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UNIVERSIDADE DO MINDELO

DEPARTAMENTO DE ENGENHARIA E RECURSOS DO MAR

CURSO DE LICENCIATURA em
ENGENHARIA EM ENERGIAS RENOVÁVEIS

RELATÓRIO DE TRABALHO DE CONCLUSÃO DE CURSO


ANO LETIVO 2016/2017 – 4º ANO

Autor: Lenira Simone Soares Gomes Sousa de Barros, N.º 3448

Orientadora: Mestre Susana Castro

Mindelo, 2018
CURSO DE LICENCIATURA EM
ENGENHARIA EM ENERGIAS RENOVÁVEIS

RELATÓRIO DE TRABALHO DE CONCLUSÃO DE


CURSO

ANO LETIVO 2017/2018 – 4º ANO

IMPLEMENTAÇÃO DE UMA UNIDADE GERADORA DE ENERGIA


ELÉTRICA A PARTIR DO BIOGÁS DE TRATAMENTO DE ÁGUAS
RESIDUAIS

AUTOR: LENIRA SIMONE SOARES GOMES SOUSA DE


BARROS

ORIENTADORA: MESTRE SUSANA CASTRO

Mindelo, 2018

iii
Lenira Simone Soares Gomes Sousa de Barros

IMPLEMENTAÇÃO DE UMA UNIDADE GERADORA DE


ENERGIA ELÉTRICA A PARTIR DO BIOGÁS DE
TRATAMENTO DE ÁGUAS RESIDUAIS

Projeto do trabalho de conclusão do


curso, apresentado à Universidade do
Mindelo como parte dos requisitos
para obtenção do grau de licenciatura
em Engenharia em Energias
renováveis.

Orientadora: Mestre Susana Castro

Mindelo, Novembro de 2018

Projeto do trabalho de conclusão do


curso, apresentado à Universidade do
Mindelo como parte dos requisitos
para obtenção do grau de licenciatura
em Engenharia em Energias
iv
renováveis.
Dedicatória

Dedico este trabalho a minha mãe, que foi meu maior apoio
nos momentos de angustia e por ser o meu pilar, que fez de
tudo para que a universidade fosse um sonho possível.

v
Agradecimentos

Agradeço primeiramente à minha mãe, Filomena Gomes, que me deu apoio e incentivo nas
horas difíceis e a minha irmã, Vânia Barros pela paciência e pela força. Sou grata também às
minhas amigas Jennifer Coelho e Sarah Freitas, que sempre estiveram comigo.

Às minhas amigas, Madile Zêgo e Sara Gomes pelo incentivo e grande ajuda com o
fornecimento de material para a realização deste trabalho.

Agradeço à minha docente, Susana Castro, responsável pela orientação desse trabalho que
me apoiou em cada etapa da pesquisa e contribuiu com as revisões do conteúdo.

Agradeço à Universidade do Mindelo, por me proporcionar um ambiente criativo e amigável


para os estudos. Sou grata a cada membro do corpo docente, à direção e à administração
dessa instituição de ensino que abriram a janela que hoje vislumbro um horizonte superior.

vi
Tenha equilíbrio e alegria.
Saiba ser reconhecido.
Procure ser humilde.
Saiba agradecer.

“Minutos de Sabedoria”

vii
Índice Principal
CAPÍTULO I................................................................................................................................................... 1

1. INTRODUÇÃO .................................................................................................................................. 1

1.1. OBJETIVOS............................................................................................................................................ 2
1.1.1. Objetivo Geral .......................................................................................................................... 2
1.1.2. Objetivos Específicos ................................................................................................................ 2
1.3. METODOLOGIA...................................................................................................................................... 2
1.4. JUSTIFICATIVA ....................................................................................................................................... 2
1.5. ESTRUTURA DO TRABALHO ....................................................................................................................... 4

CAPÍTULO II – REFERENCIAL TEÓRICO .......................................................................................................... 5

2. ESTADO DE ARTE ............................................................................................................................. 5

2.1. CONTEXTUALIZAÇÃO ENERGÉTICA .............................................................................................................. 5


2.1.1. No mundo ................................................................................................................................. 5
2.1.2. Cabo Verde ............................................................................................................................... 7

3. ESTAÇÃO DE TRATAMENTO DE ÁGUAS RESIDUAIS .......................................................................... 9

3.1. FUNCIONAMENTO DE UMA ETAR ........................................................................................................... 10


3.2. TRATAMENTOS EFETUADOS NUMA ETAR ................................................................................................. 11
3.2.1. Tratamento Preliminar ........................................................................................................... 12
3.2.2. Tratamento Primário .............................................................................................................. 13
3.2.3. Tratamento Secundário – Lamas Ativadas ............................................................................. 13
3.2.4. Tratamento Secundário – Decantação Secundária ................................................................ 15
3.2.5. Tratamento Terciário -Reutilização da água tratada ............................................................. 16

4. PRODUÇÃO DE LAMAS .................................................................................................................. 16

5. BIOGÁS .......................................................................................................................................... 20

5.1. HISTÓRICO.......................................................................................................................................... 20
5.2. ASPETOS FÍSICO-QUÍMICOS .................................................................................................................... 21
5.3. COMPARAÇÃO DO BIOGÁS COM OUTROS GASES ......................................................................................... 24
5.4. MATÉRIAS-PRIMAS ............................................................................................................................... 26

6. DIGESTÃO ANAERÓBIA .................................................................................................................. 27

6.1. PRODUÇÃO DE BIOGÁS ATRAVÉS DE LAMAS DE ETAR .................................................................................. 29


6.2. BIODIGESTORES ................................................................................................................................... 31

viii
6.3. TRATAMENTO ANAERÓBICO DE ÁGUA RESIDUAIS EM REATORES UASB............................................................ 32
6.3.2. Bio reatores de membrana anaeróbica (AnMBR) para tratamento de águas residuais ........ 36
6.3.3. Biodigestor modelo RAFA (reator anaeróbio de fluxo ascendente ......................................... 40
6.4. TECNOLOGIAS DE CONVERSÃO DO BIOGÁS ................................................................................................. 42
6.4.1. Turbinas a Gás ........................................................................................................................ 42
6.4.2. Microturbina a Gás................................................................................................................. 45
6.4.3. Motores de Combustão Interna ............................................................................................. 48
6.5. DADOS COMPARATIVOS ENTRE AS TECNOLOGIAS DISPONÍVEIS ....................................................................... 49

CAPÍTULO III – CASO DE ESTUDO ............................................................................................................... 51

7. ETAR DE SÃO VICENTE ................................................................................................................... 51

7.1. CARACTERIZAÇÃO E LOCALIZAÇÃO ........................................................................................................... 51


7.2. FUNCIONAMENTO ................................................................................................................................ 53

8. DIMENSIONAMENTO DO BIODIGESTOR ........................................................................................ 53

8.1. PROJEÇÃO .......................................................................................................................................... 53


8.2. OPERACIONALIDADE ............................................................................................................................. 58
8.3. REGRAS DE SEGURANÇA ........................................................................................................................ 60

9. CONVERSÃO DO BIOGÁS EM ELETRICIDADE .................................................................................. 61

9.1. TECNOLOGIA DE CONVERSÃO DE BIOGÁS EM ELETRICIDADE ........................................................................... 61

10. VIABILIDADE ECONÔMICA ............................................................................................................. 62

11. VIABILIDADE SÓCIO-AMBIENTAL ................................................................................................... 63

CAPÍTULO IV – DISCUSSÃO DOS RESULTADOS ........................................................................................... 64

CAPÍTULO IV – CONCLUSÃO ....................................................................................................................... 66

13. CONCLUSÃO .............................................................................................................................. 66

14. REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA ........................................................................................................ 68

ix
Índice de Figuras
Figura 1 - Repartição de energia nos países com tendência acima de 1990 – 2017 .......................... 6
Figura 2 - Esquema de funcionamento de uma ETAR ....................................................................... 10
Figura 3 - Ilustração dos tratamentos realizados numa ETAR .......................................................... 11
Figura 4 - Diagrama funcional relativo ao tratamento preliminar .................................................... 12
Figura 5 - Diagrama funcional relativo ao tratamento primário ....................................................... 13
Figura 6 - Diagrama funcional relativo ao tratamento secundário com lamas ativadas .................. 14
Figura 7 - Diagrama funcional relativo ao processo de decantação secundária............................... 15
Figura 8 - Diagrama funcional relativo ao tratamento terciário ...................................................... 16
Figura 9 - Diagrama funcional relativo ao tratamento de lamas ...................................................... 19
Figura 10 - Composição do biogás..................................................................................................... 22
Figura 11 - Relação entre o poder calorífico do biogás e percentagem em volume de metano ...... 22
Figura 12 - Peso específico do biogás (Faixa de concentração-40 A 100% de CH4) ......................... 23
Figura 13 - Equivalência energética de 1 Nm3 de biogás. ................................................................ 24
Figura 14 - Comparação entre os principais gases ............................................................................ 25
Figura 15 - Matérias-primas: fontes de resíduos .............................................................................. 26
Figura 16 - Reator UASB .................................................................................................................... 33
Figura 17 - Produção de gás e eletricidade e demanda de energia de UASB com pós tratamento de
lagoa .................................................................................................................................................. 35
Figura 18 - filtração por membrana submersa externa .................................................................... 37
Figura 19 - Filtração por membrana submersa interna .................................................................... 37
Figura 20 - Filtração por membrana de fluxo cruzado externo ........................................................ 37
Figura 21 - Módulo de membrana de folha plana submersa ............................................................ 39
Figura 22 - Módulo de membrana de fibra oca submersa ................................................................ 39
Figura 23 - Biodigestor modelo RAFA ............................................................................................... 40
Figura 24 - Detalhes construtivos de uma turbina a gás ................................................................... 43
Figura 25 - Ciclo de Brayton básico ................................................................................................... 45
Figura 26 - Detalhes construtivos de uma microturbina a gás.......................................................... 46
Figura 27 - Fotos de um motor a gás operando num sistema de cogeração .................................... 49
Figura 28 - Comparação entre as tecnologias de conversão de energia .......................................... 50

x
Índice de tabelas
Tabela 1 - Dados fornecidos e dados estimados. .............................................................................. 53
Tabela 2 - Valores dos parâmetros calculados para o dimensionamento do reator (UASB). ........... 57
Tabela 3 - Análise SWOT ................................................................................................................... 64

xi
Índice de Abreviaturas

AnMBR - Anaerobic membrane bioreactor


ANEEL - Agência Nacional de Energia Elétrica
atm - Atmosphere
B - Boro
C - Carbono
Ca – Cálcio
CBO – Carência Bioquímica de Oxigénio
Cd – Cádmio
Co - Cobalto
CQO – Carência Química de Oxigénio
Cr - Crómio
Cu - Cobre
DA – Digestão Anaeróbia

EGSB - Expanded granular sludge bed

ETAR - Estação de Tratamento de Águas Residuais


Fe - Ferro
G.E - General Electric
GEE – Gases Efeito Estufa
H – Mercúrio
H - Hidrogénio
H2O - Água
kcal - Quilocaloria
kg - quilograma
kWh – Quilowatt hora
m3 – metro cúbico
MBR - membrana
Mg – Magnésio
Mo – Molibdénio
MW – Mega Watt
xii
N – Azoto
Ni - Níquel
O - Oxigénio
P – Fósforo
PAH - Hidrocarbonetos Aromáticos Policíclicos
Pb - Chumbo
PCB - Bifenóis Policlorados)
RSU - Resíduos Sólidos Urbanos
S – Enxofre
TRH - tempo de retenção hidráulico
TRS - tempo de retenção sólido

UASB - Upflow anaerobic sludge blanket

Zn - Zinco
% - Porcento

xiii
Resumo

O trabalho tem como objetivo estudar a viabilidade teórica da geração de energia elétrica
utilizando o biogás gerado a partir do tratamento anaeróbio de águas residuais da Estação de
Tratamento de Águas Residuais (ETAR) situado na Ribeira de Vinha, sendo analisado
aspetos económicos, técnicos e ambientais relacionados com o projeto.

Em termos técnicos, pretende-se a utilização do biogás gerado através do tratamento


anaeróbio de águas residuais com possibilidade de geração de energia elétrica, utilizando
biodigestor.

Em termos económicos, será feito um estudo da viabilidade do projeto de geração de energia


elétrica e da possibilidade do uso dessa energia gerada.

Em termos ambientais espera-se que através da metodologia experimental e de recolha


bibliográfica possa ser possível a elaboração de um documento que sirva de base a futuros
projetos de valorização de águas residuais.

Palavras – chaves: águas residuais, biogás, biodigestor, energia elétrica, ETAR.

xiv
Abstract

The objective of this work is to study the theoretical feasibility of electric power generation
using the biogas generated from the station anaerobic wastewater treatment (ETAR) located
in Ribeira de Vinha, analyzing the economic, technical and environmental aspects related to
the project.

In technical terms, it is intended to use the biogas generated through the anaerobic treatment
of wastewater with the possibility of generating electric energy, using biodigester.

In economic terms, a feasibility study of the electric power generation project and the
possibility of using this energy generated.

In environmental terms, it is hoped that through the experimental methodology and


bibliographic collection it may be possible to prepare a document that will serve as a basis
for future wastewater recovery projects.

Keywords: wastewater, biogas, biodigester, electricity, ETAR.

xv
Capítulo I

1. Introdução

A aposta nas energias renováveis é estruturante para a matriz energética mundial, que desde
a revolução industrial assenta-se na utilização de combustíveis fósseis. O que ao longo do
tempo vem causando grandes impactos ambientais, poluindo e destruindo o planeta.

Mudar o paradigma da matriz energética mundial tornou-se há muito necessário. Recorrer a


recursos energéticos renováveis, limpos, sustentáveis e amigos do ambiente, é a alternativa
dos países a nível mundial. De modo a conseguir manter a satisfação da necessidade
energética da população, que cresce exponencialmente, a um preço competitivo e
ambientalmente sustentável.

O setor energético em Cabo Verde é caracterizado pela insularidade e pelo recurso


generalizado aos derivados do petróleo. Para que se evolua e se conseguia ser 100% “energia
limpa” é necessário acreditar e investir nas energias renováveis e em tecnologias que
permitam a produção de energia elétrica.

O biogás é uma fonte de energia renovável multilateral que pode substituir combustíveis
fósseis para produzir calor e energia; também pode ser usado como combustível gasoso em
aplicações automotivas. As avaliações recentes indicam que o biogás produzido por digestão
anaeróbica (DA) proporciona vantagens significativas sobre outras formas de bioenergia
porque a DA é um processo de conversão de energia eficiente e amiga do ambiente
tecnologia. (Budzianowski, 2012).

O trabalho presente aborda a produção de energia elétrica através do biogás gerado de águas
residuais.

1
1.1. Objetivos

1.1.1. Objetivo Geral

O trabalho tem como objetivo principal a análise da possibilidade de geração de energia elétrica
utilizando o biogás gerado pelo tratamento anaeróbio de águas residuais num biodigestor.

1.1.2. Objetivos Específicos

● Fazer uma revisão de literatura de alguns documentos relacionados com a geração de


energia elétrica utilizando o biogás gerado pelo tratamento anaeróbio de águas residuais;
● Compreender o processo de conversão de lamas geradas numa ETAR em biogás;
● Projetar um biodigestor para produção de biogás alimentado por lamas de ETAR.

1.3. Metodologia

O estudo presente integra-se no âmbito da investigação, na medida em que tem como objetivo
trabalhar uma situação real.
A metodologia utilizada na elaboração do trabalho foi: pesquisa bibliográfica, recolha de
dados sobre o local de pesquisa, análise e discussão dos dados recolhidos, dimensionamento
do biodigestor integrado ao local de estudo, com previsões desejadas.

1.4. Justificativa

A preservação e defesa do meio ambiente constituem dois dos principais desafios do mundo
actual, quer desenvolvido ou não, como única forma de garantir a sustentabilidade global. O
equilíbrio ecológico está em perigo desde que o homem passou a utilizar de forma irracional
os recursos da Terra.

2
Os resíduos sólidos são o maior problema ambiental de Cabo Verde, mas há outros que
podem crescer rapidamente tendo em conta as mudanças rápidas que ocorrem nos hábitos de
consumo no país.

De acordo com o Relatório de Base para Cabo Verde (2014), em Cabo Verde, prossegue-se
com o raciocínio quanto as energias renováveis para a redução do consumo dos combustíveis
fósseis, sendo que o governo adotou algumas doutrinas para o sector energético expressas no
Documento de Políticas Energéticas de Cabo Verde como forma a construir um setor
energético, seguro, eficiente e sustentável assentes em 4 pilares fundamentais:

• Segurança Energética e redução de dependência das importações – garantir a


redução da dependência das importações de energia e facilitar o acesso contínuo ao
fornecimento de energia, não obstante as incertezas e imprevisibilidades do mercado
mundial;
• Aposta nas energias renováveis – investir e adotar tecnologias de energias
renováveis e alternativas, com a consequente redução da dependência da importação
de combustíveis;
• Sustentabilidade – garantir a sustentabilidade do sector energético do ponto de vista
ambiental, sociopolítico e económico.
• Eficiência – garantir um sistema de fornecimento, distribuição e consumo de energia
adequado e eficiente em todo o país.

A motivação deste estudo foi encontrada bom base nesses pilares, pois o biogás é um
combustível explorado há muito tempo, mas recentemente que houve avanços tecnológicos
na sua exploração, continua faltando requisitos para viabilizar a sua produção e ganhar
prestígio como combustível.

O projeto propõe uma alternativa nova a ser explorada, a de produção de biogás tendo como
matéria-prima as águas residuais, utilizando o processo de digestão anaeróbica com fim de
gerar energia elétrica.

3
1.5. Estrutura do trabalho

O trabalho encontra-se dividido em cinco capítulos. No primeiro capítulo, fez-se o


enquadramento do trabalho. No segundo, elaborou-se uma breve revisão bibliográfica dos
conceitos com técnicas relacionadas as estações de tratamento de águas residuais, o biogás e
os biodigestores. No terceiro capítulo, apresenta-se o caso de estudo da ETAR, assim como
o dimensionamento do biodigestor, a tecnologia de conversão de biogás em eletricidade, a
viabilidade económica, social e ambiental. No quarto capítulo, aborda-se os resultados e as
discussões do projeto. No quinto segue-se a conclusão geral do trabalho fazendo uma
reflexão sobre o trabalho, os seus objetivos e possíveis trabalhos futuros.

4
Capítulo II – Referencial teórico

Estado de arte

2. Contextualização energética
2.1. No mundo

As alterações climáticas e a independência energética têm sido os grandes motores de toda


uma mudança no panorama internacional em relação às fontes de energia.
O consumo global de energia foi impulsionado pela recuperação na China, o maior
consumidor mundial de energia desde 2009, desencadeada pelo crescimento económico
(Enerdata, 2018).

O consumo de energia cresceu na maioria dos países asiáticos, como a Índia (taxa de
crescimento constante desde 2000), Indonésia, Malásia ou Coreia do Sul.
Aumentou pela primeira vez desde 2013 no Japão, impulsionado pelo crescimento
económico (Enerdata, 2018).

O consumo de energia permaneceu estável nos Estados Unidos pelo segundo ano
consecutivo, em parte devido à menor demanda por eletricidade e melhorias na eficiência
energética. Recuperou-se de dois anos de contração no Brasil, mas declinou no México e na
Argentina. (Enerdata, 2018)

5
Figura 1 - Repartição de energia nos países com tendência acima de 1990 – 2017

Fonte: Enerdata (2018).

O aumento significativo da população e a necessidade de expansão habitacional nas cidades


tornam necessária a preocupação com a apresentação de projetos e planos de ação para que
o saneamento básico de um município se mostre adequado, a fim de garantir um meio
ambiente saudável (Takenaka, et. Al., 2013 cit. in. Amônia).

As estações de tratamento de efluentes são sugadoras de energia. Um estudo de 2013 feito


pelo Electric Power Research Institute e Water Research Foundation relata que nos Estados
Unidos elas consomem 30 bilhões de quilowatts/ hora de eletricidade por ano, ou cerca de
0,8 porcento do total de eletricidade usada no país. (Amônia, et. Al. 2017)

A grande pegada de energia do tratamento de efluentes é irónica pois a matéria orgânica nos
efluentes contém até cinco vezes mais energia do que a estação utiliza, de acordo com o
American Biogas Council. Reduzir a pegada de energia da estação através da eficiência
energética e usar a energia desperdiçada atualmente, pode economizar dinheiro e reduzir a
emissão de gases efeito estufa (Amônia, et. Al., 2017).

Segundo Sampaio Filipe (2012), o objetivo é a obtenção de energia elétrica e térmica e o


aumento do rendimento global da instalação com o aproveitamento de todas as energias

6
disponíveis, assim como a eliminação da toxidade dos dejetos para aproveitamento como
biomassa.

A inserção do processo de digestão anaeróbica dentro das atividades humanas, trouxe como
resultado benefícios energéticos, ambientais e económicos, principalmente como decorrência
da redução de até 90% da matéria orgânica produzida, por meio da digestão anaeróbica no
mundo, confinamento dos dejetos animais e restos de cultura na ausência de oxigênio em
câmaras de fermentação, chamados biodigestores, digestores ou plantas de biogás (Sampaio,
F., 2012).

Segundo Barros, D. (2015), a cogeração é uma forma de gerar calor e eletricidade, que pode
ser feita por meio da queima de um combustível, atingindo uma eficiência global, e em alguns
casos em até 90% comparado com a energia contida no combustível. O ganho com eficiência
neste sistema proporciona a produção de uma energia elétrica confiável, com baixo custo,
ficando a unidade industrial ou comercial independente da qualidade de fornecimento do
distribuidor de energia.

2.2. Cabo Verde

Para Costa, A. (2014), o sector energético em Cabo Verde é caracterizado pelo consumo de
combustível fóssil (derivados do petróleo), biomassa (lenha) e utilização de energias
renováveis, nomeadamente a energia eólica. O consumo de combustível fóssil é constituído
pelos derivados do petróleo, a saber: a gasolina, o gasóleo, o fuel óleo, o Jet Al, o gás butano
e os lubrificantes.

O consumo da biomassa é basicamente constituído pela lenha utilizada nas zonas rurais e
periferias das cidades para a confeção de alimentos. A energia renovável, nomeadamente a
eólica, embora represente ainda uma pequena percentagem do total de energia consumida, é
utilizada principalmente na produção da eletricidade. Só a biomassa, a energia solar e a
energia eólica, com um peso em torno dos 15% do consumo bruto, podem ser considerados
energia primária (Costa, A. 2014),

7
O combustível com maior peso no consumo interno é o gasóleo, que representa cerca de 41
%, seguido da lenha outra biomassa e do fuel com 19,4% e 16% respetivamente.

Segundo Brito José (2008) estima-se que a demanda de potência instalada para a produção
de eletricidade passará de 95 MW em 2008 para cerca de 300 MW em 2020. O aumento do
consumo de energia coloca desafios de natureza estratégica e de planeamento de
infraestruturas para Cabo Verde.

As nove ilhas habitadas constituem sistemas energéticos isolados com caraterísticas próprias
de oferta e procura de energia. Os derivados do petróleo consumidos em Cabo Verde seguem
um complexo sistema de importação e redistribuição. No mercado de combustíveis operam
duas companhias a ENACOL, empresa local (com participação acionista da empresa
angolana Sonangol e da companhia portuguesa GALP) e a VIVO Energy que comercializa
produtos da Shell Internacional (Costa, A. 2014).

Cabo Verde tenciona aumentar a penetração das energias renováveis e alternativas: (vento,
sol, geotermia, gradiente de temperatura do mar, ondas do mar, detritos, biocombustível),
visando a redução da dependência dos produtos petrolíferos. Torna-se urgente diversificar as
fontes de energia face aos aumentos de preço do petróleo e seus derivados. Um dos principais
objetivos da política energética do Governo é cobrir 50 % das necessidades em energia
elétrica, até 2020, através de fontes renováveis e ter pelo menos uma ilha com 100 % de
energia renovável. (Brito, J. 2008)

De destacar a Infraestrutura Técnica de Biogás, (Lopes, J. cit. in. Costa, A.), projetada para
a produção de energia elétrica utilizando a biomassa. Em 1991 a instalação funcionou com
apenas 40% da sua capacidade por falta de matéria orgânica. Por esta razão, introduziram um
outro produto orgânico, sementes de purgueira, juntamente com os excrementos de porcos.
Com a utilização das sementes, a produção de biogás aumentou de 192 m3/dia em Dezembro
de 1991 para 495 m3/dia, em Abril de 1992. O rendimento de biogás por quantidade de

8
purgueira variava entre 0,46 e 0,53 m3/kg. A produção de energia elétrica a partir do biogás
foi cerca de 23,5% do total de energia elétrica produzida na instalação.

3. Estação de tratamento de águas residuais

Os recursos naturais estão se esgotando cada vez mais e com isso os homens devem criar
estratégias que promovam o desenvolvimento sustentável, de modo a não exceder os limites
da capacidade das futuras gerações satisfazerem as suas necessidades.

As lamas provenientes do tratamento de águas residuais constituem um resíduo como


qualquer outro. Como tal, a sua gestão deve ser otimizada ao máximo para que menos
recursos sejam consumidos com a sua valorização e que os seus potenciais impactes sejam
minimizados (Barbosa, J. 2008).

De acordo com Monte, M. (2010), o aumento das emissões de gases com efeito de estufa foi
a um máximo de 27% relativamente a 1990. Salienta-se que o anexo do Protocolo de Quioto
refere o manuseamento de águas residuais como uma das atividades emissoras de GEE (gases
efeito de estufa).

Ao longo dos anos, ouve um aumento de pesquisas e do desenvolvimento relacionado ao


tratamento e disposição do esgoto. Há também um aumento no conhecimento da taxa de
produção, métodos de caracterização, técnicas de manejo e processamento, benefícios e
riscos da utilização do lodo e também do comportamento do mesmo no meio ambiente.

A capacidade de instalação, até 2010, para a produção de energia elétrica a partir de biogás
deverá ser de 50 MW, sendo que, em 2001, era de apenas 1 MW. A fórmula de remuneração
da energia elétrica produzida a partir de recursos renováveis foi imposta um limite temporal
para a aplicação do tarifário de energia verde (de 12 anos a contar desde o início do
fornecimento de eletricidade à rede, para a valorização energética de biogás em ETAR), por

9
considerar que é o período de tempo suficiente para os promotores recuperarem os
investimentos efetuados e obterem um retorno económico mínimo (Monte, M. 2010).

3.1. Funcionamento de uma ETAR

A água é um recurso natural essencial, escasso e único a todos os seres vivos, o que a torna
um bem de extrema importância. Nos dias de hoje, o desperdício deste bem, aliado ao
aumento da sua procura, tornou-se um problema devido à decrescente disponibilidade de
água doce no nosso planeta. Todas as águas que rejeitamos depois da sua utilização para
diversos fins, designadas de águas residuais, necessitam de tratamento antes de serem
devolvidas ao meio ambiente. O seu tratamento é realizado numa Estação de Tratamento de
Águas Residuais (ETAR) e o processo de tratamento depende das suas características (Dias,
2004).

Figura 2 - Esquema de funcionamento de uma ETAR

Fonte: Dias, 2004.

10
3.2. Tratamentos efetuados numa ETAR

Os primeiros sistemas de drenagem de águas residuais em meio urbano de que existe


conhecimento datam de há mais de 5000 anos (Barreto, 2014).

Nos últimos 150 anos, teve lugar um grande progresso neste sector, provocado em parte,
pelos problemas e desafios gerados pelo crescimento populacional verificado, pelo
desenvolvimento industrial, pela concentração dos agregados populacionais no litoral e pelo
agravamento geral das condições ambientais, em especial da qualidade das águas dos meios
recetores. (Barreto, 2014).

Figura 3 - Ilustração dos tratamentos realizados numa ETAR

Fonte: Michaelis, 2009.

11
3.2.1. Tratamento Preliminar

Após a utilização das águas, as mesmas não podem ser descarregadas diretamente no meio
ambiente, o que colocaria em risco a saúde pública e a preservação dos recursos hídricos. De
modo a tratar as águas para posterior descarga no meio ambiente é então necessário recorrer
às ETAR’s. Assim sendo numa primeira fase torna-se necessária a recolha das águas
residuais (esgotos) e o seu encaminhamento para as ETAR’s, processo este que é realizado
com recurso a redes de drenagem (conjunto de coletores). O tratamento preliminar, que inclui
a obra de entrada, consiste então na primeira etapa do tratamento e é onde decorrem as
operações unitárias de gradagem, remoção de areias e desengorduramento. Nesta operação
unitária de gradagem, as águas residuais são encaminhadas através de várias grades
(mecânicas ou manuais) onde ficam depositados os resíduos sólidos com maiores dimensões.
O objetivo desta primeira fase é impedir a passagem dos resíduos para as fases seguintes, de
forma a evitar entupimentos das condutas e bloqueios de equipamentos mecânicos (Barreto,
2014).

Figura 4 - Diagrama funcional relativo ao tratamento preliminar

Fonte: Barreto, 2014.

12
3.2.2. Tratamento Primário

Apesar do esgoto apresentar um aspeto um pouco mais razoável após a etapa preliminar, as
características poluidoras ainda se encontram na água. Assim sendo dá-se início ao
tratamento propriamente dito. Nesta primeira fase denominada por tratamento primário, os
poluentes são separados da água por ação de sedimentadores primários (sedimentação). Este
processo, exclusivamente de ação física, pode em determinadas situações, ser auxiliado pela
adição de agentes químicos que por meio de uma coagulação/floculação, permitem a
obtenção de flocos de matéria poluente com dimensões mais consideráveis e mais facilmente
decantáveis. (Barreto, 2014)

Figura 5 - Diagrama funcional relativo ao tratamento primário

Fonte: Barreto José (2014).

3.2.3. Tratamento Secundário – Lamas Ativadas

Uma vez retirados os sólidos, as areias e as gorduras, a água residual segue para a fase do
tratamento secundário. O tratamento secundário é composto por processos de natureza
biológica seguidos de processos físico-químicos. (Barreto, 2014)

13
No âmbito do processo biológico pode - se recorrer a dois tipos de tratamentos diferentes:
• Aeróbicos (com presença de oxigénio), onde se podem empregar sistemas de
lamas ativadas, leitos percoladores, lagoas arejadas, biodiscos;
• Anaeróbicos (na ausência de oxigénio), podem servir-se de lagoas ou
digestores anaeróbicos.

O processo biológico trata-se de um processo aeróbico com recurso a lamas ativadas, onde
através dos microrganismos presentes no organismo e com fornecimento de oxigénio (daqui
o nome de processo aeróbico) vão utilizar a matéria orgânica como alimento, degradando-a
e eliminando-a da água residual. O oxigénio é facultado com recurso à introdução de ar nos
reatores biológicos, também denominados por valas de oxidação utilizando turbinas de
arejamento. A vala de oxidação é um tipo de reator biológico que possibilita que para além
de eliminar a matéria orgânica, eliminar o azoto, por ação do processo de
nitrificação/desnitrificação. A remoção do azoto e do fósforo (nutrientes) é importante, pois
a sua descarga no meio ambiente contribuirá para eutrofização das massas de água,
desencadeando o crescimento acelerado de algas e interferindo no equilíbrio ecológico e na
qualidade da água (Barreto, J.,2014).

Figura 6 - Diagrama funcional relativo ao tratamento secundário com lamas ativadas

Fonte: Barreto, 2014.

14
3.2.4. Tratamento Secundário – Decantação Secundária

Ainda na sequência do tratamento secundário, o processo físico-químico ocorre nos


decantadores secundários. Os flocos biológicos do processo são mais pesados do que a água
e sedimentam no fundo do decantador, ficando a água clarificada à superfície (Barreto, 2014).

As lamas que ficam depositadas no decantador são periodicamente recirculadas para a vala
de oxidação e quando em excesso, são encaminhadas para a linha de tratamento de lamas.
Esta recirculação tem em vista, o aumento da concentração de microrganismos no tanque e
consequentemente o aumento da degradação de matéria orgânica, otimizando deste modo, a
eficiência do tratamento. Nesta fase parte da água, já tratada, é lançada ao meio recetor sendo
que a outra parte segue para a etapa de tratamento terciário, com o objetivo de vir a ser
reutilizada na ETAR. (Barreto, 2014)

Figura 7 - Diagrama funcional relativo ao processo de decantação secundária

Fonte: Barreto, 2014.

15
3.2.5. Tratamento Terciário -Reutilização da água tratada

A água a reutilizar na ETAR, com utilizações na rega e nas limpezas das instalações, têm
ainda de ultrapassar mais um tratamento terciário de forma a eliminar os microrganismos e
assim garantir a segurança do pessoal afeto à instalação. Este tratamento terciário consta de
uma filtragem de modo a eliminar algumas partículas sólidas que possam existir na água,
para além disso é feita também uma desinfeção em canal com radiações ultravioletas para
eliminar microrganismos patogénicos (Barreto, 2014).

Figura 8 - Diagrama funcional relativo ao tratamento terciário

Fonte: Barreto, J.,2014.

4. Produção de lamas

Para Lopes (2002), as lamas de Estações de Tratamento de Águas Residuais são geradas em
quantidades significativas e constituem geralmente um problema em termos do seu destino
final. No entanto, quando corretamente geridas, as lamas podem representar um importante
recurso renovável. A composição das lamas de ETAR varia consoante a composição das
águas residuais, bem como com o tipo de tratamento a que são sujeitas. Este resíduo tem na
sua composição material orgânico e inorgânico, nutrientes, microrganismos, metais pesados
e alguns contaminantes.

• Matéria Orgânica

16
Os materiais orgânicos das lamas são essencialmente constituídos por hidrocarbonetos,
aminoácidos, proteínas, lípidos, e uma pequena fração correspondente a lenhina ou celulose.
Provêm, entre outros produtos, de matéria fecal, cabelos, fibras celulares, resíduos de
alimentos e produtos de higiene, óleos e gorduras;

• Nutrientes

Podem identificar-se na constituição das lamas macronutrientes como azoto (N), fósforo (P),
cálcio (Ca), magnésio (Mg), ou enxofre (S), e ainda alguns micronutrientes como o boro (B),
cobalto (Co), ferro (Fe), manganésio (Mn) e molibdénio (Mo). As concentrações de
nutrientes variam significativamente com o tipo de tratamento das águas residuais, e com o
tratamento da própria lama.

• Microrganismos Patogénicos

As lamas provenientes de ETAR são ricas em microrganismos, parte deles patogénicos,


representando um risco para a saúde pública e animais. Destacam-se entre outros bactérias,
vírus, fungos, protozoários e alguns vermes. Estes microrganismos, como qualquer ser vivo,
têm capacidade de sobrevivência a várias condições, apresentando tolerâncias distintas, o que
dificulta a sua remoção.

• Metais Pesados

As lamas de ETAR, em termos orgânicos apresentam na sua constituição componentes


húmicos (Omoike e Vanloon, 1999 cit. in. Lopes). Este tipo de matéria orgânica confere às
lamas elevada capacidade de retenção de água e de troca iónica, sendo responsável pela
retenção de metais pesados. (Stoveland e Lester, 1980 cit. in Lopes.).

Os principais metais pesados presentes nas lamas, a ter em conta devido ao seu potencial
risco, são: cádmio (Cd), crómio (Cr), chumbo (Pb), cobre (Cu), mercúrio (Hg), níquel(Ni) e

17
zinco (Zn), principalmente provenientes de efluentes domésticos, escorrências de ruas e
indústria.

• Contaminantes Orgânicos

Alguns poluentes orgânicos podem ser detetados em lamas de ETAR, como por exemplo:
PAH (hidrocarbonetos aromáticos policíclicos), proveniente da combustão incompleta ou
pirólise de substâncias orgânica; de incêndios domésticos, de instalações de produção de
energia e calor, tráfego rodoviário, incineração de resíduos e instalações industriais; PCB
(bifenóis policlorados), proveniente de pesticidas, sistemas de refrigeração, lubrificantes e
materiais sintéticos.

• Matéria Inorgânica

Em relação à constituição inorgânica das lamas, destacam-se os fragmentos metálicos


resultantes da erosão de tubagens, poeiras urbanas e industriais, bem como partículas de solos
e areia. Estão presentes ainda componentes provenientes de reagentes usados para o
condicionamento das águas residuais e das próprias lamas (óxidos, hidróxidos, sulfatos,
sulfuretos, fosfatos e silicatos).

As lamas, retiradas do processo de tratamento das águas residuais, são também sujeitas a
tratamento. O tratamento de lamas inclui duas etapas, a saber: espessamento gravítico e
desidratação mecânica em centrífuga. Na etapa de espessamento gravítico, as lamas são
conduzidas para um espessador, idêntico a um decantador, onde se vai processar a separação
entre as lamas, que são mais pesadas e a água que fica na superfície no espessador e voltando
ao início do tratamento na ETAR. As lamas obtidas através deste processo de espessamento
são desidratadas numa centrífuga de modo a retirar a maior quantidade de água possível das
lamas e consequentemente reduzir o seu volume. A lama desidratada é seguidamente
armazenada em silo e posteriormente conduzida a destino final adequado. (Barreto J. 2014)

18
Figura 9 - Diagrama funcional relativo ao tratamento de lamas

Fonte: Barreto, J.,2014.

A gestão de resíduos como as lamas de ETAR, segundo o Decreto-Lei nº 239/97 Português,


é responsabilidade do produtor, visando preferencialmente a prevenção ou redução da
produção ou nocividade dos resíduos, nomeadamente através da reutilização e da alteração
dos processos produtivos, por via de tecnologias limpas, bem como da sensibilização dos
agentes económicos e dos consumidores. Deve assegurar ainda a sua valorização, através de
reciclagem, ou a sua eliminação adequada (Barreto, J.,2014).

19
5. Biogás

O termo biogás tem origem em um processo biológico. A matéria orgânica, quando


decomposta em meio anaeróbio (ausência de oxigênio), origina uma mistura gasosa chamada
de biogás. Esse processo é muito comum na natureza e ocorre, por exemplo, em pântanos,
fundos de lagos entre outros. Por meio de diversos microrganismos, a matéria orgânica é
convertida em biogás quase por completo. Além disso, são produzidas certas quantidades de
energia (calor) e nova biomassa (Tunes, 2017).

5.1. Histórico

A descoberta do biogás, ou "gás dos pântanos" é do ano de 1667 (Classen; Lier; Stamrs, 1999
cit. in Natalie) e só um século mais tarde que se volta a reconhecer a presença de metano no
gás dos pântanos, atribuído a Alessandro Volta, em 1776. Já no século XIX Ulysse Grayon,
aluno de Louis Pasteur, realizou a fermentação anaeróbia de uma mistura de estrume e água,
a 35 °C, conseguindo obter 100 litros de gás por m3 de matéria (Natalie cit. in. Nogueira,
1986). Em 1884, Louis Pasteur, ao apresentar os trabalhos do seu aluno à Academia das
Ciências, considerou que esta fermentação podia constituir uma fonte de aquecimento e
iluminação.

Ao contrário do álcool da cana-de-açúcar e de óleos extraídos de outras culturas como o


milho e a soja, o biogás não compete por espaço com outras culturas e assim não coloca a
produção de alimentos em risco. Isso se deve ao facto de que biogás pode ser obtido através
de resíduos agrícolas, excremento de animais e de lixo orgânico como já ocorre nos chamados
aterros sanitários de grande parte dos países desenvolvidos e cuja tecnologia começa a ser
implementada em algumas cidades brasileiras, e também, de resíduos industriais. A
utilização desse gás em larga escala permitiria que a humanidade reduzisse drasticamente o
consumo de petróleo, sendo que esta redução somada à não emissão direta na atmosfera do
biogás se tomaria ferramentas contra o combate à emissão de gases de efeito de estufa e
consequentemente mitigadoras do aquecimento global (Natalie cit. in. Nogueira, 1986).

20
Há algumas décadas, o aproveitamento do biogás foi um método adotado pelos países
desenvolvidos como consequência da melhoria do tratamento dado aos resíduos orgânicos
visando uma melhoria no saneamento ambiental (Natalie cit. in. Nogueira, 1986)

As estações de tratamento que geram biogás passaram a ser tratadas como centrais de biogás,
onde o principal produto é o biogás gerado, sendo o tratamento ou saneamento visto como
subproduto. Essas centrais de biogás já são empregadas nos países desenvolvidos há mais de
30 anos, em diversas configurações e escalas, constituindo uma forma eficiente de tratamento
de resíduos orgânicos de origem doméstica, rural ou industrial e que promovem o uso do
poder energético contido no gás gerado e do alto teor de nutrientes contido no material
orgânico pós-tratamento. (Natalie cit. in. Nogueira, 1986).

Os primeiros países a utilizarem o processo de biodigestão, de forma mais intensa e com


finalidade energética foram a Índia e a China (décadas de 50 e 60), sendo que esses países e
outros, geralmente do terceiro mundo, desenvolveram seus próprios modelos de
biodigestores (Nogueira, 1986 cit. in. Natalie).

Atualmente, esse processo vem se difundindo por vários países. A recuperação de energia
gerada pelos processos de tratamento anaeróbio teve grande impulso com a crise do petróleo,
quando diversos países procuram alternativas para a sua substituição.
Posteriormente, passou-se a desenvolver e utilizar esse processo fermentativo para o
tratamento de esgoto doméstico, objetivando, principalmente, a destruição da matéria
orgânica. Isso ocorreu na metade do século XIX e o gás produzido era destinado à iluminação
(Boletim Enfoque, 1999 cit. in Natalie).

5.2. Aspetos físico-químicos

O biogás pode ser obtido na degradação da matéria orgânica, é composto principalmente por
gás metano; é um gás de efeito estufa que contribui para o aquecimento global. Na literatura
os estudos mostram que o biogás é um gás inflamável, de composição formada

21
principalmente por gás metano, inodora, incolor e insípida com mau cheiro atribuído ao gás
sulfídrico que é o componente de menor percentagem (Deublein; Steinhauser; 2008).

O biogás é uma mistura gasosa formada especialmente por metano (CH4 - em torno de50%)
e de dióxido de carbono (CO2 – acima de 30%) (Sagrillo Pereira et. al., 2015).

Figura 10 - Composição do biogás

Fonte: Adaptado de Walsh Jr. Et al, (1998); Breton et al, (2004).

O principal componente do biogás, quando se pensa em utilizá-lo como combustível, é o


metano. Segundo Alves (2000), a presença de substâncias não combustíveis no biogás, como
água e dióxido de carbono, prejudica o processo de queima tornando-o menos eficiente uma
vez que, presentes na combustão absorvem parte da energia gerada. À medida que se eleva a
concentração de impurezas, o poder calorífico do biogás torna-se menor. A figura 4.2 mostra
a relação entre o poder calorífico do biogás e a percentagem em volume de metano presente
nele.

Figura 11 - Relação entre o poder calorífico do biogás e percentagem em volume de


metano

22
Fonte: Alves, 2000.

Assim como os gases puros, as características do biogás dependem da temperatura e da


pressão, variando com elas e com o teor de humidade. O fundamental, quando se trata de
gases para fins de geração de energia é conhecer seu volume, seu poder calorífico e a própria
humidade. (Coelho et al, 2001).

O poder calorífico do biogás bruto é de cerca de 6kWh/m3 - aproximadamente meio litro de


óleo diesel, e o do gás purificado 9,5kWh/m3. O poder calorífico líquido, entretanto, depende
da eficiência dos equipamentos empregados no uso energético do gás (Coelho et al, 2001).
Outro aspeto importante a ser considerado é a humidade presente no biogás, uma vez que
tem influência direta no processo de combustão, afetando a temperatura de chama, limites de
inflamabilidade, diminuição do poder calorífico e taxa ar-combustível do biogás.

Além da humidade, o volume de biogás, representado pelo peso específico (relação entre a
sua densidade e a densidade do ar) é outro parâmetro importante quando se deseja manipular
o gás para armazenamento. A Figura mostra o peso específico do biogás numa faixa de
concentração de 40 a 100% de metano que o constitui. (Coelho et al, 2001).

Figura 12 - Peso específico do biogás (Faixa de concentração-40 A 100% de CH4)

Fonte: Ross et. al. 1996.

23
Um estudo feito por da Silva (1983) mostrou que de acordo com a quantidade de metano no
biogás o seu poder calorífico aumenta, pois o CO2, o outro produto da digestão anaeróbia, é
a forma mais oxidada do carbono, não podendo ser mais queimado. A figura a seguir, mostra
que 1 m3 de biogás (cujo poder calorífico é em média 5.500 kcal) equivale a:

Figura 13 - Equivalência energética de 1 Nm3 de biogás.

Fonte: Cardoso Filho, 2001.

O gás metano queima com uma chama luminosa; quando puro, para o biogás a chama não é
tão luminosa. O biogás não é tóxico, mas atua sobre o organismo humano, diluindo o
oxigénio e, como consequência, pode provocar a morte por asfixia. Muito estável, não é
solúvel em água. (Cardoso, 2001.)

Sob uma pressão de 140 atm, o metano se liquefaz a 0 °C, enquanto outros hidrocarbonetos
mais pesados (como os gases componentes do GLP – propano, isobutano e butano) se
liquefazem a baixas pressões (o propano se liquefaz a 8,7 atm; o isobutano a 3,2 atm e o
butano a 2,2 atm). De acordo com (da Silva, 1983 cit. in Cardoso, 2001), o biogás é mais
denso que o ar (a densidade do biogás em relação ao ar é de 0,55).

5.3. Comparação do biogás com outros gases

O gás metano, constituinte do biogás em grande proporção, pode ser apresentado como uma
importante alternativa energética, visto que, pode ser produzido através do lixo e do esgoto

24
é, praticamente, inesgotável. Portanto, o biogás pode realizar um papel significativo na
substituição do petróleo e seus derivados (Laender, 2004 cit. in. Cardoso). Na figura 4.5 são
mostradas as principais diferenças entre o biogás e os demais gases combustíveis usuais.

Existe uma importante diferença quanto à origem dos gases. Enquanto o biogás de aterro é
obtido por meio da degradação da matéria orgânica os demais gases provêm de processos
industriais, excetuando-se o gás natural que é encontrado em reservatórios de petróleo e gás
no subsolo. O GLP, como pode ser observado, é o único que possui peso molecular maior
que o do ar, resultando, em caso de vazamento, maior concentração nos níveis do solo
enquanto os demais se dispersam rapidamente (Conpet, 1997 cit. in. Cardoso).

O gás de rua é o de menor poder calorífico, necessitando então de maior quantidade de gás
quando comparado aos outros gases para liberar a mesma quantidade de energia na queima.
Segundo (Yura 2006 cit. in. Cardoso), o poder calorífico do biogás varia de 5.000 a 7.000
kcal/m³, dependendo da quantidade de metano presente na mistura.

Figura 14 - Comparação entre os principais gases

Fonte: Conpet 1997, cit. in. Cardoso.

25
5.4. Matérias-primas

A figura apresenta algumas matérias-primas capazes de gerar biogás quando submetidas ao


processo de biodigestão natural ou artificial (biodigestores).

Figura 15 - Matérias-primas: fontes de resíduos

Fonte: Gryschek e Belo 1983 cit. in. Déleo e Oliveira.

O material ou resíduo do qual o gás é um substrato devidamente equilibrado com diluição


em água, o qual é um meio para a instalação e desenvolvimento de várias espécies de
microrganismos (bactérias) envolvidos no processo de fermentação. (Gryschek e Belo, 1983
cit. in. Déleo e Oliveira).

Cada matéria-prima ou fonte de resíduos terá um potencial de geração de biogás. Resíduos


altamente fibrosos (bagaço de cana, casca de arroz), considerados de baixa digestibilidade,
apresentam potencial mais reduzido. Já materiais ricos em amido (restos de grãos ou grãos
deteriorados), proteína (restos e sangue de abatedouro), celulose (gramíneas) e hidratos de
carbono apresentam um potencial mais elevado de produção de biogás (Gryschek e Belo,
1983 cit. in. Déleo e Oliveira).

26
Para aumentar o poder calorífico, rendimento térmico e eliminar a característica corrosiva
devido à presença de gás sulfúrico e água, é preciso tratar e purificar o biogás produzido
conforme explicado nas secções seguintes (Gryschek e Belo, 1983 cit. in. Déleo e Oliveira).

6. Digestão anaeróbia

O processo biológico que dá origem à formação de biogás a partir da degradação de


compostos orgânicos é a DA. Este tipo de conversão biológica utiliza a biomassa como
matéria-prima, sendo provável que se gerem certas confusões devido à associação da palavra
biomassa a resíduos provenientes de matéria viva – animais ou plantas. A matéria orgânica é
universalmente definida como qualquer elemento vivo ou não vivo que contenha na sua
constituição carbono (C), oxigénio (O) e hidrogénio (H). Por esta razão a fração orgânica dos
resíduos sólidos urbanos (RSU) depositados em aterro é considerada biomassa. Os materiais
que não contenham na sua constituição os três elementos atrás referidos, como por exemplo
a água (H2O), são considerados matéria mineral. (Di Berardino S., 2010).

A produção de biogás através do processo de digestão anaeróbia pode ser feita a partir das
frações orgânicas existentes nas lamas provenientes de estações de tratamentos de águas
residuais (ETAR), nos RSU depositados em aterro e nos resíduos provenientes da agricultura
e da pecuária. A diferente composição da matéria-prima utilizada para produzir biogás irá ter
uma grande influência na composição final do gás formado, daí que este seja um ponto
bastante importante a ter em conta, consoante a utilização que se pretenda dar ao biogás. A
produção de biogás a partir da fração orgânica dos resíduos provenientes de atividades
industriais e agropecuárias tem tido um grande desenvolvimento nos últimos anos, podendo
mesmo vir a tornar-se num futuro próximo uma das principais fontes de produção de biogás.
(Di Berardino S., 2010).

Neste caso, o que outrora eram resíduos resultantes destas atividades económicas acabam
por se tornar subprodutos, gerando-se assim uma mais-valia através do aproveitamento dos
mesmos. Para melhorar os rendimentos e consequentemente a viabilidade dos digestores
anaeróbios instalados em sistemas agropecuários, utilizam-se atualmente como substratos

27
para a DA não só os resíduos resultantes das atividades realizadas, como também se tem
juntado a estes biomassa proveniente de culturas agrícolas produzidas com o único intuito de
fornecer substrato para utilizar na DA e consequentemente na produção de biogás. (Di
Berardino S., 2010).

A digestão anaeróbia ocorre através de bactérias que atuam na total ausência de oxigénio,
sendo estes: (Di Berardino S., 2010).

a) Hidrólise e Acidogénese

A matéria orgânica e convertida em moléculas menores pela ação de bactérias:


• Fermentativas - transformam produtos anteriores, em ácidos solúveis e
álcoois.
• Hidrolíticas - transformam proteínas em peptídios e aminoácidos;
polissacarídeos em monossacáridos.

b) Acetogénese

Nesta etapa, bactérias acetogénicas transformam os produtos do processo 1 em:


• Ácido acético (CH3COOH);
• Hidrogénio (H2); • Dióxido de Carbono (CO2).

c) Metanogénese

As bactérias metanogénicas transformam o hidrogénio (H2), o ácido acético e o dióxido de carbono


em metano (CH4). Estas bactérias são extremamente sensíveis a mudanças do meio tais como pH ou
temperatura. Existem dois tipos de processos de digestão anaeróbica;

• Digestão mesofílica - O digestor é aquecida entre 30 a 35 ºC e os resíduos ficam


tipicamente no digestor durante 15 a 30 dias. A digestão mesofílica tende a ser mais
robusta e tolerante que o processo termofilico, mas a produção de gás e menor, são

28
necessários grandes tanques de digestão e a desinfeção, se necessária, e um processo
separado;

• Digestão termofílica - O digestor e aquecido até 55 ºC durante 12 a 14 dias. Este


sistema proporciona uma maior produção de metano, maior rendimento, melhor
desinfeção de elementos patogénicos, mas requer tecnologia mais cara, maior
quantidade de energia fornecida, e um mais sofisticado grau de controlo e
monitorização.

6.1. Produção de biogás através de lamas de ETAR


As lamas são um produto inevitável do tratamento de águas residuais, proveniente
essencialmente da acumulação dos produtos em suspensão na água residual afluente,
geralmente transformados, pelos microrganismos em ação, durante o tratamento (Berco,
2013).
Segundo Eunice Moço (2012) condições de vida adequadas para as bactérias são:
• Impermeabilidade ao ar – A decomposição da matéria orgânica na presença de ar (O2)
ira produzir apenas dióxido de carbono, isto implica que o biodigestor seja totalmente
vedado.
• Temperatura – As bactérias são muito sensíveis à variação da temperatura. A faixa
ideal de temperatura para a produção de biogás e de 35 ºC a 45 ºC, sendo mais
importante a não existência de variações bruscas da temperatura.
• Alcalinidade e pH – A alcalinidade e uma medida da quantidade de carbonato na
solução (proveniente do dióxido de carbono (CO2), produzido durante a DA). Esta e
importante pois a medida que se produzem ácidos no meio, o carbonato reage com
estes, o que permite um controlo de acidez do meio. As bactérias sobrevivem numa
faixa de pH entre 6,5 e 8,0. Projeto de uma unidade produtora de biogás.
• Teor de água - O teor de água dentro do biodigestor deve variar entre 60 % a 90 %
do peso do conteúdo total.
• Nutrientes - Os principais nutrientes das bactérias são o carbono, nitrogénio e sais
orgânicos.

29
• Tempo de retenção - Dado ser este o tempo necessário para que a matéria orgânica
produza biogás, dentro do biodigestor (entre 10 a 30 dias).

Para Moço E. (2012), este processo de estabilização anaeróbia permite as lamas:

• A estabilização bioquímica;
• A destruição de parte significativa dos microrganismos patogénicos presentes nas
lamas;
• A produção de biogás;
• A limitação da emissão de odores proveniente da matéria orgânica em decomposição;
• O favorecimento da eficiência da etapa de desidratação.

Contudo este processo de estabilização anaeróbia apresentar também algumas limitações,


tais como:
• Decomposição parcial da matéria orgânica;
• As reações têm velocidades lentas, o que exige a construção de digestores volumosos
e dispendiosos;
• Produção de sobrenadante com concentrações elevadas de sólidos voláteis (SV) e
compostos azotados;
• Presença de humidade e de contaminantes no biogás, como dióxido de carbono e
sulfureto de hidrogénio;
• Presença de siloxanos voláteis no biogás, que podem danificar os equipamentos de
conversão energética (moto gerador, caldeira, etc.) pela formação de microcristais de
sílica;
• Aumento da concentração de metais pesados nas lamas digeridas, em virtude da
digestão reduzir significativamente a fração orgânica, não intervindo na fração
mineral ou não degradável.

30
6.2. Biodigestores

Para (Sganzerla 1983, p. 8 cit. in. Gonçalves E. et. al., 2002), o Bombaim é o “berço” do
biodigestor. Pela literatura pesquisada, o primeiro biodigestor posto em funcionamento
regular na Índia foi ao início deste século em Bombaim. Em 1950, Patel instalou, ainda na
Índia, o primeiro biodigestor de sistema contínuo.

Um biodigestor compõe-se, basicamente, de uma câmara fechada na qual uma biomassa (em
geral detritos de animais) é uma ferramenta anaeróbia, isto é, sem a presença de oxigénio.
Como resultado desta fermentação ocorre à libertação de biogás e a produção de
biofertilizante. É possível, portanto, definir biodigestor como um aparelho destinado a conter
a biomassa e seu produto: o biogás. Como define (Barrera 1993, cit. in. Gonçalves E. et. al.,
2002) tal aparelho, sua função é fornecer as condições propícias para que um grupo especial
de bactérias, os metanogênicas, degrade o material orgânico, com a consequente libertação
do gás metano.

Os biodigestores permitem que o dejeto seja tratado e transformado em biogás, utilizado para
produção de energia, e biofertilizante, usados nas lavouras. Adicionalmente, a captura do gás
metano gera créditos de carbono, com valor de mercado entre os países mais poluidores do
planeta, que precisam adquiri-los para compensar a “sujeira” que produzem (Gonçalves E.
et. al., 2002).

Além da economia existem outras vantagens ligadas ao desenvolvimento da tecnologia,


como por exemplo o envio de dejetos de animais para o biodigestor evita que eles sejam
jogados no meio ambiente sem tratamento, contaminando nascentes e lençóis freáticos.
Porém os principais beneficiários do equipamento são os agricultores, pelo aproveitamento
dos dejetos para a produção do biogás e o biofertilizante e o meio ambiente em geral
(Gonçalves E. et. al., 2002).

31
6.3. Tratamento anaeróbico de água residuais em reatores UASB

O processo é essencialmente baseado num regime de fluxo permitindo que o esgoto entre em
contato com um “manto de lodo” ou “leito de lama” situado no reator, e os seguintes:
separação de fase de água, lama e gás (metano). Dentro do leito de lama, a matéria orgânica
no esgoto do afluente é degradada por bactérias. No ambiente anaeróbico do reator, o metano
é formado devido a atividade bacteriana durante o processo de fermentação que pode ser
utilizado como energia fonte. Para alcançar o melhor desempenho do reator, vários
parâmetros como CQO (carência química de oxigénio), tempo de retenção necessário e
outros têm fatores que ser levados em consideração. (Technologien, 2001).
O reator UASB (Up-flow Anaerobic Sludge Blanket) representa uma importante opção para
purificação de esgoto em países com climas quentes, uma vez que atende as necessidades
básicas para uma operação sustentável de tratamento de águas residuais em países em
desenvolvimento:

• Baixos custos de investimento;


• Baixa demanda de manutenção;
• Boa performance;
• Baixa produção de lodo;
• Produção líquida de energia.

A entrada do afluente (esgoto) está situada no fundo do reator, a descarga de afluentes (águas
residuais tratadas) situa-se na parte superior do reator, forçando a entrada do esgoto a seguir
um fluxo ascendente e a entrar em contato com a manta de lodo no reator. Aqui a matéria
orgânica do esgoto está sujeita a degradação anaeróbica pelas bactérias contidas na manta de
lodo, bactérias produtoras de gás metano (CH4). São instalados dispositivos de descarga e
separação (defletores), que impedem a continuação do movimento ascendente do lodo e vai
afunda-lo de volta na cama. O gás é recolhido em suportes de gás instalados na parte superior
do reator; para o aumento do gás perto das paredes do reator, um adicional pode ser instalado
(Technologien, 2001).

32
Figura 16 - Reator UASB

Fonte: TBW, modified after cit. in. Technologien,(2001).

6.3.1.1. Parâmetros que influenciam o processo

Para a operação de um reator UASB, uma temperatura mínima do esgoto (aprox. 15 °C) e
um sistema anaeróbico ambiente são necessários para garantir que as bactérias
metanogénicas podem desenvolver sua atividade. (Technologien, 2001).

6.3.1.2. Parâmetros a serem controlados regularmente:


• Valor de pH;
• Carência química de oxigénio (CQO);
• Temperatura;
• Fluxo de águas residuais.

6.3.1.3. Outros parâmetros (Technologien, 2001)


• Ácidos Orgânicos;

33
• Concentração de amoníaco;
• Tempo de retenção;
• Velocidade de fluxo ascendente;

6.3.1.4. Operação e manutenção

Para Technologien (2001), decisão se a implementação do processo UASB pode ser


apropriado e sustentável num país específico e localização depende de vários fatores que são
muito singulares para serem listados conclusão. Alguns dados importantes de “frame” com
respeito aos requisitos do processo, operação e desempenho são no entanto dada no seguinte:
• Fase de arranque;
• Pré-tratamento;
• Desempenho de degradação;
• Pós-tratamento.

6.3.1.5. Utilização de gás

O gás produzido no processo UASB como em qualquer outro processo anaeróbico tem um
elevado potencial de aquecimento e este não deve ser libertado para a atmosfera devido às
emissões de gases de efeito de estufa e proteção climática. Se a utilização de gás não pode
ser realizado devido a infraestrutura, razões econômicas ou outras, deve ao menos ser
queimado. No entanto tem que ser considerado sob o aspetos ecológicos, bem como aspetos
econômicos. (Technologien, 2001).
A utilização do gás é possível, e para vapor, armazenamento a frio ou aplicação doméstica -
geralmente implementado no contexto de usinas comunitárias UASB menores - ou em
cogeração unidades para a produção de eletricidade que pode cobrir parte do próprio
(ambiente de processo e planta) demanda ou para alimentar a rede pública ou consumidores
vizinhos. (Technologien, 2001).
A figura 17 mostra valores aproximados para a taxa de produção de gás de anaeróbio
tratamento de águas residuais e a demanda média por energia de processo UASB.

34
Figura 17 - Produção de gás e eletricidade e demanda de energia de UASB com pós
tratamento de lagoa

Fonte: (Technologien, 2001).

6.3.1.6. Utilização de produtos

Dadas as etapas apropriadas de pós-tratamento, as lamas e águas residuais purificadas são


produtos finais do tratamento de águas residuais anaeróbias para além do biogás produzido
durante a degradação metanogénica. Estes processos que podem ser reutilizados para
diferentes fins:
• Lodo → fertilizante ou condicionador do solo.
• Águas residuais tratadas → irrigação ou hidratação do substrato. O lodo é geralmente bem
estabilizado, patógeno. A aplicação, no entanto, depende da respetiva higiene requisitada. Há
que se ter cuidado, especialmente na utilização para agricultura; irrigação para culturas
alimentares destinadas ao consumo humano deve ser evitado.

6.3.1.7. Construção

Segundo Technologien (2001).São possíveis alternativas relativas à construção dos reatores


UASB, sendo as principais diferenças da forma do reator e do projeto de limpeza (3 fases),
na entrada e saída:
• Forma do reator;
• Separador de fase;
• Sistema de Influência e Distribuição.

35
6.3.2. Bio reatores de membrana anaeróbica (AnMBR) para tratamento de águas
residuais

Uma das tecnologias para atender os tais requisitos é a diferença anaeróbica que pode
converter o CBO de resíduos em biogás utilizável, reservar nitrogênio e fósforo úteis para
recuperação adicional e requerer energia mínima para operar. No entanto, a eficiência da
digestão anaeróbica tem sido amplamente limitada pela taxa inerente do crescimento lento
dos microrganismos anaeróbios, que resulta em um grande volume de reator necessário para
o tratamento de águas residuais por digestão aeróbica. Uma das soluções avançadas para
melhorar a eficiência do tratamento anaeróbio é integrar o reator de tratamento de efluentes
anaeróbios com o processo de filtração por membrana para formar um sistema de bio reator
de membrana anaeróbico. Neste sistema, o processo de filtração por membranas pode separar
as águas residuais tratadas da biomassa anaeróbica e, ao mesmo tempo, reter a concentração
de biomassa no bio reator anaeróbio a um nível desejado (Technologien, 2001).
Embora o conceito de AnMBR tenha sido desenvolvido na década de 1980, as aplicações da
tecnologia de membrana anaeróbica foram limitadas pelas preocupações com a incrustação
da membrana no ambiente anaeróbico, o consumo de energia dos processos de membrana e
a pré-mamada, tecnologia de filtragem de membranas de tratamento de águas residuais em
larga escala. No entanto, com o sucesso da tecnologia MBR nos últimos anos, os sistemas de
filtragem de membrana em larga escala tornaram-se uma tecnologia comprovada com
estratégias eficazes para o projeto, operação e manutenção do processo de membrana
desenvolvidos para as aplicações biológicas de tratamento de águas residuais (Technologien,
2001).
O bio reator de membrana anaeróbica é um sistema integrado do bio reator anaeróbio e da
filtração por membranas de baixa pressão ou microfiltração.
Uma vez que as membranas microfiltração / ultrafiltração podem reter fisicamente entre os
dois, incluindo biomassa suspensa e sólida inerte, o AnMBR pode alcançar a separação
completa do tempo de retenção sólido do tempo de retenção hidráulica, independentemente
das características das águas residuais, condições do processo biológico e propriedades do
lodo.

36
A filtração por membrana pode ser integrada com bio reatores anaeróbios em três formas
diferentes: a filtração por membrana submersa interna (A), a filtração por membrana
submersa externa (B) e a filtração por membrana de fluxo cruzado externo (C).

Figura 19 - Filtração por membrana submersa Figura 18 - filtração por membrana submersa
interna externa

Figura 20 - Filtração por membrana de fluxo cruzado externo

Fonte: (Technologien, 2001).

37
6.3.2.1. Desempenho de Filtração de Membrana no AnMBR

Um dos principais parâmetros de projeto e operação da filtração por membranas é o fluxo de


operação, que afeta diretamente os custos de capital e operação dos AnMBRs. O fluxo do
projeto do processo de membrana determina a área de superfície da membrana ou o número
de módulos de membrana necessários para tratar um certo fluxo de esgoto. O número de
módulos de membrana instalados afetará ainda mais o tamanho do tanque de membrana, a
tubulação e o consumo dos produtos químicos usados para a limpeza da membrana. O fluxo
de projeto de AnMBRs, no qual uma operação estável deve ser atingida, deve ser
determinado com base em testes de prazo relativamente longo. (Technologien, 2001).

6.3.2.2. Tipos de bio reatores anaeróbios

O bio reator anaeróbico pode ser a mistura completa, o lodo anaeróbico de fluxo ascendente
(UASB), o lodo granular expandido cama, os reatores anaeróbios de leito fluidizado e outros
tipos de reatores anaeróbios (Technologien, 2001).
O bio reator anaeróbico de mistura completa é um bio reator anaeróbico convencional. Sem
junção à filtração por membranas, este pode ser adequado apenas para a digestão de sólidos,
lodo ou para o tratamento de águas residuais de pequena escala porque sua baixa capacidade
de carga orgânica pode resultar em um grande volume de reator para o tratamento de um
grande fluxo de esgoto, que se torna economicamente inviável. O UASB e EGSB podem
dissociar o TRH do TRS através do crescimento de biomassa densa para evitar a lavagem da
biomassa sob uma condição TRH curta, enquanto os reatores de bio filme do leito fluidizado
através de crescimento anexado para reter a biomassa no sistema (Technologien, 2001)
A integração dos bio reatores anaeróbios de alta taxa com a filtração da membrana pode
melhorar ainda mais a qualidade do efluente e a estabilidade operacional.
Um dos principais componentes de um sistema AnMBR é o sistema de filtração por
membrana, composto por dois módulos de filtração de membrana diferentes: os módulos de
membrana pressurizados de fluxo cruzado e a filtração de membrana submersa, que podem
ser usados em AnMBRs. A filtração por membrana de fluxo cruzado externo geralmente usa

38
a placa convencional e a fibra oca cilíndrica configurações de carro-tridge. Em tal sistema, o
fluxo cruzado líquido é usado para gerar o corte da superfície para controlar a incrustação da
membrana. O fluxo de permeado é acionado pela pressão gerada pelo fluxo cruzado ou obtido
pela sucção da bomba. Os módulos de membrana imersos ou submersos têm sido
amplamente utilizados nos processos de membrana aeróbica. Os módulos de membrana
imersa incluem os módulos de membrana de folha plana submersa e os módulos de
membrana de fibra oca submersa (Technologien, 2001).

Figura 21 - Módulo de membrana de folha plana submersa

Figura 22 - Módulo de membrana de fibra oca submersa

(Technologien, 2001).

39
6.3.3. Biodigestor modelo RAFA (reator anaeróbio de fluxo ascendente

O biodigestor modelo RAFA, cuja sigla original é UASB foi desenvolvido por Lettinga. É
um biodigestor com retenção interna de lodo, com a incorporação de um separador diferente
para os sólidos suspensos e para o gás (Lettinga et al., 1980 cit. in. Pecora).

Figura 23 - Biodigestor modelo RAFA

Fonte: Adaptação de Vitoratto, 2004 cit. in. Pecora.

Esse biodigestor, de certa forma, revolucionou a área de tratamento de efluentes, pois passou
a oferecer muitas vantagens que até então não se tinha, como baixo custo operacional, baixo
consumo de energia, maior estabilidade do processo, entre outras (Hirata et al., 1986 cit. in.
Pecora).

Este tipo de biodigestor vem sendo empregado para o tratamento de esgoto doméstico. Sua
eficiência tem sido demonstrada para esgoto bruto, tanto à temperatura controlada (Vieira et
al., 1987 cit in Pecora) quanto sem controlo de temperatura (Barbosa, 1988 cit. in. Pecora).

40
O princípio do biodigestor RAFA baseia-se no fluxo ascendente do efluente a ser tratado, o
qual é alimentado pelo fundo do reator e atravessa um leito de biomassa ativa, sendo
descartado após passar por um sistema de placas defletoras colocadas no topo do biodigestor,
separando as fases líquida, sólida e gasosa (Barbosa, 1988 cit. in. Pecora).

O decantador interno permite que as partículas de lodo retornem à zona de digestão,


assegurando o tempo de retenção adequada de sólidos 1e a obtenção de altas concentrações
de lodo anaeróbio no biodigestor (Barbosa, 1988 cit. in. Pecora).

O biodigestor RAFA, dotado de um sistema apropriado de distribuição da vazão de


alimentação, dispensa a recirculação do efluente para fins de fluidificação, pois o contato
necessário entre a água residual e o lodo é eficiente, uma vez que o próprio gás gerado no
seio da manta de lodo é suficiente para manter o lodo fluidizado e garantir um bom nível de
mistura (Vitoratto, 2004 cit. in. Pecora).

O volume deste tipo de biodigestor, em relação a outros, é sensivelmente menor, o que o


torna extremamente eficiente, em virtude da retenção do lodo por períodos longos (semanas,
meses ou até mesmo anos), enquanto o tempo de retenção da parte líquida pode ser baixo
(horas).

Para o dimensionamento de um biodigestor modelo RAFA, emprega-se os seguintes


parâmetros (Vitoratto, 2004 cit. in. Pecora):
• Carga Orgânica Aplicada:
➢ Para despejos concentrados – valor máximo de 6 a 8 kg DQO2/m3dia;
➢ Para despejos com baixa concentração, em torno de 1,5 kg DQO/m3dia.

• Altura do Biodigestor:
➢ Para despejos concentrados – máxima altura de 5 a 6 m;

1
É o tempo de demora
2
Corresponde à quantidade de oxigênio consumido na degradação da matéria orgânica no meio aquático por
processos biológicos

41
➢ Para despejos com baixa concentração – de 3 a 4 m.

• A distribuição de fundo do biodigestor deve ser a mais uniforme:


➢ Para despejos com alta concentração – 7 a 10 m2;
➢ Para despejos com baixa concentração – 1 a 3 m2.

• Saída do Líquido:

• A saída do líquido ocorre pela parte superior, fluxo ascendente e deve ser a mais
uniforme possível. Recomenda-se vertedores reguláveis para o ajuste do fluxo do
líquido. (Vitoratto, 2004 cit. in. Pecora).

6.4. Tecnologias de conversão do biogás

As tecnologias de geração e cogeração de energia, que é a geração combinada de eletricidade


e calor a partir de uma mesma fonte primária de energia segundo (Balestieri 2002 cit. in.
Júnior), estão bem desenvolvidas e suficientemente comprovadas com diversos sistemas
disponíveis, cobrindo os diferentes combustíveis e uma vasta gama de potências.

Alguns dos principais equipamentos utilizados em centrais para o aproveitamento energético


do biogás são as turbinas, as microturbinas e os motores (ciclo Diesel ou Otto), os quais serão
destacados a seguir (Júnior, 2008).

6.4.1. Turbinas a Gás

As turbinas a gás são equipamentos térmicos que realizam a conversão de energia de um


combustível em potência. A característica principal deste equipamento é a produção de gases
de exaustão em grandes volumes e a temperaturas elevadas, o que o torna muito adequado
aos aproveitamentos energéticos complementares de interesse, melhorando-se desta forma o
rendimento térmico do conjunto (Júnior, 2008).

42
Geralmente as turbinas a gás são a denominação do seu conjunto completo formado por três
componentes principais: o compressor de ar, uma câmara de combustão e a turbina
propriamente dita (Júnior, 2008).

Figura 24 - Detalhes construtivos de uma turbina a gás

Fonte: Júnior, 2008

O compressor é acionado pela própria turbina. Inicialmente o ar é comprimido pelo


compressor elevando a pressão, em seguida é misturado ao combustível na câmara de
combustão. Essa mistura é assim queimada sob uma pressão constante, em regime contínuo,
aumentando a temperatura dos gases e introduzindo, desta forma, a energia primária no
sistema. Os gases de combustão resultante da queima são expandidos na turbina
transformando sua energia térmica em energia mecânica, parte dessa energia é utilizada para
acionar o compressor (Júnior, 2008).

As turbinas a gás são acionadas pelos próprios gases quentes produzidos na combustão, o
que não necessita da utilização de um fluido de trabalho intermediário, como o vapor ou outro

43
fluido. Isto leva a unidades mais compactas, para os mesmos níveis de produção de potência,
as quais têm ainda a vantagem de funcionar com vários tipos de combustíveis, tais como gás
natural, querosene e gases oriundos de processo de gaseificação do carvão e da biomassa
(Júnior, 2008).

As principais características que os combustíveis gasosos devem ter são:

• Não formar cinzas na combustão, que se depositam nas palhetas das turbinas e
interferem na operação;
• Não conter materiais erosivos;
• Não conter compostos que provocam corrosão das palhetas das turbinas.

Trata-se de um equipamento com alta disponibilidade, ou seja, necessita de pouco tempo de


parada. Sistemas de cogeração baseados em turbinas a gás de vários tipos e porte estudados
por Lautman 1993 cit. in. Júnior apresentam um fator de disponibilidade na faixa entre 90 a
96 % (Júnior, A., 2008).

As centrais baseadas em turbinas a gás se caracterizam pela rapidez de entrada em


funcionamento. O tempo necessário para a turbina atingir novamente o regime em plena
carga é de 6 a 8 minutos em regime de emergência e de 15 minutos em condições normais
de operação conforme a Agência Nacional de Energia Elétrica - ANEEL (1998) (Júnior, A.,
2008).

As turbinas a gás possuem fácil manutenção e controle, permitindo, inclusive, controle


automático e podem ser classificadas de várias formas, dentre as formas que se apresentam,
podem ser citadas as turbinas para geração estacionária que foram desenvolvidas a partir das
turbinas usadas em aviação (Júnior, A., 2008).

A figura 5.8 mostra um ciclo da turbina a gás, também conhecido como Ciclo de Brayton
básico (Júnior, A., 2008).

44
Figura 25 - Ciclo de Brayton básico

Fonte: Júnior António (2008).

Neste ciclo, o ar é aspirado pelo compressor e enviado à câmara de combustão, onde é


misturado com o combustível. Como produtos do processo de combustão surgem gases a
altas temperaturas, que são encaminhados à turbina, onde são expandidos, gerando trabalho
mecânico. O eixo da turbina é conectado ao compressor e ao gerador elétrico, de maneira que
trabalho mecânico gerado pela expansão dos gases de combustão aciona tanto a compressão
do ciclo quanto à geração de trabalho (Van Wylen et al., 1995 cit. in. Júnior, A. 2008).

O rendimento do ciclo Brayton é de aproximadamente 35 %, mas, atualmente existem


turbinas, como a LM6000 de 46.000 kW da G.E. (General Electric), por exemplo, que
possuem um rendimento de 41,9 % segundo Pecora (2006).

6.4.2. Microturbina a Gás

O termo “microturbina” refere-se a um sistema de dimensões reduzidas, composto por:


compressor, câmara de combustão, turbina e gerador elétrico de potência inferior a 250 KW.
Para potências situadas entre 250 e 1.000 KW, a denominação usual é de mini-turbina
(Júnior, 2008).

45
A maioria das microturbinas existentes no mercado tem como função principal produzir
eletricidade, podendo funcionar em cogeração utilizando equipamento adicional. As
modernas microturbinas a gás representam uma tecnologia de ponta extremamente
apropriada à micro-cogeração, operando com ciclo Brayton, ou seja, utilizando o mesmo
princípio de funcionamento das turbinas a gás de maior porte. Este tipo de cogeração permite
reduzir consideravelmente o consumo de energia primária, em comparação à geração típica
de calor e eletricidade. A figura 26 mostra a vista em corte de uma microturbina a gás (Júnior,
2008).

Figura 26 - Detalhes construtivos de uma microturbina a gás

Fonte: Júnior António (2008).

O ar atmosférico entra no compressor, onde sua pressão é elevada e em seguida é comprimido


e vai para câmara de combustão, onde o combustível é injetado e se mistura com o ar. Por
meio de queimadores ocorre a inflamação dessa mistura (ar-combustível). Os gases
aquecidos em alta pressão são então expandidos através das pás da microturbina em questão,
fazendo com que esta gire em alta velocidade. No mesmo eixo do compressor é montada a
turbina de expansão e o gerador elétrico. A turbina de expansão é responsável por fornecer a

46
energia necessária para girar o compressor e o gerador elétrico (ciclo completo) (Júnior,
2008).

Referindo-se a sistemas estacionários, os gases, depois da expansão na turbina, ainda contém


uma grande quantidade de energia térmica, podendo esta ser utilizada em trocadores de calor
para, dependendo do sistema, produzir frio ou vapor de processo, caracterizando um ciclo de
cogeração (Júnior, 2008).

A maioria das microturbinas funciona a gás natural, mas pode-se utilizar, também, gasolina,
óleo combustível, álcool, querosene e propano (Júnior, 2008).

Segundo Júnior António (2008), o biogás, gerado em estações de tratamento de esgoto


urbano, geralmente está a uma pressão muito baixa, com isto é necessária a adição de um
compressor ao conjunto, quando a pressão de alimentação do combustível não for suficiente.

Dentre as vantagens de um sistema de micro-cogeração de energia podem ser destacadas as


seguintes: (Júnior, 2008).

• Fácil manutenção, implicando menores tempos de parada;


• Arranque relativamente rápido;
• Grande confiabilidade;
• Sistema compacto e relativamente isenta de vibrações, exigindo menos despesas em
termos de estruturas, fundações e isolamentos acústicos;
• Não necessita de vigilância constante; disponibilidade de energia térmica a
temperaturas elevadas;
• Redução significativa da emissão de poluentes e particularmente do CO2.

Dentre as desvantagens de um sistema de micro-cogeração de energia podem ser destacadas


as seguintes:

• Uso menos atrativo em processos com poucas necessidades térmicas;

47
• Tempo de vida útil relativamente curto.

6.4.3. Motores de Combustão Interna

Os motores de combustão interna são máquinas que transformam a energia térmica de um


combustível líquido ou gasoso em energia mecânica através do acionamento de pistões
confinados em cilindros. O aproveitamento do calor ocorre com a utilização da energia
contida nos gases de exaustão e/ou nos fluidos de refrigeração e lubrificação. A quantidade
de calor recuperada depende do tipo e porte do motor e de seu regime operacional. O calor
que precisa ser rejeitado dos óleos lubrificantes e do fluido de refrigeração é limitado à
produção de água quente (Júnior, 2008).

Já os gases de escape podem ser aproveitados diretamente ou serem conduzidos à caldeira de


recuperação para gerar vapor. Esses motores são divididos em dois tipos de ciclos: Otto e
Diesel (Júnior, 2008).

Os motores de combustão interna podem utilizar combustíveis gasosos (gás natural, propano,
butano, biogás, gás de síntese, nafta química, entre outros), líquidos (álcool, gasolina, diesel,
biodiesel, entre outros) e ainda misturas de combustíveis gasosos com líquidos em
proporções que permitam a autoignição (Júnior, 2008).

Para a utilização de gases como combustível, o ciclo Otto é o mais recomendável. Nestes
casos, misturando o gás com o ar em determinadas proporções e a uma pressão e temperatura
pré-estabelecidas. No entanto, pode-se utilizar o gás em equipamentos de ciclo Diesel desde
que o combustível inserido na câmara de combustão seja uma mistura de gás com 3 a 5 % de
diesel. Estes equipamentos são conhecidos como bi-fuel ou dual-fuel, em função do modo
em que são executadas as misturas de combustíveis. Nestes sistemas, é necessário recorrer
ao uso de compressores de elevada potência, de modo a criar as elevadas pressões de gás
necessárias à injeção deste nas câmaras/cilindros de combustão (Júnior, 2008).

48
Na figura 27 são mostradas fotos de um motor a gás integrado a um gerador de eletricidade
e um sistema de coleta de gases de escape para geração de vapor (Júnior, 2008).

Figura 27 - Fotos de um motor a gás operando num sistema de cogeração

Fonte: Júnior, A. 2008

As principais vantagens da cogeração de energia por meio de motores a gás são as seguintes:
• Arranque rápido;
• Fácil adaptação a variações das necessidades térmicas;
• Elevada eficiência mecânica;
• Não necessita de vigilância constante.

As principais desvantagens da cogeração de energia por meio de motores a gás são as


seguintes:
• Tempo de vida útil curto;
• Baixo rendimento térmico;
• Custos de manutenção elevados devido à necessidade de paradas frequentes. (Júnior,
A.,2008).

6.5. Dados comparativos entre as tecnologias disponíveis

49
Na figura 28 são mostrados dados comparativos entre as tecnologias de conversão
disponíveis comercialmente e os rendimentos e emissões de NOx em partes por milhão
(ppm), segundo dados do Centro Nacional de Referência em Biomassa. (Cenbio, 2004).

Figura 28 - Comparação entre as tecnologias de conversão de energia

Fonte: Cenbio (2004).

50
Capítulo III – Caso de Estudo

7. ETAR de São Vicente

7.1. Caracterização e localização

A estação de tratamento de águas residuais (ETAR) de São Vicente fica na Ribeira de Vinha
e é composta por duas linhas de entrada de afluentes em que o objetivo principal é o
tratamento das águas residuais provenientes da rede pública dos esgotos da cidade e arredores
de Mindelo para fins agrícolas.

O efluente da ETAR é utilizado na rega de parques e jardins da cidade e arredores e na


agricultura conforme as espécies devidamente identificadas de acordo os parâmetros
analíticos.

Ambas as linhas de tratamento possuem uma obra de entrada, com uma caixa de receção de
afluente e um canal Parshall3, o tratamento preliminar, nomeadamente a remoção de
gradados, que é efetuado numa estação elevatória. No interior das instalações da ETAR existe
ainda uma estação elevatória, para fornecimento da água residual tratada da ETAR até aos
reservatórios situados no perímetro agrícola de Ribeira de Vinha, e um laboratório para
análises físicas, químicas e bacteriológicas.

3 Dispositivo de medição de fluxo de canal aberto que foi desenvolvido para medir o fluxo de águas superficiais
e fluxos de irrigação. É uma estrutura hidráulica fixa usado para medir a vazão volumétrica em descargas
industriais, linhas de esgoto municipais e fluxos de afluentes / efluentes em estações de tratamento de águas
residuais.

51
Figura 29 - Distância entre a cidade do Mindelo e a ETAR

Figura 30 - ETAR de São Vicente

Fonte: Google Earth.

52
7.2. Funcionamento

A primeira linha de tratamento da ETAR (linha antiga) foi construída em 1987. Trata-se de
um sistema por lagunagem, constituído por duas lagoas anaeróbias paralelas, uma lagoa
facultativa, três lagoas de maturação e uma lagoa de armazenagem. Atualmente, esta linha
de tratamento da ETAR recebe o efluente da cidade do Mindelo, que é elevado por quatro
estações elevatórias da cidade (Comando Naval, Caizim, Campim e Ribeira de Julião), com
um caudal médio total de cerca de 1700 m3/dia (20 l/s), isto é, 22 000 habitantes equivalentes
em termos de caudal, se assumir uma capitação média de água de 80 l/(hab/dia).
Em 2007 procedeu-se à ampliação da ETAR, com a construção de uma segunda linha de
tratamento (linha nova), constituída igualmente por duas lagoas anaeróbias, duas lagoas
facultativas e quatro lagoas de maturação. Essa segunda linha recebe, os afluentes da zona
do Lazareto e da conserveira FRESCOMAR após o pré-tratamento na ETAR privada.

8. Dimensionamento do biodigestor

8.1. Projeção
Os cálculos de dimensionamento, a partir de dados secundários, de um reator UASB em
escala real estão demonstrados nas equações seguintes. Os dados obtidos para o
desenvolvimento do trabalho estão esquematizados na seguinte tabela nº 1.

Tabela 1 - Dados fornecidos e dados estimados

Dados: Valores
Qmédia 1700(m³/dia) – valor fornecido pela ETAR
K1 1,2 – Valor recomendado pela NBR 9649
K2 1,5 – Valor recomendado pela NBR 9649
C 0,002 (Kg/m³) - Valor estimado feito com base na dimensão da ETAR
TDH 8 (horas) - Valor recomendado
So 0,59 (KgDQO/m³) - Valor estimado feito com base na dimensão da ETAR
V 0,6 (m/h) - Valor recomendado

53
𝜋 3,14

Segundo Capassi et al. (2013), a vazão máxima é calculada em função de dois coeficientes
de maior consumo e da vazão média afluente, como segue:

[1] - Qmáxima=K1*K2*Qmédia
Qmáxima = 1,2* 1,5* 1700 (m³/dia) = 3060 (m³/dia)

Onde:
Qmáxima: vazão máxima afluente (m³/dia)
Qmédia: vazão média afluente (m³/dia)
K1 = coeficiente do dia de maior consumo 4(1,2)
K2 = coeficiente da hora de maior consumo 5(1,5)

Os valores de K1 e de K2 antes apresentados (1,2 e 1,5) são os recomendados pela NBR


96496 (ABNT, 1986).
A estimativa das concentrações diária de CQO 7e CBO8 no afluente são obtidas a partir da
igualdade entre ambos, ou seja:

[2] - Cdiária=Qmédia*C
Cdiária = 1700 (m³/dia) * 0.002 (Kg/m³) = 3,4 (Kg/dia)

Onde:
Cdiária: concentração diária de CQO ou CBO no afluente (Kg/dia)
Qmédia: vazão média do afluente (m³/dia)

4
É a relação entre a descarga que ocorre entre a média do dia e a média do ano.
5
É a relação entre a descarga que ocorre entre a média da hora máxima e da média do dia.
6
Norma técnica utilizada em projetos de coletores sanitários.
7
Carência química de oxigénio - Quantidade total de oxigénio necessário para oxidar toda a matéria orgânica
(matéria orgânica inerte, e biologicamente disponível), e transformá-la em dióxido de carbono, em água, e em
matéria inorgânica oxidável.
8
Carência bioquímica de oxigénio - Quantidade de oxigénio consumido por micro-organismos aeróbicos
durante a decomposição de matéria orgânica, numa amostra de água.

54
C: concentração de CQO ou CBO (Kg/m³)

O tempo de detenção hidráulica (TDH) varia conforme a temperatura do ambiente, sendo


mais utilizado na faixa de 8 a 10 horas. Considerando uma a temperatura média anual em
torno de 23ºC o TDH recomendado é de 8 horas.
Consequentemente, o volume é calculado em função do tempo de detenção hidráulica do
sistema, logo:

[3] - V=TDH*Qmédia
V = 8 (h) *70,8 (m³/h) = 566,4 (m³)

Onde:
V: volume total do reator (m³)
TDH: tempo de detenção hidráulico (h)
Qmédia: vazão média afluente (m³/h)
*Como o valor da vazão média está expresso em m3/dia, fiz a transformação de dia para hora.

A carga hidráulica volumétrica (CHV) é a quantidade (volume) de esgotos aplicados


diariamente ao reator, por unidade de volume dos mesmos (CHERNICHARO, 2007 cit. in.
Capassi et al.), dada da seguinte forma:

[4] - CHV=Qmédia /V
CHV = 1700 (m³/h) /566,4 (m³) = 3 (m³/m³.d)

Onde:
CHV: carga hidráulica volumétrica (m³/m³.d)
Qmédia: vazão média afluente (m³/dia)
V: volume total do reator (m³)

A carga orgânica volumétrica (COV) é a quantidade (massa) de matéria orgânica aplicada


diariamente ao reator, por unidade de volume do mesmo:

55
[5] - COV=Qmédia ∗So/V
COV=1700 (m³/h) *0,59 (KgDQO/m³) /566,4 (m³) = 1,77 (KgDQO/m³.d-1)

Onde:
COV: carga orgânica volumétrica (KgDQO/m³.d-1)
Qmédia: vazão média afluente (m³/dia)
V: volume total do reator (m³)
So: concentração de substrato afluente (KgDQO/m³)

O TDH da vazão máxima é calculado através da equação abaixo:

[6] - TDHQmáxima=V/Qmáxima
TDHQmáxima=13600 (m³) /3060 (m³/dia) =4,44 (horas)

Onde:
DHQmáxima: tempo de detenção hidráulico da vazão máxima (horas)
V: volume total do reator (m³)
Qmáxima: vazão máxima afluente (m³/dia)

A velocidade de escoamento pode variar de 0,5 m/h a 0,7 m/h, contudo a velocidade adotada
será um valor médio de 0,6 m/h, dessa maneira, é possível calcular a altura do reator UASB
em função da velocidade de escoamento:

[7] - 𝐻=𝑣∗𝑇𝐷𝐻
H= 0,6 (m/h) * 4,44 (horas) =2,664 (m)

Onde:
H: altura (m)
v: velocidade (m/h)
TDH: tempo de detenção hidráulico (horas)

56
Da mesma forma, é possível calcular a área total do reator, de acordo com a equação abaixo:

[8] - A= v /H
A= 0,6 (m/h)/2,664 (m)=1,598 (m2)

Onde:
A: área útil do reator (m²)
H: altura (m)
v: velocidade (m/h)

Em função da área, tem-se o diâmetro do reator:

[9] - A= 𝜋*d2/4
1,598 (m2) =3,14*d2/4 <=> d2= 1,598 (m2)/ 3,14*4 <=> d=√2,032 =1,42 (m)

Onde:
A: área útil do reator (m²)
d: diâmetro do reator (m)

Tabela 2 - Valores dos parâmetros calculados para o dimensionamento do reator


(UASB)

Parâmetros para dimensionamento do reator (UASB) Valores


Qmáxima 3060 (m³/dia)
Cdiária 3,4 (Kg/dia)
V 566,4 (m³)
CHV 3 (m³/m³.d)
COV 1,77 (KgDQO/m³.d-1)
TDHQmáxima 4,44 (horas)
H 2,664 (m)

57
A 1,598 (m2)
d 1,42 (m)

Figura 31 – Legenda do biodigestor UASB com as medidas calculadas.

d = 1,42 m
H = 2,664 m2
CVO=1,77 (KgDQO/m³.d-1)
CHV = 3 (m³/m³.d)

A = 1,598 m2

8.2. Operacionalidade

A água residuária, que segue uma trajetória ascendente dentro do reator, desde a sua parte
mais baixa, atravessa a zona de digestão escoando a seguir pelas passagens do separador de
fases e alcançando a zona de sedimentação. (van Haandel e Lettinga, 1994 cit. in. Pontes).

A água residuária após entrar e ser distribuída pelo fundo do reator UASB, flui pela zona de
digestão, onde se encontra o leito de lodo, ocorrendo a mistura do material orgânico nela

58
presente com o lodo. Os sólidos orgânicos suspensos são quebrados, biodegradados e
digeridos através de uma transformação anaeróbia, resultando na produção de biogás e no
crescimento da biomassa bacteriana. O biogás segue em trajetória ascendente com o líquido,
após este ultrapassar a camada de lodo, em direção ao separador de fases. (van Haandel e
Lettinga, 1994 cit. in. Pontes).

No separador de fases, a área disponível para o escoamento ascendente do líquido deve ser
de tal forma que o líquido, ao se aproximar da superfície líquida livre, tenha sua velocidade
progressivamente reduzida, de modo a ser superada pela velocidade de sedimentação das
partículas, oriundas dos flocos de lodo arrastados pelas condições hidráulicas ou floculação.
Isto possibilita que este material sólido que passa pelas aberturas no separador de fases,
alcançando a zona superior do reator, possa se sedimentar sobre a superfície inclinada do
separador de fases. Naturalmente que esta condição dependerá das condições hidráulicas do
escoamento. Desse modo, o acúmulo sucessivo de sólidos implicará consequentemente, no
aumento contínuo do peso desse material o qual, em um dado momento, tornar-se-á maior
que a força de atrito e, então, deslizarão, voltando para a zona de digestão, na parte inferior
do reator. Assim, a presença de uma zona de sedimentação acima do separador de fases
resulta na retenção do lodo, permitindo a presença de uma grande massa na zona de digestão,
enquanto se descarrega um efluente substancialmente livre de sólidos sedimentáveis (van
Haandel e Lettinga, 1994 cit. in Pontes).

Na parte interna do separador de fases fica a câmara de acumulação do biogás que se forma
na zona de digestão. O projeto do UASB garante os dois pré-requisitos para digestão
anaeróbia eficiente: a) através do escoamento ascensional do afluente passando pela camada
de lodo, assegura-se um contato intenso entre o material orgânico e o lodo e b) o decantador
interno garante a retenção de uma grande massa de lodo no reator (Van Haandel e
Catunda,1995). Com o fluxo ascendente a estabilização da matéria orgânica ocorre na zona
da manta de lodo, não havendo necessidade de dispositivos de mistura, pois esta é promovida
pelo fluxo ascensional e pelas bolhas de gás (Oliva, 1997 cit. in. Pontes).

59
Figura 32 - Esquema ilustrativo do princípio de funcionamento do reator UASB.

Fonte: Pontes (2003).

8.3. Regras de segurança

A implementação do biodigestor exige certas medidas de segurança tipo:


• O acesso aos digestores deverá ser realizado por escadas que, quando fixas na vertical
ou com grande inclinação, devem dispor de resguardos de proteção dorsal a partir de
2,5 m e de plataformas ou patamares de descanso com desnível não superior a 5 m,
providas de guarda ou proteção equivalente com altura entre 0,9 m e 1,1 m;
• Deverá ser promovida a ventilação dos espaços de armazenamento de produtos
químicos (como a cal), de modo natural ou forçado, e deverão ser instalados
equipamentos de proteção individual ou coletiva como chuveiro de emergência com
lava-olhos, luvas e óculos de proteção;
• Nos locais de trabalho que apresentem riscos de incêndio ou explosão deverá ser
proibido foguear ou acionar dispositivos elétricos e eletrónicos não específicos das
instalações, devendo esses locais ser devidamente sinalizados;
• Os trabalhos a realizar no âmbito da operação e manutenção dos digestores de lamas
deverão ser rodeados de cuidados especiais, devendo ser assegurada a exaustão dos
gases perigosos após o esvaziamento dos órgãos e previamente à entrada dos
operadores nos referidos órgãos;

60
• A equipa encarregue dos trabalhos referidos no ponto anterior deverá dispor de
aparelhagem para deteção imediata de gases e vapores perigosos, como o gás
sulfídrico;
• Deverão ser realizadas sessões de esclarecimento e formação dos trabalhadores, para
que todos tenham conhecimento dos riscos e perigos a que estão sujeitos, dos
procedimentos de segurança que deverão adotar e do modo de funcionamento dos
equipamentos de proteção que têm à disposição;
• Todos os equipamentos mecânicos e eletromecânicos, como queimadores de biogás,
válvulas, compressores de biogás, sifões condensados, etc., deverão ser sujeitos a
revisões periódicas, com a regularidade recomendada pelos respetivos fornecedores;
• Por forma a garantir a estanquidade de todo o circuito de biogás, deverão ser
vistoriadas periodicamente todas as tubagens de biogás com detetores portáteis,
prevenindo-se, deste modo, eventuais fugas de biogás para a atmosfera.

9. Conversão do biogás em eletricidade

Na maioria das estações de tratamento, o uso do biogás para gerar eletricidade e calor,
potencia a redução do consumo energético em 40%; a percentagem total de recuperação de
energia tem em conta diversos fatores como a eficácia do processo de digestão, a eficiência
do sistema de cogeração, o tipo de processos de tratamento e a eficiência de tratamento do
fluxo líquido.

O output típico de cogeração numa instalação de biogás é cerca de dois terços de energia
térmica e de um terço de eletricidade, com 80-90% de eficiência, o que dá espaço para
melhoramento da eficiência operacional, reduzindo os custos da cogeração.

9.1. Tecnologia de conversão de biogás em eletricidade

Para converter o biogás em eletricidade, é aconselhado usar o motor de combustão interna, o


ciclo Otto, pois para além de ser o mais usado, é o que impulsiona um gerador elétrico
convertendo 30% do biogás em eletricidade e os restantes 70% em calor.

61
O calor extraído da água de arrefecimento do motor e do sistema de exaustão é recuperado
através de permutadores. Uma pequena quantidade de calor pode ser recuperada através dos
turbocompressores e pelos sistemas de lubrificação. A água quente produzida atinge
frequentemente os 93˚C, as temperaturas de exaustão do motor podem atingir 650˚C. O motor
de combustão interna cujo funcionamento se desenrola em quatro fases. A primeira fase é a
de admissão da mistura ar e biogás, na segunda fase processa-se a compressão da mesma, a
terceira fase consiste na ignição por faísca e a quarta fase é a de escape.

Na primeira fase, através da válvula de admissão, há mistura do ar e do combustível admitido


no cilindro, durante o curso do pistão do ponto inferior ao ponto superior.
Na segunda fase, ocorre a compreensão da mistura do ar e do combustível, quando o pistão
sai do ponto inferior ao ponto superior.

Na terceira fase, ocorre a ignição da mistura de ar e combustível em que há uma ascendência


da temperatura e da pressão com a queima, fazendo com que haja uma expansão do pistão
do ponto inferior ao ponto superior, transmitindo ao eixo de manivelas uma força motriz.

Na quarta fase, antes do pistão atingir o ponto inferior, com a abertura da válvula os gases
passam a ser liberados quando o pistão sai do ponto inferior ao ponto superior. Após isso a
válvula de descarga fecha-se e a de admissão abre-se e o ciclo inicia-se novamente.

10. Viabilidade Econômica

Os reatores anaeróbios tipo UASB tornaram-se consagrados ao serem utilizados de maneira


extensiva no tratamento de esgotos para populações de 200 a 600.000 habitantes. O reator
por ter a capacidade de 80l, este terá um preço de R$ 14.154,36 reais (valor tabelado 2º
SANEPAR9) que em escudos cabo verdianos são 353.151$282.

9
Companhia de Saneamento do Paraná, fundado em 1963.
62
O valor citado considera os custos de desapropriação: 124$75/m2 (incluído em área geral),
escavações, interligações, 10% (em todos os itens das obras civis), montagem de
equipamentos (incluindo no reator), urbanização, cerca, portão, etc... Entretanto não estão
incluídos os seguintes custos: canteiro de obras, interligação, linhas de recalque,
abastecimento de água e drenagem de águas pluviais e laboratório.
Considerando os valores comerciais encontrados para o biogás e também que todo o produto
final será utilizado na propriedade. Isto causará um alívio na renda do produtor. O tempo de
retorno do projeto dá-se em aproximadamente 3 meses.

11. Viabilidade sócio-ambiental

Com a implementação do projeto, haverá geração de novos postos de trabalho, diminuindo o


desemprego e aumentando a qualidade de vida dos colaboradores. De se referir também que
haverá uma diminuição no consumo de energia, sendo assim uma mais-valia para a ETAR.
De uma forma geral, a produção de energia elétrica a partir do biogás apresenta não só
vantagens para a sociedade com também para as estações de tratamento de esgoto e para o
meio ambiente.
É considerada uma fonte limpa de energia, pois a emissão de gases poluentes é bem menor
em comparação com a queima de combustíveis fósseis, sendo também um importante
substituto para os combustíveis derivados de petróleo (gasolina e diesel).
A produção de lixo orgânico pode ser revertida na geração de energia limpa. Portanto, dá
uma finalidade útil aos aterros sanitários.
As duas principais alternativas para o aproveitamento energético do biogás são: conversão
em energia elétrica e o aproveitamento térmico. A emissão de biogás para a atmosfera
provoca impactos negativos ao meio ambiente na medida em que contribui para o
agravamento do efeito estufa através da emissão de metano para a atmosfera.

63
Capítulo IV – Discussão dos resultados

12. Resultados e discussão

De acordo com os objetivos referidos, posso dizer de um modo geral que foram alcançados.
Porém, como qualquer projeto, houve contratempos que criaram dificuldades na sua
elaboração.
A maior dificuldade foi dimensionar o reator, uma vez que não foi fácil obter as informações
necessárias para a realização deste objetivo. No entanto, através de muito esforço conseguiu-
se informação suficiente para avançar com o projeto e penso que o mesmo poderá ser uma
mais-valia no futuro.

Tabela 3 - Análise SWOT

SWOT Positivos Negativos


Interno Pontos Fortes Pontos Fracos
Iniciativa, interesse; Falta de experiência na mão-de-obra
Abundância de águas residuais; qualificada;
Terreno disponível; Escassez de informações;
Formados na área de energias Novidade tecnológica;
renováveis; Falta de apoio governamental e
Materiais de construção do camarário;
biodigestor existentes no mercado
nacional.
Externo Oportunidades Ameaças
Surgimento de formações e postos de Receio por parte da população
trabalhos; devido a falta de informação sobre
Aproveitamento das águas residuais; biogás;
Reconversão das lamas resultantes da Falhas na projeção.
ETAR em energia renovável,
possibilidade de microgeração,

64
exemplo que poderá ser replicado Às
restantes ilhas do arquipélago,
melhoria ambiental, económica e
social

De uma forma geral, a produção de energia elétrica a partir do biogás apresenta não só
vantagens para a sociedade com também para as estações de tratamento de esgoto e para o
meio ambiente. Os benefícios atribuídos ao uso do biogás estão vinculados ao tipo de
aproveitamento a que ele será destinado. As duas principais alternativas para o
aproveitamento energético do biogás são: conversão em energia elétrica e o aproveitamento
térmico. A emissão de biogás para a atmosfera provoca impactos negativos ao meio ambiente
e para a sociedade, na medida em que contribui para o agravamento do efeito estufa através
da emissão de metano para a atmosfera.

65
Capítulo IV – Conclusão

13. Conclusão

Com os avanços tecnológicos atrelados com o crescimento populacional, proporcionou uma


grande demanda energética no planeta. Problemas enfrentados nos últimos anos pelo
fornecimento energético impulsionaram a necessidade de diversificar a sua matriz energética
nacional.

A elevação do preço dos combustíveis, a poluição ambiental, o fato de o petróleo ser um


combustível não renovável e o aumento do desenvolvimento econômico vêm estimulando
pesquisas para se descobrir fontes de energia renováveis. A importância da utilização de
biodigestores, por ser uma tecnologia limpa e barata, vem de encontro a essa necessidade,
trazendo benefícios em forma de biogás e fertilizantes.

Apesar de ser extremamente debatida, criticada e comentada, a consciência ambiental ainda


está longe de ser uma realidade na mentalidade da sociedade, sendo, portanto necessário que
o conhecimento sobre os danos possíveis ao meio ambiente e consequentemente a todos nós,
seja apresentado na prática e disponibilizado, para que a população não apenas reconheça os
malefícios do destrato com o meio ambiente, mas também possua conhecimentos
instrumentos para minimizá-lo.

Os resíduos de biomassa são considerados fonte de energia disponível e renovável, apesar de


causar sérios problemas ambientais quando não gerenciados. Entre os diversos tipos de
resíduos gerados, os dejetos de animais possuem potencial de produção de biogás. Uma
alternativa para minimizar essa problemática ambiental dos resíduos de biomassa é a
produção do biogás através da digestão anaeróbia.

Entre as vantagens mais importantes da produção do biogás citam-se as seguintes:


• Processo natural;
• Diminuição do volume de resíduos no final do processo;

66
• Reduzem-se emissões de metano para a atmosfera;
• Fonte de energia renovável.

Para trabalhos futuros seria interessante esse mesmo estudo em um digestor anaeróbio de
lodo em escala real. Alem disso, no intuito de melhorar a eficiência do sistema, cada item
supracitado, serve como recomendação a pesquisa.

67
14. Referência Bibliográfica

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Visitas às Infraestruturas Operacionais da Águas do Tejo Atlântico Regras de Segurança.

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