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Saberemos
conviver com isso?
Introdução
A REBEA é uma rede que desde o início esteve muito próxima ou mesmo
articulada ao Estado, seja exercendo o controle social, seja participando da
implementação de ações federais. O fato que merece a nossa reflexão, é que nesta
relação de proximidade e atenção ao governo federal que a REBEA mantém
durante o governo Lula, os dois processos de transição na direção da Educação
Ambiental que ocorreram no MMA foram emblemáticos de uma situação que
precisa ser analisada no contexto do papel a desempenhar pelas redes de Educação
Ambiental: se percebe que ocorreram enfrentamentos políticos em disputa pela
ocupação do poder político propriamente dito no governo federal, e também do
poder simbólico dentro da própria REBEA para buscar discursivamente
legitimidade política. É natural haver divergências e enfrentamentos políticos
numa democracia, mas os embates que ocorreram na REBEA se configuraram
como verdadeiras “brigas de torcida”, cujos ânimos de muitos enredados estavam
exaltados, com ataques explícitos ou velados, críticas levianas e muitas vezes,
infundadas. Mas principalmente, esses enfrentamentos políticos apresentaram um
tom personalista e messiânico para a manutenção ou não de uma determinada
figura no poder, muito mais por sua capacidade operativa e poder de
combatividade do que propriamente pelas idéias e projetos políticos representados.
Aqui se configura uma questão importante para ser refletida, porque ficou
muito claro que o anúncio das diferenças entre as torcidas estava mais no
desempenho administrativo, na performance da condução de um trabalho do que
propriamente nas idéias que inspiram a elaboração e execução deste trabalho.
Parece que a condução política da Educação Ambiental nacional ficou reduzida à
sua capacidade gerencial, buscando-se comparações de quem seria mais eficiente,
criativo(a), produtivo(a), inteligente, carismático(a); e não os projetos societários
que representa para o país, para a questão ambiental. [36]
Isso é muito curioso, porque além de sabermos hoje (pelo menos para quem
já pertence nuclearmente ao campo da Educação Ambiental) que desde meados
dos anos 90 já não era mais possível rotular a Educação Ambiental no singular,
porque estava cada vez mais claro que existem distintas correntes político-
pedagógicas, ou seja, existem diferentes formas de se conceber e implementar
processos educativos voltados à realidade ambiental; é possível distinguir
razoavelmente bem quais foram as macro-intencionalidades político-pedagógicas
dos dois primeiros gestores do DEA/MMA no governo Lula. Curiosamente, não
foi esse o foco dos debates, ou seja, debater quais projetos societários e quais
estratégias educativo-ambientais guiaram os gestores que ocuparam cargos de
direção no DEA/MMA, ou que os educadores ambientais articulados na REBEA
desejam construir por meio de uma política nacional de Educação Ambiental –
distinguindo isso do perfil pessoal dos protagonistas que ocuparam os cargos de
direção no governo central. Isso foi uma não questão na REBEA, uma gritante
contradição para uma rede que sempre esteve acompanhando o poder executivo
federal.
Ao invés de se debater os fundamentos das políticas públicas nacionais de
Educação Ambiental a partir das múltiplas opções identitárias existentes, o que
ocorreu foi um violento processo de desqualificação do Outro, que inclusive se
reverberou para fora da REBEA, em blogs de Educação Ambiental por exemplo.
Afinal, tratamos a diferença da pior forma possível: no papel, tínhamos como certo
que a diversidade da Educação Ambiental brasileira era uma coisa bonita, mas na
prática, na primeira oportunidade de se visualizar os diferentes matizes dessa
Educação Ambiental, essa beleza desapareceu e se mostrou em toda sua feiúra.
Parece que finalmente descobrimos que somos diferentes, e essa diferença
definitivamente não se mostrou bonita, desfazendo o encantamento idealizado que
tínhamos. Estamos num momento histórico de grande significado, de verdadeira
descoberta de que a Educação Ambiental é plural, sinalizando o início de um
amadurecimento que demonstra haver limites para a hegemonização de um
pensamento no campo da Educação Ambiental. Qualquer tentativa de
absolutização provavelmente encontrará resistências dissidentes.
Mas o pior de tudo que se pôde constatar nos debates na REBEA é que
muitas das acusações feitas em nome de uma avaliação de eficácia na gestão
pública, desconsideram as características da cultura política brasileira, como os
clássicos processos de descontinuidade política, a lentidão da máquina burocrática,
a dificuldade ou impossibilidade de se realizar o planejado sem o apoio político
das instâncias hierárquicas superiores, a autoritária opressão simbólica sobre
aqueles que pensam diferente do pensamento do núcleo do poder. Tais
características culturais foram apontadas como defeitos individuais de um dos
gestores, como se fosse possível encontrar tais elementos apenas numa das gestões
e não estivesse presente na lógica do Estado brasileiro. [37]