Você está na página 1de 4

Registro por armadilhas fotográficas do lobo-guará, Chrysocyon brachyurus

(ILLIGER,1815), em um fragmento de Cerrado na Fazenda Veredas do Cerrado, Buritis - MG


O maior canídeo nativo da América do Sul, o Lobo-Guará (Chrysocyon brachyurus, Illiger,
1815) é único representante de seu gênero, possuindo hábitos solitários e grandes áreas de vida.
O animal geralmente mede entre 95 e 165 centímetros, pesa entre 20 e 30 quilos e pode chegar a
um metro de altura. Ele é onívoro, de dieta muito variada, sendo ela composta de
aproximadamente 50% de matéria vegetal e 50% de matéria animal. A fruta-do-lobo (Solanum
lycocarpum) aparece como uma das principais fontes de alimento (DIETZ, 1984; PAULA, MÉDICI
& MORATO, 2008).
Seu habitat é característico do bioma Cerrado e se distribui no Brasil central, sudeste
paraguaio, norte boliviano e através do nordeste argentino, mas em 2006 um espécime foi
capturado no Uruguai, confirmando a presença da espécie no local (RODDEN et al., 2004;
QUEIROLO, & MOTTA-JUNIOR 2007). Atualmente, a IUCN lista a espécie como ameaçada de
extinção, e no Brasil está classificada na categoria vulnerável. As principais ameaças enfrentadas
para a espécie é a fragmentação de seu habitat natural, introdução de espécies exóticas e
atropelamentos. (MMA, 2014; IUCN, 2016).
O uso das armadilhas fotográficas (camera trap) só veem aumentando, isso porque elas
têm se mostrado como uma ferramenta eficiente para registro de fauna (SILVEIRA et al., 2003;
SRBEK-ARAUJO & CHIARELLO. 2007), é um método não invasivo e em estudos de longa
duração, possuem baixo custo considerando o esforço amostral. Inicialmente, esta técnica era
utilizada para estimativas de tamanho populacional, mas ela permite vários estudos em ecologia
animal, além dos registros de espécies raras, ameaçadas e exóticas (KARANTH, 1995;
KARANTH & NICHOLS, 1998; TOBLER et al. 2008, CARVALHO et al. 2013).

Metodologia
O monitoramento foi realizado entre os anos de 2016 e 2020 (quatro anos), abrangendo
desta maneira a estação chuvosa e o período de seca na região. O monitoramento aconteceu na
fazenda Veredas Cerrado (15º27’13’’S e 46º 45’43º W), localizada no município de Buritis, Minas
Gerais, com uma área total de 300 hectares (Figura 1). A fazenda apresenta fitofisionomias
variadas de cerrado, incluindo matas de galeria, Cerrado stricto sensu e veredas.

Figura 1 - Mapa da fazenda Veredas do Cerrado e localização das câmeras. (Fonte: Adaptado
do Google Maps, 2020).
Foram utilizadas cinco armadilhas fotográficas (Câmeras Bushnell HD 1920x1080 pixels
com gravação de áudio), o armazenamento é feito em cartões SD (Secure Digital) e funcionam
com pilhas alcalinas, programadas para registrar indivíduos tanto em atividade diurna como
noturna, em vídeos com duração de 10 segundos. Possuem sensor infravermelho e realizam o
registro fotográfico quando o animal passa na frente dela. Foram distribuídas em cinco pontos
distintos da fazenda, em fitofisionomias diferentes da região (Figura 1): P1 (15º27’43.7”S
46º45’17.8”W); P2 (15º27’52.2”S 46º45’15.8”W); P3 (15º28’18.9”S 46º45’07.3”W); P4
(15º28’43.5”S 46º45’06.2”W); P5 (15º28’34.4”S 46º44’33.9”W).
A área de estudo foi percorrida em automóveis e a pé, os pontos de instalações das
armadilhas foram decididos de acordo com a existência de indícios ou de diversificação de
pontos-de-vista onde foram identificados com pegadas, rastos e vestígios. As armadilhas foram
instaladas a 50cm do chão, em suportes naturais (árvores, arbustos).

Resultados e Discussão
No total foram analisados 2776 registros de animais silvestres no período do
monitoramento. Foram desconsideradas das análises os “vídeos sequenciais”, que são os vídeos
da mesma espécie com intervalo menor do que uma hora entre um vídeo e outro, em uma
mesma armadilha. Os vídeos das armadilhas sendo instaladas e de animais domésticos foram
excluídos da análise.

Figura 2 – Registros feitos pelas armadilhas

Ao todo, foram 19 registros do lobo-guará (Figura 2), sendo que mais da metade (63%)
aconteceram em estradas e trilhas em cerrado típico e 37% em trilhas em mata de galeria. Esses
resultados corroboram com os de outros autores (BUENO et al. 2002; DIETZ, 1984; MOTTA-
JUNIOR, et al. 1996; MOTTA-JUNIOR & MARTINS, 2002), mostrando que os indivíduos de lobo-
guará têm preferencias por habitats abertos, estradas e trilhas, muito provavelmente por serem
indivíduos altamente adaptados para caçar presas pequenas em ambientes abertos (NARDOTO,
et al. 2006).
Segundo Trombulak e Frissell (2000) a explicação para essa associação de grandes
mamíferos com estradas e trilhas é que elas são um meio pelo qual os animais selvagens podem
salvar energia e viajar longas distâncias rapidamente. Todos os registros foram noturnos, o que
coincide com a atividade natural de caça do lobo-guará (DE MELO, et al. 2007; SA´BATO, et al.,
2006).
Outro estudo (SOARES, 2018) mostrou que as armadilhas fotográficas apresentaram
menor eficiência quando comparado com outras técnicas, o ideal é a união de mais de uma
metodologia.

Conclusão

Referências Bibliograficas
TROMBULAK, S. C.; FRISSELL, C. A. Review of ecological effects of roads on terrestrial and
aquatic communities. Conservation Biology v. 14, p. 18–30, 2000.
NARDOTO, G. B.; BUSTAMANTE, M. M. C.; PINTO, A. S.; KLINK, C. A. Nutrient use efficiency at
ecosystem and species level in savanna areas of central Brazil and impacts of fire. Journal of
Tropical Ecology v. 22, p.191–201, 2006.
BUENO, A. A.; BELENTANI, S. C. S.; MOTTA-JUNIOR, J. C. Feeding ecology of the maned wolf,
Chrysocyon brachyurus (Illiger, 1815) (Mammalia: Canidae), in the ecological station of Itirapina,
Sa˜o Paulo State, Brazil. Biota Neotropica, v. 2, p. 1–9, 2002.
DE MELO, L. F. B.; SA´ BATO, M. A. L.; MAGNI, E. M. V.; YOUNG, R. J.; COELHO C. M. The
secret lives of maned wolves Chrysocyon brachyurus Illiger 1815: as revealed by GPS tracking
collars. Journal of Zoology (London), v. 271, p. 27–37, 2007.
DIETZ, J. M. Ecology and social organization of the maned wolf (Chrysocyon brachyurus).
Smithsonian Contributions to Zoology, v. 392, p. 1-51, 1984.
PAULA, R. C.; MEDICI, P.; MORATO, R. G. Plano de Ação para a Conservação do Lobo-Guará -
Análise de Viabilidade Populacional e de Habitat. Brasília: Centro Nacional de Pesquisas para
Conservação dos Predadores Naturais - CENAP/ICMBio, 2008.
RODDEN, M.; RODRIGUES, F. H. G.; BESTELMEYER, S. V. Chapter 3. South America
(Neotropical)». In: Sillero-Zubiri,C.; Hoffman,M.; McDonald, D. Canids: Foxes, Wolves, Jackals
and Dogs (Gland, Suíça: IUCN/SSC Canid Specialist Group). p. 26–80. ISBN 2-8317-0786-2,
2004.

QUEIROLO, D., & MOTTA-JUNIOR, J. C. Prey availability and diet of maned wolf in Serra da
Canastra National Park, southeastern Brazil. Acta Theriologica, v. 52, p. 391-402, 2007.

SILVEIRA, L., JACOMO, A. T. D.; DINIZ, J. H. F. Camara trap, line transect censos and
tracksurveys: a comparative evaluation. Biological Conservation, v.114, n, 3, p. 351-355, 2003.
IUCN. Lista Vermelha da IUCN de Espécies Ameaçadas. Versão 2016. Disponível em:
http://www.iucnredlist.org. Acesso em 07 dez 2020.
MMA - Ministério do Meio Ambiente. Lista Nacional das espécies da fauna brasileira ameaçadas
de extinção. 2014. Disponível em: http://www.mma.gov.br/biodiversidade/especiesameacadas-de-
extincao/fauna-ameacada. Acesso em 07 dez 2020.
KARANTH, K. U.; NICHOLS, J. D. Estimation of tiger densities in India using photographic
captures and recaptures. Ecology, v. 79, p. 2852 – 2862, 1998.
KARANTH, K. U. Estimating of tiger population from camera-trap data using capturerecapture
models. Biological Conservation, v. 71, p. 333 – 338, 1995.
MOTTA-JUNIOR, J. C.; TALAMONI, S. A.; LOMBARDI, J. A.; SIMOKOMAKI, K. Diet of the maned
wolf, Chrysocyon brachyurus, in central Brazil. Journal of Zoology, Lond, v. 240, p. 277-284, 1996.
MOTTA-JUNIOR, J. C. & MARTINS, K. The frugivorous diet of the maned wolf, Chrysocyon
brachyurus, in Brazil: ecology and conservation. pp. 291- 303. In: LEVEY, D. J.; SILVA, W. R.;
GALETTI, M. (eds). Seed dispersal and Frugivory: Ecology, Evolution and Conservation. CAB
Publishing, p 544, 2002.
SRBEK-ARAUJO, A. C.; CHIARELLO, A. G. Armadilhas fotográficas na amostragem de
mamíferos: considerações metodológicas e comparação de equipamento. Revista Brasileira de
Zoologia, v. 24, p. 647-656, 2007.
TOBLER, M. W.; CARRILLO-PERCASTEGUI, S. E.; LEITE PITMAN, R.; MARES POWEL, G. An
evaluation of camera traps for inventorying large- and medium-sized terrestrial rainforest
mammals. Animal Conservation, v.11, p. 169-178, 2008.
CARVALHOo, W. D.; DE MACEDO GODOY, M. S. A.; ADANIA, C. H.;ESBÉRARD, C. E. L.
Assembléia de mamíferos não voadores da reserva biológica serra do Japi, Jundiaí, São Paulo,
sudeste do Brasil= Non-volant mammal assemblage of serra do Japi biological reserve, Jundiaí,
São Paulo, southeastern Brazil. Bioscience Journal, v. 29, p. 1370-1387, 2013.

Você também pode gostar