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DIAllS

O DESIGN BRASILEIRO
antes do design

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página 7 • Introdução
Rafael Cardoso

página 2.0 • A circulação de imagens no Brasil oitocentista:


uma história com marca registrada
Llvia Lazzaro Rezende

página 6o • Do gráfico ao foto-gráfico:


a presença da fotografia nos irnpressos
Joaquin1 Marçal Ferreira de Andrade

página 96 • A Maçã e a renovação do dt>sign editorial na década de 1920


Aline Haluch

páginn 124 • J. Carlos, designer


Julieta Costa Sobral

página 160 • O inído do design de lívros no Brasil


Rafael Cardoso

página 197 • Santa Rosa: um designer a St'rviço da literatura


Edna Lúcia Cwlha Lima & Márcia Christina Ferreira

página 233 • Ernsr Zeuncr e a Livraria do Globo


Leonardo Men na Barreto Gomes

página 26o • Os baralhos da Copag entre 1920 e 1960


Priscila Farias

página 296 • Capas de discos: os primeiros anos


Egeu Laus

página 339 • Notas


, .
pa!,11na 342 • Bibliografia
página 351 • Índice
página 356 • Sobre os autores
página 358 • Fontes das iJustrações

Mat co a s a ar s
INTROD UÇÃO

Perdura na consciência nacional o mito de que o design brasileiro teve sua


gênese por volta de 1960. Como todo m ito, trata-se de uma falsidade his-
tórica patente. Como todo bom m ito de orige1n, tTata-se também de uma
verdade profunda, para além dos limites de nossas vãs n1etodologias. O que
ocorreu, sem dúvida alguma, foi uma ruptura. Para uns, um novo ponto de
partida; para outros, u_m desvio de rumo. Depende do grau de compromisso
de cada um com o grande movin1ento que hoje conhecemos con10 "moder-
nismo", o qual dominou boa parte da produção anística internacional entre
as décadas de 1910 e 1960, 1 aproximadamente. Os anos de experimentação
entre a abertura do Instituto de Arte Conten1porânea do Masp, em 1951 , e a
inauguração da Escola Superior de Desenho Industrial !Esdi). em 1963. mar-
can1 uma mudança fundamental de paradigma. Surgiu nessa época não o
design propriamente d ito - ou seja. as atividades projetuais relacionadas à
produção e ao consumo em escala industrial-. mas antes a consciência do
design con10 conceito, profissão e ideologia.
Alguns considerarão equivocada a aplicação do tem10 "design" a qual-
quer situação an terior ao período he róico dessa gê11ese. Sem dúvida, h á
certa dose de anacronismo e.m descrever como "designer" alguém que pro-
vavelmente não reconheceria o sentido da palavra e tal vez nem soubesse
pronunciá-la. No entanto. os percalços lingüísticos sofridos ao longo dos
anos por termos como "design". "desenho industrial", "programação visual",
"comunicação visual" e tantos outros similares não são de maior interesse
para o presente livro. Para quem se inquieta com tais definições. vale lem•
brar que o tern10 "desenho industrial" está em uso corrente no Brasil pelo
.m enos desde a década de 1850, quando a disciplina correspondente a esse
nome passou a ser ministrada no curso noturno da Acaden1ia ln1perial de
Belas Artes. É evidente que naquela época não se entendia por "desenho
industrial" aquilo que atualmente se designa assim, mas a antigüidade des-
sa batalha de palavras serve como aviso para quem chega com muitas cer-
tezas à discussão.

Mat co a s a ar s
Mais i111portaote ainda. será que está tio claro o que hoje ent.endemos
por "design, Uma rápida sondagem das fontes disponíveis deixa a nítida
in1pressão de que exjste cada vez menos con sen so entre os criadores de
definições. É imensa a distância que separa o designer de modas no São
Paulo Fashion Week do designer de eletrodomésticos na Multibrás ou do
designer responsável pela elaboração do site da Globo.com. Em um mundo
constituído por redes artificiais de grande complexidade, o design tende a
se tornar cada vez mais ubíquo, permeando todas as atividades de todas as
pessoas em todos os momentos, e chegando mesmo a desmontar (até certo
ponto) a separação rígida que antes den1arcava a fronteira entre produtor
e u suário. Design de interfaces, design de sistemas. design de interações,
gestão do design: novas áreas de atuação que correspondem ao redimensio-
namento radical de um con ceito cujo sentido está em constante mutação
há pelo menos dois séculos.
Do ponto de vista da história do design, as disputas em tomo da apli-
cação do termo interessam mais pelo que revelam sobre as partes contes-
tantes do que sobre o sentido da palavra em si. Para os fins da presente
discussão. o aspecto mais problemático de afirmar o início de um desig:t1
brasileiro por volta de 196o reside na recusa a reconhecer como design tudo
o que veio antes. Ora. é claríssimo - e os ensaios contidos neste volume dão
provas eloqüentes disto-. que durante os cinqüenta a cem anos anterio-
res a ta.l data eram exercidas entre nós atividades projetuais com alto grau
de complexidade co.nceitual, sofi sticação tecnológica e eno.r me valor eco-
n ômico, aplicadas à fabricação. à distribuição e ao consumo de produtos
industriais. Isso é verdade tanto para a área tradicionalmente chamada de
"design de produto" quanto para a área gráfica, embora as evidências conb~
cidas acé agora apontem para uma evolução mais rápida e mais impactante
da produção industrial de impressos nesse petiodo.
Se entre 1870 e 1960 existiram no Brasil atividades correspondentes
àquilo que hoje entendemos corno desigJl, qual o sentido de negar-lhes o
epíteto? Muito. e nenhum. Depende do contexto da discussão. Soa inte.ncier
nalmente provocativa uma formulação do gênero: WEliseu Visconti. desig-
ner", visto que o próprio não se reconheceria nessa designação e que o
uso retroativo do tenno corre o 1isco de encobrir diferenças significativas

Mat co a s a ar s
entre o tipo de atividade projetual que Visconti chegou a exercer na área de
cerân1ica. por exen1plo, e aquela hoje exercida po r um designer na 111es1na
índústria. Sem dúvida, esse tipo de transposição do presente para o passado
suscita problemas de m étodo para o historiador, mas sua relevância reside
no modo em. que n os obriga a reavaliar nossos pressupostos. Se fôssemos
rigorosos. seriamos obrigados tan1bén1 a negar o título de "designer'" a uma
série de profissionais ativos após 1960 que o senso comum n1odemista reco-
nhece con10 píoneiros e baluanes da profissão. Em contrapartida, há algo
de perverso - para não dizer, pernóstico - em afirmar que as atividades de
um Santa Rosa ou un1 J. Carlos não compartilham o mesmo universo his-
tórico do design moderno ao qual pe1tencen1 Alexandre Wollner ou Aloi-
sio Magall1ães, quando uns e outros se enquadra111 en1 todos os quesitos
daquilo que entendemos como projeto gráfico industrial. variando entre si
apenas e1n termos estilísticos e de inserção social. Mesn10 havendo alguma
disparidade ent1·e as épocas ele at:1.1ação dos profissionais citados. as dife-
renças tendem a se apagar com a passagenl do tenlpo. tàzendo ressaltar as
semelhanças que os unem m ais do que as questiúnculas que os separaram
na inevitável troca de !,'1.larda entre gerações. Afirnlar que .Alo.ísio foi desig-
ner e que Santa .Rosa não o foi revela um pouco do preconceito que ainda
rege esse can1po profissional no Brasil e. en1 última inst',incia. depõe mais
contra os donos do poder no meio do design do que contra Santa Rosa, cuja
genialid ade como projetista ningi,érn 111ais coloca e,n questão.
Quen1 se arvora, po.r tanto, a legislar tern1inantemcnte sobre quem é ou
não designer no Brasil? Se 11en1 o p oder público, tradicionaln1ente aurorirá-
rio. logrou arbitrar a questão por n1eio da fan1igerada regulan1entação da
profissão, não serão os ideólogos remanescentes do modemísn10, advogando
en1 causa própria, que o farão. Em última análise, qurm determina o sentido
que se dá aos termos é a própria co11strução da sua história, feita necessaria-
mente a posteriori. Como toda palavra cuja aplica~·ào envolve qualquer ques-
tão concreta de poder ou prestígio, "design" é u1n sitio discursivo cuja posse
é dis putada por diversos agrupamentos sociais e agentes culturais. O valor
comercial de expressões como "design moderno". udesign de interiores" ou
"design italiano~ e seu uso na publicidade, bem como a proliferação de títulos
fantasiosos como "'eb designer e hair designer, dão un1 indício do grau de ani-

Mat CO"'l O s a ar s
mosidade que essa disputa é capaz de gerar, sobretudo ent.re os que se consi-
deram detentores morais dos valores da profissão, como é o caso de algun1as
fàculdades. associações de e.lasse e outras agremiações institucionais.
É dessa disputa que surge a a1nbigüidade proposítaJ do tituJo deste livro:
O design brasileiro ant<t!s do design. O paradoxo é apenas aparente. Pretende-se
afirmar duas coisas que parecen1 contraditórias à primeira vista. mas que
no fundo não o são. Primeiran1ente, e ,nais óbvio. afirma-se que houve sim
uma ruptura por volta de 1960 e que esta inaugurou um novo paradigma de
ensino e de exercício da profissão, o qual corresponde hoje àquilo que enten-
demos por design neste país. Trata-se de um design de matriz nitidamente
n1odemista, filiado diretamente ao longo processo de institucionalização
das vanguardas artísticas históricas. que ocorreu entre as décadas de 1930
e 1960 e.m escala mundial, de início como afi1m ação da luta antifascista na
Europa e posteriormente como extensão do modelo hegemõnico de corpo-
rativismo multinacional após a Segunda Guerra. E1n retrospecto. fica claro
que a implantação no Brasil de uma ideologia do design moderno, entre o
fina l da década de 1950 e o início da de 1960 - cm grande parte. patrocina-
da pelo poder público-. coincide com. e integra o esforço m.aior para inserir
o pais no novo sistema econômico mundial negociado em Bretton Woods.
O Brasil moderno de Getúlio e da Petrobras. de JK e Brasília, de Assis Ch a-
teaubriand e do Masp , de Carlos Lacerda e da Esdi pretendia-se um novo
modelo de país - aquele "do futuro ·· -. concluindo a 111ptura com o passado
a rcaico e es<-Tavocrata i11iciada pelo pensamento republicano positivista,
O título afirma, em segundo lugar. que existju um vasto universo de ati-
vidade projetual ligado à produção industrial ao longo das décadas anterio-
res a 196o. Essa proposiç.ão não exige maior justificação aqui, uma vez que a
própria leitura dos ensaios que compõem este livro a corrobora sem sombra
de dúvida. Contudo. cabe ressaltar dois aspectos subjacentes a ela. Primei-
ramente. a obviedade da coisa: é inc1ível que ainda seja preciso reafirmar,
com todas as letras, que a indústria brasileira existe há mais de um século
e que ela suscitou desafios que tiveran1 de ser c-quacionados mediante aquilo
que entendemos como projeto, seja este de orden1 construtiva/operacional
ou comunic.acional/ident ificadora. Avoluniam-se os estudos demonstrando
cabalmente que não são novidade no Brasil as questões ligadas à produção

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Mat C0"1 d s ar <;


e à distribuição de ben s de consumo em escala industrial !Rodl·igues. 1973;
Hardman & Leonardi, 1982; Suzigan, 1986; Klintowitz, 1988; Accioly et ai.,
2000). O continuado desconhecimento do passado industrial anterior a Getú-
lio e JK só pode ser atribuído a duas causas: a preguiça. por parte de alguns.
e o interesse pessoal. por parte de outros. Quem tem a lucrar com a propo-
sição, incessantemente reiterada pela mídia, de que a industrialização bra-
silei ra - e, por extensão. o design brasileiro - teve inicio na década de 1950?
Os dividendos políticos ainda hoje colhidos desse rnito sugerem que. no caso,
a falta de conhecimento do passado é proposital. Se o Brasil é n otoria1ner1-
te um país "sem memória", isso se deve ao fato de que remexer 110s relatos
sobre o passado costuma incon,odar as estruturas de poder vigentes.
Há um segundo aspec.to subjacente à ação de afirmar um design brasi-
leiro ante rior a 1960. Ao enfocarmos soluções projetuais que n ão derivaram
ostensivamente de uma 1natriz estrangeira reconhecida (por exemplo, con s-
trutivismo, neoplasr-icismo. Baubaus, Ulnl). coloca1no-nos diante de outras
perguntas: de onde surgiram tais projetos e quais as origens das linguagens
que conjugam? Não há como escapar de uma conclusão tan1bém bastante evi-
dente. Se existiran1 atividades projetuais em larga escala no Brasil entre 1870
e 1960. e se estas n ão tiveram como base uma linha única de pensamento.
uma determinada doutrina ou estética. então a produção que delas resultou
é re presentativa de uma tradição rica. variada e autenticamente brasileira.
que te rá assimilado e conciliado uma série de influências díspares.
Em outras palavras, se e,xiste uma cult11ra projetiva brasileira anterior
à importação do modelo ulmiano/con creco. esta é, até certo ponto, mais
representativa do longo processo histórico de formação da identidade nacio-
nal, o qual data desde o fim do período colorúal Afirn1ações desse tipo exi-
ge1n esclarecimento, por serem f.iceis de distorcer para fins polên1icos. Não
se está a d izer de modo algum q11e o passado ren1oto seja mais legítimo
do que o passado recente. Antes, está-se a d.izer que o passado recente deu
continuidade ao passado remoto, n1esn10 existindo n101nentos de ruptura.
Traduzindo a questão para outro regist ro histórico, dirían1os que é preciso
conhecer o Império para melhor entender a República. Em se tratando de
história política. a con statação é óbvia. En1 se tratando de design. o paradig-
ma vigente faz supor que a história teria começado. ex niliilv, por volta de

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Mat co d s a or e;
1960. em função da in1portação de um modelo estrangeiro. Ora. isso equi-
valeria a dizer que toda a história brasileira voltou à estaca zero em 1889,
ou em 1930, ou cm 1964... - como se os golpes fossem capazes de apagar os
vestígios daquilo que os motivou.
O conhecimento do passado projecua.l a11terior a 1960 é o primeiro pas-
so para un1a melhor com.preensão daquilo que pode ser entendido como
urna identidade brasileira no ca.m po do design. Para n1uitos designers, é um
pouco aborrecida essa d iscussão de identidade nacional. O que importa o
co11ceito de brasilidade na p rática p rofissional de um mundo globalizado?
A pergunta é válida e o aborrecimento, compreensível. Todavia, a questão
da idenádade parece tomar-se cada vez mais premente à medida que as
fronteiras vão sendo abolidas pelos avanços das telecomunicações. Thlvez
não mais a identidade nacional, já que o Estado-nação parece estar perden-
do importância nesta época de blocos s upranacionais, empresas multina-
cionais. organismos internacionais e redes 111ultilaterais, mas identidade
de algttma espécie: seja ela regional. con1unitária. étnica. de gênero. de
preferência sexual, musical ou visual ou. apenas. individual. Para dar con-
sistência histórica a essas e outras forn1as de identidade, faz-se vital debe-
lar o minotauro da identidade nacional. ainda tão begemônico e restritivo
entre nós. Mesmo que apenas para .n egá-la enl seguida, parece necessá.r io
conhecer melhor a tal da brasil idade - o que é. con10 funciona. como foi
con struída, por que e por quem. Na ,irea do design. ainda estamos longe de
qualquer consenso sobre o que viria a constituir urna identidade nacional
e, portanto, 1nais longe ainda de qualquer possíbiJidade eficaz de desmistí·
ficá-la em prol de outras expressões n1ais relevantes.
Nas páginas que seguetn são clesven.dados. por meio dos discursos pró-
prios ao design . diversos aspectos de u1na identjdade brasileira en1 con s-
trução. Uma. ou várias. já que os ensaios aqui apresentados apontam para
u.ma história n1últipla. diversa. rica. Começando ainda no período imperial,
os artigos de Lívia Lazzaro Rezende e Joaquim Marçal Fe1Teira de Andrade
revelam a exteJ1são no tempo da tradição gráfica brasileira. Explorando a
conjunção entre técnica e tecnologia, entre práticas co1nerciaís e normas
jurídicas. o texto de Rezende revela como as necessidades de inserção da
economia nacional n o nascente sistema industrial capitalista estimularam

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Mat CO"'l O s a ar s
a criação de novas modalidades de projeto - especialmente, marcas regis-
tradas e rótulos comerciajs - , promovendo ampla adaptação dos códigos
visuais preexistentes. No n1esn10 sentido, o texto de A11drade aponta para
o diálogo entre a mais impo rtante técnica de representação gerada na
modernidade - a fotografia - e a evolução dos impressos na passagen1 do
sécul o x1x para o xx. Em ambos sobressaem a importância da tecnologia
coo10 un1 tàtor condicionante do projeto e o papel ig1.1alm.e nte vital do pro-
jeto co1no tbrma de traduzir os avanços teo1ológicos en1 un1a linguagen1
inteligível para um público ainda poLtco acostun, ado à rapidez das trans-
formações em curso.
O uso consciente do projeto con10 n1eio de conjugar Ji11guagens, recU-
recionar infonnações e criar identificac,·ão com o público constitui o 111ote
central dos ensaios de Aline Haluch, jl1Lieta Costa Sobral e Rarael Cardoso.
Se desde o século x1x há vesrjgios de atividades projert1ais no Brasil. pode-
se dizer que a década de 1920 n1arca utn prin1eiro ponto do seu an1adureci-
menro, com o uso mais sistemático do projeto gráfico como fator de apelo
con1ercial. Não há nada de especialn1ente surpreendent e n essa constatação,
visto que os anos 1920 foram un1 período in1portante para a consolidação
da indúst ria nacional de modo gl'ral, chegando mesmo a con stituir, na opi-
nião de alguns historiadores, uin surro industrial. O design, como não podia
deixar de ser. acompanhou a evolução da indústria. Vários setores indus-
triai s aproveitaram o contexto da Primeira Guerra Mundial para ex-portar
1nais ou para realizar u1na efetiva substitttiçào de importações. Foi o c.iso.
entre outros, do setor livreiro . O texto "O in ício do design de livi-os 110 Bra-
sil" examina a situação do 1nercado editorial nessa passage1n da década de
19 10 para a de 1920. identificando os primórdios do design brasileiro nessa
área. De n1odo análogo. o ensaio de Sobral lança un1 olhar sobre a produ-
ção de revistas no a1esmo período. destacando a importância de J. Carlos na
profissionalização da atividade de diretor de arte. Sempre lembrado como
caricaturista, nosso r.n aior ilustrador teve tan1bén1 an1açâo marcante na
tran.stom1ação do panoran1a editorial de su.a época. Explorando a 1nesn1a
vertente, o ensaio de Haluch enfoca u1n caso excepcional entre as revistas
ilustradas da década de 1920, de1nonstrando co1no o projeto gráfico atingiu
à época un1 alto grau de amadtu·ecimento e sofisticação.

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Um livro dedicado à história do design gráfico não poderia deixar de
dedicar atenção especial ao próprio objeto livro. como su porte de significa-
dos visuais. Assim. dois ensaios assumem a tarefa fundamental de resgatar
uma porção negligenciada ela história da indústria editorial. Se um país é
feito de homens e livros, segundo a notória frase de Monteiro Lobato. nun-
ca é den1ais lembrar que os livros não podem ser feitos sem o trabalho de
muitos homens e mulheres. Faz parte da arqueologia aqui empreendida o
esforço de recuperar as biografias de alguns desses ilustres operários edi-
toriais. O texto de Edna Lúcia Cunha Lima e Márcia Christina Ferreira vem
suprir uma enorme falha em nossa historiografia sobre design ao enfocar
a produção gráfica de um dos m aiores projetistas brasileiros de todos os
tempos, Tomás Santa Rosa. Mais reconhecido como cenógrafo e artista, não
resta dúvida de que o principal legado de Santa Rosa como criador resíde
na área do design gráfico. O texto de Leonardo Menna Barreto Gomes visa
recon stitu ir a trajetória de uma figttra bem mais obscura na história do
design g ráfico brasileiro, mas de proporções igualmente importantes: o
alemão Ernst Zeuner. responsável pelas diretrizes projetuais que transfor-
maram a Livraria do Globo e a cidade de Porto Alegre em pólos irradiadores
de inovação gráfica no Brasil entre as décadas de 1920 e 1.940.
A história do design deriva de várias vertentes metodológicas. Baseia-
se, principalmente. na história social voltada para a produção, circuJaçâo e
recepção de bens de consumo, tal como vem sendo praticada desde a dé<:a•
da de 1960, primeiramente nos trabalhos fundadores d e Eric Hobsbawm.
Gareth Stedman Jones e outros autores ligados ao grupo History Workshop
e, posteriormente, durante as décadas de 1970 e 1980, nas in.o vadoras pes-
quisas em história social da arte condu zidas por autores corno T.J. Oark.
Michael Baxandall. Linda Nochlin e seus muitos sucessores na chamada Nf'\v
Art Hist.ory. Em se tratando de design. não há como negar a importância da
história da indústria e da tecnologia com o aporte fundamental para a com-
preensão dos processos fabris que cond.icioua1n a cria~·ào. Esse aspecto fica
mais do que claro nos trabal hos lapidares de grandes nomes da história do
design como Adrian Forty. John Heskett e Victor Margolin.
Nada disso quer d izer que nessa história não haja também espaço para
a biografia de grandes vultos. conforme se evidencia no p resente volume.

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Contud o. o enfoque mais preciso da história do design semp re acaba
recaindo sobre os objetos ein si - aqu ilo que podem os chamar de "cultt1ra
n1aterial~ - , os quais codifican1 en1 sua estrun1ra e a1>arência uma série de
infon nações complexas sobre sociedade. tecnologia e criação individual
que p recisam ser decodificadas pelo trabalho de investigação histórica. E é
nesse sentido - da recon stituição de dados mais amplos a partir da cult1.1ra
n1aterial - que se desdobram os dois ensaios seguintes. O te.xt o d e Priscila
Farias enfoca o humilde baralho de cartas. docum entando a evolução dessa
indústria por meio do caso da empresa Copag, cujos produtos se tomaram
t ão fami liares para o público brasileiro que costuman1 ser quase invisíveis
como objetos de design e de h istória. Trata-se de parte essen cial do trabalho
de investigação a ser feito : olhar em volta . pôr em questão a naturalização
das fom1as e aparências pela sua saturação e ilu.1ni11a1· as relações consútuí-
das na paisagem material que nos cerca. De mod o análogo. o texto de Egeu
Laus recon stitui a trajetória das capas d e discos no Brasil até a década de
1950, surpreendendo-nos mais u n1a vez con1 a con statação de que muito se
fez de extraordinário e jnovador en1 termos projetuais numa época en1 que
supostamente não havia design por estas paragens.
Ao chegarmos à década de 1950, aproxirnan10-nos novamente do mo-
mento de ruptura assinalado no início deste texto. Que ruptura foi essa?
Para qu em e contra que1n? São q uestões que. insepultas, ainda assombram
o cast elo cinzento da institucionalização do design no Brasil Que a ruprura
moderna se deu , está claro. Com a vantagem de quare11ta an os de retrospec-
ção, não nos resta dúvida de que deixou n1arcas duradouras aquela geração
heróica de arquitetos. designers e assemelhados que in cluiu Affonso Eduardo
Reidy, Carn1e10 Portinho, Maurício Rob erto, t ina Bo Bardi, João Batista Vi·
lanova Artígas, Geraldo de Barros, Alexand re Wollner, Alo.ísio Magalhães e
muitos outros. E. apesar da ruptt11·a. fica igualmente claro que o Brasil ar -
caico, contra o qua l se opunhan1, persiste. Se o 1nodernisn10 venceu e o de-
sign m odernist a se consagrou. é licito pergw1tar: por que não se cu n1p riu
quase nenhu1na de suas promessas de campan.h a? Afina l, a 1naior acusação
que se pode fazer ao desenvolvimentismo tecnológico vigente naquele início
da d écada de 1960 - q ue deu o rigem ao aparato institucional do design no
Brasil - resume-se à simp les constatação de que esse campo profissional tem

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Mat co a s a ar s
feito 111uito pouco para alterar as condições de "ida da maioria da popu lação
,
do país. E demasiada a cobrança? Pensemos. para efeitos de comparação, no
enorme impacto político exe rcido, para o bem ou para o tnal, pelos bacharéis
en1 direiro no século x1x, pelos engenheiros e nlédicos sanitaristas no início
do século xx. pelos arquitetos e urbanistas das décadas de 1950 a 1960.
Con10 reverter esse quadro, já que é evidente que o design ainda pode
fazer muito num país con1 extretna carência de p rojetos, de soluções, de
planej.tmcnto? Correndo assumidamente o risco de advogar em causa pró-
pria. ousaria afi nnar que um dos caminhos a serem perco1Tidos nessa busca
é o do autoconhecimento, Enquanto os designers continuarem a desconhe-
cer o rico e fértil legado histórico de projeto que existe em nossa cultura h á
um século ou mais. estarão condenados a descobrir a pólvora e a reinventar
a roda a cada geração. Pior que isso. estarão optando por permanecer presos
aos limites estreitos da conceituação da profissão imposta pela moderni-
dade envelhecida de quarenta anos atrás. que ainda se manifesta em dico-
tomias falsas, tais con10 forn1a/ funçâo , design de produto/design gráfico.
aparência/ uso. atte / design. n1ercado / sociedade. Ou. pior ainda, estarão se
sujcít.tndo a infind~íveis e n1açantes debates sobre identidade e brasilida-
de conduzidos por tipos curiosos que preferem discutir o design a fazê-lo.
A história do design que se apresenta neste livro não se propõe nenhum
debate estéril . Antes, pretende oferece r um caminho para aliar a reflexão
critica à prática inforn1ada, con10 sempre deveria ser, já que todo exercício
de teoria que se preza redunda necessariamente em ação.
Antes de encerrar esta Jnr.rodução. faz-se necessária a tarefa pouco agradá-
vel de chamar a atenç:io para ao menos uma deficiência do livro que se tem
etn mãos. Muitos leitores sentirão a fa lta de ensaios sobre temas essenciais
à história do design gráfico no Brasil no período sob consideração. A omis-
são de un1 estudo sobre a história do cartaz e do 01,tdoor, resgatando figuras
esquecidas con10 Ary Fagundes. Geraldo Orthof e Henrique Mirgalowsky é
uma falha a ser suprida. Há ainda uma série de outros assuntos não explora-
dos que clao1a1n pela atenção dos pesquisadores. Paciêncja, não se pode fazer
tudo de unia só vez. Esses e outros estudos virão com o tempo, com a evolu-
ção da história do design como can1po de çonhecimento. Ainda há muito o
que pesquisar. Esta.mos apenas no início de nosso trabalho conjunto.

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A CIRCULAÇÃO DE IMAGENS NO BRAS IL OITOCENTISTA:
UMA HISTÓRIA COM MARCA REG ISTRADA

lívia Lazzaro Rezende

Em 1875 deu-se início a uma nova prática no Império do Brasil: quem qui-
sesse tornar exclusiva a marca de sct1 produro para distingui-lo dos outros
no mercado final1ne11te poderia ir até a Junta Comercial mais próxima e
registrá-la co1no sua propriedade. Para efeti var o registro, o fabricante ,
comerciante ou seu procurador devjan1 apresentar duas cópias do desenho
da n1arca ao escrivão da Junta , que. após cuidar dos trâmites burocr~iticos
necessários. devolvia ao reqiacrente um dos exemplares carjm.bado como
prova do registro. O outro exemplar permanecia d e posse da Junta. tam-
bém como prova. colado em um. de seus livros-registro. O próximo passo
seria anunciar pu blicamente no Diário Oficial a existência da nova marca e
a quem ela pertencia. Somente d epois desse processo a n1arca se tornava
exclusividade do depositário e. co.m o toda e qualquer p ropriedade privada
numa sociedade capitalista, protegida por lei. Quem, por má-fé. utilizas-
se um nome famoso ou u1na imagen1 que não lhe pertencesse sofreria as
penalidades e multas previstas.
As marcas podiam ser apresentadas à Junta de diversas formas. Havia
quem apresentasse apenas u m rascunho de uma imagem desenhada a n1ãer
Livre e havia quem apresentasse uma peça completa: tun rótu1o com textos
informativos. in1agens e logotipos impresso pelos meios técnicos disponíveis,
co.n10 graV1.1ra em metal ou litografia. A grande maioria dos registros de mar-
ca foi. de fato, realizada por meio de rótulos impressos em litografia. os quais
permaneceram colados nos livros-registro da Junta (con1 o nom e dos fabri-
cantes, dos produtos e dos endereços comerciais escritos nos m ais variados
e criativos tipos e ilustrados com as mais diversas imagens). de modo que
hoje constituem uma inesti1nável coleção da cultura visual do século xrx e
um excelente material de investigação para aqueles que se interessam por
design gráfico n o Brasil.

20

Mat co a s a ar s
g
Essa coleção encerra uma série de questões - como, por exen1plo, a pro-
teção da propriedade indttstrial ou. intelectual - que podem parecer tlffi
tanto óbvias e corriqueiras para o consumidor atual, mas em meados do
século x,x a sociedade brasileira testen1unhava o ingresso à lógica econôu1i-
ca capitalista en1 sua for1na plena e com seus sutis paradoxos. U1n deles é o
de tomar de consumo público algo que é privado, fazendo com que penen-
ça a un1a pessoa específica e tenl1a sua exclusividade resguardada.
Nas páginas que se seguen1 examinaremos dois lados de uma n1esma
evidência material: o do registro de marcas como fenômeno histórico e
cultural e o dos rótulos como exemplares da tec11ologia gr;ifica e da comu-
nicação visual existentes no .Brasil do século x1x.

,
O I NIC.10 .DO REGI STRO DE MARCAS NO BRASIL

Antes da vinda da corte portuguesa. para o Brasil , a política de concessão


de privilégios industriais (ou patentes) não contava com regula mentação
precisa e os direitos eram an·ibuídos aos inventores por meio de conces-
sões esparsas. En1 abril de 1809. u1n alvará assinado pelo recén1-chegado
D. João VI fez do Brasil a quinta nação no mundo a possuir un1a legislação
esp<>cífica para patentes. vista como um sistema eficaz de proteção para "o
progresso da indústria nacional" !Rodrigues, 1973: 5331.2 O alvará ordena-
va que os p.l anos do invento a ser patenteado fossen1 apresentados à Real
Junta do Comércio, Agricultura. Fábrica e Navegação para que se julgasse
seu teor de novidade e utilidade. Aos inventores bem-sucedidos eram ofe-
recidas regalias como isenção do pagamento de direitos alfandegários para
i1nportar matérias-primas e apoio financeiro na in1portaçào de máquinas.
No entanto, mesmo já possu indo um significativo com ércio d<> exporta-
ção. un1 mercado interno de consumo de bens estabelecido e diversas ins-
tituições fun cionando em torno da regulamentação da atividade comercial.
até 1875 o Brasil não conhecera nenhurna legislação que previsse um siste-
111a de re!,_ristro e privilégio de 110111es ou imagens. Foi por causa de uni caso
particular de plágio e litígio jurídico que o governo atentou para a necessi-
dade premente de proteger as marcas comerciais en tão en1 circulação. En1

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21

Mat co d s a ar e;
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1 2 E1apas do
processo de reg,s tro
de marcas: rótulo
com a marca de velas
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de reg,stros da Junta
Comercial acima de sue:
descrição 1). Recorte

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1873, a fabricante do rapé baianoArêaPreta, a Meuron & Cia.. mais antiga do
país no ramo. entrou com uma ação judicial contra a firma pernambucana
de tabaco Moreira & Cia. por esta ter lançado no 01ercado o rapé Arê(I Parda,
com uma e mbalagem semelhante à do famoso Arêa Preta. Uma vez consta•
tada a usurpação da marca original, os sócios fran co-baianos conseguiram
apreender parte do material pernambucano como evidência de má-fé comer-
cial. Como não havia porém no país lei que prescrevesse o plágio corno crime
imputável. a Meuron & Cia acabou sendo obrigada a pagar os custos do pro-
cesso e o prejuízo da concorrente fraudulenta !Cunha lima, 1998j.
Esse incidente não passou despercebido pela Comissão de Justiça Cri-
minal da Câmara dos Deputados. A partir dele, o Brasil começou a elaborar
a sua primeira legislação sobre o uso de n1arcas - incluindo nornes e ima-
gens - . tendo na figura do deputado mineiro Affonso Celso de Assis Figuei-
redo (futuro visconde de Ouro Preto) o porta-voz da discussão. A legislação
que "regula o direito que tem o fabricante e o negociante de marcar os pro-
dutos de sua m anufatura e de seu comércio" foi aprovada em 23 de outu-
bro de 1875, sob o Decreto 2.682, seguindo o exemplo da similar lei fran-
cesa .j En1 seguida, designaram-se juntas e inspetorias do comércio como
os órgãos competentes para realiza r os registros e depósitos de marcas em
todo o rerritório nacional. A in.ternacionalização das marcas também estava
prevista no Decreto 2.682. Em 1876 foram assinados acordos de proteção
mútua com França e Bélgica; no ano seguin te, com Alemanha e Itália; em
1878, com Holanda e Estados Unidos; em 1879, com Portugal; e em ·1881
com a Dinamarca. En1 1883, sendo signatário da Convenção Internacional
de Paris. o Brasil j á havia firn1ado acordos con1 a maioria dos países com
os quais ma11tínha intensa troca comercial. Mas com a Inglaterra, seu prin-
cipal fornecedor de produtos ind ustrializados. o país não mantinha um
acordo restritivo.
A coleta de marcas iniciada pelo Império em 1-875 foi suspensa em mea-
dos de 1890 por um decreto baixado pelo Governo Provisório republicano.
que previu outro tipo de registro de patentes e propriedade intelectual. Os
livros-registro da Junta Comercia l contendo os rótulos litografados foram
recolhidos pelo Arquivo Nacional nas primeiras décadas do século xx. Nesse

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24

Mat co a s a ar s
n1omento, os livros perderam o seu valor original por não n1ais se presta-
rem à esfera da con1provaçâo juridi<:a, mas toram investidos de outro valor:
o de patrimônio cultttral. Atualmente saben1os a localização de o ito dos
vá rios livros-registro que devem ter sido abertos para o exercício dessa 1,rá-
tica nas juntas e inspetorias Brasil afora. Esses livros, guardados no Arqui-
vo Nacional do Rio de Janeiro. possuen1 m ais de mil marcas registradas ao
longo de suas páginas e um núm.ero u1.n pouco menor de rótulos.•
As figttras 1 e 2 nos d ão un1a idé ia de com o funcionava o regin1e de 11, 21
registr o e co1no esses livros foram <:omposros. O rótulo in1prcsso com a
n1arca de velas Rio foi apresentado à Junta no dia 7 de noven1bro de 1887.
Na mesma folha do livro onde foi colado. o funcionár io descr evia o conte-
údo do exemplar:

A marca supra de propriedade da firma abaixo assinada consiste na palavra


- RJO - acompanhada de un1a estrela cotno distintivo. na parte superior. e na
inferior: = Marca Registrada =. É destinada a especificar o tàbrico das velas
de cêra [?J e composta. sendo estampada em cada vela e nas caixas que as
acondicionarem.

Depois de depositada n a Junta. a 1narca devia ser publicada no Diário Ofi·


cial ou em qualquer j ornal de grande circulação, acon1pa11hada de um tex-
to descritivo. da data e h ora do registro e do nome do fa bricante. então
dono da m arca. Depois disso. um recorte do jorn al con1 a publica~·ão e ra
encadea1ado junto à folha do livro que continha o respectivo rótulo. finali-
zando assim o processo de registro. Uma vez que a posse fosse de conheci-
mento público, qu.tlquer contrafação ou uso irregular ela ,narca protegida
poderia ser contestado e punido.

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ROTU LOS: U MA PEQUENA INDUSTRIA E U MA GRANDE IDEIA

Em meados do século x1x. a produção de alín1entos e de bens de consu-


mo simples acompanhou o crescin1enco urbano e o p rogresso técnico do
setor de transportes, que havia facilitado a circulação de n1ercadorias para

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25

Mat CO"'l O s a ar s
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3 a 21 Marcas
registradas na Junta
Comercial en tre 1875
e 1901. Os rotulos
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1aenlil 1cav-dm
p1 údutos dgn,.;otas ou
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Os propneta nos das
marcas deviam registrar
todas as v~naçóes de
rorulos uril11adas n,:>s
produtos (41

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exporta ção e co nsumo interno. O re lativo crescimento industrial brasi-
leiro foi induzido pela necessidade de produtos básicos, con10 insumos.
111aquinaria. peças e implementos vinculados ao setor agroexportador. O
beneficiaJ11ento de café e o refino de a<,..ícar foram algumas das atividades
complementares que estiveram nas origens da indústria brasileira, assim
como produtos associados à indústria de transformação. tais como sacos
de algodão para farinha e açúcar refinado, garrafas de vidro, latas para fós-
foros, cigarros. bebidas, alin1entos. maquinaria indusrriaJ simples como
ton10s, equipamento têxtil, pequenos motores etc.
O desenvolvi1nento do setor agrocxportador não desestin1ulou o
surgimento do setor industrial no Brasil. Pelo contrário. a formação de
capital , fundarnental para a implantação da atividade industri al, este-
ve iJ1tj mamente ligada à prosper idade da econom ia agr~íria brasileira.
Essa a firmação está estampada nos rótulos. A grande maioria anu nciava
der ivados do setor agrícola. como tabaco (rapé. fumo ou cigarros) e bebi-
das (fe rmentadas e destiladas, que também eram chamadas de xaropes).
Outros setores representados também estavan1 ligados à produção rural,
como o alimentício (especialmente óleos. banhas e farinha), o têxtil (da
confecção de algodão para sacos de alimentos e roupa de escravos) e o
farmacêutico (produtos de toucador, elixir e tônicos inspirados na flora
medicinal brasileira). A própria necessidade de diferenciar u·n1 deter1ni-
nado produto de seus sin1ilares - e para tanto tornar exclusivos seu nome
e imagem e confeccionar rótulos únicos - conta como forte evidência do
aum ento de otertas no mercado.
- medida que as trocas comerciais n1ultiJaterais se .iJ1tensificavam e os
A
m ercados de cada país se internacionalizavam. construia-se wn discurso
segundo o q ual a concorrência econômica pacífica e produtiva. empre-
endida en1 âmbito industrial e com ercial. seria o índice da paz entre os
povos. Com isso. o progresso material caberia a todos e por todos deveria
ser desfrutado. No entanto, a candidatura do Brasil a pa rticipar da repre-
sentação de país n1odem o não se fincava solidamente em seus feitos indus-
tr.iais de produção ou consumo. As tentativas de industrialização no sécuJo
xix não foram. plenamente encorajadas pelo poder público. O desenvolvi-

a 1 1 5
28

Mat CO"'l O s a ar s
g
mento da produção em lat1,,a escala de bens de consumo não contou com
n1edidas políticas que tornassem o Brasil um participante ativo das trocas
comerciais de produtos industrializados. Apesar disso, sua participação no
sistema econô1nico internacional do período já estava consolidada con10
fornecedor de produtos a1,,rícolas e como consu.m idor dos produtos indus-
trializados in1portados.
A sociedade brasileira do período dizia-se libera l e progressista. n1as
encontrava-se paradoxaln1ente organizada em torno de un1 sistenla forte-
mente escravocrata. A aboli~'.ào, no final do século, não foi suficiente para
absorver como plenos cidadãos aquelas pessoas que até então eran1 trata-
das como n1ercadorias, e as dcsigi1aldades sociais só tenderam a aumentar.
Diao.te dessa perspectiva, como os conceitos de 111odernidade foran1 acon10-
dados de maneira a fazer al!:,'llm sentido para a precária realidade tropical?
Como em um país ainda fortemente agrário os traços da cultura européia
foran1 pern1anentemente representados, reproduzidos e interiorizados?
O engajamento do Brasil no projeto de modernidade deu-se. antes.
no plano do imaginário, ou seja, a apropriação dos vaJores relativos a
indust1iaJização. civilização e progresso deu-se na supcrficíe: pelo uso das
imagens vin<.uladas a eles [Hardman. 1988; Mauad. 1997j. Vn1 dos rneios
nos quais podemos ve1ificar a expressão desses valores e seu impacto n a
sociedade é aquele das imagens que foran1 mostradas pelos produtores aos
const1n1idores. isto é, as imagens que circulavam 110s rótulos das m erca-
dorias. Antes de exanúnarmos diretamente essas peças gráficas oitocen-
tistas. porém. cabe fazer uma sucinta passage1n pela história e particula•
ridade da técnica Utográfica usada para co11feccionar a maior parte dos
rótulos da coleção.


LtTOCRAF IA, TECNICA E LINCUACEM

A rápida dissen1inação da técnica litográfica foi possível graças às obras


publicadas pelo próprio inventor, que se propôs divulgá-la e explicá-la
didatican1ente. Alois Senctelder revelou todo o processo lirográfico e1n
A complete course of líthography, de 't8'l9, e em seguida outros colaboradores

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29

Mat CO"'l O s a ar s
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promoveram a difusão da litografia publicando seus princípios em outras
lín1:,ruas. Tamanha foi. a aceitação em torno desse invento que. poucos anos
depois de seu primeiro anúncio. a Lito1:,1Tafia já se popularizara e penetrava
cada vez mais no n1ercado gráfico europeu IMarzio, 1979: 69-70].
A grande vantagen1 da litografia em relação às técnicas de reprodução
de texto e imagem anteriores está na possibilidade de criação do desenho
- incluindo aí o desenho de letra e textos - in1ediatamente sobre a matriz
a ser impressa, praticamente como se fosse sobre o papel. Na tipografia. o
texto deve ser composto a partir de tipos de chumbos preexistentes e a dia-
gramação das páginas, na 1naioria das vezes, precisa ser feita à parte das
imagens utilizadas. Já na litografia. toda a composição pode ser imaginada.
realizada e impressa si1nultaneamente. o que promove o imbrica mento de
texto e desenho. e favorece o tratamento do texto como in1-agem. Essa téc-
nica pode não ser a mais adequada à publicação em sé1ie de livros e jornais.
mas a sua importància e o seu significado devem ser compreendidos no
âmbito dos impressos comerciais e publicitários realizados no século XIX.
quando se fez sentir seu impacto revolucionário.
181 O rótulo pernambucano do Xarope dí\bacachi é um bom exemplo de
co1110 a versatilidade técnica da litografia veio ao encontro das demandas
do comércio. As duas versões de texto - uma em português, voltada para
o público in.terno, e outra em francês. para exportação - podian1 ser facil-
1nente impressas sobre a mesma base, alternando son1ente a matriz dos
escritos. conforme a conveniência. Esse rótulo também. é u 1n ótimo exem-
plo de como a cor entrou de vez no aprimorarnento da linguagem con1er-
cial a partir da litografia. O método inicial para impressão litog ráfica
colorida consistia na justaposição de blocos de cor con1 tintas opacas,
impossibilitando a gradação de tons. O conhecimento da mistura de tintas
e cores oriundo das artes plásticas estimulou os litógrafos a pesquisar
outros n1étodos de superposição de cores, u.sando uma gama mais ampla
de tintas transpare11tes ou translúcidas para aplicar sobre a matriz litográ-
fica. Em 1.837. na França , Godcfroy Engclma11n e seu filho Jean desenvol-
veram a técnica que seria mundialn1ente conhec.ida con10 cron1olitografia
IMarzio. '1979: 6. 17].

a 1 l 5
32

Mat co a s a ar s
A grande va11tagem da cromolitografia está na possibilidade do registro
perfeito de cores e na an1plitude de gradações tonais obtidas m ediante a
impressão de diversas matrizes para realizar um só desenho. Finalm ente
a porosidade da pedra, que permite a absor~·ão da tinta gordurosa, passou
a ser aproveitada também para a geração de m eios-tons coloridos. à guisa
de t1ma retícu la como a que seria desenvolvida posteriormente para a
impressão em offset. A riqueza de tons no pôr-do-sol do rótulo do Xarope
d'.Abacachi e o tratamento de sombreado por todo o desenho exploran1 a
fun do essa possibilidade.

,,
ROTULOS NACIONAI S NUM MERCADO CADA VEZ M AIS INTERNACIONAL

De modo geral, arte e comércio caminharam j untos durante o século xrx.


Tratava-se de uma relação menos apartada. Era um momento no qual as
artes ditas eruditas - a dos cânones literários. a da eloqüência e su ntuosi-
dade da ópera , a da metáfora alegórica dos mitos clássicos, a da arquitetura
urbana neoclássica, a da pintura acadê1nica - influenciavam diretatnente.
com motivos e como estilo, a produção de prosaicos impressos con1erciais.
Deuses greco-ron1anos, personagens religiosos ou preceitos da linguagem
arquitetônica faziam parte do repertório visual e cultural de com erciantes
e consu1nidores brasileiros do século XIX e podiam ser utilizados na con1-
posição de um rótulo sem comp1'0meter o entendimento de seu co.n teúdo.
Apesar desse trânsito. peças gráficas efen1eras como os róti1los foram por
muito tempo desconsideradas como objeto de estudo das n1anifesrações
culturais influentes no gosto da sociedade.
Esse veto foi costumeiramente justificado pelo fato de o trabalho gráfico
no Brasil oitocentista não ter contado com a figura do designer tal como é
conhe<:ida hoje. A produção de impressos comerciais se deu a partir ela gra-
vura e evoluiu gradativamente da escala artesanal para a industrial. Somen-
te com o acirramento da divisão do trabalh.o começou a se delinear a fun-
ção de responsável pelo projeto do produto e de sua in1agem. Antes disso, a
tarefa de criar uma imagen1 para ser veiculada nu1n rótulo podia ficar tanto
a cargo de um ilustrador ou de un1 litógrafo quanto do próprio cliente. Un1a

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33

Mat CO"'l O s a ar s
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8 A l1 togralla
proporcionava a
vantagem de facilnar
a troca do texto
mantendo a mesma
,magem,

9 Imagens ue índios em
poses reminiscentes
do repertono clássico
são caracterisucas do
oeriodo.
vez que a p edra litográfica contendo essa criação fosse entregue a uma casa
de esra111pas, a i1npressão em quantidade seria realizad a. Observe-se que
nem sem pre as chamadas oficin as litográficas estavam aptas a realizar todo
o processo de impressão. ~ralmente elas ofereciam o tratamen to químico
das pedras e o desenho. As casas que possuía tn prensas para tirar em. papel
o desenho d a pedra eram conhecidas por estamparias.
Com a consolidação da litografia com o m eio de produção de impres-
sos ilustrados bons. rápidos e baratos, a de1nanda por trabalhos aumentou.
Para dar conta desse crescimento, a racionalização da produção se tornou
inevitável. Para que um pedido fosse con cluído em tempo h ábil, as etapas
do trabalho foran1 ruvididas entre várias pessoas. que ao se con cei.1trarem
apenas numa tarefa (pelo me110s e1n tese) executariam-na com m aior pre-
cisão e rapidez. Em lí11h as gerais, a divisão de tarefas na oficina obedecia à
seguinte orde1n: ajudantes e aprendizes cuidavam das pedras, polindo-as e
dando os banhos químicos de preparação para o desenho ou aplicação da
tinta; o desenhista. que muitas vezes também era chamado de litógrafo. se
responsabilizava pela criação na pedra; e o in1pressor operava a p rensa. Em
alguns casos h avia ainda o letrista . prendado na arte de escrever invertido.
Numa oficina que praticasse a cromolitografia . o cromista era o responsável
por separar as cores e1n diversas ped ras. que seriam recombinadas na impres-
são co1úorme a criação con cebida pelo litógrafo !Cunha Lima. 1998: 176-77J.
Os termos "desenhista~ e "'lit.ógrafo" era1n largan1enre utilizados: podian1
abranger desde o empregado apen as habilitado na escrita inversa, típica da
litografia, até talentosos a11.istas e c:aricaturisras d e reconhecimento intema-
cio11al. Por isso, não poden1os ser conclusivos quanto à autoria dos rótulos.
Pelo contrário, m u itas pessoas esr-c.1van1 envolvidas nesse tipo de criação. às
1101 vezes simultaneamente. No entanto, o rótulo da Imperial Fábrica Andalusa de
Chocolate a Vapor apresenta unia particular exceção à regra. Assinado pelo
famoso caricaturista português Rafael Bordallo Pinheiro e impresso na Fran-
ça, a peça também nos aponta para as sucessivas influências estr angeiras que
envolveram a consolidação da arividade gráfi ca no país (Cardoso. 2004: 44].
A partir do final da década de 1 820, litógrafos de diversas nacionalidades
começaram a fixar suas oficinas e a desenhar boa parte da história gráfica

36

Mat CO"'l d s ar <;


g
no Brasil. Nesse m omento, praticamente inexistia oferta de especialistas. Ao
n1esmo ten1po, a demanda crescia, prin cipalme nte e m relação à p rodução
de efêmeros e imp ressos con1erciais. O panora ,n a não n1udou muito nas
décadas seguintes, uma vez que as instin 1ições públicas de ensino técnico e
artístico não con se!,TUia m suprir o n1ercado com p rofission.üs n um r it1110
co1n patível. Quen1 chegasse à Corte con1 conhecin1ento técnico era logo alvo
de disputa entre as oficinas [Costa Ferreira, 1994: 320--28, 342. 353, 366]. Esse
é um dos motivos pelos quais a presen ça do olhar estrangeiro é um tema
recorrente na discussão sobre a cultura visual oitocentista brasileira.
O que dize r de uma atividade que era majoritariamente exercida por
profissionais vindos de fora do país? A influência do olhar europeu na c ria·
ção das p eças gráficas é inegáveL Vide a cons trução da imagem do Xarope ra·•
d'Abacachi: wna índia dubiamente vestida com um drapejado clássico, orna-
mentada con1 braceletes e tornozeleiras m etálicos, atíp icos aos a utóctones
brasileiros. inserida numa paisagem tropical idealizada. Idealização tan1bé1n
presente no rót ulo de fumo Ramon Anído, no qual o corpo e a pose utilizados [9J
para representa r a índia b rasileira pertencem ao mesmo ten1po à figuração
h umana do repertório clássico acadên1ico. Mas se o 0IJ1ar estr._ingeiro influe n-
ciou o olhar local. redin1ensiona11do até n1csmo a re presentação de nossos
indígenas para nós,5 a realidade local tan1bén1 proporcionou novos l1orizon-
tes para a a ntiga perspectiva européia. Ao falar do n1ateiiaJ gráfico que seria
publicado em suas revistas, o litógrafo alemão Max fleiuss. radicado no Rio
de Janeiro, revelou com o se ilniscuían1 os h orizontes nacionais e estrangeiros
nesse n1ome11to: "As gravuras serão de duas classes: as nacionais e as estra n-
geiras. de modo que pelas pri1neiras tenha a Europa conhecimento do Br.isil.
e pelas segundas conheça o Rrasil o que h á de n1ais interessante nas regiões
de alén1-mar" japud Costa Fe rreira, 199,i: 142-47j. Não obstante a forte influê n-
cia estrangeira . o ponto de vista nacional estava sendo constnlido co1n base
em nossas próprias experiê ncias e aspirações. O que dizer do rótulo para
tecidos que enaltece a reunião entre brancos e negros a partir do decreto de
u n1a lei exclan1ando "Agora sin1!n? Nada 111ais superficial e hipócrita . típico 1141
de uma sociedade que por n1uito ten1po tentou se equilibrar na contradição
de que rer ser libera.! e mode111a sendo de fato escravocrata.

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37

Mat co d s a or e;
10
10 Um raro e~empla1
de rotulo a oswntd!
a assinatura de seu
cnador o tamoso
11\JSlfildOr Ralael
Bordallo Prnhe1ro.

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inh. rmaçilo \ e1 bal se
lr'111taVJ as rnic1as do

1 fabricante ou ao lema

ti

NUNCA FA-LHO
17

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É importante notar a abrangência, popularidade e rapidez com que os
rótulos podian1 circular pela cidade, configura11do-se co1no ttm meio de
comunicação de idéias. Considerando-se que o .índice de alfabetização bra-
sileiro no final do século xtx gir ava em torno de 1.6% IOrtiz. 1991: 24. 28!,
qualquer meio de comunicação que prescindisse da leitt1ra encontraria
maior penetração ou repercussão do que aquele que dependesse somente
da escrita. Além disso. a litografia havia se n1ostrado o n1eio n1ais eficaz
- veloz e de baixo custo - para a produção em quantidade de impressos
efêmeros. E seria uma questão de pouco ten1po e aprimoramento técni-
co para que esse tipo de produção passasse da escala reduzida da prensa
1nanual para a escala industrial da prensa a vapor. A informação escrita no
11 sl canto esquerdo do rótttlo da I1nperial Fábrica da Candelária- "Llth . a Vapor"
- sinaliza um novo capítulo na história gráfica brasileira.
Não podemos falar em indústria gráfica antes de 1830, quando foram
in1plementadas diversas melhorias mecânicas no processo de tipografia,
possibilitando, por exe1nplo, a tiragem de milhares de cópias de um jornal
em pouquíssimo tempo [Cardoso, 2004: 38-391, Tampouco podemos fular
numa indústria de imagens antes de 1850, quando as primeiras prensas
automatizadas começaram a tirar litografias. Antes disso eram usadas pren-
sas 1nanuais cujo ritmo de in1pressão de cópias era relativamente lento e
que requeriam muita força e habilidade do in1pressor.
Por volta de 1840, vários inventores europeus haviam se lançado no
desenvolvimento ele "litografias a vapor''. lnicialmente muitas máquinas
se mostraran1 ineficientes na prática, e apenas em 1851 a patente franco-
austríaca Sigl-Engues obteve sucesso. a ponto de ser exportada para países
con10 os Estados Unidos. Essa máquina operava com entinta.mento mecâ-
nico. dispositivos de umedecimento do papel e un1 sistema automático de
alin1entaçào de papel e remoção das folhas impressas. No entanto, a histó-
ria da invenção da litografia a vapor não ~ muito çlara. Nos Estados Unidos
foram registradas entre 1861 e 1873 mais de vinte patentes de prensas, e
vários inventores reclamavam o privilégio da invenção, uso ou promoção de
algum tipo de mecanismo movido a vapor [Marzio. 1979: 81-821. Os dados
quantitativos publicados em anúncios da prensa a vapor nos dão uma idéia

a 1 5
40

Mat CO"'l O s a ar s
do iJnpacto que essa máquina causou na produção gráfica e, por conseguin-
te. na cultura visual do século x1x. Enquanto um bom impressor tirava na
prensa manual 200 a 250 cópias em doze horas de trabalho (cerca de vinte
folhas por hora), havia anúncio que apresentasse uma prensa a vapor capaz
de tirar at:é 1 .3 1 0 folhas por hora! Mesmo des('.onsiderando o possível exa-
gero publicitário. os números encontrados no relatório de uma oficina lito-
gráfica .n orte-a mericana de 1877 registram uma produção que atingia 2.660
cópias por dia. Isto é, a in1pressão automatizada proporcionava, no mínin10,
un1a produção dez vezes m aior que a do processo manual. A partir da déca-
da de 1870. co1n uma produção capaz de oferecer dez vezes mais impres-
sos e uma demanda capaz de absorvê-los, a produção mundial de imagens
se in seriu de vez na era industrial !Marzio, 1979: 80, 87j. O Brasil não ficou
atrás nas inovações tecnológicas qtte aceleravam o mundo. Uma das pri-
meiras oficinas a anunciar a novidade técnica na Corte. em 1872, foi a Pau-
lo Robin & Cia., pertencente ao famoso litógrafo francês de mesmo nome.
A pequena assinatura no rodapé do rótulo da Imperial Fábrica da Candelária 11eJ
nos informa que a Litografia Antônio Lobo & Cia. tambétn estava equipada
com prensas movidas a vapor ao final da década de 1870.
Os anos que vão de 1850 a 1890 compreendem um momento histórico
bastante especifico para o ('Sti.tdo da circulação de imagens. Trata-se d e
um período em que já havia a rnecanizaçâo dos impressos visuais, mas
a in1pressão de fotografias ainda não era possível. Dessa forma, grande
parte das imagen s criadas e r eprodltzidas em larga escala vinha da tradi-
ção do desenho e era in1pressa em litografias a vapor. Un1a das principais
car acterísticas dos impressos desse m omento é a profusão de desenhos
de letras numa mesma peça. Como j .i mencionado. a técnica do desenho
sobre a matriz proporciona virtualm ente a criação de qualquer tipografia
en1 qualquer dimensão, direç:1o ou cor. No rótulo de fu1110 Ramon Anido os 191
textos foram escritos em diversos estilos típicos da época: o toscano (pre-
sente nos dizeres Superior Fumo de Minas. Importado do Rio de Ja neiro e Gara11-
tido por, Especialidade e Rio de Janeiro), o se1n-se1ifa (en1 Ramon Anido e nos
t extos laterais) e o tridimensional (em Artigas). Também fi cou 111ais fácil
aplicar textos e1n negativo (letra cla ra sobre fundo escuro). ornamentos

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41

Mat CO"'l O s a ar s
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13

Matar ai corr1 a1rerbs a...1ora1s


13 No rôtulo fmpresso
pe-la 1.J1og,af1a Paulo
Robin & Cia., a Imagem
da fábrica de tecidos
aparece ao fundo.
sugerindo progresso
industrial.

14 Alguns rótulos
celebravam conquistas
sociais, como a abolição
da escravatura.

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'

14
e n1olcluras em qualquer á rea da cornposiçào. Nesse exemplo não encon-
1101 tramos textos en1 Lnovimentos curvos. mas vemos pelo rótulo da Imperial
Fábrica Andalusa a tàcilidade na aplicação de cor e n1ovimento às letras.
O nome da fábrica. além de ter ganhado un1 tratan1ento tridimensionali-
zado, co1n o contorno acentuado em preto e sombreamento em branco,
foi colorido segundo a possibilidade de gradação tonal típica da litografia.
Podemos ver nas letr as que se repetem pequenas 1nodificações realizadas
em seu.s desenhos para adaptá-las ao m ovimento dos textos. A primeira
e a segunda letras "a" de Andalusa gt1ardam as semelhanças que as faze m
pertencer à mesma família tipográfica, mas ao n1esn10 tempo foran1 dese-
nhadas especial1nente para a posição na qual se encontram dent ro da
composição. De certa forrn a, essa flexibilidade do desenho tipográfico na
litografia a aproxin1a mais da atual tipografia digital do que de sua versão
contemporânea em chumbo.

SE R MODERNO E PARECER MODERNO

Mas não fora1n apenas os aspectos técnicos que favoreceram a prolife ração
de letras e ornamentos na co,nposição litográfica. No modelo de sociedade
capitalista. especialmente no século x1x, a noção de progresso e civilidade
estava intimamente associada à de abundância material. Quem ten1 mais e
exibe mais, de acordo con1 os padrões que regem a sociedade de consumo.
é mais ben1-sucedido. O trata1nento luxuoso em torno do nome do dono
11a1 da Imperial Fábrica da Candelária confirma essa proposição. No geral, os
nomes dos fabricantes e das firmas comerciais responsáveis pelos produtos
dos rótulos vinhan1 e1n destaque. Em algt1ns casos era reservado um tipo
cursivo (sem elhan te à escrita caligráfica) para escrever o tal 11ome, como
se ele assinasse e recomendasse o produto de próprio pu1lho. Esse tipo de
procedimento é usado até hoje quando queremos conferir ceita humanida-
de e um aspecto testen1unhal aos escritos mecânicos.
Outra informação recorr~nte, que também funcionava con10 atestado
do produto, era a st1a proveniência. muitas vezes fornecida na íntegra. por
meio do endereço con1pleto do fabricai1te. Quanto à diagramação do ende-

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44

Mat co a s a ar s
g 1 1 Q
reço. alguns rótulos exibem um aspecto peculiar: tal é a preocupação con1 o
equilíbrio e a siinetria da con1posiçâo que o nún1ero do endereço do estabe-
lecimen.to comercial aparece duplicado ar1r.es e depois do no111e da rua. É o
que vemos nos rótulos da fábrica de massas M.L.C. Silva Leal & C. e da lmpe- 117 l
rial fábrica de S. João de Nictheroy. onde o número 63 na coluna de texto à l 161
direita só aparece repetido por causa da presença do n1esn10 63 abaixo do
escrito Rua da Praia. Essa busca de eq uilíbrio e simetria na disposição dos
elen1enros havia reinado na linguagen1 visual estabelecida pela tipografia
e pelo estilo neoclássico. No n1eio litográfico também encontramos cstnt-
turas n1eticulosamente sitnétricas. especialn1ente no tr abalho com textos
curvos e números. Outra vez, o rótulo da In1perial Fábrica Andalusa vem ( 1 o1

abrir urna exceção ao que dizemos. Não apenas os textos aparecem nu,na
sinuosidade assin1étrica e va riável. como a repetição do 21 logo após Rua
dos Andradas está parcialmente encoberta por u n1a das n1edall1as. comp ro-
n1ete11do a leitura imediata da informação. Trata-se de ação deliberada do
au tor. qu e pode ser entendida como um desenvolvimento da 111otivaçâo
original de repetir o número para equilibrar uma composição. Ele consente
na repetição, mas a desvaloriza.
Os rótulos apresentan1 un1a concepção de cliagran1ação bastante pecu-
liar e diferente daquela à qual estamos acostl1mados hoje. Na n1aioria das
vezes a parte textual recebia n1uito mais ênfase do que as imagens. Fosse
pelo espaço que ocupavam na composição ou pela localização cent1·al, os
nomes do fabricante. do produto. o endereço ou outra infom1açào escrita
tinham posição privilegiada de leitura sobre o resto. Apesar dessa obser-
vação. seria temerário afinnar qt1e nos rótt1los litografados as ilustrações
tivesse1n uma .iJ11.portância men.or. uma vez que é muito difícil delin1itar
a fronteira ent-re texto - con1 toda a orname11tação, faixas. sombreados e
d iversidade con1 q ue eram aplicados - e imagem. No exemplar da Imperial
Fábrica da Candelária é difíci l distinguir o q ue serian1 a imagem da faixa l 1sJ
e a imagem do 1101ne, até porque ambas estão u lidadosamente in tegradas
no movimento curvo que realizan1. A con1plexidade da d iagramação não
pára aí. O texto logo abaixo. Superior Furno Rio Novo. não apenas aco1npanha
o movimento anterior como funciona como um contraponto gráfico para

a 1 l 5
45

Mat co d s a ar .,
15 A simecna era um
dos princípios mais
recorrentes na estrutura
gráfica.

16 1 17 Alguns
rótulos utdazavam um
repenóno visual em que
convw,am s1mbolos.
seres rn1101ógicos e
cenas pictóricas em
intrincadas retaç~s. DE

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\19 RUA DE SA~TTfO A TONIO 1


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17

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o desenho do texto JM Lizaur & Cia, e1noldurando o espaço para a colocação
do brasão imperial no centro das atenções.
Apesar da liberdade na con1binaçào de texto e ilustraç.io, con10 vim os
intensamente explorada nos rótulos do Xarope dí\bacachi e da Imperial Fábri-
ca Andalusa. perceben1os em alguns exemplares uma certa reserva em dis-
por a imagem na composição. Em diversos casos as imagens são colocadas
em janelas. como um recurso de abertura para outro espaço. No rótulo do
119 l fumo Dare Gaudium essa disposição é sutil. As figura s do índio, da oca e da
plantação de fttmo estão limitadas pelas cuivas dos textos acima e abaixo.
As bordas difusas no contorno desenham timidamente essa janela para uma
1201 outra dimensão narrativa. Já no exe1nplo do tabaco A Flor elo Funw, dentro da
lógica da composição a janela ganha uma dimensão concreta, uma vez que
as figuras femininas podem apoiar-se nela. Isso reflete certa maturidade no
trabalho con1 os elen1entos e a linguagen1 gráfica disponíveis. Não é em qual-
quer peça gráfica que assistimos a um jogo tão intrincado no qual o desenho
que se pretende tridimension al - pois as 1nulheres "apóian1-se" na janela
central - busca outro espaço, praticamente uma quarta dimensão, ao fazer
uso da janela para contar uma cena que ocorre en1 outro tempo.
A 1nesma situação se repete de forma bastante sofisticada no rótulo da
1161 Imperial Fábrica de S. João de Nictheroy. De fato, esse é t1m dos mais ricos
e complexos exen1plares da coleção, um dos casos em que a mensage1n ver-
bal não está privilegiada. Quase roda a extensão do papel foi utilizada para
dispor a imagem, que por sua vez se divide em dois n1on1entos diferentes
e encerra unia série de códigos gráficos elaborados. Se os rótulos podem
nos dizer sobre a técnica de produção de i1npressos e o desenvolvimento da
atividade gráfica à época. também espelham o que de mais amplo ocorria
co1n a sociedade que os produziu.
Em primeiro plano ve1nos uma cena que se passa na nanireza. À esquer-
da, un1 indigena con1 cocar e colar de penas. rnas vestindo um panej amento
à moda clássica. Ele leva no dorso um cervo abatido e parece ter na cintura
a cabeça de outra caça. A mão direita segura o arco, e com a esquerda apóia-
se num elemento estra.n ho ao a1nbiente natural. Seu olhar entretido pela
india do outro lado da composição não nega contentamento e nos igi1ora.

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Mat co a s a ar s
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Esse ind.io é o próprio desenho do bon1 selvage1u, fo11e, capaz, q ue vive en1
s intonia com a na1urez.1 e lira dela o seu proveito. Seu corpo é n1usculoso
e bem defin ido. Corajoso e de bom coração, não se rende l1s fe ras . mas é
s uscetivel ;\ presença de u1na bela m.ulher, que lhe provoca o olhar. A c,1beça
leve111ente torcida, jogando os cabelos para n ..1s; a postura inclinada sobre a
pedra, recostada no 111esn10 eleme nto no qual se apóia o índio: as pernas cru-
zadas; o relaxam e nto do ato de fu rn ar; o seio 11u e o olhar leven1ente alheio
con1põe111 perfeita1nente a cena do jogo de sedu~·ão. En1 teru1os estilisticos,
an1bas as figuras est ão caracterizadas nun1a for111a híbrida entre o in dianis-
n10 romântico e as re presentaçôes acaden1icas tradicionais jCanclini, 1997!.
Enquanto o índio possui n1ai s características 11ativas, a índia re n1 n1ais que
ver com as figuras clássicas ocidentais. A represen tação do seio nu, p or
exemplo, remece ao modelo grego. enfatizado pelo drapejam e nto cobrindo
seu colo e pernas. O corpo, os membros e os t raços faciais ta mbé m se!,' ltCm
as regras an tigas de figuração. As sandálias de an1ai,·ar e o colar sofisticado
mostram a ligação dessa índi a com uma cultura outra que não a sua. O pró-
prio ato de fumar cigarros a coloca à frente de seu ten1po. A mulher está
acon1panhada por un1 cão don1esticado. En1 contrapont o c:0111 o ambie nte
selvagen1, o r1de são caçad os os ani1n ais ferozes que o índio carrega. essa
scgu11da parte da cena se toma o espaço da civilidade. A mulher é o retra-
to da iJ1dia q\1e aceitou os cost l1m es e h,ibitos urbanos, que se vest e e se
porta como tal. O olhar interessado do índio e a intenção de aproxin1ação
física sugerida pela torç·ão de seu corpo na direção da índia representan1 o
selvagem seduzido pela civilizaç.io. Outros elc1ne ntos estão de acordo com
o di scurso de distinção c ultural: as n1edalhas gar1has en1 exposições nacio-
nais e internacionais. o brasão monár qu ico figurando no alto e no centro
da composição e o lmpcrie1I no nomt'. Mas o que de fato arren1ata essa asso-
ciação é a inserção da janela oval e ntre o casal.
A j anela ganha uni valor a·idin1ensional tan1bén1 pelas son1bras que pro-
jeta sobre o fundo. De ntro del.t é aprcscn r.ada u1na cena urbana. centrada
no prédio da ln1perial Fábrica de S. João de Nictheroy. Alguns elen1entos que
cvocan1 n1o<lc1nidade e pro1,:rresso estão presentes: a alta ch an1iné fa bril. a
la rga construção de a lvenaria n o n1elhor estilo a rquitetônico da época, o

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Mat CO"'l O s a ar s
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.... - 1 18 A mfonnaçâo escnta
no canto esquerdo
do rotulo ·urh. a
Vapor" - sinaliza um
novo capitulo na h1s1ória
gráflca brasileira: a
produção passa
da escala reduzida da
prensa manual para
a escala Industrial da
prensa a vapor

19 A mclusão de
elementos simbólicos
podia indicar o
posicionamento politlco
do fabricante. Neste
1 rótulo, o barrete rrig,o é
uma referéncia claro ao
movimento republicano.

-
19

r 1
g
1novimento de transeuntes e trabalhadores bem-vestidos, o calçamento. a
n1a pavimentada. a ausência de ele1nentos natura.is. A j,i nela, que se abre
no n1eio de uma floresta para un1 a111bi.ente urba110, narra utn aco11teci-
1nen.to independente da cena principal. No entanto. ela não é colocada de
fo111'1a secundária nem é ignorada pelas figuras hun1anas. Pelo contrário. o
hon1en1 se apóia nela para ver 111elhor e se aproximar da n1ulher, que por
sua vez se aproveita para recostar relaxada. A janela é fuJ1damentaln1ente
o elemento de ligação entre os dois enan1orados. Apesar de pertet1cere1n ao
n1esn10 an1biente (a vegetação por trás das duas figuras mantém a noção de
continuidade espacial), a distância imposta pelas diferenças culturais (e pela
janela) é paradoxalmente minimizada pelo contato realizado pela janela. Ou
seja, aquiJo que parece separá-los na verdade pode uni-los. Se a civilidade,
representada pela cena trazida dentro da janela, uma vez separou o casal
romântico. ela agora pode ser o espaço de reencontro. Basta apenas. como
sugere a situação, a adesão do índio.
Esse rótt1l0 traz a lguns elementos de representação rípicos do século
x1x. que eran1 muito recorrentes. con10 as n1edal has. o b rasão imperial. a
figura indígena e o contraste entre a paisagem natural e a constcuída. Em
nenhun1 exemplar as 1nedalhas de premiação estão tão presentes quanto
[8 1 no rótulo do Xarope d'Abacachi. Pairam n1aciças sobre a composição as quatro
medalhas (que, mostradas frente e verso. somam oito faces) com qt1e o pro-
duto fora premiado cm exposições industriais. Esse tipo de n1ost1c1, n1uito
popuJar ao longo do século XIX em âm bito nacional e internacional. servia
para expor as novidades industriais e comerciais dos mercados e estimular a
concorrência entre produtos. oferecendo premiação aos melhores. Aqueles
que ganhavam medalhas tinham por bem destacá-las em suas embalagens,
pois esse tipo de prerniaçâo, além de atestar a qualidade do produto, de.n o-
tava certa aproximação ao poder imperial, uma vez que as exposições eram
amplamente beneficiadas e pro1novidas pelo imperador IHardman. 1988:
49-96; Cardoso. 2004: 79-81].
O uso do Intperial no non1e de fábricas ou produtos não era liberado para
quaJquer cidadão da Corte. De tato, ele correspondia a um t-itulo conced ido
pelo im~rador àqueles que lhe presrassen1 algun1 serviço e merecessem

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52

Mat CO"'l O s a ar s
g
distinção. Dos rótulos até aqui analisados, três possuíam o direito de usar
o nome, as arn1as e o brasão ilnperial : Imperial Fábrica A.n dalusa de Choco- [iO. 18. ló J
late a Vapor, Jn1perial Fábrica da Candelária e Imperial fábrica de S. João
de Nictheroy. Esses elen1entos não apenas tomavan1 especiais o produto e o
fabricante. mas tan,bém revelam de que lado eles estavam no jogo político
oitocentista. Se alguns rótulos den1onstravam apreço e filiação ao In1pério,
outros usavam os meios de representação românticos. mas com elementos
diferentes, para demarcar seus ideais contr,iríos.
A assi natura da litografia da qual foi rj rado o rótulo n1ineiro Dnre Gau- (19]
diurn não deixa dúvidas quanto à sua posição política. Ele foi in1presso na
litO!,' fafia carioca Paulo Robin & Cia, onde tam bém foram tiradas algumas
das principais revistas ilustr adas que se leva.n tara1n contra a escravatura e
pelo advento da República. Não seria de espaJ1tar. portanto. se descobrísse-
mos que algt1m dos jornalistas ou litógrafos envolvidos numa dessas revis-
tas tenha interferido na escolha da inlagem e na realização dessa peça. O
barrete frígio - a boina que aparece no meio de "Marca de F~ib rica" -, po r
exen1plo. era um símbolo havia 1nuito adotado pelo n1ovin1ento republica-
no francês e que reapareceu no Brasil na segunda nlet.ade do século x1x con1
a mesn1a significação. O barrete, sín1bolo da libertação de situações opres-
soras, é associado aos habitantes da Frígia, estabelecidos na região a noro-
este da Ásia Menor desde o século x11 a.e., que foram subjugados por diver-
sos povos conquistadores. De acordo com o repertório visual oitocentista,
apenas a menção ao barrete como marca da fábrica já seria suficien te para
den1a rcar de que lado ela estava. Provaveln1ente pelos 1nes1110s n1otivos, os
no1nes da cidade e da província ganharam maior destaque - algo compreen-
sível nu1n rótulo que queria se distanciar da Corre de diversos modos.
Assin1 como outros rótulos e peças visuais desse período. o Dare Gau-
dium explorou a imagem do indio como símbolo das riquezas e da autenti-
cidade de nossa terra, nesse caso associando-o à agricultura d o tabaco. As
imagens e idéias construídas em to rno dos indigenas durante o pe ríodo
do ro111antisn10 brasileiro toran1 expressas tanto na li teratura quanto nas
~lrtes plásticas. E1n an1bos os casos, poré,n, o ínclio não e ra representado
de fon11a fiel e .iutêntic:a. No rótulo Ra,non Anido, por exemplo. a índia está

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53

Mat co d s a ar e;
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20 Ni! borda esquerda.
um BVrso evoca a
legislação recente de
proteção de marcas
e oferece gratrficaçào
para quem denunciasse
o plágio.

21 Marcas estrange,ras
1ambem eram
reg1S1radas no Brasil
para proteger seu uso
no comércio local. o
que acabava por gerar
um intercãmb10 da
lrnguagem grâfica.

r 1
21

r 1
representadJ e m sua forn1a exótica: cocar. arco e flech a, penas e adornos
[9 1 pelo corpo e, n1esn10 com a nudez, nun1a postura civiHzada. A altivez. sem•
b lante plácido e estatura nobre falam pelo passado orgulhoso e heróico
do nativo brasileiro. Qua.lqt1er sem elh ança do cocar envergado com uma
coroa não é 111era coincidência, um a vez qu e era conven iente ao Império
idea lizar o índio como senhor das terras brasileiras no passado e colocar·
se como seu nat11ral sucessor. Nesse exemp lar é p atente a semelhança fisi-
ca do índio alegórico com a raça branca européia: a pele parece cla ra, as
feições finas e delicadas. O exotismo exposto é econõuúco, expresso mai s
pelos adornos. plum agens e arco e flecha (desarmado) do que pelas reais
d iferenças étnicas e culturais. Mu itos dos ín dios brasileiros complem e nta•
vam sua ident idade com botoques. alargadores de orelha, argolas, pinturas
corporais etc.. m as para corresponder ao ideaJ romântico o índio alegori•
za.do n ão deveria exjbir nada q ue chocasse ou con testasse e.m excesso os
padrões estéticos europeus.
Enquan to algumas peças gráfi cas proc.·uravam qualificar a i magem exó-
tica cio Brasil para o estTangei ro, outras ian1 diretamente à fonte e tTazia,m
as imagens qut' co111punhrun o repertório visual europeu da época. Ê o caso
1111 do rórulo da tãbrica de massas a vapor ~1.L.C. Silva Leal & C., co1n suas figu•
. .
ras 1nitológicas e ornan,entaçào gráiica baseada n a arquitetônica. A esquer•
da está represen tada a en tidade greco-ron1ana relacion ada à agricu ltura.
A foice e o feixe de trigo em sua mão d ireit,a sin1bolizam a boa colheita, e
a corn ucóp ia (es pécie de chifre espiralado) repleta de fl ores e fnttos à sua
esquerda era o sín1bolo-n1or de abundância no séctlio xrx. A ' direita. Mercú-

rio, o deus da comu nicação, da velocidade e d o comér cio. está rep resenta-
do com o tradicional capacete alado, o caduceu na n1ào direita, a pedra na
esquerda e logo atrás a âncora simboliza11do a in c.u rsão pelos sete m ares.

E in teressan te notar que de todos os mitos e sím bolos clássicos Mercúrio é
provaveln1ente o n1ais recorrente, 111es1no quan do rep resentado na forma
1201 juvenil, como no rótu lo A Flor do Fumo. Para um m un do que acelerava seu
passo rumo ao q ue entendia ser o p rogresso e a mod ernidade. n ada m ais
convenien te do que um mito que simbolizasse ao 1nesn10 ten1po velocida-
de. con1ércio e expansão .

a .___ _ __________, 5
56

Mat CO"'l O s a ar s
Retornan1os então ao ponto de partida, quando l1aviat11os dito que o
projeto de 1noder11idade brasileiro se apoiava sobretudo nas in1agens que
eram construídas a seu respeito e por ele consumidas. Associar-se a con-
ceitos con10 progresso e civilização por n1eio das i1nagens. por exemplo. do
branco e do negro finalmente se confraternizando. ou de fábricas a vapor e
suas incessantes chaminés. ou ainda construindo t1ma aproximação entre a
condição tropical do Brasil do Segundo Reinado e o ideal urbano europeu em
contraposi~·ão à figtir.1 alegorizada do índio - todas essas práticas revelavam
o esforço de escuJpir un1 retrato de Brasil condizente con1 o itnaginário civi-
lizado, uma vez que os índices cone.Tetos de industrialização. alfabetização
ou desenvolvimento social ainda não eram pai.pá veis.

57

Mat CO"'l d os a ar <;


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DO GRÁFICO AO FOTO-GRÁFICO:
A PRESENÇA DA FOTOGRAFIA NOS IMPRE SSOS

Joaquim Marçal Ferrejra de Andrade

/AI fotografia, de mera alternativa para a obtenção ou feitura de imagens de coisas


já vistas pelos olhos, tomou-se test,·munl1a ocular <las coisas que ttossos olhos nunca
••
podem ver direta mente. f...J Não ape11as expandiu <~ ,~scala dti rtCJSSO conhecimento
\1Lçt1al, rnas com a sua reprodução na únprensa causou uma completa revolução na
maneira corno urllizanios os nossos olllos e. em especial, nos típos de coisas ,1uc nossas
tnl>tttes pennitem c1ue nossos olhos nos inftim1em llvins Jr.. 1953: 134!.

O velho - e ainda insubstituível - ílitionário de artes 1rráficas de Frederi-


co Po rta registra. em sua quase cinqüentenária última edição. noventa e
nove verbetes injciados pelo prefixo "foto", ao longo de sete pági.n as. De
totA1guatj nta até fo tozincoti pografia. passando pelos verbetes d os prin-
cipais processos foton1ecânicos e por gêne ros ta is como fotomon tagem,
fotonovela e fotorreportagem, são n1ttitas as palavras que tornam eviden-
te a presença da fotografia no universo das artes gráficas. Seja pelo lado
da criação ou pelo da produção. a história das artes gráficas pode ser d ivi-
dida em períodos pré e pós-fotográ ficos. A presença da fotografia. através
da introdução da reprodução fotomecânica e m suas diversas variantes. ao
longo da segunda metade do sétulo XI X. trouxe conseqüências profundas
ao universo design gráfico.
A fotografia. p or su a vez. d eve muito às t radições gráficas preexisten-
tes. da velha tipografia à litografia. ainda novidad e en1 n1eados do século
xix. Boa p arte dos inventores da fotografia. em suas diversas modalidades.
esteve f'o rte1nente ligada ao livro e à estan1pa - ou seja, à in1agen1 impres-
sa. O francês Nicéphore Niépce, que produ ziu a pritneira imagem estável e
pen11an ente co1n a utilização de uma camera obscura. en1 1826. iniciou seus
experin1enros con1 a litografia, passando em seguida à invenção da heliogra-
fia - pr0<.·esso de reprodução/impressão de imagens que se vali a da ação da

l_. _____________________________ •~
60

Mat co d
~. --- - ---------- ... -------------- . • ~

luz sobre o betun1e da Judéia. Daguerre deu seguirnento às investigações de


Niép<.:e e acabou por inventar o daguerreótipo, processo de imagens n1etá-
licas e únicas. Un1a série de vistas de diversas localidades do mundo, origi-
11aln1ente produzidas e1n daguen·eoripia, foi logo copiada manualmente na
pcdr.i litO!,'Táfica e u1ultiplicada na forma de fascículos, entre 1840 e 1844,
pelo editor N .M.P. Lerebours. Hercules florence - o notável francês radica-
do na província de São Car los (hoje, a cidade de Can1pinas. SP) que realizou
uma descoberta isolada da fotografia en1 1833 - desenvolveu tambén1 un1
processo de reprod ução gráfica que denominou poligrafia [Kossoy, 1980a:
24-29]. O próprio Fox Talbot, inventor do negativo fotográfico, idealizou e
p roduziu aquele que é considerado o prirneiro livro fotográfico da história.
Também lançado e n1 fascículos, entre 1844 e 1846, The penc.il of nature foi,
st·gundo o historiador Beaumo11t Newhall, "o prin1eiro livro ilustrado com
fotografias e a p rimeira produ<;ão cm série de fotografias. Sua importância
para a história da fotografia é co1nparável à da Bíblia de Gu tenberg para a
imprensa" IFox Talbot, 1969: 3].
Apesar dessas con.exões, a fotografia de1norou a se integrar satisfa toria-
mente ao mundo das imagen s in1pressas. Sua sin1ples invenção não havia
resolvido os problemas de estabilidade e de permanência daquelas imagens.
q ue muitas das vezes esmaecia1n ou sofriam alterações cromáticas ao lon-
go do tempo. Ademais. havia vários obstáculos à sua reprodução en1 série.
A demanda crescente por im agens iJ1centivou a busca de 11ovos processos
que possibilitassem a 1nultiplicaçào das fotografias através da i111pressão.
Desde cedo. a imprensa il ustrada passou a se valer de fotografias originais
como inspiração ou m odelo para a produção de sua iconografia. O que se
pretendia - especialmente no caso da i1nprensa peti ódica - era dar ainda
mais veracidade. mais autenticidade, 1nais objetividade à n arrativa visual
dos fatos. No entanto. as imagens estampadas eram inevitavelmente altera-
das, uma vez que nào havia ainda um processo de reprodução fotomecânica
que fosse técnica e econon1icamente vi,ivel para aquele fiJn.
Foi na décad a de 1840 q ue surgiran1, na Europa, os prin1eiros perió-
dicos ilustrados com fotografia : Thc.! íllustrated London 1'J~vs [Londres, 1842], 11 - 31
L'íllustration !Paris, 1843] e Wustrirte 7.eitung !Leipzig. 1843!. Neles. as foto-

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61

Mat co a s a ar s
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OI 11mboN't que not qulurom honrar com QU,\JiTO ANNO. PREÇOS.
artigo& e d~cnllos terloa bondllde do rcn•e~-
)115 em caM4 fechada IÍ red11~io da SEMA.'lA
TLLUSTRADA no lmperial Instituto Arli1-
tlco, lari;o da ~- Franci1co de P11ulA n. 10,
N. 175.
PUDLICA•IC
C:ÕITJ:.
Trimestre. . 6$000 Trimestre. • • . 6$000
Sfmestre • • V~ ~t:StN . . . . 11 ~'\k.10
Anno • . . . l l l ~ Anno . . . . . . 18~
PllO'fUICUI.

ondo tnmbem IIC aA&llrl)A, ATuls11 500 1'11,


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- - TODOS OS DOMINGOS.

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l'rogn-.-.o l Proi;naao 1 'P•l•<'rll m3g)Qt11 quo lmpelle o mundo á conq11irt:. do futuro e ao MIi 11>4rfolço:im('olo moral e ~by-
11co.
F..Ãto fTNJf ~e~quipedal ~"º
apenllf pari:i noticiar IIOI n<>f.'lll lcitol'ff., wrlii d ol'ií, que de hoje em diantt a S,-1111 Jlbtulrold ,
om1d11 de est.A.mpu gr&'l'ndaa em madeira pel01 moços bralileiros que lrequentto a aula de XylOG)"lphia do Imperial I111tltato J.r--
tbtlco.
A l!ft"Um 1clma rtpreunta o gabinete do Dr. Semllna. Todos tnblllbllo, menos D . Negrloha, que se conttnta em admirar
ou cen&uru u obl'l.t feitas.

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4 Sernana /Ilustrada.
17/04/1864.

5 6 Fotografias da
Guerra do Paraguai
reproduzidas ria Somana
11/ustrJda. em 1865.

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grafias eram estampadas pelo processo de xilografia, depois de te rem sido


minuciosamente copiadas à m.ã o nas 1natrizes de madeira. que eram então
.. abertas" por hábeis artesãos. Na prod ução dessas publicações. os textos
(tipográficos) e as matrizes xilográfic,.1s (d enominadas "tacos~) podiam ser
montados juntam ente na 1nesn1a p éígina e impressos simu ltan.eam.e11te.
Esses novos periódicos ilustrados acabavam de in corporar un1a técnica res-
gatada e aperfeiçoada pelo inglês Thomas Bewick, que já a vinha aplicando
nos livros ilustrados: a xilograV1.1ra de n1adeira de topo (mais dura do que
a n1adeira de fibra). aberta con1 os finíssimos instrumentos da gravura em
n1etal. Já na década segt1inte o processo se aperfeiçoou. buscando maximi-
zar a fidelidade aos originais e m inimizar a interferência do estilo indivi-
dt1al dos xilogravadores.
Iniciaram-se as experiências de produção com matrizes sen sibilizadas
(com emulsão fotográfica) q ue depois recebiam a projeção do negativo e
eram reveladas de modo que a in1agem (do próprio original fotográfico ou
do desenho ou "cópia fiel " produzido a partir dele) se tornasse visível na
madeira. se1vindo de guia para o gravador, que "abria" a matriz com seus
instn,mentos de coite. Dependendo de suas dimensões e do prazo disponí-
vel para a Sl1a execução. o taco podia ser aberto por um ou n1ais gravadores
- neste últi1no caso, a matriz era dividi da e, concluído o trabalho simul-
tâneo e1n suas partes. ren1ontada. Foi n essa época que os grandes jornais
ilustrados europeus - e logo. tambén1, os norte-americanos - implantaram
o siste.m a de galvanoplastia (ou elc.trotipia). inventado en1 1839, que pos-
sibilitava a confecção d e matrizes metálicas mais resistentes a partir dos
tacos originais.

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OS PRIMEIROS IMPRESSOS CO M IM AG EN S FOTOG.RAFICAS NO BRASIL

No Brasil também. surg.iram diversos p eriódicos cujos editores certa.m en-


te terian1 gostado de adotar um procedim ento similar. No entanto. a i.ne-
xistência de mão-de-obra local <1ualificada para transpor im agens fotográ-
fica s par a a matriz xilográfica retardaria o florescimento de publicações
em que texto e imagem pudessem d ividi r a mesn1a página . mediante

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64.

Mat CO"'l O s a ar s
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impressão simultânea. Num primeiro momento. merecem destaque a tipo-


grafia do francês Pierre Plancher-Seignot e de seu filho Émile, bem con10 a
Empreza 'fypographica Dous de Dezernbro. fundada em 1850 por Francisco
de Paula Brito.
O francês Victor Frond foi o primeiro. no Brasil. a conceber e realizar
un1a obra impressa inteiramente ilustrada a partir de fotografias, tiradas
por ele em 1858. A part.e iconográfica de seu Brazil JJittoresco, a1nbiciosa obra
de divulgac;âo desenvolvida ern conjunto co1n o escritor Charles Ribeyrolles,
a quem encon1endou o texto, foi in1pressa e111 Paris, nas oficinas da In1pri-
merie Len1ercier e consiste num conjunJo de 75 litobrrafias produzidas por
artistas franceses "a partir~ de suas fotografias. No entanto, as iJ11agens não
formam um livro propriamente dito, sendo apresentadas nun1 porta-fólio
de grande formato , lançado cm 1861 e que foi encadernado por alguns de
seus proprietários. Embora seja desconhecido o destino da nlaior parte dos
originais fotográficos de Fro11d, o que impede um estudo comparativo, é
evidente a interferência dos litógrafos parisienses sobre as imagens. Do pon-
to de vista do design gráfico - e, por que não dizer. da fotografia -, a obra
pio11eira de Frond não pode ser considerada um livro fotográfico.
Foi a partir dos anos 1860 que a fotografia deslanchou no país, firman-
do-se definitivamente ao ser assi1nilada e consun1ida pela elite brasileira.
<.:oncentrada em sua maior parte nas grandes capitais. E foi nessa n1esma
década que surgiu e se destacou a Semana rnustrada de Henrique Flei uss. J,i 1
repercutindo a novidade incorporada às suas páginas mediante imagens
copiadas de fotografias que buscavan1 retratar acontecin1entos e não 1nais
apenas localidades ou pessoas. dando assi1n grande contribuição à evolu<;·ão
da narrativa visual em nossa in1prensa ilustrada. Natural de Colônia. Ale-
manha. o desenhista, brravador e litóbrrafo Fleiuss chegou ao Brasil em 1858.
com o objetivo de integrar-se à missão cientifica dirigida pelos naturalistas
alemães Spix e Martius. Em ja11eiro de 1860, estabelecido jw1tarnente con1
se\1 irmão, o litógrafo Carl Fleiuss. e o desenhista. pintor e litógrafo Carl
Linde na firma Aeiu ss Irmãos & Linde, fundaram o Instituto .'\ 1tístico, prio-
ritariamente voltado para a tipografia e a litografia, mas ta1nbén1 dedicado
à pintura a óleo e e1n aquarela, à fotogr.1fia e à xilografia - esta última até

'--·-----------------------------·~
65

Mat co d s a or e;

.,.,Nda dt ftn<> O. ~ro li, po1110 ele ei,mua.


meoio da, duu f.lu.du. Sio li horu • mda.
~ por Tt-11111,- ..-rio ,IJz.el"'° f
Ntwte momenl4 o qne - dMo -,bN, lodo
l111<!rt01r, ..pndo ma pareu, 6 q...- n o , ~
.,-!Tt\,11\moç,.r,. é dl!pOb "-'-~•-"• ~ 1111,1,e.
- ■gora ao tarro dJ?polA da c-htgada d1.1 trt111,
11 1Ütda ie,em.,. de bp,,,ar a hora d1 .ua
partida do - tu1n.,, f1"'11 4 1 hora o 114 ml-
11at01,
.......E•t:1111o< no meio d" Ctllllhtbo : o qat Pl'-11
S&XTA MUDA 1

elntre-ltio.f,

r 1

7 Pnmeua pâglna de
Revista lflustroda.
01/01/1876, com
imagens ,mprcssas em
lrtografia.

8 Pagina do hvro Doze


horas em d1ligéncia: guia
do viaJante de Petrópolis
a Juiz de Fora. com
texto e fotos de Revert
Henrique Klumb. 1872.

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• - - - - - -- - - -- - - - . ~
r-. - - - - - - - - -- - - -- •••

então quase inexistente no mercado local. A partir de 1863 o empreen-


din1ento passou a se chamar Imperial Instituto Artístico. graças ao titulo
honorífico concedido por D. Pedro 11. Segundo Orlando da Costa Ferreira
!1994: 185J, fom1aran1 "a pri1neira equipe de designers do Brasil".
Fleiuss tiJ1ha o evidente propósito de faze r da St~rnana íllustrcida uma
publicação nos n1oldes dos melh.ores periódicos ilustrados europeus no
tocante ao design da pági._na, visando a integração texto/imagem. En1bora
o texto fosse in1presso em tipografia. aqui como lá. as imagens da Semana
fllustrada e ram litográficas. sendo impressas separadamente. O caminho
para alcançar seus objetivos passava obrigatoria.m ente pela formação de
mão-de-obra para os trabalhos con1 a xilogravura de topo no Rio de Janeiro.
de modo a viabilizar a composição e in1pressào dos blocos d e texto e d as
imagen s nun1a mesma página. simultaneamente, pelo processo tipográfi-
co. A convocação foi feita nas páginas de seu jornal: "Tendo a intl'!nçào de
estabelecer un1a escola de gravura em madeira (xilografia) em maior escala,
participamos aos pais, que quíserem mandar educar seus filhos neste ramo
da arte. ainda pouco conhecido no Brasil". Lamentavelmente. Fleiuss não
obteve sucesso em sua empreitada educacional. abandonada algum tem-
po depois cm face dos resultados pífios, con10 se pode atestar pelo exame
de suas primeiras páginas xilográficas. na edição de 17 de abril de 1864.
Assim , não vingot1 o projeto de transformar a Semana fllust-rada no primei-
ro periódico ilustrado local ot1de havetia uma completa il1tegração entre
texto tipográfico e in1agens xilográficas. Na seqüência. a capa voltou a ser
impressa em litografia.
.Iniciada a Guerra do Paraguai, em 1865. algumas fotografias do confli-
to con1eçaram a ser estampadas na imprensa brasileira. inicialmente nos
{5. 6 J suple1nentos ilustrados e depois nas páginas da Setnana lllustrada.~Ressalte-
se que a preocupação e111 n;.i o moso:ar q ualqt1er cena de guerrc:1 que cho-
casse fo.i uma constante na cobertura fotográfica de Fleiuss. Na edição de .2
de abril daquele ano o editor avisava aos assinantes que "tuna comissão de
engenheiros da força expedicionária de Mato Grosso, que segue hoje para
essa província. estudou en1 nossa rasa a fotografia e levou uma máquina
e as necessárias preparações a fim de tirar vistas e tudo o que possa haver

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68

Mat CO"'l O s a ar s
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de interessante. para junto con1 as necessárias descrições ser publicado na


Semana". Começava então o primeiro grande esforço de reportagen1 toro•
gráfica na imprensa pe1i ódica brasileira [Andrade. 2004j.
Voltando aos livros. falemos do alen1ão Revert Henrique Klumb. que
obteve sua instrução em fotografia na França e chegou ao Brasil entre 1852
e 1853. te.n do realizado urna obra d igna de n1enção. Depois de trabalhar
p or mais de uma década no Rio de Janeiro, onde foi sócio do litógrafo e
impressor Pattl Théodore Robin - um dos introdutores dos processos foto-
mecânicos n.o Rio de Janeiro -. 1nudot1-se para PetTópolis. Klumb foi u111
dos prinleiros profissionais a se dedicar no Br;-isil ao ensino da fotob11·afia
e à denon1inada ufotografia de re produção". con10 anunciado no Jornal do
Con1rt1crcio, enl. 1855: "reprodução de pinturas, gravuras, plantas de arquite-
tura etc." lapud Kossoy, 2002: 189, 192]. Entre suas mais importantes reali-
zações. produziu. em .1872, a pequena e célebre obra Doze horas ern dil(gência: !O I
bruia do viajante de Petrópolis a Juiz de Fora. à época um dos raros livros com
in1agen s realizadas Ma partir'· de fotografias (de sua autoria). Trata-se da
primeira obra do género inteiramente produzida no Brasil, com itnagens
constituídas p or cópias l itográficas (en cartadas n o texto), impressas no
estabelecimento do ediror J. J. Costa Pereira Braga, localizado no centro do
Rio de Janeiro. No prefácio. Klumb reivindica o seu pioneirismo ao afir 1nar
que o livro. concJttído onze anos após a idéia inicial, e ra "o primeiro guia
do viajante, feito no país 1... ] ilustrado de desenhos copiados da fotografia".
Segundo Pedro Vasquez 11997: 211. trata-se de Mun1 dos marcos n1aiores da
história da fotografia no Brasil".

A IMPRENSA PERJÓDJCA NA DÉCADA D.E 1870

Do ponto de vista do design gréifico, o ano d e 1876 é sen1 dúvida o n1ais


1narcante da história da iu1prensa ilustrada do Rio de Janeiro no século xix:
al guns p eriódicos saíran1 de circulação e outros tantos foram estabeleci-
dos, con solidando o modelo já consagrado localn1ente dos periódicos com
imagens litografadas. O n1aior exen1plo é sem dúvida o de Angelo Agostini.
que lançava e m 1? de janeiro de 1876 a sua Revista [Ilustrada. ~a maior de 171
.,.__. _____________________________ .__,
69

Mat co d s a ar e;
9 Capa do pnme110
número da luxuosa
revista 11/ustroçJo
do Broz,J. mostrando
retrato da pnncesa
Isabel. do conde <ffu
-
'\
e do filho do casal, o
príncipe do Grão-Para.
JUiho de 1876.

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10 Capa de outubro 1
de 1878. l.
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Rio de Janeiro, Outubro de 1878


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10

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r-- . - - - - - - - - - - - - - - •••

todas as rcvist.1s brasileiras de imagens do século passado" !Costa Ferrei-


ra, 1994: 4ooj. Embora Nelson We.r neck Sodr é 11983: 203] con sidere Agos-
tini un1 "precursor da fotografia ". parece-nos q ue esse título caberia com.
mais j us teza a Fleiuss. até mesmo porque a Revista Jllustrada, cujas imagens
eran1 impressas ern litografia, apenas esporadicamente deu espaço desta-
cado à fotografia .
(9 ] Em julho de 1876 surgiu a luxuosa !Ilustração do Brazil, publica~·ão inj-
cialn1ente bimensal lançada por Charles F. de Vivaldi. Na capa do primeiro
número, um retrato de "Suas Altezas lmpcriaes do Brazil" - a princesa Isabel.
o conde d 'Eu e seu fi lho, o príncip e do Grão-Pará. Trata-se com certeza de
u1na in1agern híbrida, inspirada n w11 retrato fotográfico da princesa con1 seu
filho e noutro do conde d'Eu. ambos provaveln1entc oriundos dos estúdios
de Henschel & Benque. fornecedores de in1agen s fotográficas para o perió-
dico de Vivald i. A n1atriz m etá lica (um estereotipo) u sada para a in1pressão
do retrato foi produzida nos Estados Unidos. pela firma Centenari lnc. As
legendas que acompanhavan\ as iu1agens pro<..'Uravam faze r os leitores ver
ali tudo aquilo que o editor desejava transmitir - e sen1 q ualquer men ção
ao fato de se tratar de cópia de fotografias. Essa práti(a de "leitttra induzida
da imagem". aliás de extren1a valorização da estampa, se tornaria comum
na Illustraçào do Brazil. A contribuição de Vivaldi para o desenvolvimento da
imprensa ilustrada no Rio de Janeiro está no modelo alternativo que ado-
tou para tentar superar as deficiên cias técnicas do meio n a época. Além de
encomendar matrizes originais estereotipadas nos Estados Unidos, adquiria.
para reimpressão, chapas já utilizadas cujos assuntos seriam do interesse dos
brasileiros, providenciando a tradução ou redação dos textos por aqui.
O editor certamente encon trava dificuldades para assegurar a viabili-
dade comercial de seu ousado e original empreendimento, o que o levou
a a lo ngar a periodicidade da publicação (tomada m ensal) e a reduzir-lh e
o preço. esperando assin1 decuplicar o nún1ero de assinan tes. Vivaldi não
f 101 abandonou a ousadia. como se lê na edição de outubro de 1878:

A linda gravura. que orna a prin1cira página do nosso jornal é, se não nos
enganamos, o prin1eiro retrato gravado enl madeira no Brasil. Este prin1oroso

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72

Mat CO"'l O s a ar s

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J pnm ,ros
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Con1 t 1, gravaaora

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A VÓZ SENTIMENTAL DO
O DIIICIN . . IIAIILIIRGIANOI lllto._
Chico tton, i iM11o (oq.)

ISBN as-7503-426-b

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