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Religião Francisco

DIVULGAÇÃO
Sínodo Amazônico:
por uma conversão pastoral, sinodal e ecológica
Encontro ocorre neste mês no Vaticano, para buscar “novos
caminhos para a Igreja e para uma ecologia integral” na chamada
pan-amazônia, no coração da América do Sul
Moisés Sbardelotto *

N
este mês, entre os dias milhões de quilômetros quadrados, tropicais e aproximadamente 30%
6 e 27, realiza-se o Sí- no coração da América do Sul, que da superfície da terra, abrigando
nodo dos Bispos sobre perpassa os territórios do Brasil, cerca de 15% da biodiversidade
a “Amazônia: novos caminhos Bolívia, Colômbia, Equador, terrestre, sendo uma das biosferas
para a Igreja e para uma ecologia Guianas, Peru, Venezuela e Suri- mais ricas e complexas do planeta.
integral”. O encontro ocorre no name. Nessa região, vivem mais O Sínodo para a região pan-
Vaticano, com a presença do papa de 33 milhões de pessoas e mais -amazônica foi convocado há dois
Francisco, reunindo representan- de 370 povos indígenas. Em ter- anos, em outubro de 2017, quando o
tes da Igreja presente na chamada mos geográficos, a pan-amazônia papa Francisco acolheu o pedido de
pan-amazônia, uma região de 7,8 engloba 40% da área das florestas algumas Conferências Episcopais

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da América Latina para a realiza- outros pontos, os bispos pedem a para a experiência cristã, a tradução
ção dessa Assembleia Especial do defesa do território amazônico e a da Bíblia para as línguas autóctones
Sínodo. denúncia da destruição extrativista, da Amazônia, o aprofundamento
Seguindo o que Francisco disse das novas formas de colonialismo, de uma teologia índia amazônica
em sua encíclica Laudato si’ (“Lou- das ideologias que justificam o e até possíveis adaptações do rito
vado sejas”), sobre o cuidado da ecocídio amazônico e da violação eucarístico às culturas locais. Por
casa comum, o Sínodo quer “ouvir dos direitos humanos na região. essas e outras razões, o Sínodo tem
tanto o clamor da terra como o cla- Também exigem que os respectivos sido alvo de fortes críticas, muitas
mor dos pobres” (n. 49), como os governos nacionais garantam os delas baseadas em distorções ou até
povos amazônicos. E também quer recursos necessários para a prote- em mentiras sobre os propósitos
desafiar a Igreja a vivenciar uma ção dos povos indígenas isolados do Papa.
“conversão ecológica integral”. e a promoção de projetos agrofa-
Essa conversão busca tirar todas as miliares nas comunidades rurais. Desafio pastoral – Contudo,
consequências do encontro com Je- Em termos eclesiais, pede-se, por ainda em seu primeiro ano como
sus, também em relação ao mundo exemplo, a promoção da função da Papa, em sua visita ao Brasil para
e à realidade em que vivemos, pois, mulher, reconhecendo seu papel de a Jornada Mundial da Juventude,
segundo o Papa, “viver a vocação liderança na formação e continui- em 2013, Francisco já chamava a
de guardiões da obra de Deus não dade das comunidades e famílias atenção para a realidade amazôni-
é algo de opcional nem um aspecto locais. Também se fomentam o ca, em seu encontro com os bispos
secundário da experiência cristã, reconhecimento da espiritualidade brasileiros. O pontífice definiu a
mas parte essencial de uma exis- indígena como fonte de riqueza Amazônia como um “teste deci-
tência virtuosa” (n. 217), a exemplo
de São Francisco de Assis.
OSNILDA LIMA

Essa conversão se inter-relaciona


com outros dois movimentos “em
saída” indicados por Francisco. O
primeiro deles envolve uma con-
versão pastoral, que coloque a Igre-
ja em estado permanente de missão,
especialmente nas periferias geo-
gráficas e humanas. E também uma
conversão à sinodalidade eclesial,
favorecendo o “caminhar juntos”
de toda a Igreja – clero, religiosas,
religiosos, leigas e leigos – diante
dos desafios do mundo de hoje. No
Sínodo, essas três “conversões”
– pastoral, sinodal e ecológica –
somarão forças em um processo
dinâmico de discernimento sobre
a vida da Igreja e o anúncio do
Evangelho na Amazônia.
Inspirado no magistério do papa
Francisco, o instrumento de tra-
balho do Sínodo, texto oficial que
será debatido no encontro, traz É urgente a promoção da mulher, reconhecendo seu papel
de liderança e formação das famílias e das comunidades locais
algumas sugestões para a missão
da Igreja na pan-amazônia. Entre

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sivo” para o caminho não só da


Igreja no Brasil, mas também de
toda a estrutura social. Para ele,
a Amazônia é um “desafio pas-
toral”, especialmente no que diz
respeito à formação de um clero
autóctone e à consolidação de um
“rosto amazônico da Igreja”, na
pluralidade de seus povos, culturas
e ecossistemas.
Na Laudato si’, publicada em
2015, Francisco também alertou
para as queimadas e o desmata-
mento na Amazônia, geralmente
vinculados a “enormes interesses
econômicos internacionais”. Dian-
te dessa realidade, criticou as pro-
postas de “internacionalização da
Amazônia”, mas, ao mesmo tempo,
reafirmou o dever dos governos
de “preservar o meio ambiente e
os recursos naturais do seu país,
sem se vender a espúrios interesses
locais ou internacionais”.
E, no ano passado, no encon-
tro com os povos da Amazônia,
em Puerto Maldonado, no Peru,
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Francisco afirmou que “os povos


originários amazônicos nunca
estiveram tão ameaçados em seus
territórios como agora”. Por isso,
Papa se encontra com comunidades de Moçambique,
exortou a “romper com o paradigma Madagascar e Ilhas Maurício em sua recente visita à África
histórico que considera a Amazônia
como uma despensa inesgotável
dos Estados, sem levar em conta integral sem prestar atenção e cui- outra social, mas sim “uma única
os seus habitantes”. E convidou dar da nossa Casa Comum”. e complexa crise socioambiental”,
a Igreja inteira e ajudar os bispos Em seu discurso às autoridades que pede respostas conjuntas. “Não
e os missionários e missionárias de Madagascar, falando da bele- pode haver uma verdadeira abor-
a “plasmar uma Igreja com rosto za da biodiversidade do planeta, dagem ecológica nem uma ação
amazônico e indígena”. Francisco também denunciou: “As concreta de proteção do ambiente
florestas ainda existentes estão sem uma justiça social que garanta
África – Um mês antes do início ameaçadas pelos incêndios, pela o direito à destinação comum dos
do Sínodo, Francisco viajou para caça ilegal, pelo corte descontrola- bens da terra às gerações atuais,
Moçambique, Madagascar e as do de madeiras preciosas. A biodi- mas também às futuras.”
Ilhas Maurício, entre os dias 4 e versidade vegetal e animal está em * Moisés Sbardelotto é jornalista, mestre e
10 de setembro. Diante das várias risco por causa do contrabando e doutor em Ciências da Comunicação pela Uni-
versidade do Vale do Rio dos Sinos (Unisinos),
situações de pobreza e exclusão das exportações ilegais”, afirmou. no Rio Grande do Sul, e La Sapienza, em Roma.
encontradas, ele afirmou que “não Segundo o Papa, não há duas É também autor de E o Verbo se Fez Bit (Editora
se pode falar de desenvolvimento crises separadas, uma ambiental e Santuário) e E o Verbo se Fez Rede (Paulinas Editora).

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