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MEIO AMBIENTE, MIGRAÇÕES

E PANDEMIA:
reflexões do mundo contemporâneo

Charles Alexandre Souza Armada


Danyelly Crystynna Palácio Sena
Dara Lopes Franco Peralta
Ester Caroline Alves Pinto
Giovani Peixer Dada
Ingrid Silveira Nunes
Isabeli Naiara Mariano
José Augusto Nunes
Klara Elisa Salvalagio
Larissa Pimenta da Silva
Maria Isabel Marquetti
Nicole Felisberto Maciel
Victor Holtin Weiss
Walter Barbieri Júnior
Charles Alexandre Souza Armada
Walter Barbieri Júnior
(Organizadores)

MEIO AMBIENTE, MIGRAÇÕES


E PANDEMIA:
reflexões do mundo contemporâneo

Max
Limonad
desde 1944
MEIO AMBIENTE, MIGRAÇÕES E PANDEMIA:
REFLEXÕES DO MUNDO CONTEMPORÂNEO

Copyright: Charles Alexandre Souza Armada e Walter Barbieri Júnior


(Organizadores)
Copyright da presente edição: Editora Max Limonad
Capa: Maria Eduarda Gomes

AR727m Armada, Charles Alexandre Souza; Barbieri Júnior,


Walter (organizadores).
Meio ambiente, migrações e pandemia: reflexões
do mundo contemporâneo / Charles Alexandre
Souza Armada, Walter Barbieri Júnior - São Paulo:
Editora Max Limonad, 2021.

Organizadores.
Referências bibliográficas.

ISBN 978-65-88297-47-6
[versão eletrônica PDF pesquisável]
1. Direito Ambiental. 2. Migrações. 3. Pandemia.
4. Covid. I. Armada, Charles Alexandre Souza. II.
Barbieri Júnior, Walter.

CDD 340

Editora Max Limonad


www.maxlimonad.com.br
editoramaxlimonad@gmail.com
2021

Conselho Editorial

Celso Fernandes Campilongo


Tailson Pires Costa
Marcos Duarte
Célia Regina Teixeira
Jonas Rodrigues de Moraes
Viviani Anaya
Emerson Malheiro
Raphael Silva Rodrigues
Rodrigo Almeida Magalhães
Thiago Penido Martins
Ricardo Henrique Carvalho Salgado
Maria José Lopes Moraes de Carvalho
Roberto Bueno
SUMÁRIO

APRESENTAÇÃO ..............................................................................7

MUDANÇAS CLIMÁTICAS E GÊNERO: AS MULHERES


COMO PRINCIPAIS VÍTIMAS ......................................................11
Ester Caroline Alves Pinto
Danyelly Crystynna Palácio Sena
Charles Alexandre Souza Armada

ESTUDO COMPARATIVO SOBRE O MEIO AMBIENTE


NA POLÍTICA EXTERNA BRASILEIRA: GOVERNO
LULA E GOVERNO BOLSONARO ...............................................29
Giovani Peixer Dada
Charles Alexandre Souza Armada

A GOVERNANÇA AMBIENTAL NO BRASIL ............................51


Ingrid Silveira Nunes

A DEGRADAÇÃO DA AMAZÔNIA E O EFEITO


PANDÊMICO ....................................................................................75
Isabeli Naiara Mariano
Nicole Felisberto Maciel

O CRESCIMENTO DA VAREJISTA WALMART E A


OCUPAÇÃO DE NOVOS MERCADOS
INTERNACIONAIS ..........................................................................95
José Augusto Nunes

DIPLOMACIA E AMAZÔNIA BRASILEIRA: A IMAGEM


DO BRASIL E OS REFLEXOS DO DESMATAMENTO
NA COMUNIDADE INTERNACIONAL .....................................109
Klara Elisa Salvalagio

“SE SOUBÉSSEMOS QUE SERIA ASSIM, NÓS NÃO


TERÍAMOS VINDO PARA O EGITO”:
PRECONCEITOS SOFRIDOS POR MULHERES
AFRICANAS SUBSAARIANAS QUE BUSCAM
CHARLES ALEXANDRE SOUZA ARMADA E WALTER BARBIERI JÚNIOR
(ORGANIZADORES)

REFÚGIO NO EGITO ................................................................... 127


Larissa Pimenta da Silva

DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL E O TERCEIRO


SETOR: AS ORGANIZAÇÕES NÃO GOVERNAMENTAIS
COMO FERRAMENTA PARA UM DESENVOLVIMENTO
VERDADEIRAMENTE SUSTENTÁVEL ................................... 153
Maria Isabel Marquetti

O DESEMPENHO DO SETOR DE CELULOSE E PAPEL


NO MERCADO DE CAPITAIS BRASILEIRO DIANTE
DA PANDEMIA DE COVID-19 .................................................... 187
Victor Holtin Weiss

SUSTENTABILIDADE E AGRONEGÓCIO: UM ESTUDO


DA ATUAÇÃO DA COMPANHIA DO
AGRONEGÓCIO AMAGGI .......................................................... 205
Dara Lopes Franco Peralta

A DEGRADAÇÃO AMBIENTAL NO SÉCULO XXI:


O CASO DO MIGRANTE AMBIENTAL NO SUL DA ÁSIA ... 243
Walter Barbieri Júnior

6
APRESENTAÇÃO

O presente projeto envolve uma coletânea de artigos científicos


produzidos pelos alunos do curso de graduação e da pós-graduação em
Relações Internacionais da Universidade do Vale do Itajaí-UNIVALI.
Alguns dos artigos que compõem a presente obra foram desen-
volvidos como requisito parcial para conclusão da disciplina Contratos
Internacionais, do curso de graduação em Relações Internacionais, mi-
nistrada pela Prof. Dr. Charles Alexandre Souza Armada no segundo se-
mestre de 2020. Outros trabalhos, por sua vez, foram desenvolvidos
como requisito parcial para conclusão da disciplina Governança Global
e Regimes Internacionais, do curso de pós-graduação em Relações Inter-
nacionais, também ministrada pela Prof. Dr. Charles Alexandre Souza
Armada no ano de 2020. Por fim, cabe destacar que alguns dos artigos
aqui apresentados representam os respectivos trabalhos de conclusão de
curso de alguns dos acadêmicos do curso de graduação em Relações In-
ternacionais da Universidade do Vale do Itajaí-UNIVALI.
Os trabalhos científicos produzidos pelos egressos, graduandos
e pós-graduandos, apesar de versarem sobre temas distintos de interesse
das Relações Internacionais, apresentam alguns pontos em comum. Den-
tre eles, destaca-se a inclusão do meio ambiente e da sustentabilidade
como fios condutores da maioria das pesquisas promovidas.
Parabenizamos todos os autores da presente obra pelo resultado
alcançado.
Os trabalhos apresentados envolveram pesquisa de qualidade e
uma preocupação constante com as melhores práticas das normas acadê-
mico-científicas. Os temas desenvolvidos refletem as preocupações de
uma sociedade caracterizada pelo alto nível de complexidade de seus
problemas e pelo fato destes problemas serem de difícil adequação.
O trabalho das egressas e recém-formadas Danyelly Crystynna
Palácio Sena e Ester Caroline Alves Pinto traz o título “Mudanças climá-
ticas e gênero: as mulheres como principais vítimas” e desenvolve os
impactos diferenciados que as mudanças climáticas podem determinar
na questão de gênero.
Dara Lopes Franco Peralta, por sua vez, traz em sua pesquisa
“Sustentabilidade e Agronegócio: um estudo da atuação da companhia
do agronegócio Amaggi” a discussão dos impactos ambientais do agro-
negócio no Brasil a partir da atuação da empresa Amaggi.
APRESENTAÇÃO

O pós-graduando Giovani Peixer, na obra “Estudo comparativo


sobre o meio ambiente na política externa brasileira: governo Lula e go-
verno Bolsonaro”, faz uma análise comparativa dos governos Lula e Bol-
sonaro ao investigar o papel desempenhado pelo meio ambiente na polí-
tica externa brasileira.
A também pós-graduanda Ingrid Silveira Nunes demonstra em
seu artigo “A governança ambiental no Brasil” as dificuldades de preser-
vação do meio ambiente no Brasil.
O trabalho conjunto de pós-graduação de Isabeli Naiara Mariano
e Nicole Felisberto Maciel, com o título “A degradação da Amazônia e
o efeito pandêmico” traz a relação entre a atual pandemia da COVID-19
e a degradação ambiental na Amazônia.
O pós-graduando José Augusto Nunes traz na pesquisa “O cres-
cimento da varejista Walmart e a ocupação de novos mercados interna-
cionais” uma análise da gigante Walmart, destacando as principais ca-
racterísticas do crescimento da empresa.
A acadêmica Klara Elisa Salvalagio, em seu artigo “Diplomacia
e Amazônia brasileira: a imagem do Brasil e os reflexos do desmata-
mento na comunidade internacional”, explora os eventos relacionados
com a perda de cobertura florestal na Amazônia brasileira e os impactos
que estes eventos determinam na comunidade internacional.
Larissa Pimenta da Silva, por sua vez, com o trabalho “‘Se sou-
béssemos que seria assim, nós não teríamos vindo para o Egito’: Precon-
ceitos sofridos por mulheres africanas subsaarianas que buscam refúgio
no Egito”, explora as dificuldades e os preconceitos que cercam a busca
pelo refúgio no Egito, particularmente pelas mulheres.
A egressa Maria Isabel Marquetti apresenta seu trabalho de con-
clusão de curso “DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL E O TER-
CEIRO SETOR: As organizações não governamentais como ferramenta
para um desenvolvimento verdadeiramente sustentável” onde desen-
volve a importância das organizações não governamentais na difusão e
na consolidação do Desenvolvimento Sustentável no mundo contempo-
râneo.
Em seu artigo “O desempenho do setor de celulose e papel no
mercado de capitais brasileiro diante da pandemia de covid-19”, o pós-
graduando Victor Holtin Weiss analisa o comportamento do mercado de
capitais brasileiro, especialmente no setor de celulose e papel, em tempos
de pandemia da COVID-19.
Finalmente, fechando o presente projeto, o Prof. Dr. Walter Bar-
bieri Junior do curso de graduação e coordenador da pós-graduação em
Relações Internacionais da Universidade do Vale do Itajaí-UNIVALI
apresenta em seu artigo “A Degradação Ambiental no século XXI: O
Caso do Migrante Ambiental no sul da Ásia” a difícil realidade das

8
MEIO AMBIENTE, MIGRAÇÕES E PANDEMIA: REFLEXÕES DO MUNDO CONTEMPORÂNEO

migrações da parte sul do continente asiático e sua relação com a degra-


dação ambiental.
Mais uma vez, cumprimentamos todos(as) os(as) autores(as) pe-
los trabalhos desenvolvidos e convido a todos(as) a perseverarem na pes-
quisa científica e na discussão dos temas relevantes de nossa sociedade.

Organizadores
Prof. Dr. Charles Alexandre Souza Armada
Prof. Dr. Walter Barbieri Júnior
Escola de Ciências Jurídicas e Sociais
Universidade do Vale do Itajaí

9
MUDANÇAS CLIMÁTICAS E GÊNERO:
AS MULHERES COMO PRINCIPAIS VÍTIMAS

Ester Caroline Alves Pinto1


Danyelly Crystynna Palácio Sena2
Charles Alexandre Souza Armada3

INTRODUÇÃO

O meio ambiente vem sofrendo graves consequências que de-


correm, em sua maioria, das mudanças climáticas ao redor do mundo.
Independentemente de suas origens, os desastres ambientais estão im-
pactando a saúde e o bem-estar da vida humana e da vida terrestre.
Nos últimos anos os debates sobre mudanças climáticas e aque-
cimento global tem ganhado maior destaque nas pautas de discussões in-
ternacionais, sendo que é possível perceber um elevado grau de deserti-
ficação, desmatamento e de diminuição da biodiversidade planetária. Se
os níveis de mudanças climáticas continuarem a se intensificar, o dese-
quilíbrio ambiental que se formará, tem por princípio, alterar o modo de
vida de populações inteiras.
Desse modo, vale ressaltar que as mulheres sofrem graves con-
sequências ambientais devido ao aumento das mudanças no clima, com
a contaminação de doenças como dengue, malária, chikungunya, causa-
das pela degradação do meio ambiente. São elas também as que mais
facilmente sofrem perdas durante os acontecimentos ambientais catastró-
ficos. A justificativa para esse fato é que, em uma sociedade patriarcal,
as mulheres representam o sexo frágil. Nesse sentido, pode-se perceber
que nesta sociedade elas não ocupam lugares de importância nas decisões

1 Graduada em Relações Internacionais pela Universidade do Vale do Itajaí (UNI-


VALI). ester.caroline@hotmail.com
2 Graduada em Relações Internacionais pela Universidade do Vale do Itajaí (UNI-

VALI). danyelly_sena@hotmail.com.
3 Doutor em Direito pela Universidade de Alicante. Doutor em Ciência Jurídica pela

Universidade do Vale do Itajaí (UNIVALI). Docente nos cursos de graduação em


Direito, Relações Internacionais e Logística pela UNIVALI. Membro do Grupo de
Estudos “Sustentabilidade Ambiental e Políticas Públicas” e “Direito Ambiental,
Transnacionalidade e Sustentabilidade”, ambos registrados no CNPq. charlesar-
mada@hotmail.com.
ESTER CAROLINE ALVES PINTO, DANYELLY CRYSTYNNA PALÁCIO SENA E
CHARLES ALEXANDRE SOUZA ARMADA

referentes ao meio ambiente. Portanto, é possível visualizar a desigual-


dade de gênero até mesmo em assuntos relacionados ao meio ambiente.
As mulheres do campo costumam ver o meio ambiente como um
território com o qual se relacionam de forma integral, interdependente e
justa para garantir a sua sobrevivência e de seus familiares. No entanto,
os interesses que envolvem o meio ambiente, são decisões tomadas em
sua maioria pelas elites econômicas, culturais e políticas, que visam rea-
lizar os seus próprios desejos e necessidades. Consequentemente, não são
elas que definem e solucionam os problemas do meio ambiente que tam-
bém lhes pertence.
Sendo assim, o principal objetivo do presente artigo é demons-
trar como as mudanças climáticas impactam diretamente na vida das mu-
lheres. Atualmente, elas são consideradas as principais vítimas dos de-
sastres provocados por eventos climáticos extremos, como inundações e
furacões. O trabalho tem ainda o interesse de expor a necessidade cres-
cente das mulheres assumirem um papel de decisão em relação ao meio
ambiente do planeta terra.
Para cumprir o objetivo proposto, o artigo será estruturado em
três sessões. Na primeira sessão, será comentado sobre as mudanças cli-
máticas e seus impactos; a segunda sessão, tratará sobre como é a relação
entre as mulheres e as mudanças no clima; e, por fim, na terceira sessão,
serão expostas medidas que possam aumentar a atuação das mulheres em
assuntos relacionados ao meio ambiente.
O artigo foi produzido utilizando-se a metodologia indutiva,
através de levantamentos bibliográficos de artigos, livros e dados de or-
ganizações internacionais, referentes ao tema apresentado.

1 AS MUDANÇAS CLIMÁTICAS E OS IMPACTOS


DECORRENTES

As Mudanças Climáticas passaram a ser um tema recorrente


com o decorrer dos anos, tornando-se necessário aprofundar os estudos
sobre o seu real significado e importância. O autor Dubeux4, em sua tese
de doutorado, afirma que as primeiras pesquisas sobre os efeitos da ação
humana no clima remontam aos princípios do século XIX. E ainda traz
consigo alguns exemplos de pesquisadores como o físico francês Jean
Baptiste Joseph Fourier, que nos anos de 1824 a 1827, realizou pesquisas

4 DUBEUX, Rafael Ramalho. Regime Internacional em Formação para a Mudança


Climática. In: DUBEUX, Rafael Ramalho. Desenvolvimento e mudança climática:
estímulos à inovação em energia de baixo carbono em países de industrialização tardia
(1997-2014). Brasília: Universidade de Brasília, 2015. p. 41-42. Disponível em:
http://repositorio.unb.br/bitstream/10482/20231/1/2015_RafaelRamalhoDubeux.pdf.
Acesso em: 10 mar. 2019.

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MEIO AMBIENTE, MIGRAÇÕES E PANDEMIA: REFLEXÕES DO MUNDO CONTEMPORÂNEO

sobre a temperatura atmosférica e sugeriu pela primeira vez a existência


do termo “efeito estufa”. Da mesma forma, outro físico de origem britâ-
nica, John Tyndall, no início dos anos 1860, explicou a respeito da ab-
sorção da radiação infravermelha por determinados gases e sua forma de
compreensão a respeito do efeito estufa. Nos tempos mais atuais, depois
da Segunda Guerra Mundial, pesquisadores como Roger Revelle e Char-
les Keeling promoveram medições sobre concentrações atmosféricas de
dióxido de carbono.
A partir dos anos 1960 outras instituições de pesquisas, Organi-
zações Internacionais e governos começaram a prestar mais atenção no
tema, resultando assim na convocação da Conferência das Nações Uni-
das sobre o Meio Ambiente em 1972 em Estocolmo. Em 1988, surge o
Intergovernmental Panel on Climate Change (IPCC)5, derivado da per-
cepção de que as ações do ser humano pode exercer forte influência sobre
o clima do planeta e da existente necessidade de monitoramento. Sendo
assim, o IPCC é o órgão das Nações Unidas criado para avaliar a ciência
relacionada à mudança climática, portanto, ele fornece para os formula-
dores de políticas, avaliações e relatórios que falam a respeito do assunto,
suas implicações e possíveis riscos futuros, assim como propõem opções
de adaptações e mitigação. Alguns anos depois surgem dois marcos im-
portantes do regime internacional de mudança climática, sendo a Con-
venção Quadro das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas
(CQNUMC), de 1992, e o Protocolo de Quioto, de 1997 e finalmente o
Acordo de Paris, em 2015.
Os estudos sobre as mudanças climáticas sempre foram frequen-
tes, sendo assim, é necessário saber o que elas são e os seus impactos.
Inicialmente, é imprescindível compreender a diferença que existe entre
os termos “tempo” e “clima”, de acordo com a European Environment
Agency6, o termo “tempo” diz respeito a alterações locais do clima, den-
tro de períodos mais curtos, como minutos, horas, dias e semanas. En-
quanto o “clima” se refere a períodos a longo prazo, pode ser caracteri-
zado como regional ou global. Assim, o clima poder ser considerado uma
média do tempo ao longo das estações, anos ou décadas.
A partir da conceituação desses dois termos é possível dar pro-
gresso para o significado. As Mudanças Climáticas já são uma realidade
no cotidiano da população do mundo todo, assim como as consequências

5 BRASIL. Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Org). O que é? IPCC. 2007.


Disponível em: http://www.ipea.gov.br/desafios/index.php?option=com_con
tent&view=article&id=2134:catid=28&Itemid=23. Acesso em: 26 abr. 2019.
6 EUROPEAN ENVIRONMENT AGENCY. What is the relationship between cli-

mate change and weather? Disponível em: https://www.eea.europa.eu/themes/ cli-


mate/faq/what-is-the-relationship-between-climate-change-and-weather. Acesso
em: 09 mar. 2019.

13
ESTER CAROLINE ALVES PINTO, DANYELLY CRYSTYNNA PALÁCIO SENA E
CHARLES ALEXANDRE SOUZA ARMADA

geradas por ela. A World Wide Fund for Nature (WWF)7 diz que é resul-
tado da emissão excessiva de gases de efeito estufa, como por exemplo
o dióxido de carbono (CO2) e o metano (CH4), nas atividades como o
desmatamento, queima de combustíveis fósseis para a geração de energia
ou as práticas sem controle da agricultura e pecuária.
O IPCC\8 lista algum dos impactos que as mudanças climáticas
podem causar, como os ecossistemas perdendo a sua biodiversidade, os
seres humanos sendo diretamente afetados na área da saúde, por exem-
plo, pela proliferação de vetores de doenças, como os mosquitos. A mu-
dança climática nos lança um desafio de repensar os centros urbanos e a
mobilidade urbana, e a forma na qual realizamos nossas atividades in-
dustriais, além de afetar populações locais, obrigando-as a migrarem para
lugares mais seguros, longe de epidemias e desastres. Além disso, a mai-
oria dos cientistas entram em consenso ao declararem que a ampliação
do efeito estufa planetário, está diretamente relacionado ao aumento do
padrão de produção e ao consumo da sociedade moderna.
De acordo, com os autores Branco e Armada9, as mudanças cli-
máticas já demonstram uma ameaça e uma alteração nas condições de
vida da população mundial, levando em consideração as suas graves con-
sequências. Entre elas, é possível perceber as secas mais intensas que
vem atingindo a agricultura do planeta, o prolongamento de grandes en-
chentes e inundações, deslizamentos de terra e o aumento do nível do
mar.
As mudanças climáticas trazem impactos a todos, indistinta-
mente. Contudo algumas categorias tendem a ser especialmente afetadas
como, por exemplo, as mulheres. Desse modo, o Fundo de População das
Nações Unidas (Unfpa)10 lançou no ano de 2009 um relatório de nome

7 A WORLD WIDE FUND FOR NATURE (Org.). Causas das Mudanças Climá-
ticas. Disponível em: https://www.wwf.org.br/natureza_=brasileira/reducao_de_ im-
pactos2/clima/causas/. Acesso em: 10 mar. 2019.
8 IPCC, 2014: Climate Change 2014: Impacts, Adaptation, and Vulnerability.

Part A: Global and Sectoral Aspects. Contribution of Working Group II to the Fifth
Assessment Report of the Intergovernmental Panel on Climate Change [Field, C.B.,
V. R. Barros, D.J. Dokken, K.J. Mach, M.D. Mastrandrea, T.E. Bilir, M. Chatterjee,
K.L. Ebi, Y.O. Estrada, R.C. Genova, B. Girma, E.S. Kissel, A.N. Levy, S. Mac-
Cracken, P.R. Mastrandrea, and L.L.White (eds.)]. Cambridge University Press,
Cambridge, United Kingdom and New York, NY, USA, 1132 pp.
9 BRANCO, Mateus Gabriel; ARMADA, Charles Alexandre Souza. Desafios e pers-

pectivas para a justiça ambiental face à nova realidade das mudanças climáticas. Re-
bela, [s.l], v. 8, n.2. mai./ago. 2018. Disponível em: https://www.rebela. emnu-
vens.com. br/pc/article/viewFile/403/748 Acesso em: 19 mar. 2019.
10 UNITED NATIONS POPULATION FUND. Facing a changing world: women,

population and climate. Nova Iorque: United Nations, 2009. 96 p. Disponível em:
https://www.unfpa.org/sites/default/files/pub-pdf/state_of_world_population_2009.
pdf. Acesso em: 11 mar. 2019.

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MEIO AMBIENTE, MIGRAÇÕES E PANDEMIA: REFLEXÕES DO MUNDO CONTEMPORÂNEO

“Enfrentando um Mundo em Transição: Mulheres, População e Clima”


e afirma que entre os grupos sociais existentes as mulheres se encontram
em condições mais miseráveis – normalmente as que sobrevivem com
US$ 1 ou menos por dia – são as que sofrem as piores consequências das
mudanças climáticas.

2 AS MULHERES EM SITUAÇÃO DE VULNERABILIDADE

É possível perceber que a desigualdade de gênero está presente


até mesmo nos assuntos relacionadas ao meio ambiente. Isto porque, os
elevados índices de desertificação, desmatamento e de diminuição da bi-
odiversidade planetária, tem gerado como consequência intensas mudan-
ças climáticas que atingem mulheres em todo o mundo, as quais sofrem
perante as catástrofes ambientais que se formam, e pela discrepância
frente a questões socioeconômicas. As mulheres encontram desvanta-
gens em várias áreas da sociedade, como por exemplo, dificuldades para
acessarem recursos materiais e sociais, a falta de oportunidade para ocu-
parem cargos de comando, e ainda de tomarem decisões em assuntos que
afetam sua vida, como o próprio funcionamento do meio ambiente.
De acordo com a autora Astrid Ulloa (2014)11 ao aprofundar os
estudos em relação as temáticas de gênero e conhecimento climático é
possível perceber que diversos fatores que se correlacionam são coloca-
dos em pauta. Assim, continuamente debate-se temas como: a vulnerabi-
lidade da mulher perante os efeitos das mudanças climáticas ou, até
mesmo, a decadência econômica enfrentada por elas; a baixa participa-
ção das mulheres nas instituições ou nos cenários de tomada de decisão
e negociação diante da mudança climática e; a superioridade da ação
masculina nos espaços políticos e decisórios das mudanças climáticas.
Nesse sentido, é possível perceber que as mulheres vivem à margem das
mudanças climáticas, ocupando uma posição de mobilidade restrita pe-
rante o mal que lhes atinge.
Dados apresentados pela médica, antropóloga e membra do
IPCC Úrsula Oswald Spring, em entrevista concedida para Agência Fun-
dação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP)12, rela-
tam que as mulheres e meninas representam na atualidade 72% do total
de pessoas que vivem em situação de extrema pobreza no mundo. Em

11 ULLOA, Astrid. Diferencias de género y etnicidad em las políticas globales-naci-


onales-locales de cambio climática. Crítica y Emancipación. v. 6, n. 12, jul. 2014.
p. 227-294.
12 MULHERES SÃO mais vulneráveis aos impactos das mudanças climáticas glo-

bais. Agência FAPESP. [s.l], 06 set. 2012. Disponível em: http://agencia.fa


pesp.br/mulheres-sao-mais-vulneraveis-aos-impactos-das-mudancas-climaticas-glo
bais/16146/ Acesso em: 10 abr. 2019.

15
ESTER CAROLINE ALVES PINTO, DANYELLY CRYSTYNNA PALÁCIO SENA E
CHARLES ALEXANDRE SOUZA ARMADA

função disso, e em junção de vários outros fatores socioeconômicos e


culturais, as mulheres podem ser consideradas, na atualidade, as maiores
vítimas de eventos climático extremos, causados pelo aumento exacer-
bado das mudanças climáticas. A antropóloga ressalta a discriminação
como um dos principais fatores que marginalizam as mulheres perante as
questões do meio ambiente, isto porque, desenvolveu-se nos últimos
anos um sistema patriarcal. De acordo com este sistema excludente, per-
mitiu-se que hoje 1,2 mil homens comandem a metade de todo o planeta
e que as mulheres tivessem pouco poder de decisão e de veto em questões
que lhes afetam diretamente, como as mudanças climáticas.
Os efeitos das mudanças do clima na vida das mulheres podem
ser visualizados em diversos aspectos, por exemplo, elas são as mais pro-
pensas a serem expostas a doenças transmitidas por mosquitos, levando
em consideração suas atividades diárias, como coleta de água e colheita
de alimentos. Além disso, as temperaturas elevadas, combinadas com
maior umidade após as enchentes, aumentam a transmissão de doenças
como malária, dengue e Chikungunya. Sendo que as mulheres grávidas
correm o risco maior de contrair a malária, assim como as crianças. Vale
ressaltar ainda, que durante um surto de doenças transmitidas em sua re-
gião, são as mulheres que normalmente prestam cuidados aos seus filhos,
maridos e familiares próximos, o que também atinge sua produtividade
econômica13.
Portanto, além dos fatores expostos, e ainda de acordo com a
antropóloga e membra do IPCC, Úrsula Oswald Spring, em entrevista
concedida para a FAPESP14 é possível destacar que as mulheres foram
educadas, em sua maioria, para cuidar dos outros e, por isso, muitas ve-
zes, assumem o papel de “mãe de todos” em sua comunidade. Esse pro-
cesso, que pode ser chamado de teoria das representações sociais, tam-
bém as torna mais vulneráveis, porque possuem o papel de proteger pri-
meiramente os outros, para depois se preocuparem consigo mesmas. As
mulheres tendem a renunciar itens essenciais, como medicamento ou até
mesmo alimentos, para prestarem cuidado a sua família após o choque
de um desastre ambiental.

13 WORLDWIDE, CLIMATE change is worse news for women. The Conversation.


[s.l], 25 out. 2015. Environment+Energy. Disponível em: https://theconversa
tion.com/ worldwide-climate-change-is-worse-news-for-women-49668 Acesso em:
10 abr. 2019.
14 MULHERES SÃO mais vulneráveis aos impactos das mudanças climáticas glo-

bais. Agência FAPESP. [s.l], 06 set. 2012. Disponível em: http://agencia.fa


pesp.br/mulheres-sao-mais-vulneraveis-aos-impactos-das-mudancas-climaticas-glo
bais/16146/ Acesso em: 10 abr. 2019.

16
MEIO AMBIENTE, MIGRAÇÕES E PANDEMIA: REFLEXÕES DO MUNDO CONTEMPORÂNEO

Desse modo, vale salientar, de acordo com as autoras Suassuna


e Rabelo15, que os efeitos das mudanças climáticas são divergentes em
relação as mulheres e a realidade de injustiça climática faz com que elas
sofram, de maneira mais intensa, os efeitos dos desastres ambientais.
Sendo assim, é possível afirmar a maior vulnerabilidade que as mulheres
possuem frente as mudanças climáticas, levando em consideração a po-
sição de pobreza de muitas mulheres, que geram como consequência,
condições de saúde precárias e um elevado grau de discriminação que
acabam por cercar elas em várias sociedades do mundo. As autoras
Cynthia Suassuna e Josinês Rabelo, ainda expressam a realidade caótica
da vida das mulheres, após eventos ambientais catastróficos, ao afirma-
rem que16:

Com relação ao gênero, os desastres podem enfraquecer ainda


mais a posição das mulheres, já propensas a sofrer violência
masculina, física e sexual, que ocorrem geralmente após os
desastres. Existe um desequilíbrio em termos dos impactos das
catástrofes, que penalizam as populações mais pobres e des-
possuídas e, nesse contexto, as mulheres são as mais atingidas,
isso se deve por serem elas as responsáveis pela manutenção
da vida cotidiana e recaem sobre elas as tarefas da manutenção
da sobrevivência.

A desigualdade de gênero, nas questões de mudanças climáticas,


fica mais exposta ao verificar-se o fato que eventos climáticos extremos,
como furacões e terremotos, matam mais mulheres do que homens. Isto
porque, a sobrevivência perante a esses acontecimentos dependem, em
sua maioria, de circunstâncias sociais, como por exemplo, pobreza, res-
trições sociais, papéis na tomada de decisões, e até mesmo coisas básicas
como saber nadar. No entanto, mesmo que cheguem a um abrigo de
emergência, mulheres e meninas correm maior risco de violências

15 SUASSUNA, Cynthia; RABELO, Josinês. Vulnerabilidades e justiça ambiental no


contexto dos desastres decorrentes das mudanças climáticas: uma análise sobre a con-
dição das mulheres. In: CIRNE, Lúcio Flávio; CLAUDIO, Maria do Rozário; MON-
TEIRO, Valdênia Brito (Org.). Mulher, vulnerabilidade e justiça socioambiental.
Recife: Instituto Humanitas Unicap, 2017. p. 24-35.
16 SUASSUNA, Cynthia; RABELO, Josinês. Vulnerabilidades e justiça ambiental no

contexto dos desastres decorrentes das mudanças climáticas: uma análise sobre a con-
dição das mulheres. In: CIRNE, Lúcio Flávio; CLAUDIO, Maria do Rozário; MON-
TEIRO, Valdênia Brito (Org.). Mulher, vulnerabilidade e justiça socioambiental.
Recife: Instituto Humanitas Unicap, 2017. p. 24-35.

17
ESTER CAROLINE ALVES PINTO, DANYELLY CRYSTYNNA PALÁCIO SENA E
CHARLES ALEXANDRE SOUZA ARMADA

físicas17. Além disso, segundo as autoras Suassuna e Rabelo18, ao passar


por um desastre ambiental algumas mulheres podem necessitar de aten-
dimento médico rápido e exclusivo, quando se encontram em situação de
gestação ou lactação, ou até mesmo em proteção contra o elevado índice
de agressão e violência masculina que acontecem geralmente após o de-
sastre.
O ciclone Idai, que atingiu fortemente a região de Moçambique
na África, no mês de março de dois mil e dezenove, que produziu ventos
de até 200 quilômetros por hora, provocando a devastação de vilarejos
inteiros, causando mortes e isolando pessoas, é um exemplo recente que
demonstra a situação da mulher perante a um desastre ambiental. De
acordo com relatos noticiados no portal de notícias G119, durante a pas-
sagem do ciclone Idai, uma mãe deu à luz a sua filha em cima de uma
árvore no centro de Moçambique. A mulher relatou que estava em sua
casa com o outro filho, de apenas dois anos, quando foi surpreendida pela
chegada de uma enchente que invadiu a sua residência, a única solução
encontrada foi subir em cima de uma mangueira nas proximidades de sua
casa, e devido ao estresse ela começou a sentir as contrações do parto e,
ali mesmo, nasceu a bebê. A mulher se encontrava sozinha em cima da
árvore, sem nenhuma forma de socorro à vista. Esse era só o começo do
drama familiar, já que o nível da água demorou para descer e a mulher
teve que permanecer em cima da árvore por dois dias, até conseguir a
ajuda de vizinhos que levaram ela e seus filhos para um local seguro.
Vale destacar que a perspectiva de gênero não é evidente nas
políticas de mudança climática, isto porque, não são mencionadas dife-
renças entre homens e mulheres e suas relações com a natureza. Além
disso, existe a ideia equivocada de que como o problema ambiental é de
natureza global, ele afeta todo o planeta igualmente. De fato, os estudos
sobre mudanças climáticas fornecem um sentido de população homogê-
nea, em que as diferenças de gênero, classe ou etnia não contam para a
inclusão, mas, por outro lado, existe um favorecimento a uma perspectiva

17 WORLDWIDE, CLIMATE change is worse news for women. The Conversation.


[s.l], 25 out. 2015. Environment+Energy. Disponível em: https://theconver sa-
tion.com/ worldwide-climate-change-is-worse-news-for-women-49668 Acesso em:
10 abr. 2019.
18 SUASSUNA, Cynthia; RABELO, Josinês. Vulnerabilidades e justiça ambiental no

contexto dos desastres decorrentes das mudanças climáticas: uma análise sobre a con-
dição das mulheres. In: CIRNE, Lúcio Flávio; CLAUDIO, Maria do Rozário; MON-
TEIRO, Valdênia Brito (Org.). Mulher, vulnerabilidade e justiça socioambiental.
Recife: Instituto Humanitas Unicap, 2017. p. 24-35.
19 MÃE DÁ à luz bebê em cima de uma árvore durante passagem do ciclone Idai em

Moçambique. G1, [s.l], 05 abr. 2019. Mundo. Disponível em: <https://g1.globo.


com/mundo/noticia/2019/04/05/mae-da-a-luz-bebe-em-cima-de-uma-arvore-duran
te-passa gem-do-ciclone-idai-em-mocambique.ghtml>. Acesso em: 10 abr. 2019

18
MEIO AMBIENTE, MIGRAÇÕES E PANDEMIA: REFLEXÕES DO MUNDO CONTEMPORÂNEO

parcial em ambientes e espaços em que a tomada de decisão se concentra


nos ideais masculinos20.
Assim, os problemas ambientais são, em sua maioria, definidos
como sendo de “todos”, o que acaba por excluir as diferenças na forma
pela qual as pessoas e a coletividade pensam e agem em relação ao meio
ambiente. O “todo” coloca as mulheres em posição de vítimas universais,
eliminando as diferenças ideológicas, sociais e de interesses delas21.
Desta forma, os interesses que envolvem o meio ambiente, são decisões
tomadas pelas elites econômicas, culturais e políticas, que visam realizar
os seus próprios desejos e necessidades. No entanto, é possível perceber
que as mulheres são vítimas reais das mudanças climáticas e da degrada-
ção ambiental, e que estas devem ter voz em movimentos que busquem
restaurar e estabilizar o meio ambiente, ao qual elas também pertencem,
vivem e reproduzem.
Por fim, com base nos fatores críticos ligados as questões de gê-
nero e mudanças climáticas, diversas abordagens têm sido desenvolvi-
das, as quais visam superar estereótipos ou inclusões mecânicas das mu-
lheres, com o objetivo de compensar as desigualdades de gênero. As crí-
ticas à perspectiva de gênero e às mudanças climáticas sugerem que os
estudos e as análises de gênero devem se aprofundar em processos mais
complexos que transcendam a relação específica de uma política ambi-
ental e critiquem a própria forma de produzir conhecimento. Assim, na
produção de conhecimento ambiental é necessário denunciar a discre-
pante desigualdade que existe entre homens e mulheres. Nesse sentido,
as representações, associações, discursos e a geração de políticas em
torno das mudanças climáticas devem ser analisadas com intuito de en-
tender como ocorrem as relações de gênero associas com o conheci-
mento, o poder e a política22.

3 CONTORNANDO A SITUAÇÃO: AS MULHERES ASSU-


MINDO PAPEL DE LIDERANÇA

20 ULLOA, Astrid. Diferencias de género y etnicidad en las políticas globales-nacio-


nales-locales de cambio climática. Crítica y Emancipación. v. 6, n. 12, jul. 2014. p.
227-294.
21 ULLOA, Astrid. Diferencias de género y etnicidad em las políticas globales-na-

cionales-locales de cambio climática. Crítica y Emancipación. Vol. 12, segundo


semestre de 2014. p. 227-294. apud JOANA EMMERICK (Rio de Janeiro) (Org.).
Mulheres e Conflitos Ambientais: Nem Nossos Corpos Nem Nossos Territórios da
Invisibilidade a Resistência. Rio de Janeiro: Instituto Políticas Alternativas para O
Cone Sul, 2017.
22 ULLOA, Astrid. Diferencias de género y etnicidad em las políticas globales-na-

cionales-locales de cambio climática. Crítica y Emancipación. v. 6, n. 12, jul. 2014.


p. 227-294.

19
ESTER CAROLINE ALVES PINTO, DANYELLY CRYSTYNNA PALÁCIO SENA E
CHARLES ALEXANDRE SOUZA ARMADA

A relação entre a mulher e a natureza não é atual. Ao longo da


história da humanidade esta ligação é visível. Porém, é de extrema im-
portância reconhecer que a forma desta interação é fruto dos vínculos
sociais estabelecidos pelas relações de gênero23. Para Valdilene Monteiro
Rosa24, esta conexão é socialmente construída e se diferencia de acordo
com as posições econômicas e sociais em que a mulheres se encontram,
e acabam sendo refletidas em vários âmbitos domésticos e públicos. O
empoderamento das mulheres para tratar sobre os assuntos das mudanças
climáticas e a sua relação com Organizações não-Governamentais
(ONGs), Organizações Internacionais (OIs) e novas políticas públicas e
internacionais podem ajudar a diminuir o impacto destas mudanças em
nossa sociedade.
O cenário acadêmico, os movimentos feministas, órgãos e me-
canismos internacionais têm destacado que a mulher tem assumido pa-
péis multifacetados de destaque. A Organização das Nações Unidas
(ONU), em diversos documentos destaca o papel da mulher na adminis-
tração dos recursos naturais, enquanto protagonista relevante e ativa de
ações a níveis locais, regionais e globais. No ano de 1992 aconteceu na
cidade do Rio de Janeiro a ECO-9225 que reuniu legisladores, diplomatas,
cientistas, a mídia e representantes de ONGs de 179 países, num esforço
em conjunto para reconciliar as interações entre o desenvolvimento do
ser humano e o meio ambiente.
Como resultado foi criado a Agenda 2126, um documento assi-
nado nesta conferência que pode ser definido como um plano de ação
formulado a nível internacional, para ser adotado a escala mundial pelas
organizações do sistema das Nações Unidas, pelos governos e pela soci-
edade civil, em todos os meios em que a ação do ser humano que vai

23 JACOBI, Pedro Roberto; EMPINOTTI, Vanessa; TOLEDO, Renata Ferraz de.


Gênero e meio ambiente. Ambient. soc., São Paulo, v. 18, n. 1, Mar. 2015. Disponí-
vel em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1414753X2015
0001000 01& lng=en&nrm=is. Acesso em: 13 abr.2019
24 ROSA, Valdilene Monteiro et al. Educação ambiental: o papel das mulheres na

preservação do ambiente. Natural Resources, [s.l.], v. 6, n. 1, p. 18-26, 16 ago. 2017.


Escola Superior de Sustentabilidade. Disponível em: https://www.research
gate.net/publication/319468546_Educacao_ambiental_o_papel_das_mulheres_na_
preservacao_do_ambiente. Acesso em: 13 abr. 2019.
25 BRASIL. Senado Federal. Conferência Rio-92 sobre o meio ambiente do pla-

neta: desenvolvimento sustentável dos países. Disponível em: http://www. se-


nado.gov.br/noticias/Jornal/emdiscussao/rio20/a-rio20/conferencia-rio-92-sobre-o-
meio-ambien te-do-planeta-desenvolvimento-sustentavel-dos-paises.aspx. Acesso
em: 14 abr. 2019.
26 GOVERNO DO PARANÁ. Secretária do Meio Ambiente e Recursos Hídricos. O

que é Agenda 21. Disponível em: http://www.meioambiente.pr.gov.br/modules/


conteu do/conteudo.php?conteudo=25. Acesso em: 13 abr. 2019.

20
MEIO AMBIENTE, MIGRAÇÕES E PANDEMIA: REFLEXÕES DO MUNDO CONTEMPORÂNEO

repercutir no meio ambiente. Refletindo assim, em um consenso mundial


e compromisso político, constituindo um diálogo permanente e constru-
tivo inspirado na necessidade de atingir uma economia a nível mundial
mais eficiente e equitativa27. De acordo com a autora Nilza Araci28 mais
especificamente, no capítulo 24, reúne-se um conjunto de recomenda-
ções, mecanismos e metas para integrar as mulheres e a questão de gê-
nero em todos os níveis de governo e nas atividades correlatas de todas
as agências da ONU.
Ainda conforme Nilza Araci29 em sua parte do livro ela comenta
que o Planeta Fêmea, organizado pela Coalizão de Mulheres Brasileira
ocupou um espaço significativo nos debates sobre o meio ambiente e de-
senvolvimento no Fórum Social de ONGs, evento paralelo ao Rio-92.
Durante doze dias, mulheres do mundo todo discutiram os problemas vi-
vidos no planeta, formularam e assim adotaram sua própria plataforma
chamada de Agenda 21 de Ação das Mulheres, que tratou de temas como
governança, militarismo, globalização, pobreza, direitos da terra, segu-
rança alimentar, direitos das mulheres, direitos reprodutivos, ciência e
tecnologia e educação. Em suas recomendações incluíam novas formas
de educação, preservação de recursos naturais e participação no planeja-
mento de uma economia sustentável.
Esta mobilização das mulheres abriu espaço para sua participa-
ção em todas as conferências da ONU. Ao longo da última década, as
relações de gênero foram definitivamente incorporadas nas agendas na-
cionais e internacionais, e têm sido fundamentais na construção da visão
de sustentabilidade entre sociedade e meio ambiente. A mobilização das
mulheres a partir da ECO-92 consolidou uma visão de que feminismo e
ecologia estavam diretamente ligados, uma vez que ambos propunham
profundas mudanças na ordem natural, baseadas na justiça social30.

27 COMPÊNDIO PARA A SUSTENTABILIDADE. Agenda 21. Disponível em:


http://www.institutoatkwhh.org.br/compendio/?q=node/21. Acesso em: 30 maio
2019.
28 NILZA ARACI. Gênero e Meio ambiente: Qual a sustentabilidade possível? In:

CASTRO, Mary Garcia; ABRAMOVAY, Miriam. Gênero e Meio ambiente. 2. ed.


Brasília: Cortez Editora, 2005. p. 11-17. Disponível em: https://unesdoc.unesco.
org/ark:/48223/ pf0000112083. Acesso em: 13 abr. 2019.
29 NILZA ARACI. Gênero e Meio ambiente: Qual a sustentabilidade possível? In:

CASTRO, Mary Garcia; ABRAMOVAY, Miriam. Gênero e Meio ambiente. 2. ed.


Brasília: Cortez Editora, 2005. p. 11-17. Disponível em: https://unesdoc.unesco.
org/ark:/48223/ pf0000112083. Acesso em: 13 abr. 2019.
30 NILZA ARACI. Gênero e Meio ambiente: Qual a sustentabilidade possível? In:

CASTRO, Mary Garcia; ABRAMOVAY, Miriam. Gênero e Meio ambiente. 2. ed.


Brasília: Cortez Editora, 2005. p. 11-17. Disponível em: https://unesdoc.unesco.
org/ark:/48223/ pf0000112083. Acesso em: 13 abr. 2019.

21
ESTER CAROLINE ALVES PINTO, DANYELLY CRYSTYNNA PALÁCIO SENA E
CHARLES ALEXANDRE SOUZA ARMADA

Desta forma, a mulher possui uma função fundamental na con-


servação dos recursos ambientais e naturais, no contexto dos avanços ne-
cessário para políticas que sejam mais sustentáveis, devido as lógicas que
prevalecem em nossa sociedade atual onde o consumo é desenfreado,
elas podem indicar ações nas quais prevaleçam propostas alternativas de
um consumo mais sustentável e de redução do desperdício. Em muitas
conferências sobre o meio ambiente elas assumem um papel de protago-
nismo e introduzem o debate sobre o poder de participação no processo
de tomada de decisões.
A partir da Convenção Quadro das Nações Unidas sobre Mu-
danças Climáticas (CQNUMC), a plataforma chamada Mulher e Gênero
Constituinte31, onde organizações observadoras trabalham em conjunto
para garantir os direitos das mulheres e justiça de gênero no âmbito da
CQNUMC. Fornecendo uma série de maneiras para a sociedade civil e
as organizações não governamentais que trabalham pelos direitos das
mulheres e justiça de gênero, proteção ambiental, ou ambos, para influ-
enciar as conferências anuais e ajudar a desenvolver a CQNUMC. Isto
faz com que as mulheres possuam uma pequena parcela de participação
em lugares que não conseguiriam ter acesso antes.
A ascensão de movimentos e organizações de empoderamento
feminino que são relacionadas as mudanças climáticas, tem feito com
que as mulheres tomem a posição de liderança, um exemplo é a WECAN
(Earth Action and Climate Action Network)32, foi fundada em 2013, ori-
ginada inicialmente no Encontro Internacional da Mulher e do Clima,
que reuniu mais de 100 mulheres líderes do mundo todo para levantar
suas vozes, unir e colaborar para construírem soluções para a diminuição
das mudanças climáticas. Observando a necessidade de um mecanismo
de longo prazo, diversificado e descentralizado para a organização da
justiça climática ficou clara a necessidade da WECAN.
A organização é baseada em soluções para integrar e engajar
mulheres em todo o mundo na defesa de políticas, projetos locais, ações
diretas, treinamentos e construção de movimento para a justiça climática
global. E desde então tem realizado treinamentos online33 para capacitar
mulheres em temas diversos como “Mulheres para solos: solos saudá-
veis, agricultura restauradora de pequena escala e sequestro de car-
bono”,” Somos todas irmãs solares: mulheres por 100% de energia

31 WOMEN & GENDER CONSTITUENCY. Our background. Disponível em:


http:// womengenderclimate.org/our-background/. Acesso em: 14 abr. 2019.
32 EARTH ACTION AND CLIMATE ACTION NETWORK (Org.). About The

Women’s Earth & Climate Action Network (WECAN) International. Disponível


em: https://www.wecaninternational.org/about. Acesso em: 14 abr. 2019.
33 EARTH ACTION AND CLIMATE ACTION NETWORK (Org). Online Train-

ings & Network-Wide Organizing Calls. Disponível em: https://www.weca ninter-


national. org/online-trainings-network-calls. Acesso em: 14 abr. 2019.

22
MEIO AMBIENTE, MIGRAÇÕES E PANDEMIA: REFLEXÕES DO MUNDO CONTEMPORÂNEO

renovável”, entre outros. E marchas em defesa ao meio ambiente e contra


as mudanças climáticas e o consumo desenfreado.
Outra plataforma que existe é a United Nations Environment
Programme (UN Environment), é a principal autoridade ambiental global
que define a agenda ambiental do mundo, promovendo a implementação
coerente da dimensão ambiental do desenvolvimento sustentável dentro
do sistema das Nações Unidas e serve como um defensor autorizado do
meio ambiente a nível mundial. A missão é fornecer liderança e incenti-
var parcerias no cuidado com o meio ambiente, inspirando e capacitando
nações e povos a melhorar a sua qualidade de vida sem comprometer as
próximas gerações.
Para exemplificar de maneira clara que as mulheres podem as-
sumir papéis de liderança a UN Environment34, publicou uma história
com o título “Empowering women means taking a stand for environmen-
tal rights” (Capacitar as mulheres significa tomar posição pelos direitos
ambientais), onde uma tribo pastoril indígena chamada Samburu, locali-
zada nas vastas regiões semiáridas e áridas do norte do Quênia, enfrenta
muito dos mesmos desafios que outras comunidades indígenas em todo
mundo. Elas têm poucas oportunidades de influenciar ou gerenciar ativi-
dades que afetem os seus ambientes, e informações insuficientes e a falta
de compreensão dos seus direitos. Porém as mulheres desta comunidade
específica têm maiores dificuldades para superá-los. Quando se trata da
administração da terra e da pecuária, as mulheres Samburu tem pouco
poder: elas não possuem propriedade e são excluídas das reuniões comu-
nitárias. Elas estão inseridas nas estatísticas das milhões de mulheres que
produzem entre 60 e 80 por cento dos alimentos nos países em desenvol-
vimento, mas possuem apenas 2 por cento das terras.
Para resolver este problema, o Samburu Women’s Trust permitiu
que as mulheres da comunidade participem na tomada de decisões e in-
fluenciem políticas que afetam a comunidade Samburu. O treinamento
permite que eles entendam e defendam melhor seus direitos e protejam
os interesses econômicos, sociais e culturais da comunidade. Eles forne-
cem às mulheres, alfabetizadas e analfabetas, informações sobre seus di-
reitos constitucionais e permite que compartilhem suas opiniões com o
governo. Graças a todo esse trabalho, as mulheres Samburu estão agora
exercendo seus direitos sobre a terra. Desta forma a publicação termina
dizendo que:
Este estudo de caso é um exemplo interessante de como a de-
fesa de uma comunidade e os direitos das mulheres podem,
simultaneamente, ajudar a cumprir os direitos ambientais. A

34 UNITED NATIONS ENVIRONMENT PROGRAMME (Org.). Empowering


women means taking a stand for environmental rights. 2019. Disponível em:
https: //www.unenvironment.org/news-and-stories/story/empowering-women-me
ans-taking-stand-environmental-rights. Acesso em: 14 abr. 2019.

23
ESTER CAROLINE ALVES PINTO, DANYELLY CRYSTYNNA PALÁCIO SENA E
CHARLES ALEXANDRE SOUZA ARMADA

tribo Samburu está atualmente defendendo direitos ambientais


como direitos de acesso à informação e recursos naturais, par-
ticipação pública e direitos comunitários. Embora isso seja di-
fícil, confuso e perigoso, tem havido sucesso: as mulheres ga-
nharam a posse da terra e dos meios de subsistência e há mais
influência feminina no manejo dos recursos naturais de Sam-
buru35.

Este fato demonstra que mesmo a mulher sendo um grupo vul-


nerável às mudanças climáticas e impactos ambientais, elas podem aju-
dar a diminuir o impacto sobre a sociedade, assim como, assumindo pa-
péis de autoridade e demostrando que elas não são o “sexo frágil”.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

As mudanças climáticas têm atingindo em cheio o meio ambi-


ente. Assim, é possível perceber a influência que essas mudanças vêm
causando na produção de alimentos, isto é, diminuindo as áreas agricul-
táveis em razão da intensificação de secas, enchentes e outros eventos.
Além disso, as mudanças no clima estão sendo responsáveis por várias
situações ambientais caóticas, como por exemplo, terremotos, furacões e
ciclones que assolam a vida de diversas pessoas no mundo.
Nesse sentido, as mulheres se encontram em um contexto de
maior vulnerabilidade perante as mudanças climáticas, ou seja, é possível
perceber a marginalização das mulheres em relação a degradação ambi-
ental que lhes cercam. Isto porque, elas possuem dificuldades em assu-
mirem papéis de decisão sobre temas que afetam a sua vida, como por
exemplo, as questões ambientais. A falta de representatividade das mu-
lheres na política, é um dos fatores que lhes colocam a margem das mu-
danças climáticas, sendo que muitas das definições relacionadas ao meio
ambiente saem dessa área. Existe uma expressa desigualdade de gênero
nesse quesito, sendo que os programas de responsabilidade ambiental, e
a própria lógica da conservação estão baseados em ideias patriarcais.

35 Tradução livre dos autores: “This case study is an interesting example of how de-
fending a community and women’s rights can simultaneously help to fulfill environ-
mental rights. The Samburu tribe is currently advocating for environmental rights
such as rights of access to information and natural resources, public participation as
well as community rights. Though achieving this is difficult, confusing and danger-
ous, there has been success: women have gained ownership over land and livelihoods
and there is more female influence in Samburu natural resource management.”
UNITED NATIONS ENVIRONMENT PROGRAMME (Org.). Empowering
women means taking a stand for environmental rights. 2019. Disponível em:
https://www.unenvironment. org/news-and-stories/story/empowering-women-means-
taking-stand-enviromental-rights. Acesso em: 14 abr. 2019.

24
MEIO AMBIENTE, MIGRAÇÕES E PANDEMIA: REFLEXÕES DO MUNDO CONTEMPORÂNEO

Entretanto, foi possível perceber, com a pesquisa realizada nesse


trabalho, que novos caminhos já começaram a ser trilhados, os quais re-
velam um novo sentido para a relação que a mulher deve ter com o meio
ambiente. Nesse novo trajeto, as mulheres vêm participando de projetos
de desenvolvimento que definem ações perante as mudanças climáticas,
e uma forte presença delas em movimentos e lutas relacionados à proble-
mática ambiental. Esse novo engajamento revela que quando as mulheres
atuam na mobilização política, lideram, organizam ou participam das to-
madas de decisão relacionadas ao meio ambiente, e consequentemente as
mudanças no clima, elas estão redefinindo sua posição social e desafi-
ando as estruturas de dominação.
Portanto, a intenção do presente trabalho é demonstrar a neces-
sidade crescente de as que mulheres assumam um papel de decisão em
relação ao meio ambiente do planeta terra e, consequentemente, sobre as
mudanças climáticas e os seus impactos. Para cumprir esse propósito elas
devem criar projetos de desenvolvimento ambiental, nos quais busquem,
incansavelmente, defender a preservação dos seus ecossistemas, a sua
integridade física de suas famílias e o respeito às suas culturas.

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CHARLES ALEXANDRE SOUZA ARMADA

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28
ESTUDO COMPARATIVO SOBRE O MEIO AMBIENTE
NA POLÍTICA EXTERNA BRASILEIRA:
GOVERNO LULA E GOVERNO BOLSONARO

Giovani Peixer Dada1


Charles Alexandre Souza Armada2

INTRODUÇÃO

O Brasil é um país com abundância de recursos hídricos, natu-


rais, minerais, energéticos, vegetais, animais, dentre outros. De acordo
com dados do Ministério do Meio Ambiente (MMA, 2020), o País con-
tém a maior diversidade de espécies do mundo. São mais de 103.870 es-
pécies animais e 43.020 espécies vegetais catalogadas em seus seis bio-
mas terrestres e nos três grandes ecossistemas marinhos, o que representa
aproximadamente 20% de todas as espécies existentes no mundo. Além
disso, o Brasil também figura na lista dos dezessete países megadiversos
do World Conservation Monitoring Center (2017), da Organização das
Nações Unidas (ONU).
Dentro deste contexto, pode-se concluir que o meio ambiente
configura uma variável importante e estratégica para o Brasil e isso se
reflete também na formulação de sua política externa desde os anos 1970,
como observado por Bezerra (2013). O objetivo central deste artigo é
realizar uma análise comparativa sobre a presença do meio ambiente em
dois momentos contemporâneos e ao mesmo tempo distintos da política
externa brasileira: o governo Luiz Inácio Lula da Silva (2003-2010) e o
governo Jair Messias Bolsonaro (2019-presente).
O presente artigo foi desenvolvido com base no método indu-
tivo, amparado pelas técnicas de pesquisa bibliográfica, fichamento e re-
ferente e está dividido em três partes. Na primeira parte será realizada
uma retrospectiva histórica da presença do meio ambiente na política ex-
terna brasileira, dos anos 1970 até o começo do século XXI, com o intuito
de entender como o tema foi historicamente tratado. A segunda parte do

1 Pós-graduando em Relações Internacionais pela Universidade do Vale do Itajaí –


UNIVALI.
2 Doutor em Ciências Jurídicas pela Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI e

Doutor em Direito pela Universidade de Alicante, Espanha.


GIOVANI PEIXER DADA E CHARLES ALEXANDRE SOUZA ARMADA

artigo é destinada ao governo de Luís Inácio Lula da Silva (2003-2010).


Na terceira e última parte o foco dirige-se ao atual estado do meio ambi-
ente na política externa do Brasil, representado pelo governo de Jair Mes-
sias Bolsonaro (2019-presente).
Antes de adentrar no desenvolvimento do estudo, algumas con-
siderações precisam ser feitas. Primeiramente, é preciso atentar que a
comparação a ser feita leva em consideração um governo que já terminou
(Lula) e outro que está em curso (Bolsonaro). Portanto, é possível obser-
var uma fundamentação teórica mais bem desenvolvida e consolidada do
primeiro em relação ao segundo. Para analisar a presença do meio ambi-
ente na política externa de ambos os governos comparados contou-se
com o suporte de notícias de jornais e revistas.
Também é preciso atentar para as formas pelas quais o meio am-
biente aparece na política externa dos dois governos enquanto instru-
mento passível de análise e consequente comparação. Por não ser um
assunto tradicional das Relações Internacionais, o meio ambiente obser-
vou uma entrada paulatina na diplomacia brasileira e esta aconteceu por
diversos meios, tradicionais das Relações Internacionais ou não.
Para este trabalho foram considerados dois meios tradicionais de
inserção a presença do meio ambiente na política externa: i) participação
do Brasil em conferências internacionais multilaterais sobre o tema e ii)
realização de acordos bilaterais e tratados internacionais assinados e ra-
tificados pelo Brasil nos quais o meio ambiente está presente no escopo
principal. Como meios não tradicionais, foram levadas em consideração
também as ações domésticas realizadas pelos governos estudados e como
essas impactaram a política externa, a imagem e o posicionamento inter-
nacional do Brasil em relação ao meio ambiente.
Este trabalho considera também que a política externa enquanto
fenômeno observável não acontece de forma isolada. É fruto não so-
mente da vontade dos seus tomadores de decisão, mas, como será visto
adiante, também do contexto histórico, econômico, político e social no
qual está inserida. Portanto, entender como o meio ambiente apareceu e
foi tratado na política externa brasileira é essencial para entender qual
seu papel na diplomacia dos governos estudados. A seguir, começaremos
a exposição do antecedente histórico da presença do meio ambiente na
política externa brasileira: a participação brasileira nas três grandes con-
ferências ambientais internacionais.

1. ANTECEDENTE HISTÓRICO: O BRASIL NAS


CONFERÊNCIAS AMBIENTAIS INTERNACIONAIS

A governança ambiental global tem como seu marco histórico


inicial a realização da Conferência das Nações Unidas para o Meio

30
MEIO AMBIENTE, MIGRAÇÕES E PANDEMIA: REFLEXÕES DO MUNDO CONTEMPORÂNEO

Ambiente Humano, realizada em Estocolmo (Suécia) no ano de 1972. A


referida Conferência representa a primeira grande reunião de países de-
senvolvidos e em desenvolvimento que, sob a égide da ONU, tinham
como objetivo discutir a temática ambiental, com foco em seu impacto
na agenda econômica (SILVA, 2011).
Duas grandes teses, opostas entre si, foram discutidas na Confe-
rência. A primeira delas, elaborada pelos países desenvolvidos, versava
sobre a proteção e conservação do meio ambiente e uma releitura do con-
ceito de crescimento econômico, com a inclusão da variável ambiental
nas agendas econômicas. A segunda, defendida pelos países em desen-
volvimento liderados pelo Brasil, propunha um modelo de crescimento
econômico eficaz, ainda que às custas do meio ambiente (LAGO, 2006).
Pensar o primeiro posicionamento da política externa brasileira
em relação ao meio ambiente com um olhar atual pode levar a uma con-
clusão que beira a incredulidade. Mas, se a análise levar em consideração
o contexto no qual foi feito, pode-se observar consistência e denúncia no
argumento do Brasil e demais países em desenvolvimento na Conferên-
cia de Estocolmo.
Há por trás dele a exposição de um olhar desigual do tema por
parte dos países desenvolvidos que desde a Revolução Industrial sempre
exploraram o meio ambiente para fins econômicos. Por sua vez, os países
em desenvolvimento tiveram um processo de industrialização que ocor-
reu tardiamente e em 1972 muitos deles – como era o caso do Brasil –
estavam atingindo taxas de crescimento econômico grandes demais para,
em sua ótica, colocar empecilhos que pudessem causar algum tipo de
freio à pujança.
Vinte anos depois, quando da realização da Conferência das Na-
ções Unidas sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento (ou Rio-92), o
posicionamento da política externa brasileira em relação ao tema refletiu
e acompanhou os movimentos domésticos e internacionais relativos a
pauta ambiental. Para o Brasil, a Conferência serviu como um divisor de
águas na percepção brasileira sobre o tema e isso se deu por dois motivos:
i) a abertura política vivida pelo país durante a metade da década de 1980,
que propiciou o retorno da liberdade de expressão e ii) o aumento da
participação da sociedade civil no debate de assuntos que a afetava
(CRESPO, 2003).
O cenário internacional quando da realização da Rio-92 demons-
trava rupturas consideráveis nos países centrais e periféricos em relação
ao meio ambiente. Três delas são notáveis: i) o fim da Guerra Fria, com
a queda do Muro de Berlim, a dissolução da URSS, o fim do mundo bi-
polar e a vitória, ainda que temporária, dos Estados Unidos e dos valores
ocidentais e liberais, ii) a crise da dívida, que atingiu em cheio os países
da periferia do capitalismo e iii) a desconcentração ocorrida em torno de
temas como segurança e globalização (NASCIMENTO, 2014)

31
GIOVANI PEIXER DADA E CHARLES ALEXANDRE SOUZA ARMADA

O posicionamento brasileiro na Rio-92, bem como em Esto-


colmo-72, foi de liderança dos países em desenvolvimento. Esta lide-
rança foi fundamental para conseguir incluir a pauta do desenvolvimento.
O Brasil argumentou que os problemas ambientais do grupo de países do
qual fazia parte originavam-se da falta de desenvolvimento econômico e
social. Para esses países, as duas discussões: preservação ambiental e de-
senvolvimento econômico eram debates que não podiam ser feitos de
forma isolada (COELHO e SANTOS, 2015).
A Rio-92 também teve um outro aspecto importante para análise
da presença do meio ambiente na política externa brasileira: serviu como
o evento que aconteceu na hora certa para tentar melhorar a imagem do-
méstica e internacional do País em relação ao tratamento do tema nos
dois âmbitos. Funcionou como uma resposta da diplomacia brasileira às
pressões e ameaças internacionais sofridas até então (BEZERRA, 2013).
A maior conquista da Rio-92 foi a Agenda 21, que dispunha so-
bre um conceito potencializado na Conferência, o de desenvolvimento
sustentável. Este conceito foi fruto de debates entre países desenvolvidos
e em desenvolvimento nos quais foram considerados os interesses desses
países na formulação de uma agenda que equilibrasse duas variáveis bas-
tante caras para os dois grupos de nações: a preocupação com o meio
ambiente a questão do desenvolvimento econômico. A preocupação do
terceiro mundo com a não separação dos dois debates foi alcançada
(NASCIMENTO, 2014).
O último evento internacional relativo ao meio ambiente antes
de chegarmos aos governos que servem como objeto de estudo deste ar-
tigo (Lula e Bolsonaro) aconteceu dez anos após a Rio-92, na cidade de
Joanesburgo (África do Sul). A Cúpula Mundial sobre Desenvolvimento
Sustentável teve como objetivo revisar o progresso obtido na década que
seguiu a Cúpula da Terra. E este, como observou o então Secretário-Ge-
ral das Nações Unidas, Kofi Annan, era lento3.
A animosidade de 1992 foi substituída por uma imensa dificul-
dade em colocar os princípios da Agenda 21 em prática, além da falta de
vontade política. Fora isso, os atentados do 11 de setembro de 2001 em
Nova York e seus desdobramentos deslocaram o foco do debate na polí-
tica internacional para a segurança, o que fez com que sobrasse pouco
espaço para discutir desenvolvimento sustentável. Contudo, a Cúpula
aconteceu e rendeu frutos (LAGO, 2006).
A maior tese defendida pelo Brasil e demais países em desen-
volvimento foi o apoio incondicional ao Protocolo de Quioto (1997).
Cresce, nesta Cúpula, a participação de entidades não estatais – iniciada

3 “...o registro da década desde a Cúpula da Terra é principalmente uma demonstração

de progresso penosamente lento e de uma crise ambiental que se aprofunda” – tradu-


ção feita por Lago (2006, p. 87).

32
MEIO AMBIENTE, MIGRAÇÕES E PANDEMIA: REFLEXÕES DO MUNDO CONTEMPORÂNEO

no Rio. ONGs ambientais, setores privados e governos nacionais criaram


parcerias para o desenvolvimento sustentável e estas parcerias foram
consideradas o maior logro de Joanesburgo (LAGO, 2006).

2. O MEIO AMBIENTE NA POLÍTICA EXTERNA DO GO-


VERNO LULA

Levando em consideração os antecedentes históricos expostos


na seção anterior, pode-se concluir que quando Lula tomou posse em
2003 o meio ambiente não era apenas uma temática importante e rele-
vante para a política externa brasileira do ponto de vista humanitário, mas
também do ponto de vista estratégico.
Nesta seção será analisada a presença do meio ambiente na po-
lítica externa brasileira durante o governo de Luís Inácio Lula da Silva
(2003-2010). A seção está estruturada da seguinte maneira: primeira-
mente foi feita uma caracterização geral da política externa de Lula para
que se possa ter alguma noção de quais eram seus objetivos e como o
meio ambiente foi inserido nela.
De acordo com pesquisa do Ibope (BONIN, 2010), Lula termi-
nou seu governo em 2010 como um dos líderes políticos mais populares
do Brasil e da América Latina. Sua aprovação ao deixar a Presidência era
de 87%, o que foi considerado um recorde. E essa boa imagem também
se refletiu no cenário internacional. Sua política externa foi cunhada por
seu Ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim como “ativa e al-
tiva”.
Em linhas gerais, a política externa do governo Lula foi marcada
pela tentativa de inserção internacional do país, pela defesa dos Direitos
Humanos e condenação do terrorismo – uma tradição que foi continuada;
pela ênfase nas Relações Sul-Sul, especialmente com o Mercosul e de-
mais países América Latina; pela autonomia pela diversificação e pela
defesa da soberania e dos interesses nacionais (ALMEIDA, 2004; MI-
YAMOTO, 2011).
Para falar sobre a presença do meio ambiente na política externa
de Lula faz-se necessário começar pelo exame das ações domésticas que
o referido governo realizou e que tiveram impacto internacional, tanto na
relação do Brasil com as demais nações do sistema internacional como
na imagem e colocação do Presidente e do País dentro do mesmo sistema.
A primeira delas foi a indicação de Marina Silva para comandar o Minis-
tério do Meio Ambiente (MMA).
Ativista e política desde os anos 1980, a nomeação de Marina
foi bem recebida no exterior. Após o protagonismo requerido pelo Brasil
na questão ambiental durante os anos 1990 e por ser um país com tanta
biodiversidade que impacta economicamente também outros países, a

33
GIOVANI PEIXER DADA E CHARLES ALEXANDRE SOUZA ARMADA

ocupação do MMA por Marina forneceu ao País e ao governo Lula o


lastro necessário e desejado de preservador do meio ambiente perante as
demais nações do sistema internacional.
A gestão Marina foi marcada por quatro linhas básicas. São elas:
i) promoção ampla do desenvolvimento sustentável, ii) participação da
sociedade civil no debate ambiental, iii) fortalecimento do Sistema Na-
cional de Meio Ambiente (SISNAMA) e iv) transversalidade
(KAGEYAMA e SANTOS, 2012).
A presença da promoção do desenvolvimento sustentável numa
perspectiva ampla como uma das linhas básicas da atuação do MMA é
um dos exemplos de como ações internas se misturam com ações da po-
lítica externa, uma vez que se trata da conservação de uma corrente de
pensamento herdada como um dos principais legados da Rio-92. O con-
ceito de desenvolvimento sustentável foi exaustivamente discutido na re-
ferida Conferência e é considerado o maior êxito da mesma. É possível
observar uma postura de continuação por parte do governo Lula nesse
quesito de sua política externa para o meio ambiente.
A transversalidade, ou seja, o tratamento da pauta ambiental pe-
los demais ministérios que compõem o governo, não foi uma linha básica
alcançada devido ao intenso debate entre crescimento econômico e pre-
servação do meio ambiente. Muitos ambientalistas consideram que Ma-
rina Silva teria agido praticamente sozinha enquanto ministra
(THUSWOHL, 2005). A participação da sociedade civil no debate am-
biental, outra herança da Rio-92, aconteceu no Brasil em diversas situa-
ções.
Losekann (2012) reúne dois exemplos dessa participação. No
primeiro deles, nas edições da Conferência Nacional do Meio Ambiental
(CNMA) pode-se observar uma alta taxa de inclusão da sociedade no
debate ambiental, o que é positivo e demonstra uma maneira de consci-
entização da população. Ao mesmo tempo, em virtude de seu caráter es-
sencialmente educacional, não se pode concluir que nas CNMA houve
uma alta efetividade da participação da sociedade civil nas decisões to-
madas.
O cenário contrário encontra-se na formação do Conselho Naci-
onal do Meio Ambiente (CONAMA), na qual a sociedade civil tinha uma
participação limitada, mas consegue obter uma alta efetividade partici-
pativa, por se tratar de um órgão colegiado federal ligado ao Sistema Na-
cional do Meio Ambiente (SISNAMA).
Ainda no plano doméstico, é possível observar a criação de po-
líticas públicas sobre meio ambiente que serviram como uma espécie de
sinalização aos demais países da região e do mundo. É o caso da Lei de
Biossegurança – Lei N. 11.105/2005 (BRASIL, 2005), que cria o Conse-
lho Nacional de Biossegurança (CNBS), a Lei de Pesquisa com Animais
– Lei N. 11.794 (BRASIL, 2008) e o caso mais discutido de todos, a

34
MEIO AMBIENTE, MIGRAÇÕES E PANDEMIA: REFLEXÕES DO MUNDO CONTEMPORÂNEO

Política Nacional de Resíduos Sólidos – Lei N. 12.305 (BRASIL, 2010).


Essas políticas públicas foram criadas para preservar e regulamentar a
questão econômica e ao mesmo tempo mostraram ao mundo que o Brasil
olhava para a questão ambiental também de forma material, não apenas
discursiva.
Dentro do cenário latino-americano, Lula, como um dos repre-
sentantes da Onda Rosa4, fez questão de estabelecer fortes laços diplo-
máticos com os vizinhos, na tentativa de transformar o Brasil em um líder
regional, porém sem a alcunha de imperialista, associada aos Estados
Unidos. Ao observarmos alguns dos acordos bilaterais feitos durante o
governo Lula poderemos encontrar exemplos de como o meio ambiente
foi inserido nas relações internacionais do Brasil com os países da Amé-
rica Latina.
Em 2003, Brasil e Bolívia realizam um ajuste complementar ao
Acordo Básico de Cooperação Técnica, Científica e Tecnológica para a
implementação do Projeto de Legislação dos Recursos Hídricos. Em
2006, Brasil e Paraguai assinam o Acordo de Cooperação para o Desen-
volvimento Sustentável e a Gestão Integrada da Bacia Hidrográfica do
Apa (CONEXÃO ÁGUA, 2021).
As ações internacionais que fizeram parte da política externa do
Brasil nesse período, dentro da América Latina e em outras partes do Sul
do mundo, não tiveram caráter intervencionista nem violaram a soberania
de nenhum país, postura que já fazia parte da tradição diplomática do
país e foi mantida pelo governo Lula, que preferiu agir por meio de acor-
dos ou tratados que ajudassem a alcançar o objetivo estratégico de inserir
o Brasil como um player global. E, como foi demonstrado, o meio ambi-
ente fez parte dessa estratégia (LAGO, 2006).
A Amazônia e as mudanças climáticas também são dois exem-
plos da presença do meio ambiente na política externa do governo Lula.
A Amazônia, por exemplo, é terreno de desejo e discussão internacional
desde os anos 1960, quando da construção da Zona Franca de Manaus,
que foi uma resposta do governo brasileiro às ambições internacionais
em relação à floresta e uma forma de impulsionar o desenvolvimento in-
dustrial e econômico da Amazônia Ocidental. Desde então, a região não
saiu da política externa brasileira (SILVA, 2011).
Durante a era Lula, a maior marca da importância da Amazônia
para a política externa deu-se em 2008, durante o segundo governo com
a criação do Fundo Amazônia pelo Decreto n. 6.527. O referido Fundo
constitui um esforço internacional para preservação, conservação, moni-
toramento e combate ao desmatamento da maior floresta tropical do

4Movimento político que aconteceu na América Latina durante a primeira década


dos anos 2000 e que culminou com a ascensão de diversos governos progressistas e
de esquerda na região (MIYAMOTO, 2011).

35
GIOVANI PEIXER DADA E CHARLES ALEXANDRE SOUZA ARMADA

mundo. Boa parte do dinheiro arrecadado destina-se a programas do go-


verno federal brasileiro e do terceiro setor, que agem como guardiões da
Amazônia. Governos da Alemanha e da Noruega representam quase a
totalidade dos fundos doados, que somam R$ 3,1 bilhões (BNDES,
2020).
Também durante o governo Lula houve o lançamento do Plano
de Ações para Prevenção e Controle do Desmatamento da Amazônia Le-
gal, em 2004 e do Grupo Permanente de Trabalho Interministerial, em
2005. Esses dois órgãos, que integram o Ministério do Meio Ambiente,
fazem parte da burocracia governamental para proteção da Amazônia,
que durante o governo Lula registrou índices decrescentes de desmata-
mento, conforme mostra o Gráfico 1 a seguir.

Gráfico 1 – Desmatamento da Amazônia Legal durante a era Lula, em


Km2/ano

Fonte: PRODES (2011)

Em relação ao último tópico, as muito discutidas mudanças cli-


máticas, pode-se observar uma abordagem bastante discursiva por parte
do governo Lula. Durante seu discurso na abertura da 62° Assembleia
Geral da ONU em 2007, o então Presidente dedicou dois terços do tempo
para falar sobre meio ambiente, com enfoque especial nas mudanças cli-
máticas e no efeito delas nos países pobres. A fala de Lula no maior pai-
nel multilateral de discussão foi aplaudida por líderes latino-americanos
e europeus (G1 ONLINE, 2007).
Já em 2009, durante a realização da décima quinta edição da
Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas (COP-
15), em Copenhague, na Dinamarca, o Presidente discursou e expressou

36
MEIO AMBIENTE, MIGRAÇÕES E PANDEMIA: REFLEXÕES DO MUNDO CONTEMPORÂNEO

sua frustração em relação ao debate das mudanças climáticas que, se-


gundo ele, parecia não avançar. Em seguida, relatou as medidas de seu
governo em relação ao tema (INSTITUTO LULA, 2019).
Para finalizar a análise da presença do meio ambiente na política
externa do governo Lula, faz-se necessário abordar uma questão que co-
meçou a ser desenvolvida em 2010, no seu último ano como Presidente
da República, embora só se tenha observado um avanço nos anos seguin-
tes, no governo de Dilma Rousseff.
Em 12 de janeiro de 2010 o Haiti sofre um sismo de magnitude
7,0 que desestabiliza o país completamente, elevando assim a situação
de crise aguda que já era vivida pelo menos desde 2004, que coinciden-
temente também é o ano no qual o país aparece na política externa de
Lula pela primeira vez. Em 18 de agosto daquele ano, o então presidente
brasileiro desembarcou na capital do país, Porto Príncipe, para uma visita
de Estado e para assistir ao jogo de futebol entre a seleção brasileira e a
seleção haitiana. A visita e o jogo foram considerados uma ação estraté-
gica do soft power brasileiro.
Os meses finais do governo Lula trouxeram um novo desafio
para a política externa: após o sismo de 2010, o Brasil começou a teste-
munhar um fluxo significativo de haitianos adentrando o norte do país,
especialmente pelo estado do Amazonas. A alternativa encontrada para
mitigar a questão ficou conhecida como “visto humanitário”. Trata-se da
primeira iniciativa mundial de concessão de vistos para refugiados cli-
máticos do mundo, o que foi elogiado pela ONU (FERNANDES e FA-
RIA, 2017).
Contudo, a decisão de Lula em 2010 baseou-se mais em uma
questão de solidariedade internacional com o povo haitiano do que numa
noção clara e organizada de refúgio climático como parte componente de
sua política externa. Essa noção pôde ser observada nos anos posteriores
a era Lula, mas foi incluída nesta parte do estudo por representar as novas
demandas do meio ambiente, que precisa cada vez mais ser pensado de
forma transversal e as Relações Internacionais devem exercer um papel
significativo na realização desse debate.

3. O MEIO AMBIENTE NA POLÍTICA EXTERNA DO


GOVERNO BOLSONARO

Antes de entrar na análise do meio ambiente na política externa


do governo Bolsonaro, faz-se necessário notar a existência de dois even-
tos internacionais sobre o tema que contaram com participação do Brasil
entre o fim do governo Lula, em 2010 e o começo do governo Bolsonaro,
em 2019. São eles a Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvi-
mento Sustentável, realizada no Rio de Janeiro em 2012 e o Acordo de

37
GIOVANI PEIXER DADA E CHARLES ALEXANDRE SOUZA ARMADA

Paris, do qual o Brasil é signatário, assinado durante a COP21, na capital


francesa e dando assim, uma sobrevida ao Protocolo de Kyoto (1997).
Assim como feito com o governo Lula, começaremos caracteri-
zando a política externa de Bolsonaro e o cenário na qual a mesma se
desenvolve para depois entender o papel do meio ambiente dentro dela.
Nesse sentido Saraiva e Silva (2019) oferecem uma contribuição interes-
sante. Por se tratar de uma política externa ainda em desenvolvimento,
bem como o mandato do qual ela faz parte, considera-se que o disposto
aqui refere-se aos primeiros dois anos do governo Bolsonaro, nos quais
o Brasil e o mundo (mais uma vez) viviam um momento de ruptura e
questionamento da ordem internacional vigente.
A política externa do governo Bolsonaro se desenvolve em um
período de instabilidade para o Brasil e o mundo. O crescimento econô-
mico evidenciado por diversos países periféricos na década de 2000, deu
lugar às crises de natureza econômica, política e moral. Além disso, a
nostalgia do passado glorioso faz com que fenômenos como o neofas-
cismo e pós-verdade ganhem terreno e se popularizem. Neste cenário,
pode-se observar a ascensão de discursos conservadores e de direita em
diversas partes do mundo, incluindo o Brasil.
No cenário internacional, dois eventos são vistos como basilares
para a política externa de Bolsonaro e ambos aconteceram em 2016: em
junho, uma maioria singela, mas, ainda assim, uma maioria disse sim ao
Brexit, referendo sobre saída do Reino Unido da União Europeia e em
novembro a eleição de uma figura como Donald Trump como presidente
dos Estados Unidos indicava que algo na política internacional havia mu-
dado.
Bolsonaro é o reflexo brasileiro do movimento internacional do
qual ele faz parte. Ernesto Araújo, seu Ministro das Relações Exteriores,
escreveu um artigo em 2017 intitulado “Trump e o Ocidente” na qual
narra a figura heroica do presidente americano como um cruzado. Só que
ao invés do Santo Graal, Araújo afirma que Trump estaria em busca dos
valores ocidentais, esquecidos nos Estados Unidos desde o início do go-
verno Barack Obama.
Os Estados Unidos de Trump têm total influência na política ex-
terna de Bolsonaro. Ainda que se possa questionar o novo tom da ami-
zade entre os dois países atualmente, é notável a inspiração da política
externa de Bolsonaro nas práticas de Trump. Outro ponto interessante da
atual diplomacia brasileira é a sua aproximação com Israel, que sempre
esteve presente na política externa do Brasil, mas com certa cautela.
Regionalmente, o governo Bolsonaro atua em conjunto com o
Grupo de Lima, grupo formado por 14 chanceleres de países do conti-
nente americano que apoiam Juan Guaidó e se opõem ao governo Ma-
duro. As relações do Brasil de Bolsonaro com a América Latina são de

38
MEIO AMBIENTE, MIGRAÇÕES E PANDEMIA: REFLEXÕES DO MUNDO CONTEMPORÂNEO

combate ao que o governo chama de “ideologia de esquerda”, que tam-


bém se confundem com os conceitos de socialismo e comunismo.
Dentro desse cenário complexo, a tarefa de escrever sobre o
meio ambiente na política externa de Bolsonaro é um tanto quanto ambí-
gua. É difícil, pois o atual governo brasileiro não o coloca como uma
prioridade de sua agenda política doméstica ou internacional. Em seu
plano de governo para as eleições de 2018, o meio ambiente não aparece
em nenhuma das oitenta e uma páginas do documento registrado no Tri-
bunal Superior Eleitoral (TSE, 2018).
Porém, mesmo sem colocar uma menção sequer ao tema em seu
plano de governo, as ações perpetradas pelo presidente e seu gabinete até
o momento (fevereiro de 2021) fornecem bastante material para análise.
Começaremos pelo mesmo ponto usado para o governo Lula: as ações
domésticas que tiveram impacto internacional e que constituem a maior
parte do material disponível para análise do meio ambiente na política
externa de Bolsonaro. Exemplos tradicionais das Relações Internacionais
são mais escassos, mas também serão abordados.
Nenhuma ação do governo Bolsonaro relativa ao meio ambiente
passou em branco para a opinião pública. Desde a proposta de fusão do
Ministério do Meio Ambiente (MMA) com o da Agricultura até a ameaça
de tirar o Brasil do Acordo de Paris. O governo Bolsonaro está sendo
qualquer coisa, menos monótono. E as propostas e ações para o meio
ambiente repercutiram dentro e fora do gabinete presidencial (SCAN-
TIMBURGO, 2018).
Da mesma forma, a nomeação de Ricardo Salles para o MMA
também não passou despercebida. Apoiado pela bancada ruralista, Salles
quase não pôde tomar posse, pois sua situação política não estava regu-
larizada (OLIVEIRA, 2019). Desde a posse, algumas ações do Presidente
e do MMA deram o tom da tratativa do governo em relação ao meio am-
biente.
Juntos, Bolsonaro e Salles negaram o aquecimento global, afir-
mando se tratar de um “debate secundário” e “coisa de esquerdista”
(SCANTIMBURGO, 2018), minimizaram o desmatamento na Amazô-
nia e no Pantanal, que voltou a bater recordes (COLETTA, 2020), culpa-
ram o ator estadunidense Leonardo DiCaprio de financiar queimadas
(JORNAL NACIONAL, 2019) e propuseram o Projeto de Lei (PL) n.
2.633/2020, apelidado de PL da Grilagem, que tinha como objetivo alte-
rar a regulamentação fundiária em terras da União (BRITO, 2020).
Duas alterações feitas pelo governo Bolsonaro chamaram aten-
ção da opinião pública brasileira e internacional. A primeira delas modi-
ficou a estrutura do Conselho Nacional do Meio Ambiente (CONAMA),
órgão colegiado filiado ao Ministério do Meio Ambiente. Em 29 de maio
de 2019, o Presidente publica no Diário Oficial da União um decreto no
qual diminui de 96 para 23 as vagas do CONAMA, sendo que na nova

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GIOVANI PEIXER DADA E CHARLES ALEXANDRE SOUZA ARMADA

configuração, apenas quatro vagas são para membros da sociedade civil


(SOARES, 2019).
Como visto anteriormente, o meio ambiente foi inserido no de-
bate público brasileiro de forma paulatina e foi observada uma grande
adesão da sociedade civil nas discussões ambientais após a redemocrati-
zação. Um dos grandes legados da Rio-92 é justamente a participação de
entes não estatais nesse debate, algo que foi mantido até 2019. Bolsonaro
demonstra um processo de descontinuidade do legado da Rio-92 e das
práticas internacionais relativas ao meio ambiente na política externa.
O governo defendeu-se, afirmando que a nova configuração for-
nece ao CONAMA “mais agilidade na tomada de decisão”. E afirma tam-
bém que a proporcionalidade foi mantida (MMA, 2019). Contudo, se
pensamos nas quatro vagas da sociedade civil, que são definidas por sor-
teio, não parece um número suficiente para garantir a representatividade
que o órgão necessita.
Outra alteração que chamou atenção foi a do Fundo Amazônia,
criado como um fundo internacional de preservação da Floresta Amazô-
nica e combate à queimadas e desmatamento. O governo pretendeu usar
o dinheiro do Fundo para pagar indenizações de terras e retirar o Banco
Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) da gestão
do Fundo (NETTO, 2019). Esta alteração especificamente foi a que mais
impactou internacionalmente e expôs o governo Bolsonaro a um cons-
trangimento.
Isto porque os governos da Noruega e Alemanha, responsáveis
por 99,5% das doações para o Fundo, se posicionaram contrários a essas
mudanças e, ao observarem os crescentes índices de desmatamento da
Floresta, resolveram suspender as doações ao Fundo em agosto de 2019
(NEGRÃO, 2019). Outra contenda internacional de Bolsonaro deu-se
com o Presidente francês Emmanuel Macron, que levou a Amazônia para
o debate do G7. Como resposta, Bolsonaro endossou comentários consi-
derados machistas e misóginos feitos contra a Primeira Dama da França,
Brigitte Macron (CIPRIANI, 2019).
O conflito com os países europeus e as altas taxas de desmata-
mento da Amazônia fizeram com que 602 cientistas assinassem uma
carta publicada na revista Science na qual pedem que a União Europeia,
segundo maior parceiro comercial do Brasil, condicione a importação de
insumos brasileiros ao cumprimento de compromissos ambientais
(VEIGA, 2019). Desta forma, o meio ambiente assume a forma de uma
das variáveis que condiciona a existência ou de negócios no Brasil.
O mesmo cenário pode ser enxergado em relação ao investi-
mento estrangeiro direito. Foi o que aconteceu em julho de 2020, quando
o Vice-Presidente, Hamilton Mourão e ministros de Estado, em um es-
forço para melhorar a imagem internacional do Brasil, se reuniram com

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MEIO AMBIENTE, MIGRAÇÕES E PANDEMIA: REFLEXÕES DO MUNDO CONTEMPORÂNEO

investidores via videoconferência (MAZUI, 2020). Na ocasião Bolso-


naro não se fez presente.
Outros aspectos da presença (ou não presença) do meio ambi-
ente na política externa de Bolsonaro deram-se quando o governo recu-
sou-se a sediar a COP-25, conferência que discute as mudanças climáti-
cas, sob a égide da ONU (VEJA, 2018) e a ameaça de seguir Donald
Trump e retirar o Brasil do Acordo de Paris, que não foi consolidada
devido à forte pressão doméstica e internacional (GAIER, 2018).
Para finalizar esta seção, é preciso falar sobre dois eventos mar-
cantes sobre a variável ambiental e seu impacto na política externa, na
imagem e na reputação internacional do Brasil. São eles duas denúncias.
A primeira trata-se de uma ação civil pública enviada ao Ministério Pú-
blico (2020) contra o Ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles por
improbidade administrativa, devido aos caos ambiental vivido pelo país
em 2019 e 2020.
A segunda, direcionada ao Presidente, corre no Tribunal Penal
Internacional (TPI) e o acusa de cometer crime contra a humanidade, na
tipificação de ecocídio. Dentro da competência do TPI, este crime con-
siste em:

[...] ofensa massiva ao meio ambiente capaz de ocasionar da-


nos ao ecossistema e violações à fauna, flora, ao ar e/ou às
águas, de sorte a determinar a morte de vários espécimes ani-
mais ou vegetais, ou tornar inapropriado o uso das águas, do
solo, subsolo e/ou do ar, de modo a ocasionar abalos à própria
vida humana (GORDILHO e RAVAZZANO, 2017).

No segundo semestre de 2020, as atenções em relação às quei-


madas se deslocaram para o Pantanal, que destruíram 10% da área do
bioma e mataram várias espécies animais que lá viviam (ELLER, 2020).
Em 22 de setembro, o Presidente abriu o Debate Geral da 75° Assembleia
das Nações Unidas falando sobre a pandemia de COVID-19 e o meio
ambiente. Em relação ao segundo tópico, afirmou que seu governo é “ví-
tima de uma das mais brutais campanhas de desinformação sobre a Ama-
zônia e o Pantanal” e disse que “nossa floresta é úmida e não permite a
propagação do fogo em seu interior” e o que “o caboclo e o índio quei-
mam seus roçados em busca de sua sobrevivência, em áreas já desmata-
das” (BBC BRASIL, 2020). As três informações não procedem.
CONSIDERAÇÕES FINAIS

Agora que já abordamos a presença do meio ambiente na política


externa brasileira desde os anos 1970, passando pelos dois governos que
são objeto de estudo deste artigo (Lula e Bolsonaro) chegou a hora de
realizar o objetivo central: realizar a análise comparativa das duas

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GIOVANI PEIXER DADA E CHARLES ALEXANDRE SOUZA ARMADA

políticas externas e como ambas tratam a temática ambiental. Contudo,


realizar essa tarefa também não é algo simples ou fácil.
A comparação de políticas externas não pode ser feita sem o es-
tabelecimento de algumas diretrizes que a direcionem. Como dito ante-
riormente, a política externa enquanto fenômeno observável não acon-
tece de forma isolada. É preciso considerar o contexto político, econô-
mico, histórico e social no qual foram/estão sendo formuladas para que
seja possível entendê-las, verificar qual o nível de coerência e coesão
com os interesses nacionais e com as perspectivas em destaque no cená-
rio internacional para só depois realizar algum tipo de comparação entre
elas.
Como se trata de dois governos que até hoje têm defensores apai-
xonados, que dividem a opinião pública brasileira e que não passaram
despercebidos, cada um em seu tempo, cabe salientar que a análise com-
parativa que será feita a seguir não carregará consigo nenhum julgamento
do tipo moral, político ou ideológico. A intenção não é enaltecer um go-
verno em detrimento do outro e sim ater-se aos fatos que compõem a
análise, garantindo assim um olhar realista, porém não tendencioso.
Para garantir uma análise comparativa nos termos acima descri-
tos, também serão dadas aos dois governos as mesmas variáveis. Serão
analisadas nas duas políticas externas: i) o contexto político, econômico,
histórico e social no qual foram criadas, ii) o posicionamento do meio
ambiente dentro dela, iii) as ações domésticas que as impactaram e iv) o
posicionamento, imagem e reputação internacionais do Brasil em relação
ao meio ambiente nos respectivos períodos de tempo analisados.
Começando com a primeira variável, existe uma enorme dife-
rença no contexto político, econômico, histórico e social no qual Lula e
Bolsonaro pensaram e desenvolveram suas respectivas políticas exter-
nas. O governo Lula aconteceu em um período privilegiado da história
contemporânea, no qual foram registradas taxas altíssimas de cresci-
mento dos países, motivadas pelo crescimento ainda maior da China.
Esse momento de crescimento econômico se mostrou favorável
a implementação de suas políticas socioambientais, bem como da política
externa “ativa e altiva”, com relações estreitadas com os governos latino-
americanos da Onda Rosa e de inserção internacional do Brasil. O
mesmo não pode ser dito em relação ao governo Bolsonaro.
A virada ideológica no Brasil também foi fruto de um período
histórico específico. O governo Bolsonaro nasce da criação de uma nar-
rativa “anti-esquerda” e no momento em que vários outros governos de
direta/extrema-direita estão conquistando espaço, como por exemplo Do-
nald Trump (Estados Unidos), Viktor Orbán (Hungria), Ivan Duque (Co-
lômbia), Mario Abdo Benítez (Paraguai), dentre outros.
A crise econômica de 2008, que começou nos Estados Unidos e
foi se espalhando pelo mundo, gerou como principal consequência

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MEIO AMBIENTE, MIGRAÇÕES E PANDEMIA: REFLEXÕES DO MUNDO CONTEMPORÂNEO

política o levante dos extremismos, especialmente de direita. Desde en-


tão, governos populistas de direita são eleitos mundo afora com o obje-
tivo de voltar no tempo, para os anos de riqueza e crescimento. Paralelo
a isso, o mundo observa contestações a o que antes já havia se consoli-
dado pela ciência. Essas contestações, que também têm cunho político,
vão desde o aquecimento global e sua negação até o efeito das vacinas
em bebês.
Em relação ao contexto histórico, podemos concluir que a vari-
ável econômica faz toda a diferença. Enquanto um governo desenvolve
sua política externa em um período de ascensão econômica o outro a de-
senvolve num período de crise econômica, política e moral agudas. E o
peso dado ao meio ambiente nesses dois cenários é diferente. Em relação
a segunda variável, temos ainda mais terreno para fazer comparações.
Como dito anteriormente, não é a intenção desse artigo enaltecer
um governo em detrimento do outro. A intenção é apenas analisar e com-
parar os fatos e contextos narrados ao longo do artigo. Podemos concluir,
com o que já foi exposto nas seções anteriores, que as ações domésticas
relativas ao meio ambiente no governo Lula criaram um efeito conside-
ravelmente mais positivo no cenário internacional.
Contudo, é preciso atentar para uma crítica a este governo: a
transversalidade prometida não foi alcançada. A intenção de tratar o meio
ambiente como um assunto transministerial esbarrou no antigo debate
entre preservar o meio ambiente e fomentar o crescimento econômico.
Ainda que o governo Lula tenha deixado um legado importante na área
ambiental, como a criação do Fundo Amazônia e a diminuição do des-
matamento, na prática da execução de políticas públicas e no gerencia-
mento de todos os seus ministérios, não foi observada a transversalidade,
fato que fez com que ambientalistas, ao final do governo, temessem pela
continuidade das legislações aprovadas até então.
Em relação a Bolsonaro, as ações domésticas em relação ao meio
ambiente, relatadas na seção relativa ao seu governo, tiveram um efeito
negativo. Isto porque representam uma ruptura seguida de uma descon-
tinuidade com a tratativa vigente da agenda diplomática do Brasil em
relação ao meio ambiente, herdada da redemocratização e principalmente
da Rio-92. A referida descontinuidade não aconteceu como obra do
acaso. Foi anunciada e defendida pelo então candidato à Presidência e
implementada após sua posse.
A principal diferença entre a política externa de Lula e de Bol-
sonaro para o meio ambiente em relação às ações domésticas que a im-
pactaram está justamente no teor e na essência. Enquanto o primeiro go-
verno buscou alinhar-se ao sistema internacional na tratativa ambiental,
considerando o meio ambiente uma variável importante para a inserção
internacional desejada, o segundo questionou, inverteu e reinventou a

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GIOVANI PEIXER DADA E CHARLES ALEXANDRE SOUZA ARMADA

própria narrativa, na qual o meio ambiente mal realiza um papel secun-


dário e a reação internacional testemunhada é de repúdio.
Em relação a terceira e última variável, também é possível ma-
terial para comparação do posicionamento, imagem e reputação interna-
cionais do Brasil em relação ao meio ambiente. Contudo, observamos
aqui uma semelhança: em ambos os governos, a figura central encon-
trava-se na imagem do Presidente, que ocupou/ocupa boa parte do espaço
público e da concentração internacional. Tanto Lula quanto Bolsonaro
são líderes políticos que não passam despercebidos nos círculos de de-
bate que frequentam.
Porém, mais uma vez podemos observar a diferença no teor e na
essência. Mesmo tendo deixado o governo sem garantir a transversali-
dade do tema e com uma legislação cambaleante, é possível observar um
posicionamento protagonista do Brasil no debate ambiental na era Lula.
Porém, é preciso salientar que esse protagonismo não é fruto única e ex-
clusivamente de Lula e sim de sua decisão em dar continuidade a um
processo de ações ambientais que já estavam em curso na política externa
do Brasil desde a redemocratização.
Em relação a Bolsonaro, a ruptura elegida pelo governo causa
efeito reverso. Ao politizar o tema e não dar atenção necessária e/ou su-
ficiente para a pauta ambiental, o governo deixa de enxergar o meio am-
biente como o ativo poderoso que é e submete o governo e o país à cons-
trangimentos nunca antes enfrentados e a resposta governamental em re-
lação a isso não traz qualquer tipo de ânimo.
Os dois governos, que se parecem bastante em diversos aspec-
tos, desenvolveram suas respectivas políticas externas em contextos di-
ferentes e por isso colheram/estão colhendo frutos diferentes. Porém, é
possível também notar que o resultado da não ação ou do título secundá-
rio dado ao meio ambiente cobra o seu preço, mais cedo ou mais tarde.
Em um país como o Brasil, a política externa precisa englobar o meio
ambiente como um dos principais temas do seu escopo.
Não basta apenas ser megadiverso, é preciso saber o que fazer
com tanta biodiversidade e o que ela pode gerar para o país e como ela
pode fazer com que, por meio de seu protagonismo na política externa,
auxilie o país a de fato se inserir como um player global. É preciso pre-
servar, mas também é preciso saber explorar e retirar do meio ambiente
os insumos que ele pode nos dar, de maneira consciente. É preciso tornar
a pauta ambiental verdadeiramente política, mas não um instrumento de
ataque a ideologias.
Para finalizar, é preciso enxergar o meio ambiente como um de-
safio imposto ao mundo no século XXI e entender que esse desafio traz
consigo o desenvolvimento de novas questões que precisam ser pensadas
pela política externa, como é o caso dos refugiados climáticos. O meio
ambiente na política externa brasileira é um assunto que gera conteúdo

44
MEIO AMBIENTE, MIGRAÇÕES E PANDEMIA: REFLEXÕES DO MUNDO CONTEMPORÂNEO

suficiente para elaboração de um livro, mas respeitando a delimitação de


tempo escolhida, o artigo é finalizado aqui.

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49
A GOVERNANÇA AMBIENTAL NO BRASIL

Ingrid Silveira Nunes1

INTRODUÇÃO

O mundo contemporâneo evoluiu em vários aspectos, entretanto


no que diz respeito as ferramentas de Governança Ambiental Global e a
(In)justiça climática, verifica-se que ainda tem muito a progredir, pois
percebe-se uma relutância por parte dos governos e da sociedade em ge-
ral em combater os impactos climáticos oriundos das mudanças climáti-
cas.
E no Brasil não é diferente, pois nos últimos anos o país tem sido
alvo de várias organizações ambientalistas, por não apresentar um plano
de governança ambiental, claro, efetivo e que tenha êxito em combater
os impactos climáticos, decorrentes das mudanças climáticas.
Diante deste cenário, e com a finalidade de compreender essa
temática, neste trabalho pretendemos abordar qual a efetividade da jus-
tiça climática no Brasil.
Para tanto, o presente estudo está dividido em introdução, três
seções e considerações finais. A primeira apresenta conceitos de Gover-
nança Ambiental Global, (In)Justiça Climática, desastre ambiental, im-
pactos climáticos e como o Brasil dialoga com essas temáticas. A seguir,
discorre-se quais foram as medidas adotadas para combater os impactos
climáticos, com enfoque na análise das Pretendidas Contribuições Naci-
onalmente Determinadas, com as quais o Brasil se comprometeu quando
ratificou o Acordo de Paris, pois foi uma das últimas ações globais ado-
tadas para combater os impactos climáticos. O terceiro momento verifica
se o discurso de justiça climática foi incorporado de forma efetiva no
Brasil, por meio de pesquisa documental envolvendo a verificação da si-
tuação atual dos planos adotados pelo Brasil para incorporar a gover-
nança ambiental. As considerações finais apresentam os resultados que
permitem ambientalizar os conceitos apresentados e arguir que, no Bra-
sil, os termos de Governança Ambiental Global, Justiça Climática e

1Pós-Graduanda em Relações Internacionais Contemporâneas pela Universidade do


Vale do Itajaí. ingridsilveiranunes@gmail.com.
INGRID SILVEIRA NUNES

impactos climáticos não foram incorporados de forma efetiva e tão


pouco, existe um plano que demonstre a incorporação.

1 CONCEITOS

1.1 Governança Ambiental Global

O descompasso das mudanças no plano social, econômico, tec-


nológico e ambiental desafiam cada vez mais as estruturas tradicionais
dos governos.
Até 1990 somente o Banco Mundial detinha o domínio do con-
ceito de Governança. Mas a partir de 1991, o termo foi adotado pela for-
mação da Comissão sobre Governança Global, criada pela ONU, para
desenvolver uma visão comum acerca do rumo a ser tomado pelo mundo
na transição da Guerra Fria e na passagem da humanidade ao século XXI.
Os resultados da Comissão sobre Governança Global foram publicados
em um relatório onde Governança é definida como pessoas e instituições
públicas e privadas gerenciam assuntos em comum por meio de proces-
sos continuados de modo a acomodar interesses conflitantes.2
Desenvolvido o conceito de Governança, e incorporando as di-
mensões ambiental e global, Gonçalves apresenta a definição para Go-
vernança Ambiental Global:

A Governança Ambiental Global é, em essência, uma estraté-


gia para a solução dos problemas ambientais. Assume, por-
tanto, o caráter de meio e processo à disposição para o enfren-
tamento dessas questões. Trabalha com base na busca do con-
senso e da cooperação, articulando os diferentes atores envol-
vidos. Ela exige participação ampliada – Estados, empresas,
organizações não governamentais, comunidade científica – e
implica em um conjunto de instituições, sejam elas regras e
procedimentos, sejam práticas sociais.3

Considerando esse conceito, Armada identifica as principais ca-


racterísticas de Governança Ambiental Global:

a) envolve a busca por soluções para os problemas ambientais


globais; b) a busca por soluções implica em alternativas como
consenso e cooperação; c) a participação global implica em

2 Armada, Charles Alexandre Souza. Governança Global E Justiça Ambiental Face


Aos Desafios Da Mudança Climática Planetária. Governança Global E Justiça Am-
biental Face Aos Desafios Da Mudança Climática Planetária, Itajaí/Sc, 2016.
3 GONÇALVES, Alcindo Fernandes; COSTA, José Augusto Fontoura. Governança

global e regimes internacionais. São Paulo: Almedina, 2011. p. 108.

52
MEIO AMBIENTE, MIGRAÇÕES E PANDEMIA: REFLEXÕES DO MUNDO CONTEMPORÂNEO

mecanismos que não estão na esfera dos Estados nacionais; d)


os mecanismos envolvidos referem-se a um vasto arsenal de
instituições internacionais criadas nos últimos 40 anos e, tam-
bém, em práticas sociais.4

Logo, tais características de Governança Ambiental Global re-


fere-se ao conjunto de iniciativas, regras, instâncias e processos que per-
mitem às pessoas, por meio de suas comunidades e organizações civis, a
exercer o controle social, público e transparente, das estruturas estatais e
das políticas públicas, por um lado, e da dinâmica e das instituições do
mercado, por outro, visando atingir objetivos comuns, ou seja, a Gover-
nança Ambiental está relacionada com a implementação de políticas pú-
blicas, que visem assegurar o combate as mudanças climáticas.
Neste contexto, a categoria Justiça Ambiental passa a obter mais
relevância, tendo em vista que os efeitos das Mudanças Climáticas glo-
bais são desiguais e injustos, pois as pessoas que vão arcar com as con-
sequências mais severas das Mudanças Climáticas são aquelas que me-
nos contribuíram ao problema, gerando assim, o que foi reconhecido
como injustiça climática, que será explorado no item 1.2.
Atualmente as vítimas de injustiça climática podem participar de
iniciativas nominadas de litigância climática, que partem do pressuposto
de que, na ausência de um Poder Público comprometido com o clima, o
Poder Judiciário se torna uma instância decisória importante na constru-
ção e implementação de políticas públicas efetivas. Algumas ações tive-
ram efeitos diretos na construção de políticas climáticas, como foi o caso
de Massachusetts v. EPA5 e Urgenda v. Reino dos Países Baixos6. Para
além de representar iniciativas pontuais, esses casos apontam para o sur-
gimento de uma cultura de litigância que têm gerado frutos políticos

4 ARMADA, Charles Alexandre Souza. GOVERNANÇA GLOBAL E JUSTIÇA


AMBIENTAL FACE AOS DESAFIOS DA MUDANÇA CLIMÁTICA PLANETÁ-
RIA. In: ARMADA, Charles Alexandre Souza. GOVERNANÇA GLOBAL E
JUSTIÇA AMBIENTAL FACE AOS DESAFIOS DA MUDANÇA CLIMÁ-
TICA PLANETÁRIA. 2016. Tese (Doutorado) – Universidade do Vale do Itajaí,
Itajaí/SC, 2016.
5 OYEZ (Estado Unidos da América). Massachusetts v. Agência de Proteção Ambi-

ental. In: OYEZ (Estados Unidos da América). Massachusetts v. Agência de Pro-


teção Ambiental. Digital. Site, 26 jun. 2006. Disponível em: https://www.oyez.
org/cases/20 06/05-1120. Acesso em: 27 jan. 2021.
6 URGENDA. O CASO DO CLIMA DE URGENDA CONTRA O GOVERNO HO-

LANDÊS: DECISÃO HISTÓRICA DA SUPREMA CORTE HOLANDESA. In:


URGENDA. O CASO DO CLIMA DE URGENDA CONTRA O GOVERNO
HOLANDÊS: DECISÃO HISTÓRICA DA SUPREMA CORTE HOLANDESA.
Digital. Site, 2019. Disponível em: https://www.urgenda.nl/en/themas/climate-case/.
Acesso em: 23 jan. 2021.

53
INGRID SILVEIRA NUNES

promissores, os quais se tenta replicar, de forma crítica e consequente,


para o cenário brasileiro.

1.2 Da (In)Justiça Climática

O conceito de justiça climática surgiu como um desdobramento


do conceito de Justiça Ambiental atrelado aos impactos das mudanças
climáticas, que por sua vez, traz consigo um novo desafio às populações
mais vulneráveis e também, para a efetivação da Justiça Ambiental.
O movimento por justiça climática vê as mudanças climáticas
como um ponto atrelado a uma questão complexa de justiça social, e não
apenas como um óbice ambiental.
Observa-se que o movimento de justiça climática defende que
as mudanças climáticas são o produto da desigualdade e de um sistema
econômico obcecado pelo crescimento em prol do crescimento. Ou seja,
o movimento por justiça climática é a resposta do movimento internaci-
onal por justiça ambiental às mudanças climáticas.
Os princípios do movimento por justiça climática são similares
aos valores dos colossais movimentos por justiça social: comunidade,
grupos marginalizados, poder popular e igualdade. Isso é percebido em
suas ações, local e globalmente. A justiça climática é uma forma ativa e
integrada de enfrentar os desafios causados pelas mudanças climáticas,
pelo capitalismo e pela injustiça.
Um dos principais representantes do movimento que discute a
pauta pela lógica do direito e inclusão da população mais afetada pelos
extremos climáticos é a Fundação Mary Robinson, que define:

A justiça climática vincula direitos humanos e desenvolvi-


mento para alcançar uma abordagem centrada no humano, a
salvaguarda dos direitos das pessoas mais vulneráveis e parti-
lha dos encargos e benefícios da mudança do clima e seus im-
pactos equitativos e justos. A justiça climática é informada
pela ciência, responde à ciência e reconhece a necessidade de
administração equitativa dos recursos mundiais.7

Armada, corrobora:

Extrapolando-se estas premissas para a esfera global, a cate-


goria Justiça Climática se apresenta de forma ainda mais con-
tundente. Os países já desenvolvidos, responsáveis pela maior
parte das emissões de gases de efeito estufa, são os que apre-
sentam menor risco de impactos em função das mudanças

7PRINCÍPIOS de Justiça Climática. Digital. [S. l.], 2020. Disponível em: https://
www. mrfcj.org/principles-of-climate-justice/. Acesso em: 15 set. 2020.

54
MEIO AMBIENTE, MIGRAÇÕES E PANDEMIA: REFLEXÕES DO MUNDO CONTEMPORÂNEO

climáticas. Além disso, são os países com maior capacidade


de adaptação.8

No entanto, os países subdesenvolvidos são aqueles que, histo-


ricamente, contribuíram parcamente com a quantidade de gases de efeito
estufa e, ao mesmo tempo, são os que mais absorvem os impactos climá-
ticos e apresentam um alto grau de vulnerabilidade e ainda possuem li-
mitada capacidade de se proteger de tais impactos.
Logo, dialogar sobre justiça climática, então, provoca e intima à
impossibilidade de discutir uma perspectiva sobre futuro sem a partici-
pação periférica e de outros grupos marginalizados e ditos como “vulne-
ráveis”.
Tais constatações apresentam o conceito de injustiça climática,
que implicou o surgimento das demandas e reivindicações por justiça cli-
mática.
Um exemplo clássico de injustiça climática ocorre na África,
onde os agricultores não têm rede de segurança quando suas colheitas
falham, percebe-se aqui, que o impacto da mudança climática na agricul-
tura agrava as desigualdades existentes.9
Outro exemplo, pungente, são os refugiados/deslocados ambi-
entais. Pessoas de países periféricos, que embora contribuam pouco com
as alterações climáticas globais, tem sido severamente afetado por desas-
tres ambientais, que saem de sua terra natal, em decorrência destes, ob-
jetivando melhores condições de vida, em países desenvolvidos, estes,
sim, grandes responsáveis pelas emissões de CO2 na atmosfera, na mai-
oria das vezes, que ironicamente, fecham suas portas para estas pessoas.
Recentemente, também foi noticiada a judicialização para as
mudanças climáticas, caracterizadas por demandas de nacionais contra
seus próprios países exigindo uma postura mais eficaz na proteção de
seus cidadãos devido as consequências dos impactos climáticos. Sendo
está uma alternativa encontrada pelos cidadãos/ ONGs e comunidades
preocupadas com os impactos climáticos, para pressionar e / ou obrigar
os países a se comportarem de acordo com os objetivos do Acordo de
Paris.

8 XXV CONGRESSO DO CONPEDI; ARMADA, Charles Alexandre Souza; VI-


EIRA, Ricardo Stanziola. Governança ambiental global e mudança climática: pers-
pectivas de uma efetiva governança global para a justiça ambiental e climática pós-
acordo de paris. Direito ambiental e socioambientalismo I, Florianópolis, Santa
Catarina, 27 set. 2020.
9 CROOK, Glynis. Temperaturas extremas são uma ameaça para África. Digital.

[S. l.], 2020. Disponível em: https://www.dw.com/pt-002/temperaturas-extremas-


s%C3%A3o-uma-amea%C3%A7a-para-%C3%A1frica/a-45773734. Acesso em: 15
set. 2020.

55
INGRID SILVEIRA NUNES

No Brasil, há registro de apenas uma judicialização envolvendo


as mudanças climáticas, a ADPF 708, sendo pioneira e o primeiro caso
de litigância climática a chegar ao STF, com influência significativa-
mente no Direito do Clima, que neste caso tem o objetivo compelir o
Executivo a garantir o regular funcionamento do Fundo Clima, que teria
sido indevidamente paralisado em 2019 e 2020, bem como diversas ou-
tras ações e omissões na área ambiental que estariam levando a uma si-
tuação de retrocesso e de desproteção em matéria ambiental. Com isso o
Brasil junta-se ao grupo de países cujas cortes constitucionais manifes-
taram-se, ou estão em vias de fazê-lo, sobre litígios climáticos, e tem a
oportunidade de fomentar o fortalecimento de decisões sobre clima que
tem sido amplamente estudado, e utilizado na prática, por juristas e cien-
tistas do mundo inteiro.10 O item quatro explicará a ADPF 708 com mais
detalhes.
Sendo assim, a injustiça climática é considerada ao mesmo
tempo injustiça social e injustiça econômica, que exige um olhar especial
para aqueles que devem receber os maiores impactos resultantes da mu-
dança climática.

1.3 Desastre ambiental

Nos últimos anos os desastres ambientais têm assustado a todos


pela frequência e intensidade da força natural com que ocorrem, provo-
cando na maioria dos casos um grande número de vítimas, inclusive fa-
tais.
Os motivos desses acontecimentos originam potenciais discussões, ge-
rando estudos preventivos que vêm sendo incentivados a fim de que seja
possível, em tempo hábil, prever a ocorrência futura destes. Vários do-
cumentos (protocolos, tratados e outros documentos internacionais) re-
tratam o reconhecimento da gravidade e complexidade da situação cli-
mática do Planeta. Entre os principais, merecem destaque: a Convenção
Quadro das Nações Unidas sobre o Clima; o Protocolo de Quioto; Proto-
colo de Montreal, Convenção de Viena e o Acordo de Paris.
O conceito de desastres, como assevera Carvalho, possui uma
dimensão ampla11, mas neste trabalho trataremos apenas da

10 LEHMEN, Alessandra. O STF e o clima: inaplicabilidade da defesa da separação


de poderes à ADPF 708. In: LEHMEN, Alessandra. O STF e o clima: inaplicabili-
dade da defesa da separação de poderes à ADPF 708. Digital. [S. l.], 17 out. 2020.
Disponível em: https://www.conjur.com.br/2020-out-17/alessandra-leh men-litigan-
cia-climatica-stf. Acesso em: 23 jan. 2020.
11 CARVALHO, Délton Winter de. AS MUDANÇAS CLIMÁTICAS E A FOR-

MAÇÃO DO DIREITO DOS DESASTRES. Portal de Periódicos da Univali, [s.


l.], set-dez.2013. Disponível em: https://siaiap32.univali.br//seer/index. php/nej/arti-
cle/viewFile/5130/2690. Acesso em: 28 set. 2020.

56
MEIO AMBIENTE, MIGRAÇÕES E PANDEMIA: REFLEXÕES DO MUNDO CONTEMPORÂNEO

especificidade ligada aos desastres ambientais, pois apesar de estarem


conexos pelo aspecto formal, o termo desastre ambiental traz consigo a
variável da dimensão individual deste fenômeno, que é justamente a
parte que nos interessa discutir.
Neste sentido, desastre ambiental, “consiste em eventos (de
causa natural, humana ou mista) capazes de comprometimento de fun-
ções ambientais ou lesões a interesses humanos mediados por alguma
mudança ambiental”12, descrito na própria legislação brasileira.
Após a conceituação, em complemento aos referenciais teóricos
envolvidos, deve‐se considerar a classificação dos desastres ambientais
como oportuna a delimitação da abordagem a que se propõe, conforme
apresentado a seguir segundo definições.
Tominaga, Tobin e Montz, classificam os desastres ambientais
quanto à intensidade ou quanto a origem. Quanto à intensidade, de
acordo com Tominaga, os desastres possuem cinco níveis distintos,
sendo o primeiro nível caracterizado por determinar prejuízos menores
que 5% do PIB municipal e o último nível envolvendo prejuízos superi-
ores a 30% do PIB municipal,13 conforme demonstra tabela:

Quanto a origem, os desastres podem ser classificados em natu-


rais ou humanos (antropogênicos). Tominaga, explica:

12 BRASIL. Decreto N. 7.257, de 4 de agosto de 2010. Dispõe sobre o Sistema Na-


cional de Defesa Civil – SINDEC. 04 ago.2010. Disponível em: http://www.pla-
nalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2007-2010/2010/Decreto/D7257.htm#:~: text=Regula-
menta%20ª %20Medida%20Provis%C3%B3ria%20n,%C3%A0s%20
v%C3%ADtimas%2C%20restabelecimento%20de%20servi%C3%A7os. Acesso
em: 22 ago. 2020.
13 TOMINAGA, Lídia Keiko. Desastres Naturais: por que ocorrem? In: Desastres

naturais: conhecer para prevenir / Lídia Keiko Tominaga, Jair Santoro, Rosangela
do Amaral (orgs.) –. São Paulo: Instituto Geológico, 2009. p. 15. Disponível em: http:
//www.sidec.sp.gov.br/defesacivil/media/OSDownloads/14383758 61_Desastres-
Naturais.pdf. Acesso em: 28 ago. 2020.

57
INGRID SILVEIRA NUNES

Desastres Naturais são aqueles causados por fenômenos e de-


sequilíbrios da natureza que atuam independentemente da
ação humana. Em geral, considera-se como desastre natural
todo aquele que tem como gênese um fenômeno natural de
grande intensidade, agravado ou não pela atividade humana.
Exemplo: chuvas intensas provocando inundação, erosão e es-
corregamentos; ventos fortes formando vendaval, tornado e
furacão; etc. Desastres Humanos ou Antropogênicos são aque-
les resultantes de ações ou omissões humanas e estão relacio-
nados com as atividades do homem, como agente ou autor.
Exemplos: acidentes de trânsito, incêndios urbanos, contami-
nação de rios, rompimento de barragens etc. 14

No Brasil, a classificação considera outros fatores, como: clas-


sificação quanto a natureza; classificação quanto à intensidade; classifi-
cação quanto à evolução e a classificação quanto aos prejuízos.15
De 2003 a 2018, considerando as classificações acima, os dados
apresentados pela Confederação Nacional de Municípios (CNM), em um
estudo nominado Proteção e Defesa Civil / Estudos Técnicos, registraram
que os estados que mais tiveram desastres ambientais no período foram
a Paraíba (3.875), o Rio Grande do Sul (3.547), Ceará (3.159) e Minas
Gerais (3.120).16
O Anuário Climático Do Brasil (2019) é uma publicação cola-
borativa entre o Instituto Nacional de Meteorologia (INMET), o Centro
de Ciência do Sistema Terrestre (CCST) do Instituto Nacional de Pes-
quisas Espaciais (INPE) e o Centro Nacional de Monitoramento e Alertas
de Desastres Naturais (CEMADEN), que demonstra que nos anos de

14 TOMINAGA, Lídia Keiko. Desastres Naturais: por que ocorrem? In: Desastres
naturais: conhecer para prevenir / Lídia Keiko Tominaga, Jair Santoro, Rosangela
do Amaral (orgs.) –. São Paulo: Instituto Geológico, 2009. p. 15. Disponível em:
http://www.sidec.sp.gov.br/defesacivil/media/OSDownloads/14383758 61_Desas-
tresNaturais .pdf. Acesso em: 28 ago. 2020.
15 SAITO, Silvia M. Desastres Naturais: conceitos básicos. I Escuela De Primavera

Sobre Soluciones Espaciales Para El Manejo De Desastres Naturales Y Respues-


tas De Emergencias inundaciones, [s. l.], 2016. Disponível em:
http://www3.inpe.br/ crs/crectealc/pdf/silvia_saito.pdf. Acesso em: 10 ago. 2020.
16 ESTUDO – PROTEÇÃO E DEFESA CIVIL / ESTUDOS TÉCNICOS. [S. l.],

2018. Disponível em: https://www.cnm.org.br/cms/biblioteca/documentos/ Decreta-


coes-de-anormalidades-causadas-por-desastres-nos-Municipios-Brasileiros-10-10-
2018-v2. pdf. Acesso em: 10 ago. 2020.

58
MEIO AMBIENTE, MIGRAÇÕES E PANDEMIA: REFLEXÕES DO MUNDO CONTEMPORÂNEO

201817 e 201918 foram registrados 372 casos de desastres ambientais, su-


cessivamente, e ironicamente em ambos os anos resultou em 76 óbitos.
O que traz à tona a reflexão de quão estão atualizados os dados apresen-
tados pelo Governo Federal.
O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística IBGE apresenta
percentuais que foram obtidos entre 2013 e 2017:

Dos municípios com mais de 500 mil habitantes, 93% foram


atingidos por alagamentos e 62% por deslizamentos. O estado
do Rio de Janeiro foi o que apresentou o maior percentual de
municípios atingidos por deslizamentos (57,6%). Dos 53 mu-
nicípios atingidos, 44 encontravam-se em áreas de encostas e
35 em áreas de ocupações irregulares. As secas foram o tipo
de desastre que afetou a maior parte dos municípios brasilei-
ros: 2.706 ou 48,6%, seguido por alagamento (31%) e enchen-
tes ou enxurradas (27%). A região Nordeste teve 82,6% de
seus municípios afetados, especialmente o Ceará, em que esta
proporção chegou a 98%, Piauí (94%), Paraíba (92%) e Rio
Grande do Norte (91%). Os outros desastres foram mais fre-
quentes no Sul, em que 53,9% dos municípios foram atingidos
por alagamento, 51% por enchentes ou enxurradas, 25% por
deslizamentos e 24,5% por erosão acelerada.19
Pelos dados apresentados neste trabalho, até o momento, veri-
fica-se que o Brasil tem sido atingido em grande escala pelos desastres
ambientais, tendo determinadas regiões recebido mais impactos que ou-
tras, como é o caso da região Nordeste, que sofre com as secas e estiagens
e das regiões Sul e Sudeste, tem percebido um aumento nos eventos re-
lacionados com as enchentes e inundações.

1.4 Impactos Climáticos

Os impactos climáticos propõem um verdadeiro desafio ineren-


temente global com implicações extremamente pertinentes para a

17 ANUÁRIO CLIMÁTICO DO BRASIL – 2018. 1. ed. [S. l.]: Instituto de Pes-


quisa Espacial - INPE, 2019. Disponível em: http://www.inpe.br/noticias/arqui
vos/pdf/anuarioClima2018_Final.pdf. Acesso em: 10 ago. 2020.
18 ANUÁRIO CLIMÁTICO DO BRASIL – 2019. 1. ed. [S. l.]: Instituto de Pes-

quisa Espacial - INPE, 2019. Disponível em: file:///C:/Users/5722330/Down lo-


ads/Anuario Clima2019-VF-1-1.pdf. Acesso em: 10 ago. 2020.
19 LOSCHI, Marília. MUNIC 2017: 48,6% dos municípios do país foram afetados

por secas nos últimos 4 anos. Digital. [S. l.], 5 jul. 2018. Disponível em: https://agen
ciadenoticias.ibge.gov.br/agencia-sala-de-imprensa/2013-agencia-de-noticias/relea-
ses/ 21636-munic-2017-48-6-dos-municipios-do-pais-foram-afetados-por-secas-
nos-ulti mos-4-anos. Acesso em: 9 set. 2020.

59
INGRID SILVEIRA NUNES

adaptação entre nós e as futuras gerações e entre as comunidades no pre-


sente e no futuro.
O conceito de impacto climático está diretamente ligado as mu-
danças climáticas como o próprio termo indica, referem-se a mudanças
no clima que estão ocorrendo em todo o planeta e que apresentam efeitos
que já podem ser vistos em várias de suas partes. Extinção de várias es-
pécies, derretimento das geleiras e aumento do nível do mar são apenas
algumas das consequências desencadeadas pelo aumento da temperatura
global.
No Quinto Relatório de Avaliação do Painel Intergovernamental
sobre Mudanças Climáticas (IPCC), publicado em 2014, por exemplo, o
órgão deixou claro que, que um cenário de 1,5°C é mais seguro que 2°C
em termos de impactos climáticos e que se medidas urgentes não forem
tomadas para estabilizar as emissões dos gases até 2100, o aumento da
temperatura global excederá 2ºC dos níveis pré-industriais, e terá conse-
quências ainda mais devastadoras, incluindo a perda de habitats naturais
e de espécies, a diminuição de calotas polares e o aumento do nível do
mar, com consequências na saúde, meios de subsistência, segurança hu-
mana e no crescimento econômico.20
Tal relatório, também constatou, que os maiores castigados pelas
mudanças climáticas serão provavelmente os países tropicais (países sub-
desenvolvidos) tais como o Brasil. Segundo os relatórios do IPCC, po-
derão ocorrer numerosas inundações, em virtude das excessivas tempes-
tades, e períodos longos de estiagem. Nessas duas situações, a pecuária
e a agricultura poderão ser prejudicadas, assim como a sobrevivência de
diversas espécies.21
Além disso, algumas regiões poderão sofrer com a intensifica-
ção de chuvas, o que causará deslizamentos incessantes de terra e avolu-
mamento das enchentes. Mais uma questão inquietante corresponde às
áreas costeiras, que sofrerão com o aumento do nível do mar, graças ao
degelo das geleiras ocasionado pelo aumento da temperatura média do
planeta.
A falta de água se tornará insuportável para as áreas secas do
mundo. Sendo assim, a água potável, que já é escassa em algumas regi-
ões, possivelmente será motivo de mortes e de disputas políticas. Ade-
mais, com o aumento alarmante da seca, os episódios de incêndios

20 Painel Intergovernamental Sobre Mudanças Climáticas. The IPCC and the Sixth
Assessment cycle. Switzerland, Abril 2020. Disponível em: https://
www.ipcc.ch/site/ assets/uploads/2020/05/2020-AC6_en.pdf. Acesso em: 2 ago.
2020.
21 PAINEL INTERGOVERNAMENTAL SOBRE MUDANÇAS CLIMÁTICAS.

Climate Change 2014 Synthesis Report Summary for Policymakers. Digital. [S.
l.], Abril 2020. Disponível em: https://www.ipcc.ch/site/assets/uploads/ 2018/02/
AR5_SYR_FINAL_SPM.pdf. Acesso em: 6 ago. 2020.

60
MEIO AMBIENTE, MIGRAÇÕES E PANDEMIA: REFLEXÕES DO MUNDO CONTEMPORÂNEO

poderão ser mais habituais, determinando a prejuízos irreparáveis de bi-


odiversidade e ameaçando a vida da população.
Diante desse quadro tão assustador, não é difícil concluir que
diversas espécies de plantas e animais entrarão em extinção. Fato esse
que já é possível observar nos dias atuais. Além disso, a produção de
alimentos poderá diminuir, uma vez que qualquer mudança climática
afeta diretamente o cultivo de diversas espécies. Com isso, ocorrerá uma
dificuldade de acesso à alimentação, não somente aliada à baixa produ-
ção, mas também pela possível elevação dos preços.
Segundo o IPCC, mesmo que a emissão de gases do efeito estufa
diminuam, a Terra continuará sofrendo com os danos residuais e terá que
aprender a lidar com o aumento gradual da temperatura.
Neste contexto, o Relatório Especial sobre Mudanças Climáti-
cas, Oceanos e Criosfera, divulgado em setembro de 2019, é mais alar-
mante, pois demonstra que países pequenos, com baixa altimetria média
e pequena extensão territorial, como Ilhas Maldivas, Kiribati e Tuvalu,
serão extintos.22
Quanto aos impactos climáticos no Brasil, uma pesquisa reali-
zada pela revista científica PLOS Medicine23, sugere que o Brasil, Co-
lômbia e Filipinas terão mais mortes por ondas de calor que crescerá com
as mudanças climáticas. Os modelos construídos pelos pesquisadores
consideram projeções que podem variar entre baixa, média e alta ocor-
rência de ondas de calor. No caso do Brasil, o estudo aponta para um
aumento de até 25% nas mortes relacionadas com esses eventos climáti-
cos em um cenário de baixa ocorrência. Se a ocorrência das ondas de
calor for alta, as mortes podem aumentar em até 75%.24
O World Wide Fund for Nature-WWF, que é uma Organização
não governamental internacional que atua nas áreas da conservação, in-
vestigação e recuperação ambiental, também apresenta dados nada ani-
madores com relação ao Brasil e as Mudanças Climáticas:

No nordeste do Brasil as áreas semiáridas e áridas vão sofrer


uma redução dos recursos hídricos por causa das mudanças
climáticas. A vegetação semiárida provavelmente será

22 Painel Intergovernamental Sobre Mudanças Climáticas. 24/09/2019. The Ocean


and Cryosphere in a Changing Climate, Monaco, 2019. Disponível em: https://re
port.ipcc.ch/srocc/pdf/SROCC_FinalDraft_FullReport.pdf. Acesso em: 18 ago.
2020.
23 PLOS Medicine é uma revista científica que publica, sob o sistema de peer review,

uma grande variedade de artigos científicos.


24 Guo Y, Gasparrini A, Li S, Sera F, VicedoCabrera AM, de Sousa Zanotti Stagliorio

Coelho M, et al. (2018) Quantifying excess deaths related to heatwaves under


climate change scenarios: A multicountry time series modelling study. PLoS
Med 15(7): e1002629. https://doi.org/10.1371/journal.pmed.1002629

61
INGRID SILVEIRA NUNES

substituída por uma vegetação típica da região árida. Nas flo-


restas tropicais, é provável a ocorrência de extinção de espé-
cies. A recarga estimada dos lençóis freáticos irá diminuir dra-
maticamente em mais de 70% no nordeste brasileiro (compa-
rado aos índices de 1961-1990 e da década de 2050). As chu-
vas irão aumentar no Sudeste com impacto direto na agricul-
tura e no aumento da frequência e da intensidade das inunda-
ções nas grandes cidades como Rio de Janeiro e São Paulo. No
futuro, o nível do mar, a variabilidade climática e os desastres
provocados pelas mudanças climáticas devem ter impactos
nos mangues. De 38 a 45% das plantas cerrado correm risco
de extinção se a temperatura aumentar em 1.7°C em relação
aos níveis da era pré-industrial.25

Estes dados são aterrorizantes e fortalecem o entendimento de


que os impactos climáticos suplicam por providências e que infelizmente
os locais mais vulneráveis estão fatalmente condicionados a absorver es-
ses impactos climáticos.

2 DAS MEDIDAS ADOTADAS PARA COMBATER IMPACTOS


CLIMÁTICOS

Atualmente o clima planetário e seus impactos têm sido temáti-


cas numerosamente discutidas. O estudo dos elementos que contribuem
para transformações e alterabilidade do clima, fundamentados no aque-
cimento global e aumento assíduo de eventos extremos, é sem dúvidas
um dos maiores desafios da ciência, bem como a pesquisa de seus efeitos,
prevenção e medidas adotadas para combater os impactos climáticos.
Há anos a Governança Ambiental Global do clima, mitiga ações
conjuntas para adotar medidas de combate as mudanças climáticas. Ho-
diernamente, a Governança Global para a mudança climática é represen-
tada pelo Acordo de Paris, no qual 195 países concordaram em limitar as
futuras emissões de gases de efeito estufa para que o aumento da tempe-
ratura global não seja superior a 2°C, se possível, não superior a 1,5°C
acima do nível pré-industrial.26
Segundo, Armada:

25 WWF BRASIL. Os impactos das mudanças climáticas no Brasil. In: Brasil e as


mudanças climáticas. Digital. [S. l.], 2019. Disponível em: https://www.wwf.org.
br/natureza_brasileira/reducao_de_impactos2/clima/politicas_de_clima/brasil_mu-
dancas_ climaticas/. Acesso em: 5 set. 2020.
26 MINISTÉRIO DO MEIO AMBIENTE (Brasil). Acordo de Paris. Digital. [S. l.],

2020. Disponível em: https://www.mma.gov.br/clima/convencao-das-nacoes-uni-


das/a cordo-de-paris. Acesso em: 11 ago. 2020.

62
MEIO AMBIENTE, MIGRAÇÕES E PANDEMIA: REFLEXÕES DO MUNDO CONTEMPORÂNEO

O comportamento verificado pelas emissões globais de CO2


após o Acordo de Paris é decepcionante e, ao mesmo tempo,
paradoxal. O comportamento verificado é decepcionante por-
que demonstra a falta de compromisso dos Estados com a re-
dução das emissões de GEE e, consequentemente, com a pro-
posta de limitar o nível de aquecimento global até 2100. Ao
mesmo tempo, o comportamento também é paradoxal porque
determinam um desrespeito aos compromissos assumido pe-
rante os nacionais de cada Estado.27

Com isso, verifica-se, que o Acordo de Paris infelizmente não


foi efetivamente aderido pelos países que ratificaram o acordo.
E aqui esclarecesse que o trabalho fará uma análise das Preten-
didas Contribuições Nacionalmente Determinadas, que o Brasil adotou
face ao Acordo de Paris, pois foi uma das últimas ações globais adotadas
para combater os impactos climáticos.
Como parte da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre
Mudanças Climáticas (UNFCCC), o Brasil ratificou muitos tratados in-
ternacionais relacionados à proteção do meio ambiente, e é signatário do
Acordo Internacional sobre Mudança Climática da UNFCCC (Acordo de
Paris), que ocorreu em dezembro de 2015, tendo sido ratificado e trans-
formado em lei federal nacional em 21 de setembro de 2016, sob o De-
creto N. 9.073 / 2017.
A adoção do Acordo de Paris, em 2015, inaugurou nova fase do
regime multilateral, marcada por maior ambição para o enfrentamento da
mudança do clima em escala mundial, em que os governos se envolveram
na construção de seus próprios compromissos, a partir das chamadas Pre-
tendidas Contribuições Nacionalmente Determinadas (iNDC, na sigla
em inglês). Por meio das iNDCs, cada nação apresentou sua contribuição
de redução de emissões dos gases de efeito estufa, seguindo o que cada
governo considera viável a partir do cenário social e econômico local.
De acordo com Ministério do Meio Ambiente:

O Brasil, após ratificar o Acordo de Paris, se comprometeu a


reduzir as emissões de gases de efeito estufa em 37% abaixo
dos níveis de 2005, em 2025, com uma contribuição indicativa
subsequente de reduzir as emissões de gases de efeito estufa

27 ARMADA, Charles Alexandre Souza. GOVERNANÇA GLOBAL E JUSTIÇA


AMBIENTAL FACE AOS DESAFIOS DA MUDANÇA CLIMÁTICA PLANETÁ-
RIA. In: ARMADA, Charles Alexandre Souza. GOVERNANÇA GLOBAL E
JUSTIÇA AMBIENTAL FACE AOS DESAFIOS DA MUDANÇA CLIMÁ-
TICA PLANETÁRIA. 2016. Tese (Doutorado) – Universidade do Vale do Itajaí,
Itajaí/SC, 2016.

63
INGRID SILVEIRA NUNES

em 43% abaixo dos níveis de 2005, em 2030. Para isso, o país


se comprometeu a aumentar a participação de bioenergia sus-
tentável na sua matriz energética para aproximadamente 18%
até 2030, restaurar e reflorestar 12 milhões de hectares de flo-
restas, bem como alcançar uma participação estimada de 45%
de energias renováveis na composição da matriz energética em
2030. A NDC do Brasil corresponde a uma redução estimada
em 66% em termos de emissões de gases efeito de estufa por
unidade do PIB (intensidade de emissões) em 2025 e em 75%
em termos de intensidade de emissões em 2030, ambas em re-
lação a 2005. O Brasil, portanto, reduzirá emissões de gases
de efeito estufa no contexto de um aumento contínuo da popu-
lação e do PIB, bem como da renda per capita, o que confere
ambição a essas metas.28

Entretanto verifica-se que o governo brasileiro adotou ações


questionáveis que excluem a proteção das reservas florestais, sinalizam
obstruir os direitos de terras indígenas e elevam a um aumento do des-
matamento. As emissões decorrentes das mudanças no uso da terra cres-
ceram 23% em 2016, em comparação com 2015, com mais de 50% na
região amazônica, respondendo por aproximadamente metade de todos
os gases de efeito estufa liberados na atmosfera pelo Brasil. Isto foi im-
pulsionado por um aumento de 29% no desmatamento da Amazônia du-
rante o período entre agosto de 2015 e julho de 2016, de acordo com o
Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE).29 A elevação das emis-
sões se direciona opostamente as responsabilidades assumidas pelo Bra-
sil sob o Acordo de Paris, que incluem uma meta de zero desmatamento
ilegal na Amazônia brasileira até 2030.30
Outro dado importante é do SEEG (Sistema de Estimativa de
Emissões de Gases de Efeito Estufa), do Observatório do Clima, que re-
vela que o desmatamento na Amazônia segue sendo o principal respon-
sável pela elevação das emissões de gases do efeito estufa no Brasil, que,

28 Ministério do Meio Ambiente (Brasil). 12/09/2016. Pretendida Contribuição Na-


cionalmente Determinada, [S. l.], 2016. Disponível em: https://www.mma.gov.
br/clima/convencao-das-nacoes-unidas/acordo-de-paris. Acesso em: 16 set. 2020.
29 A taxa consolidada gerada pelo Projeto de Monitoramento do Desmatamento na

Amazônia Legal por Satélite (PRODES), do Instituto Nacional de Pesquisas Espaci-


ais (INPE), apontou o resultado de 6.947 km2 de corte raso no período de agosto de
2016 a julho de 2017. O resultado indica uma diminuição de 12% em relação a 2016,
ano em que foram apurados 7.893 km2. Disponível em: http://www.obt.inpe.
br/OBT/no ticias/inpe-registra-6-947-km2-dedesmatamento-na-amazonia-em-2017
Acesso em: 5 Ago. 2020. Não obstante essa pequena redução em relação ao ano an-
terior (2016) as taxas são altíssimas se considerarmos a meta de redução zero.
30 CLIMATE ACTION TRACKER. Dez. 2020. Disponível em: https:// climate-

action tracker.org/countries/brazil/pledges-and-targets/ Acesso em: 09 Set. 2020.

64
MEIO AMBIENTE, MIGRAÇÕES E PANDEMIA: REFLEXÕES DO MUNDO CONTEMPORÂNEO

em 2016, emitiu 2,3 bilhões de toneladas brutas de CO2e, 9% a mais que


o emitido em 2015, a maior elevação em 13 anos, e o maior número desde
2008.31
Denota-se que embora o governo tenha divulgado as metas
como, desafiadoras, há vários pontos a serem examinados e esclarecidos,
especialmente quando as políticas públicas não respeitam às metas esta-
belecidas na NDC brasileira.

3 O DISCURSO DE JUSTIÇA CLIMÁTICA FOI


INCORPORADO DE FORMA EFETIVA NO BRASIL?

Um dos pontos que demonstra que o Brasil está longe de incor-


porar o discurso de Justiça Climática é quanto ao acordo de Paris em que
a Confederação Nacional dos Municípios destaca que, apesar de o Brasil
ter ratificado o acordo de Paris, ainda não está claro como que o país irá
cumprir com os compromissos assumidos, pois são ações que necessitam
do envolvimento direto dos Municípios. Apesar disso, ainda não há de-
finição do governo federal de qual será o plano de ações e quais progra-
mas serão criados para atingir as metas brasileiras e de como os Municí-
pios serão inseridos no planejamento.
Outro fato importante que comprova que o Brasil não incorpo-
rou o discurso justiça climática efetivamente é revelado com os cortes
orçamentários de 50% para o Ministério do Meio Ambiente32 e em 70%
das autoridades de monitoramento do desmatamento e outras áreas le-
vantam questões preocupantes em torno da capacidade do governo de
fiscalizar adequadamente os impactos climáticos.33
Também há plano nacional e os planos setoriais de mitigação e
adaptação estão com seus processos de revisão em atraso. Segundo a re-
gulamentação da Plano Nacional sobre Mudança do Clima (PNMC), de-
veriam passar por revisões em períodos regulares não superior a dois
anos. O Plano Nacional sobre Mudança do Clima, criado em 2008, tam-
bém está sujeito pela referida lei a revisões que precisam ocorrer

31 SEEG (Sistema de Estimativa de Emissões de Gases de Efeito Estufa). Emissões


totais. Disponível em: http://plataforma.seeg.eco.br/total_emission Acesso em: 03
Ago. 2020.
32 Climate Home. Brazil halves environment budget amid rising Amazon defor-

estation. Climate Home – climate change news. 21 abr. 2017. Disponível em:
http:// www.climatechangenews.com/2017/04/03/brazil-halvesenvironment-budget-
amid-ri sing-amazon-deforestation/ Acesso em: 07 Set. 2020.
33 4CLIMATE HOME. Brazil’s Temer extends amnesty to Amazon landgrab-

bers. Climate Home. Climate change news. July, 2017. Disponível em:
http://www.clima techangenews.com/2017/07/17/brazils-temer-extendsamnesty-
amazon-land-grabbers/ Acesso em: 08 Set. 2020.

65
INGRID SILVEIRA NUNES

previamente à elaboração dos Planos Plurianuais (PPA). O Sistema Mo-


dular de Monitoramento e Acompanhamento das Reduções de Emissões
de Gases de Efeito Estufa (SMMARE), dada a sua importância estraté-
gica para a PNMC e agora para monitoramento futuro da NDC, deveria
estar concluído e em atividade, no entanto, ainda não está.34
Mesmo que o Brasil tente construir políticas para implementar
seus compromissos climáticos, como recuperar 12 Mha de vegetação na-
tiva35, os recentes impasses ambientais, mencionados anteriormente, vão
contra as políticas ambientais globais e colocam em risco as chances de
combater os impactos climáticos.
Recentemente, como mencionado no item 1.2, o Brasil inova
com a discussão da ADPF 708, que tem por objeto a reativação do Fundo
Clima, que oportuniza o avanço do debate climático no Brasil.
Por decisão do ministro Barroso, o processo foi recebido como
ADPF, instrumento jurídico que, segundo ele, “comporta uma maior he-
terogeneidade quanto a seu objeto, bem como maior flexibilidade quanto
às providências de ordem normativa e/ou concretas concedida. A ADPF
708, originalmente ajuizada como Ação Direta de Inconstitucionalidade
por Omissão (ADO 60), em junho 2020, o Partido Socialista Brasileiro
(PSB), o Partido Socialismo e Liberdade (PSOL), o Partido dos Traba-
lhadores (PT) e a Rede Sustentabilidade apontam a omissão do governo
federal por não adotar providências para o funcionamento do Fundo
Clima, que teria sido indevidamente paralisado em 2019 e 2020, bem
como diversas outras ações e omissões na área ambiental que estariam
levando a uma situação de retrocesso e de desproteção em matéria ambi-
ental. A ADPF apresenta as seguintes demandas:

(i) suspenda o comportamento lesivo consistente em não to-


mar as medidas administrativas necessárias para disponibili-
zar os recursos relativos ao Fundo Clima; (ii) apresente o
Plano Anual de Aplicação de Recursos do Fundo para o ano
de 2020 e não se omita de elaborar os demais planos anuais
cabíveis; (iii) se abstenha de contingenciar recursos do Fundo.
No mérito, postulam o reconhecimento da inconstitucionali-
dade da conduta da União na condução do Fundo Clima, bem
como na adoção das medidas de proteção ambiental

34 WRI. SPERANZA, J., ROMEIRO, V., BETIOL, L. E BIDERMAN, R. Monito-


ramento da implementação da política climática brasileira. Novembro, 2017.
Disponível em: https://wribrasil.org.br/sites/default/files/monitoramento-da-imple
mentacao-da-politica-climatica-brasileira.pdf
35 Decreto Federal N. 8.972 de 23 de Janeiro de 2017.

66
MEIO AMBIENTE, MIGRAÇÕES E PANDEMIA: REFLEXÕES DO MUNDO CONTEMPORÂNEO

pertinentes à mitigação de mudanças climáticas. Pedem,


ainda, a confirmação das cautelares.36

Após o recebimento o ministro Luís Roberto Barroso, relator da


Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 708,
convocou audiência pública, realizada nos dias 21 e 22 de setembro
2020, com integrantes do governo federal, organizações da sociedade ci-
vil, institutos de pesquisa, acadêmicos e empresários, com participação
dos expositores por videoconferência e transmissão em tempo real, de-
vido a pandemia.
Ao final dos debates, segundo o site do STF:

O ministro Barroso afirmou que o objetivo da reunião foi co-


nhecer os fatos e as diferentes perspectivas envolvidas. “O
mundo comporta diversos pontos de observação, e a verdade
não tem dono, embora a mentira deliberada tenha”, assinalou.
“Um de nossos esforços aqui foi identificar narrativas que não
têm apoio nos fatos”.
Barroso afirmou que, a partir das apresentações, é possível ex-
trair alguns fatos objetivos e incontroversos, entre eles o de
que o desmatamento ilegal e as queimadas causadas por ação
humana cresceram expressivamente em 2019 e, “ainda mais,”
em 2020. Ainda segundo o ministro, os relatos permitem cons-
tatar uma redução significativa na fiscalização e no número de
autuações por infrações ambientais, conforme reconhecido
pelo presidente do Ibama, ainda que com divergência quanto
às causas.
Outro fato constatado pelo relator foi que, até a propositura da
ADPF 708, o Fundo do Clima não havia aprovado o plano de
investimento nem alocado seus recursos nas finalidades le-
gais. Barroso observou que o ministro do Meio Ambiente jus-
tificou a demora e assegurou que a omissão já teria sido sa-
nada.37

O relator ainda apontou que o Brasil pode sofrer com boicotes


de produtos brasileiros, em razão de seu posicionamento anti-política
ambiental. Barroso, frisou o sério problema que o Brasil enfrenta por ser

36 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. ADO 60. Registro em: 28 jun. 2020. Dispo-
nível em: http://redir.stf.jus.br/estfvisualizadorpub/jsp/consultarprocessoeletro
nico/ComsultarProcessoEletronico.jsf?seqobjetoincidente=5951856. Acesso em: 23
jan. 2021.
37 SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL (Brasil). Barroso defende agenda efetiva de

proteção ambiental no encerramento da audiência pública. Notícias STF, Site, 22 set.


2020. Disponível em: http://www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?
idConteudo=45 2174. Acesso em: 29 jan. 2021.

67
INGRID SILVEIRA NUNES

um dos sete maiores emissores de gases de efeito estufa. O Ministro res-


saltou que o PIB da região onde se localiza a Floresta Amazônica está
estagnado, apesar do crescente desmatamento, que só fazem contribuir
para a destruição de um valioso ecossistema, do qual dependem cerca de
25 milhões de pessoas que habitam a região.38
O ministro observou como diagnósticos:

ser consenso que o Fundo do Clima, ao viabilizar estudos, pro-


jetos e empreendimentos de preservação da floresta, tem papel
importante no atingimento das metas de redução de emissões
assumidas pelo país. Constatou, ainda, que não há incompati-
bilidade entre a preservação da floresta e o agronegócio e que
ambos são prejudicados por atividades ilegais. “Para resolver-
mos nossos problemas, precisamos fazer diagnósticos corre-
tos, e não criar uma realidade imaginária paralela. Olhando
para frente, todos, governo, ONGs, acadêmicos e empresas,
têm a posição de que a floresta de pé vale mais que a derru-
bada, concluiu.39

Recentemente em janeiro de 2021, o Partido Socialista Brasi-


leiro – PSB, o Partido Socialismo e Liberdade – PSOL, o Partido dos
Trabalhadores – PT e a rede sustentabilidade, ingressaram com um re-
querimento de pedido de Tutela Provisória, para que seja determinada a
imediata SUSPENSÃO do procedimento relativo ao financiamento do
projeto “Lixão Zero” do Governo do Estado de Rondônia através do
FUNDO CLIMA, agora encabeçado pelo Consórcio Intermunicipal da
Região Centro-Leste do Estado de Rondônia (Cimcero), até que todas as
irregularidades existentes e indicadas sejam sanadas por completo, em
especial aquelas relativas: (i) à necessidade de publicação de edital pú-
blico; e (ii) ao respeito à Lei Federal n. 4.320/1964, que regula os orça-
mentos públicos, e ao Decreto n. 93.872/1986, que regulamenta a unifi-
cação dos recursos do Tesouro Nacional.40

38 STF (Brasil). Partido Socialista Brasileiro – PSB, o Partido Socialismo e Liberdade


– PSOL, o Partido dos Trabalhadores – PT e a rede sustentabilidade. 05/01/2021.
Pedido de Tutela Provisória, [S. l.], 5 jan. 2021. Disponível em: http://re-
dir.stf.jus.br/estfvisualizadorpub/jsp/consultarprocessoeletronico/ConsultarProces-
soEletronico.jsf?seqobjetoincidente=5951856. Acesso em: 25 jan. 2021.
39 SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL (Brasil). Barroso defende agenda efetiva de

proteção ambiental no encerramento da audiência pública. Notícias STF, Site, 22 set.


2020. Disponível em: http://www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?
idConteudo=452174. Acesso em: 29 jan. 2021.
40 STF (Brasil). Partido Socialista Brasileiro – PSB, o Partido Socialismo e Liberdade

– PSOL, o Partido dos Trabalhadores – PT e a rede sustentabilidade. 05/01/2021.


Pedido de Tutela Provisória, [S. l.], 5 jan. 2021. Disponível em:

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MEIO AMBIENTE, MIGRAÇÕES E PANDEMIA: REFLEXÕES DO MUNDO CONTEMPORÂNEO

Apesar da crise ambiental histórica, os indicadores reunidos na


ADPF mostram um esforço inédito da administração federal para enfra-
quecer instituições, normas e políticas que poderiam conter a destruição
da floresta.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Ainda que trabalhos estejam em desenvolvimento, e o campo de


análise seja cada vez mais amplo, não resta dúvida de que a adoção da
Governança Ambiental Global, principalmente pelos países desenvolvi-
dos, pois estes são os que mais contribuem para os impactos climáticos
e possuem mais condições de combater esse fenômeno, é imprescindível.
Neste contexto, surge a justiça climática com a percepção de que os im-
pactos das mudanças climáticas atingem de forma e intensidade diferen-
tes grupos sociais distintos, resultando na injustiça climática que implica
nas demandas e reivindicações por justiça climática.
No Brasil, verifica-se um aumento da intensidade e frequência
de desastres ambientais, bem como elevação das emissões de gases do
efeito estufa no país, que conforme dados apresentados nesse trabalho,
ocorreram após o Acordo de Paris, o que demonstra o afastamento do
país em cumprir o compromisso ratificado no então acordo, evidenciando
a falta de incorporação da justiça climática no país.
Diante do desinteresse ambiental do Brasil, talvez uma forma de
combater os impactos climáticos oriundos das mudanças climáticas, seja
a implementação de uma penalização pelo não cumprimento das NDC,
mediante a multa. Tal multa poderia ser usada para financiar países em
desenvolvimento que não tem recursos para enfrentar o fenômeno.
E por fim, cabe ressaltar que os estudos e o monitoramento des-
ses impactos climáticos são de árdua execução, e a avaliação real dos
danos causados se torna sujeita a um acompanhamento longitudinal das
áreas e indivíduos afetados.

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INGRID SILVEIRA NUNES

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72
MEIO AMBIENTE, MIGRAÇÕES E PANDEMIA: REFLEXÕES DO MUNDO CONTEMPORÂNEO

73
A DEGRADAÇÃO DA AMAZÔNIA E O EFEITO PANDÊMICO

Isabeli Naiára Mariano1


Nicole Felisberto Maciel2

INTRODUÇÃO

O presente artigo tem como objeto tecer observações sobre o pa-


pel das políticas públicas brasileiras na intensificação da degradação am-
biental durante o cenário pandêmico da Covid-19. Para tanto, o artigo
está dividido em dois itens.
No primeiro item será tratado sobre a origem do vírus e os refle-
xos da atuação do homem na natureza que contribuíram com um ambi-
ente propício para o desencadear da pandemia da Covid-19. Para isso,
pretende-se demonstrar que não é a primeira vez que a sociedade enfrenta
uma pandemia, sendo, portanto, uma realidade já prevista e estudada por
cientistas a anos, como o relatório publicado em 2016 pelo Programa das
Nações Unidas para o Meio Ambiente - PNUMA que constitui-se em um
documento comprobatório da deficiência das políticas públicas brasilei-
ras na contenção de riscos ambientais e de potencial pandêmico.
No que tange ao segundo item, pretende-se expor a correlação
entre a pandemia da Covid-19 e o progressivo desmatamento da Amazô-
nia. Para isso, analisa-se o processo de globalização que desencadeou
fatores precários de ordem sanitária e ambiental, que para tanto, fazem
parte da realidade de muitas comunidades no Brasil e que contribuem
para o surgimento e disseminação de pragas. Ademais, apresenta como
núcleo da discussão o desfoque que foi dado ao desmatamento da

1 Pós-graduanda em Relações Internacionais Contemporâneas pela Universidade do


Vale do Itajaí (UNIVALI). Graduada em Relações Internacionais pela Universidade
do Vale do Itajaí (UNIVALI). Endereço eletrônico: isabelimariano@outlook.com.
2 Mestranda em Ciências Jurídicas pelo Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu

em Ciência Jurídica (PPCJ) da Universidade do Vale do Itajaí (UNIVALI), por meio


do Programa de Suporte à Pós-Graduação de Instituições de Ensino Particulares
(PROSUP/CAPES), na linha de pesquisa Constitucionalismo e Produção do Direito.
Pós-graduada em Direito Médico pelo Complexo de Ensino Renato Saraiva (CERS).
Pós-graduanda em Relações Internacionais Contemporâneas pela Universidade do
Vale do Itajaí (UNIVALI). Graduada em Direito pela Universidade do Vale do Itajaí
(UNIVALI). Endereço eletrônico: nicole_maciel@edu.univali.br.
ISABELI NAIÁRA MARIANO E NICOLE FELISBERTO MACIEL

Amazônia durante o período de pandemia que poderá gerar efeitos irre-


versíveis. Sobretudo, destaca-se a importância de uma discussão trans-
nacional sobre o tema em virtude da crescente negligência dadas as polí-
ticas públicas do país e igualmente das Organizações Internacionais para
tratarem da matéria ambiental.
Dessa forma, ressalta-se a importância do tema, devido a neces-
sidade de compreender o papel do Estado no desenvolvimento de políti-
cas públicas ambientais e sanitárias mais eficazes ao ponto de suportar
novas pandemias. Ademais, a pesquisa mostra-se fundamental na medida
que traz destaque aos riscos do desmatamento da Amazônia e a indispen-
sabilidade da cooperação internacional e da concretização de um Direito
Transnacional na contenção de possíveis riscos ambientais e que afetem
a saúde global.
A pesquisa, de metodologia qualitativa, foi realizada com base
em livros, artigos acadêmicos e discursos. Por tratar-se de um tema que
se encontra em contínua evolução, sem obter até a presente elaboração
dados científicos precisos, fora utilizada como base notícias de platafor-
mas digitais. Envolve ainda a pesquisa de base exploratória e o levanta-
mento de dados e informações para análise através do método bibliográ-
fico.

1 ORIGENS DA COVID-19 E REFLEXOS DA ATUAÇÃO DO


HOMEM NO MEIO AMBIENTE

A civilização humana, ao longo de sua existência, foi marcada


por diversos momentos em que pestes, gripes e outras doenças infeccio-
sas surgiram. Cada época registra a atuação de determinada espécie de
doença infecciosa em diversos territórios e em diferentes proporções. Um
exemplo de grande impacto foi a Peste Negra. No século XIV registrou-
se elevados números de falecimentos na Europa, sendo difícil precisar a
quantia de óbitos no período. Estima-se que tenha ocorrido a perda de
pelo menos um terço da população europeia, além dos milhões de mortos
na Ásia e no Oriente Médio3.
A Gripe Espanhola, outro exemplo, foi responsável por aproxi-
madamente 40 a 50 milhões de óbitos em meados de 1918 e 1920 en-
quanto a Gripe Suína H1N1, originária do México, ocasionou a morte de

3 REZENDE, Joffre Marcondes de. À sombra do plátano: crônicas de história da me-


dicina. As grandes epidemias da história. São Paulo: Editora Unifesp, p. 73-82, 01
jan. 2009. Disponível em: http://books.scielo.org/id/8kf92/pdf/rezende-9788561
673635-08.pdf. Acesso em: 26 ago. 2020.

76
MEIO AMBIENTE, MIGRAÇÕES E PANDEMIA: REFLEXÕES DO MUNDO CONTEMPORÂNEO

aproximadamente 16 mil pessoas entre os anos de 2009 e 2010, tornando-


se o primeiro causador de uma pandemia no século atual4.
Houve muita evolução em pesquisas nas áreas biológicas e da
saúde. Do mesmo modo, o aumento populacional e por consequência, o
impacto desse crescimento se tornaram fatores que dificultaram o aten-
dimento das demandas internacionais, principalmente no último século.
Ademais, no que tange os fatores causadores de propagação de vírus, em
um boletim publicado por meio da Organização Mundial da Saúde –
OMS destaca-se uma característica em específico, “pode-se dizer que as
pandemias ocorrem anualmente em cada um dos hemisférios temperados
sul e norte.”5 Sob essa perspectiva, variantes como o atual aquecimento
global e o desmatamento poderiam ser considerados agravantes de tais
eventos pandêmicos.
O presente cenário é novamente marcado por um vírus desco-
nhecido. Em termos biológicos, o novo coronavírus (Covid-19) consiste
em “RNA vírus envelopados, comumente encontrados em humanos, ou-
tros mamíferos e aves, capazes de causar doenças respiratórias, entéricas,
hepáticas e neurológicas”6. Além disso, o vírus apresenta seis espécies
que provocam doenças em humanos, sendo que “duas espécies (Sars-Cov
e Mers-Cov) provocam síndrome respiratória aguda grave com taxas ele-
vadas de mortalidade”7, o que justifica a existência de uma grande par-
cela de assintomáticos.
Devido a nova mutação do vírus e suas procedências desconhe-
cidas, havia inconsistências entre alguns dados, uma vez que diversas
pesquisas estavam sendo produzidas ao mesmo tempo na expectativa de
documentar a maior quantidade de dados existentes para a produção de
uma vacina e, por consequência, para o controle da pandemia. A origem
incerta também trouxe impacto ao controle da situação, no entanto,

4 REVISTA GALILEU. Conheça as 5 maiores pandemias da história: O corona-


vírus não é o primeiro causador de pandemias mundiais. 29 mar. 2020. Disponível
em: https://revistagalileu.globo.com/Ciencia/Saude/noticia/2020/03/conheca-5-mai-
ores-pan demias-da-historia.html. Acesso em: 26 ago. 2020.
5 “pandemics can be said to occur annually in each of the temperate southern and

northern hemispheres.” (WORLD HEALTH ORGANIZATION. The classical defi-


nition of a pandemic is not elusive. Bulletin of the World Health Organization.
jul.2011. Vol. 89, p. 540-541, 2020. Tradução nossa. Disponível em:
https://www.who.int/bulletin/volumes/89/7/11-088815/en/#:~:text=A%20pandemic
%20is%20defined%20as,are%20 not%20considered%20pandemics. Acesso em: 26
ago. 2020).
6 BELASCO, Angélica Gonçalves Silva; FONSECA, Cassiane Dezoti da. Coronavi-

rus 2020. Rev. Bras. Enferm., Brasília, v. 73, n. 2, 2020, p. 1. Disponível em:
https://doi. org/10.1590/0034-7167-2020730201. Acesso em: 31 ago. 2020.
7 BELASCO, Angélica Gonçalves Silva; FONSECA, Cassiane Dezoti da. Coronavi-

rus 2020. Rev. Bras. Enferm., Brasília, v. 73, n. 2, 2020, p. 1. Disponível em:
https://doi. org/10.1590/0034-7167-2020730201. Acesso em: 31 ago. 2020.

77
ISABELI NAIÁRA MARIANO E NICOLE FELISBERTO MACIEL

conforme Roujian et all determinam, o novo coronavírus já deveria ter


sido considerado desde o início uma questão de saúde pública:

Epidemiologicamente, oito dos nove pacientes em nosso es-


tudo tinham um histórico de exposição ao mercado de frutos
do mar de Huanan em Wuhan, sugerindo que eles poderiam
ter estado em contato próximo com a fonte de infecção no
mercado. No entanto, um paciente nunca havia visitado o mer-
cado, embora tivesse se hospedado em um hotel próximo ao
mercado antes do início da doença. Este achado sugere uma
possível transmissão por gotículas ou que o paciente foi infec-
tado por uma fonte atualmente desconhecida. Evidências de
grupos de familiares infectados e trabalhadores médicos agora
confirmaram a presença de transmissão de pessoa para pessoa.
Claramente, essa infecção é um grande problema de saúde pú-
blica, especialmente porque esse surto coincide com o pico da
onda de viagens do Festival da Primavera Chinês, durante a
qual centenas de milhões de pessoas viajarão pela China8.

Em um dos primeiros relatórios emitidos pela OMS em meados


de fevereiro de 2020 referente ao novo coronavírus, já se observava o
risco de crescimento e um possível futuro cenário pandêmico, uma vez
que já registrava casos em 24 países e um cruzeiro que foi posto em qua-
rentena devido a confirmação de que mais de 60 pessoas infectadas esta-
riam a bordo9. No mês seguinte, no dia 11 de março de 2020, o caso do
novo coronavírus – biologicamente denominado Sars-Cov-2 – veio a ser

8 “Epidemiologically, eight of the nine patients in our study had a history of exposure
to the Huanan seafood market in Wuhan, suggesting that they might have been in
close contact with the infection source at the market. However, one patient had never
visited the market, although he had stayed in a hotel near the market before the onset
of their illness. This finding suggests either possible droplet transmission or that the
patient was infected by a currently unknown source. Evidence of clusters of infected
family members and medical workers has now confirmed the presence of human-to-
human transmission. Clearly, this infection is a major public health concern, partic-
ularly as this outbreak coincides with the peak of the Chinese Spring Festival travel
rush, during which hundreds of millions of people will travel through China.”
(Roujian, Lu. Genomic characterisation and epidemiology of 2019 novel corona-
virus: implications for virus origins and receptor binding. The Lancet. Vol. 395, pp.
565-574, 2020. Tradução nossa. Disponível em: https://www.thelancet. com/arti-
cle/S0140-6736(20)30251-8/fulltext#seccestitle180. Acesso em: 26 ago. 2020).
9 WORLD HEALTH ORGANIZATION. Novel Coronavirus (2019-nCoV) Situa-

tion Report N. 20. 9 fev. 2020. Disponível em: https://www.who.int/docs/default-


source/coronaviruse/situation-reports/20200209-sitrep-20-ncov.pdf?sfvrsn=6f80d
1b9_4. Acesso em: 26 ago. 2020.

78
MEIO AMBIENTE, MIGRAÇÕES E PANDEMIA: REFLEXÕES DO MUNDO CONTEMPORÂNEO

determinado como um cenário de pandemia por meio do discurso do di-


retor da OMS, após registros de mais de 118 mil casos em 114 países10.
A realidade de um possível cenário pandêmico já havia sido aler-
tada muito antes, em análise a uma trajetória de eventos entre os anos de
1940 e 2012. O Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente -
PNUMA, em seu relatório “Emerging Issues of Environmental Con-
cern”, emitido em 2016, já destacava o aumento de doenças infecciosas
– do tipo zoonóticas – emergindo nos registros internacionais, conforme
mapa11:

Antes de aprofundar os dados apresentados no relatório, faz-se


necessário destacar a realidade da relevância dada a tal documento e aos
responsáveis pelos dados reunidos. O Programa das Nações Unidas para
o Meio Ambiente – PNUMA, como já expressa em sua sigla configura
um programa dentro da Organização das Nações Unidas - ONU. Dessa
forma, sua atuação e relevância diferem de instituições como a Organi-
zação Mundial da Saúde (OMS) e a Organização Mundial do Trabalho
(OMT).
A pauta do Meio Ambiente no cenário mundial apresenta uma
visível atuação em segundo plano. Primeiramente por se configurar como
um programa. Diferente de outros programas como o de Assentamentos

10 WORLD HEALTH ORGANIZATION. WHO Director-General’s opening re-


marks at the media briefing on COVID-19 – 11 March 2020. Speeches. 11 mar. 2020.
Disponível em: https://www.who.int/dg/speeches/detail/who-director-general-s-ope-
ning-remarks-at-the-media-briefing-on-covid-19---11-march-2020. Acesso em: 26
ago. 2020.
11 UNITED NATIONS ENVIRONMENT PROGRAMME. UNEP Frontiers 2016

Report: Emerging Issues of Environmental Concern. 2 nov. 2016. Disponível em:


https://environmentlive.unep.org/media/docs/assessments/UNEP_Fronti-
ers_2016_report_e merging_issues_of_environmental_concern.pdf. Acesso em: 26
ago. 2020.

79
ISABELI NAIÁRA MARIANO E NICOLE FELISBERTO MACIEL

e de Desenvolvimento, o Meio Ambiente não se encaixa diretamente em


outras pastas, o que torna difícil difundir o debate a nível internacional.
É questionável ainda como pautas como aviação civil, propriedade inte-
lectual e o serviço postal dispõem de uma estrutura de “Organização
Mundial” enquanto a pauta ambiental é cada vez mais afastada dos de-
bates.
Tão visível é o perfil de segundo plano atribuído ao PNUMA
que, sendo uma agência que já perdura há quase 50 anos, além de não
desempenhar um papel de destaque em meio as discussões, também está
geograficamente deslocada do debate, tendo sua sede em Nairóbi, no
Quênia, diferente da realidade da maioria das agências que localizam-se
em Genebra e Berna, por exemplo. Tal cenário configura o desinteresse
aos alertas dados pelo relatório da agência ambiental.
O relatório reforçou como às práticas de pecuária, por exemplo,
servem como ponte para a propagação de vírus que incidem em episódios
de epidemias. O fator humano, indicado pelo relatório como “ocupação
humana, ou invasões em florestas e outros habitats”12 também foi asso-
ciado como responsável para intensificação destes eventos. Frente aos
fatores agravantes e o próprio vírus, fica claro o despreparo dos Estados
e das Organizações Internacionais (OIs), uma vez que tem se notado a
desconsideração de variantes, como o efeito das questões climáticas e
das queimadas que contribuem para a agravação de outros setores, como
o suprimento no atendimento de infectados pela Covid-19. Ademais, o
gráfico13 a seguir apresentou informações quanto aos fatores que incidi-
ram no surgimento de doenças:

12 “human settlement, or encroachments into forests and other habitats”. (UNITED


NATIONS ENVIRONMENT PROGRAMME. UNEP Frontiers 2016 Report:
Emerging Issues of Environmental Concern. 2 nov. 2016. Tradução nossa. Disponí-
vel em: https://environmentlive.unep.org/media/docs/assessments/UNEP_Fron
tiers_2016_report_emerging_issues_of_environmental_concern.pdf. Acesso em: 26
ago. 2020).
13 UNITED NATIONS ENVIRONMENT PROGRAMME. UNEP Frontiers 2016

Report: Emerging Issues of Environmental Concern. 2 nov. 2016. p. 24. Disponível


em: https://environmentlive.unep.org/media/docs/assessments/UNEP_Fron ti-
ers_2016_report_emerging_issues_of_environmental_concern. pdf. Acesso em: 26
ago. 2020.

80
MEIO AMBIENTE, MIGRAÇÕES E PANDEMIA: REFLEXÕES DO MUNDO CONTEMPORÂNEO

Quanto aos tópicos mencionados do relatório apresentado pelo


PNUMA, o Brasil desempenha um certo papel de peso. Por um lado, o
país abriga em um único bioma grande parte da maior floresta tropical
do mundo: a Floresta Amazônica, que igualmente abriga a maior bacia
hidrográfica, na qual pertence o rio Amazonas. Por outro, não há de-
monstração de zelo pelo próprio patrimônio, uma vez que dá total prefe-
rência às práticas de pecuária e agricultura, atividades pelas quais é re-
conhecido internacionalmente.
Ao observarmos o gráfico acima, dá-se destaque aos maiores
motivadores de doenças emergentes: mudanças no uso das terras e na
indústria agrícola: duas nocivas especialidades brasileiras, como já men-
cionado. Fez-se necessário mencionar que outros fatores como clima,
guerras e o colapso do sistema público de saúde são em parte codepen-
dentes e frutos do comportamento humano, responsável pelas mudanças
geográficas e demográficas nos ecossistemas em que se inseriu.
O reflexo dessas decisões pode ser observado por meio do pro-
jeto de lei desenvolvido durante o governo do ex-presidente Michel Te-
mer, em ação conjunta com o Ministério do Meio Ambiente. O projeto
indicava a liberação de 860 mil hectares da Floresta Nacional Jamanxim,

81
ISABELI NAIÁRA MARIANO E NICOLE FELISBERTO MACIEL

também nominada como Reserva Nacional de Cobre e Associados


(RENCA) para inserção da agricultura, mineração e por consequência,
exploração madeireira, em resposta à protestos de grupos interessados na
utilização da área. Tal decreto proposto não obteve um grande apoio e
causou repercussão internacional. Devido à má impressão causada, o go-
verno revogou o decreto que ameaçaria a região amazônica, apesar de
algumas tentativas de adequação.14
Sob análise de alguns dados no item seguinte observou-se como
o panorama da pandemia de Covid-19 destacou o agravamento das atitu-
des contraditórias determinadas pelo governo, da mesma forma que re-
forçou como regrediu o interesse em preservação do bioma amazônico.

2 COVID-19 E DESMATAMENTO DA AMAZÔNIA:


DEMANDAS AMBIENTAIS E O DESENVOLVIMENTO
DE NOVAS PANDEMIAS

Anos mais tarde, as duras consequências sobre a desconsidera-


ção do relatório do PNUMA foram de fato evidenciadas com a propaga-
ção do novo vírus. O cenário provocado pela Covid-19 fez cerca de mi-
lhões de mortos pelo mundo, e dentre os questionamentos desde o
evento, tem-se perguntado se a situação não seria um reflexo do despre-
paro dos Estados e por consequência de como tem sido aplicadas as po-
líticas ambientais e sanitárias por esses. A indagação se torna persistente
ao considerar que não é a primeira vez que a sociedade global enfrenta
uma pandemia de um vírus desconhecido, visto que, na maioria das vezes
não houve um panorama efetivo sobre os futuros riscos e quais estraté-
gias os Estados poderiam adotar para a não recorrência de casos.
Embora durante a Peste Negra tenha se instituído o período de
quarentena15, e que alguns países tenham se engajado em políticas sani-
tárias na época, percebeu-se que “[...] a urgência das crises epidêmicas
não era compatível com o maior problema a resolver a longo prazo: a

14 EL PAÍS. Renca: Temer revoga polêmico decreto que ameaça reservas da Ama-
zônia. Elaborado por Carla Jiménez. Disponível em: https://brasil.elpais.com/brasil/
2017/09/25/politica/1506372008_097256.html. Acesso em: 27 ago. 2020.
15 “Surgida em 1348 em Veneza, principal porto de comércio com o Oriente, a qua-

rentena consistia na notificação de casos suspeitos às autoridades e no isolamento e


observação rigorosa de pessoas suspeitas, embarcações e mercadorias por quarenta
dias, em uma ilha situada na laguna. Posteriormente, outros locais foram designados
com a finalidade de promover a reclusão quarentenária”. (BATISTELLA, C. Saúde,
doença e cuidado: complexidade teórica e necessidade histórica. In: FONSECA,
A.F.; CORBO, A.D. O território e o processo saúde-doença. Rio de Janeiro:
EPSJV, Fiocruz, 2007, p. 36. Disponível em: https://www.arca.fiocruz.br /han-
dle/icict/39209. Acesso em: 22 ago. 2020).

82
MEIO AMBIENTE, MIGRAÇÕES E PANDEMIA: REFLEXÕES DO MUNDO CONTEMPORÂNEO

falta de higiene, tanto pessoal como das habitações, especialmente nas


cidades”16.
A afirmativa pode ser corroborada através da presença do novo
vírus em favelas e habitações mais precárias do Brasil. Fatores como a
falta de saneamento básico e comunidades com grande concentração po-
pulacional nessas áreas, contribuíram para que se concluísse que os pro-
blemas estruturais por detrás da Covid-19 são bem maiores e infeliz-
mente fazem parte do cotidiano de diversas pessoas muito antes da pan-
demia.

De forma geral, as favelas são, espaços urbanos com dinâmi-


cas socioespaciais próprias, que não estão sendo levando em
consideração na formulação das estratégias de enfrentamento
pelas agências internacionais de saúde, assim como ministé-
rios e secretarias estaduais e municipais. Nesse contexto de
alta densidade populacional e condições sanitárias precárias
favorecem a propagação do vírus, sendo crescente a estatística
da pandemia17.

Esses aspectos não foram observados quando fora declarado no


país medidas de isolamento social e período de quarentena18. O plano de
contingência do vírus não foi pensado para os bairros periféricos que ca-
recem de infraestrutura sanitária e acesso aos setores de saúde. Macedo
et all discorrem19:

As favelas/periferias são aglomerados de comunidades e pes-


soas, que convivem em territórios com falta de abastecimento
de água para higienização e muito casos na falta de acesso a
produtos básicos de higiene. [...] Essa situação requer uma
avaliação crítica sobre a utilização acrítica de estratégias

16 ALMEIDA, Maria Antónia Pires de. As epidemias nas notícias em Portugal: có-
lera, peste, tifo, gripe e varíola, 1854-1918. Hist. cienc. saude-Manguinhos, Rio de
Janeiro, v. 21, n. 2, pp. 687-708, Jun. 2014, p. 692. Disponível em:
http://dx.doi.org/10. 1590/S0104-59702014000200012. Acesso em: 22 ago. 2020.
17 MACEDO, Yuri Miguel; ORNELLAS, Joaquim Lemos; DO BOMFIM, Helder

Freitas. COVID-19 nas favelas e periferias brasileiras. Boletim de Conjuntura


(BOCA), v. 2, n. 4, p. 50-54, 2020, p. 51.
18
BRASIL. Lei N. 13.979, de 6 de fevereiro de 2020. Dispõe sobre as medidas para
enfrentamento da emergência de saúde pública de importância internacional decor-
rente do Coronavírus responsável pelo surto de 2019, Brasília, DF, 6 fev. 2020. Dis-
ponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-2022/2020/
lei/l13979.htm. Acesso em: 30 ago. 2020.
19 MACEDO, Yuri Miguel; ORNELLAS, Joaquim Lemos; DO BOMFIM, Helder

Freitas. COVID-19 nas favelas e periferias brasileiras. Boletim de Conjuntura


(BOCA), v. 2, n. 4, p. 50-54, 2020, p. 51.

83
ISABELI NAIÁRA MARIANO E NICOLE FELISBERTO MACIEL

globais, utilizadas sem adequação aos contextos sociais locais.


É preciso (des)colonizar nossas estratégias associando às
ações globais um planejamento de ações emergências de sa-
úde coletiva que se adéquem às especificidades dessas comu-
nidades.

A própria OMS voltou atrás sobre a indispensabilidade da qua-


rentena após declarar por meio do seu diretor-chefe Tedros Adhanom
Ghebreyesus que, a restrição em realidades mais pobres não são as mes-
mas de países com alta renda, isso porque as famílias mais carentes não
têm escolha entre continuar trabalhando ou permanecerem em confina-
mento domiciliar20. Destaca Lima21:

Ou seja, o impacto da covid-19 em relação aos mais pobres é


letal, no sentido que indivíduos em situação de precariedade
terão menos chances de sobreviver devido à dificuldade de
acesso a um tratamento mais ostensivo e eficaz. A situação dos
mais vulneráveis que já sofrem cotidianamente e são privados
de uma saúde pública e de qualidade, apenas é evidenciada
com o vírus.

Portanto, os problemas das pandemias que já assolaram a popu-


lação mundial é se não o resultado da junção de outras demandas que o
Estado não fornece respostas concretas, como por exemplo, o investi-
mento na saúde pública que impacta diretamente na gestão das pande-
mias. Dessa forma, nasce o fenômeno da transnacionalização22, que para

20 ONU NEWS. Covid-19: Restrições devem ser suspensas de forma lenta e contro-

lada, diz OMS. 13 abr. 2020. Disponível em: https://news.un.org/pt/story/2020/


04/171 0212. Acesso em: 03 set. 2020.
21 LIMA, Francisco Jozivan Guedes de. O novo coronavírus e os seus impactos na

vida dos mais pobres: capitalismo e aporofobia, p. 117. In: SOBRINHO, Liton Lanes
Pilau (org.); CALGARO, Cleide; ROCHA, Leonel Severo. COVID-19: direitos hu-
manos e educação. Itajaí: UNIVALI, 2020.
22 “A transnacionalização pode ser compreendida como fenômeno reflexivo da glo-

balização, que se evidencia pela desterritorialização dos relacionamentos políticos-


sociais, fomentado por sistema econômico capitalista ultravalorizado, que articula
ordenamento jurídico mundial à margem das soberanias dos Estados. A transnacioli-
dade insere-se no contexto da globalização e liga-se fortemente à concepção do trans-
passe estatal. Enquanto globalização remete à ideia de conjunto, de globo, enfim, o
mundo sintetizado como único [...]”. (STELZER, Joana. O fenômeno da transnacio-
nalização da dimensão jurídica. p. 21. In: CRUZ, Paulo Márcio; STELZER, Joana.
Direito e transnacionalidade. Curitiba, PR: Juruá Ed., 2009).

84
MEIO AMBIENTE, MIGRAÇÕES E PANDEMIA: REFLEXÕES DO MUNDO CONTEMPORÂNEO

Garcia se constitui por meio dessas demandas que são transnacionais.


Disserta23:

As demandas transnacionais justificam-se a partir da necessi-


dade de criação de espaços públicos para tratar de questões
referentes a fenômenos novos, que serão ineficazes se tratados
somente dentro do espaço do tradicional Estado nacional. Es-
tes fenômenos novos identificam-se com os chamados “no-
vos” direitos ou novos direitos fundamentais.

Assim, pode-se afirmar que as pandemias e epidemias trata-se


de problemas que ultrapassam fronteiras, sendo, portanto, produtos da
globalização24 e da transnacionalidade, afinal são fenômenos conexos
“[...] com características que podem viabilizar o surgimento da categoria
Direito transnacional”25.
No plano das pandemias, para que se pretenda criar mecanismos
de governança sanitária e ambiental é fundamental que se estimule a re-
flexão a respeito da importância de um Direito Transnacional, pois por
meio deste poderiam se “[...] trazer soluções às demandas globais que
atualmente não encontram respaldo satisfatório nos campos tradicionais
do direito, surgindo como uma solução jurídica que não está condicio-
nada a qualquer limitação territorial ou de soberania estatal”26.
De fato, a pandemia da Covid-19 trouxe essa conscientização
pois ainda não havia uma visão global jurídica, ambiental e sanitária efe-
tiva sobre o cenário. Se faz necessário que a saúde se torne um tema uni-
versal e que as redes de vigilância sanitária dos Estados assumam

23 GARCIA, Marcos Leite. Direitos Fundamentais e transnacionalidade: um estudo


preliminar. In: CRUZ, Paulo Márcio; STELZER, Joana. Direito e transnacionali-
dade. Curitiba, PR: Juruá Ed., 2009, p. 175.
24 “A globalização (ou mundialização) é um processo paradigmático, multidimensi-

onal, de natureza eminentemente econômico-comercial, que se caracteriza pelo en-


fraquecimento soberano dos Estados-nacionais e pela emergência dos novos focos de
poder transnacional à luz da intensificação dos movimentos de comércio e de econo-
mia, fortemente apoiado no desenvolvimento tecnológico e no barateamento das co-
municações e dos meios de transportes, multiplicando-se em rede, de matriz essenci-
almente heurística”. (STELZER, Joana. O fenômeno da transnacionalização da di-
mensão jurídica. pp. 18-19. In: CRUZ, Paulo Márcio; STELZER, Joana. Direito e
transnacionalidade. Curitiba, PR: Juruá Ed., 2009).
25 STELZER, Joana. O fenômeno da transnacionalização da dimensão jurídica. p. 16.

In: CRUZ, Paulo Márcio; STELZER, Joana. Direito e transnacionalidade. Curitiba,


PR: Juruá Ed., 2009.
26 GARCIA, Heloise Siqueira; SANTOS, Kassy Gerei dos; GARCIA, Denise Sch-

mitt Siqueira. Governança Transnacional. p. 25. In: GARCIA, Heloise Siqueira;


CRUZ, Paulo Márcio. Interfaces entre Direito e Transnacionalidade. Itajaí: UNI-
VALI, 2020.

85
ISABELI NAIÁRA MARIANO E NICOLE FELISBERTO MACIEL

compromissos de cooperação a fim de evitar transmissões virais. Paulo


Marchiori Buss, pesquisador da Escola Nacional de Saúde Pública
(ENSP/Fiocruz), elucida27:

Uma destacada faceta das consequências da globalização so-


bre a saúde é a possibilidade da transnacionalização das doen-
ças transmissíveis, particularmente as novas e as reemergen-
tes. Com as facilidades das viagens internacionais e a difusão
do comércio em escala planetária, uma série de micro-orga-
nismos podem ser rapidamente transportados, através de pes-
soas, animais, insetos e alimentos, de um país a outro e de um
ponto a outro do globo. Exemplos recentes são as difusões da
SARS, do vírus da dengue e da gripe aviária. A transmissão
interpessoal das febres hemorrágicas virais, como os casos re-
centes das febres Marburg e Ébola, na África, apresentam
grande potencial epidêmico, facilitado pelos rápidos desloca-
mentos em viagens aéreas internacionais, o que aponta para a
necessidade e a importância do reforço das redes globais de
diagnóstico e vigilância em saúde, operadas pela OMS e par-
ceiros ao redor do mundo.

Diante desse panorama, é necessário que a sociedade após o in-


feliz episódio de disseminação do vírus da Covid-19 atribua um trata-
mento transnacional aos temas relacionados a doenças virais, pesquisa
científica na área da saúde, proteção ao meio ambiente, vigilância e se-
gurança sanitária. Ressalta Garcia28:

De nada adiantaria, por exemplo, uma nação cuidar e ter uma


excelente legislação e consciência social solidária e consciên-
cia ecológica no seio de seu povo, se o país vizinho não a tem,
pois ficará à mercê da poluição causada por seus vizinhos. En-
tão a conscientização e legislação ambiental têm que ter um
tratamento transnacional e ser compartida entre todos os mem-
bros da comunidade – seja regional ou internacional – para
cuidar das questões ambientais e de outras questões dos direi-
tos provenientes do processo de especificação

Nesse sentido justifica-se a preocupação internacional sobre a


Amazônia, visto que é considerada uma possível fonte de novos vírus.

27 BUSS, Paulo Marchiori. Globalização, pobreza e saúde. Ciência e saúde coletiva.


vol. 12, n. 6, 2007, p. 1581. Disponível em: https://doi.org/10.1590/S1413-81232007
000600019. Acesso em 15 set. 2020.
28 GARCIA, Marcos Leite. Direitos Fundamentais e transnacionalidade: um estudo

preliminar. p. 181. In: CRUZ, Paulo Márcio; STELZER, Joana. Direito e transna-
cionalidade. Curitiba, PR: Juruá Ed., 2009.

86
MEIO AMBIENTE, MIGRAÇÕES E PANDEMIA: REFLEXÕES DO MUNDO CONTEMPORÂNEO

No passado, alguns surtos epidêmicos já foram identificados na Amazô-


nia e, no entanto, embora controlados ainda há registros de recente inci-
dência de pessoas acometidas por esses vírus. Um exemplo, é o vírus
Oropouche (OROV)29, que causou uma grave epidemia no município de
Belém no Pará no ano de 1968, acredita-se que tanto no Brasil como em
outros países das Américas “[...] entre 1961 e 2007, aproximadamente
357000 pessoas tenham sido infectadas pelo vírus”30. Explica Andrade31:

[...] a febre do Oropouche tem se manifestado atualmente em


diversos surtos em estados fora da Amazônia. A enfermidade
tem sido caracterizada como “doença reemergente”. De
acordo com o conceito, que entende a doença de forma a ana-
lisar sua interação entre homem e meio ambiente, “doença re-
emergente” indica mudança no comportamento epidemioló-
gico de doenças já conhecidas, que haviam sido controladas
mas voltaram a representar ameaça à saúde humana. Entre os
fatores para o ressurgimento dessas enfermidades estão os mo-
delos de desenvolvimento econômico determinando altera-
ções ambientais, as migrações e a urbanização desenfreada.

O que constitui igualmente como um dos fatores determinantes


para a recorrente proliferação desses vírus é o desmatamento. Estima-se
que o desmatamento da Amazônia tenha começado com força em mea-
dos dos anos 70, através de uma medida tomada pelo governo ditatorial
de povoar a área para não correr o risco de perder esse território. A partir
daí um grande fluxo de pessoas foi para a Amazônia em busca de em-
prego, mas acabaram encontrando muitas dificuldades.
Para Barroso, é essencial a participação internacional no com-
bate ao desmatamento da Amazônia, visto que os que já sofreram com o
mesmo problema possam servir de apoio para “[...] os países em

29 “[...] uma síndrome viral dolorosa e transmitida pelo Ceratopogonidae, também


conhecido por Maruim ou mosquito-pólvora”. (ANDRADE, Rômulo de Paula. “Uma
floresta cheia de vírus!” Ciência e desenvolvimento nas fronteiras amazônicas. Rev.
Bras. Hist., São Paulo, v. 39, n. 82, p. 19-42, 9 dez. 2019, p. 20. Disponível em:
http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0102-01882019
000300019& lng=pt&nrm=iso. Acesso em: 16 set. 2020).
30 NUNES, Márcio Roberto Teixeira et al. A febre do Oropouche: uma revisão dos

aspectos epidemiológicos e moleculares na Amazônia Brasileira. Cad. saúde colet.,


Rio de Janeiro, 15 (3), 303-318, jul./set. 2007, p. 308. Disponível em: http://patua.
iec.gov. br//handle/iec/2820. Acesso em: 16 set. 2020.
31 ANDRADE, Rômulo de Paula. “Uma floresta cheia de vírus!” Ciência e desenvol-

vimento nas fronteiras amazônicas. Rev. Bras. Hist., São Paulo, v. 39, n. 82, p. 19-
42, 9 dez. 2019, p. 38. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=
sci_arttext&pid=S0102-01882019000300019&lng=pt&nrm=iso. Acesso em: 16 set.
2020.

87
ISABELI NAIÁRA MARIANO E NICOLE FELISBERTO MACIEL

desenvolvimento para que não sigam o mesmo caminho, mediante finan-


ciamento de programas e projetos que reduzam a emissão de gases de
efeito estufa, bem como prestando a assistência técnica necessária”32.
Por outro lado, embora o Brasil tenha demonstrado estar dis-
posto a se ajustar as necessidades globais e compreender as questões am-
bientais, observa-se que a postura adquirida pelo Estado brasileiro vem
mudando ao longo das últimas décadas apresentando frequentemente
opiniões contraditórias. Tais opiniões tem promovido um considerável
regresso na posição de protetor da Amazônia, pois “à medida que a eco-
nomia brasileira começou a vacilar nos últimos anos, o desmatamento
recomeçou novamente, especialmente porque os agricultores tentaram
compensar a queda da receita ao eliminar mais terras”33.
A situação piorou com o surgimento da Covid-19, posto que,
com toda a atenção e investimento voltados para a pandemia, o desmata-
mento na Amazônia alcançou níveis recordes. Segundo levantamento de
dados realizados pelo Sistema de Detecção do Desmatamento em Tempo
Real (DETER) do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE), o
desmatamento da Amazônia referente a agosto/julho de 2019/2020 foi
cerca de 1.714 km², sendo que entre os anos de 2018/2019 nesse mesmo
período os dados registraram o desmatamento equivalente a 526 km²34.
Talvez a representação das estatísticas a princípio não impacte a
sociedade, porém “[...] o risco de que a destruição de ecossistemas, o
desmatamento e o derretimento de geleiras possam arriscar os seres hu-
manos a vírus e outros microrganismos fatais”35, é uma realidade que não

32 BARROSO, Luís Roberto; MELLO, Patrícia Perrone Campos. Como salvar a


Amazônia: porque a floresta de pé vale mais do que derrubada. Revista de Direito
da Cidade. Vol. 12, N. 2, 2020, p. 1291. Disponível em: https://www.e-publica-
coes.uerj.br/index.php/rdc/article/view/50980/34015. Acesso em: 27 ago. 2020.
33 “As Brazil’s economy began to falter in recent years, deforestation picked up again,

especially as farmers attempted to make up for falling revenue by clearing more land.
Soy production in Brazil has quadrupled in the past 20 years […]”. (Washington Post,
2016, tradução nossa). PHILLIPS, D.; MIROFF, N. Brazil’s new government may
be less likely to protect the Amazon, critics say. The Washington Post. 21 mai.
2016. Disponível em: https://www.washingtonpost.com/ world/the_americas/bra-
zils-new-government-may-be-less-likely-to-protect-the-ama zon-critics-
say/2016/05/21/22cbce08-1c7d-11e6-82c2-a7dcb313287d_story.html?
utm_term=.0ba57e8c98b4. Acesso em: 27 ago. 2020.
34 DETER. Análise – Amazônia Legal. 2020. Disponível em: http://terrabrasilis.

dpi.inpe.br/app/dashboard/alerts/legal/amazon/aggregated/. Acesso em: 10 ago.


2020.
35 PIRES, Nara Suzana Stairn. COVID 19: mediação socioambiental em prol da su-

peração da vulnerabilidade, p. 417. In: SOBRINHO, Liton Lanes Pilau (org.); CAL-
GARO, Cleide; ROCHA, Leonel Severo. COVID-19: direitos humanos e educação.
Itajaí: UNIVALI, 2020.

88
MEIO AMBIENTE, MIGRAÇÕES E PANDEMIA: REFLEXÕES DO MUNDO CONTEMPORÂNEO

pode ser ignorada e precisa ser debatida com antecedência pelos órgãos
e políticas responsáveis. Alerta Barroso36:

A mudança climática, o aquecimento global e a extinção de


espécies constituem desafios ameaçadores do nosso tempo,
com graves implicações para o futuro da humanidade. A Ama-
zônia desempenha um papel crítico no enfrentamento desses
problemas e no equilíbrio ecológico do planeta, por sua extra-
ordinária biodiversidade, por sua função no ciclo da água e no
regime de chuvas, bem como por sua capacidade de armaze-
namento de carbono, de grande importância para a mitigação
do aquecimento global. Sua preservação é de vital importância
para o Brasil e para o mundo.

Segundo as autoras Mello e Feitosa37, o momento é necessário


para que sejam repensadas as medidas governamentais de exploração e
incentivo de recursos naturais não renováveis da Amazônia, afinal, ob-
servou-se que com a pandemia da Covid-19 a ocupação em áreas de pro-
teção ambiental aumentou significativamente. Ademais alertam ser im-
prescindível maiores pesquisas sobre os impactos do desmatamento da
Amazônia em um cenário pós-pandêmico.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Conforme verificado, a incidência de doenças provenientes de


vírus e similares é um problema mundial recorrente. E o que tem se ob-
servado é que as atividades humanas para com o meio ambiente têm con-
tribuído para a perpetuação de tal estado.
No que tange a análise de riscos frente a degradação ambiental,
o agravamento do aquecimento global pode ser considerado o principal
problema, dado que procedente de tais mudanças, outros eventos tornam-
se comuns: temperaturas elevadas ou muito baixas em locais onde tal
situação é considerada incomum; recorrência de períodos de seca e esti-
agem que não condizem com o histórico de produção; superfaturação de

36 BARROSO, Luís Roberto; MELLO, Patrícia Perrone Campos. Como salvar a


Amazônia: porque a floresta de pé vale mais do que derrubada. Revista de Direito
da Cidade. Vol. 12, N. 2, 2020, p. 1296. Disponível em: https://www.e-publi cacoes.
uerj.br/index.php/rdc/article/view/50980/34015. Acesso em: 27 ago. 2020.
37 MELLO, Andréa Hentz; FEITOSA, Nathália Karolinne. Dinâmicas da ocupação

territorial na Amazônia: Reflexões sobre os impactos socioambientais pós-pandemia


decorrentes do avanço do desmatamento. Unifesspa: Painel Reflexão em tempos
de crise, v. 15, 2020, p. 04. Disponível em: https://acoescovid19.unifes
spa.edu.br/images/conteudo/Texto_Profa._Andr%C3%A9a_Hen tz.pdf. Acesso em:
10 ago. 2020.

89
ISABELI NAIÁRA MARIANO E NICOLE FELISBERTO MACIEL

produtos básicos, uma vez que tais produtos são produzidos em menor
escala; e queimadas justificadas por uma “necessidade” de apropriação
de áreas para plantio.
Nesse sentido, verificou-se que a região amazônica vem sendo
ininterruptamente desmatada, e por ser detentora do maior bioma do
mundo pode ser considerada uma fonte de propagação de vírus. Anteri-
ormente, como destacado, a região já foi palco de outros vírus, que hoje
são considerados reemergentes como o vírus Oropouche (OROV). Este,
apesar de ter atuado em um período maior e em uma escala inferior ao
novo coronavírus, com estimativas de ter resultado em mais de 350.000
mortos configuram sobretudo a preocupação quanto a hipótese discutida,
de que ecossistemas inexplorados ou pouco explorados trariam mais ma-
lefícios do que benefícios quando sob influência de atividade humana.
Ambos os eventos também reforçam a ausência de ações por
parte do Brasil e das OIs com o objetivo de conscientização e prevenção
frente a exploração da matéria prima e do meio ambiente, produtor de
grande parte da matéria prima utilizada pelo homem. Como anterior-
mente mencionado, os investimentos destinados ao Ministério do Meio
Ambiente são outro exemplo do descaso com o tema, uma vez que, nos
últimos anos houve apenas a redução ao invés do aumento dos investi-
mentos nesta pauta. As principais organizações internacionais, frente a
ineficácia de sua influência por meio dos tratados, acabam por observar
a inexistência do cumprimento de medidas mínimas referentes ao meio
ambiente. Dessa forma, podemos considerar que a ameaça de uma “flo-
resta de vírus” estende-se a outros biomas no território brasileiro, bem
como em todo planeta.
Além dos apontamentos quanto as ameaças em seu relatório, o
PNUMA também propôs ações gerais aos Estados, na iniciativa de redu-
zir os impactos das atividades realizadas ao longo da existência do pla-
neta. Dentre as ações, “reconhecer as interações entre a saúde animal, a
saúde humana e o meio ambiente e abordar a questão no contexto das
abordagens One Health e EcoHealth”38. Tal ação consistiria em conside-
rar a fala de instituições de padrões internacionais (OIE, FAO, OMS)
bem como fazer uso de uma visão mais ampla das questões de saúde,
visão esta que vincularia a saúde pública à gestão de recursos naturais
dentro de uma abordagem ecossistêmica à saúde humana. Em outras pa-
lavras, uma das principais ações para o momento é considerar os recursos

38 “recognising the interactions between animal health, human health, and the envi-

ronment and addressing the issue in the context of One Health and EcoHealth ap-
proaches.” (UNITED NATIONS ENVIRONMENT PROGRAMME. UNEP Fron-
tiers 2016 Report: Emerging Issues of Environmental Concern. 2 nov. 2016.
Tradução nossa. Disponível em: https://environmentlive.unep.org/media/docs/ as-
sessments/UNEP_Frontiers_2016_report_emerging_issues_of_environmental_ con-
cern.pdf. Acesso em 26 ago. 2020).

90
MEIO AMBIENTE, MIGRAÇÕES E PANDEMIA: REFLEXÕES DO MUNDO CONTEMPORÂNEO

naturais como parte da equação na análise da qualidade de vida do ser


humano. Desta forma, estaríamos mais próximos de uma compreensão
quanto as causas comuns quanto ao surgimento de doenças: “o fato de
que as atividades humanas estão impondo tensões extremas sobre os
ecossistemas e sua capacidade de funcionar.”39
O PNUMA destaca que já há existência de estratégias efetivas
para o controle das zoonoses mais negligenciadas, no entanto, apesar de
pesquisas multidisciplinares e colaborativas, “a principal limitação é a
falta de investimento, e não de método.”40 O investimento para pesquisas
quanto a dinâmica ambiental, vetores de doenças, patógenos e suscetibi-
lidade humana, é considerado alto apesar da provável efetividade em
controlar ou conduzir cenários pandêmicos com base em análise anterior
ao evento.
Por fim, sugere-se considerar o teor de acordos e tratados como
o Mecanismo Internacional de Varsóvia sobre Perdas e Danos e o Acordo
de Paris. Estes fundamentam a necessidade da colaboração de todo o Sis-
tema Internacional para facilitação, compreensão e apoio em ações de
emergência e de avaliação de riscos contra perdas e danos irreversíveis e
permanentes nos ecossistemas.
Em outras palavras, o investimento comum, ou ainda o desen-
volvimento de um Direito Transnacional facilitaria a discussão global
sobre questões sanitárias e ambientais, promovendo a colaboração e pre-
venção entre os Estados e resultando em cenários com menos perdas nas
esferas sociais e de saúde, bem como na esfera econômica.

REFERÊNCIA DAS FONTES CITADAS

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39 “the fact that human activities are imposing extreme stresses on ecosystems and
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40 “the main constraint is lack of investment rather than method”. (UNITED NA-

TIONS ENVIRONMENT PROGRAMME. UNEP Frontiers 2016 Report: Emerg-


ing Issues of Environmental Concern. 2 nov. 2016. Tradução nossa. Disponível em:
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94
O CRESCIMENTO DA VAREJISTA WALMART E A OCUPA-
ÇÃO DE NOVOS MERCADOS INTERNACIONAIS

José Augusto Nunes1

INTRODUÇÃO

A globalização tem influenciado as decorrentes mudanças do se-


tor empresarial em seus contextos socioeconômicos afetando sua dinâ-
mica interna e externa e consequência a isso impactando no seu planeja-
mento estratégico. A competitividade fez com que a busca por novos
mercados fosse maior onde as empresas estarão cada vez mais sujeitas
aos fatores que influenciam seus resultados nos setores de atividades e
nas sociedades nas quais estão inseridas.
É preciso uma análise de mercado completa para que o processo
de internacionalização de uma empresa alcance seus objetivos e diminua
os impactos dos problemas socioculturais e políticos que podem surgir
em meio a implementação de uma marca ou de aquisições de outras redes
em determinados países.
A expansão no mercado interno e externo – por meio do estabe-
lecimento de filiais e subsidiárias, aquisições e/ou fusões – propicia o uso
mais racional de fatores produtivos subutilizados. A existência de servi-
ços produtivos ociosos – tecnológicos, de escala, produtivos – é uma ca-
racterística da firma capitalista. Dada essa condição, há uma propensão
ao crescimento das firmas, porque a expansão propicia a redução dessa
ociosidade e agrega ganhos de eficiência às firmas. A internacionalização
das operações apresenta-se como alternativa para tais ganhos.
Para melhor compreender o fenômeno do investimento e da ex-
pansão no estrangeiro, recorreu-se à literatura que o analisa numa pers-
pectiva voltada para um mundo globalizado. O objetivo do trabalho é
entender a internacionalização das empresas analisando as estratégias de
internacionalização do Walmart buscando compreender como foi estabe-
lecido a disputa pelos mercados europeu, americano e asiático visando a
transformação da marca no mercado brasileiro.

1 Graduando do 5º período de Relações Internacionais na Universidade do Vale Do

Itajaí – UNIVALI;
JOSÉ AUGUSTO NUNES

As multinacionais, ao decidirem expandir suas operações no ex-


terior, observam uma série de elementos antes de escolher os países, tais
como o estágio de desenvolvimento, o grau de industrialização, o tama-
nho do seu mercado interno, a logística de transporte e as condições po-
líticas.
Por fim, o forte crescimento de uma empresa que tornou-se re-
ferência mundial no quesito varejo. A Walmart após desbravar o mer-
cado dos Estados Unidos, trazendo o conceito de lojas que atenderão as
necessidades de todas as pessoas que residiam no espaço geográfico em
que estava inserida, começou a almejar expansão e levar sua marca para
outros continentes. Tudo isso após a morte do fundador Sam Walton no
ano de 1992.
Segundo Saracini, Paula (apud GUIMARÃES,1982, p. 82),
“Pode-se sugerir que a indústria oligopolista se move na direção de mer-
cados mais amplos: dos mercados regionais para o mercado nacional e
deste para o mercado externo”. Como será discutido na sequência, sobre-
tudo para o caso da Walmart, houve um início modesto no interior dos
EUA para, em seguida, dar o avanço em direção ao mercado nacional
para depois estabelecer-se no cenário externo.
A presente pesquisa foi dividida em três seções, onde no pri-
meiro momento trata-se dos assuntos relacionados aos processos de in-
ternacionalização e expansão de uma empresa. A segunda seção aborda
a situação da empresa Walmart, desenvolvendo a sua trajetória de expan-
são no mercado dos Estados Unidos onde surgiu e a sua expansão inter-
nacional na América do Sul, América Central, Europa e o mercado Asi-
ático. Por fim, a terceira seção desta pesquisa aborda traços da trajetória
da Walmart no Brasil, levando em vista os aspectos que a levaram ao
fracasso no mercado perante as concorrentes e abordando as novas estra-
tégias adotadas com a venda das operações e transformação da marca no
varejo brasileiro.

1 O PROCESSO DE INTERNACIONALIZAÇÃO E EXPANSÃO


DE EMPRESAS

No decorrer dos últimos anos as empresas têm adotado medidas


de expansão e internacionalização. Apesar de oferecer seus próprios ris-
cos e dificuldades, o mercado internacional pode proporcionar dimen-
sões de sucesso e estabilidade mais amplas.
Segundo Ansoff (1993) há inúmeras limitações legais nas quais
as empresas precisam imprescindivelmente se adaptar, além de pressões
sociais, grupos externos e internos cujo devem ser levados em conside-
ração nas tomadas de decisões, evidenciado que a restrição dos recursos
é apenas um dos itens a ser considerado nas ações definidas pelas

96
MEIO AMBIENTE, MIGRAÇÕES E PANDEMIA: REFLEXÕES DO MUNDO CONTEMPORÂNEO

organizações. Assim, explica Lima (2015) que diferentes tipos de riscos


podem afetar um mesmo mercado, embora existem riscos de várias ori-
gens e de diferentes níveis de influência, onde os mesmos podem impac-
tar de maneira direta ou indiretamente uma organização.
É preciso pensar e planejar o processo de internacionalização,
para que os possíveis problemas que possam surgir durante o processo,
como as questões culturais, sociais, políticas e econômicas sejam ameni-
zados. Os responsáveis pela organização que busca a internacionalização
devem refletir sobre as devidas motivações para a ocorrência deste pro-
cesso, além do mais devem estrategicamente decidir as formas de entrada
ao enfrentarem uma série de dificuldades. (KHAUAJA; TOLEDO,
2011).

Assim sendo, a internacionalização é uma tendência das em-


presas ampliarem sua atuação para uma dimensão internacio-
nal. Essa atuação deve ocorrer de forma sistemática e provei-
tosa, e pode envolver atividades de abastecimento, fabricação,
comercialização, ou a condução de outros tipos de atividades
com valor agregado em escala internacional (BARBOSA,
MOREIRA [ca. 2011] apud CAVUSGIL, KNIGHT e RIE-
SENBERGER, 2010).

É preciso levar em conta a utilização de algumas estratégias para


inserção de competitividade no meio internacional. Porem essas estraté-
gias que devem ser utilizadas para buscar excelência no processo de ex-
pansão, segundo Barbosa e Moreira ([ca. 2011] apud CAVUSGIL,
KNIGHT e RIESENBERGER, 2010) são: atividades do comércio inter-
nacional com base doméstica, relações contratuais e por fim investimento
direto estrangeiro (IED) ou as iniciativas colaborativas internacionais.
De acordo com Barbosa e Moreira ([ca. 2011] apud CA-
VUSGIL, KNIGHT e RIESENBERGER, 2010) primeiramente destaca-
se a base doméstica do comércio internacional na qual é voltada para o
ramo de exportação, ou seja, as empresas utilizam a produção de bens e
serviços para que futuramente possam comercializar em outros merca-
dos, sendo assim o primeiro estágio do processo.
A segunda categoria trata de assuntos de relações contratuais e
envolve o licenciamento e as franquias, ou seja, é uma forma avançada
de licenciamento, no qual o detentor da marca (franqueador) permite que
um empresário (franqueado) utilize um sistema de negócios completo
seja ele de bens ou serviços, em troca de uma compensação ao franque-
ador sob a forma de royalties. (BARBOSA, MOREIRA, [ca. 2011] apud
CAVUSGIL, KNIGHT e RIESENBERGER, 2010).
De acordo com Barbosa, Moreira ([ca. 2011]) (apud CA-
VUSGIL, KNIGHT e RIESENBERGER, 2010), a fase final do processo
refere-se às atividades de investimento direto estrangeiro (IED) ou

97
JOSÉ AUGUSTO NUNES

atividades colaborativas internacional, tendo o investimento direto repre-


sentação mais forte no âmbito internacional, o que apresenta uma gama
de recursos ao processo de instalação de filiais, escritórios de venda e
instalações fabris nos mercados de destino.
A expansão empresarial não é somente uma busca por aumento
de lucros, mas também uma forma da empresa conseguir sobreviver di-
ante da concorrência. Mesmo que a empresa já esteja satisfeita com os
lucros que dá, a expansão é necessária para evitar que a concorrência saia
na frente. Um exemplo de expansão global é a empresa Walmart que ao
longo dos anos desde sua criação traçou estratégias de crescimento den-
tro dos Estados Unidos e após isso iniciou a exploração de novos merca-
dos internacionais, buscando tornar-se a líder varejista não só em solo
americano mas também em outros países.

2 A EXPANSÃO DA EMPRESA WALMART

A Walmart surgiu após muito trabalho e dedicação de seu fun-


dador Samuel Moore Walton, mundialmente conhecido como San Wal-
ton. Após construir a empresa ele promoveu uma verdadeira e gigantesca
revolução no varejo e exerceu um longo caminho de aprendizado na área
de comerciante. Walton descreve o pai em sua autobiografia:

Um personagem que gostava de fazer trocas, de negociar com


qualquer coisa: cavalos, mulas, gado, casas, fazendas, carros.
Foi o melhor negociador que conheci. Exerceu todos os tipos
de atividades: banqueiro, fazendeiro, avaliador de fazendas,
corretor de seguros e de imóveis. (WALTON, 1993, p. 3).

A primeira loja Walmart finalmente foi inaugurada por San em


Julho de 1962, tendo como sede a cidade de Rogers. As cidades de
Springdale e Harrison tiveram suas primeiras lojas nos anos subsequen-
tes. “Em princípios da década de 1960 tínhamos 18 lojas de miudezas,
sob os nomes de Bem Franklin e Walton e um punhado de Wal-Marts.
As lojas de miudezas, aos poucos, foram substituídas por Wal-Marts”
(Walton, 1993, p. 48).
O crescimento da empresa estava alavancado e na década de 70
já contava com 78 sócios e um total de 32 lojas onde cada uma delas
tinha uma representação de capital diferenciado dentre todos os acionis-
tas, porém a família Walton era a maior acionista, mas San estavam com
dívidas altas e precisou transformar o Walmart em uma sociedade anô-
nima. Também nos 70 que a empresa começou a torna-se uma empresa
nacional proporcionando apelo generalizado de sua visão, sendo assim o
Walmart se torna uma empresa de capital aberto tendo sua primeira ação
vendida a $ 16,50.

98
MEIO AMBIENTE, MIGRAÇÕES E PANDEMIA: REFLEXÕES DO MUNDO CONTEMPORÂNEO

A família Walton ficou com 61% da Wal-Mart, mas pudemos


pagar a todos os banqueiros e, a partir de então, não tomamos
um tostão emprestado, pessoalmente, para manter a empresa.
A abertura do capital realmente liberou a empresa para crescer
e tirou dos meus ombros um grande peso. (Walton, 1993, p.
89)

De acordo com Costa (2006) em 1977, a Walmart fez sua pri-


meira fusão, no qual passou a assumir as operações da Mohr-Value, uma
rede de lojas em Michigan e Illinois. Ainda no mesmo ano, a Walmart
também se lançou em diversos novos seguimentos, abrindo suas próprias
farmácias, serviços de automóveis, joalherias e novos mercados. Em
1979, já contava com 276 lojas e 21.000 empregados, alcançando então
uma venda de US$1,248 bilhão.

A Kmart sempre me interessou, desde a primeira loja em 1962.


Eu ia constantemente às suas lojas porque eram um laboratório
e eles eram melhores do que nós. Passei grande parte do meu
tempo andando pelas suas lojas, conversando com seu pessoal
e tentando descobrir como faziam as coisas. (Walton, 1993, p.
172).

Em seu processo de expansão, a Walmart sofreu pressões para


entrar em negócios que não tinham nada a ver com o seguimento do co-
mércio, como as atividades industriais e serviços financeiros. O dirigente
da companhia, David Glass, afirmou que Walton e sua equipe estabele-
ceram apenas a estratégia de investir no comércio. “Desde cedo assumi-
mos o compromisso de que nunca entraríamos em qualquer área que não
fosse a de nosso negócio específico. Sabíamos o que estávamos fazendo
e juramos que continuaríamos a fazer a mesma coisa. Tudo estaria bem
enquanto a Walmart se mantivesse focada em sua única capacidade es-
sencial, lançando boas lojas uma após a outra” (COSTA. 2006 apud
SLATER, 2003, p. 70).
Em tempos onde a globalização vem abrindo novos horizontes,
era preciso pensar além e deixar de apenas ser uma empresa local, apesar
do seu vasto território e começar a ganhar novos mercados varejistas.
Com a internacionalização a Walmart se impôs, estando apta para enca-
rar os novos desafios do mercado mundial. (COSTA, 2006).
O próprio San menciona em sua biografia “não sei se a Walmart
pode manter realmente a nossa posição de liderança ficando apenas nos
EUA. Acho que teremos de nos transformar numa companhia mais in-
ternacional num futuro não muito distante” (WALTON, 1993, p. 184).
Em uma estratégia de expansão do negócio, a Walmart optou por
levar a marca além das fronteiras dos Estados Unidos, explorando assim

99
JOSÉ AUGUSTO NUNES

mercados em outros continentes como a Ásia e Europa, além de novos


países na América do Sul e Central intensificando sua presença no con-
tinente Americano.
Nos anos 90 começou-se a internacionalização, ostentando um
vasto crescimento no desempenho e papel significativo do quadro finan-
ceiro. Em poucos anos a Walmart tornou-se o maior varejista do México
e do Canadá e o terceiro maior do Reino Unido. Na América do Sul e na
Europa, aparece apenas como coadjuvante. “Na Europa, enfrentando
custos de mão-de-obra mais altos, sindicatos mais duros e um ambiente
regulamentado mais paternalista que nos EUA, a Walmart limitou sua
atuação à Inglaterra e Alemanha” (COSTA, 2006 apud SLATER, 2003,
p. 149).
Foi em 1991 que a Walmart estabeleceu aliança com o grupo
Cifra no México e inauguraram o primeiro Sam’s Club. Dois depois ini-
ciaram o processo de conversão das lojas Aurrera na bandeira Walmart,
sendo que somente em 1977 as empresas Cifra e Walmart se fundem e
criam uma única empresa. Em 2009 é realizado o processo de fusão com
a Walmart Centroamérica, surgindo assim nos próximos anos uma em-
presa com objetivo de melhorar a qualidade de vida das famílias do Mé-
xico e da América Central. A inauguração das lojas Walmart na América
Central trouxe um modelo de negócio Every Day Low Price2.
Segundo Costa (2006 apud SLATER, 2003, p. 152) mais preci-
samente, no ano de 1994 a empresa faz a aquisição de 122 lojas de des-
contos da canadense Woolco. Tanto é que, nos primeiros três anos, 1995-
1997, a Wal-Mart do Canadá sofreu prejuízos de tal magnitude que Rob
Walton um dia perguntou: “Será que alguém me lembraria por que en-
tramos nesse negócio?”
A Walmart Argentina teve início em 1995 na cidade de Avella-
neda, na província de Buenos Aires. Com um vasto crescimento no país,
a Walmart trouxe novos seguimentos e em 2007 começou a operar a ban-
deira Changomas, que se trata de um formato com logística otimizada
onde atende os gastos, hábitos e costumes de todas as comunidades e
cidades abrangendo uma gama de produtos com até 18.000 itens o que
comparado com o formato supercenter torna-se pequeno pois os Wal-
mart possuem uma gama de produtos com até 50.000 itens e tem o obje-
tivo de atender a necessidade de cidades com muitas famílias.
Segundo Costa (2006) as características do mercado asiático em
relação ao mercado na qual estava inserida apresentava uma notável di-
ferença. Para então ocupar espaço a Walmart fez associações com em-
presas locais onde após um acordo de joint venture em 1996 deu-se os

2Uma abordagem de preços em que o produto é oferecido a varejistas e consumidores


a um custo consistentemente baixo, em vez de reduzir o preço periodicamente por
meio de atividades de promoção de vendas.

100
MEIO AMBIENTE, MIGRAÇÕES E PANDEMIA: REFLEXÕES DO MUNDO CONTEMPORÂNEO

primeiros passos para entrar na China e na Indonésia. A Coreia do Sul


teve ocupação da empresa nos anos seguintes.
Após instalar-se no mercado americano e asiático através de
suas lojas próprias ou de parceria, o avanço ao mercado europeu aconte-
ceu em 1997 com a aquisição de 21 lojas de hipermercado na Alemanha.
Levar sua marca e/ou comprar filiais em outros países exige também um
tempo de aprendizado e estudo de cultura local. A Walmart passou por
um duro aprendizado até conhecer o hábito de consumo e a melhor ma-
neira de conquistar os consumidores locais.
Mantendo seu negócio de expansão a Walmart faz uma aquisi-
ção de 232 supermercados da rede ASDA no Reino Unido pagando o va-
lor de US$ 10,8 bilhões, sendo esse o maior investimento até o ano de
2000. Após o setor de supermercados no Reino Unido passar uma insta-
bilidade enfrentando pressões para ganhar crescimento tendo em vista o
avanço do setor atacadista, a gigante americana decide fundir com seu
maior concorrente a rival J Sainsbury PLC. O plano da Walmart de abrir
mão do controle de rede de supermercados no Reino Unido reflete uma
estratégia global que enfatiza os mercados de crescimento mais rápido
em detrimento de alguns de seus mercados mais maduros.
“Eles sempre saíram de mercados com desempenho insatisfató-
rio e de mercados onde não conseguiram incorporar profundamente sua
oferta à base de clientes”, disse Jennifer Bartashus, analista sênior de
consumo da Bloomberg Intelligence. (SASSO Michael; PONCZEK Sa-
rah; CHAMBERS Sam. 2018).
Mas a fusão tão esperada entre as duas grandes empresas acabou
sendo bloqueada pelo órgão Competition and Markets Authority (CMA)
pois temiam que o preço das mercadorias subisse. A CMA afirmou ainda
que a fusão diminuiria a competição em nível nacional e local. “Isso re-
duziria a concorrência nos supermercados e nas compras online e nos
postos de gasolina das empresas” (McINTOSH Stuart. 2019).
Em 2020 a gigante varejista retoma seus planos de vender parte
da empresa e busca novos investidores. Caso venha concretizar o negócio
poderá adotar características semelhantes ao que aconteceu no Brasil
após a venda de 80% de seus ativos para a Advent.
As investidas da Walmart na China iniciaram em 1992, quando
Rob Walton fez várias visitas ao país (Slater, 2003). Em 1993, a empresa
tailandesa CP Group estabeleceu contatos com a Walmart para montar
uma joint-venture e ingressar no mercado varejista de Hong-Kong, onde
já possuía três lojas Value Clubs. Todavia, a parceria não vingou, mas
permitiu que o grupo Walmart adquirisse experiência e contatos com au-
toridades chinesas.
No mercado chinês novas estratégias foram adotadas pelo grupo
Walmart após a inicialização em 1996 das operações que teve como pro-
cesso inicial a abertura de um supercenter e um Sam’s Club na cidade de

101
JOSÉ AUGUSTO NUNES

Shenzen. Mais tarde, em 1999, um importante acontecimento para o mer-


cado econômico chinês trouxe a possibilidade de expansão geográfica
através de contratos joint-ventures com empresas estrangeiras. (FLE-
XOR, 2007).
No entanto, a principal mudança institucional ocorreu em 2001,
quando a China ingressou na Organização Mundial do Comércio e teve
que eliminar um amplo leque de restrições impostas às multinacionais do
varejo. Entre outras medidas, foi permitida a abertura de lojas em qual-
quer cidade chinesa, o que representava uma mudança significativa para
uma indústria cujo desempenho depende fundamentalmente do volume
de venda.
Mantendo o bom momento atual de desenvolvimento, a Wal-
mart continuará a expandir seus investimentos na China e, no futuro,
tanto online quanto offline estarão de mãos dadas para fornecer melhores
serviços aos clientes. Ao mesmo tempo, o grupo Walmart continuará a
atualizar as lojas existentes, fortalecer a segurança alimentar e alcançar
o desenvolvimento de ganha-ganha com os fornecedores locais. A Wal-
mart espera se adaptar melhor à nova normalidade da economia chinesa,
criar mais empregos e se tornar um excelente cidadão corporativo em que
os consumidores confiam enquanto se desenvolve junto com a economia
chinesa.

3 WALMART BRASIL: DO FRACASSO NO AVANÇO DAS


OPERAÇÕES A VENDA DAS AÇÕES PARA ADVENT
INTERNATIONAL

Em 1995 a gigante americana Walmart começa suas instalações


no Brasil a partir da abertura do primeiro Sam’s Club na cidade de Osasco
em São Paulo. Mais tarde no ano de 2004 a empresa verificou uma pos-
sibilidade de expansão e adquiriu o controle das lojas do Grupo Bom-
preço no Nordeste brasileiro e no ano seguinte, seguindo o processo de
expansão comprou as lojas da rede Sonae no Sul e Sudeste, passando
assim a operar nove bandeiras: Walmart, Sam’s Club, BIG, Hiper Bom
Preço, Bom Preço, Mercadorama, Nacional, Maxxi Atacado e Todo Dia
sendo essas bandeiras distribuídas em formatos de hipermercados, super-
mercados, clube de compras, atacado e lojas de vizinhança.
O grupo Bompreço, que antes pertencia ao grupo holandês Royal
Ahold, foi adquirido pela Walmart no valor de U$$ 300 milhões. Essa
nova etapa de construção de uma história no Brasil, trouxe o resultado de
uma operação com 143 unidades no país, além de dar um importante salto
no ranking dos maiores supermercados do Brasil, deixando a sexta posi-
ção e ocupando espaço no terceiro lugar.

102
MEIO AMBIENTE, MIGRAÇÕES E PANDEMIA: REFLEXÕES DO MUNDO CONTEMPORÂNEO

Essa foi a melhor oportunidade que surgiu para o Wal-Mart no


Brasil desde que se instalou aqui, em 1995. A região Nordeste
deve garantir maior rentabilidade à empresa, porque é menor
a pressão de concorrentes, como no Sul e Sudeste do país.
(CARVALHO; PORTES, 2004).

Após essa grande aquisição, a rede americana evoluiu no quesito


de aquisições de redes que compunham a sua concorrência. O grupo por-
tuguês Sonae vendeu suas lojas subsidiarias por aproximadamente R$
1,729 bilhão para a rede Walmart, que passou ao controle de mais 140
unidades no país totalizando a operação de 295 lojas no ano de 2005 dis-
tribuídas então em 17 estados.
O crescimento da Walmart no Brasil não avançou devido a erros
estratégicos, enquanto os concorrentes Pão de Açúcar e Carrefour cres-
ciam consideravelmente, a companhia que no ano de 2010 após a troca
de presidente anunciou o fechamento de 25 lojas que apresentavam re-
sultados de prejuízos. A decisão de fechar essas lojas foi apresentada por
Guilherme Loureiro após assumir a presidência e ir a um encontro na
sede da companhia em Bentoville para uma reunião com Robin Walton,
que era presidente do conselho admirativo.
Uma das razões que explicam o fracasso da Walmart no Brasil,
foi que eles estavam muito eufóricos com o país e seus planos foram um
pouco tão grandiosos demais. Outro ponto foi trazer o conceito de Preço
Baixo Todo Dia (PBTD) operado nos Estados Unidos, para as lojas no
Brasil. Esse tipo de estratégia elimina as promoções feitas em loja, man-
tendo os preços em uma linha estável com a ideia de mostrar ao consu-
midor que a qualquer dia que vier em uma das lojas encontraria preços
mais competitivos em relação aos concorrentes, porem essa estratégia
precisaria ser desenvolvida com muita sabedoria, caso contrário se o cli-
ente não conseguisse ter a mesma percepção nada adiantaria, o que aca-
bou sendo o caso da Walmart no Brasil.

‘Preço Baixo Todo Dia’, adaptada dos Estados Unidos, foi um


dos principais erros. Preço baixo não é o que o cliente quer no
século 21. Ele deseja valor agregado com nível de serviço.
Você precisa mostrar ao cliente que aquele produto vale mais
do que o preço que ele está pagando. As empresas bem-suce-
didas de hoje agregaram valor a seus serviços e apostaram no
atendimento qualificado. (FAUSTINO,2018).

A Walmart continuou seu processo de restauração global e em


2016 anunciou o fechamento de mais 60 lojas na qual apresentavam
baixo desempenho nas operações, o que somavam o percentual de 5%
das vendas no país. No mesmo ano, a companhia anunciou a troca de
presidente após Guilherme Loureiro ter assumido o controle das

103
JOSÉ AUGUSTO NUNES

operações da Walmart México e Centroamérica, assumindo como presi-


dente e CEO o atual vice-presidente de Finanças Flavio Cotini.
Em meio a todas as oportunidades enfrentadas no mercado bra-
sileiro, a companhia ainda vivia o impasse do crescimento constante de
seus concorrentes no próprio mercado americano, um exemplo disso foi
a aquisição em 2017 da rede Whole Foods pela Amazon. Segundo Tozzi
(2018 apud Silveira) “a expansão para um país emergente fica sem sen-
tido em um momento como este. Acabam voltando as atenções para en-
frentar a competição com a Amazon.”
Após mais de 20 anos de operação no mercado brasileiro e com
um portfólio de 438 lojas distribuídas em 18 estados, em Junho de 2018
após meses de busca por investidores em sua operação no Brasil, a Wal-
mart enfim anunciou a venda de 80% dos ativos da companhia no país
para um grupo de investimentos private equity Advent International, fi-
cando com apenas 20% do controle das operações. “Estamos comprome-
tidos em construir negócios fortes e resilientes que se adaptam continua-
mente às necessidades dos clientes locais em um mundo que está em rá-
pida mudança”. (OSTALE, 2018 apud CM, 2018).
Um ano depois de adquirir a maior parte da operação da Walmart
no Brasil, a Advent traz uma nova estratégia para atuação no mercado, a
mais significativa delas foi mudar o nome para Grupo BIG. A partir deste
ponto o foco da empresa estará voltado para o investimento no setor de
atacarejo, trazendo novos conceitos de lojas para garantir a concorrência
com os grupos Pão de Açúcar e Carrefour. A Advent pretende investir
mais de R$ 1,2 bilhões nos próximos meses para completar as transfor-
mações da marca no país. A partir do mês de Setembro de 2019 as lojas
de hipermercado da região Nordeste que antes se chamavam Hiper Bom
Preço passaram a adotar o nome BIG Bompreço, enquanto que as regiões
Sul e Sudeste as lojas de bandeira Walmart passaram a se chamar BIG.
Além das mudanças nos hipermercados, o Grupo BIG revitalizou as ban-
deiras Maxxi Atacado, Nacional Supermercado, Super Bompreço e as
lojas de vizinhança chamadas Todo Dia.
“O Brasil vive um período de arrumação da casa que deverá cul-
minar em crescimento sólido no futuro próximo. Tudo indica que o con-
sumo voltará com força, beneficiando principalmente grandes redes va-
rejistas”. (TANCISNKY, 2019 apud MENDES 2019). A mudança do
nome trará resultados positivos para a companhia em relação aos lucros
tendo em vista que os 0,7% da venda mensal de royalties pagos aos ame-
ricanos passará a ser mais baixo tendo em vista que o Grupo BIG ainda
utilizará a bandeira Sam’s Club que pertence ao Walmart.

Eu tenho uma marca global de sucesso absoluto que é a Wal-


mart, mas que no Brasil nunca foi a mesma coisa que lá fora.
A sensação que tenho é que as pessoas sempre esperaram que
isso acontecesse, e ficaram com essa expectativa na cabeça.

104
MEIO AMBIENTE, MIGRAÇÕES E PANDEMIA: REFLEXÕES DO MUNDO CONTEMPORÂNEO

Em parte, por causa dessa referência, a decisão de mudança


foi muito difícil. (FAZZIO, 2019).

O Grupo BIG traça como objetivo alcançar resultados que a


marca Walmart não proporcionou. A principal missão será investir no
seguimento de atacarejo, além de dominar o formato de clube de compras
e elevar o padrão de comprar em seus hipermercados, com a ideia de
atador um formato mais simplificado com eficiência e capacidade de
competir com outras companhias, estabelecendo uma equipe voltada
para quatro pilares fundamentais na execução desta nova etapa no mer-
cado brasileiro que são: a dor de dono, o senso de urgência, o inconfor-
mismo e a capacidade de execução.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Como vimos durante a pesquisa, o processo de internacionaliza-


ção de uma empresa, precisa ser pensado e muito bem elaborado, levando
em conta questões sociais, políticas, culturais e econômicas do determi-
nado mercado de origem. A internacionalização não visa manter somente
os lucros da companhia mas também a permanência dela no mercado sob
a ótica da concorrência.
O presente trabalho abordou a temática de expansão e internaci-
onalização da maior varejista do mundo, a Walmart. Foram considerá-
veis o tamanho e proporção de mercados que a Walmart conseguiu se
instalar, porém, nem todos obtiveram sucesso considerável como é nos
Estados Unidos, seu país-sede.
Pode-se concluir que a Walmart conseguiu alcançar seu objetivo
de expansão dentro dos Estados Unidos, onde avançou para outros esta-
dos em poucos anos, atualmente a companhia já deixou de operar em
alguns mercados da Ásia e da Europa e mais recentemente em 2018 ven-
deu a maior parte das operações no mercado brasileiro. Entende-se que
o Brasil foi um mercado mal pensado para a gigante americana, a tenta-
tiva de implementação dos conceitos e cultura americana presente nas
lojas não alcançou sucesso dentre as regiões do Brasil em que a empresa
se instalou.
Por outro lado, a tentativa fracassada de implementar nas lojas a
política de Preço Baixo Todo Dia, freou a companhia em relação ao
avanço das concorrentes. O que a Walmart pensou em trazer aos clientes
preços competitivos todos os dias, estava distante da realidade de promo-
ção que os consumidores buscavam. Outro ponto foi não deixar de inves-
tir no seguimento de atacarejo que os grupos Carrefour e Pão de Açúcar
fizeram.
Atualmente, sem operar o nome da marca no Brasil, a Walmart
então transformada em Grupo BIG busca correr atrás do prejuízo passado

105
JOSÉ AUGUSTO NUNES

e acelerar o processo de revitalização das suas lojas de atacado para que


possam competir frente a frente no mercado brasileiro.

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106
MEIO AMBIENTE, MIGRAÇÕES E PANDEMIA: REFLEXÕES DO MUNDO CONTEMPORÂNEO

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107
DIPLOMACIA E AMAZÔNIA BRASILEIRA:
A imagem do Brasil e os reflexos do desmatamento
na comunidade internacional

Klara Elisa Salvalagio1

INTRODUÇÃO

O tema ambiental nem sempre fora pauta de discussões que ex-


trapolassem os limites Estatais. Apenas no final da década dos anos 80
que tópicos sobre a preservação do meio ambiente e políticas ambientais
foram ganhando espaço em Conferências e encontros Governamentais.
O Brasil, sendo um país relevante quando o assunto é meio ambiente e
preservação ambiental, se torna objeto de estudo indispensável nessa
área.
Ao longo dos anos, temas envolvendo a Amazônia e a preocu-
pação social com sua manutenção têm crescido substancialmente, moti-
vados pelo crescimento da consciência ambiental da sociedade, além do
cenário de aumento do desmatamento das floretas brasileiras anual-
mente. As taxas de desmatamento da floresta Amazônica no Brasil cres-
cem demasiadamente devido a diversos fatores, como o desenvolvimento
da agropecuária e dos latifúndios presentes nessas terras. Tal realidade
não é benéfica para o Brasil, nem para o resto do mundo. Com isso, a
nova geração da sociedade moderna e globalizada têm-se engajado em
movimentos sociais pró-preservação e políticas sustentáveis ao redor do
mundo, principalmente na questão da Amazônia Brasileira.
Devido à importância global da Amazônia, é esperado que sua
manutenção seja de interesse da sociedade civil como um todo. Essa ma-
nifestação é comumente feita através de encontros governamentais e fó-
runs de discussões internacionais organizadas por Organizações Não-
Governamentais (ONGs) e pela sociedade internacional. Além disso, a
diplomacia entre os Estados é ferramenta essencial quanto ao diálogo e
debates sobre a preservação da Flores Amazônica. O envio de documen-
tos oficiais e pronunciamentos públicos são algumas formas que os di-
plomatas, chefes de Estado ou atores internacionais utilizam para

1 Graduanda em Relações Internacionais pela Universidade do Vale do Itajaí.


Endereço de e-mail: klaraelisas@gmail.com
KLARA ELISA SALVALAGIO

expressar sua opinião, seja ela positiva ou negativa, sobre situações de


interesse transnacionais.
Sendo assim, presente trabalho tem como objetivo analisar quais
as repercussões diplomáticas em virtude do desmatamento e ações toma-
das pelo governo brasileiro em relação à Floresta Amazônica. Tendo
ainda como foco entender quais são os impactos na diplomacia interna-
cional brasileira quanto à sua responsabilidade de preservação da Ama-
zônia. A metodologia utilizada foi a de pesquisa documental e bibliográ-
fica.
O trabalho será divido em 3 seções. A primeira destinada a dis-
correr sobre a importância da Amazônia e as consequências do seu des-
matamento no âmbito social e ambiental. A segunda seção será sobre a
importância da diplomacia em debates para resolução de conflitos inter-
nacionais, com foco na pauta ambiental e, ainda entender qual a política
exterior ambiental do governo brasileiro. E por fim, na terceira seção será
abordada qual a repercussão internacional sobre as ações do governo bra-
sileiro na preservação da Amazônia e sua resultante diplomática em três
casos específicos.

1. AMAZÔNIA: IMPORTÂNCIA DA MANUTENÇÃO DE SUA


COBERTURA FLORESTAL

Primeiramente é necessário enfatizar a importância global da


Floresta Amazônica. É a maior floresta tropical do mundo e detêm uma
enorme diversidade de ecossistemas. A Amazônia está presente em al-
guns países da América do Sul: Bolívia, Colômbia, Equador, Guiana,
Peru, Suriname e Venezuela, sua maior parcela estando em território bra-
sileiro.
Sua rica biodiversidade vai além da beleza, tendo em vista que
a Amazônia, comprovadamente, influencia fatores climáticos e ambien-
tais ao redor do mundo. Pode-se tomar como exemplo os rios verdes vo-
adores – termo cunhado nos últimos anos que se referem às “massas de
vapor de água oriundas da floresta amazônica influenciam diretamente
nas condições pluviométricas no continente sul-americano”. (Nasci-
mento e Quadros, 2018, p. 125). Existe interferência das florestas na
quantidade de chuvas que ocorrem na América do Sul e principalmente
no território brasileiro, na região Centro-Oeste e Norte. Ou seja, um
exemplo factível de que sua influência atravessa fronteiras.
Outro fator importante que tange à floresta em questão é o fenô-
meno de sequestro de carbono ocorrido a partir da absorção de CO2 pelos
vegetais da floresta, que, de acordo com Renner (2004) é se suma impor-
tância para diminuição dos efeitos dos Gases de Efeito Estufa (GEE) uma

110
MEIO AMBIENTE, MIGRAÇÕES E PANDEMIA: REFLEXÕES DO MUNDO CONTEMPORÂNEO

vez que eles são absorvidos pelas plantas e diminuem a concentração


destes gases na atmosfera.
Ainda, é imprescindível analisar os serviços ecossistêmicos que
provêm da Amazônia. Esses serviços são os benefícios que as pessoas
obtêm dos ecossistemas. Segundo Millennium Ecosystem Assessment
(2005) existem quatro tipos de serviços: a) abastecimento, como os pro-
dutos alimentícios, água e combustíveis; b) reguladores, que tem a capa-
cidade de regular o clima, doenças e enchentes; c) culturais que não são
tangíveis, como a espiritualidade e benefícios recreativos; d) serviços de
suporte, que são a base para toda a cadeia de manutenção de um ecossis-
tema, como a fotossíntese e formação do solo.
É possível relacionar todos esses tipos de serviços com a vida
que existe dentro da Floresta Amazônica e tudo que ela proporciona para
o planeta Terra. Na questão de abastecimento a Amazônia é uma floresta
megadiversa, Lewinsohn (2005) apud Programa das Nações Unidas para
o Meio Ambiente (PNUMA) “afirma que há 30.000 espécies de plantas
superiores, 300 de plantas pteridófitas, 311 de mamíferos, 1.300 de aves,
mais de 163 de anfíbios e 1.800 de peixes continentais”. Nos serviços
reguladores pode-se tomar como exemplo, o conceito de rios verdes vo-
adores abordados anteriormente pois funcionam como reguladores cli-
máticos em toda a América do Sul. Ainda, em serviços culturais, existe
a carga espiritual e cultural que a floresta Amazônica tem, tendo em vista
sua grandiosidade e importância para tantos povos indígenas ou não,
como para tantas religiões que a referenciam de alguma forma. E por fim,
em serviços ecossistêmicos de suporte, podemos destacar a autossufici-
ência da floresta tropical em que, por sua grande extensão, comporta di-
versos tipos de solo, e é capaz de produzir seus próprios nutrientes.
Estes três conceitos (rios verdes voadores, sequestro de carbono
e serviços ecossistêmicos) são apenas alguns dos vários exemplos passí-
veis de serem abordados no artigo para reforçar a representação humani-
tária da Floresta Amazônica. É importante para a continuação deste ar-
tigo a potencialização da importância que a floresta tem, tanto para o
Planeta Terra bem como para o Brasil.

1.1 Consequências do Desmatamento da Amazônia

Após ter sido feita uma análise dos principais fatores que tornam
a Floresta Amazônica brasileira importante globalmente, será abordado
um tópico desagradável tendo em vista todos os benefícios que ela traz à
humanidade. O processo de desmatamento e queimadas em territórios
brasileiros é uma realidade antiga. De acordo com Fearnside (2020), o
processo de invasão da floresta amazônica se intensificou na década de
70, com a inauguração da rodovia Transamazônica. A partir de então o

111
KLARA ELISA SALVALAGIO

as áreas destruídas e que sofreram mudanças aumentou continuamente.


Os dados do IPAM apontam que:

Foram 55 milhões de hectares derrubados entre 1990 e 2010,


mais do que o dobro da Indonésia (...) ao todo, só na Amazô-
nia, 780 mil km2 de vegetação nativa já se perderam, uma área
mais do que duas vezes maior que o território da Alemanha.
(IPAM, 2017, p. 7)

Com esses dados é possível entender a dimensão do prejuízo


causado à floresta Amazônica. Os processos de desmatamento são frutos
da ganância humana para tentar extrair dos vegetais produtos como
óleos, madeira e frutos para suprir seus desejos. Além disso, as queima-
das podem acontecer de maneira natural ou por interferência humana. Os
motivos que levam o homem a colocar fogo em áreas preservadas da flo-
resta é abertura de pastagem para uma posterior plantação agrícola.
Torna-se necessário estender a análise em que, com todo esse processo
de queimadas e perda de vegetação, os chamados rios verdes voadores,
o processo de sequestro de carbono e ainda os serviços ecossistêmicos
fornecidos através da vida vegetal na Amazônia são impactados direta-
mente. Um questionamento pertinente neste cenário é: sendo de conhe-
cimento comum à população mundial, principalmente brasileira, a im-
portância ecológica e social da floresta Amazônica, como se justifica en-
tão o crescente desmatamento sofrido por ela? Tal indagação é justa e
necessária. A justificativa mais comum é relacionada ao agronegócio.
De acordo com Fearnside (2020):

Embora a floresta amazônica seja desmatada por inúmeras ra-


zões, a criação de gado ainda é a causa predominante. As fa-
zendas de médio e grande porte eram responsáveis por cerca
de 70% das atividades de desmatamento. O comércio da carne
bovina é apenas uma das fontes de renda que faz com que o
desmatamento seja lucrativo. (2020, p. 8)

Sendo o agronegócio muito importante para a economia e repre-


sentando grande parcela das exportações brasileiras, é disseminada por
muitos a ideia de que o desmatamento de terras é necessário para a eco-
nomia do Brasil pelo seu perfil agroexportador. Porém nada justifica as
ações invasivas e que prejudicam a floresta Amazônica. Nesse sentido, é
preciso que seja feito um balanço entre as consequências econômicas e
as consequências sociais e ecológicas provenientes da degradação do
meio ambiente, neste caso específico, da Amazônia brasileira.
Segundo Fearnside (2020, p. 12) “As funções da bacia hidrográ-
fica são perdidas quando a floresta é convertida para usos tais como as
pastagens”. Ou seja, as pastagens originárias de um processo de

112
MEIO AMBIENTE, MIGRAÇÕES E PANDEMIA: REFLEXÕES DO MUNDO CONTEMPORÂNEO

queimada ou desmatamento interferem nas bacias hidrográficas. Além


de também interferir no solo do da terra, que pode se tornar infértil e
nunca retornar a sua composição natural. Neste caso então perde-se algo
natural e que se autossustenta – como o solo – e troca-se por um “pro-
duto” sazonal e instável como a produção de carne bovina. Portanto, con-
clui-se que as consequências ecológicas e ambientais são eternas en-
quanto as consequências economias são efêmeras, tendo em vista que a
cadeia de produção poderá ser destinada a outro produto.
Com o intuito de enfatizar a problemática gerada com as quei-
madas e desmatamentos na floresta Amazônica, a primeira seção é en-
cerrada com tal assertiva, trazida no relatório do IPAM (2017, p. 11) “po-
luição atmosférica gerada pelas queimadas e incêndios florestais, atrela-
dos ao desmatamento, têm o potencial de causar centenas de mortes pre-
coces todos os anos”. Portanto além de prejuízos ecológicos, ambientais,
os processos de desmatamento e queimadas acarretam danos diretos aos
seres humanos, como doenças respiratórias.

2. IMPORTÂNCIA DA DIPLOMACIA EM DEBATES PARA


RESOLUÇÃO DE CONFLITOS INTERNACIONAIS

Já fora analisado então a Floresta Amazônica em seu grau de


relevância para a sociedade e meio ambiente e ainda em relação as con-
sequências ambientais das queimadas e desmatamento da vegetação.
Nesta segunda seção será abordada como a diplomacia internacional é
importante em debates sobre o meio ambiente e como esta pode ser be-
néfico na resolução de problemas internacionais, relacionados à natureza.
O conceito de diplomacia ganhou destaque após a Convenção de
Viena sobre Relações Diplomáticas, em que fora firmado um tratado in-
ternacional em 1961, a partir da Conferência das Nações Unidas sobre
Relações e Imunidades Diplomáticas, onde foram explicitadas as funções
de um diplomata. De acordo com Soares e Fernandes (2012):

Art. 3º. As funções de uma Missão diplomática consistem, en-


tre outras, em:
a) representar o Estado acreditante perante o Estado acredi-
tado;
b) proteger no Estado acreditado os interesses do Estado acre-
ditante e de seus nacionais, dentro dos limites permitidos pelo
direito internacional;
c) negociar com o Governo do Estado acreditado;
d) inteirar-se por todos os meios lícitos das condições existen-
tes e da evolução dos acontecimentos no Estado acreditado e
informar a esse respeito o Governo do Estado acreditante;

113
KLARA ELISA SALVALAGIO

e) promover relações amistosas e desenvolver as relações eco-


nômicas, culturais e científicas entre o Estado acreditante e o
Estado acreditado.

Neste artigo, o que concerne é relativo ao tópico d) em que os


Estados devem inteirar-se dos acontecimentos internacionais, principal-
mente caso haja algum movimento ilício, será tratado especificamente os
sobre os acontecimentos ilícitos em relação ao meio ambiente. Portanto,
cabe aos atores internacionais, em última instância aos diplomatas, a tra-
tarem sobre as questões que envolvem a Floresta Amazônica tendo em
vista que sua manutenção é de interesse global. A ideia de “inteirar-se”
engloba o estágio em que o Estado toma conhecimento de alguma infor-
mação que seja relevante, neste caso sobre as queimadas e desmatamento
da Amazônia. E já ao tópico e) trazido acima concerne em que os diplo-
matas mantenham uma relação amistosa entre os Estados, ainda que haja
algum debate a ser feito sobre quaisquer problemáticas existentes.
Especificamente sobre a diplomacia em debates ambientais, é
notável que em certos momentos haja uma sobreposição de interesses
quando o assunto é a preservação do meio ambiente, neste caso, da Flo-
resta Amazônica. Isso pois, além do seu valor ecológico, sua biodiversi-
dade possui certo valor econômico quando associado à sua vegetação,
solo e terras para potenciais produções agrícolas. O Brasil, detêm certo
poder de barganha quando o assunto é a Amazônia, pelo fato de a maior
parte da floresta estar em seu território, mas relação a isso, Lisboa (2012,
p. 82) alerta em muitas ocasiões a pauta ambiental e ecológica é posta
em segundo plano:

A política externa de meio ambiente pode ser influenciada


também por considerações de política externa, muitas vezes
inteiramente alheias às questões ambientais, como a manuten-
ção ou conquista de posições de liderança nos cenários regio-
nais ou internacional, a política de blocos ou subordinação a
países mais influentes e mesmo a troca de acordos, o apoio e
concessões das agendas ambientais por outros pertencentes a
agendas não ambientais de maior interesse dos países.

Importante analisar esta passagem da autora, pois abrange a re-


alidade que muitas vezes a diplomacia e negociações existentes sobre o
meio ambiente se confundem ou são influenciadas por interesses econô-
micos e políticos, desvinculando da problemática inicial. A autora ainda
traz uma afirmação em vivemos em uma realidade em que “ingressamos
em um período das negociações internacionais em meio ambiente onde
a mediocridade dos resultados possivelmente será a regra” (LISBOA,
2012, p. 93). A partir desta assertiva entende-se que a questão ambiental
cenário do século XX, que já fora discutida neste artigo, é sim pauta das

114
MEIO AMBIENTE, MIGRAÇÕES E PANDEMIA: REFLEXÕES DO MUNDO CONTEMPORÂNEO

negociações internacionais e diplomacia, porém a obtenção de resultados


efetivos e palpáveis são os mínimos possíveis para sobrevivência hu-
mana.

2.1 Política Externa Brasileira na Questão Ambiental:


Um Breve Histórico

Após a análise de qual o lugar da diplomacia sobre o meio am-


biente e com o entendimento de que em certas ocasiões a problemática
ecológica se perde, será agora discorrido sobre os alicerces da política
externa brasileira na questão ambiental.
A conjuntura internacional vigente influencia a política externa
dos países. O modo em que o Estado se posiciona internacionalmente é
resultante do cenário em que o mundo se encontra. Como aborda Nasci-
mento (2011), fora após a Conferência de Estocolmo em 1972 que a
pauta ambiental ganhou importância diplomática, principalmente dentro
do Estado Brasileiro. Nesta conferência o governo brasileiro adotou uma
postura realista, “pois assegurou o princípio de que os países tinham o
direito soberano de utilizar seus recursos naturais de acordo com suas
prioridades”. Esta posição do Brasil fora confrontada na época pelo fato
de já existir um entendimento da grande importância ambiental e da Flo-
resta Amazônia para o mundo. Porém a postura de soberania territorial
brasileira prevaleceu.
Já na década de 90 o discurso do governo mudou e adotou uma
postura mais cooperativa em relação ao desenvolvimento sustentável, no
evento Rio 92. Nascimento (2011) entende que tal mudança fora influ-
enciada pela conjuntural internacional da época, em que os Estados esta-
vam se voltando mais à temática ambiental e de sustentabilidade. Ou
seja, caso o Brasil continuasse com um discurso de direito soberano sobre
assuntos ambientais, seu poder de fala e posição na comunidade interna-
cional seria prejudicado. Portanto, após a Rio 92, o Estado brasileiro se
posicionou como grande vetor no desenvolvimento sustentável e com
promessas de medidas para proteção do meio ambiente frente ao mundo.
Ainda, Moreira (2009) aponta que o Protocolo de Kyoto fora de
importância para a política externa brasileira em relação ao meio ambi-
ente no começo do século XXI. A autora traz que as políticas adotadas
giraram em torno de 5 principais pontos:

1) afirmar o direito ao desenvolvimento como um componente


fundamental da ordem mundial, dando continuidade à política
externa brasileira do período; 2) promover uma visão do de-
senvolvimento associada à sustentabilidade ambiental, se-
guindo o crescimento da conscientização da população brasi-
leira a respeito do meio ambiente; 3) promover uma posição
de liderança do Brasil no mundo, em correspondência com o

115
KLARA ELISA SALVALAGIO

aumento do prestígio internacional do país durante o Governo


FHC; 4) evitar que o uso das florestas fosse objeto de regula-
ção internacional para não correr riscos de que outros países
influíssem nas decisões sobre a Amazônia; 5) promover o fi-
nanciamento por parte dos países desenvolvidos para projetos
relacionados à mitigação climática nos países em desenvolvi-
mento (VIOLA APUD MOREIRA, 2009)

Pode-se discorrer então que a política externa brasileira no co-


meço dos anos 2000 fora pauta em uma mistura entre a ideia de soberania
estatal e cooperação para desenvolvimento sustentável. Isso quer dizer,
na prática, que o país deixava claro que os assuntos envolvendo seu ter-
ritório, o que inclui a sua parcela da Amazônia, era de interesse primor-
dialmente brasileiro e que não seriam aceitas interferências nessa ques-
tão. Todavia, o governo do Brasil estaria disposto a fazer parte de acordos
e políticas para o desenvolvimento sustentável e proteção ao meio ambi-
ente.

2.2 Pilares da Política Externa Ambiental Brasileira no Século XXI

Um dos mais importantes pilares da política externa brasileira


na puta ambiental é a consolidação do princípio da soberania. Como já
apontado ao longo do texto, historicamente o conceito de soberania Es-
tatal permeia os discursos brasileiros quando discutida a questão ambi-
ental. O Brasil, assim entende-se o governo brasileiro, compreende que
a Floresta Amazônia é muito rica – tanto ecológica como financeira-
mente – e por isso compreende que é importante manter uma posição de
soberania no seu território. Nascimento (2011, p. 40) adiciona que “o
meio ambiente é identificado com recursos naturais, e estes fazem parte
do repertório de bens sob jurisdição da soberania territorial”, portanto,
como é de entendimento comum na comunidade internacional a ideia de
soberania, quando o discurso Brasileiro toca nesse assunto, os argumen-
tos contrários perdem força.
Outro pilar que, atualmente, fundamenta o discurso do governo
brasileiro é de “responsabilidades comuns, mas diferenciadas” (NASCI-
MENTO, 2011, p. 40). A ideia brasileira gira em torno de que são os
países desenvolvidos os principais culpados pela degradação do meio
ambiente do mundo e, portanto, é este grupo de países industrializados
que deveriam tomar medidas mais protetivas, como em relação à redução
da emissão dos gases de efeito Estufa. O Brasil entende que é de respon-
sabilidade comum à comunidade internacional o desenvolvimento sus-
tentável e de preservação do meio ambiente, mas defende também que as
responsabilidades de cada país devem ser proporcionais ao seu dano ge-
rado individualmente.

116
MEIO AMBIENTE, MIGRAÇÕES E PANDEMIA: REFLEXÕES DO MUNDO CONTEMPORÂNEO

Por fim, mas não menos relevante, está o posicionamento brasi-


leiro em relação a Floresta Amazônica. Devido à grande importância
desta floresta para o território brasileiro, o debate acerca da sua manu-
tenção atinge as premissas da política externa ambiental brasileiro. De
acordo com Silva (2012, p. 132):

O posicionamento defensivo brasileiro em relação a negocia-


ções internacionais que tenham efeitos diretos sobre florestas
mantém-se rígidos desde as primeiras discussões que levanta-
ram a questão de uma possível gestão supranacional sobre a
Amazônia. Esta posição da política externa brasileira se mani-
festou abertamente em diversas ocasiões [...]

Pode-se inferir que a questão da soberania brasileira pela Ama-


zônia é um ponto crucial defendido pelo governo brasileiro. Desde a
Conferência de Estocolmo, adentrando à Rio 92 e ainda nas discussões
atuais, é sempre pauta de debates a reafirmação no quesito da soberania
e que as questões que envolvem a Floresta Amazônica são de interesse
exclusivamente brasileiros.
É possível concluir então que a política externa ambiental brasi-
leira atualmente resulta em uma posição confortável ao Brasil. Isso por-
que, ao mesmo tempo em que se dispõe a participar de ações para pre-
servação do meio ambiente e de políticas sustentáveis, o governo sempre
reforça que os assuntos que tangem suas florestas são questões apenas
brasileiras, não aceitando interferências externas. Nesta problemática
Silva (2012, p. 136) afere assertivamente que “podemos notar que a reo-
rientação nos posicionamentos brasileiros configura mais um processo
de aprimoramento da política exterior para o meio ambiente do que uma
mudança nas suas linhas de atuação”. Portanto percebe-se uma mudança
apenas no posicionamento internacional brasileiro, porém mudanças efe-
tivas em políticas de preservação ambientais permanecem apenas em dis-
cursos.

3. REPERCUSSÕES INTERNACIONAIS A PARTIR DO


DESMATAMENTO DA FLORESTA AMAZÔNICA

A partir de tudo que fora analisado no trabalho até agora, enten-


dendo como se encontra a conjuntura do meio ambiente na perspectiva
brasileira, será feita uma análise de alguns acontecimentos de relevância
diplomática que concernem a Amazônia. Para fins acadêmicos foram se-
lecionados três grandes impactos que as ações brasileiras perante a Flo-
resta Amazônica tiveram no cenário internacional, bem como quais fo-
ram as repercussões.

117
KLARA ELISA SALVALAGIO

É de entendimento que questões acerca da Amazônia e sua pre-


servação permeiam o debate internacional desde a década de 80 do sé-
culo passado, e que vários acontecimentos internacionais seriam fontes
interessantes de análises neste contexto. Entretanto, como delimitação do
próprio artigo em trazer um recorte histórico mais contemporâneo, foram
escolhidos acontecimentos recentes do ano de 2020.

3.1 Acordo Mercosul – União Europeia

Após de mais de duas décadas de negociação entre os dois blo-


cos regionais, fora parcialmente firmado o chamado Acordo de Associa-
ção o Mercosul e União Europeia que tange apenas a área de comércio.
De acordo com o Breefing fornecido pelo Parlamento Europeu (2019, p.
2), o acordo é um “acordo de comércio livre (ACL) com um âmbito
abrangente que visa, nomeadamente, a liberalização progressiva do co-
mércio de bens e serviços e a abertura dos mercados de contratos públi-
cos das partes”. Mesmo já estando avançado nas negociações, a ratifica-
ção e assinatura do acordo bilateral ainda não aconteceu, isso devido à
diversos motivos. Importante ressaltar aqui que, de acordo com o Tratado
interno da União Europeia, estipula-se “que a deliberação do Conselho
seja por unanimidade quando se trata de adotar um acordo de Associação.
Basta, portanto, o veto de um dos Estados-Membros para impedir a rati-
ficação” (GREENPEACE, 2020), ou seja, é de extrema importância a
consonância de interesses entre as partes envolvidas. E no quesito ambi-
ental não há concordância dos países europeus quanto às atitudes brasi-
leiras para a preservação.
Países da União Europeia já manifestaram sua preocupação em
relação a situação do meio ambiente, principalmente da Amazônia brasi-
leira. A consciência de preservação da natureza dentro da Europa é ante-
rior à brasileira, políticas sustentáveis e mesmo a consciência da impor-
tância da natureza para a vida humana está mais presente na população
europeia, por isso seu discurso de preocupação quanto às atitudes do go-
verno brasileiro em relação à Amazônia. Os Estados europeus são contra
o acordo principalmente por causa da situação dos direitos humanos que
existe no Brasil e das queimadas que causam danos ao clima. O governo
francês já publicou repetidas vezes que não assinará nenhum acordo com
países que violem as condições do Acordo de Paris. (REUTERS, 2019).
Além disso, o governo austríaco também demonstra preocupa-
ção (REPUBLIK ÖSTERREICH, 2019) e entende que seja necessário a
adição de uma cláusula específica sobre a implementação das premissas
do Acordo de Paris entre as partes envolvidas no Acordo UE-Mercosul.
Ademais a Alemanha é um dos países europeus mais favoráveis ao fe-
chamento do acordo comercial, mas sinaliza que é a questão da

118
MEIO AMBIENTE, MIGRAÇÕES E PANDEMIA: REFLEXÕES DO MUNDO CONTEMPORÂNEO

sustentabilidade brasileira é extrema importância, e que este quesito pre-


cisa ser reavaliado dentro do acordo. (DW, 2020).
Portanto, pode-se entender que a ratificação pelos países da
União Europeia é algo delicado e talvez a negociação demore ainda para
ser finalizada. É nítido que a relação entre o governo brasileiro e as me-
didas de preservação do meio ambiente impactam diretamente as nego-
ciações deste acordo bilateral entre União Europeia e Mercosul. Portanto,
as ações brasileiras para o combate às queimadas e desmatamento das
suas floretas não são boas e efetivas o suficiente ao entender da Europa,
e os países entendem que seria necessária a adoção de medidas mais di-
retas e palpáveis para a proteção da vida vegetal. Ainda, no que concerne
às repercussões diplomáticas da omissão das autoridades brasileiras em
combater as queimadas e destruição da Amazônia, podemos entender que
a discussão extrapolou o campo apenas do meio ambiente e sim nas re-
lações contratuais brasileiras.

3.2 Carta aberta de países europeus ao vice-presidente brasileiro


Mourão

Em setembro de 2020, mais especificamente no dia em que as


queimadas no Pantanal brasileiro chegaram perto 3 milhões de hectares
– equivalente ao território da Bélgica – oito países europeus enviaram
uma carta aberta ao vice-presidente brasileiro Hamilton Mourão. O ob-
jetivo central da carta foi de sinalizar sua preocupação com a política
ambiental adotada pelas autoridades brasileiras.
O ano de 2020 além de ser marcado pela pandemia do Corona
vírus, também fora um ano preocupante em relação às queimadas e des-
matamento em território brasileiro. De acordo com o site Amazônia Real
(2019) “mês com mais focos de queimadas em 2020 no estado foi julho,
que bateu o recorde histórico de 22 anos”. Além de prejudicarem a re-
serva de Floresta Amazônica, as queimadas alarmantes do ano de 2020
afetam crucialmente o Pantanal, bioma exclusivamente brasileiro. E
como já abordado no trabalho, a consciência ambiental global vem cres-
cendo nos últimos anos e tais destruições que estão acontecendo com o
Pantanal e Amazônia despertam o interesse da comunidade global.
Mesmo com a pandemia do Corona vírus tendo tomado frente
nas notícias internacionais, a pauta ambiental – Amazônia e Pantanal –
ganhou espaço, principalmente no segundo semestre de 2020. Tendo em
vista os crescentes focos de incêndio e desmatamento em território bra-
sileiro, autoridades internacionais sentiram necessidade de se manifesta-
rem publicamente. Com isso, em setembro de 2020, 8 países europeus –
Alemanha, Dinamarca, França, Itália, Holanda, Noruega, Reino Unido e
Bélgica – que participam da Declaração de Amsterdã, que é uma parceria
entre alguns países europeus para promoção de sustentabilidade e

119
KLARA ELISA SALVALAGIO

incentivo a uma agricultura que com diminuição da destruição de flores-


tas, enviariam a Carta Aberta às autoridades brasileiras. Na carta, é ex-
pressa grande preocupação por parte destes países que “compartilham da
preocupação crescente demonstrada pelos consumidores, empresas, in-
vestidores e pela sociedade civil Europeia sobre as atuais taxas de des-
florestamento no Brasil” (CARTA ABERTA, 2020). A carta propõe que
sejam feitos acordos e parcerias para uma melhor e mais efetiva preser-
vação da Floresta Amazônica e ações pró-sustentabilidade. Por fim, o
documento traz que os países europeus “contam com um compromisso
político firme e renovado por parte do governo brasileiro para reduzir o
desflorestamento e esperam que isso se reflita em ações reais imediatas.”
(CARTA ABERTA, 2020)
Deste modo, é possível concluir que, mesmo em um ano de Pan-
demia global em que um vírus ganhou os holofotes sem precedentes, o
Brasil ainda consegue estar presente em pautas diplomáticas. A situação
das queimadas e desmatamento das florestas atingiu no ano de 2020 ní-
veis alarmantes jamais vistos, e claramente que esta realidade chamaria
a atenção da comunidade internacional. O fato de que um grupo de países
europeus, em meio a uma Pandemia, julgou importante o envio de uma
carta diretamente ao vice-presidente da República demonstra a importân-
cia global das atitudes – ou omissões – brasileiras em relação ao seu meio
ambiente. Novamente neste caso analisado, as repercussões internacio-
nais foram de discordância em relação ao governo brasileiro e culmina-
ram em uma imagem negativa do Brasil na comunidade internacional

3.3 Brasil como pauta de debate entre candidatos à presidência dos


Estados Unidos da América

Ainda como grande pauta internacional no ano de 2020 está a


eleição para presidência dos Estados Unidos da América (EUA). Este
acontecimento é esperado por uma grande audiência internacional, de-
vido à relevância na estrutura de poder da comunidade internacional que
os EUA ocupam. Na corrida eleitoral do ano, disputaram Donald Trump
e Joe Biden como principais candidatos. E como tradição, no final do
mês de setembro, ocorreu o debate entre estes dois candidatos para que
expusessem seus planos de governo. Não era esperado, porém, que o
Brasil tomasse lugar na fala dos candidatos.
Durante o debate, o Biden abordou a questão ambiental brasi-
leira. O candidato afirmou que, caso eleito, “começaria imediatamente a
organizar o hemisfério e o mundo para prover US$ 20 bilhões para a
Amazônia, para o Brasil não queimar mais a Amazônia” (BBC, 2020). O
americano fora ainda mais incisivo ao tratar da situação do Brasil, tra-
zendo que a comunidade internacional diria ao Brasil “aqui estão US$ 20
bilhões, pare de destruir a floresta. E se não parar, vai enfrentar

120
MEIO AMBIENTE, MIGRAÇÕES E PANDEMIA: REFLEXÕES DO MUNDO CONTEMPORÂNEO

consequências econômicas significativas” (BBC, 2020). Tais afirmações


claramente tiveram repercussão internacional, tanto pelos apoiadores
quanto aos que desprezam tal iniciativa. Há um grupo de organizações
internacionais e países que acreditam em um movimento uníssono para
preservação da Amazônia e há o governo brasileiro que defende a posição
de soberania quanto aos assuntos internos. E a repercussão desta fala de
Biden dentro da cúpula do governo brasileiro fora marcante.
O presidente brasileiro Jair Bolsonaro fez diversas críticas ao
discurso do candidato estadunidense, trazendo a discussão sobre “cobiça
internacional” da Amazônia, reforçando novamente a ideia de soberania
sobre a Floresta brasileira. Porém a negação interna não ofusca o fato de
que a situação ambiental da natureza brasileira está tão alarmante e lite-
ralmente “em chamas” que este assunto fora pauta do debate entre can-
didatos para presidência estadunidense. Se esta não fosse a realidade, im-
provavelmente que a palavra “Brasil” fosse sequer citada neste debate
que não concerne em nada o país sul-americano.
Neste terceiro caso, foi possível analisar, então, mais um acon-
tecimento diplomático internacional proveniente da situação da Amazô-
nia brasileira. O cenário é tão preocupante e alarmante internacional-
mente que está sendo pauta de discussões de outros segmentos. Neste
caso específico foram, outra vez, as omissões brasileiros quanto a medi-
das de proteção ao meio ambiente que resultaram em questionamentos
internacionais.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A importância ecológica e humanitária da Amazônia é imensa.


É de conhecimento empírico a população do Planeta Terra que as floretas
são importantes para a sobrevivência, e ainda quando se estuda mais
afundo, como os serviços ecossistêmicos provenientes da Floresta Ama-
zônica, sua relevância fica mais aparente. Dados e conceitos científicos
afirmam que a manutenção das florestas e da Floreta Amazônica em es-
pecífico são de vital notoriedade quando pensada manutenção da vida
humana e a manutenção do próprio meio ambiente.
Os dados abordados no presente trabalho puderam afirmar que
os desmatamentos e queimadas que acontecem atualmente na Amazônia
Brasileira impactam a vida dos cidadãos. Seja pela falta dos serviços
ecossistêmicos e a precariedade do “sequestro de carbono” que acontece
através dos vegetais ou ainda seja impactando na saúde dos seres huma-
nos quando pensado sobre a falta de alimentos ou doenças provenientes
da fumaça gerada.
Devido a essa relevância do meio ambiente para a sobrevivência
humana, fora dedicada uma seção para entender qual o lugar que o meio

121
KLARA ELISA SALVALAGIO

ambiente ocupa dentro das relações diplomáticas. Além disso, fora dis-
cutido também qual o lugar que o meio ambiente e políticas ambientais
ocupam nas políticas exteriores do Brasil. Mesmo tendo em vista que as
relações diplomáticas sobre a natureza são relativamente novas, pode-se
perceber que esta pauta já é relevante das discussões e fóruns internaci-
onais. Propostas e iniciativas para proteção ambiental aumentam cada
vez mais dentro dos Estados e Organizações Internacionais. Neste cená-
rio, a posição do Brasil é de suma importância pelo fato da Amazônia
estar em seu território, ou seja, as decisões e propostas que envolvem a
natureza infere quando a discussão é Amazônia brasileira.
Nesta pauta, a posição brasileira sempre fora defensiva, em que
assuntos internos, principalmente os que concernem a Amazônia, não de-
vem sofrer interferências externas. Desde as décadas de 70 e 80 o Brasil
adotou um discurso internacional que não aceita intervenções estrangei-
ras em questões sobre a floresta amazônica, pois entende que é um con-
ceito de soberania territorial. Porém, mesmo que fisicamente a Amazônia
esteja dentro de território brasileira, o mundo inteiro preza e tem interesse
na sua manutenção. Ou seja, é indiscutível que a pauta meio ambiente,
Amazônia e Brasil estejam presente na comunidade internacional, bem
como discussões e propostas para preservação do meio ambiente. E é
nesta seara que o objetivo do artigo se encontra: analisar quais as reper-
cussões diplomáticas provenientes da postura adotada pelo governo bra-
sileiro em relação à Floresta Amazônica, no contexto das queimadas e
desflorestamento.
Para cumprir esta ideia foram analisados três grandes aconteci-
mentos diplomáticos que envolveram o Brasil, em relação à Amazônia e
autoridades internacionais. A polêmica sobre o Acordo Mercosul-União
Europeia, a Carta Aberta escrita ao vice-presidente Mourão e a fala no
debate entre candidatos para presidência dos EUA foram eventos que
trouxeram esta pauta. E infelizmente, as repercussões contidas sobre a
floresta brasileira fora todas negativas. Isso porque trouxeram a realidade
de que o governo brasileiro não tomou medidas efetivas e funcionais para
o controle das queimadas e uma maior preservação do meio ambiente. O
eco que ecoa na comunidade internacional é negativo em relação ao po-
sicionamento brasileiro sobre a degradação das suas florestas. Estados,
Organizações Internacionais e a própria sociedade civil global iniciam
debates de como são necessárias mais ações concretas para o combate às
queimadas, seja com dinheiro, como trouxe o candidato Biden em seu
discurso ou através de parceiras, proposto através da Carta Aberta escrita
por países europeus.
A imagem brasileira é manchada negativamente pela omissão e
não tomada de atitudes em relação à Amazônia. É transmitida a impres-
são de negligência e ignorância tendo em vista que toda a humanidade
entende da importância ecológica da Amazônia enquanto no Brasil as

122
MEIO AMBIENTE, MIGRAÇÕES E PANDEMIA: REFLEXÕES DO MUNDO CONTEMPORÂNEO

autoridades não são capazes de combater os focos de incêndio e nem cri-


arem políticas públicas efetivas que impeçam ou diminuam o desmata-
mento.
Portanto, entende-se que as repercussões diplomáticas são fre-
quentes quando o tema é Amazônia e preservação ambiental. Elas podem
acontecer através de vários meios de comunicação, pelas redes sociais,
em fóruns internacionais, por envio de ofícios ou ainda em debates de
campanhas eleitoras. Todos os meios são passíveis de protestos ou indig-
nações, pois o que se encontra como mais relevante é a manifestação da
preocupação pela sobrevivência da Floresta Amazônia.

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125
“SE SOUBÉSSEMOS QUE SERIA ASSIM, NÓS NÃO
TERÍAMOS VINDO PARA O EGITO”:1
Preconceitos sofridos por mulheres africanas subsaarianas que buscam
refúgio no Egito

Larissa Pimenta da Silva2

INTRODUÇÃO

Nos últimos anos, registrou-se uma intensa migração da África


Subsaariana para o Egito. De acordo com o ACNUR, em 2019 o Egito
registrou 31.328 procuradores de asilo e refugiados, sendo grande parte
mulheres africanas subsaarianas. As mulheres fogem de sua região de
origem por inúmeras razões – como guerras civis e questões econômicas
– e buscam o território egípcio como alternativa de sobrevivência. Entre-
tanto, quando chegam ao país se encontram em uma situação ainda maior
de vulnerabilidade, visto que a realidade encontrada é uma violência con-
tinuada, devido a discriminação étnica e de gênero que passam a sofrer.
O tema do presente trabalho é a discriminação étnica e de gênero sofrida
por mulheres africanas subsaarianas refugiadas no Egito.
Essa pesquisa tem por objetivo analisar os tratamentos discrimi-
natórios, de etnia e de gênero, que mulheres africanas subsaarianas mi-
grantes – especialmente do Sudão, Sudão do Sul, Etiópia, Eritreia e So-
mália – sofrem quando buscam proteção e segurança no Egito. Em 2017,
a cidade que mais recebe migrantes no país, Cairo, foi considerada a mais
perigosa do mundo para mulheres viverem (THOMSON REUTERS
FOUNDATION). Ao mesmo tempo, o Egito é um dos países que mais
recebe migrantes da região do Norte da África, sendo grande parte mu-
lheres (IMIGRATION POLICY CENTRE, 2016).
Os fatores para a dinâmica da migração da África Subsaariana
são diversos (NORDIC AFRICAN INSTITUTE, 2008). Em um mundo
avançado o grau de globalização, esses países ainda precisam lidar com

1 “IF WE KNEW IT WOULD BE LIKE THIS, WE WOULD NOT HAVE COME


TO EGYPT”: sudaneses para o relatório Getting by on the Margins: Sudanese and
Somali Refugees de Paul Miranda (2018).
2 Graduanda do curso de Relações Internacionais da Universidade do Vale do Itajaí-

UNIVALI.
LARISSA PIMENTA DA SILVA

a pobreza, epidemias de HIV/AIDS, políticas instáveis, declínios econô-


micos e deteriorações ambientais (ADEPOJU, 2008). Além disso, uma
das principais causas para o deslocamento feminino forçado é o conflito
interno no país de origem. Essas mulheres correm o risco de sofrerem
violências sexuais e serem traficadas para a exploração sexual (ADEP-
OJU, 2008).
O presente trabalho pretende trazer uma contribuição ao ambi-
ente acadêmico, visto que há um silêncio nas pesquisas científicas e nos
centros de estudo a respeito do tema. No entanto, depoimentos das mu-
lheres africanas subsaarianas no Egito, registrados por livros e relatórios
de artigos, demonstram a necessidade de serem ouvidas e suas histórias
conhecidas. Para o campo das Relações Internacionais (RI) as histórias
dessas mulheres que travessam fronteiras e se lançam em jornadas mi-
gratórias perigosas para chegar ao Egito, onde são tratadas com se não
fossem humanas, são de grande valor para se compreender os desloca-
mentos humanos na África e maneira como as diferenças culturais, numa
mesma região, são utilizadas para discriminar e inferiorizar o outro, nesse
caso as mulheres africanas migrantes.
Para que os objetivos do presente projeto sejam atingidos, será
utilizada a metodologia qualitativa, empregando duas técnicas de pes-
quisa: a bibliográfica e a documental. Do ponto de vista bibliográfico,
será utilizado diversos autores que ajudam a entender aspectos do tema
que abordado. Quanto a categoria de gênero, abordaremos autoras como
Ann Tickner – primeira teórica a abordar o gênero nas RI – e Rawyn
Connell. Para pensar a respeito de migrações femininas, serão utilizadas
autoras como Wenona Giles e Jennifer Hyndman. Já para a compreensão
dos preconceitos raciais sofrido por refugiadas africanas subsaarianas no
Egito, o presente trabalho utilizará de autores que discorrem sobre raça,
como por exemplo o camaronês Achille Mbembe, e também Peter Wade.
E, por fim, através do livro Sudanese Women Refugees, compreender-
mos a situação real dessas mulheres, por intermédio de relatos e depoi-
mentos dados por elas.
A pesquisa documental baseia-se em relatórios que nos permi-
tem ter acesso aos depoimentos das mulheres africanas subsaarianas. As
Organização das Nações Unidas (ONU), o Alto Comissariado das Na-
ções Unidas para Refugiados (ACNUR), Anistia Internacional e pesqui-
sas feitas pela Universidade Americana do Cairo (AUC) são exemplos
de documentos utilizados para comprovarmos a situação dessas refugia-
das africanas subsaarianas no Egito.

1 GÊNERO, MIGRAÇÃO E RAÇA NO CAMPO DAS


RELAÇÕES INTERNACIONAIS

128
MEIO AMBIENTE, MIGRAÇÕES E PANDEMIA: REFLEXÕES DO MUNDO CONTEMPORÂNEO

Na década de 1980, quando as RI eram majoritariamente mas-


culinas, focadas na maximização de poder, autonomia e em ações estra-
tegicamente racionalizadas, Ann J. Tickner, teórica feminista e interna-
cionalista, trouxe a categoria gênero para o nosso campo do conheci-
mento. Embora ela tenha sido a primeira internacionalista a trazer essa
categoria para as RI, duas gerações de estudiosas contribuíram para o
desenvolvimento dos estudos feministas nos últimos quarenta anos.
Além de Tickner (1992), as primeiras perspectivas de gênero fo-
ram também das autoras Jean Elshtain (1987) e Cynthia Enloe (1989),
que introduziram estudos sobre a presença das mulheres nas RI. Desen-
volvendo uma abordagem que ficou conhecida como o “ponto de vista
feminista”, as três foram pioneiras em denunciar a exclusão das mulheres
dos discursos teóricos e da história internacional, ao mesmo tempo em
que também construíram críticas feministas às epistemologias e ontolo-
gias da teoria liberal e realista (HANSEN, 2010).
Já na metade na década de 1990, pesquisadoras feministas como
Sylvester (1994) e Roxanne Lynn Doty (1996), abriram caminho para
vertentes teóricas pós-estruturais. Essas vertentes defenderam que era
preciso problematizar a forma como o discurso de gênero foi um fator
determinante para a construção de papéis desiguais no cenário internaci-
onal (HANSEN, 2010, p. 24). Para as autoras da segunda geração, não
era suficiente apenas evidenciar o papel das mulheres dentro da política
internacional (TICKNER, 1992).
Em qualquer parte do mundo, ser mulher é estar em desvanta-
gem em relação ao homem. O feminismo acadêmico das RI nos ajuda a
compreender o porquê de o mundo funcionar desta maneira, uma vez que
até mesmo dentro do nosso campo de conhecimento a elaboração da po-
lítica externa e militar tem sido conduzida por homens.
Tickner (1992) afirma que para introduzir uma análise de gênero
no campo das RI, é preciso começar com uma discussão sobre masculi-
nidade. Sua caracterização se dá pela dureza, coragem, força física, poder
e a independência, valores que sempre foram bem vistos na política in-
ternacional (TICKNER, 1992). Mesmo que essas características estereo-
tipadas não se ajustem à maioria dos homens no mundo real, o patriar-
cado autoritário e uma ordem política social patriarcal sustentam essa
“masculinidade hegemônica3“ (CONNELL, 1987). O gênero, de acordo
com Tickner, está relacionado tanto a masculinidade quanto a feminili-
dade. Para os pós-positivistas, gênero é uma construção social que está

3 O termo “masculinidade hegemônica”, utilizado por Raewyn Connell, é definido


como um tipo culturalmente dominante. Diferente de outras masculinidades, a “he-
gemônica” sustenta o ideal cultural patriarcal. Mesmo que não combine com a per-
sonalidade da maioria dos homens, é o que torna as relações socialmente desiguais
entre homens e mulheres (CONNELL, 1987).

129
LARISSA PIMENTA DA SILVA

inserido nas estruturas de poder, incluindo o sistema internacional (GA-


LHERA; MASO; PREUTURLAN; 2017).
Assim como existem diferentes abordagens dentro do nosso
campo, também existem múltiplas abordagens na perspectiva feminista.
A maioria das estudiosas feministas – exceto as liberais – alegam que as
fontes de discriminação estão enredadas na estrutura econômica, cultural
e social (TICKNER, 1992, p. 25). Tickner (1992) menciona Rosemary
Tong, que propõe que podemos distinguir as categorias de gênero con-
forme a maneira como as teóricas feministas enxergam as causas da
opressão das mulheres. As marxistas, por exemplo, acreditam que o ca-
pitalismo é a fonte de opressão; feministas radicais afirmam que o sis-
tema do patriarcado é quem as oprime. Feministas da linha psicanalítica
dizem que a fonte de opressão vem das profundezas da psique, nas quais
somos socializadas desde o nascimento. Já as feministas socialistas afir-
mam que tanto as estruturas de produção na economia, quanto as estru-
turas do lar determinam a posição das mulheres (TICKNER, 1992).
O entendimento de gênero foi construído através de conceitos
normativos, com bases nas relações de poder. Na cultura ocidental, esses
conceitos determinam oposições binárias fixas, com as quais as pessoas
passam a distinguir noções, como o significado do público e privado,
objetivo e subjetivo, razão e emoção, autonomia e relacionamento, o eu
e o outro e a cultura e a natureza (TICKNER, 1992). A primeira palavra
de cada par dessas características é geralmente relacionada a masculini-
dade, a segunda à feminilidade. Essa construção hierárquica pode assu-
mir uma qualidade permanente e perpetuar a opressão das mulheres, por
isso necessitam ser desafiadas.
Na área das RI, encontramos um conjunto dessas oposições bi-
nárias hierárquicas (TICKNER, 1992). A construção do pensamento de
política internacional e o conceito de gênero são paralelos entre si. Mu-
lheres (assim como estrangeiros) são frequentemente representadas
como “o outro”. Ignorar essa construção hierárquica é sinônimo de per-
petuar as relações de dominação e subordinação (TICKNER, 1992).
Tickner deixa claro que os pós-modernistas afirmam que para
que o feminismo não se torne mais um sistema hierárquico, é preciso que
todas as vozes femininas sejam ouvidas. Feministas devem tomar cui-
dado com o risco da limitação de investigar o campo do conhecimento,
isto é, assim como os estudos teóricos não se baseiam apenas em autores
homens ocidentais brancos, também não se baseia apenas em mulheres
ocidentais brancas (TICKNER, 1992).
É possível entender que gênero se caracteriza como um espaço
de domínio em que o poder é articulado (LOURO, 1995, p. 106). “Ser do
gênero feminino ou do gênero masculino leva a perceber o mundo dife-
rentemente, a estar no mundo de modos diferentes. Em tudo isso há di-
ferença quanto à distribuição de poder” (ESPINOSA, RODRIGUES;

130
MEIO AMBIENTE, MIGRAÇÕES E PANDEMIA: REFLEXÕES DO MUNDO CONTEMPORÂNEO

STREY; 2009, p. 143). Assim, fica visível a importância da categoria


gênero no estudo sobre mulheres africanas subsaarianas no Egito, uma
vez que a violência de gênero está diretamente ligada com a jornada des-
sas mulheres.
Há também a escassez de estudos no campo das RI a respeito de
migrações femininas. Essa escassez é um reflexo do domínio do sexo
masculino sobre o feminino: a trajetória do homem sempre foi a norma
(VICENTE, 1999). Apesar da falta de estudos dos fluxos migratórios fe-
mininos, o tema não deixa de possuir suas próprias particularidades. An-
tes da década de 1980, RI não estudavam migrações. Mas quando o
campo do conhecimento deixou de identificar apenas o Estado como ob-
jeto de estudo, e passou a identificar o indivíduo, a migração de mulheres
transformou-se em objeto de estudo no campo do conhecimento. Nas dé-
cadas de 1980 e 1990, as teorias pós-modernas, críticas, construtivistas e
feministas abriram espaço para as migrações femininas (MINVIELLE,
2017).
Teóricas feministas passaram a investigar a presença feminina
no ambiente de guerra. Nos campos de batalha como guerrilheiras, nas
bases militares, como enfermeiras e prostitutas, e nas cidades, como tra-
balhadoras – consequentemente quem sustenta a economia civil e militar
–, e como alvo de agressões. Quem se torna alvo de estratégias militares
(como o estupro como arma de guerra, prostituição e gravidez forçada)
são as mulheres. E, principalmente, são elas que se deslocam de seus
lares, sozinhas ou junto com seus filhos, e que, compõem o maior número
de refugiados (MINVIELLE, 2017, p. 26). Porém, para compreendermos
a particularidade do deslocamento feminino, é preciso entender como a
violência está inserida nas guerras, nos contextos de pré e pós-conflito.
“Guerra? Não me fale de guerra. Minha vida diária é um campo
de batalha suficiente” (GILES; HYNDMAN; 2004, p. 43). Cynthia
Cockburn explica a frase que utilizou (p. 43):

[..] a violência continuada atravessa o social, o econômico e o


político, com as relações de gênero penetrando todas essas for-
mas de relações, incluindo o poder econômico. As relações de
gênero às vezes são representadas nas relações humanas mais
intimamente sociais. Mas uma perspectiva de gênero não de-
veria desviar a atenção de forças e instituições que operam
econômica e politicamente. As dinâmicas de poder de gênero
são características tanto das corporações multinacionais e das
instituições financeiras internacionais como da família. Sabe-
mos que a incidência e o abuso da desigualdade de poder é um
fator da violência dos homens contra as mulheres. Também
sabemos que uma das formas pelas quais os principais atores
econômicos do cenário mundial exacerbam a violência é

131
LARISSA PIMENTA DA SILVA

sustentando ou aprofundando as desigualdades4 [..] (2004, tra-


dução livre).

Antes mesmo de ocorrer um conflito, a violência de gênero já


está previamente inserida no sistema estrutural. Quanto ao pós-conflito,
isto é, durante a busca por refúgio e na reconstrução socioeconômica des-
sas mulheres, a violência permanece. Independente se retornará volunta-
riamente para a casa, se integrará no país de asilo ou terá um reassenta-
mento em outro país, cada problema será único se a pessoa for uma mu-
lher refugiada (MARTIN, 1991). Além das mulheres geralmente serem
responsáveis por cuidar de seus filhos sozinhas, os processos corporais
femininos também se tornam um pesadelo na migração e busca por refú-
gio – a menstruação, gestação, parto e lactação. São também suscetíveis
a molestamento e estupro por parte de homens locais, militares e polici-
ais. Enquanto o destino dos homens e meninos pode ser nas ruas, as mu-
lheres e meninas desaparecem no meio do caminho. Geralmente seques-
tradas para serviço doméstico ou prostituição (NORDSTROM, 1998).
Para compreender a importância do estudo das migrações femi-
ninas, no presente trabalho consideramos que o ACNUR (2003, p. 16-
18) reconhece cinco principais formas de violência de gênero: a sexual,
a física, a emocional e psicológica e a socioeconômica.
A violência sexual sofrida pelas mulheres refugiadas se dá atra-
vés de estupros, assédios, abuso infantil, exploração sexual e à prostitui-
ção forçada. A física é encontrada no tráfico, escravidão e nas agressões
contra o corpo feminino. Quanto à violência emocional e psicológica, as
mulheres sofrem diversas humilhações verbais, além do que, muitas ve-
zes, passam por tudo isso sozinhas e isoladas. Por fim, a violência soci-
oeconômica é verificada através da exclusão social, negação de direitos
civis, sociais, culturais, econômicos e políticos que essas mulheres so-
frem (MINVIELLE, 2017, p. 28).
Visto que as mulheres são agredidas por pessoas de seu convívio
cotidiano, no âmbito doméstico, por parentes, maridos e por outros indi-
víduos refugiados, o ACNUR afirma que o primeiro nível de violência
parte das relações entre indivíduos. A carência de políticas públicas –

4 Texto original: “[...] the continuum of violence runs through the social, the eco-

nomic, and the political, with gender relations penetrating all these forms of relations,
including economic power. Gender relations are sometimes enacted in the most inti-
mately social of human relations. But a gender perspective should not thereby be
allowed to deflect attention from forces and institutions that operate economically
and politically. Gender power dynamics are as characteristic of multinational corpo-
rations and of international financial institutions as of the family. We know that the
incidence and abuse of unequal power is a factor in violence by men against women.
We know too that one way the major economic actors on the world scene exacerbate
violence is by sustaining or deepening inequalities [...]” (COCKBURN, 2004, p. 43).

132
MEIO AMBIENTE, MIGRAÇÕES E PANDEMIA: REFLEXÕES DO MUNDO CONTEMPORÂNEO

dificuldade do fornecimento de educação, saúde e trabalho – para refu-


giados também é uma forma de agressão. Além disso, a existência de leis
e normas sociais inseridos no país também contribuem na marginalização
dessas mulheres (MINVIELLE, 2017).
Por fim, para compreender ainda melhor o duplo preconceito
que as mulheres africanas subsaarianas sofrem, é preciso entendermos as
implicações decorrentes dos preconceitos raciais. Recorremos à catego-
ria raça para problematizarmos as injúrias raciais que as mulheres africa-
nas sofrem no Egito. No âmbito das RI, em suas vertentes teóricas tradi-
cionais, como o Liberalismo e o Realismo, não há interesse no estudo do
racismo como um elemento estruturante do sistema internacional. Para
Henderson (2017, p. 27), essas teorias são inclusive racistas, pois elas se
baseiam em conceitos de supremacia branca – componente responsável
por genocídios, processos coloniais e o regime de escravidão. As teorias
pós-coloniais e decoloniais, que abordam o sistema internacional de ou-
tra maneira, entendem que o conceito de raça é central para compreender
as relações de poder no mundo, herdade em grande medida dos tempos
coloniais (QUADROS, 2019, p. 3).
Para Achille Mbembe, pensador camaronês, em seu livro “A
Crítica da Razão Negra”, raça não é um fato natural físico, antropológico
ou genético (MBEMBE, 2017, p. 28). Peter Wade também afirma que
raça não pode ser definida em termos biológicos, mas sim como uma
construção social. “Uma pessoa com certa biologia pode se identificar,
em termos raciais, de maneiras muito diferentes, dependendo do contexto
social e histórico em que vive” (WADE, 2011, p. 207).
A partir do conceito de raça, pode-se entender que o racismo não
é definido apenas por um ato discriminatório ou um conjunto de atos. Ele
está no processo de esferas de subalternidade e privilégio entre grupos
raciais que são reproduzidos na política, economia e nas relações cotidi-
anas (ALMEIDA, 2018, p. 27). Podemos dizer, então, que o racismo é
definido pelo seu carácter sistêmico. A superioridade racial, construída
pelo Ocidente, deu origem ao conceito de ser humano composto por di-
reitos civis e políticos, através de leis da guerra, direitos de conquista,
moral pública e boas maneiras. Enquanto isso, “o resto” era visto como
o negativo. A África e o negro eram considerados esse “ser-outro”, atra-
vés do vazio e perigoso. Da vida vegetal e limitada (MBEMBE, 2017, p.
29).
O século XIX foi um período em que ocorreu uma biologização
da raça no Ocidente, juntamente com a colonização na África. O precon-
ceito foi herdado do tráfico de escravos, surgiram instituições de segre-
gação, o racismo antissemita e o modelo colonial de bestialização de gru-
pos que foram dados como inferiores (MBEMBE, 2017, p. 47).
Apesar de o século XXI ser bastante diferente, e distante do sé-
culo XIX, o processo de globalização e a lógica da raça permanece no

133
LARISSA PIMENTA DA SILVA

consciente contemporâneo, por meio de mutações nas estruturas de ódio


e no racismo constante. O mundo contemporâneo é constituído pela
forma primitiva da cultura, jurídica e política, que são representados pelo
cercamento, o muro, o campo, o cerco e, por fim, a fronteira (MBEMBE,
2017, p. 54). A guerra e a raça – dados como problemas de ordem inter-
nacional – ressurgem ao mesmo tempo que a ordem militar impõe seu
modelo à “ordem pública do estado de paz”. Tudo isso para haver exclu-
são, expulsão e a erradicação – recuperados através de processos de di-
ferenciação, classificação e hierarquização. (MBEMBE, 2017. p. 54).
Assim como no início do século XIX, Mbembe afirma que o início do
século XXI representa um momento significativo de separação, de dife-
renciação universal e de busca pela identidade pura (2017, p. 55).
Para compreender a razão negra, porém, é preciso relembrá-la
desde a Antiguidade. Suas fontes são gregas, árabes ou egípcias e chine-
sas. Essa razão é composta por discursos cujos objetos são a coisa ou
pessoas de “origem africana” e aquilo que se afirma ser sua verdade (suas
características, destino e significações em posição de ser empírico no
mundo) (MBEMBE, 2017, p. 60). No entanto, a Era Moderna foi o mo-
mento decisivo para sua formação, devido à narrativa de viajantes e tam-
bém à elaboração da “ciência colonial”, na qual sua última aparência é o
“africanismo”. Instituições, museus, “artes primitivas” e sociedades eru-
ditas: todas elas contribuíram para a constituição dessa razão para que
finalmente a transformasse em senso comum (MBEMBE, 2017, p. 61).
A modernidade transformou o homem branco, europeu e cristão como
“padrão” e os demais se tornaram o exótico e selvagem (QUADROS,
2018, p. 8).
Nesse contexto, Mbembe explica que a razão negra denomina
um conjunto de discursos e práticas de inventar, contar e repetir variadas
fórmulas, para que se forme o que o autor chama de “consciência ociden-
tal do negro” (2017, p. 61). O objetivo principal é fazer com que o negro
seja visto enquanto sujeito de exterioridade selvagem, onde a população
se faz perguntas como “quem é ele?”. A partir desse entendimento, tudo
o que não é idêntico a si, é anormal (MBEMBE, 2017, p. 61-62). Em
consequência da consciência ocidental de perguntar “quem é ele?”, o
próprio negro passa a se perguntar “quem sou eu?’. O negro passa a en-
tender e se autodominar como quem não exerce o domínio.
Dito isso, é necessário compreendermos o conceito de raça.
Raça não diz respeito apenas ao mundo sensorial, mas também ao esta-
belecer e afirmar o poder. Raça é um local de verdade: a verdade das
aparências (MBEMBE, 2017). O teórico camaronês afirma que:

Aliás, é típico da raça ou do racismo sempre suscitar ou en-


gendrar um duplo, um substituto, um equivalente, uma más-
cara, um simulacro. Um rosto humano autêntico é convocado
a aparecer. O trabalho do racismo consiste em relegá-lo ao

134
MEIO AMBIENTE, MIGRAÇÕES E PANDEMIA: REFLEXÕES DO MUNDO CONTEMPORÂNEO

segundo plano ou cobri-lo com um véu. No lugar desse rosto,


faz-se emergir das profundezas da imaginação um rosto de
fantasia, um simulacro de rosto e uma silhueta que, desse
modo, tomam o lugar de um corpo e um rosto humanos. O
racismo consiste, pois, em substituir aquilo que é por algo di-
ferente, uma realidade diferente. Além de uma força de detur-
pação do real e de um fixador de afetos, é também uma forma
de distúrbio psíquico, e é por isso que o conteúdo recalcado
volta brutamente à superfície. Para o racista, ver um negro é
não ver que ele não está lá; que ele não existe; que ele não é
outra coisa senão o ponto de fixação patológica de uma ausên-
cia de relação. É necessário, portanto, considerar a raça como
algo que se situa tanto aquém quanto além do ser. É uma ope-
ração do imaginário, o lugar de contato com a parte sombria e
as regiões obscuras do inconsciente (MBEMBE, 2017, p. 69-
70).

Uma vez que são produtos de um extenso processo histórico de


construção de sujeito raciais, os conceitos de “África” e “negro” estão
correlacionados. Quando se fala de um, se evoca o outro. Apesar de nem
todo africano ser negro e vice-versa, é o negro que se confere ao “corpo”
que a África possui (MBEMBE, 2017, p. 79). Assim, é visto a importân-
cia da categoria dentro do estudo de mulheres africanas subsaarianas re-
fugiadas no Egito. Não é suficiente que compreendemos a situação de
vulnerabilidade que sofrem apenas como mulheres e refugiadas, mas
também como negras.

2 AS MIGRAÇÕES DAS MULHERES AFRICANAS


SUBSAARIANAS QUE BUSCAM REFÚGIO NO EGITO

O Egito, situado no norte da África e ponto de encontro com o


Oriente Médio, é o maior país receptores de migrantes na região até hoje
(MIGRATION POLICY CENTRE, 2016). Em 2019, o ACNUR regis-
trou 31.328 solicitações de asilo e refúgio em território egípcio. A migra-
ção africana para países dentro do próprio continente – nesse caso, para
o Egito – mostra o crescente fluxo migratório Sul-Sul (migração entre
países em desenvolvimento) que tem acontecido nos últimos anos. A
busca por refúgio em território africano quase triplicou na última década
(ACNUR, 2020).
A Eritreia e a Etiópia permaneceram com conflitos fronteiriços
entre si, deixando sempre muitos mortos e feridos (PLAUT, 2016). No
programa de recrutamento militar obrigatório eritreu, justificado sob o
argumento de que as gerações precisam garantir a liberdade e soberania
do país (NATIONAL SERVICE PROCLAMATION N. 82/1995,

135
LARISSA PIMENTA DA SILVA

preâmbulo) e evitar uma invasão da Etiópia (ANISTIA INTERNACIO-


NAL, 2015), as mulheres se deparam com diferentes tipos de abusos se-
xuais (ANISTIA INTERNACIONAL, 2019). O estupro, a tortura e a es-
cravização sexual são exemplos do que elas enfrentam nos centros de
treinamento (ANISTIA INTERNACIONAL (2019). O futuro de muitas
é engravidar e serem rejeitadas por suas próprias famílias e comunidades
(ANISTIA INTERNACIONAL, 2004).
Em um relatório da Etiópia feito em 2020 pela Anistia Interna-
cional em Amhara e Oromia, também foram registrados abusos sexuais.
Ebise Eba – pseudônimo de uma mulher etíope –, foi presa em 2020 por
oficiais da milícia e foi levada ao escritório Duqisa Megada Kebele para
ser estuprada à noite. Ebise relatou: “eles me forçaram a fazer sexo com
eles para que não me entregassem aos soldados. Um deles, eu só sei o
apelido de ‘Qeyo’. Ele é do Departamento de Paz e Segurança de Kebele.
O outro é o comandante da milícia no Kebele” (ANISTIA INTERNACI-
ONAL, 2020).
Já a população do Sudão e Sudão do Sul também enfrenta mi-
grações forçadas devido o histórico de Guerras Civis. Segundo a ONU
(2018), a maioria das pessoas sul sudanesas que buscam refúgio em ou-
tros países são mulheres e crianças. Assim como em outras regiões da
África, grande parte são violentadas em seu trânsito migratório. Podem
ser agredidas por qualquer tipo de homem, isto é, meninos que possuem
acesso a armamentos, soldados independentes, rebeldes, milicianos ou
até forças do governo (CONE, 2019). No relatório Do not remain in si-
lent: Sexual abuse in South Sudan realizado pela Anistia Internacional
(2017), uma jovem sul sudanesa com o pseudônimo de Nyajal, relatou
sua experiência:

Eles me bateram com uma vara de bambu e dois deles me for-


çaram a ir com eles. Caminhamos duas horas antes de chegar
à floresta... eles não disseram nada. Quando chegamos lá, eles
abaixaram as armas e removeram minhas roupas à força. Um
me segurou quando o outro homem estava me estuprando. Os
dois me estupraram duas vezes... fiquei inconsciente, acordei
à noite e me vi sozinha... vi pessoas andando e decidi me juntar
a elas. Havia muito sangue saindo da minha vagina, mas con-
tinuei andando até chegarmos ao complexo da ONU5 (AM-
NESTY INTERNATIONAL, 2017, p. 28, tradução livre).

5 Texto original: “They beat me with a bamboo stick and two of them forced me to
come with them. We walked for two hours before reaching the forest… they did not
say anything. When we reached there, they put their guns down and removed my
clothes by force. One held me when the other man was raping me. They both raped
me two times …I became unconscious and woke up in the evening and found myself
alone… I saw people walking and decided to join them. There was too much blood

136
MEIO AMBIENTE, MIGRAÇÕES E PANDEMIA: REFLEXÕES DO MUNDO CONTEMPORÂNEO

Segundo a sul sudanesa Rachel (pseudônimo), ao sair de uma


das Áreas de Proteção Civis para conseguir se alimentar, foi violentada
sexualmente por quatro homens. Um sargento interveio, porém Rachel
afirmou que:

Ele ordenou que eles [os quatro policiais] me colocassem no


carro dele. Era um carro da polícia, de cor preta... Ele me levou
para o hospital e eu tomei remédios e me recuperei... Depois
disso, ele me disse: “Você está bem agora, mas eu quero que
você seja minha esposa. Você ficará aqui para sempre”. Fiquei
lá 14 dias com aquele sargento em sua casa, e ele costumava
a fazer sexo comigo, até que um dia... eu decidi fugir 6 (AM-
NESTY INTERNATIONAL, 2017, p. 35, tradução livre).

Quanto a Somália, do total do número de refugiados registrados


em 2014, 53% eram mulheres (ACNUR, 2014). As formas de violência
sexual que sofrem, como o estupro, são cometidos há mais de duas déca-
das dentro do país (ANISTIA INTERNACIONAL, 2013). Os abusos são
cometidos por membros da força de paz da Missão da União Africana na
Somália (AMISOM), membros de grupos armados de oposição, milícias
e atores privados. Rahma, pseudônimo de uma mulher somali, relatou a
Anistia Internacional:

Tentei resistir, mas ele continuou dizendo que me mataria, en-


tão parei para não ser morta. Ele entrou no meu buul (abrigo)
com uma faca; era noite mas não sei que horas eram; Eu nunca
tive um relógio. Meu buul não tem porta e não tinha ninguém
para me proteger, eu estava só com meus filhos e Deus. Meus
filhos estavam dormindo. Fiquei quieta porque estava com
medo. Depois que ele saiu, o que eu poderia fazer? Só Deus é
minha testemunha. Se eu contasse ao vizinho, eles iriam rir de
mim e dizer coisas ruins7 (2013, p. 2, tradução livre).

coming from my vagina, but I just continued walking until we reached the UN com-
pound” (AMNESTY INTERNATIONAL, 2017, p. 28).
6 Texto original: “He ordered them [the four police officers] to put me in his car. It

was a police car, black in colour…He took me to the hospital and I got medicine and
recovered…After that he told me, ‘You are now ok, but I want you to be my wife.
You will remain here forever’. I stayed there for 13 days with that sergeant in his
house, and he used to have sex with me, until one day…I decided to escape” (AM-
NESTY INTERRNATIONAL, 2017, p. 35).
7 Texto original: “I tried to resist but he kept saying he would kill me so I stopped in

order not to get killed. He came into my bull (shelter) with a knife; it was night, but
I don’t know what time it was; I have never had a watch. My bull has no door and
there was nobody to protect me, I was with only my children and God. My children

137
LARISSA PIMENTA DA SILVA

Um dos principais motivos que faz com que essas mulheres es-
colham o Egito como lugar de destino é o reassentamento, definido como
a transferência de refugiados de um país de asilo para outro país que con-
cordou recebê-los (ACNUR, 2019). Considerada uma das maiores em
programas de reassentamento, o ACNUR Egito tem como destino a Aus-
trália, Canadá, Finlândia e Estados Unidos (ZOHRY, 2003, p. 49). Em
2019, 4.301 refugiados e refugiadas foram enviados para doze países de
reassentamento diferentes e 3.161 refugiados partiram para nove países
(ACNUR). Entretanto, quando se é mulher e africana subsaariana, o pro-
cesso se torna mais dificultoso: aspectos como o país de origem, nível
educacional, gênero, capacidade física e saúde são critérios para a acei-
tação de um pedido de reassentamento. Os autores Haragua Getu e Joyce
Nsubuga afirmam que:

[...] as mulheres têm menos oportunidades de se reinstalar em


países com serviços sociais/de saúde bem organizados devido
aos critérios usados pelos países ocidentais, em que é discri-
minatório para as mulheres refugiadas quando estão aceitando
refugiados africanos para o reassentamento. Esses critérios in-
cluem altos níveis de educação, a capacidade de integração nas
sociedades ocidentais e os custos potenciais de saúde para re-
fugiados8 (1996, p. 200, tradução livre, Health Issues Affec-
ting Sub-Saharan African Women Refugees).

Além disso, segundo o livro Sudanese Women Refugees escrito


por Jane Kani Edward, o aumento da busca pelo reassentamento colocou
pressão sobre a capacidade de ajuda das Organizações e Igrejas que aju-
dam solicitantes de refúgio (2007, p. 11). Chamadas OVPs, as organiza-
ções baseadas na igreja fornecem apoio material, além de se tornarem
centros que acolhem refugiadas e refugiados (EDWARD, 2018, p. 70).
Já as Organizações Não Governamentais (ONGs) também pres-
tam outros tipos de papéis. São oferecidos serviços médicos, legais, edu-
cacionais e psicológicos (MIRANDA, 2018). A Caritas Egypt é uma das
ONGs parceiras do ACNUR para servir os refugiados, como, por exem-
plo, na saúde. Outras ONGs também oferecem aconselhamento

were sleeping. I kept quiet because I was scared. After he left what could I do? Only
God is my witness. If I told neighbour they would just laugh at me and say bad things”
(AMNESTY INTENATIONAL, 2013, p. 2)
8 Texto original: “[...] women have fewer opportunities to resettle in countries with

well organized social/ health services because the criteria used by Western countries
when accepting African refugees for resettlement are discriminatory to women refu-
gees. Such criteria include high education levels, the ability to integrate into Western
societies, and potential refugee health care costs” (1996, p. 200, Health Issues Af-
fecting Sub-Saharan African Women Refugees).

138
MEIO AMBIENTE, MIGRAÇÕES E PANDEMIA: REFLEXÕES DO MUNDO CONTEMPORÂNEO

psicológico, serviços psicossociais e fisioterapia da Médicos Sem Fron-


teiras (MSF), PSTIC e Serviços de Refugiados de St. Andrew (StARS).
A CARE oferece gerenciamento em casos de violência de gênero e pos-
sui um abrigo para sobreviventes de violência doméstica (MIRANDA,
2018).
O papel das Organizações e das Igrejas é tão importante para
refugiadas e refugiados residentes no Egito devido à falta de suporte go-
vernamental. Embora o Egito seja signatário da Convenção relativa ao
Estatuto dos Refugiados de 1951 e do Protocolo de 1967, bem como a
Convenção de 1969 da Organização da Unidade Africana (OUA), as re-
servas formais que o país possui ao Estatuto dos Refugiados tornam di-
versos direitos sem fundamento. As reservas incluem o artigo 12(1) (es-
tatuto pessoal), artigo 20 (assistência) e artigo 24 (legislação laboral e
segurança social) (MOHAMAD, 2020, p. 20).
A responsabilidade de registro, documentação e determinação
do status de refúgio foi transferida ao ACNUR no âmbito do Memorando
de Entendimento (MoU), acordo assinado pelo governo do Egito e o AC-
NUR em 1954 (MOHAMAD, 2020, p. 30). Wigdan Mohamad afirma
em seu artigo “African refugee women in Egypt: lacunae in international
refugee law and the erasure of disadvantaged groups”:

Nos últimos 65 anos, o ACNUR tem operado no Egito como


uma entidade que lida diretamente com refugiados. O AC-
NUR está operando no Egito desde 1954, pois o Egito carece
de uma estrutura legal abrangente que lida diretamente com os
refugiados; a responsabilidade, portanto, recai diretamente so-
bre o ACNUR, a fim de fornecer serviços aos refugiados que
se enquadram nas seguintes áreas: 1) garantir que refugiados
e requerentes de asilo possam solicitar e obter acesso à prote-
ção internacional; 2) apoiar seu acesso a serviços de saúde e
educação e garantir que refugiados vulneráveis e requerentes
de asilo possam atender às suas necessidades básicas; 3) au-
mentar a conscientização sobre a situação dos refugiados, de-
fensores de seus direitos e coordenar esforços para apoiá-los9
(2020, p. 30, tradução livre).

9 Tradução original: “For the past 65 years, the UNHCR has been operating in Egypt
as en entity that deals directly with refugees. The UNHCR has been operating in
Egypt since 1954, as Egypt lacks the comprehensive legal framework that deals with
refugees directly; the responsibility thus falls on the UNHCR directly, in order to
provide services to refugees that fall under the following areas103: 1) ensure that
refugees and asylum-seekers are able to apply for and gain access to international
protection; 2) support their access to health and education services, and make sure
vulnerable refugees and asylum-seekers can meet their basic needs; 3) raise aware-
ness of the plight of refugees, advocates for their rights, and coordinate efforts to
support them” (MOHAMAD, 2020, p. 30).

139
LARISSA PIMENTA DA SILVA

Em outras palavras, é possível afirmar que o país não possui ins-


tituições que dão o devido suporte. O Alto Comissariado assume o papel
de fornecer educação, saúde, assistência e serviços de bem-estar social
aos refugiados. Além disso, é obrigatório que qualquer estrangeiro tenha
uma autorização de residência válida. Portanto, refugiados e requerentes
de asilo precisam primeiramente do registro no ACNUR para depois ob-
ter autorização (ACNUR, 2020).
O processo de determinação do status de refugiado no Escritório
Regional do ACNUR (RO) no Egito é dificultoso, demorado e submete
os requerentes de asilo e refugiados a dúvidas e frustrações (EDWARD,
2007). É possível que leve até um ano para receber o formulário referente
a solicitação de asilo e de quatro a seis meses para a entrevista, com a
incerteza de que será aprovado. Mesmo que seja possível apelar o caso,
pode levar cerca de um ano para que seja autorizado e ainda há possibi-
lidade de rejeição. Dessa forma, muitos permanecem ilegalmente no país.
Apesar de muitos permanecerem ilegal por razões dificultosas,
a Chefe do Departamento de Assuntos para Refugiados do Ministério das
Relações Exteriores egípcio, Minha Bakhum, afirmou que:

Os refugiados recebem melhor tratamento do que os nacionais


no Egito, porque são privilegiados e têm o ACNUR que cuida
deles (...) muitos refugiados vêm ao Egito para poderem mi-
grar para o Ocidente e o ACNUR lhes dá essa oportunidade,
embora muitos egípcios sonhem com o mesmo, eles não têm
essa opção (....) o governo egípcio já está fazendo mais que o
esperado, porque a Convenção de 1951 fala sobre igualdade
de tratamento para refugiados e nacionais. Os refugiados re-
cebem melhor tratamento do que os nacionais no Egito. Para
um país como o Egito, aceitar refugiados em suas terras já é
uma conquista maior do que outros países. Refugiados pressi-
onam a economia, o meio ambiente, o ecossistema, a infraes-
trutura; eles contribuem para a superlotação da cidade. Se eu
estivesse no governo na época de assinar a Convenção de
1951, nunca teria assinado10 (MOHAMAD, 2020, p. 37, tra-
dução livre).

10 Tradução original: “Refugees receive better treatment than nationals in Egypt. For
a country like Egypt, accepting refugees on its land is already an achievement and
more than other countries do. Refugees put pressure on the economy, on the environ-
ment, on the ecosystem, on infrastructure; they contribute to the overcrowding of the
city. If I was in the government at the time of signing the 1951 Convention, I would
have never signed it” (MOHAMAD, 2020, p. 37).

140
MEIO AMBIENTE, MIGRAÇÕES E PANDEMIA: REFLEXÕES DO MUNDO CONTEMPORÂNEO

Na prática, a cidadania egípcia é mais um exemplo de dificul-


dade para quem procura refúgio: só é concedida através do jus sanguinis,
ou seja, apenas descendentes de egípcios são considerados nacionais.
Isso significa que, a cada seis meses, refugiadas e refugiados necessitam
renovar sua autorização de residência. Ainda que o Artigo 54 da Consti-
tuição de 2014 alegue que os estrangeiros que recebem asilo político pos-
suem o direito de autorização de trabalho, não há um escritório governa-
mental físico que o conceda. Nem mesmo no ACNUR é possível solicitá-
lo (MIRANDA, 2018, p. 8)
Assim, refugiadas e refugiados são submetidos a trabalhar no
setor informal, com muitas dificuldades no caminho. Em um estudo feito
pela Refugee Assisstance Organization, a maioria das mulheres africanas
informaram que trabalham como domésticas (MIRANDA, 2018). O es-
tudo realizado pela AUC (MOHAMAD, 2020) também afirmou que as
mulheres refugiadas negras acabam trabalhando como empregadas do-
mésticas, babás, faxineiras e outros empregos que as confinam dentro de
casa.

3 OS PRECONCEITOS SOFRIDOS POR MULHERES


AFRICANAS SUBSAARIANAS QUE BUSCAM REFÚGIO
NO EGITO

Ao contrário de migrantes que já objetivam esse tipo de trabalho


ao se deslocar, as mulheres entrevistadas migraram com foco no reassen-
tamento. No entanto, se sentem obrigadas a trabalhar em casas de egíp-
cios para que possam sustentar suas famílias. As consequências são sa-
lários menores que o prometido, muitas horas de função, ser despedida
sem pagamento, ser acusada de furto e sofrer abusos sexuais e/ou verbais
(EDWARD, 2007, p. 11). Uma garota refugiada descreveu sua própria
situação e de uma mulher no prédio em que trabalham:

Eu trabalho como uma mubeed11. Eu durmo no chão da va-


randa. Meu empregador também me disse que há uma jovem
de cerca de quinze anos do sul do Sudão que trabalha em um
apartamento no mesmo prédio em que estou trabalhando. Eu
vi a garota. Ela também está dormindo na varanda no chão.
Além disso, como empregada doméstica, você não tem per-
missão para usar nenhum copo da casa para beber água. Se ela
[empregadora] descobrir que você está bebendo em qualquer

11Mubeed é uma empregada doméstica que reside em um local de seu trabalho


(EDWARD, 2007, p. 244)

141
LARISSA PIMENTA DA SILVA

xícara, ela vai ficar brava com você12 (EDWARD 2007, p.


175, tradução livre).

Uma mulher Nuba afirmou que os empregadores egípcios esta-


belecem o horário das 8h às 18h, fazendo com que as mães solteiras te-
nham que trancar seus filhos em casa quando saem para trabalhar, já que
as opções de creches são escassas (MIRANDA, 2018, p. 16). Segundo o
relato de uma africana subsaariana:

Nós achamos que estávamos escapando de uma guerra, mas


nós estamos enfrentando outra guerra aqui no Cairo. Nós en-
frentamos assédio sexual nas ruas, homens estão sempre nos
tocando inapropriadamente. No trabalho, chefes têm um cora-
ção ruim. Se você trabalha como empregada, eles vão te acusar
de roubar ou te prender na casa13 (MIRANDA, 2018, p. 16,
tradução livre).

Zuzu, pseudônimo de uma migrante sudanesa, disse ao Sudanese


Women Refugees que se o empregador egípcio descobrir que a refugiada
se inscreveu no ACNUR e desconfiar que queira sair do trabalho, ele
possivelmente a acusará de roubar algo de sua casa:

Se ela (a empregadora egípcia) descobrir que você (a empre-


gada doméstica) se inscreveu no ACNUR e ela sabe que você
quer sair do trabalho, vai te acusar de alguma coisa. Foi o que
aconteceu com nosso colega aqui do escritório. Ela foi aceita
pelo ACNUR. Então, quando seu empregador egípcio soube
disso, ela a acusou de roubar suas joias, dinheiro e outros itens.
Ela pediu à nossa colega que pagasse a ela 10.000 libras egíp-
cias (aproximadamente US $ 2.500) como a quantia das coisas
que ela havia roubado. No final, como a empregada doméstica
disse que não levava essas coisas e não tinha como pagar o

12 Tradução original: “I work as a mubeed. I sleep in the balcony on the floor. Also

my employer told me that there is a young girl about fifteen years old from the south-
ern Sudan who works in an apartment in the same building I am working in. I have
seen the girl. She is also sleeping in the balcony on the floor. Also as a maid you are
not allowed to use any drinking cup in the house to drink water. If she [woman em-
ployer] finds you drinking from any cup she will get mad at you” (EDWARD, 2007,
p. 175).
13 Tradução original: “We thought we were escaping war, but we are facing another

war here in Cairo. We face sexual harassment on the street, men are always touching
us inappropriately. At work, bosses have a bad heart. If you work as a maid, they will
accuse you of stealing and imprison you in the house” (MIRANDA, 2018, p. 16)

142
MEIO AMBIENTE, MIGRAÇÕES E PANDEMIA: REFLEXÕES DO MUNDO CONTEMPORÂNEO

valor, o empregador a colocou na cadeia por algum tempo. Ela


foi liberada mais tarde14 (2007, p. 176, tradução livre).

Da mesma forma que sofrem preconceitos no trabalho, o pro-


cesso para encontrar uma moradia é muito difícil se não estão acompa-
nhadas por pessoas do sexo masculino. Para atender a preferência de pro-
prietários egípcios, as famílias chefiadas por mulheres levam consigo pa-
rentes homens quando vão firmar um contrato de aluguel (EDWARD,
2007, p. 111). Du, pseudônimo de uma sudanesa, refugiada e mãe solteira
afirma:

Na área residencial de El Maadi, agora é difícil conseguir um


apartamento para uma mulher solteira, a menos que você te-
nha marido ou parente do sexo masculino. Isso ocorre porque
os proprietários egípcios geralmente acreditam que, se você
for solteiro, trará homens para o apartamento. Então, eu trouxe
meu tio e outro parente meu para representar os homens na
família, então não parece que estou morando sozinho, e assim
as pessoas saberão que esta é uma família. Meu tio e o outro
parente do sexo masculino são aqueles que assinaram o a’gid
ou contrato. Mesmo no contexto da sociedade do sul do Sudão,
uma mulher que vive sozinha nem sempre é respeitada e as
pessoas geralmente suspeitam que ela seja uma mulher “má”15
(2007, p. 111, tradução livre).

Ao contrário de sírias, iraquianas e palestinas, as africanas sub-


saarianas além de já sofrerem preconceitos de gênero, passam por um
terceiro tipo de vulnerabilidade: a étnica. Mesmo em seu próprio

14 Tradução original: “If she [the Egyptian employer] finds out that you [the domestic
worker] have applied for the UNHCR and she knows that you want to leave work,
she will accuse you of something. This is what happened to our colleague here in the
office. She was accepted by the UNHCR. So when her Egyptian employer learned of
that, she accused her of stealing her jewellery, money, and other items. She asked our
colleague to pay her 10,000 Egyptian Pounds [approximately US$2,500] as the
amount of the things she had stolen. In the end, because the domestic worker said she
did not take these things, and cannot afford to pay the amount, the employer put her
in jail for some time. She was later released” (EDWARD, 2007, p. 176).
15 Tradução original: “In El Maadi residential area it is now difficult to get an apart-

ment as a single woman unless you have a husband or a male relative. This is because
Egyptian landlords usually believe that if you are single you will bring men into the
apartment. So I brought my uncle and another male relative of mine to represent men
in the family, so it does not appear as if I am living alone, and so people will know
that this is a family. My uncle and the other male relative are the ones who signed
the a’gid or contract. Even in the context of southern Sudanese society, a woman who
lives alone is not always respected and people usually suspect her of being a “bad”
Woman” (EDWARD, 2007, p 111).

143
LARISSA PIMENTA DA SILVA

continente, o dia a dia dessas mulheres é uma constante guerra. É comum


jovens egípcios as tacarem lixo, água e pedra nas ruas, reproduzirem sons
de gorila e fazer comentários como “chocolata”, “dalma” (escura), ou
“samara” (MIRANDA, 2018, p. 21).
Independentemente de como está vestida, penteada, seja jovem
ou mais velha, a mulher negra é estereotipada no país africano, apontada
como prostituta e solicitada para se exibir em atos indecentes
(EDWARD, 2007, p. 166). Rasha, pseudônimo de uma sudanesa, narrou
a sua experiência nas ruas do Cairo:

Um dia, a caminho de casa, percebi que alguém estava me se-


guindo. Ele caminhou rapidamente e passou por mim, e então
parou na minha frente. Achei que ele estava assistindo a um
jogo de futebol transmitido na televisão do lado de fora de uma
loja na rua... Continuei andando e passei por ele. Quando olhei
para trás, vi o mesmo egípcio ainda me seguindo. Ele veio e
passou por mim e estava dizendo coisas ruins. Novamente ele
parou na minha frente e estava falando comigo, dizendo ve-
nha, venha. Então o que fiz fui em direção a ele, agarrei-o pelo
pescoço e disse-lhe: “vamos fazer isso aqui.” Então, houve um
ancião egípcio que testemunhou o encontro, que se desculpou
comigo e disse ao homem para ter vergonha de si mesmo por
não respeitar uma mulher16 (2007, p. 184, tradução livre).
No transporte público não é diferente: os olhares e toques sexu-
ais de homens egípcios são constantes. É preciso cuidar quem se senta ao
lado para evitar ser assediada (EDWARD, 2007, p. 167). Os relatos são
uma prova de que essas mulheres já estão cansadas de viver em estado
de alerta. Du conta que:

Um dia, a caminho de casa, levei um tapa na cara e caí. Na-


quela época eu estava doente e muito fraca. Eu me levantei e
chorei. Então eu disse, Deus, você sabe. Então continuei meu
caminho para casa, e eles (jovens egípcios) estavam rindo e
correndo. Eles nunca se importam. Assim, o que vou fazer?
Não posso correr atrás deles e não posso fazer nada com eles,

16 Tradução original: “One day on my way home I realized that someone was follow-

ing me. He walked quickly, and passed me, and then he went and stopped ahead of
me. I thought he was watching a football [soccer] match aired on a television outside
a shop along the street... I continued walking and passed him. When I looked back I
saw the same Egyptian man still following me. He came and passed by me and he
was saying bad things. Again he stopped ahead of me and was talking to me, saying
come, come. So what I did I went toward him, grabbed him on his neck and told him,
“let us do it here.” Then there was an elderly Egyptian man who witnessed the en-
counter who apologized to me and told the man to be ashamed of himself for not
respecting a woman” (EDWARD, 2007, p. 184).

144
MEIO AMBIENTE, MIGRAÇÕES E PANDEMIA: REFLEXÕES DO MUNDO CONTEMPORÂNEO

a não ser ir para casa e suportar a dor. E acho que três quartos
dos sudaneses estão sofrendo de situação semelhante17
(EDWARD, 2007, p. 167, tradução livre).

Na entrevista para Paul Miranda (2018), já mencionada anteri-


ormente, através da RAO, refugiados e refugiadas do Sudão e da Somália
afirmavam que exigiam do ACNUR que os levassem para um país que
tivesse a mesma cor de pele deles. Faziam afirmações como: “se soubés-
semos que isso iria acontecer, nós teríamos ficado nas Montanhas de
Nuba e teríamos sido mortos por aviões ao invés de ter vindo para cá”,
ou “me diga para voltar para o Sudão para morrer ou me dê um reassen-
tamento”.
O preconceito, juntamente com o sentimento egípcio de não per-
tencimento a África, se dá de diversas maneiras. Embora o Egito esteja
no continente africano, é considerado um país do Oriente Médio, sua
principal religião é o Islã e é membro da Liga Árabe, ao contrário da
maioria dos países que se encontram na África (EDWARD, 2007, p.
161). Ao conversar com egípcios que irão viajar para países abaixo do
Saara, muitos afirmam em “ir para a África”, como se o Egito estivesse
em outro continente (MOHAMAD, 2020, p. 36).
A maioria da população egípcia considera os africanos inferiores
e os associa o negro com a escravidão, isto é, consideram pessoas negras
sem valor (EDWARD, 2007, p. 163). O racismo dos egípcios ocorre in-
clusive em situações políticas: o ex-presidente Anwar Sadat, egípcio de
pele escura e filho de mãe sudanesa, foi chamado pela população de “po-
odle preto de Nasser”, além de afirmarem que ele não parecia egípcio o
suficiente (MOHAMED, 2020, p. 36). Os chefes de Estado da África
Subsaariana também sofrem situações de deboche do governo egípcio,
principalmente quando os visitantes africanos optam por vestir seu traje
nacional (MOHAMAD, 2020, p. 36). O passado histórico é importante
nessa relação, uma vez que antes da subordinação ao domínio britânico
no século XIX, o Egito desenvolveu um comércio de escravos em que
importava pessoas de diferentes lugares da África Subsaariana, como Su-
dão e Etiópia (EDWARD, 2007, p. 169).
Na cidade do Cairo, as pessoas que vivem na região do Vale do
Nilo Superior (fronteira com o Sudão) têm a pele mais escura do que as
que vivem da região do Delta. Consequentemente, quem vive no Vale do

17 Tradução original: “One day on my way home, I was slapped in the face and I fell
down. At that time I was sick and very weak. I got up and I cried. Then I said, God,
you know. So I continued on my way home, and they [Egyptian young men] were
laughing and running. They never care. So like this, what will I do? I cannot run after
them, and I cannot do anything to them, but go home and endure the pain. And I think
three quarters of Sudanese are suffering from a similar situation” (EDWARD, 2007,
p. 167).

145
LARISSA PIMENTA DA SILVA

Nilo Superior predomina nos serviços domésticos. Essa distinção tam-


bém é feita por sudanesas do sul e do norte: por conta de sua cor de pele
escura e seu “vestido africano”, é mais fácil encontrar mulheres sul su-
danesas domésticas (EDWARD, 2007, p. 171).
Há também muitos exemplos de preconceito na mídia. Após o
caso que ocorreu em 2001 entre um motorista de ônibus egípcio e um
refugiado africano, o jornal egípcio Rose El Youssef escreveu: “Refugi-
ados: Visitantes ou Criminosos? (...) é esta uma maneira de os hóspedes
em nosso país se comportarem?” (EDWARD, 2007, p. 166). Em dezem-
bro de 2018, o cantor e ator famoso egípcio, Bushra, lançou um video-
clipe que continha um homem com uma máscara preta, fingindo ser ne-
gro. Outro exemplo é do comediante Samir Ghanem e sua filha: ambos
colocaram dreads e escureceram suas peles para um seriado de televisão
famoso no país. O silêncio dos egípcios diante tais acontecimentos mos-
tram o racismo consolidado no país (MOHAMAD, 2020, p. 40).
No cinema egípcio, o preconceito também é perpetuado. Na dé-
cada de 1940, foram feitos diversos filmes com personagens negros que
representavam a violência e a irracionalidade, e faziam papéis como si-
lenciosos e servis (MIRANDA, 2018). Nos filmes, os africanos (e egíp-
cios de pele escura) são, na maioria das vezes, trabalhadores domésticos.
As mulheres geralmente são babás, empregadas domésticas ou exóticas
adivinhas. Como a vida imita a arte e a arte imita a vida, a “anti negri-
tude” e o racismo no cinema são grandes meios para influenciar a popu-
lação (MOHAMAD, 2020, p. 40).
Uma mãe egípcia, em uma entrevista para a RAO (MIRANDA,
2018) expressou não apoiar que seu filho bata em refugiados, mas, apesar
disso, afirmou que “se formos muito bons com eles, eles nunca irão em-
bora”. Outros egípcios entrevistados afirmaram que não eram racistas,
mas que tirar sarro da cor de pele fazia parte da cultura egípcia. Também
deixaram claro que os refugiados necessitavam “se comportar de acordo
com as tradições egípcias” e que refugiados africanos obtinham mais di-
reitos do que egípcios, além de terem proteção de várias “entidades”.
A despeito de declarações do governo egípcio demonstrarem
preocupação em acolher refugiados e refugiadas, na prática não há polí-
ticas públicas para que a integração ocorra (MIRANDA, 2018). Diversos
artigos18 demonstram que o tratamento que as refugiadas recebem pelos
policiais é normalmente agressivo e abusivo. Um exemplo disso é que
em 2003 refugiadas somalis presas que tentavam atravessar a fronteira
entre o Egito e a Líbia sofreram abusos sexuais de policiais (AL-SHAR-
MANI, 2003, p. 27). Outro exemplo é que, de acordo com Ani,

18 Artigos já mencionados no trabalho, como Sudanese Women Refugees (2007),


Livelihood and Identity Constructions of Somali Refugees in Cairo (2003) e Getting
by on the Margins: Sudanese and Somali Refugees (2018).

146
MEIO AMBIENTE, MIGRAÇÕES E PANDEMIA: REFLEXÕES DO MUNDO CONTEMPORÂNEO

pseudônimo de uma refugiada sul sudanesa, há caso de policiais que não


aceitam nem suas carteiras de identidade fornecida pelo ACNUR e con-
sequentemente as refugiadas são detidas e liberadas apenas após três a
quatro dias (EDWARD, 2007). O relato que comprava a fala de Ani é o
de Marc (EDWARD, 2007), pseudônimo de outra refugiada sul suda-
nesa:

Uma garota que eu conheço e é aceita pelo ACNUR foi pega


pela polícia durante o kasha [prisão policial aleatória]. Ela foi
detida com todos aqueles que não são reconhecidos pelo AC-
NUR. Então, no momento, estou apenas andando pelas ruas
do Cairo na misericórdia de Deus porque não tenho ighama.
Se o seu ighama expirar, você apenas ore a Deus para que nada
aconteça com você19 (p. 115-116, tradução livre).

Não há nem uma amizade com a população local (EDWARD,


2007, p. 161). Em uma entrevista feia pela The American University Of
Cairo (AUC), somalis afirmaram que têm bem pouca ou nenhuma inte-
ração com nacionais, uma vez que não socializam nem com seus vizinhos
egípcios (AL-SHARMANI, 2003). Já em outra pesquisa feita por Karen
Jacobsen, Maysa Ayoub e Alice Johnson, através da AUC e Tufts Uni-
versity (2012), participantes do Sudão do Sul observaram em uma oficina
que gostariam de programas de desenvolvimento mútuo entre a socie-
dade civil e refugiados. No entanto, uma parte considerável acredita que
o reassentamento seria a única solução para que vivam sua vida de forma
digna, isto é, sem preconceitos raciais e com trabalhos regularizados.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Grande parte dos refugiados e requerentes de asilo que procuram


o Egito são mulheres africanas subsaarianas. Sozinhas, milhares delas
deixam seus lugares de origem, devido a guerras civis, violências físicas,
psicológicas e sexuais, fome, situações econômicas e mudanças climáti-
cas.
No entanto, a jornada é difícil. O estupro, o medo da persegui-
ção, o assédio sexual, a prostituição forçada, a insegurança física e os
abusos psicológicos são aspectos que as acompanham, desde o momento

19 Tradução original: “A girl whom I know and is accepted by the UNHCR was
caught by the police during kasha [random police round up]. She was taken to deten-
tion with all those who are not recognized by the UNHCR. So at the moment I am
just walking in the streets of Cairo in God’s mercy because I have no ighama. If your
ighama expires you just pray to God that nothing happens to you” (EDWARD, 2007,
p. 115-116).

147
LARISSA PIMENTA DA SILVA

em que saem do país de origem até a chegada em território egípcio. Outro


fator que dificulta a jornada de cada uma dessas mulheres são os trata-
mentos racistas que recebem no Egito. Não só sofrem por serem refugi-
adas e mulheres, mas também por serem negras.
Ser mulher negra e estar na condição de refugiada em um lugar
de pouca visibilidade acadêmica e internacional, não faz com que sua
integridade e seus direitos mereçam ser menos valorizados. Cada uma é
protagonista de sua história. Histórias únicas, contendo sonhos, vontades
e objetivos profissionais envolvidos. O que nenhuma delas imagina é que
não só seus sonhos seriam mortos, mas também familiares e amigos. No
entanto, a vida continua. E todas merecem sentir-se livres. Sentir segu-
rança ao andar na rua. Todas são dignas de um trabalho regularizado. De
um lar para morar. Todas merecem um novo começo.
A devolução da dignidade a essas pessoas é um dos objetivos de
organismos como a ACNUR, por exemplo. Os trabalhos desenvolvidos
por esta agência da ONU e também por organizações não governamen-
tais têm sido fundamentais para garantir o respeito necessário às mulhe-
res que buscam refúgio no Egito.

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151
LARISSA PIMENTA DA SILVA

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152
DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL E O
TERCEIRO SETOR:
As organizações não governamentais como ferramenta para um
desenvolvimento verdadeiramente sustentável1

Maria Isabel Marquetti2

INTRODUÇÃO

O desenvolvimento sustentável é fundamental na sociedade con-


temporânea, a escassez cada vez maior dos recursos naturais tem afetado
não apenas o meio ambiente como também a economia que se vê obri-
gada a inflacionar cada vez mais os preços tornando o próprio cenário
econômico instável.
O desenvolvimento sustentável possui muitas implicações e de-
safios, principalmente no terceiro setor. Países desenvolvidos e subde-
senvolvidos possuem obstáculos a superar quando o assunto é a dissemi-
nação do desenvolvimento sustentável em suas três dimensões: social,
econômica e ambiental. A adoção de políticas que visem a diminuição
dos impactos causados no meio ambiente tem sido adotada cada vez mais
não apenas por instituições públicas como também por instituições pri-
vadas e o terceiro setor.
O objetivo da pesquisa é analisar o papel do terceiro setor, par-
ticularmente das Organizações não Governamentais (ONGs), na concre-
tização dos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODS) enquanto
ferramenta para a disseminação de um desenvolvimento verdadeira-
mente sustentável. Dentro do objetivo principal do artigo, foram defini-
dos três objetivos específicos: analisar a sociedade contemporânea en-
quanto sociedade de risco e sociedade de consumo e suas implicações
para o ser humano e o meio ambiente, analisar os Objetivos do Desen-
volvimento Sustentável como ferramenta para o desenvolvimento sus-
tentável e analisar o papel dos diferentes atores para o sucesso da

1 Trabalho de Conclusão do Curso de Relações Internacionais da Universidade do


Vale do Itajaí, Escola de Ciências Jurídicas e Sociais – ECJS, sob orientação do prof.
Dr. Charles Alexandre Souza Armada e apresentado em banca pública em novembro
de 2020.
2 Egressa do Curso de Relações Internacionais da Universidade do Vale do Itajaí,

Escola de Ciências Jurídicas e Sociais – ECJS.


MARIA ISABEL MARQUETTI

alternativa dos ODSs com ênfase na atuação do Terceiro Setor e, em es-


pecial, na atuação das ONGs.
Com o intuito de alcançar o objetivo geral e os específicos acima
mencionados, a pesquisa está dividida em três sessões, sendo essas: de-
safios da sociedade contemporânea, dos Objetivos do Desenvolvimento
Sustentável ao desenvolvimento sustentável e o papel das ONGs na dis-
seminação do desenvolvimento sustentável.
A escolha do terceiro setor como área de concentração da pre-
sente pesquisa se deu pela percepção de que o mesmo, mas, principal-
mente as ONGs, são agentes importantes para atingir o desenvolvimento
sustentável. Em adição, os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável
estão presentes em ONGs e apresentam-se como ferramentas para a dis-
seminação do desenvolvimento sustentável.
O tema proposto para a presente pesquisa também se justifica
em função da carência de produções acadêmico-científicas que relacio-
nem o terceiro setor com o desenvolvimento sustentável, principalmente
envolvendo a atuação das ONGs, dando-se normalmente mais ênfase ao
primeiro e segundo setor. Com isso, busca-se dar mais espaço e visibili-
dade à temática abordada.
Foi utilizado o método de pesquisa exploratória com a finalidade
de analisar principalmente o papel do terceiro setor, particularmente das
ONGs, na concretização dos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável
enquanto ferramenta para a disseminação de um desenvolvimento verda-
deiramente sustentável.

1. DESAFIOS DA SOCIEDADE CONTEMPORÂNEA

1.1 Sociedade de Risco

O planeta vive um momento de grandes transformações. Seu


equilíbrio ecológico está sendo rompido, acarretando graves consequên-
cias e perigos para a humanidade. Isso não significa que não havia perigo
para a vida antes, mas que a origem e o alcance desses perigos foram
modificados consideravelmente nos tempos modernos, tornando impre-
visível o conhecimento e a intervenção humana no ambiente (MAR-
TINS, 2003, p. 239). Os riscos sempre existiram, porém, em grau e ex-
tensão diferentes, posto que, num primeiro momento, tratava-se de riscos
localizados; depois, passaram a atingir uma proporção maior, vindo a
afetar a coletividade, e hoje, os riscos existentes colocam em perigo todo
o planeta.
Portanto, é um novo modo de vida e seu modelo é completa-
mente diferente dos estágios anteriores do desenvolvimento social. É ne-
cessário buscar uma adaptação razoável, com um novo ambiente e um

154
MEIO AMBIENTE, MIGRAÇÕES E PANDEMIA: REFLEXÕES DO MUNDO CONTEMPORÂNEO

novo pensamento social e econômico. Uma característica distintiva desse


novo momento é que os riscos na sociedade transcendem a realidade in-
dividual, que vão além das fronteiras geográficas e temporais (ORTEGA,
2016).
A sociedade de risco leva então à reflexão: atividades diárias
significam a geração de novos riscos e o aumento de outros riscos, devido
às novas realidades sociais, econômicas e culturais da nova era que foram
resultantes do avanço tecnológico da sociedade moderna com a tecnolo-
gia eletrônica e a tecnologia da informação, etc. (ORTEGA, 2016).
Ulrich Beck, em seu livro Sociedade de Risco, descreveu as ori-
gens e as consequências da degradação ambiental no centro da sociedade
moderna. A partir da análise da sociedade contemporânea, os aspectos
negativos ou riscos superam os aspectos positivos e, acima de tudo, es-
capam do controle das instituições sociais.
Segundo Ulrich Beck (2013, p. 359), “vivemos um momento de
transformação da sociedade industrial clássica, caracterizada pela produ-
ção e a distribuição de riquezas, em uma chamada sociedade de risco, na
qual a produção dos riscos domina a lógica da produção de bens”.
Entramos em um período de extenso desenvolvimento científico
e tecnológico, com descobertas brilhantes, mas o legado de desequilíbrio
ambiental ameaça a sobrevivência contínua da humanidade na Terra. As
mudanças climáticas e os desastres ecológicos são exemplos, onde estão
emitindo avisos e pedindo às pessoas que façam correções para impedir
que se tenha uma situação irreversível em um futuro próximo. Acredita-
se que, além dos benefícios trazidos pelo desenvolvimento econômico e
social, também tenha causado sequelas de degradação ambiental e sub-
desenvolvimento em vários países (CALGARO, 2006, p. 11).
A modernidade vem associada à ideia de transformação das es-
truturas produtivas para torná-las mais eficientes e, dessa forma, então,
gerar riqueza. Consequentemente, tem-se o vínculo do termo com o pro-
gresso técnico, o crescimento econômico e a industrialização. Os planos
de desenvolvimento praticados em muitos países mostravam pouca ou
nenhuma preocupação com o meio ambiente. E, se essa preocupação
existisse, referia-se a sua condição de fonte de recursos para o cresci-
mento econômico. Adotava-se, então, uma visão mais instrumental do
meio ambiente, considerando-o apenas um meio de extração de recursos
para poder atingir seus objetivos econômicos.
Isso só mostra mais uma vez que os nossos recursos são limita-
dos e que se necessita dar a devida atenção ao tema. Além disso, há uma
precarização crescente e massiva das condições de existência, com uma
individualização da desigualdade social. O risco seria um estágio inter-
médio entre a segurança e a destruição (MENDES, 2016, p. 41).

155
MARIA ISABEL MARQUETTI

Um exemplo são as mudanças climáticas que vem acontecendo


nos últimos anos. Segundo o relatório de 2016 da UNEP - United Nations
Environment Programme:

Anthropogenic climate change is underway and will continue


for the foreseeable future. It is manifesting more rapidly and
more intensely than many expected. The most recent global
assessment by the Intergovernmental Panel on Climate
Change indicates that the world has become 0.85°C warmer
than in the late nineteenth century and extreme weather events
are likely to become more frequent. Increase in the frequency,
intensity and/or amount of heavy precipitation is to be ex-
pected; drought is to become more intense and prolonged in
many regions; and incidence and/or magnitude of extreme
high sea level is likely to increase. These climatic changes and
extreme events pose an unprecedented threat to people, eco-
systems, assets, and economies. (United Nations Environment
Programme, 2016, p. 44).3

Outro exemplo é a atual pandemia global do COVID. O relatório


anual de 2016 da UNEP - United Nations Environment Programme men-
ciona que:

The 20th century was a period of unprecedented ecological


change, with dramatic reductions in natural ecosystems and
biodiversity and equally dramatic increases in people and do-
mestic animals. Never before have so many animals been kept
by so many people–and never before have so many opportu-
nities existed for pathogens to pass from wild and domestic
animals through the biophysical environment to affect people
causing zoonotic diseases or zoonoses. The result has been a
worldwide increase in emerging zoonotic diseases, outbreaks
of epidemic zoonoses as well as a rise in foodborne zoonoses
globally, and a troubling persistence of neglected zoonotic

3 A mudança climática antropogênica está em andamento e continuará em um futuro


previsível. Está se manifestando mais rápido e intensamente do que muitos espera-
vam. A avaliação global mais recente do Painel Intergovernamental sobre Mudanças
Climáticas indica que o mundo se tornou 0,85 ° C mais quente do que no final do
século XIX e que eventos climáticos extremos provavelmente se tornarão mais fre-
quentes. Aumento na frequência, intensidade e / ou quantidade de precipitação forte
é esperado; a seca deve se tornar mais intensa e prolongada em muitas regiões; e a
incidência e / ou magnitude do nível do mar extremamente alto tende a aumentar.
Essas mudanças climáticas e eventos extremos representam uma ameaça sem prece-
dentes para as pessoas, ecossistemas, bens e economias. (Programa das Nações Uni-
das para o Meio Ambiente, 2016, p. 44, tradução livre).

156
MEIO AMBIENTE, MIGRAÇÕES E PANDEMIA: REFLEXÕES DO MUNDO CONTEMPORÂNEO

diseases in poor countries (United Nations Environment Pro-


gramme, 2016, p. 18).4

O que chama atenção é a data do relatório, que foi emitido em


2016 e já alertava sobre mudanças que vinham acontecendo no mundo e
uma possível futura pandemia global. Mesmo com o relatório, que tem
como objetivo alertar os países, é nítida a dificuldade que os países têm
em dimensionar os riscos a nível global. A preocupação com eles já não
está centrada em um perigo de origem externa, mas no próprio homem,
com capacidade de transformar e de destruir as condições de vida através
da criação de novos riscos.
O contexto de uma sociedade de risco engendra a necessidade
de um novo código de significado sobre a vida em uma dimensão ética,
a ética da sustentabilidade; uma ética que seja capaz de equilibrar os in-
teresses do ser humano com os interesses do planeta Terra; que aceite a
tecnologia, sem, contudo, transformá-la em uma vilã (CARMO, 2018).

1.2 Sociedade de Consumo

As atividades comerciais como um todo chegam a tal necessi-


dade que a palavra ‘humanidade’ chega a ser substituída por ‘consumi-
dores’. Ou seja, a valorização do indivíduo ou de um grupo de pessoas
está justamente ligada pela sua capacidade de consumir.
O consumo exacerbado e a convivência com a natureza, que é
provedora de tudo que o homem necessita para sanar suas necessidades,
vêm se manifestando aos sentidos humanos e denunciando o desequilí-
brio atual.
O uso da metáfora da ‘sociedade líquida’ tem sido usado para
caracterizar o estado da sociedade contemporânea moderna como um lí-
quido, que se transforma em um estado de forma insustentável, incapaz
de manter a sua forma. No estado líquido prevalece uma forma de pensar
na qual essa busca da felicidade é estritamente individual. Então, a busca
é de interesse apenas do indivíduo, apenas ele deve ser atendido, apenas
seus desejos, estes que sempre estão mudando (CUNHA, 2012).

4 O século 20 foi um período de mudanças ecológicas sem precedentes, com reduções


dramáticas nos ecossistemas naturais e na biodiversidade e aumentos igualmente dra-
máticos em pessoas e animais domésticos. Nunca antes tantos animais foram manti-
dos por tantas pessoas – e nunca antes existiram tantas oportunidades para os pató-
genos passarem de animais selvagens e domésticos através do ambiente biofísico
para afetar pessoas que causam doenças zoonóticas ou zoonoses. O resultado tem
sido um aumento mundial de doenças zoonóticas emergentes, surtos de zoonoses epi-
dêmicas, bem como um aumento global de zoonoses de origem alimentar e uma per-
sistência preocupante de doenças zoonóticas negligenciadas em países pobres (Pro-
grama das Nações Unidas para o Meio Ambiente, 2016, p. 18, tradução livre).

157
MARIA ISABEL MARQUETTI

Para Bauman, a sociedade de consumidores “representa o tipo


de sociedade que promove, encoraja ou reforça a escolha de um estilo de
vida e uma estratégia existencial consumista, e rejeita todas as opções
culturais alternativas” (BAUMAN, 2008, p. 71).
Não há espaço para quem não cumpre seu principal papel social:
tornar-se um consumidor modelo. Isso ocorre porque na sociedade con-
temporânea é avaliado o poder de consumo de seus membros, uma espé-
cie de termômetro que reconhecerá – ou não – seu valor nessa escala
social. Portanto, poderá ‘garantir’ sua posição somente quando exercita
seu poder de consumidor, e esse poder deve ser feito de maneira contí-
nua. Se não for esse o caso, a sociedade de consumo exclui imediata-
mente aqueles que criam defeitos, como aqueles que ficam imediata-
mente satisfeitos com o que consomem e não precisam procurar novida-
des o tempo todo (CUNHA, 2012).
Ao transformar tudo em mercadoria, a identidade também se
constitui a partir da satisfação do prazer pelo consumo. Satisfazer por
completo os consumidores, na realidade, significaria não ter mais nada
para vender. Consumir também significa descartar. É ter acesso a tudo o
que se quer e ao mesmo tempo as coisas se tornam rapidamente obsoletas
(CUNHA, 2017).
Bauman menciona que: “Não se pode escapar do consumo: faz
parte do seu metabolismo! O problema não é consumir, é o desejo insa-
ciável de continuar consumindo” (BAUMAN, 2008, p. 23).
Como consequência desse consumo desenfreado, por exemplo,
vem o desperdício e o descarte de produtos eletrônicos considerados ob-
soletos. Em 2017, O The Global E-waste Monitor 2017, um esforço con-
junto da UIT, da Universidade das Nações Unidas (UNU) e da Associa-
ção Internacional de Resíduos Sólidos (ISWA), já alertava para o au-
mento das estatísticas globais de lixo eletrônico a um nível de detalhe
sem precedentes, incluindo uma visão geral da magnitude do problema
do lixo eletrônico em diferentes regiões (THE GLOBAL E-WASTE
MONITOR, 2017, p. 38).
O relatório inclui informações atualizadas sobre as quantidades
de lixo eletrônico gerado e reciclado. Lixo eletrônico, ou E-waste, refere-
se a todos os itens de equipamentos elétricos e eletrônicos e suas peças
que foram descartadas pelo proprietário como resíduos sem intenção de
reutilização. O relatório destaca também a necessidade de melhores da-
dos e informações sobre lixo eletrônico para os formuladores de políticas
acompanharem o progresso, identificarem a necessidade de ação e alcan-
çarem o desenvolvimento sustentável.
Segundo o relatório:
The global quantity of e-waste generation in 2016 was around
44.7 million metric tonnes (Mt), or 6.1 kg per inhabitant. It is
estimated that in 2017, the world e-waste generation will ex-
ceed 46 Mt. The amount of e-waste is expected to grow to 52.2

158
MEIO AMBIENTE, MIGRAÇÕES E PANDEMIA: REFLEXÕES DO MUNDO CONTEMPORÂNEO

Mt in 2021, with an annual growth rate of 3 to 4% (THE


GLOBAL E-WASTE MONITOR, 2017, p. 38).5

O descarte não somente está presente atualmente, como também,


o relatório menciona, a tendência é o aumento devido ao rápido consumo
do ser humano e a sua necessidade de comprar e ter a última tecnologia
em mãos.
Consequentemente, vira um ciclo vicioso e reitera o que foi men-
cionado sobre a sociedade de risco, onde é visível a dificuldade das pes-
soas em dimensionar o impacto das suas ações a nível global. Os riscos,
então, constituem uma imagem refletida das ações e das omissões huma-
nas.

1.3 Crise Ambiental Global

Na sociedade de hoje, o modelo de desenvolvimento cada vez


mais arraigado do capitalismo exerce uma pressão muito forte sobre o
meio ambiente, o que acaba levando a uma crise ambiental global (RE-
DAÇÃO CAMINHO VERDE, 2014).
Segundo Viola, “Entre o medo de uma mudança climática in-
certa e num futuro distante e a perspectiva imediata de queda no padrão
de vida material, a maioria inclinou-se em favor da manutenção de seu
padrão” (VIOLA, 2002, p. 29). Os recursos ambientais são esgotáveis e
é necessária uma preservação do meio ambiente. Busca-se então uma
harmonia entre a economia e o meio ambiente para permitir o desenvol-
vimento de maneira planejada, para que os recursos existentes hoje não
sejam consumidos e as gerações futuras possam usufruir deles.
O Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente, conhe-
cido como PNUMA, radiografou os principais problemas ambientais do
planeta com base no conhecimento científico disponível. O relatório do
PNUMA concluiu que “os esforços de alguns países e regiões são difi-
cultados por modelos de produção e consumo insustentáveis e pelas mu-
danças climáticas“ (SÁNCHEZ; PLANELLES, 2019). A ameaça ao
meio ambiente vem não apenas da tecnologia, mas, também, de como ela
é utilizada. O desenvolvimento sustentável depende da construção de no-
vos paradigmas, tanto pessoais, governamentais e estruturais, com parti-
cipação ativa dos cidadãos. (CALGARO, 2006).
Em 2015, uma nova abordagem das fronteiras planetárias (“Pla-
netary Boundaries”, que haviam sido esboçadas em 2009 pelo Stockholm

5 A quantidade global de geração de lixo eletrônico em 2016 foi de cerca de 44,7


milhões de toneladas métricas (Mt), ou 6,1 kg por habitante. Estima-se que em 2017,
a geração mundial de lixo eletrônico ultrapassará 46 Mt. A quantidade de lixo eletrô-
nico deve crescer para 52,2 Mt em 2021, com uma taxa de crescimento anual de 3 a
4% (THE GLOBAL E-WASTE MONITOR, 2017, p. 38, tradução livre).

159
MARIA ISABEL MARQUETTI

Resilience Centre) foi publicada pela revista Science. Segundo Veiga


(2017, p. 229):

Nela, a atualização dos indicadores dos nove riscos sistêmicos


globais que estariam ameaçando a prosperidade de longo
prazo ressalta que dois desafios deveriam ser considerados tão
sérios (ou até mais) que o climático. Essencialmente porque
também já se teria queimado o sinal vermelho nos casos da
erosão da biodiversidade (principalmente genética) e da per-
turbação de fluxos biogeoquímicos (principalmente o ciclo do
nitrogênio).

A pesquisa estimou que já foram ultrapassadas três fronteiras –


mudanças climáticas, perda de biodiversidade e alteração no ciclo do ni-
trogênio – mas, não se sabe ao certo quanto tempo levará até que efeitos
irreversíveis comecem a acontecer. O ponto é que muitos dos sistemas
naturais e humanos encontram-se vulneráveis a forças ambientais de
longo prazo que podem contribuir para que os mesmos se desestabilizem.
Chegando perto do sinal amarelo, que é de atenção, estariam ou-
tras cinco das maiores preocupações ecológicas globais: acidificação dos
oceanos, acumulação de aerossóis na atmosfera, camada de ozônio, con-
sumo de água doce, e poluições químicas.

Figura 1 – Gráfico das Fronteiras Planetárias

Fonte: STEFFEN, W, COENELL, S, RICHARDSON, K, FETZER, I, 2015, p. 736

A pesquisa sobre as Planetary Boundaries também menciona


que “There is an urgent need for a new paradigm that integrates the

160
MEIO AMBIENTE, MIGRAÇÕES E PANDEMIA: REFLEXÕES DO MUNDO CONTEMPORÂNEO

continued development of human societies and the maintenance of the


Earth system (ES) in a resilient and accommodating state” (STEFFEN,
W, COENELL, S, RICHARDSON, K, FETZER, I, 2015, p. 736).6
Todos os riscos mencionados acima apontaram essencialmente
para dois tipos de obstáculos: a grande dificuldade de inferir impactos
locais e regionais no escopo global e a escolha inevitavelmente arbitrária
de parâmetros para determinar as zonas de incerteza.
No despertar da consciência para a grande questão do meio am-
biente surgem temas como consumo consciente e desenvolvimento sus-
tentável. Como resposta à crise ambiental, a sociedade deve buscar o en-
volvimento de todos os setores que a compõe e iniciar uma nova relação
entre o homem e o meio ambiente que o cerca (CALGARO, 2005).

1.4 Policrises

Além dos problemas relacionados com a sociedade de consumo,


a sociedade de risco e as crises ambientais, já mencionados nesse capí-
tulo, o mundo atualmente vive em meio à policrises. Morin e Kern (1995,
p. 94) entendem a policrise da seguinte maneira:

(...) podem ser consideradas como um conjunto policrísico em


que se entrelaçam e se sobrepõem crise do desenvolvimento,
crise da modernidade, crise de todas as sociedades, umas ar-
rancadas de sua letargia, de sua autarquia, do estado estacio-
nário, outras acelerando vertiginosamente seu movimento, ar-
rebatadas num devir cego, movidas por uma dialética dos de-
senvolvimentos da tecno-ciência e dos desencadeamentos dos
delírios humanos. Assim não se poderia destacar um problema
número um, que subordinaria todos os demais; não há um
único problema vital, mas vários problemas vitais, e é essa in-
ter-solidariedade complexa dos problemas, antagonismos, cri-
ses, processo descontrolado, crise geral do planeta, que cons-
titui o problema vital número um.

O que ocorre é uma inter-relação entre os problemas globais, em


vários âmbitos diferentes como, por exemplo: ambiental, demográfico,
social, econômico, nosso modo de vida, de civilização, e de desenvolvi-
mento. Essa policrise se manifesta através da geração de incertezas, de
rupturas de regulações, por desenvolvimento e crescimentos

6 “Há uma necessidade urgente de um novo paradigma que integre o desenvolvimento

contínuo das sociedades humanas e a manutenção do sistema terrestre (ES) em um


estado resiliente e acomodador” (STEFFEN, W, COENELL, S, RICHARDSON, K,
FETZER, I, 2015, p. 736, tradução livre).

161
MARIA ISABEL MARQUETTI

descontrolados, pelo crescimento dos perigos e das oportunidades (peri-


gos de regressão ou oportunidades de encontrar solução ou salvação).
Tendo em vista que estamos em uma crise que coloca em risco
a própria existência do ser humano, é evidente a dificuldade dos países
em lidar com isso e dimensionar os riscos e a característica de consumo
já enraizada na sociedade. É necessário que os países se unam de maneira
cooperada para atingir um objetivo comum.
Por isso, com o intuito de poder auxiliar em uma nova maneira
de pensar sobre a atual situação do planeta, equilibrando o desenvolvi-
mento social, econômico e ambiental, e buscando dimensionar os riscos
à nossa volta, foram criados os Objetivos do Milênio que, mais tarde,
tornaram-se os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável, objeto do
próximo capítulo.

2. DOS OBJETIVOS DO DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL


AO DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL

2.1 Evolução do Conceito de Desenvolvimento Sustentável

Desde a revolução industrial marcada pelo desenvolvimento da


máquina a vapor, o progresso tecnológico permitiu que o desenvolvi-
mento dos recursos naturais atingisse uma escala sem precedentes, com
a invenção do motor a combustão e o aprofundamento contínuo do do-
mínio da eletricidade. Os ingleses estavam imersos no pensamento da
época e viam a poluição das fábricas como um símbolo de vitória, mas
não perceberam os possíveis efeitos colaterais do modelo industrial ca-
racterizado pela desigualdade social e pelas precárias condições de vida
dos trabalhadores (EQUIPE ECYCLE).
Ainda sofrendo com profundas mudanças sociais e culturais na
década de 1960 e 1970, as pessoas começaram a refletir profundamente
sobre os danos causados ao meio ambiente, e fizeram os primeiros esfor-
ços de consciência ecológica com uma atitude positiva. Um exemplo foi
o livro ‘Primavera Silenciosa’ de Rachel Carson, publicado em 1962, a
primeira obra que alertou para o aumento do uso de compostos químicos
e sua importância no pós-guerra, tornando-se o estopim para uma nova
percepção da população em relação a causas ambientais, o que acarretou
na proibição do uso do defensivo agrícola DDT - Dicloro-Difenil-Triclo-
roetano (POTT; ESTRELA, 2017).
Outro exemplo é que, em 1968, o presidente honorário da Fiat,
o empresário italiano Aurélio Peccei e o cientista escocês Alexander
King co-patrocinaram uma reunião para discutir o futuro estado da hu-
manidade na Terra. A ideia na época era convidar cerca de 20 pessoas
para avaliar questões políticas, econômicas e sociais relacionadas ao

162
MEIO AMBIENTE, MIGRAÇÕES E PANDEMIA: REFLEXÕES DO MUNDO CONTEMPORÂNEO

meio ambiente. A primeira reunião foi realizada em uma pequena vila


em Roma, daí o nome ‘Clube de Roma’. Quatro anos depois dessa reu-
nião, um de seus trabalhos obteve destaque a nível mundial. Foi em 1972
que o cenário ambiental global estava realmente se movendo em uma
nova direção. O Clube de Roma publicou um estudo, chamado de ‘Limite
de Crescimento’, que alertava sobre questões importantes como energia,
saneamento, poluição, saúde, meio ambiente e crescimento populacional.
Esse estudo concluía que:

Se a humanidade continuasse a consumir os recursos naturais


como na época, por consequência da industrialização, eles se
esgotariam em menos de 100 anos. A repercussão foi muito
grande, várias críticas foram feitas por nomes importantes da
política mundial, eles diziam que o clube queria frear o cres-
cimento econômico. O objetivo do relatório era abrir as dis-
cussões ambientais de maneira que a humanidade começasse
a questionar o modelo de economia e exploração praticados na
época (REDAÇÃO PENSAMENTO VERDE).

Também em 1972, a Assembleia Geral das Nações Unidas foi


realizada em Estocolmo e propôs uma nova forma de desenvolvimento,
denominada ‘ecodesenvolvimento’, cujo objetivo era procurar coordenar
o desenvolvimento econômico com prudência ecológica e justiça social,
aumentando assim a conscientização pública sobre questões ambientais
(POTT; ESTRELA, 2017).
Foi a primeira vez na história das Nações Unidas que 113 países,
250 organizações não governamentais, vários departamentos das Nações
Unidas e agências especializadas foram convocados para discutir ques-
tões ambientais e até hoje é considerado um marco histórico na educação
ambiental. Como resultado dessa reunião, foi criada uma organização
chamada Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente
(PNUMA), que está sediada em Nairóbi, capital do Quênia e tem contato
direto com as Nações Unidas (OLIVEIRA, 2007, p. 300).
Mais tarde, em 1985, a Áustria assinou a Convenção de Viena
para a Proteção da Camada de Ozônio. O ‘Protocolo de Montreal’ de
1987 complementava a Convenção, que estabelecia padrões para a redu-
ção gradual, de fabricação e consumo, de produtos prejudiciais à camada
de ozônio. Esse é considerado o único documento com adesão universal.
O conceito de desenvolvimento sustentável que conhecemos
hoje deriva do Relatório Brundtland, de 1987, onde se conceituou desen-
volvimento sustentável como “Sustainable development is development
that meets the needs of the present without compromising the ability of

163
MARIA ISABEL MARQUETTI

future generations to meet their own needs” (UNITED NATIONS,


1987).7
O relatório, intitulado “Nosso Futuro Comum”, foi escrito por
um grupo de representantes de 21 países e foi presidido pela então Pri-
meira-Ministra da Noruega, Gro Harlem Brundtland.
O impacto do Relatório Brundtland foi impressionante e inspi-
rou a Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvol-
vimento (Eco-92), realizada no Rio de Janeiro, onde mais de 100 chefes
de Estado se reuniram para discutir formas de desenvolvimento susten-
tável.
O relatório apresenta que as limitações do desenvolvimento sus-
tentável não são, por exemplo, baseadas no modelo de crescimento do
desenvolvimento de recursos naturais e incentivo ao consumo, mas ba-
seadas nas limitações impostas pela tecnologia e pelas organizações so-
ciais, recursos ambientais e a capacidade da biosfera de absorver o im-
pacto das atividades humanas.
Outra causa importante para a degradação ambiental, segundo o
Relatório Brundtland, é a pobreza, pois “poverty is a major cause and
effect of global Environment problems. It is therefore futile to attempt to
deal with environmental problems without a broader perspective that en-
compasses the factors underlying world poverty and International ine-
quality” (UNITED NATIONS, 1987).8 Um mundo onde prevalece à po-
breza sempre sofrerá desastres: desastres ecológicos ou outros desastres.
Para atender às necessidades básicas de todos, o documento recomenda
um crescimento potencial pleno, e o desenvolvimento sustentável exige
claramente que haja um crescimento econômico em regiões onde tais ne-
cessidades não estão sendo atendidas.
Essa ideia continua a ser implantada em uma lógica circular:
onde as necessidades básicas foram atendidas, há desenvolvimento sus-
tentável; se há desenvolvimento sustentável, é compatível com o cresci-
mento econômico. Mas o simples crescimento não é suficiente. As ativi-
dades de produção em grande escala podem coexistir com a pobreza ge-
neralizada, que representa uma ameaça ao meio ambiente. Portanto, o de-
senvolvimento sustentável requer que a sociedade atenda às necessidades
humanas, tanto aumentando o potencial de produção quanto garantindo
que todas as pessoas tenham as mesmas oportunidades.

7 O desenvolvimento sustentável é o desenvolvimento que atende às necessidades do


presente sem comprometer a capacidade das gerações futuras de atender às suas pró-
prias necessidades (UNITED NATIONS, 1987, tradução livre).
8 A pobreza é a principal causa e efeito dos problemas ambientais globais. Portanto,

é inútil tentar lidar com os problemas ambientais sem uma perspectiva mais ampla
que englobe os fatores subjacentes à pobreza mundial e à desigualdade internacional
(UNITED NATIONS, 1987, tradução livre).

164
MEIO AMBIENTE, MIGRAÇÕES E PANDEMIA: REFLEXÕES DO MUNDO CONTEMPORÂNEO

A diferença em relação às discussões ambientais anteriores e às


questões que o Relatório Brundtland enfrentou é que deve considerar
tanto o meio ambiente quanto o desenvolvimento. Este é um ponto cru-
cial, porque enfatiza as maneiras pelas quais as sociedades dos países
ricos e pobres destruíram o meio ambiente. O que significa conciliar duas
visões opostas: as atividades humanas – especialmente o desenvolvi-
mento baseado em métodos de produção industrial (que é sinônimo de
“desenvolvimento”) – que são a fonte da degradação ambiental. Por ou-
tro lado, existe a noção de que é impossível deixar de considerar a neces-
sidade de acelerar o desenvolvimento de pessoas que ainda não obtive-
ram condições de vida dignas.
Porém, o conceito de desenvolvimento sustentável possui tam-
bém algumas críticas.
Segundo Boff (2015, p. 46):

(...) a utilização política da expressão desenvolvimento susten-


tável representa uma armadilha no sistema imperante: “as-
sume os termos da ecologia (sustentabilidade) para esvaziá-
los e assume o ideal da economia (crescimento/desenvolvi-
mento), mascarando, porém, a pobreza que ele mesmo produz.

Antes do relatório, a visão era de que o desenvolvimento em si


era sinônimo de crescimento econômico, não levando em conta o âmbito
ambiental (extração de recursos) e o âmbito social. Seguia-se então uma
lógica de que onde as necessidades básicas foram atendidas, há desen-
volvimento sustentável; se há desenvolvimento sustentável, é compatível
com o crescimento econômico. Sendo assim, o Desenvolvimento Susten-
tável precisa que a sociedade atenda às necessidades humanas.
Já Lima (1997) diz que:

Condena sua natureza polissêmica, permitindo interpretações


relacionadas com um significado avançado de desenvolvi-
mento, associado a justiça social e preservação ecológica,
mas, ao mesmo tempo, também relacionadas com uma leitura
conservadora que a aproxima do conceito de crescimento eco-
nômico.

Com essas críticas, se tem a reflexão de que essa variação do


conceito de desenvolvimento sustentável pode ser tida como um desvio
para problemas ainda maiores, como os atuais e reais problemas ambien-
tais globais, por exemplo. E mesmo após uma série de conferências e
grandes mudanças na década de 1990, o século XXI ainda está lutando
para resolver problemas ambientais.
O conceito de desenvolvimento sustentável deve ser visto como
uma nova forma de olhar os fatos. O desenvolvimento da sociedade está

165
MARIA ISABEL MARQUETTI

baseado em suas inter-relações nas dimensões social, ambiental, cultural,


econômica e espacial, não sendo possível analisar parcialmente o pro-
cesso de desenvolvimento, pois é um processo complexo. Lembrando
que as mudanças são irreversíveis e contínuas, ampliando assim a res-
ponsabilidade de toda a sociedade, incluindo as gerações presentes e fu-
turas.
Essa evolução no processo de desenvolvimento deixa de estar
relacionada apenas ao aspecto econômico, mas também evolui com o de-
senvolvimento da política, da sociedade e do meio ambiente, tornando-o
mais completo.
Para Sachs:

(...) os objetivos do desenvolvimento vão bem além da mera


multiplicação da riqueza material. O crescimento é uma con-
dição necessária, mas de forma alguma suficiente (muito me-
nos é um objetivo em si mesmo), para se alcançar a meta de
uma vida melhor, mais feliz e mais completa para todos
(SACHS, 2004, p. 13).

Essa responsabilidade requer uma base de discussão prática para


a realização de ações construtivas, que deve buscar continuamente o de-
senvolvimento social e as opções de tomada de decisão, e considerar os
aspectos inter-relacionados, de forma a otimizar os recursos existentes e
seguir em frente. Para atingir esse objetivo, o desenvolvimento sustentá-
vel depende de um planejamento de longo prazo e da compreensão dos
recursos naturais limitados da terra. Não se trata de interromper o cresci-
mento, mas de escolher um caminho que garanta o desenvolvimento in-
tegrado e participativo, considerando o valor agregado e o uso racional
dos recursos naturais (SILVA, 2006, p. 38).
Foi nesse contexto que surgiu a necessidade de se pensar tam-
bém em conceitos como a sustentabilidade x desenvolvimento sustentá-
vel. Um grande desafio é descobrir os caminhos para a sustentabilidade
e identificar práticas sustentáveis para o desenvolvimento sustentável. O
desenvolvimento sustentável é, então, uma ferramenta que em conjunto
com o tripé (econômico, social e ambiental) tem como principal objetivo
atingir a sustentabilidade, com uma maior participação da sociedade civil
e maior conscientização sobre os recursos naturais que temos disponí-
veis. A característica do estilo de vida humana sempre foi o foco na re-
mediação, e não na prevenção. Devido ao surgimento de políticas ambi-
entais, esse paradigma vem começando a mudar.
O problema a ser resolvido está na atitude das empresas e dos
governos, e depende também das nossas escolhas diárias. Este é um con-
ceito relacionado a todas as áreas, ou seja, é sistêmico. Está em jogo a
continuidade da sociedade humana, das atividades econômicas, da cul-
tura e da sociedade, e do meio ambiente. Nesse sentido, o conceito de

166
MEIO AMBIENTE, MIGRAÇÕES E PANDEMIA: REFLEXÕES DO MUNDO CONTEMPORÂNEO

desenvolvimento sustentável parece propor um novo modo de vida. É


uma nova forma de organizar a vida humana e expressar seu potencial
(EQUIPE ECYCLE).

2.2 Dos Objetivos do Milênio aos Objetivos do Desenvolvimento Sus-


tentável

2.2.1 Objetivos do Milênio


Refletindo e baseando-se na década das grandes conferências e
encontros das Nações Unidas, em setembro de 2000, líderes mundiais se
reuniram na sede das Nações Unidas, em Nova York, para adotar a De-
claração do Milênio da ONU (NAÇÕES UNIDAS BRASIL).
Nessa declaração, os países se comprometeram a atingir oito ob-
jetivos em 15 anos: acabar com a fome e a miséria; educação básica de
qualidade para todos; igualdade de sexos e valorização da mulher; redu-
zir a mortalidade infantil; melhorar a saúde das gestantes; combater a
AIDS, a malária e outras doenças; qualidade de vida e respeito ao meio
ambiente e todo mundo trabalhando pelo meio ambiente (IPEA, 2010).
Após o evento internacional denominado Rio-92, realizado em
1992, foram realizadas discussões e reflexões sobre a proteção do meio
ambiente. Criou-se, então, a “Agenda 21”, propondo hierarquizar priori-
dades e diretrizes relacionadas à integração dos recursos ambientais para
o desenvolvimento sustentável. A partir de um diagnóstico das ações pro-
duzidas a partir do Rio-92, foram propostos os Objetivos de Desenvolvi-
mento para o Milênio (ODM), endossado por 199 nações, como impor-
tante documento produzido dentro da Cúpula do Milênio promovida pela
ONU, dando atenção aos países com menor e em desenvolvimento. Os
ODM estabeleciam levantamento de indicadores para o monitoramento
das ações e se definiu um prazo desde o ano 2000 até 2015 para cumpri-
mento desses objetivos.
O ano de 2012 marcou os vinte anos da Rio-92, daí a ideia de
retomada e de reencontro em torno da temática na agora denominada
Rio+20, tendo como intuito reunificar o tema da Rio+20 em um docu-
mento que recomendasse a inclusão de lideranças políticas internacionais
em ações conjuntas para o desenvolvimento sustentável. Lá foi estabele-
cido um grupo de trabalho aberto que, após mais de um ano de pesquisas,
propôs 17 metas que deveriam constituir os Objetivos de Desenvolvi-
mento Sustentável (MARCON, 2019).
Os anos 2012-2015 foram caracterizados por um extenso e in-
tenso processo de consultas junto à sociedade civil, setores privados e ao
setor público dos diversos governos locais em relação aos ODS. O resul-
tado foi que, no ano de 2015, a Cúpula das Nações Unidas sobre o de-
senvolvimento sustentável confirmou os 17 objetivos e suas metas. Tra-
tam-se dos seguintes aspectos: erradicação da pobreza; fome zero e

167
MARIA ISABEL MARQUETTI

agricultura sustentável; saúde e bem-estar; educação de qualidade; igual-


dade de gênero; água potável e saneamento; energia acessível e limpa;
trabalho decente e crescimento econômico, indústria inovação e infraes-
trutura; redução das desigualdades; cidades e comunidades sustentáveis;
consumo e produção responsáveis; ação contra a mudança global do
clima; vida na água; vida terrestre; paz, justiça e instituições eficientes e
parcerias e meios de implementação (MARCON, 2019).
O ano de 2015 trouxe oportunidades históricas sem precedentes,
nações mais unidas e determinou novos caminhos para melhorar a vida
de pessoas em todo o mundo. Nesse mesmo ano, os países tiveram a
oportunidade de adotar uma nova agenda de desenvolvimento sustentá-
vel e chegar a um acordo global sobre mudanças climáticas. Ações rea-
lizadas em 2015 resultaram nos novos Objetivos de Desenvolvimento
Sustentável (ODS) que se baseiam nos oito Objetivos de Desenvolvi-
mento do Milênio (ODM). As Nações Unidas trabalharam com gover-
nos, sociedade civil e outros parceiros para aproveitar e divulgar o im-
pacto gerado pelos Objetivos de Desenvolvimento do Milênio e fazer
avançar uma ambiciosa agenda de desenvolvimento (NAÇÕES UNI-
DAS BRASIL).

2.2.2 Objetivos do Desenvolvimento Sustentável


Conforme mencionado anteriormente, inspirado nos Objetivos
de Desenvolvimento do Milênio, a cúpula Rio+20 promoveu ações de
desenvolvimento humano e ao combate à pobreza e outras questões glo-
bais. A reunião concordou que alguns Objetivos do Milênio precisavam
ser formulados de uma maneira concisa, fácil de entender, global e uni-
versalmente aplicável a todos os países. Os Objetivos de Desenvolvi-
mento Sustentável foram estabelecidos em dois anos (2013-2014) e estão
comprometidos com as áreas prioritárias de desenvolvimento sustentável
(PINHO, 2019).
O Secretário-Geral das Nações Unidas nomeou uma equipe para
considerar as opções após 2015 (o ano final dos Objetivos de Desenvol-
vimento do Milênio), assim como a Assembleia Geral das Nações Unidas
estabeleceu um grupo intergovernamental de 30 membros para formular
os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável. Os estados-membros da
organização aprovaram por unanimidade a Agenda 2030 e os Objetivos
de Desenvolvimento Sustentável. Os 17 objetivos e 169 metas estão in-
ter-relacionados, o que significa que o sucesso dos Objetivos de Desen-
volvimento Sustentável afeta diretamente outro objetivo. Combater os
efeitos adversos das mudanças climáticas afeta diretamente a forma
como gerenciamos os recursos naturais. A promoção de uma sociedade
pacífica e inclusiva reduzirá a desigualdade e contribuirá para a prospe-
ridade econômica. Considerando que o cumprimento da Agenda 2030 e
dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável é um compromisso

168
MEIO AMBIENTE, MIGRAÇÕES E PANDEMIA: REFLEXÕES DO MUNDO CONTEMPORÂNEO

ousado, também representa oportunidades importantes de mudança para


o benefício das gerações presentes e futuras (PINHO, 2019).
De acordo com o Secretário Geral da ONU, Ban Ki-moon: “Os
Objetivos de Desenvolvimento Sustentável tratam-se de uma agenda uni-
versal, transformadora e integrada que anuncia um ponto decisivo para
nosso mundo. E o resultado de um processo verdadeiramente aberto, in-
clusivo e transparente” (UNITED NATIONS, 2019). Os ODS são total-
mente integrados e indivisíveis, abarcando de forma equilibrada as três
dimensões do desenvolvimento sustentável: econômica, social e ambien-
tal. Um grande diferencial consiste na participação efetiva de todos os
atores. A imagem abaixo representa a estrutura e divisão dos Objetivos
Desenvolvimento Sustentável em três blocos:

Figura 2 – Representação das três dimensões do desenvolvimento sus-


tentável

Fonte: BERGMAN, 2016. Disponível em: https://voluntariadoempresa-


rial.com.br/ods-como-usar-voluntariado-para-metas-2030/

O gráfico representa a estrutura em que os ODS estão inseridos.


O primeiro bloco e a base da estrutura são compostos por ODS que estão
diretamente ligados com o âmbito ambiental e representam os recursos
que temos disponíveis na natureza. Está representado por 4 ODS, que

169
MARIA ISABEL MARQUETTI

são: ODS número 6, que é referente à água potável e saneamento e seu


principal objetivo é assegurar a disponibilidade e gestão sustentável da
água e saneamento para todas e todos até 2030; ODS número 13 tem
como objetivo principal tomar medidas urgentes para combater a mu-
dança climática e seus impactos; ODS 14 tem como principal objetivo a
conservação e uso sustentável dos oceanos, dos mares e dos recursos ma-
rinhos para o desenvolvimento sustentável e o ODS 15 tem como princi-
pal objetivo proteger, recuperar e promover o uso sustentável dos ecos-
sistemas terrestres, gerir de forma sustentável as florestas, combater a
desertificação, deter e reverter a degradação da terra e deter a perda de
biodiversidade (NAÇÕES UNIDAS BRASIL).
Seguindo a estrutura, no meio está representado à sociedade e os
problemas urgentes a serem combatidos nela. A sociedade exerce a fun-
ção de intermediário entre os recursos e a economia e está representada
por 8 ODS, que são: ODS 1, que tem como principal objetivo acabar com
a pobreza em todas as suas formas, em todos os lugares; ODS 2 tem como
principal objetivo acabar com a fome, alcançar a segurança alimentar e
melhoria da nutrição e promover a agricultura sustentável; ODS 3 tem
como principal objetivo assegurar uma vida saudável e promover o bem-
estar para todas e todos, em todas as idades; ODS 4 tem como principal
objetivo assegurar a educação inclusiva e equitativa e de qualidade, e
promover oportunidades de aprendizagem ao longo da vida para todas e
todos; ODS 5 tem como principal objetivo alcançar a igualdade de gê-
nero e empoderar todas as mulheres e meninas; ODS 7 tem como princi-
pal objetivo assegurar o acesso confiável, sustentável, moderno e a preço
acessível à energia para todas e todos; ODS 11 tem como principal obje-
tivo tornar as cidades e os assentamentos humanos inclusivos, seguros,
resilientes e sustentáveis e o ODS 16 que tem como principal objetivo
promover sociedades pacíficas e inclusivas para o desenvolvimento sus-
tentável, proporcionar o acesso à justiça para todos e construir institui-
ções eficazes, responsáveis e inclusivas em todos os níveis (NAÇÕES
UNIDAS BRASIL).
Continuando com a estrutura dos ODS, se tem a economia. Ela
está representada por 4 ODS: O ODS 8 tem como principal objetivo pro-
mover o crescimento econômico sustentado, inclusivo e sustentável, em-
prego pleno e produtivo e trabalho decente para todas e todos; ODS 9
tem como principal objetivo construir infraestruturas resilientes, promo-
ver a industrialização inclusiva e sustentável e fomentar a inovação; ODS
10 tem como principal objetivo reduzir a desigualdade dentro dos países
e entre eles e o ODS 12 tem como principal objetivo assegurar padrões
de produção e de consumo sustentáveis (NAÇÕES UNIDAS BRASIL).
E, por fim, toda a estrutura leva ao ODS 17, que representa as
parcerias e meios de implementação dos ODS como um todo, já que to-
dos os objetivos estão conectados direta ou indiretamente. O ODS 17 tem

170
MEIO AMBIENTE, MIGRAÇÕES E PANDEMIA: REFLEXÕES DO MUNDO CONTEMPORÂNEO

como principal objetivo fortalecer os meios de implementação e revita-


lizar a parceria global para o desenvolvimento sustentável. Para poder
atingir esse objetivo até 2030, algumas metas foram traçadas e subdivi-
didas entre 5 sessões: finanças, tecnologia, capacitação, comércio e ques-
tões sistêmicas. Em relações a questões sistêmicas, as principais metas
foram subdivididas em três pontos: coerência de políticas; parcerias mul-
tissetoriais e, por fim, dados, monitoramento e prestação de contas (NA-
ÇÕES UNIDAS BRASIL).
Organizações internacionais, organizações não governamentais,
empresas multinacionais, sociedade civil, mídia, empresas e municípios
desempenham um papel ativo e claro na implementação dos Objetivos
de Desenvolvimento Sustentável. O diálogo do global ao local é muito
importante, demonstrando a necessidade de que os objetivos se transfor-
mem em agendas de ações e políticas públicas. Espera-se que a obtenção
de um amplo consenso em torno das metas de desenvolvimento susten-
tável permitirá aos países fortalecer a cooperação e, assim, ter uma visão
mais otimista do maior progresso da humanidade em alcançar um desen-
volvimento eficaz e sustentável nos próximos anos (REVISTA MUN-
DORAMA, 2016).
A estratégia de usar os Objetivos de Desenvolvimento Sustentá-
vel como ferramenta de disseminação do desenvolvimento sustentável é
uma aliança que reúne organizações representativas da sociedade civil,
setor privado e governos locais com o objetivo de ampliar e limitar o
debate sobre os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável e solucionar
os problemas. As características são o diálogo e o esforço conjunto, e os
objetivos e princípios do diálogo e do esforço conjunto estão enraizados
nas ações e comportamentos universais de todos esses atores. A prática
e a implementação dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável estão
diretamente relacionadas ao terceiro setor (ESTRATÉGIA ODS).

3. O PAPEL DAS ONGS NA DISSEMINAÇÃO DO


DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL

3.1 Atores para um Desenvolvimento Sustentável

Os desafios que atualmente se enfrentam são intensos, como


mencionado no primeiro capítulo, desde a atual sociedade de risco e de
consumo até a atual policrise (ambiental, econômica e social). O direito
internacional sozinho não dá conta de atender as inúmeras demandas.
Umas das razões para que isso ocorra é que os problemas são globais,
não somente locais. Outro ponto é que somente um ator não dá conta de
atender todos os problemas que há no mundo. Em adição, não depende
somente dele, mas sim da cooperação entre parcerias e países, e por mais

171
MARIA ISABEL MARQUETTI

ricos que sejam esses países, não conseguem sanar todos os problemas
sozinhos.
Se os Estados-nação são fortes o suficiente para destruir a hu-
manidade e a sociedade em grande escala, então eles se tornaram muito
pequenos para resolver os principais problemas do planeta, embora esses
problemas sejam muito grandes para somente os Estados resolverem ou
os seus cidadãos (MORIN; KERN, 1995, p. 115).
Se reitera, então, a importância de parcerias e como envolver di-
retamente as mesmas para trabalharem juntas por um objetivo comum:
atingir um desenvolvimento verdadeiramente sustentável.
Para poder atingir o desenvolvimento sustentável, a atuação da
iniciativa privada, dos governos, da ONU e demais organizações inter-
nacionais, da sociedade civil e do terceiro setor no geral são de extrema
importância. Segundo as Nações Unidas,

A escala e a ambição da nova Agenda exigem uma parceria


global revitalizada para garantir a sua execução. Nós nos com-
prometemos plenamente com isso. Esta parceria irá trabalhar
em um espírito de solidariedade global, em especial a solida-
riedade com os mais pobres e com as pessoas em situações
vulneráveis. Ele facilitará um engajamento global intensivo
em apoio à implementação de todos os Objetivos e metas, reu-
nindo governos, setor privado, sociedade civil, o Sistema das
Nações Unidas e outros atores e mobilizando todos os recursos
disponíveis. (NAÇÕES UNIDAS BRASIL).

Não haverá um desenvolvimento verdadeiramente sustentável


sem a atuação efetiva de todos os atores acima mencionados e represen-
tados dentro da estrutura dos ODS pelo ODS 17. Para tornar o problema
em ação em si, deve ser observado em um plano micro e macro, com
integração da ação privada com a ação pública, visando uma perspectiva
sistêmica.
Também é necessário rever o papel da sociedade civil. Sem or-
ganizações e os movimentos para monitorar ativamente as metas, propor
soluções e alternativas, se articular com participação e controle social
para responder às necessidades e propor políticas públicas, se diminuirá
as chances de sucesso na implementação dos Objetivos de Desenvolvi-
mento Sustentável. A sociedade civil tem grande poder de mobilização,
tem oportunidades e pode promover uma expressão mais clara entre di-
ferentes departamentos e forças políticas.
Como já apontado acima, vem crescendo a importância de falar
sobre os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável, juntamente com
parceiras multissensoriais. Mas o que chama atenção é que esse interesse
pelos ODS e sua implementação vem sendo representadas

172
MEIO AMBIENTE, MIGRAÇÕES E PANDEMIA: REFLEXÕES DO MUNDO CONTEMPORÂNEO

principalmente pelas ONGs, com ações locais para atingir um desenvol-


vimento verdadeiramente sustentável.

3.2. Importância do terceiro setor, em especial das ONGs

O terceiro setor está diretamente ligado à atuação do desenvol-


vimento social da sociedade civil como um todo e, principalmente nas
ONGs, o trabalho normalmente é voluntário, visando uma sociedade
mais inclusiva, participativa e ativa no combate aos problemas que ela
possui. Ademais, é o terceiro setor que implementa através da participa-
ção dos outros atores da sociedade, projetos e ações para construir juntos
uma sociedade melhor para todos e as próximas gerações.
José Eduardo Sabo Paes (2017) define terceiro setor como:

(...) podemos, assim, conceituar o Terceiro Setor como o con-


junto de organismos, organizações ou instituições sem fins lu-
crativos dotados de autonomia e administração própria que
apresentam como função e objetivo principal atuar voluntari-
amente junto à sociedade civil visando ao seu aperfeiçoa-
mento.

O dia a dia do terceiro setor como um todo é repleta de desafios


que precisam ser considerados para poder entender seu conceito e que
afetam diretamente o desenvolvimento do mesmo perante as parceiras
com outros setores do Estado. A falta de recursos para implementação e
a falta de contato efetivo com outros setores, a grande dificuldade de de-
senvolver projetos de implementação e a cultura de dependência dos go-
vernos são exemplos de desafios diários que o terceiro setor enfrenta.
Um dos elementos que integram o terceiro setor são as organi-
zações não governamentais. Elas possuem um papel fundamental de
apoio aos outros setores e mobilização social perante a sociedade civil,
buscando sempre agir de forma coletiva para o atingimento de um obje-
tivo em comum.
Para Vieira (2011, p. 116), “a crise global e a constatação de que
somente o Estado e o mercado não vão resolvê-la tendem a fortalecer o
papel das ONGs, enquanto organizações da sociedade civil, na constru-
ção de alternativas e de mecanismos de cooperação internacional”. Além
da cooperação internacional, a importância da ONGs está também no
cruzamento de setores a nível nacional e internacional, proporcionando
uma maior interação e descentralização de demandas e informação.
A atuação das ONGs nas diversas instâncias da ONU superou as
amarras dos Estados-nação em busca de defesa dos interesses públicos,
da democracia, da sustentabilidade ambiental e da diversidade cultural.
Nesse sentido, podem consolidar novas formas solidárias de composição
da sociedade internacional, em que a cooperação se dá no cruzamento

173
MARIA ISABEL MARQUETTI

das várias instâncias de poder, descentralizadas, informatizadas e parti-


cipativas (VIEIRA, 2001, p. 271).
O que as ONGs estão fazendo para poder atingir um desenvol-
vimento verdadeiramente sustentável envolve além de parcerias com os
outros setores é efetivamente tirar do papel projetos e fazer as mudanças
acontecerem na prática, gerar um senso de empoderamento perante a so-
ciedade civil como um todo, ter a capacidade de disseminar os ODS, ser
portador do desenvolvimento social e preencher a lacuna deixada pelo
Estado e consolidar novas formas solidárias de composição da sociedade
internacional, transformando em um ambiente mais interativo e de coo-
perativismo.

3.3 ODS na prática e a disseminação de um desenvolvimento


verdadeiramente sustentável

Como já mencionado, o terceiro setor, principalmente as ONGs,


possuem um papel de extrema importância e que, para se atinja um de-
senvolvimento verdadeiramente sustentável, necessita-se trabalhar com
parcerias e participar ativamente da sociedade civil para monitorar e ga-
rantir que as ações prometidas se cumpram9.
Para demostrar como as ONGs realmente contribuem na prática
para um desenvolvimento verdadeiramente sustentável e para entender
melhor o porquê elas se destacam na implementação das ODS, não so-
mente a nível local, serão mencionadas algumas características que dife-
renciam as ONGs dos demais atores e alguns exemplos de ONGs.
A primeira característica que se destaca é efetivamente a imple-
mentação dos projetos, que através das ONGs é possível acontecer, jun-
tamente com a ajuda das parcerias. Esses projetos têm como base a utili-
zação dos ODS para setar metas e métricas para poder colocar em prática
no dia a dia da ONG e da comunidade que será positivamente impactada.
Um exemplo é a Ecoswell, que tem como objetivo o desenvol-
vimento de comunidades na costa do Peru de uma forma sustentável e
possuem uma filial no Reino Unido. Trabalham com alunos voluntários
de universidades para realizar projetos socioambientais, de infraestrutura
e de cunho educacional como conservação da natureza, gestão de ONGs,
pesquisa, água e saneamento, análise de dados e energia renovável e

9 Entre os dias 07 e 09 de agosto de 2020 a autora desta pesquisa participou da con-


ferência internacional chamada 26 Youth Assembly que é uma conferência interna-
cional para jovens, coordenada pela Ambassadors Foundation, que possui uma par-
ceria com a ONU. Esse ano a conferência foi online e reuniu jovens líderes de 27
países para poder promover liderança jovem e disseminar o que são e a importância
dos ODS, com palestras e seminários para discutir essas temáticas.

174
MEIO AMBIENTE, MIGRAÇÕES E PANDEMIA: REFLEXÕES DO MUNDO CONTEMPORÂNEO

esses projetos são alinhados com os ODS. Os ODS que mais se destacam
em seus projetos são: 4, 6, 8, 10, 12, 13, 14, 15 e 17 (ECOSWELL, 2018).
Outro exemplo é a ONG Major Group, que está localizada em
Nova York, nos Estados Unidos e tem como objetivo aumentar o enga-
jamento de organizações não governamentais, conscientizar e mobilizar;
desenhar e implementar projetos; monitorar e revisar políticas; coletar
dados; fornecer conhecimento técnico; e apoiam e mantêm governos res-
ponsáveis pelos seus compromissos. Acreditam que com um maior apoio
político e financeiro para a participação da sociedade civil em todos os
níveis e estágios de implementação, se pode então melhorar e aumentar
as chances de sucesso dos ODS e requer soluções integradas e depende
de papéis complementares de diferentes atores da sociedade. Foca nos
ODS: 1, 2, 3, 5, 9, 14 e 17 indiretamente (NGO MAJOR GROUP, 2017).
Outra característica é o maior envolvimento da sociedade civil,
fazendo com que as pessoas tenham um senso de comunidade maior e
consequentemente, a ter um senso de pertencimento. Normalmente as
ONGs funcionam com ajuda de pessoas voluntárias, que acreditam no
propósito da ONG e dedicam muitas vezes suas vidas para melhorar a
sua comunidade. Trabalhando por um objetivo em comum, se gera um
poder de empoderamento e a sensação de que por mais que a ação esteja
sendo feita a nível local, esses voluntários estão sim colaborando para
uma causa maior do que eles, de nível global.
Um exemplo para essa característica é a ONG chamada
AIESEC.10 Foi criada após a segunda guerra como uma das soluções de
evitar conflitos. Está presente em mais de 120 países, com mais de 2000
membros voluntários no Brasil, realizando mais de 6000 intercâmbios
por ano. Tudo isso com um objetivo: atingir o preenchimento das poten-
cialidades humanas através do desenvolvimento da liderança nos jovens
(AIESEC BRASIL). No Brasil, os principais ODS relacionados com seus
projetos são o número 4, 10, 13 e 17. Para os projetos acontecerem, al-
guém de uma cidade específica pode ir fazer um voluntariado de 6 sema-
nas em algum país que deseja ou uma pessoa de outro país pode vir para
alguma das unidades da AIESEC no Brasil para realizar um projeto vo-
luntário em alguma ONG. Todos os projetos, independentemente do país
de escolha para a realização do intercâmbio, são norteados por algum
ODS, e as atividades devem ser relacionadas com eles, tendo o objetivo
de incentivar de maneira lúdica e prática como elas funcionam.
Outro exemplo é a ONG Education Above All, que está locali-
zada na Índia. Um de seus projetos chamado Al Fakhoora foi criado em
2009 como resposta ao conflito em Gaza que destruiu inúmeras escolas
e universidades. Al Fakhoora é um conjunto diversificado de iniciativas

10A autora desta pesquisa fez parte como membro voluntário dessa ONG por três
anos, de 2016 até 2019 e atualmente é parte do Conselho Fiscal da mesma.

175
MARIA ISABEL MARQUETTI

que vão desde assistência médica de emergência, reconstrução de insti-


tutos de ensino superior prejudicados pela guerra e apoio psicossocial
para crianças e jovens e que já tocou diretamente a vida de mais de
300.000 crianças e jovens. Todos os programas da Al Fakhoora giram
em torno do ODS 4, educação de qualidade. Promove o direito à educa-
ção, desbloqueando uma nova geração de crianças e jovens marginaliza-
dos para se tornarem líderes educados, profissionalmente qualificados e
inspiradores do futuro que guiam suas famílias e comunidades em dire-
ção à coesão e prosperidade (EDUCATION ABOVE ALL, 2009).
Além das outras características mencionadas acima, as ONGs
têm a capacidade de disseminar os ODS através das mídias sociais a im-
portância dos mesmos. A informatização tem, portanto, um papel funda-
mental na disseminação de ideias e valores nos níveis regional, nacional
e internacional, possibilitando o acesso quase imediato a dados e infor-
mações. Um dos principais pontos em nível de ODS é a falta de conhe-
cimento sobre o que são os ODS por parte da sociedade civil, que possui
um papel fundamental na cobrança e monitoramento das ações públicas
e privadas. Ao trabalharem com os ODS, se incorporam importantes me-
tas e indicadores para a gestão e contribui possibilitando o fortalecimento
de parcerias. Por mais que como já mencionado, se vem crescendo a
conscientização nas últimas décadas sobre os ODS, eles ainda são pouco
conhecidos.
Um exemplo é a ONG chamada Millenium Institute, situada na
Suíça, onde seu objetivo é ajudar os governos e a sociedade civil a aplicar
o pensamento sistêmico chamado iSDG (Sustainable Development Go-
als Integrated) para resolver os desafios do desenvolvimento sustentável.
Apoiam os países no desenvolvimento de estratégias eficazes que levarão
a avanços mensuráveis no bem-estar da sociedade no contexto dos Obje-
tivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) globais. Trabalham disse-
minando todos os ODS, mas principalmente o ODS 17. Acreditam que
este é um pré-requisito fundamental para permitir uma mudança global
em direção a um caminho de desenvolvimento sustentável. O iSDG é
uma ferramenta de simulação de políticas projetada para ajudar os for-
muladores de políticas e outras partes interessadas a compreender a com-
plexa rede de interconexões entre os ODS. Ao contrário de bancos de
dados e índices que fornecem uma medida da posição de um país, o iSDG
concentra-se nas interações dinâmicas dentro do sistema de ODS para
revelar os melhores caminhos e progressão para alcançar os mesmos
(MILLENNIUM INSTITUTE).
Outro exemplo é a ONG The Dais, que fica na Índia e é uma
iniciativa para capacitar indivíduos e organizações. Sua equipe é com-
posta por um conjunto jovem e motivado de indivíduos de diversas ori-
gens. Nos últimos anos, eles vêm focando no cumprimento dos Objetivos
de Desenvolvimento Sustentável e na facilitação do papel dos jovens,

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MEIO AMBIENTE, MIGRAÇÕES E PANDEMIA: REFLEXÕES DO MUNDO CONTEMPORÂNEO

além da capacitação dos alunos e da exploração de práticas inovadoras e


modelos de desenvolvimento das instituições de ensino para um maior
impacto no âmbito local comunidade. Para isso acontecer, seus projetos
incluem: empoderar a juventude, conscientização da comunidade, igual-
dade de gênero (ODS 5) e educação de qualidade (ODS 4); assistência
para ONGs; engajamento em políticas e formulação de projetos com se-
tores do governo (ODS 17) para atingir os Objetivos de Desenvolvimento
Sustentável (THE DAIS, 2019).
Diante do amplo crescimento econômico e das necessidades so-
ciais decorrentes, o terceiro setor tornou-se um importante portador do
desenvolvimento social, buscando preencher a lacuna deixada pelo Es-
tado e os outros setores que nele é composto. As ONGs são muito impor-
tantes, no qual possui na maioria das vezes a função de auxiliar os outros
setores (Estado e empresas privadas) em parceria para que juntos se che-
gue a um desenvolvimento sustentável. Como já mencionado no capítulo
3, muitas vezes o Estado sozinho não dá conta de implementar projetos
que visam uma sociedade melhor e utilizam as ONGs como ferramenta
para chegar lá.
Um exemplo é a ONG chamada CERES, que fica em San Fran-
cisco, nos Estados Unidos e que tem como objetivo trabalhar com em-
presas para construir liderança e gerar soluções para a economia local.
CERES enfrenta os maiores desafios de sustentabilidade do mundo: mu-
danças climáticas, escassez e poluição de água e locais de trabalho injus-
tos. Os ODS envolvidos com os projetos da ONG são: 8, 9, 11, 13 e 17.
Trabalham com o modelo CERES de sustentabilidade, visando orientar
as empresas em direção à liderança em sustentabilidade corporativa e
apoiar uma transição acelerada em direção a uma economia global mais
sustentável. Com o objetivo de incentivar as empresas a alavancar estra-
tegicamente os ODS, mapearam e criaram um modelo de desenvolvi-
mento chamado The CERES roadtrip. Esse modelo visa incorporar a res-
ponsabilidade de outros setores para impulsionar o seu desempenho e o
atingir de uma maneira sustentável (CERES).
Outro exemplo é a NGO Committee on Ageing, que está situada
em Genebra, na Suíça e tem como objetivo conscientizar sobre envelhe-
cer; alinhar os seus projetos com as Nações Unidas para construir uma
sociedade para todas as idades; lutar pelo direito dos idosos e influenciar
positivamente políticas globais de monitoramento. Os ODS que estão en-
globados são, 3, 4, 5,10 e 17. (NGO COMMITTEE ON AGEING)
Por fim, uma característica que se destaca nas ONGs é que as
mesmas podem consolidar novas formas solidárias de composição da so-
ciedade internacional, transformando um em ambiente mais interativo e
de cooperativismo. Um exemplo é a ONG African Monitor, que tem sua
sede na Africa do Sul, mas possui filiais por alguns países da África. O
seu principal objetivo é promover plataformas institucionalizadas para o

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MARIA ISABEL MARQUETTI

envolvimento de múltiplas partes interessadas a nível nacional e regional


na África e também acelerar a implementação dos ODS por meio de uma
agenda de advocacy regional e global de alto impacto; acelerar a domes-
ticação dos ODS na política nacional, planejamento e estruturas orça-
mentárias. As ODS que a ONG trabalha são: educação (ODS 4), oportu-
nidades econômicas (ODS 8), sociedades pacíficas (ODS 16), redução
da pobreza (ODS 1) e o ODS 5, igualdade de gênero (AFRICAN MO-
NITOR).
Outro exemplo é o Grupo FARO, que tem sua sede no Equador,
mas possui filiais na América Latina. Seu principal objetivo é pesquisar
e influenciar políticas públicas e práticas que promovem a transformação
social e a inovação, estando relacionado diretamente com o ODS 17. São
referência na geração de conhecimento e práticas inovadoras para o de-
senvolvimento equitativo e sustentável no Equador e na América Latina.
Ao longo de 15 anos, seus projetos tiveram parceria com diversas insti-
tuições de Governos de outros países, Sociedade Civil, Setor Privado e
Governo Nacional. O Grupo FARO assinou acordos de cooperação com
diversas instituições públicas, entidades acadêmicas e outras organiza-
ções da sociedade civil, com o objetivo de formar equipes de trabalho
multidisciplinares com diferentes visões, garantindo resultados objetivos
a partir de contribuições de um trabalho posterior (GRUPO FARO).
Com a análise das ONGs destacadas acima e as características
mencionadas, ressalta-se mais uma vez a importância das ONGs para que
se atinja um desenvolvimento verdadeiramente sustentável, sendo utili-
zadas como uma ferramenta em parceria com o Estado, empresas priva-
das e demais atores, visando uma comunidade melhor para se viver e
garantir um mundo melhor para as futuras gerações. As características
destacadas não esgotam as contribuições que o terceiro setor, particular-
mente as ONGs, tem para a consolidação dos ODSs no planeta. Aten-
dendo as exigências de estrutura da presente pesquisa, limitou-se o nú-
mero de exemplos para cada característica.
Em adição, os ODSs, sendo atingidos na sua totalidade, podem
trazer e determinar um desenvolvimento verdadeiramente sustentável,
através da combinação do âmbito ambiental (base da estrutura), âmbito
social (que faz o intermédio), âmbito econômico e com a ajuda de parce-
rias na sua implementação através das ONGs.
Além da capacidade de implementar os projetos com ajuda de
parcerias, com o maior envolvimento da sociedade civil, fazendo com
que as pessoas tenham um senso de comunidade maior, do poder das
ONGs em disseminar os ODS através e mídias sociais, da busca por pre-
encher a lacuna deixada pelo Estado e os outros setores do mesmo e pelas
ONGs poderem consolidar novas formas solidárias de composição da so-
ciedade internacional, transformando um em ambiente mais interativo e
de cooperativismo, as ONGs materializam na prática o exercício da

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MEIO AMBIENTE, MIGRAÇÕES E PANDEMIA: REFLEXÕES DO MUNDO CONTEMPORÂNEO

cidadania e da prática política no sentido de uma participação ativa dos


integrantes dessas organizações na resolução de problemas locais e glo-
bais.
Para que se atinja um desenvolvimento verdadeiramente susten-
tável, necessita-se de um desenvolvimento que obviamente extrapole a
questão econômica e invada todas as demais dimensões da sustentabili-
dade: ambiental e social, como mencionado no capítulo 2. A grande di-
ficuldade das ações voltadas para o desenvolvimento sustentável do pla-
neta está em encontrar o equilíbrio no tratamento dessas diferentes di-
mensões que caracterizam o conceito. Nesse sentido, as ONGs, ao dedi-
carem sua energia e atenção para as demais facetas da vida humana, além
da econômica, conforme os diversos exemplos apresentados configuram
uma tentativa necessária de equalização dessa balança.

CONCLUSÃO

O planeta vive grandes transformações, onde seu equilíbrio eco-


lógico está rompido, gerando várias consequências e perigos para a hu-
manidade. Os riscos do planeta sempre existiram, porém, tratava-se de
riscos localizados; depois passaram a atingir uma proporção maior, vindo
a afetar a coletividade, e hoje, os riscos existentes colocam em perigo
todo o planeta.
O primeiro capítulo explanou que o planeta vivencia um novo
modo de vida e seu modelo é completamente diferente dos estágios an-
teriores do desenvolvimento social, se tornando uma sociedade de risco
e de consumo. É necessário buscar uma adaptação razoável, com um
novo ambiente e um novo pensamento social e econômico. A sociedade
contemporânea, diante desse panorama, experimenta o dilema do ele-
vado nível de consumo, da exploração incansável dos recursos naturais
e, como consequência, do desperdício e do descarte em massa de produ-
tos. O atual modelo de desenvolvimento exerce uma pressão muito forte
sobre o meio ambiente, o que acaba levando a uma crise ambiental glo-
bal, onde três fronteiras já foram ultrapassadas. Não somente a questão
ambiental está em vogue, mas também está ocorrendo uma policrise, na
qual há uma inter-relação entre diversos problemas globais.
O capítulo 2 tratou da evolução do conceito de desenvolvimento
sustentável. Refletindo sobre a década das grandes conferências e encon-
tros das Nações Unidas, líderes mundiais adotaram a Declaração do Mi-
lênio da ONU e criaram a Agenda 21, visando priorizar diretrizes relaci-
onadas à integração dos recursos ambientais para o desenvolvimento sus-
tentável. E por fim, cabe ressaltar que toda a estrutura está diretamente
ligada a parcerias que permite que todos os Objetivos de Desenvolvi-
mento Sustentável efetivamente acontecem, tendo como principal

179
MARIA ISABEL MARQUETTI

objetivo fortalecer os meios de implementação e revitalizar a parceria


global para o desenvolvimento sustentável.
O terceiro e último capítulo traz as limitações de atuação do Di-
reito Internacional para tratar a atual policrise global. Para poder atingir
o desenvolvimento sustentável, a atuação da iniciativa privada, dos go-
vernos, da ONU e demais organizações internacionais, da sociedade civil
e do terceiro setor no geral são de extrema importância. O terceiro setor
está diretamente ligado à atuação do desenvolvimento social da socie-
dade civil como um todo e, principalmente nas ONGs, onde o trabalho
normalmente é voluntário, visando uma sociedade mais inclusiva e par-
ticipativa.
Com os ODS sendo atingidos na sua totalidade, se pode trazer e
determinar um desenvolvimento verdadeiramente sustentável, através da
combinação do âmbito ambiental (base da estrutura), âmbito social (que
faz o intermédio), âmbito econômico e com a ajuda de parcerias na sua
implementação com as ONGs.
Para que se atinja um desenvolvimento verdadeiramente susten-
tável, se necessita de um desenvolvimento que passe da questão econô-
mica e invada todas as demais dimensões da sustentabilidade: ambiental
e social. A grande dificuldade das ações voltadas para o desenvolvimento
sustentável do planeta está em encontrar o equilíbrio no tratamento des-
sas diferentes dimensões que caracterizam o conceito. Nesse sentido, as
ONGs, ao dedicarem sua energia e atenção para as demais facetas da vida
humana, além da econômica, conforme os diversos exemplos apresenta-
dos configuram uma tentativa necessária de equalização dessa balança.
Ademais, as ONGs têm a capacidade também de mostrar para as pessoas
que os ODS existem. O desenvolvimento verdadeiramente sustentável é
aquele que atende os mais variados direitos humanos, mais completos e
que os ODS têm em suprir isso, com vários objetivos diferentes. O de-
senvolvimento é muito mais que econômico, é no sentido de permitir a
realização das potencialidades humanas que vão muito além desse âm-
bito e que o planeta consiga permitir que o ser humano seja capaz de
assumir e desenvolver as suas potencialidades.

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O DESEMPENHO DO SETOR DE CELULOSE E PAPEL NO
MERCADO DE CAPITAIS BRASILEIRO DIANTE DA
PANDEMIA DE COVID-19

Victor Holtin Weiss1

INTRODUÇÃO

As crises que se estabelecem ao longo do tempo, dotam de ca-


racterísticas de aproximação, é de maneira geral, uma passagem de um
turbulento processo de instabilidade. A crise advinda do novo coronaví-
rus, mudou certos pensamentos de proteção e previsão de catástrofes nos
vários setores da sociedade.
Este artigo busca demonstrar o desempenho na bolsa de valores
brasileira que certas empresas de capital aberto do setor de celulose e
papel obtiveram. As nuances estruturais que evidenciam as principais
vantagens perante outros setores, as relações de exportação que se favo-
receram diante de moedas estrangeiras e a importância dos ideais dos
acionistas que compraram ações e seguraram suas posições no pior mo-
mento da pandemia.
As duas empresas que estão presentes no artigo, são: Klabin S.A
e Suzano Papel e Celulose. Ambas são extremamente representativas no
mercado de capitais brasileiro, suas atividades exercem uma gama de
produtos finais, destinados para todo o planeta. A relevância da pereni-
dade do setor, é evidenciado no artigo e seu entendimento é crucial para
estabelecer a tentativa de captar o imaginário dos acionistas e o compor-
tamento dos controladores da empresa.
A pesquisa para este artigo fundamenta-se, em dados de casas
de análises, notícias através dos meses que sucederam o principal mo-
mento da crise e artigos que descrevem as atividades das empresas lista-
das, para o melhor entendimento das várias décadas de produção e dis-
tribuição dos produtos advindos de celulose.

1 Graduando do Curso de Relações Internacionais da Universidade do Vale do Itajaí


- UNIVALI.
MEIO AMBIENTE, MIGRAÇÕES E PANDEMIA: REFLEXÕES DO MUNDO CONTEMPORÂNEO

1. AS SUCESSIVAS QUEDAS E OS INCONTÁVEIS CIRCUIT


BREAKERS

O pessimismo em volta da volatilidade que atingiu o mercado


financeiro em março de 2020, proporcionou quedas consecutivas no Ibo-
vespa2, acionando dispositivos como o circuit breaker3, na tentativa de
desacelerar as porcentagens exacerbantes em que as ações estavam
caindo. Foram acionados 6 circuit breakers do dia 9 ao dia 18 de março,
contabilizando um recorde na bolsa de valores brasileira4.
O gráfico abaixo do Ibovespa, evidencia a forte pressão de
venda, advinda do ambiente extremamente pessimista em que se encon-
travam os agentes do mercado:

Gráfico 1: Variação do Índice Bovespa

Fonte: Status invest5

2 “Ibovespa é o principal índice do mercado de ações. É o mais importante indicador


de desempenho médio dos ativos mais negociados e representativos do mercado de
ações de nosso País.” STATUS INVEST. IBOVESPA: COTAÇÃO, COMPOSI-
ÇÃO, VARIAÇÃO. [S. l.], 2020. Disponível em: https://statusinvest.com.br /indi-
ces/ibovespa. Acesso em: 15 set. 2020.
3 “Circuit breaker é um mecanismo de segurança utilizado para interromper todas as

operações da Bolsa de Valores do Brasil, a B3. Este mecanismo é acionado nos mo-
mentos em que as ações negociadas nesse mercado sofrem grandes quedas conside-
radas atípicas em seus preços.” Toro. Circuit Breaker na Bovespa – entenda o que
é e o seu histórico: O que é circuit breaker na Bovespa? [S. l.], 16 mar. 2020.
Disponível em: https://blog.toroinvestimentos.com.br/circuit-breaker-bovespa-o-
que-e-histori co. Acesso em: 15 set. 2020.
4 LEMOS, Amanda. Veja todas as vezes que a Bolsa brasileira acionou o circuit brea-

ker. Folha de S. Paulo, [S. l.], 9 mar. 2020. Disponível em: https:// www1.fo-
lha.uol.com.br/mercado/2020/03/veja-todas-as-vezes-que-a-bolsa-brasilei ra-acio-
nou-o-circuit-breaker.shtml. Acesso em: 15 set. 2020.
5 STATUS INVEST. Ibovespa: cotação, composição, variação. [S. l.], 2020. Dispo-

nível em: https://statusinvest.com.br/indices/ibovespa. Acesso em: 15 set. 2020.

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VICTOR HOLTIN WEISS

Este gráfico do principal índice brasileiro do mercado de ações,


registra a maior queda mensal em 22 anos6. O movimento de baixa que
atingiu a bolsa brasileira, produziu alta contração na pontuação do índice,
tendo a mínima de 63.570 pontos no fechamento do dia 23 de março7.

2. UM PANORAMA DAS EMPRESAS KLABIN S.A E SUZANO


PAPEL E CELULOSE

2.1 Klabin S.A

De acordo com o site sobre finanças e mercado, Infomoney, a


Klabin é uma empresa com mais de 130 anos de existência, tendo a pro-
dução de papel iniciado em 1902. Nos anos 1930 e 1950, a empresa cres-
ceu significativamente, suprindo a grande demanda por papel imprensa
na época. A Klabin foi se expandindo conforme as décadas se avança-
vam, em 2001 foi criada a Klabin S.A. Desde 2003 a empresa focou sua
produção em embalagens, tendo em 2019, atingindo a marca de maior
produtora e exportadora de papéis brasileira8.
Conforme o Infomoney:

A Klabin se organiza em quatro áreas de negócios: florestal,


celulose, papéis e embalagens. Em 2019 a empresa possuía 17
unidades produtivas, sendo uma na argentina. [...] Desde ja-
neiro de 2014 a companhia integra o Nível 2 de Governança
Corporativa da B3. [...] A Klabin está listada na B3, no mer-
cado à vista, com ações do tipo Unit (KLBN11), ordinárias
(KLBN3) e preferenciais (KLBN4)9.

6 FERREIRA, Gustavo. Ibovespa cai 30% em março, maior queda mensal em 22


anos. Valor Investe, São Paulo, 31 mar. 2020. Disponível em: https://valorin-
veste.globo.com/objetivo/hora-de-investir/noticia/2020/03/31/iboves pa-tem-maior-
queda-mensal-em-22-anos-dolar-maior-alta-desde-ataque-as-torres-gemeas-em-
2011.ghtml. Acesso em: 15 set. 2020.
7 STATUS INVEST. IBOVESPA: COTAÇÃO, COMPOSIÇÃO, VARIAÇÃO.

[S. l.], 2020. Disponível em: https://statusinvest.com.br/indices/ibovespa. Acesso


em: 15 set. 2020.
8 Klabin SA (KLBN4). Infomoney, [S. l.], p. 1, 19 abr. 2020. Disponível em:

https://www.infomoney.com.br/cotacoes/klabin-klbn4/. Acesso em: 8 out. 2020.


9 Klabin SA (KLBN4). Infomoney, [S. l.], p. 1, 19 abr. 2020. Disponível em:

https://www.infomoney.com.br/cotacoes/klabin-klbn4/. Acesso em: 8 out. 2020.

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MEIO AMBIENTE, MIGRAÇÕES E PANDEMIA: REFLEXÕES DO MUNDO CONTEMPORÂNEO

2.2 Suzano papel e celulose

De acordo com o Infomoney, as atividades da Suzano tiveram


início em 1924, sendo em 1955, a pioneira no plantio de eucalipto. Entre
1960 e 1990, a empresa investe em aquisições, expandindo assim os ne-
gócios. O eucalipto é sua maior matéria prima para a produção de diver-
sos produtos, sendo o portfólio constituído de papel revestido e não-re-
vestido, papel cartão, papel tissue, celulose de mercado e celulose fluff.
Possuindo três fábricas integradas de celulose e papel, sendo duas em
São Paulo e uma na Bahia10.
Houve uma importante fusão entre a Suzano papel e celulose e
Fibria em 2019, criando uma gigante global no setor de celulose e papel.
Em relação ao processo de fusão, o presidente da Suzano Walter Schalka,
comenta:

Concluímos com êxito a realização de um sonho. A jornada


que começa agora é movida pelo desejo de sermos protagonis-
tas na evolução da sociedade e referência no uso sustentável
de recursos renováveis e, a partir disso, contribuir para a cons-
trução de um mundo melhor, agora e no futuro11.

2.3 A importância da perenidade para o imaginário acionário

A perenidade é levada em conta quando investidores de longo


prazo preveem uma futura estabilidade e crescimento para a empresa,
alguns setores da bolsa brasileira, contém um viés transitório no seu se-
tor. O setor de celulose constitui um ramo da economia, na qual muitas
atividades humanas dependem exclusivamente da sua produção e distri-
buição para o convívio moderno.
Por exemplo, através das décadas a Klabin desenvolveu uma
produção verticalizada, na qual o produto final, está diretamente ligado
aos processos de matéria prima iniciais. Desenvolveu assim uma forte
independência em relação a sua produção, que está alicerçada principal-
mente em seu setor perene.

10 SUZANO PAPEL (SUZB3). Infomoney, [S. l.], p. 1, 24 jun. 2020. Disponível


em: https://www.infomoney.com.br/cotacoes/suzano-papelsuzb3/. Acesso em: 8 out.
2020.
11 CONTEÚDO, Estadão. Suzano confirma conclusão de fusão com a Fibria.

Exame, [S. l.], 14 jan. 2019. Disponível em: https://exame.com/negocios/suzano-con-


firma-conclusao-de-fusao-com-a-fibria/#:~:text=S%C3%A3o%20Paulo%20%
E2%80%93%20A%20Suzano%20Pa-
pel,15%20de%20mar%C3%A7o%20de%202018.&text=A%20Suzano%20infor-
mou%20que%20a,toneladas%20de%20papel% 20por%20ano. Acesso em: 8 out.
2020.

189
VICTOR HOLTIN WEISS

2.4 Dividendos versus investimentos em crescimento

Existem diferenças cruciais entre essas duas empresas, que re-


fletem no preço de suas ações e na possível alavancagem que esses papéis
podem sofrer no mercado acionário. A resposta para os divergentes pre-
ços listados no mercado, estão atrelados aos objetivos que as empresas
estabelecem ao receberem os lucros, pois de maneira geral, a empresa
escolhe entre captar o lucro total e reinvestir no seu próprio crescimento
ou na distribuição de dividendos12 ou juros sobre capital próprio13 aos
seus acionistas.
De acordo com Barsi14:
Para esses dois papéis você tem que olhar de forma diferente.
[..] Você tem que olhar a base acionária. [...] Elas possuem
diretrizes e DNAs diferentes, a Suzano tem a diretriz de se

12 “Dividendos são parcelas do lucro apurado de uma sociedade anônima, distribuí-


dos na forma de remuneração aos acionistas. [...] Essa remuneração pode ser paga na
forma de dinheiro, ações ou direitos de propriedades, de maneira anual, semestral,
trimestral ou até mesmo mensal. [...] Pago proporcionalmente pela quantidade de
ações do investidor.” BTG PACTUAL. O que são dividendos e como ganhar di-
nheiro com eles? O que são dividendos e como eles são pagos? Btg pactual digital,
[S. l.], 9 out. 2018. Disponível em: https://www.btgpactualdigital.com/blog/ investi-
mentos/renda-variavel/o-que-sao-dividendos-e-como-ganhar-dinheiro-com-
eles?cmpid=c04:m05:google:1741053764:b:96926179141&utm_me-
dium=spl&utm_source=google&utm_campaign=1741053764&utm_con-
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ment=&s_kwcid=AL!9288!3!430860639481!b!!g!!&gclid=CjwKCAjwzIH7B RA-
bEiwAoDxxTh0gAWW0v9URvbBvznrT1zxR1r4iUNT8c1KIiYXQp9z66soRar
FSkhoChhkQAvD_BwE. Acesso em: 15 set. 2020.
13 “É um tipo de lucro distribuído aos acionistas. [...] Ao contrário dos dividendos

que são tributados para a empresa e isentos aos acionistas, as empresas não pagam
IR sobre o valor dos JSP, mas a tributação ocorre para os investidores.” FAYH, Mar-
celo. O que são Juros Sobre Capital Próprio?, The Cap, [S. l.], 26 jun. 2020. Renda
Variável, Disponível em: https://comoinvestir.thecap.com.br/o-que-sao-juros-sobre-
capital-proprio-jcp/#:~:text=Os%20Juros%20Sobre%20Capital%20Pr
%C3%B3prio%20(JCP%20ou%20JSCP)%20s%C3%A3o%20uma,acionis-
tas%20na%20forma%20de%20dinheiro.&text=Por%20serem%20realiza-
dos%20antes%20do,as%20empresas%20pagam%20menos%20impostos. Acesso
em: 15 set. 2020.
14 “Luiz Barsi Filho é o maior investidor individual da bolsa de valores brasileira.”

Equipe André Bona. Quem é Luiz Barsi Filho? Conheça o maior investidor da bolsa
brasileira! André Bona, [S. l.], 24 ago. 2020. Bolsa de Valores. Disponível em:
https://andrebona.com.br/quem-e-luiz-barsi-filho-conheca-o-maior-investidor-da-
bolsa -brasileira/. Acesso em: 15 set. 2020.

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MEIO AMBIENTE, MIGRAÇÕES E PANDEMIA: REFLEXÕES DO MUNDO CONTEMPORÂNEO

endividar, ir atrás das dívidas e sonegar o dividendo, ao passo


que a Klabin. [...] Tem uma diretriz de distribuir os dividen-
dos. [...] Pois ela contempla os seus controladores e agregados.
[...] Enquanto uma gera para você uma renda trimestral a outra
te remunera com a valorização em bolsa15.

Diante dessa citação, pode-se entender a dinâmica própria que


as empresas efetuam no mercado de ações. O interesse do acionista des-
perta de várias formas, ora pelo objetivo de constituir uma renda, inves-
tindo em ações que proporcionam proventos, ou por empresas que inves-
tem a maior parte do lucro em si mesmas e projetam a possibilidade po-
sitiva de suas cotações se multiplicarem na bolsa de valores.

3. ANÁLISE DOS DEMONSTRATIVOS TRIMESTRAIS E


COTAÇÕES EM BOLSA

3.1 Receita líquida

De acordo com Alves, o setor de celulose e papel brasileiro é ex-


tremamente internacionalizado, resultando assim em receitas dolarizadas,
propulsadas pela valorização desta em relação ao Real. Isso ficou ainda
mais evidente com o momento atual, em que o Dólar obteve altos patama-
res de valorização, alavancando as receitas de ambas as empresas16.
Abaixo estão dois gráficos que evidenciam o viés altista em que
as receitas obtiveram, em detrimento aos trimestres anteriores:

15 Transcrito de: O que Luiz Barsi pensa sobre Klabin, Suzano e Cielo. Produção:
Ações Garantem o Futuro. Youtube: [s. n.], 13/04/2019. Disponível em:
https://www.youtube.com/watch?v=RI9f6hEoGR0&ab_chan-
nel=A%C3%A7%C3%B5esGarantem Futuro. Acesso em: 15 set. 2020.
16 ALVES, Aluísio. Suzano tem prejuízo de R$ 2 bi no 2º tri com pressão do dólar

nas despesas. CNN Brasil, [S. l.], p. 1, 13 ago. 2020. Disponível em:
https://www.cnnbrasil.com.br/business/2020/08/13/suzano-tem-prejuizo-de-r-2-bi-
no-2-tri-com-pressao-do-dolar-nas-despesas. Acesso em: 7 out. 2020.

191
VICTOR HOLTIN WEISS

Gráfico 2: Receita líquida da Klabin S.A

Fonte: Fundamentus17

Gráfico 3: Receita líquida da Suzano papel e celulose

Fonte: Fundamentus18

A resposta ao período de crise, advém das oportunidades que


esta promove, Cordeiro e Neves, exemplificam o potencial adquirido:

17 KLBN3: Demonstrativos de resultados. Fundamentus, 2020. Disponível em:


https://fundamentus.com.br/graficos.php?papel=KLBN3&tipo=2. Acesso em: 1 out.
2020.
18 SUZB3: Demonstrativos de resultados. Fundamentus, 2020. Disponível em:

https: //fundamentus.com.br/graficos.php?papel=SUZB3&tipo=2. Acesso em: 1 out.


2020.

192
MEIO AMBIENTE, MIGRAÇÕES E PANDEMIA: REFLEXÕES DO MUNDO CONTEMPORÂNEO

No setor de celulose e papel, a pandemia criou impactos tem-


porários, mas também acelerou mudanças estruturais. A de-
manda por papel de imprimir e escrever, que já vinha caindo
rapidamente nos últimos anos, se acelerou, e com ela foi redu-
zida a oferta de aparas brancas ao mercado. O segmento de
tissue foi impactado positivamente por conta do aumento da
demanda por produtos de higiene pessoal. [...] Houve também
um aquecimento do mercado de embalagens devido à maior
demanda por produtos considerados essenciais, como os ali-
mentos19.

A alta demanda de produtos básicos, combinados com a grande


fatia da receita resultada de moedas estrangeiras, potencializaram uma
alta significativa em ambas receitas. Tendo esses demonstrativos confir-
mado por meio de dados, a perenidade do setor, como foi mencionado
antes.

3.2 Endividamento

As empresas atuantes nesse setor, detém uma naturalidade de


constância, no tocante ao seu endividamento. Como destaca Neves et al.
(2019)20, uma notória fatia de suas dívidas, advém de acordos estrangei-
ros, gerando assim uma maior exposição ao fator de volatilidade de mo-
edas estrangeiras, permeando seu futuro lucro líquido de características
instáveis.
Abaixo são demostrados gráficos que demostram o alto nível de
endividamento de ambas as empresas analisadas, o gráfico percorre o es-
paço de tempo de 10 anos, evidenciando o último trimestre de 2019 até
os dias atuais.

19 CORDEIRO, João; NEVES, Manoel. Efeitos da pandemia por covid-19 no setor


de celulose e papel. Revista O Papel, 17 jun. 2020. PANORAMA SETORIAL DE
MERCADO/PÖYRY, p. 31. Disponível em: http://www.revistaopapel.org.br/ noti-
cia-anexos/1592859303_12119169b2cc2b67f58fb24cec7b6402_2002105451. pdf.
Acesso em: 15 set. 2020.
20 NEVES, Leonardo de Lima et al. INDICADORES FINANCEIROS: UMA ANÁ-

LISE SETORIAL DAS EMPRESAS DE PAPEL E CELULOSE LISTADAS NA


B3. III Encontro Internacional de Gestão, Desenvolvimento e Inovação, [s. l.],
10 set. 2019. Disponível em: https://core.ac.uk/download/pdf/270225074.pdf.
Acesso em: 7 out. 2020.

193
VICTOR HOLTIN WEISS

Gráfico 4: Endividamento da Klabin S.A

Fonte: Fundamentus21

Gráfico 5: Endividamento da Suzano papel e celulose

Fonte: Fundamentus22

Há um notório crescimento do endividamento de ambas as em-


presas nos últimos dois trimestres de 2020, que estabelece a difícil ala-
vancagem para o lucro líquido das mesmas ser positivo em relação aos
vários trimestres que se antecedem.

21 KLBN4: Ativo. Fundamentus, 2020. Disponível em: https://fundamentus.com.


br/graficos.php?papel=KLBN4&tipo=1. Acesso em: 1 out. 2020.
22 SUZB3: Ativo. Fundamentus, 2020. Disponível em: https://fundamentus.com.

br/graficos.php?papel=SUZB3&tipo=1. Acesso em: 1 out. 2020.

194
MEIO AMBIENTE, MIGRAÇÕES E PANDEMIA: REFLEXÕES DO MUNDO CONTEMPORÂNEO

3.3 Lucro líquido

O lucro líquido obtido pelas empresas, resultou no prejuízo de


ambas, atrelados aos demonstrativos já ressaltados, o endividamento cor-
respondeu aos custos de larga escala para as companhias. De acordo com
Alves (2020)23, a Suzano papel e celulose registrou um prejuízo de cerca
de R$ 2 bilhões, em detrimento aos custos relacionados ao Dólar, conco-
mitante com a alta da moeda estrangeira.
Esse processo consumiu o positivo aumento da receita líquida,
derrocando fortemente o lucro líquido, como demonstra os gráficos
abaixo:

Gráfico 6: Lucro líquido da Suzano papel e celulose

Fonte: Fundamentus24

23 ALVES, Aluísio. Suzano tem prejuízo de R$ 2 bi no 2º tri com pressão do dólar


nas despesas. CNN Brasil, [S. l.], p. 1, 13 ago. 2020. Disponível em: https:
//www.cnnbrasil.com.br/business/2020/08/13/suzano-tem-prejuizo-de-r-2-bi-no-2-
tri-com-pressao-do-dolar-nas-despesas. Acesso em: 7 out. 2020.
24 SUZB3: Demonstrativos de resultados. Fundamentus, 2020. Disponível em:

https://fundamentus.com.br/graficos.php?papel=SUZB3&tipo=2. Acesso em: 1 out.


2020.

195
VICTOR HOLTIN WEISS

Gráfico 7: Lucro líquido da Klabin S.A

Fonte: Fundamentus25

O lucro líquido das empresas foi demasiadamente afetado, per-


mitindo a não observação nos gráficos acima, de prejuízos altamente sen-
tidos como o atual. Caracterizando assim um viés negativo ao setor, pois
a lucratividade não resultou numa boa relação da companhia perante seus
ganhos líquidos, as dívidas estão profundamente ancoradas no cerne des-
sas empresas.
Por meio dos gráficos, é possível reafirmar a dinâmica de distri-
buições de proventos, enquanto a Suzano papel e celulose retém os lu-
cros, a Klabin S.A remunera os acionistas por meios dos dividendos e
demais proventos.
3.4 Desempenho das ações
Todos os demonstrativos acima listados, tiveram grande parcela
na movimentação desses dois papéis na bolsa brasileira, tendo influência
nas tendências de curto prazo, porém as oscilações dentro dos meses que
sucederam março, foram obviamente imprevisíveis, alicerças em nuan-
ces complexas para o entendimento objetivo.
Ferreira, discorre sobre o assunto, citando no mês de março um
possível ensaio positivo para ambas as ações, mediante a alta do Dólar26.

25 KLBN3: Demonstrativos de resultados. Fundamentus, 2020. Disponível em:


https://fundamentus.com.br/graficos.php?papel=KLBN3&tipo=2. Acesso em: 1 out.
2020.
26 FERREIRA, Gustavo. Klabin e Suzano ensaiam recuperação na bolsa, com co-

ronavírus e tudo. Valor Investe, São Paulo, 31 mar. 2020. Disponível em: https://va-
lorinveste.globo.com/mercados/renda-variavel/empresas/noticia/2020/03/ 31/kla-
bin-e-suzano-ensaiam-recuperacao-na-bolsa-com-coronavirus-e-tudo.ghtml. Acesso
em: 7 out. 2020.

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MEIO AMBIENTE, MIGRAÇÕES E PANDEMIA: REFLEXÕES DO MUNDO CONTEMPORÂNEO

Os gráficos abaixo nos evidenciam que esse ensaio de recuperação se


concretizou na realidade, tendo os papéis se recuperado rapidamente, ob-
tendo movimentos de alta significativos em relativo curto espaço de
tempo:

Gráfico 8: Ações ordinárias27 da Klabin S.A

Fonte: Fundamentus28
Gráfico 9: Ações ordinárias da Suzano Papel e Celulose

27 “Esta é uma ação que garante a quem a possui o direito a voto e à participação nas
decisões da companhia” TORO, Equipe. Tipos de ações – ordinária e preferencial:
quais são e como investir?. TORO Investimentos, [S. l.], 20 dez. 2019. Disponível
em: https://blog.toroinvestimentos.com.br/tipos-de-acoes-ordinaria-pre ferencial.
Acesso em: 7 out. 2020.
28 KLBN3: Histórico de cotações. Fundamentus, 2020. Disponível em: https: //fun-

damentus.com.br/cotacoes.php?papel=KLBN3. Acesso em: 7 out. 2020.

197
VICTOR HOLTIN WEISS

Fonte: Fundamentus29
Os gráficos das cotações acima listados, são claramente pareci-
dos em sua essência de movimentos, o setor é estritamente interconec-
tado e isso possibilita que os resultados setoriais que se concretizam, se-
jam projetados nos diferentes papéis.
De acordo com os analistas do BTG Pactual, Correa e Greiner:
“No lado da demanda, papel e embalagem parecem estar mais fortes do
que o esperado, sugerindo que fábricas têm incrementado seus próprios
inventários por medo de disrupções na cadeia de suprimentos”30. A am-
pla gama de produtos de ordem básica que o setor de celulose e papel
produz, permitiu a singularidade de atuação no pior momento da crise.
Em relação ao conjunto de empresas representadas no índice
Ibovespa, as ações pertencentes a esse setor, demonstraram uma melhor
recuperação no curto prazo e se mantendo em tendência de alta através
dos sucessivos meses, bem evidenciado ao comparar com algumas com-
panhias inseridas em setores divergentes:

Gráfico 10: Ações ordinárias da WEG S.A

29 SUZB3: Histórico de cotações. Fundamentus, 2020. Disponível em: https: //fun-


damentus.com.br/cotacoes.php?papel=SUZB3. Acesso em: 7 out. 2020.
30 CHENG, Diana. BTG vê “janela de oportunidade” para Klabin e Suzano no

curto prazo. Money Times, [S. l.], 22 abr. 2020. Disponível em: https:// www.mo-
neytimes.com.br/btg-ve-janela-de-oportunidade-para-klabin-e-suzano-no-curto-
prazo/. Acesso em: 12 out. 2020.

198
MEIO AMBIENTE, MIGRAÇÕES E PANDEMIA: REFLEXÕES DO MUNDO CONTEMPORÂNEO

Fonte: Fundamentus31
Gráfico 11: Ações ordinárias do Banco do Brasil S.A

Fonte: Fundamentus32

Como evidencia Neira, os bancos ainda continuam descontados


na bolsa, sendo avaliados como “baratos” para a compra de suas ações.
Ao contrário de certas companhias como WEG S.A, que demonstraram
uma recuperação rápida e forte, porém no curto prazo não supera o setor

31 WEGE3: Histórico de cotações. Fundamentus, 2020. Disponível em:

https://funda mentus.com.br/cotacoes.php?papel=WEGE3. Acesso em: 7 out. 2020.


32 BBAS3: Histórico de cotações. Fundamentus, 2020. Disponível em: https://fun-

damentus.com.br/cotacoes.php?papel=BBAS3. Acesso em: 7 out. 2020.

199
VICTOR HOLTIN WEISS

de celulose e papel, que obteve uma alta mais constante nos recentes me-
ses da crise33.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

As empresas relatadas no artigo, expressaram altas significativas


no curto prazo e na sua posterior alta do preço das ações, depois do mês
de maio. As receitas crescentes que foram adquiridas nos meses da crise,
alavancaram as cotações em bolsa nesse período, direcionando os papéis
para tendências de alta.
O fator perene do setor, foi extremamente crucial para os resul-
tados da receita líquida, podendo as empresas iniciarem ciclos de cres-
centes vendas mesmo nos períodos de crise, para suprir a grande neces-
sidade de produção e distribuição dos produtos básicos essenciais. Ca-
racterizando uma vantagem competitiva perante os diversos setores da
economia brasileira e projetando no imaginário acionista, a segurança no
alto nível de dependência social ao setor.
Ao analisar parte dos demonstrativos de ambas as empresas,
pode-se afirmar que mediante o alto endividamento crescente, elas inves-
tem constantemente na compra de equipamentos para as produções e isso
acaba refletindo no substancial percentual de dívidas. Os resultados ba-
seados no lucro líquido adquirido, ao final do período, não foram positi-
vos para nenhuma das duas companhias, permitindo assim, afirmar que
as receitas dolarizadas ajudaram no direcionamento inicial perante a mo-
eda brasileira, porém as dívidas estão atreladas ao Dólar e demais moedas
estrangeiras, afetando fortemente a capacidade de reter da receita líquida
trimestral, grande parte para os pagamentos de proventos aos acionistas,
ou nos respectivos investimentos no próprio portfólio.

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203
VICTOR HOLTIN WEISS

204
SUSTENTABILIDADE E AGRONEGÓCIO:
UM ESTUDO DA ATUAÇÃO DA COMPANHIA DO
AGRONEGÓCIO AMAGGI

Dara Lopes Franco Peralta1

INTRODUÇÃO

Os níveis de degradação ambiental vêm aumentando sistemati-


camente e seus impactos já atingem dimensões planetárias. Nesse con-
texto, é fundamental a participação, não apenas de governos e organiza-
ções internacionais, mas, também, da sociedade civil e do setor empre-
sarial na busca de alternativas para minimizar os impactos da atuação do
ser humano sobre o planeta.
O objetivo da presente pesquisa é estudar a atuação da empresa
AMAGGI preocupada com a questão da sustentabilidade. A hipótese do
estudo é mostrar que existe a possibilidade de o agronegócio e a sus-
tentabilidade se aproximarem cada vez mais, não somente por pequenas
empresas, mas, também, por grandes empresas multinacionais como a
AMAGGI.
Para atingir o objetivo proposto, a pesquisa foi dividida em três
seções. Na primeira seção será discutido o agronegócio no Brasil e seus
impactos econômicos e ambientais. Na segunda seção será discutida a
atividade agrícola perante o paradigma da sustentabilidade. Por fim, na
terceira seção será discutida a atuação da AMAGGI em termos de sus-
tentabilidade no agronegócio, se dividindo em história da companhia,
números da empresa e a relação da AMAGGI para com a sustentabili-
dade.
Justifica-se a presente pesquisa pela importância de se estudar
alternativas de sucesso em setores que naturalmente determinam impac-
tos ambientais, como a agricultura, por exemplo. Justifica-se o presente
trabalho também pelo atual estágio de degradação ambiental global e
pelo movimento da sociedade civil em prol do Desenvolvimento Susten-
tável.

1Graduada em Relações Internacionais pela Universidade do Vale do Itajaí, campus


Balneário Camboriú.
DARA LOPES FRANCO PERALTA

O agronegócio, por vezes, é associado como prática negativa em


função da poluição de rios, desmatamento de áreas para o plantio, uso de
agrotóxicos prejudiciais à saúde, dentre outros fatores. Contudo, há em-
presas nesse ramo que buscam minimizar os impactos no meio ambiente,
como a AMAGGI, que vem construindo parcerias com a sociedade civil,
governos, ONGs, clientes e fornecedores, para, dessa maneira, pautar sua
atuação no conceito de Sustentabilidade.
A presente pesquisa é importante também para as Relações In-
ternacionais porque existe uma lacuna nos estudos que associam o setor
do agronegócio e a categoria Sustentabilidade. Porém, o objetivo da pre-
sente pesquisa não é esgotar o assunto, mas trazer a discussão em pauta.

1. IMPACTOS ECONÔMICOS E AMBIENTAIS DO


AGRONEGÓCIO NO BRASIL

Desde 1950 são observadas mudanças sem precedentes no meio


ambiente do planeta: a atmosfera e o oceano aqueceram, as camadas de
gelo e neve diminuíram e o nível dos oceanos subiu2. Estima-se que as
atividades humanas tenham causado cerca de 1,0°C de aquecimento glo-
bal acima dos níveis pré-industriais3. É provável que o aquecimento glo-
bal atinja 1,5°C de acréscimo, em relação ao período pré-industrial, entre
os anos de 2030 e 2052. Não é sabido o limite da capacidade da Terra em
absorver os impactos determinados pela ação humana no planeta, entre-
tanto, alguns destes limites já foram ou estão prestes a serem ultrapassa-
dos. Conforme publicação de Rockström de 2015, quatro das nove cha-
madas ‘fronteiras planetárias’ ou espaço operacional seguro para a hu-
manidade, que abordam a sustentabilidade de forma sistêmica, já foram
ultrapassadas4. Foram transpostas: A mudança no uso da terra; Os fluxos
biogeoquímicos; As mudanças climáticas e a Perda da integridade da bi-
osfera. As duas últimas5, são limites fundamentais que tem a capacidade
de levar o planeta à catástrofe, e os humanos são os culpados dessa mu-
dança global sistêmica.

2 EMBRAPA. Mudança do Clima. Disponível em: https://www.embrapa.br/visao/


mudanca-do-clima. Acesso em: 20 mar. 2020.
3 IPCC. Aquecimento Global de 1,5°C. Disponível em: https://www.ipcc.ch/site/

assets/uploads/2019/07/SPM-Portuguese-version.pdf. Acesso em: 20 mar. 2020.


4 ROCKSTRÖM, Johan et al. Planetary boundaries: Guiding human development on

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cemag.org/content/347/6223/1259855. Acesso em: 24 ago. 2020.
5 ALVES, J. E. D. Fronteiras Planetárias 2.0. Disponível em: http://www.ihu.uni

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206
MEIO AMBIENTE, MIGRAÇÕES E PANDEMIA: REFLEXÕES DO MUNDO CONTEMPORÂNEO

As questões relacionadas com a qualidade ambiental global con-


figuram um desafio que envolve não apenas os países e as Organizações
Internacionais. A sociedade civil em geral e o empresariado também têm
um papel importante nesse processo. Existem diversas atividades empre-
sariais que determinam impactos no meio ambiente, nos mais variados
setores da economia, inclusive na agricultura, que podem causar a extin-
ção de espécies, mudanças climáticas, poluição dos rios e mares, derre-
timento das geleiras, chuva ácida, diminuição da camada de ozônio,
perda da diversidade biológica, erosões, que causam mal também a saúde
humana e assim, precisam ter uma atenção especial com a questão da
Sustentabilidade.
No Brasil, em especial, o setor agrícola tem uma importância
singular. O país é o maior exportador de grãos do planeta, sendo o pri-
meiro colocado tanto nas exportações de soja quanto nas exportações de
milho6. Segundo a Sociedade Nacional da Agricultura7, o agronegócio é
a junção de inúmeras atividades que envolvem, de forma direta ou indi-
reta, toda a cadeia produtiva agrícola ou pecuária. O agronegócio envolve
todas as atividades da cadeia agroindustrial: antes da porteira (sementes,
defensivos, máquinas e implementos), dentro da porteira (agropecuária
básica ou primária), e depois da porteira (indústria e serviços), envol-
vendo o processamento, a distribuição e o consumo.
De acordo com algumas estimativas8, a expansão da agricultura
é o fator dirigente de aproximadamente 80% do desmatamento mundial.
Entre 2000 e 2010, o agronegócio foi responsável por quase 70% do des-
matamento na América Latina9, no Brasil entre os anos de 1990 e 2005,
80% do desmatamento decorreu de pasto10, esses dados demonstram o
quão necessário é repensar em uma melhor utilização da terra agro como
a restauração dessas áreas, respeito às jurisdições na luta contra o desma-
tamento, e a utilização sustentável dos recursos naturais daquela área.

6 GRANADOS, Ó. Com supersafra em 2020, Brasil retoma o trono mundial da


soja. 09 abr. 2020. Disponível em: https://brasil.elpais.com/economia/2020-04-
08/com-supersafra-em-2020-brasil-retoma-o-trono-mundial-da-soja.html. Acesso
em: 24 ago. 2020.
7 SNA. Agronegócio: a força da economia brasileira. Disponível em: https://www.

sna.agr.br/agronegocio/. Acesso em: 14 ago. 2020.


8 FAO. State of the world’s forest. Disponível em: http://www.fao.org/3/a-i55

88e.pdf. Acesso em: 25 ago. 2020.


9 FAO. FAO: Agronegócio foi responsável por quase70% do desmatamento na Amé-

rica Latina. Disponível em: http://www.fao.org/americas/noticias/ver/pt/c/ 425810/.


Acesso em: 18 set. 2020.
10 FAO. State of the world’s forest. Disponível em: http://www.fao.org/3/a-i558

8e.pdf. Acesso em: 18 set. 2020.

207
DARA LOPES FRANCO PERALTA

O gráfico a seguir11 mostra as proporções totais de terra ocupada


pela agricultura, florestas e outras terras utilizadas em diversas regiões
do mundo em 2010. A Ásia no gráfico tem a maior proporção de terra
utilizada para agricultura (52 %) e a menor proporção de terra para flo-
resta (19%), a Europa, incluindo a Federação Russa, tem a menor pro-
porção de terra utilizada para agricultura (21%) e a segunda maior pro-
porção de floresta (46%). Globalmente a agricultura conta com mais de
um terço de área no mundo (37.7%), enquanto floresta (30.7%) e “ou-
tros” com (31.6%) são terras não categorizadas como para agricultura ou
floresta.

Gráfico 1: Área de terra por classe principal de uso da terra em 2010.

Fonte: FAO (2020)12

Os ecossistemas agrícolas são incrivelmente bons na produção


de alimentos, mas os rendimentos aumentados têm custos ambientais que
não podem ser ignorados, especialmente se as taxas de fertilização com
nitrogênio e fósforo triplicarem e a quantidade de terra irrigada dobra13.
A tradição na agricultura tem sido maximizar a produção e minimizar o
custo dos alimentos, com pouca consideração aos impactos ao meio am-
biente e aos serviços que presta à sociedade. Segundo a Agência Nacio-
nal de Águas e o Fundo das Nações Unidas para Agricultura e Alimen-
tação, a cada 100 litros de água tratada produzidos no Brasil, 72 vão para
o agronegócio. Isso significa dizer que 70% do abastecimento é endere-
çado à agricultura e à pecuária14.

11 FAO. State of the world’s forests. Disponível em: http://www.fao.org/3/a-i558


8e.pdf. Acesso em:25 ago. 2020.
12 FAO. State of the world’s forest. Disponível em: http://www.fao.org/3/a-i558

8e.pdf. Acesso em: 25 ago. 2020.


13 TILMAN, D. Global environmental impacts of agricultural expansion: The

need for sustainable and efficient practices. PNAS. Disponível em: https://www.
pnas. org/content/96/11/5995. Acesso em: 24 mar. 2020.
14 ANA. Maior consumidor de água no Brasil, setor agrícola se defende e prega

a precificação, educação e investimentos como soluções. Disponível em: http://

208
MEIO AMBIENTE, MIGRAÇÕES E PANDEMIA: REFLEXÕES DO MUNDO CONTEMPORÂNEO

Conforme o Censo Agro de 2017, o uso de agrotóxicos aumen-


tou 24% em relação ao último Censo de 2006, o que representa perto de
1.700 fabricantes que utilizam produtos prejudiciais à saúde. O contato
com agrotóxicos é perigoso para a saúde e pode ocorrer de várias formas,
seja por inalação, ingestão ou contato do produto com a pele e mucosas,
em infecção por ar e água contaminados, roupas e equipamentos de tra-
balho de profissionais que manuseiam o produto, áreas de aplicação e até
mesmo alimentos com resíduos do produto15. Cerca de 193 mil pessoas
no mundo perdem a vida todos os anos por exposição a substâncias quí-
micas nocivas, segundo Joaquín Molina16. O Brasil se destaca no cenário
mundial como o maior consumidor de agrotóxicos, respondendo na
América Latina por 86% dos produtos. Do total de agrotóxicos consumi-
dos no Brasil, 58% são herbicidas, 21% inseticidas, 12%, fungicidas, 3%
acaricidas e 7% são outros17.
Paralelamente aos impactos determinados pela atividade agrí-
cola no Brasil, é importante destacar o papel que a agricultura tem no
Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro. Os números falam por si, em
2019, o Cálculo do PIB do agronegócio brasileiro foi de R$ 1.552.995,
compreendendo insumos, agropecuária, indústria e serviços. A participa-
ção da agricultura no PIB do Brasil em porcentagem no mesmo ano foi
de 21,4%, compreendendo também insumos com 1,1%, agropecuária
com 4,8%, indústria com 6,4% e serviços com 9,0%18.

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209
DARA LOPES FRANCO PERALTA

Gráfico 02: Participação do Agronegócio no PIB em termos percentu-


ais.

Fonte: Elaborado pela autora a partir de dados extraídos de CEPEA ESALQ USP
(2020)19

De 1996 a 2019 a participação do agronegócio no Produto In-


terno Bruto em milhões de reais foi de R$ 272.346 em 1996, dentro do
PIB brasileiro total de 854.764, para R$ 1.552.995 em 2019, dentro do
PIB brasileiro de um total de 7.256.926. A despeito da diminuída da par-
ticipação no PIB brasileiro, historicamente o agronegócio tem maior ati-
vidade, em seguida se encontra a indústria e logo depois serviços20. Ape-
sar da pandemia de covid-19, O PIB do agronegócio no ano de 2020 teve
crescimento nos primeiros 5 meses, foi um crescimento de 0.78%, dessa
forma o setor aumentou para 4,62% de janeiro a maio21, equivalente a 76
bilhões de reais, o ramo pecuário teve um aumento de 9% equivalente a
48 bilhões de reais e o ramo agrícola teve um aumento 2,51 equivalente
a 28 bilhões de reais. Conforme a ABAGRP22, o saldo da balança comer-
cial brasileira somente é positivo por causa do agro. No ano de 2018 o
superávit da balança em si, foi de 58,6 bilhões de dólares enquanto o
superávit do agronegócio foi de 87,6 bilhões de dólares, os demais seto-
res como indústria e serviços tiveram déficit de 28,9 bilhões de dólares.
A participação do agronegócio no total de ocupação do país23 no primeiro

19 CEPEA. PIB do agronegócio brasileiro. Disponível em: https://www.cepea.

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ALMEIDA, A. M.; SILVA, A.D.; FACHINELLO, A. L. Mercado de trabalho do

210
MEIO AMBIENTE, MIGRAÇÕES E PANDEMIA: REFLEXÕES DO MUNDO CONTEMPORÂNEO

trimestre de 2019 foi de 18.069.561 do total de 91.863.045 correspon-


dendo a 19,66%. No primeiro trimestre de 2020 foi de 17.967.633 de um
total de 92.223.396 correspondendo a 19,48%. Os números se referem
aos trabalhadores por conta própria, empregadores, empregados com car-
teira assinada, sem carteira assinada e outros. O agronegócio brasileiro
emprega um contingente de 19 milhões de pessoas, os números se refe-
rem ao total de trabalhadores no campo e nas empresas ligadas à cadeia
do agronegócio24. O faturamento em real das exportações do agronegócio
no período de janeiro/junho de 2019 a janeiro/junho de 2020 foi de
32.2%25. Segundo a Organização das Nações Unidas para Alimentação e
Agricultura26, o Brasil é o segundo maior fornecedor mundial de produ-
tos agrícolas e fornecedor de alimento, o país está apto a se tornar o maior
fornecedor, tendo a capacidade de satisfazer a demanda mundial adicio-
nal. No Brasil 30,2% das terras são ocupadas pela agropecuária, sendo
7,8% para a produção de grãos, hortaliças, frutas e culturas perenes, 1,2%
cobertos por florestas plantadas, 21,2 são pastagens, sendo 8% nativas e
13,2% plantadas27. De acordo com a FAO28 as exportações do milho bra-
sileiro aumentaram para 29,5 milhões de toneladas em 2019/20, 15% a
mais do que no ano de 2018/19, isso coloca o Brasil como o segundo
maior exportador de milho no mundo, logo após dos Estados Unidos, e
em 2012/13 o Brasil já foi o maior exportador de milho no mundo du-
rante uma estiagem severa nos Estados Unidos. Percebe-se, portanto, que
o agronegócio é muito importante, tanto na questão econômica quanto na
questão ambiental.
Os principais impactos ambientais relacionados às atividades
agrícolas são29: I) desmatamentos e queimadas; II) compactação,

agronegócio brasileiro. Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada, Pi-


racicaba, 2020.
24 SETOR. Agronegócio brasileiro emprega 19 milhões de pessoas. 26 dez. 2016.

Disponível em: http://g1.globo.com/economia/agronegocios/agro-a-industria-ri-


queza-do-brasil/noticia/2016/12/agronegocio-brasileiro-emprega-19-milhoes-de-
pessoas. html. Acesso em 23 ago. 2020.
25 CEPEA. Índices de exportação do agronegócio. Disponível em: https://www.

cepea.esalq.usp.br/br/indices-de-exportacao-do-agronegocio.aspx. Acesso em: 31


ago. 2020.
26 FAO. Perspectivas Agrícolas 2015-2024. Disponível em: http://www.fao.org/

3/a-i4761o.pdf. Acesso em: 31 ago. 2020.


27 ABAGRP. Uso das Terras. Disponível em: https://www.abagrp.org.br/uso-das-

terras. Acesso em:31 ago. 2020.


28 FAO. FAO no Brasil. Disponível em: http://www.fao.org/brasil/noticias/detail-

events/pt/c/1194128/. Acesso em: 31 ago. 2020.


29 VILLELA, P. Impactos ambientais da modernização agropecuária em Goiás.

Disponível em: http://pnla.mma.gov.br/teses-dissertacoes-e-artigos?download=19:

211
DARA LOPES FRANCO PERALTA

impermeabilização e empobrecimento dos solos; III) aparecimento de


processos erosivos, arenizações e desertificação; IV) poluição e contami-
nação do solo e água por agrotóxicos e excrementos; V) emissão de gases
de efeito estufa; VI) perda da biodiversidade etc.
A agricultura é uma das responsáveis pelo aumento de tempera-
tura: as emissões do setor, somadas ao desmatamento para a conversão
de terras para o cultivo, representam algo entre 17% e 32% de todas as
emissões de gases do efeito estufa provocadas por atividades humanas,
esses são cálculos independentes de Pete Smith, um dos autores do capí-
tulo de agricultura do relatório do IPCC30.
Segundo o relatório da FAO, “O Estado das Florestas do Mundo
2016”, o agronegócio foi o principal causador do desmatamento é o prin-
cipal causador do desmatamento na América Latina, onde gerou 70% do
desmatamento entre 2000 e 2010. Em países tropicais e subtropicais31, a
agricultura comercial e a agricultura de subsistência em larga escala, cor-
respondeu a 73% de desmatamento, com variações regionais significati-
vas32.
Como observado, apesar de sua importância econômica, a ativi-
dade agrícola pode determinar impactos ambientais expressivos. Nesse
sentido, conciliar a atividade agrícola ou o agronegócio com a crescente
preocupação com a Sustentabilidade tem se tornado um desafio para o
setor.

2 ATIVIDADE AGRÍCOLA PERANTE O PARADIGMA DA


SUSTENTABILIDADE

O Direito Internacional tem se movimentado desde a década de


1970 para fazer frente à degradação ambiental global. Nesse sentido, vá-
rias conferências e convenções foram realizadas, as principais foram: a
Conferência de Estocolmo, primeira grande conferência das Nações

impactos-ambientais-da-modernizacao-agropecuaria-em-goias&start=20. Acesso
em: 26 ago. 2020.
30 AGRITEMPO. Aquecimento Global e a nova geografia da produção agrícola

no Brasil. Ago. 2008. Disponível em: https://www.agritempo.gov.br/climaeagri cul-


tura/CLIMA_E_AGRICULTURA_BRASIL_300908_FINAL.pdf. Acesso em: 22
mar. 2020.
31 FAO. State of the world’s forests. Disponível em: http://www.fao.org/3/a-i558

8e.pdf. Acesso em: 22 mar. 2020.


32 FAO. Agronegócio foi responsável por quase 70% do desmatamento na Amé-

rica Latina. 18 jul. 2016. Disponível em: http://www.fao.org/americas/noti


cias/ver/pt/c/425810/. Acesso em: 22 mar. 2020.

212
MEIO AMBIENTE, MIGRAÇÕES E PANDEMIA: REFLEXÕES DO MUNDO CONTEMPORÂNEO

Unidas33 para o Meio Ambiente que marcou uma virada no desenvolvi-


mento da política ambiental, na conferência se preocupou principalmente
com a proteção da biodiversidade, desenvolvimento sustentável, meio
ambiente como um direito humano, a cooperação entre os países e a for-
mulação dessas políticas em relação aos países em desenvolvimento34. A
ECO 92, segunda Conferência das Nações Unidas para o Meio Ambi-
ente, buscava reverter os efeitos da degradação ambiental para promover
o desenvolvimento sustentável em todos os países. A conclusão em que
se chegou a conferência, foi de que deve agregar os elementos econômi-
cos, sociais e ambientais para que haja a sustentabilidade do desenvolvi-
mento35. A cúpula de Johanesburgo, também conhecida como RIO + 10,
foi a terceira Conferência das Nações Unidas para o Meio Ambiente e se
preocupou principalmente com a pobreza, demonstrando que os seres hu-
manos estão no centro das preocupações com o Desenvolvimento Sus-
tentável. A quarta e última conferência realizada foi a RIO + 20 em 2012,
essa teve o objetivo de renovar o compromisso político com o desenvol-
vimento sustentável36. Contudo, a preocupação com essas e outras diver-
sas questões de Sustentabilidade, Desenvolvimento Sustentável e degra-
dação ambiental não devem ser apenas do Direito Internacional, mas,
sim, de todos, como já havia sido acentuada na Cúpula de Johanesburgo,
onde as contribuições e preocupações precisavam ser nos níveis local,
regional, nacional e internacional, com atores não governamentais nas
mais diversas áreas da sociedade civil, como o setor produtivo, os sindi-
catos, a comunidade científica e acadêmica, mas a preocupação também
precisa ser do meio privado, porque grandes empresas hoje têm o poder
de competir em muitas áreas com o Estado, assim como pequenas em-
presas têm o poder de fazer a diferença no longo prazo.
O cuidado para com o meio ambiente, interligando suas questões
com política e economia, remete ao seguinte questionamento: como

33 ONU. Organização das Nações Unidas. Conferência das Nações Unidas sobre o
Meio Ambiente Humano. Conferência de Estocolmo. Disponível em: https:// sus-
taina bledevelopment.un.org/milestones/humanenvironment. Acesso em: 22 mar.
2020.
34 LAGO, A. Estocolmo, Rio, Johanesburgo o Brasil e as três conferências ambi-

entais das nações unidas. Disponível em: http://funag.gov.br/loja/download/ 903-


Estocolmo_Rio_Joanesburgo.pdf. Acesso em: 22 mar. 2020.
35 SENADO FEDERAL. Conferência Rio-92 sobre o meio ambiente do planeta:

desenvolvimento sustentável dos países. Disponível em: http://www.senado.


gov.br/noticias/Jornal/emdiscussao/rio20/a-rio20/conferencia-rio-92-sobre-o-meio-
ambiente-do-planeta-desenvolvimento-sustentavel-dos-paises.aspx. Acesso em:09
set.2020.
36 COMITÊ NACIONAL DE ORGANIZAÇÃO RIO+20 2011. Sobre a Rio+20.

Disponível em: http://www.rio20.gov.br/sobre_a_rio_mais_20.html. Acesso em: 14


ago. 2020.

213
DARA LOPES FRANCO PERALTA

conciliar a preservação ambiental com uma atividade que, apesar de ine-


gavelmente importante para a sociedade, é também uma atividade que,
inerentemente, determina impactos ambientais? Duas terminologias são
bem aplicadas a este questionamento e auxiliam as tentativas de equaci-
onamento do questionamento proposto: Desenvolvimento Sustentável e
Sustentabilidade.
A definição do termo Desenvolvimento Sustentável foi cunhada
no Relatório da Comissão Mundial do Meio Ambiente e Desenvolvi-
mento de 1987, segundo o relatório, o desenvolvimento sustentável37 é o
desenvolvimento que encontra as necessidades atuais sem comprometer
a habilidade das futuras gerações de atender suas próprias necessidades.
O relatório organizado pela ONU, conhecido como Nosso Futuro Co-
mum ou Relatório Brundtland38 apontava várias áreas nas quais progres-
sos poderiam ser feitos nos países ricos sem custos excessivos, no con-
texto onde se fortalecia nova fase de atribuição de todos os males aos
países em desenvolvimento ou aos países do bloco socialista. O Relatório
se atenta a mostrar que existem dois conceitos importantes, o das neces-
sidades dos pobres do mundo, às quais prioridade absoluta deve ser dada,
e o conceito de limitações impostas pelo estado da tecnologia social, à
capacidade do ambiente de atender às necessidades presentes e futuras.
Assim se percebe que quanto maior a igualdade entre as pessoas maior é
a possibilidade de se alcançar melhor o Desenvolvimento Sustentável
que consequentemente atenderá as necessidades das gerações que virão.
O Relatório traz consigo apontamentos sobre os sintomas e causas do
futuro ameaçado da humanidade. A pobreza como um fator poluidor pelo
fato de que os mais pobres e famintos por vezes destroem seu ambiente
imediato para sobreviver, derrubando florestas, colocando animais para
pastar em excesso e abusando de terras marginais.
Pouca coisa mudou desde o Relatório Brundtland até os dias de
hoje, parte dessa estagnação pode ser entendida pelas metas não bem de-
finidas, como por exemplo, no escopo para ação nacional do relatório
onde governos precisam reforçar e expandir estratégias existentes, mas
não há indicações de medidas, prazos ou até mesmo instituições fiscali-
zadoras. Segundo o documento Década das Nações Unidas da Educação
para o Desenvolvimento Sustentável 2005-2014, com o crescimento da
economia, intensificam-se as pressões sobre os sistemas e recursos natu-
rais da Terra. Desse modo, de 1950 até 1997 o uso da madeira para cons-
trução triplicou; o uso do papel cresceu seis vezes mais; a pescaria quase

37 NAÇÕES UNIDAS BRASIL. A ONU e o meio ambiente. Disponível em:

https://nacoesunidas.org/acao/meio-ambiente/. Acesso em: 24 ago. 2020.


38 LAGO, A. Estocolmo, Rio, Johanesburgo o Brasil e as três conferências ambi-

entais das nações unidas. Disponível em: http://funag.gov.br/loja/download /903-


Estocolmo_Rio_Joanesburgo.pdf. Acesso em: 22 mar. 2020.

214
MEIO AMBIENTE, MIGRAÇÕES E PANDEMIA: REFLEXÕES DO MUNDO CONTEMPORÂNEO

quintuplicou; o consumo de grãos quase triplicou; o combustível fóssil


quase quadruplicou; e os poluentes do ar e da água multiplicaram-se vá-
rias vezes39.
De acordo com o relatório Brundtland, a compatibilidade dos
objetivos ambientais e econômicos é muitas vezes perdida na busca de
ganhos individuais ou em grupo, com pouca consideração pelos impactos
sobre os outros. São necessárias mudanças nas atitudes e nos procedi-
mentos das empresas do setor público e privado. Além disso, a regula-
mentação ambiental deve ir além das costumeiras regulamentações de
segurança, leis de zoneamento e promulgações de controle de poluição;
os objetivos ambientais devem ser incorporados à tributação, procedi-
mentos de aprovação prévia para escolha de investimento e tecnologia,
incentivos ao comércio exterior e todos os componentes da política de
desenvolvimento. A integração de fatores econômicos e ecológicos na lei
e nos sistemas de tomada de decisão nos países deve ser comparada em
nível internacional. O crescimento do uso de combustível e material de-
termina que as ligações físicas diretas entre os ecossistemas de diferentes
países aumentarão. As interações econômicas por meio de comércio, fi-
nanças, investimentos e viagens também crescerão e aumentarão a inter-
dependência econômica e ecológica. Ficam evidentes os níveis da degra-
dação ambiental do planeta na época do relatório, em função da tentativa
de conciliar os objetivos ambientais com os objetivos econômicos, o Re-
latório Brundtland foi um alerta ao mundo, mostrando que algo deveria
ser feito em relação aos problemas ambientais globais.
Apesar da importância do relatório Brundtland e do conceito de
Desenvolvimento Sustentável, alguns autores levantam ou desenvolvem
algumas críticas quanto à maneira como esse conceito vem sendo utili-
zado nas últimas décadas. Nesse sentido, de acordo com Leonardo
Boff40:

É contraditório, pois, desenvolvimento e Sustentabilidade


obedecem a lógicas que se contrapõem. O desenvolvimento
realmente existente é linear, crescente, explora a natureza e
privilegia a acumulação privada. É a economia política de viés
capitalista. A categoria Sustentabilidade, ao contrário, provém
das ciências da vida e da ecologia, cuja lógica é circular e in-
cludente. Representa a tendência dos ecossistemas ao

39 UNESCO. Década da Educação das Nações Unidas para o Desenvolvimento


Sustentável, 2005-2015: documento final do esquema internacional de implementa-
ção. Brasília, 2005. Disponível em: http://www.unesco.org.br. Acesso em: 10 ago.
2020.
40 BOFF, L. Crítica ao modelo-padrão de sustentabilidade. 29 jan. 2012. Disponí-

vel em: https://leonardoboff.org/2012/01/29/criticaao-modelo-padrao-de-Susten ta-


bilidade/. Acesso em: 07 abr. 2020.

215
DARA LOPES FRANCO PERALTA

equilíbrio dinâmico, à interdependência e à cooperação de to-


dos com todos. Como se depreende: são lógicas que se auto-
negam: uma privilegia o indivíduo, a outra o coletivo, uma en-
fatiza a competição, a outra a cooperação, uma a evolução do
mais apto, a outra a co-evolução de todos interconectados.

O pensamento de Leonardo Boff está de acordo com o Relatório


Brundtland41:

Há sempre o risco de que o crescimento econômico prejudique


o meio ambiente, uma vez que ele aumenta a pressão sobre os
recursos ambientais. Mas os planejadores que se orientam pelo
conceito de Desenvolvimento Sustentável terão de trabalhar
para garantir que as economias em crescimento permaneçam
firmemente ligadas a suas raízes ecológicas e que essas raízes
sejam protegidas e nutridas para que se possam dar apoio ao
crescimento a longo prazo. Portanto, a proteção ao meio am-
biente é inerente ao conceito de Desenvolvimento Sustentável,
na medida em que visa mais às causas que os sintomas dos
problemas do meio ambiente.

Enquanto a ideia de Desenvolvimento Sustentável é algo que


está em constante movimento, a ideia de Sustentabilidade traz um sentido
de conclusão, apesar da multiplicidade de sentidos. Para Carvalho42, um
dos fatores que contribuem para que a ideia de Sustentabilidade mante-
nha esta alta polissemia é, além da disputa de interesses e projetos polí-
ticos que ela abarca, certa indiferenciação entre os diferentes contextos
discursivos, sociais e epistemológicos onde ela é aplicada. A autora
elenca três níveis do conceito de Sustentabilidade, a) como fenômeno
empírico, que alude, portanto, a ações e processos concretos que são de-
nominados — ou se autodenominam —sustentáveis, principalmente na
esfera econômica. b) como fenômeno ideológico, onde se disputa o sen-
tido verdadeiro e correto do conceito contra seu uso falso e ilegítimo. c)
como categoria compreensiva para (re)pensar o mundo, um modelo de
compreensão da realidade.

41 Commission on Environment and Development. Report of the World Commis-


sion on Environment and Development: Our Common Future. Disponível em:
https://sustainabledevelopment.un.org/content/documents/5987our-common-fu-
ture.pdf. Acesso em: 05 abr. 2020.
42 CARVALHO, I. C. M. Educação para sociedades sustentáveis e ambientalmente

justas. REMEA-Revista Eletrônica do Mestrado em Educação Ambiental, dez


2008. Disponível em: https://periodicos.furg.br/remea/article/view/3387/2033.
Acesso em: 05 abr. 2020.

216
MEIO AMBIENTE, MIGRAÇÕES E PANDEMIA: REFLEXÕES DO MUNDO CONTEMPORÂNEO

De acordo com Leonardo Boff43 a Sustentabilidade fundamen-


talmente significa o conjunto de processos e ações que se destinam a
manter a vitalidade e a integridade da Mãe Terra, a preservação de seus
ecossistemas com todos os elementos físicos, químicos e ecológicos que
possibilitam a existência e a reprodução da vida, o atendimento das ne-
cessidades da presente e das futuras gerações, e a continuidade, a expan-
são e a realização das potencialidades da civilização humana em suas
várias expressões. Ele entende que a Sustentabilidade em si, é um modo
de ser e de viver que exige alinhar as práticas humanas às potencialidades
limitadas de cada bioma e às necessidades das presentes e futuras gera-
ções.
A Sustentabilidade representa uma mudança de paradigma fun-
damental, ela transforma valores humanos, visões políticas e as “regras
do jogo” da sociedade através da: “eficiência econômica em relação à
equidade social, dos direitos individuais às obrigações coletivas, do ego-
ísmo à comunidade, da quantidade à qualidade, da separação à interde-
pendência, da exclusão à igualdade de oportunidades, dos homens às mu-
lheres, do luxo à necessidade, da repressão à liberdade, do hoje para o
amanhã e do crescimento que beneficia alguns ao desenvolvimento hu-
mano genuíno que beneficia a todos nós44.
Diversos autores trazem os conceitos Sustentabilidade e Desen-
volvimento Sustentável como sinônimos, porém, como foi exposto, o
Desenvolvimento Sustentável traz consigo o perigo da aproximação com
a questão econômica, como mostra Leonardo Boff45 [...] “O desenvolvi-
mento realmente existente é linear, crescente, explora a natureza e privi-
legia a acumulação privada. É a economia política de viés capitalista
[...]”. A Sustentabilidade por outro lado tem sentido de completude e de
conclusão, para manter a vitalidade e a integridade da Terra46, tem sen-
tido de conciliação das questões ambientais com as questões sociais. Para
a presente pesquisa, se utilizará a terminologia Sustentabilidade, porque
se partiu do pressuposto de que o Desenvolvimento Sustentável é um dos
caminhos para se atingir a Sustentabilidade, assim como Gabriel Ferrer
explicita, Sustentabilidade deve ser entendida como a meta global a ser

43 BOFF, L. Sustentabilidade: o que é – o que não é. Petrópolis: Vozes, 2015. E-


book.
44 ELKINGTON J. Cannibals with Forks: The Triple Bottom Line of 21st Century

Business. Capstone, 1999. E-book.


45 BOFF, L. Crítica ao modelo-padrão de sustentabilidade. 29 jan. 2012. Disponí-

vel em: https://leonardoboff.org/2012/01/29/critica-ao-modelo-padrao-de-Susten ta-


bilidade/. Acesso em: 07 abr. 2020.
46 BOFF, L. Sustentabilidade: o que é – o que não é. Petrópolis: Vozes, 2015. E-

book.

217
DARA LOPES FRANCO PERALTA

atingida e o Desenvolvimento Sustentável como um dos instrumentos


que devem permitir sua consecução47.
A preocupação com a relação entre agricultura e sustentabili-
dade pode ser expressa também, pela agenda 2030. A agenda 203048 é
um plano de ação focado na melhoria de vida do planeta e das pessoas,
visando paz, prosperidade e parceria. Tendo foco nos meios de imple-
mentação, mobilização de recursos financeiros, capacitação e tecnologia,
além de dados e instituições. Esses objetivos são universais e aplicados
a todos os países, enquanto os ODM (Objetivos de desenvolvimento do
milênio) eram apenas destinados aos países em desenvolvimento, os
ODS também são mais abrangentes porque dão base para enfrentar os
antigos desafios que se intensificaram assim como os novos desafios
mais complexos que existem atualmente. No Brasil, o Instituto Brasileiro
de Geografia e Estatística (IBGE) em conjunto com o Instituto de Pes-
quisa Econômica Aplicada (IPEA) produzem a readequação das metas
dos ODS para o país, pois apesar de as metas serem universais, não de-
vem ser uniformes, cada nação precisa fazer uma readequação à sua rea-
lidade. Importante ressaltar que os ODS não são juridicamente vinculan-
tes49, portanto é necessário que os países entendam a urgência de resolu-
ção dos problemas mundiais por meio de objetivos, esses por serem de-
finidos e terem uma data limite fazem com que sejam melhor alcançados.
As nações têm a responsabilidade primária de fazer o acompanhamento
e revisão nos níveis nacional, regional e global dos progressos realizados
para a implementação dos ODS até 2030. Na Agenda 203050, o segundo
Objetivo do Desenvolvimento Sustentável é a Fome Zero e Agricultura
Sustentável, ela pretende acabar com todas as formas de fome e má nu-
trição até 2030 de modo a garantir que todas as pessoas - especialmente
as crianças - tenham acesso suficiente a alimentos nutritivos durante to-
dos os anos. Para alcançar esse objetivo é necessário promover práticas
agrícolas sustentáveis por meio do apoio à agricultura familiar, do acesso
equitativo à terra, à tecnologia e ao mercado. O ODS da Fome Zero e

47 CRUZ, P. M.; FERRER, G. R. Direito, Sustentabilidade e a Premissa Tecnológica


como Ampliação de seus Fundamentos. Sequência, Florianópolis, n. 71, p. 239-278,
2105. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid
=S2177-70552015000200239&lng=en&nrm=iso. Acesso em: 23 mai. 2020.
48 NAÇÕES UNIDAS BRASIL. Transformando Nosso Mundo: A Agenda 2030

para o Desenvolvimento Sustentável. Disponível em: https://nacoesunidas.org/pos


2015/agenda2030/. Acesso em: 24 ago. 2020.
49 PNUD. As perguntas mais frequentes sobre os objetivos do desenvolvimento

sustentável. Disponível em: https://www.br.undp.org/content/dam/brazil/docs/ODS


/Projeto%20ODS_FAQ%20-.pdf. Acesso em: 02 out. 2020.
50 NAÇÕES UNIDAS BRASIL Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentá-

vel. Disponível em: https://nacoesunidas.org/tema/agenda2030/. Acesso em: 07 abr.


2020.

218
MEIO AMBIENTE, MIGRAÇÕES E PANDEMIA: REFLEXÕES DO MUNDO CONTEMPORÂNEO

Agricultura Sustentável51 está em quarto lugar dentre os objetivos com


mais indicadores produzidos no país, esses, dão a dimensão técnica das
políticas públicas para o alcance dos ODS52, de 14 indicadores, sete fo-
ram produzidos, sendo estes: subsídios às exportações agrícolas, o total
de fluxos oficiais para o setor agrícola, índice de orientação agrícola par
a despesa pública, números de recursos genéticos vegetais e animais para
a alimentação e agricultura, protegidos a médio ou longo prazo em ins-
talação de conservação, a prevalência de mal nutrição nas crianças com
menos de 5 anos de idade, por tipo de mal nutrição, a prevalência de
atrasos no crescimento nas crianças com menos de 5 anos de idade e pre-
valência de insegurança alimentar moderada ou grave, baseado na Escala
de Experiência de Insegurança Alimentar (FIES). Quatro estão em aná-
lise/construção e três estão sem dados.
Segundo o Relatório “Nosso Futuro em Comum” de 1987, ainda
atual, é necessário que haja mudança de atitudes e objetivos e de arranjos
institucionais em todos os níveis. As preocupações econômicas e ecoló-
gicas não estão necessariamente em oposição, como por exemplo, polí-
ticas que conservam a qualidade das terras agrícolas e protegem as flo-
restas melhoram as perspectivas de longo prazo para o desenvolvimento
agrícola.
Apesar de inegável importância nas definições de Desenvolvi-
mento Sustentável e Sustentabilidade, da realização das Conferências e
Convenções sobre o Meio Ambiente e das resoluções que saem dessas
conferências, os Estados estão mais preocupados com os ganhos econô-
micos do que com os ganhos ambientais, cada país busca seu próprio
interesse e não busca uma comunidade internacional unida em favor dos
problemas globais, como o aumento da temperatura e a escassez dos re-
cursos naturais. É indispensável que a Sociedade Civil em totalidade, ou,
pelo menos, em sua grande maioria, com Estados, Terceiro Setor e Em-
presas Privadas como as do agronegócio que causam grande impacto am-
biental, estejam em elevados níveis de cooperação para que de fato haja
transformações e não apenas Convenções com promessas que não se tor-
nam realidade em sua maioria, com algumas exceções. A atividade agrí-
cola nesse sentido não precisa valorizar o meio ambiente apenas pela
contribuição que ele traz para a produção de riqueza econômica e apenas
pelo retorno financeiro que ela traz, mas é necessário haver uma

51 ODS BRASIL. Relatório dos Indicadores para os Objetivos do Desenvolvi-

mento Sustentável. Disponível em: https://odsbrasil.gov.br/relatorio/sintese. Acesso


em: 02 out. 2020.
52 VERDÉLIO, A. Desenvolvimento Sustentável: 231 indicadores vão medir o pro-

gresso dos ODS. Disponível em: https://agenciabrasil.ebc.com.br/geral/noticia/


2016-04/desenvolvimento-sustentavel-231-indicadores-vao-medir-progresso-dos-
ods. Acesso em: 02 out. 2020.

219
DARA LOPES FRANCO PERALTA

mentalidade voltada de fato para a sustentabilidade53. A mudança de


mentalidade leva investimento de tempo, estudo e vontade de mudança,
a percepção para esse trabalho de transição paira sobre o dia a dia, com
o aumento constante da temperatura, a escassez de água em alguns luga-
res do mundo, perda da biodiversidade por meio do desmatamento e
queimadas, mas há uma ausência em geral de investimento para uma mu-
dança de mentalidade. A atividade agrícola por causar boa parte dos im-
pactos negativos no meio ambiente tem grande dever para a conservação
de recursos e se possível até mesmo reverter os níveis anteriores à degra-
dação, justamente por tamanhos impactos causados e retorno econômico,
a atividade agrícola tem o papel e o dever de estar em harmonia com o
paradigma da sustentabilidade. A preocupação para com a agricultura
sustentável envolve além das políticas públicas e políticas internacionais,
uma atuação responsável por parte do setor empresarial. As empresas que
atuam nesse segmento não podem ser parte do problema, mas sim começar
a fazer parte da solução.

3 ATUAÇÃO DA AMAGGI EM TERMOS DE


SUSTENTABILIDADE NO AGRONEGÓCIO

A atividade agrícola determina impactos no meio ambiente,


como já mencionado, a expansão da agricultura é o fator dirigente de
aproximadamente 80% do desmatamento mundial e a quantidade utili-
zada na agricultura e pecuária é exacerbada, a cada 100 litros, 72 são
usados no agro, além de outros impactos como com a soberania alimen-
tar. Pelos impactos que a atividade agrícola determina no meio ambiente
é indispensável o agronegócio estar alinhado com a sustentabilidade,
para que esta seja alcançada em menor tempo, para que a vida planetária
não esteja em tamanho risco como no qual se encontra hoje. É indispen-
sável que o agronegócio esteja alinhado com os preceitos do desenvolvi-
mento sustentável.
Uma empresa que atua em conformidade com o Estado, ONG’s
e Organizações Internacionais como a ONU para promover Sustentabili-
dade é a AMAGGI. A AMAGGI é uma grande empresa agrícola que se
mostra preocupada com a Sustentabilidade, ela se divide em quatro, na
parte AGRO, onde possui a produção de soja, milho e algodão com uso
de tecnologia que visa a obtenção de sementes de alta qualidade e evolu-
ção da Agricultura de Precisão. Na parte de Logística e Operações, pos-
sui operações portuárias, fluviais, rodoviárias, ferroviárias, além da

53 VEIGA, J. O Prelúdio do Desenvolvimento Sustentável. Disponível em:


https://edisciplinas.usp.br/pluginfile.php/253610/mod_resource/con-
tent/1/Texto%2002%20_%20desenvolvimento_sustentavel.pdf. Acesso em: 13 nov.
2020.

220
MEIO AMBIENTE, MIGRAÇÕES E PANDEMIA: REFLEXÕES DO MUNDO CONTEMPORÂNEO

administração das fábricas de esmagamento de soja e a fábrica mistura-


dora de fertilizantes. Na parte das COMMODITIES, há a compra, venda
e o beneficiamento de grãos de soja e milho, além da transportação e
comercialização de insumos agrícolas. Na parte da ENERGIA há cinco
Pequenas Centrais Hidrelétricas (PCHs) integradas ao Sistema Interli-
gado Nacional, com potência instalada de aproximadamente 70 MW54.

3.1 História da companhia AMAGGI

Havia grande potencial de produção e comercialização de grãos


na região de São Miguel do Iguaçu55 onde André Maggi, fundador da
companhia, começou seu negócio, para descentralizar e diversificar os
níveis de ação da empresa, a Agropecuária Maggi S/A foi criada em
1983, três anos depois houve a criação da Maggi Armazéns Gerais Ltda
em 1986, e a filial de Sementes Maggi Ltda em Itiquira em 1983. A partir
de 1985 Blairo Maggi filho de André Maggi se torna o responsável pela
inserção do Grupo Sementes Maggi Ltda no sistema mercantil e finan-
ceiro internacional. De acordo com Silva56, até o ano de 1966, 75% dos
maiores negócios eram voltados para o mercado interno e 25% para o
mercado externo, só após a construção do Porto da Hermasa (AM) houve
uma mudança de perfil de comercialização, onde a companhia se voltou
mais para a exportação e menos para o mercado interno.
Os principais acontecimentos de 2002 a 201957 foram: o início
de operações comerciais da Pequena Central Hidrelétrica (PHC), a aber-
tura do primeiro escritório de originação internacional, a aquisição de
51% das ações da esmagadora norueguesa Danofa, a abertura do escritó-
rio comercial de originação, a conclusão da transferência da sede para
Cuiabá (MT), a abertura do escritório comercial na Suíça, o término da
aquisição do restante da esmagadora Danofa, a companhia passar a usar
o nome AMAGGI, as atividades do escritório no Paraguai, as atividades
da Unitapajós, joint venture com outra grande empresa do setor, o início
das operações do escritório de representação comercial na China, a aqui-
sição de 50 %da Estação de Transbordo de Miritituba (PA) e do Terminal
Portuário de Barcarena (PA) e a inauguração da misturadora de

54 AMAGGI. Nossa História. Disponível em: https://www.amaggi.com.br/sobre-a-


empresa/nossa-atuacao/. Acesso em: 28 out. 2020.
55 SILVA, C. A transnacionalização do grupo André Maggi a partir do cerrado

mato-grossense. Disponível em: http://www.feth.ggf.br/Maggi.htm. Acesso em: 26


ago. 2020.
56 SILVA, C. A transnacionalização do grupo André Maggi a partir do cerrado

mato-grossense. Disponível em: http://www.feth.ggf.br/Maggi.htm. Acesso em: 26


ago. 2020.
57 AMAGGI. Nossa História. Disponível em: https://www.amaggi.com.br/sobre-a-

empresa/nossa-historia/. Acesso em: 03 out. 2020.

221
DARA LOPES FRANCO PERALTA

fertilizantes em Comodoro (MT), a elaboração do Posicionamento Glo-


bal de Sustentabilidade, a criação da AZL Grãos, joint venture para Ori-
ginação de grãos formada pela AMAGGI e outras duas grandes empresas
do setor e em pôr fim o início das operações rodoviárias com a frota pró-
pria de caminhões.

3.2 Números da AMAGGI

A AMAGGI58 atua em 40 cidades no Brasil, dividida em sede,


fazendas, fábricas, armazéns, escritórios de comercialização, terminais,
portuários, estaleiros e pequenas centrais hidrelétricas. No exterior, pos-
sui escritórios de comercialização na Argentina, Paraguai, Suíça e Ho-
landa, possui fábrica na Noruega e escritório de representação comercial
na China.
A companhia encerrou o ano de 2019 com 6.320 colaboradores
próprios, 9,8 % superior ao ano de 2018, 298 colaboradores terceirizados.
Os colaboradores próprios da AMAGGI se concentram na região Centro-
Oeste com 63,7%, 29,1% na área de negócios Agro, 85% homens, 15%
mulheres, 40% até 30 anos, 52% entre 30 e 50 e 8% com mais de 50 anos.
Dentre o treinamento de compliance 5.199 pessoas foram treinadas, em
43 localidades, em 15.827 km de estradas, em 7 estados, sendo eles Ama-
zônia, Goiás, Mato Grosso, Pará, Paraná, Roraima e Rondônia, em 3 re-
giões sendo elas, Centro-Oeste, Norte e Sul, em 66 unidades. Em
201959, segundo a Época Negócios 360º, a AMAGGI ficou classificada
como a 170ª melhor empresa do país; 13ª melhor empresa da região Cen-
tro-Oeste; 7ª melhor empresa do agronegócio; 3ª melhor empresa em sus-
tentabilidade no agronegócio; 14ª melhor empresa em gestão de pessoas
no agronegócio; 12ª melhor empresa em visão de futuro no agronegócio;
9ª empresa em desempenho financeiro no agronegócio; e 5ª empresa em
governança corporativa no agronegócio. Também em 2019 foi destaque
como uma das empresas mais sustentáveis do Agronegócio no Guia
Exame de sustentabilidade, bem como uma das únicas duas empresas no
país a receber a nota A- da organização CDP Forest, além do mais, ape-
nas oito empresas receberam a nota máxima A em todo o mundo. No
mesmo ano, a companhia e a Fundação André e Lúcia Maggi (FALM)
receberam o certificado de Responsabilidade Social da Assembleia

58 AMAGGI. Relatório de Sustentabilidade. Disponível em: https://d3w0jmyq

4esgw1.cloudfront.net/wp-content/uploads/2020/07/Amaggi_relat%C3%B3rio2019
_GRI_mark.pdf. Acesso em: 26 ago. 2020.
59 AMAGGI. Relatório de Sustentabilidade. Disponível em: https://d3w0jm

yq4esgw1.cloudfront.net/wp-content/uploads/2020/07/Amaggi_relat%C3%B3rio
2019_GRI_mark.pdf. Acesso em: 04 set. 2020.

222
MEIO AMBIENTE, MIGRAÇÕES E PANDEMIA: REFLEXÕES DO MUNDO CONTEMPORÂNEO

Legislativa de Mato Grosso60, a FALM é uma instituição sem fins econô-


micos, responsável pela gestão do Investimento Social Privado (ISP) da
AMAGGI.

3.3 Relação da AMAGGI com sustentabilidade

A agricultura é fundamental não só para a economia brasileira,


porque esta tem uma participação importante no PIB, mas para os países
em geral tanto na questão econômica quanto na questão alimentícia, a
agricultura leva o alimento para a maioria das pessoas no mundo. Porém
a agricultura determina impactos no meio ambiente, por isso é funda-
mental que as empresas que atuam no agronegócio tenham preocupações
com a sustentabilidade, sem um ambiente sustentável, o solo é degradado
perdendo a vida biológica, os agrotóxicos podem fazer mal as pessoas e
o meio ambiente é degradado. Essas e outras questões precisam estar nas
discussões das pequenas e grandes empresas do agronegócio. A
AMAGGI tem essa preocupação e está no caminho para a sustentabili-
dade, participa com os Objetivos do Desenvolvimento Sustentável desde
o seu lançamento, estes estão incorporados nos quatro blocos estratégi-
cos do Plano de Sustentabilidade com visão até 2025 e participa também
do Pacto Global da ONU.
Alinhada com o Desenvolvimento Sustentável a AMAGGI61
lançou em 2017 o Posicionamento Global de Sustentabilidade, este reúne
a atuação socioambiental da empresa, com o intuito de dar transparência
a estratégia de sustentabilidade da companhia, dando prioridade a temas
que mostram a evolução ao decorrer dos anos da busca pelo desenvolvi-
mento sustentável62. O Posicionamento Global de Sustentabilidade está
baseado em seis princípios • Ter viabilidade econômica, agregar valor
aos acionistas e colaboradores, e compartilhar valor com a sociedade,
contribuindo para o desenvolvimento local; • Ser socioambientalmente
responsável e promover a melhoria contínua da gestão socioambiental
em suas operações e sua cadeia de valor; • Garantir a boa governança e a
transparência de sua atuação, por meio da conformidade legal e da gestão
de riscos; • Promover o respeito aos direitos humanos e ao trabalho digno
em suas operações e sua cadeia de valor; • Promover o crescimento pes-
soal e profissional de seus colaboradores, valorizando a diversidade e

60 Fundação André e Lúcia Maggi. Relatório de Atividades 2019. Disponível em:


https://www.fundacaoandreeluciamaggi.org.br/wp-content/uploads/2020/07/Relat%
C3%B3rio-de-Atividades-2019_-Funda%C3%A7%C3%A3o-Andr%C3%A9-e-Lu-
cia-Maggi.pdf. Acesso em: 04 set. 2020.
61 AMAGGI. Nossa atuação. Disponível em: https://www.amaggi.com.br/sobre-a-

empresa/nossaatuacao. Acesso em: 02 mai. 2020.


62 AMAGGI. Relatório de sustentabilidade 2017. Disponível em: https://amaggi.

com.br/relatorio2017/paginainicial/. Acesso em 08 set. 2020.

223
DARA LOPES FRANCO PERALTA

buscando a melhoria contínua das condições de trabalho, saúde e segu-


rança; • Contribuir com a promoção da segurança alimentar e nutricional.
Para integrar estratégias dos negócios da empresa ao Posicionamento
Global de Sustentabilidade, foi criado o Plano de Sustentabilidade63 com
visão até 2025, este está dividido em quatro blocos estratégicos: o Bloco
Crescendo com o Local tem os objetivos de Desenvolvimento local; Ge-
ração de emprego e renda; Parcerias para o desenvolvimento local e Dis-
seminação de conhecimento; o Bloco Melhorando a Governança e Ges-
tão: tem os objetivos de Engajamento de stakeholders; Gestão de pes-
soas, riscos e socioambiental; Saúde e segurança no local de trabalho e
Transparência; o Bloco Promovendo uma Cadeia de Valor Sustentável:
tem os objetivos de Trabalhar com outros fornecedores, Programa de ge-
renciamento da cadeia responsável da soja e tratar de temas de atuação
abrangente na cadeia de soja; e o Bloco Debatendo o presente e o futuro:
têm os objetivos de tratar das Fronteiras agrícolas, Mudanças climáticas,
Segurança alimentar e nutricional, Inovação e ir Rumo ao desmatamento
zero.
Segundo Juliana Lopes64, Diretora de Sustentabilidade da
AMAGGI, a companhia entende que a sustentabilidade é um valor que
está diretamente ligado à longevidade dos negócios e das atividades em
que a empresa se insere e dos mercados que participa internacionalmente.
Inclusive, a sustentabilidade está presente na visão institucional, e a sus-
tentabilidade de produtos e processos tem sido crescentemente exigida
pelo mercado consumidor e a AMAGGI busca atender a demanda de
forma concreta. Complementando esse pensamento, conforme Juliana
Lopes65:

É evidente que a sustentabilidade requer investimentos para a


melhoria de quaisquer atividades econômicas, a fim de que
seus processos melhor se adaptem, mas não fazemos distinção
desses custos em nossos negócios e nem os encaramos como
fator de encarecimento dos processos produtivos e logísticos

63 AMAGGI. Posicionamento Global de Sustentabilidade e Plano 2025. Disponí-

vel em: https://amaggi.com.br/relatorio2017/posicionamentoglobal/. Acesso em: 27


ago. 2020.
64 Entrevista realizada entre os dias 24 de abril a 22 de junho de 2020, por e-mail,

com a Diretora de Sustentabilidade da AMAGGI, a senhora Juliana Lopes. O obje-


tivo da entrevista foi entender o posicionamento da companhia sobre a Sustentabili-
dade.
65 Entrevista realizada entre os dias 24 de abril a 22 de junho de 2020, por e-mail,

com a Diretora de Sustentabilidade da AMAGGI, a senhora Juliana Lopes. O obje-


tivo da entrevista foi entender o posicionamento da companhia sobre a Sustentabili-
dade.

224
MEIO AMBIENTE, MIGRAÇÕES E PANDEMIA: REFLEXÕES DO MUNDO CONTEMPORÂNEO

justamente por entendermos a sustentabilidade como um valor


indispensável exigido em todas as nossas áreas.

Conforme o Relatório de Sustentabilidade da AMAGGI66, a em-


presa tem o compromisso de atuação socialmente justa, ambientalmente
responsável e economicamente viável. A concretização desse compro-
misso se dá por meio da Política Socioambiental do sistema Gestão So-
cioambiental AMAGGI (GSA), esta é formada por um conjunto de ati-
vidades operacionalizadas e desenvolvidas pela área de Sustentabilidade,
juntamente com as unidades da empresa, tendo o objetivo de prevenir e
minimizar possíveis impactos socioambientais negativos relacionados às
operações, serviços e produtos da companhia, feita por meio de disposi-
tivos de controle e oportunizar maximizando impactos positivos pela im-
plementação de programas e ações. Ainda no mesmo Relatório, desde
2017 as auditorias internas do sistema de gestão passaram a ser feitas de
forma integrada em todas as unidades de negócios abarcando as certifi-
cações socioambientais.
O sistema GSA se baseia nos requisitos da NBR 16001:201267
que corresponde a responsabilidade social, conforme o Instituto Nacional
de Metrologia, Qualidade e Tecnologia (INMETRO) a responsabilidade
social se dá pelos impactos das decisões da organização, suas atividades
na sociedade e no meio ambiente, através de um comportamento que:

Contribua para o desenvolvimento sustentável, incluindo a sa-


úde e o bem-estar da civilização; Considere as expectativas
das partes interessadas; Esteja em conformidade com a legis-
lação aplicável, sendo consistente com as normas internacio-
nais de comportamento e; Esteja integrada em toda a organi-
zação, sendo praticada em suas relações.

O sistema GSA também integra as normas ISO 14001:2015 que


corresponde ao meio ambiente, segundo a Associação Brasileira de Nor-
mas Técnicas (ABNT)68 é preciso criar alternativas que contribuam para
o desenvolvimento sustentável por meio da:

66 AMAGGI. Relatório de Sustentabilidade. Disponível em: https://d3w0jmyq


4esgw1.cloudfront.net/wp-content/uploads/2020/07/Amaggi_relat%C3%B3rio2019
_GRI_mark.pdf. Acesso em: 26 ago. 2020.
67 INMETRO. A Norma Nacional – ABNT NBR 16001. Disponível em: http:

//www.inmetro.gov.br/qualidade/responsabilidade_social/norma_nacional.asp#:~:
text=A%20ªBNT%20NBR%2016001%20estabelece,da%20cidada-
nia%20e%20do%20desenvolvimento. Acesso em: 26 ago. 2020.
68 ABNT. Sistema de Gestão Ambiental: requisitos com orientações para uso –

NBR ISO 14001. Rio de Janeiro, 2015.

225
DARA LOPES FRANCO PERALTA

Proteção do meio ambiente pela prevenção ou mitigação dos


impactos ambientais adversos; Mitigação de potenciais efeitos
adversos das condições ambientais na organização; Auxílio à
organização no atendimento aos requisitos legais e outros re-
quisitos; Aumento do desempenho ambiental; Controle ou in-
fluência no modo em que os produtos e serviços da organiza-
ção são projetados, fabricados, distribuídos, consumidos e
descartados, utilizando uma perspectiva de ciclo de vida que
possa prevenir o deslocamento involuntário dos impactos am-
bientais dentro do ciclo de vida; Alcance dos benefícios finan-
ceiros e operacionais que podem resultar da implementação de
alternativas ambientais que reforçam a posição da organização
no mercado e; Comunicação de informações ambientais para
as partes interessadas pertinentes.

O sistema Gestão Socioambiental AMAGGI também se baseia


nas certificações A. R. S.69 (AMAGGI Responsible Standard),o propó-
sito da ARS é determinar um critério mínimo de entrada para produtores
e trabalhar sua cultura de gestão socioambiental, a norma pretende fazer
diagnóstico socioambiental juntamente com seus produtores. A ARS
também contempla critérios de veto à sustentabilidade da comercializa-
ção de grãos, aplicados a 100% da cadeia de suprimentos, são eles: Veto
à utilização de trabalho degradante (trabalho escravo, ou análogo ao es-
cravo e trabalho infantil); Veto a áreas em terras indígenas; Veto a áreas
em unidades de conversação de proteção integral; Veto às áreas embar-
gadas pelo IBAMA para desmatamento; Veto às áreas embargadas pelos
órgãos ambientais estaduais; Veto às áreas desmatadas após 2008 no bi-
oma Amazônia (Moratória da Soja); Veto aos produtores que não cum-
pram o Protocolo ‘Grãos Verdes do Pará’ (“Protocolo do Feijão Verde”
no Estado do Pará).
Há uma grande importância na rede de parceiros comerciais da
AMAGGI, pois pela companhia há um engajamento na participação in-
tegral na legislação ambiental brasileira, como foi mencionado, há vetos
ao trabalho análogo a escravidão, trabalho escravo, trabalho infantil, a
áreas de terra indígena, unidade de conservação de proteção integral,
áreas embargadas pelo IBAMA para desmatamento, áreas embargadas
pelos órgãos ambientais estaduais, áreas desmatadas após 2008 e veto
aos produtores que não cumprem o Protocolo do Feijão verde do Pará. A
companhia se preocupa com suas atuações estendendo essa preocupação
com os seus parceiros, produtores e fornecedores e essa relação com a

69 AMAGGI. Padrão Responsável AMAGGI (A.R.S). Disponível em: https:

//www.amaggi.com.br/en/sustainability/amaggi-responsible-standard/. Acesso em:


26 ago.2020.

226
MEIO AMBIENTE, MIGRAÇÕES E PANDEMIA: REFLEXÕES DO MUNDO CONTEMPORÂNEO

AMAGGI, dissemina boas práticas de sustentabilidade na cadeia como


um todo.
Outra certificação em que a GSA se baseia é a Round Table on Respon-
sible Soy (RTRS), segundo o Relatório anual de progresso dos membros
da RTRS70, a política socioambiental da AMAGGI se dá em •Atender os
requisitos legais aplicáveis e outros requisitos subscritos pela organiza-
ção relacionados a seus aspectos socioambientais •Aperfeiçoar seus pro-
cessos, buscando a prevenção da poluição e de impactos sociais, o geren-
ciamento da emissão de gases de efeito estufa e a melhoria contínua do
desempenho socioambiental, nas operações e cadeias de valor •Adotar
boas práticas socioambientais visando minimizar acidentes, impactos ne-
gativos e gerar valor compartilhado •Promover engajamento dos parcei-
ros comerciais e das principais partes interessadas para a responsabili-
dade socioambiental • Promover respeito aos Direitos Humanos e ao tra-
balho digno nas operações e cadeia de valor.
As duas últimas certificações são ProTerra71, nas quais é neces-
sário que haja:

Conformidade com a lei, convenções internacionais e com o


Padrão ProTerra; Direitos Humanos e políticas e práticas de
trabalho responsáveis; Relação responsável com os trabalha-
dores e com a comunidade; Conservação da biodiversidade,
gestão ambiental eficaz e serviços ambientais; Não uso de Or-
ganismos Geneticamente Modificados (OGM); Poluição e
gestão de resíduos; Gestão de água; Gases de efeito estufa e
gestão de energia; Adoção de boas práticas agrícolas; Rastre-
abilidade e Cadeia de Custódia

E as certificações Algodão Brasileiro Responsável/ Better Cot-


ton Initiative (ABR/BCI)72, segundo a Associação Brasileira dos Produ-
tores de Algodão (ABRAPA) os critérios de diagnóstico e certificação
são: • Contrato de trabalho • Proibição de trabalho infantil • Proibição de
trabalho análogo a escravo ou em condições degradantes/indignas • Li-
berdade de associação sindical • Proibição de discriminação de pessoas •

70 AMAGGI. Relatório anual de progresso para os membros-2019. Disponível


em: https://responsiblesoy.org/wp-content/uploads/2020/03/Amaggi_Relat%C3%B
3rio-Anual-de-Progresso-2019.pdf. Acesso em: 26 ago. 2020.
71 ProTerra. ProTerra Standard: Responsabilidade Social e Sustentabilidade Am-

biental. Disponível em: https://www.proterrafoundation.org/wp-content/uploads


/2019/05/ProTerra-Standard-V04-final-26-02-PORTUGUESE-versao-final.pdf.
Acesso em: 26 ago. 2020.
72 ABRAPA. Certificação ABR e Licenciamento BCI. Disponível em:

https://www.abrapa.com.br/Paginas/sustentabilidade/certificacao-abr-e-licenciamen
to-bci.aspx. Acesso em: 26 ago. 2020.

227
DARA LOPES FRANCO PERALTA

Segurança, saúde ocupacional e meio ambiente do trabalho • Desempe-


nho ambiental e • Boas práticas agrícolas.
A AMAGGI tem a preocupação de disseminar boas práticas de sustenta-
bilidade em sua cadeia de valor e por isso considera importante trabalhar
em parceria para uma atuação sustentável73. Segundo a Diretora de Sus-
tentabilidade74, por acreditar na importância do trabalho em conjunto
para uma atuação responsável, a AMAGGI participa de iniciativas e par-
cerias de grande valor e potencial de mobilização.

Dentre as várias iniciativas de parcerias que a AMAGGI parti-


cipa, se destacam:

Quadro 01: Principais parcerias da AMAGGI em relação à sustentabili-


dade
PARCERIAS DETALHAMENTO
Essa parceria existe há 15 anos para o desenvolvimento de projetos
Pesquisa Ambien- de pesquisa científica ligados ao papel das florestas e sua interação
tal da Amazônia com atividades humanas, dentro da Fazenda Tanguro, localizada em
Querência, no estado de Mato Grosso
No ano de 2019 a AMAGGI foi uma das duas únicas empresas brasi-
CDP Forest leiras a obter a nota A- e no mundo inteiro apenas 8 empresas obti-
veram a nota máxima A
Essa parceria vem desde 2019, onde a AMAGGI participa do Comitê
Diretor Global de Produção Agrícola e Desmatamento Tropical para
Earth Innovation
apoiar o Balikpapan Challenge, o desafio busca desenvolver um mo-
Institute e Balikpa-
delo de atuação das empresas na origem dos produtos, fortalecendo
pan Challenge
mais os estados ou regiões e respeitando cada jurisdição na luta con-
tra o desmatamento e a mudança climática.
Centro de Susten- Por meio desta parceria, a AMAGGI dá transparência ao cálculo das
tabilidade da Fun- emissões de gases de efeito estufa na Plataforma Pública de Regis-
dação Getúlio Var- tros do GHG, pertencente e mantida pelo Centro de Estudos da Sus-
gas (FGVCes) tentabilidade da Fundação Getúlio Vargas.
Iniciativa do estado de Mato Grosso que visa alcançar uma visão de
desenvolvimento social e econômico para 2030 através do uso sus-
tentável dos recursos naturais. A AMAGGI integra o Instituto, fun-
Estratégia MT:
dado com a missão principal de dar suporte às ações do estado de
Produzir, Conser-
Mato Grosso para o atingimento de suas metas de produção, con-
var e Incluir (PCI)
servação e inclusão. Toda a documentação administrativa para a go-
vernança e as diretrizes estratégicas do instituto já se encontra em
andamento para atualização ainda em 2020.
Constituído por organizações da sociedade civil, empresas e órgãos
Grupo de Trabalho governamentais, o GTS é uma das frentes de combate ao desmata-
da Soja (GTS) mento em que a AMAGGI atua. Através do GTS, a AMAGGI materia-
liza seu compromisso de não comercializar soja de áreas desmatadas

73 AMAGGI. Parcerias na Cadeia de Valor. Disponível em: https://www.amaggi.

com.br/Sustentabilidade/parcerias-cadeia-valor/. Acesso em: 08 set. 2020.


74 Entrevista concedida pela Diretora de Sustentabilidade da AMAGGI, senhora Ju-

liana Lopes, conforme mencionado anteriormente.

228
MEIO AMBIENTE, MIGRAÇÕES E PANDEMIA: REFLEXÕES DO MUNDO CONTEMPORÂNEO

PARCERIAS DETALHAMENTO
após 2008 no bioma Amazônia, iniciativa essa conhecida mundial-
mente como Moratória da Soja.
A AMAGGI participa desde a fundação em 2017 dessa iniciativa que
busca encontrar oportunidades para uma solução coletiva de longo
prazo para eliminar, no menor prazo possível, o desmatamento do
Grupo de Trabalho
cerrado ligado à cadeia de soja, conciliando aspectos sociais, ambi-
do Cerrado (GTC)
entais e econômicos. A companhia discutiu também em 2017 solu-
ções que possam conciliar o fim do desmatamento com mecanismos
de pagamento direto aos produtores que abrirem mão do seu di-
reito de desmatar, conforme o Código Florestal.
A AMAGGI mantém uma parceria de longa data com a TNC, com ob-
jetivo principal de promover a adequação ambiental e restauração
florestal em propriedades rurais. Em 2019 foi feita a renovação da
parceria, com o objetivo de desenvolver um plano de disseminação
The NatureCon-
dos benefícios de boas práticas agrícolas e restauração de matas ci-
servancy (TNC)
liares para aumentar a resiliência de imóveis rurais e da paisagem,
incentivando a expansão da produção de soja associados em áreas
já abertas, como alternativa ao desmatamento na região do entorno
da BR163 e do Vale do Araguaia.
Iniciativa conjunta do Ministério Público Federal, do governo esta-
dual do Pará, do Ministério do Meio Ambiente (MMA) e da Secreta-
ria de Estado de Meio Ambiente e Sustentabilidade (SEMAS) e em-
Protocolo Verde presas locais do setor para estabelecer procedimentos de compra
dos Grãos que assegurem a origem legal e sustentável da produção agrícola de
soja no estado e fortalecer o Cadastro Ambiental Rural (CAR) como
ferramenta de ordenamento ambiental. A AMAGGI aderiu ao Proto-
colo em 2018, em razão de sua atuação no Pará.
A AMAGGI é signatária há 15 anos dessa iniciativa, essa tem o obje-
tivo de erradicar toda forma de trabalho análogo à escravidão no
InPACTO Brasil. Anualmente, a companhia submete à InPACTO o relatório de
monitoramento com o reporte das ações realizadas para a erradica-
ção do trabalho escravo na cadeia produtiva da empresa.
Há 11 anos a AMAGGI participa da iniciativa da Fundação Abrinq
que
Abrinq
Busca mobilizar empresas para uma atuação social em benefício
das crianças e adolescentes do Brasil.
onde o objetivo é encadear ações que promovam no Brasil um novo
Coalizão Brasil
modelo de desenvolvimento econômico que esteja pautado na eco-
Clima, Florestas e
nomia de baixo carbono, respondendo assim aos desafios das mu-
Agricultura
danças climáticas.

Fonte: Elaborado pela autora com base no relatório de sustentabilidade da AMAGGI


e na Entrevista para com a Diretora de Sustentabilidade, a senhora Juliana Lopes.

A AMAGGI também atua em conformidade com os Objetivos


do Desenvolvimento Sustentável da ONU75, a companhia articula os
ODS em suas atividades e os divulga com todos os seus stakeholders, Na
tabela a seguir consta os Objetivos do Desenvolvimento Sustentável em

75 AMAGGI. Relatório anual de progresso para os membros-2019. Disponível


em: https://responsiblesoy.org/wp-content/uploads/2020/03/Amaggi_Relat%C3%B
3rio-Anual-de-Progresso-2019.pdf. Acesso em: 26 ago. 2020.

229
DARA LOPES FRANCO PERALTA

cada bloco estratégico do Plano de Sustentabilidade com visão até 2025


e os temas que estão presentes nesses blocos.

Quadro 2: Plano de Sustentabilidade76 com visão até 2025.

76 AMAGGI. Posicionamento Global de Sustentabilidade e Plano 2025. Disponí-

vel em: https://amaggi.com.br/relatorio2017/posicionamentoglobal/. Acesso em: 27


ago. 2020.

230
MEIO AMBIENTE, MIGRAÇÕES E PANDEMIA: REFLEXÕES DO MUNDO CONTEMPORÂNEO

Fonte: Tabela elaborada a partir do Relatório de Sustentabilidade da AMAGGI

A agricultura é fundamental não só para a economia brasileira,


porque esta tem uma participação importante no PIB, mas para os países
em geral na questão tanto econômica quanto alimentícia, a agricultura
leva o alimento para a maioria das pessoas no mundo. Porém a agricul-
tura determina impactos no meio ambiente, por isso é fundamental que
as empresas que atuam no agronegócio tenham preocupações com a sus-
tentabilidade, sem um ambiente sustentável o negócio não tem cresci-
mento, o solo é degradado perdendo a vida biológica, os agrotóxicos po-
dem fazer mal as pessoas, essas e outras questões precisam estar nas dis-
cussões das pequenas e grandes empresas do agronegócio. A AMAGGI
tem essa preocupação e está no caminho para a sustentabilidade, parti-
cipa com os Objetivos do Desenvolvimento Sustentável desde o seu

231
DARA LOPES FRANCO PERALTA

lançamento, estes estão incorporados nos quatro blocos estratégicos do


Plano de Sustentabilidade com visão até 2025. Em 201977 a empresa fi-
cou entre os 36 finalistas do prêmio ODS Pacto Global com a plataforma
ORIGINAR para assegurar uma produção responsável na cadeia de grão,
outro compromisso institucional é com os Princípios Empresariais para
Alimentos e Agricultura (PEAA)78, lançado em 2014 pelo Pacto Global
das Nações Unidas, a AMAGGI esteve presente em todas as etapas de
sua criação, e é a única empresa brasileira que foi convidada a participar
do processo de elaboração dos princípios.
Segundo Barreto79:

A atividade agrícola está intimamente relacionada com o uso


de recursos naturais. Essa relação se caracteriza pela criação
de agroecossistemas, isto é, sistemas de cultivo baseados no
domínio da dinâmica dos ecossistemas ou sistemas naturais.
Devido a essa proximidade entre o agricultor e o meio natural
é importante a percepção que ele possui diante deste meio e de
questões ambientais que se relacionam diretamente com sua
atividade produtiva.

Considerando que a atividade agrícola determina impactos con-


sideráveis no meio ambiente, segundo a Diretora de Sustentabilidade80 a
companhia atualizou no ano de 2016 o mapeamento dos impactos posi-
tivos, negativos, os riscos e oportunidades com relação a todas as ativi-
dades, operações e serviços onde atua, esse mapeamento permite a revi-
são dos aspectos e impactos socioambientais para eliminar ou minimizar
os impactos onde atua. A AMAGGI também conta com metodologias
para implementação de projetos novos que possam provocar impacto so-
cioambiental devido a operações próprias e da cadeia de valor, relativos
à construção, ampliação ou novas atividades, esses procedimentos in-
cluem avaliação socioambiental anterior das localidades, avaliação de
fornecedores e identificação de aspectos e controles, entre outros

77 AMAGGI. Relatório de Sustentabilidade. Disponível em: https://d3w0j

myq4esgw1.cloudfront.net/wp-content/uploads/2020/07/Amaggi_relat%C3%B3rio
2019_GRI_mark.pdf. Acesso em: 04 set. 2020.
78 AMAGGI. Relatório de Sustentabilidade. Disponível em: https://d3w0jmyq4

esgw1.cloudfront.net/wp-content/uploads/2020/07/Amaggi_relat%C3%B3rio2019_
GRI_mark.pdf. Acesso em: 04 set. 2020.
79 BARRETO, C. Agricultura e Meio Ambiente: Percepções e práticas de sojicul-

tores em Rio Verde-GO. Disponível em: https://www.teses.usp.br/teses/disponiveis


/90/90131/tde-14082007-231915/publico/DissetacaoClarissadeAraujoBarreto.pdf.
Acesso em:04 set. 2020.
80 Entrevista concedida pela Diretora de Sustentabilidade da AMAGGI, senhora Ju-

liana Lopes, conforme mencionado anteriormente.

232
MEIO AMBIENTE, MIGRAÇÕES E PANDEMIA: REFLEXÕES DO MUNDO CONTEMPORÂNEO

procedimentos. Ademais, os terceiros em completude que prestam servi-


ços à AMAGGI, precisam passar por uma integração socioambiental.
A AMAGGI tem caminhado para a sustentabilidade não so-
mente na questão ambiental, mas também na questão social, por meio da
política de Investimento Social Privado (ISP) a AMAGGI repassa anu-
almente um valor para que a Fundação André e Lúcia Maggi (FALM)81
para a gestão de seus projetos, que faz com que os impactos positivos
gerados pelas atividades da empresa sejam potencializados, em comuni-
dades e em regiões onde a empresa desenvolve suas operações. Aspi-
rando se adequar ao Posicionamento Global de Sustentabilidade da
AMAGGI, a FALM atualizou seu Planejamento Estratégico em 2018,
este tem visão até 2025 bem como o Plano de Sustentabilidade da
AMAGGI. A FALM também trabalha para contribuir com os ODS, bem
como considera os compromissos institucionais assumidos pela
AMAGGI como oportunidade para uma atuação em conjunto, como o
Pacto Global da ONU, Programa Empresa Amiga da Criança da Funda-
ção Abrinq e o Pacto Nacional pela Erradicação do Trabalho Escravo do
Instituto do Pacto Nacional pela Erradicação do Trabalho Escravo (In-
PACTO). Os destaques de 2019 pela Fundação foram 83 projetos/inici-
ativas inscritas na primeira edição do Desafio Global; Priorização de atu-
ação junto a AMAGGI como as ações em Itacoatiara que mobilizaram
254 pessoas, as ações em São Félix do Araguaia que mobilizaram 554
pessoas e as ações em Porto Velho que mobilizaram 320 pessoas; 23 bol-
sas de estudo ofertadas em parceria com a AMAGGI, para o curso de
Graduação “Tecnológica em Agrocomputação”, da Faculdade de Tecno-
logia - FATEC Senai Mato Grosso; R$ 4.333.112 investidos em ações e
projetos; 235 jovens matriculados nas oficinas realizadas no Espaço Co-
letivo Fundação André e Lucia Maggi, em Rondonópolis (MT); Atuação
em 19 municípios nos estados de Mato Grosso, Paraná, Amazonas, Ron-
dônia e Roraima. Quanto aos prêmios e reconhecimentos da FALM,
desde 2009 a AMAGGI conta com o selo da Empresa Amiga da Criança
e a FALM é uma das responsáveis por garantir este reconhecimento; A
FALM obteve o 2º lugar na Categoria Investimento Social e Comunida-
des Sustentáveis do Prêmio Transformadores 2018; Recebeu o prêmio
Botar, sendo reconhecida por trabalhar como parceiro institucional que
agrega conhecimento direcionado à capacitação para o terceiro setor, a
FALM tem sua atuação reconhecida pelo Certificado de Responsabili-
dade Social da Assembleia Legislativa de Mato Grosso desde 2016.
A agricultura gera impactos no meio ambiente como o uso de agrotóxi-
cos, desmatamento, utilização inadequada da água e do solo, produtos
transgênicos entre outros problemas, por essa questão é necessário que

81Fundação André e Lúcia Maggi. Relatório de Atividades 2019. Disponível em:


Acesso em: 04 set. 2020.

233
DARA LOPES FRANCO PERALTA

as empresas que atuam no agronegócio tenham preocupações com a sus-


tentabilidade. Segundo a FAO82 o crescimento agrícola do Brasil pode
ser feito de forma sustentável, tem se a expectativa de que a pressão sobre
os recursos naturais seja suavizada por iniciativas ambientais e de con-
servação, juntamente com o apoio às práticas de cultivos sustentáveis,
conversão de terras cultiváveis naturais e deterioradas em pasto, e a inte-
gração da produção agrícola com os sistemas pecuários. A AMAGGI tem
a preocupação para com a sustentabilidade e está caminhando para al-
cançá-la em sua totalidade.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O meio ambiente é de indiscutível importância para os seres vi-


vos, unicamente através dele é possível haver oxigênio de forma natural,
o clima da terra é o único em que há vida, a alimentação vem por meio
dele e os recursos do planeta são escassos. E esse mesmo meio ambiente
se encontra em grande nível de degradação, quatro das nove fronteiras
planetárias, do espaço operacional seguro para a humanidade, já foram
ultrapassadas. Um grande problema vem do agronegócio que por si só
determina impactos negativos no meio ambiente, a agricultura é respon-
sável por aproximadamente 80% do desmatamento mundial e na Amé-
rica Latina 70%, no caso dos agrotóxicos o Brasil se destaca no cenário
mundial como o maior consumidor, respondendo na América Latina por
86% dos produtos e perto de 200 mil pessoas perdem suas vidas devido
às substâncias químicas nocivas. Até mesmo a água, um bem tão preci-
oso e escasso, é utilizada em excesso no agronegócio, a cada 100 litros
de água tratada produzida no Brasil, 72 litros vão para o negócio, 70%
do abastecimento é endereçado à agricultura e à pecuária,
É indispensável que o agronegócio no Brasil e no mundo esteja
alinhado com o paradigma da sustentabilidade, porque apesar de o capi-
talismo estimular a exploração cada vez maior de recursos naturais, é
necessário entrosar o agronegócio sem hostilidade ao meio ambiente. É
preciso diminuir os impactos e se possível restaurar o estado anterior a
degradação. Tendo em vista de que o meio ambiente está em grande nível
de degradação e que o agronegócio tem a possibilidade de potencializar
esse nível de degradação, é imprescindível que conciliar o agronegócio
com a sustentabilidade. É necessária a adequação de todos os Estados,
governos, Organizações Internacionais, Organizações Não Governamen-
tais, e empresas privadas de todos os setores, inclusive do agronegócio
ao novo paradigma da sustentabilidade. Todos vivem em um só planeta

82 FAO. OCDE-FAO Perspectivas Agrícolas 2015-2024. Disponível em: http://

www.fao.org/3/a-i4761o.pdf. Acesso em: 04 set. 2020.

234
MEIO AMBIENTE, MIGRAÇÕES E PANDEMIA: REFLEXÕES DO MUNDO CONTEMPORÂNEO

e é preciso protegê-lo, os recursos são escassos e não é possível renovar


muitos deles.
É possível adequar o desenvolvimento sustentável com o agro-
negócio? É possível adequar a atividade do agronegócio com o para-
digma da sustentabilidade? Talvez uma das empresas que trabalha no se-
tor do agronegócio e pode responder melhor essa questão a com sua his-
tória é a AMAGGI.
A AMAGGI tem o compromisso de atuar de forma socialmente
justa, ambientalmente responsável e economicamente viável, a compa-
nhia faz com que isso se torne realidade através do Sistema de Gestão
Socioambiental (GSA), que se baseia em diversas certificações e normas
nacionais e internacionais. A GSA é formada por um conjunto de ativi-
dades operacionalizadas e desenvolvidas pela área de Sustentabilidade,
juntamente com as unidades da empresa, tendo o objetivo de prevenir e
minimizar possíveis impactos socioambientais negativos relacionados às
operações, serviços e produtos da companhia, feita por meio de disposi-
tivos de controle e oportunizar maximizando impactos positivos pela im-
plementação de programas e ações. A companhia também possui um
Plano de Sustentabilidade com visão até 2025, organizado em quatro blo-
cos estratégicos, com os objetivos de desenvolvimento local, geração de
emprego e renda, parcerias para o desenvolvimento local, disseminação
de conhecimento, engajamento de stakeholders, gestão de pessoas, ges-
tão de pessoas e gestão socioambiental, saúde e segurança no trabalho,
transparência, trabalho com fornecedores, programa de gerenciamento
da cadeia responsável da soja, tratar temas de atuação abrangente na ca-
deia de soja, tratar fronteiras agrícolas, mudanças climáticas, segurança
alimentar e nutricional, inovação e ir ao rumo do desmatamento zero. As
parcerias são outro ponto muito relevante, a companhia tem parcerias
com o estado de Mato Grosso, Organizações Não Governamentais, Ins-
tituições Privadas e Organizações Internacionais. A companhia também
recebeu premiações pelo seu desenvolvimento com a sustentabilidade.
Esses pontos mostram que a empresa do agronegócio AMAGGI está vol-
tada para a sustentabilidade. A companhia entende que a sustentabilidade
é um valor que está diretamente ligada à longevidade dos negócios, tam-
bém não faz distinção dos custos nos negócios em relação à sustentabili-
dades, muito menos um fator de encarecimento nos processos produtivos
e logísticos, pois a empresa entende a sustentabilidade como um valor
indispensável exigido em todas as áreas.
Este trabalho teve como objetivo analisar a atuação e evolução
da companhia do agronegócio AMAGGI alinhada, por sua vez, com a
sustentabilidade através de parcerias com o Estado, Organizações Inter-
nacionais e Organizações Não Governamentais, bem como de iniciativas
próprias. As preocupações da empresa AMAGGI com a questão da sus-
tentabilidade ultrapassam os limites de atuação da própria empresa e

235
DARA LOPES FRANCO PERALTA

envolvem seus parceiros, produtores e fornecedores. Para a AMAGGI,


as iniciativas e os investimentos em sustentabilidade não são entendidos
como custo, uma vez que a empresa e seus investidores entendem que a
urgência de ações para preservação do meio ambiente é de fato, uma res-
ponsabilidade de todos. Nesse sentido, a visão de negócio da AMAGGI
está alinhada com o novo padrão de conscientização ambiental global
que, por sua vez, caracteriza o novo investidor do século XXI. Como a
companhia AMAGGI é um exemplo em sustentabilidade, em função da
sua estrutura com o Posicionamento Global de Sustentabilidade, o Plano
de Sustentabilidade, o Sistema de Gestão Socioambiental, suas Parcerias a
parte social gerida pela Fundação André e Lúcia Maggi, se mostra praticá-
vel e totalmente possível haver uma atuação com responsabilidade ambi-
ental tanto por pequenas empresas do agronegócio, quanto empresas mé-
dias e empresas grandes como a AMAGGI.

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241
DARA LOPES FRANCO PERALTA

242
A DEGRADAÇÃO AMBIENTAL NO SÉCULO XXI: O CASO
DO MIGRANTE AMBIENTAL NO SUL DA ÁSIA

Prof. Dr. Walter Barbieri Junior1

INTRODUÇÃO

O presente artigo tem como objetivo problematizar e conduzir a


reflexões sobre os impactos ambientais decorrente do processo de aque-
cimento global no Sul da Ásia, onde devido as condições de precariedade
socioeconômico e fragilidade para a obtenção de recursos fundamentais,
a região no século XXI tende a gerar um grande número de migrantes
ambientais. As mudanças climáticas no século XXI produzem muitos
impactos no equilíbrio do ecossistema mundial. No âmbito socioeconô-
mico, em consequência, o processo migratório tende a se intensificar
como reflexo das dificuldades para a obtenção de meios de subsistência,
assim os deslocamentos humanos motivados por problemas ambientais
se tornarão em uma das principais categorias na condição de refugiados.
Este novo grupo de migrante se diferencia do tradicional perfil
de grupos migrantes vulneráveis que necessitam proteção, o migrante
corrente migra normalmente devido à necessidade de proteção, muitas
vezes assolados por violações de direitos humanos decorrente de confli-
tos armados, perseguição étnica, política ou religiosa, ou mesmo causas
relacionadas a problemas socioeconômicos devido a um estado de forte
abalo de estruturas produtivas para obtenção de sustento capaz de pro-
mover o mínimo de dignidade humana. No entanto, o cenário de degra-
dação ambiental neste século, aponta para a emergência de uma nova
posição de migrante, o deslocado ambiental neste sentido a região do Sul
da Ásia tem um forte potencial de transformar-se num lugar de explosão
do número de migrantes ambientais.

1 Doutor em Ciências Sociais pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo


(2015), com mestrado também pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo
(2007) e graduação em História pela Universidade de São Paulo (1993). Atualmente é
Coordenador do Curso de Pós-Graduação Especialização Relações Internacionais Con-
temporâneas da Universidade do Vale do Itajaí (UNIVALI). Atua como docente nos
cursos de Mestrado Profissional Internacional Conjunto em Direito das Migrações
Transnacionais, também nos Cursos de Graduação Relações Internacionais e Direito na
UNIVALI. E-mail: walterjr@univali.br.
PROF. DR. WALTER BARBIERI JUNIOR

O Sul da Ásia é uma das regiões mais vulneráveis às mudanças


climáticas do mundo. Devido sua localização geográfica e as condições
naturais, a região é propensa a desastres como ciclones, secas, ondas de
calor ou o desaparecimento de áreas costeiras do território. Associado
aos problemas naturais, a localidade apresenta uma grande concentração
demográfica, onde uma grande parte da população enfrenta insegurança
alimentar, neste sentido a combinação dos efeitos da mudança climática
e a pobreza regional tende a afetar duramente a realidade de milhares de
asiáticos no século XXI.
O processo do aquecimento global pode provocar grandes pro-
blemas de recursos hídricos, alterações nas características e na magnitude
das monções2 que podem aumentar a probabilidade de ocorrência de vá-
rios tipos de secas no Sul da Ásia, em países da região como a Índia,
Paquistão, Bangladesh e Sri Lanka. Assim, o efeito das mudanças climá-
ticas provocará escassez de recursos hídricos impactando a produção
agrícola. A agricultura é um contribuinte significativo para o PIB dos
países do Sul da Ásia, mais da metade da população da região depende
da agricultura para a sobrevivência material.
Pode-se apontar que o aquecimento global aumentará a insegu-
rança alimentar e hídrica, em consequência, contribuirá para a migração
e deslocamento forçados. Neste sentido, há uma grande relevância na te-
mática do refugiado ambiental no mundo contemporâneo, que no mundo
contemporâneo chama a atenção de pesquisadores de diversas áreas do
conhecimento. Neste sentido, uma maior compreensão sobre o fenômeno
do chamado refugiado ambiental se faz necessário. A metodologia ado-
tada é a qualitativa e o desenvolvimento do trabalho se deu através de
pesquisa bibliográfica.

1. EFEITOS DAS MUDANÇAS CLIMÁTICAS NO SÉCULO


XXI: OS MIGRANTES AMBIENTAIS

A questão ambiental constitui um dos principais problemas do


século XXI. Segundo o Painel Intergovernamental sobre Mudanças Cli-
máticas (IPCC), que foi estabelecido desde 1988 pela Organização Me-
teorológica Mundial (OMM) e pelo Programa Ambiental das Nações
Unidas (PNUMA), para avaliar informações científicas sobre mudanças
climáticas, há evidências a partir das observações do sistema climático
que concluem que as atividades humanas estão contribuindo para o

2Fenômeno climático caracterizado pela mudança do padrão de ventos que mudam


de direção conforme as estações de inverno e verão e impactam no volume de água.
As monções provocam verões úmidos com a ocorrência de intensas chuvas e inver-
nos secos. A palavra monção vem do mausim árabe, que significa ‘Estação’, porque
essas tempestades voltam todos os anos.

244
MEIO AMBIENTE, MIGRAÇÕES E PANDEMIA: REFLEXÕES DO MUNDO CONTEMPORÂNEO

aquecimento da atmosfera terrestre. (Painel Intergovernamental sobre


Mudanças Climáticas, 2019).
Desde a Revolução Industrial de 1880, o sistema produtivo eco-
nômico adotado pelas sociedades modernas provocou um grande au-
mento nas concentrações de gases de efeito estufa (GEE), em consequên-
cia modificam a concentração de constituintes atmosféricos das proprie-
dades da Terra. Este processo decorre da queima de combustíveis fósseis
que alteram temperaturas, padrões de precipitação, nível do mar, eventos
extremos e outros aspectos do clima do qual dependem o ambiente natu-
ral e os sistemas humanos.
O IPCC aponta por meio de estudos aprofundados a ameaça da
mudança do clima para a existência de um planeta sustentável, segundo
o relatório houve um aumento de cerca de 1,0°C de aquecimento global
acima dos níveis pré-industriais (1880), com uma variação provável de
0,8°C a 1,2°C. Nos termos de manutenção dos níveis contemporâneos de
emissão de gases de efeito estufa, é possível que o aquecimento global
atinja 1,5°C entre 2030 e 2052. Os modelos climáticos projetam aumen-
tos na temperatura média na maioria das regiões terrestres e oceânicas,
extremos de calor na maioria das regiões habitadas, a ocorrência de
chuva intensa em diversas regiões e na probabilidade de seca e déficits
de chuva em algumas regiões. (Painel Intergovernamental sobre Mudan-
ças Climáticas, 2019)
O processo de degradação ambiental como resultado da mu-
dança climática tende a provocar um fluxo migratório de uma nova cate-
goria, o deslocado ambiental que devido a deterioração do meio ambiente
de seu lugar de origem decide migrar. Historicamente, a migração está
presente na vida humana devido à necessidade de uma busca constante
de melhor adaptação ou meio de forma a obtenção de sua subsistência.
No entanto, o processo das mudanças climáticas que promovem a degra-
dação ambiental criou a categoria dos deslocados ambientais. Os migran-
tes ambientais são aqueles forçados devido a causas naturais ou antrópi-
cas ligados a interferência humana no meio como determinante para a
detração ambiental. Como exemplos de motivações para os deslocados
ambientais, a partir de comunidades humanas vulneráveis a esta questão,
pode-se apontar aquelas que ocupam localidades junto as costas ou regi-
ões desertificadas ou qualquer outro fator climático que inviabilize a sub-
sistência por parte de uma população.
Segundo Zetter3, os migrantes ambientais estão sujeitos a viola-
ções de direitos humanos básicos causado pela degradação do ecossis-
tema induzida pelas mudanças climáticas. Nessa continuidade, haverá a

3Para Zetter há relevância política no sentido de criação normas de proteção, instru-


mentos e diretrizes no Direito Internacional, onde a degradação do ecossistema e o
esgotamento dos recursos do meio ambiente podem levar a conflitos e violência para
os refugiados ambientais. (ZETTER, 2008)

245
PROF. DR. WALTER BARBIERI JUNIOR

necessidade de elaboração de políticas no âmbito da comunidade inter-


nacional para dar respostas as condições dos chamados refugiados ambi-
entais, como por exemplo, os direitos de acesso à terra e moradia, liber-
dade de movimento e participação na tomada de decisões sobre reassen-
tamentos. (ZETTER, 2008)
As razões clássicas para o pedido de refúgio no direito interna-
cional estão associadas a problemas políticos, como uma guerra civil,
perseguições religiosas ou étnicas, questões relacionadas a violência e/ou
direitos humanos. Segundo Bettis, a maioria dos acadêmicos e formula-
dores de políticas e profissionais que trabalham com questão do ‘Regime
de refugiados’, assumem como base jurídica comumente a Convenção
de 1951 e seus Protocolo, onde o Alto-comissariado das Nações Unidas
para os Refugiados (ACNUR), Agência da ONU, considerado o grande
órgão relevante da Organização Internacional em relação à proteção de
refugiados. (BETTIS, 2006)
Na Convenção relativa ao Estatuto dos Refugiados da ONU
(1951)4 aparece os cinco temores para pedido de refúgio: raça, religião,
nacionalidade, pertencimento a grupo social e opiniões políticas. Assim,
evidencia-se que Convenção de 1951 não contempla os chamados mi-
grantes ambientais na condição de refugiados. A explicação está assen-
tada no fato de que a temática das mudanças climáticas como motivador
de deslocamentos humanos representa uma matéria emergente principal-
mente no século XXI.

Que, em consequência dos acontecimentos ocorridos antes de


1º de janeiro de 1951 e temendo ser perseguida por motivos
de raça, religião, nacionalidade, grupo social ou opiniões po-
líticas, se encontra fora do país de sua nacionalidade e que não
pode ou, em virtude desse temor, não quer valer-se da proteção
desse país, ou que, se não tem nacionalidade e se encontra fora
do país no qual tinha sua residência habitual em consequência
de tais acontecimentos, não pode ou, devido ao referido temor,
não quer voltar a ele. (ACNUR, Convenção relativa ao Esta-
tuto do Refugiado)

No entanto, a condição de um problema relativamente recente


não abranda a importância do debate uma vez que os problemas de de-
tração ambiental provocarão disputas pelos meios fundamentais de so-
brevivência das comunidades humanas, como o acesso e controle de

4 Adotada em 28 de julho de 1951 pela Conferência das Nações Unidas de Plenipo-


tenciários sobre o Estatuto dos Refugiados e Apátridas, convocada pela Resolução n.
429 (V) da Assembleia Geral das Nações Unidas, de 14 de dezembro de 1950. Entrou
em vigor em 22 de abril de 1954, de acordo com o artigo 43. Série Tratados da ONU,
N. 2545, Vol. 189.

246
MEIO AMBIENTE, MIGRAÇÕES E PANDEMIA: REFLEXÕES DO MUNDO CONTEMPORÂNEO

recursos hídricos, florestas e de solo em condições adequadas para a prá-


tica da agricultura e sobrevivência. Este provável cenário de degradação
ambiental no século XXI, tende a provocar um aumento considerável dos
migrantes ambientais, em consequência de disputas de interesses entre as
comunidades humanas e que certamente pautará controvérsias políticas
entre os Estados preocupados com questões de segurança nacional.
O debate sobre os migrantes ambientais enviesado pelo dilema
da questão da segurança nacional gerará inquietações sociais e prejudi-
cará a obtenção de direitos humanos básicos para os deslocados, tendo
em vista que, caso as prerrogativas materiais por parte dos interesses dos
Estados e das comunidades nacionais se sobreponham aos interesses hu-
manitários, a realidade social deve apresentar um quadro preocupante de
acúmulo de problemas de subsistência para milhares de humanos no sé-
culo XXI.
O termo “refugiados ambientais” teve origem em 1985 por Es-
sam El- Hinnawi por meio da publicação do Programa das Nações Uni-
das para o Meio Ambiente, caracterizando-os como “Aquelas pessoas
que foram forçadas a deixar seu habitat tradicional, temporária ou per-
manentemente, por causa de uma perturbação ambiental acentuada (na-
tural e / ou desencadeada por pessoas) que comprometeu sua existência
e / ou afetou seriamente a qualidade de vida. Por ruptura ambiental “nesta
definição entende-se qualquer alteração física, química e / ou biológica
no ecossistema (ou base de recursos) que a tornam, temporária ou per-
manentemente inadequada para sustentar a vida humana”. (DRAGHI,
2018). Como descrito anteriormente neste trabalho, a nomenclatura “re-
fugiado ambiental” não existe enquanto categoria oficial migratória nas
Organizações Internacionais, assim estudiosos e formuladores de políti-
cas para este assunto utilizam comumente os termos migrantes ambien-
tais ou deslocados ambientais. De qualquer forma, a evidência da degra-
dação ambiental no século XXI e o baixo grau de proteção a esses mi-
grantes, reforça a necessidade de um alargamento do debate a respeito da
matéria, na busca de garantir direitos básicos para aqueles que se deslo-
cam por motivos dos efeitos das mudanças climáticas.
Para Ramos, os migrantes ambientais carecem de um regime in-
ternacional de proteção, e apesar da existência de controvérsia entre ci-
entistas, acadêmicos e atores políticos a respeito da conexão entre as mu-
danças ambientais e a mobilidade humana, o deslocamento de comuni-
dades tende a ocorrer cada vez mais, deste modo, a presença dos chama-
dos refugiados ambientais é irrefutável e tende a produzir de forma re-
corrente situações de violação de direitos humanos básicos. Assim,
torna-se necessário uma abordagem e soluções integradas para o pro-
blema dos deslocados ambientais, que estabeleça conexões entre a pro-
teção dos direitos humanos e das condições de preservação do meio am-
biente. Para a autora, deveria ser adotada uma convenção internacional

247
PROF. DR. WALTER BARBIERI JUNIOR

para a categoria emergente dos chamados refugiados ambientais, dessa


forma, construir-se-ia uma direção para garantir uma proteção dos direi-
tos humanos as pessoas que foram obrigadas a abandonar seus locais de
origem e seus modos de vida em razão da deterioração do meio ambiente.
(RAMOS, 2011)

2. O MIGRANTE AMBIENTAL NO SUL DA ÁSIA

O Sul da Ásia representa uma das principais regiões do mundo


para a uma grande expansão de migrantes ambientais. Geograficamente,
o Sul da Ásia consiste na área formada pelos países que são banhados
pelo Oceano Índico: Irã, Afeganistão, Paquistão, Índia, Nepal, Bangla-
desh, Maldivas e Sri Lanka. A região tem uma população de 1,62 bilhões
vivendo em 642 milhões de hectares ou 5% da área geográfica do mundo.
A região do Sul da Ásia, abriga mais de um quinto da população mundial
e é conhecida por ser a região mais sujeita a desastres naturais do mundo.
As altas taxas de crescimento populacional, pobreza socioeconômica e a
degradação dos recursos naturais, produzem um quadro de tensão cons-
tante na questão da segurança alimentar. Deste modo, o Sul da Ásia apre-
senta-se como uma das regiões mais vulneráveis do planeta aos impactos
das mudanças climáticas no século XXI, a combinação entre os proble-
mas socioeconômicos de pobreza inerentes da região com a degradação
ambiental, coloca a região como um dos principais locais de fluxo de
saída de migrantes ambientais para o mundo. (LAL; SIVAKUMAR;
FAIZ; RAHMAN; ISLAM, 2011)
Decorrente das mudanças climáticas, o século XXI manifesta
significativos desafios humanitários para o Sul da Ásia, como o aumento
de ondas de calor, juntamente com um aumento na variabilidade intera-
nual da precipitação diária no chamado fenômeno das monções caracte-
rístico da região. O aumento da temperatura tende a diminuir o rendi-
mento das safras nas partes tropicais do Sul da Ásia, decorrente dos im-
pactos indiretos ligado à disponibilidade de água que reflete na alteração
do estado de umidade do solo. (SIVAKUMAR; STEFANSKI, 2011)
Os impactos das alterações climáticas no Sul da Ásia serão he-
terogêneos, algumas regiões tendem a ocorre precipitação mais intensa e
maiores riscos de inundação, enquanto outras localidades enfrentam chu-
vas mais escassas e secas prolongadas. Neste sentido, o aumento de tem-
peratura provocará dificuldades na produção de arroz e trigo nas partes
tropicais do Sul da Ásia, onde essas safras já estão sendo cultivadas perto
de seu limite de tolerância à temperatura. Calcula-se que um aumento de
2° C na temperatura média e um aumento de 7% na precipitação média
reduzirá a receita líquida em 8,4% na Índia, prevê-se que a produção de
trigo diminua em 6 a 9% em regiões sub-úmidas, semiáridas e áridas

248
MEIO AMBIENTE, MIGRAÇÕES E PANDEMIA: REFLEXÕES DO MUNDO CONTEMPORÂNEO

áreas com aumento de 1°C na temperatura; no caso do Sri Lanka, é pre-


visto um aumento de 0,5°C na temperatura deve reduzir a produção de
arroz em 6%, e o aumento da secura afetará adversamente os rendimentos
de produtos-chave como chá, borracha e coco. (SIVAKUMAR; STE-
FANSKI, 2011)
O sistema hidrológico é sensível às mudanças climáticas, o au-
mento na temperatura resultará em mudanças na evapotranspiração, umi-
dade do solo e infiltração. O aumento de CO2 atmosférico tende a au-
mentar a precipitação média, assim, as alterações em chuvas podem afe-
tar a disponibilidade de água em solos, rios e lagos, com implicações para
abastecimento de água doméstico e industrial, dificultando a geração de
energia hidrelétrica e agricultura produtividade. O aumento da evapo-
transpiração aumenta o teor de vapor de água da atmosfera e o efeito
estufa, e a temperatura média global sobe ainda mais. O uso da terra tam-
bém terá um papel fundamental no aumento da evapotranspiração. Pos-
síveis mudanças em temperatura e precipitação resultam em mudanças
na umidade do solo e escoamento da água subterrânea. (MIRZA; AH-
MAD, 2005)
Ainda sobre os efeitos da mudança climática nos recursos hi-
dráulicos, a região do Sul da Ásia é formada por grandes rios, que são
responsáveis pela vida da economia de grande parte do continente. A
massa de gelo que cobre a cordilheira Himalaia-Hindu Kush é a nascente
dos nove maiores rios da Ásia, incluindo o Ganges, Brahmaputra e Indo.
Muitas pessoas na Ásia dependem do degelo glacial durante a estação
seca. É provável que isso tenha grandes implicações para aqueles que
dependem do recurso, afetando a disponibilidade de água para fins agrí-
colas. (SIVAKUMAR; STEFANSKI, 2011)
O esgotamento dos recursos hídricos é um motivo de preocupa-
ção nos países do Sul da Ásia. O impacto do aquecimento global na ges-
tão de cheias será um grande problema na Nepal, Índia e Bangladesh, a
situação de monções causará uma série de problemas de alocação e ges-
tão da água. A região é ocupada por pequenos agricultores que possuem
baixa capacidade financeira e técnica para se adaptar à variabilidade cli-
mática, e devido a situação de precariedade socioeconômica inexiste uma
estrutura de proteção para grande parte dos camponeses.
A disponibilidade e o consumo de recursos hídricos não são uni-
formes entre os países do Sul da Ásia. O grande volume das águas é ge-
rado na monção durante o período de verão (junho-setembro), enquanto
os inversos geralmente são períodos secos. A escassez de água é um pro-
blema crítico principalmente no Paquistão; na Índia, muitas áreas sofrem
de estresse hídrico que incluem as regiões das sub-bacias do Indo,
Krishna e Ganges. Mesmo durante o período da monção, uma grande
área na Índia e em Bangladesh sofre de escassez de água. (MIRZA; AH-
MAD, 2005)

249
PROF. DR. WALTER BARBIERI JUNIOR

Devido a condição de pobreza em grande parte da região, a efi-


ciência da irrigação é geralmente baixa, assim precisa ser melhorada o
suficiente para reduzir a demanda de água e reformas estruturais são ne-
cessárias para melhorar a gestão da água. As doenças transmitidas pela
água contribuem para mortalidade infantil, e na região o acesso à água
potável é limitado.
O maior impacto ocorrerá na população pobre, que têm menor
acesso aos recursos hídricos, estima-se que 2,5 bilhões de pessoas vão
ser afetadas com estresse hídrico até o ano de 2050 no Sul da Ásia. Nas
zonas áridas, os agricultores lutam com outros desafios extremos, como
baixa fertilidade do solo, pragas, doenças das colheitas e falta de acesso
a insumos e sementes melhoradas. Além disso, os desafios são geral-
mente agravados por períodos de secas prolongadas e / ou inundações
característica da região. (SIVAKUMAR; STEFANSKI, 2011)
O impacto do aquecimento global na agricultura nos países do
sul da Ásia deve gerar perdas substanciais, a produção líquida de cereais
deve diminuir entre 4% e 10% até o final do século XXI, a partir de uma
interpretação de um cenário conservador de mudanças climáticas; em
Bangladesh, a degradação ambiental afetará drasticamente a produção de
arroz e trigo, acredita-se que pode cair 8% e 32%, respectivamente, até o
ano de 2050; enquanto na Índia, estudos mostram que um aumento de
0,5° C na temperatura do inverno pode reduzir a produtividade do trigo
em 0,45 toneladas por hectare; no Paquistão, os manguezais ao longo do
Delta do Indo, são responsáveis pela lenha e forragem para os habitantes
locais e são criadouros para uma estimativa 90% dos camarões que são
exportados, assim os impactos prejudiciais das mudanças climáticas so-
bre os meios de subsistência rurais resultariam em um êxodo rural que
gerarão demandas de infraestrutura urbana. (SIVAKUMAR; STE-
FANSKI, 2011)
Ainda no âmbito da segurança alimentar, segundo o IPCC, um
aumento do aquecimento global terá forte impacto nos sistemas humanos
e ecológicos em pequenas ilhas, zonas costeiras baixas e deltas, devido
aos riscos relacionados à elevação do nível do mar, que apresentaria
como consequência um aumento da intrusão de água salgada, inundações
e danos à infraestrutura. As megacidades costeiras da Indo-Ásia-Pací-
fico, decorrente do aumento do nível do mar provocará importantes
transtornos em cidades de baixa altitude como Karachi (Paquistão),
Mumbai (Índia) e Dhaka (Bangladesh). (IPCC, 2018). Também, as mu-
danças climáticas afetarão problemas de Estados insulares que são vul-
neráveis à elevação do nível do mar, (FETZEK; MCGINN, 2020), como
exemplo, os efeitos do nível do mar ameaça fortemente República das
Maldivas, um pequeno país insular no sul da Ásia, onde a população do
país depende principalmente da água subterrânea e da chuva como um
fonte de água doce, porem como as ilhas das Maldivas são baixas, o

250
MEIO AMBIENTE, MIGRAÇÕES E PANDEMIA: REFLEXÕES DO MUNDO CONTEMPORÂNEO

aumento do nível do mar forçará a água salgada pressionando a oferta de


água doce. (SIVAKUMAR; STEFANSKI, 2011)
O desenvolvimento econômico decorrente da expansão econô-
mica capitaneada principalmente pela Índia nas recentes décadas criou
um processo de contradição econômico-ambiental na região, devido ao
processo de industrialização, o movimento de êxodo rural tende a se in-
tensificar. A região do Sul da Ásia é uma das regiões mais densamente
povoadas do mundo, assim há uma tendência de formação de muitas me-
trópoles com importante concentração demográfica. O aumento no uso
de água pode ser afetado por meio do crescimento na renda per capita e
pelo êxodo rural, normalmente pessoas economicamente mais ricas uti-
lizam mais água do que as classes sociais baixas, como base de estima-
tiva, os moradores urbanos de Dhaka, capital de Bangladesh, que vivem
nas áreas residenciais de alta renda usam 2,5 vezes mais água do que as
pessoas de menor rendimento. Geralmente, o requisito padrão per capita
de água urbana é 2 vezes maior do que nas áreas rurais. Além disso, de-
corrente do processo de enriquecimento da população, presume-se que
os hábitos alimentares das pessoas ao longo do século com o maior con-
sumo de mais proteína. Portanto, no futuro, o aumento da demanda por
aves e produtos pecuários será uma realidade na área, assim resultaria em
aumento da demanda de água para irrigação de estoque, crescimento de
forragens e alimentos para gado (MIRZA; AHMAD, 2005).
Historicamente, o Sul da Ásia é uma das regiões com grande
fluxo migratório de população de refugiados do mundo, tradicionalmente
a motivação do êxodo está associada a perseguições religiosas ou étnicas
e a instabilidade sociopolítica. A experiência empírica da região do Sul
da Ásia mostra uma postura heterogênea entre os Estados nacionais na
recepção aos refugiados. Países como Bangladesh, Índia, Paquistão e Ne-
pal são países que tendem a hospedar refugiados, enquanto o Afeganis-
tão, Butão e Sri Lanka são aqueles geram fluxo de refugiados. o bloco de
integração regional, a Associação de Cooperação Regional do Sul da
Ásia (SAARC)5 é pouco ativo na questão para estabelecer políticas
quanto a refugiados políticos, e no momento contemporâneo há uma
nova classe, os chamados refugiados ambientais, decorrente das mudan-
ças climáticas, onde os formuladores de políticas regionais nem mesmo
remotamente discute a questão dos refugiados do clima. (JOLLY; AH-
MAD, 2019)

5A Associação Sul-Asiática para a Cooperação Regional representa uma organização


política e econômica do Sul da Ásia. A Associação, em termos de população somada
a população dos Estados membros atinge aproximadamente 1.500 milhões de pes-
soas. Foi criada em 08 de dezembro de 1985 pela Índia, Paquistão, Bangladesh, Sri
Lanka, Nepal, Butão e Maldivas. No ano de 2007, o Afeganistão tornou-se membro
do Bloco regional.

251
PROF. DR. WALTER BARBIERI JUNIOR

A questão dos refugiados é grave no Sul da Ásia, devido à pre-


cariedade no desenvolvimento de uma estrutura formal para lidar com o
problema. Na ausência de lei específica para refugiados, pessoas na con-
dição de refugiados e requerentes de asilo são tratados e tomadas de de-
cisões justificadas a partir de decisões baseadas na centralidade da juris-
dição soberana dos Estados nacionais os migrantes. Neste cenário de vá-
cuos legais nacionais e internacionais, os migrantes ambientais estão em
um estado de incerteza no que diz respeito ao seu estatuto jurídico e pro-
teção. Devido ao grau de pobreza e de alto comprometimento das condi-
ções geográficas do Sul da Ásia, a migração transfronteiriça está em um
quadro de alta vulnerabilidade na região. (JOLLY; AHMAD, 2019)
Neste sentido, a iminente migração dos chamados refugiados do
clima deverá provocar um crise decorrente do deslocamento ao longo do
século XXI, e que provavelmente devido ao alto grau de vulnerabilidade
das condições socioeconômicas do Sul da Ásia, o aumento da detração
ambiental que compromete a capacidade de recursos naturais básicos
como a água e o solo, somado a ausência de um melhor preparo legal
para lidar com ao regime de proteção de refugiados climáticos por parte
dos Estados nacionais e das Organizações Internacionais, podemos dizer
que o quadro é preocupante em termos do respeito as condições básicas
de direitos humanos na região. Ainda, uma crise regional decorrente dos
problemas ambientais, devido a grande proporção demográfica, os efei-
tos negativos não se limitarão ao âmbito regional sul-asiático, provavel-
mente esta migração produzirá impactos em muitas regiões do mundo.

CONCLUSÃO

O Sul da Ásia é uma das principais regiões do mundo em termos


de concentração populacional com um alto grau de pobreza. A precarie-
dade socioeconômica da região, associada aos riscos crescentes das mu-
danças climáticas ameaçam a obtenção de sustento básico para a sobre-
vivência. As alterações atmosféricas decorrentes do processo de indus-
trialização pós 1880 está comprometendo recursos naturais como a água
e a capacidade de cultivo do solo.
Como enfrentamento dos impactos das alterações climáticas, há
necessidade de uma melhor compreensão da vulnerabilidade dos peque-
nos agricultores de forma a criar mecanismo de práticas de adaptação
para lidar com as mudanças climáticas. O trabalho deve focar a restaura-
ção de solos e ecossistemas degradados de forma a melhorar as condições
de resiliência social. A gestão sustentável do solo e dos recursos hídricos
pode fazer a diferença na adaptação bem-sucedida frente aos desafios das
alterações climáticas do século XXI.

252
MEIO AMBIENTE, MIGRAÇÕES E PANDEMIA: REFLEXÕES DO MUNDO CONTEMPORÂNEO

Segundo o IPCC, a cooperação internacional é um catalisador


crítico para países em desenvolvimento e regiões vulneráveis, assim o
movimento de reação deve contar com a participação de autoridades na-
cionais e subnacionais, da sociedade civil, do setor privado, dos povos
indígenas e das comunidades locais que podem promover ações que
apoiam em intervenções que atenuem o desequilíbrio ambiental do pla-
neta. (IPCC, 2019). É imprescindível a tomada de ações no processo de
mitigação da degradação ambiental decorrente das mudanças climáticas,
atividades de pesquisas sobre os efeitos das alterações ambientais podem
remodelar o ambiente estratégico no sentido de preservar a segurança
regional do Sul Asiático, também, realizações práticas contribuem deci-
sivamente para a recuperação e preservação das condições do planeta.
A interação entre as estruturas de soberania dos Estados nacio-
nais e as questões internacionais aparecerão em grande debate ao longo
do século XXI. Importante salientar que não há uma estrutura jurídica e
normas no Direito Internacional que crie formas de proteção para deslo-
cados ambientai junto aos Estados nacionais. É essencial reconhecer os
fatores que provocam cada vez mais movimentos migratórios decorrente
das mudanças climáticas. Devido à tendência ao agravamento das mu-
danças climáticas, provavelmente os deslocados ambientais irão frequen-
temente não retornar para o seu lugar de origem. Neste sentido a temática
dos refugiados ambientais tende a tencionar os desencontros nas relações
internacionais do século XXI, na medida que as migrações ambientais
representam um processo global, e não uma crise local.
A temática dos migrantes climáticos no Sul da Ásia é relevante
dado que envolve bilhões de pessoas que vivem em um estado de preca-
riedade socioeconômica e em uma região que enfrenta série obstáculos
devido as mudanças climáticas. Desta forma, a matéria deve receber um
número cada vez maior de interessados, como acadêmicos, membros da
sociedade civil e formuladores de política no sentido de realizar pesqui-
sas e ações para traçar estratégias funcionais para lidar os migrantes cli-
máticos. Devido ao cenário das relações internacionais contemporâneas
caracterizado pela fragilidade no envolvimento na defesa de medidas res-
ponsáveis para mitigar os efeitos da degradação ambiental, os deslocados
ambientais do Sul da Ásia provavelmente constituirão em um dos prin-
cipais grupos na condição de refugiados.

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