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São Cristóvão – SE
2022
DANIEL SOTERO DOS SANTOS
São Cristóvão – SE
2022
AGRADECIMENTOS
Durante muito tempo, a ciência foi concebida como um campo proibida para as mulheres,
devido a crença em suas características intrínsecas não serem compatíveis com o desempenho
das atividades cientificas. Contudo, apesar dos estereótipos, há relatos que demonstram que a
mulher sempre esteve por trás de inúmeras descobertas cientificas. Com o passar dos anos
começaram a se firma cada vez mais e a ganhar espaço em um ambiente, ainda, de visíveis
desigualdades entre os gêneros. O Ensino Superior no Brasil reflete esta realidade, na qual há
divisão, de acordo com o gênero, na escolha de cursos por parte dos estudantes da educação
básica: homens escolhendo e frequentando áreas estereotipadas como masculinas e as mulheres,
áreas historicamente demarcadas como femininas. Este trabalho buscou investigar esta
realidade a nível de Ensino Médio, como também a percepção de discentes sobre o papel das
mulheres na ciência, por meio da realização de um estudo de caso, via aplicação de questionário
em uma turma de alunos e alunas de um colégio estadual no município de São Cristóvão/SE.
Os resultados não demonstram diferenças no interesse entre os gêneros por cursos de uma área
em especial. Contudo, cursos pertencentes as áreas de Ciências Exatas e de Ciências Agrárias
Aplicadas são impopulares entre as mulheres. Ademais, em âmbito colegial, as disciplinas
escolares que demandam conhecimentos matemáticos não despertam tanto interesse em ambos
os gêneros. Ainda, os resultados indicam, novamente, o desconhecimento por parte dos(as)
alunos(as) sobre as contribuições e a presença feminina no campo científico.
For a long time, science was conceived as a forbidden field for women, due to the belief that
their intrinsic characteristics were not compatible with the performance of scientific activities.
However, despite the stereotypes, there are reports that show that women have always been
behind numerous scientific discoveries. As the years went by, they started to establish
themselves more and more and to gain space in an environment, still, of visible inequalities
between genders. Higher Education in Brazil reflects this reality, in which there is a gender
division in the choice of courses by students of basic education: men choosing and attending
areas stereotyped as masculine and women, areas historically demarcated as feminine. This
paper aimed to investigate this reality at the high school level, as well as the perception of
students about the role of women in science, by conducting a case study, through the application
of a questionnaire to a group of male and female students of a state school in the city of São
Cristóvão/SE. The results show no differences in the interest between genders for courses in a
particular area. However, courses belonging to the areas of Exact Sciences and Applied
Agricultural Sciences are unpopular among women. Furthermore, at the high school level,
school subjects that require mathematical knowledge do not arouse as much interest in both
genders. Still, the results indicate, again, the students' lack of knowledge about the contributions
and the feminine presence in the scientific field.
1 INTRODUÇÃO ............................................................................................................. 7
2 REFERENCIAL TEÓRICO ...................................................................................... 11
2.1 Questões de gênero na história da ciência .......................................................... 11
3 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS ............................................................. 17
3.1 Abordagem metodológica .................................................................................... 17
3.2 Delimitação do campo de trabalho e definição dos sujeitos ............................. 17
3.3 Procedimento de coleta e análise dos dados ....................................................... 18
3.4 Processo de confecção e validação do instrumento de coleta dos dados ......... 19
4 RESULTADOS E DISCUSSÕES .............................................................................. 21
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS ...................................................................................... 31
REFERÊNCIAS .................................................................................................................. 32
APÊNDICE A - Modelo do questionário a ser aplicado aos/as estudantes da 3ª série do
Ensino Médio. ....................................................................................................................... 36
APÊNDICE B - Modelo de Termo De Consentimento Livre e Esclarecido a ser aplicado
aos/as estudantes da 3ª série do Ensino Médio. .................................................................... 39
7
1 INTRODUÇÃO
existentes, se torna um fator importante na busca por melhores condições de trabalho e por
novas oportunidades para o público feminino em carreiras científicas. Ademais, um dos grandes
objetivos do milênio, proposto pela Organização das Nações Unidas, a ser alcançado, é a
redução das desigualdades entre os gêneros.
Portanto, diante de tudo que foi exposto, se torna relevante constatar como a sociedade
contemporânea brasileira, em especial os estudantes, enxerga a mulher e sua relação com a
ciência e o meio acadêmico.
Vale mencionar que no presente trabalho, consideramos gênero como um elemento
construído a longo tempo, baseado em normalidades e divergências referente aos papeis,
funções, estruturas, práticas cotidianas, rituais ou comportamentos julgados socialmente
adequados a cada grupo sexual (LOURO, 2007; SCOTT, 1995). Dessa forma, o gênero não se
refere basicamente a fatores biológicos e físicos como aparelho reprodutor, composição
genética ou o aspecto visual, mas à uma construção histórico-cultural, sendo, portanto, mutável
(SCOTT, 1986 e 1995). Já ao evocar o termo estereótipo de gênero, refiro ao conjunto de
crenças e valores, sejam eles individuais ou coletivos, sobre os variados atributos perfeitamente
considerados pertencentes de forma particular a homens e a mulheres (D’AMORIM, 1997).
Ademais, a ciência, neste trabalho, é compreendida como um discurso estruturado
socialmente e historicamente, permeado por intensa luta entre classes. Onde os agentes sociais
objetivam não só instituir os procedimentos, métodos, saberes, habilidades e “verdades” que
formalizam o que se conhece por campo científico, como também a instauração da própria
definição de ciência e quem pode ser considerado cientista (HENNING, 2008).
Portanto, frente ao cenário de baixa representação feminina nas Ciências, aqui relatada
e que ainda vigora a nível nacional e mundial, o presente estudo visa investigar a possível
réplica, ou não, destas tendências a nível de Ensino Médio, bem como averiguar a noção dos
estudantes sobre a presença e o papel da mulher no campo científico. Insta pontuar, que o alvo
almejado com a realização desse estudo não é esboçar conclusões definitivas ou, ainda,
estatisticamente significativas sobre a questão da representação da mulher na Ciência. Visto
que, será escolhido um pequeno universo de estudo em um único colégio estadual localizado
no município de São Cristóvão/SE. Desta forma, não deve ser tomado como representativo de
toda uma população, seja ela nacional ou mundial. O que se pretende é apenas investigar se os
padrões apresentados neste estudo viriam a se replicar em uma escala menor, isto é, em um
ambiente de universo amostral limitado numericamente, sendo este escolhido de forma não
intencional para a realização deste estudo.
10
Por fim, o presente trabalho será subdivido em outras 4 seções. A primeira delas se
refere ao referencial teórico. Nesta, fizemos um breve levantamento do tema à luz das ideias de
outros autores. A segunda seção é a de Materiais e Métodos. Nesta, será descrito a ferramenta
de coleta de dados, o tipo de pesquisa, e o público e local destinado à pesquisa. A terceira seção
se refere aos Resultados e Discussões. Nesta, os dados obtidos com a execução da metodologia
supracitada, serão apresentados e discutidos. Finalmente, a quarta seção é a das Considerações
Finais. Nesta, será apresentada uma síntese dos elementos constantes na pesquisa.
11
2 REFERENCIAL TEÓRICO
Outro argumento que reforça, ainda mais, essa triste visão histórica que vigorava nas
mentes e nos pressupostos dos pensadores mais influentes da antiguidade, principalmente
daqueles que são considerados “sinônimos” da palavra cientistas, está na obra Systema naturae
de Carolus Linnaeus (SARDENBERG, 2002). Na obra se faz a associação do feminino com a
natureza e do masculino com a mente, no passo que designa a espécie humana como Homo
sapiens (“homem sábio”), e ao mesmo tempo situa essa espécie no grupo dos mamíferos ou
Mammalia (SCHIENBINGER, 1993; 1996).
De acordo Schienbinger (1996, p.144), “na terminologia de Linnaeus, uma característica
feminina (a mama lactante) liga os seres humanos aos brutos, enquanto uma característica
tradicionalmente masculina (razão) marca a sua separação”.
De acordo com Leta (2003), as mulheres se viram privadas de frequentarem as
fervorosas discussões que eram realizadas pelas comunidades e academias científicas, que se
multiplicaram durante o século XVII por todo o continente europeu e tornaram-se instituições
de referência e prestígio científico da recente e pequena comunidade científica global que se
erguia na época. Ainda segundo Leta (2003), no século XVIII, esse cenário pouco se alterou e
o acesso das mulheres em atividades de teor científico, com raras ressalvas, devia quase que
12
integralmente ao contexto familiar que estavam inseridas: Sendo esposas ou filhas de algum
homem que exercesse a função de cientista, podiam desempenhar trabalhos complementares e
de suporte, tais como, cuidar de coleções biológicas, limpeza dos equipamentos e vidrarias,
ilustração e registro dos experimentos e tradução de textos.
Continuando ainda no mesmo raciocínio, percebe-se que mesmo em meados do século
XX, onde se notava a crescente participação das mulheres nas carreiras de ciência e tecnologia,
o público feminino continuava sem o devido reconhecimento e prestígio na área (OLINTO,
2011). Segundo Chassot (2004) nas primeiras décadas do século XX, a Ciência ainda
continuava sendo definida como um ambiente indevido para a mulher, de semelhante forma, na
segunda metade do século XX, era ainda comum a separação das carreiras e profissões que
pertenciam a cada um dos grupos biológicos.
Diante disso, para tentar burlar o sistema de opressão e submissão, impostos por uma
sociedade historicamente com fortes traços patriarcais, e conseguir acesso a espaços públicos e
políticos que lhes eram negados, as mulheres utilizaram várias estratégias. A exemplo disso,
temos a utilização de pseudônimos masculinos na publicação de obras em jornais e revistas
científicas. Dessa forma, o que se esperava era aprovação e publicação dos textos, pois a
alcunha masculina gerava maior credibilidade, maximizando as chances de sucesso (SILVA,
2015).
Não obstante, o Nobel, prêmio mais relevante que um ou uma cientista pode receber por
suas contribuições à ciência e ao progresso da humanidade, conta com pouquíssimas
vencedoras (BOLZANI, 2017). Sendo que destas poucas foram premiadas individualmente, ou
seja, sem que houvesse a figura masculina para dividir o prêmio (CORDEIRO, 2013).
Marie Curie, ao receber o Nobel de Química em 1911, se tornou uma das poucas que
foram agraciadas com o prêmio de forma individual por suas descobertas (CORDEIRO, 2013;
BOLZANI, 2017). Entretanto, a mesma, em momento anterior, 1903, acabou dividindo o Nobel
de Física com seu marido, Pierre Curie, e Becquerel (GIROUD, 1986).
Nesse cenário, segundo Schiebinger (2001), a ciência antiga e moderna, de fato, é fruto
de centenas de anos de definitiva exclusão feminina do seu meio. Logo, a efetiva inclusão das
mulheres na ciência exigiu, e continuará exigindo, entranhadas mudanças estruturais na cultura,
nos métodos e nos conteúdos, e, portanto, não se deve estranhar que as mulheres naturalmente
não obtenham sucesso num empreendimento que desde suas raízes foi desenvolvido para
excluí-las. (SCHIEBINGER, 2001).
O conhecimento científico gerado na modernidade assumiu um caráter epistemológico
que teve como base tanto a tradição racionalista, de Descartes, como a tradição empirista, de
13
Bacon (SILVA, 2015; MARCONDES, 1996). Nesse sentido, é a partir do próprio indivíduo de
natureza racional, que as ideias buscam fundamentos para se firmarem como novas teorias
científicas. Assim, a modernidade se qualifica pelo lapso com as tradições anteriores
(MARCONDES, 1996). Dessa forma, é evidente o caráter subjetivo adquirido pela ciência, na
definição do conceito de “verdade”, que estava centrado no ser pensante da época, ou seja, o
homem (SILVA, 2015, COLLING, 2004).
Nesse contexto, como exposto por Lage (2008, p. 195-196)
...foi se processando uma taxionomia sobre a forma de se conhecer o mundo,
colocando de um lado tudo o que é científico e, portanto, relevante e do outro, tudo o
que é não-científico e, portanto, marginal. As consequências desta dicotomia
hierarquizante foram desastrosas sob o ponto de vista da diversidade cognitiva da
nossa humanidade, pois provocou a ocultação e a desqualificação de uma infinidade
de conhecimentos por todo o mundo, segregando-lhes do direito de também se
fazerem verdade (LAGE, 2008, p. 195-196).
Felizmente, diversos estudos como o realizado por Soares (2001), desmentem o grotesco
erro histórico, cultural e social sobre as diferenças entre gêneros. Em sua pesquisa, Soares
destacou que estudantes estadunidenses de sexos diferentes que cursaram as mesmas disciplinas
desde o início de sua formação educativa, e no mesmo período de tempo, não apresentaram
significativa diferença de aptidão para a matemática ou para ciências.
Ademais, de acordo com o relatório “Education at a Glance 2021” da Organização para
a Cooperação e Desenvolvimento Econômico, OCDE (2021), que compara resultados
educacionais tanto de homens como de mulheres em diversos países, inclusive o Brasil, indica
que o desempenho escolar não diverge significativamente em relação ao gênero. Em outras
14
3 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS
preferência pelos discentes do 3° ano em detrimento dos demais, teve como fator motivador, o
fato de estarem na última etapa da educação básica. Dessa forma, infere-se que contemplaram
todo ou boa parte dos conteúdos anteriores a essa etapa.
Ademais, por esta ser a última etapa da educação básica, infere-se que os discentes
prestem vestibular para ingressar em uma instituição de Ensino Superior, além de,
possivelmente, estarem imergidos na seguinte questão: “Qual rumo seguir após encerrar o
Ensino Médio?”. Diante disso, escolheu-se os alunos do 3° ano do Ensino Médio para o
desenvolvimento desta pesquisa.
4 RESULTADOS E DISCUSSÕES
Já referente ao gênero, 25% dos alunos são do gênero masculino e 75% do feminino.
Nenhum participante indicou pertencer a outro gênero. O gráfico 2 apresenta o percentual de
estudantes por gênero.
Sobre as preferências acadêmicas dos participantes, mormente, foi pedido que
escolhessem, a partir de uma lista de cursos de Ensino Superior, três que possuíam interesse em
cursar. Segundo os resultados obtidos, o feminino apresenta forte preferência por cursos das
áreas de Ciências Biológicas e da Saúde, de Ciências Sociais Aplicadas e de Educação e
Ciências Humanas, ambas escolhidas por 73,33% do público em questão. Já os cursos das áreas
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de Ciências Exatas e Tecnologia e de Ciências Agrárias Aplicadas foram escolhidos, cada uma,
por, apenas, 20% do total desse público.
Gráfico 2 - Percentual do número de alunos por gênero
Gráfico 3 - Quantidade de alunos com interesse em cursos das áreas de Ciências Biológicas e da Saúde; Ciências
Exatas e Tecnologia; Ciências Sociais Aplicadas; Educação e Ciências Humanas, e Ciências Agrárias
AplicadasGráfico 4 - Percentual do número de alunos por gênero
mesma medida em que cursos como História, Pedagogia e Psicologia não despertam tanto
interesse nos homens.
Gráfico 3 - Cursos superiores mencionados pelos alunos, e quantidade de menções por cada curso
Gráfico 7 - Cursos superiores mencionados pelos alunos, e quantidade de menções por cada curso
Gráfico 4 - Quantidade de alunos com interesse em cursos das áreas de Ciências Biológicas e da Saúde; Ciências
Exatas e Tecnologia;
Fonte: Elaborado peloCiências Sociais Aplicadas; Educação e Ciências Humanas, e Ciências Agrárias Aplicadas
Autor (2022)
Gráfico 5 - Cursos superiores mencionados pelos alunos, e quantidade de menções por cada cursoGráfico 6 -
Quantidade de alunos com interesse em cursos das áreas de Ciências Biológicas e da Saúde; Ciências Exatas e
Tecnologia; Ciências Sociais Aplicadas; Educação e Ciências Humanas, e Ciências Agrárias Aplicadas
Gráfico 8 - Disciplinas que meninos e meninas indicaram gostar maisFonte: Elaborado pelo Autor (2022)
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Física, História, Física e Química estão entre as menos populares entre os homens, ambas
escolhidas por 40% deles.
Gráfico 9 - Disciplinas que meninos e meninas indicaram gostar menosGráfico 10 - Disciplinas que meninos e
meninas indicaram gostar mais
Diante disso, os resultados parecem apontar para o fato de que, nesse grupo, as
disciplinas associadas a Ciências Exatas não são vistas de forma positiva por ambos os gêneros.
Entretanto, a matéria de Química é majoritariamente "odiada", com desaprovação de 75% do
público total participante. Ademais, apenas uma discente a apontou como uma das que mais
gostava. Dessa forma, embora a literatura qualifique, de forma estereotipada, como
predominantemente masculina as Ciências Exatas, nessa amostra não foi possível verificar isso.
Pereira (2018) realizou semelhante estudo, com participação de 77 estudantes no total,
na qual os resultados também apontaram as disciplinas de Ciências Exatas como não bem-vistas
pelo público da amostra, tanto para os homens, que correspondiam a 48 do total de participantes,
como para as mulheres (29). Outrossim, a disciplina de Química também se figurou como a que
mais apresentava índice de rejeição pelos discentes.
Continuando, as questões que visavam obter as percepções dos discentes em relação à
presença feminina na ciência e a relação desta com àquela, seus resultados refletem, como
relatado na literatura deste trabalho, a sub-representação e a invisibilidade de suas contribuições
à ciência.
Nesta etapa, primeiramente, foi pedido aos participantes que indicassem nomes de
cientistas que conhecessem e por qual meio tiveram conhecimento sobre a personagem. 50%
responderam a essa questão, sendo que nem todos indicaram por qual meio tiveram contato.
A lista taxativa de nomes de cientistas citados pelo público-alvo compreende, apenas, 8
personagens distintos. Dentre eles, apenas uma mulher, Marie Curie, foi citada e por apenas um
voluntário. Os outros cientistas citados foram Albert Einstein, Isaac Newton, James Webb,
Stephen Hawking, Maquiavel, Charles Darwin e Max Planck. A figura 1, representa uma
nuvem de palavras com todos os cientistas mencionados, quanto maior o tamanho do nome,
maior foi o número de menções recebidas pelo cientista.
A pequena extensão de nomes na lista denota uma esterilidade no saber dos alunos.
Ademais, o fato de o maior número de menções por um aluno ter sido 4 nomes (alguns se
limitando a citar apenas 1, sendo em grande parte Albert Einstein ou Isaac Newton) e metade
do público não terem respondido nada, corrobora com essa visão. No trabalho de Pereira (2018),
Albert Einstein e Isaac Newton também foram as personalidades científicas mais lembradas, e
Marie Curie, com apenas 3 menções, foi a única mulher citada.
Dentro os meios/locais mencionados, tivemos: livros, internet, TV, palestras, escola,
cursinho. A presença da palavra livro nessa pequena lista reforça a importância dessa poderosa
(e muito vezes única) ferramenta da qual dispõem os/as alunos(as) para estudarem.
27
Figura 1 - Nuvem de palavras com o nome dos cientistas citados pelos alunos
Assim, bons materiais didáticos que disponham em seu conteúdo de traços da história e
natureza do conhecimento científico podem servir de estratégia para amenizar tal fenômeno de
infertilidade.
A turma participou de uma série de palestras durante a semana na qual foi feita a
aplicação do questionário. Alguns dos voluntários indicaram o nome do cientista James Webb
e que o conheceram em uma palestra na UFS. Esse fato demonstra o poder de influência que
determinados eventos científicos têm sobre os participantes, podendo ser uma experiência
28
benéfica ou não. Dessa forma, deve-se ter cuidado nas informações que são repassadas ao
público, a fim de evitar a propagação e perpetuação de equivocadas e/ou falsas concepções.
Para Spiess (2020), embora muito importantes na comunicação científica, os eventos
científicos ainda são poucos conhecidos na própria comunidade acadêmica. Em sua gênese e
de forma geral, possuem o papel de divulgar as descobertas e promover os cientistas, integrando
dessa forma, e ao mesmo tempo, o contexto social, cognitivo e territorial. Ainda segundo ele:
Do ponto de vista do Programa normativo, os eventos científicos compreendem uma
etapa no processo de integração da comunidade científica. O foco analítico desta
abordagem se concentra na posição social dos participantes e na localização
geográfica dos eventos. Isso significa que os eventos científicos são produzidos e
reproduzem uma estratificação ao mesmo tempo social (entre cientistas) e espacial
(entre comunidades). O efeito combinado deste processo estabelece uma
hierarquização chamada duplo efeito Mateus: I. reflete o reconhecimento (diferencia
os cientistas em função de sua posição na estrutura de comunicação); e II. diferencia
espacialmente: (estrutura os eventos em função da localização da sua realização)
(SPIESS, 2020, p. 464)
Por fim, os discentes foram solicitados a descreverem sua imagem da figura e dos
atributos de quem trabalha como cientista. Apenas 40% (8 voluntários) responderam a esse
item. 6 dos respondentes descreveram com teor generificado, associando de forma explícita a
imagem de cientistas ao público masculino, seja por citar a palavra "cara" (culturalmente sendo
sinônimo informal de pessoa do sexo masculino), ou por citar traços marcantes da fisionomia
masculino como, "barba grande" e adjetivos que remetem ao gênero. Abaixo segue as respostas
dos alunos e/ou alunas que demonstram tal ponto de vista:
ALUNA B: “Um cara alto, com jaleco branco, tem jeito de nerd, introvertido.”
ALUNO C: “Todo de Branco e com luvas brancas.”
ALUNO D: “Todo desajeitado, cabelo grandão, barba grande, baixo e inteligente.”
ALUNA E: “Um cara alto, com cabelos brancos, considerado NERD (pessoa com
capacidade de inteligência elevada), intelectual e introvertido.”
ALUNA F: “É mais introvertido, está sempre estudando e sempre querendo
descobrir coisas novas.”
ALUNO L: “Eu tenho os caras como um gênio.”
Nesse ponto cabe citar um estudo feito por Rosenthal e Rezende (2017) com alunos do
6° ano do Ensino Fundamental de uma escola pública no município de São Paulo/SP. No estudo
foi realizado uma atividade, a qual basicamente consistia em apresentar, de forma anônima e
sem indicar o gênero, a trajetória de vida de Rosalind Franklin (uma das muitas mulheres
expressivas no campo científico, com contribuições na elucidação da estrutura do DNA, mas,
assim como outras, teve sua história silenciada por longo tempo) e depois solicitar que os
participantes desenhassem a personagem anônimo.
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A análise dos desenhos demonstrou que 72% do discentes acreditava que a personagem
se tratava de um cientista masculino, com características específicas do estereótipo apresentado
pela mídia: usando óculos e jaleco e aparência de "louco". Dessa forma, os resultados
demostram a existência de estereótipos de gênero associado a imagem do profissional da
ciência, na medida que aponta que a maioria acredita que a pessoa relatada na biografia se
tratava de um homem.
As autoras ainda reforçam, como já defendido aqui, a importância de se promover
eventos que tenham como objetivo despertar o interesse e inserir o público feminino na e pela
carreira científica.
Já na fração restante, não há como dar julgamento definitivo sobre o gênero devido à
utilização de linguagem neutra na qual nas frases se torna impreciso determinar o gênero do
referente, conforme pode ser contemplado, logo a seguir, pelos fragmentos de respostas:
ALUNA G: “Uma pessoa com cabelos brancos, usando jaleco e óculos.”
ALUNA N: “Uma pessoa muito inteligente”
Diante disso, por lógica, insta pontuar que nenhum dos participantes mencionaram ou
associaram, explicitamente, a figura feminina à imagem de cientista, mesmo a maior parte da
amostra sendo composta por mulheres. Apesar dos homens serem minoria, correspondiam em
média, aproximadamente, a 45% dos que optaram por se manifestar nessas duas últimas
questões. Somente 20% dos homens não contribuíram em nada nas questões subjetivas. O
percentual de não contribuição em nenhuma das etapas subjetivas sobe para 46% nas mulheres,
possível indicativo de falta de interesse pela temática.
Destarte, que todos os que optaram por responder listaram certas características e
objetos associados aos mesmos (cientistas) que vão de encontro à imagem de cientista
disseminado em produções audiovisuais (filmes, séries, novela etc.) (REZNIK, 2017): "cabelo
branco", "jaleco branco", "luvas", "óculos". Essa percepção, segundo Osborne et. al (2003),
envolve traços sobre a Natureza das Ciências em conjunto com valores, conhecimentos e
experiências anteriores, que são moldadas socialmente e culturalmente, por conseguinte,
incorporados pelos sujeitos.
Outrossim, parte considera como traço central de cientistas a inteligência muito acima
da média e o anseio por descobrir coisas novas e pela inovação. O adjetivo introvertido também
foi mencionado. Em grande parte, é utilizado para se referir a alguém reservado. Mas, pode
indicar que os participantes enxergam os/as profissionais como individualistas em seus serviços
laborais.
30
Sobre tudo isso, a visão apresentada por Konflanz e Scheid (2011) em um de seus
trabalhos, vai ao encontro aos resultados aqui contemplados, que nas escolas ainda são comuns
concepções ingênuas sobre o que é ciência, como realizá-la e sobre a imagem e papel dos
cientistas. Nas quais a ciência é vista por muitos como uma atividade para pessoas com mentes
privilegiadas, com intelecto distante da normalidade, decorrente de um método científico único,
infalível e neutro.
Kosminsky e Giordan (2002, p. 17) mencionam que:
…o desconhecimento sobre como pensam e agem os cientistas impede a aproximação
dos alunos à cultura científica. Consequência imediata deste impedimento é a tentativa
de transferência acrítica dos valores prezados pela cultura científica para os
estudantes. (KOSMINSKY; GIORDAN, 2002, p. 16)
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
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LEÃO, L. M. Metodologia do estudo e pesquisa: facilitando a vida dos estudantes,
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LETA, J. As mulheres na ciência brasileira: crescimento, contrastes e um perfil de sucesso.
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BRANDÃO, Z. (org.). A Crise dos Paradigmas e a educação. São Paulo: Cortez, 1996.
34
Caro(a) estudante, este questionário faz parte de uma pesquisa que tem como objetivo
analisar suas concepções quanto às questões de gênero na ciência. O referido estudo é parte
integrante do meu trabalho de conclusão de curso de graduação em Ciências Biológicas
Licenciatura da Universidade Federal de Sergipe. As informações coletadas serão mantidas no
mais absoluto sigilo, não havendo necessidade da sua identificação. Solicitamos que responda
a esse questionário de forma completa e sincera. Desde já agradecemos a sua colaboração.
Nome do Colégio:
Gênero: ( ) feminino ( ) masculino ( ) outro:_____________
Idade:
1) Quais dos seguintes cursos listados abaixo você possui ou teria interesse em cursar? (Escolha
3 opções)
( )Administração ( )Biblioteconomia e Documentação
( )Agroindústria ( )Ciência da Computação
( )Arqueologia ( )Ciências Atuariais
( )Arquitetura e Urbanismo ( )Ciências Biológicas
( )Artes Visuais ( )Ciências Contábeis
( )Astronomia ( )Ciências da Religião
37
( )Turismo ( )Outro:_____________(Especifique o
nome do curso)
( )Zootecnia
2) Quais das seguintes matérias escolares você mais gosta? (Escolha 3 opções)
( )Português ( )Química ( )Filosofia
( )Matemática ( )Biologia ( )Inglês
( )Geografia ( )Artes ( )Espanhol
( )História ( )Educação Física
( )Física ( )Sociologia
3) Quais das seguintes matérias escolares você menos gosta? (Escolha 3 opções)
( )Português ( )Química ( )Filosofia
( )Matemática ( )Biologia ( )Inglês
( )Geografia ( )Artes ( )Espanhol
( )História ( )Educação Física
( )Física ( )Sociologia
Telefone e endereço postal completo: (79) 998623753, Travessa do Campo, nº 34, São Bento,
Salgado – SE.
Eu, Daniel Sotero dos Santos, responsável pela pesquisa A PERCEPÇÃO DOS
ALUNOS DE ENSINO MÉDIO SOBRE QUESTÕES DE GÊNERO NA CIÊNCIA, o
convido a participar como voluntário deste meu estudo.
gênero nas ciências. Sua participação constará em responder um questionário com o total de
cinco (5) questões, sendo que, Três (3) delas são objetivas e as outras duas (2) subjetivas.
Sendo sua participação voluntária, você não receberá benefício financeiro. Os gastos
necessários para a sua participação na pesquisa serão assumidos pelos pesquisadores.
Os benefícios que esperamos com o estudo são: Identificar como os discentes enxergam
à questão do papel feminina nas ciências (se os participantes têm conhecimento de mulheres
que fizeram/fazem parte da história da ciência), e os estereótipos de gênero associados ao
mesmo, como também, identificar as preferências acadêmicas dos discentes, contribuindo, em
certo grau, para tomada de decisões que visem melhorar e corrigir visões históricas inadequadas
sobre o papel feminino na sociedade.
Você tem garantida a possibilidade de não aceitar participar ou de retirar sua permissão
a qualquer momento, sem nenhum tipo de prejuízo pela sua decisão.
Durante todo o período da pesquisa você terá a possibilidade de tirar qualquer dúvida
ou pedir qualquer outro esclarecimento. Para isso, entre em contato com algum dos
pesquisadores ou com o Comitê de Ética em Pesquisa com Seres Humanos.
Autorização
expresso minha concordância em participar deste estudo e assino este termo em duas vias, uma
das quais foi-me entregue.
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