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Cerrados: Uma Caracterização

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Braulio Ferreira de Souza Dias


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CERRADOS: UMA CARACTERIZAÇÃO
Braulio F. de Souza Dias

DIAS, B.F.S., 1992b. Cerrados: uma caracterização, p. 11-25 In: DIAS, B. F. S. (Coord.).
Alternativas de desenvolvimento dos cerrados: manejo e conservação dos recursos naturais
renováveis. Brasília: IBAMA & FUNATURA [2a edição em 1996]

A região (domínio ou província) dos cerrados abrange aproximadamente um quarto do


território brasileiro, ou seja cerca de 200 milhões de hectares (Adámoli et al.,1986): uma
área equivalente à da Europa ocidental ou à dos Estados Unidos a leste do Mississippi.
Inclui as seguintes unidades federativas: Bahia (oeste e Chapada Diamantina), Ceará
(encraves nas Chapadas Araripe e Ibiapaba), Distrito Federal, Goiás, Maranhão (sul e
leste), Mato Grosso (sul), Mato Grosso do Sul, Minas Gerais (centro-oeste e Serra do
Espinhaço), Pará (encraves no sudeste), Piauí (sudoeste e norte), Rondônia (área centro-
leste), São Paulo (encraves no centro-leste) e Tocantins (exceto extremo norte). É uma
região natural exclusivamente brasileira, exceto por pequena área no nordeste da Bolívia
(alto Mamoré). O Pantanal Mato-grossense é uma área de transição mas com predomínio
de paisagens de cerrado, e portanto integra a região de domínio dos cerrados
(Adámoli,1981). Existem ainda, numerosos encraves de cerrado nas regões Amazônica,
Caatinga e Mata Atlântica, além de savanas assemelhadas no norte da América do Sul:
Lhanos, Gran Sabana, Campos do Rio Branco/Lavrado, etc.

Trata-se de uma região tropical situada entre 3 e 24º de latitude sul e entre 41 e 63º de
longitude oeste, excluídos alguns encraves próximos ao litoral dos estados nordestinos:
68% situados entre 10 e 20º de latitude. É uma região dominada por amplos planaltos,
situando-se metade da área entre 300 e 600 metros acima do mar, com apenas 5,5%
ocorrendo acima de 900m: a altitude máxima da região é atingida na Chapada dos
Veadeiros com 1676m e na Serra do Espinhaço com 1797m (pico Itacolomi) e 2070m
(pico do Sol). A precipitação varia de 600 a 2200mm anuais, mas 65% da área recebe
entre 1200 e 1800mm. Entretanto, a distribuição temporal das chuvas é fortemente
estacional, com dois terços da região apresentando cinco a seis meses de seca durante o
inverno (Adámoli et al.,1986; Ab'Saber,1983).

(MAPA)

O clima dominante da região é tropical-quente-subúmido (Aw) caracterizado por forte


estacionalidade das chuvas (chuvas de verão) e ausência de estacionalidade da temperatura
média diária. Entretanto, as serras e planaltos altos de Minas Gerais, Goiás e Mato Grosso
do Sul experimentam sensíveis quedas de temperatura, inclusive geadas (Filgueiras e
Pereira,1989), caracterizando áreas de clima tropical de altitude (Cw). A estacionalidade
climática é determinada pela aproximação da Massa Tropical Atlântica ao litoral brasileiro
durante o inverno originando os ventos alísios que levam tempo seco e sem nuvens ao
planalto central (Ratisbona,1976; Nimer,1972). Durante o inverno são comuns as frentes
frias polares que ocasionam as friagens na metade sul e oeste da região.

Na primavera e verão as chuvas, acompanhadas de trovoadas, são trazidas de noroeste para


sudeste pelas linhas de instabilidade tropical, de origem amazônica, caracterizando um
clima tipo monçônico. As chuvas apresentam alta regularidade estacional, com 50% da
precipitação anual caindo em apenas três meses, mas exibindo razoável variabilidade
interanual no total precipitado. Importante fenômeno é a ocorrência irregular de pequenas
estiagens durante o período do verão, chamadas de veranicos (Wolf, 1977). Mais de 60%
da região é suscetível a eventos de estresse hídrico na vegetação herbácea causados pelos
veranicos (Cochrane et al.,1988). Descargas elétricas (raios) são muito frequentes: um em
cada três dias tem trovoadas. As chuvas costumam ser muito fortes e de curta duração,
tipicamente formando mangas de chuva, nåo sendo raro precipitações acima de 50 mm/dia.

Estudos de fenologia da vegetação de cerrado em Brasília (Moreira e Dias,1986) sugerem a


existência de seis estações ecológicas no ano: 1) início das chuvas (outubro), 2) chuvas de
primavera (novembro e dezembro), 3) veranico (janeiro), 4) chuvas de verão (fevereiro a
abril), 5) inverno seco (maio a agosto), e 6) final da seca (setembro). O inverno seco é
caracterizado pelo pico de deciduosidade e de floração; o final da seca (época mais quente
do ano) pelo pico de frutificação e de refolha das árvores; o início das chuvas por muita
frutificação, dispersão de sementes e rebrota das plantas rasteiras; as chuvas de primavera
pelo pico de crescimento vegetativo das plantas recorrentes e pelas revoadas anuais de
insetos; o veranico por uma queda de atividade de insetos e estagnação fenológica da
vegetação; e as chuvas de verão pela retomada de renovação das folhas. A grande
concentração de frutos e insetos na primavera, promovida pela estacionalidade climática, é
a responsável por outro fenômeno marcante da região: a concentração de aves migratórias
no planalto central durante a primavera vindos da Amazônia e de outras regiões para
reproduzirem (Negret e Negret,1981).

A prolongada estação seca e as características escleromórficas da vegetação de cerrado


fizeram supor inicialmente que se tratava de uma vegetação sujeita a estresse hídrico,
xerofítica portanto. Entretanto, estudos de evapotranspiração mostraram que as plantas
lenhosas mantinham seus estômatos abertos durante a estação seca, transpirando livremente
(Ferri,1977), o que sugere que o escleromorfismo é de origem nutricional e possivelmente
associado à toxidez de alumínio nos solos (Goodland,1971). Descobriu-se que a vegetação
lenhosa possui raízes profundas que garantem acesso à água mesmo no auge da seca, o que
não ocorre com as plantas herbáceas, obrigadas a secar toda a parte aérea sazonalmente por
falta de água no solo superficial (Rawitscher et al.,1943). É possível que as grandes folhas
e as altas taxas de transpiração na seca, típicas das plantas lenhosas do cerrado, sejam
adaptações à baixa fertilidade dos solos propiciando a absorção de um maior volume de
água para filtrar os nutrientes escassos (Otto Solbrig/Harvard University, inf. pes.).
Estudos fenológicos e de crescimento em diâmetro, contudo, comprovam que mesmo as
árvores com raízes profundas interrompem seu crescimento na estação seca, evidenciando
um estresse hídrico moderado (Alvim e Silva,1980). Estudos recentes a nível de
comunidade revelam uma redução das taxas de transpiração da ordem de 42% na estação
seca (Miranda e Miranda, capítulo de estresse hídrico deste livro), comprovando que a
vegetação nativa conserva água durante a estação seca.

Cerca de 90% dos solos da região são distróficos, com fertilidade extremamente baixa
devido aos milhões de anos de lixiviação sob regime de chuvas abundantes, e com alta
toxidez e acidez pelo acúmulo de óxidos de ferro e alumínio (laterita) devido às altas taxas
de evaporação durante secas prolongadas (Goedert,1986; Goodland,1971; Haridasan,1990).
A sugestão de que haveria um gradiente de fertilidade dos solos associado ao gradiente de
vegetação lenhosa de campo sujo a cerradão (Goodland,1971 e Lopes e Cox,1977) é
contestada pela verificação da existência de gradientes estruturais do solo (declividade e
profundidade do solo e profundidade do lençol freático) associados aos gradientes
fitofisionômicos (Eiten,1972,1984 e Haridasan,1990). Entretanto, a maior parte desses
solos são profundos e bem drenados e assentados sobre sedimentos do período terciário que
formam as superfícies de pediplanos e etchiplanos características dos planaltos que cobrem
70% da região. Essas superfícies sedimentares funcionam como gigantescas esponjas que
retêm temporariamente as águas das chuvas que se infiltram nos solos e liberam lentamente
durante os meses secos para as nascentes dos riachos e veredas. Essa é a razão da
paradoxal perenidade dos rios e árvores da regiåo durante a longa estação seca.

Extensas áreas de areias quartzosas e latossolos no oeste baiano (Aouad e Condori,1986),


noroeste mineiro (CETEC, 1980), leste goiano (Belcher,1984) e leste do Mato Grosso do
Sul (IBGE,1988) são vulneráveis à erosão. Pouco se sabe sobre a biologia dos solos de
cerrado, exceto por dados qualitativos evidenciando alta concentração de biomassa tanto
vegetal (raízes com mais de 20m de profundidade, raízes tuberosas, xilopódios, etc. -
Rawitscher e Rachid,1946; Rachid,1947), como animal (cupins, formigas, abelhas, tatus,
lagartos, roedores, minhocoçus, etc-Vanzolini,1963;Dias,1985) e microbiana (bactérias,
actinomicetos e micorrizas-Drozdowicz,1977; Thomasini,1972; Teixeira,1986). Insetos
sociais como as saúvas e os cupins desempenham um papel chave na ciclagem de nutrientes
nos cerrados (Coutinho,1984; Egler,1984).

Os poucos solos eutróficos/mesotróficos estão associados a encraves com afloramentos


calcários (especialmente do grupo Bambuí na bacia do São Francisco e vale do Paranå) ou
basálticos (na bacia do Paranaíba) (Alvim e Silva,1980; Azevedo e Adámoli, 1988).
As águas da regiåo, tanto de superfície quanto de sub-superfície, são oligotróficas e ácidas,
mas possuem concentrações muito elevadas de ferro e oxigênio dissolvido, caracterizando
águas de boa potabilidade mas alta agressividade (Barros,1990; Souza,1990). Nas áreas de
afloramento calcário, as características das águas mudam bastante, apresentando-se com
dureza elevada. A vazão média dos poços é da ordem de 6000 litros/hora, variando de
menos de 1000 l/h nos poços rasos do Distrito Federal a valores acima de 100.000 l/h nos
arenitos Botucatu (SP,MS), Urucuia (BA) e vale do Gurgueia (PI), com recordes de
443.000 l/h (Pimentel et al.,1977; Barros,1990). Devido à estacionalidade das chuvas
existe grande flutuação na vazão dos rios, com o quociente média mensal máxima/média
mensal mínima variando de 2 a 5 nas áreas de arenito do oeste baiano e norte paulista, até
20 a 50 no Maranhão. A vazão média cumulativa dos rios que drenam a região dos cerrados
é da ordem de 25.000 m3/s ou aproximadamente 400 bilhões m3/ano. Com boa parte dos
cursos d'água situados em planaltos, a alta vazão anual d'água se traduz num potencial
hidrelétrico medido, em 1980, da ordem de 57.000 MW correspondentes à metade do
potencial medido do país (Paiva,1982). Cabe lembrar a posição geográfica da região dos
cerrados, englobando os planaltos com as nascentes das três grandes bacias hidrográficas
brasileiras e sulamericanas: amazônica, platina e franciscana. São frequentes as áreas de
encontro físico entre as bacias, conhecidas como "águas emendadas", que funcionam como
importantes corredores ecológicos entre as bacias.

A geologia da região dos cerrados é bastante complexa, constituindo-se na maior parte de


rochas do pré-cambriano recobertas em grande parte por coberturas detrito-lateríticas dos
pediplanos cenozóicos, exceto pelos planaltos areníticos e basálticos paleozóicos das bacias
sedimentares do Paraná e Parnaíba e mesozóicos das bacias sedimentares do São Francisco
e Parecis, e pelas bacias sedimentares cenozóicas do Paraguai. Araguaia e Guaporé
(IBGE,1989; DNPM,1984). A região dos cerrados é das mais ricas do país em reservas
minerais: mais de 85% das reservas brasileiras de amianto, diamante, nióbio, ouro, prata,
titânio e zinco; e entre 40 e 80% das reservas de calcário, ferro, fosfato, manganês, níquel e
quartzo (IBGE,1990).

A região dos cerrados constitui-se num grande mosaico de paisagens naturais dominado por
diferentes fisionomias de savanas estacionais sobre solos profundos e bem drenados das
chapadas (os cerrados), ocupando mais de 2/3 das terras, que são recortadas por estreitos
corredores de florestas mesofíticas perenifólias ao longo dos rios (as matas de galeria)
ladeados por savanas hiperestacionais de encosta (os campos úmidos) ou substituídos por
brejos permanentes (as veredas). Esse padrão é interrompido por encraves de outras
tipologias vegetais: savanas estacionais de altitude (os campos rupestres), savanas
estacionais em solos rasos (os campos litólicos), florestas xeromórficas semidecíduas (os
cerradões), florestas mesofíticas dos afloramentos calcários (as matas secas), florestas
mesofíticas de planalto (as matas de interflúvio), savanas hiperestacionais aluviais com
murunduns (os pantanais), florestas baixas xeromórficas decíduas em solos arenosos (os
carrascos), além dos ambientes diferenciados associados às cavernas, lagedos, cachoeiras e
lagoas. Essas paisagens diferenciam-se estruturalmente, podendo conter biotas distintas ou
compartilhadas com outras paisagens em combinações únicas (Eiten,1972,1990;
Rizzini,1979; Ratter et al.,1973; Velloso e Góes Filho,1982; Ribeiro et al.,1983;
Warming,1973).

Os fatores que determinam qual tipo de cobertura vegetal ocorre em cada local são diversos
e podem variar de local para local. Os dois fatores mais importantes são a disponibilidade
de água (resultante do total anual e estacionalidade das chuvas e da capacidade de retenção
de água do solo dada pela profundidade e textura do solo) e a disponibilidade de nutrientes
(resultante da fertilidade natural do solo e da ciclagem de nutrientes pela atividade
biológica e das queimadas) (Alvim e Silva,1980; Goodland e Ferri,1979; Eiten,1972;
Coutinho,1990; Frost et al.,1986; Walker,1987; Sarmiento,1984).

Tampouco existe uniformidade quanto à composição biológica na região. Pelo menos 11


biotas (floras+faunas) distintas coexistem, frequentemente lado a lado sem se misturar,
outras vezes misturando-se em faixas ecotonais:
a) biota dos cerrados (em todo o gradiente desde campo limpo a cerrado senso restrito, mas
também nos cerradões, carrascos, campos litóticos, e nos murunduns dos campos úmidos e
pantanais);
b) biota das florestas distróficas (na maioria das florestas de galeria, de encosta, e de
interflúvio, mas também em parte dos cerradões);
c) biota das florestas mesotróficas (nas florestas de afloramentos calcários e basálticos, mas
também em florestas de galeria e de interflúvio mesotróficas e cerradões mesotróficos);
d) biota das savanas hiperestacionais (restrita aos campos úmidos e pantanais);
e) biota das savanas de altitude (restrita aos campos rupestres);
f) biota das savanas de encostas (associada aos campos litólicos não-cerrado, mas também
nos campos litólicos de cerrado);
g) biota dos brejos permanentes (restrita às veredas e outros brejos permanentes
miscelâneos nas várzeas de rios e lagoas);
h) biota das cavernas (associada na maioria com afloramentos calcários);
i) biota das lagoas (associada às lagoas perenes e estacionais tanto de planalto quanto de
planície, mas também nas veredas, brejos permanentes miscelâneos, pantanais e rios);
j) biota das cachoeiras (associadas às cachoeiras e corredeiras);
k) biota dos lagedos (associada aos afloramentos de rocha).

As biotas dos cerrados, florestas distróficas, savanas hiperestacionais e brejos permanentes


(veredas) são as mais bem distribuídas na região enquanto as demais têm ocorrência mais
pontual ou concentrada em determinadas áreas, como por exemplo os campos rupestres que
estão associados principalmente à Serra do Espinhaço(MG)/Chapada Diamantina(BA) e
nas serras centrais de Goiás (Dourada, Pirineus e Veadeiros); as florestas mesotróficas e
cavernas associadas principalmente aos afloramentos calcários do grupo Bambuí no vale do
São Francisco(MG/BA) e nos vales do Paranã/Preto(GO/MG).

Tratando-se de uma região de escala continental, com importante variação latitudinal e


altitudinal, grande variação na precipitação anual e na duração da seca, diversidade de solos
(quanto à profundidade, textura, inundação e fertilidade), complexa geologia e
geomorfologia, diversidade de tipologias vegetais, que engloba diferentes bacias
hidrográficas e rica biota, não é nenhuma surpresa constatar que existem importantes
diferenças regionais dentro do domínio dos cerrados. Azevedo e Caser (1980) dividem o
cerrados em cinco regiões climáticas: 1) "core" ou nuclear, 2) influência amazônica, 3)
influência nordestina, 4) influência sulina/atlântica, e 5) influência sulina/continental; e
reconhecem 22 sub-regiões definidas por aspectos abióticos. Cochrane et al. (1985)
identificaram cerca de 100 unidades ambientais distintas (sistemas de terra) na região, o que
dá uma ideia da diversidade ambiental da região.

Cerca de dois terços da região estavam cobertos primitivamente por savanas estacionais em
solos bem drenados (os cerrados), quase um quarto eram cobertos por florestas de
diferentes tipos (matas mesofíticas de galeria e de interflúvio, cerradões e carrascos), cerca
de 10% estavam ocupados por savanas estacionais com fortes restrições hídricas (campos
rupestres e litólicos, e campos úmidos e pantanais), restando 2,5% para os brejos
permanentes (veredas, etc.). Predominavam, assim, as formações abertas savânicas, o que
enquadra a região entre as savanas tropicais do mundo. Aliás, o Brasil é o país do mundo
com maior área de savana.

DISTRIBUIÇÅO ESPACIAL PRIMITIVA DOS DIFERENTES TIPOS DE


ECOSSISTEMAS DA REGIÅO DOS CERRADOS

TIPO DE ECOSSISTEMA ÁREA ESTIMADA OCORRÊNCIA


(1000 ha) % GEOGRÁFICA

CERRADOS (RESTRITO) 108.000 53,0 GERAL


CAMPOS DE CERRADO 23.600 11,6 GERAL
CERRADÕES 16.900 8,3 GERAL E TRANSIÇÕES
CAMPO ÚMIDO/PANTANAL 11.200 5,5 GERAL E ARAGUAIA
MATAS DE GALERIA 10.200 5,0 GERAL
MATAS DE INTERFLÚVIO 10.200 5,0 PODZÓLICOS EUTRÓFICOS
CARRASCOS 8.200 4,0 TRANSIÇÕES
CAMPO RUPESTRE 5.100 2.5 >1000m MG, BA, GO
CAMPO LITÓLICO 5.100 2,5 <1000m MG, BA, GO, TO
VEREDA E BREJO 5.100 2,5 GERAL
________________________________________________________________
FONTE: ADAPTADO DE AZEVEDO E ADÁMOLI 1988

CARACTERIZAÇÃO FÍSICA DA REGIÃO DOS CERRADOS


VARIÁVEL CLASSES ÁREA (1000ha) %
latitude 0- 5o sul 10.000 4,8
5-10 35.000 17,0
10-15 70.000 34,2
15-20 70.000 34,2
20-25 20.000 9,8
altitude 0- 300m 44.419,6 21,8
300- 600 102.287,5 50,2
600- 900 45.846,0 22,5
900-1200 10.595,5 5,2
1200-1800 611,3 0,3
temperatura 18-20 Co 10.000 4,8
(média anual) 20-22 30.000 14,4
22-24 77.000 37.0
24-26 60.000 28.0
26-28 35.000 16,0
precipitação 600- 800mm 3.667,7 1,8
800-1000 13.244,4 6,5
1000-1200 20.579,8 10,1
1200-1400 45.031,2 22,1
1400-1600 44.216,1 21,7
1600-1800 43.604,1 21,4
1800-2000 21.598,6 10,6
2000-2200 11.818,1 5,8
duração da seca 0 mês 611,3 0,3
1 1.018,8 0,5
2 1.630,1 0,8
3 4.890,2 2,4
4 18.134,6 8,9
5 81.504,0 40,0
6 55.830,2 27,4
7 24.650,0 12,1
8 10.799,3 5,3
9 3.056,4 1,5
10 1.630,1 0,8
solos concrecionários 5.746,0 2,8
litólicos 14.813,4 7,3
areias quartzosas 30.971,5 15,2
latossolos distróficos 87.475,0 43,0
podzólicos distróficos 20.306,0 10,0
lateritas hidromórficas 12.266,4 6,0
cambissolos 6.194,3 3,0
gleys húmicos 4.075,2 2,0
podzólicos eutróficos 10.461,7 5,1
latossolos eutróficos 6.150,0 3,0
terras roxas 3.423,1 1,7
outros 1.915,4 0,9

FONTE: ADÁMOLI et al.1986 (exceto latitude e temperatura)

Existe aproximadamente um milhão e meio de espécies descritas cientificamente, até o


momento, no mundo todo (Wilson,1988). Entretanto, grande parte das espécies de insetos,
fungos, bactérias, vírus e protozoários, especialmente dos trópicos, ainda não foi descrita.
As estimativas conservadoras apontam para a existência de cerca de três milhões de
espécies, enquanto as mais radicais sugerem trinta milhões (Erwin,1988)! Seja qual for o
número correto, dois terços das espécies vivem nos trópicos: aproximadamente metade no
novo mundo (região neotropical) e metade no velho mundo. Cerca de metade da biota
neotropical ocorre em território brasileiro, o que faz do Brasil o país "detentor" da maior
parcela da biodiversidade mundial: cerca de 15% do total! Pela sua extensão territorial
(25% do país), pela sua posição central (que propicia compartilhar espécies com quatro
outras regiões), pela sua diversidade de tipologias vegetais (que abrigam cerca de 11 biotas
distintas), e por conter trechos importantes das três maiores bacias hidrográficas brasileiras
e sul-americanas, a região do cerrado potencialmente abriga aproximadamente um terço da
biota brasileira, ou seja cerca de 5% da fauna mundial. O quadro abaixo ilustra uma
estimativa conservadora da riqueza biológica da região, tomando-se por base 5% da biota
mundial, e estimando-se essa pelo seu valor mais conservativo de três milhões de espécies.
A riqueza mínima estimada para a região é da ordem de 320.000 espécies distribuídas por
35 filos e 89 classes. Vírus (50%), Insetos (28%) e fungos (12,5%) responderiam sozinhos
por três quartos da riqueza total, enquanto as plantas com flor (3,1%) e os vertebrados
(0,6%) constituem grupos minoritários, embora dominantes em termos de biomassa. O
grau de conhecimento atual para alguns grupos taxonômicos mais bem estudados, de
vertebrados, insetos e plantas superiores apoiam essas estimativas.

TABELA ILUSTRATIVA DA RIQUEZA ESTIMADA (ORDEM DE GRANDEZA) DE


ESPÉCIES DA BIOTA DA REGIÃO DOS CERRADOS

FILO CLASSE VERNÁCULO RIQUEZA

CHORDATA MAMMALIA MAMÍFEROS 150


AVES AVES 550
REPTILIA RÉPTEIS 150
AMPHIBIA ANFÍBIOS 150
OSTEICHTHYES PEIXES 1.000
CONDRICHTHYES ARRAIAS 10
UNIRAMIA HEXAPODA:
COLEOPTERA BESOUROS 35.000
HYMENOPTERA VESPAS, etc. 20.000
LEPIDOPTERA MARIPOSAS 15.000
DIPTERA MOSCAS 10.000
demais ordens outros insetos 10.000
MYRIAPODA LACRAIAS 500
TARDIGRADA TARDÍGRADOS 50
PENTASTOMIDA PENTASTOMÍDEOS 10
ONYCHOPHORA PERÍPATOS 5
CRUSTACEA CRUSTÁCEOS 500
CHELICERATA:
ARACHNIDA ARANHAS, etc. 4.000
ANNELIDA;
OLIGOCHAETA MINHOCAS 100
HIRUDINEA SANGUESSUGAS 50
MOLLUSCA:
GASTROPODA CARACOIS 500
BIVALVIA MARISCOS 50
BRYOZOA BRIOZOÁRIOS 10
PLATYHELMINTHES VERMES ACHATADOS 400
NEMATODA VERMES NEMATÓIDES 500
NEMATOMORPHA VERMES 10
ACANTHOCEPHALA VERMES 50
GASTROTRICHA VERMES 10
NEMERTINI VERMES 5
ROTIFERA ROTÍFEROS 100
COELENTERATA HIDRAS 50
PORIFERA ESPONJAS 10
PROTOZOA:
MASTIGOPHORA FLAGELADOS 1.500
SARCODINA AMEBAS 400
SPOROZOA ESPOROZOÁRIOS 1.500
CNIDOSPORA ESPOROZOÁRIOS 100
CILIOPHORA CILIADOS 1.500
PROKARYOTE:
VIRALES VÍRUS 160.000
SCHIZOPHYTA BACTÉRIAS 1.500
CYANOPHYTA ALGAS AZUIS ?10
FUNGI:
GYMNOMYCOTA BOLORES 50
ASCOMYCETES LEVEDURAS 15.000
BASIDIOMYCETES COGUMELOS 10.000
DEUTEROMYCETES FUNGOS IMPERFEITOS 10.000
mais 6 classes 5.000
LICHENES LÍQUENS 1.000
ALGAE:
EUGLENOPHYTA FITOFLAGELADOS 50
CHRYSOPHYTA ALGAS DOURADAS 1.000
PYRROPHYTA DINOFLAGELADOS 100
RHODOPHYTA ALGAS VERMELHAS ?5
CHLOROPHYTA ALGAS VERDES 1.000

BRYOPHYTA MUSGOS 1.500


PTERIDOPHYTA SAMAMBAIAS 500
SPERMATOPHYTA:
GYMNOSPERMAE PINHEIROS 3
ANGIOSPERMAE:
DICOTYLEDONEAE PLANTAS COM FLOR 7.500
MONOCOTYLEDONEAE PLANTAS COM FLOR 2.500

RESUMO: 35 FILOS
89 CLASSES >320.000 ESPÉCIES:
160.000 (50,0%) VÍRUS
90.000 (28,0%) INSETOS
40.000 (12,5%) FUNGOS
10.000 (3,1%) ANGIOSPERMAS
5.000 (1,5%) PROTOZOÁRIOS (5 FILOS)
5.000 (1,5%) ARTRÓPODOS (EXCETO INSETOS)
2.000 (0,6%) VERTEBRADOS
2.000 (0,6%) ALGAS (5 FILOS)
1.500 (0,5%) MUSGOS
1.500 (0,5%) BACTÉRIAS (2 FILOS)
1.200 (0,4%) VERMES (8 FILOS)
500 (0,2%) MOLUSCOS
500 (0,2%) SAMAMBAIAS
50 (0,02) HIDRAS
10 (0,003) ESPONJAS
10 (0,003) BRIOZOÁRIOS
3 (0,001) CONÍFERAS
____________________________________________________________
FONTES: Holmes, S.,1979. Henderson's Dictionary of Biological Terms.9a ed., Londres,
Longman; Myers, N.,1984. The Primary Source: Tropical Forests and Our Future. Nova
York, Norton; Wilson, E.O.(Org.),1988. Biodiversity. Washington, National Academy
Press; Castri, F. Di & T. Younes, 1990. Ecosystem Function of Biological Diversity.
Biology International, Special Issue 22; Barnes, R.D., 1984. Zoologia dos Invertebrados, 4a
ed., São Paulo, Roca; Manton, S.M.,1977. The Arthropoda. Oxford, Claredon.
O estado ainda incipiente do levantamento da biota regional dificulta uma análise
comparativa. A flora lenhosa arbórea/arbustiva já conhecida é estimada em mais de 2.000
espécies (Fernando Martins/UNICAMP, inf. pes.), das quais cerca de 56% seriam
acessórias, provenientes de outras regiões, e 44% seriam peculiares ao cerrado, assim como
33,7% dos gêneros (Heringer et al.,1977). Observa-se nos cerrados uma forte dominância
no estrato arbóreo das famílias Vochysiaceae, acumuladoras de alumínio, e Leguminosae,
associadas a bactérias, Rhizobium, fixadoras de nitrogênio (Ribeiro e Haridasan,1990;
Felfili e Haridasan, no prelo). Estudos fitogeográficos de famílias arbóreas reconhecem a
região dos cerrados como uma das grandes províncias florísticas da América do Sul, rica
em endemismos e em nítido contraste com a Caatinga e o Pantanal Matogrossense que têm
muito poucos endemismos (Prance,1990).

A flora do estrato rasteiro é pouco conhecida, porém muito rica e quase 100% endêmica à
região (Tarciso Filgueiras/IBGE-DF, inf. pes.). As famílias Gramineae e Leguminosae
dominam o estrato rasteiro do cerrado em número de espécies (38% conjuntamente) e em
número de indivíduos (52% são gramíneas) (Filgueiras, T. In: Felfili e Haridasan, no prelo).
Uma única espécie de gramínea, Echinolaena inflexa, responde por um terço dos indivíduos
do estrato rasteiro nos cerrados do Planalto Central: surpreendentemente trata-se de uma
espécie com sistema fotossintetisante C3, teoricamente mais adaptada à sombra do que ao
sol o que sugere que os campos cerrados de hoje se originaram de cerrados
densos/cerradões. A flora dos campos rupestres, por sua vez, é reconhecidamente a de
maior endemismo relativo e absoluto no Brasil, sobressaindo as Velloziaceae,
Eriocaulaceae, Melastomataceae e Compositae (Menezes e Giulietti,1986).

O tamanho das flórulas conhecidas de plantas superiores de algumas áreas restritas melhor
estudadas ilustra a riqueza da região dos cerrados: 200 a 240 espécies em 0,1ha e 300 a 450
espécies em 1ha de cerrado denso em Brasília, DF (Eiten,1990), 1.360 espécies nativas nos
1260ha da Reserva Ecológica do IBGE em Brasília, DF (Mendonça, Pereira e
Filgueiras/IBGE-DF, inf. pes.), mais de 1590 espécies nativas em 15.000ha da Serra do
Cipó, MG (Menezes e Giulietti,1986), mais de 1200 espécies nativas na região do Pico das
Almas em Rio de Contas, BA (Burman,1991), e mais de 2042 espécies nativas nos
579.000ha do Distrito Federal (Filgueiras e Pereira,1990).

Estudos comparativos da flora lenhosa de cerrado senso restrito de diferentes localidades


mostram uma similaridade de composição específica decrescente com o aumento da
distância: localidades no Distrito Federal distando cerca de 30 a 50km entre si exibem
índices de Sörensen entre 68 a 78% e de Morisita entre 69 a 80%; localidades na Chapada
Pratinha (GO/MG) distantes 200 a 300km apresentam similaridades de 52 a 61%
(Sörensen) e 22 a 50% (Morisita) (Felfili et al.,In: Felfili e Haridasan, no prelo), da mesma
forma que localidades no interior de São Paulo (Ratter et al.,1988); enquanto que
localidades distantes 800km como Brasília, DF e Angatuba, SP têm apenas 36,9% de
similaridade (Sörensen) e outras como Santa Terezinha, MT (Parque Nacional do Araguaia)
e Angatuba compartilham apenas 24,9% das espécies (Ratter et al.,1988). Heringer et al.
(1977) chamam a atenção para as enormes diferenças florísticas entre os cerrados do
Maranhåo, Distrito Federal, São Paulo e Mato Grosso. Áreas particularmente ricas em
endemismos são as Serras do Espinhaço, onde cada localidade exibe espécies próprias
(Burman,1991).
A listagem de Costa et al. (1981) para os vertebrados terrestres da região dos cerrados
apontam índices de endemismos de 16% para aves e 21 a 23% para répteis e mamíferos,
considerando espécies e subespécies. Dados atualizados para os mamíferos, só
considerando espécies, indicam que 19% são exclusivas, ou quase, à região dos cerrados,
índice que sobe para 37% entre os roedores (ver tabela abaixo). Existem grandes
diferenças faunísticas entre localidades distantes dentro da região dos cerrados, com
endemismos restritos a diferentes sub-regiões como é o caso de 92 espécies/subespécies de
vertebrados terrestres (Costa et al.,1981), e um gradiente inverso de presença de espécies
amazônicas e atlânticas nas matas de galeria e de interflúvio conforme a distância de uma
localidade e a borda dos dois domínios, comprovado para as aves (Silva,1989). Áreas com
altas taxas de endemismos já conhecidas são o Distrito Federal e a Serra do Espinhaço em
Minas Gerais e Bahia. A riqueza faunística da região pode ser ilustrada pela presença de
250 espécies de aves nos 1260 ha da Reserva Ecológica do IBGE (sem ambientes lacustres)
em Brasília (Negret,1983) e 430 espécies de aves nos 579.000 ha dos Distrito Federal
(Negret et al.,1984); ou ainda pela presença de mais de 90 espécies de libélulas na Reserva
Ecológica do IBGE (Mariza Simões/IBGE-DF, inf. pes.), mais de 60 espécies de cupins nos
campos e cerrados da Fazenda Água Limpa da UnB, com 4.000 ha, em Brasília e mais de
250 espécies de abelhas no Jardim Botânico de Brasília (Anthony Raw/UnB, inf. pes.).

BIODIVERSIDADE DA FLORA NATIVA DO DISTRITO FEDERAL


FAMÍLIAS GÊNEROS ESPÉCIES
CRIPTÓGAMOS
ALGAS 38 107 343
FUNGOS ?50 128 419
LÍQUENS ?10 27 28
BRIÓFITAS 43 92 127
PTERIDÓFITAS 20 40 169

FANERÓGAMOS
GIMNOSPERMAS 1 1 1
ANGIOSPERMAS 135 678 1938

TOTAL ?297 1073 3025


______________________________________________________
FONTE: Filgueiras, T.S. e B.A.S. Pereira,1990. Flora do Distrito Federal, In: Novaes-
Pinto, M.(Org.) Cerrado: Caracterização, Ocupação e Perspectivas. Brasília, Editora UnB

TABELA ILUSTRATIVA DA FAUNA ENDÊMICA DA REGIÃO DO CERRADO:


MAMÍFEROS
ESPÉCIES CARACTERÍSTICA ENDÊMICA
(QUASE ENDÊMICA)
Blastocerus dichotomus X
Ozotocerus bezoarticus X
Chrysocyon brachyurus X
Dusicyon vetulus X
Alouatta caraya X
Callithrix penicillata X
Euphractus sexcinctus X
Cabassous tatouay X
Dasypus septemcinctus X
Monodelphis kunsi X
Monodelphis unistriata X
Lonchophylla dekeyseri X
ROEDORES:
Akodon lindberghi X
Carterodon sulcidens X
Clyomys laticeps X
Ctenomys brasiliensis X
Echimys braziliensis X
Euryzygomatomys guiara X
Galea flavidens X
Juscelinomys candango X
Kunsia fronto X
Kunsia tomentosus X
Oecomys cleberi X
Oryzomys fornesi X
Oryzomys lamia X
Oryzomys utiaritensis X
Oxymyterus roberti X
Pseudoryzomys simplex X
Thalpomys cerradensis X
Thalpomys lasiotis X

TOTAL MAMÍFEROS 30 (19%) 13 (8%) 17 (11%)


TOTAL ROEDORES 18 (37%) 4 (8%) 14 (29%)
TOTAL NÃO-VOADORES 29 (26%) 13 (12%) 16 (14%)
TOTAL MORCEGOS 1 (2%) 0 (0%) 1 (2%):
________________________________________________________
FONTE: Costa,C.C.C et al,1981. Fauna do Cerrado: Lista Preliminar de Aves, Mamíferos e
Répteis. Rio de Janeiro, IBGE; Marinho Filho, J & M.L. Reis,1989. A Fauna de Mamíferos
Associada às Matas de Galeria. Anais do Simpósio sobre Mata Ciliar, São Paulo,
Fundaçåo Cargill. Hershkovitz, P.,1990. Journal of Natural History 24:763-783 e Fieldiana,
Zoology 57:37p.

[OBSERVAÇÃO: As referências bibliográficas deste capítulo são apresentadas no capítulo


7 – Referências Bibliográficas ao final do livro: Dias, B.F.S. (coord.), 1992a. Alternativas
de Desenvolvimento dos Cerrados: Manejo e Conservação dos Recursos Naturais
Renováveis. Brasília, IBAMA & FUNATURA, 118p. [2a edição em 1996]

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