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NAS ESCOLAS
FASCÍCULO N° 01
IDENTIDADE NACIONAL E FUNDAMENTOS
DAS RELAÇÕES ÉTNICO-RACIAIS NO BRASIL
Presidência da República Igualdade Racial nas Escolas
Coordenação Geral
Antonio Manoel Ribeiro Almeida
Coordenação Técnica
Segone Nadangalila Cossa
Coordenação Pedagógica
Ricardo Ossagô de Carvalho
Coordenação Audiovisual
Emmanuel Nogueira Ribeiro
Igualdade racial nas escolas: Identidade nacional e fundamentos das relações étnico-
raciais no Brasil. / Ivan Costa Lima; Vera Rodrigues. – Redenção: Instituto de Educação a
Distância – IEAD / Unilab, 2022.
ISBN 78-65-00-50733-1
CDD 305.8
SUMÁRIO
APRESENTAÇÃO...........................................................................................................................................4
REFERÊNCIAS .............................................................................................................................................16
APRESENTAÇÃO
Prezado/a cursista:
Este curso foi pensado como um instrumento de re�lexão acerca daquelas identidades que ainda estão ausentes de
representações e reconhecimento em nossas salas de aulas, por conta da forma como o racismo estrutura a sociedade
brasileira. Objetiva a formação continuada de professores/as das séries iniciais do ensino fundamental tendo como foco
a história e cultura africana e afro-brasileira, sem deixar de considerar outros povos, como a população indígena, central
na compreensão da identidade brasileira.
Você está em contato com o primeiro fascículo de um projeto elaborado pela Universidade da Integração Internacional
da Lusofonia Afro-Brasileira (Unilab - Ceará), em parceria com o Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos
(MMFDH), do Governo Federal. Ao longo do curso, você contará com fascículos e materiais audiovisuais produzidos para
auxiliar tanto no processo de ensino-aprendizado quanto na prática pedagógica. Desejamos que o conteúdo deste curso
possa fortalecer seus saberes e ser útil ao seu fazer docente.
As abordagens aqui tratadas são direcionadas a temas abrangentes e presentes no debate das relações étnico-raciais no
Brasil. Assim, numa dinâmica multidisciplinar, buscamos trazer elementos teóricos, históricos e didáticos, que
contribuam para a compreensão de discussões contemporâneas sobre as relações étnico-raciais e a conexão dessas
discussões com a educação e com a ciência, para que a sua formação seja enriquecida e, assim, você se sinta capaz de
trazer para a sala de aula, de forma crítica e contextualizada, temáticas que historicamente não são objetos de re�lexão
na escola.
A equipe responsável por esse material está ciente de que lidamos aqui com assuntos complexos, talvez inéditos para
alguns/algumas cursistas. Os conteúdos das unidades, portanto, são apresentados em linguagem acessível a todos/as
que buscam ampliar seu repertório sobre o tema. Ser a linguagem acessível, no entanto, não significa que a apresentação
do tema será raso, de modo algum! O/A cursista perceberá que as explicações das áreas de Humanidades serão recor-
rentes e sentirá como elas são fundamentais ao entendimento do processo educacional brasileiro.
Esperamos que façam bom proveito e, mais do que isso, que seja um caminho de aprendizado e questionamentos
necessários sobre nosso papel na compreensão histórica ainda desconhecida em nossos sistemas de ensino.
Objetivos do Módulo:
- Problematizar a identidade nacional em sua singularidade.
- Discutir a necessidade de ampliação dos conhecimentos sobre a população negra e indígena.
- Conhecer a legislação educacional que visa tornar a escola um espaço de combate ao racismo.
- Re�letir sobre o papel que os/as professores/as têm para a implementação de práticas
e ações antirracistas na escola.
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UNIDADE 1 | IDENTIDADE NACIONAL E RELAÇÕES ÉTNICO-RACIAIS
As re�lexões que trazemos, ao longo desta primeira unidade, estão organizadas em torno de ideias, pensamentos e
conceitos elaborados na nossa história social, os quais serão retomados ao longo de todo o curso. Por isso, consideramos
importante, para seu trajeto formativo, problematizar e balizar o que você tem aprendido sobre as relações étnico-raciais.
Acreditamos que a leitura atenta e inquisidora, típicas do exercício da docência, poderá dar maior consistência teórica
para o tema em debate.
Lembre-se de que os conceitos, como produto humano, estão a todo momento sendo elaborados e reconstruídos por
nossos estudos e re�lexões ancorados por especialistas de diferentes áreas de conhecimentos, portanto, indicamos que é
preciso situar historicamente seu surgimento e como tem sido utilizado para a compreensão de nossas vidas.
Você está sendo convidado/a a re�letir sobre elementos que configuram a identidade do Brasil como nação. Mas, você já
parou para pensar se de fato a nossa identidade enquanto país pode ser tratada no singular, como sugere o título de
nosso curso?
Queremos, a partir desta problematização, deixar evidenciado que a identidade não pode ser pensada em sua singulari-
dade, mas, em sua diversidade. Você já ouviu falar em diversidades? Desde o mito fundador do Brasil, afirma-se que
somos constituídos pelos povos europeus, indígenas e africanos, para além de outros povos que foram agregados ao
longo do processo de constituição da nação.
Contudo, se formos considerar nossa trajetória histórica, social e econômica, podemos perceber que estas diferentes
representações de povos foram constituídas para privilegiar uma única vertente nesta formação nacional: o povo
europeu. Esse lugar central é o que denominamos de eurocentrismo. Qual tem sido o resultado desta escolha? Vamos
re�letir sobre?
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Historicamente, africanos e seus descendentes foram submetidos ao processo de escravização, sofrendo violência física,
simbólica e cultural, que, entre outras consequências, transformou sujeitos em coisas, mercadorias, destituindo-lhes o
direito de ser humano. Por isso não conseguimos fomentar na escola a re�lexão sobre os conhecimentos e os processos
civilizatórios dos povos africanos. É preciso compreender que cada povo, em diferentes lugares e épocas, se organiza à sua
maneira. Não há um povo superior ou inferior a outro; há povos diferentes. Se você compreendeu que o termo ESCRAVO é
a leitura eurocêntrica de povos africanos, já pensou em substituir esse nome por ESCRAVIZADOS?
O sistema colonial e escravista, por sua violência e processo de dominação, considerava os/as africanos/as como desti-
tuídos/as de razão, alma e humanidade. A denominação NEGRO/A nasce, então, como designador de inferioridade,
expressão ressignificada como positiva a relativamente pouco tempo.
Este processo de construção de uma inferiorização passa inclusive por estudos acadêmicos. Tais estudos, assentados em
ideologias pré-concebidas, irão propor um universo de classificação humana no qual africanos serão desqualificados. Esse
foi um período no qual, na Europa, vigoravam correntes como o positivismo, o evolucionismo e o naturalismo, que reforça-
vam a ideia de superioridade da raça branca. Tais estudos, portanto, deram origem ao que se conhece hoje como RACISMO
CIENTÍFICO.
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Você sabia que esses discursos chegaram ao Brasil? Alguns intelectuais brasileiros utilizaram as ideias evolucionistas e
eugenistas como modelo de análise para a nossa sociedade. A partir das elites presentes, principalmente, nos Museus
Etnográficos, nos Institutos Históricos e Geográficos, nas escolas de Medicina e de Direito, essas ideias in�luenciaram as
relações raciais em nosso país, apontando, como solução para o progresso e desenvolvimento nacional, a tese do bran-
queamento da população, visto que se tinha uma ideia da população negra como degenerada, ao mesmo tempo que se
tem o surgimento da democracia racial. Você já ouviu falar sobre democracia racial?
Como este debate se encontra na atualidade? Hoje há um grande questionamento no uso da raça a partir de seu ponto
de vista biológico, já que não se pode falar sobre ela pensando apenas nas características físicas dos seres humanos. No
entanto, do ponto de vista das relações sociais, percebemos que muitas das características atribuídas aos negros, indíge-
nas e a outras populações discriminadas permanecem em nosso imaginário. Essa percepção traz para o debate social e
educacional a permanência da discussão sobre raça, mas em seu sentido político e de construção social, pois faz com
possamos re�letir sobre a história da população negra e os desafios para a superação do racismo que atravessa diferentes
setores.
Na atualidade brasileira, a população negra é formada por descendentes de africanos e africanas, e pelo resultado de
vários cruzamentos raciais ao longo da história. No censo brasileiro, por exemplo, temos os PARDOS. Quem são os
pardos? São o resultado da junção de diferentes sujeitos: não brancos e não negros. Essa categorização acaba por camu-
�lar o fato de que a maioria da população brasileira é negra. Assim, politicamente, discutimos que pretos e pardos confor-
mam a população negra.
ht ps:/ biblioteca.ibge.gov.br/visualizacao/livros/liv63405.pdf
nescentes de quilombolas". Quem seriam esses Mais https://biblioteca.ibge.gov.br/visual-
"novos sujeitos de direito"? Os QUILOMBOLAS são izacao/livros/liv63405.pdf
descendentes de africanos residentes em terras
nas quais escravizados construíram espaços sociais
de resistência ao regime escravocrata.
Uma das razões para esse debate era o desconhecimento sobre esses territórios negros, para além do Quilombo dos
Palmares na serra da barriga/Alagoas. Hoje se sabe que existem comunidades quilombolas em praticamente todas as
regiões do país e que abarcam centros urbanos e contextos rurais.
Inclusive, fazem parte deste cenário contemporâneo as escolas quilombolas, que demandam por educação antirracista,
pauta na legislação que contempla a história e a cultura africana e afro-brasileira.
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Re�litamos: Se, na própria Carta Magna do Brasil, há o reconhecimento dos direitos dos quilombolas, por que as comuni-
dades quilombolas não são contempladas na nossa formação escolar? Afinal, não são parte de nossa identidade nacional?
Na década de 90 do século XX, uma outra concepção indenitária vem à tona; começamos a nos referir à população
NEGRA como AFRODESCENDENTE. Afinal, qual a diferença dessas denominações? Afrodescendente engloba pretos e
pardos. Mas não é só isso! Busca-se, agora, construir uma identidade ancorada na história e na cultura africana, afirman-
do a positividade deste pertencimento em todo o lugar do mundo. Essa categorização é muito significativa, pois é uma
tentativa de superar a ideia de raça em sua dimensão biológica constituída pelo racismo científico.
Nesse início de curso, o/a cursista já deve ter sentido
o quanto nosso tema é complexo e como é desa- Documentário “Olhos de Anastácia”,
histórias e memórias negras quilombolas
https:/ www.youtube.com/watch?v=q89jvdxFIwM
fiador tratar das relações étnico-raciais e de seus
desdobramentos a partir de bases racistas, histori- https://www.youtube.com/watch?v=q89-
camente construídas, nas quais o ensino se alicerça. jvdxFIwM
Base de dados IBGE sobre quilombos no
O nosso tema nos remete a alguns conceitos que
Saiba
htps:/daosgeocin as.ibge.ovbr/potal/ps/opdashboard/inex.html#/ec6840f52b74c7940c16e713ac84
Brasil:
fazem parte do nosso dia a dia; pois palavras como Mais https://dadosgeociencias.ibge.gov.br/-
"racismo", "discriminação" e "preconceito" são bem portal/apps/opsdash-
conhecidas de todos nós. Vamos agora conhecer board/index.html#/ec6c840f52b74c7797
mais a fundo esses conceitos? 40c166e713ac84
E qual o objetivo de conhecer criticamente alguns desses conceitos? Passamos a ter maior aprofundamento da trajetória
dos/as africanos/as e de seus descendentes, em termos históricos, sociais e culturais.
Esses conceitos, caro/a cursista, são construções sociais; produzidas em determinado tempo e lugar; por isso, os significa-
dos das palavras que expressam esses conceitos também são construções sociais.
RACISMO
De acordo com as Nações Unidas: “O racismo engloba as ideologias racistas, as atitudes fundadas em preconceitos
raciais, os comportamentos discriminatórios, as disposições estruturais e as práticas institucionalizadas que provo-
cam a desigualdade racial, assim como a ideia falaz de que as relações discriminatórias entre grupos são moral e
cientificamente justificáveis.” No Brasil o racismo é entendido como crime inafiançável e imprescritível.
DISCRIMINAÇÃO
A discriminação racial é uma das faces do racismo, pois diz respeito à ação do sujeito que tem preconceito racial. Assim,
a discriminação racial se materializada por meio de palavras ou atos que desqualificam outras pessoas em termos
raciais, agredindo-as, obstaculizando sua entrada ou permanência em espaços sociais por considerar a pessoa racial-
mente diferente. Um dos exemplos dessa obstacularização é quando se deixa de empregar uma pessoa afrodescenden-
te sob alegação de inadequação. Inadequação a quê?
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PRECONCEITO
O preconceito é um sentimento anterior à construção de um conceito. Para que tenhamos um conceito sobre alguém
ou algo, precisamos estudar, conhecer, conviver, experimentar. O preconceito é a resposta de quem não tem respos-
ta. Você pergunta: Colega, por que você não se dá bem com sua vizinha? Resposta: Não vou com a cara dela! Assim,
quando pessoas fazem afirmações depreciativas sobre pessoas que nem conhecem, simplesmente passam adiante
ideias e modos de agir sobre os quais nunca pararam sequer para pensar.
Caro/a cursista, você tem alguma dúvida quanto à relevância deste debate no século XXI? Talvez você pense que o
sistema escravocrata não existe mais, que o mundo já superou esse momento histórico. Aceite, então, o seguinte convite:
olhe atentamente para a sociedade brasileira, o mundo e os conhecimentos trazidos por nossa educação.
Ao parar para olhar/recordar/re�letir, provavel-
mente, você lembrou do lugar inferiorizado ao qual No seu dia a dia, você já se deparou
grande parte da população negra foi relegada no Para com atos de RACISMO, DISCRIMI-
sistema econômico e produtivo; da perseguição a NAÇÃO ou PRECONCEITO? Como você
re�letir
religiões de matrizes africanas, da violência agiu?
policial que recai sobre corpos negros etc.
Percebemos, portanto, que o fenômeno do racismo e seus desdobramentos estão presentes no cotidiano. É por isso que
esse tema é tão atual.
Todo esse debate nos remete a um outro conceito, o do PENSAMENTO SOCIAL BRASILEIRO. Como este pensamento
tem sido construído na nossa sociedade?
Podemos dizer que o pensamento social brasileiro é construído por intelectuais, instituições sociais, políticas, culturais e
religiosas como um campo vasto de interpretação sobre o Brasil ao longo de seu processo histórico.
De um lado, estão intelectuais e instituições que
pretendem afirmar a superioridade ocidental
europeia. Do outro lado, estão intelectuais e https:/ www.youtube.com/watch?v=DGg6WolKgOs
h t t p s : / / w w w . y o u -
tube.com/watch?v=DGg6WolKgOs - O
canal problematiza como o racismo
instituições que se propõem a questionar
https://arqbrasileira.awordpress.
superi- com/2019/03/26/ciclos-economicos-no-periodo-colonial/
oridade branca europeia, lançando novas luzes
Saiba atravessa toda a nossa sociedade e nossa
sobre a formação da sociedade brasileira, por Mais dificuldade de percebê-lo em sua crueldade
reivindicar o lugar dos africanos e de seus descen- https://www.ufrgs.br/africanas/
https://www.ufrgs.br/africanas/ -
dentes, bem como dos povos indígenas e das Mulheres Africanas como recurso para uma
comunidades tradicionais, na formação do Brasil. contranarrativa sobre África e seus povos.
Caro/a cursista, percebeu os sentidos gerados por palavras que usamos no dia a dia? Se afirmamos que alguém é ESCRA-
VO estamos apontando uma condição permanente; assim como dizemos que alguém é brasileiro, por exemplo. Ora, isso
é totalmente diferente da expressão ESCRAVIZADO - agora, sim, fazemos referência a uma violência à qual pessoas
foram submetidas.
Vamos, então, prosseguir aprofundando conhecimentos para que possamos nos posicionar de forma balizada pelo
conhecimento sistematizado e crítico?
Veja “Pensamento social brasileiro” –
Silvio de Almeida. Disponível em:
Saiba h t t p s : / / w w w . y o u -
Mais tube.com/watch?v=gHEU9Vil-rU] - Aqui
podemos melhor compreender sobre
https:/ www.youtube.com/watch?v=gHEU9Vil-rU]
quem tem sido os intérpretes do Brasil
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UNIDADE 3 | ANTIRRACISMO E O PAPEL DA ESCOLA
Nesta unidade, vamos considerar como o combate ao racismo tem sido estruturado por diferentes instâncias da socie-
dade, entre elas A ESCOLA.Para o enfrentamento do racismo, de forma institucionalizada, o Brasil organizou um conjun-
to de instrumentos legislativos: as chamadas AÇÕES AFIRMATIVAS.
Mas, o que são ações afirmativas? Ações afirmativas dizem respeito a um conjunto de políticas que buscam combater os
efeitos advindos do racismo e da discriminação racial na oferta de oportunidades iguais aos grupos historicamente
discriminados. Assim, o objetivo da ação afirmativa é ser orientadora de ações de caráter público ou privado, que podem
ser obrigatórias ou não, de combate às desigualdades sociais e étnico-raciais na sociedade brasileira.
Você sabia que, durante os debates sobre a implementação das ações afirmativas no acesso ao ensino superior e ao
funcionalismo público, tivemos movimentos contra e a favor?
Com o passar do tempo, muitas pessoas perceberam a importância das ações afirmativas. Elas formam um conjunto de
estratégias e ações que abre caminhos para que populações marginalizadas ou minoritárias adentrem espaços social-
mente prestigiados.
Assim, cumpre-se alertar que as discussões sobre a Educação das Relações étnico-raciais não podem ficar restritas aos
estudiosos do tema ou aos integrantes do Movimento Negro, têm que ser compromisso do conjunto das instituições de
ensino do país: do ensino fundamental ao superior, com repercussões na organização curricular, nos métodos e nas práticas
educativas, como escreve a professora Petronilha Beatriz Silva (BRASIL, 2006, p. 238): “A luta pela superação do racismo e
da discriminação racial é, pois, tarefa de todo e qualquer educador, independentemente do seu pertencimento étnico-ra-
cial, crença religiosa ou posição política”, cabendo ao conjunto de sujeitos preocupados com o tema atuarem para este
enfrentamento nos sistemas de ensino de forma integrada.
http:/ www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2003/l10.639.htm ht p:/ w w.planalto.gov.br/c ivl_03/_ato20 7-2010/20 8/lei/l1 645.htm
Aqui destacamos, em especial, a Lei 10.639/03 e a Lei 11645, que determinam o ensino da história e da cultura africana,
afro-brasileira e indígena nos sistemas de ensino público e privado, de forma que toda a comunidade escolar – profes-
sores/as, alunos/as, gestores/as e funcionários/as – possa se envolver em práticas educativas em prol da superação do
racismo e de outras formas de discriminação, fazendo isso de forma crítica, consistente e transformadora.
Para complementar o conteúdo da primeira Lei, foram instituídas, em 2004, as Diretrizes Curriculares Nacionais para a
Educação das Relações Étnico-Raciais e para o Ensino de História e Cultura Africana e Afro-Brasileira.
http:/ portal.mec.gov.br/dmdocuments/cnecp_003.pdf
Para que o combate ao racismo se materialize em
http://portal.mec.gov.br/dmdocu-
ações concretas, temos outros documentos que
ments/cnecp_003.pdf - Aqui o parecer
devem ser conhecidos por todos os integrantes da Saiba
elaborado pela professora Petronilha
comunidade escolar; são eles: Mais Beatriz e Silva, que descreve as razões
para a instituição desta legislação.
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2006 2012 2013
https:/ gemaa.bemvindo.co/linha-do-tempo/
Caro/a cursista, você já conhecia esse conjunto de
https://gemaa.bemvin-
políticas educacionais que busca orientar o ensino
Saiba do.co/linha-do-tempo/ - Gemaa/Uerj
da Educação das Relações Étnico-Raciais? Que tal
convidar os/as professoras/es de sua escola para Mais situa o combate ao racismo em
diferentes tempos e espaços.
formar um grupo de estudo desses documentos?
Bem, para além do Estado, outros atores têm atuado, a partir desse arcabouço legislativo. Você já ouviu falar do Movimen-
to Negro? Sabe o que é?
O Movimento Negro é um desses atores, que se configura como um conjunto de movimentos sociais do Brasil. Existem
alguns estudos que buscam conceituar o movimento social como expressão do poder da sociedade civil, que busca discutir
uma identidade coletiva para criar ações e demandas de transformação social e política na nossa sociedade.
Fotografia:
Manifestação durante a reunião da SBPC,
Salvador, BA, 1981.
Autor: Juca Martins/Olhar Imagem
Entendemos que o Movimento Negro busca, de diferentes formas, agir na sociedade. Mas, para que ele serve?
Serve para lutar no combate ao racismo, ao preconceito e à discriminação racial. Mas, como, na prática, o Movimento
Negro faz isso?
Por articular resistências individuais e coletivas de africanos e seus descendentes. O Movimento é constituído por indivídu-
os que se reconhecem como negros/as, os quais se organizam com objetivos culturais, políticos, religiosos ou acadêmicos.
E qual a relevância dessas ações para a sociedade brasileira?
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O Movimento Negro explicita para a sociedade brasileira a necessidade do debate sobre os mecanismos e as práticas
discriminatórias em vários campos do tecido social, entre eles o educacional.
Você sabia que este movimento social é considerado educador? Vamos re�letir?
O Movimento Negro é considerado educador por conta de sistematizar saberes, conhecimentos ancestrais e científicos
para questionar a realidade brasileira. A partir dessa sistematização, o Movimento Negro elaborou pedagogias para que
a escola se torne um lugar de combate às desigualdades raciais. Vamos conhecer algumas destas proposições?
PEDAGOGIA INTERÉTICA
Proposição elaborada pelo Núcleo Cultural Afro-Brasileiro, em 1970. Propõe a utilização do teatro na prática
pedagógica. A base dessa proposta foram as pesquisas sobre os impactos do racismo nos setores políticos e
econômicos, bem como os impactos psicológicos.
PEDAGOGIA MULTIRRACIAL
Proposição elaborada por Maria Jose Lopes da Silva, professora, intelectual e militante do Movimento Negro no Rio
de Janeiro, em 1980. Propõe uma perspectiva curricular, política e de conteúdos direcionados à alfabetização e à
formação de professores. A base dessa proposta foi a percepção da necessidade de alteração da realidade educacio-
nal, que não problematiza a democracia racial.
PRETAGOGIA
Proposição elaborada por Sandra Petit, ativista e professora da Universidade Federal do Ceará (UFC), e Geranilde
Costa, professora da Universidade da Integração Internacional da Lusofonia Afro-Brasileira (Unilab). Propõe um
fazer educativo a partir de referenciais da história e da cultura africana e afro-brasileira. A base dessa proposta
teórico-metodológica é a percepção da necessidade de construção de uma prática educacional que, de fato,
contribua para que a escola se torne uma aliada na luta antirracista.
Você já parou para pensar que nossa formação pedagógica raramente faz menção à Pedagogia Interética, à Pedagogia
Multirracial, à Pedagogia Multirracial e Popular ou a Pretagogia? Você conhece essas proposições?
O que queremos neste curso é despertar o seu interesse em conhecer estratégias educacionais calcadas na trajetória dos
africanos/as e seus descendentes. Aprofunde, pesquise e conheça essas dimensões para que a sua formação seja consistente,
este é o primeiro passo para que sua atuação como docente seja construtiva da democracia racial!
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Quais são os entraves geradores desse descompasso entre políticas públicas e sua implementação?
Podemos problematizar que há a necessidade de se realizar alguns passos importantes para isto, não é mesmo? Entre
eles: decisão política, recursos financeiros, formação inicial e continuada, material didático e a compreensão de que este
conteúdo é tão importante quanto os conhecimentos ocidentais para a formação da identidade nacional.
Diante disto, qual é o papel de cada professor(a)? Que contribuições cada um(a) pode dar à formação de seres humanos,
antirracistas e críticos?
Como tentamos demonstrar ao longo deste fascículo, a escola é um lugar privilegiado para contribuir no combate ao
racismo, pois, além de um lugar de transmissão de conhecimentos, é um espaço de socialização e de trocas culturais.
O primeiro desafio para o/a educador/a é a compreensão de que o racismo e suas formas correlatas de discriminação se
manifestam nas práticas educativas e no currículo escolar. Por que assim afirmamos? Porque a regra é a ausência de
debate consistente sobre os grupos historicamente discriminados, como negros/as e indígenas. Tais grupos são portado-
res de filosofias, de histórias, de memórias, que estão ausentes de forma consistente na prática pedagógica.
Que possibilidade temos para superar esses limites? Trazemos algumas pistas, mas é necessário que os/as educa-
dores/as, a partir de uma formação continuada e do apoio da comunidade escolar, tenham acesso a diferentes materiais
para subsidiar um trabalho que seja transformador desta realidade social.
- Reconhecer ser imprescindível o debate sobre a história e a cultura das populações africanas, afro-brasileiras e indíge-
nas, como prática cotidiana e multidisciplinar, que se expressa ao longo de todo o calendário escolar e em relação com a
re�lexão sobre o combate ao racismo.
- Desmitificar, do imaginário de crianças, jovens e adultos, a ideia de superioridade de uma raça sobre outra, amplian-
do-se o repertório histórico, social, político e cultural dos/as alunos/as, com base nos conhecimentos das lutas travadas
pelos descendentes de africanos e povos indígenas.
- Acrescentar, de forma crítica, aos conteúdos escolares, a dimensão da história, da luta e da cultura dos povos africanos,
afro-brasileiros e indígenas como identidades que formam a nação brasileira; atuando na escolha de livros didáticos que
incorporem o debate racial como uma realidade.
- Ampliar, de forma crítica, os conteúdos escolares a partir de problematizações quanto aos livros didáticos que ainda
não incorporam o debate racial como uma realidade; trazendo a dimensão dos africanos, afrobrasileiros e indígenas
como identidades e culturas que formam a nação brasileira.
- Estar vigilante para que a temática racial apareça como elemento de valorização dos grupos historicamente marginal-
izados; intervindo, de modo firme, se a temática resultar em tentativas de inferiorização, por meio de nomes pejorativos,
brincadeiras de mal gosto e isolamento de crianças africanas, afro-descendentes, quilombolas ou indígenas na sala de
aula e em todo o espaço escolar.
- Possibilitar um diálogo com diferentes representações que compõem a sociedade, empreendendo pesquisas que
atualizam os conhecimentos do passado e sua relação com o presente de forma contextualizada e crítica da realidade
social.
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- Apropriar-se de outras perspectivas pedagógicas para o trato das relações étnico-raciais, atuando como educador(a) e
mediador(a), ao mesmo tempo que permanece aprendiz dos conteúdos da história e da cultura africana, afro-brasileira
e indígena.
Enfrentar estes desafios não é tarefa fácil, nós bem sabemos, mas é necessário para modificar a realidade brasileira.
Vamos arregaçar as mangas?
Assim, desejamos que o conjunto de matérias que compõem este curso possa, de fato, subsidiar sua intervenção
pedagógica no combate à discriminação, seja na sala de aula, no cotidiano escolar ou em momentos específicos de sua
ação no exercício da cidadania.
Por onde começar então? Você já sabe: pelo PLANEJAMENTO. É preciso integrar as ações com as proposições da escola
com um todo no ensino-aprendizado.
Vamos relembrar?
Planejamento:
- Definir objetivos a serem alcançados.
- Integrar ao contexto a ação a ser realizada.
- Conhecer os diferentes materiais para a ação (fascículos, vídeos, textos de apoio, pesquisa).
- Definir a melhor forma de realizar a metodologia.
Assim, vamos apresentar algumas sugestões, entre tantas, que podem ser aglutinadas ao seu planejamento para lidar
com as relações étnico-raciais no ambiente escolar.
Educação infantil
Para auxiliar os/as professores/as da educação infantil nesta tarefa de discutir as relações étnico-raciais, sugerimos
temas e possibilidades de ações para a faixa etária desta modalidade de ensino. De certo, haverá outros, mas é preciso
começar....
- Cuidado, afeto e acolhimento de forma igualitária.
- Identidades na escola.
- Corpo, oralidade e mundo que nos cerca.
- África: berço da humanidade e de civilizações.
- Saberes e conhecimentos na sociedade brasileira.
- Heróis e heroínas da população negra e indígena.
- Corpo, oralidade e mundo que nos cerca.
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3. Leitura das imagens, situações que aparecem no audiovisual, na literatura, que possa estimular as relações entre as
crianças.
4. Contação de histórias.
5. Estimulação: construir estratégias de retorno sobre as imagens e sons trabalhados: desenhar, dançar, cantar.
6. Atividades complementares.
7. Socialização dos produtos criados pelos/as estudantes.
Para este nível de ensino, é muito importante o universo imagético, pois propicia reconhecimento, identificação e acolhi-
mento, por isso os estímulos imagéticos precisam estar de acordo com as realidades racial, econômica e social dos/as
estudantes. Também, indicamos que o fazer pedagógico deve estar ligado ao brincar, pois promove o movimento do
corpo, as percepções e gera a interação entre as crianças. Vamos lá, se inspire e faça a diferença!!!
Ensino fundamental
Você, professor/a das séries iniciais, ao acompanhar os fascículos e os materiais audiovisuais, terá acesso a informações
que desejamos sejam inspiradoras para sua ação educativa, movendo-o(a) a compartilhar esses saberes e re�lexões com
seus/suas estudantes e com seus/suas colegas.
Estamos cientes de que, para muitos de vocês, estes poderão ser os primeiros conhecimentos sobre o tema; portanto, o
primeiro passo é preparar-se para trabalhar essas complexas temáticas.
Seria muito interessante que os/as educadores/as pudessem se organizar de forma coletiva, a partir de grupos de
estudos, rodas de conversas ou outras possibilidades coletivas. Para o êxito de suas ações educativas, o "segredo" você já
sabe: planejar e complementar seus saberes com estudos, diálogos e socialização do trabalho.
Mesmo que essa temática seja nova para você e, naturalmente, você ainda não se sinta em condições para atuar peda-
gogicamente com as complexas questões sociais aqui apresentadas, não perca de vista a NECESSIDADE de trabalhar
essas questões na escola. Essa consciência da NECESSIDADE será uma força que impulsionará você a superar desafios e
a querer aprofundar seus estudos nesta temática. Inclusive, seria muito interessante que os/as educadores/as pudessem
se organizar de forma coletiva, a partir de grupos de estudos, rodas de conversas ou outras possibilidades coletivas.
Sugestão para o planejamento. Aqui apresentamos ideias para o trabalho didático com as turmas:
1. Escolha um tema ou uma pergunta problematizadora sobre as relações étnico-raciais: organizar a discussão em rodas
de debates, de conversas.
2. Estimule a dramatização a partir da criação de situações onde os temas aparecem na vida cotidiana.
3. Proponha a montagem de materiais informativos produzidos como resultado das ações em sala de aula.
4. Organize eventos culturais, feiras ou exposições que provoquem a escola como um todo.
5. Estimule a pesquisa dentro e fora da escola, das memórias e experiências dos familiares ou de grupos sociais.
6. Aproprie-se de histórias que contextualizam o conhecimento a ser construído, o que pode se dar pela leitura de textos
literários - em prosa ou em verso; que poderão embasar um trabalho de escrita de textos autorais dos(as) próprios(as)
estudantes.
7. Promova a contação de histórias, que podem ser lidas, recriadas ou motivar a criação de outras histórias.
8. Programe visitas guiadas a espaços como museus, casas de cultura ou associações culturais na cidade.
Como você pode ver, caro/a cursista, indicamos caminhos, visando estimular você a repensar sua prática educativa. As
ideias aqui apresentadas podem ser ampliadas, modificadas e, principalmente, adaptadas à sua realidade.
Não existem receitas, mas caminhos a serem trilhados e construídos. Seu compromisso com uma educação antirracista,
certamente, fará seus/suas alunos(as) enxergar grupos que historicamente têm sidos invisibilizados com outras lentes:
libertas de preconceito.
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Bem caro/a cursista, esperamos que seu percurso até aqui tenha sido instigante, re�lexivo e inspirador, que você tenha
se sentido impelido/a a problematizar as relações raciais.
Então, que ações você considera que seriam importantes para que sua prática pedagógica seja antirracista?
Tente formular ações e proposições que possam ser realizadas com os instrumentos trazidos por este curso, de modo
que consigamos enxergar os grupos historicamente invisibilizados, e a nós mesmos, de uma forma muito melhor.
REFERÊNCIAS
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Ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana. Brasília: MEC/SEPPIR, 2004.
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