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As mutações da periferia na
‘narrativa legitimada’ dos Racionais
MC’s - Vermelho
Mariana Serafini

6–8 minutos

Uma contradição entre o discurso e a realidade. É dessa forma


que o pesquisador Tiarajú Pablo D’Andrea, autor da tese de
doutorado A formação dos sujeitos periféricos: cultura e política
na periferia de São Paulo, resume o que foi a década de 1990
com a chegada do neoliberalismo e os efeitos que esse
provocou nos bairros populares.

Por Simone Freire e Eduardo Sales, no Brasil de Fato

Publicado 11/06/2014 12:02


Racionais MC's - Reprodução
De um lado, o avanço dos produtos importados, shoppings e
condomínios fechados. Do outro, o desemprego, a precarização
do trabalho, as privatizações e os ataques aos direitos sociais
provocados por essa mesma ideologia, que tinha como objetivo
criar um pensamento que glorificava o individualismo.

Para o discurso, a sociedade havia chegado ao seu melhor


momento. A realidade, no entanto, mostrava o contrário.
Chacinas se multiplicavam nas peri-ferias paulistas e as formas
clássicas de organização política entravam em crise. Em meio a
essa contradição, eis que surge um grupo de rap que começa a
narrar a realidade que até então estava invisível: o Racionais
MCs.

Formado por Mano Brown, KL Jay, Edi Rock e Ice Blue, o grupo,
de acordo com Tiarajú, conseguiu, através de suas canções,
fazer toda uma geração ter o autoconhecimento de que a arte
era a única maneira de se sobressair diante daquele labirinto
social iniciado na década de 1990.

O pesquisador cita como exemplo a música Fórmula Mágica da


Paz, uma das que compõem o CD Sobrevivendo no Inferno,
lançado em 1997. Em um dos trechos da música, em que fala
“descanse o seu gatilho, meu rap é o trilho”, Tiarajú explica que
esse é o discurso de que ‘a arte me salvou’.

“Eles conseguiram com esse discurso potente fazer toda uma


geração dizer para si mesma 'pô, vamos fazer arte que é mais
legal. Vamos ficar se matando? Vamos cantar rap. Esse discurso
ajudou a formar uma geração que falou ‘vamos cantar, vamos
abrir um sarau, fazer uma comunidade do samba porque aqui
tem uma saída interessante’”, explica.

Racionais e o lulismo
Após uma década de desesperança, 2002 renovou os ânimos
no país. Lula ganha as eleições, e o Brasil, a Copa do Mundo.
Lula assume em 2003 a presidência da República. No plano
político, o lulismo seria marcado por uma ascensão social ao
consumo nos anos seguintes. Fato que o Racionais antecipou
um ano antes com o lançamento de seu novo – e último – disco
Nada como Um dia Após o Outro Dia. Para explicar, Tiarajú cita
o exemplo da música Negro Drama que, segundo ele, evidencia
a ascensão ao consumo de quem mora nas periferias.

“A música [negro drama] cantou a bola de uma questão subjetiva


que ia perpassar toda uma geração. É uma obra artística muito
louca, porque o cara cantou a bola antes de acontecer. Aí você
tem uma rapaziada da periferia de São Paulo que fala que negro
drama é a música que fala a trajetória da minha vida”,
argumenta.

Por outro lado, Tiarajú também reconhece que esse cd causou


bastante polêmica na época.

“Esse cd foi muito criticado no mundo do rap, porque foi um cd


que fez várias alusões ao mundo do consumo. É um cd que bate
muito numa questão: eu consegui cantandorap, hoje eu consigo
ter um carrão, consigo ter mulheres bonitas, consigo me inserir
no mercado de consumo. Em vez de brigar com o consumo, eu
vou consumir mais que você. É um cd que a todo momento fala
deles”, observa.

O pesquisador complementa dizendo que o Racionais foi o


despertar de uma geração que não via outra saída. Em meio ao
mundo do crime, da violência e das drogas, o rap veio como
uma alternativa para a juventude da época.

“O papo reto é mais eficaz. A crítica direta é mais eficaz. O


realismo é mais eficaz. Eles conseguem elaborar um discurso
sobre o que foi morar e o que é morar na periferia de São Paulo
nos últimos 20 anos. Eles elaboram o melhor discurso. Eles
conseguiram falar os anseios de uma população em
determinado tempo. É a narrativa legitimada”, conclui.

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