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Construtoras mudam para se reerguer

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Construtoras brasileiras têm legado de
grandes obras em outros países

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"Brasil à frente" explora desafios econômicos
e políticos do país

BRASIL À FRENTE LEIA MAIS

Ditadura barrou
internacionalização de
setores-chave; entenda
Decreto de 1969 turbinou empresas
brasileiras; corrupção era comum e não
havia mecanismos de controle, diz
especialista
25.dez.2022 (domingo) - 10h00
atualizado: 29.dez.2022 (quinta-feira) - 17h41
este post continha erro e foi corrigido

Barragem da Usina Hidrelétrica de Itaipu em


construção. Obras começaram em 1975 e a usina
passou a produzir energia em 1984

A ditadura civil-militar brasileira


(1964-1985) foi o “momento
fundamental” para a consolidação
das grandes empreiteiras nacionais
e responsável pela concentração de
poder e de capital dessas
construtoras na economia.

A avaliação é do professor Pedro


Henrique Pedreira Campos, da
UFRRJ (Universidade Federal Rural
do Rio de Janeiro), doutor em
História pela UFF (Universidade
Federal Fluminense).

Campos é autor do livro “Estranhas


catedrais – As empreiteiras
brasileiras e a ditadura civil-militar”
(Editora da UFF, 444 págs., 2014). A
obra, resultado de sua pesquisa
para a tese de doutorado “A
Ditadura dos Empreiteiros”,
concluída em 2012, analisou a
relação entre as construtoras e os
governos ditatoriais brasileiros. Leia
a íntegra da pesquisa (3,2 MB).

Assista à entrevista de Pedro


Campos ao Poder360 (57min12s):

Poder Entrevista: Pedro …

Em abril de 1969, com o Congresso


fechado pelo AI-5 (Ato Institucional
nº 5), o então presidente Arthur da
Costa e Silva baixou um decreto que
fechou as portas do país para
empresas estrangeiras em obras de
infraestrutura. Era criada ali uma
reserva de mercado para o setor da
construção pesada.

“Art. 1º Os órgãos da
Administração Federal, inclusive as
entidades da Administração
Indireta, só poderão contratar a
prestação de serviços de
consultoria técnica e de Engenharia
com empresas estrangeiras nos
casos em que não houver empresa
nacional devidamente capacitada e
qualificada para o desempenho dos
serviços a contratar.”

A medida vigorou até 1991, quando


foi revogada pelo presidente
Fernando Collor. A extinção da
proteção, no entanto, não surtiu
efeitos práticos. As grandes
construtoras nacionais já tinham
uma posição consolidada no
mercado, além de influência política
e profunda inserção no Estado
brasileiro.

Até o final dos anos 1960, por


exemplo, a Odebrecht (atualmente
OEC) era apenas uma empresa local
da Bahia. Depois do decreto,
despontou para a lista das maiores
do país. Uma das grandes obras que
ajudou a companhia foi a
construção do prédio-sede da
Petrobras no Rio de Janeiro (em
1971). A estatal era então
controlada pelos militares.

Houve uma grande evolução de


outras empreiteiras no período,
como Andrade Gutierrez e Mendes
Júnior.

Amparadas pela blindagem da


concorrência internacional e com
grandes obras e projetos de
infraestrutura à disposição, como a
rodovia Transamazônica e a
hidrelétrica de Itaipu, as maiores
construtoras nacionais
concentraram poder e faturamento.
No fim do regime, em 1984, as 5
maiores empreiteiras faturavam o
equivalente a 56,9% da receita das
100 maiores.

Beneficiadas durante a ditadura,


essas grandes construtoras
estiveram na mira da operação Lava
Jato na 2ª década do século 21. As
investigações, que expuseram o
modo de agir das empresas em
arranjo com o Poder Público,
impactaram profundamente o
setor.

O mercado ficou menos


concentrado. Em 2020, o
faturamento das 5 maiores
empreiteiras representava 24,4%
das 100 maiores.

“ALTAMENTE BENEFICIADAS”
Durante os governos militares, as
empreiteiras brasileiras viram suas
receitas explodir e, com apoio de
órgãos governamentais, passaram
a atuar em outros países, tornando-
se multinacionais.

Segundo Campos, as grandes


construtoras brasileiras foram
“altamente beneficiadas pelas
políticas implementadas durante a
ditadura”. Citou medidas como a
canalização de recursos do
Orçamento para obras de
infraestrutura, uma ação
institucional de proteger e
impulsionar determinados grupos
econômicos do setor, financiamento
direto das atividades e isenções
fiscais.

“Não à toa, durante a década de


1970, esses grupos econômicos
tomam um impulso inédito e se
tornam grandes conglomerados,
com atividades não só no setor da
construção pesada, como em
outros segmentos da economia”. 

O especialista disse que houve uma


certa “seletividade” dos governos
militares para proteger
determinados grupos empresariais,
como os setores bancário, da
comunicação, e da construção.

Na área das empreiteiras, a ação do


governo na época provocou uma
concentração de capital nas mãos
de poucas empresas, centralizando
um mercado que antes era mais
pulverizado.

“A centralização de recursos vai


fazer com que a gente tenha um
grande oligopólio no setor da
construção pesada ao final da
ditadura”, afirmou.

CORRUPÇÃO
O “protecionismo seletivo”
investigado por Campos não
beneficiou de forma igual todas as
empresas, mesmo as de áreas
protegidas pelo governo. O
pesquisador citou casos em que
acusações de corrupção foram
instrumentalizadas para tirar de
cena determinadas companhias.

Foi o caso da construtora Rabello,


empresa que ficou ligada à imagem
do presidente Juscelino Kubitschek
e que foi responsável por obras
como as dos palácios da Alvorada e
do Planalto, em Brasília.

“A Rabello era uma empresa que


seguia JK desde que ele foi prefeito
de Belo Horizonte. Foi sendo
acusada de corrupção associada ao
Juscelino, [algo] nunca provado, e
sofrendo uma série de derrotas nos
processos de concorrências e
licitações depois do golpe de 1964″,
afirmou Campos.

Longe de estar presente em casos


isolados, a corrupção era comum na
época, segundo o professor. As
empresas estavam “fartamente
envolvidas” em episódios de
irregularidades, como pagamento
de propinas, fraudes em licitações,
acertos prévios de concorrência, e
aditivos durante as obras.

“No entanto, a gente não tinha os


mecanismos de controle, por parte
de um Estado de Direito típico:
imprensa livre fiscalizando os
processos, Ministério Público
atuando, Polícia Federal
independente, oposição
parlamentar podendo fiscalizar”,
declarou.

“Criou-se um ambiente
completamente censurável em
relação às acusações de
irregularidades e ilegalidades
envolvendo essas empresas
privadas, os agentes públicos e o
Estado como um todo”.

Um exemplo da proximidade de
empresas com o poder público na
época da ditadura era a alocação de
militares em cargos de direção de
firmas que forneciam para obras de
infraestrutura ou em conselhos de
grandes corporações.

REDEMOCRATIZAÇÃO
Se durante a ditadura a atuação
política e estratégica de
construtoras e empreiteiros focou
no Poder Executivo, com a
redemocratização a tática teve que
mudar.

Conforme Campos, a ação passa a


se dar nas eleições, na imprensa e
nos partidos com o objetivo de
manter a presença nos novos nichos
de poder e assegurar a posição
conquistada durante a ditadura.

“As empresas começam a financiar


campanhas eleitorais, e vão passar
a ter uma movimentação na
dinâmica parlamentar”, disse o
pesquisador. “Essas empresas têm
também uma ação no sistema de
Justiça, que é algo que pouco
apareceu nas investigações
recentes e na Lava Jato”. 

LAVA JATO
Deflagrada em 2014, a operação
Lava Jato impactou o setor de
infraestrutura foi responsável por
um processo de “devastação” e
“penalização” das empresas do
setor, segundo Campos.

O professor critica a forma de


condução das investigações. A
operação, ao final, tornou as
companhias menos competitivas, o
que abriu caminho para a vinda de
grupos estrangeiros.

Segundo ele, grupos internacionais


“entraram com muita força no
setor de infraestrutura brasileiro,
passando a rivalizar e até superar
as empresas brasileiras em alguns
projetos”, porque as empreiteiras
nacionais “foram desestabilizadas e
enfraquecidas, e algumas
chegaram à falência”.

Campos afirma que é possível


observar “a ascensão de alguns
grupos econômicos nacionais,
associados a governos específicos,
como o caso da MRV no governo
Bolsonaro”. Segundo ele, até a Lava
Jato, o setor de infraestrutura era
“um dos poucos segmentos da
economia controlados por
empresas notoriamente nacionais,
por capitais brasileiros e por
pessoas do país”.

Para o pesquisador, o cenário futuro


do setor tende a ser de coexistência
entre grupos nacionais e
estrangeiros. “Acho difícil haver
uma reversão do poder destrutivo
deflagrado pela operação Lava
Jato”, disse.

CORREÇÃO
25.dez.2022 (20h50) – Diferentemente
do que foi publicado neste post, a
conjugação do verbo impactar no 10º
parágrafo é impactaram, não impactou. O
texto acima foi corrigido e atualizado.

autores

Lucas Mendes
repórter

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