Luísa Ducla Soares é uma autora portuguesa de literatura infantil e juvenil. Ela se formou em Filologia Germânica e trabalhou por 30 anos na Biblioteca Nacional de Portugal. Soares escreveu 130 livros e recebeu prêmios da Fundação Calouste Gulbenkian por duas vezes.
Luísa Ducla Soares é uma autora portuguesa de literatura infantil e juvenil. Ela se formou em Filologia Germânica e trabalhou por 30 anos na Biblioteca Nacional de Portugal. Soares escreveu 130 livros e recebeu prêmios da Fundação Calouste Gulbenkian por duas vezes.
Luísa Ducla Soares é uma autora portuguesa de literatura infantil e juvenil. Ela se formou em Filologia Germânica e trabalhou por 30 anos na Biblioteca Nacional de Portugal. Soares escreveu 130 livros e recebeu prêmios da Fundação Calouste Gulbenkian por duas vezes.
Filologia Germânica, dedica-se especialmente à literatura infanto juvenil como autora, estudiosa, divulgadora. Tendo sido jornalista, adjunta do Ministério da Educação e trabalhando 30 anos na Biblioteca Nacional, tem realizado numerosas sessões de incentivo à leitura e conferências em escolas, bibliotecas, universidades. Autora de 130 livros, recusou, por motivos políticos, o Prémio Maria Amália Vaz de Carvalho e foi por duas vezes galardoada pela Fundação Calouste Gulbenkian. Sinopse da história «A CIDADE DOS CÃES»
Um senhor que gostava muito de cães decidiu
comprar uma quinta para eles morarem. A cidade dos cães tinha: . árvores à porta das casotas para os cães fazerem xixi; . um talho; . um supermercado com bolachas recheadas com frango, presunto, fiambre, queijo e leites de conserva; . cinema com cheiros; . estádio para os cães correrem atrás das lebres; . cabeleireiro; . loja de móveis especiais; . loja de roupa. Os homens só lá iam acompanhados de um cão, com açaime e trela. Não havia poluição. Um dia, o cão lembrou-se que tinham de fazer eleições. Foi uma grande confusão porque todos queriam ser reis. Kaiser, um cão muito feroz, tornou-se num imperador. Todos os cães se tornaram seus criados, obedecendo com medo, de Kaiser. O Kaiser comia as melhores carnes e tinha um grande palácio. Os cães começaram a passar fome e foram-se embora. Kaiser ficou sozinho e raivoso decidindo ir à terra dos homens procurar os seus súbditos, sendo apanhado e levado para o canil. Quem aproveitou, foram os gatos e a cidade passou a chamar-se “A cidade dos gatos”. Era uma vez um homem que gostava imenso de cães. - Ah!, como os pobres bichos vivem tristes no meio dos homens! – lamentava-se ele. –Uns ficam presos nos apartamentos. Outros passam fome. Outros são vítimas de brincadeiras de miúdos malandros. Cheio de pena, resolveu: Vou gastar a minha fortuna na construção de um espaço maravilhoso, onde os nossos maiores amigos sejam felizes. Se bem o pensou, melhor o fez. Comprou uma bela quinta, contratou um arquicteto, ouviu os pareceres da Sociedade Protectora dos Animais e deitou mãos à obra. Assim nasceu a CIDADE DOS CÃES. Ali tudo obedecia ao gosto dos seus habitantes de quatro patas. As casas eram casotas com árvores à porta para fazerem xixi. A principal atração do centro comercial era, naturalmente, o talho, mas mesmo ao lado havia um supermercado com queijos, fiambre, presunto, deliciosas bolachas recheadas de frango, latas de conserva de todas as marcas e paladares. O pronto a vestir apresentava as novas modas de coleiras, trelas, casacos, impermeáveis para os dias de chuva.. Sem esquecer as fitas de seda com que as cadelas vaidosas prendiam os seus totós. Na secção de brinquedos vendiam-se ossos de plástico, pantufas de borracha para morder e bolas maciças coloridas. Além de toda a espécie de bonecos de peluche para cachorrinhos desdentados. Os cabeleireiros usavam champô contra as pulgas e eram peritos em tosquiar. Faziam cortes à leão, imitavam poupas de araras, franjas de meninas; no verão usavam a máquina zero para os que queriam parecer-se com certos carecas famosos. As lojas de móveis e decorações não tinham cadeiras, mesas ou estantes. Mas apresentavam boas camas, sofás de veludo, fofas almofadas de penas. A variedade de tapetes e mantas espantava qualquer canídeo. Havia uma piscina cheia de patos para caçar, um estádio com pista onde se corria atrás de lebres. Mas o mais sensacional era o cinema que passava filmes para farejar. Os de aventuras cheiravam a tigres, a elefantes, a girafas, à selva distante. Os destinados aos mais pequenos cheiravam a pintos, a pássaros, a coelhinhos. Os homens só podiam entrar na cidade acompanhados por algum cão, mesmo assim, com açaimo na boca e gravata a fazer de trela. Lá ninguém se queixava da poluição. Os cães nunca tiveram ideia de construir fábricas, que tornassem o ar irrespirável, ou esgotos que envenenassem os rios. Os dejetos estrumavam a terra, onde nasciam as mais lindas flores. Vícios? Já viram algum cão bêbedo, drogado ou sequer a mascar pastilha elástica? Ninguém fumava. Em vez de cigarro, traziam na boca um osso, prática muito mais saudável. Porque é que os humanos não experimentam fazer o mesmo? Não havia desastres de viação pois eram proibidos os automóveis. Os cães, apesar de viverem bem, continuavam a andar a pé, aliás à pata. Que paraíso! Só os gatos, espreitando para além dos muros, achavam aquele o pior dos mundos. Tudo corria em harmonia até que um cão se lembrou de que naquela cidade, tão perfeita, algo faltava. - Que será? Que será? – perguntavam os curiosos. - Um imperador, um rei ou, ao menos, um presidente da república. Os cães nada percebiam de política mas, se os homens tinham governantes, porque não haviam eles de os ter? Resolveram fazer eleições. Todos queriam ser governantes para mandar. Uns discursavam, outros criticavam, outros ralhavam. Enfim , todos ladravam. No meio da terrível barulhada os mais ágeis faziam habilidade, as cadelinhas tiravam partido dos seus dotes de beleza, os grandes cães de guarda exibiam os músculos e os dentes. - Quero ser rei! – uivava um perdigueiro sarapintado. - Quero ser rei! – gania um baixote de orelhas a arrastar no chão. - Quero ser rei! – rosnava um pesado Serra da Estrela. - Quero ser rainha! – esganiçava-se uma caniche branca coberta de caracóis. Era grande a barafunda quando se apresentou o mais corpulento, o mais feroz de todos os cães. De rabo alçado, todo senhor, ladrou em voz alta: - Focinho calado! Quem manda aqui sou eu, Kaiser, o imperador dos cães. Houve que tremesse como varas verdes, quem desatasse a rir, quem ficasse paralisado. Poli, o cão polícia, não podendo aceitar aquele desplante, avançou para o prender. Para a direita, para a esquerda, Kaiser atirou-se à dentada. Pescoços abertos, orelhas cortadas, olhos arrancados, em breve o largo municipal parecia um campo de batalha. Erguendo-se, coberto de sangue, de entre mortos e feridos, Kaiser alçou novamente o rabo ladrando: - Sou o imperador de todos os cães! Tenho as orelhas maiores, tenho o focinho maior, tenho as patas maiores, tenho a barriga maior e principalmente tenho os dentes muito maiores que vocês. - Sou o máximo! Obedeçam! Os restantes encolheram-se e cumpriram ordens. Arranjaram um trenó para o grande chefe, que deixou de andar à pata, passando a ser puxado por dez cães esquimós. Vinte pastores alemães da Guarda Republicana passaram a acompanhá-lo para o protegerem. Trinta cães de circo foram chamados para o entreterem. Quarente cadelas de luxo o mimavam. Cinquenta cães rafeiros lhe serviam de criados. A melhor carne do talho era para ele. Os outros que comessem gorduras e nervos… Mandou juntar todas as casotas à volta da sua porque um imperador precisa de um palácio. Uma casota transformou-se em quarto de dormir, outra em sala de estar, outra em casa de jantar, outras em salas para catar carraças, para namorar, jogar à bola, etc, etc, etc. A casota escola, que era mais ampla, ficou para sala do trono. Os cães mais fracos viram-se sem abrigo, passando a noite ao relento. Com a barriga a dar horas, passaram a procurar restos de banquetes nos caixotes de lixo do palácio. - Que vida de cão! – ganiam os pobres. E começaram a fugir da cidade dos cães. Um após outro, dia após dia, dali se sumiram até que, certa manhã, Kaiser acordou, espreguiçou-se, deitou a cabeça de fora, espetou as orelhas, torceu o nariz. - Não farejo nada de bom! Deixaram-me só… - rosnou ele. Raivoso, partiu à procura dos seus súbditos. Entrou na cidade dos homens mas logo, por azar, era dia da camioneta da câmara apanhar os animais vadios.. Sem perceber bem como, viu-se a espernear, a morder, a ladrar dentro de uma rede, ele, o incrível, Kaiser, o imperador. Levaram-no para o canil, meteram-no numa jaula. A cidade dos cães estava finalmente deserta. Então, dos alto dos muros, das árvores, dos telhados, saltaram os gatos. Enroscaram-se ao sol sobre as casotas. Trocaram o talho por uma peixaria, no lugar da piscina instalaram uma lareira enorme para se aquecerem e afiavam as unhas nos troncos onde os cães dantes faziam xixi. Em vez de ão, ão, ão, a música agora é miau, miau, miau. A tabuleta à entrada anuncia: A CIDADE DOS GATOS.