Você está na página 1de 45

PRISCILA SCHUSTER COLLING

A LEGITIMIDADE DA PROIBIÇÃO DA EUTANÁSIA EM FACE DA MISTANÁSIA


NO BRASIL
A EUTANÁSIA PARA TRANSPLANTES E A ORTOTANÁSIA COMO ALTERNATIVAS?

Monografia final do Curso de Graduação


em Direito objetivando a aprovação no
componente curricular Monografia.
UNIJUÍ – Universidade Regional do
Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul.
DEJ – Departamento de Estudos
Jurídicos.

Orientador: MSc. Maiquel Ângelo Dezordi Wermuth

Ijuí (RS)
2011
2
3

Dedico este trabalho para todos os pacientes que de


alguma forma ou outra desejaram ter o direito à
morte digna.
4

AGRADECIMENTOS

Aos meus pais, acima de tudo, pela vida,


força e coragem.

Ao Vicente, pela motivação, incentivo,


força e, principalmente, pela fé depositada em
mim.

À minha avó Izabel, que sempre está


presente em minha vida.

Ao meu orientador Maiquel, pela sua


dedicação e disponibilidade.

A todos que colaboraram de uma maneira


ou outra durante a elaboração deste trabalho,
muito obrigada!
5

A MORTE

A morte vem de longe


Do fundo dos céus
Vem para os meus olhos
Virá para os teus
Desce das estrelas
Das brancas estrelas
As loucas estrelas
Trânsfugas de Deus
Chega impressentida
Nunca inesperada
Ela que é na vida
A grande esperada!
A desesperada
Do amor fratricida
Dos homens, ai! Dos homens
Que matam a morte
Por medo da vida.
Vinicius de Moraes
6

RESUMO

O presente trabalho de pesquisa monográfica faz uma análise da legitimidade


da eutanásia pelo ordenamento jurídico brasileiro em face da mistanásia. A análise é
feita a partir do princípio da dignidade da pessoa humana. São abordadas as
diversas modalidades ligadas à eutanásia, conceituando-as e interligando-as ao
referido princípio e o seu importante papel nas escolhas que envolvam a defesa pela
vida ou pela morte digna. Discute-se acerca do direito à morte e a legitimidade
estatal em proibir a eutanásia para pacientes em Estado terminal. Por fim, são
apresentadas modalidades que podem ser consideradas como alternativas à
eutanásia, considerando que até a presente data a sua prática constituiu um ilícito
penal.

Palavras-Chave: Direito Penal. Legitimidade. Eutanásia. Mistanásia.


Ortotanásia. Doação de órgãos.
7

ABSTRACT

The present monograph research analyzes the legitimacy of euthanasia by


the Brazilian legal system in the face of misthanasia. The analysis is done from the
principle of human dignity. There are discussed many modalities related to
euthanasia, appraising and linking them to this principle and its important function
in the choices involving the defense of living or dying with dignity. It is discussed
about the right to die and the state legitimacy of prohibiting euthanasia for patients
in a terminal state. Finally, there are presented modalities that may be considered
alternatives to euthanasia, considering that nowadays its practical is a criminal
offense.

Keywords: Criminal Law. Legitimacy. Euthanasia. Misthanasia.


Orthotanasia. Organ donation.
8

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ..................................................................................................... 9

1 A EUTANÁSIA EM FACE DO PRINCÍPIO DA DIGNIDADE DA


PESSOA HUMANA ............................................................................................. 11
1.1lO poder de escolha entre o direito à vida e à morte com dignidade ....... 14
1.2 Eutanásia, distanásia, ortotanásia e mistanásia ....................................... 19

2 A PROIBIÇÃO DA EUTANÁSIA E A RESPONSABILIDADE DO ESTADO


EM FACE DA MISTANÁSIA: A EUTANÁSIA PARA TRANSPLANTES
E A ORTOTANÁSIA COMO ALTERNATIVA? .................................................... 25
2.1 Mistanásia no Brasil e a legitimidade estatal em proibir a eutanásia ...... 29
2.2 Eutanásia para transplantes e a ortotanásia como alternativa ................ 34

CONCLUSÃO ...................................................................................................... 41

REFERÊNCIAS .................................................................................................... 43
9

INTRODUÇÃO

O presente trabalho objetiva refletir acerca da legitimidade da proibição da


eutanásia pelo ordenamento jurídico brasileiro em face da mistanásia. Este estudo é
feito a partir do princípio da dignidade da pessoa humana.

Assim, no primeiro capítulo abordar-se-á o princípio da dignidade da pessoa


humana, bem como o direito à vida, visto que este é um direito tutelado e garantido
pelo Estado Democrático de Direito Brasileiro, ao passo que, também indagar-se-á
acerca de um direito que, até então, não é tutelado pela Constituição Federal
vigente, qual seja, o direito à morte digna.

Consequentemente surge a polêmica da eutanásia. Assim, passar-se-á à


análise e conceituação acerca do enfoque principal do presente trabalho que é a
legitimidade da eutanásia para pacientes em estado terminal e sem perspectivas de
cura, a partir do princípio da dignidade da pessoa humana, bem como evidenciando
qual é o poder de escolha destes pacientes perante o processo morte.

Da mesma forma, também abordar-se-ão as diversas modalidades de


enfrentamento ao processo “morte”, entre elas, a distanásia, ortotanásia e a
mistanásia.

No segundo capítulo, com fundamento no princípio da dignidade da pessoa


humana, tendo em vista que o Estado brasileiro tutela pela inviolabilidade do direito à
vida questionar-se-á a legitimidade estatal em proibir a eutanásia no Brasil, sendo
que esse mesmo Estado, atualmente, é o responsável por diversas mortes que
ocorrem em função da mistanásia.
10

Assim, com o intuito de fundamentar o questionamento acima mencionado,


refletir-se-á sobre a mistanásia, com base em exemplos verídicos, os quais foram
colacionados no presente trabalho como forma de evidenciar que a a eutanásia – ao
invés de ser tipificada como crime – deveria ser reconhecida como um direito de
escolha do moribundo que deseja morrer dignamente.

No entanto, considerando que a eutanásia está longe de ser legitimada,


buscar-se-á também, refletir acerca da ortotanásia como alternativa para pacientes
que se encontram em situações indignas, para que estes possam desfrutar do
conforto de suas residências, na companhia de amigos e familiares, de modo que
não sejam submetidos a tratamentos dolorosos que só prolongam o processo morte,
bem como causam mais sofrimento ao moribundo e aos que estão em volta dele.

Por fim, sugerir-se-á também, a doação de órgãos dos pacientes que optarem
pela efetivação da eutanásia, com o consentimento destes. A partir disso, passar-se-
á à reflexão dessa última alternativa, como forma do Estado conceder ao enfermo o
direito de escolha acerca de sua morte, bem como garantir o direito à vida para
aqueles doentes que dependem de um transplante para tornarem-se saudáveis,
tendo em vista que as filas de espera para transplantes são enormes e vagarosas, e
em razão disso, muitos pacientes acabam morrendo antes de realizar o transplante.

Assim, o presente trabalho analisará a legitimidade estatal em proibir a


eutanásia, bem como evidenciará alguns benefícios que poderiam ocorrer em face
da legalização da prática da eutanásia, como forma de diminuir a mistanásia, através
da ortotanásia e da doação de órgãos.
11

1 A EUTANÁSIA EM FACE DO PRINCÍPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA


HUMANA

O princípio da dignidade da pessoa humana é um dos princípios mais


mencionados nas decisões judiciais proferidas pelos tribunais e câmaras judiciais,
nas lides que envolvem os direitos fundamentais da pessoa humana.

Consagrado no Brasil a partir da Constituição Federal de 1988, o referido


princípio teve os primeiros registros no estoicismo e no cristianismo.

Segundo os estóicos, a dignidade seria uma qualidade que, por ser inerente
ao ser humano o distinguiria dos demais. Com o advento do Cristianismo, a
idéia ganha grande reforço, pois, a par de ser característica inerente apenas
ao ser humano, este ser, na concepção cristã, foi criado à imagem e
semelhança de Deus. Ora, violar a dignidade da criatura seria, em última
análise, violação à vontade do próprio Criador. (BERNARDO, 2010, p. 223).

Durante a Idade Média, Tomás de Aquino passou a ser um dos principais


pensadores a desenvolver o tema, seguido por Pico Della Mirandola, que, na Idade
Moderna, desenvolveu o princípio e deu a este justificativa teológica (BERNARDO,
2010).

Ninguém provavelmente melhor que São Tomás de Aquino resumiu a


impossibilidade de encontrar uma definição para o conceito de dignidade
quando disse: “[...] o termo dignidade é algo absoluto e pertence à essência.”
Premissa básica do jusnaturalismo é o reconhecimento no homem de sua
própria dignidade, fazendo desprezar eticamente condutas incompatíveis
com tal condição, o que aparece também na consideração finalista
kantiniana da pessoa. (MOTA, 2010, p. 1).

No século XVI, o espanhol Francisco de Vitória também foi um dos defensores


do princípio da dignidade da pessoa humana, sendo que recebeu bastante destaque,
pois, “[...] suas teses tiveram enorme repercussão, tendo em vista que contrariavam
a política de escravização de índios então praticada pela Coroa Espanhola.”
(BERNARDO, 2010, p. 234).

Em meados dos séculos XVII e XVIII, o pensador Samuel Pufendorf


acreditava que respeitar a dignidade da pessoa humana deveria ser um dever de
todos os seres humanos, inclusive, do monarca. Já Imanuel Kant entendia que o
12

valor da dignidade de uma pessoa não tem preço e que estes jamais poderiam ser
coisificados como um objeto para a obtenção de algo em troca (BERNARDO, 2010).

Segundo Mota (2010, p. 1) “o reconhecimento da dignidade humana operou-


se por lentas e dolorosas conquistas.” Eis que, somente após a humanidade ter
vivenciado o horror da segunda Guerra Mundial, o principio da dignidade da pessoa
humana ressurgiu com força. A partir daí, foi positivado na maioria das novas
Constituições vigentes, bem como consagrado no art. 1° da Declaração Universal
das Nações Unidas de 1948 (BERNARDO, 2010).

No Brasil, o aludido princípio foi legalmente reconhecido no ordenamento


jurídico através da Constituição Federal de 1988, a qual o elencou como um dos
fundamentos da República Federativa, consagrando-o com uma verdadeira cláusula
geral da tutela da pessoa humana (BERNARDO, 2010).

De modo geral, é a dignidade humana um atributo da pessoa, não podendo


ser medida por um único fator, pois nela intervém a combinação de aspectos
morais, econômicos, sociais e políticos, entre outros. Como princípio
fundamental do Estado Democrático brasileiro, a dignidade da pessoa
humana, juntamente com o direito à vida e à liberdade, são garantias
individuais asseguradas pela Constituição Federal de 1988 e servem como
fundamento e princípios informadores que legitimam as manipulações sobre
a vida humana, objeto desta pesquisa [...] (MOTA, 2010, p. 1).

A partir de 1988, o poder estatal brasileiro passou a zelar - ao menos em


âmbito legal – pela dignidade humana de seus cidadãos, defendendo, acima de tudo,
a vida destes. Nessa perspectiva, qualquer cidadão que tirar a vida de outrem,
independentemente da forma, com exceção dos casos de legítima defesa, sofrerá
com as sanções impostas pelo Estado e terá restringido o seu direito à liberdade.

A Constituição da República Federativa do Brasil, em seu título II, referente


aos direitos e garantias fundamentais da pessoa humana, no caput do artigo 5º,
declara como primeiro direito fundamental o direito à vida, nos seguintes termos:
“todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se
aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no país a inviolabilidade do direito à
vida.”
13

Silva (apud NAMBA, 2009, p. 15), caracteriza “a dignidade da pessoa humana


como um valor superior, que atrai o conteúdo dos outros direitos fundamentais,
desde o direito de viver.”

Segundo Maria Celina Bodin de Moraes (apud BERNARDO, 2010, p. 235) “[...]
será desumano, isto é, contrário à dignidade da pessoa humana, tudo aquilo que
puder reduzir a pessoa (o sujeito de direitos) à condição de objeto.”

Na qualidade de princípio, exige como pressuposto a intangibilidade da vida


humana. Sem vida, não há pessoa e, sem pessoa, não há dignidade. A
pessoa é o bem e a dignidade é seu valor, a sua proteção. A vida da pessoa
humana deve ser digna. (NAMBA, 2009, p. 17).

A dignidade da pessoa humana, mesmo sendo um dos princípios mais


consagrados pelo ordenamento jurídico, a cada dia se revela mais difícil de
conceituar, pois o simples fato de viver não significa, necessariamente, ter uma vida
digna.

Nesse sentido, acredita-se que o ser humano, ao possuir o direito de viver,


consequentemente, deve ter o direito de escolher as variadas formas que conduzirá
essa vida, bem como a maneira que acontecerá o seu processo de morte, quando
estiver vivendo indignamente em razão de doença terminal e sem perspectivas de
cura, cujo sofrimento seja superior à dádiva de viver.

Em casos como o mencionado acima, a dignidade da pessoa humana


raramente é respeitada. A partir dessa perspectiva, surge a polêmica da eutanásia,
cujo tema é hodiernamente um dos mais discutidos dentro do Direito Penal e será
abordado no tópico a seguir.
14

1.1 O poder de escolha entre o direito à vida e à morte com dignidade

Um indivíduo não tem o poder de escolha sobre a vida. Ao que consta, a


concepção de todos os seres humanos independe da vontade destes. O nascimento
com vida da pessoa humana marca o inicio da personalidade civil, atribuindo-lhe
direitos, obrigações e deveres.

A morte, igualmente à vida, é inevitável. Ela sempre fez parte da história da


humanidade e de todo o ecossistema em geral. Acontece que as pessoas sempre
associam a morte a algo horripilante. Talvez, este conceito decorra do fato de que o
evento morrer é o único acontecimento que o homem moderno ainda não conseguiu
evitar, apenas prolongar.

Desta forma, apesar da morte estar presente na vida de todos os seres


humanos, constitucionalmente falando, não possuímos o direito a ela. Essa
afirmação decorre do fato de que a Constituição Federal vigente em nosso país
menciona somente o direito à vida, o qual é inviolável.

Assim, contata-se que não há no texto constitucional nenhuma menção acerca


da morte, pois somente se prioriza a vida e a dignidade da pessoa humana, como se
morrer não fizesse parte do ciclo natural da vida.

Moraes (apud RODRIGUES, 2008, p. 1) leciona: “o direito à vida é o mais


fundamental de todos os direitos, já que se constitui em pré-requisito à existência e
exercício de todos os demais direitos.”

Ocorre que o fenômeno morrer “[...] não é mera falência físico-biológica de um


corpo [...]” (REZENDE, 1996, p. 16), pois esse acontecimento representa um abalo
psicológico em todos os familiares, bem como naqueles que são próximos ou ligados
ao morto.

Durante séculos, a morte foi um evento doméstico, circundado por atos


sacramentais e na presença dos parentes e amigos. O homem tinha
consciência de seu fim próximo, seja porque o reconhecia
espontaneamente, seja porque cabia aos outros adverti-lo. (PESSOA, 2010,
p. 5).
15

O Estado garante o direito à vida, bem como é o grande defensor da tese de


que essa vida deve ser digna. Entretanto, não nos permite decidir sobre a própria
existência, dando a entender que viver é uma obrigação do ser humano e não um
direito inerente a ele.

Os ativistas pró-eutanásia alegam que se há um direito à vida, tem de


haver um direito à morte que seria inerente ao indivíduo, fazendo com
que ele pudesse dar cabo à sua vida quando bem o entendesse.
(RODRIGUES, 2008, p. 2, grifo nosso).

Verifica-se que a prática da eutanásia no Brasil é proibida e enquadrada pelo


Código Penal vigente no tipo penal que prevê genericamente “matar alguém” (art.
121). A mencionada lei desconsidera peculiaridades como condições de vida indigna,
pois não se tem o direito de decidir sobre a própria existência. Dessa forma, segundo
a letra legal, ao se praticar eutanásia, o individuo estará violando um dos tipos penais
que integram o nosso ordenamento jurídico – “matar alguém”.

O que pode ocorrer ao restar demonstrada a prática da eutanásia será a


diminuição da pena do indivíduo, em face do §1º do art. 121 do Código Penal
vigente, o qual menciona a redução de um sexto a um terço, se o crime for cometido
por motivo de relevante valor social ou moral, ou sob o domínio de violenta emoção,
ou ainda por injusta provocação da vítima.

Sobre o tema, Goetten (2010, p. 6) leciona:

Como poderia o direito à vida estar ameaçado pela eutanásia, quando o


indivíduo não goza do direito à vida em sua plenitude, nem se quer se pode
mais alegar que ele apresente vida digna, pois está privado de sua liberdade
e do exercício de muitos de seus direitos, não pode usufruir de um nível de
vida adequado, como educação, cultura, lazer, nem mesmo as suas funções
vitais são autônomas.

Nessa perspectiva, tem-se o direito à vida como um bem sagrado que é


assegurado pelo Estado, mas nem este tem o poder de alterá-lo. A propósito, em
análise diversa da filosófico-jurídica, mas que com ela contribui, entende-se que o
único juiz competente para decidir sobre a vida ou a morte de alguém é Deus.
16

Vislumbra-se, pois, que o fenômeno da morte, independentemente da nossa


vontade, faz parte da vida. Porém o direito sobre a morte não existe, pois ele não
está positivado no ordenamento jurídico (RODRIGUES, 2008). Dessa forma, verifica-
se que, “constitucionalmente o homem tem direito à vida e não sobre a vida.”
(RODRIGUES, 2008, p. 2).

O direito à morte se existisse, nada mais seria que o oposto ao direito à vida,
ou seja, seria o direito de acabar com a vida. Mas é forçoso afirmar que ele
não existe porque o direito à vida, assim como todos os demais direitos
fundamentais, é, segundo a doutrina, imprescritível, inalienável e
indisponível. (RODRIGUES, 2008, p. 2).

Ocorre que o significado da eutanásia se difere do conceito de “matar alguém”


por qualquer motivo, razão inexistente ou desconhecida. Exemplo disso é que se
defende a eutanásia para pacientes em estado terminal, com doenças incuráveis e
que sofrem diariamente dores insuportáveis, ou para pacientes em estado
vegetativo, com morte cerebral.

Infelizmente, a sociedade atual banaliza a eutanásia e tudo o que está a ela


associado, considerando-a um homicídio. “Esse entendimento também é partilhado
pelo Código Penal Brasileiro, que não possui um artigo específico para tratar da
eutanásia [...]’’ (RODRIGUES, 2008, p. 4).

No caso verídico da italiana Eluana Englaro, uma jovem de 21 anos que, após
sofrer um acidente de trânsito, em 1992, ao voltar de uma festa, “viveu” durante 17
anos em uma cama hospitalar, em estado vegetativo, ou seja, durante todos esses
anos, foram apenas máquinas e equipamentos hospitalares que viveram por Eluana.

Uma pessoa, como no caso da Eluana, que durante 17 anos permaneceu em


estado vegetativo, há quem diga que, simplesmente, ela não apresentava mais vida,
pois “a sua “vida” já tinha sido tirada involuntariamente.” (GOETTEN, 2002, p. 6).

Diante de um paciente vegetativo, no entender de Borges (2005), uma pessoa


nessas condições, biologicamente falando, pode viver durante anos, pois os seus
órgãos vitais podem ser mantidos em funcionamento, de forma artificial, por tempo
indefinido, mesmo sem qualquer previsão de cura.
17

Entretanto, ao manter uma pessoa viva artificialmente, Borges menciona que:

[...] ao invés de curar ou de propiciar benefícios ao doente, apenas


prolongam o processo de morte. Portanto, cabe indagar se se trata,
realmente, de prolongar a vida ou de prolongar a morte do paciente
terminal. (2005, p. 2, grifo nosso).

Depois da incansável luta contra os tribunais italianos, o pai de Eluana


conseguiu uma autorização da Justiça para interromper a alimentação da filha e
desligar os aparelhos que viviam por ela.

Após três dias sem o sistema de alimentação e de hidratação que a


mantinham viva, Eluana Englaro morreu no dia 9 de fevereiro de 2009, em uma
clínica na cidade de Udine, no Norte da Itália1.

O caso teve repercussão internacional, provocando, assim, enorme polêmica


sobre a eutanásia. Inclusive, dias antes do falecimento de Eluana, o governo italiano
tentava de todas as formas interferir no caso e derrubar a liminar concedida pela
justiça italiana, com o pressuposto de que ainda dava tempo de “salvar” a jovem e
2
ligar novamente os aparelhos que a mantinham “viva”.

Quando a notícia da morte de Eluana se espalhou, a Itália parou. Pessoas que


somente acompanhavam o caso pela mídia também sentiram a perda da jovem
juntamente com a família desta. Esse sentimento de tristeza, oriundo de pessoas que
não conheciam pessoalmente Eluana, deriva, principalmente, do temor que a
humanidade sente diante da complexidade que o significado da palavra morrer
possuiu.

1
Eluana teve a alimentação e a hidratação reduzidas em 50% na sexta-feira e interrompidas no
sábado na clínica La Quiete. O neurologista Carlo Alberto Defanti, que acompanhava o caso há anos,
disse estar surpreso e que a morte repentina pode ter sido devida a uma crise. Antes, ele próprio
dissera acreditar que ela viveria mais 12 ou 14 dias (O GLOBO, 2009).
2
Contrário à morte da paciente, o governo italiano tentava aprovar em caráter de urgência um projeto
de lei que revertesse a decisão judicial. A votação do decreto de emergência estava marcada para
terça-feira, com a conclusão prometida para quarta-feira, quando, acreditavam os médicos, ainda
daria tempo para reverter o quadro médico de Eluana (O GLOBO, 2009).
18

Eluana, teoricamente, há mais de 17 anos já estava morta, porquanto


ausência de atividade cerebral, pois eram apenas equipamentos eletrônicos que
viviam por ela.

Ao analisar os fatos verídicos do caso Eluana Englaro, percebe-se que a raça


humana em geral é egoísta e ao denegarem a prática da eutanásia, demonstram
isso claramente. Os familiares de pacientes em estado terminal e a sociedade em
geral, ao se depararem com o processo morte do ente querido, simplesmente não
conseguem deixar esta pessoa partir, seja porque não sabem o que acontece
depois, seja porque pensam que não verão mais o corpo físico, mesmo que a mente
do paciente já esteja “morta”.

Outro fator que influencia a maioria das pessoas a serem contrárias à prática
da eutanásia, é notadamente imposto pela ortodoxa igreja católica que, a cada dia,
torna-se mais conservadora e indiferente à evolução dos tempos.

No entanto, levando em consideração a situação em que Eluana se


encontrava, velhos paradigmas religiosos devem ser abandonados, pois submetê-la
a novos tratamentos só resultaria em mais sofrimento e afastaria o propósito principal
que é o bem estar da paciente.

Há situações em que os tratamentos médicos se tornam um fim em si


mesmo e o ser humano passa a estar em segundo plano. A atenção tem seu
foco no procedimento, na tecnologia, não na pessoa que padece. Nesta
situação o paciente sempre está em risco de sofrer medidas
desproporcionais, pois os interesses da tecnologia deixam de estar
subordinados aos interesses do ser humano. (BORGES, 2005, p. 2).

Por esse motivo, manter um paciente preso a uma cama hospitalar, a cada
dia, só dificulta mais a vida dele e dos familiares que estão à sua volta. Ao
compreender essa situação e perceber que o sofrimento da filha ultrapassava as
razões para mantê-la viva, o pai de Eluana empenhou-se para conseguir dar um fim
digno para esta.

Dessa forma, deve-se respeitar a vontade do enfermo e, quando este não tiver
mais condições de opinar acerca do seu fim, a decisão deve ser concedida para a
19

sua família, a qual deverá decidir com base nos princípios que o paciente expressava
em vida, partindo do pressuposto que viver é um direito inerente à pessoa humana e
não pode ser confundido com uma obrigação.

[...] A pessoa tem a proteção jurídica de sua dignidade e, para isso, é


fundamental o exercício do direito de liberdade, o direito de exercer sua
autonomia e de decidir sobre os últimos momentos de sua vida. Esta
decisão precisa ser respeitada. Estando informado sobre o diagnóstico e o
prognóstico, o paciente decide se vai se submeter ou se vai continuar se
submetendo a tratamento. Ele pode decidir pelo não tratamento, desde o
início, e pode também decidir pela interrupção do tratamento que ele
considera fútil. (BORGES, 2005, p. 4).

Desta forma, acredita-se que “defender o direito de morrer dignamente não


se trata de defender qualquer procedimento que cause a morte do paciente, mas de
reconhecer sua liberdade e sua autodeterminação” (BORGES, 2005, p. 4). Ou seja,
cabe ao enfermo decidir acerca do que melhor se enquadra no seu caso concreto, na
tentativa de evitar sofrimentos desnecessários.

Assim, evidencia-se que procedimentos como eutanásia e ortotanásia, são


alternativas que buscam idealizar o desejo do moribundo, bem como reduzir os
sofrimentos que uma pessoa em estado terminal enfrenta.

No tópico seguinte veremos as diversas modalidades de


interrupção/prolongamento da vida ligadas à eutanásia, conceituando-as e
interligando-as ao princípio da dignidade da pessoa humana e o seu importante
papel nas escolhas que envolvam a defesa pela vida ou pela morte digna.

1.2 Eutanásia, distanásia, ortotanásia e mistanásia

Para melhor compreensão acerca da eutanásia, é necessário conhecer o seu


significado e as expressões utilizadas nos termos a ela relacionados como a
distanásia, a ortotanásia e a mistanásia.

Etimologicamente, a palavra eutanásia significa boa morte ou morte sem


dor, tranqüila, sem sofrimento. Deriva dos vocábulos gregos eu, que pode
significar bem, bom e thanatos, morte. No sentido que tinha em sua origem,
a palavra eutanásia significaria, então, morte doce, morte sem sofrimento.
(BORGES, 2005, p. 5, grifo nosso).
20

O dicionário Houaiss (2001, p. 1276) conceitua eutanásia como “ato de


proporcionar morte sem sofrimento a um doente atingido por afecção incurável que
produz dores insuportáveis.”

Atualmente, o conceito de eutanásia significa “uma morte provocada por


sentimento de piedade à pessoa que sofre. Ao invés de deixar a morte acontecer, a
eutanásia, no sentido atual, age sobre a morte, antecipando-a.” (BORGES, 2005, p.
6).

No Brasil a prática da eutanásia é proibida, sendo, por isso, considerada um


homicídio. Porém, como anteriormente mencionado, o Código Penal Brasileiro não
faz menção expressa sobre a eutanásia, pois não existe tipo penal específico para
delimitar o tema, enquadrando-se assim no art. 121.

Diniz (apud Borges, 2005, p. 7) “relata que os Códigos Penais da Alemanha,


da Suíça e da Itália encaixam a eutanásia no tipo de homicídio atenuado por motivo
piedoso, não se admitindo absolvição nem perdão judicial.”

Além disso, deve-se esclarecer que quando se busca simplesmente causar a


morte do paciente, sem motivo humanístico, não significa eutanásia e sim homicídio.
Ou seja, “só é eutanásia a morte provocada em doente com doença incurável, em
estado terminal e que passa por fortes sofrimentos, movida por compaixão ou
piedade em relação ao doente.” (BORGES, 2005, p. 7).

Atualmente, como a eutanásia é proibida no Brasil, o que mais ocorre dentro


dos modernos hospitais brasileiros é a distanásia, cuja prática é justamente o
prolongamento artificial da vida.

A distanásia é “o antônimo de eutanásia, ou seja, é a morte lenta, ansiosa e


com muito sofrimento.” (NAMBA, 2009, p. 172). Nessa modalidade, “não se objetiva
estender a vida de alguém, todavia, o processo da morte.” (NAMBA, 2009, p. 173).

[...] Chama-se de distanásia o prolongamento artificial do processo de


morte, com sofrimento do doente. É uma ocasião em que se prolonga a
agonia, artificialmente, mesmo que os conhecimentos médicos, no momento,
21

não prevejam possibilidade de cura ou de melhora. É expressão da


obstinação terapêutica pelo tratamento e pela tecnologia, sem a devida
atenção em relação ao ser humano. Ao invés de se permitir ao paciente
uma morte natural, prolonga-se sua agonia, sem que nem o paciente
nem a equipe médica tenham reais expectativas de sucesso ou de uma
qualidade de vida melhor para o paciente. Conforme Maria Helena Diniz,
"trata-se do prolongamento exagerado da morte de um paciente terminal ou
tratamento inútil. Não visa prolongar a vida, mas sim o processo de morte."
(BORGES, 2005, p. 8, grifo nosso).

Possuindo uma conceituação completamente diversa da distanásia, surge a


ortotanásia, cujo significado é “[...] o não prolongamento do processo morte além do
que seria natural. Ela deve ser praticada por médico.” (NAMBA, 2009, p. 173). Porém
o que há de comum entre as duas modalidades é que ambas não são tipificadas pelo
Código Penal vigente.

Na situação em que ocorre a ortotanásia, o doente já se encontra em


processo natural de morte, processo este que recebe uma contribuição do
médico no sentido de deixar que esse estado se desenvolva no seu
curso natural. Apenas o médico pode realizar a ortotanásia. Entende-se
que o médico não está obrigado a prolongar o processo de morte do
paciente, por meios artificiais, sem que este tenha requerido que o médico
assim agisse. Além disso, o médico não é obrigado a prolongar a vida do
paciente contra a vontade deste. A ortotanásia é conduta atípica frente ao
Código Penal, pois não é causa de morte da pessoa, uma vez que o
processo de morte já está instalado. (BORGES, 2005, p. 8, grifo nosso).

Conforme menciona Namba (apud PESSINI, 2007):

A ortotanásia, ou também chamada de medicina paliativa, consiste nos


cuidados exercidos diariamente em prol do enfermo, que pode ser exercido
em sua residência ou em ambiente hospitalar. Nessa modalidade de
tratamento, a preocupação maior é com o bem-estar do paciente e com a
sua dignidade humana, sem prolongar nem antecipar a sua morte. Difere,
portanto, da eutanásia, na qual se objetiva, antecipadamente, o término da
vida.

No mesmo sentido, Pessoa (2010, p. 11) leciona:

Sensível à necessidade de humanização da morte, com alívio das dores


sem incorrer em prolongamentos abusivos com aplicação de meios
desproporcionados, o Conselho Federal de Medicina emitiu a Resolução nº.
1.805/2006, estabelecendo que, na fase terminal de enfermidades graves e
incuráveis é permitido ao médico limitar ou suspender procedimentos e
tratamentos que prolonguem a vida do doente, garantindo lhe os cuidados
necessários para aliviar os sintomas que levam ao sofrimento, na
perspectiva de uma assistência integral, respeitada a vontade do paciente ou
de seu representante legal.
22

“A ortotanásia serviria, então, para evitar a distanásia. Ao invés de se


prolongar artificialmente o processo de morte (distanásia), deixa-se que este se
desenvolva naturalmente (ortotanásia).” (BORGES, 2005, p. 8).

Como exemplos de cuidados paliativos, Eliane Brum (2008, p. 2) relata que:

Para cuidar na morte, é preciso compreender a singularidade da vida de


cada um. Não basta aplicar o manual. O que é alívio para um paciente pode
ser uma tortura para outro. A falta de apetite quando a vida chega perto do
fim é sempre um drama para o doente e para a família. Em geral, naquele
momento comer não fará diferença. Mas não é fácil aceitar. “Meu marido
quase não come mais”, disse a mulher a Juliana. “Não seria bom botar uma
sonda nele? Eu entendo do meu marido, mas não entendo do organismo
dele.” Sentada num banquinho, a médica responde, suave: “O organismo
naquela cama é o seu marido. Nesse momento, uma sonda não vai trazer
benefício, só sofrimento. Mas vamos decidir junto com a senhora. E vamos
apoiá-la.” Ele morreu alguns dias depois. Sem sonda.

Prosseguindo, Eliane Brum (2008, p. 2) menciona que:

Para outra paciente, comer era o que fazia sentido na vida. Mas ela estava
num estágio em que vomitava tudo o que ingeria. Mesmo assim, não queria
ser alimentada por uma sonda. “Comer, para mim, é o sabor da vida”, disse
à médica Veruska Hatanaka, de 34 anos. Mesmo vomitando, para ela valia a
pena. A equipe respeitou sua vontade. Ela comeu e vomitou até morrer.
Viveu.

Em casos como os relatados acima, por mais que a situação do enfermo seja
desgastante e extremamente complicada, constata-se que no fim da vida, a vontade
deles e de seus familiares foi respeitada, garantindo-lhes assim, menos sofrimento e
dignidade.

E, por fim, temos a mistanásia, a qual, segundo Namba (2009, p. 174), “[...] é
a morte miserável, fora e antes do seu tempo.”

A mistanásia, também conhecida por eutanásia social, conforme Namba


mencionou anteriormente, significa a morte lenta e fora do seu tempo natural devido
à falta de atendimento médico hospitalar. Nessa modalidade, também se enquadram
as pessoas que morrem de fome, frio e os que morrem em razão do descaso estatal
pela vida.
23

Nesse sentido, Di Paolo et al. (2003, p. 3), destaca que “[...] Um dos grandes
contrapontos entre a mistanásia e a eutanásia é o resultado.” Ou seja, na eutanásia
a morte é antes do seu tempo natural, porém sem dor e sofrimento. Na mistanásia
também ocorre a antecipação da morte, porém há muito sofrimento por parte do
moribundo.

Outrossim, a mistanásia também classifica-se como o oposto da ortotanásia,


pois consiste em uma das piores modalidades do processo que envolve a morte. A
respeito dela (mistanásia), tal como vista no Brasil, não há tratamento humanitário
algum e ela tampouco acontece no confortável - e eventualmente luxuoso - hospital,
como é o caso da distanásia.

Sinala-se que mistanásia é uma realidade freqüente nas mais variadas


cidades espalhadas pelo Brasil a fora. Como não há estruturas hospitalares, muito
menos recursos suficientes destinados à área da saúde, milhares de pessoas
morrem diante da omissão de socorro estatal, pela negligência e precariedade dos
serviços públicos oferecidos.

Estamos vivemos em uma sociedade, cujo lema é: “salve-se quem puder”


(MARTIN, 2009). Ou seja, aqueles que possuem um poderio econômico um pouco
acima da média nacional, já têm condições financeiras pagar um plano de saúde que
cobre as condições mínimas exigidas para um tratamento digno médico-hospitalar.

No entanto, em uma sociedade como a nossa, marcada pela desigualdade


social, como já mencionado anteriormente, não é somente nos hospitais públicos que
o pobre sofre com a mistanásia, ela deriva também de moradias precárias, falta de
água limpa, alimentação diária, entre outros fatores que, além de serem indignos,
provocam doenças que acabam ficando sem tratamento.

O problema central acerca da mistanásia se intensifica quando paramos para


pensar no elevado número de pessoas que morrem na clandestinidade, pois nem ao
menos conseguem chegar a um lugar em que haja tratamento digno.

Neste ínterim, Di Paolo et al. (2006, p. 3) leciona:


24

A perplexidade nasce quando nos defrontamos com a realidade onde uma


mesma sociedade oferece a mais alta tecnologia para o “bem morrer” e nega
o indispensável para o “bem viver”.

Assim, enquanto alguns pacientes estão “hospedados” em hospitais com a


mais complexa estrutura, infelizmente, os demais brasileiros enfermos estão
internados em entidades custeadas pelo SUS- Sistema Único de Saúde, as quais,
por si só, já representam um custo muito alto para o Estado, e mesmo assim não
possuem recursos e investimentos financeiros para o tratamento de doentes com
enfermidades mais graves.

Conseqüentemente, muitos pacientes morrem por falta de quartos e UTI’s


disponíveis. Da mesma forma, as entidades estatais, responsáveis pela garantia dos
direitos humanos consagrados na Constituição Federal vigente, simplesmente
fecham os olhos para os mais variados problemas relacionados à mistanásia.

Como se percebe, de todas as possibilidades fáticas e legais de se enfrentar o


fenômeno “morte”, a eutanásia representa a mais complexa: envolve reflexões sobre
o término da existência humana, condições físicas de hospitais, afeto de amigos e
familiares, perspectiva de evolução da ciência e o suprimento da vontade da própria
pessoa protagonista do respectivo episódio.

Igualmente, a legitimidade para decidir sobre a prática ou não da eutanásia


cabe ao Estado. Entretanto, esse mesmo Estado que defende a vida e ao mesmo
tempo, proíbe a Eutanásia no Brasil é o principal responsável pela mistanásia.

No capítulo a seguir, indagaremos acerca da legitimidade Estatal para decidir


sobre uma questão que deveria ser inerente ao ser humano, quando o próprio
Estado nem ao menos consegue aplicar os próprios princípios constitucionais que
nomina como invioláveis.
25

2 A PROIBIÇÃO DA EUTANÁSIA E A RESPONSABILIDADE DO ESTADO EM


FACE DA MISTANÁSIA: A EUTANÁSIA PARA TRANSPLANTES E A
ORTOTANÁSIA COMO ALTERNATIVAS?

Na antiguidade clássica, o principio da dignidade da pessoa humana estava


relacionado com a posição social que o individuo ocupava. Quanto mais elevado
fosse o seu cargo, maior era o grau de reconhecimento que este detinha perante os
demais (SARLET, 2010).

Atualmente, o mencionado princípio é positivado na maioria das constituições


vigentes, bem como faz parte de tratados internacionais, sendo que para sua
aplicabilidade, não há distinção de raça, classe social, nacionalidade, cor ou etnia.
Ou seja, basta ser pessoa humana para que a dignidade seja reconhecida.

Nesse sentindo, Ingo Sarlet (2010, p. 33) ressalta que:

[...] o homem possui uma dignidade que decorre de sua posição mais alta na
hierarquia da natureza, já que é o único ser racional dentre os animais, o
que lhe assegura uma posição especial no universo (sentido absoluto de
dignidade).

No mesmo sentido, o cristianismo desde a época do Império até os dias de


hoje, prega a idéia de que homem foi criado à imagem e semelhança de Deus,
engrandecendo e dignificando a imagem do ser humano perante os demais seres
existentes no planeta terra.

No entanto, ao evidenciar que homem é um ser superior dos demais seres da


natureza, bem como ao reconhecer a dignidade da pessoa humana, não se está
querendo privilegiar a raça humana. Mas, sim, demonstrar que, pelo fato do homem
ser racional, é justamente ele o responsável pelo respeito e proteção dos diferentes e
dos iguais a ele.

Assim, a dignidade de uma pessoa, qualidade inerente e indissociável do ser


humano, deve ser reconhecida e respeitada em qualquer tempo e lugar e não
somente quando esta for violada. Cumpre registrar, mais uma vez, que a
mencionada dignidade, independe de circunstâncias concretas, sendo válida também
26

para os maiores criminosos, visto que são iguais em dignidade, pois também são
reconhecidos como pessoas (SARLET, 2010).

Desta forma, sendo a dignidade uma qualidade que não pode ser perdida ou
alienada, ao mesmo tempo em que ela é um encargo dos poderes estatais, ela
também serve como forma de limite dessas atividades públicas, eis que a
individualidade e autonomia da pessoa devem ser respeitadas pelo Estado, tendo em
vista que se trata de sujeitos de direitos (SARLET, 2010).

Destarte, a ordem jurídica tutela pela proteção, bem como garante respeito por
parte do Estado a todos os seus cidadãos, tendo em vista que todos são iguais
perante a lei.

Nessa linha, Sarlet (2010, p. 58, grifo nosso) leciona que:

[...] a dignidade, na sua perspectiva assistencial (protetiva) da pessoa


humana, poderá, dadas as circunstâncias, prevalecer em face da dimensão
autonômica, de tal sorte que, todo aquele a quem faltarem as condições
para uma decisão própria e responsável (de modo especial no âmbito da
biomedicina e bioética) poderá até mesmo perder – pela nomeação eventual
de um curador ou submissão involuntária a tratamento médico e/ou
internação- o exercício pessoal de sua capacidade de autodeterminação,
restando-lhe, contudo, o direito de ser tratado com dignidade (protegido e
assistido).

Com base no pressuposto de que a dignidade concede ao indivíduo as


formas e os meios autônomos para conduzir a vida, mesmo no momento em que lhe
faltar o discernimento para continuar esta jornada, o homem jamais pode ser
destituído dos seus valores intrínsecos e ser qualificado como coisa.

No entanto, não há um conceito universal acerca da dignidade da pessoa


humana, por mais que ela seja consagrada internacionalmente, em determinados
lugares, o que prevalece são os costumes da região, pios há lugares no mundo, em
que a prática de certos atos, para o nosso ver este são extremamente indignos,
porém para eles, faz parte de um ritual perpetrado há anos.

Sobre o tema, Dworkin (apud SARLET, 2010, p. 65) aduz que:


27

Ao sustentar a existência de um direito das pessoas de não serem tratadas


de forma indigna, refere que qualquer sociedade civilizada tem seus próprios
padrões e convenções a respeito do que constitui esta indignidade,
conceitos que variam conforme o local e a época.

Desta forma, contata-se que, o que pode ser indigno para uns, não será,
necessariamente, indigno para outros. Como exemplo dessa situação, nos
deparamos com a pena de morte, a qual é adotada por vários Estados norte-
americanos, sendo que nesses Estados o mencionado procedimento pode não ser
aceito por toda população, mas é admitido pela maior parte da sociedade que
defende a pena de morte como forma de sanção.

Sobre o assunto, Sarlet (2010, p. 65, grifo nosso) relata que:

[...] recente decisão envolvendo recurso impetrado por um condenado à


morte no Estado de Washington, a Suprema Corte reconheceu que a morte
por enforcamento constitui prática atentatória à dignidade da pessoa
humana, notadamente, pelo fato de infligir - ao menos em relação aos
outros meios utilizados (injeção letal e eletrocutamento)- sofrimento
desnecessário ao sentenciado, já que constatada a possibilidade maior de
uma postergação do estado de inconsciência e morte, com risco de asfixia
lenta e até mesmo de decapitação parcial ou total, verificada em diversos
casos.

Nos Estados Unidos, por mais que haja a pena de morte, a Suprema Corte
entendeu que o sofrimento desnecessário do sentenciado constitui uma causa
legítima de inviolabilidade do direito à dignidade, bem como mencionou que a morte
mediante injeção letal não viola os direitos da pessoa humana.

No Brasil a pena de morte é constitucionalmente proibida. No entanto, a


diferença entre os Estados Unidos e o Brasil é que o estado estadunidense
reconhece a indignidade do sofrimento desnecessário. Ao passo que no Brasil, em
casos de extremo sofrimento, onde o próprio agente ou familiares deste decidem por
fim a esta situação, através da eutanásia, as entidades governamentais alegariam
que este procedimento constituiu um crime, sendo constitucionalmente proibido.
28

Da mesma forma, tais entidades não tomam atitudes plausíveis para as


pessoas que sofrem com a mistanásia. Ou seja, a dignidade da pessoa humana, na
prática, raramente é reconhecida3.

Assim, ao mesmo tempo em que o Estado brasileiro proíbe a eutanásia, esse


mesmo ente deixa milhares de pessoas morrerem por diversas razões, sendo que
caberia a ele diligenciar medidas públicas que evitassem o sofrimento da população
mais pobre, a qual é sempre a mais afetada pela mistanásia.

A partir da leitura do texto constitucional vigente, constata-se que o Estado


tem a responsabilidade e o dever de garantir aos seus cidadãos a inviolabilidade da
vida, bem como a dignidade destas. Porém, é notório que tais afirmações não
ocorrem e que em nosso país, apesar das melhorias que ocorreram nos últimos
anos, grande parte da população continua sendo pobre, sem acesso à saúde e
educação, e, muitas vezes, sem condições mínimas de sobrevivência, como por
exemplo, o simples acesso à água potável.

A partir do que foi explanado, questiona-se qual é legitimidade do Estado para


decidir sobre a vida de uma pessoa que deseja ter resguardada a sua dignidade,
bem como o seu direito à morte com dignidade, quando a própria República
Federativa do Brasil não consegue garantir condições mínimas aos que querem
viver?

De acordo com Martínez (2009, p. 21), a solução para os questionamentos


acima seria “la eutanásia como excepción legítima, bajo certas condiciones, de la
portección estatal de la vida”4. Ou seja, a legitimidade da eutanásia como forma de
proteção estatal para a vida digna.

3
A dignidade da pessoa humana é reconhecida constitucionalmente, no entanto, ela não possui
plena eficácia.
4
A eutanásia como uma exceção legítima, sob certas condições, como forma real de proteção do
estado pela vida (Tradução nossa).
29

Sinala-se, novamente, que a defesa acerca da legitimidade da eutanásia é


somente para as pessoas enfermas, em estado terminal, sem perspectivas de cura,
em que o sofrimento seja superior à dádiva de viver.

Outrossim, a decisão sobre a prática da eutanásia deve decorrer do próprio


enfermo, ou quando este não tiver mais condições, como já mencionado, a decisão
deve advir da família do moribundo que decidirá com base nos princípios que ele
possuía em vida.

No tópico seguinte, iremos explanar casos verídicos de mistanásia, para


melhor compreensão acerca do tema, bem como questionar qual a legitimidade do
Estado em proibir a eutanásia.

2.1 Mistanásia no Brasil e a legitimidade estatal em proibir a eutanásia

A mistanásia, apesar de fazer parte da vida de milhões de pessoas em nosso


país, enquanto palavra em si, é um termo pouco conhecido. Para se ter uma noção,
é só abrirmos o jornal, ligar a televisão ou até mesmo acessarmos algum site de
notícias que iremos perceber que a realidade da mistanásia está bem perto de nós.

Exemplo de responsabilidade civil do Estado por ausência combinada com


negligência na prestação de serviço público são os fatos relatados e reconhecidos na
decisão do processo judicial número 016/1.05.0042596-6, que tramitou perante a
Comarca de Ijuí.

Neste, uma gestante não obteve atendimento médico de urgência necessário,


tampouco o teve a criança recém nascida, que faleceu. Reconhecida a ausência de
prestação desse serviço público, fixou-se valor indenizatório a título de reparação de
danos, porém em valor inferior a todos os demais casos em que se reconheceu a
mesma responsabilidade civil por morte decorrente da ausência do referido serviço
estatal.

Assim, no caso ora relatado, identificam-se duas omissões do Estado: a


primeira na não prestação dos serviços públicos de saúde estabelecidos em lei e na
30

constituição e a segunda na fixação de quantia reparatória em valor inferior ao


costumeiramente fixado em casos idênticos pelos tribunais brasileiros.

A propósito, colacionam-se trechos da respectiva decisão do Tribunal de


Justiça do Estado do Rio Grande do Sul (acórdão proferido na apelação cível n.°
70026769661):

[...] Em acréscimo ao que acima restou transcrito, tenho que ficou


evidenciado pela prova documental e testemunhal constante dos autos, que
houve, efetivamente, má prestação de serviço médico e de atendimento
dispensado pela parte demandada à autora.
E não há como se afastar o entendimento do magistrado a quo, qual seja, o
de que se mostrava necessária a internação da autora, ainda mais
porque a esta, em duas oportunidades, procurou o nosocômio demandado
para o tratamento das dores intensas a que se viu submetida.
Também merece destaque o fato de que, embora a autora não tivesse
realizado os exames pré-natal, como recomenda a situação em casos como
o dos presentes autos, a verdade é que, em razão do quadro de dor e
sofrimento apresentado pela autora, tal atenção poderia lhe ter sido
dispensada a partir do momento em que ela recorreu ao socorro do hospital
demandado pela segunda vez.
O quadro apresentado, a partir da realização da ultra-sonografia realizada no
hospital demandado, e que chegou ao conhecimento do médico que estava
tratando da autora, indicava, no mínimo, maior prudência por parte do
médico, que em hipótese alguma deveria ter liberado a paciente para se
recolher à sua residência, e observar repouso. Aliás, a determinação de
repouso absoluto, por parte do médico que a tratou, evidenciava, inclusive, a
impossibilidade de a mesma ficar se deslocando a um posto de saúde que
pudesse tratar dos problemas de saúde apresentados pela autora. (Grifo
nosso).

Outro exemplo de mistanásia é o caso ocorrido na cidade de Passo


Fundo/RS, onde um detento morreu no interior do estabelecimento penitenciário da
referida cidade, momento em que uma beliche caiu sobre o seu corpo.

Em face disso, a companheira e o filho menor da vítima, ingressaram com


uma ação contra o Estado e contra o Município, em busca da reparação civil, bem
como a responsabilização dos órgãos públicos pela morte do detento.

Os autores alegaram à má-prestação do serviço médico- hospitalar, tendo em


vista que após o acidente que casou traumatismo cranioencefálico no detento, este
foi liberado pelo hospital demandado para retornar à casa prisional, sendo que
31

recebeu no referido nosocômio tratamento para intoxicação alimentar. Com efeito, o


detento morreu dias após o ocorrido.

Abaixo se colaciona trecho do acórdão proferido pelo Tribunal de Justiça do


Estado do Rio Grande do Sul, na apelação cível n.° 70028902476, em que restou
caracterizada a responsabilidade estatal (do presídio) e municipal (do hospital).

[...] Destarte, restou evidenciada a omissão do Estado por não ter


prestado socorre corretamente, uma vez que se constatou erro no
diagnóstico inicial do detento, o que acarretou em seu falecimento.
Assim, tem-se no artigo 37, § 6º, da Constituição Federal, que responde
o Estado objetivamente pelos danos que seus agentes, nessa qualidade,
causarem a terceiros, sendo desnecessária a comprovação de dolo ou
culpa. Por se tratar de omissão do Estado, a responsabilidade será
objetiva, se a omissão for específica, e subjetiva, se a omissão for
genérica.
No caso em análise, a omissão é específica, pois o Estado deve zelar
pela integridade física dos internos em estabelecimentos
penitenciários que estão sob sua custódia. Comprovado está nos
autos a ausência de ações preventivas, visto que se depreende dos
depoimentos testemunhais, ser frequente a ocorrência de acidentes por
queda dos beliches.
Restou-nos claro a falha na prestação do serviço médico-hospitalar,
pois o paciente foi liberado pelo médico atendente para retornar ao
presídio, não agindo este com a cautela necessária, tendo em vista
que o paciente recebeu tratamento para intoxicação alimentar enquanto,
na verdade, havia sofrido traumatismo cranioencefalico, vindo a falecer
dias depois.
Conforme previsão do Código de Defesa do Consumidor, responde o
hospital objetivamente pelos danos causados a seus pacientes pela falha
na prestação de serviço [...]. (Grifo nosso).

No caso em epígrafe, assim como no mencionado anteriormente, o Estado foi


duplamente negligente, pois, conforme relatado pelo Tribunal de Justiça, a vítima,
estando na condição de detento de presídio estadual, passa a ser responsabilidade
do Estado que tem o dever de lhe proporcionar cuidados básicos de sobrevivência e,
ao ser lesionado de alguma forma, o mesmo Estado deve também garantir
atendimento médico-hospitalar adequado. No entanto, ocorreu a morte do detento
em face da mistanásia.

Os casos acima reportados são apenas exemplos dos milhares que tramitam
nos tribunais de justiça brasileiros. Porém, em outras situações, antes mesmo da
família recorrer ao Judiciário em busca de reparações, o caso vira notícia através da
mídia.
32

Como exemplo dessa circunstância, temos diversos casos, entre eles, o da


jovem de 23 anos de idade, que morreu no dia 25 de julho de 2010, após passar por
cinco hospitais públicos sem receber o devido tratamento. A notícia veio a público
através do site G1-São Paulo5.

Laura, uma jovem de 23 anos, morreu em 25 de julho, na unidade de tratamento


semi-intensivo do Hospital das Clínicas, de tromboembolismo pulmonar, um
coágulo em uma veia da perna que se deslocou e foi parar no pulmão. Ela
passou por cinco hospitais públicos da capital até ser diagnosticada.
“Eu sinto raiva, ódio”, disse a mãe de Laura, Antonia da Mata e Souza, que ainda
tenta retomar o dia a dia. A filha não tinha plano de saúde particular. “Quem
tem dinheiro se salva. A saúde pública não tem condições”, completa Antonia.
(Grifo nosso).

Igualmente, o caso da morte de uma criança recém nascida na cidade de


Porto Seguro, na Bahia, que faleceu logo após o parto devido a uma falha do
hospital. A reportagem foi publicada pelo site O Globo6:

SALVADOR - A polícia de Porto Seguro, na Bahia, vai abrir inquérito para


apurar a responsabilidade pela morte de um recém-nascido que teve
traumatismo craniano ao cair de uma mesa cirúrgica que quebrou logo
depois do nascimento. De acordo com a família da vítima, a mãe, Alcione
Teixeira, de 28 anos, deu entrada no Hospital Luís Eduardo Magalhães, em
Porto Seguro, às 6h de domingo. Por volta das 16h, quando a criança estava
nascendo, a maca quebrou e o bebê caiu. A mãe teve ferimentos na
perna e a criança morreu vítima de traumatismo craniano.Grifo nosso. A
família se queixa. Segundo a avó, nenhum médico procurou os parentes de
Alcione para dar explicações. Só três horas depois do parto, eles ficaram
sabendo da morte por uma enfermeira [...]. (Grifo nosso).

Outro caso, ainda mais indignante, é o da menina de 12 anos de idade, que


morreu no Hospital São Luiz Gonzaga, no Estado de São Paulo-SP, no dia 03 de
dezembro de 2010, após receber vaselina na veia ao invés de soro. Abaixo,
colacionam-se trechos da reportagem publicada no site clicapiaui.com7:

A auxiliar de enfermagem de 26 anos que atendeu Stephanie dos Santos


Teixeira, 12 na última sexta-feira no hospital São Luiz Gonzaga, no Jaçanã
(zona norte de São Paulo), admitiu, em depoimento à polícia nesta quarta-

5
Disponível em: < http://g1.globo.com/sao-paulo/noticia/2010/11/morte-por-falta-de-atendimento-
medico-sera-investigada-diz-kassab.html> Acesso em: 1 mai. 2011.
6
Disponível em: <http://oglobo.globo.com/cidades/mat/2010/05/25/maca-quebra-durante-parto-recem-
nascido-morre-na-queda-na-bahia-916683322.asp>. Acesso em: 1 mai 2011.
7
Disponível em: <http://www.clicapiaui.com/geral/38177/enfermeira-e-indiciada-por-aplicar-vaselina-
em-menina.html> Acesso em: 1 mai.2011.
33

feira, que aplicou vaselina em vez de soro na veia da menina. Ela foi
indiciada sob suspeita de homicídio culposo (sem intenção de matar).
Stephanie foi internada com dores abdominais, diarreia e vômito, e morreu
na madrugada de sábado (4), após receber a dose de vaselina.
O advogado da auxiliar, Roberto Vasconcelos da Gama, afirmou que sua
cliente foi induzida ao erro. “O recipiente preparado pela Santa Casa
[mantenedora do hospital] não dispunha de elementos esclarecedores que
desse a ela condições de saber que se tratava de vaselina líquida” [...].

Diante dos exemplos acima expostos, a médica Maria do Carmo Lobato


(2010, p. 2) menciona que a mistanásia é

[...] situação vivida tanto pelos pacientes que aguardam tratamento para
doenças crônico-degenerativas (câncer, insuficiência renal, cardiopatias
etc.), quanto pelos que, em quadros agudos, perambulam por unidades de
urgência e emergência e hospitais até conseguirem atendimento. Denúncias
chegam às ouvidorias, à mídia e até mesmo ao Judiciário - exemplos de
que, contra fatos, não há argumentos ou meias-palavras capazes de
mascarar a realidade.

Com efeito, desde 1988, a Constituição Federal estabeleceu que a saúde é


direito de todos e, ao mesmo tempo, um dever do Estado. Diante disso, o Estado
criou o sistema Único de Saúde- SUS, como forma de garantir saúde aos seus
cidadãos.

Ocorre que, o mencionado sistema de saúde, é financiado pelos recursos do


orçamento da seguridade social oriundos da União, do Distrito Federal, dos Estados
e dos Municípios, os quais, ao invés de jogarem toda a responsabilidade para o
governo federal, deveriam juntos proporcionar medidas preventivas capazes de
combater a mistanásia, conforme é estabelecido no artigo 196 da Constituição
Federal vigente8.

Para Lobato (2010, p. 1):

A mistanásia, enfim, envolve erros de vários sujeitos e é conseqüência de


deficiências graves em vários níveis - inclusive por parte de gestores
omissos e até de médicos que reclamam das péssimas condições de
trabalho, porém praticam plantões em esquema de "dobradinha" e não
comparecem a seus locais de trabalho por motivos fúteis. Trata-se de uma
grave infração social que traz sérias consequências - seja na motivação dos

8
Art. 196. A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e
econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e
igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação.
34

servidores do SUS ou na vida dos milhões de brasileiros que dependem de


seus serviços.

O problema central da mistanásia é que ela atinge um número muito elevado


de pessoas e a sua resolução não acontece do dia para a noite. A solução deve
partir de medidas públicas inspiradas na ética, responsabilidade e solidariedade de
todos os agentes envolvidos.

Assim, mais uma vez, ressalta-se qual é a legitimidade do Estado em proibir e


tipificar a eutanásia como crime diante dos infinitos casos de mistanásia que ocorrem
no País?

Todos sabem que o Estado brasileiro é um Estado democrático, sendo assim,


esse Estado governa através de seus representantes eleitos pelo povo, bem como
sua legitimidade para governar decorre de lei, sendo seu principal dever administrar
o país de acordo com as mencionadas normas e princípios.

Entretanto, torna-se hipocrisia do Estado ter como um dos seus princípios


basilares a inviolabilidade da vida, sendo que, diariamente, deixa milhares de
pessoas morrerem por falta de aplicabilidade dos deveres que lhe são inerentes.

Frisa-se, que diante dessa discussão, o bem maior tutelado é a vontade dos
pacientes em estado terminal, para que estes possam decidir a maneira mais digna
de viver os seus últimos dias, bem como a forma que desejam morrer, sem que isso
prejudique penalmente seus entes queridos ou executores de sua vontade.

Enfim. Por um lado, a eutanásia ainda demorará a ser legitimada pelo sistema
jurídico brasileiro. Por outro lado, trata-se de um tema que tem repercussão social e
midiática bastante crescente. Por este prisma, no tópico seguinte abordaremos o
lado positivo e o negativo deste instituto, bem como alternativas à sua prática.

2.2 Eutanásia para transplantes e a ortotanásia como alternativa


35

Desde que nascemos aprendemos que a vida humana tem um começo, meio
e um dia chega ao fim. Aprendemos também, que a palavra morte é um tabu
indecifrável e que é melhor não tocar nesse assunto, eis que é amedrontador.

No presente trabalho, até o momento, abordamos a terminalidade da vida de


pessoas com doenças graves, sem perspectivas de melhoras. Essas pessoas estão
na fase terminal ou são pacientes terminais.

Segundo Cícero de Andrade Urban (2007, p. 3)9 na fase terminal

[...] se compreende uma condição patológica que leva a pensar em uma


expectativa de morte em breve tempo como conseqüência direta da doença
ou por paciente terminal se designa uma pessoa portadora de doença
terminal que, em pouco tempo, com muita probabilidade morrerá.

Evidenciamos também as nomenclaturas dadas às variadas fases da


terminalidade de pessoas que estão em condições acima referidas, dentre elas a
ortotanásia, eutanásia, distanásia e mistanásia.

Assim, retomando ao enfoque principal do presente trabalho, ou seja, a


eutanásia percebe-se que ela tem peculiaridades que podem ser consideradas
vantagens ou desvantagens.

Como vantagens da eutanásia, por um lado, temos o livre arbítrio e autonomia


do paciente, eis que é ele quem determina como deseja morrer, visando diminuir
sofrimentos do seu corpo físico, pois a morte ocorrerá de forma pacífica, bem como
também escolherá como quer viver os últimos dias de vida.

Outra vantagem, a qual, até então é pouca mencionada em virtude da


eutanásia ser legalmente proibida, seria a legitimação da eutanásia com o propósito
específico de, além de atender a vontade do moribundo, também salvar a vida
daqueles que possuem perspectivas de melhora através de transplantes e doações
de órgãos.
36

Acerca da doação de órgãos, sabe-se que ela é regulada pela lei n.° 9.434/97.
Ao analisar esta lei, constata-se em seu artigo 9°, que somente é permitida a retirada
e doação de órgãos e tecidos de um corpo vivo, quando houver consentimento
expresso do doador e quando for doação de órgãos duplos, sem que esse
procedimento impeça o doador de continuar vivo, bem como não cause risco a sua
integridade física10.

Já o artigo 3° da referida lei, dispõe sobre a doação de órgãos post mortem:

A retirada post mortem de tecidos, órgãos ou partes do corpo humano


destinados a transplante ou tratamento deverá ser precedida de diagnóstico
de morte encefálica, constatada e registrada por dois médicos não
participantes das equipes de remoção e transplante, mediante a utilização
de critérios clínicos e tecnológicos definidos por resolução do Conselho
Federal de Medicina. (Grifo nosso).

Neste ínterim, constata-se que para a efetivação da doação de órgãos, deve


haver a morte encefálica do doador para que os órgãos sejam transplantados para o
novo indivíduo receptor.

Da mesma forma, está estabelecido na lei que, para a doação de órgãos, deve
haver manifestação expressa dos familiares do indivíduo doador11.

É claro que para uma pessoa ser beneficiada com a doação de órgãos, deve
estar inscrita em uma lista única do Sistema Nacional de Transplantes, bem como
preencher burocracias definidas em lei, para que o procedimento seja justo e
universal, garantindo o acesso a todos que necessitarem de transplante de órgãos.

9
URBAN, Cícero de Andrade apud Revista de Direito Constitucional e Internacional. Disponível em:
<http://www2.oabsp.org.br/asp/esa/comunicacao/artigos/eutanasia.pdf>. Acesso em: 23 abr. 2011.
10
Art. 9°, § 3º, da lei n.° 9.434/97. Só é permitida a doação referida neste artigo quando se tratar de
órgãos duplos, de partes de órgãos, tecidos ou partes do corpo cuja retirada não impeça o organismo
do doador de continuar vivendo sem risco para a sua integridade e não represente grave
comprometimento de suas aptidões vitais e saúde mental e não cause mutilação ou deformação
inaceitável, e corresponda a uma necessidade terapêutica comprovadamente indispensável à pessoa
receptora.
11 o
Art. 4 A retirada de tecidos, órgãos e partes do corpo de pessoas falecidas para transplantes ou
outra finalidade terapêutica, dependerá da autorização do cônjuge ou parente, maior de idade,
obedecida a linha sucessória, reta ou colateral, até o segundo grau inclusive, firmada em documento
subscrito por duas testemunhas presentes à verificação da morte. (Redação dada pela Lei nº 10.211,
de 23.3.2001).
37

Ocorre que, é notório que a mencionada lista a cada dia cresce mais e muitas
pessoas portadoras de doenças cuja cura depende de um transplante, morrem na fila
de espera.

Segundo o editorial da Revista de Direito Constitucional e Internacional (2007,


p. 14)12:

O que existe segundo o direito pátrio, para as pessoas humanas com


doenças cuja única opção terapêutica é o transplante, é a expectativa de um
direito, desde que cumpridas as determinações estabelecidas em lei, para
que, após cumpridos os requisitos legalmente estabelecidos, essas pessoas
humanas tenham direito e conseguintemente acesso a um transplante de um
órgão de uma outra pessoa humana, segundo pensamos.

Nesse sentido, acreditamos que, em um país como o Brasil, o qual, conforme


já foram referidas inúmeras vezes, é um país que prioriza a supremacia da vida, ao
legitimar a eutanásia para certos pacientes, poderia direcionar os órgãos sadios
destes para os enfermos que dependem do transplante para sobreviver e, assim,
salvar vidas.

É claro que, para a prática do transplante sob questão, dependeria da


autorização do doador, assim como ocorre atualmente nos demais casos. Porém,
esta prática seria uma maneira do Estado, além de proporcionar o livre arbítrio ao
indivíduo que deseja realizar a eutanásia, também aplicaria na prática os seus
princípios fundamentais, pois estaria dando vida para quem tem perspectivas de
melhora, bem como diminuiria os casos de mistanásia.

No entanto, considerando que a eutanásia é, atualmente, legalmente proibida,


como desvantagens a prática dessa, temos a sua tipificação como um crime e a
responsabilização criminal da pessoa que praticar o ato em favor do moribundo.

Por isso, sopesando os pontos acima referidos, bem como ponderando o fato
que a eutanásia está longe de ser legitimada no Brasil, verifica-se que a ortotanásia
surge como alternativa natural à eutanásia. Isso porque, neste instituto coexistem

12
Disponível em <http://www2.oabsp.org.br/asp/esa/comunicacao/artigos/eutanasia.pdf>. Acesso em:
23 abr. 2011.
38

vantagens como a vontade do paciente e diminuição do sofrimento deste, bem como


não se fazem presentes as desvantagens da prática de uma conduta ilícita.

Como já mencionado no capítulo anterior, a ortotanásia é caracterizada em


cuidados paliativos ao enfermo, priorizando o seu bem estar, não o submetendo a
tratamentos médicos indesejados, bem como, o paciente poderá desfrutar os seus
últimos dias na sua casa, na companhia de familiares e amigos, simplesmente a
base de medicamentos contra a dor, porém sem impedir o ciclo natural da morte.

Além do já exposto, como previamente referido, o tema da eutanásia e da


ortotanásia podem ser apresentados simplesmente pela indagação de qual é o
alcance do livre arbítrio de um cidadão em um estado democrático de direito.

Nesse sentido, cabe refletir-se sobre a mencionada liberdade e seu


enquadramento pela Constituição Federal da República Brasileira. Por isso, vale à
pena referir que até o ano de 2000, o artigo 4°, da lei n.° 9434/97, previa a
possibilidade de transplante de órgãos de pessoas falecidas, quando estas não
haviam expressado formalmente em vida vontade contrária.

Assim, o antigo texto legal autorizava a retirada de órgãos sem o


consentimento do defunto, muito menos de seus familiares, que, provavelmente,
jamais ficariam sabendo acerca do procedimento realizado.

Sobre o tema, Loureiro (2009, p. 20, grifo nosso), ressalta que:

Sua redação original gerou polêmica, dilemas éticos e morais suscitando


manifestações da Bioética e do Biodireito, uma vez que havia uma
presunção de que todos os indivíduos seriam doadores, salvo
manifestação de vontade em contrário. Presunção essa que estaria
ferindo direitos à personalidade e à dignidade da pessoa humana. Foi
uma imposição violenta do Estado, uma lei compulsória e absurda que
passou por cima de tais direitos, onde o Estado se sentiu no direito de se
apropriar dos corpos por uma decisão unilateral. Houve um verdadeiro
descompasso entre a vontade legal e os anseios da sociedade no que diz
respeito à legislação atinente à remoção de órgãos e tecidos para fins de
transplantes, fazendo com que houvesse uma manifestação generalizada na
opinião pública, a qual esboçou sua contrariedade ao novo dispositivo legal.
39

Sinala-se que o parágrafo único, do artigo 4°, da lei n.°9.434/97, o qual previa
a retirada de tecidos, órgãos e partes do corpo de pessoas falecidas foi vetado com
as seguintes justificativas13:

A inserção deste parágrafo induz o entendimento que, uma vez o potencial


doador tenha registrado em vida a vontade de doação de órgãos, esta
manifestação em si só seria suficiente como autorização para a retirada dos
o
órgãos. Isto além de contrariar o disposto no caput do art. 4 - a autorização
familiar, contraria a prática da totalidade das equipes transplantadoras do
País, que sempre consultam os familiares (mesmo na existência de
documento com manifestação positiva de vontade do potencial doador) e
somente retiram os órgãos se estes, formalmente, autorizarem a doação.

Prosseguindo, Loureiro (2009, p. 20) destaca que:

O legislador optou por alterar o art. 4° da lei n° 9.433/97, acabando com a


doação presumida, passando-se a exigir a autorização dos familiares
elencados nesse artigo, os quais se tornaram responsáveis pela autorização
da retirada de órgãos do cadáver do seu ente falecido. Assim, embora o
direito à vida seja um bem jurídico tutelado como direito fundamental básico,
no caso da lei dos transplantes, na ponderação de valores dos princípios em
confronto, preponderou o princípio fundamental da dignidade da pessoa
humana, ao retirar da lei a obrigatoriedade, caso manifestação em contrário,
a doação presumida ou compulsória.

Em outras palavras, a partir do veto do supracitado texto legal, constata-se


que o legislador decidiu que o livre arbítrio de um cidadão permite a ele doar os seus
órgãos em vida ou após a morte (dependendo do caso). Entretanto, esse mesmo
livre arbítrio requer manifestação individual do cidadão, de forma que, em não
havendo registro favorável à doação, esta não poderá ser realizada, nem que lei
assim disponha.

Disso se percebe, além da possibilidade, obviamente, da realização de


transplantes, o reconhecimento da natureza individual do livre arbítrio, que deve se
sobrepor à vontade coletiva.

Por este prisma, sobre a supremacia da vontade individual do livre arbítrio, é


imperioso se observar que é justamente este o próprio fundamento da eutanásia.

13
Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/Mensagem_Veto/2001/Mv252-01.htm>.
Acesso em: 23 abr. 2011.
40

Ora, se no Brasil já está consolidado o entendimento de que cada cidadão tem


a liberdade suprema de manifestar a sua vontade para a doação ou transplante de
órgãos, observa-se que a legalização da eutanásia, embora ainda não tenha
ocorrido, pelo menos já tem reconhecido o seu fundamento principal (supremacia
individual do livre arbítrio) pelo sistema jurídico nacional.

Destarte, é lógico e natural que se indague: se já está consolidado o


entendimento de que o livre arbítrio alcança a doação e o transplante de órgãos, o
que falta (se é que falta), para se legalizar a eutanásia com base nesta mesma
liberdade?

Desta forma, acredita-se que, assim como ocorreu na doação de órgãos, a


eutanásia dever ser legalmente reconhecida para pacientes terminais que resolvam
aderir a sua efetivação.

Frisa-se, novamente, que a prática ou não da eutanásia, deve partir do próprio


moribundo e na falta deste, a decisão não dever ser tomada pelo Estado, mas sim
pela família do paciente, com base nos princípios que o mesmo detinha em vida.

Sinala-se, por fim, que se está tutelando pelo reconhecimento da vontade do


indivíduo, o qual é o único proprietário de seu corpo físico, sob o fundamento que,
assim como as pessoas no decorrer de suas vidas escolhem, de forma livre, o
destino a ser seguido, no processo morte esse mesmo livre arbítrio que ocorreu no
transcurso da vida, deve ser respeitado, de maneira que cada cidadão decida acerca
do seu fim de forma digna.
41

CONCLUSÃO

A presente monografia foi elaborada com a intenção de estudar e analisar a


legitimidade da proibição da eutanásia no Brasil, com o pressuposto de que,
atualmente, o Estado Brasileiro, ao mesmo tempo em que proíbe a eutanásia com o
fundamento da inviolabilidade da vida, também deixa muitas pessoas morrerem
diante da mistanásia.

Para tanto, no primeiro capítulo, examinou-se o princípio da dignidade da


pessoa humana, bem como o direito inerente do ser humano que é a vida.
Consequentemente abordou-se acerca do direito à morte, que até então, não é
tutelado pela legislação brasileira, assim como a eutanásia.

Da mesma forma, passou-se à análise acerca da vontade do moribundo que


enfrenta uma doença incurável, que passa diariamente por dores insuportáveis e
deseja por fim a uma vida que para ele não é mais digna.

Em seguida, verificaram-se as diversas modalidades de


interrupção/prolongamento da vida ligadas à eutanásia, entre elas, a distanásia,
ortotanásia, eutanásia e a mistanásia.

No segundo capítulo, analisou-se a proibição da eutanásia e a


responsabilidade do Estado em face da mistanásia, de modo que a presente análise
deu-se a partir do princípio da dignidade da pessoa humana.

Assim, a partir da mencionada apreciação, bem como através de exemplos


verídicos acerca da mistanásia, os quais foram colacionados no presente trabalho,
42

constatou-se que o Estado Brasileiro, de fato, proíbe a eutanásia, com o fundamento


de que a vida do ser humano é inviolável, porém não põem em prática os princípios
fundamentais do Estado Democrático de Direito, tendo em vista que são diversos os
casos de mistanásia e a responsabilidade dessas mortes é estatal.

Por tais razões, concluiu-se que o indivíduo tem o direito à vida, mas não tem
o direito sobre ela, tendo em vista que este não possui o poder de escolha acerca do
seu processo morte.

Desta forma, ressaltou-se a ortotanásia e o transplante de órgãos como


modalidades que podem ser consideradas como alternativas à eutanásia. Pois, na
ortotanásia, o paciente pode negar-se a submeter-se a certos tratamentos, bem
como pode passar seus últimos dias junto com a sua família, em sua residência, sem
que ninguém seja responsabilizado criminalmente por permitir tal conduta. Assim, o
moribundo estará agindo de acordo com o seu livre arbítrio.

Do mesmo modo, sugeriu-se a doação de órgãos como fundamento para


legitimar a eutanásia, bem como diminuir os casos de mistanásia, levando em
consideração que o paciente que efetivasse a eutanásia, seria um possível doador
de órgãos que salvaria uma segunda vida, diminuindo assim a mistanásia.

Por fim, ressaltou-se que a eutanásia deve ser legitimada apenas para casos
em que, de fato, não há perspectivas de cura e o sofrimento do paciente é maior que
o simples fato de viver. Do mesmo modo, frisou-se a importância acerca da vontade
e do livre arbítrio do paciente, ao passo que, quando este não tiver mais condições
para decidir, a legitimidade ou não acerca da eutanásia deve ser concedida para a
família do moribundo, garantindo-lhe, acima de tudo, a sua dignidade como pessoa
humana.
43

REFERÊNCIAS

BERNARDO, Wesley de Oliveira Lousada. O princípio da dignidade da pessoa


humana e o novo direito civil: breves reflexões. Disponível em: <http://www.fdc.br/
Arquivos/Mestrado/Revistas/Revista08/Artigos/WesleyLousada.pdf>. Acesso em: 11
maio 2010.

BORGES, Roxana Cardoso Brasileiro. Eutanásia, ortotanásia e distanásia: breves


considerações a partir do biodireito brasileiro. Disponível em:
<http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=7571>. Acesso em: 23 out. 2009.

BRASIL (Constituição, 1988). Constituição da República Federativa do Brasil de


1988. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2004.

______. Lei n° 9.434, de 4 de fevereiro de 1997. Dispõe sobre a remoção de


órgãos, tecidos e partes do corpo humano para fins de transplante e
tratamento e dá outras providências. In: Vade mecum profissional &
acadêmico. São Paulo: Saraiva, 2010.

BRUM, Eliane e Marcelo Mim. A enfermaria entre a vida e a morte. Disponível em:
<http://www.direitonet.com.br/artigos/exibir/4270/Breve-estudo-juridico-acerca-do-
direito-a-vida-e-do-direito-a-morte> Acesso em: 24 mar. 2011

CASO Eluana: Eutanásia e conflito entre poderes. Disponível em:


<http://www.paranaonline.com.br/canal/direitoejustiça/news/358842/?noticia=CASO+
ELUANA+EU TANASIA+E+CONFLITO+ENTRE+PODERES>. Acesso em: 10 set.
2009.

CLICAPIAUI.COM. Disponível em:<http://www.clicapiaui.com/geral/38177/enfermeira


-e-indiciada-por-aplicar-vaselina-em-menina.html> Acesso em: 1 maio 2011.

DIREITO E JUSTIÇA. Reflexões sociojurídicas. Universidade Regional Integrada


do Alto Uruguai e das Missões-URI, Santo Ângelo; organização de Astrid Heringer,
Janete Rosa Martins- v. 1, n. 1(abril 2002). Santo Ângelo: EDIURI, 2009, p. 18/28.

DI PAOLO, Edvige. Luciane Aparecida Ribas e Maria Regina Rodrigues Pereira.


Eutanásia social: um estudo de caso da população de rua de Juiz de Fora.
Disponível em: <http://web2.cesjf.br/sites/cesjf/revistas/cesrevista/edicoes/2006/euta
nasia_social.pdf> Acesso em 27 mar. 2011.
44

ELUANA Englaro. Está em estado físico ótimo, diz neurologista. Disponível em:
<http://www1.folha.uol.com.br/folha/mundo/ult94u500923.shtml>. Acesso em: 22 out.
2009.

GOETTEN, Glenda Francês Moraes. Eutanásia x direito à vida. Disponível em:


<http://www.direitonet.com.br/artigos/exibir/600/Eutanásia-X-Direito-a-vida>. Acesso
em: 25 set. 2009.

G1-São Paulo. Morte por falta de atendimento médico será investigada.


Disponível em: <http://g1.globo.com/saopaulo/noticia/2010/11/morte-por-falta-de-
atendimento-medico-sera-investigada-diz-kassab.html> Acesso em 10. abr. 2011.

HOUAISS, Antônio e Vilmar Mauro de Salles. Dicionário Houaiss da língua


portuguesa. Rio de Janeiro: Objetiva, 2001.

LOBATO, Maria do Carmo. Ausência de atendimento provoca morte com causa


social. Disponível em:<http://academiademedicinamt.com.br/site/artigo_view.aspx?id
=12>. Acesso em 10. abr. 2011.

LOUREIRO, Zuleica Regina de Araújo. Doador de órgãos Post Mortem: uma


Vontade sobrestada pelo art. 4º da lei 9.434/97. Disponível
em:<http://www.fesmpdft.org.br/arquivos/mono_zuleica.pdf>. Acesso em 23 abr.
2011.

MARTIN, Leonard. A mistanásia: a “eutanásia social”. Disponível em:


<http://paginasdefilosofia.blogspot.com/2009/07/mistanasia-eutanasia-social.html>
Acesso em: 10 fev. 2011.

MARTÍNEZ, Fernando Rey. Eutanasia y derechos fundamentales. Revista Direito e


Justiça. Reflexões Sociojurídicas. Universidade Regional Integrada do Alto Uruguai
e das Missões-URI, Santo Ângelo; organização de Astrid Heringer, Janete Rosa
Martins- v. 1, n. 1(abril 2002). Santo Ângelo: EDIURI, 2009, p. 18/28.

MORRE Eluana Englaro. Disponível em:


<http://veja.abril.com.br/noticia/internacional/morreeluanaenglaro420435.html>
Acesso em: 10 set. 2009.

MOTA, Sílvia. Princípio da dignidade da pessoa humana e manipulação e


genéticas. Disponível em:<www.silviamota.com.br/enciclopediabiobio/artigosbiobio/p
rincipio-dignidadehumana.htm>. Acesso em: 11 maio 2010.

NAMBA, Edison Tetsuzo. Manual de bioética e biodireito. São Paulo: Atlas, 2009.

O Globo. Disponível em: <http://oglobo.globo.com/mundo/mat/2009/02/09/eutanasia-


morre-na-italia-eluana-englaro-754327534.asp>. Acesso em: 11 nov. 2010.

PAI de Eluana Englaro a sequestra para aplicar-lhe eutanásia em Udine. Disponível


em: <http://www.acidigital.com/noticia.php?id=15339>. Acesso em: 08 out. 2009.

PESSOA, Laura Scalldaferri. Pensando o final: reflexões sobre o direito de morrer.


45

Disponível em:<http://www.publicadireito.com.br/conpedi/manaus/arquivos/Anais/sao
_paulo/2073.pdf>. Acesso em: 10 out. 2010.

REVISTA DE DIREITO CONSTITUCIONAL E INTERNACIONAL. Instituto Brasileiro


de Direito Constitucional. Ed. RT, 2007, p. 39/50. Disponível em:
<http://www2.oabsp.org.br/asp/esa/comunicacao/artigos/eutanasia.pdf>. Acesso em
23 abr. 2011.

REZENDE, A. L. M. et al. Ritos de morte na lembrança de velhos. Florianópolis:


Ed. da UFSC, 1996.

RODRIGUES, Carlos de Rezende. Breve estudo jurídico acerca do direito à vida


e do direito à morte. Disponível em:
<http://www.direitonet.com.br/artigos/exibir/4270/Breve-estudo-juridico-acerca-do-
direito-a-vida-e-do-direito-a-morte>. Acesso em 27 out. 2010

SARLET, Ingo Wolfgang. Dignidade da pessoa humana e direitos fundamentais


na Constituição Federal de 1988. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2010.

URBAN, Cícero de Andrade apud Revista de Direito Constitucional e Internacional.


Disponível em: <http://www2.oabsp.org.br/asp/esa/comunicacao/artigos/eutanasia.pd
f>. Acesso em: 23 abr. 2011.

Você também pode gostar