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Redação

Aprendendo com a música

Teoria

A música é uma representação de arte que se constitui na combinação de vários sons e ritmos. Já reparou
que o nosso cotidiano é repleto de música? Os jingles, a trilha sonora de uma novela, a abertura de uma série
etc. Essa manifestação artística é, portanto, uma prática cultural e humana. Não se conhece nenhuma
civilização que não possua manifestações musicais próprias. É importante ressaltar, também, que é capaz de
representar determinado povo e além da função de entretenimento, muitas vezes, pode também promover a
reflexão acerca de contexto sócio-histórico. E é claro que as músicas podem ser utilizadas como repertório
sociocultural na redação. Vamos aprender com a elas?

A música como crítica social


A escolha de um álbum dos Racionais MC’s para a lista de obras obrigatórias no vestibular 2020 da Unicamp
deve aproximar estudantes da "leitura de mundo", segundo o coordenador executivo da comissão
organizadora do exame (Comvest), José Alves de Freitas Neto. Para ele, as músicas de "Sobrevivendo no
inferno" permitem uma abordagem da literatura que dialoga com o atual momento do país, e as
transformações da universidade na busca por elevar a inclusão social.

"É a primeira vez que um disco entra na lista de obras literárias. Não devemos estranhar, afinal, as letras
trazem uma visão da periferia e conjunto de inferências que faz parte da produção textual [...] Nas escolas é
bastante comum o trabalho com músicas, assim como o reconhecimento de seu valor literário e de crítica da
realidade social", destaca o professor do Departamento de História do Instituto de Filosofia e Ciências
Humanas (IFCH).
Disponível em: https://g1.globo.com/sp/campinas-regiao/noticia/unicamp-2020-album-dos-racionais-mcs-aproxima-estudante-de-
leitura-do-mundo-diz-coordenador-da-comvest.ghtml

Veja o exemplo abaixo:

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“Diário de um Detento”, Racionais MC’s


São Paulo, dia 1º de outubro de 1992, 8h da manhã Mato o tempo pra ele não me matar
Aqui estou, mais um dia Homem é homem, mulher é mulher
Sob o olhar sanguinário do vigia Estuprador é diferente, né?
Você não sabe como é caminhar com a cabeça na Toma soco toda hora, ajoelha e beija os pés
mira de uma HK E sangra até morrer na rua 10
Metralhadora alemã ou de Israel Cada detento uma mãe, uma crença
Estraçalha ladrão que nem papel Cada crime uma sentença
Na muralha, em pé, mais um cidadão José Cada sentença um motivo, uma história de lágrima
Servindo o Estado, um PM bom sangue, vidas e glórias, abandono, miséria, ódio
Passa fome, metido a Charles Bronson sofrimento, desprezo, desilusão, ação do tempo
Ele sabe o que eu desejo Misture bem essa química
Sabe o que eu penso Pronto: eis um novo detento
O dia tá chuvoso. O clima tá tenso Lamentos no corredor, na cela, no pátio
Vários tentaram fugir, eu também quero Ao redor do campo, em todos os cantos
Mas de um a cem, a minha chance é zero Mas eu conheço o sistema, meu irmão, hã
Será que Deus ouviu minha oração? Aqui não tem santo
Será que o juiz aceitou a apelação? Rátátátá preciso evitar
Mando um recado lá pro meu irmão Que um safado faça minha mãe chorar
Se tiver usando droga, tá ruim na minha mão Minha palavra de honra me protege
Ele ainda tá com aquela mina pra viver no país das calças bege
Pode crer, moleque é gente fina Disponível em: https://www.letras.mus.br/racionais-
Tirei um dia a menos ou um dia a mais, sei lá mcs/63369/
Tanto faz, os dias são iguais
Acendo um cigarro, e vejo o dia passar

A música como manifestação cultural


Um exemplo é a música “Triste, Louca ou Má”, da banda Francisco, el Hombre, que traz uma crítica em relação
ao papel social da mulher. Veja abaixo:

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Triste, louca ou má Que um homem não te define


Será qualificada ela Sua casa não te define
Quem recusar Sua carne não te define
Seguir receita tal Você é seu próprio lar

A receita cultural Um homem não te define


Do marido, da família Sua casa não te define
Cuida, cuida da rotina Sua carne não te define
Você é seu próprio lar
Só mesmo rejeita (…)
Bem conhecida receita Disponível em: https://www.letras.com/francisco-el-
Quem, não sem dores hombre/triste-louca-ou-ma/
Aceita que tudo deve mudar

A música como manifestação cultural

Popular e perseguido, funk se transformou no som que faz o Brasil dançar


Surgido no final da década de 1980, ritmo carioca tem sucessos milionários e críticos agressivos. Abaixo-
assinado enviado ao Senado pediu sua criminalização
Camilo Rocha, 22 de out de 2017 (atualizado 03/12/2020 às 14h38).

FOTO: LIA DE PAULA/MINISTÉRIO DA CULTURA

O funk brasileiro vive há quase duas décadas entre extremos de aceitação e repúdio. Se as músicas contam
com milhões de plays no YouTube e Spotify, o estilo também foi alvo em 2017 de um abaixo-assinado com
mais de 20 mil assinaturas que pediu ao Senado que o tornasse crime. (…)

Entre os detratores do gênero é comum ouvir que o funk estaria entre os responsáveis por um declínio moral
e cultural do Brasil. Entretanto, de acordo com a opinião de profissionais e especialistas ouvidos pelo Nexo,
o funk pode ser entendido sim como consequência de uma sociedade marcada por exclusão e violência.

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Como o funk projeta o orgulho da periferia


O funk se consolidou como gênero ouvido por jovens da periferia de cidades por todo o Brasil, do Rio de
Janeiro ao Recife. Ao lado dos gêneros conhecidos como “gospel”, ligados às igrejas evangélicas e opostos
em termos de mensagem, o funk é para onde tendem a migrar adolescentes com interesse em fazer música,
hoje, na periferia.

Cantado em português, o funk frequentemente se tornou um canal para se relatar as dificuldades da vida na
comunidade. Em meio à denúncia, entretanto, o tom raramente soa resignado ou melancólico. Muito mais
comum nas letras é o orgulho da favela, da sua potência criativa e capacidade de animação.

A exaltação da origem aparece em funks de todos os tipos e vertentes, às vezes até em nomes de artistas,
como Nego do Borel (da Favela do Borel, no Rio) ou o MC Neguinho da Kaxeta (da favela do mesmo nome,
em São Vicente, Baixada Santista). Bairros e comunidades costumam ser citados em shows e aparecem em
letras.

“Baile de favela”, MC João


Para quem estuda a cultura do funk, o orgulho serve como defesa contra a estigmatização, que vai da classe
social ao gosto musical. “Movimento funk leva à desesperança”, mostrava a manchete do Jornal do Brasil,
em 1992, em uma das primeiras matérias negativas sobre os frequentadores de bailes funk. Nas letras do
funk deste período, entretanto, o que predomina é um sentimento oposto. “Elas vão falar de como é bonita a
Rocinha, como Vidigal tem lindas meninas, como a Cidade de Deus tem gente inteligente”, disse Adriana
Facina, antropóloga e professora da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro), ao Nexo.

Em 2009, a Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro promulgou uma lei que declarava o funk como
patrimônio cultural imaterial do estado. Como justificativa, dizia que o funk “está diretamente relacionado aos
estilos de vida e experiências da juventude de periferias e favelas”. (…)
Link para matéria completa: https://www.nexojornal.com.br/explicado/2017/10/22/Popular-e-perseguido-funk-se-transformou-no-
som-que-faz-o-Brasil-dan%C3%A7ar

A música como manifestação cultural pode, inclusive, aparecer na prova de linguagens ou ciências humanas.
Veja, a seguir, uma questão do Enem 2015:

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O rap, palavra formada pelas iniciais de rhythm and poetry (ritmo e poesia), junto com as linguagens da dança
(o break dancing) e das artes plásticas (o grafite), seria difundido, para além dos guetos, com o nome de
cultura hip hop. O break dancing surge como uma dança de rua. O grafite nasce de assinaturas inscritas pelos
jovens com sprays nos muros, trens e estações de metrô de Nova York. As linguagens do rap, do break dancing
e do grafite se tornaram os pilares da cultura hip hop.
DAYRELL, J. A música entra em cena: o rap e o funk na socialização da juventude. Belo Horizonte: UFMG, 2005 (adaptado).

Entre as manifestações da cultura hip hop apontadas no texto, o break se caracteriza como um tipo de dança
que representa aspectos contemporâneos por meio de movimentos
a) retilíneos, como crítica aos indivíduos alienados.
b) improvisados, como expressão da dinâmica da vida urbana.
c) suaves, como sinônimo da rotina dos espaços públicos.
d) ritmados pela sola dos sapatos, como símbolo de protesto.
e) cadenciados, como contestação às rápidas mudanças culturais.

Gabarito: letra B - o break é uma dança de improviso, que trabalha com movimentos aleatórios e dinâmicos.

A música como representação de contexto histórico

Chico Buarque e a ditadura retratada em músicas


Cantor e compositor colocou as críticas ao regime militar em suas letras
Cantor e compositor, Chico Buarque de Hollanda deixou a ditadura brasileira registrada em suas canções.
Sempre crítico, Chico retratava as dificuldades vividas no período e teve seu trabalho censurado em vários
momentos. Uma das canções mais relacionadas ao tema é Apesar de Você, censurada logo depois do
lançamento, em 1970. Chico trazia a ideia de um futuro diferente, sem a repressão do regime militar. Em 1978,
a música foi lançada novamente, já liberada pela censura. Essa esperança de um amanhã melhor é também
tema de Cordão e Quando o carnaval chegar.
Disponível em: http://educacao.globo.com/artigo/chico-buarque-e-ditadura-retratada-em-musicas.html

Veja o exemplo abaixo:

“Cálice”, Chico Buarque


Pai, afasta de mim esse cálice Tanta mentira, tanta força bruta
Pai, afasta de mim esse cálice
Pai, afasta de mim esse cálice Como é difícil acordar calado
De vinho tinto de sangue Se na calada da noite eu me dano
Quero lançar um grito desumano
Como beber dessa bebida amarga Que é uma maneira de ser escutado
Tragar a dor, engolir a labuta Esse silêncio todo me atordoa
Mesmo calada a boca, resta o peito Atordoado eu permaneço atento
Silêncio na cidade não se escuta Na arquibancada pra a qualquer momento
De que me vale ser filho da santa Ver emergir o monstro da lagoa
Melhor seria ser filho da outra Disponível em: https://www.letras.mus.br/chico-
Outra realidade menos morta buarque/45121/

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Exercícios

1. Leia o texto abaixo:


“Que País é Este”, Legião Urbana
Nas favelas, no Senado Que país é esse?
Sujeira pra todo lado Que país é esse?
Ninguém respeita a Constituição Que país é esse?
Mas todos acreditam no futuro da nação Que país é esse?
Que país é esse? Terceiro mundo, se for
Que país é esse? Piada no exterior
Que país é esse? Mas o Brasil vai ficar rico
No Amazonas, no Araguaia iá, iá Vamos faturar um milhão
Na Baixada Fluminense Quando vendermos todas as almas
Mato Grosso, Minas Gerais Dos nossos índios num leilão
E no Nordeste tudo em paz Que país é esse?
Na morte eu descanso Que país é esse?
Mas o sangue anda solto Que país é esse?
Manchando os papéis, documentos fiéis Que país é esse?
Ao descanso do patrão
Comente acerca da crítica social apresentada na música “Que País é Este”, de Legião Urbana.

2. EUA: protestos contra racismo recolocam músicas de artistas negros no topo


Faixas de Childish Gambino, Bruno Mars e Kendrick Lamar lançadas há alguns anos retornaram às mais
ouvidas após ecoarem nos protestos
A onda de protestos contra a violência policial nos
Estados Unidos, que se espalhou por diversos países do
mundo, teve efeitos na indústria cultural: músicas
emblemáticas de artistas negros voltaram a figurar entre
as mais consumidas.
This is America, do rapper Childish Gambino, que discute
a questão do racismo, voltou a aparecer na lista das mais
vendidas no iTunes norte-americano.
Disponível em: https://www.metropoles.com/entretenimento/musica/eua-protestos-contra-racismo-
recolocam-musicas-de-artistas-negros-no-topo

A música, dentre as duas funções, é também um meio de crítica social acerca dos problemas da
sociedade. Como a música de Childish Gambino pode contribuir para a luta antirracista nos Estados
Unidos?

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Gabarito

1. A música ‘Que País é Este’, lançada em 1987, no álbum ‘Que País é Este’, da banda Legião Urbana, nunca
esteve tão atual. A canção foi escrita por Renato Russo em 1978, durante a Ditadura Militar, e fala sobre
as contradições sociais do Brasil.
Leia mais em: https://bit.ly/3cFfJhd

2. Childish Gambino é o pseudônimo musical de Donald Glover (Califórnia, 1983). Em 2017, a revista Time
o incluiu em sua lista das 100 pessoas mais influentes do ano, devido ao impacto de seu mais recente
trabalho, o clipe musical “This is America”.

“Recheado de simbolismos que podem servir como pauta de outra matéria, o clipe de This Is America
fala de não somente críticas à brutalidade policial, do Estado, ao assassinato de pessoas negras, como
também critica o estúpido movimento supremacista branco, a posse de arma, a mídia americana, o
conservadorismo, e outras mazelas como a apropriação cultural. Além de também fazer referências a
tragédias ocorridas com pessoas negras nos Estados Unidos, como o massacre da igreja de Charleson,
na Carolina do Sul, quando um homem branco entrou na igreja armado e matou nove pessoas ali
presentes com um discurso extremamente racista. A igreja em questão era referência na luta por direitos
civis da sua região, o que deixa tudo ainda mais simbólico.”
Disponível em: https://www.torredevigilancia.com/a-importancia-das-musicas-de-beyonce-kendrick-lamar-e-childish-
gambino-nas-atuais-manifestacoes-raciais-estadunidenses/
Leia mais em: https://brasil.elpais.com/brasil/2018/05/08/cultura/1525772706_935369.html

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