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Editor Responsável
Editores Adjuntos
Editores de Seção
Viviane Linares
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N.º 4, jan-mar de 2022.
Contatos
Website
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Redes Sociais
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https://www.youtube.com/channel/UCAZauJ5L_OCJYfWcSW_BIBA/featured
revistameno@gmail.com
Revista Menó
Publicação eletrônica trimestral voltada para artigos de divulgação
científica, ensaios políticos, crônicas, contos e poesias.
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Sumário
Resenha do Pivete
O Sol não nasce igual para todos: história, educação, música e memória
com NATÖ e sua trilogia NÔMADE
Por Iago Menezes, vulgo Pivete
Novo clipe de Marcão Baixada e Rodrigo Caê nasce dentro de um filme
Por Azis Gabriel
Peabiru 3000
22, Menó e uns B.O.
Por Dimas
Ônibus
Por Dimas
Mesa de dama
“Eu preciso disso para ontem”: O imediatismo como obstáculo no
cumprimento de metas a longo prazo.
Por Fijó
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Bora Apre(e)nder?
Um podcast para mim, um podcast para você, todos nós Perdidos na
Paralaxe
Por Débora K. Fofano, Carlos Frederico Costa e Raquel R. Rocha
Você não é uma empresa
Energia em Evolução
Energia em evolução
Por Aed Vieira
Observatório Cotidiano
Desespero literário no apartamento em Botafogo
Por Roberto Brito
Mágicas e trevas
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Poetizando
Rubi, Amor e o cão
Por Marcelo Nunes da Rocha
Vivências de um Sul Americano
Por Pivete
Sexta-feira
Por Fijó
Silêncio Absoluto
Por Marcelo Nunes da Rocha
Conto do Vigário
Os alienígenas e o pinguim
Partiu Resenha
Entrevista Livraria YorùBar
Por Carlos Douglas
Não estamos sozinhos
Por Carlos Douglas
Um feminismo de amasamiento: Interseccionalidade entre o pensamento
de Lélia Gonzalez e Gloria Anzaldúa
Por Gabrielle Venancio da Silva (Skia)
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Coluna
Resenha do Pivete
Editor Iago Menezes
Entrevistas
1Iago Menezes de Souza, vulgo Pivete. Colunista da Resenha do Pivete, Editor Adjunto da
Revista Menó. Mestrando em Antropologia, Graduado em Ciências Sociais e Graduando em
Segurança Pública pela Universidade Federal Fluminense e Técnico em Computação Gráfica.
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Além da sua família, seus amigos também são vistos nas suas músicas,
seja pelos interlúdios que iniciam e finalizam o primeiro EP, e o que começa no
segundo. São eles as faixas “Cyberlori 1” e “Cyberlori 2” em Nômade, e “Clá”
que é um discurso emocionante que mostra o quanto de amor e afeto esses dois
projetos levam, que introduz o segundo EP. E não só nas músicas, mas também
nas redes sociais de NATÖ que percebemos que seus amigos são o fio condutor
de suas músicas, formam as redes que ele facilmente transcende e incorpora
nas suas músicas
Essa entrevista demorou muito para sair, mas sempre foi um desejo meu
que fosse algo feito com o máximo de cuidado e atenção. Nesse meio tempo, eu
entrei no Mestrado em Antropologia, mudei de estado depois de um ano
morando no Rio Grande do Sul, aluguei um apartamento com minha
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AULADA
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Eu acho que é natural ter esse link. “Aulada” é uma expressão minha em
termos de educação, mas enquanto prática artista também, pois é o professor e
o artista que estão ali. Minha carreira artística está ligada a carreira docente, pois
algumas referências estão colocadas nas músicas propositalmente. Quando em
Memória estou falando de personagens históricos e da urgência em entender o
presente com olhar para o passado, isso é uma influência da minha formação
como professor de história.
Não tem como falar de NATÖ sem falar do meu pai e da Baixada
Fluminense. Eu vou te explicar o porquê. Meu pai é feirante e vende discos em
Duque de Caxias. Tem duas paradas muito fodas sobre o meu pai: ele é feirante,
vende e coleciona discos; e foi DJ nos Bailes do Movimento Black Rio nas
décadas de 1970 e 1980. Na verdade, até hoje ele é DJ do Baile que rola debaixo
da Biblioteca Municipal Governador Leonel de Moura Brizola, em Duque de
Caxias. E ele também é muito apaixonado por samba. Então, desde pequeno,
meu pai estava lá falando, sempre me mostrando: “isso aqui é James Brown,
isso aqui é Martinho da Vila”.
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INFLUÊNCIAS
A minha antena não está virada lá pra fora primeiro, estava virada pra cá,
mas acredito que faço uma música universal. Tipo assim, eu acredito fazer uma
música que toca em todos os lugares. No app consigo ver onde toca, e vejo que
minhas músicas tocam em vários lugares que nunca imaginei que tocariam. A
minha primeira antena está sintonizada aqui no Brasil, eu não quero fazer uma
música que soe como música lá de fora, eu quero fazer uma música daqui de
dentro. Mas é algo global, sabe? Até nisso acho que a história me deu muitas
ferramentas, porque sempre tive as influências, mas o olhar de historiador me
abriu um leque, um universo.
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NÔMADE?
MEMÓRIA
Eu falo uma frase na música: “história é filme, não é foto”. Isso é uma
coisa que eu costumo dizer em sala de aula para chamar atenção de que não é
possível a gente compreender a nossa existência sem relacionar ela com a
memória, com a memória histórica. Pensar que às vezes uma pessoa vai sair na
rua e vai falar: “Pô, mas qual a diferença do meu vizinho que é preto e eu sou
branco na hora de ingressar em uma universidade pública? Por que cota?” Mano,
você está falando isso porque você está vendo a realidade como se fosse uma
foto, uma coisa estática que começou ali. Somente quando você vê a história
como um filme, que você entende que algo fez aquilo acontecer.
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Mas a gente não pode achar que as pessoas são vítimas desse processo,
dessa pressão e que elas são passivas. A gente nunca foi passivo. A gente é
forte pra caralho! Em todos os campos, mano. A gente vive pra caralho em todos
os campos, e a gente consegue ser ouvido porque não tem como ignorar. Tem
uma frase do Crioulo dita no programa da Marília Gabriela que eu acho
fascinante. Ele falou que você pode dizer que o gigante não existe. Até ele
começar a pisar nas flores do seu jardim. E aí quando ele pisar, essa conta não
vai ser ele que vai ter que pagar. Alguém vai ter que pagar o jardineiro.
Entendeu?
Resenhas
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Coluna
Peabiru 3000
Editor Ademas Pereira
Aqui passado e presentes irão se encontrar, em uma multiplicidade de formatos
textuais, da cantiga de rua ao discurso político, passando pelas artes, o cinema,
e as vidas anônimas dos brasileiros. Estórias e trajetórias serão contadas no
encontro proposto por essa grande encruzilhada: Peabiru 3000.
Artigos
A essa altura o Menó se dá conta que o seu papo reto é coletivo. Cuidar
e buscar resolver junto. Não existe jornada de herói solitário na latinoamérica. O
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Menó é um coletivo. Cada um com seus B.O, tentando dizer como tenta resolver.
E vivendo. Sem excesso de texto no sangue. Pois a fórmula é mais que um texto,
como o ouro é mais que ouro para um alquimista. Ela é mais porque pode dizer
mais. Quer dizer mais. Quer apontar para esse mistério que não se resolve
sozinho, o Brasil. E quer aprender e cuidar mais dos seus rumos.
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vistos com bons olhos, nem no dia a dia, nem no imaginário apresentado em
livros e telas do cinema de Hollywood ou do Brasil.
Essa frustração se enraizou em meu ser e hoje, com 23 anos, faço dessa
a minha missão enquanto estudante de filosofia, livreire e possível future
escritore.
No entanto, para alcançar meu objetivo de dar espaço a cosmogonia
yorubá, preciso de muito estudo e vivência. Nesse caminho, encontrei algumas
figuras que iniciaram essa jornada e me servem de inspiração, no ramo fictícios:
Eberton Ferreira, Hugo Canuto,e PJ Pereira.
Decidi falar aqui sobre a obra de PJ Pereira, “O livro do Silêncio”, volume
um da “coleção Deuses de Dois Mundos'', que li recentemente e me cativou e
provocou uma série de reflexões sobre seus personagens (os orixás e New, o
protagonista), sua escrita e sua pessoa.
Em 277 páginas, o autor nos apresenta um enredo de aventura e
investigação, dividindo a narrativa entre o eixo das histórias dos orixás, e o eixo
de New, um jornalista mauricinho de São Paulo no início dos anos 2000.
Me apaixonei pela jornada dos 7 heróis de Orum que buscam restabelecer
o equilíbrio do mundo em busca do odus sequestrados pela Iyami Osoronga! No
entanto tive um pouco de dificuldade de tragar a narrativa de Newton, devido a
uma série de questões relacionadas à cor, raça e classe…, mas, enfim, o fato é:
PJ criou uma ótima representação dos orixás e da cosmogonia Yorubá (digna de
ser roteirizada por streamings como a Netflix, ouso dizer), tal como Rick Riordan
com Percy Jackson e Os olimpianos. E ainda sim, seu livro é pouco conhecido
e/ ou tido como desinteressante pelo público consumidor de cultura pop. Tenho
certeza que isso não ocorre por seu protagonista de carisma duvidoso ou pela
obra. E sim por racismo, racismo epistêmico, racismo estrutural, intolerância/
racismo religioso.
Cidade Invisível ganhou destaque com os folclores da cosmogonia indígena, no
entanto seu elenco era, majoritariamente, branco. Então, lanço a pergunta:
Quando as histórias, mitos e cosmogonias não eurocentradas serão bem
recepcionadas e representadas pelo mundo Pop? Espero ver isso se concretizar
– em grande escala, assim como todas as outras mitologias – e quem sabe, que
eu ajude a fazer essa realidade acontecer. Conto com isso…
Poesias
Ônibus
Por Dimas
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Hora que trepida com a questão: que é no lugar em que está o movimento?
Alinho:
Ainda assim, não nego a sentença das horas, pois faço ver.
Som da parada.
Para
Abrem-se portas.
Valeu moto!!!
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Coluna
Mesa de dama
Editor Fijó
Num lugarzinho pitoresco da baixada, existem senhoras e senhores, crianças,
adolescentes por aí conversando sobre a vida, sobre o mundo, sobre política,
religião e afins. Ideias nascem, crescem, se desenvolvem e até morrem dentro
dessas viagens pela subjetividade do dia-a-dia baixadense. Geralmente tais
conversas se dão num lugar improvável, sentados à uma mesa com um tabuleiro
de damas pintado, e eu convido você a ter um vislumbre da baixada no que se
propõe a ser um mensageiro dessas ideias.
Artigos
2 Pires, Lenin. Esculhamba, mas não esculacha! / Lenin Pires – Niterói: Editora da UFF, 2011.
171 p. (Coleção Antropologia e Ciência Política; 50).
3 Trabalho: do latim “tripalium”, um instrumento de tortura com três (tri) pedaços de madeira
(palum). A palavra passou ao francês como “travailler”, significando “sofrer, sentir dor”,
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evoluindo depois para “trabalhar duro”. Emprego: vem do latim “implicare”, “unir, juntar, enlaçar”,
formada por IN, “em”, mais PLICARE, “dobrar (como num tecido). Empregar uma pessoa é
promover um envolvimento, uma reunião de interesses. Fontes:
https://origemdapalavra.com.br/palavras/emprego/
https://origemdapalavra.com.br/palavras/trabalho/ [Grifos Nossos]. Acesso em: 28 jan. 2022.
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Tudo o que num dado momento se ordena, afasta por aquele momento
o resto do acontecer. É num aspecto inevitável que acompanha o criar
e, apesar de seu caráter delimitador, não deveríamos ter dificuldades
em apreciar suas qualificações dinâmicas. Já nos prenuncia o
problema da liberdade e dos limites (ibid., p. 26).
4
OSTROWER, Fayga. Criatividade e processos de criação / Fayga Ostrower. - Petrópolis: Editora Vozes,
1977. 187 p.
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DE MASI, Domenico. O ócio criativo. 2. ed. Rio de Janeiro: Sextante, 2000. 328 p.
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Coluna
Bora Apre(e)nder?
Editor Robson Campanerut
O que é ensinar? O que é aprender? O que faz de nós seres educativos? A
seção coloca na mesa o debate da importância de se aprender a aprender para
depois aprender a educar. A educação é a coisa mais linda, mas também uma
das coisas mais difíceis de se fazer.
Artigos
Quem nunca ouviu alguém falar: “Vou investir na minha carreira para crescer na
empresa.” ou “Preciso investir em tal curso para minha empresa me notar”; ou
ainda este: “A empresa está investindo em mim”.
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Desde o início do texto estamos nos referindo a “eles”. Quem eles são?
Por isso o 1% sempre vai criar estratégias para te convencer a investir em sua
carreira. Ou seja, você investe dinheiro, aprende novas informações para ser
explorado. A vida, o trabalho, nós e você não cabemos na lógica do 1%.
Tal lógica não veio à toa. Ela foi historicamente construída por profissionais das
áreas que podemos enquadrar nas Ciências Cognitivas: psicólogos, pedagogos,
economistas, designers, publicitários, engenheiros, sociólogos, antropólogos,
entre outros que, em diversos debates acadêmicos ocorrido desde 1946, após o
término da Segunda Guerra Mundial.
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Você já pensou nisso? Como podemos fugir disso? Como podemos sair deste
moedor de gente e construtor de modelos preditivos de empreendedores?
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desta mídia nas principais plataformas de áudio (como Spotify), que vem
investindo pesado em programas exclusivos ou adquirindo direitos de
exclusividade de programas de sucesso, sem falar nos podcasts de veículos da
mídia tradicional como a Folha de São Paulo, Rádio CBN, dentre outras.
Independentemente do formato ou temática, o grande atrativo desta mídia
é, sem dúvida, sua linguagem (com exceção dos programas de narração de
histórias, de estilo próximo às radionovelas, por exemplo). E assim, pela paixão
por esse formato de comunicação maravilhoso, que percebemos um potencial
enorme de levar a filosofia (outra grande paixão nossa) de forma leve e
descontraída pelos sete cantos da podosfera.
– Amo podcast, quero ter um, mas só sei falar de filosofia! – Disse a
Débora para o Freddy no começo de 2020. A primeira preocupação que tivemos
foi sobre como criar um programa para abordar filosofia de uma forma acessível,
mas sem perder o rigor do pensamento, ou melhor: sem perder a profundidade
da filosofia e sem perder o bom humor. É aí que entra a ideia de pensar um
projeto que usasse a cultura pop como desculpa para falar de filosofia, que
conseguisse ser mais profundo em suas análises do que trabalhar em cima de
opiniões, mas sem criar uma sensação de aula. Por isso, a dinâmica de uma
conversa aparentemente informal nos soou mais natural e atrativa, evocando
mais à atmosfera dos bons encontros com amigos em torno do café ou de um
barzinho para debater sobre as coisas que a gente gosta, como filmes, literatura,
músicas e atravessar isso com filosofia de forma até despretensiosa. Assim
surgiu o Perdidos na Paralaxe6, cujo nome do programa já nos remete a um
conceito filosófico (paralaxe) e a ideia de que perdidos nesse conceito podemos
juntar a cultura pop, filosofia e outros temas aleatórios que fazem parte do nosso
cotidiano.
Por falarmos sobre filosofia, é comum que, em um primeiro momento,
associem o programa a um formato de programa que lembra a sala de aula. A
ideia de um podcast ser a extensão da sala de aula existe e é até interessante,
sendo aplicada muito bem em outros programas, mas não foi o nosso foco. Há
uma dicotômica interessante que as artes em geral enfrentam, elas podem
ensinar muito quando não pretendem fazer isso, uma vez que desconstroem os
paradigmas didáticos e metodológicos que o rigor acadêmico exige.
Aprendemos muito a partir das experiências estéticas, com filmes, séries, peças,
músicas, assuntos debatidos nas redes sociais. No entanto, caso essas
experiências tivessem a objetiva intenção de ensinar, talvez não nos apetecesse
tanto.
É isso que muito pretensiosamente tentamos fazer nos nossos episódios:
falar de coisas interessantes sem pretensão didáticas, porém, sem dúvida,
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e sugestões que fazem a gente pensar em mais episódios (e não é assim com a
própria filosofia?!) e também despertam o interesse de quem está nos ouvindo.
Acreditamos que de fato, é possível aprender com podcasts, mas no
nosso caso, este não necessariamente é o objetivo, tampouco o resultado. O
principal e mais importante feedback que recebemos dos ouvintes é sobre
quererem saber mais sobre os assuntos, a procura pelos textos, livros ou filmes
que indicamos, tudo que complemente e enriqueça sobre os tópicos que
levantamos. A consequência é o despertar do interesse filosófico, a geração de
debates, o estímulo à leitura e à pesquisa e isso nos deixa muito satisfeitos. É
assim, Perdidos na Paralaxe de temas, ideias, filosofias e cultura pop que nos
encontramos na podosfera e procuramos nos conectar com quem nos ouve. Ao
entrar na vida das pessoas através do podcast queremos que elas tenham a
mesma satisfação e companhia afetiva que temos com os podcasts que
aprendemos a amar.
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Referências:
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Transcrição do enunciado do documento: “Solicitante: Representante da 6ª Câmara de Coordenação e
Revisão no estado do Ceará. Ementa: Estado Atual das Demandas Referentes à Demarcação de Terras
Indígenas no Estado do Ceará”.
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Ver artigo 67 em Ato de Disposições Transitórias.
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INGOLD, Tim. 2015. “Terra e Céu”. P.215-229 In: _______Estar vivo: ensaios sobre
movimento, conhecimento e descrição. São Paulo, Editora Vozes.
Distrito Sanitário Especial Indígena do Ceará (DSEI-CE).
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Coluna
Artigos
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Coluna
Energia em Evolução
Editor Aed Vieira
Convido a todos a construirmos um espaço de conhecimento e aprendizado,
descomplicando as aplicações e tecnologias da energia elétrica.
Vamos juntos apresentar soluções para eficiência energética, fontes de energias
renováveis e cuidados em nosso cotidiano, para mostrar que a inovação na
geração de energia está cada vez mais presente na nossa vida e isso é papo
sério.
Artigos
Energia em evolução
Por Aed Vieira
Sejam todos bem-vindos! Hoje vamos iniciar nossa trajetória entorno da
eletricidade, que busca levar informações precisas, dinâmicas e repletas de
conhecimento aos leitores. Por muito tempo observamos a dificuldade de todos
em ter acesso a este tema, sendo assim, esta coluna vem desmistificar esse
temido assunto.
A energia elétrica está presente em diversas aplicações em nosso
cotidiano como em nossas casas, na iluminação pública, ao carregar a bateria
de dispositivos móveis, ao conectar um aparelho ou eletrodoméstico na tomada,
entre outros. Dessa forma, fica evidente que seu uso é constante em nosso dia-
a-dia, assim como a proximidade das pessoas com essa fonte de energia. Além
destes benefícios selecionamos os pontos principais que influenciam
diretamente a vida de todos. Vamos abordar modelos de geração de energia,
formas de economia, segurança das instalações, fontes de energias renováveis,
descarga atmosféricas e como nos proteger de possíveis riscos à saúde.
Para abordarmos estes temas é necessário em primeiro lugar
apresentarmos a questão principal que envolve a energia elétrica, onde
podemos destacar: a segurança em instalações elétricas e o risco oferecido pela
interação direta e indireta com a energia. Como a cada dia nossa proximidade
aumenta, também aumentam os riscos causadores de danos físicos e materiais,
mas todos esses riscos possuem medidas de controle a serem amplamente
usadas e apresentadas de forma descomplicada ao público geral. Neste tópico
o objetivo será apresentar todos os cuidados necessários que precisamos tomar
individualmente com a finalidade de nos proteger contra os riscos mencionados.
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Coluna
Observatório Cotidiano
Editor Roberto Brito
O espaço Observatório Cotidiano tem a vocação de tornar públicas as múltiplas
visões daquilo que é, em parte, inominável e intangível: o cotidiano. O tema vem
a calhar pelo fato de ser ao mesmo tempo uma abstração espaço-temporal e
uma arte ainda não compreendida.
Crônicas
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cavalo de rodeio, mas a tristeza em perceber seus dedos murchos, foi o que
mais o deixou triste.
Ficou parado por um instante, olhando a barra do redator de texto piscar,
e a cada piscadela, seu coração palpitava. Questionava-se então se sua escrita
era um regozijo de seu ego. Pensou também que seus devaneios literários, suas
pretensões como escritor, que nunca haviam se concretizado, chegara ao fim,
sem mesmo ter começado. Seu esforço em tentar era seu último esconderijo,
seu último bastião moral. Dizia a si mesmo que era capaz, confortava-se dizendo
que sua literatura era “marginal”, “inovadora”, “incompreendida”, mas quando se
lembrava de que ninguém nunca lera seus esforços literários, uma ânsia ainda
maior tomou seu coração num rumor nunca antes sentido por ele.
Nesse instante, convenceu-se de que era preciso chorar, era preciso
deixar derramar o azeite antes eivado pelos dedos. Como bom intelectual
burguês, pegou seu maço de cigarros, abriu a janela do quarto de empregada e
começou a fumar consecutivos cigarros, observando atentamente sua culpa
burguesa diante de um quarto menor do que um canil.
Num esforço totalmente desesperado, dialogava sozinho, queria
convencer-se de que era apenas uma fase ruim, como um homem que tenta
convencer sua parceira de que sua “brochada” fora a primeira. Sempre tivera a
mania de escrever frases para si em cadernos baratos e nessa noite de uma
indesejada improdutividade, rabiscou a seguinte frase: “Sou o que deveria ser
do que fizeram de mim e pouco me satisfaço disso”.
Ao terminar de escrever, deu seu último trago e apagou o cigarro, deitou
no colchonete da empregada – que havia saído para tomar uma cerveja com as
amigas num sábado de chuva – e pensou que a vida burguesa é um fado
teatralizado, pensou no livro de Goffman que havia resenhado, e culpou-se ainda
mais.
Mágicas e trevas
Por Paulo Roberto
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Suas mãos magrelas parecem ter cola, já que é possível suportar tudo ao
mesmo tempo, caixas, notas, moedas e o próprio mundo.
Seu coração bate, mas bate forte. Está vivo, mas agora com outra
cadência. A noite traz consigo as trevas, a incerteza, a luxúria e o castigo. A
noite, aquela noite, desfibrila seu coração e o faz renascer. Suas costas ganham
asas, seu corpo ganha plumas, suas mãos um elegante cetro que ele habilmente
movimenta com suas mãos envoltas por uma luva brilhante e elegante. De
repente, num picar de olhos, as ruas que o castiga durante o dia se tornam seu
jardim, e esse é seu grande reino, que em poucos minutos ele irá viajar, voar,
encantar os olhos cegos e medrosos que a luz do dia engana, como um mágico
que ilude e inebria a plateia. Ele não tem medo, nunca teve, nem de dia e nem
durante a noite, mas ali, naquele momento, a festa devolve a ele o posto que
sempre teve, o lugar que nunca perdeu, o de rei, rei de tudo e de todos que
ousam se encantar com seus movimentos fluidos e encantadores. A luz do dia
não ousa aparecer enquanto seu sorriso ousa a rodopiar. O sol ameaça subir,
mas não se atreve a disputar o brilho com o bravo cavalheiro que desfila toda a
sua elegância pela avenida, diante de seus súditos, ávidos pelo seu ritual, que
irradia luz onde quer que sua nobreza passe. Durante aqueles minutos ele
caminha sob as águas, voa como um anjo, e lança feitiços por todos os lados.
Depois de tudo, depois que o portão fecha, que o sangue esfria, tudo
desaparece, e ele é levado de novo ao mundo de mentira, esperando que o ano
passe e o pecado devolva o seu título, seu nobre título de rei.
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Coluna
Poetizando
Editor Felipe Moura Fernandes
Esse espaço está dedicado a leitores/escritores que curtem a subversão da
linguagem que a poesia/poema evoca. As fronteiras entre o dentro e o fora, o
corpo e a alma, o escritor e a escrita, o grito e o silêncio são colocados em
questão nessa eterna reescrita de si para o “outro” que é a poesia.
Editorial
Pô-esia
Poesias
Meu rio, em seu volume, força, massa, não quer ser reduzido a um cão,
lacaio...
No fundo, meu coração é um bárbaro como os bárbaros romanos...
Não perde a incandescência e a intensidade de rubi...
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nasci
mas
nasci
pobre
literalmente pobre
cinematograficamente pobre
a primeira vez que me reconheci
foi nos livros
cidade de deus
e no filme
na série
e morrendo
e tomando chicotada
sendo o empregado doméstico
eu sou um só
mas não o que me representa
a tela, o fogo, a vida, a morte
eu to deitado na lama
exposto igual o luciano
talvez não
mas minha negritude televisionada
enquanto as massas querem
brancos
dominantes e dominados
táticos
eles são maquiavélicos
poder, poder e poder
qualquer avanço é uma ofensa
conservadores
nunca gostei de poesia
conserva
dores?
e o picareta morreu.
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N.º 4, jan-mar de 2022.
Sexta-feira
Por Fijó
Um novo sistema operacional
Chegou criando expectativas.
Ele prometia otimizar tarefas
Que cumprimos no dia-a-dia.
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Silêncio Absoluto
Por Marcelo Nunes da Rocha
Abandonar um pouco as lembranças do silêncio absoluto –
Só se abrirão agora o que ficou do passado como resquício...
Como artefato do afeto... como flor irrepetível...
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N.º 4, jan-mar de 2022.
Coluna
Conto do Vigário
Editor Marcelo Sophos
Bem-vindos aventurados. Nossa coluna os conclama a lerem nossos contos
ficcionais de muitas formas literárias. Nessa grande orgia, que se revelará a cada
história, reúnem-se os malditos da literatura marginal e seus boêmios
hedonistas, o fantástico de muitos mundos, o grotesco do horror e sua
expectativa do suspense, os vislumbres das novas distopias, e o futuro que nos
aguarda.
Contos
Os alienígenas e o pinguim
Por Marcelo Sophos
Era uma bela tarde de sol, a praia estava perfeita com sua típica
transparência das águas da Região dos Lagos, no Estado do Rio de Janeiro. As
ondas pequenas deslizavam sobre as areias brancas, o sol das 16h queimava
suave com a brisa úmida e fresca que vinha do mar. Contemplava o mundo,
observando o movimento da vida e refletindo sobre o cosmo. Foi quando vi
aquelas criaturas bizarras cercando um pobre animal no canto da praia, onde
estavam as pedras com o Forte São Matheus em suas costas. O pinguim fugia
como podia.
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pedras para tentar descansar. Mas a perseguição era implacável, mais seres se
juntaram em busca de sua captura e finalmente cercaram e subjugaram a
criatura. O pavor era nítido em seus olhos.
Busca ativa
Por Thiago Sento Sé
O ano letivo tinha começado agitado. A escola estava lotada, com direito
até a uma porradaria na hora da entrada. Certamente alguma treta de bola ou
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dar uma carona para ela até Nova Cidade, e verificar porque dois irmãos da Pré-
Escola não estavam frequentando as aulas, num procedimento chamado de
“busca ativa”.
No caminho, Rosa falava da situação problemática: eram os filhos de
Doralice. Guto e Gustavo, de quatro e cinco anos. Doralice vivia numa condição
complicada, ainda mais depois que o posto de gasolina de Nova Cidade tinha
fechado, lugar onde ela tinha aprendido a se prostituir ainda na infância.
— Nova Cidade é que nem rabo de cavalo, só cresce pra baixo. — Falava
a pedagoga que vinha ao meu lado no carro.
Pela rodovia federal, vimos o esqueleto do posto de gasolina, e do outro
lado da pista uma placa sinalizava o desvio para Nova Cidade. O lugar não
passava de um vilarejo miserável as margens da BR101. Pelas ruas de terra a
poeira subia, e o que se via além das casas de tijolos, eram apenas anilhas de
uma obra de saneamento básico que nunca aconteceu. A casa de Dora, de tão
antiga parecia que iria desabar a qualquer momento. Tudo o que se via era velho,
feio e miserável. Para completar, o calor e o esgoto a céu aberto deixavam o ar
insuportável.
Chegando no endereço, Dora nos recebeu com surpresa no portão.
Sorriu-me de maneira assustadoramente estranha, em seguida, olhou com
desprezo para minha colega de trabalho.
— Bom dia Dora, como vai? Porque os meninos não estão frequentando
a escola Dora? Você sabe que por lei, eles deveriam estar estudando né?
— Dia dona Rosa. Oras! A senhora pode ter certeza que as crianças estão
muito bem. Eu vendi Gugu pra uma família lá de Perobeba. Eles me pagaram
um bom dinheiro e levaram o menino. Veja você mesma.
Dora tirou de um envelope a foto do menino, muito bem vestido por sinal.
Usava roupas novas. De terninho, estava de pé num jardim sem flores, mas com
um gramado muito bem tratado e uma belíssima casa ao fundo. Mas havia algo
de estranho naquela foto. O menino parecia muito sério, e apesar de bem
gordinho parecia pálido. A imagem de uma criança, vestida como um adulto,
nenhum brinquedo por perto. Não se via qualquer traço de alegria em seu rosto,
e nem de felicidade em seus olhos. Foi justamente aí, que reparando bem nos
olhos do menino, vi que pareciam furados. Isso deixou tudo ainda mais estranho.
E Doralice continuava:
— Ainda me enviam dinheiro toda semana num envelope. Já comprei
comida, sabão de se lavar e tô até querendo compra um fogão, um fogão de
verdade, com botijão e tudo menina. Além do mais, dona, tô cansada de vê
criança morrê no meu colo, sem eu pode faze nada...sem remédio, sem nada!
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Esse ai vai ser o próximo! O casal de Perobeba gostou tanto do Gugu que
resolveram levar o Guto também, né meu filho! —Virando-se para o menino de
cinco anos, gritava em sua direção, — engole o choro moleque, fica ai dentro pra
não se sujar, porque sua família nova vai vir amanhã pra te levar!
Desespero, loucura, miséria...
De posse do endereço em Perobeba, Rosa fez com que a gente seguisse
em nossa missão pedagógica da busca ativa, com a promessa de que me daria
um dia de folga durante a semana, o que ainda me renderia uma bela economia
de combustível. O problema era que nem eu, nem ela, conhecíamos Perobeba.
A única referência era Padre Fabiano, um jovem pároco que esteve à frente da
igreja que ficava na praça perto da escola e havia sido transferido para lá já a
alguns anos. Rosa achava tudo aquilo normal, e até relativizava. A mulher já
havia perdido cinco filhos para a fome e a doença. Não queria ver os dois mais
novos morrerem também. Aquele tipo de “adoção” era inclusive, comum nos
lugares mais pobres, tinha até um nome bastante sugestivo, “à brasileira”.
O tempo começava a mudar, tornando o ar levemente úmido, porém, não
menos quente, depois de 45 minutos de estrada chegamos em Perobeba. O
lugar parecia um pouco mais desenvolvido, mas não passava de uma praça com
três ou quatro ruas, todas calçadas com paralelepípedos. A velha igreja estava
lá, em estilo barroco, o barroco pobre, típico das regiões do Brasil que não se
desenvolveram. A fachada pintada de branco banhada pelo sol evidenciava os
caroços do emboço feito porcamente, e até os arcos eram visivelmente fora de
esquadro. Enquanto bebíamos um pouco de água, o jovem padre olhava
desacreditado o endereço.
— Acredito que deva haver algum engano. Não existe nada nesse
endereço. Apenas uma velha estrada que não passa nem carro de boi.
Mas Rosa, com seus vinte e poucos anos, com todo o seu furor
pedagógico, nos fez ir até o endereço. O Padre percebendo a cilada se ofereceu
a nos acompanhar.
A estrada era realmente horrível e os paralelepípedos deram lugar a um
chão de terra esburacada. Os pastos sem fim deram lugar a um mato alto, que
muitas vezes invadia a estrada, e foi justamente no meio desse matagal que
vimos, primeiro uma cerca caída, e logo em seguida, ao longe, a grande casa da
foto. Além da forma, nada mais lembrava aquela casa da fotografia. Estava
abandonada e caindo aos pedaços. Tudo estava destruído. Portas, vidros, e até
mesmo um pedaço do telhado havia desabado. Uma placa tão velha quanto a
casa confirmava o endereço. Quando parei o carro, nuvens pretas tomavam
conta do céu, mas uma estranha luz de sol iluminava o lugar. Parecia que nada
tinha vida por ali, nem um vento batia. Nem um ruído vindo da natureza. Por
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mim aquela busca tinha se encerrado ali, mas antes que eu pudesse dizer
qualquer coisa, Rosa desembarcou e entrou pelo terreno. Padre Fabiano foi logo
atrás, e pude perceber quando ele tirou do bolso uma pequena cruz de prata.
Fechei o carro e fui atrás.
De um lado, uma enorme figueira seca e retorcida com galhos brancos
apodrecidos, do outro, um pequeno espaço entre o mato que avançava
selvagem pela cerca e a casa, formavam um estreito corredor para os fundos,
por onde seguimos, até que Rosa parou. O jovem padre apertou sua cruz contra
o peito, pude ver um pequeno cemitério familiar nos fundos da casa, desses que
eram relativamente comuns no passado. Passei pelos dois, me aproximando um
pouco, pude perceber o chão duro se transformando em uma terra fofa debaixo
dos meus pés. Uma estranha energia correu pelo meu corpo. Diante da pedra
que marcava o local do sepultamento, observei uma pequena moldura com uma
foto preto e branco. As peles pálidas e sem vida contrastavam com as roupas e
cabelos escuros do casal. A data de falecimento era de aproximadamente uns
70 anos. Ao lado, seis cruzes de madeira, bem modestas e a última com a terra
recentemente remexida. Presa nessa cruz, havia uma pequena moldura, atrás
do pequeno vidro, a foto enevoada do menino de terninho, expressão séria e os
olhos terrivelmente furados. Demorei alguns segundos ali, quando me virei, Rosa
e padre Fabiano ainda permaneciam paralisados. Não restava dúvidas, o menino
estava morto e enterrado, e não havia nada que pudéssemos fazer ali.
Sem trocar muitas palavras, ainda chocados e sem acreditar naquela
cena, meu estômago se revirava enjoado. Aquilo parecia um pesadelo, era
terrivelmente real. Precisávamos falar com Dora, e claro com as autoridades.
No entanto, não conseguimos ir muito longe, pouco antes de chegarmos na
antiga igreja para deixar o padre, a chuva caiu, caindo com força, alagando as
estradas e interrompendo a comunicação, tivemos que nos abrigar dentro da
igreja, o que tornava tudo ainda mais exaustivo e sinistro.
Assim como toda chuva de verão, no fim da madrugada ela estiou.
Engolimos um café com pão cedidos pelo padre e saímos nas primeiras horas
do dia, antes mesmo do sol subir, em um lindo céu azul. Apesar, de termos
passado a noite em claro, parecíamos incrivelmente renovados. Seguimos rumo
Nova Cidade para falar com Dora pela estrada enlameada. Tudo parecia muito
estranho, aquela energia renovada criava um paradoxo a descoberta do destino
do menino, e que agora, estávamos prestes a contar para aquela mãe. Mas nada
foi tão estranho que ao chegar até a frente da casa de Dora, e ver que agora a
velha casa se resumia a uma pilha de escombros, derrubada pela forte
tempestade da noite, e debaixo dos escombros estavam todos mortos, Dora e
seu único filho que restava. Não havia nada que pudéssemos fazer ali.
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Coluna
Partiu Resenha
Editor Carlos Douglas
Sejam bem-vindos a coluna Partiu Resenha. Um espaço para narrar o cotidiano,
descrever experiências literárias, culturais e artísticas, expressar percursos
afetivos e experimentações. Aqui traremos resumos e resenhas de livros.
Entrevistas
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Livraria YorùBar: Bom, nós trabalhamos com livros há muito tempo… fundamos
a Livraria Soletrando, que funciona até hoje no centro de Niterói. No entanto,
constatamos a necessidade de um espaço que não seja só uma livraria, mas um
espaço cultural, próximo a UFF. Um local que não seja uma mera livraria, mas
sim um espaço de cultura, que seja referência a política cultural, resistência,
debates, discussões, lançamentos de livros, e atividades culturais literárias de
um modo geral. Essa demanda nos levou a tomar uma iniciativa.
Quanto às pessoas que trabalham no projeto, além de mim, José Cícero, que
sou o idealizador e responsável pelo projeto, possuindo uma vasta experiência
nesse ramo – mais de 40 anos trabalhando como livreiro – temos outros livreiros
extremamente capacitados. Também contamos com a colaboração de alguns
alunos da UFF, que a partir do retorno presencial, tentaremos firmar parcerias
para construir uma relação conjunta, não só com a universidade, como com seu
o corpo docente e discente, de um modo geral. Contamos muito com esse
público – a comunidade acadêmica da UFF – para nos ajudar no sucesso do
nosso projeto.
Dirigir uma livraria é difícil, obviamente, ainda mais por trabalhar especificamente
com livros, em um país como o nosso, onde o hábito da leitura não é –
infelizmente – incentivado, além da ausência de políticas públicas de incentivo à
leitura e à cultura…, mas há um lado prazeroso: quem realmente gosta de livros
passa a encarar essas dificuldades de forma serena, já que construímos
relações, aprendemos e trabalhamos com que gostamos. No final, se torna uma
atividade bastante prazerosa.
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Revista Menó: Afinal, YorùBar é livraria, bar ou os dois? Como e por que dessa
mistura?
Livraria YorùBar: Yorùbar é mais do que os dois. É mais que livraria e bar. A
proposta é ser um espaço cultural, tendo a livraria com referência principal, mas
que tem um serviço de bar, de café, onde as pessoas possam vir, tomar uma
cerveja, um café, papear… E tem também as atividades, né? O espaço também
está aberto para atividades culturais, como oficinas de dança afro e maracatu,
iniciativas que visam incentivar a cultura afrobrasileira com parcerias que já
iniciamos. Além disso, procuramos parcerias para eventos como: lançamentos
de livros, palestras, debates e demais atividades literárias.
A mistura é extremamente necessária, né? Você agrega múltiplos valores e
atividades em um único espaço… é uma boa mistura. Uma mistura de cultura e
lazer, que é um caminho que várias livrarias hoje estão seguindo, e que tem dado
certo. É um caminho que tende a fortalecer a livraria, se tornando multicultural.
Revista Menó: O local onde a loja física funciona, na Praça da Cantareira, ao
lado da Universidade Federal Fluminense, é um local tradicional de cultura e
resistência da cidade de Niterói/RJ. Nessa localidade, ao longo da história da
cidade, foram realizadas várias iniciativas de eventos culturais, shows e
manifestações. Como o projeto da Livraria YorùBar se encaixa nesse contexto?
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Livraria YorùBar: Esse foi um dos motivos que escolhemos a praça Cantareira.
É um local de efervescência cultural e política, devido à proximidade com a UFF
e com essa juventude, representada pela maioria de seus alunos… Isso é
fundamental. É importantíssimo, na nossa concepção, ter um espaço como esse
aqui. Um espaço onde as pessoas possam compartilhar, participar, ter acesso a
variados gêneros literários, possam tomar sua cerveja, possam discutir, possam
se reunir…é um espaço participativo. Eu acho que ele só vem a complementar
e fortalecer essa vocação da Cantareira, e só vem a somar e agregar mais
valores a todas as atividades culturais e políticas que já acontecem aqui na cena
local.
Revista Menó: Vocês consideram que as livrarias precisam integrar causas
culturais e políticas ou o papel das livrarias é somente vender livros?
Livraria YorùBar: Não, nossa proposta inclusive é integrar. Acho que as
livrarias devem ter uma função social, cultural e política. Nossa proposta é
justamente não nos limitarmos a uma relação puramente comercial. Acho que as
livrarias - respeitando o perfil de cada uma- devem ir muito além disso, elas têm
uma contribuição cultural muito importante para dar.
Revista Menó: Como é ser uma livraria de rua nos dias de hoje? Vocês
consideram que a concorrência da Amazon e outros sites de vendas online tem
colaborado para a falência das livrarias físicas? Hoje é necessário também
vender pela internet ou é possível sobreviver somente com vendas no local da
loja física?
Livraria YorùBar: É difícil, mas se for uma livraria que tenha um atendimento
personalizado, que tenha livreiros que de fato conheçam e que tenham uma
relação mais orgânica com os livros e com as pessoas, dá certo. Nós somos, de
certa forma, um exemplo disso. Conversamos com a clientela, indicamos títulos,
temos amigos que frequentam o espaço, recebemos sugestões… então, penso
que essa parceria entre o livreiro e o cliente é fundamental.
Quanto à questão das vendas online, infelizmente, não há a menor dúvida. A
internet é um mercado muito amplo, oferecendo mais variedades, muitas vezes
tendo ofertas melhores, o conforto do cliente não precisar sair de sua casa…O
mercado virtual, de modo geral, é arrasador! E isso tem contribuído muito, tanto
que, as grandes livrarias, como a saraiva; a cultura, a nobel e etc, passam por
um momento muito difícil, quase em uma situação falimentar…, mas as livrarias
de bairro têm ressurgido, exatamente por conta de seu caráter independente e
mais personalizado. Elementos como a figura do livreiro presente – que as
livrarias de grande porte, infelizmente, não têm – fazem com que as livrarias de
rua ressurjam de uma forma mais autônoma, criativa e personalizada, se
reconstruindo e redescobrindo o perfil das livrarias, voltando para o cenário
cultural do mercado do livro.
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Por outro lado, sem a internet, seria quase inviável a nossa sobrevivência. Do
ponto de vista do lucro comercial, o que nos mantém hoje, são as vendas virtuais
pelo site “estante virtual”.
Revista Menó: Como é ser uma livraria independente? Como as livrarias têm
conseguido sobreviver nesse contexto desfavorável de ataques à cultura? Como
a pandemia afetou a livraria?
Livraria YorùBar: Isso só aumenta o nosso compromisso, nossa
responsabilidade. Sabemos que temos que trabalhar muito mais, que temos que
ser muito mais. Ser mais atenciosos, mais conhecedor dos conteúdos dos livros,
ter cuidado e respeito com o livro, e ter uma relação mais intrínseca com o
público, para manter essa independência. Sem esses elementos, sem valorizar
o livro e a figura do livreiro, essa independência fica bastante comprometida.
Infelizmente, sobre o contexto político dos ataques à cultura, o país passa por
um momento bastante tenebroso, digamos assim. A investida do governo federal
contra a cultura, de forma geral, nos afeta e nos deixa receosos. Mas isso só
fortalece o nosso espírito de resistência, pois faz com que lutemos muito mais
para que esse estado das coisas mude, o mais breve o possível. Para que a
cultura volte a ser respeitada e volte a ter seu espaço em relação a prática
proposição de políticas públicas, como as de incentivo à leitura. Acho que essa
fase obscura vai passar e a cultura vai voltar a ter seu local de destaque e a
importância que lhe é devida.
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A pandemia afetou drasticamente o cenário. Bastante. Muito. O que nos deu gás
e manteve a nossa sobrevivência nesse período- e que ainda mantém, de certa
forma- são as vendas virtuais. Se não fosse isso, dificilmente estaríamos com o
espaço aberto.
Revista Menó: Qual o futuro das livrarias, na visão da Livraria YorùBar?
Livraria YorùBar: As livrarias terão que sempre se reinventar, terão sempre que
criar outras atividades que venham de encontro ao livro. Não dá pra se limitar
meramente a uma relação comercial. A figura do livreiro é importante, o estímulo
a iniciativas e atividades culturais passam a ser fundamentais. As livrarias terão
que se tornar ponto de encontro, ponto de referência cultural, para que possam
agregar mais pessoas e sobreviver.
Revista Menó: Qual a mensagem que vocês deixam para todas as pessoas que
amam os livros?
Livraria YorùBar: Parabéns! Só temos a agradecer a todos, porque são essas
pessoas que nos fazem existir. E dizer, para todos que se interessarem, que o
espaço Yorùbar está aberto, e que será um grande prazer contar com a presença
delas aqui em nosso espaço.
Revista Menó: Na sua visão, o que é ser um livreiro?
Livraria YorùBar: Livreiro é ter uma relação orgânica e prazerosa com o livro. É
procurar absorver, se não tudo, pelo menos fragmentos dos conhecimentos que
você tem em torno de si – considerando que estamos rodeados de milhares de
livros, lidamos com milhares de livros e com uma clientela mais sofisticada, no
ponto de vista intelectual. Então, ser livreiro é você estar envolvido, de corpo e
alma, nesse processo. É você não quer só vender o livro, é você conhecer o
livro, conhecer o comprador do livro. Não se limitar a um mero decorador de
títulos, é ter um conhecimento de conteúdo de livro.
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Mini BIO
Arthur Charles Clarke nasceu na cidade
de Minehead, na Inglaterra, em 16 de dezembro
de 1917. Desde a infância se interessou por
revistas de ficção científica, como a Amazing
Stories, e durante a adolescência construir o
seu próprio telescópio. Em 1934, aos 16 anos,
associou-se a British Interplanetary Society
(BIS), começou a escrever para o boletim
informativo da BIS e ficção científica sob o
pseudônimo "Ego", "Arthur Ego Clarke" ou
"E.G.O’Brien". Durante a Segunda Guerra Mundial, como oficial da Força Aérea
Real Inglesa (RAF), Clarke esteve encarregado da pesquisa do primeiro
equipamento de controle de aproximação por radar.
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A recepção
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O mistério de Rama
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O interior de Rama
Rama desafiava dois dogmas da ciência: primeiro, que o universo era uma
arena de forças titânicas e impessoais, como a gravitação, o magnetismo e a
radiação; segundo, que era impossível para a vida atravessar o abismo
interestelar. Porém, até aquele momento não haviam detectado vida em Rama,
e o artefato mais parecia uma espécie de "arca espacial" (conceito que remota
as ideias do cientista de foguetes russo Konstantin Tsiolkovski e do físico
britânico J. D. Bernal).
A hipótese inicial dos cientistas era que Rama sustentaria uma ecologia
para sobreviver no máximo 10 mil anos, tempo adequado ao transporte entre os
sois apinhados no centro da galáxia, mas não num lugar como o sistema solar
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Ovo cósmico
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Com o degelo, perceberam que o mar cilíndrico não era feito de água,
mas de uma espécie de sopa orgânica. Rama havia passado do estado
anaeróbico para plantas fotossintéticas em 48h. A água estava viva: "cada colher
de sopa continha milhares de microrganismos esféricos e unicelulares,
semelhantes as primeiras formas de plâncton que existiram nos oceanos da
terra". Em pouco tempo criaturas complexas começam a surgir, mas elas não
eram semelhantes a vida terrestre, pareciam biômatos, um tipo de robô biológico.
Uma crise se instaura nos Planetas Unidos (Mercúrio, Terra, Lua, Marte,
Ganimedes, Titã e Tritão) sobre o que fazer com o artefato, que parecia estar
estabelecendo uma órbita no Sol. O embaixador de mercúrio assumiu um tom
de alerta com relação a Rama, apresentando o artefato como um perigo iminente
para a humanidade. Em meio à crise, antes de evacuar Rama, o capitão Norton
abre um buraco nas construções hermeticamente fechadas e descobre o visual
de objetos de um possível traje ramano, com três braços e três pernas.
Conclusão
Encontro com Rama é uma das obras primas de Arthur C. Clarke, não
necessariamente pela excelência narrativa, que segundo os críticos deixa a
desejar na construção dos personagens, mas pela centralidade do objeto como
elemento central da trama. A narrativa do livro se desenrola análoga a pesquisa
de cientista sobre seu objeto, onde este lança perguntas e realiza descobertas
graduais sem necessariamente chegar a conclusões definitivas, mas a
perguntas cada vez mais complexas. Os personagens, como capitão Norton, os
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Essa é uma das razões para Encontro com Rama ter tido uma recepção
tão acalorada no meio literário da ficção científica, que durantes as décadas de
1960, 1970 e 1980, foi um espaço de vazão para especulações metafísicas que
não cabiam no campo acadêmico-científico. A temática do livro atendia a uma
curiosidade corrente dos cientistas e do público, intuindo a possibilidade de
respostas para perguntas que que a humanidade estava se fazendo: existe vida
fora da Terra? Como seria a vida fora da Terra? É possível a vida viajar pelo
universo?
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Referências:
ANZALDÚA, Gloria. “La conciencia de la mestiza/rumo a uma nova
consciência". Florianópolis: Revista Estudos Feministas, 2005, p. 704-719.
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