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Guilherme Altmayer
Rio de Janeiro State University
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All content following this page was uploaded by Guilherme Altmayer on 19 January 2021.
Bordas
Transversalidades discursivas em arte e design
Rio de Janeiro
2020
BORDAS
TRANSVERSALIDADES DISCURSIVAS EM ARTE E DESIGN
© Áspide, 2020
co nsel h o edi to r i a l
ISBN 978-65-992238-0-8
20-43539 CDD-745.4
qualquer meio impresso ou eletrônico, está autorizada, desde que citada a fonte. Se for
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www.aspide.com.br
SUMÁRIO
NARRATIVAS CURATORIAIS de
cultura material popular
Yasmin Fabris 59
— Bertolt Brecht
— Michel f oucault
POR UM ARQUIVO TRANSVIADO
notas para uma queerização do design
Guilherme Altmayer1
-
lidades de queerização -
cas engendradas pelo desenho de um arquivo2 para a salvaguarda de memórias
3
1 Doutor em design pela linha de digital <https://www.tropicuir.org/>. bons costumes. adj. Desencaminha-
pesquisa Comunicação Cultural e 3 O termo “transviado”, frequente- do; que se perdeu do caminho; que se
Artes do Programa de Pós-graduação mente mencionado neste capítulo, é
em Design da Pontifícia Universidade usado por Berenice Bento para de-
Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio). signar estudos/ativismos transviados, preestabelecidos ou vigentes. Figura-
Membro da Red Conceptualismos do. Vagabundo; que vive a vagar sem
del Sur, rede latino-americana para termo “queer”, uma tradução consi- rumo certo. Para mais, ver: Padilha,
- derada pertinente pela autora para Felipe; Facioli, Lara. “É o queer tem
líticas. Pesquisa práticas dissidentes pensar em um termo “guarda-chuva”
Bento”. Áskesis, v. 1, n. 4, p. 143-155,
design. E-mail: galtmayer@gmail.com. jan./jun. 2015. Disponível em: <ht-
2 dicionário, o termo transviado tem o tps://www.revistaaskesis.ufscar.br/
arquivo que serviram de inspiração
para a construção da plataforma se transviou; quem se afastou dos Acesso em junho de 2020.
O caminho proposto para esta escrita passa por uma breve introdução
aos estudos queer, com suas propostas e práticas contranormativas, enquanto
vertente de pesquisa que subsidia o pensar crítico do qual lançaremos mão
para debruçarmo-nos sobre práticas arquivísticas e o papel do design em suas
transviação.4 Longe de esgotar
o tema, e tendo em vista a impossibilidade de fornecer respostas assertivas,
interessa aqui desnaturalizar o campo do design, despi-lo de uma suposta
de design politizado, mas poucos em que o design foi de fato político”.5 Desta
feita, interessa aqui pensar politicamente o design ao propor uma queerização
do campo. Para iniciar esta tentativa, apresentaremos, brevemente e de forma
introdutória, os estudos queer como um arcabouço teórico referencial.
-
cas e ativistas, descontentes com as políticas identitárias em curso nas práticas
ativistas que ainda trabalhavam dentro de um recorte normativo, dedicaram-se
a abrir frentes para a crítica e a desconstrução dos meca-
nismos de produção de discursos e dispositivos normativos
o Design”. Arcos Design, Edição
e identitários, centrados em reforçadores da hegemonia
especial Seminário Design.Com,
- v. 10, n. 1, 2017. Disponível em:
<https://www.e-publicacoes.
pulsória.
A partir desse gesto de levante, setores da comunida- article/view/30937>. Acesso em
junho de 2020.
5 Portinari, Denise; Nogueira,
queer (termo da língua inglesa que tem caráter Pedro Caetano Eboli. “Por um
design político. Estudos em Design,
pejorativo correspondente a estranho e a desajustado) para
v. 24, n. 3, p. 32-46, 2016, p. 33.
Disponível em: <https://estudo-
semdesign.emnuvens.com.br/
simbólicas e físicas sofridas por corpos dissidentes, subme-
design/article/view/379/255>.
Acesso em junho de 2020.
Nessa linha, a pesquisadora Guacira Lopes Louro, criada a partir desse conjunto de
normas para designar os indiví-
uma das precursoras dos estudos queer na educação, no
duos considerados anormais e
Brasil dos anos 2000, entende que, mais do que buscar uma
nova identidade, as práticas queer
diferença: “queer representa claramente a diferença que não foi atribuído ao nascer. Muitas
outras pessoas não se sentem
quer ser assimilada ou tolerada e, portanto, sua forma de
ação é muito mais transgressora e perturbadora”.10 -
-
rias, memórias e imaginários desde um viés questionador, interessa conceber
estratégias para encarar o design por um viés queerizado, pelo que nos pro-
pomos a pensar no que pode ser, que desenho e contornos pode ganhar, um
-
mento, entre outras formas de forjar a história como a conhecemos.
achados a uma cronologia, mas interrogar o que já foi dito, as “coisas ditas”
14
que este teórico inclui o arquivo em sua arqueologia dos saberes, como um
sistema de enunciados que tem acontecimentos de um lado, e coisas (estrutu-
ras) de outro. O autor fala de como, nas tecnologias das práticas discursivas,
se encontram em atuação sistemas que determinam enunciados (regras que
(produção de verdade).
-
mínio de aparecimento e arcabouço que suporta acontecimentos: “o arquivo
é, de início, a lei do que pode ser dito, o sistema que rege o aparecimento dos
enunciados como acontecimentos singulares”.15 Esses dois elementos — acon-
tecimentos e coisas —
poder que logo darão um sentido ao discurso.
-
rável do enunciado. Na sua origem, o arquivo é constitutivo do discurso, logo,
politicamente responsável pela produção discursiva que abriga e comunica.
Mais do que ser um repositório do que foi proferido em discurso, e para além
virá a se tornar arquivo. Registros que são subsídios para a escrita de histórias e
elucidação dos processos discursivos imbricados no fazer design. Para tal, incli-
namo-nos a pensar o design como técnica que sugere caminhos para dar forma
e propor meios de distribuição da informação — algo que “in + forma”, 20 ou seja,
que dá forma a algo: vaso comunicante.
mortes anunciadas.
Nesse sentido, Derrida pergunta “a quem cabe, em última instância, a
-
21
incitando-nos a questionar
para além do conteúdo do arquivo e a conjecturar sobre o sujeito arquivador.
trabalho humanos”. 22
Já o sociólogo espanhol Manuel Castells, por sua vez, em consonância
não somente aplicada, mas também responsável social e politicamente por sua
atuação — localizar os saberes que gera, assumindo sua implicação enquanto
dispositivo que, além de operar discursos, projeta suas formas.
Frente ao entendimento de que o designer é corresponsável pelos ditos
e não ditos que constituem discursos normativos, podemos recorrer a Donna
Haraway, em Saberes localizados, para evidenciar que uma proposta epistemo-
lógica de saber situado é uma ação política que reconhece que a produção de
-
22 McLuhan, Marshall; Lapham ligada, da subjetividade de quem a realiza. 24 Relatar o ponto
Lewis. Understanding Media: The
Press, 1994, p. 12, trad. minha. fazer, neste caso, design. Bem como leva em consideração
23 Castells, Manuel. Commu-
que, em realidades tão diversas, é preciso compreender que
nication Power
University Press, 2009. são muitos os olhares possíveis para analisá-las.
24 Haraway, Donna. “Saberes
Não se trata, ademais, de atestar que tudo pode o de-
para o feminismo e o privilégio signer que se coloca e que se localiza. Muito pelo contrário, a
da perspectiva parcial”. Cadernos
pesquisadora feminista frisa que esse não é um lugar isento
Pagu, n. 5, p. 7-41, 1995. Disponí-
vel em <https://periodicos.sbu. de reavaliação crítica, de desconstrução e interpretação; até
-
porque, segundo a autora, a visão é sempre uma questão do
gu/article/view/1773>. Acesso em
junho de 2020.
Longe de ser uma atividade artística neutra e inofensiva, o design, por sua própria
mídia porque pode dar formas mais tangíveis e permanentes às ideias sobre quem
somos e como devemos nos comportar. 30
diferenças entre homens e mulheres; crianças e adultos; ricos e pobres, para de-
monstrar a atuação do campo do design como dispositivo de
28 estruturação de lógicas binárias e reforçadores de discursos
o Design”, op. cit., p. 2.
29 Ibidem, p. 14.
30 Forty, Adrian. Objetos de
desejo: design e sociedade desde
dos períodos nos quais está inserido. O autor atenta para o
1750. São Paulo: Cosac Naify,
2007, p. 12. quanto o design, na sua tarefa de conceber, projetar e dar
-
-
31
-
nhar, através de práticas artísticas entendidas como práticas políticas, lugares
onde todas nos tornamos agentes. Testemunhos como