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Dados Internacionais de Catalogacao na Publicacio (CiP) (Camara Brasileira do Livro, SP, Brasil), ‘Uma leitura critica da Base Nacional Comum Curricular compreensdes subjacentes / Terezinha da Conceigso Costa. Hibes, Marcia Adriana Dias Kraemer, (organizadoras). — Campinas, SP : Mercado de Letras, 2019. Varios autores. Bibliografia ISBN 978-85-7591-581-3, BNCC ~ Base Nacional Comum Curricular 2. Critica de texto 3. Educacao ~ Finalidades e objetivos 4. Ensino tundamental —Curriculos 5. Lingua portuguesa 6. Politicas publicas 7. Professores - Formacao I. Costa-Hilbes, Terezinha da Conceigao. I. Kraemer, Marcia Adriana Dias. 1931613 COD-370.961_ indices para catdlogo sistematico: 1. Leitura critica da Base Nacional Comum Curricular : Educacao 370.981 capa ¢ geréncia editorial: Vande Rota Gomide preparacao dos originais: Editora Mercado de Letras revisao final dos autores bibliotecaria: Maria Alice Ferreira - CRB-8/7964 DIREITOS RESERVADOS PARA A LINGUA PORTUGLESA: MERCADO DE LETRAS! VR GOMIDE ME Rua Jodo da Cruz e Souza, 53 Telefax: (19) 3241-7514 ~ CEP 13070-116 Campinas $P Brasil www mercado-de-fetras.com. br livros@mercado-de-tetras.com.br Tedicao 2019 IMPRESSAO DIGITAL IMPRISSO NO BRA Esta obra esté protegida pela Lei 9610/98. E proibida sua reproducao parcial ow total sem a autorizacao previa do Editor. O infrator @stard sujeito as penalidades previstas na Lei 3 CONCEPGOES DE LINGUAGEM NA BASE NACIONAL COMUM CURRICULAR: REFLEXOES PARA O ENSINO DE LINGUA PORTUGUESA Jodo Carlos Rossi Andréia Cristina de Souza Palavras Iniciais E sabido, teoricamente, que o ensino de lingua passou por mudangas significativas a partir de 1980, influenciadas por discussdes provocadas (dentre outras) com a publicagdo da obra O texto na sala de aula, organizada por Joao Wanderley Geraldi e publicada, em sua primeira edigao, em 1984. Desde entio, as novas proposigdes dos estudiosos da linguagem abriram caminhos para reflexdes mais aprofundadas sobre a forma como a lingua portuguesa vinha sendo ensinada nas escolas. Esses estudos, como era de se esperar, impactaram também nas politicas educacionais. Assim, com a publicagao, em um primeiro momento, dos Parametros Curriculares Nacionais (doravante, PCN) (Brasil 1998) foi assumido um ensino da lingua em uma perspectiva interacionista, 0 que se refletiu Posteriormente em outros documentos norteadores da educagao. srl ngua causou certo desconforg ender a li na Vez que ESSE Novo a Portuguesa. um ge, 0 entendimento de que a luz linguagem, os Tal forma de compr" a nos, professores de Lingu: P olhar nos exigi. € ainda exige das orientagdes de um estudo } encaminhamentos didatico-metodol em conta a lingua em uso. Para ISSO, pr ; “ qual concep¢ao de linguagem partimos, Me aes em cada agao de ensino do professor esta inscrita uma concepgao de linguagem, bem um posicionamento ideold: nteracionista da gicos do docente devem levar ecisamos ter clareza de gico (Geraldi 1991[1997]) e que como ditada pelas concep¢des que “[...] nossa programagao de ensino € (Antunes 2014, p. 16). compreendemos que Os documentos camente, buscam servir como propostas pedagdgicas alimentamos [...]" Nesse contexto, se © oficiais, situados historica e ideologi' referéncia para a construgdo de curriculos e que orientarao as a¢oes didatico-pedagogicas em sala de aula, ¢ também essencial analisar as concepgdes de linguagem nas quais estes documentos encontram-se ancorados. A vista disso, neste capitulo, buscamos refletir sobre a concepgao de linguagem presente na Base Nacional Comum Curricular (BNCC) que s ubjuz 0 ensino de Lingua Portuguesa. Para isso, em um primeiro momento, apresentamos brevemente 0 percurso historico das concepgdes de linguagens subjacentes ao ensino de Lingua Portuguesa e, em um segundo momento, analisamos a BNCC, visando entender até que ponto ha uma ancoragem na concepgdo de linguagem interacionista. > 0 do ensino de Lingua Portuguesa: concep¢oes de linguagens subjacentes Oensino de Lingua P. durante muito tempo. por ur 1 ortuguesa (doravante, LP) foi orientado, ma perspecti is i ‘4 perspectiva de ensino gramatiqueira. Essa compreensa Jo sustentavz ustentava-se no ensino das normas estruturais da lingua(gem),' na arte do bem falar e do bem escrever. Com 0 passar dos anos, 0S estudos linguisticos foram avangando e um novo vies tedrico-metodologico passou a conduzir as reflexdes em sala de aula, 0 dialdgico & interacionista. ‘Ancorado nos pressupostos tedricos do Circulo de Bakhtin, Geraldi (1984{2011]) problematiza as concepgdes de linguagem e apresenta-nos uma nova compreensao, a da linguagem como forma de interagao. A vista desse entendimento, 0 texto passa a ser visto como unidade de ensino e vem para ocupar um lugar privilegiado na sala de aula, tornando-se 0 ponto de partida e de chegada para o ensino de LP. Ao levarmos em consideragdo o carater sécio-historico da lingua(gem), que nem sempre fez parte das agendas dos estudiosos do ramo linguistico, para cada momento historico implica uma maneira de a concebermos. Desse modo, discorreremos sobre as orientagdes estruturalista e cognitivista que ainda hoje deixam resquicios na sala de aula. Bakhtin e Volochinov (1929[2014]) nomeiam essas orientagdes como Subjetivismo Idealista e Objetivismo Abstrato, respectivamente. A partir das reflexdes dos filésofos, Geraldi (1984[2011]) renomeia essa classificagao, apresentando-as como: expressGo do pensamento e como instrumento de comunicagao. A concepgio de Jinguagem como expressdo do pensamento partia do entendimento de que 0 pensamento do individuo se organizava de forma logica. A esse respeito, Bakhtin e Volochinov (1929[2014}) explicam que, para essa orientagao tedrica, “[...] tudo © que ¢ essencial é interior, o que é exterior sé se torna essencial a titulo de receptaculo do contetido interior, de meio de expresso do espirito” (Bakhtin e Volochinov 1929[2014, p. 115]). Sob tal orientag’o, 0 ato de comunicagao parte do interior da mente para 0 exterior social, o que significa desconsiderar todos os fatores 1 ‘Sempre que nos referirmos @ lingua ou a linguagem dentro da teoria bakh- tiniana procederemos dessa forma — lingua(gem) — pois nos escritos do Cir- culo nao ha um tratamento diferenciado entre uma ¢ outra expressao. UMA LEITURA CRITICA DA BASE NACIONAL COMUM CURRICULAR n 5 dialégicas, sociais ¢ externos a esse processo, ou seja, as relagdes garanta a interacio historicas, que sdo determinantes para que se entre os sujeitos. gem) como expressdo do 1 orientado pela visdo da e se entendia que as Ao se compreender a lingua(s pensamento, 0 estudo de LP passou a se: gramatica normativa-prescritiva, uma vez qu atividades gramaticais possibilitariam ao aluno pensamento, bem como, seria uma oportunidade de o aferir o entendimento do contetido gramatical a ele ensinado, De acordo com Menegassi (2010), essa compreensao levava em conta a premissa de que os individuos apresentavam um dom inato/biolégico para falar ¢ escrever. Bakhtin e Volochinov (1929[2014]) asseveram que a expressao se organiza no exterior da mente do sujeito a partir de orientagdes/compreensoes/valores/ verdades advindas do meio social com o qual convive, ou seja, para os autores “[...] ndo existe atividade mental sem expressdo semiotica [...]” (Bakhtin e Volochinov 1929[2014, p. 116]). Assim sendo, podemos perceber que toda a orientagdo expressa pelo sujeito é determinada e organizada a partir das relagdes sociais, 0 que invalida uma compreensao de linguagem totalmente subjetiva, uma vez que nao da conta de explicar os fenémenos sociais que determinam as manifestagées linguisticas. expressar O seu professor Essa compreensao respaldou o ensino até meados do século XX, periodo este que passou a ser questionado pelos estudiosos. Mendes (2012) aponta que os estudos saussurianos vieram contrapor o viés subjetivista idealista, ao compreender a linguagem a partir de uma nova proposi¢ao. Para Saussure (1916{2012]), a lingua nao poderia ser estudada em uma abordagem subjetivista, mas sim, em fungdo de sua estrutura social, Por isso, ao estabelecer um aidan estudo entre fangue ¢ Parole, da énfase a estrutura organizacional da lingua escrita e nao da fala, tend i considera a fala como individual e » Fendo em vista que : Portanto, dentro de um sistema linguistico int nao deve ser engessada n aN for TORA MERCADO DE LETRAS ~ FDUCACAO re A es: denominaram como ohjetivismo abstrato por nao considerar as momento, Bakhtin e Volochinov (1929[2014]) relagdes concretas da lingua(gem) com seu contexto de uso. Essa compreensao implicava em © profess ‘or ensinar a norma padrao, da sua estrutura. No entanto, Mendes (2012) assinala que por volta de 1970, influenciadas pelos estudos saussurianos, varias inquietagdes passaram a ganhar voz nos estudos da lingua, destacando, dentre elas, a compreensdo de fazendo com que 0 aluno se apropr linguagem como instrumento social de comunicagao, defendida por Roman Jakobson. Embora passasse a se considerar o estudo da lingua(gem) dentro de uma situagdo de comunicagao — envolvendo emissor, receptor, canal, mensagem, cddigo e referente — 0 sujeito continuou a ser visto passivamente, situado no ato de receber uma mensagem e nao de agir com/sobre ela. Nesse contexto, apesar de todos os avangos ao longo da histéria, o ensino ainda privilegiava a variedade padrao da LP, pois entendia-se que 0 dominio do cédigo garantiria uma boa comunicagao. Aose perceber as dificuldades que a escola vinha enfrentando em relacao ao ensino de LP, tendo em vista que o ato de ensinar se voltava, especificamente, a estrutura da lingua ou do texto, Marinho aponta que “[...] com as criticas e denuincias a essas praticas de ensino, passou-se a repensar 0 contetido das aulas de portugués, com 0 intuito de se procurarem alternativas para o ensino & aprendizagem da lingua.” (Marinho 1997, p. 88). Nesse contexto, novas propostas de ensino passaram a ser enfaticamente estudadas, a partir de 1980, compreendendo a linguagem como forma de interagao. Rojo e Cordeiro (2004) intitularam esse momento como yirada discursiva ou enunciativa, j4 que essa virada ocasionou uma mudanga de perspectiva frente ao ensino de leitura e produgao textual, No novo cendrio, o texto passa a ser visto como enunciado, estudado em seu funcionamento, ou seja, em seu contexto de produgao. Esse momento dos estudos linguisticos possibilitou mudangas significativas para o ensino de LP, tanto que a lingua(gem) passou a ser concebida dentro de uma perspectiva dialégica ¢ UMA LEITURA CRITICA DA BASE NACIONAL COMUM CURRICULAR. 73 foi jormente incorporada ‘sta, compreensdo que foi posteriorm ae ie interacionista. its educagio, tais COMO OS PCN (Brasij - ane eadores : documentos norte wbsidiar a prética docente. 1998), a fim de orientar € SI lingua como dialdgica € interacionista implica er a ig 1 de seu carater sécio historico e ideol6sice, ompreensdes anteriores, Baka . ee (1929{2014]) afirmam que “A lingua vive © eg reel na comunicagao verbal concreta, nao no —. inguist eo. abstrato das formas da lingua nem no psiquismo individual dos falantes.” (Bakhtin e Volochinov1929[2014, P- 128). Essa maneira de conceber a lingua(gem) nos leva a inferir que seu ensino nao deve ser desprendido de um contexto real de utilizagao, ja que a lingua n&o se reduz a um sistema de signos abstratos, a expressao do pensamento ou a um instrumento social de comunicagao, mas sim, Concebs na _compreensa Confrontando © aum fenémeno social de interagao verbal. Neste Ambito, passa-se a se defender que € por meio de enunciados que os sujeitos fazem uso da lingua na perspectiva de estabelecerem um didlogo com o outro. A vista disso, Bakhtin e Volochinov (1929[2014]) refutam as compreensdes que desprezavam 0 contexto em que a situagao comunicativa ocorre, concepgdes essas, que ainda hoje encontramos resquicios em sala de aula e em documentos que orientam 0 ensino de LP, tais como a BNCC, sobre o qual discorremos na segao que segue. Qual a concepedo de linguagem que subjaz © ensino de Lingua Portuguesa na BNCC? No percurso teérico soo que tragamos bre: anterior, é possivel verificar vemente na se¢do Que desde a publicacao dos PCN (Brasil ” rom ORA MERCADO DE LETRAS ~ EDUCAGAO centrado no texto, nos usos efetivos da lingua e nas reflexdes criticas que possibilitam formar cidadaos para a “{...] plena participacao numa sociedade letrada” (Brasil 1998, p. 24). Embora tais orientagdes tenham apresentado um grande avango para a maneira de se conceber 0 ensino de LP, é possivel perceber consideraveis lacunas tedricas ou tratamentos conceituais equivocados, no que se refere aos estudos bakhtinianos, aos quais se dizem vinculados. Diferente dos PCN (que se apresentou como um parametro para 0 ensino), a BNCC (Brasil 2017) vem para atuar como um documento normativo, como referéncia obrigatoria, em complementagdo as Diretrizes Curriculares Nacionais (Brasil 2013a), para a formulagao de curriculos e propostas pedagdgicas, o que da, entdo, um peso maior a esse documento mais atual. No que se refere a concepgao de linguagem que dasustentagao ABNCC (foco deste capitulo), ¢ possivel verificar que ha uma énfase 4 compreensao interacionista de lingua(gem). No entanto, vinte anos apés a publicagao do primeiro documento, ainda podemos encontrar equivocos ¢ lacunas no tratamento dado & lingua(gem), ao considerar que a base assume os estudos bakhtinianos e, portanto, a concep¢ao dialégica e interacionista de linguagem. Dentre as questdes que necessitam ser destacadas, a primeira encontra-se jé entre as dez competéncias gerais definidas pela BNCC. Segundo o documento, estas competéncias ancoram-se em uma concepgao de educagao j4 apresentada no Caderno de Educagao em Direitos Humanos (Brasil 2013b), a partir da qual é dever da escola “{...] afirmar valores ¢ estimular agdes que contribuam para a transformacao da sociedade, tornando-a mais humana, socialmente justa e, também, voltada para a preservagao da natureza” (Brasil 2017, p. 08). Embora nao esteja explicito no documento, podemos afirmar que esta é uma concepgio critica de educagao e que dialoga com a pedagogia histrico-critica e pedagogia critico-soc ial dos contetidos (Libaneo 1985), vinculadas ao materialismo histérico dialético, assim como aos estudos bakhtinianos sobre a natureza da linguagem, UMA LEITURA CRITICA DA BASE NACIONAL COMUM CURRICULAR 75 gem. Se consideramos estas s sobre a aprendiza: arantir que 0 educando se as, a educagao deve 8 inte ativo de transformacao social, visando uma usta. Assim, 4 partir do dominio de contetidos, e de linguagem, os alunos diante das realidades sociais © vygotskyniano: perspectivas tedrics alirme como age! sociedade mais j 5 ; competéncias, habilidades, inclusiv podem formar uma consciéncia critica para, entao, transforma-las. verificamos que, de um s competéncias, quando consideram o Ao analisar a: contemplam esta proposta, jo dos sujeitos, em diferentes nivels, para a transformagao da sociedade. E possivel perceber que a educagao deve visar a formagao de alunos que sejam sujeitos ativos em seu prendizagem, com capacidade de reflexdo € andlise critica (CG2)" ¢ que podem “[...] colaborar para a construgao de uma sociedade justa, democratica € inclusiva [...]” (CG1) (Brasil 2017, p. 9). levando em consideracao as tecnologias digitais de “[..] de forma critica, significativa, ‘a se comunicar, modo geral, protagonismo e a ag processo de aj informagao e comunicagao, reflexiva e ética nas diversas praticas sociais [...] par acessar e disseminar informacdes, produzir conhecimentos, resolver problemas ¢ exercer protagonismo ¢ autoria na vida pessoal ¢ coletiva” (CGS) (Brasil 2017, p. 9). Na mesma direcdo, as CG6, CG7, CG8, CG9 e CGI10 focalizam a formagdo de agentes ativos, capazes de se posicionar historica e socialmente no mundo, de (inter)agir no, com e sobre o mundo. Curiosamente, a competéncia que trata especificamente a linguagem (CG4) nao aborda estas questdes, como podemos verificar em seu texto, transcrito abaixo na integra: 2. Para a or ; ara a organizacao deste capitulo, optou-se por utilizar as siglas CG part apa cia Geral, CL para Competéncia da area de Linguagens ¢ Cl LP Para Competéncias da area de Lingua Portuguesa, acompanhadas do nme ro da competéncia a que se referem. 76 EDITORA MERCADO DE LETRAS ~ EDUCAGAO 4. Utilizar diferentes linguagens — verbal (oral ow visual- motora, como Libras, ¢ escrita), corporal, visual, sonora € digital -. bem como conhecimentos das linguagens artistica, matemitica ¢ cientifica, para se expressar e partilhar informagoes, experiéncias, ideias ¢ sentimentos em diferentes contextos ¢ produzir sentidos que levem a0 entendimento mituo. (Brasil 2017, p. 9) Embora mencione a produgao de sentidos, 0 que pressupde protagonismo por parte do sujeito, quando pensamos em utilizar linguagem para produzir sentidos que levem ao entendimento ituo, esta Ultima parte esta vinculada ao que Bakhtin e Volochinov 1929[2014]) chamam de Objetivismo Abstrato e Geraldi 1984[2011]) de concepgao de linguagem como instrumento de munica¢do, sem pressupor a interagdo que ha entre sujeitos sdcio- istorica e ideologicamente constituidos: o objetivo da utilizagao da inguagem, segundo esta competéncia, seria levar a compreensao de ensagens compartilhadas entre os individuos Além disso, também percebemos o destaque da utilizagdo da Jinguagem para expressar e partilhar informagdes, experiéncias, leias ¢ sentimentos em diferentes contextos, 0 que também podemos Vincular A concep¢ao de linguagem como expressdo de pensamento, ém de instrumento de comunicagao, pois 0 que esta em destaque é a capacidade de expressdo/exteriorizagao das informagdes. Ainda que a concepgao de linguagem como forma de interag&o possa ‘exigir a capacidade de expressdo, de partilhar informagdes e de ‘omover o entendimento mituo, esta claro que a competéncia nao da conta de apontar a linguagem como uma capacidade interagdo tre interlocutores, sujeitos que ocupam lugares sociais, situados cio-historica e ideologicamente. No decorrer do texto, verificamos que as, concepslo.é jo limitada. Ainda € valido chamar a m aqui de forma ta ted Aa a forma como a CG5 es linguage! atengao para is de informa i jas digit utilizar eeriar teenologias di it reflexiva e ética a crit oe significativa. (incluindo as escolares) para ar informagdes. produzir cer protagonismo e ¢ comunigagao de forma eri ‘iticas socials nas diversas praticas socials (ine e dissemin se comunicar, acessar e dissem resolver problemas € exere conhecimentos. aay autoria na vida pessoal ¢ coletiva. (Brasi queno avango em relag&o a Podemos verificar um pe vem siderar as praticas vinculadas competéncia anterior. V isto que, a0 con: ; as tecnologias digitais de informagao e comunicacao (TDIC), © texto introduz a utilizagao dessas tecnologias nas diferentes praticas sociais, de forma critica, reflexiva, com protagonismo, No entanto, tal percepgdo ¢ limitada 4 compreender, utilizar e criar — capacidades voltadas ao desenvolvimento individual do sujeito — para se comunicar, acessar ¢ disseminar informagdes 0 que se vincula 4 concepgdo de linguagem como instrumento de comunicagao, mesmo avangando para o protagonismo do aluno, para a nogao de autoria e de produgao de conhecimentos. Ainda assim, valeria a pena questionar este pequeno avango em relagao as praticas de linguagem elencadas na CG4, em que ja esto previstas as diferentes modalidades: verbal (oral ou visual-motora, como Libras, e escrita), corporal, visual, sonora e digital, 0 que, portanto, contempla as praticas elencadas na CGS. i Para finalizar essa breve andlise das competéncias gerais, ainda consideramos valido destacar a CG3: Valoriz ae °s vali ar e fruir as diversas manifestagoes artisticas culturais, das locais as prdticas diversificadas da seja importante valorizar mundiais, @ também participar de produgado artistico-cultural. Embora corr A ‘ORA MERCADO DE LETRAS — EDUCAGAO considerar apenas a valorizagao e a fruigdo destas manifestagdes € a participagao nestas praticas — onde fica a capacidade de interagir por meio dessas praticas? Essa mesma ideia € reforgada mais a frente na CLS e na CLP9 que trata sobre a literatura, visto que as manifestacdes artisticas e culturais também participam dos jogos da linguagem e, portanto, interagem com/no/sobre 0 mundo em suas dimensdes politica e social, por exemplo.? Seguindo a leitura do documento, ao apresentar as etapas da educacao infantil, podemos verificar que a discussdo estd condizente com a concepgao de linguagem como forma de interagao, especialmente ao definir 0 sujeito de aprendizagem: um sujeito historico e sdcio ideologicamente constituido, dialégico, que constréi conhecimento de forma ativa, também por meio da linguagem. Podemos verificar tal compreensao no direito de aprendizagem da educagao infantil, relacionado & linguagem, a partir do qual objetiva-se que a crianga expresse “[...] suas necessidades, emogoes, sentimentos, dividas, hipdteses, descobertas, opinides, questionamentos, por meio de diferentes linguagens [...]”, como sujeito dialogico que “[...] constréi conhecimentos ¢ se apropria do conhecimento sistematizado por meio da agdo e nas interagdes com 0 mundo fisico e social” (Brasil 2017, p. 36). Nesse mesmo sentido, na apresentagao da etapa do Ensino Fundamental (EF), 0 documento destaca a necessidade de valorizar as vivéncias dos alunos “[...] em seu contexto familiar, social e cultural [...]” (Brasil 2017, p. 56), como um sujeito que apreende, se expressa e atua sobre o mundo, numa abordagem interacionista da linguagem: Oesi da construgdo e do fortalecimento da capacidade de fazer sul ao pensamento criativo, légico e eritico, por meio perguntas e de avaliar respostas, de argumentar, de interagir 3. Uma analise mais acentuada sobre o tratamento dado a linguagem literéria na BNCC sera feita no Capitulo 10. UMA LEITURA CRITICA DA BASE NACIONAL COMUM CURRICULAR. com diversas produgaes © urais, de fazer uso de tecnologias sas produgdes CU de fazer u a“ ilita aos alunos ampliar comunicaga . do mundo natural ¢ social. das de informagao & 2 si mesmoOs. sua eomprecnsiio de si mesm humanos entre ste com a natureza. (Brasil res ‘ relagdes dos se 2017. p. 56) io referente aos anos finais do Ef, NCC considera as praticas de e suas mudangas sociais ng essidade de fortalecer a Ao introduzir @ discussa verificamos novamente que 4 Bl agem inseridas na cultura digital a interacionista, a0 reforgar a nec : um sujeito critico € responsivo. Com isso, 0 papel da ar “[...] seu compromisso de estimular a refiexao fundada e contribuir para o desenvolvimento, no lingu: perspectivs formagao de escola é preservi ea andlise apro! estudante, de uma atitude critica em relagao ao contetdo e a multiplicidade de ofertas midiaticas e digitais.” (Brasil 2017, p. 59). Também aponta para a necessidade de compreender e incorporar as novas linguagens, considerando as possibilidades de comunica¢ao € manipulacao, educar para democratizar as tecnologias e para participacdo mais consciente na cultura digital. Ainda vai além, considerando, também, as relagdes ideoldgicas de poder, por meio da linguagem, ao reforgar 0 compromisso de “[...] desnaturalizar violéncias, incluindo a violéncia simbélica de determinados grupos sociais, que impdem normas, valores e conhecimentos tidos como universais e que nao estabelecem dialogo entre as diferentes culturas Presentes na comunidade e na escola” (Brasil 2017, p. 59). Essa visdo também é destacada na concepeao de estudante defendida no documento: A compreens » dos estudantes como sujeitos com histérias ¢ saberes construidos nas interagdes com outras pessoas, tanto do entomo social mais préximo quanto do universo da cultura midiatica ¢ digital, fortalece o poteneial da es formador e orientador para a cid Participativa. (Brasil 2017, Pp. 60) cola como espago jadania consciente, critica e EDITORA MERCADO DE LETRAS - EDUCAGAQ, Finalmente, ao chegar a apresentagao da area de Linguagens (da qual fazem parte os componentes curriculares de Lingua Portuguesa, Artes, Educagao Fisica e Lingua Inglesa), temos a apresentagdo explicita de uma concepgao de linguagem, aqui tomada como forma de interagao: As atividades humanas realizam-se nas praticas sociais. mediadas por diferentes linguagens: verbal (oral ou visual- motora, como Libras, e escrita), corporal, visual, sonora e, contemporaneamente, digital. Por meio dessas praticas. ‘as pessoas interagem consigo mesmas e com os outros, constituindo-se como sujeitos sociais. Nessas interagdes, esto imbricados conhecimentos, atitudes ¢ valores culturais, morais ¢ éticos. (Brasil 2017, p. 61) O documento salienta, também, que os estudantes devem compreender as especificidades de cada linguagem, sem perder a nogao do todo, de que elas se inter-relacionam. Também devem compreender que as linguagens sdo dinamicas (se diversificam conforme as praticas sociais também se diversificam) “[...] e que todos participam desse processo de constante transformagao [...]” (Brasil 2017, p. 61). Estas definigdes dialogam intimamente com os pressupostos bakhtinianos. Entretanto, ainda podemos verificar uma limitagao em relagdo a concep¢ao interacionista, quando o documento introduz a finalidade da area como “[...] possibilitar aos estudantes participar de praticas de linguagem diversificadas, que Ihes permitam ampliar suas capacidades expressivas em manifesta¢gdes artisticas, corporais e linguisticas, como também seus conhecimentos sobre essas linguagens [...]” (Brasil 2017, p. 61), muito vinculadas ainda a concepgao da linguagem como expressao de pensamento e ao conhecimento metalinguistico. Parece-nos que ha, aqui, um apagamento da necessidade de interacdo entre 08 sujeitos e com o mundo. O que ganha destaque é a necessidade de ampliar as capacidades expressivas dos alunos para que sejam UMA LEITURA CRITICA DA BASE NACIONAL COMUM CURRICULAR. 8 eo para 0 outro: A énfase esta na emissag capazes de se manifestarem enao na interagao. : anda assim, percebemos que © foco na apresentagio cepgao interacionista, em que radas em rela¢ao constitutivas, truam os conhecimentos com nguagens € a da con da area de Li : | so conside linguagem e pratica socia objetivando formar sujeitos que cons autonomia e tenham autonomia € prot anos iniciais do EF, 0 tratamento se V agonismo na vida social. Nos lta para as praticas culturais adicionais ¢ contemporaneas, centradas na alfabetizacao, possibilitando aos estudantes ampliar “L..] suas possibilidades de construir conhecimentos nos diferentes componentes, por sua insergdo na cultura letrada, e de participar com maior autonomia e protagonismo na vida social.” (Brasil 2017, p. 61), Nos anos finais, o que se visa é ampliar as praticas de linguagem trabalhadas anteriormente, agora com “[..] aprofundamento das praticas de linguagem artisticas, corporais e linguisticas que sé constituem e constituem a vida social” (Brasil 2018, pp. 61-62). infantis tr nos dois primeiros anos, Emboraas discuss6es vinculadas a area estejam, em sua maior parte, de acordo com os pressupostos bakhtinianos, acreditamos que ha necessidade de um olhar atento para as competéncias especificas definidas para a drea de linguagem, visto que elas ocupam posigao de destaque junto as habilidades elencadas para seu desenvolvimento. Podemos perceber um breve avango em relacdo & concepgao de linguagem como expressdo de pensamento e como instrumento de comunicagao, na CL1, ao defender a compreensao das linguagens como uma construgdo humana, historica, social e cultural (CL!) (Brasil 2017, p. 63) e ndo apenas como fendmeno essencializado, reconhecendo, assim, sua natureza dindmica: Compreender as Tinguagens como construgdo humana, histrica, sociale cultural, de natureza dinmica, reconhecendo- a ¢ valorizando-as como formas de significagdo da realidade © expresstio de subjetividades ¢ identidades sociais e culturais. (Brasil 2017, p. 63) one 82 EDITORA MERCADO DE LETRAS ~ EDUCAGAO gs Ainda que seja possivel perceber, no documento como um todo, uma maior preocupagado com a diversidade linguistica, cultural e social, é possivel verificar uma limitagdo ao considerar a linguagem “[...] como forma de significagaio da realidade e expressio de subjetividades e identidades sociais e culturais” (Brasil 2017, p. 63). Esta definigao parece negar a relacdo constitutiva entre linguagem e praticas sociais em que elas sio mutuamente constituidas (apresentada na pagina 61 do documento), uma vez que, de acordo com Bakhtin e Volochinov, a verdadeira substancia da lingua é constituida “[...] pelo fendmeno social da interagao verbal, realizada através da enunciagao ou das enunciagdes. A interagao verbal constitui assim a realidade fundamental da lingua [...]” (Bakhtin e Volochinov 1929[2014, p. 127]), visto que, considerada dentro da perspectiva interacionista, a lingua(gem) nao somente significa e expressa a realidade, as subjetividades e identidades sociais e culturais, mas também as constréi, ao representa-las nos contextos sociais de interagao. A CL3 apresenta a mesma limitagao: Utilizar diferentes linguagens ~ verbal (oral ou visual-motora, como Libras, ¢ escrita), corporal, visual, sonora e digital -, para se expressar e partithar informag6es, experiéncias, ideias ¢ sentimentos em diferentes contextos e produzir sentidos que levem ao didlogo, & resolugao de conflitos e cooperagao. (Brasil 2017, p. 63) Embora avance brevemente em diregao a terceira concepgao de linguagem, nao a contempla totalmente. Embora valorize a diversidade de linguagens, ainda se filia aos termos expressar e partilhar, os quais podemos relacionar a primeira e a segunda concepgao de linguagem. Em sua parte final, acrescenta a utilizagao da linguagem também para “[...] produzir sentidos que levem ao didlogo, a resolugao de conflitos e a cooperagao [...]” (Brasil 2017, p. 63), 0 que ja estabelece um didlogo com a concepgao interacionista, porém, parece nao dar conta da interago como um UMA LEITURA CRITICA DA BASE NACIONAL COMUM CURRICULAR 83 ao nao esta na interagao, mas iin os € de cooperar com © outros Ny aCL6: haa valorizagao das Tie liza-la de forma critica. ética € reflexivg a sidade de = comunicar Produzir conhecimentog sas priticas. Mas F volver projetos autorais € Coletivos, di cial sin da interagao © das relagdes de Poder yas parcla a linguagem. A CLS apresenta Continuidad, + ne as manifestagbes artisticas € cultura 0, enfatizando, agora, @ Necessidade idade. ue a preocupas ae , contlit todo. um resolver CON” os analisat imbuidas nas praticas em relagao 4 G3, a0 trate apenas no sentido estétic’ também de valorizar a divers Vale salie ordo com a abor' raticas de linguagem mudam de acordo de humana. A vista disso, é praticas de linguagem ntar que as duas outras competéncias esto r nte de ac dagem interacionista. Na CL2, ha plenamet a compreensao de que as P! com os diferentes campos da atividat dever da escola ampliar os conhecimentos dos alunos para além dos campos de atividade humana que eles jé circulam. Também é um ponto positive o ultimo enunciado que fala sobre “[...] ampliar suas possibilidades de participagao na vida social e colaborar para a construgdo de uma sociedade mais justa, democratica e inclusiva” (Brasil 2017, p. 63). O aluno aqui & concebido como sujeito ativo nas interagdes presentes na vida social, que age sobre 0 mundo, como ¢ reforgado pela CL4, a partir das diferentes praticas de linguagem. Nao apenas para defender um onto de vista, mas promover, a partir deste ponto de vista, “I. 5] ee een socioambiental e 0 consumo criticamente frente a estas ie a oe ele questdes (Brasil 2017, p. 63). Especit Lingua aera tratando do componente See i; twauesa, podemos perceber que a BNCC pretende ue trata dos cones citos subjacente 2 ida de comprsreg, teemes auanda se opta, na BNC. por recuperat a EDITORA MERCADO DE LETRAS - EDUCA? dialogar com os documentos ja produzidos, visando atualiza-los em relago as pesquisas e levando em conta as Tecnologias Digitais de Informagao e Comunicagao (TDIC). O documento afirma partir da perspectiva enunci tivo-discursiva de linguagem, ja assumida nos PCN: “[...] uma forma de agdo interindividual orientada para uma finalidade especifica; um processo de interlocugao que se realiza nas praticas sociais existentes numa sociedade, nos distintos momentos de sua histria” (Brasil 1998, p. 20). Ao longo da apresentagao do componente, realmente verificamos a presenga de conceitos ja presentes em outros documentos, orientagdes curriculares e contextos de formagao de professores como: praticas de linguagem, discurso e géneros discursivos, esferas/campos de circulagao dos discursos. Agora, estes conceitos sao ampliados, considerando [a] as praticas contemporaneas de linguagem, sem 0 que a participagao nas esferas da vida publica, do trabalho e pessoal pode se dar de forma desigual” (Brasil 2017, p. 65). A partir dessa atualizagao da proposta, percebemos grande énfase no trabalho voltado aos multiletramentos, com foco nas diversas midias e semioses, ndo apenas na lingua verbal, oral ou escrita, de forma desvinculada. Assim como os PCN, mantém- se a centralidade do texto, “[...] na definigao dos contetidos, habilidades e objetivos, considerados a partir de seu pertencimento aum género discursivo que circula em diferentes esferas/campos sociais de atividade/comunicagao/uso da linguagem L..]”, buscando “L...] sempre relacionar os textos a seus contextos de produgao € 0 desenvolvimento de habilidades ao uso significativo da linguagem em atividades de leitura, escuta € produgao de textos em varias midias e semioses.” (Brasil 2017, p. 65). Ento, podemos confirmar que ha uma adequa¢ao a proposta bakhtiniana que considera que a comunicagao humana ocorre por meio de enunciados relativamente estaveis, nomeados como géneros discursivos, os quais sao produzidos considerando 0 contexto de produgdo de seu uso em diferentes praticas sociais. Também verificamos que a proposta de Geraldi (1984[2011], 1991[1997]), com o texto como centro de UMA LEITURA CRITICA DA BASE NACIONAL COMUM CURRICULAR 85 ponente curricul nto da no! tacdio do com Bcsidade de conhecime’ rma-padrao: sobre 0s rem ee Qs conhecimenti a -padrio, sobre as diferentes: 2 lingua. sobre a norma =) devem ser mobilizados em favoe Finguagens (semiose desenvolvimento das capacidades de leitura, produglo © al, que, por sua vez, devem estat possibilidades de participaglo ea ’ campos de atividades os sobre oS genera, sobre a | tratamento das linguagens. servigo da ampliagdo das priticas de diferentes esferas (Brasil 2017. p. 65) ‘Ao tratar sobre o conhecimento da unto com o da lingua e com as diferentes lings icamos que ha uma desidentificagdo da lingua essfio de pensamento. Ou seja: am pressuposi¢ao da diversidade linguistica, norma em detrimento das demais y as diferentes semioses também d lanto, © foco nao deve ser producir, de configurar, de disponibilizar, de replicar e de interagir. percebe-se com clar a concepgao interacionista, ao incentivar a troca, a interagdo, o dialogo por meio dos textos produzidos: [...] ndo s6 é possivel acessar contetidos variados em diferentes midi um livro de literatura ou a: como também produzir ¢ publicar [...]. Depois de ler istir a um filme, pode-se postar comentarios em redes sociais especificas, seguir diretores. autores, escritores, acompanhar de perto seu trabalho; podemos produzir playlists, vlogs, videos -minuto, eserever fanfics, produzir e-zines, nos tornar um booktuber, dentre muitas outras possibilidades. (Brasil 2017, p. 66, grifo do texto original) No entanto, também podemos perceber que, ao defender o trabalho com as tecnologias e os géneros multimodais, fica mais explicito 0 papel ativo do sujeito da linguagem € como ele deve se responsabilizar pelo que lé e pelo que escreve/diz, constituindo- se como autor, Esse destaque fortalece a impressdo, ao analisar as competéncias gerais do documento, de que as praticas vinculadas as TDIC sao tratadas de forma mais interacionista do que as praticas de uso da linguagem de modo geral. Esta perspectiva pode dar- se em decorréncia da necessidade assumida de formar sujeitos que se comprometam com suas produgées e leitura no ambito das tecnologias, visto que, mesmo com a utilizagao cada vez mais frequente, nem sempre ha o preparo para lidar com a infinidade e rapidez de informagdes e de posicionamento critico perante essas informagdes. Segundo o documento: “Ser familiarizado e usar nao significa necessariamente levar em conta as dimensées ética, estética € politica desse uso, nem tampouco lidar de forma critica com os contetidos que circulam na Web” (Brasil 2017, p. 66). Com base nisso, a BNCC defende o trabalho com os novos multiletramentos, a partir do que também podemos comprovar a adequacao em relag&o a linguagem como interagao, que pressupoe um posicionamento dialégic UMA LEITURA CRITICA DA BASE NACIONAL COMUM CURRICULAR 87 ascola: conten ge coloca para a escolar conte plar ques eel i a pritieas de jinguagem e produgdes, jqessas novas ae ee aoc oe ve axender as mullas demandas sociais unas ico das TDIC ~ Jo so nat persPe ey tio os i agem para um uso qualifica niueenee gue mn BT A an do raat PP? estudar. veessaiio para oraunde pean aes fede tambem fomentar ° debate ¢ outras cotidiana ete. ~ mas eae aay ee am €ssa8 vais que oer : a ais que CTT Jo adio, refletir sobre 0s limites zi direitos. aprender a entos contrarios, mandas So ihecer 0 det saber recon} entre: liberdade de expres aoe + ideias, eonsiderando posig0es © discurse .ssaio @ ataque # argum debater (Brasil 2017. P- 67) os multiletramentos que n conta estes NOV considerados desde a sao atualizados os eixos de integragao ja publicagio dos PC’ “[...] oralidade, leitura/escuta, produgao (escrita e multissemidtica) e andlise linguistica/semidtica” (Brasil 2017. p. 69). Considerando que © documento enfatiza a concepgdo de linguagem como interagao ao abordar as TDIC, fica claro que a ampliagao para a produgao multissemidtica e a ampliagao da analise linguistica para contemplar outras semioses, fortalece esta concepgao. Ainda assim, verificamos uma lacuna ao sugerir, nesse Ambito. apenas a leitura/escuta de texto, 0 que poderia desconsiderar que ha também outras semioses envolvidas na leitura do texto, além da linguagem verbal - oral ou escrita. Entretanto, essa questao é corrigida ao explorar o eixo de leitura mais a frente, ao toma-la com um sentido mais amplo (Brasil 2017, p. 70). E levando er Ao explorar estes eixos vinculados as praticas de linguagem e suas dimensbes, fica mais evidente a ancoragem a concep¢a0 nectaae de linguagem, embora também possamos encontrar ae De um modo geral, podemos ressaltat S praticas de linguagem — leitura, produgao e andlise 5.5.05 Ca etalhadas do apitulos 6 a 10 deste Livro apresentam uma andlise mais d ¢ livro apresenta amento dado a lingual aera 7m) em cada ci e la cixo de ensino (oralidade, leitura/escula rodugao textual ¢ Producao textual ¢ anilise linguistica/semistica) & £0) 'TORA MERCADO DE LETRAS - EDUCAGAO linguistica/semiotica — articuladas entre si, situadas socialmente, levando em conta as condi¢des de produgao e recepgdo de textos de diferentes géneros discursivos que circulam em diferentes campos/esteras de atividade humana, considerando, ainda, as questdes éticas, estéticas, politicas ¢ ideolégicas de interagao. A organiza¢ao do curriculo por meio da categoria campos de atuacdo, pode ser relacionada com a nogio de esferas de atividade humana, apresentada por Bakhtin: “Os campos de atuagao orientam a selegao de géneros, praticas, atividades e procedimentos em cada um deles” (Brasil 2017, p. 83). Chama a atengdo, ainda, que tais campos nao sao compreendidos de forma essencializada, mas se inter- relacionam, como acontece nas praticas sociais, dialogando com os pressupostos bakhtinianos. Por fim, antes de apresentar as habilidades para os diferentes niveis de ensino, o documento apresenta também uma lista de dez competéncias especificas para 0 componente curricular de LP para o Ensino Fundamental (Brasil 2017, p. 85). Ao analisa-las, percebemos que algumas das competéncias consideram, mesmo que algumas vezes, de modo limitado, a concep¢ao de linguagem como forma de interagao, em que a linguagem é compreendida de forma multifacetada, pressupondo um sujeito ativo, que pode interferir nas questdes ideoldgicas e de poder, conforme podemos verificar no Quadro 1: QUADRO 1 - Competéncias especificas de LP que consideram a linguagem como forma de interacao 1. | Compreender a lingua como fendmeno cultural, histérico, social, va- ridvel, heterogéneo e sensivel aos contextos de uso, reconhecendo-a como meio de construgao de identidades de seus usudrios e da comu- nidade a que pertencem. Apropriar-se da linguagem escrita, reconhecendo-a como forma de in- teragéio nos diferentes campos de atua¢ao da vida social e utilizando-a para ampliar suas possibilidades de participar da cultura letrada, de construir conhecimentos (inclusive escolares) e de se envolver com maior autonomia € protagonismo na vida social. UMA LEITURA CRITICA DA BASE NACIONAL COMUM CURRICULAR 9 remarcnrsienianioeetnnitie etn | variedade e 0 estilo de linguagen, oo ial rye) interlOCutOr'es) © 20 gener, 5. T cmprepar, nas interacdes 50 ae paituacao comunicativr adequados | “ /gonero textual | do discurso! - — mentow © opines Manifestados em inter et posicionando-se ética € cr. de comunicagao, Posi nteuidos discriminatorios que ferem direitos | Analisar informacoes, 4! 6 os meios des sociais € nos M | ticamente em relacae 4 ce humanos e ambientals- SS SaeaeTEISssiees ETERS. 3 gociacao de [ Reconhecer o texto como lugar de manifestagao e negociacao de sen. econhece! | tidos, valores e ideologias- ee eee ey %, Fonte: Organizado pelos autores: Mas também podemos verificar algumas incoeréncias coma ainda que algumas possam ser, em alguma discussdo apresentada. : E 0 que podemos medida. corrigidas por outras competéncias. perceber na CL3: “Ler, escutar € produzir textos orais. escritos e multissemidticos que circulam em diferentes campos de atuagdo @ midias, com compreensao, autonomia, fluéncia e€ criticidade, de modo a se expressar e partilhar informagdes, experiéncias, ideias e sentimentos. e continuar aprendendo” (Brasil 2017, p. 85). Embora considere as multissemioses, os diferentes campos de atuagao e as diferentes midias, ha um problema no para que ler, escutar e produzir textos. ao utilizar as palavras expressar @ — as quais se vinculam as duas primeiras concepgdes de linguagem apresentadas - como expressdo de pensamento e como instrumento de comunicagdo porque reduzem essas praticas ao ato de exteriorizar i itis ¢ exteriorizar ideias (expressar) e emitir mensagem (partilhar — que difere de compartilhar). Do mesmo moi 7 sel do, embora a CLS aborde o posicionament0 Hat ) me que se refere a discriminagao, ao tratar 4 questo da variagao linguistica, na CL r necessidade de respeitar e rejeitar entanto, -4, 0 documento salienta 4 Preconceitos linguisticos. N° se entendem is compreendemos ea linguagem nos pressupostos bakhtinianos- $ variedades linguisticas (inclusive a norma Considerada culta) sto manifest agdes da lingua q culta) sa nifestacdes da lingua em ue uso e A 90 fo : TTORA MERCADO DE LETRAS ~ EOUCAGAO legitimo utilizd-las em determinados contextos de produgdo e recepcao, situadas nas diferentes esferas de atividade humana. Isso pressupde mais que respeitar e rejeitar preconceitos linguisticos, mas também evidenciar as relagdes ideolégicas Por tras do uso da lingua. Por mais que os alunos respeitem e evitem estes preconceitos, eles proprios podem ser vitimas de desrespeito e de preconceito. Por isso, ha a necessidade de conscientizar sobre estas questdes. Na CLP9, como ja enfatizado anteriormente, podemos verificar que as praticas de leitura literdria focalizam a questo do senso estético e da fruigao, desconsiderando a literatura como jogo de linguagem que também age sobre o mundo. Também a CLP10 traz uma incompletude ao apresentar a competéncia: “Mobilizar praticas da cultura digital, diferentes linguagens, midias e ferramentas digi is para expandir formas de produzir sentidos (nos processos de compreensio e produgao), aprender a refletir sobre 0 mundo e realizar diferentes projetos autorais.” (Brasil 2017, p. 85). Se consideramos esta competéncia, em relag&o 4 concepgao de linguagem enfocada, junto 4 concepgdo de educagao subjacente a definigao das competéncias gerais, verificamos uma lacuna importante: a possibilidade de agir sobre 0 mundo, para ent&o transforma-lo. De um modo geral, entendemos que as discussdes apresentagdes referentes a area de Linguagens ¢ do componente curricular de LP contemplam os pressupostos bakhtinianos, ao partir de uma concepgao dialégica € interacionista de linguagem. No entanto, percebemos uma grande limitagao na defini¢ao das competéncias, o que pode ser considerado um problema, dado a relevancia desta definigéo em um documento de carater normativo. Ainda assim, é importante ressaltar que, comparada a competéncia geral que remete a linguagem, a qual nao da conta da interagao, ha um grande avango nas definigdes das competéncias da area de linguagens e do componente curricular de LP. n UMA LEITURA CRITICA DA BASE NACIONAL COMUM CURRICULAR Consideragoes: finais A partir da andlise empreendida neste capitulo, buscamos if go de linguagem presente na Base Nacional Comum Curl (BNCC) que sujee 2 ensino de Lingua Portuguesa. Evidenciamos que @ BNCC pce diversas al buscam dialogar € aproximar 0 ensing atualizagdes importantes que : y de LP com as mudangas contemporaneas, especialmente, para dar is TDIC. priticas de linguagem V inculadas A vista disso, percebemos que © caminho ainda € longo, Ao .s lacunas presentes no documento, que é basilar para a educagao b: apés mais de trinta anos do inicio das discussées tedrico-metodolégicas que concebem a lingua(gem) de forma dialégica e interacionista, e quase vinte anos depois da publicagao do primeiro documento que considerou essa concepgao de linguagem ~ os PCN (Brasil 1998) — podemos perceber o grande desafio que € aproximar a pratica pedagégica as orientagdes da BNCC (Brasil 2017). uma vez que apresenta lacunas no que concerne a maneira como compreende o trabalho com a lingua(gem). Essa constatagao aponta para a necessidade de agdes governamentais, no que diz Tespeito ao investimento em formag¢ao continuada de professores, a fim de que se garanta uma compreensao sélida do trabalho sob um Viés dialégico e interacionista no ensino de LP. sobre a concer refletir icular conta das olharmos para a Referéncias ANTUNI é be Irande (2014). Gramdtica contextualizada: limpando 0 PO das ideias simples, Sao Paulo: Parabola Editorial. BAKHTIN, Mil aepoLay M. € VOLOCHINOY, Valentin N: ). Marxismo e filosofia da linguagem. Traduzido oA Ei . DITORA MERCADO DE LETRAS - EDUCAGAQ. por Michel Lahud e Yara Frateschi Vieira, 16" ed. Sao Paulo: Hucitec. ; BRASIL (2017). Base Nacional Comum Curricular, Brasilia: MEC. Disponivel em: http://basenacionalcomum.mec.gov. br/, Acesso em: 01/05/2019, i __. 2013a). Diretrizes Curriculares Nacionais Gerais da Educaydo Basica, Brasilia: MEC/SEB/DICEL. __. (2013b). Caderno de Educaydo em Direitos Humanos: Diretrizes Nacionais. 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