílias
patrícias pisanas (entre elas a
familia dos Upezzinghi, a mais
importante no local e da qual
ainda resta uma torre na cidade)
e era também um importante
posto militar e administrativo
para Pisa.
93
Uma trincheira foi escavada ao redor
da muralha da cidade, que foi
preenchida com a água que escoava
do lago de Bientina com o riacho
chamado Cilecchio. Só se podia entrar
na cidade transpondo a vala através de
uma das duas pontes levadiças das
portas da cidade. Um problema com
essa vala era que o esgoto da cidade
se acumulava ali durante os meses
secos do verão e a vala começava a
cheirar terrivelmente.
O Lago di Bentina, onde nossos ancestrais de Bientina foram pescadores por inúmeras gerações.
Hoje ele só é visivel quando chove muito inundando os campos.
94
De fato, Bientina teve que se defender várias vezes contra o avanço de inimigos, por ex.
em 1265 e 1275. Até mesmo contra o famoso Ugolino della Gherardesca, um poderoso
patrício pisano, que foi declarado traidor de Pisa por causa de seu tratado de paz com
Florença e Lucca após a batalha naval de Meloria. Ugolino lutou como um pária com
seus aliados contra seus próprios compatriotas pisanos, por quem ele havia sido traído
e aao mesmo tempo sido declarado traidor.
Naquela época, houve até mesmo uma batalha naval entre Pisa e Lucca dentro do lago
de Bientina, na qual Pisa saiu vitoriosa. Os navios de guerra pisanos incendiaram os
lucanos. A partir de então e até a
unificação da Itália em 1860, o lago
formou a fronteira com o território de
Lucca. Para comemorar essa batalha, os
bientinesi realizavam todos os anos uma
festa, no qual pequenos barcos
representando os de Lucca eram
queimados na Piazza del Angiolo. Este
festival não muito pacífico foi
posteriormente substituído no século
XVII pela festa de San Valentino.
95
As armas da nossa
família ancestral del
Rosso de Bientina..
96
De
fato,
algu
ns
dest
es
objet
os
viera
m à
luz
em
mea
dos do século XVI, quando as águas abaixaram durante uma das primeiras
tentativas modernas de drenar o lago (com a construção do primeiro canal
Serezza), outras peças foram encontradas no fundo do lago pelos pescadores que
as usavam para se orientar e as consideravam parte de um tecido urbano submerso
com muitas ruas, praças e edifícios.
O século XIV não foi um século bom para Calcinaia, Bientina e nossa terra ancestral
em geral. Em 1315-1317, o clima estava ruim em toda a Europa. As colheitas foram
desastrosas e uma fome terrível se espalhou. A Itália não foi tão afetada quanto o
norte da Europa, mas também aqui foram sentidos a falta de alimentos e os preços
extremamente altos dos alimentos. Em 1333, parte de Calcinaia (40 casas) foi
destruída por uma inundação devastadora do Arno. Essa inundação foi muito grave
em todo o vale do Arno, até
Florença foi fortemente
inundada. em Empoli, Santa
Croce e Castelfranco, as massas
de água destruíram muitas
casas e grande parte das
muralhas das cidades. As
frequentes inundações no rio
Arno e, especialmente, a
epidemia de peste negra de
1348, causaram um
encolhimento considerável da
população. Dos 900 habitantes
de Calcinaia, apenas 200
sobreviveram à peste.
Calcinaia
hoje.
97
A parte histórica da cidade de Calcinaia hoje
Foi para evitar essas inundações e escoar a água dos pântanos da região, que o
governo da Toscana mudou o curso do Arno entre Calcinaia e Bientina entre 1560
e 1580. Mas após essa modificação Calcinaia passou para a outra margem do rio
deixando assim de ter a posição comercial estratégica que tivera outrora, perden-
do-a para Pontedera que teve um avanço considerável a partir de então.
Nos séculos XIII e XIV, Bientina esteve alternadamente sob o domínio de Lucca e
Pisa, até que, em 1402, se submeteu ao domínio florentino. Teve que colaborar
com Florença no último cerco d guerra de Pi-
sa
soldados de infantaria espanhóis, mas estes foram afastados pelos defensores. O
Senado florentino, em homenagem à lealdade demonstrada, concedeu à Bientina
privilégios econô-
micos e fiscais, bem
como a alcunha
Bientina Fiorentina
Reconstrução do lago di
Bientina entre os estados
de Lucca e a Toscana
98
Giorgio Vasari: Afresco do cerco de Pisa por Florença em 1505. No início da guerra, em 1498, um
ancestral nosso, Gaspero di Michele Cavallini de Castelfranco foi para Firenze pedir mais
Uma imagem de
Siena medieval
99
Entre as três
cidades de Vico-
pisano, Calcinaia
e Bientina, é de
Bientina de onde
veio a maior
parte de nossos
ancestrais. Isso é
porque os No-
velli e os Morelli
se casaram com
mulheres de
Bientina tendo
assim muitos
ancestrais de lá. Era cômodo: as casas deles no i Ronchi e Sardina eram mais
próximas de Bientina do que de Calcinaia.
Abaixo: Mapa antigo retratando toda nosssa região ancestral no vale do Arno
100
Os campos de Bientina e Calcinaia
Como vimos, em fevereiro de 1774 nasceu o primeiro filho de Gaspero Gaetano Novelli
e Diana Luschi, que recebeu o nome do avô paterno: Giovanni Battista. Foi uma época
muito interessante. Em 1776 ocorreu a independência dos Estados Unidos, em 1783 os
irmãos Montgolfier decolaram com o seu balão iniciando uma grande nova era
tecnológica, em 1786 o Grão-Ducado da Toscana passa a ser o primeiro País do mundo
a abolir a tortura e a pena de morte e em 1789 a revolução francesa botou fogo na
França, e no mesmo ano a inconfidência mineira eclodiu no Brasil. A revolução francesa
ecoou muito na Toscana, mas ainda passariam alguns anos até que ela tivesse uma
repercussão efetiva
em nossa área.
A antiga igreja de
Calcinaia, que foi
substituida pela atual
101
A cidade de Bientina por volta de 1900
Giovanni se casou em Calcinaia em 1803 com Maria Diamante Chiarini (nascida por
volta de 1773), a filha do falecido Francesco Chiarini, de Bientina, e de Maria Teresa
Masoni, de Calcinaia. Os Chiarini foram meieiros em Bientina por várias gerações e
trabalhavam na fattoria do Grão-Duque da Toscana. Infelizmente não conseguimos
encontrar o registro do casamento nos livros da paróquia. Como a mãe de Giovanni,
Diana Luschi faleceu no mesmo ano do casamento, no dia 16 de Setembro de 1803, a
jovem Diamante teve que assumir os deveres na casa do sogro Gaspero (com 71 anos
na época), do marido Giovanni
(31 anos) e do cunhado Francesco
(27 anos). Era um pequeno grupo
de homens e alguém tinha que
cozinhar para eles, lavar e cuidar
da casa e da horta.
102
Casamento de camponeses italianos
por volta de 1850 quadro de
Angelo Inganni
époc
às vezes, também com o
notário para a casa da futura
esposa para discutir e
determinar os detalhes
financeiros do casamento.
Após negociar o dote e
elaborar o contrato de
casamento (geralmente notarial), são servidos refrescos e doces ou pão com queijo
junto com toda a família. Nenhum presente é feito aqui. Os camponeses costumam
servir o jantar ao invéz de um refresco, para o qual também são convidados outros
parentes do casal nupcial. Após a
refeição, o noivo entrega o anel de de
noivado à noiva.
103
A cidade de Vicopisano em pintura de Giorgio Vasari de ca. 1500, de onde vieram nossos ancestrais
da familia Buti
104
O mesmo ocorre na volta da igreja principalmente entre os mais jovens. Ao chegar ao
novo lar, a mãe do noivo ou outra pessoa importante vai até a noiva e a cumprimenta
com um avental estendido que prende à noiva. Ela dá um beijo na noiva e a abraça.
Então ela leva a noiva ao seu quarto. Lá, ela recebe os parentes e moradores da casa, que
rallegro
Agora vem a ceia, que é bancada
todos os parentes são convidados. Todo mundo está sentado à mesa, o novo casal no
início e em ordem de importância até os parentes distantes. Após a sobremesa, os
convidados dão os presentes à noiva. À noite, há um bolo e um jantar, para os quais
também são convidados amigos e vizinhos.
105
Imagem acima: Morte de Diana Luschi em 16 de setembro de 1803, Igreja Paroquial de Calcinaia.
Imagem do meio: A família Novelli no Stato delle Anime de Calcinaia de 1804. Diana já não aparece
mais, pois falecera e Diamante del fu (falecido) Francesco Chiarini aparece pela primeira vez como
esposa de Gio Batta.
106
Acima: Imagem histórica de uma
enchente do Arno em Florença.
A inundação de 1798
107
Os moradores de
Bientina e Calcinaia
haviam construído
diques nas margens
desses canais após
as últimas
inundações e
prestavam muita
atenção à suas
condições. No início
de novembro de
1798, as águas
do Serchio, no estado vizinho de Lucca, subiram tanto que foi declarada
emergência em Bientina e Calcinaia e os moradores tiveram que monitorar as bar-
ragens dia e noite. O pai Gaspero e o filho Giovanni certamente participaram
dessas missões que também eram escaladas com os colonos que moravam nas
proximidades.
Para se ter uma idéia de como a área de Calcinaia e Bientina estava sob perigo de ser inundada,
podemos ver neste mapa de 1750 os pintados de amarelo em
comparaçâo aos terrenos que podem ser cultivados (terreni lavorativi). Os i Ronchi ficavam nesta
restrita área cultivável entre Bientina e Calcinaia.
108
Pessoas sendo resgatadas por helicóptero durante a enchente de 1966 no vale do Arno
em uma foto publicada em um jornal italiano.
A situação permaneceu tensa por mais 15 dias, até que as barragens, enfraquecidas
pela água, começaram a ceder na manhã de 24 de novembro. A situação foi
dramática. As pessoas deixaram desesperadamente as áreas da planície. A água se
espalhou pelos campos com muita força e no dia seguinte, quinta-feira, a planície
de Calcinaia, Vicopisano e Bientina estava totalmente submersa. As inundações
chegaram às margens do Arno. A área entre o lago e o Arno tinha 17,5 km de
Piaz-
za de Bientina, a profundidade da água chegou a 1,70 metros no ponto mais
profundo. Na estrada para Vicopisano, muito perto do sítio dos Novelli, a
profundidade era de 1,40 metros. Apesar das perdas, nossos Novelli sobreviveram.
O governo os apoiou um pouco, mas certamente só tanto que pelo menos eles
não podiam morrer de fome.
109
Temos difíceis na virada do
século
Os colonos não estavam em uma situação muito melhor. O mau tempo, as más
colheitas, o caos político, as inundações e os preços dos alimentos dificultavam sua
subsistência. Além disso, o meio de trabalho mudou em muitas propriedades.
Muitos mezzadri (meieiros) receberam a oferta para arrendar a terra a preços fixos.
Foi tentador, mas também muito arriscado.
Embora muitos pudessem finalmente se tornar seu próprio chefe, embolsar seu
próprio lucro e avançar economicamente, havia também o risco de ficar pobre e de
ir à falência em tempos de crise devido à dificuldade em pagar o arrendamento. A
Livello
(arrendamento) desde o início da década de 1780, enquanto os Novelli
permaneceram inicialmente como meieiros.
110
Annibale Carracci
A situação econômica
permaneceu ruim nos
primeiros anos do
século XIX. O padre
de Calcinaia contava
56 pessoas em
extrema pobreza e
137 pessoas em
sérias dificuldades em
sua paróquia por
volta de 1800. Muitos
pais de familia se
tornaram ladrões
porque não sabiam mais como alimentar seus filhos. Em Bientina, o pastor contou
50 pessoas que não puderam trabalhar devido a doenças e idade e não eram
capazes de sobreviver por conta própria, na época cerca de 3% de todos os resi-
dentes. Outras 40 famílias viviam no nível de subsistência e 250 eram pescadores
pobres, incapazes de obter uma renda regular. Juntos, essa já era a maioria da
população de Bientina.
Em 1800, foi relatado que pelo menos 50 artesãos e trabalhadores rurais da vizinha
Fornacette estavam morrendo de fome porque não tinham trabalho. Diz-se que um
pai de sete filhos teve que passar o inverno inteiro só com legumes cozidos, sem
pão nem temperos, para alimentar sua família.
A Via Marrucco com as Case Novelli vistas do sul.
111
A cidade de San Miniato, que dista poucos quilômetros de nossa região ancestral, daqui veio
provavelmente nossa familia ancestral Barzacchi (que passou mais tarde para Santa Maria a Monte)
e também (imagem abaixo).
112
No stato delle anime de Calcinaia de 1811 já aparece nosso ancestral
Gaspero Valentino, nascido em 1810.
No início do século 19, muitos pequenos agricultores tiveram que vender suas
terras por causa de dificuldades financeiras. Muitos se
mudaram para procurar trabalho. Neste momento, no
entanto, também estamos vendo uma melhoria na
situação econômica da Novelli. Pode ser que nossa
família tenha conseguido aumentar seus bens apesar
da crise e sair mais forte dela. Por volta de 1815,
suspeito de uma maior consolidação da situação
econômica da família.
113
A inundação de 1811
Imagem da planície
do vale do Arno
alagada durante a
enchente de 1966.
114
Pintura alegórica retratando a
revolução francesa.
propriedade onde já estava vivendo e trabalhando faz 40 anos. Isso foi possivel,
pois nessa época o governo subordinado à Napoleão mudou muito o sistema
economico e administrativo da Toscana, o que possibilitou muitos camponeses de
se tornarem proprietários.
Os Novelli no Stato delle Anime de Calcinaia de 1804, Gaspero foi riscado, pois havia falecido
115
Localização das casas dos Novelli (Case Novelli) na Via Marrucco
O sítio dos Novelli estava sendo dirigido por Francesco, o irmão mais novo de
nosso ancestral Giovanni Battista. Não sabemos por que. Apesar dele não ter se
casado e ser mais novo que Giovanni, era ele o chefe da familia. Pode ser que ele
tenha sido mais capaz ou tenha gozado de saúde melhor. Mas mesmo assim a
familia manteve-se unida e eu creio que os irmãos se davam muito bem.
.Podemos ser muito críticos em relação à sede de poder de Napoleão, mas ele fez
muito bem para a Europa e
para o mundo quanto à sua
política interna, sua visão
crítica do papel da igreja na
política, seus ideiais
revolucionários em que ele
propagava a igualdade de
chances, a educação para
todos, um papel do
governo mais voltado para
o bem da população.
116
Em 1808 a propriedade onde os Novelli vivem passa a ser chamada de Novelli podere
(sítio dos Novelli).
117
Familia Novelli em 1815
Giovanni Novelli e Diamante Chiarini criaram quatro filhos neste período difícil:
Diana (* 1807), Maria Ubaldesca (* 1808), Gaspero Valentino (* 1810) e Stefano (*
1812). O filho Gaspero herdou o nome de seu avô de acordo com os costumes da
família. Ele nasceu logo após a anexação francesa da Toscana em 12 de julho de
1810 às 16 horas e foi batizado na igreja paroquial de San Giovanni Battista, em
Calcinaia. Seu padrinho foi Ferdinando di Giuseppe Morelli, que também era o
padrinho de outros filhos da Novelli. A partir de 1814 os Novelli passaram a
empregar um garzone, um ajudante no seu sítio. Ele tinha 17 anos e se chamava
Francesco Bachi, filho de Filippo Bachi. Talvez sinal de que estavam indo bem e de
que tinham muito trabalho.
Como nosso antepassado Gaspero Valentino Novelli se casará com uma filha da
familia Morelli, vamos ver no próximo episódio a história desta familia e de nossas
familias ancestrais de Bientina, antes de prosseguirmos com a nossa história dos
Novelli.
118
O convento da Ordem de Nicosia em Calci, ao qual pertenceram as
terras dos Morelli na Sardina até ca. 1780
No local em que ficava o curso original do Arno entre Calcinaia e Bientina, haviam
campos nos quais antigamente se plantava principalmente grãos em primeira
linha trigo, centeio e cevada, além de vegetais, vinho, cânhamo e linho, que eram
os produtos agrícolas tradicionais da região. Do lado da margem de Calcinaia,
onde a curva original do Arno beirava Bientina, havia desde a Idade Média um
vilarejo chamado Anghio. Mais tarde este povoado recebeu o nome de Sardina. Lá,
o importante mosteiro di Nicosia, da cidade próxima de Calci, tinha muitas terras
desde os idos do século
XV.
119
Por volta de 1650, quando encontramos os primeiros documentos relativos a
nossos ancestrais da familia Morelli que viviam nessa área, as terras do mosteiro de
Nicosia estavam divididas em 3 propriedades distintas, que contavam juntas 3
fogos (familias). Ainda havia lá uma pequena capela antiga. Estes poucos edificios
compunham toda a Sardina na época.
120
Não sabemos dizer quando os Morelli começaram a administrar as propriedades
do mosteiro, mas é
certo que vários Morelli
já aparecem nos livros
paroquiais de Bientina
desde o século XVI.
Vários homens com o
sobrenome Morelli
viveram em Calcinaia e
Bientina por volta de
1570-1600. Entre eles
encontramos um Anto-
nio e um Piero Morelli,
os quais suponho
fazerem parte de nossa
família. Por causa da
tradição dos italianos
de darem o nome do
pai a seus filhos, e pelo
fato de que em nossa
família Morelli há vários
121
Pieros, creio que nosso ancestral seja o Piero, nascido por volta de 1550. Mas isto
ainda é uma suposição, pois só a partir da próxima geração temos uma
documentação que comprova a descendência sem deixar dúvidas.
Seja como for, estes Morelli mais antigos pertencem à geração do pai de nosso
ancestral mais antigo desta familia: Santi Morelli, cujo filho Piero aparece mais tarde
administrando o maior dos 3 sítios da ordem de Niccosia na Sardina. Santi deve ter
nascido por volta de 1580 a 1600, logo após a época do desvio do curso do Arno. E
seu filho Piero (as vezes também escrito Pietro) deve ter nascido por volta de 1620
e se casou com Alessandra
di Pierino por volta de 1650.
Eles foram os patriarcas de
uma grande familia.
122
Os Morelli formavam já a 400 anos atrás uma família numerosa, com muitos
membros. As famílias dos Morelli estão listadas desde o começo no Stati delle
Anime de Calcinaia (listas da igreja onde eram registrados os membros da
paróquia), que em Calcinaia começam por volta de 1680.
Como os Morelli cultivavam muitas terras, eles costumavam ter alguns empregados
ou criados (garzone) morando com eles. Somente atravéz dos Morelli já somos
parentes de uma grande parte de Calcinaia e Bientina, já que eles se casaram com
um grande número de famílias tradicionais locais. O segundo sítio dos Morelli na
Sardina era habitado por volta de 1680 por um Tommaso di Francesco Morelli, que
certamente era parente de nosso Piero e que tinha uma família igualmente grande.
O terceiro sítio da ordem de Nicosia era tocado pela família Del Corso. Mas
podemos ver claramente nas listas de moradores que o sítio do nosso Piero Morelli
era o principal dos três. Essa fazenda foi denominada: Sardino primo, luogo detto
123
San Lorenzo (Sardino primeiro, lugar chamado San Lorenzo
antiga capela medieval da Sardina. Piero também é mencionado como um
administrador, o que significa que ele era mais do que um simples mezzadro. Por
volta de 1680, encontramos também as famílias Fiorentini e Lucchese sendo
mencionadas vivendo nos campos perto da Sardina, das quais também
descendemos.
A família Fiorentini pode ser rastreada em Calcinaia até meados do século XVI e,
como os registros da igreja não chegam mais para trás, podemos supor que eles e
seus ancestrais já estavam lá muito antes. Provavelmente, o primeiro dessa família
veio de Florença, pois Fiorentini Lucchesi vieram
nem precisaria ser mencionado = Lucca. Assim, desde a Idade Média ou desde o
início dos tempos modernos, temos ancestrais aqui, que testemunharam as muitas
guerras, a mudança no curso do Arno, as várias inundações e as epidemias desta
área.
Foto acima: Casamento de Santi di Piero Morelli e Lisabella di Bastiano Fiorentini em 1678 em
Calcinaia. O pastor de Calcinaia naquela época, Alessandro Bacchereti, era um irmão de uma
ancestral nossa.
Imagem abaixo: Stato delle anime de Calcinaia de 1739 com nossa familia Morelli na Sardina
nossos ancestrais diretos estâo marcados em vermelho.
124
Mais tarde, Piero di Santi Morelli passou sua fazenda a seus filhos Santi (nascido em
10 de dezembro de 1659) e Francesco (nascido por volta de 1660). Parece que
Francesco não se casou. Santi casou-se em 13 de novembro de 1678 em Calcinaia
com Lisabella, filha de Sebastiano Fiorentini e de Maddalena Maloni, todos de
Calcinaia. No ano anterior ao casamento, as cidades de Calcinaia e Bientina
passaram por uma forte epidemia de febre, um inverno extremo e uma colheita
muito ruim, todas ocorrências frequentes durante aquela época díficil que já
idade do
125
Una inaspettata e gradita
sorpresa che è rimasta celata
struttura.
I lavori di ristrutturazione
buon punto. Si sono infatti conclusii lavori di ripristino della copertura e degli intonaci
esterni. Al momento sono in corso le operazioni di recupero delle decorazioni interne.
Texto de um jornal de
Calcinaia sobre a recuperacâo
126 da antiga capela na Sardina.
Stato delle Anime de Calcinaia de 1701.
Acima a família Morelli de Piero e logo
abaixo a segunda familia Morelli na Sardina, que
era chefiada por Tommaso Morelli
127
Nos séculos XVII e XVIII, as familias de pescadores mais ricas de Bientina, como os
Tonissi e Pacini, gostavam de casar seus filhos com filhas da familia Morelli, que
provavelmente eram capazes de oferecer um dote melhor do que a maioria dos
habitantes de Bientina. Giovanni Sebastiano Morelli se casou por volta de 1715 com
Anna Maria Lemmi (ou Lomi), filha de Francesco Lemmi e Maria Angiola Boschi. Ela
vinha de Santa Maria a Monte, mas sua família paterna provavelmente era de
Montecalvoli, já que a maioria dos Lemmi vinha de lá. Com ela, ele teve pelo menos
12 filhos.
128
Neste momento, apesar de todas as adversidades, os habitantes da Sardina e o
mosteiro de Nicosia reuniram os recursos necessários para construir uma nova
capela. Por volta de 1760, eles construíram uma pequena igrejinha barroca para
San Stefano, decorada com um belo quadro do pintor Gaetano Maria Franchi
retratando o beato Arcangelo Canetoli (1460-1513), um religioso eremita
pertencente à ordem dos canônicos lateranenses, à qual também pertencia o
mosteiro de Nicosia. Podemos supor que a ordem de Nicosia forneceu o terreno
em que já estava a capela mais antiga de San
Lorenzo para sediar o novo templo.
129
A capela de San Stefano, na
Sardina, construída por volta de
1750 antes da reforma
130
Pietro Leopoldo de Lorena,
grão-duque da Toscana
e como Leopoldo II, imperador
do Sacro Império Romano-
Germânico
O reinado de Pietro
Leopoldo e os novos
tempos na Toscana
O novo grão-duque da
Toscana, o filho mais novo
de Francisco I, Pietro Leo-
poldo de Lorena (após 1790
também coroado
imperador alemão com o
nome de Leopoldo II)
passou a acupar o trono
em 1765 introduzindo uma
série de reformas que
finalmente tiraram o
ducado de seu estado de
crise que já perdurava
muitos anos. Por exemplo,
ele restringiu o poder dos
nobres e da igreja e aboliu
seus privilégios. Foi
introduzido um sistema
tributário que tratava
todos igualmente. Os
direitos dos agricultores
foram ampliados e ele prestou mais atenção às condições de vida do povo. O
Estado foi modernizado, a inquisição foi abolida, as propriedades do Grão-Duque
foram separadas da propriedade do Estado. Pietro Leopoldo aboliu a tortura e a
pena de morte, fazendo a Toscana ser o primeiro país moderno do mundo sem
essas crueldades. Ele até queria dar ao país uma constituição que seria a primeira
do mundo, mas seu irmão, o imperador romano-alemão José II, não permitiu que
ele fizesse isso.
131
Vista das casas dos Novelli em direção a Sardina e Bientina
A rígida ordem social, que antes se acreditava ser dada por Deus, tornou-se
subitamente mutável, permeável. Essa política estava sob a influência do novo
espírito iluminista, que deu às pessoas mais liberdade, igualdade e justiça. Alguns
governantes como Pietro Leopoldo na Toscana, Frederico II da Prússia, José II na
Áustria e o Marquês de Pombal em Portugal cederam às reinvidicações da
burguesia e reformaram seus estados. Os novos ideais finalmente levaram à
declaração de independência dos Estados Unidos da América em 1776 e ao início
da Revolução Francesa em 1789, que derrubou o antigo regime absolutista francês
que não queria se adaptar aos novos tempos.
132
Stato delle Anime de
Calcinaia de 1772: família
Morelli
Quando Pedro Leopoldo morreu em 1792, Gaspero Valentino Morelli já estava com
cerca de 60 anos, era finalmente um homem casado, já tinha quatro filhos (o filho
mais novo foi nosso ancestral Filippo Neri Morelli) e administrava com sucesso a
fazenda da ordem de Nicosia pelo menos na sexta geração com seu irmão Frances-
co.
133
O lago di Bentina hoje somente visível em época de cheia.Na página ao lado vemos um mapa
antigo com os fossos de drenagem do lago de Bientina. Em azul o fosso imperiale de Pietro Leopol-
do. Em verde a área onde viveram os Morelli e os Novelli
Em 1810, o filho do meio, Filippo Morelli, então com 22 anos de idade, casou-se
com Rachele Giannetti de Bientina, de 18 anos. Seus pais eram o comerciante Si-
mone Giannetti (nascido por volta de 1755) e Caterina Tonissi (nascida por volta de
1758), ambos de famílias tradicionais bientinesas, que viviam da pesca no lago. As
famílias Giannetti e Tonissi podem ser rastreadas em Bientina pelo menos até o
século XVI e provavelmente residiram lá desde a Idade Média. O jovem casal ainda
deverá ter muitos filhos, entre esses filhos a Maria Caterina Morelli, nascida em 24
de outubro de 1812 que se casará com Gaspero Valentino Novelli do sítio vizinho,
no i Ronchi.
134
Acima: Um antigo mapa onde podemos ver alguns
lugares de relevância na história dos Novelli e dos
e viviam os Novelli
está marcado em um círculo verde.
135
Sobre o advento da modernidade no século XIX
Após ver vários stati delle anime de Calcinaia entre 1684 a 1800 epodemos
constatar que geralmente apenas um membro de cada geração da família Morelli
se casou e teve filhos na fazenda na Sardina. Os outros se mudaram (talvez
tivessem a oportunidade de alugar um sítio em outro lugar) ou permaneceram
solteiros e continuaram a viver na família. As cidades dificilmente ofereciam
emprego naquela época, então era mais seguro continuar vivendo da agricultura.
136
Um dos vários diques dos municípios de Calcinaia e Bientina
Como os mezzadri (meieiros) não podiam dividir a terra entre suas crianças e todos
os herdeiros tinham que continuar o contrato, eles eram forçados a planejar suas
famílias, casando apenas um dos irmãos que ficavam na fazenda. Era a estratégia
para manter o nível que haviam atingido até agora. Porém, com o novo espírito
iluminista, tornou-se cada vez mais difícil fazer com que os muitos membros da
família renunciassem ao casamento. As reformas de Pietro Leopoldo e, mais tarde,
também dos Napoleões, não apenas inauguraram uma nova era política e
econômica, mas também social.
Registro de batismo de nossa ancestral Maria Carolina Morelli: (igreja de San Giovanni Battista
em Calcinaia 23.10.1812): Maria Carolina di Filippo del fu Gaspero Morelli e di Rachele di Simone
Giannetti coniugi, nata ieri alle 3 pomeridiane. Si battezzò (il giorno 24 ottobre) dal suddetto signor
Ghilardi e le fu posto detto nome. Fu compare Angelo di Giuseppe Corsi.(APCx)
137
Acima: Imagem de Google maps de Calcinaia e Bientina demostrando onde estão as áreas dos sítios
dos Novelli (abaixo) e Morelli (acima)
138
Cartão postal antigo de Calcinaia com vista da margem do rio Arno
139
Árvore dos descendentes de Giovanni Battista Novelli o do meio e Diamante Chiarini.
Enquadrados em vermelho seu filho Gaspero e seu neto Giovanni,
que mais tarde emigrará para o Brasil
O terceiro dos quatro filhos do casal Giovanni Novelli e Diamante Chiarini nosso
antepassado Gaspero Valentino Novelli nasceu no dia 12 de julho de 1810 às 4
horas da madrugada na casa da familia no i Ronchi em Calcinaia. Ele herdou o
nome de seu avô Gaspero Gaetano de acordo com o costume da família.
140
Após o nascimento da criança, alguns
parentes e, acima de tudo, muitas
meninas da família e da vizinhança vêm
à mãe e acompanham o pai e o recém-
nascido à igreja para que possa ser
batizado. A avó materna do bebê ou
outro parente próximo da jovem mãe fica
com ela e assumirá as tarefas da casa
durante certo tempo até que a mãe se
recupere do parto. A madrinha e o
padrinho também se encontram na
igreja. A par
dá ao bebê uma pequena vela e uma
toalha fina para secar a cabeça após o
batismo. Depois do batismo, todos vão
juntos à casa da criança para se
refrescarem.
padrinho da nova mãe fazem presentes para o novo filho. Sua mãe já lhe deu um
pano batismal lindamente bordado, uma tigela de sopa e uma colher. O padrinho dá
a ele um par de sapatos e a madrinha dá a ele um vestido completo com meias e
capuz. Ovos, pão, macarrão e galinhas também são entregues, principalmente pelos
irmãos da mãe do bebê. Mais tarde, a mãe do bebê traz uma vela para o padre
abençoar.
Mesmo que tenha passado ileso pelas inundações do Arno em 1811, em 1815-16 e
pela terrível crise econômica do início do século, o pequeno Gaspero teve uma
infância mais calma que a do seu pai, pelo menos do ponto de vista político. Em
1814, o imperador austríaco Ferdinando III de Habsburgo-Lorena libertou a Tosca-
na da França e inaugurou uma nova era, que deveria tranquilizar o Estado após o
caos do início do século e que duraria até as Guerras de Libertação e Unificação da
Itália, em 1859, Até então, Gaspero teria a possibilidade de crescer em paz, casar e
ter muitos filhos.
Árvore
genealógica de
Bartolomeo
Tonissi, ancestral
dos Morelli.
Os Tonissi foram
uma família
tradicionalíssima
de Bientina
142
Em
1809
ou
1810
, o
143
(mingau de milho) como o prato favorito da população rural italiana na época. O
clima estava muito chuvoso e o Arno e o Lago di Bentina transbordaram e
inundaram os campos novamente no outono-inverno de 1815-16, o que aumentou
a pobreza da população de maneira catastrófica
O ano de 1816 foi um dos mais frios já medidos em qualquer lugar do mundo. O
motivo foi provavelmente a erupção do vulcão indonésio Tambora na ilha de
Sumbawa em 1815. Foi a maior erupção vulcânica nos últimos vinte mil anos.
Como resultado, praticamente não houve verão em 1816 e, devido à turbulência
política do período pós-napoleônico, este ano deve ser um claro ponto baixo na
vida dos contemporâneos. Muitos dos agricultores, incluindo os Novelli e Morelli,
não conseguiram colher completamente suas lavouras porque tinham suas terras
na planície inundada. Mas os agricultores nas colinas também tiveram colheitas
extremamente ruins devido à chuva constante. Quando o outono chegou, o trigo
não havia tido sol suficiente para amadurecer. O pouco que foi colhido era tão caro
que as pessoas não podiam pagar.
A diferença entre a temperatura do verão no ano de 1816
com a média dos anos de 1971 a 2000
O aumento dos preços
atingiu fortemente todos
os moradores de nossa
região. Isso resultou em
grave sofrimento. Uma
das pessoas que
acompanhou de perto
essas flutuações nos
preços dos alimentos foi
nosso ancestral Simone
Giannetti, de Bientina. Ele
possuía uma bottega (loja)
na cidade por volta de
1810, onde vendia óleo,
144
sal, tabaco e outros mantimentos. Mas, nessa época de crise, ele deve ter tido
problemas para obter mercadorias e vendê-las aos preços necessários.
Imagens acima e na página da esquerda acima: As familias Novelli e Morelli no stato delle anime de
Calcinaia de 1817.
145
Quatro crianças entre 15 e 9 anos estão listadas na família Novelli no Stato delle Anime de 1821
Os campos que ainda davam frutos foram limpos pelas multidões famintas. Isso
também levou à crise os agricultores que não foram afetados pela enchente. O
médico de Bientina na época, Angelo Bonci, escreveu um longo relatório às
autoridades de saúde em 9 de abril de 1816, no qual descreveu a terrível situação
da população que, doente e sem trabalho (os campos ficaram debaixo de água por
meses), implorava por um pedaço de pão e ajuda. E mesmo que ele prescrevesse
remédios para eles, isso não os ajudava, porque eles não tinham
os denários suficientes para comprá-los.
Ele viu um velho já enfraquecido que mal conseguia se mexer e que só tinha um
pedacinho de pão de feijão e um pouco de água. Bonci se perguntou como
alguém pode sobreviver nessa condição?
146
Camponeses de Santa Maria a Monte por volta de 1900
Depois de um dia de trabalho duro no qual Bonci havia subido mais de 2.000
degraus nas casas da cidade e arredores, desde o início da manhã até a meia-noite,
já exausto, teve uma sensação de desespero por não poder fazer nada contra a
situação geral. As autoridades, o bispo de Lucca e outros enviaram dinheiro e
medicamentos necessitados urgentemente, especialmente quinino. Mas meses
passariam antes que a situação finalmente
melhorasse.
Os anos de 1820
Leopoldo II
148 da Toscana
Morelli talvez já
brincavam juntos ou até
mesmo paqueravam
quando se encontravam
nos campos ou durante A família Morelli no
as obrigatórias missas Stato delle Anime de
dominicais, as festas de Calcinaia de 1832.
Os números à esquerda
santos ou outras dos nomes indicam a
comemorações nas idade dos membros da
cidades vizinhas. família
149
Certidão de casamento entre Gaspero Novelli e Maria Morelli em 1835 Calcinaia
150
Os Novelli viviam do que
colhiam em suas terras na
planície do i Ronchi. No
151
Não demorou para que os filhos de Gaspero e Maria nasceriam. Juntos tiveram 10
filhos, todos nascidos nas casa Novelli na Via Marrucco. A seguir vemos a lista
deles:
Gaspero Valentino Novelli 1810-1863 & 1835 Maria Caterina Morelli 1812-1883
A familia era chefiada pelo tio Francesco, que vivia junto com os pais de Gaspero.
Um irmão de Gaspero, Stefano Novelli, casado com Luisa del Nista também vivia
nas proximidades e tinha terras
no i Ronchi. Gaspero e Maria
tinham grande amizade com o
senhor Masoni, que foi convidado
por eles muitas vezes para ser
padrinho dos filhos que iam
nascendo. Até onde eu sei, seis
deles chegaram à idade adulta:
cinco filhos e uma filha. Além da
família numerosa, Valentino Ferri,
um garzone (criado), também
morava no sítio dos Novelli.
152
A grande inundação de 1844
andar pelas ruas e usavam escadas para entrar em suas casas pelas janelas dos
andares superiores.
Além dessas crises gerais, a família Novelli também teve que suportar as privadas:
em 1840, falece o tio Francesco, o capoccia (chefe da familia) dos Novelli com 64
anos. Ele nunca se casou. Agora nosso antepassado Giovanni Battista, o do meio,
assumiu o papel de chefe da família.
154
O teto da igreja de Santa
Maria Assunta em Bientina,
onde Giovanni Battista Novel-
li (o novo) foi batizado em
1855
156
Giovanni Battista Noveli e Galzuinda de Araújo Macedo por volta de 1885-90
158
Acima: Lucca com sua Piazza del Anfiteatro (à direita) e abaixo:
Florença com seu maravilhoso Duomo com a torre de Giotto e a cúpula de Brunelleschi
Raizes profundamente ligadas à sua terra natal. Como vimos, a mãe de Giovanni,
Maria Morelli veio da fazenda vizinha na Sardina, onde nasceu em 1812 e onde a
familia Morelli já estava desde no mínimo o século dezesseis. A familia paterna de
Giovanni por sua vez veio algumas gerações atrás de Santa Maria a Monte e antes
disso viveram na Pianora de Santa Croce e em Castelfranco, de onde os Novelli,
ainda chamados de Pacini sairam por volta de 1540.
160
Vista das nos campos de Calcinaia
161
A torre de Brunelleschi
em Vicopisano
A infância de Giovanni
Era um mundo pequeno. Tanto é que um ditado local diz mais ou menos assim:
Calcinaia, Bientina e Vico hanno spazio in un fico = Calcinaia, Bientina e Vi-
co(pisano) cabem dentro de um um Figo. Um mundo com limites definidos pelos
altos Monti Pisani ao poente, o rio Arno ao sul, os morros da Cerbaia ao nascente e
o lago di Bientina (na época ainda existente) ao norte. Um mundo protegido.
Pontedera, do outro lado do Arno, já estava muito longe e não sabemos se o
jovem Giovanni esteve com os pais ou algum irmão mais velho em Pisa a cinco
horas de caminhada dali para admirar a famosa torre pendente ou em Lucca para
ver suas torres medievais, e nem pensar se esteve na maravilhosa Florença a
sessenta quilômetros de distância.
A ferrovia entre Florença e Pisa já havia sido inaugurada 10 anos antes de seu
nascimento mas o fato dos camponeses terem feito uma série de atentados e
sabotagens contra as locomotivas e os trilhos durante os primeiros anos de seu
funcionamento, nos dá uma ideia do expanto que o advento da modernidade deve
ter causado nas almas das pessoas simples, que acreditavam que os trens
fumegantes eram coisas do diabo e que estragariam suas colheitas. Os italianos,
muito católicos e devotos, sempre enxergaram seu mundo como dependente da
vontade divina. E podemos ver nos nomes dos Novelli, com os numerosos Giovan-
nis Battistas, Marias, e
também as Dianas e os
Valentinos, que eram os
santos das cidades
próximas de Santa Maria a
Monte e Bientina, que
nossa familia evocava a
assistência do além para
ter proteção e ajuda no
aquém.
163
Foto antiga de Sta. Maria a Monte (ca. 1900). Na foto embaixo, igualmente Santa Maria a Monte.
Numa sociedade onde uma colheita malograda poderia significar um ano muito
duro para os camponeses, onde estando mal nutrido e pela falta de higiene e
assistência médica uma simples gripe podia matar rápido familiares queridos e
ar ruim
comunidade, onde a morte do capo di famiglia, do chefe da familia, poderia
acarretar a ruína de toda a familia, ou até mesmo a morte de um boi ou de uma
vaca significava uma perda quase irreparável, obter ajuda do plano espiritual era
muito importante para a fé de que tudo dará certo. Assim, as romarias e procissões
nas cidades próximas, entre elas principalmente a famosa Festa di San Valentino em
Bientina no final
de maio e início
de junho eram
datas muito
importantes. Mais
importantes do
que hoje o
carnaval e o natal
para nós.
164
A libertade
personificada em
pintura de ca. 1850
A Italia na época
Fora da esfera política o país também se mudava cada vez mais depressa. A
população cresceu rapidamente no século XIX graças a novos avanços na medicina
e higiene. Ferrovias foram instaladas e industrias foram se formando,
principalmente no norte da península. As cidades estavam crescendo muito, mas
não havia trabalho para todos. Muitos dos agora 4000 habitantes de Calcinaia e
165
3000 de Bientina tiveram que se mudar para os grandes centros ou ir para a França
para procurar trabalho temporário nas salinas da Camargue.
Giuseppe
Garibaldi
166
Imagem da página ao lado ao alto: Cartão postal antigo com a estação de trem de Pontedera
(ca. 1880). E acima: A estação ça por volta de 1860.
Mas o outro lado da moeda não tardou a chegar: a pesca marítima, tornada agora
possível com os novos barcos a vapor, fez muitos pescadores locais do lago di Bientina
ficarem sem poder vender seus produtos e a ferrovia deixou muitos navicellai (os
navegadores dos navicelli que faziam o percurso fluvial no Arno para transporte de
mercadorias) sem trabalho. Muitas pessoas passavam fome e tinham medo do futuro. A
guerra ainda estava em andamento no sul do país e a política estava cada vez mais
insegura. Havia muitos comunistas e anarquistas e a política interna do novo país
também foi conturbada pelo próprio papa, que convocou todos os católicos a boicotar
a política na Italia unificada porque ele estava furioso por ter perdido seu grande
estado e governar agora apenas o pequeno Vaticano.
167
Uma cena de embarque em porto europeu com destino às Americas século XIX
isso
tudo soava como música nos ouvidos dos sofridos italianos, acostumados com a santa
polenta de quase todos os dias.
décadas de 80 e 90 do século XIX a maioria dos italianos foi para o sul, deixando o
norte de lado. Especialmente da região vizinha de Lucca partiram muitos
emigrantes para o Brasil, e quando um parente ou amigo já estava lá, ele chamava
os outros.
168
Como nos conta a bela e conhecida canção italiana , fazemos uma
idéia do que passaram:
timos
Partimos com nossa honra
Trinta e seis dias de maquina e vapor,
Os mais jovens dos irmãos Novelli certamente estavam interessados nestes relatos,
pois não estavam felizes com a idéia de viver como agricultores simples e
depender dos irmãos mais velhos. Eles não eram fatalistas, tinham objetivos mais
altos e espírito aventureiro. Após longas discussões com a familia e amigos e após
matutar muito, Giovanni decidiu emigrar para a América do Sul.
Camponeses do Basso Valdarno no século XIX
Panfleto
propagandístico
para estimular a
emigração de
italianos ao
Brasil.
169
A estação de Pontedera por volta de 1900.
A despedida da amada mãe certamente foi muito dolorosa. Ela deve ter chorado,
talvez já prevendo que nunca mais veria o filho caçula e de fato, pouco tempo
depois faleceria com 70 anos em janeiro de 1883. Após limpar as lágrimas do rosto,
Giovanni foi provavelmente acompanhado de parte de sua familia até Pontedera
onde pegou o trem para ir a Pisa ou Livorno e continuar de lá a viagem para
Gênova. No porto desta cidade onde milhares de imigrantes de toda a Italia
passavam dias e semanas com seus pertences, geralmente trouxas de roupas e
cestos com comida, à espera de seus navios, Giovanni zarpou em um navio a vapor
e começou a árdua travessia marítima de várias semanas rumo ao Brasil.
170
O porto de Santos em 1880.
Podemos imaginar como tudo deve ter sido novo e emocionante para Giovanni. O
clima tropical e suas chuvas fortes. As casas e cidades diferentes, as plantas e frutas
exóticas. As matas e os cafezais intermináveis, tão diferentes das paisagens
Branca
ele provavelmente foi de carroça atravéz de estradas de terra para Mococa, uma
pequena cidade a cerca de 30 quilômetros de Casa Branca, na divisa com o Estado
de Minas Gerais. Talvez ele já tivesse conhecidos aqui ou sentisse que havia aqui as
melhores condições para uma vida nova. De certo nunca iremos saber por quais
motivos ele decidiu vir justamente para cá entre tantas outras cidades e até mesmo
estados e países. Mas
seja como for, foi aqui
que Giovanni Battista
Novelli se fixou e abriu
a sua cervejaria.
171
Exemplo de locomotiva a vapor utilizada nas ferrovias brasileiras por volta de 1880
Imigrantes
italianos no
interior de
S. Paulo no
início
do século
XX
172
Mapa de 1900 demostrando a localização das cidades de
Casa Branca, Mococa e S. José e os ramais ferroviários
Pintura de um cafezal
paulista em colheita
173
Vista da cidade de Mococa, SP a maioria da população destas cidades do interior paulista vivia na
zona rural, por isso as cidades parecem ser muito pequenas
Parece que durante seus primeiros anos no Brasil Giovanni esteve ao mesmo tem-
po em Mococa e na vizinha São José do Rio Pardo, a apenas 20 quilômetros de
distância. A sua fábrica
da época, mas ele era socialmente ativo em São José do Rio Pardo, onde foi sócio
fundador da
, uma
associação beneficiente para o
apoio mútuo dos imigrantes
italianos. Por volta de 1886, ele
passa a estar apenas em São José
do Rio Pardo, para onde mudou sua
fábrica de cerveja. Também não
está claro se o irmão Valentino ou o
irmão Santi se juntaram como
sócios à fabrica de cerveja por um
certo tempo. Há algumas evidências
que sugerem isso. De qualquer
forma, o irmão voltou para a Itália,
enquanto Giovanni, agora chamado
João Novelli, se estabeleceu
definitivamente no Brasil.
175
Galzuinda de Araújo
Macedo por volta de 1890
176
São Gonçalo do Sapucaí em Minas Gerais
A familia da Galzuinda havia se mudado para São José do Rio Pardo por volta de
1880 vindo de São Gonçalo do Sapucaí, em Minas Gerais, onde foram outrora
importantes agricultores, donos de engenho de cana de açucar e onde tiveram
lavras de ouro, herdadas de seu bisavô Antônio Joaquim Rodrigues de Macedo,
nascido em Coimbra, Portugal, que havia sido sobrinho do importante contratador
e banqueiro português João Rodrigues de Macedo, o construtor da famosa Casa dos
Contos em Ouro Preto MG. Esse tio havia participado da Inconfidência Mineira em
1789 e havia comprado essas terras de seus compadres, o poeta, ouvidor e
inconfidente Alvarenga Peixoto e a poetisa Barbara Heliodora. Em São José, o pai
de Galzuinda, Antônio Julio, teve o cargo de delegado de polícia. Tios e primos de
Galzuinda também viviam aqui. A familia provavelmente já fizera parte da primeira
leva de colonos mineiros que derrubaram as matas virgens e abriram roças nas
terras férteis e que povoou a região por volta de 1840 a 1870.
O alferes (o que era algo como um tenente) Antônio Júlio de Araújo Macedo,
nascido em 1829 em São Gonçalo, havia sido na década de 1860 delegado de
polícia da recém-criada cidade de Pirassununga (vizinha de Casa Branca) e
cirurgião de batalhão do exército nesta cidade, mas após a morte precoce de sua
primeira esposa Alexandrina, teve que voltar para S. Gonçalo do Sapucaí, onde
parte de sua família continuava a viver. Em S. Gonçalo teve nos idos de 1870 uma
botica ou boticário entre os bairros (hoje cidades) Natércia e Lambari.
177
Imagem acima: Praça em S. Gonçalo e embaixo: a Rua Coronel José Julio em Mococa.
Em 1869 Antônio Julio de Araújo Macedo se casou em segundas núpcias com sua
prima Maria José de Araújo, que também havia ficado viúva a pouco tempo. Como
Antônio Julio tinha 5 filhos para criar, era importante se casar logo novamente para
que a familia voltasse a ter um amparo maternal. A primeira filha do casal foi
Galzuinda nascida em 10 de Abril de 1872.
Quando se mudaram para São José, Galzuinda tinha 8 anos e era a mais velha de
uma penca de irmãos inteiros e ao mesmo tempo a mais nova de outra penca de
meio-irmãos mais velhos. E a familia de Galzuinda formava junto com alguns
irmãos de Antônio Júlio que já moravam na região de São José e também já tinham
familias, o clã dos
Araújo Macedo
uma familia muito
numerosa e presente
em toda região.
Especialmente o seu
irmão mais novo o
Tenente Coronel José
Júlio de Araújo
Macedo era muito
poderoso. Ele teve 7
178
grandes fazendas que se extendiam
por vários municípios da região e
exercia forte influência politica e
econômica. Uma das ruas principais de
Casa Branca, a Rua Coronel José Julio,
recebeu seu nome em homenagem.
O Casamento de Giovan-
ni com Galzuinda
180
São José do Rio Pardo por volta de 1900
181
Proclamação da república em 1889
Assim, São José já havia proclamado a república antes da proclamação oficial que
foi em 13 de novembro. E é muito provável que Giovanni esteve envolvido nestes
tumultos, visto que ele tinha um papel importante na Sociedade Italiana XX de
Setembro.
Antônio Novelli em 18 de Junho de 1895 São José do Rio Pardo, que nasceu
depois da morte de Giovanni.
182
Foto acima: O largo do mercado em São José do Rio Pardo, onde ficava a casa dos Novelli e dos
Araújo Macedo em uma fotografia histórica
A familia morou no Largo do Mercado em São José do Rio Pardo, numa casa logo
ao lado da casa da mãe de Galzuinda. Após a Proclamação da República, o largo
passou a se chamar Prudente de Morais em homenagem ao republicano.
183
A estação de trem de São José do Rio Pardo por voltaa de 1900
A nova familia passou um tempo muito bom nestes primeiros anos da década de
1890. Galzuinda teve em pouco espaço de tempo 3 filhos, que encheram Giovanni
de orgulho. Como era de se esperar de um bom italiano, o primeiro filho recebeu o
nome do avô e do tataravô Gaspero, em português . O segundo filho,
nascido um ano e meio depois de Gaspar, recebeu com pouca modéstia o nome
do próprio progenitor, mas que também foi uma homenagem aos
quatro Giovannis ancestrais da criança. O terceiro filho, nascido depois de uma
breve pausa de nem mesmo 2 anos recebeu o nome do irmão mais próximo de
Giovanni, Valentino, que ficou em português A familia crescendo, a
fábrica indo bem foram anos de vacas gordas e Giovanni, que tinha uma boa
índole, e bom apetite, gostava de comer bem e certamente não desprezava a
própria cerveja. Na familia se conta que depois de almoçar, ele costumava dar uma
cochilada ainda sentado à mesa.
184
Talvez por causa dos
seus hábitos
alimentares, a saúde
de Giovanni piorou.
Foi dito na época que
ele tinha muita
gordura no coração.
Ele estava muito
acima do peso (de
acordo com a
tradição oral da
família, ele pesava
cerca de 130 kg a
uma altura máxima de
1,6 metros). O filho
mais velho, Gaspar,
também tinha um
problema na perna
que precisava ser
operada. Como havia
melhores médicos na
Itália e os Novelli
tinham condição de
viajar, eles decidiram
fazer o tratamento lá.
Assim, Giovanni, Galzuinda e o pequeno Gaspar com seus 3 anos de idade foram
por volta do final de 1893 ou início de 1894, para sua terra natal Calcinaia e para
Bientina onde os irmãos de Giovanni viviam. Os outros dois filhos menores ficaram
no Brasil com a avó Maria José. O reencontro com a familia depois de quase 15
anos separados deve ter sido muito comovente. Alguns irmãos de Giovanni
também haviam sido produtivos e Giovanni pôde conhecer pelo menos 10 novos
sobrinhos, entre eles pelo menos mais dois , que devem ter adorado
brincar com o pequeno primo Gaspar, achando-o com certeza muito engraçado
pelo fato dele falar uma lingua esquisita.
185
Foto acima: Bientina, década de 1950
186
marcante e íntimo
pode ter integrado
ela mais ainda na
comunidade das
mulheres da familia:
No primeiro dia de
junho de 1894, a sua
primeira e única filha
nasceria na Via
Borgo di Venezia 17.
Recebeu o nome
patriota
ao
mesmo tempo uma homenagem às avós, ambas Marias, e à nova pátria brasileira.
O tempo foi passando, o caloroso verão italiano também. O pequeno Gaspar foi
tratado com sucesso na Italia, mas infelizmente o tratamento de Giovanni não teve
êxito. Sua saúde acabou piorando cada vez mais e, por final, ele faleceu às quatro e
meia da tarde no dia 15 de outubro de 1894, uma segunda feira, na Sardina nº 66
em Calcinaia, na mesma casa onde havia nascido. Tinha apenas 39 anos de idade.
Talvez ele nunca ficou sabendo que sua esposa estava grávida de novo com mais
um filho seu. Giovanni foi enterrado no cemitério de Calcinaia.
Ao lado:
registro de
nasci-
mento de
Ada Novel-
li 1894
187
Acima: Fotografia de Giovanni morto em
1894 e ao lado: registro de óbito
de Giovanni.
188
Elenco dos membros da familia Novelli em Bientina em 1911 com Ada Novelli viva.
189
Duas páginas do inventário de Giovanni Novelli de 1895
Parece que a herança de Giovanni foi infelizmente diminuindo com o tempo. Os
tutores das crianças parecem ter se apropriado de boa parte da herança, alegando
ter que manter os filhos do falecido. Nos documentos do inventário de Giovanni
(João Novelli) vemos que Santi comprou os terrenos que Giovanni ainda tinha em
Calcinaia em nome do irmão Valentino, pagando a quantia estipulada a Galzuinda
voltando depois para a Italia (Santi faleceria em 1936 em Calcinaia).
Passados apenas alguns
meses, Galzuinda deu a luz a
um filhinho no dia 18 de Junho
de 1895 que foi batizado de
Antônio em homenagem ao
avô, bisavô, trisavô e tetravô
maternos (que se chamaram
todos Antônio) e que teve
como madrinha a italiana An-
gela Trivellato, dona de um
restaurante em S. José e que
foi a mãe de Cesare Trivellato,
o fundador da fábrica de
implementos automotivos
Trivellato S.A.
Imagem ao lado: Registro de nasci-
mento de Antônio Novelli de 1895
190
Cidades
importantes
na história
da familia
Novelli em
mapa da
ferrovia de
1920
Galzuinda não chegou a ter filhos com seu segundo esposo Sr. Silva (Antonio For-
tunato da Silva). Juntos eles passaram alguns anos vivendo em diversas cidades
onde Sr. Silva trabalhou para a ferrovia. Pouco sabemos sobre o Sr. Silva, mas foi
certamente ele que incentivou vários enteados a trabalhar na ferrovia. Ao menos
João, Valentim e Antônio foram ferroviários. A desvantagem desta profissão foi que
os irmãos foram a
trabalho cada um
para uma outra
cidade, nenhum
deles ficou em Casa
Branca ou São José
do Rio Pardo
A antiga igreja
matriz de Monte
Santo de Minas na
década de 1910-
1920. Aqui se
casou Antônio
Novelli e daqui
saiu o funeral de 191
Galzuinda.
Inauguração da estação de trem de Monte Santo de Minas em 1913
João se casou com Rina Spaloni de Itapira, morou em várias cidades devido ao seu
emprego na ferrovia, por exemplo em Arceburgo MG, e foi parar em Campinas SP onde
hoje vivem muitos de seus mais de 90 descendentes. Valentim se casou com Bibiana
Alves e foi para Ribeirão Prêto onde também deixou vasta descendência (mais de 50).
Antônio foi para Monte Santo de Minas onde se casou em primeiras núpcias com a
jovem montessantense Dolores do Carmo e em segundas núpcias com Antonieta
Lattaro, também de Monte Santo (veja sobre ele na página 457). Seus mais de 70
descendentes se espalharam pelo Brasil e pelo mundo, assim como os mais de 80
descendentes de Gaspar, que se casou em São Simão, SP com Maria Caramaschi que
era de lá. Ele viveu muito tempo em Cafelândia e foi parar em Valparaiso, SP. Mesmo
estando distantes os irmãos sempre mantiveram fortes laços entre si e se visitavam
frequentemente até o final de suas vidas.
Galzuinda acabou por falecer em 9 de outubro
de 1924 em Monte Santo de Minas, a apenas
60 quilômetros de S. José. Foi em Monte Santo
que ela viveu a maior parte de seus ultimos 10
anos de vida e onde o Sr. Silva havia sido chefe
da estação ferroviaria da Companhia Mogiana.
Quando Galzuinda faleceu, o Sr. Silva estava
trabalhando em Guaiuvira, próximo a
Nuporanga, SP. Galzuinda deve ter passado
seus últimos meses ou anos na casa do filho
Antônio Novelli que vivia em Monte Santo
onde já estava casado com sua segunda
esposa Antonieta Lattaro, uma
montessantense filha de italianos de
Montemurro, Basilicata.
Certidâo de óbito de
192 Galzuinda de 1924
Monte Santo de Minas na década de 1930. A seta à esquerda indica a casa e padaria dos Lattaro.
193
Acima: Alguns descendentes dos Novelli de visita à Via Novelli em Castelfranco, onde se iniciou a
história de nossa familia na idade média.
E árvore abaixo: Os descendentes de Giovanni e Galzuinda até seus netos.
194