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O SISTEMA BRASILEIRO DE COTAS

NAS INSTITUIÇÕES FEDERAIS


Avaliação da experiência da Universidade Federal da Fronteira Sul
no Curso de Medicina do Campus Passo Fundo

Jaime Giolo
Leandro Tuzzin
Lucianne Braga Oliveira Vilarinho
Fernando Haetinger Masera da Silva

Introdução
O essencial na avaliação da política de cotas, implantada a partir de 2013 nas
instituições federais de ensino médio e de educação superior, é averiguar se o
sistema está produzindo os efeitos desejados, identificar possíveis deficiências
e apresentar as melhorias cabíveis.
O presente estudo está orientado por esta perspectiva e construiu um
método adequado e eficaz para avaliar a política de cotas do Brasil e o sistema
organizado pela Universidade Federal da Fronteira Sul (UFFS). Sua virtude se
manifesta, sobretudo, na capacidade de simular, com dados reais, consistentes
e de fácil acesso, o preenchimento das vagas nas várias dimensões da política,
supondo a inexistência dessa, e comparando-o com a realidade produzida pelo
sistema de cotas.
Esse método, que se explicitará ao longo da exposição, pode ser
aperfeiçoado por meio de estudos mais amplos que contemplem o conjunto dos
cursos de cada instituição ou, talvez baste, todos aqueles cursos que
experimentam uma disputa significativa pelas vagas ofertadas. É altamente
desejável que as instituições utilizem dados comparativos pretéritos (isto é,
anteriores à política de cotas e com preenchimento de vagas, apenas, pela ampla
concorrência), o que não é o caso da UFFS, que já nasceu praticando um sistema
geral de bonificação das notas do Enem obtidas pelos egressos da escola pública.
Num primeiro olhar, pode parecer que um estudo centrado em, apenas, um
curso de uma única instituição tem potencial limitado para avaliar a política de
cotas do país. Essa constatação é, por certo, verdadeira, mas é verdade também
que, sendo a política única para todo o Brasil, incidindo sobre a mesma realidade

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nacional, se pode esperar, com alto nível de confiabilidade, que a replicação do
estudo chegue às mesmas conclusões ou conclusões muito semelhantes,
sobretudo, em se tratando de inquéritos dirigidos a cursos de grande demanda.
A política de cotas realiza plenamente seus objetivos nos cursos federais mais
disputados, diminuindo, progressivamente, a sua eficácia à medida que o foco se
desloca na direção dos cursos de baixa demanda, até esmaecer-se completamente
naqueles que não chegam a preencher as vagas ofertadas nos processos seletivos.
Nesse diapasão, se pode afirmar que a política de cotas precisa ser avaliada
e calibrada a partir dos cursos mais disputados, em torno dos quais se jogam as
cartadas mais decisivas da discriminação e da segregação social ou, ao contrário,
da interpenetração de perspectivas e da congregação das diversidades.
O presente relatório analítico assume estes pressupostos e, por isso, ousa
sugerir ajustes na legislação das cotas, sob a convicção de que ele confere, face
às lacunas evidenciadas, fundamento e assertividade a cada uma das proposições
feitas no final do texto. Por isso, o estudo pretende estabelecer um diálogo
privilegiado com os proponentes e signatários dos principais projetos de lei que
tramitam no Congresso Nacional e que serão descritos no capítulo 3 deste texto.
Talvez não haja tempo (ou senso de oportunidade) para inserir mudanças nos
projetos em tramitação no Congresso Nacional, todos eles objetivando exame e
deliberação das duas casas ainda em 2022, ano em que, segundo a Lei nº 12.711,
de 29 de agosto de 2012, “será promovida a revisão do programa especial para
o acesso às instituições de educação superior” (cf. BRASIL, Lei nº 12.711, Art. 7º).
Todavia, sob qualquer aspecto que se examine a matéria, todas as proposições
apresentadas no final deste estudo são pertinentes e necessárias para garantir a
realização dos objetivos da própria Lei de Cotas. Não realizar as correções
apontadas significa aceitar um decaimento progressivo dos propósitos do
programa.

1. A política de cotas

1.1. A política e o sistema de cotas

A política de cotas, criada pela Lei nº 12.711/2012, suas alterações e suas


regulamentações1, objetivou ampliar o senso de justiça nas instituições federais
de educação superior e de nível médio da educação básica quanto:
(a) ao itinerário escolar dos estudantes, criando uma correspondência mais
efetiva entre o percentual de alunos que realizam o ensino médio na rede de
escolas públicas e o percentual destes que acessam os cursos de graduação
nas instituições federais; e o percentual de alunos que realizam o ensino

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fundamental na rede de escolas públicas e o percentual destes que acessam
o ensino médio nas escolas federais de ensino técnico;
(b) ao perfil econômico das famílias cujos integrantes realizam o ensino
fundamental e/ou ensino médio na rede de escolas públicas, dividindo ao
meio as vagas reservadas para esses estudantes nas escolas federais de nível
médio ou nas instituições federais de educação superior e destinando uma
dessas metades para os alunos oriundos de famílias com renda igual ou
inferior a 1,5 salário-mínimo per capita;
(c) à conformação étnico-racial da população, garantindo um percentual de vagas
em cada uma das metades reservadas, conforme descrição feita no item
anterior, igual ao percentual de pretos, pardos e indígenas apurado pelo
Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) na respectiva Unidade da
Federação onde são ofertados os cursos federais.
(d) à representação das pessoas com deficiência nas instituições federais de
ensino médio e de educação superior, ao menos, nos percentuais apurados
pelo IBGE no respectivo Estado da Federação onde são ofertados os cursos
federais, considerando, nesse caso, a linha de Corte do Grupo de Washington
de Estatísticas sobre Deficiência, vinculado à Comissão de Estatística da
Organização das Nações Unidas - ONU.2
Em síntese, a política de cotas do Brasil determina que sejam reservadas, nos
processos seletivos para os cursos de graduação, por curso e turno, no mínimo,
50% das vagas para candidatos que tenham cursado, integralmente, o ensino
médio em escolas públicas (cf. BRASIL, Lei nº 12.711, Art. 1º). Esse percentual
mínimo também é exigido das instituições federais de ensino técnico de nível
médio, relativamente aos candidatos que cursaram, integralmente, o ensino
fundamental em escolas públicas (cf. BRASIL, Lei nº 12.711, Art. 1º). Em ambos
os casos, o percentual mínimo exigido para candidatos oriundos da escola pública
deve ser divido em partes iguais - uma delas para candidatos integrantes de
famílias com renda per capita igual ou inferior a um salário mínimo e meio (cf.
BRASIL, Lei nº 12.711, Art. 1º, parágrafo único e Art. 4º, parágrafo único).
Delimitados esses dois segmentos de vagas reservadas para candidatos que
cursaram a etapa precedente de sua formação em escolas públicas (o segmento
para hipossuficientes e o segmento para não hipossuficientes3), há que se
reservar, em ambos, um número de vagas equivalente à representação
percentual, apurada pelo último censo do IBGE, de pardos, pretos e indígenas na
população total da Unidade da Federação onde é ofertado o respectivo curso (cf.
BRASIL, Lei nº 12.711, Art. 3º, e Art. 5º). Os percentuais desses três grupos
étnico-raciais (pardos, pretos e indígenas) são somados e as vagas reservadas para
os candidatos daí oriundos compõem uma única cota, disputada pelo conjunto

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dos candidatos que autodeclaram as características descritas (cf. BRASIL, Lei nº
12.711, Art. 3º, e Art. 5º; BRASIL/MEC, Portaria Normativa, nº 18, Art. 10, Inciso
IV).
A Lei nº 13.409, de 28 de dezembro de 2016, deu nova redação aos artigos
3º e 5º da Lei nº 12.711/2012, para contemplar as pessoas com deficiência na cota
dos autodeclarados pardos, pretos e indígenas. Dispôs da mesma forma o Decreto
nº 9.034, de 20 de abril de 2017, que altera o Decreto nº 7.824, de 11 de outubro
de 2012. Todavia, a Portaria Normativa nº 9, de 5 de maio de 2017, trouxe uma
inovação jurídica na regulamentação do tema ao instituir uma cota própria para
pessoas com deficiência. Dessa forma, ela excede os limites jurídicos
estabelecidos na Lei nº 12.711/2012 e no Decreto nº 7.824/2012, sugerindo uma
ruptura na hierarquia dessas normas.
Importa assinalar que a Lei nº 13.409/2016, em momento algum, cria uma
cota específica para pessoas com deficiência; apenas determina que, na cota
reservada para pardos, pretos e indígenas, seja adicionado o grupo de pessoas
com deficiência, cuja cota teria um percentual de vagas, no mínimo,
correspondente à soma de pessoas pardas, pretas, indígenas e pessoas com
deficiência, apuradas pelo IBGE na Unidade da Federação onde o curso é
ofertado. In verbis:
“Em cada instituição federal de ensino superior, as vagas de que trata o art. 1º
desta Lei serão preenchidas, por curso e turno, por autodeclarados pretos, pardos
e indígenas e por pessoas com deficiência, nos termos da legislação, em
proporção ao total de vagas no mínimo igual à proporção respectiva de pretos,
pardos, indígenas e pessoas com deficiência na população da unidade da
Federação onde está instalada a instituição, segundo o último censo da Fundação
Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE” (BRASIL, Lei nº 13.409).

A Portaria Normativa extrapola, portanto, os limites do território desenhado


pelas normas superiores. Não bastasse isso, a referida Portaria extrapola a si
mesma quando, na alteração que faz no Art. 10 da Portaria Normativa anterior,
ao tratar do “cálculo das vagas reservadas”, estabelece que a cota para pessoas
com deficiência seria exclusiva, porém efetivada em apenas duas posições: (a) no
segmento da cota para candidatos oriundos da escola pública hipossuficientes (ao
lado da cota para pardos, pretos e indígenas); e (b) no segmento da cota para
candidatos oriundos da escola pública não hipossuficientes (ao lado da cota para
pardos, pretos e indígenas). Ora, quando a Portaria Normativa em tela trata do
“preenchimento das vagas reservadas”, alterando o Art. 14 da Portaria Normativa
anterior, ela situa a cota para pessoas com deficiência em quatro posições
diferentes: (a) no segmento das vagas reservadas para pardos, pretos e indígenas
hipossuficientes; (b) no segmento das vagas reservadas para candidatos
hipossuficientes oriundos da escola pública; (c) no segmento das vagas reservadas
para pardos, pretos e indígenas não hipossuficientes; e (d) no segmento das vagas

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reservadas para candidatos não hipossuficientes oriundos da escola pública (cf.
Portaria Normativa nº 9/2017, Art. 1º, alteração feita ao Art. 14 da Portaria
Normativa nº 18/2012).
Talvez por causa dessa incongruência interna da Portaria Normativa nº
9/2017, o Sistema de Seleção Unificada (Sisu) praticou a cota para pessoas com
deficiência em quatro posições, apenas, nos dois primeiros processos seletivos
(2017/2 e 2018/1), retirando, depois, as duas que estavam incrustadas nos
segmentos dos pardos, pretos e indígenas.4
O Quadro 1 mostra a organização do sistema de cotas no Brasil.

Quadro 1: Representação gráfica do sistema brasileiro de cotas.


VAGAS RESERVADAS PARA ALUNOS DA ESCOLA PÚBLICA
(mínimo 50% das vagas, por curso e turno)

Alunos hipossuficientes Alunos não hipossuficientes


(50%) (até 50%, considerando os arredondamentos)

PPI(1) (IBGE) PcD(2) Alunos hipossuficientes PPI(1) (IBGE) PcD(2) Alunos não hipossuficientes
(IBGE) (o restante, depois das cotas (IBGE) (o restante, depois das cotas
específicas) específicas)
PcD(2) (IBGE) PcD(2) (IBGE)
(1)
Pardos, pretos e indígenas; (2) Pessoas com deficiência.

A Portaria Normativa nº 18/2012 dispõe que, respeitada a distribuição das


cotas previstas na legislação e considerando as realidades locais, “as instituições
federais de ensino, no exercício de sua autonomia, poderão, em seus editais,
assegurar reserva de vagas separadas para os indígenas” (Art. 10, §2º). Esta
mesma norma, fazendo eco ao Decreto nº 7.824/2012, faculta, ainda, às
instituições federais a implementação de políticas afirmativas adicionais, por meio
de reserva de vagas suplementares e de outra modalidade (cf. Decreto nº
7.824/2012, Art. 5º, §3º; e Portaria Normativa nº 18/2012, Art. 12).
Este é, no essencial, o sistema de cotas em operação no Brasil, desde 2012,
com a ampliação feita em 2016. Os demais dispositivos das leis, decretos e
portarias normativas regulam o processo de implementação do sistema e serão
mencionados, ao longo do texto, sempre que se fizerem necessários.

1.2. O sistema de cotas da UFFS

A UFFS, desde seu primeiro processo seletivo, realizado no início de 2010,


praticou um sistema provisório de cotas para alunos oriundos da escola pública,
acrescendo em 10% a nota do Enem para cada ano do ensino médio (padrão: 3
anos) que o candidato tivesse realizado, com aprovação, em escola pública. Por
isso, quando foi promulgada a Lei nº 12.711/2012, a Universidade,
imediatamente, reorganizou o seu sistema para adaptá-lo às novas exigências

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legais e implementá-lo integralmente já em 2013, mesmo que a Lei estabelecesse
um prazo de quatro anos para que as instituições federais implantassem o sistema
na íntegra, começando com, no mínimo, 25% (cf. BRASIL, Lei nº 12.711, Art. 8º).
A política de cotas da UFFS foi oficializada por meio da Resolução nº
6/CONSUNI/CGRAD/UFFS/2012, de 03 de dezembro de 2012.
No seu sistema, a UFFS, considerando que a Lei nº 12.711/2012 estabeleceu
o mínimo de 50% das vagas, por curso e turno, a serem reservadas para alunos
oriundos da escola pública, sem fixar um percentual máximo, e considerando a
necessidade de definir um percentual que mantivesse forte coerência com o
itinerário escolar dos estudantes, optou por tomar como referência a taxa de
alunos que realizam o ensino médio em escola pública, segundo o último Censo
Escolar do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais (Inep), apurado
por Unidade da Federação. Tendo a UFFS campi universitários no Paraná, em Santa
Catarina e no Rio Grande do Sul, pratica índices diferentes para cada um desses
Estados, respeitando os percentuais apresentados pelo Censo Escolar, ficando,
ipso facto, todos eles, entre 80% e 90%.
Entre 2012 e 2013, a UFFS, sendo contemplada no Plano Nacional de
Expansão das Escolas Médicas Federais, uma das iniciativas do Programa Mais
Médicos, implantou o Campus Passo Fundo e o Curso de Medicina, inicialmente,
com 40 vagas anuais.
O Curso de Medicina, no Brasil, é, certamente, o mais demandado e, por isso,
o que encarna, em elevado grau, a dinâmica elitista e excludente que marcou, ao
longo da história da educação brasileira, os cursos superiores de maior prestígio.
Além disso, na rede privada, o Curso de Medicina é muito caro (o mais caro de
todos), impossível de ser bancado pelos segmentos sociais populares e mesmo
por grande parte dos segmentos médios. Sob o ponto de vista econômico,
sempre foi compensador para as famílias dos extratos superiores colocarem seus
filhos nas escolas privadas de educação básica (mesmo as mais caras), para
garantir, em seguida, uma vaga nos cursos superiores públicos. Por isso, o
prestígio que, na educação básica concentra-se em determinadas escolas privadas,
na educação superior, se transfere, preferencialmente, para as instituições
públicas. Por esse mecanismo, os, aproximadamente, 12% dos alunos que,
tradicionalmente, frequentaram o ensino médio privado, ocupavam, antes da Lei
de Cotas, a maior parte das vagas nos cursos superiores de maior demanda. Essa
inversão no itinerário escolar dos alunos, situada na transição do ensino médio
para a educação superior, com suas conjugadas causas de natureza econômica,
social, étnica e cultural e com seus consequentes efeitos econômicos, sociais,
étnicos e culturais, é que motivou a instauração de uma política de cotas no
Brasil. Ela é particularmente sensível no âmbito do Curso de Medicina, e, por isso,

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é relevante que a avaliação do sistema de cotas brasileiro se referencie,
principalmente, nele e nos outros cursos de elevada demanda.
Esta é a proposta deste estudo que se concentra no Curso de Medicina do
Campus Passo Fundo da UFFS.

1.3. Campus Passo Fundo: dados gerais

A primeira oferta de vagas do Curso de Medicina foi realizada pelo Campus


Passo Fundo no segundo semestre de 2013. Nesta edição e nos dois anos
seguintes, a oferta foi anual, com 40 vagas por certame. Com a ampliação das
vagas para 62, autorizada pelo Ministério da Educação, a partir de 2016, o Campus
passou a ofertar duas turmas anuais com 31 vagas cada. A tabela a seguir mostra
o quantitativo das matrículas realizadas de 2013 a 2021.

Tabela 1: Matrículas realizadas, por ano e semestre - UFFS/PF 2013-2021.


MATRÍCULAS REALIZADAS
ANO
1º Semestre 2º Semestre Total
2013 - 39 39
2014 - 45 45
2015 - 44 44
2016 32 33 65
2017 36 34 70
2018 31 31 62
2019 34 35 69
2020 31 32 63
2021 27 37 64
Total 191 330 521
Fonte: Sistema de Gestão Acadêmica (SGA/UFFS).

Note-se que a soma das vagas autorizadas, computados todos os períodos,


é de 492, mas a soma das matrículas realizadas foi de 521. Essa diferença se deve
ao processo de reaproveitamento das vagas desocupadas em virtude da
desistência de alunos já matriculados ou de sua transferência para outras
instituições. Esse reaproveitamento foi realizado por meio de editais de seleção
interna e externa.
Durante o período, 4 turmas foram diplomadas (2013, 2014, 2015 e 2016/I),
num total de 141 concluintes. As três últimas formaturas foram antecipadas em
função da pandemia da Covid-19, com respaldo na Lei nº 14.040, de 18 de agosto
de 2020. Do total das matrículas realizadas, registra-se também 34 de alunos
desistentes, 3 de alunos transferidos e 2 de alunos com trancamento, restando,
no final de 2021, 341 matrículas ativas.
Considerando o Estado de nascimento dos 521 alunos que foram matriculados
no período, sua distribuição é a apresentada na próxima tabela.

... 7 ...
Tabela 2: Matrículas segundo o Estado de nascimento dos alunos - UFFS/PF 2013-2021.
Ano AM BA CE DF ES GO MA MG MS MT PA PE PI PR RJ RN RO RS SC SP TO Total
2013 2 1 3 1 1 23 3 3 2 39
2014 1 5 4 2 20 9 4 45
2015 1 1 4 28 7 3 44
2016 7 3 2 1 42 8 2 65
2017 2 1 1 1 4 2 1 1 6 2 35 11 2 1 70
2018 3 2 6 1 2 2 1 37 6 1 61
2019 4 3 2 2 1 2 1 45 6 3 69
2020 3 2 1 1 2 1 2 1 2 1 32 10 5 63
2021 1 2 1 3 2 4 1 2 4 1 3 30 7 3 64
Total 1 15 7 2 6 5 1 32 2 4 5 5 1 30 11 3 2 292 67 26 3 520
% 0,19 2,88 1,35 0,38 1,15 0,96 0,19 6,15 0,38 0,77 0,96 0,96 0,19 5,77 2,12 0,58 0,38 56,15 12,88 5,00 0,58 100,00
Na turma 2018/II, há um aluno nascido nos Estados Unidos da América, não sendo, portanto, incluído nesta tabela.
Fonte: Sistema de Gestão Acadêmica (SGA/UFFS).

De modo geral, a tabela mostra que há uma tendência de ampliação dos


Estados representados nas matrículas do Curso de Medicina. Essa tendência não
foi constante, mas se torna bem visível nos anos mais próximos. Com efeito, até
2016, os Estados com alunos matriculados ficaram abaixo de dez; depois disso,
os Estados com alunos matriculados variaram entre 10 e 14. Ao todo, foram
matriculados alunos de 21 Estados da Federação. Em relação ao número de alunos
por Unidade da Federação, destaca-se, com larga vantagem, o Rio Grande do Sul,
com 292 alunos (56,15%), seguido de Santa Catarina com 67 (12,88%), Minas
Gerais com 32 (6,15%), Paraná com 30 (5,77%), São Paulo com 26 (5,00%) e Bahia
com 15 (2,88%).
A presença de pessoas de vários Estados e Regiões do Brasil, considerada
também a política de cotas que garantiu a presença de extratos sociais
diferenciados, constituiu, no contexto do Campus Passo Fundo e do Curso de
Medicina, um ambiente de integração cultural e de vivência cidadã da diversidade.
Entre os alunos matriculados no período, a distribuição por sexo é idêntica
ao perfil da população brasileira. O censo do IBGE de 2010 constatou 51,03% da
população na condição de mulher e 48,97% na condição de homem; entre os
alunos matriculados no período, o sexo feminino representou 51,06% e o
masculino, 48,94%. Na próxima tabela, estão os números absolutos das matrículas,
por sexo, e seus respectivos percentuais e a totalização, por ano e no geral.

Tabela 3: Matrículas, segundo o sexo, por ano e no total - UFFS/PF 2013-2021.


Ano Feminino % Masculino % Total
2013 20 51,28 19 48,72 39
2014 25 55,56 20 44,44 45
2015 25 56,82 19 43,18 44
2016 36 55,38 29 44,62 65
2017 36 51,43 34 48,57 70
2018 29 46,77 33 53,23 62
2019 30 43,48 39 56,52 69
2020 34 53,97 29 46,03 63
2021 31 48,44 33 51,56 64
Total 266 51,06 255 48,94 521
Fonte: Sistema de Gestão Acadêmica (SGA/UFFS).

... 8 ...
A tabela seguinte mostra a média das idades dos alunos, por ano de ingresso
e por sexo; a faixa etária abrangente (menor e maior idade); a média geral de
idade, independente de sexo; e a distribuição dos alunos em segmentos etários,
com sua totalização e respectivos percentuais. O cálculo das idades levou em
conta o ano de nascimento e o ano de ingresso, independentemente do dia e do
mês do aniversário.

Tabela 4: Médias das idades, por ano de ingresso e por sexo; menor e maior idade, média geral e
distribuição dos alunos segundo a faixa etária - UFFS/PF 2013-2021.
Ano Média da idade Faixa etária/Média Geral Alunos por idade em segmentos temporais
Ingresso Feminino Masculino Faixa Média Até 18 19-20 21-22 23-26 27-30 31+
2013 21,8 22,7 18-38 22,2 5 10 11 10 0 3
2014 22,0 25,2 19-36 23,4 0 13 9 14 5 4
2015 21,1 21,2 18-38 21,1 4 20 12 6 1 1
2016 22,0 23,4 18-39 22,7 3 23 15 15 4 5
2017 21,5 22,1 18-34 21,8 6 22 24 10 6 2
2018 20,7 22,7 18-37 21,7 3 30 12 11 2 4
2019 23,5 21,5 18-44 22,3 2 25 25 9 2 6
2020 21,5 23,0 18-41 22,2 2 18 29 8 3 3
2021 21,0 23,2 18-46 22,1 1 21 24 15 0 3
Total de alunos por faixa de idade 26 182 161 98 23 31
Percentual por faixa de idade 4,99 34,93 30,90 18,81 4,41 5,95
Fonte: Sistema de Gestão Acadêmica (SGA/UFFS).

A primeira constatação a ser feita é a média de idade do sexo feminino quase


sempre inferior à média de idade do sexo masculino, excetuando-se, apenas, o
ano de 2019. Em 2014, a média de idade do sexo feminino foi de 3,2 anos menor
do que a do sexo masculino, vindo, depois, 2021, com 2,2 anos, e 2018, com 2
anos. Somente em 2019, o sexo masculino teve a média de idade inferior a do
sexo feminino (2 anos). A situação do conjunto reflete, de alguma forma, o
percurso dos alunos da educação básica, onde se verifica uma distorção idade-
série dos alunos do sexo masculino maior do que a do sexo feminino. Segundo
o Censo da Educação Básica 2020 - Resumo Técnico, do Inep, as taxas de distorção no
terceiro ano ensino médio, em 2020, foram de 24,5% para meninos e 19,5% para
meninas. Outros estudos mostram que o desempenho escolar das meninas, no
ensino médio, é significativamente melhor do que o dos meninos5. Poderão não
ser estes os únicos fenômenos que explicam o retardo da chegada do sexo
masculino ao Curso de Medicina, entretanto a conexão entre os fatos não pode
ser negada.

A concentração avantajada dos alunos nas faixas de19-20 anos (34,93%), 21-22
anos (30,90%) e 23-26 anos (18,81%), perfazendo, no conjunto, 84,64% de todos
os alunos matriculados de 2013 a 2021, permite inferir que, de modo geral, o

... 9 ...
acesso a um curso de Medicina exige alto grau de preparação (por meio, por
exemplo, dos tradicionais cursinhos) e, por certo, várias tentativas de sobrepujar
a elevada concorrência nos processos seletivos6.

O processo seletivo para ingresso nos cursos de graduação da UFFS sempre


se deu por meio do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem), com apenas uma
exceção no ano de 2020, em que parte das vagas foram preenchidas por
vestibular7. As notas (em pontos de zero a mil) maiores e menores com que os
candidatos foram selecionados no Sisu, a diferença entre a maior e a menor nota
(em pontos) e a média geral de todas as notas dos alunos selecionados e
matriculados em cada processo seletivo estão apresentadas na próxima tabela.

Tabela 5: Maiores e menores notas, diferença entre elas e a média dessas notas referentes aos alunos
selecionados em cada processo seletivo - UFFS/PF 2013-2021.
Primeiro semestre Segundo semestre Médias das notas
Ano
Maior nota Menor nota >…< Maior nota Menor nota >…< 1º semestre 2º semestre
2013 - - - 779,96 667,88 112,08 - 734,98
2014 - - - 774,64 660,44 114,20 - 736,53
2015 - - - 786,48 710,08 76,40 - 742,66
2016 784,36 710,96 73,40 771,80 689,96 81,84 746,85 735,49
2017 797,68 711,54 86,14 784,20 624,42 159,78 775,81 724,15
2018 778,80 631,30 147,50 773,64 605,14 168,50 737,84 733,18
2019 794,04 686,78 107,26 784,38 649,60 134,78 758,61 749,63
2020 778,34 527,30 251,04 781,46 648,88 132,58 732,57 732,72
2021 805,12 655,54 149,58 - - - 763,42 -
Obs.: Em 2021, por causa da pandemia da Covid-19, realizou-se um processo seletivo único para as duas turmas do ano.
Fonte: Sistema de Gestão Acadêmica (SGA/UFFS).

A média das diferenças entre a maior e a menor nota de cada processos


seletivos realizados no período, foi de 128,22 pontos, verificando-se a menor
diferença no processo seletivo 2016/I que foi de 73,40 pontos e, a maior, no
processo seletivo 2020/I que foi de 251,04 pontos. Este valor é relativamente
isolado de todos os demais, haja vista que a segunda maior diferença ficou em
159,79 pontos. As diferenças entre as maiores e menores notas são mais elevadas
a partir do segundo semestre de 2017, quando a cota para pessoas com
deficiência começou a ser praticada, cujos alunos ingressaram, no geral, com
notas mais baixas do que os demais. Este fato pode ser melhor detectado nas
duas próximas tabelas, nas quais as notas obtidas pelos alunos selecionados em
todos os processos seletivos aparecem especificadas por tipo de cota, no âmbito
do segmento dos hipossuficientes e do segmento dos não hipossuficientes.
Também são apresentadas as médias dos selecionados em cada cota.

... 10 ...
Tabela 6: Maiores e menores notas e a média dessas notas referentes aos alunos selecionados em cada
processo seletivo, no segmento das cotas para hipossuficientes - UFFS/PF 2013-2021.
Segmento das cotas para candidatos hipossuficientes
Ano PPI(1) PcD(2) EP(3) Médias
Semestre Maior Menor Maior Menor Maior Menor PPI PcD EP
2013 717,20 690,48 - - 757,58 715,16 704,54 - 730,91
2014 723,68 660,44 - - 749,18 720,86 694,23 - 731,72
2015 733,92 725,02 - - 748,40 710,08 729,47 - 733,08
2016/I 722,42 710,96 - - 745,90 722,64 717,88 - 736,89
2016/II 700,06 689,96 - - 737,28 715,04 695,09 - 724,05
2017/I 725,90 712,58 - - 746,12 728,00 720,19 - 737,08
2017/II 685,82 683,94 715,96 694,10 740,86 724,20 684,88 700,17 729,15
2018/I 738,12 730,46 720,20 631,30 763,86 737,68 734,29 689,64 745,04
2018/2 714,92 703,68 605,14 - 744,30 711,92 707,67 605,14 726,77
2019/I 735,28 731,70 686,78 - 772,50 739,54 733,75 686,78 754,63
2019/II 735,62 729,76 649,60 - 755,86 738,26 733,27 649,60 744,39
2020/I 712,58 704,04 527,30 - 750,20 748,34 708,31 527,30 749,39
2020/II 716,28 711,98 707,02 - 734,00 721,98 714,13 707,02 728,35
2021/I-II 737,90 721,08 669,94 655,54 786,58 753,60 726,51 662,74 764,87
(1)
Pardos, pretos e indígenas; (2) Pessoas com deficiência; (3) Escola pública - Fonte: Sistema de Gestão Acadêmica (SGA/UFFS).

As diferenças das notas entre os primeiros e os últimos colocados, em cada


processo seletivo, na cota destinada a pardos, pretos e indígenas foram, no geral
muito pequenas (respectivamente aos processos seletivos, em pontos: 26,72;
63,24; 8,90; 11,46; 10,10; 13,32; 1,88; 7,66; 11,24; 3,58; 5,86; 8,54; 4,30; 16,82).
Na cota para pessoas com deficiência, houve apenas uma vaga preenchida para
cada segmento, com exceção dos processos seletivos 2017/II e 2018/I, quando o
Sisu posicionou essa cota em quatro lugares, como se demonstrou acima e no
processo seletivo de 2021 que constituiu as duas turmas do ano em apenas um
certame. As diferenças entre os primeiros e os últimos colocados da cota para a
escola pública foram também muito pequenas (respectivamente, em pontos:
42,42; 28,32; 38,32; 23,26; 22,24; 18,12; 16,66; 26,18; 32,38; 32,96; 17,60; 1,86;
12,02; 32,98).

Os selecionados nas cotas destinadas às pessoas com deficiência, com


exceção do primeiro processo seletivo, tiveram notas menores que os últimos
classificados nas outras cotas.

A próxima tabela performa a mesma disposição de dados da anterior, referida,


desta vez, aos alunos selecionados no segmento das cotas destinadas a
candidatos não hipossuficientes.

... 11 ...
Tabela 7: Maiores e menores notas e a média dessas notas referentes aos alunos selecionados em cada
processo seletivo, no segmento das cotas para não hipossuficientes - UFFS/PF 2013-2021.
Segmento das cotas para candidatos não hipossuficientes
Ano PPI(1) PcD(2) EP(3) Médias
Semestre Maior Menor Maior Menor Maior Menor PPI PcD EP
2013 710,76 667,88 - - 767,84 745,74 698,64 - 753,20
2014 736,66 729,50 - - 759,58 733,78 733,28 - 745,19
2015 739,46 729,68 - - 768,08 737,66 735,25 - 753,17
2016/I 746,00 731,68 - - 764,46 752,24 738,87 - 759,51
2016/II 750,56 735,16 - - 758,14 740,98 742,03 - 748,53
2017/I 746,80 744,00 - - 772,68 757,20 745,40 - 764,09
2017/II 722,62 676,38 699,30 624,32 764,70 747,26 695,55 652,33 757,30
2018/I 717,10 714,40 687,60 640,46 770,46 766,58 715,75 669,71 767,78
2018/2 749,18 719,44 679,02 - 765,26 755,08 729,64 679,02 761,20
2019/I 765,12 736,60 693,32 - 793,04 775,96 753,74 693,32 780,08
2019/II 745,00 731,06 738,82 - 775,24 768,88 738,25 738,82 772,49
2020/I 729,34 719,08 725,34 - 778,34 744,70 724,21 725,34 760,83
2020/II 717,88 717,66 711,64 - 765,62 757,56 717,77 711,64 759,83
2021/I-II 755,82 738,12 761,36 728,02 801,10 779,22 747,14 744,69 788,02
(1)
Pardos, pretos e indígenas; (2) Pessoas com deficiência; (3) Escola pública - Fonte: Sistema de Gestão Acadêmica (SGA/UFFS).

Nas cotas destinados ao segmento dos não hipossuficientes, as diferenças das


notas entre os primeiros e os últimos colocados foram similares às do segmento
descrito anteriormente. Para a cota dos pardos, pretos e indígenas: 42,88; 7,16;
9,78; 14,32; 15,40; 2,80; 46,24; 2,70; 29,74; 28,52; 13,94; 10,26; 0,22; e 17,70. Da
mesma forma, para a cota da escola pública: 22,10; 25,80; 30,42; 12,22; 17,16;
15,48; 17,44; 3,88; 10,18; 17,08; 6,36; 33,64; 8,06; e 21,88.

Os selecionados nas cotas destinadas às pessoas com deficiência na maioria


das vezes, tiveram notas menores que os últimos classificados nas outras cotas.

A tabela a seguir faz o mesmo exercício das duas anteriores, especificando as


pontuações obtidas em todos os processos seletivos por grupos que estão fora
do sistema geral de cotas, mas participam de cotas especiais criadas pela UFFS:
a cota para alunos que frequentaram parcialmente a escola pública e cota
específica para indígenas. A tabela traz também os dados da ampla concorrência.
Para todos os grupos são apresentadas a maior e a menor nota dos candidatos
classificados e média das notas destes, em cada processo seletivo. Quando apenas
uma vaga for preenchida por determinado grupo, em determinado processo
seletivo, a menor nota deixa de existir e a média repete a nota do único
classificado.

... 12 ...
Tabela 8: Maiores e menores notas e a média dessas notas referentes aos alunos selecionados em cada
processo seletivo, no segmento das cotas próprias da UFFS (parcialmente pública e indígenas) e da
ampla concorrência - UFFS/PF 2013-2021.
Segmento dos candidatos para as cotas próprias da UFFS (parcialmente pública e indígenas) e da ampla concorrência
Ano PP(1) A2(2) AC(3) Médias
Semestre Maior Menor Maior Menor Maior Menor PP A2 AC
2013 754,80 - - - 779,96 771,54 754,80 - 777,05
2014 772,36 - - - 774,64 - 772,36 - 774,64
2015 752,04 - - - 786,48 736,38 752,04 - 761,61
2016/I 774,52 - - - 784,36 762,66 774,52 - 773,51
2016/II 770,10 - - - 771,80 761,46 770,10 - 766,63
2017/I 755,44 - 711,54 - 797,68 771,78 755,44 711,54 781,02
2017/II 767,38 - 659,96 - 784,20 776,28 767,38 695,96 779,95
2018/I 770,82 - 728,24 - 777,80 777,60 770,82 728,24 777,70
2018/2 754,62 - 722,76 - 773,67 762,84 764,62 722,76 768,24
2019/I 780,14 - 739,14 - 794,04 793,78 780,14 739,14 793,91
2019/II 772,86 - 695,42 - 784,38 782,66 772,86 695,42 783,52
2020/I 775,28 - 701,96 - 773,64 - 775,28 701,96 773,64
2020/II 772,26 - 648,88 - 781,46 - 772,26 648,88 781,46
2021/I-II 793,20 790,52 703,32 686,50 805,12 790,00 791,86 694,91 797,88
(1)
Parcialmente pública; (2) Indígenas (cota/UFFS); (3) Ampla concorrência - Fonte: Sistema de Gestão Acadêmica (SGA/UFFS).

Nesta tabela, importa observar a similaridade entre as notas dos selecionados


pela cota parcialmente escola pública e as dos selecionados pela ampla
concorrência, questão que será retomada em tópico específico.

2. Avaliação da política e do sistema de cotas

2.1. A cota para a escola pública

Como mencionado anteriormente, o sistema de cotas da UFFS optou pelo


percentual dos alunos públicos do ensino médio do Rio Grande do Sul, apurados
pelo Censo Escolar do Inep, para ser o critério de definição do percentual de
reserva de vagas nos cursos de graduação nos campi instalados neste Estado. O
resultado alcançado para o Curso de Medicina do Campus Passo Fundo é o que
mostra a tabela a seguir, destacando os números das matrículas dos alunos
oriundos da escola pública (com percentuais sobre o total das matrículas) e da
escola privada, por ano e semestre, ingressantes através de editais de
transferência, por ano, e total geral das matrículas, por ano.

... 13 ...
Tabela 9: Matrículas de alunos oriundos da escola pública e da escola privada, por ano, semestre; e
matrículas de alunos ingressantes por transferência - UFFS/PF 2013-2021.
Escola pública Escola privada Transfe-
Ano Total
1º semestre 2º semestre Total % 1º semestre 2º semestre Total rências
2013 - 36 36 92,31 - 3 3 - 39
2014 - 35 35 77,78 - 2 2 8 45
2015 - 33 33 75,00 - 3 3 8 44
2016 29 28 57 87,69 2 2 4 4 65
2017 25 28 53 75,71 5 4 9 8 70
2018 26 28 54 87,10 4 3 7 1 62
2019 28 28 56 81,16 3 3 6 7 69
2020 27 29 56 88,89 4 3 7 - 63
2021 22 36 58 90,63 5 1 6 - 64
Total - - 438 84,07 - - 47 36 521
Fonte: Sistema de Gestão Acadêmica (SGA/UFFS).

Nesta tabela, podem ser observados números com ligeiras disparidades ao


longo dos anos. Isso se deve principalmente às desistências e transferências, que
foram compensadas com a recepção de alunos transferidos, processo que não
segue a classificação por cotas. O elevado percentual de alunos egressos da escola
pública se deve ao sistema de cotas adotado pela UFFS, cuja performance está
quantificada na próxima tabela.

Tabela 10: Alunos matriculados como hipossuficientes e não hipossuficientes na reserva de vagas para
escola pública, por ano e semestre - UFFS/PF 2013-2021.
Reserva de vagas para hipossuficientes Reserva de vagas para não hipossuficientes
Ano Total
1º semestre 2º semestre Total % 1º semestre 2º semestre Total %
2013 - 18 18 51,4 - 17 17 48,6 35
2014 - 17 17 48,6 - 18 18 51,4 35
2015 - 17 17 53,1 - 15 15 46,9 32
2016 14 14 28 50,9 14 13 27 49,1 55
2017 13 13 26 50,0 12 14 26 50,0 52
2018 13 14 27 50,9 13 13 26 49,1 53
2019 14 14 28 51,9 13 13 26 48,1 54
2020 14 14 28 50,9 13 14 27 49,1 55
2021 29 29 51,8 27 27 48,2 56
Total 218 51,05 209 48,95 427
Fonte: Sistema de Gestão Acadêmica (SGA/UFFS).

Há pequenas disparidades entre o segmento dos hipossuficientes e o


segmento dos não hipossuficientes, embora a Lei indique uma repartição meio
a meio (cf. Lei nº 12.711/2012, Art. 1º, parágrafo único). Ocorre que essa
repartição está submetida à regra do arredondamento prevista no Decreto nº
7.824/2012, §§ 1º e 2º, convertendo os números fracionados em inteiros
superiores, favorecendo o segmento com prioridade no preenchimento, que, no
caso, é o dos alunos hipossuficientes. Vale sublinhar que o montante de
matrículas vinculadas às cotas, 427, representa um percentual de 86,79% sobre o
total de vagas ofertadas no período, que foi de 492.
A primeira ordem a ser considerada na avaliação do sistema de cotas é a
destinada aos alunos oriundos do ensino médio público. Com os dados das

... 14 ...
inscrições e das notas obtidas no Enem pelos candidatos, é possível visualizar a
hipótese do preenchimento das vagas na ausência da política de cotas. A próxima
tabela mostra essa situação hipotética. Considerou-se as vagas ofertadas pelo
Curso de Medicina do Campus Passo Fundo, em cada processo seletivo (40 vagas
nos três primeiros anos, e 31 vagas, em duas edições anuais, nos anos
subsequentes, com exceção de 2021, cujos dados estão agregados, pois foi
realizado um único processo seletivo, sendo chamados 62 candidatos e, depois,
divididos em duas turmas) e o quantitativo dos candidatos inscritos em cada
certame. Na ausência da política de cotas, os resultados seriam os apresentados
nas 6ª e 7ª colunas, onde aparecem os classificados hipotéticos, por rede escolar
de origem (nível médio). Nas quatro colunas anteriores, são apresentadas as notas
maiores e menores de cada segmento, considerando o número de vagas ofertadas
(por exemplo, a primeira e a quadragésima nota dos inscritos de 2013 ou a
primeira e a trigésima primeira nota dos inscritos de 2016/I). Por fim, as duas
últimas colunas apresentam o universo dos inscritos.

Tabela 11: Simulação do preenchimento das vagas ofertadas com os primeiros colocados, em cada
processo seletivo, no rank do Sisu, caso não houvesse sistema de cotas - UFFS/PF 2013-2021.
Notas/escola pública Notas/escola Privada Classificados Inscritos
Ano
Maior Menor Maior Menor Pública Privada Pública Privada
2013 776,24 770,08 792,82 768,90 3 37 7.514 5.666
2014 815,06 767,48 786,00 764,80 6 34 5.650 1.372
2015 794,42 757,20 790,98 759,68 19 21 2.638 514
2016/I 780,38 762,46 803,90 761,48 11 20 1.553 348
2016/II 777,92 768,92 797,44 767,28 3 28 3.453 946
2017/I 786,10 772,68 797,68 771,98 6 25 1.559 500
2017/II 785,04 768,66 822,54 770,64 4 27 3.500 708
2018/I 773,26 764,88 790,84 769,92 15 16 1.988 368
2018/II 767,88 766,80 795,28 767,44 2 29 2.783 602
2019/I 793,04 775,96 794,04 776,20 16 15 1.787 409
2019/II - - 793,12 780,82 0 31 4.770 1.023
2020/I 779,38 772,10 783,00 768,94 5 26 1.947 465
2020/II 788,36 761,90 781,46 761,28 4 27 2.234 400
2021/I-II 810,58 784,36 805,12 784,98 40 22 3.360 721
Total 134 358 44.736 14.042
Fonte: Sistema de Gestão Acadêmica (SGA/UFFS).

Note-se, antes de tudo, que as diferenças entre as notas - seja considerando


a maior e a menor em cada segmento, seja considerando as dos candidatos da
rede pública e da rede particular - são relevantes apenas para fins de classificação;
não o seriam para qualquer outro objetivo que pretendesse detectar, nos
candidatos inscritos, uma característica essencial ou meritocrática. Mesmo
perante diferenças de notas tão pequenas, no certame de 2019/II, na ausência da
política de cotas, nenhum aluno oriundo da escola pública teria ingressado no
curso. Em outros oito certames, a presença de alunos da escola pública não teria
atingido 20% do total ((2013 (7,50%); 2014 (15,00%); 2016/II (9,68%); 2017/I
(19,35%); 2017/II (12,90%); 2018/II (6,45%); 2020/I (16,13%); e 2020/II (12,90%)),

... 15 ...
embora o percentual de inscritos desse grupo fosse, respectivamente, 57,01%;
80,46%; 78,50%; 75,72%; 83,17%; 82,22%; 80,72%; e 84,82%. Em seis casos, os
inscritos desse grupo teriam uma taxa de sucesso bem melhor, embora aquém do
percentual das respectivas inscrições: 2015 (47,50%), 2016/I (35,48%), 2018/I
(48,39%), 2019/I (51,61%) e 2021 (64,52%).
Não há dúvidas de que, sob o aspecto analisado neste tópico, a política de
cotas está trazendo resultados substanciais para a escola pública. Na ausência
dela, de acordo com a simulação realizada, as vagas ofertadas teriam sido
preenchidas majoritariamente por egressos da escola privada. Das 492 vagas
ofertadas no período de 2013 a 2021, 358 (72,76%) teriam sido ocupadas por
alunos da escola privada e, apenas, 134 (27,24%), por alunos da escola pública. Ao
passo que, no abrigo do sistema de cotas da UFFS, o percentual da escola pública,
como já referido (ver Tabela 9), foi de 84,07%.
A política de cotas, por certo, está promovendo um processo bastante
positivo no âmbito das escolas públicas que é a ampliação do horizonte de
possibilidades para seus alunos ingressarem em cursos superiores públicos de alta
demanda, algo antes muito restrito. Empenhos e esforços nessa direção
qualificam a educação pública básica. Essas hipóteses são mais difíceis de
demonstrar com dados diretos e números exatos, mas as inscrições no Sisu
apontam nessa direção. No conjunto dos processos seletivos, o curso obteve
59.040 inscrições; destas, 44.736 (75,77%) de egressos da escola pública, 14.042
(23,78%) de egressos da escola privada e 262 (0,44%) de indígenas inscritos na cota
específica criada pela UFFS.8

2.2. A cota para alunos hipossuficientes

A segunda ordem do sistema de cotas a ser examinada é a reserva de vagas


para candidatos hipossuficientes: 50% das vagas destinadas à escola pública.
Como está disposto na Tabela 10, em todos os processos seletivos realizados até
o momento, o segmento dos hipossuficientes ocupou 218 vagas (51,05%) e o
segmento dos não hipossuficientes ocupou 209 vagas (48,95%).
Caso a reserva de vagas para integrantes de famílias com renda familiar per
capita inferior a um salário mínimo e meio não tivesse sido criada, repetindo o
mesmo padrão de simulação feito na Tabela 11, o quadro hipotético do
preenchimento das vagas ficaria como demonstrado na tabela que segue.

... 16 ...
Tabela 12: Simulação do preenchimento das vagas ofertadas com os primeiros colocados, em cada
processo seletivo, no rank do Sisu, caso o sistema de cotas não tivesse reservado vagas específicas
para hipossuficientes - UFFS/PF 2013-2021.
Notas/hipossuficientes Notas/não hipossuficientes Classificados Inscritos
Ano
Maior Menor Maior Menor Hiposs. Não hiposs. Hiposs. Não hiposs.
2013 761,58 750,60 776,24 748,90 4 31 4.318 3.196
2014 772,00 749,18 815,06 749,46 3 32 2.806 2.844
2015 757,18 752,70 794,42 752,58 5 27 1.327 1.311
2016/I 763,40 754,46 780,38 753,94 4 24 775 778
2016/II 757,16 748,46 777,92 749,62 3 24 1.785 1.668
2017/I 777,84 - 786,10 759,36 1 24 774 785
2017/II 785,04 - 777,40 758,58 1 26 1.797 1.703
2018/I 763,86 757,24 773,26 756,52 3 23 1.274 714
2018/II 753,66 - 767,88 753,72 1 26 1.600 1.183
2019/I 772,50 - 793,04 773,06 1 26 956 831
2019/II 768,04 - 777,98 768,04 1 26 2.707 2.063
2020/I 751,60 750,68 779,38 750,74 3 24 1.110 837
2020/II - - 788,36 750,22 0 28 1.331 903
2021/I-II 786,58 783,26 810,58 781,14 2 54 1.819 1.541
Total 32 395 24.379 20.357
Fonte: Sistema de Gestão Acadêmica (SGA/UFFS).

Das 427 vagas reservadas, no período de 2013 a 2021, para alunos que
cursaram integralmente o ensino médio em escolas públicas, na hipótese de não
existir a cota para hipossuficientes, 395 (92,51%) teriam sido ocupadas por
candidatos oriundos da escola pública, independente de renda, e apenas 32
(7,49%) teriam ficado com candidatos de baixa renda, embora o percentual de
inscritos deste grupo fosse significativamente superior (54,50% contra 45,50%). As
diferenças das notas de cada grupo, mais uma vez, demonstram que são
significativas apenas para fins de classificação, não autorizando qualquer juízo
que aponte, por exemplo, para garantias de maior desempenho futuro na
realização do curso pretendido. As cotas têm, portanto, a virtude de desbloquear
o ingresso burocrático do sistema de seleção, no qual alguns décimos ou
centésimos a mais nas notas eram suficientes para manter uma estrutura elitizada
e segregacionista na educação superior brasileira. O conceito da educação como
bem público (e, especialmente, como direito) requer medidas que a
democratizem e, se ainda não é possível distribuí-la universalmente e na mesma
medida, é imperioso reparti-la equitativamente entre os grupos que compõem o
tecido social.
Sabe-se que a educação básica pública recepciona principalmente os
integrantes da base, absurdamente larga, da pirâmide social brasileira, mas,
apesar disso, ela não é, de forma alguma, similar em todos os lugares e não
oferece a mesma formação indistintamente. Os graus dos benefícios escolares
têm relação direta com a renda das famílias, elemento que, quando insuficiente,
obstrui, de todas as formas, a dinâmica de ascensão social das pessoas. Em
divulgação recente, o IBGE fez o mapa do rendimento domiciliar per capita dos

... 17 ...
brasileiros, fornecendo a média e a mediana, em valores mensais, no todo e
discriminadas por sexo e raça/cor.

Tabela 13: Rendimento domiciliar per capita da população brasileira - Brasil 2020.
Rendimento domiciliar per capita das pessoas (em Reais) - Brasil 2020
Sexo Cor ou raça
Total
Homem Mulher Branca Parda Preta
Médio Mediano Médio Mediano Médio Mediano Médio Mediano Médio Mediano Médio Mediano
1.349,00 836,00 1.381,00 856,00 1.318,00 822,00 1.842,00 1.080,00 959,00 672,00 983,00 707,00
Fonte: IBGE, 2021

A mediana é o valor intermediário numa sequência de elementos que, no


caso, são as pessoas, mostrando, portanto, que a metade da população brasileira
tem rendimento per capita igual ou inferior ao apontado nesta tabela, no geral (R$
836,00) e para cada grupo específico (homens: R$ 856,00; mulheres: R$ 822,00;
brancos: R$ 1.080,00; pardos: R$ 672,00; e pretos: R$ 707,00). Do outro lado da
mediana, a pirâmide continua a mostrar faixas largas com rendimentos baixos,
afunilando-se, mais adiante, rumo à cumeeira, radicalmente estreita, onde os
rendimentos são paradisíacos.
Laborou com acerto, portanto, a Lei de Cotas ao segmentar a reserva de vagas
para os egressos do ensino médio público, destinando 50% delas para integrantes
de famílias de baixa renda. Como se verificou nas tabelas 10 e 12, foi esta cota
específica que garantiu, em vez de um volume residual, uma presença significativa
de alunos hipossuficientes no Curso de Medicina que está em exame.
Pontuou-se, parágrafos acima, que a educação pública não é similar em todos
os lugares e nem opera com o mesmo grau de qualidade. É um continente cuja
planície ostenta, aqui e ali, elevações significativas, algumas são como altas
montanhas. A Lei de Cotas esteve atenta a essa realidade e, por isso, definiu cotas
menores e específicas dentro da cota maior que é a da escola pública. O modelo,
porém, não conseguiu prever todas as situações que poderiam obstaculizar o
alcance dos objetivos pretendidos, uma delas constituída no próprio universo da
escola pública. Os colégios militares, os institutos federais e as escolas de
aplicação/escolas técnicas das universidades federais constituem uma dessas
elevações que podem contrariar, em certa medida, os propósitos da Lei de Cotas.
A próxima tabela apresenta os quantitativos das matrículas realizadas no Curso
de Medicina, nos quadrantes do sistema de cotas, cujos alunos são oriundos
desses três tipos de instituições.

... 18 ...
Tabela 14: Alunos matriculados no sistema de cotas, provindos de Colégios Militares (CM), Institutos
Federais (IF) e Escolas de Aplicação/Escolas Técnicas ligadas à Universidades Federais (E/UF), por ano
e semestre de ingresso - UFFS/PF 2013-2021.
Semestre Escolas 2013 2014 2015 2016 2017 2018 2019 2020 2021 Total
Primeiro CM - - - 1 2 2 3 7 3 18
IF - - - 4 3 4 5 3 2 21
E/UF - - - 1 2 - - - - 3
Segundo CM 4 2 3 2 1 5 5 6 5 33
IF 1 2 5 1 1 3 2 6 10 31
E/UF 1 - - 1 2 - 2 1 1 8
Total Geral 6 4 8 10 11 14 17 23 21 114
Fonte: Sistema de Gestão Acadêmica (SGA/UFFS).

Observe-se que há uma tendência de crescimento expressivo de ocupação de


vagas feito por alunos dos três tipos de instituições destacados. No total do
período, foram 114 matrículas que representam 26,70% de todas as matrículas
feitas na reserva de vagas para a escola pública (427). Os colégios militares
respondem por 51 (44,74%) desses alunos, os institutos federais por 52 (45,61%)
e as escolas de aplicação/escolas técnicas das universidades federais por 11
(9,65%). Desses alunos, 72 (63,16%) ingressaram pelo segmento da escola pública
não hipossuficientes e 42 (36,84%), pelo segmento dos hipossuficientes.
Como se observa na tabela acima, em 2021, das 56 vagas reservadas para
oriundos da escola pública, os egressos desses três tipos de instituições
ocuparam 21, o que representa 37,50% do total dessas vagas.
Esse fenômeno pode representar uma tendência prejudicial ao sistema de
cotas. Com o tempo, as vagas dos cursos superiores federais mais disputados
poderão ser monopolizadas pelos egressos desses três tipos de escolas, à medida
que se evidencia a tendência de setores sociais elitizados pressionarem essa
ponte de passagem para o sistema de cotas da educação superior. Quanto mais
competentes essas instituições se mostrarem para conseguir as aclamadas vagas
na educação superior, mais elitizado se tornará o seu ensino médio. Essa
propensão é particularmente preocupante em relação aos colégios militares9, pois
eles não praticam a política oficial de cotas em relação ao ensino médio - como
fazem os institutos federais -, além de cobrarem taxas ou mensalidades e
realizarem processos seletivos restringentes10. Essas instituições poderão
desempenhar no âmbito das cotas para a escola pública o que o olimpo das
escolas particulares desempenha, em termos de hegemonia, nos processos
seletivos de ampla concorrência. Nas proposições feitas no final do texto, sugere-
se uma forma de corrigir essa insinuante distorção.

... 19 ...
2.3. A cota para pardos, pretos e indígenas e a cota para pessoas com
deficiência

A terceira ordem do sistema de cotas a ser analisada é a que determina a


reserva de vagas, em cada segmento da cota para escola pública (hipossuficiente
e não hipossuficiente), para alunos da escola pública autodeclarados pardos,
pretos e indígenas, na proporção, no mínimo, igual ao percentual que os
respectivos grupos têm na população, segundo o último censo do IBGE para a
Unidade da Federação onde o curso é ofertado.
A Tabela 15 apresenta os dados consolidados de todo o período (2013-2021),
mostrando as matrículas em cada cota, por condição étnica, tanto no segmento
dos hipossuficientes quanto no segmento dos não hipossuficientes.

Tabela 15: Cotas para hipossuficientes e não hipossuficientes e, dentro delas, as cotas para pardos,
pretos e indígenas e para pessoas com deficiência, segundo a cor - UFFS/PF 2013-2021.
Condição Hipossuficientes Não hipossuficientes Total
Étnica PPI(1) PcD(2) EP(3) PPI(1) PcD(2) EP(3)
Brancos 0 12 150 0 13 140 315
Pretos 4 0 0 1 2 0 7
Pardos 40 5 4 43 2 3 97
Indígenas 0 0 0 1 0 0 1
Amarelos 0 0 2 0 0 1 3
N/D 0 0 1 0 0 3 4
Total 44 17 157 45 17 147 427
(1)
Pardos, pretos e indígenas; (2) Pessoas com deficiência; (3) Escola pública - Fonte: Sistema de Gestão Acadêmica (SGA/UFFS).

Observando os números de cada coluna, chama a atenção a presença


avassaladora da cor branca entre os alunos cotistas: 315 (73,8%) de um total de
427. Onde sua presença não é obstruída legalmente, a cor branca é quase
absoluta: 83,3% na cota das pessoas com deficiência hipossuficientes; 95,6% na
cota da escola pública para alunos hipossuficientes; 81,3% na cota de pessoas com
deficiência não hipossuficientes; e 95,3% na cota da escola pública para alunos
não hipossuficientes.
Nas cotas da condição étnica, a dissonância não é menor. Ao colocar num
único pacote pardos, pretos e indígenas, a Lei acabou criando um entrave quase
intransponível para pretos e indígenas. Com efeito, no segmento dos
hipossuficientes, os pardos ocupam 91,5% das vagas e, no segmento dos não
hipossuficientes, 95,7%. No cômputo geral das cotas, os pardos representam
22,7%.
Os pretos participam, apenas, com 9,09% na cota específica para pardos,
pretos e indígenas no segmento dos alunos hipossuficientes e 2,22%, na mesma
cota, no segmento dos alunos não hipossuficientes; 11,76% na cota de pessoas
com deficiência não hipossuficientes, e 1,64% no cômputo geral. Nenhuma
presença de negros é verificada na cota para pessoas deficiência hipossuficientes,

... 20 ...
na cota da escola pública para alunos hipossuficientes e na cota para escola
pública para alunos não hipossuficientes.
Os indígenas só têm um representante na cota para pardos, pretos e
indígenas não hipossuficientes.
Amarelos e sem cor declarada têm presença mínima (3 e 4, respectivamente).
Não há dúvida, portanto, de que a disponibilização das vagas para esses três
grupos, disputadas na mesma modalidade de contingente, estimula e facilita a
preponderância de ocupação dessas oportunidades pelos autodeclarados pardos.
Os estudantes autodeclarados pretos e indígenas, por sua vez, concorrem com
extraordinária desvantagem diante do obstáculo gerado pelo desenho do sistema
de cotas.
Contudo, se cotas não houvesse, os pardos teriam, por sua vez, chances
mínimas perante os brancos. Em situação hipotética, sem a cota específica,
comparando as notas dos candidatos inscritos no segmento escola pública de
baixa renda, a presença dos pardos cairia das atuais 49 (22,48%) matrículas para,
apenas, 6 (2,75%); e, no segmento escola pública sem a condição da renda, a
situação seria ainda pior: das atuais 48 (22,97%) matrículas, para 3 (1,44%).
A manutenção da ação afirmativa para pardos é inquestionável, mas a
configuração do sistema precisa contemplar os autodeclarados pretos e indígenas
em condições de igualdade - na medida de sua desigualdade - para disputar as
vagas, já que, no atual modelo, restam exageradamente comprimidos. Ao passo
que os pardos matricularam 97 representantes do grupo (22,71% do total da
escola pública), os pretos, nas mesmas condições, conseguiram, apenas, 7
matrículas (1,64% do total da escola pública). Os indígenas conseguiram apenas
1 matrícula. Nas considerações finais, será apresentada a solução para esse
problema.

2.4. A cota própria para indígenas

Em 2016, a UFFS criou uma cota especial para alunos indígenas (Resolução nº
6/Consuni/CGRAD/UFFS/2012, Art. 2º, I, b - redação dada pela Resolução nº 8/2016
- Consuni/CGAE, de 25 de outubro de 2016), sendo sua condição comprovada pela
apresentação do Rani (Registro Administrativo de Nascimento de Indígena) ou
declaração atestada pela Funai (id. Art. 7º, VII). A Portaria Normativa nº 18/2012
(Art. 10, §2º) faculta às instituições federais, no exercício de sua autonomia e
considerando a realidade local, assegurar reserva de vagas separadas para os
indígenas. Foram duas as razões para que a Universidade tomasse essa medida:
(a) a percepção de que os estudantes indígenas disputam em condições desiguais
no âmbito da cota que agrupa pardos, pretos e indígenas, sabendo-se que o

... 21 ...
itinerário escolar desses diferentes grupos não são comparáveis; e (b) a existência,
na abrangência geográfica da UFFS, da maior concentração de terras indígenas da
Região Sul.
Por meio desta modalidade de cota, de 2017 a 2021, foram matriculados 10
estudantes indígenas (1 em cada processo seletivo), enquanto que, pelo processo
das cotas segundo o sistema geral da Lei, de 2013 a 2021, apenas 1 aluno
ingressou no curso, como pode ser observado na Tabela 15. Esses estudantes
provêm dos seguintes Estados: Ceará (1), Distrito Federal (1), Mato Grosso do Sul
(1), Pará (3), Pernambuco (4). Pela distribuição geográfica dos alunos indígenas,
no que se refere ao Curso de Medicina do Campus Passo Fundo, até o momento,
resta completamente frustrada a segunda razão pela qual da UFFS criou essa cota
específica. Pelo menos em parte, essa situação resulta do fato de existirem duas
categorias de indígenas, os aldeados e os desaldeados, com itinerários escolares
bastante diversos. Nenhum dos alunos referidos integra comunidades indígenas
aldeadas.

2.5) A cota para a escola parcialmente pública

Com base na experiência realizada entre 2010 e 2012, quando o sistema de


bonificação ao egresso do ensino médio da escola pública também incentivava
aquele que realizara parcialmente esse nível escolar na rede pública ou aquele
que frequentara escolas comunitárias financiadas, em parte, pelo poder público,
a UFFS criou uma pequena cota destinada a esse público, que, segundo análises
da época, se aproximava muito mais do perfil do aluno do ensino médio público,
do que do aluno que frequentara integralmente as escolas privadas. Essa cota,
segundo a Resolução nº 6/2012 do Conselho Universitário, é destinada a
“candidatos que tenham cursado parcialmente o ensino médio em escola pública
(pelo menos um ano com aprovação) ou em escolas de direito privado sem fins
lucrativos, cujo orçamento da instituição seja proveniente do poder público, em
pelo menos 50%” (Resolução nº 6/Consuni/CGRAD/UFFS/2012).
Confrontando as notas dos selecionados por esta cota e pela ampla
concorrência, em cada processo seletivo, verifica-se que, se a cota não existisse
e se os inscritos nessa cota se tivessem inscrito na ampla concorrência, mesmo
assim, pelos menos, 6 candidatos teriam conquistado sua vaga. Esse número
configura um percentual de sucesso correspondente ao percentual das inscrições
que grupo realizou ao longo do período de 2013 a 2021. A próxima tabela
apresenta os dados dos inscritos nos grupos da ampla concorrência e dos que
realizaram o ensino médio parcialmente em escola pública, das vagas
conquistadas por cada grupo e a situação hipotética da inexistência da cota para
o último grupo.

... 22 ...
Tabela 16: Inscritos nos grupos da ampla concorrência e da cota para candidatos que realizaram o
ensino médio parcialmente em escola pública, com as vagas conquistadas na situação real e na
hipótese de inexistência da mencionada cota, com respectivos percentuais.
Inscritos e vagas conquistadas (situações: real e hipotética) AC(1) PP(2) Total % AC % PP
Inscritos (2013-2021) 12.258 1.808 14.066 87,15 12,85
Vagas conquistadas (2013-2021) 33 15 48 68,75 31,25
Vagas conquistadas - hipótese sem cota PP (2013-2021) 42 6 48 87,50 12,50
(1)
Ampla concorrência; (2) Formação escolar parcialmente pública - Fonte: Sistema de Gestão Acadêmica (SGA/UFFS).

Na situação hipotética, os candidatos inscritos na ampla concorrência (que


representam 87,15% do total das inscrições) conquistaram 42 vagas (87,50% do
total das vagas). Os candidatos inscritos na cota destinada a alunos que cursaram
parcialmente a escola pública (que representam 12,85% das inscrições), por sua
vez, conquistaram 6 vagas (12,50% do total). Considerando que, na situação
hipotética, o segundo grupo conquistou vagas na proporção quase exata do
universo dos inscritos, resta demonstrado que a condição de o estudante ter
frequentado parcialmente o ensino médio escola pública não é entreve para o
acesso fluido ao nível superior. É plausível inferir, por outro lado, que essa cota,
no caso específico do Curso de Medicina do Campus Passo Fundo, representa um
privilégio muito mais do que uma ação afirmativa, tendo em vista que para um
percentual de 12,85% dos inscritos, o grupo, por conta da cota, conquistou 31,25%
das vagas. Salvo melhor juízo, esta cota deve deixar de existir no âmbito da UFFS.

2.6. A inserção regional

Faz parte do projeto da UFFS corresponder às expectativas da comunidade


regional em termos de ensino, pesquisa e extensão. O Plano Nacional de
Expansão da Escolas Médicas (Programa Mais Médicos), por sua vez, buscou a
regionalização e a interiorização da formação médica federal para atingir o
mesmo propósito: atender às demandas locais quanto aos serviços de saúde.
Importa, pois, demonstrar em que proporções o Curso de Medicina do Campus
Passo Fundo está (ou não) cumprindo esse desiderato. A Tabela 17 apresenta o
rol dos Estados com o maior número de alunos matriculados e seu percentual em
relação ao total de matrículas realizadas no período de 2013 a 2021, que foi de
521. Destaca também o número de municípios com até 50 mil habitantes, de cada
Estado, com alunos matriculados e o percentual desses municípios em relação ao
total de municípios do respectivo Estado com alunos matriculados.

... 23 ...
Tabela 17: Estados com o maior número de alunos matriculados, com respectivo número de matrículas
e o percentual dessas em relação ao total das matrículas realizadas no período de 2013-2021 (521);
municípios com, até, 50 mil habitantes e percentual destes em relação ao total de municípios do
Estado com alunos matriculados - UFFS/PF 2013-2021.
Estados com maior número de estudantes matriculados
Municípios com até 50.000 habitantes
Matrículas
Unidades da Federação Alunos
Total Percentual(2)
Total Percentual(1) Total Percentual(1)
Rio Grande do Sul 292 56,05 80 74,77 131 25,14
Santa Catarina 67 12,86 28 73,68 39 7,49
Minas Gerais 32 6,14 10 41,67 10 1,92
Paraná 30 5,76 10 58,82 10 1,92
São Paulo 26 4,99 1 5,26 1 0,19
Bahia 15 2,88 4 44,44 6 1,15
Total 462 88,68 133 62,15 197 37,81
Outros Estados 59 11,32 12 26,67 12 26,67
Total geral 521 100,00 145 70,05 209 40,12
(1)
Relativo ao total de matrículas do Curso de Medicina; (2) Relativo ao total de municípios (dos Estados) com estudantes
matriculados. Fonte: Sistema de Gestão Acadêmica (SGA/UFFS).

O destaque feito aos municípios de pequeno porte e sua expressiva


representação perante os municípios do respectivo Estado que têm alunos
matriculados é imprescindível para demonstrar o impacto da política de cotas,
pois, sabe-se que, nesses municípios, a rede escolar da educação básica é, quase
exclusivamente, pública. Além disso, é nos pequenos municípios que o sistema
de saúde enfrenta as maiores dificuldades para fixar profissionais médicos.
Espera-se que alunos provindos dessas localidades, por causa de seus vínculos
culturais aclimatados no lugar, a elas retornem, em alguma proporção
significativa, depois de se tornarem médicos.
A tabela seguinte circunscreve, de forma mais específica, a região de
abrangência da UFFS, designada Mesorregião Grande Fronteira do Mercosul
(GFM)11. As 389 matrículas provenientes da Região Sul equivalem a 74,66% de
todas as matrículas efetuadas de 2013 a 2021; os 161 municípios donde provêm
alunos do Curso de Medicina representam 12,52% dos municípios da Região Sul;
e os 117 municípios com, até, 50 mil habitantes representam 72,67% dos
municípios da Região Sul donde provêm alunos do Curso de Medicina.

Tabela 18: Alunos provindos da Região Sul e Mesorregião Grande Fronteira do Mercosul (GFM),
municípios de procedência dos alunos e, destes, os que têm, até, 50 mil habitantes e percentuais da
GFM relativos à Região Sul - UFFS/PF 2013-2021.
Alunos/Municípios Região Sul GFM % (GFM)
Alunos matriculados (2013-2021) 389 216 55,53
Municípios de procedência dos alunos 162 79 48,77
Municípios com até 50 mil habitantes 117 55 47,01
Fonte: Sistema de Gestão Acadêmica (SGA/UFFS).

Os cursos de Medicina costumam movimentar alunos entre Regiões e entre


as Unidades da Federação em volume, provavelmente, maior do que os outros
cursos superiores de graduação. Isso é importante para a formação cultural da

... 24 ...
comunidade universitária e para o adensamento da identidade nacional.
Entretanto, é preciso atribuir méritos à política de expansão das escolas médicas
federais e ao sistema de cotas que, conjugados, abriram possibilidades de acesso
aos cursos de Medicina para as comunidades locais e para os segmentos sociais
populares. Os dados apresentados neste tópico, lidos em combinação com os
demais apresentados ao longo de todo o texto, comprovam esta tese.

2.7. A questão da qualidade

Nos anos que precederam a implantação das cotas, e mesmo depois de 2012,
os argumentos contrários a elas, mal disfarçando, sob o manto da meritocracia,
um arraigado impulso segregacionista, se concentravam principalmente na
hipótese de que a qualidade da educação superior pública seria seriamente
afetada. À medida que a disponibilidade de dados permitiu estudos sistemáticos
e conclusivos, a hipótese entrou em descrédito e já não integra o escol das
alegações daqueles que ainda combatem a política. Pesquisas e publicações sobre
a qualidade acadêmica dos alunos cotistas e, sobretudo, de seu progresso
avantajado durante a realização do curso, existem em grande quantidade12, o que
dispensa este texto de aprofundar-se na questão. Entretanto, apenas para
corroborar as conclusões dos estudos específicos, serão apresentadas, aqui,
algumas informações retiradas do Teste de Progresso (TP).
O TP é uma avaliação cognitiva que verifica o ganho contínuo e progressivo
de conhecimento dos alunos de medicina. Alunos, cursos e instituições se
beneficiam dessa avaliação para qualificar o processo formativo. Trata-se de um
instrumento consolidado internacionalmente (iniciou na década de 1970, por
iniciativa da Universidade de Missouri - EUA - e da Universidade de Maastricht -
Holanda), sendo introduzido, no Brasil, na segunda década deste século, com
edições regionais em 2013, 2014, 2015, 2016, 2018 e 2019, ano em que o TP
integrou as ações institucionais da Associação Brasileira de Educação Médica
(Abem), que, em 2021, coordenou sua aplicação e a estendeu para o âmbito
nacional.
O Campus Passo Fundo da UFFS participa do teste desde 2016, quando apenas
os dois primeiros anos do curso realizaram a prova. A partir de 2018, essa
participação passou a ser plena com todos os anos do curso funcionando e
participando do exame. A próxima tabela trata das três últimas edições e traz a
média dos percentuais de acertos atingidos pelos alunos do primeiro e do último
ano dos cursos avaliados (o do Campus Passo Fundo da UFFS, os do Estado do Rio
Grande do Sul e, em 2021, os do Brasil). A tabela também apresenta a diferença
entre as médias dos percentuais atingidos pelos alunos do primeiro em confronto
com os do último ano.

... 25 ...
Tabela 19: Média dos percentuais de acertos atingidos pelos alunos do primeiro e do último ano dos
cursos avaliados (UFFS, RS e Brasil); Diferença entre as médias dos percentuais atingidos pelos alunos
do primeiro e a do último ano dos cursos avaliados - TP 2018, 2019, 2021.
Ano do Alunos do Percentuais de acertos obtidos Progresso do 1º ao 6º (5º) anos (%)
teste ano do curso UFFS/PF RS Brasil UFFS/PF Região Brasil
1º Ano 30,65 32,44 -
2018 34,91 34,05 -
6º Ano 65,56 66,49 -
1º Ano 30,56 32,14 -
2019 35,00 34,35 -
6º Ano 65,56 66,49 -
1º Ano 30,65 32,44 31,69
2021 25,24 23,35 23,05
5º Ano 55,89 55,79 54,74
Fonte: Abem Nacional - Teste de Progresso - Resultados por período.

Em 2021, a formatura do 6º ano do Curso de Medicina da UFFS foi antecipada


em virtude da pandemia da Covid-19 (Lei nº 14.040/2020), não participando, pois,
do TP, sendo considerado, em seu lugar, o rendimento dos alunos do 5º ano.
Como ficou demonstrado ao longo do texto, os alunos cotistas da UFFS
alcançaram, no período de 2013 a 2021, 90,31% das matrículas, não considerando
aqueles que ingressaram por transferência (mas considerando os ingressantes
pelas cotas próprias da UFFS: para indígenas e para alunos que cursaram
parcialmente o ensino médio em escolas públicas). Trata-se, por certo, da maior
taxa de cotas praticada pelas instituições públicas brasileiras. Mesmo assim, nas
edições do TP de 2018 e 2019, a média dos percentuais de acertos dos alunos da
UFFS está muito próxima da média dos alunos do Estado, porém na última edição
(2021), embora ficando ligeiramente abaixo no desempenho do 1º ano, ultrapassa
a média do Estado e a média nacional, no 5º ano. Isso mostra que o curso com
maior percentual de cotistas se equipara (com alguma vantagem na última
edição), em rendimento, aos cursos públicos que têm menor percentual de cotas,
somados aos cursos privados.
O indicador mais alvissareiro, todavia, é o que aparece nas três últimas
colunas da tabela: a diferença entre a média de acertos do primeiro ano em
confronto com a média de acertos do último ano. Em todas as edições do TP, as
diferenças verificadas na UFFS/PF entre as médias de acertos dos alunos do
primeiro ano e as médias de acertos dos alunos do último ano foi sempre
superior às diferenças das outras duas populações, com vantagem mais saliente
no último exame. Esse indicador sinaliza o aprendizado durante a realização dos
estudos, ou seja, o conhecimento agregado pelo processo pedagógico promovido
pelo curso e pelo empenho individual dos alunos.

3. Projetos de lei no Congresso Nacional


Neste ano de 2022, a Lei de Cotas completa dez anos de vigência. Diante da
expectativa de sua revisão pelo Congresso Nacional, o tema das cotas ganhou
repercussão em periódicos nacionais e internacionais, com matérias jornalísticas13

... 26 ...
que problematizam aspectos específicos dessa política e, de maneira especial,
sinalizam as incertezas quanto à oportunidade da revisão da Lei em ano eleitoral
e alertam para riscos de retrocessos.
No Parlamento, entretanto, o debate, a rigor, não se estabeleceu, embora
vários projetos tenham sido apresentados, estando em fases diferentes de
tramitação. A maior parte destes projetos foi iniciada na Câmara dos Deputados,
mas há também alguns projetos tramitando no Senado Federal.
Apesar da existência desse significativo número de projetos de lei - alguns dos
quais agregando vários parlamentares como proponentes, a exemplo do Projeto
de Lei nº 3.402/2020, da deputada Marília Arraes (PT/PE), que agregou mais 49
parlamentares signatários; do Projeto de Lei nº 3.422/2021, do deputado Valmir
Assunção (PT/BA), que agregou mais 39 signatários; e do Projeto de Lei nº
5.384/2020, da deputada Maria do Rosário (PT/RS), que agregou mais 6 signatários
-, a matéria mereceu pouca atenção e escasso aprofundamento. Isso fica patente
ao se observar a singeleza das propostas, as justificativas genéricas acostadas
tanto aos projetos originais quanto aos eventuais substitutivos e o espírito
meramente burocrático que acompanha a tramitação dos mesmos. Quanto a este
último aspecto, é importante referir que, na tramitação de todos os projetos
analisados por este estudo, os tempos dedicados às emendas foram
completamente desperdiçados, pois nenhuma foi apresentada em qualquer das
fases de análise ou em qualquer das comissões nas quais os projetos deram
entrada. Audiências públicas requeridas foram apenas três e realizadas, duas (uma
na Câmara e outra no Senado). Nas fundamentações das propostas são quase
imperceptíveis os estudos sistemáticos e as pesquisas realizadas no âmbito das
instituições educacionais e afins.
A pandemia da Covid-19 e um conjunto de outros assuntos polêmicos que
concentraram as atenções da República, somados ao clima pré-eleitoral e à
inatividade do Ministério da Educação, são, certamente, as razões principais para
a relativa apatia quanto à matéria e também para a singeleza das proposições.
Os projetos de lei, aqui examinados, podem ser agregados de acordo a
natureza das mudanças que propõem à Lei nº 12.711/2012, resultando na
sistemática que segue.

3.1. Projetos que tratam do período de revisão da Lei de Cotas

Sob esta rubrica, foram apresentados 3 projetos na Câmara dos Deputados


e 1 projeto no Senado Federal.

... 27 ...
a) O Projeto de Lei nº 5.384/2020, da deputada Maria do Rosário (PT/RS),
torna permanente a política de cotas, garantindo, também, assistência
estudantil para alunos que a necessitem.
b) O Projeto de Lei nº 3.422/2021, do deputado Valmir Assunção (PT/BA),
estende o prazo de revisão da política de cotas por mais 50 anos,
prevendo bolsas de permanência para os alunos hipossuficientes. Este
projeto também cria o Conselho Nacional das Ações Afirmativas no
Ensino Superior, com estrutura paritária entre membros de organizações
estatais e da sociedade civil, para subsidiar os poderes públicos nas
avaliações e no monitoramento da política, com relatórios quinquenais.
c) O Projeto de Lei nº 1.788/21, do deputado Bira do Pindaré (PSB/MA),
amplia o prazo para revisão da política de cotas dos atuais 10, para 30
anos. Na Comissão dos Direitos das Pessoas com Deficiência (CPD), esse
tempo foi reduzido para 15 anos e, em seguida, corrigido para 20 anos.
d) O Projeto de Lei nº 1.676/2021, do senador Rogério Carvalho (PT/SE),
torna a reserva de vagas na educação federal política pública permanente.

3.2. Projetos que tratam da regionalização das cotas

Desde 2015, o tema da regionalização das cotas frequenta o debate público


nas Regiões Nordeste e Norte, principalmente. A percepção de que as vagas são
majoritariamente ocupadas por candidatos dos grandes centros e mesmo de
Estados e Regiões diversas da localização da instituição que realiza a oferta,
principalmente em relação aos cursos de maior demanda, gerou movimentos em
favor de cotas restritas ao município, à microrregião, à mesorregião, ao Estado
etc. Vários projetos fizeram eco a esses movimentos, como o Projeto de Lei nº
3.079/2015, do deputado Victor Mendes (PV/MA), que acresce em 10% a
pontuação final no processo seletivo para o candidato que comprovar domicílio,
há pelo menos 5 anos, na macrorregião do País em que se encontra sediada a
instituição na qual pleiteia vaga. A este processo foram apensados os projetos da
relação seguinte.
a) O Projeto de Lei nº 3.489/2015, do deputado Roberto Sales (PRB/RJ), dá
prioridade na classificação dos alunos cotistas para os residentes, há 5
anos, no município sede da instituição federal de educação ou no
município de influência desta. Além disso, para os candidatos que
concorrem com a pontuação do Enem, prevê majoração da nota em 10%.
c) O Projeto de Lei nº 8.818/2017, do deputado Rubens Pereira Jr. (PT/MA),
propõe que as vagas reservadas pela Lei de Cotas sejam preenchidas por

... 28 ...
candidatos residentes em municípios do mesmo estado-membro em que
esteja localizado o campus da Universidade Federal correspondente,
abrangendo também candidatos de municípios de outros Estado que
estejam na região de influência dessa instituição.
d) O Projeto de Lei nº 4.010/2020, do deputado Danilo Cabral (PSB/PE),
prevê o preenchimento de, pelo menos, 30% das vagas ofertadas nos
cursos de graduação federais para estudantes que cursaram o ensino
médio em escolas da região geográfica imediata em que será ofertado o
curso superior.
e) O Projeto de Lei nº 5.044/2020, da deputada Natália Benevides (PT/RN),
institui o “Argumento de Inclusão Regional”, para possibilitar às
instituições federais de educação superior criarem cotas regionais para
atender aos alunos que cursaram parcial ou totalmente o ensino médio
em escolas regulares presenciais.
f) O Projeto de Lei nº 3.658/2015, do Fernando Monteiro (PP/PE), altera a Lei
nº 10.473, de 2002, que instituiu a Fundação Universidade Federal do
Vale do São Francisco, para estabelecer que as vagas disponibilizadas por
esta instituição favoreçam preferencialmente os candidatos residentes na
Região Administrativa Integrada de Desenvolvimento do Polo Petrolina
(PE) e Juazeiro (BA).
g) O Projeto de Lei nº 5.286/2020, do deputado Rubens Pereira Jr.
(PCdoB/MA), propõe a regionalização das cotas, apenas de nível médio,
para candidatos domiciliados no Estado da oferta, abrangendo também
candidatos de municípios de outros Estados que estejam na região de
influência da instituição ofertante.
h) O Projeto de Lei nº 810/2021, do deputado Neucimar Fraga (PSD-ES),
determina que, “atendidos os critérios dos processos seletivos
estabelecidos pelo Sistema de Seleção Unificada (SISU) e pelas respectivas
Instituições de Ensino Superior (IES) públicas, 50% das vagas distribuídas
serão disponibilizadas para candidatos selecionados residentes na
Unidade da Federação onde está situada a IES escolhida.” Faz a mesma
proposta para os Institutos Federais e para os programas Fies e Prouni.
O texto não é nada claro, mas a justificativa (igualmente obscura, quanto
a este aspecto) sugere que o referido percentual de 50% se refira às vagas
que permanecerem ociosas após a conclusão do processo seletivo.
Dessa intrincada plêiade de propostas, derivou um substitutivo do deputado
Bira do Pindaré, em 30 de setembro de 2021, atribuindo às instituições federais

... 29 ...
de educação a prerrogativa de criarem seu critério regional de reserva de vagas,
majorando percentualmente a pontuação obtida pelo candidato no processo
seletivo.
Sobre esta temática, no Senado Federal, foi apresentado o Projeto de Lei nº
282/2018, do senador Fernando Bezerra Coelho (MDB/PE), reservando 30% das
vagas remanescentes à distribuição pelas cotas, em todas as instituições federais
do Nordeste, para candidatos domiciliados no Semiárido.

3.3. Projetos que contemplam a pós-graduação na política de cotas

O Projeto de Lei nº 3.402/2020, da deputada Marília Arraes (PT/PE), altera a


Lei nº 12.711/2012 para determinar aos programas de pós-graduação (mestrado,
mestrado profissional e doutorado) das instituições federais, a reserva de vagas,
por curso e turno, de, no mínimo, 50% para estudantes que tenham cursado
integralmente o ensino médio em escolas públicas. Na Comissão de Educação
(CE), a relatora deputada Natália Bonavides (PT-RN) elaborou um substitutivo que
cria projeto de lei autônoma, específica para pós-graduação, destinando a cota
para pessoas com deficiência, negros, oriundos de comunidades quilombolas e
indígenas, sem o critério da escola pública. Também propõe a criação de
comissões de heteroidentificação pelas instituições com a finalidade de avaliar as
autodeclarações.
O Projeto de Lei nº 3.552/2020, do senador Confúcio Moura (MDB/RO)
também trata de cotas para a pós-graduação. Este estende a política de cotas para
a pós-graduação stricto sensu segundo o sistema já estabelecido pela Lei de
Cotas, respeitando a autonomia das instituições federais de ensino superior e os
critérios de mérito definidos nos respectivos editais.

3.4. Projetos que tratam de cotas para pessoas com deficiência

A esse respeito, o Projeto de Lei nº 1.527/2019, do deputado Léo Moraes


(Podemos/PR), reapresenta o Projeto de Lei nº 485/2015, do deputado Alfredo
Nascimento (PL/RN), que institui a reserva de 5% das vagas nas instituições
federais de ensino superior e de ensino técnico de nível médio para pessoas com
deficiência. Durante sua tramitação na CPD, a relatora deputada Soraya Manato
(PSL/ES) elaborou substitutivo, ampliado para 10% a reserva de vagas no segmento
da escola pública e 10% no segmento da ampla concorrência. Além disso, o
substitutivo redefine a exigência da Lei de Cotas para o acesso às cotas de nível
médio: ao candidato não se exigirá ensino fundamental cursado integralmente em

... 30 ...
escola pública, mas, apenas relativo aos anos finais desse nível de ensino (Ensino
Fundamental II).

3.5. Projetos isolados

O Projeto de Lei nº 4.799/2020, do deputado Felipe Rigoni (PSB/ES),


determina que, nos processos seletivos, todos os candidatos, independentemente
de estarem inscritos em cotas específicas, participem da ampla concorrência e,
em sendo classificados nessa modalidade, não comprometerão as vagas
reservadas nas cotas específicas. Esse projeto pretende solucionar o problema,
já identificado, de alunos que concorrem pelas cotas terem nota de corte superior
a dos que participam da ampla concorrência.
O Projeto de Lei nº 1.983/2021, do senador Jorge Kajuru (Podemos/GO),
reserva vagas para egressos do “Programa de Acolhimento Institucional”, depois
de terem aguardado a adoção, sem o conseguir, até os 18 anos.
Finalmente, o Projeto de Lei nº 4.656/2020, do senador Paulo Paim (PT/RS),
propõe alterações à Lei de Cotas para garantir a continuidade da política
enquanto “o preenchimento de vagas por curso e turno, por autodeclarados
pretos, pardos e indígenas e por pessoas com deficiência, nos termos da
legislação, é inferior à proporção respectiva de pretos, pardos, indígenas e
pessoas com deficiência na população da unidade da Federação onde está
instalada a instituição”. Satisfeito esse critério, a cota pode ser descontinuada a
partir do quinto ano subsequente. Além disso, estende a aplicação da política de
cotas às instituições de ensino privadas. Finalmente, torna obrigatória a
classificação racial do aluno, por autodeclaração ou por iniciativa da instituição.
Até aqui, foram relacionados e caracterizados os projetos que reafirmam a Lei
de Cotas, propondo-lhes determinados ajustes e complementos. Na sequência,
também serão trazidos a lume os projetos que descaracterizam a política
instituída pela Lei nº 12.711/2012. Antes, porém, cabe tecer algumas
considerações sobre o conjunto dos projetos que reafirmam a política de cotas.
Num primeiro olhar, fica evidente que o Parlamento circundou externamente
a política de cotas sem examiná-la por dentro, sem perscrutar o funcionamento
concreto do sistema, por isso as proposições restaram empobrecidas. Os dados
com que os parlamentares trabalharam até o momento são restritos e
insuficientes para sustentar uma abordagem substancial e de conjunto. Não cabe,
todavia, apontar as armas da crítica para os parlamentares, principalmente num
contexto absolutamente conturbado no qual os poderes centrais se moveram nos
últimos anos. Além disso, não é próprio do Parlamento a gestão, o
acompanhamento e a avaliação minuciosa das políticas conduzidas pelo Estado.
Para isso existe o Executivo que tem o dever de subsidiar o debate congressual

... 31 ...
e, de modo especial, formular os projetos estruturantes para o país, submetendo
ao Legislativo, pelas vias cabíveis, minutas maduras e sólidas para serem
convertidas em leis. Do mesmo modo, cabe ao Executivo avaliar detidamente os
projetos em desenvolvimento para dar curso, quando necessário, às devidas
reformulações. Somente assim evitam-se a dispersão das iniciativas e os
sobrevoos genéricos que dela derivam. No caso específico, a inatividade e/ou
omissão do Ministério da Educação deu/deram causa às deficiências na
formulação dos projetos de lei. Como é sabido, o MEC não conduziu processos
de pesquisa e de análises consistentes da política de cotas, nem dialogou com as
instituições de educação e entidades correlacionadas no sentido de avaliar
amplamente o modelo. Ao contrário, seus sucessivos comandos - breves,
desnorteados e beligerantes - deram as costas para as principais políticas
educacionais do Estado, entre elas, a que está em evidência.
O exame dos projetos parlamentares demonstra que vários deles tiveram
como único intento evitar consequências nefastas que poderiam advir de um
processo atabalhoado de revisão do programa, conforme previsto no Art. 7º da
Lei nº 12.711/2012, que reza:
Art. 7º No prazo de dez anos a contar da data de publicação desta Lei, será
promovida a revisão do programa especial para o acesso às instituições de
educação superior de estudantes pretos, pardos e indígenas e de pessoas com
deficiência, bem como daqueles que tenham cursado integralmente o ensino
médio em escolas públicas.

A revisão do programa requer embasamento conferido por estudos, análises


e debates amplos e competentes, coisa que não aconteceu, muito em virtude da
pandemia da covid-19 e, principalmente, em função da inatividade e do
truncamento do diálogo institucional promovido, em sentido amplo, pelo
governo e, em sentido estrito, pelo Ministério da Educação. Diante desse cenário,
talvez a atitude mais sensata seja a de, apenas, dilatar o prazo para a revisão do
sistema, embora, passados dez anos, ajustes importantes - como os apontados
neste texto - mereçam e devam ser realizados para que os objetivos iniciais sejam
preservados e potencializados.
Os vários projetos interessados em conferir um caráter regional às cotas
transitaram em terreno escorregadio, muito embora sejam a expressão de uma
problemática real e frequente nos debates acadêmicos. A dificuldade está em
definir os contornos para sua aplicação prática e segura. Além disso, faltaram
dados comprovando a pertinência da tese aventada. De qualquer forma, o
processo se encaminha para atribuir às instituições educacionais a prerrogativa
legal de estabelecer cotas regionais de acordo com a realidade experimentada por
cada uma delas.
Os projetos que tratam de cotas para a pós-graduação, para pessoas com
deficiência (ampliação do já regulamentado) e de egressos do Programa de

... 32 ...
Acolhimento Institucional estão insuficientemente delineados, o que adiará,
certamente, a produção de acordos e entendimentos a respeito deles.
A proposta do senador Paulo Paim é mais abrangente e causará, em sendo
aprovada, grande impacto sobre o sistema. Mas dificilmente poderá ser aprovada
porque está mal desenhada e se faz acompanhar de argumentos frágeis. Em
primeiro lugar, o projeto prevê que, se identificada paridade entre o percentual
de pardos, pretos, indígenas e pessoas com deficiência na sociedade e no
preenchimento das vagas da educação superior ou do ensino médio, conforme
o caso, a política pode ser suspensa, como se o objetivo da cota fosse criar essa
paridade momentânea. Mesmo que o objetivo fosse esse, a paridade, sendo
produzida pela política de cotas, deixaria de se verificar, imediatamente, após a
sua supressão. Mas a política de cotas não objetiva produzir essa paridade, senão
promover o senso de justiça descrito no tópico 1.1 deste relatório analítico e
promover maior isonomia social nas profissões e na vida institucional da
sociedade.
Ademais, essa paridade entre os percentuais na população e nos alunos para
ter algum sentido requer a aplicação das cotas para todo o sistema da educação
superior e do ensino médio, ou seja, a política de cotas deverá incidir,
indistintamente, sobre as instituições públicas e privadas. O Projeto de Lei nº
4.656/2020 prevê essa condição para a educação superior, mas ela parece
bastante inócua sem a garantia da gratuidade para os alunos cotistas. Em ficando
a política de cotas restrita às instituições federais, o cálculo da paridade
desvirtua-se completamente já que compara a população total na Unidade da
Federação onde ocorre a oferta das vagas com uma parte diminuta dos alunos da
educação superior. Em 2020, segundo o Inep, apenas 14,45% dos alunos da
educação superior estavam matriculados em instituições federais. Atingidos,
portanto, os índices de paridade entre esses relativamente poucos alunos e os
índices da Unidade da Federação não significa, de forma alguma, que a educação
superior, como um todo, tenha atingido os índices verificados na população total.
Quanto às cotas do ensino médio, a situação seria ainda mais díspar. Esse
conceito de paridade carrega outro problema insolúvel. A política de cotas
contempla o Brasil, mas os percentuais de pardos, pretos, indígenas e pessoas
com deficiência estão referenciados localmente (na Unidade da Federação). Sendo
a configuração populacional brasileira muito diversa, é evidente que as Unidades
da Federação atingirão essa paridade em tempos diferentes e, nesse caso, a
política de cotas, que é nacional, ficaria suspensa num lugar e em vigência num
outro, o que geraria um movimento migratório de estudantes inédito e
incontrolável.
A proposta de tornar obrigatória a declaração racial rescende certa ilegalidade
e ineficácia. Todos aqueles que pretendem disputar cotas raciais já,

... 33 ...
necessariamente, fazem essa declaração; quanto aos demais, não parece haver
razão ou legalidade suficiente para que as instituições a realizem
compulsoriamente.
Finalmente, o Projeto de Lei nº 4.656/2020 causa a impressão de ter ele
confundido a política de cotas criada pela Lei nº 12.711/2012 - que é ampla e
contempla, antes de tudo, os estudantes egressos da escola pública, subdivididos
em hipossuficientes e não hipossuficientes, para contemplar, nesses segmentos,
as cotas específicas - com uma política restrita para pardos, pretos, indígenas e
pessoas com deficiência. Ora, prever a suspensão da política de cotas quando
houver paridade nos índices de pardos, pretos, indígenas e pessoas com
deficiência na educação superior e na sociedade é desconsiderar que essa política
tem abrangência maior. Faltou definir um indicador para decidir quando as cotas
para egressos da escola pública atingirão um patamar satisfatório a ponto de
autorizar a descontinuidade da política. E quando descontinuar a política para as
instituições federais de nível médio?

3.6. Projetos que descaracterizam a política de cotas

Entraram, no Congresso Nacional, pelo menos, quatro projetos orientados


para a descaracterização da política de cotas.
a) O Projeto de Lei nº 1.443/2019, da deputada Dayane Pimentel (PSL/BA),
propõe a revogação da Lei nº 12.711/12, sob o seguinte argumento: “Se
os brasileiros devem ser tratados com igualdade jurídica, pretos, pardos,
indígenas, pessoas com deficiência e estudantes oriundos de famílias com
renda igual ou inferior a 1,5 salário-mínimo per capita não deveriam ser
destinatários de políticas públicas que criam, artificialmente, divisões
entre brasileiros, com potencialidade de criar indevidamente conflitos
sociais desnecessários.” Em 19/3/2019, a autora requereu a retirada deste
projeto, apresentando, em seguida, outro menos radical.
b) O Projeto de Lei nº 1.531/2019, da deputada Dayane Pimentel (PSL/BA),
reforma a Lei de Cotas suprimindo as cotas destinadas a pardos, pretos
e indígenas, mantendo o mesmo argumento do projeto anterior.
c) O Projeto de Lei nº 5.303/2019, do deputado Dr. Jaziel (PL/CE), tem o
mesmo teor do Projeto de Lei nº 1.531/2019, acompanhado do seguinte
argumento: “A educação superior pública, bem como o ensino médio
técnico público, devem ser de acesso a todo e qualquer brasileiro,
independentemente da cor e da raça. Cabe unicamente beneficiar aqueles
que sejam egressos das instituições de ensino público e de baixa renda,
assim como as pessoas com deficiência.”

... 34 ...
d) O Projeto de Lei nº 4.125/2021, do deputado Kim Kataguiri (DEM-SP),
restringe a política de cotas aos estudantes de baixa renda e veda,
expressamente, a discriminação positiva para o ingresso nas instituições
de ensino federal com base em cor, raça, origem ou qualquer critério,
exceto o de baixa renda.
As minutas e suas justificações mal disfarçam a cosmovisão racista e
segregacionista ainda forte em setores da sociedade brasileira, além de
demonstrar completo desconhecimento do sistema escolar e crassa ignorância a
respeito da estrutura social e seu funcionamento. A autora dos projetos de lei nº
1.443/2019 e nº 1.531/2019, por exemplo, utiliza, num projeto, o inciso IV do Art.
3º da Constituição Federal para suprimir todo o tipo de cotas e, em seguida, o
mesmo fundamento para restabelecê-las todas, menos para pardos, pretos e
indígenas. Na retirada do primeiro projeto, em 19/03/2019, para ser substituído,
depois, pelo segundo, a autora alega que “o texto apresenta erro que distorce o
real propósito do Projeto, que é revogar tão somente as Cotas Raciais”. Essa
postura em sociologia tem nome. Além disso, a alegação de que as cotas raciais
criam divisões artificiais e potencializam conflitos deturpa completamente a
verdade factual, pois as cotas criaram nas universidades um ambiente de maior
integração e solidariedade.
O mesmo posicionamento é demonstrado pelo autor do Projeto de Lei nº
5.303/2019, ao reconhecer direito às cotas para egressos da escola pública,
hipossuficientes e pessoas com deficiência, mas negá-lo aos pardos, pretos e
indígenas. Não é outra, também, a motivação do autor do Projeto de Lei nº
4.125/2021 quando restringe as cotas apenas para alunos de baixa renda. Quanto
à justificação do Projeto de Lei nº 4.125/2021, assim como afirma que “a pobreza,
como se sabe, não tem cor; atinge negros e brancos”, é um conjunto de chavões
simplistas, superficiais e inverídicos.
Em prosperando, esses projetos representariam um duro golpe contra a
democratização da educação brasileira e um empecilho para a superação de
velhas mazelas sociais.

Considerações finais: proposições


A título de considerações finais, são formulados vários ajustes, objetivando
tornar o sistema mais justo, mais efetivo e mais coerente com os propósitos da
Lei de Cotas. Alguns desses ajustes são mais estratégicos e necessários do que
outros, mas todos eles estão orientados unicamente para aperfeiçoar a política
e o sistema de cotas, jamais deturpá-los. Os ajustes propostos são:

... 35 ...
a) A questão mais premente a exigir, sem sombra de dúvidas, ajustes na Lei de
Cotas é a que se refere aos grupos de raça/cor. Como ficou evidenciado no
tópico 2.3, o grupo dos pardos fecha, quase completamente, a porta de
acesso para os pretos e indígenas, embora tenha ficado evidente também que
os pardos necessitam da cota para manter presença significativa no Curso de
Medicina. A solução do problema só pode estar na instituição de cotas
individualizadas por grupo: uma cota para pardos, uma cota para pretos e
uma cota para indígenas, no âmbito das quais os integrantes de cada grupo
concorrem apenas entre si, a exemplo do que está sendo praticado em
relação às pessoas com deficiência (cuja cota separada também precisa ficar
clara na Lei). Embora, em determinados Estados, o índice populacional de
pretos e indígenas seja bastante baixo, mesmo assim é vantajoso para esses
grupos terem cota específica, pois, segundo a regra de arredondamento, cada
cota garantirá, pelo menos, um integrante de cada grupo em todos os
processos seletivos. No caso do Curso de Medicina do Campus Passo Fundo,
um sistema de cotas separadas teria, até o momento, matriculados, pelo
menos, 15 representantes (podendo chegar a 30) dos autodeclarados pretos
e 15 representantes (podendo chegar a 30) dos autodeclarados indígenas,
situação radicalmente mais favorável do que a atual que, pelo sistema geral
(não contando a cota própria da UFFS, favorecendo os indígenas), matriculou
apenas 7 pretos e 1 indígena. Quanto à cota específica para indígenas criada
pela UFFS é preciso assinalar sua relevância porque foi ela que garantiu a
presença efetiva de representantes desse grupo étnico no Curso de Medicina.
Conforme referência feita acima, essa iniciativa foi responsável por 10 das 11
matrículas de indígenas realizadas de 2013 a 2021. Há, entretanto, entre os
autodeclarados indígenas aqueles que vivem em aldeias e os que vivem em
espaços urbanos14, com estilos de vida e oportunidades escolares
diferenciados. Nenhum dos indígenas matriculados até o momento integra
grupos aldeados/rurais. É oportuno, portanto, que a Lei de Cotas trate dessa
questão de forma a garantir a presença de indígenas aldeados nos cursos
superiores, estabelecendo, por exemplo, uma divisão meio a meio, nos
lugares onde o percentual de indígenas na população do Estado garantir duas
ou mais vagas reservadas para indígenas, em cada segmento da cota para a
escola pública. Nos lugares onde esse percentual não garantir esse volume de
vagas reservadas, a Lei deve estipular que a vaga reservada para
hipossuficientes seja para um indígena aldeado, ficando a outra (do segmento
para não hipossuficientes) sem essa exigência específica.
b) O segundo ajuste a ser feito diz respeito aos candidatos egressos dos
colégios militares, dos institutos federais e das escolas de aplicação ligadas
às universidades públicas. Há fortes evidências de que essas instituições
dotam seus alunos de qualificação diferenciada, similar ou superior às

... 36 ...
melhores escolas particulares, apropriando-se, pois, progressivamente, das
vagas reservadas para o padrão médio dos egressos da educação básica
pública. O ajuste sugerido para este caso está em condicionar as cotas
reservadas para egressos do ensino médio público, no caso desses três
grupos de escolas, apenas, para aqueles alunos que, nessas instituições,
cursarem o ensino médio na condição de cotistas, em sistema organizado de
acordo com a Lei de Cotas (considerando o percentual de vagas reservadas,
o conjunto das cotas previstas e o modo de seleção para seu preenchimento),
como ocorre nos institutos federais de educação, ciência e tecnologia. Os
alunos que, nessas instituições, não forem cotistas durante o ensino médio
deverão participar da ampla concorrência nos cursos superiores federais.
Além disso, os alunos cotistas nessas instituições devem acessar o ensino
médio por meio de processos seletivos similares aos dos institutos federais
e não serem submetidos a pagamento de mensalidades ou taxas de qualquer
natureza.
c) O universo dos egressos do ensino médio público com renda familiar per
capita igual ou inferior a um salário mínimo que buscam cursos superiores
está aumentando e já ultrapassa o número daqueles que tem renda familiar
per capita superior a esse limite. Como ficou demonstrado neste texto, os
inscritos do grupo hipossuficiente em todos os processos seletivos realizados
pelo Curso de Medicina do Campus Passo Fundo, entre 2013 e 2021, atingiu
o percentual de 54,50% relativo ao universo dos egressos do ensino médio
público. Sugere-se, portanto, ampliar a reserva de vagas para esse grupo, que
atualmente está em 50,00%, para, no mínimo, 60,00%, considerando não
apenas o índice atual de inscrições, mas também o necessário estímulo
profissional que precisa ser direcionado aos segmentos populares do Brasil.
d) As instituições federais envidaram muitos esforços, criatividade e ousadia
para encontrar uma fórmula que impedisse a utilização estratégica da
autodeclaração com o objetivo de burlar os processos seletivos e, em última
instância, a própria política de cotas. De modo geral, foram usadas, por
analogia, a Orientação Normativa MPOG nº 3, de 1º de agosto de 2016, e, na
sequência, a Portaria Normativa MPOG nº 4, de 6 de abril de 2018, atinentes
à heteroidentificação nos concursos para servidores públicos, para organizar
comissões de heteroidentificação nos processos seletivos das cotas étnico-
raciais. Porém a insegurança jurídica é constante. A Lei de Cotas precisa criar
a figura institucional da Comissão de Heteroidentificação, mista, plural e
especializada, com a presença de representantes das etnias, servidores da
instituição, estudantes e, se possível, de representantes de instituições afins
da sociedade civil, atribuindo ao MEC a prerrogativa de definir composição,
competências, capacitação, procedimentos e critérios a serem considerados
na heteroidentificação. As decisões da Comissão serão finais em termos de

... 37 ...
mérito, podendo ser objeto de recurso apenas sob o ponto de vista
procedimental.
e) Matéria recente da Folha de S. Paulo (Cotista tem nota de corte maior que não
cotista em 25% dos cursos do Sisu, de 7 de maio de 2022), assinada por Angela
PINHO; Raphael HERNANDES e Diana YUKARI, reporta exaustiva pesquisa
mostrando uma frequência significativa de casos em que a nota de corte, no
Sisu, é mais alta em candidatos cotistas do que em candidatos da ampla
concorrência. Essa situação atinge 25,3% dos cursos de graduação e 5,2% das
vagas reservadas para ações afirmativas, em relação ao universo pesquisado.
Trata-se de um problema detectado há mais tempo no sistema de cotas, cuja
solução é relativamente fácil, bastando incluir, na Lei Cotas, o mecanismo
sugerido pelo Projeto de Lei nº 4.799/2020, do deputado Felipe Rigoni
(PSB/ES): no Sisu e nos processos seletivos próprios das instituições federais,
as vagas ofertadas, por cada curso e turno, serão preenchidas primeiro pelo
segmento da ampla concorrência, considerando as melhores notas de todos
os participantes do certame. Nos procedimentos subsequentes, os candidatos
serão selecionados segundo a modalidade de cotas nas quais estejam
inscritos e seguindo os ritos já estabelecidos.
f) No que concerne ao tema das cotas regionais, objeto de grande parte dos
projetos de leis apresentados no Congresso Nacional, a solução apontada
pelo deputado Bira do Pindaré no substitutivo ao Projeto de Lei nº 3.079/2015
parece a mais adequada, face à impossibilidade de encontrar uma fórmula
única para situações diversas e imprecisas. O substitutivo atribui às
instituições a competência para criar o modelo mais apropriado para a sua
realidade específica.
g) A Lei nº 12.711/2012 estabeleceu o percentual mínimo de 50% para a reserva
de vagas para egressos da escola pública. Na maior parte dos casos, as
instituições trataram esse percentual mínimo também como percentual
máximo. Com base na experiência já realizada e na posse de dados concretos
sobre o universo dos inscritos, esse percentual pode ser estabelecido com
maior exatidão e senso de justiça. O percentual das vagas reservadas para os
egressos da escola pública, em cada curso e turno, deve ser proporcional à
taxa de inscritos oriundos dessa rede escolar, no conjunto dos processos
seletivos realizados pela instituição no ano anterior, desde que nunca inferior
a 50%.
h) A cota para pessoas com deficiência teve a virtude de conduzir à universidade
pessoas que, dificilmente, teriam tido essa oportunidade sem ela. Entretanto,
de maneira geral, como se viu, as notas obtidas por este grupo nos processos
seletivos são menores que as dos outros cotistas, o que aponta para
dificuldades adicionais e específicas enfrentadas nos processos formativos

... 38 ...
escolares. Essas dificuldades continuam a se manifestar no âmbito dos cursos
superiores e exigem acompanhamento especializado. A Lei de Cotas deve
atribuir responsabilidades ao Ministério da Educação no sentido de, com base
em estudos minuciosos, dotar as instituições federais de educação de
estrutura de acompanhamento compatíveis com as deficiências verificadas.
i) Vários estudos e também alguns dos projetos de lei descritos acima tocam no
tema da assistência estudantil para garantir a permanência dos alunos
hipossuficientes e o seu progresso nos estudos sem sobressaltos. O Programa
Nacional de Assistência Estudantil (PNAES), criado pelo Decreto nº 7.234, de
19 de julho de 2010, foi muito importante para a educação superior,
garantindo a permanência de milhares de estudantes nas instituições federais.
No Campus Passo Fundo, por exemplo, seis alunos indígenas são, atualmente,
beneficiados com a bolsa permanência e outros 67 recebem auxílios, sob
rubricas variados, concedidos com recursos do PNAES. É indispensável que
Lei de Cotas referencie formalmente o PNAES.
***
A política de cotas é importante para o país e, em hipótese alguma, pode ser
descontinuada, diminuída ou transfigurada, embora já mereça determinados
ajustes para calibrar seus meios e potencializar seus fins. Todas as proposições
feitas neste texto estão alinhadas com o aprofundamento da política e o
aperfeiçoamento do sistema que ela instituiu. Não sendo possível introduzir tais
melhoramentos nos projetos de lei em curso no Congresso Nacional, eles deverão
pautar discussões subsequentes e continuadas para, no menor tempo possível,
corrigir as disfunções apontadas, cujos efeitos tendem a incrementar um certo
desvirtuamento da política de cotas.

... 39 ...
Referências

ABEM - Associação Brasileira de Educação Médica. Teste de Progresso - Resultados por período.
Disponível em: https://admin.abem-nacional.com.br/teste-de-progresso.
BRASIL. Lei nº 12.711, de 29 de agosto de 2012. Diário Oficial da União, Brasília, DF, nº 169, 30
de agosto de 2012, Seção 1, p. 1 e 2.
BRASIL. Lei nº 13.409, de 28 de dezembro de 2016. Diário Oficial da União, Brasília, DF, nº 250,
29 de dezembro de2016 nº Seção 1 -, p. 3.
BRASIL. Lei nº 14.040, de 18 de agosto de 2020. Diário Oficial da União, Brasília, DF. 19de agosto
de 2020, Edição: 159, Seção: 1, p. 4.
BRASIL. Decreto nº 7.824, de 11 de outubro de 2012. Diário Oficial da União, Brasília, DF. 15 de
outubro de 2012, p. 6.
BRASIL. Decreto nº 9.034, de 20 de abril de 2017. Diário Oficial da União, Brasília, DF. 24 de abril
de 2017, p. 1.
BRASIL. Ministério da Educação. Portaria Normativa nº 18, de 11 de outubro de 2012. Diário
Oficial da União, Brasília, DF. Seção 1, 15 de outubro de 2012, p. 16.
BRASIL. Ministério da Educação. Portaria Normativa nº 9, de 5 de maio de 2017. Diário Oficial
da União, nº 86, 08 de maio de 2017, Seção 1, p, 29-30.
BRASIL. Ministério da Educação. Portaria Normativa nº 1.117, de 1º de novembro de 2018.
Diário Oficial da União, nº 212, 05 de novembro de 2018, Seção: 1, p. 26.
BRASIL. Ministério da Defesa. Despacho nº 22/GM-MD, de 27 de março de 2020. Disponível em:
https://www.in.gov.br/web/dou/-/despacho-n-22/gm-md-de-27-de-marco-de-2020-
251487446.
BRASIL. Ministério do Planejamento, Desenvolvimento e Gestão - Secretaria de Gestão de
Pessoas e Relações do Trabalho no Serviço Público. Orientação Normativa nº 3, de 1º de
agosto de 2016. Diário Oficial da União, 02/08/2016, Edição: 147, Seção: 1, p. 54.
BRASIL. Ministério do Planejamento, Desenvolvimento e Gestão - Secretaria de Gestão de
Pessoas. Portaria Normativa nº 4, de 6 de abril de 2018. Diário Oficial da União, 10/04/2018,
Edição: 68, Seção: 1, p. 34.
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CARVALHO, Rejane Maria Andrade; GARCIA, Fernando Coutinho. Percepção sobre o
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GZH (Gaúcha Zero Hora): Ministro anuncia impressão de todas as provas e afasta risco de adiamento
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... 41 ...
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https://educacao.estadao.com.br/noticias/geral,com-revisao-prevista-para-2022-lei-de-cotas-
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VILELA, L., TACHIBANA, T. Y.; MENEZES FILHO, N.; KOMATSU, B. (2021). As cotas nas
universidades públicas diminuem a qualidade dos ingressantes? Estudos Em Avaliação
Educacional, 28(69), 652–684. https://doi.org/10.18222/eae.v28i69.4427.

Notas:

1. Essa Lei foi regulamentada pelo Decreto nº 7.824, de 11 de outubro de 2012, e pela Portaria Normativa nº 18,
de 11 de outubro de 2012. Na sequência, a Lei nº 12.711/2012, foi alterada pela Lei nº 13.409, de 28 de dezembro
de 2016; o Decreto nº 7.824/2012, foi alterado pelo Decreto nº 9.034, de 20 de abril de 2017; e a Portaria
Normativa nº 18/2012, foi alterada pela Portaria Normativa nº 9, de 5 de maio de 2017, e pela Portaria Normativa
nº 1.117, de 1º de novembro de 2018.

2. A reserva de vagas para pessoas com deficiência foi introduzida no ordenamento legal brasileiro pela Lei nº
13.409/2016, e regulamentada pelo Decreto nº 9.034/2017, e pelas Portarias Normativas nº 9/ 2017, e nº 1.117/
2018.

3. Ao longo do texto, quando necessário para fins de simplificação, serão qualificados como “hipossuficientes” os
alunos integrantes de famílias com renda per capita igual ou inferior a um salário mínimo e meio; e de “não
hipossuficientes” os que não apresentam essa condição.

4. Apesar de ter se desviado do texto da Lei nº 12.711/2012, essa peculiaridade introduzida pela Portaria
Normativa nº 9/2017 acabou sugerindo uma alteração oportuna no sistema de cotas: a criação de cotas específicas
e independentes. Assim como se está praticando em relação às pessoas com deficiência, é absolutamente

... 42 ...
necessário que seja feito em relação aos pardos, pretos e indígenas, estabelecendo-lhes cotas específicas e
independentes. Essa necessidade será demonstrada ao longo do texto.

5. Ver DA REDAÇÃO, “Meninos têm pior desempenho escolar, mas recebem mais incentivo para o trabalho -
Pesquisa da OCDE mostra que estudantes do sexo masculino têm notas mais baixas”. Veja, Da Redação, 5 de março
de 2015. MATTEI, Saôni; OLIVEIRA, Camila Rosa de; DALBOSCO, Simone Nenê Portela; PATIAS, Naiana Dapieve.
Desempenho escolar de adolescentes do ensino médio de escolas públicas e privadas.

6. Chama a atenção o percentual dos que estão na faixa dos 31 ou mais anos, comparativamente aos que estão
na faixa dos 27 a 30 anos e também dos que estão na faixa dos até 18 anos. Há, aqui, certamente, muitos que são
portadores de diploma superior, em áreas próximas da medicina, o que lhes dá lastro para disputar uma vaga.
Pode-se especular também a respeito da condição econômica e familiar desses alunos, haja vista ser Medicina um
curso de tempo integral e não ser, pois, compatível com a maioria dos empregos disponíveis no mercado de
trabalho. Depois dos 30 anos, as pessoas, geralmente, já constituíram suas próprias famílias e possuem certo
patrimônio, fontes alternativas de receitas ou reserva financeira que lhes permite dedicarem-se a outro projeto
de vida.

7. Em março de 2019, a gráfica RR Donneley, responsável pela impressão das provas do Enem, abriu falência. O
risco de não haver Enem naquele ano foi anunciado na imprensa e tornou-se uma preocupação real entre as
instituições que usavam esse exame, no todo ou em parte, para selecionar seus alunos de graduação. A UFFS
dependia integralmente do Enem, por isso acorreu à Universidade Federal de Santa Catarina - que mantinha parte
de suas vagas sendo ofertadas por meio de vestibular próprio - a fim de aderir àquele processo seletivo,
garantindo, dessa forma, uma parte das vagas a serem ofertadas em 2020 (as demais vagas poderiam ser
preenchidas por meio do Enem realizado nos anos anteriores, que, evidentemente, não contemplavam os
concluintes do ensino médio de 2019). A GZH (Gaúcha Zero Hora) noticiou, em 01/04/2019: “Enem 2019: falência
de gráfica que imprime as provas coloca exame em risco. Para cumprir o cronograma da avaliação, que ocorre em
novembro, impressão dos cadernos deve ser feita até maio.” Alguma certeza de que o Enem seria realizado foi
dada apenas em outubro. Sobre isso, ver: GZH (Gaúcha Zero Hora) de 10/10/2019: “Ministro anuncia impressão
de todas as provas e afasta risco de adiamento do Enem. Realização das provas nos próximos dias 3 e 10 de
novembro havia sido posta em dúvida por causa de falência de gráfica que imprimiria os cadernos.”

8. As inscrições relativas aos indígenas foram feitas na cota específica criada pela UFFS e aparecem em separado
nessa divisão porque não há, nessa cota, a exigência quanto à rede escolar frequentada no ensino médio e não
consta essa informação nas planilhas fornecidas pelo Sistema de Gestão Acadêmica (SGA/UFFS).

9. Houve controvérsia a respeito de serem os colégios militares instituições de educação públicas stricto sensu, pois,
apesar de criadas, administradas e mantidas pelo Poder Público, possuem características peculiares que as
diferenciam das demais instituições, como: pagamento de taxas e mensalidade e ensino com contornos militares.
Essa argumentação foi realizada pela USP ao negar, no processo seletivo de 2018, a matrícula, no âmbito de sua
política de cotas, para egressos de colégios militares. A polêmica deu origem ao DESPACHO Nº 22/GM-MD, DE 27
DE MARÇO DE 2020, do Ministro da Defesa, estabelecendo que “os Colégios Militares possuem natureza jurídica
de instituições educacionais públicas, devendo seus alunos ser considerados como egressos de escolas públicas
para todos os fins e direitos”.

10. O complexo de Colégios militares da Brigada Militar do Rio Grande do Sul cobra uma contribuição para o
Círculo de Pais e Mestres (em torno de 100 reais). Os Colégios Militares do Exército cobram aproximadamente R$
250,00 por mês. Quanto aos processos seletivos restritos, vale mencionar que essas escolas reservam vagas para
dependentes de servidores dos órgãos militares mantenedores, matéria que suscitou, já, várias ações judiciais,
questionando a legalidade e a legitimidade do fato (Lucas MARCHESINI. Portal Metrópole). Além disso, os
processos seletivos fazem uso de métodos e estratégias inusuais no sistema regular de ensino, tornando as
aprovações profundamente direcionadas.

11. A Mesorregião Grande Fronteira do Mercosul (GFM) é uma das 13 mesorregiões definidas pelo Ministério da
Integração Nacional (criado em 1999) e abrange o Norte do Rio Grande do Sul (238 municípios), Oeste de Santa
Catarina (130 municípios) e Sudoeste do Paraná (42 municípios). No Paraná, a região de abrangência da UFFS
extrapola os limites da GFM, pois o Campus Laranjeiras do Sul está localizado na Região Centro-Sul Paranaense (29
municípios).

... 43 ...
12. Entre esses estudos, estão: VILELA, L., TACHIBANA, T. Y.; MENEZES FILHO, N.; KOMATSU, B. (2021). As cotas
nas universidades públicas diminuem a qualidade dos ingressantes?; SILAME, Thiago Rodrigues; MARTINS JÚNIOR
Hernani; & FONSECA, Agnaldo Henrique Silva. O efeito das cotas: desempenho acadêmico dos estudantes cotistas da
Universidade Federal de Viçosa - Campus Rio Paranaíba; UNIVERSIDADE de São Paulo (USP) - ESCOLA POLITÉCNICA.
Apesar de ter melhor desempenho, aluno cotista precisa de apoio; CARVALHO, Rejane Maria Andrade; GARCIA, Fernando
Coutinho. Percepção sobre o desempenho de alunos cotista e não cotista: um estudo de caso dos alunos de direito e medicina
da Universidade Federal de Viçosa; GALHARDO, Eduardo; VASCONCELOS Mário Sérgio; FREI Fernando & RODRIGUES,
Edgar Bendahan. Desempenho acadêmico e frequência dos estudantes ingressantes pelo Programa de Inclusão da UNESP.

13. SANTOS, Ynaê Lopes dos. Quem tem medo das cotas raciais? DW Brasil,11/20/2021; HENRIQUE, Guilherme.
Dez anos depois, é hora de revisar a Lei de Cotas. DW Brasil, 14/2/2022; CARRANÇA, Thais. Lei de Cotas ainda não
cumpriu seu objetivo e precisa ser renovada em 2022, diz reitor da Zumbi dos Palmares. BBC NEWS Brasil,
13/2/2021; CARRANÇA, Thais. Enem mais negro: por que número de candidatos pretos e pardos cresceu ao longo
dos anos”. BBC NEWS Brasil, 22/4/2022; MENDONÇA, Heloísa. Negros são maioria nas universidades públicas do
Brasil pela primeira vez”. El PAÍS Brasil, 13/11/2019; VALFRÉ, Vinícius. Com revisão prevista para 2022, Lei de Cotas
enfrenta polarização no Congresso e pode excluir negros. O Estado de S. Paulo, 22/11/2021; POL, Ana Maria. Com
quase 20 anos, política de cotas revela resultados positivos na UnB. Correio Braziliense, 2/5/202022; PINHO, Angela;
HERNANDES, Raphael; YUKARI, Diana. Cotista tem nota de corte maior que não cotista em 25% dos cursos do Sisu.
Folha de S. Paulo, 7 de maio de 2022. DIAS, Luciano. As mudanças na Lei de Cotas em disputa na Câmara. BBC NEWS
Brasil, 17/05/2022.

14. Na Região Sul, segundo o Censo do IBGE/2010, há 74.945 indígenas, dos quais 40.936 (54,6%) estão na zona
rural e 34.009 (45,4%) vivem em zonas urbanas.

... 44 ...

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