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ELETRÔNICA DE

POTÊNCIA

Vinícius Novicki Obadowski


Retificadores
monofásicos a diodo
Objetivos de aprendizagem
Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados:

 Caracterizar circuitos retificadores monofásicos a diodo.


 Analisar circuitos retificadores monofásicos a diodo.
 Analisar as topologias com cargas R, RL e RLE.

Introdução
Embora a geração de energia elétrica seja majoritariamente feita em corrente
alternada, são poucos os tipos de cargas que empregam a energia nessa
forma, pois boa parte dos equipamentos comerciais, residenciais e alguns
industriais utilizam corrente contínua. Consequentemente, é necessário que se
faça a conversão da energia alternada em contínua para alimentação dessas
cargas. Nesse momento, surge como solução o retificador eletrônico, cuja
função é exatamente converter a energia de um tipo em outro.
Portanto, neste capítulo, você vai estudar o comportamento dos
retificadores e suas particularidades, vendo qual empregar e por quê.
Além disso, você verá como caracterizar e analisar o circuito retificador
monofásico a diodo e analisar as topologias R, RL e RLE.

Caracterização do retificador monofásico


O funcionamento dos retificadores monofásicos consiste em converter a energia
alternada oriunda de uma fonte alternada a dois fios em dois polos de tensão
contínua. Antes de analisar a fundo a operação e as propriedades dos diferentes
retificadores, cabe rever os conceitos a seguir.

 Fonte alternada a dois fios: é uma fonte de tensão alternada composta


por duas fases ou um fio fase e outro neutro, similar à estrutura vista
2 Retificadores monofásicos a diodo

no ambiente doméstico, porém, não restrita a ele. Por exemplo, os ter-


minais de uma tomada podem ser considerados como uma fonte deste
tipo, bem como os dois fios de saída de um transformador 220/15 V.
 Polos na tensão contínua: tradicionalmente, entende-se que as fontes
contínuas possuem um polo positivo e outro negativo. A diferença entre
eles é o valor fornecido de tensão por essa fonte. A Figura 1a apresenta
a simbologia tradicional para fontes de corrente contínua, enquanto a
Figura 1b, a de uma fonte de corrente alternada.

Figura 1. a) fonte de tensão contí-


nua; b) fonte de tensão alternada.

Além de saber diferenciar um tipo de tensão de outro, você deve saber


como um diodo ideal funciona: sua operação é permitir a passagem de corrente
elétrica quando submetido a uma tensão elétrica positiva e impedir a passagem
desta corrente quando submetido a uma tensão elétrica negativa. A Figura 2
apresenta uma ilustração simplificada de um circuito com diodo submetido e
seu equivalente teórico. Veja que a polaridade da fonte de tensão está invertida
no circuito da direita, enquanto no da esquerda está positiva, implicando que
no circuito da esquerda há circulação de corrente, enquanto no da direita não.

Figura 2. Diodo submetido a uma tensão positiva.


Retificadores monofásicos a diodo 3

Conhecendo os elementos básicos de um sistema alternado, contínuo e


a função do diodo, resta caracterizar formalmente o retificador. Para isso,
considere a situação simples descrita na Figura 3a, um circuito com uma
fonte de tensão alternada, um diodo e um resistor. Sabendo como um diodo
funciona, você consegue inferir que a tensão sobre o resistor é somente
a parte positiva da tensão alternada da fonte, conforme demonstrado na
Figura 3b.

Figura 3. a) retificador simplificado; b) gráfico.

Ao compreender a natureza do funcionamento do diodo no circuito


elétrico de permitir somente o fluxo da corrente quando a tensão entre
anodo e catodo é positiva, você tem o primeiro elemento do retificador.
Considere o exemplo da Figura 3: veja que somente o ciclo positivo da
tensão é transmitido até o resistor decorrente dessa característica do diodo.
A compreensão dessa arquitetura é a base para a definição da operação
do retificador (HART, 2012).

Todas as análises desenvolvidas neste capítulo consideram diodos ideais, isto é, não
apresentam queda de tensão em função da passagem de corrente. Em circuitos reais,
não é o que ocorre; entretanto, se a tensão for muito mais elevada que a queda típica
(maior que dez vezes), pode-se desprezar a queda de tensão do diodo.
4 Retificadores monofásicos a diodo

Circuitos retificadores
Os retificadores monofásicos a diodo são divididos em dois tipos: os de onda
completa e os de meia onda. A principal diferença entre eles é que os do pri-
meiro tipo convertem toda a onda senoidal em tensão CC, e os do segundo,
por outro lado, fazem isso com apenas metade da onda senoidal de tensão.
Como você verá mais adiante, os retificadores de onda completa apresentam
uma tensão de saída maior e uma tensão de ripple menor que seus pares de
meia onda. As duas seções seguintes analisam cada um dos retificadores em
maior profundidade e de forma separada, para que você possa perceber as
diferenças que existem entre eles.

Retificadores de meia onda


Este é o retificador mais simples de ser construído e analisado. O exemplo
na Figura 3(a) mostra um retificador monofásico de meia onda que alimenta
uma carga resistiva. Como você pode perceber, na Figura 3(b), há o gráfico de
queda de tensão sobre o resistor e, durante o semiciclo positivo, o diodo fica
polarizado diretamente com queda de tensão zero e corrente positiva; durante
o semiciclo negativo, reversamente polarizado, com o diodo apresentando a
mesma tensão da fonte e corrente zero.
A fim de ilustrar com maiores detalhes, a Figura 4 apresenta o mesmo
circuito com detalhes para as tensões da fonte vs, do diodo vd e do resistor v0.
Além disso, essa figura apresenta o eixo do tempo como ωt a fim de facilitar
as análises a despeito da frequência adotada.

Na Figura 4, todas as variáveis são funções do tempo. Porém, a fim de facilitar a leitura,
adotou-se vs, vd e v0 no lugar de vs(t), vd(t) e v0(t).
Retificadores monofásicos a diodo 5

Figura 4. Retificador monofásico de meia onda com carga resistiva e formas de onda de
tensão.
Fonte: Hart (2012, p. 66).

Com base na Figura 4, pode-se estimar o valor da componente CC da


tensão sobre o resistor (1) e sobre a corrente (2).

(1)

(2)

Para calcular a potência (3) sobre o resistor, será necessário que você calcule
os valores RMS da tensão (4) e da corrente (5) sobre o resistor.

(3)

(4)

(5)

Como você pode perceber, há uma expressão que denota o valor da tensão
RMS de um retificador monofásico de meia onda alimentado por uma fonte
senoidal para uma carga puramente resistiva.
6 Retificadores monofásicos a diodo

Contudo, poucas são as cargas reais que podem ser tratadas como pura-
mente resistivas e ainda mais raras são as eventuais aplicações que requerem
a retificação. Normalmente, você encontrará na indústria e em muitas outras
aplicações reais cargas com componentes indutivas e capacitivas; portanto, é
interessante que você saiba como analisá-las.
Primeiramente, analisar os retificadores com indutores lhe fornecerá uma
boa base sobre particularidades inerentes a esse tipo de circuito. A Figura 5
apresenta o retificador de meia onda alimentando uma carga RL e gráficos
com as tensões sobre a fonte vs, a carga RL v0, o resistor VR, o indutor vL e
sobre o diodo vd.

Figura 5. Retificador monofásico de meia onda com carga RL e formas de onda


de tensão na carga vs, no resistor VR, no indutor vL e no diodo vd.
Fonte: Hart (2012, p. 68).
Retificadores monofásicos a diodo 7

Ao avaliar o comportamento da tensão, perceba que o diodo continua


conduzindo durante uma parte do semiciclo negativo; isso acontece pois o
indutor é um componente que não admite variações abruptas de corrente.
Nesse caso, esse comportamento é visto com a elevação da tensão do indutor
de forma a manter a corrente fluindo, “forçando” o diodo em polarização
direta. Isso é evidente no ângulo β, momento em que a corrente is é zerada e
a tensão varia instantaneamente para zero no indutor vL .

O ângulo β apresentado é o valor que representa o instante de tempo em que a


corrente atinge o valor zero. Contudo, esse parâmetro não é facilmente estimado e,
normalmente, requer um processo iterativo de cálculo para sua determinação.

A análise deste circuito é feita usando as leis de Kirchhoff para uma ma-
lha fechada (6); porém, dado que há um indutor, deve-se analisar a resposta
completa do circuito (7), incluindo a resposta forçada e a natural, pois existe
o armazenamento de energia no indutor.

(6)
(7)

Nesse circuito em particular, em função da interrupção da corrente e do


comportamento do indutor, não é possível obter uma solução analítica direta-
mente, pois a resposta natural depende do ângulo β. A equação que expressa
o comportamento deste ângulo é (8).

(8)
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Para o cálculo da corrente RMS, empregada no cálculo da potência deste


circuito, é dada pela equação (9).

(9)

É também importante estudar o comportamento do retificador quando


alimentando uma carga RC, conforme apresentado na Figura 6.

Figura 6. Retificador monofásico de meia onda com carga RC.


Fonte: Hart (2012, p. 88).

Analogamente ao caso com o indutor, o capacitor também não apresentará


uma solução analítica completa, pois esse componente não admite variações
Retificadores monofásicos a diodo 9

instantâneas de tensão, fazendo com que o diodo conduza além do ângulo π.


O ângulo no qual o diodo não conduz mais e se torna reversamente polarizado
é chamado de α e sua definição é dada pela equação (10).

(10)

Este circuito difere dos dois anteriores analisados, pois, nele, não há
interesse em reconhecer a carga propriamente sobre o resistor: no momento
da condução do diodo, o capacitor comporta-se como um curto-circuito,
fazendo com a corrente de condução seja muito elevada. Na prática, isso
implica que o dimensionamento desse circuito se dá em função desse parâ-
metro. A expressão que rege o comportamento da corrente de pico no diodo
é a equação (11).

(11)

Além disso, outro parâmetro avaliado em um retificador monofásico acom-


panhado de um circuito RC é a tensão de oscilação (ripple) de saída, expressa
pela equação (12).

(12)

Cabe destacar, ainda, que este último tipo de circuito é tipicamente em-
pregado como filtro a fim de diminuir as oscilações de tensão sobre uma
carga (HART, 2012).
Por fim, uma das aplicações mais comuns de retificadores é seu uso como
fonte de alimentação para outra fonte de corrente contínua com característica
resistivo-indutiva, a também chamada carga RLE ou Carga-Resistiva-Indutiva.
A Figura 7a apresenta o circuito que representa este tipo de topologia para
o retificador de meia onda, enquanto as Figuras 7b e 7c ilustram o circuito
equivalente da resposta forçada para a fonte CA e para a fonte CC, respecti-
vamente. Finalmente, a Figura 7d exibe o gráfico com as formas de onda da
tensão CC, CA e da corrente sobre a Carga-RL.
10 Retificadores monofásicos a diodo

A carga RLE ou Carga-Resistiva-Indutiva é uma forma alternativa de se referir ao modelo


do motor de corrente contínua.

Figura 7. a) retificador monofásico de meia onda alimentando carga RL


e fonte CC; b) circuito equivalente da resposta forçada para fonte CA; c)
circuito equivalente da resposta forçada para fonte CC; d) formas de onda
da tensão CC, CA e da corrente.
Fonte: Hart (2012, p. 76).
Retificadores monofásicos a diodo 11

Para que você compreenda a operação desse circuito, primeiramente, deve


entender os dois ângulos presentes na Figura 6d, α e β, que se referem aos
momentos nos quais o diodo começa e para de conduzir, respectivamente. O
ângulo α ocorre quando a tensão iguala a tensão VCC, ou seja, ocorre quando
ωt = α. Portanto, a equação (13) expressa o valor deste ângulo.

(13)

Por outro lado, como o ângulo β indica o momento em que o diodo para de
conduzir, sua determinação é mais complexa, similar ao que ocorre no caso
da carga RL sem fonte CC dado pela equação (8).
Para que você entenda maiores detalhes sobre esse circuito, é importante
analisar seu comportamento no tempo. Para isso, deve-se verificar a resposta
da corrente no tempo, cuja composição é dada pelo somatório da resposta
forçada mais a natural, conforme apontado na equação (14).

(14)

A resposta forçada desse circuito é composta pela superposição das res-


postas forçadas da fonte CA e da fonte CC, ambas expressas pelas equações
(15) e (16) respectivamente.

(15)

(16)

Note que as correntes das fontes CA e CC em suas respostas forçadas, Figuras 7b e


7c, possuem sentidos contrários. Por esta razão, a corrente if,cc possui valor negativo.
O valor do ângulo θ remete ao fator de potência.
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Consequentemente, a equação (17) expressa o resultado completo da res-


posta forçada.

(17)

A resposta natural para esse circuito é simplesmente entendida como o


decaimento da energia magnética armazenada no indutor na forma de corrente,
dada pela equação (18).

(18)

Com isso, a resposta completa para este circuito é:

(19)

Para determinar o valor A, basta analisar a condição inicial i(a) = 0 e,


resolvendo a equação resultante, você terá:

(20)

Por fim, nesse circuito, a corrente média é expressa como:

(21)

Retificadores de onda completa


Os retificadores de onda completa são compostos, tradicionalmente, por 4
diodos em ponte, conforme ilustrado na Figura 8. Sua nomenclatura deriva
do fato de que retifica totalmente a onda senoidal em CC.
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Figura 8. Retificador monofásico de onda completa para uma carga puramente resistiva.
Fonte: Hart (2012, p. 112).

O valor da componente CC de tensão e de corrente da carga é obtido


da mesma forma que no caso do retificador de meia onda, porém, agora, o
período de integração é até π, visto que a onda retificada tem um período
menor quando confrontada com o caso de meia onda. As equações (22) e (23)
apresentam ambas as variáveis.

(22)

(23)
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Diferentemente do caso do retificador de meia onda, não há interrupção da


corrente no retificador de onda completa do ponto de vista do indutor. Dessa forma,
a análise da carga RL é similar à feita para a carga puramente resistiva, porém,
não é uma onda senoidal pura, sendo necessário representar a onda de tensão e de
corrente na carga por meio de séries de Fourier. A Figura 9 ilustra o porquê disso.

Figura 9. Retificador monofásico de onda completa para uma carga puramente


resistiva.
Fonte: Hart (2012, p. 113).
Retificadores monofásicos a diodo 15

Com base nas ondas de tensão e corrente, você pode perceber que há uma
distorção na forma de onda da corrente do ponto de vista da fonte que não
aparece diretamente na carga. Porém, devido à simetria da onda, a série de
Fourier tem seus coeficientes ímpares nulos, e a equação (24) apresenta o
valor da tensão.

(24)

Como do ponto de vista da carga não há descontinuidades no fornecimento


de corrente, essa tem suas componentes da série de Fourier expressas pelas
equações (25) e (26).

(25)

(26)

Por fim, resta analisar o caso do retificador de onda completa quando


alimentando um filtro RC. Lembre-se de que na indústria e nas aplicações em
geral não se vê cargas RC, essa configuração é empregada como filtro para
uma carga que será conectada posteriormente. Para que você inicie a análise
dessa configuração, verifique a Figura 10, que apresenta o circuito completo
com as formas de onda da tensão.
16 Retificadores monofásicos a diodo

Figura 10. Retificador monofásico de onda completa para uma carga puramente resistiva.
Fonte: Hart (2012, p. 123).

Perceba que, de forma similar ao retificador de meia onda, o de onda


completa também apresenta um ângulo α , que representa o instante em que
o próximo ciclo de tensão é percebido pelo filtro. A principal aplicação dessa
configuração é minimizar a oscilação de tensão percebida por uma carga
conectada em paralelo.
Porém, há uma diferença importante que precisa ser destacada: o retificador
de onda completa sempre mantém o capacitor com tensão da fonte sem nunca a
suprimir; em outras palavras, o evento de “curto-circuito” não ocorre de forma
periódica, implicando que não há corrente de pico a ser estimada nesse caso.
Além disso, a oscilação da tensão (ripple) percebida é menor no retificador
de onda completa do que no retificador de meia onda. A própria equação (27)
ressalta essa característica.
Retificadores monofásicos a diodo 17

(27)

Similar ao caso do retificador meia onda, também é importante que você


conheça o comportamento do retificador de onda completa para o caso em
que ele alimenta uma Carga-RL, isto é, uma carga composta por um resistor,
um indutor e uma fonte de corrente contínua. Esse tipo de modelo é, em geral,
usado para representar carregadores de baterias e motores de corrente contínua.
A Figura 11a apresenta o circuito de um retificador de onda completa em
ponte que alimenta esse tipo de carga; a Figura 11b exibe o comportamento
da tensão e da corrente ao longo do tempo após energização do circuito em
questão. Perceba que a corrente leva um certo período de tempo para atingir
um regime oscilatório permanente (um nível de ripple constante).

Figura 11. a) retificador monofásico de onda completa alimentando uma fonte como
carga RL; b) comportamento da corrente e da tensão sobre a fonte como carga RL ao
longo do tempo.
Fonte: Hart (2012, p. 121).
18 Retificadores monofásicos a diodo

A análise desse circuito se processa da mesma maneira como feito para os


circuitos anteriores RL e R, a única diferença reside sobre o nível da compo-
nente CC da corrente, a qual é influenciada pela Fonte CC no lado da carga.
As outras componentes senoidais da série de Fourier não são afetadas pela
presença da fonte. A equação (28) apresenta o valor da componente I0.

(28)

Referência

HART, D. W. Eletrônica de potência análise e projetos de circuitos. Porto Alegre: AMGH, 2012.

Leituras recomendadas
CHAPMAN, S. J. Fundamentos de máquinas elétricas. 5. ed. Porto Alegre: AMGH, 2013.
KOMATSU, W.; MATAK AS JUNIOR, L.; K AISER, W. PEA-3487 eletrô-
nica de potência I: notas de aula. São Paulo: USP, 2017. Disponível em:
https://edisciplinas.usp.br/mod/resource/view.php?id=1445103. Acesso em: 19 jul. 2019.
RASHID, M. Eletrônica de potência: dispositivos, circuitos e aplicações. São Paulo: Pe-
arson, 2014.
SEDRA, A. S.; SMITH, K. C. Microeletrônica. 5. ed. São Paulo: Pearson, 2007.

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