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Introdução
O número de estudos sobre a estrutura do componente herbáceo-subarbustivo da
vegetação brasileira é significativamente menor do que os realizados a respeito do componente
lenhoso. Essa escassez de trabalhos resulta na deficiência de conhecimentos sobre esse estrato
e os métodos de amostragem desse componente da vegetação.
Os métodos de amostragem de espécies do estrato rasteiro da vegetação dividem-se
basicamente em dois grandes grupos: 1 - Métodos de densidade, que avaliam parâmetros de
densidade e frequência, por meio da contagem do número de indivíduos das espécies por
unidade de área; e 2 - métodos de cobertura, que investigam a projeção da espécie dada pela
sua taxa de cobertura na área e, dependendo do método, pela sua frequência. Para determinar
qual o método de amostragem a ser utilizado, é necessário certo nível de conhecimento preliminar
da vegetação a ser estudada. Informações referentes à homogeneidade vegetacional da área,
como altura, densidade da vegetação, composição relativa aproximada das espécies, morfologia
e formas de vida das plantas são importantes para selecionar o método.
Depois de decidir qual método utilizar, no momento da amostragem o pesquisador deve
descrever o habitat, coletar amostras de solo para análises físicas e químicas e confeccionar
um mapa de localização da área. Essas informações são necessárias para avaliar quais variáveis
ambientais condicionam a distribuição das espécies em determinado local. As alterações na
diversidade e padrões de distribuição espacial das espécies do estrato herbáceo-arbustivo estão
intimamente relacionadas com a heterogeneidade e aspecto nutricional do solo; a disponibilidade
1
Universidade de Brasília, Campus Darcy Ribeiro, Instituto de Ciências Biológicas, Asa Norte, 70910-900
Brasília, DF, Brasil.
2
Universidade Federal de Uberlândia, Instituto de Biologia, 38400-902 Uberlândia, MG, Brasil.
3
Autor para correspondência: cassiamunhoz@unb.br.
214 Munhoz e Araújo
de água também é fator extremamente importante para essas alterações (SAN JOSÉ, 1983;
SAN JOSÉ; FARIÑAS, 1991; POULSEN, 1996).
Além da segurança na escolha do método adequado para a investigação do estrato
herbáceo-arbustivo, para garantir a correta identificação das espécies o investigador deve
possuir bom conhecimento florístico e, também, contar com a colaboração de herbários e
taxonomistas especialistas nos diversos grupos botânicos; portanto, é importante uma cuidadosa
coleção de todas as espécies de plantas da área. Outro fator fundamental e negligenciado por
alguns autores é o acompanhamento reprodutivo das espécies para que se possa obter material
fértil das plantas, o que facilita a identificação e separação daquelas que em estado vegetativo
são muito semelhantes.
O propósito deste texto foi descrever os principais métodos utilizados para amostragem
do estrato herbáceo-arbustivo em comunidades vegetais, especialmente os mais usados no
Brasil.
Método de parcelas
Neste método, uma contagem dos indivíduos é feita em pequenas parcelas espalhadas
na comunidade. Tradicionalmente, as parcelas são quadradas, mas parcelas retangulares e, até
mesmo, circulares têm sido usadas (KENT; COKER, 1992). A soma de indivíduos por espécie
é calculada para a área total das parcelas amostradas, e o resultado é expresso em termos de
densidade de espécies por área.
A contagem de árvores, arbustos não ramificados e hastes simples de plantas anuais é
relativamente fácil, mas com frequência apresenta dificuldade em ser aplicada a outras formas
de vida. Isso ocorre porque é difícil decidir onde o indivíduo começa e onde ele termina, como
é o caso de arbustos e subarbustos ramificados ou rastejantes, samambaias e ervas agrupadas,
ou entouceiradas ou cespitosas e, principalmente, muitas outras ervas perenes com formas
rizomatosas e estoloníferas. Portanto, a utilização de contagem como ferramenta de amostragem
é limitada pela forma de vida da planta, e a contagem acurada requer bom conhecimento da
forma de vida das espécies. No entanto, uma contagem dos indivíduos ou partes destes pode
ser sempre estabelecida desde que apoiada em uma definição própria de como eles serão
considerados. Por exemplo, pode-se considerar cada ramificação estolonífera de uma erva
como um indivíduo ou um subarbusto com vários caules saindo da base como apenas um
indivíduo. Porém, se essas decisões não são tomadas a priori, a contagem de indivíduos pode
ser menos acurada do que uma estimativa visual de abundância.
O tamanho das parcelas deve ser decidido de modo a evitar o efeito marginal da parcela
(MUELLER-DOMBOIS; ELLENBERG, 2002), ou seja, a borda da unidade amostral pode
Métodos de amostragem do estrato herbáceo-subarbustivo 215
- Densidade absoluta:
em que:
ni = número de indivíduos da espécie “i”; e
ha = hectare.
- Densidade relativa:
em que:
N = número total de indivíduos.
216 Munhoz e Araújo
- Frequência absoluta:
em que:
NPi = número de parcelas onde a espécie “i” ocorre; e
NPT = número total de parcelas amostradas.
- Frequência relativa:
Método de Relevé
Relevé é um termo francês que significa coleção de dados. Foi desenvolvido por Josias
Braun-Blanquet como um método de amostragem-padrão da vegetação e amplamente utilizado
em ambientes temperados, predominantemente em áreas campestres e em menor escala em
ambientes florestais. O relevé é uma porção da vegetação escolhida pelo pesquisador para
representar uma fisionomia vegetal. Por meio de uma estimativa visual qualiquantitativa de
abundância e cobertura, confecciona-se uma lista de todas as espécies de plantas encontradas
em uma área amostral.
Este método requer que três requisitos sejam atendidos (MUELLER-DOMBOIS;
ELLENBERG, 2002): 1- a área escolhida deve ser grande o suficiente para conter todas as
Métodos de amostragem do estrato herbáceo-subarbustivo 217
Esse método pode ser considerado subjetivo e pouco preciso, pois não requer medidas,
mas tem como vantagem exigir menos tempo para sua realização. Nos casos-limite de variação
na escala de valores, um erro por um valor de nota pode ocorrer. No entanto, se o objetivo do
método de relevé for descrever a variação florística espacial da cobertura da vegetação de
uma região, a ênfase é colocada em mais relevés com estimativas semiquantitativas do que em
poucas amostras de vegetação com medidas exatas das quantidades de espécies (MUELLER-
DOMBOIS; ELLENBERG, 2002). Em uma mesma comunidade, preferencialmente o número
de relevés deve ser menor ou somente um, porém em maior quantidade de detalhes do que na
amostragem de diferentes comunidades.
Durante o estabelecimento do relevé, as relações quantitativas gerais entre as espécies
se tornarão evidentes na sua listagem. Depois que todas as espécies forem registradas, o
investigador deve caminhar pela área de estudo ou para um local aonde ele possa avistar a
completa assembleia de plantas do relevé. Nesse ponto, o procedimento para cada espécie é
perguntar qual o seu valor de cobertura de acordo com as notas de Braun-Blanquet. Por
exemplo, em uma parcela de 1 m2 de área as espécies que podem estar espalhadas no relevé
são memorizadas pelo pesquisador. Uma espécie com menos de 5% de cobertura pode tanto
receber nota 1 ou +. Se a cobertura for realmente 1%, a nota é +, mas, se aparecer somente
uma, ela receberá nota r, de rara ou solitária no relevé (Figura 1).
Os parâmetros fitossociológicos do método de estimativa de cobertura, segundo Mueller-
Dombois e Ellenberg (2002), são:
- Cobertura absoluta:
(a) (b)
Figura 1 - Representação esquemática da escala de cobertura de Braun-Blanquet. As letras, em caixa alta,
representam as espécies. (a) espécie A - classe 5, com mais de 75% de cobertura; espécie C –
classe r, rara; espécie E – classe +, com menos de 1% de cobertura. (b) espécie A - classe 4, com
50 a 75% de cobertura; espécie B – classe 3, com 25 a 50% de cobertura; espécie C – classe 2,
com 5 a 25% de cobertura; e espécie D – classe 1, com 1 a 5% de cobertura.
- Cobertura relativa:
- Frequência absoluta:
em que:
UAi = número de unidades amostrais onde a espécie “i” ocorre; e
UAT = número total de unidades amostrais.
220 Munhoz e Araújo
- Frequência relativa:
- Valor de importância:
Método de pontos
O termo “método de pontos” foi usado pela primeira vez por Lindquist (1931 apud
MANTOVANI; MARTINS, 1990), mas também recebe outras denominações, como: “point
Métodos de amostragem do estrato herbáceo-subarbustivo 221
quadrant” (LEVY; DAVIES, 1929 apud MANTOVANI; MARTINS, 1990), “point sampling”
(OSBORN et al., 1935; YARRANTON, 1966), “point intercept” (WHITMAN; SIGGEIRSON,
1954), “point frame method” (NERMEY, 1960) e “método de agulhas” (BUSELATO; BUENO,
1981). Mantovani e Martins (1990) consolidaram o uso do termo “método de pontos” no Brasil em
uma revisão detalhada sobre o método, em que apresentam vários aspectos conceituais, metodológicos
e comparativos da técnica, além de destacarem especialmente a rapidez da amostragem.
Essencialmente, trata-se de um método de cobertura que determina a proporção de
unidades amostrais (número de pontos) coberta por uma espécie em relação ao total de unidades
amostrais (número total de pontos). Nesse procedimento, os pontos que interceptam parte da
planta são contados (MUELLER-DOMBOIS; ELLENBERG, 2002).
Várias ferramentas de amostragem têm sido usadas no método de ponto, entre elas a
armação de frequência de pontos (HEADY; RADER, 1958), que consiste de uma armação de
madeira com duas ripas de 1 m de comprimento, horizontalmente fixadas em duas ripas laterais
do mesmo tamanho. No comprimento da armação, são feitas perfurações por onde passam 10
pinos de metal da mesma altura. A segunda ripa permite que os pinos fiquem eretos e sejam
colocados verticalmente, não oblíquos, de modo a eliminar o efeito de paralaxe e favorecer a
repetição. Os buracos com seus pinos são espaçados em intervalos iguais ao longo da armação
linear (Figura 2). Essas dimensões podem mudar em função da altura e espaçamento das
plantas memorizadas pelo pesquisador.
A armação linear é montada com os braços sobre uma faixa da vegetação herbácea a
ser medida, e os pinos são rebaixados verticalmente um após o outro. Seus toques nas partes
das plantas são usualmente registrados por espécie e utilizados nas medidas de cobertura e
frequência destas. Dez colocações da armação resultam em levantamento de 100 pontos de
amostragem. Isso leva a uma medida de cobertura das espécies que são interceptadas pelos
pinos. A cobertura de touceiras é tomada pela contagem somente da primeira interceptação ou
do toque inicial de cada agulha com uma parte do ramo. A altura da planta pode ser medida
simultaneamente pelo comprimento da agulha em cada primeira interceptação.
- Média de toques:
em que:
NTi = número de toques da espécie “i”; e
NPi = número de pontos com a espécie “i”.
- Frequência absoluta:
- Frequência relativa:
em que:
- Cobertura:
- Vigor absoluto:
- Vigor relativo:
- Índice de cobertura:
Ci = FAi + VAi
em estender uma linha, ou várias, entre dois pontos de uma comunidade vegetal. Dependendo
dos objetivos do trabalho, o local da plotagem da linha pode ser preferencial ou aleatório. A
linha pode ter 10, 20, 50, 100 m ou mais, dependendo da extensão desejada para a amostragem.
A altura da linha em relação ao solo será proporcional à altura da vegetação a ser interceptada.
Essas linhas podem ser divididas em trechos menores, cuja extensão pode variar de acordo
com a densidade da vegetação.
Em estudo conduzido numa área de vegetação de vereda (GUIMARÃES et al., 2002), a
linha foi estendida de uma borda a outra com a intenção de contemplar as diversas zonas de
umidade. Já em uma área de campo limpo úmido, Munhoz (2003) sorteou linhas em diferentes
estratos da área, definidos pelas fitofisionomias vizinhas a ela. Nesses dois casos, os referidos
autores subdividiram as linhas em segmentos de 1 m, demarcados com estacas de 70 cm de
altura, confeccionadas com vergalhões de ferro de 6,3 mm, que representaram as subunidades
amostrais (SuA). Com o auxílio de uma vareta de 1 m demarcada com fita métrica e colocada
sobre cada SuA, foi feita a visualização da projeção da linha sobre todos os indivíduos com
hábito herbáceo ou subarbustivo (Figura 3). Com esses dados, calcularam-se as coberturas e
as frequências (absoluta e relativa).
As equações utilizadas para obter os parâmetros quantitativos das espécies são as
seguintes:
(a) 1m (b)
Figura 3 - Representação esquemática do método de interseção na linha. Em (a), observa-se a demonstração
de como a unidade de amostragem é colocada e em (b), de como é tomada a projeção das
espécies.
226 Munhoz e Araújo
em que:
em que:
ni = número de UAs onde a espécie (i) ocorreu; e
n = número total de UAs amostradas.
Obs.: Se a linha de 10 m é subdividida em 10 trechos de 1 m cada (UAs) e a espécie
ocorreu em cinco trechos, ela tem frequência absoluta de 50%.
em que:
Considerando que a abundância pode ser avaliada por outras medidas como frequência
e área basal (KENT; COKER, 1992), Munhoz et al. (2008) utilizaram a proporção da cobertura
das espécies para obter o índice de diversidade de Shannon (H´).
Considerações Finais
Todos os métodos aqui apresentados foram utilizados em diversos estudos no mundo e já
foram comparados quanto às suas vantagens e limitações em experimentos realizados,
principalmente, em ambientes temperados na Europa (LEPŠ; HADINCOVÁ, 1992; CHYTRÝ,
2001) e nos Estados Unidos (FLOYD; ANDERSON, 1987).
O Brasil, no entanto, carece de trabalhos comparativos entre os métodos nas diferentes
formações vegetacionais. Estudos futuros devem, por exemplo, comparar as metodologias não
só quanto às suas capacidades de realizar estimativas de riqueza, de diversidade, de substituição
das espécies em amostragens repetidas, bem como quais métodos são úteis nas análises de
ordenação e classificação das comunidades de plantas. Por meio de comparações entre métodos
diferentes, podem também ser avaliados os custos, o tempo e o esforço de coleta de dados para
acessar dados estruturais, assim como o melhor método para cada tipo vegetacional. Enquanto
esses estudos comparativos não são realizados, o pesquisador, no momento da seleção de um
deles, deve levar em conta, principalmente, as características estruturais da vegetação a ser
estudada, o tempo para a realização do trabalho e a capacidade de repetição do experimento,
visto que há grande demanda de avaliações das comunidades de plantas ao longo do tempo.
Agradecimentos
Às Fundações de Amparo à Pesquisa do Distrito Federal (FAPDF) e de Minas Gerais
(FAPEMIG) e ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq),
pelo apoio aos projetos de pesquisa; ao Chesteton Ulysses O. Eugênio e à Maura Rejane A.
Mendes, pelos momentos de discussão sobre metodologias de amostragem de plantas herbáceas;
aos revisores anônimos, que muito contribuíram para a melhoria do manuscrito; e à querida
Professora Jeanine Maria Felifi Fagg (in memoriam), pelo incentivo e pela amizade.
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