Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
ALUNOS (AS):
CLEYTON ARAUJO FERREIRA 20190056952
GEISYELLEN THÁFFYNE SOUSA FABRICIO 20190117619
THAIS GOMES LIRA 20190117010
A edição da revista Veja SP de 21 de janeiro de 2021 tem recebido duras críticas nas
redes sociais devido sua manchete especial de aniversário de São Paulo como “Capital do
Nordeste”.
É recorrente que edições da revista veja virem piada, ou sejam motivo de protestos
por trazer algum tipo de preconceito. Esta edição da Veja São Paulo, uma revista que na
maioria dos seus colaboradores são do Sudeste, e que comemora os 467 anos da cidade,
pecou feio ao sugerir em sua capa que São Paulo seria a capital do Nordeste.
Dificilmente pensarão sob o ponto de vista Nordestino. Era a mesma coisa de Baby
Consuelo, que é carioca de Niterói, se intitular Bahiana apenas por ter sido casada com o
Baiano Pepeu Gomes, e ter por algumas vezes tocado em trio elétrico como participação
especial em algum bloco de carnaval de Salvador, e posar comendo um “Bolinho de
Jesus”[1].
Nesse sentido, a Veja errou feio! Não é sob o ponto de vista unilateral que se entende
o Brasil. Essa manchete polêmica só corroborou para escancarar esse preconceito velado que
sempre existiu entre sudestinos e nordestinos (“é tudo Paraíba”, “cabeça chata”, “fala
arrastado”, “só servem para pedreiros”, “são todos Baianos").
Uma falha grosseira! As Capitais nordestinas (Recife , João Pessoa, Aracaju, Maceió,
Natal, Fortaleza, Teresina e São Luís) têm muito mais beleza, riqueza, grandeza e História.
Não há o que se invejar ou pormenorizar. O Nordeste é a região que possui o maior número
de estados. A resiliência dos nordestinos vai muito além do que qualquer definição literária e
científica, assim sendo, não cabe detrimento ou juízo de valor em relação à nenhuma outra
região ou população, pois, cada uma tem suas peculiaridades, identidades, costumes, etc, e
precisam ser respeitados como são.
Quando se julga qualquer outra cultura à partir do seu ponto de vista ou apenas da
realidade em que o olhador está, comete-se etnocentrismo, o que Meneses diz:
Sabemos que durante anos, vários nordestinos migraram para o Sudeste, buscando
incertas oportunidades de trabalho atreladas à esperança de uma vida financeira estável. O
mestre da música popular brasileira, estudado nas faculdades de música do mundo inteiro,
Luiz Gonzaga, também conhecido como Rei do Baião, retratou em seus versos tão bem as
angústias e amargor de estar longe de casa buscando melhorias de vida. Lula Gonzaga soube
traduzir para o cosmopolitismo sudestino e a partir daí ganhar o mundo: “Minha vida é andar
por esse país, pra ver se um dia descanso feliz. Guardando as recordações, das terras onde
passei, andando pelos sertões, e dos amigos que lá deixei”[5]
A capa e propósitos da Veja com a referida matéria, mesmo que se diga “não
intencionalmente”, apresenta sim esse etnocentrismo, que muitas vezes se apresenta de forma
camuflada, intrínseca, ou já está tão enraizado como o racismo estrutural, que faz com que
digam por exemplo “é um negro de coração branco”, por repetir aquilo que lhe foi ensinado
como “inocente” e mesmo que a pessoa não perceba está sim, cometendo racismo ao dar
continuidade àquele comentário. E sobre esse etnocentrismo camuflado, Menezes diz:
Ao analisar com cautela os elementos que compõem a capa, percebe-se que estes
elementos foram escolhidos e colocados em pontos estratégicos através de uma visão
estereotipada a respeito do nordeste, em que, nessa visão, o nordestino vive em condições de
pobreza e seca. Esse estereótipo é reforçado mediante a cor escolhida para a parede ao fundo,
em um tom terroso que faz referência a casas de taipa, dando a entender que na região não
tem casas de alvenaria. Para reforçar essa ideia de seca e pobreza, são posicionados também
alguns cactos, planta característica do nordeste conhecida pela incrível capacidade de
sobreviver em ambientes extremamente quentes ou áridos. O olhar apresentado aos leitores
da revista é de que a região nordeste se resume à seca e pobreza, desvalorizando então a
cultura, a história, as crenças desse povo que é rico em cultura e valores.
Ainda falando sobre a capa, se a intenção da Veja era ressaltar o papel positivo do
nordestino em São Paulo, o mesmo não foi obtido com êxito. Segundo o Instituto Brasileiro
de Geografia e Estatística (IBGE), as regiões Norte e Nordeste têm como maioria dos
habitantes as pessoas negras. Entretanto, das seis pessoas escolhidas para representarem os
nordestinos na capa da revista, nenhum é negro, o que reforça a ideia de que para o
nordestino cresce na capital Paulista, é preciso ter pele clara. O que nos lembra de todo o
preconceito vivido por pessoas negras nessa grande capital, são frases como: “Esses
Paraíbas”; “são todos Baianos"; “cabeça chata”; “só servem para pedreiros e diaristas”, além
de todo o preconceito com seu sotaque. São frases como essas que o nordestino que mora em
São Paulo escuta ao menos uma vez por dia.
“A capital do nordeste”, neste título a Veja elege São Paulo como a capital de uma
região que nem sequer a cidade faz parte, e reforça também a ideia de que São Paulo é o
centro do Brasil. Além da problemática de diminuir o nordeste a um mero estado, e não ao
que realmente é: uma região do Brasil. O nordeste conta com nove estados, cada um com
suas próprias capitais e suas individualidades, mas nesse caso, foi resumido a um simples
estado, como se os nove estados que a compõem fosse um só, como algo homogêneo.
A reportagem conta, de forma romantizada, dos migrantes que foram para São Paulo
em busca de uma vida melhor, como se isso fosse uma espécie de sonho ou meta de todo
nordestino, o que não é verdade quando a vontade é mudar de vida. São Paulo foi construído
através de mão de obra nordestina barata, sempre muito mal remunerada, trabalhando o dobro
do que deveriam para conseguir o mínimo para sua sobrevivência. A maioria vive com baixos
salários e tem baixo nível educacional, devido a ter que escolher entre trabalhar para poder se
alimentar e estudar. Em razão disso e com os altos aluguéis que tem que pagar, grande parte
mora nas periferias da cidade, muitas das vezes tendo que pedir autorização para poder entrar
e sair da favela, pois lá o aluguel é mais barato, e muitas vezes têm que conviver com o crime
do lado de fora da janela. Além de toda essa problemática, os empregos geralmente são
distantes do local onde vivem, com isso, gastam tempo e dinheiro para se locomover até o
trabalho. Chegando lá, o trabalho também não é dos melhores, a maioria dos nordestinos
trabalha como diarista e pedreiros, pois são as áreas de trabalho, em sua maioria, que são
ofertadas para eles.
“Não é mais com calos nas mãos e sacos de cimento nas costas
que muitos migrantes nordestinos constroem uma nova São
Paulo. Durante o século XX, quando se tornaram a maior
população da cidade vinda de fora da capital, eles carregaram o
estigma de ser uma força de trabalho para serviços duros e mal
remunerados. Agora, transformam a metrópole por meio da
gastronomia, do design, de startups inovadoras e até da
construção de prédios — mas, desta vez, no papel de donos das
construtoras. É o que revelam dados oficiais e os personagens
destas páginas, feitas como uma homenagem de Vejinha ao
Nordeste no aniversário da capital paulista, que completa 467
anos na segunda-feira (25).”
(https://vejasp.abril.com.br/cidades/capa-migrantes-nordestinos
-sao-paulo/)
É fato que foram os nordestinos que construíram a cidade de São Paulo às custas de
muita exploração de trabalho em um momento em que migrar para o sudeste era a única
alternativa para quem sofria as consequências da desigualdade social impostas aos
nordestinos como forma de manutenção do monopólio regional.
Ao migrarem para a cidade de São Paulo, os nordestinos levaram também os seus
costumes, tradições, memórias e, mais do que isso, a saudade de sua terra. Também é fato que
o trabalho manual dos nordestinos foi bem utilizado pelas indústrias e construtoras de São
Paulo, mas a cultura nordestina foi subestimada e marcada pelo preconceito etnocêntrico que
se utilizou de diversos meios para concretizar as ideologias que reduzem a arte produzida
pelos nordestinos.
O preconceito etnocêntrico se deu por diversos meios e pela disseminação de
diferentes ideologias. Uma destes meios foi a apropriação cultural, que consiste em absorver
elementos de uma cultura, historicamente oprimida, fora do contexto, recontando a história e
o significado de forma centralizada na cultura que estabelece poder.
A publicação da revista Veja foi etnocêntrica não só ao ao realizar esta apropriação
sugerindo São Paulo como capital nordestina e contando a história a partir de uma visão do
Sudeste, mas também apresentou um nordeste desterritorializado e embranquecido,
invisibilizando as pessoas negras e indígenas que também fazem parte do Nordeste. “A
cultura Nordestina é antes de tudo negra- indígena”, comentou um internauta no Twitter.
A edição quer parecer uma valorização do nordeste trazendo pessoas nordestinas que
conseguiram se desenvolver em São Paulo, afirmando que houve a mudança do perfil dos
migrantes e que isso se deve a uma elevação na qualidade da educação no Nordeste. Dessa
forma, a reportagem coloca São Paulo como superior, sugerindo que o motivo para os
nordestinos não terem se destacado até então tenha sido por falta de uma educação,
relacionando a educação formal à capacidade de criar para além do trabalho braçal.
[1] Termo que os evangélicos usam para descaracterizar o alimento sagrado das religiões de
matriz africana, Acarajé.
Programa de Iniciação Científica da mesma instituição de ensino com orientação do Prof. Dr.
Edson Capoano.
[4] Grande Sertão: Veredas. Romance experimental modernista escrito pelo autor
brasileiro João Guimarães Rosa e publicado pela Livraria José Olympio Editora, em 1956.
[6] (https://vejasp.abril.com.br/cidades/capa-migrantes-nordestinos-sao-paulo/)