CURSO DE TEATRO DO SIND.

ESCRITORES DO RJ – CURSO LIMA BARRETO

CONVERSA COM
O DEMÔNIO
SCRIPT

[PAULO MONT’ALVERNE]

[03/DEZ/2007]

[Um demônio dos tempos modernos tenta comprar a alma de alguém]

 [PERSONAGENS]

Demônio — Veste um terno elegante e leva em sua mão uma pasta de

executivo. Ao contrário do que se poderia esperar, não tem cauda,
chifres ou asas. Na pasta deverá haver um contrato comercial e uma
caneta.

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 [CENA 1] [ATO 1]

SOBE O PANO

A CORTINA SE ABRE, REVELANDO O PALCO ILUMINADO DE VERMELHO. NO CENTRO DO

PALCO ESTÁ UM HOMEM DE TERNO E PASTA DE EXECUTIVO. ELE POUSA A PASTA NO CHÃO E
FALA, DIRIGINDO-SE PARA UM LOCUTOR IMAGINÁRIO NA DIREÇÃO DA PLATÉIA.

[Demônio]:.......Olá!

ACENDE-SE A LUZ CLARA.

[Demônio]:.......Ora, surpreso em me ver? Não deveria, afinal todos vocês

pedem nossa presença uma ou outra vez. Afinal, negociamos
muitas coisas. Para a velha dama, sua juventude e beleza
perdidas. Para a jovem moça, o amor que partiu para
longe. Para o ancião em seu leito de morte, alguns anos a
mais de vida. E para o miserável â?" esta é fácil â?"
basta alguma riqueza.
[Demônio]:.......Quem sou eu? Bem, seguindo as palavras que um de seus
escritores pôs em minha boca, "sou um homem de muitas
posses e bom gosto". (Com desdém) Ora, o que esperava?
Chifres e uma cauda? Talvez... asas de morcego! Por
favor, isso é muito barroco! Já lhe disseram que não
estamos mais na Idade Média? Temos de nos adaptar aos
dias de hoje ou a concorrência nos passa a perna.
[Demônio]:.......Vamos, vamos! Acredite ou não, eu não tenho todo o tempo
do mundo. Você não imagina como sou ocupado!
[Demônio]:.......Pense bem: o pagamento é adiantado. Dez anos de tudo o
que quiser, e depois você entra para a nossa... compania.
Sim, com todos os privilégios de seu novo encargo. E do
jeito que as coisas andam por aqui, nem vai sentir a
diferença. E se não aceitar, ainda há uma grande chance
de acabar junto a nós, de um jeito ou de outro. Eu mesmo
entrei para a firma neste esquema. E, olhe para mim...
Não estou tão mal, certo? Além do mais, veja só as
condições que a concorrência impõe. Trabalho pesado, com
pagamento só no final, e sem garantias.
[Demônio]:.......(Impaciente) Olha, isto aqui é um negócio simples. Você
tem uma mercadoria que me interessa e eu tenho uma oferta
por ela. É pegar ou largar. Como? Mentiras? (Indignado)
Ah, essa não! Não me diga que você também caiu nesta? E
eles gostam de se bancar os bons moços!

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[Demônio]:.......Claro que eu tenho referências! Diga-me, já ouviu falar
de Dorian Gray? E Fausto, conhece? Bem, o que acha agora?
Nós jamais rescindimos um contrato ou deixamos de cumpri-
lo. Sequer usamos letrinhas miúdas... Pergunte só a
alguns de nossos clientes anteriores. E ainda temos que
agüentar uma destas. Eu sempre disse para o pessoal do
marketing que deveríamos mudar nossas campanhas
publicitárias. Mas aqueles idiotas insistem em usar os
métodos tradicionais. Cabras! Imaginem só! És vezes chego
a pensar que trabalham para a concorrência.
[Demônio]:.......Mas, voltando ao nosso pequeno negócio, vamos decidir
logo. Já lhe disse que tenho muito que fazer. Afinal de
contas, preferimos tê-lo em nossa folha de pagamento do
que como mais um serviço. E você não faz idéia de como
tem chegado serviço ultimamente. É por isto que estamos
tentando aumentar nossa equipe com estas promoções.
[Demônio]:.......Ah, vejo que já se decidiu.

ABAIXA-SE, PEGA A PASTA, RETIRANDO DE DENTRO DELA UM CONTRATO COMERCIAL E UMA

CANETA. RECOLOCA A PASTA NO CHÃO E ESTENDE O CONTRATO E A CANETA PARA FRENTE,
EM DIREÇÃO À PLATÉTIA. SEU ROSTO TEM UM SORRISO DIABÓLICO.

[Demônio]:.......Vamos lá. Basta assinar na linha pontilhada...

FIM