Você está na página 1de 214

Formação da Sociedade

Brasileira
Prof. Fábio Roberto Tavares

2014
Copyright © UNIASSELVI 2014

Elaboração:
Prof. Fábio Roberto Tavares

Revisão, Diagramação e Produção:


Centro Universitário Leonardo da Vinci – UNIASSELVI

Ficha catalográfica elaborada na fonte pela Biblioteca Dante Alighieri


UNIASSELVI – Indaial.

981.041
O48p Tavares, Fábio Roberto
Formação da sociedade brasileira / Fábio Roberto Tavares.
Indaial : Uniasselvi, 2014.

204 p. : il

ISBN 978-85-7830-846-9

1. Brasil – Sociedade. 2. História do Brasil.


I. Centro Universitário Leonardo da Vinci.
Apresentação
A sociedade brasileira é complexa, rica em nuances, em
caracterizações que são muito peculiares. E na história da colonização,
os povos que aqui vieram, os povos que já aqui moravam, contribuíram,
cada um à sua maneira, para a formação da sociedade brasileira. É isso que
queremos estudar nesse caderno.

A população brasileira é resultado de uma miscigenação cultural


complexa, em que é possível perceber a presença de pessoas de diferentes
origens no que tange à raça, ou ao povo e suas influências para essa
miscigenação tão peculiar. Para sermos justos com a nossa história, vamos
iniciar com as populações indígenas.

As populações indígenas/nativas, as quais não existiram somente


enquanto povo para facilitar a exploração e a fixação no território, e os
escravos negros, que foram trazidos da costa ocidental da África para servir
ao trabalho nas atividades agrícolas e mineradoras, existiam enquanto
populações possuidoras/elaboradoras de conhecimento, cultura, identidade,
memória e experiências de resistência.

Mesmo não tendo acesso e garantias iguais às benesses do Estado e da


sociedade ocidental civilizada nos aspectos políticos, jurídicos, econômicos,
educacionais, estas populações conseguiram se posicionar e criar, mesmo
paralelamente, um espaço em que suas manifestações e anseios sociais não
fossem solapados no interior de suas comunidades.

A dignidade, a liberdade, a livre expressão, a igualdade de direitos,


os diferentes, diversos e complexos traços em seus perfis, as vozes, os anseios
e sonhos de todos os povos devem ser contemplados e ser considerados
nos conteúdos curriculares, projetos e políticas públicas dos governos, de
maneira a atender às expectativas intrinsecamente ligadas à busca pela
autorrealização, emancipação e exercício pleno dos direitos na sociedade.
Tudo isso queremos estudar na primeira unidade do nosso caderno, e ainda
verificar como o país vai se formando no que hoje ele é, passando pelas
formas de governo que caracterizaram o nosso Estado.

Na Unidade 2 vamos conhecer o Brasil através de suas identidades


regionais, como se desenvolveram, suas contribuições em diferentes campos,
como, por exemplo, a economia e a cultura. A partir dessa visão regional,
podemos então estudar o Brasil e seu sistema econômico, a divisão nacional
do trabalho, as organizações e instituições, a burocracia, enfim, entender o
Brasil como nação.

Para concluir esse caderno, vamos, na terceira unidade, estudar


as urgências que os indivíduos e a sociedade desenvolvem na atualidade:

III
direitos humanos, redes sociais, a confiança no indivíduo, uma economia
voltada para o bem social e para a solidariedade e o desenvolvimento
consciente do meio ambiente.

A partir de uma visão globalizada, o Brasil é visto hoje como uma


nação em desenvolvimento e, por isso, grandes oportunidades se apresentam
quando o governo, o terceiro setor e o setor privado se unem no esforço do
trabalho conjunto. Cada um, com sua contribuição muito específica, tornará
o Brasil uma nação mais homogênea, não no sentido de uniformidade, porém
mais unida em torno daquilo que é o bem comum.

Prof. Fábio Roberto Tavares

NOTA

Você já me conhece das outras disciplinas? Não? É calouro? Enfim, tanto para
você que está chegando agora à UNIASSELVI quanto para você que já é veterano, há
novidades em nosso material.

Na Educação a Distância, o livro impresso, entregue a todos os acadêmicos desde 2005, é


o material base da disciplina. A partir de 2017, nossos livros estão de visual novo, com um
formato mais prático, que cabe na bolsa e facilita a leitura.

O conteúdo continua na íntegra, mas a estrutura interna foi aperfeiçoada com nova
diagramação no texto, aproveitando ao máximo o espaço da página, o que também
contribui para diminuir a extração de árvores para produção de folhas de papel, por exemplo.

Assim, a UNIASSELVI, preocupando-se com o impacto de nossas ações sobre o ambiente,


apresenta também este livro no formato digital. Assim, você, acadêmico, tem a possibilidade
de estudá-lo com versatilidade nas telas do celular, tablet ou computador.
 
Eu mesmo, UNI, ganhei um novo layout, você me verá frequentemente e surgirei para
apresentar dicas de vídeos e outras fontes de conhecimento que complementam o assunto
em questão.

Todos esses ajustes foram pensados a partir de relatos que recebemos nas pesquisas
institucionais sobre os materiais impressos, para que você, nossa maior prioridade, possa
continuar seus estudos com um material de qualidade.

Aproveito o momento para convidá-lo para um bate-papo sobre o Exame Nacional de


Desempenho de Estudantes – ENADE.
 
Bons estudos!

IV
V
VI
Sumário
UNIDADE 1 - SURGE UMA NAÇÃO................................................................................................ 1

TÓPICO 1 - FORMAÇÃO DO POVO BRASILEIRO...................................................................... 3


1 INTRODUÇÃO.................................................................................................................................... 3
2 SURGIMENTO DO POVO BRASILEIRO..................................................................................... 3
3 OS INDÍGENAS.................................................................................................................................. 6
3.1 ASPECTOS HISTÓRICOS............................................................................................................. 7
3.2 ASPECTOS RELIGIOSOS.............................................................................................................. 7
3.3 ASPECTOS CULTURAIS............................................................................................................... 8
3.4 AS POPULAÇÕES INDÍGENAS HOJE....................................................................................... 9
4 GRUPOS EUROPEUS......................................................................................................................... 11
5 GRUPOS AFRODESCENDENTES.................................................................................................. 14
5.1 BREVE HISTÓRIA DA ÁFRICA.................................................................................................. 15
5.2 ASPECTOS HISTÓRICOS............................................................................................................. 15
5.3 A EXPERIÊNCIA DA ESCRAVIDÃO.......................................................................................... 18
6 CULTURA AFRO-BRASILEIRA....................................................................................................... 21
6.1 ASPECTOS RELIGIOSOS.............................................................................................................. 22
6.2 ASPECTOS CULTURAIS............................................................................................................... 27
6.3 A PARTICIPAÇÃO NA HISTÓRIA DO BRASIL....................................................................... 32
LEITURA COMPLEMENTAR.............................................................................................................. 34
RESUMO DO TÓPICO 1...................................................................................................................... 36
AUTOATIVIDADE................................................................................................................................ 37

TÓPICO 2 - UM PAÍS VAI SE FORMANDO.................................................................................... 39


1 INTRODUÇÃO.................................................................................................................................... 39
2 O SUBDESENVOLVIMENTO E O DESENVOLVIMENTO...................................................... 40
3 MODERNIZAÇÃO.............................................................................................................................. 42
LEITURA COMPLEMENTAR.............................................................................................................. 44
RESUMO DO TÓPICO 2...................................................................................................................... 46
AUTOATIVIDADE................................................................................................................................ 47

TÓPICO 3 - FORMAS DE GOVERNO............................................................................................... 49


1 INTRODUÇÃO.................................................................................................................................... 49
2 CAPITANIAS........................................................................................................................................ 52
3 IMPÉRIO............................................................................................................................................... 53
4 REPÚBLICA.......................................................................................................................................... 58
RESUMO DO TÓPICO 3...................................................................................................................... 65
AUTOATIVIDADE................................................................................................................................ 66

UNIDADE 2 - CONHECENDO O BRASIL CONTEMPORÂNEO............................................... 67

TÓPICO 1 - A QUESTÃO REGIONAL NO BRASIL...................................................................... 69


1 INTRODUÇÃO.................................................................................................................................... 69
2 REGIÃO CENTRO-OESTE................................................................................................................ 70
2.1 CARACTERIZAÇÃO GERAL...................................................................................................... 70

VII
2.2 FORMAÇÃO SOCIOCULTURAL................................................................................................ 71
2.3 ECONOMIA.................................................................................................................................... 73
3 REGIÃO NORDESTE......................................................................................................................... 75
3.1 CARACTERIZAÇÃO GERAL...................................................................................................... 75
3.2 FORMAÇÃO SOCIOCULTURAL................................................................................................ 76
3.3 ECONOMIA.................................................................................................................................... 78
3.4 OUTRAS QUESTÕES..................................................................................................................... 79
4 REGIÃO NORTE................................................................................................................................. 79
4.1 CARACTERIZAÇÃO GERAL ....................................................................................................... 80
4.2 FORMAÇÃO SOCIOCULTURAL.................................................................................................. 81
4.3 ECONOMIA...................................................................................................................................... 83
5 REGIÃO SUDESTE............................................................................................................................. 85
5.1 CARACTERIZAÇÃO GERAL...................................................................................................... 85
5.2 FORMAÇÃO SOCIOCULTURAL................................................................................................ 87
5.3 ECONOMIA.................................................................................................................................... 88
6 REGIÃO SUL........................................................................................................................................ 90
6.1 CONTEXTUALIZAÇÃO GERAL............................................................................................... 90
6.2 FORMAÇÃO SOCIOCULTURAL................................................................................................ 91
6.3 ECONOMIA.................................................................................................................................... 92
6.4 OUTRAS QUESTÕES..................................................................................................................... 94
6.4.1 A mais segura......................................................................................................................... 94
6.4.2 A mais alfabetizada............................................................................................................... 94
6.4.3 Onde mais se lê...................................................................................................................... 94
6.4.4 O melhor sistema de saúde.................................................................................................. 94
LEITURA COMPLEMENTAR.............................................................................................................. 95
RESUMO DO TÓPICO 1...................................................................................................................... 98
AUTOATIVIDADE................................................................................................................................ 99

TÓPICO 2 - PANORAMA ECONÔMICO: “PRA FRENTE BRASIL”.......................................... 101


1 INTRODUÇÃO.................................................................................................................................... 101
2 O SISTEMA ECONÔMICO.............................................................................................................. 101
3 A DIVISÃO NACIONAL DO TRABALHO................................................................................... 104
3.1 SETOR PRIMÁRIO......................................................................................................................... 104
3.2 SETOR SECUNDÁRIO.................................................................................................................. 107
3.3 SETOR TERCIÁRIO........................................................................................................................ 108
LEITURA COMPLEMENTAR.............................................................................................................. 111
RESUMO DO TÓPICO 2...................................................................................................................... 115
AUTOATIVIDADE................................................................................................................................ 116

TÓPICO 3 - ESPAÇOS E ATORES POLÍTICOS............................................................................... 117


1 INTRODUÇÃO.................................................................................................................................... 117
2 CONFERÊNCIAS DE POLÍTICAS PÚBLICAS............................................................................. 117
3 ORGANIZAÇÃO SOCIAL: NOVO ATOR POLÍTICO E ECONÔMICO................................ 120
3.1 HISTÓRICO .................................................................................................................................... 121
3.2 REALIDADE DAS ORGANIZAÇÕES SOCIAIS NO BRASIL................................................ 122
4 MOVIMENTO DOS SEM TERRA (MST): MOVIMENTO
ANTIGO, PARADIGMAS RENOVADOS..................................................................................... 123
5 AS ORGANIZAÇÕES NÃO GOVERNAMENTAIS (ONG)...................................................... 125
LEITURA COMPLEMENTAR.............................................................................................................. 128
RESUMO DO TÓPICO 3...................................................................................................................... 131
AUTOATIVIDADE................................................................................................................................ 132

VIII
UNIDADE 3 - A SOCIEDADE BRASILEIRA E SUAS INFLUÊNCIAS...................................... 133

TÓPICO 1 - NOVOS CONCEITOS?................................................................................................... 135


1 INTRODUÇÃO.................................................................................................................................... 135
2 OS CONCEITOS – SOCIEDADE, INDIVÍDUO, COMUNIDADE.......................................... 136
3 CARACTERÍSTICAS DA SOCIEDADE CONTEMPORÂNEA BRASILEIRA....................... 148
4 PERFIL SOCIAL................................................................................................................................... 150
LEITURA COMPLEMENTAR.............................................................................................................. 152
RESUMO DO TÓPICO 1...................................................................................................................... 157
AUTOATIVIDADE................................................................................................................................ 158

TÓPICO 2 - A SOCIEDADE E NOVAS REALIDADES.................................................................. 159


1 INTRODUÇÃO.................................................................................................................................... 159
2 GLOBALIZAÇÃO E A ÉTICA........................................................................................................... 160
3 CONHECIMENTO E A INFORMAÇÃO........................................................................................ 166
4 NOVA DINÂMICA CULTURAL E SOCIAL?................................................................................ 173
LEITURA COMPLEMENTAR.............................................................................................................. 175
RESUMO DO TÓPICO 2...................................................................................................................... 177
AUTOATIVIDADE................................................................................................................................ 178

TÓPICO 3 - OS DESAFIOS CONTINUAM...................................................................................... 179


1 INTRODUÇÃO.................................................................................................................................... 179
2 A IMPORTÂNCIA DOS DIREITOS HUMANOS
NA FORMAÇÃO DA SOCIEDADE................................................................................................ 180
2.1 OS PRIMEIROS PASSOS................................................................................................................ 180
2.2 NA IDADE MÉDIA COM O CRISTIANISMO........................................................................... 181
2.3 NA IDADE MODERNA COM OS RACIONALISTAS............................................................. 182
2.4 NA FRANÇA EM 1789.................................................................................................................. 182
2.5 APÓS A SEGUNDA GUERRA MUNDIAL................................................................................ 183
3 O SER HUMANO NO SÉCULO XXI............................................................................................... 185
4 AS RELAÇÕES INTERPESSOAIS E DIREITOS HUMANOS NO TRABALHO................... 186
5 A SOCIEDADE QUE QUEREMOS – NOVOS DESAFIOS........................................................ 188
RESUMO DO TÓPICO 3...................................................................................................................... 194
AUTOATIVIDADE................................................................................................................................ 195
REFERÊNCIAS........................................................................................................................................ 197

IX
X
UNIDADE 1

SURGE UMA NAÇÃO

OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM
Esta unidade tem por objetivos:

• estudar como se forma o povo brasileiro, seus diferentes grupos que aqui
já moravam e também os grupos que vão se estabelecer no país no início
da colonização;

• entender como o país vai se formando através da história por meio dos
seguintes aspectos: desenvolvimento e modernização;

• conhecer os diferentes tipos de governo adotados no Brasil, capitanias,


império, república, e suas características.

PLANO DE ESTUDOS
Esta unidade está dividida em três tópicos, sendo que em cada um deles você
encontrará atividades visando à compreensão dos conteúdos apresentados.

TÓPICO 1 – FORMAÇÃO DO POVO BRASILEIRO

TÓPICO 2 – UM PAÍS VAI SE FORMANDO

TÓPICO 3 – TIPOS DE GOVERNO

1
2
UNIDADE 1
TÓPICO 1

FORMAÇÃO DO POVO BRASILEIRO


A solidariedade entre os povos só se realiza
compartilhando a aventura, bela e perigosa,
da transformação do mundo.
(Eduardo Galeano)

1 INTRODUÇÃO
Vivemos. Por que vivemos? Para que vivemos? Estes são alguns dos tantos
questionamentos com os quais nos deparamos em nossa vida.

O pensar nem sempre está presente em nossas vidas. Nos tempos atuais,
os cidadãos não primam pelo pensar, como acontecia nos tempos de Sócrates,
de Platão, dos padres da Igreja, da Escola de Frankfurt e tantos outros lugares e
momentos que honravam o pensar e tudo o que podia advir desse ato tão ousado,
como o simples pensar.

Queremos estudar, no primeiro tópico desta unidade, a formação do povo


brasileiro, assim como o povo indígena, os primeiros moradores “oficiais” de
nossas terras; também o conceito de sociedade, sua evolução, e os grupos que vão
compor esta sociedade.

Vamos aos estudos, com coragem e livre pensar.

2 SURGIMENTO DO POVO BRASILEIRO


Nativo, segundo consta na maioria dos dicionários, é aquele que vive
onde nasceu, que cresce no mesmo local em que veio à vida, que é ali no lugar em
que a vida se desenvolve. Como sinônimo, temos autóctone, que vai além, porque
acrescenta as gerações que permanecem no mesmo lugar em que nasceram. A
palavra surgimento nos aponta que algo surge, algo aparece, algo se desenvolve.

Para falarmos do povo brasileiro, não há como não apresentar aqui os


indígenas como indicativo do povo brasileiro, devido à evidente presença dos
diferentes povos que aqui se faziam presentes quando do “descobrimento do
país” pelos povos europeus.

É a partir disso que vamos, então, estudar o surgimento do povo brasileiro.

3
UNIDADE 1 | SURGE UMA NAÇÃO

UNI

Neste link você vai encontrar um pequeno vídeo que conta abreviadamente a
formação do povo brasileiro. Acesse: <http://agfdsd.blogspot.com.br/2011_04_01_archive.html>.

FIGURA 1 – FORMAÇÃO DO POVO BRASILEIRO

FONTE: Disponível em: <http://pontoecontraponto.com.br/?p=6261>. Acesso


em: 8 out. 2013.

A expressão que afirma que o Brasil é um país de dimensões continentais


é bastante comum. Parecem normais, então, os vários tipos de povos e de
convivências decorrentes do contato desses povos que aqui vêm povoar. O
primeiro contato entre os indígenas e os europeus dá indícios da singularidade
que se tornará o povo brasileiro.

No artigo do professor B. Fausto temos, de forma sintética, a descrição dos


primeiros habitantes de nossas terras. Serve como introdução do ponto que vem
a seguir, sobre os povos indígenas.

4
TÓPICO 1 | FORMAÇÃO DO POVO BRASILEIRO

PRIMEIROS HABITANTES

Antes da chegada dos portugueses ao Brasil já existiam pessoas


habitando esse território, que tanto impressionou os lusos em sua chegada.
Esses primeiros moradores dessa região tão rica eram os índios, um povo
com uma cultura singular, totalmente diferente da europeia.

Dados da Fundação Nacional do Índio (Funai) indicam que os


índios sul-americanos foram originados de povos caçadores vindos da
América do Norte. Os índios ocupavam, além da Amazônia, a costa
brasileira e a bacia dos rios Paraná-Paraguai, sendo divididos em dois
grandes blocos, conforme características culturais e linguísticas: os tupis-
guaranis e os tapuias. Grande parte das informações existentes sobre
a população indígena veio dos relatos feitos pelos portugueses, que
diferenciavam os índios como positivos ou negativos conforme o grau de
resistência que apresentavam.

Os tupis-guaranis, assim denominados pela semelhança de


cultura e língua, ocupavam quase toda a costa brasileira, desde o Ceará
até o extremo sul, sendo que os tupis, também chamados de tupinambás,
ficavam na faixa litorânea do norte até a atual região sul de São Paulo, e
os guaranis localizavam-se na bacia Paraná-Paraguai até o extremo sul.

Tapuias era uma denominação genérica usada pelos tupis-


guaranis para identificar outros grupos indígenas, como os goitacazes,
que habitavam a foz do rio Paraíba, os aimorés, localizados no sul da
Bahia e no norte do Espírito Santo, e os tremembés, presentes na faixa
entre o Ceará e o Maranhão.

A cultura indígena variava entre os grupos existentes. Os aimorés,


por exemplo, se destacaram pela eficiência militar e pelo canibalismo,
enquanto os tupinambás comiam os inimigos apenas por vingança e
viviam da caça, da pesca, coleta de frutas e da agricultura. Cada aldeia
produzia para a própria subsistência, havendo poucas trocas de alimentos
entre as tribos. Por outro lado, existiam muitos contatos para troca de
mulheres, bens de luxo (penas, pedras etc.) e para estabelecer alianças
para guerra e captura de inimigos.

Por sua cultura e pela própria resistência que empreenderam aos


portugueses (não apenas física, mas principalmente por meio de fugas e
deslocamentos), os índios não foram escravizados, foram aculturados e,
por muitas vezes, mortos tanto por violência quanto por doenças trazidas
pelos brancos. A exploração do trabalho indígena, no período chamado
de pré-colonial (entre 1500 e 1530), foi feita através do escambo (troca do
trabalho por mercadorias) e a relação deles com os portugueses gerou a
população conhecida como mestiça.

5
UNIDADE 1 | SURGE UMA NAÇÃO

Embora não existam dados concretos com relação à quantidade de


índios presentes no território brasileiro antes da chegada dos portugueses,
cálculos estimam uma população que varia entre 1 a 10 milhões de
habitantes, número que atualmente está entre 300 e 800 mil.

FONTE: FAUSTO, B. História concisa do Brasil. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 2002.

3 OS INDÍGENAS
É comum a população indígena ser identificada como uma população
preguiçosa, selvagem e desalmada, ou por serem os responsáveis por negociar
riquezas naturais brasileiras por quinquilharias e bugigangas da indústria
europeia. Por outro lado, também são reconhecidos pela prática de poligamia,
costume que permite a convivência de um homem com mais de uma mulher, ou
ainda pelo exotismo e excepcionalidade de sua produção artesanal, musical e
arte corporal. Isso se dá diante do fato de que as referências para compreensão
destas populações são a partir do referencial etnocêntrico da cultura europeia,
ocidental, cristã/católica.

FIGURA 2 – INDÍGENAS

FONTE: Disponível em: <http://fabiopestanaramos.blogspot.com.br/2010/09/historia-indigena-


na-america-portuguesa.html>. Acesso em: 8 out. 2013.

Porém, a complexidade das referências e relações culturais deste povo


carece de um esforço reflexivo e compreensivo que ultrapasse a visão imediatista
e superficial que se possui, para conseguir perceber a importância e a contribuição
da cultura indígena/nativa para a formação do povo brasileiro nos aspectos
históricos, religiosos e culturais.

6
TÓPICO 1 | FORMAÇÃO DO POVO BRASILEIRO

3.1 ASPECTOS HISTÓRICOS


O contato do homem branco com o indígena, no Brasil, pode ser entendido
a partir da seguinte sequência: o primeiro contato, a colonização, a dizimação e o
período pós-colonização.

O processo de aculturação europeia foi responsável pelo desequilíbrio


e desorganização tanto da vida econômica como social no interior das tribos
indígenas. Doenças transmissíveis como a cárie, doenças venéreas, práticas como
o estupro, aproveitamento do conhecimento e da mão de obra na exploração das
riquezas naturais, ocupação e ampliação do território fazem parte desse processo.

Por outro lado, existiu a experiência das missões jesuíticas, que foi
menos agressiva e consistia na formação de aldeias indígenas organizadas e
administradas por padres católicos jesuítas. O objetivo principal das missões
era o de criar uma sociedade dentro dos cânones europeus de civilidade e
religiosidade católico-cristã. No entanto, os padres jesuítas utilizavam a mão de
obra dos nativos também nas atividades agrícolas e artesanais.

3.2 ASPECTOS RELIGIOSOS


No aspecto religioso é possível constatar que é comum nas tribos
indígenas a crença em um ser superior. Definir a religiosidade indígena é um
tanto difícil, pelo fato de serem muitas tribos diferentes e porque viviam em
constante movimento em busca de meios de sobrevivência. De acordo com
Prezia (2012, p. 28),

a ideia de Deus perpassa todas as religiões indígenas. Muitos desses


povos têm a noção de um Deus criador, mas de um Deus que cria
e, em seguida, se afasta, intervindo no mundo através de entidades
espirituais ou heróis civilizadores, isto é, humanos com grandes
poderes. Outras vezes esse herói é também o ancestral de um povo.

Foi exatamente neste aspecto que os europeus foram compreendidos/


interpretados pelos povos nativos, foram confundidos com entidades
espirituais, e com suas roupas e artefatos foram vistos como humanos de
grandes poderes, partindo daí o processo de colonização e exploração para
com as populações nativas.

Outro elemento importante na religiosidade dos indígenas é a presença


dos astros e elementos da natureza, como se estes fossem espíritos regidos por uma
divindade. A maneira como cada tribo trata desses mitos apresenta semelhanças
e diferenças, pois a religiosidade está diretamente ligada às experiências
vivenciadas no decorrer do tempo. Em determinadas tribos os pajés têm uma
função sacerdotal, pois ele é o responsável pelos rituais religiosos e mediador
entre a tribo e seus deuses.

7
UNIDADE 1 | SURGE UMA NAÇÃO

Os indígenas criaram seus mitos e lendas para explicar sua origem, seus
rituais religiosos e seus deuses. Existem mitos que se referem aos elementos
agrícolas, que se explicam à origem e à finalidade de tais alimentos e seu
simbolismo. Outro elemento importante na religiosidade dos indígenas é a
presença dos astros e elementos da natureza, como o Sol, a chuva, as estrelas, a
Lua, os relâmpagos, e demais forças e manifestações da natureza.

A realização de rituais antropofágicos que incluíam a prática de canibalismo


foi o que mais impressionou e fez com que os navegadores europeus realmente
temessem as populações nativas. Esta prática era típica das populações das tribos
Tupinambás, que se localizavam na região do litoral do Nordeste brasileiro.

Não se pode deixar de destacar também as reduções como expressão de


organização indígena, mesmo que coordenadas pelos jesuítas. A organização,
a socialização, o desenvolvimento e a partilha de conhecimento indígena
e jesuíta são marcantes em nossa história. Aqui cabe destacar a relação de
obediência que se estabelece entre o indígena e o jesuíta na redução, pois
“nenhuma tirania moderna, nenhum teórico da ditadura, do proletariado,
ou do Estado totalitário, chegou sequer a vislumbrar a possibilidade desse
prodígio de racionalização que conseguiram os padres da Companhia de
Jesus em suas missões” (HOLANDA, 2007, p. 31).

UNI

Para compreender melhor essa enculturação jesuítica e os conflitos entre jesuítas,


colonizadores e indígenas no século XVIII, veja o filme A MISSÃO.
Direção: Roland Joffé.
Produção: Fernando Ghia e David Puttnam.
BrasilFilmsInternational, 1986, 1 DVD.

3.3 ASPECTOS CULTURAIS


As práticas alimentares de raízes, tubérculos, sementes, legumes, peixes,
pequenos animais e aves silvestres. A prática de acúmulo de matérias-primas,
de capital, é típica da cultura europeia, enquanto a tradição indígena se encontra
voltada somente às necessidades e sobrevivência imediata do grupo.

A combinação de tecnologias da cultura europeia e da cultura indígena


pode ser observada no engenho de farinha de mandioca. Neste se identifica a
estrutura do engenho à base de madeira e modelos tecnológicos europeus e a
adaptação da técnica de cestaria, para confeccionar a prensa de tipiti, que consiste
em um cesto de taquaras/bambu para depositar e prensar a massa da mandioca.
A imagem abaixo ilustra a adaptação destas tecnologias.

8
TÓPICO 1 | FORMAÇÃO DO POVO BRASILEIRO

FIGURA 3 – ENGENHO DE FARINHA DE MANDIOCA

FONTE: Disponível em: <http://www.velhobruxo.tns.ufsc.br/imagpag/Engenho1.jpg>.


Acesso em: 31 jul. 2013.

As atividades de cestaria, cerâmica, escultura em madeira, argila, artefatos


e utensílios com o uso de fibras, sementes, tintas naturais, danças, rituais circulares,
canções e pinturas culturais eram comuns aos indígenas. O banho diário também
é reconhecido como contribuição da cultura indígena. Além disso, a prática da
medicina natural a partir da manipulação de ervas, raízes, resinas, entre outros.

3.4 AS POPULAÇÕES INDÍGENAS HOJE


Estima-se que, antes do contato intensivo com navegadores e exploradores
europeus, período anterior ao século XV, a população indígena/nativa variava de
1 milhão a 10 milhões de habitantes, distribuídos em diversas tribos e aldeias.
Hoje, conforme as informações da Funai (2012), meio século depois, conta-se com
aproximadamente 800 mil indígenas.

9
UNIDADE 1 | SURGE UMA NAÇÃO

FIGURA 4 – INDÍGENA

FONTE: Disponível em: <http://g1.globo.com/vestibular-e-educacao/noticia/2012/04/escolas-


usam-tecnologia-para-fugir-do-estereotipo-sobre-cultura-indigena.html>. Acesso em: 31 jul.
2013.

Houve um crescimento significativo desde o Censo de 2000, que apontava


uma população em torno de 700 mil habitantes indígenas, 12,5%. A pesquisa
do Censo do IBGE apresenta uma distinção para uma melhor compreensão do
universo indígena. Sendo que as informações fornecidas trazem sua identificação
étnica, localização, seja em terras indígenas, seja no meio urbano, integrados na
polis, seja no meio rural, já desenvolvendo uma agricultura nos moldes capitalistas,
e também aquelas pessoas que se declaram indígenas, mas que já estão integradas
ao modo de vida contemporâneo, com todas as suas características diferentes
daquelas do índio de aldeia.

Acerca das principais etnias indígenas brasileiras na atualidade


e população estimada, os dados apontam que existem os Ticunas, com
aproximadamente 35.000 integrantes; Guaranis, com 30.000; Caigangues,
com 25.000; Macuxis, com 20.000; Terenas, com 16.000; Guajajaras, com
14.000; Xavantes, com 12.000; Ianomâmis, com 12.000; Pataxós, com 9.700;
Potiguaras, com 7.700.

FONTE: Adaptado de: <http://wilsonpicler.blogspot.com.br/2013_04_01_archive.html>. Acesso


em> 13 nov. 2013.

10
TÓPICO 1 | FORMAÇÃO DO POVO BRASILEIRO

FIGURA 5 – ARCO E FLECHA – MODALIDADE DOS JOGOS INDÍGENAS

FONTE: Disponível em: <http://www.brasilescola.com/educacaofisica/jogos-dos-povos-


indigenas.htm>. Acesso em: 30 jul. 2013.

UNI

1- Confira as condições atuais da população indígena brasileira através do


site da Fundação Nacional do Índio (Funai). Disponível em: <http://www.funai.gov.br/>.

2- Confira a Declaração da ONU para os Direitos dos Povos Indígenas. Disponível em:
<http://www.cimi.org.br/pub/publicacoes/1191526307_Encarte299.pdf>.

3- Visite o site e o espaço do Museu do Índio. Disponível em: <http://www.museudoindio.


org.br/>.

4- Procure ver o filme “Caramuru: a invenção do Brasil” (2001), dirigido e escrito por
Guel Arraes e Jorge Furtado, que aborda o relacionamento entre navegadores europeus
e nativos brasileiros, sobressaindo-se a imagem de indígena ingênuo e destituído de
cultura. Por outro lado, o longa metragem valoriza os aspectos de troca e cooperação
cultural entre ambos.

4 GRUPOS EUROPEUS
Para introduzirmos este ponto que trata da imigração europeia no Brasil,
o artigo a seguir apresenta, de forma resumida, desde o início dessa imigração
até o desfecho de grandes grupos vindos da Europa no período das duas grandes
guerras. O que temos depois disso é o fluxo praticamente normal de imigração,
sem grandes volumes de pessoas cruzando o Atlântico para as nossas terras.
11
UNIDADE 1 | SURGE UMA NAÇÃO

RESUMO DA HISTÓRIA DA IMIGRAÇÃO NO BRASIL

A imigração no Brasil teve início em 1530, com a chegada dos


colonos portugueses, que vieram para cá com o objetivo de dar início ao
plantio de cana-de-açúcar. Durante todo o período colonial e monárquico,
a imigração portuguesa foi a mais expressiva.

Nas primeiras décadas do século XIX, imigrantes de outros países,


principalmente europeus, vieram para o Brasil em busca de melhores
oportunidades de trabalho. Compravam terras e começam a plantar para
sobreviver e também vender em pequenas quantidades. Aqueles que
tinham profissões (artesãos, sapateiros, alfaiates etc.) na terra natal abriam
pequenos negócios por aqui.

No começo da década de 1820, muitos imigrantes suíços se


estabeleceram na cidade de Nova Friburgo (Estado do Rio de Janeiro).
Neste mesmo período, os alemães começaram a chegar a Santa Catarina e
ao Rio Grande do Sul. Estes imigrantes passaram a trabalhar em atividades
ligadas à agricultura e à pecuária.

Já os italianos, que vieram em grande quantidade para o Brasil,


foram para a cidade de São Paulo, trabalhar no comércio ou na indústria.
Outro caminho tomado por eles foi o interior do Estado de São Paulo, para
trabalharem na lavoura de café, que estava começando a ganhar fôlego em
meados do século XIX.

Já os japoneses começaram a chegar ao Brasil em 1908. Grande parte


destes imigrantes foi trabalhar na lavoura de café do interior paulista, assim
como os italianos. Por que estes imigrantes vieram para o Brasil?

No século XIX, o Brasil era visto na Europa e na Ásia


(principalmente Japão) como um país de muitas oportunidades. Pessoas
que passavam por dificuldades econômicas enxergaram uma ótima
chance de prosperarem no Brasil. 

Vale lembrar também que, após a abolição da escravatura no Brasil


(1888), muitos fazendeiros não quiseram empregar e pagar salários aos ex-
escravos, preferindo assim o imigrante europeu como mão de obra. Neste
contexto, o governo brasileiro incentivou e chegou a criar campanhas para
trazer imigrantes europeus para o Brasil.

Muitos imigrantes também vieram para cá fugindo do perigo


provocado pelas duas grandes guerras mundiais que atingiram o
Continente Europeu.

FONTE: Disponível em: <http://www.historiadobrasil.net/imigracao/>. Acesso em: 8 out. 2013.

12
TÓPICO 1 | FORMAÇÃO DO POVO BRASILEIRO

Quando queremos considerar a chegada de outros povos além daqueles


que já viviam por aqui, os indígenas em suas diferentes etnias, podemos identificar
um pequeno número que estava por aqui a serviço das feitorias e do comércio
do pau-brasil para Portugal. Estes foram estabelecendo relações com algumas
tribos indígenas que permitiram a miscigenação muito peculiar do Brasil, já nos
seus primórdios, que juntamente com outras características, sejam culturais,
religiosas, sociais, foram se desenvolvendo somente nestas paragens, como bem
descreve Holanda (2007, p. 31):

a tentativa de implantação da cultura europeia em extenso território,


dotado de condições naturais, se não adversas, largamente estranhas
à sua tradição milenar, é, nas origens da sociedade brasileira, o
fato dominante e mais rico em consequências. Trazendo de países
distantes nossas formas de convívio, nossas instituições, nossas
ideias, e timbrando em manter tudo isso em ambiente muitas vezes
desfavorável e hostil, somos ainda hoje uns desterrados em nossa terra.
Podemos construir obras excelentes, enriquecer nossa humanidade de
aspectos novos e imprevistos, elevar à perfeição o tipo de civilização
que representamos: o certo é que todo o fruto de nosso trabalho ou de
nossa preguiça parece participar de um sistema de evolução próprio
de outro clima e de outra paisagem.

A instalação das capitanias hereditárias vai facilitar a distribuição territorial


do Brasil entre os portugueses. Por vários motivos, apenas algumas regiões vão ter
um desenvolvimento significativo.

Com o cultivo da cana-de-açúcar, já temos os camponeses, grupos mais


abastados, que, por causa das plantações de cana, precisavam trazer consigo
valores para tal empreendimento. Estas famílias de nível econômico elevado
vão se instalar nas áreas rurais para o desenvolvimento da agricultura. A única
realidade comum por todo o país é a escravidão tanto de negros africanos, já a
partir da segunda metade de 1500, quanto de indígenas.

13
UNIDADE 1 | SURGE UMA NAÇÃO

FIGURA 6 – ENGENHO DE CANA-DE-AÇÚCAR

FONTE: Disponível em: <http://www.historiabrasileira.com/brasil-colonia/ciclo-da-cana-


de-acucar/>. Acesso em: 8 out. 2013.

Com o desenvolvimento da cultura da cana-de-açúcar, teremos a presença


de portugueses e também de holandeses, que vão auxiliar na comercialização
da cana-de-açúcar no Continente Europeu. Já nesse período da cana-de-açúcar,
percebe-se a limitação no trabalho indígena, por motivos óbvios que não cabe
aqui desenvolvê-los. Por isso, a urgência em intensificar o tráfico de negros para
essa cultura e para os outros ciclos que virão.

A mineração vai exigir ainda mais mão de obra escrava e haverá um


deslocamento do desenvolvimento regional. Se a cana-de-açúcar desenvolveu-se
principalmente na região Nordeste, com destaque para os estados do Maranhão e
Bahia, a mineração vai concentrar-se na região Sudeste, com destaque para Minas
Gerais. Enquanto que a vinda de negros africanos vai multiplicando, o número
de europeus, principalmente portugueses, também cresce, mas não com tanta
expressão. Açorianos também vão chegando e colonizando o litoral sul do Brasil.

5 GRUPOS AFRODESCENDENTES
Com este texto propõe-se abordar aspectos históricos, religiosos e
culturais das populações africanas, na tentativa de contribuir na divulgação e
reconhecimento da formação da cultura brasileira e dos demais povos. Além
disso, pretende-se favorecer a construção de relações étnico-sociais harmônicas,
respeitosas e positivas, rumo à construção de uma nação democrática e tolerante,
apontando a tolerância e convivência respeitosa diante da diversidade cultural
nos espaços de trabalho e sociabilidade, no interior de organizações, espaços
públicos, privados, empresas, escolas. Com isso, disponibilizam-se elementos
que possam nortear aspectos de gestão humana nos espaços de trabalho.

14
TÓPICO 1 | FORMAÇÃO DO POVO BRASILEIRO

5.1 BREVE HISTÓRIA DA ÁFRICA


É fato que a história da África e da cultura africana têm sido
negligenciadas nos espaços de sociabilidade, na produção e divulgação do
conhecimento, bem como em movimentos de expressão artístico-cultural.
Porém, ela é facilmente lembrada e utilizada em programas e reportagens
que exploram a visão da África e da cultura africana através das riquezas
naturais favoráveis a safáris e a temporadas de férias, bem como aos aspectos
exóticos e excepcionais presentes nas vestimentas, religiosidade, música,
danças, entre outros.

Por outro lado, ocorrem também a negligência e o descaso com


informações históricas com relação aos vestígios mais longínquos da presença
pré-humana e humana enquanto forma de sobrevivência, fabricação de
utensílios e inscrições rupestres que resistem no sul do continente. Todo esse
legado foi deixado pela civilização egípcia, situada na região nordeste, e não
no Oriente Médio, como é comumente confundido.

5.2 ASPECTOS HISTÓRICOS


A história da África conta com elementos e aspectos que remontam à pré-
história, sendo este continente considerado o berço da humanidade, pelo fato de
que os vestígios arqueológicos do gênero humano mais antigos são encontrados
no Continente Africano. A evolução iniciou com o Australopithecus (homem/
macaco do sul), cujos vestígios e contextos datam de aproximadamente 4.000
anos atrás. Em seguida surge o Homo erectus (homem ereto), e os representantes
de nossa espécie Homo sapiens (homem que sabe), que se espalharam pelos
demais continentes. A África também é considerada o berço da civilização, por
suas populações realizarem atividades como de agricultura, criação de animais,
metalurgia de ferro, e estabeleceram relações comerciais com as regiões e
continentes próximos.

Desde a Antiguidade o Continente Africano foi muito procurado, por


representar um espaço e território de forte comércio, pois se localiza entre as
rotas do Mar Vermelho e Mar Mediterrâneo, caminhos para embarcações e
caravanas entre a Europa e a Ásia. Eram comuns as trocas de técnicas e produtos
entre as aldeias e a migração de povos de uma região a outra.

15
UNIDADE 1 | SURGE UMA NAÇÃO

FIGURA 7 – MAPA DA ÁFRICA

FONTE: Disponível em: <http://civilizacoesafricanas.blogspot.com.br/2010/04/o-intercambio-


entre-as-regioes.html>. Acesso em: 8 out. 2013.

Com a intensificação da presença europeia, a partir do século XIV


passam a ser explorados principalmente os produtos que representavam fonte
de matérias-primas e produtos de alto valor comercial, como o ouro, cobre,
marfim, sal, noz-cola, escravos, armas, pimentas, vestimentas, artesanatos, entre
outros produtos naturais. As transações comerciais são comumente indicadas
como as grandes responsáveis por causar os maiores impactos e interferências no
sentido da violência, desorganização e acirramento dos conflitos no interior das
comunidades africanas.

Conforme descreve Cordova (2010), a organização social dos africanos antes


da colonização/exploração europeia se encontrava dividida em aldeias, reinos,
confederações, cidades e grupos seminômades e nômades. As aldeias representavam
a formação sociopolítica mais comum no continente, onde o modo de subsistência
predominante era a caça, coleta e o plantio.

16
TÓPICO 1 | FORMAÇÃO DO POVO BRASILEIRO

FIGURA 8 – CAMPO DE PLANTIO

FONTE: Disponível em: <http://fernandonaescola.blogspot.com.br/2012/08/kilimanjaro-20-de-


agosto-de-2007.html>. Acesso em: 8 out. 2013.

As aldeias constituíam unidades políticas formadas por famílias, sendo


lideradas por um chefe responsável pela distribuição de terras e a aplicação da
justiça. As confederações, por sua vez, eram resultantes da associação de várias
aldeias articuladas e que obedeciam a um conselho de chefes. Os povos nômades
geralmente eram constituídos por caçadores e coletores que viviam nas florestas,
ou pastores seminômades no interior dos desertos. O fato de serem nômades de
certa forma favorecia a desarticulação política.

A formação das cidades vai acontecendo a partir das transações comerciais


que se estabeleciam entre os povos africanos. Nelas viviam comerciantes e, nos
seus arredores, agricultores e pastores. As cidades costumavam apresentar muros
de pedra, terra ou paliçada, o que lhes conferia um aspecto de segurança. Os
reinos eram caracterizados pela existência de um chefe maior que administrava,
da capital do reino, a justiça, as forças militares, o comércio e a expansão territorial.
Nas capitais havia a concentração de riquezas e de poder.

17
UNIDADE 1 | SURGE UMA NAÇÃO

5.3 A EXPERIÊNCIA DA ESCRAVIDÃO


Entre os anos de 1520 até 1870, várias regiões da África forneceram
escravos para as atividades de exploração nas Américas. Antes deste período, os
africanos escravizados eram destinados à Europa.

FIGURA 9 – PRINCESA ISABEL E A LEI ÁUREA

FONTE: Disponível em: <http://www.revistadehistoria.com.br/secao/dossie-


imigracao-italiana/sempre-na-berlinda>. Acesso em: 8 out. 2013.

A estratégia para a captação de escravos era a aplicação de punições aos


crimes, entre eles pode-se relacionar: assassinato, agressão armada, adultério,
furto e feitiçaria e contração de dívidas. As circunstâncias e contextos de guerras
internas e a fome favoreciam o acondicionamento de escravos. As guerras
internas também ocorriam com a finalidade de raptar mulheres e os conflitos
entre estados visavam também à incorporação de povos e aplicação de tributos.
Por sua vez, a fome impelia o povo africano a vender a si mesmo e a sua família
em troca de mantimentos. A imagem abaixo ilustra os africanos capturados sendo
transportados para serem negociados.

18
TÓPICO 1 | FORMAÇÃO DO POVO BRASILEIRO

FIGURA 10 – AFRICANOS CAPTURADOS

FONTE: Disponível em: <http://t3.gstatic.com/images?q=tbn:ANd9GcTOCAKiYTZ3YxkxogGT


1vVPv6w6LGuPcBCnCuAH0IQGFMGSukL>. Acesso em: 20 jul. 2012.

As primeiras levas foram organizadas pelos espanhóis e eram destinadas


a trabalhar nas recém-descobertas minas de Prata no Peru. Em seguida, inicia-se
o desembarque de africanos para atender à produção de açúcar no Brasil e no
Caribe. Posteriormente, foram responsáveis pelo cultivo do tabaco na Bahia e
pelo tabaco e algodão nas colônias inglesas da América do Norte. Depois, o ouro
e diamante no Brasil e, mais à frente, o café, que por muito tempo foi a principal
fonte de riqueza na economia brasileira.

UNI

Assista ao filme O Jardineiro Fiel, dirigido por Fernando Meirelles, 2005. Cor.
Adaptado do romance de mesmo nome escrito por John Le Carré, em 2001.
O filme aborda a problemática do descaso com relação à população africana através da
história de um diplomata britânico e uma ativista para direitos humanos no interior da África,
que identificam a estratégia de laboratórios farmacêuticos que se utilizam da população,
em condições paupérrimas e sem o consentimento das mesmas, como cobaias para testar
medicamentos.

Para melhor entendermos esse fluxo migratório entre as colônias e as


metrópoles a partir do século XVI até o século XVIII, o artigo que segue descreve
essa realidade a partir do viés econômico escravocrata.

19
UNIDADE 1 | SURGE UMA NAÇÃO

COLONIZAÇÃO E IMIGRAÇÃO AFRICANA

O tráfico internacional de escravos da África subsaariana para o


Brasil foi um movimento migratório, embora forçado. Seu início ocorreu na
segunda metade do século XVI, e desenvolveu-se no século XVIII, atingiu
seu ápice por volta de 1845 até ser bruscamente extinto em 1850. Foi,
certamente, a maior migração forçada da história mundial.

O tráfico negreiro foi uma atividade altamente lucrativa e legal,


que pagava impostos tanto para a Coroa portuguesa quanto para a Igreja
Católica (dízimo). O tráfico negreiro iniciou-se oficialmente em 1559, quando
a metrópole portuguesa decidiu permitir o ingresso de escravos vindos
da África no Brasil. Antes disso, porém, transações envolvendo escravos
africanos já ocorriam no Brasil, sendo a escassez de mão de obra um dos
principais argumentos dos colonos.

A escravidão era utilizada nas mais desenvolvidas sociedades da


África Subsaariana antes mesmo do início do tráfico negreiro para as Américas.
Escravos negros eram comumente transportados através do Saara e vendidos
no norte da África por mercadores muçulmanos. Estes escravos podiam ser
pessoas capturadas nas guerras tribais, escravizadas por dívidas não pagas
ou mesmo filhos de outros escravos por várias gerações. A necessidade de
trabalhadores escravos na América aumentou a procura de escravos, de
modo que passaram a serem organizados grupos que entravam pelo interior
da África Subsaariana com o único propósito de capturar pessoas de outras
nações para serem vendidas como escravos nos portos do litoral.

A maior parte dos escravos africanos provinha de lugares como Angola,


Guiné, Benin, Nigéria e Moçambique. Os traficantes trocavam os escravos
por produtos como fumo, armas e aguardente. Os escravos comprados
eram transportados nos chamados navios negreiros, principalmente para as
cidades do Rio de Janeiro, Salvador, Recife e São Luís. As péssimas condições
sanitárias existentes nas embarcações, que vinham superlotadas, faziam com
que muitos escravos morressem; entretanto, a maior parte das mortes ocorria
no transporte desde o local de captura até o porto africano de embarque.
Quando desembarcavam em solo brasileiro, os escravos africanos ficavam
de quarentena, enquanto recuperavam a saúde e engordavam para serem
vendidos em praça pública. A maior parte ainda viajava a pé para as regiões
mais distantes do interior onde havia minas ou plantações.

Os escravos homens, jovens, mais fortes e saudáveis, eram os mais


valorizados. Havia um grande desequilíbrio demográfico entre homens
e mulheres na população de escravos. No período 1837-1840, os homens
constituíam 73,7% e as mulheres apenas 26,3% da população escrava. Além
disto, os donos de escravos não se preocupavam com a reprodução natural
da escravaria, porque era mais barato comprar escravos recém-trazidos

20
TÓPICO 1 | FORMAÇÃO DO POVO BRASILEIRO

pelo tráfico internacional do que gastar com a alimentação de crianças. Em


relação à grande quantidade de escravos que aqui chegaram, a sociedade
brasileira tem até poucos de seus descendentes.

Ao todo, entraram no Brasil aproximadamente quatro milhões de


africanos na forma de escravos.

FONTE: Disponível em: <http://www.universitario.com.br/noticias/n.php?i=8054>. Acesso em: 8 out. 2013.

6 CULTURA AFRO-BRASILEIRA
A totalidade da formação étnica brasileira aponta para a diversidade, que é
resultante de uma ampla e longa combinação e recombinação entre negros, brancos
e amarelos, bantos, iorubás, nagôs, tupinambás, guaranis, carijós, portugueses,
alemães, italianos, japoneses, árabes e tantos outros. E reside exatamente nesta
vasta possibilidade de combinação e miscigenação o reconhecimento pela riqueza
peculiar da cultura brasileira.

A história através da imagem nos dá algumas pistas da distinção do


trabalho do negro homem e da mulher negra neste período:

FIGURA 11 – TRABALHO DA MULHER NEGRA

FONTE: Disponível em: <http://historiofobia.blogspot.com.br/2011/05/o-lugar-do-negro-na-


sociedade.html>. Acesso em: 8 out. 2013.

Conforme Cordova (2010), o Brasil recebeu aproximadamente 4 milhões


de africanos. Além do Nordeste, regiões como a Amazônia, desde o século XVII,
o Rio Grande do Sul, a partir do XVIII, empregaram trabalhadores negros no
regime de escravidão, nas mais diversas atividades dentro da sociedade colonial,

21
UNIDADE 1 | SURGE UMA NAÇÃO

entre elas a criação de gado, lavouras de açúcar, tabaco, algodão, arroz, anil, entre
outros produtos agrícolas. Será neste contexto que se formarão os quilombos.

Melo (2010, p. 33) explica que os quilombos constituíram agrupamentos


negros rurais, suburbanos e urbanos, não somente como fuga ou resistência direta
ao sistema vigente, mas como uma espécie de ‘busca espacial’, numa perspectiva
dinâmica, na construção de um território social e histórico, através da manutenção
e reprodução de um modo de vida culturalmente próprio.

O quilombo mais expressivo foi o Quilombo de Palmares, organizado no


interior da Bahia, que existiu ao longo dos séculos XVI e XVII. Era composto por
vários núcleos de povoamento, chamados de mocambos. Os principais foram:
Subupira, Macaco e Zumbi. De acordo com historiadores, o Quilombo de Palmares
reuniu de 15 a 20 mil quilombolas na segunda metade do século XVII. Em seu
interior era praticada a agricultura de subsistência e a confecção de artesanatos. A
organização interna se encontrava centralizada na figura de um líder, semelhante
aos reinos na África. Os líderes que se destacaram foram Ganga Zumba e Zumbi.

As populações que habitavam estas regiões são chamadas de quilombolas.


Quilombolas são descendentes de africanos escravizados que mantêm tradições
culturais, de subsistência e religiosas, ao longo dos séculos em uma determinada
região. Hoje, mais de 1.500 comunidades remanescentes de quilombos se
encontram espalhadas pelo território nacional e recentemente foram certificadas
e reconhecidas pela Fundação Palmares, órgão do Governo Federal.

6.1 ASPECTOS RELIGIOSOS


Na África a religião ocupa lugar central na cultura, representa a esfera de
onde vem toda a orientação para a vida cotidiana, a garantia do bem-estar, da
harmonia e da saúde. Nos ritos, o sobrenatural é acionado por especialistas que
dominam os conhecimentos necessários para que as entidades do além pudessem
ajudar a solucionar questões como doenças, amansar senhores, conquistar o sexo
oposto, fechar o corpo contra agressões e fazer adivinhações.

Outras vezes, o acesso às informações sobrenaturais se dava pela leitura


dos indícios do além, por meio dos oráculos que se utilizavam de pedras, contas,
conchas, cabaças com conteúdos misteriosos, bacias de água, entre outros, para
as consultas. Cordova (2010) escreve que conforme o resultado das consultas,
certas medidas deveriam ser tomadas para que os objetivos fossem alcançados,
e poderiam ser compostos de bebidas, extratos de plantas, penas de animais,
secreções, entre outros.

No Brasil, as religiões foram misturadas e adaptadas a ritos e crenças


praticados por portugueses e nativos indígenas. Os termos Umbanda e
Candomblé são utilizados para designar as religiões que cultuam ancestrais e
espíritos da natureza, com forte presença de elementos das religiões indígenas e
do espiritismo europeu.
22
TÓPICO 1 | FORMAÇÃO DO POVO BRASILEIRO

FIGURA 12 – CAMDOMBLÉ

FONTE: Disponível em: <http://www.girafamania.com.br/tudo/religiao_candomble.html>.


Acesso em: 8 out. 2013. Acesso: 8 out. 2013.

UNI

Neste link você encontra a descrição bem detalhada sobre as comunidades


indígenas que vivem na área urbana. Disponível em: <http://g1.globo.com/brasil/
noticia/2012/08/mais-de-324-mil-indios-brasileiros-vivem-em-area-urbana-diz-ibge.html>.
Acesso em: 17 nov. 2013.

Os terreiros que abrigam candomblés e umbandas são espaços que


reforçam as características da cultura africana, através da arquitetura, vestimentas
utilizadas, comidas e bebidas consumidas, músicas e danças realizadas. Os Orixás
são entidades ancestrais e heróis divinizados fundadores de linhagens, reinos e
cidades-estados, sendo não só a origem da organização social e política, como
aqueles que orientam toda a ação dos homens em sua vida terrena.

Na sua maioria, têm um dia de comemoração, uma ou mais cores


características que podem variar conforme o grupo pesquisado, um elemento de
distinção, um planeta e até um paralelo com um santo católico.

Os principais Orixás cultuados são:

Oxalá: soberano e criador de todos os seres humanos. É o grande


representante da paz. Sua cor predominante é o branco com tons azulados.
23
UNIDADE 1 | SURGE UMA NAÇÃO

FIGURA 13 – OXALÁ

FONTE: Disponível em: <http://amorumbandista.blogspot.com.br/2012/09/oracao-ao-nosso-


pai-oxala.html>. Acesso em: 19 nov. 2013.

Xangô: divindade dos raios, relâmpagos e trovões. Suas cores são o cinza,
roxo e a determinante é o marrom, e seus elementos são o ar e a terra. Podemos
observar que as cores, na maioria das vezes, combinam com os elementos
representados.

FIGURA 14 – XANGÔ

FONTE: Disponível em: <http://www.brasilescola.com/religiao/xango.htm>. Acesso em: 11 nov. 2013.

24
TÓPICO 1 | FORMAÇÃO DO POVO BRASILEIRO

Ogum: divindade do ferro e dos ferreiros, deus das guerras. Suas cores
são o branco e o vermelho, com o fogo como elemento.

FIGURA 15 – OGUM

FONTE: Disponível em: <http://juntosnocandomble.blogspot.com.br/2012/06/ogum-chama-


morte-para-ajuda-lo-numa.html>. Acesso em: 11 nov. 2013.

Iansã: como vimos até agora, a maioria dos orixás é do sexo masculino.
Como a imagem nos diz muito, Iansã é guerreira, como muitos orixás, mensageira,
guardiã dos templos, das casas e das pessoas. Suas características são muito
peculiares, por exemplo, ela concentra três elementos – ar, água e fogo - e atua
nos fenômenos da natureza de forma geral.

FIGURA 16 – IANSÃ

FONTE: Disponível em: <http://www.olhosdebastet.com.br/textos/IANS%C3.htm>. Acesso em: 11 nov. 2013.

25
UNIDADE 1 | SURGE UMA NAÇÃO

Iemanjá: divindade das águas salgadas, suas cores são o azul claro e o branco
transparente, como óbvio relacionado à sua divindade, o seu elemento é a água.

FIGURA 17 – IEMANJÁ

FONTE: Disponível em: <http://www.portalangels.com/oracoes/wp-content/uploads/2011/10/


iemanja2.jpg>. Acesso em: 11 nov. 2013.

Oxum: divindade das águas doces. Sua cor inicial é o cobre, por ser um
metal nobre, porém o ouro pode ser considerado também sua cor predominante,
junto com o azul claro.

Ibeji: divindade das brincadeiras, da infância e da fecundidade.

26
TÓPICO 1 | FORMAÇÃO DO POVO BRASILEIRO

FIGURA 18 – IBEJI

FONTE: Disponível em: <http://pt.fantasia.wikia.com/wiki/Ib%C3%AAji>. Acesso em: 11 nov. 2013.

Oxóssi: é comum os orixás emanarem energias de diferentes matizes. Oxóssi


também emana energia voltada para a saúde. Suas cores são o verde e o branco, e
representa o elemento terra.

Conforme Monteiro (1987), o catolicismo e o islamismo também foram


crenças difundidas entre os grupos africanos. De devoção católica e africana, podem
ser relacionados Nossa Senhora do Rosário, Santa Efigênia, São Benedito, Nosso
Senhor do Bonfim, Santo Antônio e São Jorge. O islamismo inicialmente chegou
ao Brasil através dos negros trazidos para serem trabalhadores escravizados. A
grande maioria era alfabetizada em árabe. Estes trabalhadores ofereceram maior
resistência às formas de escravidão e à violência praticada pelos senhores.

6.2 ASPECTOS CULTURAIS


As manifestações culturais, tais como os aspectos religiosos, também
resultam de misturas mais antigas e complexas, incorporando elementos das
culturas indígena, portuguesa e iorubá. Na medida em que o africano foi sendo
inserido na sociedade brasileira, foi se tornando afro-brasileiro. Lopes (2006, p. 15)
define que o termo “afro-descendente” é uma expressão modernamente usada para
designar o indivíduo descendente de africanos, em qualquer grau de mestiçagem.

27
UNIDADE 1 | SURGE UMA NAÇÃO

FIGURA 19 – SOCIEDADE AFRO-BRASILEIRA

FONTE: Disponível em: <http://maricotinhadhodhia.blogspot.com.br/>. Acesso


em: 11 nov. 2013.

Além dos traços físicos e marcas genéticas nas feições da população, a


música e a culinária podem ser relacionadas como as manifestações culturais que
mais se evidenciaram e foram incorporadas à cultura brasileira como um todo.

A música africana influenciou fortemente a música contemporânea, tanto


a popular quanto a erudita, entre elas estão os ritmos populares como o samba,
a rumba, a salsa, o jazz e o calipso. Os principais instrumentos utilizados são o
berimbau, o tambor, o agogô e o reco-reco, sendo que os instrumentos e os estilos
trazidos pelos europeus, como a viola e o cavaquinho, combinados num mesmo
contexto, tornaram possível a invenção de novos estilos e gêneros.

28
TÓPICO 1 | FORMAÇÃO DO POVO BRASILEIRO

FIGURA 20 – INSTRUMENTOS AFRICANOS

FONTE: Disponível em: <http://cultura-afro-brasileira-adriani.blogspot.com.br/2010/11/


instrumentos-musicais.html>. Acesso em: 19 nov. 2013

Cordova (2010) observa que o rap, que traz ritmos marcados e repetidos,
mais a palavra fraseada, rimada e cantada, remetem às características da
musicalidade africana. Esta narrativa e musicalidade, na maioria das vezes,
acabam por denunciar a opressão e a marginalização sofrida por mestiços e
negros nos grandes centros urbanos das cidades.

FIGURA 21 – PRINCIPAIS INSTRUMENTOS UTILIZADOS

FONTE: Disponível em: <http://georesumos.blogspot.com.br/>. Acesso em: 11 nov. 2013

29
UNIDADE 1 | SURGE UMA NAÇÃO

Os estilos de dança, como as congadas, maracatus, capoeiras e reisadas,


também podem ser relacionados. A capoeira, por exemplo, pode ser entendida como
um jogo, luta, dança, música, ritmo, ginga, movimentação, roda e até confecção de
instrumentos. Consiste numa luta dançada com dois antagonistas que dão golpes
de pernas e cabeça, usando as mãos como apoio, saltando de um lado para outro.

FIGURA 22 – CAPOEIRA

FONTE: Disponível em: <http://grupovirver.blogspot.com.br/2010/02/capoeira.html>.


Acesso em: 19 nov. 2013.

Exemplares da culinária africana encontram-se representados pelos pratos


como o acarajé, vatapá, caruru, aluá, ximxim de galinha, mugunzá, feijoada, entre
outros. Estes são facilmente encontrados no Estado da Bahia, onde a pimenta e o
azeite de dendê são amplamente utilizados.

Outros aspectos da cultura material foram confeccionados por ferreiros,


mineiros, oleiros, tecelões, escultores. Entre os povos africanos, a confecção de
esculturas e máscaras representa uma das expressões, pois eram comumente
utilizadas em rituais religiosos. Diferente das concepções artísticas ocidentais,
a arte africana está fundamentada na religiosidade, onde o artista não trabalha
expressando a individualidade, e sim a coletividade, o artista interpreta os
valores de sua cultura. Os principais materiais utilizados são a madeira, terracota,
a pedra, o marfim, o ouro, o cobre e o bronze.

30
TÓPICO 1 | FORMAÇÃO DO POVO BRASILEIRO

A presença africana se encontra na língua portuguesa e no vocabulário, em


verbos como: cochichar, cochilar, fungar, xingar, zangar, beijar; os substantivos:
bagunça, cachaça, caçula, cafuné, quitute; adjetivos como: capenga, dengoso,
encabulado, zonzo, entre outros. Existem também as lendas, como a do Saci-
Pererê e a do Menino do Pastoreio. E as danças como o Bumba meu boi e/ou Boi-
bumbá. Existe a festa popular da Amazônia, o Boi de Parintins, que incorporou
elementos indígenas.

FIGURA 23 – BOI CAPRICHOSO/BOI DE PARINTINS

FONTE: Disponível em: <http://feambra.blogspot.com.br/2011/06/festival-de-


parintins-i.html> Acesso em 12 jul. 2012.

31
UNIDADE 1 | SURGE UMA NAÇÃO

FIGURA 24 – SACI-PERERÊ

FONTE: Disponível em: <http://folclore.huum.com.br/2012/04/11/o-saci-perere/>.


Acesso em 12 jul. 2012.

UNI

Visite o Museu Afro Brasil. Localizado na Avenida Pedro Álvares Cabral, s/n –Parque Ibirapuera,
Portão 10, São Paulo/SP, ou acesse o site <http://www.museuafrobrasil.org.br/>.

6.3 A PARTICIPAÇÃO NA HISTÓRIA DO BRASIL


A história do Brasil se encontra marcada em diversos momentos e fatos
em que a população negra foi responsável e protagonista direta, como, por
exemplo, a Revolta do Malês (1835) ocorrida na Bahia; a Revolução Farroupilha
(1935-1845) no interior do Rio Grande do Sul, e na Guerra do Paraguai (1864-
1870). Posteriormente, conta-se com os fatos reconhecidos pela oficialidade,
como a Lei Eusébio de Queirós de 1850, Lei do Sexagenário de 1885, Lei do
Ventre Livre de 1871, Lei Áurea de 1888, todas inseridas no rol dos eventos em
prol da abolição da escravatura.

A Fundação Cultural Palmares, criada em 1988, instituição vinculada


ao Ministério da Cultura do Governo Federal, tem por finalidade promover e
preservar a cultura afro-brasileira. A data de 20 de novembro é considerada
como o Dia Nacional da Consciência Negra e se dá pelo fato de ser a provável
data da morte de Zumbi de Palmares, o principal líder do Quilombo de
32
TÓPICO 1 | FORMAÇÃO DO POVO BRASILEIRO

Palmares. Existem também ações e movimentos mobilizados por organizações


não governamentais, como é o caso da Selo Negro Edições, criada desde 1999
e voltada essencialmente para assuntos que dizem respeito à comunidade
afro-brasileira.

UNI

Acesse o site da Fundação Cultural Palmares <http://www.palmares.gov.br/>.


Confira o blog da ABRA (Organização Afro-brasileira): <http://abraong.blogspot.com.
br/2008/04/ong-afro-brasileira.html>.
Visite o site do grupo Summus/Selo Negro: <http://www.gruposummus.com.br/selonegro/
index.php>.

Porém, estes povos precisam de espaço reconhecido e consolidado


efetivamente, como contribuintes significativos na formação do povo brasileiro,
nas suas mais diversas manifestações e matizes. Melo (2010, p. 12) discute que:

pouco se fala da inclusão do negro no processo educacional, da


exclusão da classe trabalhadora dos meios acadêmicos, do preconceito
racial no processo educacional, da invisibilidade do negro nos meios
midiáticos, livros didáticos e paradidáticos, enfim, da formação,
passada e presente, do povo brasileiro.

Por fim, diante dos aspectos, problemáticas e reflexões arroladas até


aqui, surge o desafio de, no interior dos espaços produtivos, de trabalho e de
sociabilidade, reconhecer, gerir, favorecer e promover experiências tolerantes,
respeitosas, positivas e valorativas entre os indivíduos das mais diversas origens
étnico-raciais, no sentido de contemplar a pluralidade e a totalidade constitutiva
da população brasileira, apontando para a tão idealizada e almejada justiça social.

33
UNIDADE 1 | SURGE UMA NAÇÃO

LEITURA COMPLEMENTAR

NAÇÃO E POVO
Adriano Moreira

As palavras nação e povo são frequentemente empregadas como


sinônimos, talvez porque as relações entre a realidade que com elas se pretende
exprimir, e o poder político, nunca podem ser rigorosamente delimitadas, e as
fidelidades que este exige não apelam sempre para os mesmos valores. Nota
Shafer que, na Idade Média, um homem deveria sentir-se primeiramente cristão,
depois burguinhão, e finalmente francês, em sentido inteiramente diferente do
atual. A hierarquia das fidelidades foi alterada pelo tempo, ao menos no Ocidente,
de tal modo que a Nação se transformou num valor cimeiro determinante da
organização política, do direito internacional, e até de orientações ideológicas.
Mas continuamos a lidar com realidades chamadas globalmente Nação árabe,
assim como Gioberti fala da Nação europeia, outros em Nação eslava, sem que a
unidade política ou o sentimento popular cubram o fenômeno a que as expressões
se referem, e na tradição americana usa-se a expressão the Nation and the States
para designar uma comunidade nacional pluriestatal embora federativa. Daqui
resulta que a palavra povo tem aparentemente mais relação com a submissão
ao mesmo poder político, sem que necessariamente constitua uma Nação,
e esta é ainda a regra no mundo contemporâneo. O povo do Estado soberano
da Califórnia é parte da Nação americana, os povos dos Estados resultantes do
anticolonialismo moderno não são nações, e a Nação alemã esteve dividida em
dois Estados com o respectivo povo subordinado a fidelidades políticas diferentes.
Sendo certo que a Revolução Francesa de 1789 marca o início da importância
atual do princípio das nacionalidades, a hesitação da mudança encontra-se na
incerteza da linguagem com que divulgou os seus princípios. A Encyclopédie
tinha proposto, no século XVIII, que a expressão Nação designasse o conjunto
de povos submetidos ao mesmo governo, de modo que se tratava de uma síntese
que absorvia os regionalismos culturais e políticos, problemas que enfrentaram
as monarquias centralizadoras, e que constituem hoje objetivo fundamental dos
Estados que foram colônias das soberanias europeias. Mas a definição, nestes
termos, refere-se mais a um projeto nacional que anima um programa político,
do que a uma realidade cultural existente. Quando o artigo 3º da Declaração dos
Direitos do Homem e do Cidadão, de 1791, afirmou que "o princípio de toda a
soberania reside essencialmente na Nação", provavelmente ainda tinha em vista
o conjunto dos três estados representados na Constituinte, e não um corpo moral
com identidade, isto porque, nas constituições de 1793, do ano 111, do ano VIII,
de 1852, se fala na soberania do povo, e o povo é definido como a universalidade
dos cidadãos. O fundamental é, nesta fórmula última, a relação entre o poder
político e o conjunto das pessoas que abrange, não o é a natureza das relações que
eventualmente dão carácter nacional a tal conjunto de pessoas, porque o Estado

34
TÓPICO 1 | FORMAÇÃO DO POVO BRASILEIRO

pode ser multinacional, ou não corresponder a uma nacionalidade. Todavia, o


princípio das nacionalidades tomou-se num princípio guia do legado político
ocidental, o qual outras áreas culturais procuraram adoptar, de tal modo que
se reivindica que exista uma relação de coincidência entre a Nação e o Estado, e
apenas nessa hipótese se afirma que uma Nação é livre, em face da comunidade
internacional. É um problema diferente o de saber se os seus membros são livres
dentro do Estado, e aqui está a sede das questões referentes à participação na
direção política. Surgem, portanto, os problemas de saber o que é a Nação que
anima o princípio das nacionalidades independentes, porque é que tal princípio
se tomou dominante no legado político ocidental.

FONTE: Disponível em: <http://www.eselx.ipl.pt/ciencias-sociais/Temas/nacao_povo.htm>. Acesso


em: 17 set. 2013.

35
RESUMO DO TÓPICO 1
Neste tópico vimos:

• A importância para a história do Brasil dos grupos indígenas e afrodescendentes


a partir de sua cultura, seus costumes, seu trabalho, sua música e sua
religiosidade.

• A formação do povo brasileiro, com influências que vão além dos povos
europeus que aqui chegaram a partir de 1500.

36
AUTOATIVIDADE

1 Os trabalhadores africanos foram amplamente utilizados como mão de


obra escrava nas atividades agrícolas desenvolvidas na América, entre os
séculos XVI e XIX. Para dar conta da necessidade de abastecer o mercado
com escravos, diversas estratégias foram criadas. Relacione a seguir quais
foram estas estratégias.

2 A contribuição e a presença dos aspectos da cultura africana na sociedade


brasileira ficam evidentes na culinária, nas lendas, vocabulário, assim
como se encontram contribuições e participações em momentos da história
do país. Diante disto, relacione quais seriam os principais aspectos e
elementos que procedem da cultura africana.

37
38
UNIDADE 1
TÓPICO 2

UM PAÍS VAI SE FORMANDO

1 INTRODUÇÃO
Entender a formação da sociedade brasileira passa pela compreensão
de um país que precisa se desenvolver, e esse desenvolvimento passa, no
meu entendimento, também por uma economia forte tanto interna quanto
externamente, para poder crescer. O Brasil, desde o início, serviu para o
crescimento econômico de várias nações que viam aqui uma ‘galinha dos ovos
de ouro’ dividida em várias fases: o pau-brasil, a cana-de-açúcar, o ouro, o cacau.
Esta forma de exploração vai tornando o Brasil uma nação atrasada em seu
processo de industrialização em relação ao que se desenvolve já no século XVIII
em algumas nações da Europa. Somente no século XX é que vai se efetivando
uma indústria equivalente ao tamanho do país. Furtado (2006, p. 18) nos esclarece
esta questão, mencionando que:

As críticas à industrialização brasileira concentraram-se na denúncia


de uma suposta tendência à autarquia, à ineficiência, à falta de
competitividade externa e à estatização. Estes, diziam os detratores,
eram males congênitos do processo de substituição de importações. É
bom notar que muita gente já havia apontado a exaustão do chamado
“modelo de substituição de importações”, sublinhando, aliás, alguns
desafios importantes que estavam presentes nessa dinâmica: a) a
criação de instrumentos e instituições de mobilização da “poupança”
doméstica, particularmente para suportar o financiamento de longo
prazo; b) a reestruturação competitiva e a modernização organizacional
da grande empresa de capital nacional e de suas relações com o
Estado; c) a constituição de Fernando Fajnzylber chamava de “núcleo
endógeno de inovação tecnológica”.

Por que essa análise é importante? Porque sabemos de antemão que


para um país crescer é preciso se desenvolver, se modernizar, se autogerir. O
que vemos é uma situação preocupante, com a economia do país que sofre mais
que outros países com as influências do mercado externo e com os equívocos
realizados neste campo internamente. Este é um tema complexo, caro(a)
acadêmico(a), e que deve despertá-lo a acompanhar mais de perto os noticiários,
impressos, televisivos, livros que são vastos neste tema. E isto é o que vamos ver
de forma breve neste tópico.

39
UNIDADE 1 | SURGE UMA NAÇÃO

2 O SUBDESENVOLVIMENTO E O DESENVOLVIMENTO
País de terceiro mundo. País de primeiro mundo. País subdesenvolvido,
país emergente, país em desenvolvimento. Estas são expressões que ouvimos
corriqueiramente, não só nos meios acadêmicos ou na bolsa de valores. O Brasil já
se enquadra no grupo dos países em desenvolvimento. Bill Clinton, ex-presidente
dos Estados Unidos, reforça essa visão afirmando que o Brasil se caracteriza
pelo “rápido desenvolvimento”. Não vamos aqui apresentar as características do
país para enquadrá-lo neste grupo, mas sim, em noções gerais, estudar como a
economia no país se desenvolve para, assim, identificar se realmente estamos em
desenvolvimento. No quadro que segue temos o IDH – Índice de Desenvolvimento
Humano, com algumas características que indicam a posição do Brasil e seu
desenvolvimento humano em relação a um número determinado de países que
também têm esse levantamento.

UNI

Veja no quadro a seguir a posição na qual o Brasil se encontrava no ano de 2010


e faça uma comparação com outras nações que você conhece. Veja esses indicadores
– esperança de vida ao nascer, anos médios de estudo, anos esperados de escolaridade
e rendimento nacional bruto per capita, e faça um levantamento da sua própria situação
para identificar se você está na média do brasileiro.

QUADRO 1 – ÍNDICE DE DESENVOLVIMENTO HUMANO

Indicadores Brasil
IDH 0,699 (73º posição)
Esperança de Vida ao Nascer 72,9 anos
Anos Médios de Estudo 7,2 anos
Anos Esperados de Escolaridade 13,8 anos
Rendimento Nacional Bruto per capita US$ 10.607
FONTE: Disponível em: <http://3terceiravia.blogspot.com.br/2010_11_01_archive.html>. Acesso
em: 11 nov. 2013.

A globalização trouxe, por bem ou por mal, uma interdependência


entre os países e suas economias. Isso pode ser constatado com a crise de 2008,
nos Estados Unidos, pois esta se espalhou pelo Ocidente e também aqui em
nosso país. Agora, com a recuperação econômica dos Estados Unidos, estamos
também com sérias dificuldades, pois há uma desvalorização de nossa moeda em

40
TÓPICO 2 | UM PAÍS VAI SE FORMANDO

detrimento ao dólar. Em um primeiro olhar, o que isso indica? Que aqueles que
estavam atraídos em investir por aqui desviam suas intenções para o mercado
norte-americano, pela simples segurança que lhes é conferida. O que há de errado
conosco? De acordo com Furtado (2010, p.19):

Os ciclos de crescimento e desaceleração da economia brasileira ao


longo dos últimos 20 anos mostram uma tendência preocupante: a
partir dos anos 80, as taxas médias de crescimento caem sensivelmente,
as flutuações tornam-se mais intensas, e os surtos de expansão
mais curtos. O debate atual sobre o desenvolvimento brasileiro está
concentrado em demasia sobre as políticas macroeconômicas de
curto prazo, em prejuízo das investigações que tomem como guia
a “dinâmica das estruturas”, ou seja, as transformações financeiras,
tecnológicas, patrimoniais e espaciais determinadas pela interação
entre o centro hegemônico e as estratégias nacionais de “inserção” das
regiões periféricas.

FIGURA 25 – GLOBALIZAÇÃO

FONTE: Disponível em: <http://magicgracy.blogspot.com.br/>. Acesso em: 11 nov. 2013.

Sabemos, de antemão, que cada país tem suas características próprias de


cultura, educação, economia, e nem sempre a máxima de que se no “vizinho deu
certo, aqui também vai dar” é correta.

Quando falamos em indústria, lembramos rapidamente do Estado de


São Paulo, conjuntamente com o Estado do Rio de Janeiro, formando um eixo de
muitas indústrias que respondem por grande parte do que é produzido no Brasil.
Podemos também acrescer a esse grupo o Estado de Minas Gerais. Vamos ver mais

41
UNIDADE 1 | SURGE UMA NAÇÃO

adiante as diferentes regiões do país em alguns aspectos do seu desenvolvimento,


para entendermos sua importância dentro da conjuntura nacional.

Quando o Brasil assume o seu desenvolvimento, acabando com aquele


ciclo exploratório até meados do século XIX, começa a identificar quais são suas
demandas para um desenvolvimento consistente e o que pode obter aqui mesmo
para dar resposta a estas demandas. Hoje já se percebe uma pulverização positiva
de polos industriais de diferentes matizes pelo Brasil. Isso é muito positivo.

Não podemos deixar de salientar que existe, sim, uma grande


preocupação, já em nosso país e recorrente em tantos outros, principalmente
aqueles já desenvolvidos, sobre o esgotamento das chamadas fontes de recursos
naturais, mesmo no nosso país, “abençoado por Deus e bonito por natureza”.
Vamos estudar um pouco mais sobre essa temática nas próximas unidades.

Pensamento recorrente hoje é que os países com alto grau de


desenvolvimento souberam aproveitar e gerenciar seus recursos naturais quando
abundantes. Já o Brasil os está desperdiçando de maneira despreocupada,
justamente porque ainda acreditamos que estes recursos são inesgotáveis.

Outra discussão muito presente é o custo da previdência pública, já


deficitária no presente e altamente preocupante no futuro, quando se vislumbra,
no Brasil, uma população com idade superior aos 60 anos em franco crescimento.
Muito se discute aumentar a data limite para aposentadoria, aumentar o tempo
de contribuição etc. O que se constata, realmente, é que enquanto os países hoje
desenvolvidos enfrentam essa condição de ter uma população envelhecida, eles
construíram um grau de desenvolvimento que os mantêm sólidos, enquanto
que no Brasil falta muito para esse desenvolvimento e já estamos nesse processo
acelerado de envelhecimento. Além disso, em nossa cultura ocidental, quanto
mais velho, mais descartável.

Temos sinais positivos de mudança desse pensamento, quando vemos


pessoas de mais idade ainda na ativa, contribuindo para o crescimento do país,
seja na indústria, na agricultura ou na prestação de serviços. Outras mudanças
estão relacionadas ao avanço da medicina, à universalização de serviços essenciais
como esgoto, água potável etc. Todos estes fatores contribuem para a elevação da
expectativa de vida da população.

3 MODERNIZAÇÃO
A modernização de um país acontece não só no viés econômico. Ela deve
estar acompanhada de avanços também no campo social, político, enfim, no
que alcança o indivíduo e a sociedade. A modernização precisa englobar essas
características para se mostrar forte econômica e socialmente.

42
TÓPICO 2 | UM PAÍS VAI SE FORMANDO

Após a Proclamação da República, em meados do final do século XIX,


o Brasil estava apenas iniciando o desenvolvimento da sua indústria, com a
contribuição inglesa e também de imigrantes europeus.

Com a urbanização, já na metade do século XX, o país passa por um


acelerado e sólido processo de modernização, industrialização. A indústria vai
também se diversificando, mas sem abandonar sua proximidade com a agricultura
quando processa e industrializa o que ali é produzido.

Essa modernização econômica vai contribuir para avanços sociais desse


período que merecem destaque:

Uma infraestrutura que vai contribuindo para o bem-estar da população,


através do acesso à água, à eletricidade e aos meios de comunicação;

A educação vai se universalizando, contribuindo para a diminuição


do analfabetismo. Como consequência dessas melhorias, teremos o aumento
na expectativa de vida da população e também na diminuição da mortalidade
infantil. A partir desse período, em todos esses setores, o Brasil vai sempre
apresentar uma evolução com mais ou menos intensidade. Vide o caso da
educação, pois mesmo com bons investimentos, pecamos numa educação básica
de qualidade, num professorado bem remunerado, em agências governamentais
que não contribuem para uma educação de qualidade.

Podemos também salientar que esses avanços não aconteceram e ainda não
acontecem uniformemente, mas sim pontualmente, conforme as forças políticas
vão orientando a vontade dos governos de investimentos em determinadas
regiões. Vamos tratar um pouco mais sobre essas discrepâncias na próxima
unidade.

43
UNIDADE 1 | SURGE UMA NAÇÃO

LEITURA COMPLEMENTAR

PAÍSES EMERGENTES

A expressão países emergentes foi substituída por ‘em desenvolvimento’.


Antigamente, estes eram conhecidos como países de segundo e terceiro mundo.
Veja bem, para se entender o que é um país de Terceiro Mundo, é preciso
mergulhar na história, mais precisamente, na Guerra Fria (1945-1989). O período
das batalhas indiretas ficou marcado por causa dos Estados Unidos e de seus
aliados. Eles formaram um bloco capitalista, conhecido como Primeiro Mundo.

Na época, eram as nações da América do Norte: Canadá e Estados


Unidos, parte da Europa Ocidental, Japão e Austrália. O Segundo Mundo era
representado pelos socialistas: União Soviética, a China, Coreia do Norte e Cuba.
O Terceiro Mundo era composto pelos países da América do Sul, o Continente
Africano em sua totalidade, e parcela da Ásia e Filipinas. Esses formavam os
países neutros, não se posicionavam em relação a nenhum dos grandes blocos
econômicos: capitalista e socialista.

Os países considerados como emergentes são aqueles que apresentam


grande potencial e buscam se reordenar em vários aspectos: mercado, político
e apresentam uma alta taxa de crescimento – o que contribui para as relações
econômicas no exterior. Ou seja, uma nação rumo ao desenvolvimento passa pelo
processo de globalização. Os que estão no decorrer dessa evolução são chamados
de emergentes. Podem ser tomados como exemplo: Brasil, Rússia, Índia e China.
Eles formam o grupo denominado de BRIC – termo criado por Jim O’Neill,
presidente da Goldman Sachs.

Embora o BRIC seja considerado um grupo de países emergentes, o próprio


criador mudou esse conceito. Brasil, Rússia, Índia e China já estão concentrados
em outros patamares que não no emergente. O mercado deles se diferencia, e
muito, em relação a outros que estão na condição: se reestruturando. De acordo
com especialistas, o Brasil já ocupa o lugar de sétima economia no mundo,
perdendo para os grandes, como o todo-poderoso Estados Unidos, China, Japão,
Alemanha, França e Itália.

As pesquisas indicam a ascensão dessas nações até 2020. Alguns


economistas dizem que os emergentes se tornarão grandes potências e superarão
as que hoje estão liderando a economia mundial. Existem grandes expectativas
quanto a isso. O G7, um grupo composto pelos sete países mais ricos do mundo,
mais a Rússia, corre o risco de ser superado pelo BRIC. O topo dessa hierarquia
do Grupo dos Sete, a saber, são os Estados Unidos, com o Produto Interno Bruto
(PIB) de cerca de 120 trilhões de dólares.

Então, os países emergentes ou em desenvolvimento são classificados a


partir de seus dados políticos e sociais, tais como o Índice de Desenvolvimento

44
TÓPICO 2 | UM PAÍS VAI SE FORMANDO

Humano (IDH). Os números apontados por essas estatísticas contam ao destacar


o nível em que cada país se encontra. Ele é avaliado em uma escala que vai de
zero até dez. Grosso modo, os lugares que atingem a marca entre 0,8 e 0,9 o IDH é
elevado – acima disso, é muito elevado. A Noruega está no ápice, totalizando um
IDH de valor igual a 0,938.

Para um país possuir o status de desenvolvido, é preciso trabalhar para o


crescimento de algumas taxas importantes. O índice de educação se calcula pela
taxa de alfabetização. São contadas, na operação, as pessoas que, aos 15 anos,
já concluíram o Ensino Fundamental. Outro fator levado em conta é a taxa de
escolarização. Essa se baseia na soma das pessoas de qualquer idade matriculadas,
seja no Ensino Fundamental, Médio ou Superior. O quantitativo é dividido pelo
quociente de pessoas entre sete e 22 anos do local. E os dados das pessoas que
cursam a pós-graduação, supletivo e demais cursos também são contabilizados
no marcador.

A renda está diretamente ligada ao Produto Interno Bruto, por cabeça,


da localidade. Os países possuem diferenças em seu custo de vida. O cálculo da
renda do IDH é feito por meio do dólar americano. Isso porque, contabilizando
com a moeda estadunidense, exclui as diferenças do custo de vida de cada nação.
O indicador é chamado de Paridade do Poder de Compra (PPC) ou Paridade do
Poder Aquisitivo (PPA).

A longevidade é um critério que avalia a expectativa de vida, desde o


nascimento. Ele mostra quantos anos uma pessoa vive numa determinada
localização. As condições do local contribuem para que essa estatística seja
elevada. Se um indivíduo tem a vida mais digna, os hospitais são de qualidade,
a segurança é eficiente, existe todo um saneamento básico, contribui para
o crescimento da taxa, uma vez que a expectativa de vida, que é diferente da
longevidade, faz peso no registro de mortes precoces.

Esse modelo, adotando todas essas exigências, só foi utilizado até o ano
de 2009. Em 2010, o Índice de Desenvolvimento Humano seguiu outras vertentes:
a expectativa de vida ao nascer, o acesso ao conhecimento e um padrão de vida
digno, conhecido como PIB (PPC) per capita.

FONTE: Disponível em: <http://paises-emergentes.info/>. Disponível em: 17 set. 2013.

45
RESUMO DO TÓPICO 2
Neste tópico vimos:

• A economia tem papel fundamental para o desenvolvimento e avanço de um


país em todos os âmbitos da sociedade.

• Conceitos que identificam a caminhada dos países para o seu desenvolvimento.

• A importância da modernização para o avanço do país, juntamente com outras


realidades, como a cultura, a economia e a própria sociedade.

46
AUTOATIVIDADE

1 Comente sobre a relação entre países desenvolvidos e o gerenciamento de


recursos naturais.

47
48
UNIDADE 1
TÓPICO 3

FORMAS DE GOVERNO

A melhor forma de governo é a justiça.


A melhor justiça é o direito.
O melhor direito é a igualdade.
(Antonio Carlos Pucci)

1 INTRODUÇÃO
Vimos, no tópico anterior, aspectos que são determinantes para o
desenvolvimento de um país, como a modernização, o desenvolvimento
econômico, social e cultural. É um processo contínuo, ou seja, não existe um
ponto de chegada para garantir que o país está 100% desenvolvido em todos os
seus aspectos.

Vamos agora estudar outros aspectos que fazem parte desse processo de
crescimento que vai além do econômico: a governança.

Para entendermos os tipos de governo no Brasil, podemos nos reportar


aos períodos da história do país para delimitarmos as duas formas de
governo que aqui se desenvolveram: a monarquia e a república. Vamos, de
forma bastante resumida, verificar conceitos a partir das formas de governo
identificadas em nosso país.

Interessante primeiro destacar alguns conceitos para termos clareza


das diferenças entre sistema de governo e forma de governo, o conceito de
governo e tipos de governo. Começamos então com o entendimento de que o
governo objetiva orientar uma determinada sociedade política, exercendo sua
autoridade instituída.

O governo é a instância máxima de administração executiva, geralmente


reconhecida como a liderança de um Estado ou uma nação, e o governo
é formado por dirigentes executivos do Estado, ou ministros.
Existem duas formas de governo, república ou monarquia, e dentro
desse sistema de governo pode ser Parlamentarismo, Presidencialismo,
Constitucionalismo ou Absolutismo. A forma de governo é a maneira
como se dá a instituição do poder na sociedade e como se dá a relação
entre governantes e governados. Existem diversos tipos de governo,
como anarquismo, que é quando existe a ausência ou falta de governo,
democracia, ditadura, monarquia, oligarquia, tirania e outros.

49
UNIDADE 1 | SURGE UMA NAÇÃO

Sistema de governo não pode ser confundido com a forma de governo,


pois a forma é o modo como se relacionam os poderes e o sistema de
governo é a maneira como o poder político é dividido e exercido no
âmbito de um Estado (SIGNIFICADOS, 2013).

Entendidos esses conceitos e diferenças, vamos então nos reportar


aos períodos da nossa história, para, a partir daí, entender melhor como se
desenvolveram as formas de governo até agora vivenciadas em nosso país, desde
as capitanias, o período imperial até a república.

50
FIGURA 26 – PERÍODOS DA HISTÓRIA DO BRASIL

51
TÓPICO 3 | FORMAS DE GOVERNO

FONTE: Disponível em: <http://historiacem01.weebly.com/2-bim2.html>. Acesso em: 11 nov. 2013.


UNIDADE 1 | SURGE UMA NAÇÃO

A figura acima, dividida historicamente em período pré-colonial, colonial,


imperial e republicano, com suas principais culturas características, indica na
própria descrição do período a forma de governo predominante. Nos períodos
pré-colonial, colonial e imperial, temos a monarquia perpassando-os e, então,
com a proclamação da República é instaurado o sistema republicano no país.

2 CAPITANIAS
Imaginemos o Brasil logo após o descobrimento. Os portugueses não
devem ter ideia da extensão territorial de sua nova aquisição. D. João, por ser o
proprietário dessas terras, as divide e as concede a pessoas de sua confiança para que
as administrem, as colonizem e as protejam das invasões de outras nações. Em troca
disso, eles, os arrendatários, poderiam explorar o que a terra oferecia em recursos
naturais. Essas terras, denominadas capitanias hereditárias, vão produzir por algum
tempo as riquezas da nova nação que se vislumbra: a madeira, tendo como carro-
chefe o pau-brasil, os minérios, um pouco mais para a frente, com a descoberta das
“minas gerais”, e também a exploração de animais. A história nos aponta que essa
forma de gerenciar as terras não alcançou bons frutos. Podemos identificar alguns
dos motivos de não terem obtido êxito: a grande extensão de terras para a época, falta
de meios de transporte, falta de mão de obra, os ataques dos índios, entre outros. Para
conhecimento, elencamos a seguir as capitanias, com destaque para as capitanias de
São Vicente e de Pernambuco, que tiveram algum sucesso.

FIGURA 27 – CAPITANIAS

FONTE: Disponível em: <http://professormarcianodantas.blogspot.com.br/2013/04/a-lei-de-


terras.html>. Acesso em: 11 nov. 2013.

52
TÓPICO 3 | FORMAS DE GOVERNO

3 IMPÉRIO
Você já deve ter ouvido ou visto a expressão “país da jabuticaba”, quando
queremos identificar algo, acontecimento, fato que só vemos por essas paragens.
Por sermos um país de dimensões continentais, sempre foi difícil estabelecer um
governo central forte. Este período imperial que vamos estudar não foge à regra.

Para entendermos este período precisamos ter clareza de que:

Uma monarquia é um governo comandado por um rei ou rainha


que herda sua posição da sua família, que é geralmente chamada de
“família real”. Há dois tipos de monarquias: monarquias absolutas e
monarquias constitucionais. Em uma monarquia absoluta, o rei/rainha
não tem restrições em seus comandos e poderes. Em uma monarquia
constitucional, seus poderes são restritos pela Constituição (EXPLICA
TUDO, 2013).

Eminentemente agrícola, longe dos territórios urbanos, a população, via


de regra, não participava da vida política e, dessa forma, o poder monárquico não
sentia efetivamente grande oposição à sua governança, a não ser de grupos de
fazendeiros que dividiam o poder em diferentes setores. Como afirma Holanda
(2011, p. 73):

Na monarquia eram ainda os fazendeiros escravocratas e eram filhos


de fazendeiros, educados nas profissões liberais, quem monopolizava
a política, elegendo-se ou fazendo eleger seus candidatos, dominando
os parlamentos, os ministérios, em geral todas as posições de mando, e
fundando a estabilidade das instituições neste incontestado domínio.

Nada a estranhar que tenham acontecido tantas revoltas regionais neste
período no Brasil. No mapa que segue temos algumas das principais revoltas, cada
uma com sua localização geográfica. Podemos identificar que um dos agravantes
que era comum a essas revoltas reporta-se ao centralismo do governo, à herança
das capitanias que não primavam pela unidade e sim pelo “cada um por si”.
Cada uma se organizou de forma muito peculiar, conforme suas necessidades e
capacidade de angariar recursos para manter seus objetivos.

53
UNIDADE 1 | SURGE UMA NAÇÃO

FIGURA 28 – REVOLTAS

FONTE: Disponível em: <http://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/0/00/Periodo_


Regencial_rebeli%C3%B5es.svg>. Acesso em: 11 nov. 2013.

Para exercer um mínimo de controle sobre o Brasil, a monarquia vai esbarrar


em um país dividido em províncias, rescaldo das capitanias, que também, em sua
maioria, não foram viáveis para o desenvolvimento do Brasil. Podia transparecer
uma certa unidade a partir de um governo monárquico centralizador, porém
as diferentes etnias, as distâncias enormes a serem percorridas de um centro a
outro vão forçando uma necessidade de federalização contra a artificialidade
instaurada pela monarquia no seu modelo de governo.

Podemos concluir que a monarquia é um fracasso? Não necessariamente.


Atualmente temos alguns países bem desenvolvidos econômica e socialmente
com a monarquia dividindo poder com outros sistemas de governo, como, por
exemplo, Inglaterra, Japão e Holanda.

A reforma da Carta Imperial no ano de 1824 é um sinal visível dessa


necessidade de mudança, quando D. Pedro I abdica do trono e torna possível
o processo de federalização, sem, contudo, contemplar os verdadeiros ideais
republicanos ou democráticos.

54
TÓPICO 3 | FORMAS DE GOVERNO

UNI

Pesquise sobre o Manifesto Republicano de 1870 para entender melhor os anseios


federativos dessa época. Seguem alguns links com informações sobre este acontecimento:
<http://umtironanoite.wordpress.com/>.
<http://arepublicano.blogspot.com.br/2011/10/o-carbonario-de-evora-100-anos-depois.html>.
<http://profmuciohistoria3.blogspot.com.br/2012/02/derrocada-da-monarquia-no-brasil.html>.

A Constituição de 1891 estruturou o federalismo brasileiro segundo


o modelo norte-americano. Ajustou a um sistema jurídico-constitucional
estrangeiro uma realidade completamente diversa.

FONTE: Disponível em: <http://www.passeidireto.com/arquivo/1092162/estadoestadoestadoestado


estado/2>. Acesso em: 13 nov. 2013.

Daí resultou que a Constituição escrita não pôde reproduzir, como não
reproduziu, a Constituição real do país.

FIGURA 29 – PODER MODERADOR

Poder Moderador
Imperador
+
Conselho de Estado

Poder Legislativo Poder Executivo Poder Judiciário


Câmara Imperador Supremo Tribunal
dos Senado +
Deputados Ministério de Justiça

Presidentes de
Província

Eleitorado
de 2º grau ou Conselhos de
Paróquia Província

Eleitorado
de 1º grau ou Conselhos
Paróquia Municipais

FONTE: Disponível em: <http://mestresdahistoria.blogspot.com.br/2012/05/conheca-as-


principais-caracteristicas.html>. Acesso em: 11 nov. 2013.

55
UNIDADE 1 | SURGE UMA NAÇÃO

A figura anterior indica os diferentes poderes para uma monarquia.


Podemos identificar que alguns poderes são indiscutivelmente necessários
também em uma república.

Tivemos também a possibilidade de optar pelo parlamentarismo como


forma de governo através de um plebiscito, porém, não foi aprovado. O texto que
segue vai esclarecer a diferença do presidencialismo, modelo atualmente vigente
no Brasil, e do parlamentarismo, modelo adotado na Inglaterra, por exemplo.

DIFERENÇAS ENTRE PRESIDENCIALISMO E PARLAMENTARISMO

Analisar as diferenças entre presidencialismo e parlamentarismo não


é uma tarefa tão difícil. Muitos autores tratam sobre o assunto, dentre tantos
temos Tavares (2002, p. 859), que explica: “A grande diferença entre os dois
modelos está no papel do órgão legislativo. Enquanto no parlamentarismo
este não se limita a fazer leis, mas também é responsável pelo controle do
governo, tomando posições políticas fundamentais, no Presidencialismo
aquela atividade lhe é atribuída em caráter principal. Além disso, naquele o
Parlamento pode destituir o Gabinete, por razões exclusivamente de ordem
política, enquanto neste isso só poderia ocorrer em relação ao Presidente
da República e em razão da prática de certos delitos. Ao comparar os dois
sistemas, Bastos afirma: ‘[…] o que o presidencialismo perde em termos
de ductibilidade às flutuações da opinião pública, ganha em termos de
segurança, estabilidade e continuidade governamental’”.

Para que entenda melhor a grande diferença existente entre estas


duas formas de governo, temos:

Parlamentarismo

Caracterizado por ter todo o poder concentrado no Parlamento, que


é, de fato, o único poder, e ainda caso o governo executivo discordar do
Parlamento, a maioria dos deputados dissolve esse governo. A Justiça não
se opõe ao Parlamento, até porque, em um sistema parlamentarista puro,
a Constituição não é rígida: se uma lei for considerada inconstitucional, o
Parlamento pode alterar a Constituição. No Reino Unido, o exemplo mais
puro de parlamentarismo, não há sequer uma Constituição escrita.

56
TÓPICO 3 | FORMAS DE GOVERNO

As principais funções parlamentares são exercidas em sua plenitude


por uma casa legislativa que se pode chamar, por exemplo, de Câmara
dos Deputados, Parlamento, Câmara dos Comuns (Reino Unido) ou
Assembleia Nacional (França). Mas em geral, são muito raros os sistemas
parlamentaristas puros, que subsistiram, sobretudo nas monarquias (Reino
Unido, Suécia, Holanda etc.). No Brasil, as formas de parlamentarismo
sempre foram totalmente impuras. Enquanto monarquia tínhamos um
regime parlamentarista, mas o imperador dispunha do “poder moderador”,
o que lhe permitia até nomear primeiros-ministros que não dispusessem do
apoio da maioria parlamentar. Segundo Araújo (1999, p. 234),

as seguintes características do parlamentarismo são:


a) divisão orgânica de poderes;
b) repartição de funções de chefia de Estado e de governo;
c) interdependência entre o Executivo e Legislativo, em especial
porque o gabinete espelha a maioria parlamentar;
d) gabinete dirigido por um Primeiro Ministro, a quem são
atribuídas as funções inerentes à chefia de governo;
e) queda do gabinete por voto de desconfiança do Parlamento;
f) dissolução do Parlamento, com a convocação de eleições
gerais, por injunção da chefia de Estado.

Há que se acrescentar, também, que neste sistema o Banco Central é


autônomo, a burocracia é profissionalizada e a política monetária e cambial
deve ser estável.

Presidencialismo

O presidencialismo, por sua vez, produz um gabinete, personificado


no presidente, com prazo definido. Nesse regime há três poderes: o Executivo,
o Legislativo e o Judiciário, exercidos, respectivamente, pelo presidente da
República, pelo Parlamento (no caso do Brasil, o Congresso Nacional) e pelo
Supremo Tribunal ou Corte Suprema. Toda a concepção do presidencialismo

57
UNIDADE 1 | SURGE UMA NAÇÃO

baseia-se na harmonia desses três poderes, sendo que nenhum pode impor-
se ao outro ou tentar superar os demais, e para manter esse equilíbrio há um
sistema de freios e contrapesos pelo qual um poder controla o outro e cada
um depende dos outros dois. Em um regime presidencialista, o Legislativo
pode ser exercido apenas pela Câmara dos Deputados (sistema unicameral)
ou por duas casas, a Câmara e o Senado (sistema bicameral).

Segundo Araújo (1999, p. 235),


as seguintes características básicas do presidencialismo são:
a) a chefia de governo e a chefia de Estado ficam concentradas
nas mãos de uma única pessoa: o presidente da República;
b) o presidente é eleito para mandato determinado, não
respondendo, ordinariamente, perante o Poder Legislativo;
c) o presidente da República possui ampla liberdade para a
formação de seu ministério;
d) o Parlamento, de igual forma, não pode ser dissolvido por
convocação de eleições gerais pelo Executivo;
e) só é compatível com a república, sendo inviável em uma
monarquia.

FONTE: Disponível em: <http://www.educacao.cc/politica/diferencas-entre-presidencialismo-e-


parlamentarismo/>. Acesso em: 17 set. 2013

4 REPÚBLICA
Para entender um país e sua política, principalmente, é preciso entender
qual tipo de governo é exercido neste país. Vimos isso anteriormente, agora
queremos aqui destacar a democracia, pois é nela que vivemos atualmente.

Caro(a) acadêmico(a), não conheço nenhum povo que consiga viver e


se desenvolver sem o mínimo de organização, de regras, normas em que todos,
ou pelo menos a maioria, tenha condições de viver dignamente. Teoricamente,
a democracia prima por isso. E o governo é o grande responsável para tornar
isso possível enquanto representante de um povo com poderes de representação
instituídos. A democracia:
58
TÓPICO 3 | FORMAS DE GOVERNO

é o tipo de governo mais comum no Ocidente. Nas democracias, todas


as pessoas em um país podem votar durante as eleições para escolher
representantes ou partidos políticos de sua preferência. As pessoas em
democracias podem eleger representantes para poderes legislativos (como
Parlamento ou Congresso). Partidos políticos são organizações de pessoas
com ideias similares sobre como um país ou região deve ser governado.
Diferentes partidos políticos possuem diferentes ideias sobre como o
governo deve lidar com diferentes problemas (EXPLICA TUDO, 2013).

O sistema eleitoral é uma garantia para a vigência da democracia, não o único.
E é nele que incorremos em enormes erros, como indica DaMatta (2001, p. 77), pois
jamais utilizamos o concurso público e a competição como algo
normal entre nós, daí o trabalho que é fazer uma eleição honesta e
disputada. Ela implica, inclusive, algo que evitamos: dar opiniões e
disputar vontades, revelando abertamente as nossas mais legítimas (e
ocultas) diferenciações sociais.

O ano de 2013 marca os 25 anos da promulgação da Constituição brasileira.
Podemos identificar no dia a dia a aplicabilidade do que rege, determina, orienta
a Constituição. Cabe aos cidadãos fazer valer as normas, orientações, leis, direitos
e deveres contidos na Carta Magna.

CONCEITO GERAL DE REPÚBLICA

República: Regime político em que o chefe do Estado é eleito, direta


ou indiretamente. O poder pode ser concentrado em sua pessoa, ou caber a
uma assembleia o papel preponderante; entretanto, é preciso observar que
a forma republicana de governo não precisa ser fatalmente democrática.

As principais formas de governo republicano são: a república


aristocrática, na qual a participação ao poder é limitada a uma classe
(regime de Veneza e da Polônia até o fim do séc. XVIII,  hoje  extinto); a
república presidencialista, na qual o poder fica com um presidente eleito
(EUA e países da América Latina e Constituição napoleônica de 1800); a
república parlamentarista, na qual o poder do Parlamento é limitado por
forte autoridade do chefe do Estado (Constituição alemã de Weimar, 1919, V
República na França, 1958); e o regime colegiado, no qual o poder fica com
um Conselho, eleito pela Assembleia a curto prazo (Suíça, Uruguai).

Assim como as repúblicas de Veneza e Polônia não podem ser


comparadas às repúblicas modernas, assim também eram repúblicas de
estilo político diferente as de Atenas (democracia direta) e Roma (república
aristocrática, dirigida pelo Senado).

A primeira república moderna foram os EUA, que adotaram em 1787


a Constituição presidencialista, sendo seguidos pelos países da América
espanhola e, no ano de 1889, pelo Brasil.

59
UNIDADE 1 | SURGE UMA NAÇÃO

Tipos de República:

• República Aristocrática:  É aquela na qual exerce o governo uma


representação na minoria imperante, que por algum motivo (cultura,
patriotismo, riqueza etc.) é considerada a mais notável. Este regime
republicano afasta-se da representação popular, aproximando-se mais
da ditadura e constituindo uma oligarquia. Foi posto em prática em
Esparta, Atenas e Roma, onde poderes eram conferidos aos governantes,
embora temporariamente houvesse eleição.

• República Democrática:  É a república em que o poder, em esferas


essenciais do Estado, pertence ao povo ou a um Parlamento que o
represente. A república democrática decorre, assim, do princípio da
soberania popular. O povo é aqui o partícipe principal dos poderes do
Estado. Mas só parte de cidadania provoca, sem dúvida, seleção do corpo
de eleitores. E a qualidade de cidadão, que depende de vários requisitos
e que varia segundo as legislações, restringe consideravelmente a massa
votante. Além disso, se todos os cidadãos gozam de iguais direitos
políticos, poucos são os que governam realmente, sobretudo onde,
por força da divisão partidária, nem mesmo a maioria absoluta chega
a governar. Oriundas do sistema de ideias da Reforma e das lutas
constitucionais americanas e francesas, se alastraram as repúblicas
democráticas no mundo moderno, ganhando cada vez maior extensão.
Dentre elas, podemos distinguir:

a) Democracias Diretas – Nestas formas, o povo, diretamente, examina e


decide o que se põe em votação. Nas assembleias populares reside a
soberania do Estado.

b) Democracias Indiretas ou Representativas  – Nestas formas, os poderes


públicos são integrados por órgãos representantes do povo. A separação de
poderes pode aqui funcionar melhor que nas monarquias constitucionais,
em que há dois órgãos supremos - rei e povo -, não se achando tão exposto
o regime à intervenção pessoal do chefe do governo quanto a monarquia.

• República Federal:  É a que apresenta duas esferas de direito público, a


provincial e a nacional. Por exemplo: os EUA, o Brasil, a Argentina, a
Venezuela, a Suíça... A URSS é também, talvez, um Estado Federal (sui generis).

• República Federativa:  É a república em que se inserem obviamente


princípios descentralizadores. A República Federativa do Brasil, aludida
pela Emenda Constitucional nº 1, de 17/10/1969, deu ao Estado federal
brasileiro, tanto pelo espírito, como pela letra expressa da Constituição,
então aprovada, uma natural ênfase ao governo central, dentro da
tendência atual de fortalecimento, no mundo, do Estado federal
contemporâneo.

60
TÓPICO 3 | FORMAS DE GOVERNO

• República Oligárquica:  É a república governada por um pequeno grupo


de pessoas integrantes da mesma família, classe ou grupo, permanecendo
o poder nas mãos desses poucos.

• República Parlamentar:  É a república de feição parlamentarista. Seu exemplo


clássico é o da França, após o período libertário da Revolução. Sob a Segunda
República,  a França conheceu  o governo parlamentar, de incentivo e
aperfeiçoamento. Da república francesa, o parlamentarismo irradiou-se para
inúmeras outras repúblicas, passando a adotar o regime parlamentar.

• República Popular: É a que visa a estabelecer a ditadura do proletariado,


na base da revolução comunista. Enquanto a República Popular da
Albânia se mantém fiel ao stalinismo e vê com bons olhos a intransigência
revolucionária da China, a República Popular da Polônia ostenta maior
influência das democracias ocidentais. Apesar de “a política do Estado de
democracia popular ter por fim a liquidação da exploração do homem e
a edificação do socialismo”, como proclama a Constituição da República
Popular Romena de 1952, a da República Socialista Tchecoslováquia,
ao lado da propriedade social dos meios de produção, constituída pelo
Estado e peças de propriedades cooperativas, admite a propriedade
pessoal das casas, dos jardins, familiares etc.

• República Presidencial:  É o tipo de república que pode ser encarada


como adaptação da monarquia ao governo republicano, desde que dá
indiscutível prestígio e poder ao presidente da República. Dentro do
sistema, o presidente, eleito direta ou indiretamente pelo voto, passa
a ficar, quanto à origem, no mesmo pé de igualdade que o Congresso.
Irrevogável em seu mandato, é ele que imprime pessoalmente orientação
à política. Dentro de suas prerrogativas, de preeminência incomparável,
é um verdadeiro ditador em estado latente, a impor sempre ao governo
a sua própria personalidade.

• República Teocrática:  A expressão república teocrática é imprópria,


de vez que a teocracia é uma forma de governo exercido em nome de
uma entidade sobrenatural, e por isso desempenhado por sacerdotes
que representam deuses ou um Deus na Terra. A teocracia designa o
Estado em que Deus é considerado como o verdadeiro soberano, e as leis
fundamentais como mandamentos divinos, sendo a soberania exercida
por homens relacionados diretamente com Deus: profetas, sacerdotes ou
reis, considerados como representantes diretos da divindade.

• República Unitária:  É a república que se subordina a uma só esfera de


direito público. Por exemplo: França, Portugal... Pode-se, assim, distinguir
uma república unitária de outra, composta ou complexa, pelo fato de se
apresentar simples em sua estrutura. A república que é o resultado da íntima
união de vários ordenamentos jurídicos estatais que dá lugar ao Estado de

61
UNIDADE 1 | SURGE UMA NAÇÃO

Estados ou à República Federal. A república unitária tem uma estrutura


interna que a tipifica: integra-se por um único centro decisório constituinte
e legislativo, e um único centro de impulsão política e um só conjunto de
instituições de governo. A denominação de república simples ou unitária
explica-se por ser o poder, dessa forma política, uno em sua estrutura, em
seu elemento humano e em seus limites territoriais. Enquanto a república
monocrática pressupõe concentração de poder em uma ou em poucas mãos,
a república unitária não é incompatível com a separação de poderes e com
a existência mesmo de uma pluralidade de órgãos. A república autocrática
nada tem que ver com a simplicidade ou complexidade do Estado, o que
lhe interessa é a extensão do poder sobre os indivíduos e a coletividade. A
república unitária centralizada corporificou-se com a Revolução Francesa.
A unidade e a indivisibilidade da nação soberana importaram certamente
no cancelamento dos corpos intermediários.

CONCEITO GERAL DE MONARQUIA

A monarquia é a forma típica de governo de indivíduos, portanto


o poder supremo está nas mãos de uma só pessoa física, o monarca ou rei.

A monarquia é uma forma de governo que já foi adotada, há muitos


séculos, por quase todos os Estados do mundo. Com o passar dos séculos
ela foi sendo gradativamente enfraquecida e abandonada. Quando nasce o
Estado Moderno, a necessidade de governos fortes favorece o ressurgimento
da monarquia, não sujeita a limitações jurídicas, onde aparece a monarquia
absoluta. Aos poucos, vai crescendo a resistência ao Absolutismo e, já a
partir do  final do século XVIII, surgem as monarquias constitucionais. O rei
continua governando, mas está sujeito a limitações jurídicas, estabelecidas
na Constituição; surge ainda outra limitação ao poder do monarca, com a
adoção do parlamentarismo pelos Estados Monárquicos, assim o monarca
não mais governa, se mantendo apenas como chefe do Estado, tendo
somente as atribuições de representação, não de governo, pois o mesmo
passa a ser exercido por um gabinete de ministros.

A antiga noção de monarquia afirmava que o poder do monarca era


absoluto. Por vezes afirma que o monarca era responsável somente perante
Deus. Doutrina esta que ficou conhecida como “Direito Divino”.

A forma monárquica não se refere apenas aos soberanos coroados,


nela se enquadram os consulados e as ditaduras (governo de uma só pessoa).

Tipos de monarquia:

• Monarquia Absoluta: é a monarquia em que o monarca se situa acima


da lei, todo poder se concentra nele. Não tendo que prestar contas dos
seus atos, o monarca age por seu livre e próprio arbítrio. Dizendo-

62
TÓPICO 3 | FORMAS DE GOVERNO

se representante ou descendente dos deuses, temos, como exemplo


de monarca absoluto: o Faraó do Egito, o Tzar da Rússia, o Sultão da
Turquia e o Imperador da China, entre outros.

As monarquias também podem ser limitadas onde o poder central


se reparte, três são os tipos de monarquias limitadas:

• Monarquia de Estamentos, ou de Braços, em que o rei descentraliza


certas funções que são delegadas a elementos reunidos em cortes. Esta
forma é antiga e típica do regimento feudal, como exemplos temos: a
Suécia e o Mecklemburgo, perdurado até 1918.

• Monarquia Constitucional, onde o rei exerce apenas o poder executivo


paralelo dos poderes Legislativo e Judiciário. Temos como exemplo:
Bélgica, Holanda, Suécia e o Brasil Imperial. 

• Monarquia Parlamentar  - o rei não exerce a função do governo. É um


conselho de ministros que exerce o Poder Executivo, responsável perante
o Parlamento. Ao rei se atribui o poder moderador com ascendência
moral sobre o povo, sendo ele um símbolo vivo da nação, não tendo
participação ativa na máquina estatal.

Características da monarquia: 

Vitaliciedade: o monarca tem o poder de governar enquanto viver


ou enquanto tiver condições para continuar governando. 

Hereditariedade: quando morre o monarca ou deixa o governo por


qualquer outra razão, é imediatamente substituído pelo herdeiro da coroa.

Irresponsabilidade:  o rei não tem responsabilidade política, não


deve explicações ao povo ou a qualquer órgão.

CONCLUSÃO

Sendo vitalício e hereditário, o monarca está acima das disputas


políticas, é um fator de unidade do Estado, pois todas as correntes políticas
têm nele um elemento superior, comum.

A monarquia sendo o ponto de encontro das correntes políticas,


e estando à margem das disputas, o monarca assegura a estabilidade das
instituições.

O monarca é alguém que recebe desde o nascimento uma educação


especial que o prepara para governar, não ocorrendo assim o risco de
governantes despreparados.

63
UNIDADE 1 | SURGE UMA NAÇÃO

Se o monarca não governa, se torna uma inutilidade, que sacrifica o


povo sem qualquer proveito.

A monarquia é essencialmente antidemocrática, uma vez que não


assegura ao povo o direito de escolher seu governante, desaparecendo a
supremacia da vontade popular, que deve ser mantida permanentemente
nos governos democráticos.

O que nos mostra a realidade é que a monarquia vai perdendo


adeptos e vai desaparecendo como forma de governo, havendo atualmente,
no mundo todo, apenas cerca de 20 Estados com governos monárquicos,
como exemplo: Inglaterra, Noruega, Dinamarca, entre outros.

Portanto, a república tem maiores adeptos numa visão globalizada,


porém isso não significa que seja melhor ou pior, e sim o mais usual
atualmente, pois na forma de república temos também diversos fatores
negativos como também positivos, conforme contempla a pesquisa.

Podemos afirmar, com a apresentação desta pesquisa que discorre


sobre as formas de governo, em diferentes partes do mundo, que os Estados
se adaptam às diferentes formas de governo, uns com sucesso e outros nem
tanto, portanto fica difícil concluir qual é a mais adequada ou eficiente, pois em
diferentes épocas um mesmo Estado passou por várias formas de governar,
e mesmo assim obteve êxito em suas diferentes gestões. Essa questão nos
mostra que existe sempre a busca pela melhor forma de governo.

Existem vários exemplos de formas de governo republicano que


prosperam ao longo da história da humanidade, assim como também de
formas de governo monárquico.

Todas as formas de governo almejam uma sociedade bem


organizada, que ame a sua pátria e que esteja satisfeita com a manifestação
do exercício do poder público à qual está subordinada.

As formas de governo estão ligadas com a cultura de cada povo,


por essa razão se formam diversos segmentos. A forma de se governar
se define como uma modalidade de organização do poder político, onde
são representadas as diversas influências da natureza moral, psicológica,
intelectual, geográfica e político-econômica, que mudam conforme as
necessidades sociais do local, e historicamente se renovam com o surgimento
de novos imigrantes, novos ideais, enfim, com a mudança natural do ciclo
de vida ao qual todos estamos sujeitos.

FONTE: Disponível em: <http://www.coladaweb.com/politica/conceito-geral-de-republica-e-


monarquia>. Acesso em: 8 out. 2013.

64
RESUMO DO TÓPICO 3
Neste tópico vimos:

• As diferentes formas de governo, suas principais características, suas


diferenças e sua vigência em nosso país, começando pelo período imperial,
das capitanias, à monarquia e à regência, até chegar à república.

• A diferença entre presidencialismo e parlamentarismo.

65
AUTOATIVIDADE

1 Apresente o conceito de governo.

2 Como podemos entender as formas de governo.

66
UNIDADE 2

CONHECENDO O BRASIL
CONTEMPORÂNEO

OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM
Esta unidade tem por objetivos:

• traçar um panorama geral do Brasil contemporâneo;

• indicar especificidades tendo em conta a divisão por regiões do país, trazen-


do a perspectiva social e cultural da população pertencente a cada lugar;

• apresentar como se dispõe a economia brasileira na atualidade, tendo em


vista a divisão de setores (primário, secundário e terciário);

• tratar de espaços e atores políticos importantes, de modo que se entenda


o fazer político para além do Estado e seus governos.

PLANO DE ESTUDOS
Esta unidade está dividida em três tópicos e no decorrer de cada um deles
você encontrará atividades que o ajudarão a fixar os conteúdos adquiridos.

TÓPICO 1 – A QUESTÃO REGIONAL NO BRASIL

TÓPICO 2 – PANORAMA ECONÔMICO: “PRA FRENTE BRASIL”

TÓPICO 3 – ESPAÇOS E ATORES POLÍTICOS

67
68
UNIDADE 2
TÓPICO 1

A QUESTÃO REGIONAL
NO BRASIL

1 INTRODUÇÃO
O Brasil é um país imenso em termos territoriais e populacionais, e
culturalmente diverso. Não é difícil perceber que fazemos parte de uma nação
heterogênea, com diferenças marcantes. Basta ligar a televisão e vemos diferenças
de sotaque, hábitos, paisagens, tradições. Assim como também é possível
observar as profundas desigualdades sociais. A televisão que glamoriza a riqueza
é a mesma que apresenta grupos que sofrem com a pobreza, a indiferença da
sociedade e o abandono do Estado.

Essa heterogeneidade acontece em diferentes dimensões: a caracterização


do bioma predominante de cada lugar, a história sociocultural, a população,
a produção econômica, a composição das cidades etc. Esse tópico apresentará
as regiões do Brasil – Centro-Oeste, Nordeste, Norte, Sudeste e Sul – e suas
características essenciais que as diferenciam na contemporaneidade. As impressões
do nosso senso comum já possuem algumas identificações para cada região: o
Nordeste com a seca, o Norte com a floresta, o Centro-Oeste como o celeiro do
Brasil, o Sudeste com megalópoles e o Sul com sua cultura mais europeia. Mas
será que é isso mesmo? Será que só existe floresta na Amazônia? Ou será que
nunca existiu uma população indígena no Sul do Brasil? Vamos começar este
tópico entendendo um pouco de cada região e desmistificando essas ideias que
temos e que, muitas vezes, não as questionamos.

NOTA

A divisão atual das regiões brasileiras existe desde 1970. É uma divisão oficial, mas
não se centra na autonomia. Baseia-se em critérios de proximidade nos aspectos físicos,
culturais e sociais, e ajuda nas análises e estatísticas do país.

69
UNIDADE 2 | CONHECENDO O BRASIL CONTEMPORÂNEO

2 REGIÃO CENTRO-OESTE
Quais figuras surgem na sua mente quando pensa na região Centro-
Oeste? A imagem de um caubói? Grandes fazendas? A capital federal Brasília?
Todos esses elementos fazem parte do contexto atual da região, que será mais
bem entendido agora.

2.1 CARACTERIZAÇÃO GERAL


A região Centro-Oeste, como o próprio nome já diz, fica no centro do país.
O mapa a seguir mostra sua localização no território nacional, inclusive sendo a
única região que faz divisa com todas as outras. Sua localização central é importante
nacionalmente em termos econômicos e estratégicos. Também é importante
observar que a região faz fronteira com dois países da América do Sul: a Bolívia e o
Paraguai. Essa característica faz com que surjam conflitos nas regiões fronteiriças,
em termos de uso de recursos naturais, migrações clandestinas, escoamento de
tráfico de drogas e mercadorias roubadas no país (ROCHA; OLIVEIRA, 2011),
sendo uma área que apresenta alta complexidade em relação à segurança nacional.

Ela conta com quatro unidades da Federação: os estados de Mato Grosso,


Mato Grosso do Sul e Goiás, mais o Distrito Federal. Em 2010 a região contava com
14.058.094 habitantes (IBGE, 2010). Em termos de área, é a segunda maior região
do país. Também é a segunda região com maior número de habitantes vivendo em
área urbana, já que 84,9% da sua população viviam nas cidades (IBGE, 2010). Tendo
em mente seu grande território e sua população urbanizada, conclui-se que seu
território conta com centros urbanos densos e quilômetros sem população.

FIGURA 30 – MAPA DO BRASIL COM DESTAQUE À REGIÃO CENTRO-OESTE

FONTE: Disponível em: <http://pt.wikipedia.org/wiki/Ficheiro:Brazil_Region_CentroOeste.svg>.


Acesso em: 14 nov. 2013.

70
TÓPICO 1 | A QUESTÃO REGIONAL NO BRASIL

2.2 FORMAÇÃO SOCIOCULTURAL


O processo de colonização do país privilegiou as áreas litorâneas e renegou
o vasto território do interior por vários séculos. Foram afetadas as regiões Centro-
Oeste e Norte, em termos de ocupação populacional e econômica. Um povoamento
incipiente surgiu no período da mineração, mas não foi um processo intenso.

Por isso surge uma preocupação do Estado brasileiro em criar estratégias


para povoar e integrar essa região, juntamente com o Norte, a partir da metade do
século XX (ROCHA; OLIVEIRA, 2011). O grande marco foi a criação de Brasília,
deslocando a capital do país da região Sudeste, no Rio de Janeiro, para o Centro-
Oeste. Deste modo, inaugurou-se a estrutura da atual capital do Brasil em 1958,
em terras do Estado de Goiás. Por trás dessa mudança, as aspirações de atribuir
maior importância e atrair população para a região.

FIGURA 31 – CONSTRUÇÃO DE BRASÍLIA

FONTE: Disponível em <http://informacaodeprimeira.blogspot.com.br/2010/04/agenda-


cultural-de-30-de-abril-06-de.html>. Acesso em: 21 nov. 2013.

Outros projetos foram sendo implantados no período com o mesmo fim


da construção de Brasília. Pode-se citar a criação de eixos rodoviários, como a
BR-153 (Belém-Brasília) e a BR-364 (Cuiabá-Porto Velho). O destaque se dá para
os projetos agropecuários, denominados como a “Marcha para o Oeste”, que
estimulavam a produção de erva-mate e do café. Esse último ponto é importante
para entender tanto a ocupação da região como, também, sua economia nos dias
atuais, que retomaremos adiante.

71
UNIDADE 2 | CONHECENDO O BRASIL CONTEMPORÂNEO

NOTA

A “Marcha para o Oeste” visava levar o progresso e a ocupação do Centro-Oeste


especificamente, incentivando a migração de indivíduos para o centro do Brasil, onde havia
terras desocupadas. O incentivo era especificamente para a produção de matéria-prima
(extração mineral, agricultura), que objetivava suprir as demandas da industrialização do
Sudeste. Esta marcha foi organizada pelo governo de Getúlio Vargas.

Esses projetos geram, de fato, grande repercussão e atração para o Centro-


Oeste. Eles geraram um processo migratório intenso a partir da segunda metade
do século XX. Entre 1968 e 1978 acontece o primeiro movimento rumo às terras
do centro, tendo como característica o fluxo migratório vindo do Nordeste e,
em menor quantidade, do Sudeste. Esses migrantes chegam principalmente
para trabalhar nas obras de Brasília. Em um segundo momento, intensifica-se a
migração vinda do Sul do país em direção ao Cerrado, principalmente no Estado
do Mato Grosso. Isso acontece principalmente pela escassez de solo no Sul do
país e a busca de novas terras para plantio (ROCHA; OLIVEIRA, 2011).

Assim, essa região apresenta características de uma ocupação recente, de


pouco mais de meio século, que guarda, em grande medida, traços de uma cultura
do Sul e do Nordeste, principalmente na sua arquitetura, hábitos e costumes.

A figura abaixo mostra os principais deslocamentos populacionais na


metade do século XX. Como é possível acompanhar, as principais regiões de
destino são Centro-Oeste e Norte.

FIGURA 32 – DESLOCAMENTO POPULACIONAL NO BRASIL DE 1968 A 1998

FONTE: Rocha e Oliveira (2011, p. 220)

É importante ressaltar que o Centro-Oeste também é a região que abriga


grande parte da etnia indígena guarani, entre outros povos. São cerca de 30
mil guaranis que vivem na região, segundo dados do Instituto Socioambiental
(ISA). É um povo nômade, mas que se fixou em áreas do Mato Grosso do Sul há
72
TÓPICO 1 | A QUESTÃO REGIONAL NO BRASIL

cerca de um século. Os guaranis, juntamente com outros povos, “atrapalharam”


os planos de ocupação, já que se ignorava essa população quando os projetos
do governo foram traçados. Desde então, se estabeleceu um intenso conflito
entre esses povos e os fazendeiros que chegaram para estabelecer a produção
agropecuária (SANSON, 2012). Os índios, em maior medida, são vítimas
desse plano de desenvolvimento, que não os incluía nos seus traços originais.
Atualmente, muito se luta para o reconhecimento, mas centenas de vidas já
foram perdidas nesse processo.

2.3 ECONOMIA
Retomando a questão dos projetos de ocupação, eles provocam uma
descentralização da produção antes concentrada no litoral e, com isso, grande
parte do território brasileiro se torna ocupado, explorando o imenso potencial
dessas terras. Isso é essencial para compreender a dinâmica econômica da região,
pautada na produção agropecuária.

Em países semi-industrializados como o Brasil, em regiões antes


consideradas periféricas, a exemplo do Centro-Oeste, sob o impulso
da técnica, há condições para atividades com alto nível de capital,
tecnologia e organização, dando lugar a fenômenos de descentralização
seletiva. Ainda que as atividades de comando tendam a se manter
concentradas, a rede de atividades produtivas mais modernas tende
a se expandir territorialmente, o que pressupõe a compreensão da
atuação do Estado nos movimentos de localização/relocalização e os
mecanismos desenvolvidos (BERNARDES, 1996, p. 327 apud ROCHA;
OLIVEIRA, 2011).

Uma das propostas de ocupação do Centro-Oeste estava pautada


justamente na expansão agrícola. A cultura agrícola de fato se estabeleceu
na região, principalmente por conta da ocupação sulista, mas ganhou outras
roupagens com ampliação da técnica de produção, conhecido como processo
de modernização agrícola (ROCHA; OLIVEIRA, 2011). Isso envolve sementes
modificadas, melhores técnicas de plantio, controle e colheita.

Não apenas as técnicas mudaram, mas toda a forma de negócio que


envolve outras produções. Isso determina a expansão da agricultura em nível
empresarial, que exacerba os produtores e conta com a entrada de grandes
empresas interessadas no aumento da produção, como a Sadia e a Cargill,
entre outras. Esse novo tipo de agricultura e pecuária estabelecida na região é
denominada de agronegócio, e passa a envolver a agricultura, a pecuária e a
indústria. O principal produto envolvido nessa nova perspectiva de negócio é
a soja, juntamente com as aves e suínos. A figura a seguir mostra bem como é a
produção de soja: em modelo de monocultura altamente mecanizada.

73
UNIDADE 2 | CONHECENDO O BRASIL CONTEMPORÂNEO

FIGURA 33 – COLHEITA DE SOJA NA CIDADE DE SORRISO (MT)

FONTE: Disponível em: <http://www.mochileiro.tur.br/sorriso.htm>. Acesso em: 21 nov. 2013.

Também se estabeleceu uma produção de algodão, além de algumas áreas


com culturas de subsistência. Destaca-se a pecuária extensiva, com uma média de
mais de quatro cabeças de gado para cada habitante. Pecuária extensiva significa
que o gado é criado solto no pasto, o que ocupa uma grande área.

Tendo em vista as principais atividades do Centro-Oeste, devem-se


considerar alguns pontos. Fica claro que se busca aproveitar o potencial da região, que
possuía um grande espaço vazio e terras relativamente férteis. Contudo, o modelo
agrícola instalado na região provocou uma expulsão de pequenos produtores, pois
o modelo requer um investimento inicial elevado para a implantação da tecnologia
mínima para uma grande produção (ROCHA; OLIVEIRA, 2011). Na medida em
que os pequenos produtores não conseguiram se adequar a esse modelo, eles
foram sendo expulsos de suas áreas e migrando para as cidades. Atualmente, a
região conta com grandes latifúndios, sendo que as pequenas propriedades foram
incorporadas pelas grandes.

Um segundo problema é relativo ao transporte. Vamos pensar juntos: o


Centro-Oeste é a única região do Brasil que não tem saída para o mar, o que
inviabiliza o transporte marítimo. Também não tem rios com capacidade de
transporte hidroviário. E o Brasil não implementou ao longo dos anos uma rede
ferroviária para transporte de cargas (e nem de passageiros). Como escoar a
produção dessa região para outras áreas do país e outros países? A produção de
soja do Mato Grosso, por exemplo, bate recorde de produção a cada ano, sendo
o Estado com a maior produção de soja do país. E grande parte desse produto é
para exportação, ou seja, para abastecer mercados de outros países. Restam as
rodovias como opção de transporte de cargas, que se configura como um gargalo

74
TÓPICO 1 | A QUESTÃO REGIONAL NO BRASIL

para a realização da economia da região. É a opção mais cara e mais perigosa,


principalmente para a população local que ali vive.

Conhecemos o Centro-Oeste, a região onde se diz que “nasce ouro da


terra”. Vamos agora conhecer a região Nordeste, de mais antiga colonização
europeia do país.

3 REGIÃO NORDESTE
A região Nordeste remete a imagens de praias, mar azul, tranquilidade,
carnavais típicos. Não é à toa: os sete Estados que compõem a região são banhados
pelo mar. Mas muitas vezes também surgem imagens de seca, falta de chuva,
sofrimento da população no interior do território. Esse contraste é importante
para se entender a região, sua economia, dinâmica populacional e formação social.

3.1 CARACTERIZAÇÃO GERAL


A composição da região conta com nove unidades da Federação:
Alagoas, Bahia, Ceará, Maranhão, Paraíba, Piauí, Pernambuco, Rio Grande do
Norte e Sergipe. Somam-se a esse conjunto as ilhas de Fernando de Noronha
(PE), o Arquipélago de São Pedro e São Paulo (PE) e a Reserva Biológica
Marinha do Atol das Rocas (RN). O território da região corresponde a 18%
do território do país, e possui o mesmo tamanho do Estado do Amazonas. O
Nordeste contava com 53.081.950 habitantes em 2010 (IBGE, 2010), segunda
região mais populosa do país, concentrando 30% da população brasileira. Sua
população é predominantemente urbana, 82,3% do total.

NOTA

Quando se diz que é uma região populosa, quer se destacar o total de habitantes
que ela apresenta, quantos indivíduos vivem ali. Isso é diferente de uma região povoada, que
se refere à distribuição da população em um território, o que é mensurado pela densidade
demográfica (número de habitantes por quilômetro quadrado).

O mapa a seguir destaca seus nove Estados e mostra sua localização


no território brasileiro, mais ao norte banhado pelo Oceano Atlântico. Isso
é importante para entender a diferença do clima e vegetação do Nordeste: no
litoral, apresenta-se um clima tropical úmido, com uma vegetação exuberante
e rios permanentes; no interior, um clima seco e o bioma da caatinga, semiárido
com rios que secam periodicamente. Isso não apenas influencia no clima de fato,
mas na dinâmica social e econômica da região, como vamos ver adiante.

75
UNIDADE 2 | CONHECENDO O BRASIL CONTEMPORÂNEO

FIGURA 34 – MAPA DO BRASIL COM DESTAQUE À REGIÃO NORDESTE

FONTE: Disponível em: <http://pt.wikipedia.org/wiki/Ficheiro:Brazil_Region_Nordeste.svg>.


Acesso em: 14 nov. 2013.

3.2 FORMAÇÃO SOCIOCULTURAL


A região Nordeste é a ocupação branca mais antiga do país. Foi em 1500
que os portugueses iniciaram seu processo de colonização no país, chegando
justamente em praias baianas. Claro que antes existiam populações indígenas,
mas essa foi a região que mais sofreu perdas dessas populações.

Ali foi construída a base econômica e política no início da colonização. A


estrutura concebida pelos portugueses permaneceu por longos anos, de produção
canavieira para exportação e com exploração da mão de obra escrava negra
(BERNARDES, 2007). Em um primeiro momento se utilizaram de populações
escravas indígenas, que foram logo substituídas por indivíduos capturados e
trazidos do continente africano.

Sem entrar nos detalhes sobre o lado cruel da estrutura de produção


portuguesa no início da colonização, é importante ter este fato em mente para
entender como está disposta a constituição social do Nordeste. O processo de
formação histórica reflete-se nas características dos dias atuais, sejam elas
culturais, sociais, econômicas, de território (BERNARDES, 2007).

Em primeiro lugar, o grande fluxo de população africana trazida pelos


portugueses fez com que se constituísse uma forte tradição afrodescendente. Ela
está presente na religião, nas crenças populares, nas manifestações artísticas. Na
religião pode-se citar o candomblé e a umbanda com seus orixás, a língua iorubá; na
76
TÓPICO 1 | A QUESTÃO REGIONAL NO BRASIL

música, o maracatu, o afoxé, o samba de roda; na dança, o jongo; na luta, a capoeira;


na culinária, o vatapá e o acarajé. Todos esses elementos têm origem na cultura
africana e sofrem transformações depois de chegarem ao Brasil, criando caminhos
próprios distintos do seu lugar de origem, o continente africano. Por isso, essa
denominação de afrodescendente, pois não são elementos puramente africanos e,
sim, transformados no território brasileiro com descendência africana. Isso criou uma
identidade relacionada à negritude contundente na região, porém não exclusiva, já
que essas características estão presentes por todo o território nacional.

É importante também pensar os elementos de sincretismo presentes


na formação cultural do Nordeste. Sincretismo significa a combinação de dois
ou mais elementos de origens distintas, que formam outro elemento cultural.
Um exemplo de sincretismo religioso é o candomblé, que reúne elementos de
religiões africanas com algumas perspectivas do cristianismo português. Um
evento tradicional em Salvador (BA) é a lavagem das escadarias do Senhor do
Bonfim, praticado por seguidores de religiões afrodescendentes em uma igreja
católica, conforme a figura as seguir.

FIGURA 35 – LAVAGEM DAS ESCADARIAS DA IGREJA DO SENHOR DO BONFIM

FONTE: Disponível em: <http://www.geledes.org.br/patrimonio-cultural/artistico-esportivo/manifestacoes-


culturais/8819-cineasta-brasileiro-busca-origens-da-lavagem-do-bonfim-na-africa>. Acesso em: 17 nov. 2013.

Em segundo lugar, pode-se falar que o Nordeste possui um ritmo histórico


mais antigo e duradouro dentre as regiões do Brasil: é o único lugar onde se
pode afirmar que são 500 anos de história desde a chegada dos portugueses. Isso
trouxe uma estrutura, um sistema antigo e fortemente arraigado aos costumes e
hábitos da população da região. Isso teria reflexo em traços das formas políticas
de algumas regiões até os dias de hoje, com um indivíduo que possui o poder
central e estabelece trocas com a população que vive ali, mais popularmente
conhecido como coronelismo (BERNARDES, 2007). Esse traço teria origem nas
relações desde a monarquia e suas capitanias instituídas na região, onde uma
pessoa possuía o poder sobre uma grande porção de terra.
77
UNIDADE 2 | CONHECENDO O BRASIL CONTEMPORÂNEO

NOTA

As capitanias foram a estrutura de administração territorial implantada pelo


império de Portugal, associada à produção de cana-de-açúcar do início do século XVI até
o século XVIII. Foram 15 capitanias, ou seja, o território português no Brasil foi dividido em
15 partes, e cada uma foi doada para um nobre português realizar a exploração do território.

3.3 ECONOMIA
O modelo de produção do período de colonização não se reflete apenas
em termos culturais, mas também em estruturas econômicas importantes que
resistem e influenciam os dias de hoje.

[...] comungando com esse contexto está o fato de que persistem na


região estruturas tradicionais e excludentes, como a concentração de
renda, da terra e do poder político, o que ganha forma e dinâmica
através do latifúndio, das péssimas condições de vida de parte da
população e da perpetuação de grupos políticos ligados ao poder na
região (ROCHA; OLIVEIRA, 2011, p. 150).

Essa herança deixada pelo período colonial está presente principalmente
na área do sertão nordestino, no interior da região, caracterizado pelo semiárido.
Ainda hoje existem grandes latifúndios que dominam seu território, fazendas
enormes que muito têm a ver com as capitanias que citamos anteriormente.
Diferente da produção de cana-de-açúcar do período anterior, sua economia gira
em torno da pecuária extensiva, com grandes pedaços de terra ocupados pelo gado.
Também se produz algodão na região. E, por fim, pode-se citar a agricultura de
subsistência, mandioca, arroz, feijão, que é realizada pelos pequenos agricultores
ou também pelas famílias que trabalham para os donos das grandes fazendas
(ROCHA; OLIVEIRA, 2011).

Já a área litorânea, conhecida como Zona da Mata, apresenta outro tipo de


economia. Ela sofre influência da produção portuguesa de forma mais presente,
já que foi a principal região ocupada no período colonial. Assim, ainda existe
uma economia canavieira, agora associada a usinas de álcool e açúcar. Também
se inseriu a produção de cacau, um dos produtos mais valorizados no Brasil,
e o tabaco (ROCHA; OLIVEIRA, 2011). Além disso, a costa baiana possui uma
extração e beneficiamento de petróleo significativo, mais especificamente no
Recôncavo Baiano. Por fim, não podemos esquecer da atividade do turismo,
realizada por todo o litoral, com destaque especial para Salvador (BA) e Recife
(PE). Essa última é responsável pela renda de grande parcela da população,
empregada por empresas hoteleiras, restaurantes, museus, comércio em geral.

78
TÓPICO 1 | A QUESTÃO REGIONAL NO BRASIL

3.4 OUTRAS QUESTÕES...


Também associado ao contraste da natureza nordestina, o quase deserto no
interior e as exuberantes praias no litoral, podemos citar o fenômeno da migração
relacionada às secas. Periodicamente, uma massa de indivíduos foge das fortes
secas que acontecem no interior, que apresenta um precário abastecimento de água
e a dificuldade de sustentar sua vida e da sua família, em busca de empregos nas
áreas litorâneas (ROCHA; OLIVEIRA, 2011). Isso também está associado à vinda
maciça de migrantes para a região do Sudeste nas décadas de 80 até 2000.

DICAS

O livro Morte e Vida Severina, de João Cabral de Melo Neto, mostra, de forma
lírica, os percalços e sofrimento da vida no sertão nordestino, como também o contraste
entre a vida no interior e a vida no litoral. Acompanhe um trecho:

O RETIRANTE CHEGA À ZONA DA


MATA, QUE O FAZ PENSAR, OUTRA VEZ,
EM INTERROMPER A VIAGEM.

—— Bem me diziam que a terra


se faz mais branda e macia
quando mais do litoral
a viagem se aproxima.
Agora afinal cheguei
nesta terra que diziam.
Como ela é uma terra doce
para os pés e para a vista.
Os rios que correm aqui
têm água vitalícia.
[...]
Não tenho medo de terra
(cavei pedra toda a vida),
e para quem lutou a braço
contra a piçarra da Caatinga
será fácil amansar
esta aqui, tão feminina.

Conhecemos um pouco da região Nordeste e a importância da herança


colonial portuguesa para sua formação até o momento contemporâneo. Agora será
apresentada a região Norte.

4 REGIÃO NORTE
Quando se pensa na região Norte, logo se associa a imensidão e riqueza
da floresta amazônica, que é de fato o bioma predominante da região. Mas não só
as árvores compõem essa região, ela possui uma colonização portuguesa antiga
e, nos dias de hoje, possui grandes metrópoles, como Belém (PA) e Manaus
79
UNIDADE 2 | CONHECENDO O BRASIL CONTEMPORÂNEO

(AM), além de ser o principal polo de produção mineral no país. Um exemplo


disso é que o Norte foi a região com maior crescimento populacional desde a
década de 1980 (DINIZ, 1995). Isso acontece pela massa de migrantes atraídas
pelas possibilidades por lá oferecidas, e o crescimento potencial que está por vir.
Assim, ela se mostra como um polo de atração por tudo o que oferece ao país.

4.1 CARACTERIZAÇÃO GERAL


A região Norte é formada por sete unidades da Federação: Acre, Amapá,
Amazonas, Pará, Rondônia, Roraima e Tocantins. Juntos eles possuem 42,3% do
território nacional do país. O mapa abaixo traz a grandeza da região em termos
territoriais, sendo que o maior Estado do país se situa na região: o Amazonas.
Segundo os dados do Censo, em 2010 sua população estava em 15.864.454
habitantes, o que representa 8,3% da população do país (IBGE, 2010), um grande
contraste entre o tamanho do território e o número de habitantes. Isso é decorrente
de diversos fatores, dentre os quais se destaca a concentração de territórios
destinados à preservação de biodiversidade e de comunidades tradicionais, entre
outros pontos, como a colonização maciça mais recente. Por exemplo, as reservas
indígenas ocupam 21,7% do território amazônico, segundo dados do ISA (2013).
Assim como no restante do país, sua população se concentra nas cidades, com
77,9% dos moradores vivendo em área urbana (IBGE, 2010).

FIGURA 36 – MAPA DO BRASIL COM DESTAQUE À REGIÃO NORTE

FONTE: Disponível em: <http://pt.wikipedia.org/wiki/Ficheiro:Brazil_Region_Norte.svg>.


Acesso em: 14 nov. 2013.

80
TÓPICO 1 | A QUESTÃO REGIONAL NO BRASIL

NOTA

Os povos tradicionais não envolvem apenas grupos indígenas. É todo povo que
possui uma cultura e uma organização social diferenciada. Eles possuem conhecimentos,
inovações e práticas tradicionais transmitidos de geração para geração. Assim, essa categoria
abrange os povos indígenas, os quilombolas, os ribeirinhos, os pomeranos, dentre outros.

4.2 FORMAÇÃO SOCIOCULTURAL


Sua ocupação acontece principalmente a partir da década de 1960, com
ações do regime militar para o estabelecimento naquelas terras, consideradas
como “vazio demográfico” (ou seja, sem nenhuma população). O que não se
reconhecia era que aquelas terras já eram habitadas por populações indígenas
tradicionais, que ali estavam antes da chegada dos portugueses no país. Além
disso, já havia lugares colonizados pelos próprios ditos “brancos”, que faziam
comércio e extração das riquezas naturais encontradas na região através dos
grandes rios de fácil navegação. Um exemplo disso é a cidade de Santarém,
que é elevada à categoria de município em 1848, mas que na verdade possui
registros sistemáticos de sua ocupação desde o século XVII. Ou seja, existe uma
ocupação antiga da região, mas a intervenção do Governo Federal acontece, de
fato, a partir de 1960.

Essa visão obscurecida das populações indígenas que ali viviam traz
como reflexo um dos grandes impasses vividos nos dias de hoje: a questão
da demarcação de terras indígenas. Não é algo exclusivo da região, mas é um
aspecto forte, pela quantidade de povos tradicionais que ali habitam. Cerca de
180 povos indígenas vivem na região, que somados são aproximadamente 208
mil indivíduos. A demarcação de suas terras foi reconhecida pela Constituição
de 1988, com direito ao usufruto exclusivo das riquezas naturais nelas existentes
(HECK; LOEBENS; CARVALHO, 2013).

81
UNIDADE 2 | CONHECENDO O BRASIL CONTEMPORÂNEO

FIGURA 37 – FAMÍLIA INDÍGENA DO XINGU

FONTE: Disponível em: <http://palavrastodaspalavras.wordpress.com/2008/06/29/os-povos-


indiginas-do-xingu-e-a-hidreletrica-belo-monte-por-dom-erwim-krautler-bispo-do-xingu/>.
Acesso em: 17 nov. 2013.

Um dos casos emblemáticos da disputa entre os povos tradicionais e


a população que tomou terras por outros meios (doação do Governo Federal,
grilagem) foi o caso da Raposa Serra do Sol, em Roraima, a partir de 2005. Após
análises realizadas pelo Governo Federal através da Fundação Nacional do Índio
(Funai), órgão responsável pelos estudos, reconheceu-se o território dos povos
Macuxi, Wapichana, Ingaricó e Taurepang. Contudo, um grupo de grandes
produtores de arroz não aceitou e agiu juntamente com o governo estadual,
que realizou manobras de bloqueio da efetivação da demarcação. Isso gerou
um conflito judicial e físico entre os grupos indígenas e os produtores do local,
com perdas de vida indígenas e não indígenas (HECK; LOEBENS; CARVALHO,
2013). Isso é um exemplo das disputas que acontecem nos dias atuais em outros
lugares da Amazônia e do Brasil.

NOTA

A região amazônica está presente em grande parte da região, mas expande sua
fronteira ocupando pequenas porções do território do Centro-Oeste e Nordeste.

Retomando os projetos de ocupação, eles aconteceram principalmente


entre os anos 1960 e 1980, através da intervenção do Governo Federal, com medidas
que propunham o fortalecimento da região. Era uma perspectiva de ocupar para
não perder o território, com incentivo à migração e a novos empreendimentos
símbolos do desenvolvimento, como rodovias e hidrelétricas (BECKER, 1999).
Isso fez com que a região se modificasse significativamente, com um grande fluxo
de pessoas que ali se instalaram.

82
TÓPICO 1 | A QUESTÃO REGIONAL NO BRASIL

Esses dois pontos marcam as características culturais até os dias atuais. Por
um lado, existe a população indígena, com os principais símbolos da região (danças,
pinturas, comida). Entretanto, essa massa de migrantes vinda de diversos lugares do
país, em especial do Nordeste, também traz outro aspecto do caldeirão cultural ali
encontrado. Esses fluxos migratórios são essenciais para compreender a formação da
população do Norte do país e não podem ser ignorados (CRAICE; SOUZA, 2013).

4.3 ECONOMIA
Entre as capitais dos Estados da região, duas foram fundamentais nos
planos da integração do território proposto pelo regime militar: Belém e Manaus.
Na verdade, ambas possuem destaque desde o início do século XX, com o “ciclo
da borracha”, quando essas capitais concentraram os portos e, consequentemente,
a comercialização do produto (BECKER, 2009). Essa centralidade comercial
também provoca uma atração de população a esses municípios desde o período.

Na atualidade, as duas capitais se configuram como metrópoles do país.


Isso significa que as capitais se tornaram grandes centros urbanos, em termos
territoriais, populacionais e econômicos. Além disso, concentram uma considerável
infraestrutura de saúde (como hospitais especializados) e de educação (como
universidades, centros de pesquisa). Assim, elas são capazes de exercer forte
influência na população regional, que busca esses serviços nesses lugares. Além
disso, as capitais Belém e Manaus exercem uma ligação entre o território nacional
e, por vezes, internacionais, que buscam entrar e estabelecer relações na região. E
o inverso também: população da região que busca estabelecer relações fora dali.

Na dimensão econômica, o regime militar passa a tratar a


Amazônia como região prioritária de desenvolvimento, impulsionando o
desenvolvimento econômico. Dentro dessas ações, criou-se a Zona Franca
de Manaus, que incentivava a instalação de indústrias. Apesar de a região
ter passado por uma crise na década de 1990, sua criação foi determinante
para que as indústrias situadas na região Norte estivessem presentes
principalmente no Amazonas (DINIZ, 1995). Mas é uma produção industrial
pouco significativa em contexto brasileiro.

A economia da região Norte é baseada no extrativismo vegetal (madeira,


látex, açaí, cacau) e mineral (cassiterita, ferro, ouro). A opção pelo extrativismo
está, por um lado, associada ao modo de vida da população tradicional, juntamente
com a riqueza e imensidão da flora e fauna presentes na região. Mas, por outro
lado, está relacionada com a visão que o Governo Federal possuía no período do
regime militar e que permanece presente até os dias de hoje: a região existe para
oferecer matéria-prima, em especial os minérios e madeira, para a produção do
restante do país.

Isso pode ser mais bem compreendido nos grandes projetos (rodovias,
hidrelétricas, extração mineral de grande porte) propostos pelo governo que são
realizados ali desde a década de 1960. Esses projetos não buscam simplesmente
integrar a região ao país, mas também explorar seus recursos (BECKER, 2009). E

83
UNIDADE 2 | CONHECENDO O BRASIL CONTEMPORÂNEO

muitas vezes não há um real benefício para o Estado que os abriga e a sua população,
já que não é instalada a infraestrutura necessária para o desenvolvimento e
autonomia para além do momento de construção dos grandes projetos.

Como exemplo das hidrelétricas, pode-se citar o caso emblemático atual


de Belo Monte, que deverá ser a maior hidrelétrica do mundo. Muitas perguntas
foram colocadas sobre o projeto: qual o real benefício para a população que vive
no lugar da construção? A quem servirá de fato a energia elétrica produzida
ali? Como ficarão as populações que dependem do rio há séculos? Como ficará
a condição de um rio tão importante para a economia e a vivência do povo da
região, o rio Xingu? São perguntas que parecem essenciais para tornar realidade
algo tão grandioso, mas com respostas vagas.

FIGURA 38 – O RIO XINGU E AS OBRAS DE BELO MONTE

FONTE: Disponível em: <http://agenciabrasil.ebc.com.br/noticia/2013-05-31/belo-monte-indios-


aceitam-encontro-com-governo-mas-ocupacao-continua>. Acesso em: 17 nov. 2013.

DICAS

Não conhece a questão da hidrelétrica de Belo Monte? Acompanhe o


documentário “Belo Monte, Anúncio de uma Guerra”, sob direção de André D’Elia e diversos
apoiadores (grupos indígenas, pesquisadores, ONGs, população local) presentes ativamente na
região. Acesse o site <http://www.belomonteofilme.org/portal/> e veja o filme gratuitamente.

Mostramos aqui a complexidade que a região Norte apresenta, com


contrastes entre grandes centros urbanos e populações tradicionais, a floresta
exuberante e o concreto.
84
TÓPICO 1 | A QUESTÃO REGIONAL NO BRASIL

5 REGIÃO SUDESTE
O Sudeste é popularmente conhecido como o coração econômico do
Brasil. A imagem do Sudeste é recheada de superlativos: é a região mais populosa
(maior número de habitantes), com população vivendo em todas as suas partes,
mais industrializada, lugar que abriga os maiores centros urbanos do país (e,
no caso de São Paulo, do mundo), sinônimo de desenvolvimento tecnológico e
econômico. Enfim, diversas são as visões dessa parte do país, que ganha destaque
nas mídias pela centralidade e poderio que exerce no território nacional. Vamos
conhecer um pouco mais dessa região?

5.1 CARACTERIZAÇÃO GERAL


O Sudeste é composto por quatro Estados: Espírito Santo, Minas Gerais,
Rio de Janeiro e São Paulo. A região possui mais de 84 milhões de habitantes (IBGE,
2010), representando 44% da população total do país. Em termos de território é o
quarto e em termos de área, maior apenas que a região Sul. Ou seja, a região com
mais habitantes e uma das menores do país territorialmente, o que resulta em
alta densidade (que significa número de habitantes por quilômetro quadrado).
Assim, é a região mais urbanizada, com cerca de 90,5% dos moradores vivendo
nas cidades, com três das maiores metrópoles do país: São Paulo (SP), Rio de
Janeiro (RJ) e Belo Horizonte (MG). São Paulo conta com mais de 11 milhões de
habitantes, e o Rio, com mais de 6 milhões.

FIGURA 39 – SÃO PAULO E SUA DENSA POVOAÇÃO

FONTE: Disponível em: <http://asimplicidadedascoisas.wordpress.com/2012/06/13/sao-paulo-e-a-


cidade-latino-americana-mais-cara-para-se-viver/>. Acesso em: 22 nov. 2013.

85
UNIDADE 2 | CONHECENDO O BRASIL CONTEMPORÂNEO

Outro aspecto importante é a vegetação da região. Como se pode


verificar no mapa a seguir, a região sofre influência do mar, o que facilitou o
desenvolvimento de uma floresta tropical, rica e exuberante, a Mata Atlântica.
Atualmente restam apenas por volta de 10% da área original, resultado do
intenso desenvolvimento econômico que a região sofreu. Outras vegetações são
a caatinga, para o Norte de Minas Gerais, e as araucárias, no Sul de São Paulo.

Outro aspecto interessante é o rio Tietê. Este é conhecido por atravessar o


Estado de São Paulo do Leste para o Oeste. Ele traça a geografia da maior cidade
do país, São Paulo, trecho que concentra intensa poluição, fazendo-o ser conhecido
como o rio mais poluído do Brasil. Isso também se associa ao desenvolvimento
intenso e crescimento desordenado do município. O esgoto e resíduos de centenas
de casas e indústrias fizeram deste rio um esgoto a céu aberto. Atualmente existe
um projeto de despoluição, o Projeto Tietê.

FIGURA 40 – MAPA DO BRASIL COM DESTAQUE À REGIÃO SUDESTE

FONTE: Disponível em: <http://pt.wikipedia.org/wiki/Ficheiro:Brazil_Region_Sudeste.svg>.


Acesso em: 14 nov. 2013.

DICAS

Você sabia que a maior parte dos grandes centros urbanos no Brasil foi
construída em cima de rios? Isso inclui o município de São Paulo, em que grande parte
dos rios foi encanada e servia de traçados para as principais vias que cortam a cidade e
por onde passam milhares de carros diariamente. O documentário Entre Rios mostra a
urbanização da maior cidade brasileira e a transformação dos seus rios. Busque na internet
ou confira em <http://vimeo.com/14770270>.

86
TÓPICO 1 | A QUESTÃO REGIONAL NO BRASIL

5.2 FORMAÇÃO SOCIOCULTURAL


Quando nos referimos ao Sudeste como a região mais desenvolvida e
povoada do país, conseguimos citar os fatores que explicam essa realidade?
Algumas questões podem nos ajudar, como a mineração em Minas Gerais no século
XVIII, o café em São Paulo e o fato de o Rio de Janeiro já ter sido a capital do Brasil.

Com o período de mineração em Minas Gerais aos finais do século XVII,


inicia-se o processo de interiorização de ocupação do país (ROCHA; OLIVEIRA,
2011). Não só a interiorização, como também o avanço às áreas mais ao sul
do território brasileiro. Como vimos anteriormente, o Nordeste concentrou as
atividades econômicas e a população no período colonial, e a mineração foi o
primeiro passo para os avanços a outros horizontes.

Nesse processo, a capital do país foi transferida de Salvador na Bahia para


o Rio de Janeiro, por ser mais próximo da região de mineração. Isso facilitaria o
escoamento pelos portos, o controle da atividade e, claro, os negócios em torno
das pedras preciosas. Ou seja, o Rio de Janeiro passa a ser a porta de entrada (e
saída) da riqueza e da população no país.

Outro ponto importante foi que a mineração atraiu milhares de migrantes


para as áreas de Minas Gerais e também do Rio de Janeiro. Além, claro, que parte
da atividade era realizada por escravos. Com o declínio da mineração no século
XVIII, grande parte da sua população buscou seus meios de vida em outro lugar,
mas a atividade marcou profundamente a cultura da região. Pode-se observar este
fato nos municípios próximos a Ouro Preto e Mariana, sua arquitetura fortemente de
inspiração portuguesa, suas igrejas banhadas a ouro. E marca também uma mudança
na ocupação do país, essencial para entender o papel do Sudeste até os dias de hoje.

Ao mesmo tempo em que declina a mineração, expande a produção do


café em São Paulo. Com as atividades da cana-de-açúcar em uma iminente
crise, um expressivo fluxo de imigrantes chegou do Nordeste. Após a abolição
da escravatura, esse fluxo se intensificou, principalmente rumo à capital Rio de
Janeiro. Outro ponto importante foi a chegada de milhares de imigrantes vindos
da Itália, Espanha, Alemanha, principalmente (ROCHA; OLIVEIRA, 2011). Com a
indústria do café, também se construiu uma estrutura ferroviária para transportar
a produção para o Porto de Santos, facilitando o transporte de cargas e de pessoas
para São Paulo.

Todos esses fatores, entre outros pontos que se sucederam posteriormente,


contribuíram para que o Sudeste adquirisse a centralidade e atração que exerceu
por todo o século XX até os dias de hoje. O que se pode notar é que a conjuntura
econômica somada a ações estratégicas do governo, como a implantação de
ferrovias, fez com que o Sudeste ganhasse o destaque que possui, exercendo
o fascínio que atraiu e atrai até os dias de hoje muitos imigrantes. Além disso,
as outras regiões, por muito tempo, foram profundamente dependentes das
estruturas estabelecidas na região.

87
UNIDADE 2 | CONHECENDO O BRASIL CONTEMPORÂNEO

A intensa imigração nordestina também foi um ponto importante nos


meados do século XX, entre 1960 e 1970. O poder de atração de São Paulo,
Rio de Janeiro e Minas Gerais, juntamente com problemas econômicos que as
outras regiões do país enfrentaram, estimulou um fluxo intenso e provocou o
inchaço dessas regiões, em especial a capital de São Paulo. Na verdade, esses
imigrantes foram essenciais para a construção do Estado paulista, servindo de
mão de obra fundamental nas indústrias e na construção civil, principalmente.
Também ajudaram a construir a São Paulo mito, fonte de promessas de emprego
e de uma vida melhor. O mito criado esconde as profundas desigualdades nos
municípios paulistas e do Sudeste quase como um todo, enfrentando situações
de miséria e moradias precárias.

São Paulo e Rio de Janeiro tornaram-se cidades de migrantes, sendo


a história, o sonho, a decepção desses indivíduos contada e recriada
em nossas músicas e obras de arte [...], que retratam as angústias
do migrante nordestino ao chegar a cidades como São Paulo e Rio
de Janeiro. São Paulo também destaca-se como a cidade com maior
número de migrantes japoneses, italianos e portugueses do país,
chegando a formar bairros com essas comunidades estrangeiras: bairro
da Liberdade (japoneses), Bixiga e Braz (italianos) e Vila Olímpia
(portugueses). Já no Rio de Janeiro temos a Feira de São Cristóvão,
que surge da necessidade natural dos migrantes nordestinos se
encontrarem consigo mesmos através de sua cultura (música, poesia,
gastronomia, conterrâneos etc.) (ROCHA; OLIVEIRA, 2011, p. 259)

Deste modo, o Sudeste se caracteriza por essa mistura de tradições e


culturas vindas de outras partes do Brasil e do mundo. E apesar de ainda exercer
certo atrativo para migrantes de diferentes partes do país, o fluxo decaiu a partir
dos anos 2000. E uma parte considerável da população nordestina está preferindo
voltar à sua região de origem.

5.3 ECONOMIA
Retomando o ponto da produção cafeeira, ainda restam algumas questões
sobre como a economia do Sudeste adquiriu tamanha centralidade. Rocha e
Oliveira (2011, p. 252) respondem a essa questão.

Mas que fatores levaram a essa imensa concentração da atividade


industrial nos Estados da região Sudeste? Foram vários, no entanto,
destacamos os seguintes: em meio à expansão da lavoura cafeeira,
as cidades existentes cresceram e muitas outras foram sendo criadas;
a produção, que por muito tempo fora realizada pela mão de obra
escrava, passou a ser implementada por trabalhadores livres (sobretudo
migrantes italianos). Isso significava que podiam comprar produtores
para o seu próprio consumo. Além disso, muitos desses trabalhadores
vieram da Europa e estavam acostumados ao trabalho fabril, isto
é, sabiam lidar com as máquinas industriais. Aliás, os imigrantes
influenciaram fortemente a dinâmica econômica da cidade paulista.
A maioria dos primeiros grandes industriais de São Paulo - como
Matarazzo e os Crespi – constituiu o grupo dos chamados “condes
italianos”, cuja proeminência só foi ultrapassada com o correr dos anos.

88
TÓPICO 1 | A QUESTÃO REGIONAL NO BRASIL

O trecho mostra as condições fundamentais para a centralidade


econômica do Sudeste: primeiro, havia mão de obra que já dominava as técnicas
das máquinas fabris, os imigrantes europeus; segundo, a figura do trabalhador
livre era predominante, aquele que ganhava o salário pelo seu trabalho e poderia,
assim, comprar os produtos; terceiro, existiam pessoas interessadas em investir
em indústrias e não mais na produção agrícola, os tais “condes italianos”. A
industrialização foi importante, pois empregava um grande número de pessoas,
concentrando essa população em centros urbanos e estava associada ao processo
de modernização que se inicia. Ou seja, esse processo de modernização tem início
no Sudeste e vai sendo implementado gradualmente em outras regiões do país.

Outros fatores também devem ser destacados. O Sudeste passa a ser o


centro de negócios de toda a produção agrícola que visava à exportação (café,
cana-de-açúcar, cacau, entre outros). Assim, quanto mais se produzia no campo,
mais os grandes centros da região ganhavam importância.

Outro ponto diz respeito à intervenção do Estado. Ele influenciou, por


exemplo, na concentração da instalação de indústrias e das sedes de grandes
empresas nos centros urbanos, oferecendo incentivos, entre outros atrativos
(ROCHA; OLIVEIRA, 2011). Também construiu uma malha de rodovias densa
e de qualidade que tornava os trajetos pelo Sudeste mais fluidos e ágeis que
no restante do país.

Deste modo, a infraestrutura e a concentração de empresas fazem


do Sudeste o maior centro econômico do país. Sua economia gira em torno
das indústrias. Um exemplo é a indústria automobilística: em 2008, 43,7%
funcionavam no Estado de São Paulo e outros 24,6% em Minas Gerais. Ou seja,
68,3% das indústrias nesse setor se situavam no Sudeste.

FIGURA 41 – ÁREA ALTAMENTE INDUSTRIALIZADA EM SÃO PAULO

FONTE: Disponível em: <www.vitruvius.com.br>. Acesso em: 25 nov. 2013.

89
UNIDADE 2 | CONHECENDO O BRASIL CONTEMPORÂNEO

É importante ressaltar outros aspectos de sua economia, pois ela


é extremamente diversificada. Em termos de agricultura, suas terras são
extremamente férteis, com destaque para as produções de cana-de-açúcar, café,
algodão e laranja. Para se ter uma dimensão da importância, cerca de 50% da cana-
de-açúcar produzida no Brasil está em áreas do Sudeste. Também o extrativismo
mineral do Estado de Minas Gerais, com ferro, manganês e ouro, e a extração de
petróleo do Rio de Janeiro, movimentam intensamente a economia da região.

6 REGIÃO SUL
Prosseguindo com nossa discussão sobre as regiões do Brasil, chegamos à
nossa última (mas não menos importante), a região Sul. Suas principais referências
passam pelos costumes tradicionais, principalmente de origem alemã, com festas
e danças, pela alta qualidade de vida que seu povo vive, pela sua vasta produção
rural. Vamos, então, conhecê-la melhor?

6.1 CONTEXTUALIZAÇÃO GERAL


O Sul conta com três unidades da Federação: Paraná, Santa Catarina
e Rio Grande de Sul. Em 2010 sua população totalizou 27.386.891 habitantes,
a terceira região mais populosa do país (IBGE, 2010). É a menor região em
termos de área, com 576.409 km2. Interessante pensar que sua área é superior
ao território de um país, a França, ao mesmo tempo em que é menor que a de
outro Estado brasileiro, Minas Gerais. Sua população vive predominantemente
nas cidades, 84,9% do total, mas há discussões que mostram que parte de sua
população urbana possui relação forte com o campo.

Importante ressaltar que a região faz fronteira com três países latino-
americanos: o Paraguai, a Argentina e o Uruguai, além de todos os seus Estados
terem saída para o mar. De um lado, estabelece relação com outros países,
de outro, escoa a produção pelo oceano (ROCHA; OLIVEIRA, 2011). Isso é
importante, principalmente em termos econômicos, pois se configura como
área estratégica para estabelecer relações com os países vizinhos.

Sobre a geografia, podemos destacar o clima. Como se pode observar


no mapa abaixo, a região localiza-se no extremo sul do Brasil, sendo a única
região do país que está fora da área tropical, apresentando clima subtropical
na maior parte do território. Isso quer dizer que sua população enfrenta as
temperaturas mais baixas, entre 12 e 20°C graus. No Morro da Igreja, em Santa
Catarina, se registrou a temperatura mais baixa do Brasil, -17,8 °C. A localização,
juntamente com a temperatura, também influencia na vegetação da região, com
a Mata das Araucárias e o pampa gaúcho. Infelizmente, a Mata das Araucárias
foi extremamente devastada, por conta da construção de estradas na época do
Império e pela indústria madeireira, restando apenas trechos em áreas mais
elevadas dos Estados.

90
TÓPICO 1 | A QUESTÃO REGIONAL NO BRASIL

FIGURA 42 – MAPA DO BRASIL COM DESTAQUE À REGIÃO SUL

FONTE: Disponível em: <http://pt.wikipedia.org/wiki/Ficheiro:South_Region_in_Brazil.svg>.


Acesso em: 14 nov. 2013.

6.2 FORMAÇÃO SOCIOCULTURAL


A região Sul não possui uma ocupação de colonização tão antiga como o
Nordeste, datada do período colonial, nem tão recente como o Norte e Centro-
Oeste, que aconteceu no último século. Seria algo no intermédio desses dois tempos.

O processo de ocupação data do período imperial. Os monarcas


brasileiros ofereceram lotes para imigrantes no sul do país para levarem a vida
como pequenos agricultores. Idealizava-se um processo de ocupação com o
desenvolvimento da agricultura. A preocupação em ocupar a área era tão grande
que não apenas oferecia-se o lote, mas também subsídio de passagens entre os
países para toda a família e o transporte no Brasil, do porto até as fazendas. O
objetivo era atrair famílias pobres para um país que possuía diferença climática
gritante e pouca infraestrutura (ROCHA; OLIVEIRA, 2011).

Primeiro vieram os alemães, sendo que a primeira colônia foi fundada


em 1824, com o nome de São Leopoldo, no Rio Grande do Sul. A partir de 1870,
começam a chegar os italianos. Esses dois países, a Alemanha e a Itália, são as
principais origens dos grupos que colonizaram a região.

[...] é importante destacar o relativo isolamento em que permaneceram,


durante algum tempo, os primeiros imigrantes alemães que se
estabeleceram na serra gaúcha. Como se tratava de uma área de
difícil acesso, ainda não incorporada à dinâmica produtiva da região
e com ocorrência de ataques indígenas, a falta de assistência do
império brasileiro teve impactos prolongados sobre os imigrantes.
Eles permaneceram falando e ensinando o alemão a seus filhos. Eram
imigrantes que construíam suas escolas e providenciavam professores.
Poucas localidades recebiam assistência religiosa, e a presença do
Estado brasileiro só se fazia sentir nos períodos de conflitos armados,

91
UNIDADE 2 | CONHECENDO O BRASIL CONTEMPORÂNEO

em que os alemães eram convocados a lutar (mesmo que não


dispusessem de equipamentos e sequer falassem português) e para a
cobrança de impostos (ROCHA; OLIVEIRA, 2011, p. 284)

De fato, permanecem fortes as tradições, hábitos e costumes de origem
europeia entre a população da região, marcando os elementos centrais da
identidade da região (ROCHA; OLIVEIRA, 2011). Nesse descaso do governo
brasileiro por um longo tempo, os grupos que chegavam viam-se obrigados
a cuidar não apenas de suas propriedades, mas também das terras públicas,
organizando a educação, a saúde e a cultura. Nesse sentido, foram fundadas
inúmeras colônias que se transformaram nas cidades da atualidade. Aquelas de
origem alemã: Sinos, Jacuí, no Paraná; Blumenau, Brusque, Pomerode, em Santa
Catarina; Ijuí e Novo Hamburgo, no Rio Grande do Sul. Também aquelas de
origem italiana, como Caxias do Sul, Garibaldi e Bento Gonçalves.

FIGURA 43 – DANÇA TÍPICA ALEMÃ E PREFEITURA MUNICIPAL DE BLUMENAU EM ESTILO ENXAIMEL

FONTE: Disponíveis em: <http://kulturundtradition.blogspot.com.br/2012/05/cultura-alema.


html> e <jaimebatistadasilva.blogspot.com>. Acesso em: 23 nov. 2013.

A influência dessa colonização fortemente europeia pode ser observada


nos resultados da declaração de raça/cor do Censo 2010. Pouco mais de 78% da
sua população se declara como branca, enquanto a média do país com a mesma
definição é menos de 50% (IBGE, 2010). Já a declaração mais comum no país, a
raça/cor parda, não chega a 15% na região Sul.

6.3 ECONOMIA
Obviamente, a economia da região Sul tem profundas relações e
reflexos da forma como aconteceu sua ocupação e quem ali chegou. Primeiro, a
característica de lotes pequenos e propriedades familiares permanece (ROCHA;
OLIVEIRA, 2011). Produtos tradicionalmente cultivados por esses imigrantes,
como feijão, milho e mandioca, além da produção do próprio vinho e da carne
de porco defumada, frutas para compotas e geleias, ainda fazem parte das bases
econômicas da região.

92
TÓPICO 1 | A QUESTÃO REGIONAL NO BRASIL

Alguns produtos agora são produzidos por estruturas mais capitalistas


e em maior quantidade. Por exemplo, há forte presença na região de indústrias
frigoríficas. Em 2003, a região possuía 43% do rebanho nacional de suínos por
conta disso. Também se destaca a produção de alimentos defumados e embutidos
relacionada a essa cultura tradicional da carne suína.

Outra grande produção tradicional da região são as uvas e, consequentemente,


os vinhos. Em 2009, o Estado do Rio Grande do Sul foi responsável por cerca de
90% da produção nacional de produção de uvas, vinhos e derivados, assim como a
sua comercialização (MELLO, 2010).

Outro setor importante para a economia do Sul é a indústria de móveis e


calçados. Isso se explica por conta de boa parte dos imigrantes ser composta por
artesãos e possuir domínio de técnicas do manuseamento e fabricação das peças.
Além, claro, da grande disponibilidade de matéria-prima, como o gado utilizado
para a fabricação de sapatos com o seu couro.

Esse é outro setor importante para a região, a pecuária. Seu estabelecimento


se deu por conta das grandes áreas de pastagens naturais, que favorecem sua
produção. Atualmente, a atividade ocupa grande parte do território da região e
alimenta tanto os frigoríficos como os curtumes da produção de couro.

O próprio tipo de colonização da área do Vale do Itajaí, no centro do Estado


de Santa Catarina, é associado à intensa presença de indústrias. Primeiro, esses
colonos não tinham fácil acesso a estabelecimentos comerciais que oferecessem
utensílios agrícolas e também a atividades domésticas, como velas, móveis,
peças de montaria etc. Desse modo, essa população fabricava seus próprios
utensílios. Segundo, a região do Vale, que se situa mais para o centro do Estado
de Santa Catarina e distante do litoral, não estava em nenhuma rota comercial de
interesse luso-brasileira na época (ROCHA; OLIVEIRA, 2011). Cooperavam com
essa distância as dificuldades geográficas de se chegar até o Vale, com encostas
íngremes e vegetação densa. Isso, por um lado, deixou os imigrantes parcialmente
isolados por um tempo, mas, ao mesmo tempo, estimulou o desenvolvimento de
técnicas para a fabricação de diversos utensílios, culminando na intensa produção
industrial existente na região.

Não à toa, a região Sul é a segunda região mais industrializada do país.


Destaca-se a região do Vale do Itajaí (SC) com a área têxtil, também Curitiba e
Londrina (PR), Joinville (SC), Caxias do Sul e Pelotas (RS). É a segunda maior
população em termos de volume de trabalhadores empregados em atividades
industriais.

93
UNIDADE 2 | CONHECENDO O BRASIL CONTEMPORÂNEO

6.4 OUTRAS QUESTÕES


Por fim, cabe destacar que os indicadores de vida na região são os melhores
de todo o país. Alguns municípios com destaque ilustram bem esses indicadores:

6.4.1 A mais segura


Os índices de criminalidade de Maringá, no noroeste paranaense, são
comparáveis aos de Amsterdã, a capital da Holanda. Sua taxa de homicídios
é de 7,9 para cada 100.000 pessoas. No resto do país, alcança 35,5. A cidade
venceu o crime ao criar um canal permanente de comunicação entre polícia
e a sociedade, que, hoje, paga algumas despesas da corporação.

6.4.2 A mais alfabetizada

Menos de 1% da população com mais de 15 anos de São João do


Oeste, no Oeste catarinense, é analfabeta. A taxa é semelhante à do Japão.
A erradicação do analfabetismo deve-se ao empenho dos padres de origem
alemã, que construíram uma igreja e uma escola logo que a região foi
povoada, nos anos 30.

6.4.3 Onde mais se lê

Os habitantes da gaúcha Passo Fundo leem, em média, 6,5 livros


por ano – um índice próximo ao francês e mais de três vezes superior ao
brasileiro. Para alardear o feito, a prefeitura inaugurou em março de 2008
um monumento de metal de 13 metros de altura chamado Árvore das
Letras.

6.4.4 O melhor sistema de saúde


Santa Cruz do Sul é mais conhecida como a capital do fumo. No
nordeste gaúcho, a cidade abriga o maior complexo beneficiador de fumo
da América Latina. No entanto, gasta 30% do seu orçamento com saúde. A
cobertura do sistema público alcança 90% da população, muito acima do
padrão de 25% recomendado pela Organização Mundial da Saúde.

FONTE: Rocha e Oliveira (2011, p. 280-281)

Observou que interessante? Veja que também é a região com menor taxa
de analfabetismo. São dados importantes que ilustram aspectos da região e que a
fazem tão conhecida pela sua qualidade de vida.

94
TÓPICO 1 | A QUESTÃO REGIONAL NO BRASIL

O texto para a leitura complementar foi retirado do Portal Brasilianas


<http://www.brasilianasorg.com.br/>. Esse portal tem como proposta fomentar o
debate com temas recentes do Brasil e do mundo, e aproximá-lo do público em geral
através das mídias sociais. O convite para que o público participe ativamente se dá
por comentários e sugestões em geral. Sobre o texto especificamente, ele tem origem
num seminário promovido pelo Portal Brasilianas, e suas palestras estão disponíveis
em vídeo no endereço <http://www.youtube.com/watch?v=6SYqyewRoJ8 >.

LEITURA COMPLEMENTAR

O retrato da desigualdade regional no Brasil


País cresce mantendo desigualdades regionais históricas

João Paulo Caldeira

Apesar das mudanças ocorridas na última década, o Brasil ainda é muito


concentrado, tanto populacional quanto economicamente. Em relação à população,
três Estados do Sudeste representam mais de 40% do total de habitantes do país:
São Paulo (21,63%), Minas Gerais (10,67%) e Rio de Janeiro (8,38%).

As informações de Jefferson Mariano, analista socioeconômico do


IBGE, durante o 22º Fórum de Debates Brasilianas.org - Os novos polos de
desenvolvimento, mostraram que o país ainda concentra boa parte de sua
população e economia no Sudeste.

Por exemplo, a participação do PIB por região, entre 1995 e 2009, não teve
grandes mudanças. O Sudeste participava de 59,1% do PIB do país em 1995, e
hoje tem 55,3% do total. O Nordeste teve um leve aumento, de 12% para 13,5%, e
o Sul continuou no mesmo patamar: 16,2% em 95 e 16,5% em 2009.

A concentração também é perceptível quando se olha mais a fundo o papel


da indústria. O Estado de São Paulo tem 43% das indústrias de transformação
do país, seguido por Minas Gerais, com 5,6%, e Rio de Janeiro, com 6,6%. Da
mesma maneira, quase metade das indústrias de grande porte (49,08%) também
se localiza no Sudeste.

Segundo os dados apresentados pelo analista do IBGE, a desconcentração


da economia brasileira é tímida, baseada principalmente na atividade extrativista
e na agropecuária. Esta atividade representava 28,6% do valor adicionado do
Maranhão em 2009, 23,6% no de Rondônia e 20,6% no de Tocantins.

Para Guilherme Delgado, especialista em economia regional e agrária e


segundo palestrante do Fórum, o processo de desenvolvimento citado por Jefferson
é relativamente recente, tendo início em 2004. A diferença da primeira década do

95
UNIDADE 2 | CONHECENDO O BRASIL CONTEMPORÂNEO

século XXI para as anteriores é notada por duas determinantes deste crescimento,
que são específicas dos anos 2000. A primeira é uma inserção diferente do Brasil
no comércio internacional com as exportações brasileiras sendo multiplicadas
por 4, passando de 50 bilhões para 200 bilhões em 10 anos. Tal movimento foi
concentrado em setores que possuem, segundo Delgado, vantagens produtivas
ou no produto final.

O segundo aspecto apontado pelo especialista é a presença dos direitos


sociais, que serviram como vetor de melhoria na distribuição da renda do trabalho.
A última década teve um processo de crescimento do emprego formal, com
aumento também do vínculo previdenciário. Segundo a Previdência Social, em
2000 existiam 27 milhões de contribuintes, e há um salto para 57 milhões em 2010.

Delgado aponta que este processo de melhoria distributiva teve efeitos


virtuosos sobre o desenvolvimento, com a ampliação do tamanho do mercado
de consumo, criando demanda em setores produtores de bens e salários. Outro
fator importante na melhora da distribuição da renda foi o aumento gradativo do
salário mínimo.

O ganho de competitividade externa da última década se deu em setores


com vantagens comparativas naturais, como o setor agrícola, de extrativismo
mineral e o petroleiro, devido à expansão do mercado das commodities. O lado
negativo é que os setores ligados a bens de consumo, cujo incremento principal é
a inovação e o progresso técnico, não tiveram o mesmo ganho. Isto pode se tornar
um problema sério mais à frente, como o vazamento do crescimento da renda
para o setor externo, via importação de produtos, o que causaria um crescente
déficit da balança comercial e até mesmo a uma situação de dependência.

Noutro ponto, Delgado ressalta que os direitos sociais são direitos


fiscalmente onerosos, e que nossa estrutura tributária vai na contramão do
processo distributivo, já que a carga pesa muito sobre o consumo e sobre a base da
população que começa a entrar agora neste mercado. Para ele, é necessário criar
a ideia, no sistema previdenciário, de um fundo de reserva que possa socorrer e
financiar estes direitos sociais, que são fundamentais para manter a trajetória de
igualdade no crescimento.

O terceiro palestrante do Fórum de Debates Brasilianas.org, Miguel Matteo,


diretor-adjunto de Estudos e Políticas Regionais, Urbanas e Ambientais do IPEA,
sentenciou que a política social deve ser vista não somente como uma questão de
justiça social, mas também como um ponto central da política econômica.

[...]

Miguel trouxe dados sobre novas regiões que tiveram um aumento


populacional expressivo, muitas delas produtoras de commodities como soja e
96
TÓPICO 1 | A QUESTÃO REGIONAL NO BRASIL

gado. No Mato Grosso, o município de Lucas do Rio Verde triplicou o número de


habitantes, indo de 19 mil pessoas em 2000 para 45 mil em 2010. Em Goiás, a soja
e o gado têm provocado uma explosão populacional, mas as cidades no entorno
de Goiânia e do Distrito Federal também têm crescido exponencialmente, aí
ligado aos velhos polos de desenvolvimento. Por último, o Pará também tem um
aumento acelerado de população, sendo o maior exemplo a cidade de São Félix
do Xingu, que pula de 34 mil habitantes para 91 mil em 10 anos.

O desafio, segundo Matteo, é aliar o crescimento destas regiões com


desenvolvimento, fornecendo educação, saúde e infraestrutura adequada
para essas cidades, algo que ele considera muito difícil devido às grandes
taxas de crescimento. Por último, o porta-voz do IPEA sinalizou duas questões
importantes para o desenvolvimento regional. A primeira delas é o incentivo
às micro e pequenas empresas. Para ele, é necessária uma política nesse
sentido, já que as diferenças entre as empresas de pequeno e grande porte são
muito grandes, não só na questão salarial, mas também nos investimentos em
pesquisa e desenvolvimento, em treinamento e em financiamentos. A segunda
é a falta de mão de obra qualificada que possibilite o desenvolvimento regional
de maneira sustentada.

FONTE: Disponível em: <http://advivo.com.br/node/875215>. Acesso em: 5 dez. 2013.

97
RESUMO DO TÓPICO 1
Neste tópico vimos:

• Um panorama geral de aspectos sociais e econômicos das cinco regiões do


país: Centro-Oeste, Nordeste, Norte, Sudeste, Sul.

• A diferença fundamental entre esses lugares é seu processo de ocupação


populacional, em especial a ocupação branca. Os portugueses chegam ao
Nordeste, lugar de ocupação mais antiga no país. Após isso, aumenta o
interesse pelo Sudeste, por conta principalmente dos minerais encontrados
em Minas Gerais. Assim, direciona-se a população para o Sudeste, tendo
como principal marco a transferência da capital de Salvador, na Bahia, para o
Rio de Janeiro. Pouco depois, inicia-se a expansão ao Sul do Brasil, trazendo
imigrantes europeus, em especial alemães e italianos, para a região. Somente
no século XX é que se inicia uma contundente expansão para as áreas do
Centro-Oeste e do Norte, colocados como lugar do vazio demográfico. Em
especial o Norte, de vazio não havia nada, já que ali viviam povos tradicionais
indígenas, entre outros, há séculos. Enfim, tudo isso trouxe especificidades
para a cultura e economia das diferentes regiões.

98
AUTOATIVIDADE

1 Considere a figura abaixo, principalmente a variação do PIB (Produto


Interno Bruto) de cada região. O PIB, basicamente, mostra a riqueza, o
quanto a região produziu.

FIGURA – EVOLUÇÃO DO PIB REGIONAL ENTRE 1968 E 2008

5%
2,2% 13,1%
Variação 11,7%
Norte 127%
Variação
Nordeste 12%
8,9%
3,9% 65,5%
Variação 56,4%
Centro-Oeste 128%

Variação
16,7% 16,6%
Sudeste -14%

Variação
Sul -0,6%
PIB 1968 2008

FONTE: Rocha e Oliveira (2011, p. 221).

Agora responda às perguntas:


a) Quais regiões que apresentaram maior variação do PIB (em porcentagem)
entre 1968 e 2008?

b) Quais regiões apresentaram queda no PIB?

c) Quais foram as regiões de mais recente ocupação através de projetos no


Brasil?

99
d) Considerando o que foi estudado sobre a ocupação das regiões no Brasil,
você acredita que esse crescimento do PIB tem a ver com o processo de
ocupação?

2 Em termos de formação social das regiões explicitada ao longo do tópico,


você acredita que exista influência da cultura em aspectos econômicos?
Justifique.

100
UNIDADE 2 TÓPICO 2
PANORAMA ECONÔMICO: “PRA
FRENTE BRASIL”

1 INTRODUÇÃO

A realidade que vivemos na contemporaneidade apresenta um quadro


de globalização de ideias (por exemplo, no Brasil, ouvimos música dos Estados
Unidos simplesmente ligando o rádio), de projetos de desenvolvimento no
âmbito econômico (quantos produtos “made in China” compramos no mês?),
social e político. Desta forma, a concorrência acontece não apenas com produtos,
empresas, músicas do nosso país, mas com elementos vindos de todo território
mundial, isso em todas as dimensões da dinâmica social. E, de certa forma, nós
estamos ligados a toda essa dinâmica que se torna cada vez mais globalizada,
consciente ou inconscientemente, sendo uma condição da nossa vida social,
religiosa, econômica. Um exemplo foi a última crise desses últimos cinco anos,
que não apenas atingiu um país isolado, mas envolveu praticamente todos os
países do mundo: países da União Europeia, Estados Unidos da América, Japão e
a tal “marolinha” que chegou no Brasil. Esse é só um exemplo de como estamos
integrados, e não se sabe ao certo as consequências deste contexto.

Queremos neste tópico entender um pouco mais o Brasil contemporâneo,


como ele se mostra perante seus habitantes em suas diferentes organizações e o
que se visualiza como uma melhora substancial deste país como nação.

2 O SISTEMA ECONÔMICO
Vivemos em um mundo globalizado. Você com certeza já ouviu essa
expressão. Mas o que realmente isso significa? Como podemos entender os
fenômenos contemporâneos que afetam o Brasil e o mundo? O educador Marshall
McLuhan (1989) desenvolveu a ideia da "aldeia global", isto é, a concepção de que
o mundo está se tornando um espaço de convergência e de comunicação direta
entre as diferentes nações. As barreiras que impediam essas conexões estão sendo
derrubadas graças à tecnologia, como a internet e a telefonia celular. Desse modo,
diversos aspectos do comportamento social estão em transformações nunca antes
imaginadas.

101
UNIDADE 2 | CONHECENDO O BRASIL CONTEMPORÂNEO

Precisamos então retomar o desenvolvimento do capitalismo recente


para nos situarmos neste cenário atual. Diferentes cientistas estão de acordo de
que a Revolução Industrial, iniciada na Inglaterra no século XVIII, desde os anos
1970 tem características bem diferentes. Este novo período pode ser chamado de
Terceira Revolução Industrial ou Revolução Técnico-Científica-Informacional, e é
marcada pela presença do modelo toyotista e flexível de produção, pela adoção
da eletrônica e da informática, pela aproximação das ciências com o mercado
(química e biologia, por exemplo), entre outros fatores.

Já o contato entre diferentes porções do planeta vem acontecendo há mais


tempo. É a partir das grandes navegações e da colonização, quando Portugal
e Espanha se aventuram nos oceanos em busca de produtos e mercados, que
consideramos o início de uma verdadeira conexão global. Antes deste momento,
os deslocamentos eram muito complicados, relegados às regiões de fronteira ou
mesmo indesejados. Na medida em que o capitalismo comercial toma forma,
avançando para o capitalismo industrial inglês e, por fim, sendo adotado ou
imposto para as diferentes nações do mundo, compreendemos como o mundo
parece estar "pequeno". Era e é preciso que as mercadorias circulem do modo
mais amplo possível, já que este é um dos elementos essenciais do modo de vida
que adotamos.

Tomemos cuidado, contudo, com detalhes que passam desapercebidos.


Outras dimensões, além da econômica, devem ser analisadas, como também
os problemas ocasionados pelas escolhas feitas. O mundialmente reconhecido
geógrafo brasileiro Milton Santos (1996) nos diz que, além, de trocarmos
mercadorias, acontece atualmente o compartilhamento de valores e culturas.
Em outras palavras, as nações mais poderosas economicamente impõem sua
cultura, que acaba sendo difundida globalmente. Por outro lado, cada povo tem
sua cultura, que entra em choque com esta homogeneização. Como os produtos
e valores acabam sendo impostos dentro das trocas comerciais, Santos (1996)
afirma que a globalização é perversa, e devemos buscar alternativas que realmente
promovam o crescimento de todos os povos, e não de somente algumas nações
ou poucas empresas. Não só as mercadorias devem se locomover pelos espaços e
serem centrais, mas sim as pessoas.

Neste planeta globalizado, percebe-se que a forma de participação


no mercado mundial é diferente para cada país. Alguns são extremamente
industrializados e fornecem seus produtos de alto valor agregado. Outros
possuem poucas indústrias e tratam de fornecer matérias-primas e insumos, de
baixo valor, para as nações desenvolvidas. Além disso, as transnacionais criam
fábricas nos países pobres em busca de mão de obra barata, porém seus lucros
retornam aos países de origem. Onde o Brasil se localiza neste contexto?

102
TÓPICO 2 | PANORAMA ECONÔMICO: “PRA FRENTE BRASIL”

DICAS

O documentário Trabalho Interno, dirigido por Charles H. Ferguson, mostra


justamente esse mundo globalizado, onde as economias estão extremamente interligadas.
O filme de 2010 trata da crise norte-americana de 2007 e sua repercussão interna e
externamente. Busque na internet e aprofunde o seu conhecimento.

De forma geral, o Brasil é a sétima maior economia do mundo. Entretanto,


esta riqueza está concentrada nas mãos de pouquíssimas pessoas (FÓRUM, 2013).
Esta minoria pode acessar a qualidade na educação, na alimentação, no salário
e emprego, e em todos os outros serviços básicos, enquanto a grande maioria
da população se encontra na precariedade. Esta situação de desigualdade social,
conhecida internacionalmente, coloca o país em níveis baixos nos rankings
internacionais como o IDH, que mede a qualidade de vida.

Como chegamos até aqui? Após a crise ocorrida na década de 1980 (a


chamada "década perdida"), os governos de Fernando Henrique Cardoso (FHC)
conseguiram estabilizar a economia e promover o início de um grande crescimento
industrial. O Brasil cresce, porém, para conseguir tal feito, privatiza grandes
empresas estatais. Seu argumento era que o Estado brasileiro não dava conta
de administrar estas organizações, e o melhor seria vendê-las para iniciativas
particulares (estrangeiras em sua maioria) e delas cobrar impostos e investimentos.
Neste momento há pouco investimento no setor social, já que a preocupação está
na estabilização das elites econômicas que sempre estiveram no poder.

Os governos de Luís Inácio Lula da Silva, o Lula, e Dilma Rousseff, a partir


dos anos 2000, continuam com a política econômica de FHC, estimulando os
grandes negócios e, assim, finalmente colocando o país como um ator importante
no mercado internacional. Iniciam-se também, nestes governos, ações mais incisivas
para tratar da desigualdade social, que aliviam um pouco as consequências do
modelo econômico proposto. Porém, como constatado anteriormente, o Brasil
ainda continua sendo uma das nações mais desiguais do planeta.

Por fim, cabe salientar que uma estratégia recente do Brasil, para estabelecer
uma economia forte, é a promoção do desenvolvimento socioeconômico de todas
as suas regiões, de forma contrária à história nacional, marcada por "bolsões"
econômicos (cana-de-açúcar no Nordeste, minérios em Minas Gerais, borracha
na Amazônia etc.). No plano internacional, os países buscam se fortalecer através
de blocos econômicos, sendo o mais conhecido a União Europeia. Por aqui,
paulatinamente se constrói o Mercosul (Mercado Comum do Sul), que pretende
unir as forças dos países da América do Sul via tratados diplomáticos e comerciais.
Importante também é o grupo político de cooperação chamado BRICS, formado
103
UNIDADE 2 | CONHECENDO O BRASIL CONTEMPORÂNEO

pelos países emergentes Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul. Devido a
suas economias em crescente ascensão, podem agora, de forma conjunta, tomar
medidas que pressionem as nações desenvolvidas e influenciem as decisões
internacionais.

3 A DIVISÃO NACIONAL DO TRABALHO


O Brasil é mundialmente reconhecido como celeiro do mundo, com
extensas produções de culturas como soja, cana-de-açúcar, café, que abastecem
todo o mercado mundial. Mas será que esse é o único setor importante da
economia do país? Será esse o setor mais lucrativo? Como vimos no Tópico
1 dessa Unidade 2, essa distribuição regional é desigual, e grande parte da
população não vive de agricultura.

As atividades econômicas de um país são tradicionalmente divididas


em três setores: o setor primário, o secundário e o terciário. Atualmente também
se fala de um setor quaternário. Vamos então conhecer um pouco mais das
características dos setores da economia do país.

3.1 SETOR PRIMÁRIO


O setor primário está relacionado às atividades econômicas de extração
ou produção de matéria-prima, ou seja, a produção de bens in natura ou com
pouco processamento. Em grande parte, essas atividades ocupam grandes
extensões de terra e, por isso, grande quantidade de trabalho. Esse trabalho não
seria apenas em relação à mão de obra humana, mas principalmente em termos
de técnicas de cultivo.

Seu objetivo é, principalmente, oferecer insumos para as atividades


industriais do setor secundário, que reprocessam esses produtos elaborando
novos produtos (BACHA, 2013). É esse o processo que agrega maior valor à
matéria-prima. Por exemplo, a cana-de-açúcar passa por um processo industrial
que gera o açúcar ou a cachaça. Ou o trigo, que, processado, se torna farinha,
ingrediente básico na fabricação de massas e pães. Assim, deve-se ressaltar que
grande parte da produção agropecuária destina-se a suprir o setor industrial e
não ao consumo in natura.

Originalmente, esse setor abrangia agropecuária, extrativismo vegetal,


caça, pesca e mineração. Algumas modificações foram feitas sobre essa divisão.
Primeiro, as atividades minerais foram transferidas para o setor secundário. A
mineração é uma atividade que requer um aparato industrial sólido, já que não
basta “tirar da terra” para a sua extração, envolve todo um processo com um
grande valor de capital. Um segundo ponto é a discussão sobre os limites tênues
de cada setor, já que eles mantêm uma forte relação de dependência. Nesse
sentido, surge o conceito de agronegócio, que será melhor apresentado adiante.

104
TÓPICO 2 | PANORAMA ECONÔMICO: “PRA FRENTE BRASIL”

NOTA

Quando se fala em agropecuária, refere-se a todas as atividades que têm a terra


como base da sua produção, que origina produtos em termos vegetais e animais (bovinos,
suínos etc.). É uma união entre os termos agricultura, estritamente de produção vegetal, e
pecuária, estritamente de produção animal.

Para se medir um setor da economia, usualmente se utiliza sua


importância monetária em relação ao PIB, que mostra o valor monetário de
todos os bens e serviços produzidos em uma nação. Vamos falar em termos de
Brasil, o PIB nacional.

O PIB do Brasil apresenta um crescimento constante desde a década de


90. Na última década, os três setores da economia apresentam uma participação
constante, ou seja, não apresentaram variações significativas nas suas porcentagens.
Como podemos ver no gráfico abaixo, em 2005 o PIB do setor primário (quer dizer,
a contribuição para a riqueza do país) estava em cerca de 10%. É relevante, mas
quando comparamos com os setores secundários, com quase 40%, e terciário, com
quase 60%, vemos que ele não é o setor central na economia nacional.

GRÁFICO 1 – EVOLUÇÃO DA PARTICIPAÇÃO DOS SETORES DA ECONOMIA DO PIB, 1990-2005

FONTE: Girardi (2008, p. 172)

Outro ponto que se deve observar é a População Economicamente Ativa


(PEA), que significa a população inserida no mercado de trabalho, exercendo uma
atividade remunerada, comparando os diferentes setores. Isso traz um panorama
de quantas pessoas são dependentes daquela atividade.

Apesar de uma menor contribuição para a riqueza no país, como vimos


no PIB, o setor primário emprega 18,7% dos trabalhadores. Isso é um valor muito
próximo do secundário, com 21,4%.
105
UNIDADE 2 | CONHECENDO O BRASIL CONTEMPORÂNEO

Contudo, a condição de vida do trabalhador no campo é mais precária e


com baixos salários, como mostra Girardi (2008, p. 176):

Os dados do Censo Demográfico de 2000 mostram que a população


ocupada no setor primário é caracterizada predominantemente pelas
baixas rendas monetárias. Naquele ano, 33,4% destes trabalhadores
não tinham remuneração alguma; 53,9% recebiam até dois salários
mínimos; 8,4% recebiam de dois a cinco salários e 4,1% ganhavam
mais de cinco salários mínimos.

O próprio autor também alerta que o campo tem em conta outro modo de
vida, mas isso não significa necessariamente que essas populações possuem um
modo de vida inferior.
[...] o campo não é um lugar somente de produção econômica, é também
um lugar de vida. Quando analisamos a produção camponesa, nem
tudo que é produzido tem como destino o mercado, o autoconsumo
é importante neste sistema. Isso não quer dizer que os camponeses
não necessitem participar do mercado, pelo contrário, isso é necessário
para que possam vender seus produtos e adquirir bens e serviços para
gozarem de melhores condições de vida. (GIRARDI, 2008, p. 176).

Mas esse modo de vida relacionado ao campo, mostrado acima, não
corresponde a todos os donos de terra, mas sim àqueles presentes nas pequenas
propriedades, que são 28,4% do total de terras com imóveis rurais (GIRARDI,
2008). Elas ainda não se encontram totalmente capitalizadas, ou seja, com
produções totalmente voltadas para o mercado, diferentemente de grande parte
das médias (que representam 30,4% do total) e grandes propriedades (com 35,1%).

NOTA

A discussão do agronegócio surge na atualidade, quando se une fortemente a


produção agropecuária e as atividades industriais que transformam essa matéria-prima,
formando um complexo agroindustrial (BACHA, 2013). A estrutura necessita uma grande
produção, altamente mecanizada e com um investimento em pesquisa que a garanta, e
toda a indústria de beneficiamento dessa produção. Assim, essa atividade necessita de um
alto investimento inicial, sendo realizada estritamente por médios e grandes produtores.

O que se pode concluir com essa breve observação da realidade social do


setor primário é que ele guarda uma imensa desigualdade: os grandes e médios
proprietários, responsáveis por grande parte da produção, com monocultura
e extremamente mecanizada; e os pequenos proprietários, com uma produção
menos capitalizada, voltada para o mercado da região e menos para a exportação.

106
TÓPICO 2 | PANORAMA ECONÔMICO: “PRA FRENTE BRASIL”

3.2 SETOR SECUNDÁRIO


O setor secundário tem como função transformar a matéria-prima pelo
setor primário em bens de consumo, tanto para o consumidor como para oferecer
suporte para outras indústrias (esse último mais associado ao setor de serviços,
como veremos no setor terciário). Em suma, é esse setor que transforma o
produto bruto (como minérios, suínos, cacau) em produtos manufaturados para
o consumo (como celulares, linguiça, chocolate).

A indústria é a atividade mais importante do setor. Os ramos são


extremamente diversificados: automobilístico, alimentício, naval, químico,
eletrônico, têxtil. Também se insere aqui a indústria mineral, que foi realocada
do setor primário para o secundário. É importante citar que a construção civil
também se insere nesse setor.

Sobre o contexto brasileiro, a realidade do setor mudou bastante a partir


de 1980, e especialmente no século 21. Entre 1950 e 1980, o setor expandiu
sua atuação considerando o PIB, sendo responsável pelo crescimento do país
juntamente com o setor primário (IPEA, 2011). Contudo, após esse período de
aumento de importância, o setor se estabilizou.

GRÁFICO 2 – A EVOLUÇÃO DA COMPOSIÇÃO DO PRODUTO INTERNO BRUTO (EM %)


80
70 66,2
60
50,1 50,7
50
38,6
40
29,4 27,9
30
20,5
20
10,7
10 5,9

0
Produção primária Produção secundária Produção terciária

1950 1980 2008

FONTE: IPEA (2011, p. 6)

Como é possível observar no gráfico acima, houve um aumento de 1950


para 1980 de 20,5% para 38,6% no setor secundário, referente ao segundo grupo de
colunas. Após isso, houve um declínio para 27,9% em 2008. Esse declínio acontece
principalmente após a virada do século, explicado em um primeiro momento
pela expansão maciça do setor terciário.

É interessante pensar que, apesar da expansão das indústrias no Brasil desde


1980, a porcentagem da população empregada pelo setor variou relativamente
pouco. Isso acontece por mudanças na estrutura da produção industrial do país,
107
UNIDADE 2 | CONHECENDO O BRASIL CONTEMPORÂNEO

que se modernizou desde então. São vários elementos envolvidos nesse processo,
como:

• terceirização (por exemplo, uma empresa presta serviço específico para a


indústria, como o setor de limpeza, de recursos humanos etc.);
• a expansão da globalização e a internacionalização de algumas atividades
econômicas (ou seja, alguns países passam a realizar atividades que eram
feitas no Brasil);
• a maior proximidade entre o setor secundário e terciário (aquele que produz
passa a oferecer diretamente o produto para o consumidor);
• desenvolvimento de máquinas e softwares que eliminam parte do trabalho
rotineiro (ou seja, menos pessoas trabalhando; ao mesmo tempo que exige um
trabalho mais qualificado).

Por trás dessas mudanças de fundo econômico estão transformações


sociais e culturais relacionadas a uma sociedade mais globalizada de maior
consumo, que exige uma indústria cada vez mais veloz, com alta tecnologia.

Estas transformações foram interpretadas como uma modificação


da sociedade fordista baseada na produção e consumo de massa em
grande escala, apoiada pela demanda dos gastos governamentais
para o gerenciamento de suas funções e para a previdência e saúde
(principalmente nas nações mais avançadas, em que prevalecia o welfare
state). Como visto, as formas pós-fordistas de produção emergiram
desde os anos 70, quando a indústria passou a utilizar nova tecnologia e
uma força de trabalho mais flexível para responder com maior rapidez
às mudanças do mercado e à competição internacional, encorajadas
por novas formas de governo que se retirava de funções empresariais e
restringia suas funções produtivas [...]. (KON, 2006, p. 250).

3.3 SETOR TERCIÁRIO


O setor terciário era formado por atividades residuais que não se
enquadravam nos outros dois setores. Com o desenvolvimento das discussões, ele
foi ganhando contornos mais claros, e envolve atividades de serviços e comércio.
Ele não apenas é aquele que oferece diretamente os bens para o consumidor,
mas também proporciona os insumos para a cadeia produtiva. Assim, ele
contribui diretamente para o desenvolvimento das empresas, pois sua presença é
fundamental para se estabelecer relações econômicas (KON, 1999).

Por exemplo, o setor primário de produção necessita de maquinário


para colheita da lavoura. Quem irá realizar a venda para o setor primário é uma
empresa pertencente ao setor terciário. O mesmo acontece com a indústria, em
relação ao maquinário. E é também através do setor terciário que, por exemplo,
os bens produzidos pela indústria irão chegar ao mercado consumidor.

Esse setor era considerado residual e com a menor produtividade no


passado. Sua natureza vem se modificando com a recente transformação das
economias internacionais, as empresas nesse contexto e as inovações tecnológicas

108
TÓPICO 2 | PANORAMA ECONÔMICO: “PRA FRENTE BRASIL”

(KON, 1999). As economias mais globalizadas fomentam tanto as conexões


empresariais quanto o mercado consumidor, que cada vez mais têm contato e
buscam novos serviços e produtos.

No Brasil, essa reviravolta aconteceu nos últimos anos. Houve reformas


que visaram reduzir o papel do Estado na prestação de serviços de algumas
atividades estratégicas, como transporte, telecomunicações e energia, que passam a
ser oferecidas pelo setor privado. Nesse sentido, entre 2000 e 2006, o setor primário
apresentou um crescimento de 4,1%, maior entre os três setores (CNC, 2008).

FIGURA 44 – CELULARES E O SETOR DAS TELECOMUNICAÇÕES AUMENTAM SUA IMPORTÂNCIA

FONTE: Disponível em: <http://www.meionorte.com/noticias/tecnologia/operadoras-e-bancos-


querem-transformar-celular-em-meio-de-pagamento-160523.html>. Acesso em: 27 nov. 2013.

A foto acima mostra aparelhos celulares, relacionados ao setor de


telecomunicações pela telefonia móvel. O uso do celular teve um crescimento
forte no Brasil na última década, e o serviço é oferecido por operadoras privadas,
um dos pontos que fomentaram o setor terciário.

No Brasil, a evolução do setor terciário esteve historicamente associada


ao desenvolvimento de atividades mercantis e auxiliares à indústria.
Paralelamente, a modernização das atividades agrícolas e o processo
de urbanização criaram novas necessidades que vieram a ser atendidas
pelo setor terciário de consumo não industrial (CNC, 2008, p. 22).

Além disso, observando o gráfico 1, percebe-se também que, nos últimos


anos, o setor terciário é responsável por cerca de 60% do PIB. Ou seja, tal setor é
responsável por grande parte da riqueza do país.

109
UNIDADE 2 | CONHECENDO O BRASIL CONTEMPORÂNEO

É importante atentar que é o setor que mais cria novos postos de trabalho
nos últimos anos. O setor está mais presente nas grandes cidades, principalmente o
oferecimento de serviços, e é o grande responsável pela criação de empregos. Porém,
nos últimos anos, tal qual o setor secundário, o comércio está passando por um
processo de interiorização, que significa o aparecimento de mais estabelecimentos
comerciais no interior (CNC, 2008). Não que as grandes cidades estejam perdendo
sua área comercial, mas ela passa a se fortalecer em municípios menores.

Tão importante quanto o desempenho quantitativo são as evidências


de mudanças na dinâmica do setor terciário no sentido de uma menor
volatilidade no mercado de trabalho e de uma maior autonomia
em relação à indústria, uma vez que o setor tem conseguido gerar
novos postos de trabalho mesmo em momentos de fraco crescimento
da indústria. Efetivamente, a capacidade do setor terciário de gerar
empregos – ainda que informais –, absorvendo a mão de obra liberada
de outros setores da economia, mostra a importância fundamental
desse setor para o desenvolvimento do país (CNC, 2008, p. 24).

Essa maior autonomia em relação à indústria está atrelada ao aumento


real da renda média da população brasileira. Com o aumento da renda, aumenta
também o consumo de bens e demanda por serviços antes restritos a grupos com
poder monetário mais alto.

Temos cenários e prognósticos positivos para os diversos setores da


economia. Os avanços apresentados pelo país nos últimos cinco anos,
tanto macro como microeconômicos, contribuem de forma efetiva
para um desempenho promissor de nossas empresas.
A classe C, por exemplo, já é a maioria da população. Quase 20 milhões
de pessoas ingressaram nesse estrato social, reunindo hoje 86,2
milhões de brasileiros. A maior parte do contingente que engordou
a classe C, perto de 12 milhões de pessoas, vem da base da pirâmide
populacional, as classes D e E.
Isso significa novos consumidores, resultado de uma combinação
favorável de fatores: mais crédito com prazos longos e juros menores,
preços em queda dos bens duráveis, crescimento do emprego e os
programas sociais que colocaram mais recursos no bolso das camadas
que estão na base da pirâmide populacional.
São pessoas que passam a consumir mais, alavancando a indústria,
o comércio e os serviços. Uma boa notícia que deve ser encarada
como mais um desafio. O mercado brasileiro torna-se mais disputado,
interna e externamente (CNC, 2008, p. 13).

Desde 2005 há uma discussão entre os economistas sobre o surgimento de


uma “nova classe média”. Isso alvoroçou a mídia, que clamou por essas pessoas
que estariam mudando de vida. Mas será que podemos falar sobre uma nova
classe média? Esse conceito ajuda-nos a pensar essa realidade? Acompanhe a
reflexão da antropóloga Hilaine Yaccoub, a seguir.

110
TÓPICO 2 | PANORAMA ECONÔMICO: “PRA FRENTE BRASIL”

LEITURA COMPLEMENTAR

A chamada “nova classe média”: cultura material, inclusão e distinção social

Hilaine Yaccoub
Uma “nova classe média” existe?

O olhar para essa nova nomenclatura para tratar de um grupo específico


pertencente a estratos populares teve seu marco com a pesquisa intitulada
“Nova classe média”, realizada pelo Centro de Políticas Sociais (CPS) da
Fundação Getúlio Vargas (FGV), sob a coordenação do economista Marcelo
Neri (2008). Divulgada em agosto de 2008, suscitou uma quebra de paradigmas
para muitos setores da economia quanto às representações dos pobres no Brasil
e suas relações com o consumo. A investigação enfocou a chamada “classe C”
e mostrou, por meio de uma pesquisa quantitativa, como esta aumentou seu
poder aquisitivo, elevando sua posição na hierarquia socioeconômica. Nesse
caso, o grupo em questão deixou de ser classificado como “pobre” – classes D e
E (e todo o peso que a expressão denota) – para passar a pertencer às chamadas
“classes médias” (NERI, 2008).

Essa pesquisa gerou uma profusão de artigos e reportagens especiais


em jornais e revistas, que buscavam conhecer quem eram essas pessoas que
“compravam mais”, pagavam suas contas em dia e, diferente do que se pensava,
faziam planos para o futuro. Os estratos populares, sempre tão desvalorizados,
ganharam status de “potenciais consumidores”, uma aposta que possivelmente
seria acertada para muitas empresas e estrategistas de marketing. Assim, o tema
foi objeto de reportagens dos principais jornais do país, como O Globo e Folha
de S. Paulo, além de revistas de circulação nacional que apresentaram o assunto
em questão em suas capas, como as revistas Veja, Época e Época Negócios (esta
última apostou em uma reportagem aprofundada, buscando mais fontes e outros
institutos de pesquisa para corroborar ou contrapor as conclusões).

[...]

Na pesquisa da FGV, essa “nova classe média”, ou “nova classe C”, está
compreendida abaixo da A e B e acima da D e E. A fim de quantificar a renda, foi
realizado um cálculo da renda per capita de cada domicílio. Dessa forma, a classe
C tem uma renda entre R$ 1.064,00 e R$ 4.561,00 e se localiza acima dos 50% mais
pobres e abaixo dos 10% mais ricos do país. A chamada “nova classe média”
brasileira – a classe C – refere-se a 52,67% da população, o equivalente a quase 98
milhões de pessoas. Dessa forma, o economista Marcelo Neri (2008, p. 5) aponta
que a classe C “é a imagem mais próxima da sociedade brasileira”.

111
UNIDADE 2 | CONHECENDO O BRASIL CONTEMPORÂNEO

Para ele, a grande inovação desse grupo é a recuperação do mercado de


trabalho formal de carteira assinada (baseando-se na Pesquisa Mensal de Emprego
– PME/IBGE e no Cadastro Geral de Emprego e Desemprego do Ministério do
Trabalho e Emprego – Caged/MTE). Este seria o fator mais representativo do
“ressurgimento de uma nova classe média brasileira” (NERI, 2008, p. 41) e da
diminuição da desigualdade social sentida na última década.

Segundo Neri (2008), os valores intrínsecos que a nomenclatura pode gerar


– a possibilidade de fazer planos bem definidos para ascensão social futura tendo
o trabalho como veículo para a concretização dos objetivos – são fundamentais
para que a classe C tenha uma conotação de “classe média”.

[...]

Sem entrar nos detalhes metodológicos, podemos observar que a pesquisa


apontou dois métodos utilizados para conceituar classe média. “Uma primeira é
pela análise das atitudes e expectativas das pessoas”, utilizando a sondagem do
consumidor divulgada pelo Instituto Brasileiro de Economia (Ibre) da Fundação
Getúlio Vargas. A segunda maneira de se definir classes “é pelo potencial de
consumo tal como no chamado Critério Brasil, no qual a classe média é aquela
chamada de Classe C” (NERI, 2008, p. 23). A estratificação é mensurada a partir
do acesso a bens duráveis e a quantidade deles por unidade residencial.

[...]

Estava claro, desde o início, que pertencer a uma “classe” ou estrato


social implica muito mais que estatísticas sobre renda total ou per capita. Há toda
uma questão de habitus (BOURDIEU, 2007), assim como de poder simbólico
(BOURDIEU, 2000) das classes dominantes. O encerramento do texto parece
“proteger” o discurso apresentado de eventuais críticas pautadas de que a
nomenclatura é “forçada” por utilizar a renda e acesso a bens de consumo
como fatores de categorização de classe – o que certamente está longe de uma
identificação de alteridade. As chamadas “camadas médias urbanas”, expressão
popularizada por Gilberto Velho (1989), são vistas como “elite” para a pesquisa
do economista, que questionou o uso da expressão “classe média” ao comparar
os integrantes desta a seus empregados, oriundos das camadas populares da
sociedade, como porteiros, empregadas domésticas, zeladores e jardineiros.

A pesquisa quis comprovar, de forma muito otimista (senão exagerada),


que diferentemente do que muitos pensam, o Brasil não é um país de pobres e
miseráveis. E este parece ser um discurso legitimado pelo governo Lula e que teve
continuidade com a presidente Dilma Rousseff; exemplo disso foi a realização de
um seminário promovido pela Secretaria de Assuntos Estratégicos da Presidência
da República e pelo Ministério da Fazenda que debateu sobre Políticas Públicas
para a Nova Classe Média, em agosto de 2011. Interessante o que o convite da
divulgação do evento revela:

112
TÓPICO 2 | PANORAMA ECONÔMICO: “PRA FRENTE BRASIL”

[...]

O consumo é o passaporte para que sejam vistos como modelo a ser


seguido, aqueles que deram certo na vida e têm de tudo; no entanto, visivelmente
falta-lhes capital cultural e social, e se percebe nas conversas que os entrevistados
reconhecem essa carência por informação. Outro ponto interessante é que mesmo
possuindo capital econômico para residir em bairros/municípios mais nobres,
com mais infraestrutura e uma ampla gama de serviços, preferem continuar em
seus bairros de origem: antes “alguém” no local onde mora, do que um “qualquer”
em um bairro rico. O consumo é, portanto, uma possibilidade para a saída da
condição de pobre (BARROS, 2009).

Definir “classes” é muito mais que definir renda, pois devemos tratar de
status social sempre de forma relacional; para definirmos ou classificarmos as
identidades de grupos ou estratos sociais, precisamos muito mais do que renda
ou tipo (ou intensidade) de consumo. Como considerar pertencente à classe
média um taifeiro aposentado entrevistado pela Folha de S. Paulo se, apesar de
ganhar mensalmente R$ 3.400,00, ele sustenta cinco pessoas? Sua família não tem
lazer, ele diz nunca terem ido a um cinema, moram em rua sem calçamento que,
até bem pouco tempo atrás, sequer possuía rede de esgoto.

Alguns pontos devem ser considerados, primeiramente a hierarquia


dos empregos e profissões no Brasil. Não é novidade que serviços que lidam
com sujeira/limpeza – e outros tantos considerados “subalternos” devido a
uma conotação de “servidão”, como empregadas domésticas, por exemplo –,
lidam com a falta de valorização da categoria profissional e de suas expertises.
Mesmo quando pagam altos salários, os empregos domésticos “desprestigiam”
o indivíduo.

Segundo, o consumo para a família, comprar eletroeletrônicos e bens de


uso comum é moralmente aceito. Como Miller (2002) aponta, no zelar pela família,
o ato de comprar é um ato que não se finda em si, é um sacrifício devocional,
de amor. Há uma obrigação intrínseca, de dar aos filhos aquilo que merecem:
o melhor. Isso foi claramente percebido durante o trabalho de campo, quando
uma das entrevistadas se colocou abaixo de sua família ao dizer que para si
mesma comprara um único vestido barato, enquanto considerava itens básicos
bens eletroeletrônicos para a família, que para ela toda casa “tinha que ter” para
conferir o mínimo de conforto.

O autor afirma que “o ato de comprar [...] é visto como um meio de


descobrir, mediante observação acurada das práticas das pessoas, algo sobre
seus relacionamentos” (MILLER, 2002, p. 19). Para ele, essa “obrigação” ou
desejo de oferecer o melhor para a família está intimamente ligada à noção
de uma demonstração de amor, ou, como ele mesmo menciona, “um ato de
amor”, por isso os indivíduos se sacrificam. Numa situação de escassez, onde o
113
UNIDADE 2 | CONHECENDO O BRASIL CONTEMPORÂNEO

dinheiro é contado, a escolha de um determinado bem significa o não consumo


de outro. Escolher bens duráveis que trarão conforto e bem-estar para a família é
moralmente aceito, pois se está investindo na coletividade e não em um consumo
individualizado.

Numa perspectiva antropológica, é bastante nítido que um aumento de


renda por si só não vai determinar uma adoção mecânica a um novo estilo de vida,
como parece estar embutido, em boa parte, nessa discussão sobre a “nova classe
média”. Os estratos mais baixos não eram vistos com esse potencial de consumo,
mas consumiam, só que em outras esferas de consumo. O que parece é que a
ideia e o discurso da carência e da falta ao tratar e se referir às camadas populares
(SARTI, 2003; ZALUAR, 2002), as transformavam em não consumidoras. No
entanto, elas sempre foram consumidoras, só que participavam de outra forma
dos circuitos de consumo.

FONTE: YACCOUB, Hilaine. A chamada “nova classe média”: cultura material, inclusão e distinção
social. Horiz. antropol. [on-line]. Vol.17, n.36, 2011. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.
php?pid=S0104-71832011000200009&script=sci_arttext&tlng=pt#nt00>. Acesso em: 28 nov. 2013.

114
RESUMO DO TÓPICO 2
Neste tópico vimos:

• A economia pode ser dividida em três setores: o setor primário envolve


a agropecuária e o extrativismo animal e vegetal; o secundário é o setor da
indústria, da construção civil e da extração mineral; já o terciário é o mais
amplo, incluindo o comércio e a prestação de serviços.

• Nos últimos anos, o setor terciário brasileiro teve um grande crescimento,


podendo ser considerado como um dos propulsores do desenvolvimento
econômico do país. Também foi aquele que mais empregou a população, algo
inédito na história econômica.

• Já o setor industrial estagnou em termos de riqueza e de empregabilidade,


pois aconteceu uma reestruturação da sua forma de produção, que diminuiu
o número de trabalhadores, transferindo uma parte para o setor de serviços, o
terciário. Também aconteceu a internacionalização, sendo que alguns produtos
passaram a ser produzidos em outros países.

• O primário diminuiu importância em termos de riqueza. Há um novo tipo de


produção surgindo, o agronegócio, que deve expandir a importância do setor,
contudo não deve aumentar o número de pessoas empregadas.

115
AUTOATIVIDADE

1 Descreva brevemente os principais aspectos sociais em termos empregatícios


relacionados aos setores da economia atualmente no Brasil:

a) Setor primário

b) Setor secundário

c) Setor terciário

116
UNIDADE 2 TÓPICO 3

ESPAÇOS E ATORES
POLÍTICOS

1 INTRODUÇÃO
Em junho de 2013 o Brasil viveu um momento de rebuliço social. Milhares
de pessoas saíram às ruas em diferentes cidades do país, grandes centros urbanos
ou pequenas cidades, protestando. E simplesmente protestando, não se sabe ao
certo qual era a principal reinvindicação, quem eram essas pessoas. O mês foi um
marco para o descontentamento social.

O próximo passo possível é encontrar meios para refletirmos e


solucionarmos o que aflige cada um. Mas qual o cenário político para além dos
governantes que encontramos no país hoje? Quem mais está envolvido nas
decisões que possui contato direto com a sociedade civil? Como se mobilizar? Esse
tópico vem traçar brevemente o que se tem hoje no Brasil que atua diretamente
aliado aos governos atualmente, os espaços políticos, a exemplo das conferências
de políticas públicas e as organizações sociais. Mas também mostrar que algumas
entidades já se mobilizam a fim de pressionar por mudanças no país, trazendo o
caso emblemático do Movimento Sem Terra (MST) e da atuação das Organizações
Não Governamentais (ONGs).

Entender de política nesse contexto exacerba a questão do voto na nossa


democracia participativa para mostrar espaços e atores que possibilitam a atuação
para além do momento da eleição.

2 CONFERÊNCIAS DE POLÍTICAS PÚBLICAS


A teoria democrática contemporânea prevê a existência de espaços
deliberativos e participativos como forma de garantir a governança com
o povo. Uma das diretrizes que visam atender essa esfera democrática é a
existência das conferências de políticas públicas, que têm como pressuposto a
participação da população.

117
UNIDADE 2 | CONHECENDO O BRASIL CONTEMPORÂNEO

As Conferências de Políticas Públicas são definidas “oficialmente como


espaços institucionais de participação e deliberação acerca das diretrizes gerais
de uma determinada política pública, podendo assumir caráter consultivo ou
deliberativo” (REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL, SG-PR/SNAS apud
FARIA, 2012). Cabe aos municípios, estados ou Governo Federal convocá-las por
lei, decreto, portaria ou através dos conselhos.

NOTA

Os conselhos gestores participativos de gestão surgiram no Brasil no final da


década de 1980. Foi adotado esse modelo como meio de aproximar a relação Estado e
Sociedade, instituindo de fato uma democracia participativa. Em 2008, eram mais de 30
mil presentes em praticamente todos os municípios brasileiros. Entretanto, é importante ter
em mente como é sua estrutura, que conta apenas com representantes, não tendo uma
participação ampla do povo.
Os conselhos gestores são instituições participativas permanentes, definidas legalmente
como parte da estrutura do Estado, cuja função é incidir sobre as políticas públicas em
áreas específicas, produzindo decisões (que algumas vezes podem assumir a forma de
norma estatal), e que contam em sua composição com a participação de representantes do
Estado e da sociedade na condição de membros com igual direito a voz e voto (TATAGIBA;
TEIXEIRA, p. 62-63, apud PONTUAL, 2008)

A lei que criava as Conferências de Políticas Públicas foi promulgada no


governo Vargas, em 1937. Sua criação objetivava constituir um espaço que permitisse
que o Governo Federal conhecesse as atividades desenvolvidas pela saúde.

Apesar de a lei ser antiga, esse mecanismo passou a ser utilizado
largamente a partir do governo Lula. Seus objetivos se ampliaram. Não apenas
a área da saúde entra como temática das conferências, mas também a assistência
social, educação, ciência e tecnologia e, principalmente, as relativas a questões
urbanas, muito fortes nos últimos dois anos.

A disseminação de ideias, opiniões e experiências narradas pelas


comunidades de atores vinculados à área de saúde poderia, acreditava-
se, racionalizar ações governamentais nesta área e, deste modo,
elaborar decisões mais eficazes. Em um contexto político radicalmente
diferente, esta mesma percepção serviu de inspiração para o governo
Lula realizar e expandir as conferências para quase todas as áreas de
políticas públicas (FARIA, 2012, p. 276)

Uma situação que ilustra esse processo recente: desde sua criação até
2010, o Governo Federal realizou 102 conferências nacionais. Dessas 102, 67
conferências foram realizadas entre 2003 e 2010, anos dos governos Lula. Ou seja,
66% das conferências foram realizadas em oito anos.

118
TÓPICO 3 | ESPAÇOS E ATORES POLÍTICOS

Também se inicia a partir de 2003 um alinhamento entre as conferências


municipais, estaduais e federais. As conferências municipais são o ponto de partida,
que levam deliberações para as estaduais, e assim chega-se às federais. Intrínseca a
essa proposta está a ideia de integração dos governos e que os problemas do país
devem ser observados “na ponta”.

Como se pode observar no quadro abaixo, existe uma integração entre as


conferências. Por exemplo, nas conferências municipais elegem-se os delegados
para as estaduais. Isso varia por área, mas é uma diretriz geral.

FIGURA 45 – OBJETIVOS ESPECÍFICOS DAS CONFERÊNCIAS DE ASSISTÊNCIA SOCIAL

FONTE: Faria (2004, p. 264)

Os resultados obtidos com essa nova dinâmica (apesar de a lei ser antiga)
são avaliados positivamente. Segundo Faria (2012, p. 281):

Seus diferentes espaços internos são capazes de acomodar tipos diferentes


de ação, assim como suas conexões externas são capazes de vincular
uma etapa com a outra mediante uma metodologia que envolve roteiros
temáticos e um processo representativo cuidadosamente construído. Do
ponto de vista da engenharia institucional, isto não é pouco. Não obstante,
embora acreditando que as regras importam na operacionalização desses
espaços participativos, sabe-se que elas não são suficientes para predizer
a qualidade da dinâmica participativa e deliberativa nestes sistemas
que, como já ressaltado, devem envolver inclusão de todos, deliberação
autêntica e produção de resultados vinculantes.

119
UNIDADE 2 | CONHECENDO O BRASIL CONTEMPORÂNEO

3 ORGANIZAÇÃO SOCIAL: NOVO ATOR


POLÍTICO E ECONÔMICO
Tradicionalmente, as organizações são pensadas e divididas a partir de
uma lógica política administrativa que dirige a organização, partindo de dois
pontos: de ordem pública ou de ordem privada. As organizações que estão fora
desses dois grupos, que não apresentam um objetivo meramente lucrativo ou
não apenas desempenham funções públicas, são as Organizações Sociais. Ou seja,
todas as organizações residuais são definidas nesse guarda-chuva, o que abarca
um conjunto muito heterogêneo de tipos e práticas.

A expressão “terceiro setor” pode considerar-se também adequada,


na medida em que sugere uma terceira forma de propriedade entre
a privada e a estatal, mas se limita ao não estatal enquanto produção,
não incluindo o não estatal enquanto controle. (BRESSER-PEREIRA;
GRAU, 1999, p. 16).

Pode-se notar que existe um problema de definição conceitual sobre o que


abrange o terceiro setor, pois:

[...] o conceito de terceiro setor descreve um espaço de participação e


experimentação de novos modos de pensar e fazer sobre a realidade
social... É um campo marcado por uma irredutível diversidade de
atores e formas de organização (CARDOSO, 1997 apud BRESSER-
PEREIRA; GRAU, 1999, p. 37).

Mas é importante ter em conta que a Organização Social é um tipo


específico de ator dentro do terceiro setor. Apesar disso, algumas características
podem ser apontadas como típicas das Organizações Sociais (BRESSER-PEREIRA;
GRAU, 1999), que aqui são listadas:

• iniciativas privadas que buscam suprir uma utilidade de ordem pública. Ou


seja, seus fins são públicos;
• constituído em grande parte por voluntários. Isso quer dizer, alguns membros
devem trabalhar sem ser remunerados;
• sem fins lucrativos (o que não quer dizer que não haverá salário para alguns
membros, mas sim que o objetivo não é enriquecer);
• deve ser formalmente constituída. Isso não significa que deve necessariamente
ser uma instituição legalizada, mas sim possuir regras, procedimentos que
asseguram a existência e atuação da organização;
• a gestão é própria, não deve ser realizada por grupos externos;
• passa por processo de regulamentação nesses últimos anos.

Deste modo, pode-se afirmar que o terceiro setor não é público nem
privado. Ele se situa num entremeio, preenchendo lacunas do Estado através de
uma atuação na esfera privada. Assim, as organizações visam prestar serviços com
fins de atender demandas sociais em áreas como saúde, educação, cultural etc.
Seu formato típico é da Organização Não Governamental (ONG), e sim do setor

120
TÓPICO 3 | ESPAÇOS E ATORES POLÍTICOS

estatal e do setor privado, que visa suprir as falhas do Estado e do setor privado
no atendimento às necessidades da população, numa relação conjunta. Entretanto,
algumas organizações estão evitando tal denominação, como explicam Fischer e
Falcone (1998, p. 4):

Esta característica pode ser observada quando se analisa a adoção


do termo ONG – Organização Não Governamental – pelas entidades
brasileiras. O termo foi adotado mais por influência dos financiadores
internacionais do que por uma tendência espontânea das organizações
brasileiras. Até, pelo contrário, muitas entidades atualmente não
aceitam esta denominação por considerá-la restritiva, ou mesmo,
porque ela omite princípios e valores que lhes são mais caros do ponto
de vista ideológico, ou que, na sua opinião, expressam com mais
clareza sua missão institucional.

De fato, a imagem das Organizações Sociais colou nas ONGs, mas elas são na
verdade múltiplas e assumem vários formatos. Uma das críticas a essas organizações
seria sobre uma atuação que serviria apenas a fins privados, não abrangendo a
dimensão social da questão. Outro ponto seria sobre o enriquecimento de algumas
organizações, que obtinham lucro irregularmente. Entretanto, as organizações
sociais se apresentam como uma alternativa que, quando considerados todos os
seus preceitos, funcionam efetivamente junto à população.

3.1 HISTÓRICO
O surgimento das Organizações Sociais acontece no contexto de crise
do último quarto do século XX, a partir da proposta de Estado mínimo nos
anos 80 pelo neoliberalismo, que significa a maior redução possível do Estado
na economia, o que significou um corte nos programas destinados ao apoio da
população. Na década de 1990 essa proposta começa a se mostrar irreal e se inicia
um retorno do Estado a uma posição mais atuante.

O contexto foi agravado pela abertura do capitalismo na década de 1990 e


a globalização. Com o processo de globalização e o fortalecimento das estruturas
capitalistas no mundo (com o fracasso dos sistemas socialistas), aumenta a
competitividade entre as empresas, que a partir deste momento não competem
apenas com as nacionais, mas com aquelas situadas em outras partes do mundo.

Assim, o Estado nacional teve dificuldade em proteger as empresas


nacionais e os seus trabalhadores, o que levou a uma crise. “Esta crise levou o
mundo a um generalizado processo de concentração de renda e a um aumento da
violência sem precedentes, mas também incentivou a inovação social na resolução
dos problemas coletivos e na própria reforma do Estado” (BRESSER-PEREIRA;
GRAU, 1999, p. 15).

Uma dessas inovações se refere justamente ao fortalecimento do controle


social através do público não estatal. Isso a tal ponto que se pode afirmar que o século
XXI é o momento em que o público não estatal torna-se chave para a manutenção

121
UNIDADE 2 | CONHECENDO O BRASIL CONTEMPORÂNEO

da vida social. Outro ponto que fortalece é a visão dessas organizações como espaço
possível para a prática da cidadania, tornando efetiva a democracia participativa.

No Brasil, existem algumas particularidades sobre o histórico dessas


organizações. Na verdade, desde o período militar, em meados do século XX, o
Estado brasileiro realizou intervenção maciça na economia. Na década de 1990
esse modelo começou a ser criticado, algumas críticas em direção do desvio da
função do papel do Estado (BRASIL, 1997), outras em direção do gasto gerado
por essa atuação. Na década de 90 surge, de fato, uma reação a essa conjuntura:

Só em meados dos anos 90 surge uma resposta consistente com o


desafio de superação da crise: a ideia da reforma ou reconstrução do
Estado, de forma a resgatar sua autonomia financeira e sua capacidade
de implementar políticas públicas conjuntamente com a sociedade
(BRASIL, 1997, p. 8).

Desta forma, o Estado inicia um processo de repensar o desenvolvimento.


Ele toma para si outros papéis, o de promotor e regulador do desenvolvimento,
deixando de se responsabilizar diretamente, como era antigamente. Nesse
sentido, por um lado ele deixa a função de prestador direto de serviços sociais,
principalmente saúde e educação, para assumir a sua regulação. Por outro lado,
enquanto promotor, ele oferece subsídios a esses novos atores que assumirão essa
atuação direta (BRASIL, 1997).

Nesse contexto, surgem as Organizações Sociais, figura fundamental para


o processo da reforma do Estado. O Estado, na verdade, fomenta esse novo ator.
Ainda está em curso essa troca de atores, da saída do Estado para a ocupação das
Organizações Sociais, que foi impulsionada pela regularização da sua atuação
promovida na última década.

3.2 REALIDADE DAS ORGANIZAÇÕES


SOCIAIS NO BRASIL
Possuir um título de Organização Social no Brasil atualmente garante o
recebimento de benefícios do Estado, que abrangem dotações orçamentárias, isenções
fiscais, subsídios etc. Reiterando que as organizações sociais devem atender a uma
demanda específica da comunidade.

Elas se fazem presentes atualmente na gestão de hospitais, santas casas,


museus, institutos de fomento à pesquisa, de projetos voltados a algumas áreas
específicas (saúde e cultura, esporte no caso de alguns estados), manutenção de
grupos (como a Fundação Orquestra Sinfônica do Estado de São Paulo). Ou seja,
essas organizações sociais realizam a gestão do espaço público. O espaço continua
sendo público, ou seja, do Estado, mas quem administra os recursos, os negócios e
as pessoas são as organizações sociais (BRASIL, 1997). Isso significa dizer que uma
associação de um museu faz desde a gestão dos funcionários que ali trabalham,
controle da bilheteria, programação cultural, peças e curadoria das peças.

122
TÓPICO 3 | ESPAÇOS E ATORES POLÍTICOS

O Estado de São Paulo foi pioneiro na implantação do sistema na área


de saúde. A seleção envolve uma convocatória pública, exigindo a experiência
mínima na área de gerenciamento. Esse método visa garantir que entidades
sólidas assumam a frente das instituições, e o sucesso do modelo.

Segundo avaliação da experiência de São Paulo pelo Banco Mundial


em 2006 (apud CAMARGO et al., 2013), a solução gerou uma experiência
de modernização positiva em relação ao modelo anterior, mais produtiva e
barata. Entretanto, há muitas críticas na proposta. A primeira seria o desvio
de função, com alta probabilidade das organizações passarem a atuar por fins
privados. Segundo, que há pouca transparência na sua atuação em relação à
disponibilidade de informações (CAMARGO et al., 2013). Isso não apenas por
parte das organizações, como também a postura do próprio Estado.

4 MOVIMENTO DOS SEM TERRA (MST): MOVIMENTO


ANTIGO, PARADIGMAS RENOVADOS
O Movimento Sem Terra (MST) tem reconhecida atuação no país,
por conta da sua luta pela reforma agrária. Seus acampamentos e ocupações
estão presentes em vários estados do país. Contudo, pouco se conhece do
seu processo e organização interna, que abrange diferentes dimensões da
vida daqueles que participam do grupo. Sua atuação, além da defesa da
redistribuição agrária, abrange aspectos sociais, educacionais e de cidadania.
Isso o faz um ator social importante no país, com longa atuação e que se renova
sem muito aparecer nas grandes mídias.

O MST surge entre os finais dos anos 70 e início dos 80, tendo como base
fundante o coletivo, que permanece até os dias de hoje. Deve-se pensar no grupo
e em grupo, com decisões tomadas por todos e que beneficiem a todos. Na sua
origem, o MST tinha o ideário cristão, que visava defender os mais pobres e
oprimidos, excluídos do campo (SCHERER-WARREN, 2000).

Essa ideia do coletivo se transformou, e atualmente a base do movimento é


um ideário democrático. Isso ampliou o movimento, que foi de uma luta do grupo
dos excluídos para uma luta de todos. Com isso, amplia também o diálogo e o
apoio a outras lutas e outros movimentos, como por moradia, por educação etc.

Isso também resulta na ampliação das preocupações internas. Destacam-se


algumas, como:

• a solidariedade: com base cristã, de atuação em prol da coletividade. Nesse


sentido, “o MST tenta criar condições de sobrevivência no mundo globalizado
se integrando a uma nova concepção de intercâmbio, ‘o comércio solidário’”
(SCHERER-WARREN, 2000, p. 44). Na sua aplicação, o MST passou a
estabelecer o comércio direto com cooperativas.

123
UNIDADE 2 | CONHECENDO O BRASIL CONTEMPORÂNEO

• valorização do ser humano: tal preocupação tem relação direta com o


exercício da cidadania. Primeiro, deve-se valorizar a vida de cada indivíduo,
principalmente em relação à saúde. Isso passa pela questão ambiental,
defendendo a qualidade do que se come, se bebe, uma relação mais próxima
daquilo que consumimos. Um dos aspectos, por exemplo, seria a não
utilização de agrotóxicos na produção. Segundo, a valorização do ser povo,
ou seja, do ser brasileiro, e compartilhar de direitos sociais e humanos e
reconhecer a necessidade de cada um. Outro ponto seria o desenvolvimento
da capacidade de se indignar e de buscar a efetividade dos direitos legítimos
do povo (SCHERER-WARREN, 2000). Isso ajuda a entender o porquê das
manifestações que mobilizam grandes grupos e o porquê de o MST sempre
estar presente em protestos de diversos grupos, já que importa a dignidade
humana muito além de disputas.

FIGURA 46 – MANIFESTAÇÃO DE INTEGRANTES DO MST JUNTAMENTE COM OUTROS GRUPOS

FONTE: Disponível em: <http://brasil247.com/get_img?ImageWidth=651&ImageId=273094>.


Acesso em: 29 nov. 2013.

• o trabalho e o estudo: compreendidos como essenciais para humanizar o


indivíduo. Além disso, o trabalho, principalmente, é aquele que provê os meios
de vida. Já o estudo é responsável pelo desenvolvimento humano. São eles que
transformam as pessoas e a sua realidade (SCHERER-WARREN, 2000). Nesse
sentido, há um intenso investimento na educação dentro dos acampamentos,
não financeiro, mas de conhecimento humano, através de parcerias com
universidades e capacitação constante dos professores.

124
TÓPICO 3 | ESPAÇOS E ATORES POLÍTICOS

Assim, o MST amplia sua dimensão de atuação:

O objetivo material imediato (a terra) “não basta”, como dizem; deve


vir acompanhado de lutas pelos direitos sociais (a cidadania plena) e
em direção à construção de uma sociedade mais justa (a socialista). Para
atingir este objetivo é que a educação, considerada como um direito
essencial, deve se desenvolver como um processo que inclui educação
formal (ensino fundamental) e informal (participação no movimento,
nas mobilizações, em ações de solidariedade etc.), incluindo neste
processo todas as gerações e gêneros (SCHERER-WARREN, 2000, p. 48).

5 AS ORGANIZAÇÕES NÃO GOVERNAMENTAIS (ONG)


No Brasil, as Organizações Não Governamentais (as ONGs) surgem no
país no contexto da entrada da sociedade civil de forma orgânica, quer dizer, da
sua participação efetiva nos rumos do país através da política. Isso acontece nas
últimas décadas do século XX, ou seja, pouco mais de 20 anos.

Mas qual seria de fato o espaço ocupado pelas ONGs em relação à


sociedade civil na atualidade? Elas atuam politicamente?

[...] no Brasil, temas como direitos humanos, meio ambiente e fome


têm tido como porta-voz, em grande parte, um conjunto de ONGs, que
toma a iniciativa diante do Estado, propondo políticas diretamente
ao Poder Executivo ou pressionando o Congresso Nacional para
aprovações de leis (PINTO, 2006, p. 654).

Exercendo um papel de pressionar governantes, as ONGs tratam de temas


relativos a grupos e questões não trabalhadas sistematicamente entre outras
formas de atuação política. Como exemplo, podemos citar a questão do meio
ambiente. Dentro das plataformas dos partidos, apenas recentemente a discussão
surgiu e, mesmo assim, algo ainda raso, que não compreende o problema de
forma profunda.

125
UNIDADE 2 | CONHECENDO O BRASIL CONTEMPORÂNEO

NOTA

É interessante pensar que quem começa com as discussões ambientais são as


ONGs. Na Amazônia, não se sabe ao certo o número de ONGs que atuam. As informações
variam de 1.000 a 100.000. Abaixo, seguem os símbolos de algumas delas.

Outros temas relativos a grupos minoritários no país, como sobre


as mulheres, direitos homoafetivos, indígenas, moradores de rua, são
sistematicamente trabalhados e elaborados pelas ONGs. É bom esclarecer que
as vozes desses grupos não são substituídas pelas ONGs, mas elas servem como
intermediadoras na realização de projetos e sistematização das demandas, já que
possuem uma preocupação maior em termos de organização que os movimentos
sociais (PINTO, 2004). E dentro das ONGs também atuam indivíduos pertencentes
a essas minorias. Não existe uma fronteira, mas uma integração.

No que concerne às formas como as ONGs se movem no espaço


público, vale chamar a atenção para o potencial de construção
de redes, abrangendo os espaços locais, regionais e globais,
como também as potencialidades de incluir nessas redes desde
organizações internacionais, como as do sistema ONU e fundações
financiadoras, até grupos semimarginalizados em bairros da periferia
das grandes cidades. A noção de rede em relação às ONGs pode
ser pensada de duas formas: uma é a rede entre ONGs, incluindo
também os movimentos sociais, na qual cada organização é ponto
de transmissão para outras, maiores ou menores, locais ou globais.
Outra forma de pensar a rede é como um espaço tridimensional
onde as ONGs funcionam não apenas como pontos de transmissão,
mas como pontos nodais, que acumulam e distribuem informações,
acumulam poder, credenciam-se como representantes fazendo a
ligação entre o Estado e a sociedade em geral (PINTO, 2006, p. 658).

Dessa forma, as ONGs adquirem poder, conseguem estabelecer pontes


entre diferentes grupos. Por um lado, isso é positivo, pois elas conseguem fazer
ressoar as vozes daqueles que pouco seriam ouvidos e colocar suas demandas aos
governos. Por outro lado, esse poder pode ser perigoso, quando as populações
apoiadas por essas ONGs passam a depender de sua atuação. Ou seja, as ONGs

126
TÓPICO 3 | ESPAÇOS E ATORES POLÍTICOS

podem desenvolver territórios de domínio, não estimulando a prática da cidadania


e a busca dos direitos por si mesmo, mas uma dependência de sua atuação.

O fato é que as ONGs possuem, na realidade brasileira contemporânea,


uma atuação política real e que consegue pressionar o governo por uma atuação
mais social. O espaço significa uma atuação política potencial, mas não existem
limites das ações. Elas “não podem ser vistas de maneira simplista, como
substitutas de partidos políticos, do Estado ou mesmo dos movimentos sociais.
“Suas ações têm limites, entre eles o fato de serem fragmentadas, atingirem o
conjunto da sociedade de forma limitada e dependerem de financiamentos
pontuais” (PINTO, 2006, p. 667).

NOTA

O filme Quanto Vale ou é por Quilo?, do diretor Sérgio Bianchi, desenvolve uma
crítica sobre a atuação das ONGs no Brasil. Busque e assista!

Com certeza você ouviu algo ou talvez participou das manifestações


que aconteceram em junho de 2013. Multidões foram às ruas defendendo
diferentes bandeiras: contra a corrupção, melhorias na saúde, melhorias no
transporte público etc. Não se sabe ao certo o que significou esse movimento,
mas com certeza bradou um grito político. Marilena Chauí, grande intelectual
brasileira da atualidade, tratou do tema de uma perspectiva sociológica.
Acompanhe na leitura abaixo.

127
UNIDADE 2 | CONHECENDO O BRASIL CONTEMPORÂNEO

LEITURA COMPLEMENTAR

As manifestações de junho de 2013 na cidade de São Paulo

Marilena Chauí
O inferno urbano

Não foram poucos os que, pelos meios de comunicação, exprimiram


sua perplexidade diante das manifestações de junho de 2013: de onde vieram
e por que vieram, se os grandes problemas que sempre atormentaram o país
(desemprego, inflação, violência urbana e no campo) estão com soluções bem
encaminhadas e reina a estabilidade política? As perguntas são justas, mas
a perplexidade não, desde que voltemos nosso olhar para um ponto que foi
sempre o foco dos movimentos populares: a situação da vida urbana nas
grandes metrópoles brasileiras.

Quais os traços mais marcantes da cidade de São Paulo nos últimos


anos e que, sob certos aspectos, podem ser generalizados para as demais?
Resumidamente, podemos dizer que são os seguintes:

• explosão do uso do automóvel individual: a mobilidade urbana se tornou


quase impossível, ao mesmo tempo em que a cidade se estrutura com um
sistema viário destinado aos carros individuais em detrimento do transporte
coletivo, mas nem mesmo esse sistema é capaz de resolver o problema;

• explosão imobiliária com os grandes condomínios (verticais e horizontais)


e shopping centers, que produzem uma densidade demográfica praticamente
incontrolável, além de não contar com redes de água, eletricidade e esgoto,
os problemas sendo evidentes, por exemplo, na ocasião de chuvas;

• aumento da exclusão social e da desigualdade, com a expulsão dos


moradores das regiões favorecidas pelas grandes especulações imobiliárias
e o consequente aumento das periferias carentes e de sua crescente distância
com relação aos locais de trabalho, educação e serviços de saúde. (No caso de
São Paulo, como aponta Hermínia Maricatto, deu-se a ocupação das regiões
de mananciais, pondo em risco a saúde de toda a população); em resumo:
degradação da vida cotidiana das camadas mais pobres da cidade;

• o transporte coletivo indecente, indigno e mortífero. No caso de São Paulo,


sabe-se que o programa do metrô previa a entrega de 450 km de vias até 1990;
de fato, até 2013, o governo estadual apresenta 90 km. Além disso, a frota de
trens metroviários não foi ampliada, está envelhecida e mal conservada; além
da insuficiência quantitativa para atender à demanda, há atrasos constantes

128
TÓPICO 3 | ESPAÇOS E ATORES POLÍTICOS

por quebra de trens e dos instrumentos de controle das operações. O mesmo


pode ser dito dos trens da CPTU, que também são de responsabilidade do
governo estadual.

[...]

Em resumo: definidas e orientadas pelos imperativos dos interesses


privados, as montadoras de veículos, empreiteiras da construção civil e
empresas de transporte coletivo dominam a cidade sem assumir qualquer
responsabilidade pública, impondo o que chamo de inferno urbano.

[...]

No ponto de chegada, as manifestações introduziram o tema da


corrupção política e a recusa dos partidos políticos. Sabemos que o MPL é
constituído por militantes de vários partidos de esquerda e, para assegurar a
unidade do movimento, evitou a referência aos partidos de origem.

Por isso foi às ruas sem definir-se como expressão de partidos políticos
e, em São Paulo, quando, na comemoração da vitória, os militantes partidários
compareceram às ruas foram execrados, espancados e expulsos como
oportunistas – sofreram repressão violenta por parte da massa. Ou seja, alguns
manifestantes praticaram sobre outros a violência que condenaram na polícia.
A crítica às instituições políticas não é infundada, mas possui base concreta:

a. no plano conjuntural: o inferno urbano é, efetivamente, responsabilidade


dos partidos políticos governantes;

b. no plano estrutural: no Brasil, sociedade autoritária e excludente, os partidos


políticos tendem a ser clubes privados de oligarquias locais, que usam o
público para seus interesses privados; a qualidade dos legislativos nos três
níveis é a mais baixa possível e a corrupção é estrutural; como consequência,
a relação de representação não se concretiza porque vigoram relações de
favor, clientela, tutela e cooptação;

c. a crítica ao PT: de ter abandonado a relação com aquilo que determinou seu
nascimento e crescimento, isto é, o campo das lutas sociais auto-organizadas
e ter se transformado numa máquina burocrática e eleitoral (como têm dito e
escrito muitos militantes ao longo dos últimos 20 anos).

Isso, porém, embora explique a recusa, não significa que esta tenha sido
motivada pela clara compreensão do problema por parte dos manifestantes. De
fato, a maioria deles não exprime em suas falas uma análise das causas desse

129
UNIDADE 2 | CONHECENDO O BRASIL CONTEMPORÂNEO

modo de funcionamento dos partidos políticos, qual seja, a estrutura autoritária


da sociedade brasileira, de um lado, e, de outro, o sistema político-partidário
montado pelos casuísmos da ditadura. Em lugar de lutar por uma reforma
política, boa parte dos manifestantes recusa a legitimidade do partido político
como instituição republicana e democrática.

Assim, sob este aspecto, apesar do uso das redes sociais e da crítica
aos meios de comunicação, a maioria dos manifestantes aderiu à mensagem
ideológica difundida anos a fio pelos meios de comunicação de que os partidos
são corruptos por essência.

Como se sabe, essa posição dos meios de comunicação tem a finalidade


de lhes conferir o monopólio das funções do espaço público, como se não fossem
empresas capitalistas movidas por interesses privados.

Dessa maneira, a recusa dos meios de comunicação e as críticas a


eles endereçadas pelos manifestantes não impediram que grande parte deles
aderisse à perspectiva da classe média conservadora difundida pela mídia a
respeito da ética.

De fato, a maioria dos manifestantes, reproduzindo a linguagem


midiática, falou de ética na política (ou seja, a transposição dos valores do espaço
privado para o espaço público), quando, na verdade, se trataria de afirmar a
ética da política (isto é, valores propriamente públicos), ética que não depende
das virtudes morais das pessoas privadas dos políticos e sim da qualidade das
instituições públicas enquanto instituições republicanas.

A ética da política, no nosso caso, depende de uma profunda reforma


política que crie instituições democráticas republicanas e destrua de uma vez
por todas a estrutura deixada pela ditadura, que força os partidos políticos a
coalizões absurdas se quiserem governar, coalizões que comprometem o sentido
e a finalidade de seus programas e abrem as comportas para a corrupção.

Em lugar da ideologia conservadora e midiática de que, por definição e


por essência, a política é corrupta, trata-se de promover uma prática inovadora
capaz de criar instituições públicas que impeçam a corrupção, garantam a
participação, a representação e o controle dos interesses públicos e dos direitos
pelos cidadãos. Numa palavra, uma invenção democrática.
FONTE: CHAUÍ, M. As manifestações de junho de 2013 na cidade de São Paulo - Teoria e
Debate, Edição 113, 2013. Disponível em: <http://www.teoriaedebate.org.br/materias/nacional/
manifestacoes-de-junho-de-2013-na-cidade-de-sao-paulo?page=full>. Acesso em: 28 nov. 2013.

130
RESUMO DO TÓPICO 3
Neste tópico vimos:

• A atuação social na esfera política para além do momento da eleição com o voto
nos representantes. Nesse sentido, dois grupos foram apresentados: aqueles
espaços proporcionados pelo governo de atuação direta do espaço civil, as
Conferências e Organizações Sociais; e outro grupo já mais estabelecido, que
pressiona os governantes com os movimentos sociais, representado pelo MST e
as ONGs. Muito além de elementos estagnados no tempo, eles se transformam
ao longo do tempo e ampliam sua luta pela cidadania.

131
AUTOATIVIDADE

1 Mostre como acontece a atuação política:


a) das Conferências;
b) das Organizações Sociais;
c) das ONGs.

132
UNIDADE 3

A SOCIEDADE BRASILEIRA E
SUAS INFLUÊNCIAS

OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM

A partir desta unidade você será capaz de:

• entender os conceitos de indivíduo, sociedade, comunidade, perfil social,


para poder analisar o meio em que vivemos;

• compreender a influência da globalização e suas fases na sociedade brasi-


leira;

• identificar como a ética, os direitos e a solidariedade são grandes desafios


na atualidade.

PLANO DE ESTUDOS
Esta unidade está dividida em três tópicos. Ao final de cada um deles
você encontrará atividades que o(a) ajudarão a refletir e fixar os conheci-
mentos abordados.

TÓPICO 1 – NOVOS CONCEITOS?

TÓPICO 2 – A SOCIEDADE E NOVAS REALIDADES

TÓPICO 3 – OS DESAFIOS CONTINUAM

133
134
UNIDADE 3
TÓPICO 1

NOVOSCONCEITOS?

1 INTRODUÇÃO
A sociedade atual, essa mesma em que vivemos, tem características muito
peculiares desse tempo. Não vamos elencar todas essas características, mas essa
realidade, sim, o que nos possibilita aqui fazer uma leitura dos comportamentos,
das relações humanas etc., diferentemente do que era no século XIX. A imagem
a seguir retrata somente situações, acontecimentos negativos; reais, sim, mas
carregados de negatividade porque agridem o ser humano, desestabilizam
relações, desacreditam na humanidade, mas que servem de reflexão acerca
deste meio em que vivemos.

FIGURA 47 – A SOCIEDADE ATUAL

FONTE: Disponível em: <http://4.bp.blogspot.com/-vyXC_pTIJcs/TxNxHc6y-bI/


AAAAAAAAAGc/9_WqF9k2wEY/s1600/SOCIEDADE+ATUAL.jpg >. Acesso em: 16 dez. 2013.

135
UNIDADE 3 | A SOCIEDADE BRASILEIRA E SUAS INFLUÊNCIAS

O nosso caderno traz à discussão o tema Formação da sociedade


brasileira. O Brasil, com seus contrastes socioeconômicos, está também
avançando como expressão econômica mundial. Estudos apontam o Brasil
como a décima economia mundial, às vezes chega à sétima posição, porém,
toda essa riqueza produzida encontra dificuldades para chegar a todas as
pessoas, principalmente aquelas que vivem ainda em situação de pobreza.

Queremos, neste tópico, entender como se caracteriza a sociedade


brasileira, seu perfil, sua formação, para daí analisar como a informação
e o conhecimento, a economia, o meio ambiente, podem contribuir para
as melhorias necessárias a esta sociedade. Afinal, a realidade muda
constantemente, o tempo todo, e estas transformações acontecem na sociedade
brasileira com suas peculiaridades próprias.

2OSCONCEITOS–SOCIEDADE,INDIVÍDUO,COMUNIDADE
Nossa carteira de identidade traz a foto/imagem do nosso rosto. As
formas do nosso rosto indicam algumas de nossas características, que são muito
pessoais. Essas características indicam nossa identidade pessoal e intransferível,
pelo menos visualmente, a não ser que tenhamos um gêmeo univitelino, e através
de uma foto não se pode identificar as diferenças.

Para chegarmos ao entendimento do conceito de sociedade, o que é


sociedade, vamos destacar algumas palavras-chave imprescindíveis para este
entendimento. A primeira palavra que quero destacar é “indivíduo”. Entre vários
significados, pontos de vista para conceituar indivíduo, que parece ser mais
complexo para entender do que a própria sociedade, vamos tomar o caminho
do conceito do indivíduo como distinto, mas nem por isso incomunicável com
outros indivíduos.

FIGURA 48 – INDIVÍDUO

FONTE: Disponível em: <http://1.bp.blogspot.com/_yj8Cr0cDhm8/TOsnNYwuRBI/


AAAAAAAAAIg/WAtoIi7b9XE/s1600/ind.jpg>. Acesso em: 16 dez. 2013.

136
TÓPICO 1 | NOVOS CONCEITOS?

A singeleza da imagem na figura acima mostra o indivíduo como tantos


outros, junto, porém, com suas peculiaridades, no caso, a cor o diferencia, mas
sabemos que o que realmente diferencia um indivíduo de outro, via de regra, não
é visível aos olhos.

Trata-se, sempre, da questão de identidade. De saber quem somos e


como somos; de saber por que somos. Sobretudo quando nos damos
conta de que o homem se distingue dos animais por ter a capacidade
de se identificar, justificar e singularizar. De saber quem ele é. De fato,
a identidade social é algo tão importante que o conhecer-se a si mesmo
através dos outros deixou os livros de filosofia para se constituir numa
busca antropologicamente orientada (DAMATTA, 1986, p. 15).

A etimologia da palavra indivíduo nos reporta ao latim “individuus”,


dividindo-se em “in” que indica negação, não, mais “dividuus”, divisível, dividir.
Juntando-se essas duas palavras, não divisível, entendemos que indivíduo
é o que não se divide, que não se pode multiplicar, ou numa linguagem mais
cinematográfica, não se pode replicar.

De indivíduo deriva individuação, termo que designa a


determinabilidade individual, ou seja, aquilo que faz com que este indivíduo
seja precisamente este e se distinga de todos os outros, por exemplo: este
determinado ser - Pedro. Duns Scotus e sua escola dão também o nome
de haecceitas à individuação, enquanto Pedro, por seu ser individual,
é este ente determinado, capaz de ser assinalado como "este". Na esfera
do conhecimento, o indivíduo manifesta-se no conceito individual. — A
substantividade incomunicável do indivíduo e sua separação de tudo o
mais crescem com a perfeição dos graus do ser. No domínio do inorgânico,
os indivíduos salientam-se muitíssimo pouco; entram sempre em
associações maiores (atômicas ou moleculares) e até hoje não foram ainda
fixados de maneira unívoca. Nos reinos vegetal e animal, todo indivíduo
está, de ordinário, nitidamente separado dos restantes. O homem possui
uma substantividade essencialmente superior, visto que sua alma o eleva à
categoria de pessoa. O espírito puro repousa ainda mais em si. Finalmente,
a substantividade absoluta compete a Deus, porque se ergue infinitamente
acima de todas as coisas.

FONTE: Disponível em: <http://bebellaworld.files.wordpress.com/2010/09/individuo.doc>. Acesso


em: 17 dez. 2013.

Entendido o termo indivíduo, vamos agora estudar o conceito de


sociedade. Vários pensadores desenvolveram estudos para conceituar o termo
sociedade. Vamos lembrar três pensadores que têm sua importância para além da
sociologia: Emile Durkheim, Karl Marx e Max Weber.

137
UNIDADE 3 | A SOCIEDADE BRASILEIRA E SUAS INFLUÊNCIAS

FIGURA 49 – DURKHEIM, MARX E WEBER

FONTE: Disponível em: <http://4.bp.blogspot.com/-yS82vC8U7Eo/TZcul1QzFZI/AAAAAAAACzg/


qE9BaWDDkM0/s400/caric_sociologia300.png>. Acesso em: 16 dez. 2013.

NOTA

Neste site você vai encontrar mais informações sobre estes três pensadores
de destaque: <http://contextoshistoricos.blogspot.com.br/2012/04/saiba-mais-sobre-
karl-marx.html>.

Vamos começar por Karl Marx, simplesmente por ser o mais famoso dos três.

Podemos entender o conceito de sociedade desenvolvido pela teoria de


Marx da seguinte maneira:

• Conjunto de relações sociais.


• Este conjunto de relações sociais evidencia a luta de classes.
• Estas classes se constituem a partir das relações de produção.
• As relações de produção se formam a partir das classes dominantes e dos
subordinados.

A obra mais conhecida de Marx é “O Capital”.

138
TÓPICO 1 | NOVOS CONCEITOS?

FIGURA 50 – CHARGE O CAPITAL

FONTE: Disponível em: <http://2.bp.blogspot.com/_xAH-47hY8Uk/TJo4N-n6aDI/


AAAAAAAABAM/PdbQ_AWZQDs/s1600/karlmarxcharge.JPG>. Acesso em: 16 dez. 2013.

Emile Durkheim, nosso segundo autor, tem na obra “Da divisão social
do trabalho” seu destaque nesta seara da sociologia. Este pensador e também
filósofo vai embrenhar-se na sociologia, destacando-se as seguintes ideias:

O homem se torna humano a partir de sua socialização, quando se torna


parte de um grupo social.

A socialização aponta para as seguintes características de aprendizagem:

▪ Como ser
▪ Como sentir.
▪ Como comportar-se.

Estas características humanas se tornarão um fato social a partir do momento


em que esse comportamento é determinado pela sociedade, pelo grupo e não por
vontade ou escolha própria.

139
UNIDADE 3 | A SOCIEDADE BRASILEIRA E SUAS INFLUÊNCIAS

FIGURA 51 – INDIVÍDUO E O COMPORTAMENTO DETERMINADO PELA SOCIEDADE

FONTE: Disponível em: <http://fabiopestanaramos.blogspot.com.br/2011/03/os-


estudos-de-durkheim.html>. Acesso em: 16 dez. 2013.

Durkheim salienta que a sociedade deve buscar sempre a integração entre


suas partes. Até parece que ele vive em nosso país, anda tranquilamente nas
nossas ruas e entende o nosso comportamento. Isso é muito próximo da visão de
DaMatta (2010, p. 77) quando afirma que:

Basta observar que nós, brasileiros, somos um povo marcado e


dividido pelas ordens tradicionais: o nome de família, o título de
doutor, a cor da pele, o bairro onde moramos, o nome do padrinho,
as relações pessoais, o ser amigo do rei, chefe político ou presidente.
Tudo isso nos classifica socialmente de modo irremediável.

FIGURA 52 – FATO SOCIAL

regras, leis, FATO SOCIAL


costumes, rituais (características)

realidade do seria
composta de caracteriza-se
indivíduo generalidade
por

força que os fatos exterioridade ou seja


como coerção
exercem sobre os social
indivíduos ou seja
tudo aquilo
é exterior ao que é
apresenta-se manifesta-se repetido
quando indivíduo
em todos os
indivíduos
assim como
sob formas de
SANÇÔES adotamos um
idioma ou uma regras e
forma de família leis sociais

FONTE: Disponível em: <http://2.bp.blogspot.com/-h20UNT3U2v4/T6_2N4xms_I/


AAAAAAAAABY/5s3sAj1SY0M/s320/Fato+Social+caracter%C3%ADsticas.jpg>. Acesso em: 16 dez. 2013.

140
TÓPICO 1 | NOVOS CONCEITOS?

A figura acima ilustra superficialmente o pensamento de Durckeim sobre


sua visão do fato social como ponto integrador da sociedade.

UNI

Faça um exercício de análise deste organograma e estabeleça um paralelo com


a sociedade atual. As perguntas são as mesmas que perpassam a história da humanidade:
De onde vêm a fome, a pobreza e a miséria?
O que gera a violência?
Quais as causas do preconceito?

O terceiro pensador desse grupo é Max Weber. Não menos importante,


mas com sua característica predominante de pensar a partir de uma ordem que se
mantém para o bem comum. Se, enquanto para Weber o sujeito deve prevalecer
em detrimento do social, em Marx as consciências individuais são determinadas
pelas relações materiais da própria sociedade.

Max Weber, assim como Marx e Durkheim, vai além do estudo moderno
da sociologia, contribuindo também para a filosofia, o direito, a economia.

Grande parte de seu trabalho como pensador e estudioso foi


reservada para o chamado processo de racionalização e desencantamento
que provém da sociedade moderna e capitalista. Mas seus estudos também
deram contribuição importante para a economia. Sua obra mais famosa é o
ensaio A ética protestante e o espírito do capitalismo, com o qual começou suas
reflexões sobre a sociologia da religião. Weber argumentou que a religião
era uma das razões não exclusivas do porquê de as culturas do Ocidente e
do Oriente se desenvolverem de formas diversas, e salientou a importância
de algumas características específicas do protestantismo ascético, que levou
ao nascimento do capitalismo, da burocracia e do estado racional e legal
nos países ocidentais. Em outro trabalho importante, A política como vocação,
Weber definiu o Estado como "uma entidade que reivindica o monopólio
do uso legítimo da força física", uma definição que se tornou central no
estudo da moderna ciência política no Ocidente. Suas contribuições mais
conhecidas são muitas vezes referidas como a “Tese de Weber". A ética
protestante e o espírito do capitalismo é considerada a grande obra de Max
Weber e é o seu texto mais lido e conhecido. A primeira parte desta obra foi
publicada em 1904 e a segunda veio a público em 1905, depois da viagem
do autor e de sua esposa aos Estados Unidos.

FONTE: Disponível em: <http://www.recantodasletras.com.br/discursos/3836781>. Acesso em: 16 dez. 2013.

141
UNIDADE 3 | A SOCIEDADE BRASILEIRA E SUAS INFLUÊNCIAS

UNI

Uma leitura muito interessante de Weber é “A ética protestante e o espírito


do capitalismo”. Ele consegue desenvolver um pensamento onde religião e capitalismo
andam juntos.

FIGURA 53 – INCLUSÃO E EXCLUSÃO SOCIAL

FONTE: Disponível em: <http://peadportfolio164206.blogspot.com.br/2010/09/


pertencimentos-e-desenvolvimento.html>. Acesso em: 16 dez. 2013.

A figura acima nos questiona a partir da realidade de inclusão/exclusão


que acontece na sociedade em nome da ordem, da disciplina, do bem comum.
Podíamos ficar horas refletindo sobre essa imagem singela, aplicando conceitos
sobre o sujeito, sobre a sociedade, sobre interação, sobre exclusão, enfim, como
vivemos hoje, como indivíduos, como cidadãos, em relação a nós mesmos, entre
nós e com a sociedade.

Só podemos, então, melhor entender a sociedade e o indivíduo que aí


reside, vive, evolui, partilhando, interagindo diferentes atividades, como, por
exemplo: cultura, religião, lazer e tantas outras atividades que vão dar uma forma
a esse grupo de indivíduos – a comunidade na sociedade.

Comunidade é outra palavra onipresente, principalmente nos meios


jornalísticos, para identificar, por exemplo, favelas, denominações religiosas que
vivem em pequenas comunidades etc. A palavra comunidade pode indicar grupo
social e também um relacionamento particularizado visto como qualidade, de
modo a qualificar as ações que, por si só, são comuns.

142
TÓPICO 1 | NOVOS CONCEITOS?

Na contemporaneidade, podemos fazer uso de termos que distinguem


diferentes tipos de comunidades, com suas caracterizações e formas. O primeiro
uso que podemos fazer para contextualizar uma comunidade se manifesta como os
grupos locais que se caracterizam pela proximidade, pelas relações de trabalho. A
figura a seguir mostra um grupo de pessoas, em determinados espaços, algumas
interagindo com outras, outras solitárias, paradas ou caminhando, mas que no
final do dia ou do expediente irão para suas casas.

FIGURA 54 – PESSOAS INTERAGINDO

FONTE: Disponível em: <http://culturadigital.br/simposioacervosdigitais/files/2010/04/4-


grupos-de-trabalho.jpg>. Acesso em: 16 dez. 2013.

Uma segunda identificação se dá nas comunidades com interesses


comuns, e esses interesses é que determinam o tipo de relação que vai se
estabelecer, e não o contrário. Ou seja, o mais importante são os objetivos a
serem alcançados e não a qualidade das relações. Aqui podemos citar como
exemplo os condomínios residenciais.

143
UNIDADE 3 | A SOCIEDADE BRASILEIRA E SUAS INFLUÊNCIAS

FIGURA 55 – CONDOMÍNIO HORIZONTAL

FONTE: Disponível em: <http://imoveis.culturamix.com/blog/wp-content/uploads/2010/09/34.


jpeg>. Acesso em: 16 dez. 2013.

E uma terceira caracterização de comunidades se desenvolve dentro de


uma qualidade das relações baseada em objetivos que são comuns a todos, ou,
pelo menos, todos assumem como sendo seus. Neste último grupo, podemos
exemplificar as comunidades religiosas, que em suas relações desenvolvem
valores, emoções, ideologias próprias, ética em vista de projetos comuns a todos.

FIGURA 56 – RELAÇÕES BASEADAS EM OBJETIVOS COMUNS

FONTE: Disponível em: <http://www.camp.org.br/?canal=noticias&id=366>. Acesso em: 16 dez. 2013.

144
TÓPICO 1 | NOVOS CONCEITOS?

Um termo bastante citado é a comunidade virtual. O primeiro registro


dessa expressão se deu em 1993, por Howard Rheingold. A comunidade virtual
que estabelece relações entre diferentes pessoas, às vezes com objetivos comuns,
às vezes sem objetivos claros, mas que estão aí para discutir, para opinar, para
“cutucar”, para “curtir”, para “compartilhar”, ou seja, no tempo suficiente para
estabelecer relação que pode ser duradoura ou não, que pode ser aberta a mais
pessoas ou não, algumas com menor ou maior grau de envolvimento sentimental.
Mundos virtuais são assim, comunidades virtuais também.

Para entendermos a sociedade contemporânea, vamos entender a


dinâmica das chamadas ‘comunidades’, termo muito utilizado para diferentes
fins, principalmente nos meios de comunicação e também por organizações
sociais. OLIVEIRA (1995, p. 45) assim caracteriza as comunidades:

As comunidades formadas por sociedades que apresentam características


de permanência e defesa do bem comum, transcendentemente aos
interesses individuais de cada um. Nesta linha de reflexão é possível
entender-se também como comunidade: a paróquia, as comunidades
municipais, nacionais, etc., não sendo correto que se incluam aquelas
que não objetivam o bem comum e que não possuem ânimo de
perpetuidade. As sociedades comerciais são grupamentos que se
formam com o objetivo de atender interesses individuais, desfazendo-
se tão logo atingido tal mister, logo, estão afastadas de tal classificação.

O autor deixa claro que, para ser denominada comunidade, precisa ter
como objetivo o bem comum como condição, se não por todos, pelo menos pela
maioria integrante da comunidade, e que também almeja ‘perpetuidade’ na sua
existência. Mesmo que haja divisões, não são divisões que se digladiam, mas que
se fazem necessárias como forma de organização de funções em vista do bem
maior, que é o bem comum.

As comunidades proporcionam uma identidade social comum e


obtêm lealdades que transcendem às experiências de muitos outros
grupos, muito embora possam conter divisões internas (famílias, clãs
ou linhagens, grupos étnicos, religiosos, associações etc.), segundo
Chinoy (1967) (OLIVEIRA, 1995, p. 46).

Uma palavra que caracteriza de forma evidente uma comunidade é


participação. A participação, é óbvio, tem como objetivo aquilo que se visualiza
como o melhor para a comunidade. A participação vai tornar possível a efetivação
dos objetivos propostos e também da cobrança da realização desses objetivos.
Claro que tudo isso implica em muito trabalho.

A sociedade comunitária apresenta uma divisão simples do trabalho,


limitando a diferenciação de papéis, o que determina que tenhamos
os papéis sociais como inclusivos de aspectos comportamentais, e não
apenas relativos ao segmento do indivíduo e atinentes ao seu trabalho
ou demais atividades. A participação ampla traz como consequência
uma interação dos atores sociais em todos os contextos, levando a um
comprometimento espontâneo do particular com o geral, existindo
ainda, evidentemente, a via de retorno a tal compromisso social
(OLIVEIRA, 1995, p. 46-47).

145
UNIDADE 3 | A SOCIEDADE BRASILEIRA E SUAS INFLUÊNCIAS

Isso ressalta a importância da comunidade, ou de comunidades na


sociedade contemporânea. Vemos o próprio Estado se utilizando da organização
comunitária, pois dentro da territorialidade da nação a comunidade se torna um
microcosmo, com a possibilidade de se entender as necessidades que podem ser
ampliadas para além desse microcosmo.

FIGURA 57 – QUEBRA-CABEÇA

FONTE: Disponível em: <http://rodrgoncalves.files.wordpress.com/2010/08/


quebracabeca.jpg>.Acesso em: 16 dez. 2013.

Por isso, é recorrente na sociedade contemporânea, a realização de pesquisas


de intenção, de opinião, principalmente quando o Estado tem necessidade de saber
quais são os maiores anseios da população, levando em conta que a maioria sente
diferentes necessidades, e o que é comum e que se faz necessário no dia a dia e no
desenvolvimento da sociedade, como saúde, educação, segurança, infraestrutura,
lazer. O Estado tem obrigações básicas, que muitas das vezes não consegue realizar,
e é aí que muitos organismos sociais participam de forma aleatória, conforme a
situação em que se está inserido, ou conforme é regida a sua organização.

A formação de valores ético-morais realmente sólidos e voltados ao


bem comum somente pode ser trabalhada pelo Estado interessado nos
seus cidadãos, interesse que se reafirma quando o aparelho oferece
ensino, emprego e preserva os valores culturais de cada uma das
comunidades. Assim, a cadeia de contatos entre os atores sociais pode
fazer proliferar o sentido de bem comum, do particular para o geral; de
baixo para cima. Qualquer outra medida é eleitoreira e manipulativa.
Todas as iniciativas que se assemelham a tais providências se têm
apresentado apenas como promessas e com o objetivo espúrio de
eternizar o poder, antes dos ditadores militares, agora dos ditadores
da gravata de seda (OLIVEIRA, 1995, p. 52).

146
TÓPICO 1 | NOVOS CONCEITOS?

FIGURA 58 – VALORES CULTURAIS COMUNITÁRIOS

FONTE: Disponível em: <http://api.ning.com/files/m4pxLdlQr2u343skflHKgiiKEjAdU


UW3is56NPT*vCcLzyb8M5jtEciNEMK0cMd66Y1jibbQc3-y8FhzJSbkWH7gKakC1AOe/
CapturadeTela20120730s15.07.57.png>. Acesso em: 16 dez. 2013.

Quando essas comunidades conseguem desenvolver aquelas necessidades


prímárias – saúde, educação, lazer – para alcançar o bem comum, essa realidade
pode ser ampliada para a sociedade como um todo. Porém, temos consciência
de que, muitas vezes, essas necessidades básicas não alcançam a população,
gerando descontentamento, descrença e a necessidade de se buscar outras formas
de cobrança dos seus direitos. Esta situação propicia o surgimento e organização
de movimentos sociais que se apresentam então como um caminho de cobrança,
contestação e organização para esta situação de ingerência e leniência do Estado.

Hoje, dois anseios muito fortes e muito cobrados pela sociedade são a
segurança e a preservação do meio ambiente. São duas realidades que são
muito próximas, mesmo sendo de diferentes concepções e de características tão
adversas. Os movimentos sociais sabem dessas diferenças, mas sabem também
que não há desenvolvimento sem segurança e sem a preservação do meio em que
vivemos, da natureza que ainda resta.

147
UNIDADE 3 | A SOCIEDADE BRASILEIRA E SUAS INFLUÊNCIAS

FIGURA 59 – PRESERVAÇÃO DO MEIO AMBIENTE

FONTE: Disponível em: <http://2.bp.blogspot.com/_TrB06CGAm5M/TAEle647R_I/AAAAAAAAPik/


XLxNehbw3jg/s400/Amaz%C3%B4nia+Grilagem+de+terra+2009.jpg>. Acesso em: 16 dez. 2013.

3 CARACTERÍSTICAS DA SOCIEDADE
CONTEMPORÂNEA BRASILEIRA
Como podemos caracterizar a sociedade brasileira? Qual o princípio para
esta caracterização? A história seria uma ferramenta? Acredito que podemos
seguir por este caminho e acrescentar as questões econômicas, políticas e – é claro
– sociais para entender a sociedade brasileira.

Certa vez, enquanto eu participava de uma discussão em um grupo, o


tema era a grande extensão de terras em propriedade dos índios. Alguns do
grupo criticavam uma postura do governo brasileiro em dar aos índios grandes
propriedades de terras; outros integrantes afirmavam que nós não podemos
sequer criticar esta postura de devolver aos índios o que é deles por direito, afinal,
nós “brancos” é que nos apropriamos das terras dos índios.

Se essa discussão das terras já é por si complexa, podemos imaginar como


caracterizar a sociedade brasileira nos seus primórdios, quando aqui começam
a chegar levas de europeus – portugueses, espanhóis, holandeses – e encontram
grupos indígenas, com diferentes comportamentos resultantes desse encontro.
Já vimos um pouco dessa realidade nas unidades anteriores, mas é bom destacar
mais uma questão.

148
TÓPICO 1 | NOVOS CONCEITOS?

FIGURA 60 – “A REDENÇÃO DE CAM” – MODESTO BROCOS

FONTE: Disponível em: <http://planeta.coppe.ufrj.br/midia/multimidia/2008/1458.jpg>.


Acesso em: 16 dez. 2013.

Vemos na figura anterior uma senhora negra de pé com as mãos levantadas


ao céu, um homem branco sentado ao lado de uma mulata, que tem um bebê de
tez clara ao colo. Esta pintura, conhecida como “A Redenção de Cam”, de Modesto
Brocos, nos apresenta uma realidade já presente no final do século XIX e início do
século XX muito peculiar no Brasil, que é a miscigenação. O que entendemos por
miscigenação? Mistura, fusão, e por aí vai. Raças, etnias que entram em contato
entre si e desse contato resultam outras raças, outras etnias. É uma riqueza de
diferenças, de diversidade muito própria do Brasil. Quando assistimos, por
exemplo, a uma partida de voleibol da Seleção Brasileira masculina, vemos ali
negros, pardos, brancos. Forma-se e mostra-se ali um quadro muito próprio do
povo brasileiro, dessa nossa miscigenação. Bom, voltemos à pintura. O autor da
obra quer mostrar o embranquecimento de um povo forçado à escravidão, como
castigo de geração em geração que pode ser apagado através da miscigenação.

Esses povos europeus que aqui chegam e, juntamente com os indígenas e


negros africanos, vão provocando essa miscigenação, podem ser considerados os
protagonistas do que entendemos por ‘primórdios da sociedade brasileira’.
149
UNIDADE 3 | A SOCIEDADE BRASILEIRA E SUAS INFLUÊNCIAS

Uma das marcas do povo brasileiro é sua capacidade de se relacionar


com todo mundo, de somar, juntar, sincretizar e sintetizar. Por isso, ele
não é intolerante nem dogmático. Gosta e acolhe bem os estrangeiros.
Ora, esses valores são fundamentais para uma globalização de rosto
humano. Estamos mostrando que ela é possível e a estamos construindo.
O Brasil é a maior nação neolatina do mundo. Temos tudo para sermos
também a maior civilização dos trópicos, não imperial, mas solidária
com todas as nações, porque incorporou em si representantes de 60
povos que para aqui vieram. Nosso desafio é mostrar que o Brasil pode
ser, de fato, um pedaço do paraíso que não se perdeu (BOFF, 2011, s. p.).

Se nos reportarmos à filosofia, ela vai identificar esta situação como negação
do outro, ou até nós mesmos, no achismo de querer identificar a sociedade a partir
de apenas uma base, ou uma causa, ou um modo, seja econômico, político, religioso
etc. O que podemos perceber é que temos uma relação dinâmica entre vários fatores.

[...] no mundo econômico surge uma curiosa combinação de uma


economia altamente estatizada com uma iniciativa privada vigorosa
e ainda importante. Que na religião aparece com a intrigante mistura
de catolicismo com religiões afro-populares. E que na cosmologia
em geral – e aqui estou pensando na literatura popular e erudita
do Brasil – aparece sob uma certa ânsia de criar personagens
intermediários, gente que pode permitir a conciliação de tudo o que a
sociedade mantém irremediavelmente dividido por um movimento
inconsciente (DAMATTA, 1986, p. 123).

Essa consciência aberta aos sinais que o tempo vai nos apresentando é que
devemos ter para compreender a sociedade em que vivemos e tudo o que nos cerca,
tudo o que chega até nós, mesmo sem percebermos. Assim, tendo um pouco de
noção desse meio em que vivemos, vamos então para o próximo ponto, com o intuito
de entender melhor outro termo que a globalização trouxe até nós – o perfil social.

4 PERFIL SOCIAL
Uma palavra recorrente hoje é a palavra perfil. Nas redes sociais é muito
comum encontrá-la. Qual é o seu perfil? Perfil para que? O seu perfil pessoal
se anula no perfil social? Mesmo sendo utilizada hoje com muita frequência, a
condição de se ter um perfil, uma identificação (neste caso, social), já remonta aos
primórdios, quando ainda não havia tantos grupos legitimamente formados e
nem um Estado que organizasse a sociedade.

A permanência do homem em estado social (ou sua integração em


sociedade) constitui fato natural, como fato natural é a própria família.
Parece não haver salvação para o ser humano fora do cenário de um
grupo organizado, muito embora nem sempre tenha sido assim. Em
outros tempos, muito antes da existência do Estado, o homem não
tinha família, senhor, comunidade ou grupo religioso, sobrevivendo
pelo ato de converter-se em servo ou escravo de outro homem ou
eventual pequeno grupo. A possibilidade de organização da sociedade
era inviabilizada pela incapacidade de as pessoas formarem grupos
que permanecessem unidos por longo tempo, muito embora o homem
apareça como um ‘animal social’, segundo o pensar de Aristóteles. Por
isso mesmo, historicamente o homem se apresenta integrado a grupos,
mesmo pequenos e rudimentares, representados, às vezes, apenas por
ele e pela mãe, salvo exceções (OLIVEIRA, 1995, p. 19).

150
TÓPICO 1 | NOVOS CONCEITOS?

No Brasil contemporâneo, onde a corrupção, a falta de ética e de valores


mais elevados e, sobretudo, a criminalidade econômica grassam (esta como
decorrência daquelas), a situação tem evoluído de tal forma que nos sentimos
envoltos por um “túnel do tempo” que, regulado para o passado, nos transportou
ao período da barbárie. Circunstância de tal envergadura não tem uma causa,
mas é consequência de um desencadear de fatores, posto que, em se tratando de
fenômenos humanos, refere atos complexos a serem avaliados (OLIVEIRA, 1995).

FIGURA 61 – CORRUPÇÃO

FONTE: Disponível em: <http://2.bp.blogspot.com/-vRcXPot_UfI/T1YjEbsKDXI/


AAAAAAAAHDU/72dvimOmKGU/s320/corrupcao.jpg>. Acesso em: 16 dez. 2013.

Dentro da família brasileira, cabe-nos dirigir o enfoque ao pater familias,


por múltiplas razões. Entre elas: no Brasil, o direito mais ferrenhamente protegido
(judicial ou extrajudicialmente) é o “direito de propriedade”, a “moral” brasileira
está fundamentada no consumo, no medo, na proibição e no amor do pater
familias, que permanece em estágio bem próximo da barbárie.

151
UNIDADE 3 | A SOCIEDADE BRASILEIRA E SUAS INFLUÊNCIAS

LEITURA COMPLEMENTAR

CRIME E VIOLÊNCIA NA SOCIEDADE BRASILEIRA CONTEMPORÂNEA

1 CONTEXTO

Desde meados da década de 1970 vem se exacerbando, no Brasil, o


sentimento de medo e insegurança. Não parece infundado esse sentimento. As
estatísticas oficiais de criminalidade indicam, a partir dessa década, a aceleração
do crescimento de todas as modalidades delituosas. Crescem mais rápido os
crimes que envolvem a prática de violência, como os homicídios, os roubos,
os sequestros, os estupros. Esse crescimento veio acompanhado de mudanças
substantivas nos padrões de criminalidade individual, bem como no perfil das
pessoas envolvidas com a delinquência.

Recente estudo sobre as tendências do homicídio, para o país em seu


conjunto, constatou que: a) o número de homicídios causados por armas de fogo
vem crescendo desde 1979; b) esse número cresce mais que a população. No
Distrito Federal, em 1980, a taxa de homicídios era de 13,7 por cem mil habitantes;
em 1991, isto é, 11 anos após, saltou para 36,3. Na Região Metropolitana de Belo
Horizonte, o crescimento dos homicídios foi da ordem de 31,21% no período de
1991-96, segundo dados do Ministério da Saúde.

No município do Rio de Janeiro, cresceram os homicídios dolosos,


entre 1985 (33,35 registros/cem mil habitantes) e 1989 (59,16 registros/cem mil
habitantes). No município de São Paulo, os homicídios evoluíram de 48,69
registros/cem mil habitantes, em 1991, para 55,77 registros/cem mil habitantes,
em 1996, na Região Metropolitana (www.saude.sp.gov.br).

Em todo o país, o alvo preferencial dessas mortes são adolescentes e


jovens adultos masculinos das chamadas classes populares urbanas, tendência
que vem sendo observada nos estudos sobre mortalidade por causas externas
(violentas). Na Região Metropolitana de São Paulo, registros de mortes violentas
revelam maior incidência nos bairros que compõem a periferia urbana, onde as
condições sociais de vida são acentuadamente degradadas. É provável que parte
significativa dessas mortes se deva aos conflitos entre quadrilhas, associados ou
não ao tráfico de drogas.

A esse quadro conviria agregar graves violações de direitos humanos,


entre as quais as mortes praticadas por policiais em confronto com civis, suspeitos
de haver cometido crimes, como também aquelas cometidas por justiceiros e
grupos de extermínio.

Ademais, ao longo das décadas de 1980 e 1990, observou-se intensificação


de casos de linchamentos em todo o Brasil, particularmente nas regiões
metropolitanas de São Paulo e em Salvador.

152
TÓPICO 1 | NOVOS CONCEITOS?

Finalmente, têm-se as mortes violentas provocadas por tensões nas


relações intersubjetivas e que pouco têm em comum com a criminalidade
cotidiana. Trata-se de um infindável número de situações, em geral envolvendo
conflitos entre pessoas conhecidas, cujo desfecho acaba, muitas vezes até acidental
e inesperadamente, na morte de um dos contendores. São os conflitos entre
companheiros e suas companheiras, entre parentes, entre vizinhos, entre amigos,
entre colegas de trabalho, entre conhecidos que frequentam os mesmos espaços
de lazer, entre pessoas que se cruzam diariamente nas vias públicas, entre patrões
e empregados, entre comerciantes e seus clientes.

As políticas públicas de segurança, justiça e penitenciárias não têm


contido o crescimento dos crimes, das graves violações dos direitos humanos e da
violência em geral. A despeito das pressões sociais e das mudanças estimuladas
por investimentos promovidos pelos governos estaduais e federal, em recursos
materiais e humanos e na renovação das diretrizes institucionais que orientam
as agências responsáveis pelo controle da ordem pública, os resultados ainda
parecem tímidos e pouco visíveis.

Ao que tudo indica, o crescimento dos delitos não foi acompanhado


de uma elevação proporcional do número de inquéritos e processos penais
instaurados. Suspeita-se que o número percentual de condenações vem caindo
desde a década de 1980 e, por consequência, aumentando as taxas de réus isentos
da aplicação de sanções penais.

No município do Rio de Janeiro, no ano de 1992, apurou-se que 92% dos


inquéritos policiais instaurados para apurar responsabilidade em crimes de morte
não chegam a ser convertidos em processos penais. Cerca de 98,28% dos casos de
assassinatos de crianças e adolescentes investigados no município de São Paulo,
no ano de 1991, permaneceram isentos da aplicação de sanções penais.

Essa queda das principais atividades judiciárias se reflete na outra ponta


do sistema de justiça criminal – as prisões. O número total de presos, no país,
no ano de 1995, foi de 148.760, ou seja, 95,47 presos/cem mil habitantes, um
coeficiente baixo quando comparado com o coeficiente de outras sociedades. Nos
Estados Unidos, por exemplo, esse coeficiente, no mesmo período, foi da ordem
de 411 presos/cem mil habitantes.

No Estado do Rio de Janeiro, enquanto o crescimento da criminalidade,


entre 1977 e 1986, foi da ordem de 50%, a taxa de aprisionamento (população
prisional/cem mil habitantes) decresceu 27,4%. No entanto, pressões da opinião
pública contribuíram para que esse cenário fosse alterado na década de 1990,
fazendo com que as taxas de encarceramento revelassem crescimento, agravando
a superpopulação das prisões.

Presentemente, a Secretaria de Administração Penitenciária do Estado de


São Paulo tem, sob sua responsabilidade, 107 estabelecimentos penitenciários.
A população carcerária, em março de 2002, compreendia 98.405 presos, dos

153
UNIDADE 3 | A SOCIEDADE BRASILEIRA E SUAS INFLUÊNCIAS

quais 66.799 alocados no sistema penitenciário, sob encargo da Secretaria da


Administração Penitenciária (SAP), e 31.606 nas cadeias públicas e distritos
policiais, sob a responsabilidade da Secretaria de Segurança Pública (<www.
mj.gov.br/depen>). Nunca é demais lembrar que parte substantiva de presos já
condenados, sob a tutela do sistema policial, deveria em verdade se encontrar
sob a tutela do sistema penitenciário. Esse cenário permite uma visão das tensões
que se acumulam no tempo e que vêm gerando rebeliões com maior frequência,
desde a década passada.

Não é estranho que desde o início dos anos 80, em várias capitais
brasileiras, aumentaram os motins e as rebeliões de presos em cadeias públicas,
distritos policiais, casas de detenção e penitenciárias. Alguns desses eventos foram
controlados e vítimas poupadas. Em outros, sobretudo naqueles estabelecimentos
que concentravam grande número de presos, os resultados foram quase sempre
deploráveis, resultaram em mortos e feridos dentre os presos ou agentes do
sistema penitenciário, além da destruição do patrimônio público. Em todo o país,
essas intervenções vêm se sucedendo com relativa constância desde 1985.

No domínio das prisões, esses fatos são indicativos de uma crise há


tempos instalada no sistema de justiça criminal. Todas as imagens de degradação
e de desumanização, de debilitamento de uma vida cívica conduzida segundo
princípios éticos reconhecidos e legítimos, parecem se concentrar em torno dessas
“estufas de modificar pessoas e comportamentos”. As prisões revelavam a face
cruel de toda essa história: os limites que se colocam na sociedade brasileira à
implementação de uma política de proteção dos direitos fundamentais da pessoa
humana, nela incluído o respeito às regras mínimas estipuladas pela ONU para
tratamento de presos.

2 EXPLICAÇÕES

Desde a década passada, o impacto desse problema vem estimulando o


desenvolvimento de pesquisas no domínio das ciências sociais. Grosso modo,
podem-se agrupar os esforços de explicação em três direções:

a) mudanças na sociedade e nos padrões convencionais de delinquência e violência.


Em particular, nos últimos 50 anos, assiste-se a uma aceleração de mudanças,
jamais conhecida e experimentada anteriormente: novas formas de acumulação
de capital e de concentração industrial e tecnológica; mutações substantivas nos
processos de produção, nos processos de trabalho, nas formas de recrutamento,
alocação, distribuição e utilização da força de trabalho, com repercussões
consideráveis nas formas tradicionais de associação e representação sindicais;
transbordamento das fronteiras do Estado-nação, promovendo acentuado
deslocamento nas relações dos indivíduos entre si, dos indivíduos com o Estado
e entre diferentes Estados, o que repercute na natureza dos conflitos sociais e
políticos e nas formas de sua resolução (com a criação de legislação e tribunais
paralelos ao Estado, por exemplo).

154
TÓPICO 1 | NOVOS CONCEITOS?

Essas mudanças repercutem no domínio do crime, da violência e dos


direitos humanos. Transformam-se os padrões tradicionais e convencionais
de delinquência, nuclearizados em torno do crime contra o patrimônio, via de
regra motivados por ações individualizadas e de alcance local. Cada vez mais, o
crime organizado segundo moldes empresariais e com bases transnacionais vai
se de impondo, colonizando e conectando diferentes formas de criminalidade
(crimes contra a pessoa, contra o patrimônio, contra o sistema financeiro, contra
a economia popular). Seus sintomas mais visíveis compreendem emprego
de violência excessiva mediante uso de potentes armas de fogo (daí a função
estratégica do contrabando de armas), corrupção de agentes do poder público,
acentuados desarranjos no tecido social, desorganização das formas convencionais
de controle social. Na mesma direção, agrava-se o cenário das graves violações de
direitos humanos.

b) violência e desigualdade social. A tese que sustentava relações de causalidade


entre pobreza, delinquência e violência está hoje bastante contestada em
inúmeros estudos. No entanto, não há como deixar de reconhecer relações
entre a persistência, na sociedade brasileira, da concentração da riqueza, da
concentração de precária qualidade de vida coletiva nos chamados bairros
periféricos das grandes cidades e a explosão da violência fatal. Mapas da
violência, realizados para algumas capitais brasileiras, na década passada,
indicavam que as taxas de homicídios eram sempre e flagrantemente mais
elevadas nessas áreas do que nos bairros que compõem o cinturão urbano
melhor atendido por infraestrutura urbana, por oferta de postos de trabalho,
por serviços de lazer e cultura. Recente estudo (Cardia e Schiffer <www.nev.
prp.usp.br>) sugeriu que, no município de São Paulo, a maior concentração
de homicídios estava associada ao congestionamento habitacional, fenômeno
característico dos bairros onde habitam preferencialmente trabalhadores
urbanos de baixa renda. Tudo isso parece indicar, nesses bairros, maior
predisposição para desfechos fatais em conflitos sociais, interpessoais e
intersubjetivos.

Além do mais, a desigualdade social e a concentração de riqueza,


fenômenos que persistiram ao longo dos anos 90 a despeito do crescimento
da riqueza e das profundas mudanças por que vem passando a economia
brasileira, coincidiram com a crise fiscal, mais propriamente com fortes restrições
ao Estado para reduzir a violência por meio do estímulo ao desenvolvimento
socioeconômico, à expansão do mercado de trabalho e à garantia de um mínimo
de qualidade de vida para o conjunto da população.

Se a crise econômica afeta a qualidade de vida de imensas populações


urbanas, sobretudo de seus segmentos pauperizados e de baixa renda, a crise
afeta também a capacidade do Estado em aplicar as leis e garantir a segurança da
população.

c) crise no sistema de justiça criminal. Não são poucos os estudos que reconhecem
a incapacidade do sistema de justiça criminal – agências policiais, ministério
155
UNIDADE 3 | A SOCIEDADE BRASILEIRA E SUAS INFLUÊNCIAS

público, tribunais de justiça e sistema penitenciário – em conter o crime e a


violência nos marcos do Estado democrático de direito. O crime cresceu e mudou
de qualidade; porém, o sistema de justiça permaneceu operando como o fazia
há três ou quatro décadas. Em outras palavras, aumentou sobremodo o fosso
entre a evolução da criminalidade e da violência e a capacidade do Estado de
impor lei e ordem. Os sintomas mais visíveis desse cenário são as dificuldades
e os desafios enfrentados pelo poder público em suas tarefas constitucionais de
deter o monopólio estatal da violência, sintomas representados pela sucessão
de motins e rebeliões nas prisões, pela ousadia no resgate de presos, pela
existência de áreas das grandes cidades onde prevalecem as regras ditadas,
por exemplo, pelo tráfico de drogas em detrimento da aplicação das leis.

A consequência mais grave desse processo em cadeia é a descrença dos


cidadãos nas instituições promotoras de justiça, em especial encarregadas de
distribuir e aplicar sanções para os autores de crime e de violência. Cada vez
mais descrentes na intervenção saneadora do poder público, os cidadãos buscam
saídas. Aqueles que dispõem de recursos apelam, cada vez mais, para o mercado
de segurança privada, um segmento que vem crescendo há, pelo menos, duas
décadas. Em contrapartida, a grande maioria da população urbana depende de
guardas privados não profissionalizados, apoia-se perversamente na “proteção”
oferecida por traficantes locais ou procura resolver suas pendências e conflitos
por conta própria. Tanto num como noutro caso, seus resultados contribuem
ainda mais para enfraquecer a busca de soluções proporcionada pelas leis e pelo
funcionamento do sistema de justiça criminal.

FONTE: Disponível em: <http://www.nevusp.org/downloads/down103.pdf>. Acesso em: 10 dez. 2013.

156
RESUMO DO TÓPICO 1

Neste tópico você viu:

• A sociedade também se caracteriza pelas peculiaridades de seu tempo, que


vão além das questões econômicas e sociais.

• A importância do pensamento de Marx, Engels e Weber para o entendimento


das mudanças sociais que ocorrem também na atualidade.

• A sociedade brasileira, ao mesmo tempo que tem suas especificidades, assume


muitas características que são universais entre os povos.

157
AUTOATIVIDADE

1 Como podemos entender o conceito de Marx aplicado à sociedade?

2 Que anseios são muito cobrados pela sociedade na atualidade?

158
UNIDADE 3
TÓPICO 2

A SOCIEDADE E NOVAS REALIDADES

1 INTRODUÇÃO
A globalização tem a interdependência como uma forte característica
entre as nações, sejam elas desenvolvidas ou não. E isso pode ser para coisas boas
como também para coisas ruins, como, por exemplo, no campo econômico, que,
por vezes, pode viver momentos de augúrio ou de recessão.

Acho oportuno trazer aqui, brevemente, a formação inicial das primeiras


sociedades – civitas –, nos primórdios da presença do ser humano na Terra, lá no
início do desenvolvimento da agricultura e da pecuária.

Com o lento desenvolvimento da agricultura e da pecuária, as tribos


– formadas de fratrias ou cúrias, por sua vez formadas dos clãs ou
gentes em que se compunham as famílias – foram se reunindo e
fixando em terras de que acabaram por se apropriar definitivamente,
nas quais eram colhidos e cada vez mais produzidos pelo trabalho os
bens indispensáveis. As necessidades de subsistência impuseram às
tribos a acomodação mútua, por confederação (como as primitivas
confederações gregas e germânicas) ou por aliança mais estreita,
formando um povo. No Lácio, no populus romanus se reuniram
três tribos, cada uma com dez cúrias, cada cúria com dez gentes,
constituindo uma comunidade política, civitas, cujos membros eram
os cives (no singular, civis) (BARROS, 2010).

FIGURA 62 – AGRICULTURA

FONTE: Disponível em: < http://3.bp.blogspot.com/_sFeRzgjx7D4/TLHTG5aovXI/AAAAAAAAAF8/


yF0yTa9OL9E/s320/Revolu%C3%A7%C3%A3o+agr%C3%ADcola.jpg>. Acesso em: 16 dez. 2013.

159
UNIDADE 3 | A SOCIEDADE BRASILEIRA E SUAS INFLUÊNCIAS

FIGURA 63 – PECUÁRIA

FONTE: Disponível em: <http://3.bp.blogspot.com/_sFeRzgjx7D4/TLHTFJwD1tI/AAAAAAAAAFk/


mnixAYNi9a0/s1600/Domestica%C3%A7%C3%A3o+dos+animais.jpg>. Acesso em: 16 dez. 2013.

Vemos nas figuras acima uma representação das primeiras manifestações


de desenvolvimento da agricultura e da pecuária, já com a presença de grupos de
pessoas formando pequenas comunidades. Esse modo de vida deve ser o sonho
de muitas pessoas que vivem hoje nesse nosso mundo tão frenético. Ou não?

2 GLOBALIZAÇÃO E A ÉTICA
A globalização é um fenômeno amplo e complexo, que, por suas
características próprias, impõe uma tomada de posição em termos éticos em
nível pessoal, social e religioso. Não há como compreender a sociedade sem levar
em conta esse fenômeno da globalização, com suas influências que vão além do
campo econômico.

O processo de globalização inicia-se com a expansão marítima e comercial


dos países europeus, nos séculos XV e XVI. As grandes navegações do período
ligam-se ao crescimento do comércio, da economia e da cultura europeia. O
modelo de colônias exportadoras de matérias-primas e importadoras dos produtos
industrializados europeus se impõe nesta primeira fase, que vai de 1450 a 1850.

A segunda fase, que dura de 1850 a 1950, traz novas formas de dependência
econômica dos países periféricos. Neste período foram criados diversos mecanismos
e organizações econômicas em nível mundial, e há a imposição do domínio americano
após a Segunda Guerra Mundial.

160
TÓPICO 2 | A SOCIEDADE E NOVAS REALIDADES

Na terceira fase da globalização, que vai de 1950 a 1988, os mecanismos da


economia global, com seus diversos organismos, concorrem para a manutenção da
dependência dos países subdesenvolvidos, inclusive com o sacrifício da democracia,
o que não impediu as sucessivas crises e o endividamento crescente das economias
nestes países de economia periférica.

Podemos perceber que o Brasil foi vivenciando em sua curta história, com
maior ou menor intensidade, essas fases da globalização.

A imagem a seguir ilustra bem uma das características da globalização no


campo econômico: a forte interdependência entre as economias mundiais, sejam
elas grandes ou pequenas. Via de regra, as pequenas sempre terão mais a perder,
principalmente pelo seu baixo grau de desenvolvimento.

FIGURA 64 – INTERDEPENDÊNCIA ENTRE AS ECONOMIAS

FONTE: Disponível em: <http://noticias.bol.uol.com.br/entretenimento/2008/01/23/


ult2529u326.jhtm>. Acesso em: 19 nov. 2013.

A partir de 1989, com o objetivo de possibilitar o atendimento às novas


demandas da economia mundial, com sua enorme velocidade no fluxo de capitais,
os organismos internacionais propõem o corte dos gastos públicos, a diminuição
das tarifas, o equilíbrio econômico, a privatização das estatais e a abertura da
economia dos países desenvolvidos, entre outras medidas de ajustamento da
economia mundial.

161
UNIDADE 3 | A SOCIEDADE BRASILEIRA E SUAS INFLUÊNCIAS

UNI

Não se esqueça, caro acadêmico, de fazer um paralelo com essas realidades da


globalização aplicadas aos momentos vividos no Brasil nas décadas finais do século passado.

A globalização tem como consequência uma forte ruptura sobre as formas


tradicionais de interação social e intercâmbio de bens, constituindo um fenômeno
com várias dimensões, tanto econômicas quanto culturais, tecnológicas e políticas.
Uma de suas principais características foi a formação de grandes conglomerados
econômicos, a transnacionalização dos capitais e a mobilidade da produção, que
se desloca sempre em busca de melhores condições em nível internacional. Outra
característica marcante é o desenvolvimento da informática e a introdução de
novas tecnologias de informação. A informatização dos processos econômicos
trouxe transformações em nível infraestrutural, com o aumento da produtividade
e a eliminação de postos de trabalho, e superestruturais, com novas maneiras de
se comunicar e consumir.

FIGURA 65 – GLOBALIZAÇÃO

FONTE: Disponível em: <http://filosofiase.blogspot.com.br/2008/05/globalizao.html>. Acesso


em: 19 nov. 2013.

162
TÓPICO 2 | A SOCIEDADE E NOVAS REALIDADES

Também é importante a característica imposta à política pela


globalização, com a vinculação do discurso democrático a práticas neoliberais
e a espetacularização da política, com a redução desta enquanto espaço de
solução de conflitos na sociedade. Por fim, notamos como característica notável
da globalização as transformações culturais que advêm desta, com o crescente
individualismo, a perda de antigas referências, com a família, a escola, o Estado, a
religião. Esta última se desinstitucionaliza, passa a ser mais um objeto de consumo
a definir identidades e, por outro lado, passa a justificar reações violentas ao
processo de erosão identitária dos povos de países em desenvolvimento ou
emergentes.

O texto a seguir nos esclarece essa nova realidade conceitual de


identificação dos países emergentes.

Mercados emergentes?

Segundo o economista José Luis Fiori, em artigo publicado na


Folha de S. Paulo, em 01-10-95, após a Segunda Guerra Mundial e épocas
distintas, a mídia e parte da intelectualidade de língua inglesa deram quatro
denominações para países subdesenvolvidos: na década de 50, países em
desenvolvimento; nas de 60 a 70, países recentemente industrializados;
na de 80, países endividados; na de 90, as bolsas de valores excluíram-nos
da condição de países – pois a globalização da economia se expandiu e
derrubou as fronteiras nacionais – e passamos a ser chamados de mercados
emergentes. É essa, hoje, nossa identidade no cenário da globalização, onde
o que prevalece ou interessa ao grande capital é a perspectiva de mercado.

No contexto de um país subdesenvolvido, os efeitos da globalização


têm sido desastrosos. Um exemplo ilustrativo foi o ocorrido com o México,
que viveu sua pior crise financeira em dezembro de 1994. O país fora, até
então, o melhor aluno do FMI e do Banco Mundial, fez a desregulamentação
da economia, a abertura econômica ao exterior e a política de privatizações
de suas empresas estatais.

De um dia para o outro, bilhões de dólares de capital especulativo


foram transferidos de suas bolsas de valores para outras praças. A crise
financeira resultante teve as consequências típicas desse quadro: inflação,
recessão, aumento do desemprego e falências de empresas.

Estamos vivendo, portanto, um momento ímpar na história da


humanidade. A globalização da economia exige das empresas nacionais
um esforço muito grande para se adaptarem à nova realidade mundial, com
métodos cada vez mais apurados de administração empresarial, controle
eficaz do capital financeiro, novas tecnologias, baixos custos de produção,

163
UNIDADE 3 | A SOCIEDADE BRASILEIRA E SUAS INFLUÊNCIAS

mão de obra altamente qualificada etc., requisitos que elas nem sempre são
capazes de possuir.

No mundo globalizado, a competição e a competitividade entre as


empresas tornaram-se questões de sobrevivência. Entretanto, como o poder
das empresas (quanto ao domínio de tecnologia de capital financeiro, de
mercados, de distribuição etc.) é desigual, surgem relações desiguais
entre elas e entre elas e o mercado. Algumas sairão vitoriosas e outras
sucumbirão. Muitos setores da economia estão oligopolizados e até mesmo
monopolizados, dificultando a entrada de novos competidores. Desse modo,
a noção de livre mercado é relativa. Muitos setores da atividade econômica
já têm “donos” e dificilmente permitirão a entrada de novos produtores.
A globalização da economia e das finanças beneficia, assim, amplamente o
grande capital, as grandes corporações transnacionais. Inserido nessa nova
conjuntura, nessa nova ordem econômica, o Brasil fez a abertura econômica
para o exterior, tem aplicado a política de privatizações e empenha-se em
desregulamentar sua economia, oferecendo vantagens às transnacionais
para que aqui se instalem. Em alguns segmentos da economia, como as
indústrias farmacêuticas, da borracha, do fumo e a automobilística, existe
um domínio absoluto das transnacionais. Cerca de 44% do total das
exportações de manufaturados brasileiros são das transnacionais. Somos
uma das economias mais internacionalizadas do mundo e caminhamos
a passos largos para que essas características se acentuem em vista do
processo de globalização que estamos vivendo.

O desafio que esse quadro nos impôs é o de definir uma política


de controle da ação dessas corporações e dos capitais de curto prazo,
principalmente daqueles que possuem enorme poder econômico e político,
e centros de decisão sediados no exterior.

Atualmente somos a sexta economia do mundo e não conseguimos


resolver vários problemas referentes ao meio ambiente, com queimadas
e desmatamentos sem controle, para beneficiar as madeireiras e
agropecuaristas, falta de uma boa educação, moradia, mão de obra
qualificada, um salário mínimo vergonhoso e mais vergonhoso ainda é o
salário dos aposentados.

FONTE: Melhem Adas/Panorama Geográfico do Brasil. Adaptado por: Geo-Conceição. Disponível em:
<http://geoconceicao.blogspot.com.br/2012/09/a-globalizacao-mundializacao-do.html>. Acesso em:
19 nov. 2013.

164
TÓPICO 2 | A SOCIEDADE E NOVAS REALIDADES

Em face da intensificação das trocas comerciais e a imposição do consumo


enquanto determinante das subjetividades e da afirmação de sentido à existência,
cabe o resgate da noção teológica da graça, do dom e da dádiva, como alternativa
de modelo de solidariedade e afeto na sociedade atual.

Diante da aceleração na destruição da natureza e dos recursos naturais em


virtude dos atuais padrões de consumo impostos globalmente, faz-se necessário
recuperar a noção da criação, como categoria ética básica. Com as alterações nas
formas de comunicação, sua potencialização e consequente distorção, impõem-se
a lembrança da noção de comunhão, como categoria capaz de engendrar formas
de relações mais integrais e mais humanas.

Confrontados com o atrelamento da democracia aos princípios


neoliberais, faz-se necessária a recuperação da noção de justiça, como postura
ética imprescindível ao resguardo dos interesses dos menos favorecidos, bem
como o resgate da ideia de poder enquanto serviço, para reconduzir a política a
seu verdadeiro sentido.

Em virtude das distorções impostas em nível afetivo pela globalização,


com a exclusão das referências tradicionais na construção das identidades
pessoais, torna-se imperativa a valorização da noção de amor, como princípio da
constituição do indivíduo na perspectiva da fé.

As reações à globalização não têm se dado somente ao nível cultural


e ideológico, mas também em relação a novas propostas de organização da
economia. Estas visam barrar, minorar ou acabar com a deterioração social,
política, econômica e cultural decorrentes do processo de globalização, como a
degradação do meio ambiente, a falta de valores éticos e a piora na educação.

Uma destas propostas é a constituição de uma economia alternativa e


solidária em todas as etapas da cadeia de produção, distribuição e consumo dos
bens necessários à vida, como uma dimensão ética própria, visando democratizar
e socializar a economia e a própria sociedade. Trata-se de produzir, gerir,
comercializar e consumir de maneira ética, sustentável e solidária, com o objetivo
de diminuir ou acabar com o impacto ambiental e com as diferenças sociais. Focar
na produção familiar, cooperativada, solidária, local, comunitária e baseada nas
trocas solidárias e no consumo responsável.

A ideia é colocar a economia a serviço das necessidades das pessoas, sem


a reificação do consumo e o fetiche da mercadoria, repensando, reorientando
e reconstruindo a economia para que esta vá ao encontro do ser humano e à
preservação plena da natureza.

165
UNIDADE 3 | A SOCIEDADE BRASILEIRA E SUAS INFLUÊNCIAS

3 CONHECIMENTO E A INFORMAÇÃO
Informação, conhecimento, sociedade. Conceitos muito usados por todos
nós, em todos os lugares, de todas as formas, em todos os momentos. Conceitos
indispensáveis num mundo globalizado.

Uma sociedade não se forma sem a contribuição do conhecimento e da


informação. Por isso nos perguntamos: o que é mais importante: a informação
ou o conhecimento? Cada um tem a sua devida importância e cada um tem sua
contribuição para o enriquecimento do outro.

FIGURA 66 – INFORMAÇÃO OU CONHECIMENTO?

FONTE: Disponível em: <http://www.pybony.xpg.com.br/wp-content/uploads/2011/06/


tv-brasileira.jpg>. Acesso em: 16 dez. 2013.

Quando estudamos o conceito de sociedade, na unidade anterior, percebemos


que, de fato, nunca o cidadão teve tanto acesso à informação e a possibilidades de
conhecimento. O acesso à informação acontece porque existem facilidades trazidas
pela internet, visto que as informações impressas, jornal, revista, por exemplo, têm
custo, e o que se encontra de informação na internet nem sempre vai ser cobrado
para quem aí buscar informação.

Os meios de comunicação no Brasil, por exemplo, têm que reservar na sua


grade de programação um tempo de informação jornalística, para que possam
manter seus contratos de concessão. Porém, não há um controle sobre o tipo de
informação, apenas se houve o cumprimento do tempo que deve ser destinado
a isso. O cidadão recebe muitas informações e acredita que, pela quantidade de
informações que ele adquire, isso o torna qualificado para emitir diferentes tipos
de juízo. Sabemos, é claro, que isso não é garantia de qualidade no conhecimento
que possa ser adquirido com tamanha informação. É preciso que a informação seja
processada, debatida, comparada, confrontada, e não só ouvida, assistida, vista.

166
TÓPICO 2 | A SOCIEDADE E NOVAS REALIDADES

A globalização, que falamos antes, não pode ser vista somente do ponto
de vista econômico, mas também como uma realidade atual, contemporânea,
privilégio nosso. Podemos aqui apresentar algumas características da globalização
que trazem essa identificação com a economia, mas que também se identificam
com a ideologia política, com a língua e com os modos de comunicação. Vejamos,
então, a primeira característica da globalização:

Relações econômicas: as relações econômicas do mundo globalizado


são moldadas pelas exigências das empresas, corporações ou
conglomerados multinacionais e planetários (o Estado é compelido
a reduzir sua presença direta na economia nacional, privatizar as
empresas sob seu controle, promover a redução de seus gastos,
principalmente na área social, mantendo, porém, o papel de guardião
dos interesses transnacionais) (SOARES, 1986, p. 10).

Na crise econômica em que o mundo está desde 2008, já com previsões


de que dure até 2020, essa ideia de um Estado com pouca presença na economia
parece contraditória, quando vemos o governo norte-americano criando subsídios
e auxiliando com enormes somas de dinheiro várias empresas em dificuldades
nos seus balancetes.

NOTA

Neste link <http://economia.uol.com.br/ultnot/2008/03/31/ult4294u1176.jhtm>,


você poderá encontrar, de forma bem resumida, informações das causas da crise de 2008
nos Estados Unidos.

FIGURA 67 – MÁQUINA DE DINHEIRO

FONTE: Disponível em: <http://abluteau.files.wordpress.com/2009/02/printing-money.jpg>.


Acesso em: 16 dez. 2013.

167
UNIDADE 3 | A SOCIEDADE BRASILEIRA E SUAS INFLUÊNCIAS

FIGURA 68 – O MUNDO EM CRISE

FONTE: Disponível em: <http://www.palavras.blog.br/2009/04/crise-mundial-no-psicologo.


html>. Acesso em: 16 dez. 2013.

UNI

Neste link <http://economia.estadao.com.br/noticias/economia+internacional.


entenda-a-crise-na-grecia-e-suas-implicacoes,71997,0.htm> você encontra informações
sobre a crise grega, suas variantes e sua influência principalmente para a Europa, mas
também seus reflexos para o mundo.

Quando temos essa afirmação – o Estado é compelido a reduzir sua


presença direta na economia nacional – tivemos uma comprovação de que
isso é relativo, no sentido de que o Estado pode ser a única tábua de salvação
quando fortes instituições, como, por exemplo, instituições bancárias, indústrias
automobilísticas, passam por dificuldades financeiras e de gerenciamento.
A crise de 2008 nos Estados Unidos e também, mais recentemente, a crise em
países europeus, com destaque para a Grécia foram crises que ainda se refletem
fortemente hoje e não só nos seus países de origem, mas em todo o mundo.

Não queremos aqui discutir em profundidade as implicações econômicas


dessas crises, mas entender sua influência nesse processo de globalização, onde
aí, sim, todos percebemos seus efeitos em nossas vidas.

Uma segunda característica que predomina juntamente com a economia,


na globalização, é a língua inglesa:
168
TÓPICO 2 | A SOCIEDADE E NOVAS REALIDADES

a língua inglesa garante o intercâmbio entre os agentes financeiros


mundiais e passa a ser utilizada como idioma universal nos campos
da cultura e do turismo (oitenta e oito por cento de toda a literatura
científica e técnica são veiculados em inglês (SOARES, 1986, p. 10).

FIGURA 69 – LÍNGUA INGLESA

FONTE: Disponível em: <http://sandra1martins.files.wordpress.com/2011/11/sem-nome2.


png>. Acesso em: 16 dez. 2013.

Quando vemos a grande importância da China na economia mundial,


também sabemos a importância crescente da língua – o mandarim. Mas o inglês
ainda permanece predominante, assim como o latim tinha sua importância no
Império Romano.

A terceira característica, essa sim, determinante neste nosso trabalho, são


os modos de comunicação.

A revolução tecnológica no campo dos recursos e dos meios de


comunicação – possibilitada pela telemática e pela tecnologia dos
satélites – amplia de forma excepcional a capacidade de produção,
acumulação e veiculação de dados e informações. A capacidade de
armazenamento dos bancos de dados de todos os computadores
conectados à internet equivale, por exemplo, a mais de cinquenta
milhões de CD-ROMs. E em um CD-ROM pode-se armazenar toda
uma enciclopédia (SOARES, 1986, p. 10).

O período entre o final do século XIX e início do século XX foi marcado,


entre tantos eventos, pela evolução da indústria e sua fixação como forte provedora
de emprego e contribuinte para a evolução da sociedade. É neste período também
que o termo sociedade da informação surge com força para reforçar o termo
sociedade pós-industrial. A indústria vai evoluindo, se transformando com os
avanços técnicos, com novas formas organizacionais, com o que chamamos de
excelência e qualidade no gerenciamento do que compõe e integra uma indústria:

169
UNIDADE 3 | A SOCIEDADE BRASILEIRA E SUAS INFLUÊNCIAS

insumos, força de trabalho, energia. O que vai perpassar essa evolução e contribui
para isso é a capacidade da informação de trazer os avanços tecnológicos para a
indústria, com destaque para a eletrônica, a informatização, a telecomunicação.

O vertiginoso fluxo de informações a que o homem atual está exposto,


se, de um lado, lhe permite estar “bem informado”, de outro dificulta
o “processamento” dessas informações numa síntese pessoal de
pensamento. Também a linguagem está mudando, sobretudo ante
as infinitas possibilidades oferecidas pela tecnologia e multimídia. A
imagem, o som, as luzes, o movimento confinam a palavra abstrata.
O modo de perceber e interpretar a realidade torna-se mais sensitivo,
emotivo e estético do que racional e ético. Em outras palavras, tende-
se mais ao “sentir” que “pensar” (SOARES, 1986, p. 5).

Acredita-se piamente que informação hoje é tudo. Estar bem informado é


uma necessidade premente entre um círculo de amigos em torno do tema futebol,
de outro interessado na novela, de outro reunido para discutir a qualidade musical
de nossas rádios. Enfim, informação tem seu valor e por isso é importante termos
claro o que vem a ser informação.
Informação é formada por três palavras: in + formar + ação, poderíamos
dizer que informação é uma ação de interiorizar a formação. Aqui
parece que há mais um caráter passivo por parte do sujeito, neste caso
sequer há relação direta do sujeito com o objeto, o sujeito tem acesso
ao conteúdo, e é formado pelo dado pronto, de uma "relação" prévia e
universalmente ou oficialmente aceita, e este recebe este produto pronto,
acabado, sem inicialmente nenhuma possibilidade de autonomia no
processo que se levou ao dado "informado" (MIGUEL, 2005, s. p.).

Através da informação, adquirimos conhecimentos que são pertinentes


para nosso dia a dia, assim como as ferramentas que utilizamos para ter
informação contribuem para as transformações sociais atuais. É a informação na
sociedade da informação.

As transformações em direção à sociedade da informação, em


estágio avançado nos países industrializados, constituem uma tendência
dominante mesmo para economias menos industrializadas e definem um
novo paradigma, o da tecnologia da informação, que expressa a essência da
presente transformação tecnológica em suas relações com a economia e a
sociedade. Esse novo paradigma tem, segundo Castells (2000), as seguintes
características fundamentais:

• A informação é sua matéria-prima: as tecnologias se desenvolvem


para permitir o homem atuar sobre a informação propriamente dita,
ao contrário do passado, quando o objetivo dominante era utilizar
informação para agir sobre as tecnologias, criando implementos novos
ou adaptando-os a novos usos.
• Os efeitos das novas tecnologias têm alta penetrabilidade porque a
informação é parte integrante de toda atividade humana, individual
ou coletiva e, portanto, todas essas atividades tendem a ser afetadas
diretamente pela nova tecnologia.

170
TÓPICO 2 | A SOCIEDADE E NOVAS REALIDADES

• Predomínio da lógica de redes. Esta lógica, característica de todo tipo de


relação complexa, pode ser, graças às novas tecnologias, materialmente
implementada em qualquer tipo de processo.
• Flexibilidade: a tecnologia favorece processos reversíveis, permite
modificação por reorganização de componentes e tem alta capacidade
de reconfiguração.
• Crescente convergência de tecnologias, principalmente a microeletrônica,
telecomunicações, optoeletrônica, computadores, mas também e crescente-
mente, a biologia. O ponto central aqui é que trajetórias de desenvolvimen-
to tecnológico em diversas áreas do saber tornam-se interligadas e transfor-
mam-se as categorias segundo as quais pensamos todos os processos.

FONTE: Disponível em: <http://www.scielo.br/pdf/ci/v29n2/a09v29n2.pdf>. Acesso em: 16 dez. 2013.

O recurso que agora estamos utilizando para informar sobre a disciplina


que estamos estudando passa por material impresso, o Caderno de Estudos.
Enquanto durar o estudo dessa disciplina, temos à nossa disposição outros
recursos: o Ambiente Virtual de Aprendizagem, a internet, o DVD etc. Quando
processamos todas essas informações, estamos potencializando o nosso processo
de aprendizagem e, por isso, nós envolvemos esses recursos em nossas práticas
de informação, utilizando alguns tipos de conhecimento. Platão nos ajuda nesta
reflexão, dividindo o conhecimento em categorias, começando pelo sensorial,
visto que sua abrangência vai além do ser humano, passando pelos animais. Veja
que ele parte do geral para o particularizado, para aqueles conhecimentos que, a
princípio, são exclusivos do ser humano:

• Conhecimento intelectual.
• Conhecimento popular.
• Conhecimento científico.
• Conhecimento teológico.

Cada um desses tipos de conhecimento tem suas características e podemos


nós mesmos caracterizá-los a partir de nossa própria vivência. O próprio conceito
e etimologia da palavra nos ajudam a entender o processo de conhecimento.

Conhecimento no grego vem de gnosis, que pode ser traduzido como


"saber" ou "ciência", mas tem uma variável, gnômê, que pode ser
traduzido como "juízo", "opinião", "conselho", "parecer", "acordo"
etc. Conhecer é apropriar-se do cognoscível, absorver parcialmente
ou plenamente (sendo aqui idealista) um objeto ou o outro, o que
está fora ou dentro dos limites de nossa observação. Conhecer, no
hebraico, é "Yadá", que está ligado a "intimidade". Esta palavra às
vezes é usada com conotação sexual, dando a ideia de que conhecer
é transpor o véu do desconhecido, é entrar no outro, é penetrar a
realidade desconhecida. Porém, quando se diz "conhecimento", trata-
se do produto do ato de conhecer. Conhecer é a relação, conhecimento
é o seu produto, porém está implícito no ato de conhecer que não
há conhecimento passivo, este está diretamente ligado ao "ato de
conhecer", e não é possível assim "receber conhecimento", o que é
possível é conduzir ao conhecimento, mas esta está sempre ligada à
própria intervenção do sujeito ao objeto (MIGUEL, 2005, s. p.).

171
UNIDADE 3 | A SOCIEDADE BRASILEIRA E SUAS INFLUÊNCIAS

Para podermos apresentar alguns tipos de conhecimento, precisamos


identificar quais aspectos queremos destacar com essa escolha. Vamos então
apresentar os aspectos desenvolvidos por Carvalho e Ivanoff (2009, p. 16).

Linguagem: a existência de uma linguagem comum é fundamental


quando a integração de conhecimento é realizada por meio de regras e
diretivas ou quando é realizada pela resolução de problemas e tomada de
decisões em grupo. Estudantes que falam línguas diferentes deverão fazer
mais esforços para coordenar seus conhecimentos.

Outras formas de comunicação simbólica: a familiaridade, o


conhecimento e a destreza na utilização de programas computacionais
específicos são outro exemplo de comunicação simbólica. Quando alunos
e professores conhecem jogos físicos, jogos eletrônicos ou programas
como o Second Life, outras possibilidades de linguagem estão disponíveis
para a comunicação.

Aspectos comuns do conhecimento especializado: esse é um caso


de paradoxo, parece uma contradição, mas tem solução. O benefício da
integração de conhecimento está em articular os diferentes conhecimentos
especializados de diferentes pessoas; se duas pessoas têm a mesma base
de conhecimentos, não há vantagem com a integração. No entanto, se as
pessoas têm bases de conhecimentos completamente separadas, a integração
não vai ocorrer além de níveis básicos ou primitivos.

Construção de significados compartilhados: o conhecimento das


pessoas pode ser comunicado pelo estabelecimento de compreensões
compartilhadas entre elas. Grant faz um comentário interessante sobre
esse aspecto, dizendo que ensinamentos que a princípio parecem sem
sentido podem ter seu significado descoberto pela convivência entre alunos
e professores, pelo compartilhamento de esquemas de cognição comuns
ou pelo uso de metáforas, analogia e histórias como veículos para moldar,
integrar e reconciliar diferentes compreensões e experiências individuais.

Reconhecimento de domínios individuais de conhecimento: a


compreensão compartilhada facilita o agir coordenado. A integração efetiva
de conhecimentos requer, entretanto, que cada pessoa esteja consciente
do repertório de conhecimento de todas as outras. Interdependências
recíprocas ou de grupos, como as que acontecem em um time de futebol,
requerem coordenação por ajuste mútuo. Chegar a esse ponto sem
comunicação explícita requer que cada jogador reconheça as habilidades
de outros jogadores. Esse reconhecimento mútuo favorece o sucesso da
coordenação em situações novas.

Em nossa sociedade é urgente que essa comunicação explícita entre todos


os atores sociais que têm conhecimento de sua interdependência com os outros
conduza a uma nova dinâmica social, em que valores comuns são evidenciados
e vivenciados como parte integrante da cultura e da relação natural dos seres
humanos. Vamos aprofundar essa realidade no próximo ponto.
172
TÓPICO 2 | A SOCIEDADE E NOVAS REALIDADES

4 NOVA DINÂMICA CULTURAL E SOCIAL?


Nós, seres humanos, devemos obedecer a certos imperativos da natureza,
como a necessidade de nos abrigar, nos alimentar e nos reproduzir. A maneira
pela qual fazemos isso, entretanto, difere da dos outros animais, qualitativamente.
Não nos comportamos em função de uma programação inata e instintiva, como
estes. Se assim fosse, não haveria diferentes visões de mundo e diferentes formas
de agir ao longo das gerações.

A nossa espécie, porém, por força das pressões evolutivas a que fomos
submetidos em nossa formação, desenvolveu um mecanismo que possibilita
modificar nosso comportamento e adotar diferentes soluções para resolver as
demandas da vida, o que permitiu nossa ocupação de diversos nichos ecológicos
por todo o planeta.

Este mecanismo é a cultura, este todo integrado e complexo que congrega


as dimensões de nossos comportamentos, hábitos, costumes, crenças, valores,
normas, regras, instituições, linguagens e outros, que nos orientam em nossa
experiência no mundo e na satisfação de nossas necessidades.

Ao contrário dos animais, não nascemos sabendo como agir para solucionar
nossas demandas naturais, instintivamente. Precisamos de um longo aprendizado
para adquirir os conhecimentos necessários para sobrevivermos. Este período é
chamado de processo de socialização ou endoculturação: aprendizado contínuo
da cultura da sociedade à qual pertencemos e que é, desta forma, interiorizado
em nós, nos guiando em nossas práticas.

Seria impossível sobrevivermos sem pertencer a uma comunidade, em


função do caráter social e gregário de nossa espécie. Entretanto, a comunidade
não sobrevive sem que aqueles que a compõem compartilhem de regras mínimas
de convivência e crenças que orientem os indivíduos em suas ações. A cultura,
que faz isso, é produto de nossas interações sociais e nos é legada pelas gerações
que nos precederam.

Nascemos num mundo social que nos transmite uma tradição, representada
por nossa cultura, a qual nós modificamos por nossas ações e questionamentos.

Estamos de tal modo mergulhados em nossa cultura que a percebemos


como natural, como a realidade, e não como uma das realidades possíveis. Não
percebemos a arbitrariedade da cultura, que pode propor e adotar diversas
soluções para os problemas da vida. Assim, reificamos nossa cultura e punimos
aqueles que se desviam desta quando adotam comportamentos não aprovados. O
desvio é punido, tanto de maneira subjetiva, através da culpa de quem o cometeu,
como objetiva, através de diferentes sanções impostas pela sociedade.

A interiorização dos valores de uma cultura nunca é completa e absoluta,


estando sujeita às contingências da existência. Há sempre um espaço para o
exercício da liberdade de se pensar alternativas e novos modelos.

173
UNIDADE 3 | A SOCIEDADE BRASILEIRA E SUAS INFLUÊNCIAS

A ordem estabelecida, todavia, tende a lutar para preservar o sistema,


através de aparelhos ideológicos de dominação, que visam ao convencimento
dos membros da sociedade de que o atual estado das coisas é o melhor possível,
excluindo, ou eliminando, os desviantes e dissidentes. A cultura constitui, desta
forma, uma moral que lhe é própria, isto é, uma classificação dos atos como bons
ou maus, como estando de acordo com os valores da sociedade, ou não.

Nas sociedades tradicionais tudo se legitima em nome da tradição, que


impede a modificação dos fundamentos que a compõem. O caráter estático da
ordem tradicional tem por base a religião, que justifica como de origem divina
o sistema moral, com seus valores e normas próprias, punindo e reprimindo as
tentativas de inovação.

Nas sociedades modernas, ao contrário, valorizam-se as inovações e


o progresso, o indivíduo em detrimento da comunidade. A moral tradicional
é descartada e a ordem se legitima pelo mito do progresso e pela crença na
positividade da ciência, que seria capaz de eliminar os problemas da existência.
Impõe-se desta maneira o domínio da técnica, que toma o lugar da ética.

Nosso tempo apresenta, portanto, enormes desafios éticos que decorrem


da diversidade cultural das sociedades contemporâneas, do consumismo, do
individualismo, do hedonismo, do desprezo ao próximo e à natureza, gerando
um quadro de crise que tem sérias implicações sobre a ética, sobre os valores e
sobre a responsabilidade social.

Podemos notar um triplo aspecto nesta crise: primeiro, o agravamento da


desigualdade social, com crescente pobreza e miséria de uma parte considerável
da população humana mundial. A desigualdade hoje se mostra tão grande que
pode até levar à desumanização de uma parte considerável das pessoas, com
os laços de cooperação e solidariedade atingindo níveis tão baixos como nunca
vistos antes na história de nossa espécie.

Em segundo lugar, vemos uma crise do sistema de trabalho, com o


desemprego, a perda dos postos de trabalho para a automação e a exclusão social
que colocam o problema ético de como construir uma sociedade que não gere
destituídos dela.

Em terceiro lugar, vemos a crise ecológica, com os níveis de consumo atuais


esgotando os recursos naturais e degradando a natureza a ponto de comprometer
a sobrevivência dos seres vivos, o que nos chama a atenção para a necessidade de
uma nova ética em nossa relação com a natureza.

Impõe-se, portanto, a necessidade de desenvolvermos novas atitudes


éticas para que possamos superar a crise da atualidade. Estas se apresentam de
três ordens: a ética do cuidado, pela qual devemos nos comprometer a adotar
uma atitude amorosa, protetora, de amparo e cuidado com a vida, com todos os
seres vivos e especialmente com os mais desassistidos; a ética da solidariedade,
pela qual devemos cooperar entre nós, compartilhar nossas riquezas e nos ajudar
de tal forma que não aja excluídos; e, por fim, devemos atentar para a ética da
responsabilidade, pela qual nós nos conscientizamos da responsabilidade das

174
TÓPICO 2 | A SOCIEDADE E NOVAS REALIDADES

consequências de nossos atos e adotamos atitudes no sentido de proteger a vida,


tendo cautela em nossas ações naquilo em que elas podem comprometer ou
prejudicar a nós e à natureza.

LEITURA COMPLEMENTAR

GLOBALIZAÇÃO, CONSCIENTIZAÇÃO E ÉTICA

A nova formatação econômica mundial tem provocado inúmeras


alterações no comportamento do homem, como pessoa e como profissional, nas
suas relações em sociedade e na atuação das organizações.

Competitividade. Disputa agressiva por poder econômico. Guerras. Nova


configuração geopolítica. Mercantilização dos prazeres. Escassez dos recursos
naturais. Aquecimento global. Consumismo exacerbado.

Por um lado, a globalização proporciona um mercado cada vez mais


agressivo, em que as tomadas de decisões são sempre movidas pela pressão
financeira e do tempo e, por vezes, não levam em consideração a abordagem
ética, seja em âmbito local ou global.

Grandes empresas engolindo pequenas, cartéis, negociatas, dumping,


propinas, entre outros exemplos, mostram como o mercado tem se tornado
antiético.

Por outro lado, a mesma globalização trouxe expressivos avanços para


a medicina, proporcionando aumento da expectativa de vida e discussões sobre
a qualidade de vida. Isso sem falar da evolução tecnológica, que ampliou a
interação virtual.

A globalização quebrou barreiras e mostrou que, embora geopoliticamente


existam fronteiras, pelo menos na realidade virtual o mundo não tem delimitações
e a consciência é o primeiro passo para a mudança no campo ético.

O mercado globalizado proporcionou maior acesso às informações e,


como consequência, as pessoas estão cada vez mais conscientes de seu papel
no mundo. Pessoas conscientes são, na verdade, consumidores exigentes, que
passam a cobrar das empresas não apenas bons produtos, mas, principalmente,
uma postura ética e o compromisso com a responsabilidade social e ambiental.

Os escândalos do mercado financeiro dos EUA, assim como a crise que


abarcou todo o mundo, servem como alerta para as empresas de que ética não
pode figurar como segundo plano. As empresas precisam compreender que o
consumidor está atento e não admitirá que a responsabilidade empresarial
esteja limitada aos seus resultados financeiros. Isso quer dizer que a conduta
das empresas deverá estar alinhada aos valores morais de onde quer que esteja
175
UNIDADE 3 | A SOCIEDADE BRASILEIRA E SUAS INFLUÊNCIAS

instalada, respeitando as culturais locais, bem como o meio ambiente.

Prova disso é o grande número de empresas que estão em busca de


certificações ambientais e de responsabilidade social, como forma de atender ao
mercado. Isso sem falar na criação de institutos, trabalhos realizados junto às
comunidades locais e apoio aos projetos sociais.

É certo afirmar que as práticas ainda não estão completamente alinhadas


aos discursos, no entanto, vale ressaltar que isso será essencial para as empresas
futuramente. Afinal, é a experiência das pessoas que forma o conceito de uma
empresa e constrói a sua imagem. Assim, uma empresa não conseguirá sustentar
por muito tempo o discurso de “empresa responsável” se, na prática, as pessoas
não conseguirem comprovar e experimentar isso.

Na atualidade, essa é a grande missão do homem: estar atento e consciente


de seu papel no mundo e cobrar das organizações e instituições que cumpram a
sua responsabilidade socioambiental.

FONTE: Disponível em: <http://www.canalvg.com.br/index.php/canalvg/descricao/geral/noticia/14


41.html>. Acesso em: 10 dez. 2013.

176
RESUMO DO TÓPICO 2

Neste tópico você viu:

• A formação inicial das primeiras sociedades se dá nos primórdios da presença


do ser humano na Terra, com o início do desenvolvimento da agricultura e da
pecuária.

• A globalização é um fenômeno amplo e complexo, que vai além das dimensões


econômicas e sociais.

• Uma sociedade necessita da contribuição da informação e do conhecimento


para que seus cidadãos possam fazer escolhas conscientes.

177
AUTOATIVIDADE

1 O que podemos entender como participação em uma comunidade?

2 Como podemos caracterizar a terceira fase da globalização, que vai dos


anos 1959 até 1988?

178
UNIDADE 3
TÓPICO 3

OS DESAFIOS CONTINUAM

1 INTRODUÇÃO
No decorrer da história sempre existiram os dominantes e os dominados,
os favorecidos e os desfavorecidos. O drama histórico é marcado pela busca
de liberdade e igualdade por parte daqueles que se encontram em situação de
opressão. Nesse sentido, sempre houve uma busca pela igualdade de direitos
entre todos os seres humanos, ou pelo menos o respeito por sua cultura, educação
e tradições. E a sociedade brasileira, desde seus primórdios, lutou por isso até os
dias atuais.

A conquista dos direitos humanos é um processo que ainda não está


plenamente consolidado. A discussão em torno do assunto não é recente, pois
vem sendo discutido desde muito tempo por juristas e filósofos de diferentes
sociedades e culturas. O Brasil não fica fora dessas discussões e das influências
que esta realidade provoca em todos.

A relevância das discussões pode ser percebida pelo teor e a quantidade


de documentos relacionados que surgiram e que ainda continuam sendo pauta
nas reuniões de várias organizações governamentais e não governamentais.

Devido ao espaço, não será possível considerar todos os marcos


importantes que influenciaram na elaboração dos direitos humanos. Iremos
considerar apenas alguns eventos marcantes neste processo histórico que, para
nós brasileiros, tem profunda relevância.

UNI

“Todos os seres humanos nascem livres em dignidade e em direitos. Dotados de


razão e de consciência, devem agir uns para com os outros em espírito de fraternidade”
(Declaração Universal dos Direitos Humanos, 1948).

179
UNIDADE 3 | A SOCIEDADE BRASILEIRA E SUAS INFLUÊNCIAS

2 A IMPORTÂNCIA DOS DIREITOS HUMANOS


NA FORMAÇÃO DA SOCIEDADE
Os direitos humanos não são um privilégio das sociedades modernas. De
forma diferente, eles também existiam em outros tempos. Os gregos, além das
contribuições no campo do direito, também contribuíram para que a sociedade
primasse pela justiça.

2.1 OS PRIMEIROS PASSOS


As primeiras discussões em torno do direito remontam à antiguidade. De
acordo com Aranha e Martins (2009, p. 277),

Na Antiguidade, os gregos promoviam discussões e elaboravam teorias


sobre o direito e a justiça, conceitos que para eles se confundiam: não
fazia sentido pensar num direito que não fosse ao mesmo tempo justo.
Os gregos também indagavam se a justiça nascia da própria lei ou se
haveria uma justiça anterior, derivada da natureza.

O debate em torno do assunto possibilitou o desenvolvimento e a


elaboração de várias teorias relacionadas ao direito. “Essas questões deram
origem às teorias jusnaturalistas, que se caracterizaram pela tentativa de
distinguir o direito positivo do direito natural” (ARANHA; MARTINS, 2009, p.
277). O direito natural está intrinsecamente ligado à tradição, é à lei não escrita,
mas que está presente na consciência humana. Em contrapartida, o direito
positivo é elaborado pelo ser humano e de alguma maneira expressa suas
concepções acerca do que vem a ser a justiça e o direito.

FIGURA 70 – DEUSA ROMANA JUSTITIA, QUE EQUIVALE À DEUSA GREGA DIKÉ

FONTE: Disponível em: <http://1.bp.blogspot.com/-7bse4mLktvQ/T8UuFrg4SYI/


AAAAAAAAAB0/94K5zluqRf0/s1600/balan%25C3%25A7a.jpg>. Acesso em: 9 jul. 2013.

180
TÓPICO 3 | OS DESAFIOS CONTINUAM

A filosofia platônica convida para um olhar além das aparências, uma


busca pela essência do ser humano, sendo isso o que importa nas relações
humanas.

No diálogo de Alcibíades, por exemplo, o Sócrates de Platão procura


demonstrar que a essência do ser humano está na alma, não no
corpo, tampouco na união de corpo e alma, pois o homem serve-se
de seu corpo como de um simples instrumento. De onde segue que
a individualidade de cada ser humano não pode ser confundida com
a sua aparência, estampada no rosto (COMPARATO, 2010, p. 28-29).

Esse procedimento, ao ponderar sobre os direitos de alguém, nos leva à


conclusão de que sempre que um julgamento ou tratamento de um ser humano
por outro basear-se apenas nas aparências, corre o risco de ser, no mínimo,
equivocado e tendencioso.

2.2 NA IDADE MÉDIA COM O CRISTIANISMO


De acordo com o pensamento cristão, todos possuem os mesmos direitos
e são responsáveis diante de Deus por suas ações. Nesse aspecto é importante
diferenciar as ações da Igreja dos ensinamentos do cristianismo. Nem sempre a
Igreja seguiu fielmente os fundamentos cristãos, seu desvio deve-se ao fato de
que, em alguns momentos da história da Igreja, homens buscaram seus interesses
pessoais em detrimento da obediência à ética cristã. É importante ressaltar que:

para os juristas medievais, que eram influenciados pelo cristianismo,


o direito natural era transcendente: a verdadeira justiça não era a
humana, mas divina. Desse modo, caberia aos juristas harmonizar os
textos legais às sagradas escrituras, optando sempre pela solução mais
justa de acordo com a religião (ARANHA; MARTINS, 2009, p. 278).

Para estes juristas, a palavra revelada nas escrituras sagradas servia


como base para o exercício pleno da justiça e imparcialidade na tomada de
decisões relacionadas aos direitos do homem. Ao atribuir o direito natural ao
transcendente, os cristãos estavam reconhecendo que a justiça não pertence
ao mundo inferior, mas a justiça divina triunfa sobre a justiça humana, por
mais moral que esta venha a ser. Essa prática é questionada, pois até mesmo as
escrituras precisam ser interpretadas, e neste ponto os pressupostos subjetivos
influenciavam na interpretação das escrituras e, consequentemente, nos
ensinamentos a ela relacionados.

181
UNIDADE 3 | A SOCIEDADE BRASILEIRA E SUAS INFLUÊNCIAS

2.3 NA IDADE MODERNA COM OS RACIONALISTAS


O Racionalismo questionou o absolutismo e a exploração do homem pelo
homem. A capacidade de questionar as diferenças sociais existentes em uma
sociedade de elites dominantes desencadeou uma série de mudanças nas relações
de poder. Os reis absolutistas defendiam seu poder como sendo uma escolha
divina, no entanto os racionalistas, ao reivindicar mudanças, acusavam os reis de
despotismo que, por sua vez, feria a liberdade do povo.

Na Idade Moderna houve uma mudança nas ideias relacionadas ao


direito. Os pensadores deste período procuravam separar o sacro da ciência,
arte, filosofia e do próprio Estado. Para Maquiavel (apud ARANHA e MARTINS,
2009, p. 278), “o poder é forjado nas relações humanas e, como tal, pertence a este
mundo”. Essa mudança de paradigma lançou as bases para mudanças em outras
áreas do conhecimento humano. De acordo com o pensamento racionalista, não
há interferência divina na política do Estado.

O Iluminismo foi o resultado da busca pelas mudanças necessárias nas


relações do Estado. O grande anseio dos pensadores iluministas era a mudança
deste paradigma ainda medieval em que a Igreja concentrava muito poder e
apoiava os regimes absolutistas existentes na Europa. Os pensadores deste
período criticavam abertamente o regime absolutista, por este motivo:

O Iluminismo surgiu, então, ao mesmo tempo como uma tradição


filosófica militante de crítica e também de fundamentações de
novas propostas e valores baseados nas ideias de que a humanidade
caminharia no sentido do progresso, da liberdade e da busca da
felicidade (MORAES, 1993, p. 200).

O Iluminismo influenciou significativamente na maneira de pensar no


século XVIII, tendo forte influência nos ideais de independência dos Estados
Unidos da América, que por sua vez influenciou na Revolução Francesa de 1789.

2.4 NA FRANÇA EM 1789


A Revolução Francesa de 1789 foi um marco importante na busca pela
igualdade de direitos. O lema da Revolução Francesa criado por Jean-Jaques
Rousseau era “Liberdade, igualdade e fraternidade”, que se tornaram princípios
universais e impulsionaram uma série de reivindicações nas áreas sociais. A
França deste período era composta por uma sociedade extremante desigual, pois
quem possuía riquezas as possuía em abundância, e quem não as possuía vivia
na miséria.

Essa situação gerou certa instabilidade nas relações sociais e o


enfraquecimento da monarquia, sendo que a autoridade do rei foi questionada.
De acordo com Moraes (1993, p. 221), “A Revolução Francesa foi um marco

182
TÓPICO 3 | OS DESAFIOS CONTINUAM

decisivo na formação do mundo contemporâneo, orientando e influenciando,


com suas ideias, bandeiras, propostas e ações, o universo político moderno em
quase todos os cantos do mundo”.

O documento resultante da Revolução Francesa foi a Declaração dos


Direitos do Homem e do Cidadão. A partir deste, outros foram surgindo ao longo
do tempo, tendo por base os mesmos princípios estabelecidos na ocasião de sua
formulação. O significado da Revolução é bastante amplo, pois, “de um lado,
ela representou a vitória da burguesia; do outro, a luta de todos os povos contra
qualquer forma de poder autoritário e a favor da liberdade, da democracia,
do progresso e da modernização” (MORAES, 1993, p. 221). Há quem atribua a
Revolução Francesa apenas aos interesses dos burgueses, no entanto, pessoas de
todas as classes sociais envolveram-se nas reivindicações revolucionárias, e por
este motivo esta foi uma revolução popular.

2.5 APÓS A SEGUNDA GUERRA MUNDIAL


A arbitrariedade praticada por governos não democráticos, no decorrer
do século XX, cerceou o direito de milhões de pessoas no mundo inteiro.
Podemos tomar como exemplo o nazismo alemão, o fascismo italiano e o
stalinismo russo, e ainda as ditaduras asiáticas e latino-americanas, que no uso
da força suprimiram manifestações e solaparam os direitos do cidadão.

A Segunda Guerra Mundial foi a demonstração de que o homem não


tem limites quanto à prática da maldade. As atrocidades cometidas durante a
guerra deixaram marcas profundas na humanidade e na vida de muitas famílias.
A política antissemita de Hitler deixou evidente até que ponto a crueldade
humana pode chegar, e o nacionalismo exacerbado é a arma mais letal contra
as minorias.

Após a Segunda Guerra Mundial foi criada a Organização das Nações


Unidas (ONU), com a finalidade de trabalhar para estabelecer a paz mundial.
Com o objetivo de manter a paz mundial, as nações assinaram a Carta das
Nações Unidas, no dia 20 de junho de 1945. Nessa carta estava expressa a
vontade dos povos de manter a paz mundial e preservar a dignidade e o valor
da pessoa humana.

183
UNIDADE 3 | A SOCIEDADE BRASILEIRA E SUAS INFLUÊNCIAS

FIGURA 71 – SÍMBOLO DA ONU

FONTE: Disponível em: <http://numberpi.blogspot.com.br/2011/09/onu-e-guerra-fria.html>.


Acesso em: 10 jul. 2012.

Para evitar que o Estado de Direito se torne um Estado autoritário, foi


criado um tribunal internacional com o objetivo de salvaguardar os direitos do
cidadão quando o Estado for omisso ou deficiente. “A ordem que surgiu a partir
de 1948 apresenta algumas inovações, como a universalização, a indivisibilidade
e a participação” (ARANHA; MARTINS, 2009, p. 282). Para melhor compreender
estes aspectos, iremos estudá-los separadamente.

O primeiro aspecto trata da universalização e, nesse sentido, “os direitos


humanos são universalizáveis, mas não são universais, pois não são eternos,
imutáveis, cósmicos nem religiosos, como se acreditou ao longo da história da
humanidade. Ao contrário: os direitos humanos são valores históricos” (ARANHA;
MARTINS, 2009, p. 282). Mas qual a diferença entre universais e universalizáveis?
O universal é o que não permite mudança, é fechado em si mesmo e tem uma
conotação de imutabilidade e até mesmo mítico. Como a história da humanidade
é dinâmica, os direitos são universalizáveis, ou seja, são aceitos pela sociedade de
cada tempo histórico, pois nem mesmo os direitos humanos devem ser impostos,
mas serem discutidos e avaliados por cada agente deste processo histórico.

O segundo aspecto, a indivisibilidade, afirma que os direitos humanos


são, em sua natureza, um conjunto indivisível e não podem ser classificados entre
os mais ou os menos importantes, por este motivo é que “Os direitos humanos
são indivisíveis. Os direitos civis e políticos, próprios do discurso liberal da
cidadania, devem ser conjugados com os direitos econômicos, sociais e culturais,
que defendem a igualdade e são próprios do discurso social da cidadania”
(ARANHA; MARTINS, 2009, p. 282). Esses elementos compõem os direitos
humanos e a dissociação entre os mesmos tende a enfraquecê-los. Dividir é
individualizar, e esta individualização é contrária ao princípio da igualdade.
184
TÓPICO 3 | OS DESAFIOS CONTINUAM

E o terceiro aspecto, não menos importante que os demais: a participação


é indispensável para a consolidação dos direitos humanos, portanto, “a
democratização da política interna dos países não apenas facilitou, como
possibilita e estimula a participação da sociedade civil no palco da política
internacional” (ARANHA; MARTINS, 2009, p. 283). Os organismos internacionais
criados para intervir nos casos em que os direitos humanos estão sendo violados
em seus próprios territórios têm permitido que cada vez mais pessoas participem
das mudanças que estão ocorrendo neste sentido. A participação popular garante
que mudanças ocorram, pois sem esta participação os mecanismos internacionais
e nacionais de defesa não podem ser aperfeiçoados, visto que o aperfeiçoamento
destes é resultado das necessidades e desafios por eles enfrentados.

3 O SER HUMANO NO SÉCULO XXI


O século XXI iniciou com um atentado terrorista de grande proporção e
repercussão, em 11 de setembro de 2001, em seguida uma guerra (EUA e Iraque),
e os conflitos não param por aí. A Primavera Árabe foi a demonstração do
inconformismo daqueles que estavam sendo explorados por ditaduras radicais e
desumanas, que roubavam a dignidade das pessoas; mas que o poder do Estado
pode ser usado para os interesses de uma elite minoritária.

No âmbito político interno, o povo brasileiro sofre com os elevados


impostos e a corrupção que está impregnada e corrói o sistema político (Judiciário,
Legislativo e Executivo), prejudicando setores importantes da sociedade civil. A
corrupção política é culpada pela desgraça e miséria de muitas pessoas em nosso
país, que têm sua dignidade e direitos roubados junto com o dinheiro desviado
por aqueles que deveriam gerir com honestidade e respeito o patrimônio público.

Na área econômica é possível ver ainda a exploração por parte daqueles


que detêm o capital. A exaltação do ‘ter’ em relação ao ‘ser’ denuncia claramente
que na ordem de prioridades na sociedade capitalista está aquilo que o homem
possui em detrimento ao que ele realmente é.

A essência dos Direitos Humanos está fundamentada na liberdade e


igualdade. A discussão em torno do assunto não esgotou, é um debate que perdura
há muito tempo e vem se intensificando à medida que o tempo vai passando e
novos desafios vão aparecendo. “Na modernidade discutiu-se um rol crescente
de direitos considerados naturais e inatos, universais e atemporais, a começar
pelo direito à vida e à segurança [...], até chegarmos aos direitos à liberdade [...] e
à igualdade” (ARANHA; MARTINS, 2009, p. 279).

É um anseio humano ser tratado com igualdade. Quando se fala em


igualdade, estamos nos referindo na relação com o outro.

185
UNIDADE 3 | A SOCIEDADE BRASILEIRA E SUAS INFLUÊNCIAS

UNI

Se você deseja conhecer na íntegra a Declaração Universal dos Direitos Humanos,


acesse o site: <http://portal.mj.gov.br/sedh/ct/legis_intern/ddh_bib_inter_universal.htm>.

4 AS RELAÇÕES INTERPESSOAIS E
DIREITOS HUMANOS NO TRABALHO
A convivência com outras pessoas é um desafio, pois as diferentes
personalidades, temperamentos, tradições, cultura e educação influenciam
diretamente nas relações sociais. Nesse sentido se faz necessário conhecer os
direitos humanos, para que as atitudes individuais não violem estes direitos.
O grande desafio dos líderes da atualidade, seja em qualquer segmento social,
é gerir através de uma política que respeite o ser humano e suas diferenças. O
filósofo Kant (apud SARLET, 2011, p. 40-41) sustenta que:

O homem, e, de uma maneira geral, todo ser racional, existe como um fim
em si mesmo, não simplesmente como meio para o uso arbitrário desta
ou daquela vontade. Pelo contrário, em todas as ações, tanto nas que se
dirigem a ele mesmo como nas que se dirigem a outros seres racionais,
ele tem sempre de ser considerado simultaneamente como um fim...
Portanto, o valor de todos os objetos que possamos adquirir pelas nossas
ações é sempre condicional. Os seres cuja existência depende, não em
verdade da nossa vontade, mas da natureza, têm, contudo, se são seres
irracionais, apenas um valor relativo como meios e por isso se chamam
coisas, ao passo que os seres racionais se chamam pessoas, porque a sua
natureza os distingue já como fins em si mesmos, quer dizer, como algo
que não pode ser empregado como simples meio e que, por conseguinte,
limita nessa medida todo o arbítrio (e é um objeto de respeito).

A partir desta citação é possível perceber que o ser humano possui uma
singularidade não encontrada em qualquer outra coisa ou lugar. Diferente
de um objeto qualquer, a qualidade de raciocinar que o ser humano possui é o
elemento distintivo das demais coisas, pois ele pode construir sua própria história
e determinar, mesmo que de maneira parcial, seu próprio destino.

Nas relações interpessoais, o outro deve ser reconhecido como um ‘ser’


consciente e autônomo, capaz de avaliar e decidir. A partir disso entendemos que
‘ser’ envolve o ‘eu’, que culmina com o ‘Eu sou’, que é a expressão que define o eu
indivíduo capaz de interagir e expressar-se, pois o expressar-se caracteriza o ser
como e existente. Qualquer atitude que roube o direito do indivíduo de ‘ser’ é um
atentado aos direitos naturais do homem.

Os locais de trabalho são espaços onde as relações em determinados


momentos se tornam tensas. Esta tensão pode ter origem na importância das tarefas
desenvolvidas ou na competitividade características destes espaços de convivência.
Os gestores têm um constante desafio de criar um ambiente de harmonia, para que
o desempenho profissional de seus subordinados não seja prejudicado.
186
TÓPICO 3 | OS DESAFIOS CONTINUAM

FIGURA 72 – ASSÉDIO MORAL

FONTE: Disponível em: <http://www.protecao.com.br/upload/protecao_noticia/2422.jpg>.


Acesso em: 12 jul. 2013.

É comum acontecer agressões verbais e até mesmo assédio moral em


determinados locais de trabalho. Atitudes como estas são entendidas como
violência aos direitos humanos. Para coibir tais atitudes é importante que o
responsável pela equipe esteja atento ao comportamento das pessoas sob sua
responsabilidade e busque soluções criativas para amenizar os conflitos

UNI

Conforme a Organização Mundial da Saúde (OMS), o assédio moral consiste no


uso deliberado da força e do poder contra pessoa, grupo ou comunidade, de forma repetitiva
e prolongada, em consequência do qual podem resultar lesões, danos psicológicos,
transtornos e privações, com graves desdobramentos para a saúde dos que passam por
essa lamentável situação.

FONTE: Disponível em: <http://www.protecao.com.br/site/content/noticias/noticia_detalhe.


php?id=JajaJay5>. Acesso em: 12 jul. 2012

Por ser o trabalho um local em que as pessoas passam geralmente um


terço de seu tempo, é importante que este local seja prazeroso, pois do contrário
o trabalhador poderá vir para o trabalho desmotivado, o que possivelmente
refletirá em seu desempenho.

187
UNIDADE 3 | A SOCIEDADE BRASILEIRA E SUAS INFLUÊNCIAS

5 A SOCIEDADE QUE QUEREMOS – NOVOS DESAFIOS


Hoje, mais do que nunca, é preciso possibilitar às pessoas uma experiência
de vida grupal, de formação humana que leve as pessoas a serem agentes integrados
e comprometidos na transformação do ambiente em que vivem, e não acharem que
isso não tem nada a ver com elas.

Essa dinâmica solidária é praticamente uma novidade. O cume do


desenvolvimento da noção de solidariedade foi a emergência de um sistema
de proteção de direitos através de seguros sociais. A sociedade seguradora era
a expressão autêntica deste pensamento. Inscrito na lógica da solidariedade, o
sistema de seguridade social ocupou um lugar histórico e estratégico de grande
importância nas práticas do Estado providência. Conclui-se facilmente que o
Estado de bem-estar social, de corte claramente liberal, apropriou-se de elementos
da compreensão de solidariedade, tomando, assim, uma feição humanitária.

É preciso aprofundar a vivência da cultura da solidariedade tendo em


vista a humanização e personalização, principalmente do adolescente e jovem.

Dentro dessa cultura da solidariedade é preciso apoiar, participar


ativamente dos Conselhos dos Direitos da Criança e do Adolescente e dos
Conselhos Tutelares, para influenciar na definição e implantação de políticas
públicas a favor da vida.

Devemos saber de antemão que a cultura da solidariedade vai além da


pura e simples prática. Não é só limpar um guarda-roupa e doar aquilo que você
não usa mais, aquela comida que já está vencendo, aquele sapato já gasto.

A cultura da solidariedade leva as pessoas a acreditarem nas próprias


potencialidades, especialmente dos adolescentes e jovens:

• acreditando no valor da pessoa, por pior que seja;


• educando e evangelizando a partir da ótica dos excluídos;
• solidarizando-se com os diversos organismos empenhados no resgate e
humanização das pessoas.

Cultura da solidariedade diz mais que práticas solidárias. Vai mais


fundo. Significa criar um imaginário cujos símbolos segreguem
aliança, fraternidade. Nela o símbolo (syn+ballein) realiza sua vocação
etimológica de unir opondo-se ao diábolo (dia+ballein) que divide. Sem
cair no dualismo grotesco de demonizar a realidade que se opõe a nossa
posição, é inegável que a solidariedade se situa do lado sim+bólico, da
união, da comunhão, da cooperação, enquanto o sistema vigente com
a lógica da troca competitiva é dia+bólico, dividindo as pessoas dentro
de si em desejos opostos, dentro da família com competição entre seus
membros, dentro das classes jogando os indivíduos uns contra os
outros, dentro da sociedade em classes antagônicas. Tudo regido pela
competição, concorrência insolidária (LIBÂNIO, 2009, s. p. )

O que se espera de uma sociedade que se vê desafiada pelos seus


indivíduos é que seja capaz de:

188
TÓPICO 3 | OS DESAFIOS CONTINUAM

• orientar as pessoas e os recursos materiais e financeiros para a promoção


humana;
• manter uma atitude crítica frente às propostas políticas vigentes;
• vivenciar o espírito de partilha e ajuda mútua na comunidade educativa;
• realizar campanhas comunitárias diante das situações emergentes.

O ser humano, desde os seus primórdios na Terra, enfrentou desafios das


mais diferentes formas, diferentes momentos, diferentes situações. E tanto o ser
humano quanto os desafios foram modificando o meio, o espaço ocupado por este
ser e tantos outros seres. Queremos neste tópico visualizar os novos paradigmas
que se apresentam para o ser humano, como acontecerá o desenvolvimento
humano em meio a tantos desafios e o que pode facilitar esse processo de
desenvolvimento, tanto para o ser humano como para tudo o que o circunda.

FIGURA 73 – CONHECIMENTO

FONTE: Dispobível em: <http://www.gazetadopovo.com.br/blog/tubodeensaio/index.


phtml?mes=201204>. Acesso em: 9 jul. 2012.

189
UNIDADE 3 | A SOCIEDADE BRASILEIRA E SUAS INFLUÊNCIAS

A participação ativa e efetiva das pessoas na vida política e social é um


grande desafio, como forma de externar a cidadania que todos almejam. No texto
a seguir, lemos, entre conceitos, o que vem a ser cidadania, os direitos e deveres
do cidadão, algo que deveria estar entranhado em nossas vidas, porém, sabemos,
não são tão conhecidos, muito menos praticados em nossa sociedade.

Cidadania é o exercício dos direitos e deveres civis, políticos e


sociais estabelecidos na Constituição. Os direitos e deveres de um cidadão
devem andar sempre juntos, uma vez que ao cumprirmos nossas obrigações
permitimos que o outro exerça também seus direitos.

Exercer a cidadania é ter consciência de seus direitos e obrigações


e lutar para que sejam colocados em prática. Exercer a cidadania é estar
em pleno gozo das disposições constitucionais. Preparar o cidadão para o
exercício da cidadania é um dos objetivos da educação de um país.

A Constituição da República Federativa do Brasil foi promulgada


em 5 de outubro de 1988, pela Assembleia Nacional Constituinte, composta
por 559 congressistas (deputados e senadores). A Constituição consolidou
a democracia, após os anos da ditadura militar no Brasil. Entre os diversos
deveres e direitos do cidadão, podemos destacar:

Deveres do cidadão

• Votar para escolher os governantes;


• Cumprir as leis;
• Educar e proteger seus semelhantes;
• Proteger a natureza;
• Proteger o patrimônio público e social do país.

Direitos do cidadão

• Direito à saúde, educação, moradia, trabalho, previdência social, lazer,


entre outros;
• O cidadão é livre para escrever e dizer o que pensa, mas precisa assinar
o que disse e escreveu;
• Todos são respeitados na sua fé, no seu pensamento e na sua ação na
cidade;
• O cidadão é livre para praticar qualquer trabalho, ofício ou profissão,
mas a lei pode pedir estudo e diploma para isso;
• Só o autor de uma obra tem o direito de usá-la, publicá-la e tirar cópia, e
esse direito passa para os seus herdeiros;

190
TÓPICO 3 | OS DESAFIOS CONTINUAM

• Os bens de uma pessoa, quando ela morrer, passam para seus herdeiros;
• Em tempo de paz, qualquer pessoa pode ir de uma cidade para outra,
ficar ou sair do país, obedecendo à lei feita para isso.

FONTE: Disponível em: <http://www.significados.com.br/cidadania/>. Acesso em: 25 nov. 2013.

Conhecemos e vivenciamos esses conceitos no nosso dia a dia? Veja que


não são grandes teorias filosóficas, que demandam grandes estudos para seu
entendimento.

Na economia, na cultura, também é simples assim. Se para a maioria


das pessoas essa realidade é algo distante, podemos imaginar como deve ser
para a criança, mesmo sabendo que, no viés econômico, nunca a criança foi tão
consumista e participante nessa dimensão econômica como antes. Podemos citar
as produções cinematográficas de Hollywood, que levam em conta o gosto da
criança para desenvolver seus enredos, pois sabe que ela tem poder de decisão
na escolha dos filmes e ainda influencia seus pais para que eles também assistam
aos mesmos filmes.

FIGURA 74 – CONSUMISMO INFANTIL

FONTE: Disponível em: <http://s3-sa-east-1.amazonaws.com/upload.osvigaristas.com.br/


images/780x/5505.jpg>. Acesso em:16 dez. 2013.

191
UNIDADE 3 | A SOCIEDADE BRASILEIRA E SUAS INFLUÊNCIAS

A necessidade de possibilitar a participação cidadã das crianças deve levar


em conta seus diferentes modos de vida, suas diferentes famílias, suas diferentes
culturas, educação e todos os paradoxos que as envolvem.

A concretização de uma infância cidadã apresenta-se como uma


imperiosa necessidade, mas também como uma laboriosa tarefa, na
medida em que, para além de outros constrangimentos, não podemos
esquecer que a infância não é vivida do mesmo modo por todas as
crianças, varia muito, quer de sociedade para sociedade, quer dentro de
uma mesma comunidade ou mesmo dentro de uma mesma família. Por
conseguinte, podemos afirmar a existência não de uma única infância,
mas de infâncias, dada a pluralidade de situações, especificidades e
características culturais disseminadas da vivência quotidiana deste
grupo social e geracional. São infâncias com diferentes lógicas, por
exemplo: crianças de rua, crianças trabalhadoras, crianças exploradas
sexualmente; são lógicas paradoxais lógicas com outros sentidos e
com diferentes significações, que reafirmam o pressuposto das várias
infâncias que têm que ser pensadas com outras categorias de análise e
outros pressupostos metodológicos e analíticos.
Além disso, não podemos esquecer que a criança não é mero receptor
das influências a que está sujeita, é também um ator em contínuo
desenvolvimento e com opinião própria e pontos de vista que importa
ter em consideração sempre que são abordadas questões que lhes
digam respeito. No fundo, trata-se de considerar a socialização como
um processo dinâmico e dual (TOMÁS, 2007, p. 122).

Não podemos acreditar que nosso país é o país do futuro. E nossas


crianças são o futuro do amanhã. Essas ideias nos tiram das responsabilidades
presentes, nos tiram a capacidade de interação, de praticar no já e no aqui, aquilo
que acreditamos ser o melhor no futuro.

O que faz com que a 'sociedade', em qualquer dos sentidos válidos


da palavra, seja sociedade, são evidentemente as diversas maneiras
de interação a que nos referimos. Um aglomerado de homens não
constitui uma sociedade só porque exista em cada um deles em
separado um conteúdo vital objetivamente determinado ou que o
mova subjetivamente. Somente quando a vida desses conteúdos
adquire a forma da influência recíproca, só quando se produz a
ação de uns sobre os outros - imediatamente ou por intermédio de
um terceiro - é que a nova coexistência social [...] se converte numa
sociedade (SIMMEL, 1983 apud SATURINO JUNIOR, 2011, p. 2).

192
TÓPICO 3 | OS DESAFIOS CONTINUAM

UNI

No link a seguir você vai encontrar um vídeo da faculdade de Guarulhos que vai
tratar sobre o mito da caverna de Platão, a partir da associação entre o grupo de alienados
da caverna com os diferentes grupos de alienados da atual sociedade. Muito interessante,
forte nas imagens, mas esclarecedor e impactante.
<http://eixodajustica.blogspot.com.br/2010/03/o-mito-da-caverna-vs-sociedade-atual.html>.

193
RESUMO DO TÓPICO 3

Neste tópico você viu que:

• No decorrer da história da humanidade sempre existiram dominantes e


dominados, sempre houve a busca pela liberdade e pela igualdade de direitos.

• Ainda existem governos antidemocráticos que cerceiam os direitos de milhões


de pessoas no mundo inteiro.

194
AUTOATIVIDADE

1 O que as pessoas podem esperar de uma sociedade desafiadora?

195
196
REFERÊNCIAS
ARANHA, Maria L. A.; MARTINS, Maria H. P. Filosofando: introdução à
filosofia. 4. ed. rev. – São Paulo: Moderna, 2009.

BACHA, C. J. C. Definição e importância da agropecuária e do agronegócio na


economia brasileira, 2013. Disponível em: <http://www.economia.esalq.usp.br/
intranet/uploadfiles/690.pdf>. Acesso em: 25 nov. 2013.

BARROS, Sérgio Resende. Trajetória da família. 2010. Disponível em: <http://


www.srbarros.com.br/pt/trajetoria-da-familia.cont>. Acesso em: 16 dez. 2013.

BECKER, B. K. Os eixos de integração e desenvolvimento e a Amazônia. Revista


Território, Rio de Janeiro, LAGET/UFRJ, n. 6, jan.-jun. 1999.

______. Por que a participação tardia da Amazônia na formação econômica do


Brasil? In: ARAÚJO, T. P. de; VIANNA, S. T. W.; MACAMBIRA, J. (Orgs.). 50
anos de Formação econômica do Brasil: ensaios sobre a obra clássica de Celso
Furtado. Rio de Janeiro: IPEA, 2009.

BERNARDES, D. M. Notas sobre a formação social do Nordeste. São Paulo:


Lua Nova, 71: 41-79, 2007.

BOOF, Leonardo. Pensamentos e sonhos sobre o Brasil. 2011. Disponível em:


<http://domacedo.blogspot.com.br/2011_11_01_archive.html>. Acesso em: 16
dez. 2013.

BRASIL. Ministério da Administração Federal e Reforma do Estado (MARE)/


Secretaria da Reforma do Estado - Organizações sociais. / Secretaria da Reforma
do Estado. Brasília: Ministério da Administração e Reforma do Estado, 1997.

BRESSER-PEREIRA, L. C.; GRAU, N. C. Entre o Estado e o mercado: o público


não estatal. In: O público não estatal na reforma do Estado. Rio de Janeiro:
Editora FGV, 1999.

CAMARGO, Carlos Eduardo Dias; LANZONI, Augusto (Org). América Latina:


500 anos de conquista. São Paulo: Ícone ed., 1987.

197
CAMARGO, T. A.; PRADO, O.; BERNARDO, R.; LARA, A. C. H. S.. Controle e
transparência no modelo de organizações sociais de saúde do Estado de São
Paulo. VI Congresso de Gestão Pública. Brasília, 2013.

CARDOSO, F. H. e , FALETTO E. Dependência e desenvolvimento na América


Latina. São Paulo: Civilização Brasileira, 2004.

CARVALHO, Fábio Câmara Araújo de; EVANOFF, Gregório Bittar. Tecnologias


que educam. São Paulo: Pearson, 2009.

CNC – Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo. A


competitividade nos setores de comércio, de serviços e do turismo no Brasil:
Perspectivas até 2015: Relatório Executivo/CNC; Serviço Brasileiro de Apoio às
Micro e Pequenas Empresas (Sebrae). Brasília: CNC; Sebrae, 2008.

COMPARATO, Fábio Konder. A afirmação histórica dos Direitos Humanos. 7.


ed. São Paulo: Saraiva, 2010.

CORDOVA, Tânia. História da África. Indaial/SC: Uniasselvi, 2010.

CRAICE, C.; SOUZA, M. F. S. Entre Minérios e Rios: Notas sobre urbanização,


migração e consumo no Sudeste do Pará. Anais XV Encontro da Associação
Nacional de Programas de Pós-graduação e Pesquisa em Planejamento Urbano e
Regional (ANPUR), Recife, 2013.

CUNHA, G. Dakuzaku, R. SOUZA, A. Uma outra economia é possível: Paul


Singer e a economia solidária. São Paulo: Contexto, 2003.

DAMATTA, Roberto. O que faz o Brasil, Brasil? São Paulo: Rocco. 2010.

______. O que faz o Brasil, Brasil? Rio de Janeiro: Rocco, 1986.

DECLARAÇÃO UNIVERSAL DOS DIREITOS HUMANOS. Adotada e


proclamada pela resolução 217 A (III) da  Assembleia Geral das Nações Unidas
em 10 de dezembro de 1948. Disponível em: <http://portal.mj.gov.br/sedh/ct/
legis_intern/ddh_bib_inter_universal.htm>. Acesso em: 17 dez. 2013.

DINIZ, C. C. A dinâmica regional recente da economia brasileira e suas


perspectivas. Rio de Janeiro: IPEA, 1995.

EXPLICA TUDO. Tipos de governo, 2013. Disponível em: <http://explicatudo.


com/tipos-de-governo#ixzz2DXWtj4erao>. Acesso em: 13 nov. 2013.

198
FARIA, C. F.; SILVA, V. P.; LINS, I. L.. Conferências de políticas públicas: um
sistema integrado de participação e deliberação? Rev. Bras. Ciênc. Polít.. 2012.

FISCHER, R. M.; FALCONER, A. P. Desafios da parceria governo terceiro setor.


I Encontro da Rede de Pesquisas sobre o Terceiro Setor na América Latina e
Caribe – ISTR. Rio de Janeiro: Escola de Serviço Social da UFRJ, 1998.

FÓRUM ECONÔMICO MUNDIAL. Relatório de competitividade global para


2013-2014. Genebra: 2013.

FREYRE, Gilberto. Casa-grande & senzala: a formação da família brasileira sob


o regime da economia patriarca. 51. ed. São Paulo: Global, 2006.

FUNAI. Fundação Nacional do Índio. Disponível em: <http://www.funai.gov.


br/>. Acesso em: 19 nov. 2013.

FURTADO, C. Formação econômica do Brasil. São Paulo: Companhia das


Letras, 2007.

______. Formação econômica do Brasil. São Paulo: Schwarcz, 2006.

GALEANO, Eduardo. Direito dos povos e direito à vida. In: MARTIN, Paulo
San.

GIRARDI, E. P. Proposição teórico-metodológica de uma cartografia geográfica


crítica e sua aplicação no desenvolvimento do atlas da questão agrária brasileira.
Tese (Doutorado). Presidente Prudente: [s.n], 2008.

HECK, E.; LOEBENS, F.; CARVALHO, P. D.. Amazônia indígena: conquistas e


desafios. Estud. av., São Paulo , v. 19, n. 53, Apr. 2005. Disponível em: <http://
www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0103-40142005000100015&lng
=en&nrm=iso>. Acesso em: 14 nov. 2013.

HOLANDA, Sérgio B. Raízes do Brasil. São Paulo: Companhia das Letras, 1997.

IBGE - Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Censo Demográfico 2010.


Rio de Janeiro: IBGE, 2010.

IPEA - Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada. Natureza e dinâmica


das mudanças recentes na renda e na estrutura ocupacional brasileiras.
Comunicados do IPEA, n. 104. 2011.

ISA – Instituto SocioambientaL. Disponível em: <http://www.socioambiental.


org/>. Acesso em: 5 dez. 2013.

199
KON, A. Sobre as atividade de serviços: revendo conceitos e tipologias. Ver. De
economia Ppolítica, vol. 19, n. 24, 1999.

LIBÂNIO, João Batista. Cultura da solidariedade e espírito de caridade. 2009.


Disponível em: <http://www.domtotal.com/colunas/detalhes.php?artId=551>.
Acesso em: 17 dez. 2013.

LOPES, Nei. Dicionário escolar afro-brasileiro. São Paulo: Selo Negro, 2006.

______. Enciclopédia brasileira da diáspora africana. 3. ed. São Paulo: Selo


Negro, 2004.

MCLUHAN, Marshall; POWERS, Bruce R. The global village: Transformations


in World Life and Media in the 21st Century. Oxford University Press, 1989.

MELO, Elisabete; BRAGA, Luciano. História da África e afro-brasileira: em


busca de nossas origens. São Paulo: Selo Negro, 2010.

MELLO. L. M. R. Vitivinicultura brasileira: Panorama 2009. Instituto Brasileiro


do Vinho (IBRAVIN), 2010.

MIGUEL, Igor. Conhecimento e informação. 2005. Disponível em: <http://


pensarigor.blogspot.com.br/2005/10/conhecimento-e-informao.html>. Acesso
em: 17 dez. 2013.

MONTEIRO, Antônio. Notas sobre negros malês na Bahia. Salvador, Ianamá,


1987.

MORAES, José Geraldo Vinci de. Caminhos das civilizações: da pré-história aos
dias atuais. São Paulo: Atual, 1993.

NINA RODRIGUES, Raymundo. Os africanos no Brasil. São Paulo: Madras,


2008.

OLIVEIRA, Frederico Abrahão. Poder e ética na sociedade brasileira. Porto


Alegre: Livraria do Advogado, 1995.

OLIVER, Roland. A experiência africana: da pré-história aos dias atuais. Rio de


Janeiro: Jorge Zahar Ed., 1994.

PINTO, C. R. J. As ONGs e a política no Brasil: presença de novos atores.


DADOS –Revista de Ciências Sociais, Rio de Janeiro, Vol. 49, n. 3, 2006.

200
PONTUAL, P. Desafios à construção da Democracia Participativa no Brasil: a
prática dos conselhos de gestão das políticas públicas. Cadernos da CIDADE, n.
14, vol. 12, 2008.

PREZIA, Benedito. O sagrado nas culturas indígenas. Disponível em: <http://


estudoreligioso.wordpress.com/2008/10/17/o-sagrado-nas-culturas-indgenas/>.
Acesso em: 2 ago. 2012.

RIBEIRO, D. O povo brasileiro: a formação e o sentido do Brasil. São Paulo:


Companhia das Letras, 1995.

ROCHA, A. P. B.; OLIVEIRA, M. S. Geografia regional do Brasil. 2. Ed., Natal:


EDUFRN, 2011.

SANSON, C. Guarani-Kaiowá: A indizível violência contra um povo.


Revista do Instituto Humanitas Unisinos. Ano XII, n. 408, 2012.
Disponível em: <http://www.ihuonline.unisinos.br/index.php?option=com_
content&view=article&id=4768&secao=408>. Acesso em: 18 nov. 2013.

SANTOS, Milton. A natureza do espaço: técnica e tempo, razão e emoção. São


Paulo: Hucitec, 1996.

SARLET, Ingo Wolfgang. Dignidade da pessoa humana e direitos


fundamentais na Constituição Federal de 1988. 9. ed. rev. atual. Porto Alegre:
Livraria do Advogado Editora, 2011.

SATURINO JUNIOR, Jessé. Um estudo da sociedade a partir das formas sociais.


In: Revista Pensar: Gestão e Administração, v. 1, n. 1, jul. 2011. Disponível em:
<http://www3.promovebh.com.br/revistapensaradm/art/a07.pdf>. Acesso em: 17
dez. 2013.

SCHERER-WARREN, I. A atualidade dos movimentos sociais rurais na nova


ordem mundial. Motriviv. N. 14, UFSC, Florianópolis, 2000.

SIGNIFICADOS. Significado de governo. Disponível em: <http://www.


significados.com.br/governo/>. Acesso em: 17 nov. 2013

SINGER, P. Introdução à economia solidária. São Paulo: Fundação Perseu


Abramo, 2003.

SOARES, Ismar de Oliveira. Sociedade da informação ou comunicação. São


Paulo: Cidade Nova, 1986.

201
TOMÁS, Catarina. Paradigmas, imagens e concepções da infância em
sociedades midiatizadas. In: Media e Jornalismo, v. 11, 2007, p. 119-134.
Disponível em: <http://200.144.189.42/ojs/index.php/mediajornalismo/article/
viewFile/5797/5252>. Acesso em: 17 dez. 2013.

202
ANOTAÇÕES

____________________________________________________________
____________________________________________________________
____________________________________________________________
____________________________________________________________
____________________________________________________________
____________________________________________________________
____________________________________________________________
____________________________________________________________
____________________________________________________________
____________________________________________________________
____________________________________________________________
____________________________________________________________
____________________________________________________________
____________________________________________________________
____________________________________________________________
____________________________________________________________
____________________________________________________________
____________________________________________________________
____________________________________________________________
____________________________________________________________
____________________________________________________________
____________________________________________________________
____________________________________________________________
____________________________________________________________
____________________________________________________________
____________________________________________________________
____________________________________________________________
____________________________________________________________

203
____________________________________________________________
____________________________________________________________
____________________________________________________________
____________________________________________________________
____________________________________________________________
____________________________________________________________
____________________________________________________________
____________________________________________________________
____________________________________________________________
____________________________________________________________
____________________________________________________________
____________________________________________________________
____________________________________________________________
____________________________________________________________
____________________________________________________________
____________________________________________________________
____________________________________________________________
____________________________________________________________
____________________________________________________________
____________________________________________________________
____________________________________________________________
____________________________________________________________
____________________________________________________________
____________________________________________________________
____________________________________________________________
____________________________________________________________
____________________________________________________________
____________________________________________________________
____________________________________________________________
____________________________________________________________
____________________________________________________________
____________________________________________________________
204

Você também pode gostar