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7.1 Introdução
7.2 Notificação compulsória
7.3 Critérios de identificação de epidemia
7.3.1 Índice endêmico e diagrama de controle
7.4 Conclusão
Referências
7.1 Introdução
Na aula anterior, você estudou como a descrição da distribuição de ocorrência do agravo à saúde
permite identificar quem está ficando doente, onde as doenças estão ocorrendo e a sua relação com
o tempo, isto é, verificar se existe algum padrão dessa ocorrência, como variação cíclica, sazonalidade
ou se existe tendência temporal. Esse conhecimento é importante para levantar hipóteses sobre a
etiologia da doença e auxiliar o planejamento de intervenções em saúde para a prevenção ou
tratamento de doenças, além de permitir avaliar o impacto dessas intervenções.
Nesta aula, você vai aprender como o acompanhamento da distribuição de ocorrência da
doença com o tempo permite identificar uma epidemia. A evolução temporal dos casos
durante a epidemia, a descrição das pessoas acometidas e os lugares onde as doenças acontecem
auxiliam a identificar os determinantes das epidemias e, dessa forma, decidir ações para o seu controle.
A vigilância em saúde é uma prática destinada a verificar, de forma sistemática, como se encontra
a situação de determinada doença em um grupo populacional, por meio do “levantamento
contínuo de todos os aspectos relacionados com a manifestação e propagação de uma doença que
sejam importantes para o seu controle eficaz” (Waldman; Costa-Rosa, 1998).
informação adiante, ou seja, notificar. Isso é feito com o preenchimento de uma ficha ou formu-
lário para cada caso detectado, com dados que incluem diagnóstico, idade, sexo, local de residência,
ocupação etc. Assim, são colhidas as informações básicas associadas ao evento.
Para ilustrar, imaginemos uma pessoa que se sente mal, procura um serviço de saúde e o profissional
que a atende suspeita de que seja um caso de meningite (doença de notificação compulsória).
Mesmo que o caso seja apenas suspeito, sem diagnóstico definitivo, o profissional deverá fazer a
notificação, preenchendo o formulário apropriado.
Essa notificação chega ao serviço de vigilância para análise dos dados. Se for necessário, uma equipe
de profissionais do serviço de vigilância vai investigar o caso.
O Gráfico 7.1 mostra os casos de infecção pelo vírus influenza A – H1N1 (gripe), que
ocorreram durante a epidemia em 2009, no Estado de São Paulo. Esse tipo de gráfico é deno-
minado curva epidêmica temporal e é construído com o tempo na abscissa e o número de
casos novos na coordenada.
Gráfico 7.1: Distribuição dos casos e óbitos, confirmados para influenza A (H1N1), segundo semana
epidemiológica. Estado de São Paulo, 2009. / Fonte: modificado de Sinan Web, 2011.
Quando ocorre um surto, para poder adotar as medidas de controle, é importante carac-
terizar os casos de doenças por tempo e lugar em que acontecem e as pessoas acometidas,
identificando as suas características e como elas diferem daquelas que não ficaram doentes.
As informações colhidas permitem levantar hipóteses em relação à identificação da fonte de
infecção, como está sendo a sua disseminação entre as pessoas e ao modo de transmissão.
Essas hipóteses são testadas com realização de culturas a partir de amostras biológicas
coletadas, testes diagnósticos ou por estudos que comparam um grupo de pessoas acometidas
com um grupo de pessoas não acometidas (controle) para verificar se existe diferença entre os
grupos e decidir se ela pode ser aceita ou deve ser rejeitada.
Por exemplo, se ocorrem casos diarreicos em pessoas que participaram de um jantar, na investigação
procura-se saber quantas das pessoas que participaram do jantar apresentaram sintomas, quais foram esses
sintomas e o dia e hora em que apareceram. Procura-se também identificar, por meio da aplicação de um
questionário, o que cada pessoa comeu. A comparação dos alimentos ingeridos por quem teve sintomas
e por quem não teve auxilia na identificação do alimento que foi a fonte de contaminação da doença.
Para investigar surtos epidêmicos, logo que surgem e durante sua vigência, é calculada a
taxa de ataque, que é a incidência da doença que ocorre em uma população específica ou um
grupo definido de pessoas, limitada a um período de tempo de dias ou semanas e localizada em
uma área restrita.
No exemplo anterior, para o cálculo da taxa de ataque, o número de pessoas que tiveram
quadro diarreico seria dividido pelo número de pessoas que participaram do jantar.
Há doenças que não se restringem a uma determinada área geográfica. Podem ocupar
extensas regiões do planeta com relativa rapidez, estendendo-se por vários continentes.
Nesse caso, ocorre uma pandemia.
Vimos que uma epidemia é a ocorrência de casos de uma doença em excesso em relação
ao esperado. Portanto, para que se possa identificar uma epidemia, é necessário conhecer o
comportamento da doença na população e saber qual a ocorrência esperada.
Gráfico 7.2: Mortalidade por poliomielite. Município de São Paulo (1924-1995). / Fonte: Fund. SEADE.
Há diferentes métodos utilizados para saber se o número de casos notificados de uma deter-
minada doença que são notificados está dentro do esperado ou se representa um valor acima
do que normalmente se espera. Os valores esperados são o índice endêmico da doença e sua
representação gráfica é o diagrama de controle.
Existem diferentes métodos que utilizam técnicas estatísticas para a confecção do diagrama.
Vamos ver um dos métodos, que consiste na representação gráfica da distribuição da média
mensal e desvio-padrão das incidências (ou número de casos) observadas em um período de
tempo (em geral, de pelo menos 10 anos).
Para a construção desse diagrama, é calculada a média aritmética e os desvios-padrão
das incidências registradas em cada um dos meses do ano, observadas nos anos anteriores,
após excluir os dados referentes aos anos endêmicos. O limite de variação esperada para cada
mês compreenderá os valores que ficam no intervalo que corresponde à média ± 1,96
desvios-padrão. Esse intervalo corresponde ao nível endêmico da doença e é representado
graficamente. Os limites inferior e superior do intervalo definem o diagrama de controle.
As incidências que ocorrem dentro desse intervalo são consideradas dentro dos valores esperados.
Quando a incidência da doença ultrapassa o limite superior da variação esperada, diz-se que
está ocorrendo uma epidemia.
Vamos ver o exemplo que é apresentado no Guia de Vigilância Epidemiológica do
Ministério da Saúde, 2010. Na Tabela 7.1 é mostrada a incidência mensal da doença
meningocócica por 100 mil habitantes no Brasil, de 1983 a 2000.
Ano Jan Fev Mar Abr Mai Jun Jul Ago Set Out Nov Dez
1983 0,08 0,08 0,1 0,08 0,12 0,11 0,11 0,11 0,09 0,08 0,09 0,06
1984 0,08 0,07 0,07 0,08 0,11 0,09 0,11 0,1 0,08 0,1 0,09 0,07
1985 0,06 0,05 0,05 0,06 0,07 0,06 0,07 0,07 0,06 0,07 0,06 0,05
1986 0,11 0,08 0,1 0,07 0,1 0,11 0,17 0,15 0,12 0,13 0,12 0,1
1987 0,15 0,11 0,17 0,15 0,17 0,16 0,17 0,12 0,13 0,15 0,13 0,11
1988 0,12 0,11 0,14 0,18 0,17 0,22 0,3 0,29 0,17 0,15 0,17 0,17
1989 0,14 0,13 0,15 0,17 0,24 0,27 0,31 0,27 0,2 0,2 0,19 0,15
1990 0,24 0,16 0,2 0,18 0,25 0,26 0,3 0,28 0,32 0,28 0,24 0,22
1991 0,22 0,17 0,18 0,19 0,21 0,23 0,3 0,28 0,28 0,3 0,21 0,2
1992 0,2 0,19 0,25 0,22 0,23 0,25 0,29 0,29 0,28 0,29 0,2 0,21
1993 0,22 0,23 0,29 0,36 0,36 0,31 0,36 0,34 0,3 0,29 0,24 0,22
1994 0,29 0,21 0,27 0,28 0,31 0,41 0,49 0,44 0,4 0,32 0,31 0,27
1995 0,27 0,23 0,37 0,28 0,39 0,47 0,49 0,45 0,43 0,37 0,32 0,27
1996 0,28 0,28 0,33 0,31 0,36 0,43 0,53 0,5 0,38 0,38 0,3 0,26
1997 0,34 0,26 0,31 0,31 0,36 0,43 0,48 0,42 0,4 0,3 0,28 0,29
1998 0,28 0,22 0,29 0,25 0,35 0,43 0,45 0,33 0,31 0,31 0,27 0,23
1999 0,23 0,22 0,24 0,25 0,29 0,36 0,33 0,28 0,24 0,23 0,2 0,19
2000 0,24 0,16 0,2 0,18 0,25 0,26 0,3 0,28 0,32 0,28 0,24 0,22
Fonte: Brasil, 2010.
Com os dados da tabela, após excluir os dados referentes aos anos epidêmicos, são calculados
a média mensal e os limites superiores do diagrama de controle. Esses resultados estão mostra-
dos na Tabela 7.2 a seguir.
Tabela 7.2: Média mensal e limites máximo e mínimo esperados do diagrama de controle.
Gráfico 7.3: Diagrama de controle da doença meningocócica, no período 1983-1993. / Fonte: Brasil, 2010.
Por exemplo, vamos supor que a equipe de vigilância de uma cidade percebe, ao analisar os dados de
notificação de doenças, o surgimento de casos de hepatite A em crianças de idade escolar, em um
bairro periférico da cidade. A transmissão dessa doença pode ocorrer pela via fecal-oral ou por água
contaminada. Informando o restante do sistema de saúde local, este pode implantar algumas ações,
como avaliar e, se for preciso, melhorar a qualidade da água de beber e das condições de higiene nas
escolas, incluindo o preparo e distribuição da merenda escolar. Também pode incluir temas em sala
de aula ou palestras educativas, como a importância de lavar as mãos, para conscientizar os alunos
sobre comportamentos de risco que facilitam o contato com o vírus.
7.4 Conclusão
Nesta aula, você viu que para a detecção e controle de uma epidemia, adotando-se medidas
para impedir sua propagação, são necessárias informações rápidas da ocorrência de casos ou
infecções. Para isso, existe uma lista de doenças que são de notificação compulsória e o acom-
panhamento dessas doenças permite que o serviço de vigilância analise os dados de notificação,
por meio de tabelas, gráficos e mapeamento da localização dos eventos notificados. Assim, é
possível a detecção de surtos e epidemias.
A taxa de ataque é calculada para investigar surtos epidêmicos logo que surgem e o acompa-
nhamento de sua evolução. Uma epidemia é a ocorrência de casos de uma doença em excesso
em relação ao esperado. Portanto, para que se possa identificar uma epidemia é necessário
conhecer o nível endêmico da doença. Um dos métodos para identificar uma epidemia consiste
na representação gráfica da incidência da doença, comparando-a com os níveis endêmicos
esperados, representados no diagrama de controle.
A avaliação da efetividade das ações de controle é possível com a análise dos dados feita pela
vigilância. A vigilância pode criar indicadores de monitoramento. Na próxima aula, você vai
estudar o que são indicadores de saúde e para que são utilizados.
Referências
Almeida Filho, N.; Rouquayrol, M. Z. Introdução à Epidemiologia. 4. ed. Rio de Janeiro:
Guanabara Koogan, 2006.
Brasil, Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Saúde Brasil 2010: uma
análise da situação de saúde e de evidências selecionadas de impacto de ações de vigilância
em saúde. Brasília: Ministério da Saúde, 2007.
Brasil, Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Guia de Vigilância
Epidemiológica. Série A Normas e Manuais técnicos, Brasília, 7. ed., 2010.
Gordis, L. Epidemiologia. 4. ed. Rio de Janeiro: Revinter, 2010.
Jekel, J. F.; Katz, D. L.; Elmore, J. G. Epidemiologia, Bioestatística e Medicina Preventiva.
2. ed. Porto Alegre: Artmed, 2005.
Maletta, C. H. R. Bioestatística Saúde Pública. 3. ed. Belo Horizonte: Sografe, 2000.
Waldman, E. A.; Costa-Rosa, T. E. Vigilância em Saúde. São Paulo: USP, 1998.
Glossário
Agente infeccioso: agente biológico, capaz de produzir infecção ou doença infecciosa.
Controle de doenças: operações e programas desenvolvidos para reduzir a incidência e/ou prevalência a
níveis baixos.
Diagrama de controle de infecção: representação gráfica da distribuição da média mensal e desvio-padrão das
incidências (ou número de casos) observadas em um período de tempo (em geral, de pelo menos 10 anos).
Doença transmissível ou infecciosa: doença causada por um agente infeccioso ou pela toxina produzida por ele.
Endemia: presença contínua de uma enfermidade ou agente infeccioso em uma zona geográfica determinada.
Epidemia: ocorre quando o número de casos de uma determinada doença excede a incidência esperada.
Pandemia: epidemia de uma doença que afeta pessoas em muitos países e continentes.
Surto: epidemia localizada em uma determinada região ou local.
Taxa de ataque: é a incidência de doença em um grupo particular de pessoas, observadas por um período
limitado de tempo e em condições especiais, como em um surto.