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Quim. Nova, Vol. 45, No. 8, 949-958, 2022 http://dx.doi.org/10.21577/0100-4042.

20170889

O MERCADO DE ÓLEOS ESSENCIAIS NO BRASIL E NO MUNDO NA ÚLTIMA DÉCADA

Revisão
Humberto R. Bizzoa,b,*, e Claudia M. Rezendeb
a
Embrapa Agroindústria de Alimentos, 23020-470 Rio de Janeiro – RJ, Brasil
b
Instituto de Química, Universidade Federal do Rio de Janeiro, 21945-970 Rio de Janeiro – RJ, Brasil

Recebido em 25/01/2022; aceito em 08/03/2022; publicado na web em 05/04/2022

THE MARKET OF ESSENTIAL OILS IN BRAZIL AND IN THE WORLD IN THE LAST DECADE. The international trade of
essential oils accounted for more than US$ 10 billion in 2021, with a growing tendence. USA, China, India, France and Brazil are
the main global players. Reliable and comprehensive market data, however, is hard to obtain. Apart from a few government databases
dealing with import/export values, information regarding local (national/internal) production and consumption as well as market
trends, when available, are for sale, and expensive. Data from the global and Brazilian markets in the last decade were gathered and
discussed in this review, with highlights on the balance of trade and the main oils produced in Brazil. As a megadiverse country,
opportunities for new essential oils from Brazil do exist, but several obstacles must be overcome, such as legislation compliance,
quality, supply and safety assurance, so that the market can be conquered.

Keywords: essential oils; market; international trade; commercial balance; ISO.

INTRODUÇÃO bem como a origem geográfica da planta (quando implica diferenças


físicas e químicas no óleo). Outra norma, a ISO 4720, especifica
Óleos essenciais (OEs) são definidos, segundo a norma 9235 as espécies botânicas usadas na produção dos OE comerciais.5 As
da International Organization for Standardization (ISO), como características físico-químicas, como cor, odor, densidade, rotação
“...produtos obtidos de matérias-primas naturais de origem vegetal, óptica, índice de refração e composição mínima também são descritas
por destilação a vapor, por processos mecânicos a partir do epicarpo nas normas. De modo análogo, os métodos de ensaio para a testagem
de frutos cítricos, ou por destilação a seco, após a separação da das especificações são descritos em normas próprias, podendo variar
fase aquosa – se houver – por processos físicos”.1 Essa definição é desde simples medidas de densidade6 até cromatografia gasosa com
seguida internacionalmente pela indústria e associações científicas fases quirais.7
e regulatórias do setor. Logo, extratos contendo voláteis obtidos O objetivo da normatização é fazer com que os atores da cadeia
com solventes, ceras e gorduras, fluidos supercríticos, técnicas de produtiva, ao usar um nome ou termo normatizado, estejam, todos,
headspace ou quaisquer outros meios não são óleos essenciais. Na referindo-se a um mesmo produto, evitando (ou tentando evitar)
mesma norma técnica são apresentadas as definições e designações equívocos entre as partes, voluntários ou não. Obviamente, variações
para esses outros tipos de produtos aromáticos. lote a lote na composição são esperadas, pois trata-se de produto
O Brasil é um importante ator na cadeia de produção e natural, sujeito às respostas do metabolismo secundário da planta.8
comercialização de OEs, ofertando esse tipo de insumo ao mercado Essas variações devem estar, entretanto, dentro de faixas de tolerância
internacional há quase 100 anos.2 Diferentes OEs foram produzidos também descritas nas normas.
ao longo deste século de história, tanto de espécies nativas (pau-rosa, Assim, para fins de comércio internacional, um OE só pode ser
sassafrás) quanto de exóticas (menta, laranja, eucalipto).2 rotulado como “óleo essencial de lavanda” (essential oil of lavender)
Neste artigo são apresentados e discutidos diversos aspectos se for obtido por destilação a vapor de flores recentemente colhidas
do mercado de óleos essenciais, incluindo dados da última década da espécie Lavandula angustifolia Mill.9 Um óleo destilado de flores
relativos ao comércio internacional de OEs, seu impacto na balança de L. latifolia Medikus, cultivadas na Espanha, por outro lado, deve
comercial brasileira e dados da produção nacional. ser rotulado como “óleo essencial de lavanda spike tipo espanhol”
(essential oil of spike lavender, Spanish type).10 Outros exemplos são
NORMAS TÉCNICAS PARA ÓLEOS ESSENCIAIS fornecidos na Tabela 1S (Material Suplementar). Isso não significa
que óleos de outras espécies ou com variações fora das faixas de
A ISO possui, atualmente, 143 normas publicadas referentes a tolerância normatizadas não possam ser comercializados; se houver
óleos essenciais, além de 8 em desenvolvimento.3 Esses documentos quem produza e quem compre, haverá comércio. Porém, a designação
contêm as especificações técnicas para a maioria dos óleos essenciais do produto (o nome do óleo essencial no rótulo) não poderá ser a
com importância comercial, bem como seus métodos de análise e mesma usada para o produto normatizado.
aspectos de rotulagem. Um desses documentos, a ISO 3218, descreve Diversos países possuem normas técnicas com especificações de
o que deve ser considerado ao se conferir um nome “oficial” a um produto e métodos de análise. No Brasil, a Associação Brasileira de
óleo essencial: a origem botânica da planta, a parte usada, o estado Normas Técnicas (ABNT) editou normas para OEs desde a década
fenológico, a existência de pré-tratamento do material antes da de 1970. Entretanto, todas foram canceladas entre 2010 e 2011 e, no
destilação e método de obtenção (quando houver mais de um).4 Outras presente, não há normas nacionais vigentes para óleos essenciais.11
informações podem ser acrescidas ao nome, se necessário, quando há Óleos produzidos no país em pequena escala, a partir de espécies
ocorrência de variedades, clones e quimiotipos associados a um OE, nativas ou mesmo exóticas, não possuem especificações pré-definidas.
Somando-se a isso a variedade na composição dos metabólitos
*e-mail: humberto.bizzo@embrapa.br secundários de plantas em função de sua herança genética e das
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condições edafoclimáticas nas quais são cultivadas,8 não é raro são computados com base na Classificação Nacional de Atividades
encontrar OEs, supostamente da mesma espécie, de duas ou mais Econômicas (CNAE),20 que agrupa os produtos diferentemente do
procedências com composições qualitativa e quantitativamente SH. A comparação direta de dados não é possível, embora algumas
diferentes.12 Essa falta de uniformidade é, aliás, um dos principais generalizações possam ser feitas.
problemas para os produtores e as indústrias interessadas no seu
emprego. Sistema Harmonizado (SH)

A PESQUISA DE DADOS DE MERCADO PARA ÓLEOS O Sistema Harmonizado de Descrição e Codificação de


ESSENCIAIS Mercadorias, ou apenas Sistema Harmonizado (Harmonized System,
HS, em inglês) é uma nomenclatura de produtos adotada no comércio
Informações sobre o mercado internacional são difíceis de obter. internacional desenvolvida pela Organização Mundial de Alfândegas.
Geralmente são de documentos disponíveis para compra, com custo É adotado em mais de 200 países e classifica cerca de 98 % das
entre US$ 500 e 5000, com projeções de mercado.13–15 Uma fonte mercadorias comercializadas no mundo.21
gratuita e bem detalhada é a Comtrade Database, mantida pela Consiste em um número, de 2 a 6 dígitos, nos quais os dois
ONU.16 O Trade Map, do International Trade Center (ITC) é outra primeiros correspondem ao capítulo, os dois seguintes à posição e
fonte de acesso livre.17 No Brasil, informações sobre importação e os dois últimos à subposição (Figura 1). A Receita Federal do Brasil
exportação de OE estão disponíveis gratuitamente na base Comex traduziu as notas explicativas de como aplicar o SH, que foram
Stat, do Ministério da Indústria, Comércio Exterior e Serviços.18 Essas publicadas sob a forma de Instrução Normativa.22
bases mencionadas tratam de comércio internacional, vale dizer, não
levam em conta os volumes de produção e os mercados internos. Nomenclatura Comum do Mercosul (NCM)
Relatórios de fontes diferentes apresentam valores diferentes,
pois a abrangência da pesquisa varia com relação ao número de óleos Este sistema tem uso restrito à região do Mercosul, sendo
listados, de empresas consultadas e de países considerados. Há que empregado pelos países do bloco. Além dos 6 dígitos do SH, mais 2
se manter uma postura crítica e cuidadosa quando da comparação de são acrescentados: item e subitem (7° e 8° dígitos, respectivamente),
dados de bases diferentes. Frequentemente, outros extratos aromáticos conforme apresentado na Figura 1. A NCM não altera a classificação
que não óleos essenciais, como aqueles obtidos com solventes e do SH, apenas a torna mais detalhada. Toda mercadoria comercializada
resinoides, são incluídos nos dados, sendo considerados todos os no Brasil deve ser classificada segundo a NCM. A Tabela 2S (Material
itens da posição 3301 do Sistema Harmonizado (SH), o que complica Suplementar) contém todos os itens listados dentro da classificação
ainda mais a coleta e a comparação de informações. Para verificar 3301 do SH.
quais classes ou produtos foram incluídos, deve-se verificar qual o
código do SH foi utilizado na elaboração do conjunto de dados da Classificação Nacional de Atividades Econômicas (CNAE)
base consultada.
Quanto à produção interna propriamente dita, há poucos dados A CNAE foi elaborada pela Comissão Nacional de Classificação
disponíveis em fontes públicas. Na base SIDRA (Sistema de (Concla), sendo usada pelo IBGE para a coleta e processamento
Recuperação Automática) do Instituto Brasileiro de Geografia e dos dados de produção.20 Os produtos são organizados segundo
Estatística (IBGE) encontram-se algumas informações condensadas uma hierarquia associada ao seu processo de fabricação. Os óleos
para o período (mais recente) de 2014-2018.19 Esses dados, entretanto, essenciais são classificados dentro da Seção C, “Indústrias de

Figura 1. Códigos de numeração usados no Sistema Harmonizado (SH) e Nomenclatura Comum do Mercosul (NCM)
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Transformação”, na divisão 20, “Fabricação de Produtos Químicos”,


grupo 20.9, “Fabricação de produtos e preparados químicos diversos”,
classe 20.93-2 “Fabricação de aditivos de uso industrial”. Dentro
da subclasse, todos os óleos essenciais são agrupados em apenas
três categorias: OEs de laranja (2093.2280), OEs de outros cítricos,
excluindo os de laranja (2093.2270) e outros OEs (2093.2295). Essa
distribuição impossibilita a coleta de informações sobre a produção de
óleos específicos, como óleo de eucalipto ou o óleo de uma espécie
específica de menta, por exemplo. Na Tabela 2S encontra-se uma
correlação entre o SH, CNAE e NCM, e pode-se observar a quantidade
de OEs diferentes agrupados em cada uma das três categorias.

MERCADO INTERNACIONAL DE ÓLEOS ESSENCIAIS

Principais atores do mercado global de OE

O mercado internacional de OE em 2021 foi estimado em US$


10,3 bilhões, correspondentes a 253 mil toneladas, com tendência de
crescimento constante, devendo atingir US$ 16 bilhões anuais e 345
mil toneladas em 2026.14 Esses dados, entretanto, consideram todos
os itens da posição 3301 do SH, o que inclui extratos, resinoides e
outros materiais aromáticos na projeção. Com algum detalhamento
das tabelas do ITC Trade Map, pode-se estimar que os óleos essenciais
propriamente ditos (segundo a definição da ISO 9235) correspondem
a cerca de 80% do total, ou seja, trata-se de um mercado da ordem
de US$ 8 bilhões.17
Os principais atores do mercado são a Índia, os EUA, a França, Figura 2. Maiores exportadores de OEs em valores (A) e quantidades (B)
a China e o Brasil, em termos de valores. No caso de volumes
exportados, a Espanha substitui a França entre os 5 primeiros. A dificuldade na obtenção de dados fica clara quando se considera
Os EUA foram, durante as últimas décadas, os maiores as faixas de variação admitidas na Tabela 1, particularmente para os
exportadores mundiais em valores.2 Desde 2017, entretanto, a Índia OE de menta japonesa e de eucalipto.
passou para a primeira posição, principalmente por conta da produção
de OE de Mentha arvensis.17 O Brasil tem se mantido na quinta Tendências de crescimento do mercado de OE
colocação (Figura 2A).17
Quando se considera, porém, a quantidade exportada, o país ocupa Segundo análises da Fortune Business Insights24 e da Markets
o primeiro lugar (Figura 2B), posição que mantém há mais de 20 and Markets,14 as principais forças norteadoras ou drivers para o
anos.2,17 Tal colocação deve-se ao grande volume produzido e exportado mercado de OEs são o aumento da demanda por aditivos naturais,
de óleo essencial de laranja, um subproduto da indústria do suco. em substituição aos sintéticos na indústria de alimentos e bebidas,
e o crescimento do setor de aromaterapia, principalmente nos EUA,
Principais OE no mercado internacional tendo ultrapassado US$ 1 bilhão em 2018 e apresentando crescimento
médio de 10 % ao ano. Em menor escala, essa tendência também
Os principais óleos comercializados globalmente estão listados se manifesta no Brasil, tendo sido observado o estabelecimento de
na Tabela 1. Os dados foram gerados pela International Federation of diversos pequenos produtores de óleo essencial com foco no mercado
Essential Oils and Aroma Trades (IFEAT),23 que representa os atores de aromaterapia.
que atuam no mercado internacional. As quantidades correspondem A substituição de materiais sintéticos por produtos naturais tem
ao ano de 2018, mas não há informação de que tenha havido alteração sido uma tendência constante e influenciada de forma direta por
na ordem da tabela. demandas dos consumidores, principalmente nos países do hemisfério

Tabela 1. Principais óleos essenciais no mercado internacional (em 2018)

Óleo Essencial Quantidade (ton) Usos


Laranja (Citrus sinensis (L.) Osbeck e outras) 50.000-55.000 Bebidas, aromatizante
Menta japonesa (Mentha arvensis L.) 25.000-40.000 Aromatizante, mentol
Eucalipto (Eucalyptus globulus Labill.) 5.000-11.000 Aromatizante, medicamentos
Limão siciliano (Citrus limon (L.) Osbeck) 7.000-7.500 Bebidas, aromatizante
Hortelã-pimenta (Mentha x piperita L.) 4.000-4.500 Aromatizante, higiene oral
Cravo, folhas (Syzygium aromaticum (L.) Merr. & L.M.Perry) 2.500-4.000 Fragrâncias, aromatizante
Menta (Mentha spicata L.) 2.000-3.700 Aromatizante, higiene oral
Cedro da Virgínia (Juniperus virginiana L.) 2.000-3.500 Fragrâncias
Citronela (Cymbopogon winterianus Jowitt ex Bor ) 1.500-3.000 Fragrâncias
Fonte: IFEAT, 2019.
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Norte. Essa predileção por produtos de origem natural tem levado a mercado interno como óleo essencial per se; parte é transformada em
uma gradativa mudança nos ingredientes de alimentos e bebidas, o que coprodutos. É interessante observar que houve um grande aumento
vem se refletindo favoravelmente no mercado de óleos essenciais.24 no volume produzido deste OE entre 2015 e 2016, indo de 54 para
145 mil toneladas (Figura 3), seguido de pequena elevação em
Ameaças ao mercado global de OEs 2017 e 2018. Essa variação, entretanto, não se refletiu nos volumes
exportados para o mesmo período,18 conforme discutido a seguir.
O aumento da demanda não tem sido proporcionalmente
acompanhado por um aumento na produção de matérias-primas
para óleos essenciais. A principal ameaça ao mercado é, portanto, a
redução na oferta destes insumos.
A isso soma-se a concentração da produção dos OEs comerciais
e de diversas matérias-primas das indústrias de aromas e fragrâncias,
ou seja, o cultivo e a produção são localizados, com poucos países
produzindo grande parte do volume comercializado. Eventos
climáticos desfavoráveis e desastres naturais constituem ameaças
ao fornecimento, como foi recentemente observado com a baunilha
de Madagascar, cuja produção foi drasticamente reduzida por vários
ciclones em 2016 e 2017, fazendo o preço subir de US$ 25/kg para
US$ 550/kg.23 Para contornar essa ameaça, os grandes produtores do
setor de aromas e fragrâncias têm buscado diversificar suas fontes de
matérias-primas, como no caso da menta, discutida recentemente na
conferência anual da IFEAT.25

A pandemia de COVID-19 e o mercado de OEs

Embora seja um evento muito recente e um período maior seja


necessário para uma melhor avaliação, nos dados de comércio Figura 3. Dados de produção de óleos essenciais no Brasil
internacional consultados não se verificou redução de volumes e
valores negociados em 2020.17 Ao contrário, houve crescimento do Por conta da agregação de informações de todos os OEs, exceto
mercado, tanto em função dos drivers já apresentados anteriormente os de cítricos, dentro da classificação 2093.2295, não se pode obter
como também pelo uso de OEs em sanitizantes.14 Ainda não se pode informações sobre a produção de outros OEs específicos, como o
afirmar, entretanto, se essa tendência vai se consolidar nos próximos óleo essencial de eucalipto, o segundo em volume produzido no
anos. país. Um dos maiores produtores nacionais informa em seu sítio na
internet um total de 720 toneladas anuais, sendo 85% deste total de
PARTICIPAÇÃO DO BRASIL NO MERCADO GLOBAL DE OE de Corymbia citriodora (syn Eucalyptus citriodora), 10% de
ÓLEOS ESSENCIAIS E. globulus e 5% de E. staigeriana.26 Metade dessa produção seria
destinada à exportação. Novamente, deve-se olhar com cuidado para
Dados da produção comercial de óleos essenciais no Brasil esses dados, pois essas informações não são atualizadas e há vários
outros produtores de OE de eucalipto no país. Uma avaliação mais
Como comentado anteriormente, o IBGE usa a Classificação segura pode ser feita com base nos dados de importação e exportação,
Nacional de Atividades Econômicas (CNAE) como forma de listar disponíveis na base Comex Stat.
os produtos, o que torna necessário agrupar vários campos de dados
de tabelas que se valem do SH ou do NCM, como aquelas da base Balança comercial brasileira para os óleos essenciais
Comex Stat, para que as informações das diferentes fontes possam
ser comparadas. As quantidades de OE exportadas oscilaram na faixa entre 25 e
O Brasil é o maior produtor mundial e exportador de suco de 31 mil toneladas ao longo da última década, exceto no último ano
laranja e, em consequência, o maior produtor e exportador do óleo do período (2020), quando se verificou um aumento expressivo, com
essencial de laranja (principalmente Citrus sinensis, além de outras 36,6 mil toneladas exportadas (Figura 4A). No mesmo intervalo,
espécies).17 De acordo com dados do IBGE, em 2018 (último ano a quantidade importada permaneceu relativamente constante,
disponível para consulta) foram produzidas 154,6 mil toneladas de com pequenas variações entre 1,7 e 2 mil toneladas. Esses dados
OEs de laranja (Figura 3), equivalentes a R$ 1,5 bilhões ou US$ 418 são relativos somente a óleos essenciais (NCM 3301.12.10 a
milhões.19 Esses dados incluem tanto o óleo obtido por prensagem 3301.29.90).18
a frio do fruto, chamado OE de laranja, como aquele obtido por Os principais responsáveis pela elevação do total exportado
destilação das folhas e ramos, chamado de OE de petitgrain. Note-se, em 2020 foram os OEs de laranja e eucalipto, que apresentaram
porém, que o volume deste último corresponde, em média, a apenas crescimentos de 23% e 24% em relação a 2019, respectivamente.
0,1% do total dos óleos de laranja. Quanto a valores, houve um nítido crescimento da arrecadação
Já o volume exportado desses dois OEs foi de 29 mil toneladas, entre 2014 e 2018, tendo-se atingindo US$ 292 milhões neste ano.
segundo dados do Comex Stat,18 cerca de 16,9% do total produzido no O pior desempenho da década aconteceu em 2013, com uma receita
mesmo ano. Aqui também é importante ressaltar que o OE de laranja é de US$ 124 milhões (Figura 4B). A balança comercial para os OEs
matéria-prima para a produção de limoneno e de diversos subprodutos permaneceu superavitária durante todo o período, com melhor
terpênicos residuais da desterpenação dos óleos essenciais. Logo, o desempenho nos anos de 2017 e 2018 (US$ 222 milhões em cada ano).
fato da fração exportada de OE de laranja ser pequena em relação A diferença de perfil entre os dois gráficos deve-se à oscilação
ao total produzido não significa que a diferença seja consumida no nos preços dos OEs (em função das dinâmicas do mercado) e à
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variação nos volumes ofertados dos diferentes óleos. Esses efeitos


serão apresentados em maior detalhe a seguir.

Figura 5. Exportações de OE de laranja na última década

Se agrupados como “óleos essenciais de cítricos, exceto de laranja”,


ficam em segundo lugar em valores nos dados de exportações de OE.
As quantidades exportadas no decênio passado estão na Tabela 2.

Óleo essencial de limão siciliano


O fruto da espécie Citrus limon (L.) Burm. f. é chamado no Brasil
de limão siciliano. No resto do mundo, apenas de limão (lemon). A
produção do seu óleo essencial, obtido a frio, aumentou ao longo do
decênio, indo de 182 toneladas em 2011 para 318 toneladas em 2019,
saltando para 820 toneladas em 2020.

Figura 4. Dados da balança comercial de OE no Brasil em toneladas (A) Óleo essencial de limão Tahiti
e valores (B) No Brasil, o fruto designado limão ou limão Tahiti é conhecido
como lima (lime) no resto do mundo. A nomenclatura comumente
PRINCIPAIS ÓLEOS ESSENCIAIS COMERCIALIZADOS usada, C. latifolia Tanaka, ainda não é aceita como válida.27 Sua
PELO BRASIL designação anterior era C. aurantiifolia var. latifolia Yu.Tanaka.28
Disputas botânicas à parte, o país exportou 168 toneladas do OE de
Todos os dados estatísticos apresentados a seguir foram obtidos e limão Tahiti anualmente, em média, na última década. Somente em
estão disponíveis na base Comex Stat.18 Os dados brutos encontram-se 2020 foram 182,6 toneladas, gerando uma receita de US$ 3,7 milhões.
no material suplementar (Tabelas 3S-6S).
Óleo essencial de petitgrain
Óleo essencial de laranja O óleo essencial de petitgrain é obtido por hidrodestilação das
folhas, ramos e frutos imaturos de laranja (C. aurantium L.). Rico
Na última década, cerca de 95% da quantidade total de OEs em acetato de linalila e linalol, é usado no mercado de fragrâncias.
exportados pelo Brasil a cada ano foi de óleo essencial de laranja, As quantidades exportadas variaram expressivamente ao no período
o que correspondeu de 80 a 90% do total de valores arrecadados analisado, tendo iniciado com 2,5 toneladas em 2011, atingido um
com exportação de OEs no mesmo período. A quantidade exportada máximo de 87 toneladas em 2018 e decrescido para 28 toneladas no
variou pouco ao longo da década, entre 25 e 31 mil toneladas/ano último ano da década.
(Figura 5). Apenas em 2020 houve um aumento mais expressivo, com
35 mil toneladas exportadas. O preço, entretanto, variou fortemente Outros óleos essenciais de cítricos
no mesmo período, tendo ido de US$ 4,6 por quilograma, em 2011, “Outros óleos essenciais de cítricos” é uma classificação que
até o máximo de US$ 8,9/kg no biênio 2017-2018, retornado ao inclui os demais OEs de cítricos não mencionados nas categorias
patamar de US$ 4,6 em 2020, com reflexo direto no total arrecadado anteriores, como as mandarinas e aqueles obtidos por hidrodestilação.
com as exportações nestes dois anos e, consequentemente, no perfil Nesse grupo as quantidades exportadas variaram de 118 a 239
da balança comercial dos OEs (Figura 4B) no período. toneladas/ano entre 2011 e 2020, e a média da década foi de 167
Nos dados de produção interna (Figura 3), por outro lado, verificou- toneladas/ano, com uma receita média anual de US$ 8,4 milhões.
se um aumento no volume produzido entre 2015 e 2016, indo de 54
para 145 mil toneladas, com pequena elevação em 2017 e 2018.19 Óleos essenciais de eucalipto

Óleos essenciais de outros cítricos No Brasil são destilados OEs de ao menos três espécies de
eucalipto: Eucalyptus globulus Labill., E. staigeriana F.Muell.
Com uma participação muito menor quando comparada àquela ex F.M.Bailey e Corymbia citriodora (Hook.) K.D.Hill &
do OE de laranja, o Brasil produz e exporta OE de outros cítricos. L.A.S.Johnson (anteriormente designado E. citriodora Hook).
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Tabela 2. Exportações de OE de cítricos, exceto o de laranja

Quantidades Exportadas (em toneladas)


Óleo Essencial 2011 2012 2013 2014 2015 2016 2017 2018 2019 2020
Petitgrain 3 2 8 4 22 13 23 87 39 28
Limão siciliano 182 157 146 328 209 400 374 355 318 820
Lima (limão Tahiti) 391 73 97 116 218 171 184 105 140 183
Outros OEs de cítricos 118 123 167 179 269 118 239 165 124 171
Total anual 694 356 418 626 717 702 821 712 621 1202
Fonte: Comex Stat.

O sistema NCM não faz distinção entre os OEs das diferentes Óleo essencial de vetiver
espécies, codificando-os todos como 33012919 – óleos essenciais
de eucalipto. Os dados, portanto, representam os totais exportados. O vetiver é um bom exemplo da volatilidade do mercado de óleos
Como mencionado anteriormente, os OEs de eucalipto estão na essenciais no país. Os volumes exportados cresceram ao longo da
segunda posição em termos de volume de produção, mas ocupam primeira década deste século, tendo atingido o máximo em 2010, com
o terceiro lugar em termos de quantidades e valores exportados.18 4755 kg. A exportação do produto, entretanto, diminuiu a partir de
Estima-se que cerca de 85% do total produzido e exportado seja 2011, chegando a um mínimo de apenas 30 kg em 2014. Mesmo com
de OE de C. citriodora.26 uma elevação nos anos seguintes, não conseguiu superar 1 tonelada/
A quantidade exportada aumentou ao longo do período 2011- ano até o fim da década (Figura 7).
2020 (Figura 6). O preço médio do produto variou pouco, indo de O Brasil supre sua demanda interna com importação. A
US$ 17/kg em 2011 para US$ 14/kg em 2020.18 quantidade importada, se comparada à exportada, variou pouco no
período, ficando em torno de 4,1 toneladas/ano (média do período).18

Figura 6. Exportações de OEs de eucalipto no decênio 2011-2020


Figura 7. Quantidades exportadas e importadas de óleo essencial de vetiver.
Óleos essenciais de mentas O ano de 2010 foi incluído para ênfase na queda dos volumes exportados

O Brasil foi o maior produtor mundial de OE de menta japonesa O efeito do forte terremoto ocorrido no Haiti em 2021 no
ou corn mint (Mentha arvensis L.) nos anos 1970, tendo exportado mercado de óleo de vetiver ainda não pode ser avaliado. Existe a
6.300 toneladas de óleo bruto em 1973.29 A produção foi drasticamente possibilidade da produção e exportação brasileiras terem um grande
reduzida já no final do século passado. Hoje, a Índia cumpre o papel crescimento, como ocorreu em 2010, quando outro terremoto
de principal fornecedor, com 11.550 toneladas exportadas em 2020.16 devastou aquele país? Provavelmente não, pois o Brasil apresentava
Segundo dados do Comex Stat, o Brasil é hoje um grande um crescimento constante na produção de OE de vetiver ao longo da
importador de OEs de mentas.18 Embora o país ainda exporte esses primeira década do século XXI e havia disponibilidade de matéria-
óleos, as quantidades importadas são muito maiores. O produto prima e capacidade instalada para suprir o mercado internacional.
exportado pode ser até mesmo reexportação de material importado. Tal situação, a julgar pelos dados dos últimos anos (Figura 7), não
Na Tabela 3 são apresentados os dados detalhados para o OE de M. mais se verifica.
arvensis.

Tabela 3. Dados de comércio exterior do OE de M. arvensis 2011-2020 (em kg)

2011 2012 2013 2014 2015 2016 2017 2018 2019 2020
Exp 3284 627 245 535 420 4145 3935 6588 9713 5724
Imp 574662 441365 485187 336511 426745 513988 538418 495538 511344 594517
Exp: Quantidades exportadas (kg). Imp: Quantidades importadas (kg). Fonte: Comex Stat.
Vol. 45, No. 8 O mercado de óleos essenciais no Brasil e no mundo na última década 955

Óleo essencial de pau-rosa para menos de 100 toneladas no final do período, exceto pelo atípico
ano de 2014, quando o país exportou 769 toneladas de produtos
Da madeira de Aniba rosaeodora Ducke, o pau-rosa, obteve-se (Figura 8A). As importações variaram menos, ficando entre 300 e
o primeiro OE produzido e exportado em larga escala pelo Brasil, 400 toneladas ao longo da década.18
ainda na década de 1920. A exportação desse OE, produto de alto
valor, chegou a atingir 444 toneladas em 1951, mantendo-se acima de
100 toneladas/ano até o começo da década de 1980 quando, a partir
daí, foi progressivamente reduzida.30 No último decênio, a produção
diminuiu ainda mais, tendo ido de 4160 kg em 2011 para 360 kg em
2020, o equivalente a apenas 2 tambores. O preço do óleo (FOB)
iniciou a década em US$ 164 por quilo, tendo ultrapassado os US$
300/kg em 2018 e terminado o período em US$ 350/kg.
Embora outras fontes mais baratas de linalol, principal
constituinte do OE de pau-rosa, estejam disponíveis, principalmente
o linalol sintético, ou mesmo de fontes naturais, como variedades de
Ocimum basilicum e Lippia alba, o óleo do lenho de A. rosaeodora e
seus componentes minoritários adicionam notas de madeira (woody)
que são desejáveis em fragrâncias, fazendo com permaneça o interesse
da indústria por este óleo essencial.31
O modelo tradicional de exploração do pau-rosa é totalmente
insustentável, pois implica o corte da árvore, uma espécie de
crescimento lento, que leva décadas até atingir o ponto ideal para
abate. As inciativas de cultivo, como o plantio de árvores, iniciado
ainda em meados do século passado, não lograram resultado em
resolver o problema da disponibilidade de matéria-prima.32 Dentre as
diversas dificuldades enfrentadas, estava a própria seleção de material
para propagação, de modo que a espécie correta fosse plantada. Nas
duas últimas décadas esse cenário parece ter mudado, com a expansão
das áreas de plantio, a introdução de práticas de manejo, como a poda
regular da copa, além de estudos de obtenção do óleo essencial de
ramos e folhas.33 O incremento das iniciativas de plantio não tem se
dado sem percalços, com dificuldades até na oferta de mudas.34 A
qualidade do OE de ramos e folhas já foi objeto de estudo.35,36 Figura 8. Dados para “outros óleos essenciais” (NCM 30012990): Quanti-
Não há dados estatísticos disponíveis sobre a produção de dades importadas e exportadas (A) e valores correspondentes (B)
OE de pau-rosa, seja do lenho ou de folhas, somente os dados de
exportação apresentados anteriormente. Embora algumas empresas Houve um pequeno aumento nos valores exportados durante o
já anunciem usar produtos contendo o OE de folhas,37 ainda há, além decênio, exceção feita ao ano de 2014, tendo atingido cerca de US$ 4
dos desafios de todo o processo produtivo e das possíveis variações milhões em 2020 (Figura 8B). Por outro lado, quando se consideram
na composição do óleo, duas questões, interdependentes, que as importações, os valores pagos aumentaram expressivamente no
precisarão ser enfrentadas para se definir o sucesso comercial do OE período analisado, indo de US$ 15 milhões para US$ 35 milhões,
de fontes renováveis: uma, mais objetiva, é que o produto deverá estar embora as quantidades importadas tenham variado muito pouco.18
disponível em quantidade e qualidade para atender a uma eventual
demanda; a outra, mais complexa, é saber se os perfumistas irão Importações brasileiras
acrescentá-lo às suas paletas e, com isso, gerar a demanda.
Como já mencionado anteriormente, a balança comercial
Outros óleos essenciais brasileira para óleos essenciais é superavitária. Entretanto, ainda são
gastos na importação deste tipo de insumo cerca de US$ 75 milhões
Essa categoria inclui algumas dezenas de produtos que são anualmente. O principal produto na pauta de importações é o OE
importados e exportados pelo país. Exceção feita aos produtos listados de M. arvensis. Na última década, entraram no país, em média, 500
separadamente (ver Material Suplementar, Tabela 2S), não há como toneladas anuais, representando US$ 9.7 milhões.18 Também são
fazer inferências particulares com relação aos demais OEs. importados em quantidades e valores expressivos os OEs de limão
É importante notar que nas bases que utilizam somente o sistema siciliano (179 toneladas/ano ou US$ 4.9 milhões), eucalipto (203
harmonizado (SH), como o ITC Trade Map e o Comtrade, a categoria toneladas/ano ou US$ 3.5 milhões), lavanda (77 toneladas/ano ou
300129 vai incluir também os óleos de eucalipto, vetiver, pau-rosa, US$ 2.8 milhões) e aqueles do grupo “outros óleos essenciais” (348
lemongrass, coriandro, pau-santo, cabreúva, lavanda, palmarosa, toneladas/ano ou US$ 23.8 milhões). Os demais óleos discriminados
cedro e citronela, ou seja, os itens que na NCM possuem os códigos com diferentes códigos na NCM são minoritários na pauta de
33012911 a 33012922, além dos muitos óleos já agrupados sob o importações e, somados, correspondem a apenas cerca de 5,5% do
código 33012990. Os dados apresentados a seguir são aqueles do total (Figura 9). Os valores correspondem à média do período 2011-
Comex Stat e referem-se somente aos produtos registrados como 2020, não tendo sido observadas grandes variações entre o início e
33012990. Os demais, quando pertinentes para a balança comercial, o final do período.
foram apresentados anteriormente. Em que medida essas informações podem ser úteis para induzir
Verificou-se uma redução gradativa das quantidades exportadas, os produtores nacionais ao planejamento e desenvolvimento de
de quase 200 toneladas nos dois primeiros anos do decênio 2011-2020 novas cadeias de valor para óleos essenciais? Talvez muito pouco,
956 Bizzo e Rezende Quim. Nova

No caso dos EUA, é aplicada somente para produtos comercializados


em quantidades acima de 1 tonelada.
O mercado interno brasileiro, comparativamente, é bem menos
regulado. Registro ou regulamentação não se aplicam ao OE per
se, mas em função da sua forma de uso. Em alimentos, os OEs são
classificados como aditivos alimentares e, uma vez que constem
em documentos internacionais, como o Codex Alimentarius, estão
isentos de registro.
Por outro lado, no Brasil, fitoterápicos (óleos essenciais incluídos)
são considerados como medicamentos. Portanto, para fins medicinais,
OEs devem seguir as avaliações de segurança e eficácia previstas
na RDC 26/201442 e em outras normas da Agência Nacional de
Vigilância Sanitária (ANVISA).43 Se usados como excipientes, os
estudos de segurança e eficácia deverão ser realizados nos produtos
finais (medicamento ou cosmético), também seguindo regulamento
específico.44 É importante mencionar que os regulamentos citados
Figura 9. Distribuição dos óleos essenciais importados pelo Brasil estão em processo de revisão pela ANVISA e modificações são
esperadas, particularmente com o aumento das exigências para
pois, como já comentado, há poucos dados sobre a produção interna registro e autorização de uso.45
e uma carência generalizada de dados sobre tendências do mercado
nacional. Há perguntas que ficam sem resposta, obviamente para Origem da matéria-prima e sustentabilidade
quem está fora da estrutura comercial do setor. Por exemplo, por
que o maior produtor e exportador mundial de OE de laranja importa A garantia de fornecimento é outro ponto que precisa ser
OE de laranja? Foram 208 toneladas anuais, em média, no último considerado. O simples extrativismo é deletério, inviável e inaceitável
decênio. Seriam questões associadas a parâmetros de qualidade e para a produção em escala comercial. Ao se planejar a produção de
composição específicos? Seria material com certificação orgânica, OEs de novas espécies, além da correta identificação do material
já que boa parte desse OE produzido no país contém resíduos botânico, deve ser considerado o desenvolvimento de um sistema
de pesticidas?38,39 Seriam questões econômicas relacionadas às de produção com todas as suas variáveis, incluindo nutrição, uso
empresas multinacionais que dominam o setor? Pode tratar-se, água e de defensivos, estimativa de produção e produtividade, que
inclusive, de uma importação específica de uma indústria, para uso seja suficiente (e eficiente) para a oferta de matéria-prima em escala
em produtos próprios. comercial. Há que se considerar também as mudanças climáticas e
seus efeitos sobre o metabolismo das plantas e, consequentemente,
HÁ MERCADO PARA NOVOS ÓLEOS ESSENCIAIS? na composição dos óleos destilados.
A concentração da produção de óleos consumidos em larga
Quais as questões a se enfrentar para se colocar um novo óleo escala em um ou dois países fornecedores majoritários é uma ameaça
essencial no mercado? O primeiro ponto a ser analisado é definir qual ao mercado. Eventos climáticos e políticos interferem diretamente
mercado se deseja atingir. Dessa resposta dependem todas as demais. na oferta e, consequentemente, no preço destes insumos. Vetiver
Uma matéria-prima para a indústria de alimentos ou bebidas, por e menta japonesa são exemplos no foco da atenção das casas de
exemplo, deverá ser produzida anualmente em escala de toneladas; aromas, que buscam desenvolver essas culturas em outras regiões
se a aplicação for na indústria de perfumes, poucos quilos podem ser para diversificar a oferta de matérias-primas. Com relação ao vetiver,
suficientes. Além de atender às exigências legais do país de produção, após o terremoto de 2010, várias iniciativas foram estabelecidas pelos
em materiais destinados ao mercado internacional as características grandes compradores para a garantia de fornecimento.46
da legislação dos países importadores (aqueles que estão comprando Os consumidores dos produtos finais possuem expectativas
os OEs) também deverão ser consideradas. relativas a questões éticas e ambientais para os produtos que compram.
Sim, há mercado para novos óleos essenciais. Faz-se necessário, Essas expectativas pressionam toda a cadeia até o setor primário.47
entretanto, que o planejamento e a estruturação da cadeia de valor Essa pressão pode, por exemplo, criar e incrementar a demanda por
sejam bem conduzidos, a começar pela correta prospecção das um OE de folhas e ramos de pau-rosa. Sustentabilidade e fair trade
tendências de mercado. Além da já mencionada expansão do mercado não apenas ajudam a vender melhor, mas tornam-se características
de aromaterapia, novas aplicações para OES, como seu uso na necessárias para se garantir acesso e sucesso no mercado. Instituições
elaboração de biopesticidas,40 para citar apenas uma, constituem governamentais e empresas privadas têm alinhado suas ações aos
oportunidades de crescimento do setor. objetivos para o desenvolvimento sustentável da ONU,48 consolidando
a necessidade de se considerar essas questões quando novos produtos
Legislação são planejados e desenvolvidos.

Para a União Europeia, toda a legislação do REACH (Registration, Qualidade dos estudos iniciais
Evaluation, Authorisation and Restriction of Chemicals), emitida
pela Agência Europeia de Produtos Químicos (European Chemicals Outra necessidade e, não raras vezes, um problema que inviabiliza o
Agency – ECHA) tem que ser cumprida. “Sem dados, sem mercado” desenvolvimento de um novo produto é a baixa qualidade de estudos de
(No data, no market) é o moto do REACH.41 Óleos essenciais são caracterização tanto da espécie vegetal quanto da composição química
classificados pela ECHA como “substâncias naturais complexas” e do OE. Erros, grosseiros em alguns casos, tanto na análise qualitativa
precisam ser caracterizados do ponto de vista químico (composição), quanto na quantitativa são recorrentes.49–51 Não menos importante
biológico (toxicológico) e ambiental (biodegradabilidade, é a acurácia dos estudos de atividade biológica e identificação de
bioacumulação).41 A China e os EUA adotaram uma legislação similar. compostos alergênicos.52–55 Investigações impropriamente conduzidas
Vol. 45, No. 8 O mercado de óleos essenciais no Brasil e no mundo na última década 957

e conclusões que extrapolam o modelo experimental desenvolvido method; International Organization for Standardization: Genebra, 1998.
corrompem e inviabilizam estudos de quimiotaxonomia, correlação 7. International Organization for Standardization.; ISO 22972:2004.
com características sensoriais, correlação com atividade biológica Essential oils - Analysis by gas chromatography on chiral capillary
e tratamento estatístico dos dados,47 podendo levar ao abandono de columns - General method.; International Organization for
inciativas ou, mais grave, gerar prejuízo a produtores e indústrias, caso Standardization: Genebra, 2004.
os equívocos sejam descobertos tardiamente. 8. Figueiredo, A. C.; Barroso, J. G.; Pedro, L. G.; Scheffer, J. J. C.; Flavour
Fragr. J. 2008, 23, 213.
CONCLUSÕES 9. International Organization for Standardization.; ISO 3515/2002. Oil of
lavender (Lavandula angustifolia Mill.).; International Organization for
O Brasil é um importante ator no mercado global de óleos Standardization: Genebra, 2002.
essenciais, sendo o maior em quantidade e o quinto em valores 10. International Organization for Standardization; ISO 4719:2012.
exportados.17 Dados econômicos sobre óleos essenciais são difíceis Essential oil of spike lavender (Lavandula latifolia Medikus), Spanish
de se obter e, não raras vezes, somente em fontes pagas. Encontram- type.; International Organization for Standardization: Genebra, 2012.
se informações sobre o mercado mundial em termos de importações 11. Associação Brasileira de Normas Técnicas www.abntcatalogo.com.br,
e exportações em bases públicas, mas dados atualizados sobre acessada em março 2022.
a produção e mercado interno não estão disponíveis. Esse tipo 12. Da Silva, E. R.; De Oliveira, D. R.; De Fátima Figueiredo Melo, M.;
de conhecimento é necessário para se orientar o planejamento e Bizzo, H. R.; Leitão, S. G.; Braz. J. Pharmacogn. 2016, 26, 647.
desenvolvimento da cadeia de valor. 13. https://www.statista.com/study/60656/essential-oils-market/, acessada
Há expectativa de crescimento estável do mercado de OE ao longo em março 2022.
da década de 2020. Dentre os setores de aplicação, o de aromaterapia 14. https://www.marketsandmarkets.com/Market-Reports/essential-oil-
tem se destacado, com um incremento médio anual de 10%.14 É market-119674487.html, acessada em março 2022.
necessário lembrar que as aplicações de OES devem seguir os 15. https://www.grandviewresearch.com/industry-analysis/essential-oils-
princípios de eficácia e segurança. Questões relativas a alergenicidade market, acessada em março 2022.
precisam ser estudadas antes da indicação e uso de novos óleos. 16. United Nations, Comtrade Database, disponível em https://comtrade.
Ainda são poucas as espécies nativas exploradas comercialmente, un.org/, acessada em março 2022.
uma situação que não mudou na década 2011-2020. O estabelecimento 17. ITC Trade Map, disponível em https://www.trademap.org/Index.aspx,
de sistemas de produção sustentáveis como fonte de matérias-primas acessada em março 2022.
e, consequentemente, geração de renda para as populações locais, é 18. MDIC, Comex Stat, disponível em http://comexstat.mdic.gov.br/pt/
uma estratégia válida para a preservação da biodiversidade brasileira, home, acessada em março 2022.
que pode e deve ser mais desenvolvida. 19. IBGE, Tabela 6705, disponível em https://sidra.ibge.gov.br/Tabela/6705,
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alguns óleos essenciais comerciais, correlação entre os sistemas de acessada em março 2022.
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