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Destruiçao e Conservaçao da Floresta Amazonica-Prova

Book · August 2022

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1 author:

Philip Fearnside
Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia
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DESTRUIÇÃO E
CONSERVAÇÃO DA

FEARNSIDE
FLORESTA

PHILIP M.
AMAZÔNICA
PHILIP M. FEARNSIDE

DESTRUIÇÃO E CONSERVAÇÃO DA
FLORESTA AMAZÔNICA

Livro_Destruição_Conservação_Capa.indd 1 8/18/2022 3:21:39 PM


DESTRUIÇÃO E CONSERVAÇÃO DA
FLORESTA AMAZÔNICA

PHILIP M. FEARNSIDE

1ª edição

Manaus
2022

Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 1 8/18/2022 3:12:45 PM


Copyright © 2022 - Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia

MINISTRO DA CIÊNCIA, TECNOLOGIA FOTOGRAFIAS DA CAPA


E INOVAÇÕES Descrição: Reserva de
Paulo César Alvim Desenvolvimento Sustentável do
Uatumã. Floresta Amazônica, vista
a partir da Torre ATTO/INPA.
DIRETORA DO INSTITUTO NACIONAL
Crédito: Cimone Barros.
DE PESQUISAS DA AMAZÔNIA
Antonia Maria Ramos Franco Pereira Descrição: Queimada em Rondônia.
Crédito: Philip M. Fearnside.
PROJETO GRÁFICO E
EDITORAÇÃO ELETRÔNICA
Rodrigo Verçosa
Descrição: Terra preparada para soja
em Mato Grosso.
EDITORA INPA
Crédito: Philip M. Fearnside.
Editor-Chefe
Mario Cohn-Haft
Descrição: Caminhão madeireiro na
Produção Editorial
BR-163.
Rodrigo Verçosa
Crédito: Mauricio Torres.
Shirley Ribeiro Cavalcante
Tito Fernandes

Descrição: Barragem de Belo


Catalogação na Publicação (CIP-Brasil) Monte.
F288d Fearnside, Philip M. Crédito: Philip M. Fearnside.
Destruição e conservação da floresta
amazônica / Philip M. Fearnside. - Manaus:
Editora do INPA, 2022.

ISBN 978-85-211-0193-2
356 p. : il. color.

1. Floresta amazônica - conservação. 2.


Floresta amazônica - destruição. I. Título

CDD 634.9811

Editora do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia


Av. André Araújo, 2936 – Cep: 69067-375 Manaus – AM, Brasil
Tel: 55 (92) 3643-3223
www.gov.br/inpa e-mail: editora@inpa.gov.br

Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 2 8/18/2022 3:12:46 PM


ÍNDICE 3

1. Desmatamento na Amazônia 11. Uma análise das lacunas de


brasileira: História, índices e 7 conservação da vegetação da 193
consequências (P.M. Fearnside) Amazônia (P.M. Fearnside & J. Ferraz)

2. Uso da terra na Amazônia e as 12. Política de conservação na Amazônia


mudanças climáticas globais 21 brasileira: Entendendo os dilemas 213
(P.M. Fearnside) (P.M. Fearnside)

3. Questões de posse da terra como 13. BR-163: A rodovia Santarém-Cuiabá


fatores na destruição ambiental na e o custo ambiental de asfaltar um
Amazônia brasileira: O caso do sul 39 corredor de soja na Amazônia 239
do Pará (P.M. Fearnside) (P.M. Fearnside)

4. O cultivo da soja como ameaça 14. Fearnside, P.M. 2006. Desmatamento


para o meio ambiente na Amazônia 55 na Amazônia: Dinâmica, impactos e 259
brasileira (P.M. Fearnside) controle (P.M. Fearnside)

15. BR-319: A rodovia Manaus-Porto


5. A intensificação da pastagem pode
Velho e o impacto potencial de
frear o desmatamento no Brasil? 81 conectar o arco de desmatamento à 267
(P.M. Fearnside)
Amazônia central
(P.M. Fearnside & P.M.L.A. Graça)
6. Fósforo e a capacidade de suporte
humano na Amazônia brasileira 95 16. Modelagem de desmatamento e
(P.M. Fearnside)
emissões de gases de efeito estufa
na região sob influência da Rodovia
7. Solo e desenvolvimento na
Amazônia: Lições do projeto
Manaus-Porto Velho (BR-319) 287
(P.M. Fearnside, P.M.L.A. Graça,
dinâmica biológica de fragmentos 107 E.W.H. Keizer, F.D. Maldonado, R.I.
florestais Barbosa & E.M. Nogueira)
(P.M. Fearnside & N. Leal Filho)
17. Grandes estradas amazônicas
8. Fatores limitantes para o (P.M. Fearnside) 317
desenvolvimento da agropecuária na 135
Amazônia brasileira (P.M. Fearnside) 18. Dinâmica de uso da terra e
a expansão de propriedades
9. O futuro da Amazônia: Modelos rurais em Apuí, um hotspot
para prever as consequências da do desmatamento na 329
infraestrutura futura nos planos Rodovia Transamazônica
plurianuais 157 (G.C. Carrero & P.M. Fearnside)
(P.M. Fearnside, W.F. Laurance, M.A.
Cochrane, S. Bergen, P.D. Sampaio, C. 19. A Política Brasileira Ameaça as
Barber, S. D’Angelo & T. Fernandes) Políticas Públicas Ambientais 345
(P.M. Fearnside)
10. Controle do desmatamento no Mato
Grosso: Um novo modelo para 20. Como sempre, os negócios: o
reduzir a velocidade de perda da 177 ressurgimento do desmatamento na 351
floresta amazônica (P.M. Fearnside) Amazônia brasileira (P.M. Fearnside)

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APRESENTAÇÃO
As decisões tomadas nos próximos anos sobre desenvolvimento de infraestrutura e
políticas públicas na Amazônia serão entre as mais influentes em determinar o futuro da
população humana e do meio ambiente na região. A maioria dos capítulos deste livro são
traduções atualizadas de trabalhos originalmente publicados na literatura internacional,
ou de trabalhos na literatura brasileira. A magnitude dos planos, junto com a magnitude
dos seus impactos, faz com que seja extremamente importante tirar todas as lições possí-
veis dos erros e acertos na região até agora. Estas experiências indicam a necessidade de
melhoria dos sistemas de planejamento de desenvolvimento, análise de impactos e licen-
ciamento de obras. Este livro reúne as informações de uma forma acessível para facilitar
um repensamento da forma de planejar e licenciar grandes projetos de todos os tipos.
As publicações originais para os capítulos aqui apresentados abrangem um período
de 26 anos (1989-2014). Isso levanta a questão de como lidar com a atualização das infor-
mações, especialmente onde a informação atual mudaria significativamente os resultados
numéricos que têm sido amplamente citados em sua forma “clássica”. Esse dilema tem
sido tratado, mantendo os valores originais e adicionando notas indicando as alterações
relevantes no conhecimento. Em alguns casos, os eventos desde a publicação original
precisam ser resumidos. Cada capítulo do livro, assim como as publicações originais,
é intencionado a ser independente dos outros, o que significa que alguma repetição de
informação é necessária.
Agradeço as seguintes pessoas pela ajuda na revisão linguística: Gabriel Cardoso
Carrero, Jeane Marcelle Cavalcante do Nascimento, João Ferraz, Karina Dias da Silva,
Lívia Fusari, Neusa Hamada, Niwton Leal Filho, Paulo Maurício Lima de Alancastro
Graça, Paulo Vilela Cruz, Sheila Couceiro e Renato Tavares Martins.

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CAPÍTULO

1
Desmatamento na Amazônia brasileira:
História, índices e consequências

Philip M. Fearnside
Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (INPA).
Av. André Araújo, 2936, Manaus, Amazonas, Brasil. CEP: 69.067-375.
E-mail: pmfearn@inpa.gov.br

Tradução de:
Fearnside, P.M. 2005. Deforestation in Brazilian Amazonia: History, rates and consequences.
Conservation Biology 19(3): 680-688. https://doi.org/10.1111/j.1523-1739.2005.00697.x

Tradução original:
Fearnside, P.M. 2005. Desmatamento na Amazônia brasileira: História, índices e consequências.
Megadiversidade 1(4): 113-123. http://www.conservation.org.br/publicacoes/megadiversida-
de/16_Fearnside.pdf

7
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DESTRUIÇÃO E CONSERVAÇÃO
8 DA FLORESTA AMAZÔNICA

RESUMO O combate ao desmatamento no Brasil é


uma prioridade para o governo e para as or-
A floresta amazônica brasileira perma- ganizações internacionais. O monitoramen-
neceu completamente intacta até o início to e a repressão são, atualmente, as estra-
da era “moderna” do desmatamento, com tégias principais. Uma fiscalização efetiva e
a inauguração da rodovia Transamazônica, a arrecadação de multas daqueles que não
em 1970. Os índices de desmatamento na possuem autorização do Ibama, contudo,
Amazônia vêm aumentando desde 1991 com devem ser acompanhadas pela compreensão
o processo de desmatamento num ritmo va- necessária dos aspectos sociais, econômi-
riável, mas rápido. Embora a floresta amazô- cos e políticos para se tratar o problema por
nica seja desmatada por inúmeras razões, a meio de mudanças na política.
criação de gado ainda é a causa predominan-
te. As fazendas de médio e grande porte são
responsáveis por cerca de 70% das ativida- A EXTENSÃO E O ÍNDICE DE
des de desmatamento. O comércio da carne DESMATAMENTO
bovina é apenas uma das fontes de renda Em 2003, a área de floresta desmatada
que faz com que o desmatamento seja lu- na Amazônia brasileira alcançou 648,5 ×
crativo. A degradação da floresta resulta do 103 km2 (16,2% dos 4 × 106 km2 da flores-
corte seletivo, dos incêndios (facilitados pelo ta original da Amazônia Legal, que é de 5
corte seletivo) e dos efeitos da fragmentação ×106 km2), incluindo, aproximadamente,
e da formação de borda. A degradação con- 100 ×103 km2 de desmatamento “antigo”
tribui para a perda da floresta. Os impactos (pré-1970) no Pará e no Maranhão (Figura
do desmatamento incluem a perda de bio- 1; Brasil, INPE, 2018). O índice atual e a ex-
diversidade, a redução da ciclagem da água tensão cumulativa do desmatamento abran-
(e da precipitação) e contribuições para o gem áreas enormes. A extensão original da
aquecimento global. As estratégias para de- floresta amazônica brasileira era, aproxi-
sacelerar o desmatamento incluem a repres- madamente, equivalente à área da Europa
são através de procedimentos de licencia- Oriental. O índice é frequentemente discuti-
mento, monitoramento e multas. O rigor das do no Brasil em termos de “Bélgicas” já que a
penalidades deve ser suficiente para impedir perda anual equivale à área desse país (30,5
os desmatamentos ilegais, mas não tão gran- ×103 km2), enquanto que a soma cumulativa
de que as impeçam de ser executadas. Uma é comparada à França (547,0 ×103 km2). A
reforma política também é necessária para presença europeia, por quase cinco séculos,
discutir as causas primordiais do desmata- antes de 1970, desmatou uma área ligeira-
mento, incluindo o papel do desmatamento mente maior que Portugal. Os valores atu-
no estabelecimento da posse da terra. ais do desmatamento podem ser obtidos na
website do INPE (http://www.inpe.br). As
explicações oficiais, assim como os motivos
INTRODUÇÃO pelos quais os índices do desmatamento flu-
A ocupação intensa da Amazônia come- tuam (decretos influenciando os incentivos
çou no início da década de 1970. Embora e programas para fiscalização e arrecadação
áreas extensas ainda permaneçam intactas, de multas), no entanto, são provavelmente
a taxa de perda da floresta é dramática, em incorretas, como explico aqui. Além disso,
especial no “arco do desmatamento”, ao lon- uma variedade de questões técnicas sobre as
go das bordas sul e leste. A perda da bio- próprias estatísticas permanece em aberto
diversidade e os impactos climáticos são as (Fearnside & Barbosa, 2004).
maiores preocupações. A vastidão das flores-
tas remanescentes significa que os impactos CAUSAS DO DESMATAMENTO
potenciais do desmatamento de forma con-
tinuada são muito mais importantes que os Na Amazônia brasileira, o peso relativo
já severos impactos que ocorreram até hoje. dos pequenos fazendeiros versus grandes

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Desmatamento na Amazônia brasileira:
História, índices e consequências 9

FIGURA 1.
Desmatamento na
Amazônia brasileira.
Para o desmatamento
acumulado, a parte
preta de cada
barra representa o
desmatamento anterior
a 1970. Dados do INPE
(2018), exceto o ano
de 1978 (Fearnside,
1993b).

latifundiários altera-se continuamente devi- especulação de terra (Hecht et al., 1988;


do às pressões econômicas e demográficas. Faminow, 1998; Fearnside, 1987, 2002b). A
Os grandes latifundiários são mais sensíveis especulação de terra foi importante até por
às mudanças econômicas, tais como as taxas volta de 1987, quando houve um aumento
de juros e outros investimentos, subsídios subsequente do lucro da pastagem a partir
governamentais para o crédito agrícola, índi- da produção de carne bovina (Mattos & Uhl,
ce de inflação e preço da terra. 1994; Margulis, 2003).
Os incentivos fiscais foram um forte con- A recessão econômica brasileira é a me-
dutor do desmatamento nas décadas de 1970 lhor explicação para a queda nos índices do
e 1980 (Mahar, 1979). Embora um decreto desmatamento de 1987 até 1991. Os fazen-
em 1991 tenha suspendido novos incenti- deiros não tinham capacidade de expandir
vos, os antigos continuam, ao contrário da suas áreas desmatadas tão rapidamente e o
impressão sustentada por afirmações de au- governo não tinha recursos para a constru-
toridades do governo de que tudo acabou. ção de rodovias e para projetos de assenta-
Outros incentivos, como o crédito subsidia- mento. O impacto das medidas de repressão
do pelo governo com taxas bem abaixo da (p. ex., patrulhamento com helicópteros,
inflação, tornaram-se muito mais escassos confisco de motosserras, multas) foi, prova-
depois de 1984. velmente, menor. A mudança política sobre
os incentivos fiscais também foi ineficaz. O
Antes do Plano Real, em 1994, a hiperin- decreto suspendendo os incentivos (nº 153)
flação dominou a economia do Brasil duran- começou a vigorar em 25 de junho de 1991
te décadas. A terra era muito valorizada e – subsequente à maior queda observada no
os preços atingiam níveis mais altos do que desmatamento (Figura 1). Mesmo naquele
poderiam ser justificados como um insumo último ano (1991), o efeito teria sido míni-
para a produção agropecuária. a retirada das mo, porque o mês de agosto foi a data média
florestas possibilitava reivindicações pela das imagens do satélite Landsat para o con-
terra e o desmatamento para a formação junto de dados de 1991. Em seu ponto mais
de pastagens era o mais barato e mais efe- baixo, em 1991, muitos fazendeiros foram
tivo nesse sentido, embora seja questioná- impossibilitados de usar seus recursos para
vel até onde essa atividade era usada como investir em desmatamento porque o então

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DESTRUIÇÃO E CONSERVAÇÃO
10 DA FLORESTA AMAZÔNICA

presidente, Fernando Collor de Melo, havia de desmatamento, com um marcante cresci-


confiscado as contas bancárias em março de mento do mercado internacional de soja e,
1990, com o dinheiro sendo posteriormente em especial, de carne bovina. Anteriormente,
liberado em pequenas prestações. a carne bovina restringia-se ao mercado na-
cional devido à febre aftosa (Alencar et al.,
O pico de 1995 foi, provavelmente, um
2004; Kaimowitz et al., 2004).
reflexo da recuperação econômica do Plano
Real. As reformas aumentaram a disponibili- Conhecer os responsáveis pelo desmata-
dade de capital e as eleições municipais, em mento é vital para qualquer programa que
1994, resultaram no aumento do crédito agrí- busca sua redução. Os levantamentos rea-
cola. Esse aumento de capital para os fazen- lizados em 1998, no arco do desmatamen-
deiros foi muito mais efetivo em incentivar to, que se estende de Paragominas até Rio
o desmatamento do que as mudanças eco- Branco, encontraram apenas 25% das áreas
nômicas que influenciaram o valor dos bens desmatadas em propriedades iguais ou me-
duráveis, como a terra. A queda posterior nos nores a 100 hectares (Nepstad et al., 1999a).
índices de desmatamento, em 1996 e 1997, O custo social da redução considerável dos
foi uma consequência lógica do Plano Real ter índices de desmatamento seria, portanto,
cortado, de forma brusca, o índice da infla- muito menor do que é sugerido em pronun-
ção. Os preços da terra atingiram o pico em ciamentos frequentes, que culpam a pobre-
1995 e caíram quase 50% no final de 1997. za pelos problemas ambientais na região.
Esses preços em queda fizeram da especula- Assim, estratégias como as que promovem
ção um negócio não atrativo. Em seguida, os agroflorestas entre os pequenos fazendeiros
índices de desmatamento subiram para 17-18 são provavelmente ineficazes quando, na
× 103 km2 por ano, permaneceram constan- verdade, os pecuaristas latifundiários são
tes pelos quatro anos seguintes, e deram um os principais vilões. O dinheiro do tráfico
salto, em 2002, para um novo patamar de 23 de drogas, da corrupção e de muitas outras
× 103 km2 por ano (Figura 1). fontes ilegais pode ser lavado com investi-
mentos em iniciativas de lucro questionável,
A associação das maiores variações na
tais como dragas de mineração de ouro e fa-
taxa de desmatamento com os fatores macro-
zendas de criação de gado falidas. O rápido
econômicos, tais como a disponibilidade de
aumento do tráfico de drogas na Amazônia,
capital e o índice de inflação, é uma indica-
provavelmente, agravará tal tendência.
ção de que a maior parte desse desmatamen-
to é realizado mais por aqueles que investem Atualmente, o avanço das plantações de
em fazendas médias e grandes de criação soja na região apresenta-se como a maior
de gado, que por pequenos fazendeiros que ameaça, com seu estímulo para o investi-
usam a força de trabalho familiar. O papel mento maciço do governo em infraestrutura,
predominante dos latifundiários é compro- como hidrovias, ferrovias e rodovias. O de-
vado pela localização das áreas desmatadas. senvolvimento da infraestrutura desata uma
O Estado do Mato Grosso, sozinho, contabi- cadeia traiçoeira de investimento e explora-
lizou 26% do total de 11,1 ×103 km2 de área ção que pode destruir mais florestas do que
desmatada, em 1991, e tinha a maior porcen- as próprias plantações (Fearnside, 2001c). As
tagem de suas terras privadas em fazendas estradas para retirada de madeira, especial-
iguais ou maiores que 1.000 hectares (84% mente para extração de mogno, precedem e
na época do censo agrícola de 1985). Por ou- acompanham as rodovias, tornando as fron-
tro lado, o Estado de Rondônia – famoso por teiras acessíveis para o investimento dos lu-
seu desmatamento pelos pequenos fazendei- cros do comércio da madeira em plantações
ros – representava apenas 10% do total de de soja e fazendas para a criação de gado.
1991, e o estado do Acre, apenas 3%. O au- A extração da madeira aumenta a inflama-
mento para um índice de 23 × 103 km2/ano, bilidade da floresta, levando às queimadas
em 2002, mesmo com a economia interna do sub-bosque que colocam em movimento
sem vitalidade, pode ser parcialmente atribu- um ciclo vicioso de mortalidade de árvores,
ído a um aumento da globalização das forças aumento da carga de combustível, reentrada

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Desmatamento na Amazônia brasileira:
História, índices e consequências 11

do fogo e, por fim, destruição total da flo- que em uma floresta não explorada (Nepstad
resta. O que começou como um desmata- et al., 2004).
mento não detectado conduz a um estrago Nas florestas da Amazônia, o fogo se
detectável como desmatamento nas imagens espalha como uma linha de chamas de mo-
de satélite Landsat (Cochrane et al., 1999; vimento lento no sub-bosque. As bases de
Nepstad et al., 1999b). muitas árvores são queimadas à medida
A infraestrutura de transporte acelera a que o fogo se prolonga. As árvores da flo-
migração para áreas remotas e aumenta o resta amazônica não são adaptadas ao fogo
desmatamento de propriedades já estabele- e a mortalidade a partir de uma primeira
cidas. O programa Avança Brasil, um pacote queimada fornece o combustível e a aridez
de desenvolvimento para o período de 2000- necessários para fazer as queimadas subse-
2007, incluiu US$ 20 bilhões para infraestru- quentes muito mais desastrosas. A tempe-
tura na região da Amazônia (Laurance et al., ratura alcançada e a altura das chamas na
2001; Nepstad et al., 2001; Fearnside, 2002a), segunda queimada são, significativamente,
a maioria voltada à necessidade de transporte maiores que na primeira, matando muitas
de soja. As rodovias estão em péssimas con- outras árvores (Cochrane, 2003). Depois de
dições, particularmente, a BR-163 (Santarém- várias queimadas, a área fica devastada a
Cuiabá) e a BR-319 (Manaus-Porto Velho), ponto de aparecer como desmatamento nas
que possibilitam o acesso a grandes blocos imagens de satélite Landsat (Cochrane et al.,
1999; Nepstad et al., 1999b).
de floresta pouco alterada. O seu sucessor, o
Plano Plurianual (PPA) para 2004-2007, é pra- Durante o fenômeno El Niño, em 1997-
ticamente idêntico ao Avança Brasil. 1998, o grande incêndio de Roraima queimou
entre 11.394 e 13.928 km2 de floresta primá-
ria intacta (Barbosa & Fearnside, 1999), e as
O PAPEL DO CORTE SELETIVO E DO FOGO queimadas no arco do desmatamento tota-
NA PERDA DA FLORESTA lizaram mais 15 × 103 km2 (Nepstad et al.,
1999b; Cochrane, 2003). Uma queimada sig-
O corte seletivo aumenta consideravel- nificativa também ocorreu em áreas de corte
mente a vulnerabilidade da floresta ao fogo. seletivo próximo à Tailândia, no sul do Pará
Quando o fogo entra na floresta, ele mata as e em floresta no estado do Amazonas. No
árvores, aumenta a carga de combustível e sul do Pará, os danos do El Niño são maiores
seca o sub-bosque, elevando o risco de futu- devido a uma combinação de fatores: uma
ras queimadas e da completa degradação da estação seca mais duradoura que em outras
floresta. O impacto do corte de espécies de partes da Amazônia, a concentração da ati-
baixa densidade e comercialmente valiosas vidade de corte seletivo e a concentração de
é, frequentemente, subestimado. O proces- desmatamento e queimada associada para
so de corte seletivo resulta em um prejuízo favorecer a agricultura e a criação de gado.
de quase duas vezes o volume de árvores
que estão sendo removidas (Veríssimo et al.,
1992). Devido ao fato de muitas árvores me- OS IMPACTOS DO DESMATAMENTO
nores serem mortas, o efeito sobre os indiví-
duos é ainda maior. Próximo à Paragominas,
Perda de produtividade
no Pará, para cada árvore retirada, 27 outras A erosão e a compactação do solo e a
árvores foram mortas ou severamente preju- exaustão dos nutrientes estão entre os im-
dicadas (Veríssimo et al., 1992). As aberturas pactos mais óbvios do desmatamento. A pro-
no dossel permitem ao sol e ao vento atin- dutividade agrícola cai na medida em que a
girem o solo da floresta, resultando em mi- qualidade do solo piora, embora um patamar
croclimas mais secos. O número de dias sem mais baixo de produtividade possa ser man-
chuvas necessários para o sub-bosque atin- tido por sistemas tais como a alternância de
gir condições inflamáveis é muito menor em cultivo. A adição contínua de cal, adubo e
uma floresta afetada pelo corte seletivo do nutrientes pode conter a degradação, mas as

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DESTRUIÇÃO E CONSERVAÇÃO
12 DA FLORESTA AMAZÔNICA

limitações de recursos físicos e econômicos de Rondônia, Acre e oeste do Amazonas).


tornam o uso desses produtos inviáveis para O suprimento de vapor de água para a re-
grandes áreas longe dos mercados urbanos gião centro-sul tem diferentes magnitudes
(Fearnside, 1997d). O desmatamento acaba e importância diferenciada dependendo da
com as opções de manejo florestal sustentá- estação. Durante o período de transição da
vel tanto para os recursos madeireiros quanto estação seca para a chuvosa (setembro-ou-
para os farmacológicos e os genéticos. tubro) no sudoeste da Amazônia, o forneci-
mento de vapor de água é particularmente
Mudanças no regime hidrológico importante para evitar o prolongamento da
estação seca em São Paulo (a região agrícola
As funções da bacia hidrográfica são per- mais produtiva do Brasil). A capacidade de
didas quando a floresta é convertida para geração hidrelétrica, por outro lado, é parti-
usos tais como as pastagens. A precipitação cularmente dependente da chuva no verão
nas áreas desmatadas escoa rapidamente, austral (dezembro), correspondendo à es-
formando as cheias, seguidas por períodos tação chuvosa no sudoeste da Amazônia,
de grande redução ou interrupção do fluxo quando a diferença entre o comportamento
dos cursos d’água. Os padrões regulares das hidrológico das áreas de floresta e das áre-
cheias são importantes para o funcionamen- as desmatadas é mínima. De acordo com as
to do ecossistema natural do rio e próximo a estimativas preliminares de Pedro Silva Dias
ele, assim como para a agricultura de várzea. (comunicação pessoal), da Universidade de
Acredita-se agora que a porcentagem de São Paulo, aproximadamente 70% da preci-
água reciclada dentro da bacia Amazônica pitação do estado de São Paulo vem do vapor
esteja entre 20 e 30% (Lean et al., 1996), de água da Amazônia durante esse período.
e não mais a tradicional estimativa de 50% Além da manutenção da precipitação na
(Salati & Vose, 1984). Embora haja indicação extensa bacia e do transporte de água de lon-
que o impacto hidrológico do desmatamento go alcance, o desmatamento também produz
seria menor que o imaginado, na realidade, efeitos em escala média. Observações recen-
o oposto é verdadeiro. O escoamento atra- tes de um pequeno aumento (aproximada-
vés do rio Amazonas de quase 50% da chu- mente 5%) a ocorrência de chuvas na área
va que cai na bacia implica que os outros Desmatamento na Amazônia brasileira: his-
50% sejam reciclados, supondo que o va- tória, índices e consequências severamente
por de água permaneça dentro da bacia. Na desmatada de Ji-Paraná, em Rondônia, jun-
realidade, parte do vapor de água escapa para tamente com os dados de imagens de satélite
o Pacífico, especialmente na ponta noroeste que mostram a formação de nuvens preferen-
da bacia, na Colômbia. Mais importante que cialmente sobre áreas desmatadas tão peque-
isso, uma quantia considerável é transporta- nas quanto 5 km de diâmetro, confirmam os
da para o sul e centro-sul do Brasil, Paraguai, resultados teóricos preliminares sobre os efei-
Uruguai e Argentina, e parte continua pelo tos em média escala do desmatamento.
do Atlântico em direção ao sul da África.
O potencial do desmatamento em aumen-
Isso confere ao desmatamento Amazônico
tar a precipitação local ao criar correntes de
um grau de impacto que não é considerado
ar ascendentes convectivas que provocam
em nível político (Fearnside, 2004). As cida-
a formação de nuvens pode levar um leigo
des do Rio de Janeiro e São Paulo ficaram
a concluir que o desmatamento não é tão
sujeitas a repetidos apagões e racionamentos
ruim. Poderia se ter uma melhoria temporá-
de energia em 2001 como resultado dos bai-
ria e ilusória à medida que o desmatamento
xos níveis de água nos reservatórios hidrelé-
avança, seguida por uma íngreme queda na
tricos fora da região amazônica.
precipitação quando o desmatamento passa
A umidade chega à região centro-sul de certo limiar. Além disso, o aumento da
do Brasil por correntes de ar (jatos de ní- precipitação sobre uma área desmatada signi-
vel baixo) procedentes da Bolívia e da par- fica que a chuva foi tirada de algum outro lu-
te ocidental da Amazônia brasileira (oeste gar. Isso inclui tanto os distantes destinos do

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Desmatamento na Amazônia brasileira:
História, índices e consequências 13

transporte do vapor de água quanto as bordas ao carbono de CO2. No período de 1988 a


florestais próximas. As bordas da floresta so- 1994 (período base usado pelo Brasil para
freriam porque as células convectivas forma- o seu inventário inicial de gás estufa para
das sobre as áreas desmatadas levariam o ar o Protocolo de Kyoto) foram liberadas 275
úmido para cima, induziriam a chuva, e cria- × 106 toneladas, incluindo todos os com-
riam uma descida de ar sobre as redondezas ponentes (atualizado de Fearnside, 2000b,
da floresta, trazendo o ar seco para baixo, o considerando as correções em Fearnside &
que inibiria a ocorrência de chuva e secaria a Laurance, 2004 e Nogueira et al., 2005), ou
floresta próxima às bordas da área desmatada 252 × 106 toneladas se considerados apenas
(talvez numa faixa aproximada de 20km, sob os componentes das emissões usados no
a condição de que ventos prevalentes não es- Inventário Nacional, assim como os valores
tejam soprando). Essa seca das bordas adicio- de densidade de madeira disponíveis an-
na um fator de retroalimentação que reforça a tes da revisão de Nogueira e colaboradores
degradação das bordas da floresta, por meio (2005). Esse valor é ligeiramente maior que
do estresse de fogo e água. o dobro do valor oficial de 116,9 × 106 to-
neladas (Ministério da Ciência e Tecnologia,
2004: 149). A diferença é explicada por uma
PERDA DE BIODIVERSIDADE série de componentes omitidos na aprecia-
ção oficial (incluindo raízes e necromassa) e
A manutenção da biodiversidade é uma
por uma estimativa elevada da absorção do
função para a qual muitos atribuem valor além
carbono pelas florestas secundárias, que não
da venda comercial dos produtos (Fearnside,
reflete a lenta taxa na qual elas crescem nas
1999). A perda de partes importantes das flo-
pastagens degradadas da Amazônia.
restas tropicais do Brasil empobrece a biodi-
versidade da Terra (Capobianco et al., 2001). O O que mais distingue as implicações do
impacto sobre a biodiversidade causado pelo desmatamento amazônico no aquecimento
desmatamento continuado é muito maior em global daquelas de outras florestas tropicais
áreas com pouca floresta remanescente e altos é o enorme potencial para emissões futuras.
níveis de endemismo, como a Mata Atlântica. Em 1990, as emissões líquidas comprometi-
Se o desmatamento da Amazônia continuar das do desmatamento no Brasil representa-
até próximo de sua completa destruição, os ram 5% do total de todas as fontes de emis-
mesmos níveis de risco à biodiversidade serão são (incluindo tanto as mudanças do uso
aplicados a essa região. da terra quanto os combustíveis fósseis) na
época (Fearnside, 1997b), enquanto que o es-
Emissões de gases de efeito estufa toque de carbono na biomassa na Amazônia
brasileira representava 38% do total tropical
Os incêndios florestais emitem gases de (Fearnside, 2000a: 129). As emissões líquidas
efeito estufa. O grande incêndio de Roraima comprometidas referem-se ao resultado líqui-
liberou, através da combustão, de 17,9 a do de emissões e absorções quando uma pai-
18,3 × 106 toneladas de carbono equivalen- sagem florestada é substituída por um mosai-
te ao carbono de CO2, dos quais 67% (12,0 a co de usos da terra (que seria o resultado de
12,3 × 106 toneladas de carbono) foram pro- uma condição de equilíbrio criado por uma
venientes de queimadas na floresta primária projeção das tendências atuais).
(Barbosa & Fearnside, 1999). Os carbonos
equivalentes ao carbono do dióxido de carbo-
no são utilizados para comparar as emissões
ESTRATÉGIAS PARA DESACELERAR O
de vários gases de efeito estufa baseado no DESMATAMENTO
potencial de aquecimento global de cada gás Repressão
em um horizonte de tempo de 100 anos. O
desmatamento em uma taxa igual à de 2003 No Brasil, o desmatamento é controlado
implica na emissão de, aproximadamente, principalmente pela repressão, através de li-
429 × 106 toneladas de carbono equivalente cenças, fiscalizações e multas. As campanhas

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DESTRUIÇÃO E CONSERVAÇÃO
14 DA FLORESTA AMAZÔNICA

são frequentemente anunciadas simultanea- para estender o sistema para municípios se-
mente às conclusões anuais do programa de lecionados no Pará e em Rondônia.
monitoramento do INPE. O primeiro esforço Reforma política sobre impostos, crédi-
importante para reprimir o desmatamento tos e subsídios O principal problema para o
ocorreu em 1989, com o programa Nossa controle do desmatamento é que muito do
Natureza. Desde então, uma série de ações que precisa ser feito está fora do alcance das
punitivas tem sido mal sucedidas. Os índices agências responsáveis pelos assuntos am-
de desmatamento na região parecem aumen- bientais. O poder para mudar as leis tributá-
tar e diminuir independentemente desses rias e as políticas de crédito está com as ou-
programas. A repressão, ainda que indubi- tras agências governamentais, assim como
tavelmente necessária, precisa ser repensada as políticas de reassentamento, a construção
e as causas subjacentes devem ser tratadas. de estradas e as prioridades de desenvolvi-
Em 2000, surgiu a indicação de que o mento. Os subsídios de impostos para as fa-
Brasil teria capacidade de controlar o des- zendas de criação de gado, aprovados pela
matamento. Depois da proibição das quei- Superintendência para o Desenvolvimento
madas se tornar efetiva em julho, as ima- da Amazônia (SUDAM), foram uma impor-
gens do sensor AVHRR (Advanced Very tante força indutora do desmatamento nas
High Resolution Radiometer ou Radiômetro décadas de 1970 e 1980. A interrupção de
Avançado de Resolução Muito Alta), inter- novos subsídios, em 1991, não revogou
pretadas no INPE, indicaram uma queda de aqueles que já haviam sido concedidos.
mais de 80% nas queimadas. O desmatamen- Os projetos aprovados pela SUDAM davam
to também diminuiu por causa do programa isenção de imposto sobre a renda gerada e
permitiam que os proprietários investissem
de licenciamento e desmatamento, que esta-
em suas fazendas parte do imposto devido
va em vigor no Mato Grosso de 1999 a 2001,
de operações de lucro de quaisquer outros
apesar das mudanças posteriores no governo
lugares. A exclusão das fazendas, em 1991,
estadual que transformaram o programa de
não afetou outras atividades prejudiciais,
tal modo que não fazia mais efeito como um
tais como as serrarias e as fundições de fer-
impedimento ao desmatamento (Fearnside,
ro-gusa alimentadas por carvão vegetal. Os
2003b; Fearnside & Barbosa, 2003). subsídios de impostos remanescentes preci-
A redução das queimadas no Mato sam ser cortados.
Grosso foi alcançada por uma combinação Outra causa do desmatamento, mais pro-
de medidas. Um sistema de licenciamen- eminente nas décadas de 1970 e 1980 do
to foi instituído pela Fundação Estadual do que hoje, é a especulação de terra. O ganho
Meio Ambiente de Mato Grosso (FEMA), de capital da venda de uma propriedade de-
incluindo a impressão de imagens de saté- pois de possuí-la por poucos anos foi a fonte
lite mostrando os limites das propriedades e principal de lucro dos fazendeiros, quando
o desmatamento existente. As multas eram os preços da terra subiam mais rápido que a
emitidas juntamente com a imagem do sa- inflação. Embora os preços médios da terra
télite desestimulando, assim, argumentos e não estejam mais subindo nos índices vistos
tentativas de má interpretação da área real- antes da queda brusca da inflação, com o
mente devastada. As regiões do Mato Grosso Plano Real de 1994, as propriedades indivi-
com as maiores diminuições de queimadas duais podem ainda produzir lucros especu-
foram aquelas sujeitas a um treinamento es- lativos, principalmente, quando elas estão
pecial da comunidade e a programas educa- próximas a uma estrada recém-construída
cionais sobre o manejo do fogo pelo Grupo ou reformada. Impostos pesados deveriam
de Trabalho Amazônico e Amigos da Terra – ser aplicados para retirar o lucro provenien-
Amazônia Brasileira, com o apoio da FEMA te da especulação de terra, tanto para tirar
e do Programa de Prevenção e Controle a força especulativa remanescente em áreas
de Queimadas e Incêndios Florestais na favorecidas pela infraestrutura quanto para
Amazônia Legal. Foram anunciados planos fornecer proteção, caso algum dia, retornem

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Desmatamento na Amazônia brasileira:
História, índices e consequências 15

os índices de inflação astronômicos que pre- Título de posse da terra e reforma


valeceram no Brasil durante a maior parte do política de assentamento
último século.
A natureza dos assentamentos estabele-
A sonegação de impostos é uma fonte
cidos pelo Instituto Nacional de Colonização
significativa de recursos de investimentos
e Reforma Agrária (INCRA), mudou acentu-
nas fazendas da Amazônia. Dentre os fazen-
adamente ao longo dos anos. Nas décadas
deiros que mais desmatam, alguns são mé-
de 1970 e 1980, a maioria deles foi estabele-
dicos e outros profissionais das cidades que,
cida em áreas escolhidas pelo INCRA. Desde
frequentemente, têm grandes rendas não de-
meados da década de 1990, o INCRA tem
claradas. Se investirem na bolsa de valores
exigido que os novos assentamentos sejam
ou em bens imobiliários urbanos, eles, pro-
alocados somente em áreas já desmatadas,
vavelmente, despertarão a atenção das au-
para minimizar os impactos do desmata-
toridades fiscais, entretanto, as autoridades
mento. Apesar das numerosas declarações
têm dificuldade para avaliar grande parte
oficiais de que tal política estava em ação,
do investimento nas fazendas amazônicas.
Mesmo que o tipo de solo e o regime de chu- novos assentamentos continuaram a ser ins-
va não sejam favoráveis para as pastagens, talados em áreas florestais, tais como aque-
resultando em algum prejuízo no investi- les no rio Acari e no rio Juma, no estado do
mento, o dinheiro da venda de carne bovina Amazonas, em 1996. Mais recentemente, o
de uma fazenda amazônica será “limpo”. O INCRA cedeu sua função de determinar os
governo deve investir na aplicação da lei e locais de assentamento às organizações de
endurecer no rastreamento dos movimentos colonos que reivindicam terra, tais como o
financeiros para eliminar esse importante Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem
condutor de desmatamento. Terra (MST). Eles invadem terras públicas
ou reservas legais de grandes fazendas e o
O desmatamento também recebe um for- INCRA, posteriormente, “legaliza” os assen-
te incentivo do crédito agrícola subsidiado. O tamentos quando eles já são fato consumado
subsídio do governo vai além das baixas ta- e indeniza os fazendeiros pela terra perdida.
xas de juros e dos prazos generosos. Existem Devido à indenização ser geralmente maior
também frequentes “anistias”, perdoando as que o preço de mercado da terra, alguns
dívidas ou convertendo-as em pagamentos fazendeiros, discretamente, incentivam os
simbólicos durante longos períodos a juros invasores. Fazendas falidas, sob o embargo
baixos. As anistias são concedidas quando do Banco do Brasil, têm sido particularmen-
a produção é reduzida por causa da seca ou te propensas à invasão, uma situação que
de outros “atos divinos”. Embora geralmente tanto assegura aos invasores uma ocupação
consideradas como intervenções únicas, elas sem resistência, quanto resolve o problema
são comuns e representam um subsídio adi- financeiro do Banco do Brasil quando a in-
cional para o desmatamento. denização é paga pelo INCRA. As áreas es-
Uma variedade de outros subsídios tam- colhidas pelos invasores para ocupação são,
bém aumenta a lucratividade da agricultura invariavelmente, de florestas tropicais pri-
e da pecuária. Isso inclui garantia de pre- márias, e não de pastagens, áreas agrícolas
ço para muitos produtos agrícolas, onde o ou florestas secundárias. A madeira fornece
governo assegura o preço pago para o fa- capital para os invasores e os solos são con-
zendeiro, independentemente da distância sideravelmente melhores do que poderia se
que o fazendeiro possa estar dos mercados. esperar de um pasto degradado. A mudança
Muitos programas especiais fornecem aju- de atitude do INCRA para seguir as inicia-
da, como fertilizantes ou cal para planta- tivas de organizações de agricultores sem
ções específicas e uma enorme rede de in- terra cria uma barreira adicional para o con-
fraestrutura de transporte, com despesas trole efetivo dessa forma de desmatamento
pagas pelo governo. (Fearnside, 2001a).

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DESTRUIÇÃO E CONSERVAÇÃO
16 DA FLORESTA AMAZÔNICA

Embora os pequenos fazendeiros sejam desqualificar as pessoas que já receberam


responsáveis por apenas cerca de 30% do terra anteriormente resultam apenas na cria-
desmatamento (Fearnside, 1993a), sua in- ção de uma classe permanente de sem-terra,
tensidade (impacto por quilômetro quadra- que também contribui para o desmatamen-
do) dentro da área que eles ocupam é maior to. O objetivo de fornecer oportunidades de
que a das médias e grandes fazendas, que emprego para todos os brasileiros terá que
detêm 89% da terra privada da Amazônia ser alcançado de maneira ambientalmente
Legal. A intensidade do desmatamento cai menos destrutiva do que os planos de con-
com o aumento do tamanho da proprieda- cessão de áreas nos assentamentos amazôni-
de. O desmatamento, portanto, cresceria se cos (Fearnside, 2001a).
as áreas florestais inseridas em grandes fa-
zendas fossem redistribuídas em pequenas
Serviços ambientais
propriedades. Isso enfatiza a importância de
usar as áreas já devastadas para a reforma As atividades econômicas na Amazônia
agrária, em vez de seguir o caminho politi- envolvem quase exclusivamente bens de con-
camente mais fácil, de distribuição das áre- sumo – como madeira, minerais, produtos
as florestais remanescentes. Apesar da área agrícolas, criação de gado e produtos não ma-
já devastada ser grande, ela está aquém da deireiros, como a borracha natural e a casta-
demanda potencial para os assentamentos. nha. Encontrar maneiras de explorar os servi-
Sem dúvida, a Amazônia Legal como um ços ambientais da floresta, tanto para mantê-la
todo está aquém dessa demanda. O reco- quanto para sustentar a população humana,
nhecimento da existência dos limites da tem um grande potencial em longo prazo.
capacidade de carga e a manutenção dos
níveis populacionais dentro desses limites A floresta Amazônica fornece, no míni-
é fundamental para qualquer planejamento mo, três classes de serviços ambientais: a
em longo prazo de ocupação sustentável da manutenção da biodiversidade, o estoque de
Amazônia (Fearnside, 1997c). O desmata- carbono e a ciclagem da água. A magnitu-
mento para a formação de pastagens para o de e o valor desses serviços são pobremente
gado é considerado uma “melhoria” para a quantificados e os passos diplomáticos, entre
obtenção e a manutenção do título da terra. outros, através dos quais eles devem tornar-
Enquanto essa situação perdurar, podemos se bens, estão ainda em sua infância – fa-
esperar que os donos de terra devastassem tos que não diminuem sua importância ou a
suas florestas apesar das proibições. Para necessidade urgente de concentrar esforços
cessar o reconhecimento da pastagem como na divulgação de informações e a vontade
uma melhoria, é preciso, ainda, mudar os política exigidas para integrá-los na econo-
procedimentos de registro de terra. mia, de modo a preservar a floresta, em vez
Para barrar o fluxo de pessoas para novas de destruí-la. O papel das florestas tropicais
áreas em busca de terra, a reforma agrária é em evitar o aquecimento global está mui-
necessária na Amazônia e nas áreas de onde to mais próximo de servir como uma base
vêm os imigrantes. A disponibilidade de em- para os fluxos financeiros internacionais do
prego alternativo nas áreas rurais e urbanas que estão os outros serviços ambientais,
também está relacionada com esses fluxos como a manutenção da biodiversidade. Isso
populacionais. Ao mesmo tempo, cresceu porque a Convenção das Nações Unidas
uma “indústria do assentamento”, na qual sobre Mudança Climáticas (UN-FCCC, em
as pessoas que recebem terras em um assen- inglês) avançou mais que a Convenção so-
tamento vendem seus direitos (geralmente, bre Biodiversidade muito embora ambas
de maneira informal, se o título definitivo tenham sido assinadas, simultaneamente,
da terra ainda não tiver sido concedido) e se na Conferência das Nações Unidas para o
mudam para tentar obter outro terreno em Desenvolvimento e Meio Ambiente, em 1992
um novo assentamento. Os esforços frequen- (UNCED, em inglês). A UN-FCCC foi suple-
tes e malsucedidos do INCRA em detectar e mentada com o Protocolo de Kyoto, em 1997.

Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 16 8/18/2022 3:13:01 PM


Desmatamento na Amazônia brasileira:
História, índices e consequências 17

O interesse de investimento em carbono, crédito do carbono porque o Protocolo de


com um panorama de retorno em curto pra- Kyoto não obriga que as reduções sejam li-
zo, provavelmente será limitado, pelo fato gadas de forma causal a um projeto específi-
do acordo sobre o Protocolo de Kyoto, alcan- co. Ele também não exige que as mudanças
çado em julho de 2001, excluir o crédito para sejam “adicionais” ao que teria ocorrido em
a manutenção da floresta no Mecanismo de um cenário sem projeto, sendo o primeiro
Desenvolvimento Limpo (MDL) durante o inventário nacional do país a linha de parti-
primeiro período de compromisso do proto- da para o cálculo (p. ex., emissões no perío-
colo (2008-2012). Se isso for permitido nos do de 1988 a 1994, no caso do Brasil).
períodos de compromisso futuro, o Brasil
Sem levar em consideração o futuro das
poderá, potencialmente, ganhar de modo
decisões a respeito do MDL no Protocolo
substancial projetos do MDL para reduzir o
de Kyoto, o aquecimento global representa
desmatamento. Também está em discussão
um problema de longo prazo, que prova-
uma proposta para a criação dos meios pe-
velmente ganhará urgência na arena políti-
los quais o desmatamento evitado hoje po-
ca internacional, à medida que os impactos
deria gerar créditos após 2012 (Santilli et al.,
se tornarem cada vez mais aparentes para
2004). Os conflitos políticos ao redor des-
o público e para os líderes políticos. Em al-
sa decisão, na cidade de Bonn, no primei-
gum momento no futuro, o papel principal
ro período de compromisso, podem mudar
exercido pelo desmatamento tropical vai ser
no futuro, porque a “quantia determinada”
reconhecido e serão tomadas medidas apro-
(cota de emissão nacional) de cada parte
priadas, no Brasil e no mundo, para finan-
é renegociada para cada período sucessivo
ciar o combate ao desmatamento e fornecer
de compromisso. Isso retira as vantagens
os fundamentos para uma alternativa ao de-
dos atores-chave (especialmente na Europa)
senvolvimento destrutivo.
das partes que pressionam (especificamen-
te os Estados Unidos) para satisfazer os Muitos acreditam que a floresta será cor-
compromissos feitos em Kyoto, quase com- tada a qualquer custo e, consequentemente,
pletamente por meio de medidas nacionais argumentam que deveríamos nos preocupar
relativamente caras (Fearnside, 2001b). As com outros problemas. Um dos maiores im-
negociações desde a Conferência de Kyoto, pedimentos à ação efetiva é o fatalismo. O
em 1997, têm sido únicas, porque os países fatalismo age como um dissuasor de ações
industrializados concordaram com quotas que envolvem compromisso de recursos fi-
específicas determinadas para o primeiro pe- nanceiros significativos e aceitação dos ris-
ríodo de compromisso, antes que as regras cos políticos reais ou percebidos. Muitos dos
fossem definidas sobre questões como a in- determinantes-chave para o caminho futuro
clusão do desmatamento evitado no MDL. do desenvolvimento estão nas mãos das au-
Para futuros períodos de compromissos, a toridades públicas, que precisam tomar suas
inclusão do desmatamento evitado ajudaria decisões baseadas na responsabilidade que
a incentivar os países a concordar com com- isso exige. Embora o futuro dependa das de-
promissos maiores do que eles aceitariam na cisões humanas, os limites também existem.
ausência de tal meio, o que resultaria, então, Não podemos continuar destruindo florestas
em um benefício líquido para o clima. sem consequências terríveis e duradouras.
Embora não favorecido atualmente pelo
Ministério das Relações Exteriores do Brasil, AGRADECIMENTOS
o país sempre tem a opção de aceitar limites
nacionais sobre as emissões, o que permi- O trabalho de Philip M. Fearnside
tiria ganhar muito mais sobre as emissões é apoiado pelo Conselho Nacional de
negociadas no Artigo 17 do Protocolo do Desenvolvimento Científico e Tecnológico
que através do Artigo 12 do MDL (Fearnside, (CNPq: Proc. 470765/01-1) e pelo Instituto
2001d). As emissões negociadas têm, subs- Nacional de Pesquisas da Amazônia (INPA:
tancialmente, um potencial maior para o PPI 1 3620). Agradeço a A.B. Rylands, G.

Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 17 8/18/2022 3:13:01 PM


DESTRUIÇÃO E CONSERVAÇÃO
18 DA FLORESTA AMAZÔNICA

A.B. da Fonseca, K. Brandon e um revisor Fearnside, P.M. 1997a. Environmental services as


anônimo pelos comentários. Este é uma tra- a strategy for sustainable development in rural
Amazonia. Ecological Economics 20: 53-70.
dução de Fearnside (2005a), que original-
mente foi publicado em Megadiversidade Fearnside, P.M. 1997b. Greenhouse gases from
deforestation in Brazilian Amazonia: net committed
(Fearnside, 2005b)
emissions. Climatic Change 35: 321-360.
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Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 18 8/18/2022 3:13:01 PM


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Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 19 8/18/2022 3:13:01 PM


Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 20 8/18/2022 3:13:01 PM
CAPÍTULO

2
Uso da terra na Amazônia e as mudanças
climáticas globais

Philip M. Fearnside
Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (INPA).
Av. André Araújo, 2936, Manaus, Amazonas, Brasil. CEP: 69.067-375.
E-mail: pmfearn@inpa.gov.br

Publicação original:
Fearnside, P.M. 2007. Uso da terra na Amazônia e as mudanças climáticas globais. Brazilian
Journal of Ecology 10(2): 83-100.

21
Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 21 8/18/2022 3:13:08 PM
DESTRUIÇÃO E CONSERVAÇÃO
22 DA FLORESTA AMAZÔNICA

RESUMO INTRODUÇÃO
O uso da terra, e as mudanças no uso ao O uso da terra e as mudanças de uso da
longo tempo, na Amazônia, contribuem para terra na Amazônia afetam as mudanças cli-
as mudanças climáticas globais de distintas máticas globais de várias maneiras. Uma das
formas. No período 1981-1990, a emissão lí- consequências, o efeito estufa, recebe contri-
quida comprometida de gases causadores do buições de gases como gás carbônico (CO2),
efeito estufa na Amazônia brasileira corres- metano (CH4) e óxido nitroso (N2O) libera-
ponde à 4% da emissão global de combustí- dos no desflorestamento, seja por queima,
veis fósseis e produção de cimento. Gases são ou pela decomposição da biomassa que não
liberados pelo desmatamento através da quei- queima. Apesar da emissão de gases por su-
ma e decomposição da biomassa, pelos solos, pressão vegetal ser amplamente conhecido,
pela exploração madeireira, pelas hidrelétri- o contínuo uso da terra, sem uma mudança
cas, pelo gado e pelas queimadas recorrentes
no tipo de uso (e.g. exploração madeireira
de pastagens e de capoeiras. Os incêndios flo-
na floresta, manejo das pastagens), também
restais também emitem gases, mas não foram
contribui para a emissão e fluxo de gases do
incluídos nos cálculos. A perda de um possí-
vel sumidouro de carbono no crescimento da efeito estufa.
floresta em pé também não está incluída. Além do efeito estufa, a conversão da
A “emissão líquida comprometida” repre- floresta amazônica em pastagens reduz a
senta o saldo líquido, durante um longo pe- evapotranspiração, sobretudo na época seca,
ríodo, das emissões e absorções de gases. O diminuindo o suprimento de água para a
principal gás utilizado para aferir o saldo é o atmosfera (Lean et al., 1996; Shukla et al.,
gás carbônico (CO2), uma vez que é liberado 1990). A água reciclada pela floresta amazô-
na queima, e absorvido no crescimento vege- nica mantém as chuvas na Amazônia e, tam-
tal. Gases traço, como metano (CH4) e óxido bém, no restante do Brasil (e.g., Eagleson,
nitroso (N2O), não entram na fotossíntese, e 1986; Salati & Vose, 1984; Fearnside, 2004a).
se acumulam na atmosfera mesmo quando a A falta de energia elétrica nas partes não
biomassa se recupera totalmente. Portanto, amazônicas do Brasil no “apagão” de 2001,
são menos utilizados (ou ausentes) no cálcu- embora provocada por condições meteoroló-
lo de emissão líquida comprometida. gicas de origem não amazônica, deve levar
Outras mudanças climáticas afetadas pelo a uma apreciação maior do valor do serviço
desmatamento incluem a diminuição de chu- ambiental da floresta em manter os padrões
vas devido à diminuição da reciclagem de de precipitação e, portanto, a geração de
água, sobretudo na época seca, alteram a quí- energia por hidrelétricas.
mica da atmosfera, afetando a formação de Outros fatores climáticos afetados pela
nuvens, e a química da atmosfera de diversas conversão da floresta em pastagens, incluem
maneiras além do efeito estufa. Essas profun- o aumento do albedo da superfície, ou seja, a
das alterações climáticas, junto com outras fração da radiação solar que é refletida (e.g.,
mudanças globais tais como a perda de bio-
Henderson-Sellers & Gornitz, 1984). A quei-
diversidade, fundamentam a adoção de uma
mada também lança grandes quantidades de
nova estratégia para sustentar a população da
aerossóis no ar, que alteram o balanço de ca-
região. Ao invés de destruir a floresta para po-
der produzir algum tipo de mercadoria, como lor e o estoque de núcleos de condensação
é o padrão atual, usariam a manutenção da de nuvens no ar. O excesso de núcleos de
floresta como gerador de fluxos monetários condensação resulta na formação de gotas
baseado nos serviços ambientais da floresta, de água que são pequenas demais para cair
ou seja, o valor de evitar os impactos que se em forma de chuva, diminuindo a precipi-
seguem da destruição da floresta. tação (Roberts et al., 2003). As queimadas
também liberam compostos quimicamente
PALAVRAS CHAVE: aquecimento global, car- ativos como N2O, óxidos de nitrogênio (NOx)
bono, desmatamento, efeito estufa, mudan- e monóxido de carbono(CO), diminuindo a
ça de clima, serviços ambientais taxa de remoção dos poluentes pela chuva

Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 22 8/18/2022 3:13:08 PM


Uso da terra na Amazônia e
as mudanças climáticas globais 23

e pela reação com o radical hidroxilo (OH-). e nas paisagens desmatadas, e os estoques
Quando o ar contém altos teores de NOx e de carbono nos solos.
ozônio (O3), o mecanismo natural de limpeza
da atmosfera é atrapalhado, elevando o nível
de poluição. Enquanto que, na ausência de USO DA TERRA E O RÍTMO DAS MUDANÇAS
queimadas, o ar na Amazônia tem teores de Em 1990, o ano de referência dos inven-
NOx e O3 característicos do “ar limpo” sobre tários nacionais sob a Convenção Quadro das
os oceanos, e os radicais OH- combinam com Nações Unidas sobre Mudança do Clima (UN-
o CH4 para formar água (H2O), limpando o FCCC), as mudanças de uso da terra nos 5 ×
metano do ar (Andreae et al., 2002; Kirkman 106 km2 da Amazônia Legal incluíram 13,8 ×
et al., 2002). 103 km2 de desmatamento, aproximadamente
As queimadas, além de diminuem a taxa 5 × 103 km2 de corte de cerrado (que ori-
remoção de poluentes, aumentam a taxa de ginalmente ocupou aproximadamente 20%
formação dos poluentes pela ação de raios. da Amazônia Legal), corte de 7 × 102 km2
As nuvens mais altas e, além de água em de florestas secundárias “velhas” (pré-1970)
forma líquida, contém gelo (Silva-Dias et e de 19 × 103 km2 em florestas secundárias
al., 2002). A produção de descargas elétricas “jovens” (1970+); queimada de 40 × 103
em forma de raios é maior na presença de km2 de pastagens produtivas (33% da área
gelo do que em nuvens formadas apenas de presente), e recrescimento em 121 × 103 km2
água líquida (tais como as que caracterizam de florestas secundárias “jovens”. Nenhuma
a Amazônia quando não há queimadas). O represa hidrelétrica nova foi criada em 1990,
aumento da produção de raios leva a forma- mas a decomposição continuou em 4,8 × 103
ção de N2O que, além de ser um gás de efei- km2 de reservatórios já existentes. A explora-
to estufa, possui outros efeitos indesejáveis ção madeireira de 24,6 × 106 m3 de toras foi
na química atmosférica, como a destruição presumida, a taxa oficial de 1988.
de O3 na estratosfera. A mudança de nuvens
baixas e úmidas para nuvens altas e frias
também afeta a chuva: embora a quantidade
ESTOQUES DE CARBONO
de chuva seria a mesma, cairia com maior Biomassa florestal
intensidade, o que poderia levar a mais ero-
são do solo (Silva-Dias et al., 2002). A estimativa da biomassa florestal é es-
sencial para poder estimar a magnitude das
O papel do solo na liberação de gases
emissões do desmatamento, sendo as emis-
também muda com o desmatamento. Em
sões diretamente proporcionais a este parâ-
condições florestais, o NOx (e N2O) do solo
metro. A biomassa média presente nas flo-
é reciclado e retido sob a floresta, sendo li-
restas primárias na Amazônia brasileira foi
berado, na maior parte, em forma de NO2
calculada baseada na análise de dados publi-
(Gut et al., 2002; van Dijk et al., 2002). Isto
cados sobre o volume de madeira de 2.954 ha
muda caso a área esteja desmatada, com
de inventários florestais distribuídos em toda
CH4 e NOx sendo liberados para a atmosfera
região (atualizado de Fearnside, 1994 baseado
(Kirkman et al., 2002).
em Fearnside & Laurance, 2004; Nogueira et
O impacto climático mais conhecido pro- al., 2005, 2006). A biomassa total média (in-
vocado pelo uso da terra, e a mudança do cluindo os componentes mortos e debaixo do
uso da terra, é a contribuição ao efeito estufa solo) foi calculada em 415 t/ha para todas as
através de emissões de gases. Gases são emi- florestas maduras, não exploradas para ma-
tidos por desmatamento, queimadas recor- deira, originalmente presentes na Amazônia
rentes, exploração madeireira e inundações Legal brasileira. A biomassa média acima do
por hidrelétricas. A quantidade de emissões solo foi 317 t/ha, dos quais 25 t/ha está mor-
depende do ritmo do desmatamento e dos ta, enquanto a média de biomassa debaixo
estoques de carbono, que, por sua vez, de- do solo foi calculada em 98 t/ha. Estas es-
pendem da biomassa nas florestas originais timativas incluíram a densidade de madeira

Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 23 8/18/2022 3:13:08 PM


DESTRUIÇÃO E CONSERVAÇÃO
24 DA FLORESTA AMAZÔNICA

calculada separadamente para cada tipo de 90% restantes dos dados. Os dados da FAO
floresta, baseado no volume de cada espécie são de cinco relatórios do período 1957-1960
presente e nos dados publicados sobre den- (ver Fearnside, 1994, 1997b); os dados são
sidade básica para 274 espécies (Fearnside, do Projeto RADAMBRASIL (Brasil, Projeto
1997a). As estimativas de biomassa total fo- RADAMBRASIL, 1973-1983). Há certas indi-
ram desagregadas por estado e por tipo de cações de que as equipes de inventário evita-
floresta, assim permitindo o uso dos dados ram locais com muita exploração madeireira
junto com os dados sobre desmatamento (Sombroek, 1992). Além disso, os danos de
baseados no satélite LANDSAT, divulgados exploração madeireira eram muito menos
para cada unidade federativa (Brasil, INPE, difundidos na época dos inventários do que
2006). As biomassas foram ajustadas por da- atualmente. A exploração madeireira está pro-
dos melhorados sobre densidade da madeira gredindo rapidamente, já que a percentagem
(Nogueira et al., 2005) e para reinterpreta- das áreas desmatadas que foram antes explo-
ções dos efeitos de fator de forma e árvores radas para madeira aumentou rapidamente
ocas (Fearnside & Laurance, 2004). nos meados da década de 1970 quando o
acesso rodoviário melhorou na região. Além
Foram calculadas as extensões das áreas
disso, a madeira para carvão e lenha às vezes
protegidas e desprotegidas (até 1990) de cada
é cortada e vendida depois da queimada.
tipo de vegetação em cada um dos nove esta-
dos da Amazônia Legal (Fearnside & Ferraz, A redução da biomassa devido à explora-
1995). Multiplicando a biomassa por hectare ção madeireira em áreas que são derrubadas
de cada tipo de floresta pela área desprotegida é muito mais alta que a redução da biomassa
presente em cada estado, pode-se calcular a média para a floresta como um todo, já que
biomassa cortada, presumindo que o desma- as áreas que estão sendo derrubadas geral-
tamento dentro de cada estado estava distri- mente têm o melhor acesso viário e, portanto,
buído entre os diferentes tipos de vegetação acesso mais barato para madeireiros. Muito
na mesma proporção que os tipos de vegeta- da redução de biomassa pela exploração ma-
ção estavam presentes na área desprotegida deireira resultará em liberação de gás seme-
do estado. Através de ponderação da média lhante às liberações que aconteceriam devido
da biomassa pela taxa de desmatamento em a uma derrubada. Isso ocorre pela decompo-
cada estado, o total médio de biomassa sem sição dos resíduos florestais e do número sig-
exploração madeireira em áreas cortadas em nificante de árvores não-comerciais que são
1990 foi calculado em 389 t/ha, 6,5% abaixo mortas ou danificadas durante o processo
da média para florestas sem exploração ma- de exploração madeireira. Além disso, pode
deireira, presentes na Amazônia Legal como ocorrer também a decomposição e queima
um todo (atualizado de Fearnside, 1997b). A dos resíduos descartados no processo de be-
diferença se deve à concentração da atividade neficiamento, mais os gases liberados pela
de desmatamento ao longo dos limites sul e decomposição mais lenta dos produtos flores-
leste da floresta, onde a biomassa por hectare tais feitos das toras colhidas (veja Fearnside,
é mais baixa que nas áreas de desmatamen- 1995a). Com ajuste para exploração madei-
to mais lento nas partes central e norte da reira, as áreas cortadas em 1990 tiveram uma
região. biomassa total média de 364 t/ha, dos quais
224 t/ha eram biomassa viva acima do solo,
Os valores para biomassa de floresta “não
53 t/ha eram biomassa morta acima do solo
explorada para madeira” representam as me-
e 88 t/ha foram biomassa debaixo do solo.
lhores estimativas para cada tipo de floresta
na época em que foi inventariada, ou seja, Muitas estimativas existentes de biomas-
nos anos 1950 no caso dos inventários flo- sa de floresta amazônica foram subestimadas
restais feitos pela Organização das Nações por deixar de fora alguns componentes da
Unidas para Alimentação e Agricultura biomassa (ver Fearnside, 1994). Estimativas
(FAO), que representam 10% dos dados, e no de emissões que usam estes valores (e.g., 7
início da década de 1970 no caso dos dados entre 8 cálculos feitos por Houghton et al.,
do Projeto RADAMBRASIL, que compõem os 2000) chegam a resultados subestimados

Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 24 8/18/2022 3:13:08 PM


Uso da terra na Amazônia e
as mudanças climáticas globais 25

para a emissão de carbono. A grande gama floresta secundária derivada de agricultu-


de estimativas existentes da biomassa da ra, e 44,9% floresta secundária derivada de
floresta (Houghton, 2003) explica parte da pastagens. Uma quantidade insignificante é
diferença entre as estimativas, assim como “floresta regenerada” (definida como flores-
as diferentes maneiras de contabilizar as ta secundária com mais de 100 anos). A bio-
emissões (Fearnside & Laurance, 2004; massa total média (matéria seca, inclusive
Ramakutty et al., 2007). Muitas diferenças se debaixo do solo e componentes mortos) foi
devem à inclusão de elementos de emissões 43,5 t/ha em 1990 nos 410 × 103 km2 desma-
líquidas comprometidas (Fearnside, 1997b) tados antes daquele ano para usos que não
junto com elementos do balanço anual das estejam represas hidrelétricas. A biomas-
emissões líquidas (Fearnside, 1996b). Cada sa média em equilíbrio seria 28,5 t/ha em
metodologia é válida por si só, mas as duas toda a área desmatada (excluindo represas)
não podem ser misturadas. Isto afeta, inclu- (Fearnside, 1996a). Fontes oficiais alegaram
sive, o Inventário Nacional Brasileiro, que uma absorção maciça de C em “plantações”,
calcula as emissões brutas por uma metodo- com o resultando em as emissões líquidas
logia de emissões líquidas comprometidas e por desmatamento iguais a zero (ISTOÉ,
as absorções do recrescimento de florestas 1997). Esta alegação está completamente
secundárias baseado no balanço anual, as- discrepante com os resultados apresentados
sim apontando altos valores para as absor- no atual trabalho.
ções e um saldo líquido menor do que seria
o caso para uma estimativa de emissões lí- Várias estimativas de emissões oriundas
quidas comprometidas. do desmatamento chegam a valores líquidos
relativamente baixos devido, entre outros fato-
res, a presunções muito otimistas com relação
Paisagens desmatadas ao estoque de carbono na paisagem de subs-
A Paisagem de Substituição tituição. Por exemplo, Achard et al. (2002) se
basearam nas presunções de Houghton et al.
Uma matriz de Markov de probabilida- (2000) de que 70% da biomassa da floresta
des anuais de transição foi construída para original seria recuperada em 25 anos, o que
calcular a composição da paisagem em 1990 corresponde a uma taxa de crescimento de
e para projetar mudanças futuras, presu- aproximadamente o dobro do que tem sido ob-
mindo que o comportamento dos agriculto- servado em capoeiras nas pastagens abando-
res e fazendeiros permanece inalterado. As nadas da Amazônia brasileira (ver Fearnside
probabilidades de transição para pequenos & Laurance, 2003, 2004; ver respostas de Eva
agricultores foram derivadas usando os re- et al., 2003 e Achard et al., 2004).
sultados de estudos de satélite em áreas de
assentamento (Moran et al., 1994; Skole et
al., 1994). As probabilidades para fazendei-
Taxas de crescimento de florestas
ros foram derivadas do comportamento típi- secundárias
co indicado por levantamentos por entrevis- A taxa de crescimento de florestas secun-
ta realizados por Uhl et al. (1988). dárias é crítica na determinação da absorção
A paisagem calculada para 1990 em áre- de carbono pela paisagem de substituição.
as desmatadas foi composta de 5,4% áreas A maioria das discussões de absorção atra-
cultivadas, 44,8% pastagens produtivas, vés de florestas secundárias presume que
2,2% pastagens degradadas, 2,1% floresta estas crescerão à taxas rápidas, que caracte-
secundária “jovem” (1970 ou depois) deri- rizam os pousios de agricultura itinerante.
vada de agricultura, 28,1% floresta secundá- Na Amazônia brasileira, no entanto, a maior
ria “jovem” derivada de pastagens, e 17,4% parte do desmatamento é para pastagens, e a
floresta secundária “velha” (pré-1970). Esta agricultura itinerante desempenha um papel
paisagem chegaria a um equilíbrio de 4,0% relativamente secundário (Fearnside, 1993).
áreas cultivadas, 43,8% pastagens produ- Florestas secundárias em pastagens degrada-
tivas, 5,2% pastagens degradadas, 2,0% das crescem muito mais lentamente do que

Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 25 8/18/2022 3:13:09 PM


DESTRUIÇÃO E CONSERVAÇÃO
26 DA FLORESTA AMAZÔNICA

em locais onde foram plantadas apenas cultu- grafítico particulado é calculado por meio de
ras anuais após a derrubada inicial da floresta. fatores de emissão a partir da quantidade de
madeira que passa pelo processo de combus-
Brown & Lugo (1990) revisaram os dados
tão. A quantidade de carbono que entra neste
disponíveis sobre crescimento de florestas
sumidouro é apenas 1/13 da quantidade que
secundárias tropicais. As informações dis-
entra no sumidouro de carvão.
poníveis são praticamente todas de pousios
de agricultura itinerante. As florestas secun- A floresta secundária pré-1970 deve ser
dárias em pastagens abandonadas crescem considerada separadamente da floresta pri-
mais lentamente (Guimarães, 1993; Uhl et mária, já que estas áreas não foram incluídas
al., 1988). Foram usadas estas informações na estimativa de taxa de desmatamento (13,8
sobre taxas de crescimento de vegetação se- × 103 km2/ano em 1990). Uma estimativa
cundária de origens diferentes para calcular a grosseira da taxa de derrubada foi 713 km2/
absorção pela paisagem em 1990 (Fearnside ano (Fearnside, 1996b). A floresta secundá-
& Guimarães, 1996). ria pré-1970 só é pertinente ao balanço anu-
al, não à emissão líquida comprometida. A
quantidade de gases do efeito estufa oriunda
EMISSÕES DE GASES do corte de floresta secundária de origem pré-
1970 é muito pequena.
Desmatamento
Foram calculadas as emissões e absorções
Queimada inicial de gases de efeito estufa para o cálculo de
emissão líquida comprometida em um “cená-
A eficiência da queimada (porcentagem rio baixo de gases-traço” e um “cenário alto
do carbono pré-queima acima do solo que é de gases-traço”. Estes dois cenários usam va-
presumida ser emitida como gases) foi, em lores altos e baixos tirados da literatura para
média, 38,8% nas 10 medidas disponíveis em os fatores de emissão para cada gás nos dife-
queimadas de florestas primárias na Amazônia rentes tipos de queimada (revisão da literatu-
brasileira (ver Fearnside, 2000a, 2003). Ajustes ra em Fearnside, 1997b). Eles não refletem a
para o efeito da exploração madeireira sobre a incerteza com relação à biomassa de floresta,
distribuição diamétrica das peças de biomassa taxa de desmatamento, eficiência de queima-
deram uma eficiência de 39,4%. da e outros fatores importantes.
O carvão vegetal formado na queimada é A queimada inicial representou 246 × 106
uma maneira pelo qual o carbono pode ser t de gás de CO2, ou 27% da emissão compro-
transferido para um estoque de longo prazo, metida bruta de 901 × 106 t. A emissão bruta
sendo que este carbono não entra novamente de um gás se refere a todas as suas libera-
na atmosfera. O carvão no solo é um estoque ções, mas não às absorções. A contribuição
de longo prazo, considerado a ser seques- da queimada inicial de CH4 foi 0,79-0,95 do
trado permanentemente na análise. A média total de 1,08-1,38 × 106 t (69-73%), a de CO
das quatro medidas disponíveis de formação foi 19-24 do total de 27-34 × 106 t (70-71%) e
de carvão em queimadas em florestas primá- a de N2O é 0,05-0,13 do total de 0,06-0,16 ×
rias na Amazônia brasileira indica que 2,2% 106 t (81-83%). Para compostos de nitrogênio
do carbono acima do solo é convertido em e oxigênio como NO e NO2 (NOx) e para hidro-
carvão (Fearnside et al., 1993, 1999, 2001; carbonetos não-metano (NMHC), se conside-
Graça et al., 1999). rados aparte da perda de fontes nas florestas
O carbono grafítico particulado é outro su- maduras representou, respectivamente, 0,60
do total de 0,73 × 106 t (82%) e 0,53-1,00 do
midouro para o carbono que está queimado.
total de 0,57-1,14 × 106 t (88-93%).
Uma quantia pequena de carbono elementar
é formada como particulados grafíticos na Queimadas subsequentes
fumaça; mais de 80% do carbono elementar
formado permanece no local em forma de car- O comportamento dos fazendeiros com
vão (Kuhlbusch & Crutzen, 1995). O carbono relação à queimada pode alterar a quantidade

Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 26 8/18/2022 3:13:09 PM


Uso da terra na Amazônia e
as mudanças climáticas globais 27

de carbono que passa para o estoque ao lon- um grande papel. O Inventário Nacional
go prazo na forma de carvão. Fazendeiros Brasileiro (Brasil, MCT, 2004) segue uma me-
requeimam as pastagens em intervalos de todologia padronizada que obriga a inclusão
2-3 anos para combater a invasão de ve- da decomposição, embora a estimativa no
getação lenhosa não comestível. Quando Inventário Nacional também foi mais baixa
essas requeimas acontecem, os troncos so- por diversas razões.
bre o chão são frequentemente queimados.
A decomposição bacteriana e a ativida-
Pode ser esperado que algum carvão forma-
de de térmitas acontecem em grande parte
do em queimadas anteriores também sofra
durante a primeira década. Emissões de me-
combustão. Parâmetros para transformações
tano por térmitas oriundas da decomposi-
dos estoques brutos de carbono foram de-
ção de biomassa que não queima (Martius
terminados em Fearnside (1997b: 337-338),
et al., 1996) são substancialmente menores
com mudanças na biomassa, na fração da
que estimativas anteriores. Isto ocorre prin-
biomassa presente acima do solo, na efici-
cipalmente porque as estimativas do número
ência de queimada, na formação de carvão
de térmitas em áreas desflorestadas indicam
e na liberação de carbono do solo, como es-
que as populações são insuficientes para
pecificado em outras partes do atual traba-
consumir a quantidade de madeira que tinha
lho. Um cenário típico de três requeimadas
sido presumida anteriormente. A produção
ao longo de um período de 10 anos eleva-
mais baixa de metano (0,002 g CH4 por g de
ria a porcentagem de C acima do solo que
madeira seca consumida) também contri-
é convertida em carvão para 2,2% a 2,9%.
buiu para abaixar as emissões desta fonte,
Parâmetros para emissões de carbono por
que foram calculadas em um total de apenas
caminhos diferentes, tais como na forma de
0,013 × 106 t/ano de gás de CH4 nas áreas
CO2, CO e CH4, e para outras emissões de
desmatadas da floresta original até 1990.
gases traço, também foram apresentados em
Fearnside (1997b: 341-344). Os cálculos fo- Queimadas recorrentes
ram realizados por um programa chamado
“DEFOREST”, mas melhor conhecido como Uma fonte de emissões em áreas
“BIG CARBON”, composto de aproximada- desmatadas é a queimada das pastagens
mente 150 planilhas eletrônicas interligadas. que predominam nas paisagens derivadas
de florestas cortadas na Amazônia brasilei-
Decomposição de remanescentes não ra. O CO2 oriundo da queima da biomassa
queimados de capim, de ervas daninhas, ou de vegeta-
ção de crescimento secundário jovem (“ju-
A decomposição acima do solo de re-
quira”) nessas pastagens, não representa
manescentes não queimados foi calculada
uma contribuição líquida ao efeito estufa, já
usando os estudos disponíveis listados em
que a mesma quantidade de carbono seria
Fearnside (1996b: 611). A decomposição faz
removida da atmosfera no ano seguinte com
uma contribuição significante às emissões
o recrescimento do capim. Aproximadamente
de gases de efeito estufa, e fica aparente que
21-22 × 106 t CO2 (5,7-6,0 × 106 t C) oscilam
o grande interesse no assunto de queima de
anualmente entre a biomassa nas pastagens
biomassa muitas vezes tende a levar as pes-
e a atmosfera na Amazônia brasileira. Os ga-
quisas a negligenciar as contribuições da de-
ses traço liberados na queimada das pasta-
composição. As estimativas de emissões de
gens não entram no processo de fotossíntese
gases de efeito estufa do desmatamento di-
e, portanto, são acumulados na atmosfera.
vulgadas por fontes oficiais do governo bra-
Estas emissões têm sido estimadas conside-
sileiro ao longo do período 1992-2002 (e.g.,
rando o destino da biomassa em pastagens de
Borges, 1992; Silveira, 1992) eram apneas
Roraima (Barbosa & Fearnside, 1996).
um terço dos valores calculados no presente
trabalho por um fator de três, principalmen- As queimadas de florestas secundárias
te porque elas ignoravam as emissões herda- (capoeiras) contribuem com gases traço, da
das nas quais a decomposição desempenha mesma forma que a queima das pastagens.

Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 27 8/18/2022 3:13:09 PM


DESTRUIÇÃO E CONSERVAÇÃO
28 DA FLORESTA AMAZÔNICA

Para o efeito sobre CO2, diferente das pasta- Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE) in-
gens, é preciso calcular explicitamente os flu- dicou que foram explorados apenas 2000
xos brutos, com estimativas da emissão e da km2/ano na Amazônia Legal (Krug, 2001;
absorção por recrescimento. Um total de 29 dos Santos et al., 2001, 2002). Estimativas
× 106 t de gás de CO2 (7,9 × 106 t C) foi rea- feitas pelo Instituto de Pesquisa Ambiental
bsorvido pelas capoeiras em 1990. Estima-se da Amazônia (IPAM) indicam 10.000-15.000
que, sem contar as florestas secundárias pré- km2/ano (Nepstad et al., 1999a). A grande va-
1970, a biomassa de capoeira exposta a fogo riação nas estimativas da área explorada anu-
em 1990 liberou 40-52 × 106 t CO2 (11,0-14,2 almente é, de fato, maior que a incerteza real,
× 106 t C) por combustão, e que e a decom- porque limitações metodológicas conhecidas
posição de biomassa não queimada de capo- explicam os resultados obtidos em alguns dos
eira liberou 44-46 × 106 t CO2 (12,0-12,5 × estudos, especialmente as estimativas muito
106 t C), assim tendo uma emissão líquida baixas obtidas pelo INPE. O cálculo do INPE
de 76-90 × 106 t CO2 (20,7-24,5 × 106 t C). está baseado em imagens de LANDSAT sem
Quase tudo isto representa áreas que original- “verdade terrestre” (observações no chão). A
mente eram floresta. explicação mais provável para as estimativas
serem tão baixas é a inabilidade da técnica de
Exploração madeireira interpretação das imagens de satélite de dis-
tinguir a perturbação resultante da explora-
Em uma situação típica, as florestas aces- ção madeireira que não seja os pátios onde os
síveis por terra ou por transporte fluvial são troncos são temporariamente estocados antes
exploradas para madeira, reduzindo a bio- de serem transportados. Os pátios de estoca-
massa tanto pela remoção de madeira como gem das toras têm um padrão característico
por matar ou danificar muitas árvores não de manchas circulares nas imagens. O cálculo
colhidas. Essa floresta já degradada pela ex- do IPAM para a Amazônia Legal (Nepstad et
ploração madeireira é derrubada posterior- al., 1999a) está baseado no volume de madei-
mente para agricultura ou pecuária bovina. ra removido da região como um todo e na in-
O efeito de exploração madeireira não é tensidade da exploração madeireira estimada
tão direto quanto poderia parecer. A remoção com base em entrevistas.
dos fustes (troncos comerciais) das árvores A questão da área sendo explorada anu-
grandes aumentará a eficiência da queimada, almente para madeira na Amazônia foi o
assim como também aumentará a taxa de de- tema de um “grande debate” realizado em
composição média da biomassa não queima- 28 de junho de 2000 no Workshop Temático
da. Isto é porque os galhos de diâmetro pe- do Primeiro Congresso Científico LBA
queno queimam melhor e se decompõe mais (Experimento de Larga Escala na Biosfera-
rapidamente do que os grandes troncos. Estas Atmosfera na Amazônia), em Belém, Pará.
mudanças compensarão parcialmente a redu- David Skole calculou taxas de exploração ma-
ção das emissões devido à menor biomassa. deireira de 2.655 e 5.406 km2/ano, respectiva-
Em cálculos que incluem taxas de desconto mente, para 1992-1993 e 1996-1997 na cena
ou ponderação por preferência temporal, é de LANDSAT-TM (223/63) ao sul do polo de
dada ênfase às emissões em curto prazo, O exploração madeireira em Tailândia, Pará.
efeito de exploração madeireira no impacto Nestes mesmos anos, o cálculo do INPE, apre-
do desmatamento quando as áreas explora- sentado por Thelma Krug, indicou apenas
das para madeira são desmatadas subsequen- 3.220 e 1.989 km2/ano, respectivamente, na
temente será reduzido mais ainda, já que os Amazônia Legal inteira. Na cena LANDSAT
troncos grandes removidos teriam decompo- adjacente, ao norte de Tailândia (223/62),
sição lenta se tivessem sido deixados para se- Ane Alencar calculou uma taxa de exploração
rem cortados no processo de desmatamento. madeireira de 16% (aproximadamente 5.000
Estimativas da área explorada anualmente km2) por ano. O extenso trabalho de campo
para madeira na Amazônia brasileira variam que fundamentou esta estimativa faz com
muito. Uma estimativa feita pelo Instituto que ela seja a mais segura. É impressionante

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Uso da terra na Amazônia e
as mudanças climáticas globais 29

que a área explorada anualmente na única de florestas primárias (intactas, em pé) e, o


cena de LANDSAT-TM estudada por Alencar restante, de savanas (22.583 km2), campinas
foi maior que a área calculada pelo INPE para / campinaranas (1.388 km2) e ambientes
exploração madeireira na Amazônia Legal in- florestais já transformados como pastagens,
teira. A estimativa baixa do INPE para a área áreas agrícolas e florestas secundárias (2.780
explorada anualmente deu origem à estima- km2) (Barbosa & Fearnside, 1999). O total de
tiva de apenas 2,4 × 106 tC/ano de emissão carbono afetado pelos incêndios foi de 46,0
apresentado no Inventário Nacional Brasileiro × 106 t, sendo que 19,1 × 106 t foram libe-
(Brasil, MCT, 2004). rados por combustão, 26,4 × 106 t seguiram
Uma estimativa recente (Asner et al., para a classe de decomposição e 0,5 × 106 t
2005) para o período 1999-2002 calculou foram depositados nos sistemas na forma de
para cinco dos nove estados da Amazônia carvão (estoque de longo prazo). A emissão
Legal que a exploração madeireira atingiu bruta de gases do efeito estufa, em milhões
16,1-19,8 × 103 km2/ano, colhendo 27-50 × de toneladas de gás, considerando apenas o
106 m3/ano e emitindo 80 × 106 tC/ano. Em emitido por combustão foi de 61.51 de CO2,
declarações nos jornais, pesquisadores do 0,18-0,22 de CH4, 4,45-5,60 de CO, 0,001-
INPE contestaram estes números, sugerindo 0,003 de N2O, 0,06-0,09 de NOx e 0,69 de
que a emissão deve ser aproximadamente a NMHC. O total de carbono equivalente a CO2
metade, ou seja 40 × 106 tC/ano. Esta faixa emitido por combustão, quando considerado
de 40-80 × 106 tC/ano foi consistente com o potencial de aquecimento global (GWP) de
a estimativa deste autor para o ano 1990 cada gás em um horizonte de tempo de 100
(Fearnside, 2000a, 2003). Para estimar a anos utilizados pelo Protocolo de Quioto,
emissão por exploração madeireira em 1990, oriundos do Segundo Relatório de Avaliação
foi considerada a colheita de 24,6 × 106 m3 (SAR) do Painel Intergovernamental sobre
de toras registrada pelo Instituto Brasileiro Mudanças Climáticas (IPCC) (Schimel et al.,
de Geografia e Estatística (IBGE) para 1988. 1996), foi de 17,9-18,3 × 106 t, das quais
A emissão foi equivalente a 62-63 × 106 t C, 67% eram de floresta primária impactadas
para os cenários de baixo e alto gases traço pelo fogo, ou 12,0-12,3 × 106 t de C equiva-
(Fearnside, 2000a, 2003). Isto é mais que a lente a CO2 (Barbosa & Fearnside, 1999).
quantidade que o Brasil emitia em 1990 por No Pará e Mato Grosso durante o mes-
queima de combustíveis fósseis, estimada mo evento El Niño de 1997-1998, incêndios
em 50 × 106 tC em 1987 (Flavin, 1989: 26). atingiram 26.000 km2, enquanto em um
A exploração madeireira aumenta em ano sem El Niño (1995) a área de incêndio
muito a frequência de incêndios florestais, florestal na mesma região foi de 2.000 km2
com consequente degradação da floresta e (Alencar et al., 2006). Usando estimativas
emissões de carbono (Cochrane & Shulze, de mortalidade de biomassa acima do solo a
1999; Cochrane et al., 1999; Nepstad et al., partir da literatura (Holdsworth & Uhl, 1997;
1999b). Degradação e emissão também resul- Cochrane & Schultz, 1999; Barlow et al.,
tam de mudanças microclimáticas perto da 2002), estima-se as emissões comprometidas
borda das florestas remanescentes em paisa- dessas áreas em 24-165 × 106 tC no ano com
gens fragmentadas (Laurance et al., 1997). El Niño e 1-11× 106 tC no ano sem El Niño
(Alencar et al., 2005).
Incêndios florestais
Hidrelétricas
Os incêndios florestais representam uma
grande fonte adicional de emissões de gases Emissões de gases de efeito estufa de repre-
de efeito estufa não contada nos cálculos de sas são frequentemente retratadas pela indús-
emissões por desmatamento. No “Grande tria hidrelétrica como sendo inexistentes (por
Incêndio de Roraima” durante o evento El exemplo, de Souza, 1996), e, geralmente, têm
Niño de 1997-1998, 38.144-40.678 km2 quei- sido ignoradas em cálculos globais de emis-
maram no total, sendo 11.394-13.928 km2 sões das mudanças de uso da terra. A represa

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DESTRUIÇÃO E CONSERVAÇÃO
30 DA FLORESTA AMAZÔNICA

de Balbina emite mais gases que a geração um determinado ano) de desmatamento fei-
da mesma quantidade de energia por termo- to em 1990 (não incluindo emissões da ex-
elétricas (Fearnside, 1995b), mas representa ploração madeireira ou de corte do cerrado)
um caso extremo devido à topografia plana totalizaram 836 × 106 t de CO2, 1,1-1,4 ×
do local do reservatório e a pequena vazão do 106 t de CH4, 27-34 × 106 t de CO, e 0,06-
rio Uatumã. A represa de Tucuruí apresenta 0,16 × 106 t de N2O. Estas emissões foram
um exemplo mais otimista, já que, do pon- equivalentes a 267-278 × 106 t de carbono
to de vista de densidade energética (Watts de equivalente a carbono de CO2, usando os
capacidade instalada por m2 de superfície de GWPs de 100 anos do SAR. Emissões de CO2
reservatório) e, consequentemente, das emis- incluíram 246 × 106 t de gás da queimada
sões de gases de efeito estufa por unidade de inicial, 561 × 106 t de decomposição, 51 ×
eletricidade, é menor do que a média para 106 t de queimadas subsequentes de biomas-
represas existentes na Amazônia. Também é sa da floresta primária, e 43 × 106 t C de
melhor do que a média para as represas plane- carbono do solo nos 8 m superiores. A longo
jadas que, se todas fossem construídas, inun- prazo, a paisagem de substituição chega a
dariam 3% da floresta na Amazônia brasileira armazenar 65 × 106 C, ou 7,2% da emissão
(Brasil, ELETROBRÁS, 1987: 150). A emissão total. As faixas de variação de emissões da-
de gases de efeito estufa de Tucuruí em 1990 das acima se referem aos cenários de gases
foi equivalente a 7,0-10,1 × 106 toneladas de traço baixo e alto, refletindo a gama de fa-
carbono equivalente a CO2, uma quantidade tores de emissão que aparecem na literatu-
substancialmente maior que a emissão de ra para diferentes processos de queima e de
combustível fóssil da cidade de São Paulo. As decomposição. Estes cenários não refletem a
emissões precisam ser pesadas corretamente incerteza nos valores sobre taxa de desmata-
em decisões sobre construção de barragens. mento, biomassa de floresta, intensidade de
Embora se espere que muitas hidrelétricas exploração madeireira e outras entradas no
propostas na Amazônia tenham balanços cálculo. Algum carbono entra em sumidou-
positivos em comparação com combustíveis ros através da conversão para carvão (5,0 ×
fósseis, as emissões reduzem os benefícios 106 t C) e para carbono de particulados grafí-
atribuídos às represas planejadas (Fearnside, ticos (0,42 × 106 t C).
2002, 2004b). As estimativas oficiais brasi- A inclusão de gases traço no cálculo das
leiras de emissões de gases por hidrelétricas emissões aumentou o impacto da emissão
(Brasil, MCT, 2004; ver também Rosa et al., líquida comprometida em 5-9%, comparada
2004, 2006) ainda omitiam as principais fon- com valores que consideram apenas o CO2.
tes de gases (a água que passa pelas turbinas O SAR reconhece alguns efeitos indiretos do
e pelo vertedouro), resultando em subestima- CH4, mas nenhum do CO, que é um compo-
tivas por um fator de 10 (1.000%) ou mais nente importante das emissões da queima
(Fearnside, 2004c, 2005a, 2006a). Estimativas de biomassa. O terceiro relatório de avalia-
subsequentes para outras represas confirmam ção (TAR) aumentou o GWP de metano de
emissões uma ordem de grandeza acima dos 21 para 23 (um aumento de 10%) devido a
incluídos no Inventário (Fearnside, 2005b; uma revisão do modelo global de carbono,
Delmas et al., 2005). mas não mudou os efeitos indiretos incluídos
no cálculo do SAR (Houghton et al., 2001).
ÍNDICES DE IMPACTO SOBRE MUDANÇA [Obs.: no sexto relatório de avaliação (AR6),
de 2021, o GWP de metano para 100 anos,
CLIMÁTICA comparável a esses números, é de 27,2, e o
Emissões líquidas comprometidas de 20 anos, que é mais relevante ao com-
promisso de limitar o aquecimento global
As emissões líquidas comprometidas em 1,5 ºC, é de 80,8]. É provável que os
(quantidades líquidas de gases de efeito impactos de gases traço aumentem quando
estufa que serão emitidos em longo prazo a IPCC chegar a um acordo sobre os efeitos
como resultado do desmatamento feito em indiretos adicionais dos gases. Por exemplo,

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Uso da terra na Amazônia e
as mudanças climáticas globais 31

se o impacto de CO fosse calculado usando rápido do que o observado em capoeiras na


o potencial de aquecimento global de 2, que região, que geralmente são em pastagens de-
foi adotado no relatório da IPCC de 1990 gradadas onde o crescimento é lento.
(Shine et al., 1990: 60), mas não usados nos
relatórios subsequentes enquanto não há Balanço anual das emissões líquidas
acordo, o balanço anual seria aumentado o
equivalente a 54-68 × 106 t de gás de CO2 O balanço anual de emissões líquidas em
(15-19 × 106 t C). Enquanto a inclusão do 1990 (fluxos líquidos em um único ano na
efeito adicional de CO em estender a vida região como um todo) incluiu 1.113-1.128 ×
atmosférica do CH4 devido à remoção dos 106 t de CO2, 3,2-3,5 × 106 t de CH4, 34,5-
radicais OH- (Shine et al., 1990: 59) aumen- 42,1 × 106 t de CO, e 0,15-0,23 × 106 t de
taria este impacto ainda mais. Somente os N2O. As emissões de CO2 incluíram 270 ×
efeitos representados no GWP de 2, aplica- 106 t de gás da queimada inicial, 618-619 ×
dos à emissão de desmatamento, equivalem 106 t de decomposição, 59 × 106 t de quei-
até a metade da emissão anual brasileira da madas subsequentes de biomassa de flores-
queima de combustíveis fósseis. ta primária, 46-58 × 106 t de queimada de
biomassa de floresta secundária de todas as
O Brasil escolheu o intervalo 1988-1994 idades, 52-54 de decomposição das florestas
para seu primeiro inventário sob a UN- secundárias, 54-57 × 106 t CO2 de liberações
FCCC, ao invés do padrão mundial de 1990. líquidas de carbono do solo até 8 m de pro-
Durante este intervalo a taxa média anual fundidade (primeiros 15 anos apenas), 224
de desmatamento era 15,4 × 103 km2, ou × 106 t de exploração madeireira e 36 × 106
11,6% a mais que a taxa em 1990. O inven- t de reservatórios hidrelétricos. Pastagens li-
tário (Brasil, MCT, 2004) calculou uma emis- beraram através da queimada (e assimilaram
são anual de 117 × 106 tC de desmatamento através do crescimento) 21-22 × 106 t de gás
na Amazônia. A metodologia para emissões de CO2, não contadas nos cálculos. O efeito
de desmatamento nos inventários nacionais do desmatamento no balanço anual foi uma
(IPCC, 1997) é equivalente a emissões lí- emissão líquida equivalente a 330-335 × 106
quidas comprometidas. Algumas partes da t de carbono equivalente a carbono de CO2.
emissão considerada aqui como parte das
emissões líquidas comprometidas do desma- Considerando somente o CO2, 1.113-
tamento, como as do solo e do gado, foram 1.128 × 106 t de gás foram emitidas (emis-
consideradas em outras partes do inventá- são bruta) através do desmatamento (não in-
rio que não o desmatamento. Tirando essas cluindo emissões da exploração madeireira).
emissões, o atual estudo indica uma emissão Subtraindo a absorção de 29 × 106 t de gás de
de 215,9 × 106 tC em 1990, considerando CO2 rende uma emissão líquida de 1.084-1.099
apenas o CO2 (i.e., sem os efeitos dos gases × 106 t de CO2, ou 296-300 × 106 t de carbo-
traços) para ser comparável com o inven- no. Portanto, o recrescimento de floresta se-
tário. Ajustando isto pela taxa de desmata- cundária em 1990 absorveu apenas 2,6% da
mento no intervalo 1988-1994 indicou uma emissão total, excluindo hidrelétricas e emis-
emissão anual de 240,9 × 106 tC, o dobro do sões de pastagens. Acrescentando os efeitos
número oficial. Já que na época do inven- de gases traço, usando os GWPs de 100 anos
tário não havia os recentes ajustes aos valo- do SAR, os impactos aumentaram para 330-
res para densidade de madeira (Nogueira et 335 × 106 t de carbono equivalente de carbo-
al., 2005, 2006), que reduzem os valores de no de CO2. O efeito dos gases traço elevara o
biomassa da floresta usados no atual cálculo balanço anual em 10-14%. Consideração de
em 5,3%, a discrepância é ainda maior. A mais efeitos indiretos dos gases traço elevaria
diferença se deve principalmente à omissão estes valores substancialmente.
de vários componentes de biomassa do in- Em termos de CO2 da biomassa da flores-
ventário, tais como as raízes das árvores, as ta original, apenas 27% da emissão (antes
árvores mortas e as palmeiras, e a presunção de subtrair as absorções) no balanço anu-
de uma regeneração de capoeiras muito mais al era de emissões prontas (imediatas) de

Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 31 8/18/2022 3:13:09 PM


DESTRUIÇÃO E CONSERVAÇÃO
32 DA FLORESTA AMAZÔNICA

desmatamento naquele ano, e 73% eram de maneiras de diminuir o desmatamento é não


emissões herdadas da decomposição e requei- fazer rodovias e outras obras de infraestrutu-
mada de biomassa não queimada oriunda de ra que estimulem o desmatamento em áreas
derrubadas feitas em anos anteriores. Por cau- ainda pouco perturbadas. Muito da infraes-
sa das emissões herdadas mais altas nas áreas trutura anunciada no Programa Avança Brasil
desmatadas nos anos de desmatamento mais (2000-2002) e no Plano Plurianual (PPA)
rápido, que precederam o ano 1990, o balan- (2003-2007) oferece um bom exemplo.
ço anual é mais alto que as emissões líquidas
Planos para construção de infraestrutura
comprometidas em 30-32% se só considerado
implicam em um aumento substancial nas
o CO2, e em 35-38% se também são incluí-
taxas de desmatamento e na degradação de
dos os equivalentes de CO2 dos outros gases.
florestas em pé. Um estudo (Nepstad et al.,
As emissões líquidas comprometidas seriam
2000; Carvalho et al., 2001) estimou que a
iguais ao balanço anual se o desmatamento
porção rodoviária da infraestrutura planeja-
fosse proceder a uma taxa constante ao longo
da sob o programa Avança Brasil provoca-
de um período prolongado.
ria 120.000 a270.000 km2 de desmatamento
adicional ao longo de 20-30 anos (400.000-
PAPEL DO USO DA TERRA NO COMBATE AO 1.350.000 ha/ano) que liberaria 6-11 × 109 t
EFEITO ESTUFA C apenas do desmatamento (200-550 × 106
t C/ano). Em uma estimativa mais conser-
O uso e a mudança de uso da terra na vadora, Laurance et al. (2001a,b) estimaram
Amazônia brasileira em 1990 representaram que as obras anunciadas de todos os tipos
4% das 6 GtC de emissões globais anuais de levariam, ao longo do período 2000-2020, a
gases de efeito estufa na época oriundas de 269.000 a 506.000 ha/ano de desmatamento
combustível fóssil e fabricação de cimento adicional como resultado da infraestrutura
(atualizado de Fearnside, 2000b). Portanto, planejada, mais a conversão de 1,53-2,37 ×
a redução dessas emissões faria uma contri- 106 ha/ano de floresta das duas categorias
buição aos esforços mundiais de combate ao menos degradadas (primitiva ou ligeiramen-
aquecimento global, embora é claro que não te degradada) para as duas categorias mais
poderá controlar o aquecimento global sem degradadas (moderadamente ou pesada-
também ter uma redução grande das emissões mente degradada). O desmatamento por si
oriundas da queima de combustíveis fósseis, só resultaria em um aumento de emissões de
principalmente pelos países industrializados. carbono de 52,2-98,2 × 106 de t C/ano.
O setor florestal brasileiro pode ajudar na Soares-Filho et al. (2006) estimaram 26
redução das emissões líquidas globais com GtC de emissões com desmatamento de
medidas para evitar o desmatamento, com a 1.750.000 km2 na Amazônia brasileira en-
substituição da exploração madeireira preda- tre 2004 e 2050 (i.e., 37.234 km2/ano). Isto
tória por exploração de baixo impacto, e algu- representa 553.2 × 106 t C/ano, em média,
mas medidas com plantações silviculturais e e corresponde a uma emissão de 148,6 tC/
agroflorestas (Fearnside, 1999a, 2000c). Entre ha desmatada sob um cenário de “negócios
estas opções, evitar o desmatamento tem, como sempre” (i.e, sem mitigação do efei-
de longe, o maior potencial para contribuir to estufa). No entanto, esta estimativa foi
com a luta contra o efeito estufa. O seques- baixa por ter usado estimativas baixas da
tro de carbono no solo de pastagens também biomassa (incluindo omissão da biomassa
é muito menos promissor como medida de abaixo do solo), junto com presunções al-
mitigação do que o desmatamento evitado tas com relação ao crescimento das florestas
(Fearnside & Barbosa, 1998). Evitar desma- secundárias (baseados em Houghton et al.,
tamento pode ser feito de várias maneiras, 2000). O desmatamento até 2050 simulado
desde proteção de áreas específicas até mu- por Soares-Filho et al. (2006) implicaria na
danças de políticas públicas que afetam a emissão de 30,3-31,6 GtC, ou 644,8-1.214,8
taxa de desmatamento, este último tendo o × 106 de tC/ano baseado nas informações
maior potencial (Fearnside, 1995a). Uma das apresentadas no atual trabalho.

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Uso da terra na Amazônia e
as mudanças climáticas globais 33

Considerando que as estimativas de os vários pontos críticos. Um destes pontos,


Soares-Filho et al. (2006) não incluíram ga- ainda a ser definido, se refere às linhas de
ses traços, as estimativas são razoavelmente base (“baselines”). Um acordo sobre as li-
próximas. No entanto, o atual estudo indica nhas de base é necessário, uma vez que pos-
uma emissão líquida comprometida por hec- suem implicações importantes tanto para a
tare de 173,2-180,5 tC equivalente a CO2 (in- quantidade de crédito alcançável como tam-
cluindo gases traços), ou 16,6-21,5% mais bém para o potencial para incentivos per-
alto que os valores usados por Soares-Filho versos (Watson et al., 2000; Hardner et al.,
et al. (2006). 2000). Entre as diversas considerações sobre
o valor atribuído ao desmatamento evitado
O acordo alcançado na segunda rodada
são de grande importância as exigências re-
da Sexta Conferência das Partes (COP-6-bis)
lativas à certeza (Fearnside, 2000d), perma-
da UN-FCCC, realizada em Bonn, Alemanha
nência (o tempo ao longo de que o carbono
em julho de 2001, excluiu o desmatamento
seria mantido fora da atmosfera) (Fearnside
evitado do Mecanismo de Desenvolvimento
et al., 2000), e várias formas de “vazamen-
Limpo (MDL) no primeiro período de com-
to” (efeitos do projeto, tais como a expulsão
promisso (2008-2012). A chegada a um acor-
de população ou de atividade de desmata-
do que viabilizou a ratificação do Protocolo
mento, que depois continuaria fora dos li-
representou um grande avanço, e já modifica
mites físicos ou conceituais do projeto), que
o quadro para investimentos em manuten-
podem resultar na negação da mitigação es-
ção de floresta na Amazônia, mesmo sem ter
perada (Fearnside, 1999a).
crédito pelo MDL antes de 2013. Os países e
ONGs europeias se opuseram à inclusão do No contexto brasileiro, somente é permi-
desmatamento evitado, mas a consideração tido o uso das taxas de desmatamento histó-
que melhor explica esse posicionamento de- ricas como linha de base, a partir da qual o
pende de circunstâncias que aplicaram ape- crédito de carbono seria dado. Desta forma,
nas ao primeiro período de compromisso. Isto a maneira de agir seria “cercando” (figurati-
é o fato que as “quantidades atribuídas” (co- vamente) remanescentes de floresta em par-
tas nacionais de emissão de carbono) foram tes do Brasil que já tenham passado por um
fixas em Quioto em 1997 para o primeiro pe- pesado desmatamento antes de 1990, e, por
ríodo de compromisso, ou seja, antes de che- outro lado, não teria nenhum crédito para
gar a um acordo sobre as regras do jogo, tais evitar a abertura futura de áreas atualmente
como a inclusão de florestas. Esta circunstân- intactas. O potencial para desmatamento no
cia abriu a possibilidade de forçar os E.U.A. a Avança Brasil e sua continuação no Plano
aumentarem o preço de combustíveis fósseis Plurianual (PPA) ilustra por que vale a pena
(Fearnside, 2001, 2003). Já no segundo perío- achar maneiras para fazer com que o crédito
do de compromisso as quantidades atribuídas para desmatamento seja aplicado não só às
serão renegociadas para cada país e, portanto, áreas que já foram muito desmatadas, mas
a inclusão de desmatamento evitado levaria também às novas fronteiras. O que torna os
os países a aceitaram cotas maiores do que planos de construção de infraestrutura tão
sem florestas. O acordo em Bonn quebrou a danosos ao meio ambiente, inclusive como
paralisia em relação ao futuro do Protocolo, fonte de emissões de carbono, é que estes
e aumentou o atrativo de investimentos a planos abrem vastas áreas “virgens” para
longo prazo visando benefícios de carbono. desmatamento, exploração madeireira e in-
Por exemplo, planos de manejo florestal na cêndios florestais.
Amazônia brasileira, que obrigatoriamente
Vale a pena notar que o MDL não é o úni-
têm pelo menos 30 anos de duração, prova-
co meio pelo qual o Brasil poderia obter cré-
velmente levariam em conta possíveis benefí-
dito por evitar desmatamento sob o Protocolo
cios de carbono ao final do ciclo.
de Quioto. Caso o Brasil fosse entrar no Anexo
O uso futuro do desmatamento evitado B do Protocolo, o Artigo 3.7 do Protocolo ga-
no MDL, definido no Artigo 12 do Protocolo rante que as emissões volumosas do desma-
de Quioto, depende de negociações sobre tamento no País em 1990 seriam incluídas na

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DESTRUIÇÃO E CONSERVAÇÃO
34 DA FLORESTA AMAZÔNICA

“quantidade atribuída” do Brasil, e que qual- teriam sido se a taxa de desmatamento fosse
quer redução em emissões futuras abaixo dos constante ao nível de 1990.
níveis de 1990 poderia ser usada para comer-
As emissões líquidas comprometidas
cio de emissões sob o Artigo 17 (Fearnside,
(as quantidades líquidas de gases de efeito
1999b). Outra possibilidade importante é a
estufa que serão emitidos a longo prazo
proposta de “redução compensada” de emis-
como resultado do desmatamento feito em
sões (Santilli et al., 2005). Isto também conce-
um determinado ano) de desmatamento
deria crédito com base na redução do total das
feito em 1990 (não incluindo emissões da
emissões nacionais, ao invés de se basear nos
exploração madeireira ou da corte de cer-
resultados de projetos individuais como seria
rado) foram equivalentes a 239-249 × 106
o caso se o crédito fosse concedido por meio t de carbono equivalente a carbono de CO2.
do Mecanismo de Desenvolvimento Limpo. O efeito de desmatamento no balanço anual
Uma provisão importante é a possibilidade de de emissões líquidas em 1990 (fluxos líqui-
“bancar” dados de um período de compromis- dos em um único ano na região como um
so para outro sob o Protocolo de Quioto, o que todo) foi uma emissão líquida equivalente a
poderia possibilitar que ações realizadas no 330-335 × 106 t de carbono equivalente a
primeiro período de compromisso para redu- carbono de CO2, enquanto a exploração ma-
zir o desmatamento resultassem em créditos deireira acrescentou 62 × 106 t de carbono
no segundo período de compromisso. equivalente ao carbono de CO2.
A contribuição da perda de floresta às Estes valores indicam que o desmatamen-
mudanças climáticas, junto com outras mu- to na Amazônia brasileira faz uma contribui-
danças globais tais como a perda de biodi- ção significativa ao efeito estufa, e indicam
versidade, fundamenta a adoção de uma es- a alta prioridade que deveria ser dada à me-
tratégia nova para sustentar a população da lhoria das estimativas destas emissões e das
região. Ao invés de destruir a floresta para incertezas contidas nelas. As medidas que te-
poder produzir algum tipo de mercadoria, riam o maior potencial para reduzir a emissão
como é o padrão atual, usaria a manuten- líquida de gases de efeito estufa da Amazônia
ção da floresta como gerador de fluxos mo- seriam mudanças nas políticas públicas? para
netário baseado nos serviços ambientais da reduzir a taxa de desmatamento.
floresta, ou seja, o valor de evitar os impac-
tos que se seguem da destruição da floresta
(Fearnside, 1997c, 2005c, 2006b). AGRADECIMENTOS
Atualizado do trabalho apresentado
CONCLUSÕES na sessão “Dinâmica da Matéria Orgânica
do Solo e Mudanças Climáticas Globais”
Em 1990, o ano para a linha de base (org. Sâmia Tauk-Tornisielo), V Congresso
dos inventários nacionais sob a Convenção Brasileiro de Ecologia, Porto Alegre, RS, 04-09
Quadro das Nações Unidas sobre a Mudança de novembro de 2001. Agradeço ao INPA (PPI
do Clima, a biomassa total média nas áre- 1-3160; PRJ05.57) e ao CNPq (350230/97-8;
as de floresta original desmatadas era 364 t/ 465819/00-1; 470765/2001-1; 306031/2004-3;
ha (ajustado para a distribuição espacial do 557152/2005-4; 420199/2005-5) pelo apoio
desmatamento e para a exploração madeirei- financeiro. Todas as opiniões expressadas
ra). Desse total, 277 t/ha era biomassa (viva são do autor.
e morta) acima do solo, exposta à queima-
da inicial. Além de emissões da queimada
inicial, os remanescentes de desmatamen- LITERATURA CITADA
tos em anos anteriores emitiram gases por
Achard, F., Eva, H.D., Mayeux, P., Stibig, H-J., Belward,
decomposição e por combustão em requei- A. 2004. Improved estimates of emissions from land
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Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 38 8/18/2022 3:13:10 PM


CAPÍTULO

3
Questões de posse da terra como fatores
na destruição ambiental na Amazônia
brasileira: O caso do sul do Pará

Philip M. Fearnside
Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia – INPA
Av. André Araújo, 2936 – CEP: 69.067-375, Manaus, Amazonas, Brasil.
E-mail: pmfearn@inpa.gov.br

Tradução de:
Fearnside, P.M. 2001. Land-tenure issues as factors in environmental destruction in Brazilian
Amazonia: The case of southern Pará. World Development 29(8): 1361-1372.
https://doi.org/10.1016/S0305-750X(01)00039-0

Tradução original:
Fearnside, P.M. 2010. Questões de posse da terra como fatores na destruição ambiental na
Amazônia brasileira: O caso do sul do Pará. p. 185-189, 205-207, 217-219 & 237-239. In: I.S.
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39
Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 39 8/18/2022 3:13:17 PM
DESTRUIÇÃO E CONSERVAÇÃO
40 DA FLORESTA AMAZÔNICA

RESUMO no Pará em função dos interesses dos pro-


prietários de terras e dos migrantes sem terra
Questões de posse da terra têm influen- que invadem as suas propriedades. O des-
ciado as taxas de desmatamento e a expan- matamento é de interesse de ambos grupos,
são da pecuária extensiva como o uso domi- e tem como finalidade aumentar a probabili-
nante da terra na Amazônia brasileira. O sul dade de um resultado favorável para o grupo
do Pará é a região da Amazônia onde estas em questão e para reduzir a probabilidade
questões são mais proeminentes. A análise de conflitos violentos. Ironicamente, Alston
desta região com relação as questões de pos- et al. (2000) indicaram que os esforços do
se da terra, as suas consequências ambien- Instituto Nacional de Colonização e Reforma
tais e as medidas necessárias para resolver Agrária (INCRA) de implantar de assenta-
os problemas fornece informações valiosas mentos servem para aumentar a probabili-
para formular políticas que conduzam a um dade de conflitos violentos. A mesma lógica
desenvolvimento melhor em termos sociais se aplicaria aos outros meios pelos quais os
e ambientais. É provável que os problemas esforços do INCRA induzem os dois grupos
do sul do Pará expandam para outras áreas a aumentar os esforços para garantir a posse
da Amazônia. A revisão da situação atual da da terra que eles reivindicam, inclusive, ace-
posse da terra nessa região do Pará auxilia lerando a atividade de desmatamento.
na identificação das mudanças políticas ne-
Como em qualquer parte da Terra, o nú-
cessárias para reduzir o impacto ambiental.
mero de pessoas que podem ser sustentadas
em áreas rurais na Amazônia está limitado
PALAVRAS CHAVE: Amazônia, Posse da
por diversos fatores. Entre esses fatores es-
Terra, Reforma Agrária, Desmatamento,
tão a área disponível para o assentamento,
Assentamentos
o nível médio da produtividade agrícola que
pode ser sustentado por hectare, o nível de
INTRODUÇÃO consumo da população e as limitações de-
vido aos impactos ambientais, tais como
Questões sobre a posse da terra afetam o desmatamento (Fearnside, 1986a). Na
praticamente todas as decisões na Amazônia Amazônia, a área total que pode ser desma-
brasileira, as quais incluem os investimentos tada é limitada por impactos sérios do des-
de mão-de-obra e capital por proprietários de matamento em larga escala, enquanto a área
terras (tanto os grandes quanto pequenos), a na qual a agricultura ou a pecuária pode ser
migração de populações, a formação e ação intensificada está limitada por recursos físi-
de movimentos sociais e o lançamento de cos, tais como o fosfato (Fearnside, 1997a,b).
programas governamentais e internacionais.
A distribuição desigual da posse da ter-
Além disso, o desmatamento e exploração
ra na Amazônia brasileira representa uma
madeireira são resultados diretos dessas
limitação severa sobre a área alocada para
decisões. Mudanças nos procedimentos de
agricultura familiar porque a maioria da terra
posse da terra são imprescindíveis para re-
privada é, atualmente, de grandes proprietá-
direcionar o desenvolvimento por caminhos
rios. Da área total de terra privada (incluin-
mais sustentáveis, mais socialmente benéfi-
do as florestas) na Amazônia, 62% estavam
cos e ambientalmente mais fundamentados
em propriedades de 1.000 ha (ou maior) na
do que os atuais. O padrão atual de ocupa-
época do censo agrícola em 1986 (Brasil,
ção da terra é uma indicação ambiental da
IBGE, 1989). Dos quatro milhões de km2 da
ausência do controle de lei. Os problemas
Amazônia brasileira que eram originalmente
incluem leis de propriedades inadequadas e
florestados (uma área do tamanho da Europa
um sistema de financiamento caracterizado
Ocidental), a área desmatada totalizava
por fraudes rotineiras.
551.782 km2 até 1998 (Brasil, INPE, 2000),
Alston et al. (2000) usaram uma aborda- uma área maior que a França. Pelo menos
gem conceitual da teoria de jogos para in- 80% dessa área estão hoje sob pastagem ou
terpretar a frequência dos conflitos de terra floresta secundária em pastagens que foram

Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 40 8/18/2022 3:13:17 PM


Questões de posse da terra como fatores na destruição
ambiental na Amazônia brasileira: O caso do sul do Pará 41

degradadas e abandonadas (Fearnside, 1996). em áreas de assentamentos patrocinadas


Grande parte da área de pastagem está nas pelo governo. Os lotes distribuídos para fa-
mãos de grandes proprietários de terras. A re- mílias de pequenos colonos eram de 100 ha
distribuição de pastagens das grandes fazen- nos anos 1970 e de 50 ha nos anos 1980. Na
das à população sem terra da região e a con- época, a terra era vendida sob condições fa-
versão dessas áreas para agricultura familiar voráveis, com períodos de carência de cinco
representaria um avanço significativo na anos e 6% anuais de juros (muito abaixo da
redução das desigualdades sociais extremas taxa anual de inflação). Na prática, oportu-
que predominam hoje no Brasil. nidades para se obter terra pública por meios
legais eram normalmente raras e, atualmen-
Apesar do tamanho vasto da Amazônia,
te, são inexistentes. Embora grandes áreas
a população de 4,8 milhões de famílias sem
de terras públicas tenham sido distribuídas
terra no Brasil (Langevin & Rosset, 2000) é
dessa maneira nos anos de 1970, tais dis-
muito grande para ser sustentada pela distri-
tribuições não têm acontecido desde 1987.
buição de terras na região (Fearnside, 1985).
Entretanto, por meio de uma tradição de lon-
Soluções fora da Amazônia devem ser en-
ga data, desde os tempos coloniais, a maio-
contradas para sustentar as populações sem
ria das transferências de terra pública para a
terra nos estados não amazônicos. A mi-
propriedade privada tem sido realizada por
gração contínua dessas populações para a meio de invasões ilegais, tanto por grandes
Amazônia torna inviável qualquer plano para proprietários quanto por pequenos. O papel
sustentar a população rural atual da região do governo fica restrito à “regularização” ou
por meio da “reforma agrária”. Na prática, “legalização” a posteriori das propriedades
esse termo é usado para incluir tanto a redis- que existem no chão (Rosenn, 1971).
tribuição das grandes propriedades privadas
quanto a distribuição de áreas de floresta de Atualmente, a reforma agrária é feita pre-
domínio público, prática que fica evidente dominantemente por redistribuição de gran-
no sul do Pará. É provável que os problemas des propriedades privadas, em vez de terras
do sul do Pará se estendam para áreas cada públicas. O procedimento legal para esta re-
vez maiores na Amazônia. Portanto, lições distribuição tem sido, até agora, a expropria-
aprendidas com a problemática dessa região ção e indenização dos proprietários de terras,
fornecerão contribuições valiosas para deci- em acordo com o Estatuto da Terra (Lei 4.330
sões em toda a região amazônica. O pre- de 30 de novembro de 1964). Desde 1985, as
sente trabalho examina a atual situação de indenizações têm sido pagas em Títulos de
posse da terra no sul do Pará e as tentativas Dívida Agrária (TDAs), em vez de dinheiro
de identificar as mudanças na política que vivo, permitindo, assim, expropriações mais
reduziriam o seu impacto ambiental. rápidas. Os TDAs vencem em períodos varia-
dos que dependem do tamanho da área ex-
propriada, geralmente em 20 anos. A terra é
QUESTÕES DE POSSE DA TERRA distribuída aos colonos pelo INCRA. A expro-
priação e distribuição da terra prosseguiram
O status legal da terra muito lentamente até 1994, quando o ritmo
A maior parte dos cinco milhões de km2 acelerou acentuadamente como resultado di-
de terra da Amazônia Legal (Fig. 1) estava, reto de ocupação da terra por várias organi-
até recentemente, sob o domínio público, ou zações de base, especialmente o Movimento
sob o governo federal ou sob os governos dos Trabalhadores Rurais sem Terra (MST).
estaduais. A terra pode ser incorporada às Em apenas cinco anos, de 1995 a 1999, foram
propriedades privadas por meio de vários assentadas 372.866 famílias no Brasil, mais
mecanismos. Legalmente, as terras públicas do que as 218.000 famílias assentadas nos 30
podem ser vendidas para grandes proprietá- anos anteriores, desde o Estatuto da Terra de
1964 (Schwartzman, 2000).
rios privados por meio de licitações, enquan-
to parcelas pequenas de terra, chamadas de Desde 1997, um sistema de reforma
“lotes”, podem ser vendidas para colonos agrária “dirigido pelo mercado” está sendo

Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 41 8/18/2022 3:13:17 PM


DESTRUIÇÃO E CONSERVAÇÃO
42 DA FLORESTA AMAZÔNICA

FIGURA 1. A Amazônia
Legal Brasileira e o Sul
e Sudeste do Pará em
locais mencionados no
texto.

testado em cinco estados do Nordeste, den- produção agrícola nos lotes (Schwartzman,
tro do programa “Cédula da Terra”, financia- 2000). Este programa está sendo estendido
do pelo Banco Mundial. A terra é comprada para o restante do país, por meio do pro-
dos proprietários a preços de mercado, pa- jeto “Banco da Terra”, do Banco Mundial,
gando-se em dinheiro vivo, e é financiada de US$2 bilhões em seis anos. Até julho de
aos colonos por empréstimos com períodos 2000, o modelo de expropriação e indeniza-
de carência de três anos e 18% de juros anu- ção ainda predominava no estado do Pará.
ais. O programa é criticado pelo MST, que Antes das estradas chegarem no inte-
vê, nessa situação, um esforço para minar rior da Amazônia, no início dos anos 1970,
o seu papel na iniciação da reforma agrária. grandes áreas de terra foram concedidas a
O programa também é criticado pelas con- longo prazo como concessões (aforamentos)
dições desfavoráveis dos empréstimos, os para colheita de produtos como a seringa
quais são improváveis de serem pagos pela (Hevea brasiliensis) ou a castanha-do-Brasil

Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 42 8/18/2022 3:13:17 PM


Questões de posse da terra como fatores na destruição
ambiental na Amazônia brasileira: O caso do sul do Pará 43

(Bertholletia excelsa). Muitas vezes as terras nas margens de estrada em frente às proprie-
foram adquiridas por “grileiros” com docu- dades que eles desejam que seja expropriada
mentos falsificados, combinado com subor- pelo governo. Se o governo aceitar essa de-
nos, ameaças e violência para se obter áreas manda, ou os acampamentos são transfor-
ilicitamente. No Brasil como um todo, hoje, mados em assentamentos do INCRA ou são
75% das propriedades com mais de 10.000 ha oferecidos às pessoas lotes de terra em um
de área (latifúndios) têm títulos inválidos, de assentamento em outro local.
acordo com o Ministro do Desenvolvimento Até julho de 2000, o INCRA tinha 276
Fundiário (de Souza, 2000). Uma parte signi- assentamentos no sul do Pará, contendo
ficativa da terra no Pará é registrada no nome 46.000 famílias reconhecidas legalmente
de “fantasmas”, ou seja, pessoas fictícias (além de uma população flutuante significa-
(Pinto, 1999). Essas irregularidades são fa- tiva). Aproximadamente 5.000 famílias adi-
cilitadas pelo sistema bizantino brasileiro de cionais esperavam em 29 acampamentos. Os
inscrição de títulos da terra, onde diferentes acampamentos estabelecidos por movimen-
cartórios podem arquivar uma variedade de tos sociais recebem uma doação de comida
documentos que datam de períodos histó- (cesta básica) do INCRA, desde que eles não
ricos diferentes. As reivindicações de terra invadam terra privada. A entrada de migran-
frequentemente se sobrepõem e, até que o tes em terra privada, chamada de “invasão”
Cadastro Nacional da Terra planejado seja pelo governo e de “ocupação” pelos migran-
implementado, a maioria dos documentos tes, ainda é comum, apesar da política do
da terra não tem informações georreferencia- INCRA, iniciada em 1999, de não inspecio-
das sobre os limites das propriedades. nar e expropriar propriedades que foram in-
Em julho de 2000 o Ministério do vadidas. Atualmente as atenções estão foca-
Desenvolvimento Fundiário cancelou as ins- das na Fazenda Cabaceiras (35 km ao sul de
crições de 1.899 grandes propriedades (77% Marabá). O MST acampou nesta fazenda em
do número total) como parte de um esforço abril de 1999, e os ocupantes se retiraram
para conferir a documentação de grandes temporariamente para a margem da estrada
propriedades em todo o país (Brasil, MDF, em julho de 2000 para permitir a inspeção
2000). No Pará foram cancelados 344 re- do INCRA, a qual é exigida para uma decisão
gistros, ou 88% dos latifúndios no Estado. sobre a expropriação.
Propriedades com registros cancelados não Áreas vastas de pastagem dominam o uso
podem ser vendidas, subdivididas, alugadas de terra na região, se estendendo além do
ou hipotecadas, até que um título válido seja horizonte de visão das estradas principais.
apresentado ao INCRA. A prevalência de tí- A maioria da terra se encontra em grandes
tulos irregulares significa que a situação da fazendas de pecuária, frequentemente com
posse de terra na área poderia mudar radi- donos ausentes. Pelo menos nove fazendas
calmente se as terras que atualmente se en- grandes (cada uma com aproximadamente
contram nas mãos de “grileiros” fossem, de 10.000 ha) são da família Mutran, que obte-
fato, desapropriadas. ve concessões de 99 anos para a exploração
No sul e sudeste do Pará, que daqui por de castanha-do-Brasil antes da área se tor-
diante será denominado o “sul do Pará” nar acessível ao transporte rodoviário (e.g.,
(Fig. 1), a iniciativa de assentar pequenos Bunker, 1985; de Almeida, 1995; Emmi,
agricultores vem, principalmente, de uma 1988). O estado legal destas concessões é
variedade de movimentos sociais que orga- um ponto fundamental a ser resolvido nas
nizam migrantes sem terra. Enquanto o MST disputas fundiárias atuais. O MST argumen-
é o maior destes movimentos em escala na- ta que as concessões só permitem a colheita
cional, e o que exerce mais pressão políti- da castanha-do-Brasil, e não o desmatamen-
ca sobre o governo federal, no sul do Pará to ou a exploração madeireira. Estas conces-
o maior é a Federação dos Trabalhadores na sões são controladas pelo Instituto Estadual
Agricultura (FETAGRI). Movimentos sociais de Terras do Pará (ITERPA), ao invés de se-
fixam acampamentos ou em terra privada ou rem controladas pelo órgão federal (INCRA).

Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 43 8/18/2022 3:13:17 PM


DESTRUIÇÃO E CONSERVAÇÃO
44 DA FLORESTA AMAZÔNICA

Prováveis complicações legais, de acordo Foweraker, 1981; Schmink, 1982). Foi nessa
com a lei brasileira, incluem a possibilidade área que 19 membros do MST foram mortos
dos fazendeiros reivindicar que os termos de a tiros pela Polícia Federal em abril de 1996,
concessão tinham sido violados “de boa fé” no massacre de Eldorado dos Carajás, um
e também a grande dificuldade de remover evento que resultou em mudanças abruptas
qualquer pessoa (grande ou pequena) que nas políticas públicas na área. A colonização
ocupa uma terra sem oposição durante mais durante os anos de 1970 seguiu o modelo
de um ano. A existência de pastagens serve dos Projetos de Colonização Integrado (PICs)
como prova de que os fazendeiros estão ocu- da Rodovia Transamazônica, os quais eram
pando a terra de forma produtiva. Pastagem fortemente subsidiados (Smith, 1982). Nos
também conta como “benfeitoria” na terra anos de 1980, o fluxo de migrantes aumen-
que deve ser indenizada se a terra for desa- tou dramaticamente, levando à substituição
propriada, impondo, assim, limites práticos do INCRA na região pelo Grupo Executivo
sobre a quantidade de terra com pastagem das Terras do Araguaia e Tocantins (GETAT),
que o governo pode expropriar. uma agência militar que realizou expropria-
ções sumárias de terra privada que não tinha
O MST afirma que pastagem não é “terra “melhorias” (i.e., áreas florestadas) e distri-
produtiva” (classificação como “improduti- buição rápida da terra como lotes em áreas
vo” permite a expropriação), argumentando de assentamento com infraestrutura míni-
que a pastagem não cumpre a “função so- ma. A terra em volta da área de mineração
cial da terra”, requerida pela Constituição do Carajás era de prioridade máxima (e.g.,
Brasileira de 1988 (Artigo 184). A interpre- Fearnside, 1986b).
tação do MST da “função social” é que a
terra tem que produzir comida e emprego. O GETAT foi extinto em 1987, seguido
Embora os sistemas de pecuária extensiva por um hiato de 11 anos durante os quais
que predominam nas fazendas forneçam a reforma agrária permaneceu paralisada,
carne bovina e empregos, as quantidades até que o INCRA reiniciou as atividades na
produzidas por hectare são minúsculas área em novembro de 1996, após o massacre
(Hecht, 1993). O INCRA classifica a produti- de Eldorado dos Carajás. Enquanto isso, as
vidade considerando um sistema de pontua- populações urbanas e rurais desempregadas
ção que acrescenta pontos para a pastagem tinham aumentado muito após o esgotamen-
com base na densidade de gado presente e o to da mina de ouro da Serra Pelada no fi-
retorno econômico da operação. No caso da nal dos anos 80. As demissões em massa da
Fazenda Cabaceiras, uma equipe do INCRA companhia que operava as minas de ferro
com dois observadores do MST começaram do Carajás (Companhia Vale do Rio Doce:
a inspecionar a fazenda em julho de 2000 CVRD), privatizada em 1997, incrementaram
para decidir a sua classificação como “pro- a crise. Insuficiências no restabelecimento
dutiva” ou “improdutiva”. das 23.871 pessoas deslocadas pela represa
de Tucuruí, em 1984, também agravaram
os problemas sociais (Fearnside, 1999a).
Conflitos de terra Por exemplo, na Área de Assentamento Rio
O sul do Pará é uma região de 40 mu- Moju, 60% das famílias que foram trans-
nicípios abrangendo 49 milhões de hecta- feridas da área do reservatório venderam
res e, frequentemente, é proposto que essa ou abandonaram os seus lotes nos primei-
região se torne um estado independente, de ros seis anos de assentamento (Magalhães,
nome “Carajás”, com a capital localizada em 1994, pág. 454).
Marabá. Essa área é conhecida como a parte Conflitos entre fazendeiros e posseiros
da Amazônia onde questões fundiárias são têm sido comuns ao longo do tempo, mas
muito explosivas, com uma série contínua de agora os conflitos também estão surgindo
conflitos violentos de terra entre os peque- entre migrantes recém-chegados e os co-
nos agricultores e os grandes proprietários de lonos já estabelecidos que possuem lotes
terras desde o início dos anos de 1970 (e.g., de 20-25 ha em áreas de assentamento do

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Questões de posse da terra como fatores na destruição
ambiental na Amazônia brasileira: O caso do sul do Pará 45

INCRA, como é o caso da área Progresso es- aos lotes, em vez de serem ligadas às pesso-
tabelecida em 1987. Áreas como esta con- as que receberam os empréstimos. Isto serve
tém populações flutuantes significantes, como um forte estímulo para o abandono
incluindo migrantes individuais que não se dos lotes depois que os recursos do financia-
uniram aos movimentos organizados e mi- mento são recebidos. Também, torna difícil a
grantes que já receberam lotes previamente venda dos lotes abandonados, já que o com-
do INCRA e que agora são desqualificados prador teria que herdar as dívidas do dono
de serem assentados novamente. anterior. Frequentemente, os que abando-
nam seus lotes estão fugindo com o dinheiro
Fracasso e sucesso dos colonos do empréstimo e, dessa forma, o comprador
subsequente estaria assumindo a dívida
A dificuldade de implantar e manter sis- sem um nível correspondente de melhorias
temas de produções sustentáveis em áreas oriundas do investimento dos fundos de fi-
de assentamento na Amazônia é aparente. nanciamento. O resultado é que os bancos
Entre outras deficiências, os colonos, fre- ficam com lotes expostos, sujeitos às inva-
quentemente, têm pouco conhecimento sões subsequentes pela população flutuante.
de como administrar uma propriedade, in-
cluindo habilidades administrativas básicas A extensão agrícola (incluindo serviços
e conhecimento dos problemas especiais da educacionais) é essencial para implantar
agricultura amazônica. Em alguns casos, sistemas sustentáveis. A EMATER, a agên-
como os projetos Palmares -I e -II, os colo- cia federal para extensão agrícola, tem, nos
nos foram trazidos de favelas dos arredores anos recentes, limitado as suas atividades
de Marabá. Moradores de rua urbanos são para servir de intermediária para o crédito
péssimos agricultores, já que esta profis- agrícola, em vez de agir como uma agência
são requer, pelo menos, tanto conhecimen- de extensão. Em 1997, o INCRA estabeleceu
to especializado quanto empregos urbanos um programa de extensão independente cha-
(Moran, 1981). Deve-se enfatizar que a falta mado “Projeto Lumiar”, que foi extinto em
de sucesso de muitos migrantes em projetos junho de 2000 devido a dificuldades legais.
de assentamento de governo não é o resul- Esse projeto alocou agentes de extensão agrí-
tado dos defeitos inerentes das pessoas as- cola para cuidar dos colonos em 29 dos 276
sentadas, como às vezes é alegado por fun- projetos de assentamento (11%) do sul do
cionários do governo (ver Almeida, 1994). Pará. Os agentes foram espalhados de forma
O fracasso é, frequentemente, o resultado esparsa nos projetos favorecidos; por exem-
da falta de apoio material oportuno e apro- plo, no projeto Palmares-II, três agentes co-
priado, assim como, também, da falta de um briam 517 famílias em uma área de 15.000
conjunto de informações e atitudes que pre- ha. Financiamentos do PRONAF concedem
cisam ser adquiridas. até R$ 9.500 (US$ 5.135) por família para
A substituição de lotes é um problema projetos julgados adequados para a terra de
perene que inibe a redução das taxas de des- cada assentado, tais como vacas leiteiras para
matamento. Quando lotes são abandonados os assentamentos com pastagem e cupuaçu
ou vendidos, os donos anteriores se mudam (Theobroma grandiflorum) ou mudas de coco
para desmatar em outro lugar. Se abandona- (ambos irrigados) para os assentamentos
do, o lote deixado para trás permanece inal- com floresta. A associação que organiza os
terado durante um período de tempo, mas, colonos em uma área de assentamento pode
também, pode ser invadido por migrantes deduzir 2% dos fundos do PRONAF para con-
sem terra. Se o lote é comprado por uma tratar uma empresa privada para fornecer os
segunda onda de colonos, provavelmente serviços de extensão. Muitas vezes as associa-
será agregado aos lotes vizinhos para formar ções de colonos foram infelizes nas escolhas
uma pequena fazenda. As dívidas bancá- das suas empresas de extensão. Por exemplo,
rias, incluindo as do Programa Nacional de o assentamento Progresso escolheu uma em-
Agricultura Familiar (PRONAF), são ligadas presa (AGROPAN) sem agentes de extensão

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DESTRUIÇÃO E CONSERVAÇÃO
46 DA FLORESTA AMAZÔNICA

qualificados; o dinheiro acabou e a empresa CORRENTÃO, em Nova Ipixuna, onde o apoio


desapareceu. material e a liderança local culminaram na
montagem de uma usina de beneficiamento
Problemas crônicos incluem corrupções
de cupuaçu, açaí (Euterpe oleracea) e outros
em agências do governo e, às vezes, entre
produtos não madeireiros extraídos da flo-
os dirigentes das associações que, em várias
resta. Embora os recursos limitados para o
ocasiões, fugiram com os fundos obtidos
apoio material possam ser sempre direciona-
para as suas associações através de financia-
dos apenas para os projetos com liderança
mentos pelo PRONAF (e.g., a área de assen-
forte, isto não resolveria o problema do que
tamento Progresso). Decisões financeiras
fazer com o restante dos assentamentos. É
insustentáveis também são abundantes. Um
necessário criar mecanismos para nutrir ati-
exemplo foi a associação liderada pelo MST
vamente a iniciativa.
na área de assentamento Palmares-II, a qual
aceitou um financiamento generoso, ofereci-
do após o massacre de Eldorado dos Carajás, Indústria da expropriação
para a obtenção de uma usina mecanizada A compensação generosa pelas terras ex-
de farinha de mandioca, uma usina de ra- propriadas fez com que alguns fazendeiros
ção para galinhas, uma usina de leite, um com dificuldades econômicas ficassem an-
matadouro de galinhas e vários caminhões e siosos para ter as suas terras expropriadas
tratores. Com exceção dos veículos e o uso para a reforma agrária. O INCRA, frequen-
ocasional da usina de ração para galinhas, temente, paga mais por hectare como uma
todas as instalações estão inativas. O finan- indenização pelas “melhorias” (principal-
ciamento de 10 anos tinha um período de mente pastagem) do que valeriam as fazen-
carência de dois anos que expirava em 2001, das expropriadas se elas fossem vendidas
antes de que qualquer produção agrícola sig- no mercado livre (frequentemente é alegado
nificante fosse esperada. corrupção no processo de fixar os valores
É importante entender que a agricultura das indenizações). Em alguns casos, condi-
no Brasil recebe subsídios governamentais ções favoráveis conduziram a uma forma de
de muitos tipos, incluindo frequentemen- conspiração entre as organizações de sem
te “anistias” nas quais são perdoadas as terras, fazendeiros e o Banco do Brasil. Um
dívidas não pagas. Isto se aplica tanto aos fazendeiro com dívidas grandes pode con-
grandes fazendeiros e agroindústrias quan- vidar uma organização de sem terras para
to aos pequenos agricultores. A situação nos invadir a propriedade (ou, alternativamente,
E.U.A. durante a “bacia de poeira” dos anos estabelecer um acampamento à margem da
1930, quando os bancos executaram hipote- estrada na frente da propriedade, sem inva-
cas inadimplentes, expulsando milhares de dir a mesma). Quando o INCRA desapropria
pequenos agricultores das suas terras, seria a propriedade, a indenização permite o paga-
politicamente inconcebível no Brasil con- mento da dívida bancária, o que é vantajoso
temporâneo. Ao invés disso, o curso normal para o banco por causa da alta probabilida-
dos eventos hoje no Brasil é a prorrogação de de o fazendeiro deixar de honrar o em-
préstimo caso a invasão e expropriação não
dos períodos de empréstimo quando os ren-
tivessem acontecido. Os sem terras têm o
dimentos da colheita são pobres, frequente-
benefício de obter as terras com pouco risco
mente terminando em um calote.
de resistência violenta. Em termos ambien-
As experiências dos assentamentos tais esta situação resulta em desmatamento
Progresso e Palmares-II indicam que o apoio adicional, já que a invasão quase sempre
material, por si só, não é suficiente para acontece na porção florestada das proprieda-
superar as barreiras do estabelecimento de des. A invasão de propriedades endividadas
uma agricultura próspera. O sucesso dos co- é aparentemente comum no Mato Grosso,
lonos individuais e de associações de colono mas na área de Marabá o INCRA estima que
depende fortemente da iniciativa individual. estes casos representem, aproximadamente,
Um exemplo é fornecido pela cooperativa apenas 10% do total.

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Questões de posse da terra como fatores na destruição
ambiental na Amazônia brasileira: O caso do sul do Pará 47

A compensação pela terra expropriada é A identificação eficazdas pessoas que já


geralmente paga na forma de TDAs, que po- possuíram lotes é apenas uma parte do pro-
dem ser usados, no seu valor nominal, para blema. Embora a resolução desse problema
pagar dívidas no Banco do Brasil. No mer- aliviaria o governo da despesa infinita de as-
cado livre, estes títulos tradicionalmente são sentar as mesmas pessoas repetidamente, o
vendidos apenas por uma fração do valor problema não termina aí. Existe uma popu-
nominal e, frequentemente, são chamados lação flutuante de migrantes sem terra que
de “títulos podres”. Desde 1996, no entanto, já são inelegíveis para assentamento, con-
o governo federal tem privatizado uma série tribuindo para o nível crescente de conflito
de grandes empresas estatais e os consórcios entre os pequenos proprietários já assenta-
(normalmente multinacionais) que com- dos e os invasores individuais. Esta popu-
pram estas empresas podem pagar por elas lação flutuante crescerá substancialmente se
usando TDAs no valor nominal. O resultado um sistema de cadastro melhorado começar
é que, no mercado secundário para TDAs, o a funcionar. Também vale a pena notar que
valor subiu aos níveis mais altos da história. a suposição de que qualquer pessoa tem o
Atualmente, isto faz com que seja especial- direito a uma oportunidade de ser assenta-
mente atraente para os fazendeiros terem da em um projeto do INCRA representa uma
as suas terras desapropriadas, incentivando questão em aberto. Por exemplo, se for ado-
a conspiração entre as organizações de mi- tada a proposta de alguns atores (como a
grantes sem terra e os donos de fazendas, FETAGRI) para um zoneamento ecológico-e-
conduzindo à aceleração do desmatamento. conômico nesta parte do Pará, isso implica-
rá em um limite na quantidade de terra que
será destinada à reforma agrária e, portanto,
Indústria da invasão em um limite no número de famílias que po-
Uma acusação frequente relatada pelo derão ser assentadas na área. A mensagem
INCRA é a existência de uma “indústria de para os migrantes que chegam depois que
invasão”, na qual os migrantes recebem ter- as áreas zoneadas para assentamentos já fo-
ras do INCRA, vende-as e recebem terras no- ram distribuídas como lotes seria, então, que
vamente em outros assentamentos. Muitas eles não teriam nenhum direito de receber
vezes o segundo lote é registrado no nome um lote do INCRA na região.
de um cônjuge ou uma criança. Pelo menos
teoricamente, o INCRA desqualifica os mi- Aumento contínuo de demandas
grandes descobertos nesse processo (uma Uma das marcas características do MST
ocorrência rara na prática). Funcionários é o papel central da ideologia: existem outras
do INCRA relatam que em alguns acampa- metas políticas importantes ao movimento
mentos, particularmente aqueles organi- além de ganhar terras e ajudar os migrantes
zados pelo Movimento de Luta pela Terra assentados nelas (Silveira, 2000). O MST é di-
(MLT), a maioria dos migrantes são subsi- vidido em grupos que exigem expropriações
diados por patrões urbanos, tais como lojis- adicionais para novos assentamentos e os que
tas das cidades vizinhas como Curionópolis representam migrantes que já obtiveram ter-
e Parauapebas. Os migrantes passariam as ras e agora querem crédito, extensão agrícola e
terras para os seus patrões assim que eles as outros benefícios do governo (e.g., Figueiredo,
recebessem do INCRA. Parte desse problema 2000). Uma vez que a terra é obtida, os mi-
poderia ser resolvida aplicando impostos pe- grantes frequentemente trocam as suas de-
sados sobre vendas de terras, possivelmente mandas para crédito, estradas e assistência
junto a um aumento nas barreiras burocráti- técnica. Esta transição pode conduzir para
cas para a transferência dos títulos da terra. uma evolução de demandas ou para um fra-
A falta de um cadastro nacional adequado cionamento em grupos menores com ênfases
dos migrantes assentados impede a adoção diferentes; por exemplo, o projeto Palmares se
de medidas efetivas para acabar com a “in- dividiu no projeto Palmares-I (menos ideoló-
dústria de invasão”. gico) e os assentamentos de Palmares-II (mais

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DESTRUIÇÃO E CONSERVAÇÃO
48 DA FLORESTA AMAZÔNICA

ideológico). Organizações diferentes adotam extrema, crescimento populacional rápido e


uma gama de orientações diferentes. Por pela distribuição de posse da terra altamen-
exemplo, a FETAGRI focaliza nas necessidades tedesigual. Os migrantes são expelidos do
de sustentar a agricultura para os que já foram Maranhão pelo padrão de desenvolvimento
assentados em uma parcela de terra. que continua aumentando a concentração
No caso dos assentamentos e acampa- de riqueza nas mãos de uma elite pequena,
mentos do MST espera-se que as famílias empobrecendo a maioria da população. De
forneçam um subsídio às invasões em fazen- acordo com o INCRA, uma média de 100 fa-
das privadas (como a Fazenda Cabaceiras). mílias chegam por semana de trem. Os fun-
Isto é feito compartilhando a cota mensal de cionários do INCRA relatam que os gover-
comida dada pelo INCRA até que o primeiro nos municipais no Maranhão regularmente
financiamento da PRONAF chegue (obvia- pagam a passagem de trem para exportar
mente, estas fontes de apoio governamental população.
não são disponíveis aos ocupantes de terras A barreira básica contra a solução dos
privadas). Depois, espera-se que os agriculto- problemas de posse da terra no sul do Pará
res nos assentamentos estabelecidos compar- é o fluxo contínuo de migrantes. A grande
tilhem com a organização parte da produção maioria vem do Maranhão, embora alguns
dos seus lotes. Isto cria um problema óbvio venham de outras áreas. Se o fluxo das po-
para um assentamento como Palmares-II que pulações do Maranhão fosse paralisado pe-
não tem produção agrícola suficiente para las melhorias na organização dos assenta-
pagar o financiamento concedido. Por outro mentos na área de Marabá e as fronteiras
lado, o sistema do MST de financiar as suas fossem fechadas por meio do zoneamento,
atividades acrescenta um elemento importan- junto com esforços para se fazer cumprir
te de independência às fases iniciais das suas as restrições sobre a instalação de assenta-
iniciativas de ocupação de terra. Em fases
mentos em áreas de floresta, as condições
posteriores, aumenta a demanda por fontes
enfrentadas pelos migrantes que chegam no
de apoio governamental, assim como, fre-
trem teriam que ser substancialmente piores
quentemente, também costuma acontecer em
do que as atuais para paralisar esse fluxo.
assentamentos que não são do MST.
Já que, atualmente, os migrantes enfrentam
A dependência da ajuda governamental sofrimentos dramáticos, inclusive riscos sig-
tende a se tornar um espiral infinito de au- nificativos de serem mortos em conflitos vio-
mento contínuo das demandas, que, mais lentos com os proprietários de terras, essa
cedo ou mais tarde, deve parar. Um exemplo opção para desencorajar os migrantes em
é fornecido pela antiga Fazenda Bamerindus, potencial é inaceitável.
onde os colonos no assentamento Progresso
que receberam lotes de 20 ha com cacau A chegada contínua de população de
agora estão clamando por dinheiro para sem terras é um aspecto da situação que é
pagar outros para podar os cacaueiros por diferente do problema da grande reserva de
eles (observação pessoal). Para os colonos migrantes não assentados já existente no sul
na maioria das áreas de assentamento, rece- do Pará. A migração para a área é um pro-
ber a terra já com cacaueiros saudáveis e em blema que deve ser solucionado para conter
produção seria um sonho, ao invéz de ser a degradação social e ambiental na região.
uma razão para reclamações. A prestação de serviço de passageiro desem-
penha um papel de relações públicas para
a CVRD, que, compreensivelmente, quer
Fluxos de migração
mostrar que a companhia fornece benefícios
Migrantes novos chegam na região em sociais à região, e não somente remove o mi-
um fluxo contínuo, especialmente os pro- nério de ferro da mina de Carajás, a maior
venientes do estado do Maranhão que jazida de minério de ferro de alto teor do
chegam pela Estrada de Ferro de Carajás. mundo. Obviamente, o custo ambiental de
O Maranhão é conhecido pela pobreza facilitar o movimento das populações para

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Questões de posse da terra como fatores na destruição
ambiental na Amazônia brasileira: O caso do sul do Pará 49

áreas de floresta tropical não é enfatizado na acontece quase que, exclusivamente, nas
propaganda da companhia. porções florestadas das propriedades (e.g.,
A Estrada de Ferro de Carajás, completada Fazenda Cabaceiras). Certamente esse resul-
em 1984, foi financiada pelo Banco Mundial, tado se deve, em parte, à maior probabili-
pela Comunidade Econômica Européia e pelo dade de os fazendeiros reagirem com resis-
Banco de Importação-Exportação Japonês. tência armada se as áreas de pastagem das
Na ocasião, foi considerado um “modelo de propriedades forem invadidas. Outro fator
progresso ambiental” (Goodland, 1985). No importante é a dificuldade de plantar cultu-
entanto, a avaliação ambiental do Banco ras anuais, como arroz e milho, em áreas de
Mundial considerou apenas os impactos di- pasto por causa do solo compactado, o tape-
retos, e a área de influência considerada foi te grosso de raízes de capim e a tendência de
limitada a uma faixa de 100 km ao longo o capim rebrotar como erva daninha depois
da estrada de ferro mais as áreas em vol- que as culturas estiverem estabelecidas. A
ta da mina e do porto (Fearnside, 1989). O conversão de pastagem para culturas agrí-
Programa Piloto para a Conservação das colas usando ferramentas manuais é uma
Florestas Tropicais do Brasil (PPG-7) fornece tarefa muito difícil.
atualmente um arcabouço de que os esforços A manutenção da produtividade das
para conter a destruição ambiental nesta par- pastagens também enfrenta impedimentos,
te da Amazônia poderiam ser financiados pe- tanto para pequenos colonos quanto para os
las mesmas fontes que financiaram original- grandes fazendeiros. A pastagem se degrada
mente a estrada de ferro (Brasil, MMA, 2000). depois de aproximadamente dez anos, mas,
pode ser “recuperada” se os troncos e tocos
forem retirados mecanicamente e a terra for
A POSSE DA TERRA E O MEIO AMBIENTE arada, fertilizada, corrigida (com calcário) e
Desmatamento replantada (Faminow, 1998; Mattos & Uhl,
1994). Em 2000, estas operações tiveram um
Por muitos anos os fazendeiros se conside- custo aproximado de R$ 1.500 (US$ 811) por
raram “obrigados” a desmatar a floresta para hectare, muito maior que o preço médio de
garantir a posse da terra, porque, apesar das R$ 350/ha (US$180/ha) da terra com pas-
proibições contra o desmatamento, qualquer tagem ou R$ 80/ha (US$ 43/ha) para terra
proprietário de terras que não desmatasse, na com floresta. Este fato desencoraja a intensi-
prática, perderia a terra, ou pela expropriação ficação da pastagem uma vez que haja terra
ou pela invasão. Os problemas de posse da disponível para compra.
terra estão conduzindo à destruição ambien- O processo de assentamento conduz ao
tal tanto por efeitos diretos quanto por indire- desmatamento de floresta adicional até mes-
tos, acelerando o desmatamento por grandes mo para a parcelao da população já assen-
e pequenos proprietários de terras. Deve-se tada em áreas desmatadas. Por exemplo, na
enfatizar que a maior parte do desmatamen- área de assentamento Palmares-I (iniciada
to é realizada por propriedades grandes e em 1993), os colonos que receberam lotes de
médias (Fearnside, 1993, 1997c). Imagens do
terra de pastagem muitas vezes plantaram as
satélite LANDSAT, de 1998, indicam que um
suas culturas anuais nas terras dos seus vizi-
pouco mais da metade do desmatamento feito
nhos que receberam lotes ainda em floresta.
ao longo do período 1997-1998 na Amazônia
Os assentamentos conduzem, inexoravel-
brasileira foi observada em áreas contínuas de,
mente, a uma paisagem dominada por pas-
pelo menos, 100 ha de extensão (Brasil, INPE,
tagem que, exceto pela maior densidade de
2000), uma escala de atividade que excede em
casas, tem o mesmo aspecto geral das vastas
pelo menos 20 vezes o que um agricultor pe-
áreas de pastagem nas grandes propriedades
queno pode desmatar em um único ano usan-
vizinhas. A área de assentamento Boca do
do mão-de-obra familiar.
Cardoso, iniciada pelo GETAT em 1986 em
A invasão atual de fazendas grandes uma área de floresta contínua dominada por
por organizações de camponeses sem terra árvores de castanha-do-Brasil, fornece um

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DESTRUIÇÃO E CONSERVAÇÃO
50 DA FLORESTA AMAZÔNICA

exemplo triste. A falta de fixação da popu- previamente estabelecidos em áreas de flo-


lação de colonos é tão aparente atualmente resta são frequentemente expandidos.
como era nos anos 1970 nos PICs, ao longo
da Rodovia Transamazônica (Rodovia BR- Exploração madeireira
230), onde quase todos os colonos originais
venderam seus lotes? e foram embora. Em A exploração madeireira pode contribuir
Boca do Cardoso, um colono da segunda com a seleção de áreas florestadas para a in-
onda de parceleiros comprou 11 lotes, os vasão, já que os ocupantes frequentemente
quais ele administra como uma pequena fa- vendem toras. O Instituto Brasileiro do Meio
zenda de pecuária (observação pessoal). O Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis
padrão de substituição dos donos dos lotes e (IBAMA), o qual é responsável pela
consolidação em propriedades maiores repe- regulamentação da exploração da madeira, está
te a experiência da Rodovia Transamazônica presente apenas esporadicamente. Exploração
(Fearnside, 1986a). madeireira intensa é evidente nas porções flo-
restadas das áreas de assentamento (como na
O processo de estabelecer áreas de as- área de assentamento Progresso). Os colonos
sentamento leva a investimentos de infraes- podem receber um pequeno pagamento para
trutura que induzem ao desmatamento adi- permitir a exploração madeireira, embora
cional. O INCRA atualmente quer construir também ocorra o simples roubo das árvores.
25.000 km de estradas de acesso para os 276 Madeireiros cortaram as árvores de castanha-
assentamentos existentes (no entanto, até do-Brasil, apesar desta espécie ser protegida
julho de 2000 a agência tinha fundos apenas legalmente pelo Código Florestal (Lei 4.771 de
para 1.200 km). Embora o acesso por estrada 15 de setembro de 1965). Esta parte do sul do
seja essencial para agricultura comercial se Pará é conhecida como o “polígono dos cas-
tornar viável, ele também é bem conhecido tanhais”, devido à abundância dessa espécie.
como um fator fundamental na aceleração Frequentemente, árvores isoladas que são dei-
do desmatamento (Fearnside, 1987). xadas em pé nas pastagens morrem quando
O INCRA não tem iniciado assentamen- as pastagens são queimadas para controlar a
tos novos em áreas florestadas na Amazônia invasão da vegetação lenhosa. Em 1995 uma
desde 1996. Em novembro de 1999 esta prá- brecha na proteção de árvores de castanha-
tica foi formalizada por uma Portaria (INCRA do-Brasil foi aberta, permitindo o corte das
/ IBAMA 88/98) exigindo que somente áre- árvores mortas ou que estivessem morrendo
as não florestadas fossem selecionadas para (“desvitalizadas”) (IBAMA Portaria 048/95 de
novos assentamentos do INCRA. Embora 10 de julho de 1995). Esta brecha expirou no
essa portaria tenha sido citada frequente- final de 2000, mas, pode ser renovada. O corte
mente por funcionários do governo como comercial de castanheiras vivas é aparente em
uma indicação de que novos assentamentos toda a parte (observação pessoal). A ausência
não causam desmatamento, esta conclusão de aplicação dos regulamentos, pelo IBAMA,
está longe da verdade. Na realidade, pratica- sobre a exploração madeireira fere a base do
mente todas as áreas de assentamento novas manejo florestal sustentável: a proteção con-
continuam sendo estabelecidas em terra flo- tra a competição injusta da exploração madei-
restada, embora seja verdade que o INCRA, reira insustentável.
por si só, não faz a seleção destes locais. Isto A entrada de migrantes em terra privada
ocorre porque o INCRA, na prática, já não pode estimular a exploração madeireira no
seleciona mais os locais para as novas áreas resto da reserva de floresta tanto pelo pro-
de assentamento. Em vez disto, o MST, ou prietário da terra quanto por madeireiros que
as outras organizações de sem terras, sele- pagam para o dono uma taxa pela madeira re-
cionam os locais, escolhendo as fazendas a movida por eles (e.g., na Fazenda Cabaceiras).
serem invadidas, e o papel do INCRA se limi- A venda de madeira também pode estimular
ta à subsequente “legalização” destes fatos uma forma de conspiração entre os migrantes
consumados. Além disso, os assentamentos e os proprietários de terras. Os regulamentos

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Questões de posse da terra como fatores na destruição
ambiental na Amazônia brasileira: O caso do sul do Pará 51

atuais licenciam efetivamente 3 ha de des- exemplo, por meio de negociações interna-


matamento por ano por família (Instrução cionais relacionadas a benefícios de carbono
Normativa do MMA 07/99 de 17 de abril de (Fearnside, 1999b).
1999), com o direito de vender 15 m3 de toras
por hectare desmatado. Isso fornece o meca-
nismo principal para a entrega legal de toras MEDIDAS NECESSÁRIAS
para as serrarias e para a obtenção de docu- Políticas nacionais são necessárias para
mentos que dão a aparência de legalidade às fortalecer a agricultura familiar, redirecio-
entregas de fontes proibidas. Em contraste, nando, assim, as prioridades governamen-
obter a aprovação de um plano de manejo tais da soja e dos outros usos da terra adap-
florestal do IBAMA requer, pelo menos, dois tadas aos grandes proprietários de terras.
anos e uma despesa considerável. Para os do- Reformar a terra de pastagem para agricul-
nos de fazenda que já desmataram a porcen- tura, às vezes denominada “recuperação de
tagem legalmente permitida nas suas proprie- terras degradadas”, é uma atividade essen-
dades, um caso normal na área de Marabá, o cial para que grandes fazendas sejam redis-
investimento de tempo e dinheiro necessários tribuídas aos pequenos agricultores sem o
para obter a aprovação de um plano de mane- estímulo de desmatamento adicional.
jo florestal praticamente impede os fazendei-
ros de colherem, de forma legal, a madeira da O progresso significativo na estabiliza-
porção florestada (“reserva legal”) das suas ção da população de assentados é vital para
terras. O resultado é um estímulo ao desma- todas as outras metas do desenvolvimento,
tamento por migrantes. incluindo a limitação da destruição ambien-
tal. Entre outras medidas, isso necessitará de
um investimento significativo em educação
Serviços ambientais e saúde (inclusive controle de natalidade).
Os diversos grupos, desde o MST até Serviços ambientais devem ser considerados
os grandes proprietários de terra represen- como uma fonte de apoio, como a proposta
tados pelo Sindicato dos Produtores Rurais PROAMBIENTE.
de Marabá (PRORURAL) estão aprendendo Restrições efetivas sobre a venda de lotes
a usar um discurso ecológico. Muitas vezes e o recebimento subsequente de outros lotes
ainda não está claro se esse discurso é um sob o programa de reforma agrária devem
primeiro passo para um desenvolvimento ser colocadas em prática. Isso exigirá um
ambientalmente sustentável ou apenas um cadastro nacional de migrantes assentados.
meio de neutralizar a influência das preocu- Mudar as condições de financiamento para
pações ambientais. amarrar os empréstimos aos indivíduos, ao
A medida com melhores perspecti- invés de amarrá-los às parcelas de terra, aju-
vas é uma proposta da FETAGRI, chamada daria a reduzir a substituição dos colonos.
PROAMBIENTE, que inclui a concessão de Estabelecer o controle da lei é uma condição
uma porcentagem dos valores dos emprésti- prévia para o uso de outras ferramentas de
mos agrícolas do Banco da Amazônia (BASA) políticas públicas, tais como o zoneamento
como subsídio para cobrir os custos adicio- ecológico-econômico. Em locais efetivamen-
nais das práticas sustentáveis e de impacto te sem lei tais ferramentas não podem ser
reduzido. A FETAGRI defende os subsídios esperadas para conter a destruição ambien-
com base nos serviços ambientais das flores- tal resultante de roubo, fraude e corrupção.
tas deixadas em pé (e.g., Fearnside, 1997d). Os graves problemas ambientais e sociais
Ainda há muito para ser definido: como mo- causados pelo fluxo contínuo de migran-
nitorar as práticas melhoradas, como atri- tes para a área de Marabá provavelmente
buir desmatamento evitado e como lidar continuarão à medida que os sistemas de
com casos de não cumprimento dos acordos. transportes para fronteiras vizinhas me-
Uma fonte de fundos para um subsídio deste lhoram. Com a pavimentação da rodovia
tipo também teria que ser encontrada, por Transamazônica de Marabá até Altamira, e

Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 51 8/18/2022 3:13:18 PM


DESTRUIÇÃO E CONSERVAÇÃO
52 DA FLORESTA AMAZÔNICA

depois para o oeste até Rurópolis (prevista (Fazenda Taboquinha), e colonos nos
no Plano Plurianual 2000-2003, também co- Projetos de Assentamento (P.A.) Progresso,
nhecido como “Avança Brasil”), é provável Palmares-I e Palmares-II. Informações úteis
que o fluxo destas áreas se distribua para também foram fornecidas por represen-
áreas maiores com floresta em pé. Isto res- tantes em Brasília dos CNA, EMBRAPA,
salta a necessidade de uma ação para dimi- IBAMA, INCRA, MMA e Banco Mundial.
nuir o fluxo de pessoas, particularmente do Representante do Pará/Amapá da FETAGRI
Maranhão, para Marabá. e especialmente discussões com os meus
Reduzir a velocidade do fluxo de popula- colegas membros do Grupo Aconselhador
ções do Maranhão requer, no mínimo, dar um Internacional (IAG), do PPG-7. O Conselho
fim à prática de pagamento da passagem de Nacional do Desenvolvimento Científico
trem realizada por algumas prefeituras muni- e Tecnológico (CNPq AI 523980/96-5) e o
cipais do Maranhão para os migrantes e, tam- Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia
bém, remover qualquer subsídio da CVRD no (INPA PPI 1-3160) contribuíram com apoio
fornecimento do serviço de passageiro na fer- financeiro. R.I. Barbosa, N. Hamada, S.V.
rovia. No futuro, considerar o fim do serviço Wilson e um referee anônimo fizeram co-
de passageiro pode ser necessário. Também mentários valiosos. Esta é uma tradução atu-
são necessários maiores esforços para alcan- alizada de um trabalho publicado na revista
çar a reforma agrária para viabilizar a pro- World Development (Fearnside, 2001).
dução agrícola familiar dentro do Maranhão.
Nenhum programa para reduzir os problemas
ambientais e de posse da terra no sul do Pará GLOSSÁRIO DE SIGLAS
terá êxito sem o fim da exportação de popu-
lação das áreas fonte. Condições prévias para BASA Banco da Amazônia, S.A.
a melhoria dos problemas sociais e ambien- CNA Confederação Nacional da
tais na Amazônia incluem enfrentar o pro- Agricultura
blema de migração, estabelecer o controle da
lei na região, redistribuir áreas de pastagem CORRENTÃO Cooperativa dos
de grandes propriedades e implantar formas Trabalhadores Agro-
sustentáveis de agricultura familiar nas pasta- Extrativistas de Nova Ipixuna
gens redistribuídas. CVRD Companhia Vale do Rio Doce
EMATER Empresa Assistência Técnica
AGRADECIMENTOS e Extensão Rural
Os seguintes órgãos e grupos fornece- EMBRAPA Empresa Brasileira de
ram ajuda e informações valiosas no Sul do Pesquisa Agropecuária
Pará: Instituto Nacional de Colonização e FETAGRI Federação de Trabalhadores
Reforma Agrária (INCRA), Superintendência na Agricultura
do Sul e Sudeste do Pará, Movimento dos
Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) GETAT Grupo Executivo das Terras
na Fazenda Cabaceiras, Federação dos do Araguaia-Tocantins
Trabalhadores na Agricultura (FETAGRI), IBAMA Instituto Brasileiro do Meio
Marabá, Sindicato dos Produtores Rurais
Ambiente e dos Recursos
de Marabá (PRORURAL), Associação
Naturais Renováveis
dos Produtores Rurais Agro-Extrativistas
do Assentamento Progresso (APREAP), ITERPA Instituto das Terras do Pará
Associação de Produção e Comercialização
INCRA Instituto Nacional de
do Assentamento de Palmares (APROCPAR),
Colonização e Reforma
Cooperativa dos Trabalhadores Agro-
Agrária
Extrativistas de Nova Ipixuna (CORRENTAO),
Amigos da Terra-Marabá, José Diamantino MLT Movimento da Luta pela Terra

Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 52 8/18/2022 3:13:18 PM


Questões de posse da terra como fatores na destruição
ambiental na Amazônia brasileira: O caso do sul do Pará 53

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54 DA FLORESTA AMAZÔNICA

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Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 54 8/18/2022 3:13:18 PM


CAPÍTULO

4
O cultivo da soja como ameaça para o
meio ambiente na Amazônia brasileira

Philip M. Fearnside
Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia – INPA
Av. André Araújo, 2936 – CEP: 69.067-375, Manaus, Amazonas, Brasil.
E-mail: pmfearn@inpa.gov.br

Tradução de:
Fearnside, P.M. 2001. Soybean cultivation as a threat to the environment in Brazil. Environmental
Conservation 28(1): 23-38. https://doi.org/10.1017/S0376892901000030

Tradução original:
Fearnside, P.M. 2006. O cultivo da soja como ameaça para o meio ambiente na Amazônia bra-
sileira. p. 281-324. In: L.C. Forline, R.S.S. Murrieta & I.C.G. Vieira (eds.) Amazônia Além dos 500
Anos. Museu Paraense Emílio Goeldi, Belém, Pará, Brasil. 566 p.

55
Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 55 8/18/2022 3:13:25 PM
DESTRUIÇÃO E CONSERVAÇÃO
56 DA FLORESTA AMAZÔNICA

RESUMO PALAVRAS CHAVE: Soja, Desmatamento,


Cerrado, Amazônia, Biodiversidade,
A soja representa uma recente e poderosa Impactos ambientais, Transgênicos
ameaça à biodiversidade tropical no Brasil. O
desenvolvimento de estratégias efetivas para
conter e minimizar os danos ambientais desta INTRODUÇÃO
cultura exigem a compreensão tanto das for-
ças que a impulsionam, quanto dos muitos A necessidade de estratégias para conter
modos através dos quais a soja e a infraes- o avanço da soja
trutura a ela associada catalisam processos A soja representa uma força nova e po-
destrutivos. A expansão da soja é propulsio- derosa entre as ameaças ao meio-ambiente
nada por forças globais de mercado, que é no Brasil. Estratégias efetivas para conter
diferente de muitas das mudanças de uso da o avanço da soja e os danos causados por
terra que dominaram o cenário até agora no este processo requererão o entendimento
Brasil, particularmente na Amazônia. A soja é dos processos pelos quais o avanço aconte-
muito mais prejudicial ao meio ambiente que ce, assim como a natureza de seus impactos.
outras culturas porque ela justifica grandes Quaisquer mudanças no rumo do processo
projetos de infraestrutura de transporte; que, de desenvolvimento só ocorrerão se os ges-
por sua vez, iniciam uma cadeia de eventos tores e o público estiverem atentos a toda a
conduzindo à destruição de hábitats naturais gama de impactos e os meios, freqüentemen-
em grandes extensões além das áreas plan- te indiretos, pelos quais eles são infligidos.
tadas diretamente com a soja. A capacidade
de mercados globais para absorver produção Na hora de lançar grandes projetos, o pro-
adicional representa um limite provável à ex- cesso de tomada de decisão dá pouco peso
pansão da soja, mas sempre existe a possibi- aos impactos. O quadro de desenvolvimento
lidade que, antes desse limite chegar, os mui- que emerge é de um vôo cego para áreas de
tos efeitos opostos aos interesses nacionais soja cada vez maiores e mais amplamente
brasileiros podem levar o País a desencorajar espalhadas. Os mecanismos legais para ava-
esta cultura, ao invés de subsidiá-la. Estes liar impactos ambientais e licenciar projetos
efeitos incluem concentração severa de posse de infraestrutura são incapazes de lidar com
de terra e renda, expulsão de contingentes po- muitas das conseqüências mais severas da
pulacionais para as fronteiras agrícolas e para soja, sobretudo o “efeito de arrasto”. Este úl-
áreas de garimpo (assim como também para timo refere-se à implantação de outras ativi-
centros urbanos), e o custo de oportunidade dades destrutivas (tais como a pecuária e a
devido à drenagem significativa de recursos exploração madeireira), acelerada por meio
governamentais. Os impactos múltiplos da da infraestrutura construída para a soja. Até
expansão da soja sobre a biodiversidade, bem mesmo quando problemas são evidentes,
como outras considerações, levam às seguin- apesar das limitações das atuais formas de
tes recomendações: 1) criar áreas protegidas avaliação de impacto ambiental, o sistema
antes da chegada das fronteiras de soja, 2) de licenciamento não representa nenhum
encorajar a eliminação dos muitos subsídios impedimento para o poder de “lobby” dos
que fazem a expansão da soja acelerar além interesses da soja. Além da insuficiência de
do que seria possível caso esta dependesse proteções do sistema regulador, o processo de
exclusivamente das forças de mercado, 3) ra- tomada de decisão, que gera uma proposta
pidamente levar a cabo estudos para avaliar atrás da outra para obras grandiosas de infra-
os custos de impactos sociais e ambientais estrutura, está efetivamente desconectado de
associados à expansão da soja, e 4) forta- qualquer consideração dos impactos causa-
lecer o sistema legal regulador de impactos dos pelos grandes projetos, que ocorrem mui-
ambientais, inclusive mecanismos para com- tas vezes em lugares distantes dos projetos
promissos de não implantação de projetos de em si. Estes aspectos não deveriam ser consi-
infraestrutura específicos, considerados como derados como pressupostos da situação, mas
excessivamente impactantes. sim como fatores sujeitos a mudança. Assim,

Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 56 8/18/2022 3:13:25 PM


O cultivo da soja como ameaça para
o meio ambiente na Amazônia brasileira 57

considerar as ramificações da expansão da Fica uma questão em aberto: se os impactos


soja com detalhes fornece ampla justificativa ambientais e sociais da soja causarem uma
para uma reforma da tomada de decisão. mudança das percepções sobre o interesse na-
cional, os gestores passarão a ver vantagens
A soja e os mercados internacionais em reduzir a velocidade do avanço desta cul-
tura antes que os mercados estejam saturados.
Como outros produtos comercializados
em mercados internacionais, a soja estabele- Os impactos da soja são um tópico de de-
ce uma ligação entre a economia global e as bate dentro do Ministério do Meio Ambiente.
atividades na fronteira de desmatamento. No No entanto, o avanço da soja no chão tem
entanto, a soja é diferente de outras mercado- pouca conexão com discussões sobre seus
rias como o cacau e o café. Mais importante impactos na biodiversidade e outras preocu-
de tudo é a habilidade da primeira em justifi- pações não monetárias.
car a construção de grandes projetos infraes-
truturais, os quais movimentam uma enorme A soja e o desmatamento
cadeia de eventos condutores da destruição
de vastas áreas de hábitats naturais, além da O mercado global para a soja é composto
área plantada com soja. No Brasil, os produ- por três grandes ramificações: a soja a granel,
tores de soja foram mais efetivos que os pro- o óleo de soja e o farelo de soja. A maior parte
dutores de outras mercadorias na captura de do farelo vai para a Europa (para alimentar
subsídios do governo, acelerando em muito porcos e aves), enquanto que a maior par-
o avanço desta cultura. Conseqüentemente, o te do óleo vai para a Ásia. A safra global da
desenvolvimento tecnológico foi mais eficaz soja aumentou rapidamente, expandindo-se a
em apressar o avanço da soja do que outras 10% ao ano de 1989 a 1998 (Mendez, 1999).
culturas, embora a sustentabilidade em longo A China, que até 1993 era um exportador de
prazo continue sendo duvidosa. soja, hoje é o maior importador do mundo
(Brown et al., 1999). A demanda futura da
Sementes transgênicas(1), representam um China é um fator chave para saber até que
elemento adicional ao avanço potencial da ponto o cultivo da soja crescerá no Brasil.
soja. O uso de sementes transgênicas abaixa-
ria os custos de produção de soja, aceleran- Uma das dificuldades em entender o des-
do o avanço dessa cultura na Amazônia. A matamento amazônico em termos de mer-
crescente preocupação de consumidores em cadorias é que as decisões sobre o desma-
muitos países compradores, especialmente tamento são tomadas individualmente por
na Europa, com os “perigos” dos alimentos proprietários de terras. As decisões são base-
transgênicos, coloca o Brasil numa posição adas na consideração combinada de todas as
privilegiada como um dos únicos países ex- fontes pertinentes de custos e benefícios liga-
portadores que não usa sementes genetica- dos a uma determinada opção de uso da ter-
mente modificadas, permitindo que os produ- ra. Por exemplo, as opções incluem a venda
tores de soja brasileiros obtenham melhores da madeira, a venda de carvão (se existe um
preços a para a soja não modificada. mercado acessível), a pecuária, e os lucros de
especulação fundiária e, conseqüentemente,
É provável que os limites para o avanço
as considerações relacionadas à segurança da
da soja venham da saturação de mercados
posse da terra. A ênfase em mercadorias in-
internacionais. No entanto, esses mercados
dividuais, tais como a madeira ou o gado (ou
vêm crescendo rapidamente, e espera-se que
a especulação de terra), poderia conduzir à
essa tendência continue durante algum tempo.
conclusão de que o investimento em desma-
A quantidade fornecida por fontes tropicais
tamento é uma loucura financeira. Porém, a
aumentou ainda mais rapidamente do que o
mesma decisão torna-se racional quando são
volume total do comércio global da soja. Isto
consideradas todas as fontes de lucro.
se dá, principalmente, devido à transferência
progressiva do cultivo de áreas temperadas Decisões para converter ecossistemas na-
para áreas tropicais, onde a terra é mais barata. turais em soja podem ser menos influenciadas

Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 57 8/18/2022 3:13:25 PM


DESTRUIÇÃO E CONSERVAÇÃO
58 DA FLORESTA AMAZÔNICA

pelo efeito de fontes múltiplas de lucro do que Entretanto, para substituir pastagens perdi-
é o caso para produtos como a madeira ou a das, os fazendeiros podem desmatar mais
carne de boi. Isto ocorre em função do custo áreas de floresta dentro das suas proprieda-
muito alto por hectare para implantar a soja, des. Também é possível desviar parte dos
principalmente, quando comparado com a recursos dos subsídios governamentais des-
exploração madeireira ou com a implantação tinados à soja para aumentar áreas de pas-
de pastagens. A soja, então, escapa do uso tagem, como aconteceu com freqüência nos
por motivos ulteriores, como assegurar a pos- anos oitenta no caso de subsídios para serin-
se para propósitos especulativos. Além disso, gueira em Rondônia.
a soja freqüentemente substitua ecossistemas Até o momento, a grande maioria da soja
de baixa biomassa, tais como o cerrado, fa- plantada no Brasil não fica em áreas de flo-
zendo com que os lucros potenciais da explo- resta tropical, mas, principalmente, no cer-
ração de madeira sejam mínimos. rado e nos vários tipos de campos nativos
amazônicos (Fig. 1). No entanto, esta vegeta-
A soja pode estimular o desmatamento ção também abriga uma diversidade alta que
em fazendas amazônicas, mesmo que flo- freqüentemente não é apreciada. Acredita-se
resta não seja derrubada para o seu culti- que o cerrado brasileiro seja a mais diversa
vo. Por exemplo, em Paragominas, Pará, a das savanas do mundo em termos de número
soja é plantada em áreas de pastagem velha. de espécies (Klink et al., 1993).

O ‘efeito de arrasto’ e o desenvolvimento


destrutivo
O impacto da soja excede em muito a
perda direta de áreas naturais convertidas
a este uso da terra, porque somente a soja
pode justificar o desenvolvimento da infra-
Figura 1. Vegetação estrutura volumosa necessária para prover
original do Brasil, transporte para o escoamento da safra e para
inclusive áreas a entrada de insumos. Outras formas de uso
ameaçadas por
da terra, tais como as pastagens, ocupam
desenvolvimento da
soja no Pantanal, áreas vastas más não têm o peso político ne-
florestas amazônicas, cessário para induzir o governo a construir
o cerrado e ‘outros oito hidrovias (Fig. 2), três estradas de ferro,
savanas amazônicas’.
e uma rede extensa de rodovias (Figs. 3 &
4). Muito da porção amazônica do Programa
Brasil em Ação, foi dedicado à infraestrutura
Figura 2. Hidrovias para soja (Consórcio Brasiliana, 2000; Brasil,
para transporte da Programa Brasil em Ação, 1999). O Plano
soja. Hidrovias 1, 4 e
a parte sul de 5 são
Plurianual (PPA) para 2000-2003, melhor co-
parcialmente operacionais; nhecido como ‘Avança Brasil’, prevê aloca-
2 e 3 estão em fase ções orçamentárias para a mesma infraestru-
avançada do processo tura (Brasil, Programa Avança Brasil, 1999).
de licenciamento; a parte
norte de 5 é um ‘projeto Muitos dos efeitos dos projetos de infraes-
vampiro latente’ (veja
trutura vêm do que os planejadores brasileiros
texto), e 6, 7 e 8 estão
em fases preliminares chamam do ‘efeito de arrasto’, ou seja, a esti-
de discussão. Há outras mulação de investimento privado como resul-
hidrovias existentes e tado de uma despesa pública em um projeto.
planejadas em outras
partes do País, mas estes
É esperado que a Hidrovia do Rio Madeira
não são relacionados tenha um efeito de arrasto de 1:3, segundo
diretamente à soja. o diretor do Programa Brasil em Ação (Paulo

Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 58 8/18/2022 3:13:25 PM


O cultivo da soja como ameaça para
o meio ambiente na Amazônia brasileira 59

Silveiro, declaração pública, 1998). Pode ser


esperado que os investimentos incluirão a ex-
ploração madeireira, a pecuária bovina e ou-
tras atividades com impactos severos sobre o
meio ambiente.
O custo para o País para produzir soja
não se restringe ao dinheiro investido na
infraestrutura e no sistema de produção.
Também inclui o custo de oportunidade dos
serviços ambientais perdidos causados pelo
impacto sobre os ecossistemas naturais afe-
tados pelo “efeito de arrasto”. O “efeito de
arrasto” escapa completamente do Relatório
de Impactos sobre o Meio Ambiente (RIMA)
e o processo de licenciamento de projetos.
Os custos incluem a perda de biodiversidade
quando são convertidos ecossistemas natu- Figura 3. Locais
no continente
rais em campos de soja, impactos severos de sulamericano
alguns dos sistemas de transporte, erosão do mencionados no texto.

Figura 4. Locais na
Amazônia e áreas
vizinhas mencionados
no texto.

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DESTRUIÇÃO E CONSERVAÇÃO
60 DA FLORESTA AMAZÔNICA

solo, e efeitos de substâncias químicas agrí- do Norte e na Europa (veja Fearnside, 1995).
colas sobre o meio ambiente e sobre a saú- Além disso, uma seca na América do Norte
de humana, a expulsão de populações que conduziu à suspensão temporária de re-
antes habitava as áreas usadas para soja, a messas de soja para a Europa (Smith et al.,
falta de produção de comida para consumo 1995). O aumento resultante nos preços da
local, já que as terras agrícolas usadas para soja conduziu à expansão rápida do cultivo
a agricultura de subsistência são plantadas mecanizado da soja no Paraná. Uma geada
com soja, e o custo de oportunidade das ver- na região Sul do Brasil em 1975 também
bas governamentais dedicadas a subsidiar a acelerou o abandono do café. Outros fato-
soja que não são usadas para educação, saú- res que induziram os proprietários de terras
de e investimentos em atividades que geram na Região Sul trocarem de culturas com uso
mais emprego do que a sojicultura mecani- intensivo de mão-de-obra, tais como o café,
zada. Geração de emprego através do culti- incluem o aumento dos direitos dados a me-
vo de soja é mínima. No Maranhão a média eiros sob um estatuto de terra de 1964 e leis
é um trabalhador por cada 167 ha de soja, de salário-mínimo que aumentaram o custo
e em plantações grandes esta relação sobe de contratar os trabalhadores (Kaimowitz &
para um por cada 200 ha (Carvalho, 1999). Smith, 2001).
Freqüentemente, o emprego criado não é lo-
A soja se deslocou então do Paraná ao
cal. Por exemplo, em Humaitá, Amazonas,
cerrado (Klink, 1995; Klink et al., 1994). A
trabalhadores qualificados do Estado de Rio
marcha do cultivo da soja, no nível muni-
Grande do Sul são trazidos para operar a ma-
cipal, é mostrada em mapas de dados do
quinaria agrícola (observação pessoal).
Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
(IGBE) (Fig. 5).
A EXPANSÃO DA SOJA
Um fator importante no avanço da soja
O Brasil produziu menos de um quarto para o cerrado foi o desenvolvimento de com-
da safra global de soja em 1998, tornando binações soja-bactéria com relações pseu-
o País o segundo produtor do mundo, de- do-simbiónticas que permitiram plantar soja
pois dos Estados Unidos, que produziram sem aplicação de fertilizantes nitrogenados.
mais da metade da safra global (Brown et Este era um triunfo para a pesquisa brasilei-
al., 1999: 32). Em 1999 a área de soja no ra, alcançado através do trabalho de Johanna
Brasil somou 13 milhões de hectares (Brasil, Döbereiner (por exemplo, Döbereiner, 1992).
CNPSO-EMBRAPA, 1999). A longa estação O desenvolvimento de variedades toleran-
de crescimento que a agricultura no Brasil tes a baixos níveis de fósforo no solo e de
tem representa uma grande vantagem so- altos níveis de alumínio também foi crítico
bre concorrentes em países temperados. A (Spehar, 1995).
produção anual por hectare é mais alta no
Subsídios generosos era um fator funda-
Brasil do que na América do Norte, e o tem-
mental induzindo o movimento da soja para
po extra na estação de crescimento alivia os
o cerrado. O Programa para Desenvolvimento
agricultores brasileiros dos picos de trabalho
dos Cerrados (POLOCENTRO) distribuiu
intenso nas épocas de plantio e de colheita
US$577 milhões em empréstimos altamente
que são necessários para os competidores na
subsidiados entre 1975 e 1982, responsável
zona temperada.
pela conversão em agricultura de 2,4 milhões
Nos anos setenta a pescaria de anchova de hectares de savana (Mueller et al., 1992
ao largo da costa do Peru desmoronou devido citados por Kaimowitz & Smith, 1999). Outro
ao efeito combinado de depleção pela sobre- evento fundamental na história do avanço da
pesca prolongada e o golpe-de-misericórdia soja no cerrado era o Programa de Cooperação
do fenômeno El Niño/Oscilação do Sul. O Nippo-Brasileiro para Desenvolvimento
fim da pesca comercial contribuiu para o uso Agrícola do Cerrado (PRODECER), começado
da soja como substituto para a farinha de em 1974 com financiamento da Agência de
peixe em ração de animais usada na América Cooperação Internacional Japonesa (JICA).

Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 60 8/18/2022 3:13:26 PM


O cultivo da soja como ameaça para
o meio ambiente na Amazônia brasileira 61

Este programa continua até o presente,


sendo que o atual programa (PRODECER-
III) está focalizado em ampliar a soja no
município de Pedro Afonso, situado no
Bico do Papagaio, região no extremo
norte do Estado de Tocantins (Carvalho,
1999). O “Bico do Papagaio” é uma área
que, nos anos setenta, era famosa por
conflitos de terra violentos entre agri-
cultores pequenos e grandes, incluindo
os “grileiros” (por exemplo, Foweraker,
1981). Hoje, pode-se dizer que os gran-
des fazendeiros ganharam estas batalhas,
depois de terem expulsado os agriculto-
res pequenos para fronteiras mais dis-
tantes. Atualmente as terras estão sendo
convertidas de pastagens para plantações
de soja.
O crescimento na área total de soja
no Brasil estancou em 1998, a área di-
minuiu ligeiramente de 13,2 para 12,7
milhões de ha de 1998 para 1999 (Brasil,
CNPSO-EMBRAPA, 1999). Porém, o local
das áreas plantadas com soja continuou
se deslocando para a Amazônia. Em
1996 havia apenas 1.800 ha de soja em
Rondônia, mas a área quase triplicou em
dois anos, chegando a 4.700 ha em 1998,
e depois triplicou novamente em um úni-
co ano, chegando a 14.000 ha em 1999.
No Maranhão a área de soja aumentou
de 89.100 para 140.000 ha ao longo do
período 1996-1999 (Brasil, CNPSO-
EMBRAPA, 1999).
O avanço atual da soja na Amazônia
é diferente de outros tipos de conversão
de uso da terra nas últimas três décadas.
O papel dos mercados globais na ex-
pansão da soja contrasta com o uso da
terra dominante nas partes desmatadas
da Amazônia brasileira: a pastagem. A
pecuária bovina tem sido, no contexto
da Amazônia brasileira, largamente in-
centivada através de motivos ulteriores
como a especulação e o estabelecimento
da posse da terra, e os incentivos fiscais
(veja Hecht et al., 1988, Fearnside, 1987a,
2002). Até mesmo no caso da explora- Figura 5.Avanço
da soja ao longo do
ção madeireira, no contexto brasileiro, o período 1970-1998
mercado doméstico tem predominado, (redesenhado de
pelo menos até o presente (Smeraldi & Théry, 1999).

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DESTRUIÇÃO E CONSERVAÇÃO
62 DA FLORESTA AMAZÔNICA

Veríssimo, 1999). Outras mercadorias, tais patriótico é freqüentemente colocado como o


como o cacau, existem principalmente por elemento crítico: algumas décadas atrás nin-
causa do financiamento a juros concessionais guém acreditava que o cerrado servia para
e outros tipos de subsídios, que são dados, coisa alguma, e agora é um grande produtor
principalmente, para fazer áreas de coloni- de soja. A próxima linha nesta retórica nor-
zação parecerem ser menos improdutivas malmente será: “Se somente nós acreditar-
(Fearnside, 1986a). mos na Amazônia...”. Infelizmente, mais do
A soja tem se expandido rapidamente que retórica é necessário para poder fazer uso
na Amazônia brasileira como um resultado sustentável da Amazônia, embora a retórica
combinado de preços altos (ainda favorável freqüentemente seja suficiente para lançar
apesar das quedas recentes) e os subsídios grandiosos programas de desenvolvimento
governamentais indiretos em várias formas, que conduzem a ampla destruição em troca
incluindo a volumosa despesa pública com de recompensas efêmeras (ver, por exemplo,
infraestrutura de transporte como hidro- Fearnside, 1986a). Limites severos restringem
vias. Obras de infraestrutura já construídas o uso produtivo das enormes áreas contem-
ou ainda em construção incluem a hidrovia pladas nos planos de desenvolvimento na
do Rio Madeira, o terminal graneleiro de Amazônia (Fearnside, 1997d). Estes incluem
Itacoatiara, parte da Ferrovia Norte-Sul e a limites sobre insumos, tais como os fosfatos,
Rodovia BR-333 que une o sul do Maranhão que devem ser importados de outros lugares.
ao Estado de Minas Gerais. Projetos ain- Topografia e fatores físicos são muito impor-
da não construídos incluem a Hidrovia tantes para agricultura mecanizada, como no
Araguaia-Tocantins, a Hidrovia Teles caso da soja. O melhor solo na Amazônia em
Pires-Tapajós, a Hidrovia do Rio Capim, a uma escala comercialmente importante (terra
Ferrovia Norte-Sul (Anápolis-Açailândia), a roxa: Alfisol) é normalmente associado com
Ferronorte (a estrada de ferro de Uberaba e uma topografia acidentada. Uma das pergun-
Santa Fé do Sul para Vilhena, e depois para tas essenciais para avaliar o interesse nacio-
Porto Velho), a Hidrovia Paraguai-Paraná (a nal brasileiro na promoção deste uso de terra
‘Hidrovia do Pantanal’), a reconstrução da é se aumento do cultivo da soja é sustentável.
Estrada de Ferro Madeira-Mamoré e a cons- Alguns locais contemplados para soja
trução de uma hidrovia ligada a esta última têm solos com limitações severas. O Banco
nos rios Mamoré e Guaporé, o asfaltamento Nacional de Desenvolvimento Econômico e
da Rodovia Santarém-Cuiabá (BR-163) e a Social adverte que “sem critérios técnicos bem
construção da Estrada para o Pacífico. Foram definidos” a terra poderia tornar-se inaprovei-
anunciados outros planos que podem con- tável por causa do cultivo da soja em municí-
duzir a projetos de construção no futuro. Por pios como os de Humaitá, Canutama e Lábrea
exemplo, em 1999, o governador do Estado (Brasil, EMBRAPA, 1998: Amazonas). Este
do Amazonas propôs uma hidrovia para co- tipo de advertência é comum em discussões
nectar o Estado com a Bacia do Rio Orinoco do desenvolvimento da Amazônia, tais como
na Venezuela (Amazonas em Tempo, 15 de as advertências freqüentes da EMBRAPA que
setembro de 1999). Também é proposto con- pastagens só produzirão bem na Amazônia
clusão da Rodovia Boa Vista-Georgetown, com um ‘manejo adequado’. O problema é
Guiana. Todos estes projetos teriam impac- que todo mundo envolvido sabe que é pouco
tos ambientais significativos. provável que os ‘critérios técnicos’ ou ‘ma-
O fato de a pesquisa agrícola ter sido o nejo adequado’ sejam aplicados na prática.
fator-chave em abrir o cerrado ao cultivo da O resultado é que depois, quando problemas
soja (Paterniani & Malavolta, 1999) é freqüen- acontecem, os agrônomos do governo sempre
temente apresentado em discursos políticos podem apontar o dedo para o agricultor por
como prova definitiva de que a pesquisa resol- não ter usado ‘critérios técnicos’ ou ‘mane-
verá as barreiras restantes para abrir as vas- jo adequado’: a culpa para qualquer fracasso
tas áreas dos trópicos úmidos na Amazônia à que possa acontecer é transferida do governo
agricultura igualmente produtiva. O espírito para o agricultor.

Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 62 8/18/2022 3:13:26 PM


O cultivo da soja como ameaça para
o meio ambiente na Amazônia brasileira 63

IMPACTOS AMBIENTAIS E SOCIAIS anos, preocupações ambientais têm levado a


recomendações para favorecer a agricultura
Impactos da conversão da terra à soja no cerrado como substituto para o desma-
tamento de floresta tropical (por exemplo,
Um impacto mais óbvio é a perda de
Goodland et al., 1978). Hoje, lamentam-se
ecossistemas naturais convertidos em soja.
tais recomendações frente ao rápido desa-
No entanto, poucos sojicultores cortaram
parecimento do cerrado. Áreas restantes de
floresta para a soja; ao invés disso, eles com-
cerrado têm importância para a biodiversidade
pram terras já desmatadas dos agricultores
parecida com a de áreas equivalentes de
pequenos, que se movimentam para áreas de
floresta amazônica (Dinerstein et al., 1995).
fronteira e desmatarão mais. O fato de que
muitos dos pequenos agricultores que agora O cerrado, com apenas 1,5% da sua área em
são ameaçados de expulsão das suas terras reservas federais (Ratter et al., 1997), é um
na Amazônia por causa do avanço da soja dos ecossistemas menos protegidos no Brasil.
já foram previamente expulsos do Paraná Menos protegido ainda é o ecótono entre flo-
pela mesma cultura dá um tom de desespe- resta e cerrado, uma faixa que tem um núme-
ro à resistência deles contra o atual ciclo. A ro mais alto de espécies endêmicas de plantas
pergunta que é freqüentemente levantada é, do que floresta ou cerrado “puros” (Fearnside
para onde mais eles podem ir? & Ferraz, 1995).
Quando a terra é convertida para cultu- O cultivo da soja provoca compactação
ras mecanizadas como a soja, a maioria da e erosão do solo (Barber et al., 1999). A
população humana é expulsa. Muitos se erosão por vento pode ser particularmen-
mudam para desmatar em outro lugar. No te severa em Mato Grosso, mas nenhuma
caso do Paraná, a soja substituiu os peque- mensuração das perdas existe (Jean Dubois,
nos agricultores que plantavam milho, feijão comunicação pessoal, 1999). Uma idéia das
e outras culturas alimentícias, além do café. conseqüências de degradação de terra pode
O plantio da soja deslocou 11 trabalhadores ser ganha da experiência na Bolívia. Na área
agrícolas para cada um que encontrou em- perto da cidade de Santa Cruz, onde a soja
prego no novo sistema de produção (Zockun, tem representado uma importante forma de
1980). Nos anos setenta, 2,5 milhões de pes- uso da terra desde os anos setenta, a degra-
soas deixaram as áreas rurais no Paraná; no dação já é severa (Alan Bojanic, comunica-
mesmo período, o número de propriedades ção pessoal, 1999). Os solos perto de Santa
diminuiu em 109.000 no Paraná (Diegues, Cruz são Entisols, que são mais férteis que
1992 citado por Kaimowitz & Smith, 1999) e os solos no Escudo brasileiro localizado nas
em 300.000 no Rio Grande do Sul (Genetic partes norte e leste das terras baixas boli-
Resources Action International, 1997 citado vianas, assim como também no Brasil. Pelo
por Kaimowitz & Smith, 2001), o que vale di- menos inicialmente, a soja na área de Santa
zer que as propriedades hoje nesses estados Cruz podia ser cultivada sem fertilizantes e
são maiores do que antes. Embora a maioria aplicações de calcário, o que contrasta com
dos pequenos agricultores que foram deslo- a situação no cerrado brasileiro e na floresta
cados mudou para áreas urbanas, muitos se- amazônica (Alan Bojanic, comunicação pes-
guiram pela Rodovia BR-364 (financiada pelo soal, 1999). No fim dos anos noventa, mais
Banco Mundial) para áreas de fronteira em de 100.000 ha de terra de soja foram aban-
Rondônia, onde estes migrantes foram um fa- donadas (transformadas em pastagens) por
tor fundamental em uma das explosões mais causa de esgotamento do solo, e os três prin-
rápidas de atividade de desmatamento tropi- cipais assentamentos de Mennonitas que ti-
cal no mundo (Fearnside, 1986b, 1987a). nham cultivado a área se deslocaram para
O cerrado brasileiro sofreu grandes perdas desmatar as terras de floresta mais ao norte
devido ao avanço da soja. Hecht (s/d-a,b) (Alan Bojanic, comunicação pessoal, 1999).
habilmente chama o cerrado de “zona de sa- As áreas de terras relativamente férteis es-
crifício para o desenvolvimento”. Por muitos tão se acabando rapidamente para serem

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DESTRUIÇÃO E CONSERVAÇÃO
64 DA FLORESTA AMAZÔNICA

incorporadas por esta versão mecanizada de de empreiteiras e para uso eleitoral dos pro-
agricultura itinerante. jetos. As barragens de Balbina e de Jatapu
são exemplos bem-documentados deste tipo
Agrotóxicos usados para combater doen-
de dinâmica (Fearnside, 1989; Fearnside &
ças, insetos e ervas daninhas no cultivo da
Barbosa, 1996).
soja podem ter impactos no ambiente, como
também nas pessoas expostas a eles. Isto é Projetos de infraestrutura implantados
especialmente preocupante com relação aos com o propósito primário de transportar a
planos para expansão da soja na várzea per- soja terão efeitos na atratividade econômica
to de Santarém (Carvalho, 1999). Durante o de outras mercadorias, com impactos conse-
período de vazante encolhem ou secam os qüentes no ambiente. A Exportação de ma-
lagos da várzea, concentrando os peixes que deira do Acre pela Estrada para o Pacífico é
são facilmente capturados. Se as terras cir- um exemplo.
cunvizinhas estiverem plantadas com soja,
pode-se esperar que as altas doses de agrotó- Hidrovia Paraguai-Paraná (Hidrovia do Pantanal)
xicos usadas nessa cultura vão se concentrar
Impactos da Hidrovia Paraguai-Paraná
nos lagos e nos peixes.
seriam significativos, posando uma ameaça
Devido ao fato de que a soja requer in- ao tesouro de vida selvagem brasileira no
vestimentos pesados de capital em maquina- Pantanal (Blumenschein et al., s/d [1999];
ria, preparação do terreno e insumos agríco- Hamilton, 1999). O trecho da Hidrovia de
las, essa cultura é inerentemente de domínio Corumbá para Cáceres seria o pior do ponto
de empresários ricos da agroindústria, e não de vista de impactos ambientais no Pantanal.
de agricultores pobres. Uma extrema con- A importância do Pantanal para a biodiver-
centração de renda tem sido associada com sidade global não pode ser sobre-enfatizada
a soja onde quer que essa cultura esteja na (Heywood & Watson, 1995).
América Latina (Kaimowitz et al., 1999). A
A Hidrovia do Pantanal parece ser um
concentração de renda e a influência política
exemplo daquilo que é conhecido como “proje-
associada de elites poderosas têm repercus-
to vampiro”, ou seja, projetos que, como vam-
sões negativas em todas as sociedades onde
piros, dificilmente podem ser mortos, apenas
estas transformações estão acontecendo.
voltando para os seus caixões, dos quais eles
reemergem depois. O governo brasileiro anun-
Impactos de infraestrutura de transporte ciou em março de 1998 que estava sustando
Estrada para o Pacífico planos para a Hidrovia Paraguai-Paraná (por
exemplo, Associated Press, 1998). A existência
Os Planos para produção de soja no de projetos vampiro ficou claro recentemen-
Estado de Acre são usados como justificativa te com o caso da Hidrelétrica de Babaquara,
para construir a Estrada para o Pacífico, ou via no Rio Xingu. Desde 1992, os porta-vozes do
Assis Brasil (no sul do Acre) e Cuzco, Peru, governo fizeram inúmeras declarações de que
ou via Cruzeiro do Sul (no oeste do Acre) e esta represa não seria construída, mas agora
Pucallpa, Peru. Porém, a viabilidade econô- reapareceu com um nome novo (a Hidrelétrica
mica de transportar soja pelo Andes por ca- de Altamira) no plano decenal atual (Brasil,
minhão ainda não tem sido demonstrada. No ELETROBRÁS, 1998: 148), com conclusão pro-
entanto, a existência de numerosas obras de gramada para 2013. O vampiro da Babaquara
infraestrutura economicamente injustificáveis voltou. O problema é que faltam mecanismos
na Amazônia indica que a falta de viabilidade legais pelos quais o governo possa fazer com-
econômica não é o suficiente para proteger promissos irrevogáveis para não construir pro-
o ambiente desses projetos. Independente da jetos específicos que são conhecidamente da-
exportação da soja ser economicamente viá- nosos. Nós temos a cruz e o alho para afastar
vel ou não, esta pode vir a ser usada como temporariamente o vampiro, mas não a estaca
uma desculpa para que obras públicas caras para cravar no seu coração e, assim, matá-lo
sejam impelidas por interesses financeiros para sempre. O trecho Corumbá-Cáceres da

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O cultivo da soja como ameaça para
o meio ambiente na Amazônia brasileira 65

Hidrovia do Pantanal dorme como um vam- construção obteve uma contra decisão, per-
piro no seu caixão, pacientemente esperando mitindo que as preparações para a hidrovia
um retorno futuro. prosseguissem (Radiobrás, 1999). A Hidrovia
Tocantins-Araguaia continua sendo um proje-
Hidrovia Tocantins-Araguaia to de prioridade no programa Avança Brasil.
A Hidrovia Tocantins-Araguaia iria expor A Hidrovia Tocantins-Araguaia incluiria
a Ilha de Bananal à ação das ondas e afetaria instalação de eclusas na barragem de Tucuruí
negativamente a pesca no rio (Cohen, 1995; e em uma longa série de represas hidroelétri-
Switkes, 1999). A Ilha de Bananal é o local cas planejadas nesses rios (Fearnside, 1999).
do Parque Indígena do Araguaia e o Parque O caminho da hidrovia inclui uma mudança
Nacional do Araguaia. O Estudo de Impacto em elevação de 925 m. A pergunta de como
Ambiental (EIA) e o Relatório de Impactos seriam tomadas as decisões sobre a instalação
sobre o Meio Ambiente (RIMA) para esta hi- de eclusas em dezenas de represas é delicada,
drovia (FADESP, 1996a,b) omitiram porções já que o Ministro do Desenvolvimento desde
do texto original que mencionavam aumen- 14 de setembro de 1999 era, até se tornar mi-
tos esperados na mortalidade em tribos no nistro, o presidente da companhia de constru-
Parque Indígena do Araguaia devido ao efei- ção Camargo Corrêa (Folha de São Paulo, 7 de
to que a poluição e o tráfico de barcaças te- setembro de 1999). Na hora de assumir o car-
riam sobre os recursos pesqueiros. Isto con- go, a Camargo Corrêa já estava instalando
duziu a acusações pelos antropólogos que as eclusas na primeira barragem (Tucuruí)
trabalharam no estudo que as alterações no e estava mais bem posicionada para obter
relatório submetido ao Instituto Brasileiro todos os contratos ao longo da Hidrovia
do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Tocantins-Araguaia.
Renováveis (IBAMA) eram “inescrupulosas
e de má-fé” (Carvalho, 1999). Falhas múlti- Hidrovia Teles Pires-Tapajós
plas no Relatório de Impactos sobre o Meio
As obras na Hidrovia Teles Pires-Tapajós
Ambiente (RIMA) levaram a uma ordem judi-
foram suspensas por uma ordem judicial em
cial em junho de 1997 suspendendo as obras
junho de 1997 porque seu estudo de impacto
nesta hidrovia (Switkes, 1999). Entre outras
ambiental (EIA) omitiu impactos sobre os po-
falhas, o relatório não diz nada sobre o que
vos indígenas ao longo da rota. Impactos na
seria feito com 2,5 milhões de m3 de sedimen-
tribo Mundurucu foram omitidos por um tru-
tos a serem dragados do rio e 204.000 m3 de
que inteligente: dividindo o relatório em duas
pedras a serem explodidos, nem diz nada so-
seções, um para a extensão abaixo da tribo e
bre o impacto das explosões. O relatório não
a outra para o trecho acima da tribo, simples-
menciona que o nível do rio é muito baixo
mente negligenciando qualquer menção da
para navegar de junho a novembro, período
existência da tribo (Novaes, 1998). Omitir a
que corresponde à época da colheita da soja.
menção sobre os índios era um meio de evitar
O cálculo do relatório prevê o transporte de
a exigência constitucional de obter aprovação
30 milhões de toneladas de soja por ano (seis
do projeto pelo Congresso Nacional.
vezes a produção atual de Mato Grosso), e
presume, sem nomear um único produto, que Hidrovia do Rio Madeira
as barcaças levariam frete de retorno igual a
50% desta capacidade (Novaes, 1998). A hi- Em março de 1997 barcaças começaram
drovia competiria com a Ferrovia Norte-Sul a chegar em Itacoatiara, Amazonas, em um
por transportar a produção de muitas das terminal graneleiro novo que tinha sido em
mesmas áreas produtoras de soja. A audiência grande parte pago pelo governo estadual
pública para a hidrovia foi suspensa em 22 de (Amazonas em Tempo, 02 de março de 1997).
setembro de 1999 por uma decisão judicial a O depósito tem capacidade de armazenamen-
favor dos antropólogos que tinham sido false- to por 90.000 t, e em uma segunda fase, isto
ados no relatório (Silveira, 1999). Uma sema- será dobrado. Desde que o terminal começou
na depois, em 29 de setembro, o consórcio de a operar, 145 caminhões por dia têm chegado

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DESTRUIÇÃO E CONSERVAÇÃO
66 DA FLORESTA AMAZÔNICA

em Porto Velho carregados de soja. A soja é original e no Relatório de Impactos sobre o


transferida para barcaças para descer o Rio Meio Ambiente (RIMA). Na prática, a pres-
Madeira até o porto de Itacoatiara, onde é ar- são já gerada pela atividade econômica
mazenada e carregada em navios para expor- praticamente garante a aprovação de qual-
tação. Do dia para noite, esta rota de exporta- quer pedido para infraestrutura adicional.
ção nova cortou o custo de transporte por um Depois que as remessas de soja começaram,
fator de três, assim radicalmente mudando o a HERMASA (a companhia de barcaça da
contexto econômico para agricultura na ba- propriedade da Maggi) pediu que o governo
cia do Rio Madeira. do Estado de Rondônia permitisse o corte de
Por enquanto, a soja exportada vem de uma curva aguda no Rio Madeira a jusante
áreas de cerrado no Estado de Mato Grosso, de Porto Velho. Isto cortaria o Lago de Cuniã
especialmente Sapezal, no centro do ‘im- na Estação Ecológica de Cuniã, uma área
pério’ de soja Maggi (Vieira & Giraldez, protegida. O corte poderia conduzir ao esco-
1999). No entanto, o governo do Estado do amento de áreas inundadas e lagos fluviais,
Amazonas está dando prioridade para a pro- que abrigam uma vida selvagem abundante
moção de soja e arroz irrigado nos campos para a qual a estação ecológica foi criada.
de Humaitá, uma área natural de gramí- Não foram incluídos planos para alterar
neas na parte sul do Estado do Amazonas o rio na proposta considerada pelas atuais
(Amazonas em Tempo, 15 de janeiro de EIA e RIMA para a hidrovia, aprovados em
1997). O estudo clássico dos solos nos cam- 1999. O aumento planejado de tráfico de bar-
pos de Humaitá condena esta área para de- caças de 300.000 t/ano inicialmente para 3
senvolvimento agrícola devido ao perigo milhões de t/ano em 2000 (HERMASA, 1995
de laterização (Gross Braun & de Andrade citado por Blumenschein et al., s/d [1999])
Ramos, 1959). Embora muitos exageros sugere a necessidade de alterar o leito flu-
populares existem relativo ao perigo de la- vial e remover as obstruções de pedra ao
terização na Amazônia, estes exageros não longo da rota. O EIA e o RIMA só considera-
mudam o fato que a laterização realmente ram a remoção de três obstruções de pedra.
pode acontecer em certos lugares. O solo dos Sem estas modificações, a hidrovia é nave-
campos de Humaitá tem drenagem impedi- gável somente durante o período de cheia. O
da, que causa o afloramento do lençol freáti- número total de obstruções que precisariam
co (Fearnside, 1997a). ser removidas tem sido declarado como
De acordo com Luís Antônio Pagot, re- sendo seis (Luis Antônio Pagot, declaração
presentante do Grupo Maggi (que insta- pública, 1997) a nove (Blumenschein et al.,
lou o porto), o grupo planeja ampliar suas s/d [1999]).
plantações nos campos de Humaitá, desde A hidrovia e os terminais graneleiros tra-
que seja permitido pelo zoneamento econô- zem pouco benefício local. O terminal grane-
mico-ecológico da área (atualmente sendo leiro de Itacoatiara emprega apenas 17 pes-
concluído pelo governo estadual). A Maggi soas (Osawa, 1999). Benefícios de impostos
vem fazendo experimentação agrícola no lo- também são mínimos porque, desde 1996,
cal desde 1993, e acredita que a laterização a Lei Complementar No. 87, mais conhe-
não seria um problema porque a drenagem cida como a ‘Lei Kandir’, isenta produtos
do solo pode ser feita instalando canais para rumo a exportação de pagar o Imposto Sobre
conduzir a água até os igarapés. Serviços (ISS) que, de outra forma, iria para
A Hidrovia do Rio Madeira proporcio- os governos municipais (Carvalho, 1999).
na um bom exemplo de um problema ge- Antes da isenção, os sojicultores brasilei-
nérico com projetos de infraestrutura deste ros estavam em desvantagem comparada
tipo: a evolução dos projetos depois que aos competidores bolivianos, que pagaram
começa a construção, assim conduzindo a US$37,17/t a menos em impostos (Monitor
maiores impactos do que aqueles considera- Company, 1994 citado por Kaimowitz &
dos no Estudo de Impacto Ambiental (EIA) Smith, 1999).

Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 66 8/18/2022 3:13:26 PM


O cultivo da soja como ameaça para
o meio ambiente na Amazônia brasileira 67

Hidrovias do Rio Branco e Rio Negro-Orinoco barata no Brasil (US$5-50/ha), e os serviços


de uma cooperativa patrocinada pelo go-
A Hidrovia para Venezuela que utiliza verno (COOPERNORTE) (Veríssimo, 1999).
o Rio Negro, o Canal de Casiquiare e o Rio Em agosto de 1999, o governo do Estado de
Orinoco, proposto por Amazonino Mendes, Roraima fretou um avião para trazer 60 in-
governador do Estado do Amazonas, foi bem vestidores em potencial ao Estado; a meta
recebida na Venezuela (Amazonas em Tempo, é investir US$300 milhões em cinco anos e
15 de setembro de 1999). Encontrar maneiras ter 200.000 ha de soja em Roraima até 2003
para estimular o desenvolvimento da parte (Veríssimo, 1999). Como no caso da Estrada
sul (i.e., Amazônico) da Venezuela tem sido, para o Pacífico, embora os argumentos para
durante muito tempo, uma prioridade do go- a Rodovia Boa Vista-Georgetown estão em
verno nacional, e é promovido pelo slogan grande parte baseados na soja, muito do im-
‘conquista do sul’. Os venezuelanos ficaram pacto ambiental do projeto provavelmente
impressionados com a ‘conquista’ do cerrado seria sentido por efeitos sobre outras merca-
brasileiro pelo cultivo da soja (Paterniani & dorias. Neste caso, é provável que as compa-
Malavolta, 1999). O termo ‘conquista’ é es- nhias malasianas de exploração madeireira
pecialmente poderoso em países de língua es- com concessões na Guiana sejam os prin-
panhola de América Latina por causa da sua cipais beneficiários (cf., Colchester, 1994;
associação com os eventos de 500 anos atrás. Veening & Groenendijk, 2000).
Uma Hidrovia no Rio Branco é in-
dicada como planejado pelo Ministério Rodovia Santarém-Cuiabá
de Transporte (Brasil, Ministério dos
Um grande terminal graneleiro está em
Transportes, 1999). Isto afetaria as econo-
construção pelo Grupo Maggi em Santarém,
mias de soja em Roraima. As análises de cus-
Pará. Esta facilidade (com capacidade de
to/benefício financeiro, baseadas em custos
75.000 t) está prevista para começar a ope-
e preços atuais, indicam que Roraima tem
ração em maio de 2000 (Carvalho, 1999).
a mais baixa margem de lucro de qualquer
Planos para a produção da soja incluem o as-
área de soja contemplada na Amazônia bra-
faltamento da Rodovia Santarém-Cuiabá (BR-
sileira (Brasil, EMBRAPA, 1998: Roraima). O
163), que faz parte dos Programas Brasil em
Brasil também está planejando exportar soja
Ação e Avança Brasil, e a melhoria da hidro-
de Roraima para a Venezuela por rodovia
via de Itaituba para Santarém. Como previa-
como parte do Programa ‘Grãos Norte’ que
mente mencionado, também seria promovido
espera aumentar a área de soja no Estado
plantio da soja na várzea perto de Santarém.
de aproximadamente zero em 1999 para até
200.000 ha em 2005 (Mary Helena Allegretti, A Rodovia Santarém-Cuiabá já é uma gran-
declaração pública, 1999). Algumas estima- de fonte de mogno ilegal (Fearnside, 1997b).
tivas dos planos de Maggi para plantar soja Pressão política para pavimentar a estrada é
em Roraima são tão altas quanto 500.000 ha, liderada por Blairo Maggi, senador de Mato
caso a Hidrovia do Rio Branco prove ser viá- Grosso e a pessoa que encabeça o Grupo
vel (Instituto Socioambiental, 1999). Maggi que está financiando o plantio de soja
na área de Santarém e a construção dos termi-
Rodovia Boa Vista-Georgetown nais graneleiros de Santarém e de Itaituba. A
campanha incluiu uma caravana de caminhão
Uma rodovia com tráfego em todas
(“caminhonaço”) ao longo da rota em maio de
as épocas do ano é proposta de Boa Vista
1999 para demonstrar a viabilidade de expor-
para Georgetown, Guiana, o que proveria
tar soja do norte de Mato Grosso pelo porto de
uma rota de 600 km para exportação de
Itaituba (Vieira & Giraldez, 1999).
Roraima. O governador de Roraima, Neudo
Campos, está tentando atrair sojicultores Hidrovia do Rio Capim
das regiões sul e centro-oeste, oferecendo
induzimentos tais como isenção de todos A Hidrovia do Rio Capim daria acesso
os impostos durante 20 anos, a terra mais a barcaças ao pólo de soja de Paragominas,

Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 67 8/18/2022 3:13:26 PM


DESTRUIÇÃO E CONSERVAÇÃO
68 DA FLORESTA AMAZÔNICA

assim conectando essa área com o porto de prioridade nos Programas Brasil em Ação e
água funda em Barcarena. A hidrovia tam- Avança Brasil, mas permanece nos planos. O
bém seria usada para transportar caulim Ministério dos Transportes tem planos gran-
(barro da China) de uma das maiores jazidas diosos para expansão da Ferronorte (Brasil,
do mundo desta matéria-prima para uso na Ministério dos Transportes, 1999). Estes
fabricação de papeis lustrosos. incluem a extensão da estrada de ferro até
Porto Velho e a adição de um trecho de 1500-
Ferrovia Norte-Sul km de Cuiabá para Santarém, assim dupli-
cando a rota da Rodovia Santarém-Cuiabá
A Ferrovia Norte-Sul ligaria Goiânia, (BR-163) e da Hidrovia Teles Pires-Tapajós.
Goiás, com Açailândia, Maranhão, onde co-
nectaria com a Estrada de Ferro de Carajás Estrada de Ferro Madeira-Mamoré
que conduz ao porto de Itaiquí perto de São
Luís. A Estrada de Ferro de Carajás tem fun- A reconstrução da Estrada de ferro
cionado para transporte de minério de ferro Madeira-Mamoré, inicialmente construí-
desde 1984. Parte da Ferrovia Norte-Sul foi da em 1912 e abandonada em 1972, é uma
construída em 1988, mas foi interrompida das propostas para o transporte de soja. Isto
como resultado de um escândalo financeiro: evitaria as cataratas no Rio Madeira, forne-
a licitação tinha sido fraudada e os resultados cendo escoamento de produção da Bolívia,
foram publicados nos anúncios classificados da parte sul de Rondônia, e do Mato Grosso
de um dos principais jornais do país antes de ocidental. Uma hidrovia seria necessária nos
abrir os lances. Uma distinção menos famosa Rios Guaporé e Mamoré para trazer a soja
é que a ferrovia foi uma das primeiras obras de vila Santa Trindade em Mato Grosso oci-
públicas a ter continuidade ilegalmente sem dental para o ponto terminal da ferrovia em
aprovação ambiental depois que Relatórios Guajará-Mirim, Rondônia.
de Impactos sobre o Meio Ambiente fossem
Outras rodovias
obrigatórios em janeiro de 1986.
Em 1996 a Rodovia MT-235, de 450-
Ferronorte km, foi completada cortando a Chapada
dos Parecis, de Mato Grosso, de leste para
A estrada de ferro Ferronorte conectaria
oeste de Comodoro para Sapezal e Campo
Uberaba e Uberlândia, em Minas Gerais com
Novo dos Parecis. Áreas grandes de cerrado
Vilhena, em Rondônia oriental. Esta estrada
cortado para soja apareceram ao longo da
de ferro também conectará à rede ferroviária rota em seu primeiro ano, em antecipação
no Estado de São Paulo (FEPASA) em Santa à exportação pela Hidrovia do Rio Madeira
Fé do Sul. A rota atravessaria áreas impor- (Blumenschein et al., s/d [1999]).
tantes de soja, tais como Rondonópolis, Mato
Grosso. A construção da ponte sobre o Rio Rodovias do Maranhão para Minas
Paraná foi completada em janeiro de 1998. Gerais unem a área de produção de soja ao
redor de Balsas, no sul do Maranhão, com
Algumas versões do plano para Ferronorte o sistema rodoviário em Minas Gerais, tam-
estendem essa ferrovia até Porto Velho, no bém provendo acesso a áreas agrícolas no
Rio Madeira. O trecho Uberaba-Vilhena re- Estado de Piauí. Estas rodovias foram pa-
presenta a estrada de ferro conhecido como vimentadas para transporte de soja através
a “Ferrovia Leste-Oeste”, que era um projeto do empréstimo de melhoria de estradas do
favorito de Olacyr de Moraes quando ele era Banco Mundial para o Maranhão, Piauí e
o ‘rei da soja’ do Brasil. No meio dos anos no- Tocantins. As rodovias atravessam a melhor
venta, o império de soja de Olacyr de Moraes área preservada de vegetação de cerrado, de
foi eclipsado pela família Maggi que deu me- acordo com um estudo do INPE de imagens
nos ênfase a esta estrada de ferro, concen- de 1992 e 1993 que indicam que tinham sido
trando o seu poder de “lobby” na Hidrovia do desmatados 65% do cerrado para pastagens,
Rio Madeira e na Rodovia Santarém-Cuiabá. agricultura e centros urbanos (Mantovani &
A Ferrovia Leste-Oeste não é um projeto de Pereira, 1998 citado por Stedman, 1999).

Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 68 8/18/2022 3:13:27 PM


O cultivo da soja como ameaça para
o meio ambiente na Amazônia brasileira 69

IMPACTOS DE INDÚSTRIAS RELACIONADAS a rentabilidade da agricultura normalmente


À SOJA tem o efeito oposto sobre o desmatamento
(Fearnside, 1987b). O plano não avançou,
Indústrias de beneficiamento e outras aparentemente devido à oposição de organi-
atividades associadas à soja também podem zações não governamentais brasileiras pre-
ter impactos, especialmente no que se re- ocupadas com a possibilidade de contami-
fere à estimulação da expansão de planta- nação por metais pesados e hormônios de
ções. No Brasil as usinas de esmagamento crescimento (Wim G. Sombroek, comunica-
de soja estão situadas principalmente perto ção pessoal, 1999).
das áreas produtoras mais antigas na parte
sul do País. Estão sendo planejadas instala-
ções adicionais para esmagamento, inclusive PERSPECTIVAS FUTURAS: DINÂMICA DE
uma em Itacoatiara, Amazonas, com capital EXPANSÃO DA SOJA
venezuelano (Amazonas em Tempo, 15 de
setembro de 1999). Os ‘sunk costs’, ou cus- “Lobbies” e subsídios
tos fincados, da indústria de beneficiamento
e das instalações de armazenamento eram “Lobbies” operam em todos os níveis:
um fator importante dando força ao “lobby” federal, estadual e municipal. Decisões so-
da soja nos anos oitenta. Este “lobby” tinha bre desenvolvimento no nível estadual
bastante êxito em ganhar subsídios adicio- são influenciadas fortemente pela soja. No
nais do governo para expansão da plantação. Maranhão, por exemplo, o gerente de plane-
Em 1982 a capacidade de processamento no jamento do governo estadual, que também
Brasil chegou a ter o dobro do tamanho da é o marido da governadora, tem um império
safra de soja por causa dos incentivos que de soja se expandindo rapidamente na área
tinham sido oferecidos para instalações de de Balsas. Decisões pendentes incluem a re-
esmagamento (Williams & Thompson, 1984 vogação de parte do Parque Estadual Serra
citados por Kaimowitz & Smith, 1999). do Mirador (Itapecuru), no Vale do alto
Já que uma grande parte da safra de soja Itapecuru do Maranhão. Uma parte do par-
do Brasil é transportada para Rotterdam para que que é apto para soja seria trocada por
alimentar os porcos europeus, Holambra áreas protegidas em outro lugar no Estado
(uma firma agroindustrial holandesa em São (Afonso Henriques de Jesus Lopes, declara-
Paulo) propôs o estabelecimento de uma ção pública, 1999).
colônia de criadores de porcos holandeses
em Mato Grosso. Isto obviamente eliminaria No Maranhão, a babaçu (Attalea, antiga-
muito do transporte requerido pelo arranjo mente Orbignya) foi tradicionalmente uma
atual. Deve ser lembrado que a criação de fonte de óleo e de uma grande variedade
suínos em escala industrial produz poluição de outros produtos. Meios industriais me-
significativa de fezes e urina, como está acon- lhorados para usar os frutos desta palmei-
tecendo agora nos Países Baixos. A indús- ra foram durante muito tempo uma priori-
tria brasileira de suínos, no Estado de Santa dade por sustentar a população local que
Catarina, sofre dos mesmos problemas. vive de extrativismo de babaçu (May, 1990).
O Instituto Estadual do Babaçu (INEB) foi
Outra proposta holandesa previu a re-
messa de esterco dos Países Baixos para criado pelo governo de Maranhão para este
Amazônia, usando a viagem de regresso dos propósito, mas em 1984, depois de apenas
navios que levam a soja para Rotterdam. quatro anos de existência, foi abolido pelo
O esterco seria usado como fertilizante na então-governador Luis Roja. No Maranhão,
Amazônia. Enquanto os proponentes do es- muitas pessoas acreditam que a razão era
quema enfatizam que o esterco aumentaria os interesses financeiros do governador em
a sustentabilidade da agricultura amazônica, soja, com o qual a cultura do babaçu ainda
reduzindo o desmatamento, o resultado pro- estava competindo como fonte de óleo de
vavelmente seria mais complexo. Aumentar cozinha no mercado local.

Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 69 8/18/2022 3:13:27 PM


DESTRUIÇÃO E CONSERVAÇÃO
70 DA FLORESTA AMAZÔNICA

A agricultura familiar no Maranhão está Humaitá é US$22,94/t. A capacidade da jazi-


diminuindo rapidamente frente ao avanço da da de Pimenta Bueno é de 266 milhões de to-
soja, agravando disparidades sociais em um neladas (Brasil, EMBRAPA, 1998: Amazonas,
estado que já é notório pela pobreza e pelas pág. 65). O segundo depósito mais próximo
desigualdades sociais (Carneiro, 1999). O fica em Cáceres, Mato Grosso (distante 1.440
Maranhão também é uma das maiores fontes km), onde o custo do calcário é US$6,47/t e
de migrantes para a Amazônia, abastecendo o frete até Humaitá é US$29,41/t.
populações para áreas de assentamento pio-
O calcário atualmente está sendo trans-
neiro e para a corrida de ouro em áreas de
portado até Humaitá por meio de barcaças
garimpo (por exemplo, MacMillan, 1995).
de Urucará, no Rio Jatapu (há 1.000 km
A garimpagem causa impactos ambientais
por via fluvial); a capacidade da jazida de
e sociais severos, inclusive a poluição por
Urucará é de 48 milhões de toneladas. O se-
mercúrio, a liberação de grandes quantida-
gundo depósito mais próximo acessível por
des de sedimentos nas cabeceiras dos rios
via fluvial está em Maués, Amazonas (1.200
amazônicos, e a invasão de terras indíge-
km de Humaitá), com uma capacidade de
nas, expondo os índios a doenças, violência
175 milhões de toneladas (Brasil, EMBRAPA,
e desculturação, e impedindo o reconheci-
1998: Amazonas, pág. 66).
mento e demarcação das reservas.
O calcário, e seu transporte, geralmente
A expulsão de populações campesinas
são considerados a principal despesa no esta-
do Maranhão conduz ao desmatamento em
belecimento da soja na Amazônia. O pólo de
outras áreas na Amazônia pela pressão de
soja de Humaitá representa um extremo no
migrantes sem terra, assim como fornece a
que se refere à distância (não tem nenhum
maior fonte de mão-de-obra barata usada por
depósito de calcário por perto). O pólo de
fazendeiros amazônicos para o desmatamen-
Redenção, Pará tem uma jazida de calcário
to. Entre os 19 camponeses sem terra mas-
considerado como sendo de baixa qualida-
sacrados pela polícia federal em Eldorado do
de (Carvalho, 1999). O pólo de Santarém
Carajás, Pará em 1996, sete (37%) eram do
tem uma jazida grande de calcário perto de
Maranhão (Folha de São Paulo, 10 de maio
Itaituba. Apuí, Amazonas, tem uma jazida
de 1996).
de calcário no município que ainda não foi
Governos estaduais foram instrumen- desenvolvido; más condições de estrada en-
tais em promover a entrada rápida da soja tre Apuí e Humaitá têm impedido que este
na Amazônia. No estado do Amazonas, um depósito entrasse nos planos atuais para
esquema de promoção agrícola que inclui a abastecer o pólo de soja de Humaitá (Brasil,
soja de Humaitá e áreas de arroz irrigado era EMBRAPA, 1998: Amazonas).
o carro chefe da campanha do governador na
O calcário deve ser reaplicado a cada três
eleição de governo estadual em 1998. Áreas
anos. A exigência de calcário é de 4-8 t/ha,
de soja estabelecidas em Humaitá teriam
caso que é calculado com base na saturação
sido improváveis sem a gama extensiva de
de alumínio no solo conforme a recomenda-
subsídios dado pelo Estado. Foi trazido ferti-
ção do escritório local da Empresa Brasileira
lizante de Israel pelo governo estadual e dis-
de Pesquisa Agropecuária (EMBRAPA)
tribuído sem exigir nenhum pagamento até
(Brasil, EMBRAPA, 1998: Amazonas, pág.
depois da colheita. Fertilizante de Cubatão,
62). Isto considera a força de tampão do cal-
perto de Santos, São Paulo (há uma distân-
cário nas jazidas disponíveis. Se a necessi-
cia de 3.340 km) valeria US$200/t (Brasil,
dade de calcário for calculada considerando
EMBRAPA, 1998: Amazonas), considerando
o cálcio e o magnésio no solo, além do alu-
a taxa de câmbio nos meiados de 1999 de
mínio, seria indicada uma dosagem de 7-8
R$1,7/US$. Calcário, que não existe na área
t/ha de calcário (Brasil, EMBRAPA, 1998:
de Humaitá, foi trazido por caminhão de
Amazonas, pág. 62).
Pimenta Bueno, Rondônia (distante 700 km)
e distribuído gratuitamente. Calcário em Uma necessidade menor de calcário re-
Pimenta Bueno vale US$7,05/t, e o frete até presenta uma das atrações do movimento da

Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 70 8/18/2022 3:13:27 PM


O cultivo da soja como ameaça para
o meio ambiente na Amazônia brasileira 71

soja para a Amazônia, já que menos calcário noroeste de Mato Grosso até os portos. O
é requerido em áreas de floresta recentemen- Grupo Maggi está ajudando, segundo notí-
te desmatada do que em áreas de cerrado. cias, com a construção da estrada Aripuanã-
Em floresta, são requeridos 2 t/ha de calcá- Apuí e com melhoria da estrada Apuí-Novo
rio, contra 4-6 t/ha em cerrado (Homma & Aripuanã. A Cooperativa dos Produtores de
Carvalho, 1997). Soja do Amazonas (COPASA), que é fomen-
tado pela Maggi, está tentando obter um tí-
Um projeto de construção de estra-
tulo de 850.000 ha de terras da união (terras
da para soja em Apuí, que está situada na
devolutas) no município de Novo Aripuanã
Rodovia Transamazônica no canto sudeste
(Fachel, 1999). A COPASA encorajou publi-
do Estado do Amazonas, é de preocupação
camente que os agricultores desmatassem
particular tanto por causa dos seus impactos
áreas novas tão depressa quanto possível
potenciais como pelo que este episódio reve-
entre dezembro de 1998 e agosto de 1999,
lou sobre a inabilidade dos mecanismos re-
para que as áreas pudessem ser usadas para
guladores ambientais do Brasil de funcionar
plantio de soja (Carvalho, 1999). A Maggi
na prática. A prefeitura municipal de Apuí e
prometeu comprar toda a soja beneficiada
a prefeitura do município adjacente em Mato
que a cooperativa produzisse (Carvalho,
Grosso começaram a construir uma estrada
1999). A COPASA encorajou migrantes a
para conectar os dois municípios (Amazonas
virem à área para desmatar; um total de
em Tempo, 8 de maio de 1999). Isto estava
85.000 ha foi desmatado, segundo o IBAMA
sendo construído sem qualquer forma de
(Fachel, 1999). Não é claro o que acontece-
relatório de impacto sobre o meio ambiente
rá com os migrantes depois que a terra for
ou aprovação, e foi parado pela agência am-
convertida para soja, já que o emprego ofe-
biental do Estado do Amazonas em setem-
recido pela produção da soja é mínimo. O
bro de 1999 (Amazonas em Tempo, 24 de se-
subsídio do governo para soja vai além da
tembro de 1999). A constituição brasileira e
infraestrutura visível planejada sob progra-
a legislação requerem um Estudo de Impacto
mas de desenvolvimento tais como o Brasil
Ambiental (EIA) e um Relatório de Impactos
em Ação e o Avança Brasil que são o carro
sobre o Meio Ambiente (RIMA) para todas
chefe da administração presidencial atual. O
as rodovias. Porém, nenhum critério é es-
crédito agrícola para a compra de insumos
pecificado definindo o que constitui “cons-
(sementes, agrotóxicos, etc.) e especialmen-
trução” de rodovia, ao invés de “melhorar”
te para a compra de tratores e outras maqui-
uma rodovia existente. Na prática, propo-
narias é oferecido a taxas abaixo daquelas
nentes podem reivindicar que um caminho
que seriam aplicadas com base de cálculos
ilegal de madeireiros pela floresta pode ser
financeiros de tipo padrão, principalmente
melhorado aos poucos até virar uma estra-
se o risco de inadimplência for levado em
da pavimentada, sem ser considerada como
conta. O crédito agrícola brasileiro tem sido
“construção” de uma rodovia (Francisco
influenciado por muito tempo por “lobbies”
Arguelles, comunicação pessoal, 1999).
de grandes proprietários, e a soja é a cul-
A estrada de Aripuanã, Mato Grosso, para tura favorita dos bancos porque os grandes
Apuí, Amazonas será conectada a uma es- proprietários que plantam soja têm títulos
trada existente que conecta Apuí ao porto de de terra seguros, “colateral” (bens hipote-
Novo Aripuanã, Amazonas (no rio Madeira). cáveis) e custos mais baixos de transação
Esta estrada foi construída pelo governo es- para os bancos (Helfand, 1999: 7). Devido
tadual sem ter um Relatório de Impacto so- ao fato de o preço da soja estar sujeito a flu-
bre o Meio Ambiente usando o argumento tuações, a más condições meteorológicas,
que estava apenas melhorando estradas de a insetos, e outros infortúnios que podem
acesso em assentamentos implantados pelo reduzir a produção, os agricultores freqüen-
Instituto Nacional de Colonização e Reforma temente acham os empréstimos difíceis de
Agrária (INCRA). As duas estradas redu- pagar. Já que ciclos de preço e problemas
ziriam a distância que a soja tem que via- agrícolas afetam todos os agricultores simul-
jar de caminhão das áreas de produção no taneamente, o “lobby” ruralista representa

Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 71 8/18/2022 3:13:27 PM


DESTRUIÇÃO E CONSERVAÇÃO
72 DA FLORESTA AMAZÔNICA

um grupo de interesse significante para pres- A controvérsia sobre sementes


sionar concessões especiais do governo. Em transgênicas
várias ocasiões o governo cancelou todas as
dívidas agrícolas que freqüentemente che- Uma fonte adicional de controvérsia é a
gam a somar dezenas de bilhões de dólares ligação íntima do cultivo da soja com a enge-
de subsídio ao setor. Em 1999, pressão dos nharia genética controlada pela agroindús-
ruralistas levou a uma anistia parcial das dí- tria. A aprovação do uso da soja transgênica
vidas agrícolas do ano (Medida Provisória no País abriria o caminho para as sementes
No. 1.918). Isso valerá uma quantia não re- de soja “Roundup-Ready™” da companhia
velada, mas consideravelmente mais alta do Monsanto. Estas sementes geneticamen-
que os US$4 bilhões do acordo prévio feito te modificadas são resistentes ao herbicida
com os ruralistas (Folha de São Paulo, 20 de Roundup™, ou glifosato, também fabricada
outubro de 1999). pela Monsanto. O Roundup™ mata pratica-
mente todas as outras plantas, isto é, as ervas
Acredita-se que o “lobby” da soja seja res-
daninhas. Claro que, também pode matar a
ponsável pela obtenção de subsídios federais
soja não resistente de agricultores vizinhos,
que permitiu que a soja se expandisse para
assim criando uma motivação adicional para
áreas mais distantes, com solos mais pobres,
que todos façam a mudança juntos. Tem sido
o que não teria sido justificado na ausência
levantada uma grande variedade de dúvidas
dos subsídios (Kaimowitz & Smith, 1999).
relativo aos impactos potenciais de liber-
Particularmente importante é o norte do Mato
tar organismos geneticamente modificados
Grosso onde impactos ambientais da expan-
no ambiente (por exemplo, Halweil, 1999;
são da soja são grandes. Além do crédito sub-
Labes, 1999). A descoberta que borboletas
sidiado, nos meados dos anos oitenta, o go-
monarcas podem ser mortas pelo pólen de
verno federal manteve a Política de Garantia
milho transgênico (Losey et al., 1999) levan-
de Preço Mínimo (Goldin & Rezende, 1993
tou preocupação pela falta de entendimento
citados por Kaimowitz & Smith, 1999). Isto
dos impactos em potencial; o contraste com
significou que os agricultores receberam o
o cuidado tomado na introdução de novos
mesmo valor independente da localização,
produtos farmacêuticos é evidente. Já têm
assim encorajando a expansão para frontei-
sido liberados organismos geneticamente
ras distantes onde forças comerciais teriam
modificados em muitos países, de forma que
feito a soja antieconômica. Nos anos oitenta,
apenas se pode esperar para ver até que pon-
outro subsídio para plantações distantes era
to as previsões relativas ao impacto de mate-
o preço unificado para produtos de petróleo.
rial genético liberado (superervas daninhas,
Transporte para e de locais distantes recebe-
etc.) serão confirmadas.
ram assim um subsídio dos consumidores de
combustível localizados próximos dos portos Herbicidas de glifosfato são supostamente
e das refinarias de petróleo. ligados a desordens reprodutivas, danos
genéticos, estimulação de tumores e
Raramente discutido é o custo de opor-
demoras no desenvolvimento em mamíferos
tunidade do dinheiro do governo que é gas-
(Cox, 1999; Labes, 1999). Estas substâncias
to para subsidiar a soja. Claramente, exis-
químicas também são acusadas de afetar
tem muitos usos para o dinheiro que teriam
adversamente minhocas, fungos benéficos
maiores benefícios para o bem-estar do povo
do solo e bactérias fixadoras de nitrogênio
brasileiro. Não se pode saber quanto de tal
(Cox, 1999). No lado positivo, o uso de her-
dinheiro iria de fato para saúde, educação,
bicidas reduz a necessidade de arar, assim
meio ambiente e outras áreas que produzi-
evitando a compactação do solo e a conse-
riam maiores benefícios sociais se as verbas
qüente erosão do solo e depleção do estoque
fossem usadas para estes fins ao invés de se-
de carbono.
rem usadas para subsidiar a soja. Também há
um custo de oportunidade ambiental grande Pode ser esperado que as áreas de soja no
quando ecossistemas naturais como a floresta Brasil sejam dominadas pela soja Roundup-
amazônica é sacrificada (Fearnside, 1997c). Ready™ dentro de um ano ou dois depois

Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 72 8/18/2022 3:13:27 PM


O cultivo da soja como ameaça para
o meio ambiente na Amazônia brasileira 73

que a aprovação for obtida. Em setembro semântica. Como era o caso de “agropecu-
de 1998, a Comissão Técnica Nacional de ária”, o eufemismo para a pecuária bovina
Biotecnologia aprovou a soja transgênica na Amazônia, chamar a soja de grãos serve
para plantio no País. Em junho de 1999, orga- para transmitir a implicação de que a soja
nizações não governamentais obtiveram uma esteja alimentando o povo brasileiro junto
decisão judicial que requer um Relatório de com arroz, milho e trigo. Na realidade, a
Impactos sobre o Meio Ambiente para a soja expansão da soja é muito mais consangüí-
transgênica (Arnt, 1999). Antes da decisão, nea à longa história de exploração predató-
a Monsanto esperava que até 2002 fossem ria dos recursos naturais no Brasil, como o
convertidos 50% dos 13 milhões de hectares pau-brasil na mata Atlântica e os minérios
de soja no Brasil para sementes Roundup- em Minas Gerais, do que é a agricultura de
Ready™ (Labes, 1999). O pacote tecnológico culturas alimentícias para consumo local.
para esta variedade resulta em rendimentos Freqüentemente o milho é enfatizado no dis-
mais altos a custo reduzido sob as atuais curso sobre “grãos” no Brasil. De fato, o mi-
condições de preço. No entanto, deve ser lho normalmente é parte do ciclo de rotação
mencionado que esta transformação dará de culturas usada com a soja, mas economi-
para Monsanto um monopólio efetivo sobre camente é apenas um subproduto. Somente
uma série de insumos essenciais no processo a soja justifica a infraestrutura volumosa, o
de produção de soja, aumentando a chance que dá a esta mercadoria tanto impacto so-
de elevação dos preços destas contribuições bre o meio ambiente.
ao nível máximo tolerado pelo mercado após Eu já vi altos funcionários da Embrapa
a consolidação do monopólio. fantasiar (depois de algumas cervejas) sobre
No mínimo, uma mudança para soja como a soja poderia alimentar a população
transgênica no Brasil poderia tornar o culti- faminta do Nordeste semiárido, e depois
vo da soja mais lucrativo e assim aceleraria ser lembrado que os brasileiros gostam de
o avanço dessa cultura na Amazônia. Por arroz e feijão, não soja. Pessoas pobres
outro lado, se o Brasil não aceita sementes na Amazônia não comem carne de soja.
transgênicas, a demanda para soja não-trans- Alguma soja é consumida na forma de óleo
gênica na Europa resultaria em um preço de de cozinha, mas esta parte da safra poderia
prêmio, assim também podendo acelerar o ser provida facilmente a partir das áreas de
avanço da soja na Amazônia. Este último soja já existentes no Brasil. A expansão adi-
efeito já está acontecendo (Carvalho, 1999), cional da soja é completamente voltada para
e a própria Maggi se opõe à abertura do País a exportação, e não tem nada que ver com a
para transgênicos (Branford & Freris, 2000). alimentação dos brasileiros.
A Figura 6 ilustra os fatores que afetam
Limites para a expansão da soja a expansão da área de soja no Brasil. Em
diagramas de alças causais como este, o si-
Até onde a soja chegará? A resposta de-
nal perto da ponta de cada seta representa
pende do novo equilíbrio entre a oferta e a
a direção da mudança no valor da variável
demanda. Também depende do ponto além
na ponta da seta dada um aumento no valor
do qual o País consideraria que a expansão
da variável no rabo da seta. A relação entre
adicional de soja seria contrária ao interesse
áreas plantadas e os preços representa um
nacional, devido aos impactos ambientais e
fator importante de controle: a produção de
sociais dessa forma de uso da terra.
soja do Brasil é suficiente para ter um im-
As discussões do interesse nacional bra- pacto significativo sobre os preços mundiais
sileiro na produção de soja estão confusas dessa mercadoria (Frechette, 1997). A por-
pela terminologia adotada. A Embrapa e ção do diagrama que representa a tomada
outras agências ativas na promoção da soja de decisão sobre as políticas do governo re-
raramente utilizam o termo “soja”, substi- ferentes aos subsídios pode parecer distan-
tuindo isso pelo termo “grãos”. A diferen- te da realidade de hoje, mas é importante
ça entre “soja” e “grãos” é muito mais que perceber que uma decisão por omissão é, na

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DESTRUIÇÃO E CONSERVAÇÃO
74 DA FLORESTA AMAZÔNICA

Figura 6. Fatores
que afetam a
expansão da soja
no Brasil.

realidade, tomada diariamente. “Negócios- Rodovia BR-174 parece ser real (Fearnside &
como-sempre” não acontecem por conta Leal Filho, 2001). O anúncio dos assentamen-
própria: é o resultado de uma decisão tácita tos na Rodovia BR-174 veio como uma sur-
para deixar as políticas inalteradas. As con- presa, já que a pavimentação da rodovia em
seqüências desta decisão, e das alternativas, 1996 e 1997 tinha sido apresentada como um
devem ser entendidas e enfrentadas. corte cirúrgico pela floresta. A estrada permi-
tiria o comércio entre a cidade de Manaus e
Um evento preocupante aconteceu em
a Venezuela, bem como o acesso aos portos
1998 em Roraima, quando a soja foi ataca-
daquele país.
da pelo fungo Rhizoctonia que, no feijão,
produz a temida doença conhecida como Embora balões de ensaio, como o anún-
“mela” (Andrade, 1999). O ano de 1998 foi cio no programa de rádio do Presidente
mais chuvoso que a média por ser um ano Cardoso, precisam ser vistos com certas
afetado pelo fenômeno La Niña, e a umidade restrições, eles freqüentemente predizem
alta depois das chuvas favoreceu a doença. grandes projetos que precedem planos de-
Levando em consideração a alta umidade nas talhados. Um dos problemas genéricos com
áreas de várzea perto de Santarém para onde projetos de desenvolvimento amazônicos
o plantio de soja é planejado, espera-se um é que a pressão política para levar a cabo
risco maior de doença do que em áreas secas os projetos é gerada antes que os impac-
como as do cerrado, conduzindo ao maior tos ambientais e sociais dos projetos sejam
uso de fungicidas (Carvalho, 1999). O ataque analisados e julgados. São anunciadas obras
de Rhizoctonia na soja é facilitado pela pre- públicas como compromissos de governo
sença de ervas daninhas (Black et al., 1996). antes que o Estudo de Impacto Ambiental
(EIA) e o Relatório de Impactos sobre o Meio
No dia 24 de junho de 1997, o Presidente
Ambiente (RIMA) estejam preparados, as-
Fernando Henrique Cardoso anunciou no seu
sim fazendo com que seja difícil, na prática,
programa de rádio semanal “A Palavra do
que os projetos sejam sustados até mesmo
Presidente” que seis milhões de hectares ao
quando os impactos são severos.
longo da Rodovia BR-174 (Manaus-Caracaraí)
seriam abertos para assentamentos, e suge- É necessário mais que meros anúncios
riu que a área cultivada ali seria “tão colossal para fazer vastas áreas de soja aparecerem:
que dobraria a produção agrícola nacional” é necessário demanda de mercado adequada,
(de Cássia, 1997). Provavelmente, apesar da infraestrutura para transportar a produção, o
hipérbole quase certa tanto sobre a produção calcário e os outros insumos. Até que pon-
esperada como sobre a área a ser plantada, to a expansão rápida de mercados globais de
a intenção de iniciar um grande projeto na soja, que aconteceu durante a última década,

Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 74 8/18/2022 3:13:27 PM


O cultivo da soja como ameaça para
o meio ambiente na Amazônia brasileira 75

continuará, é uma interrogação crítica. Por momento, isto está longe de acontecer; prin-
exemplo, uma pergunta importante é se a cipalmente, com governos competindo em
China aumentará as suas importações de soja. todos os níveis para atrair tanto investimento
No Brasil, a soja é conhecida pelo termo quanto possível para a soja.
“grãos”, enquanto em inglês o termo “grain” É necessária uma ponderação honesta
é usado para fazer uma distinção entre a soja dos custos e benefícios de ampliar o cultivo
e mercadorias como trigo e milho. O idioma da soja, incluindo todos os custos sociais e
chinês faz a mesma distinção que o inglês, e ambientais. Somente então seria possível to-
em 1993 o governo chinês decidiu dar prio- mar decisões racionais sobre se a expansão
ridade para “grains”, em detrimento da soja. adicional da soja é de interesse nacional, e
A China, que era um exportador pequeno de com que infraestrutura esta se dará.
soja até 1993, começou a importar quantida-
des sucessivamente maiores de soja a partir
de 1994. Até 1998 a China tinha se tornado CONCLUSÕES E RECOMENDAÇÕES
o maior importador do mundo em todos os
Os impactos adversos múltiplos da ex-
três mercados: soja a granel, óleo de soja e
pansão da soja sobre a biodiversidade e ou-
farelo de soja (Brown et al., 1999). A deman-
tras considerações de desenvolvimento su-
da chinesa poderia esporear uma expansão
gerem as seguintes recomendações:
adicional significativa de soja nos países ex-
portadores. Já que a expansão de soja nos 1) criar áreas protegidas com antecedên-
Estados Unidos está chegando ao seu limite, cia ao estabelecimento das fronteiras
é provável que muito da demanda crescen- de soja.
te da China seja suprida pela ampliação das
2) encorajar a eliminação dos diversos
áreas de soja plantadas na América Latina.
subsídios que aceleram a expansão da
Decisões humanas, particularmente de- soja além do que aconteceria sob as
cisões do governo brasileiro, determinarão forças de mercado.
até que ponto a soja vai avançar no País.
3) levar a cabo estudos, com rapidez,
Claramente a área sob o cultivo da soja não
para avaliar os custos de impactos so-
irá simplesmente se expandir até que essa
ciais e ambientais associados à expan-
cultura ocupe o País inteiro. Espera-se que o
são da soja. São necessários melhores
avanço pare quando a provisão de produção
exceder a demanda global causando a queda métodos para quantificar custos de
de preços, tornando a expansão adicional da oportunidade de dinheiro e terra.
soja antieconômica. Antes de esse ponto ser 4) fortalecer o sistema regulador de im-
alcançado, no entanto, o Brasil poderia deci- pactos ambientais, inclusive avaliação
dir que mais expansão das áreas de soja não dos impactos indiretos (o “efeito de
é de interesse nacional. As razões incluem o arrasto”) da infraestrutura, que esti-
impacto sobre preços, que afetaria a rentabili- mulam outras atividades econômicas
dade da soja se fosse cultivada em toda parte potencialmente destrutivas.
do País, o dreno financeiro significativo que
os subsídios de governo representam aos or- 5) criar mecanismos para assumir com-
çamentos federais, estaduais e municipais, e promissos de não-implantação de pro-
os custos sociais e ambientais em converter jetos de infraestrutura específicos que
áreas cada vez maiores em soja. Governos forem julgados como tendo impactos
poderiam decidir pela redução de subsídios excessivos.
antes que a expansão da soja pare por si só,
sob o conjunto atual de forças econômicas. NOTAS
Pode-se imaginar que governos tomariam
providências ativas para desencorajar a ex- (1) Na época, o uso de sementes transgênicas
pansão adicional da soja se essa expansão atualmente está esperando um relatório de im-
fosse percebida como sendo danoso, mas, no pacto ambiental, com intensa controvérsia.

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DESTRUIÇÃO E CONSERVAÇÃO
76 DA FLORESTA AMAZÔNICA

APÊNDICE Jean Dubois, Instituito Rede Brasileira


Agroflorestal (REBRAF), Rio de Janeiro.
Lista de siglas
Luis Antônio Pagot, Diretor, HERMASA
BNDES Banco de Nacional de Navegação da Amazônia, S.A., Itacoatiara,
Desenvolvimento Econômico Amazonas.
e Social Mary Helena Allegretti, Secretária de
COPASA Cooperativa dos Produtores Coordenação da Amazônia (SCA),
de Soja do Amazonas Ministério do Meio Ambiente, Brasília.
EIA Estudo de Impacto Ambiental Paulo Silveiro, Diretor, Programa Brasil em
Ação, Ministério do Planejamento, Brasília.
IBAMA Instituto Brasileiro do Meio
Ambiente dos Recursos Wim G. Sombroek, Centro Internacional
Naturais Renováveis Informações de Referência sobre Solos
(ISRIC), Wageningen, Países Baixos.
INEB Instituto Estadual da Babaçu
EMBRAPA Empresa Brasileira de
Pesquisa Agropecuária AGRADECIMENTOS
INCRA Instituto Nacional de Este trabalho faz parte do ‘Projeto
Colonização e Reforma Mercadorias’, Centro para Ciência de
Agrária Biodiversidade Aplicada, Conservação
JICA Agência de Cooperação Internacional, Washington, DC (Fearnside,
Internacional Japonesa 2001; Nieston et al., 2004). Uma versão ante-
rior em inglês foi publicada em Environmental
POLOCENTRO ProgramadoDesenvolvimento Conservation (Fearnside, 2001), e agradeço
dos Cerrados a Cambridge University Press pela permis-
PRODECER Programa de Cooperação são de publicar esta tradução. Versões ante-
Nipo-Brasileiro para o riores foram apresentadas no V Simpósio de
Desenvolvimento do Cerrado Ecossistemas Brasileiros: Conservação, 10 a
15 de outubro de 2000, Universidade Federal
RIMA Relatório de Impactos sobre o
de Espírito Santo, Vitória, ES (Fearnside, 2000)
Meio Ambiente
e no Simpósio Internacional: Amazônia 500
Anos; O V Centenário e o Novo Milênio:
Afiliações de pessoas citadas Lições de História e Reflexões para uma
Francisco U.M. Arguelles, Ministério Público Nova Era. 17 a 20 de abril de 2000, Belém-
do Estado do Amazonas, Procuradoria Pará (Fearnside, 2006). Agradeço às seguintes
Especializada para Defesa do Ambiente e pessoas pelo fornecimento de informações:
do Patrimônio Histórico (PRODEMAPH), R.I. Aguirre, R. Smeraldi, J. Hardner, A.K.O.
Manaus. Homma, D. Kaimowitz, A.G. Moreira, R. Rice,
S. Schwartzman, W.G. Sombroek, G. Switkes,
Alan Bojanic, PROMAB, Riberalta, Bolívia H. Théry e S.V. Wilson. O Conselho Nacional
[ex-diretor do Centro para Pesquisa em de Desenvolvimento Científico e Tecnológico
Agricultura Tropical (CIAT), Santa Cruz, (CNPq AI 523980/96-5), o Instituto Nacional
Bolívia]. de Pesquisas da Amazônia (INPA PPI 1-3160)
Afonso Henriques de Jesus Lopes, Coordenador e a Conservation Internacional contribuiram
para o Maranhão, SubPrograma dos apoio financeiro. R.I. Barbosa, C. Gascon,
Recursos Naturais (SPRN), Programa Piloto P.M.L.A. Graça, N. Hamada, R.S.S. Murrieta,
para a Conservação das Florestas Tropicais N.V.C. Polunin e S.V. Wilson fizeram comen-
do Brasil (PP-G7), São Luis, Maranhão. tários valiosos sobre o manuscrito.

Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 76 8/18/2022 3:13:27 PM


O cultivo da soja como ameaça para
o meio ambiente na Amazônia brasileira 77

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DESTRUIÇÃO E CONSERVAÇÃO
78 DA FLORESTA AMAZÔNICA

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Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 78 8/18/2022 3:13:27 PM


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Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 80 8/18/2022 3:13:28 PM


CAPÍTULO

5
A intensificação da pastagem pode
frear o desmatamento no Brasil?

Philip M. Fearnside
Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia – INPA
Av. André Araújo, 2936 – CEP: 69.067-375, Manaus, Amazonas, Brasil.
E-mail: pmfearn@inpa.gov.br

Tradução de:
Fearnside, P.M. 2002. Can pasture intensification discourage deforestation in the Amazon and
Pantanal regions of Brazil? p. 299-314 In: C.H. Wood & R. Porro (eds.) Deforestation and Land
Use in the Amazon. University Press of Florida, Gainesville, Florida, E.U.A. 386 p.

81
Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 81 8/18/2022 3:13:35 PM
DESTRUIÇÃO E CONSERVAÇÃO
82 DA FLORESTA AMAZÔNICA

RESUMO A lógica de subsidiar a intensifica-


ção é resumida por Serrão & Homma
Autoridades agrícolas brasileiras têm (1993: 319-320),pesquisadores da Empresa
promovido a intensificação da produção Brasileira de Pesquisa Agropecuária
da pecuária bovina como meio de desen- (Embrapa):
corajar o desmatamento na Amazônia e no
Pantanal. A intensificação da pastagem é fei- “Com a intensificação tecnológica e a
ta por meio da aplicação de fertilizantes e melhoria consequente na sustentabili-
herbicidas junto com o replantio com varie- dade das pastagens que substituem a
dades de capim mais produtivas, melhoria floresta, ...a produtividade da pecuária
genética dos rebanhos de gado e um melhor na Amazônia pode ser dobrada ou tripli-
cada. Então, do ponto de vista técnico,
regulamento das densidades de estocagem
não mais que os 50% da área já usados
e dos cronogramas de rotação. No caso do para criação de gado são realmente ne-
Pantanal, a instituição de pesquisa agrícola cessários para suprir a demanda regional
do governo (Embrapa) recomendou que as de carne de boi.... Se isto está correto,...
propriedades plantassem 10% de suas áreas uma quantia considerável de terra de
com pastagem melhorada, embora alguma pastagem já degradada pode ser reforma-
floresta de terra firme dentro de cada pro- da ou pode ser regenerada para formação
priedade precise ser sacrificada para que isto de floresta e acumulação de biomassa.”
seja feito. Na Amazônia, em função da limi-
tação de recursos financeiros e de insumos A intensificação da pastagem é feita pela
físicos, tais como o fosfato, não é provável aplicação de fertilizantes e de herbicidas,
que sejam mantidas as vastas áreas de pas- junto com o replantio de capim de varieda-
tagem sob estes sistemas intensificados. A des mais produtivas, melhoria genética dos
busca por medidas efetivas para desencora- rebanhos de gado, um regulamento mais efi-
jar o desmatamento deveria focar no conjun- ciente das densidades de estoque e dos cro-
to de motivações que levam os fazendeiros nogramas de rotação. A intensificação é pro-
a investirem na derrubada da floresta, inclu- movida tanto em fazendas estabelecidas na
sive fatores sem ligação com a produção de floresta amazônica como no Pantanal (Fig.
carne bovina. Fatores como a especulação 1). No caso do Pantanal, a Embrapa reco-
imobiliária e a garantia de posse da terra po- mendou que as propriedades plantassem o
dem anular os efeitos esperados de subsidiar pasto melhorado em 10% da sua área, em-
a intensificação de pastagem. bora alguma floresta em terra firme dentro
de cada propriedade tivesse que ser sacrifi-
PALAVRAS CHAVE: Amazônia, Desmatamento, cada para se fazer isso. Estes desmatamen-
Pantanal, Pastagem, Fosfato tos estariam nas áreas não inundadas nas
elevações dentro do Pantanal; essas unida-
des topográficas ocupam uma maior propor-
INTRODUÇÃO: A RAZÃO PARA ção da paisagem na área mais próxima ao
INTENSIFICAÇÃO planalto (áreas de planalto fora do Pantanal)
na extremidade oriental da região.
Pastagem é o uso predominante da terra
em áreas desmatadas na Amazônia brasileira Propostas para criar subsídios novos ou
(Fearnside, 1990, 1996). Qualquer mudança redirecionar subsídios “velhos” (cf. Serrão &
política que afete as motivações para ampliar Toledo, 1990: 210) sempre encontrarão um
o uso da terra terá um papel fundamental em apoio cordial entre os beneficiários. Os be-
determinar o curso futuro do desmatamento. neficiários representam um grupo onde de
A intensificação do manejo das pastagens, es- onde se espera o interesse em perpetuar e
pecialmente pela aplicação de fertilizantes de ampliar qualquer programa de subsídio, in-
fosfato, foi subsidiada pelo governo brasileiro dependente dos seus resultados agronômi-
como meio de reduzir o desmatamento. As cos, sociais ou ambientais. Na década de
suposições que estão por trás dessa estratégia 1970, fazendeiros amazônicos eram benefi-
requerem um exame cuidadoso. ciados por generosos subsídios do governo

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A intensificação da pastagem pode
frear o desmatamento no Brasil? 83

Figura 1. Amazônia
brasileira e o Pantanal,
com locais mencionados
no texto.

na forma de incentivos fiscais e crédito sub- RAZÕES PARA DUVIDAR DO CENÁRIO


sidiado (Yokomizo, 1989). Ao contrário da OFICIAL
crença popular, muitos destes fazendeiros
ainda recebem incentivos fiscais, pois o A hipótese do estômago cheio
decreto (Nº. 153, de 25 de junho de 1991)
Uma série de indicações sugere falta de
sobre incentivos apenas suspendeu a con-
realidade num cenário imaginado onde fa-
cessão de incentivos “novos”, em vez de zendeiros que lucram com uma intensifica-
revogar, também, os incentivos “velhos” ção bem-sucedida se conterão em fazer mais
(já aprovados). Os fazendeiros represen- desmatamento. Primeiro, isso corre ao con-
tam uma força política com influência que trário do que geralmente é conhecido sobre o
vai muito além da representação númerica comportamento econômico humano. Quando
que eles têm. Portanto, deve-se tomar gran- as pessoas ganham dinheiro em uma determi-
de cuidado na recomendação de quaisquer nada atividade, a resposta virtualmente uni-
subsídios novos. versal é a de ampliar tal atividade ao invés

Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 83 8/18/2022 3:13:35 PM


DESTRUIÇÃO E CONSERVAÇÃO
84 DA FLORESTA AMAZÔNICA

de limitá-la. Se a intensificação da pastagem O argumento que aumentar a produtivi-


realmente fosse um sucesso econômico, além dade das pastagens limitará o uso futuro da
dos fazendeiros individuais aumentarem a floresta para pastagens “novas” foi feito por
fração das suas terras dedicada ao sistema, Faminow (1998: 232). A suposição é que,
investidores adicionais viriam à região para com produtividade mais alta, os fazendeiros
tirar proveito da oportunidade. ou seriam satisfeitos com os seus lucros ou
que o mercado para carne bovina seria satu-
Como Kaimowitz (1996: 56) observou rado de maneira que mais desmatamento se-
no contexto da América Central, “até mes- ria improdutivo. Questionei com freqüencia
mo um argumento plausível pode ser feito, a idéia de que pequenos agricultores ama-
de que a melhoria da tecnologia de pecuária zônicos deixariam de derrubar se seus estô-
aplicável às áreas com solos pobres nos tró- magos pudessem ser preenchidos por meio
picos úmidos pode, provavelmente, aumen- de rendimentos melhores (e.g., Fearnside,
tar o desmatamento, já que faria com que o 1987a, 1998a). Uma ideia mais forçada se-
gado criado nessas áreas fosse mais lucrati- ria a de que grandes fazendeiros limitariam
vo”. White et al. (2001) mostraram o poder a sua expansão porque eles estariam satisfei-
desta força na América Central. No contexto tos com o seu nível de riqueza material. Por
amazônico, os efeitos prováveis incluiriam o outro lado, o mercado pode ser saturado no
estímulo adicional da venda de terra e con- futuro, mas, antes que as forças de mercado
sequente expulsão de pequenos agricultores possam frear este processo, é provável que a
para fronteiras de desmatamento mais dis- área de pastagem se amplie tremendamente,
tantes. Isso porque os fazendeiros amazôni- e a um grande custo ambiental. A demanda
cos compram as propriedades dos pequenos para carne bovina na Amazônia, que foi pre-
agricultores com ofertas de somas atraentes, sumida por Serrão & Homma (1993: 319-320)
de fixar o limite superior para expansão da
visto que os fazendeiros têm um preço som-
pecuária amazônica, não é o teto imagina-
bra mais alto para a terra (Schneider, 1994).
do. A carne bovina pode ser consumida no
Essa diferença no preço sombra aumenta-
resto do Brasil e em outras partes do mundo,
ria ainda mais se tecnologias melhoradas apesar de restrições (até recentemente) sobre
estivessem disponíveis, para as quais seria exportação de carne congelada para muitos
provável que os fazendeiros tivessem tam- países devido a existência de febre aftosa na
bém melhor acesso (Kaimowitz, 1996: 56). América do Sul. A demanda externa por carne
Quando os pequenos agricultores são substi- da Amazônia está rapidamente se tornando
tuídos, a taxa de desmatamento nas proprie- uma força importante, embora ao longo das
dades compradas aproximadamente duplica primeiras três décadas depois da construção
(Fearnside, 1984). da rodovia Transamazônica, em 1970, o des-
Uma resposta alternativa para a renda matamento se mostrou capaz de proceder em
ganha a partir da intensificação é o investi- um ritmo acelerado sem que essa força fosse
tão forte. Há um forte aumento na deman-
mento dos lucros em outras atividades pro-
da por carne e na taxa de desmatamento nas
missoras (tais como, a expansão da pecuária
áreas de expansão mais rápida da atividade
extensiva), mas essas atividades normal- pecuária (Alencar et al., 2004; Kaimowitz et
mente envolvem a derrubada de mais flores- al., 2004; Margulis, 2003). Desde a expansão
ta. Um exemplo é o investimento da renda da área certificada como livre da febre afto-
ganha, a partir de safras boas de cacau em sa, no início da década de 2000, a taxa de
Rondônia, na ampliação das pastagens ex- desmatamento tem se tornado desvinculada
tensivas, ao invés de reverter o dinheiro na da economia brasileira, aumentando mesmo
cultura perene, mais ambientalmente dese- quando o produto interno bruto (PIB) do País
jável (veja Fearnside, 1987a). Outro é o uso está em declínio (Alencar et al., 2004). A
dos lucros da indústria de madeira para man- influência crescente da soja, também desvin-
ter a pecuária em Paragominas, Pará (Mattos culada da economia nacional, está aconte-
& Uhl, 1994). cendo simultaneamente (Fearnside, 2001d).

Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 84 8/18/2022 3:13:35 PM


A intensificação da pastagem pode
frear o desmatamento no Brasil? 85

A ascenção da força do mercado internacio- concorrentes, é notório por ter se tornado


nal é somada aos outros motivos “ulteriores” um mar de floresta secundária quando os
levando ao desmatamento e os fazendeiros subsídios do governo diminuíram a partir de
continuam a fundar as suas decisões sobre 1984 (Fig. 2). Se a produção de carne bovina
desmatamento em muitos motivos, além da fosse tão lucrativa, por que estas fazendas
venda de carne bovina. não permaneceram ativas desde 1984, pe-
ríodo em que a população de Manaus qua-
A pastagem não é só para carne bovina se que duplicou, junto com a sua demanda
para carne bovina? O caso de Manaus é con-
A lógica de intensificação como estra- sistente com um quadro que inclui motivos
tégia para reduzir a velocidade do desma- para o desmatamento diferentes da comer-
tamento é calcada na suposição de que o cialização da carne bovina: a motivação para
motivo primário para ampliar as pastagens manter as fazendas da Suframa seria depen-
é a produção de carne bovina. Várias indi- dente quase que somente dos lucros da carne
cações apontam outros motivos como sendo porque o valor da madeira dessas florestas é
críticos no comportamento de fazendeiros relativamente baixo; porque o pasto não era
amazônicos. Talvez a indicação mais clara necessário para manter a posse da terra (já
tenha sido o caso do Distrito Agropecuário que as fazendas fazem parte de um esque-
da Zona Franca de Manaus (Suframa). No ma organizado pelo governo com a devida
Estado do Amazonas, que é dominado pela
documentação, o que é muito diferente do
capital Manaus (população em 1999 de apro-
vale-tudo jurídico que caracteriza o sul do
ximadamente 1,6 milhões), apenas 25% da
Pará: Fearnside, 2001a), e porque a ameaça
carne bovina consumida é produzida no
de invasão por migrantes sem terra tem (até
Estado (Faminow, 1998: 132). O Distrito
muito recentemente) sido bastante remota.
Agropecuário da Suframa, situado nos arre-
dores de Manaus, e protegido da competição A especulação da terra e os incentivos
por distâncias vastas das áreas produtoras financeiros do governo tem acrescentado

Figura 2.
A predominância
de crescimento
secundário é
aparente em fazendas
localizadas a 80
km ao norte de
Manaus, Amazonas.
As áreas brancas
são floresta, áreas
cinzas são pastagem
e áreas pretas são
florestas secundárias
em pastagens
abandonadas.
Landsat-TM (bandas
3, 4 e 5) imagem
de 20 de setembro
de 1995 (INPE). A
área mostrada é de
aproximadamente
27 × 16 km.

Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 85 8/18/2022 3:13:36 PM


DESTRUIÇÃO E CONSERVAÇÃO
86 DA FLORESTA AMAZÔNICA

à rentabilidade de derrubar a floresta para sendo que em alguns locais essa valorização
pasto, até mesmo quando a produção da foi bastante expressiva, como, por exemplo,
carne bovina é desprezível (Browder, 1988, em Querência-MT, onde o hectare de “mata”
Fearnside, 1980, 1987b, Hecht, 1993, Hecht passou de R$ 125,00 em novembro-dezem-
et al., 1988). Faminow (1998) apresentou bro de 2001 à R$ 1.000,00 em julho-agosto
uma visão contrária (para uma refutação, de 2003, uma valorização de 700% (Ferraz,
veja Fearnside, 1999a). Faminow (1998: 125 2004). Coincidentemente, o Mato Grosso,
e 131) acredita que a demanda por carne bo- onde as terras se valorizaram mais em 2002-
vina e leite em cidades amazônicas é o fator 2003, foi o estado que teve as mais altas taxas
fundamental que motiva a conversão da flo- de desmatamento em 2003; a forte expansão
resta em pasto. O caso de Manaus desmente da soja também estava em curso nesse esta-
a generalidade de tal interpretação. do. De acordo com o órgão de monitoramen-
to ambiental estadual (Fundação Estadual do
Talvez o sinal mais claro de que a espe-
Meio Amiente-Mato Grosso: FEMA-MT), o
culação da terra foi uma força significante
desmatamento no Mato Grosso cresceu 133%
no desmatamento é o padrão seguido desde
de 2002 para 2003, saltando de 7,95 × 103
o início do Plano Real (o pacote econômi-
km2/ano para 18,58 × 103 km2/ano (incluin-
co, lançado em julho de 1994, que reduziu
do cerrado, transição e floresta).
fortemente a taxa de inflação). Imagens de
LANDSAT indicam um tremendo salto inicial A importância da expansão rápida da área
na taxa de desmatamento em 1995, com 29,1 de pastagem como forma de capturar os lu-
× 103 km2/ano, contra uma taxa de 14,9 × 103 cros da valorização da terra, em detrimento do
km2/ano em 1994; o salto é melhor explicado investimento em intensificação da pastagem,
como sendo o resultado de um volume muito é mostrada por dados de painéis conduzi-
maior de dinheiro que se tornou disponível dos com pecuaristas em Rondônia (Ichihara,
para investimento depois da implantação do 2003). Os retornos econômicos com quatro
Plano Real. O pico de desmatamento em 1995 formas diferentes de recuperação de pastagem
foi seguido por um declínio significativo, para (adubação associada ao uso de herbicidas,
18,2 × 103 km2/ano em 1996 e 13,2 × 103 gradagem e adubação, recuperação através do
km2/ano em 1997, seguido por um aumento cultivo de arroz, e recuperação através do cul-
de 17,4 × 103 km2/ano em 1998, 17,3 × 103 tivo da soja) foram comparados com os retor-
km2/ano em 1999, 18,2 × 103 km2/ano em nos de outras duas opções: a primeira, onde
2000, 18,2 × 103 km2/ano em 2001, 23,2 × não são adotadas tecnologias suplementares
103 km2/ano em 2002, e, de acordo de uma àquelas observadas no manejo convencional,
estimativa preliminar, 23,7 × 103 km2/ano atuando como testemunha; e a segunda, con-
em 2003 (Brasil, INPE, 2004). O declínio en- siderando o desmatamento para a abertura de
tre 1995 e 1997 nas taxas de desmatamento novas áreas de pastoreio, ao invés da intensifi-
acompanhou uma queda nos preços da terra cação do uso de áreas já exploradas. A opção
de mais de 50% ao longo do mesmo período, do desmatamento foi economicamente preferí-
uma diminuição de preço que é melhor expli- vel em todos os casos devido aos ganhos imo-
cada como sendo resultado da taxa muito re- biliários. Mesmo respeitando os limites legais
duzida de inflação que tem eliminado o papel das áreas de reservas (80%) e sem considerar
da terra como uma proteção contra a inflação. os ganhos com a extração da madeira durante
A associação entre a queda no preço da terra o desmatamento, os benefícios concedidos pe-
e as taxas de desmatamento reduzidas sugere las técnicas de recuperação de pastagens ainda
que uma parte significativa do desmatamento eram inferiores (Ichihara, 2003).
que estava acontecendo nos anos anteriores
É importante lembrar que a especulação
estava sendo motivada pela especulação.
acontece com base em propriedades inteiras,
Os elevados níveis de desmatamento em no lugar de ser baseada somente na porção
2002 e 2003 são consistentes com essa rela- de cada propriedade que foi convertida para
ção na medida em que os preços das terras no pastagens. As porções florestadas das pro-
Brasil voltaram a valorizar-se nesse período, priedades, inclusive os estoques de madeira

Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 86 8/18/2022 3:13:36 PM


A intensificação da pastagem pode
frear o desmatamento no Brasil? 87

contidos nelas, representam um valor signi- tamanho do rebanho de gado, tanto quando
ficativo. A pastagem fornece uma garantia a análise era feita usando áreas de culturas
efetiva de posse continuada da propriedade anuais (Reis & Margulis, 1991) como quan-
inteira, dando assim uma motivação impor- do usando a produção em toneladas (Reis &
tante, além da produção da carne bovina. Margulis, 1994: 186). Cline (1991) acredita
Se uma propriedade fosse oferecida à ven- que a colinearidade entre as diversas variá-
da sem que uma porção dela estivesse sobre veis seja a explicação provável para a cons-
pastagem, até mesmo se degradada, a flo- tatação de Reis & Margulis (1991) de uma
resta restante teria um valor de venda mais contribuição relativamente baixa do rebanho
baixo por causa da necessidade do compra- de gado (explicando apenas 10% do desma-
dor de fazer despesas pesadas para derrubar tamento em simulações para 1980-1985).
parte da floresta, ou então, correr o risco de
Seria esperada uma associação forte en-
perder a posse da propriedade.
tre o gado e o desmatamento, por causa da
A lavagem de dinheiro dá outra fonte em associação conhecida entre o tamanho da
potencial de motivação para o aumento de propriedade e o desmatamento, além do
investimento em pastagens na Amazônia. fato óbvio de que fazendas grandes tendem
Dinheiro “sujo”, ganho das drogas, da cor- a plantar pastagem mais que os pequenos
rupção e de muitas outras fontes ilegais, pode agricultores (embora os pequenos agriculto-
ser convertido em dinheiro “limpo” por meio res também plantam pastagem). Evidência
de investimentos em negócios amazônicos, de que a maioria do desmatamento é feito
tais como dragas de garimpagem de ouro e por fazendas médias e grandes incluem as
fazendas de gado, até mesmo se estas ativi- regressões das taxas de desmatamento na
dades são improdutivas com base no valor área de terra privada em propriedades de
aparente de retorno sobre o investimento. A diferentes classes de tamanho nos estados
lógica é ilustrada pelo caso do ex-Deputado amazônicos, ajustadas pelas diferenças nos
Federal João Alves, que ganhou notoriedade tamanhos dos estados. Tais regressões ex-
no escândalo do orçamento federal de 1993 plicam 74% da variância nas taxas de des-
(ISTOÉ, 29 de dezembro de 1993). O João matamento para 1990 e 1991, e indicam que
Alves ganhou aproximadamente 55 vezes os pequenos agricultores respondem por
na loteria nacional porque ele tinha com- apenas 30,5% do total (Fearnside, 1993).
prado muitos milhares de tickets para con- Outra evidência vem de entrevistas feitas por
verter um dinheiro vivo ganho ilegalmente Nepstad et al. (1999) em 202 propriedades
para um valor calculado em US$50 milhões no “arco de desmatamento” de Paragominas
em lucros reconhecidos legalmente. A por- até Rio Branco, indicando apenas 25% do
centagem pequena de dinheiro investida em desmatamento em propriedades de 100 ha
tickets de loteria que vão, em média, voltar ou menos. Uma indicação indireta é forneci-
para um apostador como lucros faria com da pelos tamanhos das clareiras medidas em
que investimentos em esquemas de pecuária imagens de LANDSAT (Brasil, INPE, 1998,
na Amazônia, financeiramente pouco pro- 1999, 2000). Estas medidas indicam a por-
metedores, tornem-se transações excelentes. centagem de clareiras com área < 15 ha era
21% em 1995, 18% em 1996 e 10% em 1997,
Densidade de gado, produtividade de 11% em 1998 e 15% em 1999. O limite de
pasto e desmatamento 15 ha é bem acima dos aproximadamente 3
ha/ano que as famílias de pequenos agricul-
Em uma análise de 191 municípios na tores podem desmatar usando mão de obra
Amazônia brasileira, Reis & Margulis (1991: familiar. Estes valores omitem clareiras pe-
358) acharam uma relação positiva forte en- quenas - o limite de detecção é 6,25 ha numa
tre a densidade de gado por quilômetro qua- escala de 1:250.000 usada para interpreta-
drado e a taxa de desmatamento. Porém, esta ção das imagens no INPE. Porém, a medida
análise econométrica indicou a área plantada que clareiras com áreas abaixo do limite de
como tendo uma elasticidade maior do que o detecção cresçem em anos sucessivos, elas

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DESTRUIÇÃO E CONSERVAÇÃO
88 DA FLORESTA AMAZÔNICA

entrarão na categoria de > 15 ha: pode-se km2/ano em 1994 para 29,1 × 103 km2/ano
presumir que isso ocorra a cada ano de ma- em 1995 (Brasil, INPE, 2002).
neira que a subestimativa de clareiras não Na área de Altamira, Pará, Castellanet et
detectadas é igual à superestimativa da en- al. (1994) encontraram que as predições de
trada de clareiras passadas, quando a área Boserup (1965) relativas à densidade de popu-
cumulativa desmatada em cada local desde lação e à intensificação foram confirmadas no
o levantamento anterior ultrapasse o limiar caso de manejo de pastagens. Em outras pa-
de 6,25 ha. As áreas se referem ao tamanho lavras, os proprietários de terras em Altamira
das clareiras, e não ao tamanho das proprie- não estão intensificando as suas pastagens.
dades nas quais elas se situam. Boserup (1965) forneceu a apresentação clás-
Em um estudo de agricultura em Rondônia, sica da relação entre a densidade da popula-
Jones et al. (1995) encontraram que a “produ- ção humana e a mudança para usos da terra
tividade da terra de pecuária parece, essencial- mais intensas, onde os produtores em regiões
mente, não ser afetada pelas taxas de desma- esparsamente povoadas, como a Amazônia,
tamento”. Pode-se deduzir disto que o oposto tendem a adotar tecnologias extensivas no lu-
também se aplica, por exemplo, que mudan- gar das intensivas, apenas trocando para os
ças na produtividade do gado não afetam o métodos mais intensivos quando a densidade
comportamento dos fazendeiros com respeito populacional aumenta.
ao desmatamento, nem para cima nem para
baixo. Dale et al. (1993: 1002) constataram que Limites de fosfato
os solos bons têm um número maior de gado A EMBRAPA reconheceu que adubação
de corte em Ouro Preto do Oeste, Rondônia, com fósforo acumulado é necessário para
mas Jones et al. (1995) constataram que a qua- manter a produtividade do pasto, e, em 1977,
lidade do solo não tem conexão com a taxa de mudou a sua posição prévia de que o pasto
desmatamento no local. melhora o solo, passando a recomendar que
a produtividade seja mantida por meio da
PERSPECTIVAS FUTURAS PARA A aplicação de 200-300 kg/ha de fertilizante
fosfatado (50% superfosfato simples, 50%
INTENSIFICAÇÃO hiperfosfato) (Serrão & Falesi, 1977: 55),
Competitividade econômica fornecendo 50 kg/ha de P2O5 (Serrão et al.,
1978: 28). Isto foi modificado, subsequente-
É provável que vários limites restrinjam mente, para 25-50 kg/ha de P2O5 (Serrão et
a expansão do manejo intensificado da al., 1979: 220), no entanto, recomendações
pecuária na Amazônia brasileira. Um sinal mais recentes indicaram os 50 kg/ha origi-
pouco encorajador para a intensificação nais (Corrêa & Reichardt, 1995).
é a extensão mínima de pastagens não Em Paragominas foram encontrados bai-
subsidiadas que usam sistemas altos de in- xos níveis de fósforo disponível no solo, fator
sumos. Hecht (1992) destaca a falta de res- limitante ao crescimento do capim (Serrão
posta para a melhoria de tecnologia na área et al., 1978, 1979). Problemas que limitam a
de Paragominas. Uma demonstração dra- possibilidade de depender de fertilizantes fos-
mática disso aconteceu em 1995, quando o fatatados são o custo de suprir fosfato e os li-
Plano Real (o pacote de medidas econômicas mites absolutos dos estoques mineráveis deste
inaugurado em julho de 1994) de repente fez elemento. Isso foi ressaltado no relatório so-
com que quantias muito maiores de dinheiro bre as jazidas de fosfato no Brasil, publicado
se tornassem disponíveis para investimento. pelo Ministério das Minas e Energia. Só uma
No lugar de um surto de manejo intensifica- pequena jazida existe na Amazônia (de fato
do de pastagens, a resposta dos fazendeiros duas juntas: Serra Pirocaua e Ilha Trauira),
amazônicos foi um tremendo aumento nas estando situada na costa Atlântica perto da
taxas de desmatamento. A taxa de desmata- fronteira do Pará e Maranhão (de Lima, 1976,
mento anual mais que dobrou de 13,9 × 103 veja também Fenster & Leon, 1978). Além do

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A intensificação da pastagem pode
frear o desmatamento no Brasil? 89

tamanho pequeno da jazida, acrescenta-se a nenhuma expectativa de uso de fosfato para


desvantagem da mesma ser constituída de fertilização de pastagem (de Albuquerque,
compostos de alumínio que fazem seu uso 1996: 56 e 99). Os 54,7 × 106 ha de flores-
agrícola subótimo, mas não impossível se ta desmatados até 1998 na Amazônia Legal
fossem desenvolvidas novas tecnologias para (Brasil, INPE, 1998) consumiriam 1,1 × 106
produção de adubos (dos Santos, 1981: 178). t de P2O5 anualmente se essa área fosse man-
Uma jazida adicional, de tamanho significan- tida sob pastagem. Isto presume que as pas-
te, foi descoberta no Rio Maecuru, perto de tagens são fertilizadas uma vez a cada 2,5
Monte Alegre, Pará (Beisiegel & de Souza, anos (Serrão et al., 1979: 220), à dosagem
1986), mas a estimativa do seu tamanho ain- de 50 kg/ha de P2O5 por fertilização, consi-
da está incompleta. Quase todo o fosfato do derando um nível crítico mínimo de 5 ppm
Brasil está em Minas Gerais, um local muito
de P2O5 no solo, no lugar do nível crítico tra-
distante da maior parte da Amazônia.
dicional de 10 ppm (que exigiria aplicações
O Brasil, como um todo, não é dotado anuais de fertilizante para manter). Se foram
de um estoque muito grande de fosfato: os fertilizados todos os 400 × 106 ha de área
Estados Unidos, por exemplo, tem depósi- originalmente florestada na Amazônia Legal
tos aproximadamente 20 vezes maiores (de em uma dosagem recomendada para pasta-
Lima, 1976: 26). As reservas do Brasil tota- gem, seria requerido 8,0 × 106 t de P2O5 anu-
lizam apenas 1,6% do total global (de Lima, almente. Se todas as reservas de fosfato do
1976: 26). A continuidade das tendências ob- Brasil fossem dedicadas a este propósito, es-
servadas desde o final da II Guerra Mundial, tas durariam 79 anos para manter sob pasta-
com respeito ao uso de fosfato, esgotariam os gens a área atualmente desmatada (uma área
estoques mundiais em meados do século XXI
do tamanho da França), e apenas 11 anos se
(Estados Unidos, CEQ & Departamento de
o resto da área originalmente florestada tam-
Estado, 1980). Embora a extrapolação simples
dessas tendências seja questionável por cau- bém fosse convertida para pastagem (Tabela
sa de limites para a continuação do aumento 1). Porém, as jazidas de fosfatos do Brasil já
da população humana nas taxas passadas, estão quase totalmente comprometidas para
a conversão de uma porção significativa da a manutenção da produção agrícola fora da
Amazônia para pastagem fertilizada acelera- Amazônia Legal (Fearnside, 1999b).
ria, em muito, o dia em que os estoques de
fosfato serão esgotados no Brasil e no mundo.
Tabela 1. Exigências
Para o Brasil seria sábio ponderar, cuidado- DEPÓSITOS DE FOSFATO
de fosfato para manter
samente, se deveria alocar os seus estoques Depósitos brasileiros de fosfato (10 6 t de rocha) 780,7 pastagem na Amazônia
remanescentes desse recurso limitado para Depósitos, corrigidos para 8% de perda, 718,2
Brasileira
pastagens amazônicas (Fearnside, 1997).
P2O5 a 12% (10 6 t P2O5) 86,2
Um cálculo grosseiro pode ser feito da DOSAGEM DE FERTILIZANTE
suficiência das reservas brasileiras de fosfato
Freqüência de fertilização (anos) 2,5
para sustentar pastagens na Amazônia. As
reservas brasileiras de rocha de fosfato to- Dose/aplicação de fertilizante (t P2O5/ha) 0,05
talizam 780,6 × 106 t, com um conteúdo de Dose/ano de fertilizante (t/ha P2O5) 0,02
P2O5 médio de 12% (de Lima, 1976: 24), não EXIGÊNCIA PARA ÁREA JÁ DESMATADA
contando o depósito de Maecuru ainda em Área de floresta desmatada até 1998 (10 6 ha) 54,7
avaliação. Descontando a perda de 8% do
Consumo/ano de fertilizante em área desmatada até 1998
P2O5 na transformação da rocha em fertili- (10 6 t P2O5)
1,1
zante fosfatado (de Lima, 1976: 10), as re- Tempo que o estoque duraria (anos) 79
servas representam 86,2 × 106 t de P2O5. As
EXIGÊNCIA SE FLORESTA INTEIRA FOR DESMATADA
cinco maiores companhias têm reservas que
somam 67,1 × 106 t de P2O5 (depois das cor- Área de floresta original em Amazona Legal (10 6 ha) 400
reções para as perdas). As taxas atuais de ex- Consumo/ano de fertilizante se floresta inteira for
8,0
desmatada (10 6 t P2O5)
tração esvaziariam estas reservas em apenas
30 anos em uma projeção que não incluia Tempo que o estoque duraria (anos) 11

Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 89 8/18/2022 3:13:36 PM


DESTRUIÇÃO E CONSERVAÇÃO
90 DA FLORESTA AMAZÔNICA

Nada obriga o Brasil a depender exclusiva- à importância do problema. Sempre fico im-
mente de fontes domésticas de fosfato, embo- pressionado com disparidade entre os esfor-
ra os estoques globais também sejam finitos. ços de modelagem no campo de mudanças
Para usos de alta prioridade, já são importa- climáticas e os esforços no campo de des-
dos fosfatos do estrangeiro para a Amazônia. matamento tropical. No caso da meia-dúzia
O Projeto Jari usa fosfato da Carolina do de modelos de circulação global (GCMs) que
Norte, EUA. No caso da soja e do projeto de são os principais usados para estimativas de
arroz irrigado em Humaitá, Amazonas, que mudança climática, cada modelo consiste de
se tornou uma prioridade política do governo aproximadamente 300.000 linhas de código
estadual antes da eleição para governador em de programação executado em um super
1998, foi importado fertilizante NPK de Israel computador, tendo um time de programado-
para distribuição aos agricultores. res mantidos em tempo integral ao longo de
várias décadas para continuamente testar e
Mitigação do efeito estufa melhorar o modelo. Contrastando com isto,
os esforços para modelar o desmatamento
A intensificação do manejo da pastagem tropical são normalmente provenientes de
poderia ser subsidiada com o objetivo de se- indivíduos ou de grupos pequenos, sempre
questrar carbono no solo como uma medi- operando com recursos mínimos. Apesar
da de mitigação do efeito estufa? Isso pode- dessas limitações, progresso continua a ser
ria conduzir a um programa de subsídios e feito na modelagem do desmatamento (veja
acesso a volumes muito maiores de dinhei- revisões por Kaimowitz & Angelsen, 1998,
ro; por exemplo, durante o governo Clinton Lambin, 1994). Talvez se o entendimento da
os Estados Unidos estavam esperando gas- dinâmica do desmatamento fosse uma prio-
tar US$8 bilhões anualmente em “mecanis- ridade no mesmo nível da mudança climá-
mos de flexibilidade”, como o Mecanismo tica, estaríamos mais perto de ter modelos
do Desenvolvimento Limpo (CDM), para com boa capacidade preditiva. Precisaríamos
arcar com os compromissos dos EUA sob o de modelos funcionais (i.e., causais) que são
Protocolo de Kyoto (veja Fearnside, 1998c, espacialmente explícitos e que incluam a re-
2001a,b). A intensificação do manejo das pas- presentação específica do comportamento
tagens amazônicas foi proposta para seques- dos diferentes grupos sociais para cada lo-
trar carbono na camada superficial do solos cal. Somente quando modelos desse tipo for-
(Batjes & Sombroek, 1997), mas a efetividade necerem cenários adequadamente seguros,
de tais medidas depende muito das suposi- sob uma gama de regimes alternativos de
ções sobre o uso prévio da terra e o mane- política, será possível aproveitar os recursos
jo subsequente (Fearnside & Barbosa, 1998). financeiros mais vultosos que poderiam se
Mais importante, as verbas destinadas a miti- tornar disponíveis se, por exemplo, fossem
gar o efeito estufa seriam muito melhor gas- aceitas as mudanças políticas para reduzir a
tas em medidas para reduzir a velocidade do velocidade do desmatamento como medida
desmatamento. Além de ser o uso mais eficaz para evitar emissões de gás do efeito estufa
em termos de custo para mitigar mudanças sob os termos do Protocolo de Kyoto (i.e.,
climáticas, também traria muitos benefícios com “verificabilidade” de “adicionalidade”).
adicionais oriundos da manutenção de flores- Um perigo existente é a controvérsia en-
tas intactas (Fearnside, 1995). tre os investigadores com relação às causas
do desmatamento ser aproveitada como uma
ENTENDIMENTO DO DESMATAMENTO desculpa para adiar a tomada de qualquer
medida sobre o problema. Amplos preceden-
O nosso entendimento das causas do tes existem, como o lobby da indústria de
desmatamento amazônico ainda está em tabaco que conseguiu adiar durante décadas
um estado embrionário. Isso decorre da falta qualquer ação governamental para desen-
de esforços de pesquisa sobre as causas do corajar o fumo, em virtude de uma alegada
desmatamento em uma escala proporcional “controvérsia” sobre a questão de se o fumo

Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 90 8/18/2022 3:13:36 PM


A intensificação da pastagem pode
frear o desmatamento no Brasil? 91

causa o câncer, ou sucessos semelhantes con- Flórida, E.U.A. (Fearnside, 2002). Trechos
seguidos por lobbies de combustível fóssil desta discussão foram atualizados de
para diminuir e adiar qualquer ação contra o Fearnside (1998b, 1999a, 2006). Agradeço os
efeito estufa. No caso do desmatamento ama- comentários de P.M.L.A. Graça, A. Razera e
zônico, já sabemos o bastante para identificar S.V. Wilson.
algumas das causas críticas que deveriam ser
os objetos de ação imediata do governo. Estas
causas incluem as políticas de estabelecimen- LITERATURA CITADA
to de posse da terra, a arrecadação de impos- Alencar, A., D. Nepstad, D. McGrath, P. Moutinho,
tos para remover os lucros da especulação da P. Pacheco, M.C.V. Diaz & B. Soares Filho. 2004.
terra, o fortalecimento das exigências de ava- Desmatamento na Amazônia: Indo Além da
liação dos impactos ambientais para projetos Emergência Crônica. Instituto de Pesquisas da
de desenvolvimento, e a limitação da constru- Amazônia (IPAM), Belém, Pará. 83 p.
ção e melhoria de rodovias (Fearnside, 1989). Batjes, N.H. & W.G. Sombroek. 1997. Possibilities for
Subsidiar a intensificação das pastagens não carbon sequestration in tropical and subtropical soils.
é recomendado como estratégia para reduzir Global Change Biology 3: 161-173.
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fosfatosPanorama nacional e mundial. p. 5567 In:
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CONCLUSÕES Nacional de Rocha Fosfática, Brasília, 1618/06/86.
IBRAFOS, Brasília, DF. 463 p.
Não é provável que subsidiar a intensifi-
Boserup, E. 1965. The Conditions of Agricultural Growth.
cação do manejo de pastagens na Amazônia Aldine, Chicago, Illinois, E.U.A. 124 p.
brasileira resulte em reduções nas taxas de
Brasil, INPE (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais).
desmatamento previstas pelos proponentes
1998. Amazonia: Deforestation 1995-1997. INPE, São
da intensificação. Ademais, com os limites José dos Campos, São Paulo.
de recursos financeiros e de insumos físicos
(tais como o fosfato) é improvável manter Brasil, INPE (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais).
1999. Monitoramento da Floresta Amazônica
vastas áreas de pastagem sob este sistema. Brasileira por Satélite/Monitoring of the Brazilian
A procura por medidas efetivas para desen- Amazon Forest by Satellite: 1997-1998. INPE, São José
corajar o desmatamento deveria focalizar no dos Campos, São Paulo.
quadro de motivações que levam os fazen- Brasil, INPE (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais).
deiros a investir no desmatamento, inclusive 2000. Monitoramento da Floresta Amazônica
os fatores sem conexão à produção de carne Brasileira por Satélite/Monitoring of the Brazilian
bovna. Fatores como a especulação de terra Amazon Forest by Satellite: 1998-1999. INPE, São José
e a segurança de posse da terra podem anu- dos Campos, São Paulo.
lar os efeitos esperados de subsidiar a inten- Brasil, INPE (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais).
sificação das pastagens. 2002. Monitoramento da Floresta Amazônica
Brasileira por Satélite/Monitoring of the Brazilian
Amazon Forest by Satellite: 2000-2001. INPE, São
AGRADECIMENTOS José dos Campos, São Paulo, SP. 23 p.
Brasil, INPE (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais).
O Conselho Nacional do Desenvolvimento
2004. Monitoramento da Floresta Amazônica
Científico e Tecnológico (CNPq AI Brasileira por Satélite/Monitoring of the Brazilian
350230/97-98; AI 465819/00-1; 470765/01- Amazon Forest by Satellite: 2003-2004. INPE, São José
1; 477430/2003-1) e o Instituto Nacional de dos Campos, São Paulo.
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Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 91 8/18/2022 3:13:36 PM


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A intensificação da pastagem pode
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94 DA FLORESTA AMAZÔNICA

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Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 94 8/18/2022 3:13:36 PM


CAPÍTULO

6
Fósforo e a capacidade de suporte
humano na Amazônia brasileira

Philip M. Fearnside
Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia – INPA
Av. André Araújo, 2936 – CEP: 69.067-375, Manaus, Amazonas, Brasil.
E-mail: pmfearn@inpa.gov.br

Tradução de:
Fearnside, P.M. 1998. Phosphorus and Human Carrying Capacity in Brazilian Amazonia.
p. 94-108 In: J.P. Lynch & J. Deikman (Eds.) Phosphorus in Plant Biology: Regulatory Roles
in Molecular, Cellular, Organismic, and Ecosystem Processes. American Society of Plant
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95
Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 95 8/18/2022 3:13:43 PM
DESTRUIÇÃO E CONSERVAÇÃO
96 DA FLORESTA AMAZÔNICA

RESUMO o tempo que a área é capaz de fornecer este


sustento varia com a definição. O termo, às
A estimativa da capacidade de suporte hu- vezes, é usado para uma relação instantânea
mano fornece informações necessárias para entre os recursos disponíveis e as exigências
formular políticas racionais sobre população, de consumo de uma população, como na
consumo e desenvolvimento. Na Amazônia equação logística da biologia de populações
brasileira, o desenvolvimento tem sido do- (ex.: Wilson & Bossert, 1971). No entanto,
minado pela conversão de florestas tropicais no atual trabalho, o termo é usado exclusiva-
em pastagens, que se degradam dentro de mente com referência aos níveis sustentáveis
alguns anos sob o manejo normal, mas que de população e consumo. A capacidade de
apresentar maior produção se mantidas com suporte, no presente caso, se refere ao núme-
a aplicação de fertilizantes de fosfato. No en- ro de pessoas que podem ser sustentadas por
tanto, o uso desse fertilizante em pastagens um período indefinido, dado às suposições
não é usual. Pouco emprego é gerado pela feitas sobre a tecnologia de produção e os ní-
pastagem. Este também é o caso da soja, que veis e os padrões de consumo da população.
é atualmente promovida através de progra-
A capacidade de suporte não é fixa, mas
mas governamentais. O fosfato representa um
também não é infinitamente expansível
fator limitante na agricultura, na pecuária e,
(Arrow et al., 1995; Cohen, 1995). A capa-
possivelmente, também no manejo florestal.
cidade de suporte pode ser aumentada por
Sob a suposição improvável de que o Brasil
mudanças nos modos em que os recursos são
dedicasse toda a sua reserva de fosfatos à
usados e distribuídos. Por outro lado, a capa-
Amazônia, a área desmatada até agora (uma
cidade de suporte pode diminuir por causa da
área do tamanho da França) poderia ser man-
degradação ambiental, aumento da desigual-
tida em pastagem durante 81 anos, enquanto
dade na distribuição dos recursos e a adoção
que, se o resto da floresta fosse desmatado, a
de padrões ineficientes de uso da terra, tais
pastagem poderia ser mantida apenas durante
como a pastagem. Todas estas mudanças des-
11 anos. O fósforo está entre os fatores que
favoráveis acontecem hoje na Amazônia.
afetam o papel da Amazônia nas mudanças
globais, tanto em áreas florestadas como em Roger Revelle (1976) calculou que a Terra
áreas desmatadas. A lição a ser aprendida das pudesse sustentar 40 bilhões de pessoas, pre-
limitações de fosfato sobre a intensificação sumindo que haja grande aumento no ren-
da agricultura e da pecuária na Amazônia é a dimento por hectare e que seja aproveitada
necessidade de enfrentar a natureza finita do toda a terra que ele pensava ser “disponível”
potencial dessas atividades, e de adaptar ade- (inclusive a Amazônia). Mas as suposições de
quadamente as políticas que afetam a popu- Revelle relativas à agricultura de altos insumos
lação e o desenvolvimento. Prioridades para na Amazônia são discrepantes com as várias
pesquisas futuras incluem o fortalecimento do limitações conhecidas na região (veja Revelle,
nosso conhecimento destes limites e das suas 1987). Organização das Nações Unidas para a
implicações para a capacidade de suporte. Alimentação e a Agricultura (FAO) sugeriu, em
1971, que a Terra pudesse sustentar 36 bilhões se
as áreas não cultivadas (inclusive a Amazônia)
CAPACIDADE DE SUPORTE HUMANO fossem convertidas para agricultura no mesmo
O termo “capacidade de suporte” tem sido nível de intensidade dos E.U.A. (Pawley, 1971).
usado por pesquisadores em biologia, antro-
pologia, geografia, manejo de pastoreio, pes- DESENVOLVIMENTO AMAZÔNICO
ca, manejo de vida selvagem e administração
empresarial com significados relacionados, Até hoje, a característica predominante
mas diferentes. O termo sempre se refere ao do desenvolvimento na Amazônia brasilei-
número de indivíduos que podem ser susten- ra (Fig. 1) é a conversão de floresta em pas-
tados em uma determinada área, mas o nível tagem (Fearnside, 1990a). Pastagem é o uso
de consumo em que eles serão sustentados e da terra que causa o máximo de impacto na

Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 96 8/18/2022 3:13:43 PM


Fósforo e a capacidade de suporte
humano na Amazônia brasileira 97

floresta, enquanto apenas sustenta uma popu- condições físicas permitem, pode ultrapassar
lação humana muito escassa (Fearnside, 1983). limites rapidamente em outras esferas quan-
Iniciativas novas podem alterar este cenário do as alocações individuais do zoneamento
significativamente. A soja está sendo promo- são consideradas juntas. Pode examinar cada
vida pelos governos nacional e estaduais. As cela em uma malha, usando um sistema de
primeiras grandes plantações estão localizadas informação geográfica (GIS), comparando o
em campos naturais próximos de Humaitá, solo, chuva, etc., com as demandas de uma
Amazonas. A Hidrovia do Rio Madeira, aberta determinada cultura agrícola, e concluir que
em março de 1997, diminuiu o custo de trans- cada cela individual pode ser alocada ao uso
porte desta parte da região para um terço do em questão, e ainda chegar a uma conclusão
seu custo anterior, mudando assim radicalmen- global que é completamente irreal.
te o quadro econômico para a agricultura mais
A FAO, em colaboração com o Fundo de
intensiva. Um armazém de 90.000 t foi inaugu-
População das Nações Unidas (UNFPA) e o
rado em Itacoatiara, Amazonas, na foz do Rio
Instituto Internacional de Análise de Sistemas
Madeira, e um segundo armazém igual é espe-
Aplicados (IIASA) estimaram a capacidade
rado em uma fase subsequente. A soja já repre-
de suporte na Amazônia e em outras áreas
senta uma cultura importante no Mato Grosso
tropicais do mundo (FAO, 1980, 1981, 1984;
e na parte oriental de Rondônia. Também é
Higgins et al., 1982). Vale a pena examinar o
planejada a expansão no cultivo da soja em
estudo da FAO/UNFPA/IIASA, uma vez que
Roraima. Mas, por ser mecanizado, esse cultivo
a ilusão embutida nele é de que a Amazônia
resulta em pouco emprego para a população.
pode ser transformada em um grande celeiro-
Decisões sobre o uso da terra baseadas -uma ideia muito anterior ao estudo da FAO/
em permitir a intensidade máxima que as UNFPA/IIASA--é um persistente e pernicioso

Figura 1. Mapa do
Brasil com locais
mencionados no texto.

Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 97 8/18/2022 3:13:44 PM


DESTRUIÇÃO E CONSERVAÇÃO
98 DA FLORESTA AMAZÔNICA

fator no planejamento brasileiro para a região. Logo após a queima [da floresta] a acidez
Os resultados do estudo contêm numerosas é neutralizada, com mudança de pH de 4 para
inconsistências obvias com a realidade, indi- acima de 6 e o alumínio desaparecendo, per-
cando que tais esforços precisam estar base- sistindo esta situação nas diversas idades de
ados em uma verdade mais fundamentada. pastos, tendo a pastagem mais velha a idade
O estudo da FAO/UNFPA/IIASA indica que a de 15 anos, localizada em Paragominas. Os
área da Amazônia brasileira é capaz de sus- elementos nutrientes tais como cálcio, mag-
tentar entre meia e uma pessoa por hectare ao nésio e potássio elevam-se na composição
atual baixo nível de insumos tecnológicos, e química do solo, e permanecem estáveis no
entre cinco e dez pessoas por hectare com al- decorrer dos anos. O nitrogênio baixa logo
tos insumos (fertilizantes, mecanização e uma após a queimada, mas, no entanto, em pou-
ótima mistura de culturas não irrigadas). Estes cos anos volta apresentar o teor semelhante
cálculos conduzem à conclusão de que o Brasil ao existente na mata primitiva.... A formação
pode sustentar uma incrível população de 7,1 de pastagens em latossólos e podzólicos de
bilhões de pessoas, se altos níveis de insumos baixa fertilidade é uma maneira racional e
forem aplicados (Higgins et al., 1982: 104). A econômica de ocupar e valorizar essas exten-
possibilidade implícita de converter a região sas áreas. (Falesi, 1974: 2.14-2.15)
em uma vasta área de agricultura mecaniza- Nas publicações originais da Embrapa,
da, com altos insumos, vai contra os limites não constava o fósforo entre os caracteres de
de disponibilidade de recursos para suprir os solo indicados como melhorando devido à
insumos, especialmente de fosfato. pastagem (Falesi, 1974, 1976), mas foi acres-
centado à lista por outras pessoas quando
Um dos fatores que conduzem aos altos
os resultados foram divulgados para o mun-
valores da capacidade de suporte que o estu-
do (ex.: Alvim, 1981). A própria Embrapa
do apontou para a Amazônia é a suposição
reconheceu que o fósforo era necessário, e
de que a qualidade do solo em áreas ainda
em 1977 mudou a sua posição de que o pas-
não cultivadas é igual à qualidade nas áreas to melhora o solo, passando a recomendar
já cultivadas. O estudo vai tão longe que ale- que a produtividade seja mantida aplican-
ga que “há evidência de que a produtivida- do 200-300 kg/ha de fertilizante de fosfato
de das reservas pode ser mais alta, mas, por (50% superfosfato simples, 50% hiperfosfa-
uma questão de simplicidade, é presumido to) (Serrão & Falesi, 1977: 55), fornecendo
que a produtividade em potencial da terra 50 kg/ha de pentóxido de difósforo. ou P2O5
nova seja igual à da terra já sob cultivo” (Serrão et al., 1978: 28). Isto foi modifica-
(FAO, 1984: 43). Infelizmente, como tam- do posteriormente, para 25-50 kg/ha de P2O5
bém é verdade na maior parte do Planeta, (Serrão et al., 1979: 220), mas recomenda-
as melhores terras são aproveitadas primeiro ções mais recentes têm sido de 50 kg/ha
para o cultivo, com a qualidade da terra di- (Corrêa & Reichardt, 1995).
minuindo progressivamente nas novas áreas
de assentamento, até que apenas terras mui- Embora a controvérsia sobre o solo sob
to marginais permanecem. pastagem possa parecer apenas um engano
passado, que pode ser consignado ao lixo da
No início dos anos 1970, quando os história, suas ramificações ainda representam
programas de incentivos fiscais para pas- uma força no desenvolvimento amazônico até
tagens amazônicas estavam se expandin- os dias de hoje. A noção de que a pastagem
do rapidamente, a agência que hoje é a melhorava o solo coincidiu com o lançamen-
Embrapa (Empresa Brasileira de Pesquisa to de um grande programa de incentivos fis-
Agropecuária) informava que o pasto me- cais para promover a conversão de floresta em
lhorava o solo. Falesi (1974: 2.14) compa- pastagem. Incentivos fiscais foram um forte
rou solos sob floresta virgem e sob pastagem motivo para o desmatamento nos anos 1970 e
de várias idades em Paragominas (Rodovia 1980. Em 25 de junho de 1991, um decreto sus-
Belém-Brasília, Pará) e na Fazenda Suiá pendeu a concessão de incentivos novos. No
Missu (norte do Mato Grosso): entanto, os incentivos antigos, já aprovados,

Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 98 8/18/2022 3:13:45 PM


Fósforo e a capacidade de suporte
humano na Amazônia brasileira 99

ainda continuam, ao contrário da impressão pastagem com cinco anos tem um conteúdo de
popular nutrida por numerosas declarações de P2O5 de 0,46 mg/100 g, e com algumas peque-
funcionários do governo dizendo que os incen- nas variações, ainda possui 0,46 mg/100 g no
tivos haviam sido finalizados. Os mais de 400 décimo ano (Falesi, 1976: 42 43), ou seja, um
projetos de pecuária já aprovados excedem em nível mais baixo do que no solo sob floresta
muito o pequeno número de projetos adicionais virgem na mesma área (0,69 mg/100 g).
que seriam acrescentados à lista a cada ano se
a aprovação de novos projetos continuasse. Grande parte do debate sobre as mudanças
do solo sobre pastagens é irrelevante à questão
As mudanças do solo notadas por Falesi da manutenção da produtividade do pasto. A
(1974, 1976) não conduziram à conclusão de pergunta importante é: os baixos valores, até
que as pastagens serão sustentáveis (Fearnside, os quais os níveis de fósforo são reduzidos
1980). Altos rendimentos de capim não podem sob pastagem, são adequados para sustentar a
ser sustentados se o crescimento for restringi- produção? A resposta é que não, como é con-
do por baixa quantidade de certos nutrientes, firmado pelos baixos rendimentos obtidos em
como o fósforo, mesmo que a quantidade de plantações, tanto experimentais como comer-
outros nutrientes seja suficiente. Usando dados ciais, onde os fertilizantes não são aplicados.
de experimentos de adubação de pastagens
em Belém (Serrão et al., 1971), foi demonstra- O custo dos suprimentos de fosfato e os li-
do que a falta de fósforo limitou o crescimen- mites absolutos dos estoques mineráveis deste
to do capim (veja Fearnside, 1979). Baixos mineral são os problemas que limitam o uso
níveis de fósforo também foram identificados de fertilizantes à base de fosfato. Um relatório
como limitantes do crescimento de capim em sobre as jazidas de fosfato no Brasil, publica-
Paragominas (Serrão et al., 1978, 1979). Os do pelo Ministério de Minas e Energia, indica
dados do estudo de Falesi na Rodovia Belém- uma única jazida pequena na Amazônia (de
Brasília (1974, 1976) mostraram uma forte ten- fato, duas jazidas próximas: Serra Pirocua e
dência descendente no nível de fósforo disponí- Ilha Trauira), situada na costa atlântica, per-
vel, depois do pico inicial que resulta da queima to da divisa entre Pará e Maranhão (de Lima,
da floresta virgem. O fósforo disponível (P2O5) 1976; também ver Fenster & León, 1978) (Fig.
é reduzido de um máximo de 4,18 mg/100 g de 2). Além do pequeno tamanho da jazida, o
solo seco na pastagem nova, para um patamar seu fósforo tem a desvantagem de ser comple-
mais baixo depois de cinco anos. O solo sob xado com o alumínio, dificultando o seu uso

Figura 2. Jazidas de
fosfatos no Brasil e nos
países vizinhos.

Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 99 8/18/2022 3:13:45 PM


DESTRUIÇÃO E CONSERVAÇÃO
100 DA FLORESTA AMAZÔNICA

agrícola, embora não seja impossível desenvol- fertilizante para ser mantido). Se fossem fer-
ver novas tecnologias para fabricação de fer- tilizados todos os 400 × 106 ha de área ori-
tilizantes (dos Santos, 1981: 178). Uma jazida ginalmente florestada na Amazônia Legal à
adicional foi descoberta no Rio Maecuru, per- taxa recomendada para pastagem, requereria
to de Monte Alegre, Pará, com a estimativa do anualmente 8,00 × 106 t de P2O5. Se todas as
seu tamanho ainda incompleta (Beisiegel & de reservas de fosfato do Brasil fossem dedicadas
Souza, 1986). Quase todos os fosfatos do Brasil a este propósito, elas durariam 81 anos para
estão no Estado de Minas Gerais, um local mui- manter em pastagem a área atualmente desma-
to distante da maior parte da Amazônia. tada (uma área do tamanho da França), e só 11
anos se o resto da área originalmente floresta-
O Brasil não é dotado de um estoque par-
da também fosse convertido em pastagem. No
ticularmente grande de fosfato. Por exemplo,
entanto, as jazidas de fosfatos do Brasil já são
os E.U.A. tem depósitos aproximadamente 20
quase totalmente comprometidas para manter
vezes maiores (de Lima, 1976: 26). Em uma
a produção agrícola fora da Amazônia Legal.
escala global, a maioria das jazidas de fos-
fatos fica situada na África (Sheldon, 1982).
A continuação das tendências prevalecentes FOSFATO COMO UM FATOR LIMITANTE
desde a Segunda Guerra Mundial, em uso de
fosfato, esvaziaria os estoques mundiais até Agricultura
os meados do século XXI (Smith et al., 1972;
E.U.A., CEQ & Department of State, 1980). O fósforo (P) é baixo em praticamente
Embora uma extrapolação simples destas todos os solos na Amazônia brasileira, até
tendências seja questionável devido aos li- mesmo incluindo os tipos relativamente
mites sobre a continuação do aumento da férteis, tais como nas ocorrências de terra
população humana às taxas passadas (Wells, roxa (Alfissolo) nas áreas de colonização ao
1976), a conversão de uma porção significa- longo de partes da Rodovia Transamazônica
tiva da Amazônia em pasto fertilizado acele- no Pará e da Rodovia BR-364 na Rondônia.
raria em muito o término do fosfato no Brasil Na Rodovia Transamazônica, ao oeste de
e no mundo. Para o Brasil, seria sábio pon- Altamira, uma área de estudo de 23.600 ha,
derar cuidadosamente se os seus estoques um estudo baseado em 187 amostras de solo
remanescentes deste recurso limitado devem em floresta virgem indicou que 83% da área
ser alocados a pastagens amazônicas. tem solo com < 1 ppm de P disponível nos
20 cm superiores do solo, e 91% tem P total
Um cálculo grosseiro pode ser feito da sufi- ≤ 2 ppm, determinado usando a solução ex-
ciência das reservas brasileiras de fosfato para tratora de Carolina do Norte, que é o proce-
sustentar pastagens na Amazônia. Reservas dimento padrão para determinações de fós-
brasileiras de rocha de fosfato totalizam 780,6 foro disponível no Brasil (Fearnside, 1984).
× 106 t, com um conteúdo de P2O5 médio
de 12% (de Lima, 1976: 24), não contando Uma variedade de características e proces-
a jazida de Maecuru, ainda sendo avaliada. sos do solo determina a quantidade de fósfo-
Descontando perdas de 8% de P2O5 na trans- ro disponível. A disponibilidade de fósforo
formação da rocha em fertilizante de fosfato em Ultissolos geralmente é muito baixa, pois
(de Lima, 1976: 10), isto representa 86,2 × 106 a maioria do P se encontra em compostos al-
t de P2O5. Os 53,0 × 106 ha de floresta des- tamente insolúveis de ferro (Fe) e de alumínio
matada até 1997 na Amazônia Legal (Brasil, (Al) (Kamprath, 1973: 139). Geralmente, valo-
INPE, 1998) consumiriam anualmente 1,06 × res de pH abaixo de 5,5 são associados à dimi-
106 t de P2O5 se mantidos em pastagem. Isto nuição acentuada na disponibilidade do fósfo-
presume que são fertilizadas as pastagens uma ro (Young, 1976: 299; veja revisão em Jordan,
vez a cada 2,5 anos (Serrão et al., 1979: 220), 1985: 79). O carbono orgânico e o Óxido de ferro
à dose de 50 kg/ha de P2O5, considerando o (Fe2O3) são ambos relacionados positivamente
nível crítico mínimo como sendo de 5 ppm de ao fósforo disponível em Oxissolos brasileiros
P2O5 no solo (em vez do nível crítico tradicio- (Bennema, 1977: 43). Micorrizas são importan-
nal de 10 ppm, o que exigiria doses anuais de tes na mobilização do P em formas disponíveis

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Fósforo e a capacidade de suporte
humano na Amazônia brasileira 101

(St. John, 1985). Associações de micorrizas fo- Manaus, presumiu-se que o nitrogênio N era
ram encontradas em muitas, mas não em todas, o fator limitante para a floresta como um
das poucas espécies de árvores amazônicas que todo (Biot et al., 1997: 284). Esta suposição,
têm sido examinados (St. John, 1980). provavelmente é uma consequência da falta
de literatura sobre outros nutrientes, e indi-
Quando o P está em formas disponíveis, o
ca a necessidade de pesquisas para quantifi-
processo de fixação converte isto em comple-
car as ligações dos outros caracteres do solo
xos indisponíveis com Fe e Al. Geralmente os
com o crescimento das árvores.
Oxissolos na Amazônia não são considerados
fortes fixadores de P (Cochrane & Sánchez, As leguminosas arbóreas podem fixar ni-
1982: 153). A fixação de fósforo depende das trogênio com a ajuda de bactérias simbiônti-
características do solo: a matéria orgânica im- cas, fato que, provavelmente, representa para
pede a fixação de P, enquanto baixos valores de os membros desta superfamília uma vanta-
pH favorecem à fixação (Bennema, 1977: 44). A gem competitiva em relação às espécies de
taxa de fixação de fósforo (em seis horas a 100 famílias que não possuem esta capacidade.
ppm de P) varia de 26,8 a 51,6% em solos repre- Isto explica, em parte, o fato de que as legu-
sentativos da Amazônia brasileira (Fassbender, minosas são um grupo comum nas florestas
1969). Estas taxas não são altas pelos padrões amazônicas; porém, nas reservas próximas
de muitos Oxissolos e Ultissolos tropicais, po- de Manaus, mantidas pelo Projeto Dinâmica
rém mais fósforo é perdido por meio da fixação Biológica de Fragmentos Florestais (PDBFF)
quando as taxas de aplicação de fertilizante são do INPA e o Instituto Smithsonian, as famí-
baixas (i.e., nos níveis mais prováveis de apli- lias Burseraceae, Sapotaceae e Lecythidaceae
cação). Em terra roxa (Alfissolos) em Altamira, são todas mais comuns que Leguminosae
Pará, o melhor tipo de solo de terra firme na re- (Rankin-de-Merona et al., 1990: 574). Isto
gião (fora das ocorrências, muito pequenas, de leva a crer que, embora o N seja, indubita-
terra preta antropogênica), até 83% do P apli- velmente, importante, não pode ser presu-
cado são fixados em sete dias a uma baixa taxa mido que este elemento esteja controlando o
de aplicação (53 ppm P) (Dynia et al., 1977). A crescimento da floresta.
toxicidade do alumínio age, em parte, por meio
As florestas amazônicas recebem uma
do P, já que o alumínio tende a acumular nas
parte significante do P que elas dispõem
raízes e impede a absorção e translocação de P
proveniente da poeira africana transportada
e cálcio (Ca) até as porções aéreas das plantas
por ventos sobre o Oceano Atlântico (Swap
(Sánchez, 1976: 231).
et al., 1992). A quantidade de poeira é au-
mentada pelo sobre-pastoreio e outros usos
Manejo florestal da terra, além de mudanças de uso da terra
na África e por um clima caracterizado por
As baixas perspectivas de sustentar gran-
eventos severos de seca. Nutrientes também
des áreas de pastagens, são uma razão para o
são transportados em forma de fumaça e
manejo florestal para produção de madeira ser
partículas de cinza das queimadas em sava-
frequentemente sugerido como o melhor uso
nas, possivelmente incluindo as queimadas
de grandes áreas de floresta. Apesar de tais
na África (Talbot et al., 1990). Não é conhe-
recomendações, barreiras econômicas impe-
cido até que ponto estas fontes de nutrien-
dem a manutenção de floresta sobre sistemas
tes podem aumentar a taxa de crescimento
de manejo sustentáveis ao longo de uma su-
das florestas amazônicas. Sem dúvida, os
cessão de ciclos (Fearnside, 1989b). Precisa-
aumentos diferem entre as espécies de árvo-
se considerar se o P é um limite adicional.
re, potencialmente levando a alterações na
Frequentemente tem sido presumido que composição da floresta (Fearnside, 1995).
o nitrogênio limita o crescimento da floresta.
Por exemplo, em um modelo desenvolvido Papel ambiental da floresta
pelo projeto BIONTE (Biomassa e Nutrientes)
para a “Bacia Modelo” do Instituto Nacional A floresta amazônica tem um valor
de Pesquisas da Amazônia (INPA), perto de significante em diferentes maneiras do

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DESTRUIÇÃO E CONSERVAÇÃO
102 DA FLORESTA AMAZÔNICA

fornecimento de madeira ou da abertura do prazo da agricultura e atividades de pecuária


caminho para a expansão da agricultura e a na Amazônia, quais são as lições que devería-
pecuária. Esta floresta fornece serviços am- mos tirar disto? O que estaria limitando caso os
bientais, pelos quais ninguém paga nada no suprimentos infinitos de fosfato se tornassem
momento, que excedem em muito o valor do disponíveis ou se fosse descoberta uma cultura
retorno financeiro dos produtos tradicionais maravilhosa que não requeresse praticamente
da exploração. Estes serviços incluem a ma- nada de fósforo? Tem sido argumentado que o
nutenção da biodiversidade, o armazenamen- impacto ambiental de converter uma porção
to de carbono (evitando o efeito estufa) e a grande da Amazônia em agricultura ou pecu-
ciclagem de água. Com uma negociação bem ária vai (ou deve) levar os tomadores de deci-
conduzida e mecanismos institucionais apro- são a dar passos para evitar uma transformação
priados, o aproveitamento do valor destes desse tipo, até mesmo se tais desenvolvimentos
serviços poderia fornecer uma base sustentá- improváveis fossem se materializar (Fearnside,
vel de sustento para a atual população rural 1997a). A lição principal do fósforo limitado não
na Amazônia brasileira (Fearnside, 1997b). é que mais pesquisas de fisiologia de planta são
necessárias, mas que nós precisamos aprender
Se o P limitar o crescimento de biomassa na
a viver dentro deste e de outros limites.
floresta, então, este elemento pode ser relevante
ao papel ambiental da floresta, particularmente Quando confrontados com a existência
no armazenamento de carbono. Uma contro- de um fator limitante, a reação normal por
vérsia relativa ao efeito estufa é até que ponto parte de tomadores de decisão e de pesquisa-
a fertilização causada por concentrações atmos- dores é de concentrar os esforços na procura
féricas mais altas de dióxido de carbono (CO2 de uma maneira para superar a limitação. A
poderia resultar na absorção de carbono pela pergunta de se o limite deveria ou não ser
floresta, estimulando o acúmulo de biomassa. combatido, no primeiro lugar, normalmente
Se isso acontece ou não depende da existên- nem mesmo é considerada. No entanto, esta
cia de outros fatores limitantes que restringem pergunta básica sempre deve ser respondida,
o crescimento da floresta. Medina & Cuevas antes que qualquer esforço seja feito para
(1996) argumentaram que o efeito das concen- superar uma limitação. O simples reflexo de
trações mais altas de CO2 seria um aumento na que todo fator limitante deve ser combatido
eficiência do uso de água e de nutrientes, o que é tanto desperdiçador como pouco inteligen-
resultaria no aumento do crescimento da flores- te. Uma vez que informações pertinentes são
ta, especialmente durante a estação seca. Estes organizadas e interpretadas, podendo ser
autores argumentam que parte do fotosintato comparados a efetividade, o custo, e os efei-
adicional seria alocada para raízes e exsudatos tos colaterais sociais e ambientais de atacar
da raiz, o que poderia, a longo prazo, ajudar a os diferentes limites.
relaxar as limitações de nutrientes do solo sobre Uma reação comum é ver como dados a
o crescimento. Se o fósforo estivesse limitando o atual distribuição altamente desigual da posse
crescimento durante qualquer período do ano, da terra e qualquer decisão baseada em argu-
por exemplo, durante a estação chuvosa, quan- mentos militares ou geopolíticos, e só concen-
do outras limitações são relaxadas, então este trar as atenções sobre avanços técnicos contra
elemento teria um papel no equilíbrio global de restrições de solo. Eu sugiro que sejam “dadas”
carbono. O fósforo também teria uma influên- muito mais restrições relacionadas ao solo e às
cia no papel da Amazônia no equilíbrio global condições físicas, do que as que são resulta-
de carbono, caso o P limitasse o crescimento de do da hierarquia social do País e da tomada
floresta secundária em pastagens degradadas de decisão, sendo que nesta última categoria
(Fearnside & Guimarães, 1996). é onde a atenção deveria ser focalizada. Quais
são os ingredientes de uma decisão racional
LIÇÕES DE LIMITAÇÕES DE FOSFATO sobre a pergunta de tentar ou não superar uma
limitação sobre o desenvolvimento? O ponto
Dado que o fosfato representa um fa- de partida deve ser uma definição clara dos
tor limitante para a sustentabilidade a longo objetivos do desenvolvimento. Por exemplo,

Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 102 8/18/2022 3:13:46 PM


Fósforo e a capacidade de suporte
humano na Amazônia brasileira 103

se o objetivo do desenvolvimento for fornecer aumentarão exponencialmente a 1,5-2,0%/


um meio de suporte sustentável às populações ano (veja Fearnside, 1996a). A ideia de que o
da região, então fornecer fertilizantes resultará crescimento exponencial é uma opção é enga-
em pouco benefício devido ao aumentando da nosa, e a noção de que se pode selecionar isto
produtividade ou da longevidade das pasta- como se fosse a escolha de um produto na pra-
gens nas grandes fazendas de pecuária. Muitos teleira de um supermercado é ainda mais peri-
esforços para afastar limites na produção de gosa. Na realidade, os rendimentos brasileiros
culturas agrícolas têm como razão sustentar por hectare tradicionalmente têm sido quase
uma população cada vez maior de agriculto- constantes, com os aumentos na colheita total
res, por exemplo, dos imigrantes de outras par- sendo obtidos por meio da expansão das áreas
tes de Brasil que vêm para a Amazônia. Isto sob cultivação (Paiva et al., 1976: 62-68).
não está necessariamente nos melhores inte- A aplicação de fertilizantes é apenas uma
resses da população atual da Amazônia e os das maneiras de enfrentar as limitações de
seus descendentes. Seria melhor reconhecer fertilidade do solo. Precisa-se considerar até
que a capacidade da Amazônia para sustentar que ponto as perspectivas agrícolas da área da
a população é limitada, e guiar o desenvolvi- floresta amazônica mudariam se outros tipos
mento de tal modo que o tamanho da popula- de avanços técnicos vieram a acontecer. Por
ção e os impactos ambientais sejam mantidos exemplo, progresso recente tem sido alcança-
dentro desses limites (Fearnside, 1997c). do na remoção de limitações de saturação de
Não existe desenvolvimento sustentável alumínio, através do desenvolvimento de plan-
para um número infinito de pessoas, nem tas transgênicas (Barinaga, 1997; de la Fuente
para uma população fixa que esteja infini- et al., 1997). Não é inconcebível que limita-
tamente ávida. Muitos limites físicos repre- ções de P pudessem ser relaxadas por meio
sentam restrições e precisam ser respeita- do desenvolvimento de variedades de culturas
dos, devendo-se conviver com eles, em vez com associações apropriadas de micorrizas.
de ver os limites como uma agenda de itens Podem ser relaxadas limitações de N de várias
a serem atacados. O reconhecimento deste culturas de não leguminosas, por meio de re-
fato força as pessoas a enfrentarem os pro- lações pseudo-simbiônticas com diferentes ti-
blemas fundamentais do desenvolvimento, pos de bactérias fixadoras de N, uma área na
sobre os quais muitos prefeririam não pen- qual foram alcançados avanços significantes
sar, resultando em uma tendência para negar no Brasil pelo trabalho de Johanna Döbereiner
a existência de limites. Admitir ao potencial (por exemplo Döbereiner, 1992).
finito do bolo para crescer não condena o Os solos na Amazônia são claramente es-
pobre à pobreza, mas sim condena o rico a téreis: indicadores de fertilidade do solo, tais
dividir o bolo (Fearnside, 1993b). como pH, capacidade de troca catiônica, bases
trocáveis totais e fósforo disponível, são baixos,
enquanto a saturação de alumínio é alta. Sob
PRIORIDADES DE PESQUISA FUTURAS tais circunstâncias, é lógico manter estas áreas
É sempre forte a tentação de acreditar que em floresta, em vez de convertê-las a usos de
a pesquisa removerá praticamente todos os terra de baixa produtividade e curta duração.
limites do desenvolvimento, e não há nenhum Mas até que ponto a situação seria diferente se
lugar onde tais voos de imaginação estão mais os solos fossem mais produtivos? Que nível de
livres de correr soltos do que na Amazônia. É qualidade de solo faria com que valesse a pena
fácil para os planejadores se convencerem que sacrificar a floresta? Não há nenhuma respos-
os rendimentos das culturas podem aumentar ta simples a estas perguntas. Uma tomada ra-
indefinidamente, e que eles podem aumentar cional de decisão requereria uma avaliação do
de forma exponencial. Recentemente, Gallopín valor de ambos, a produção agrícola que pode
& Winograd (1995: 27) chegaram a uma con- ser esperada da área (de forma realista) e o
clusão otimista com relação às perspectivas custo ambiental de sacrificar a floresta.
para um “cenário sustentável”, presumindo “Precisamos de mais pesquisas” não é
que os rendimentos por hectare das culturas a principal conclusão a ser tirada da atual

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DESTRUIÇÃO E CONSERVAÇÃO
104 DA FLORESTA AMAZÔNICA

revisão. Embora mais pesquisas realmente REFERÊNCIAS


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Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 104 8/18/2022 3:13:46 PM


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Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 106 8/18/2022 3:13:46 PM


CAPÍTULO

7
Solo e desenvolvimento na Amazônia:
Lições do Projeto Dinâmica Biológica
de Fragmentos Forestais

Philip M. Fearnside & Niwton Leal Filho


Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia – INPA
Av. André Araújo, 2936 – CEP: 69.067-375, Manaus, Amazonas, Brasil.
E-mail: pmfearn@inpa.gov.br

Tradução de:
Fearnside, P.M. & N. Leal Filho. 2001. Soil and development in Amazonia: Lessons from the
Biological Dynamics of Forest Fragments Project. p. 291-312 In: R.O. Bierregaard, C. Gascon,
T.E. Lovejoy & R. Mesquita (Eds.) Lessons from Amazonia: The Ecology and Conservation of a
Fragmented Forest. Yale University Press, New Haven, Connecticut, E.U.A. 478 p.

107
Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 107 8/18/2022 3:13:53 PM
DESTRUIÇÃO E CONSERVAÇÃO
108 DA FLORESTA AMAZÔNICA

RESUMO qualquer área agrícola. Quando se decide


incentivar atividades agrícolas em áreas
A análise dos solos de uma área de 1.000 com solos inadequados a este propósito,
km2, onde estão localizadas as reservas do pode se esperar o fracasso das colheitas. Na
Projeto Dinâmica Biológica de Fragmentos Amazônia, freqüentemente, decisões sobre
Florestais (PDBFF) (aproximadamente 80 km a ocupação de vastas áreas de terra são to-
ao norte de Manaus, Amazonas), fornece in- madas sem que haja o mínimo de informa-
formações detalhadas, essenciais aos planos de ção necessária sobre a qualidade das terras
desenvolvimento sugeridos por agências gover- disponíveis. Por exemplo, quando o Projeto
namentais, como por exemplo, o zoneamento POLONOROESTE abriu Rondônia ao assen-
econômico-ecológico da região, atualmente sen- tamento por meio de um programa de desen-
do realizado pelo governo brasileiro. O solo nas volvimento regional financiado pelo Banco
reservas é típico de vastas áreas da Amazônia Mundial, centrado ao redor da pavimenta-
brasileira, sujeitas a uma ameaça crescente de ção da rodovia BR-364 (Cuiabá-Porto Velho),
desmatamento objetivando a implantação de a informação sobre solos disponível para
atividades agrícolas e pecuárias. Estes solos, Rondônia (Brasil, Projeto RADAMBRASIL,
ácidos e de baixa fertilidade, possuem níveis 1978: Vol. 16) baseava-se em apenas 85
tóxicos de alumínio e limitações impostas pela amostras de solo.
topografia, sendo ainda extremamente argilosos
e com elevada capacidade de retenção hídrica. Evento similar ocorre hoje nas proxi-
Assim, o potencial agrícola pode ser considera- midades das reservas do Projeto Dinâmica
do baixo e, diante das alterações nos padrões do Biológica de Fragmentos Florestais (PDBFF):
uso do solo na região, são extremamente nega- em 24 de junho de 1997, o presidente
tivas as perspectivas de manutenção da capa- Fernando Henrique Cardoso anunciou em
cidade de resiliência do ecossistema natural. O seu programa de rádio semanal “Palavra do
solo sob a floresta indica o tipo de impacto am- Presidente” que seis milhões de hectares
biental esperado ao converterem-se estas áreas (ha) ao longo da rodovia BR-174 (Manaus-
para pastagens e outros usos, inclua-se aqui o Caracaraí) seriam abertos ao assentamento,
potencial para liberação de gases de efeito estu- e sugeriu que a área cultivada seria “tão co-
fa (que depende da biomassa da floresta, uma lossal que duplicaria a produção agrícola na-
característica relacionada com a distribuição cional” (de Cássia, 1997). Apesar do prová-
de vegetação natural e com a potencialidade vel exagero em relação à produção esperada
dos solos para o desenvolvimento vegetal) e os e à área a ser ocupada, a intenção de iniciar
efeitos negativos da criação de fragmentos flo- um grande programa de assentamento na ro-
restais e da mudança climática sobre a floresta. dovia BR-174 parece ser real. O anúncio do
Os resultados sugerem que áreas como esta pro- programa de assentamento na BR-174 veio
duziriam pouco se convertidas para agricultura de surpresa, já que a pavimentação da rodo-
ou pecuária, e tornam claro que os usos que via (em 1996 e 1997) havia sido apresentada
mantenham a cobertura florestal intacta seriam como um corte cirúrgico pela floresta, per-
preferíveis. O valor dos serviços ambientais mitindo à cidade de Manaus incrementar o
fornecidos pela floresta original ultrapassa em comércio com a Venezuela e ter acesso aos
muito os lucros que podem ser esperados da portos daquele país.
agricultura ou da pecuária. Antes do anúncio do projeto agrícola da
BR-174, não havia sido realizado nenhum
estudo sobre o potencial agronômico dos
INTRODUÇÃO
solos, muito menos uma avaliação do pro-
Relevância dos solos para o vável impacto ambiental. Assim, como para
planejamento a maior parte da Amazônia brasileira, as in-
formações sobre as características dos solos
A qualidade do solo é obviamente um usadas nos planos de desenvolvimento são
parâmetro fundamental na definição do po- essencialmente limitadas aos resultados do
tencial de produção e sustentabilidade de Projeto RADAMBRASIL que, no início dos

Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 108 8/18/2022 3:13:53 PM


Solo e desenvolvimento na Amazônia: Lições do
Projeto Dinâmica Biológica de Fragmentos Forestais 109

anos setenta, mapeou o solo, a vegetação e Latossolos Amarelos Álicos, similares aos
outras características com base em imagens “Allic Haplorthoxes” (Oxisols) na taxono-
do radar aerotransportado de perscruta late- mia de solos dos EUA e “Ferralsols Haplic
ral (SLAR) (Brasil, Projeto RADAMBRASIL, ou Xanthic” no sistema FAO/UNESCO (veja
1976: Vol. 10, 1978: Vol. 18). As imagens Beinroth, 1975). A classificação como um
originais foram obtidas em uma escala de Latossolo(1) relacionasse ao tipo de minerais de
1:250.000 e as imagens publicadas em uma argila presente no solo. As quantias relativas,
escala de 1:1.000.000. Áreas com aspecto se- presentes na fração argilas, de minerais como
melhante foram agrupadas na mesma unida- silicato (caolinita), ferro (goetita) e alumínio
de de classificação, ocorrendo uma posterior (gibsita) determinam a estabilidade estrutural,
visita de verificação no campo para caracte- a fertilidade natural e o efeito da aplicação de
rizar a vegetação e os solos em muitas destas fertilizantes (Sombroek, 1966: 73).
unidades. A área da BR-174 foi identificada Os Latossolos são os solos mais comum
pelo governo do Estado do Amazonas como na bacia amazônica, cobrindo 220 milhões de
uma prioridade para zoneamento econômi- há, ou 45,5% de sua área total (inclusive áreas
co-ecológico (Pinheiro, 1997). fora do Brasil); a maioria da área restante está
A porção do BR-174 a ser aberta para coberta por solos classificados como Podzólicos
agricultura está localizada sobre o Escudo (como o Podzólico Vermelho-Amarelo da
das Guianas, e, portanto, pode se esperar nomenclatura brasileira), cobrindo 142 mi-
que seja mais fértil do que os solos de origem lhões de ha ou 29,4% de sua área (Cochrane
sedimentar que ocorrem nas áreas das re- & Sánchez, 1982: 152). Os Latossolos distin-
servas do PDBFF. No entanto, o Movimento guem-se dos Podzólicos por não apresentarem
dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) uma elevação no conteúdo de argila nas ca-
invadiu recentemente algumas fazendas madas mais profundas do solo; comparado ao
no Distrito Agropecuário da SUFRAMA horizonte A, os Podzólicos têm cerca de 20%
(Superintendência da Zona Franca de a mais no conteúdo de argila no horizonte sub-
Manaus), onde também se localizam as fa- superficial (horizonte B) (E.U.A., Department
zendas que abrigam as reservas sendo estu- of Agriculture, Soil Survey Staff, 1975). De
dadas pelo PDBFF, elevando assim a possi- forma generalizada, os Podzólicos são consi-
bilidade de que algumas destas possam ser derados menos apropriados que os Latossolos
utilizadas no futuro para o assentamento de para a agricultura mecanizada devido à sus-
pequenos agricultores (Pacífico, 1997). cetibilidade à compactação e à sua ocorrência
freqüente em áreas de topografia acidentada
Classificação de solos (Sánchez, 1977: 539). No entanto, o amplo es-
pectro de características envolvidas por esses
As reservas de PDBFF estão situadas a 80 grandes grupos de solos (como ilustrado, por
km ao norte de Manaus (2°30’S, 60°O), dis- exemplo, pelos resultados do presente estudo)
tribuindo-se por várias fazendas que englo- indica a necessidade de cautela na aplicação
bam uma área de 20 × 50 km (1.000 km2). de tais generalizações nas decisões específicas
A altitude local é de aproximadamente 50-100 de manejo dos solos (veja Fearnside, 1984).
m acima do nível médio do mar; a tempera-
O Latossolo Amarelo e o Podzólico verme-
tura média anual em Manaus é 26,7°C e a
lho-amarelo (Oxissolo e Ultissolo) freqüente-
pluviosidade média anual (média de 30 anos)
mente ocorrem em proximidade íntima na
é de 2.186 mm, com uma estação seca de três
Amazônia, além de existir uma intergradação
meses que dura de julho a setembro (Lovejoy
muito próxima entre eles (Sombroek, 1966:
& Bierregaard, 1990). A área onde estão loca-
68). Perfis de solos analisados nas proximi-
lizadas as reservas do PDBFF apresenta ca-
dades do local do estudo confirmam isto
racterísticas ambientais que podem ser consi-
(Ranzani, 1980, Chauvel, 1982). No entanto,
deradas típicas para a Amazônia central.
já que Latossolos e Podzólicos se assemelham
Os mapas do RADAMBRASIL classifi- em relação a acidez e baixa fertilidade, sen-
cam os solos das reservas do PDBFF como do indistinguíveis sem que haja informação

Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 109 8/18/2022 3:13:53 PM


DESTRUIÇÃO E CONSERVAÇÃO
110 DA FLORESTA AMAZÔNICA

sobre diferenças no conteúdo de argila encon- uso da terra na Amazônia brasileira; na re-
trado no horizonte B (que está fora da zona alidade, nem mesmo este nível de detalhe é
das raízes da maioria das culturas agrícolas), considerado quando são tomadas muitas des-
as diferenças taxonômicas entre eles geral- tas decisões. Talvez o exemplo mais gritante
mente têm pouca relevância para a agricultu- deste fato seja o desprezo completo dos ma-
ra na forma praticada na Amazônia. pas de solo demonstrado quando da tomada
As reservas do PDBFF ficam situadas a de decisão, por parte do governo, sobre a lo-
aproximadamente 50 km ao sul do limite do calização dos assentamentos em áreas pouco
Escudo das Guianas (a hidrelétrica de Balbina promissoras para agricultura em Rondônia
fica situada no limite do Escudo). Sendo as- (Fearnside, 1986a).
sim, as reservas estão dentro da bacia delimi-
tada pelos Escudos Brasileiro e das Guianas. Variabilidade dos solos
Esta bacia ocupa aproximadamente 1,2 × 106
km2 no Brasil, ou aproximadamente 25% dos O levantamento de solos na área do
5 × 106 km2 da Amazônia Legal brasileira. Os PDBFF oferece uma oportunidade única para
solos são derivados de depósitos sedimenta- avaliar a variabilidade em escala fina dos so-
res do fundo de um mar raso que ocupou o los amazônicos e o potencial significado des-
centro da bacia amazônica durante o Terciário ta variabilidade para os planos de desenvol-
(Falesi, 1974; Jordan, 1985), compondo a vimento. Pode-se esperar que a variabilidade
Formação Alter do Chão (antigamente cha- em escala fina afete o sucesso de empreen-
mada de Formação Barreiras). Os solos deri- dimentos agrícolas e as características da ve-
vados destes sedimentos foram expostos ao getação natural, tanto influenciando a ocor-
clima tropical ao longo de grande parte dos rências das espécies arbóreas (e, portanto,
60 milhões de anos, desde que a região foi outras formas de vida), assim como o nível
drenada pelo efeito da elevação dos Andes; de estresse ao qual se submetem as árvores
com isso, a maioria dos nutrientes dos solos quando isoladas em fragmentos florestais.
foi perdida por lixiviação (Sombroek, 1984). A variabilidade nas características origi-
Solos mais jovens, tais como aqueles deriva- nais do solo, entre outros fatores, é um ele-
dos de pedras ígneas no Escudo das Guianas mento chave na determinação da capacidade
e no Escudo Brasileiro, têm fertilidade mais de suporte humano de determinada região
alta que os da área do PDBFF, embora eles (Fearnside, 1986b). Na área de colonização
também estejam longe de ser classificados da rodovia Transamazônica, por exemplo,
como férteis para agricultura. os solos variam de níveis de fertilidade se-
Os processos históricos gerais envolvidos melhantes a aqueles encontrados na área do
na origem dos solos estão estreitamente as- PDBFF até níveis consideravelmente mais
sociados com sua fertilidade global. No caso elevados em áreas de terra roxa (Alfisol), as-
do solo da área do PDBFF, esta história eli- sim como em muitas das manchas menores
mina a possibilidade de ocorrência de solos de terra preta do índio (Fearnside, 1984). A
de alta fertilidade, com exceção de pequenas ocorrência de manchas férteis de solos, até
manchas de terra preta de índio (solo antro- mesmo em pequenas áreas, é importante no
pogênico originário da ação de populações in- sucesso da agricultura dos colonos, assim
dígenas) que não foram encontradas na área como é a habilidade dos agricultores em lo-
do projeto. No entanto, uma grande variação calizar estas manchas através da identifica-
em algumas características dos solos pode ser ção das espécies florestais indicadoras que
observada dentro de determinada área, como sobre elas crescem (Moran, 1981).
é o caso das reservas de PDBFF, consideradas
como uma superfície com características uni- Zoneamento econômico-ecológico
formes de solo na escala utilizada pelo levan-
tamento do Projeto RADAMBRASIL, o nível A constituição brasileira de 1988 exige o es-
máximo de detalhe considerado atualmente tabelecimento e a observância do zoneamen-
nas decisões originadas do planejamento de to econômico-ecológico do país nas decisões

Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 110 8/18/2022 3:13:53 PM


Solo e desenvolvimento na Amazônia: Lições do
Projeto Dinâmica Biológica de Fragmentos Forestais 111

sobre uso da terra. Esta exigência foi apoiada do Brasil (PPG-7), com verbas administradas
pela bancada ambientalista composta por dele- pelo Banco Mundial.
gados constituintes, sendo entendida como um
Aumentar o nível de detalhe dos dados
grande passo na redução das probabilidades
sobre características como vegetação e solos
de ocorrência de impactos ambientais exces-
é, obviamente, importante para aumentar o
sivos, como aqueles que resultam dos planos
grau de confiança nas conclusões do zone-
de desenvolvimento que implicam em desma-
amento. Além disso, é importante alcançar
tamentos nas áreas de Florestas Tropicais. No
um melhor entendimento de como evoluir da
entanto, a questão do zoneamento logo se tor-
escala dos mapas gerais de zoneamento para
nou controversa, com os Governos estaduais
uma variação em escala fina existente ao ní-
implementando o zoneamento principalmente
vel do solo, onde as ações acontecem de fato.
como um meio para “abrir” novas áreas para
o desenvolvimento, ao invés de adotá-lo como Uma abordagem proposta para interpre-
ferramenta para conter os excessos cometidos tar as informações sobre solos em conjunto
em nome desse pretenso desenvolvimento com aquelas sobre vegetação, topografia e
(veja Fearnside & Barbosa, 1996, para exem- outras características refere-se as “unidades
plos de Roraima). de terra” (Sombroek, 1966; veja Sombroek et
Após a constituição de outubro de 1988, al., 2000). Unidades de terra usam conjun-
estabeleceu-se uma contenda interinstitucio- tos destes caracteres que coocorrem natural-
nal pelo controle do processo de zoneamen- mente como a base para definir as categorias
to a nível federal; os principais interessados nas quais a paisagem é dividida para propó-
eram o Instituto Brasileiro de Geografia e sitos de planejamento.
Estatística (IBGE), a Empresa Brasileiro de
Pesquisa Agropecuária (EMBRAPA), e o Importância das propriedades do solo
Ministério da Ciência e Tecnologia (MCT)
Textura do solo
(Régis, 1989). O assunto foi resolvido por um
decreto presidencial em 1991, que apontou Uma das características mais importan-
como responsável a Secretaria de Assuntos tes do solo é a sua textura, definida princi-
Estratégicos (SAE), antigo Serviço Nacional palmente pela proporção das frações de areia
de Informações (SNI): uma agência de infor- e argila. Solos muito arenosos podem ser
mação interna envolvida em muitas ações prejudiciais ao crescimento das plantas, de-
polêmicas. Esta decisão institucional pode vido a sua baixa capacidade de retenção de
afetar, potencialmente, tanto a prioridade cátions (moléculas de carga positiva como
dada às preocupações ambientais como o Ca2+, Mg2+, K+ e Na+, necessárias ao de-
grau de participação popular no processo de senvolvimento vegetal). Assim, nestes solos,
zoneamento. os cátions são facilmente perdidos por lixi-
A metodologia a ser utilizada no zone- viação, resultando em um solo estéril. Além
amento foi motivo de muitas controvérsias. disso, os solos arenosos possuem uma baixa
Uma série de mapas com informações ge- capacidade de retenção de água, expondo os
rais foi preparada em uma escala de 1:2,5 vegetais ao estresse hídrico durante os perí-
milhões, usando os dados do levantamen- odos mais secos. Os solos argilosos apresen-
to RADAMBRASIL; a coleta de dados no- tam maior capacidade de retenção catiônica,
vos não foi empreendida para estes “mapas principalmente porque o conteúdo de argila
diagnósticos”, mas alguma outra coleta de é positivamente correlacionado com a maté-
dados adicionais está prevista em projetos ria orgânica. A fração argila em si também
de zoneamento desenvolvidos por alguns retém os cátions, independente de seu con-
Governos estaduais. Os projetos de zonea- teúdo de matéria orgânica. A matéria orgâni-
mento e o fortalecimento das agências es- ca é especialmente importante para definir a
taduais que começaram a realizá-los está capacidade de troca catiônica (CTC) em so-
sendo feito com a ajuda do Programa Piloto los com minerais de argila de baixa ativida-
para a Conservação das Florestas Tropicais de, tais como os Latossolos e Podzólicos da

Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 111 8/18/2022 3:13:53 PM


DESTRUIÇÃO E CONSERVAÇÃO
112 DA FLORESTA AMAZÔNICA

Amazônia (Lenthe, 1991: 121). A capacidade o conteúdo de argila e de alumínio. Assim,


de troca catiônica é uma estimativa do nú- como a presença da argila beneficia o desen-
mero dos sítios de carga negativa presentes volvimento das plantas, pode-se esperar uma
na superfície das moléculas de argila e de associação positiva entre os níveis de alumí-
húmus; estes sítios podem ser ocupados por nio e o desenvolvimento vegetal, embora o
elementos necessários à nutrição das plan- efeito do alumínio por si só seja negativo.
tas (Ca2+, Mg2+, K+ e Na+) ou por íons que
Solos extremamente argilosos podem im-
competem com estes em solos ácidos (H+,
por um impedimento físico ao crescimento
Al3+ e Fe2+, apesar de que, somente os dois
das raízes dos vegetais. Por exemplo, para
primeiros são incluídos na CTC).
o plantio de citros são preferíveis solos que
A fração argila também retém melhor a apresentem certa porcentagem de areia em
água nos poros existentes na matriz do solo. detrimento daqueles extremamente argilo-
No entanto, solos argilosos que apresen- sos. Para o cacau, os melhores solos têm 30-
tam uma proporção elevada de microporos 40% de argila, 50% de areia, e 10-20% de
podem apresentar obstáculos ao desenvol- silte (Smyth, 1966 citados por Alvim, 1977:
vimento vegetal, já que nestes a remoção 289). Os vários efeitos de conteúdo de argila
da água requer um esforço muito grande sobre o crescimento das plantas podem ser
por parte da planta (i.e., a água exige uma resumidos em diagramas de alças causais
tensão superior a 15 atmosferas (atm) para (Fig. 1), onde o sinal na ponta da seta indi-
ser removida). A proporção de água retida ca a direção da mudança na quantidade do
com tensão acima de 15 atm em solos muito fator localizado à frente da seta, dado um
argilosos pode representar até 30% de seu aumento na quantidade do fator localizado
peso, porém, desempenha um papel impor- na extremidade oposta.
tante: aumenta a estabilidade da matéria or-
O conteúdo de argila do solo superficial
gânica, contribuindo com a relação positiva
relaciona-se diretamente à suscetibilidade
entre o conteúdo de argila e a matéria orgâ-
do solo à erosão, especialmente a erosão la-
nica (Bennema, 1977: 35). A relação entre os
minar (veja Fearnside, 1980). A argila, sen-
teores de argila e o crescimento das plantas
do composta por partículas de dimensões
pode ser afetada pela concentração de íons
menores, é transportada mais facilmente
de alumínio, que são tóxicos para a maioria
pelo escoamento superficial da água do que
das plantas quando em altas concentrações.
as partículas mais grosseiras como a areia.
Os solos álicos argilosos (com alto teor Um conteúdo elevado de argila pode tornar
de alumínio), comuns na Amazônia, apre- o solo menos permeável, propiciando assim
sentam uma forte correlação positiva entre maiores volumes de água transportados por

Figura 1. Relações
entre o conteúdo de
argila no solo e pH
com o crescimento de
plantas.

Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 112 8/18/2022 3:13:53 PM


Solo e desenvolvimento na Amazônia: Lições do
Projeto Dinâmica Biológica de Fragmentos Forestais 113

escoamento superficial para uma mesma bares seja mais apropriada, o que significa
quantidade de chuva. Porém, em solos ar- que o método padrão conduz a uma subes-
gilosos com elevado nível de agregação, tais timativa da capacidade de água disponível
como os existentes na área do PDBFF, a dre- em aproximadamente 35% (Sánchez, 1976:
nagem pode ser boa, apesar do elevado con- 111). Uma terceira razão é que a amostra ide-
teúdo de argila. Em Latossolos Amarelos típi- al para estimar a água disponível deve ser
cos (Oxisols), os agregados de solo não estão constituída de perfis intactos de solo, retira-
cobertos ou forrados por membranas de sili- dos da lateral da trincheira. De outra forma,
cato de argila, o que os torna pouco sujeitos o resultado obtido utilizando material seco
à formação de voçorocas (Sombroek, 1966: e fragmentado de amostras de solo tradicio-
77). Latossolos com baixo conteúdo de ferro nais (como no presente estudo) dá apenas
(uma característica indicada pela cor amare- uma indicação destes parâmetros no campo.
lada dos solos das reservas do PDBFF) são
Existem Algumas indicações de que a ca-
os mais suscetíveis à deterioração da cama-
pacidade de água disponível pode representar
da de solo superficial quando, sob a agricul-
um obstáculo ao uso de água pela floresta em
tura, são expostos ao sol e a chuva. Neste
solos semelhantes aos das reservas do PDBFF.
cenário, eles se tornam mais suscetíveis à
Um estudo de perfis não deformados na “Bacia
erosão, já que, a sua superfície fica imper-
Modelo” do INPA (30 km ao sudoeste das re-
meável e o escoamento superficial, por con-
servas do PDBFF) indicou que, enquanto 60%
seguinte, aumenta (Bennema, 1977: 35).
do volume do solo coletado a 10 cm de profun-
Capacidade de água disponível didade é composto por poros, somente 17%
da água contida nestes poros estão disponíveis
A capacidade de água “disponível”, tam- às plantas, enquanto que 50% são constituí-
bém conhecida como “água disponível”, dos por água indisponível e 33% são perdidos
mede a quantidade de água que o solo pode por escoamento a uma pressão menor que
conter na forma aproveitável pelas raízes 0,33 bares (Ferreira, 1997: 168).
das plantas. Ela é calculada como a diferen-
ça entre a capacidade de campo (conteúdo Fósforo
de umidade total do solo depois de permiti-
O fósforo (P) é um elemento limitante
do escoar, pela força de gravidade, o excesso
para a produção agrícola e de pastagens
de água de um solo) e o ponto de murcha (o
na Amazônia brasileira. Por exemplo, adu-
conteúdo de umidade sob o qual as plantas
bação com P é o elemento chave para o
murcham e não se recuperam quando no-
aumento do desenvolvimento das gramíne-
vamente umedecidas) (Young, 1976: 40). A
as forrageiras no receituário técnico formu-
água não pode ser absorvida dos microporos
lado pela EMBRAPA (por exemplo, Koster
do solo se a pressão exigida para isso supera
et al., 1977; Serrão et al., 1979). O nível de
aquela que pode ser exercida pelo sistema
fósforo é baixo em praticamente todos os
radicular das plantas. A capacidade de cam-
solos na Amazônia brasileira, incluindo so-
po é determinada a 0,33 bares de tensão, e o
los relativamente férteis, tais como a terra
ponto de murcha em 15 bares.
roxa (Alfissolo), que ocorrem em áreas de
A capacidade de água disponível calcu- assentamento ao longo de partes da rodovia
lada por este procedimento padrão possui Transamazônica no Pará e da rodovia BR-364
um significado restrito por várias razões. em Rondônia (veja Fearnside, 1984, 1986b).
Em primeiro lugar, a habilidade das plantas Além disso, não são boas as perspectivas de
em extrair água do solo varia entre espécies, se manter grandes extensões de áreas agrí-
diferindo do girassol, a planta considerada colas na dependência de fertilizantes fosfata-
como padrão pelos pedólogos. Uma segunda dos na Amazônia, devido às exíguas jazidas
razão é que o valor de 0,33 bares de pressão, de rochas de fosfato existentes no Brasil e no
usado como padrão na determinação da ca- mundo; praticamente todas as modestas jazi-
pacidade de campo, subestima a capacida- das deste mineral localizadas no Brasil ficam
de de retenção de água: acredita-se que 0,1 situadas fora da Amazônia (veja Beisiegel &

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DESTRUIÇÃO E CONSERVAÇÃO
114 DA FLORESTA AMAZÔNICA

de Souza, 1986; de Lima, 1976; Fearnside, Uma exceção importante é o caso do cacau,
1997a,b, 1998a; Fenster & León, 1979). uma espécie amazônica nativa de grande im-
portância econômica e muito pesquisada, em
Na realidade é o fósforo disponível (PO4,
comparação com outras espécies. É notável
na verdade o anion H2PO4-), em lugar de P to-
que, embora a maioria das espécies amazô-
tal, que se relaciona diretamente com o cresci-
nicas aparentemente seja altamente tolerante
mento das plantas. A disponibilidade de fós-
aos solos muito ácidos, o pH do solo (reação
foro em Latossolos geralmente é muito baixa,
do solo) é o melhor previsor de rendimen-
em razão de que a maior parte deste elemento
tos do cacau (Hardy, 1961; veja Fearnside,
se encontra em compostos altamente insolú-
1986b). Sob condições ácidas, que prevale-
veis de Fe e de Al (Kamprath, 1973a: 139).
Normalmente, a disponibilidade de fósforo na cem na maioria dos solos amazônicos, o pH
agricultura é representada pelos teores de ani- do solo é, aparentemente, o único fator im-
drido fosfórico (P2O5); considerando análises portante afetando o rendimento de muitas
feitas com o extrator Carolina do Norte (HCl culturas, tais como o milho (veja Fearnside,
de 0,05 N e H2SO4 de 0,025 N) que é o padrão 1986b). Na Amazônia, o pH do solo no mo-
utilizado no Brasil. Assim, considera-se que mento do plantio depende menos do pH ori-
um miliequivalente (m.e.) de PO43-/100 g de ginal do solo do que da qualidade da quei-
solo seco corresponde a 103 partes por milhão mada utilizada pelo agricultor para preparar
(ppm) de P ou 23,7 mg de P2O5/100 g de solo a terra para o plantio (Fearnside, 1986b). Na
seco (por exemplo, Vieira, 1975: 451-453). Um Figura 1 estão incluídas as relações do pH do
m.e./100 g de solo seco é igual a um centimol solo com o crescimento das plantas.
de carga positiva por quilograma (cmol(+)/ A capacidade de troca catiônica dos solos
kg solo seco). Embora o P total obviamente li- ricos em ferro e óxidos de alumínio (como
mite à quantidade de fósforo disponível que os das reservas do PDBFF) depende do pH
pode estar presente no solo, outras caracterís- (Young, 1976: 95). Além disso, o pH baixo
ticas e processos ao nível do solo determinam eleva as concentrações de íons que são tóxi-
na realidade o fósforo disponível em relação cos ou inúteis para as plantas (Fe2+, Al3+ e
ao fósforo total. Valores de pH abaixo de 5,5 H+) e que ocupam um número significativo
são geralmente associados com uma redu- dos poucos sítios de ligação que existem nos
ção marcante na disponibilidade de fósforo componentes do solo. O termo “saturação
(Young, 1976: 299). Carbono orgânico e Fe2O3 de bases” se refere à porcentagem de sítios
são ambos relacionados positivamente com o ocupados por cátions essenciais, ou bases
fósforo disponível (P2O5) em latossolos bra- trocáveis (Ca2+, Mg2+, K+ e Na+, a soma dos
sileiros (Bennema, 1977: 43). Considerando quais informa a quantidade de “bases tro-
que carbono e ferro estão associados com alto cáveis totais”). A capacidade de troca cati-
conteúdo de argila, a estrutura granulométrica ônica normalmente é calculada como bases
do solo está relacionada com o crescimento de trocáveis totais + Al3+ + H+, em unidades
plantas através do fósforo, assim como atra- de m.e./100 g de solo seco (Guimarães et al.,
vés de outros nutrientes e da disponibilidade 1970: 85). A capacidade de troca catiônica,
de água. Micorrizas desempenham um papel bases trocáveis totais e saturação de bases
importante na mobilização de P em formas são, na prática, freqüentemente calculadas
disponíveis (St. John, 1985). Considerando a sem considerar os teores de Na+ (por exem-
elevada diversidade de espécies arbóreas ama- plo, Young, 1976: 426-429), porém, os re-
zônicas, associações com micorrizas foram en- sultados são pouco alterados, já que os íons
contradas em muitas das poucas espécies até de sódio normalmente estão presentes em
agora estudadas (St. John, 1980). quantidades constantemente baixas (aproxi-
madamente 0,01 m.e./100 g de solo seco).
pH, alumínio e cations
A importância do pH baixo na agricul-
Poucas informações existem sobre a res- tura deve-se a sua relação íntima com íons
posta de espécies arbóreas amazônicas em de alumínio tóxicos (Al3+). A concentração
relação às diferentes características do solo. de íons de alumínio normalmente tem uma

Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 114 8/18/2022 3:13:54 PM


Solo e desenvolvimento na Amazônia: Lições do
Projeto Dinâmica Biológica de Fragmentos Forestais 115

relação logarítmica negativa com o pH (veja A diferença entre o pH medido em clo-


Fearnside, 1984; Sánchez, 1976: 225). Em reto de potássio (KCl) e aquele medido em
geral, acredita-se que a saturação de alumí- água, ou “delta pH”, indica o estado da car-
nio, e não a concentração absoluta de íons ga elétrica de um sistema óxido (um solo no
de alumínio, seja mais estreitamente relacio- qual partículas de argila inteiras consistem
nada ao crescimento das plantas (Primavesi, em óxidos de ferro e alumínio, ou alofanes,
1981: 100). A saturação de alumínio pode ou um solo no qual películas estáveis des-
ser calculada de dois modos, incluindo ou tes óxidos recobrem as partículas de silica-
não a acidez trocável (H+). Incluindo o H+, to) (Sánchez, 1976: 140-141). Se o pH em
a soma de Al3+ + H+ é dividida pelo total KCl é menor que o pH em água (delta pH
de bases trocáveis mais Al3+ e H+, e o re- é negativo: o caso habitual), então há uma
sultado expressado em forma de porcenta- carga negativa líquida (capacidade de tro-
gem (Sánchez, 1976: 224). O mesmo resul- ca catiônica). Por outro lado, se o inverso
tado pode ser encontrado subtraindo-se de é verdadeiro, há uma carga positiva líquida
100% os teores encontrados para a saturação (capacidade de troca aniônica). A magnitude
de bases. Fazendo com que seja possível a da carga afeta o pH do solo no ponto iso-
utilização de um ou outro destes índices na elétrico, ou seja, no “ponto zero de carga”,
análise das relações com o crescimento das isso, por seu turno, determina a capacidade
plantas, quando assim definido. No Brasil, de troca catiônica (CTC) a um dado nível de
no entanto, a saturação de alumínio normal- pH do solo.(2) O conteúdo de matéria orgâ-
mente é calculada sem H+. Assim, a fórmula nica do solo influencia fortemente estas re-
usualmente empregada considera o Al3+ di- lações e a CTC resultante (Bennema, 1977:
vidido pela soma das bases trocáveis + Al3+, 39; Sánchez, 1976: 146). O delta pH é fre-
expresso em forma de porcentagem (Brasil, quentemente usado como um indicador do
SNLCS-EMBRAPA, 1979). A saturação de conteúdo de matéria orgânica. Se pH em KCl
alumínio, calculada desta forma, alcançan- é mais alto que pH em H2O (delta pH é po-
do um valor maior de 25%, indica que os sitivo), então a matéria orgânica é baixa. O
solos são impróprios para o plantio de cacau delta pH normalmente é associado positiva-
(Alvim, 1977: 291). mente com a relação C/N em solos amazôni-
cos, especialmente quando são comparados
As culturas agrícolas variam muito na
solos com grandes diferenças em delta pH
sua sensibilidade à toxidez do alumínio: em
(Tanaka et al., 1984: 55).
termos de saturação de alumínio com H+,
o milho pode tolerar até 60% de saturação, Nitrogênio
enquanto o sorgo sofre restrições em níveis
muito mais baixos (Sánchez, 1976: 231). A Tradicionalmente, considera-se que a
presença de íons de Alumínio afeta negativa- deficiência de nitrogênio no solo é o prin-
mente a produtividade do solo, pois promo- cipal fator limitante para a agricultura tro-
vem a fixação do fósforo em formas indispo- pical (National Academy of Sciences, 1972:
níveis (Kamprath, 1973b: 127). A toxidez de 8; Webster & Wilson, 1980: 220). As legumi-
alumínio, em parte, se reflete negativamente nosas arbóreas podem fixar nitrogênio com
na absorção de fósforo, já que o alumínio a ajuda de bactérias simbiônticas, fato que,
tende a acumular-se nas raízes impedindo provavelmente, representa para os membros
a absorção e translocação do P e Ca para a desta superfamília uma vantagem competi-
parte aérea da planta (Sánchez, 1976: 231). tiva em relação às espécies de famílias que
A presença de alumínio na solução do solo não possuem esta capacidade. Isto explica,
não só depende do pH, mas também do con- em parte, o fato de que as leguminosas for-
teúdo de matéria orgânica no solo: A presen- mam um grupo abundante nas reservas do
ça de íons de alumínio diminui na medida PDBFF, embora não cheguem a representar
em que a matéria orgânica aumenta e forma uma das famílias dominante: Burseraceae,
complexos fortemente estáveis com o alumí- Sapotaceae e Lecythidaceae são mais
nio (Sánchez, 1976: 226). comuns (Rankin-de-Merona et al., 1990:

Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 115 8/18/2022 3:13:54 PM


DESTRUIÇÃO E CONSERVAÇÃO
116 DA FLORESTA AMAZÔNICA

574). Em um modelo desenvolvido pelo pro- (valores de pH representam o expoente), au-


jeto BIONTE (Biomassa e Nutrientes) para mentando rapidamente com valores de pH do
a “Bacia Modelo” do INPA (situada sobre solo abaixo de 5 (Coelho & Verlengia, 1972:
o mesmo tipo de solo e a aproximadamen- 58). Valores críticos de zinco na agricultura se
te 30 km ao sul das reservas do PDBFF), encontram entre 1 e 2 ppm quando extraído
assumiu-se que o N era um fator limitante com HCl em 1 N (Cox, 1973a: 183).
para o desenvolvimento da floresta como
um todo (Biot et al., 1997: 284). Nas reser- Manganês
vas do PDBFF, o N total foi positivamente
correlacionado com a biomassa da floresta O manganês é um micronutriente reque-
(Laurance et al., 1999). rido em pequenas quantidades pelas plantas
(Young, 1976: 291). Porém, a níveis altos é
Sollins (1998: 23), revisou a literatura re- tóxico e, assim como a toxicidade de alumí-
ferente à relação entre as características dos nio, pode inibir o crescimento das plantas.
solos e a composição das Florestas Tropicais A disponibilidade de Mg para plantas é es-
de terras baixas, sugerindo que os caracteres treitamente ligada ao pH, com solubilidade
pedológicos a afetam. Em ordem decrescen- mais alta em níveis baixos de pH. A toxici-
te de importância estas características se- dade de manganês é um problema comum
riam: disponibilidade de P, toxicidade de Al, para a produção de legumes nos solos ácidos
profundidade do lençol freático, quantidade brasileiros (Cox, 1973a: 87).
e arranjo de poros de tamanhos diferentes,
disponibilidade de cátions de metais básicos, Outros elementos
micronutrientes (por exemplo, B, Zn) e N.
O nitrogênio é listado por último na ordem A discussão acima foi restrita aos ele-
de importância porque a maioria dos solos mentos que, acredita-se, podem limitar o
tropicais em terras baixas é relativamente crescimento da floresta e o sucesso das ati-
rica em N. Por outro lado, estudos feitos em vidades agropecuárias implantadas em solos
florestas montanas tropicais na Venezuela, como aqueles existentes na área das reser-
Jamaica e Havaí encontraram relações entre vas do PDBFF. O conjunto de dados sobre
o nitrogênio, a ocorrência e o crescimento os solos das reservas do PDBFF inclui ainda
das árvores (Tanner et al., 1998). As pes- informações sobre enxofre e cobre. Não fo-
quisas sobre Florestas Montanas tropicais ram analisados boro, molibdênio e cloro. O
podem ser consideradas mais avançadas do potássio total não foi analisado: esta medida
que aquelas realizadas em florestas de terras normalmente não é correlacionada com o
baixas, já que alguns estudos em florestas desenvolvimento das plantas e, assim sen-
montanas incluem experimentos com ma- do, foi considerada uma informação apenas
nipulação de variáveis em lugar de confiar de interesse acadêmico (Cox, 1973b: 162).
exclusivamente em correlações. Tanner et al.
(1998), especulam que muitas florestas de
terras baixas estejam limitadas pelo P, en- O LEVANTAMENTO DE SOLOS DO PDBFF
quanto muitas florestas montanas estejam
limitadas pelo por N. Resenha do conjunto de dados
O conjunto de dados contem informa-
Zinco
ções obtidas de 1.693 amostras superficiais
A deficiência de zinco pode representar de solos retiradas em locais sobre floresta
um problema para crescimento das plantas. nas reservas do PDBFF (entre as quais, 272
Ela pode ser causada pela fixação do zinco são amostras adicionais obtidas em datas
em sesquióxidos cristalinos (Bennema, 1977: posteriores), 41 perfis de solo e 1.693 amos-
36), já que a presença dos sesquióxidos (Fe2O3 tras de densidade do solo. Estes dados per-
e Al2O3) caracteriza os Latossolos (Oxisols). mitem investigar a variação em escala fina
A solubilidade de zinco apresenta uma rela- de uma maneira que não seria possível na
ção exponencial negativa com relação ao pH escala dos mapas de solo disponíveis nos

Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 116 8/18/2022 3:13:54 PM


Solo e desenvolvimento na Amazônia: Lições do
Projeto Dinâmica Biológica de Fragmentos Forestais 117

levantamentos do Projeto RADAMBRASIL, o cilindro fosse puxado para cima). O solo


usados frequentemente no zoneamento e foi retirado batendo-se o dorso de um facão
em outras decisões de planejamento sobre contra o lado exterior do cilindro metálico.
o uso do solo. Os dados de solos do PDBFF
As amostras foram armazenadas em sa-
indicam variabilidade significativa dentro
cos plásticos duplos para serem transporta-
de uma área considerada homogênea em re-
das e pesadas no laboratório. Uma amostra
lação às características do solo nos mapas
do perfil do solo (1,5 m de profundidade)
do RADAMBRASIL. As diferenças observa-
foi coletada no centro de um subconjunto de
das entre locais amostrados nas reservas do
parcelas, com o uso de um “trado holandês”.
PDBFF são suficientes para prever certo im-
Cada perfil foi composto por oito amostras
pacto negativo sobre a agricultura, caso es-
representando diferentes profundidades, as
tas áreas (ou áreas semelhantes) sejam des-
primeiras sete amostras representaram ca-
matadas e plantadas. É provável que estas
madas de 20 cm de espessura, correspon-
diferenças também afetem a distribuição das
dendo a uma profundidade total de 1,4 m,
espécies arbóreas na floresta, assim como, a
enquanto a última amostra representou uma
suscetibilidade da floresta ao estresse hídri-
camada de 10 cm de profundidades (totali-
co, caso fosse exposta a uma variabilidade
zando 1,5 m de profundidade). As amostras
climática significativa (por exemplo, a varia-
foram depositadas sobre uma lona plástica
bilidade provocada pelo fenômeno El Niño),
estendida ao lado do ponto amostrado, per-
aos efeitos do microclima característico das
mitindo a caracterização dos horizontes (em
bordas de fragmentos, aos efeitos das mu-
relação à cor, textura e plasticidade) segundo
danças climáticas esperadas em função do
a metodologia sugerida por Vieira & Vieira
efeito estufa e da redução da precipitação
(1983: 60-81). As amostras foram armazena-
provocada pela diminuição na evapotranspi-
das separadamente em sacos plásticos para
ração da floresta.
serem transportadas para o laboratório. A
localização dos perfis no campo foi identi-
Métodos de campo ficada com piquetes de tubos de PVC com
etiquetas de alumínio numeradas.
Amostras superficiais (0-20 cm) foram
obtidas com a utilização de um trado de solo
do tipo parafuso, cada amostra individual Métodos de laboratório
foi composta por 15 subamostras retiradas Preparação de amostras, cor do solo, textura e
aleatoriamente no interior de uma parcela Consistência
quadrangular de 20 m × 20 m. As parcelas
foram delimitadas com o uso de estacas per- No laboratório, as amostras superficiais e
manentes (cano de PVC com etiqueta de alu- de perfis foram classificadas no estado úmi-
mínio numerado), localizadas em seus vérti- do em relação à cor (usando uma cartela de
ces, permitindo assim que os mesmos locais cores na escala Munsell), a consistência (vis-
sejam localizados em estudos posteriores. cosidade e plasticidade) e a textura. Estas
descrições seguiram os métodos de Vieira &
Uma amostra de densidade do solo foi
Vieira (1983: 60-81).
coletada no centro de cada parcela. Para
isso, foram utilizados cilindros volumétricos As amostras submetidas às análises quí-
com 20 cm de comprimento e 6,9 cm de diâ- micas sofreram uma secagem prévia em um
metro. O cilindro ajustasse à extremidade de secador solar, seguido de 24 horas de expo-
um trado e é introduzido no solo batendo- sição em uma estufa elétrica a 105°C. Depois
se com um peso móvel que desliza pela sua desta secagem, fragmentos de carvão encon-
haste metálica. Uma vez introduzido no trados nas amostras foram coletados manu-
solo, o cilindro era retirado cavando-se ao almente, pesados e armazenados. As amos-
seu redor com uma cavadeira, tomando-se tras secas foram então moídas manualmente
os devidos cuidados para que o cilindro de (usando uma tábua e um rolo de maçarão),
solo fosse retirado intacto (evitando-se que passadas por peneiras de malha de 20 mm e

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DESTRUIÇÃO E CONSERVAÇÃO
118 DA FLORESTA AMAZÔNICA

posteriormente de 2 mm. As pedras e con- tabela, que depende da temperatura (por


creções lateríticas encontradas foram sepa- exemplo, 3 horas e 33 minutos para 25°C),
radas, pesadas e registradas. utilizando-se uma pipeta, uma amostra de
25 ml foi retirada a uma profundidade de 5
Uma subamostra de 300 g de solo seco
cm. Antes da pesagem, o material coletado
foi armazenada em recipiente de vidro
foi depositado em um recipiente previamen-
em uma coleção de referência (soloteca).
te tarado e colocado para secar em uma es-
Subamostras adicionais de 300 g foram pre-
tufa elétrica a 105°C.
paradas para os laboratórios de solos do
INPA (Instituto Nacional de Pesquisas da A areia total (fração grossa + fina) foi
Amazônia, Manaus, Amazonas) e CENA determinada passando o solo por uma pe-
(Centro de Energia Nuclear na Agricultura, neira com uma malha de 0,053 mm, seguido
Piracicaba, São Paulo). Análises granulo- por lavagem, secagem em estufa e pesagem.
métricas, densidade, carbono orgânico, ca- Este material foi então separado em uma pe-
pacidade de água disponível e pH em H2O neira com malha de 0,2 mm. A areia fina foi
e KCl foram realizadas no INPA; N total, C pesada e a areia grossa determinada por di-
total, Al3+, H+, Ca2+, Mg2+, K+, PO43-, Cu, ferença do peso da areia total. O silte foi de-
Fe, Zn+, Mn2+ foram feitas no CENA. Os re- terminado por diferença do peso da amostra
sultados de textura obtidos no INPA foram total da soma das outras três frações (areia
conferidos comparando-se os resultados de fina, areia grossa e argila).
10 amostras aleatoriamente escolhidas que
foram também analizados pelo laboratório Densidade do solo
de solos da EMBRAPA em Manaus; nenhu- As amostras volumétricas foram coloca-
ma diferença significativa foi encontrada (O das para secar até peso constante em uma
laboratório do CENA enviou 10 amostras a estufa elétrica a 105°C. Raízes finas e car-
cada dois meses para um, entre um grupo vão foram imediatamente removidos destas
de laboratórios brasileiros associados, para amostras após a determinação do peso seco.
obter uma checagem independente em suas As raízes foram então lavadas, secas na estu-
análises químicas). fa e pesadas. O carvão foi armazenado após
a obtenção de seu peso.
Textura do solo
Carbono orgânico e matéria orgânica
A análise granulométrica utilizou o mé-
todo da pipeta (Brasil, SNLCS-EMBRAPA, O método Walkley-Black modificado
1979) e considerou quatro frações: areia foi adotado nas análises desenvolvidas no
grossa (diâmetro de 0,2-2,0 mm), areia fina INPA, nele, as medidas volumétricas são fei-
(diâmetro de 0,05-0,2 mm), silte (diâmetro tas com utilização de bicromato de potássio
de 0,002-0,05 mm) e argila (diâmetro < e titulação com sulfato ferroso. O método
0,002 mm) (Vieira & Vieira, 1983: 68). As (Walkley & Black, 1934) incluiu as modifi-
dimensões definidas para cada classe de cações empregadas pela EMBRAPA. A ma-
partículas correspondem aos padrões do téria orgânica é estimada multiplicando-se o
Departamento de Agricultura dos Estados resultado obtido pela constante 1,72 (Brasil,
Unidos, em lugar daqueles adotados pela SNLCS-EMBRAPA, 1979), uma prática co-
Sociedade Internacional de Ciência do Solo. mum (Young, 1976: 102). A relação C/N é
encontrada dividindo-se o carbono orgânico
A fração argila foi determinada diluindo
(Walkley-Black) pelo nitrogênio total.
o solo em solução de NaOH e utilizando um
agitador elétrico. A mistura foi então coloca- Capacidade de água disponível
da em um cilindro de sedimentação (cilin-
dro graduado) de 1 litro e agitada, através A capacidade de campo e o ponto de mur-
de inversões sucessivas, antes de permitir a cha foram indiretamente determinados com a
sedimentação em repouso. Após um período utilização de um aparato com membrana de
de tempo que é determinado a partir de uma pressão (Soil Moisture Equipment Co., Santa

Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 118 8/18/2022 3:13:54 PM


Solo e desenvolvimento na Amazônia: Lições do
Projeto Dinâmica Biológica de Fragmentos Forestais 119

Barbara, California, E.U.A.). A capacidade de de injeção de fluxo. PO43- foi determinado


campo corresponde ao conteúdo de umida- em um autoanalizador utilizando o método
de mantido sob uma sucção de 0,33 bares e de azul molibdênio (Jorgensen, 1977: 10).
o ponto de murcha correspondente ao valor
de 15bares (1  bar  = 0.9869 atmosferas). A Nitrogênio total
diferença na quantidade de água retida pelo
solo entre estes dois pontos define a capaci- O nitrogênio total foi determinado pelo
dade de água disponível. O conteúdo de umi- método de digestão de Kjeldahl, usando uma
dade e a capacidade de água disponível são
mistura de H2O2, Li2SO4 e H2SO4 concentrado
expressos como porcentagens obtidas através
do peso da água sobre o peso da amostra em para digerir a matéria orgânica e transformar
base seca (Klar, 1984: 71). Note que, seguin- o nitrogênio contido na amostra em NH4+
do o procedimento padrão, o solo foi seco e (Parkinson & Allen, 1975). O destilado foi
peneirado antes de ser colocado nos anéis titulado com H2SO4.
distribuídos sobre a chapa de pressão, assim
alterando a sua estrutura. Carbono total (%C)
pH em água e KCl O carbono total (%C) foi determinado
A reação do solo (pH) em H2O destilada e no CENA pelo “método a seco” que con-
em solução de KCl de 1 N foi estimada com verte as formas de carbono do solo em CO2
a utilização de um equipamento apropriado através da combustão às 1.100°C. O gás é
(pH-metro). A proporção entre a quantida- então enviado a uma célula de cloreto de só-
de de solo seco na estufa e a quantidade de dio padrão onde é detectada a diferença de
água ou solução de KCl utilizada é de 1:1 em
uma base volumétrica (20 ml de solo para condutividade elétrica entre esta solução e
20 ml de água ou solução). Outros trabalhos uma solução carbonatada com CO2, sendo o
sobre solos tropicais determinaram que a re- resultado expresso em miligramas de carbo-
ação do solo aumenta em aproximadamen- no (Cerri et al., 1990).
te 0,3 unidades de pH em amostras secas,
quando comparado às condições de campo;
o pH não é afetado desde que o solo seja RESUMO DOS RESULTADOS
armazenado seco (Gillman & Murtha, 1983).
Os resultados apresentados aqui são
Macro e micronutrientes restritos aos 54 ha nãocontíguos nos quais
A metodologia empregada no CENA para inventários das espécies arbóreas foram de-
determinação dos micronutrientes foi des- senvolvidos no âmbito no projeto PDBFF. Na
crita por Zagatto et al. (1981) e Jorgensen área das reservas não foi constatada a pre-
(1977). As amostras foram digeridas seguin- sença dos melhores tipos de solos amazôni-
do a metodologia da EMBRAPA: 0,0025 N cos: solos antropogênicos (terra preta do ín-
de HCl e 0,005 N de H2SO4 (Brasil, SNLCS-
dio) e Alfisols (terra roxa estruturada), nem
EMBRAPA, 1979). K+ foi medido através de
espectrofotometria de emissão atômica em dos piores tipos, tais como os solos forma-
uma chama de ar e acetileno, usando um dos por depósitos de areia branca (Podzols
equipamento Perkin-Elmer AAS 306; Al3+, ou Spodosols), que ocorrem sob a vegetação
Ca2+, Cu, Fe, Mg2+, Mn2+, Na+ e Zn+ por de campina. Não obstante, os dados indicam
espectrometria de absorção atômica com uma variação significativa em qualidade do
plasma induzido em argônio, usando um
solo apesar da uniformidade relatada nos
espectrômetro computadorizado (espectrô-
metro de leitura direta Jarell-Ash Plasma mapas gerais de solo. A Tabela 1 apresen-
Atomcomp), e S (como sulfato de bário) ta as estatísticas descritivas sobre as médias
através de turbidimetria, usando um sistema por hectare.

Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 119 8/18/2022 3:13:54 PM


DESTRUIÇÃO E CONSERVAÇÃO
120 DA FLORESTA AMAZÔNICA

Tabela 1. Variação em Desvio


propriedades de solo Categoria Caraterística do solo Unidades Média Mínimo Máximo N
padrão
nas reservas do PDBFF
(0-20 cm)(estatísticas
CARÁTERISTICAS GRANULOMÊTRICAS
descritivas das médias Argila % 54,7 13,5 18,0 68,8 54
dos locais)
Silte % 21,2 4,3 8,3 32,5 54
Areia fina % 5,6 3,9 1,3 18,1 54
Areia grossa % 18,5 12,5 4,4 56,6 54
ÁGUA DISPONÍVEL
Conteúdo de umidade a 1/3 barra % H2O por peso 31,8 6,8 13,0 41,2 45
Conteúdo de umidade a 15 barras % H2O por peso 24,3 5,8 9,1 31,9 45
Capacidade de água disponível % H2O por peso 7,6 2,0 3,3 12,0 45
TOPOGRAFIA
Declive % 10,8 8,9 1,4 38,7 36
CARBONO
Matéria orgânica % 2,1 0,7 0,8 3,3 50
C orgânico (Walkley- Black) % 1,6 0,3 0,8 2,2 40
C total % 1,96 0,45 1,27 3,07 51
Razão C/N Sem dimensão 9,9 1,6 8,4 17,0 38
REAÇÃO DO SOLO
pH em H2O Unidades de pH 4,0 0,3 3,4 4,4 53
pH em KCl Unidades de pH 3,8 0,2 3,2 4,3 53
Delta pH Unidades de pH -0,3 0,1 -0,5 0,0 53
NUTRIENTES PRIMÁRIOS
N (total) % 0,16 0,03 0,10 0,21 38
PO 4 3-
m.e./100 g de solo seco (cmol(+)/kg solo seco) 0,030 0,005 0,022 0,041 38
K+
m.e./100 g de solo seco (cmol(+)/kg solo seco) 0,060 0,011 0,032 0,077 38
NUTRIENTES SECUNDÁRIOS
Ca2+ m.e./100 g de solo seco (cmol(+)/kg solo seco) 0,058 0,026 0,015 0,131 38
Mg 2+
m.e./100 g de solo seco (cmol(+)/kg solo seco) 0,076 0,031 0,013 0,125 38
Na +
m.e./100 g de solo seco (cmol(+)/kg solo seco) 0,052 0,018 0,026 0,106 18
S ppm (mg/kg) 13,0 1,4 10,6 15,0 13
MICRONUTRIENTES
Cu ppm (mg/kg) 0,33 0,12 0,10 0,54 24
Fe ppm (mg/kg) 137 31 77 185 24
Zn ppm (mg/kg) 1,48 0,78 0,61 2,99 24
Mn ppm (mg/kg) 1,81 0,49 0,87 2,49 24
OUTROS ÍONES
Al3+ m.e./100 g de solo seco (cmol(+)/kg solo seco) 1,63 0,29 1,03 2,22 38
Saturação de Al com H , com Na
+ +
% de CTC 89,4 1,0 86,3 90,5 18
Saturação de Al com H+, sem Na+ % de CTC - Na+ 92,4 1,7 87,8 96,2 38
Saturação de Al sem H+, com Na+ % de sat. de bases + Al3+ 85,2 1,2 82,4 86,5 18
Saturação de Al sem H , sem Na
+ +
% de sat. de bases + Al 3+
89,5 2,2 84,3 94,4 38
H +
m.e./100 g de solo seco (cmol(+)/kg solo seco) 0,70 0,12 0,39 0,85 38

Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 120 8/18/2022 3:13:54 PM


Solo e desenvolvimento na Amazônia: Lições do
Projeto Dinâmica Biológica de Fragmentos Forestais 121

Desvio Tabela 1. Continuação


Categoria Caraterística do solo Unidades Média Mínimo Máximo N
padrão
MEDIDAS DOS CATIONS
Capacidade de troca catiônica (com Na+) m.e./100 g de solo seco (cmol(+)/kg solo seco) 2,7 0,2 2,5 3,0 18
Capacidade de troca catiônica (sem Na+) m.e./100 g de solo seco (cmol(+)/kg solo seco) 2,5 0,4 1,7 3,3 38
CTC de argila (sem Na+) m.e./100 g de solo seco (cmol(+)/kg solo seco) 5,1 1,6 3,7 10,5 38
CTC de Argila (sem Na ) com correção de C m.e./100 g de solo seco (cmol(+)/kg solo seco) 14,4
+
1,7 10,9 18,2 38
Bases trocáveis totais (com Na+) m.e./100 g de solo seco (cmol(+)/kg solo seco) 0,3 0,0 0,2 0,4 18
Bases trocáveis totais (sem Na )
+
m.e./100 g de solo seco (cmol(+)/kg solo seco) 0,2 0,1 0,1 0,3 38
Saturação de bases (com Na+) % de CTC 10,6 1,0 9,5 13,7 18
Saturação de bases (sem Na ) +
% de CTC 7,6 1,7 3,8 12,2 38

O conteúdo de argila (valor médio: 215). Dos 373 pontos com medidas de declive
54,7%) apresenta uma ampla variação, de no conjunto de dados usado no atual estudo,
18,0-68,8%; como o conteúdo de argila é 57,1% não apresentaram nenhuma limitação
estreitamente ligado a vários indicadores de por estes critérios, 23,6% apresentaram limi-
fertilidade do solo, o nível de fertilidade em tação reduzida, 23,1% apresentaram limita-
geral também varia substancialmente. O solo ção moderada e 2,7% apresentaram limitação
médio poderia ser classificado como aquele severa. Além disso, a razão argila/areia de 2,6
ocupando o ponto central da “categoria de (ou 3,1 considerando argila+silte) nas reser-
solos argilosos” (Vieira & Vieira, 1983: 68). vas do PDBFF pode ser considerada um im-
O solo apresenta uma porcentagem significa- pedimento à mecanização, pois, o valor má-
tiva de partículas do tamanho de silte (valor ximo desta relação considerado apropriado é
médio = 21,2%), fazendo com que difira de 2,0 (Vieira & Vieira, 1983: 123). No entanto,
alguns solos amazônicos, onde as partículas esta classificação de limitações à mecaniza-
são concentradas nas frações de areia e argila, ção baseada no conteúdo de argila represen-
com pequena proporção das partículas de ta- ta uma média para todo Brasil; W. Sombroek
manho intermediário. Porém, é possível que (comunicação pessoal, 1998), acredita que os
a dispersão incompleta de agregados de argila Latossolos amarelos na Amazônia tais como
possa resultar em uma abundância aparente os que ocorrem nas reservas do PDBFF, pode-
de partículas de silte quando, na realidade, riam se sujeitar à mecanização, mesmo apre-
esta classe de tamanho está presente em sentando conteúdos de argila mais elevados
quantias muito menores (Thierry Desjardins, que os recomendados por esta classificação.
comunicação pessoal, 1998). Assim, para
efeito de análise estatística, estas duas classes O solo é bastante ácido, com um pH mé-
de partículas foram agrupadas em uma só. dio em água de 4,0 (variação: 3,4-4,4). Porém,
não se deve esquecer que, para a agricultura,
O relevo da área pode ser considerado on- não é o nível de nutrientes no solo sob a flo-
dulando, com um declive médio de 10,8%. resta que importa, mas sim o nível que es-
Uma parte da área, com declives íngremes, tará presente após a floresta ser derrubada e
além de não indicada para a agricultura meca-
queimada. Especialmente no caso de pH, os
nizada, apresenta-se propensa a sofrer fenô-
valores se elevam dependendo da qualidade
menos erosivos. As classificações propostas
da queimada (Fearnside, 1986b).
sobre a capacidade de uso da terra consideram
sem limitações declives de 0-2%, ligeiramen- O delta pH (valor médio: -0,3) apresenta
te limitados aqueles entre 2-8%, moderada- uma carga negativa líquida, indicando a exis-
mente limitados aqueles entre 8-30% e mui- tência de capacidade de troca catiônica. Isto
to limitados aqueles >30% (Benites, 1994: também confirma a existência de um nível

Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 121 8/18/2022 3:13:55 PM


DESTRUIÇÃO E CONSERVAÇÃO
122 DA FLORESTA AMAZÔNICA

razoável de matéria orgânica no solo, conside- à sua aplicação (Young, 1976: 291). Um siste-
rando os padrões de solos agrícolas tropicais. ma de avaliação de capacidade de uso da terra
adotado no Brasil (Vieira & Vieira, 1983: 144)
A saturação de alumínio (excluindo H+),
classifica níveis de K+ < 0,11 m.e./100 g de
com um valor médio de 92,4%, é sem dú-
solo seco como “insuficientes”, 0,11-0,37 como
vida elevada, enquanto a saturação de ba-
“regulares” e > 0,37 como “bons”. Considera-
ses (sem Na+) é baixa, com um valor médio
se que o nível mínimo absoluto exigido por
de apenas 7,6%. Valores de saturação de Al
culturas agrícolas é 0,10 m.e./100 g de solo
(sem H+) < 50% são classificados como
seco (Boyer, 1972: 102).
baixos e > 50% são classificados como altos
(Vieira & Vieira, 1983: 144). Entre os nutrientes essenciais, potássio
é o que apresenta maior demanda pelos ve-
O carbono total apresentou um valor mé-
getais cultivados (Webster & Wilson, 1980:
dio de 1,96%. O carbono orgânico, determi-
74). Assim, provavelmente a deficiência de
nado pelo método Walkley-Black modificado,
potássio trocável afetará o crescimento das
teve um valor médio de 1,58%. A matéria or-
plantas nestes solos.
gânica apresentou um valor médio de 2,72%.
Apesar destes valores sejam baixos para solos As concentrações de íons de cálcio
agrícolas, eles podem ser considerados co- são muito reduzidas (valor médio: 0,058
muns nos solos típicos da Amazônia. m.e./100 g de solo seco). Para culturas agrí-
colas, < 1,50 m.e./100 g de solo seco é con-
Os níveis de N total podem ser conside-
siderada “insuficiente”, 1,50-3,50 m.e./100
rados moderados, com um valor médio de
g de solo seco é considerada “regular” e >
0,16%; valores inferiores a 0,1% são consi-
3,50 m.e./100 g de solo seco “bom” (Vieira &
derados “baixos”, podendo-se prever uma
Vieira, 1983: 144).
provável reposta à fertilização em culturas
agrícolas, enquanto valores de 0,1-0,2% As concentrações de íons de magnésio
ocupam uma faixa “moderada” onde estas são baixas (valor médio: 0,076 m.e./100 g de
respostas ainda são de ocorrência possível solo seco). Na agricultura, < 0,50 m.e./100
(Young, 1976: 291). A relação C/N (valor g de solo seco é considerado “insuficiente”,
médio: 9,9) indica uma quantidade razoável, 0,50-1,00 m.e./100 g de solo seco “regular”
mas não ideal, de nitrogênio disponível às e > 1.00 m.e./100 g de solo seco “bom”
plantas (valores acima de 15 indicam quan- (Vieira & Vieira, 1983: 144).
tidades baixas de N nas formas disponíveis).
A capacidade de troca catiônica (expres-
Os níveis de fosfato são muito reduzi- sa como o CTC de argila) é muito baixa, com
dos (valor médio de PO43 : 0,030 m.e./100 g um valor médio de 14,4 m.e./100 g de argila
de solo seco). A quantidade de PO43- pode depois de corrigida para carbono. Com a cor-
ser considerada “insuficiente” para espé- reção para carbono (considera-se que cada
cies agrícolas em níveis < 0,097 m.e./100 g 1% de carbono corresponde a 4,5 m.e. de
de solo seco (equivalente a < 2.30 m.e. de CTC), uma CTC de 24 m.e./100 g de argila re-
P2O5/100 g de solo seco); níveis “regulares” presenta a linha divisória entre as atividades
de PO43- variam entre 0,097-0,253 m.e./100 g “baixa” e “alta” de argila (Vieira & Vieira,
de solo seco (equivalente a 2,30-6,00 m.e. de 1983: 38). O valor de 24 m.e./100 g de argi-
P2O5/100 g de solo seco), enquanto um “solo la é considerado baixo para solos agrícolas
bom” apresenta > 0,253 m.e. de PO43-/100 g (Benites, 1994: 231).
de solo seco (>6,00 m.e. de P2O5/100 g de
Considera-se a saturação básica > 50%
solo seco) (Vieira & Vieira, 1983: 144).
como indicativo de alta fertilidade, desde
O nível de potássio trocável (K+) é reduzi- que a CTC do solo seja > 24 m.e./100 g de
do, com um valor médio de 0,06 m.e./100 g de solo; saturação básica < 50% indica ferti-
solo seco; valores abaixo de 0,2 m.e./100 g de lidade moderada, como no caso destes so-
solo seco são considerados baixos, podendo- los (Benites, 1994: 215; também veja Vieira
se esperar uma resposta das culturas agrícolas & Vieira, 1983: 46). O valor médio de 7,6%

Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 122 8/18/2022 3:13:55 PM


Solo e desenvolvimento na Amazônia: Lições do
Projeto Dinâmica Biológica de Fragmentos Forestais 123

(sem Na+) na área de estudo é obviamente BTT = 1,86 × 10-3 AS + 3,88 × 10-2 MO – 5,20 × 10-2 Tabela 2. Relações
entre parâmetros de
baixo, como também é o valor máximo de (p < 0,00001, r2=0,84, n=38) solo
12,2%. Os níveis de Na+ encontrados pa- BASES TROCÁVEIS TOTAIS
onde: BTT = bases trocáveis totais (sem Na+)
recem ser estranhamente elevados (média: (sem Na+)
(m.e./100g de terra seca ou cmol(+)/kg solo seco)
0,052 m.e./100 g de solo seco); combinado AS = Argila + silte (%)
com valores muito baixos de Ca2+ (média: MO = Matéria orgánica (%)
0,058 m.e./100 g de solo seco), neste caso, MO = 2,13 × 10-2 AS + 1,12

o Na+ faz uma contribuição relativamente MATÉRIA ORGÂNICA


(p < 0,00001, r2=0,73, n=38)a
maior do que normalmente esperado para a onde: MO = Matéria orgánica (%)
troca de bases. Porém, devido a um conjunto AS = Argila + silte (%)
muito menos completo de dados relativos ao Al3+ = 7,66 × 10-3 AS – 7,70 × 10-1 log10 pH + 5,64
Na+, nas análises estatísticas as medidas ca- (p < 0,00001, r2=0,78, n=38)
tiônicas utilizadas excluíram o sódio. ÍONES DE ALUMÍNIO
onde: Al3+ = Al3+ (m.e./100g solo seco ou cmol(+)/kg solo seco)
AS = Argila + silte (%)
As relações entre as características dos pH = pH na água (pH units)
solos no conjunto de dados obtidos para a CAD = 5,24 × 10-2 AS + 3,66
área do PDBFF foram calculadas para ba-
CAPACIDADE DE ÁGUA (p < 0,01, r2 = 0,43, n=45)
ses trocáveis totais, matéria orgânica, íons DISPONÍVEL
onde: AS = Argila + silte (%)
de alumínio e capacidade de água disponí- CAD = Capacidade de água disponível (%H2O por peso)
vel (Tabela 2). Algumas das outras relações
a.) Com eliminação de um dado isolado fora da faixa dos demais (um “outlier”).
apresentadas na Figura 1, apesar de repre-
sentarem generalidades conhecidas, não
emergem como regressões significativas no
conjunto de dados do PDBFF. O conteúdo de de determinada área. Os dados deixam claro
bases trocáveis totais não foi predito signifi- que a fertilidade do solo é baixa, e que exis-
cativamente melhor com a inclusão do pH tem significativos obstáculos à implantação da
(ou log10pH) na regressão, embora se reco- agricultura nesta área, como por exemplo, os
nheça que valores de pH mais elevados se- níveis tóxicos de alumínio. O conjunto de obs-
jam associados com maiores quantidades de táculos existentes levou alguns autores a con-
cátions como Ca2+ e Mg2+ (veja Fearnside, cluir que solos como estes não deveriam ser
1986b). A quantidade de fosfato não se rela- usados para agricultura. Irion (1978: 519), por
cionou significativamente a pH, Al3+ e Fe no exemplo, conclui que, nos solos da formação
conjunto de dados. Barreiras (ou Alter do Chão), como aqueles
que ocorrem nas reservas do PDBFF, o cultivo
“extensivo .... é impossível, já que a qualidade
LIÇÕES PARA O DESENVOLVIMENTO do solo é inadequada. Qualquer cultivo, com a
finalidade de exportação de produtos agrícolas
Potencial agrícola resultaria em um esgotamento do solo dentro
de poucos anos, tornando-o assim agricultural-
O conhecimento adquirido no estudo
mente inaproveitável durante muitas décadas”.
desenvolvido na área do PDBFF ultrapassa
Van Wambeke (1978: 233), adverte contra o
em muito o nível de conhecimento que es-
potencial de “destruição irreversível de solos e
taria normalmente disponível para as deci-
a criação de desertos inférteis”. Por outro lado,
sões referentes ao zoneamento do restante
Serrão & Homma (1993: 287), avaliando o
da Amazônia. Se não pudermos propor re-
mesmo cenário, concluem que 70% das terras
comendações bem fundamentadas para esta
na Amazônia brasileira são “apropriadas para
área específica, torna-se óbvio que de forma
produção de cultivos”, e afirmam que “regiões
alguma poderemos esperar sugestões bem
com baixa fertilidade e solos ácidos não foram
fundamentadas para a vasta maioria das ou-
transformadas em desertos, como alguns pre-
tras áreas amazônicas.
viram.... Ao contrário, tais regiões têm se mos-
Existem opiniões divergentes sobre o nível trado muito dinâmicas em termos de desen-
de fertilidade adequado que deveria ser ado- volvimento agrícola” (Serrão & Homma, 1993:
tado na definição do uso agrícola ou florestal 288). É questionável se estas regiões podem

Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 123 8/18/2022 3:13:55 PM


DESTRUIÇÃO E CONSERVAÇÃO
124 DA FLORESTA AMAZÔNICA

ser descritas como “muito dinâmicas” e, cer- os problemas de produção para sustentar a
tamente, a situação observada nas fazendas, população humana (Fearnside, 1998b).
sobre as quais situam-se as reservas do PDBFF,
O discurso político que envolve o anún-
não pode ser classificada de dinâmica.
cio de novos assentamentos na Amazônia
Por muito tempo, a Amazônia em geral invariavelmente é repleto de imagens da
e, particularmente, o Estado do Amazonas, prosperidade permanente que emanam dos
era protegido do desmatamento por obstá- sistemas agrícolas a serem implantados nas
culos que incluíam solos pobres, doenças áreas desmatadas. No entanto, as decisões
humanas (particularmente a malária) e di- governamentais de cortar a floresta e im-
ficuldade de acesso a partir das partes den- plantar assentamentos agrícolas em áreas
samente povoadas do Brasil. Entretanto, a com solos como os das reservas do PDBFF,
doença não representa mais o obstáculo que que são típicos de vastas áreas da Amazônia,
foi no passado; por exemplo, se hoje a aber- implicam em duas coisas: ou o governo está
tura de novas áreas exigissem o mesmo nível disposto a prover ou subsidiar com pesadas
de sacrifício de vidas, como ocorreu duran- contribuições regulares o uso eterno de ferti-
te abertura da estrada de ferro Madeira- lizantes (um cenário altamente improvável),
Mamoré em Rondônia no começo do século ou aceita a responsabilidade de converter a
XX, então a ameaça de desmatamento seria floresta em uma paisagem de pastagens de-
reduzida. As dificuldades de acesso também gradadas e capoeiras.
estão sendo rapidamente superadas: muitos
colonos migraram diretamente de Rondônia Infelizmente, esta responsabilidade fre-
para Roraima, evitando assim o Estado do quentemente não é assumida quando se
Amazonas, através do qual passaram, um recorre à utilização de alarmes metafóricos,
fenômeno que se explica tanto pelos solos onde se repete monotonamente que a agri-
de melhor qualidade que ocorrem no Escudo cultura ou pecuária serão sustentáveis atra-
das Guianas em Roraima, como pela indução vés da adoção de um “manejo adequado”,
criada pelo governo de Roraima. A pavimen- implicando que a responsabilidade sobre um
tação da rodovia BR-319, que une Rondônia eventual fracasso futuro do projeto deverá
a Manaus, abrirá as comportas para o flu- ser imputada aos fazendeiros, por não terem
xo migratório de colonos para a Amazônia adotado um “manejo adequado”.
central, inclusive para a área que abrange as É improvável que duas das principais
reservas do PDBFF. culturas atualmente em moda na Amazônia
O que acontece quando se desmata uma tenham êxito em áreas como aquelas onde se
área com as características daquela onde es- localizam as reservas de PDBFF. Uma delas
tão estabelecidas as reservas do PDBFF de- é o dendê (por exemplo, Smith et al., 1995).
pende de qual é o uso da terra implantado. Que apresenta uma rápida e significativa
Algumas opções são melhores que outras redução na produção potencial de óleo em
sob o ponto de vista de maximizar a susten- áreas como a de Manaus, que sofrem uma
tabilidade e minimizar o impacto ambien- estação seca bastante severa. Na Amazônia
tal. Por exemplo, sistemas agroflorestais ou brasileira, duas áreas que apresentam con-
cultivos consorciados que incluam espécies dições climáticas ótimas para dendê locali-
arbóreas são, em muitos aspectos, melhores zam-se nas proximidades a Belém (Pará) e
que culturas anuais ou pastagens. No en- Tefé (Amazonas), apesar das plantações na
tanto, existem limitações severas para uso área de Belém sofrerem os efeitos de uma
generalizado de sistemas agroflorestais nas doença que provoca o amarelamento dos
vastas áreas de terras degradadas já criadas brotos (Fearnside, 1990). Além disso, como
na região amazônica, sem considerar a cria- a maioria dos custos/área de estabelecimen-
ção de novas áreas degradadas, ainda mais to e manutenção das culturas agrícolas, in-
amplas, se o processo de desmatamento fos- depende do seu rendimento, as plantações
se apoiado na convicção de que a adoção localizadas em áreas subótimas tornam-se
de sistemas agroflorestais poderia resolver não competitivas.

Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 124 8/18/2022 3:13:55 PM


Solo e desenvolvimento na Amazônia: Lições do
Projeto Dinâmica Biológica de Fragmentos Forestais 125

Outra cultura agrícola que assume fi- apropriadas. As limitações, devidas a carên-
gura de realce no discurso atual envolven- cia de nitrogênio no solo para várias culturas
do o desenvolvimento amazônico é a soja. não leguminosas, podem ser superadas pela
Infelizmente, os benefícios sociais desta existência de relações pseudossimbionticas
cultura são reduzidos quando se considera dos vegetais com vários tipos de bactérias
a população local, além de requerer mecani- fixadoras de nitrogênio, uma área de pesqui-
zação e demandar pesados investimentos de sa que vem alcançado avanços significativos
capital e utilização de defensivos químicos. no Brasil através do trabalho de Johanna
Embora a mecanização em áreas como a que Döbereiner (por exemplo, Döbereiner, 1992).
é objeto do atual estudo não seja impossível, No entanto, ainda hoje, a manutenção
sua utilização seria ainda contra producente da agricultura e pecuária em vastas áreas da
devido à topografia ondulada do terreno e ao Amazônia é impossibilitada por limitações
elevado conteúdo de argila presente no solo. de mercado, carência de jazidas de fosfatos
A baixa fertilidade do solo pode ser e necessidade investimento financeiro eleva-
compensada pela aplicação de fertilizan- do. Assim sendo, não devemos contar com
tes. Porém, Existem sérias dúvidas sobre uma “solução tecnológica” para solucionar
racionalidade de se difundir um modelo de os problemas de sustentabilidade, pelo me-
agricultura baseado em um consumo in- nos até o dia quando os avanços tecnológi-
tenso de fertilizantes em grandes áreas na cos em questão sejam alcançados de fato.
Amazônia. O melhor exemplo dos riscos “Não se deve contar com os pintos antes
envolvidos é a história da “tecnologia de que eles sejam chocados” é um princípio de
Yurimaguas” desenvolvida para cultivo con- precaução, uma regra básica universal que
tínuo na Amazônia peruana (Sánchez et al., deve ser considerada antes de assumir os
1982; veja Fearnside, 1987, 1988; Walker et riscos de qualquer tipo de aventura. Além
al., 1987). Apesar de uma longa lista de sub- disso, convêm considerar os custos ambien-
sídios, que variavam desde o fornecimento tais envolvidos na perda da floresta, custos
de substâncias químicas até as análises de que não se alteram significativamente, seja
solo e apoio técnico grátis aos 24 agriculto- a agricultura implantada produtiva ou não
res, este pacote de manejo envolvendo uma (veja Fearnside, 1997a).
grande quantidade insumos e custos eleva- Os solos na área de estudo são indiscuti-
dos não obteve aceitação popular na região. velmente inférteis: os indicadores da fertili-
Os limites impostos pelos recursos físicos, dade do solo como pH, capacidade de troca
como jazidas de fosfatos indisponíveis, além catiônica, bases trocáveis totais e PO43- são
de restrições financeiras e institucionais, fa-
baixos, enquanto a saturação de alumínio é
zem com que o uso difundido de tais siste-
alta. Sob estas circunstâncias, a decisão lógi-
mas seja improvável (veja Fearnside, 1997a).
ca seria a de manter estas áreas em floresta
O uso intensivo de fertilizantes represen- e não utilizá-las em usos do solo de baixa
ta apenas uma das soluções para superar as produtividade e de curto prazo. Mas até que
limitações impostas pela baixa fertilidade do ponto a situação seria diferente caso os so-
solo. É necessário considerar as perspectivas los fossem mais produtivos? Em que ponto
de mudanças no potencial agrícolas destas a qualidade do solo faria com que valesse a
áreas caso ocorram outros tipos de avanços pena sacrificar a floresta? Não há nenhuma
técnicos. Por exemplo, um progresso recente resposta simples a estas perguntas. Uma to-
foi o desenvolvimento de plantas transgêni- mada de decisões racional requer a avaliação
cas capazes de superar as limitações impos- de ambos: do valor da produção agrícola da
tas pela saturação de alumínio (Barinaga, área que pode ser esperada realisticamente
1997; de la Fuente et al., 1997). Não seria e do custo ambiental envolvido pela destrui-
inconcebível que as limitações impostas pela ção da floresta. Assim, que lição podemos
carência de fósforo pudessem ser superadas retirar ao constatar a infertilidade dos solos
através do desenvolvimento de culturas agrí- e o fracasso da implantação da pecuária ex-
colas capazes de associar-se com micorrizas tensivas nestas áreas?

Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 125 8/18/2022 3:13:55 PM


DESTRUIÇÃO E CONSERVAÇÃO
126 DA FLORESTA AMAZÔNICA

Acreditamos que a lição principal vem cátions. Mudanças provocadas pela perda de
da constatação de que os lucros obtidos da matéria orgânica e pelo aumento da compacta-
conversão, para agricultura ou pecuária, ção do solo podem ser revertidas adotando-se
de áreas como aquelas onde estão situadas períodos de pousío. Entretanto, até que ponto
as reservas do PDBFF, são mínimos quan- a sua capacidade em recuperar o solo e rege-
do comparados com o verdadeiro valor dos nerar a floresta compensaria os impactos do
serviços ambientais prestados pela floresta desmatamento constitui foco importante de
intacta. Mesmo considerando que o retorno debate. Infelizmente, a possibilidade teórica
financeiro a ser obtido futuramente através de recuperação de áreas abandonadas por dé-
do fornecimento desses serviços, por parte cadas, ou até mesmo séculos, tem pouca rele-
de países como o Brasil, seja subestimado, vância diante das perdas reais produzidas pelo
o retorno financeiro da agricultura ou da pe- avanço contínuo do desmatamento na região.
cuária também será insignificante quando
O termo “resiliência” encontra-se em
comparado com os valores que, de fato, po-
evidência nas discussões sobre o desenvol-
deriam ser obtidos (Fearnside, 1997c).
vimento amazônico, referindo-se à habili-
dade de um sistema em recuperar suas ca-
Perspectivas de resiliência racterísticas originais após a ocorrência de
determinado distúrbio (por exemplo, Smith
As correlações observadas entre várias
et al., 1995). Os solos das reservas do PDBFF
características do solo seguem padrões ge-
seriam resilientes a ponto de recuperar suas
rais consistente com outros estudos sobre
características originais após serem conver-
solos tropicais. Estas correlações (Figura 1
tidos para pastagens degradadas? Existem
e Tabela 2) indicam algumas das prováveis
razões bem consistentes para duvidar desta
mudanças que resultariam das intervenções
capacidade. Entre elas incluem-se os original-
humanas na floresta: exploração seletiva de
mente baixos níveis de nutrientes essenciais,
madeira, criação de bordas através da frag-
que seriam esgotados em curto prazo. Entre
mentação da floresta e remoção da floresta
as mudanças que ocorrem normalmente po-
para implantação da agricultura ou pecuária.
de-se prever a perda de argila e de carbono,
No caso da exploração madeireira, as mu- junto com os cátions a eles associados. O
danças normalmente observadas incluem a carbono pode ser reposto pela vegetação de-
compactação do solo ao longo as trilhas dos senvolvida em pousíos prolongados, mas, na
tratores utilizados no transporte da madeira prática, pode-se duvidar que os solos seriam
(Veríssimo et al., 1992), exportação de nu- deixados em pousío por períodos suficientes
trientes através da biomassa removida (Ferraz para que isto aconteça (Fearnside, 1996a).
et al., 1997) e remoção de cátions presentes
Diferentes pessoas analisando o mesmo
no solo através da lixiviação e do escoamento
conjunto de dados podem chegar a conclu-
superficial (Jonkers & Schmidt, 1984).
sões radicalmente diferentes. Serrão et al.
A remoção por completo da cobertura flo- (1996: 8), por exemplo, consideram que a
restal provoca impacto significativo sobre os regeneração da floresta secundária (capoei-
estoques de nutrientes e na estrutura do solo ra) em pastagens abandonadas indica que
(veja revisão em Fearnside, 1986b). As carac- “o ecossistema florestal amazônico é bas-
terísticas do solo importantes para o desenvol- tante resiliente aos usos atuais”, embora
vimento das plantas modificam-se simultane- outros discordem. Por exemplo, Fearnside &
amente: na medida em que se ajustam a um Guimarães (1996).
novo equilíbrio, os fatores tenderão a manter,
entre um e outro, as mesmas relações obser- Distribuição da vegetação natural
vadas anteriormente no solo sob a floresta. As
queimadas elevam o pH e contribuem com Em grande escala, a relação entre o solo,
nutrientes para o solo, entretanto, o cultivo espécies arbóreas e biomassa torna-se eviden-
agrícola normalmente implica em perdas de te, cite-se aqui a diferença entre a vegetação
matéria orgânica e de argila que, gradualmen- de baixa densidade das campinas e campina-
te, reduzem a capacidade do solo de reter os ranas que ocorrem sobre solos de areia branca

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na área de Manaus, e a vegetação com eleva- relacionadas à sobrevivência de plântulas e


da biomassa que ocorre sobre solos argilosos às taxas de crescimento das árvores adultas.
nos platôs elevados encontrados nas reservas A associação de espécies com solos pode
do PDBFF. Entre solos que apresentam maior ser demonstrada através da biomassa flo-
semelhança, como aqueles encontrados no restal, quando espécies caracterizadas por
conjunto de reservas do PDBFF, as diferenças apresentar indivíduos de grande porte são
são sutis, mas de existência provável. encontradas sobre determinado tipo de solo.
Estudos desenvolvidos em várias partes Qualquer efeito do solo sobre a ocorrência de
dos trópicos indicam a existência de relações espécies emergentes de grande porte poderia
entre ocorrência de espécies arbóreas e ca- influenciar significativamente a distribuição
racterísticas dos solos. Uma revisão (Sollins, de biomassa na floresta, já que grande par-
1998) em 18 estudos desenvolvidos em te da biomassa da floresta se concentra fre-
Florestas Tropicais de terras baixas, mostrou qüentemente em apenas alguns destes gran-
que a existência de relações entre a ocorrên- des indivíduos (Brown et al., 1995; Clark &
cia de determinadas espécies e o regime de Clark, 1995). Independente do efeito espe-
drenagem do solo é comum. Um caso impor- cífico sobre a distribuição das espécies, po-
tante é o estudo de Lescure & Boulet (1985) de-se esperar que o efeito da fertilidade do
em 16,8 há de floresta na Guiana Francesa, solo no desenvolvimento vegetal se traduza
indicando que a presença de 69% das espé- por uma associação positiva com a biomassa
cies arbóreas se relaciona às condições de florestal. Uma análise de ordenação da dis-
drenagem do solo. tribuição da biomassa com relação aos solos
nas reservas de PDBFF indica que 53% da
Em somente três, entre os 18 estudos re- variância na biomassa é explicada pela exis-
visados por Sollins (1998), foram observadas tência de um gradiente relacionado ao con-
relações de ocorrência de espécies arbóreas teúdo de argila (associado positivamente aos
e propriedades químicas do solo: Ashton & níveis de N total, C orgânico, bases trocá-
Hall (1992) encontraram relações com P e veis, K+, Mg2+, Ca2+, Al3+, H+ e capacidade
cátions em Sarawak e Brunei; Clark et al. de troca catiônica) (Laurance et al., 1999).
(1995) encontraram relações com P, Al e
pH na Costa Rica, e Van Schaik & Mirmanto
(1985) apontaram uma relação com pH na
Potencial de liberação dos gases de
ilha de Sumatra. Os três estudos que detec- efeito estufa
taram relações com propriedades químicas A enorme quantidade de carbono nos so-
foram aqueles com as maiores amplitudes los e na biomassa das florestas na Amazônia
referentes a indicadores químicos de ferti- deve-se ao elevado estoque deste elemento
lidade (as variáveis independentes). Sollins armazenado por hectare nas vastas áreas co-
(1998) acredita que a amplitude limitada de bertas pela floresta amazônica que ainda são
fertilidade do solo dentro das áreas nas quais mantidas intactas. A liberação, a partir deste
foram desenvolvidos os estudos relacionan- estoque, tem contribuído significativamente
do a ocorrência de espécies às propriedades para o efeito estufa, em razão das taxas atuais
químicas é uma razão fundamental para o de desmatamento (Fearnside, 1996b, 1997d),
fracasso na demonstração da existência de enquanto, o grande estoque remanescen-
relações significativas. Outros ruídos, que te sugere uma importância ainda maior das
interferem na constatação de resultados po- ações que evitem novas emissões no futuro
sitivos sobre a existência de correlações, in- (Fearnside, 1997c). A conversão definitiva de
cluem a ocorrência de variação sazonal em cada hectare de floresta para outros tipos de
alguns indicadores chaves do nível de fer- uso do solo em um cenário definitivo pode
tilidade, especialmente o fósforo disponível, liberar aproximadamente 8,5 t de carbono do
cátions e pH. Cite-se que ambas as restrições solo para a atmosfera, considerando a cama-
se aplicam ao conjunto de dados do PDBFF.
da até 8 m de profundidade ao longo de 15
Pode-se esperar que a fertilidade e as anos, ou 7,4 t C/ha para uma profundidade
características hídricas dos solos sejam de 1 m (Fearnside & Barbosa, 1998).

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A variabilidade espacial em escala fina tornado mais freqüente após 1976 (Nicholls
na distribuição de carbono do solo, observa- et al., 1996). Ele resulta em secas prolonga-
da neste estudo, sugere a existência de uma das (de Souza et al., 2000) que podem ter
quantidade significativa de incerteza inerente impacto significativo sobre a floresta ama-
aos estudos sobre alterações no estoque de zônica (Tian et al., 1998). Espécies arbóre-
carbono do solo baseado em “cronoseqüên- as especializadas em áreas mais úmidas são
cias”, pois os efeitos de uso do solo (como particularmente vulneráveis ao estresse pro-
pastagem) são deduzidos de comparações en- vocado pela falta de água. Por exemplo, na
tre amostras coletadas quase simultaneamen- Ilha de Barro Colorado, Panamá, tais espé-
te em vários locais com diferentes histórias de cies sofreram uma mortalidade extremamen-
uso (veja Fearnside & Barbosa, 1998). Porém, te elevada durante o evento El Niño de 1982-
diferenças significativas entre estas áreas po- 1983 (Hubbell & Foster, 1990: 531).
deriam ocorrer devido à variação espacial na-
Evidências arqueológicas sugerem
tural e não em função do uso do solo.
que incêndios catastróficos ocorreram na
Amazônia, sempre em sincronia com even-
Resposta provável da floresta à tos El Niño, quatro vezes durante os últi-
fragmentação mos 2.000 anos: 1.500, 1.000, 700 e 400
anos antes do presente (Meggers, 1994). A
Os estudos desenvolvidos na área do ação humana poderia fazer com que even-
PDBFF forneceram evidências inegáveis so- tos El Niño menos intensos, tais como os que
bre o fato de que a criação de bordas resulta ocorreram em 1982-1983 e em 1997-1998,
em um aumento da mortalidade de árvores
assumam proporções catastróficas (Barbosa
localizadas nas proximidades destas áreas
& Fearnside, 2000). Sabe-se que os eventos
(Laurance et al., 1998; Lovejoy et al., 1984).
menos intensos são muito mais freqüentes
Estas bordas apresentam um ar mais seco
do que aqueles de grande intensidade, en-
que aquele encontrado no interior da flo-
tretanto, seus efeitos podem se tornar mais
resta (Kapos, 1989; Kapos et al., 1993). O
agudos quando somados aos efeitos previs-
aumento na mortalidade de árvores nas pro-
tos das mudanças climáticas, como a redu-
ximidades das bordas provoca um “colapso
ção de chuva provocada pela redução da eva-
de biomassa”, liberando o carbono para a
potranspiração causada pelo desmatamento
atmosfera (Laurance et al., 1997).
continuado (Lean et al., 1996; Salati & Vose,
É provável que algumas características 1984) e ao efeito das alterações na tempera-
dos solos desempenhem um papel importan- tura média e na distribuição de chuva causa-
te na mortalidade de árvores sob estas con- da pelo efeito estufa (veja Fearnside, 1995).
dições de estresse. Pode-se esperar que solos Embora não exista a expectativa de que es-
com maiores quantidades de areia retenham tas alterações produzam, por si só, reduções
menos água, produzindo maior estresse hí- radicais na precipitação pluviométrica, seus
drico na vegetação localizada sob o ambiente efeitos são ampliados pela variabilidade na-
mais seco nas proximidades das bordas. No tural, como aquela causada pelo fenômeno
entanto, solos arenosos são associados aos El Niño, por perturbações promovidas pela
fundos de vale, nos quais se espera a ocorrên- exploração madeireira e pela criação de áreas
cia de um volume adicional de água no solo, de bordas em fragmentos. A exploração ma-
quando comparados aos locais mais altos. deireira está aumentando rapidamente nas
florestas amazônicas, criando áreas abertas
Resposta provável da floresta à mudança e mais inflamáveis devido ao acúmulo de
climática combustível representado pelos resíduos flo-
restais e por árvores mortas acidentalmente
Atualmente, podem ser previstas, ou durante a exploração (Uhl & Buschbacher,
mesmo constatadas variações e mudanças 1985; Uhl & Kauffman, 1990). O avanço
climáticas de vários tipos. O fenômeno co- contínuo das frentes de assentamentos e
nhecido como “El Niño/Oscilação do sul”, desmatamento na região significa que, atual-
ocorre periodicamente há milênios e tem se mente, existem mais oportunidades para que

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Solo e desenvolvimento na Amazônia: Lições do
Projeto Dinâmica Biológica de Fragmentos Forestais 129

ocorram incêndios descontrolados nas flores- identifica o “caráter latossólico” no siste-


tas adjacentes às áreas de cultivo (Nepstad ma de classificação de solo brasileiro as-
et al., 1999). Os efeitos das ações citadas an- sume que a relação dos óxidos de silício
teriormente somam-se aos provocados pela e de alumínio (SiO2:Al2O3) apresente um
variabilidade e mudança climática, criando valor menor que dois (veja Sombroek,
um sinergismo que aumenta o risco de pro- 1966: 69). Valores abaixo de dois geral-
pagação de incêndios na floresta intacta. mente indicam que os minerais de sili-
Os solos desempenham um papel impor- cato de argila apresentam uma estrutura
tante no tipo de resposta da floresta aos dis- com distribuição regular de átomos em
túrbios provocados por estes eventos. Assim, um razão de 1:1 (Sombroek, 1966: 80). A
pode-se prever que as árvores estabelecidas relação refere-se ao número de lâminas
em solos com baixa disponibilidade de água, de tetraedro de silício e lâminas de octae-
como é o caso daquelas sobre estresse hídrico dro de alumínio que formam a fração ar-
relacionado às áreas de bordas, sejam aquelas gila, e é um dos determinantes primários
que apresentem maior probabilidade de su- das propriedades do barro (Young, 1976:
cumbirem durante os eventos extremos. 73). A quantidade mais baixa de silicatos
nestes solos, quando comparada à estru-
tura formada por uma relação de 2:1, é
CONCLUSÃO uma conseqüência da remoção de silício
Os solos das reservas do PDBFF podem do perfil do solo (junto com a maioria
ser considerados típicos para vastas áre- dos minerais intemperizados, incluindo
as da Amazônia brasileira que, provavel- nutrientes importantes para plantas) ao
mente, sofrerão uma pressão crescente de longo de milhões de anos de lixiviação.
desmatamento. Na ausência de dados analíticos sobre
SiO2 e Al2O3, a mineralogia da argila dos
Estes solos apresentam baixa fertilidade, horizontes subsuperficiais (que são po-
são ácidos e têm níveis elevados de íons tó- bres em matéria orgânica) pode ser de-
xicos de alumínio. Eles também apresentam duzida da capacidade de troca catiônica
limitações para o estabelecimento da agri- (CTC) apresentada pela fração argila que
cultura devido sua topografia ondulada, ele- é calculada como o CTC do solo dividida
vado conteúdo de argila e baixa capacidade pela porcentagem de argila, multiplicado
de disponibilidade hídrica. Os resultados das por 100; valores abaixo do limite de 16-
análises de solos indicam que eles produzi- 20 m.e./100 g de argila indicam a ausên-
riam pouco se convertidos para a agricultura cia de minerais de argila apresentando a
ou pecuária, e apontam para a necessidade relação 2:1 (Young, 1976: 95-96).
de priorizar a adoção de usos que mante-
nham a cobertura florestal intacta. (2) O pH dos extratos usados nas análises de
laboratório afeta os valores obtidos para
Embora os serviços ambientais prestados os cátions que compõe o CTC e, como
pela floresta intacta não gerem atualmente as determinações normalmente não são
nenhum rendimento financeiro, o valor po- feitas nos valores de pH do solo origi-
tencial destes serviços excede em muito os nal, os resultados obtidos representam
lucros que podem ser esperados da agricul- somente um índice relacionado ao valor
tura ou pecuária implantada após o corte da verdadeiro da CTC. No Brasil, os extratos
floresta. usados para as determinações são tam-
ponados a um pH 7,0 (Brasil, SNLCS-
NOTAS EMBRAPA, 1979). Valores para CTC de-
terminados ao nível do pH do solo (CTC
(1) O critério utilizado para a definição de efetivo) é muito mais baixo que os obti-
Latossolos estabelece que o horizon- dos, seja a um pH 7,0 ou a um pH 8,2,
te B deve ser “latossólico”, ao invés de padrão utilizado às vezes nos Estados
“textural” (i.e., argiloso). O critério que Unidos (Sánchez, 1976: 150-151).

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Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 134 8/18/2022 3:13:56 PM


CAPÍTULO

8
Fatores limitantes para o desenvolvimento da
agropecuária na Amazônia brasileira

Philip M. Fearnside
Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia – INPA
Av. André Araújo, 2936 – CEP: 69.067-375, Manaus, Amazonas, Brasil.
E-mail: pmfearn@inpa.gov.br

Tradução de:
Fearnside, P.M. 1997. Limiting factors for development of agriculture and ranching in Brazilian
Amazonia. Revista Brasileira de Biologia 57(4): 531-549.

135
Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 135 8/18/2022 3:14:03 PM
DESTRUIÇÃO E CONSERVAÇÃO
136 DA FLORESTA AMAZÔNICA

RESUMO modificador da tolerância dos organismos


ao responder aos limites de mínimo ou de
Fatores limitantes restringem tanto a in- máximo. A “lei da tolerância” de Shelford
tensificação da agropecuária como a escala completou o conceito de fatores limitantes
em que estes usos da terra podem ser amplia- na forma como geralmente é aplicada hoje.
dos. A expressão dos fatores limitantes no de-
senvolvimento é mediada pelo planejamento A maior parte do uso de fatores limitan-
humano: a percepção de limites sobre os ren- tes enfoca os efeitos de um único fator, sen-
dimentos agrícolas, a severidade e a probabi- do a redução na complexidade permitida por
lidade de impactos ambientais, pode conduzir esta abordagem é um dos aspectos mais for-
a decisões para limitar a expansão agrícola. te do conceito, em fazer sentido uma gama
Limites sobre a intensificação da agricultura de possíveis influências que, de outra forma,
incluem limites agronômicos (sobre os rendi- seriam confusas. No entanto, fatores únicos
mentos por hectare), tecnológicos, de pesqui- raramente limitam organismos ou popula-
sa e culturais. Limites sobre a expansão das ções no mundo real. Hubbell argumentou
áreas agrícolas incluem recursos físicos limi- fortemente contra a “inundação de respostas
tantes, tais como jazidas de fosfato, e limites de fator único nos últimos 20 anos” (1973:
de valores sociais, institucionais (inclusive a 95). Ele sugere que, ao invés disso, “vários
credibilidade das instituições), sobre a habi- fatores podem agir simultaneamente, con-
tação humana (tais como a saúde), e sobre cebivelmente igualmente” na limitação de
riscos ambientais. Limites de considerações populações a qualquer momento no tempo.
nas esferas política e militar frequentemen- A produção pode ser não apenas colimita-
te anulam “decisões racionais”, baseadas na da através de vários fatores, mas também
aptidão do solo e nas consequências ambien- os sinergismos entre fatores podem resultar
tais. No entanto, este tipo de “interferência” em maiores aumentos de produção quando
pode causar uma gama de impactos que, se certas combinações de fatores são forneci-
corretamente avaliados, provavelmente tor- das juntas. O melhor exemplo é a limitação
naria o resultado líquido de tais projetos de de água e de nitrogênio sobre a produção de
desenvolvimento, negativo para os interesses terras de pastoreio na região Sahel da África
nacionais do Brasil. (veja revisão por Hall, 1990).
Entre os tipos de fatores limitantes que
PALAVRAS CHAVE: agropecuária, Amazônia,
afetam o crescimento de plantas em geral,
capacidade de suporte, desenvolvimento
inclusive a agricultura na Amazônia, estão
econômico, desmatamento, fatores limitan-
nutrientes de solo, água, luz, gás carbônico,
tes, pecuária bovina
ataques de pragas e doenças. Em sistemas
agrícolas, pode-se contornar os fatores limi-
INTRODUÇÃO: FATORES LIMITANTES tantes (até certo ponto) por contribuições
externas de energia, fertilizantes e outros
Tipos de fatores limitantes insumos que dependem da disponibilidade
de capital.
Justus Liebig (1840) observou que plan-
tas requerem certas substâncias químicas do O uso de insumos agrícolas de fora faz
solo ,e que elas não podem crescer a me- com que seja necessária a definição explícita
nos que uma quantidade mínima de cada dos limites sobre estes insumos (e, por con-
substância esteja presente. O nutriente que seguinte, sobre a capacidade de suporte hu-
está carente, então, limita o crescimento da mano). Podem ser evitadas carências locais
planta (um princípio que, até hoje, guia a não apenas pela importação de insumos de
teoria na ecologia e a prática na aplicação energia, mas também de fertilizantes e capi-
de fertilizantes na agricultura). Esta “lei do tal inicial. Ao extremo, poderia até mesmo
mínimo” foi ampliada por Blackman (1905) ter agricultura na lua se for permitido im-
para incluir os efeitos limitantes do máximo, portar tudo de fora do sistema local. Os limi-
e por Shelford (1911) para incluir o efeito tes práticos sobre a importação de insumos

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Fatores limitantes para o desenvolvimento
da agropecuária na Amazônia brasileira 137

provavelmente serão determinados através sobre políticas entenderem que a natureza


dos mercados para os produtos agrícolas ex- possui limites sobre a produção agrícola, e
portados do sistema e pela natureza finita dos enfatiza o potencial de melhorar a eficiência
estoques disponíveis dos insumos nas áreas fazendo melhor uso do conhecimento indí-
de origem. Estes limites são críticos por causa gena e através da agilização das instituições
da vasta área da Amazônia: 5 × 106 km2 na através da participação de organizações que
Amazônia Legal brasileira (Fig. 1). agem em diferentes níveis, desde o micro
(local) até o macro (das políticas públicas).
Fatores limitantes do desenvolvimento
amazônico podem ser agrupados em uma Os limites do desenvolvimento atuam de
série de classes, das quais limitações agro- dois modos: limites sobre a produção por
nômicas representam apenas uma. Também área imposta por restrições na intensifica-
são importantes as limitações institucionais, ção de uso em qualquer determinado hecta-
limites impostos por valores, mecanismos re de terra, e restrições na área para a qual
ou costumes sociais, por condições de vida a atividade pode se expandir, como ditado,
humana e pelo contexto macroeconômi- por exemplo, pela área “disponível”. Alguns
co do desenvolvimento. Salati et al. (1998) dos fatores são trocáveis entre os dois tipos
examinaram a pergunta de fatores limitan- de restrições, como fertilizantes, mão-de-
tes sobre o desenvolvimento sustentável na -obra e capital entre intensificar produção
Amazônia, agrupando as limitações naque- por hectare e ampliar o número de hecta-
las que afetam a produtividade biológica e res. Alguns fatores não são trocáveis, como
na esfera institucional. Estes autores mostra- os que não envolvem a distribuição entre
ram a necessidade de tomadores de decisões opções concorrentes; exemplos incluem os

Figura 1. A Amazônia
Legal brasileira.

Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 137 8/18/2022 3:14:03 PM


DESTRUIÇÃO E CONSERVAÇÃO
138 DA FLORESTA AMAZÔNICA

impedimentos impostos por valores sociais comunidade, e por isso que Allan (1965)
e fatores macroeconômicos. chamou isto de “excesso natural da agricul-
tura de subsistência nível”. Este mecanismo
Expressão de fatores limitantes envolve plantar mais área de cada colheita do
que seria necessária para que seja produzido
Intermediação do planejamento o suficiente para a subsistência, mesmo que
Avaliação de fatores limitantes sobre o o rendimento fosse mau, assim fornecendo
desenvolvimento é fundamentalmente dife- uma margem de segurança contra carências.
rente, de alguns modos, de avaliar limitar
fatores para uma população de organismos LIMITES SOBRE A INTENSIFICAÇÃO
em um ecossistema natural ou no campo de
um fazendeiro. Limites de desenvolvimento Limites agronômicos sobre rendimento
são mediados através de inteligência huma- por hectare
na, pelos mecanismos de planejar (inclusive
zoneamento) e uma variedade de barreiras A “lei do mínimo” de Liebig é aplicada
reguladoras (incluindo avaliações de impac- na agricultura na forma conhecida como o
tos ambientais). Se terra pobre conduzirá a “modelo de resposta linear e platô”. A res-
colheitas fracassadas ou se o desmatamen- posta ao rendimento da colheita abaixo de
to conduzirá para erosão e degradação do um nível suficiente de cada nutriente é con-
solo, então a percepção destes limites pode siderada linear, enquanto nenhuma resposta
conduzir a decisões para não cortar floresta ocorre acima desse limiar. Este modelo foi
para agricultura. Em lugar de simplesmente mostrado para ser adequado para propósi-
permitir que os colonos encontrem os limi- tos práticos para o trabalho agronômico em
tes físicos, uma camada adicional de infor- terras tropicais, com resultados apenas mar-
mação, julgamentos de valor e tomada de ginalmente melhores sendo obtidos usando
decisão é interposto entre as limitações fí- funções quadráticas (Waugh et al., 1975). O
sicas e as decisões sobre desenvolvimento. modelo de resposta linear e platô foi apli-
Por exemplo, quais são os níveis aceitáveis cado a culturas agrícolas usadas por colo-
de risco de fracasso da colheita? Quais são nos na rodovia Transamazônica (Fearnside,
os riscos aceitáveis de grandes catástrofes 1986a). Por causa do solo ácido na maioria
ambientais? Estes e uma larga gama de ou- da área (na maior parte da Amazônia), o
tras considerações determinarão os fatores pH é frequentemente o caráter limitante do
limitantes aplicáveis para o desenvolvimen- solo, por exemplo, para milho (Zea mays),
to da agropecuária na Amazônia. feijão (Phaseolus vulgaris), feijão de corda
(Vigna sinensis), mandioca brava e maca-
Efeito de variabilidade xeira (Manihot esculenta), pimenta-do-reino
A variabilidade de qualquer fator, em lu- (Piper nigrum) e cacau (Theobroma cacao).
gar de apenas o valor médio, é um aspecto Com o passar do tempo, o domínio do pH
essencial de limitação. O fósforo do solo, a tende a exagerar o seu papel na manutenção
chuva, o dinheiro ou outras necessidades dos níveis de produtividade das culturas. O
variam muito no espaço e no tempo. A ca- pH pode ser mantido em um nível razoável
pacidade para sobreviver às carências de um através de queimadas frequentes das roças
determinado fator, depende, em parte, de agrícolas, mas é provável que outros limites,
mecanismos como uma almofada monetária tais como a falta de matéria orgânica e de vá-
(ex., dinheiro, ou uma reserva equivalente rios cátions associados, apareçam em alguns
como o gado, que pode ser utilizado quando anos (Fearnside, 1986a). O arroz (Oryza sa-
necessário). Em sociedades agrícolas tradi- tiva) está limitado pelo pH em combinação
cionais, dinheiro vivo e armazenamento de com matéria orgânica, iones de alumínio
valor e produtos são raros, mas formas de e fósforo total (Fearnside, 1986a). No caso
seguro são providas compartilhando entre da pastagem, o fósforo disponível limita a
membros da família ou agrupamentos da produção (Serrão & Falesi, 1977; Fearnside,

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Fatores limitantes para o desenvolvimento
da agropecuária na Amazônia brasileira 139

1979a). Os rendimentos de todas as culturas aumentos na colheita total são obtidos atra-
anuais não só dependem da fertilidade do vés da expansão das áreas cultivadas (Paiva
solo, mas também da densidade de plantio, et al., 1976: 62-68).
da consorciação com outras culturas, e dos A tentativa mais conhecida para diminuir
ataques de pragas e doenças. os limites de restrições do solo para susten-
tar produção agrícola ao longo do tempo é
Limites tecnológicos e de pesquisa o projeto para desenvolver cultivo contínuo
empreendido pela Universidade Estadual da
A tentação sempre é forte em acreditar
Carolina do Norte (NCSU), junto com ins-
que a pesquisa removerá praticamente todos
tituições peruanas, em Yurimaguas, Peru
os limites sobre o desenvolvimento, e não
(Sánchez et al., 1982; Nicholaides et al.,
há nenhum lugar onde tais voos de imagina- 1985; veja Fearnside, 1987, 1988; Walker et
ção estão mais livres de correr soltos do que al., 1987). Depleção do solo é um proble-
na Amazônia. Por causa da vasta área da re- ma fundamental que fica cada vez mais caro
gião, estão suposições de áreas enormes de e problemático para corrigir na medida em
agricultura intensiva na Amazônia o fator que o tempo procede sobre cultivo contínuo.
mais importante que está por trás de conclu- Todos os nutrientes removidos nas colheitas
sões globais fantásticas sobre a capacidade colhidas ou perdidos por erosão, lixiviação,
da terra para sustentar populações humanas. podem ser substituídos por outros processos
Presume-se que isto faça parte da convic- na forma de fertilizantes. O custo da substi-
ção do então presidente dos E.U.A., Ronald tuição não só tem que incluir a despesa sig-
Reagan de que “estudos agrícolas” haviam nificativa de comprar os fertilizantes e trans-
mostrado que o mundo poderia sustentar 28 portá-los até o local, mas também a despesa
bilhões de pessoas, se pudessem persuadir de identificar quais elementos estão faltando
os outros países a cultivarem as suas áreas e em que quantidades para cada roça, e de
aráveis na mesma intensidade que é encon- comunicar estas informações a tempo ao
trada nos E.U.A. (Holden, 1980: 989). agricultor para permitir a correção das de-
É fácil para os planejadores se ficiências antes que os rendimentos sejam
convencerem que os rendimentos das afetados. Os principais macronutrientes (ni-
culturas podem aumentar indefinidamente, trogênio [N], fósforo [P] e potássio [K]), jun-
e que eles podem aumentar a sempre to com calcário, respondem pela maioria da
taxas crescentes. Por exemplo, quando a despesa de compra e transporte. Sánchez et
Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária al. (1982: 825) afirmam que as quantidades
(EMBRAPA) foi criada em 1974, uma série de fertilizante que precisam ser fornecidas
de projeções de rendimentos por hectare destes elementos são semelhantes às quan-
foi feita para culturas diferentes que tidades usadas por agricultores na região su-
presumem crescimento linear, logarítmico e deste dos E.U.A. Embora este fato poderia
exponencial do rendimento (Páez & Dutra, ter a aparecia de implicar que a agricultura
1974). Recentemente, Gallopín & Winograd poderia ser tal lucrativa na Amazônia como
(1995: 27) chegaram a uma conclusão na Carolina do Norte, deveria se lembrado
otimista com relação às perspectivas para que as distâncias longas elevam em muito o
um «cenário sustentável”, presumindo que custo de fertilizante e diminuem em muito
os rendimentos por hectare das culturas os preços recebidos pelas colheitas que é o
aumentarão exponencialmente a 1,5-2,0%/ caso em outros lugares.
ano (veja Fearnside, 1996a). A ideia de que A correção da depleção de micronutrien-
o crescimento exponencial é uma opção está tes, embora requeira apenas pequenas quan-
enganada, e a noção que se pode selecionar tidades de fertilizantes importados, acrescen-
isto como se fosse escolher algo de uma es- taria substancialmente ao custo e ao risco dos
tante é ainda mais perigosa. Na realidade, agricultores que praticam o sistema. Devem
os rendimentos brasileiros por hectare tra- ser equilibrados os nutrientes para evitar siner-
dicionalmente têm sido quase constantes, gismos prejudiciais. O sistema requer análise

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DESTRUIÇÃO E CONSERVAÇÃO
140 DA FLORESTA AMAZÔNICA

do solo e amostras de planta depois de cada frequente nas roças dos agricultores amazôni-
colheita para calcular a mistura certa de nu- cos. Fracassos seriam mais altos por causa do
trientes para fertilização. Está temeroso imagi- fornecimento incerto de insumos e das infor-
nar a expansão da capacidade dos laboratórios mações sobre quais insumos são necessários.
e dos serviços de extensão que seria necessária
Para fazer o sistema funcionar correta-
para controlar os milhões de amostras que se-
mente, é necessário informações separadas
riam geradas se a tecnologia Yurimaguas fosse
para cada campo. Sánchez et al. (1982: 824)
implementada amplamente. Embora estes ser-
afirmaram que “a cronometragem do apare-
viços foram fornecidos grátis (ex., como um
cimento de limitações de fertilidade de solo
subsídio) por NCSU no caso dos agricultores
que colaboram com a estação experimental de e a intensidade da sua expressão variou
Yurimaguas, os agricultores, os contribuintes nos [três] campos [de teste], embora eles
ou os consumidores nos países amazônicos estivessem localizados perto um do outro,
teriam que aguentar estas despesas se o sis- estavam na mesma unidade cartográfica de
tema fosse ampliado. Quando Sánchez et al. solo, e tiveram a mesma vegetação antes de
(1982) publicaram os primeiros resultados da desmatar. A intensidade do fogo durante o
experiência, as parcelas experimentais tinham desmatamento é considerada um fator que
oito anos e precisavam, além de N, P, e K a contribui a esta variabilidade”. A dificul-
substituição de cinco outros nutrientes: mag- dade de adquirir resultados a tempo para
nésio, cobre, zinco, boro e molibdênio. Três medidas apropriadas de correção, quando
anos depois, tinham sido acrescentados mais só alguns campos experimentais são en-
dois nutrientes à lista: enxofre e magnésio (D. volvidos, deveria dar alguma indicação da
Alterne, comunicação pessoal, 1985). O gru- magnitude dos problemas que seriam en-
po de pesquisa se queixou da dificuldade de frentados por agricultores tentando extrair
obter pureza adequada nas amostras de solo resultados deste tipo dos laboratórios de
e a precisão suficiente nas análises de labora- solos do governo e as suas burocracias as-
tório: com micronutrientes, uma diferença de sociadas. Uma situação paralela pode ser
só algumas partes por bilhões pode ter um im- encontrada nas dificuldades dos agriculto-
pacto grande em rendimentos de colheita. A res na rodovia Transamazônica do Brasil
dificuldade de obter tal precisão seria indubi- na obtenção da liberação de desembolsos
tavelmente muito maior para agricultores com de crédito no momento apropriado no ano
dificuldades de isolamento geográfico, falta de agrícola (Moran, 1981).
educação e uma ligação tênue com as instala-
ções de laboratório por meio de uma cadeia Limites culturais
de pessoal de extensão que frequentemente
faltam treinamento e motivação. Qualquer A ideia de que a Amazônia pode, um
erro ou demora no cálculo da mistura correta dia, se assemelhar aos vales do Ganges ou
de fertilizantes pode causar perdas nos ren- do Yangtze, com populações humanas den-
dimentos. Sánchez et al. (1982: 824) admite: sas que são sustentadas por arroz irrigado,
“No tratamento completo, foram aplicados aponta a importância de limitações culturais
fertilizantes e calcário de acordo com as re- e o grande abismo que existe entre os limi-
comendações baseadas em análises de solo. tes físicos e as restrições sobre populações
Durante o segundo ou terceiro ano, no entan- humanas. Não é provável que a Amazônia
to, os rendimentos começaram a diminuir ra- sofra uma transformação deste tipo no futu-
pidamente. A análise do solo identificou dois ro previsível porque, entre outras barreiras,
possíveis fatores... calcário, e... magnésio”. Se a população que habita a região teria que
rendimentos puderem sofrer por causa de má sofrer mudanças culturais radicais para tor-
avaliação das necessidades de nutrientes em nar atraente a rotina pesada de transplantar
um campo experimental monitorado de perto arroz. É improvável que a agricultura ama-
por uma equipe altamente qualificada de agrô- zônica mude por transfusões de imigrantes
nomos de pesquisa, se esperaria que a queda de outros lugares onde métodos mais inten-
no rendimento das colheitas seria muito mais sivos já fazem parte da tradição cultural. Os

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Fatores limitantes para o desenvolvimento
da agropecuária na Amazônia brasileira 141

imigrantes japoneses em Tomé-Açu oferecem de uma maneira que garante “sabedoria” em


um bom exemplo (Fearnside, 1980a; Subler equilibrar os diferentes papéis que cada lo-
& Uhl, 1990), assim como os Gaúchos trazi- cal poderia terno ecossistema e na socieda-
dos à rodovia Transamazônica pelo Instituto de. Por exemplo, até agora, a tendência da
Nacional de Colonização e Reforma Agrária metodologia de zoneamento foi de avaliar
(INCRA) com a expectativa enganada de que as diferentes restrições sobre as escolhas
eles serviriam como um modelo para os co- agrícolas impostas pela qualidade do solo,
lonos provenientes de outras partes do País topografia, pluviosidade e outros fatores físi-
(Moran, 1981). cos. Os locais mais férteis são alocados aos
A mudança cultural que conduz à inten- usos mais intensos, enquanto os locais com
sificação ou à desintensificação da agricultu- pouco potencial agrícola são zoneados como
ra tem sido assunto de muita discussão entre reservas florestais.
cientistas sociais (revisado por Brookfield, A necessidade de precaução em de-
1972). Boserup (1965: 62-63) mostrou a signar áreas para a agricultura é ilustrada
tendência de pessoas que migram de áreas pela questão da expansão agrícola no Acre.
densamente povoadas para áreas escassa- Mapas preliminares de zoneamento produ-
mente povoadas abandonarem os métodos zidos pela EMBRAPA indicaram grandes
intensivos que elas usavam antigamente, áreas para agricultura, inclusive os dois ter-
substituindo os por métodos extensos. Isto ços ocidentais de Acre (Brasil, EMBRAPA,
aconteceu frequentemente na Amazônia, 1988). Um zoneamento preliminar feito pelo
por exemplo, entre os colonos que chegaram Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
na rodovia Transamazônica de outras partes (IBGE) difere do zoneamento da EMBRAPA
do Brasil nos anos 1970. em suas recomendações para a maioria da
Limitações educacionais restringem as Amazônia, mas concorda que o Acre oci-
opções agrícolas que podem ser implanta- dental deveria ser usado para agricultura
das. Um caso ilustrativo é a decisão da co- (Régis, 1989). Acredita-se que os solos des-
operativa Cotrijui, em 1986, de desistir de ta área são melhores que os da maioria da
uma iniciativa de criação de bicho de seda, Amazônia, pelo menos em uma escala muito
proposta em Mato Grosso, porque, de acordo geral. O Acre também é a melhor área para
com funcionários da cooperativa, era consi- estabelecer reservas extrativistas, tanto por
derado que os colonos na área tinham educa- causa das densidades relativamente altas de
ção insuficiente para dominar a tecnologia. árvores na floresta que produzem produtos
valiosos, como pela melhor organização so-
cial entre os habitantes humanos da floresta
LIMITES SOBRE A EXPANSÃO (Allegretti, 1990; Fearnside, 1989).

Limites de recursos físicos Decisões sobre o uso da terra, baseadas


em permitir a intensidade máxima que as
Aparte de limites de espaço, os recursos condições físicas permitem pode ultrapas-
físicos, tais como jazidas de fosfato, restrin- sar limites rapidamente em outras esferas
gem as áreas para as quais os diferentes usos quando são consideradas distribuições de
de terra podem se expandir. Decisões sobre o zoneamento individuais junto. O zonea-
uso da terra encarnam julgamentos de valor mento é mais que a soma das suas partes.
sobre que uso deveria ser feito de pedaços Podem ser esperados resultados enganosos
diferentes de terra. Quando são tomadas de- de métodos de zoneamento que não incluem
cisões em escala regional, como no zonea- providências por limitações de vários tipos
mento econômico-ecológico atualmente em na área, que pode ser alocada para qualquer
andamento no Brasil, a escala das áreas que uso da terra. Pode examinar cada célula em
entram nos resultados de usos diferentes, uma malha em um sistema de informação
em propriedades emergentes que não são geográfico (GIS), comparando o solo, chu-
pensadas a um nível micro. Não é fácil che- va, etc., com as demandas de uma determi-
gar a uma fórmula para tomar estas decisões nada cultura agrícola, e concluir que cada

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DESTRUIÇÃO E CONSERVAÇÃO
142 DA FLORESTA AMAZÔNICA

célula individual pode ser alocada ao uso ilusão cruel (veja Fearnside, 1990a). Estes
em questão, e ainda chegar a uma conclu- limites são ilustrados pela inviabilidade de
são global que é completamente irreal. Por aplicar em qualquer parte significante da
exemplo, esta é a explicação da conclusão Amazônia a tecnologia Yurimaguas para cul-
que o Brasil pode sustentar sete bilhões de tivo contínuo, previamente discutida.
pessoas, alcançada por um estudo realiza- Um dos fatores que conduzem aos altos
do pela Organização das Nações Unidas valores para capacidade de suporte que o
para a Alimentação e a Agricultura (FAO), estudo apontou para a Amazônia é a supo-
em colaboração com o Fundo de População sição de que a qualidade da terra em áreas
das Nações Unidas (UNFPA) e o Instituto ainda não cultivadas é igual à qualidade nas
Internacional de Análise de Sistemas áreas já cultivadas. O estudo vai tão longe
Aplicados (IIASA) (FAO, 1980, 1981, 1984; que alega que “há evidência de que a pro-
Higgins et al., 1982). dutividade das reservas pode ser mais alta,
Vale a pena examinar o estudo da FAO/ mas, por causa de simplicidade, é presumido
UNFPA/IIASA, já que a ilusão embutida nele, que a produtividade em potencial da terra
de que a Amazônia pode ser transformada nova esteja igual à da terra já sobre culti-
em um grande celeiro (uma ideia que ante- vação” (FAO, 1984: 43). Infelizmente, como
cede em muito tempo o estudo FAO/UNFPA/ também é verdade na maior parte do pla-
IIASA) é um persistente e pernicioso fator neta, as melhores terras são as primeiras a
no planejamento brasileiro para a região. Os serem aproveitadas para o cultivo, com a
resultados do estudo contêm numerosas in- qualidade da terra diminuindo progressiva-
consistências obvias com a realidade, indi- mente nas novas áreas de assentamento, até
cando que tais esforços precisam estar base- que apenas terras muito marginais perma-
ados em mais verdade terrestre. A Amazônia necem. Das terras em projetos de coloniza-
brasileira é toda indicada no estudo da FAO/ ção instalados os anos 1970 em Rondônia,
UNFPA/IIASA como capaz de sustentar en- 42% foram classificados por uma pesquisa
tre meia e uma pessoa por hectare ao baixo de solo do governo como sendo “boas para
nível atual de insumos tecnológicos, e entre agricultura com insumos baixos ou médios”.
cinco e dez pessoas por hectare com insu- Por exemplo, para projetos iniciados na pri-
mos altos (fertilizantes, mecanização e uma meira metade dos anos 1980, foram classi-
ótima mistura de culturas não irrigadas). ficados assim 15% da terra, enquanto para
Estes cálculos conduzem à conclusão de que áreas planejadas na época a quantidade foi
o Brasil poderia sustentar uma população de minúsculos 0,13% (Fearnside, 1986b).
incrível de 7,1 bilhões de pessoas, se altos Uma recomendação incluída no estudo
níveis de insumos fossem aplicados (Higgins da FAO/UNFPA/IIASA que os países em de-
et al., 1982: 104). A possibilidade implícita senvolvimento deveriam encorajar a migra-
de converter a região em uma vasta área de ção para as terras baixas tropicais, a partir
agricultura mecanizada com altos níveis de das áreas altamente povoadas em latitudes
insumos vai contra os limites de disponibili- e/ou altitudes mais altas (por exemplo, FAO,
dade de recursos para suprir os insumos. A 1984: 21), é provável provar uma catástro-
Amazônia não tem praticamente nenhuma fe ambiental, assim como já aconteceu com
jazida de fosfato; os transportes são caros, programas semelhantes em países como a
quando a vasta extensão da Amazônia é Colômbia, Equador, Bolívia e Indonésia. A
considerada, e a agricultura deste tipo logo sugestão de que propriedades “fragmenta-
entraria em conflito com os limites absolu- das” de terra devem se agrupar em “proprie-
tos deste recurso. A tentação é grande para dades consolidadas” como parte da transi-
ver a Amazônia como uma cornucópia em ção para agricultura de altos insumos (FAO,
potencial capaz de resolver os problemas da 1981: 16) acabaria com a função social de
população e de distribuição da terra; os limi- muitos programas tropicais de assentamen-
tes sobre a aplicação da agricultura intensiva to. As conclusões sobre a capacidade de
em grande escala tornam esta proposta uma suporte humano são afetadas pela falta de

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Fatores limitantes para o desenvolvimento
da agropecuária na Amazônia brasileira 143

consideração no estudo da igualdade na dis- de Minas Gerais, um local muito distante da


tribuição do alimento produzido, além do maioria da Amazônia. Brasil não é dotada de
efeito do sistema ativamente concentrador um estoque particularmente grande de fos-
de posse da terra que o relatório implicita- fato; os Estados Unidos, por exemplo, têm
mente recomenda. depósitos aproximadamente 20 vezes maio-
A necessidade de fertilizantes de fosfato res (de Lima, 1976). Em uma escala global,
torna as perspectivas pobres para manter o a maioria dos fosfatos ficam situados na
uso da terra mais comum nas áreas desmata- África (Sheldon, 1982). A continuação das
das—a pastagem—em grandes extensões na tendências prevalecentes desde a Segunda
Amazônia. No início dos anos 1970, quan- Guerra Mundial, em uso de fosfato, esvazia-
do os programas de incentivos fiscais para ria os estoques mundiais até os meados do
pastagens amazônicas estavam se expan- século XXI (Smith et al., 1972; E.U.A., CEQ
dindo rapidamente, a agência que hoje é a & Department of State, 1980). Embora uma
EMBRAPA manteve que o pasto melhorava extrapolação simples destas tendências seja
o solo (Falesi, 1974, 1976). Infelizmente, o
questionável por causa dos limites sobre o
fósforo disponível cai abruptamente do pico
aumento da população humana continuado
causado pela deposição inicial de cinza da
queima da floresta, depois de dez anos, os às taxas passadas (Wells, 1976), a conversão
níveis deste elemento crítico chegam a níveis de uma porção significativa da Amazônia
tão baixos quanto os sob a floresta virgem, e em pasto fertilizado aceleraria em muito o
muito abaixo dos níveis exigidos pelo capim dia quando o fosfato seria esgotado no Brasil
de pastagem (Fearnside, 1980b; Hecht, 1981, e no mundo. O Brasil seria sábio em ponde-
1983). Em 1977, a EMBRAPA mudou a sua rar cuidadosamente se deveria alocar para os
posição de que o pasto melhorava o solo,
passando a recomendar que a produtividade
seja mantida aplicando 50 kg/ha de fósforo
anualmente, equivalente a aproximadamen-
te 300 kg/ha de adubo superfosfato (Serrão
& Falesi, 1977; Serrão et al., 1979). A produ-
tividade muito maior de pastagem quando
fertilizada com fosfato é óbvia (Koster et al.,
1977). Os problemas são o custo de suprir o
fosfato e os limites absolutos dos estoques
mineráveis deste mineral.
Um relatório sobre as jazidas de fosfa-
to no Brasil, publicado pelo Ministério de
Minas e Energia, indica uma única jazida pe-
quena na Amazônia, situada na costa atlân-
tica perto da divisa entre Pará e Maranhão
(de Lima, 1976) (Fig. 2). Além do tamanho
pequeno da jazida, o seu fósforo tem a des-
vantagem de ser complexado com o alumí-
nio, dificultando o seu uso agrícola, embora
não seja impossível o desenvolvimento de
novas tecnologias para a fabricação de fer-
tilizantes (dos Santos, 1981: 178). Uma jazi-
da adicional foi descoberta no Rio Maecuru, Figura 2. Minas e
perto de Monte Alegre, Pará, embora a esti- jazidas de fosfatos no
Brasil (de Lima, 1976).
mativa do seu tamanho ainda esteja incom- A jazida na vale do Rio
pleta (Beisiegel & de Souza, 1986). Quase Maecuru é de Beisiegel
todos os fosfatos do Brasil estão no Estado & de Souza, 1986.

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DESTRUIÇÃO E CONSERVAÇÃO
144 DA FLORESTA AMAZÔNICA

pastos amazônicos os seus estoques rema- climáticos que estão dentro da capacidade
nescentes deste recurso limitado. dos sistemas naturais para corrigir ou absor-
ver, mas uma área grande deslancharia, em
Pode ser esperado que grandes expan-
algum ponto, processos que levam estes equi-
sões de pasto estejam sujeitas a erupções de
líbrios a se degenerar (Fearnside, 1985, Salati
doenças e insetos, da mesma maneira como
& Vose, 1984). A característica mais inquie-
outras grandes monoculturas. Trocando as
tante da pastagem é que não há nenhum li-
variedades de capim plantadas podem se
mite imediato para contrariar a sua expansão.
opor a tais problemas até certo ponto, mas
Diferente de outras culturas, especialmente as
o custo e a frequência de tal mudança de-
culturas perenes, limites de mercado para os
verá aumentar. A Brachiaria decumbens
produtos do sistema são improváveis de pa-
(braquiária), um capim antigamente comum
rar sua expansão, pois a demanda para carne
na rodovia Belém-Brasília, foi devastada no
de boi é tremenda e seria até maior se mais
início dos anos 1970 por erupções do in-
carne ficasse disponível. A disponibilidade de
seto da ordem Hemiptera conhecido como
mão-de-obra também não restringe a pasta-
cigarrinha (Cercopidae: Deois incompleta).
gem, por ser um sistema extenso com baixa
O capim colonião (Panicum maximum) se
demanda de mão-de-obra (Fearnside, 1980c,
tornou um favorito na área, e o seu desem-
1986a). O domínio de pastagem entre as es-
penho foi descrito pela EMBRAPA como
colhas de uso da terra permite que uma po-
“magnífico” (Falesi, 1974). A diminuição
pulação humana pequena tenha um impacto
posterior da produtividade ficou aparen-
máximo sobre o desmatamento (Davidson,
te, com a depleção do fósforo disponível e
1987: 8; Fearnside, 1983a).
a invasão de ervas daninhas. A invasão de
ervas daninhas em P. maximum é facilita- Limitações de insumos colocam restri-
da pelo hábito de crescimento em toucei- ções rígidas sobre a expansão de sistemas
ras desta espécie, que deixa espaços vazios agrícolas exigentes de fertilizantes, inclusive
entre os tufos de capim, e pela germinação sistemas agroflorestais (Fearnside, 1995a).
pobre das sementes produzidas pelo capim Mercados para os produtos restringiriam a
no campo. Antes dos anos 1980, a cigarri- expansão de muitos usos da terra (especial-
nha tinha se adaptado bem à P. maximum, mente culturas perenes, tais como o cacau)
mas não aos níveis devastadores alcançados que poderiam, de outra forma, ser escolhas
em B. decumbens. No final dos anos 1970, desejáveis dos pontos de vista de sustentabi-
a EMBRAPA começou a recomendar o ca- lidade e de impacto ambiental.
pim de hábito rastejador conhecido como Os limites de mercado, refletidos na di-
braquiária amazônica (Brachiaria humidico-
minuição dos preços de cacau que começou
la). Esta espécie era, no princípio, toleran-
1977, fazem com que as vantagens do cacau
te ao ataque de cigarrinha, mas os insetos
(e.g., Alvim, 1981) sejam improváveis a con-
se tornaram cada vez mais bem adaptados
tinuar, até mesmo para a pequena porção da
a ela.. A EMBRAPA atualmente recomenda
Amazônia que é atualmente dedicada a este
os capins brizantão (Brachiaria brizantha) e
uso da terra, deixado só entrar outras áreas
andropógon (Andropogon gayanus). A cons-
que poderiam ser zoneadas para expansão
tante mudança de espécies e recomendações
de plantações de cacau. Em Rondônia, a área
de fertilizante não alteram as características
principal de cacauicultura na Amazônia bra-
básicas de pastagem que torna a sua susten-
sileira, o Projeto POLONOROESTE do Banco
tabilidade duvidosa.
Mundial (um projeto de desenvolvimento re-
A sustentabilidade do pasto, assim como gional que incluiu a pavimentação da rodovia
também seus impactos sociais e ambientais BR-364), teve cacau como o esteio de seu pro-
é fortemente ligada à extensão potencial des- grama agrícola. A proposta do Banco para o
tas áreas. Uma área pequena de pastagem POLONOROESTE, que foi escrita antes do pro-
pode ser mantida com insumos de nutrientes jeto ser lançado, projetou o declínio nos preços
importados, enquanto uma área grande não do cacau que, na realidade, aconteceu desde
pode. Uma área pequena causaria impactos então, conforme a predição (IBRD, 1981).

Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 144 8/18/2022 3:14:04 PM


Fatores limitantes para o desenvolvimento
da agropecuária na Amazônia brasileira 145

Limites de valores sociais que estes agentes poderiam ter (veja Moran,
1981; Fearnside, 1986a).
Henry Walter Bates (1863), o grande natu-
ralista do século XIX, que erradamente acre- O financiamento, desde empréstimos
ditou que terras amazônicas eram férteis, se bancários para pequenos agricultores até
maravilhou que na Amazônia um fazendeiro grandes empréstimos internacionais para
[branco] poderia ganhar uma renda aceitá- projetos de desenvolvimento, representa um
vel com menos de uma dúzia de escravos. fator limitante para muitos tipos de uso da
Obviamente, os valores sociais mudaram desde terra. A natureza limitada dos fundos dis-
o tempo de Bates para excluir sistemas de pro- poníveis para distribuição pelas instituições
dução baseado em escravidão, ou pelo menos financeiras obviamente possui um limite ao
o tipo de escravidão que foi abolido no Brasil nível de financiamento. Este não é o único
em 1888. Os limites de aceitabilidade social não tipo de limitação, no entanto.
são estáticos. A “escravidão” de trabalhadores No caso de financiamento da agricultu-
de carvão vegetal na área de Grande Carajás, ra, restrições burocráticas sobre os emprés-
por exemplo, representa um sistema que, mais timos comumente excluem o financiamento
cedo ou mais tarde, tem que se acabar, com das camadas mais pobres da sociedade. Os
base na justiça social. Denúncias de escravi- títulos de terra normalmente são requeridos
dão no Brasil perante o Tribunal Internacional pelos bancos para crédito agrícola, e é me-
de Trabalho em Genebra em 1994 provocaram nos provável que os agricultores mais pobres
um escândalo que envolve a indústria brasilei- tenham estes documentos. Vários tipos de
ra de carvão vegetal (Sutton, 1994; Pachauski, garantias exigidos para iniciativas de “alto
1994; Pamplona & Rodrigues, 1995). A pergun- risco” também podem ser um obstáculo. Um
ta é se deveriam ser aceitas outras práticas so- exemplo é a demanda (relaxada em 1995)
cialmente questionáveis, como precondições pelo governo alemão para garantias no caso
fixas, tem implicações profundas para os fato- do mal uso de fundos pelas várias cooperati-
res que limitam a produção. Mudanças na situ- vas e outras organizações não governamen-
ação de posse da terra na Amazônia e a prática tais serem financiadas pelo setor de projetos
de especulação de terra afetariam fortemente demonstrativos (PD/A), do Programa Piloto
a direção do desenvolvimento. A quantidade para a Conservação das Florestas Tropicais
de terra “disponível” para desenvolvimento in- do Brasil.
tensivo também depende de se é considerada
Um limite institucional que afeta grandes
“aceitável” a obliteração de culturas indígenas.
empréstimos de desenvolvimento interna-
cionais é a credibilidade institucional. Isto
Limites institucionais age como um fator limitante quando em-
Os limites institucionais do desenvolvi- préstimos não são aprovados (ou não são
mento tomam muitas formas diferentes. Um contemplados) devido à falta de confiança
exemplo é a limitação institucional impos- no compromisso das instituições implemen-
ta por extensão e outros serviços de apoio tadoras para respeitar os limites ambientais.
à agricultura. Estes incluem limites de in- Esta falta de confiança pode ter uma base
fraestrutura, tais como, a impossibilidade firme na realidade, e deve ser examinada.
de laboratórios de solo atender à demanda O Brasil, assim como muitos outros pa-
que seria necessária para estender a tecno- íses, tem um sistema regulador que admi-
logia Yurimaguas para grandes áreas. Eles nistra a avaliação e a aprovação de projetos
também incluem os limites culturais, tais propostos de desenvolvimento. Este sistema
como a recusa dos agentes de extensão de está composto de uma série de decretos, leis
visitar propriedades além do alcance dos e providências constitucionais, e é projeta-
seus veículos. As barreiras culturais para co- do para assegurar que sejam feitas escolhas
municação entre os agentes de extensão e sábias de desenvolvimento. Os componentes
os pequenos agricultores na Amazônia são do sistema incluem a exigência desde 1986
suficientes para cancelar quase todo o efeito que propostas para grandes projetos sejam

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DESTRUIÇÃO E CONSERVAÇÃO
146 DA FLORESTA AMAZÔNICA

examinadas por um Relatório de Impactos outro lado pode parecer uma boa ideia ao
sobre o Meio Ambiente (RIMA) e um Estudo escutar as garantias solenes das agências do
de Impactos Ambientais (EIA). Infelizmente, governo de que nenhum assentamento será
muitos dos mecanismos que compõem este permitido ao longo da estrada, mas os de-
sistema falharam repetidamente em exem- senvolvimentos, na prática, são prováveis
plos específicos para cumprir o seu papel de de serem diferentes uma vez que a estrada
garantir a proteção ambiental. Fortalecer o for construída. O melhor exemplo é a estra-
sistema regulador seria necessário para re- da pela Parque Nacional Yasuní, no Equador
laxar o efeito limitador que a falta de credi- para abrir campos de petróleo desenvolvidos
bilidade coloca sobre os financiamentos por inicialmente pelo Texaco.
bancos multilaterais.
Como controlar o desmatamento é um
Um exemplo é fornecido pela melhoria dos mais importantes e mais difíceis pro-
da rodovia BR-429, em Rondônia. Esta estra- blemas para qualquer política de desenvol-
da, que conecta Presidente Medici a Costa vimento. Na Amazônia brasileira prevalece
Marques, abriu o Vale do Rio Guaporé ao uma tradição de mais de 400 anos, de des-
assentamento. Praticamente nada da terra respeito completo por qualquer lei proje-
aberta pela estrada é satisfatória para agri- tada para preservar a flora e fauna da área
cultura com baixos ou médios insumos, e (Sternberg, 1973). Em todo o Brasil a lei é
só poderia ser esperado que os assentamen- percebida como algo que só será aplicado a
tos trouxeram severos problemas agrícolas, “inimigos”, e que sempre pode ser evitado
sociais e ambientais (Fearnside, 1986b). por meio do onipresente “jeito” (Rosenn,
Porque toda a Rondônia, inclusive o Vale 1971). Uma tradição existente, datando da
do Rio Guaporé, é parte da área de influên- época colonial, de manter tecnicamente em
cia do Projeto POLONOROESTE, financiado vigor milhares de leis e de só aplicar algu-
pelo Banco Mundial, o governo brasileiro mas delas. Estes problemas fazem com que
tinha se comprometido a proteger o meio seja difícil de formular leis efetivas para con-
ambiente em toda esta área quando aceitou trolar o desmatamento, e não é razoável es-
o financiamento para o POLONOROESTE perar que este contexto do problema mudará
(que reconstruiu a rodovia BR-364 que liga no futuro próximo.
Cuiabá a Porto Velho, e financiou o desen-
volvimento associado à rodovia). Quando o Limites de habitação humana
plano para melhorar a rodovia BR-429 para o
tráfego em todos as épocas do ano se tornou Problemas de saúde humana, particu-
uma controvérsia pública, o Governador de larmente a malária, impediram extensas
Rondônia fez uma solene declaração pública áreas da Amazônia de serem densamente
diante dos representantes do Banco Mundial povoadas durante os últimos cinco séculos.
que a BR-429 não seria melhorada (teste- Hoje, em áreas de assentamentos de peque-
munhada por este autor, 16 de setembro de nos agricultores, a malária tem um impacto
1987). Não obstante, alguns meses depois a significante na produção agrícola (e na con-
melhoria tinha acontecido. fiabilidade daquela produção), incapacitan-
do membros chaves da família na época do
Além das discrepâncias entre o discurso
ano quando do trabalho deles é necessário
e a ação, a proteção ambiental pode ser até
para tarefas agrícolas específicas. Foi quan-
mesmo uma impossibilidade, mesmo quan-
tificado o efeito da saúde humana em provi-
do as ações são tomadas. Não importa o
são de trabalho e habilidade para executar
grau de sinceridade com que as autoridades
tarefas agrícolas para colonos da rodovia
de governo podem jurar que o desmatamen-
Transamazônica (Fearnside, 1978, 1986a)
to será evitado em um determinado projeto
usando dados na sazonalidade de admissões
de desenvolvimento, muito do processo de
desmatamento permanece fora do controle de hospital em Altamira (Smith, 1976).
do governo. Por exemplo, uma estrada que Conflitos de terra representam um limi-
corta uma reserva para abrir uma área no te sobre as atividades agrícolas em muitas

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Fatores limitantes para o desenvolvimento
da agropecuária na Amazônia brasileira 147

partes da região. Em áreas como o Bico do outros aspectos do ecossistema original man-
Papagaio, no norte de Tocantins, que é notó- tidos em círculos concêntricos ao redor das
rio pela matança decorrente das reivindica- áreas núcleo (Sayer, 1991).
ções de terra contraditórias, alguns tipos de
O fator limitante mais óbvio para a expan-
desenvolvimento seriam difíceis. Até mesmo
são da agricultura e pecuária na Amazônia é a
na ausência de conflitos de terra, o aumento
área de floresta que deve ser mantida intacta.
rápido de populações de colonos acrescen-
As diferentes formas de uso de terra insinuam
ta um aspecto de instabilidade para usos da
impactos ambientais (com níveis distintos de
terra que requerem manutenção de um sis-
impacto que dependem se o uso da terra se
tema de manejo consistente ao longo de um
mostra sustentável). O impacto de converter
extenso período.
floresta a outro uso da terra não depende ape-
nas do pedaço de terra para o qual a conver-
Limites sobre risco são está sendo considerada, mas também o
Riscos ambientais que foi feito com o resto da região. Na medida
em que há o acúmulo de área desmatada, au-
Os impactos ambientais limitam a alo- menta-se o perigo que cada hectare adicional
cação de terra para muitos usos. Por exem- de desmatamento conduzirá a impactos ina-
plo, a suscetibilidade para erosão do solo é ceitáveis. Por exemplo, o risco de extinções de
uma restrição direta. As alocações podem espécies aumenta muito na medida em que
afetar áreas vizinhas também, por exemplo, as áreas remanescentes de floresta natural di-
quando são colocados os pequenos agricul- minuem. O papel da floresta amazônica no
tores em proximidade íntima com reservas ciclo da água na região também implica num
de floresta natural. Invasões de áreas de re- risco crescente com a escala do desmatamen-
serva seguem frequentemente, aproveitando to, quando as reduções de chuva causadas
da infraestrutura viária implantada para os por perdas de evapotranspiração da floresta
pequenos agricultores. Exemplos incluem são somadas ao efeito da variabilidade natu-
a Área Indígena Sete de Setembro, perto ral que caracteriza a chuva na região, as secas
de Cacoal, e a Área Indígena Uru-Eu-Wau- resultantes podem cruzar limiares biológicos
Wau, perto de Ouro Preto do Oeste (ambos que conduzem a graves impactos (Fearnside,
em Rondônia). A interposição de plantações 1995b). Estes limiares incluem a tolerância
silviculturais tem sido sugerida como uma à seca das espécies individuais de árvores,
barreira efetiva onde este uso da terra é vi- e a probabilidade aumentada de incêndios
ável (Fearnside, 1983a; Davidson, 1987: 8). que podem se propagar na floresta em pé. Os
Pequenos agricultores não são os únicos ato- incêndios já entram em florestas em pé na
res que tem impactos sobre áreas vizinhas Amazônia brasileira, especialmente em áreas
de floresta, queimadas de pastagens em perturbadas pela exploração madeireira (Uhl
grandes fazendas podem conduzir a incên- & Buschbacher, 1985; Uhl & Kauffman, 1990).
dios que entram na floresta adjacente, espe- Durante a seca do El Niño de 1982/1983,
cialmente se esta foi seletivamente explora- aproximadamente 45.000 km2 de floresta tro-
da para madeira (Uhl & Buschbacher, 1985). pical na ilha de Borneo queimaram quando
Fatores limitantes impostos pela necessi- fogos escaparam dos campos de cultivado-
dade para satisfazer os padrões de qualidade res itinerantes. Dos 35.000 km2 desta área na
ambiental deveriam ser interpretados em ter- província indonésia de Kalimantan Oriental,
mos de um conceito da paisagem como um pelo menos 8.000 km2 era floresta primária,
mosaico de áreas diferentes, onde critérios di- enquanto 12.000 km2 eram de floresta seleti-
ferentes se aplicam, inclusive exigências para vamente explorada para madeira (Malingreau
qualidade ambiental (Odum, 1969; Eden, et al., 1985). Na Amazônia, eventos de “me-
1978; Fearnside, 1979b). Esta visão ajusta ga-El Niño” causaram conflagrações difundi-
bem com o paradigma atual de zonas de en- das na floresta quatro vezes durante os úl-
torno ao redor das unidades de conservação, timos 2.000 anos (Meggers, 1994). O efeito
com níveis diferentes de biodiversidade e de desmatamento amplo é de fazer eventos

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DESTRUIÇÃO E CONSERVAÇÃO
148 DA FLORESTA AMAZÔNICA

relativamente raros tornarem-se algo que para evitar explosões ou outros acidentes
poderia ocorrer periodicamente a intervalos graves que envolvem usinas nucleares, so-
muito mais frequentes. A maneira em que es- mente riscos infinitesimalmente pequenos
tes perigos estão incorporados nas decisões são aceitáveis à sociedade. A aceitabilidade
sobre o uso da terra terá forte influência sobre de risco para a sociedade (Fig. 3A) não é
a capacidade de suporte da região para as po- uma questão científica, mas uma questão
pulações humanas. Presume-se que a região moral e política que precisa ser debatida e
inteira pudesse ser convertida a uso agrícola decidida de maneira democrática.
sem consequências inaceitáveis, então a ca-
Um esboço grosseiro da possível rela-
pacidade de suporte que seria calculada se-
ria muito mais alta do que presumindo que ção entre o risco ambiental para expansão
bastante floresta tem que permanecer intacta de área de desmatamento é apresentado na
para manter o risco de catástrofes ambientais Figura 3B. Ao contrário da relação entre o
dentro de limites definidos. risco aceitável e a magnitude do impacto
(Fig. 3A), a relação de risco com o desmata-
A Figura 3A mostra a relação entre a mento (Fig. 3B) é uma questão científica. A
magnitude de um impacto e a probabilida- construção de uma curva deste tipo baseado
de máxima que a sociedade está disposta em estudos de campo deveria ser uma prio-
a aceitar de o impacto acontecer. Impactos ridade. Na medida em que a área desmata-
pequenos, tais como o fracasso de uma de- da aumenta, a probabilidade de uma grande
terminada colheita, podem até mesmo ser perturbação aumenta, como uma seca seve-
aceitáveis de ocorrerem todos os anos (pro- ra que excede a tolerância de muitas espé-
babilidade de 1,0), mas a sociedade deveria cies de árvores adaptadas a um clima relati-
insistir em uma probabilidade minúscula de vamente estável.
uma grande catástrofe acontecer, por exem-
plo, um ano seco o suficiente para permi- A quantidade máxima permitida de des-
tir o fogo destruir áreas grandes de floresta matamento pode ser calculada dos gráficos
tropical em pé. Isto é análogo a precauções A e B de Figura 3. Começando com o tama-
nho do impacto que seria provocado atra-
vés da perturbação do desmatamento, pode
ser determinado o nível correspondente de
risco máximo aceitável para a sociedade (a
partir da Figura 3A). Então, pode-se deter-
minar (a partir da Figura 3B) a porcentagem
Figura 3. A. Relação de floresta que poderia ser cortada e ainda
entre o nível de poderia ficar dentro dos limites deste nível
risco aceitável e a de risco aceitável.
magnitude do impacto.
Dado que algumas
consequências
Riscos agrícolas
esperadas do
desmatamento são As escolhas sobre desenvolvimento não
graves, a probabilidade só criam riscos para os que participam nas
máxima aceitável atividades de desenvolvimento e os que vi-
destes impactos
acontecerem deveria
vem na vizinhança imediata dos projetos,
ser baixa (Fonte: mas também para terceiros que podem estar
Fearnside, 1993b). milhares de quilômetros distantes do projeto.
B. A porcentagem Por exemplo, quando o cacau foi promovido
máxima permissível
de desmatamento, em Rondônia como o esteio agrícola do proje-
determinada a partir do to POLONOROESTE, aumentou substancial-
risco máximo aceitável mente o risco da doença vassoura de bruxa
(esta probabilidade é
(causado pelo fungo Crinipellis perniciosa) se
determinada na parte
A) (Fonte: Fearnside, espalhar pela principal região de cacauicultu-
1993b). ra do Brasil, na ex-Mata Atlântica do Estado

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Fatores limitantes para o desenvolvimento
da agropecuária na Amazônia brasileira 149

da Bahia. Com serviço de ônibus direto, que entanto, ordens de governo não podem anu-
conecta Rondônia com a Bahia, era só uma lar leis naturais, tais como as relações entre
questão de tempo antes do fungo saltar esta a fertilidade do solo e o rendimento agrícola.
barreira geográfica. Na realidade, a doença Eles podem alterar o resultado dos eventos,
entrou na Bahia em 1988, somente sete anos no entanto, fornecendo fertilizantes e ou-
depois que o projeto de POLONOROESTE co- tros insumos como subsídios e induzindo os
meçou, e devastou o cacau ao longo do pe- agricultores a cultivar certas áreas, por meio
ríodo 1988-1995. Indubitavelmente, a perda de promessas de títulos de terra e de várias
para a economia do Brasil representada pela formas de ajuda.
destruição do cacau na Bahia ultrapassou to- O desenvolvimento militar tem um pa-
dos os ganhos econômicos de agricultura na pel potencialmente importante na promoção
área do POLONOROESTE. de projetos que conduzirão ao desmatamen-
to em áreas de fronteira. Também obstruiu
Riscos à saúde
(mas não completamente impediu) a demar-
Outro exemplo é o risco causado pela cação das áreas indígenas em uma faixa com
oncocercose, ou cegueira dos rios africanos, 150 km de largura ao longo das fronteiras,
uma doença que na América do Sul é limi- facilitando a entrada de garimpeiros, madei-
tada à fronteira entre Roraima e Venezuela. reiros, posseiros e outros nestas áreas (de
A doença, que se pensa ter sido introduzida Oliveira Filho, 1990).
na região por missionários que haviam tra- São feitos planos militares para o desen-
balhado na África, é transmitida por piúns volvimento, independente do exercício de
ou borrachudas (Simulium spp.) que ocor- zoneamento, e, também, dos procedimentos
rem em grandes áreas do Brasil. Casos isola- normais para obter licenciamento ambiental.
dos já apareceram em outras partes do país, Esta independência não é concedida nos de-
como em Goiás, em garimpeiros de ouro cretos que exigem o Zoneamento Ecológio-
que voltaram de Roraima (Gerais & Ribeiro, Econômico (ZEE) e os Relatórios sobre
1986). Se planos militares vão manter guar- Impacto no Meio Ambiente (RIMAs), mas
nições na área e abrir estas áreas de fronteira são executados nos desenvolvimentos mili-
para a colonização por razões geopolíticas, o tares, na realidade, com liberdade completa.
risco de erupções de cegueira de rio em todo Por exemplo, de acordo com os funcionários
o Brasil seria aumentado consideravelmente. do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e
dos Recursos Naturais Renováveis (IBAMA),
por exemplo, em 1990 o exército construiu
LIMITES DE INTERFERÊNCIA POLÍTICA E uma estrada que corta o Parque Nacional
MILITAR Pico de Neblina, sem sequer consultar o
O planejamento racional pode estar ba- IBAMA (a agência responsável pelos par-
seado na percepção de limites, assim con- ques nacionais), muito menos passando pe-
duzindo as decisões, por exemplo, de não los procedimentos de avaliação ambiental
encorajar o assentamento agrícola em áreas requeridos para construção de estradas.
onde a baixa fertilidade do solo e outros as- Assentamentos na área ao longo das
pectos de qualidade da terra para agricultu- bordas internacionais do Brasil foi um ob-
ra fazem com que os rendimentos preditos jetivo do exército do país durante muitas
sejam baixos. No entanto, outros setores do décadas. O melhor exemplo do perigo de
sistema de tomada de decisão podem inter- permitir considerações militares em deter-
ferir, por exemplo, com argumentos milita- minar o local de projetos de assentamento é
res ou geopolíticos, que anulam este tipo de o Projeto de Colonização Sidney Girão, que
racionalidade. Os limites sobre o desenvolvi- foi colocado na fronteira da Rondônia com
mento nas partes da região amazônica que a Bolívia por razões estratégicas no início
estão sujeitas a este tipo de racionalidade dos anos 1970 (Mueller, 1980). O solo pobre
alternativa são diferentes dos limites que po- na área logo resultou em tantos lotes sen-
deriam ser deduzidos em outras áreas. No do abandonados que o governo não pôde

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DESTRUIÇÃO E CONSERVAÇÃO
150 DA FLORESTA AMAZÔNICA

encher o projeto até que todas as outras quando os fundos não foram aprovados pelo
áreas de assentamento em Rondônia esti- Congresso Nacional.
vessem transbordando com migrantes em
Em 1993, os mais altos líderes militares
busca de terras. O fracasso do projeto foi
do Brasil traçaram uma lista de nove deman-
reconhecido oficialmente como sendo devi-
das, com a qual o então presidente Itamar
do ao solo pobre (Valverde et al., 1979).
Franco concordou (Folha o São Paulo, 11 de
A construção da Rodovia Perimetral do agosto de 1993). As demandas incluíram a
Norte (BR-210), para abrir acesso às terras retomada da colonização na Amazônia e a
perto das fronteiras do Brasil com Colômbia, “revisão” (i.e., a redução) das áreas indíge-
Venezuela e Guianas, começou em 1973, nas na região.
mas foi parado em 1974. A desilusão com
Em 1995, a maioria das funções do
a pobre aptidão agrícola dos solos revela-
Projeto Calha Norte estava incorporada nos
dapela publicação dos mapas do Projeto
planos para o SIVAM (Sistema de Vigilância
RADAMBRASIL para a área contribuíram
da Amazônia) – um grande projeto militar
para esta decisão (Foresta, 1991: 28).
para manter vigilância através de radar sobre
O Projeto Calha Norte para construir ba- o espaço aéreo amazônico. Rodovias e assen-
ses militares e/ou pistas de pouso em 16 lo- tamentos não aparecem nos planos que foram
cais ao longo das fronteiras do norte do Brasil, tornados públicos até o momento. Embora
foi anunciado em 1986, e a implementação propostas militares individuais aumentem e
procedeu sem qualquer estudo de impacto enfraquecem com uma certa regularidade,
ambiental (embora o projeto inteiro foi rea- a pressão dos líderes militares para assenta-
lizado depois que os RIMAs tivessem ficado mentos ao longo das fronteiras amazônicas
obrigatórios). A área afetada por bases como ainda permanece como uma característica
estas é potencialmente muito maior que o en- inalterada da paisagem política na qual o pla-
torno das instalações militares. Embora não nejamento do desenvolvimento acontece.
indicado no orçamento do projeto, o plano
visa a construção de rodovias e a promoção
de assentamentos. A exposição de motivos DIRETRIZES PARA PESQUISA E AÇÃO
que propõe o projeto para o então presiden-
Quando confrontados com a existência
te José Sarney declarou claramente que “é
fundamental que a ação de governo também de um fator limitante, a reação normal por
contemple o aumento da infraestrutura de parte dos tomadores de decisão e dos pes-
estradas... e o aumento da colonização na- quisadores é de concentrar os esforços em
quela região fronteiriça” (Setubal et al., 1986: achar uma maneira para superar a limitação.
3). Uma vez que as estradas são construídas, A questão de saber se o limite deve ou não
é esperado que posseiros e especuladores en- ser superado, normalmente, nem mesmo é
trem para cortar a floresta independente de considerada. No entanto, esta pergunta bá-
qualquer política do governo, como já acon- sica sempre deve ser respondida, antes que
teceu repetidamente em outras partes da re- qualquer esforço para superar uma limitação
gião (Fearnside & Ferreira, 1984). Nenhuma possa fazer sentido.
parte da área do Projeto Calha Norte é mos- Uma vez tomada a decisão de que os li-
trada nos mapas do Projeto RADAMBRASIL mites devem ser empurrados até certo ponto,
como sendo satisfatória para a agricultura então é necessário obter informações sobre a
(Brasil, Projeto RADAMBRASIL, 1974-1977, gama inteira de fatores que limitam alcançar
Vols. 6, 8, 9, 11, 14). os objetivos definidos de desenvolvimento.
Em 1991, foram anunciados planos para São necessárias informações sobre os custos
a rodovia Transfronteira, uma estrada de unitários e os efeitos de escala de confron-
8.000 km que, por razões estratégicas, acom- tar cada limitação. A reação simplista de que
panharia todas as fronteiras internacionais todo fator limitante deve automaticamente
brasileiras na Amazônia (Jornal do Brasil, 12 ser superado é tanto desperdiçador como e
de agosto de 1991). O projeto foi paralisado pouco inteligente. Apenas depois de organizar

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Fatores limitantes para o desenvolvimento
da agropecuária na Amazônia brasileira 151

e interpretar as informações pertinentes é que da Amazônia para sustentar população este-


podem ser comparados a efetividade, o custo ja limitada, e guiar o desenvolvimento de tal
e os efeitos colaterais sociais e ambientais de modo que o tamanho da população e impac-
atacar os diferentes limites. tos ambientais sejam mantidos dentro des-
Quais limites deveriam ser respeitados e ses limites (Fearnside, 1996b).
quais deveriam ser combatidos depende de Não existe desenvolvimento sustentável
quais são os limites em questão. Por exem- para um número infinito de pessoas, nem
plo, a maioria concordaria que devem ser para uma população fixa que esteja infinita-
respeitados limites como obedecer às leis mente ávida. Também não há nenhum modo
trabalhistas brasileiras, enquanto devem ser de o desenvolvimento voltado a aumentar o
combatidos limites como a falta de educação tamanho do bolo pode resolver os problemas
e os problemas de ineficiência e corrupção que estão fundados na distribuição altamen-
nas instituições. Esse acordo é mais difícil te desigual do bolo. Muitos limites físicos
sobre outros tipos de limites, tais como os
representam restrições que precisam ser res-
que envolvem a distribuição de recursos pú-
peitados, e deve conviver com eles, em vez
blicos ou a redistribuição das propriedades
de ver os limites como uma agenda de itens
de terra. Uma reação comum é de ver como
presunções inquestionáveis a atual distribui- a serem atacados. O reconhecimento deste
ção altamente desigual da posse da terra e fato obriga pessoas a enfrentarem os proble-
quaisquer decisões baseadas em argumentos mas fundamentais do desenvolvimento, so-
militares e geopolíticos. Portanto, a atenção bre os quais muitos prefeririam não pensar
é concentrada somente sobre os avanços (resultando em uma tendência para negar a
técnicos, por exemplo, contra restrições do existência de limites). Admitir o potencial fi-
solo. Eu sugeriria que sejam muito mais ap- nito do crescimento do bolo não condena o
tas como “supostos admitidos” as restrições pobre à pobreza, mas sim condena o rico a
relacionadas ao solo e às condições físicas dividir o bolo (Fearnside, 1993a).
do que as que são o resultado da hierarquia Uma gama formidável de fatores limites
social do País e da tomada de decisão, sendo impede de sustentar a produção em grandes
sobre esta última categoria onde a atenção áreas da Amazônia na hipótese de conver-
deveria ser focalizada.
são das florestas em agricultura e pecuária.
Quais são os ingredientes de uma deci- Isto não significa, necessariamente, que as
são racional sobre a pergunta de tentar ou perspectivas sejam sombrias para sustentar
não superar uma limitação sobre o desenvol- a população atual da região, desde que os
vimento? O ponto de partida deve ser uma meios de sustentação sejam da própria flo-
definição clara dos objetivos do desenvolvi- resta, em vez de ser por meio de usos não
mento. Por exemplo, se o objetivo do desen- florestais. Este autor acredita que a melhor
volvimento for fornecer um meio de suporte estratégia, a longo prazo, para fornecer uma
sustentável às populações da região, então base sustentável de desenvolvimento para
pouco benefício será alcançado aumentando a atual população rural da Amazônia e os
a produtividade ou a longevidade das pas- seus descendentes é de aproveitar o poten-
tagens nas grandes fazendas de pecuária, cial valor monetário dos serviços ambientais
fornecendo fertilizantes e melhorando o ma-
fornecidos ao resto do mundo pelas florestas
nejo. Muitos esforços para afastar os limites
naturais na Amazônia (Fearnside, 1997a).
sobre a produção de culturas agrícolas têm
como razão sustentar uma população cada
vez maior de agricultores, por exemplo, dos CONCLUSÕES
imigrantes que vêm para a Amazônia de ou-
tras partes de Brasil. Isto não está necessaria- 1. Os fatores limitantes restringem a in-
mente nos melhores interesses da população tensificação da agropecuária e a escala
atual da Amazônia e os seus descendentes. até onde estes usos da terra possam ser
Seria melhor reconhecer que a capacidade ampliados.

Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 151 8/18/2022 3:14:05 PM


DESTRUIÇÃO E CONSERVAÇÃO
152 DA FLORESTA AMAZÔNICA

2. A expressão dos fatores limitantes sobre Fearnside, 1987, 1990a e 1990b. Agradeço à
o desenvolvimento é mediada pelo pla- Academia Brasileira de Ciências pela permis-
nejamento humano. A percepção de li- são de publicar esta tradução, originalmente
mites sobre os rendimentos agrícolas e publicada em inglês na Revista Brasileira de
sobre a severidade e a probabilidade de Biologia (Fearnside, 1997b). E. Salati, B.R.
impactos ambientais pode conduzir a de- Teles e S.V. Wilson fizeram valiosos comen-
cisões para limitar a expansão agrícola. tários no manuscrito.
3. Os limites sobre a intensificação da agri-
cultura incluem limites agronômicos sobre REFERÊNCIAS
rendimentos por hectare, limites tecnoló-
gicos e de pesquisa, e limites culturais. Allan, W. 1965. The African Husbandman. Barnes and
Noble, New York, E.U.A. 265 p.
4. Os limites para expansão das áreas agrí-
colas incluem limites de recursos físicos, Allegretti, M.H. 1990. Extractive reserves: An alternative
for reconciling development and environmental
tais como jazidas de fosfato, limites de
conservation in Amazonia. in: A. B. Anderson
valores sociais, limites institucionais (in- (ed.) Alternatives to Deforestation: Steps toward
clusive a credibilidade das instituições), Sustainable Use of Amazonian Rain Forest. Columbia
limites sobre habitação humana (como a University Press, New York, E.U.A. p. 252-264.
saúde) e limites sobre riscos ambientais. Alvim, P. de T. 1981. A perspective appraisal of perennial
5. Os limites de considerações em esferas crops in the Amazon Basin. Interciencia, 6(3): 139-
políticas e militares frequentemente anu- 145.
lam decisões “racionais” baseadas na Bates, H.W., 1863 [1989], The Naturalist on the River
aptidão do solo e nas consequências am- Amazons. Penguin Books, New York, E.U.A. 383 p.
bientais. No entanto, este tipo de inter- Beisiegel, W. de R. & de Souza, W.O. 1986. Reservas
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plesmente devem ser aceitas e se deve Agroecológico do Brasil. Empresa Brasileira de
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Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 156 8/18/2022 3:14:05 PM


CAPÍTULO

9
O futuro da Amazônia: Modelos para
prever as consequências da infraestrutura
futura nos planos plurianuais

Philip M. Fearnside(1), William F. Laurance(2), Mark A. Cochrane(3),


Scott Bergen(4), Patrícia D. Sampaio(5), Christopher Barber(3),
Sammya D’Angelo(6) & Tito Fernandes(1)
(1)
Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (INPA), Av. André Araújo, 2936, Manaus, Amazonas
69.067-375
(2)
James Cook University, Townsend, Queensland, Austrália
(3)
South Dakota State University, Brookings, South Dakota, E.U.A.
(4)
Center for Environmental Literacy, Mt. Holyoke College, South Hadley, MA 01075, E.U.A.
(5)
University of Florida, Gainesville, Florida, E.U.A.
(6)
Projeto Dinâmica Biológica de Fragmentos Florestais (PDBFF), INPA/Smithsonian, Manaus, Amazonas

Publicação original:
Fearnside, P.M., W.F. Laurance, M.A. Cochrane, S. Bergen, P.D. Sampaio, C. Barber, S. D’Angelo
& T. Fernandes. 2012. O futuro da Amazônia: Modelos para prever as consequências da in-
fraestrutura futura nos planos plurianuais. Novos Cadernos NAEA 15(1): 25-52. https://doi.
org/10.5801/ncn.v15i1.865

157
Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 157 8/18/2022 3:14:12 PM
DESTRUIÇÃO E CONSERVAÇÃO
158 DA FLORESTA AMAZÔNICA

RESUMO INTRODUÇÃO: AVANÇA BRASIL


“Avança Brasil” é um pacote de 338 pro- “Avança Brasil” se refere um grande
jetos em todo o Brasil. A parte do plano a ser programa de construção de infraestrutu-
realizada na Amazônia Legal totaliza US$43 ra planejada e de outras atividades (Brasil,
bilhões ao longo de oito anos, US$20 bilhões Ministério do Planejamento, 1999). A parte
dos quais seriam para infraestrutura que causa do plano localizada nos 5.000.000 km2 da
dano ambiental. O sistema de avaliação de im- Amazônia Legal (Figura 1) totalizou US$43
pacto ambiental no Brasil ainda não é capaz de bilhões ao longo do período 2000-2007, dos
lidar com o desafio apresentado pelo Avança quais US$20 bilhões eram para infraestru-
Brasil, e espera-se que este desafio resulte no tura com impactos diretos no ambiente. O
fortalecimento do sistema. Problemas genéri- pacote de 338 projetos em todo Brasil era
cos com o processo de licenciamento incluem: organizado em “eixos de desenvolvimento”
a formação de lobby a favor da construção (Consórcio Brasiliana, 2000), projetados para
antes de serem tomadas as decisões sobre a estimular a atividade econômica em geral,
prudência dos projetos; o “efeito arrasto” de além das atividades financiadas diretamen-
terceiros, devido a atividade econômica esti- te sob o programa (Tabela 1). Grande parte
mulada pela infraestrutura, que escapa do sis- das verbas para a infraestrutura e outras
tema de avaliação de impacto ambiental; uma atividades viriam do setor privado, em ge-
tendência forte para empresas de consultoria ral fontes estrangeiras não identificadas no
plano. “Avança Brasil” refere-se ao Plano
produzirem relatórios favoráveis, como resul-
Plurianual do país para 2000-2003, e é o su-
tado de tentações embutidas no sistema; uma
cessor ao plano para 1996-1999 conhecido
ênfase burocrática na existência de passos, tais
como “Brasil em Ação”. Além do período de
como a submissão de relatórios e a realização
quatro anos do Avança Brasil para o qual há
de audiências públicas, sem considerar o con-
quantias previstas para o orçamento federal
teúdo do que é dito; e a inabilidade do sistema
anual, o plano inclui um horizonte mais lon-
de avaliação de impactos de considerar a ca- go de planejamento “indicativo” até 2007,
deia de eventos que são deslanchados quando com projetos adicionais já listados.
um determinado projeto é empreendido.
O Avança Brasil representa um modelo
Os custos ambientais e sociais de perda de novo para o planejamento e financiamento
floresta são altos; entre eles a perda de oportu- de infraestrutura no Brasil. Seu antecessor, o
nidades para uso sustentável da floresta, inclu- programa Brasil em Ação (1996-1999), tam-
sive perda de serviços ambientais como ma- bém inovou no passado com procedimentos
nutenção de biodiversidade, ciclagem de água, de planejamento, reorganizando o orçamen-
e armazenamento de carbono. Os benefícios to federal em uma série de grandes projetos.
da infraestrutura de exportação são escassos, Foram exigidos para os proponentes do pro-
especialmente do ponto de vista de geração jeto que ajustassem os seus pedidos em uma
de emprego e de outras contribuições social- das áreas de atividade do programa global, e
mente desejáveis. Muito da infraestrutura de os fluxos financeiros e responsabilidade segui-
transporte é para soja, enquanto as barragens riam a hierarquia de administração do plano
hidrelétricas contribuem para beneficiar o alu- plurianual em lugar do sistema tradicional de
mínio. O exemplo do Avança Brasil deixa clara governo municipal-estadual-federal. Durante
a necessidade de repensar a maneira em que o programa Brasil em de Ação, um estudo de
grandes programas de desenvolvimento são “eixos nacionais de integração e desenvolvi-
decididos e são promovidos, assim como tam- mento” era comissionado, formando a base
bém a necessidade de reconsiderar a prudên- para o programa Avança Brasil (Consórcio
cia de vários projetos que o compõem. Brasiliana, 2000). Isto divide o país em uma
série de “eixos” que não correspondem a
PALAVRAS CHAVE: Amazônia, Desmatamento, qualquer unidade geográfica existente, tais
Impacto Ambiental, Rodovias como os limites estaduais, as regiões do Brasil

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O futuro da Amazônia: Modelos para prever as consequências
da infraestrutura futura nos planos plurianuais 159

definidas pelo Instituto Brasileiro de Geografia


e Estatística (IBGE), ou a Amazônia Legal
(unidade territorial sobre qual a maioria do
planejamento e dos programas de desenvol-
vimento tem sido baseada na Amazônia). A
intenção do novo sistema é de aumentar a
integração ao longo de corredores de trans-
porte como rios, rodovias e estradas de ferro.
Também tem o efeito de quebrar as linhas tra-
dicionais de autoridade sobre os projetos.
Os planos para Avança Brasil foram
concebidos e redigidos pelo Ministério do
Planejamento e por empresas de consultoria
contratadas pelo Ministério. Uma vez pronto,
o plano foi levado a outros ministérios e ao Figura 1. A região
público através de uma apresentação em cada Amazônia Legal,
capital estadual. Estas apresentações não fo- o Pantanal, e os
limites estaduais.
ram estruturadas como audiências públicas
para gerar listas de alterações obrigatórias
nos planos, porém deram ao Ministério uma
oportunidade para acrescentar ou modificar Custo Tabela 1. Alguns
informações com base nas contribuições da Comprimento tipos de projetos
Tipo de projeto Numero (US$
platéia. O mesmo se aplicava às apresenta- ou tamanho de infraestrutura do
milhões)
Programa Avança
ções do plano para os outros ministérios. Pavimentação de Brasil na Amazônia
30 7.560 km 2.794
No caso do Ministério do Meio Ambiente, o rodovias Legal(a)
Ministério do Planejamento prevaleceu em Melhoramento de
3 46
sua posição de que o atual sistema de licen- trechos rodoviários
ciamento no país cobre adequadamente qual- Melhoramento de
6 1.023 km 290
estradas agrícolas
quer impacto ambiental dos projetos, sem
qualquer estudo ou audiência adicional. O Ferrovias 4 1.625 km 1.749
Ministério do Meio Ambiente conseguiu um Gasodutos 2 920 km 450
acordo com o Ministério do Planejamento Hidrovias 2 1.057 km 55
para realizar uma revisão dos potenciais im- Eclusas em
2 254
pactos globais ou sinérgicos do conjunto de hidrelétricas
projetos propostos para cada região (diferente Represas hidrelétricas 10 20,4 MW 11.942
dos impactos de cada projeto individual). O Linhas de transmissão 12 4.830 km 651
estudo não é uma condição prévia para a ini-
(a) Informações de Consórcio Brasiliana (2000).
ciação de quaisquer dos projetos propostos, e
estes estão procedendo conforme planejado.
Com a metade do tempo do plano plurianual
2000-2003 já passado, a revisão geral ainda e BR-319 (Manaus-Porto Velho) (Figura 2).
permanece na fase de planejamento. Em 2001 Gasodutos planejados no coração do bloco
os planos foram ampliados para incluir ONGs não perturbado de floresta na Amazônia oci-
selecionadas, especialmente o Instituto de dental poderiam conduzir a efeitos semelhan-
Pesquisas Ambientais da Amazônia (IPAM). tes. Construção de gasodutos normalmente
A gama diversa de projetos de infraestru- envolve uma estrada de acesso, pelo menos
tura sob o Avança Brasil implica numa quan- durante a fase de construção. Isto pode levar
tidade extensiva de impactos. Particularmente à entrada de migrantes, apesar da quantidade
importante é a facilitação de acesso a áreas de placas e advertências. Invasão é especial-
não perturbadas, especialmente pavimen- mente provável no caso do gasoduto Urucú-
tando as rodovias BR-163 (Cuiabá-Santarém) Porto Velho, que liga ao foco de migração em

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DESTRUIÇÃO E CONSERVAÇÃO
160 DA FLORESTA AMAZÔNICA

Rondônia. O impacto esperado do gasoduto O presente trabalho discute conseqüên-


Urucú-Porto Velho é mais grave que um pro- cias prováveis destes planos e identifica as-
jeto planejado de forma semelhante, que une pectos do processo de tomada de decisões
Coarí com a cidade de Manaus. Um exemplo que impede a sua capacidade para evitar
dessa situação é o Parque Nacional de Yasuni, projetos prejudiciais. O trabalho conclui que
no Equador, que foi cortado por um oleoduto, os custos ambientais e sociais de muitos pro-
terminado em 1994, e pouco depois invadido jetos do Avança de Brasil são altos, e que o
por posseiros, apesar de placas, barreiras e processo de tomada de decisões ambientais
promessas governamentais de que nenhuma no Brasil precisa de fortalecimento.
entrada seria permitida ao longo da estrada
de acesso (e.g., Jochnick, 1995). Isto é seme- IMPACTOS DO AVANÇA BRASIL
lhante ao padrão no Brasil, como por exem-
plo, a invasão da Reserva em Bloco de Urupá, Modelagem de perdas de floresta
Rondônia (Fearnside, 2000a). Hidrovias e re-
Desenvolvemos um modelo dos impac-
presas hidrelétricas teriam impactos severos tos sobre a floresta provocados pelas obras
sobre ecossistemas aquáticos e sobre popula- do programa Avança Brasil e por outras
ções indígenas. Um caso especialmente grave obras anunciadas (Laurance et al., 2001a,b;
é a hidrovia Paraguai-Paraná (“hidrovia do Fearnside & Laurance, 2002). Este modelo
Pantanal”), que teria impactos sobre o panta- organiza as informações disponíveis em um
nal vizinho e a sua vida selvagem (Figura 3). sistema de informações geográficas (SIG)

Figura 2. Principais
projetos do Avança
Brasil na Amazônia e
no Pantanal.

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O futuro da Amazônia: Modelos para prever as consequências
da infraestrutura futura nos planos plurianuais 161

Figura 3. Locais
mencionados no texto.

para calcular, em uma forma espacialmente desmatamento a partir de rodovias ou outras


explícita, as implicações da implantação das obras. As atividades legalmente permitidas
obras, presumindo, para fins de ilustração, em cada tipo de reserva são apresentadas na
que todas as obras anunciadas fossem ime- Tabela 3. Presunções sobre o quanto destas
diatamente implantadas. Além dos projetos exigências legais são efetivamente cumpri-
previstos no horizonte de planejamento de das teria importantes implicações sobre o
Avança Brasil (2000-2007), nossa análise destino das florestas a longo prazo.
também inclui vários projetos de infraestru- O modelo considera não apenas o des-
tura que são planejados para proceder du- matamento, mas também a degradação da
rante os próximos 20 anos (e.g., barragens floresta por exploração madeireira, incên-
no rio Xingu a montante de Belo Monte, a dios florestais, e outros impactos. Os quatro
ferrovia Cuiabá-Santarém, a ferrovia Cuiabá- níveis de degradação usados nos cálculos
Porto Velho, a estrada Aripuanã-Apuí-Novo são definidos na Tabela 4.
Aripuanã e a rodovia Perimetral Norte). As
camadas de dados incorporadas no SIG são O modelo foi usado para gerar dois ce-
apresentadas na Tabela 2. Estas incluem a ve- nários, com presunções diferentes sobre
desmatamento e degradação em diferentes
getação, os vários tipos de reservas, as redes
tipos de reservas e a diferentes distâncias
hidrográficas e rodoviárias e a susceptibili-
das obras. Os cenários foram denominados
dade das florestas a incêndios, além das in-
“Otimista” e “Não otimista”, refletindo as
formações sobre a infraestrutura planejada.
presunções apresentadas na Tabela 5. A rapi-
A existência de diferentes tipos de reser- dez do aumento do desmatamento a partir de
vas, inclusive áreas indígenas, são fatores estradas não asfaltadas e rodovias asfaltadas
importantes na determinação da evolução de é um fator chave na evolução simulada da

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DESTRUIÇÃO E CONSERVAÇÃO
162 DA FLORESTA AMAZÔNICA

Tabela 2. Camadas
Camada Fontes de dados
de dados usadas nas
análises de tendências Cobertura de floresta/não floresta produzida pela Administração Nacional Oceanográfica e
Camada florestal atual e rios
de uso da terra na Atmosférica dos EUA baseado em imagens de AVHRR de 1999
Amazônia brasileira Mapa da Amazônia Legal brasileira de 1995 (escala 1:3.000.000) produzido pelo Instituto
Rodovias pavimentadas e estradas não Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE); atualizado a partir do mapa de áreas protegidas na
pavimentadas existentes Amazônia em 1999 (escala 1:4.000.000) do Instituto Socio-Ambiental, São Paulo, imagens de radar
JERS-1 para 1999, e conhecimento pessoal
Construção e melhoria de rodovias
pavimentadas e de estradas não Mapas e Informações de Avança Brasil(a), e Brasil em Ação(b), e conhecimento pessoal
pavimentadas
Projetos de infraestrutura Mapa da Amazônia Legal brasileira de 1995 de IBGE existentes e conhecimento pessoal
Mapas e informações de Avança Brasil(a), Brasil em Ação(b), ELETROBRÁS(c), e conhecimento
Projetos de infraestrutura planejados
pessoal
Mapa de áreas com alta, média, e baixa vulnerabilidade a incêndios, baseado em análises de
Susceptibilidade das florestas a
cobertura florestal, umidade sazonal do solo, atividade de exploração madeireira, e fogos recentes
incêndios
durante a estação seca de 1998(d)
Mapa do IBAMA de 1998 dos locais estimados de exploração madeireira legal e ilegal, garimpagem
Exploração madeireira e mineração
artesanal de ouro e mineração industrial.
Parques e reservas federais e
Mapa do IBGE de 1995 da Amazônia Legal brasileira, completado pelo mapa de 1999 de áreas
estaduais, florestas nacionais, reservas
protegidas na Amazônia, e conhecimento pessoal
extrativistas, e áreas e terras indígenas

a.) Brasil, Programa Brasil em Ação (2000).


b.) Brasil, Ministério do Planejamento (1999, 2002); Consórcio Brasiliana (2000).
c.) Brasil, ELETROBRÁS (1998a).
d.) Tem sido calculado que aproximadamente 200.000 km2 de floresta amazônica brasileira são vulneráveis a incêndios durante anos normais, mas essa cifra pode
chegar até 1,5 milhões de km2 durante secas periódicas provocadas pelo fenômeno El Niño (Nepstad et al., 1998).

Tabela 3. Atividades Recreação & Exploração Extrativismo


legalmente permitidas Tipo de Área não madeireiras Agropecuária Caça Mineração
Turismo madeireira de produtos
dentro de áreas
protegidas e semi- Áreas nominalmente com proteção alta
protegidas na Amazônia Parques nacionais & estaduais Sim Não Não Não Não Não
brasileira(a).
Reservas ecológicas Sim Não Não Não Não Não

Reservas biológicas Não Não Não Não Não Não

Estações ecológicas Não Não Não Não Não Não

Áreas com proteção moderada

Florestas nacionais & estaduais Sim Sim Sim Sim Sim(b) Não

Res. de florestas nacionais Sim Sim Sim Sim Sim (b)


Não

Reservas extractivistas Sim Sim Sim Sim Sim(b) Não

Reservas extractivistas estaduais Sim Sim Sim Sim Sim(b) Não

Florestas de uso sustentável Sim Sim Sim Sim Sim (b)


Não

Reservas de desenvolvimento sustentável Sim Sim Sim Sim Sim (b)


Não

Áreas de proteção ambiental Sim Sim(c) Sim(c) Sim(c) Não Sim(c)

Áreas de relevante interesse ecológico Sim Sim(c) Não Sim(c) Não Não

Áreas com proteção incerta

Terras e áreas indígenas Não Sim(c) Não Sim(c) Não Não

a.) Fontes: Silva (1996), Olmos et al. (1998), Rylands & Pinto (1998), Borges et al. (2001) e Brasil, IBAMA (2000), Brasil, IBGE (2000), e Luciene Pohl, Fundação
Nacional do Índio-FUNAI (comunicação pessoal, 2000)
b) Caça é permitida em algumas áreas; para outras, informações não eram disponíveis
c.) Estas atividades não são permitidas expressamente, mas, já que são permitidas que as pessoas moram nessas reservas, as atividades certamente acontecerão,
pelo menos em escala limitada.

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O futuro da Amazônia: Modelos para prever as consequências
da infraestrutura futura nos planos plurianuais 163

Nível Denominação Descrição Tabela 4. Definições dos


níveis de degradação
Cobertura de floresta primária intacta mas podem ter alguma atividade de caça, pesca, e agricultura
1 “Áreas primitivas”
itinerante por comunidades indígenas tradicionais.
Cobertura de floresta primária >95% intacta
2 “Áreas de impacto leve” mas podem experimentar garimpagem ilegal de ouro, agricultura em pequena escala, caça,
exploração manual de madeira, e extração de recursos de não madeireiras, tais como seringa.
Cobertura de floresta primária >85% intacta
3 “Áreas de impacto moderado” mas contém clareiras localizadas na de floresta e algumas estradas, e podem ser afetadas por
exploração madeireira, mineração, caça, e exploração de petróleo e gás.
Nenhuma ou pouca cobertura de floresta
4 “Áreas de impacto pesado” primária, e são pesadamente fragmentadas. Tais áreas sofrem efeitos de borda, incêndios e
exploração madeireira.

Tabela 5. Presunções
FATOR CENÁRIO OTIMISTA CENÁRIO NÃO OTIMISTA
dos dois cenários
Tampões de rodovias asfaltadas 25, 50 & 75 km 50, 100 & 200 km
Tampões de estradas não asfaltadas & outra infraestrutura 10, 25 & 50 km 25, 50 & 100 km
Áreas de exploração madeireira fora dos tampões Degradação moderada Degradação moderada
Áreas de garimpagem fora dos tampões Degradação leve Degradação leve
Áreas propensas a incêndios dentro dos tampões Degradação moderada Degradação forte
Áreas de uso indireto e reservas indígenas dentro dos tampões Degradação leve Degradação moderada
Áreas de uso indireto e reservas indígenas fora dos tampões Permanecem intactas Degradação leve
Parques nacionais dentro dos tampões Permanecem intactas Degradação leve
Parques nacionais fora dos tampões Permanecem intactas Permanecem intactas

paisagem. Os dados usados (Figura 4) indi-


cam rápida expansão de desmatamento, so-
bretudo quando rodovias são pavimentadas.
Os aumentos no desmatamento e na de-
gradação até 2020 variam muito em diferen-
tes partes da região (Figura 5). A Amazônia
oriental fica quase totalmente desprovida de
floresta original (Tabela 6).
O modelo de Laurance et al. (2001a,b)
fez projeções até 2020 indicando 269.000 a Figura 4. Percentagem
506.000 ha/ano de desmatamento adicional de floresta primária
como resultado da infra-estrutura planejada, destruída até 1992
com função da
mais conversão de 1,53-2,37 milhões de ha/
distância de rodovias
ano de floresta das duas categorias menos de- asfaltadas e de
gradadas (pristina ou ligeiramente degradada) todas as estradas na
para as duas categorias mais degradadas (mo- Amazônia Legal.
deradamente ou pesadamente degradada)(1).
Considerando somente o desmatamento (sem somaria a US $1,04-1,96 bilhões/ano. Para
a degradação das outras áreas), a infraestru- fins de comparação, Nepstad et al. (2000)
tura planejada resultaria em um aumento nas calcularam que a parte rodoviária da infraes-
emissões de carbono de 52,2-98,2 milhões de trutura planejada provocaria 120.000-270.000
t C/ano (Tabela 7). Somente como ilustração, km2 de desmatamento adicional ao longo
ao preço esperado de carbono de US$20/t C de 20-30 anos (400.000-1.350.000 ha/ano),
que foi usado no planejamento orçamentá- que libertaria 6-11 Gt C no período (200-550
rio dos EUA, o valor perdido deste carbono milhões de t C/ano) do desmatamento.

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DESTRUIÇÃO E CONSERVAÇÃO
164 DA FLORESTA AMAZÔNICA

Figura 5. Cenários
“otimista” (painel
superior) e “não
otimista” (painel inferior)
de desmatamento e
degradação da floresta
até 2020. Preto é
desmatado ou fortemente
degradado (e savanas
e outras áreas não
florestadas). Vermelho
é moderadamente
degradado, amarelo é
levemente degradado e
verde é floresta nativa.

Tabela 6. Aumentos Aumento total (ha) Aumento Anual (ha/ano) Aumento porcentual(a)
esperados nas taxas Área de Estudo
Otimista Não otimista Otimista Não otimista Otimista Não otimista
de desmatamento total,
anual, e porcentual na Rondônia/BR-364 5.658.598 9.902.779 282.930 495.139 15,0 26,2
Amazônia brasileira, ao Amazônia oriental (a leste de
7.055.033 12.871.555 352.752 643.578 18,7 34,1
longo dos próximos 20 50o Oeste)
anos, como resultado Amazônia inteira 3.429.200 7.576.400 171.460 378.820 9,1 20,0
de rodovias e outros Média 5.380.944 10.116.911 269.047 505.846 14,3 26,8
projetos planejados de
infraestrutura. a.) O “aumento porcentual” é relativo à taxa de desmatamento média atual (1,89 milhões de ha/ano para o período 1995-1999). São apresentadas estimativas
para dois cenários de desenvolvimento (otimista e não otimista), baseado em avaliações de desmatamento passado em três áreas de estudo diferentes (Rondônia/
Rodovia BR-364; Amazônia oriental; Amazônia brasileira inteira). O valor médio dos três cenários foi usado neste estudo.

Tabela 7. Impacto de
Cenário
infraestrutura até 2020
Otimista Não otimista
Aumento em desmatamento devido à infraestrutura (mil ha/ano) 269 506
Aumento de degradação (milhões de ha/ano) 1,53 2,37
Aumento de emissão de carbono de desmatamento (milhões de t C/ano) 52,2 98,2
Valor perdido a US$20/t C (US$ bilhões/ano) 1,04 1,96

COMPARAÇÃO COM OUTROS MODELOS Os modelos não são simples extrapola-


ções de tendências passadas, mas especifi-
Nossos resultados podem ser compa- cam um tampão (“buffer”) ao redor de cada
rados com os obtidos por outro grupo de projeto de infraestrutura, representando a
modelagem que fez projeções dos impactos distância ao longo da qual o projeto conduz
do Avança Brasil (Tabela 8). Este grupo, no a transformações entre as várias classes de
Instituto de Pesquisas da Amazônia-IPAM degradação, inclusive o processo de desma-
(Nepstad et al., 2000, 2001; Carvalho et al., tamento. Apesar da nossa análise conside-
2001, 2002; Barros et al., 2001) considera ape- rar mais obras de infraestrutura do que a
nas as rodovias projetadas, enquanto nossos análise do IPAM, nossos resultados indicam
resultados também incluem o impacto de ou- menos desmatamento. Isto se deve a duas
tros tipos de infraestrutura. O grupo de IPAM diferenças entre os dois modelos. Primeiro,
se restringiu ao desmatamento, enquanto nós no nosso modelo, as transformações dentro
modelamos também a degradação de floresta dos tampões são modificadas pela existên-
através de transferências entre quatro classes cia de várias categorias de áreas protegidas
de degradação. Ambos os grupos chegaram e semiprotegidas, tais como parques nacio-
a conclusões semelhantes, indicando gran- nais, florestas nacionais (para manejo flores-
des aumentos no desmatamento ao longo das tal visando produção de madeira), reservas
próximas duas décadas. extrativistas (para produtos florestais não

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O futuro da Amazônia: Modelos para prever as consequências
da infraestrutura futura nos planos plurianuais 165

Laurance et al.(2001a,b) Nepstad et al. (2000, 2001) Tabela 8. Comparação


PRESUNÇÕES de presunções e
resultados de estudos
Largura do tampão para desmatamento 50 km modelagem com GIS
Largura do tampão para degradação 200 km Não considerado de infraestrutura na
Amazônia brasileira
Estradas, ferrovias, gasodutos, linhas de
Impactos considerados Somente estradas
transmissão, hidrovias, hidrelétricas
Base para desmatamento nos tampões Todas as rodovias existentes PA-150, BR-010, BR-364
Inibe desmatamento e degradação,
Efeito de áreas protegidas Não considerado
dependendo do tipo e da distância
RESULTADOS
Taxa de desmatamentoadicional (103 ha/ano) 269-506 400-1.350
Degradação adicional (106 ha/ano) 1,53-2,37 Não considerado
Emissão adicional de gases de efeito estufa
52,2-98,2 200-550
pelo desmatamento(106 t C/ano)

madeireiras), e reservas indígenas, enquan- Atividades ilegais de desmatamento, garim-


to este efeito não foi considerado no modelo pagem e caça também são comuns.
do IPAM. A segunda diferença importante
A inclusão sob o Avança Brasil de pro-
é a base de dados para calcular a taxa de
jetos não destrutivos, tais como o programa
aumento de áreas desmatadas a partir das
PROBEM para bioprospeção, não muda o
obras. O grupo de IPAM se baseou na histó-
efeito dos componentes de infraestrutura.
ria das taxas de desmatamento dentro dos
Esta infraestrutura é volumosa, incluindo
tampões ao longo de três rodovias principais
aumentos significativos no impacto da rede
onde houve expansão rápida das áreas des-
de estradas. A reivindicação por proponentes
matadas, enquanto nosso modelo se baseou
em observações sobre todas as estradas exis- do Avança Brasil de que o plano não contém
tentes na Amazônia, inclusive aquelas com “nenhuma rodovia nova” dá a impressão en-
pouco desmatamento. Sem dúvida, serão ganosa de que a rede de rodovias asfaltadas
necessários meios mais sofisticados para cal- pelo Avança Brasil não causaria desmata-
cular melhor a abrangência desta influência, mento. Infelizmente, o plano para pavimen-
e valores diferentes dos parâmetros que fo- tar 7.500 km de rodovias aumentaria a aces-
ram usados poderiam estar corretos. sibilidade de áreas remotas da Amazônia
para fazendeiros, madeireiros e outros. As
rodovias BR-163 e BR-319 são especialmente
PROTEÇÕES AMBIENTAIS E AVANÇA BRASIL danosas porque elas cortam blocos grandes
de floresta relativamente intacta.
Os proponentes do Avança Brasil enfa-
tizam a existência de agências ambientais É importante entender que exigências
federais e estaduais, polícia, etc., dando a de estudos de impactos ambientais (Tabela
impressão de que o processo de ocupação 9) não garante que projetos prejudiciais não
da terra e desmatamento na Amazônia é or- sejam construídos. É altamente improvável
denado e controlado (e.g., Brasil, Ministério que o resultado seria como sugerido pelo
do Planejamento, 2002; Silveira, 2001), o diretor de Avança Brasil, José Paulo Silveira
que não corresponde à realidade, já que (2001), que afirma que a pavimentação de
muito desta atividade acontece ilegalmente estradas e outros projetos causarão impactos
(e.g., Carvalho et al., 2002; Laurance et al., mínimos, devido às exigências atuais no
2001c). Fazer cumprir os regulamentos que Brasil de avaliações de impactos ambientais,
existem no papel é um problema grave na à capacidade do País para monitorar por
fronteira. Um relatório recente da Secretaria satélite o desmatamento, e a lei de crimes
de Assuntos Estratégicos (SAE) indicou ambientais (Lei federal 9.605 de 12 de
que 80% da exploração madeireira na re- fevereiro de 1998). Por exemplo, em 1995
gião é ilegal (ver Cotton & Romine, 1999). a taxa de desmatamento saltou para 29.000

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DESTRUIÇÃO E CONSERVAÇÃO
166 DA FLORESTA AMAZÔNICA

Tabela 9. O sistema
de licenciamento Base legal Conselho Nacional do Meio Ambiente (CONAMA) resolução 001 de 23 de janeiro de 1986
ambiental no Brasil
Relatórios exigidos para
EIA (Estudo de Impacto Ambiental) RIMA (Relatório de Impactos sobre o Meio Ambiente)
grandes projetos
Um “equipe multidisciplinar” (normalmente uma firma de consultoria) que não seja “diretamente ou indiretamente
Preparação do relatório
dependente do proponente do projeto

Pagamento para relatórios Proponente do projeto

RIMA: publicamente disponível no órgão estadual do meio ambiente (OEMA) no estado onde o projeto fica
Acesso público
situado. EIA: interpretações discrepantes; na prática, o relatório normalmente não está disponível
Conselho do Ambiente se o projeto fica situado completamente dentro de um único estado; Instituto Brasileiro do
Aprovação do relatório Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (IBAMA) se o projeto fica em mais que um estado. Licença
operacional emitida pelo OEMA
EIA e RIMA têm que considerar
“alternativas”. Isto é interpretado por ONGs para significar alternativas para alcançar os objetivos sociais do
Alternativas consideradas
projeto. Os proponentes de projetos interpretem “alternativas” para significar meios alternativos de explorar o
recurso em questão(b). Interpretação judicial está pendente.
O RIMA deve ser apresentado em um local (ou locais) “acessível a partes interessadas”(c). Audiências são
Consulta pública
organizadas pelo OEMA com participação do Ministério Público
O Ministério Público(d) é uma divisão independente do Ministério da Justiça que tem autonomia considerável para
iniciar investigações, solicitar informações e decidir casos (ver Eve et al., 2000). Pedidos pelo Ministério Público
Participação judicial
para adição de informações ao RIMA, normalmente na hora da audiência pública, é uma barreira importante
dentro o processo de aprovação.

(a) O “Conselho do Ambiente” em cada estado é designado pelo governo de estado. Estes conselhos são dominados freqüentemente por interesses empresariais
locais que são favoráveis a projetos de infraestrutura (ver Carvalho et al., 2002).
(b) Por exemplo, alternativas para o gasoduto Urucú–Porto Velho são interpretados por ONGs para incluir outras formas de provisão de eletricidade para Rondônia
(usinas hidrelétricas, linhas de transmissão, outras fontes de gás, etc.), mas o proponente do gasoduto alega que alternativas são restringidas a meios de
transportar gás de Urucú (i.e., gasodutos versus barcaças).
(c) CONAMA resolução 009 de 03 de dezembro de1987.
(d) Autorizado através da Lei No. 7.347 de 24 de julho de 1985 (Lei dos Interesses Difusos) e pela Constituição Brasileira de 1988.

km2/ano, ou o dobro da taxa anual nos anos PROBLEMAS GENÉRICOS COM O PROCESSO
anteriores (Brasil, INPE, 2002), apesar do DE LICENCIAMENTO
sistema atual de regulação estar vigente,
com exceção da lei de crimes ambientais. Lobby estimulado antes da decisão
Também é importante perceber a distinção
entre o que é requerido legalmente e o que Um problema é que grupos de interesse
acontece na prática. Enquanto práticas de poderosos a favor de construção do projeto
licenciamento atuais representam muitas vi- são mobilizados antes dos impactos ambien-
tórias duramente conquistadas na melhoria tais serem avaliados. Essa avaliação somente
gradual do sistema, é incorreto supor que acontece pouco antes do começo da constru-
o resultado é de ser livre de preocupações ção. No caso do Avança Brasil, o programa
sobre impactos ambientais causados pela in- tem uma página na web em língua inglesa
fraestrutura projetada. Quando são examina- para atrair financiamentos internacionais,
dos exemplos específicos dos estudos e rela- obviamente com antecedência aos estudos
tórios de impacto (EIA/RIMA), a inabilidade ambientais de cada projeto. Em abril de 2001
do sistema para traduzir os impactos am- uma apresentação em Londres pelo ministro
bientais e as preocupações das populações de finanças Pedro Malan e outros oficiais bra-
afetadas em fatores na tomada de decisão é sileiros de alto nível explicou o programa a po-
evidente (e.g., Eve et al., 2000; Fearnside & tenciais investidores europeus. São apresen-
Barbosa, 1996a). Pode-se esperar que o de- tados os 338 projetos do Avança Brasil como
safio apresentado pelo Avança Brasil resulte se fossem um restaurante de comida a kilo,
numa revisão do sistema de licenciamento no qual os investidores em potencial podem
ambiental no Brasil e dos procedimentos pe- escolher os investimentos que os interessam.
los quais são tomadas as grandes decisões Isto está acontecendo antes do País pesar os
sobre o desenvolvimento. custos e benefícios dos projetos propostos,

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O futuro da Amazônia: Modelos para prever as consequências
da infraestrutura futura nos planos plurianuais 167

especialmente os impactos ambientais e so- 2001; Nepstad et al., 2000, 2001). Pavimentar
ciais. Uma vez que o financiamento é mobi- a BR-163 é uma prioridade alta para o Avança
lizado para um projeto, um lobby com inte- Brasil, e serrarias já estão migrando para a
resses financeiros na aprovação do projeto se área (Schneider et al., 2000: 19).
forma automaticamente, aumentando assim Os proponentes do Avança Brasil freqüen-
a probabilidade de aprovação governamental temente sugerem que a infraestrutura do pro-
independente de que impactos ambientais e grama na região amazônica terá impactos
sociais possam ser provocados. ambientais mínimos porque empregará “tec-
nologia ambientalmente amigável” com exi-
O “efeito arrasto” de terceiros gências federais e estaduais de relatórios sobre
avaliação de impactos ambientais, e porque o
A existência de estudos de impactos am-
programa Avança Brasil inclui uma seleção
bientais não significa que projetos prejudi-
de “projetos ambientais” além da construção
ciais não seriam empreendidos. A afirmação
de infraestrutura (e.g., Brazilian Embassy,
de que qualquer projeto que envolve dano London, 2001). Infelizmente, nada disso alte-
ambiental deve ser, ou reformulado ou aban- ra a natureza básica do Avança Brasil e os ce-
donado (e.g., Brazilian Embassy, London, nários para o futuro da Amazônia, tais como
2001) não coincide com a experiência. Um os apresentados por Nepstad et al. (2000) e
dos problemas é que o Estudo de Impacto Laurance et al. (2001a,b).
Ambiental (EIA) e o Relatório de Impactos
sobre o Meio Ambiente (RIMA) somente
reportam sobre impactos diretos, tais como Tendência para relatórios favoráveis
colocar o leito de uma rodovia. É essencial Empresas consultoras tendem a prepa-
entender que os principais impactos dos rar relatórios favoráveis à aprovação dos
projetos de infraestrutura, que são os danos projetos, já que as consultorias são contra-
causados pelas atividades econômicas atra- tadas pelos proponentes dos projetos em
ídas e facilitadas pelos projetos, escapam foco, que têm interesses financeiros pesados
completamente do EIA/RIMA e do proces- na aprovação dos mesmos (e.g., Fearnside
so decisório. Os impactos das atividades de & Barbosa, 1996b). O Estudo de Impacto
terceiros, tais como fazendeiros e madeirei- Ambiental (EIA) e o Relatório de Impactos
ros, que aceleram quando as áreas se tornam sobre o Meio Ambiente (RIMA) são custea-
de fácil acesso, não estão incluídos nesses dos pelo proponente do projeto, que assim
relatórios. Ironicamente, as descrições dos tem influência na escolha do pessoal que é
benefícios dos projetos freqüentemente exal- contratado, na fixação de prazos finais qua-
tam os lucros econômicos destas ativida- se impossíveis, dando atenção sumária aos
des, que os planejadores do Avança Brasil problemas causados pelos projetos, e que o
chamam de “efeito arrasto”, mas o mesmo proponente revise uma série de rascunhos
não se aplica aos impactos das atividades preliminares dos relatórios (com oportu-
(Fearnside, 2001a). No caso da hidrovia do nidades para “sugerir” supressões e outras
rio Madeira, José Paulo Silveira (declara- mudanças) antes dos relatórios finais serem
ção pública, 1998), então diretor do plano submetidos às autoridades governamentais.
plurianual Brasil em Ação, calculou que o Freqüentemente os contratos estipulam que
“efeito arrasto” iria atrair US$3 em ativida- a última prestação do pagamento da empresa
des econômicas adicionais para cada dólar consultora só é feita depois que as autorida-
investido na hidrovia. des ambientais do governo aprovarem o rela-
A rodovia BR-163 (Santarém-Cuiabá) for- tório, dessa forma praticamente garantindo
nece um exemplo dramático do efeito arrasto. que o relatório será traçado para enfatizar os
Esta rodovia abre acesso a áreas vastas de flo- aspectos positivos do projeto proposto.
resta relativamente intacta que é particular- A hidrovia Araguaia-Tocantins, outra prio-
mente suscetível à degradação por fogo devi- ridade do Avança Brasil, fornece um exem-
do à estação seca forte na área (Carvalho et al., plo. Neste caso, quando foram incluídas no

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DESTRUIÇÃO E CONSERVAÇÃO
168 DA FLORESTA AMAZÔNICA

relatório declarações que consideraram pe- hidrelétricas de Belo Monte e Altamira (ver
sados os impactos sobre populações indíge- Fearnside, 1989, 1996, 1999a). Estas represas
nas ao longo da rota, o resultado foi de al- planejadas serão indubitavelmente o foco de
terar o relatório ao invés de sustar o projeto uma das grandes controvérsias ambientais
(Carvalho, 1999; Switkes, 1999). A hidrovia na Amazônia na próxima década.
foi embargada temporariamente por ordem Os impactos de represas hidrelétricas
judicial (Silveira, 1999), mas a empresa pos- são severos em muitas formas, e vão além
teriormente conseguiu uma liminar permitin- de transformações de uso da terra (World
do a continuação (Radiobrás, 1999). Commission on Dams, 2000). Pouca evidên-
A hidrovia Teles-Pires—Tapajós também cia existe de que aconteceu alguma mudan-
foi assunto de um escândalo que envolve ça fundamental na seleção de projetos no
seus estudos de impacto ambientais que, Brasil, já que o projeto mais prejudicial de
neste caso, foi dividido em dois estudos, um todos é agora marcado para conclusão em
para o trecho acima e outro para o trecho 2013, ou seja, um pouco além do horizon-
abaixo da área indígena Mundurucú que é te de planejamento do Avança Brasil. Isto se
cortada pela hidrovia (Novaes, 1998). O pro- refere à hidrelétrica de Altamira, de 6.000
jeto foi barrado desde 1997 por uma ordem km2, antigamente chamada de “Babaquara”
judicial, mas continua aparecendo no “res- (Brasil, ELETROBRÁS, 1998b). A hidrelé-
taurante de comida a kilo” como investimen- trica planejada de Belo Monte (que era co-
to em potencial do Avança Brasil apresenta- nhecida como “Kararaô” antes de 1992),
do a possíveis investidores (e.g., Consórcio alta prioridade para o Avança Brasil, está
Brasiliana, 2000). estreitamente ligada ao projeto muito mais
prejudicial de Altamira (Babaquara), que re-
Ênfase na existência de passos gularia o fluxo do rio Xingu para compen-
sar o reservatório pequeno na hidrelétrica
Mais comum que escândalos como os de Belo Monte (Santos & de Andrade, 1990;
que cercam as hidrovias Tocantins-Araguaia Fearnside, 2001b).
e Teles-Pires-Tapajós é o efeito mais sutil do
Em 1989, uma mulher indígena ameaçou
sistema de licenciamento que requer apenas
com um terçado Antônio Muniz, diretor da
que cada passo no processo seja completado
ELETRONORTE, empresa estatal elétrica na
(entrega de relatório, audiência pública, etc.),
Amazônia, como parte de um protesto con-
com pouca consideração, na prática, para o
tra as seis represas que foram planejadas na
conteúdo das informações. Em efeito, os con-
época na Bacia do Xingu/Iriri, especialmente
sultores que escrevem os relatórios e os teste-
a hidrelétrica de Babaquara. Nos anos seguin-
munhos nas audiências públicas podem dizer
tes, as autoridades governamentais declara-
qualquer coisa, até mesmo mostrar impactos
ram muitas vezes de que a Babaquara não se-
graves, e o processo de aprovação de projeto
ria construída, mas agora ela reapareceu com
simplesmente prossegue baseado no fato de
um nome novo (hidrelétrica de Altamira) no
que os relatórios foram devidamente subme-
plano atual para expansão hidrelétrica no
tidos e a população foi “consultada” (Eve et
país (Brasil, ELETROBRÁS, 1998b: 148).
al., 2000; Fearnside & Barbosa, 1996a).
O reaparecimento de planos para a hi-
Deslanchamento de cadeias de eventos drelétrica de Babaquara é indicativa de um
problema básico: a falta de um mecanismo
Um dos problemas inerentes do atual legal através do qual o governo pode se com-
sistema de avaliação de impacto ambien- prometer a não executar projetos específicos
tal no Brasil é que apenas um projeto pro- que são identificados como danosos. Quando
posto é considerado de cada vez, sem levar projetos são julgados a serem politicamente
em conta os outros projetos que podem ser pouco promissores devido a críticas dos seus
iniciados em conseqüência da implementa- impactos esperados, eles podem simples-
ção do primeiro. Exemplos clássicos são as mente ficar latentes durante décadas, para

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O futuro da Amazônia: Modelos para prever as consequências
da infraestrutura futura nos planos plurianuais 169

depois reemergirem em um momento mais manutenção de biodiversidade (Fearnside,


politicamente favorável. Tais obras são co- 1999b), ciclagem de água (Silva Dias et al.,
nhecidas como “projetos vampiro”. 2002; Laurance et al., 2002), e controle da
emissão de gases do efeito estufa. O arma-
Outro exemplo é a hidrovia Paraguai-
zenamento de carbono é o serviço ambiental
Paraná, ou a “hidrovia do Pantanal”. O go-
que está mais próximo a render lucros mone-
verno brasileiro anunciou em março de 1998
tários significativos, mesmo depois da decisão
que estava desistindo dos planos para a hidro-
do presidente dos EUA, George W. Bush, em
via Paraguai-Paraná (e.g., Associated Press,
março de 2001, de retirar os EUA das negocia-
1998). No momento, o porto de barcaças de
ções sobre a regulamentação do Protocolo de
Mourinhos, 80 km de Cáceres na ponta su-
Kyoto, e os acordos de Bonn (julho de 2001) e
perior do trecho Curumbá-Cáceres do alto rio Marrakesh (novembro de 2001) que excluem
Paraguai, é uma alta prioridade do governo crédito para evitar o desmatamento, segun-
do Estado de Mato Grosso e assunto de uma do o Mecanismo de Desenvolvimento Limpo
batalha judicial (International Rivers Network (MDL), definido no Artigo 12 do Protocolo,
& Coalição Rios Vivos, 2001). Se uma licença durante o primeiro período de compromisso
é concedida para operar o porto, o tráfico (2008-2012) (UNFCCC, 2001).
de barcaças carregadas de soja no alto rio
Paraguai fornecerá a justificativa para futu- O uso desse mecanismo no MDL após
ra dragagem e direcionamento do leito do 2012 precisaria da resolução de vários pontos
rio. Isto aumentaria o fluxo de água no rio, chaves. O mesmo se aplica ao possível uso
baixando o lençol d’água no Pantanal e cau- de crédito fora do Protocolo de Kyoto. Ainda
sando impactos sobre uma das maiores con- permanece em aberto, como seriam definidas
centrações de vida selvagem no Brasil e no as linhas de base (“baselines”), com implica-
Mundo (Hamilton, 1999). ções importantes tanto para a quantia de cré-
dito alcançável como também para o poten-
Eclusas na barragem Luis Magalhães cial para incentivos perversos (Watson et al.,
(Lajeado) fornecem outro exemplo do peri- 2000; Hardner et al., 2000). Importante entre
go de um processo de aprovação a retalhos. estas considerações são exigências relativas
A construção das eclusas, um projeto do à certeza (a probabilidade dos benefícios lí-
Avança Brasil, não teria propósito a não ser quidos de carbono reivindicados serem reais)
que se torne o resto do rio Tocantins nave- (Fearnside, 2000b), permanência (o tempo ao
gável, levando a cabo a hidrovia Araguaia- longo do qual o carbono seria mantido fora
Tocantins como um todo, pelo menos até o da atmosfera) (Fearnside et al., 2000), e vá-
começo da Estrada de Ferro de Carajás, em rias formas de “vazamento” (efeitos do proje-
Marabá. No entanto, os proponentes das to, tais como a expulsão de população ou de
eclusas estão travando uma batalha legal atividade de desmatamento, que depois con-
para permitir o começo da construção, com tinuaria fora dos limites físicos ou conceitu-
aprovação pelo Estado de Tocantins como ais do projeto), freqüentemente resultam na
um projeto isolado, antes que se decida so- negação da mitigação esperada (Brown et al.,
bre a hidrovia como um todo. Uma ordem 2000; Fearnside, 1999c).
judicial parou o projeto temporariamente a
No contexto brasileiro, se só é permitido
partir de abril de 2001.
o uso das taxas de desmatamento históricas
como a linha de base, a partir de que cré-
CUSTOS DE OPORTUNIDADE DE PERDA DE dito de carbono seja dado, então a manei-
FLORESTA ra de agir seria de “cercar” (figurativamen-
te) remanescentes de floresta em partes do
O desmatamento conduz inevitavelmente Brasil que já tenham passado por um pesado
à perda de oportunidade para uso sustentável desmatamento antes de 1990, e, por outro
de floresta em pé, inclusive o aproveitamento lado, não teria nenhum crédito para evitar
do valor de serviços ambientais (Fearnside, a abertura futura de áreas atualmente in-
1997). Serviços ambientais incluem a tatas. O exemplo do Avança Brasil ilustra

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DESTRUIÇÃO E CONSERVAÇÃO
170 DA FLORESTA AMAZÔNICA

porque vale a pena encontrar maneiras para de soja em Mato Grosso contrasta com a ro-
fazer com que o crédito para evitar o des- dovia BR-230 (Transamazônica) de Marabá
matamento, se aplique também às novas para Itaituba que serve como área já ocupa-
fronteiras. O que torna o Avança Brasil tão da por pequenos agricultores.
danoso ao meio ambiente, inclusive o seu
O beneficiamento de alumínio, que é
papel como fonte de emissões de carbono,
uma das principais atividades a serem su-
é que este plano abre vastas áreas “virgens”
pridas pela construção de hidrelétricas pla-
para desmatamento, exploração madeireira
nejadas, fornece outro exemplo extremo.
e incêndios florestais. O preço provável de
ALBRÁS, que usa energia da rede de trans-
não criar regulamentos que dão crédito por
missão suprida pela Tucuruí e outras repre-
evitar estes impactos seria transformar em
sas, consome mais eletricidade que a cidade
realidade os cenários gerados em computa-
dor. Claramente, as apostas são altas. de Belém, mas emprega somente 1.200 pes-
soas (ver Fearnside, 1999a). Em 2000, 33%
Vale a pena notar que o MDL não é o único de ALBRÁS foram comprados por compa-
meio pelo qual o Brasil poderia obter crédito nhias norueguesas, e o plano para dobrar a
por evitar desmatamento sob o Protocolo de capacidade de produção foi anunciado.
Kyoto. Caso o Brasil fosse entrar no Anexo B
do Protocolo, o Artigo 3.7 do Protocolo ga- A hidrelétrica de Serra Quebrada, a ser
rante que as emissões volumosas do desma- construída no rio Tocantins por companhias
tamento no País em 1990 (Fearnside, 2000c) de alumínio internacionais (Alcoa e Billiton)
seriam incluídas na “quantidade atribuída” é parte do plano do Avança Brasil para trans-
ao Brasil, e que qualquer redução em emis- formar este rio em uma escadaria de repre-
sões futuras abaixo dos níveis de 1990 pode- sas. Neste caso, o reservatório deslocaria um
ria ser usada para comércio de emissões sob número grande de pessoas [aproximadamen-
o Artigo 17 (Fearnside, 2000d). Diferente do te 15.000] e inundaria parte de duas reservas
Artigo 12 (que cria o MDL), a elegibilidade indígenas, assim como também afetaria flo-
de florestas para estes créditos não requer restas inundadas (Themag, 2000).
negociação adicional. Os planos do Avança Se a energia é para ser usada para alu-
Brasil implicam num custo de oportunidade mínio, então não há praticamente nenhum
significativa por tornar tais reduções de des- limite à quantidade de capacidade geradora
matamento inviáveis. “necessária”. O Brasil seria sábio de estabe-
lecer primeiro as suas políticas sobre para
BENEFÍCIOS DE INFRAESTRUTURA DE que a eletricidade será usada, antes de de-
cidir sobre projetos de construção de novas
EXPORTAÇÃO hidrelétricas. Um critério primário por ava-
Uma pergunta básica a ser respondida liar usos de energia deveria ser o número de
com respeito à infraestrutura de exporta- empregos criado por unidade de eletricidade
ção, como para qualquer projeto planeja- consumida. No caso de alumínio para expor-
do, é se os benefícios compensam o custo. tação, as duas usinas de alumínio providas
Infelizmente, os benefícios de infraestrutura pela hidrelétrica de Tucuruí consomem 6
de exportação são escassos, especialmen- MWh de energia anualmente para cada um
te em termos de benefícios sociais para o dos 1.950 postos de trabalho criados como
Brasil. Investimento público na infraestru- emprego direto. Considerando só o custo
tura, como também o investimento privado proporcional de construir a hidrelétrica de
nas atividades servidas pelas obras, repre- Tucuruí, estes empregos valeram US$2,7 mi-
senta um tremendo custo de oportunidade, lhões cada (Fearnside, 1999a). Se decisões
já que muitos outros tipos de desenvolvi- sobre projetos hidrelétricos estiverem basea-
mento resultariam em maiores benefícios lo- das em benefícios sociais no Brasil, eu acre-
cais a partir dos recursos financeiros limita- dito ser improvável que a decisão seria de
dos. Por exemplo, a rodovia BR-163 que será fornecer energia para a produção de alumí-
pavimentada para benefício de exportadores nio para exportação.

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O futuro da Amazônia: Modelos para prever as consequências
da infraestrutura futura nos planos plurianuais 171

A noção de que projetos como rodovias não seja o Ministério do Planejamento). O


e hidrovias melhorará a situação dos ama- papel de licenciamento ambiental é ineren-
zônidas pobres é pouca realista. Estes pro- temente pequeno quando feito como uma
jetos são projetados principalmente para mera formalidade logo antes do começo da
transportar mercadorias como a soja, que construção em si, ou seja, depois que já fo-
são produzidas por operações de agroin- ram anunciados os projetos, levantadas as
dústria intensivas de capital, e que geram verbas, licitadas as obras e assinados os con-
muito pouco emprego (Fearnside, 2001a). tratos de construção.
Por exemplo, no Maranhão uma média de
Os estudos poderiam ser melhorados de
167 ha de soja é necessária para criar um
várias maneiras. Ampliar os estudos para
emprego, de acordo com um levantamento
incluir o “efeito arrasto” de atividade econô-
feito pela Empresa Brasileira de Pesquisa
Agropecuária-EMBRAPA (Carvalho, 1999). A mica estimulada pela infraestrutura é essen-
soja está sendo, freqüentemente, produzida cial. É impressivo que nenhuma estimativa
em savanas, e é transportada por rodovias, do desmatamento da infraestrutura proposta
hidrovias e estradas de ferro que passam foi gerada, nem como uma parte do processo
pelas áreas de floresta. Nas próprias áreas de planejamento para o Avança Brasil, nem
de floresta, a pecuária bovina é o principal como parte do processo de avaliação de im-
uso de terra que rapidamente domina a pai- pacto ambiental para os projetos individuais.
sagem em áreas que foram abertas a trans- Os dois estudos disponíveis (Nepstad et al.,
porte. A pecuária beneficia uma elite rica e 2000; Laurance et al., 2001a) foram produzi-
fornece uma quantidade mínima de empre- dos independente destes processos e depois
go (Fearnside, 2001c). No caso de explora- que o Avança Brasil já estava em andamento.
ção madeireira, o emprego gerado provavel- Precisa-se de estudos que avaliem o im-
mente será temporário porque a maioria da pacto de conjuntos de projetos relacionados,
exploração madeireira na Amazônia hoje é como no caso de planos de desenvolvimen-
insustentável (Cotton & Romine, 1999). to de bacias hidrográficas, antes de aprovar
Muito da infraestrutura está justifica- os projetos individuais. As hidrelétricas do
da pela exportação de soja, uma cultura rio Xingu ilustram o perigo de deslanchar
com benefícios sociais mínimos (Fearnside, cadeias de eventos que são muito mais pre-
2001a). É difícil imaginar a construção de judiciais que os projetos iniciais. Para cada
uma rede de infraestrutura volumosa para projeto, uma gama completa de alternativas
apoiar a produção de soja sob a rubrica de precisa ser analisada, e as alternativas de-
“desenvolvimento sustentável”. vem ser interpretadas no sentido amplo para
incluir outras formas de alcançar os objeti-
vos sociais dos projetos. O debate sobre o
MELHORIA DO SISTEMA DE gasoduto Urucu-Porto Velho, já mencionado,
LICENCIAMENTO AMBIENTAL deixa isto claro.
Avança Brasil oferece lições múltiplas Garantir a objetividade de estudos de im-
para melhoria do sistema de licenciamen- pacto requererá enfrentar o arranjo pelo qual
to ambiental no Brasil. Fortalecer o sistema o proponente dos projetos pague os estudos
requer não só que os relatórios sejam im- ambientais, que é especificado nos regula-
parciais e completos, mas também que eles mentos que governam o sistema (CONAMA
entrem no processo de tomada de decisões, resolução 001 de 23 de janeiro de 1986).
antes que sejam definidas as prioridades de Substituir isto com verbas públicas não se-
infraestrutura. O plano Avança Brasil eleva ria viável, já que verbas não estariam dis-
uma lista de projetos de construção à condi- poníveis, na prática, em quantias adequadas
ção de prioridades nacionais antes de serem e com velocidade e eficiência suficientes
identificados os impactos potenciais, e an- para fazer o sistema funcionar. Uma solução
tes que os planos sejam discutidos pela so- melhor seria exigir dos proponentes a con-
ciedade (ou até mesmo por ministérios que tribuição de dinheiro para um fundo, que

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DESTRUIÇÃO E CONSERVAÇÃO
172 DA FLORESTA AMAZÔNICA

seria administrado independentemente, com processo de decisão. No entanto, este tipo


supervisão do governo. O fundo contrata- de envolvimento judicial não é um substi-
ria os estudos sem envolvimento do propo- tuto para um sistema de licenciamento que
nente. Isto removeria os vieses inerentes no funcione por conta própria. Devem ser feitos
direito atual do proponente para selecionar esforços para fortalecer o sistema de licen-
uma empresa de consultoria, e a influência ciamento, enquanto mantendo a proteção
subseqüente desfrutada pelos proponentes fornecida pelo setor jurídica.
sobre as contratações dentro da empresa, es-
tabelecimento de prazos finais impossíveis e
outras limitações que evitam uma avaliação CONCLUSÕES
adequada dos impactos, e a revisão de esbo- De acordo com as tendências atuais ve-
ços do relatório pelo proponente antes de ser rificadas, a Amazônia será drasticamen-
entregue às autoridades. te alterada nos próximos 20-25 anos como
A participação pública poderia ser au- conseqüência da implantação das obras
mentada através de escolhas melhores de lo- anunciadas. Iniciativas de conservação na
cais e horários de audiências, e com esforços Amazônia têm grandes chances de serem
para facilitar a disponibilidade de documen- “esmagadas” pelos investimentos em proje-
tação pertinente sobre o projeto. Isto sempre tos de rodovias e outra infraestrutura. O grau
deveria incluir a disponibilidade pública de de proteção de terras indígenas é um fator
uma versão completa do Estudo de Impacto chave na degradação de florestas e a perda
Ambiental (EIA), não apenas Relatório de de vida selvagem. Retro-alimentações positi-
Impacto sobre o Meio Ambiente (RIMA), vas entre desmatamento regional, mudanças
que é mais resumido. Essa disponibilidade climáticas e fogo podem se tornar importan-
deveria incluir a liberação dos documentos tes. Seria provável que poucas áreas vão sus-
na íntegra pela internet, ao invés da forma tentar florestas intactas, com a exceção das
atual de “acesso” que é restrito à oportuni- áreas na região oeste da Amazônia.
dade para consultar volumes encadernados O desafio apresentado pelo Avança Brasil
na biblioteca do órgão ambiental estadual. faz claro a necessidade para fortalecer mais
Procedimentos judiciais representam o sistema de avaliação de impacto ambien-
uma parte importante do processo de licen- tal, que ainda não é capaz de contender com
ciamento. Uma necessidade importante é a muitos dos tipos de impactos esperados do
criação de um mecanismo pelo qual podem plano. Estes incluem o “efeito arrasto” de
ser feitos compromissos para não imple- projetos de infraestrutura em atividades eco-
mentar certos projetos que são identificados nômicas que conduzem a desmatamento
como especialmente danosos. Na ausência e outros impactos, e as cadeias de jogo de
de um mecanismo desse tipo, graves proble- eventos em movimento por projetos inter-
mas que podem ser identificados em estudos ligados como fios de represas hidrelétricas.
de projetos interligados, tais como planos O cronograma dos passos no processo de
avaliar os impactos ambientais e licenciar as
para desenvolvimento de bacias hidrográfi-
obras precisa ser mudado para fornecer uma
cas, teriam pouco efeito em potencial, a não
contribuição ao processo de planejamento,
ser a possível negação de autorização da
em lugar de apenas legitimar projetos depois
obra inicial em cada conjunto de projetos.
que já fossem tomadas decisões principais.
O envolvimento do Ministério Público Uma gama completa de alternativas deveria
é uma proteção importante assegurando a ser avaliada para cada projeto proposto e,
inclusão de considerações pertinentes nos uma discussão mais ampla dos objetivos so-
relatórios e a aderência aos procedimentos ciais dos projetos precisa ser feita, particular-
que foram especificados para o sistema de mente nos casos de desenvolvimentos para
licenciamento (ver Tabela 9). Atualmente, exportação de soja e alumínio. Várias mudan-
isto é o mecanismo principal pelo qual pode ças poderiam aumentar a independência e a
ser incluída documentação alternativa no transparência do processo de licenciamento,

Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 172 8/18/2022 3:14:14 PM


O futuro da Amazônia: Modelos para prever as consequências
da infraestrutura futura nos planos plurianuais 173

que atualmente é pesadamente influenciado Negro. p. 303-330 In: A. Oliveira & D. Daly (Eds.)
pelos proponentes dos projetos, que pagam As Florestas do Rio Negro, Editora da Universidade
Paulista, São Paulo, SP. http://ecologia.ib.usp.br/
pelos estudos ambientais. Os severos impac-
guiaigapo/images/livro/RioNegro0.pdf
tos implícitos no programa Avança Brasil
deixam clara a necessidade de repensar a Brasil, ELETROBRÁS (Centrais Elétricas do Brasil).
maneira em que os grandes programas de 1998a. Eletrobrás: The Ten-Year Expansion Plan, B,
1998-2007, ELETROBRÁS, Rio de Janeiro, RJ.
desenvolvimento são decididos e promovi-
dos, assim como a necessidade de reconside- Brasil, ELETROBRÁS. (Centrais Elétricas Brasileiras S.A.).
rar a prudência de implantar vários dos seus 1998b. Plano Decenal 1999-2008. ELETROBRÁS, Rio
de Janeiro, RJ.
projetos componentes.
Brasil, IBAMA (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente
e dos Recursos Naturais Renováveis). 2000. http://
AGRADECIMENTOS www.mma.ibama.gov.br.

O presente trabalho é traduzido de Brasil, IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e


Estatística). 2000. http://www.ibge.gov.br.
um trabalho publicado em inglês na re-
vista Environmental Management Brasil, INPE (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais).
(Fearnside, 2002), junto com partes pu- 2002. Monitoramento da Floresta Amazônica
Brasileira por Satélite/Monitoring of the Brazilian
blicadas em Science (Laurance et al.,
Amazon Forest by Satellite: 2000-2001. INPE, São
2001a) e Science Online (Laurance et al., José dos Campos, SPhttp://www.inpe.br).
2001b). Agradecemos a Springer-Verlag
New York e a American Association for the Brasil, Ministério do Planejamento. 1999. Avança
Brasil: Plano Plurianual 2000-2003/Orçamento da
Advancement of Science pela permissão de União 2000. Ministério do Planejamento, Brasília,
publicar esta versão. Uma versão anterior DF. 359 p.
do trabalho de Environmental Management
Brasil, Ministério do Planejamento. 2002. Avança Brasil.
foi apresentada no Seminário Nacional so-
Ministério do Planejamento, Brasília, DF. http://
bre o Desenvolvimento da Amazônia: Um www.abrasil.gov.br/http://www.abrasil.gov.br/
debate sobre o Programa Avança Brasil,
Senado Federal, Brasília 9-10 de abril de Brasil, Programa Brasil em Ação. 2000. Identificação
de Oportunidades de Investimentos Públicos e/ou
2001 (Fearnside, 2001d). Contribuíram com Privados: Estudo de Eixos Nacionais de Integração
apoio financeiro o programa LBA da NASA, de Desenvolvimento Programa Brasil em Ação,
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Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 176 8/18/2022 3:14:15 PM
CAPÍTULO

10
Controle de desmatamento em Mato Grosso:
Um novo modelo para reduzir a velocidade
de perda de floresta amazônica

Philip M. Fearnside
Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia – INPA
Av. André Araújo, 2936 – CEP: 69.067-375, Manaus, Amazonas, Brasil.
E-mail: pmfearn@inpa.gov.br

Tradução de:
Fearnside, P.M. 2003. Deforestation control in Mato Grosso: A new model for slowing the loss of
Brazil’s Amazon forest. Ambio 32(5): 343-345. https://doi.org/10.1579/0044-7447-32.5.343

Tradução original:
Fearnside, P.M. 2003. O programa de controle de desmatamento no Mato Grosso e as perspec-
tivas da floresta amazônica no combate ao efeito estufa. p. 71-75 In: V. Claudino-Sales (Ed.)
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177
Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 177 8/18/2022 3:14:22 PM
DESTRUIÇÃO E CONSERVAÇÃO
178 DA FLORESTA AMAZÔNICA

RESUMO INTRODUÇÃO
O controle do desmatamento na Desde 1999 um projeto realizado pelo ór-
Amazônia brasileira tem sido ilusivo, há gão ambiental do governo estadual (Fundação
muito tempo, apesar dos esforços repetidos Estadual do Meio Ambiente-Mato Grosso:
das autoridades do governo para reduzir a FEMA-MT) (Mato Grosso, FEMA, 2001) está
sua velocidade. Agora, um programa de li- em andamento com o objetivo de licenciar e
cenciamento e fiscalização no estado do controlar o desmatamento no estado do Mato
Mato Grosso parece mostrar um efeito sig- Grosso. O programa tem o apoio financei-
nificativo. As taxas de desmatamento na ro do Subprograma dos Recursos Naturais,
floresta amazônica e na “transição” entre do Programa Piloto para Conservação das
floresta e cerrado diminuíram desde o início Florestas Tropicais do Brasil (PPG7-SPRN), na
do programa, em 1999, enquanto o desmata- Secretaria de Coordenação da Amazônia, do
mento no restante da Amazônia Legal conti- Ministério do Meio Ambiente (MMA-SCA).
nuou aumentando. Porém, a taxa de desma- Embora o Mato Grosso tradicionalmente seja
tamento já estava diminuindo em algumas um dos estados amazônicos com as taxas
partes de Mato Grosso, antes mesmo do iní- mais altas de desmatamento (Brasil, INPE,
cio do programa, devido ao esgotamento das 2002), vários indicadores sugerem que o pro-
terras com vegetação original e sem decli- grama vem obtendo um efeito significativo
ves íngremes ou outros impedimentos para sobre o desmatamento mato-grossense. Uma
agricultura. O declínio das taxas de corte na vez que os recursos e a experiência da equipe
floresta e em áreas de transição tornou-se da FEMA estiveram mais limitados em 1999 e
2000 do que em 2001 e 2002, espera-se que o
mais acentuado depois do início do progra-
impacto do programa seja maior em anos fu-
ma, especialmente na área de transição onde
turos do que o efeito observado nas imagens
a fiscalização foi concentrada. O exame das
de satélite de 2001 disponíveis no momento.
tendências em nível de município ajudam
Além disso, existe um atraso natural entre a
a separar os efeitos do envelhecimento das
inspeção, notificação e punição de proprietá-
fronteiras dos da repressão. Em fronteiras
rios de terras que desmatam ilegalmente e,
novas, as taxas de desmatamento estavam
também, um atraso na mudança de compor-
aumentando antes do programa de fiscali- tamento desses proprietários e dos seus vizi-
zação, entretanto, diminuíram nitidamente nhos na medida em que eles são convencidos
depois de 1999. As taxas de desmatamento a se adaptar ao novo “ambiente” regulador.
diminuíram mais onde a fiscalização esta-
va concentrada. Evidências perturbadoras Antes das campanhas de campo, os
de desmatamento em algumas terras indí- desmatamentos ilegais são localizados em
genas indicam a urgência de desenvolver imagens de satélite e, posteriormente, os
mecanismos para recompensar os serviços técnicos são enviados para inspecionar
ambientais como uma forma alternativa desmatamentos específicos (Figuras 1 e 2).
de desenvolvimento. A suposição de que o Usando um sistema de posicionamento glo-
desmatamento na Amazônia esteja incon- bal (GPS), eles podem localizar o desmata-
trolável é a raiz da resistência tradicional do mento e a sede da propriedade. Depois da
Brasil aos fluxos monetários internacionais notificação, a documentação é enviada ao
para recompensar o desmatamento evitado, Ministério Público para ação judicial e o pro-
por exemplo, através do Protocolo de Kyoto. prietário das terras tem a oportunidade de
apresentar qualquer documentação que ele
Os eventos recentes no Mato Grosso indicam
possua para contestar o caso.
que esta suposição é falha e que o desmata-
mento pode ser controlado. Para avaliar qualquer efeito do progra-
ma de controle, é necessário examinar as
PALAVRAS CHAVE: Amazônia, Brasil, tendências de desmatamento em diferentes
Desmatamento, Serviços Ambientais, Mato partes do estado. O Mato Grosso inclui zo-
Grosso, Florestas Tropicais. nas com tipos distintos de ocupação e uso

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Controle de desmatamento em Mato Grosso: Um novo modelo
para reduzir a velocidade de perda de floresta amazônica 179

Figura 1. Técnicos da FEMA


examinando no campo a
imagem de satélite (à esquerda)
e a licença de desmatamento
(à direita) em uma missão de
fiscalização no município de
Ipiranga do Norte (MT). As
áreas em rosa na imagem de
satélite são campos agrícolas
(principalmente soja), as verdes
são florestas e as em marrom,
para as quais os técnicos estão
apontando, são desmatamentos
recentes. O homem à esquerda
está apontando para um
desmatamento legal autorizado
pela licença de desmatamento
na mão do homem à direita
(a linha amarela indica o
desmatamento autorizado
e a linha branca a “reserva
legal”). O homem ao fundo
está apontando para um
desmatamento, sem licença
da FEMA, em uma propriedade
vizinha (Fig. 2). Foto: P.M.
Fearnside.

Figura 2. Um desmatamento de
618 ha sem licença da FEMA
no município de Ipiranga do
Norte (MT). O dono recebeu
uma notificação solicitando
seu comparecimento em
um escritório da FEMA para
apresentar a documentação
sobre o desmatamento.
O processo do caso foi
despachado desde então pela
FEMA ao Ministério Público
para ação judicial. Foto: P.M.
Fearnside.

da terra, e com fases diferentes de evolução maior da vegetação original permanece em


da paisagem. Na parte sul do estado, a maio- pé) há uma faixa de atividade de desmata-
ria da vegetação original já foi cortada, e a mento rápido para plantio de soja em gran-
maioria da terra é ocupada por grandes pro- des propriedades. Mais ao norte, o uso da
priedades com plantações de soja. Na parte terra muda de platações de soja para pas-
mediana do estado (onde uma percentagem tagens, com predominância, também, de

Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 179 8/18/2022 3:14:23 PM


DESTRUIÇÃO E CONSERVAÇÃO
180 DA FLORESTA AMAZÔNICA

grandes propriedades. No extremo norte do 4a). No biênio seguinte (2000-2001), a porcen-


estado existe uma fileira de grupos de as- tagem de desmatamentos maiores que 100 ha
sentamentos onde os pequenos agricultores diminuiu para 64%, o que ainda é uma por-
se instalaram em projetos de assentamento centagem muito alta nesses desmatamentos
públicos ou privados. As tendências de des- grandes (Fig. 4b). A maioria do desmatamen-
matamento nessas diferentes zonas revelam to em clareiras menores que 100 ha também
parte da dinâmica subjacente ao desmata- representa o trabalho de grandes proprietá-
mento e os efeitos do programa de controle. rios de terras, já que agricultores pequenos
A distribuição espacial da atividade de que usam trabalho familiar desmatam, em
desmatamento durante 1999 é apresentada média, aproximadamente 3 ha/ano/família
na Figura 3. As áreas indicadas em laranja (Fearnside, 1984). A escala dos desmatamen-
representam desmatamentos de até 100 ha tos indica a importância potencial de medidas
de área no biênio 1998-1999, as azuis re- que afetam o comportamento de alguns dos
presentam os desmatamentos de 101-500 proprietários de terras maiores. Um desmata-
ha, as verdes 501-1.000 ha, as pretas 1.001- mento de 10.000 ha apareceu na imagem de
3.000 ha e as em vermelho > 3.000 ha. 2001 no município de Rondolândia, perto da
Desmatamentos muitos pequenos em áreas divisa com Rondônia (dividido em três parce-
de assentamento na parte norte do estado las adjacentes de aproximadamente 3.000 ha
são evidentes. Olhando para o mapa temos a cada). Parte do desmatamento foi incluída no
impressão de que a cor laranja é predominan- sistema de autorização da FEMA, e o proprie-
te, mas, isto é resultado dos muitos pontos tário foi notificado pelo correio. Os grandes
pequenos separados por laranja, enganando desmatamentos são importantes em toda a
o olho do observador. Quando as áreas dos Amazônia, apesar do Mato Grosso ser conhe-
desmatamentos de tamanho diferentes são cido como o estado com maior predomínio de
medidas por um sistema de informação geo- grandes propriedades na região (Fearnside,
gráfica (SIG) e, posteriormente, somadas, o 1993). Isso é crucial para tornar possível a re-
resultado indica que apenas 28,4% da área dução significativa da taxa de desmatamento
desmatada neste biênio correspondem à des- sem afetar o desmatamento feito por agricul-
matamentos de até 100 ha, enquanto 71,6% tores pobres que dependem da agricultura de
são desmatamentos maiores que 100 ha (Fig. subsistência para a sua sobrevivência.
O papel dos pequenos agricultores tem
sido uma fonte de controvérsia nos cálculos
de desmatamento na Amazônia. As estimati-
vas anuais liberadas pelo Instituto Nacional
de Pesquisas Espaciais (INPE) incluem uma
separação do desmatamento pelo tama-
nho das clareiras, sendo a menor categoria
Figura 3. Distribuição
correspondente a uma área < 15 ha. Isso
do espaço de
desmatamentos de responde por 10-20% do total, dependendo
tamanhos diferentes do ano, na Amazônia Legal como um todo
no biênio 1998-1999. (Brasil, INPE, 2002). Apesar das mal inter-
Laranja representa
desmatamentos de até
pretações ocasionais, isso apoia a conclusão
100 ha de área (28,4% de que os grandes proprietários de terras
do desmatamento), respondem pela grande maioria do desma-
azul representa tamento amazônico. Porém, sempre existiu
desmatamentos de
101-500 ha (36,4%), uma dúvida por causa da incapacidade das
verde representa técnicas analógicas tradicionais (interpreta-
505-1.000 ha (16,7%), ção de imagens de papel) em distinguir des-
preto representa 1.001-
matamentos representados por menos de 1
3.000 ha (14,0%) e
vermelho mais de mm2 de área em uma imagem de LANDSAT-
3.000 ha (4,5%). TM na escala 1:250.000, ou seja, 6,25 ha. Os

Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 180 8/18/2022 3:14:23 PM


Controle de desmatamento em Mato Grosso: Um novo modelo
para reduzir a velocidade de perda de floresta amazônica 181

Figura 4. Parte
da atividade de
desmatamento nos
biênios 1998-1999
(A) e 2000-2001
(B) em clareiras de
tamanhos diferentes.
A predominância
de desmatamentos
maiores que 100 ha é
evidente. Os dados de
2000-2001 (B) para
desmatamentos com
menos de 100 ha são
divididos em classes
de tamanho menores,
mostrando, assim, que
6% da área desmatada
está em clareiras <15
ha de área, e apenas
2% da área desmatada
tem área < 6,25 ha.

novos dados da FEMA podem descobrir des- “desflorestamento” para designar o corte da
matamentos de 1 ha, ou menor, em imagens vegetação que corresponde às categorias de
digitais do mesmo satélite. A informação floresta e transição, e não considera o corte
para a faixa 1-6,25 ha indica que somente do cerrado ou outras savanas, com a exce-
2% do desmatamento no Mato Grosso se en- ção do “cerradão”. No Mato Grosso, o ter-
contram neste intervalo (Fig. 4b). Este fato mo “desmatamento” refere-se ao corte das
é significante com relação a uma estimativa três categorias. As grandes discrepâncias en-
para os desmatamentos menores de 15 ha em tre os números de desmatamento liberados
área, pois a inclusão de desmatamentos me- pelo INPE e os liberados pela Organização
nores que 6,25 há (o limite de detecção nos das Nações Unidas para Alimentação e a
números do INPE) representa um aumento Agricultura (FAO, 1995, 1996) são, principal-
de 40% para esta categoria. No entanto, o mente, devido à confusão sobre essas defini-
impacto sobre o total de desmatamento em ções (Fearnside, 2000).
Mato Grosso seria pequeno, e o novo núme-
As estimativas de desmatamento da
ro da FEMA praticamente elimina a dúvida
FEMA foram realizadas bienalmente até
com relação à possibilidade de um grande
2001, e passaram a ser anuais a partir de
componente do desmatamento passar sem
2002. Estimativas anuais são importantes
detecção, e confirma que os pequenos agri-
tanto para acompanhar o efeito do progra-
cultores têm um papel secundário no total
ma como para permitir indicações melhores
global da atividade de desmatamento.
de outras causas de mudanças nas taxas de
O termo “desmatamento” é usado no desmatamento e nos padrõe espaciais. Deve-
Mato Grosso de um modo diferente de se ressaltar que as taxas durante um biênio
como é em outros contextos, tais como as dividido por dois não são estritamente iguais
estimativas de desmatamento anuais libe- a uma taxa anual da perspectiva de proprie-
radas pelo INPE. O INPE inventou o termo dades individuais, por causa de um padrão

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DESTRUIÇÃO E CONSERVAÇÃO
182 DA FLORESTA AMAZÔNICA

de pulsos na atividade de desmatamento em foi registrada até agora, mas, isto está au-
nível de propriedade (Fearnside, 1984). mentando continuamente a medida que os
Algumas discrepâncias entre os cálculos proprietários de terras solicitam à FEMA li-
da FEMA e do INPE para o Mato Grosso são cenças para derrubar e queimar. De acordo
evidentes, embora as diferenças na sua dire- com a FEMA, entre os 40 milhões de ha de
ção não sejam consistentes (Tabela 1). Para terra privada, somente 1 milhão de ha são
as estimativas de desmatamento serem com- registrados como legais no sistema, 5 mi-
paráveis, são apresentados apenas os dados lhões de ha têm requerimentos com a reso-
relativos à floresta e à transição (no caso da lução de irregularidades pendente, e os 34
FEMA). A estimativa da FEMA é 30,4% mais milhões de ha restantes são de propriedades
alta que a estimativa do INPE para o biênio que estão, atualmente, ignorando o sistema
1996-1997, mas, é 5% abaixo da estimativa do de licenciamento. Multas de R$ 1.000-1.500/
INPE para o biênio 1998-1999. O INPE ainda ha de desmatamento ilegal, além de possí-
não tem dados em nível estadual para 2001. veis penas de prisão para “crimes ambien-
tais”, resultam em uma motivação para que
os proprietários de terras busquem o licen-
O SISTEMA DE LICENCIAMENTO DO MATO ciamento. Isso acontecerá na medida em que
GROSSO eles ficarem convencidos de que eles vão, na
realidade, ser detectados e punidos caso eles
A Fundação Estadual do Meio Ambiente desmatem ilegalmente.
do Mato Grosso (FEMA-MT) tem implementa-
do, desde 1999, um programa para autorizar As campanhas de campo para notificar
e controlar o desmatamento (Mato Grosso, propriedades com desmatamentos ilegais estão
FEMA, 2001). O Mato Grosso está no pro- concentradas no período de fevereiro a maio.
cesso de trazer os proprietários de terras em Além disso, a FEMA realiza uma campanha
complacência com a legislação existente, por semelhante no período de junho a agosto para
exemplo, o “Código Florestal” (Decreto Lei reprimir as queimadas ilegais. A campanha de
No. 4.771 de 15 de setembro de 1965) e ajustes 2001 teve uma frota de 20 camionetes para le-
subsequentes. Desde 2000, exigências federais var os técnicos até os desmatamentos identi-
especificam que a “reserva legal” que deve ser ficados nas imagens do ano anterior, além de
mantida em cada propriedade precisa cobrir uma pequena aeronave para localizar desma-
80% da propriedade quando se tratar de áreas tamentos ocorrendo na hora da campanha.
de floresta e 35% em áreas de cerrado. Uma
Um fator fundamental para tornar a ne-
decisão do governo estadual do Mato Grosso
cessidade de obter as licenças aparente aos
especifica 50% na área de “transição”.
proprietários é a tecnologia de sensoriamen-
Os proprietários de terra devem regis- to remoto, com cópias de partes da imagem
trar sua reserva legal (uma área na qual não incluídas nos documentos de autorização e
deve ter corte raso, porém, onde o manejo nas notificações de infrações, fazendo com
florestal e atividades afins podem ser reali- que os argumentos de contestação sejam
zados), inclusive, com uma descrição geo- muito mais difíceis. Também, é importante
referênciada de seus limites. A “área de pre- um sistema de documentação e administra-
servação permanente”, ou áreas localizadas ção do pessoal que limite muito as oportu-
perto de cursos d’água ou em declives ín- nidades para corrupção, já que os fiscais de
gremes, também deve ser registrada. Só uma campo não têm nenhuma opção para alegar
pequena fração da terra privada no estado que um desmatamento não existiu, que a ve-
getação original era de um tipo onde mais
desmatamento é permitido (por exemplo
Tabela 1. comparação
dos dados da FEMA
Biênio INPE (ha/ano) FEMA (ha/ano) Diferença (%) cerrado em lugar de floresta), ou que a pro-
com os do INPE para 96-97 590.700 770.130 30,4% priedade não foi encontrada. Se os donos
Mato Grosso da propriedade ou os seus representantes
98-99 671.450 638.066 -5,0%
não estiverem presentes para receber uma

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Controle de desmatamento em Mato Grosso: Um novo modelo
para reduzir a velocidade de perda de floresta amazônica 183

notificação, podem ser usados meios alter- da propriedade mostrando a reserva legal, a
nativos, tais como publicações em jornais. área de proteção permanente e os desmata-
mentos legais e ilegais. O sistema atualmen-
Um aspecto importante do programa tem
te está em fase de ampliação para incluir
sido o apoio político do governador do esta-
a imagem de satélite subjacente, como um
do, protegendo, assim, o pessoal da FEMA
pano de fundo para o mapa.
responsável pelo programa contra as pres-
sões em potencial dos proprietários de terras O sistema de licenciamento no Mato
politicamente influentes. Nos níveis abaixo Grosso é facilitado pela distribuição de terra
da liderança da FEMA, a mecânica do siste- nesse estado, com a maior parte em proprie-
ma também funciona para desencorajar in- dades grandes. De acordo com o Instituto
terferência política, uma vez que a seleção Nacional de Colonização e Reforma Agrária
de propriedades para inspeção é feita por (INCRA) cerca de 20.000 propriedades res-
técnicos que não possuem nenhuma infor- pondem por 88% da área de terra privada
mação sobre quem possui cada propriedade. no estado. A responsabilidade por autorizar
o desmatamento é dividida entre a FEMA e o
Os trabalhos de digitalização dos desma-
IBAMA (Instituto Brasileira do Meio Ambiente
tamentos e montagem do banco de dados
e dos Recursos Naturais Renováveis), basean-
foram contratados de uma empresa privada
do-se em um “pacto federativo”, o qual foi
(Tecnomapas, Ltda.). A empresa ganha uma
acordado para que a FEMA autorize os des-
taxa por propriedade incluída no sistema (não
matamentos acima de 200 ha, enquanto o
uma porcentagem das multas coletadas). O ar-
IBAMA autoriza os desmatamentos menores.
ranjo motiva a empresa para maximizar a efi-
Observa-se que o limite de 200 ha se refere ao
ciência de trazer propriedades adicionais para
tamanho do desmatamento e não ao tamanho
dentro do sistema de licenciamento, contri-
da propriedade. Este arranjo aloca metade do
buindo, por exemplo, com algum investimen-
desmatamento, quase exatamente, a cada
to próprio de “risco” para o desenvolvimento
instituição: no biênio 2000-2001, 48,2% do
do software que está sendo distribuído aos
desmatamento descoberto nas imagens esta-
engenheiros florestais no estado para uso na
vam em clareiras de 200 ha ou menos, en-
preparação das propostas de autorizações em
quanto 51,8% estavam em clareiras maiores.
nome dos seus clientes proprietários de terras.
Obviamente, o licenciamento de grandes des-
A integração do Ministério Público no matamentos é mais fácil por hectare do que
Mato Grosso foi crucial no sentido de con- para desmatamentos menores.
vencer os proprietários de terras que eles
O IBAMA ainda não tem um sistema ad-
não têm nenhuma opção a não ser regis-
ministrativo desenvolvido semelhante ao da
trar suas propriedades e obter as licenças.
FEMA para controlar o pessoal de campo e
O Ministério Público é uma parte do sistema
dificultar as oportunidades de irregularidades.
judicial federal, e não está sujeito a mudan-
Autorizações de desmate do IBAMA que, apa-
ças nas administrações do governo estadual.
rentemente, foram realizadas com data retroa-
O acesso público pela internet às infor- tiva são frequentemente encontradas. Isso era
mações sobre propriedades registradas e seus realizado nos primeiros anos do programa em
donos (inclusive a identificação de infrato- 1997, ou antes, para indicar as autorizações
res) representa uma nova adição ao sistema. quando a reserva legal exigida em áreas de
Um “site” foi aberto em março de 2002, e floresta era de 50% em vez dos atuais 80%
estão sendo acrescentadas, progressivamen- e, em áreas de cerrado, de 20% em vez dos
te, as informações sobre as propriedades re- atuais 35%. Datas retroativas também eram
gistradas. O site (http://200.163.61.50/pls/ comuns em 2001 para permitir ao IBAMA
publico/ovigianet.index_ovigianet) lista as conceder as aprovações de desmatamentos
propriedades sem infrações na cor azul e os de mais de 200 ha, as quais, posteriormente,
infratores em vermelho. “Clicando” sobre passaram a ser responsabilidade da FEMA. Os
uma propriedade na lista, aparecem as in- documentos com datas retroativas são feitos,
formações pessoais sobre o dono e um mapa com frequencia, para serem válidos por dois

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DESTRUIÇÃO E CONSERVAÇÃO
184 DA FLORESTA AMAZÔNICA

anos, embora o regulamento especificasse que biênio1998-1999. A taxa já estava diminuindo


estes documentos podem ter validade de ape- antes do início do programa em 1999, com di-
nas um ano. A parte da documentação que é minuição de 17,1% no biênio 1998-1999, rela-
virtualmente impossível para datar retroativa- tivo ao período 1996-1997. Pelo menos parte
mente é o recibo do banco para pagamento da da queda adicional reflete, provavelmente, os
taxa de licenciamento; este documento está esforços do controle do desmatamento.
na maioria das vezes ausente ou se encontra
com uma data muito mais recente. Baseando-se nas estimativas do INPE
(Brasil, INPE, 2002), a taxa de desmatamento
A autorização de desmate serve para lega- no Mato Grosso pode ser comparada com a
lizar a madeira para o transporte até serrarias. taxa do restante da Amazônia Legal (Fig. 5).
Esse pode ser um motivo significativo para o Os dados em nível de estado indicam que o
desmatamento. Nos últimos anos, quando as
Mato Grosso estava seguindo as tendências
estimativas nacionais indicavam aumentos
gerais da região e até mesmo sugere que, du-
significantes das taxas de desmatamento, uma
rante o intervalo 1998-1999, a taxa de desma-
das medidas tomadas era declarar “morató-
rias” (suspensões) de emissão de autorizações tamento estava aumentando no Mato Grosso
de desmate por parte do IBAMA. Quando uma enquanto diminuía ligeiramente na região
moratória é declarada, são os madeireiros que remanescente. No ano 2000 (o primeiro ano
reclamam, e não os fazendeiros. Pelo menos após o começo do programa de licenciamento
até agora, os fazendeiros simplesmente des- no Mato Grosso), o desmatamento diminuiu
matariam ilegalmente de qualquer maneira, no estado ao mesmo tempo em que aumen-
mas os madeireiros precisariam das autoriza- tou no restante da Amazônia Legal, fornecen-
ções para legalizar a madeira que eles trans- do, assim, uma indicação de que o programa
portam de reservas indígenas, etc. estava tendo um efeito positivo.
Até o momento, a maior parte do desma- Baseando-se nos dados da FEMA, a taxa
tamento no estado tem sido ilegal. Somente anual de perda de vegetação original no
40.000 ha de desmatamento em clareiras Mato Grosso, mostra declínios que variam
>200 ha foram autorizadas pela FEMA em de acordo com o tipo de vegetação (Fig. 6).
2000-2001. O desmatamento ilegal pode ser A taxa de perda de floresta e transição (i.e.,
calculado, então, pela subtração das clarei- “desmatamento”) e a taxa de corte do cerra-
ras >200 ha (789.004 ha pelo biênio) da do diminuíram ao longo do período. No caso
área do total. Dessa forma, desmatamentos do cerrado, o declínio é menos íngreme no
ilegais com área >200 ha somam aproxima- segundo biênio (i.e., após o início do siste-
damente 750.000 ha (95%). ma de licenciamento), possivelmente porque
O programa da FEMA visitou aproxi- a maioria da terra em áreas de cerrado sem
madamente 5.000 propriedades em 2000 e impedimentos agrícolas, tais como declives
2001, a maioria (3.213), em 2001. Em 2000- íngremes, já tinha sido convertida para agro-
2001 a FEMA emitiu 2.609 autos de infração, pecuária. No caso de floresta e transição, o
somando 11 milhões de ha. O processo é declínio é mais acentuado no segundo biê-
bastante rápido, reduzindo, assim, seu cus- nio, sendo consistente com um efeito do pro-
to. Em uma campanha de duas semanas em grama. Como as taxas de desmatamento já
2001 a equipe da FEMA realizou 1.600 vi- estavam diminuindo antes mesmo do início
sitas. Fiscais podem visitar, em média, seis do programa, um exame das áreas menores
propriedades por dia. se faz necessário para separar os efeitos do
programa daqueles causados pelo envelhe-
INDICAÇÕES DO EFEITO DO PROGRAMA cimento da fronteira. Na medida em que a
floresta disponível se esgotar, se esperaria
SOBRE O DESMATAMENTO
que a taxa de desmatamento diminuísse, in-
A taxa de desmatamento no Mato Grosso dependente de qualquer programa de repres-
em áreas de floresta e transição diminuiu em são. Quando a última árvore for cortada, a
35,0% no biênio 2000-2001 em relação à taxa no taxa de desmatamento alcançará o zero.

Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 184 8/18/2022 3:14:24 PM


Controle de desmatamento em Mato Grosso: Um novo modelo
para reduzir a velocidade de perda de floresta amazônica 185

Figura 5.
Desmatamento
no Mato Grosso
comparado ao restante
da Amazônia baseado
em estimativas do INPE
(Brasil, INPE, 2002).

Figura 6.Taxa anual


da perda de vegetação
original no Mato
Grosso baseada em
dados da FEMA.

A rapidez da queda em 1999 parece es- provavelmente, o resultado de outro fator: a


tar relacionada à concentração do esforço de idade da fronteira.
fiscalização em partes diferentes do estado.
Tendências em nível de município re-
A queda mais forte ocorreu na zona de tran-
velam diferenças que dependem do uso da
sição, onde a taxa diminuiu em 43,7% no bi-
ênio 2000-2001 quando comparado ao perí- terra predominante e da idade da fronteira.
odo de 1998-1999; isto corresponde a região Entre as áreas de soja, Rondonópolis (Fig.
do meio do estado, a qual recebeu a maio- 7a) representa uma fronteira velha de soja,
ria do esforço de fiscalização. Em contraste, onde 75,3% do município havia sido cor-
o cerrado, situado na parte sul do estado, tada até 2001. O esgotamento das áreas de
apresentou uma queda de 32,7% na taxa de floresta satisfatórias para o corte já estava
corte, enquanto a zona de floresta no norte levando a uma redução na taxa de desmata-
teve uma queda de 31,9%. O maior declínio mento antes mesmo do início do programa
na área de transição, comparado com a da de licenciamento, em 1999. Posteriormente
floresta, parece ser explicado melhor pelo ao início do programa, o desmatamento
nível do esforço na fiscalização, enquanto continuou em seu platô (relativamente) bai-
a diferença entre essas áreas e o cerrado é, xo. Ao contrário, em uma fronteira de soja

Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 185 8/18/2022 3:14:25 PM


DESTRUIÇÃO E CONSERVAÇÃO
186 DA FLORESTA AMAZÔNICA

mais nova no município


de Ipiranga do Norte (Fig.
7b), onde 32,8% da região
foi desmatada até 2001, as
taxas de desmatamento es-
tavam aumentando forte-
mente antes do programa
começar, mas a tendência
inverteu nitidamente após
o programa.
Nas áreas de pecuária,
Colíder (Fig. 8a), repre-
senta uma fronteira velha,
onde 72,2% do município
haviam sido desmatados
até 2001. A taxa de desma-
tamento estava diminuindo
antes de 1999 e continuou
a mesma tendência anos
depois. Em Aripuanã (Fig.
8b), uma nova fronteira
Figura 7.Tendências de pecuária, onde apenas
de desmatamento em
nível de município
5,1% do município fo-
nas áreas de soja: ram desmatados até 2001,
Rondonópolis (A) e a taxa de desmatamento
Ipiranga do Norte (B). estava aumentando antes
do início do programa em
1999 e, depois disso, a ten-
dência inverteu. Da mes-
ma forma que nas áreas de
soja, a reversão é referente
ao efeito do programa de
controle do desmatamento.
Tendências de des-
matamento em nível de
município nas áreas de
assentamento também
mostram reversões nas
áreas mais novas, embora
seja provável que o efeito
se deve às fazendas
maiores localizadas nos
mesmos municípios. Em
Alta Floresta (Fig. 9a), uma
área antiga de assentamen-
tos de pequenos agriculto-
res, 38,4% do município já
Figura 8.Tendências de tinha sido desmatado até
desmatamento em nível
de município nas áreas
2001, mas a taxa de des-
de pecuária: Colider matamento já estava di-
(A), Aripuanã (B). minuindo antes de 1999 e

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Controle de desmatamento em Mato Grosso: Um novo modelo
para reduzir a velocidade de perda de floresta amazônica 187

continuou a mesma tendên-


cia de redução depois disso.
Em Juruena (Fig. 9b), uma
fronteira de assentamento
mais nova, onde 16,6% do
município foi desmatado
até 2001, as taxas de desma-
tamento estavam aumen-
tando antes do programa
em 1999, e a tendência in-
verteu depois disso. Ambos
os municípios incluem al-
gumas fazendas grandes,
além dos assentamentos de
pequenos agricultores.
Tendências de desma-
tamento em nível de muni- Figura 9.Tendências
de desmatamento em
cípio em áreas com níveis nível de município
contrastantes de esforço de nas áreas de
fiscalização também indi- assentamento: Alta
cam um efeito do progra- Floresta (A) e Juruena
(B). Ambos os
ma. Em Cáceres (Fig. 10a), municípios incluem
onde virtualmente nenhu- algumas fazendas
ma fiscalização foi feita, grandes, além dos
as taxas de desmatamento assentamentos de
pequenos agricultores.
estavam diminuindo antes
do início do programa, mas
o declínio não continuou à
mesma taxa depois disso.
Em Sinop (Fig. 10b), uma
área com um nível alto de
esforço de fiscalização, as
taxas de desmatamento
estavam diminuindo ligei-
ramente antes de 1999,
mas, o declínio aumen-
tou nitidamente depois do
programa de fiscalização.
Sinop era 44,5% desma-
tado até 2001, enquanto
Cáceres possuía uma área Figura 10. Tendências
de 20,1% desmatada. de desmatamento em
nível de município
em áreas com
EMISSÕES DE CARBONO níveis contrastantes
de esforço de
EVITADAS fiscalização: Cáceres
(A), onde virtualmente
Um cálculo prelimi- nenhuma fiscalização
nar das emissões de car- foi feita em 2001,
e Sinop (B), uma
bono de desmatamento área com um nível
evitado pode ser feito ba- alto de esforço de
seado nas áreas cortadas fiscalização.

Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 187 8/18/2022 3:14:27 PM


DESTRUIÇÃO E CONSERVAÇÃO
188 DA FLORESTA AMAZÔNICA

em cada uma das três categorias de vege- de 43 milhões de toneladas de carbono in-
tação original: floresta, transição e cerrado. dicados diminuiria proporcionalmente.
No Mato Grosso, entre as áreas mapeadas Apesar da incerteza relacionada à porção do
na escala 1:250.000 pelo RADAMBRASIL declínio que pode ser atribuída ao programa
(Brasil, RADAMBRASIL, 1973-1983), são de licenciamento, várias linhas de evidência
consideradas “Floresta” as que correspon- discutidas anteriormente indicam que houve
dem aos seguintes códigos no mapa de ve- um efeito na taxa de desmatamento e que
getação do IBAMA (Brasil, IBGE & IBDF, as quantidades correspondentes de carbono
1988; ver Fearnside & Ferraz, 1995): Da, Ds, são, então, significativas.
Aa, As, Cs, Fa, Fb, Fm e Fs. São considera-
A Tabela 3 apresenta um valor monetário
das “Transição” as áreas que incluem ON,
para estas emissões evitadas, com o cálcu-
SN, SO, TN, Sd, Pa e Pf, e são consideradas
lo presumindo um preço de US$ 20/tonela-
“Cerrado” as áreas que incluem o Sa, Sg, Sp,
da de carbono. Estes valores fornecem uma
Tg, Tp, Ph e ST. Alguns tipos de vegetação,
ilustração útil, indicando um valor de US$
especialmente Sd, Pa, Pf e Ph, não se encai-
864 milhões/ano se toda a redução no des-
xam bem em nenhuma das três categorias,
matamento resultasse em crédito de carbo-
mas foram alocados de acordo com a maior
no. Uma série de considerações restringe a
afinidade. As estimativas de área e biomassa
quantidade de crédito que poderia ser rei-
são apresentadas na Tabela 2.
vindicado pelo desmatamento evitado, de-
Considerando as estimativas de biomas- pendendo de decisões futuras sobre alguns
sa para cada tipo de vegetação original e de fatores como a certeza, permanência (o tem-
substituição (áreas e biomassas atualizadas po que o carbono fica fora da atmosfera) e o
de Fearnside, 1997a por Reinaldo Imbrozio “vazamento” (movimento potencial das fon-
Barbosa, do INPA-Roraima) é possível calcu- tes de emissões, tais como o desmatamento,
lar a emissão correspondente a essas taxas para áreas fora de uma determinada área do
de desmatamento (Tabela 3). Isso presume projeto, por exemplo, através do movimento
que todo o declínio na taxa de desmata- para outro estado) (ver Watson et al., 2000).
mento entre o biênio 1998-1999 e o biênio Embora o valor de US$ 20/tonelada continue
2000-2001 pode ser atribuído ao programa. sendo o que é mais comumente usado em dis-
Os valores são apresentados em uma base cussões sobre carbono, deveria ser lembrado
anual (i.e., a metade dos valores do biênio). que é um valor puramente ilustrativo. O pre-
Uma vez que parte do declínio é o resultado ço de US$ 20/tonelada originou-se de cál-
de outros processos, a redução na emissão culos orçamentários dos Estados Unidos no
governo Clinton. Espera-se que os preços de
mercados do carbono variem livremente de
Tabela 2. Áreas
e biomassas das Área Biomassa média
Ha/ano considerado acordo com a oferta e a demanda; é provável
evitado (com base
paisagens em Mato (km2) (t/ha)
da taxa de 1999)
que o preço de carbono suba bastante a lon-
Grosso e redução da
“Floresta” 208.552 375 149.302
go prazo, quando países industriais alcança-
taxa anual de perda em rem acordos que requerem maiores reduções
“Transição” 393.946 311 74.257
2000-2001.
“Cerrado” 291.030 153 95.835 nas suas emissões de gases de efeito estufa.
Total 893.527 273 319.393 O acordo de Bonn, de julho de 2001, proí-
be crédito para desmatamento evitado sob
o “Mecanismo de Desenvolvimento Limpo”
Tabela 3. Redução Carbono (t/ha) do Protocolo durante o Primeiro Período de
de emissão anual por
Emissão Valor a Compromisso, mas a inclusão de provisões
mudança do uso da
Paisagem Paisagem Ganho evitado US$20/ como esta poderia ocorrer para o período de
terra em Mato Grosso original substituta líquido (Milhões tC (US$
em 2000-2001. 2013 em diante.
de t C) milhões)
“Floresta” 187 13 175 26 521 A experiência no Mato Grosso assu-
“Transição” 155 13 142 11 212 me uma importância especial no contex-
“Cerrado” 75 5 71 7 131 to das posições brasileiras na negociação
Total 146 10 136 43 864 do Protocolo de Kyoto. O Ministério das

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Controle de desmatamento em Mato Grosso: Um novo modelo
para reduzir a velocidade de perda de floresta amazônica 189

Relações Exteriores e o Ministério da Ciência CUSTOS DO PROGRAMA


e Tecnologia, os quais representam o Brasil
nas negociações de clima, se opuseram à Os custos do programa de controle do
concessão de crédito para o desmatamento desmatamento no Mato Grosso são extre-
evitado. Isso se opõe ao pensamento da gran- mamente modestos, especialmente quando
de maioria dos grupos brasileiros interessa- comparado com a magnitude dos benefícios
do nos problemas ambientais da Amazônia ambientais. O programa está custando apro-
(veja Fearnside, 2001a; Manifestação da so- ximadamente R$ 6 milhões/ano desde 1999.
ciedade civil brasileira, 2000). Acredita-se O programa PRODEAGRO, financiado pelo
que a razão fundamental para a posição de Banco Mundial, contribuiu com R$ 0,6-1,0
negociação do país é o medo entre os indi- milhão, e o Programa Piloto para Conservar
víduos-chaves de que aceitar crédito para o as Florestas Tropicais do Brasil (PPG7) con-
desmatamento evitado poderia expor o Brasil tribuiu com R$ 5 milhões. Estes valores não
a pressões internacionais que ameaçariam a incluem os salários, edifícios e outras infra-
soberania do país caso o Brasil fosse assu- estruturas providas pela FEMA.
mir compromissos para reduções de emis-
sões que não pôde subsequentemente rea-
lizar (Fearnside, 2001b). O problema básico O PAPEL DAS RESERVAS INDÍGENAS
é uma falta de confiança de que o desmata-
mento pode ser controlado. Desde 1997, as Reservas indígenas (Fig. 11) têm grande
taxas de desmatamento na Amazônia Legal potencial para evitar o desmatamento. Povos
têm aumentado continuamente. Os eventos indígenas, até agora, apresentaram um his-
no Mato Grosso sugerem que medidas de tórico muito melhor na manutenção da ve-
governo são capazes de influenciar no des- getação natural do que as suas contrapartes
matamento, e que o processo não é inerente- não indígenas. Não obstante, os dados do
mente incontrolável. Mato Grosso indicam que as áreas indígenas

Figura 11. Áreas


indígenas na Amazona
Legal brasileira.

Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 189 8/18/2022 3:14:27 PM


DESTRUIÇÃO E CONSERVAÇÃO
190 DA FLORESTA AMAZÔNICA

não oferecem uma garantia automática de floresta nestas áreas (Fearnside, 1997b). As
que serão evitados os desmatamentos. perdas crescentes de florestas dentro de áre-
as indígenas são uma indicação da urgência
As imagens de 2001 revelaram grandes
de alcançar progresso nos mecanismos para
desmatamentos em várias reservas indí-
prover compensação por serviços ambientais.
genas no Mato Grosso. A terra indígena
Maraiwatsede teve 6.645 ha desmatados em
2000-2001, incluindo duas clareiras de cer- EXTENSÃO PARA OUTROS ESTADOS
ca de 1.800 ha cada. A reserva Bakairi teve
6.922 ha desmatados em 2000-2001, também No dia 26 de fevereiro de 2002, o Ministro
em grandes desmatamentos como aqueles do Meio Ambiente, baseando-se na experiên-
produzido por grandes fazendeiros em vez cia do Mato Grosso, anunciou que o “Sistema
de roças pequenas. Na Tabela 4 são listadas de Licenciamento de Propriedades Rurais”
as reservas com as taxas de desmatamento seria estendido para toda a Amazônia. Isto
mais altas, quando expressadas na forma de será muito importante para ganhar controle
porcentagem da área da reserva desmatada sobre o processo de desmatamento. No pas-
em um único biênio (2000-2001). Deve-se en- sado, os anúncios anuais das áreas desmata-
fatizar que a maioria das reservas tem muito das calculadas pelo INPE para a Amazônia,
menos desmatamento, e que a numeração frequentemente, vinham acompanhados de
das reservas foi incluída na Tabela para en- pacotes de medidas de controle. No ano se-
fatizar este fato. A terra indígina desmatada guinte, o desmatamento parece, em grande
mais rapidamente perdeu mais de 11% da parte, aumentar ou diminuir, independen-
sua área em um único biênio, até mesmo te dessas medidas. A experiência no Mato
mais do que o município com o recorde se- Grosso fornece uma indicação de que este
melhante: Ipiranga do Norte com 8,4%. não precisa continuar sendo o caso.

Além do desmatamento, a exploração No entanto, diferenças importantes são


madeireira é outro fator importante de per- evidentes entre os estados com relação ao
turbação em áreas indígenas. Na reserva dos compromisso oficial para reduzir o desma-
Cinta Larga, perto da divisa com Rondônia, tamento. O Acre e o Amapá têm uma repu-
uma grande cicatriz de exploração madeirei- tação por serem os estados que dão maior
prioridade ao meio ambiente, enquanto o
ra apareceu na imagem de 2001, ocupando a
Maranhão, Rondônia e Roraima são os es-
porção sudoeste inteira da reserva.
tados em que essas prioridades são as me-
Até agora, os povos indígenas não têm nores. Dentro de qualquer estado, essa prio-
recebido nenhum benefício direto de seu ridade pode mudar radicalmente quando
papel ambiental na manutenção da floresta. ocorre a troca dos governantes. Por exem-
Este também é o caso dos amazônidas não- plo, antes de 1999, o Mato Grosso era um
-indígenas. Caso os serviços ambientais se estado com pouquíssima preocupação com
tornem uma fonte significante de fluxos fi- o desmatamento. Neste caso, a mudança
nanceiros, haverá uma mudança radical na aconteceu durante a mesma administração
economia para favorecer a manutenção de estadual: Dante de Oliveira (1995-2002).

Tabela 4. Áreas Desmate


indígenas no Mato Total Geral
Grosso com maiores Num Área indígena BIENIO 2000/2001
perdas percentuais (ha) (%) (ha) (%)
de desmatamento em 5 BAKAIRI 6.922 11,3 13.190 21,5
2000-2001
15 IRANTXE 2.796 6,1 5.115 11,2
18 JUININHA 3.611 5,1 19.965 28,3
21 MARAIWATSEDE 6.645 4,0 61.305 36,5
29 PARECIS 20.392 3,6 60.449 10,7
33 PERIGARA 555 5,2 1.602 14,9

Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 190 8/18/2022 3:14:27 PM


Controle de desmatamento em Mato Grosso: Um novo modelo
para reduzir a velocidade de perda de floresta amazônica 191

Um modo de fornecer proteção do siste- (MMA-SCA), contribuiu com os custos de


ma contra governos de estado desfavoráveis viagem. O trabalho do autor é apoiado pelo
seria o de ter um centro federal em Brasília, Conselho Nacional de Desenvolvimento
como IBAMA ou alguma outra parte do Científico e Tecnológico (CNPq) (Proc.
Ministério do Meio Ambiente, que proces- 470765/01-1). R.I. Barbosa e R.M. Ferreira fi-
se os dados de desmatamento e/ou mante- zeram comentários sobre o manuscrito. Esta
nham uma imagem de espelho no banco de é uma tradução de Fearnside (2003a), refor-
dados das agências em nível estadual. Isto
matado de Fearnside (2003b).
ajudaria a nivelar, em termos da ênfase co-
locada no meio ambiente, algumas das dife-
renças entre os estados e as administrações REFERÊNCIAS
de governadores dentro de qualquer estado.
Brasil, IBGE & IBDF (Instituto Brasileiro de Geografia e
Estatística & Instituto Brasileiro do Desenvolvimento
CONCLUSÕES Florestal). 1988. Mapa de Vegetação do Brasil. Escala
1:5.000.000. Instituto Brasileiro do Meio Ambiente
A experiência com o sistema de licencia- e dos Recursos Naturais Renováveis (IBAMA),
mento e controle do desmatamento no Mato Brasília, DF.
Grosso oferece indicações fortes de um efei-
Brasil, INPE (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais).
to na redução das taxas de desmatamento. O
2002. Monitoramento da Floresta Amazônica
sistema também possui baixo custo em re- Brasileira por Satélite/Monitoring of the Brazilian
lação aos seus benefícios ambientais. Junto Amazon Forest by Satellite: 2000-2001. INPE, São
com os programas para aumentar a atrativi- José dos Campos, São Paulo. http://www.inpe.br
dade de atividades que mantêm a cobertura
Brasil, Projeto RADAMBRASIL. 1973-1983. Levantamento
da floresta, incluindo o aproveitamento do
de Recursos Naturais, Vols. 1-27. Ministério das
valor dos serviços ambientais de floresta em
Minas e Energia, Departamento Nacional de
pé, o licenciamento e programas de controle Produção Mineral (DNPM), Rio de Janeiro, RJ.
representam um passo essencial na habilida-
de do governo para redirecionar o desenvol- FAO (Food and Agriculture Organization of the United
vimento na região por linhas mais sustentá- Nations). 1995. Forest Resources Assessment 1990:
Global Synthesis, FAO Forestry Paper 124, FAO,
veis e menos prejudiciais ao meio ambiente.
Roma, Itâlia.
FAO (Food and Agriculture Organization of the United
AGRADECIMENTOS Nations). 1996. Forest Resources Assessment 1990:
Survey of Tropical Forest Cover and Study of Change
Uma versão anterior deste trabalho foi Processes, FAO Forestry Paper 130, FAO, Roma, Itâlia.
apresentada no “Seminário: Aplicações do
Sensoriamento Remoto e de Sistemas de Fearnside, P.M. 1984. Land clearing behaviour in small
Informação Geográfica no Monitoramento farmer settlement schemes in the Brazilian Amazon
and its relation to human carrying capacity. p.
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Brasileira,” 02-03 de abril de 2002, Brasília-
Tropical Rain Forest: The Leeds Symposium. Leeds
DF (Fearnside, 2002); uma parte dela foi Philosophical and Literary Society, Leeds, Reino
publicada em inglês (Fearnside, 2003; Unido. 335 p.
Fearnside & Barbosa, 2003). Agradeço à
Fundação Estadual do Meio Ambiente do Fearnside, P.M. 1993. Deforestation in Brazilian
Amazonia: The effect of population and land tenure.
Mato Grosso (FEMA-MT) por me permi-
Ambio 22(8): 537-545.
tir fazer acompanhamentos no campo e ao
FEMA-MT e Tecnomapas, Ltda. por suas in- Fearnside, P.M. 1997a. Greenhouse gases from
formações e paciência. O Subprograma dos deforestation in Brazilian Amazonia: Net committed
Recursos Naturais, do Programa Piloto para emissions. Climatic Change 35(3): 321-360.
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Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 191 8/18/2022 3:14:27 PM


DESTRUIÇÃO E CONSERVAÇÃO
192 DA FLORESTA AMAZÔNICA

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org/10.1579/0044-7447-32.5.343 Reino Unido. 377 p.

Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 192 8/18/2022 3:14:27 PM


CAPÍTULO

11
Uma análise de lacunas de conservação
da vegetação da Amazônia

Philip M. Fearnside
Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia – INPA
Av. André Araújo, 2936 – CEP: 69.067-375, Manaus, Amazonas, Brasil.
E-mail: pmfearn@inpa.gov.br

Tradução de:
Fearnside, P.M. & J. Ferraz. 1995. A conservation gap analysis of Brazil’s Amazonian vegetation.
Conservation Biology 9(5): 1134-1147. https://doi.org/10.1046/j.1523-1739.1995.9051127.x-i1

Tradução parcial anterior:


Fearnside, P.M. & J. Ferraz. 2004. O estado de proteção da vegetaçao da Amazônia brasileira.
p. 293-299 In: R. Cintra (Ed.) Historia Natural, Ecologia e Conservação de Algumas Espécies de
Plantas e Animais da Amazônia. Editora da Universidade do Amazonas (EDUA), Fundação de
Amparo de Pesquisas do Estado do Amazonas (FAPEAM) & Instituto Nacional de Pesquisas da
Amazônia (INPA), Manaus, Amazonas. 333 p

193
Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 193 8/18/2022 3:14:34 PM
DESTRUIÇÃO E CONSERVAÇÃO
194 DA FLORESTA AMAZÔNICA

RESUMO O estudo atual aplica um critério biológi-


co à prioridade para as terras: o tipo de ve-
São identificados os tipos de vegetação getação, tal como classificado no mapa do
sem proteção nas unidades de conservação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
dos nove estados na Amazônia Legal, e são (IBGE) e o antigo Instituto Brasileiro de
identificados os locais onde exemplos destes Desenvolvimento Florestal (IBDF) (Brasil,
tipos de vegetação possam ser protegidos. Os IBGE & IBDF, 1988). Desde 1989 o IBDF está
mapas da vegetação das unidades protegi- incorporado ao Instituto Brasileiro do Meio
das, e das semiprotegidas (tais como reser- Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis
vas indígenas e reservas florestais) são digi- (IBAMA), e o mapa é conhecido como o
tados e analisados utilizando um Sistema de “mapa do IBAMA”. Os tipos de vegetação da
Informações Geográficas (GIS). Na Amazônia Amazônia na legenda deste mapa são defini-
Legal, existem 28 tipos de vegetação natu- dos na Tabela 1. Isto não implica que outros
ral na legenda do mapa utilizado (escala: critérios não devam ser aplicados também,
1:5.000.000). Exemplos de áreas para a pro- nem significa que as áreas não identificadas
teção adicional foram selecionados utilizando são sem importância. O atual estudo procura
um critério de proteção mínima, de pelo me- avaliar áreas adicionais não protegidas pelo
nos um exemplo de cada tipo de vegetação, governo brasileiro, e supõe que as áreas já
em cada estado (chamado aqui de “zonas de protegidas continuarão assim no futuro.
vegetação”). Há 111 zonas de vegetação na
Amazônia Legal, dos quais apenas 37 (33%) Os tipos de vegetação natural no mapa
têm, pelo menos, uma parcela de sua área do IBAMA são utilizados para definir de “zo-
protegida. Há poucas áreas protegidas nos es- nas de vegetação”, ou áreas em cada um dos
tados mais fortemente desmatados, ao longo nove estados na Amazônia Legal (5 × 106
da borda sudeste da floresta. No Maranhão, km2) que são cobertas por um dos tipos de
onde 72,9% da floresta original tinha sido vegetação.(1) As áreas de prioridade bioló-
perdida até 2000, apenas 1 entre 10 tipos de gica indicadas pelo critério de “zona de ve-
vegetação está protegido. A negociação de getação” não são particularmente grandes.
acordos com tribos indígenas e com extrati- Aplicar outros critérios produziria áreas
vistas, que colhem produtos não madeireiros muito maiores com prioridade alta. Uma ra-
da floresta, representa uma possibilidade im- zão para reservar grandes áreas é a necessi-
portante para se aumentar a área, e sua repre- dade de redundância: a alta freqüência no
sentatividade, nas unidades de conservação. Brasil de sacrifício de áreas protegidas não
Unidades de conservação adicionais necessi- conduz à confiança de que todas as áreas
tam ser estabelecidas rapidamente, antes que protegidas sobreviverão indefinidamen-
o aumento do desmatamento, e dos preços te (ver Fearnside & Ferreira, 1985; Foresta,
da terra, torne impossível esta possibilidade. 1991; Rosa & Ferreira, 2000). Exemplos in-
Caso contrário, tipos de vegetação significati- cluem a inundação do Parque Nacional de
vos poderão desaparecer. Sete Quedas pela Represa de Itaipu em 1982.
Também, dentro de algumas áreas protegi-
das existem atividades ilegais de exploração
INTRODUÇÃO madeireira e garimpagem de minérios.
As resoluções sobre a proteção de ecos- A análise apresentada aqui foi original-
sistemas naturais exigem informações sobre mente realizada como parte do “Workshop
a importância biológica das diferentes áreas, 90”, uma reunião promovida em Manaus
assim como, sobre os fatores políticos e so- em 1990 pela Conservation International,
ciais que afetam cada local. É importante que o IBAMA e o INPA, para definir prioridades
sejam utilizadas as melhores informações de conservação na Amazônia (e.g., Rylands,
disponíveis, para identificar as áreas de maior 1990). Desde então, várias outras análises
prioridade, de modo que as reservas possam também têm classificado os tipos de vege-
ser estabelecidas em áreas que protejam as tação para fins de conservação. Dinerstein et
diversidades biológica e ecológica. al. (1995; ver Fearnside, 2001), numa análise

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Uma análise de lacunas de conservação
da vegetação da Amazônia 195

Categoria Código Grupo Subgrupo Classe Tabela 1. Tipos de


Floresta Densa Da-0 Floresta ombrófila Floresta densa Aluvial Amazônica vegetação natural na
Db-0 Floresta ombrófila Floresta densa Terras baixas Amazônicas Amazônia Legal
Dm-0 Floresta ombrófila Floresta densa Montana Amazônica
Ds-0 Floresta ombrófila Floresta densa Submontana Amazônica
Floresta não densa Aa-0 Floresta ombrófila Aberta Aluvial
Ab-0 Floresta ombrófila Aberta Terras baixas
As-0 Floresta ombrófila Aberta Submontana
Cs-0 Floresta estacional Decidual Submontana
Fa-0 Floresta estacional Semidecidual Aluvial
Fs-0 Floresta estacional Submontana
Vegetação lenhosa oligotrófica dos
Ld-0 Arborea densa("Campinarana
pântanos e das áreas arenosas
Vegetação lenhosa oligotrófica dos
LO-0 Áreas de tensão ecológica e contato
pântanos e das áreas arenosas
ON-0 Áreas de tensão ecológica e contato Floresta ombrófila-Floresta estacional
Pa-0 Áreas das formações pioneiras Influência fluvial
Pf-0 Áreas das formações pioneiras Influência fluvio-marinha
Sd-0 Savana Cerrado Arbórea densa (“cerradão”)
SM-0 Áreas de tensão ecológica e contato Savana-Floresta ombrófila densa
SN-0 Áreas de tensão ecológica e contato Savana-Floresta estacional
SO-0 Áreas de tensão ecológica e contato Savana-Floresta ombrófila
Td-3 Savana estépica Campos de Roraima Arbórea densa
Vegetação lenhosa oligotrófica dos
Não floresta La-0 Arborea Aberta
pântanos e das áreas arenosas
Vegetação lenhosa oligotrófica dos
Lg-0 Gramineo-lenhosa
pântanos e das áreas arenosas
rm-0 Refúgio ecológico Campos de altitude Montana
Sa-0 Savana Cerrado Arbórea aberta
Sg-0 Savana Cerrado Gramineo-lenhosa
Sp-0 Savana Cerrado Parque
ST-0 Áreas de tensão ecológica e contato Savana-savana estépica
Tp-3 Savana estépica Campos de roraima Parque
Fonte: Brasil, Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) & Instituto Brasileiro do Desenvolvimento Florestal (IBDF) 1988. Em Fearnside & Ferraz (1995) os
tipos La-0 e Lg-0 foram classificados de “floresta não densa”, enquanto Pa-0, Sd-0 e Td-3 foram classificados de “não floresta”. Os números usados como sufixos
nos códigos se referem às convenções de sombreamento usadas no mapa.

de toda a América Latina, estimaram nas áre- florestas e algumas savanas dentro e fora
as das diferentes “ecorregiões”, sua importân- da Amazônia Legal, mas não o cerrado). As
cia biológica e o grau de ameaça de cada uma áreas sem representação foram identificadas
para gerar prioridades de conservação. Com para uma possível inclusão como unidades de
este tipo de análise, a Amazônia fica classifi- conservação. Em 1999, um workshop realiza-
cada como de menor prioridade, comparada do em Macapá, por um grupo de organiza-
com a Mata Atlântica brasileira e as florestas ções não governamentais, usou estes e outros
nas proximidades dos Andes, da Bolívia até a dados para recomendar uma série de priori-
Colômbia, devido ao alto grau de endemismo, dades para a criação de reservas, levando em
às pequenas extensões existentes dos ecossis- conta considerações sociais em diferentes
temas, e às ameaças humanas sobre elas (ver partes da região (Capobianco et al., 2001; ISA
também Myers et al., 2000). et al., 1999). A base da análise foi um mapa,
Ferreira (2001; Ferreira et al., 2001) usa- em escala 1:2.500.000, do Instituto Brasileiro
ram um mapa digital produzido pelo WWF- de Geografia e Estatística (Brasil, IBGE, 1997)
US, em escala 1:5.000.000 (Dinerstein et al., que classifica a vegetação da Amazônia Legal
1995), para definir unidades de vegetação em 161 tipos (incluindo tipos antrópicos),
dentro do “Bioma Amazônia” (que abrange simplificado para 21 tipos por Nelson & de

Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 195 8/18/2022 3:14:34 PM


DESTRUIÇÃO E CONSERVAÇÃO
196 DA FLORESTA AMAZÔNICA

Oliveira (2001).(2) Os mapas de vegetação em e o cerrado está sobre grande pressão devido
todas estas análises, inclusive o atual, foram à sua proximidade aos centros populacionais
derivados a partir dos mapas de 1:1.000.000 importantes, e à procura de madeira e carvão
do Projeto RADAMBRASIL (1973-1983). vegetal no Centro-Sul do País. A produção
de grãos, especialmente a soja, é uma fon-
te de pressão que aumentou nos ecótonos
ESTABELECENDO PRIORIDADES da floresta/cerrado. Estes tipos de vegetação
são mais fáceis de desmatar que tipos flo-
Um problema no estabelecimento de cri-
restais mais densos, e não têm sido protegi-
térios objetivos para atribuir a importância
dos dos programas de incentivos fiscais para
biológica é o nível de conhecimento da va-
expansão da pecuária após 1979, quando a
riação sobre ecossistemas diferentes e locais
Superintendência do Desenvolvimento da
geográficos em Amazônia. A maioria da di-
Amazônia (SUDAM) suspendeu, pelo menos
versidade biológica é encontrada em áreas
teoricamente, a aprovação dos novos proje-
intensamente coletadas (Nelson et al., 1990).
tos em áreas de “florestas densas”.(3)
Um critério alternativo daria uma prioridade
mais alta às áreas que tiveram muito pou- Os dados de satélite indicam que a zona
co estudo, devido ao princípio de precaução de transição floresta/cerrado sofre o desma-
para evitar a perda de biodiversidade desco- tamento mais rápido (Brasil, INPE, 2002). A
nhecida, mas potencialmente preciosa. pressão mais intensa sobre os tipos de vege-
tação localizados ao longo do limite entre a
O grau de ameaça levantado pelas ativi- floresta e o cerrado também é mostrada por
dades atuais de exploração e desenvolvimen- várias análises de mapas que criam cená-
to varia consideravelmente entre as regiões e rios de desmatamento simulados, baseados
tipos de vegetação. As áreas ameaçadas in- em padrões de expansão de áreas desmata-
cluem a várzea, onde a facilidade de acesso das a partir de rodovias e cidades existen-
fluvial, combinada com a presença de espé- tes (Kangas, 1990; Laurance et al., 2001;
cies de madeira de lei (como ucuuba ou viro- Nepstad et al., 2000).
la: Virola spp.), fez esta a fonte primária de
madeira na região. Em áreas de terra firme, os
locais com concentrações altas de árvores de POSSIBILIDADES PARA A PROTEÇÃO DE
valor, tais como as áreas de cerejeira (Torresea ECOSSISTEMAS
acreana Ducke) e de mogno (Swietenia ma-
crophylla King), em Rondônia, fizeram dessas Assim como os níveis de ameaças variam
alvos para a exploração madeireira, inclusive em diferentes partes da região, as oportuni-
dades para criar áreas protegidas também va-
atividades de exploração em reservas indí-
riam espacialmente. Quando as possibilida-
genas. As ameaças à floresta amazônica es-
des estão presentes, este elemento deve ser
tão continuamente evoluindo. Atualmente, o
pesado nas decisões sobre áreas protegidas.
conjunto de planos para rodovias, ferrovias, Contudo, o esforço para estabelecer novas
hidrovias, hidrelétricas, linhas de transmissão reservas não deveria ser guiado exclusiva-
e gasodutos, incluídos no Programa Avança mente pela perseguição das oportunidades,
Brasil (Consórcio Brasiliana, 2000), repre- como aconteceu no passado. Uma estratégia
senta uma das principais forças aumentan- global baseada em prioridades biológicas
do a pressão sobre a vegetação natural na deve ser elaborada.
Amazônia (ver Fearnside & Laurance, 2002).
Estes desenvolvimentos levantam uma amea- Um tipo de oportunidade surge das rei-
ça às florestas nas áreas afetadas. vindicações territoriais entre estados. O
conflito entre os estados de Amazonas e
Ecótonos entre os vários tipos de savana Pará para as áreas de várzea no lado norte
e a floresta, classificados como as “áreas de do rio Amazonas é um exemplo. Reservas
tensão ecológica” no sistema de classificação extrativistas oferecem outra alternativa fun-
de vegetação do IBAMA (Tabela 1), estão sob damental, onde os produtos que são agora
grande pressão. A transição entre a floresta comercializáveis ocorrem em intensidade

Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 196 8/18/2022 3:14:34 PM


Uma análise de lacunas de conservação
da vegetação da Amazônia 197

relativamente alta, e onde populações locais MATERIAL E MÉTODOS


de seringueiros e de outros extrativistas, são
organizadas para controlar estes recursos Analisamos o mapa de vegetação do
(Allegretti, 1990; Fearnside, 1989, 1992). IBAMA, em escala de 1:5.000.000 (Brasil,
IBGE & IBDF, 1988). O mapa de vegetação
As reservas indígenas representam uma do IBAMA é uma simplificação dos ma-
oportunidade importante para preservar pas na escala de 1:1.000.000, produzidos
ecossistemas naturais, desde que estas áre-
pelo projeto RADAMBRASIL (Brasil, Projeto
as sejam utilizadas com este objetivo. Até
RADAMBRASIL, 1973-1983). Os mapas do
hoje, os povos indígenas têm tido um histó-
RADAMBRASIL foram derivados a partir da
rico muito melhor do que a maioria dos não
visualização em imagens de radar, transpor-
indígenas na manutenção dos ecossistemas
tado em vista lateral (SLAR), na escala de
naturais. As áreas indígenas têm, em mui-
1:250.000, conjuntamente com verificação no
tos casos, resistido às pressões de forma que
campo em aproximadamente 3.500 pontos
elas se encontram circundadas por grandes
nos quais foram feitos inventários florestais
áreas desmatadas, como no caso das áreas
na Amazônia Legal. Enquanto que, sem dúvi-
Mãe Maria (Nelson & de Oliveira, 2001),
da, o mapa do IBAMA contém erros, e o estu-
Xikrin do Catete e Kayapó (Schwartzman
et al., 2000) e o Parque Indígena do Xingu do atual não pode ser mais seguro que o mapa
(Vilas Boas, 2000). No entanto, as reservas sobre o qual está baseado, esse mapa fornece
indígenas atualmente não podem ser con- uma base inicial útil para um tipo de análise
sideradas como sendo protegidas, devido à que, igualmente, necessita ser aplicada a ou-
ausência de negociações especiais com as tros mapas existentes e futuros. Para as áre-
tribos, para declarar partes das suas reservas as protegidas e nativas, utilizamos os mapas
como unidades de conservação. Povos nati- (também na escala de 1:5.000.000) produzi-
vos nem sempre utilizam as suas reservas dos pela Conservation International (1990a,b)
de modo ecologicamente benigno. O exem- para a reunião do Workshop-90, realizada em
plo mais conhecido é o sistema produtivo Manaus em janeiro de 1990.
não-tradicional do povo Navajo, do sudoes- Analisamos os mapas para identificar áre-
te dos EUA, onde o sobrepastoreio por ove- as que já estão protegidas em cada estado, e
lhas conduziu à uma severa erosão do solo. para identificar áreas de cada zona de vege-
Alguns exemplos já podem ser encontrados tação que poderiam ser protegidas no siste-
no Brasi, nas tribos que destruiriam rapida- ma existente das áreas indígenas. Os mapas
mente as suas reservas, se tivessem tido essa foram digitalizados, e as áreas de cada tipo
oportunidade. Por exemplo, várias tribos em de vegetação por estado e grau de proteção,
Rondônia concordaram em permitir garim- foram tabuladas utilizando-se o Sistema de
peiros e madeireiros explorar suas áreas tri- Informações Geográficas ARC/INFO (GIS), no
bais, em troca de uma parcela dos lucros. A Centro de Dados de Sistemas de Observação
exploração do mogno na reserva dos Cinta de Recursos da Terra (EROS), do Serviço de
Larga fornece um exemplo gráfico (J. Ferraz, Levantamento Geológico dos EUA (USGS),
observação pessoal, 1992). Sioux Falls, Dakota do Sul. As coordenadas
O fornecimento de serviços ambien- geográficas (latitude-longitude) para as carac-
tais oferece uma base bem melhor para terísticas no mapa da vegetação, foram cal-
avaliar o futuro sustento econômico das culadas a partir da projeção policônica deste
populações indígenas, mostrando que se- mapa; para os outros mapas, as coordenadas
ria altamente vantajoso para esses povos, podem ser obtidas diretamente. O GIS foi uti-
entrarem em acordos que valorizem esses lizado para sobrepor à vegetação três camadas
serviços (Fearnside, 1997). A proposta do adicionais: estados, áreas indígenas, e parques
Instituto Socioambiental (ISA) para Reservas e reservas. Os dados digitais resultantes para
Indígenas de Recursos Naturais (RIRN) seria a Amazônia Legal foram transformados para
um modelo apropriado para estes acordos a projeção Azimutal Lambert de Áreas Iguais
(Santilli, 2001). para permitir medições corretas das áreas.

Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 197 8/18/2022 3:14:35 PM


DESTRUIÇÃO E CONSERVAÇÃO
198 DA FLORESTA AMAZÔNICA

Algumas diferenças entre o mapa de vege- mapas mais refinados deveriam ser feitos para
tação e outros mapas deram lugar a polígonos identificar e proteger estas áreas. Não obstan-
de “tiras” ou “faixas” ao longo das bordas do te, é importante fazer um início mediante a
mapa, mas estas foram pequenas e tenderam identificação das áreas onde a necessidade de
a se sobrepor. Os casos nos quais a fronteira proteção fica evidente, com base na escala do
do Brasil no mapa de vegetação estava fora da mapa atual. Os resultados deste exercício de-
fronteira mostrada nos outros mapas, foram vem ser considerados como um mínimo, e não
contrabalançados por casos onde o inverso como uma proposta definitiva para proteger a
era verdade. O mapa de vegetação foi cortado diversidade biológica.
para ter conformidade com o mapa das áreas
protegidas. Foram descartadas quaisquer áreas
que estivessem no mapa de áreas protegidas, RESULTADOS E DISCUSSÃO
mas fora do mapa de vegetação, codificado-as
como “fora do mapa” e excluídas da análise. A
Desmatamento
presença de polígonos de tira indica que não A extensão de desmatamento em relação
havia uma harmonia perfeita entre os mapas às áreas originais de cobertura florestal é apre-
de origem. Na maioria dos casos, os erros eram sentada na Tabela 2, para os nove estados do
muitos pequenos considerando-se o tamanho Amazônia Legal. Até 2000, o desmatamento
das regiões. Os polígonos foram distribuídos da atingiu 583,3 × 103 km2 (Brasil, INPE, 2002),
seguinte forma: 41 polígonos de 0-500 km2, 5 ou 14,6% da área originalmente florestada. O
polígonos de 500-1.000 km2, e um de cada com desmatamento acumulado chegou a propor-
1.708 km2, 2.056 km2 e 2.124 km2. Uma análise ções alarmantes em estados como Maranhão
mais detalhada dos mapas de origem seria ne- e Tocantins.(4) As percentagens mais baixas
cessária para evitar estas discrepâncias. em alguns outros estados, como Pará e Mato
A escala muito pequena do mapa utilizado Grosso, são um reflexo das imensas áreas de
(1:5.000.000), significa que muitos dos tipos de terra destes estados: por ser o desmatamen-
ecossistemas naturais não estão representados: to desigualmente distribuído nestes estados,
tipos de vegetação originais podiam ser dema- o impacto nas florestas das áreas mais afe-
siado pequenos para aparecer nesta escala de tadas é muito maior que as percentagens em
mapa, ou podem ter sido agrupados com ou- nível estadual sugerem. A predominância de
tras categorias na legenda do mapa. No futuro, endemismo significa que tais perturbações

Tabela 2. Extensão Área original de floresta (103 km2) Área e porcentagem desmatada (103 km2) (%)(a)
de desmatamento Estado
IBAMA(b) INPE(c) 1978 1990 2000
na Amazônia Legal
brasileira 1 2 3 4 5 6
Acre 154 152 2,6 (1,7%) 10,3 (6,8%) 15,8 (10,3%)
Amapá 132 115 0,2 (0,2%) 1,3 (1,1%) 2,0 (1,7%)
Amazonas 1.561 1.481 2,3 (0,2%) 22,2 (1,5%) 30,3 (2,0%)
Maranhão 155 143 65,9(d) (46,1%) 93,4(d) (65,3%) 104,3(d)
Mato Grosso 585 528 26,5 (5,0%) 83,6 (15,8%) 143,9 (27,3%)
Pará 1.218 1.139 61,7(d) (5,4%) 144,2(d) (12,7%) 200,1(d) (17,6%)
Rondônia 224 215 6,3 (2,9%) 33,5 (15,6% ) 58,1 (27,0)
Roraima 188 164 0,2 (0,1%) 3,8 (2,3%) 6,4 (3,9%)
Tocantins
58 59 4,2 (7,1%) 22,9 (38,9%) 26,9 (45,6%)
Goiás
Amazônia Legal 4.275 3.996 169,9 (4,3%) 410,4 (10,3%) 589,7 (14,7%)

(a) Desmatamento, incluindo floresta inundada por represas hidrelétricas. Fontes: Brasil, INPE (2002) para valores de 1990 e 2000; valores de 1978 remedidos por
Skole & Tucker (1993) a partir de Tardin et al. (1980); ver Fearnside (1993b).
(b) Áreas medidas no mapa de IBAMA (Brasil, IBGE & IBDF, 1988).
(c) Áreas medidas pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE). Estas áreas de floresta (coluna 3) foram definidas através do aparecimento em imagens de
LANDSAT-TM, e são as mais consistentes com as estimativas de área desmatadas nas colunas 4-6. Eles foram usados, portanto, para calcular as percentagens. As
inconsistências com as estimativas das áreas originais de floresta do IBAMA (coluna 2) representam uma fonte importante de incerteza nas informações disponíveis
sobre percentagens de desmatamento.
(d) Valores para o Maranhão incluem 57,8 × 103 km2, e valores para o Pará incluem 39,8 × 103 km2 de desmatamento “antigo” (aproximadamente pré-1970).
Atualmente grande parte dessa área se encontra com floresta secundária.

Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 198 8/18/2022 3:14:35 PM


Uma análise de lacunas de conservação
da vegetação da Amazônia 199

concentradas podem ter impactos mais seve- (Nelson & de Oliveira, 2001: 144). Incorporar
ros nas espécies limitadas a estas áreas. áreas indígenas e outras semiprotegidas em
um sistema de unidades de conservação não
É igualmente importante recordar a
implica expulsar os habitantes florestais. Ao
invalidade da prática do cálculo comum
contrário, eles não somente têm o direito de
(mas errôneo) da percentagem desmatada
habitar as suas áreas tradicionais, mas sua
utilizar como denominador a área de terra
presença pode, potencialmente, oferecer
das unidades políticas, em vez de conside-
uma garantia maior de que a floresta perma-
rar apenas a área da floresta original desses
necerá como está, do que no caso de uma
estados. No caso do Tocantins, por exemplo,
transformação destas áreas em parques va-
apenas 9,8% da área terrestre do estado fo-
zios, com proteção contra invasões confiada
ram desmatadas até 2000, mas na realida-
apenas aos guardas florestais do IBAMA.
de isto representa 45,6% da área da floresta
original. No Maranhão, 40,1% da área ter- Os compromissos precisam ser negocia-
restre do estado foram desmatadas até 2000, dos com aqueles responsáveis por estas áreas
representando 72,9% da área originalmente semiprotegidas (como índios, seringueiros e
recoberta por floresta. órgãos do setor florestal do governo) para de-
finir o grau de perturbação aceitável e os me-
Os parques e reservas equivalentes a par- canismos para garantir que estes limites não
ques na Amazônia brasileira são uma peque- serão ultrapassados. Hoje, estas áreas não
na percentagem da região (Tabela 3).(5) Até podem ser consideradas como protegidas.
1997, apenas 18,4 milhões de hectares, ou Nas florestas nacionais e reservas florestais,
seja, 3,7% da Amazônia Legal haviam sido por exemplo, é prevista a futura exploração
incluídos em reservas desse tipo, mesmo que madeireira. As reservas extrativistas que fo-
apenas no papel (Nelson & de Oliveira, 2001: ram criadas são justificadas, principalmente,
144). A conservação de 25% da vegetação pelo seu papel na conservação ambiental. As
original da região foi recomendada em 1979 reservas representam uma iniciativa impor-
pela Comissão Interministerial de Política tante para manter a floresta sob a tutela dos
Florestal, na versão original do projeto de seus habitantes. Contudo, é necessário evitar
lei elaborado pela comissão (ver Fearnside, a perda de sustentabilidade desses sistemas,
1986). O Programa para Aumentar as Áreas devido às expectativas excessivamente altas
de Proteção Ambiental (PROAPAM, também no que diz a respeito à capacidade destas áre-
chamada ARPA), melhor conhecido com o as para absorver fluxos populacionais ou para
“Projeto dos 10%”, foi criado no Ministério produzir riqueza (Fearnside, 1989).
do Meio Ambiente com esse fim. As áreas
na Tabela 3 referem-se a todos os tipos de A maior parte da vegetação semiprotegi-
vegetação, não somente às florestas. da está em áreas indígenas e, infelizmente,
para parte dessas terras ainda falta o reco-
O estado de conservação melhoraria con- nhecimento e delimitação legal na região.
sideravelmente se as áreas semiprotegidas Parte da área indígena incluída na Tabela 3
tivessem sido incluídas. O termo “semipro- não é legalmente reconhecida ainda, e, em
tegido” é utilizado aqui para se referir às flo- alguns casos, vem sendo diminuída por in-
restas nacionais, reservas florestais, reservas vasões e/ou por decretos do governo.
extrativistas e áreas indígenas. Estas unida-
des atualmente exercem apenas uma limita- Exemplos de reservas
ção restrita às perturbações, faltando ainda
exigências legais para impedir a futura ex- A Figura 1 mostra áreas que satisfariam
ploração e perturbação. A inclusão das áreas o critério de proteção de pelo menos alguma
semiprotegidas aumentaria a fração protegi- parte de cada tipo de vegetação em cada es-
da na Amazônia Legal de 2,7% para 19,0% tado, presumindo que as áreas já protegidas
(Tabela 3). Considerandose porém o diagnós- serão mantidas. A distribuição dos tipos de
tico ambiental da Amazônia Legal, do IBGE vegetação nas áreas protegidas existentes é
(1997), o aumento seria de 3,7% para 21,5% especificada na Tabela 4. Os exemplos das

Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 199 8/18/2022 3:14:35 PM


200

Tabela 3. Áreas protegidas e semi-protegidas na Amazônia Legal(a)

Áreas protegidas (km2) Áreas semiprotegidas (km2)


Área terrestre Percentual
Todos os tipos
Estado do estado protegido ou semi-
Percentual do Total de Área)(km2)
(103 km2) Estação Parque Reserva Reserva Total Floresta Reserva Reserva Área protegido(%)
estado protegido semi-
Ecológica Nacional Biológica Ecológica protegido Nacional Florestal Extratvista indigena
(%) protegida

Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 200


Acre 154 984 3.455 4.439 2,9 20.248 11.443 31.691 36.130 23,5
DA FLORESTA AMAZÔNICA

Amapá 142 4.123 3.969 548 8.640 6,1 8.052 9.588 17.640 26.280 18,5
DESTRUIÇÃO E CONSERVAÇÃO

Amazonas 1.568 4.399 44.365 13.527 2.057 64.348 4,1 36.980 3.994 287,015 327.989 392.337 25,0

Maranhão 260 2.936 2.936 1,1 18.505 18.505 21.441 8,2

Mato Grosso 901 2.225 2.547 4.772 0,5 111.285 111.285 116.057 12,9

Pará 1.247 2.016 8.206 3.831 14.053 1,1 3.021 11.363 161.998 176.382 190.435 15,3

Rondônia 238 893 7.176 8.978 17.047 7,2 10.346 39.974 50.320 67.367 28,3

Roraima 225 5.192 1.160 1.156 7.508 3,3 97.505 97.505 105.013 46,7

Tocantins/Goiás 273 4.460 4.460 1,6 23.415 23.415 27.875 10,2

Amazônia legal 5.009 15.709 75.492 33.241 3.761 128.203 2,6 3.021 48.343 22.392 749.285 823.041 946.805 18,9

Percentual da área
100 0,3 1,5 0,7 0,1 2,6 0,1 1,0 0,4 15,0 16,4 18,9
da Amazônia Legal

(a) Áreas medidas a partir dos mapas em escala de 1:5.000.000 preparados por Conservation International (1990a,b). Áreas não incluem as partes cobertas por água segundo o mapa do IBGE & IBDF (1988), com a exeção das reservas
extrativistas, que são de Fearnside (1989). Nem todas as áreas indigenas listadas tem proteção legal. Todas as categorias incluem todos os tipos de vegetação natural (não apenas floresta); apenas áreas de vegetação natural intacta são
incluídas. No caso de reservas não incluidas no mapa da Conservation International Reserva Biológica Uatumã, Reserva Ecológica Sauím-Castanheira, Estação Ecológica Niquiá e Parque Nacional Monte Roraima, as áreas totais são usadas,
possivelmente incluindo água e vegetação não natural

8/18/2022 3:14:35 PM
Uma análise de lacunas de conservação
da vegetação da Amazônia 201

Figura 1. Áreas
protegidas existentes
(da Tabela 4) e áreas
que satisfazem o
critério para proteger
um exemplo de cada
tipo de vegetação
em cada estado (da
Tabela 5).

reservas que cobririam os tipos de vegeta- floresta devem ser protegidos rapidamente.
ção que restam estão enumerados na Tabela Isso, porém, não significa que os projetos
5. As dimensões das áreas indicadas (Fig. 1) de desenvolvimento, existentes nestas áre-
são modestas; em alguns casos a vegetação as, devam ser abandonados.
em questão existe em áreas muito maiores.
A Tabela 1 define os 28 tipos de vege-
Aqui, não se faz nenhuma tentativa de es-
tação natural na Amazônia Legal, indica-
tabelecer critérios para os tamanhos dessas
dos no mapa do IBAMA em uma escala de
reservas que devem ser protegidas. Sempre
1:5.000.000 (Brasil, IBGE & IBDF, 1988).
que possível, os exemplos foram tirados
A área de vegetação natural de cada tipo
para incluir várias zonas de vegetação em
é apresentada, por estado, na Tabela 6. A
uma única área contígua. Nenhuma ten-
distribuição dos tipos de vegetação nas áre-
tativa foi feita para localizar as áreas com
as protegidas, tais como reservas biológicas
referência às oportunidades para proteção
(RB), reservas ecológicas (RE), estações
de habitat, como por exemplo, em reservas
ecológicas (EE) e parques nacionais (PN),
indígenas. Em alguns casos, onde os con-
em cada estado, é apresentada na Tabela 7.
flitos conhecidos com estradas e projetos
As áreas referem-se à vegetação atual (de
de desenvolvimento possam ser evitados,
acordo com o mapa), que é diferente da
mediante a indicação das áreas mais remo-
vegetação original (segundo as indicações
tas do mesmo tipo de vegetação, isto foi
da Tabela 2). Dos 28 tipos de vegetação, 10
feito, porém as áreas não evitam todos os
(36%) não têm área protegida na Amazônia
conflitos desse tipo. É importante recordar
Legal, na sua totalidade.
que onde áreas biologicamente importantes
coincidem com as áreas de desmatamento Por ser a Amazônia tão vasta, as espé-
extensivo, quaisquer remanescentes de cies e outras características dos ecossistemas

Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 201 8/18/2022 3:14:35 PM


DESTRUIÇÃO E CONSERVAÇÃO
202 DA FLORESTA AMAZÔNICA

Tabela 4. Tipos de Área protegida


vegetação nas áreas Estado Código de Vegetation Natural(c) e Área (km2)
protegidas por unidade Código(b) Tipo Nome
federativa na Amazônia EE06 Estação ecológica Rio Acre Ab-0 (984 km2)
Legal(a) ACRE
PN10 Parque nacional Serra do Divisor Aa-0 (372 km2); Ab-0 (3.083 km2)

RB01 Reserva biológica Lago Piratuba Da-0 (306 km2); Pa-0 (3.031 km2); Pf-0 (473 km2); Sp-0 (159 km2)

AMAPÁ EE11 Estação ecológica Maracá-Jipioca Pa-0 (548 km2)

PN01 Parque nacional Cabo Orange Ds-0 (59 km2); Pa-0 (2.184 km2); Pf-0 (1.080 km2); SO-0 (799 km2)

RB04 Reserva biológica Abufarí Ab-0 (60 km2); Da-0 (3.312 km2); Pa-0 (54 km2)

RB07 Reserva biológica Uatumã Não incluido no mapa de Conservation International; área total = 10.100 km2
Da-0 (22 km2); Dm-0 (3.874 km2); Ds-0 (2.699 km2); La-0 (597 km2); LO-0
PN02 Parque nacional Pico da Neblina
(13.672 km2)
Ab-0 (2.699 km2); As-0 (643 km2); Db-0 (17.822 km2); Ds-0 (378 km2);
PN03 Parque nacional Jaú
Ld-0 (481 km2); LO-0 (1.248 km2)
AMAZONAS
PN04 Parque nacional Amazônia Db-0 (231 km2)

RE01 Reserva ecológica Sauim-Castanheira Não incluido no mapa de Conservation International; área total = 1 km2

RE02 Reserva ecológica Jutaí-Solimões Aa-0 (98 km2); Da-0 (945 km2); Db-0 (1.014 km2)

EE05 Estação ecológica Anavilhanas Da-0 (449 km2); Db-0 (481 km2); Ds-0 (511 km2)

EE12 Estação ecológica Juami-Japurá Da-0 (549 km2); Db-0 (2.286 km2); LO-0 (123 km2)

MARANHÃO RB03 Reserva biológica Gurupí Db-0 (2.936 km2)

EE03 Estação ecológica Ioué SN-0 (1.712 km2)

EE09 Estação ecológica Taiamã Vegetação não disponível; área total = 143 km2

MATO EE10 Estação ecológica Serra das Araras Sa-0 (513 km2)
GROSSO
Chapada dos
PN07 Parque nacional Sa-0 (820 km2); SN-0 (119 km2)
Guimarães
Pantanal
PN08 Parque nacional Sg-0 (852 km2); SN-0 (754 km2)
Matogrossense
EE07 Estação ecológica Jari Da-0 (7 km2); Ds-0 (2.010 km2)

PN04 Parque nacional Amazônia As-0 (75 km2); Db-0 (5.144 km2); Ds-0 (2.987 km2)
PARÁ
RB02 Reserva biológica Rio Trombetas Db-0 (795 km2); Ds-0 (3.036 km2)

RB08 Reserva biológica Tapirapé Vegetação não disponível; área total = 182 km2

RB05 Reserva biológica Jarú As-0 (2.398 km2)

RB06 Reserva biológica Guaporé Da-0 (295 km2); Pa-0 (1.560 km2); Sa-0 (1.388 km2); SO-0 (145 km2)
RONDÔNIA
EE02 Estação ecológica Cuniã Ds-0 (192 km2); SO-0 (701 km2)
Ab-0 (88 km2); As-0 (2.490 km2); Ds-0 (363 km2); Sa-0 (2.105 km2); SO-0
PN05 Parque nacional Pacaás Novos
(2.130 km2)
Ld-0 (475 km2); LO-0 (111 km2), incluindo a antiga Estação Ecológica de
EE01 Estação ecológica Caracaraí Niquiá (vegetação não disponível; não incluido no mapa de Conservation
International; área total = 2.866 km2)
RORAIMA
EE04 Estação ecológica Maracá Dm-0 (564 km2); Ds-0 (421 km2); LO-0 (171 km2)

PN09 Parque nacional Monte Roraima Não incluido no mapa de Conservation International; área total = 1.160 km2

TOCANTINS/ EE08 Estação ecológica Coco-Javaes Não incluido no mapa de Conservation International; área total = 370 km2
GOIÁS PN06 Parque nacional Araguaia Da-0 (57 km2); Fs-0 (421 km2); Sp-0 (3.981 km2)
(a) Áreas totais por estado differem levemente dos totais na Tabela 3 porque uma adjuste por áreas do estado não foram applicada.
(b) Códigos de áreas protegidas: Reserva biológica = RB, Reserva ecológica = RE, Estação ecológica = EE, Parque nacional = PN.
(c) Códigos de tipos de vegetação definidos na Tabela 1.

Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 202 8/18/2022 3:14:35 PM


Uma análise de lacunas de conservação
da vegetação da Amazônia 203

Número de Tabela 5. Reservas de


Estado Nome Tipos de vegetação(b) exemplo para proteção
Reserva(a)
de áreas de vegetação
1 Acre Extensão do Parque Nacional Serra do Divisor Db-0; Ds-0
desprotegidas
2 Amapá/ Pará Serra do Tumucumaque Dm-0 [Amapá]; Dm-0 [Pará]
3 Amapá Baixo Jari Db-0; Ds-0(c)
4 Amazonas Extensão da Reserva Ecológica de Jutaí-Solimões Aa-0(c)
5 Amazonas Rio Demini Lg-0
6 Amazonas Extensão da Reserva Biológica de Abufarí Pa-0(c)
7 Amazonas Campos de Humaitá/Campos de Estanho Sa-0; SO-0; Sp-0
Amazonas/
8 Várzea do Rio Machado/Ji-Paraná Aa-0 [Rondônia]; Aa-0(c) [Amazonas]
Rondônia
9 Amazonas Rio Juruena SN-0
10 Maranhão Mangues do norte de Maranhão Pf-0
11 Maranhão Extensão da Reserva Biológica de Gurupí Ds-0
12 Maranhão Mangues de São Luís Pa-0; Pf-0
13 Maranhão Extensão do Parque Nacional de Lençois Maranhenses [fora do mapa] SM-0
14 Maranhão Rio Zutiua Cs-0; SN-0
15 Maranhão Boa Esperança Sd-0
16 Maranhão Rio Parnaíba Sa-0; Sp-0
17 Mato Grosso Aripuanã As-0; Ds-0; ON-0; Sd-0
18 Mato Grosso Serra do Roncador SO-0
19 Mato Grosso Alto Xingu/Rio Sete de Setembro Fa-0; ON-0; Pa-0
20 Mato Grosso Pontes de Lacerda Fs-0; Sp-0; ST-0
21 Mato Grosso Rio Jauru Cs-0; Fs-0
22 Pará Rio Cumina Sd-0; SO-0
23 Roraima Prainha As-0; SO-0
24 Pará Várzea de Almeirim Pa-0
25 Pará Ilha Caviana Da-0(c); Pa-0; Sp-0
26 Pará Ilha de Marajó Da-0(c)
27 Pará Mangues da Baía de Marajó Pf-0
28 Pará Serra do Carajás As-0(c); Dm-0
29 Pará Serra do Cachimbo Cs-0; ON-0; Sa-0
30 Pará Rio Benedito SN-0; SO-0
31 Pará Cerrado do Araguaia Sg-0
32 Rondônia Rio Abunã Db-0
33 Rondônia Alto Guaporé Fs-0; Sp-0
34 Rondônia Colorado d’Oeste ON-0; SN-0
35 Roraima Campos de Roraima Sg-0; SN-0; Sp-0; Td-3; Tp-0
36 Roraima Refúgio de Parima rm-0
37 Roraima Extensão norte de Estação Ecológica de Caracaraí As-0; La-0; Lg-0; ON-0
38 Roraima Tacutu Fs-0; SO-0
39 Roraima Extensão este da Estação Ecológica de Caracaraí As-0; Lg-0
40 Roraima Rio Jauaperi Da-0; Db-0
41 Tocantins Bico do Papagaio As-0; Cs-0; SO-0
42 Tocantins Rio Araguaia Ds-0
43 Tocantins Tocantins central Sa-0; Sd-0; SN-0
44 Tocantins Cerrados do Rio Sono Sa-0; Sg-0

(a) Número de reserva mostrado na Figura 1.


(b) Códigos definidos na Tabela 1.
(c) Estas zonas de vegetação têm alguma área pequena protegida nas reservas existentes (<0,5% da área da zona de vegetação): Aa-0 no Amazonas; As-0 no Pará;
Da-0 no Pará; Ds-0 no Amapá e Pa-0 no Amazonas. Duas destas zonas de vegetção precisam de reservas additionais (reservas de exemplo nos. 43 e 44), e as
outras podem ser protegidas dentro das reservas de exemplo precisadas para proteger zonas de vegetação atualmente sem área protegida.

Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 203 8/18/2022 3:14:35 PM


DESTRUIÇÃO E CONSERVAÇÃO
204 DA FLORESTA AMAZÔNICA

Tabela 6. Área de Mato Tocantins/ Total


vegetação natural Categoria Código Acre Amapá Amazonas Maranhão Pará Rondônia Roraima
Grosso Goiás presente
presente na Amazônia
Da-0 9.011 164.876 76.570 2.704 3.326 2.610 259.097
Legal brasileira (km2)
Floresta Db-0 16.408 2.184 615.203 22.586 164.091 2.066 10.248 832.786
densa Dm-0 113 10.181 3.418 20.661 34.373
Ds-0 518 99.220 178.103 1.988 23.154 413.345 14.607 83.692 3.055 817.682
Subtotal 16.926 110.528 968.363 24.574 23.154 657.424 19.377 117.927 5.665 1.943.938
Aa-0 10.591 65.748 805 2.273 79.417
Ab-0 114.380 211.052 41.064 366.496
As-0 37.555 124.620 286.271 77.794 8.430 1.216 535.886
Cs-0 3.666 736 5.386 115 9.903
Fa-0 3.554 3.554
Fs-0 24.317 7.718 1.041 1.328 34.404
Ld-0 37.405 10.967 48.372

Floresta LO-0 172.607 30.184 202.791


não densa ON-0 168.069 2.991 4.801 3.045 178.906
Pa-0 15.157 12.778 2.517 14.738 27.162 8.690 81.042
Pf-0 1.823 2.089 3.894 7.806
Sd-0 15.771 10.840 1.274 2.234 30.119
SM-0 384 384
SN-0 1.082 6.570 142.778 27.812 4.781 904 14.465 198.392
SO-0 4.226 27.350 22.124 59.734 21.932 4.286 6.551 146.203
Td-3 1.550 1.550
Subtotal 124.971 21.206 565.577 30.997 511.776 415.329 169.053 60.407 25.909 1.925.225
Subtotal todas
141.897 131.734 1.533.940 55.571 534.930 1.072.753 188.430 178.334 31.574 3.869.163
as florestas
La-0 14.979 970 15.949
Lg-0 9.663 9.767 19.430
rm-0 390 390

Não Sa-0 1.531 55.758 167.534 5.686 11.028 102.445 343.982


floresta Sg-0 10.490 5.057 15.481 7.113 38.141
Sp-0 10.038 5.556 26.980 64.085 12.393 2.664 8.969 48.962 179.647
ST-0 6.599 6.599
Tp-3 10.671 10.671
Subtotal 0 10.038 31.729 82.738 248.708 23.136 13.692 46.248 158.520 614.809
Total 141.897 141.772 1.565.669 138.309 783.638 1.095.889 202.122 224.582 190.094 4.483.972

(a) Áreas em km2 medidas do mapa de vegetação em escala 1:5.000.000 (Brasil, IBGE & IBDF, 1988); Estas áreas não refletam perdas devido a desmatamento recente.

mudam de uma parte da região para outra, diversas zonas podem ser consideradas em
até mesmo dentro de qualquer determinado uma única reserva, como nas 35 áreas pro-
tipo de vegetação. É, por consequente, impor- tegidas existentes, e nos 44 exemplos de re-
tante adotar o critério que um objetivo míni- servas na Tabela 5 e Fig. 1). Das 111 zonas de
mo seja proteger pelo menos um exemplo de vegetação, apenas 37 (33%) têm alguma par-
cada tipo de vegetação, em cada um dos esta- te da sua área protegida, deixando 74 (67%)
dos da região. Como pode ser visto na Tabela sem nenhuma proteção (Fig. 2).
7, isto implica que 111 zonas de vegetação de- A percentagem da área “atual” (Tabela 7)
vem ser protegidas na região (frequentemente que é protegida em cada tipo de vegetação é

Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 204 8/18/2022 3:14:36 PM


Uma análise de lacunas de conservação
da vegetação da Amazônia 205

Figura 2. Número de
tipos de vegetação
protegidos e
desprotegidos na
Amazônia Legal.

apresentada na Tabela 8. Pelo fato das áreas vegetação desempenham, também, papéis
protegidas serem, às vezes, bastante peque- importantes no regulamento do clima global
nas, a combinação das reservas existentes. e regional, mediante o armazenamento de
com as de exemplo tidas em conta aqui (Fig. carbono e a reciclagem da água. As priorida-
2), é apenas um ponto de início para uma des para a conservação para a regulação do
estratégia para proteger adequadamente a clima seriam diferentes, mas estabelecimen-
biodiversidade na Amazônia brasileira. to destas prioridades depende de muitas das
mesmas informações apresentadas aqui.
Os estados e as zonas de vegetação con-
tidas neles variam tremendamente em ta-
manho. A extensão da área que deve ser CONCLUSÕES
protegida em cada zona de vegetação, além
das áreas mínimas necessárias para manter Apenas um terço das zonas de vegetação
populações biológicas viáveis, deveria man- terrestre presentes na Amazônia Legal estão
ter alguma proporcionalidade ao tamanho protegidas, considerando como de “zonas de
das zonas de vegetação. Decisões sobre os vegetação” as áreas de cada um dos nove esta-
tamanhos das novas reservas necessitarão a dos na região da Amazônia Legal. Proteger um
exemplo de cada tipo de vegetação, em cada
ponderação de vários elementos não incluí-
estado, é recomendado como um objetivo mí-
dos no trabalho atual, inclusive os custos de
nimo. Para proteger as 111 zonas de vegetação
estabelecer e de manter áreas protegidas em
terrestres presentes na Amazônia Legal, não
locais diferentes, os méritos de criar poucas
seria necessário ter uma reserva separada para
grandes reservas versus muitas pequenas
cada uma, porque freqüentemente é possível
reservas, limites de bacias hidrográficas, e
englobar diversos tipos em uma única reserva.
a defensabilidade dos locais contra acesso A atual análise indica que 74 (67%) das zonas
não autorizado. Bacias hidrográficas inteiras de vegetação estão sem proteção. A situação
são as unidades com melhor defensabilidade é mais crítica nas áreas de contato entre a flo-
(Peres & Terborgh, 1995). resta e o cerrado, no Maranhão, Tocantins e
Este documento focalizou a biodiver- Mato Grosso. No Maranhão, atualmente ape-
sidade como a base racional para proteger nas um, dos dez tipos de vegetação, tem pro-
áreas de vegetação natural. Estas formas de teção. Os estados com as zonas de vegetação

Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 205 8/18/2022 3:14:36 PM


DESTRUIÇÃO E CONSERVAÇÃO
206 DA FLORESTA AMAZÔNICA

Tabela 7. Áreas de Tipo de


zonas de vegetação Área de vegetação protegida (km 2)
vegetação (a) Total
protegidas na
Mato Tocantins/ Protegido
Amazônia Legal Categoria Código Acre Amapá Amazonas Maranhão Pará Rondônia Roraima
Grosso Goias
brasileira
Da-0 -- 305 5.316 -- -- 7 297 0 58 5.983
Floresta Db-0 0 0 21.994 2.872 -- 5.914 0 0 -- 30.780
densa Dm-0 -- 0 3.902 -- -- 0 -- 565 -- 4.467
Ds-0 0 59 3.614 0 0 7.999 558 4.954 0 17.184
Subtotal 0 364 34.826 2.872 0 13.920 855 5.519 58 58.414
Aa-0 375 -- 99 -- -- 0 0 -- -- 474
Ab-0 4.100 -- 2.779 -- -- -- 3.296 -- -- 10.175
As-0 -- -- 648 -- 0 75 4.915 0 0 5.638
Cs-0 -- -- -- 0 0 0 -- -- 0 0
Fa-0 -- -- -- -- 0 -- -- -- -- 0
Fs-0 -- -- -- -- 0 -- 0 0 430 430
Ld-0 -- -- 485 -- -- -- -- 476 -- 961
Floresta não LO-0 -- -- 15.029 -- -- -- -- 1.296 -- 16.325
densa ON-0 -- -- -- -- 0 0 0 0 -- 0
Pa-0 -- 5.739 54 0 0 0 1.569 -- -- 7.362
Pf-0 -- 1.547 -- 0 -- 0 -- -- -- 1.547
Sd-0 -- -- -- 0 0 0 -- -- 0 0
SM-0 -- -- -- 0 -- -- -- -- -- 0
SN-0 -- -- 0 0 2.592 0 0 0 0 2.592
SO-0 -- 796 0 -- 0 0 2.993 0 0 3.789
Td-3 -- -- -- -- -- -- -- 0 -- 0
Subtotal 4.475 8.082 19.094 0 2.592 75 12.773 1.772 430 49.293
Subtotal todas
4.475 8.446 53.920 2.872 2.592 13.995 13.628 7.291 488 107.707
as florestas
La-0 -- -- 601 -- -- -- -- 0 -- 601
Lg-0 -- -- 0 -- -- -- -- 0 -- 0
rm-0 -- -- -- -- -- -- -- 0 -- 0
Sa-0 -- -- 0 0 1.336 0 3.513 -- 0 4.849
Não floresta
Sg-0 -- -- -- -- 854 0 -- 0 0 854
Sp-0 -- 158 0 0 0 0 0 0 4.064 4.222
ST-0 -- -- -- -- 0 -- -- -- -- 0
Tp-3 -- -- -- -- -- -- -- 0 -- 0
Subtotal 0 158 0 0 2.190 0 3.513 0 4.064 9.925
Total 4.475 8.604 53.920 2.872 4.782 13.995 17.141 7.291 4.552 117.632

(a) Vegetação atualmente inalterada de acordo com o mapa de vegetação em escala 1:5.000,. 00 (Brasil, IBGE & IBDF, 1988);
(b) “--” indica que nenhuma vegetação deste tipo existe no estado; “0” indica que a vegetação existe, porém nenhuma é protegida.

menos protegidas são precisamente aqueles em todas as reservas definidas fora das áre-
que já perderam as maiores percentagens da as protegidas. Em alguns casos, as propos-
sua cobertura florestal. tas revogariam até reservas existentes, para
permitir a livre exploração da região, na sua
Na apresentação de resultados de um
totalidade.(6) As recomendações do estudo
exercício de atribuição de prioridades, deve
atual não implicam, enfaticamente, que o
ser tomado cuidado para evitar a implica-
desenvolvimento ilimitado deve ser permiti-
ção de que apenas estas áreas sejam vistas
do nas áreas que restam.
como necessárias. Forças políticas e econô-
micas muito fortes no Brasil, estão tentando Tanta área, quanto o possível, necessita
remover as limitações ao desenvolvimento ser reservada para objetivos de conservação,

Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 206 8/18/2022 3:14:36 PM


Uma análise de lacunas de conservação
da vegetação da Amazônia 207

Tipo de Tabela 8.
Porcentagem de vegetação protegida (%) Porcentagens de
vegetação (a)
zonas de vegetação
Mato Tocantins/
Categoria Código Acre Amapá Amazonas Maranhão Pará Rondônia Roraima protegidas na
Grosso Goias
Amazônia Legal
Da-0 -- 3,4 3,2 -- -- 0,0 11,0 0,0 2,2 brasileira
Floresta Db-0 0,0 0,0 3,6 12,7 -- 3,6 0,0 0,0 --
densa Dm-0 -- 0,0 38,3 -- -- 0,0 -- 2,7 --
Ds-0 0,0 0,1 2,0 0,0 0,0 1,9 3,8 5,9 0,0
Subtotal 0,0 0,3 3,6 11,7 0,0 2,1 4,4 4,7 1,0
Aa-0 3,5 -- 0,2 -- -- 0,0 0,0 -- --
Ab-0 3,6 -- 1,3 -- -- -- 8,0 -- --
As-0 -- -- 1,7 -- 0,0 0,0 6,3 0,0 0,0
Cs-0 -- -- -- 0,0 0,0 0,0 -- -- 0,0
Fa-0 -- -- -- -- 0,0 -- -- -- --
Fs-0 -- -- -- -- 0,0 -- 0,0 0,0 32,4
Ld-0 -- -- 1,3 -- -- -- -- 4,3 --
Floresta não LO-0 -- -- 8,7 -- -- -- -- 4,3 --
densa ON-0 -- -- -- -- 0,0 0,0 0,0 0,0 --
Pa-0 -- 37,9 0,4 0,0 0,0 0,0 18,1 -- --
Pf-0 -- 84,9 -- 0,0 -- 0,0 -- -- --
Sd-0 -- -- -- 0,0 0,0 0,0 -- -- 0,0
SM-0 -- -- -- 0,0 -- -- -- -- --
SN-0 -- -- 0,0 0,0 1,8 0,0 0,0 0,0 0,0
SO-0 -- 18,8 0,0 -- 0,0 0,0 13,6 0,0 0,0
Td-3 -- -- -- -- -- -- -- 0,0 --
Subtotal 3,6 38,1 3,4 0,0 0,5 0,0 7,6 2,9 1,7
Subtotal
todas as 3,2 6,4 3,5 5,2 0,5 1,3 7,2 4,1 1,5
florestas
La-0 -- -- 4,0 -- -- -- -- 0,0 --
Lg-0 -- -- 0,0 -- -- -- -- 0,0 --
rm-0 -- -- -- -- -- -- -- 0,0 --
Sa-0 -- -- 0,0 0,0 0,8 0,0 31,9 -- 0,0
Não floresta
Sg-0 -- -- -- -- 8,1 0,0 -- 0,0 0,0
Sp-0 -- 1,6 0,0 0,0 0,0 0,0 0,0 0,0 8,3
ST-0 -- -- -- -- 0,0 -- -- -- --
Tp-3 -- -- -- -- -- -- -- 0 --
Subtotal -- 1,6 0,0 0,0 0,9 0,0 25,7 0,0 2,6
Total 3,2 6,1 3,4 2,1 0,6 1,3 8,5 3,2 2,4
(a) Vegetação atualmente inalterada de acordo com o mapa de vegetação em escala 1:5.000.000(Brasil, IBGE & IBDF, 1988).
(b) “--” indica que nenhuma vegetação deste tipo existe no estado; “0” indica que a vegetação existe, mas nenhuma é protegida.

e isso precisa ser feito muito rapidamente. muito antes que este processo esteja comple-
Caso contrário, não haverá nenhuma segun- to, aumentos dramáticos são esperados nos
da chance para muitas áreas biologicamente custos políticos e financeiros para criar áreas
importantes. A continuação das tendências protegidas.. Os custos de procrastinação se-
atuais na Amazônia significaria que as áreas rão, por conseguinte, muito altos.
que devem ser protegidas, logo seriam rei- A urgência no estabelecimento de áreas
vindicadas por ocupantes legais ou ilegais. protegidas antes que se percam as possibili-
O desmatamento pode, fisicamente, remover dades, exige que as decisões sejam tomadas
a possibilidade de proteção futura median- agora, com base nas informações disponí-
te a remoção da vegetação em questão, mas veis. É perigoso demais adiar as decisões,

Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 207 8/18/2022 3:14:36 PM


DESTRUIÇÃO E CONSERVAÇÃO
208 DA FLORESTA AMAZÔNICA

alegando que mais dados devam ser cole- (3) Na prática, alguns projetos continuaram
tados para assegurar que as melhores áreas a ser aprovados, mesmo em áreas de flo-
possíveis serão as escolhidas. A máxima de resta, ao longo da década de 1980, e a
Júlio César não poderia ser mais apropria- suspensão dos incentivos foi pausada e
da: às vezes é mais importante que uma de- incompleta. Em 12 de outubro de 1988,
cisão seja tomada, do que ela ser a melhor o Programa Nossa Natureza suspendeu
decisão. outra vez os incentivos. Em 16 de janeiro
de 1991, uma lei (No. 167) limitou subsí-
dios, mas a limitação foi cancelada ape-
NOTAS nas três meses depois em 17 de abril de
(1) A escolha da Amazônia Legal e as uni- 1991 (Decreto No. 101). Somente em 25
dades federativas (estados) como uni- de junho de 1991 o decreto No. 153 ve-
dades da análise, tem vantagens e des- dou “concessão de incentivos fiscais ....
vantagens. Estas unidades políticas não para empreendimentos que implicam em
têm fundamento biológico, fazendo com desmatamento de áreas de floresta pri-
que uma representatividade mais efi- mária e destruição de ecossistemas pri-
ciente poderia ser alcançada ignorando mários” (artigo 15, parágrafo 3). Porém,
essas divisões (Ferreira, 2001; Nelson & mesmo esse decreto apenas suspendeu
de Oliveira, 2001). Por outro lado, o em- concessão de novos incentivos, sem re-
basamento de grande parte das decisões vogar os incentivos das centenas de pro-
políticas sobre essas divisões territoriais, jetos já aprovados.
faz com que as informações organiza- (4) Tocantins é um estado criado pela cons-
das por estado tenham bastante utilida- tituição brasileira de outubro de 1988, a
de prática. Também, o fato dos dados partir da metade norte do antigo Estado
de desmatamento do INPE (e.g., Brasil, de Goiás. A divisa entre Tocantins e o atu-
INPE, 2002) serem liberados com base al Estado de Goiás é uma linha irregular
estadual, aumenta enormemente a utili- ao longo do paralelo 13 S, que é o limi-
dade dos dados aqui apresentados, para te da Amazona Legal nesta área. Dados
fins de cálculos dos impactos climáticos sobre desmatamento de anos prévios
do desmatamento. foram reinterpretados para usar a divisa
(2) A diferença principal entre a classificação estadual entre Tocantins e Goiás (Tabela
dos 28 tipos de vegetação usada no atual 2), mas as áreas dos tipos de vegetação
trabalho, e a de 21 tipos de Nelson & de não têm sido ajustadas (nas tabelas se
Oliveira (2001), é que estes autores jun- refere a essas áreas como “Tocantins/
tam as “zonas de tensão ecológica” do Goiás”). Do atual Estado de Goiás, 2.875
IBGE com o tipo de vegetação em cada km2 ficam ao norte do paralelo 13 S, e
par com menor porte. Nesse caso, as “zo- 7.411 km2 do Estado de Tocantins ficam
nas de tensão” são consideradas como ao sul deste paralelo (Fearnside, 1993a).
interdigitações de dois tipos adjacentes Virtualmente nenhuma parte desta área
de vegetação, e não como ecótonos, com era originalmente arborizada.
características próprias que justificariam (5) As Tabelas 3, 4, 7 e 8 e as Figuras 1 e
uma proteção específica. Independente 2 são baseadas na versão do mapa da
de decisões sobre áreas protegidas, deve- Conservation International (1990a), na
se lembrar que a desagregação de dados escala 1:5.000.000 para áreas protegi-
sobre vegetação de forma que se mante- das, utilizada no Workshop-90 em janei-
nha a distinção entre “zonas de tensão” ro de 1990. Uma Estação Ecológica não
e a vegetação em si, é importante para foi incluída no mapa em questão: Niquiá
cálculos de biomassa e emissões de ga- (2.866 km2 , em Roraima), codificada
ses de efeito estufa, já que essas áreas como EE01 na Tabela 4 e Figura 1. Um
(que atualmente sofrem a maior pressão parque nacional (Monte Roraima) não
antrópica) são de biomassa diferenciada. foi incluído, codificado aqui como PN09.

Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 208 8/18/2022 3:14:37 PM


Uma análise de lacunas de conservação
da vegetação da Amazônia 209

Duas Estações Ecológicas codificadas er- declaratórios de preservação permanente,


roneamente como Reservas Ecológicas no serão objeto de revisão, submetendo-se
mapa da Conservation International (CI) para novo enquadramento ao disposto no
foram recodificadas aqui (com ajustes artigo 18 desta lei [que indica que toda a
para Tabela 3): Anavilhanas [hoje Parque autoridade para criar reservas ficará com
Nacional] no Estado do Amazonas (aqui as assembléias legislativas estaduais]”
codificada como EE05), e Maracá em (Mestrinho, 1991: capítulo 5, artigo 19).
Roraima (aqui codificada como ES04).
O Parque Nacional Serra do Divisor, no
Acre, listado como “proposto” no mapa AGRADECIMENTOS
da CI, é incluído como PN10. Estas Este trabalho foi uma contribuição para
mudanças estão baseadas em Brasil, o Workshop-90, realizado em Manaus,
IBAMA, 1989 e s/d [1991]. Uma reserva Amazonas, de 10-20 de janeiro de 1990.
biológica (Mucajaí: RB01 no mapa da CI) Agradecemos a Cambridge University Press
nunca existiu. Os esboços das reservas pela permissão de publicar a tradução do
(e áreas conseqüentes de vegetação) são nosso trabalho na Conservation Biology
os que aparecem no mapa da CI, embo- (Fearnside & Ferraz, 1995). Uma versão
ra discrepâncias existam com áreas to- parcial anterior foi publicada em Fearnside
tais publicadas por IBAMA (1989) para & Ferraz (2004). Norman Bales executou al-
algumas das reservas: Parque Nacional gumas das análises estatísticas no Centro de
Serra do Divisor (PN10) 3.455 km2 ve- Dados EROS, do Serviço de Levantamento
getação natural + 66 km2 de outra ve- Geológico dos EUA (USGS), mas todas as ou-
getação, contra 6.050 km2 área total de tras partes do trabalho representam as opi-
acordo com IBAMA; Estação Ecológica niões exclusivas dos autores. Nós agradece-
Coco-Javaes (EE09) 4.954 km2 vegetação mos a Madura Maçado Cumagay, Christine
natural, contra 6.250 km2 de acordo com Housel e Summer V. Wilson pela ajuda na
IBAMA; Estação Ecológica [hoje Parque confecção da Figura 1.
Nacional] Anavilhanas (EE05) 1.441 km2
vegetação natural + 71 km2 de outra ve-
getação, contra 3.500 km2 de acordo com REFERÊNCIAS
IBAMA. Uma quantia pequena (120 km2)
Allegretti, M.H. 1990. Extractive reserves: An alternative
de área adicional é protegida em reser-
for reconciling development and environmental
vas do Instituto Nacional de Pesquisas conservation in Amazonia. p. 252-264. In: A.B.
da Amazônia (INPA), e não são inclu- Anderson (ed.) Alternatives to Deforestation: Steps
ídas no atual estudo: Adolfo Ducke toward Sustainable Use of Amazonian Rain Forest.
(Amazonas) 100 km2, Egler (Amazonas) Columbia University Press, New York, E.U.A.
10 km2, Campina (Amazonas) 9 km2, Brasil, IBAMA (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e
Ouro Preto do Oeste (Rondônia) 1 km2. dos Recursos Naturais Renováveis). 1989. Unidades
Também não estão incluídos os aproxi- de Conservação do Brasil, Vol. 1. - Parques Nacionais
madamente 120 km2 protegidos perto de e Reservas Biológicas. IBAMA, Brasília, DF.
Manaus pelo Projeto Dinâmica Biológica Brasil, IBAMA (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente
de Fragmentos Florestais (PDBFF), do e dos Recursos Naturais Renováveis). s/d. [1991].
INPA e da Instituição Smithsonian. Unidades de Conservação Federais e Áreas Indígenas
da Amazônia Legal. Escala: 1:5.000.000. IBAMA,
(6) Propostas desse tipo surgem periodi- Brasília, DF.
camente, sendo a melhor conhecida Brasil, IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e
o “Código Amazônico” proposto em Estatística). 1997. Diagnóstico ambiental da
julho de 1991, pelo então Governador Amazônia Legal. CD-ROM. IBGE, Rio de Janeiro, RJ.
do Amazonas Gilberto Mestrinho, que Brasil, IBGE & IBDF (Instituto Brasileiro de Geografia e
indicava “as áreas de cada Estado da Estatística & Instituto Brasileiro do Desenvolvimento
Região Amazônica que, na data de publi- Florestal). 1988. Mapa de Vegetação do Brasil. Escala
cação desta lei, estão sob o efeito de atos 1:5.000.000. Instituto Brasileiro do Meio Ambiente

Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 209 8/18/2022 3:14:37 PM


DESTRUIÇÃO E CONSERVAÇÃO
210 DA FLORESTA AMAZÔNICA

e dos Recursos Naturais Renováveis (IBAMA), Fearnside, P.M. & Ferraz, J. 1995. A conservation
Brasília, DF. gap analysis of Brazil’s Amazonian vegetation.
Conservation Biology 9: 1.134-1.147. https://doi.
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Brasileira por Satélite/Monitoring of the Brazilian Fearnside, P.M. & Ferraz, J. 2004. O estado de proteção
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Mineral (DNPM), Rio de Janeiro, RJ. 23 vols. do Estado do Amazonas (FAPEAM) & Instituto
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Uma análise de lacunas de conservação
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Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 212 8/18/2022 3:14:37 PM
CAPÍTULO

12
Política de conservação na Amazônia
brasileira: Entendendo os dilemas

Philip M. Fearnside
Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia – INPA
Av. André Araújo, 2936 – CEP: 69.067-375, Manaus, Amazonas, Brasil.
E-mail: pmfearn@inpa.gov.br

Tradução de:
Fearnside, P.M. 2003. Conservation policy in Brazilian Amazonia: Understanding the dilemmas.
World Development 31(5): 757-779. https://doi.org/10.1016/S0305-750X(03)00011-1

Tradução original:
Fearnside, P.M. 2011. Dilemas no campo. Políticas de conservação. p. 69-71, 88-91, 93-97, 125-
128, 129-131, 153-155 & 138-139. In: I.S. Gorayeb (Ed.). Amazônia Sustentável. RM Graph,
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213
Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 213 8/18/2022 3:14:44 PM
DESTRUIÇÃO E CONSERVAÇÃO
214 DA FLORESTA AMAZÔNICA

INTRODUÇÃO conflito com as de organizações não go-


vernamentais ambientalistas (ONGs). Cada
A política de conservação na Amazônia grupo apela para um bem maior, como, a
Legal brasileira (Figura 1), é assunto de mui- conservação da biodiversidade ou a redução
tas controvérsias. As decisões tomadas em da pobreza. Estes apelos concorrentes criam
um futuro próximo serão críticas para deter- dilemas para a formulação de políticas que
minar os tipos de desenvolvimento que mol- afetam a conservação na Amazônia.
delarão a paisagem emgrandes áreas nesta
região de cinco milhões de km2. A política Este artigo examina as políticas e pro-
de conservação na Amazônia enfrenta uma gramas de conservação no Brasil à luz de
série de dilemas no que diz respeito à alo- uma teoria baseada nos interesses da eco-
cação dos recursos escassos para essa área. nomia política da mudança do uso da terra
O desmatamento e a degradação continuam na Amazônia (Rudel & Horowitz, 1993). Os
em um ritmo rápido, fechando, de forma ge- interesses discrepantes de diferentes grupos
ral, as oportunidades para a conservação e ajudam a explicar a pletora de programas
para o desenvolvimento sustentável. e de tipos de unidades de conservação na
O presente trabalho tenta explicar algu- Amazônia. As decisões sobre a seleção de
mas das controvérsias no desenho das polí- unidades de conservação e o processo de im-
ticas de conservação para a região, as quais plementação são influenciadas pelos mesmos
afetam terras dentro e fora das unidades de interesses e atores. A importância dos povos
conservação. Com relação a praticamente indígenas é especialmente significativa nos
todos os assuntos existe uma gama de ato- esforços futuros de conservação. E por fim, o
res prontos para batalhar em nome dos seus artigo enfatiza a necessidade de flexibilidade
interesses particulares. Por exemplo, produ- e as oportunidades de estratégias de gerencia-
tores de soja têm agendas que entram em mento e de negociação de conflito.

Figura 1. Floresta e
áreas de não floresta
na Amazônia Legal
brasileira.

Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 214 8/18/2022 3:14:44 PM


Política de conservação na Amazônia
brasileira: Entendendo os dilemas 215

OS INTERESSES E A ECONOMIA POLÍTICA em RDS, representa um impacto maior na


DE USO DE TERRA floresta do que a colheita de produtos flores-
tais não madeireiros em RESEX.
Governos federal, estadual e municipal Assim, basear a escolha em nível de go-
Governos federal, estadual e municipal verno responsável pela terra resolveria este
(Figura 2) frequentemente têm prioridades problema. De acordo com a política atual,
contraditórias com respeito à criação de os representantes dos governos estaduais
unidades de conservação. Essas contradi- devem ser ouvidos quando são criadas uni-
ções podem levar à perda de oportunidades dades de conservação federais dentro de um
para conservação e desenvolvimento susten- estado e as autoridades ambientais federais
tável. A solução prática pode ser a criação devem ser ouvidas quando são criadas uni-
de unidades federais, tais como Reservas dades estaduais. Lapsos desta política po-
Extrativistas (RESEX), Parques Nacionais dem gerar resultados desastrosos.
(PNs) e Florestas Nacionais (FLONAs), Alguns governos estaduais apoiam os go-
quando a terra em questão pertence à União, vernos municipais na decisão de não criar
ou criar unidades estaduais, tais como nenhuma unidade de conservação que es-
Reservas de Desenvolvimento Sustentável tes não queiram. Essa tendência é reforçada
(RDS) e Florestas Estaduais, quando a terra por restrições legislativas que limitam a fra-
for dos governos estaduais. No caso da esco- ção dos orçamentos dos governos estaduais
lha entre RESEX e RDS, o que é uma fonte de que pode ser usada para despesas de folha
tensão no estado do Amazonas, as unidades de pagamento, motivando os estados a re-
de conservação são essencialmente equiva- passar para os governos municipais o má-
lentes em termos de efeito no ambiente, en- ximo de funções possível (tais como, vigiar
tretanto, a exploração madeireira, permitida reservas). Comparado aos governos estadu-
em projetos de manejo florestal comunitário ais, os governos municipais normalmente

Figura 2. Estados
na Amazônia Legal
brasileira e cidades
mencionadas no texto.

Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 215 8/18/2022 3:14:44 PM


DESTRUIÇÃO E CONSERVAÇÃO
216 DA FLORESTA AMAZÔNICA

estão mais sujeitos às pressões locais dos com partidos políticos e, às vezes, têm suas
donos de serraria e outros grupos de inte- próprias ambições eleitorais. Cada unidade
resse, diminuindo, portanto, a prioridade de conservação cria vencedores e perdedores,
para a conservação comparada os ganhos a criando assim oportunidades de obtenção de
curto prazo. Assim, embora a contribuição votos entre os diferentes grupos por políticos
dos governos municipais seja importante na que apoiam ou não qualquer proposta de con-
tomada de decisões sobre unidades de con- servação. Dependendo da proposta, os perde-
servação federais e estaduais, os governos dores, tais como os trabalhadores de serraria,
municipais não deveriam ter poder de veto podem ser mais numerosos e/ou serem mais
sobre a criação das mesmas. prováveis de terem título eleitoral válido do
que os vencedores, tais como extrativistas tra-
dicionais e povos indígenas.
POLÍTICA PARTIDÁRIA
A relevância para as bases de apoio polí-
A política partidária é uma considera- tico é ilustrada pelas reservas de desenvolvi-
ção onipresente nas decisões sobre o esta- mento sustentável como Mamirauá e Amanã
belecimento de unidades de conservação. (Figura 3), as quais são promovidas pelo go-
Particularmente em nível estadual, as au- verno do estado do Amazonas. Pode-se espe-
toridades ambientais são atores diretos que rar que os residentes das reservas, que têm
geram apoio político para os governadores acesso preferencial aos recursos pesqueiros,
que as indicaram, enquanto é provável que além de receberem benefícios modestos adi-
os políticos de partidos da oposição adotem cionais de programas sociais, tenham maior
posiçõescontrárias nestas questões. Além probabilidade de votar em candidatos apoia-
disso, indivíduos chaves nos órgãos federais dos pelo governador estadual que criou as
e estaduais e em organizações não governa- reservas. Por outro lado, esforços de organi-
mentais (ONGs) frequentemente têm ligações zação social mais antigos e geograficamente

Figura 3. Projetos e
reservas mencionados
no texto.

Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 216 8/18/2022 3:14:45 PM


Política de conservação na Amazônia
brasileira: Entendendo os dilemas 217

difundidos por parte da Igreja Católica e or- a todos os lados do espectro político, desde
ganizações associadas, tais como a Comissão políticos conservadores como Mestrinho (do
Pastoral da Terra (CPT), frequentemente au- Partido do Movimento Democrático Brasileiro:
mentam a probabilidade de votos em candi- PMDB) até os da esquerda política que, du-
datos da oposição. Isto pode levar as pessoas rante uma série de audiências públicas da
que são ligadas à partidos políticos da opo- Comissão sobre Meio Ambiente e Assuntos
sição a resistirem aos esforços de criação de Amazônicos, da Assembleia Legislativa do
reservas liderados pelo governo estadual no Estado do Amazonas, em outubro de 1999,
Corredor da Amazônia Central. denunciou o projeto Corredores Ecológicos do
PP-G7 como sendo umaartimanha para inter-
Além das oportunidades para obtenção
nacionalizar a região.
de votos das populações diretamente afetadas
pela criação de uma unidade de conservação, Embora as lutas relacionadas à política
a vantagem política também pode ser adqui- partidária estejam por trás de muitas contro-
rida por meio de apelos aos interesses mais vérsias sobre unidades de conservação que
universais na tentativa de influenciar eleitores são debatidas com apelos ao patriotismo e
em locais distantes (normalmente urbanos). altos princípios, os custos ambientais do fra-
Embora as preocupações ambientais como casso na conservação dos ecossistemas na-
a biodiversidade e mudanças climáticas se- turais são bastante reais. Não se deveria per-
jam, às vezes, enfatizadas por partidários de mitir que a política partidária impedisse os
reservas, os oponentes, por sua vez, frequen- esforços paracriar unidades de conservação
temente se aproveitam da crença comum no enquanto ainda existem oportunidades para
Brasil de que o mundo está comprometido se fazer isto em grandes áreas.
em uma conspiração permanente para ata-
car a soberania brasileira sobre a Amazônia O setor público versus o setor privado
(e.g., Reis, 1982). Uma pesquisa sociológica
na população da Amazônia brasileira reve- Tanto o setor público quanto o setor
lou que 71% dos entrevistados concordaram privado desempenham papéis importantes
com a afirmação “eu tenho medo de quea para a conservação amazônica. Algumas
Amazônia seja internacionalizada” e 75% atividades, como ecoturismo, são inerente-
concordaram que “os estrangeiros estão ten- mente mais eficientes se conduzidas pelo
tando ocupar a Amazônia” (Barbosa, 1996). setor privado. Organizações não governa-
Este fato cria uma tentação permanente para mentais têm se mostrado intermediários es-
qualquer político denunciar ameaças reais ou senciais entre os órgãos governamentais, tais
imaginárias à soberania brasileira, já que des- como o IBAMA, e as comunidades locais em
sa forma ele atrairia um número maior de elei- unidades de conservação. O Parque Nacional
tores. Gilberto Mestrinho foi o político mais do Jaú (cogestão IBAMA [hoje ICMBio] e a
conhecido em aplicar esta tática com suces- Fundação Vitória Amazônica) e o Parque
so (A Crítica, 1991a). Quando foi governador Nacional Serra do Divisor (cogestão IBAMA
do estado do Amazonas ele ameaçou ordenar [hoje ICMBio] e SOS Amazônia) são os me-
que a polícia militar metralhasse as equipes lhores (e praticamente os únicos) exemplos
da Fundação Nacional do Índio (FUNAI) caso (Guazelli et al., 1998; SOS Amazônia, 1998).
elas tentassem demarcar terras indígenas no
estado (A Crítica, 1991b). Na condição de se-
nador, Mestrinho declarou no plenário do se-
UNIDADES DE CONSERVAÇÃO
nado que o projeto corredores ecológicos, do Tipos de unidades
PP-G7, ia “engessar a Amazônia. Por que eles
fazem isto? Esvaziar [a Amazônia] faz com O Brasil tem uma ampla variedade de ti-
que seja mais fácil dominar [a região]. ..... pos de unidades de conservação. Em muitos
[É] usado como uma estratégia para a invasão casos elas servem para propósitos diferentes,
futura de nossa soberania” (Adolfo, 1999). O enquanto em outros, elas têm propósitos se-
uso da teoria de internacionalização se aplica melhantes, mas devem sua origem a órgãos

Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 217 8/18/2022 3:14:45 PM


DESTRUIÇÃO E CONSERVAÇÃO
218 DA FLORESTA AMAZÔNICA

governamentais diferentes. Áreas voltadas (isentando, assim, essas áreas do Imposto


principalmente para manter ecossistemas Territorial Rural-ITR). Além disso, também
naturais sem presença humana (com exceção podem ser designadas áreas como Áreas de
de áreas pequenas designadas para pesqui- Proteção Ambiental (APAs), na qual a terra
sa) foram classificadas antigamente na legis- está sujeita a certos procedimentos de zone-
lação brasileira como “áreas de uso indire- amento projetados para limitar atividades
to”, com uma mudança na terminologia para prejudiciais, mas onde muitas formas de de-
“áreas de proteção integral” sob o Sistema senvolvimento (incluindo centros urbanos)
Nacional de Unidades de Conservação são permitidas. As áreas indígenas, embora
(SNUC). Unidades de conservação federais não sejam classificadas como “unidades de
nesta categoria incluem Parques Nacionais, conservação”, são, talvez, as mais críticas de
Reservas Ecológicas (antigamente Estações todas as designações de uso da terra para
Ecológicas) e Reservas Biológicas. Por outro manter blocos significativos de ecossistemas
lado, “áreas de uso sustentável” (antigamen- naturais na Amazônia brasileira.
te chamadas de “áreas de uso direto”) pro-
movem o uso de recursos naturais renová- O Sistema Nacional de Unidades de
veis em regimes de manejo que sustentam Conservação (SNUC)
a produção enquanto mantém as funções
ecológicas principais do ecossistema natu- O sistema de unidades de conservação
ral. Esssas incluem as Florestas Nacionais no Brasil evoluiu rapidamente ao longo
(FLONAs), que são planejadas para “uso dos anos, assim como, também, tem evo-
múltiplo”, mas predominantemente vi- luído a força dos processos destrutivos, tais
sam manejo para madeira, e as Reservas como, desmatamento, exploração madei-
Extrativistas (RESEX), que são planejadas reira e incêndios florestais. Uma lei nova
para manejo de produtos não madeireiros, que cria um Sistema Nacional de Unidades
tais como a seringa e a castanha-do-Brasil. de Conservação (SNUC) foi aprovada pelo
No estado do Amazonas, em 1996, foi cria- Congresso Nacional em julho de 2000 (Lei
da, pelo governo do estado, uma categoria de No. 9985/2000). Até sua aprovação foram
“Reserva de Desenvolvimento Sustentável” oito anos de deliberação face às diferen-
(RDS), na qual os residentes locais fazem o ças intratáveis entre as várias partes inte-
zoneamento da região designando as áreas ressadas. E mesmo após a sua aprovação,
para manejo comunitário de recursos como um processo de regulamentação demora-
peixes e madeira, e uma área núcleo que do seguiu-se em meio às várias lutas entre
deve permanecer intacta. grupos de interesse diferentes. O processo de
regulamentação define as regras específicas
As propriedades privadas são obriga-
e os procedimentos que direcionam como a
das a manter uma porcentagem específi-
lei será aplicada - um processo que, na práti-
ca da sua área como uma “reserva legal”,
ca, é frequentemente tão importante quanto
onde podem ser empreendidas atividades
a própria lei.
de manejo aprovadas, mas, com a perma-
nência da cobertura florestal. Lutas legisla- Vários grupos lutaram para influenciar
tivas estão em curso para definir questões o SNUC, evidenciando que alguns de seus
como: a porcentagem requerida como re- alicerces mais básicos estão mal definidos
serva legal, se são contadas plantações sil- ou são incompatíveis. O mais fundamental
viculturais como “cobertura florestal” e se dele é a questão “as pessoas nos parques”,
um sistema de troca de reservas legais entre ou seja, se deveriam ser permitidas popula-
propriedades é permitido (Vieira & Becker, ções humanas viverem nos diferentes tipos
2010; Fearnside, 2010a). Proprietários de de unidades de conservação. Um grupo de
terras privadas também podem manter áre- ONGs chamado “Grupo Pró-Unidades de
as de terra para fins de conservação, regis- Conservação” (liderado por FUNATURA
trando a terra, de forma irreversível, como e BIODIVERSITAS) apoia a visão de que
uma “Área de Relevante Interesse Ecológico” deveria ser dada prioridade às unidades

Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 218 8/18/2022 3:14:45 PM


Política de conservação na Amazônia
brasileira: Entendendo os dilemas 219

totalmente protegidas (unidades sem pesso- existência de um parque de papel intimida


as). O ponto de vista contrário é adotado por as invasões dessas áreas.
outro grupo que inclui organizações como o
Ao mesmo tempo em que o sistema de
Instituto Socioambiental (ISA), o Instituto de
unidades de conservação deve ser ampliado
Pesquisa Ambiental na Amazônia (IPAM), o
rapidamente, com devida atenção para provi-
Instituto do Homem e do Meio-Ambiente na
dências de consulta pública e outras exigên-
Amazônia (IMAZON) e o Grupo de Trabalho
cias do SNUC, deve-se cumprir a responsabi-
Amazônico (GTA).
lidade do governo para defender e manter as
Os órgãos do governo envolvidos têm di- unidades existentes. O estado de degradação
visões semelhantes, incluindo a Diretoria de sério e a invasão ilegal de algumas unidades
Áreas Protegidas (DAP) dentro do Ministério existentes indica a necessidade de uma ação
do Meio Ambiente (MMA) e no IBAMA. Os energética por parte das autoridades gover-
chefes destes órgãos apoiam o lado “pessoas namentais para evitar a destruição comple-
nos parques”, enquanto muitos dos servi- ta destas unidades (Rosa & Ferreira, 2000).
dores que lidam com a questão, na prática, Entre os exemplos estão as FLONAs Jamarí
estão do outro lado da questão. Governos e Bom Futuro, em Rondônia e o Parque
estaduais são universalmente a favor de uni- Nacional Serra do Divisor, no Acre.
dades que mantenham populações humanas
nelas e, frequentemente, querem um uso Unidades de conservação bem
mais intensivo dos recursos naturais do que financiadas versus unidades baratas
os seus equivalentes ao nível federal.
Considerando a natureza sempre inade-
quada de verbas de pessoal necessário para
DILEMAS NA ESCOLHA DE UNIDADES DE criação de reservas, existe um dilema sem-
CONSERVAÇÃO pre presente: usar os recursos disponíveis
para criar poucas reservas bem financiadas
Novas unidades de conservação ou criar muitas unidades baratas. A ideia de
versus consolidação das unidades evitar estimular a criação de novas unidades
existentes de conservação até que mais recursos este-
jam disponíveis, evitando, assim, a criação
Apesar da sabedoria convencional de que
de expectativas irreais por parte das popu-
os “parques de papel” representam um gran-
lações locais, é uma fórmula certa para não
de mal, sabe-se que eles desempenham, na
fazer nada. Só o estímulo da demanda pe-
realidade, um importante papel no processo
las populações locais leva os vários órgãos
de conservação da Amazônia. Decretar áre-
governamentais envolvidos a criar as áreas
as como reservas de vários tipos, antes do
para, posteriormente, fornecer a infraestrutu-
governo liberar os fundos adequados para
ra e os programas necessários para melhorar
“implantar” tais unidades, faz com que se
o padrão de vida das populações residentes.
inicie processos que podem resultar na ob-
tenção de recursos. Se fosse esperar a aquisi- Um caso ilustrativo dessa questão é o
ção de verbas adequadas para a implantação corredor da Amazônia Central, onde, a vár-
antes de decretar a reserva, o resultado prá- zea, compõe a maior parte da área “intersti-
tico seria que pouquíssimas reservas seriam cial” (i.e., a área entre as unidades de conser-
criadas, uma vez que os órgãos do governo vação estabelecidas). Existe uma demanda
raramente têm verbas adequadas para esses muito mais forte para o estabelecimento de
fins, e até mesmo para as suas próprias des- Reservas de Desenvolvimento Sustentável
pesas operacionais. O custo para a criação (RDS), como Mamirauá e Amanã, para o ma-
de reservas aumenta dramaticamente na me- nejo da pesca na várzea do que para as áreas
dida em que se aproxima da fronteira do des- de terra firme ou, até mesmo, para o mane-
matamento e, as invasões, tornam politica- jo florestal nas próprias áreas de várzea. O
mente impossível a criação dessas reservas. simples ato de criar a RDS e cercar os lagos
Frequentemente (mas não sempre) a simples de várzea contra a entrada de “peixeiros”

Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 219 8/18/2022 3:14:45 PM


DESTRUIÇÃO E CONSERVAÇÃO
220 DA FLORESTA AMAZÔNICA

(grandes barcos de pesca vindo de fora da situadas longe da atual fronteira. No compu-
área) tem o apoio imediato da população to geral, deveria ser colocada prioridade para
local. Isto pode ser usado para alavancar o a expansão rápida de unidades de conserva-
apoio para a RDS, como um todo, até mes- ção em áreas relativamente pouco ameaça-
mo se nenhum financiamento seja oferecido das, longe das fronterias de desmatamento.
para a extensa lista de programas associados
a uma reserva como Mamirauá. Assim, ati- Distribuição do esforço entre áreas
vidades novas RDS iniciar com atividades de completamente e parcialmente
pesca, evoluindo, posteriormente, para o uso
dos outros recursos da várzea e, finalmente,
protegidas
para os da terra firme. Se menos for prome- O debate sobre “pessoas nos parques” é
tido o risco de levantar esperanças pode ser central à pergunta de quanto esforço deva
reduzido enquanto se permanece incapaz de ser alocado entre áreas completamente e
entregar resultados . O custo pode ser mo- parcialmente protegidas. Em um extremo
desto: Amanã tem somente oito funcionários do espectro, os que argumentos a favor da
para uma área de 2,35 milhões de hectares concentração dos esforços em algumas áre-
área maior que o estado de Sergipe. as bem protegidas vêem o futuro como uma
marcha inexorável rumo a degradação am-
Local perto ou longe da fronteira de biental, com reservas habitadas adiando
desmatamento apenas ligeiramente a hora quando essas
áreas chegarão ao seu ponto final de deso-
A escolha dos locais para a criação de lação completa (Terborgh, 1999). Já os que
unidades de conservação influencia forte- estão a favor de priorizar as áreas habitadas
mente o custo de se estabelecer e manter as vêem a criação de áreas grandes sob prote-
unidades. Locais próximos às áreas de des- ção total como sendo politicamente inviável,
matamento ativo são, normalmente, de alto tendendo a causar injustiças para as popu-
custo, além da provável resistência política lações tradicionais que já vivem nas áreas
à criação de reservas. No que diz respeito e oferecendo menos proteção, no final das
ao estabelecimento de áreas significativas de contas, para natureza devido à falta de apoio
unidades de conservação, é sábio, então, dar popular dos habitantes locais que podem de-
prioridade às reservas longe das fronteiras fender as florestas contra invasores de forma
do desmatamento. Por outro lado, um fator mais eficiente do que os guardas pagos pelo
a favor do estabelecimento de reservas perto governo (Schwartzman et al., 2000). Embora
da frente de desmatamento é a raridade de a caça e outras atividades dos povos tradi-
unidades de conservação que existem nessas cionais possam reduzir a biodiversidade de
regiões, as quais protegem amostras de vá- unidades de conservação quando compara-
rios tipos de vegetação ao longo da transição das às com as florestas despovoadas, a con-
entre floresta e cerrado, local atual do “arco vergência de muitos objetivos entre os que
de desmatamento”. Um segundo fator é a buscam assegurar os direitos de posse da
probabilidade de que, num futuro próximo,
terra aos povos tradicionais e aqueles que
essas florestas sejam derrubadas na ausência
estão principalmente interessados na con-
das unidades de conservação, contribuindo,
servação da biodiversidade, o que oferece
assim, para a “adicionalidade” de desmata-
um grande campo para alianças com ganhos
mento evitado nessas áreas como uma con-
para ambos os grupos de interesse (Redford
tribuição para reduzir as emissões de gases
& Stearman, 1993).
de efeito estufa. Além disso, a atratividade
política de distribuir os recursos o mais uni- Uma certa tensão é evidente entre vários
formamente possível entre estados tenderia atores governamentais e não governamen-
a desestimular a concentração de recursos tais com relação às suas prioridades para
em certos estados, tais como o Amazonas, criar áreas de uso sustentável, como RESEX,
onde vastas áreas potencialmente aprovei- FLONA e RDS versus áreas totalmente prote-
táveis para unidades de conservação ficam gidas, tais como parques nacionais, reservas

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Política de conservação na Amazônia
brasileira: Entendendo os dilemas 221

biológicas e reservas ecológicas (antigamen- Quando o grau de ameaça é acrescentado


te estações ecológicas). O objetivo de au- como um critério, as grandes áreas restantes de
mentar a porcentagem de floresta amazôni- floresta levama Amazônia receber uma ava-
ca com proteção seria alcançado muito mais liação mais baixa do que as áreas altamente
facilmente se fossem criadas novas unidades ameaçadas em outros lugares no Brasil, como,
de conservação de uso sustentável, cada por exemplo, as áreas de mata Atlântica e o
uma com um processo participativo de zo- resquícios do Cerrado (Dinerstein et al., 1995).
neamento que inclua a delimitação de uma A lógica de “triagem” pode resultar em pouco
área núcleo totalmente protegida, cercada ou nenhum esforço alocado para proteger áre-
por zonas nas quais várias formas de extra- as longe das fronteiras atuais. Os “hotspots”
ção sustentável seriam feitas pelas comuni- (pontos quentes) de endemismo na Mata
Atlântico e nas encostas dos Andes também
dades locais. Essa estratégia ajuda a ganhar
conduzem a dar maior prioridade a estas áreas
o apoio das comunidades locais e a conter o
do que para a Amazônia brasileira.
temor de alguns governos estaduais de que a
conservação inibe o desenvolvimento e que Usando a meta de obter proteção de, pelo
seria feita de forma de “criar unidades de menos, 10% de cada tipo de paisagem (ba-
conservação apenas por criar”. seando-se na vegetação e no solo) com uma
priorização baseada em vulnerabilidade
(uma função de distância de estradas, áreas
Peso relativo dos fatores na seleção dos
de assentamento e desmatamento existen-
locais para as reservas te) e conectividade (inclusive proximidade
O peso relativo dos fatores a serem con- com áreas indígenas e áreas de uso susten-
siderados na seleção dos locais para as reser- tável), Ferreira et al. (2001) desenvolveram
vas pode afetar fortemente as escolhas feitas. um procedimento para identificar as áreas
prioritárias para o estabelecimento de novas
Um dos conjuntos de fatoresé biológico, por
unidades de conservação. Critérios sociais
exemplo, a representatividade dos ecossis-
adicionais (junto com prioridades biológicas
temas incluídos em uma unidade proposta
semelhantes às do Workshop 90) foram apli-
e a contribuição que isso faz aos objetivos cados durante um workshop realizado em
gerais de proteger pelo menos alguma área Macapá, em 1999, resultando na identifica-
de cada um dos tipos de vegetação existen- ção de 265 áreas de “extrema” prioridade e
tes (Fearnside & Ferraz, 1995; Ferreira et al., 105 áreas de “alta” prioridade para conser-
2001). Em 1990, a Conservação Internacional vação. Isso se tornou a base do sistema usa-
(CI) organizou um evento em Manaus, co- da pelo Programa Nacional de Diversidade
nhecido como “Workshop 90”, para aplicar a Biológica (PRONABIO) no estabelecimento
informação sobre diversidade e endemismo das prioridades para a criação de reservas.
de diferentes grupos taxonômicos de plantas
Outros fatores pertinentes incluem a exis-
e animais, solos, assim como o nível de co-
tência de povos tradicionais, o nível de orga-
nhecimento biológico das diferentes regiões,
nização comunitária e a defensabilidade das
para localizar áreas prioritárias para conser-
áreas propostas como resultado dos limites
vação. O problema é que muitas partes da naturais e de barreiras naturais contra a inva-
região são pobremente conhecidas, e as que são (Peres et al., 1995). Um conjunto adicio-
são bem conhecidas por causa de proximida- nal de fatores pode ser chamado de “fatores
de aos principais institutos de pesquisa em oportunísticos”. Esses incluem as oportuni-
Manaus e Belém são apontadas como sen- dades para criação de reservas que frequen-
do mais diversas simplesmente pelo artefato temente surgem independente de fatores
de serem melhor estudadas. O cruzamento biológicos e sociais. A habilidade de Paulo
do esparso conhecimento com a alta diver- Nogueira Neto de aproveitartais oportunida-
sidade resulta, portanto, em que quase toda des desempenharam um papel fundamental
região amazônica seja identificada como de na criação do sistema brasileiro de estações
alta prioridade (Veríssimo, 2001). ecológicas nos anos setenta e oitenta.

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DESTRUIÇÃO E CONSERVAÇÃO
222 DA FLORESTA AMAZÔNICA

DILEMAS NO PROCESSO DE IMPLANTAÇÃO demarcadas sob o PPTAL do programa PP-


DAS UNIDADES DE CONSERVAÇÃO G7 porque o cumprimento das políticas do
Banco Mundial sobre reassentamento torna-
Políticas sobre a remoção e ria a demarcação inviável e, assim, bloquea-
compensação dos ocupantes e invasores ria o PPTAL como um todo.

O pensamento sobre o estabelecimento


e gerenciamento das unidades de conserva- PROGRAMAS DE CONSERVAÇÃO
ção evoluiu nos últimos anos, com crescente
Fundo Amazônia
aceitação de que as populações tradicionais
devem contininuar vivendo dentro das unida- Hoje, discussões sobre programas am-
des de conservação que são criadas nas áreas bientais na Amazônia focalizam o futuro
por elas habitadas. No entanto, isso não re- do Fundo Amazônia, o qual foi criado em
solve o problema de lidar com os invasores 2008 pelo governo brasileiro para receber
que entram posteriormente nestas unidades. doações de outros países interessados em
Se estes invasores são recompensados com ajudar o Brasil na redução de suas emissões
acesso especial aos assentamentos pelo go- de gases de efeito estufa. O desmatamento
verno e programas de ajuda, acaba-se criando na Amazônia ainda é o maior componente
um incentivo perverso que encoraja invasões das emissões brasileiras, mesmo com a redu-
ilegais futuras. É indicado, então, uma mão ção das taxas de desmatamento desde 2004.
firme com os invasores, além da manutenção O Plano Nacional sobre Mudança do Clima
de uma distinção clara entre os “ocupantes” (PNMC), oficializado em 2009, visa redu-
que estavam na área antes da criação da uni- zir as emissões com benefícios de redução
dade de conservação e os “invasores” que de emissão que seriam ligados às doações
chegam depois. Situações mais delicadas sur- para o fundo (Brasil, MMA. 2008; mas ver
gem quando os habitantes das unidades de Fearnside, 2010b).
conservação prósperas convidam os seus pa- O Fundo Amazônia é foco de contro-
rentes e amigos de áreas de fora da reserva vérsias por ser administrado pelo Banco
(frequentemente só uma questão de mudar Nacional do Desenvolvimento Econômico e
de um lado de um rio para o outro). Social (BNDES). O BNDES não é uma en-
A remoção de residentes de áreas desti- tidade ambiental. Muito pelo contrário, é a
nadas as unidades de conservação, para a principal fonte de financiamento das gran-
qual o governo dá o termo Orwelliano de des obras do Programa de Aceleração do
“desintrusão”, é controversa devido à ne- Crescimento (PAC), com impactos ambien-
cessidade de sustentar a população remo- tais imensos na Amazônia brasileira. O
vida e pela falta crônica de verbas nos ór- BNDES também financia uma larga gama de
gãos responsáveis pelos diferentes tipos de hidrelétricas e rodovias em países vizinhos,
reservas. A política de reassentamento do como Bolívia e Peru, onde as leis ambientais
Banco Mundial é mais rígida do que as que são mais fracas do que as leis no Brasil. As
se aplicam aos programas financiados com- decisões do comitê que definem as diretrizes
pletamente por fontes brasileiras, resultando do Fundo são, geralmente, descritas como
no fato de que os esforços para criação de “não transparentes” (De olho no Fundo
reservas, os quais, frequentemente, incluem Amazônia, 2010). Isso gera uma crescente
financiamento do Banco Mundial, excluem preocupação na opinião pública da Noruega
qualquer caso para o qual a remoção de in- e no meio político desse país (Amazônia.org.
vasores seria necessária. Por exemplo, a área br, 2010), colocando em risco uma fonte po-
indígena Raposa Serra do Sol, em Roraima, tencial e muito importante para melhorar a
só foi decretada em 2005 e homologada em situação ambiental na Amazônia.
20 de março de 2009, após quase duas déca- Lições úteis para a aplicação dos recur-
das de postergação. Nos anos de 1990, essa sos do Fundo Amazônia podem ser tiradas
região foi tirada da lista das áreas a serem do Programa Piloto para a Conservação das

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Política de conservação na Amazônia
brasileira: Entendendo os dilemas 223

Florestas Tropicais do Brasil (PP-G7), o qual incluiu projetos nas florestas nacionais
foi um dos principais financiadores de pro- (FLONAs). Outros componentes visavam a
gramas ambientais na Amazônia até a sua ciência e tecnologia, o manejo das várzeas
finalização em 2008. e havia também um programa especial para
combater as queimadas.
Programa Piloto (PP-G7)
Sub-Programa dos Recursos Naturais
Avaliação do PP-G7
(SPRN)
O Programa Piloto para a Conservação
O Sub-Programa dos Recursos Naturais
das Florestas Tropicais do Brasil (PP-G7) foi
anunciado pelos países do G-7 na reunião (SPRN) fortaleceu os órgãos estaduais de
em Houston, em 1990, numa época em que a meio ambiente (OEMAs), incluindo as ati-
preocupação global com relação ao desmata- vidades especiais dentro dos Projetos de
mento amazônico atingiu seu auge, havendo Gestão Ambiental Integrado (PGAIs) e um
cobertura quase que diária sobre o assunto Zoneamento Ecológico-Econômico (ZEE) em
na imprensa internacional. Os líderes do G-7 cada estado. O zoneamento foi um assunto
(Canadá, França, Alemanha, Itália, Japão, particularmente controverso, com negocia-
Reino Unido e E.U.A.), pressionado por seus ções prolongadas entre autoridades federais
eleitores, sinalizaram que repassariam US$ e cada governo de estado resultando em
1,5 bilhões ao Programa. No entanto, com atraso de sua implementação em alguns es-
o fim da Conferência das Nações Unidas tados. Uma metodologia padrão foi encoraja-
sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento da, mas houve variações de suas aplicações
(UNCED, ou ECO-92), em junho de 1992, entre os estados. Em Rondônia,por exemplo,
a atenção da mídia sobre Amazônia desa- onde o governo do estado ordenou o zone-
pareceu abruptamente. Em 1993, no início amento em lei, houve um engessamento do
do PP-G7, os países do G-7 destinaram ape- processo, complicando ajustes que pode-
nas US$ 250 milhões de fundos ao progra- riam amenizar os problemas (Mahar, 2000).
ma central, ou seja, 1/6 da quantia original, Apesar de seu zoneamento, Rondônia con-
além disso, esse valor teve que ser extraí- tinuava sendo um dos estados mais destru-
do dos países com um esforço considerável. tivos ambientalmente entre os nove estados
Originalmente, esperava-se que o PP-G7 du- da região amazônica. Em contraste, o zo-
rasse três anos, entretanto, as demoras na neamento exigiu maior proteção ambiental
iniciação de vários componentes, combina- no Acre e Amapá, que eram os dois estados
do com o desejo geral para continuar as ati- cujos governos favoreciam a conservação
vidades mais bem sucedidas, foi prorrogado mais fortemente na época do zoneamento.
repetidamente até 2008. Embora o planejamento possa ser apri-
O PP-G7 foi financiado pelos países do morado por esforços que usem o zonea-
G-7 e administrado pelo Banco Mundial e o mento para prever consequências das di-
governo brasileiro. Os componentes incluí- ferentes decisões de desenvolvimento, a
am o PD/A (projetos demonstrativos tipo realidade observada atualmente é outra. O
“A”) para os projetos de desenvolvimento verdadeiro zoneamento está acontecendo
sustentáveis em pequena escala conduzidos (sem discussões de impactos) por meio de
por ONGs. Também foram incluídos projetos grandes decisões, tais como a implantação
para reservas extrativistas e terras indígenas. dos eixos de desenvolvimento que fazem
Um Sub-Programa dos Recursos Naturais parte de programas como o Avança Brasil e
(SPRN) incluiu o zoneamento ecológico-e- o Programa de Aceleração do Crescimento-
conômico (ZEE) e o fortalecimento dos ór- PAC (Fearnside, 2002). Bilhões de dólares em
gãos estaduais do meio-ambiente (OEMAs) investimentos estão sendo buscados antes
em cada um dos nove estados da Amazônia que os estudos ambientais, estudos de zone-
Legal brasileira. O projeto PROMANEJO, que amento e outras informações sejam realiza-
promoveu iniciativas de manejo sustentável, dos e debatidos. Assim, o zoneamento está

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DESTRUIÇÃO E CONSERVAÇÃO
224 DA FLORESTA AMAZÔNICA

sendo feito, na prática, em grande escala, Agrário. Também é significante que as propos-
sem seguir quaisquer um dos princípios que tas para reservas extrativistas se originaram
guiam o programa de zoneamento. dos próprios extrativistas, e não das autorida-
des governamentais. Ao contrário de condenar
Corredores Ecológicos os seus residentes à pobreza, as reservas lhes
oferecem uma renda melhor e mais estável
O projeto Corredores Ecológicos foi pro- do que eles poderiam, realisticamente, espe-
jetado para promover uma administração rar obter na ausência das reservas (Allegretti,
coordenada dos diferentes tipos de unidades 1996). A ideia de que os residentes foram en-
de conservação e terras indígenas em uma ganados por ecologistas ao renunciar a uma
área contígua, incluiíndo a área intersticial vida como fazendeiros prósperos é comple-
que completa a paisagem dentro do corredor. tamente fictícia. Ao invés disso, eles seriam,
Apenas um corredor na Amazônia acabou provavelmente, obrigados a se mudarem para
sendo trabalhado ativamente (o Corredor favelas urbanas ou a se juntarem às fileiras de
da Amazônia Central, centralizado nas pobres sem-terras nas áreas rurais da região.
Reservas de Desenvolvimento Sustentável Sob o PP-G7, o projeto RESEX fortaleceu as co-
Mamirauá e Amanã e no Parque Nacional munidades de extrativistas nas reservas, assim
do Jaú). Quatro corredores adicionais para o como, também, ajudou na comercialização da
projeto foram esboçados nos primeiros pla- produção local? e facilitou o acesso à saúde,
nos. Apesar dos medos de alguns políticos, educação e outros serviços.
os corredores não paralisam o desenvolvi-
mento dentro dos seus limites, pelo contrá- Terras Indígenas (PPTAL)
rio, podem facilitar a obtenção de ajuda para
projetos de desenvolvimento sustentável O Projeto Integrado para Proteção de
destinados a estas áreas. Populações e Terras Indígenas na Amazônia
Legal (PPTAL) obteve realizações concretas
Reservas Extrativistas (RESEX) que englobam grandes áreas da região. Até o
momento, 29 milhões de hectares foram de-
As Reservas Extrativistas (RESEX) se ori- marcados em 53 reservas, de um total de 45
ginaram de uma proposta feita em 1985 pelo milhões de hectares e 160 reservas (Figura
Conselho Nacional dos Seringueiros, sob a li- 4). O processo de demarcação das terras in-
derança de Chico Mendes. Elas têm sido cria- dígenas restantes não incluídas no PPTAL foi
das pelo governo federal como uma forma de muito mais lento do que as demarcações no
unidade de conservação desde fevereiro de PPTAL, e incluíam, praticamente, todas as ter-
1988. A área sob esta forma de uso da terra ras nos estados de Mato Grosso e Rondônia.
totaliza, atualmente, mais de doze milhões de Esses estados, ironicamente, foram excluídos
hectares. As reservas extrativistas foram criti- do PPTAL com base no argumento de que eles
cadas por condenar os seus residentes à po- já tiveram financiamento de empréstimos do
breza e por serem financeiramente inviáveis Banco Mundial PRODEAGRO e PLANAFLORO
devido ao baixo preço dos produtos extrativis- para demarcação . A metodologia de demarca-
tas, tais como a seringa e a castanha-do-Bra- ção participativa desenvolvida sob o PPTAL,
sil (Homma, 1996). No entanto, é importante onde os próprios povos indígenas faziam a
observar que a razão para criação das reser- demarcação ao invés do trabalho ser feito por
vas extrativistas é ambiental, ao invés de ser uma empresa contratada, teve êxito tanto na
um meio barato de produzir borracha ou de execução da tarefa a custo mínimo quanto na
sustentar uma grande população humana geração de experiência organizacional e de ati-
(Fearnside, 1997a). As reservas extrativistas tudes de responsabilidade entre os membros
são criadas como unidades de conservação dos grupos indígenas. Esses benefícios ser-
pelo Ministério do Ambiente, ao invés de se- virão as tribos na defesa dos seus territórios
rem criadas como assentamentos pelo Instituto e na implementação de atividades sustentá-
Nacional de Colonização e Reforma Agrária veis dentro deles. Problemas com empresas
(INCRA), no Ministério do Desenvolvimento contratadas que resistem e comprometem a

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Política de conservação na Amazônia
brasileira: Entendendo os dilemas 225

supervisão indígena na demarcação de terras reação praticamente alérgica em diplomatas


têm levado a um processo de aprendizagem e oficiais brasileiros. Qualquer país que ofe-
para fortalecer a aplicação da metodologia ao recesse fundos para demarcar reservas in-
longo da existência do PPTAL. As 160 reservas dígenas seria rechaçado imediatamente por
no programa PPTAL têm uma população indí- ofender a soberania brasileira. O componen-
gena de 62.000 habitantes. A demarcação pe- te indígena do Programa Piloto encontrou re-
los próprios indígenas encoraja esta população sistências desse tipo ao longo dos primeiros
a resolver os seus próprios problemas com um anos do Programa, entretanto, foram encon-
mínimo de dependência de recursos e inicia- tradas soluções negociadas permitiram ao
tiva externas, e é uma realização importante Brasil fazer muito progresso no cumprimen-
para a conservação. to de sua meta de demarcar todas as suas
terras indígenas, embora não antes de 1993,
O PPTAL ilustra o papel do Programa como requerido pela Constituição.
Piloto para alcançar uma meta queseria im-
possível para possíveis financiadores realiza-
ARPA: O “Projeto dos 10%”
rem através de projetos bilaterais. Apesar da
demarcação das terras indígenas ser exigida Em 29 de abril de 1998, o presidente
pela Constituição Brasileira de 1988 (Artigo Fernando Henrique Cardoso anunciou um
67), o governo brasileiro, na realidade, tem compromisso de criar áreas totalmente prote-
gastado praticamente nada dos seus próprios gidas para aumentar a porcentagem de flores-
recursos para esse fim. Além disso, o envol- ta amazônica totalmente protegidas para 10%
vimento de países estrangeiros em assun- até 2004. Este esforço foi promovido pelo
tos ligados à povos indígenas provoca uma Fundo Mundial para a Natureza (WWF) e o

Figura 4. Áreas
indígenas na Amazônia
Legal brasileira.

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DESTRUIÇÃO E CONSERVAÇÃO
226 DA FLORESTA AMAZÔNICA

Banco Mundial, como parte da campanha do até mesmo, um “golpe ambiental” (Laschefski
WWF “florestas para a vida”. Até 2001, áreas & Freris, 2001). A certificação florestal, organi-
totalmente protegidas que não eram sobre- zada pelo Conselho para Zelar pelas Florestas
postas com áreas indígenas correspondiam (FSC, 2001), é apoiada por organizações de
a 3,6% do bioma amazônico, enquanto as conservação internacionais, tais como WWF,
áreas de uso sustentável representavam 9,0% Amigos da Terra (FOE) e Greenpeace, assim
e as terras indígenas 22,5% (Ferreira, 2001). como, também, por organizações brasileiras,
O Programa para Ampliar Áreas de Proteção tais como IMAZON, ISA e IPAM. Manejo sus-
Ambiental (PROAPAM, também chamado tentável não é sinônimo de minimização do
ARPA), mais conhecido como o “Projeto dos impacto ambiental, podendo causar danos sig-
10%”, foi criado dentro do Ministério do Meio nificantes aos ecossistemas florestais (Bawa &
Ambiente para atingir esse objetivo. Seidler, 1998). No entanto, biodiversidade sig-
nificativa pode sobreviver em áreas manejadas
Agendas Positivas (Johns, 1997), e os métodos de baixo impacto
exigidos em áreas certificadas reduzem bas-
As “Agendas Positivas” - uma série de tante o dano em comparação à exploração des-
prioridades para desenvolvimento e conser- controlada (Johns et al., 1996). Se o cenário de
vação negociadas entre os diferentes atores referência que se vê como alternativa for flo-
de cada estado - estão em andamento desde resta intacta, então o manejo é desastroso para
1999. Este sistema foi criado pelo Ministério a biodiversidade, enquanto se a alternativa for
do Meio Ambiente em resposta ao aumento considerada uma pastagem, então o manejo é
das taxas de desmatamento em 1999, e se muito melhor. Se este copo é visto como “meio
tornou o principal determinante de priorida- cheio” ou “meio vazio” é, atualmente, uma
des para a Secretaria Especial da Amazônia questão de orientação pessoal, com pouca
(SCA), tendo início em abril de 2000. As base em informações quantitativas. Cenários
agendas positivas são elaboradas pelos con- mais realísticos de como a mudança do uso
sensos dos participantes em reuniões que da terra progrediria numa região sob diferen-
duram vários dias em cada capital estadual. tes regimes de política, incluindo regimes rela-
O uso desta técnica em 1999 para solucio- cionados ao manejo florestal, poderiam ajudar
nar uma disputa intratável sobre a criação
na redução da disparidade entre as conclusões
de uma reserva extrativista para coleta de
sobre as perdas ou benefícios que o manejo
castanha-do-Brasil nas ilhas do reservatório
florestal traz para a biodiversidade.
de Tucuruí foi visto como uma grande con-
quista na abordagem das agendas positivas. Operações certificadas de manejo flores-
Como qualquer participante nas reuniões tal aumentaram rapidamente: Mil Madeireira
tem poder de veto efetivo sobre a inclusão (com operações florestais e serraria localizadas
de qualquer item na agenda, os resultados em Itacoatiara, Amazonas) foi certificada em
em medidas ambientais são, frequentemen- 1997, a GETHAL (com as operações florestais
te, fracos. A sua vantagem se encontra no em Manicoré e a serraria de laminados em
amplo apoio para a implementação das reco- Itacoatiara, Amazonas) foi certificada em 2000
mendações que elas fazem. (mas, posteriormente desativado), e a CIKEL
(com operações florestais em Paragominas e
serraria de laminados em Belém, Pará) foi cer-
DILEMAS DO MANEJO FLORESTAL tificada em 2001. Embora o aumento de ope-
Certificação versus boicotes rações certificadas de manejo na Amazônia
tenha tido uma mudança significativa, a maior
Poucos debates são tão polarizados quanto parte da exploração madeireira na região ain-
aqueles que envolvem a questão do manejo e da é predatória. Até mesmo operações com
certificação florestal como uma medida de con- Planos de Manejo Florestal (PMFs) aprovados
servação, com visões que variam desde o seu pelo IBAMA têm impacto pesado e prospectos
uso como sendo a “última chance” para a bio- pobres para sustentabilidade (Eve et al., 2000).
diversidade (Rainforest Alliance, 2001) para, A demanda por madeira certificada é pequena,

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Política de conservação na Amazônia
brasileira: Entendendo os dilemas 227

mas crescente. Ao contrário da percepção po- Manejo florestal versus plantações


pular, a grande maioria da madeira colhida na silviculturais
Amazônia é consumida no mercado domésti-
co, ao invés de serem exportadas para destinos No Brasil, a demanda por madeira, seja
internacionais. Em 1997, por exemplo, 86-90% de qual tipo for, gera uma pressão para a
da madeira colhida na Amazônia brasileira fo- exploração madeireira em florestas amazô-
ram consumidas dentro do país, sendo expor- nicas. Ao contrário da convicção popular, a
tadas apenas 10-14%. A demanda por madeira madeira de florestas tropicais não é usada
certificada na Europa e na América do Norte é, apenas, nem mesmo principalmente, em
portanto, menos importante do que a demanda produtos de alto valor, tais como mobília e
dentro do Brasil. Os consumidores brasileiros instrumentos musicais. O Brasil utiliza ma-
são menos exigentes por produtos certificados deira tropical para praticamente tudo, inclu-
do que os da Europa e da América do Norte. O sive azimbre, paletas, caixotes, construções,
encorajamento de uma aliança entre ONGs es- aglomerados e compensados. Substituir esta
timulou um mercado doméstico pequeno, que demanda por madeira de plantações somen-
cresceu praticamente do zero em 1997. te acontecerá se a madeira barata, produto
da destrutiva colheita na floresta amazôni-
O mogno representa uma exceção impor-
ca, não estiver mais disponível. Atualmente,
tante à generalizações sobre o peso relativo
as grandes áreas de plantações brasileiras
dos mercados domésticos e estrangeiros. O
são quase todas manejadas para celulose e
mogno está em uma classe de preço a parte:
carvão vegetal, em vez de serem manejadas
US$ 900/m3 de madeira serrada no portão
para madeira serrada (Fearnside, 1998). Essa
da serraria (3-6 vezes o preço de outras es-
situação poderia mudar se fossem imple-
pécies comerciais), e a maioria é exportada.
mentadas políticas que criassem os mesmos
Importações dos E.U.A. representam 60%
tipos de limitações no acesso livre aos re-
do comércio global; os E.U.A., sozinhos, im-
cursos madeireiros, as quais são necessárias
portaram 120.000 m3 da América Latina em
para motivar o manejo florestal sustentável.
1998, equivalente a 57.000 árvores (Robbins,
2000). Considerando que o mogno justifica
a abertura de estradas madeireiras em áreas Sustentabilidade versus lucros
remotas, ele desempenha um papel catalisa- financeiros
dor no desmatamento na região (Fearnside,
O manejo florestal sustentável tem se
1997b). A colheita ilegal desta espécie tam-
tornado uma exigência da legislação brasi-
bém está causando grande impacto nas
leira, além de ser um objetivo endossado,
áreas indígenas e protegidas. Esforços para
pelo menos nominalmente, por todos. No
garantir a origem certificada desta espécie e
entanto, o manejo enfrenta contradições
para boicotar produtos não-certificados têm
fundamentais entre restringir a intensida-
potencial particularmente alto para conser-
de da colheita aos níveis que permitirão a
vação desta e de outras espécies.
regeneração da floresta e a maximização dos
Boicotes indiscriminados sobre a ma- lucros financeiros aos madeireiros. Os ma-
deira tropical teriam um efeito negativo de deireiros destruirão o recurso e investirão os
remover a razão financeira principal para lucros obtidos em outro lugar, caso isso re-
pôr de lado áreas substanciais de floresta sulte em um retorno melhor aos seus investi-
manejada. No entanto, é a ameaça real de mentos, independente de qualquer promes-
boicotes deste tipo que fornece a motivação sa feita às autoridades governamentais sobre
crítica aos governos e à indústria madeireira o seguimento de um sistema de manejo sus-
para procurar a certificação e para reduzir o tentável. Uma vez que as florestas tropicais
impacto e aumentar a sustentabilidade das crescem a uma taxa aproximadamente três
operações de manejo. A existência de um vezes menor do que os lucros que podem ser
sistema de certificação permite que a amea- obtidos sobre o capital investido em ativida-
ça de boicote seja focalizada somente sobre des concorrentes, o manejo sustentável per-
as operações que não se unem ao sistema. manecerá ilusório, a menos que os critérios

Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 227 8/18/2022 3:14:46 PM


DESTRUIÇÃO E CONSERVAÇÃO
228 DA FLORESTA AMAZÔNICA

de decisões econômicas sejam mudados materiais precisa levar para poder comple-
(Fearnside, 1989; Clark, 1976). tar a viagem. No caso do manejo florestal, a
pessoa está embarcando em uma viagem de
O primeiro ciclo sempre produzirá ma-
25 anos (no caso de áreas de várzea) ou de
deira mais valiosa do que os ciclos subse-
30 anos (no caso de terra firme), e o recurso
quentes porque quem maneja a floresta pode
que está sendo gasto é a madeira de lei da
vender as árvores grandes que levaram sécu-
floresta (complementado por alguma renda
los para crescer. Além do custo inicial muito
de fontes adicionais, tais como o ecoturis-
baixo de compra da terra, estas árvores gran-
mo). Se a intensidade da colheita adotada
des estão disponíveis sem nenhum custo fora
mantém a viabilidade financeira do projeto
da despesa de extração, enquanto que nos
ao longo deste período de tempo, o projeto
ciclos futuros a operação terá que passar por emergirá do outro lado com uma floresta em
uma transição para vender apenas a quan- pé (menos as grandes árvores de madeira
tidade de madeira que cresceu enquanto o de lei). Depois do primeiro ciclo, a floresta
investidor esperou e manteve a operação. pode ser usada para produtos farmacêuticos
Kageyama (2000) questionou a sustentabi- e, possivelmente, para renda que poderia ser
lidade das operações de manejo com base alcançada, naquela época, a partir de bene-
na biologia populacional das árvores. Além fícios de carbono e da vontade para pagar
disso, cálculos de sustentabilidade invaria- pelo valor de existência da biodiversidade.
velmente ignoram a probabilidade de que Isto seria complementado por qualquer ren-
os fogos entrarão em uma área de manejo da que poderia ser obtida com manejo das
florestal. A exploração madeireira aumenta espécies de madeira “branca” (macia) da
a suscetibilidade da floresta para entrada de floresta, ecoturismo, etc. A taxa interna de
incêndios, e uma vez que fogo entra, árvores retorno (IRR) exigida é bastante alta (20-
são mortas, a carga de combustível aumenta 25%/ano) para impedir que a operação ca-
e o sub-bosque fica mais seco, aumentando nibalize a sua base de capital.
o risco de futuros incêndios mais prejudi-
ciais e de degradação completa da floresta Investimentos para ganhos de biodiversi-
(Cochrane & Schulze, 1999; Cochrane et al., dade em curto prazo são improváveis, devido,
1999a; Nepstad et al., 1999a,b). em parte, à sabedoria de esperar o governo
brasileiro definir as suas políticas sobre o uso
Manter o manejo florestal como uma ope- da biodiversidade. Atualmente, as políticas
ração economicamente viável além do primei- operacionais são definidas por “medidas provi-
ro ciclo requer uma mudança, com o passar siórias”, ou seja, decretos presidenciais tempo-
do tempo, nos produtos dos quais o valor é rários que devem ser renovados a cada quatro
derivado, já que as taxas de crescimento das meses e que podem mudar facilmente de um
árvores das espécies de madeira de lei colhi- dia para o outro. Além disso, um escândalo
das no primeiro ciclo são inerentemente muito em 2000 (Adolfo, 2000) sobre um contrato as-
baixas. Isto pode incluir uma troca para espé- sinado entre a Associação Brasileira para o Uso
cies de crescimento rápido, assim como, tam- Sustentável da Biodiversidade da Amazônia
bém, para outras fontes de renda potenciais. (BIOAMAZONIA) e Novartis, uma empresa
Estas outras fontes de renda podem ser um fa- farmacêutica baseada na Suíça, afastou, pelo
tor fundamental no planejamento à longo pra- menos temporariamente, o interesse empresa-
zo de projetos de manejo florestal sustentável rial nesses recursos. A BIOAMAZONIA era uma
e do interesse de certos grupos em investir em “organização social” formada para realizar a
“hedges” (tampões) contra mudanças econô- bioprospecção e atividades relacionadas sob
micas e ambientais futuras. o Programa Brasileiro de Ecologia Molecular
A lógica do (já extinto) projeto de mane- para o Uso Sustentável de Biodiversidade de
jo florestal sustentável GETHAL foi descrita Amazônia (PROBEM). A Novartis se retirou do
pelo seu originador (J. Forgach, comunica- contrato e o projeto acabou.
ção pessoal, 2001) da seguinte maneira: se A lógica de “cruzar o deserto” se apli-
uma pessoa for cruzar um deserto ela pre- ca aos benefícios das mudanças climáticas
cisa saber quanta água, comida e outros de maneira semelhante à biodiversidade. O

Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 228 8/18/2022 3:14:46 PM


Política de conservação na Amazônia
brasileira: Entendendo os dilemas 229

interesse do investimento em carbono, vi- madeira bruta serrada ou, em extremos, tron-
sando lucros a curto prazo, foi limitado nos cos sem beneficiamento?”. Um lado deste de-
últimos anos pelo fato de que o acordo sobre bate afirma que somente produtos de valor
o Protocolo de Kyoto alcançado em Bonn, agregado deveriam ser produzidos para que a
em julho de 2001, excluiu o crédito para a quantidade máxima de emprego e dos ganhos
manutenção de floresta, no Mecanismo de financeiros permaneçam na região (Goodland
Desenvolvimento Limpo, durante o primei- & Daly, 1996). Analistas empresariais frequen-
ro período de compromisso do Protocolo temente se opõem a isto porque mais dinheiro
(2008-2012). No entanto, a longo prazo, es- pode ser ganho exportando as matérias-pri-
pera-se que as lutas políticas que estão por mas, já que as serrarias no exterior desper-
trás desta decisão mudem. A “quantidade diçam menos madeira e produzem mercado-
atribuída” (cota nacional de emissões) à rias com melhor qualidade e uniformidade,
cada parte é renegociada a cada período de obtendo-se, assim, preços substancialmente
compromisso sucessivo, removendo, assim, mais altos do que os produtos das serrarias
a vantagem dos atores chaves (especialmen- amazônicas. Repetto (1988) mostrou a lógi-
te na Europa) de forçar certas partes (espe- ca financeira desta posição com exemplos do
cialmente os Estados Unidos) a cumprirem Sudeste da Ásia. No contexto amazônico ar-
os compromissos assumidos em Kyoto quase gumenta-se também que a expansão do ma-
completamente com medidas domésticas re- nejo florestal certificado de baixo impacto está
lativamente caras (Fearnside, 2001). As ne- limitada pela quantidade de capital disponível
gociações ao longo de um período de três para este propósito, e que o dinheiro “verde”
anos e meio entre a conferência de Kyoto em disponível para este tipo de investimento se-
1997 e o acordo de Bonn em 2001 foram úni- ria usado melhor na maximização da área sob
cas porque os países industrializados já ha- manejo, ao invés de usá-lo para construir e
viam aceitado as quantidades atribuídas (co- manter operações industriais muito caras que
tas) específicas para o primeiro período de são necessárias para transformar a produção
compromisso antes que as regras sobre tais em mercadorias de valor agregado. De outra
questões fossem definidas, como a inclusão maneira, um mercado de madeira seriaabas-
do desmatamento evitado no Mecanismo de tecido pelas operações predatórias de explo-
Desenvolvimento Limpo. Para períodos de ração madeireira que dominam a cena hoje.
compromisso futuros, a inclusão do desma- O emprego e renda dos produtos de valor
tamento evitado ajudaria a induzir os países agregado são a razão pela qual o Brasil proí-
a aceitarem compromissos maiores do que be, desde 1965, a exportação de toras brutas.
eles aceitariam na ausência de uma provisão Embora seja evidente a atratividade reduzida
desse tipo, e, portanto, a inclusão das flores- para o capital de investimento da perspec-
tas teria um benefício líquido inegável para o tiva de operações de valor agregado, existe
clima. À medida em que o efeito estufa pio- um raciocínio ambiental (assim como tam-
ra e os esforços para combatê-lo ficam mais bém um social) para favorecer investimentos
fortes e mais universais, pode-se esperar que deste tipo. Este é o efeito do dano ambiental
o valor do carbono das florestas tropicais au- do aumento da exploração madeireira, inde-
mente dramaticamente. É provável que isto pendente dos cálculos do dano serem feitos
aconteça antes do fim de um ciclo de manejo por unidade de investimento absorvido, por
florestal de 30 anos iniciado agora. unidade de emprego criado, ou na forma
de uma porcentagem de lucro que inclui os
Valor agregado versus efeitos monetários e ambientais. Uma ilus-
matérias-primas tração hipotética é apresentada na Tabela
1. Embora uma estratégia de matéria-prima
Uma pergunta recorrente é “até que ponto seja mais lucrativa em termos puramente fi-
as operações de manejo florestal na Amazônia nanceiros, a opção de valor agregado pode
deveriam se esforçar para fornecer produtos ser preferível se forem incluídos indicadores
de valor agregado (tais como laminados ou sociais e ambientais, dependendo do valor
mobília) ao invés de matérias-primas como atribuído a essas outras considerações.

Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 229 8/18/2022 3:14:46 PM


DESTRUIÇÃO E CONSERVAÇÃO
230 DA FLORESTA AMAZÔNICA

Tabela 1. Comparação Produtos No exemplo da Tabela 1, o valor do dano


hipotética entre manejo Matérias
Item Unidades de valor
primas
Fonte ambiental é crítico: se for menor que US$
florestal para produtos agregado
de valor acrescentado 650/ha, a estratégia de matéria-prima for-
e produtos de matéria INDICADORES FINANCEIROS necerá um resultado melhor em termos de
prima lucro calculado como a porcentagem de re-
Área explorada ha 1 1 (a)
torno em relação ao investimento monetário
Despesa monetária US$/ha colhido 4.264 1.315 (b) e ambiental. Mas, se o dano for maior que
Volume explorado m3/toras/ha colhido 30 30 (c) US$ 650/ha, a estratégia de valor agregado
será preferível. O caso que reflete a realidade
Volume vendido m3 de produto/ha 5,25 10,5 (d)
depende do cenário de referência: a orien-
Preço US$/m3 de produto 1.074 215 (e) tação do “copo meio-vazio” ou do “copo
meio-cheio” do observador. Se a operação
Retorno total US$/ha 5.639 2.255 (f)
é vista como tendo salvado o hectare ma-
Retorno líquido nejado do desmatamento, então o “custo
US$/ha 1.374 941 (f)
monetário
% retorno sobre
ambiental” é negativo (i.e., há um benefí-
Lucro investimento 32 72 (f) cio ambiental) e a estratégia da matéria-pri-
monetário ma é preferível. No entanto, se os impactos
INDICADORES SOCIAIS simplesmente são totalizados sem presumir
empregos/100 ha
este benefício (i.e., o cenário de referência é
Emprego local 0,58 0,12 (g) uma floresta inalterada), então, o custo am-
degredados/ano
INDICADORES AMBIENTAIS biental excederá US$ 650/ha e a estratégia
do valor agregado será a preferível. Algumas
Impacto ambiental de ha explorados /
investimento US$1.000 investidos
0,2 0,8 (f) indicações do valor monetário do dano am-
Impacto ambiental por ha explorados / biental da exploração madeireira sugerem
1,7 8,6 (f)
emprego criado emprego valores acima de US$ 650/ha. Considerando
Dano ambiental US$/ha 650 650 (h) somente a colheita (não o manejo ao lon-
Custo (monetário + go do ciclo inteiro), em 1990 a emissão da
US$/ha 4.914 1.965 (f)
ambiental) exploração madeireira na Amazônia Legal
Retorno líquido foi de 61 milhões de t C, da colheita de 24,6
(monetário + US$/ha 724 291 (f) milhões de m3 de toras (Fearnside, 1997c),
ambiental)
Lucro (% retorno sobre
o que corresponde a 2,48 t C/m3 de toras,
investimento monetário % 15 15 (f) ou 74,4 tC de emissão/ha com exploração na
+ ambiental ) intensidade de 30 m3/ha (i.e., US$ 1.488/ha
(a) Presume-se 1 ha (igual para ambos os sistemas) para propósitos de colhido, caso fosse presumido que a vontade
comparação.
(b) Todos os custos de: Schneider et al. (2000, p, 39). Para matérias-primas,
para pagar pelo valor do carbono é de US$
custo variável de extração US$ 7,59/m3, presumindo que toda a madeira 20/tC). Para floresta sob manejo, conside-
colhida é usada; custo variável do beneficiamento das toras US$ 24,58/
m3; Transporte em área explorada US$ 1,3/km, média presumida 2,5 km rando os parâmetros de emissão por explo-
(i.e., concessão de 2.500 ha em formato de quadrado); Transporte em ração madeireira que prevalecem na região
estrada asfaltada US$0,10/m3, presumido 84 km distância (i.e., FLONA
Tapajós); Valor agregado custo de beneficiamento. (Fearnside, 1995) de 38 m3/ha colhidos ao
(c) Volume permitido (e.g., contrato da FLONA Tapajós).
(d) Troncos para madeira serrada (matérias-primas): conversão 35% longo de um ciclo de 30 anos, o estoque de
(Schneider et al., 2000, p. 38.); valor agregado assumido 50% do valor da
matéria prima.
carbono em equilíbrio sob manejo sustentá-
(e) Preços de Schneider et al. (2000, p. 39) para madeira serrada (US$/m3 vel corresponde a uma perda de 14,9 tC/ha
de produto): valor alto 280, valor médio 239, valor baixo 158; presume-se
proporções da colheita do primeiro ciclo de 30 m3 de toras/ha como 20% manejado (incluindo áreas em regeneração)
para valor alto, 40% para valor médio e 40% para valor baixo; preços para
valor agregado presumidos serem cinco vezes mais alto.
quando comparada à floresta não explorada,
(f) Calculado acima. a um ganho de 18,0 tC/ha quando compara-
(g) Emprego da matérias-primas baseado em 258 m3 de toras/ano/emprego
sob manejo sustentável (Schneider et al., 2000, p. 44, baseado em Barreto da à floresta explorada de forma predatória
et al., 1998 e Veríssimo et al., 1992); presume-se que a quantidade de (presumindo-se que não haverá degeneração
emprego na estratégia de valor acrescentado é cinco vezes maior.
(h) Para os parâmetros usados aqui, US$ 650/ha é o valor crítico ao qual uma subsequente à exploração madeireira), e a
troca acontece entre as duas estratégias, a estratégia de valor agregado
é preferível se o dano ambiental excede US$650/ha. Por exemplo, a US$ um ganho de 187,6 tC/ha quando compara-
1.000/ha, o lucro (% retorno sobre o investimento monetário + ambiental)
é 7% para a estratégia de valor agregado contra 3% para a estratégia de da às áreas desmatadas. A US$ 20/tC, estes
matérias-primas, enquanto que à níveis de custo ambientais que excedem
US$ 1.400/ha ambas as estratégias são negativas, com a estratégia de
valores de carbono correspondem a - US$
matérias-primas sendo mais negativa. 298, + US$ 360 e + US$ 3.752 por hectare,

Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 230 8/18/2022 3:14:46 PM


Política de conservação na Amazônia
brasileira: Entendendo os dilemas 231

respectivamente. A disposição de pagar pela do Brasil por Portugal. Este programa inclui
manutenção da floresta seria maior se os be- uma meta de aumentar, em muito, a área de
nefícios da biodiversidade fossem incluídos FLONAs para suprir os mercados interno e
além dos benefícios do carbono (Fearnside, de exportação de madeira a partir do mane-
1997b, 1999). Se um valor monetário fosse jo sustentável nestas áreas. Mais da metade
atribuído à criação de emprego, então o va- dos 15,2 milhões de hectares de FLONAs da
lor crítico mudaria para favorecer ainda mais Amazônia se sobrepõem áreas indígenas, re-
a estratégia de valor agregado. duzindo para 8 milhões de hectares a área
disponível para manejo. O PNF espera ter 20
milhões de hectares sob manejo em 10 anos,
PROPRIEDADES PRIVADAS e a área em FLONAs deverá totalizar 50 mi-
VERSUS CONCESSÕES lhões de hectares para alcançar a meta de su-
FLORESTAIS prir o mercado (Deusdará Filho, 2001). Um
total de 115 milhões de hectares, ou 23% da
Iniciativas privadas são cada vez mais
Amazônia Legal, estão aptos para a criação de
proeminentes nas discussões sobre a polí-
FLONAs onde não há terras indígenas, unida-
tica de conservação na Amazônia. Embora
des de conservação, desmatamento, ou falta
a criação de unidades de conservação possa
de acessibilidade (Veríssimo et al., 2000).
ser proposta para algumas áreas, as vastas
áreas de floresta restantes, fora de qualquer Em comparação com o manejo em ter-
unidade existente, sempre deixam a pergun- ras privadas, concessões florestais em terras
ta do que fazer com o resto. Eficiência é uma públicas, tais como FLONAs, oferecem ao
preocupação: em comparação com o gover- proprietário da concessão a “viagem pelo
no, as operações privadas são mais eficien- deserto”, mas não a recompensa ao chegar
tes em muitas das tarefas envolvidas. Claro do outro lado. Efeitos que contrapõem esta
que a supervisão é necessária para garantir desvantagem, do ponto de vista do investidor,
que as operações privadas de manejo flores- são a liberação da necessidade de comprome-
tal desempenhem o papel esperado delas na ter capital para comprar a terra e a expecta-
conservação. A viabilidade de iniciativas pri- tiva de proteção do governo para defender a
vadas tem uma relação com as unidades de terra contra invasão. No entanto, concessões
conservação, já que o preço baixo da madei- para exploração madeireira representa um as-
ra representa um fator fundamental que de- sunto difícil em relações aos setores público
sencoraja o investimento no manejo susten- e privado. Argumentos para precaução são
tável. O preço só aumentará quando a oferta fornecidos pela experiência triste do sudeste
em relação à demanda diminuir. Madeira de asiático, onde companhias privadas de explo-
manejo sustentável estará em desvantagem ração madeireira destruíram ou degradaram
enquanto houver o fornecimento de toras severamente vastas áreas de floresta tropical
baratas colhidas de forma insustentável. Isto nas terras públicas exploradas por meio de
pode mudar através da criação de unidades concessões (Repetto & Gillis, 1988).
de conservação para tornar áreas grandes de Outro arranjo é a venda de madei-
floresta indisponíveis à exploração e através ra no lugar de uma concessão. Na FLONA
da aplicação rígida dos regulamentos flores- Tapajós, uma experiência de 2.700 ha de
tais já existentes no Brasil. Essas unidades manejo florestal iniciada pela Organização
devem ser iniciadas agora para evitar a al-
Internacional de Madeira Tropical (ITTO) foi
ternativa de esperar até que a floresta esteja
concedida à CEMEX, uma companhia com
quase totalmente destruída, levando à escas-
uma serraria de laminados em Santarém (84
sez de madeira e ao consequente aumento
km por estrada asfaltada da área), por um
dos preços, motivando, assim, a conserva-
período de cinco anos. A companhia paga
ção dos fragmentos restantes.
R$ 6/m3 de toras e tem o direito de colher 30
O Programa Nacional das Florestas (PNF) m3/ha. O custo para a serraria é, então, 30
foi decretado em 22 de abril de 2000, em co- × R$ 6 = R$ 180/ha, ou aproximadamente
memoração aos 500 anos da “descoberta” seis vezes o preço de compra de áreas de

Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 231 8/18/2022 3:14:47 PM


DESTRUIÇÃO E CONSERVAÇÃO
232 DA FLORESTA AMAZÔNICA

floresta, com um acesso apenas ligeiramente A questão do “desenvolvimento sustentável


menos favorável, ao longo da rodovia BR-163 para quem?” sempre deve ser respondida e,
entre Rurópolis e a divisa entre Pará e Mato ao lidar com política de conservação, a res-
Grosso. Já que a serraria só usa três espécies posta sempre deve ser “para aqueles que
de árvore, a quantidade de madeira de alta protegem o meio ambiente”. Evidentemente,
qualidade destas espécies é insuficiente para aliviar a pobreza é, também, um papel im-
ser fornecida pelos 30 m3/ha permitidos da portante, e os grupos beneficiados por ver-
colheita total, levando à tentação de invadir bas com esse fim seriam outros.
áreas vizinhas à FLONA para remover ma-
deira valiosa. Devem ser projetados sistemas Na alocação de dinheiro para alívio da
de concessão com os ciclos de manejo com- pobreza em unidades de conservação, inva-
pletos e atividades econômicas incluídas. riavelmente surge a questão sobre se deveria
Concessões devem ser de longo prazo para ampliar áreas tão rápido quanto possível,
para motiver o uso métodos sustentáveis, com investimento mínimo em serviços so-
preferivelmente sujeitos a inspeções perió- ciais e atividades geradoras de renda, ou se
dicas e renovações no decorrer do termo da um nível melhor de serviços deveria ser pro-
concessão (Poore et al., 1989). vido a uma população menor. Como mencio-
nado anteriormente, a justificativa ambien-
tal das reservas faz com que a maximização
RELAÇÃO ENTRE O ALÍVIO DA POBREZA E A da área seja uma meta melhor. Em lugar de
CONSERVAÇÃO concentrar quantidades grandes de recursos
em algumas comunidades selecionadas, se-
O alívio da pobreza tem um papel im- ria melhor elevar os padrões de vida grada-
portante na política de conservação, mas é
tivamente: todos os residentes de uma uni-
importante definir claramente a relação en-
dade de conservação deveriam ser trazidos
tre os dois para fins de alocação de recursos
primeiro para um nível de subsistência antes
financeiros. Os governos britânico e alemão
de promover atividades de renda mais alta.
têm políticas firmes de que todos os esforços
de conservação que eles financiam devem Uma questão que deve ser enfrentada de
incluir o alívio da pobreza. frente é os efeitos sobre a população excluída
Se o alívio da pobreza fosse o critério das unidades de conservação. Um exemplo
exclusivo para julgar o sucesso de projetos, é fornecido pelos recursos pesqueiros das
então, estabelecer e apoiar unidades de con- unidades de RDS no estado do Amazonas,
servação não seria a atividade de escolha. tais como Mamirauá e Amanã. Até que pon-
Sempre se pode delimitar alguns hectares to as verbas destinadas à criação de reser-
de área de favela em uma grande cidade, vas deveriam ser usadas para aliviar o im-
como Manaus ou Belém, e beneficiar essa pacto em pescadores excluídos de Manaus,
área com programas para saúde, educação, Manacapuru e Tefé? Embora seja frequente-
e geração de renda em pequena escala a um mente alegado que há peixe suficiente para
custo muito menor por família salva da po- todo mundo, é preciso dizer que haverá
breza do que no caso de fornecer serviços perda para as pessoas excluídas. “Peixeiros”
semelhantes às comunidades distantes em (barcos de pesca grandes de fora da área)
unidades de conservação na Amazônia. A são inerentemente predatórios porque
mesma quantidade de dinheiro sempre ali- este tipo de exploração é economicamente
viará mais pobreza em um projeto urbano. A racional em uma situação de acesso aberto,
razão para gastar o dinheiro em unidades de ou seja, a “Tragédia dos Comuns”, sensu
conservação é ambiental: o alívio da pobreza Hardin (1968). A captura total de peixes dos
em unidades de conservação pode ter bene- lagos protegidos melhorará porque aumenta
fícios ambientais grandes, enquanto os be- a produtividade sob manejo comunitário e
nefícios ambientais do alívio da pobreza em porque a alternativa de livre acesso não é
áreas urbanas são pequenos (ou até mesmo sustentável (McGrath, 2000; McGrath et al.,
negativos devido ao aumento do consumo). 1994; Pires et al., 1996).

Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 232 8/18/2022 3:14:47 PM


Política de conservação na Amazônia
brasileira: Entendendo os dilemas 233

A quantidade de peixe que pode ser reti- em um enclave de assentamento dentro da


rada dos ecossistemas naturais na Amazônia reserva (Comunidade de São Jorge). No geral,
é limitada, enquanto a demanda é, para pro- a presença das pessoas em unidades de con-
pósitos práticos, infinita, já que existe na re- servação faz a administração da zona tampão
gião uma população humana de 20 milhões ser menos crítica na Amazônia do que em ou-
e existe transporte refrigerado para os pei- tras partes do Mundo.
xes até os mercados do todo o Brasil e do
A colocação de áreas totalmente prote-
Mundo. A pergunta, então, é “para quem
gidas adjacente aos assentamentos, e vice-
este recurso será usado?”. Argumentos para
versa, aumenta o risco de as áreas protegi-
dar os direitos aos residentes locais incluem
das serem invadidas. Uma maneira de se
o papel deles na proteção do ambiente, além
evitar isso é designar as FLONAs, ou outras
dos princípios comuns de autodeterminação.
áreas de uso sustentável, para servir como
Em via inversa, os pescadores que são tampões entre áreas de assentamento e re-
excluídos da pesca em áreas de unidades de servas. O estado do Acre está seguindo essa
conservação tirarão empregos de outras pes- estratégia ao longo do lado sul da rodovia
soas em lugares distantes quando eles com- BR-364 entre Rio Branco e Cruzeiro do Sul.
petirem pelo número limitado de empregos Já no estado do Amazonas, no outro lado da
em tarefas manuais disponíveis em Manaus rodovia (pela divisão territorial reivindicada
e em outros centros urbanos. Portanto, em pelo Amazonas), não adotou medidas seme-
termos de alívio da pobreza, isso representa lhantes para conter a expansão da frente de
uma redução no saldo líquido dos benefícios desmatamento da BR-364.
do alívio de pobreza.

NEGOCIAÇÃO COM POVOS INDÍGENAS


PRIORIDADE DE AÇÕES EM ZONAS
TAMPÃO VERSUS AÇÕES EM UNIDADES DE Negociação com povos indígenas é uma
área crucial na política de conservação ama-
CONSERVAÇÃO
zônica e, atualmente, é quase inexistente.
A prioridade relativa a ser dada às ações As terras indígenas representam áreas de
em zonas tampão versus ações dentro das ecossistemas naturais muito maiores do que
próprias unidades de conservação é discutida todos os tipos de unidades de conservação
frequentemente (Sayer, 1991). Unidades de juntas, e o destino futuro das terras indíge-
conservação na Amazônia diferem significa- nas será, portanto, um fator determinante
tivamente do estereótipo de uma reserva de no destino destes ecossistemas. De longe, os
natureza primitiva como uma ilha cercada povos indígenas tiveram um histórico muito
por um mar de pobreza. Em vez disso, as uni- melhor na manutenção dos ecossistemas na-
dades de conservação contêm populações tra- turais em seu entorno do que as outras popu-
dicionais que, frequentemente, não diferem lações na Amazônia. No entanto, é importan-
muito das populações em áreas adjacentes te entender que os povos indígenas não são
fora das reservas. No entanto, em alguns inerentemente conservacionistas, como às
casos, populações não-tradicionais densas fi- vezes se é presumido, e que se pode esperar
cam situadas adjacente às reservas, como é que eles respondam aos mesmos estímulos
caso das áreas de assentamento ao longo dos econômicos que induzem os outros atores a
dois lados da FLONA Tapajós. Nesses casos, destruir e degradar as florestas. Isso seria um
fornecer serviços à zona tampão representa- erro grande do ponto de vista do bem-estar
ria um “buraco negro” para os fundos, já que dos próprios grupos indígenas, além do seu
as populações são grandes e os fundos são impacto sobre problemas ambientais globais
limitados. E, ao mesmo tempo, existem de- como biodiversidade e clima. É precisamente
mandas que excedem em muito a capacida- a habilidade dos povos indígenas em defen-
de financeira para auxiliar as pessoas que já der e manter as florestas de suas terras que
estão na FLONA do Tapajós, tanto em áreas dão a estes um papel importante, ainda não
tradicionais ao longo do rio Tapajós, quanto remunerado, no fornecimento de serviços

Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 233 8/18/2022 3:14:47 PM


DESTRUIÇÃO E CONSERVAÇÃO
234 DA FLORESTA AMAZÔNICA

ambientais (Fearnside, 1997d). Para planejar oportunidades para a conservação e para o


o seu futuro, os povos indígenas precisam uso sustentável tanto dentro quanto fora das
entender que o seu papel conservacionista é unidades de conservação. Isso significa que
valioso e, também, é a fonte de sustentação. o Brasil tem que agir rapidamente para de-
Até o momento as recompensas deste pa- finir prioridades e proceder com a expansão
pel foram restringidas aos benefícios modes- e fortalecimento do seu sistema de unidades
tos de programas especiais, tais como o apoio de conservação na Amazônia.
que tem sido dado às reservas extrativistas,
como pagamentos por serviços ambientais
pelo Ministério do Meio Ambiente nos 11
AGRADECIMENTOS
pólos pilotos do programa PROAMBIENTE, As pesquisas do autor são financiadas
e o programa Bolsa Floresta, do governo do pelo Instituto Nacional de Pesquisas da
estado do Amazonas em reservas estaduais Amazônia–INPA (PRJ13.03) e pelo Conselho
desse estado. Projetos comunitários susten- Nacional do Desenvolvimento Científico
táveis como esses precisam ser encorajados e Tecnológico–CNPq (305880/2007-1;
numa escala mais ampla. Entretanto, falta a 573810/2008-7). Este texto é atualizado de
compreensão pelos receptores de que a ra- Fearnside (2011), uma tradução parcial de
zão pela qual eles recebem esses benefícios
Fearnside (2003).
é ambiental, e, portanto, eles precisam man-
ter e fortalecer a sua habilidade emprover
serviços ambientais. REFERÊNCIAS
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Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 238 8/18/2022 3:14:47 PM
CAPÍTULO

13
BR-163: A rodovia Santarém-Cuiabá
e o custo ambiental de asfaltar um
corredor de soja na Amazônia

Philip M. Fearnside
Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia – INPA
Av. André Araújo, 2936 – CEP: 69.067-375, Manaus, Amazonas, Brasil.
E-mail: pmfearn@inpa.gov.br

Tradução de:
Fearnside, P.M. 2007. Brazil’s Cuiabá-Santarém (BR-163) Highway: The environmental cost of
paving a soybean corridor through the Amazon. Environmental Management 39(5): 601-614.
https://doi.org/10.1007/s00267-006-0149-2

Versão original:
Fearnside, P.M. 2005. Carga pesada: O custo ambiental de asfaltar um corredor de soja na
Amazônia. p. 397-423 In: M. Torres (Ed.) Amazônia revelada: Os descaminhos ao longo da BR-163.
Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), Brasília, DF. 496 p.

239
Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 239 8/18/2022 3:14:54 PM
DESTRUIÇÃO E CONSERVAÇÃO
240 DA FLORESTA AMAZÔNICA

RESUMO soja do Brasil. Além disso, a pavimentação da


BR-163 é classificada como de alta priorida-
O asfaltamento da rodovia Cuiabá- de pelos Ministérios da Integração Nacional,
Santarém (BR-163), na região Norte do Planejamento, Transportes e da Agricultura.
Brasil, foi prevista para facilitar a exportação
A rodovia Santarém-Cuiaba existe como
de soja via rio Amazonas. Porém, o proje-
uma estrada de terra batida desde 1973. Suas
to ainda não recebeu as licenças ambientais
condições precárias de tráfego (especialmen-
e a área atravessada pela rodovia está, em
te na estação chuvosa) são um impedimento
grande parte, fora do controle do governo,
significativo ao fluxo de migrantes e de in-
existindo um clima de “terra-sem-lei” e de
vestimento na região. Se o asfaltamento me-
impunidade generalizado. Assuntos relacio-
lhoraria o escoamento de produtos e fluxo de
nados ao meio ambiente e a posse da terra
pessoas, seu simples estabelecimento, sem as
ao longo dessa rodovia estão fora de contro-
devidas medidas socio-ambientais, aumen-
le, com um crescente desmatamento e ex-
tariam grandemente os impacto de desmata-
ploração ilegal de madeira em antecipação
mento na área circunvizinha, como aconteceu
ao asfaltamento da rodovia. O asfaltamen-
em outras áreas da Amazônia. Um exemplo
to da BR-163 aceleraria ainda mais a perda
notório é o da rodovia BR-364 em Rondônia,
de áreas florestadas, assim como apressaria
asfaltada em 1982 (Fearnside, 1986). A BR-
migrassões de apropriadores ilegais de terra
364, financiada pelo Banco Mundial, se tor-
(grileiros) na região. Nesse texto se apresen-
nou o projeto mais constrangedor dessa ins-
ta o argumento de que a aprovação para o
tituição (veja Fearnside, 1987; Schwartzman,
asfaltamento da BR-163 deveria ser conce-
1986) devido ao desmatamento excessivo ao
dida somente após o estabelecimento de um longo da rodovia, exigindo do Banco Mundial
estado de ordem, em que predomine um ní- a criação de um Departamento de Meio
vel de governança suficiente, independente- Ambiente para avaliar futuros financiamen-
mente certificado, para assegurar a proteção tos, em maio de 1987 (Holden, 1987).
da floresta (áreas protegidas) e, para fazer
cumprir a legislação ambiental no entorno A área a ser atravessada pela BR-163 é ca-
da rodovia. Ainda sendo tomadas essas me- racterizada por irregularidades e impunidade
didas, um período de avaliação seria neces- sob todos os aspectos, inclusive ambiental.
sário, antes do asfaltamento da rodovia. Fato este que não minimiza os significativos
impactos que ocorrerão mais a frente resul-
PALAVRAS CHAVE: Desmatamento, Estradas, tantes do asfaltamento da BR, por estimular
Impacto ambiental, Floresta, produção agrí- ainda mais a destruição da floresta. Soma-se
cola, Terra do Meio a isso que o asfaltamento da BR-163 está re-
velando sérios problemas do atual sistema de
licenciamento ambiental brasileiro, apontan-
INTRODUÇÃO do a necessidade de melhoria desse sistema,
como a necessidade de uma avaliação dos im-
Projetos de desenvolvimento na Amazônia
pactos ambientais previamente a tomada de
são freqüentemente polêmicos, mas poucos
decisões para a construção de obras de grande
são tão polêmicos quanto o asfaltamento da
porte. Os impactos devem ser ponderados em
BR-163, no trecho de Cuiabá (MT) ao porto de
relação aos benefícios, para que seja tomada
Santarém (PA), no rio Tapajós próximo ao rio
uma decisão racional. E isso não foi realizado
Amazonas (Fig. 1). A rodovia seria usada para
no caso desta importante rodovia amazônica.
transportar soja e ampliar rapidamente as áre-
as cultivadas, principalmente, na parte norte
do estado do Mato Grosso (Fearnside, 2001a). IMPACTOS AMBIENTAIS DE ASFALTAR A
O asfaltamento dessa rodovia é uma questão RODOVIA
de alta prioridade tanto para o governo do es-
tado de Mato Grosso, encabeçada pelo gover- O principal impacto de asfaltar a rodo-
nador Blairo Maggi, socio do Grupo Maggi, via BR-163, neste momento, seria acelerar a
dono do Grupo Maggi, o maior produtor de destruição da floresta ao longo de sua rota e,

Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 240 8/18/2022 3:14:54 PM


BR-163: A rodovia Santarém-Cuiabá e o custo ambiental
de asfaltar um corredor de soja na Amazônia 241

Figura 1. Brasil com


a Rodovia BR-163
(Santarém-Cuiabá).

em áreas que mesmo fisicamente distantes expansão de estradas interioranas e, amplia


da rodovia estão sob sua influência. O cará- a exploração madeireira e o desmatamento
ter “terra-sem-lei” da área atravessada pela para distâncias substancialmente maiores
rodovia significa que as boas intenções por (Alencar et al., 2004; Arima et al., 2002;
parte dos planejadores governamentais têm Laurance et al., 2002a). Isso estimula a rei-
pequena relevância na maneira com que o vindicação destas áreas por “grileiros” ou la-
desmatamento, a exploração madeireira e o drões de terra, que se apropriam ilegalmen-
fogo podem se expandir na prática. A flo- te dessas áreas e subseqüentemente obtém
resta remanescente perto da rodovia seria títulos legais, freqüentemente baseados em
desmatada, principalmente para pastagens documentos falsificados e corrupção.
e as terras planas, existentes (Fig. 2) entre
O desmatamento é o meio mais efetivo
a fronteira Pará/Mato Grosso e a rodovia
de tomar o controle destas terras e justifi-
Transamazônica, seriam transformadas em
car a documentação para “legalização” ou
plantações mecanizadas de soja.
“regularização” exigidas pelas agências
Mais importante que o desmatamento à de assentamentos do governo tais como o
margem da estrada é a extensão do alcan- INCRA (Instituto Nacional de Colonização
ce da influência da rodovia em qualquer e Reforma Agrária) e ITERPA (Instituto
direção. O asfaltameto resulta na rápida de Terras do Pará). Até mesmo as multas

Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 241 8/18/2022 3:14:54 PM


DESTRUIÇÃO E CONSERVAÇÃO
242 DA FLORESTA AMAZÔNICA

Figura 2. A Rodovia
BR-163 (Santarém-
Cuiabá), trecho
Guarantã do Norte a
Santarém.

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BR-163: A rodovia Santarém-Cuiabá e o custo ambiental
de asfaltar um corredor de soja na Amazônia 243

aplicadas pelo IBAMA (Instituto Brasileiro al., 2002). Obviamente, o outro lado desta
do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais moeda é a rápida destruição da floresta com
Renováveis) pelo desmatamento ilegal po- o asfaltamento da rodovia. Outro efeito im-
dem ser usadas para documentar a presença portante do clima mais seco seria facilitar a
efetiva de grileiros na área. Assim, ironica- entrada do fogo na floresta em pé. Incêndios
mente, levando alguns a quererem ser mul- rasteiros em áreas da floresta amazônica se
tados pelo Órgão. tornaram uma fonte importante de impacto
ambiental durante as últimas duas décadas
O preço da terra aumenta rapidamente
(Barbosa & Fearnside, 1999; Cochrane, 2003;
quando uma estrada é asfaltada. Isto sus-
Cochrane et al., 1999; Nepstad et al., 1998,
tenta a motivação em desmatar para asse-
1999a,b, 2000, 2001). A inflamabilidade da
gurar as reivindicações de posse da terra, floresta é aumentada pela exploração ma-
incluindo terras pretendidas para propósitos deireira, que é uma atividade em franca ex-
especulativos. Todos esses processos já es- pansão ao longo de toda a BR-163. Assim,
tão acontecendo na expectativa de asfaltar pode-se esperar que uma grande extensão
a estrada, mas se o asfaltameto ocorresse de de floresta seja destruída pelo fogo ao longo
fato, aceleraria ainda mais esses processos. dessa rota, além daquela derrubada delibe-
A quantificação deste efeito deveria ser uma radamente para pecuária, agricultura e espe-
prioridade máxima na avaliação do impacto culação de terra.
ambiental. Cenários com e sem asfaltamento
precisam ser comparados para avaliar seus A definição “terra-sem-lei” é um fenôme-
efeitos. Ao invés disso, o que tem acontecido no estreitamente ligado à BR-163, permean-
é uma série de comparações de cenários com do praticamente todas as atividades econô-
e sem “governança”, mas sempre com a su- micas e grupos sociais exitentes na região.
posição que a rodovia será asfaltada. A história da rodovia é, no mínimo, pitores-
ca, inclui a febre do garimpo de ouro nos
O desmatamento na Amazônia brasileira anos 1980 (quando o preço de ouro era mui-
tem sido em grande parte limitado ao “arco to maior do que é atualmente), com a do-
de desmatamento” ou “arco de fogo” que se minação violenta da atividade por “Márcio
estende em forma de meia-lua, da rodovia Rambo”, morto em uma invasão policial,
Belém-Brasília na Amazônia oriental, na di- mas que ainda é fonte de lendas na região.
visa entre a floresta amazônica e o Cerrado Um evento emblematico dessa “terra-sem-
no Mato Grosso, continuando ao longo do -lei” foi o assassinato, ainda não soluciona-
eixo da rodovia BR-364 de Rondônia até a do, de um grileiro em Novo Progresso, em
parte oriental do Acre. A BR-163 mudará este julho de 2004, depois que ele viajou à Belém
padrão, cortando ao meio a região, de sul e denunciou a polícia vários outros grileiros
para norte, até o rio Amazonas, formando e madeireiros por uma variedade de crimes
um “W”. comuns na BR-163, inclusive a exploração
Um aspecto importante da BR-163 é que ilegal de mogno, exploração madeireira em
essa rodovia está inclusa numa área de clima áreas indígenas, falsas reivindicações de ter-
mais seco do que a maioria das áreas flores- ra e pistolagem para executar os oponentes
tadas na Amazônia. Esse clima mais seco se (O Liberal, 2004). A lista de pessoas denun-
estende-se diagonalmente pela região, apro- ciadas inclui políticos e seus familiares (O
ximadamente em paralelo ao rio Tapajós, Estado de São Paulo, 2004).
com precipitação pluviométrica aumentando A crença de que a “governança” será
tanto no sentido oriental (para Belém) quan- capaz de controlar a área sob influência da
to no sentido ocidental (para Manaus) desta BR-163 tem sido tema de debate largamen-
linha (Nimer, 1979; Nepstad et al., 2004). O te divulgado (Laurance & Fearnside, 2002;
clima mais seco é benéfico para a agricultu- Laurance et al., 2001a,b, 2002a,b, 2004;
ra e criação de gado, aumentando assim a Nepstad et al., 2002a,b; Silveira, 2001).
rentabilidade obtida pela conversão da flo- O efeito da governança foi simulado por
resta em cultivos ou pastagens (Schneider et Britaldo Soares-Filho (Soares-Filho, 2004a;

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DESTRUIÇÃO E CONSERVAÇÃO
244 DA FLORESTA AMAZÔNICA

Soares-Filho et al., 2004), comparando dois os madeireiros locais (Radiobras, 2004).


cenários, com e sem governança. No cenário Claramente, há um caminho longo para se
de governança, o desmatamento prossegue percorrer para estabelecer a governança, até
muito mais lentamente. Porém, tem-se a per- mesmo na única cidade liderada por um pre-
gunta: como uma área notoriamente “terra- feito “verde” na região.
sem-lei” vai ser transformar em um exemplo
A realidade na BR-163 tem sido mais
de obediência a regulamentação ambiental?
cruel que o pior cenário simulado pelo
Marina Silva, a Ministra do Meio Ambiente,
IPAM (Instituto de Pesquisa Ambiental da
descreveu o futuro da BR-163 como um “cor-
Amazônia) com e sem a governança (Soares-
redor de desenvolvimento sustentável” (pa-
Filho et al., 2004), no modelo escrito em
lestra de abertura do Congresso Científico do
2000 usando parâmetros derivados do des-
LBA, Brasília, 27 de julho de 2004), mas a
matamento nos anos 1990, quando as difi-
sucessão de eventos na área dessa rodovia
culdades econômicas no Brasil se traduziam
pouco apoia esta predição. Ironicamente na
mesma semana que a Ministra predisse o em baixas taxas de desmatamento a qual-
“corredor de desenvolvimento sustentável”, quer distância de uma estrada. A capacidade
o Grupo de Assessoria Internacional (IAG) do processo de desmatamento em pular para
do Programa Piloto para Conservação das blocos de floresta virgem tem se mostrado
Florestas Tropicais do Brasil (PPG7) relatou ainda maior do que aquela indicada pelos
uma situação de caos social: parâmetros utilizados no modelo para simu-
lar este fenômeno.
“A falta de confiança na capacidade de Uma avaliação quantitativa do impacto
atuação do Estado gera freqüentemente de asfaltar a rodovia requer uma compara-
um clima de desobediência civil aberta e ção de cenários com e sem asasfaltamento.
declarada em relação ao estado de direi-
to. Tal desobediência se manifesta tanto Comparações de cenários com e sem gover-
em relação à legislação ambiental quanto nança, embora forneçam informações im-
à situação fundiária” (IAG, 2004). portantes, não estimam quantitativamente
os impactos. A governança está como a ma-
Em outras palavras, a área não tem a ternidade ou o desenvolvimento sustentável:
mínima chance de se tornar um corredor de todo mundo está a favor. As perguntas per-
desenvolvimento sustentável antes que uma tinentes com respeito à governança são: “As
mudança maciça aconteça com relação à suposições que constituem este cenário são
presença do Estado e do ajuste da população realísticas no contexto social da BR-163?” e
a uma vida sob estado de lei. “Qual a capacidade de atuação dos órgãos
ambientais?”. Um cenário realístico ou en-
Governança é claramente essencial. Mas tão um conjunto de cenários em termos de
como ser obtida? O prefeito de Guarantã do governança com asfaltamento, teria que ser
Norte, no Mato Grosso se declarou “prefeito comparado com o cenário correspondente
verde” e anunciou uma série de planos que le-
sem o asfaltamento.
varam Nepstad et al. (2002a) a usar este caso
como evidência primária para predizer que Simulações que controlam o asfaltamen-
a governança reduziria em muito o desma- to e a governança foram realizadas recen-
tamento ao longo da rodovia. Ironicamente, temente usando o modelo SIMAMAZONIA,
poucos meses depois, Raimunda Nonata desenvolvido pelo Projeto de Cenários
Monteiro, diretora do Fundo Nacional do Amazônicos (Soares-Filho, 2004a,b). Estas
Meio Ambiente (FNMA), foi tomada e manti- simulações compararam resultados para os
da como refém por madeireiros em Guarantã anos entre 2030 e 2050, presumindo que a
do Norte até que o prefeito concordasse em BR-163 seria asfaltada em 2008, ou que não
não criar duas reservas propostas na área havaria asfaltamento. Os resultados sem
(ISA, 2004a). Em 23 de novembro de 2004 o governança indicam uma área adicional de
escritório do IBAMA em Guarantã do Norte foi desmatameno de 29.767 km2 até 2030 como
queimado, tendo como principais suspeitos resultado do asfaltamento, uma média de

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BR-163: A rodovia Santarém-Cuiabá e o custo ambiental
de asfaltar um corredor de soja na Amazônia 245

1.353 km2/ano ao longo dos 22 anos (de 2008 em cada faixa de distâncias a partir de uma
a 2030). A influência do asfalto declina ao estrada. Relações estatísticas são estabeleci-
longo do tempo, na medida em que a área de das com variáveis preditora, tais como a dis-
floresta remanescente diminui: a taxa média tância de cada tipo de estrada (Soares-Filho et
adicional de perda de floresta diminui pela al., 2003, 2004, 2005). A quantidade de des-
metade para 653 km2/ano se a análise for matamento na área em geral é calculada em
extendida até 2050. A diminuição do efeito uma simulação não espacializada baseada
do asfaltamento ao longo do tempo implica em parâmetros econômicos, seguido por uma
que, nos primeiros anos após sua condução, alocação espacial do desmatamento simula-
a diferença entre os cenários com e sem as- do, baseada nos pesos de evidência. Quando
faltamento é provavelmente muito acima da o peso de evidência para um determinado fa-
média de 1353 km2/ano em 22 anos, o que tor é positivo (maior que zero), então o fator
por si só representa uma área enorme (quase estimula o desmatamento, e quando o valor
a metade da área do reservatório de Balbina é negativo, o fator inibe o desmatamento.Um
por ano!). Os primeiros anos são críticos, exame destes parâmetros por Britaldo Soares-
não somente em termos de extensão da área Filho, autor do modelo, indicou que a faixa
desmatada, mas também em termos da loca- de distância a partir de uma estrada que afe-
lização das áreas. E a continuação do desma- ta o desmatamento (baseado em imagens da
tamento sob as atuais condições “terra-sem- parte norte de Mato Grosso) é 10 vezes maior
-lei” reduziria rapidamente as oportunidades no caso de uma estrada asfaltada em compa-
para criar áreas protegidas. ração a uma estrada não asfaltada. O peso de
Comparações de cenários com governança evidência é mais alto na margem da estrada,
(Soares-Filho, 2004b) indicam um efeito cres- e diminui progressivamente a medida em que
cente da governança a medida em que o tem- se desloca para longe da estrada, caindo abai-
po passa. Sob os cenários com governança, se xo de zero a uma distância de 5 km de uma
o extensivo asfaltamento da BR-163 fosse pos- estrada não asfaltada e 50 km de uma estrada
tergado até 2050 (um cenário não realista), a asfaltada. Isto significa que asfaltar a estrada
floresta poupada totalizaria uma área impres- aumenta a taxa de desmatamento em uma
sionante de 92.134 km2, ou 2.194 km2/ano. larga faixa (45 km adicionais de cada lado)
ao longo da rodovia.
Os parâmetros usados nos modelos publi-
cados para simular o desmatamento com e O efeito da rodovia não se restringe à
sem governança (Soares-Filho et al., 2004a) e, faixa de desmatamento que se expande a
também em simulações substancialmente me- partir de cada lado da rodovia. A influência
lhoradas usando o modelo SIMAMAZONIA pode saltar para locais distantes por meio de
(Soares-Filho, 2004a, 2005), calculam a proba- “teleconexões”, semelhantes àquelas obser-
bilidade de cada celula (i.e., cada hectare) ser vadas na climatologia, onde eventos (como
desmatada baseada em “pesos de evidência” o desmatamento) em um lugar podem afe-
que refletem fatores tais como a proximidade tar o clima em um lugar distante. Em 2004,
de uma estrada asfaltada ou de uma estrada havia uma dramática extensão da atividade
não asfaltada e, a proximidade para desmata- grileira da BR-163 para a área de Apuí, no
mentos já existentes. Os “Pesos de evidência” Amazonas, situado a mais de 1.000 km por
decorrem de uma técnica comum em estudos estrada (Fig. 3). Apuí, município situado na
geológicos para modelar os locais prováveis rodovia Transamazônica, no extremo sudes-
de jazidas minerais (Bonham-Carter, 1994). te do estado do Amazonas, foi durante mui-
Para estudos de desmatamento, a técnica é to tempo um foco de desmatamento naque-
aplicada dividindo em celulas (rasterização) le estado, principalmente pelos pecuaristas
um par de imagens de satélite de uma deter- e colonos que migraram de Rondônia via
minada área em duas datas distintas, e cal- Humaitá. O fluxo de pessoas, e sobretudo de
culando a fração de celulas que sofrem tran- investimento, vindos do lado leste pioraria
sições (tais como o desmatamento) em cada a situação, já crítica. De acordo com grilei-
zona tampão de distância (buffer), ou seja, ros que atuam na BR-163, estes fluxos são

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DESTRUIÇÃO E CONSERVAÇÃO
246 DA FLORESTA AMAZÔNICA

encorajados pelo prefeito de Apuí, que ofe- é o Baixo Amazonas. O cultivo de soja na
receu lotes de 100 ha perto da cidade como área de Santarém tem expandido ao lon-
incentivo para que grileiros maiores mon- go dos anos. Esta atividade já ultrapassou
tassem bases naquela região. Vários ônibus o rio Amazonas, chegando aos municí-
fretados com grileiros das cidades ao longo pios de Prainha, Monte Alegre, Alenquer e
da BR-163, desde Castelo dos Sonhos até Oriximiná. É provável que a migração de
Caracol, fizeram a viagem. Uma empresa de investidores neste setor seja estimulada por
ônibus em Itaituba com três microônibus de uma rodovia asfaltada, com investimentos
18 assentos se especializou neste ramo. Os partindo de Mato Grosso na direção norte.
grileiros geralmente não abandonam as suas
O alcance de atividades madeireiras tam-
bases na BR-163, mas fazem breves visitas
bém está ampliando, se expandindo a mais
a Apuí e, despacham familiares ou empre-
de 70 km da BR-163. A floresta nos dois la-
gados de confiança para estabelecer e man-
dos da rodovia foi penetrada por muitas es-
ter as novas reivindicações. Em dezembro
tradas de exploração madeireira. Atualmente
de 2004 o governo do estado do Amazonas
são exploradas quatro espécies em quanti-
criou um mosaico de 3,2 milhões de hectares
dades significantes: cumaru (Dipteryx spp.),
de reservas, principalmente florestas estadu-
jatobá (Hymenaea spp.), ipê (Tabebuia spp.)
ais (para manejo de madeira) no extremo
e cedro (Cedrela odorata) (Maurício Torres,
sudeste do estado (Ninni, 2004) com objeti-
comunicação pessoal, 2004). O mogno
vo de freiar a entrada de desmatadores pro-
(Swietenia macrophylla) também ocorre na
venientes de Mato Grosso, assim como de
área, mas sua exploração atualmente é ile-
grileiros oriundos da BR-163.
gal. Com o asfaltameto da rodovia, a distân-
Outro local distante que é receptor das cia a partir da qual é financeiramente viável
atividades impactantes da rodovia BR-163 explorar a madeira será expandida, assim

Figura 3. A área
de influência da
BR-163 no Pará,
incluindo a rodovia
Transamazônica em
direção oeste até Apuí,
e a Terra do Meio, que
extende a leste até o rio
Xingu, em São Félix do
Xingu (mapa elaborado
por Arnaldo Carneiro).

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BR-163: A rodovia Santarém-Cuiabá e o custo ambiental
de asfaltar um corredor de soja na Amazônia 247

como o número de espécies exploradas (e.g., sob o programa ARPA (Áreas Protegidas da
Veríssimo et al., 2002). Amazônia) do Ministério do Meio Ambiente,
e fizeram parte de um mosaico de reservas
Pelo menos duas rotas ligam a BR-163 a
propostas para a Terra do Meio (ISA, 2003b).
“Terra do Meio”, que é uma área de flores-
ta relativamente intacta entre o rio Xingu ao Ao mesmo tempo, uma área de 8 milhões
leste, rio Iriri ao norte, reservas ao longo da de hectares, a maior parte localizada no lado
rodovia BR-163 ao oeste, e áreas indígenas ao oeste da rodovia BR-163, foi declarada uma
sul (Fig. 3). A primeira rota inicia em Novo “área administrativamente interditada”, na
Progresso, de onde uma parte uma estrada se- qual seriam criadas outras reservas ao longo
cundária (“ramal”) em direção ao rio Curuá. O dos próximos meses. Nessa área, a estrada
transporte público na forma de caminhonetas de penetração principal a partir de Moraes
“pickup” de lotação faz a viagem até o ponto de Almeida (a estrada “Transgarimpeira”) se
de embarcação e de lá, podem ser contratados tornou uma fronteira ativa de especulação de
barcos para descer o rio Curuá, chegando a terra e de grilagem (estabelecimento de rei-
Terra do Meio. Do mesmo modo, equipamen- vindicações fraudulentas de terra). Imagens
tos pesados, como tratores florestais (“skid- LANDSAT indicam que o desmatamento já
ders”) são transportados de Novo Progresso a passou do rio Novo e do rio Crepori, alcan-
estrada de Canópus, que corta uma seção de çando o rio Cururu na divisa da área indí-
250 km da Terra do Meio, de leste para oeste. gena dos Mundurucus (Fig. 3), podendo
A segunda rota é uma estrada aberta para a ainda avançar ao norte para unir com a ro-
exploração madeireira, que atualmente pene- dovia Transamazônica em Jacareacanga. A
tra a área do Riozinho de Anfrísio a partir da Transgarimpeira representa o ponto de entra-
BR-163 perto de Trairão (Maurício Torres, co- da principal no grande bloco de floresta que
municação pessoal, 2004). O acesso é proibido é delimitado ao oeste pela rodovia BR-163,
a todos com a exeção das pessoas envolvidas a noroeste pela rodovia Transamazônica, ao
na operação de exploração de madeira. Uma sul pelo campo de provas do Exército, na
das principais famílias de grileiros de Castelo Serra do Cachimbo, e ao sudoeste pela área
dos Sonhos reivindica parte dessa área. indígena dos Mundurucus (Fig. 3). O anún-
cio da área interditada aparentemente teve
A área de Riozinho de Anfrísio foi decla- algum efeito em desestimular os grileiros em
rada uma reserva extrativista em 08 de no- investir em mais desmatamentos nesta área
vembro de 2004 (ISA, 2004b). A opção de durante a estação seca de 2005.
criação dessa reserva por pouco não foi per-
dida, visto a migração de madeireiros e de Os planos para a área interditada estão
outros grupos que avançavam sobre a área evoluindo, e uma proposta para “florestas
a partir da BR-163 e da estrada “Transiriri”, públicas”, nas quais seriam concedidas con-
uma estrada interiorana que parte de Uruará cessões de manejo florestal (incluindo em-
(na rodovia Transamazônica) em direção ao presas internacionais) está em análise no
rio Iriri (e.g., Amazonas em Tempo, 2004a; Congresso Nacional. Um aspecto preocupan-
te desses planos é a proposta para aproxi-
Greenpeace, 2003; Pontes Júnior et al.,
madamente metade da área ser transforma-
2004). Defender esta reserva requer mais do
da em Áreas de Proteção Ambiental (APAs)
que um esforço simbólico.
(Fig. 4). Apesar do som tranqüilizador deste
Em fevereiro de 2005 o assassinato da nome, APAs não apresentam praticamen-
irmã Dorothy Stang criou uma oportuni- te nenhuma restrição ambiental real. APAs
dade política para criação de várias reser- pode incluir áreas de agricultura (como a
vas na área. Assim, no dia 17 de feverei- Ilha de Marajó inteira) e áreas urbanas, até
ro o Ministério do Meio Ambiente criou a mesmo um bairro inteiro como ocorre na ci-
Estação Ecológica da Terra do Meio (3,4 mi- dade de Rio de Janeiro (Santa Teresinha). O
lhões de hectares) e o Parque Nacional da fato mais importante é que APAs reconhe-
Serra do Pardo (445.392 ha). Ambas as re- cem propriedade privada dentro dos seus
servas haviam sido planejadas previamente limites, significando que os muitos grileiros

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DESTRUIÇÃO E CONSERVAÇÃO
248 DA FLORESTA AMAZÔNICA

que têm reivindicações ilegais de terra na destes posto, tanto em “Trinta” como na
área podem continuar as negociações e re- Serra de Cachimbo precisa-se de medidas
cursos jurídicos intermináveis para legali- para impedir rotas alternativas de fuga de
zar as suas reivindicações, e eles ganharão madeira, que contornam os postos de fisca-
legitimidade adicional por serem partes em lização; além de meios de evitar a corrupção
negociações oficiais, como se fossem os ocu- dos fiscais, que reportadamente permitem a
pantes legítimos em lugar de criminais. passagem de mogno ilegal disfarçado como
sendo de outras espécies. Além dos desafios
A exploração madeireira é uma das ativi-
para controlar o transporte de madeira, há
dades mais importantes a ser controlada ao
ainda problemas relacionados aos projetos de
longo da BR-163. A exploração está aconte-
manejo florestal como as autorizações de des-
cendo de qualquer maneira, até mesmo na
mate fraudulentas, e a exploração madeireira
ausência de uma rodovia asfaltada, e sua lu-
em áreas indígenas, freqüentemente com o
cratividade e alcance seriam ampliadas com
consentimento de líderes indígenas locais.
o asfaltamento, como já mencionado. Para
controlar o transporte de madeira, o IBAMA Pode ser esperado um estímulo de migra-
criou em 2004, um posto de fiscalização no ção para a área área alcançada pela BR-163.
ponto onde a BR-163 encontra com a rodo- O exemplo de Rondônia é pertinente: embora
via Transamazônica, 30 km a leste de Itaituba uma migração enorme para Rondônia tivesse
(conhecido como “Trinta”) e outro na ponta acontecido antes que a BR-364 fosse asfalta-
sul da rodovia no Pará, ainda a ser estabeleci- da, o efeito da rodovia abrindo aquela parte da
do. Como ainda não foi fisicamente criado, o Amazônia à destruição foi evidente (Fearnside,
fluxo de madeira ilegal para o sul continuou 1986). Um fato importante é que não são ape-
desimpedido durante toda a estação seca nas migrantes pobres, mas também grandes
de 2004. E mesmo como o estabelecimento investidores, que chegam a essas áreas.

Figura 4. Atual
proposta para a
alocação da zona de
8 milhões de hectares
interditadas ao oeste
da Rodovia BR-163.

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BR-163: A rodovia Santarém-Cuiabá e o custo ambiental
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O LUGAR DOS IMPACTOS AMBIENTAIS NA Isto ficou claro nas desaventuras do Banco
TOMADA DE DECISÕES Mundial em Rondônia, onde os funcioná-
rios do Banco justificaram o financiamento
A recente história da rodovia BR-163 ser- da BR-364 (projeto POLONOROESTE) com
ve como uma lembrança das deficiências do o argumento de que o asfaltameto da rodo-
atual sistema de licenciamento ambiental via era inevitável mesmo antes do seu início
no Brasil. O problema fundamental é que a (Fearnside, 2005a).
avaliação do impacto ambiental e os proce- Muitas das audiências públicas e de ou-
dimentos de autorização são sujeitos à pres- tras discussões são explícitas em somente
são dos agentes interessados em uma cons- permitir comentários “positivos”, o que quer
trução veloz e livre de obstáculos. Apenas dizer que os participantes têm que aceitar
poucos dias após o lançamento do grupo de a suposição de que a rodovia será asfaltada
trabalho para controlar o desmatamento no como uma pré-condição para a participação.
Brasil, o Presidente da República chamou Discussões são limitadas, então, à questão
seus ministros para exigir que estes encon- de como minimizar os impactos negativos o
trassem modos para contornar impedimen- máximo possível. O grupo de trabalho inter-
tos ambientais a projetos de infraestrutura ministerial que elabora o plano de ação para
protelados em todo território brasileiro, in- prevenção e controle de desmatamento trata
cluindo 10.000 km de projetos rodoviários como “medidas de prevenção, ordenamento
(Amazonas em Tempo, 2004b). e mitigação de efeitos socioambientais” na
Um aspecto fundamental do debate so- BR-163, assim não fazendo nenhuma men-
bre a BR-163 foi o esforço para suprimir ção de discussão da questão de se a rodovia
de qualquer discussão a possibilidade de deve ser ou não asfaltada agora (Brasil, GT-
não asfaltar a rodovia, assim permitin- Desmatamento, 2004, pág. 31). A existên-
do somente sugestões sobre como mitigar cia de rodovias e de outra infraestrutura é o
ou minimizar os impactos do projeto, não determinante mais importante do desmata-
uma avaliação de que se o projeto deveria mento, e não os detalhes sobre os programas
ir adiante. A discussão de impactos invaria- de mitigação que podem ser promovidos
velmente começa a partir da suposição de junto com os projetos.
que o asfaltameto da rodovia é inevitável. O papel de participação de organizações
Nepstad et al. (2002a) consideram que o as- não governamentais (ONGs) ambientalistas
faltameto da rodovia BR-163 é “inevitável”. nas reuniões se tornou um assunto polêmico.
Embora seja altamente provável que esta Em julho de 2004, quando ONGs protestaram
rodovia seja asfaltada como planejado no como o argumento que a série de reuniões
Plano Plurianual (PPA) de 2003-2007, não públicas sobre os impactos da rodovia
se deve tratar uma alta probabilidade como simplesmente tinham o objetivo de obter
sinônimo de inevitabilidade (Laurance et al., uma imediata “liberação” para a construção,
2002b). Uma probabilidade desse tipo não a resposta oficial do governo foi de que as
é como uma probabilidade associada a um ONGs tinham participado de reuniões prévias
evento natural, como a ocorrência de uma e, portanto, não deveriam estar se queixando
seca. Sua ocorrência depende de decisões dos procedimentos fora do contexto das reu-
humanas e, estas estão sujeitas à mudanças. niões (Nunomura, 2004). Desnecessário di-
Tratando o projeto como inevitável faz-se zer, que a citação de participação em reuniões
uma profecia que se auto-realiza. A questão como alegação a existência de acordo e, silen-
de quando considerar algo como inevitá- ciar divergências, não é a melhor maneira de
vel ou irreversível sempre será controverso. traçar um caminho para o desenvolvimento
Fomentadores sempre considerarão obras sustentável. Participação em reuniões não
como inevitáveis desde o momento de sua significa que as ONGs estão coniventes.
idealização. Considerar antecipadamente Pelo contrário, é notável que as ONGs tive-
obras como inevitáveis pode deixar pessoas ram um papel importante em pressionar as
bem intencionadas em uma situação difícil. autoridades para prometerem medidas que

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DESTRUIÇÃO E CONSERVAÇÃO
250 DA FLORESTA AMAZÔNICA

aumentariam os benefícios para as popula- um “efeito de arraste” que estimula ati-


ções locais e a proteção do ambiente. vidades como a exploração madeireira e a
Um “consórcio” de 32 ONGs participou pecuária, embora estas não sejam parte do
em discussões organizadas pelo governo e desenvolvimento planejado na região (por
identificou a necessidade de criação e con- exemplo, Fearnside, 2001b, 2002; Fearnside
solidação de áreas protegidas, regularização & Laurance, 2002). No EIA realizado para a
de assentamentos da reforma agrária, maior BR-163, a expansão do desmatamento, eufe-
apoio para a agricultura familiar com incen- misticamente denominada de “substituição
tivos para atividades sustentáveis e, a exten- gradual das formações florestais por áreas
são de infraestrutura para todos os segmen- abertas”, é abordado em somente três pági-
tos da sociedade ao longo da BR-163. Para nas do relatório de sete volumes (ECOPLAN,
apoiar os programas necessários, um tipo de 2002a, Vol. 4, p. 23-25).
“pedágio de sustentabilidade” foi proposto a Tanto o EIA e o RIMA listam impactos
ser cobrado dos caminhões que levam soja negativos relacionados ao asfaltamento da
na Rodovia. Porém, esta provisão ainda não BR-163, assim como incluem os “impac-
foi incorporada no plano oficial (Convênio tos” positivos, tais como “Dinamização da
DNIT/IME, 2005). O Instituto de Pesquisas economia local”, “Barateamento do frete e
da Amazônia (IPAM), uma ONG sediada em dos custos de manutenção para transporte
Belém, desempenhou um papel de liderança de produtos”, “Melhoria da qualidade de
na formulação destas propostas e na orga- vida para a população”, “Expansão da fron-
nização de mapeamento participativo e dis- teira agrícola e do potencial produtivo” e
cussões ao longo da rodovia (Alencar et al., “Potencialização da exploração dos recursos
2005; IPAM, 2005). naturais” (ECOPLAN, 2002a, Vol. 4, p. 57).
O Estudo de Impacto Ambiental (EIA) e o O RIMA revela um descompasso enorme
Relatório sobre Impactos Ambientais (RIMA) entre o tratamento dos impactos diretos do
têm sido obrigatórios desde 1986 como parte asfaltamento da rodovia e a influência mais
do processo de licenciamento. Estes relatórios ampla e indireta do asfaltamento da BR-163
foram entregues em 2002 para o trecho da BR- em acelerar a destruição da floresta circun-
163 no estado do Pará, da divisa com Mato vizinha. Para floresta removida diretamente
Grosso até Rurópolis e Miritituba (na rodo- pelo asfaltamento da estrada, o RIMA afirma
via Transamazônica), mas os relatórios ainda sob o título “O que deve ser feito?”:
não foram aprovados. Estudos para os trechos
em Mato Grosso e de Rurópolis até Santarém “Para previnir a eliminação de vegetação
ainda não foram completados. O trecho para próxima à rodovia, a retirada deverá ser
o qual foram realizados o EIA e o RIMA é o restrita ao máximo e deve ser feita ape-
mais controverso, já que os outros dois seg- nas em locais realmente necessários.
mentos já são servidos por estradas melhores, Caso seja necessária a remoção, verificar
e o asfaltameto destes teria menos impacto. se os animais que habitam o local têm
condições de se deslocar naturalmente
A tendência do EIA e do RIMA para en- para outras áreas e, caso não tenham, au-
fatizar os benefícios do asfaltamento da BR- xiliá-los no processo” (ECOPLAN, 2002b,
163, minimizando os impactos negativos p. 44-45).
é notável. Isso porque o estudo ambiental
não trata dos impactos principais do proje- As preocupação com os impactos diretos
to, que são o estímulo ao desmatamento e do leito da estrada contrasta nitidamente com
a exploração madeireira em uma larga área os próximos três parágrafos que contêm as re-
influenciada pela melhoria de transporte, comendações do relatório sobre o impacto do
além da migração de grileiros e outros agen- desmatamento, que certamente afeta muitos
tes a partir da BR-163 para outras áreas, tais milhares de vezes mais floresta (e vida selva-
como Apuí, Terra do Meio e para a área da gem) do que o leito da estrada propriamente
“Transgarimpeira”. Projetos rodoviários têm dito. Os parágrafos sobre o desmatamento:

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BR-163: A rodovia Santarém-Cuiabá e o custo ambiental
de asfaltar um corredor de soja na Amazônia 251

“Em relação ao desmatamento são ne- em degradação ambiental e da qualidade


cessárias medidas de maior alcance de vida das populações residentes já es-
do que as atividades normais do DNIT tão instalados atualmente e que a obra,
[Departamento Nacional de Infra- em sí, pouco irá contribuir diretamente
Estrutura de Transportes], assim será ne- para a introdução de novos processos de
cessário que outras agências do governo degradação. Porém, a acessibilidade que
juntem seus esforços ao Ministério dos a rodovia irá incrementar tornará dis-
Transportes e realizem estudos para defi- ponível para as comunidades e grupos
nir um melhor uso de solo nas áreas pró- interessados na região recursos para a
ximas à rodovia, levando em considera- orientação sustentável de seu desenvol-
ção o Zoneamento Ecológico-Econômico, vimento” (ECOPLAN, 2002b, p. 72).
as diretrizes de desenvolvimento apre-
sentadas no EIA/RIMA e as recomenda- Desnecessário dizer, “novos processos de
ções de Embrapa para sistemas alternati-
vos de uso da terra que ajudem a conter degradação” não são necessários para que o
o desmatamento. projeto de asfaltamento da BR-163 tenha um
grande impacto no meio ambiente. Estender
Os órgãos governamentais de fiscalização o alcance dos “velhos” processos como
das atividades extrativistas e poluidoras, desmatamento, exploração madeireira e in-
como IBAMA, devem ser adequados à
nova situação.
cêndios florestais, é mais do que suficiente.
Infelizmente, a “acessibilidade que a rodovia
Também devem ser implantados corredo- irá incrementar” não só resultará em mais
res ecológicos entre as manchas de flores- recursos para uma “orientação sustentável”
ta (.....) garantindo a manutenção da bio- de desenvolvimento, mas também acrescen-
diversidade” (ECOPLAN, 2002b, p. 45).
tará às forças de destruição.
É evidente que os autores do EIA/RIMA Uma enorme pressão tem sido feita para
não tiveram nenhuma idéia sobre como o que se aprove o EIA e o RIMA, e se de segui-
impacto decorrente do asfaltamento da rodo- mento imediato do asfaltamento da rodovia,
via poderia ser controlado, e simplesmente presumivelmente na estação seca de 2005.
transfere a responsabilidade para um órgão Este é um exemplo do que exatamente deve
diferente, neste caso o IBAMA. Que o IBAMA ser evitado para o desenvolvimento amazôni-
“deva” poder controlar a “nova situação” é co. Isto é, a execução de projetos de desenvol-
óbvio, mas é igualmente aparente que isto vimento em rolos compressores irreversíveis
está longe de ser o caso, até mesmo para a por meio de uma decisão política de alto ni-
atual e “velha” situação, sem o asfaltamento vel, depois da qual todos os estudos ambien-
da rodovia. O que seria feito para transformar tais e medidas mitigatórias se tornam mera
ou adequar o IBAMA a nova sitauação não é decoração para dar ao projeto um selo de le-
especificado, embora o endosso explícito do galidade e uma reputação suficiente de que
RIMA para projeto como um todo implica que os cuidados ambientais necessários foram le-
esta transformação seja automática. A afirma- vantados para assegurar a liberação de qual-
ção adicional de seguir as indicações (presu- quer financiamento internacional necessário.
mivelmente futuro) da EMBRAPA (Empresa
Brasileira de Pesquisa Agropecuária) para o POLÍTICAS E CAMINHOS ALTERNATIVOS
uso da terra resultaria em “conter o desmata-
mento” deixa inexplicado quais poderiam ser A necessidade de governança ao longo
estes usos milagrosos da terra. da BR-163 é óbvia. A pergunta de importân-
O RIMA culmina com a sua conclusão cia é se esta deveria ser uma condição prévia
global: para asfaltar a rodovia, ou se (como é im-
plicitamente presumido no EIA/RIMA, por
“Avalia-se que o prognóstico realizado exemplo) isto virá automaticamente como
aponta para a viabilidade ambiental do resultado do asfalto? Infelizmente, a gover-
projeto, considerando, principalmente, nança não vem automaticamente, e mesmo
que os principais processos que resultam quando esta acontece, o descompasso de

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DESTRUIÇÃO E CONSERVAÇÃO
252 DA FLORESTA AMAZÔNICA

tempo é crucial em permitir que o desmata- governança de fato estabelecida, é que se de-
mento irreversível se expanda a partir da ro- veria asfaltar a rodovia. Ainda assim, com
dovia. Uma vez mais, Rondônia provê uma um período de espera a ser iniciado a partir
lembrança triste. O asfaltameto da rodovia do momento em que a área fosse indepen-
BR-364 em Rondônia era para acontecer si- dentemente certificada como sendo sobre
multaneamente com medidas tais como a controle (i.e., com governança).
criação de áreas protegidas e a demarcação
Entre as medidas necessárias tem-se a
de terras indígenas (Goodland, 1985; IBRD,
necessidade de neutralizar os esforços de au-
1981). O asfaltamento foi adiante “a todo va-
toridades locais em promover atividades ile-
por” (até mesmo com adiantamentos finan-
gais. Exemplos são fáceis de achar. Em 2004
ceiros das empresas de construção), enquan-
um trator de esteira da prefeitura do Trairão
to as medidas de mitigação ficaram para trás
foi apreendido pelo IBAMA fazendo estradas
durante anos. Invasões e desmatamento das
áreas a serem protegidas se tornaram um ilegais para exploração madeireira dentro da
fato consumado antes que as atividades de FLONA [Floresta Nacional] de Itaituba. A
mitigação fossem empreendidas (Fearnside, implantação de governança efetiva é neces-
1989b; Fearnside & Ferreira, 1985). sária não só ao longo da BR-163, mas tam-
bém nas áreas para as quais os efeitos da
O esforço para conter a falta do estado BR-163 estão se expandindo, inclusive Apuí
de direito tem que se estender além da vi- e Terra do Meio. Antes de asfaltar a rodovia,
zinhança imediata da rodovia BR-163. Um é preciso ter um programa acelerado para
programa efetivo deve ser implantado para criação de áreas protegidas e de áreas de uso
conter a migração da fronteira “terra-sem- sustentável, tais como FLONAs. Nenhuma
-lei” para locais mais distantes na região. É área pode ser deixada sem destinação espe-
impressionante a frequência de comentários cífica, já que isto inevitavelmente conduz a
de grileiros e outros atores na região insinu- sua apropriação por grileiros.
ando que eles têm um direito dado por Deus
para se apropriar de qualquer terra desocu- A área em questão também sofreu um
pada e subsequentemente conseguir que o retrocesso importante nos esforços para pro-
governo legalize a ocupação. A atitude de teger os povos indígenas e áreas protegidas
que a terra florestada está lá para ser tomada de floresta. Exemplo disso é a redução em
é algo que pode mudar com relativa rapidez, 317.000 ha da terra indígena Baú, em 2003,
mas não sem um momento decisivo. O pa- para satisfazer fazendeiros e os grileiros atu-
ralelo com a ocupação da América do Norte antes na BR-163, que invadiram uma parte
é evidente, o “fechamento da fronteira” em da reserva (ISA, 2003b). Isto constitui um
1890 estando lá o momento decisivo (Turner, precedente muito perigoso, visto que a ex-
1893). O lugar onde isso deve acontecer na pectativa de que as tentativas de invasão de
Amazônia está aqui mesmo na BR-163: não áreas indígenas e unidades de conservação,
se deve esperar até que a última árvore seja no final das contas, não sejam bem-sucedi-
cortada em alguma área mais distante. das é maior proteção que estas áreas têm.
Se considerado o futuro em uma escala A Terra do Meio é reconhecida como
de décadas, o asfaltameto da BR-163 está uma “terra-sem-lei” dominada por tráfico
praticamente garantido, mas a pergunta nes- de drogas, lavagem de dinheiro, grilagem e
te momento é se o asfaltamento deveria se outras atividades ilegais (Castro et al., 2002;
dar agora, no período até 2007, ou se deveria Greenpeace, 2003; ISA, 2003a; Schönenberg,
ser adiado até que os planos atuais de levar 2003). A área é semelhante aos morros do
a região um estado de direito seja efetivado? Rio de Janeiro, onde a polícia somente en-
e ainda se a governança só pode ser conse- tra durante operações pontuais e, os resi-
guida com asfalto? Eu sugiro que pode haver dentes locais têm que se adequar às regras
governança sem asfalto, desde que o gover- dos traficantes de droga para sobreviver. A
no esteja disposto a investir em um esforço necessidade urgente em se ter o controle do
sério para trazer a lei à região. Só depois da governo sobre a Terra do Meio é ilustrado

Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 252 8/18/2022 3:14:58 PM


BR-163: A rodovia Santarém-Cuiabá e o custo ambiental
de asfaltar um corredor de soja na Amazônia 253

por um desmatamento gigantesco ao sul de momento. Até mesmo um posto de fiscaliza-


Uruará, na área entre o rio Iriri e a estrada ção simples na Serra do Cachimbo ainda não
de Canópus, em 2004. Os funcionários do foi estabelecido para inspecionar caminhões
IBAMA em Itaituba se referem à área como de madeira saindo da área na direção sul.
o “revólver”, devido à sua forma sugesti- Em outras palavras, embora o exemplo da
va. Esse desmatamento cobriu uma área de base de IBAMA em Itaituba seja encorajador
6.185 ha, de acordo com o IBAMA e 6.239 ha como um exemplo do que precisa ser feito
de acordo com o INPE (Instituto Nacional de para estabelecer a lei na BR-163, a situação
Pesquisas Espaciais), ambas estimativas ob- mostra o tremendo descompasso que existe
tidas a partir de imagens de satélite. A área entre falar sobre estes problemas e fazer algo
apareceu nas imagens de satélite no curso de para os mudar de fato.
um único mês, demonstrando a velocidade
Os acertos de governanças e medidas
impressionante com que estes investidores
para o estabelecimento da lei na região deve-
podem agir (Venturieri et al., 2004). De acor-
riam ser concretizada antes do asfaltameto
do com funcionários do IBAMA de Itaituba
da rodovia ir adiante. Claramente há forças
que pousaram de helicóptero no local, mais
poderosas que querem asfaltar imediata-
de 100 homens estavam trabalhando na ope-
mente, não importando quais que sejam os
ração de desmatamento em abril de 2004.
impactos. No entanto, a história de projetos
Ter o controle da área requer barrar nu- rodoviários passados, onde a construção da
merosas operações ilegais, inclusive pistas estrada e as medidas mitigatórias suposta-
de pouso ilegais, garimpos de ouro (fre- mente íam ocorrer simultaneamente ao as-
qüentemente em áreas indígenas) e explo- faltamento, oferece ampla justificativa para
ração de mogno. Para isso pe necessária a rejeitar qualquer sugestão que um plano
presença permanente de polícia armada, desse tipo deveria ser adotado aqui.
além de pessoal do IBAMA. O IBAMA tem
A visão do Grupo de Assessoria
uma base em Itaituba do qual uma série de
Internacional (IAG) do Programa Piloto
operações de controle foi lançada durante
para Conservação das Florestas Tropicais do
a estação seca de 2004, usando helicópte-
Brasil (PPG7) relata em seu 21º relatório: “O
ros. Os funcionários jovens e dedicados fi-
IAG sugere uma alternativa que permita um
zeram um progresso exemplar, apesar de
início relativamente rápido da obra, porém
ameaças e da hostilidade dos madeireiros
atrelada a uma condicionante essencial, isto
na cidade. Em novembro de 2004, ameaças
é, a prévia solução da questão fundiária”
ainda mais fortes contra os funcionários do
(IAG, 2004). As palavras operativas aqui são
IBAMA em Itaituba levaram a sede do Órgão
“prévia solução”, significando que o proble-
em Brasília enviar um helicóptero para eva-
ma deve ser resolvido primeiro, não somente
cuar a base (que é um enclave cercado de
que seja o assunto de um anúncio oficial ou
arame farpado). Os funcionários recusaram
de algum plano ou comitê. Até agora, prati-
a oferta de evacuação para deixar claro aos
camente nada aconteceu para lidar com a si-
madeireiros que eles não cedariam a intimi-
tuação fundiária. Certamente é essencial que
dação. Patrulhar uma área com a extensão
o governo fique firme em não legalizar atos
da BR-163 e da Terra do Meio requer várias
ilegais consumados.
bases adicionais do mesmo calibre da base
de Itaituba. Apenas a Terra do Meio tem 7,6 Irei um pouco mais longe. Esperaria que
milhões de hectares de área, mais que o do- outros aspectos da governança fossem im-
bro da área da Bélgica, por exemplo. A ten- plantados, além de resolução da situação
tativa para estabelecer uma base em Novo fundiária, antes de falar em asfaltar a rodo-
Progresso foi mal-sucedida até agora, já que via. Afinal de contas, os problemas fundiá-
a maioria do pessoal do IBAMA acabou fu- rios e ambientais em asfaltar a BR-163, que
gido em face as ameaças. Nenhuma tentati- poderiam ser evitados se o asfaltamento fos-
va de estabeler uma base adicional em Vila se adiado, incluem a invasão de terras indí-
Central, na Terra do Meio foi efetuada até o genas, invasão da Terra do Meio, invasão da

Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 253 8/18/2022 3:14:58 PM


DESTRUIÇÃO E CONSERVAÇÃO
254 DA FLORESTA AMAZÔNICA

área ao oeste da BR-163 por meio da estrada 2004. Desmatamento na Amazônia: Indo Além
Transgarimpeira, invasão da nova reserva da Emergência Crônica. Instituto de Pesquisa
Ambiental da Amazônia (IPAM), Belém, Pará. 87 p.
extrativista de Riozinho de Anfrísio, assim
como também FLONAs e outras áreas, além Amazonas em Tempo [Manaus]. 2004a. Grileiros
da perda de oportunidades para estabelecer derrubam milhares de hectares de floresta no Xingu.
áreas protegidas adicionais. 27 de outubro. p. B-8.
Amazonas em Tempo [Manaus]. 2004b. Lula quer a
Embora, na escala de décadas a existên-
retomada de obras paralisadas. 21 de março. p. A-7.
cia de uma estrada asfaltada seja logicamen-
te esperada, isto não significa que deveria Arima, E. & A. Veríssimo. 2002. Brasil em Ação:
ser feito na próxima estação seca, nem no Ameaças e Oportunidades Econômicas na Fronteira
Amazônica. Imazon Série Amazônia No 19.
atual mandato do presidente ou dos gover- Instituto do Homem e Meio Ambiente na Amazônia
nos estaduais. Um argumento que ainda (IMAZON), Anandeua, Pará. 22 p.
pode ser dado é de que o custo ambiental
Barbosa, R.I. & P.M. Fearnside. 1999. Incêndios na
de asfaltar a estrada nos próximos anos é de-
Amazônia brasileira: Estimativa da emissão de
masiadamente alto, e que, ao invés disso, o gases do efeito estufa pela queima de diferentes
asfaltamento da BR-163 deveria ser adiada ecossistemas de Roraima na passagem do evento “El
até que a área apresentasse um histórico de Niño” (1997/98). Acta Amazonica 29(4): 513-534.
governança estabelecida. Bonham-Carter, G. 1994. Geographic Information
Systems for Geoscientists: Modeliing with GIS.
Pergamon, New York, E.U.A. 414 p.
AGRADECIMENTOS
Brasil, GT-Desmatamento (Grupo Permanente de
Agradeço ao Conselho Nacional do Trabalho Interministerial para a Redução dos
Desenvolvimento Científico e Tecnológico Índices de Desmatamento da Amazônia Legal).
(CNPq) pelo apoio financeiro para vi- 2004. Plano de Ação para a Prevenção e Controle do
sitar a BR-163 (Proc. 52.0177/2003-7 a Desmatamento da Amazônia Legal. Presidência da
República, Casa Civil, Brasília, DF. 156 p.
Maurício Torres). O Conselho Nacional de
Desenvolvimento Científico e Tecnológico Castro, E.R., R. Monteiro & C. P. Castro. 2002. Relatório:
(CNPq AI 470765/01-1) e o Instituto Nacional Atores e Relaçoes Sociais em Novas Fronteiras na
Amazõnia; Novo Progresso, Castelo de Sonhos e
de Pesquisas da Amazônia (INPA PPIs1-3620
São Félix do Xingu. Estudo sobre dinâmicas sociais
& 1-1005) também contribuíram com apoio na fronteira, desmatamento e expansão da pecuária
financeiro. R.I. Barbosa, P.M.L.A. Graça, B. na Amazônia. Trabalho de Consultoria prestado ao
Soares Filho e M. Torres fizeram comentá- Banco Mundial (Contrato – 23584 e 388135 - de
rios valiosos. Agradeço a P.M.L.A. Graça, 18/01/2002), World Bank, Brasília, DF. 141 p.
A. Carneiro e J. Costa por ajuda com as Cochrane, M.A. 2003. Fire science for rainforests. Nature
figuras. Uma versão anterior desta discus- 421:913-919.
são foi apresentada ao Grupo de Trabalho
Cochrane, M.A., A. Alencar, M.D. Schulze, C.M. Souza
Interministerial sobre Desmatamento (Casa Jr., D.C. Nepstad, P. Lefebvre & E.A. Davidson. 1999.
Civil). Este trabalho é traduzido de Fearnside Positive feedbacks in the fire dynamic of closed
(2007), atualizado de Fearnside (2005b). canopy tropical forests. Science 284: 1832-1835.
Convênio DNIT/IME. 2005. Estudos De Viabilidade
LITERATURA CITADA Técnico-Econômica Consernantes à Construção
da BR-163/MT/PA Trecho Guarantã-do-Norte/
Alencar, A., Micol, L., Reid, J., Amend, M., Oliveira, M., MT – Santarém/PA. Ministério dos Transportes,
Zeidemann, V., de Sousa, W. C. 2005. O asfaltameto Departamento Nacional de Infra-Estrutura de
da BR-163 e os desafios à sustentabilidade: Transportes (DNIT) & Ministério da Defesa, Instituto
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Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 254 8/18/2022 3:14:58 PM


BR-163: A rodovia Santarém-Cuiabá e o custo ambiental
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DESTRUIÇÃO E CONSERVAÇÃO
256 DA FLORESTA AMAZÔNICA

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Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 258 8/18/2022 3:14:58 PM
CAPÍTULO

14
Desmatamento na Amazônia:
Dinâmica, impactos e controle

Philip M. Fearnside
Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia – INPA
Av. André Araújo, 2936 – CEP: 69.067-375, Manaus, Amazonas, Brasil.
E-mail: pmfearn@inpa.gov.br

Versão original:
Fearnside, P.M. 2006. Desmatamento na Amazônia: Dinâmica, impactos e controle. Acta
Amazonica 36(3): 395-400. https://doi.org/10.1590/S0044-59672006000300018

259
Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 259 8/18/2022 3:15:05 PM
DESTRUIÇÃO E CONSERVAÇÃO
260 DA FLORESTA AMAZÔNICA

RESUMO DESMATAMENTO
O desmatamento na Amazônia procede a O desmatamento na Amazônia brasi-
um alto ritmo por várias razões, muitas das leira tem aumentado continuamente desde
quais dependem de decisões do governo. O 1991, variando de acordo com as mudanças
desmatamento leva à perda de serviços am- relacionadas às forças econômicas (Fig. 1).
bientais, que têm um valor maior que os Estas mudanças incluem um pico no desma-
usos pouco sustentáveis que substituem a tamento em 1995, resultado do Plano Real,
iniciação em 1994 e uma queda em 2005,
floresta. Estes serviços incluem a manuten-
resultado de taxas de câmbio desfavoráveis
ção da biodiversidade, da ciclagem de água e
para exportações, combinado com a “ope-
dos estoques de carbono que evitam o agra- ração Curupira” para reprimir a exploração
vamento do efeito estufa. Retroalimentações madeireira ilegal em Mato Grosso, junto com
entre as mudanças climáticas e a floresta, por criação de reservas e uma de área interditada
meio de processos tais como os incêndios no Pará após o assassinato da Irmã Dorothy
florestais, a mortalidade de árvores por seca Stang. É provável que o desmatamento futu-
e calor e a liberação de estoques de carbono ro aumente ainda mais rapidamente por cau-
no solo, representam ameaças para o clima, sa da constante expansão da rede de estra-
a floresta e a população brasileira. Eventos das. Decisões para construir ou pavimentar
recentes indicam que o desmatamento pode rodovias têm conseqüências de longo alcan-
ser controlado, tendo a vontade política, ce, condenando a floresta circunvizinha ao
pois os processos subjacentes dependem de desmatamento (por exemplo, Ferreira et al.,
decisões humanas. 2005; Soares-Filho et al., 2004, 2005).
Os atores e as forças que conduzem ao
PALAVRAS CHAVE Aquecimento global, desmatamento variam entre partes diferen-
Biodiversidade, Desmatamento, Carbono, tes da região, e variam ao longo do tempo.
Cíclo hidrológico, Efeito estufa, Serviços Em geral, os grandes e médios fazendeiros
ambientais respondem pela grande maioria da atividade

Figura 1. Taxas anuais


de desmatamento na
Amazônia brasileira
obtidas de dados do
satélite LANDSAT.
As taxas de 1978 a
1988 são uma média
durante este período
antes do começo do
monitoramento anual
(Fearnside, 1993).
Taxas de 1989 em
diante são do Instituto
Nacional de Pesquisas
Espaciais, incluindo
estimativas revisadas
para o período 2002-
2004 (Brasil, INPE,
2006). A taxa para
1993 e 1994 é uma
média durante aquele
período (nenhuma
estimativa existe para
1993).

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Desmatamento na Amazônia:
Dinâmica, impactos e controle 261

do desmatamento, mas os pequenos agricul- IMPACTOS


tores podem atuar como forças importantes
nos lugares onde estão concentrados. Uso sustentável
Em Mato Grosso, grandes plantações de Os impactos do desmatamento incluem
soja têm se alastrado em direção ao norte a a perda de oportunidades para o uso susten-
partir da área de cerrado (Fearnside, 2001). tável da floresta, incluindo a produção de
A parte norte do Mato Grosso e muito das mercadorias tradicionais tanto por manejo
partes sul e leste do Pará são dominadas por florestal para madeira como por extração de
grandes fazendas de pecuária. Em partes do produtos não-madeireiros. O desmatamento,
Pará (tais como focos de desmatamento em também, sacrifica a oportunidade de captu-
Novo Repartimento), pequenos agricultores rar o valor dos serviços ambientais da flo-
representam a força principal. Em Rondônia e resta. A natureza não-sustentável de prati-
ao longo da rodovia Transamazônica no Pará camente todos os usos de terra implantados,
e no Amazonas, pequenos agricultores são numa escala significante em áreas desmata-
agentes importantes. Porém, regionalmente, das, faz com que as oportunidades perdidas
fica claro o domínio de fazendas grandes e de manter a floresta de pé sejam significati-
médias (Fearnside, 2005). Projetos rodoviários vas a longo prazo.
planejados, tais como a reconstrução das ro-
dovias BR-163 (Cuiabá-Santarém) e a BR-319 Biodiversidade
(Manaus-Porto Velho), implicam na abertura
de áreas grandes de floresta para a entrada Os serviços ambientais providos pela ma-
de agentes de desmatamento. O mero anún- nutenção da floresta são muitos. Três grupos
cio de projetos de construção e de melhoria de serviços provêem ampla justificativa para
de rodovias leva a uma corrida especulativa manter áreas grandes de floresta: biodiver-
de terra, com “grileiros” (grandes pretenden- sidade, ciclagem de água e armazenamento
tes ilegais de terra) freqüentemente tomando de carbono (Fearnside, 1997). A Amazônia
posse de áreas extensas em antecipação de brasileira tem um número grande de espé-
cies, embora, para muitos grupos, tanto os
lucros oriundos do rápido aumento do preço
membros e as distribuições são mal conhe-
da terra, uma vez que a rodovia esteja com-
cidos. Esta biodiversidade tem valor signifi-
pleta. A quantidade continuamente crescente
cativo tanto em termos de utilidade tradicio-
de infraestrutura de transporte implantada re-
nal como em termos de valor de existência
presenta uma garantia de níveis significativos
(Fearnside, 2003a). A sociodiversidade tam-
de atividade de desmatamento futuro, na qual
bém é ameaçada pela perda de floresta, já
grande parte fica fora do controle do governo.
que isto elimina culturas indígenas e extra-
A natureza descontrolada do processo de des- tivistas tradicionais tais como seringueiros.
matamento poderia mudar substancialmente
se a vontade política para fazer isto existisse.
O fato de que a maior parte do desmatamen- Água
to é feita por grandes fazendeiros represen- A ciclagem de água é uma função am-
ta uma oportunidade porque significa que a biental importante para todo o Brasil e para
taxa global de desmatamento poderia ser re- os países vizinhos. Os ventos prevalecentes
duzida bastante sem qualquer perigo de que na Amazônia sopram de leste a oeste, tra-
agricultores pobres fossem obrigados a passar zendo para a região a cada ano uma quanti-
fome. A redução da perda de floresta também dade de água calculada em 10 trilhões de m3,
representa uma oportunidade por causa do isto sendo na forma de vapor d’água oriun-
fato que a maior parte do desmatamento é do da evaporação do Oceano Atlântico. Na
para pastagens pouco produtivas, fazendo Amazônia, a evapotranspiração da floresta
com que uma redução significativa na taxa soma 8,4 trilhões de m3/ano, assim permi-
de desmatamento tivesse um custo de opor- tindo a precipitação na região totalizar 15
tunidade pequeno para a economia nacional. milhões de m3/ano, excedendo em 50% o

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DESTRUIÇÃO E CONSERVAÇÃO
262 DA FLORESTA AMAZÔNICA

total que entra na região a partir do oceano do recrescimento de florestas secundárias


(Salati, 2001). A porcentagem de água re- nas áreas desmatadas, mas os outros gases
ciclada aumenta de leste a oeste na região: de efeito estufa, tais como metano (CH4) e
quando a água chega aos Andes, 88% dela já óxido nitroso (N2O), não são. A quantidade
caíram pelo menos duas vezes como precipi- de carbono absorvida como CO2 pelo recres-
tação (Lettau et al., 1979). A água reciclada cimento de florestas secundárias é pequena
é, então, muito importante para transporte quando comparada à emissão inicial, por-
de água da Amazônia para outras regiões. que a biomassa por hectare da floresta se-
O total de água transportado a outras regi- cundária é muito mais baixa que a da flo-
ões pode ser deduzido da diferença entre a
resta primária. A taxa de crescimento de
água que entra (10 trilhões de m3/ano) e a
floresta secundária é lenta porque a maioria
água que flui na foz do rio Amazonas (6,6
das áreas desmatadas é de pastagens degra-
trilhões de m3/ano). A diferença (3,4 trilhões
de m3/ano) deve ser transportado para al- dadas com solo compactado e esgotado de
gum outro lugar. Alguma parte disto escapa nutrientes. Em 2004, quando 27.429 km2 de
da Amazônia, passando por cima do Andes desmatamento aconteceram (Brasil, INPE,
no canto noroeste da região, na Colômbia. 2006), a emissão líquida comprometida so-
Porém, a maior parte da água exportada é mou 495 milhões de toneladas de carbono
redirecionado ao sul quando encontra os CO2-equivalente, enquanto a estimativa de
Andes. Muito disto depois segue para o les- 18.793 km2 para 2005 corresponde a 348 mi-
te, fornecendo água para precipitação no lhões de toneladas (atualizado de Fearnside,
centro-sul do Brasil. A chuva que cai na 2003a). A emissão por unidade de área de
Serra da Mantiqueira e nas outras cadeias de desmatamento é mais que o dobro da quan-
montanhas litorais passa por uma série de tidade calculada no inventário nacional bra-
reservatórios hidrelétricos quando desce, ou sileiro de emissões de gases de efeito estu-
pelo lado ocidental pela bacia do rio da Prata fa (MCT, 2004, pág. 147), em grande parte
ou a leste pelo rio São Francisco. Em 2001 porque o inventário omite componentes da
a porção não amazônica do Brasil sofreu floresta, tais como, as raízes das árvores e
blecautes e racionamento de eletricidade a biomassa morta, e por causa da suposição
devido à falta de água nestes reservatórios. pouca realista de alta absorção de carbono
Estes reservatórios enchem durante algumas
através do recrescimento da floresta secun-
poucas semanas em dezembro e janeiro, no
dária (veja Fearnside & Laurance, 2004).
pico da estação chuvosa na região Sudeste,
que também é o período do ano no geral o A grande emissão líquida de gases de
papel da Amazônia tem a sua contribuição efeito estufa causada pelo desmatamento re-
máxima (veja Fearnside, 2004). Em 2003 os presenta uma oportunidade porque o valor
reservatórios que abastecem São Paulo e Rio em potencial de não desmatar cada hectare é
de Janeiro com água potável alcançaram ní- pelo menos duas ordens de magnitude maior
veis muito baixos; se o começo da estação que o valor que pode ser ganho vendendo
chuvosa tivesse atrasado cerca de 15 dias a mercadorias tradicionais como madeira e
mais teria faltado água potável em ambas as carne bovina (Fearnside, 2003a). Uma deci-
cidades. Claramente, as cidades principais
são em 2001 barrou a concessão de crédito
do Brasil já estão no limite de abastecimento
de carbono por desmatamento evitado sob
de água, e qualquer redução significativa de
o Protocolo de Kyoto durante o período até
transporte de vapor de água da Amazônia
teria sérias conseqüências sociais. 2012. Negociações começaram em novem-
bro de 2005 para estabelecer as regras para
o período seguinte, que começa em 2013.
Carbono
Crédito deste tipo oferece o prospecto de flu-
O desmatamento emite gás carbônico xos monetários que poderiam ajudar manter
(CO2) e outros gases de efeito estufa. Uma a população da região em uma base susten-
parte do CO2 é reabsorvida depois através tável (Fearnside, 2003a).

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Desmatamento na Amazônia:
Dinâmica, impactos e controle 263

RETROALIMENTAÇÃO COM A MUDANÇA DE uniformemente sobre o planeta, e é esperado


CLIMA que a Amazônia seja um dos locais com os
maiores aumentos de temperatura (Stainforth
A floresta amazônica tem uma série de li- et al., 2005). Simulações que presumem alta
gações de retroalimentação com e mudança sensabilidade climática (a quantidade de ele-
climática que representa uma ameaça séria vação da temperatura média global para cada
à existência da floresta e para a continuação unidade de concentração de CO2 adicional na
de seus serviços ambientais. Um mecanis- atmosfera) indicam aumentos de temperatu-
mo é por perda de evapotranspiração, assim ra média tão alto quanto 14o C na Amazônia
reduzindo a precipitação a ponto em que a (Stainforth et al., 2005, p. 405). Isto implica em
floresta deixa de ser o tipo de vegetação fa- picos de temperatura de bem mais de 50o C, o
vorecido pelo clima da região (por exemplo, que não só resultariam em morte da floresta,
Shukla et al., 1990). A floresta seria subs- mas também em aumento na mortalidade hu-
tituída com um tipo de vegetação parecido mana. Projeções mais modestas indicam au-
com o cerrado, por meio da savanização. Até mentos de temperatura de aproximadamente
60% da floresta amazônica no Brasil poderia 6o C, que também seriam catastróficos.
ser transformado em cerrado pelo processo
de savanização (Oyama & Nobre, 2003). Os resultados de Stainforth et al. (2005)
indicando aumento de 14o C na Amazônia
Uma ameaça separada resulta do aumen- até aproximadamente 2070 sob alta sensiti-
to da freqüência do fenômeno de El Niño. Os vidade climática está defasada devido a revi-
eventos El Niño aumentaram em freqüência sões para baixo das probabilidades de valo-
desde 1976, indicando uma mudança no siste- res muito altos para a sensitividade climática
ma climatológico global (Nicholls et al., 1996). (Hegerl et al., 2006). Presumindo proporcio-
O fenômeno El Niño causa secas na Amazônia nalidade, o aumento de 14o C seria alcança-
que, por sua vez, provê condições para incên- do 30 anos mais tarde em 2100.
dios destrutivos, como os que ocorreram em
Roraima em 1997-1998 (Barbosa & Fearnside, Espera-se atualmente que o sistema de
1999). Eles também conduzem à perda de clima global se mantenha em um El Niño
carbono de ecossistemas de floresta em pé, permanente caso o efeito estufa continue au-
mesmo na ausência de fogo (Tian et al., 1998; mentando sem mitigação. Este resultado foi
Camargo et al., 2004). A mudança continua- encontrado primeiro pelo modelo do Hadley
da no equilíbrio entre anos El Niño, quando a Center, do Escritório Meteorológico do Reino
floresta perde carbono, e os anos do tipo “nor- Unido (Cox et al., 2000, 2004). Inicialmente,
mal” e de La Niña, quando a floresta pode ga- os outros modelos de clima global não mos-
nhar carbono, implica em uma perda a longo travam isto, mas agora foram acrescentadas a
prazo de quantias grandes de carbono. Vários estes modelos as retroalimentações de siste-
estudos apontam para o efeito estufa como a ma acoplado biosfera-atmosfera que foram in-
causa subjacente do aumento de El Niño (por cluídas primeiro no modelo do Hadley Center,
exemplo, Timmerman et al., 1999). O aumen- com o resultado que hoje a maioria dos mo-
to contínuo do aumento do efeito estufa, como delos (5 entre 7) apresentam a formação do
projetado por todos os modelos climáticos na El Niño permanente. O modelo do Hadley
ausência de mudanças significantes nas emis- Center, que projeta o cenário mais catastrófi-
sões antropogênicas mundiais, implica em co para a Amazônia, também é o modelo que
eventos de El Niño que são mais freqüentes e, melhor representa o clima atual desta região
provavelmente, mais severos. (J.A. Marengo, declaração pública, 2005).
O efeito estufa pode causar a morte da A morte da floresta amazônica contri-
floresta amazônica diretamente, além de seu buiria numa retroalimentação significativa
efeito provável por meio do El Niño. Médias de para intensificar o efeito estufa, tanto por li-
temperatura mais altas exigem que cada árvore beração de carbono da biomassa da floresta
use mais água para executar a mesma quantia (Huntingford et al., 2004) como por libera-
de fotossíntese. O efeito estufa não acontece ção de carbono do solo (Huntingford et al.,

Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 263 8/18/2022 3:15:06 PM


DESTRUIÇÃO E CONSERVAÇÃO
264 DA FLORESTA AMAZÔNICA

2004; Jones et al., 2005). Isto eleva o espec- ser a redução da velocidade de movimento da
tro do “efeito estufa fugitivo”, onde o aqueci- Corrente Marinha do Golfo, como resultado
mento global escapa de controle de humano da debilitação da circulação termohalina (por
e continua aumentando independentemente exemplo, Bryden et al., 2005). É esperado que
de quaisquer cortes nas emissões antropo- o efeito estufa debilite esta circulação e, além
gênicas que possam ser alcançadas. Uma disso, pode ser esperado que o aquecimento
pesquisa recente indica que ocorreram per- geral dos oceanos faça massas de água morna
das de estoques de carbono do solo na Grã- exceder as temperaturas de limiar com maior
Bretanha mesmo com o modesto nível atu- freqüência em geral, incluindo tanto as anoma-
al de aumento da temperatura global desde lias de temperatura no Atlântico, assim como
1900, de apenas 0,8oC Hansen et al., 2006). o aquecimento da água superficial do Oceano
Os estoques globais de carbono contidos nos Pacífico que ativa o fenômeno El Niño.
solos, como os da Amazônia, dê a este, o
potencial para alcançar o limiar para o efeito
estufa fugitivo (Fearnside, 2010). CONTROLE DO DESMATAMENTO
Uma indicação da capacidade de mudan- O controle do desmatamento é essencial
ça climática para liberar grandes estoques de para evitar os impactos da perda de flores-
carbono independente da vontade humana foi ta. Muito do processo do desmatamento
provida pela seca na Amazônia em 2005. Esta está atualmente fora de controle do governo
seca causou níveis de água muito baixos em to- (por exemplo, Torres, 2005). Não obstante, a
dos os afluentes do lado sul do rio Amazonas, ação de governo já mostrou ter uma influên-
assim como também nas calhas principais dos cia notável sobre as taxas de desmatamen-
rios Amazonas e Solimões. Incêndios afetaram to onde foram aplicados esforços para fazer
muitas áreas que não estão historicamente su- cumprir a legislação indo mais além do que
jeitas a fogos, inclusive a Reserva Extrativista uma base simbólica. Um exemplo histórico
Chico Mendes, no Acre. A seca não foi causa- importante é o programa de licenciamento
da pelo El Niño, mas sim por uma massa de e controle de desmatamento executado pelo
água morna no Oceano Atlântico (Fearnside, governo do estado de Mato Grosso de 1999
2006a). Na época do período de pico da seca a 2001 (Fearnside, 2003b). Este alcançou re-
na Amazônia, a zona de convergência inter- duções significantes no desmatamento no
tropical (ITCZ) ficava situada aproximadamen- estado como um todo, como mostrado pe-
te na latitude de 12o N, ou seja, em cima da las tendências em municípios onde uma fra-
área de água morna. A energia da água mor- ção significativa da floresta continuava em
na causou a intensificação da ascensão de ar pé exposta ao desmatamento. A explosão
no ITCZ, assim aumentando a circulação de subseqüente do desmatamento no estado
Hadley, inclusive a descida do ar seco em cima que resultou de uma mudança no governo
das cabeceiras dos afluentes do lado sul do estadual realça a importância de políticas
rio Amazonas. Anomalias de temperatura no de governo por estas tendências (Fearnside
Atlântico seguem um ciclo natural de 60 anos, & Barbosa, 2004). Em 2005, o Instituto
e este ciclo estava em um ponto alto em 2005 Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos
(Marengo & Nobre, 2005). De junho a outubro Naturais Renováveis (IBAMA) empreendeu a
de 2005 a temperatura média da superfície do “Operação Curupira” para reprimir a explo-
mar no Atlântico Norte Tropical era 0,92oC aci- ração ilegal de madeira, que também parece
ma da média para 1901-1970; a metade disto ter contribuído para reduzir a velocidade de
(0,45o C) era devido ao aquecimento global, desmatamento naquele ano, embora outros
o resto sendo do ciclo natural de 60 anos (< fatos como baixos preços da soja e da carne
0,1o C), o efeito residual de El Niño no ano bovina também contribuíram.
anterior (0,2oC) e de fenômenos com variabili- Além da repressão ao desmatamento em
dade de ano a ano (0,2o C) (Trenberth & Shea, áreas onde o desmatamento já é bem avan-
2006). Um fator adicional que contribui à acu- çado em propriedades privadas, decisões de
mulação de água morna no Atlântico pode governo terão grande efeito sobre a taxa de

Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 264 8/18/2022 3:15:06 PM


Desmatamento na Amazônia:
Dinâmica, impactos e controle 265

desmatamento regional quando obras de in- ecossistemas de Roraima na passagem do evento


fraestrutura de transporte forem aprovadas “El Niño” (1997/98). Acta Amazonica 29: 513–534.
e construídas. O estudo de impacto ambien- Brasil, INPE (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais).
tal (EIA/RIMA), exigido para projetos de ro- 2006. Estimativas Anuais desde 1988: Taxa de
dovia desde 1986, ainda está sendo testado desmatamento anual (km2/ano). INPE, São José dos
Campos, São Paulo. Disponível em: http://www.obt.
quando a pressão é grande para reconstru- inpe.br/prodes/prodes_1988_2005.htm
ção de rodovias, como no caso da rodovia
BR-319 (Fearnside & Graça, 2006). Até agora, Bryden, H.; Longwort, H. & Cunningham, S. 2005.
Slowing of the Atlantic meridional overturning
estes estudos não refletem os impactos prin- circulation at 25 N. Nature 438: 665-657.
cipais de projetos que são o custo ambien-
tal do desmatamento que estende além das Cox, P.M.; Betts, R.A.; Collins, M.; Harris, P.; Huntingford,
C. & Jones, C.D. 2004. Amazonian dieback under
rotas de rodovias e o aumento de migração climate-carbon cycle projections for the 21st century.
para áreas novas quando o acesso ficar mais Theoretical and Applied Climatology 78: 137-156.
fácil (Fearnside, 2002).
Cox, P.M.; Betts, R.A.; Jones, C.D.; Spall, S.A. &
O elemento fundamental para reduzir a Totterdell, I.J. 2000. Acceleration of global warming
velocidade do desmatamento, e um dia pa- due to carbon-cycle feedbacks in a coupled climate
model. Nature 408: 184-187.
rá-lo, é a vontade política para fazer isto.
Fluxos monetários dos serviços ambientais Fearnside, P.M. 1993. Desmatamento na Amazônia:
da redução da velocidade do desmatamen- Quem tem razão nos cálculos—o INPE ou a NASA?
Ciência Hoje 16(96): 6-8.
to poderiam prover a motivação para isto,
assim como a motivação poderia vir dos im- Fearnside, P.M. 1997. Serviços ambientais como estratégia
pactos diretos do Brasil, tais como a perda para o desenvolvimento sustentável na Amazônia
rural. p. 314-344 In: C. Cavalcanti (ed.) Meio Ambiente,
de provisão de vapor de água para os princi- Desenvolvimento Sustentável e Políticas Públicas. São
pais centros de população do País na região Paulo, SP: Editora Cortez. 436 p.
centro-sul. A cima de tudo, os líderes do País
Fearnside, P.M. 2001. Soybean cultivation as a threat
têm que ter a confiança que a ação de gover- to the environment in Brazil. Environmental
no realmente pode frear, ou mesmo parar, Conservation 28: 23-38.
o desmatamento. Existe uma forte tendên-
Fearnside, P.M. 2002. Avança Brasil: Environmental and
cia para as pessoas verem a Amazônia em social consequences of Brazil’s planned infrastructure in
termos fatalistas, incluindo tanto o desmata- Amazonia. Environmental Management 30(6): 748-763.
mento como as conseqüências da mudança
Fearnside, P.M. 2003a. A Floresta Amazônica nas
climática. Mas estas mudanças dependem de Mudanças Globais. Manaus, AM: Instituto Nacional
decisões humanas. Nós temos livre-arbítrio, de Pesquisas da Amazônia-INPA, 134 p.
e nós temos que ter a coragem para usá-lo.
Fearnside, P.M. 2003b. Deforestation control in Mato
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Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 265 8/18/2022 3:15:06 PM


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Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 266 8/18/2022 3:15:06 PM


CAPÍTULO

15
BR-319: A rodovia Manaus-Porto Velho e
o impacto potencial de conectar o arco de
desmatamento à Amazônia central

Philip M. Fearnside
Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia – INPA
Av. André Araújo, 2936 – CEP: 69.067-375, Manaus, Amazonas, Brasil.
E-mail: pmfearn@inpa.gov.br

Tradução atualizada de:


Fearnside, P.M. & P.M.L.A. Graça. 2006. BR-319: Brazil’s Manaus-Porto Velho Highway and
the potential impact of linking the arc of deforestation to central Amazonia. Environmental
Management 38(5): 705-716. https://doi.org/10.1007/s00267-005-0295-y

Tradução atualizada original:


Fearnside, P.M. & P.M.L.A. Graça. 2009. BR-319: A rodovia Manaus-Porto Velho e o impacto
potencial de conectar o arco de desmatamento à Amazônia central. Novos Cadernos NAEA 12(1):
19-50. https://doi.org/10.5801/ncn.v12i1.241

267
Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 267 8/18/2022 3:15:13 PM
DESTRUIÇÃO E CONSERVAÇÃO
268 DA FLORESTA AMAZÔNICA

RESUMO A RODOVIA BR-319


A rodovia BR-319 unia Manaus (Amazonas) História da rodovia
e Porto Velho (Rondônia) até ficar intransitável
em 1988. O governo agora propõe a reconstru- Em 1970, a ditadura militar brasileira ini-
ção e pavimentação, que facilitaria a migração ciou a construção da rodovia Transamazônica,
do “Arco de Desmatamento” para novas fron- dividindo ao meio a região amazônica de leste
teiras ao norte. O propósito da rodovia, que é para oeste. Ao mesmo tempo, uma vasta rede
o transporte da produção das fábricas da Zona de rodovias adicionais foi anunciada. A rede de
Franca de Manaus para São Paulo. Este seria estradas planejadas excedeu em muito a capaci-
mais bem atendido enviando os contêineres dade financeira do governo, mesmo no período
para Santos em navios. A falta de uma ligação denominado a época do “milagre econômico”. A
terrestre atualmente representa uma barreira enxurrada de estradas planejadas também exce-
significante à migração para as regiões central deu em muito aquilo que seria justificado pelos
e norte da Amazônia. O discurso relativo à re- benefícios econômicos da melhoria de trans-
construção da rodovia sistematicamente supe- porte. Isto, porque o programa de construção
restima os benefícios da rodovia e subestima de estradas estava, em parte, sendo incentivado
seus impactos, particularmente, o efeito de fa- por questões de controle territorial ao invés de
cilitar migração do “Arco de Desmatamento” priorizar as questões econômicas. Em 1971, um
da parte sul da região amazônica para novas Decreto-Lei (No. 1.164) deu o controle ao gover-
e mais distantes fronteiras ao norte. Para ate- no federal todas as terras localizadas até 100 km
nuar estes impactos potenciais seria necessá- das rodovias planejadas, até mesmo se a “rodo-
ria uma série de mudanças fundamentais an- via” fosse nada mais do que uma linha riscada
tes de pavimentar a rodovia. Estas mudanças no mapa. O anúncio da rede de estradas resul-
incluem o zoneamento ecológico-econômico, tou em uma vasta área, somando 2,2 milhões
de km2 (quase a metade da Amazônia Legal),
a criação de reservas, e o aumento de gover-
sendo transferida do controle estadual ao fede-
nança em várias formas, inclusive programas
ral (Brasil, PIN, 1972). Este decreto foi revoga-
de licenciamento e controle do desmatamento.
do em 1987 (Decreto-Lei No. 2.375), tornando
Tal iniciativa, também, requer mudanças mais
qualquer terra dentro de 100 km de uma rodovia
profundas, especialmente, o abandono da tra-
que não tivesse ainda sido alocada a um pro-
dição existente há muito no Brasil de conceder
pósito específico como “terra devoluta” sobre
a posse da terra a pequenos agricultores que
controle estadual. Isto afetou uma parte signi-
invadem terras públicas. Organizar a ocupa-
ficativa das terras ao longo da BR-319, diferente
ção amazônica, de tal modo que a construção
do caso de outras rodovias, tais como a rodovia
e a melhoria de estradas deixem de conduzir
Transamazônica e a BR-163, onde as terras nesta
inexoravelmente ao desmatamento explosivo
faixa foram reivindicadas por órgãos federais
e descontrolado, deveria ser uma condição
prévia para a aprovação da BR-319 e de outras A rodovia BR-319 possui uma de extensão
estradas projetadas, para quais são esperados 877 km, no sentido norte a sul de Manaus a
grandes impactos. Estes projetos quando con- Porto Velho (Figura 1), e foi construída em 1972
duzidos de maneira adequada poderiam pro- (680 km) e 1973 (197 km). A política governa-
ver o ímpeto necessário para deixar para trás mental, na época, exigia que todas as rodovias
o costume de apropriação de terras públicas, fossem primeiramente construídas como estra-
tanto por pequenos invasores como por grilei- das sem pavimento, e apenas seriam pavimen-
ros (grandes reivindicadores ilegais de terra). tadas depois de decorrido um período de anos
Retardar a reconstrução desta rodovia seria e se justificado pelo tráfego na estrada. No caso
aconselhável até que mudanças apropriadas da BR-319, porém, foi aberta uma exceção espe-
pudessem ser efetuadas. cial, e a rodovia foi pavimentada imediatamen-
te na hora da construção. A pressa era tanta,
PALAVRAS CHAVE Amazônia, BR-319, que a estrada foi construída na estação chuvosa
Desmatamento, Rodovias, Manaus, Porto utilizando a extraordinária prática de proteger o
Velho, Estradas asfalto fresco com lonas de plástico.

Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 268 8/18/2022 3:15:13 PM


BR-319: A rodovia Manaus-Porto Velho e o impacto potencial
de conectar o arco de desmatamento à Amazônia central 269

Figura 1. Mapa
do Brasil com a
localização das
rodovias federais
amazônicas (linhas
tracejadas).

A alta prioridade dada à pavimentação Amazonas à categoria de província, quan-


inicial da rodovia é explicada melhor como do este deixou de pertencer à Província
parte de um pacote informal de obras pú- do Grão Pará e se tornou independente.
blicas e programas federais que foram con- Adicionalmente, o Estado do Amazonas
cedidos ao Estado do Amazonas, como um recebeu do governo federal a Zona Franca
tipo de compensação aos investimentos fe- de Manaus (SUFRAMA), a hidrelétrica de
derais mais substanciais no Estado de Pará Balbina e as rodovias BR-174 e BR-319.
(por exemplo, Mahar, 1976, p. 360). A sede Nos anos 1970, a BR-319 teve pouco trá-
da Superintendência do Desenvolvimento fego, já que a produção industrial de Manaus
da Amazônia (SUDAM) foi estabelecida em foi exportada de forma mais barata por meio
Belém, e a grande maioria dos projetos pe- de navios, e até via aérea. Rondônia ainda
cuários e outros financiados pela agência es- era o destino da maioria dos migrantes do
tava localizada no Pará. O Estado do Pará Paraná e de outros estados que seguiram pela
adquiriu também a maior parte da rodovia rodovia BR-364 (Cuiabá-Porto Velho). Por
Transamazônica, incluindo todas as suas sua vez, até que Rondônia estivesse repleta
áreas de colonização, além da construção da e transbordando de migrantes, a BR-319 se
rodovia BR-163 e a pavimentação da rodovia degradou a ponto que as condições de trafe-
Belém-Brasília (BR-010), seguida logo após gabilidade inibiram a migração adicional ao
pela hidrelétrica de Tucuruí. O Amazonas é norte. Porém, até que o serviço de transpor-
um rival tradicional do Pará, e ainda celebra, te por ônibus de Porto Velho para Manaus
como feriado estadual, o dia 5 de setembro, fosse suspenso em 1988, muitos migrantes
data de aniversário da elevação do estado do seguiram rumo a Manaus e, especialmente,

Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 269 8/18/2022 3:15:13 PM


DESTRUIÇÃO E CONSERVAÇÃO
270 DA FLORESTA AMAZÔNICA

a Roraima, afetando significativamente o geral, os discursos políticos na Assembleia


seu crescimento. As precárias condições de Legislativa do Estado do Amazonas dire-
trafegabilidade da BR-319 fizeram com que cionavam a culpa em um suposto complô
fosse mais fácil para os migrantes, que dei- contra o projeto por donos de barcaças que
xavam Rondônia, irem para o Acre ou para transportam carga entre Manaus e Porto
a parte sul do Estado do Amazonas do que Velho (Amazonas em Tempo, 2005a). Por ou-
para Manaus ou para Roraima. A alterna- tro lado, o governador do Estado culpou os
tiva ao transporte rodoviário era uma via- “interesses econômicos poderosos que estão
gem de barco de quatro dias de Porto Velho preocupados com o que o Amazonas está al-
a Manaus, o que representou uma barreira cançando comparado com o resto do País”
significante para os paranaenses, não acos- (Amazonas em Tempo, 2005b).
tumados à navegação, que constituíam a
maior parte da população de migrantes de Planos para reconstrução
Rondônia. A camada fina de asfalto na BR-
319 se tornou uma série quase contínua de A reconstrução e a repavimentação da
buracos que são, ambos, mais difícil de con- BR-319 foram planejadas e adiadas repetida-
sertar e mais danoso aos veículos do que mente. O projeto foi incluído inicialmente no
seria o caso de uma estrada sem pavimen- programa Brasil em Ação, de 1996-1999, mas
to. Muito da rota teve que ser desviado para foi retirado pelo coordenador do programa,
trilhas temporárias ao lado da estrada, mais José Paulo Silveira (apesar de objeções feitas
do que o próprio leito da rodovia. O trecho por políticos do Estado do Amazonas) por
da estrada de Porto Velho até Humaitá per- causa da baixa justificativa econômica em
manece trafegável, desde que a rodovia foi comparação com as centenas de outros pro-
construída, e os primeiros 200 km ao nor- jetos no programa (J.P. Silveira, declaração
te de Humaitá foi colonizado por pequenos pública, 1999; Brasil, Programa Brasil em
agricultores em lotes de 100 ha, distribuídos Ação, 1999). A proposta de pavimentar a ro-
pelo Instituto Nacional de Colonização e dovia foi incluída subsequentemente no pro-
Reforma Agrária (INCRA). A maioria destes grama “Avança Brasil” de 2000-2003 (Brasil,
lotes já mudou de proprietário uma ou mais Programa Avança Brasil, 1999; Consórcio
vezes até agora, e está consolidada em pe- Brasiliana, 1998), mas somente os 158 km
quenas fazendas (“fazendolas”) de 500 ha mencionados acima foram pavimentados
ou mais. A rodovia permanece pelo menos de fato. No Plano Plurianual 2004-2007, ou
marginalmente transitável nos primeiros 100 “PPA”, lançado sob a presidência de Luiz
km, e em grau menor nos 100 km seguintes. Inácio Lula da Silva (Brasil, MPOG, 2004),
o projeto da BR-319 aparece listado como
Em 2001, os primeiros 58 km da BR- previsto para “depois de 2007”, significando
319, depois do entroncamento com a ro- que não seria construído durante o termo do
dovia Transamazônica, a 30 km ao oeste plano. No entanto, o ministro dos transpor-
de Humaitá, foram repavimentados, assim tes, à época, Alfredo Nascimento (ex-prefei-
como os 100 km no extremo norte da rodo- to de Manaus) fez do projeto uma alta priori-
via, no sentido Manaus-Careiro Castanho. dade, prometendo começar a construção na
Um trecho de 340 km no meio da rota per- estação seca de 2005 (Banega & Simonetti,
manece intransitável, embora comboios oca- 2005). O partido político de Nascimento
sionais de veículos fizessem este percurso (Partido Liberal: PL) fez uso exaustivo das
no pico da estação seca em alguns anos. A promessas dele sobre a reconstrução da ro-
relutância em gastar recursos limitados na dovia em anúncios televisivos em Manaus,
reconstrução da BR-319 é, indubitavelmen- em preparação para a sua candidatura na
te, um resultado combinado da existência próxima eleição para governador, em ou-
de uma via fluvial (hidrovia) no rio Madeira tubro de 2006. A BR-319 também tem sido
paralela à rodovia, e o custo muito alto de tema proeminente nas preparativas da can-
manter uma rodovia em uma região aonde a didatura do Nascimento para as eleições ao
chuva média anual chega até 2.200 mm. Em cargo de governador, em outubro de 2010.

Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 270 8/18/2022 3:15:13 PM


BR-319: A rodovia Manaus-Porto Velho e o impacto potencial
de conectar o arco de desmatamento à Amazônia central 271

A pavimentação da rodovia BR-319 tem se tornaram os principais focos de desmata-


grande apelo público em Manaus. Em mar- mento no Amazonas desde 2002, tais como
ço de 2005 todos os 24 deputados estaduais as áreas entre Humaitá e Lábrea e entre
do Amazonas assinaram um “manifesto de Humaitá e Apuí. A malária é endêmica e de-
apoio” pedindo ao Governo Federal pavimen- bilitante ao longo da rota da rodovia; porém,
tar a rodovia imediatamente (Amazonas em isto também não pode explicar o avanço mo-
Tempo, 2005a). Em Manaus a rodovia é vis- desto do desmatamento, desde a construção
ta, geralmente, como um meio mais barato de original, uma vez que a doença afeta outras
exportar produtos industriais para São Paulo áreas com taxas de desmatamento altas.
e outros grandes mercados no centro sul bra- A agricultura ao norte do trajeto é pouco
sileiro, e como uma rota mais barata para os promissora por causa de solos menos férteis.
habitantes da cidade viajar para estas áreas, A porção do norte é ocupada por solos hi-
por exemplo, para visitas de família. O fato da dromórficos, que são menos desejáveis para
estrada facilitar viagens em ambas as direções, agropecuária do que o argissolo (podzólico
conduzindo assim a migração exacerbada para vermelho-amarelo) que ocupa a maior parte
Manaus, praticamente não é mencionado. dos primeiros 300 km ao norte de Humaitá
(Brasil, Projeto RADAMBRASIL, 1973-1982,
IMPACTOS POTENCIAIS vols. 17 & 18). Há uma predominância maior
de solo hidromórfico no lado oeste do que no
Impactos ao longo da rota da rodovia lado leste da estrada. Apesar de limitações
agrícolas, a porção do norte da rodovia tem
A pavimentação da BR-319 conduziria a sido o foco de projetos de assentamento, tais
transformação da área adjacente da rota da como, por exemplo, Panelão e Igarapé Açu,
rodovia. Representantes dos setores de cons- no município de Castanho Careiro. Embora
trução industrial e civil em Manaus argu- solos inférteis sirvam para desestimular um
mentam que, como a rodovia existiu durante pouco o desmatamento, a noção de que isto
muito tempo, a reconstrução e a pavimen- confere certa imunidade ao desmatamento é
tação da mesma não teriam praticamente errônea como mostrado através de exemplos
nenhum efeito ambiental porque “o que era frequentes (e.g., Fearnside, 1986a).
para degradar já foi degradado” (Almeida,
2005). Infelizmente, experiências anterio- Algumas indicações de aumento poten-
cial de desmatamento ao longo da BR-319 são
res de construção e melhoria de estradas
evidentes. Houve várias aquisições de terra
na Amazônia resultaram em um padrão de
em antecipação à pavimentação, com im-
desmatamento que se espalha para além das
plantação de agricultura intensiva de capital
vias de acesso quando estabelecidas, e que
(arroz, seguido por soja). Segundo relatos de
se aceleram quando estas são melhoradas
moradores locais, uma propriedade a 120 km
(Laurance et al., 2001, 2002; Nepstad et al.,
e várias áreas a 200 km ao norte de Humaitá
2000, 2001; Soares-Filho et al., 2004).
foram compradas por investidores maiores
O fato de ter ocorrido pouco desma- provenientes de Mato Grosso. Porém, em
tamento desde a época em que a rodovia 2005 a rentabilidade agrícola estava em um
BR-319 foi aberta inicialmente, às vezes, é ponto econômico baixo, com quedas signifi-
sugerido como indicativo de que esta região cativas nos preços de arroz, soja e carne bo-
sofreria pouco impacto se a estrada fosse vina que causaram perdas para agricultura
reconstruída e repavimentada. A falta de e pecuária em toda a Amazônia. Preços em
desmatamento ao longo da rota é atribuí- mercados globalizados e outros fatores eco-
da por alguns à chuva excessiva que torna nômicos, incluindo a taxa de câmbio do Real
a agropecuária menos produtiva (Schneider frente ao Dólar americano, seguem ciclos e
et al., 2000) e às desvantagens econômicas podem ser esperados que voltem aumentar
da longa distância até os mercados. Porém, a pressão por desmatamento em níveis equi-
as diferenças físicas não são tão grandes en- valentes ou maiores que os experimentados
tre a metade sul da BR-319 e as áreas que na última década.

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DESTRUIÇÃO E CONSERVAÇÃO
272 DA FLORESTA AMAZÔNICA

Outro processo que indica um aumento po- residentes tradicionais da área que se ocupam
tencial no desmatamento ao longo do eixo da da colheita de castanha-do-pará (Bertholetia
rodovia, caso a estrada seja repavimentada, é excelsa), e várias reivindicações maiores por
a chegada de migrantes sem-terra. Isto inclui, donos individuais e empresas, de blocos de
por exemplo, o estabelecimento de um acam- lotes ao longo da rodovia. Os residentes ao
pamento de sem-terra no Igarapé Realidade longo da rodovia acreditam que a proprieda-
(100 km ao norte de Humaitá: Figura 2). Os mi- de de um lote à margem de estrada confere
grantes sem terra no acampamento no Igarapé ao dono o direito a uma área praticamente ili-
Realidade estão organizados na forma de co- mitada de terra pública que se encontra atrás
munidade (embora não se identificam como da área colonizada. Por sua vez, o INCRA diz
pertencendo a quaisquer dos movimentos na- que os colonos não têm nenhum direito desse
cionais de sem-terra, como o Movimento dos tipo (David Benedito Gonçalves, comunicação
Trabalhadores Rurais Sem-Terra, ou MST). pessoal, 2005).
Dois ônibus de migrantes foram obrigados a
voltar para Rondônia depois de uma confron- Além dos migrantes no Igarapé Realidade,
tação com a polícia, mas aproximadamente 30 um fluxo de pessoas procurando terra de for-
famílias permaneceram no acampamento e na ma independente apareceu buscando áreas
área circunvizinha, e, ao longo do período de para estabelecer posses. Alguns destes vêm
2005-2008, este acampamento evoluiu para se por meio de embarcações, sendo deixados
tornar uma vila e um assentamento. Antigos às margens do rio Madeira para então va-
residentes na área reivindicam as áreas com gar pela floresta em busca de terras não
desmatamentos iniciados em várias partes da ocupadas. Espera-se que estes agentes indi-
área “fundiária” (as terras públicas atrás da viduais de áreas já ocupadas em Rondônia
faixa de 2 km dos lotes que foram original- viajem para todos os pontos ao longo da es-
mente distribuídos pelo INCRA ao longo da trada, uma vez que o acesso seja melhorado.
margem da estrada). Esta área de terra pú- Atualmente, existem linhas de ônibus ope-
blica já tem vários pretendentes, inclusive os rando até 200 km ao norte de Humaitá.

Figura 2. Localização
da rodovia BR-319.

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BR-319: A rodovia Manaus-Porto Velho e o impacto potencial
de conectar o arco de desmatamento à Amazônia central 273

A reivindicação de grandes áreas por interflúvio com diversidade biológica particu-


grileiros (grandes pretendentes ilegais) tem larmente alta (Mario Cohn-Haft, comunicação
levado a um padrão de violência no qual pis- pessoal, 2005).
toleiros são contratados para remover quais-
quer pretendentes concorrentes. O delega- Impactos na Amazônia central
do do Instituto Nacional de Colonização e
Reforma Agrária (INCRA) no Amazonas de- Manaus, hoje, é uma ilha de paz que
nunciou a prevalência deste padrão na região parece estar fora da Amazônia. Ao norte
(Litaiff, 2005). A visão do governador esta- da cidade está o Distrito Agropecuário da
dual de que a BR-319 vai se tornar um “cor- SUFRAMA onde grandes fazendas foram es-
redor de agricultura familiar” (Amazonas tabelecidas no início da década 1980 com in-
em Tempo, 2005b) pareceria ser um cenário centivos fiscais generosos e pacotes de finan-
improvável sem primeiro alcançar o sucesso ciamento subsidiados pelo governo. Quando
na implantação de governança na área. o fluxo de fundos do governo encolheu em
meados dos anos 1980, a maioria das pasta-
O efeito da BR-319 não é apenas restrito
gens foi abandonada. Hoje mais de 80% da
à área diretamente acessada pela rodovia,
área desmatada está ocupada por vegetação
mas, também, por uma série de estradas
secundária (capoeira). Ainda assim, nenhum
laterais planejadas que conectarão a BR-
migrante sem terra invade a área; não há ne-
319 a sedes municipais nos rios Madeira e
nhuma batalha entre os posseiros e pistolei-
Purus (Fearnside et al., 2009). Estas incluem
ros, nenhum barraco queimado e nenhuma
Manicoré, Borba, Novo Aripuanã e Tapauá.
morte. Se as mesmas fazendas abandonadas
Os planos para as estradas laterais (vicinais)
fossem magicamente transportadas para o
já estão estimulando os políticos locais em
sul do Pará, norte de Mato Grosso ou para
resistir à criação de reservas de proteção am-
Rondônia, provavelmente, seriam invadidas
biental perto das rotas propostas. Uma reser-
dentro de algumas semanas, se não de dias!
va indígena proposta, que limita a estrada
planejada AM-465, que dá acesso a Tapauá, O cenário calmo em áreas rurais ao redor
é foco de objeções de vereadores de Tapauá de Manaus poderia mudar rapidamente com a
que querem as terras abertas por esta es- abertura de uma ligação pavimentada para o
trada lateral sejam destinadas à agricultura “Arco de Desmatamento”, área em expansão
(Amazonas em Tempo, 2005c). localizada ao longo das margens sul e leste da
floresta amazônica onde atividade de desma-
A existência de áreas protegidas de vários
tamento está concentrada. As incursões relati-
tipos pode reduzir significativamente a velo-
vamente modestas de migrantes de sem-terra
cidade do avanço de desmatamento, assim
na BR-319, atualmente, como o acampamento
reduzindo a probabilidade de que qualquer
do Igarapé Realidade, não revelam a magnitu-
determinado hectare sofra uma transformação
de do impacto que aconteceria quando novas
de floresta para outro uso da terra (Ferreira et
fronteiras de migração se tornam disponíveis.
al., 2005). Às vezes um mero rumor de que
O efeito muito mais forte em áreas de fronteira
uma reserva será criada pode desencorajar a
no sul do Pará oferece uma indicação melhor
invasão. No momento, não há quase nenhuma
deste potencial (Fearnside, 2001). Estimativas
reserva para restringir o desmatamento ao
do número de famílias rurais sem terras em
longo da BR-319, embora a intenção de criar
todo o Brasil variam de 5 a 10 milhões, ex-
tais reservas seja uma preocupação importante
cedendo em muito a capacidade da região
entre os fazendeiros e pecuaristas maiores em
amazônica até mesmo se a região fosse com-
Humaitá e ao longo da porção ocupada pela
pletamente distribuída em projetos de assenta-
rodovia. O governo federal já criou uma re-
serva extrativista (RESEX): Carapanã Grande. mento (por exemplo, Fearnside, 1985).
O governo estadual planeja a criação da re- Pode-se esperar, também, que Manaus
serva de desenvolvimento sustentável (RDS) receba um fluxo substancialmente crescente
rio Amapá. A área ao entorno da BR-319 é de de migrantes urbanos. A migração de áreas
interesse para criação de reservas, por ser um rurais para urbanas e de áreas urbanas para

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DESTRUIÇÃO E CONSERVAÇÃO
274 DA FLORESTA AMAZÔNICA

outras áreas urbanas são tendências podero- per capita no Amazonas é até ligeiramente
sas na redistribuição da população brasilei- maior do que no Paraná, que é bem conheci-
ra (Brasil, IBGE, 2005; Browder & Godfrey, do como um estado rico. A renda per capita
1997). O distrito industrial em Manaus, que do Amazonas é mais que o dobro do Pará, e
se beneficia de isenções de impostos, empre- quatro vezes maior do que a do Maranhão
gou 82,7 mil pessoas em abril de 2005 (Brasil, (Figura 3). De grande importância para a BR-
SUFRAMA, 2005a); este foi o principal ímã de 319, é o fato do Amazonas ter quase o dobro
atração de população para a cidade (popula- da renda per capita de Rondônia.
ção aproximadamente 1,6 milhões em 2005).
É desnecessário dizer que a chegada mas-
Muito da migração para Manaus tem siva de migrantes urbanos em Manaus de-
sido de populações ribeirinhas do interior da gradaria os serviços sociais já precários e au-
Amazônia até agora, mas este fluxo poderia mentaria os problemas urbanos, tais como:
ser tolhido pela vinda de novos migrantes do desemprego, subemprego, invasões urbanas e
resto do Brasil se o acesso fosse facilitado. O criminalidade. É esperado que a taxa de mi-
desemprego em Manaus é mais baixo do que gração de outras partes do Brasil seja propor-
em muitas cidades brasileiras, embora a re- cional à disparidade em relação a oportuni-
putação que Manaus desfruta de níveis altos dades de emprego e padrões de vida entre os
de emprego não é completamente merecida. locais fontes e de destino, conduzindo a uma
Manaus tem 141 empregos formais por mil redução das qualidades atrativas do local de
habitantes; das capitais das unidades federati- destino até que um equilíbrio seja estabeleci-
vas brasileiras, um terço tem mais desemprego do. A magnitude da disparidade que pode ser
que Manaus enquanto dois terços têm menos mantida em equilíbrio depende da fricção, ou
(Brasil, IBGE, 2005). Porém, Manaus tem a resistência, à migração representada por im-
melhor razão entre emprego e população de pedimentos como a falta de acesso de estrada
qualquer cidade importante na região Norte. para Manaus. Manaus hoje se mantém como
Renda per capita fornece outro indicador uma ilha de riqueza da mesma forma que uma
da atratividade de Manaus como destino à garrafa térmica mantém seu café quente por
migração. O Estado do Amazonas é muito meio do impedimento da parede da garrafa à
melhor do que os estados circunvizinhos, e passagem de calor. Colocando o mesmo café
tem renda per capita mais alta que qualquer quente em um bule de ferro, ele se esfria logo.
outro estado no Brasil com a exceção do Quando os impedimentos à migração fo-
Distrito Federal, Rio de Janeiro, São Paulo, rem afastados, o equilíbrio poderia mudar
Rio Grande do Sul e Santa Catarina. A renda na medida em que a taxa elevada de migra-
ção abaixasse as características atraentes da
área de destino. Um exemplo é a cidade de
Sorriso, em Mato Grosso, que está no cen-
tro do “boom” da soja em Mato Grosso: era
o assunto de reportagens frequentes por-
que o “boom” econômico na área resultou
no alcance do Índice de Desenvolvimento
Humano (IDH) mais alto do Brasil. Um ano
depois, o prefeito da cidade lamentava que
Figura 3. Renda per
a publicidade sobre o IDH resultasse em um
capita nos estados excesso de migrantes. Com cinco ônibus lo-
brasileiros em 2002 tados de pessoas chegando por dia, o prefeito
(fonte de dados: estava procurando meios para desencorajar
IPIB, 2005). Valores
em Reais, em 2002
a migração que já aumentou a população es-
(US$ 1 = R$ 2,28). colar em 36% (A Folha de São Paulo, 2005).
Estados “ricos” têm
renda per capita acima Criar emprego em Manaus é uma luta
de R$8 mil. interminável para autoridades em todos os

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BR-319: A rodovia Manaus-Porto Velho e o impacto potencial
de conectar o arco de desmatamento à Amazônia central 275

níveis, como também é o caso em outros lu- extensão de reservas indígenas e unidades
gares. Esta luta pode facilmente se tornar um de conservação em Roraima (em ambos os
trabalho de Sísifo. Assim como o Sísifo da mi- casos criados por autoridades federais).
tologia grega, que foi condenado a rolar eter-
namente um pedregulho pesado para cima de
uma colina em Hades, para que a pedra rolasse BENEFÍCIOS DA RODOVIA
de volta ao fundo da colina cada vez que ela Os benefícios de pavimentar a BR-319 são,
se aproximasse ao topo, a luta de Manaus para indubitavelmente, menores do que aqueles
empregar sua população seria em vão se para retratados no discurso político acerca desse
cada posto de trabalho criado, três ou quatro assunto. A justificação principal apresentada
migrantes desempregados chegassem à cidade. é a redução de custos de transporte no fre-
te para o centro-sul brasileiro, aumentando
Impactos em Roraima assim a competitividade de produtos indus-
triais de Manaus nos mercados em São Paulo
É provável que o potencial à migração
e em outros centros populacionais. Porém,
crescente em direção a Roraima seja um
os produtos industriais de Manaus, como te-
dos principais impactos em pavimentar a
levisores e motocicletas, não são artigos pe-
BR-319 (Barni et al., 2009). A parte do fluxo
recíveis para os quais a diferença de alguns
de população existente há muito tempo do
dias em tempo de transporte faria uma dife-
Maranhão para o Pará, Rondônia se tornou
rença significante. Remessa de tal frete por
a principal fonte de migração para outros
navio para o porto de Santos é muito mais
estados amazônicos, os destinos principais
eficiente tanto em termos de uso de energia
são áreas como Apuí (no sul do Amazonas),
como em termos de custos de mão-de-obra,
Acre oriental, e um movimento significante
quando comparado com a remessa em mi-
para o noroeste de Mato Grosso (inverten-
lhares de caminhões, qualquer que seja a
do o fluxo tradicional de Mato Grosso para
rota rodoviária. É notável, que os mesmos
Rondônia). Roraima também é um destino,
argumentos usados como justificativa para a
embora a dificuldade de transporte entre
BR-319 estão sendo simultaneamente usados
Rondônia e Manaus contenha a migração,
como parte da justificativa para pavimentar
no momento, nesta rota. No início da década
a rodovia BR-163 de Santarém à Cuiabá (por
1980, quando a BR-319 era transitável, uma
exemplo, Simonetti, 2005; Brasil, SUFRAMA,
fração significativa dos migrantes que che-
2005b). O frete atualmente realizado de
garam a Manaus pela rodovia seguiu direta-
Manaus para Belém em barcaças e transpor-
mente para Roraima pela BR-174, ao invés de
tado em caminhão para São Paulo pela ro-
se instalar na Amazônia central. Isto é expli-
dovia Belém-Brasília (BR-010) leva 11 dias, e
cado parcialmente pela geoquímica, já que
chegaria em 5 dias se transportado em cami-
Roraima, situada em parte na formação Boa
nhão a partir de Santarém (Brasil, BNDES,
Vista, possui solos mais jovens e mais férteis
1998, p. 68). Desnecessário dizer que, con-
do que os de Manaus. A migração também
tabilizando o mesmo frete para justificar a
é explicada, em parte, pelo encorajamento
BR-319, implica que este benefício evapora-
ativo do governo de Roraima na distribuição
ria para a BR-163. A atual rota multimodal
de terras em áreas de assentamento, no for-
via Porto Velho é mais barato que a rota via
necimento de transporte subsidiado até mer-
Belém, mas só é utilizável durante uma par-
cados e nos outros serviços, e até mesmo em
te do ano porque o rio Madeira não perma-
programas ativos para transportar migrantes
nece navegável, no seu período de vazante
novos ao estado, como parte de estratégias
(o nível de água no rio varia em 15 m ao
de eleição (veja Fearnside & Barbosa, 1996a).
longo do curso do ano, e a profundidade em
Roraima ganhou uma reputação como um
Porto Velho é de apenas 2 m quando a vazão
estado onde o nível de governança ambien-
do rio chega ao seu mínimo anual).
tal é próximo de zero (Fearnside & Barbosa,
1996a,b). Uma exceção importante é a bar- A rota de transporte por caminhão
reira ao desmatamento atribuído pela grande de Manaus para São Paulo pela rodovia

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DESTRUIÇÃO E CONSERVAÇÃO
276 DA FLORESTA AMAZÔNICA

Belém-Brasília pareceria faltar lógica quando O porto de Manaus é o mais ineficien-


comparada com movimento de frete por ca- te do Brasil em termos do número de horas
botagem, ou navios litorais, entre Manaus e necessárias para carregar e descarregar um
Santos. O Banco Nacional do Desenvolvimento navio: 36 horas, ou duas vezes o tempo que
Econômico e Social (BNDES), que é respon- leva em Santos (Ono, 2001, p. 43). Além de
sável em promover o desenvolvimento de in- serem ineficientes, os portos também são
fraestrutura de transporte, estimava que uso caros. Em um relatório pela Confederação
dos navios reduziria o custo do frete porta a Nacional do Transporte, uma “ação neces-
porta em 50%, quando comparado às atuais sária” identificada para tornar a cabotagem
opções via barcaça e rodovia (Brasil, BNDES, viável é “reduzir o excedente de mão-de-obra
1998, p. 102). Porém, conforme constatado nos portos” (CNT, 2002, p. 148). A moderni-
pelo BNDES, o “transporte de carga geral por zação reduziu o número de tarefas manuais,
cabotagem é praticamente inexistente” (Brasil, assim resultando em trabalhadores em exces-
BNDES, 1998, p. 64). O BNDES (1998, p. 100) so. A Confederação Nacional do Transporte
estabelece que “o maior impedimento para esboça uma estratégia de negociação baseado
em ofertas de aposentadoria antecipada para
movimento deste frete por cabotagem está na
estes trabalhadores. Porém, nós podemos su-
ineficiência e insegurança dos portos. …. Se ta-
gerir que, no caso de Manaus, muito disto
xas e qualidade de serviço estivessem em acor-
pode ser desnecessário, já que a necessidade
do com normas internacionais, assim tornando
de expansão do porto deveria permitir que os
a operação regular de cabotagem viável, o frete atuais trabalhadores fossem mantidos.
entre Manaus e a região sudeste cairia em apro-
ximadamente R$3 mil [US$2,6 mil na época] O discurso político relativo aos benefí-
[por cada contêiner], ou a metade do custo cios de transportar a produção industrial de
atual”. Além de custos portuários, o BNDES Manaus para São Paulo por caminhão pela
também enfatiza preços “abusivos” de servi- BR-163 ou pela BR-319 pode ter pouca rela-
ços auxiliares. Somente as taxas de praticagem ção ao real desdobramento dos fatos, quando
no rio Amazonas custavam R$100 [US$86] por as rodovias forem pavimentadas. Por exem-
contêiner em 1998, em média, ou 3% do custo plo, a pavimentação da rodovia BR-174, em
total de frete entre Manaus e São Paulo. 1997, foi justificada com base de que seriam
transportados em caminhão produtos indus-
A infraestrutura física dos portos foi me- triais de Manaus para a Venezuela, de onde
lhorada sob os programas Brasil em Ação e seriam exportados por navio para o porto
Avança Brasil. No entanto, parte da insegu- de Houston, Texas, E.U.A. (Abdala, 1996).
rança dos portos resulta da dependência de Isto foi planejado para reduzir em 15 dias o
estivadores em Santos para descarregar os tempo do percurso, comparado com a expor-
navios. O sindicato de estivadores tem fe- tação dos produtos diretamente por navio a
chado este porto estratégico periodicamente partir de Manaus. Depois que a rodovia foi
durante as últimas décadas, em decorrência pavimentada, nenhuma frota de caminhões
de greves sobre assuntos trabalhistas. De apareceu para tirar proveito desta nova rota
fato, acredita-se que o objetivo de quebrar de exportação. A maior eficiência econômi-
o poder de estrangulamento deste sindicato ca de exportar diretamente por navio é evi-
foi uma das razões para que o governo mili- dente, a diferença em custo excede o valor
tar brasileiro lançasse seu programa maciço de economizar duas semanas em transpor-
de construção de rodovias nos anos 1970. O te. Não obstante, o discurso relativo a uma
temor a tais eventos não deveria ser usado rota por caminhão para a Venezuela serviu
para justificar a manutenção artificial de al- seu propósito, ganhando apoio político para
ternativas de transportes onerosas e ambien- pavimentar a rodovia. O aumento de desma-
talmente destrutivas, já que esta fonte de in- tamento em Roraima é um dos custos contí-
certeza não é maior para cabotagem do que nuos da rodovia BR-174.
é para quaisquer das exportações principais É provável que o benefício principal
do Brasil, tais como a soja. da BR-319 seja os benefícios políticos para

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BR-319: A rodovia Manaus-Porto Velho e o impacto potencial
de conectar o arco de desmatamento à Amazônia central 277

os que conseguem levar o crédito pela sua caso é o efeito de não contabilizar o impac-
reconstrução. Deveria ser notado que a to ambiental e social da estrada que é o im-
construção seria feita com fundos federais, pacto potencial do fluxo de população para a
não com fundos dos contribuintes do Estado Amazônia central e para Roraima. Os impac-
do Amazonas. Esta diferença de perspectiva tos de construir o leito rodoviário propriamen-
pode ser crucial na percepção de que grandes te dito são mínimos quando comparado aos
investimentos valem à pena; a construção impactos de alcance mais longo, tais como o
da Hidrelétrica de Balbina perto de Manaus fluxo populacional e o aumento da atividade
é um exemplo claro (Fearnside, 1989a). de desmatamento (e.g., Fearnside, 2005).
Outro grupo influente são as empresas de
A necessidade por um repensar dos pla-
construção e os provedores potenciais de
nos para reconstruir a BR-319, neste momen-
bens e serviços ao esforço de construção.
to, é sugerida pelos altos custos ambientais e
Como qualquer investimento público de
sociais e os benefícios modestos quando vis-
grande porte, cujos custos financeiros vêm
to sob uma luz mais realística do que o dis-
de contribuintes espalhados por todo o País
curso político atual. Os impactos poderiam
enquanto que a atividade comercial e os em-
ser reduzidos na rodovia se uma decisão em
pregos gerados na fase de construção são lo-
pavimentar fosse adiada por vários anos e se
calizados (por exemplo, em Manaus), pode
fosse feito bom uso do tempo interveniente.
ser esperado que um lobby de apoio local
Uma alternativa que o governo do Estado do
se desenvolva até mesmo caso o projeto em
Amazonas faria bem em explorar é a promo-
questão tenha justificativa econômica míni-
ção de um serviço de cabotagem regular en-
ma. Por exemplo, a Hidrelétrica de Balbina é
tre os portos de Manaus e Santos. O porto de
conhecida como um projeto “faraônico” por-
Manaus é capaz de receber navios oceânicos
que, como no caso das pirâmides de Egito
de todos os tamanhos, mas o transporte é fo-
antigo, ergueu-se uma estrutura enorme a
calizado principalmente em mercados exter-
grande custo com pouco ou nenhum retorno
nos. Uma resistência a isto pode ser espera-
prático (Fearnside, 1989a).
da por empresários por questão de interesses
Além do frete industrial que é visto financeiros da atual operação de barcaças
como condutor de aumento de empregos em para Belém e Porto Velho. No entanto, esses
Manaus, uma fonte importante de apoio à pa- mesmos interesses também seriam contra o
vimentação da BR-319 está na imaginação de projeto de reconstrução da BR-319. Em 1996,
residentes de classe média de Manaus que se havia 15 empresas transportando carga geral
visualizam fazendo viagens de férias para o para Belém e oito empresas para Porto Velho
centro-sul brasileiro, embora, a maioria das (Brasil, BNDES, 1998, p. 66 & 79).
tais viagens provavelmente nunca viesse a
O zoneamento ecológico-econômico do
acontecer (pelo menos por estrada). Acabar
Estado do Amazonas já foi realizado em forma
com o “isolamento” de Manaus demonstra
preliminar (Estado do Amazonas, 2001), mas
ser um lema poderoso, mas raramente é
precisa ser fortalecido e implementado. Em
lembrado que se trata de uma moeda com
Roraima, foi concluído um zoneamento, mas
dois lados, o outro sendo a chegada de um
foi deixado sem implementação porque o ór-
fluxo de migrantes para Manaus.
gão ambiental estadual não enviou a proposta
de zoneamento à Assembleia Legislativa do
A BR-319 E O PROCESSO DE TOMADA DE estado. Deveria ser enfatizado que a condição
DECISÃO prévia necessária para a decisão de pavimen-
tar uma rodovia não é um plano ou um comi-
O processo de tomada de decisão sobre a tê, mas reais mudanças que sejam implanta-
reconstrução da BR-319 segue o padrão evi- das de fato antes da aprovação ser concedida.
dente em outros projetos de infraestrutura Pressupõe-se que as medidas de mitigação
amazônica de subestimar substancialmente que serão implantadas simultaneamente com
os impactos e superestimar os benefícios de pavimentação da rodovia representam uma
obras públicas propostas. O mais notável neste fórmula para o desastre ambiental, como

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DESTRUIÇÃO E CONSERVAÇÃO
278 DA FLORESTA AMAZÔNICA

amplamente mostrado pela história da rodo- de terra. Isto precisa ser feito sem legalizar
via BR-364 (Fearnside, 1989b). as reivindicações, tanto de grileiros ou dos
pequenos invasores. Embora um cadastro
A criação de reservas ambientais e a sua
nacional esteja em preparação pelo INCRA,
implantação (incluindo a contratação de pes-
progresso neste projeto de longo prazo ainda
soal) ao longo do eixo rodoviário é uma me-
não alcançou a área da BR-319. O Instituto
dida importante que precisa, não só estar no
de Terras do Amazonas (ITERAM) também
lugar antes da rodovia ser aberta, mas antes
ainda não teve sucesso em montar um ban-
que os efeitos de expectativas de uma futura
co de dados georreferenciados das proprie-
pavimentação corroam as possibilidades de
dades nas áreas que o órgão controla.
criar tais áreas. As reservas podem formar bar-
reiras paralelas à rodovia para conter a expan- São necessárias mudanças fundamentais
são do desmatamento a partir das margens da e de longo alcance, além de medidas mais
estrada. No caso de reservas extrativistas, es- paliativas para conter o desmatamento por
tas oferecem também a possibilidade de man- meio de zoneamento, criação de reservas e
ter a economia atual baseada na colheita de fazer cumprir os regulamentos ambientais.
castanha-do-pará, uma atividade que é sacri- A falta de alternativas de emprego precisa
ficada onde o desmatamento avança e onde ser endereçada em contextos urbanos e ru-
os residentes locais são substituídos. rais. No contexto rural, fatores que agem
para desencorajar a contratação de trabalho
A falta de governança é um problema crô- incluem o fardo pesado de “custos sociais”,
nico na BR-319, assim como em outros lugares tais como a previdência social. O mercado
na Amazônia. Ambos, a agência ambiental informal (não regulado) de trabalho domi-
federal (IBAMA: Instituto Brasileiro do Meio na em grande parte do interior amazônico.
Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis) Abusos como a escravidão por dívida são
e o órgão estadual (IPAAM: Instituto de um resultado comum. Este é um resultado
Proteção Ambiental do Amazonas) são muito lógico da governança fraca que arruína a
fracos quando comparado aos desafios que execução de regulamentos de todos os tipos.
enfrentam. A execução de regulamentos
ambientais é mínima, tanto para os que Os tipos de uso de terra escolhidos desen-
exigem uma reserva legal de 80% em cada corajam a criação de emprego rural estável.
propriedade situada na parte da Amazônia, A exploração madeireira é um empregador
onde a vegetação original é de floresta, assim significante, mas a falta de sustentabilida-
como para aqueles regulamentos que exigem de deste uso da terra, até mesmo quando
as áreas de proteção permanente (APPs) ao executado como parte de planos de manejo
longo de cursos de água e em locais aciden- aprovados, conduz a um movimento ininter-
tados. Uma combinação de sensoriamento re- rupto de serrarias e fronteiras de exploração
moto, campanhas de campo, e de cooperação madeireira. O próprio processo de desmata-
íntima entre os órgãos de execução e o siste- mento emprega uma mão-de-obra significan-
ma judiciário se mostrou eficaz em influen- te na Amazônia, mas necessariamente é um
fenômeno efêmero em qualquer determina-
ciar o comportamento de desmatamento, a
do local (e, em longo prazo, na região como
exemplo de Mato Grosso, no seu programa
um todo). O uso da terra predominante após
de licenciamento e controle de desmatamento
o desmatamento é a pastagem, que também
de 1999 a 2001, ou seja, durante o governo
emprega poucas pessoas. Onde o cultivo me-
estadual anterior (Fearnside, 2003; Fearnside
canizado de arroz e soja é lucrativo, estes
& Barbosa, 2003). Estes métodos ainda não
usos estão presentes em áreas crescentes.
têm sido aplicados no Amazonas e nem em
Esta forma de agricultura substitui a mão-
Roraima.
de-obra braçal pela maquinaria e os herbici-
Um impedimento básico para uma go- das. Entre os fatores que desencorajam usos
vernança melhor é a falta de um cadastro da terra que empregariam mais pessoas em
das terras, que tornaria possível identificar áreas desmatadas está o receio de que meei-
quem possui qualquer determinado pedaço ros e/ou trabalhadores contratados ganhem

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BR-319: A rodovia Manaus-Porto Velho e o impacto potencial
de conectar o arco de desmatamento à Amazônia central 279

direitos de posse sobre a terra que cultivam. fronteira” em 1890 marcou o fim desta for-
Estratégias para evitar tais reivindicações de ma de assentamento independente (Turner,
posse pela terra incluem a atual combinação 1893). Para este tipo de mudança acontecer
de usos da terra, que exigem pouca mão-de- no Brasil por algum meio diferente do sim-
-obra e a periódica expulsão e substituição ples esgotamento de área de terra, precisa-se
de trabalhadores e arrendatários. de algum marco visível. Se a vontade políti-
O Brasil precisa enfrentar urgentemente o ca para uma mudança desse tipo vier ocor-
desafio de fazer a transição em deixar de usar rer, as rodovias BR-163 e BR-319 poderiam
o costume de direitos de posse como uma vál- ser o momento decisivo para o Brasil.
vula de escape para desigualdades e injustiças
de todos os tipos, assim como também por fim O EIA-RIMA DA RODOVIA BR-319
ao padrão de permitir e legitimar apropriação
de grandes áreas de terra pública por grileiros. O EIA-RIMA para a rodovia BR-319
Mais cedo ou mais tarde, este costume fatal- (Manaus-Porto Velho) trata de uma das deci-
mente vai mudar, à medida que chegarem ao sões mais importantes diante o governo bra-
limite as áreas de floresta disponíveis. Os be- sileiro hoje: se deveria abrir a parte central
nefícios ambientais e sociais seriam grandes se e norte da Amazônia à migração oriunda do
a transição pudesse ser alcançada logo, bem notório “arco de desmatamento”, que atual-
antes que o País seja forçado a isto por falta de mente se restringe ao sul da Amazônia. A
floresta adicional para invadir. Infelizmente, proposta de reabertura da rodovia BR-319,
a “MP da grilagem” (Medida Provisória uma estrada abandonada há mais de 20
458/2009), já aprovada pelo Congresso anos, facilitaria em muito o movimento de
Nacional, representa um grave retrocesso nes- atores do arco de desmatamento, inclusive
te sentido, legalizando uma grande área de grileiros (apropriadores ilegais de grandes
ocupações ilegais anteriores e criando a expec- áreas de terra pública) e de sem terras (gru-
tativa geral de que, no futuro, os que seguem pos organizados de camponeses pequenos
invadindo também serão beneficiados. que não possuem terras) (Fearnside & Graça,
Na maioria das partes do mundo, esta 2006; Fearnside, 2008). A região de Manaus,
transição já foi feita há muito tempo: pes- por exemplo, tem sido poupada de conflitos
soas desempregadas que faltam os recursos agrários resultantes da busca por terra, tais
para começar um negócio próprio enfrentam como a invasão de fazendas por sem terras,
a opção de buscar alguma forma de empre- e o ciclo resultante de desmatamento cujo
go, urbano ou rural. Nem passaria pela ca- posseiros desmatam para estabelecer as suas
beça de tais pessoas a ideia de que teriam reivindicações e os grandes proprietários de
um direito inato de invadir qualquer terra terras desmatam para evitar que as terras
“não utilizada”, tais como as terra públicas sejam invadidas, ou então, confiscadas pelo
na Amazônia, para começar uma proprieda- governo para fins de reforma agrária. A situ-
de nova. É claro que, em alguma época no ação inusitada na Amazônia central somente
passado distante, os antepassados de prati- é possível por causa da dificuldade de chegar
camente todas as pessoas de hoje reivindica- até esta área na ausência de uma conexão
ram terra por meio de simples ocupação. No por estrada. O EIA-RIMA especificamente re-
Brasil esta forma de transferir terra pública jeita um aumento da migração como impac-
para o domínio privado persiste até os dias to da BR-319, declarando que “A existência
de hoje. Abandonar esta tradição requer uma de uma migração reprimida é um fenômeno
mudança na mente da população. É impor- questionável, já que, desde os tempos da co-
tante entender que tal mudança de atitude lonização da Amazônia, o uso da via fluvial
pode acontecer: a tradição de ganhar a posse tem sido intenso, sendo o principal meio de
da terra por meio da ocupação não é uma acesso às diversas cidades da região” (UFAM,
constante da paisagem. Um exemplo é for- 2009a, Vol. 1, p. 189). Infelizmente, a migra-
necido pelo assentamento da parte ocidental ção tem sido uma ocorrência repetida quan-
dos Estados Unidos, cujo “fechamento da do outras áreas foram abertas por estradas,

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DESTRUIÇÃO E CONSERVAÇÃO
280 DA FLORESTA AMAZÔNICA

como no caso da BR-364 em Rondônia (por Manaus e São Paulo pela rodovia e o custo
exemplo, Fearnside, 1986b). de transporte pela alternativa mais barata.
O EIA-RIMA contém a confissão extraor- Neste caso, a alternativa mais barata para a
dinária de que a BR-319 tem “baixa importân- maioria do frete seria transporte em contê-
cia para o Pólo Industrial de Manaus” (UFAM, ineres por cabotagem, e o “benefício” seria
2009a, Vol. 1, p. 216). Seguramente, isto deve negativo porque a alternativa é mais barata
ser uma das declarações mais extraordiná- do que a rodovia. Observa-se que a viagem
rias nos 23 anos de história do EIA-RIMA que precisa ser comparada para a maior par-
no Brasil. A importância alegada da BR-319 te do cálculo está entre Manaus e São Paulo,
para o Pólo Industrial de Manaus sempre foi não entre Manaus e Porto Velho (UFAM,
a principal justificativa para a existência da 2009a, Vol.1, item Análise Financeira do
rodovia. Infelizmente, a afirmação da inexis- Projeto, p. 191). Porto Velho serve apenas
tência de interesse é completamente verda- como um entreposto para os caminhoneiros
deira, e isto foi declarado publicamente pelo em trânsito para São Paulo, e não como o
representante da Federação das Indústrias do destino final do transporte.
Amazonas (FIAM) no evento realizado na
Superintendência da Zona Franca de Manaus A quantidade de tráfego que os autores
(SUFRAMA), em 19 de março de 2008. O refe- do EIA-RIMA esperam está baseada em su-
rido evento teve por objetivo debater a propos- posições extraordinariamente otimistas. Eles
ta, que estava sendo apoiada pelo governo do esperam 375.000 passageiros de ônibus por
Estado do Amazonas naquele momento, para ano a partir de 2012, data esperada de inau-
substituir o projeto da rodovia BR-319 por uma guração da rodovia (UFAM, 2009a, Vol. 1, p.
ferrovia. Um ampla informação existe, mos- 193), o que é aproximadamente igual à po-
trando que a cabotagem em navios oceânicos pulação inteira da cidade de Porto Velho, que
de Manaus para Santos é um meio muito mais era de 368.345 habitantes em 2007 (UFAM,
barato para transportar a produção das fábri- 2009a, Vol. 4, p. 25). Vale a pena lembrar que
cas de Manaus para São Paulo do que o trans- atualmente o número de imigrantes chegando
porte por qualquer rota rodoviária (Fearnside a Manaus é 1,8 vezes maior do que o núme-
& Graça, 2006, 2009a; Peixoto, 2006; Teixeira, ro de emigrantes saindo da cidade (UFAM,
2007). Por exemplo, Teixeira (2007), investi- 2009a, Vol. 4, p. 208), e que a proporção de
gando as opções de transporte de carga geral
viagens no sentido Porto Velho-Manaus deve
nas conexões com a região amazônica, con-
cluiu que o transporte marítimo por cabota- guardar uma proporção similar em compara-
gem reduz os custos do transporte na ligação ção às viagens Manaus-Porto Velho depois de
Manaus-São Paulo em 37%, quando compa- abrir a estrada. Esta migração líquida de de-
rado com os atuais meios de transporte. Por sempregados para Manaus não representaria
sua vez, a mesma autora, quando considera um benefício para Manaus de hipótese algu-
a construção da rodovia (BR-319) ligando ao ma, mas sim um custo enorme em termos de
resto da malha rodoviária brasileira, os custos gastos municipais com serviços e em termos
aumentam em 19% em relação à rota atual, de outros impactos sociais.
que utiliza a hidrovia até Belém. Os autores do EIA declaram: “a rodovia
O EIA-RIMA calcula o benefício da rodo- BR-319 é encarada como uma promissora
via como a receita bruta do frete e do tráfego rota de exportação de commodities do agro-
de passageiros que os autores esperam pas- negócio (soja e álcool)” (UFAM, 2009a, Vol.
sar pela rota. Esta receita, é claro, não cons- 1, p. 184). Porém, é improvável que este tipo
titui nenhum tipo de benefício, mas sim um de frete seja transportado por estrada, uma
custo a ser pago por aqueles que usam a ro- vez que estes produtos são muito mais bara-
dovia. Por esta lógica, quanto mais ineficien- tos transportados a granel, em barcaças, do
te e mais caro o transporte, maior o “benefí- que fracionar o frete em contêineres ou cami-
cio” que poderia ser contabilizado (L. Fleck, nhões. Poupar alguns poucos dias em trans-
declaração pública, 15 de abril de 2009)! O porte não justifica o custo substancialmente
benefício deveria ser calculado como a di- mais alto de transportar este tipo de frete por
ferença entre o custo de transporte entre caminhão. A literatura de transporte trata a

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BR-319: A rodovia Manaus-Porto Velho e o impacto potencial
de conectar o arco de desmatamento à Amazônia central 281

“carga geral” (carga fracionada) de uma ma- os impactos e os benefícios. A abrangência


neira completamente diferente do transporte máxima dos impactos está limitada à “área de
a granel (p. exemplo, cereais, carvão, mine- influência indireta” ao longo da rota da rodo-
rais, etc.), devido aos custos muito discrepan- via, abarcando a faixa entre os rios Madeira
tes associados ao transporte, carregamento e e Purus (UFAM, 2009b, p. 12-13), enquanto
administração destas duas classes distintas de os benefícios são reivindicados para uma área
frete. O EIA simplesmente usa uma equiva- muito maior, inclusive a cidade de Manaus,
lência de 60 t de grãos como igual a um con- áreas agrícolas em Mato Grosso, e até mes-
têiner (UFAM, 2009a, Vol. 1, p. 192). mo outros países conectados à rede rodoviá-
As quantidades de produtos agrícolas que ria pela infraestrutura planejada sob a IIRSA
o EIA-RIMA espera que sejam transportadas (Iniciativa para Infra-Estrutura da América do
para Manaus estão baseado na suposição de Sul) (UFAM, 2009a, Vol. 1, p. 158). A “área de
que 20% do potencial agrícola de Rondônia influência” para passageiros inclui uma po-
e de uma grande área em Mato Grosso se- pulação de 6,4 milhões que engloba Manaus,
rão transportados para Manaus pela rodo- Rondônia e grande parte de Mato Grosso
via. Nenhuma relação com a demanda em (UFAM, 2009a, Vol. 1, p. 193). Impactos ao
Manaus é demonstrada. A produção na área norte do rio Amazonas, incluindo os na ci-
da qual os produtos agrícolas são obtidos dade de Manaus, no Distrito Agropecuário
totalizou 28 milhões de toneladas em 2006 da SUFRAMA ao norte de Manaus, que pro-
(UFAM, 2009a, Vol. 1, p. 192). Isto é com- vavelmente será invadido por sem terras, e
posto de 49,2% soja, 16,0% madeira, 15,9% no Estado de Roraima e outras áreas para as
milho, 15,9% lenha, 2,5% culturas perma- quais acesso rodoviário de Manaus já existe,
nentes, 0,3% álcool e 0,2% açúcar (UFAM, não são mencionados. Também não são con-
2009a, Vol. 1, p. 185). sideradas as estradas prováveis a serem cons-
Um dos aspectos mais notáveis do EIA- truídas para ligar a BR-319 à área de floresta
RIMA é a seletividade com que são comparados intacta ao oeste do Rio Purus (Figura 4).

Figura 4. Mapa
rodoviário do
Amazonas incluindo
estradas planejadas
ao longo da BR 319
(indicadas por setas
amarelas). Fonte:
(Brasil, DNIT, 2002,
acrescentadas as
setas).

Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 281 8/18/2022 3:15:15 PM


DESTRUIÇÃO E CONSERVAÇÃO
282 DA FLORESTA AMAZÔNICA

O EIA especificamente exclui a conside- governança ambiental forte, todos os indica-


ração dessas estradas planejadas, observando dores (VPL [valor liquido presente], TIR [taxa
“É interessante notar que a rodovia AM-366 interna de retorno] e IBC [índice custo/benefí-
faz parte de um planejamento de expansão cio]) se mostram altamente favoráveis ao pro-
rodoviária antigo. Segundo o planejado, esta jeto. Nesse cenário, os custos ambientais são
rodovia seguiria em direção oeste, atravessan- mitigados a um nível desejável que torna o
do o rio Purus em direção à sede do muni- projeto socialmente desejável” UFAM, 2009a,-
cípio de Tefé, bifurcando-se na altura do rio Vol. 1, págs. 202-203). O exemplo dado desta
Coari em direção a cidade de Coari e, a par- “forte governança ambiental” é: “Não neces-
tir de Tefé, indo até o rio Juruá. Antes disso, sariamente o fato de ter rodovias em áreas de
apresentaria ainda uma ligação com a sede concentração de recursos naturais implica em
do município de Beruri. Segundo o planejado, degradação do patrimônio natural. Um exem-
esta rodovia seguirá, embora este planejamen- plo de turismo sustentável é aquele realizado
to faça parte do mapa oficial do planejamento no Parque Nacional de Yellowstone” (UFAM,
do Ministério dos Transportes. A exceção da 2009a, Vol. 1, p. 204). Isto é seguido pelo
rodovia BR-319, nenhuma dessas estradas está mapa do parque de Yellowstone, indicando as
no planejamento do Governo Federal” (UFAM, estradas existentes dentro do parque, onde,
2009b, Vol. 1, p. 58). No entanto, estas es- é claro, ninguém desmata nada (Figura 5).
tradas adicionais, que se ramificam a partir Por coincidência, um de nós (PMF) é um ex-
da BR-319, fazem parte dos planos oficiais do funcionário do Serviço de Parques Nacionais,
Departamento Nacional de Infraestrutura de dos EUA, e trabalhou como naturalista em um
Transportes (DNIT) e continuam sendo exi- parque não muito distante de Yellowstone. A
bidas no site da internet do DNIT até hoje noção de que um cenário similar ao parque
(Brasil, DNIT, 2002). de Yellowstone se instalará na área aberta
pela BR-319 é totalmente fora da realidade na
O fator chave na conclusão dos autores área atualmente, onde há um cenário típico
do EIA-RIMA sobre a viabilidade ambien- do “arco do desmatamento” ao seu redor,
tal da obra é a sua crença em um cenário caracterizado pela disputa por terras e todos
de “forte governança ambiental.” Eles con- os seus desdobramentos (grileiros, posseiros,
cluem “quando se coteja com o cenário de madeireiros ilegais). Parece mais realista que
após o tempo que levaria para o cenário atu-
al evoluir para o de Yellowstone, já não teria
praticamente mais floresta na área! Presumir
que um cenário tão fora da realidade atual se
instale com a rapidez necessária para evitar
graves impactos ambientais é extremamente
perigoso como presunção para embasar deci-
sões como a da abertura da estrada.
A falta de uma justificativa econômica se
torna até irônica com a argumentação de que
“Cada vez mais a sociedade brasileira questio-
na a elevada carga tributária, que atualmen-
te está em torno de 37% do PIB. Portanto, é
importante a aplicação eficiente dos recursos
Figura 5. Mapa do públicos na forma de projetos que atendam
Parque Nacional de
Yellowstone, nos EUA, ao interesse da sociedade” (UFAM, 2009a,
dado como exemplo Vol. 1, p. 177). Evidentemente, concordamos
de “governança com a importância de não desperdiçar o di-
ambiental forte” no
EIA-RIMA (fonte:
nheiro do contribuinte, o que deve ser um
UFAM, 2009a,Vol. 1, forte argumento contra a realização desta
p. 205). obra. Os autores do EIA-RIMA até sugeriram

Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 282 8/18/2022 3:15:16 PM


BR-319: A rodovia Manaus-Porto Velho e o impacto potencial
de conectar o arco de desmatamento à Amazônia central 283

repassar parte do ônus mal contabilizado argumentou que nenhum estudo de viabilida-
desta obra para os usuários, por meio da co- de é preciso, pois considera que este projeto
brança de um novo tipo de imposto na forma é apenas uma “recuperação” de uma estra-
de um “pedágio ambiental” (UFAM, 2009a, da existente. O mesmo argumento era usado
Vol. 1, p. 211-212). pelo Ministério dos Transportes ao reivindicar
que nenhum EIA-RIMA seria necessário, mas
A análise de custos ambientais realizada
isto não foi aceito pelos tribunais e agora foi
pelo EIA, considerou quatro cenários (um sem
elaborado um EIA-RIMA. A pergunta de por
governança e os demais com governança fra-
que um estudo de viabilidade também não
ca, moderada e forte) para a mensuração dos
foi realizado permanece. Por exemplo, a rodo-
custos ambientais da pavimentação da rodovia
via BR-163 (Santarém-Cuiabá), que também
BR319. Nesta análise os autores concluíram
é um projeto de “reconstrução” de rodovia,
que devido aos altos custos ambientais a re-
construção da rodovia só teria viabilidade eco- tem os dois tipos de relatório: o EIA-RIMA e o
nômica no caso de um cenário de governança estudo de viabilidade.
ambiental (UFAM, 2009a, Vol.1, p. 203). No Qualquer tomada de decisão racional so-
entanto, os custos ambientais para a realiza- bre projetos de infraestrutura como a rodovia
ção de uma governança ambiental, tais como a BR-319 deve pesar todos os custos e benefícios
implementação de Unidades de Conservação, para todas as alternativas, inclusive a opção
postos de fiscalização, contratação de pessoal, sem o projeto, antes que uma decisão fosse to-
não foram considerados na análise de custos. mada. A finalidade de avaliações ambientais
De acordo com dados preliminares de um es- é de prover informações para tomar uma de-
tudo realizado pela Conservação Estratégica cisão racional. Neste caso, a consideração dos
(CSF-Brasil), em abril de 2009, a implantação custos e benefícios é altamente seletiva, omi-
de 29 parques e reservas ao longo da rodovia tindo as comparações econômicas principais
gerará um custo estimado de R$ 578 milhões, que precisam ser feitas relativo ao transporte
que não será coberto pela economia nos trans- entre Manaus e São Paulo (não somente entre
portes. O custo para a implementação dessas Manaus e Porto Velho), e omitindo os impac-
áreas de proteção ambiental atualmente pelo tos ambientais principais que seriam o resul-
governo é estimado em apenas 39 milhões de tado da migração para áreas fora da área ao
reais (Brasil, Ministério dos Transportes, 2009, longo da extensão de rodovia planejada para
p. 5). Apesar da “blindagem verde” proposta reconstrução. A apresentação das informações
para a BR 319, é possível que grandes áreas no EIA-RIMA deve ser de uma forma objetiva
de florestas remotas bem conservadas sejam para permitir uma decisão livre sobre a obra
atingidas pelo desmatamento caso as estra- pela sociedade e pelas autoridades competen-
das laterais planejadas pelo DNIT venham a tes. Os autores do RIMA não demonstram ne-
ser realizadas. Por exemplo, já existe a um nhuma preocupação em manter uma posição
trecho aberto da extensão BR-174, que liga a neutra sobre a obra, concluindo que: “Ao final,
BR-319 a Manicoré, atualmente intransitável, reiteramos a relevância desta obra como instru-
que ultrapassa essa “blindagem verde”. Pior, mento de integração dos estados do Amazonas
a estrada planejada cruzando o rio Purus em e Roraima ao restante do país e a importância
Tapauá abriria uma vasta área para desmata- de que ela seja executada com base em alicerces
mento atrás da estreita fila proposta ao lado econômicos, sociais e ecológicos fortes e equili-
da rodovia BR-319. brados” (UFAM, 2009b, p. 38).
Nenhum estudo de viabilidade existe para
a BR-319. Um estudo de viabilidade consiste CONCLUSÕES
em uma estimativa detalhada dos custos e be-
nefícios financeiros de um projeto proposto. O custo ambiental não contabilizado de
Obviamente, este é um elemento fundamen- conectar a Amazônia central com o “Arco
tal no processo de tomada de decisão para de Desmatamento” precisa ser incorporado
qualquer projeto de infraestrutura. No caso da no processo de decisão antes dela ser toma-
rodovia BR-319, o Ministério dos Transportes da sobre a reconstrução e pavimentação da

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DESTRUIÇÃO E CONSERVAÇÃO
284 DA FLORESTA AMAZÔNICA

rodovia BR-319. Embora seja lógico, numa Amazonas em Tempo. 2005b. “Rodovia BR-319 será
escala de tempo de décadas, esperar que a o corredor de agricultura familiar”. Amazonas em
Tempo [Manaus]. 05 de junho de 2005, p. A-5.
pavimentação desta rodovia se concretize, o
custo ambiental seria alto se isto fosse reali- Amazonas em Tempo. 2005c. “Demarcação de terras
zado sem primeiro preparar as áreas para as em Tapauá gera polêmica”. Amazonas em Tempo
[Manaus]. 17 de junho de 2005, p. B-7.
quais os impactos potenciais se estendem,
inclusive Roraima. Estas preparações in- Banega, A. & K. Gomes. 2005. “BR-319 começa a ser
cluem zoneamento ecológico-econômico, es- recuperada”. Amazonas em Tempo [Manaus]. 09 de
julho de 2005, p. A-5.
tabelecimento de reservas, e aumento do ní-
vel de governança, a ponto que o impacto de Banega, A. & A. Simonetti. 2005. “Alfredo garante:
um fluxo crescente de migrantes poderia ser Enfim, a BR-319 será recuperada.” Amazonas em
Tempo [Manaus]. 06 de março de 2005, p. B-4.
contido. Mais fundamentalmente, o Brasil
precisa passar por uma transição de modo Barni, P.E., P.M. Fearnside & P.M.L.A. Graça. 2009.
que a tradição secular de conceder a posse Deforestation and carbon emissions in Amazonia:
Simulating the impact of connecting Brazil’s
da terra a migrantes que invadem áreas de state of Roraima to the “arc of deforestation” by
floresta seja encerrada. Isto significa prover reconstructing the BR-319 (Manaus-Porto Velho)
uma válvula de escape para muitos proble- Highway. In: CFM 2009| WFC 2009 XII Congreso
mas do País que não podem ser sustentados, Forestal Mundial XIII World Forestry Congress
e é melhor substituir isto com oportunida- – XII Congrès Forestier Mondial 18-23 Octubre
des de emprego melhores em áreas urbanas 2009, Buenos Aires-Argentina. Desarrollo Forestal-
Equilibrio Vital / Forest in Devlopment- A Vital
e rurais antes que esta transição no País seja Balance, Food and Agriculture Organization of the
forçada pela dizimação da floresta. United Nations (UN-FAO), Roma, Itália. CD-ROM &
http://www.wfc2009.org.

AGRADECIMENTOS Brasil, BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento


Econômico Social).1998. Transporte na Região
Ao Conselho Nacional do Desenvolvimento Amazônica. Cadernos de Infra-Estrutura No. 7,
BNDES, Rio de Janeiro, RJ. 114 p. http://www.finame.
Científico e Tecnológico (CNPq: Proc.
com.br/conhecimento/cadernos/aicad_07.pdf.
470765/01-1) e o Instituto Nacional de
Pesquisas da Amazônia (INPA: PPI 1-1005) Brasil, DNIT (Departamento Nacional de Infraestrutura
de Transportes). 2002. Mapa Rodoviário Amazonas.
por fornecer apoio financeiro. E.M. Nogueira
Escala: 1:2.250.000. DNIT, Ministério dos
ajudou no trabalho de campo e R.I. Barbosa Transportes, Brasília, DF. Disponível em: http://
contribuiu com valiosos comentários. www.dnit.gov.br/menu/rodovias/mapas
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reformatado de Fearnside & Graça (2009b). Geografia e Estatística (IBGE), Rio de Janeiro, RJ.
Parte deste trabalho é atualizada de uma http://www.ibge.gov.br
tradução de Fearnside & Graça (2006) e de Brasil, Ministério dos Transportes. 2009. BR-319: A
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Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 285 8/18/2022 3:15:16 PM


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Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 286 8/18/2022 3:15:16 PM


CAPÍTULO

16
Modelagem de desmatamento e emissões de
gases de efeito estufa na região sob influência
da Rodovia Manaus-Porto Velho (BR-319)

Philip M. Fearnside, Paulo Maurício L.A. Graça, Edwin W.H. Keizer,


Francisco D. Maldonado, Reinaldo I. Barbosa & Euler M. Nogueira
Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia – INPA
Av. André Araújo, 2936 – CEP: 69.067-375, Manaus, Amazonas, Brasil.
E-mail: pmfearn@inpa.gov.br

Versão original:
Fearnside, P.M., P.M.L.A. Graça, E.W.H. Keizer, F.D. Maldonado, R.I. Barbosa & E.M. Nogueira.
2009. Modelagem de desmatamento e emissões de gases de efeito estufa na região sob influên-
cia da Rodovia Manaus-Porto Velho (BR-319). Revista Brasileira de Meteorologia 24(2): 208-233.
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287
Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 287 8/18/2022 3:15:23 PM
DESTRUIÇÃO E CONSERVAÇÃO
288 DA FLORESTA AMAZÔNICA

RESUMO A biomassa florestal na ALAP foi calcula-


da a partir de 306 parcelas de um hectare dos
Uma simulação de desmatamento e levantamentos do Projeto RADAMBRASIL,
emissões no período 2007-2050 foi executa- em 13 tipos florestais identificados, e incor-
da para a Área sob Limitação Administrativa pora uma série de melhorias recentes na
Provisória (ALAP) ao longo da rota da rodo- metodologia para a obtenção da estimativa.
via BR-319 (Manaus-Porto Velho); uma área Estimativas das emissões incluem adições
de 153.995 km2 que representa aproxima- para o efeito de liberações de gases-traço de
damente 10% do estado do Amazonas. O queimadas e de decomposição, e deduções
governo federal por meio do Ministério dos para carbono sequestrado pelo recrescimento
Transportes anunciou a sua intenção de re- da vegetação na paisagem de equilíbrio que
construir e pavimentar a rodovia BR-319, que substitui a floresta. As estimativas de emis-
está abandonada desde 1988. A Secretaria de sões estão restritas à biomassa (fitomassa). O
Estado do Meio Ambiente e Desenvolvimento carbono do solo foi excluído. Em um cenário
Sustentável (SDS), do Governo do Estado do “business-as-usual” para a ALAP, com apenas
Amazonas, e o Ministério do Meio Ambiente as reservas já existentes em 2007, a simulação
(MMA) têm planos para criar uma série de indica 5,1 milhões de hectares desmatados
áreas protegidas dentro da ALAP. Nossa si- até 2050 (38% da ALAP), com uma liberação
mulação compara cenários com e sem as re- consequente de 0,95 Gt (giga toneladas = Gt,
servas de proteção propostas. A reconstrução correspondente a um bilhão de toneladas)
de carbono equivalente ao carbono de CO2
e a pavimentação da rodovia são presumidas
(CO2-equivalente). Em um “cenário de con-
a serem finalizadas em 2011, com a abertura
servação” com as reservas de proteção exis-
de estradas laterais associadas em datas espe-
tentes e propostas, o desmatamento alcan-
cificadas ao longo do período 2014-2024. A si-
çaria 3,4 milhões de hectares até 2050 (22%
mulação de desmatamento acopla os progra- da ALAP), liberando 0,64 Gt de carbono CO2-
mas computacionais DINAMICA e Vensim, e equivalente. O efeito das reservas propostas
incorpora uma série de inovações para per- produz uma redução de 1,6 milhões de hec-
mitir que o total de desmatamento responda tares no desmatamento e 0,31 Gt de carbo-
à melhoria do acesso por estradas. O modelo no CO2-equivalente em emissões de gases de
é baseado em uma parametrização da relação efeito estufa. Como exemplificação do valor
entre desmatamento e expansão viária obser- potencial desta redução, se o carbono fosse
vada em imagens de satélite de uma área no avaliado a US$10 tonelada-1, esta redução em
noroeste de Rondônia, adjacente à ALAP. A emissões equivaleria a US$3,1 bilhões. Como
expansão modelada de estradas endógenas em qualquer simulação, estes resultados de-
não está limitada por uma presunção de um pendem de uma série de presunções relativas
processo de desmatamento puramente “di- ao comportamento do desmatamento. Neste
rigido pela demanda”. Esta suposição impe- caso, largamente influenciado pelas áreas de
diu que outros modelos de desmatamento pequenos agricultores nas quais nosso mode-
na Amazônia representassem o efeito sobre lo foi calibrado. Futuras melhorias para me-
o desmatamento total causado por decisões lhor representar os papéis dos grandes atores
relativas às reservas. Isto, visto que o des- (legais e ilegais) podem resultar em desmata-
matamento total especificado externamente, mento mais rápido nas áreas desprotegidas.
baseado na demanda, implica em um “va-
zamento” de 100% para qualquer benefício PALAVRAS-CHAVE Amazônia, Carbono,
de criação de reservas. A mesma limitação se Desmatamento, Efeito estufa, Unidades de
aplica ao efeito de estradas em modelos di- Conservação, Rodovias
rigidos por demanda. Os resultados obtidos
pelo nosso modelo foram validados a par- INTRODUÇÃO
tir de uma simulação de desmatamento em
Santo. Antônio do Matupi, que fica situado A principal contribuição brasileira ao
adjacente à ALAP, no sul do Amazonas. aquecimento global é o desmatamento

Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 288 8/18/2022 3:15:23 PM


Modelagem de desmatamento e emissões de gases de efeito estufa
na região sob influência da Rodovia Manaus-Porto Velho (BR-319) 289

amazônico (Brasil, MCT, 2004). Modelar pelo governo federal como parte do Plano de
esse processo, portanto, representa uma alta Aceleração do Crescimento (PAC).
prioridade para subsidiar a tomada de medi- Rondônia e Amazonas contrastam nitida-
das visando diminuir essa emissão, inclusi- mente em termos de desmatamento (Figura
ve por meio do aproveitamento do valor da 2). As florestas ao redor de Manaus estão em
Redução de Emissões por Desmatamento e grande parte intactas e o desmatamento está
Degradação (REDD), que é um dos pontos acontecendo em um ritmo relativamente len-
chaves nas negociações sob a Convenção to, enquanto o estado de Rondônia foi quase
de Clima atualmente. Este estudo apresenta completamente desmatado exceto em áreas
simulações de desmatamento e de emissões de terras indígenas e unidades de conserva-
de gases de efeito estufa em uma área no ção, tais como parques nacionais e reservas
estado do Amazonas, onde se espera nas biológicas. Rondônia é a principal fonte de
próximas décadas grandes reduções na co- migrantes que se deslocam para outras áreas
bertura florestal, em decorrência da constru- no sudoeste da Amazônia, tais como o estado
ção da infraestrutura planejada (Figura 1). do Acre e a parte sul do Amazonas. Desde o
Essa área corresponde a “Área sob Limitação período em que a rodovia BR-319 foi abando-
Administrativa Provisória” (ALAP), de nada (1988), Rondônia é fonte de migração
153.995 km2, ao longo da rodovia BR-319, que para áreas circunvizinhas. Esse movimento
corta o estado de norte a sul, unindo Manaus aumentou continuamente, como é eviden-
(Amazonas) e Porto Velho (Rondônia). Essa te na recente expansão do desmatamento
rodovia está abandonada desde 1988, quan- em partes acessíveis do sul do Amazonas,
do o serviço de ônibus entre Manaus e Porto tais como Apuí, Santo Antônio do Matupi,
Velho cessou, entretanto, a reconstrução da Humaitá, Lábrea e Boca do Acre (veja Brasil,
estrada até 2011 foi anunciada recentemente INPE, 2007). Portanto, é razoável deduzir,

Figura 1. Mapa
do Brasil com as
principais rodovias
amazônicas existentes
e planejadas (linhas
tracejadas), inclusive
a BR-319 (Manaus-
Porto Velho) (fonte:
Fearnside & Graça,
2006).

Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 289 8/18/2022 3:15:23 PM


DESTRUIÇÃO E CONSERVAÇÃO
290 DA FLORESTA AMAZÔNICA

Figura 2.
Desmatamento na
Amazônia brasileira
até 2006, baseado em
dados do programa
PRODES do Instituto
Nacional de Pesquisas
Espaciais (INPE)
(desmatamento em
preto) (dados de:
Brasil, INPE, 2007). Em
destaque, a rodovia BR-
319, ainda com grande
parte da cobertura
floresta intacta ao redor
do seu traçado.

sem depender de resultados de modelagem, interflúvio ao desmatamento, uma das estra-


que a reconstrução da rodovia, hoje, reativa- das laterais está planejada para cruzar o rio
ria uma pressão maior para o desmatamen- Purus em Tapauá e continuar até Coari, Tefé
to do que em relação ao período 1974-1988, e Juruá, assim tornando acessível o grande
quando a rodovia permaneceu aberta. bloco de floresta intacta que ocupa a parte
ocidental do estado do Amazonas (Fearnside
Estradas laterais planejadas conectariam
& Graça, 2006). Isto transformaria a geogra-
a rodovia principal a todas as sedes muni-
fia do desmatamento na Amazônia como um
cipais ao longo dos rios Madeira e Purus,
todo, onde aproximadamente 80% da ativi-
provendo áreas substancialmente grandes
dade de desmatamento têm sido restritas ao
ao desmatamento, além de expansão do
“arco de desmatamento”, localizado nas pe-
desmatamento a partir das margens da pró-
riferias sul e leste da floresta, enquanto as
pria rodovia BR-319. Estas estradas laterais
grandes extensões de floresta na Amazônia
não fazem parte do Plano de Aceleração do
ocidental permaneceram intactas devido à
Crescimento, mas são aguardadas pelos mu-
falta de acesso por estrada.
nicípios interessados desde 1997 (A Crítica,
1997). É provável que a pressão política para A rodovia BR-319 teria dois impactos im-
a construção delas seja irresistível depois portantes, como indicado pelo histórico de
que a rodovia principal esteja aberta, e esta outras obras de infraestrutura na Amazônia.
pode ser adotada como premissa na cons- Um deles seria a expansão do desmatamento
trução de cenários modelados. As estradas a partir das margens da rodovia e das es-
laterais possibilitarão o acesso à maior parte tradas laterais associadas (Figura 3). O ou-
do interflúvio Madeira-Purus, que é o mais tro seria facilitar a migração de uma ponta
estreito dos interflúvios entre os afluentes da rodovia até a outra, criando um fluxo
do rio Amazonas e que abriga um núme- de população de Rondônia para Manaus.
ro extraordinariamente grande de espécies Ao chegar em Manaus, parte desta popula-
biológicas endêmicas. Além de abrir este ção ficaria na cidade, parte ocuparia a área

Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 290 8/18/2022 3:15:23 PM


Modelagem de desmatamento e emissões de gases de efeito estufa
na região sob influência da Rodovia Manaus-Porto Velho (BR-319) 291

rural circunvizinha, por exemplo, o Distrito DESAFIOS PARA MODELAR O


Agropecuário da Zona Franca de Manaus DESMATAMENTO
(SUFRAMA), e parte continuaria pela rodo-
via BR-174, já pavimentada, até novas fron- Cenário de linha-base
teiras de desmatamento em Roraima. Neste Como o desmatamento deve ser mode-
último caso, incrementando as altas taxas de lado depende fortemente do propósito das
desmatamento já existentes ao longo de todo estimativas resultantes. Pretende-se que as
o setor sul da BR 174 (Barbosa et al., 2008). estimativas do atual estudo sirvam como
O potencial para tal migração é significativo. uma maneira de quantificar as implicações
É provável que um grande pulso aconteça ambientais de diferentes possíveis decisões
em 2013, ao término da construção das bar- de desenvolvimento, tais como a construção
ragens hidrelétricas de Santo Antônio e Jirau de rodovias e a criação de áreas protegidas.
Cenários com e sem as rodovias ou reser-
no Rio Madeira, em Rondônia. Os projetos
vas servem como base para comparações.
de construção das barragens terão um total
Diferenças nas áreas de floresta perdidas e
de 20.000 trabalhadores, atraídos de todas diferenças em impactos como as emissões
as partes do Brasil, que serão dispensados de gases de efeito estufa proveem medidas
quase simultaneamente quando as represas quantitativas dos custos e benefícios am-
estiverem construídas. É improvável que bientais de diferentes opções de política.
esta população de trabalhadores desempre- A obtenção de crédito de carbono sob o
gados permaneça em Porto Velho, sendo que Protocolo de Kyoto torna-se possível, presu-
uma estrada asfaltada com serviço de ônibus mindo que reduzir o desmatamento ficará
até Manaus fará com que a migração para a elegível para crédito sob o Mecanismo de
Amazônia central seja a opção mais atraente. Desenvolvimento Limpo no Segundo Período

Figura 3. A Rodovia
BR-319 e estradas
laterais propostas
(fonte: Fearnside &
Graça, 2006).

Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 291 8/18/2022 3:15:24 PM


DESTRUIÇÃO E CONSERVAÇÃO
292 DA FLORESTA AMAZÔNICA

de Compromisso do Protocolo (2013-2017). áreas selecionadas para o presente estudo:


É provável que o cálculo do benefício de car- Apuí e a rodovia BR-319.
bono seja com base no critério de “adiciona-
A abordagem que pode ser aplicada para
lidade”, ou seja, o cálculo de emissões evita-
reduzir emissões do desmatamento nas áreas
das que estão além do que teria sido emitido
de estudo é a simulação de um cenário de refe-
na ausência de um projeto de mitigação
rência “Business as Usual” de mudança de uso
dentro do Protocolo de Kyoto (Artigo 12).
da terra. Isto tem que representar o processo de
Isto envolve a comparação do resultado de
desmatamento que é provável para acontecer
um determinado projeto observado com um
sem intervenções ambientais, tais como a cria-
cenário de linha-base hipotético que repre-
ção de áreas protegidas e/ou uma decisão de
senta o que teria acontecido sem o projeto.
cancelar ou adiar o projeto rodoviário a favor
Há duas possíveis abordagens para construir
de um dos outros modos de transporte alter-
o cenário de linha-base. Uma delas consiste
nativos, tais como uma estrada de ferro ou um
em fazer uma extrapolação simples das ten-
porto novo para transporte de frete via cabota-
dências passadas, refletindo a série históri-
gem para São Paulo (veja Fearnside & Graça,
ca de estimativas de desmatamento na área
2006). Para que os que concedem crédito este-
do projeto, baseado em imagens de satélite.
jam satisfeitos de que nenhuma manipulação
Cálculos deste tipo (“linha-base histórica”),
da linha-base aconteceu, o cenário de linha-
também conhecido como “reduções com-
-base deve ser suficientemente transparente,
pensadas”, têm uma atração forte porque
documentado e “conservador” da perspectiva
não podem ser manipulados para exagerar
do crédito de carbono (i.e., desmatamento da
os benefícios de um projeto. Porém, somen-
linha-base exagerado).
te sobre circunstâncias especiais vai fornecer
uma aproximação razoável do resultado in-
tencionado como representação daquilo que Cenários de mitigação
teria sido emitido na ausência do projeto de Qualquer crédito de carbono a ser con-
mitigação. A situação sob a qual a linha-ba- cedido atualmente por reduzir o desmata-
se histórica funcionaria bem é aquela cujo mento terá como base de cálculo as áreas
desmatamento foi procedido rapidamen- de floresta e estoques de carbono que são
te durante algum tempo e uma quantidade observados ou medidos no mundo real, de-
significante de floresta permanece em pé pois que decorrer um período de atividade
e disponível para desmatar. Se uma ampla de mitigação, e não com base em cenários
provisão de floresta não estiver disponível, modelados. Não obstante, cenários que in-
a taxa de desmatamento necessariamente cluem os efeitos de atividades de mitigação
diminuirá mesmo sem um projeto de mitiga- podem ser muito úteis aos tomadores de
ção, portanto, significando que a linha-base decisão no governo, negociadores de clima
histórica gerará apenas “ar quente”, ou cré- e financiadores em potencial de projetos de
dito de carbono sem real benefício climático. mitigação. A mudança de uso da terra em
A outra situação na qual a linha-base períodos futuros precisa ser simulada, tal
histórica não funcionará como planejada é como o período 2007-2050 considerado no
quando muito pouco desmatamento aconte- presente estudo, assim incorporando uma
ceu no passado, mas um desenvolvimento gama de possíveis decisões relativas à infra-
novo, por exemplo, a abertura de uma rodo- estrutura, áreas protegidas e outras possíveis
via, implica em desmatamento significativo ações de governo.
no futuro. Aqui, a linha-base histórica não
gerará nenhum crédito de carbono, porque é
impossível reduzir a taxa de desmatamento
MODELOS ANTERIORES
a um nível abaixo de zero, e qualquer taxa Laurance et al. (2001)
de desmatamento possível sob as condições
futuras seria mais alta do que a desprezível Uma simulação de desmatamento na
taxa histórica. Esta é a situação aplicada às região da Amazônia Legal Brasileira, ao

Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 292 8/18/2022 3:15:24 PM


Modelagem de desmatamento e emissões de gases de efeito estufa
na região sob influência da Rodovia Manaus-Porto Velho (BR-319) 293

longo do período 2000-2020, foi produzida


por Laurance et al. (2001, 2005; Kirby et al., Figura 4. Laurance et
al. (2001), simulação
2003). Esta simulação utilizou a taxa histórica
de desmatamento e
de expansão de desmatamento (e de formas não-floresta (preto)
adicionais de perturbação, tais como a ex- e perturbação (cinza
ploração madeireira) em rodovias existentes, médio e claro) até
2020 em um “cenário
para projetar o que aconteceria se as obras otimista”, se a
de infraestrutura anunciadas sob o Programa infraestrutura projetada,
“Avança Brasil”, de 2001 a 2003, fossem rea- especialmente, a que
lizadas, inclusive a rodovia BR-319. O resul- foi anunciada sob o
programa Avança Brasil
tado mostrou a rota da rodovia BR-319 pro- (inclusive a rodovia
duzindo uma faixa larga de desmatamento, BR-319) tivesse sido
flanqueada por zonas sucessivas de outras construída em 2000.
perturbações (Figura 4). Estas transições fo-
ram representadas em um sistema de infor-
mações geográficas (SIG), onde as transições pela demanda” em sua representação de
ocorreriam em faixas de território, conheci- desmatamento. Isto significa que não só re-
das como “áreas de entorno” ou “buffers”, presentou onde desmatamento aconteceria,
que delineiam áreas de terra localizada a di- mas também quanto seria o desmatamento
ferentes distâncias de feições, como estradas total. Modelos dirigidos pela demanda (como
pavimentadas e não pavimentadas. Nepstad et al., 2000; Soares-Filho et al., 2004,
2005, 2006) calculam o desmatamento total
A simulação de Laurance et al. (2001) era separadamente, baseado em suposições que
uma compilação simples de relações conheci- consideram fatores, tal como o produto inter-
das, por exemplo, entre proximidade de rodo- no bruto (PIB), e então só representa onde
via e desmatamento, para extrair lições para o desmatamento acontece. A diferença é im-
a política. O sistema de informações geográ- portante se o modelo é aplicado para avaliar
ficas utilizado no modelo quantificou os vá- as consequências de decisões individuais de
rios efeitos sobrepostos de projetos diferentes desenvolvimento, tais como construir uma
e estimativas derivadas de desmatamento e estrada ou criar uma reserva. No caso de um
áreas alteradas, assim como, também, permi- modelo puramente dirigido pela demanda, a
tiu uma estimativa grosseira de emissões de construção de uma estrada não aumentaria o
gases de efeito estufa. Não foram incluídas as total de desmatamento, e a criação de uma re-
relações causais subsequentes da expansão serva não o diminuiria, porque o total de des-
do desmatamento. O modelo inclui o efeito
matamento é fixado de antemão sem conside-
inibidor de várias classes de áreas protegidas.
rar o efeito dessas ações de política. Isto faz
A inclusão de efeitos de áreas protegidas e
com que o modelo de Laurance et al. (2001)
de formas de perturbação que não fossem o
tenha conclusões sobre o total de desmata-
desmatamento total representava vantagens
mento, enquanto outros modelos com mui-
significantes quando comparado a outros
to mais complexidade na sua representação
modelos desenvolvidos na mesma época (por
espacial, podem apenas indicar a localização
exemplo, Nepstad et al., 2000, 2001). Na re-
e não a quantidade de desmatamento, sendo
alidade, o efeito das reservas junto com a es-
que a taxa de desmatamento é apenas uma
colha de locais, como a fonte de dados para o
premissa de entrada para os cenários.
desmatamento histórico, resultou em estima-
tivas mais conservadoras do desmatamento
no estudo de Laurance et al. (2001) do que Aguiar (2006)
no estudo de Nepstad et al. (2000, 2001) (veja
O desmatamento na Amazônia Legal
Fearnside, 2002).
Brasileira foi simulado usando o progra-
Apesar das limitações do modelo de ma computacional CLUE (Conversion of
Laurance et al. (2001), este teve como carac- Land Use and its Effects), desenvolvido pela
terística importante o de não ser “dirigido Universidade de Wageningen, na Holanda

Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 293 8/18/2022 3:15:24 PM


DESTRUIÇÃO E CONSERVAÇÃO
294 DA FLORESTA AMAZÔNICA

(Aguiar, 2006; Aguiar et al., 2007). Uma si- será o mesmo, ainda que estradas ou reservas
mulação específica para a área da rodovia sejam criadas, isto só mudará a distribuição
BR-319 também foi executada (Rede Temática espacial do desmatamento, e não a sua ex-
GEOMA, 2006; Câmara, 2007). O CLUE pro- tensão total. No jargão que cerca o Protocolo
duz uma representação de espaço do local de de Kyoto, criar uma reserva resulta em 100%
desmatamento baseado em tais fatores como: de “vazamento”, ou seja, o desmatamento
distância até mercados, distância até estradas, evitado dentro da área da reserva criada sim-
qualidade do solo e status como área protegi- plesmente seria deslocado para outro local.
da (Veldkamp et al., 2001; Kok et al, 2001; Isto pode ser visto na Figura 5, onde o des-
Verburg et al., 2002). As relações entre o uso matamento que teria acontecido nas reser-
da terra e seus fatores determinantes são ava- vas propostas ao longo da rodovia de BR-319
liadas a partir de regressões logísticas. A re- aconteceu no Acre, Boca do Acre e na área ao
solução espacial é bastante grosseira quando redor de Manaus.
áreas extensas são simuladas. Por exemplo,
Aguiar (2006) usou um tamanho de célula de Soares-Filho et al. (2006)
grade de 25 km × 25 km. O programa não
inclui meios para calcular o total de desma- Britaldo Soares-Filho e colaboradores de-
tamento, e isto culmina na presunção de que senvolveram um pacote de software chamado
o desmatamento anual segue uma trajetória DINAMICA para simular a distribuição es-
fixa, podendo permanecer constante a um pacial do desmatamento (Soares-Filho et al.,
determinado nível, aumentando linearmente 2002, 2003; Soares-Filho, 2004). Nas simu-
por uma quantia fixa a cada ano, ou aumentar lações, o programa DINAMICA pode operar
exponencialmente por uma porcentagem fixa junto com a contribuição de uma simulação
anualmente. Isto limita severamente os pro- não espacial executada no software Vensim
pósitos para os quais as simulações podem (Ventana Systems Inc., 2007). Recentes me-
ser aplicadas. Não podem ser representados lhorias no software DINAMICA permitem que
os efeitos de decisões de políticas diferentes, cálculos feitos pelo Vensim sejam executados
como construção de estradas e criação de re- dentro do próprio DINAMICA. Baseado em
servas, porque o desmatamento total anual indicadores econômicos como crescimento do

Figura 5. Efeito de
áreas protegidas
propostas na BR-
319 ALAP indicado
pelo deslocamento
do desmatamento
em outras áreas
(indicado pelo círculo
vermelho) em uma
simulação em CLUE
(Fonte: Rede Temática
GEOMA, 2006;
também veja Câmara,
2007). Porém, este
“vazamento” é um
artefato do método
de simulação que usa
um valor externamente
especificado pelo total
de desmatamento
(veja texto).

Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 294 8/18/2022 3:15:25 PM


Modelagem de desmatamento e emissões de gases de efeito estufa
na região sob influência da Rodovia Manaus-Porto Velho (BR-319) 295

PIB, o programa Vensim calcula o desmata- Collor de Mello) e depois teve um pico em
mento total durante cada ano a ser simulado. 1995 (seguindo o início do Plano Real), que
O vetor das taxas de desmatamento anuais é refletiam a disponibilidade de dinheiro para
passado então ao programa DINAMICA que investimento em desmatamento (i.e., a capa-
determina onde a alocação do desmatamento cidade dos fazendeiros para desmatar).
acontecerá baseada em pesos de evidência, ou O software DINAMICA inclui rotinas
na probabilidade relativa que cada célula na para simular a construção de redes de estra-
grade que representa a paisagem será desflo- das secundárias e para iniciar focos de des-
restada. Estes pesos são derivados de relações matamento novos (ao invés da expansão de
calculadas de pares de imagens de satélite das clareiras já existentes). Estas características
quais são feitos cálculos de probabilidade de fazem o DINAMICA mais complexo do que
desmatar a distâncias diferentes de estradas, o CLUE, e permite representar alguns aspec-
considerando a influência da qualidade do tos que são conhecidos do desmatamento no
solo, a influência de áreas protegidas, distân- Brasil. Especialmente importante é a expan-
cia dos mercados, distância do desmatamento são da rede de estradas endógenas (Souza Jr.
existente e outras características. et al., 2005) e o processo de estabelecimento
O modelo do Vensim usado por Soares- de novas fronteiras (Fearnside, 1987).
Filho et al. (2006) calcula o vetor de taxas de Simulações com o DINAMICA indicam a
desmatamento, ou seja, de “demanda” para rota da rodovia BR-319 formando um enorme
desmatamento, para o período inteiro da si- corredor de desmatamento. Praticamente o
mulação (2001-2050) separadamente do mo- interflúvio Madeira-Purus inteiro é indicado
delo espacial do DINAMICA. Posteriormente, como desmatado até 2050 (Soares-Filho et
repassa este vetor para que o DINAMICA al., 2006; veja Figura 6).
possa determinar onde este desmatamento
ocorre. Não há uma retroalimentação anual As simulações e capacidades dos softwa-
entre os dois modelos, que seria necessária res DINAMICA e Vensim evoluíram continua-
mente (Soares-Filho et al., 2003, 2004, 2006).
para que as características espaciais possam
Estes proveram séries úteis de representações
influenciar na taxa de desmatamento no ano
de como é provável que o desmatamento se
seguinte. Portanto, a existência de reservas
espalhe conforme cenários do tipo “Business
não muda o total de desmatamento (i.e., o
as Usual”. Séries paralelas de cenários de go-
vazamento é de 100%). O uso do modelo
vernança representaram o que aconteceria
para o efeito de reservas envolve recortar as
se regulamentos como o Código Florestal de
áreas das reservas e subtrair o desmatamento
contido nelas do total, ou seja, um método
de “cookie cutter” (cortador de biscoitos), que
efetivamente representa um vazamento zero
(i.e., Soares-Filho & Dietzsch, 2008). O que
limita o quanto que um fazendeiro desmata e,
portanto, o quanto o conjunto de todos os ato-
res desmata no total, normalmente é a capaci-
dade do fazendeiro, ou seja, a oportunidade.
Se tivesse mais dinheiro, mais mão-de-obra,
e menos risco de punição, então, desmataria
mais. Sua opção de desmatar não está dire-
tamente associada à regulação do mercado,
Figura 6. O cenário de
com base na lei da oferta e da procura, e referência (“Business
sim pela disponibilidade de capital. Isto está as Usual”) de Soares-
exemplificado no histórico de subidas e deci- Filho et al. (2006)
indica praticamente
das na taxa de desmatamento amazônico, a o interflúvio Madeira-
qual declinou de 1988 até o ponto mais baixo Purus inteiro sendo
em 1991 (recessão no governo de Fernando desmatado até 2050.

Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 295 8/18/2022 3:15:25 PM


DESTRUIÇÃO E CONSERVAÇÃO
296 DA FLORESTA AMAZÔNICA

1965 (Brasil, 1965) fossem respeitados, com- do desmatamento: uma redução de 20% no
binado com uma diminuição do desmatamen- custo de transporte resulta em um aumento
to total por uma quantidade presumida (por no desmatamento na Amazônia de 29-32%
exemplo, Carvalho et al., 2001, 2002; Soares- (Cattaneo, 2001, p. 230). Em uma análise fei-
Filho et al., 2006). Estes estão baseados em ta por Chomitz & Thomas (2003), desenha-
suposições relativas à quantidade global de da para testar o efeito da pluviosidade sobre
desmatamento ao invés de ser derivado de taxas de desmatamento, demonstrou que as
cálculos baseados em dados sobre como o estradas aumentam o desmatamento, mas
comportamento do desmatamento responde a magnitude do aumento depende sobre o
a medidas específicas de política. A utilidade controle de outras variáveis, tais como o im-
de tais cenários de governança está no foco pacto do desmatamento pré-existente, que
da discussão sobre a necessidade de gover- tem um efeito que se mescla com o das es-
nança, mas os cenários não deveriam ser con- tradas. Análises no nível municipal indicam
fundidos com um cenário “com projeto” para que estradas aumentam o desmatamento
qualquer determinado conjunto de medidas em locais onde muito da floresta permanece
de governança, tais como o Programa “BR- intacta (como é o caso na ALAP da rodo-
163 Sustentável” (veja: Alencar et al., 2004, via BR-319), mas em locais onde o processo
2005) no caso da rodovia Santarém-Cuiabá de desmatamento já está bem avançado a
(veja Fearnside, 2007). Diferente dos cená- construção de estradas adicionais diminui o
rios utilizados no modelo de Soares-Filho et desmatamento (Andersen et al., 2002; Reis &
al. (2006), os cenários do presente estudo se Weinhold, 2004). No entanto, estudos sub-
restringem aos efeitos de estradas e reservas e sequentes das mesmas bases de dados do
não oferecem cenários de governança. IBGE, mas usando dados ao nível de unida-
des de censo (i.e., com aproximadamente 20
Modelos econométricos e outros vezes mais dados), indicam que estradas são
propulsores do desmatamento em todas as
Outros tipos de modelagem, especial- fases do processo (Pfaff et al., 2007).
mente modelos econométricos, têm sido
aplicados ao desmatamento amazônico.
Geralmente estes se aplicam a uma esca- UM MODELO PARA DESMATAMENTO NA
la maior, representando, por exemplo, a BR-319
Amazônia brasileira como um todo, sem
ser detalhados em termos espaciais. Os da- Abordagem de simulação com o DINAMICA
dos geralmente vêm de censos ao nível de Modelo conceitual do DINAMICA
município, ou então de unidades de cen-
so, do Instituto Brasileiro de Geografia e O DINAMICA é um modelo de simulação
Estatística (IBGE). Exemplos incluem as explicitamente espacial da dinâmica da pai-
equações desenvolvidas por Reis & Margulis sagem que se baseia em um algoritmo de au-
(1991) e Reis & Guzmán (1994), para as- tônomo celular. Modelos fundamentados em
sociar a taxa de desmatamento com dados autômatos celulares, tal como o DINAMICA,
sobre população, percentagem de área em podem ser entendidos como sistemas de di-
cultivos agrícolas, densidade de bovinos por nâmica espacial no qual o estado de cada
km2, intensidade de exploração madeireira célula dentro de um arranjo espacial (grade
em m3 km-2, comprimento de estradas por de células) depende do estado prévio das
km2, distância da capital do estado, e uma células de vizinhança, de acordo com um
variável dummy para representar diferenças conjunto de regras de transição estabeleci-
entre estados. Nestes modelos, as estradas do. Conforme Soares-Filho et al. (2006), au-
são consideradas como um determinante tônomos celulares são capazes de simular
significativo do desmatamento. O custo de os padrões espaciais do desmatamento in-
transporte, que depende diretamente da dis- corporando um mapa de probabilidades re-
ponibilidade e qualidade das estradas, tem presentando a influência integrada de dados
sido mostrado ser um determinante chave cartográficos na alocação do desmatamento.

Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 296 8/18/2022 3:15:25 PM


Modelagem de desmatamento e emissões de gases de efeito estufa
na região sob influência da Rodovia Manaus-Porto Velho (BR-319) 297

O DINAMICA reúne: funções de transição pode ser encontrado no site http://www.csr.


baseadas na vizinhança multi-escala; con- ufmg.br/dinamica.
ceito de fases utilizando um processo esto-
cástico de simulação em múltiplas etapas; Parâmetros para a ALAP BR-319
um método de retroalimentação espacial a
partir de cálculos de variáveis dinâmicas; Desenvolvimento do modelo para a ALAP BR-319
uma componente que direciona a expansão O modelo foi desenvolvido em dois mó-
da malha viária; e pesos de evidência para dulos acoplados, cada um deles executado
calcular as probabilidades de transição da em software diferente. Um modelo não espa-
dinâmica espacial. Seu arcabouço também cial executado em Vensim 3.0 e um modelo
foi concebido para acoplar outros modelos espacial desenvolvido em DINAMICA EGO
em uma arquitetura multinível constituído (versão mais recente do programa), com re-
de submodelos. O esquema do arcabouço do solução espacial de 500 m. Estes dois mode-
DINAMICA ilustrando suas funcionalidades los permutam parâmetros em cada ciclo da
pode ser observado na Figura 7. simulação como se apresenta na Figura 8.
Um maior detalhamento das funcionali- O modelo Vensim calcula as taxas e as dis-
dades incorporadas no programa DINAMICA ponibiliza para o modelo espacial DINAMICA

Figura 7. Fluxograma
esquematizando
a arquitetura do
DINAMICA. Fonte:
modificado de http://
www.ufmg.br/csr/
dinamica, acesso em
13/10/2007.

Figura 8. Acoplamento
dos modelos não
espacial e espacial.
Em cada ciclo são
enviadas as variáveis
calculadas entre os
módulos.

Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 297 8/18/2022 3:15:26 PM


DESTRUIÇÃO E CONSERVAÇÃO
298 DA FLORESTA AMAZÔNICA

EGO. As taxas calculadas são as de desmata- em função da superfície de estradas que ain-
mento, “clearing” (corte das florestas secun- da não tenham produzido desmatamento.
dárias, “capoeiras”) e recuperação (regenera-
Os mapas de estradas combinados com
ção da vegetação). Para o cálculo das taxas, o
os mapas de uso do ciclo anterior geram ma-
modelo espacial disponibiliza valores quan-
pas de floresta disponível sobre os quais são
titativos que caracteriza a cena, como as su-
aplicadas as taxas fornecidas pelo módulo
perfícies de floresta acessível e fundiária entre
outras, e a de extensão de estradas que ainda não espacial (Vensim). Esta superfície de
não tem produzido desmatamento. A Figura floresta disponível é uma das principais ino-
9 apresenta um quadro sintético dos fluxos de vações deste modelo espacial. Esta superfí-
informação em cada ciclo. cie está estreitamente relacionada com o de-
senvolvimento da rede de estradas, e com a
A primeira linha do diagrama corres- localização de áreas de proteção ambiental,
ponde ao módulo espacial de construção de como veremos no ponto seguinte. A floresta
estradas. Este utiliza os conceitos de atrati- disponível é uma faixa de floresta a 10 km de
vidade e fricção para seu funcionamento. A distância das estradas. Dentro desta faixa se
atratividade é formada por mapas numéri- encontra a faixa de floresta fundiária (flores-
cos, onde as áreas propícias para agropecu- tas disponíveis em uma propriedade padrão,
ária possuem os maiores valores e as áreas tal como aquelas oriundas de assentamentos
protegidas ou inundáveis possuem os meno- antigos do INCRA na BR-319) relacionada
res valores e as áreas de proteção integral va- com a propriedade de pequena ocupação.
lor zero. Nos mapas de fricção as áreas com
maior declividade, inundadas ou com prote- O cálculo das taxas para desmatamento,
ção ambiental possuem os maiores valores. clearing e recuperação está relacionado com
Desta forma, o módulo aumenta a rede de a superfície fundiária, uma faixa de 2 km de
estradas e disponibiliza o novo mapa para o distância à estrada. A área de floresta dentro
resto do modelo. Este módulo de construção desta faixa modifica a atividade agropecuária.
de estradas pode ter sua atividade regulada Na esquerda da Figura 10 observa-se a série de

Figura 9. Diagrama
dos fluxos de
informação onde são
indicadas as inovações
desenvolvidas
no laboratório de
Agroecologia do INPA.

Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 298 8/18/2022 3:15:26 PM


Modelagem de desmatamento e emissões de gases de efeito estufa
na região sob influência da Rodovia Manaus-Porto Velho (BR-319) 299

Figura 10.
Esquematização do
modelo numérico
elaborado em Vensim.
O módulo principal de
cálculo e os módulos
de transferência das
variáveis localizados
no centro da figura
(anéis concêntricos);
à esquerda, a entrada
de variáveis iniciais
do DINAMICA no
modelo não espacial
e, à direita, a saída das
taxas para o modelo
espacial.

variáveis de superfície que o modelo espacial al., 2002), por exemplo, atravessar áreas com
envia ao modelo numérico para o cálculo das maior declividade, áreas inundadas e áreas
taxas. O módulo numérico do Vensim calcula protegidas produzem trajetos de maior cus-
as demandas para cada tipo de uso da terra e to. O terceiro módulo está relacionado com a
as disponibiliza para a rotina de expansão do regulação da atividade. Neste módulo é com-
desmatamento do modelo espacial. parado o mapa de desmatamento correspon-
dente a uma dada iteração com o mapa da
Construção de estrada BR-319 e estradas rede de estradas correspondente. Desta ma-
laterais neira, uma proporção alta de estradas que te-
nha produzido desmatamento resulta em um
A construção de estradas no modelo aumento da atividade do “construtor de estra-
DINAMICA está dividida em duas instân- das”. Este é um mecanismo de autorregularão
cias, uma delas constituída por uma rotina que aproxima o comportamento do autômato
interna de construção automática e outra ao esperado na realidade.
por rotina de incorporação de mapas de es-
tradas planejadas.
Incorporação de estradas planejadas
A rotina automática, ou “construtor de es-
tradas”, é formada por três módulos automá- As estradas planejadas são incorporadas
ticos, o principal constrói estradas com base ao modelo em etapas predefinidas, relaciona-
na localização probabilística de destinos. A das às datas estimadas de construção extraí-
distância destes destinos é regulada pelo esta- das do plano diretor do Estado. Dentre estas
do de atividade. Um “construtor de estradas” estradas foram incluídas aquelas do segmen-
mais ativo significa destinos mais distantes to central da BR-319 (trecho Realidade-Igapó
(estradas de penetração), e menos ativos com- Açu) no ano 2011, a estrada vicinal BR-319-
preende destinos mais próximos (estradas de Manicoré (AM-464), atualmente abandonada,
consolidação). O segundo módulo calcula o no ano 2014, a vicinal BR-319-Borba (AM-356)
custo do trajeto até o destino, este custo é cal- no ano 2017, BR-319-Tapauá (AM-366) proje-
culado com base na fricção (Soares-Filho et tada para conectar via terrestre a região de

Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 299 8/18/2022 3:15:27 PM


DESTRUIÇÃO E CONSERVAÇÃO
300 DA FLORESTA AMAZÔNICA

Coari, Tapauá-Coari (AM-365) ano 2021 e BR- Modelo Vensim


319-Nova Aripuanã (AM-360) no ano 2024.
O modelo desenvolvido no Vensim re-
Construtor de estradas com ciclos de presenta apenas um esqueleto para receber
futuros componentes para representar os
atividade
efeitos de fatores macroeconômicos e de po-
O construtor de estradas aumenta sua líticas públicas que afetam os preços e, por-
atividade quando a maioria das estradas tem tanto, o lucro do desmatamento. As flutua-
produzido desmatamento nas suas proximi- ções simuladas nas taxas de desmatamento
dades. Deste modo, a atividade de constru- seriam maiores com a incorporação destes
ção varia em relação com a saturação das efeitos não-espaciais importantes. As flutu-
estradas com desmatamento. O ciclo de ati- ações nas taxas internas de desmatamento
vidade baixo está relacionado com destinos nas simulações atuais se devem a ciclos na
na ordem de 2 km, o que, em geral, significa estimulação de desmatamento pela extensão
o adensamento da rede de estradas ou cons- da rede de estradas, aumentando em pulsos
trução de estradas de consolidação. O ciclo a área “disponível” ao desmatamento, o que
médio utiliza destinos ao dobro do ciclo me- representa um padrão concordante com o
nos ativo, e o ciclo alto localiza destinos a nosso entendimento do padrão temporal do
6 km e, em geral, os traçados configuram desmatamento real (e.g., Fearnside, 1989).
estradas de penetração. Este tipo de estra-
da é orientado pelos traçados preferenciais
Cenários para a região
localizados em mapas de fricção nos quais
se baseia o cálculo dos custos dos traçados. Cenário de referência

Na primeira fase deste estudo o modelo é


Construtor de estradas com traçados
executado para o cenário de referência com
preferenciais
as seguintes suposições:
A trajetória das estradas não está comple- I. As unidades de conservação e terras in-
tamente relacionada com o cálculo simples de dígenas implementadas até 2007 estão
custos e atratividade, mas também é definida incluídas na análise (veja mapa das uni-
pelo padrão espacial de construção caracte- dades de conservação, Figura 11, e as ter-
rística na região da simulação. Estes padrões
ras indígenas, Figura 12);
podem ser observados na construção de es-
tradas vicinais (ramais ou travessões) a cada II. A implementação das unidades de con-
15 km nas estradas principais. Assim como, servação existentes é eficaz e não têm
estradas de penetração em sentido radial ao desmatamento no seu interior;
adensamento da ocupação e malha viária de III. Não há desmatamento dentro das terras
consolidação condicionada pela disposição indígenas.
fundiária de lotes, entre outras variáveis que
são utilizadas para a formação dos mapas de Cenário conservação
atratividade e fricção correspondentes a cada
ciclo da simulação (iteração). Suposições do cenário chamado
Conservação (Figura 13) foram:
Unidades de conservação existentes e I. As unidades de conservação e terras in-
propostas dígenas implementadas até 2007 estão
incluídas na análise;
O modelo desenvolvido considera a in-
clusão de unidades de conservação exis- II. As unidades de conservação propostas
tentes e, também, aquelas propostas para a para a área de ALAP-BR-319 estão incluí-
ALAP da BR-319. das na análise;

Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 300 8/18/2022 3:15:27 PM


Modelagem de desmatamento e emissões de gases de efeito estufa
na região sob influência da Rodovia Manaus-Porto Velho (BR-319) 301

Figura 11. Mapa


com unidades de
conservação estaduais
e federais

Figura 12. Mapa de


terras indígenas na
área da ALAP com
zona de “buffer” de
100 km

Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 301 8/18/2022 3:15:28 PM


DESTRUIÇÃO E CONSERVAÇÃO
302 DA FLORESTA AMAZÔNICA

Figura 13. Mapa


das unidades
de conservação
propostas para a
regiao da ALAP

III. A implementação das unidades de con- Dados espaciais de entrada


servação existentes e propostas é eficaz e
não têm desmatamento dentro das áreas; Dados espaciais de entrada para o mo-
delo são:
IV. Não tem desmatamento dentro das terras
indígenas; I. Mapas de cobertura da terra de tempo
inicial (t1) (derivados dos dados de des-
matamento do PRODES para o ano 2000
, Brasil, INPE, 2007) e o tempo seguinte
(t1+x) (derivados dos dados do PRODES
referentes a 2004, Brasil, INPE, 2007)
para cálculo da taxa de transição e para
o cálculo dos pesos de evidência, veja
Figura 14 & 15.
II. Mapas de variáveis estáticas (discretas e
contínuas):
a. Tipo de solo (RADAMBRASIL)
Figura 14. Mapa
b. Tipo de vegetação (IBGE/SIPAM)
cobertura da terra
no ano 2000. c. Altitude (SRTM)
Legenda do mapa:
1-Desmatamento; d. Declividade (derivado do SRTM)
2- Não floresta; 3-
Floresta; 4- Água. e. Distância aos rios (ANA)

Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 302 8/18/2022 3:15:29 PM


Modelagem de desmatamento e emissões de gases de efeito estufa
na região sob influência da Rodovia Manaus-Porto Velho (BR-319) 303

f.
Distância estradas primárias
(CSR-UFMG)
g.
Distância estradas secundárias
(CSR-UFMG)
h. Atratividade a centros urbanos (deri-
vado de IBGE)
O mapa de distâncias às estradas é apre-
sentado na Figura 16.
III. Mapa de fricção
Figura 15. Mapa
O mapa de fricção foi elaborado a partir cobertura da terra
de dados de declividade e áreas de proteção no ano 2004.
ambiental (UCs) existentes nos cenários. A Legenda do mapa:
1-Desmatamento;
fricção é uma variável que influencia a ativi- 2- Não floresta; 3-
dade do módulo de construtor de estradas. Floresta; 4- Água.

IV. Mapa de atratividade


O mapa de atratividade (Figura 17) é cal-
culado a partir da propriedade de áreas que
funcionam como polos de atração de ativida-
de humana, tais como mapas de aptidão agrí-
cola, áreas inundáveis e reservas de proteção.
Estas duas últimas possuem baixa atrativida-
de. Esse mapa também orienta a atividade do
módulo de construtor de estradas.

Estabelecimento de relações funcionais


Relação entre estradas e taxa de desmatamento
A construção de estradas incorpora a
superfície de floresta, atualizada a cada ite- Figura 16. Mapa de
ração, ao sistema da simulação. Esta incor- distância às estradas
poração está definida por uma faixa de 10
km (buffer) em ambos os lados das estradas.
A superfície assim definida é denominada
de floresta acessível. Deste modo, a super-
fície de floresta acessível pode aumentar no
máximo de 20 km2 por cada quilômetro de
estrada construída nos casos de estradas de
penetração. Nos casos de estradas vicinais
ou ramais, o aumento da superfície disponí-
vel pode ser até nula.
A incorporação de superfície de floresta
disponível é minimizada quando existem
áreas de proteção integral ou terras indígenas
vizinhas ao traçado, estas áreas não se in- Figura 17. Mapa de
atratividade. A legenda
corporam à floresta disponível. A construção
do mapa refere-se aos
de estradas também é inibida pela presença pesos de atratividade,
de áreas de proteção integral. Nestes casos o em ordem crescente.

Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 303 8/18/2022 3:15:30 PM


DESTRUIÇÃO E CONSERVAÇÃO
304 DA FLORESTA AMAZÔNICA

incremento da superfície de floresta dispo- Variáveis do DINAMICA que alimentam o


nível pode ser zero quando a construção de Vensim
estradas acontece nas proximidades ou den-
tro das áreas de proteção, assim a superfície As variáveis geradas no DINAMICA são
desmatada também não aumentará embora exclusivamente de superfície, as principais
as estradas possam ser de penetração. são: superfície de floresta, área desmatada,
área de florestas secundárias (capoeiras) e
Este conceito de acessibilidade implica
área fundiária. Estas variáveis são incorpo-
que a atividade de construção de estradas
radas no modelo de simulação numérica do
aumenta positivamente o desmatamento
Vensim para produzir uma taxa de desmata-
através da aplicação das taxas internas de
mento, uma taxa de clearing (corte de flores-
desmatamento segundo a equação (1) se-
ta secundária) e uma taxa de recuperação.
guinte, na qual a superfície desmatada cor-
responde à superfície desmatada no ciclo
correspondente; Modificações nos modelos existentes de
DINAMICA

Sup. desmatada = Tx interna × Sup. flores- As seguintes modificações foram reali-


ta.acessível (1) zadas nos modelos existentes desenvolvidos
na Universidade Federal de Minas Gerais
(Soares-Filho et al., 2003, 2004, 2006):
Onde,
Sup. desmatada representa a superfície total I. Acoplamento do modelo espacial
desmatada em um dado ciclo; DINAMICA com o modelo numérico do
Tx.interna refere-se às taxas de desmata- programa Vensim;
mento calculadas a partir da disponibilidade II. Construtor de estradas ativado por raio
de áreas acessíveis ao desmatamento; de alcance de estradas para desmata-
Sup.floresta.acessível representa a superfície mento, alternando entre atividades de
total de floresta capaz de ser utilizada para o construção para extensão da rede e para
desmatamento. penetração na floresta;
III. Construtor de estradas orientado por es-
tradas planejadas para o futuro;
Nesta equação se observa que, embora
a taxa interna de desmatamento possa não IV. Busca por destinos pelo construtor de
variar, a superfície desmatada em cada ciclo estradas, com preferência às áreas pla-
varia com as variações da superfície de flo- nas e de platô, evitando áreas alagadas;
resta acessível. V. Geração de um mapa de atratividade
para o desmatamento baseado na den-
Superfície fundiária e floresta disponível sidade de estradas;
A atividade de desmatamento é formada VI. Geração de uma superfície de floresta
por uma atividade basal constante associada acessível com base no mapa de estra-
a uma superfície fundiária. Esta superfície é das, este valor de superfície é fornecido
constituída por todas as células localizadas ao modelo Vensim;
a menos de 2 km do traçado das estradas.
VII. Geração da extensão de estradas sem
Isto está relacionado com uma atividade de
desmatamento, fornecida ao modelo
desmatamento de pequenas propriedades
Vensim;
agropecuárias que em geral varia pouco com
as variações econômicas. Esta superfície es- VIII. Geração de uma superfície de floresta
treita constitui uma faixa muito atrativa para disponível para atividade fundiária, de-
o desmatamento, e se ajusta conforme a va- finida pela distância menor de 2 km das
riações da densidade da rede de estradas. estradas.

Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 304 8/18/2022 3:15:30 PM


Modelagem de desmatamento e emissões de gases de efeito estufa
na região sob influência da Rodovia Manaus-Porto Velho (BR-319) 305

Calibração do Modelo Central, entre Manaus e Porto Velho e ao lon-


go da Transamazônica (BR-230), ver Figura
O software DINAMICA-EGO fornece uma 18. A taxa anual foi derivada a partir da
série de operadores especialmente desenvol- média anual calculada para o período 2000-
vidos para calibração e validação (Rodrigues 2004. A taxa de transição no modelo adapta-
et al., 2007). No desenvolvimento do mode- do neste estudo é calculada a partir de dados
lo de mudança do uso e cobertura da ter- de desmatamento, apenas na primeira itera-
ra (LUCC) existem diferentes momentos de ção, sendo atualizada a cada iteração pelo
calibração do modelo. Uma das ferramentas modelo numérico desenvolvido no Vensim.
de calibração do modelo é o calculo da taxa
de transição das classes de cobertura. Neste Validação do Modelo
caso particular da modelagem de desmata-
mento, a transição na região modelada é de O resultado global foi validado em sua
floresta para área desflorestada. Dados de aplicação para a área de Matupi (Figura
desmatamento obtidos do projeto PRODES 19). Aqui a quantidade e o padrão espa-
(Brasil, INPE, 2007) do período 2000 até cial do desmatamento simulado confirmam
2004 são utilizados para o cálculo da taxa de de forma aproximada o que é observado
transição e para analisar a tendência de des- nas imagens de satélite (PRODES) (Brasil
matamento anual para o período 2000-2006, INPE, 2007). Porém, deve ser notado que o
em diferentes locais da região da Amazônia tipo de desmatamento representado aqui é

Figura 18. Mapa das


subáreas na região da
ALAP, as quais foram
utilizadas para análise
dos padrões temporais
de desmatamento. Nas
sub-áreas as cores
representam: verde
– floresta; amarelo -
não-floresta; vermelho
– desmatamento; azul
– água; branco – sem
dados.

Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 305 8/18/2022 3:15:30 PM


DESTRUIÇÃO E CONSERVAÇÃO
306 DA FLORESTA AMAZÔNICA

produzido por pequenos agricultores, como Resultados sobre desmatamento


aqueles ao norte da área da barragem de
Samuel, em Rondônia, onde a relação foi Cenário de referência
estabelecida entre estradas e a expansão de
Os resultados da simulação utilizando o
desmatamento. Os efeitos de outros atores
cenário de referência são apresentados nas
também precisam ser modelados (veja seção
Figuras 20 e 21.
em melhorias futuras). Em geral, estes ou-
tros atores (grandes fazendeiros) produzirão O percentual desmatado resultante da si-
desmatamento mais rápido. mulação que teria acontecido na cobertura

Figura 19.
Comparação entre
o desmatamento
modelado e observado
em Matupí, provendo
alguma validação os
resultados globais do
modelo.

Figura 20. Mapa


desmatamento até
2050, cenário de
referência

Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 306 8/18/2022 3:15:32 PM


Modelagem de desmatamento e emissões de gases de efeito estufa
na região sob influência da Rodovia Manaus-Porto Velho (BR-319) 307

florestal das áreas de reservas de proteção II. O aumento da taxa de desmatamento no


propostas pelo governo, caso que não fos- intervalo entre os anos 2004 e 2015 está
sem criadas, está indicado na Tabela 1. As relacionado com a construção das estra-
percentagens desmatadas até 2050 nas uni-
das planejadas e a reconstrução e asfalta-
dades de conservação indicada pelo modelo
deste estudo variam desde 0,4 até 77,6% no mento da BR-319.
cenário de referência.
Cenário Conservação
Características:
I. No cenário de referência a área de des- Os resultados da simulação consideran-
matamento projetada para 2050 chega do o cenário de conservação são apresenta-
até 38% da área da floresta original. dos nas Figuras 22 e 23.

Figura 21. Área


desmatada acumulada,
cenário de referência

Figura 22. Mapa


desmatamento
até 2050, cenário
“Conservação”

Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 307 8/18/2022 3:15:33 PM


DESTRUIÇÃO E CONSERVAÇÃO
308 DA FLORESTA AMAZÔNICA

Figura 23.Área
desmatada acumulada,
cenário “Conservação”

Tabela 1. Unidades de
Conservação Propostas
BIOMASSA E EMISSÕES
e Porcentagem
desflorestada no Biomassa florestal na área de influência
Cenário 1 da BR-319
Estimativa da biomassa florestal dos ecossiste-
mas terrestres

Neste trabalho, considerou-se a biomas-


sa total como o conjunto da massa vegetal
(viva e morta) presente em cada um dos
ecossistemas terrestres (acima + abaixo do
solo). A biomassa total dos diferentes ecos-
sistemas terrestres presentes ao longo da
área de influência da BR-319 foi calculada a
partir dos dados de volume de madeira co-
mercial (m3 ha-1) de 306 parcelas (1 ha cada)
amostradas pelos inventários florestais do
Características: Projeto RADAMBRASIL realizados entre os
I. No cenário Conservação a área desflores- estados de Rondônia (35 parcelas; 11,4%)
tada projetada para 2050 chega até 25% e Amazonas (272 parcelas; 88,6%) (Brasil,
da área da floresta original. Projeto RADAMBASIL, 1973-1984). Cada par-
II. O aumento da taxa de desmatamento no cela amostrada pelo Projeto RADAMBRASIL,
intervalo entre os anos 2004 e 2015 está nesta região da Amazônia, representa o resul-
relacionado com a construção das estra- tado do volume total de madeira comercial
das planejadas e a reconstrução e asfalta- com circunferência à altura do peito (CAP)
mento da BR-319. maior ou igual a 100 cm (correspondente a

Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 308 8/18/2022 3:15:34 PM


Modelagem de desmatamento e emissões de gases de efeito estufa
na região sob influência da Rodovia Manaus-Porto Velho (BR-319) 309

31,8 cm de DAP - diâmetro à altura do peito), das Minas e Energia (MME) nas décadas
exclusivamente para sistemas florestais. de 1970 e 1980 (escala 1:1.000.000) (Brasil,
Projeto RADAMBRASIL, 1973-1984). O re-
Para transformar os dados de volume de
sultado bruto dos inventários (volume da
madeira em biomassa por unidade de área (t
madeira com casca, número de espécies e
ha-1), como método de ajuste, foram utilizados
de indivíduos) foi obtido das publicações do
os fatores de expansão de volume (VEF = 1,25 MME, enquanto que a base física (localiza-
para florestas densas e 1,5 para não densas) ção dos pontos amostrais) das espécies botâ-
para adicionar os volumes correspondentes aos nicas do inventário foi extraída do banco de
fustes das árvores menores (com DAP entre 10 dados do SIVAM. Embora nesta última fonte
e 31,7cm). A densidade de madeira média pon- houvesse incertezas devido a vários erros de
derada pelas espécies ocorrentes em cada par- digitação nas informações de circunferência
cela foi utilizada para converter o volume dos do tronco ou na altura comercial, foi possível
fustes em biomassa dos fustes. A biomassa das utilizá-la para obter estimativas de densida-
copas foi acrescentada utilizando um fator de de da madeira (crucial nos cálculos gerais)
expansão de biomassa (BEF), conforme des- por cada unidade amostral de acordo com a
crito originalmente por Brown & Lugo (1992) as espécies presentes em cada parcela.
e Brown (1997). Esta expansão de volume em
As definições fitofisionômicas (ecossis-
biomassa foi posteriormente refinada a partir
temas) adotadas na base de cálculo foram
de ajustes propostos por Fearnside (1992), que
todas derivadas do manual técnico da vege-
adicionam outros compartimentos da biomas-
tação brasileira (Brasil, IBGE, 1992), que é a
sa florestal que não estavam contemplados no referência para a classificação das fitotipolo-
modelo de Brown & Lugo (1992). Os dados de gias no País. Foram formados dois grandes
densidade de madeira foram corrigidos para grupos florestais para dar início ao proces-
a variação radial conforme resultados obtidos so de cálculo que transformaria volume em
em floresta densa na Amazônia central (veja biomassa: “Floresta Densa” e “Floresta Não
Nogueira et al., 2005). Os ecossistemas não densa”. Ambos são o marco inicial para apli-
florestais (vegetação aberta, com menor abun- cação do VEF e do BEF. No primeiro grupo
dância de espécies e indivíduos) presentes na estão incluídas todas as formações primá-
área de influência não foram contemplados rias (aluvial, das terras baixas, submonta-
pelos inventários de volume de madeira do na e montana) definidas dentro da classe
Projeto RADAMBRASIL, e estão desprovidos de formação “floresta”, subclasse de for-
de estimativas confiáveis. mação “ombrófila”, subgrupo de formação
“densa”, conforme determina o sistema de
Base dos cálculos classificação brasileiro. No caso das flores-
Para realizar os cálculos gerais, todas tas não densas, estão incluídas todas demais
as 306 parcelas selecionadas para a área subclasses e subgrupos de formação flores-
de abrangência da BR-319 foram dimen- tal, como as florestas ombrófilas abertas, as
sionadas em um banco de dados georrefe- campinaranas, as florestas estacionais deci-
renciado. Este banco foi formatado a par- duais e semideciduais, e todos os sistemas
tir de duas fontes básicas: (1) banco de florestais de contato (p. ex. floresta ombró-
dados georreferenciado do SIVAM/SIPAM fila em contato com floresta estacional ou
(Brasil, SIVAM/SIPAM, 2004), versão 6, para savana em contato com floresta ombrófila).
toda a Amazônia Legal Brasileira (escala
Estimativas gerais
1:250.000), juntamente com um conjunto
geral das informações fornecidas pelo IBGE Das 306 parcelas amostradas, 253
ao SIVAM sobre a base de dados do Projeto (82,7%) estavam no grupo de Floresta
RADAMBRASIL e (2) livros de levantamento Densa e 54 (17,6%) no de Floresta Não
de recursos naturais(volumes) e mapas te- densa. Os ecossistemas com o maior número
máticos (solos, vegetação, etc.) do próprio de parcelas amostrais foram os de Floresta
RADAMBRASIL publicados pelo Ministério Ombrófila Densa das Terras Baixas (Db; 156

Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 309 8/18/2022 3:15:34 PM


DESTRUIÇÃO E CONSERVAÇÃO
310 DA FLORESTA AMAZÔNICA

parcelas) e Aluvial (Da; 62): quase todos apresentada por Brown & Lugo (1992),
dentro do estado do Amazonas e, o de menor e de +4,5% em relação ao refinamento
amostragem foi a Floresta Ombrófila Aberta apresentado posteriormente por Fearnside
Aluvial (Aa; 9). Este último com apenas uma (1992) (ver Tabela 3). Os valores aqui
parcela no estado de Rondônia. relatados já possuem os mais recentes ajustes
para densidade da madeira, por ecossistema
A biomassa média total (não ponde-
e Estado (média geral de 0,651 g.cm-3), além
rada pela área de cada sistema) calculada
de outros refinamentos como a eliminação
neste trabalho foi de 414 t ha-1 (277-604 t
de ajustes anteriores para “árvores ocas”
ha-1) (Tabela 3). Os demais sistemas terres-
e “casca”, atualmente contemplados em
tres presentes na amostragem do Projeto
outros níveis do cálculo.
RADAMBRASIL continham um maior nú-
mero de parcelas inventariadas e consegui- Estes valores para biomassa incorporam
ram diluir sua variabilidade na média final, uma série de melhorias em comparação com
não apresentando distorções. Todos estão estimativas anteriores por ter resolvido pro-
dentro da faixa de resultados encontrados blemas com relação à contabilidade de ár-
para a maioria dos trabalhos realizados na vores ocas e irregulares e de fator de forma
Amazônia (300-600 t ha-1) utilizando os (Fearnside & Laurance, 2004; Nogueira et
métodos de medidas direta e indireta dis- al., 2006), e de diferenças regulares e signi-
ponibilizados na literatura corrente (Klinge ficativas a cerca da densidade de madeira no
& Rodrigues, 1974; Fearnside et al., 1993; arco de desmatamento em comparação com
Fearnside, 1994; 1997; 2000a,b; Higuchi et a Amazônia Central, mesmo para árvores de
al., 1994; Alves et al., 1997; Laurance et al., uma mesma espécie (Nogueira et al., 2007).
1999; Nascimento et al., 2007).
Os cálculos acima apresentados usam
Para comparação, os valores aqui a biomassa da floresta original, sem ajuste
calculados possuem uma diferença de -75% pelos efeitos da exploração madeireira ou
em relação à aplicação direta da fórmula outras formas de degradação da floresta em
de expansão de volume em biomassa pé. Desta maneira, as emissões associadas

Tabela 2. Distribuição Estado Tipo Florestal Legenda Floresta Densa Floresta Não-Densa Total
das parcelas
amostrais (inventários Floresta Ombrófila Densa (sem formação) D? 8 8
florestais) do Projeto Floresta Ombrófila Densa Aluvial Da 58 58
RADAMBRASIL dentro
Floresta Ombrófila Densa das Terras Baixas Db 156 156
das classes de floresta
densa e não densa, por Floresta Ombrófila Densa Submontana Ds 8 8
ecossistema, utilizadas Amazonas Floresta Ombrófila Aberta (sem formação) A? 1 1
na área de influência
Floresta Ombrófila Aberta Aluvial Aa 9 9
da BR 319.
Floresta Ombrófila Aberta das Terras Baixas Ab 16 16
Floresta Ombrófila Aberta Submontana As 6 6
sem informação (*) si 10 10
Floresta Ombrófila Densa Aluvial Da 4 4
Floresta Ombrófila Densa Submontana Ds 2 2
Floresta Ombrófila Aberta Aluvial Aa 1 1
Rondônia Floresta Ombrófila Aberta das Terras Baixas Ab 9 9
Floresta Ombrófila Aberta Submontana As 11 11
Formações Pioneiras com influência fluvial Pa 1 1
sem informação (*) si 7 7
Total - - 253 54 307
(*) 10 parcelas no Amazonas e 7 em Rondônia foram incluídas como floresta densa para comparação, embora o banco de dados do Brasil, SIVAM/SIPAM (2004)
não tenha fornecido esta informação (ecossistemas sem definição).

Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 310 8/18/2022 3:15:34 PM


Modelagem de desmatamento e emissões de gases de efeito estufa
na região sob influência da Rodovia Manaus-Porto Velho (BR-319) 311

Biomassa Tabela 3. Densidade


Ecossistema Densidade Básica da Volume RADAMBRASIL Biomassa (Brown & Biomassa (Este básica da madeira (g
Estado (Fearnside, 1992) t
(legenda) Madeira (g cm -3) (*) (m3 ha -1) Lugo, 1992) t ha -1 (**) Trabalho) cm-3), volume (m3 ha-1)
ha -1 (**)
e
biomassa (t ha-1) dos
D? 0,670 110 228 417 398
ecossistemas florestais
Da 0,615 125 233 427 408 presentes na área de
Db 0,663 119 236 433 413 influência da BR 319.
Ds 0,668 121 237 434 415
Amazonas A? 0,668 42 159 290 277
Aa 0,633 99 231 422 403
Ab 0,673 106 248 454 433
As 0,632 124 258 473 451
si 0,663 126 242 443 423
Da 0,636 145 257 471 450
Ds 0,661 116 236 433 414
Aa 0,631 210 345 632 604
Rondônia Ab 0,648 109 243 446 426
As 0,631 100 232 424 405
Pa 0,632 166 303 555 530
si 0,646 104 211 386 369
Média Geral - 0,651 118 237 433 414
(*) Valores de densidade básica da madeira são derivados do banco de dados geral para a Pan Amazônia (R.I. Barbosa, comunicação pessoal).
(**) Os valores de biomassa total de Brown & Lugo (1992) e Fearnside (1992) são apenas para comparação, não se resumindo no resultado final deste trabalho.

aos processos de degradação para as áreas tais como monóxido de carbono (CO), óxidos
desmatadas estão implicitamente incluídas, de nitrogênio (NOx) e hidrocarbonetos não-
mas não para a degradação na floresta re- metanos (NMHC) não são considerados atu-
manescente que não é desmatada logo (por almente pelo Painel Intergovernamental sobre
exemplo, dentro de um prazo de três anos Mudanças Climáticas (IPCC). A equivalência
após a exploração madeireira). Se no futuro dos gases foi baseada nos potenciais de aque-
vierem a ser realizados cálculos explícitos de cimento global (GWPs) do Segundo Relatório
exploração madeireira e de outras emissões de Avaliação do IPCC, e são os valores que
por degradação, a biomassa usada para cal- foram adotados pelo Protocolo de Kyoto
cular a emissão do desmatamento teria que para uso durante o seu Primeiro Período de
ser ajustada adequadamente (veja discussão
em Fearnside, 1997).

Mapa e características de distribuição de biomassa


O mapa com as características de dis-
tribuição da biomassa na ALAP da BR-319
é apresentado na Figura 24. A biomassa é
menor na parte sul da ALAP e aumenta ao
longo do trajeto para Manaus.

ESTIMATIVAS DE EMISSÕES DE CARBONO


A emissão total foi calculada a partir da
perda do estoque de carbono de biomassa so-
Figura 24. Distribuição
mando o efeito dos gases-traço. Apenas meta-
de biomassa (abaixo
no (CH4) e óxido nitroso (N2O) foram conside- e acima do solo) na
rados, porque os efeitos de outros gases-traço, região da ALAP BR-319

Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 311 8/18/2022 3:15:34 PM


DESTRUIÇÃO E CONSERVAÇÃO
312 DA FLORESTA AMAZÔNICA

Compromisso (2008-2012). Usando essas equilíbrio que substitui a floresta. Isto con-
equivalências, cada tonelada de CH4 tem o tém 28,5 t ha-1 de biomassa com um con-
impacto sobre o aquecimento global de 21 to- teúdo de carbono de 0,45, ou 12,8 t C ha-1
neladas de gás de CO2, enquanto que cada em biomassa (i.e., não considerando o car-
tonelada de N2O é equivalente a 310 toneladas bono do solo), baseado em uma matriz de
de CO2, calculado ao longo de um horizonte transições entre categorias de usos da terra
de tempo de 100 anos (Schimel et al., 1996). (Fearnside, 1996).
Deve ser notado que o Quarto Relatório de Os cálculos acima das emissões causa-
Avaliação do IPCC (Forster et al., 2007, p. das pelo desmatamento apenas incluem o
212) altera estes valores. No caso de metano, carbono da biomassa viva e morta, excluído
o valor do GWP aumenta para 25, uma ele- o carbono do solo. Uma estimativa de libe-
vação de 19% sobre o impacto deste impor- ração de carbono do solo pela conversão da
tante gás. No caso de óxido nitroso, o GWP floresta amazônica na paisagem de substi-
foi reduzido para 298, uma diminuição de tuição de equilíbrio é de 5,4 t C ha-1 nos pri-
4%. Para estas emissões, o efeito do metano meiros 20 cm de solo, 7,9 t C ha-1 no primei-
será maior, e o impacto atribuído ao desmata- ro 1 m de solo, ou 8,5 t C ha-1 nos primeiros
mento aumentará quando essas novas infor- 8 m de solo (Fearnside & Barbosa, 1998). O
mações forem incorporadas nas negociações carbono do solo mais profundo leva mais
internacionais. Usando os valores atuais do tempo para ser liberado do que o carbono
Protocolo de Kyoto, cada tonelada de carbono no solo superficial.
emitida tem um impacto adicional de gases-
O cenário de referência resulta na libera-
traço equivalente a 0,087 t C (toneladas de
ção de 0,9 Gt C até 2050, comparado com a
carbono), baseado nas emissões de 1990 cal-
liberação de 0,6 Gt C no cenário conservação.
culadas por Fearnside (2000a,b).
A maior parte da diferença entre os dois
A emissão líquida foi calculada a partir cenários se deve à taxa comparativamente
da emissão bruta, da qual foi subtraído o menor de liberação de carbono no cenário
estoque médio de carbono na paisagem de conservação após o ano 2020 (Figura 25).

Figura 25. Emissão


de gases de efeito
estufa nos cenários
de referência e
conservação

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Modelagem de desmatamento e emissões de gases de efeito estufa
na região sob influência da Rodovia Manaus-Porto Velho (BR-319) 313

MELHORIAS FUTURAS comportamento sem precedentes. Estas me-


lhorias representam, principalmente, acrés-
Embora o atual esforço de modelagem cimos ao modelo não espacial (em Vensim).
tenha produzido o que acreditamos ser um
Necessidades futuras também incluem
progresso para representar o processo de
melhorias adicionais nas estimativas de bio-
desmatamento, isto, de certo modo, refle-
massa de floresta e estoques de carbono, e
te os papéis da construção da estrada e da
das emissões resultantes do desmatamento
melhoria e criação de áreas protegidas. Este
e de perturbações na floresta como a ex-
tipo de cálculo “dirigido por infraestrutura”,
ploração madeireira, incêndios florestais e
ou mais geralmente, “dirigido por oportuni-
efeitos de borda. Devem ser feitas, também,
dade”, é essencial se as implicações de deci-
análises com base em estoques de carbono,
sões de política são avaliadas. Não obstante, ao invés de restringir a consideração às mu-
os modelos “dirigidos por demanda” tam- danças nos fluxos de carbono por desmata-
bém capturam aspectos importantes do pro- mento reduzido. De uma forma mais geral,
cesso de desmatamento, especialmente para avaliações futuras têm que incluir a quanti-
fronteiras consolidadas. O desenvolvimento ficação de uma gama mais larga de serviços
de modelos híbridos que combinam as duas ambientais, inclusive a ciclagem de água e a
abordagens, e o desenvolvimento de mode- manutenção de biodiversidade.
los baseados em agentes (atores), também
conhecidos como “arranjos institucionais”,
representam o próximo passo. AGRADECIMENTOS
Além dos efeitos macroeconômicos que A preparação deste trabalho foi financiada
determinam a demanda para os produtos de pela Iniciativa Amazonas (IA), Secretaria de
desmatamento, os papéis de vários grupos Estado do Meio Ambiente e Desenvolvimento
importantes de atores precisam ser mode- Sustentável (SDS), Manaus, Amazonas,
lados explicitamente. Estes incluem: “gri- Brasil. Apoio financeiro ao estudo tem
leiros” (os grandes apropriadores ilegais de sido fornecido pelo Conselho Nacional do
terra), grandes investidores (i.e., agroindús- Desenvolvimento Científico e Tecnológico
tria de soja e grandes pecuaristas) e fontes (CNPq) (306031/2004-3; 474548/2006-
ilegais de dinheiro, em combinação ou não 6; 557152/2005-4; 420199/2005-5), Rede
com a agropecuária (i.e., lavagem de dinhei- GEOMA, FAPEAM e o Instituto Nacional
ro com renda de tráfico de drogas, corrup- de Pesquisas da Amazônia (PRJ05.57 &
ção, sonegação tributária e outras fontes PRJ02.12). Um revisor anônimo fez comen-
ilegais). Além disso, é preciso modelar ex- tários úteis ao manuscrito. Este capítulo foi
plicitamente o efeito da exploração madei- reformatado de Fearnside et al. (2009).
reira (que influencia o desmatamento tanto
por construir estradas endógenas quanto por
fornecer dinheiro aos proprietários de terras REFERÊNCIAS
para investir na derrubada). O efeito mais Aguiar, A.P.D. 2006. Modeling Land Use Change in
amplo da rodovia sobre a migração também the Brazilian Amazon: Exploring Intra-Regional
precisa ser modelado, pois este efeito não só Heterogeneity. Tese de doutorado em sensoriamento
estimula a expansão do desmatamento ao remoto (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais
(INPE), São José dos Campos, São Paulo. 153 p.
longo da rota da rodovia, como representa-
do aqui, mas também seu papel como um Aguiar, A.P.D., G. Câmara & M.I.S. Escada. 2007. Spatial
statistical analysis of > land-use determinants in
canal para transportar população até o final
the Brazilian Amazonia: exploring intra-regional
da estrada em Manaus. Finalmente, os efei- heterogeneity. Ecological Modelling 209: 169-188.
tos potenciais da necessidade de governan-
Alencar, A., D.C. Nepstad, D. McGrath, P. Moutinho,
ça precisam ser quantificados e modelados,
P. Pacheco, M. del C. V. Diaz & B. Soares-Filho.
e isto deve ser feito baseado em dados de 2004. Desmatamento na Amazônia: Indo além da
observações ao invés de suposições sim- Emergência Crônica. Instituto de Pesquisa Ambiental
ples que postulam mudanças dramáticas de da Amazônia (IPAM), Belém, Pará. 87 p.

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Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 316 8/18/2022 3:15:35 PM


CAPÍTULO

17
A tomada de decisão sobre
grandes estradas amazônicas

Philip M. Fearnside
Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia – INPA
Av. André Araújo, 2936 – CEP: 69.067-375, Manaus, Amazonas, Brasil.
E-mail: pmfearn@inpa.gov.br

Versão original:
Fearnside, P.M. 2012. A tomada de decisão sobre grandes estradas amazônicas. p. 59-75. In: A.
Bager (Ed.) Ecologia de Estradas: Tendências e Pesquisas. Editora da Universidade Federal de
Lavras, Lavras, Minas Gerais. 313 p.

317
Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 317 8/18/2022 3:15:42 PM
DESTRUIÇÃO E CONSERVAÇÃO
318 DA FLORESTA AMAZÔNICA

RESUMO BR-319 (Manaus-Porto Velho), ambas consi-


deradas prioridades no Plano de Aceleração
A tomada de decisões sobre grandes es- do Crescimento (PAC), que orienta os investi-
tradas na Amazônia é um dos pontos mais mentos do Governo federal. Estas duas rodo-
críticos na determinação do futuro da floresta vias foram originalmente construídas duran-
amazônica e para manutenção dos seus ser- te o período da ditadura militar, entre 1972
viços ambientais. A decisão sobre a constru- e 1974, quando decisões eram tomadas por
ção, reconstrução ou melhoria de uma estra- poucos altos oficiais militares, sem estudos
da é feita pelo governo. Entretanto, uma vez de viabilidade econômica ou de impacto am-
aberta uma estrada, muitos dos processos biental. Desde então houve muito progresso
que levam à destruição da floresta ficam fora na área ambiental e no processo de tomada
do controle do governo. Este fato é evidente decisão no Brasil, mas quando as obras têm
em dois casos críticos: a BR-163 (Santarém- grande prioridade política o processo decisó-
Cuiabá) e a BR-319 (Manaus-Porto Velho). rio acaba sendo conduzido de forma similar
O processo decisório atual sistematicamente ao da época militar, isto é, sem considerar os
subestima os impactos e exagera os benefí- fatores ambientais e até mesmo, econômicos.
cios das obras propostas. Quando uma obra
é considerada prioridade política, pode ser
mantida no topo das prioridades apesar de
BR-163: A RODOVIA SANTARÉM-CUIABÁ
ser injustificável em termos financeiros e, em A BR-163 foi construída pelo Exército em
termos ambientais. A BR-319, que ainda não 1973, mas a falta de manutenção adequada
é um fato consumado, oferece um exemplo tem deixado a estrada com condições margi-
claro dessa situação. É urgentemente neces- nais de trafegabilidade nas últimas décadas,
sário reformular o processo decisório para no Estado do Pará entre a divisa com Mato
assegurar decisões mais racionais no futuro. Grosso e Trairão, próximo ao ponto de cru-
zamento com a rodovia Transamazônica
PALAVRAS-CHAVE Rodovias, Amazônia, (BR-230). Durante a época chuvosa, frequen-
Brasil, Impacto ambiental, EIA, RIMA, Estudo temente, a estrada se torna intransitável e
de Impacto Ambiental, Licenciamento, mesmo na época seca as pontes são inade-
Desmatamento, Migração quadas para tráfico pesado, por exemplo, dos
caminhões de soja, previstos de trafegarem
pela rodovia para escoar a produção do norte
INTRODUÇÃO de Mato Grosso para o porto em Santarém, no
A grande maioria do desmatamento na rio Amazonas. Mesmo com esses problemas,
Amazônia brasileira tem sido confinada, a rodovia nunca foi completamente abando-
até agora, ao “arco de desmatamento” que nada, e serve como caminho para transporte
se estende ao longo das bordas leste e sul de madeira e para entrada de população de
da floresta (Fig. 1). A concentração do des- migrantes, fazendeiros e grileiros.
matamento nessa região é resultado, princi- Em 2000 foi feita uma simulação da dis-
palmente, da dificuldade de acesso a gran- seminação futura do desmatamento ao longo
de parte da floresta remanescente. A falta da BR-163 sob um cenário “convencional” e
de estradas impede o movimento de fluxos um de “governança” (Nepstad et al., 2000;
migratórios, e inviabiliza, ou, pelo menos, Soares-Filho et al., 2004). A idéia de que a
dificulta muitas atividades econômicas que governança levaria, de fato, a uma contenção
destroem a floresta. Este quadro tende a mu- efetiva do desmatamento foi defendida pelos
dar na medida em que os planos do Governo autores da simulação (Nepstad et al., 2002) e
para construção e melhoria de rodovias na contestado baseado no caos evidente na épo-
Amazônia forem realizados. As duas princi- ca na área atravessada pela rodovia (Laurance
pais obras, que abrirão novas áreas a partir & Fearnside, 2002). Evidentemente, o cená-
do arco de desmatamento são a reconstrução rio simulado de governança indicava muito
das rodovias BR-163 (Santarém-Cuiabá) e menos desmatamento. Os responsáveis pelo

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A tomada de decisão sobre
grandes estradas amazônicas 319

Figura 1. Brasil e as
rodovias amazônicas
(linhas tracejadas).

programa Brasil em Ação, que depois foi su- uma área que fica a leste da rodovia BR-163
cedido pelos programas Avança Brasil, PPA (Venturieri et al., 2004, p. 5). Há sinais claros
(Plano Plurianual), e hoje o PAC (Programa da facilidade com que a legislação ambiental
de Aceleração do Crescimento), argumentava é burlada na área, com placas de propaganda
que a reconstrução e asfaltamento da estrada na beira da estrada oferecendo serviços de “re-
iram ser acompanhados por um nível de go- gularização fundiária” e de “plano florestal”
vernança, para evitar qualquer impacto sobre com o mesmo telefone de contato (Fearnside,
o desmatamento (Silveira, 2001), um cená- 2005a). O papel de grileiros (grandes apropria-
rio que foi logo contestado (Laurance et al., dores ilegais de terras) é fundamental na dinâ-
2001a). De fato, a história da área desde 2000 mica de desmatamento na região (Escada et
tem revelado um espalhamento de desmata- al., 2005; Fearnside, 2005b, 2006, 2008).
mento ainda mais rápido do que aquele pre-
visto no cenário “convencional”, mesmo sem O Estudo de Impacto Ambiental (EIA)
a reconstrução da estrada (Brasil, INPE, 2011; da BR-163 contém menos de duas páginas
veja Fearnside, 2007). Um evento marcante foi sobre o desmatamento, em uma obra com-
o aparecimento em 2004 de uma clareira de posta por oito volumes (ECOPLAN, 2002).
6.239 ha, conhecida como o “revólver” devi- Abaixo, está transcrito o que foi abordado
do à sua forma, em parte da Terra do Meio, sobre o desmatamento:

Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 319 8/18/2022 3:15:42 PM


DESTRUIÇÃO E CONSERVAÇÃO
320 DA FLORESTA AMAZÔNICA

“Para prevenir a eliminação de vegeta- conteúdo indica que haverá um estímulo


ção próxima à rodovia, a retirada deverá para a disseminação do desmatamento em
ser restrita ao máximo e deve ser feita uma grande área a partir da estrada. Não
apenas em locais realmente necessários.
é apresentada nenhuma evidência para
Caso seja necessária a remoção, verificar
se os animais que habitam o local têm subsidiar a noção de que o desmatamento e
condições de se deslocar naturalmente seus impactos seriam evitados pela completa
para outras áreas e, caso não tenham, au- transformação dos órgãos ambientais, que
xiliá-los no processo.” (ECOPLAN, 2002, na época (e mesmo hoje) estavam longe de
p. 44-45). poder controlar a atuação de madeireiros,
grileiros, sem terras e outros atores nessa
“Em relação ao desmatamento são ne-
área. A idéia de que apenas “novos proces-
cessárias medidas de maior alcance
do que as atividades normais do DNIT sos de degradação” são conseqüências da es-
[Departamento Nacional de Infra- trada também é equivocada, já que os velhos
Estrutura de Transportes], assim será ne- processos, principalmente o desmatamento
cessário que outras agências do governo com motosserras, são mais do que suficien-
juntem seus esforços ao Ministério dos tes para acabar com a floresta.
Transportes e realizem estudos para defi-
nir um melhor uso de solo nas áreas pró- O IBAMA aprovou o EIA apesar dos seus
ximas à rodovia, levando em considera- defeitos evidentes devido à proposta de im-
ção o Zoneamento Ecológico-Econômico, plantar o Programa BR-163 Sustentável, um
as diretrizes de desenvolvimento apre- conjunto de ações a serem realizadas por 32
sentadas no EIA/RIMA e as recomenda- organizações não governamentais mais o
ções de Embrapa para sistemas alternati-
vos de uso da terra que ajudem a conter Ministério do Meio Ambiente (e.g., Alencar
o desmatamento. et al., 2005; IPAM, 2005). Esse fato estabele-
ce um precedente perigoso por tirar o princi-
Os órgãos governamentais de fiscaliza- pal ponto forte do sistema de licenciamento,
ção das atividades extrativistas e polui- que é a exigência legal de que o EIA seja
doras, como Ibama, devem ser adequa- aprovado e que qualquer condicionante seja
dos à nova situação. atendida antes do início da obra. O Programa
Também devem ser implantados corredo- BR-163 Sustentável foi uma ação paralela,
res ecológicos entre as manchas de flores- que poderia ser desenvolvida simultanea-
ta ..... garantindo a manutenção da biodi- mente com a implantação da obra rodoviá-
versidade.” (ECOPLAN, 2002, p. 45). ria. A experiência com programas paralelos,
no caso da rodovia BR-364 (Cuiabá-Porto
A conclusão geral do EIA é: Velho) financiada pelo Banco Mundial, com
base em promessas similares, foi um com-
“Avalia-se que o prognóstico realizado pleto fracasso (Fearnside, 1986, 1987, 1989).
aponta para a viabilidade ambiental do
projeto considerando, principalmente,
O Município de Novo Progresso, Pará,
que os principais processos que resultam que se autodenomina a “Capital da BR-319”
em degradação ambiental e da qualidade foi um foco de desmatamento em 2009 e
de vida das populações residentes já es- 2010 (Brasil, INPE, 2009, p. 7). Este muni-
tão instalados atualmente e que a obra, cípio ficou em primeiro lugar entre os que
em si, pouco irá contribuir diretamente mais desmataram na Amazônia brasileira,
para a introdução de novos processos de nesses dois anos. Esse fato, que ocorreu no
degradação. Porém, a acessibilidade que
a rodovia irá incrementar tornará dis-
meio de um suposto “corredor de desenvol-
ponível para as comunidades e grupos vimento sustentável”, que recebeu um in-
interessados na região recursos para a vestimento governamental e de organização
orientação sustentável de seu desenvol- social considerável, não é um bom indício
vimento” (ECOPLAN, 2002, p. 72). para a outra grande estrada planejada na
Amazônia, a BR-319, onde não há nenhum
É difícil imaginar como um EIA pôde programa parecido para promover o desen-
ser aprovado quando a totalidade do seu volvimento sustentável.

Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 320 8/18/2022 3:15:42 PM


A tomada de decisão sobre
grandes estradas amazônicas 321

BR-319: A RODOVIA MANAUS-PORTO VELHO na área aproximadamente 100 km ao norte


de Humaitá, o preparo de algumas áreas para
A rodovia BR-319 foi construída pelo plantio de soja em propriedades compradas
Exército entre 1972 e 1973, mas o uso da por sojicultores de Mato Grosso. Há também
estrada foi relativamente modesto nos anos a compra de áreas de floresta visando a explo-
subseqüentes, devido à falta de um raciocí- ração madeireira, com a exploração já inicia-
nio econômico pela estrada. A manutenção da em algumas delas.
foi mínima e em 1988 a estrada foi aban-
donada pelo Departamento Nacional de Modelos de desmatamento com a reaber-
Infraestrutura de Transportes (DNIT), e o ser- tura da BR-319 indicam cenários com gran-
viço de ônibus entre Manaus e Porto Velho de expansão do desmatamento a partir das
foi suspenso desde então. No entanto, uma margens da estrada, ocupando em poucos
série de torres de microondas da Empresa anos praticamente todo o interflúvio entre os
Brasileira de Telecomunicações (EMBRATEL) rios Madeira e Purus (Laurance et al., 2001b;
levou esta empresa a prover uma manuten- Soares-Filho et al., 2006). Uma mudança
ção mínima das pontes para poder ter acesso importante que reduziria esta expansão de
às torres. Posteriormente, essas torres foram desmatamento a partir da rota, não incluída
suplementadas com uma linha de fibra óti- nos modelos, é a criação de uma série de
ca, suspensa em postes de madeira ao longo áreas protegidas. Por outro lado, há também
da rota. Hoje, o grosso dos dados são trans- nos modelos omissão de vários fatores que
mitidos pela fibra ótica, e as microondas (de levaria a mais desmatamento. Um é a mi-
capacidade muito menor e já obsoletas) são gração ao longo da estrada, de uma ponta à
mantidas para ter uma conexão simbólica outra, levando migrantes de Rondônia para
em caso de ruptura da linha, evitando assim as áreas já conectadas a Manaus por estra-
multas. Deve ser lembrado que há outras ma- das, inclusive a área entre os rios Solimões e
neiras para ligar Manaus ao resto do Brasil Negro que terá acesso por uma nova ponte
digitalmente. Uma é via Venezuela, onde em Manaus, o Distrito Agropecuário da Zona
uma das empresas (Oi) já tem uma conexão Franca de Manaus (localizado ao norte de
de banda larga. A outra é fazer uma linha de Manaus), e o Estado de Roraima (e.g., Barni
fibra ótica seguindo a linha de transmissão et al., 2009). Outro fator que aumentaria o
elétrica entre Tucuruí e Manaus, já licenciada desmatamento é o plano para construir uma
e esperando construção nos próximos anos, e série de estradas laterais, dando acesso, à
depois de Tucuruí até Imperatriz, Maranhão, partir da rodovia, para todas as sedes de mu-
onde o Plano Nacional da Banda Larga visa nicípio nos rios Madeira e Purus. Uma des-
estabelecer uma conexão de alta capacidade sas estradas cruzaria o rio Purus em Tapuã
com a Região Sul-Sudeste (Lobato, 2010). seguiria para Coarí, Tefé, Juruá, assim abrin-
do o grande bloco de floresta intacta na parte
Os trechos nas duas extremidades da ro- oeste do Estado do Amazonas (Fearnside &
dovia (de Porto Velho a Humaitá e de Manaus Graça, 2006b, 2009). O EIA da BR-319 nega a
a Igapó Açu) foram reconstruídos sem exigên- existência desses planos, afirmando:
cia de um EIA-RIMA. Após uma prolongada
batalha legal, um EIA-RIMA foi feito às pres- “A exceção da rodovia BR-319, nenhuma
sas (em seis meses) para a parte central da dessas estradas está no planejamento do
rodovia, onde o impacto ambiental seria bem Governo Federal” (UFAM, 2009, Vol. 1,
maior, permitindo, inclusive, o fluxo migrató- p. 58).
rio do arco do desmatamento para a Amazônia
Central. A expectativa da reconstrução da es- Mas, no site do Departamento Nacional
trada tem levado a aumentos visíveis na ven- de Infraestrutura dos Transportes (DNIT) o
da de propriedades nas partes acessíveis da mapa das estradas planejadas mostra essas
estrada e invasão de áreas na beira da estrada estradas (Brasil, DNIT, 2009). As estradas la-
por posseiros individuais (Fearnside & Graça, terais neutralizariam grande parte do benefí-
2006a). Há aumento de áreas de pastagem e, cio previsto para as novas reservas em frear

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DESTRUIÇÃO E CONSERVAÇÃO
322 DA FLORESTA AMAZÔNICA

o desmatamento. A barreira das reservas ao outras áreas, como ao oeste do rio Purus e ao
longo dos dois lados da rodovia é denomina- norte de Manaus), as novas reservas teriam
da “zona de blindagem”, mas se esta “blin- um efeito substancial sobre desmatamento e
dagem” for perfurada pelas estradas laterais, emissões. Cenários simulados para a ALAP
os desmatadores serão simplesmente levados da BR-319 com e sem as reservas até 2050
para o outro lado da fila de reservas. No caso indicam uma diferença equivalente a 310 mi-
do lado oeste, há uma enorme área que seria lhões de toneladas de carbono em forma de
exposta no “miolo” do Amazonas, ao oeste CO2 em termos de emissão líquida compro-
do rio Purús. Esta área, que é do tamanho do metida (Fearnside et al., 2009)
Estado de Rondônia, é de terras públicas, sem
nenhum tipo de proteção, como mostra o ma- Ao norte de Manaus há uma área de
crozoneamento do Estado do Amazonas. Este grande vulnerabilidade à invasão, que de-
é o tipo de terra que é mais vulnerável à in- monstra o papel chave da proteção da flo-
vasão por grileiros, fazendeiros e sem terras. resta, no impedimento da migração via a
BR-319 para a Amazônia Central, ao longo
As reservas ao longo da BR-319 foram
dos últimos 23 anos. Essa área compreende
criadas dentro de uma Área de Limitação
o Distrito Agropecuário da Superintendência
Administrativa Provisória (ALAP), criada em
da Zona Franca de Manaus, onde grandes
2006 para facilitar a implantação das reservas.
fazendas receberam generosos subsídios go-
Uma simulação do efeito da estrada e das re-
servas foi feito a pedido da Casa Civil (Aguiar, vernamentais entre 1974 e 1984. Quando os
2006; Câmara, 2007; Rede Temática GEOMA, incentivos fiscais e outros subsídios acaba-
2006). A conclusão foi de que a estrada não ram na prática, estas fazendas pararam de
ia aumentar o desmatamento e teria até um desmatar e mais de 80% das pastagens fo-
efeito benéfico, atraindo o desmatamento do ram abandonadas, transformando-se em ca-
interior para a beira da estrada como se fosse poeira (ver Fearnside, 2002). Que uma área
um imã, e assim aliviando a pressão sobre assim pudesse ficar sem uso ativo ao longo
reservas e outras áreas longe da estrada. Ao de mais de 25 anos, sem ser invadida, é uma
mesmo tempo, as reservas não iriam reduzir situação sem paralelo em outras regiões da
o desmatamento, mas apenas levariam isto a Amazônia. Se essa área estivesse localizada
acontecer em outro local, no caso, nas áreas no arco do desmatamento, certamente seria
de Manaus e de Boca do Acre. Acontece que invadida em poucos dias. A área de Manaus
estas conclusões são baseadas em um artefa- não tem “sem terras” (grupos organizados
to do método de simulação e, portanto, não de agricultores sem terra) e nem o padrão
representam um fenômeno real. A simulação de violência rural entre fazendeiros e possei-
foi feita presumindo uma taxa predetermina- ros que caracteriza o arco de desmatamento.
da de desmatamento na Amazônia como um Mas isto pode mudar da noite para dia se
todo. Portanto, não importa em termos do to- for aberta a conexão rodoviária com o arco
tal do desmatamento, se for criada uma reser- de desmatamento, via a BR-319. O efeito se
va ou aberta uma estrada. Portanto, haveria estenderia para Roraima (Barni et al., 2009).
100% de “vazamento” das reservas, ou seja,
a perda do benefício climático pelo desloca- A chamada “polêmica da BR-319” tem
mento do desmatamento para outros locais. um aspecto surreal devido à falta de um ra-
Mas, apesar de existir algum vazamento, re- ciocínio econômico para a abertura da estra-
servas têm efeitos reais em diminuir o desma- da. Diferente da BR-163, onde o transporte
tamento (Ferreira et al., 2005; Nepstad et al., de soja para portos no rio Amazonas tem um
2006; Fearnside et al., 2009; Vitel et al., 2009). retorno financeiro substancial, a BR-319 não
As estradas têm um efeito real no aumento é necessária para transportar os produtos
do desmatamento (Ferreira, 2001; Laurance das fábricas da Zona Franca de Manaus para
et al., 2001b, 2002; Soares-Filho et al., 2004; São Paulo, a suposta razão-de-ser da estrada.
Nepstad et al., 2001). No caso da ALAP (sem De fato, o EIA admite que o principal raciocí-
considerar o efeito de deslocamento para nio da estrada simplesmente não existe:

Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 322 8/18/2022 3:15:42 PM


A tomada de decisão sobre
grandes estradas amazônicas 323

“representantes das indústrias de Manaus pela BR-319 fosse incluído na conta, a diferen-
têm indicado que, no momento, a rodo- ça entre essas opções seria astronômica.
via teria baixa importância para o Pólo
Industrial de Manaus.” (UFAM, 2009, Um estudo financeiro foi feito comparan-
Vol. 1, p. 216). do os custos de transporte na BR-319 com
outras opções, como a cabotagem e o siste-
Este autor não conhece outra confissão ma atual de balsa + rodovia (Teixeira, 2007)
deste tipo desde que o EIA-RIMA se tornou e, nele concluiu-se que:
obrigatório no Brasil em 23 de janeiro de 1986.
“A cabotagem reduz os custos do trans-
As indústrias em Manaus não estão inte- porte na ligação Manaus-São Paulo em
ressadas na BR-319 porque o frete do trans- 37%, quando comparado com os atuais
porte para São Paulo é mais barato pelo meios de transporte. Via a BR-319 os cus-
sistema atual, e poderia ter um custo ainda tos aumentam em 19% em relação à rota
menor se houvesse melhoria nos portos que atual, que utiliza a hidrovia até Belém.”
servem Manaus. O porto público em Manaus (Teixeira, 2007)
fica no centro da cidade, onde não há espa-
ço suficiente para uma operação eficiente. Há O Banco Nacional de Desenvolvimento
um porto privado para conteiners (o Porto Econômico e Social (BNDES), que é respon-
de Chibatão), e um terceiro porto está pla- sável pelo financiamento tanto de rodovias
nejado. Todos esses portos atendem quase quanto de portos, avaliou os impedimentos à
que exclusivamente a exportação de contai- operação de cabotagem a partir de Manaus.
ners para outros países, não a operação de Apontou que:
cabotagem, ou seja, o transporte em navios
oceânicos para outros portos no mesmo país. “O maior impeditivo para a operação
A grande maioria do frete para São Paulo é dessa carga por cabotagem está na ine-
realizada em balsas, conhecidas como “cha- ficiência e falta de confiabilidade dos
portos. Caso fossem praticadas tarifas e
tas”, cada uma com capacidade para carregar
qualidade dos serviços em padrões inter-
35 carretas. Essas carretas são levadas para nacionais, viabilizando a operação regu-
Belém, para descer a rodovia Belém-Brasília lar de cabotagem, o frete entre Manaus e
(BR-010), ou, na estação em que a água no rio a região Sudeste cairia para cerca de R$3
Madeira é alta, as balsas vão até Porto Velho mil [por contêiner], metade do praticado
para seguir na rodovia Cuiabá-Porto Velho atualmente.
(BR-364). O custo médio por contêiner (20 t
em 33 m3) de Manaus para São Paulo é de Além dos custos portuários, tem-se tam-
bém os preços abusivos dos serviços au-
R$12.032 via balsa e rodovia, versus R$3.500 xiliares. Apenas com praticagem [serviço
via cabotagem, ou seja 3,4 vezes mais caro de guia oficial para mostrar o caminho
por balsa e rodovia (Peixoto, 2006, p. 104). no percurso fluvial] no rio Amazonas,
Aproximadamente 80% do custo do percurso gasta-se R$100 por contêiner, em média,
por balsa e rodovia é a parte rodoviária. ou seja, 3% do frete entre Manaus e São
Paulo.” (Brasil, BNDES, 1998)
A cabotagem é inerentemente muito mais
barata do que o transporte de frete em carre-
Manaus tem o pior dos seis maiores por-
tas. Um navio, com cerca de uma dúzia de
tos do Brasil, levando o dobro do número de
tripulantes, pode levar o equivalente de cen-
horas para descarregar um navio comparado
tenas de caminhões. Ter uma fila de milhares
com o porto de Santos (Ono, 2001, p. 43).
de caminhões fazendo o trajeto entre Manaus
e São Paulo seria muito caro, mesmo se a Um EIA, por lei, precisa avaliar “alterna-
construção e manutenção da rodovia fossem tivas” à obra proposta. No entanto, o EIA da
gratuitas. Cada caminhão tem gastos com BR-319 não considera a cabotagem para trans-
combustível, pneus, manutenção, seguro con- porte de carga até São Paulo. As comparações
tra roubo de carga, etc. Evidentemente, se o são restritas às diferentes alternativas de
custo ambiental do desmatamento provocado transporte entre Manaus e Porto Velho, não

Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 323 8/18/2022 3:15:43 PM


DESTRUIÇÃO E CONSERVAÇÃO
324 DA FLORESTA AMAZÔNICA

entre Manaus e São Paulo (UFAM, 2009, Vol. 72%. Deve ser lembrado que grande parte
1, p. 126). Acontece que a cidade de Porto desta redução já aconteceu (inclusive, an-
Velho não é o destino final da carga suposta- tes do anúncio do PNMC), com a ajuda de
mente a ser transportada. Porto Velho serviria fatores macroeconômicos (Fearnside, 2009,
apenas como uma parada para os caminhei- 2010). No entanto, o desmatamento não está
ros, antes da continuação da viagem para São sob controle. Pensar que estradas podem ser
Paulo, geralmente, o destino final. abertas em qualquer lugar da Amazônia,
sem ter impacto sobre o desmatamento é
A conclusão do EIA é que:
uma ilusão perigosa. A BR-319 está sendo
“... quando se coteja com o cenário de
mantida como prioridade no Programa de
governança ambiental forte, todos os in- Aceleração do Crescimento (PAC) (Amazonas
dicadores (Valor Presente Líquido, Taxa em Tempo, 2009), decisão que é questionada
Interna de Retorno e Índice Benefício- pelo fato de ser inconsistente com o objetivo
Custo) se mostraram altamente favorá- declarado no PNMC para reduzir o desmata-
veis ao projeto. Nesse cenário, os custos mento e as emissões (Fearnside, 2009).
ambientais são mitigados a um nível de-
sejável que torna o projeto socialmente Uma particularidade da BR-319 é que não
desejável.” (UFAM, 2009, Vol. 1, p. 187) existe um Estudo de Viabilidade, que é pa-
drão para qualquer obra. Isto normalmente
É impressionante o exemplo escolhido da é um documento volumoso dando os deta-
referida “governança ambiental forte”: lhes técnicas da engenharia da obra e uma
justificativa do trafico (no caso de estradas)
“...não necessariamente o fato de ter ro- e do raciocínio econômico do projeto. A ex-
dovias em áreas de concentração de re- plicação dada para não ter um Estudo de
cursos naturais implica em degradação Viabilidade é de que se trata de uma obra
do patrimônio natural. Um exemplo de de “segurança nacional”. É marcante o para-
turismo sustentável é aquele realizado
no Parque Nacional de Yellowstone...”
lelo com o discurso na época militar quan-
(UFAM, 2009, Vol. 1, p. 184) do a primeira estrada na rota foi construí-
da. Acontece que nem o argumento militar
Isto é seguido no EIA pela reprodução do salva a BR-319, pois a estrada está situada
mapa de Yellowstone (UFAM, 2009, Vol. 1, no meio do continente, longe de qualquer
p. 185). Há estradas no parque onde o pú- fronteira, e não consta em nenhuma men-
blico circula, sem cortar uma única árvore. ção na lista de prioridades elaborada recen-
Comparações dessa natureza são extrema- temente pelos altos oficiais militares do País
mente perigosas. Embora um dia o caos (Brasil, Presidência da República, Casa Civil,
da fronteira amazônica poderá evoluir para Subchefia de Assuntos Jurídicos, 2008).
uma situação semelhante ao de Yellowstone, A tomada de decisão sobre grandes es-
o tempo que levaria para esta transformação tradas na Amazônia precisa de uma reforma
não deixaria muitas árvores nas áreas aber- imediata para que as decisões futuras sejam
tas pela BR-319 (Fearnside & Graça, 2009). mais sensatas. Essa reforma é muito mais
importante do que os impactos e benefícios
de cada projeto individual, mesmo que as
ESTRADAS E O PLANO NACIONAL DE conseqüências sejam muito grandes como
MUDANÇAS CLIMÁTICAS nos dois casos examinados aqui.
Decisões sobre estradas como a BR-163
e BR-319 têm enormes conseqüências para o AGRADECIMENTOS
processo de desmatamento e, por consequ-
ência, para a emissão de gases de efeito estu- As pesquisas do autor são financiadas
fa. Ao lançar o Plano Nacional de Mudanças pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento
Climáticas, ou PNMC (Brasil, CIMC, 2008), Científico e Tecnológico (CNPq 305880/2007-
o governo quer reduzir o desmatamento em 1, 610042/2009-2, 575853/2008-5,

Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 324 8/18/2022 3:15:43 PM


A tomada de decisão sobre
grandes estradas amazônicas 325

563315/2008-3) e pelo Instituto Nacional Amazônia por Satélites: Avaliação DETER-Agosto


de Pesquisas da Amazônia. Agradeço a N. de 2009. Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais
(INPE), São José dos Campos, SP. 11 p. Available at:
Hamada pelos comentários. Trabalho apresen-
http://www.amazonia.org.br/arquivos/329230.pdf
tado em Road Ecology Brazil 2010 (REB 2010),
23-25 de ago. de 2010, Universidade Federal de Brasil, INPE (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais).
Lavras, Lavras, MG, 24 de ago. de 2010. Este 2011. Projeto PRODES: Monitoramento da Floresta
Amazônica Brasileira por Satélite. INPE, São José
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Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 328 8/18/2022 3:15:43 PM
CAPÍTULO

18
Dinâmica de uso da terra e a expansão de
propriedades rurais em Apuí, um hotspot do
desmatamento na Rodovia Transamazônica

Gabriel C. Carrero & Philip M. Fearnside


Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia – INPA
Av. André Araújo, 2936 – CEP: 69.067-375, Manaus, Amazonas, Brasil.
E-mail: pmfearn@inpa.gov.br

Tradução de:
Carrero, G.C. & P.M. Fearnside. 2011. Forest clearing dynamics and the expansion of land holdin-
gs in Apuí, a deforestation hotspot on Brazil’s Transamazon Highway. Ecology and Society 16(2):
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329
Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 329 8/18/2022 3:15:50 PM
DESTRUIÇÃO E CONSERVAÇÃO
330 DA FLORESTA AMAZÔNICA

RESUMO localidade. Ao invés de uma única variá-


vel-chave impactar a mudança da cobertu-
Apresentamos um estudo de caso em ra florestal, sinergias múltiplas entre causas
escala local no Projeto de Assentamento proximais e subjacentes explicam melhor
Rio Juma (PARJ), em Apuí, um hotspot de a perda de florestas tropicais ao redor do
desmatamento na  porção sul do estado do mundo (Geist & Lambin, 2001, 2002). Na
Amazonas. Analisamos o acúmulo de terras Indonésia, por exemplo, as forças de desma-
e as estratégias de uso da terra das famílias a tamento foram dominadas por movimentos
fim de elucidar como esses fatores moldam de pequenos agricultores - transmigração
o desmatamento na região. Mais de 76% da (Fearnside,1997), seguidas pela exploração
amostra de unidades familiares era do sul e de madeira (Osgood, 1994), e, mais recen-
sudeste do Brasil, e aproximadamente 72% temente, as plantações de dendê (Koh &
delas migraram para as fronteiras de expan- Wilcove, 2008; Koh & Ghazoul, 2010). Nos
são antigas antes de chegar a Apuí. A por- Camarões, as estradas são o vetor essencial.
centagem de propriedades com terras titula- Seu efeito atua mais porque traz migrantes
das foi até cinco vezes menos, enquanto o do que facilita a transformação da agricultu-
acúmulo de terras foi muito maior do que ra de subsistência daqueles que já habitam
o relatado para outros projetos de assenta- as áreas para a produção orientada ao mer-
mento no Brasil. A mudança de uso da terra cado (Mertens & Lambin, 2000). A pesqui-
seguiu padrões diferentes, dependendo se o sa domiciliar no sul dos Camarões revelou
lote tinha sido obtido com 100% da cober- uma mudança na importância de vários ve-
tura florestal ou com um uso da terra her- tores ao longo do tempo: o desmatamento
dado. Uma análise de árvores de regressão aumentou na sequência de uma crise eco-
mostrou que o tamanho do rebanho bovino nômica em 1986, com fatores demográficos,
e a área total das propriedades nem sempre principalmente a migração, sendo as forças
explicam a área desmatada, nem o tamanho dominantes até 1991, seguidos no período
da área desmatada necessariamente é rela- 1991-1996 pelo mercado de banana e o au-
cionado com atividades produtivas. A au- mento da riqueza das famílias, com melho-
sência de renda obtida da pecuária indicou res estradas que reduziram o efeito inibitório
que pelo menos 30% dos casos estudados da distância aos mercados (Mertens et al.,
estão relacionados com a natureza especu- 2000). Na Amazônia brasileira a importância
lativa da aquisição de terras e do desmata- relativa de fatores, tais como subsídios do
mento. A crescente consolidação de áreas governo para grandes fazendas, a especula-
maiores e mais fazendas altamente capitali- ção de terras, e o assentamento de pequenos
zadas indicam a possibilidade de altas taxas agricultores têm variado ao longo do tempo
de desmatamento no futuro, mesmo quando (Fearnside, 2005). Diferenças de atores e as
a rentabilidade da pecuária é questionável. diferenças espaciais em fatores físicos e eco-
nômicos também resultam em heterogenei-
PALAVRAS-CHAVE Amazônia; pecuária; colo- dade intrarregional nos padrões de desma-
nização; desmatamento; especulação da terra; tamento (Fearnside, 1986ª; Brondízio et al.,
projetos de assentamento; mudança de uso da 2002; Aguiar et al., 2007).
terra; migração; LUCC; LULUCF; floresta Lambin (1994, 1997) e Kaimowitz &
Angelsen (1998) revisaram mais de 150 mo-
INTRODUÇÃO delos econômicos de desmatamento tropi-
cal, e criticam estudos trans-nacionais pela
O desmatamento de florestas tropicais má qualidade dos dados utilizados, entre
tem impactos diretos sobre o aquecimento outros problemas (ver Fearnside, 1996). Eles
global, o ciclo da água e a diversidade bio- também enfatizam a grande variedade de
lógica. As causas do desmatamento tropical vetores de desmatamento em lugares dife-
variam enormemente entre os diferentes rentes e a necessidade de mais investigação
países e ao longo do tempo em qualquer no nível local. Kaimowitz e Angelsen (1998:

Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 330 8/18/2022 3:15:50 PM


Dinâmica de uso da terra e a expansão de propriedades rurais em
Apuí, um hotspot do desmatamento na Rodovia Transamazônica 331

5) concluem que os mercados de terras são expansão ainda precisam ser compreendidos
uma das grandes dúvidas “ ...que só pode melhor. No entanto, existe informação sobre
ser resolvida por futuras pesquisas”. Eles a relação entre o desmatamento, o tamanho
concluem que “a pesquisa provavelmente da área e o tamanho do rebanho em tais áre-
será mais produtiva se concentrar no nível as.  Geralmente há uma correlação positiva
da família e regional, em vez de estudos na- entre tamanho da propriedade e do número
cionais e global”. O presente estudo contri- de cabeças de gado (Downing et al., 1992;
bui para preencher esta necessidade em um Kaimowitz, 1996; Ludewigs et al., 2009),
foco (hotspot) do desmatamento no Brasil. como também entre o número de cabeças e a
disponibilidade de crédito rural (Moran, 1981;
Na Amazônia brasileira, as causas subja-
Hecht, 1993).  As áreas com solos mais fér-
centes são uma combinação de políticas de co- teis têm uma produção mais diversificada e
lonização e agrícola promovida pela migração são mais resistentes a trocar de proprietários
de camponeses sem terra e fortes subsídios (Moran et al. 2005). Desmatamento em áreas
para os empresários iniciar a atividade pecuá- com solos inférteis e alta pluviosidade dimi-
ria (Mahar, 1979, 1989). As maiores áreas des- nuem de forma assintomática na Amazônia
matadas estão no “arco do desmatamento”, em áreas com níveis de precipitação anual
uma área em forma de lua crescente ao longo acima de 1800 mm, mesmo na presença de
das bordas sul e leste da floresta amazônica. uma estrada (Chomitz & Thomas, 2001).
A colonização foi frequentemente realizada
por agricultores familiares do sul e nordeste O papel especulativo de terras que atraiu
do Brasil, que foram posteriormente substitu- empresários à Amazônia foi importante na
ídos por grandes fazendas (Fearnside, 1986b, década de 1970 e ainda é mantido hoje, em
1987). Recentemente, o desmatamento tem se certa medida (Fearnside, 2008). Isso significa
expandido a partir do arco do desmatamento que a pecuária tem uma dinâmica que pode
em direção ao centro da Amazônia (Laurance, ser parcialmente independente de produti-
2000; Fearnside & Graça, 2006), principal- vidade (Hecht et al., 1988), que fortemente
mente no sul do estado do Amazonas e sul de moldou a paisagem e a acumulação de terra
Roraima (Sawyer, 2001). no estado de Rondônia entre 1973-1986 (ver
Mahar, 1979, 1989; Binswanger, 1991). A es-
O movimento da população significa o peculação de terras tem sido menos rentável,
movimento de investimentos, um fator cru- já que a inflação foi reduzida em 1994 com
cial que influencia as decisões domésticas. as reformas econômicas do “Plano Real”, e
Áreas de projetos de assentamento e ga- a criação de gado nem sempre é rentável em
rimpos funcionam como “pólos” que resul- fronteiras de expansão. Em geral, as taxas de
tam da migração intrarregional (Ozório de retorno anual na Amazônia variam entre 3
Almeida & Campari, 1995; Campari, 2002; e 15% (Schneider et al., 2000; Arima et al.,
Perz, 2002). Projetos de assentamento repre- 2005). No entanto, taxas negativas de retorno
sentam cerca de 15% do desmatamento total foram relatadas em Apuí quando apenas as
da Amazônia Brasileira (Brandão & Souza, receitas de gado são consideradas, sem acres-
2006). A tendência de famílias acumular ter- centar as receitas da exploração madeireira e
ras continuamente nas fronteiras de expan- do aumento do valor da terra (Razera, 2005).
são (Hecht, 1993; Campari, 2002) sugere que
A expansão de pastagens em Apuí ainda
os atores desempenham papéis diferentes na
ocorre mesmo em uma área onde os retor-
mudança da paisagem ao longo do tempo. A
nos econômicos são limitados pelo excesso
atividade pecuária em áreas de assentamen-
de chuvas e baixa fertilidade do solo, entre
to incorpora mais terras, geralmente através
outras características. O caso de Apuí oferece
de compra de propriedades adjacentes para
a oportunidade de, ao mesmo tempo, anali-
formar uma fazenda contínua (Aldrich et al.,
sar a dinâmica temporal do desmatamento,
2006; Caldas et al., 2007).
os agentes e fatores sócioeconômicos espe-
Os padrões de estratégias de uso da ter- cíficos da região, e fatores que são gerais
ra no acúmulo de terras nas fronteiras de para a Amazônia. Esses fatores incluem a

Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 331 8/18/2022 3:15:50 PM


DESTRUIÇÃO E CONSERVAÇÃO
332 DA FLORESTA AMAZÔNICA

movimentação anterior dos atores através de PARJ foi criado pelo Instituto Nacional de
uma sucessão de fronteiras agrícolas em ex- Colonização e Reforma Agrária (INCRA).
pansão antes de chegar a Apuí, suas estraté- A cidade de Apuí está localizada dentro do
gias para a geração de renda e a forma como PARJ. O PARJ apresenta um bloco de cerca de
eles contribuem para moldar a cobertura ve- 5.240 lotes com uma área total de 444.000 ha
getal nessa fronteira. Atentamos para evidên- (Fig. 1), incluindo áreas de florestas remanes-
cias baseadas no uso da terra de unidades centes e as propriedades que foram tituladas
familiares que poderiam elucidar como suas antes da criação do PARJ. A área de estudo
estratégias estão moldando o desmatamen- é composta por 108 estradas de acesso (“es-
to, considerando as forças subjacentes em tradas vicinais”) com uma extensão de apro-
Apuí. Optamos por utilizar uma abordagem ximadamente 1200 km com diferentes graus
que pode representar os padrões dessas fa- de trafegabilidade (Brasil, INCRA, 2006). Há
mílias em relação ao uso e ao acúmulo de também estradas abertas para exploração ma-
terra e o desmatamento. Nossa hipótese é deireira, os “carreadores”, que foram abertos
que o acúmulo de terras e a expansão de pelos proprietários ou por madeireiros.
pastagens usando os investimentos de outras Apuí apresenta altitude média de 135 m
fontes estão impulsionando o desmatamento acima do nível do mar, com relevo plano a
em Apuí. O artigo procura abordar a questão moderadamente ondulado (Brasil, Projeto
da importância relativa de diferentes fatores RADAMBRASIL, 1978). A precipitação anu-
na evolução do desmatamento em Apuí, in- al está entre 2200-2800 mm e a temperatura
cluindo características de unidades familia- média anual é de 26°C. O clima é classifi-
res e da especulação de terras. cado como tropical de monções (Köppen,
1948).  O tipo de solo predominante é
METODOS Latossolo Vermelho-Amarelo na classifica-
ção brasileira, um Argissolo (Aber & Melillo,
Área de estudo 1991; EMBRAPA, 2006).

A área de estudo compreende o Projeto Apuí passou por um processo de cresci-


de Assentamento Rio Juma (PARJ), junta- mento da população associado ao aumento
mente com algumas propriedades vizinhas, do desmatamento e à expansão da pecuária.
no município de Apuí que está localizado A população triplicou do início dos anos 1990
no sudeste do Amazonas (7,20°S. Latitude, a 2007, quando seu total ultrapassou 17 mil
59,89° W Longitude.) ao longo de um trecho habitantes. As percentagens da população
de 110 km da rodovia Transamazônica (BR- urbana (41,6%) e população rural (58,4%)
230; Fig. 1). Esta rodovia liga Apuí à cidade mantiveram-se praticamente constantes ao
de Humaitá, situada a 400 km a oeste no Rio longo do período 1991-2000 (Brasil, IBGE,
Madeira, e a Jacareacanga, a 300 km ao leste 2007). Aproximadamente 90% da área pro-
a 400 km no estado do Pará. A rodovia AM- dutiva de Apuí é ocupada por pastagens
174 liga Apuí a Novo Aripuanã, 290 km ao (Amazonas, IDAM, 2008). A área desmatada
norte. Uma extensa rede de rios navegáveis acumulada entre 1990 e 2009 quadruplicou,
irriga Apuí apenas na época das cheias, ou totalizando 167.670 ha (Brasil, INPE, 2009)
cerca de seis meses do ano (Amazonas, SDS, com um rebanho de 139.000 cabeças (Brasil,
2009). As estradas são quase intransitáveis IBGE, 2010). Apuí foi o município com maior
no período de chuvas (dezembro-abril), o desmatamento anual no estado do Amazonas
que torna difícil e caro para transportar os em 2008 e 2009, totalizando 7.100 e 6.460 ha,
produtos da agricultura ou pecuária das pro- respectivamente (Brasil, INPE 2009).
priedades rurais, quer para a cidade de Apuí
ou para mercados mais distantes. Coleta e análise de dados
A expansão das estradas e da agropecu- A amostra aleatória foi obtida a partir do
ária começou no início de 1970 quando a conjunto de lotes com desmatamento em 2008
Transamazônica foi construída. Em 1982, o (n = 4.023) (Carrero, 2009). A amostra foi

Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 332 8/18/2022 3:15:50 PM


Dinâmica de uso da terra e a expansão de propriedades rurais em
Apuí, um hotspot do desmatamento na Rodovia Transamazônica 333

Figura 1. Localização
de Apuí na região
amazônica; área de
estudo com os lotes
com desmatamento
do Projeto de
Assentamento Rio
Juma e arredores.

separada em oito coortes representativas de lotes ocupados em cada período, bem como o
períodos de ocupação dos lotes desde a criação espectro da área total de propriedades rurais
do PARJ em 1982. Foi considerada a freqüên- entre as famílias. Uma entrevista foi agendada
cia de lotes em cada coorte (ni) proporcional- com a pessoa responsável pela família proprie-
mente ao número total de lotes. Utilizamos tária do lote. Um total de 83 famílias foram en-
essa proporção para selecionar um número trevistadas em 78 dias de coleta de dados no
de lotes de cada coorte. A amostra, portanto, segundo semestre de 2008. Um questionário
tem o intuito de representar a proporção de semiestruturado foi adaptado de um utilizado

Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 333 8/18/2022 3:15:53 PM


DESTRUIÇÃO E CONSERVAÇÃO
334 DA FLORESTA AMAZÔNICA

pelo Centro Antropológico para Treinamento todas as propriedades rurais dentro do PARJ
e Pesquisa em Mudanças Ambientais Globais e quaisquer outras propriedades localizadas
(Indiana University, Bloomington, Indiana, até 115 km da cidade de Apuí. Este critério
E.U.A.). Também foram coletados mapas de foi usado para controlar o efeito da distância
uso da terra seguindo o método descrito em (transporte) e as limitações nas respostas di-
D’Antona et al. (2008). ferentes a respeito do uso produtivo das pro-
priedades da unidade familiar. A amostra foi
A entrevista continha informações sobre a composta por 83 famílias obtidas de 83 lotes
origem e a migração, o acúmulo de lotes, a sorteados.  Nota-se que alguns proprietários
economia e a estrutura familiar, e sobre as ca- residem em seus lotes e obtém renda somente
racterísticas da infraestrutura e do uso da terra da produção, enquanto outros residem na ci-
nas propriedades rurais. As informações cole- dade e realizam outras atividades econômicas,
tadas permitem uma análise sobre a posse da como por exemplo, comércio, cargos públicos,
terra e a mudança no uso da terra nos lotes, etc., e vice-versa. O esforço para encontrar as
tamanho do rebanho bovino, mão de obra e famílias dos lotes sorteados é necessário para
renda. Para cada família foram contabilizadas representar a gama de estratégias de ocupação
e acumúlo de terras, de uso da terra e de con-
solidação das propriedades rurais.
Tabela 1. Lista das Variável Carater† Tipo‡ Valores
variáveis utilizadas Foi utilizado o método de Árvores de
Dependente
na análise de árvore
Desmatamento total 9,42 - 1.300,00
Regressão (Breiman et al., 1984), conside-
de regressão com os Esp N
(log10) (0,45 - 3,11) rando uma ampla gama de variáveis inde-
valores máximos e
mínimos obtidos da Independente pendentes (Tabela 1).  Este método é ade-
amostra. Área total Esp N 24,57 - 4.831,02 quado para explorar as relações complexas
Residência Esp C urbana, rural entre os dados. O método aceita valores fal-
sul, sudeste, centro- tantes e estima um valor substituto potencial
Região de origem Esp C
oeste, norte, nordeste
(Therneau et al., 2009). A árvore de regres-
Pasto sujo Esp N 0-1
Pasto limpo Esp N 0-1
são é construída continuamente dividindo
Vegetação Secundária Esp N 0-1 a amostra com base em uma única variável
Derrubada Esp N 0 - 0,83 dependente e, também, lista alternativas ou
Culturas (anuais/perenes/ variáveis concorrentes para a variável inde-
Esp N 0 - 0,52
consórcios) pendente eleita (De’ath & Fabricius, 2000).
1 (80-92%); 2, (50- Nós usamos a soma dos quadrados, equi-
Floresta remanescente Esp C 80%), 3(20-50%),
4(<20%) valente aos modelos lineares dos mínimos
Despesa anual por quadrados. Usamos a regra “1 – SE” para
Ec N R$240 - 19.320
pessoa selecionar o tamanho da árvore pela valida-
Riqueza§ Ec C 1, 2, 3 e 4. ção cruzada, onde o “SE” é o erro padrão
agropecuária, (Breiman et al., 1984). Isso foi feito usando
comércio, emprego
Atividade principal Ec C
urbano, sem o pacote “mvpart” no programa estatístico R
ocupação v.2.6.2 (R Core Team Development, 2008).
Tempo permanência Temp N 1 - 29
Testamos 20 variáveis que refletem fa-
Cabeças gado por
propriedade
Fis N 0 - 1.600 tores socioeconômicos para explicar a área
Cabeças gado por família Fis N 0 - 1.700 total desmatada por unidade familiar. A va-
Infra-estrutura pecuária Fis N 0 - 61 riável resposta foi transformada em log10 e
Mão de obra familiar Fis N 0-7 teve distribuição normal (Shapiro-Wilk: W
Mão de obra contratada Fis N 0-6 = log10 0,98, p> 0,47).  Estes valores são
Mão de obra permanente Fis N 0-6 apresentados em hectares nas figuras e ta-
Mão de obra para fora Fis N 0-1 belas sobre as folhas da árvore de regressão.
† Esp = espacial, Ec = econômico, Fis = física e Temp = temporal.
‡ C = categorica, N = numérica
§ Riqueza:classes baseadas nos bens acumulados: 1-não tem fogão a gás,
Entre as variáveis espaciais estão o local
geladeira ou TV; 2- tem pelo menos fogão, geladeira ou TV; 3- tem veículo de residência, a origem geográfica, a área to-
(moto, carro, caminhão ou caminhonete) e pelo menos um dos bens citados
acima; 4- tem dois ou mais veículos e pelo menos um dos bens citados acima. tal das propriedades, a floresta remanescente

Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 334 8/18/2022 3:15:53 PM


Dinâmica de uso da terra e a expansão de propriedades rurais em
Apuí, um hotspot do desmatamento na Rodovia Transamazônica 335

e a proporção de áreas de cada uso da terra: propriedades, 37 foram excluídas do conjun-


pasto “sujo”, pasto “limpo”, as áreas derru- to de dados com base no limiar de corte de
badas, vegetação secundária,  e as culturas 115 km do centro de Apuí. O tempo médio
(anuais, perenes, ou consórcios de anuais e de moradia em Apuí foi de 16 anos, e a área
perenes).  Para diferenciar pasto “sujo”, ou total média em posse das unidades familia-
seja, pasto com invasão de vegetação secun- res foi 345,5 ha, variando entre 25 e 4.831
dária lenhosa, de vegetação secundária, foi ha. A área das propriedades de uma família
perguntando primeiro sobre a área total de geralmente representa um conjunto de lotes
pastagem e, então, pediu para estimar a pro- adjacentes na PARJ (Fig. 2).  O número de
porção nesta área entre as categorias “limpo” propriedades por família variou bastante,
e “sujo”. Depois, o proprietário do lote ou ge- com 17 tendo apenas um lote, 40 tendo 2 a 5
rente foi questionado sobre a área de vegeta- propriedades, 16 outras entre seis e dez pro-
ção secundária. O tempo de permanência des- priedades, quatro famílias que tinham entre
de a aquisição da primeira propriedade atual 11 e 20 propriedades e uma declarando-se
foi usado como uma variável temporal.  As como proprietária de 38 lotes adjacentes, di-
variáveis físicas foram: o número de pessoas vididos entre avô, filhos e netos (Fig. 3). Não
que trabalham nas propriedades como mão houve correlação entre o número de proprie-
de obra familiar, o trabalho permanente e diá- dades ou a área total e o número de pessoas
rias de trabalho, infraestrutura para pecuária, da unidade familiar. O número médio foi de
o número de cabeças de gado na propriedade 3,6 pessoas por família, com uma razão se-
e da unidade familiar. A infraestrutura da pe- xual de 1,36 homens para cada mulher.
cuária foi obtida a partir da soma do número Das 370 propriedades em posse/adminis-
de currais (peso 2), saleiros (peso 1), cochos tração de 83 unidades familiares, elas se auto-
(peso 0,5) e piquetes (peso 1). A mão de obra declararam proprietárias de 338 (91,4%). As
para fora consiste na proporção dos dias do outras propriedades eram geralmente de pos-
ano que os membros da família trabalham se de parentes que residem em Rondônia, no
para propriedades de terceiros. Variáveis eco- sul do Brasil, ou no exterior e que enviam di-
nômicas foram: despesas anuais por pessoa nheiro para a aquisição e consolidação dessas
(alimentação, saúde, educação, transporte, propriedades. Os proprietários têm contratos
vestuário, lazer, etc.), atividade principal e de compra e venda para 33,8% sem valor
um índice de riqueza ou bens acumulados. legal, nenhum documento para 30,1% e o
nome de uma pessoa da unidade familiares
inscrito no INCRA para 16% das proprieda-
RESULTADOS des. Apenas 10,3% reportaram ter o título
Migração, posse da terra e expansão de definitivo expedido pelo INCRA e devida-
propriedades rurais mente quitado, 7,3% terem título definitivo
com procuração em seu nome e 2,6% estar
Aproximadamente 77% das unidades em processo de regularização dele. Um total
familiares eram do sul e sudeste do Brasil
(43,9% e 32,9%, respectivamente), enquan- Origem Migração
Tabela 2.
to os 23% restantes eram famílias das regi- Características das
  Frequência (%)     Frequência (%) unidades familiares
ões centro-oeste (7,3%), Nordeste (7,3%) (n=83), (a) – região
e Norte (8,5%) (Tabela 2).  Enquanto 25 fa- CO †
6 7,3 Origem>Apuí 25 27,8 de origem e (b)
mílias (27,8%) migraram diretamente para NE ‡
6 7,3 Origem>CO>Apuí 22 24,4 migração.
Apuí de sua região de origem, 22 (24,4%) se N§ 7 8,5 Origem>Rondônia>Apuí 37 41,1
mudaram para a região centro-oeste e depois S |
36 43,9 S>Paraguai>Apuí 6 6,7
para Apuí. Antes de se mudar para Apuí, 37
SE ¶
27 32,9        
famílias (41,1%) residiam em Rondônia e seis
†Centro Oeste (Distrito Federal, Goiás, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul).
(6,7%) da região sul residiam no Paraguai. ‡ Nordeste (Alagoas, Bahia, Ceará, Maranhão, Piauí, Paraíba, Pernambuco, Rio
Grande do Norte, Sergipe).
Um total de 83 famílias foram registradas § Norte (Acre, Amapá, Amazonas, Pará, Rondônia, Roraima, Tocantins).
| Sul (Paraná, Rio Grande do Sul, Santa Catarina).
na posse de 370 propriedades rurais. Dessas ¶ Sudeste (Espírito Santo, Minas Gerais, Rio de Janeiro, São Paulo).

Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 335 8/18/2022 3:15:53 PM


DESTRUIÇÃO E CONSERVAÇÃO
336 DA FLORESTA AMAZÔNICA

Figura 2. Grupo de
propriedades rurais
da amostra dentro do
PARJ. Cores diferentes
representam cada uma
das unidades familiares.

de 77% das propriedades houve uma troca


de proprietários, sendo que a taxa média de
troca (turnover), foi de 1,32 (n=310) para as
propriedades estudadas, variando de 0 a 6.
Das unidades familliares amostradas, 70
(84,3%) possuiam cabeças de gado, com
97,5% destas possuindo gado em seus lotes.
62 famílias (75%) afirmaram que a pecuária é
a sua atividade principal. No entanto, aproxi-
madamente 30% destas declararam que não
recebem qualquer lucro proveniente dessa
atividade (Fig. 4). Embora 68% das famílias
Figura 3. Número de
propriedades rurais relataram-se como sendo produtores agrícolas
acumuladas por família. antes chegar a Apuí, apenas 25 delas (30,1%)
praticam a agricultura atualmente.
Um total de 57% das unidades familiares
aluga pastagens a outros (32%) e de outros
fazendeiros (33%), enquanto 8% realizam
ambas as atividades.  Uma família alugava
pastagens e não tinha cabeças de gado pró-
prias. Os grandes pecuaristas locais (>1.000
cabeças) em geral engordam o gado, en-
Figura 4. Porcentagem quanto os pequenos produtores investem
de renda obtida da em rebanhos reprodutores para produzir
pecuária das famílias
que tem a atividade
bezerros para venda. Nenhuma das famílias
como sua atividade amostradas utilizava insumos como fertili-
principal (n = 62). zantes ou calcário ou realizava qualquer tipo

Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 336 8/18/2022 3:15:53 PM


Dinâmica de uso da terra e a expansão de propriedades rurais em
Apuí, um hotspot do desmatamento na Rodovia Transamazônica 337

de preparo do solo em suas pastagens. Em de pasto “sujo” (11,2%) do que “limpo”


31% dos casos pelo menos uma pessoa da (8,3%), e uma proporção considerável de
unidade familiar trabalhava para outros pro- vegetação secundária (6,5%).
prietários por diárias ou por empreita, absor-
A árvore de regressão explicou 84,1%
vendo uma média de 24% da oferta total de
da variação na área desmatada das famílias
mão de obra das unidades familiares. Dentre
(Fig. 6). O tamanho do rebanho na proprie-
esses trabalhadores, 65% foram contratados
dade definiu a primeira divisão da árvore e
para roçar a vegetação secundária que inva-
explicou 51,8% da variação. A área total da
de as pastagens, 50% para construir cercas,
unidade famíliar foi responsável pela segun-
e 19% para derrubar a floresta.
da e terceira divisões. A segunda divisão adi-
cionou 13,1% à explicação do desmatamen-
Padrões de desmatamento e uso da terra to, enquanto a terceira divisão outros 10,7%.
A validação cruzada garantiu a inclusão das
Propriedades podem ser separadas em
duas últimas folhas da árvore, reduzindo
dois tipos: aquelas adquiridas com 100%
ainda mais 7,5% o erro da árvore. Nas três
de cobertura florestal e aquelas que já es-
primeiras folhas da árvore, com menos de 69
tavam parcialmente derrubadas quando
cabeças de gado, havia 16 famílias que não
compradas, e o atual proprietário, portanto,
tinham gado em suas propriedades (Tabela
“herdando” cobertura vegetal (Fig. 5). No
3). A média de 20,6 cabeças de gado na fo-
momento da nossa pesquisa, os lotes com-
lha 3 é inferior à da folha 2 (29,3 cabeças).
prados com 100% de cobertura florestal ti-
A folha 4 apresenta quase a mesma área des-
nham desmatado uma área total média de
matada da folha 3, mas tem três vezes mais
31,1%, dividida quase que igualmente en-
cabeças de gado.
tre pasto “sujo” (14,3%) e pasto “limpo”
(14,2%). Lotes parcialmente abertos quan- Quando as variáveis eram “área total” ou
do adquiridos tinham um tempo médio de “número de cabeças de gado na propriedade”,
ocupação pelo proprietário atual de 2,2 anos a outra variável serviu como uma alternativa
menor do que os lotes que foram compra- de divisão com um poder explicativo de mais
dos com a 100% de floresta. Lotes com uso de 95%, exceto na folha 1, onde o número
da terra herdados sofreram desmatamento a de gado explicou apenas 41% da variação na
uma taxa quase três vezes menor (12,6%) variável que tinha sido selecionado (“área to-
do que lotes com cobertura florestal de tal”).  Famílias da folha 1 apresentaram uma
100%. Lotes parcialmente derrubados antes proporção considerável de culturas anuais, ve-
da compra continham uma maior proporção getação secundária e áreas recém derrubadas.

Figura 5. Porcentagens
de cobertura vegetal
nas propriedades de
83 unidades familiares
(n=325) para dois pontos
no tempo (1= no momento
da aquisição ou ocupação
da propriedade, 2= em
2008) agrupadas em duas
classes: (a)- propriedades
adquiridas com 100% de
cobertura florestal [tempo
médio de aquisição =
8,8 anos ((± 6,6)]; (b) –
propriedaeds parcialmente
abertas (desmatadas)
quando adquiridas de
proprietários anteriores
[tempo médio de aquisição
= 6,7 anos (± 5,6)].

Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 337 8/18/2022 3:15:53 PM


DESTRUIÇÃO E CONSERVAÇÃO
338 DA FLORESTA AMAZÔNICA

Tabela 3. Folhas Desmatamento Área


formadas pela análise (Folha) divisões n No. lotes No. Cabeças Tperm (anos)
(ha) (ha)
da árvore de regressão
(1) <69 cab† , < 91,2 ha 19,7 ( ±8,1) 14 1 ( ±0) 4,4 (± 6,6) 66,9 ( ±18,5) 6,4 (±4,2)
do desmatamento e
os valores médios (2) < 69 cab, >91,2ha‡, ≥ 4,5 tper 47,4 (± 18,9) 23 2,5 ( ±1,5) 29,3 (± 25,4) 181,5 ( ±102,5) 13,2 (±6,6)
(desvios padrão) das (3) < 69 cab, >91,2ha, < 4,5 tper§ 90,2 (± 37,4) 7 3,43 ( ±1,3) 20,6 (± 25,0) 244,7 ( ±126,1) 2,7 (±0,9)
variáveis atuando como
(4) ≥69 cab,< 536,9 ha, < 175 cab 91,3 (± 30,4) 16 3,56 ( ±2) 110,6 (± 32,5) 247,8 ( ±147,9) 14 (±8,4)
divisões (negrito).
(5) ≥69 cab, <536,9 ha, ≥175 cab 189,0 (± 59,0) 12 5 ( ±1,5) 335,7 (± 106,2) 363,1 ( ±85,0) 8,9 (±7,3)
(6) ≥69 cab, >536,9 ha 524,7 (± 368,0) 9 13,3 ( ±10,1) 485,2 (± 477,4) 1462,1 ( ±1362,9) 13,3 (±6,4)
†Número de cabeças de gado da família.
‡ Área total em posse da família.
§ Tempo de permanência ou residência (anos) desde a aquisição da primeira propriedade rural em Apuí.

a ser mais direcionados ao crescimento eco-


Figura 6. Árvore nômico, geralmente associado à experiências
de regressão com anteriores com crédito rural e capital (Moran,
área desmatada total
em 2008 como a
1981). Essas diferenças nos padrões de compor-
variável dependente. tamento são relevantes à luz da concentração
Valores abaixo dos de terras em Apuí comparada a outros locais
nós representam na Amazônia. De 1.393 municípios do Brasil
as porcentagens de
redução do erro, ou
com taxas líquidas positivas de imigração e
quanto da variância de criação de empregos ao longo do período
dos dados a divisão 1995-2000 (Matos, 2007), Apuí é o 34º, uma
em questão conseguiu das regiões para onde têm imigrado as famí-
explicar. Os valores
das folhas terminais
lias que viveram em Rondônia. Outra fonte de
(1, 2, 3, 4, 5 e 6) desmatamento são fazendeiros capitalizados
representam a média que imigraram diretamente do sul do Brasil e
da área desmatada do Paraguai entre 1999 e 2005.  Nós identifi-
e o número de
famílias amostradas, camos 58 famílias que vieram para Apuí de-
respectivamente. pois de viver no Paraguai. Recentemente, tem
havido imigração de agricultores sem-terra
vindos de áreas vizinhas, como o município
Em resumo, os resultados mostram que de Colniza, no Mato Grosso e o município de
a pecuária está intimamente ligada tanto à Novo Progresso no sul do Pará. Estes agricul-
quantidade de desmatamento como ao acú- tores sem-terra podem vir por conta própria ou
mulo de terras de uma unidade famíliar em a trabalho para fazendeiros capitalizados para
Apuí. Ao mesmo tempo, a renda baixa ou abrir as áreas de floresta. Os moradores antigos
inexistente de venda do gado levanta ques- de Apuí alegam que esses novos migrantes são
tões sobre o porquê de Apuí ser um foco de responsáveis pela maioria do desmatamento
desmatamento e porque o gado desempenha ocorrendo atualmente.
um papel tão central.
Estrutura famíliar
DISCUSSÃO O número médio de pessoas e a composi-
Origem da população e migração ção sexual das unidades familiares da amos-
tra corroboram estudos mais detalhados so-
A predominância de migrantes das regiões bre a influência da estrutura familiar sobre o
sul e sudeste do Brasil mostra que as prefe- desmatamento e o uso da terra nas frontei-
rências e atitudes são diferentes em relação ao ras da Amazônia (Walker & Homma, 1996;
acúmulo de terras. Ao contrário dos imigrantes Marquette, 1998, McCracken et al., 1999, 2002;
predominantemente do Maranhão nas frontei- Perz, 2001). A média de 3,6 pessoas por domi-
ras do sul do Pará (Fearnside, 2001) e no sul de cílio encontrada neste estudo é baixa em com-
Roraima, os migrantes do sul do Brasil tendem paração com 6,6 encontrado por Marquette

Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 338 8/18/2022 3:15:54 PM


Dinâmica de uso da terra e a expansão de propriedades rurais em
Apuí, um hotspot do desmatamento na Rodovia Transamazônica 339

(1998) e 7,3 por Perz (2001) para a Amazônia em Apuí (n = 78) 78,2% das famílias possu-
equatoriana e Uruará, no estado do Pará, res- íam dois lotes ou mais com 27% (21 famílias)
pectivamente. No entanto, esses estudos não possuindo seis lotes ou mais. Num total de
demonstraram que a composição familiar tem 77% dos lotes da amostra houve a mudan-
efeito significativo na mudança da cobertura ça de proprietário, percentual semelhante ao
da terra (ver VanWey et al., 2007). A impor- encontrado em assentamentos em Porto Acre
tância do número de pessoas por unidade fa- (65%), Santarém (74%) e Altamira (76%),
miliar parece diminuir quando usam mão de embora a área total média possuída por unida-
obra contratada para as derrubadas. Ainda de familiar em Apuí foi, respectivamente, 3,7,
assim, a pecuária é dependente do trabalho 2,5 e 1,6 vezes maior do que as médias nestes
do sexo masculino (Marquette, 1998; Perz, outros assentamentos (Ludewigs et al., 2009).
2001), com o número de homens adultos em
geral positivamente correlacionado com a área O isolamento geográfico e as péssimas
desmatada (por exemplo, Godoy et al.,1998, condições de acesso também resultam em
Sydenstricker-Neto 2004), fator confirmado uma baixa freqüência de fiscalização e li-
pela razão sexual média de 1,36. cenciamento ambiental, e a ineficiência dos
serviços prestados pelas agências do governo
torna inviável o manejo florestal sustentável.
Posse e acúmulo de terras
Os escritórios mais próximos dos órgãos am-
Ludewigs et al. (2009) encontraram bientais estão em Humaitá (400 km por es-
93,6% das propriedades tituladas em Porto trada) ou em Manaus (500 km em linha reta,
Acre (Acre), 53,2% em Santarém (Pará) e mas sem acesso por estrada). Apuí é um mu-
69,9% em Altamira (Pará); estas percenta- nicípio localizado na extremidade do arco do
gens são de três a cinco vezes maiores do que desmatamento e fica evidente a necessidade
o percentual em Apuí (17,6%). Muitas pro- de maior governança.
priedades em Apuí não são tituladas por uma
variedade de razões. Uma parte é devido à ca- Especulação de terras e desmatamento
pacidade limitada do INCRA para supervisio-
nar, inspecionar e emitir títulos de terras na O tamanho do rebanho bovino e a área to-
região. Outras razões incluem a incapacidade tal de propriedades rurais foram as variáveis
dos ocupantes de pagar as prestações anuais mais significativas explicando as causas pro-
necessárias para a compra do lote; a mudan- ximais do desmatamento. No entanto, quando
ça de proprietários de um determinado lote analisamos o uso da terra e as características
que bloqueia a emissão de títulos de terra por de cobertura vegetal das propriedades rurais
causa de dívidas hipotecárias; e pessoas que dos grupos gerados pela análise de árvores
já possuem um lote reivindicando outros, o de regressão, alguns padrões podem desven-
que é inelegível perante a lei. dar estratégias que denotam a especulação de
A compra e venda de lotes ocorre mes- terras. O preço da terra subiu rapidamente em
mo na ausência de título da terra, porque as Apuí, com a chegada de agricultores capitali-
vendas são feitas do «direito de posse» com- zados do Paraguai, Rondônia, e sul do Brasil a
pensando, teoricamente, o vendedor das ben- partir de 1995, inflando o valor da terra (Portal
feitorias realizadas. A frequente ausência de Apuí, 2008). A alta taxa de abandono de lo-
títulos de terras favorece muito uma mudança tes contribuiu para o acúmulo de terras como
de proprietário dos lotes e o acúmulo de terras. outros colonos na região adquiriram as terras
No assentamento em Uruará (Pará) em 1996, a preços simbólicos, ou quando estes lotes fo-
18,9% das unidades familiares (n = 132) ti- ram comprados por fazendeiros recém-chega-
nham mais de um lote com o máximo obser- dos altamente capitalizados. A venda da ma-
vado sendo cinco lotes (Caldas et al., 2007). deira também contribui para a especulação.
No mesmo assentamento, em 2002, Aldrich et Madeireiras e serrarias têm aumentado a sua
al. (2006) constataram que 27,6% (n = 125) contribuição na economia do município, com
tinham mais de dois lotes, com o maior pro- nove serrarias operando em 2010 em compara-
prietário tendo sete lotes. Em nossa amostra ção a apenas quatro em 2004 (Razera, 2005).

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DESTRUIÇÃO E CONSERVAÇÃO
340 DA FLORESTA AMAZÔNICA

A proporção de gado em relação à área e pecuária em Apuí, como também tem sido
total de pastagem indica que, embora quase o caso em outras áreas de assentamento
todos os colonos possuam gado, em alguns (MacMillan, 1995; Phillips, 2007).
casos isso não representa uma fonte primá-
O corte de vegetação secundária contribui
ria de renda. A análise dos resultados indica
para reduzir a taxa de desmatamento, absor-
que há uma tendência das famílias em não
vendo os recursos financeiros dos recém-che-
confiar exclusivamente na rentabilidade da
gados por um tempo. No entanto, altas taxas
pecuária de seus lotes, ao invés disso, as pro-
de desmatamento continuarão a ocorrer e
priedades funcionam como oportunidades de
provavelmente irão aumentar quando áreas
investimento que dirigem a especulação de
de floresta secundária forem significativa-
terras.  Esse fato foi confirmado por 30,6%
mente reduzidas e apenas restarem florestas
das unidades familiares que tinham a pecuá-
primárias, assumindo que capital externo
ria como sua atividade principal, porém sem
e mão de obra estejam disponíveis (Walker
obtenção de renda. O capital proveniente de
et al., 2000). No monitoramento mensal de
outras fontes está sendo investido no rebanho
grandes incrementos em derrubadas (> 25
e/ou no acúmulo de terras, apesar da falta
ha), utilizando imagens MODIS de 250 m de
de rentabilidade demonstrada da pecuária. O
resolução, o PARJ figurou sete vezes entre os
influxo de capital para compra de terras ali-
três assentamentos com as maiores taxas de
menta o aumento dos preços da terra, criando
desmatamento em toda a Amazônia brasilei-
uma retroalimentação positiva entre a espe-
ra entre maio de 2008 e maio de 2010, e foi
culação de terras e o desmatamento que im-
duas vezes o «campeão» na primeira posição,
pulsiona a expansão das pastagens. Este ciclo
com taxas de até 2,5 mil ha em um único mês
especulativo fornece a explicação para o que
(Souza et al., 2009; Hayashi et al., 2010).  O
de outra forma seria um verdadeiro enigma:
uso da terra predominante em Apuí é a pe-
a expansão das pastagens, apesar retornos fi-
cuária extensiva baseada na expansão de áre-
nanceiros baixíssimos. Apesar de grandes fa-
as de pastagens, com a expectativa de que a
zendeiros já serem bem conhecidos por trazer
terra aumente de valor. O resultado é a pro-
recursos externos para investir nessas ativida-
pagação contínua da atividade destrutiva da
des (Walker et al., 2000), esta tendência foi
floresta, mesmo durante um período em que
observada até mesmo em pequenos e médios
as taxas de desmatamento total na Amazônia
proprietários rurais de Apuí.
têm reduzido (Brasil, INPE, 2009).
Geração de renda e investimento na Esforços para chegar a generalizações glo-
destruição da floresta bais sobre as causas de desmatamento muitas
vezes passam longe da realidade quando se
O acúmulo de terras com base na expan- olha para um caso específico. Por exemplo, a
são da pecuária sobre a floresta primária pa- visão de que a maior parte do desmatamen-
rece ser impulsionado por recursos externos, to tropical está sendo causado por famílias
mesmo quando as famílias tenham atividades pobres que realizam a agricultura de pousio
próprias ou fornecem mão-de-obra para ou- (Myers, 1980, 1994) não se encaixa bem no
tras propriedades. Adicionalmente à venda Brasil, onde a maioria do desmatamento é o
da madeira (Razera, 2005), as mulheres, em trabalho dos fazendeiros mais ricos (Fearnside,
particular, podem trazer dinheiro de fontes 2005). Dentro da Amazônia brasileira, a por-
urbanas para a família, que é investido na ção oriental da região tem a pecuária que é
propriedade (Marquette, 1998; VanWey et al., pelo menos moderadamente rentável para a
2007). O município de Apuí foi classificado produção de carne bovina em áreas com aces-
em 22º entre 5.507 municípios do Brasil du- so rodoviário adequado (Mattos & Uhl, 1994;
rante o período de 1995 a 2000 em termos da Mertens et al., 2002; Margulis, 2004), fornecen-
taxa de aumento do emprego formal, ou seja, do vetores económicos além dos identificados
com carteira assinada (Matos, 2007). O ga- em nosso estudo em Apuí.  Mesmo em uma
rimpo de ouro também foi relatado como fon- área relativamente limitada, como o município
te de renda para investimento na agricultura de Apuí (54.251 km², uma área maior que a

Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 340 8/18/2022 3:15:54 PM


Dinâmica de uso da terra e a expansão de propriedades rurais em
Apuí, um hotspot do desmatamento na Rodovia Transamazônica 341

Costa Rica), diversos agentes se comportam de (SEPROR-AM: IDAM e CODESAV), ao


maneiras diferentes. Instituto Nacional de Colonização e Reforma
Agrária (INCRA), e mais de 100 moradores
de Apuí pelas conversas  e/ou documentos.
CONCLUSÃO À Fundação Amazonas Sustentável (FAS),
A migração para Apuí é dominada por fa- ao programa BECA do Instituto Internacional
de Educação do Brasil (IIEB) juntamen-
mílias originárias do sul e sudeste do Brasil
te com  a Fundação Moore, ao Instituto
que viveram em fronteiras de expansão mais
Nacional de  Pesquisas da Amazônia (INPA)
antigas nas regiões centro-oeste ou norte. O
PPI. PRJ05.57) e à CNPq (Proc. 575853/2008-
baixo nível de titulação de terras e a baixa
5; 305880/2007-1; 573810/2008-7) que apoia-
governança parecem ser os principais fatores
ram financeiramente o estudo. Agradecemos
que contribuem para o acúmulo de terras que
à faz pelo empréstimo das  duas motocicle-
ocorreu mais rapidamente em Apuí do que em tas utilizadas durante o trabalho de cam-
outras áreas de assentamento na Amazônia. A po. Agradecemos ao  IDAM, à Secretaria de
pecuária facilita o acúmulo de terras e a sua Estado do Meio Ambiente e Desenvolvimento
consolidação em fazendas maiores. O com- Sustentável (SDS-AM), e ao Instituto de
portamento do desmatamento e o uso da terra Conservação e Desenvolvimento Sustentável
dependem da cobertura vegetal presente quan- do Amazonas (IDESAM) pelo apoio logístico
do uma propriedade é adquirida. A compra de e por compartilhar informação. A Eduardo
lotes e a expansão e consolidação da pecuária S. Brondízio  por compartilhar a ficha de
em Apuí não parecem estar ligadas à sua ren- seu  questionário de campo e a Fernando
tabilidade como fazendas de gado, mas sim O. Figueiredo, Paulo M.L.A. Graça, Claudia
a investimentos de outras fontes. Projetos de S.M.N. Vitel, Eduardo S. Brondízio, Stephen
assentamento podem servir como oportunida- G. Perz, dois revisores anônimos e dois edi-
des de investimento para os fundos de outras tores do periódico Ecology and Society pelos
fontes. A inexistência de receitas da pecuária valiosos comentários. Este é uma tradução de
indica a natureza especulativa da aquisição de um artigo publicado na Revista Ecology and
terras e desmatamento em pelo menos 30% Society (Carrero & Fearnside, 2011).
das unidades famíliares estudadas.
A crescente consolidação da terra em fa-
zendas maiores e mais capitalizadas indica o REFERÊNCIAS
potencial para altas taxas de desmatamento Aber, J.D., & J.M. Melillo. 1991. Terrestrial
no futuro. Essas constatações apontam tam- ecosystems. Saunders, Philadelphia, Pennsylvania,
bém o deslocamento de pequenos agriculto- E.U.A.
res para outras fronteiras e a continuação do Aguiar, A.P.D., G. Câmara & M.I.S. Escada. 2007.
desmatamento nessas áreas. Essa complexi- Spatial statistical analysis of land-use determinants
dade das relações entre os atores envolvidos in the Brazilian Amazonia: exploring intra-regional
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nas fronteiras do desmatamento deve ser re-
presentada em modelos de dinâmica de uso Aldrich, S.P., R.T. Walker, E.Y. Arima & M.M. Caldas.
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Camila, Haroldo, e Rogimário  serviram Apuí. SDS, Manaus, Amazonas.
como  assistentes de campo. Agradecemos Arima, E., P. Barreto & M. Brito. 2005.  Pecuária
à Secretaria Estadual de Produção Rural na Amazônia: tendências e implicações para a

Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 341 8/18/2022 3:15:54 PM


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Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 344 8/18/2022 3:15:55 PM


CAPÍTULO

19
A Política Brasileira ameaça as
Políticas Públicas Ambientais

Philip M. Fearnside
Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia – INPA
Av. André Araújo, 2936 – CEP: 69.067-375, Manaus, Amazonas, Brasil.
E-mail: pmfearn@inpa.gov.br

Tradução de:
Fearnside, P.M. 2016. Brazilian politics threaten environmental policies. Science 353: 746-748.
https://doi.org/10.1126/science.aag0254

345
Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 345 8/18/2022 3:16:01 PM
DESTRUIÇÃO E CONSERVAÇÃO
346 DA FLORESTA AMAZÔNICA

A situação política tumultuada do Brasil continuassem como membros da Comissão.


acarreta riscos para o meio ambiente no país As emendas exigem apenas maioria de 60%
mais biologicamente diverso e que é o lar das em cada casa do Congresso Nacional, e, em
maiores florestas tropicais e rios do mundo. seguida, são automaticamente efetivadas,
Dentre as ameaças está uma proposta de sem necessidade de sanção presidencial. A
emenda constitucional de uma frase (PEC-65) Constituição Brasileira de outubro de 1988
que revogaria quarenta anos de progresso na já foi emendada 90 vezes até dezembro de
construção de um sistema de licenciamento 2015 (de Moura Rocha Lima, 2016).
para avaliar e mitigar os impactos ambien-
tais de projetos de desenvolvimento (Senado Um porta-voz da ONG Instituto Brasileiro
Federal, 2016). Sob a PEC-65, a mera apresen- de Proteção Ambiental (PROAN) comparou
tação de um Estudo de Impacto Ambiental a PEC-65 à permissão para um estudante
(EIA), independentemente do seu conteúdo, que passa no vestibular em um curso de
permitiria que o avanço de qualquer projeto medicina começar imediatamente a realizar
fosse irreversível até sua conclusão. A comu- cirurgias (Borges, 2016). O Conselho Federal
nidade científica contribuiu substancialmente de Biologia, o qual representa os biólogos
para o sistema de licenciamento ambiental do Brasil, publicou uma manifestação de
do Brasil e agora deve redobrar seus esforços “indignação” e entregou-a aos líderes nas
para comunicar as informações que confir- duas casas do Congresso (CFBio, 2016). O
mem a sua importância. Ministério Público Federal (incumbido de
defender os interesses do povo) preparou
Apesar de suas limitações (e.g., Fearnside, um parecer jurídico (Brasil, MPF, 2016) con-
2014a), o sistema de licenciamento ambien- testando a proposta da emenda. Conflitos
tal do Brasil, que começou a exigir o EIA em constitucionais podem, potencialmente, ser
1986, é vital para restringir os projetos de in- julgados pelo Supremo Tribunal Federal.
fraestrutura com impactos excepcionalmente
altos. A comunidade científica tem documen- Essa ameaça está adicionada a uma pro-
tado os serviços fornecidos pelos ecossis- posta de lei (n.º 654/2015) (Senado Federal,
temas da Amazônia ao Brasil e ao mundo, 2015) aguardando votação no plenário do
aumentando a compreensão de como esses Senado. Isso permitiria que qualquer projeto
serviços são perdidos quando os ecossiste- “estratégico”, tais como uma usina hidrelé-
mas são destruídos. Projetos de infraestrutura trica, tivesse aprovação ambiental simplifi-
grandes, tais como estradas e barragens, são cada e rápida. A sequência normal de três
propulsores-chaves dessas perdas. licenças (preliminar, instalação e operacio-
nal) seria condensada em uma só licença,
Os defensores da PEC-65 afirmam que
com um prazo impossível de oito meses para
com os procedimentos de licenciamento
o órgão ambiental aprovar a licença, o que
“perde-se muito tempo e desperdiçam-se re-
normalmente leva 4-5 anos. Após o término
cursos públicos vultosos em flagrante des-
do prazo, o projeto seria automaticamente
respeito à vontade da população” (Senado
autorizado a prosseguir.
Federal, 2016). A emenda afirma: “A apre-
sentação do estudo prévio de impacto am- Os vastos planos do Brasil para barragens
biental importa autorização para a execu- e rodovias (Fearnside, 2015) fazem com que
ção da obra, que não poderá ser suspensa as consequências potenciais sejam enormes
ou cancelada pelas mesmas razões [ou seja, (Figuras 1 e 2). A lista mais completa das hi-
por razões ambientais] a não ser em face de drelétricas planejadas liberada pelo governo
fato superveniente” (Senado Federal, 2016). previa 79 grandes barragens na Amazônia
Em abril de 2016 uma Comissão do Senado brasileira, inundando 10 milhões de hectares
aprovou a PEC-65, liberando-a para votação (Fearnside, 1995). Rodovias planejadas conec-
no plenário do Senado. Senadores opostos tariam áreas inacessíveis das regiões centrais
à PEC-65 conseguiram retardá-la, devolven- e ocidentais da região ao “arco do desmata-
do a proposta à Comissão, embora os mes- mento”, onde a derrubada da floresta vem se
mos senadores que aprovaram a PEC-65 concentrado ao longo da borda sul da floresta.

Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 346 8/18/2022 3:16:02 PM


A Política Brasileira ameaça as
Políticas Públicas Ambientais 347

Figura 1. O Santarém-
Cuiabá (BR-163),
destinado à reconstrução
para transportar a soja
de Mato Grosso para os
portos do rio Amazonas
(Fearnside, 2007), é
um importante corredor
para desmatamento e
extração de madeira.
Construir ou melhorar
uma estrada desencadeia
a migração da população
com impactos de
longo alcance no meio
ambiente e na população
tradicional. Foto: Pulsar
images/Alamy stock
photo

Figura 2. A represa de
Jirau, no rio Madeira,
tem enormes impactos
(Fearnside, 2014b),
assim como terão as
represas planejadas:
deslocamento de
populações humanas,
bloqueio de migrações
de peixes, perda
de biodiversidade,
emissões de gases
de efeito estufa,
entre outros. Foto: N.
Friedman-Rudovsky/
Polaris/Newscom

A composição do Congresso e o seu po- maio de 2016, resultando na sua substituição


tencial para atender às influências empresa- pelo vice-presidente Michel Temer por até
riais sobre as questões ambientais (Zucco & 180 dias (enquanto o julgamento prossegue)
Lauderdale, 2011) aumentam as chances de e, presumindo que a mesma maioria a favor
aprovação repentina de medidas prejudiciais da cassação permanecerá inalterada, até fim
ao meio ambiente. Os políticos envolvidos do mandato presidencial em janeiro de 2019.
são alguns dos mais poderosos no Brasil,
com histórias que sugerem uma predisposi- As atividades frenéticas ligadas ao pro-
ção para explorar e degradar o meio ambien- cesso de impeachment levaram a um esvazia-
te (e.g., Infomoney, 2014). Um agravante da mento das funções normais do Senado, tais
situação é o julgamento de impeachment da como as sessões de comissão. Isto represen-
presidente Dilma Rousseff, iniciado em 11 de tou uma oportunidade para os interessados

Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 347 8/18/2022 3:16:02 PM


DESTRUIÇÃO E CONSERVAÇÃO
348 DA FLORESTA AMAZÔNICA

na aprovação de propostas “adormecidas” da Assembleia Legislativa Estadual, fizeram


que implicam em retrocessos na área ambien- um apelo direto ao presidente interino para
tal (a PEC-65 estava pendente desde 2012), as revogar cinco unidades de conservação re-
quais podem saltar, aparentemente do nada, cém-criadas no maior estado da região ama-
para tornarem-se ameaças concretas. Com a zônica (Amazonas em Tempo, 2016).
colaboração da maioria dos partidos políticos
do Brasil na aprovação do processo de impe- Além disso, a PEC-215, uma proposta
achment, o clima entre os políticos é de uma de emenda constitucional que está há mui-
unidade incomum para aprovar as medidas to tempo na agenda dos ruralistas, também
propostas pelo governo provisório para esti- está aguardando aprovação (OEco, 2015).
mular a economia do país, como, por exem- Isso transferiria a autoridade para a criação
plo, liberando os projetos de desenvolvimen- de terras indígenas e unidades de conser-
to das restrições ambientais. vação do executivo para o poder legislati-
vo, encerrando, efetivamente, a criação de
A governança ambiental do Brasil, in- novas áreas protegidas enquanto o controle
cluindo o licenciamento, foi marcada por
do legislativo permanecesse com os ruralis-
problemas anteriores ao tumulto político
tas. Outra legislação aguardando aprovação
recente (e.g., Ferreira et al., 2014), particu-
abriria as terras indígenas para mineração
larmente, devido a legislatura dominada por
(Barros & Barcelos, 2016). Uma proposta
“ruralistas” (representantes do Congresso
de grandes proprietários de terras). O poder dos governos dos Estados para enfraquecer
deste grupo foi demonstrado pela votação o sistema de licenciamento permitindo “au-
de 2011, com uma margem de sete-para-um, tolicenciamento” está progredindo através
para reduzir significativamente as proteções do Conselho Nacional do Meio Ambiente -
ambientais no Código Florestal (e.g., Soares- CONAMA (Guetta, 2016).
Filho et al., 2014), apesar de, na época, 80% Não existem soluções fáceis para esses
da população brasileira serem contra qual- problemas. É necessário fazer com que o
quer mudança no Código (Lopes, 2011). legislativo seja mais sensível aos impactos
Um líder dos ruralistas e, também, o irrestritos da construção de infraestruturas e
maior plantador de soja do Brasil, foi no- menos responsivo aos interesses especiais.
meado Ministro da Agricultura, o que su- A investigação de corrupção “Lava Jato”,
gere uma prioridade maior para projetos ainda em curso, pode ajudar (e.g., Baquero,
de infraestrutura para o transporte de soja 2015). A comunicação entre cientistas e os
(Fearnside, 2007). Os ruralistas solicitaram tomadores de decisão é essencial, apesar de
ao presidente interino Temer para rever as um histórico dessas informações serem ig-
decisões do poder executivo dos últimos noradas, como no caso da revisão do Código
dias da administração anterior, como, por Florestal (e.g., Metzger et al., 2010).
exemplo, a criação de unidades de conser-
vação e terras indígenas. O novo Ministro O poder executivo também é funda-
da Justiça afirmou que todas as decisões do mental, apesar dos aconselhamentos cien-
final da administração anterior seriam “re- tíficos muitas vezes serem ignorados lá
vistas” (Bergamon, 2016). A administração também (como no caso do licenciamento
anterior declarou sete terras indígenas, to- da hidrelétrica de Belo Monte: Hernandez
talizando 14,8 milhões de hectares, em seu & dos Santos, 2011). O Ministério do Meio
último mês no governo (Klein, 2016). Terras Ambiente e a Fundação Nacional do Índio
indígenas são particularmente importantes (órgão do Ministério da Justiça) originaram
porque protegem uma área maior do que as a expansão substancial de unidades de con-
unidades de conservação e porque têm um servação e de reconhecimento oficial das ter-
histórico melhor de resistência ao desmata- ras indígenas ao longo das últimas décadas,
mento (Nepstad et al., 2006). Representantes apesar da oposição de instâncias mais pode-
do estado do Amazonas no Congresso rosas, tais como as dos Ministérios de Minas
Nacional, juntamente com uma delegação e Energia, dos Transportes e da Agricultura.

Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 348 8/18/2022 3:16:02 PM


A Política Brasileira ameaça as
Políticas Públicas Ambientais 349

Um risco constante é que cientistas e ou- de Moura Rocha Lima, G. 2016. Constitucionalização
tras pessoas que trabalham com os proble- de Políticas Públicas e Emendamento Constitucional
no Brasil. Tese de doutorado em administração
mas ambientais na Amazônia sucumbam ao pública e governo, Escola de Administração de
fatalismo ao assumir que evitar a destruição Empresas de São Paulo, São Paulo, SP. 102 p.
na região é uma causa perdida. A continuida- http://bibliotecadigital.fgv.br/dspace/bitstream/
de de subsídios da comunidade científica é h a n d l e / 10 4 3 8 / 1 6 3 7 5 / Te s e G i ova n n a L i m a .
fundamental para orientar a política ambien- pdf?sequence=1
tal em direção a um futuro melhor no Brasil. Fearnside, P.M. 1995. Hydroelectric dams in the
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O autor reconhece o apoio do CNPq
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Torres por Figura 2. Paulo Maurício Lima doi.org/10.1007/s00267-006-0149-2
de Alencastro Graça e dois referees forne- Fearnside, P.M. 2014a. Brazil’s Madeira River dams:
ceram comentários. Isto é uma tradução de A setback for environmental policy in Amazonian
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Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 349 8/18/2022 3:16:02 PM


DESTRUIÇÃO E CONSERVAÇÃO
350 DA FLORESTA AMAZÔNICA

investir/fundos-de-investimento/noticia/3624539/ indigenous lands. Conservation Biology 20: 65-73.


senador-eleito-mais-rico-tem-quase-400-milhoes- https://doi.org/10.1111/j.1523-1739.2006.00351.x
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corte-de-protecao-a-matas.shtml asp?t=120446&c=RTF&tp=1

Metzger, J.-P.; Lewinsohn, T.; Joly, C.A.; Verdade, Soares-Filho, B.S., R. Rajão, M. Macedo, A. Carneiro,
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org/10.1126/science.329.5989.276-b https://doi.org/10.1126/science.1246663
Nepstad, D.C., S. Schwartzman, B. Bamberger, M. Zucco, C. & B. Lauderdale. 2011, Distinguishing
Santilli, D. Ray, P. Schlesinger, R. Lefebvre, A. between influences on Brazilian legislative behavior.
Alencar, E. Prinz, G. Fiske, & A Rolla. 2006. Inhibition Legislative Studies Quarterly. 36(3): 363-396.
of Amazon deforestation and fire by parks and https://doi.org/10.1111/j.1939-9162.2011.00019.x

Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 350 8/18/2022 3:16:02 PM


CAPÍTULO

20
Como sempre, os negócios: O ressurgimento
do desmatamento na Amazônia brasileira

Philip M. Fearnside
Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia – INPA
Av. André Araújo, 2936 – CEP: 69.067-375, Manaus, Amazonas, Brasil.
E-mail: pmfearn@inpa.gov.br

Tradução de:
Fearnside, P.M. 2017. Business as Usual: A Resurgence of Deforestation in the Brazilian
Amazon. Yale Environment 360, 18 de abril de 2017. http://e360.yale.edu/features/
business-as-usual-a-resurgence-of-deforestation-in-the-brazilian-amazon

Tradução original:
Fearnside, P.M. 2017. Como sempre, os negócios: o ressurgimento do desmatamento na
Amazônia brasileira. Yale Environment 360, 18 de abril de 2017. http://e360yale.universia.net/
como-sempre-os-negocios-o-ressurgimento-do-desmatamento-na-amazonia-brasileira/?lang=pt-br

351
Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 351 8/18/2022 3:16:09 PM
DESTRUIÇÃO E CONSERVAÇÃO
352 DA FLORESTA AMAZÔNICA

A Amazônia brasileira é do tamanho da Evidentemente este não foi o caso. O


Europa Ocidental. Nos 41 anos em que mo- desmatamento continuou em alta a partir de
rei na região, trabalhando com os problemas 2012, com um aumento notável de 29% na
do desmatamento, uma área maior do que taxa de corte em 2016. Agora, mais uma vez,
a da França foi devastada. Ao longo de dé- pressões econômicas e de desenvolvimento
cadas vi os ciclos econômicos, as oscilações poderosas pairam sobre a Amazônia brasilei-
nos preços das matérias-primas e a especu- ra, agravadas por uma realidade preocupan-
lação fundiária provocarem altos e baixos te: o crescimento impressionante do poder
na destruição da Amazônia, que atingiu seu político dos ruralistas, uma coalizão de lati-
recorde em 1995 quando aproximadamente fundiários, produtores de soja e outros ato-
res da economia com um interesse enorme
30 mil quilômetros quadrados, uma área do
de que esses projetos de “desenvolvimento”
tamanho da Bélgica, foi sacrificada em prol
e de infraestrutura entrem na Amazônia.
das madeireiras, dos pecuaristas e dos agri-
cultores (Figura 1). Enquanto as taxas de desmatamento na
Amazônia brasileira sofrem alterações, as
Quando a taxa anual de desmatamento diversas forças políticas e econômicas que
da Amazônia brasileira caiu de 30 mil quilô- estão constantemente destruindo a floresta
metros quadrados em 2004 para 4.400 quilô- costumam ser as mesmas. E não mudarão
metros quadrados em 2012, uma diminuição até o que governo do Brasil, como um todo,
de 84%, claro que fiquei aliviado. Mas eu já mostre uma determinação real para proteger
tinha visto destruição demais na Amazônia essa região vital, a qual desempenha um pa-
para querer comemorar. Infelizmente, essas pel crucial na regulação do clima da terra. O
quedas alardeadas exaustivamente, criaram atual ressurgimento do desmatamento é um
na comunidade ecológica internacional não lembrete disso (Figura 2).
apenas a impressão de que o desmatamen- Por mais que hoje em dia o controle do
to amazônico finalmente estava diminuin- desmatamento seja incontestavelmente me-
do, mas, também, uma perigosa ilusão na lhor do que em 2004, grande parte da di-
capital, Brasília: a crença de que o desma- minuição do desflorestamento entre 2004 e
tamento estava completamente controlado 2012 pode ser explicada por outros fatores,
e, portanto, o governo podia construir es- ao invés de ser atribuída a uma administra-
tradas, represas e outras infraestruturas na ção melhor. Praticamente toda diminuição
Amazônia sem consequências para a maior até 2007 (e 70% do total até 2012) foi origi-
floresta tropical do mundo. nada das forças do mercado, principalmente

Figura 1. Uma área


de selva amazônica
recentemente
derrubada no norte do
Brasil. Foto: D. Beltrá /
Greenpeace.

Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 352 8/18/2022 3:16:10 PM


Como sempre, os negócios: O ressurgimento
do desmatamento na Amazônia brasileira 353

Figura 2. Na Amazônia
brasileira uma área do
tamanho da França foi
perdida em virtude do
desmatamento desde
2016.

pela queda dos preços dos principais produ- do desflorestamento foi o resultado, sobretu-
tos de exportação como a soja e a carne bo- do, da redução dos cortes que estavam sendo
vina. Esta situação foi agravada pelo aumen- realizados pelos grandes e médios latifundiá-
to de 80% no valor da moeda brasileira em rios que precisavam lidar com as restrições de
comparação com o dólar norte-americano, crédito dos bancos públicos, ao contrário dos
tornando as exportações menos rentáveis pequenos agricultores.
para os latifundiários cujas despesas eram Então, o que há por trás do crescimen-
pagas em reais, enquanto os lucros das ex- to constante do desflorestamento a partir
portações eramem dólares de 2012? Esse ano foi caracterizado pela
De 2008 em diante os preços das matérias- promulgação de uma lei que enfraquecia
-primas se recuperaram, mas o desmatamen- muito o Código Florestal Brasileiro, remo-
to continuou a cair em 2012, uma indicação vendo restrições importantes sobre o des-
de que alguma coisa tinha mudado. A mu- matamento, especialmente na Amazônia, e
dança mais evidente foi a resolução adotada tornando mais fácil a obtenção da permissão
em 2008 pelo Banco Central do Brasil de su- oficial para desmatarlegalmente. E, graças
bordinar a concessão de créditos para a agri- ao aumento sem precedentes da influência
cultura e a pecuária à condição de não pos- política dos latifundiários ruralistas, o códi-
suir multas pendentes por desflorestamento go perdoou as derrubadas ilegais realizadas
ilegal. Ao contrário das multas - contra as até 2008, criando assim uma expectativa de
quais, pelo que parece, é possível apresentar futuras “anistias”. O preço da soja também
um recurso atrás do outro e, frequentemente, subiu em 2012, atingindo brevemente o nível
não pagar nunca - o indeferimento do crédi- (corrigido pela inflação) de 2004, encorajan-
to é imediato, não cabe recurso e afeta dire- do os agricultores a desmatar mais terras.
tamente os atores principais e mais ricos do O aumento do desmatamento nos últi-
processo de desmatamento. A desaceleração mos cinco anos não deveria nos surpreender,

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DESTRUIÇÃO E CONSERVAÇÃO
354 DA FLORESTA AMAZÔNICA

já que os fatores subjacentes à destruição dos os problemas econômicos do país. Essa revi-
bosques continuam crescendo ano após ano. ravolta abriu as porteiras para o avanço rápi-
A cada ano a região amazônica fica mais po- do de iniciativas do legislativo para eliminar
pulosa, mais estradas penetram na selva e as restrições ambientais, uma tendência que
existem mais investimentos na agricultura e continuou após a transferência formal dos
pecuária e em grandes projetos, tais como a poderes presidenciais ao atual líder do Brasil,
contrução de represas hidrelétricas. As áreas Michel Temer (Fearnside, 2016).
ao redor das represas no rio Madeira (Santo
Ainda que outros fatores econômicos
Antônio, cujo reservatório foi enchido em
possam ter contribuído para o aumento do
2011, e Jirau, enchido em 2013) e no rio
desflorestamento, sua magnitude sugere
Xingu (Belo Monte, enchido em 2015) foram
que ele também teve sua origem no rápido
pontos de desflorestamento intenso. O mes-
crescimento do poder político dos ruralistas,
mo ocorreu na estrada de Santarém a Cuiabá
que está sendo reconstruída para transportar que já tinha começado muito antes do fim
a soja do Mato Grosso para os portos com do governo de Rousseff. O atual ministro da
acesso ao rio Amazonas (Pearce, 2011). Agricultura, Blairo Maggi, é o maior produtor
de soja do Brasil (Bonato & Samora, 2016).
Os antigos motivos do desflorestamento, Em 2005, quando era governador do Mato
como a especulação fundiária, a lavagem de Grosso, ele recebeu do Greenpeace o prêmio
dinheiro e a aquisição de terras - seja obten- “Motosserra de ouro” por ser o maior res-
do o título legal de propriedade da terra ou ponsável individual pelo desmatamento da
ocupando e evitando que sejam invadidas Amazônia (Greenpeace, 2005).
ou confiscadas, com ou sem um documento
legal - continuam existindo. Soma-se a tudo O Ministro da Justiça, Osmar Serraglio,
isso uma economia livre para vender produ- que controla o órgão responsável pelas ter-
tos agrícolas com fins lucrativos (Fearnside, ras indígenas, foi o congressista mais pode-
2005). Durante este período foram abertos roso por trás de uma emenda constitucional
novos mercados internacionais para a carne proposta para extirpar do órgão a autoridade
do Brasil, com um aumento constante das para criar reservas indígenas, uma iniciati-
exportações até 2016, antes que estourasse va amplamente considerada um revés para
o escândalo de inspeção da carne e sua co- os esforços de conservação das florestas tro-
mercialização fosse proibida (supostamente picais (Arsenault, 2017). Serraglio também
de forma temporária) em 2017. O avanço da lutou para arrancar do Ministério do Meio
soja para as antigas pastagens de gado no es- Ambiente a faculdade de criar reservas na-
tado do Mato Grosso, inclusive em algumas turais. A facção ruralista também encabeça
áreas onde originalmente predominavam sa- ambas as câmaras do Congresso Nacional e
vanas em vez de floresta tropical, induziu os lidera a coalizão governamental nas mesmas.
pecuaristas a vender suas terras e reinvestir Não existe uma solução única para a
os lucros para a compra e desmatamento de incessante destruição da floresta amazôni-
zonas florestais na região mais remota da ca. Uma série de medidas divididas em três
Amazônia, onde a terra é barata. categorias são necessárias: esforços para
Compreender o aumento do desmata- prevenir o desflorestamento; suspensão das
mento do ano passado é importante para ações governamentais que fomentam o des-
prever quais medidas deverão ser adotadas florestamento; e oferta de alternativas para
para limitar a derrubada dos bosques. Um aqueles que dependem da agricultura para
fator importante em 2016 foi a incerteza po- subsistir - um grupo que não inclui o agrone-
lítica durante e após o processo de impeach- gócio, os pecuaristas ou os “grileiros” (gran-
ment da presidente Dilma Rousseff, a qual foi des usurpadores ilegais de terras) (Fearnside,
obrigada a afastar-se em maio de 2016 para 2008a). O valor dos serviços ambientais da
o início de seu julgamento, culminando em região é uma fonte potencial de recursos
sua acusação formal, em agosto passado, por que estive promovendo durante mais de
manipular o orçamento federal para ocultar três décadas. Estes serviços incluem manter

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Como sempre, os negócios: O ressurgimento
do desmatamento na Amazônia brasileira 355

a biodiversidade, evitar o aquecimento glo- mantendo estradas e demais infraestruturas


bal e reciclar a água da chuvas, não só na para transportar estes produtos.
Amazônia, mas também em São Paulo e nos A abertura de estradas coloca inevitavel-
países vizinhos do Brasil. Mas, apesar de al- mente em andamento uma cadeia de invasão
guns progressos obtidos, essa alternativa à de terras, especulação fundiária e desfloresta-
atual economia destrutiva, necessária para mento que escapa rapidamente do controle do
mudar o curso do desenvolvimento, encon- governo. Um exemplo claro disto é a reabertu-
tra-se ainda em fase incipiente (Fearnside, ra prevista da estrada abandonada de Manaus
2008b). a Porto Velho, a qual, junto com as estradas de
O estabelecimento de áreas protegidas é ligação existentes e planejadas, abriria aproxi-
uma prioridade urgente, e sua criação deve madamente a metade do que resta da flores-
ser imediata, antes que os colonizadores e in- ta amazônica no Brasil para os produtores de
vestidores cheguem às regiões intocadas até soja, pecuaristas, madeireiros e demais atores
agora. Mas em vez de criar reservas, o gover- do infame “arco de desmatamento” que se es-
no e seus aliados ruralistas as estão reduzin- tende ao longo da fronteira meridional da re-
do e revogando. Um exemplo disso é o estado gião (Fearnside & Graça, 2006).
do Amazonas, onde representantes do esta- A resposta à intensificação do desma-
do no Congresso Nacional estão trabalhando tamento deveria incluir, portanto, o cance-
atualmente para anular partes de um mosaico lamento de alguns importantes projetos de
de reservas no sul do Estado, que é um dos infraestrutura com grande potencial para ca-
maiores focos de desmatamento (ISA, 2017). talisar uma derrubada maior das florestas.
Infelizmente, deter esses projetos de desen-
O Ministério do Meio Ambiente e de-
volvimento não é a tendência atual, que se
mais órgãos precisam de reforços, ajuda fi-
caracteriza como uma explosão de propostas
nanceira e respaldo político. O fracasso em
legislativas para enfraquecer ou abolir as li-
obter isso é uma das razões que explicam
cenças ambientais a favor de projetos de in-
o atual ressurgimento da derrubada de flo-
fraestrutura “estratégicos”, como as estradas
restas. O Ministério do Meio Ambiente está e represas (Fearnside, 2017a).
sempre entre as últimas prioridades quando
os recursos do escasso orçamento estatal são Se o governo brasileiro, com a ajuda da
destinados. Isto reduziu as inspeções de des- comunidade internacional, não levar a sério o
matamento ilegal e dificultou os esforços de controle das forças do desenvolvimento destru-
criação e defesa de áreas protegidas. tivo, então, independentemente dos períodos
de crescimento e diminuição do desmatamen-
Entretanto, o problema é mais complexo. to, esta magnífica floresta tropical continuará,
Responder às más notícias sobre o desflores- década após década, desaparecendo.
tamento significa sempre passar o problema
para o Ministério do Meio Ambiente, enquan-
to o resto do Governo segue impassível. Mas, AGRADECIMENTOS
uma infinidade de ações governamentais leva
Este capítulo é uma tradução de Fearnside
a um desmatamento maior, e estas ações de-
(2017b), reformatado de Fearnside (2017c),
vem ser reconhecidas e detidas. O Governo
subsidia o desflorestamento oferecendo em-
préstimos a juros baixos para a agricultura e REFERÊNCIAS
a pecuária (e perdoando as dívidas quando
Arsenault, C. 2017. Brazil stops demarcating land for
surgem problemas), criando assentamentos, indigenous people: ex-government agency official.
eximindo de impostos as exportações sem se Reuters, 11 de janeiro de 2017. http://www.
preocupar com os danos, fornecendo prorro- reuters.com/article/us-brazil-landrights-politics-
gações e pesquisa para ampliar o cultivo de idUSKBN14V24R
soja, a pastagem bovina e a “gestão” flores- Bonato, G. & R. Samora 2016. New Brazil ag minister seen
tal insustentável, bem como construindo e friendly to business, maybe not to Amazon. Reuters,

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DESTRUIÇÃO E CONSERVAÇÃO
356 DA FLORESTA AMAZÔNICA

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Destruição e Conservação da Floresta Amazônica - Miolo.indb 356 8/18/2022 3:16:11 PM

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