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A ANGÚSTIA

Angústia e Sintoma
Susane Vasconcelos Zanotti

Considerando a importância em estudar os diversos aspectos referentes à angústia,


partimos do pressuposto freudiano de que existe uma relação entre a angústia e o
sintoma. Pretendemos mostrar, nesse texto, o caminho teórico percorrido por Freud até
chegar aos conceitos de angústia e sintoma que lhe permitiram afirmar em Angústia e
vida pulsional (1932) que a geração da angústia e a formação dos sintomas se
representam e se substituem uma à outra.
A primeira teoria freudiana da angústia, é explicitada a partir do Rascunho B (1894) e
mantida até o artigo Inibição, sintoma e angústia (1926). Nesse momento tardio de sua
elaboração teórica, Freud apresenta o que ficou conhecido como sua segunda teoria da
angústia. Entretanto, no que tange a neurose de angústia, o autor ainda se vale aí das
concepções próprias a sua primeira teoria, o que faz até o escrito Angústia e vida
pulsional (1932).
O termo 'neurose de angústia' surge em A etiologia das neuroses (1893) - Rascunho B,
quando Freud dá seus primeiros passos na teorização sobre o fenômeno da angústia.
Nesse texto, Freud coloca a questão de saber se a angústia não deve ser classificada
enquanto 'neurose de angústia' por ser mais freqüente na histeria do que na neurastenia.
No entanto, uma extensa descrição da neurose de angústia é realizada no texto em que
Freud busca a diferenciação desta com a neurastenia (Freud, 1895/1996). Nessa ocasião,
demonstra que tanto a etiologia quanto o mecanismo da neurose de angústia são
fundamentalmente diferentes da etiologia e do mecanismo da neurastenia.
A terminologia 'neurose de angústia' foi escolhida porque todos os seus componentes
podem ser agrupados em torno do sintoma principal da angústia, pois cada um deles
mantém com esta última uma relação definida (Freud, 1895/1996, v. 3, p. 94).
Em termos gerais, podemos identificar na teoria freudiana três momentos distintos onde
é questão da descrição do quadro clínico da angústia.
O primeiro, refere-se às formulações expostas em A etiologia das neuroses (1893) -
Rascunho B, a neurose de angústia é apresentada em três formas: 1) como um estado
crônico: os sintomas como angústia relacionada com o corpo (hipocondria); angústia em
relação ao funcionamento do corpo (agorafobia, claustrofobia, vertigem em lugares
altos); angústia relacionada com as decisões e a memória - isto é, as fantasias de alguém
a respeito de seu próprio funcionamento psíquico (folie de doute, ruminações obsessivas
etc.); 2) como um ataque de angústia: é descrito como dispnéia isolada, palpitações
isoladas, sensações de angústia isoladas; como um ataque de angústia com duração de
semana ou meses: quase sempre tem como causa precipitante uma conexão
aparentemente racional com um trauma psíquico. Freud ressalta que o estado crônico e
o ataque de angústia podem combinar-se facilmente; e que um ataque de angústia nunca
ocorre sem sintomas crônicos.
O segundo momento seria o da elaboração encontrada em Sobre os fundamentos para
destacar da neurastenia uma síndrome específica denominada neurose de angústia
(1895). Nesse texto, Freud apresenta o quadro clínico completo da neurose de angústia,
que abrange os seguintes sintomas:
1) irritabilidade geral: hiperestesia auditiva; 2) expectativa angustiada: tendência a
adotar uma visão pessimista das coisas, que se transforma em uma compulsão;
hipocondria. A expectativa angustiada é considerada como o sintoma nuclear da neurose
- um quantum de angústia em estado de livre flutuação, o qual, quando há uma
expectativa, controla a escolha das representações e está sempre pronto a se ligar a
qualquer conteúdo representativo adequado (Freud, 1895/1996, v.3, p. 96). 3) ataques
de angústia: como o próprio nome sinaliza, pode irromper subitamente na consciência
sem ter sido despertada por uma seqüência de representações; pode consistir apenas no
sentimento de angústia, sem nenhuma representação associada, ou ser acompanhado de
uma interpretação que estiver mais próxima; ou então algum tipo de parestesia -
combinar-se com o sentimento de angústia, ou, finalmente, o sentimento de angústia
pode estar ligado ao distúrbio de uma ou mais funções corporais - tais como a
respiração, a atividade cardíaca, a inervação vasomotora, ou a atividade glandular.
Dessa combinação o paciente seleciona ora um fator particular, ora outro. 4)
equivalentes de angústia; 5) acordar em pânico à noite; 6) vertigem; 7) 2 grupos de
fobias: a) relacionado com riscos fisiológicos - medo de cobras, tempestade, escuridão,
vermes, e assim por diante, assim como o típico escrúpulo moral excessivo e algumas
formas da mania de duvidar. b) agorafobia, caracterizadas por sua relação com a
locomoção.
É importante sublinhar que esses dois primeiros momentos de elaboração aqui
recortados inserem-se no que se convencionou chamar de primeira teoria freudiana da
angústia. Esta teorização explica o surgimento da angústia como ligada a fatores
econômicos. A causa da angústia é atribuída à acumulação de tensão sexual produzida
pela abstinência sexual ou pela excitação sexual não consumada e ao fracasso na
descarga da tensão por vias psíquicas e sucesso por vias físicas. Ou seja, após a
incidência do recalque, esse afeto, a libido, não descarregado é transformado em
angústia. A angústia surge como produto do recalque (Freud, 1895/1996).
O terceiro momento seria relativo à teorização apresentada no texto denominado A
angústia (1916). Freud inclui, nesse momento, um novo fator ao surgimento da angústia
- o perigo, classificando a angústia como neurótica ou realística, de acordo com a
origem do perigo (se é desconhecido ou conhecido). Apesar de ainda referir-se
teoricamente à angústia como libido transformada, podemos supor que ele já está dando
os primeiros passos para a modificação teórica que fica formulada expressamente em
Inibições, sintomas e angústia (1926). A respeito da angústia neurótica realística, no que
tange a angústia expectante, a angústia das fobias e aos equivalentes da angústia, o autor
explicita:
1) angústia expectante: descrita anteriormente enquanto expectativa angustiada, uma
espécie de angústia livremente flutuante, que está pronta para se ligar a alguma idéia
que seja de algum modo apropriada a esse fim; 2) angústia das 'fobias': ao contrário da
angústia expectante, é psiquicamente ligada e vinculada a determinados objetos e
situações. Freud descreve o que pode se tornar objeto ou conteúdo de uma fobia:
escuridão, ar livre, espaços abertos, gatos, aranhas, lagartas, cobras, ratos, trovoadas,
pontas agudas, sangue, espaços fechados, multidões, solidão, atravessar pontes, viagens
marítimas, viagens de trem, etc. etc. e propõe uma divisão desses objetos em 3 grupos:
a) objetos temidos "universalmente", mas que nas fobias a intensidade é exagerada,
como cobra por ex.; b) uma relação a uma situação de perigo ainda existe, embora
estejamos acostumados a minimizar o perigo e a não prevê-lo (ex. andar de avião).; c)
agorafobia e fobia a animais. Freud classifica essas fobias enquanto histeria de angústia;
ou seja, considerando-as um distúrbio estreitamente relacionado com a histeria de
conversão; 3) equivalentes da angústia: não há relação entre a angústia e um perigo
ameaçador. Essa pode aparecer acompanhando sintomas histéricos ou na forma de
acesso de angústia isolado.
O autor conclui, a partir desse estudo, que o aparecimento da neurose de angústia pode
se dar em diferentes intensidades e combinadas com outras neuroses. "...os sintomas de
angústia ocorrem ao mesmo tempo que - e em combinação com - os sintomas de
neurastenia, histeria, obsessões ou melancolia" (Freud, 1895/1996, v.3, p. 113).
Sobre as relações da neurose de angústia com a histeria, Freud observa que as duas
neuroses se combinam com muita freqüência. Ele chega a dizer, em Obsessões e fobias
(1894), que a neurose de angústia é o equivalente somático da histeria. Ao compará-las,
conclui que em ambas trata-se de um acúmulo de excitação, de uma insuficiência
psíquica em conseqüência da qual surgem processos somáticos anormais e um desvio da
excitação para o campo somático por ausência de uma elaboração psíquica. A diferença
entre elas, refere-se apenas à excitação em cujo deslocamento a neurose se expressa,
que na neurose de angústia é puramente somática (excitação sexual somática), enquanto
a histeria é psíquica (provocada por um conflito). (Freud, 1895/1996). Em suas
palavras: Na neurose de angústia, existe uma espécie de conversão, tal como ocorre na
histeria; contudo, na histeria, é a excitação psíquica que toma um caminho errado,
exclusivamente em direção à área somática, ao passo que aqui é uma tensão física, que
não consegue penetrar no âmbito psíquico e, portanto, permanece no trajeto físico. As
duas se combinam com extrema freqüência (Freud, 1894/1996, v. 1, p. 241).
Por outro lado, assinala que é também muito freqüente a combinação de uma fobia e de
uma obsessão. A fobia se desenvolve no início da doença como um sintoma de neurose
de angústia. A representação que constitui a fobia e que é associada ao estado de medo
pode ser substituída por outra representação, ou melhor, pelo procedimento protetor
(obsessão substitutiva) que parecia aliviar o medo (Freud, 1895/1996). A partir desse
momento, onde é instalada uma medida protetora, como atos obsessivos, se o sujeito for
privado de realizar tal medida, irrompe-se a mais terrível angústia. Com respeito a isso,
é interessante observar que os pacientes obsessivos parecem estar isentos da angústia.
No entanto, a angústia está encoberta pelo ato obsessivo que só é executado com o fito
de evitar a angústia (Freud, 1893/1996).
Ainda no texto A angústia (1916), Freud afirma que tanto na neurose obsessiva quanto
na histeria, o resultado do processo de recalque é ou a geração da angústia pura e
simples, ou a angústia acompanhada pela formação de um sintoma ou a formação mais
completa de um sintoma sem angústia. Define-se dessa forma a relação entre a angústia
e o sintoma.
Se, nesse momento de teorização a angústia surge como posterior ao recalque e
acompanhando o sintoma, com a construção da segunda teoria sobre a angústia, em
Inibições, sintomas e angústia (1926), Freud apresenta uma relação muito mais ampla
entre a geração da angústia e a formação dos sintomas.
A posição freudiana sobre a angústia baseada em fundamentos econômicos de que a
libido (excitação sexual) rejeitada ou não utilizada pelo eu encontrava descarga sobre a
forma de angústia, precisou ser revista a partir da descrição do psiquismo e de seu
funcionamento apresentada em O eu e o isso (1923). A partir da constatação do eu
enquanto reservatório da libido, a angústia não pode mais ser vista como resultado da
libido pertencente aos impulsos pulsionais recalcados (angústia do isso). Freud,
portanto, passa a considerar o eu como a única sede da angústia - apenas o eu pode
produzir e sentir angústia de acordo com suas necessidades. A angústia é um estado
afetivo e como tal, naturalmente, só pode ser sentida pelo eu (Freud, 1926/1996, v. 20,
p. 139).
Esse novo ponto de vista enfraqueceu a estreita ligação entre a angústia e a libido, já
que a energia que o eu emprega é dessexualizada. O que passa a ter importância agora é
a idéia de angústia emitida pelo eu, a fim de tornar afetiva a instância prazer-desprazer,
remetendo à geração da angústia a uma situação de perigo.
Foi a partir do estudo da fobia de animais, que Freud conclui que a angústia é uma
reação aflitiva por parte do eu ao perigo. A angústia é uma reação a uma situação de
perigo. Ela é remediada pelo eu que faz algo a fim de evitar essa situação ou para
afastar-se dela (Freud, 1926/1996, v. 20, p. 128).
Freud considera, que existe um perigo relacionado a cada estádio do desenvolvimento
do sujeito: da experiência do nascimento ao poder do supereu. No entanto, esses perigos
só podem ser significados a partir da experiência de castração. É a partir da experiência
do complexo de Édipo, que o perigo de castração torna-se um perigo real de que o eu
tenta defender-se.
Assim, a angústia passa a ser considerada uma reação a uma perda, uma separação. Mas
ao analisar o complexo de Édipo nas mulheres, Freud vai além da perda de objeto. Não
se trata mais da perda do objeto, mas de perder o amor do objeto: O que o eu considera
como sendo o perigo e ao qual reage com um sinal de angústia consiste em o supereu
dever estar com raiva dele ou puni-lo ou deixar de amá-lo (Freud, 1926/1996, v.20, p.
138).
A situação pulsional temida remonta basicamente a uma situação de perigo externa, a
saber o medo de castração. O eu, ao perceber que a satisfação de uma exigência
pulsional recriaria tal situação de perigo, antecipa a satisfação do impulso pulsional
suspeito e permite que se efetue a reprodução dos sentimentos desprazerosos no início
da situação de perigo temida. Ele dá o sinal de angústia. Com isso, o automatismo do
princípio de prazer-desprazer é posto em ação e agora executa o recalque do impulso
pulsional perigoso (Freud, 1926/1996). Ou seja, é sempre a atitude de angústia do eu
que é a coisa primária e que põe em movimento o recalque (Freud, 1926/1996, v. 20, p.
111).
Se voltarmos agora ao exame da relação entre angústia e sintoma, Freud nos ensina em
Inibição, sintoma e angústia (1926) que os sintomas são formados a fim de evitar uma
situação de perigo que foi assinalada pela geração da angústia. Como vimos, a situação
de perigo é o medo de castração e a angústia um sinal afetivo que assinala o surgimento
desse perigo. Resta sabermos o que é um sintoma.
Ao distinguir sintomas de inibições, Freud afirma que o sintoma denota a presença de
algum processo patológico, quando uma função passou por alguma modificação
inusitada ou quando uma nova manifestação surgiu desta (Freud, 1926/1996, v.20, p.
91).
Um sintoma surge de um impulso pulsional que foi prejudicialmente afetado pelo
recalque. Se o eu, fazendo uso de seu sinal de desprazer, atingiu seu objetivo de recalcar
inteiramente o impulso pulsional, não tem como sabermos como isso aconteceu. Só
podemos descobrir o que aconteceu nos casos em que o recalque falhou, em que não
conseguiu suprimir todo o impulso pulsional, que acabou por encontrar um substituto.
Tal substituto apresenta-se muito mais reduzido, descolado e inibido, e não é mais
reconhecível como uma satisfação do impulso pulsional, ao contrário, sua realização
apresenta a qualidade de uma compulsão (FREUD, 1926/1996).
Nesse momento, para o autor, um sintoma é um sinal e um substituto de uma satisfação
pulsional que permaneceu em estado jacente, é uma conseqüência do processo de
recalque. O recalque se processa a partir do eu quando este - pode ser por ordem do
supereu - se recusa a associar-se com uma catexia pulsional que foi provocada no id. O
eu é capaz, por meio de recalque, de conservar a idéia que é o veículo do impulso
repreensível a partir do tornar-se consciente (Freud, 1926/1996, v.20, p. 95).
Ainda em Inibição, sintoma e angústia (1926), Freud destina um dos capítulos para o
estudo da relação entre a angústia e o sintoma. os sintomas só se formam a fim de evitar
a angústia: reúnem a energia psíquica que de outra forma seria descarregada como
angústia. Assim, esse seria o fenômeno fundamental e o principal problema da neurose
(Freud, 1926/1996, v. XX, p. 142) Dois exemplos ilustram tal afirmação: o ataque de
angústia de um paciente agorafóbico, se for deixado sozinho na rua e o de um
obsessivo, se for impedido de realizar seu ritual. Ambos os sintomas consistem em
prevenir irrupções de angústia.
No entanto, Freud nos alerta para não estabelecermos uma relação imediata entre a
angústia e o sintoma: entre eles, é necessário inserir-se a situação de perigo. À medida
que remetemos a geração da angústia a uma situação de perigo, é mais correto dizer que
os sintomas são criados a fim de remover o eu de uma situação de perigo: a geração de
angústia põe a geração de sintomas em movimento e é, na realidade, um requisito prévio
dela, pois se o eu não despertasse a instância de prazer-desprazer gerando angústia, não
conseguiria a força para paralisar o processo que se está preparando no isso e que
ameaça com perigo (Freud, 1926/1996, v. XX, p. 143).
Se o sintoma não for formado, o perigo de fato se concretiza. A formação de sintomas,
portanto, neutraliza a situação de perigo. Ela tem dois aspectos: uma modificação no
isso em virtude da qual o eu é afastado de perigo; e a formação substitutiva criada em
lugar do processo pulsional que foi afetado (Freud, 1926/1996). Nas palavras do autor:
A conclusão a que chegamos, portanto, é esta. A angústia é uma reação a uma situação
de perigo. Ela é remediada pelo eu que faz algo a fim de evitar essa situação ou para
afastar-se dela. Pode-se dizer que se criam sintomas de modo a evitar a geração de
angústia. Mas isto não atinge uma profundidade suficiente. Seria mais verdadeiro dizer
que se criam sintomas a fim de evitar uma situação de perigo cuja presença foi
assinalada pela geração de angústia. Nos casos que examinamos, o perigo em causa foi
o de castração ou de algo remontável à castração (Freud, 1926/1996, v. XX, p. 128).
Voltamos, então, a nosso ponto de partida. Em Angústia e vida pulsional (1933), Freud
retoma a discussão da relação entre a geração da angústia e a formação dos sintomas,
afirmando que ambos se representam e se substituem. Mais uma vez Freud serve-se de
um exemplo de agorafobia e de um obsessivo para avançar em sua afirmação anterior de
que os sintomas consistem em prevenir irrupções de angústia.
No exemplo da agorafobia, um paciente inicia seu acesso de angústia na rua. Essa
angústia retorna toda vez que ele for à rua novamente. Por esse motivo ele desenvolve o
sintoma de agorafobia, que vai substituir os ataques de angústia. Enquanto não for à rua,
não será repetido esse ataque de angústia. Há assim uma restrição do funcionamento do
eu.
No caso do obsessivo, o objetivo é o mesmo - prevenir irrupções de angústia, mas o
mecanismo difere e é inverso ao do que acontece na agorafobia. No sintoma obsessivo
não há uma restrição do funcionamento do eu. O obsessivo executa rituais para se
proteger da angústia (Freud, 1933/1996, v. 22). Segundo Freud, a geração da angústia é
o que surgiu primeiro, e a formação dos sintomas, o que veio depois, como se os
sintomas fossem criados a fim de evitar a irrupção do estado de angústia. Isto é
confirmado também pelo fato de que as primeiras neuroses da infância são as fobias -
estados nos quais vemos tão claramente como uma geração inicial de angústia é
substituída pela formação subseqüente de um sintoma (Freud, 1933/1996, v. 22, p. 87-
8).
Todas essas questões nos remetem a um exame mais detalhado do processo de formação
de sintomas nas fobias e nas obsessões.
No caso Pequeno Hans, O inexplicável medo por cavalos era o sintoma e sua
incapacidade de sair à rua era uma inibição, uma restrição que o eu do menino impusera
a si mesmo a fim de não despertar o sintoma de angústia (Freud, 1926/1996, v.20, p.
104). O medo por cavalo é considerado um sintoma porque houve a substituição do pai
por um cavalo. A idéia de ser mordido por um cavalo surge substituindo, por distorção,
a idéia de ser castrado pelo pai: É esse deslocamento que tem portanto, o direito de ser
denominado de sintoma e que, incidentalmente, constitui o mecanismo alternativo que
permite um conflito devido à ambivalência ser solucionado sem o auxílio da formação
reativa (Freud, 1926/1996, v.20, p. 106). Nesses casos, o perigo parece ser ainda sentido
inteiramente como externo, justamente como sofreu um deslocamento externo no
sintoma.
O papel desempenhado pela angústia nesse processo acontece da seguinte forma: ao
reconhecer o perigo de castração, o eu dá o sinal de angústia, desencadeando o recalque.
Ao mesmo tempo forma-se a fobia. Agora a angústia de castração é dirigida para um
objeto diferente, externo.
Essa solução encontrada pela formação substitutiva apresenta duas vantagens: evita um
conflito devido à ambivalência (pois o pai é um objeto amado, também) e, permite ao eu
deixar de gerar angústia constante, visto que na escolha por um animal basta evitá-lo.
Assim, o sujeito fica livre do perigo e da angústia (Freud, 1926/1996). Afirma o autor:
Uma fobia geralmente se estabelece após um primeiro ataque de angústia ter sido
experimentado em circunstâncias específicas, tais como na rua, em um trem ou em
solidão. A partir desse ponto a angústia é mantida em interdição pela fobia, mas
ressurge sempre que a condição não pode ser realizada. O mecanismo da fobia presta
bons serviços como meio de defesa e tende a ser muito estável. (Freud, 1926/1996, v.20,
p. 127).
No que concerne às obsessões, Freud utiliza o que aprendeu sobre a angústia nas fobias.
Nesses casos, a força motriz do recalque e consequentemente da formação de sintomas é
o medo que o eu tem de seu supereu. A situação de perigo da qual o eu deve fugir é a
hostilidade do supereu. Esse medo, é uma extensão do castigo de castração. Se nas
fobias, essa angústia de castração se apresenta de forma clara, na neurose obsessiva essa
angústia está oculta. O eu foge dela obedientemente, executando as ordens, precauções
e penitências que lhe foram inculcadas. A angústia só aparece se o sujeito for foi
impedido de assim agir (Freud, 1926/1996).

FREUD, S. Edição Standard Brasileira das Obras Psicológicas Completas de Sigmund


Freud, Rio de Janeiro, Imago, 1996:
____ A angústia (1893), v. XVI, p. 393-412
____ Rascunho B: a etiologia das neuroses (1894), v. I., p. 223-228
____ Rascunho F. (1894), v. I, p. 241-244
____ Sobre os fundamentos para destacar da neurastenia uma síndrome específica
denominada 'neurose de angústia', (1895), v. III, p. 93-116
____ Resposta às críticas a meu artigo sobre a neurose de angústia, (1895), v. III, p.
123-142
____ Inibição, sintoma e angústia (1926), v. XX, p. 79-170
____ Angústia e vida pulsional (1933), v. XXII, p. 85-112
____ Obsessões e fobias: seu mecanismo psíquico e sua etiologia (1895), v. III., p. 79-
86

ARTIGO ORIGINAL

COSTA, Rodrigo César [1]

COSTA, Rodrigo César. A angústia nas suas primeiras considerações psicanalíticas:


uma análise da metapsicologia freudiana. Revista Científica Multidisciplinar Núcleo do
Conhecimento. Ano 04, Ed. 05, Vol. 09, pp. 47-55 Maio de 2019. ISSN: 2448-0959

RESUMO
O objetivo deste presente trabalho é fazer uma retomada nas primeiras considerações
sobre o conceito de angústia na obra de Freud, mais precisamente o entendimento sobre
a neurose de angústia. Pontuando as questões econômicas da angústia, tanto a ligação da
angústia com o recalque e a neurose de angústia, averígua-se que em ambas ocorre uma
transformação da libido, e também, nos sonhos, a angústia surgiria ligada as questões
sexuais. Mas o que podemos ressaltar é que, se na neurose de angústia a origem da
angústia se dá pela abstinência sexual ou pela prática do coito interrompido, e esta
concepção de angústia seria ampliada pela condição do recalcamento. Podemos
considerar que encontramos nesse modelo de angústia conjunto com o recalcamento, ou
melhor, essa angústia em segundo grau, a ideia de não-emprego de excitação sexual e,
por isso, a sua transformação em angústia, como ocorre na neurose de angústia. Mas,
para ampliar essa compreensão, necessita-se explicar o mecanismo da angústia que
Freud postulou nas psiconeuroses, onde acontece uma transformação de uma quantidade
de libido em angústia, mas agora mediada pelo recalcamento. Não podemos, dessa
forma, dizer que este entendimento da angústia e recalque é visto como um novo
modelo, distinto daquele da neurose de angústia. O modelo de angústia é o mesmo, o da
não-descarga, mas na psiconeurose e no sonho, o recalcamento é o seu grande
responsável, tanto quanto a abstinência na neurose de angústia.

Palavras-Chave: neurose de angústia, abstinência sexual, psiconeuroses.

INTRODUÇÃO

O objetivo deste presente trabalho é fazer uma retomada nas primeiras considerações
sobre o conceito de angústia na obra de Freud, mais precisamente o entendimento sobre
a neurose de angústia. Será feito uma retomada breve na compreensão desta neurose,
mas o foco principal é o esclarecimento da questão econômica da angústia. E para
finalizar, será comparada a angústia presente na neurose de angústia com a consideração
da angústia presente na obra Interpretação dos sonhos. Para uma melhor compreensão
da angústia, far-se-á uma retomada á alguns textos de Freud que fale sobre este
conceito, usando como alicerce o livro Angústia e sociedade na obra de Sigmund Freud
de Mello Neto (2003).
Freud, em suas primeiras publicações sobre as neuroses, distingue as chamadas
neuroses atuais, dentre as quais se encontra a neurose de angústia, das psiconeuroses.
Diferente das psiconeuroses, a neurose de angústia pode ser comumente entendida, nas
palavras de Freud (1895), como uma grande acumulação de tensão sexual, e a
elaboração psíquica dessa excitação sexual esta ausente ou é insuficiente. Desta forma,
compreende-se que na neurose de angústia ocorre um défict de libido psíquica e
excessiva libido somática. Sendo assim, o indivíduo que sofre desta neurose não
consegue ter uma descarga adequada desta energia somática, pelo contrário, acumula-se
essa tensão porque não consegue elaborar tal excitação psiquicamente.

Segundo Mello Neto (2003) foi na década de 1890 que Freud começa a introduzir na
sua obra o conceito de angústia, e o que provocaria á angústia nos indivíduos seriam os
fatores sexuais. Para uma melhor compreensão de a sexualidade estar envolvida com a
angústia, Freud pontua na sua carta a Fliees, no rascunho “E”, datado de 1894, que o
campo sexual esta na etiologia das neuroses e na angústia dos neuróticos. Ele nos dá o
exemplo de que a prática do coitus interruptus está intrinsecamente ligada aos sintomas
da neurose de angústia. Praticamente em todos os casos em que a angústia esta presente
aparece uma conexão com a sexualidade, e mais precisamente, com a abstinência
sexual. Outros exemplos que envolvem a ligação da sexualidade com a neurose de
angústia é a angústia que aparece nas mulheres anestésicas, nas pessoas abstinentes e
nas virgens. Também é comumente aparecer sintomas em mulheres cujo marido sofre
de ejaculação precoce, em homens que não aproveitam sua excitação sexual para o coito
e dos neurastênicos que abdicaram sua compulsão a masturbação.

Segundo Freud (1894), no “rascunho G”, através das suas observações de pacientes que
apresentam o quadro melancólico, o autor chegou à conclusão que estes sujeitos
freqüentemente não possuem desejo sexual, não querem ter relações desse gênero, são
praticamente anestésicos, e por isso não sentem necessidade de uma satisfação sexual,
mas necessita de amor, este de ordem psíquica (Freud, 1894). Desta forma, a melancolia
parece ser o inverso da neurose de angústia, pois enquanto na primeira tem-se uma
acumulação psíquica, de necessidade de amor, a segunda trata de uma acumulação
somática, e de uma fraca ou inexistente elaboração psíquica. Assim sendo, Freud
observa que, enquanto as pessoas impotentes têm tendência a adquirir a melancolia, as
potentes contraem neurose de angústia. Neste mesmo rascunho Freud ainda nos diz que
os sintomas de angústia também aparecem ao mesmo tempo em que advêm os sintomas
de neurastenia, histeria, obsessões e melancolia, originando as neuroses mistas.

Já no rascunho “B”, Freud (1894) nos fala brevemente sobre a neurose de angústia e que
esta pode aparecer sob duas formas: a primeira como um ataque de angústia, sendo que
está pode aparecer conjuntamente com a histeria, e que isto justifica o fato de aparecer
mais freqüentemente em mulheres. A segunda forma, que no caso é o estado crônico de
angústia, aparece comumente nos neurastênicos. Freud destaca vários sintomas,
característicos destes estados crônicos, dentre eles: A angústia em relação ao corpo,
relacionada com o funcionamento deste e a angústia pautada na memória. O autor
considera esses três sintomas próximos, e se indaga sobre a hereditariedade desses
casos, considerando o fator sexual, e afirma que esses sintomas são adquiridos por
cônjuges que praticam o coitus interruptus. Ainda neste rascunho, pontuando as
questões econômicas da neurose de angústia, Freud nos diz que a neurose de angústia e
a neurastenia têm em comum uma característica bem peculiar, pois nas duas neuroses a
fonte da excitação e a causa do distúrbio residem no campo somático e não no psíquico.
Entretanto, existe uma diferença entre os sintomas da neurose de angústia e da
neurastenia; enquanto no primeiro o que encontramos é um acúmulo de excitação, no
último predomina o empobrecimento de excitação.

Freud (1894), nas conclusões do rascunho “B”, propõe aos jovens de boa índole
relações sexuais para a prevenção de afecções, ou senão:

Na ausência de tal solução, a sociedade parece condenada a cair vítima de neuroses


incuráveis, que reduzem a um mínimo o gozo da vida, destroem a relação conjugal e
trazem a ruína hereditária a toda a geração seguinte. As camadas inferiores da sociedade
nada sabem do malthusianismo, mas estão em plena procura e, do jeito que as coisas
vão, atingirão o mesmo ponto e serão vitimadas pela mesma fatalidade. (Freud, 1894, p.
109).

Retomando o rascunho “E”, Freud (1894), nesse rascunho, constata que as mulheres
frígidas estão sujeitas à angústia após o coitus interruptus, isso leva o autor a dizer que
na neurose de angústia se trata de uma questão de acumulação física de excitação. Esta
acumulação acontece porque não ocorreu a descarga desta tensão. Desta forma, a
neurose de angústia se parece com a histeria, pois ambas as neuroses são de
represamento. Freud indaga-se do porque da ocorrência da transformação em angústia
quando há uma acumulação da tensão, e examina o mecanismo normal para lidar com a
tensão acumulada, dando atenção á excitação endógena.

Para Freud (apud Mello Neto, 2003) os acontecimentos são mais simples no caso da
excitação exógena. A fonte da excitação é externa ao indivíduo e transmite para dentro
de seu psiquismo um aumento de excitação, que passa a ser dirigido de acordo com sua
quantidade. Para alcançar a satisfação, deverá ocorrer uma diminuição da quantidade de
excitação psíquica, equilibrando com a excitação externa. Diferente das excitações
exógenas, as endógenas se originam dentro do corpo do sujeito, como exemplos têm a
fome, a sede e a pulsão sexual. Assim, para satisfazer essas excitações, precisa-se de
ações específicas, que são reações que impedem, por um período, o surgimento de
novas excitações nos órgãos internos, sejam essas reações possíveis com maior ou
menor gasto de energia.

Desta forma, Freud (apud Mello Neto, 2003) cria a suposição que a tensão interna, ou
melhor, endógena, pode aumentar sem interrupções, e diminuir conforme ocorra uma
ação específica que impeça seu aumento. Entretanto, só é percebido esse aumento de
excitação endógena quando esta alcança um determinado limiar e esta excitação passa a
ter uma representação psíquica quando fica acima desse limite, fazendo que o psiquismo
procure soluções para acabar com esse aumento de tensão. Como exemplo, podemos
supor o que Freud disse sobre a sexualidade, pois quando a tensão sexual física fica
acima de certo nível, chega ao psiquismo, e este passa a procurar uma ação para
diminuir essa tensão, que no caso é o coito.

O pai da psicanálise, nesta mesma obra supracitada, ainda nos diz que, quando não
ocorre uma ação específica, a tensão aumenta demasiadamente e passa a ser uma
perturbação para o indivíduo, mas ainda não há embasamento para sua transformação.
Mas no caso da neurose de angústia, essa transformação ocorre, pois a tensão física
aumenta, ultrapassando ou atingindo o nível do limiar em que despertar o afeto
psíquico, mas a conexão psíquica com a física não ocorre ou permanece precária.
Assim, um afeto sexual não pôde ser desenvolvido, isto porque faltou algo para ligar-se
aos fatores psíquicos. Desta forma, a tensão física não sendo psiquicamente ligada,
passa a ser transformada em angústia.

Para Freud (apud Mello Neto, 2003), na neurose de angústia ocorre uma
impossibilidade de ligação entre o físico e o psíquico e, conseqüente, uma
transformação, e o motivo esta situado no plano psíquico. Como exemplo, nas mulheres
virgens, observa-se que elas não possuem ou são escassas suas noções sobre a
sexualidade, e mais ainda, essa limitação psíquica pode ser resultante da rígida educação
dos pais. Pode-se também tratar da recusa psíquica da sexualidade dos indivíduos que
escolheram ser abstinentes e das limitações de processos psíquicos nas mulheres cujo
marido pratica o coito interrompido. Desta forma, pode-se deduzir que em todos os
casos ocorre um desvio da excitação física sexual, e o motivo é psíquico. O principal
sintoma da neurose de angústia é o ataque de angústia, e abrange várias características,
como a dispnéia, as palpitações e a própria sensação de angústia, e todas essas
características lembram o coito, como se fosse uma reprodução.

Freud (1895), em Sobre os fundamentos para destacar da neurastenia uma síndrome


específica denominada neurose de angústia, ressalta que a neurose de angústia é distinta
da neurastenia, pois apresenta etiologia e mecanismos próprios. Em relação à neurose de
angústia, pode-se dizer que nesta neurose praticamente todos os caracteres são
congregados em torno de um sintoma fundamental, que é a angústia.

A partir disto, a neurose de angústia passa a ser uma entidade clínica, aparecendo na
forma simples, isolada, ou em forma completamente combinada com outras neuroses,
como por exemplo, combinada com a histeria, obsessões, fobias, denominadas por
Freud de neuroses mistas. O quadro clínico da neurose de angústia, para Freud (1895),
abrange vários sintomas, dentre eles: irritabilidade geral, expectativa angustiada (o
indivíduo acredita que algo muito ruim vai acontecer sem que exista um motivo, um
fundamento peculiar para isso), ataques de angústia acompanhados de pensamentos de
morte, medo de enlouquecer, distúrbios da atividade cardíaca (arritmia, palpitações,
taquicardia), pavor noturno, fobias, distúrbio das atividades digestivas como vômito,
náusea e fome voraz, dentre outros sintomas.
Na etiologia desta neurose, descrita por Freud (1895), aparecem alguns componentes
fundamentais que contribuem para o surgimento da neurose de angústia, dentre os
quais: A pré-disposição, que é similar a hereditariedade; a intensidade da excitação
sexual somática sem a simbolização; e também as causas auxiliares, que não tem um
papel fundamental na gênese da neurose, mas unem-se as demais características
mencionadas, compondo assim o que é chamado por Freud de “equação etiológica”.
Estas causas são perturbações banais, como por exemplo, a exaustão física. Na neurose
de angústia o que é preponderante é a angústia, seja ela em estados mais graves,
crônicos ou leves.

Em sua obra Respostas às criticas ao meu artigo sobre a neurose de angústia, Freud
definiu a neurose de angústia como:

A neurose da angústia é criada por tudo aquilo que mantém a tensão sexual somática
afastada da esfera psíquica, por tudo o que interfere em sua elaboração psíquica. Ao
retrocedermos às circunstâncias concretas em que esse fator se torna atuante, somos
levados a afirmar que a abstinência |sexual|, quer voluntária quer involuntária, a relação
sexual com satisfação incompleta, o coito interrompido, o desvio do interesse psíquico
da esfera da sexualidade e coisas similares são os fatores etiológicos específicos dos
estados que denominei de “neurose de angústia”. (Freud, 1895, p.70).

Para finalizar este breve apanhado sobre a neurose de angústia, retomaremos ao que
Mello Neto (2003) disse sobre a angústia da neurose de angústia. Observando este
sintoma do ataque de angústia, é interessante notar que a excitação sexual não ligada ao
plano psíquico, sem domínio, é retomada por um nível que é estranho ao indivíduo,
como se este não tivesse controle e posse disto, que seria no caso o perigo relacionado
ao que esta fora do sujeito, ao mundo externo, comportando-se como se projetasse a
excitação de dentro para fora.

Já no período de 1900, Freud começa a definir de forma um pouco distinta a angústia;


esta ganha uma ampliação em seu entendimento. Em Interpretação dos sonhos, Freud
(Apud Mello Neto, 2003) nos fala que, no capitulo IV, seja na fobia ou nos sonhos, a
angústia esta vinculada a uma representação, mas as causas desta angústia provem de
fontes sexuais, pelo qual a libido não obteve sua satisfação; ela foi desviada de sua
finalidade, assim como observamos na angústia da neurose de angústia. Já no capitulo
V, Freud relaciona a angústia com o recalcamento. Neste capitulo, encontramos um
breve entendimento do recalcamento. Observamos que existem desejos inconcebíveis de
ser realizado na realidade, que foram inibidos por uma força que não deixa esse impulso
se manifestar. Esses desejos encontram-se no primeiro plano, no inconsciente, e
contrasta-se com o segundo sistema, que seria o pré-consciente. Se no caso esse desejo
escapa da inibição que sofreu do pré-consciente, e chegar ao consciente de forma pura,
ele aparece como um desprazer imenso, como angústia.

No capitulo VII, Freud exemplifica melhor o funcionamento do mecanismo do recalque.


Para este autor, nos sintomas dos neuróticos, a inibição ocorre para evitar o impulso
desagradável, mas acontece uma solução de compromisso entre o pré-consciente e o
inconsciente para esse impulso encontrar uma forma de descarregar-se. Essa solução
não deixa de ser um cumprimento do desejo. O desejo pertence ao inconsciente
enquanto é reprimido pelo pré-consciente, é daí que deriva o compromisso; pois
enquanto, por um lado, essa energia reprimida encontra saída através do sintoma, por
outro, é uma forma do pré-consciente, que é responsável pela inibição, de controlar essa
energia indomável. Assim, Freud define que o sintoma surge como uma forma de evitar
a manifestação da angústia, pois se aquele impulso se manifestasse de forma pura, como
exemplo num indivíduo que sofre de uma fobia, em que o ele não forma o sintoma e
tem que desempenhar o ato que repudia, tende a aparecer à angústia.

Se pensarmos a respeito, o recalcamento aparece para sufocar este conteúdo


inconsciente, retirar o afeto e a representação a ele ligada, para justamente prevenir o
desprazer, a angústia.

O que podemos observar, comparando aquilo que Freud falou sobre a neurose de
angústia e essa relação da angústia com o recalcamento, é em que ambas ocorre uma
não ligação da excitação somática com o psíquico, ou seja, enquanto na neurose de
angústia observa-se o excesso somático devido à abstinência sexual e a pratica do coitus
interruptus, no recalcamento acontece uma repressão do pré-consciente dos impulsos
inconscientes, e que, para este conteúdo manifestar-se, ele perde todo seu afeto e sua
representação devido ao recalque. Entretanto, a transformação desta energia, deste
impulso, em angústia, nesta nova consideração da angústia de Freud posterior ao
entendimento da neurose de angústia, é intercedida pelo recalcamento, e as questões
ligadas ao coitus interruptus e a abstinência sexual são entendidas de outra forma:
Enquanto na angústia da neurose de angústia ocorria uma busca voluntária de o
indivíduo abster-se da pratica sexual, no recalcamento acontece um represamento, uma
inibição, que seria uma “abstinência”, mas inconsciente.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Apresentando esses dois modelos de angústia; uma peculiarmente explicada pela


neurose de angústia, enquanto em outro momento vemos a conciliação da angústia com
o recalque, podemos tecer considerações tentando aproximar esses duas vertentes,
observando se existem divergências e em que pontos elas convergem.

Pontuando as questões econômicas da angústia, tanto a ligação da angústia com o


recalque e a neurose de angústia, averigua-se que em ambas ocorre uma transformação
da libido, e também, nos sonhos, a angústia surgiria ligada as questões sexuais. Mas o
que podemos ressaltar é que, se na neurose de angústia a origem da angústia se dá pela
abstinência sexual ou pela prática do coito interrompido, e esta concepção de angústia
seria ampliada pela condição do recalcamento: A angústia agora é empregada como
defesa frente ao desejo. A angústia fica em segundo plano, e assim, torna-se razão para
o recalcamento. A angústia e recalque mesclam-se, e aquela aparece como sinal para,
assim, ocorrer o recalque. É desse modelo que Freud constrói o embasamento etiológico
para as psiconeuroses. Assim, compreendemos o movimento das psiconeuroses quanto à
solução de compromisso do sintoma; á angústia é o principal indicador do desejo, da
realização fantasiosa deste, mas também o precursor do recalcamento.

Para concluirmos, podemos considerar que encontramos nesse modelo de angústia


conjunto com o recalcamento, ou melhor, essa angústia em segundo grau, a idéia de
não-emprego de excitação sexual e, por isso, a sua transformação em angústia, como
ocorre na neurose de angústia. Mas, para ampliar essa compreensão, necessita-se
explicar o mecanismo da angústia que Freud postulou nas psiconeuroses, onde acontece
uma transformação de uma quantidade de libido em angústia, mas agora mediada pelo
recalcamento. Não podemos, dessa forma, dizer que este entendimento da angústia e
recalque é visto como um novo modelo, distinto daquele da neurose de angústia.
O modelo de angústia é o mesmo, o da não-descarga, mas na psiconeurose e no sonho, o
recalcamento é o seu grande responsável, tanto quanto a abstinência na neurose de
angústia.

REFERENCIAS

Freud, S. Primeiras Publicações Psicanalíticas. Cartas dirigidas a Fliess, Rascunho “B”.


(1894). Edição Standard Brasileira das Obras Psicológicas Completas de Sigmund
Freud. V.I. Rio de Janeiro: Imago, 1996.

______. Primeiras Publicações Psicanalíticas. Cartas dirigidas a Fliess, Rascunha “E”.


(1894). Edição Standard Brasileira das Obras Psicológicas Completas de Sigmund
Freud. V.I. Rio de Janeiro: Imago, 1996.

______. Primeiras Publicações Psicanalíticas. Cartas Dirigidas a Fliess, Rascunho “G”.


(1894). Edição Standard Brasileira das Obras Psicológicas Completas de Sigmund
Freud. V.I. Rio de Janeiro: Imago, 1996.

______. Primeiras Publicações Psicanalíticas. Sobre os fundamentos para destacar da


neurastenia uma síndrome específica denominada neurose de angústia. (1895). Edição
Standard Brasileira das Obras Psicológicas Completas de Sigmund Freud. V.III. Rio de
Janeiro: Imago, 1996.

______. Primeiras Publicações Psicanalíticas. Respostas às criticas ao meu artigo sobre


a neurose de angústia. (1895). Edição Standard Brasileira das Obras Psicológicas
Completas de Sigmund Freud. V.III. Rio de Janeiro: Imago, 1996.

Mello Neto, G.A.R. (2003). Angústia e sociedade na obra de S. Freud. Campinas, São
Paulo: Ed Unicamp, no prelo.

[1] Graduado em psicologia pela U.E.M, especialização em psicanálise: teoria e clínica


pela N.E.C.P.A.R, Mestre em psicologia Pela UNESP, Doutorando em psicologia pela
UNESP.

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