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O blitzkrieg dos signos.

Sobre o choque na mensagem publicitária.


Eduardo J. M. Camilo
Universidade da Beira Interior, Portugal

Neste ensaio é nosso intuito delimitar semioticamente o estatuto do choque na


publicidade. Por um lado, será concebido como um acto perlocutório que, conforme seja mais
ou menos convencionalizado ou intencional, vai pressionar a reflexão para os limites
epistemológicos da semiótica, rumo à sociologia, à antropologia da comunicação e à
sociolinguística da publicidade. Por outro lado, será compreendido como um efeito
decorrente de um ‘percurso gerativo de sentido publicitário’; já não a reacção a uma
enunciação publicitária, mas, simplesmente, uma ‘substância de conteúdo’ integrada no
domínio da ‘anti-sedução’.
Este curto ensaio encontra-se organizado em três partes: na primeira, descreveremos
o que concebemos por ‘choque publicitário’. Nas outras, propomo-nos reflecti-lo
respectivamente a partir de um ângulo pragmático e textual.
Numa perspectiva tecno-operativa, consideramos que este estudo é relevante por
contribuir para uma sistematização dos modos de percepcionar o fenómeno do choque
publicitário e, assim sendo, para uma inventariação dos factores que estão subjacentes à sua
ocorrência.

§ 1 – Conceptualização do choque
Começamos por esclarecer o que entendemos por ‘choque publicitário’: qualquer tipo
de mensagem (de índole comercial, corporativa ou social/cívica) que apresente a dupla
particularidade de ser caracterizada por significações de índole disfórica, negativa, sobre
temas ou actores publicitários (a) ou que suscite reacções negativas, não obstante o seu
carácter espectacular, fascinante (b) (Figura nº1).
Na internet abundam sítios onde esse tipo de mensagens já se encontra compilado.
Confiram-se, a título de exemplo, três: o do blog Odee (“Onother16 offensive, banned and
reject ads”, url em Maio de 2011: http://www.oddee.com/item_96990.aspx); o que se
assume como a antologia dos 30 anúncios mais ofensivos e rejeitados (“30 most banned,
offensive and rejected ads”, url em Maio de 2011: http://km-
stressnet.blogspot.com/2010/07/30-most-offensive-banned-and-rejected.html) e o relativo a
anúncios considerados como escandalosos (“25 vintage ads that would be banned today”, url
em Maio de 2011: http://www.boredpanda.com/vintage-ads/). Este último sítio é
interessante por ser ilustrativo de uma característica fundamental do fenómeno do choque
publicitário: a classificação do que é ofensivo, escandaloso, agressivo, varia de época para
época, de contexto para contexto, de cultura para cultura, como tão bem tentaram
demonstrar Kara Chan et al (Chan, Li, Diehl & Terlutter, 2007).

1
http://www.unsoughtinput.com/wp-content/uploads/2007/06/old-fashioned-
http://www.dublnr.com/wp-content/uploads/2010/03/003.jpg
ad3.jpg

(a)

(b)
Figura nº 1

2
Um anúncio absolutamente mainstream das décadas 60/70 do século passado é eleito no
referido blog como chocante por ser ofensivo (figura nº 2).

http://www.boredpanda.com/vintage-ads/

Figura nº 2

§ 2 – Fundamentos
No âmbito da conceptualização do choque publicitário propomos três referências
epistemológicas: o já referido estudo de Kara Chan et al (Chan, Li, Diehl & Terlutter, 2007);
as investigações sobre a publicidade como forma de comunicação social de William Leiss et al
(Leiss, Kline & Jhally, 1988) e os estudos semiológicos sobre o discurso da publicidade da
autoria de Georges Péninou (Péninou, 1972). Salientamos a particularidade das duas últimas
referências não incidirem explicitamente sobre a temática do choque publicitário. Só foram
repescadas derivado à sua relevância e pertinência, justamente por contribuírem para a
compreensão de tal temática.
Através de William Leiss, Stephen Klein e Sut Jallhy, conceptualizaremos o choque
publicitário como uma reacção negativa das audiências – e da sociedade civil em geral -
decorrente do facto de certas mensagens explicita ou implicitamente, intencional ou
involuntariamente, terem infringido certas regras deontológicas do ‘fazer publicitário’. Assim
sendo, o seu fundamento deverá ser averiguado a partir do estatuto da publicidade como
mecanismo de mediação entre as esferas da produção e do consumo e o campo dos media.
Esta particularidade é importante, pois possibilita-nos averiguar os focos de emergência de
mensagens chocantes conforme os valores ou as normas consagradas em cada um destes três
domínios são afrontados.
Eis o primeiro foco de emergência da publicidade chocante: o decorrente de uma
tomada de posição simbólica de cariz reactivo por parte de um anunciante relativamente às
dinâmicas produtivas ou dos mercados que, segundo a sua perspectiva, terão sido

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alegadamente subvertidas por outros anunciantes/marcas. A mensagem publicitária é
intencionalmente chocante porque visa repor simbolicamente certos valores do agir
microeconómico que, de alguma forma, terão sido infringidos (na sua perspectiva). O choque
publicitário encontra-se associado ao reposicionamento das ‘verdades depois de se terem
zangado as comadres’; a uma conduta agónica de defesa ou de acusação relativamente às
posições manifestadas nos textos publicitários das marcas concorrentes. Sobre este assunto,
confira-se o anúncio da Bentley de reacção às cínicas congratulações da Subaru, BMW e Audi
relativamente aos prémios que entretanto conquistaram: melhor carro ano de 2006 (BMW),
seis vezes vencedor do prémio Les Man (Audi), melhor motor de 2006 (Subaru) (figura nº 3).
http://img.uphaa.com/uploads/338/2852536983_1dc4f7e20e_o.jpg

Figura nº 3
Passamos para o segundo fundamento da publicidade chocante: o resultante da
infracção dos contextos mais adequados à publicitação de certos bens ou serviços. Está
relacionado com a problemática dos unmentionables patente na investigação de Kara Chan e
a sua equipa (Chan, Li, Diehl e Terlutter, 2007: 608). Existem mercadorias que, per se, são
potencialmente chocantes - ofensivas ou escandalosas - quando não cuidadosamente
promovidas. É o caso dos produtos de higiene feminina íntima, dos de planeamento familiar,
etc., que impõem um contexto adequado de publicitação. É a sua infracção - sob a forma de
um conjunto de procedimentos locutórios e ilocutórios desadequados (como se a promoção
destas mercadorias impusesse um código pragmático de enunciação publicitária) - que
induzirá reacções pragmáticas negativas dos públicos que não eram intencionadas. Este
fundamento da publicidade chocante reflecte uma deficiente planificação de media e criativa
– incompatível no respeitante à divulgação de certos produtos para determinadas públicos e
em certos contextos.

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Apresentamos seguidamente o terceiro fundamento da publicidade chocante: o
resultante de infracções aos valores vigentes. O choque publicitário assume-se como uma
reacção, por vezes inconsciente, das próprias comunidades sobre o modo como certos
conteúdos podem ameaçar o equilíbrio social. É este o principio patente no interessante
estudo de Kara Chan et al: até que ponto a classificação de ‘chocante’ atinente a
determinados anúncios, traduz modos de conceptualizar o impacto da publicidade na
dissolução de valores considerados fundamentais, por referência a dois países, a Alemanha e
a China? Nesta vertente, o choque publicitário é uma reacção pragmática cujo fundamento é
assumidamente sócio-cultural, mas variável de sociedade para sociedade. Decorre do modo
como as mensagens transgridem as leis e os costumes (por exemplo, os direitos e a dignidade
das mulheres, animais, minorias étnicas, crianças – figura nº 4), afrontam os códigos morais e
sociais (concretamente, apelando à vulgaridade ou à obscenidade e à violência). Do ponto de
vista operativo, a variabilidade das reacções das audiências às mensagens publicitárias – tão
importante na relativização das estratégias de marketing global –, vai impor um ângulo de
análise de natureza culturalista, como se encontra bem evidente na investigação da equipa
de Kara Chan.
Não obstante a opção epistemológica culturalista daquela equipa de investigadores
(uma opção que repesca para o campo dos advertising studies as contribuições de Edward T.
Hall – 1976 – e de Geert Hofsted - url, 2011), consideramos também ser possível ponderar
mais um foco de emergência da publicidade chocante; um que se reporta à existência de
fenómenos de disfuncionalidade dos seus regimes de significação (denotação ou conotação
publicitárias). Na sua caracterização, surge-nos uma importante referência no âmbito da
semiologia da publicidade: Georges Péninou (Peninou, 1972).
Se concebermos o choque publicitário como uma reacção a uma espécie de
‘impertinência’ de significação ou ‘desemantização’ (Péninou, 1972: 160) - como se o
discurso publicitário significasse de um modo que não estaria autorizado, por inerência da sua
especificidade comunicativa -, então a sua origem poderia ser averiguada a partir de certas
modalidades de significação: as da (des)conformidade e as da (des)conformação, qualquer
uma plena de implicações éticas.

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http://2.bp.blogspot.com/_rKvAmdl5y-8/RhtQP-UBHtI/AAAAAAAAAaw/OMdQ-
pbtDMY/s400/Milk+Ad+2.jpg

Figura nº 4
Em primeiro lugar, o investigador considera que as imagens de marca são o produto
de modalidades de significação integradas em duas modalidades precisas: a da conformidade
e a da conformação. No pólo da modalidade da conformidade, no âmbito do qual prevalece o
exercício da denotação, procura-se transmitir significados adstritos aos valores de uso e de
troca intrínsecos da mercadoria. É neste pólo que se gera a objectividade publicitária, se
‘fala’ dos objectos, se representa o espaço da funcionalidade e da troca comercial.
Complementarmente no pólo da conformação, no âmbito do qual as dinâmicas de significação
apresentam agora uma dimensão conotativa, gere-se uma espécie de ‘poética publicitária’,
um embelezamento da referência comercial. Instituindo o espaço lírico, o pólo da
conformação vai impor uma espécie de sublimação das mercadorias.
Em segundo lugar, se é certo que Georges Péninou nada refere sobre o choque
publicitário, redigiu, porém, algumas interessantes considerações sobre a impertinência e a
imoralidade publicitárias (Péninou, 1971:151; 155 –162). Assim sendo, será possível conceber
o choque publicitário como correspondendo ao efeito pragmático relativo ao reconhecimento
(escandaloso) dessas dimensões de imoralidade. As audiências não só reconhecem as
disfuncionalidades semânticas como também as condenam. Estas disfuncionalidades são, por
sua vez, modalidades de significação excessiva: o anúncio choca porque denota ou conota em
excesso (desconformidade ou desconformação).
O exagero de denotação, ilustrativo de uma situação de desconformidade,
consubstancia-se num hiperealismo publicitário que deverá ser concebido como a pretensão a
uma absoluta ‘verdade publicitária’, um idealismo que só pode redundar no logro. O anúncio
choca não por ser falso, mas por ser pretensamente verdadeiro. A mensagem afronta o

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auditório comercial por se assumir como um fenómeno discursivo enganador e dissimulador
relativamente à alegada apregoação da verdade das mercadorias. O abuso da denotação –
como se a publicidade iludisse o destinatário no âmbito da mais pura imparcialidade,
(pretensão utópica pois o seu registo típico é sempre o da valorização e da sobre-valorização)
– só pode conduzir a uma significação equívoca: a referente ao ‘fazer-acreditar’ num registo
pretensamente objectivo.
Já o excesso de conotação, atinente a uma situação de desconformação,
consubstancia-se num surrealismo publicitário, numa ‘dilatação’ da significação que vai
comprimir o significado inicial das mercadorias até um ponto em que deixam de ser
reconhecidas. É como se existisse um exagero da função poética que se sobrepõe às relativas
às dimensões referenciais e estratégicas do processo de comunicação publicitária. De
salientar que a conotação publicitária é um excesso expressivo que deverá modificar a visão
das mercadorias, mas jamais o seu sentido; amplificar as suas formas, mas nunca o seu valor.
Justamente, a desconformação – se bem que plena de efeitos fáticos – institui uma
gratuitidade publicitária que se vai consubstanciar em várias modalidades, cada uma
correspondente aos distintos fundamentos a partir dos quais o choque publicitário se pode
gerar. A primeira modalidade redunda na fragilização referencial. O anúncio torna-se
chocante porque, do ponto de vista estratégico e referencial, é um fracasso: nada transmite
sobre as mercadorias. O exagero conotativo faz-se à custa da delibilitação dos seus valores
funcionais, comerciais e simbólicos. A segunda modalidade, muito dependente da primeira,
corresponderá à gratuitidade. O choque publicitário corresponde a um reconhecimento da
vacuidade do anúncio, na medida em que os valores convocados nada têm a ver quer com os
referenciais ou os relativos ao móbil estratégico que deverão ser imanentes a qualquer
campanha publicitária. Finalmente, a terceira modalidade é a que habitualmente está
associada aos fenómenos do choque publicitário. O anúncio vai escandalizar pela
ilegitimidade: convoca-se axiologias, culturas, mitologias, temáticas que ficam debilitadas ou
desprestigiadas quando mergulhadas no irrisório do mundo das mercadorias. Confira-se a este
propósito a figura nº 5, a. Também pode suceder a situação inversa: desta feita serem os
valores da mercadorias que ficam fragilizados ou até são subvertidos a partir do momento em
que são mobilizadas certas ideologias subversivas constituídas por anti-valores (figura nº 5,
b). Num caso, o anúncio choca porque afronta as comunidades, no outro, escandaliza pela sua
própria inépcia estratégica.

§ 2 – 1º Centramento semiósico: a perspectiva pragmática


Aprofundemos agora o estatuto semiósico do choque publicitário.
Em termos pragmáticos, será concebido como uma reacção publicitária de índole
negativa, quer do ponto de vista cognitivo (o reconhecimento de um desenlace negativo, de
um epílogo trágico, de um destino catastrófico, funesto), quer emotivo (o espanto, a
repulsa), quer comportamental (uma certa conduta preventiva ou reactiva). Em suma, é, na
sua essência, um acto perlocutório que exige uma adequada classificação.

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http://km-stressnet.blogspot.com/2010/07/30-most-offensive-banned-and-rejected.html

(a)
http://adsoftheworld.com/files/images/SISLEY-FASHION-JUNKIE-
1.preview.jpg

(b)
Figura nº 5

Recorremos a John Austin e a John Searle (Austin, 1970; Searle, 1972) para conceber
o choque como um acto perlocutório decorrente de um processo de comunicação comercial
(publicitário). Como já referimos, corresponderá à ocorrência de um comportamento de
índole negativa, inclusivamente de cariz cognitivo, que decorre da enunciação de certos

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anúncios. Do ponto de vista ilocutório, estes são concebidos como actos de fala de índole
comercial ou cívica, suportados pelas mais variadas matérias expressivas e difundidos por
diversos meios de comunicação. Podem apresentar estatutos de natureza primária ou
secundária, conforme são dotados de um valor textualmente literal ou derivado (implícito ou
pressuposto) (Searle, 1979; Tanase, url em 2006:
http://archivesic.ccsd.cnrs.fr/sic_00000766/en/; Camilo, 2007). Eis os anúncios que
prometem, apelam, avisam, glorificam, etc.. E do ponto de vista perlocutório, como poderão
ser classificados?
Esta é uma questão fundamental no âmbito de uma investigação pragmática. Se,
derivado à sua dimensão convencional, sempre foi possível avançar com propostas de
classificação dos actos locutórios e principalmente dos ilocutórios, já o mesmo não sucedeu
com a mesma facilidade no respeitante aos actos perlocutórios. Como escreveram Jean-Pierre
Meunier e Daniel Peraya, “uma análise detalhada das perlocuções ainda está por fazer e
existe escassa literatura consagrada à sua taxionomia: talvez porque sejam na realidade um
fenómeno mais movediço, menos facilmente discernível que os actos ilocutórios” (Muenier e
Peraya, 2004:98-99 – a tradução é nossa). Tal não impediu que os autores propusessem uma
grelha que sistematizasse os critérios de classificação concebidos quer por John Searle, quer
por John Austin. É precisamente a partir dela que intentaremos discernir as diversas
especificidades do choque publicitário enquanto acto perlocutório.
O primeiro critério de avaliação é o da intencionalidade. Com John Searle,
concretamente no âmbito da sua teoria geral da acção, Jean Pierre Meunier e Daniel Peraya
distinguiram os actos perlocutórios conforme apresentam um valor de pretensão. Os
destituídos de intencionalidade constituem-se em perlocuções involuntárias - as que são
surpreendentes, ‘efeitos pragmáticos perversos’, que surgem independentemente da vontade
do locutor e em certos contextos. É precisamente nesta categoria que se inscreve todo o
ensaio da equipa de Kara Chan. Já a segunda categoria de actos perlocutórios – os que
apresentam um valor intencional – subdivide-se nas classes das perlocuções decorrentes de
uma intencionalidade prévia ou em acção. No âmbito da intencionalidade prévia, a
perlocução consistirá numa reacção que ultrapassa a que convencionalmente estaria adstrita
à enunciação de qualquer acto ilocutório. Assim, por intermédio de um aviso, o locutor
pretender educar, evitar um acidente, intimidar e já não só suscitar um impedimento (um
‘fazer não fazer’) por referência a valores que são do interesse do próprio auditor (Searle,
1972:109). Esta meta, de cariz mais elementar, não deve ser, então, confundida com a que
apresenta o tal valor derivado. Esta é a razão pela qual é importante distinguir perlocuções
intencionais adstritas a um objectivo não associado por definição a uma ilocução, das que
necessariamente ocorrerão a partir do momento em que essa ilocução actualiza os seus vários
critérios de realização (de índole linguística, social e pragmática). São precisamente estas
perlocuções de valor convencional que estão inscritas no domínio da intencionalidade em
acção.

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A categoria das perlocuções intencionais (convencionais – em acção; ou não
convencionais - prévias) possibilita reportar o choque publicitário como sendo uma reacção
pragmática estrategicamente desejada pelo locutor. Pode ser complexa e não convencional
porque decorre da enunciação de uma multiplicidade de actos ilocutórios caracterizados por
significações que até podem nem ser de natureza repulsiva ou negativa. Todavia, alicerça-se
num fundamento estrutural: o da contratualização de um programa de ‘não acção’ que é tão
evidente nalguma publicidade cívica de prevenção. Complementarmente, descortinam-se
também as reacções de fundamento mais primário, elementar e imediato, de índole
convencional. Neste contexto, o choque publicitário estará associado ao cumprimento de
regras adstritas (as de tipo essencial, segundo Searle) à enunciação de actos ilocutórios
inseridos no domínio de um ‘fazer não fazer’. Advém de actos ilocutórios relativos ao
impedimento. É uma reacção perlocutória (de natureza publicitária) que se reporta a um
simples aviso1.
Passemos agora para o segundo critério de classificação que provém da teoria dos
actos de fala de Austin. As perlocuções são classificadas conforme resultam de actos de fala
enunciados pelo locutor de acordo com certos objectivos (convencer, alertar, etc.) ou
simplesmente são efeitos produzidos pelo auditor decorrentes de sequências de enunciação.
Duas considerações se impõem neste critério.
1ª) A perlocução considerada a partir do ponto de vista de um objectivo, será
ponderada como um acto intencional a partir do locutor. Está submetida a condições de
sucesso e é avaliada por critérios de eficácia;
2ª) Também existem perlocuções suscitadas a partir do ponto de vista do auditor. Já
não são resultantes de uma intenção prévia. Assumem-se como efeitos surpreendentes - que
fogem ao tal calculismo táctico do locutor. Frequentemente, é possível explicar as suas
causas a partir do contexto, da psicologia dos interlocutores, das relações de força que estão
subjacentes à relação interlocutiva, etc.. Do ponto de vista do locutor, não poderemos
considerar estas perlocuções na medida em que estão destituídas de um valor estratégico.
Correlacionando o critério da intencionalidade com os dos objectivos/efeitos
perlocutórios, concebemos uma matriz a partir da qual intentámos sistematizar as diferentes
possibilidades de conceptualização do choque publicitário (tabela nº 1). Destacámos a
sombreado a categoria de actos perlocutórios que se inscreve no domínio semiótico da
pragmática. De acordo com Jean-Pierre Meunier e Daniel Peraya, os actos perlocutórios não
intencionais vão depender do contexto da comunicação, da psicologia, da sociologia do
auditor, etc. (Muenier e Peraya, 2004: 102). Esta posição vai ser alargada também à classe
dos actos perlocutórios intencionais, mas não convencionais a partir das teses de Recanatti,
já que, na sua concepção de pragmática, ficará erradicado tudo o que não só existe de

1
- Esta ideia é importante porque nos possibilita distinguir, no âmbito do fenómeno do choque
publicitário, duas ‘realidades perlocutórias’ distintas. As de fundamento intencional (adstritas,
portanto, a campanhas que se reportam a objectivos relacionados com o “impedimento”) e as de
especificidade não intencional (correspondentes àquelas mensagens que suscitaram “efeitos perversos”,
isto é, não contemplados no âmbito dos briefings).

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contingente na utilização da língua (portanto, o particular e o individual), como também o
relativo aos efeitos empíricos da comunicação (Recanatti 1981: 20, apud Muenier e Peraya,
2004: 102). Eis uma posição que tem, pelo menos, a vantagem de ‘separar as águas’, de
traçar linhas epistemológicas, clarificando o que se inscreve no domínio da pragmática
linguística e da semiótica: exclusivamente o que está adstrito às regras de utilização da
linguagem (independentemente da sua materialidade expressiva) a partir de uma abstracção
das particularidades psicológicas e sociológicas dos seus utilizadores. Assim sendo, de acordo
com estas posições, não só os actos perlocutórios não intencionais, mas igualmente os de
intencionalidade não convencional se encontram para lá do objecto de estudo da semiótica,
exigindo uma abordagem adequada, inscrita na antropologia e na sociologia da comunicação
ou na sociolinguística da publicidade. Adoptando esta posição purista, seremos, então,
conduzidos a incidir o enquadramento pragmático do choque publicitário exclusivamente na
avaliação das regras linguísticas que, estando associadas à enunciação de certos actos
ilocutórios de publicidade, necessariamente o irão suscitar.
CHOQUE PUBLICITÁRIO (ESTATUTO PRAGMÁTICO)
Critérios de classificação A PARTIR DOS OBJECTIVOS A PARTIR DOS EFEITOS
1- Especificidade convencional Choque publicitário como efeito
perlocutório previsto e
desencadeado.

Observações: Observações:
O choque publicitário encontra-se associado A sua ocorrência decorre das
à realização de actos ilocutórios de índole condições linguísticas sociais e
publicitária, no âmbito dos quais se pragmáticas subjacentes à realização
contratualiza com o auditor um programa de dos actos ilocutórios.
INTENCIONALIDADE ‘não acção’.
2- Especificidade não convencional Choque publicitário como efeito
perlocutório probabilístico

Observações: Observações:
O choque publicitário pode ser A sua ocorrência decorre de
desencadeado pela interacção de uma condições extra-linguísticas, geridas
multiplicidade de ilocuções veiculadas por pelo locutor, mas efectivamente
uma diversidade de meios de comunicação e decididas pelo auditor: da sua
suportadas por matérias expressivas vontade, da aceitação do estatuto e
heterogéneas (desde as palavras, às dos valores do locutor, do
imagens). (des)crédito que lhe atribui e da sua
capacidade intelectual.
Choque publicitário como efeito
perlocutório imprevisto
NÃO INTENCIONALIDADE --- Efeitos inesperados, surpreendentes
ao locutor (portanto não
intencionais), mas realizados
efectivamente pelo auditor.
Tabela nº 1

§ 3 – 2º Centramento semiósico: a perspectiva textual


Ensaiemos agora um modo complementar de compreender o fenómeno do choque
publicitário. Recorramos, para isso, às teorias semióticas a partir das quais será
conceptualizado como um efeito de sentido ‘tecido’ no próprio texto publicitário. Assim
sendo, já não é mais importante descrever em que medida anúncio choca, mas como
transmite significados chocantes.
Esta conceptualização textual do choque publicitário vai implicar duas considerações.

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1ª) Por ‘texto’, concebemos uma realidade de sentido que se caracteriza duplamente:
pela sua organização (ou estruturação) – exigindo, portanto, uma análise interna – e como
objecto de comunicação entre um enunciador e um enunciatário, encontrando o seu lugar
numa sociedade e sendo determinado por formações ideológicas - exigindo, assim, uma
análise externa (Barros, 2055: 12 e ss.);
2ª) Para aferir os modos de formação do sentido chocante (publicitário) torna-se
necessário recorrer a uma teoria semiótica do texto que o conceba como o produto
decorrente de um percurso gerativo (Greimas e Courtés, 1993: 157-160; Barros, 2005: 13;
Zecchetto (Coord.), 2008:155 e ss). Será, então, considerado como um fenómeno cuja
sistematização pode ser operada do seguinte modo:
a) Apresenta múltiplas dimensões de significação, umas mais simples e abstractas e
outras mais complexas e concretas (discursivas);
b) Resulta de três ’etapas’ do percurso gerativo de sentido. Cada uma apresenta a sua
especificidade, uma ‘gramática’ autónoma, embora se encontrem intimamente
interconectadas. A primeira etapa do percurso gerativo de sentido chocante decorrerá das
estruturas fundamentais de sentido, no âmbito das quais as significações estão associadas a
oposições mínimas associadas à transformação dos valores em ‘não valores’ e/ou em ‘anti-
valores’. Na segunda etapa, relativa às estruturas narrativas, a significação do choque
resultará da performance realizada por certos actantes integrados em percursos narrativos
adequados. A terceira e última etapa reporta-se às estruturas discursivas a partir das quais a
estrutura narrativa do choque dá lugar a uma estrutura expressiva que decorre da relação de
comunicação entre um enunciador e um enunciatário (publicitários).
Caracterizamos seguidamente cada uma dessas ‘estruturas-etapa’, intentando
demonstrar como cada vai introduzir especificidades na configuração do choque publicitário.

§ 3.1 – 1ª ‘etapa’ gerativa: a das estruturas fundamentais


Todo o texto ‘tece’ um conjunto de valores que circulam entre sujeitos e objectos
(de desejo). Justamente, o que apresenta uma especificidade chocante actualiza a mesma
dinâmica, mas inverte a sua especificidade. A significação do choque dependerá da gestão de
valores negativos que circulam entre sujeitos e objectos. Esta particularidade vai conduzir a
que os sujeitos de acção/transformação sejam investidos do estatuto de sujeitos de ‘não
vontade’, de ‘anti-desejo’. Indivíduos renitentes cujo programa de actividade (ou de
narrativa) se consubstancia num distanciamento (preventivo ou reactivo/terapêutico). Ao
mesmo tempo, os objectos transformam-se em abjectos: realidades que fascinam, é certo,
mas que escandalizam, que atemorizam, que enojam. Em suma, o que está em jogo no texto
chocante são os valores do não desejo e/ou do anti-desejo por referência aos quais se articula
sempre a mesma categoria tímica: a da disforia. Esta é uma interessante particularidade
tendo em conta o facto de a publicidade comercial ser um texto persuasivo que é tanto mais
efectivo quanto conseguir tornar desejáveis os objectos (as mercadorias) ou seduzir os
enunciatários. Justamente, o texto chocante vai inverter esta dinâmica e, por isso mesmo,

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está mais adequado a outro tipo de estratégias de marketing: as de índole cívica, sanitária,
religiosa ou política. É certo que o fundamento desta publicidade chocante permanece
estratégico. Contudo, a dinâmica dos programas de geração de sentido alicerça-se num
‘desencantamento’ através do qual se desconfia da capacidade performativa dos
enunciatários (assim se impondo uma manipulação pela provocação) ou se concretiza uma
sistemática desvalorização dos objectos (manipulação pela ameaça).
Se o choque de índole publicitária se reporta a valores negativos, então o seu
substrato ideológico deverá ser descoberto em tudo o que contradiz e/ou contraria certas
categorias axiológicas da sociedade (e não exclusivamente da ‘sociedade de consumo’). A
partir de Aristóteles (Aristóteles, 1998), descobriremos três paradigmas axiológicos
fundamentais, cada um sendo o fundamento dos três géneros retóricos classificados pelo
estagirita: o deliberativo, o judicial e o epidíctico (Aristóteles, 1998: 56-103). Eis, então, as
categorias axiológicas da conveniência, da justiça e da virtude relativamente às quais a
textualidade do choque publicitário se encarregará metodicamente de desvalorizar.
A inversão dos valores da conveniência (através da inconveniência e/ou não
conveniência) vai-se consubstanciar discursivamente num texto sobre a disfuncionalidade ou a
inapropriação. O conselho publicitário transforma-se num aviso. Na sua dimensão mais
ameaçadora, reporta-se a uma estratégia veridictória no âmbito da qual “se esclarecem os
factos”: “Crack é [será] caixão e cadeia”, “Desastre! Se não utilizar Calgon, necessariamente
irá inundar a cozinha por avaria da máquina de lavar roupa” (CALGON, endereço URL em
Junho de 2011: http://www.youtube.com/watch?v=NIfayRbEPDI).
A inversão dos valores da justiça consubstancia um significado chocante cuja
textualidade veridictória irá implicar um discurso de acusação baseado em mensagens de
combate, agónicas, sempre panfletárias e até mesmo invectivas. Corresponderá à denúncia
de uma “maldade” (comercial ou cívica) e, igualmente, à demonstração do cunho de
intencionalidade que lhe esteve subjacente. Estará relacionada com um ‘kairós’ - o momento
fundamental em que a verdade dos factos vem ao de cima, quando é reposta e são aduzidos
os culpados. De um ponto de vista publicitário, esta perspectiva judicial do choque
caracterizar-se-á por uma dimensão de incriminação que tanto poderá incidir sobre sujeitos
(os consumidores), quer sobre anti-sujeitos (isto é, as marcas da concorrência).
Na inversão dos valores da virtude já não está mais em jogo uma textualidade
veridictória sobre a responsabilidade – sendo esse o fundamento do choque de cariz ‘judicial’
– mas relativamente à culpa. Esta particularidade é relevante: o choque epidíctico é uma
forma de conteúdo que não incide sobre a ‘qualidade’ do fazer do actante publicitário, mas
exclusivamente sobre a ‘especificidade’, isto é, sobre o ‘ser’ de quem fez. Em suma, reporta-
se ao seu ethos, à sua ‘reputação performativa’. Como a natureza da significação chocante
incide numa contrariedade ou numa contradição dos valores da virtude, então haverá de
gravitar em torno do descrédito, isto é, da afirmação veridictória, da sua (não) performance
ou da sua deficiente actuação (incompetência).

13
§ 3.2 – 2ª ‘etapa’ gerativa: a das estruturas narrativas
Usualmente, concebe-se a narratividade como uma espécie de ‘espectáculo’ no qual
ocorre a significação das acções transformativas do mundo. Justamente, são essas actividades
que fazem circular os valores que se lhe encontram investidos. Considerando que a
significação do choque se integra no domínio dos valores negativos (isto é, dos anti-valores
e/ou dos não valores), então será fundamental explicitar a natureza das actividades operadas
pelos sujeitos. Em primeiro lugar, são condutas que se reportam a estratégias de distanciação
ou, pelo menos, de mitigação dessas axiologias negativas. Em segundo lugar, reportam-se ao
estabelecimento ou à ruptura de contratos no respeitante à não intervenção sobre objectos
não desejáveis (que daqui em diante passaremos a denominar por ‘abjectos’).
No âmbito das estruturas narrativas do choque publicitário, propomos um estudo a
partir de diversas dimensões e níveis de análise. Assim, na dimensão de análise sintáctica,
iremos discorrê-lo relativamente ao nível dos seus enunciados (a), programas (b), percursos
(c) e esquemas narrativos típicos (d). Por sua vez, no atinente a uma dimensão de análise
semântica, o desafio consubstanciar-se-á num primeiro ensaio de dissertação sobre o estatuto
dos valores modais da interdição e das paixões chocantes.

A dimensão sintáctica
(a) Nível dos enunciados elementares: considerando que, subjacente aos objectos –
relativamente aos quais um determinado sujeito empreende uma acção - , se encontram
valores negativos, então os enunciados narrativos elementares das mensagens publicitárias
chocantes serão caracterizados pela dinâmica do anti-desejo, da nolição. Tal vai implicar que
não seja mais o ‘querer-fazer’ dos sujeitos que se assume como o motor da narrativa, mas,
pelo contrário, o seu ‘não querer-fazer’ caracterizado por um voluntarismo assumido para a
inacção sob a forma da atitude de resistência. É certo que, no choque publicitário, o objecto
de anti-desejo fascina, mas exclusivamente a partir do seu valor monstruoso. A abjecção irá
traduzir-se numa paixão negativa, numa atitude renitente ditada pelo horror fascinado:
quanto mais admirável, mais grotesco. Justamente esta atitude de resistência decorrerá de
uma gama limitada de dimensões repudiáveis do próprio objecto. É abjecto porque é
detestável (subverte o ‘querer’), é subversivo (não se integra no ‘dever’), é misterioso (está
arredio ao ‘saber’) e é contraproducente (dissociado do ‘poder’). A significação da abjecção
conduz a que os enunciados de estado sejam ditados por todos estes atributos de ‘não ser’
que conduzem à tal transformação do estatuto do objecto em abjecto (o ‘ser’ transforma-se
num ‘não ser’). Estes atributos repudiáveis serão o fundamento de relações de tipo disjuntivo
do sujeito: quanto mais longe se encontrar deste abjecto, melhor. São precisamente estas as
relações subjacentes aos enunciados de estado da mensagem chocante. Por sua vez, os
enunciados de fazer, os que significam o tipo de actividade encetada pelos sujeitos, são
pautados pelos valores do distanciamento e da recusa.
Uma observação importante: do ponto de vista da enunciação publicitária de índole
comercial, a narrativa do choque é uma textualidade que, aparentemente, é um contra-

14
senso. Não é esta publicidade um discurso do desejo (isto é, do ‘querer (o) ser’ e do ‘querer
fazer’), que significa as mercadorias e os serviços no domínio da tentação e manipula os
consumidores na perspectiva da sedução? A resposta é afirmativa, conduzindo-nos à
conceptualização do estatuto do choque na publicidade comercial só surgir a partir duas
circunstâncias (pragmáticas). As relativas à culpabilização do consumidor, pela inépcia da sua
conduta comercial, e as atinentes ao ‘esclarecimento comercial’, através do qual as marcas
procuram repor ‘a verdade dos factos’, denunciando as alegadas ‘golpadas’, isto é, as
propaladas conveniências e vantagens competitivas da concorrência. Esta textualidade
encontra-se habitualmente associada a estratégias retóricas de natureza judicial
(fundamentadas na denúncia e na acusação - confira-se de novo a figura nº 3) e nas de índole
epidíctica (portanto, de cariz agónico e reportando-se ao ‘deslouvor’ e ao desprestígio’).
É, contudo, no âmbito das enunciações publicitárias de cunho cívico, inscritas nos
ideais da solidariedade social, espírito político e religioso (pautadas, portanto, por
especificidades de índole propagandística), que a textualização do choque é mais frequente.
À medida que os tópicos das mensagens se reportam a objectos de anti-desejo (problemáticas
que afectam a sociedade civil), tende a integrar-se em estratégias retóricas de especificidade
deliberativa. Reportam-se a modalizações veridictórias através das quais se intenta ‘fazer
crer sobre o não ser’ (isto é, sobre os anti-valores) dos objectos (os tópicos relativos a essas
problemáticas). É precisamente nesta vertente que o choque na publicidade se impõe na sua
dimensão mais espectacular (figura nº6).
http://www.fugly.com/media/IMAGES/TRUE/riding_with_hitler.jpg

Figura nº 6

(b) Nível do programa narrativo: se, do ponto de vista mais elementar, as narrativas
do choque se caracterizavam por enunciados de estado de tipo disjuntivo e de transformação
correspondente ao distanciamento, então os seus programas típicos serão pautados por uma
única função: a da resistência. Por intermédio da significação dos anti-valores, os actantes

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pretendem gerir voluntariamente uma ‘não acção’ – comportamento de nolição à dimensão
abjecta dos objectos (‘não querer fazer não ser’). Tencionam permanecer afastados dos
abjectos. Ou abstêm-se ou auto-impedem-se de agir. Simultaneamente, a exploração e
inculcação – tantas vezes hiperbólica (confira-se de novo a figura nº6) desse tal quadro
axiológico disfórico possibilita fundamentar a intervenção (manipulativa) por parte de outros
actantes que, relativamente aos primeiros, aos sujeitos de anti-desejo, com eles intentam
contratualizar um programa de impedimento (‘fazer não fazer não ser’). Eis, então estes
sujeitos convencidos negativamente - dissuadidos; reduzidos a uma situação de impotência
(‘não poder fazer’) ou de obediência (‘não poder não fazer’) (Greimas e Courtés, 1993: 221).
Não só se abstêm de agir, como crêem beatificamente nos anti-valores propostos pelos
sujeitos manipuladores.
Caracterizemos mais detalhadamente os programas narrativos da resistência.
•) Podem ser simples ou complexos conforme existe um ou vários programas
narrativos coordenados entre si. Num caso, a significação do choque estará adstrita à nolição
de uma determinada acção por referência aos valores negativos patentes nos abjectos.
Alicerça-se discursivamente numa encenação espectacular das abjecções. Contudo, já no
outro caso, adquire outro estatuto. O enunciado de (não) fazer ao estar integrado num
programa narrativo acessório, mas fundamental para o protagonismo de um programa mais
importante, conota os anti-valores como predicados modais fundamentais para o exercício de
futuras performances de cariz positivo, associadas a objectos e objectivos desejáveis,
ambicionados. A viabilidade dos programas narrativos principais exige previamente um ‘não
querer fazer/ser’ (nolição), um ‘dever não fazer’ (interdição), um ‘dever não ser’/’não poder
ser’ (impossibilidade), um ‘não poder fazer’ (impotência) (Greimas e Courtés, 1993:287) e um
‘saber fazer não ser’ (competência preventiva - prudência). A significação do choque já não
vai apresentar mais um cunho dissuasor, mas terapêutico e deôntico. “No pain, no gain”: para
se conseguir almejar aos valores positivos que tornam um objecto desejável (por exemplo, a
saúde), é fundamental que o sujeito pene, no sentido de protagonizar programas narrativos
de disjunção, isto é, de negação dos anti-valores adstritos a objectos de anti-desejo ou
abjectos (o alcoolismo, o tabagismo, o sendentarismo, etc.);
•) Os programas narrativos da resistência podem ser caracterizados por diversos tipos
de anti-valores. Os de tipo descritivo predicam o objecto na sua dimensão mais negativa. É a
manifestação espectacular da abjecção que consubstancia o seu carácter monstruoso.
Curiosamente, no texto publicitário essa manifestação é incoerente, como se se encontrasse
discursivamente escondida ou dissimulada. Esta particularidade é importante originando
estratégias veridictórias, quer de esclarecimento, quer de desmistificação (Greimas e
Courtés, 1993: 419). É necessário denunciar, no sentido de publicitar, os anti-valores ocultos
nas manifestações discursivas (‘parecer, mas não ser’) sempre que o abjecto, tal qual o lobo
travestido com a pele do cordeiro, se encontra disfarçado. É um falso objecto de desejo que,
aparentemente, está dotado de valores positivos quando, realmente, se caracteriza por um
agregado de anti-valores (confira-se de novo a figura nº 6 e a nº 8a). Do ponto de vista

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pragmático, isto é, enquanto enunciações, são precisamente estas estratégias de veridicção
que suscitam os tais actos perlocutórios anteriormente descritos, integrados no domínio do
escândalo, da agressividade, do susto, em suma do choque. Que se pretende com estas
veridicções? Somente suscitar ‘paixões’ relativas ao carácter negativo, perigoso, repulsivo,
etc., do abjecto. Por intermédio destas ‘paixões’ é importante que, de algum modo, os
sujeitos consigam gerar um ‘não querer não ser’ (uma repulsa), um ‘dever não ser’ /‘não
poder ser’ (uma impotência) ou um ‘saber não ser’ (uma consciência abjecta).
Complementarmente aos anti-valores descritivos, os de cariz modal assumem-se como o
fundamento de enunciados de transformação que vão capacitar o sujeito para uma ‘não
performance activa’ como já anteriormente salientámos;
•) Deixámos propositadamente para o fim a reflexão sobre o estatuto dos sujeitos nos
programas narrativos da resistência: um sujeito de ‘não ser’ e/ou um sujeito de ‘não fazer
não ser’. Independentemente destes actantes poderem ser assumidos por um único actor ou
por distintos (particularidade significativa de uma performance de índole reflexiva ou
transitiva), torna-se importante caracterizar o que entendemos por ‘não ser’ e por ‘não fazer
não ser’.
Um sujeito de ‘não ser’ é alguém desapaixonado. Se, por desgraça, se encontra numa
situação de conjunção com os anti-valores do objecto, é então, na sua essência mais básica,
um indivíduo infeliz pela consciência da sua fatalidade correspondente ao reconhecimento da
incorporação desses anti-valores. Ei-lo, em estado de douta ignorância, reconhecendo não só
que nada sabe (pois o abjecto só o conduziu a um falso saber), nada pode (pois em conjunção
com os anti-valores se tornou impotente), já nada deseja (pois os valores que o abjecto
manifestava eram uma simples mistificação, uma miragem) e nada deve (o estado de
conjunção com os anti-valores alienou-o de qualquer outro programa narrativo). Não será esta
a situação de estado de choque?
Se o sujeito de ‘não ser’ é um sujeito em choque ou chocado, o sujeito de ‘não fazer
não ser’ será alguém previdente. Desapaixonado pelos anti-valores do objecto, é,
aparentemente, um sujeito não narrativo: não pretende agir sobre o abjecto. Assim, quanto
mais intensos forem os anti-valores que lhe estão patentes, maior será o seu ‘querer
distanciar-se’, o seu ‘não querer fazer não ser’ gerido a partir de uma inacção ou de um
afastamento voluntarioso. A pretensão de ‘não acção’ sobre o abjecto constitui-se como uma
atitude de resistência voluntária, assumida. Se o sujeito de ‘não ser’ era um actante em
estado de choque, absolutamente intimidado pelas suas fragilidades, o de ‘não fazer não ser’
é alguém, profundamente obstinado no seu programa narrativo de nolição. Qual, é então, a
funcionalidade estratégica da significação do choque para este actante aparentemente tão
renitente? Aventamos a hipótese dela se inscrever no âmbito das tais estratégias deônticas e
preventivas, adstritas a programa narrativos secundários, por intermédio das quais se
assegura o sucesso performativo de programas narrativos principais: a almejada saúde só é
possível graças à resistência ao álcool, uma sexualidade previdente exige a capacidade de

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negar hábitos sexuais inseguros (figura nº 6), a sã amizade não é possível sem uma ruptura
com a imprevidência (figura nº 7) …
http://weburbanist.com/wp-content/uploads/2010/11/bizarre-ads-
dont-talk-while-he-drives.jpg

Figura nº 7

(c) Nível dos percursos narrativos: sobre este plano de análise, é importante
relembrar que a narratividade pressupõe duas dimensões fundamentais. Por um lado, é
concebida como o programa gerativo de significação de qualquer acção: a referente à
transformação de situações de estado operada pela performance de um sujeito.
Simultaneamente, por outro lado, também abrange tudo o que é relativo ao estabelecimento
e à ruptura de contratos entre actantes, uma variável fundamental na aferição da qualidade
dessa performance. Justamente, esta duplicidade vai encontrar o seu correlato na
emergência de dois percursos narrativos: o do sujeito, determinado pelos programas da
competência e da performance, e o do destinador, consubstanciado nos da manipulação e da
sanção. Esta duplicidade vai, por sua vez, afectar o estatuto do choque publicitário que
passará a apresentar disparidades quando analisado a partir da óptica destes dois percursos
narrativos.
O percurso narrativo do sujeito é perpassado por um denominador comum: o da
privação voluntária (resistência) dos anti-valores que transformaram os objectos em abjectos.
Esta particularidade vai determinar que a sua actuação (o programa narrativo da
performance) seja caracterizada por uma espécie de ‘não acção’. Não a deveremos conceber
com uma abstenção, uma demissão da acção, mas simplesmente como um fazer que é
voluntariamente não transformador: uma actividade estratégica cujo propósito consiste na
preservação de situações de estado de índole positiva (aquelas nas quais o sujeito já se
encontra em situação de estado de conjunção com valores associados a outros objectos). A
performance do sujeito é, então, calculista, estratégica, alicerçada numa interdição, num
‘dever não ser’/’não poder ser’ reflexivo ou transitivo, real ou imaginado. Já no programa

18
narrativo da competência, a gestão do distanciamento relativamente aos anti-valores imporá
a textualização de temas ou de figuras ilustrativas do ‘ser do não fazer’, isto é, integradas
numa pedagogia da prevenção. Salientamos, porém, que este cunho preventivo do programa
narrativo da competência se altera radicalmente quando deixa de sustentar uma performance
que é não mais regida por programas narrativos integrados no domínio da resistência, mas da
reacção. Em tais situações, a competência passa a reporta-se a situações de ‘não ser’, ou
situações de choque - as em que o sujeito já está conjugado com os anti-valores do abjecto.
Nestas difíceis ocasiões terá de organizar (reflexiva ou transitivamente) e pôr em prática um
programa narrativo de privação, descobrir, por si ou por intermédio de outro actante, um
‘não fazer não ser’ que implicará a aquisição de valores modais integrados no domínio do ‘não
querer fazer’, do ‘dever não fazer’, ‘do saber não fazer’ e ‘do poder não fazer’. Neste
contexto, a competência transforma-se num programa narrativo de índole pedagógica que
adquire um cariz ‘terapêutico’.
Passemos agora para o estatuto do choque publicitário no âmbito do percurso
narrativo do sujeito-destinador, concretamente o do destinador-manipulador. Antes de tudo,
concebamo-lo como aquele actante que procura contratualizar com outro o seu próprio
percurso narrativo: não só uma performance, mas igualmente uma certa competência.
Justamente, esta contratualização só é efectiva a partir de um programa narrativo integrado
no domínio da manipulação. Deverá ser concebida, por sua vez, como uma praxis dotada de
uma dupla dimensão. Por um lado, estará associada à contratualização com o sujeito de uma
competência semântica, por outro de uma competência modal (Barros, 2005: 30-37). A
contratualização da competência semântica reporta-se à legitimação das axiologias de valores
que irmanam a relação entre destinador e sujeito. Podem remeter para o próprio destinador –
no respeitante ao seu ethos - ou para outros domínios por este determinados. Neste caso, as
axiologias são de anti-valores e reportam-se à transformação dos objectos em abjectos.
Relembramos que os paradigmas axiológicos já foram inventariados no âmbito das estruturas
fundamentais. Repescámos Aristóteles para os identificar: a (in)conveniência, a (in)justiça e a
(des)virtude. Salientamos a importância desta acção de legitimação fundamentada num ‘fazer
crer’: jamais existirá manipulação – enquanto contratualização de um certo programa
narrativo de afastamento (prevenção) ou de reacção (terapia) - se o sujeito manipulado
recusar o sistema de (anti)valores proposto pelo destinador manipulador.
Complementarmente, por outro lado, esta praxis manipulatória também se reporta a um
‘fazer-fazer’, agora caracterizado pela atribuição de uma competência modal por intermédio
da qual se decide o sucesso do programa narrativo entretanto contratualizado. Consiste na
proposta dos valores modais do querer, dever, saber e poder fazer. Contudo, como na
significação do choque, se gerem axiologias de valores negativos, então esta competência
modal sempre estará associada a um ‘não ser’, assumindo-se como o alicerce de uma
intervenção dissuasora. Assim sendo, as estratégias subjacentes ao percurso narrativo do
destinador manipulador são duplas e podem sintetizar-se no âmbito da fórmula canónica do

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‘fazer não fazer não ser’ (acção manipulatória inscrita no domínio do impedimento, da
interdição, e específica de programas narrativos típicos da prevenção).
Algumas sintéticas palavras para as modalidades de manipulação. Já que o choque
publicitário se inscreve num programa gerativo de sentido relativo a valores negativos, então
as suas modalidades típicas jamais serão do domínio da tentação ou da sedução (com as quais
o actante manipulador propõe programas narrativos fundamentados em axiologias positivas).
Em contrapartida, será possível conceber as restantes. A mais frequente é, indubitavelmente,
a modalidade da intimidação/ameaça, através da qual o sujeito-destinador contratualiza um
programa narrativo de afastamento (correspondente ao impedimento ou, pelo menos, à
abstenção) baseado nos anti-valores do abjecto, isto é significando-o com um ‘anti-dom’. Do
ponto de vista discursivo, esta modalidade vai traduzir-se numa espectacularidade disfórica
caracterizada por uma interessante imaginação distópica que visa dissuadir à partida qualquer
atrevimento de acção. Eis as abordagens hardcore do ‘quanto pior, melhor’ (figura nº 8 a).
Complementarmente à anterior, a modalidade da provocação é a estratégia
manipulatória que visa forçar o sujeito a um ‘não fazer’ a partir de um julgamento negativo
da sua competência. Nela se descortina uma atitude de desconfiança do destinador
manipulador relativamente ao ethos performativo do sujeito. Do ponto de vista da
significação do choque publicitário, a provocação pressupõe a inevitabilidade de um programa
narrativo disfórico, como se o destinador manipulador se alvitrasse em arauto sansionador ou
retribuidor da performance desadequada do sujeito, ainda antes dela ter ocorrido,
formulando um juízo de desvalorização. Seja pela sua fraqueza, obstinação, ignorância ou
impotência, a modalidade provocatória do choque sempre se vai consubstanciar na
textualidade das suas fraquezas e incide na significação de situações de estado de conjunção
com os anti-valores (figura nº 8b).

(d) Nível dos esquemas narrativos: corresponde ao encadeamento dos respectivos


percursos narrativos. De um ponto de vista canónico, isto é, concebendo os esquemas
narrativos como resultantes da organização sintáctica de percursos do destinador
manipulador, sujeito e destinatário julgador (nas suas variantes interpretativa e retributiva),
concebemos que no percurso narrativo se descortina o encadeamento de dois percursos
principais: o do destinador manipulador e o do sujeito. Este centramento é compreensível: no
percurso do destinador manipulador gerem-se os anti-valores investidos nos abjectos com o
propósito de se facilitar a contratualização de programas narrativos de afastamento de índole
dissuasora. Já no percurso gerativo do sujeito esta dinâmica de afastamento vai incidir numa
performance preventiva, num voluntarismo auto-reflexivo que sempre vai redundar num
tacticismo nolitivo. O seu propósito teleológico implicará o voluntarismo da preservação das
situações de estado de cariz positivo (performance de prevenção) ou a reacção àquelas em
que – entretanto fragilizado - se encontra numa situação de conjunção com os anti-valores do
abjecto (performance terapêutica). Os programas da competência acompanham esta dupla
vocação também adquirindo um cunho preventivo ou terapêutico.

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Figura nº 8
b
A

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A dimensão semântica
Este plano de análise impõe a ponderação das substâncias e das formas dos conteúdos
chocantes evocados a partir das estruturas narrativas. As considerações que seguidamente
iremos formular são seminais. Esta é uma matéria que exige aprofundamento decorrente de
autores como Algirdas Greimas, Herman Parret e Jacques Fontanille (Greimas 1983; Parret,
1986; Greimas & Fontanille, 1991).
Consideramos que os conteúdos chocantes poderão ser avaliados a partir de três
direcções de análise. A primeira corresponderá à natureza dos anti-valores que determinam
estruturalmente a própria especificidade abjecta dos objectos. Como já anteriormente
referimos, por vezes, esta não se encontra textualmente manifestada, exigindo um
discursivização veridictória de revelação.
A segunda direcção de análise semântica reportará às denominadas modalizações de
‘ser’, neste caso, de ‘não ser’. Os anti-valores dos abjectos (‘não ser’) são, de algum modo,
‘predicados’– isto é, modalizados – por outros integrados na ordem do querer, do dever, do
poder e do saber. Justamente esta modalização/predicação vai instituir uma gama de
significações subjacentes às relações dos sujeitos com o abjecto, todas integradas no domínio
da disjunção. Do ponto de vista semântico, consideramos que são o fundamento das ‘paixões
elementares do choque’. Assim sendo, o ‘não querer não ser’ consubstancia-se na paixão do
repúdio decorrente da dimensão não desejável do abjecto; o ‘dever não ser’/’não poder ser’,
reporta-se à frustração da impotência; o ‘saber não ser’ – eis o choque decorrente da
‘brutalidade dos factos’, daquela operação veridictória a partir da qual se reconheceu um
carácter abjecto. Em suma, as paixões chocantes elementares constituem-se como
substâncias de conteúdo relativas às atitudes que o sujeito vai estabelecer a partir das
modalizações dos anti-valores que o abjecto já comporta em si.
Estas paixões podem revestir-se de uma dimensão ainda mais complexa,
transformando-se, então, em ‘configurações passionais’ e impondo uma terceira direcção de
análise semântica.
As ‘configurações passionais’ decorrerão do desenvolvimento de programas narrativos
do destinador manipulador (regulados pela função do impedimento: ‘fazer não fazer não ser’)
e/ou do sujeito (pautados pela da nolição: ‘não querer fazer não ser’). Incidamos
sumariamente a reflexão sobre este actante. Assim sendo, tal gama de paixões estará
alavancada na sua afirmação como sujeito de oposição mais ou menos prescritiva (que não
quer ou que deve), como sujeito habilitado (que sabe evitar) ou como actante capacitado,
prevenido (habilitado a concretizar uma performance de negação). Deste modo, o estado de
choque (como paixão complexa) haverá de resultar da combinação de alguns destes valores
que entretanto adquiriram estatuto contrário no desenvolvimento do programa narrativo.
Confira-se, a este propósito, o choque enquanto configuração passional da «frustração».
Existem tantas frustrações quantas resultarem da interacção de uma situação inicial (que
Algirdas Greimas designava por ‘estado de espera’ Greimas, 1983, apud, Barros, 2005:51 ) de
repulsa assumida (a do ‘não querer não ser’) ou de resistência (‘não querer fazer não ser’)

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com variações mais ou menos inesperadas, mas sempre não desejadas, de programas
narrativos de performance e/ou de competência fracassados pelo sujeito. Assim,
independentemente da sua vontade, até parece que os deuses se juntaram para o ‘pôr à
prova’, para testar a sua resistência e estoicismo, como se os valores modais do poder ou do
saber fazer se conjugassem (todos ou em parte) para sabotar a sua atitude ou vontade
nolitiva inicial. Por exemplo, no âmbito de uma progressão narrativa, a relação do ‘não
querer fazer não ser’ com o ‘não saber fazer não ser’ estará na origem da significação da
paixão da «frustração decorrente da incompetência» (Silva, 2009:50).
As paixões complexas ou compostas resultam, portanto, da conjugação e,
principalmente, da transformação dos valores modais do ser e do fazer (neste caso, do ‘não
ser’ e do ‘não fazer’), originando autênticos percursos passionais negativos. Do ponto de vista
das significações do choque, estarão associados aos estados de alma – sempre de valor
disfórico e de intensidade mais ou menos intensa - que os actantes vão experimentando à
medida que protagonizam - com maior ou menor sucesso - os seus programas narrativos de
afastamento ou de impedimento.

§ 3.3 – 3ª ‘etapa’ gerativa: a das estruturas discursivas


É no âmbito desta ‘etapa’ do percurso gerativo de sentido que a significação do
choque publicitário se encontra mais próxima da sua manifestação textual.
Das dimensões de análise sintáctica e semântica, iremos abordar os seguintes
aspectos: o das heterogeneidades expressivas que reflectem a coincidência de coordenadas
actanciais, temporais e espaciais de enunciado e enunciação (dimensão sintáctica) (a) e o das
particularidades actoriais, figurativas e temáticas (dimensão semântica) (b).
(a) Dimensão sintáctica: nos anúncios publicitários, as disparidades de enunciado e de
enunciação reportam-se às diversas formas de manifestação textual (parecer) das axiologias
de valores que estão na base dos contratos de veridicção estabelecidos entre os
comunicadores, o enunciador e o enunciatário (ser). Justamente, esta manifestação pode ser
‘objectiva’, quando o texto publicitário se caracteriza por uma ‘dissimulação’, pela gestão de
uma ‘ausência’ das modalidades de enunciação (pessoa/actor, espaço e tempo) nas
textualmente enunciadas (como se o enunciador se ocultasse por detrás dos cenários, das
cronologias e das intervenções dos interlocutores - dos sujeitos enunciados). Corresponde,
então, ao fenómeno da embreagem enunciativa das categorias da pessoa, espaço e do tempo
de enunciação. A sua versão simétrica – consistindo numa subjectivização discursiva – reporta-
se ao fenómeno da debreagem.
Esta dicotomia é importante porque vai suscitar a emergência de distintos efeitos de
sentido no atinente à textualização do choque publicitário.
A embreagem enunciativa vai facilitar a ‘transparência’ das significações chocantes.
Os anti-valores dos abjectos são evocados pela performance concretizada por um elenco de
actores num espaço e num tempo que podemos considerar como sendo o da desgraça. Nesta
modalidade enunciativa é, a ‘anedotização’, a dramatização que está em causa, uma

23
dramatização que até pode nem ser realista. Confira-se sobre este assunto, os regimes
conotativos subjacentes aos anúncios que ilustram esta dissertação. Contudo, não obstante
esta representação não ser realista, não implica que não seja verdadeira. A ‘verdade’ deverá
ser concebida, neste contexto, como o juízo decorrente de um ‘fazer interpretativo’ dos
enunciatários sobre o modo como os textos manifestam axiologias de valores (neste caso, de
anti-valores) consideradas como legítimas ou consensuais pelos sujeitos de enunciação. Assim,
a embreagem enunciativa subjacente a uma textualidade chocante pretensamente objectiva
decorre de uma estratégia de dissimulação do sujeito de enunciação com o propósito de
evocar mais eficazmente um mundo axiológico negativo subjacente aos vínculos existenciais
que o ligam ao enunciatário.
Em contrapartida, os fenómenos de debreagem, ao corresponderem a uma projecção
das entidades de enunciação (pessoa, tempo e espaço) nas do enunciado publicitário, vão
consubstanciar-se num efeito de ‘subjectivização’ por intermédio do qual a ‘verdade do
choque’ manifestada pelo texto encontra o seu fundamento no ethos do enunciador (no seu
capital simbólico, mas igualmente social). Nos anúncios de publicidade, em conjugação com a
tal dramatização chocante (típica de processos de embreagem - veiculada
predominantemente por matérias expressivas de natureza visual, audiovisual ou gráfica),
existem módulos expressivos nos quais se desenrola uma espécie de subjectivação. Está
consubstanciada numa ‘moralização’ através da qual se concretiza não só uma tematização
dos anti-valores entretanto dramatizados (através da qual passam a adquirir uma
inteligibilidade explícita) mas, simultaneamente, uma contratualização – mais ou menos
assumida - com os enunciatários, propondo-se-lhes um determinado programa de não
actuação: não compre, não se aproxime, não experimente, não faça, etc.. Para finalizar esta
consideração é de sublinhar que o sujeito de enunciação do texto chocante é de cunho
institucional – uma organização microeconómica ou não lucrativa. Esta particularidade é
importante: significa que os fenómenos de debreagem enunciativa são sempre evocativos de
uma dinâmica corporativa;

(b) Dimensão semântica: a disparidade sintáctica da embreagem /debreagem vai


redundar em dicotomias fundamentais no respeitante a alguns planos de análise,
concretamente nos relativos aos actores, figuras e temas do choque publicitário.
Por ‘actor’, consideramos a categoria semântica correspondente a alguém que
protagoniza um determinado enredo. O actor é um sujeito complexo. Do ponto de vista
discursivo, é uma entidade no âmbito da qual confluem distintas modalidades de enunciação
(mais ou menos ‘embreadas’). Já numa perspectiva narrativa, é um sujeito de acção que se
distingue conforme actualiza diversos percursos narrativos (sujeito, destinador - manipulador
ou destinatário - julgador). Por fim, no respeitante às estruturas fundamentais, constitui-se
como uma entidade cujo fundamento decorre de certas estruturas axiológicas pautadas pelas
categorias tímicas da euforia ou da disforia. Justamente, o actor do choque publicitário
corresponderá àquele sujeito que pena (categoria da disforia) por referência aos anti-valores

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integrados nos quadros paradigmáticos da (in)conveniência, da (in)justiça e do (des)prestígio.
É portanto, o protagonista do anti-desejo e/ou das fragilidades.
Já demonstrámos em que medida o texto chocante publicitário actualizava
sintacticamente duas modalidades enunciativas distintas: a relativa a uma espectacularização
pretensamente objectiva das fragilidades e a atinente a uma subjectivização institucional de
cunho moralista. Justamente, esta interessante dicotomia também se vai consubstanciar na
emergência de duas classes distintas no paradigma dos actores, dos temas e das figuras do
choque. Relativamente aos elencos, tais paradigmas originam dois tipos de actores. Os
actores protagonistas dos anti-valores e os actores institucionais. Os primeiros tendem a
corresponder a entidades fragilizadas. São os anti-heróis que protagonizam
espectacularmente as abjecções. É interessante verificar como, do ponto de vista discursivo,
são protagonistas daquele ‘kairós’ – o tal momento decisivo da sua perda, quando se
conjugam com os anti-valores que caracterizam o carácter abjecto do objecto (confira-se de
novo as figuras nº 6, 7 e 8). Eis o espectáculo da desgraça - o que determina o cunho
escandaloso, mas fascinante deste tipo de registos. Poderíamos considerar que este actor se
integra nos programas narrativos do actante sujeito. Complementarmente, a esta classe de
actores da desgraça, encontra-se a dos actores institucionais - as ‘pessoas jurídicas’
correspondentes aos anunciantes. São quem mais evidentemente reflectem, do ponto de vista
narrativo, o actante destinador-manipulador e as tais esferas de acção integradas no domínio
do impedimento.
Passemos para os temas e as figuras do choque publicitário.
Um tema chocante corresponde à formulação discursiva dos anti-valores integrados
nas categorias axiológicas da (in)conveniência, (in)justiça e (des)prestígio devidamente
organizados em percursos narrativos. Esta organização é constituída pela recorrência de
traços semânticos ou semas. Por exemplo, relativamente à ‘prevenção da SIDA por
preservativo’ (figura nº 6), é possível descortinar dois temas: o da sexualidade e o da morte à
traição. Mais uma vez, a dicotomia sintáctica da embreagem / debreagem, que originava uma
interessante polaridade no estatuto dos actores do choque publicitário, também se reconhece
no âmbito da disparidade de temas, como se existissem distintas ‘funcionalidades temáticas’.
Nas textualidades de índole mais objectiva, portanto pautadas pela dinâmica da embreagem,
os temas parecem reportar-se a um manancial infinito de assuntos integrados exclusivamente
no domínio das desgraças. Complementarmente, nas textualidades de cunho mais subjectivo,
descortinam-se as temáticas que apresentam um valor institucional. São aquelas propostas
pelas ‘pessoas jurídicas de cunho lucrativo ou não lucrativo’ (empresas ou instituições
políticas, cívicas ou religiosas) e assumem-se como o fundamento ‘moralista’ de programas
narrativos pautados pela função do impedimento. Integram-se nos tópicos das campanhas
promocionais: a luta contra o tabagismo e a SIDA, a prevenção rodoviária, a poupança
energética, etc..
Alguns sumários apontamentos relativamente à figuração chocante. Concebemos as
figuras do choque como o resultado do investimento ‘sensorial’ dos actores e dos temas com o

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propósito de suscitar aos enunciatários uma ilusão referencial que lhes possibilite reconhecer
as ‘imagens do mundo’. É a partir desta dimensão que o texto publicitário chocante vai gerir
uma espécie de ‘ancoragem’ à realidade, possibilitando-lhes projectarem-se nas
significações: descobrir os anti-valores que estão em jogo, reconhecerem-se nos actores,
considerarem familiares os enredos, os assuntos e os cenários. Justamente, também no
respeitante à figuração consideramos a existência de disparidades importantes de regime. Em
primeiro lugar, descortinamos a uma figuração realista ou surrealista, mas sempre a partir da
qual se pretende, de algum modo, contextualizar as temáticas chocantes no mundo vivido dos
enunciatários. Este mundo não é ontológico, mas axiológico (portanto, reportando-se às
categorias da (in)conveniência, (in)justiça e do (des)prestígio). Tal constatação vai implicar a
formulação da hipótese desta figuração ser predominantemente ideográfica, alegórica, típica
da fábula e admitir os mais variados recursos expressivos: desde os da personalização,
passando pela metonímia, a metáfora, a hipérbole. Implica uma espécie de encenação dos
‘maus costumes’ que vai preparar e possibilitar legitimar tematizações de índole institucional
e moralista. Complementarmente, em segundo lugar, o anúncio chocante também engloba
um outro registo de figuração: o dos actores e das temáticas institucionais. Esta figuração não
é mais nem menos importante que a primeira - apenas distinta. Encontra-se agora centrada
na ilustração dos lemas, dos actores institucionais sob a forma de designações verbais,
símbolos, logótipos e de máximas (slogans). Se a figuração dos anti-valores estava repleta de
figuras do mundo e pautada pelo objectivo do reconhecimento, da coerência e da
redundância (isotopia figurativa dos anti-valores) já a de índole institucional, também não
deixa de apresentar um certo grau de pregnância, mas agora de cunho exclusivamente
corporativo e deontológico (isotopia figurativa institucional e moralista).

Conclusão
Nesta sintética dissertação intentámos delimitar semioticamente o fenómeno do
choque publicitário. Eis as principais teses que nela procurámos fundamentar.
1ª - Salientámos a diversidade de interpretações relativamente ao fenómeno do
choque publicitário e ao modo como tendem a integrar-se num domínio de análise
pragmática;
2ª No âmbito dessa análise pragmática, defendemos a necessidade de avançar para
uma abordagem inscrita no domínio da pragmática accional. Tal opção consubstanciou-se na
sua conceptualização como sendo um acto perlocutório e no ensaio da sua classificação
quanto à intencionalidade e convencionalidade. Fomos conduzidos à interessante conclusão
relativa ao facto deste fenómeno – principalmente no atinente às classes de actos
perlocutórios não intencionais ou, se bem que intencionais, não convencionais - pôr à prova a
semiótica enquanto disciplina, pressionando os seus limites epistemológicos até um ponto
máximo a partir do qual vai dar lugar a outros domínios do saber dotados de outros
pressupostos e metodologias de cariz sociológico ou antropológico. Esta posição encontra-se
em sintonia com as conclusões patentes nos estudos da equipa de Kara Chan;

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3ª A partir de uma abordagem de índole semiológica, relativa às dinâmicas de
significação (muito devedora dos estudos de Georges Péninou e, indirectamente, de Roland
Barthes e Louis Hjelmeslev, portanto, adstrita ao modo como o ‘texto publicitário’ gere os
conteúdos publicitários numa perspectiva denotativa ou conotativa), procurámos demonstrar
como o choque publicitário se fundamenta no reconhecimento de um modo excessivo de
significação (publicitária). O anúncio escandaliza por se assumir como uma mensagem
enganadora relativamente à pretensão de apregoar a verdade das mercadorias, numa espécie
de ‘excesso de denotação’, ou afronta as audiências derivado à vacuidade referencial, à
gratuitidade e à ilegitimidade associadas a uma espécie de ‘excesso de conotação’;
4ª No respeitante a um ângulo de análise textual, ensaiámos outra abordagem
complementar ao fenómeno do choque, a partir da qual passa a ser concebido como o
produto de um programa de geração de sentido dotado de dinâmica e regras próprias. Esta
tese implicou a conceptualização da mensagem publicitária como um texto no qual são
evocados valores negativos relativos a objectos (isto é, abjectos) principalmente de cariz
cívico, político ou religioso ou são contratualizados programas de ‘não acção’.
Na etapa do programa gerativo de sentido relativa às estruturas profundas, o choque
sempre se reportará à significação de axiologias de valores negativos dos objectos. Estes
transformam-se em abjectos quando inconvenientes ou são o fundamento de condutas
injustas ou viciosas. Por sua vez, no atinente à etapa das estruturas narrativas, o choque
publicitário encontra-se adstrito a enunciados, a programas, a percursos e a esquemas
narrativos protagonizados por ‘sujeitos de não desejo’ - actantes renitentes - ou por
destinadores-manipuladores, por intermédio dos quais se decidem funções narrativas relativas
ao afastamento e/ou ao impedimento. Por sua vez, no âmbito das etapas relativas às
estruturas discursivas, a textualidade do choque estará relacionada com dicotomias
enunciativas que se reportam às interessantes polaridades entre
objectividade/subjectividade, embreagem / debreagem, responsáveis pela introdução de
heterogeneidades expressivas no texto publicitário, como se existisse uma espécie de ‘divisão
do trabalho discursivo’. No texto publicitário existirão assim módulos específicos da
objectividade chocante, nos quais são significados temas, actores e figuras do «mundo da
desgraça». Em contrapartida, nos módulos discursivos atinentes ao domínio da
subjectividade, geram-se temas, actores e figuras institucionais que, relativamente aos
outros, são responsáveis pela transmissão de significações de índole moralista. A sua
funcionalidade é só uma: a de objectivar - intelectualizar - os anti-valores que
fundamentavam esse mundo da desgraça e, simultaneamente, propor - mais ou menos
explicitamente – programas narrativos ditados pelas funções do impedimento.

Bibliografia
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