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Uma Reflexão Sobre a Psicologia Social Comunitária

“A psicologia social foi a união de teorias da psicologia, sociologia e a


antropologia... visando um trabalho junto às instituiçoes sociais em benefício do homem
que vive em sociedade... mas, sua base de estudos estava voltada para as instituições,
principalmente as instituições totais ou totalitárias...
Daí surge uma nova corrente de pensamento que não concordava com um trabalho
direcionado às instituições e parte para uma busca de respostas sobre a formação de
comunidades... sobre o estudo do homem em sociedade e do contexto da incersão desse
homem no associativismo e na construção de uma sociedade mais humana e mais justa
para todos e todas...
Nesses termos, a psicologia comunitária cria seu viés de trabalho especificamente
com o homem inserido na comunidade e sua atuação na organização dessa comunidade
para o controle social... Como exemplo de um trabalho possível da psicologia
comunitária podemos dizer que o psicólogo(a) pode colaborar na organização de
conferências de direitos, na criação e ampliação de associações comunitárias, em
projeto sociais, em projetos de capitação de verbas para associações e fundações de
direito privado...etc...”

Considerações Iniciais
Segundo Góis (1993) a psicologia comunitária se define como uma área da
psicologia social que estuda a atividade do psiquismo decorrente do modo de vida do
lugar/comunidade; estuda o sistema de relações e representações, identidade, níveis de
consciência, identificação e pertinência dos indivíduos ao lugar/comunidade e aos
grupos comunitários.
Esse termo se define a partir de uma ampla conceituação, visto que é um conceito
novo e depende do arcabouço teórico e da práxis do psicólogo que o define. Pode ser
nomeada como psicologia comunitária, psicologia na comunidade, psicologia do
desenvolvimento comunitário, dentre outros.
A origem dessa área de conhecimento da psicologia remonta a uma psiquiatria
social e preventiva, bem como a dinâmicas e psicoterapias grupais. O desenvolvimento
de movimentos que se manifestaram contra a falta de atenção social, no que diz respeito
à participação coletiva no processo de tomada de decisões se tornou expressivo para o
surgimento da psicologia comunitária.
A psicologia comunitária tem a finalidade de desenvolver uma consciência crítica
nos sujeitos, através de um modelo interdisciplinar. É um trabalho realizado em grupos,
e na comunidade, a fim de transformar o indivíduo em sujeito. No que concerne à
psicologia comunitária, pode-se referenciar como uma área de atuação com a finalidade
de aplicar as teorias e métodos da psicologia social no contexto de uma comunidade.
Percorrendo um Caminho
Sabe-se que desde a década de 60 no Brasil foram desenvolvidos alguns
trabalhados em comunidades de baixa renda, com o intuito de despertar consciência
crítica no sujeito e possibilitar melhores condições de vida na população. Sendo que se
caracterizou um modelo de atuação pautado no espaço teórico e prático da psicologia
social. Desse modo, foram realizados trabalhos com a educação popular, como a
alfabetização de adultos, como um instrumento para a conscientização, método que aos
poucos foi sendo denominado de psicologia comunitária ou psicologia na comunidade.
Uma revisão da psicologia comunitária no Brasil não pode ser feita fora do
contexto econômico e político do Brasil e da América Latina. Sem dúvida, o golpe
militar de 1964 tem muito a ver como seu surgimento, pois se num primeiro momento,
vivemos um período de extrema repressão e violência, quando uma reunião de cinco
pessoas já era considerada subversão, ele fez com que, individualmente, os profissionais
de psicologia se questionassem sobre a atuação junto à maioria da população, e de qual
maneira seria o seu papel na sua conscientização e organização. (CAMPOS, 2009).
Nessa mesma época surgia nos Estados Unidos e em outros países da América
Latina a expressão “psicologia comunitária” que se referia à atuação do profissional de
psicologia juntamente as comunidades carentes. A propósito, se constituía um trabalho
de cunho assistencial e manipulativo.
Bonfim (1994) faz uma retrospectiva da história da psicologia social no Brasil, nas
décadas de oitenta e noventa. Nos anos oitenta, surgiram os primeiros cursos de pós-
graduação na área da Psicologia Social e foi criada a ABRAPSO–Associação Brasileira
de Psicologia Social. Novas práticas emergiram como, por exemplo, os trabalhos em
favelas, com meninos de rua, com os sem-terra e com pessoas da terceira idade, além de
práticas em comunidades, organizações e instituições. A partir dos anos noventa, em
uma sociedade ainda mais pobre, foi constatado um aumento significativo da população.
Ao mesmo tempo, ocorria o fortalecimento da democracia e a criação de instituições em
defesa dos direitos humanos; por exemplo, as que foram criadas com base no Estatuto
da Criança e do Adolescente, que entrou em vigor em 1990. Decorrentes desse contexto
surgiram demandas de novas formas de trabalho do psicólogo, voltadas para práticas
psicossociais. Por conta dessas demandas, o quadro conceitual precisou também ser
revisto e ampliado.
No início dos anos 90, a nível nacional, presencia-se a expansão dos trabalhos dos
psicólogos junto aos diversos segmentos da população. Entretanto, cabe salientar que
essa expansão acontece dentro de um quadro variado de práticas, envolvendo diferentes
pressupostos filosóficos e referenciais teóricos. (CAMPOS, 2009).
Nesse caso, começam a se desenvolver práticas nos diferentes setores públicos da
sociedade, bem como em postos de saúde, secretaria do bem-estar social, ou em algum
órgão ligado à família e aos menores. Essa atuação tem o objetivo de expandir e
democratizar os serviços psicológicos em diversas áreas para a população em geral, esse
trabalho tem continuidade e perpassa os dias atuais.
Entendendo o Conceito de Comunidade
Sanchez e Wiesenfeld apud Gomes (1999) estabelece alguns critérios significativos
para uma melhor definição de comunidade que estejam relacionados com a Psicologia
Social, por contemplarem os principais aspectos da interação humana: “Podemos dizer
que uma comunidade se caracteriza por:a) ser um grupo de pessoas, não um agregado
social, com determinado grau de interação social;b) repartir interesses, sentimentos,
crenças, atitudes; c) residir em um território específico; e d) possuir um determinado
grau de organização”.
Comunidade é conceito ausente na história das ideias psicológicas. Aparece como
referencial analítico apenas nos anos 70, quando um ramo da psicologia social se
autoqualificou de comunitária. Assim fazendo, definiu intencionalidades e destinatários
para apresentar-se como ciência comprometida com a realidade estudada, especialmente
com os excluídos da cidadania. (SAWAIA,1994).
Assim, o conceito de comunidade não é mérito exclusivo da psicologia social. Esse
conceito introduziu a incorporação de um corpo técnico e epistemológico da psicologia
social, pois, representou a criação de um campo teórico que visa transformar o homem
no contexto em que vive, levando em consideração a sua subjetividade.
De acordo com Pierson (1974) as comunidades surgem do simples fato de
vivermos em simbiose, isto é, de viverem juntos num mesmo habitat indivíduos tanto
semelhantes quanto diferentes e da ‘competição cooperativa’ em que se empenham. As
comunidades são estudadas como partes organizadas funcionalmente mutável,
enfatizando a divisão de trabalho, a especialização de atividades e a concentração dos
indivíduos em instituições.
As relações comunitárias que constituem uma verdadeira comunidade são relações
igualitárias, que se dão entre pessoas que possuem iguais direitos e deveres. Essas
relações implicam que todos possam ter vez e voz, que todos sejam reconhecidos em
sua singularidade, onde as diferenças sejam respeitadas. E mais: as relações
comunitárias implicam, também, a existência de uma dimensão afetiva, implicam que as
pessoas sejam amadas, estimadas e benquistas. (CAMPOS 2009).

O Trabalho do Psicólogo Comunitário


De acordo Vasconcelos (1994), o trabalho do Psicólogo comunitário é
interdisciplinar, realizado por equipes multiprofissionais, com formação generalista. No
campo da saúde, esse profissional atua como assessor e treinador de agentes de Saúde
Mental. Para o psicólogo comunitário, o saber científico é relativizado diante do saber
popular, sendo este uma importante via para o acesso à Saúde Mental da população.
A propósito, o trabalho do psicólogo comunitário deve consistir em uma atuação
que objetiva despertar consciência critica em um sujeito, ou em uma comunidade. O
serviço de psicologia na comunidade é feito a partir de visitas domiciliares, entrevistas,
mapeamento da realidade comunitária do local. Essa prática rompe com o modelo
tradicional clínico e pretende estar mais próxima da situação em que o indivíduo está
inserido, configurando-se um modo de fazer psicologia não-elitista.
A psicologia social ao qualificar-se de comunitária, hoje, explicita o objetivo de
colaborar com a criação desses espaços relacionais, que vinculam os indivíduos a
territórios físicos ou simbólicos e a temporalidades partilhadas num mundo assolado
pela ética do “levar vantagem em tudo” e do “é dando que se recebe”. Esses espaços
comunitários se alimentam de fontes que lançam a outras comunidades e buscam na
interlocução da fronteira o sentido mais profundo da dignidade humana. Enfim ela
delimita seu campo de competência na luta contra a exclusão de qualquer espécie.
(SAWAIA,1994).
A psicologia social comunitária utiliza-se do enquadre teórico da psicologia social,
privilegiando o trabalho com os grupos, colaborando para a formação da consciência
crítica e para a construção de uma identidade social e individual orientadas por preceitos
eticamente humanos. (FREITAS, 1987).
Sintetizando, o psicólogo na comunidade trabalha fundamentalmente com a
linguagem e representações, com relações grupais – vínculo essencial entre o indivíduo
e a sociedade – e com as emoções e afetos próprios da subjetividade, para exercer sua
ação a nível de consciência, da atividade e da intensidade dos indivíduos que irão,
algum dia, viver em verdadeira comunidade. (LANE, 1991).

Considerações Finais
Conclui-se através dessa literatura que a psicologia social comunitária teve sua
construção a partir de um desejo de proporcionar autonomia para uma sociedade, e foi
realizada a partir de movimentos políticos e sociais que foram desenvolvidos ao longo
de quatro décadas. Desse modo, fica claro a expressão “conscientização” como mola
propulsora do movimento na comunidade, visto que essa motivação é diretamente
relacionada com a formação da individualidade crítica, da consciência de si e de uma
nova realidade social que é esperada que o sujeito alcance em seu grupo social.

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