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A Era dos Humanos

João Marcos
Baseado em um sonho que tive na madrugada do dia 4 de abril de 2022

As espumas escorriam das taças cheias de champanhe. As danças, acompanhadas


de uma música agitada e dos fogos de artificio que tomavam os céus, eram quase que
sincronizadas ao redor do mundo. Cada um do seu jeito, na sua cultura, festejava a
chegada do ano 2060. Uns mais cedo que outros. Horas, minutos e segundos. A projeção
de que as coisas poderiam melhorar naquele ano eram otimistas. Nunca se tinha visto
tantas pessoas nascerem ao mesmo tempo. A morte era uma questão de escolha. A
juventude se estendia até os 50 e a velhice só se permitia chegar depois dos 90. Eram os
dois lados da moeda. Um brilhava mais que o outro. Porém, naquele dia, a Terra resolveu
acertar as contas com a humanidade.
1º de janeiro de 2060 chegou com aplausos, fogos, gritaria e alegria. O céu começou
a se fechar e as luzes estavam ao seu máximo. Os pilotos de avião avisaram aos seus
passageiros que passariam para um momento de leve turbulência. Não se levantem.
Apertem os cintos. Em caso de acidente, mascaras cairão a sua frente. Ajuste bem a sua
antes de ajudar quem estiver ao seu lado, diziam as cartilhas que ficavam em um bolsão
a frente do bancos onde os passageiros estavam acomodados. Aquele seria o dia de testar
o transporte mais seguro do mundo.
Todos os olhos se voltaram para os céus. Os animais da selva, ao perceberam a
formação das nuvens, se esconderam onde podiam. Um gato preto em um apartamento
em Chicago se agitou no colo da seu dona enquanto olhava para a janela. Ele saltou e se
escondeu dentro de um caixa de sapatos. Ela riu e tirou uma foto do gato acuado e postou
em seu perfil em uma rede social. Cute! My cat is so funny haha. Happy new year guys.
E então, as primeiras gotas de chuva começaram a cair. Uma carioca curtia uma
bela festa em Copacabana e ao tirar os saltos, pediu para que seu namorado gravasse um
vídeo seu tomando banho de chuva. Era benção. Chuva quer dizer boas energias. Ela
jogou os saltos para alto e abriu os braços ainda sorridente.
Seu sorriso desapareceu quando ela desabou na areia. A chuva estava mais forte. O
namorado parou a gravação e foi socorrer sua amada. Ambos tiveram seus corpos
engolidos pelo mar quando não mais respiravam.
A festa saiu de cena e convidou o desespero para tomar o seu lugar. Um garoto se
despediu de seus amigos quando a chuva começou a cair e se preparou para descansar.
Colocou seu celular no silencioso e deitou-se para aproveitar o início do novo ano. Pela
janela de seu quarto viu o céu da Noruega se escurecer. Pegou roupas mais grossas, vestiu-
se e fechou a cortina. Se viesse uma tempestade, ele saberia somente quando acordasse.
Para ele, era só mais o começo de um ano qualquer.
O caos tomou conta do mundo. As pessoas morriam intoxicadas. Nas ruas, os
corpos de estendiam. A única segurança que tinham eram dentro de um local fechado
onde a chuva água fosse impossibilitada de entrar.
Era o Dia de Sobrecarga da Terra. A humidade já tinha usado todos os recursos
possíveis. Não dava mais para o planeta aguentar. Naquele dia, metade da população
mundial simplesmente deixou de existir. Com quase 10 bilhões de habitantes, os humanos
chegaram ao seu limite. E assim começou a Era do Humanos, ou, para ser mais justo, o
começo do seu fim.

***
Bernardo via a enorme catedral a sua frente. Coberto por uma capa grossa, esse
conseguia atravessar a vegetação e ao mesmo tempo não ser atingido pela chuva
incessante. A sua respiração irregular era a única coisa que ainda o incomodava. Era
impossível não ter problemas respiratórios com toda aquela umidade, já que os fungos
gigantes cresciam e se multiplicavam pelas paredes dos antigos prédios que antes fazia
de São Paulo uma das maiores cidades do mundo.
A Catedral Metropolitana de São Paulo ou Catedral da Sé, ainda exibia as suas
torres góticas apontadas para o céu cinza. Incrível como essas construções religiosas
permanecem de pé mesmo com a pior das catástrofes, pensou Bernardo ajustando a
espingarda ao corpo. Outros humanos habitavam ali e se não fosse cuidadoso o suficiente,
perderia o pouco mantimento que tinha. Mas para chegar ali teve de sair de um caverna
na qual habitava desde a que a chuva começou a cair. Não tinha sobrado ninguém da sua
família. Primeiro os pais, depois a esposa e por fim os trigêmeos. Não havia sobrado
nenhuma fotografia para relembrar o rosto dos seus filhos. Bernardo espremeu os olhos
com a dor da lembrança. Mas mesmo com isso se recusava a chorar.
Atravessou a rua. Estava na parte detrás da catedral. Ninguém no seu campo de
visão. Caminhou na direção da praça. Tudo limpo. Tomar banho de chuva não significava
mais o que era antes. Na escadaria da igreja ele vislumbrou as figuras esculpidas nas
paredes. Se fosse um tempo atrás, teria tirado uma foto e postado em alguma rede social.
Agora ele só queria concluir a sua missão.
Subiu os degraus. Bateu no portão com força. O silêncio se estendeu por alguns
segundos até que alguém teve a coragem de destravar as trancas da porta. Ele sabia que
só conseguiria entrar por já estar sendo vigiado desde o momento em que se aproximou
há alguns metros daquele local.
Os portões se abriram e seis homens com armas apontadas para ele apareceram.
Bernardo conhecia o protocolo e então fez objeção. Como estava ali em busca de
respostas e não para uma possível briga, obedeceu. Tirou toda a roupa do corpo e jogou
para o lado. Um dos homens surgiu com uma mangueira e um jato forte de água foi
lançado contra o corpo de Bernardo. Lhe entregaram um sabão e depois de ter higienizado
todo o corpo, lhe foi permitido mais um jato de água. Enxugou-se com uma toalha seca e
lhe entregaram um roupão provisório. Sua roupa foi recolhida e colocada dentro de uma
caixa de plástico. Ela não seria aberta tão cedo. A única coisa que ficou de fora foi uma
garrafa de vidro de Coca-Cola que Bernardo fez questão de não largar.
Agora ele tinha passagem livre. Seguiu na direção do altar que naquele momento
estava completamente notificado. Há mais de dez anos os cânticos não ecoavam mais por
aquelas paredes. Os vitrais foram substituídos por janelões de ferro e as estatuas e os
santos foram recolhidos para uma sala em outro local da igreja.
Cândida Ferreira estava vestida em um casaco cinza, que se misturava com a
catedral. Ruiva por escolha, ela mantinha os cabelos soltos depois do banho. Precisava
deixá-los secos para que não pegasse um resfriado, algo comum ali. Ao ver Bernardo com
os próprios olhos, ficou sobressaltada. Não entendia como alguns humanos conseguiam
sobreviver na chuva.
- Faz um bom tempo que o aguardo aqui. – disse Cândida antes que Bernardo se
aproximasse o suficiente.
- A chuva se intensificou no norte do estado. Muitas das estradas estão
intrafegáveis. Se continuar assim, vou trocar as botas por barcos.
Um riso frio se formou nos lábios de Cândida. Ela estava protegida por três homens
fortes bem armados, mas um gesto ordenou que se afastassem. Bernardo praticamente nu
e ela sempre considerava isso um ponto fraco. Bernardo estendeu a garrafa de refrigerante
para ela. Cândida a afagou no peito. Há como sentia falta daquilo. O homem tinha
acertado em cheio com seus presente diplomático. A última vez que tinha bebido uma
daquelas foi quando uma senhora chegou na porta da catedral e trazia cinco garrafas com
ela. Isso havia acontecido seis anos atrás. Desde então, ficara somente no desejos, no
mundo dos sonhos.
- Me acompanhe.
Ambos seguiram para o lado direito do altar, em direção a cripta da igreja. O portão
foi aberto e eles seguiram para o lugar onde antes haviam bancos de madeira, foram
substituídos por mesas, cadeiras e alguns objetos tecnológicos. Bernardo se impressionou
com o que via. Cândida havia se tornado a líder da cidade. Todas as pessoas que ainda se
desafiavam a encarar a chuva, sempre batiam na porta da catedral em busca de alimento
e abrigo. Cândida oferecia, mas sempre cobrava algo em troca. Itens tecnológicos, moveis
ou até frutas exóticas. A catedral continuava sendo um símbolo de poder.
- Então é verdade que vocês possuem energia elétrica. Mas como é possível? – falou
Bernardo estendendo a mão para tocar em um dispositivo que ele identificou como sendo
uma mistura de um computador com outro eletrodoméstico. Mas antes que seus dedos se
aproximassem o suficiente, um dos guardas segurou o seu braço.
Bernardo franziu as sobrancelhas, mas não ousou reclamar. Ele que era o estranho
ali.
- Na sua mensagem você dizia que tinha algo de extrema importância para
compartilhar comigo. Espero que a sua viagem e a minha hospitalidade tenha valido a
pena. – ela virou-se e fixou os seus olhos verdes nos de Bernardo.
- Antes do Dilúvio eu era engenheiro civil, formado pela Universidade de São
Paulo...
- Me poupe de seu currículo. – ela interveio. Bernardo não deu ouvidos.
- ... e durante seis anos eu desenvolvi um projeto que pode ajudar todos os
sobreviventes. Pretendo utilizar o antigo prédio do Museu de Arte de São Paulo Assis
Chateaubriand para isso. Ele tem a arquitetura perfeita para isso.
- Sabe que o prédio foi tomado pelos Selvagens, não sabe?
- Você fala dos homens e mulheres que se transformam em animais?
- Isso é uma aberração da natureza. Eles não são humanos.
- Dona, a gente estar vivo hoje é uma aberração. A Natureza mandou a chuva para
nos eliminar.
- Durante séculos dominamos a Natureza e agora não vai ser diferente.
- Acho que o problema aqui é que você acha que a chuva não é um problema. –
soltou Bernardo. Queria chegar no ponto certo da conversa e para isso precisava colocar
Cândida em uma situação de defesa.
- É que em importo. Sempre estendo a mão para os humanos que vem até aqui. Lhes
ofereço abrigo, casacos e alimento. É mais do que qualquer presidente desde país de
merda jamais fez.
Bernardo não escondeu que achou graça daquela situação. Cândida parecia
incomodada. Três guardas se aproximaram deles dois quando perceberam a tensão.
- E isso inclui os Selvagens? – ele indagou.
- Os Selvagens... é algo interessante. Se são adaptados para suportar a chuva, não
precisa de minha ajuda. Só estendo a minha mão para seres humanos, como seu.
- Então você também tem medo de se molhar?
Ela cerrou a mão direita. O ar que entrava fazia o seu peitoral de movimentar de
forma mais rápida. Cândida passou por Bernardo e foi na direção o opostas. Ele virou-se
e a seguiu. Pararam diante do local onde jaziam os restos mortais do cacique Tibiriçá, o
primeiro cidadão de Piratininga.
- Assim como o este cacique, um dia serei lembrada como a primeira cidadão de
São Paulo após o Dilúvio.
Bernardo via as imagens esculpidas do cacique e sua tribo pela primeira vez. Eram
em tamanho real. As expressões dos retratados eram melancólicas. A Morte não fica feliz
nem com as homenagens.
- Isso não anula o fato de que você não quer ajudar o seu próprio... povo.
- Está insinuando que eu não estou sendo uma boa líder?
- Eu estou apenas dizendo que desde quando cheguei aqui você não parou para ouvir
o que eu tenho a dizer. Podemos mudar tudo isso juntos, por São Paulo, pelo Brasil e até
pelo mundo. Depois que a internet caiu, estamos isolados e somente nós podemos resolver
nossos problemas.
Cândida fechou os olhos. Não suportava mais tudo aqui. Eram como se as portas
do Abismo estivessem sendo abertas. Ela visualizou o caos em sua mente. Somente ela
tinha o poder e mais ninguém. Estava construindo sim um mundo melhor. Isso pulsava
forte em seu peito. Os humanos vivos em São Paulo já estavam todos cadastrados em seu
sistema. Tinha um controle sobre os alimentos. Desenvolvera uma capa de chuva
poderosa em seu laboratório. Nunca imaginou que aquilo que aprendeu em uma faculdade
a distância iria ajuda-la tanto. Antes do Dilúvio, a sua formação em Administração feita
via internet não era bem recebida nas grandes empresas. Tinha sido rejeitada. Substituída
por homens burros e desvalorizada.
Mas depois da catástrofe não. Estava em visitação a Catedral da Sé quando a chuva
começou a cair. Trancaram os portões com todos dentro. Cantores, padres e turistas.
Passaram um bom tempo ali dentro, rezando, clamando. Cândida acreditava na
providência divina, mas também sabia que tinha inteligência para contornar aquela
situação.
Muitos enlouqueceram e partiram para o lado de fora. Outros morreram. Reuniu
todos os que estavam dispostos a mudar aquela situação. Montou uma guarda. Usou as
habilidades da velhas senhoras que ali estavam e com agulhas improvisadas começaram
a pensar em como poderiam se sustentar sem que fossem infectados com a água da chuva.
E obteve êxito. E não era um estranho, que há poucos dias havia mandado uma mensagem
por outro estranho, que faria todo o seu império ruir.
- A sua fama é notória por onde quer que eu vá. Você pode mudar o mundo, isso eu
tenho certeza. Mas não fará sozinha.
- Eu fui a única pessoa neste local santo que conseguiu enxergar as ações que
deveriam ser feitas. Temos a fé, temos as obras. Deus, o santo Deus, me iluminou para
isso. – ela estendeu as mãos aos céus. – Sou sua nova Maria. A escolhida para isso.
- Não seja blasfema. Você está tão cega no seu poder que não consegue enxergar
que seu império está prestes a ruir. – Bernardo agora começou a falar em tom de suplica.
– Você precisa me ouvir! Tenho um projeto que pode ajudar todos nós! Uma construção
em que a chuva não nos atrapalhe mais.
- Você fala como um Selvagem! – gritou Cândida.
- Os Selvagens sentem as dores da Natureza. São capazes de se transformarem em
animais não por seres mais desenvolvido que outros, mas por agora conseguirem sentir a
dor que infligimos contra a natureza, contra Deus, contra nós mesmo!
- Guardas! Tirem esse homem daqui. – ordenou Cândida.
Os três homens surgiram e logo imobilizaram Bernardo. Ele não se opôs. Seguiram
até a escada e o levaram até a portão. Cândida os acompanhou. O vento frio veio do lado
de fora quando as portas da catedral foram abertas. Trovões, relâmpagos e uma forte
chuva caia. Os respingos a água já tocavam o piso da catedral. Precisavam ser rápidos.
- E então é assim que você ajuda o seu semelhante? O lançando sem proteção na
chuva toxica? – argumentou Bernardo.
- Quem decidiu isso foi você mesmo quando se opôs a minha autoridade.
- Eu só estava querendo melhor tudo para todos nós! Um acordo. Ninguém que tirar
o seu poder.
- Eu sei disso. Tenho feito ações diárias para que isso não aconteça.
- Matando pessoas inocentes? Envenenando as águas dos Selvagens? Oprimindo
crianças? Causando fome? Você só pensa em si mesma! Sabia que eu também estou a par
de seu plano de começar a raça humana do zero?
Cândida pareceu congelar. Colocou as mãos sobre o ventre.
- Sei que tem sequestrado homens para o seu... laboratório. E ah! Como esquecer a
sua ideia genial de formar casais geneticamente perfeitos?
- Alguém precisa povoar a terra quando as águas baixarem. – disse ela, por fim. –
Joguem esse inútil na chuva. Sua existência se finda hoje.
Assim como ordenado, os guardas lançaram Bernardo na escadaria. O corpo dele
ficou estirado no chão. Rapidamente seu corpo ficou encharcado de água. Cândida assistia
tudo com prazer. Mas o sorriso virou fumaça quando Bernardo de levantou. Diante dos
presentes ele tirou o roupão que cobria seu corpo nu. A chuva não fazia mal para ele.
Colocou as mãos no chão. A cabeça permaneceu erguida. Um pelo vermelho
começou a surgir no seu corpo, cobrindo-o aos poucos. Suas orelhas ficaram pontudas.
Uma calda surgiu. O tronco diminuiu e as mãos e os pés viraram patas. Cândida só
conseguiu se mover quando Bernardo rosnou para ela, mostrando os seus poderosos
dentes. Era um lobo-guará.
- Selvagem... – sussurrou Cândida. O lobo olhava nos olhos dela. – Matem! Vamos,
acabem com essa aberração agora! – gritou.
Os homens se colocaram o capuz e o restante dos equipamentos que faltavam caso
precisassem encarar a chuva. Mas ao contrário que imaginavam, o lobo deu as costas e
correu na direção onde antes era uma praça e sumiu na mata antes que as balas o
acertassem. Depois disso, o silêncio reinou por cerca de dez minutos, o suficiente para
que as coisas mudassem.
Da mata não surgiu um lobo-guará, mas sim uma onça pintada enorme. Depois veio
um macaco, três jaguatiricas e uma capivara. E com isso vários e vários outros animais
começaram a surgir aos montes. Felinos, caninos, roedores. Aves enormes também
tomavam o céu. Todos caminhavam em direção a catedral.
Cândida começou a ir de um lado para outro dando ordens. Homens e mulheres
fortemente armados corriam para se equiparem, já que não estavam adaptados a água
tóxica. As balas começaram a cortar o ar quando primeiro soldado chegou na porta, já
coberto com todo equipamento necessário. Mas para sua falta de sorte, os animais vinham
de todas as direções e era impossível escolher apenas um único alvo.
A onça pintada tomou a frente da empreitada e começou a correr na direção da
entrada da igreja. A cada salto de dava, uma perfuração de bala era evitada. Sem medo,
saltou no pé da escadaria e se atracou ao homem que atirava. Suas patas enormes rasgaram
a roupa dele. Ela o puxou para a escadaria e o homem ficou exposto as gotas de chuva.
Não demoraria muito para que ele parasse de respirar. No entanto, a onça foi ao chão
quando foi coberta por balas que vinham de todas as direções. O sangue agora pintava o
chão cinza.
Depois da onça, os outros animais vinham com rapidez em direção a catedral.
Alguns foram abatidos por flechas, outros por balas. Um gavião despencou no ar quando
sua asa fora atingida. Uma capivara foi esmagada assim que uma enorme pedra foi
lançada do alto da catedral. Porém, as baixas foram poucas, pois os animais estavam com
vantagem diante da chuva.
Eles entraram os montes na igreja. Os caos generalizado ajudou com que Cândida
rapidamente se esquivasse da batalha e fosse em direção a cripta, onde todo o seu material
mais precioso estava guardado. Abriu o portão com a ajuda de dois guardas e entrou
rapidamente. Eles trancaram a porta pelo lado de dentro e a todo o baralho da batalha
pareceu nunca ter existido. O silêncio reinava.
Cândida foi até um cofre e depois digitar a senha, de lá tirou um notebook cinza.
Correu até um armário e pegou uma bolsa. Colocou mais algumas outras coisas dentro e
seguiu para o tumulo do cacique. Tirou um pedaço de uma pedra de mármore e abriu uma
porta secreta ali mesmo.
- Peguem o computador que está sobre a mesa e os cadernos que ficam na gaveta
do armário número 7. – ordenou.
Os guardas surgiram diante dela, mas permaneceram parados, com suas armas nas
mãos.
- Não ouvirão? Vão fazer agora o que eu falei! – berrou, mas não obteve sucesso.
De repente, saindo por detrás da escada, surgiu uma mulher completamente nua.
Cândida agarrou a bolsa e a apertou contra os seios. Iria lutar por aquilo. Segundos depois
Bernardo apareceu na mesma condição. Os guardas tiraram os óculos de proteção. Os
olhos deles brilhavam como o do casal desnudo de mãos dadas.
- Selvagens... – sussurrou Cândida assustada.
- Entregue a bolsa. – disse a mulher.
- Não! Vocês não podem...
- Não vamos matá-la. Eu não queria fazer isso, mas os seus atos foram longe demais.
Já estava cansando muita dor e você tem o que a gente precisa para começar tudo de novo.
Como você bem disse, sair da Arca.
Cândida tentou correr, mas foi barrada pelos guardas. A mulher que acompanhava
Bernardo pegou a bolsa gentilmente. Os guarda saíram levando Cândida que gritava
ameaças. O seu império se findava ali.
- Finalmente chegou o momento. – os olhos de Bernardo brilhavam. As lágrimas
começaram a correr pelo seu rosto. – Finalmente vamos consertar as coisas.
A mulher encostou a testa na dele e juntos compartilharam suas lágrimas. Bernardo
agora tinha tudo o que precisava para reconstruir aquela cidade e salvar os humanos
restantes, sendo eles “selvagens” ou não. Não tinham mais importância.
E então as águas começaram a baixar...

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