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“Para onde vão os guarda-chuvas” é considerado uma das melhores obras escritas por

Afonso Cruz, para qual fui imediatamente atraída pelo título retórico (que mais tarde
irei explicar), e pela beleza da capa.
A narrativa passa-se num país do médio oriente e segue a vida de Fazal Elahi, onde ao
longo da história, podemos acompanhar as suas esperanças, medos e sofrimentos.
Fazal Elahi é a personagem principal, que não gosta de dar nas vistas e prefere passar
despercebido, mas a quem o destino lhe traz uma mulher de cabelos pretos, atraente,
provocadora e o foco de todos os olhares, e um filho irrequieto, com notórios atos de
malícia, incomuns numa criança tão pequena.
Este homem está, portanto, destinado a grandes tragédias.
Enfrentará aquele que tende a ser o maior desafio de todos: a perda de um filho. A
trágica forma como ocorre leva-nos a duvidar da sua capacidade de superação, no
entanto a vida traz sempre surpresas.
Mais do que uma história com início, meio e fim, este é sobretudo um livro que se foca
na perda de alguém que nos é muito e a dor que essa ausência causa no peito. Para
além disso, de como sobreviver a esse sentimento. Afonso cruz dá atenção á religião
concretamente à intolerância religiosa e como isso pode causar um grande impacto na
vida das personagens.
Posso dar-vos o exemplo de Aminah, irmã de Fazal Elahi que vive presa aos
preconceitos e não quis casar com Nicketa (um homem carinhoso e apaixonado por
ela), por este ser indiano e por isso não ser bem-vindo, e acabou por casar com o filho
do general que visitava casas de ópio e era violento.
Também quero destacar o ponto alto do livro, que para mim é quando surge Isa, uma
personagem muito cativante, amorosa, que pensa e ama de forma diferente. Faz-nos
querer desejar amar alguém de forma incondicional mesmo que não seja do nosso
sangue. No entanto, é daqui que surge a minha crítica, pois custa-me perceber como é
que uma obra com mais de seiscentas páginas não tenha dado mais tempo de antena
a Isa. E continuando com aquilo que menos gostei, este é um livro que se torna muito
difícil de ler, porque Afonso Cruz traz-nos uma narrativa metafórica e quem não tenha
um hábito de leitura, precisará de ler a página mais que uma vez.
Contudo, é sim uma obra cujas citações devem ser partilhadas, mas não se torna fácil
quando o próprio livro é uma constante de reflexões e de dizeres que nos cortam a
respiração.
Em suma, a que se refere Afonso Cruz quando intitula o livro: para onde vão os guarda-
chuvas?
Na minha opinião: para onde vai tudo aquilo que perdemos? Nós perdemos tantas
coisas…memórias, as mães, os pais e os filhos, que de repente desaparecem e não
voltamos a encontrar. Existirá um lugar à espera de ser descoberto? Uma caixa gigante
com tudo aquilo que perdemos? E se um dia encontrarmos esse lugar? O que
acontecerá dentro de nós quando observarmos aquilo que já não nos pertence e que
um foi nosso? Eu também não sei.
Aconselho, de facto, esta obra aos leitores com um gosto peculiar pela linguagem
metafórica e que consigam digerir os sentimentos à medida que estes forem
aparecendo com o livro.

Citações:

 “Elahi é um excelente jogador, se o objetivo for perder.”

 “Não é a falta de pessoas à nossa volta que faz a solidão. São as


pessoas erradas.”

 “O futuro é aquilo que conseguimos fazer do passado.”

 “O crente acredita na vida eterna. O ateu, na morte eterna.”

 “A verdade é um conjunto infinito de mentiras.”

 “Encheremos o mundo de coisas preciosas. Serão tantas que os


homens passarão por elas julgando-as banais.”
 “Disse o profeta: é mais sábio perguntar do que responder.”

 “Não estamos a pergunta certa, se a nossa pergunta tiver resposta”

 Uns caminham na penumbra a acompanhar o sol, outra atravessam


a noite e veem o dia.

 Disse Ali: as árvores que crescem sozinhas dão frutos que não se
comem.

 Os rios são mais longos quando se navegam contra a corrente.

 Criámos dois tipos de homem, os que veem as coisas do cimo da


montanha e os que as veem do sopé.

 As montanhas são a prova de que até a terra quer chegar ao céu.

 Se não conseguires estar em silêncio, fala apenas para dizer bem.

 A única pessoa rica é aquela que continua rica depois de perder


tudo.
 O mal é que os homens fazem as coisas erradas corretamente e as
coisas certas erradamente.

 Um homem, quando aprende, não fica a saber mais. Mas ficas a


ignorar menos.

 A pedra onde nos sentamos é precisamente o oposto da pedra que


atiramos.

 No deserto as flores desabrocham na imaginação.

 O infiel, à medida que envelhece, vai encurtando o seu futuro,


aumentando o seu passado, e chega ao dia da sua morte cheio de
ontens e sem depois. Depois é o nada. O futuro daquele que não
crê em Nós será o seu passado. Mas ao crente acontece
precisamente o inverso: à medida que envelhece vai tendo mais
futuro, à medida que envelhece, aproxima-se cada vez mais da
eternidade.

 Criamos os caracóis para fazer o mundo mais lento.

 As flores aprendem a voar nos olhos dos pássaros.

 Daremos ao homem a chave certa e ele irá usá-la na porta errada.


 As ostras bebem água e produzem pérolas; as serpentes bebem
água e produzem veneno.

 Daremos aos homens a sabedoria para que aqueles que são puros e
aqueles que são maus compreendam que são exatamente os
mesmos.

 Aos homens caberá lutarem contra a realidade.

 A vida humana é uma sombra no meio de trevas absolutas.

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