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Reflexões

Sobre os Sentimentos Caruso Samel

Propriedade exclusiva do Centro Redentor


Rua: Jorge Rudge, nº 119 - Vila Isabel
Rio de Janeiro - RJ - BRASIL
CEP 20550-220
www.racionalismo-cristao.org.br

Sumário

APRESENTAÇÃO

INTRODUÇÃO

PARTE I - SENTIMENTOS POSITIVOS

A alegria
O altruísmo
A amizade
O amor
A atitude
A bondade
A confiança
A coragem
A criatividade
A curiosidade
A dignidade
O entusiasmo
A felicidade
A franqueza
A gratidão
A harmonia
A honestidade
O idealismo
O otimismo
A ousadia
A paciência
A persuasão
A prontidão
A renúncia
A saudade
A serenidade
A simplicidade
A ternura
A tolerância
O triunfo
O valor

PARTE II - SENTIMENTOS NEGATIVOS

A ansiedade
A autocompaixão
A avidez
O ciúme
A compulsão
O desespero
O egoísmo
A emulação
A frivolidade
A hipocrisia
A indiferença
A infidelidade
A inveja
A maledicência
O medo
O medo da morte
A mentira
O ódio
A perversidade
A raiva
O ressentimento
O sensualismo
O tédio
A timidez
A tristeza
A vaidade
A vulgaridade

PARTE III - SENTIMENTOS AMBIVALENTES

A ambição
O amor-próprio
O desejo
O orgulho
O sofrimento

PARTE IV - ATRIBUTOS ESPIRITUAIS

A concentração
A consciência
O livre-arbítrio
O pensamento
A vontade

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
APRESENTAÇÃO

Caruso Samel nasceu em Miracema, Estado do Rio de Janeiro, Brasil, em 1929,


em berço racionalista cristão. Proveniente de família humilde, diplomou-se em
Engenharia Química pela então Escola Nacional de Química da Universidade do
Brasil, tendo-se especializado em refinação de petróleo e petroquímica, áreas em
que trabalhou na primeira fase de sua carreira. Foi, também, professor em cursos
de formação universitária, em vários momentos de sua bem sucedida carreira
profissional. Ainda na fase técnica de sua carreira, criou e implantou o primeiro
Curso de Petroquímica no Brasil, em 1969. Exerceu cargos de diretoria em
importantes empresas brasileiras de planejamento e projetos. É também bacharel
em Direito.

Diretor-Tesoureiro do Centro Redentor Filial de Butantã, na cidade de São


Paulo, SP, Brasil, em abril de 2000 passou a colaborar no jornal A Razão,
desenvolvendo temas sob o título geral de ‘‘Regras de bem viver’‘.

Como autodidata em Filosofia e Humanidades, tendo dedicado longos anos ao


estudo e reflexão das obras racionalistas cristãs, e, por isso, palestrante e
conferencista de grande densidade na apresentação de temas relacionados com a
espiritualização das criaturas, o Autor apresenta sua visão sobre os sentimentos,
empregando métodos próprios de investigação dos fenômenos afetivos, e cria
algo novo em filosofia comportamental, ao mostrar a importância de o ser
humano manter uma atitude de bem-querer em suas relações.
O Editor

INTRODUÇÃO

Sumário
INTRODUÇÃO

‘‘Todo nosso conhecimento tem princípio nos sentimentos.’‘


Leonardo Da Vinci

Para tratar dos sentimentos, expressão da sensibilidade e da afetividade humana,


foi idealizado o presente livro. Nele procuramos dar uma ampla abrangência ao
estudo de um dos estados da consciência que mais tem a ver com a sensibilidade
humana, isto é, com os fenômenos afetivos, também conhecidos como
sentimentos, emoções e paixões. Procuramos exprimir com palavras, de modo
convincente, os sentimentos humanos, nos seus diversos matizes, apresentados
em mais de setenta temas.

Não vamos entrar em divagações filosóficas ou comparar conceitos defendidos


por muitos autores e diferentes escolas filosóficas ao longo da História. Nem
tampouco vamos nos fixar em conceitos religiosos pregados por seitas e
religiões de todo o mundo. Mas, isso não nos impede de fazer citações
apropriadas de grandes autores e mestres de todas as épocas para enriquecer
nossas próprias idéias.

Ao longo dos tempos muitos autores estudaram os sentimentos e prepararam


várias classificações, mas nenhuma delas nos satisfaz completamente, por serem
incompletas ou por não se ajustarem aos aspectos mais modernos da filosofia e
da psicologia. Dessa forma, este livro não se apegará a qualquer classificação ou
escola filosófica. O título sugere um tratamento mais amplo do que específico,
sem perder em profundidade. De regra, mergulhamos fundo na essência dos
sentimentos, procurando identificar suas causas e efeitos, mas preservamos a
leveza de cada tema tratado de forma livre e intuitiva.

Quando se procura compreender o processo de formação das causas conscientes


e inconscientes geradoras dos sentimentos, das emoções e das paixões e os seus
efeitos no dia-a-dia das pessoas, enfrentamos dificuldades. Não se trata de
avaliar e medir coisas e suas formas para as quais se dispõe de metodologia e
instrumentos apropriados, como medir a distância entre dois pontos ou pesar um
determinado produto, mas de ‘‘experimentar’‘ e ‘‘avaliar’‘ sensações que são
sentidas de forma e graus diferentes por nós, individualmente.

Ao contrário, aqui procuramos empregar métodos de investigação diferentes, tais


como a analogia e a associação de estados internos da mente com o meio
ambiente, o relacionamento das pessoas entre si, o conteúdo moral e psíquico
dos indivíduos, a natureza e a manifestação de seus pensamentos, enfim, temos
que ‘‘ver’‘ e ‘‘experimentar’‘ com a ótica da Razão e da Moral, procurando, de
forma mais sensível e concreta, captar atitudes e atos voluntários e involuntários
presentes na vida de cada criatura.

Termos que penetrar fundo nas mentes, avaliar e interpretar sentimentos,


emoções e paixões, sem nos envolvermos de forma particular com a nossa
própria experiência de vida, é tarefa quase sobrenatural. A isso nos propusemos
neste despretensioso livro, acreditando poder colaborar para o deleite, o
progresso e a evolução de nossos leitores, procurando oferecer-lhes, em cada
parágrafo, um ponto de apoio para reflexão e meditação sobre os temas tratados.

Os sentimentos, no seu sentido mais amplo, constituem o conjunto das


qualidades morais do indivíduo. Embora o autor não pretenda adotar um
esquema rígido de classificação dos sentimentos, podemos agrupá-los em
simples e complexos. Os simples são diretos e independentes, tais como, a
alegria, o ódio, a dor. Já os complexos são de natureza mais emotiva e são
comumente conhecidos como emoções, tais como a esperança, o ciúme, a
saudade. As emoções resultam de reações mentais das criaturas em resposta a
uma situação inesperada provocada por outras pessoas, modificando o estado
afetivo de uma forma penosa ou agradável, conforme a emoção estimulada.
Quando os sentimentos ou as emoções são levados a um alto grau de
intensidade, sobrepondo-se à lucidez e à razão, estaremos lidando com as
paixões, como no caso do amor, na sua concepção meramente materialista. Nesta
obra, trataremos tanto dos sentimentos positivos como dos negativos, realçando
os seus efeitos na conduta e nas atitudes das pessoas. Estas constituem uma
forma de ação consciente, inconsciente e emocional, resultante ou não de uma
provocação. O leitor encontrará um tema especial sob o título ‘‘A ATITUDE’‘.
Além disso, dada a sua importância na vida espiritual dos seres, foram incluídos
os principais temas voltados aos atributos espirituais.

Como pode ser observado, o título Reflexões sobre os sentimentos sugere um


conjunto de temas que levarão o leitor à reflexão criadora. Lembramos que a
palavra emoções é usada aqui de forma genérica e abrangente. Algumas
emoções, dada a sua importância, serão apresentadas independentemente de seus
contrários, como amor e ódio, mas outras, devido às sutilezas de entrelaçamento,
serão tratadas conjuntamente num mesmo contexto, como esperança e
desesperança.
No desenvolvimento deste livro, foram tomados como fundamentais os
princípios cristãos e espiritualistas mais essenciais, já que a criatura, desde o seu
nascimento até a morte, possui todos os recursos espirituais e mentais de que
precisa para o seu desenvolvimento e evolução. Alguns desses recursos são:

1) A faculdade do pensamento, que é tudo na vida da criatura.

2) A faculdade da vontade, para pôr o pensamento e o livre-arbítrio em ação.

3) A faculdade do livre-arbítrio, que é a liberdade de pensar e agir livremente.

4) A faculdade do raciocínio, que analisa o que é moralmente certo ou errado.

5) A consciência, que censura, critica e aprova ou não as ações empreendidas.

6) A reunião do pensamento com a vontade para criar e recriar o que desejar.

7) A percepção criadora para poder compreender a vida em sua real totalidade.

8) A intuição para perceber que a vida não termina com a morte do corpo físico.

9) A autodisciplina para ser comedido e bem cumprir os princípios cristãos.

Assim, o autor acredita que os fundamentos desses princípios poderão servir de


ponto de apoio para todos aqueles que se dedicarem a pensar e refletir sobre os
temas dos sentimentos, das emoções e das paixões aqui apresentados.

Este livro pode ser lido de diferentes maneiras, do começo para o fim ou
escolhendo o tema que se desejar, aleatoriamente. O importante é criar uma
relação individual com cada tema e seu conteúdo e, dele, tirar as idéias para
construir suas próprias reflexões. Os frutos que cada um dos leitores colherá da
reflexão e meditação suscitadas em cada um dos temas tratados compensarão, de
longe, os esforços do autor, cuja única motivação é poder abrir novos horizontes
para uma melhor compreensão de si mesmo e de seus semelhantes pelos
caminhos da Vida.

Possa este livro despertar em cada um dos leitores o hábito salutar do raciocínio
e da meditação e o autor sentirá que seu esforço não foi em vão.

PARTE I - SENTIMENTOS POSITIVOS


Sumário
PARTE I
SENTIMENTOS POSITIVOS
A alegria

O homem, quando nasce, recebe toda a bagagem espiritual e genética de que


precisa para organizar e desfrutar a sua vida com alegria e relativa felicidade.
Tanto mais é assim quanto mais corretamente agirmos, usando o nosso livre-
arbítrio para o bem.

Mas, o que é ser feliz?

Ser feliz é sobrepujar as incertezas da vida e, no dizer de José da Silva Martins,


em seu livro Sabedoria e felicidade: ‘‘ultrapassar as inquietudes e angústias,
transformando-as em felicidade’‘ [MARTINS, 1990, p. 303].

As lamentações e lamúrias a que muitas pessoas se dedicam são fontes contrárias


à felicidade; já a alegria de viver nos leva à felicidade. Marco Aurélio disse:
‘‘Não devo lamentar-me, eu que jamais lamentei quem quer que fosse’‘
[MARTINS, 1990, p. 306]. Portanto, para sermos felizes é preciso pugnarmos e
elevarmo-nos pelo cumprimento de nossos deveres. Assim procedendo, veremos
que o império da alegria nos purificará e se tornará nosso reino.

Fazendo o bem, nossa felicidade aumenta e, com ela, nossa liberdade; ao


contrário, nas correntes do mal, nossas ações tornar-se-ão limitadas e, com elas,
nossa liberdade restará diminuída. Assim, a felicidade precisa ser exercitada
todos os dias, a cada momento, pensando no presente e no futuro e esquecendo o
passado, se este foi triste.

É preciso não se deixar enganar, pensando que a felicidade se revela apenas nos
arroubos da alegria; os verdadeiros sábios parecem disfarçar sua felicidade em
austera serenidade, da qual emana uma irreversível felicidade, que toca a todos
que com eles convivem ou se aproximam.

É de Rabelais esta frase: ‘‘Ri, ri, porque o riso é próprio do homem’‘


[MARTINS, 1990, p. 307]. Aliás, é sabido que o homem é o único animal que ri
e nisto está parte de sua superioridade no mundo animal.

Para conservar a felicidade é preciso que evitemos a ociosidade, que é a mãe de


todos os males. Para isso, nosso tempo deve ser dedicado às ações e tarefas
concretas e que nos dêem prazer. Veja estas linhas de Ella Wilbur Wilcox:
‘‘Adorai a vida que tendes. Buscai algo que valha a pena fazer enquanto fordes
trabalhando para melhorar vossas condições e aspirar à felicidade que almejais.
Rejubilai-vos com alguma coisa todos os dias, porque o cérebro ganha hábitos e
não podeis ensiná-lo de repente a ser feliz se lhe permitirdes ser infeliz’‘
[MARTINS, 1990, p. 307].

É um erro pensar que a felicidade só é possível com o isolamento, na meditação


ou que se necessita de um guru para alcançá-la. Muito ao contrário, a felicidade
não viceja no isolamento; é preciso haver o contato benéfico e harmonioso com
todos que nos rodeiam, para que ela se torne possível, real.

A felicidade não se procura, não se busca, ela advém naturalmente da prática do


Bem, com fundamento no amor universal, com o desejo ardente de trabalhar não
só para si, mas também, para toda a família humana, para nossos irmãos, nesta
jornada terrena. É isso o que nos ensinou Aristóteles: ‘‘A felicidade consiste em
fazer o Bem’‘ [MARTINS, 1990, p. 308]. Em outras palavras: há uma relação de
causa e efeito recíproca entre o trabalho do corpo e do espírito com a saúde:
corpo são e mente sã são necessários para nos proporcionar alegria e
contentamento, sentimentos estes que acompanham a felicidade. Portanto, para
sermos felizes o lema é saber tornar os outros melhores e mais felizes que nós
próprios.

Mas, a melhor forma que temos para alcançar felicidade está na bondade que
praticamos para com os nossos semelhantes. Ela retorna, realimentando esse
processo. Outra forma de ser feliz é cumprir rigorosamente com os nossos
deveres. A consciência do dever cumprido consagra em nossa alma uma doce
alegria, que reflete diretamente em nosso semblante, contagiando, positivamente,
as pessoas com quem convivemos.

Krishnamurti nos dá uma lição: ‘‘Nunca permita sentir-se triste ou deprimido. A


depressão é negativa, porque ela contamina outras pessoas, torna suas vidas mais
difíceis, o que você não tem o direito de fazer. Portanto, se a tristeza o atingir,
livre-se dela imediatamente’‘ [MARTINS, 1990, p. 309]. Encarar a vida
negativamente é debater-se sem cessar nas trevas da noite, deprimindo o corpo,
esvaindo a saúde e gerando toda espécie de doença.

O segredo é viver em harmonia com tudo o que existe, com amor e abnegação,
dedicando-se ao serviço da humanidade e à felicidade de nossos semelhantes;
com certeza a alegria e a felicidade serão os nossos baluartes.

José da Silva Martins escreveu: ‘‘A felicidade e a verdade são plantas da vida
moral mais do que da vida intelectual. Uma verdade só existe a partir do
momento em que ela modifica, purifica e enobrece qualquer coisa em nossa
alma’‘ [MARTINS, 1990, p. 311].

Aquele que melhor conhece a si mesmo é o mais feliz dos homens e sabe mais
profundamente que a felicidade não é inseparável dos sofrimentos e das
angústias que o ser humano tem que enfrentar na marcha de sua evolução aqui
na Terra. A criatura que é forte e determinada sabe ser infatigável, humana e
corajosa. Sabe onde quer chegar e é sempre vencedora no cumprimento de seus
deveres. Por isso, goza de relativa felicidade. Esta felicidade não é igual para
todos. Cada um tem que adquiri-la por si mesmo e senti-la a seu modo, de
acordo com o grau de sua espiritualidade.

Finalmente, encontramos pessoas que entendem que a felicidade só pode ser


alcançada no sacrifício. A resignação e o sacrifício são sentimentos belos,
quando empregados para salvar vidas humanas diante de fatos inevitáveis, tais
como incêndios, desastres e catástrofes, mas, fora disso, não passam de
estupidez humana. Isso ocorre porque certas criaturas acham mais fácil morrer
moral e até fisicamente para os outros do que viver para si mesmas. É bom
observar, no entanto, que a resignação pode se tornar um refúgio de covardia.

A felicidade pode tornar-se um hábito pela nossa vontade posta a serviço do bem
pelo amor ao bem.

Enfim, a felicidade é a chave de ouro da vida!

O altruísmo

O altruísmo é um sentimento positivo e nobre em que a criatura direciona as suas


energias ou, pelo menos, dedica parte delas em benefício de seus semelhantes,
sem nada pedir em troca ou em retribuição. O altruísta pensa no próximo como
se fosse ele mesmo e procura ajudá-lo a resolver os seus problemas. O altruísta é
um ser prestativo, solidário por excelência. Está sempre disposto a ajudar seus
semelhantes, em momentos difíceis para estes, cooperando direta ou
indiretamente para o seu bem-estar. Os altruístas são capazes de enfrentar
problemas que muitos julgam insolúveis, tomando a iniciativa em muitos
movimentos, campanhas ou cruzadas de solidariedade humana.

Existem pessoas altruístas em todas as camadas sociais, em todos os países do


mundo. O verdadeiro altruísta não tem preconceito de raça, de religião ou de
partido político. Sua estrutura psíquica está preparada para aceitar as
desigualdades sociais, mas principalmente para lutar e vencer todos os
obstáculos que acentuam essas desigualdades. Independentemente de sua
posição social, o altruísta é generoso, nobre, leal e valente e gosta de dar, de
distribuir, com os mais necessitados, parte do que ganha com seu trabalho.
Quando o que ganha é pouco para o seu próprio sustento e o de sua família,
então, dedica parte de seu tempo e trabalho, o melhor de seus esforços e até de
seu lazer para ajudar o próximo em suas dificuldades. Nesses casos, são pessoas
simples e humildes, prestativas por excelência, que praticam essas boas ações
nos momentos mais difíceis por que passam seus parentes ou seus vizinhos e
amigos mais próximos. São chamadas de pessoas de bom coração, verdadeiros
missionários anônimos da dor, sempre procurando mitigá-la.

As criaturas de bom coração estão sempre dispostas a se empenharem em


campanhas de ajuda humanitária e normalmente fazem parte da chamada defesa
civil, núcleos de pessoas bem intencionadas, organizados para atender e socorrer
necessitados em dificuldades nas grandes catástrofes da natureza como
inundações, furacões, terremotos, desabamentos ou mesmo nas situações de
aflição criadas pelo próprio homem, como nos incêndios, nos grandes desastres
aéreos, de trens e de ônibus, nos naufrágios e tantos outros. É nesses episódios
que se revelam a coragem, a abnegação e o heroísmo de muitas criaturas
anônimas, tantas vezes mostradas em comoventes cenas de televisão que
empolgam nossos melhores sentimentos de fé nos verdadeiros valores humanos.
Há outros que, em idênticas situações, escolheram esse tipo de vida, engajando-
se em profissões voltadas para tal fim, como os soldados do corpo de bombeiros,
existentes em quase todas as comunidades e até nas grandes indústrias. Cabe
mencionar aqui, também, os salva-vidas que vigiam os banhistas incautos nas
praias de todo o mundo e, não raro, se tornam heróis no salvamento de pessoas
afogadas.

Há, ainda, entre as criaturas humildes e de bom coração, aquelas que escolheram
como profissão serem enfermeiras. Essas criaturas são prestativas, zelosas e
dedicadas, treinadas para praticarem o bem em situações as mais difíceis,
lidando com a dor e o sofrimento alheios, às vezes, com recursos exíguos, nos
hospitais de todo o mundo. Ajudam os médicos em suas tarefas de salvar vidas
ou de remover doenças, mas também, na recuperação pós-operatória. Não
poderia deixar de lembrar a atuação dessas criaturas em zonas de conflitos e
guerras, quando se torna mais evidente sua coragem e operosidade. Não nos
esqueçamos de citar aqui, Ana Néri (1814-1880), natural da Bahia e grande
pioneira da enfermagem no Brasil, que atuou em 1865 na Guerra do Paraguai,
onde instalou, com seus próprios recursos, uma enfermaria na casa onde passou
a morar. Recebeu, por isso, do Governo Brasileiro, as medalhas ‘‘Humanitária’‘
e ‘‘da Campanha’‘, sendo então chamada ‘‘a mãe dos brasileiros’‘. Entre os
médicos, cumpre destacar a figura de Oswaldo Cruz (1872-1917), médico
sanitarista, fundador da medicina experimental brasileira e do Instituto de
Manguinhos no Rio de Janeiro, que afrontou a ira da população para erradicar a
peste bubônica e a febre amarela, esta última com vacina por ele desenvolvida.

Uma faceta do altruísmo é a filantropia, cuja prática revela um grande amor pela
humanidade e pelas causas justas. É o caso de Diana Spencer, Princesa de Gales,
símbolo contemporâneo da generosidade e da filantropia, morta recentemente
(31/08/1997) em desastre de automóvel, em Paris. Mais conhecida como Lady
Di, foi consagrada por mais de 1 bilhão de pessoas que assistiram às suas
exéquias pela televisão, com o nome de Princesa do Povo. Ela levou a
fraternidade aos necessitados de cinco continentes. Jamais negou alimento
material ou espiritual a quem lhe estendesse a mão e, mais que isso, abriu
caminhos em cenários trágicos, confortou mutilados de guerras e flagelados pela
fome e pela doença. Como voluntária da Cruz Vermelha Internacional, visitou os
campos minados de Angola, Norte da África, em janeiro de l997 e deflagrou
uma luta sem tréguas para eliminação das minas terrestres que mutilam, em
tempos de paz, 25000 pessoas por ano. A consagração veio em 17/09/1997, três
semanas após o seu desenlace, com a assinatura do ‘‘Acordo para Eliminação
das Minas Terrestres’‘ em Oslo, Noruega.

Em quase todos os países do mundo, principalmente nos países mais ricos,


homens de grande sucesso que venceram na vida, partindo do nada ou do quase
nada e fizeram grandes fortunas com seus negócios, fundaram universidades e
institutos filantrópicos, doando parte de seus lucros para manutenção dessas
instituições. São as chamadas ‘‘Fundações’‘ que alocam recursos sem fins
lucrativos em Galerias de Arte, Pinacotecas, Bibliotecas, Museus e Organizações
Não-Governamentais, estas últimas, principalmente para atuarem em defesa da
ecologia e do meio ambiente como é o caso da Greenpeace, que atua em todos os
continentes, empregando cerca de 300 pessoas e aplicando verbas da ordem de
US$ 160 milhões por ano. Essas organizações e as pessoas que nelas trabalham
são verdadeiros abnegados e exemplos de idealismo altruísta, verdadeiros
vigilantes e conservacionistas da não-proliferação nuclear e suas radiações
cancerígenas, beneficiando toda a humanidade com os seus protestos por todo o
mundo. Recebam todas essas criaturas altruístas a admiração e o apoio de cada
um dos habitantes deste planeta, pela sua grandeza de espírito e pela sua
magnanimidade de propósitos.

No momento em que estas linhas são escritas (20/09/1997), os jornais noticiam


que Ted Turner, o magnata americano da televisão a cabo, acaba de doar US$ 1
bilhão à ONU - Organização das Nações Unidas, a serem aplicados nos
próximos dez anos na ajuda a refugiados de guerra, à saúde infantil, ao
desarmamento de minas terrestres e aos mais necessitados do mundo inteiro.
Devemo-nos rejubilar com tamanho gesto de altruísmo!
A amizade
A amizade é um dos mais nobres sentimentos, só ultrapassada pelo amor. Não se
concebe a amizade verdadeira sem sinceridade e confiança. Pela amizade
compartilhamos nossos sentimentos, nossos segredos mais íntimos com outra
pessoa a quem dedicamos toda a nossa estima, simpatia e consideração. A
verdadeira amizade implica em lealdade, acima de qualquer outra exigência. Um
leve sinal de desconfiança, deslealdade e traição rompe qualquer amizade e, daí
por diante, as relações sinceras não são mais possíveis.

Cícero, o grande tribuno romano da época do imperador Júlio Cesar, dizia: ‘‘A
primeira lei da amizade consiste em pedir aos amigos coisas honestas, em fazer
por eles coisas honestas. O amigo certo conhece-se nos momentos incertos’‘
[MARTINS, s.d., p. 113]. Honesto aqui tem o sentido amplo de certo, correto, de
que não se duvida. Pedir coisas honestas é esperar ouvir a verdade e só a
verdade, sem incerteza de espécie alguma. Ainda do mesmo Cícero: ‘‘Dentre
todas as sociedades, nenhuma é mais nobre, mais estável que os homens de bem
unidos pela conformidade e pela amizade’‘ [MARTINS, s.d., p. 113]. Ressalta-
se, novamente, a nobreza de sentimentos que deve existir em todas as
verdadeiras amizades.

A amizade pode se revestir de diferentes matizes, isto é, pode ser estudada


segundo diferentes pontos de vista. Primeiramente, temos a considerar a amizade
com pessoas sinceras: com estas nada temos a temer, pois retribuem um
sentimento recíproco de igual intensidade, desinteressado de valores materiais.
Em segundo lugar, temos a considerar a amizade com os falsos: esta será sempre
vantajosa para eles e, por isso, é preciso ter muito cuidado para aceitar a amizade
daqueles que não sendo retos, alardeiam a referida amizade, dizendo por aí, a
quase todo mundo, que são amigos de pessoas influentes e até dizem poder nos
ajudar. Há, ainda, um terceiro tipo de amizade que embora pareça constante,
envolvendo-nos por algum tempo, ao menor sinal de precisarmos de uma ajuda,
fogem de nosso convívio: é a amizade dos insinceros e hipócritas, dos
simuladores, dos aduladores, dos puxa-sacos. Vide, em outra parte desta obra, o
tema ‘‘A hipocrisia’‘.

Uma grande amizade firma-se no princípio da confiança recíproca e repousa na


simpatia e na sinceridade de sentimentos bons entre pessoas de bons
sentimentos. Um amigo fiel é um amigo firme, constante e quem o tem possui
um grande tesouro. Isso é bem diferente dos companheiros de mesa de bar e dos
encontros sociais que, na hora da desgraça, dizem não nos conhecer e até mudam
de calçada ou de direção quando nos encontram na rua. Na prosperidade estão
sempre do seu lado e, na penúria, fogem até da sua sombra. Ressaltamos, pois, o
princípio da reciprocidade, mediante o qual nenhuma qualidade nos
proporcionará mais amigos do que nossa disposição para admirar as qualidades
dos outros. Só assim poderá haver duplo pólo de harmonização desse nobre
sentimento que é a amizade. Graça Aranha dizia: ‘‘Quem possui um amigo pode
dizer que possui duas almas’‘ [MARTINS, s.d., p. 117], tamanha deve ser a
conjunção de sentimentos entre os verdadeiros amigos.

É preciso, porém, não querer obter demasiados favores de nossos amigos. Se um


amigo nosso não nos infligir nenhum desgosto ou ilusão, só por isto já devemos
sentir gratidão. Estaremos errando, isto sim, se esperarmos que nossos amigos
façam tudo por nós. Esperemos, sim, dos verdadeiros amigos, compreensão,
sintonia de sentimentos, uma palavra de consolo nos momentos difíceis.

Conhece-se um bom amigo pelo olhar, pelo aperto de mão, pelo abraço apertado
e comovido que com ele trocamos após longa ausência, indicando que nem o
tempo nem as distâncias podem quebrar os verdadeiros laços de amizade. Sendo
um sentimento livre e desinteressado, pode até tornar-se mais perfeito e puro que
o amor mundano.

Os amigos sinceros e constantes são muito raros e isso porque vivemos em um


mundo de interesses materiais. Os ideais que selam as grandes amizades só se
transformam em fraternal abraço ou aperto de mãos calorosas, símbolo da
amizade, quando os amigos comungam de igual modo e com a mesma
intensidade seus fundamentos e sua essência. Por isso, é preciso falar,
comunicar-se, vivenciar experiências comuns, pois não existe nada mais injusto
que um amigo que não fala com franqueza. Esta significa um modo mais aberto,
transparente, de coração e mente abertos, de entrega, de confidências e, portanto,
de plena e irrestrita confiança. Mas é preciso muito cuidado e discrição para não
entregar o melhor de seus sentimentos a quem não os merece, o que poderá
causar tremendos aborrecimentos, quando não significativas perdas financeiras.
Lembre-se que bastam poucos minutos para destruir antigas e boas amizades,
quando, em certos casos, não soubermos conter nosso ímpeto de falar
confidências e segredos que nos foram confiados por amigos, mesmo quando
fazemos isso de boa fé. Cada um de nós conhece muitas situações desagradáveis
criadas por não observarmos cuidados mínimos em nosso relacionamento
cotidiano, em que verdadeiros amigos foram transformados em implacáveis
inimigos. É, portanto, necessário observar que a verdadeira amizade requer uma
virtude honesta, conversação franca e aprazível e, obviamente, certa dose de
utilidade para ambos.

Cabem, finalmente, algumas palavras sobre a amizade entre um homem e uma


mulher. Aqui, além dos ingredientes essenciais à amizade já tratados, não
devemos ignorar a admiração que nasce e floresce um pelo outro. Quando esta
virtude ultrapassar ao nosso controle lógico, pode surgir e, freqüentemente surge
o amor, que é um sentimento de bem-querer mais forte e intenso que a amizade,
por ser muito possessivo. Veja também nesta obra, o tema ‘‘O AMOR’‘.

A amargura e a decepção pelas amizades perdidas foram maravilhosamente


retratadas no soneto ‘‘OS MEUS AMIGOS’‘ de Camilo Castello Branco,
escritor e romancista português do século XIX, que já cego, no final de sua vida,
nos legou e que reproduzimos, a seguir [CASTELO BRANCO, 1913, p. 240].

‘‘OS MEUS AMIGOS

Amigos cento e dez e talvez mais


Eu já contei!. Vaidades que eu sentia!
Pensei que sobre a terra não havia
Mais ditoso mortal entre os mortais.

Amigos cento e dez, tão serviçais,


Tão zelosos das leis da cortesia,
Que eu, já farto de os ver, me escapulia,
Às suas curvaturas vertebrais.

Um dia adoeci profundamente,


Ceguei. Dos cento e dez houve um somente
Que não desfez os laços quase rotos.

Que vamos nós (diziam) lá fazer?


Se ele está cego não nos pode ver...
Que cento e nove impávidos marotos!’‘

(O Conselho d’Estarreja, 17-10-1901)


O amor
Antes de considerarmos o amor em seus diversos aspectos, faz-se mister
constatarmos que a palavra amor tem um sentido muito amplo em todas as
línguas; daí, prestar-se a interpretações extremas, levando a grande maioria dos
seres a utilizarem-na fora do seu sentido mais puro e mais nobre. A despeito de o
ser humano, desde remotas eras, ter desenvolvido a linguagem, primeiro na
forma falada e só muito mais tarde na forma escrita, para se libertar do seu
isolamento e poder comunicar-se com outras pessoas e permitir que os outros
façam o mesmo, muitas vezes falhou neste objetivo, praticamente em todas as
culturas. A linguagem utiliza as palavras para planejar e organizar a sabedoria
(cultura) do passado, mas acima de tudo o ser humano aprendeu a usar as
palavras para pensar, sentir, criar e comunicar-se, transformando as idéias em
palavras e ações e os sentimentos em atitudes em face de si mesmo e dos seus
semelhantes. Nunca imaginou, porém, que poderia tornar-se escravo das
palavras. E isso porque, tal é o poder das palavras que elas, muitas vezes, são
confundidas com a própria coisa, como se fosse o próprio objeto,
materializando-se nele. Isto acontece não só com relação aos objetos, mas
principalmente com relação aos sentimentos. Daí, ser difícil nos livrarmos de
muitos ‘‘rótulos’‘ e ‘‘clichês’‘ que entronizaram o amor em todas as sociedades
modernas, banalizando-o de tal forma a se ajustar aos muitos e diferentes gostos,
quase sempre relacionados com a satisfação dos mais diversos prazeres
mundanos, geralmente de natureza instintiva e dominadora, englobando a ‘‘posse
do objeto do amor’‘.

Não devemos encarar o amor como uma necessidade material, pois isto é o que o
verdadeiro amor não é, conforme veremos mais adiante neste tema. Não se trata
de uma necessidade de posse, de possuir alguém ou alguma coisa. Nós não
possuímos nada, tudo nos é dado, emprestado ou mesmo conseguido a duras
penas para bem usarmos durante a nossa passagem pela Terra, servindo à
evolução do espírito e aqui ficando após a nossa partida. É comum
empobrecermos o sentido da palavra amor quando nos referimos a certos hábitos
materiais e, até mesmo, a hábitos culinários, cujo sentido de apoio deveria ser o
paladar. Ouvimos por ai dizerem: ‘‘eu amo comer chocolate’‘, ‘‘eu amo tomar
sorvete’‘, ‘‘eu amo pescar’‘, etc. Isto não é amar. Trata-se, isto sim, de expressar
preferências ou de dizer que isto ou aquilo nos satisfaz, como vivência
meramente material, onde o uso do verbo ‘‘gostar’‘ seria suficiente. Mas, jamais
expressará de forma profunda o que realmente é o amor. Portanto, temos que nos
afastar dessa idéia enganosa que tanto banaliza e que tanto deturpa o sentido da
palavra amor.

Algumas pessoas podem entender o amor como um sacrifício ou uma


dependência. Muitos outros pensam no amor como um relacionamento entre
homem e mulher numa referência ao amor sexual, usando inclusive a expressão
‘‘fazer amor’‘. Poucos consideram o amor como um puro sentimento espiritual.
Daí, depararmo-nos com diferentes visões ou entendimentos (não tipos) e, dentro
destes, com diversas gradações sobre o que seja o amor. Assim, para um homem
puro e esclarecido o amor é um constante e permanente estado de consciência
voltada para o bem geral; para o poeta, o amor é uma visão exagerada de alegria
e desilusão; já o filósofo, que tudo racionaliza, tem uma visão detalhada,
minuciosa, mas obscura do amor. A verdade é que o amor não se encaixa em
nenhuma dessas visões isoladamente, mas está contido em todas ao mesmo
tempo. É certo, também, que não existem ‘‘tipos’‘ de amor. O amor é
simplesmente o amor. Por isso, cada pessoa expressa o que sabe sobre o amor,
em diferentes graus ou intensidades. Mesmo para um determinado indivíduo, o
seu conceito de amor evolui, de forma bem diferenciada, em cada estágio de sua
vida, desde a infância até a velhice, mas de forma crescente.

Longe de nós pretendermos defender aqui uma tese sobre o amor, porque
estamos diante de um tema que jamais se esgotará, mesmo porque este não é o
objetivo de nossa despretensiosa obra, nem aqui existe espaço para isto. Vamos,
no entanto, procurar tratar de alguns de seus diferentes aspectos, não só frente a
uma visão espiritualista, como também, sob o ponto de vista mundano, através
do amor materialista, bem como do amor romântico. É o que faremos nas linhas
a seguir, na ordem indicada.

1. Visão espiritualista do amor

No sentido puramente espiritualista, preferimos reforçar a palavra amor com o


qualificativo ‘‘verdadeiro’‘, sempre que necessário, por ser responsável, sábio e
nobre, para fugirmos do amplo espectro de outros significados que esta palavra
abrange, conforme explicamos acima. Nós sabemos que tudo na vida é o
resultado de um longo aprendizado e depende de nosso empenho em
compreender porque temos que conviver em harmonia com os nossos
semelhantes, com outras pessoas. Também o amor não foge às regras do
aprendizado humano, embora o verdadeiro amor não aceite condicionantes, é
espontâneo, é uma força que se desdobra da própria espiritualidade das criaturas,
mas, como tudo na vida, precisa ser bem direcionado pelo livre-arbítrio para o
bem da humanidade em geral, mesmo quando, por falta de uma visão mais
ampla da vida, agimos por sentimentalismo. Que seja, pelo menos, um
sentimentalismo puro!

O amor é um atributo do espírito e está, portanto, inserido em todos os seres, na


forma de uma virtude nata, de uma qualidade nobre, mas que precisa ser
vivenciado com pleno respeito a idêntico sentimento existente em nossos
semelhantes, de modo a não se tornar, em ambos, uma força destrutiva, com
objetivos meramente instintivos. Na medida em que o ser ‘‘cresce’‘ em
espiritualidade, o sentimento do amor também crescerá em proporção direta com
ela, sobrepujando os instintos, que visam meramente à satisfação dos prazeres
materiais de nossos sentidos físicos. Como seres humanos que somos, seres
inteligentes, devemos estar bem cônscios dessa enorme diferença e não nos
deixarmos levar pelas aparências enganosas de nossos sentidos físicos.

Se cada um de nós não se sente satisfeito com o que entende ser o amor, então
devemos aprender o verdadeiro sentido do amor. Como? Através de uma
constante mudança de atitudes para podermos ‘‘crescer’‘ internamente. Esta
expressão ‘‘crescer internamente’‘, muito usada por falta de conhecimento de
muitos e comodismo de outros sobre o que seja a evolução do espírito, significa,
de fato, crescer espiritualmente, desenvolver os atributos espirituais, visando ao
aperfeiçoamento. Esse é o ponto chave, essencial mesmo, para a mudança, para
criarmos em nós mesmos um novo panorama, um novo paradigma.

O amor é o mais puro, o mais perfeito, o mais nobre dos sentimentos. A máxima
cristã nos conclama: ‘‘Amai-vos uns aos outros como a si mesmo’‘. Jesus, o
Cristo, nos legou esta preciosa mensagem não como um mero jogo de palavras
ou de intenções, mas como expressão de grandeza espiritual. A verdadeira
compreensão do amor tem que ser espontânea, flexível, libertária e justa, de
acordo com o grau de espiritualidade de cada um. Este princípio cristão
respalda-se no amor próprio e sugere que a criatura só pode amar de fato a
outrem se souber, primeiro, amar a si própria. Ninguém pode dar o que não tem
e, em se tratando do amor, isto é mais verdade ainda, porque o amor é um
constante dar e receber, sem exigências, sem segundas intenções de qualquer
espécie. Ou melhor, no verdadeiro amor, não se dá coisa alguma, mas
compartilha-se este sentimento na forma e na intensidade que cada um puder
senti-lo na intimidade mais profunda de seu ser, o que vale dizer, da sua
espiritualidade. Na verdade, esta máxima é um axioma da lei da atração e
repulsão ou de causa e efeito aplicada a este sentimento, que constitui,
espiritualmente falando, a principal meta da evolução espiritual, de nossas
trajetórias evolutivas nas numerosas encarnações por que passamos, pois o amor
está no ápice de todos os demais sentimentos virtuosos. Tudo visa a aprender
bem-querer aos nossos semelhantes, a nossos familiares e à humanidade em
geral. Enquanto não lapidarmos este sentimento ao máximo não estaremos
preparados para prosseguir nossa evolução em planos superiores, onde o
sentimento de amor, fraternidade e solidariedade se entrelaçam como se fossem
um só. Se nós nos deixarmos impulsionar nesta direção, haveremos de criar um
novo panorama, um novo paradigma em relação ao amor.

Um dos mais importantes aspectos associados com o sentimento do amor é o


sentimento de abnegação. A criatura recebe influências de toda parte, vive num
mar de influências. As pessoas captam as influências que, no seu entender,
melhor lhes aproveitem, de acordo com sua percepção do ambiente, das coisas
da vida e dos fenômenos que as cercam. As crianças não fogem a essas
influências, através do ambiente criado pelos pais, que têm a obrigação de lhes
transmitir uma adequada educação moral e, as escolas, a educação formal. Os
pais precisam saber avaliar e corrigir os possíveis conflitos que podem ocorrer e
freqüentemente ocorrem entre um e outro ambiente, procurando evitar que seus
filhos venham tornar-se robotizados por más influências captadas aqui e acolá.
Com esta atenção constante, evitam que seus filhos percam parte de suas
personalidades, por influência de companheiros menos preparados moralmente e
venham desajustar-se de um ambiente de carinho e amor responsável que lhes
dedicam com toda a compreensão e abnegação. Lembrem-se as mães que mimar
uma criança não é amá-la de verdade. Isto pode ser tendência de proteção ou até
mesmo de posse, que pode levar a uma concepção errada e obsessiva do que seja
o amor materno. Mas, também, devemos enaltecer a mãe que proporciona, com
desenvoltura e carinho derivado do seu espírito de abnegação, tantos gestos de
amor nas pequeninas coisas que faz no seu dia-a-dia, como, por exemplo,
preocupar-se e atender, com imensa paciência, a necessidade de alívio de uma
criança que está chorando noite adentro por ter molhado a fralda ou por sentir
dor de ouvido.

Um aspecto importante sempre associado com o verdadeiro amor é a


espontaneidade. Ela está contida na essência do amor e é preciso acreditar nisto.
Demonstre-o de forma espontânea, franca, moral, leal e sincera. Se outra ou
outras pessoas estiverem afinadas com essa idéia fundamental, então ela(s)
começa(m) a entender o que é a empatia - esta maravilhosa vibração, este
sentimento elevado que consiste em querer ser o outro, estar em seu lugar,
completá-lo, integrá-lo, como se fossem apenas um. Estaremos, então, sabendo o
que é vibrar em uníssono, conjuntamente, harmonicamente. Compreenderemos o
que é acordar de manhã e sentirmo-nos imensamente felizes, alegres, bem
dispostos para a vida. Simplesmente, procure ser você mesmo, não force nada.
Deixe o amor fluir com espontaneidade, sem se deixar enredar pelas artimanhas
do amor material, cuja essência é a idéia da ‘‘posse do objeto amado’‘, que
escraviza a ambos - aquele que ama e o que é amado. Passe a dar valor ao que
tem valor e deixe de dar valor ao que não tem valor - os objetos, a matéria
trabalhada, formatada para satisfazer necessidades meramente terrenas. Uma das
coisas mais difíceis neste mundo é sermos como as outras pessoas gostariam que
fôssemos. A questão é cada um se convencer de que é o que realmente pensa e
não o que os outros pensam que você é. Mas, lembre-se que ‘‘ser’‘ não é ser
ofensivo, ostensivo, egocêntrico; ‘‘ser’‘, de fato, é reconhecer-se como uma
individualidade única, porque não existe outra pessoa igual a você.

Vale notar, ainda, que o amor não é competição, nem sobrevivência, nem precisa
ser perfeito para sermos felizes, já que a perfeição não é própria deste mundo. Se
tudo fosse perfeito não precisaríamos fazer mais nada ou, então, as criaturas
sentiriam medo de fazer alguma coisa por não poderem fazê-la perfeita e isto
paralisaria a evolução, mola mestra da vida na Terra. Voltamos a insistir: tudo
está sempre dinamicamente em equilíbrio, mas em contínua mudança e a
perfeição absoluta não existe neste mundo Terra.

Gosto de pensar na seguinte situação: se cada um de nós tivermos uma moeda,


eu lhe der a minha e você me der a sua, cada um de nós ficamos com uma
moeda; se, porém, cada um de nós tivermos uma idéia, eu lhe der a minha e você
me der a sua, cada um de nós ficamos com duas idéias. No primeiro caso, temos
um bem material; no segundo, estamos lidando com um valor imaterial. Se
substituirmos a palavra ‘‘idéia’‘ pela palavra ‘‘amor’‘, nós temos uma situação
semelhante, e isto com qualquer outro sentimento, levando-nos ao entendimento
do que seja ‘‘compartilhar’‘, bem diferente do significado oferecido pela palavra
‘‘dar’‘. Então, ao compartilhar o meu sentimento de amor com alguém, eu não o
perco, não me empobreço; ao contrário, eu me enriqueço, eu me engrandeço.
Valorizando o meu conhecimento desse elevado sentimento, eu ‘‘cresço
internamente’‘, ganho pontos em minha espiritualidade. Portanto, vemos que o
amor visa compartilhar a grande diversidade de idéias altruísticas e sentimentos
elevados de modo não egoístico, não egocêntrico, de forma natural, sabendo que
ninguém pode nos tirar aquilo que possuímos de maior valia, que são os valores
e atributos espirituais, em que o amor está no ápice da pirâmide dos valores
virtuosos.

Gosto, também, de pensar no significado das seguintes palavras: o que pensamos


é menos do que sabemos; o que sabemos é menos do que amamos; o que
amamos é muito menos do que existe; e, até esse ponto, somos muito menos do
que deveríamos ser. Parece um jogo de palavras, mas não é. É muito profundo e
serve a muitas reflexões, principalmente para percebermos que todo o nosso
potencial está, ainda, por ser explorado e, isto inclui, certamente, o nosso
entendimento do que seja o amor. Estas palavras revelam-nos que somos únicos,
que temos uma individualidade ou personalidade a desenvolver e, nessa
caminhada, o amor deve ser incluído como um dos principais objetivos de nossa
busca eterna. Então, devemos nos compenetrar de que temos (somos) um ‘‘eu’‘,
uma individualidade própria em evolução, e isso é verdade para cada um dos
seres humanos. Daí, a necessidade de respeitarmos cada criatura, amando-a
como se amássemos a nós mesmos, embora sabendo que ninguém pode ser ou
estar no lugar do outro, o que vale dizer que o ‘‘eu espiritual’‘ é único, diferente
em cada um de nós. Diferente, por que? A diferença está no grau de
espiritualidade, não como um dom nem como um privilégio, mas como mérito
oriundo de valores adquiridos, cada um à sua vez, ao longo de suas trajetórias
evolutivas, vivenciadas em numerosas encarnações. Estas vivências se somam e
reaparecem, em cada encarnação, na forma de tendências que se revelam ao
longo de nossa vida, e isso não podemos mudar, pois trata-se do determinismo
universal, que, juntamente com o livre-arbítrio da criatura, moldam-lhe a
individualidade. Estes são os fatores essenciais de tudo o que somos, sentimos e
amamos. Por isso, é nosso dever estimularmos todas as pessoas com quem nos
relacionamos a se preocuparem com o real sentido da vida, que não decorre,
sabemos muito bem, de nossos limitados sentidos físicos que o amor terreno
pretende enaltecer.

Precisamos aprender a amar a contínua maravilha de estarmos vivos, reconhecer


que existe alegria e beleza em tudo que nos cerca. Olhemos as árvores, as flores,
os lírios do campo, as rosas, os pássaros, o rosto das pessoas e observemos que
não existem coisas iguais; existem coisas parecidas, nunca iguais. A água que
corre num rio agora nunca será a mesma, nunca houve o mesmo pôr de sol duas
vezes, nunca vivemos dois dias iguais em nossa vida. Tudo está em contínua
mudança a todo o tempo. A verdadeira beleza está nesta imensa diversidade de
formas e cores, nestas minudências, nestas pequenas maravilhas. Tudo isso para
dizermos que o amor se encontra por toda parte, é só querer vê-lo e senti-lo em
toda a sua profundidade e pujança. A isto chamamos dar valor à vida, observar e
compreender o seu verdadeiro sentido.

Então, precisamos nos compenetrar de que, para alcançar o verdadeiro amor,


devemos praticá-lo, mesmo nos menores atos do nosso dia-a-dia,
compreendendo os nossos semelhantes e suas necessidades, sendo fraternos com
nossos amigos, com as pessoas de nossa convivência, familiares ou não. Enfim,
devemos ser prestimosos, solidários e, sobretudo, respeitosos com a
independência que cada um deve ter sobre suas idéias, pensamentos, sentimentos
e atitudes face às circunstâncias do mundo Terra.

2. Visão materialista do amor

Não vamos nos estender muito sobre o amor materialista, mesmo porque este
impera, de forma flagrante, por toda a nossa sociedade. A mídia falada e escrita e
o cinema exaltam-no e expõem-no de todas as formas, de maneira ostensiva,
abusiva e até repugnante aos bons costumes. O recato e a intimidade deixaram
de existir; daí, assistirmos, de forma passiva, aos abusos de toda natureza que se
cometem em nome do amor. Por isso, desejamos, apenas, destacar alguns
aspectos de sua diferenciação marcante com a visão espiritual do amor, incluindo
o amor fantasioso dos grandes escritores e poetas de todos os tempos.

No amor materialista, o fulcro da questão está na ‘‘posse do objeto amado’‘ e,


portanto, no egocentrismo. Deixa de haver o desprendimento e a espontaneidade,
traços marcantes do amor espiritual. Então, as criaturas procuram o desfrute, o
gozo e os prazeres da vida, sem nenhum ou quase nenhum sentido de
compartilhamento, espontaneidade e responsabilidade. Tudo vale, desde que
proporcione prazer. Aqui os sentimentos associados são o egoísmo, o orgulho, a
desconfiança, o ciúme, a competição desonrosa, a ambição desmedida, os
desregramentos sexuais, a luxúria, enfim. Daí porque muitos amores se
transformam em verdadeiras paixões, de natureza doentia, geradas pela
insegurança, desfazendo-se naturalmente por falta de conteúdo e de respaldo
moral. Há, ainda, as anomalias enfermiças e doentias dos masoquistas,
sadomasoquistas e psicopatas de toda espécie dos quais não cuidaremos neste
tema, por serem objeto da moderna psiquiatria e da psicanálise.

Sabemos, também, que algumas satisfações emocionais são tão necessárias


como certas sensações de natureza física, como a fome, a sede, a falta de abrigo
etc. Entre as primeiras destacamos a frustração, o isolamento e a ansiedade,
emoções que, quando não satisfeitas, podem causar até maior dano que uma
simples privação física transitória, levando muitas criaturas ao estresse e até
mesmo à obsessão. Dentre as muitas necessidades psicológicas básicas próprias
do mundo físico, relacionados com o amor terreno, destacamos a de ser visto,
reconhecido, apreciado, escutado e acariciado pelo nosso semelhante,
principalmente pela criatura do sexo oposto. Mas, numa família bem formada,
numa sociedade mentalmente sã, o sexo responsável é natural e necessário para
promover a comunhão das criaturas e a continuidade das gerações futuras.
Então, precisamos aprender a trilhar este caminho, aprender com
responsabilidade o que precisa ser aprendido, pois o amor reconhece todas
aquelas necessidades, para que possamos olhar para ver, ouvir para escutar,
tocar para acariciar.

Se você ama uma pessoa você olha para ela com olhos de ver, já que pelo
sentido da visão recebemos 80% a 90% das informações que processamos, e
procura nela perceber idêntico afeto. Já a necessidade de ser ouvido nos leva a
lembrar que uma vibração sonora não se transforma em som, até que seja
ouvido, traduzido e interpretado pela nossa mente. Devemos não só ouvir o que
deve ser escutado, mas também, procurarmos não descartar a parte que não nos
convém, isto é, devemos abrir a nossa alma para entender o outro. E assim
também, com relação aos outros sentidos físicos, pois o amor ouve, o amor
escuta, o amor fala, o amor toca, o amor acaricia. Parodiando René Descartes, o
grande filósofo francês que instituiu o racionalismo filosófico e científico, com a
frase ‘‘Penso, logo existo’‘, poderíamos dizer, com base no materialismo, a frase
‘‘Toco, logo existo’‘, para significar que o sentido do tato é muito importante
para o amor terreno. Mas também, não devemos olhar, mesmo o amor material,
como sendo somente sexo, embora o poder do desejo sexual seja, de fato, muito
forte nas criaturas. Para que não haja repressão íntima dos sentidos, que tantos
males causa, levando tantas criaturas ao divã dos psicanalistas, precisamos
aprender a controlar nossos desejos malsãos mediante o bom uso de nossa
vontade, tudo encarando como natural, espontâneo e dentro das regras de uma
sociedade moralmente sadia, para evitar o amor puramente animalesco.

3. Visão romãntica do amor

Muitos escritores, romancistas e a grande maioria dos poetas enaltecem o amor


de forma fantasiosa, imaginosa e requintada, constituindo um grande repertório
da literatura mundial de todos os tempos e de todos os povos. Se a intenção for
boa, nada há a condenar em tais arroubos, trazendo grande deleite às criaturas
românticas e cultas. Porém, há nos poetas e filósofos muita ambigüidade sobre o
que seja o amor. É o que veremos nos parágrafos seguintes, a título de exemplo,
inclusive com algumas citações.

O amor é criança que dorme com toda a sua pureza e acorda cheia de vida. É
pássaro que canta ainda de madrugada, anunciando a nova aurora cheia de graça.
É o perfume de uma flor a nos inebriar os sentidos. A natureza inteira é Amor.

O amor é um sentimento tão profundo em sua essência que quem se dedicar a


estudá-lo nunca deixará de ser um eterno aprendiz. Ele ilumina nossa vida de tal
forma que, uma vez conhecido em toda a sua grandeza, não se pode mais passar
sem ele, integrando de forma definitiva a essência de nosso ser. E, como uma luz
nas trevas, alumiará nossos caminhos pela vida afora. É o tesouro da vida,
morando no mais profundo de nosso ser e quem pretender defini-lo com clareza
certamente passará por tolo.

O amor é um hino ao Criador. Através do amor podemos compreendê-lo melhor


em toda a sua pureza e plenitude. Cantemos este hino em todos os momentos de
nossa vida através de nossas boas ações. O amor é próprio do Criador: dele
emana, a ele retorna. Ama ao Criador quem ama todas as coisas, todos os seres
viventes que percorrem os caminhos da evolução até chegar a Ele. Portanto,
façamos do amor a nossa estrela-guia de cada dia.

O amor é a própria razão da vida. É a sua base, a sua essência, o propósito


mesmo de nossa existência. Somente através dele chegaremos a conhecer a nós
mesmos e a compreendermos a razão do mundo e da vida.

É preciso não confundir amor com prazeres mundanos: nestes impera o desejo,
naquele governa a comunhão espiritual que transmite o amor puro e verdadeiro.

O amor feminino reconcilia as grandes dores por que passa a mulher,


transformando-as em vibrações de amor. La Fontaine dizia: ‘‘Amai, amai, que
tudo mais é nada!’‘ [MARTINS, s.d., p. 120]

O grande filósofo de nossos tempos, Krishnamurti, disse: ‘‘Estar em comunhão é


amar. Não havendo amor não se pode apagar o passado. Amai e o tempo deixa
de existir. A vida é a imortalidade do amor. No amor não existem ‘‘tu’‘ nem
‘‘eu’‘‘‘ [MARTINS, s.d., p. 119]. E eu completo: no amor ‘‘somos’‘.
O amor consagra quem o pratica e enche de benesses quem o recebe. Mas, e o
amor recíproco, correspondido? Existe também, embora muito mais raro. Mas
ele leva a uma consagração dupla, porque mútua. Esta consagração é a
verdadeira comunhão.

E como amar de verdade? No dizer de Machado de Assis está a resposta: ‘‘Cada


qual sabe amar a seu modo, o modo pouco importa. O essencial é que saiba
amar.’‘ Só a escola da vida ensina-nos a amar. Ainda de Machado de Assis:
‘‘Amar e ser amado é, neste mundo, a tarefa melhor de nossa espécie tão cheia
de outras que não valem nada.’‘ [MARTINS, s.d., p. 121].

Viver no amor, com amor e pelo amor é um dos maiores desafios da vida!

É do inigualável escritor luso Luiz de Camões, o seguinte soneto extraído de


uma de suas obras, onde o poeta procura mostrar os paradoxos e as contradições
do Amor. Diante destas contradições só resta ao poeta a indagação final, sem
resposta plausível. Este soneto é famoso por ser, também, um prenúncio do
movimento barroco [PASSONI, s.d.m p. 19].

‘‘Amor é fogo que arde sem se ver;

É ferida que dói e não se sente;

É um contentamento descontente;

É dor que desatina sem doer;

É um não querer mais que bem querer;

É solitário andar por entre gente;

É nunca contentar-se de contente;

É cuidar que se ganha em se perder.

É querer estar preso por vontade;

É servir a quem vence, o vencedor;

É ter com quem nos mata lealdade.


Mas como causar pode seu favor

Nos corações humanos a amizade,

Se tão contrário a si é o mesmo Amor?’‘

Finalmente concluímos: o amor é como o aroma de uma rosa, que não basta
senti-la; é preciso vê-la e tocá-la para possuí-la por inteiro.
A atitude
A atitude perante a vida é a nossa disposição de poder influenciar os nossos
pensamentos e os nossos atos, conforme é apresentado nesta obra sob o tema ‘‘O
LIVRE-ARBÍTRIO’‘. Da convicção de que nosso pensamento e nossa saúde
ampliam ou restringem nossas possibilidades perante a vida, nasce nossa atitude
com a sua marca característica para cada criatura. A atitude que assumirmos dirá
em que direção iremos e os resultados que colheremos. Uma atitude correta e
positiva influencia, de acordo com nossos desejos, os fatos, as nossas ações e as
pessoas que nos cercam.

O papel do pensamento é fundamental na adoção de uma atitude correta. Ele


traça os limites de nossas possibilidades. A criatura será aquilo que o seu
pensamento determinar, desde que ponha em ação uma forte força de vontade
para realizá-lo. É o pensamento que eleva ou detém a ascensão da criatura na
escala social. Quem adotar uma atitude modesta, humilde, sem muito esforço, só
fazendo o que os outros lhe dizem para fazer, seu alcance não vai muito além do
seu nariz. Ao contrário, quem se dispuser a lutar com denodo, com muita garra,
traçando metas bem definidas, colocando otimismo e entusiasmo em toda e
qualquer tarefa que vier realizar, por mais simples que seja, alcançará, sem
dúvida alguma, resultados satisfatórios que, por um processo de reativação e
reafirmação da vontade, o levará sempre a progredir materialmente e a avançar
espiritualmente. Esta é a base da boa luta que levará a criatura a aumentar o seu
poder de iniciativa, de comando e de liderança. O dinheiro que vier ganhar é
uma conseqüência, um prêmio a mais, de que ela deverá fazer bom uso.

Quanto à saúde, esta depende também de nossos pensamentos, de nossa higiene


física e mental. Um grande número de doenças é de natureza espiritual,
deflagradas pelo mau uso do pensamento e do livre-arbítrio. Tais doenças são
somatizadas, isto é, inseridas, impressas e incubadas no corpo da criatura,
localizando-se ou se dispersando pelo organismo. Um exemplo típico é o
estresse, causado pelo excesso de trabalho realizado sob o impulso de excesso de
compromissos assumidos pela criatura, definido pela alta ansiedade que dela
toma posse. Outra causa bastante comum de doença psicossomática está nos
vícios de qualquer tipo que a criatura adquiriu. Mas não trataremos do aspecto
saúde aqui, já que foge à natureza intrínseca do presente tema. Foi apenas
mencionada para mostrar que ela influi direta e reciprocamente nos resultados, já
que afeta a própria base de nossas atitudes.

Não tome uma atitude sob ameaça ou constrangimento que possa,


automaticamente, colocar as pessoas com quem temos de tratar de negócios ou
mesmo de qualquer assunto em guarda ou em posição de defesa, criando uma
atmosfera negativa, pessimista, que certamente bloqueará a obtenção de bons
resultados.

Todos os que vivem em sociedade, principalmente nas grandes cidades, em que


as pessoas mal se conhecem, mesmo no seu ambiente de trabalho, deverão
adotar uma boa postura e uma atitude correta e, dependendo do seu cargo, é
conveniente apresentarem-se esmeradamente vestidos com trajes adequados,
barba sempre raspada, cabelo bem penteado, mas, tudo sem afetação. Estes
cuidados infundirão atitude respeitosa aos demais, sejam seus superiores ou seus
subordinados, já que percebem que sua postura é positiva, e o efeito causado é
de respeito absoluto. Não estou dizendo que a roupa faz o homem, mas ajuda
bastante no trato social. Mas é preciso muito cuidado para não cair no ridículo e
parecer cafona, já que a roupa tem que ser adequada ao ambiente e seguir as
regras da etiqueta social. O segredo aqui chama-se comedimento, nada de
exageros.

De outro lado, é preciso não parecer bom demais nem pretensioso. A vaidade e a
soberba são sentimentos funestos que levam as pessoas a se afastarem da criatura
que ostenta esses sentimentos. Ninguém gosta de ser amigo ou de colaborar com
uma criatura ‘‘metida’‘, orgulhosa, que anda sempre de nariz em pé. É preciso,
sim, ser humilde, mas não deixar-se humilhar. Colocado de uma forma um tanto
poética, podemos dizer que o mundo é um espelho no qual refletimos nossos
pensamentos e nossas ações: se sorrirmos, ele nos sorrirá; se nos apresentarmos
de cara fechada e de mau humor, ele nos fará carranca. Em outras palavras,
recebemos aquilo que formos capazes de dar. Esta é a forma de assumirmos
sempre uma atitude ativa, positiva. Ninguém melhor do que Dale Carnegie
ensinou a difundir isso em seus conhecidíssimos livros Como fazer amigos e
influenciar pessoas [CARNEGIE, 1970] e Como evitar preocupações e começar
a viver [CARNEGIE, 1972].

Se a criatura quiser submeter os acontecimentos à sua vontade, é preciso, em


primeiro lugar, dominar a si mesmo e, em segundo lugar, colocar-se em
harmonia com o mundo, isto é, com os nossos semelhantes, com as leis
universais, que são naturais e imutáveis. Disso, tratamos no tema ‘‘A
HARMONIA’‘, apresentado nesta obra.

A pessoa quando nasce traz em estado embrionário todos os recursos de que


precisa para bem cumprir sua trajetória evolutiva neste mundo. Parte desses
recursos está impressa no código genético e a outra parte, a mais importante,
deriva da força de seu espírito que, através do pensamento, da vontade e do
livre-arbítrio, as três alavancas poderosas da criatura, manifesta o seu verdadeiro
‘‘eu’‘, ou seja, o conjunto de qualidades e dons necessários aos embates na luta
pela vida. Tudo o que é preciso para vencer os obstáculos e travar a boa luta pela
vida através do trabalho honrado e digno é se compenetrar dessas verdades:
lembrar-se sempre de seu influxo ancestral (hereditariedade ou herança genética)
e das vibrações do pensamento, força de vontade e livre-arbítrio. Este, quando
mal dirigido, atrai o mal; ao contrário, quando usado para fazer o bem, atrai
forças positivas que fazem a criatura evoluir cada vez mais e vencer com
galhardia todos os problemas que a afetam. Basta querer e manifestar esses dons,
basta exercitá-los na forma apropriada para que logo surjam como forças
soberanas a influenciar o sucesso de nossos atos.

Devemos ser repetitivos sim, quando a repetição nos leva a consolidar em nossa
mente o valor desses dons, que todos temos, não é privilégio de ninguém. Mas
aquele que usa esses dons naturais de forma apropriada e toma a atitude de quem
de fato sabe que os possui, e os torna conscientes em cada momento do seu
viver, ganhará, pelo menos, metade das lutas pela vida, antes mesmo de se
desencadearem os problemas e, pelo raciocínio e o bom uso que vier fazer do
livre-arbítrio, ganhará a outra metade. Em outras palavras, a criatura que assim
proceder estará dotada de tranqüilidade e serena certeza de vencer todas as
dificuldades que se lhe antepõem. Estará, finalmente, assumindo a atitude de um
ser livre, sem antolhos, que caminha de cabeça erguida, que sabe qual é o seu
verdadeiro papel na vida, procedendo sempre de acordo com sua consciência,
liberto das sugestões maléficas e livre das influências negativas de toda sorte de
que o nosso ambiente terreno está repleto. Saberá não dar ouvidos a boatos e
mexericos, não dispensando atenção a falsos amigos ou pessoas interesseiras,
que só querem ver a desgraça e a infelicidade alheia. Não se exasperará nunca,
será benevolente, grato às boas ajudas que vier receber, receptivo às boas idéias,
indiferente ou desapegado das coisas materiais, trabalhará com afinco e sempre
satisfeito, saberá afastar a ansiedade e o estresse de seu caminho. Enfim, saberá
viver de acordo com os preceitos cristãos e será, de fato, um homem.

Resta-nos dizer algumas poucas palavras sobre a atitude perante o trabalho.


Dedique-se ao trabalho com amor, satisfação e denodo, pois nenhum poder
humano poderá dar tanto alívio em troca, qualquer que seja a profissão ou por
mais penoso que ele seja. O trabalho é uma poderosa alavanca para o progresso,
e enobrece o homem. Lembre-se do ditado popular: ‘‘A ociosidade é a mãe de
todos os males’‘. Quando não trabalhar por conta própria, a criatura deve cuidar
de manter o seu emprego, usando o máximo de sua competência, carinho e
empenho na realização das tarefas que lhe couber.

Portanto, manter uma atitude sempre positiva e otimista é um dever de todos


aqueles que desejarem ser bem sucedidos em tudo o que vierem fazer na vida.
A bondade
Fazer o Bem sem olhar a quem, eis o ditado popular que constitui um dos
mandamentos da Moral cristã e, portanto, daqueles que são bons.

Praticam a bondade todos aqueles que respeitando a si próprios, respeitam seus


semelhantes.

Estas duas máximas são complemento uma da outra. As pessoas são boas e
nascem boas em sua essência: a má educação e a luta pela sobrevivência,
disputando muitas vezes as necessidades mais imediatas, é que levam muitos a
tornarem-se maus, empregando a violência para realizarem seus desejos e
ambições. Outras vezes, as criaturas afastam-se do caminho do Bem pela
ambição, desenvolvida para a ganância de bens materiais, pela obtenção
desmedida de riquezas, ou mesmo pela desenfreada luta pelo poder político,
social ou religioso, colocando suas ambições acima do bem comum.

Quando praticada com extremo empenho e dedicação, a bondade pode assumir a


forma de caridade, entendida como tal toda a forma de bondade que leva as
pessoas a distribuírem bens materiais ou se dedicarem aos mais necessitados, aos
que têm fome, aos miseráveis e até mesmo àqueles que tudo perderam em
catástrofes e calamidades. Mas é preciso também saber que, em certos casos, a
caridade pode retardar a reação do indivíduo que está passando por
necessidades; por isso, a moderação pode ser a melhor virtude a nos aconselhar a
não praticar a caridade em excesso. É bom notar que, quem pratica a bondade ou
a caridade com o objetivo de obter prestígio ou alcançar aplausos da sociedade
ou da mídia certamente não faz caridade, porque está tentando obter vantagens
ou reconhecimento.

São de Benjamin Constant estas palavras: ‘‘Viver pelos outros, viver em todos e
em cada um, como sentimos os nossos semelhantes viverem em nós mesmos, eis
o verdadeiro destino dos homens’‘ [MARTINS, s.d., p. 138].

Uma boa ação praticada com altruísmo, de forma pura, discreta, sem segundas
intenções, produz um confortante prazer na criatura. É, possivelmente, a única
ação que pode e deve ser feita às escondidas ou mesmo na calada da noite.

O Bem e a Bondade triunfarão sempre, embora temporariamente, o império do


Mal possa parecer tomar-lhes a dianteira. Mas, o Mal logo tropeça em suas
próprias armadilhas, nas dores e sofrimentos que causa, nos tormentos que cria e
no remorso que cedo ou tarde advém de sua prática.

Tampouco nos devemos envergonhar de praticar o Bem por indicação alheia,


pois assim abrimos nossos corações aos bons conselheiros.

Muitas são as formas de Bondade: ela é visível nas mães que aconselham os
filhos, no transeunte que ajuda um deficiente físico a atravessar uma rua de
muito trânsito, na professorinha que, com carinho e dedicação, ensina as
primeiras letras a seus alunos e, em tantos e numerosos outros exemplos de
nosso cotidiano.

A Bondade desarma os homens que, com sua agressividade, pretendem a ela se


opor; se fosse levada a sério entre os homens, as nações e seus governantes
muito diminuiria a desigualdade entre os povos e, as guerras, em curto prazo,
desapareceriam da face da Terra.

Disse o Marquês de Maricá: ‘‘A bondade é sempre feliz e oportuna quando a


prudência a dirige e a recomenda’‘ [MARTINS, s.d., p. 148].

Parece haver uma retroalimentação na prática das boas ações, que consiste em
induzir e estimular as pessoas a praticarem outras maiores e melhores. Este
processo é uma avenida de duas direções que leva as pessoas boas a dividirem
com os necessitados parte de sua vitalidade e sua boa fortuna. Sófocles, o antigo
filósofo grego, já dizia: ‘‘A coisa mais bela consiste em ser útil ao próximo’‘
[MARTINS, s.d., p. 151]. Ou, na palavra de Thoreau, ‘‘A mais nobre missão do
ser humano é prestar ajuda ao seu semelhante por todos os meios ao seu
alcance’‘ [MARTINS, s.d., p. 151].

Os verdadeiros cristãos, aqueles que colocam o seu livre-arbítrio a serviço do


Bem, nunca prejudicando ninguém, praticam a Bondade e trazem a paz consigo
mesmos, no seu íntimo, em todas as ações de suas vidas.

Felizes os que semeiam o Bem!

A confiança

A confiança é um sentimento positivo e própria das criaturas fortes e firmes em


seu modo de pensar e agir. Ela deriva diretamente do conhecimento, da
convicção e da energia que nunca faltam àqueles que agem com lógica, bom
senso, probidade e integridade espiritual.

Devemos considerar sob este tema dois aspectos da confiança, a saber: a


confiança em si mesmo ou autoconfiança e, de uma maneira mais ampla, a
confiança que inspiramos ao nosso semelhante, vista em nós sob o ponto de vista
deste.

1. A autoconfiança

A autoconfiança é uma força muito grande que impulsiona a criatura a enfrentar


desafios com uma força de vontade e talento imbatíveis. Os valores espirituais,
no seu conjunto, constituem o caráter do ser, uma espécie de marca registrada, de
impressão digital espiritual que torna a criatura única no seu modo de agir, no
seu comportamento e temperamento. Trata-se enfim, de características
interiorizadas e exteriorizáveis que exprimem a real conduta de cada um de nós.

A confiança que depositamos em nós mesmos é função de uma série de fatores,


dentre os quais destacamos a fortaleza de espírito, a força de vontade elevada, o
alto idealismo, a autodisciplina, as experiências anteriores bem sucedidas, a
obstinação, a segurança, a convicção, o entusiasmo e o dom de liderar e
comandar outras pessoas.

A força de vontade, o idealismo e o entusiasmo são tratados em outras partes


desta obra. Vamos desdobrar, de maneira sucinta, os demais fatores
intervenientes.

A fortaleza de espírito decorre de nossa natural disposição para enfrentar


desafios, vencer obstáculos, encontrar soluções sempre as mais perfeitas
possíveis para nossos problemas. A fortaleza de espírito é a convicção, a certeza
que o indivíduo tem em si mesmo de que não falhará em suas tarefas e o que lhe
permite sempre buscar assumir maiores responsabilidades perante si mesmo, no
lar e na sociedade. É ela que induz uma causação circular progressiva que acaba
por realimentar a confiança e a nossa capacidade de prontidão, tema já tratado
em outra parte desta obra. Pela prontidão, nós damos resposta imediata às nossas
decisões para a solução dos problemas, não deixando para amanhã o que pode
ser feito hoje. O cumprimento fiel e reiterado deste lema é essencial, é
fundamental para garantir os efeitos imediatos e positivos da ação das criaturas
em qualquer atividade humana.
As experiências anteriores bem sucedidas reconduzem o nosso esforço no
sentido de pensar e fazer melhor aquilo que já fizemos antes. Isto alarga e
concentra o nosso discernimento, a nossa acuidade mental para fazer sempre
escolhas acertadas, ajuda a marcar a diretriz de nossas decisões sem sombra de
dúvida, sem medo de errar. Ou seja, com as experiências anteriores formamos
um cabedal que nos ajuda a reduzir a probabilidade de erros e falhas.

Pelo idealismo nós nos amparamos em idéias bem concebidas e maduras,


planejadas com lógica e bom senso, procurando afastar todos os fatores
adversos. Com ele, nós formatamos o perfil ideal que garantirá o sucesso de
nossos projetos, tendo uma visão bem clara deles antes de executá-los,
submetendo-os a uma depuração prévia para diminuir os riscos da empreitada.
Com isso, fechamos a corrente que nos conduzirá com entusiasmo ao sucesso.
Veja também, nesta obra o tema ‘‘O entusiasmo’‘.

A autodisciplina se orienta no sentido de exigir o controle firme e seguro da


vontade para que essa possa atuar de acordo com certos princípios rígidos de
respeito que assumimos conosco mesmo. Principalmente os princípios que
implicam em sinceridade, moralidade e justiça. São valores a preservar a
qualquer custo, a realçar acima de quaisquer outros como os de caráter
financeiro, por exemplo. Pela autodisciplina reforçamos a verdadeira crença em
nosso próprio poder, pois quem crê em si não se impressiona com a falta de
recursos, com a influência de certos meios, com a crítica fácil e graciosa de
certas pessoas que não enxergam um palmo adiante do nariz. Com empenho e
esforço nada deterá a criatura, e sua autodisciplina se tornará cada vez mais forte
e determinada. Devemos ser rígidos nos princípios, determinados nas decisões e
flexíveis no uso dos recursos durante a execução.

A obstinação é a insistência, a persistência com que executamos nossos projetos.


Este sentimento é tão forte que contamina a todos de forma a acabarem por
adotar os nossos pontos de vista. Ela transmite uma certeza tão grande,
portentosa mesmo, que recebemos a adesão até mesmo da mais renitente das
criaturas, quebrando a oposição, granjeando admiração. Este dom nos leva a
comandar em qualquer situação, com satisfação de nossos comandados, nele se
destacando a nossa capacidade de liderar. A liderança é um comando aceito sem
resistência, não imposto, de adesão espontânea aos nossos propósitos.

A segurança é uma conseqüência, o resultado certo de tudo aquilo que fazemos


seguindo os princípios e fatores já mencionados. Ela é a eliminação quase
completa do risco, já que a confiança nos leva a trabalhar ‘‘com risco
calculado’‘, com a prudência previsível. É preciso dizer que a falibilidade
humana é própria deste mundo e da imperfeição humana, principalmente quando
se procura realizar o melhor, o superior, o mais perfeito. Mas se riscarmos do
nosso dicionário, na faina diária, a palavra fracasso e o conteúdo que ela encerra
de negativo, venceremos sempre, apresentando resultados ou produtos da mais
alta confiabilidade.

2. A confiança induzida

A confiança que inspiramos aos nossos semelhantes é o reflexo natural da nossa


autoconfiança. Ela resulta do reconhecimento alheio espontâneo ao nosso
comportamento insuspeito, probo, digno, honrado. Granjeamos confiança porque
cumprimos com a nossa palavra, honramos nossos compromissos como
devedores financeiros ou pela palavra empenhada nos atos mais simples de
nossa vida de relação como, por exemplo, nos encontros com hora marcada.

Recebemos confiança porque respeitamos os nossos semelhantes, porque


sabemos ouvir o que têm a dizer, porque não os apoquentamos com ninharias ou
tolices de qualquer tipo, porque oferecemos ajuda nas ocasiões difíceis, porque
não nos deixamos assaltar por incertezas ou tibieza, porque mantemos a calma e
a paciência nos momentos mais difíceis e de desentendimentos, porque nos
mantemos equilibrados, porque nunca lhes faltamos quando nos pedem um bom
conselho.

Oferecendo de boa vontade orientação quando nos pedem, dentro de nossa


experiência de vida ou de nossa especialização na profissão que escolhemos,
oferecendo um ombro amigo para abrirem seus corações, estaremos criando
outra condição muito especial, muito poderosa, conhecida por empatia. Esta tem
o poder de aproximar pessoas de sentimentos semelhantes, que comungam do
mesmo ideal, sendo a base das grandes amizades. A iniciativa das pessoas no
sentido de uma ajudar a outra, unindo-as por um sentimento de fraternidade, é o
fruto maior e mais saboroso que a confiança entre duas ou mais pessoas poderá
esperar.

A confiança, no seu sentido mais amplo, está presente em todas as atividades


humanas. Temos de ter confiança no motorista do ônibus, no piloto de uma
aeronave, no maquinista de um trem. Temos de ter confiança no mercado
financeiro e nos banqueiros que têm o dever de zelar pelo nosso dinheiro. Temos
que contar com a confiança dos homens de negócio, dos empreendedores, dos
industriais e dos comerciantes que garantem a qualidade dos produtos que
compramos e proporcionam empregos a milhões e milhões de criaturas, graças
ao seu espírito de iniciativa e boas ambições.

Enfim, sem a confiança, imperando a desconfiança, o mundo seria insuportável e


o progresso humano e a evolução espiritual teriam um ritmo desalentador. Não
haveria crédito, só descrédito. Os negócios e as transações não se realizariam e o
esforço seria enorme para sairmos do caos e do pandemônio que se instalaria
neste planeta.
A coragem
A coragem é um sentimento muito forte que precisa ser cultivado por aqueles
que têm fortaleza de espírito. A maior coragem consiste em enfrentar as
responsabilidades que toda criatura tem para consigo mesma e com terceiros
durante toda a sua vida. É, portanto, um sentimento nobre e para consegui-lo é
preciso saber dominar nossas fraquezas e temores.

Não encontramos a coragem só nos heróis, isto é, naqueles que nos campos de
batalha são intrépidos e agem com bravura e ousadia, vencendo o inimigo seja a
que custo for. Não é preciso enfrentar desafetos ou provocar brigas para
demonstrar coragem, isto é, a coragem não significa só ir às vias de fato e vencer
o seu contendor.

A verdadeira coragem implica em encarar as privações e o sacrifício, em expor-


se a sérios perigos para conseguir o que é mais meritório e valioso. Aqueles que
são levados pelas circunstâncias a enfrentar a adversidade sem perder o
entusiasmo e prosseguir em sua missão, qualquer que ela seja, sem
esmorecimento, lutando com persistência, com paciência e sublime compreensão
até alcançarem seus objetivos, são os corajosos anônimos de que o mundo está
cheio de exemplos.

O verdadeiro heroísmo, que resulta da grandeza dos atos de coragem, brilha pelo
seu conteúdo de abnegação, generosidade e espírito de sacrifício. É preciso
distinguir o corajoso do exibicionista; este precisa de um cenário armado para se
portar como tal e aquele, ao contrário, pratica uma coragem desprendida e sem
exteriorizações.

Não se pode louvar o herói que espera a recompensa do elogio, já que a coragem
deste dificilmente poderá ter impulsos construtivos e generosos, que brotam do
próprio espírito, cuja vontade realmente soberana entrega-se de ‘‘moto próprio’‘
às realizações altruísticas e de grande beleza em sua essência. Somente aqueles
que possuírem um espírito bastante generoso são capazes de grandes sacrifícios,
incondicionalmente praticados em prol de seus semelhantes. Nesses casos, até
mesmo gestos que possam parecer insignificantes, podem produzir resultados
inesperados e de grande efeito.

Vemos, pois, que os sentimentos de coragem, arrojo e heroísmo estão


intimamente interligados. Maior e mais eficiente será o nosso trabalho quanto
mais atuarem estas virtudes para produzi-lo de forma a beneficiar nossos
semelhantes. Viveremos assim com menos temores e inquietações, podendo
dedicar maior empenho e maior gosto às ações de maior relevo e aos
empreendimentos de maior significado espiritual.

Essas qualidades não devem ser usadas somente para as grandes ocasiões;
servem também para podermos suportar nossos próprios erros, para superar
nossas próprias dificuldades e propiciar melhor entendimento com os nossos
semelhantes. Não raro, essas e outras grandes virtudes sobressaem-se quando
dedicadas a pequenas causas. Por exemplo, sem desmerecer a coragem para
salvar alguém que esteja se afogando ou devorado pelas chamas de um incêndio,
há também coragem para se esforçar e procurar evitar uma provocação ou uma
frase ferina e insultuosa dirigida a outra pessoa.
A criatividade
A criatividade é um atributo ou predicado do espírito da mais alta valia para a
criatura e também para o progresso material da humanidade. Criatividade,
conforme o próprio nome o diz, é o poder de criar. Pertence à mesma raiz, à
mesma etimologia, a palavra Criador, para indicar, para sugerir e significar a
Força Criadora, a Inteligência Universal ou Deus, para usar a palavra preferida
por quase todas as religiões. No sentido prático, criatividade é o ato de fazer
qualquer coisa de modo diferente do que era feito antes, desde que mais fácil,
mais útil e preferivelmente, mais econômico. Criar é dar existência a alguma
coisa que nos interessa, é tirar algo do nada ou do quase nada, dar origem a algo
útil, enfim, é inventar, descobrir o novo. Criatividade tem, portanto, o mesmo
sentido que inventividade. Milhares e milhares de livros e artigos têm sido
escritos sobre criatividade, mas este tema tem apenas o intuito de enfocar seus
fundamentos e importância para o progresso humano.

A criatividade tem seus fundamentos na intuição, na experiência, nas


necessidades. A intuição, também chamada por inspiração por muitos inventores
e pesquisadores, desempenha um papel fundamental nesta cadeia de eventos. A
intuição é uma força de natureza espiritual que direciona a mente da criatura para
a solução mais imediata dos desafios, minimizando as tentativas e os erros,
economizando tempo e dinheiro para atingir o alvo ou o objetivo com mais
acerto e precisão. É pela intuição que é canalizado o ‘‘fluxo’‘ das idéias para a
solução dos problemas. Para usá-la com eficácia é preciso ter a mente calma,
concentração nos problemas a resolver e harmonia com as Forças Universais
Superiores, procurando atingir uma sintonia precisa com as mesmas, ainda que
inconscientemente ou de forma imperceptível à criatura. Parece complicado, mas
não é. As idéias fluem em lampejos, rápidas e diretas. Só é preciso ter
sensibilidade para captá-las e pô-las em prática, sem perda de tempo.

A parte prática da criatividade não prescinde da experiência. Esta é mãe de todos


os erros e a predecessora de todos os acertos. Erra-se com a experiência, que por
sua vez nos leva aos acertos. Observe o desenvolvimento de uma criança que,
desde que nasceu, aprende com o método das tentativas e erros, única forma de
achar o caminho para o seu aprendizado. Nessa determinação, inata na criatura
de sempre experimentar, está a origem da persistência, que nada mais é do que
sempre tentar, tentar sempre enfrentando riscos, perdendo o medo, esta grande
barreira à evolução humana. É preciso se imbuir, se dar conta de que a
experiência é um dos pilares da vida terrena. Vivenciando experiências,
observando e experimentando com moderação as necessidades que a vida nos
impõe, lutando para vencer os desejos malsãos, fazendo perguntas, procurando
respostas racionais para os problemas estaremos criando condições de pautar a
nossa vida no caminho do reto viver.

As necessidades, o terceiro ingrediente, provêm da observação. A criatividade


também não prescinde da observação que, por sua vez, deriva da curiosidade.
Observação e curiosidade andam de mãos dadas no processo criativo. A criatura
criativa vale-se da intuição, observação e curiosidade, sempre à procura de idéias
para trabalhá-las e testá-las pela experimentação. A criatura criativa está sempre
procurando ir além das rotinas e superar obstáculos, explorando novos rumos,
novas rotas. Ela sabe, ainda que intuitivamente, o que é uma estrutura de
decisão, como examinar alternativas e como selecionar o que parece ser a
escolha mais interessante para a solução de seu problema. E o sucesso vem,
porque persiste e porque pensa só no que está fazendo, afastando toda a distração
que atravessar o seu caminho no momento da criação. Veja também nesta obra
os temas ‘‘A curiosidade’‘ e ‘‘A concentração’‘, importantes para entender
completamente como se processam os mecanismos que intervêm na criatividade.

Às vezes pensamos muito em determinado problema e não encontramos solução


imediata para ele. Esta pode vir a qualquer momento após deixarmos a mente
descansar, através de ‘‘insights’‘ ou lampejos, em qualquer lugar que estejamos:
no banheiro, no chuveiro, andando, guiando o carro, enfim, quando menos se
espera. Isto porque a mente continua trabalhando as idéias, inconscientemente,
recebendo intuições e fazendo associações entre as idéias e a experiência já
adquiridas e registradas em nossa memória. Parecemos perdidos, absortos em
nossos pensamentos, mas estes não param nunca, a não ser quando dormimos.
De repente, lá vem a solução que procurávamos para o problema. E então, é
comum exclamarmos: ‘‘Como é que não tinha pensado nisso antes!’‘ Isto parece
confirmar que toda criatura é criativa, bastando colocar o seu potencial espiritual
em ação.

A criatividade é um processo superior de evolução em que as forças interiores da


criatura são propositadamente dirigidas para a solução dos problemas que
enfrentam de uma forma mais direta que os rotineiros, que sempre fazem tudo da
mesma maneira, escravizados que estão às rotinas da vida. A criatividade, dessa
forma, de uma maneira mais ampla e abrangente, é essencial para se ter uma
vida mais vibrante. Basta ter interesse, procurar caminhos, fazer escolhas e testá-
las.

A criatura verdadeiramente criativa não deve ter medo de cometer erros nem de
trabalhar com pessoas mais inteligentes que ela própria, algumas até tidas como
excêntricas ou mesmo ‘‘malucas’‘, dadas ao hábito de sonhar acordadas. Aliás,
em muitos casos, após árduo trabalho na busca de uma solução, o sono e os
sonhos podem apontar e têm apontado pistas e soluções quase inacreditáveis que
resolvem o problema procurado. Encontramos a criatividade em toda parte e
todas as pessoas, em maior ou menor grau, possuem criatividade para avançar
em determinada área mas não em outra, ou seja, ninguém é bom em tudo.
Einstein era um músico medíocre, mas foi um gênio da matemática e da física. É
preciso pois, procurar em que campo e em que ramo do conhecimento humano a
pessoa tem habilidades e aptidões para se desenvolver nela.

Foi a criatividade que levou Thomaz Alva Edison a desenvolver mais de 2000
inventos, destacando-se entre eles a invenção da lâmpada elétrica. Este inventor
foi um ‘‘self-made-man’‘, um autodidata que não possuía nenhum diploma
universitário. Perguntado como se tornara um gênio da invenção, respondia:
‘‘com 90% de trabalho e 10% de inspiração’‘. Palavras bem acertadas, porque
seu sucesso fundamentava-se no método das tentativas e erros, na
experimentação persistente e paciente. Para se ter uma idéia da sua persistência,
menciona-se que para descobrir o material ideal para o filamento da sua lâmpada
teve que testar mais de 1000 materiais até chegar ao tungstênio. Este foi um
exemplo de trabalho isolado, como o foi o de Louis Pasteur no campo da
medicina. Esse tipo de trabalho seria quase impossível hoje, substituído que foi
por grandes equipes de pesquisadores em laboratórios sofisticadíssimos,
conforme mencionaremos mais adiante. É óbvio que o trabalho em grupo, em
equipe, desenvolve-se com maior rapidez graças à cooperação e à confiança que
surgem entre os membros dos grupos de pesquisadores.

A criatividade, quando exercida em grupo mediante técnicas apropriadas,


planejadas e orientadas por pessoas dotadas de espírito criador, de poder
interpessoal, que têm habilidade de lidar não só com problemas mas também
com pessoas, conduz a resultados surpreendentes. Milhares de organizações de
pesquisa em todo o mundo, em todos os ramos do saber humano, empregam
grupos de pesquisadores com conhecimentos e inteligências específicas,
dirigidas a determinadas especializações para descobrirem novas invenções,
novos produtos, novas máquinas maravilhosas. Estas equipes de cientistas e
técnicos trabalham solidariamente, por profissão. As organizações recebem
bilhões de dólares de recursos por ano da própria empresa, de fundações
filantrópicas ou do governo. Por isso, a ciência e a tecnologia têm avançado a
passos largos, muitas vezes, infelizmente, é preciso que se diga, para tornarem
mais ricas e poderosas algumas nações do planeta, concentrando cada vez mais,
nas mãos de poucos, a riqueza da Terra que deveria pertencer e beneficiar a
todos os habitantes de todas as nações.

Apesar dos interesses e das ambições materialistas de algumas nações que,


possuindo 5% a 10% da população, utilizam mais de 50% dos recursos minerais
e energéticos do planeta, há alguns campos da ciência e da tecnologia que têm se
difundido mais que outros. É o caso da medicina, da agricultura e da
biotecnologia, a despeito de certas barreiras impostas pelas patentes e direitos de
propriedade intelectual. O progresso da medicina, principalmente da medicina
reparatória, tem sido simplesmente fantástico, onde a criatividade não está
encontrando limites. A revolução da biotecnologia está apenas começando,
abrindo novas fronteiras do conhecimento sobre a genética, com o projeto
genoma, com participação internacional. Esses conhecimentos vão influenciar o
tratamento do câncer e de outras doenças genéticas, além de contribuir para a
pesquisa sobre o envelhecimento celular e a capacidade de prolongar a vida. Está
em marcha a modificação de organismos para produzir substâncias úteis para a
medicina. Com a técnica da clonagem, virão as modificações genéticas em
animais, que contribuirão para mais eficaz transplante de órgãos. Na agricultura,
os progressos não têm sido menos surpreendentes. Novas e melhores culturas
estão sendo praticadas com maiores e melhores colheitas por hectare plantado, o
que vale dizer maior produtividade. Tudo isso devido à criatividade que permeia
e se difunde entre os laboratórios de todo o mundo.

Não estaria completo este tema se não abordássemos, ainda que de relance, a
área de comunicações e informática e seus inter-relacionamentos. Estas
tecnologias estão na vanguarda do conhecimento humano, permitindo a sua
rápida e até instantânea difusão às entidades e institutos de pesquisas envolvidos
através de redes de comunicação mundial, como a internet e as intranets. Com
esses recursos, os pesquisadores nem precisam se deslocar de um país para
outro, estando a todo tempo em contato uns com os outros, através de
teleconferências, com o que se ganha tempo para enfrentar muitos desafios com
eficácia.
A curiosidade
A curiosidade é uma faculdade do espírito, pela qual as criaturas desenvolvem os
sentidos e a acuidade mental num processo que consiste em pesquisar o meio
ambiente e desvendar os seus segredos, para melhor adaptar-se às exigências da
vida. Através dela, as criaturas descobrem também os perigos que as cercam
para poder evitá-los, como acontece durante o desenvolvimento das crianças. É
ainda, a curiosidade que leva o ser humano a abrir novos horizontes, rasgando o
véu do desconhecido, descobrindo, inventando e desenvolvendo novas maneiras
de tornar a vida mais fácil e útil, alavancando o progresso, retirando satisfação
do seu trabalho e dando conforto ao corpo e ao espírito. Ser curioso é fazer
perguntas, indagar, pesquisar e analisar para obter e realizar o conhecimento, as
descobertas e as conquistas as mais notáveis.

Devemos considerar a curiosidade natural, ampla e irrestrita, peculiar às


criaturas em geral, e as curiosidades particulares e específicas de certas
profissões, como ocorrem com os cientistas, biólogos, astrônomos e tantos
outros. Qualquer que ela seja, varia com a educação recebida na infância, a
inteligência, o grau de espiritualidade e as inclinações específicas das criaturas.
Nos curtos de espírito ela atua de maneira simples, mas sempre existe. Nas
pessoas mais evoluídas, intelectualmente falando, a curiosidade age com muita
força, como já citado em outra parte desta obra: nos cientistas em todos os ramos
da ciência, trabalhando em grandes grupos ou em equipes nos laboratórios das
universidades, dos institutos especializados ou de grandes empresas industriais.
Aqui, a curiosidade se manifesta como verdadeira fome ou apetite intelectual
através do instinto indagador.

O instinto indagador já se manifesta desde a mais tenra idade na grande maioria


das crianças, através de perguntas insistentes e freqüentes sobre quase tudo que
seus sentidos apreendem. Fazem perguntas como: o que é isto?, de onde vem
aquilo?, como se chama isso?, por que é assim? e tantas outras que começam
com as seis palavras mágicas: o que, quem, quando, onde, por que e como.
Procuram assim satisfazer o desejo de saber, de aprender o que é útil, de como se
comportar diante das coisas e situações estranhas e com as quais se defrontam
pela primeira vez.

Na criatura curiosa os sentidos estão sempre aguçados, vigilantes, em


permanente estado de alerta. Os pais têm o dever de despertar a curiosidade dos
filhos, orientando-a para coisas boas que tragam satisfação e utilidade, que
induzam ao desenvolvimento intelectual. É preciso dirigir sua atenção para as
coisas da natureza e seus fenômenos, seja no reino mineral, vegetal ou animal.
Ensinar-lhes a conservar o ambiente natural, a preservar as espécies. Viver em
harmonia com a natureza é dever obrigatório no desenvolvimento da criança.
Boas escolas e movimentos culturais juvenis estão ajudando, em todo o mundo,
a completar a sua educação. Esta é a postura certa e os tipos de estímulos que
convêm.

É preciso lembrar para ter certos cuidados. A curiosidade e o medo correm


paralelos na criança, principalmente na infância. Por isso, é preciso não forçar
nada, para não ir além dos limites desejáveis. O objetivo deve sempre ser
enriquecê-la através da experiência, com conhecimentos úteis. Na primeira
infância, até os dois anos de idade, aproveitar o interesse dela pela luz, sons,
ruídos e objetos coloridos ou não que se encontram ao seu redor e que lhes
causem espanto, transformando o seu aprendizado em satisfação e motivo de
alegria e prazer. Nessa fase, é preciso fazê-la perder o medo para se concentrar
no que lhe interessa mais, embora tenha-se que ter muito cuidado e atenção
quando ela começar a andar e mexer em tudo. O mais importante é nunca
recusar atenção à curiosidade infantil, mas estimulá-la ao máximo, sem contudo
chegar ao exagero.

A curiosidade deve ser bem orientada, principalmente quando diz respeito ao


sexo. Todas as perguntas devem ser respondidas com naturalidade, sem exageros
e sem evasivas, que podem tornar-se perigosas. Muitos desvios de personalidade
da criança nascem de posturas impróprias adotadas pelos pais nesta fase. É
preciso, pois, muito cuidado nesse relacionamento, onde a confiança, a
naturalidade e a sinceridade devem prevalecer.

A curiosidade se manifesta nos medíocres e nos vulgares quase sempre sob a


forma de estupefação. A qualquer novidade, ficam boquiabertos e estupefatos.
Satisfazem-se perante seus parentes e amigos em simplesmente poder dizer que
viram alguma coisa ou evento, sem saber o seu real sentido, o que representa e
qual o seu valor de fato. Exemplos desses tipos o mundo está cheio, como a
estupefação que causou quando o homem pisou na Lua pela primeira vez.
Muitos até nem acreditaram, tamanha era a ingenuidade de certas pessoas.

A curiosidade como sentimento propulsor das iniciativas da criatura instiga a


argúcia e é fecunda. Através dela os sentidos são aguçados para conhecer a
natureza das coisas, o seu valor utilitário, investigando a criatura tudo que
redunda em benefício próprio e coletivo. A curiosidade aliada ao raciocínio, que
serve para aferir tudo que a criatura consolida como saber e conhecimento, são
os atributos de maior alcance para o progresso na sua precípua função de
devassar o desconhecido.

Melhor seria para o progresso da humanidade se as criaturas usassem o poder da


curiosidade para orientar os pais sobre o seu verdadeiro papel, mostrando-lhes a
grande responsabilidade que lhes cabe na educação dos filhos para o bem das
futuras gerações. Daí, ser necessário dirigir a curiosidade para os problemas de
ordem superior, orientando-a para práticas sadias e dentro da moral cristã. Para
isso, é preciso saber ouvir os palestrantes e estes saberem despertar a curiosidade
dos ouvintes para, se possível, atingirem até mesmo os pobres de espírito.

É fora de dúvida que, em qualquer meio ou cultura, a curiosidade e a inteligência


andam de mãos dadas e uma se dispõe em função da outra. Quanto mais
inteligente a criatura, mais curiosa é ela e mais sabe despertar a curiosidade dos
que lhe seguem com naturalidade e maestria. Não é difícil identificar o curioso
nas conversações ou em palestras: há um primeiro grupo em que as pessoas
ouvem e demonstram interesse por um ou mais assuntos; num segundo grupo, as
pessoas ouvem, perguntam e fazem considerações com ou sem propósitos; no
terceiro grupo, as pessoas interrompem a palestra e procuram mudar de assunto e
mostram-se impacientes; finalmente, no quarto grupo, só encontramos as que
querem ser ouvidas, as que não sabem ouvir e só querem falar. No primeiro
grupo e, em menor grau no segundo, encontram-se os curiosos. A incapacidade
de ouvir sem interromper demonstra falta de curiosidade, falta de educação e
falta de polidez.

A curiosidade pode, também, ser usada como elemento ou fator de distração e


lazer, como em certos jogos para crianças, quebra-cabeças e palavras cruzadas.
Os modernos programas de jogos de multimídia para computadores exploram a
curiosidade de muitos consumidores de passatempo.

Finalmente, devemos assinalar que existe a curiosidade mórbida, voltada para as


fofocas e devassa da vida alheia. Há criaturas, com estreiteza mental, com
comportamentos desprezíveis, totalmente entregues à prática de frivolidades e
futilidades que adentram os lares para conhecer sentimentos íntimos, que se
preocupam com a miséria e intrigas alheias para comentá-las com outros, numa
demonstração inequívoca de mau caráter. Este tipo negativo de curiosidade
existe, também, nas colunas sociais e, sob outros aspectos, na espionagem
industrial, onde ela se transforma em profissão para obter e revelar segredos
industriais a concorrentes de marcas, produtos e processos. A espionagem
industrial é condenável através de leis sobre patentes e registro industrial de
marcas em quase todos os países do mundo moderno.
A dignidade
A dignidade é um sentimento que requer alto valor moral. É, portanto, uma
qualidade espiritual positiva e nobre. Sendo um atributo do bom caráter, o
homem digno é encontrado em todas as camadas sociais. A dignidade implica no
uso da liberdade com autonomia para poder não se vergar ao domínio e
exploração que as criaturas mais bem dotadas, materialmente falando, impõem
sobre os pobres, miseráveis e desassistidos. A dignidade soma, integra e inclui
engenho e virtude.

Quem é digno possui firmeza de espírito, é firme em suas opiniões, não se


acumplicia com opiniões alheias e até desafiam-na se isto for necessário para
salvar a sua. Quem é digno sabe renunciar a qualquer cargo, posição ou bem
material quando for chegada a hora, já que nunca trai seus ideais. Onde faltar a
dignidade não existirá sentimento de honra. Assim, o homem digno é sempre
honrado e jamais será escravo, capacho ou joguete de alguém. Jamais será
arrebanhado.

Não será exagero considerar a coragem como sendo a primeira das eloqüências,
pois a coragem integra o caráter. Ambas essas virtudes, coragem e caráter
possuem-nas o homem digno que respalda suas ações em direção à perfeição. Os
homens dignos sabem refletir quando convém agir; já os fracos agem sem
refletir. O mérito das ações que empreendem é medido pelo esforço que
requerem e não pelos seus resultados.

Escreveu José Ingenieros: ‘‘Sem coragem não há honra’‘ [INGENIEROS, 1953,


p. 157]. A dignidade, que está sempre associada à honra, podemos vê-la na
atitude dos sábios e cientistas que procuram abrir as novas fronteiras da ciência;
está também, nos moralistas que abrem para si e para os outros os caminhos do
Bem; pode ser vista em todas as pessoas de atitudes firmes, para resistirem às
tentações e vícios de toda espécie; é encontrada ainda, em gestos extremos,
como nos mártires que foram para a fogueira por desmascararem a tirania
religiosa e a hipocrisia, ou até naqueles que num gesto extremo, ateiam fogo às
suas vestes por não aceitarem a violência e a tirania.

O homem digno jamais pede o que merece, nem tampouco aceita o imerecido. O
homem digno é insubornável, incorruptível. Quando aspira a um cargo, seja nas
empresas, seja na política ou no serviço público, não sobe por favoritismo, mas
por mérito e pelas suas virtudes.

O homem digno abomina qualquer favor, só aceita o que pode ser dado por
mérito e guarda esse orgulho, o bom orgulho, acima de tudo, conservando-se
erguido e incólume. Por isso jamais se rebaixará, preferindo perder um direito a
obter um favor.

Por tomar atitudes assim tão definidas e sem recortes, as criaturas dignas são, na
maior parte das vezes, solitárias. Seu recolhimento é quase sempre uma
constante, a não ser que possa estar com seus iguais.

O homem digno é obstinado e leva em consideração não depender de ninguém;


procura garantir a sua independência material com trabalho sério e árduo, porque
sabe que, perdida esta, sua honra estará exposta às pressões dos poderosos. Por
isso procura garantir, com seu trabalho, posição de independência no futuro. Ele
luta para fugir da miséria e da pobreza, para poder alcançar um ideal mais
elevado, um trabalho menos servil e mais agradável, vencendo com sobranceria
os desafios da vida.

Segundo os estóicos, o segredo da dignidade estava em cada um contentar-se


com o que tem, restringindo suas próprias necessidades. Mas esta não é uma boa
lição, já que o progresso material pode levar, embora não seja esta a regra,
muitos a acumularem fortuna, dela fazendo bom uso em benefício dos
necessitados, redimindo-se de uma vida desgastada e que de outra forma se
tornaria medíocre e inútil. Muitas fundações e instituições que difundem a
cultura e as artes respondem por estas honrosas exceções.

Em contraposição aos estóicos, preferimos levar a mensagem de que os únicos


bens verdadeiros não são os materiais, mas os valores que se consolidam em
nossas mentes e em nossos corações, em função das boas ações que viermos
praticar usando nosso livre-arbítrio para o bem. Quando estas deixam de existir,
nenhum tesouro poderá substituí-las.

José Ingenieros nos transmitiu estas linhas: ‘‘Inflexíveis e tenazes, porque trazem
no coração uma fé sem dúvidas, uma convicção que não trepida, uma energia
indômita que não cede, nem teme coisa alguma, costumam manifestar asperezas
urticantes para com os homens amorfos. Em alguns casos podem ser altruístas,
ou porque são cristãos, na mais alta acepção do vocábulo, ou porque são
profundamente afetivos; apresentam então, um dos caracteres mais sublimes,
mais esplendidamente belos que tanto honram a natureza humana. São os santos
da honra, os poetas da dignidade. Sendo heróis, perdoam as covardias dos
outros; sempre vitoriosos em face de si mesmos, compadecem-se dos que, na
batalha da vida, semeiam, feita em pedaços sua própria dignidade. Se a
estatística pudesse nos dizer o número dos homens que possuem este caráter, em
cada nação, essa cifra bastaria, por si só, melhor do que qualquer outra, para nos
indicar o valor moral de um povo’‘ [INGENIEROS, 1953, p. 161].
O entusiasmo
O entusiasmo é a energia que leva as criaturas a um estado de inspiração e
otimismo, exaltando-lhes sua capacidade criadora e induzindo nelas o desejo de
ser útil a seu semelhante. Essa energia mantém o indivíduo em alto astral, com a
vitalidade espiritual virtualmente aumentada. Sem otimismo e entusiasmo, vive-
se em baixa pressão, em baixo astral, como se diz na gíria.

Esta palavra provém do grego e significa ‘‘Deus dentro do homem’‘. É um


significado nobre, sublime em si mesmo, em sua essência e está intimamente
associada ao otimismo. Ninguém pode derrotar um entusiasta. Sua determinação
é invencível. Carregado de impulsos e energias vitais, o entusiasta enfrenta tudo
e desconhece a derrota.

Os otimistas assumem sempre uma atitude positiva sobre todas as coisas belas da
vida. São os que melhor compreendem o valor do pensamento positivo e
enfrentam todos os tropeços que encontram com galhardia, superando-os.
Desconhecem o desespero e o sufoco porque, agindo inteligentemente, com
método e disciplina, sabem contrapor-se com maior energia às dificuldades e aos
conflitos que se lhes apresentam. No dizer de N. D. Lafuerza, notável educador:
‘‘O otimista acende luzes onde quer que se ache; o pessimista apaga as poucas
que encontra. Na escuridão tudo parece desarranjado’‘ [LA FUERZA, s.d., p.
55]. Em outras palavras, os otimistas contam sempre com maior poder de fogo,
estão armados com os estímulos necessários a atingir seus objetivos, sem
caminhar por veredas sem saída.

O entusiasta caminha sempre de cabeça erguida e aumenta o seu valor diante dos
conflitos. Não se detém à beira do caminho, não desiste nunca, persevera
sempre, sendo a esperança bem fundada a luz que alumia seu caminho. Nunca se
lamenta de nada. Acostumado a usar a razão para decidir sobre os problemas e
guiar-lhe os passos, sempre chega onde quer chegar. Esforça-se sempre para
resolver seus problemas, investigando e analisando serenamente os fatos. Encara
com responsabilidade seus deveres e obrigações e os cumpre todos. Não se
desgasta antecipadamente avolumando os problemas que não existem nem se
deixa aniquilar quando o peso deles pareça intransponível.

É inquestionável que o homem tem de lutar, sendo também verdade


incontrastável que a criatura encontre satisfação para suas grandes esperanças e
necessidades na ação construtora e positiva que vier empreender. Entreguemo-
nos, pois, à luta com entusiasmo e otimismo, focalizando nossos objetivos de
forma prudente, sensata e racional. Assim procedendo, a vitória será certa, o
progresso deixa de ser uma esperança para se tornar realidade tanto no plano
material como no plano espiritual.

Não permita nunca que a chama do entusiasmo se extinga. Não se deixe abater
por nada mesmo diante das maiores decepções; antes, faça com que as derrotas e
as vicissitudes da vida lhe revigorem o espírito. Em muitas ocasiões, o desânimo
virá bater-lhe à porta; não perca a calma nem o vigor de suas convicções,
realimente-se com energia redobrada e persista, persista sempre que a vitória
será sempre o seu troféu, desde que seus objetivos sejam elevados, sadios e
dirigidos para o Bem. Em outras ocasiões, haverá momentos difíceis em que
parece estar só; não se deixe então abater ou contaminar-se com pensamentos
negativos que estimulam ações negativas. Nessas situações reaja de imediato,
induzindo otimismo e entusiasmo em seus pensamentos, de modo a aumentar a
sua confiança e poder de visão bem além do horizonte e perceber perspectivas
melhores e mais atraentes.

O entusiasmo proporciona energia a nossos projetos e ações, tornando-os bem


sucedidos. Sem o entusiasmo nada de grande, de eficaz, de meritório se realiza.
Temos, pois, que ser entusiastas em todas as nossas ações. Façamos todo o nosso
trabalho com gosto, satisfação e carinho, inclusive quando tivermos que arcar
com serviços difíceis e penosos. Exaltemos, pois, nossa dedicação ao trabalho
que é uma poderosa alavanca para o progresso material e evolução espiritual.

É preciso não confundir ‘‘o fogo de palha’‘ com o ardor do entusiasmo. Os


entusiastas do primeiro tipo possuem uma pseudo-energia, uma animação fugaz
e passageira, enquanto que o verdadeiro entusiasta carrega um entusiasmo ativo,
tenaz como o aço, trabalha e age sem desfalecimento.

Com relação ao otimista cabe notar a diferença que existe entre o otimista
‘‘apático’‘, que não age, mas espera sossegadamente que tudo venha acontecer a
seu contento e o otimista ‘‘ativo’‘ que reconhece, identifica as oportunidades e
luta por elas com entusiasmo, na hora, fazendo acontecer os resultados com seu
trabalho fecundo, muitas vezes árduo.

Só restam umas poucas palavras sobre os pessimistas: estes esgotam suas


energias em vãs censuras e recriminações, adotam posições hostis, são
insensatos e não se esforçam para que os bons resultados sejam obtidos.
A felicidade
A felicidade é um sentimento nobre e positivo em que a criatura se sente
contente e realizada, satisfeita consigo mesma, que entende e aceita os encargos
da vida com satisfação e naturalidade. Ser feliz é cumprir os seus deveres com
prazer e satisfação, sabendo dar à vida a sua verdadeira dimensão e, portanto,
estar de bem com a vida. Ser feliz é reconhecer a sua essência espiritual e vibrar
de alegria e contentamento, valorizando e dignificando todos os grandes
atributos do espírito em cada momento de sua vida. A felicidade é, portanto, um
processo de crescimento e evolução espiritual duradouro, permanente e que
consiste em eliminar ou pelo menos lutar e tentar afastar as frustrações de seu
caminho. Não é fácil ser feliz, mas é possível, como veremos no desdobrar deste
tema.

Na prática, a felicidade resulta da forma como nós construímos nossa auto-


estima ou amor-próprio. Veja o tema ‘‘O AMOR-PRÓPRIO’‘ em outra parte
desta obra. A auto-estima é uma imagem de nós mesmos, que criamos
mentalmente para caracterizar nossa personalidade, nossa maneira de ser e agir.
É a maneira como nos vemos e sentimos no contexto entre as demais criaturas,
nossos semelhantes. É a maneira como nos identificamos perante o próximo e
perante nós mesmos. Apagar essa imagem leva à decepção e, por um momento,
sentimo-nos deprimidos e frustrados. Com o tempo, com nossas vivências ou
experiências da vida, vamos aprendendo a redirecionar nossas energias para um
caminho mais realista, vamos crescendo espiritualmente e ganhando confiança
em nós mesmos. Este é um processo permanente de realização espiritual e
adaptação à realidade material.

Nessa realidade em que a criatura se insere, a pessoa é avaliada segundo três


pontos de vista: no seu próprio ponto de vista ela é o que pensa ser; na ótica de
seus semelhantes, ela é o que os outros pensam dela; e, na verdadeira essência,
ela é o que é, o que deve ser de fato, um espírito encarnado em evolução. Daí
resulta toda uma necessidade de adaptação à realidade para não ter que viver
atrelada às ilusões e frustrações, e disso tudo extrair a alegria de viver e ser feliz.
A felicidade só será possível, então, mediante esse entendimento, essa sabedoria
que reside na aceitação de que não somos perfeitos e temos que evoluir para a
perfeição. E, como não há evolução sem dores e sofrimentos, compete a cada um
esforçar-se para, pelo menos, obter paz e serenidade, e conseguir viver com uma
felicidade relativa, já que a felicidade absoluta não é possível neste mundo,
porque não há desprendimento nem desapego às coisas e valores materiais nos
quais se fixam ilusoriamente os interesses humanos. Pelo fato de a felicidade não
admitir comparações, cada um a tem ou a terá no exato limite de sua sabedoria
de vida. Não existe felicidade sem espiritualização do ser. Por isso mesmo, não
se deve confundir felicidade com lazer ou prazer, do mesmo modo que não se
deve confundir sabedoria com conhecimento ou cultura.

Foi dito, linhas atrás, que a felicidade é um processo de realização espiritual e de


adaptação à realidade material. Sendo um processo, ela tem uma duração -
princípio, meio e fim. Para que ela ocorra, é preciso afastar toda a frustração e
não buscar nenhuma finalidade, nenhum significado especial, a não ser o de
procurar sentir o estado de graça que ela proporciona à criatura, uma paz interior
muito grande e uma serenidade inexcedível. Mas, a felicidade não é permanente,
é efêmera, passageira. Logo vêm os novos problemas que nos tomam toda a
atenção e novos cuidados são necessários para enfrentá-los e resolvê-los. Então,
caímos de novo na realidade da vida terrena.

Sem teorizar muito, vamos passar aos aspectos práticos que, dominados pela
criatura, poderão fazê-la feliz, embora gozando de uma felicidade relativa.
Vamos desdobrar esses aspectos ou pré-requisitos em dez atitudes para a
felicidade, sem maior preocupação de manter uma linha divisória entre elas. A
palavra atitude é usada aqui com o significado de um esforço interior da criatura
para criar seu próprio ambiente de felicidade.

PRIMEIRA ATITUDE: Adapte o conceito de felicidade à sua personalidade

Para poder reconhecer a felicidade em nós é preciso provar, ter passado pelos
sentimentos que se lhe contrapõem como a tristeza, a dor, o sofrimento e a
melancolia. Embora as criaturas prefiram a alegria, ninguém consegue se livrar
por inteiro da dor e do sofrimento. Para tentar anular este efeito, temos que nos
esforçar para aumentar o nosso bem-estar, usando os seguintes recursos ou
ingredientes básicos:

1) Manter relações de simpatia, empatia, amizade e intimidade com as pessoas.

2) Selecionar pessoas e amigos e estreitar a confiança recíproca com eles.

3) Melhorar sempre o sentimento de auto-aceitação, gostando de si mesmo.


4) Identificar seus padrões pessoais e manter a sua autonomia de pensar e agir.

5) Não imitar os padrões dos outros: a felicidade não admite comparações.

6) Criar o seu ambiente, ou seja, o seu pequeno mundo e sentir-se confortável.

7) Não se isolar e esforçar-se para aumentar o seu crescimento pessoal.

8) Ser flexível e tolerante, requisitos essenciais para a sua espiritualização.

9) Ter objetivos na sua vida e lutar pelos seus ideais - isso é a própria felicidade.

É preciso não confundir felicidade com estados de ânimo efêmeros em que a


euforia embriaga os sentidos. O bem-estar psicológico repousa em desafios
duros que requerem esforço e disciplina, podendo entrar em conflito com a
felicidade passageira.

A felicidade não é uma emoção tão efêmera quantos alguns possam imaginar.
Ela é um sentimento tranqüilo e bom que a criatura experimenta quando,
enfrentando os embates da vida, vence-os um a um. É, de fato, a percepção da
criatura de que possui uma força muito poderosa, capaz de superar tudo e, ao
final dos embates, sentir-se feliz.

Erra aquele que pensa que a felicidade é o oposto da tristeza: o oposto desta é a
alegria, a qual nem sempre está associada à felicidade. A felicidade é uma
espécie de graça que convocamos para vencer a tristeza. Ela não desaparece nos
tempos difíceis, apenas assume outra forma. A busca da felicidade não deve ser
uma fuga para longe da dor ou sofrimento; antes, devemos pensar no sofrimento
como uma prova de seu grande potencial para atingir a felicidade. Sabemos
também, que não se pode sentir alegria sem ter experimentado a tristeza.

SEGUNDA ATITUDE: Não aceite insinuações, nem as suas próprias

Ao redefinir e adaptar os critérios e conceitos de felicidade, assegure-se de que


essa definição é mesmo sua, ou seja, a que melhor se ajusta à sua personalidade.
Muitas pessoas vivem a nos fazer insinuações, para tomar esta ou aquela
decisão, para nos comportar da forma como elas estão acostumadas. Não aceite,
sem a devida análise, os conselhos recebidos de terceiros, que muitas vezes não
sabem resolver nem os seus próprios problemas. Portanto, rechace e fuja dos
‘‘você deve fazer isso ou aquilo’‘, sugeridos ou insinuados por outras pessoas e
até mesmo por amigos. Seja você mesmo.

TERCEIRA ATITUDE: Não tenha medo de ser feliz

Nunca use a infelicidade como desculpa. Há pessoas felizes, mesmo quando


provenientes de famílias problemáticas que aprenderam a lidar com suas
dificuldades e vencer os seus conflitos. Tais criaturas sabem que são
competentes quando enfrentam situações de crise e não têm medo de falhar, mas
em situações mais tranqüilas podem não se sentir tão eficazes. Devido à sua
incansável coragem, essas pessoas transformam a angústia que poderiam sentir
em fonte de conforto e auto-estima.

Em contraste, há pessoas que sempre viveram sem problemas aparentes e não


conseguem ser felizes. Tiveram uma boa educação, bons colégios, muitas
facilidades e excessos de liberdade. Mas, provavelmente, não receberam dos pais
bons ensinamentos e exemplos edificantes no ambiente familiar. Diante de um
contexto tão variado e incerto, a criatura, para se afirmar, não deve ter medo de
ser feliz. Precisa, apenas, descobrir um meio, uma forma própria para ser feliz. É
recomendável não se assustar, não esmorecer, face à enormidade dos problemas.
Procure fazer as coisas em doses pequenas, pois, muitas vezes, não há como
cuidar de todos os seus problemas de uma só vez, muito menos dos problemas
dos outros.

QUARTA ATITUDE: Escolha outro caminho, dê outra solução

Há varias maneiras de vencer um obstáculo. Procure descobrir qual é o melhor


caminho para cada caso. Encare cada obstáculo sob diversos pontos de vista. Se
você não perceber que ele existe, poderá ser vítima de seu descuido ou da
maldade de muitas pessoas. Outra possibilidade é perceber que ele existe, mas
deve ignorá-lo, caso em que você também se sentirá infeliz. Se você reconhecer
a existência dele e, ainda assim ser sua vítima, sua é a culpa por negligência ou
preguiça em não vencê-lo, nada adiantando lamentar-se. Mas, se você
reconhecê-lo e contorná-lo, superá-lo com seu próprio esforço, poderá sentir-se
satisfeito e feliz.

É óbvio que nem sempre podemos mudar o mundo em que vivemos, a opinião
das pessoas e suas reações, mas podemos mudar o nosso modo de reagir a essas
situações e, com a nossa atitude, encontrarmos solução para qualquer problema.

QUINTA ATITUDE: Ligue-se


Procure estar sempre vigilante e alerta para tudo a sua volta. Procure descobrir a
causa de seus infortúnios: ela pode estar bem perto de você ou ser você mesmo.
Se os seus problemas o deixam amargo e antes que perceba isso está deixando de
participar ativamente da vida, procure a causa e achando-a dê a ela uma solução
racional. Nada acontece por acaso. Ligue-se e administre o seu tempo, seu
espaço e sua vida, para ser feliz.

SEXTA ATITUDE: Desligue-se

Lembre-se que seu melhor amigo é você mesmo. É preciso muito cuidado ao
pedir ajuda a outras pessoas, que sem você o saber podem ser a causa de seus
problemas. Desligue-se dessas pessoas tão logo descubra isso. Reafirme-se e
lembre-se que você é o juiz de você mesmo, do verdadeiro significado de sua
vida. Assim procedendo, não se ressentirá com o controle que outra pessoa possa
estar tendo sobre você. Lembre-se que, quando necessário, ser sozinho não é a
mesma coisa que solidão.

SÉTIMA ATITUDE: Sua saúde vem em primeiro lugar

Para ser feliz é essencial ter boa saúde do corpo e do espírito. Falta de sono leva
à ansiedade, à incapacidade de concentrar-se, à memória fraca e à perda da
sensação de bem-estar. A boa alimentação com dieta balanceada em
carboidratos, proteínas e gorduras é fundamental para se ter uma boa saúde.
Complementando a dieta com vitaminas naturais sob a forma de frutas e
verduras balanceadas, a criatura estará dando ao corpo o tratamento que ele
precisa. Nas disfunções hormonais, faça o tratamento médico apropriado.

OITAVA ATITUDE: Encare o trabalho como fonte de prazer

Entre o tédio e a ansiedade, ambos indesejáveis, prefira o trabalho como o


melhor instrumento para cumprir os seus deveres. O trabalho, executado com
satisfação, seja ele qual for, ativa suas energias, deixando-o capacitado para
enfrentar os desafios. Vencer os desafios traz sensações confortantes de
envolvimento, como prazer e sensação de controle. Esse fluxo de energia ocorre
mais no trabalho que no lazer e isso é surpreendente, porque vem demonstrar
que a felicidade não é proporcional ao nosso tempo livre. Há pessoas que
preenchem o seu lazer com atividades passivas e freqüentemente se sentem
esgotadas, cansadas de não fazer nada. Seu tempo livre é um tempo vazio,
perdido. Portanto, é preciso fazer do trabalho uma fonte de prazer e, para sentir-
se feliz no trabalho, descubra atividades que apresentem desafios.

NONA ATITUDE: A dor e o sofrimento

É fora de dúvida que você não pode se livrar da dor, mas pode livrar-se do
sofrimento ou minorá-lo a ponto de tornar-se quase imperceptível. A dor nós
sentimos na carne, no corpo; o sofrimento, na consciência. Isso pode ser
insuportável e causar-lhe infelicidade. Tenha pensamentos otimistas e
sentimentos positivos, e pare de dizer frases depreciativas como ‘‘isso sempre
acontece comigo’‘ ou ‘‘sou uma pessoa muito infeliz’‘ ou ainda, ‘‘coitadinho de
mim’‘. Quanto mais cedo você deixar de se lamuriar e reclamar, mais cedo
poderá superar o sofrimento ou, pelo menos, aprenderá a lidar com ele.

DÉCIMA ATITUDE: Dê uma oportunidade para a felicidade

Faça o jogo da felicidade, não da infelicidade. Eu proponho um teste para você:


escolha um dia da sua vida, apenas um, e nesse dia prometa ser tão perspicaz, tão
sensível e tão hábil em relação à felicidade quanto costuma ser em relação à
infelicidade. Nesse dia, lembre-se que você merece ser feliz; faça elogios aos
outros e a si mesmo; trate apenas os assuntos que lhe tragam sensações
agradáveis e responda mentalmente aos elogios com tanto prazer quanto tem
feito em relação aos insultos. Dê a este exercício o mesmo tempo e atenção que
costuma dispensar à angustia e à infelicidade. Se você o fizer e não se sentir
consideravelmente melhor, então vai precisar da ajuda de alguém muito amigo
para reerguer sua motivação e auto-estima.

É preciso não se valer da vingança para sentir-se feliz. A vingança é um


sentimento mórbido e deve ser evitada a todo custo. A felicidade faz vir à tona o
que há de melhor na criatura; a vingança, o que há de pior. Quando, para a
criatura sentir-se bem o outro deve sentir-se mal, isso não é felicidade, é uma
forma de vingança. Da mesma forma, não se deve confundir felicidade com uma
paixão louca e desenfreada. Esta se evapora facilmente, é ilusória e efêmera;
aquela, é permanente.

É necessário saber buscar os sinais de que a felicidade está ao seu alcance.


Quando você perceber que está evitando situações estressantes e tem estratégias
para lutar contra aquelas que não sabe evitar é um bom sinal. Outros bons sinais:

1) Não desenterre os momentos angustiosos já passados e que não tiveram


solução.
2) Não comece mais o seu dia lamentando-se e lamuriando-se.

3) Sorria quando alguém tentar sabotar a sua felicidade.

4) Não finja que não está triste se na realidade assim se sente.

5) Relaxe os seus músculos.

Um dos fatores mais nocivos que contribui para a infelicidade é a indecisão. A


nossa vida é feita de escolhas. Nem sempre é possível conciliar realização
pessoal com as exigências de sua família ou de seu parceiro. A escolha não é
fácil em certas situações, mas opte pela que lhe fizer mais feliz desde que haja
conciliação com a paz de sua consciência. Adiar um dilema não ajuda ninguém.
É preciso decidir; portanto, decida sem tensões, correrias ou complicações, e
procure sentir-se feliz dentro de sua pele. Nessas escolhas, a sua vida pessoal
deve sempre ser colocada em primeiro plano, ainda que a criatura possa parecer
egoísta aos olhos dos outros. Mesmo no trabalho, leve em conta que você, como
ser humano, deve ter prioridade em caso de dúvida tipo ‘‘ou-ou’‘, como por
exemplo: ‘‘ou trabalho e não cuido da família direito ou me dedico inteiramente
à família e não trabalho’‘, dilema muito comum entre as mulheres casadas que
trabalham fora. Lembre-se que sua felicidade pessoal não tem preço. Mas, se a
escolha for continuar trabalhando, faça-a sempre com muita satisfação, mais do
que por dinheiro para sustentar vaidades e futilidades. Mas, vigie sempre o seu
ritmo de trabalho, afastando o estresse e a ansiedade. Não os deixe acumular
além do limite razoável. Tire umas férias!

Seria recomendável que, de vez em quando, a criatura parasse para pensar e se


perguntasse: - o que quero da vida? Ou - para que me serve a vida? Respostas
sensatas e sinceras a essas perguntas ajudam a elucidar muitos dilemas, quase
sempre ocorrendo quando a criatura percebe que não sobra tempo para nada.
Para bem administrar o tempo a criatura deve permanecer serena, ser organizada,
disciplinada e procurar ser feliz para se sentir bem consigo mesma. Isso vale
para qualquer profissão e para qualquer idade e resolve a desarmonia do seu dia-
a-dia. Mas, sempre faça um exame meticuloso de cada coisa ou situação, dos
motivos e das atitudes envolvidas. Dessa análise, surgem as alternativas, novos
caminhos ou mesmo trilhas disponíveis à sua escolha.

Existem também muitas técnicas para transformar defeitos em qualidades, sem o


subterfúgio do fingimento e da hipocrisia. Procure descobri-las em si mesmo e
verá que poderá transformar rebeldia a certos padrões rígidos em algo novo e
aceitável. Lembre-se de que o ótimo é inimigo do bom, como reza o ditado
popular. Desde que a solução não ofenda a sua dignidade nem fira a sua
consciência, por que não se adaptar e desfazer-se de um bloqueio emocional ou
de uma limitação? Note-se, ainda, que algumas limitações são temporárias e
desaparecem com o correr do tempo e, ainda, que a sabedoria se adquire com a
experiência; o conhecimento e a cultura, com a leitura. O fundamental é ter
coragem para avaliar-se e mudar-se de acordo com as circunstâncias. Atrás
dessas atitudes, vem a felicidade.

Há uma regra de ouro para ser feliz: evite fazer comparações com outras
pessoas; as limitações de cada um são diferentes, mas todos as têm. Aprender a
observar e aceitar esta regra é fundamental para se libertar emocionalmente. A
criatura que se libertar é capaz de se mover em direção às coisas que são
gratificantes e distanciar-se das que não o são.

Lembre-se que escolher não é renunciar; escolher é exaltar as prioridades


transformando sonhos e desejos em realidade. Os problemas existem e jamais
deixarão de existir. O infortúnio e a infelicidade fatalmente ocorrerão em nossas
vidas, mas se a criatura realmente desejar sentir-se feliz, não na superfície e nas
aparências, assimilando as idéias, os conceitos e o processo aqui descritos, nada
a impedirá de ser bem sucedida, de verdade.
A franqueza
A franqueza é um sentimento positivo que consiste em expressar aquilo que se
pensa com clareza e espontaneidade, dar a sua opinião procurando ser sincero
consigo mesmo e respeitoso com a criatura a quem se destina. Mas, é preciso ser
cuidadoso para não ofender, para não transformar a franqueza em hostilidades,
criando situações embaraçosas e difíceis de corrigir. Mesmo quando se faz um
elogio, é preciso cuidar para que ele não seja interpretado de maneira incorreta.
Um mesmo elogio pode ser acolhido de forma totalmente diversa por uma ou
outra pessoa, dependendo ainda do momento em que é feito. Cuidado para não
acrescentar ironia ao elogio, pois pode ser desastroso.

Existe uma linha divisória mal definida, pouco visível e sentida, em que o
comportamento aceitável para expressar uma franqueza pode ser interpretado
pelo outro como crueldade. É uma linha limítrofe fina e sutil que a criatura
precisa descobrir, se não quiser procurar encrenca e receber uma reação
inesperada da pessoa a quem se pretendia elogiar, para não ter que dizer frases
como essas: ‘‘o que foi que eu disse que a deixou furiosa?’‘ e ‘‘eu não quis
ofendê-la’‘ ou ainda, ‘‘por que será que ela reagiu assim?’‘.

Há pessoas que não agüentam outra criatura, principalmente do sexo oposto,


dizer-lhes frases como esta: ‘‘é para o seu próprio bem, mas...’‘, que se ofendem
profundamente e normalmente retrucam mais ou menos assim: ‘‘sou bastante
crescida ou esperta para saber o que é bom para mim’‘. A palavra-chave
indesejada aí é ‘‘mas’‘. Acham que querem impingir-lhes algo que não desejam
e reagem dessa forma, apesar da boa intenção de quem assim falou, com
franqueza. Pensam que estão tirando-lhe a liberdade de pensar por si mesmas e
tentando conter o seu livre-arbítrio. E se de fato houve ‘‘segundas intenções’‘,
desejos ocultos, elas podem estar certas. Outros, ainda, interpretam certas
franquezas e elogios como uma espécie de honestidade perniciosa ou doentia.

De qualquer forma, quando se pretende usar de toda a franqueza é bom ligar o


‘‘desconfiômetro’‘, principalmente com relação às sutilezas da linguagem. Às
vezes, um elogio vai por água abaixo quando acompanhado da palavra ‘‘mas’‘,
que é restritiva. Assim, pode haver reação se dissermos, por exemplo: ‘‘Você
está elegante, mas eu já vi você mais bem vestida em ocasiões como esta’‘, pode
ter uma reação inesperada de uma mulher. Melhor seria dizer algo assim: ‘‘Puxa,
até que você sabe muito bem como ficar elegante!’‘ Aí está a força, o efeito das
palavras certas no lugar certo. É claro que no elogio o tom da voz tem que ser
correto, para não parecer ironia ou sarcasmo.

É preciso saber distinguir o elogio do galanteio. Elogia-se para louvar o mérito


de uma pessoa, seu bom gosto e reconhecer sinceramente suas qualidades. Já o
galanteio é usado para atrair a atenção de uma pessoa do sexo oposto,
massageando-lhe a vaidade. É óbvio que o elogio pode e deve ser feito com
franqueza, já ao galanteio basta exprimir-se com simpatia, com forte desejo de
agradar, mesmo que não esteja dizendo a pura verdade. Mas, por trás do
galanteio existe sempre uma segunda intenção.

Muitos pensam que para fazer um elogio, a criatura tem que ser perfeita, mas
este tipo de perfeccionismo é uma maneira de camuflar a insegurança,
principalmente a masculina. Julgando-se perfeita, a criatura protege a sua
pretensa superioridade. É aí que está o perigo, pois uma criatura que se julga
perfeita dificilmente aceitará críticas e, se ela perceber que não existe franqueza
no elogio, tomará este como crítica e reagirá ou revidará à altura.

Se a franqueza de alguém para com outrem a encostar na parede e deixá-la sob


tensão ou até mesmo fazê-la chorar, este alguém poderá estar mascarando raiva e
demonstrando o seu poder sobre a outra pessoa. Isso pode ser inaceitável e,
normalmente o é, gerando muitos e profundos ressentimentos entre os dois.

Usar da franqueza para fazer uma colocação, propor medidas ou estabelecer


regras de convivência no escritório ou em qualquer local de trabalho não
significa ter que erguer a voz e falar em altos berros ou ficar bravo com as
pessoas. O mais importante é atingir o seu objetivo usando o bom diálogo e a
camaradagem. Isso se obtém com uma liderança bem aceita por todos, sem
imposição, mas mediante ampla compreensão sobre a necessidade da disciplina
no trabalho.

Outra frase muito comum e usada com freqüência é: ‘‘Você quer que eu seja
honesto com você, não quer?’‘, ou então, ‘‘Você quer que eu seja sincero, não
quer?’‘. Nem sempre, ao proferir essas perguntas, a criatura está pensando em
ser franca, mas em vociferar as suas queixas contra a pessoa e dizer-lhe umas
‘‘verdades que estava querendo dizer há muito tempo’‘ e que ela precisa ouvir. É
mais uma forma de desabafo e não de franqueza construtiva. Daí à hostilidade é
um passo. É óbvio que a pessoa vai ficar magoada e não grata.
Há pessoas que ficam dando voltas para dizer ao que veio, como que querendo
‘‘apalpar’‘ a reação do seu interlocutor ao que pretende de fato falar-lhe.
Pretendem ser jeitosos para não ferir susceptibilidades e acabam irritando ou
deixando o seu interlocutor impaciente, que termina dizendo-lhe: - ‘‘Vá logo ao
assunto’‘ ou - ‘‘Diga logo o que tem a dizer que eu não agüento mais’‘. O que
ele está tentando dizer é que tudo tem limites, até mesmo para receber uma
notícia triste. Não vale a pena disfarçar e estender a conversa, nesses casos,
como ocorre quando se tem que dar a notícia da morte de um parente próximo.

Num casamento é muito comum ter que resolver juntos as diferenças que levam
a muitas brigas, criam feridas e aprofundam mágoas e ressentimentos. A melhor
solução é partir para o bom diálogo, botar tudo para fora de uma vez, com toda
franqueza e sinceridade. Não deixando acumular as tensões, a franqueza presta
um grande serviço à solução dos problemas, se por detrás de tudo houver amor
de verdade. Nessas situações, cada um tem que encarar seus próprios defeitos,
verificar os desajustes, ser tolerante e estar disposto a tolerar as imperfeições do
outro.

A gratidão

A gratidão é um sentimento de ordem superior que destaca o reconhecimento por


uma ação de valor recebida de outrem. Ela está intimamente relacionada com o
bem que nos fazem outras pessoas, seja a que pretexto for.

Para entender a gratidão é preciso partir do princípio de que não se pode ter ou
ser tudo o que se deseja. Na luta pela vida, enfrentamos problemas descomunais
e, por mais duro que batalhemos, temos que fazer escolhas nem sempre bem
sucedidas. Mas, nossas aflições e temores se tornam mais amenos quando
encontramos a ajuda e a boa vontade de terceiros. E é aí que entra a necessidade
de sermos gratos, de preferência expressando nossa gratidão de forma educada e
espontânea. Não se trata de servilismo, rebaixamento ou humilhação agradecer
por um obséquio recebido. Não há pequenez na gratidão, mas grandeza de
espírito.

De outro lado, temos de destacar o prazer da posse, o qual deve ser dirigido mais
em apreciar e aproveitar aquilo que se recebeu, quando se trata de um objeto
material, do que em aumentar a mesma posse. É preciso valorizar e bem utilizar
o pouco que se tem, pois dessa forma, tem-se mais prazer do que aquele que, por
muito cobiçar o que não está ao seu alcance, acaba esquecendo ou
menosprezando o que já tem.

A vida não é um grande banquete. Saborear uma comida simples, mas bem feita,
pode ser mais saudável do que pensar em pratos deliciosos que não se pode ter
ou conseguir. É preciso saber apreciar as coisas simples, como por exemplo,
saciar a sede com um copo de água bem fresca, quando se tem muita sede, ou
banhar-se junto a uma cascata de água borbulhante e cristalina, quando seu corpo
estiver abrasado e suado de muito trabalhar ou após uma longa caminhada.

É preciso habituar-se a agradecer o que se tem e valorizar seus méritos. Lembre-


se que outros, talvez mais merecedores ou necessitados, possuem menos que
você. Precisamos nos alegrar com as vantagens do que temos e plantar em nosso
espírito sentimentos de gratidão pelo que possuímos. Isto não quer dizer que não
devemos nos esforçar para obter o que desejamos, mas devemos fazê-lo sem
prejudicar ou tirar vantagens de outrem. Este processo de respeitar os bens dos
outros, do ponto de vista material, está dentro do princípio cristão de não fazer a
outrem o que não queremos que nos façam.
A harmonia
Nós vamos tratar aqui da harmonia como sentimento pessoal e coletivo, isto é,
como um instrumento de paz interior e entre as criaturas de boa vontade,
portanto, no seu sentido espiritual maior.

Antes de poder participar da harmonia com os outros, precisamos estar em


harmonia com nós mesmos. Isso é fundamental: pleno controle dos reflexos, dos
instintos e da vontade, dirigindo estes sentimentos para o bem geral. Precisamos
traçar um plano para que nossos pensamentos, atos e palavras se ponham de
acordo com o objetivo de nossa existência e com a existência dos outros seres
humanos e seguir, à risca, a máxima cristã que diz ‘‘fazer o bem sem olhar a
quem’‘. Para isso, devemos agir com sinceridade em todos os atos de nossa vida.
Para agirmos com sinceridade e livre de influências, precisamos nos esforçar
para eliminar a excitação, o ódio, a inveja, o arrependimento, o tédio, o ciúme, a
impaciência e a concupiscência, somente para citar os principais sentimentos
negativos causadores da maior parte de todos os males. São estes sentimentos
que nos fazem entrar em desarmonia com as criaturas, com as coisas e com os
fenômenos da vida.

Enfim, crie e mantenha a harmonia em si mesmo, que é mais importante que o


resto. Toda vez que você estiver inquieto, descontente, agitado, ansioso, de mau
humor significa que a harmonia cedeu lugar à desarmonia e a desordem impera
sobre a ordem interior. Nestas circunstâncias, a criatura é incapaz de levar
adiante e a bom termo qualquer ação útil e proveitosa. Vai encontrar, por parte de
seu semelhante, compreensível resistência ao que desejar desenvolver. Por isso,
saiba, mediante esforço consciente, manter a harmonia em si mesmo para poder
disseminá-la entre os seus semelhantes de maneira natural e sincera. O esforço
consciente para obter a calma e a serenidade será bem sucedido, desde que você
se disponha a pesquisar e analisar um a um seus defeitos, seus pontos fracos e
dar-lhes a necessária correção mediante o uso de um raciocínio forte, firme,
decidido e suportado por uma vontade inquebrantável de acertar.

Para estar em harmonia consigo mesmo é preciso ser sincero, o que vale dizer,
exprimir o seu verdadeiro ‘‘eu’‘ consciente e inconsciente, isto é, o conjunto de
atributos e qualidades superiores de que você é dotado. O ‘‘eu ideal’‘ é o ser
moral que você deseja ser, representado pelo ideal de justiça, de bondade, de
beleza, de amor, de amizade, enfim, de perfeição que é o próprio objetivo da
evolução do espírito. Manifestar o verdadeiro ‘‘eu’‘ trará a saúde e a felicidade
desejada, e toda criatura tem o dever de educar a sua vontade para atingi-lo,
mesmo sabendo que esta reeducação é difícil e penosa.

Para não sermos escravos e vítimas de nossas paixões e baixos sentimentos,


devemos colocar, acima de tudo, o raciocínio em ação, sermos sensatos em tudo
que pensarmos e fizermos, interagindo com atenção e educação perante nossos
semelhantes, não humilhando ninguém, sendo serenos o tempo todo. Maeterlink
disse: ‘‘Nunca existe drama na vida de um homem sensato’‘ [PAUCHET, 1936,
p. 202]. Não só não existe em sua vida, como também, na dos que o cercam. O
homem sensato, pela simpatia e respeito que irradia, mantém nos outros a
harmonia e o equilíbrio de receptividade e atitudes desejadas.

Tratemos agora, da harmonia com os outros. Devemos ficar atentos, simpáticos e


de bom humor na relação com outras criaturas. Não podemos modificar as
pessoas de forma abrupta nem podemos modificar o mundo da noite para o dia.
Cada momento da evolução é importante e há um longo caminho para completá-
la. Viver é lutar e relacionar-se. Mas, esta relação tem que processar-se sob os
critérios dos bons sentimentos e da razão. Precisamos ser racionais e cristãos,
tratando nossos semelhantes como queremos que nos tratem, com respeito e
dignidade. Vamos procurar construir e não destruir. Não procuremos culpas nos
outros, antes procuremos ser rigorosos com nós mesmos e indulgentes com os
outros, procurando realçar suas qualidades. Procuremos reformar a nós mesmos
sem nos preocuparmos com as falhas dos outros. Não lamentemos nossos erros e
deslizes do passado, mas tenhamos consciência deles, para não os repetirmos no
presente e no futuro. Nas nossas relações procuremos dar especial atenção e
cuidado às nossas palavras e sobretudo à nossa voz. Pela voz pode-se conhecer o
temperamento e o estado psíquico das pessoas. Existem vozes trêmulas,
estridentes, veladas, fanhosas, ásperas, desafinadas. Mas, também, há as serenas,
fortes e expressivas, que denotam justiça, afeição, compreensão, ternura,
equilíbrio mental e moral e tantas outras características. Há, ainda, vozes
estudadas, com entonação adequada ao momento. Se você possui essas belas
qualidades, cuide-se para que sua voz reflita o que você de fato é e deseja
transmitir. Isso é essencial para o bom êxito de nossas relações.

Há, ainda, a necessidade de considerar a harmonia em relação à vida e à natureza


como um todo. Queira ou não, o homem acha-se inserido no grande contexto
universal e, na Terra, no grande contexto da criação. É, pois, imperativo respeitar
e reconhecer as leis naturais e universais, que tudo regem. Harmonizar-se com a
existência dessas leis, como a lei de causa e efeito (todo efeito tem a sua causa,
nada acontece por acaso), a lei da atração e repulsão do pensamento, a lei da
gravitação universal e numerosas outras que são imutáveis, é uma necessidade
para garantir a evolução das espécies e da criatura humana. Preservar a natureza,
manter os ecossistemas em seu estado primitivo e natural, defender a ecologia,
não poluir rios, lagos, mananciais, mares e florestas é um dever de todos nós.

É fora de dúvida que o objetivo supremo da vida é a evolução, isto é, o


aperfeiçoamento contínuo do ser espiritual, ético e moral. Este fim, para ser
atingido, requer harmonia, paciência, tolerância e perseverança. Estes
sentimentos quando combinados e apoiados em uma força de vontade poderosa,
realizam qualquer desejo, desde que dirigidos para o bem, com sucesso absoluto.
O ambiente se transformará e a vitória de cada feito é a garantia de que as
próximas ações serão, também, bem sucedidas.

Para terminar este tema, e evitar a desarmonia em nossa vida, é necessário


preservar a unidade de nossas ações sob um clima de sensatez e serenidade.
Submetamos nossas ações sempre ao critério moral, empregando nossa
consciência com seus princípios e essência e, busquemos apoio em seus
auxiliares, a vontade e a razão. Assim, estaremos construindo bases sólidas para
viver em harmonia e paz de espírito.
A honestidade
A honestidade é um dos mais elevados predicados do espírito, sendo, pois, um
sentimento altamente positivo. Pela própria definição léxica, ser honesto é ser
digno, reto, decente, probo, puro e íntegro, enfim, virtuoso.

Está fora de dúvida, embora o mundo dos negócios possa aparentar o contrário,
que a honestidade é fundamental para se obter resultados valiosos e sólidos nos
negócios, nas artes, nas ciências, enfim, em todas as atividades humanas.
Estamos falando de resultados permanentes e não transitórios e fugazes. Trata-se
de pôr à prova o valor dessa conduta como fator fundamental para a evolução
moral e espiritual da criatura. Aqueles que possuem a mente e o pensamento
desonestos, uma conduta reprovável nos negócios, podem ganhar, pela ilusão e
trapaça, muito dinheiro. Trata-se, porém, de um êxito efêmero que mais cedo ou
mais tarde desaparece inesperadamente, podendo trazer resultados desagradáveis
e fatais para a criatura.

Devemos distinguir dois tipos de honestidade: a honestidade material, que


consiste em fazer o que é reto e justo aos nossos semelhantes, e a honestidade
superior e espiritual, que se refere às relações conosco mesmo, que vai muito
além da honestidade que recusa furtar e pagar com pontualidade nossas dívidas.

A honestidade superior é um dever de toda criatura que deseja sempre o bem e o


melhor para si e seus semelhantes. Ela deriva da aplicação do livre-arbítrio
sempre dirigido para o cumprimento de nossos deveres, impostos pelo nosso já
elevado grau de espiritualidade. Para isso, precisamos ser sinceros ao nosso
‘‘eu’‘ superior. Trata-se de uma honestidade absoluta, bem mais importante que
a simples seriedade em assuntos financeiros. Se vivemos de acordo com as
nossas convicções de direito e de bom senso, então, nossa honestidade tem
caráter superior; se, ao contrário, cumprimos com nossas obrigações por medo
de sermos considerados relapsos, inadimplentes, então, não somos honestos de
verdade.

É interessante notar que, como chefe de família, se ao chegarmos em casa


encontramos nossos familiares em conversa, e esta pára imediatamente e o
assunto muda completamente, é sinal de que não há honestidade entre os
membros dessa família, mas sim bastante falsidade nesse lar. Isso é mais comum
do que parece.
Um outro ponto importante a observar é que, ao fazermos uma auto-análise e
detectarmos alguns pontos fracos em nossa personalidade, é de grande utilidade
confessarmos estas falhas a algum amigo de alta confiança, sem orgulho algum.
Esta é, também, uma forma de honestidade, mas é preciso tomar muito cuidado
para não se expor desnecessariamente.

É preciso notar que, sempre que uma convicção é contrariada, há desonestidade.


Isto devido ao fato de que a nossa convicção provém de nosso ‘‘eu’‘ superior.
Este se contrapõe sempre ao ‘‘eu’‘ material, ou seja, aos nossos interesses
materiais. Dessa luta que travamos dentro de nós entre o Bem e o Mal, se
inclinarmos para o Bem, nossos atos serão honestos, já que confirmarão nossas
mais elevadas convicções. Caso contrário, estaremos dando guarida à
desonestidade.

Muitas vezes a criatura que mente, que é desonesta, de tanto praticar a mentira e
a falsidade, de tanto trapacear, chega a acreditar que é honesta, porque acha que
está tendo tanto sucesso, pensando que outro faria o mesmo se estivesse no seu
lugar. Esta tentativa de iludir a mente superior, ou seja, a consciência, a longo
prazo, sempre acaba mal para o indivíduo. Esses indivíduos, que assim
procedem, tentam fazer com que a verdade, que acreditamos verdadeira, se faça
ridícula e falsa para nós. É preciso termos convicções sérias e bem fundadas para
não cairmos nas artimanhas do Mal, colocando-nos sempre em guarda contra
suas investidas.

O homem virtuoso está acima do homem honesto, já que o virtuoso tem sempre
disposição firme e constante para a prática do Bem; é valoroso, tem grande força
moral e, portanto, dotado de alta espiritualidade. Este é um forte de espírito.
Sendo valoroso, está à prova de qualquer tentação, de deslize moral ou suborno.
É honesto de consciência, sempre aspira a uma perfeição, à melhor conduta. É
preciso ser conspícuo para ser honesto e virtuoso, donde se conclui que a virtude
é um predicado mais nobre que a simples honestidade. Quem a possui arrisca-se
a tudo, até mesmo a cair na miséria, se necessário for, para manter sua seriedade
e respeitabilidade.

Há também os que se mantêm honestos por conveniência, não pelo próprio valor
espiritual. Para ser simplesmente honesto, basta ser probo, digno e cumpridor de
seus deveres, isto é, as ações que a criatura pratica enquadram-se mais na órbita
social que na esfera moral. Basta que suas ações sejam aceitas pela opinião
pública, o que não quer dizer que sua consciência também não atue, mas não em
primeiro plano.

Aqueles que têm capacidade para reconhecer seus próprios erros pela justa
reflexão dos fatos, e sabem tirar deles sábias lições de vida, são virtuosos, têm
caráter firme e retidão de conduta, bem diferente dos simples honestos que
cumprem seus deveres, honram seus compromissos e, basta isso. O homem
comum jamais reconhece seus erros e chega até mesmo a reincidir no erro, se
isso lhes trouxer vantagens.

É preciso ainda saber reconhecer a honestidade hipócrita. Veja o tema sobre


hipocrisia, nesta obra. No hipócrita, o verdadeiro caráter é escondido, camuflado
e escamoteado de todas as formas e com todas as artimanhas que puder usar. O
hipócrita é todo aparência e só aparências!

Segundo José Ingenieros, em sua monumental obra O homem medíocre: ‘‘A


virtude requer fé, entusiasmo, paixão, arrojo; vive disso. Requer tais coisas, na
intenção e nas obras. Não há virtude quando os atos desmentem as palavras’‘
[INGENIEROS, 1953, p. 118]. Daí, o hipócrita ser o oposto do homem virtuoso.

Pelo exposto, não é demais insistir que o Bem sempre vencerá o Mal. Este pode
ganhar algumas batalhas, mas não a luta final. Precaver-se com segurança contra
os desonestos é o melhor remédio e, uma vez identificados, jamais fazer
negócios de qualquer tipo com eles. Assim procedendo, a criatura estará
eliminando muitos aborrecimentos.
O idealismo
O idealista é aquele que, acreditando no valor das idéias, estabelecidas com base
em uma lógica irreparável, propugna por elas com uma força incomum, fugindo
das idéias preestabelecidas e das rotinas da vida. É preciso não confundir o
idealista com um sonhador inconseqüente.

Na vida existem mentalidades ativas e passivas, idealistas e passadistas,


revolucionários e conservadores, bem como mentalidades amorfas e medíocres.

De um lado, temos os conservadores, cujas raízes têm origem no medo a


qualquer modificação tanto no modo de vida como no modo de pensar; eles são
contrários às inovações e estão satisfeitos dentro dos limites de sua experiência e
do seu conhecimento. Detestam ter que se adaptar ou ajustar-se às novas
situações. Não possuem ambições, nem mesmo as mais simples, e detestam tudo
que é novidade. A Filosofia os classifica como misoneístas.

Existem também, os passadistas, ou seja, aqueles que se apegam às velharias do


passado, herdadas de tradições, amigos de velhos costumes, amantes de coisas
antigas, bem como os preciosistas, que cultivam a mania de usar velhos chavões
de estilo.

Uns e outros constituem a grande maioria dos rotineiros: são socialmente


apáticos, de regra, não se manifestam, são aferrados a velhos pontos de vista,
não acompanham o progresso intelectual, filosófico e científico, estão sempre
satisfeitos com o ‘‘status quo’‘. Embora alguns despertem a sua curiosidade, não
possuem desejo forte de progredir, preferindo ficar na inércia mental. Preferem a
lei do menor esforço, até para discordarem de novas idéias. Por isso, não
oferecem grandes resistências e embaraços às inovações. Já os reacionários,
lutam aferradamente contra os idealistas que procuram abrir novas rotas e dar
novo rumo à ciência e ao saber humano, em geral. Sob certo ponto de vista, os
reacionários podem desempenhar papel preponderante, no sentido de conter
certas mudanças abruptas de alguns idealistas desenfreados, que embora agindo
de boa fé, não chegam a perceber que certas reformas ou inovações bruscas
podem acarretar grandes transtornos sociais e econômicos.

Os idealistas e rotineiros empenham-se em permanente e renhida luta; a teimosia


destes últimos, sempre em muito maior número que aqueles, cria grandes
entraves e causa grandes atrasos ao progresso das sociedades. Mas, a despeito
disso, os empecilhos são vencidos e o progresso abre o seu caminho
inexoravelmente.

O idealismo criador nas ciências e nas artes é fundamental para o progresso


humano. A criação de novas invenções, o avanço da tecnologia e da medicina
não dispensam o gênio criador dos idealistas. O idealista, para provar suas idéias
e suas teorias, luta com denodo, sem cessar, incansavelmente. É a luta da
inteligência contra a ignorância e a inércia dos rotineiros ou a oposição dos
reacionários.

A História da Humanidade está cheia de exemplos edificantes de idealistas


notáveis, em todas as áreas do conhecimento humano, bastando, para isso,
consultar as biografias dos grandes reformadores da ciência, das artes e da
sociedade de uma maneira mais ampla.

A despeito das barreiras opostas pelos rotineiros e reacionários de toda espécie,


inclusive a barreira criada pelos dogmas e fanatismos impostos pelas religiões,
novas concepções da vida e do Universo continuarão surgindo e sua marcha em
direção ao progresso e à evolução espiritual jamais será detida, pois a
observação e a experiência revelarão ao mundo, em futuro breve, verdades
incontestáveis. Está claro que os idealistas, agindo sempre de boa fé e recebendo
intuições voltadas para o progresso material e a evolução espiritual, têm um
importante papel a desempenhar nesse contexto.
O otimismo
O otimismo é um sentimento positivo e representa uma atitude, uma disposição
da criatura de encarar os problemas humanos e sociais de forma global,
considerando ser sempre possível dar-lhes a melhor solução, fundamentado no
seu bem-estar e no de seus semelhantes. O otimismo praticado com freqüência,
constância e perseverança é para a criatura um ideal de bem fazer, de
benevolência e altruísmo. Veja, nesta obra, os temas ‘‘O ALTRUÍSMO’‘ e ‘‘O
IDEALISMO’‘.

A vontade otimista realça a alegria e o ânimo para a vida. A criatura otimista


revela muito de sua espiritualidade elevada e vê com confiança suas ações e a de
seus semelhantes. O otimista sabe muito bem separar o joio do trigo e distinguir
o otimismo das ilusões, fantasias e sonhos impossíveis. Ele sabe avaliar sua
capacidade e seus limites, e atua seguro, confiante de que será vencedor e bem
sucedido em suas ações. Mesmo sendo otimista, em muitas situações sabe
reconhecer que, às vezes, o ótimo é inimigo do bom e, para não ficar na inércia,
realiza o bom, quando não puder realizar o ótimo. O otimista sabe que é preciso
valorizar o próprio esforço e tudo o que tem de melhor em seu caráter, apoiado
sempre na sua grande força de vontade e autoconfiança. Assim como a
autoconfiança, a confiança no próximo ajuda-nos a sermos otimistas.

O otimismo é o bálsamo do espírito, o mel da vida, assim como, em contraste, o


pessimismo é o fel da vida. Aquele que tem o otimismo como cúmplice é um
vencedor desde o início de cada tarefa que faz, de cada negócio que empreende,
porque ele sabe usar os seus atributos espirituais de forma ativa, criadora. O
otimista caminha com a cabeça erguida a passos firmes, sabe o que quer, não
titubeia, é uma criatura sempre resoluta e é um vencedor por natureza. Dotado de
viva coragem, vence com galhardia os obstáculos da vida e ainda dá volta por
cima, isto é, retempera-se com os sucessos que vai obtendo.

O otimista reconhece a verdadeira função do trabalho, tendo este como uma


dádiva, uma alavanca para promover o seu desenvolvimento, enquanto o
pessimista teme o trabalho e o encara como um castigo. Aquele vive o seu
trabalho com alegria e produz mais e melhor, progride; este, está sempre a
reclamar, a lamuriar-se, fazendo-o de mau humor, a contragosto, cansando-se
mais facilmente e curvando-se fisicamente às dores e sofrimentos antes do
tempo. Para o primeiro, o trabalho sempre traz bons frutos; já para o pessimista,
aborrecimentos e dissabores. O otimista sabe que precisa lutar, empenhar-se com
os seus recursos mentais e manuais, coloca coração, músculos, nervos em tudo o
que faz, e colhe o fruto saboroso de seu trabalho e, se chegar a ser altruísta,
distribui com alegria aos necessitados parte do que obteve.

O bom otimista é também, quase sempre, o bom samaritano. Sabe ser


benevolente, conciliador, polido, maleável, tolerante, para se tornar feliz e
procura fazer feliz o seu semelhante. Ele se coloca sempre em harmonia com o
ambiente, irradia alegria e confiança, o que deixa o seu organismo praticamente
invulnerável ao mal, às doenças. Sabe dar o passo certo na hora certa, não é
indeciso, não titubeia e sempre encontra o caminho certo para progredir e
evoluir. Cumpre os seus deveres com satisfação estampada em sua face. Nunca é
sarcástico nem humilha ninguém; antes, procura ensinar a quem tem fome de
saber, ajudando o próximo, tratando bem a todos, sempre amável e cordial. O
otimista sabe ser cortês, amigo de verdade, não um hipócrita. A figura do bom
otimista quase sempre se confunde com a figura do homem de bem, aquele que
compreende e sabe usar o seu livre-arbítrio para o bem em tudo que faz; é
respeitado, querido, porque sabe cativar e influenciar pessoas devido aos seus
sentimentos de benevolência, causando grande efeito e bem-estar nas pessoas. O
otimista tem o carisma de líder e contamina as pessoas com quem trabalha de
forma respeitosa. Por isso, obtém a colaboração fácil de todos e é admirado pelo
entusiasmo que distribui de graça.

O otimismo tem grande efeito positivo no trabalho fecundo das pessoas


criadoras, artesãos e artistas, grandes escultores e, principalmente, dos cientistas
que dedicam com ardor suas vidas a desvendar o mistério das leis físicas,
químicas e cósmicas, sempre em busca da verdade e seus desdobramentos em
benefício da humanidade. O sucesso advém desse trabalho, desse esforço
contínuo de uns em benefício de muitos. Aliados a uma intuição forte, não
encontram barreiras, vencem sempre.

Em contraste, temos o pessimismo e os pessimistas que estão sempre amargando


as suas derrotas, maldizendo tudo e a todos, sempre derramando suas influências
negativas por toda parte sobre os incautos, aqueles que não sabem se defender do
mal e de suas investidas. O pessimismo é enervante, destrói a vontade, aumenta
os receios e temores. As emoções pessimistas são desagregadoras e não levam a
nenhuma realização pessoal. O pessimismo é uma doença de natureza psíquica,
que não leva a Luz a nada; antes, a amortece e até a apaga como um eclipse
solar; o pessimista vive na inércia, municiado de estímulos malignos, e alimenta
a fantasia como uma fuga à realidade.

Tanto a atitude otimista como a pessimista depende do pensamento e da vontade


da criatura. As emoções influem, mas com pouca intensidade. O
sentimentalismo não deve criar obstáculos à prática do otimismo, não deve
obstar que ele ocorra e seja praticado por quem tem vontade e determinação para
adotá-lo como norma de vida. Deve-se evitar a comparação com outras pessoas,
mesmo quando estas conseguem coisas com menor esforço. Em vez de se
comparar a outrem, dedique-se a melhorar, empregando suas energias de forma
positiva e produtiva, visando o seu bem e o de seus semelhantes. Passe do
discurso à prática e realize o que planejar, sem demora, sem adiamentos, ou seja,
avalie a sua vontade, fale menos e aja mais e sempre.

É preciso muito cuidado com o sentimentalismo exagerado que enfraquece,


debilita a vontade, mostrando apenas o lado ruim das coisas, a sombra, as trevas,
não a realidade. O sentimentalismo exagerado vira ilusões e fantasias na mente
dos pessimistas, sem valor prático, que enganam pelas aparências e normalmente
se dirige às coisas fúteis e banais, convida ao repouso e à inércia, não aponta o
verdadeiro caminho a trilhar.

O otimismo sempre gera mais otimismo, impulsiona a criatura sempre para a


frente, para o progresso, para a evolução espiritual. Sejamos, pois, sempre
otimistas.
A ousadia
A ousadia é a atitude assumida com inusitada coragem frente aos obstáculos da
vida e, neste sentido, é um sentimento poderoso para o sucesso material e social
da criatura, desde que bem utilizada. A ousadia só é positiva se o arrojo for
sensato e equilibrado, com risco calculado. Do contrário, a ousadia pode levar a
criatura a ser vítima de grandes fiascos e fracassos irremediáveis.

O homem, em seu ambiente vivencial, pode assumir diferentes atitudes face aos
acontecimentos de sua vida: uns enfrentam com arrojo qualquer problema ou
situação - são, em geral, os vitoriosos; outros agem com cuidado e ponderação -
são cautelosos ao extremo, podendo chegar aos limites da timidez, esta
prejudicial ao desenvolvimento das criaturas. O que é preciso evitar é o extremo
da timidez, que caracteriza os medrosos e até mesmo os estúpidos.

O temperamento do homem ousado é o de obter aquilo que deseja, seja a que


título for, usando toda a sua capacidade, força de vontade, inteligência e argúcia
para vencer. Nele, a derrota é sempre um incentivo para aprender a lição e
fortalecer-se para novos embates. Confia tanto na sua capacidade que precisa
fazer um esforço para não deixar-se extravasar além da boa prática moral. Estas
qualidades são próprias do primeiro tipo acima descrito, que se caracteriza pelo
destemor e pelo atrevimento de sua maneira de agir. Atuam, portanto, de uma
maneira abusada.

Já o segundo tipo, aqueles que atuam com certa prudência e mantêm a dignidade
em todos os seus atos, são ponderados, utilizam com mais intensidade sua
espiritualidade para vencer na vida. Raciocinam e utilizam o seu livre-arbítrio
como um filtro para evitar usar ardis e trapaças que podem trazer certas vitórias
materiais, mas ferem os bons princípios da convivência, da Moral e da Ética.
Estes atuam de uma maneira correta e desabusada.

A ousadia inescrupulosa é condenável em todos os sentidos. Ela é vista nas


bravatas das brigas de rua, nos ‘‘rachas’‘ realizados pelos bons ‘‘mocinhos’‘ com
seus carros envenenados pelas ruas das grandes cidades, nas disputas de caráter
‘‘machista’‘ de muitos homens pela conquista das mulheres, nas torcidas ditas
organizadas durante os torneios esportivos, na luta pelo acúmulo desmedido de
fortunas ganhas ilicitamente, no enfrentamento policial com abuso de
autoridade, enfim, esta série de exemplos poderia ser estendida a numerosos
outros aspectos da vida moderna.

Mas, de outro lado, é bom que se diga que nem todos os ousados são homens de
briga, mesmo quando são provocados por outros que lhes venham criar
embaraços em seus negócios e atividades. Estes usam a ousadia com maior
poder de espírito, com competência técnica e profissional, sem o uso de ardis,
com base em sua capacidade mental, inteligência e sensibilidade moral.

Para melhor realçar a ousadia e seus aspectos, vamos examinar, de relance, o


sentimento oposto, a timidez que foi tratada com maior profundidade em outra
parte desta obra. Os tímidos são, em geral, inteligentes e capazes de grandes
proezas, mas, por recolhimento e introspecção procuram se esconder ou não
parecem bons demais para não chamar a atenção de suas qualidades. O tímido
nasce tímido e pode corrigir-se ou tornar-se mais tímido ainda em função da
educação familiar e escolar que venha ter. Se, por exemplo, uma criança tímida
vier a ser criada em um ambiente autoritário, a tendência é tornar-se mais tímida
ainda, devido à repressão que sofre aos estímulos que a vida lhe oferece. De
outro lado, se o ambiente for demasiadamente frouxo ou acanhado, pode
sobrevir ao tímido o medo de não vencer os obstáculos cotidianos e até recalcar,
em seu subconsciente, falhas ou derrotas que venha ter na vida. O que é preciso
para minorar ou corrigir esse quadro é dar aos tímidos estímulos positivos,
elogiar sempre suas vitórias, oferecer-lhes o melhor amparo moral possível e
abrir-lhes os olhos para enfrentar com hombridade os obstáculos da vida, sem
deixar de mostrar-lhes os encantos que ela tem.

De maneira geral, os tímidos não alcançam grandes fortunas nem acumulam


bens materiais além do necessário. Visto pelo prisma material, são uns
fracassados. Mas, os tímidos, por serem introvertidos, possuem qualidades de
valor crítico, ético e estético bem acima dos ousados, o que aliados à sua
peculiar inteligência, os habilitam a desenvolver, em maior grau, competência
para a pintura, escultura, música e outros tipos de arte, por terem, também, uma
maior intuição e percepção.

Vê-se, pois, que aos tímidos não lhes faltam qualidades, o que lhes falta é
impulso para vencer os obstáculos da vida material ou os tabus que a sociedade
cria para preservar pseudoverdades, manter preconceitos que a evolução
consciente já deveria ter abolido. Antes de mais nada, o tímido precisa esforçar-
se para vencer os seus receios e temores, verdadeiros inimigos que têm dentro de
si. Vencidos esses inimigos, o caminho estará aberto para se tornarem vitoriosos.
Faz bem ao tímido o aforisma que diz ‘‘errar é humano, mas só não erra quem
não faz ou produz’‘, sendo um vigoroso estímulo para se arrojar um pouco mais
e obter da vida aquilo a que tem direito.

A paciência

A paciência é um sentimento de ordem superior e, portanto, uma virtude,


praticada por quem é espiritualmente forte. É fortaleza do espírito. Estas duas
virtudes são adquiridas pela persistência em resolver com calma e ponderação,
os problemas que a vida nos enseja. Aqueles que são espiritualmente fortes e
fieis às suas decisões sabem resistir e persistir e, portanto, são capazes de
resolver seus problemas com domínio e fortaleza de ânimo necessários.

É preciso não exagerar na avaliação dos problemas que a vida nos oferece a cada
momento, nem dar curso à imaginação, tornando-os ameaçadores e terríveis, isto
é, não dispersar as energias antecipando-os, imaginando-os difíceis,
insuportáveis e insolúveis. Em suma, não enfocar com lentes de aumento
problemas que só existem na imaginação, criados por uma mente fraca, doentia e
desgovernada. O próprio homem é o causador de muitas de suas misérias, que
são geradas, na maior parte das vezes, por incompreensões, conjecturas,
suspeitas e outras fraquezas humanas.

É preciso levar a vida a sério, não levá-la ‘‘numa boa’‘, como proclamam os
materialistas insensatos e irresponsáveis. Não estou dizendo com isso que não se
deve desfrutar o lazer. Há tempo para tudo; mas o que não deve ser esquecido é
que a nossa vida pessoal deve ser administrada como um negócio, uma empresa:
com competência, valor e seriedade.

O negócio mais importante da vida é a própria vida, é saber administrá-la, bem


governá-la com fundamento nos princípios cristãos. Assim procedendo, com
forte determinação para praticar o bem, cultivando a devida virtude da paciência,
sem querer apressar ou antecipar fatos e soluções e completando com firmeza o
que planejou e iniciou, as sucessivas vitórias se acumularão e fortalecerão o
espírito para novas empreitadas.

É preciso ter paciência. Ter paciência é sofrer, agüentar-se, manter-se sem ceder
às pressões e não dar por terminado o que ainda não chegou ao fim. Quem está
ocupado em pensar em meios construtivos não tem tempo para imaginar
suspeitas e temores. Aquele que tem consciência da necessidade de resistir, não
se impressiona com pequenos inconvenientes e supera todos. Compreende que
não deve temer os percalços das tarefas da vida.

Quando se tem os olhos postos na conquista dos grandes ideais, desprezam-se os


pequenos desenganos e aborrecimentos que a vida nos traz.

A fortaleza de espírito, que estimula a paciência, adquire-se pela prática, pela


experiência, pela adaptação aos propósitos bem fundamentados e pelo desejo de
bem cumprir as metas traçadas. Aquele que vence na vida destaca-se
precisamente por cumprir suas metas e não ceder diante dos pequenos obstáculos
e das fraquezas humanas. A coragem se intensifica com a prática, com a
persistência e com a constância, aplicadas de forma inteligente e com base na
consciência de segurança.

Mas também, é preciso ter suficiente coragem para abandonar as idéias falsas,
venham de onde vierem, se possível antes de iniciar qualquer empreendimento
por elas ensejadas. Para isso, analise a situação, pense e raciocine muito antes de
agir.

Somente aqueles que adquiriram e sabem usar as lições da experiência, na


compreensão e na interpretação da vida, é que terão paciência para persistir, não
desanimar nem esmorecer, mas vencer suas próprias fraquezas e temores, isto é,
superar seus próprios limites.

Todos, na vida, desejam e buscam uma oportunidade, mas muitos estão


adormecidos ou atrasados ao encontro marcado, e quando aquela chega não a
reconhecem e, portanto, não sabem agarrá-la e aproveitá-la.

Mas, lembrem-se, as oportunidades não correm facilmente ao encontro das


criaturas; são estas que devem correr atrás delas, examiná-las, largá-las se forem
falsas ou fora de seu alcance ou agarrá-las, realizando-as quando se mostrarem
viáveis. Não aceite palpites infundados, mas ouça os bons conselhos e analise-
os, pondere-os. A exaltação, o ‘‘oba-oba’‘, pode ser um mau começo e levar ao
insucesso, ao fracasso.

A paciência é contrária ao desespero; quando este domina, os temores assaltam a


criatura, implantando em sua mente incertezas, quimeras e ilusões. É preciso ser
paciente para ver menos perigos, saber esperar sem se desesperar, afastar as
influências ameaçadoras e mobilizar seus recursos espirituais para conseguir ser
vitorioso.
Impõe-se invocar sempre suas forças interiores, vale dizer, espirituais. Afastar as
inquietações e emoções deprimentes, cultivar o hábito da paciência para bem
resolver seus problemas são princípios de sabedoria para o bem viver.

A persuasão

A persuasão é um dom positivo que a criatura tem e que consiste em convencer


outras pessoas a pensarem ou fazerem aquilo que desejamos que pensem ou
façam. Ela se fundamenta no poder criador do espírito humano, apoiando-se no
pensamento e na vontade da criatura, como faculdades que são daquele. Além
disso, para convencer outras pessoas, a criatura vale-se de vários outros recursos
e habilidades como a empatia, o magnetismo pessoal, o poder de liderança, o
saber e o conhecimento das coisas e dos fatos, a experiência de vida e a
autoconfiança. Usando tudo isso, a criatura gera em torno de si uma aura de
dignidade e de respeito que faz com que corações e mentes se abram e
acompanhem suas ações.

A persuasão é uma verdadeira arte - a arte de convencer. Não existe uma fórmula
mágica única, infalível, válida para todas as situações. Cada pessoa tem que
forjar o seu próprio método, inventar uma chave e utilizá-la de forma útil para si
e para os seus semelhantes. Existe uma ligação muito direta entre persuasão e
convicção: para persuadir, a criatura tem, primeiro, que se convencer que as
idéias, atos ou fatos que deseja incutir nos outros precisam ser, antes, bem
aceitos por si mesma. É preciso exercitar-se, com persistência e demoradamente
nesta tarefa, para não falhar diante dos olhos atentos de uma platéia, nem sempre
querendo ouvir o que ela pretende transmitir. É fundamental, neste processo, o
poder individual e coletivo que a criatura precisa ter para atingir com sucesso
seu objetivo.

É o poder de percepção que vai possibilitar compreender e encontrar a forma e a


fórmula para cada caso que, ao ser aplicada, resultará num esforço de persuasão
bem sucedido. Trata-se de um poder individual, não cabendo imitação, o que
significa que a criatura tem que imprimir o seu próprio cunho, suas
características pessoais, no jeito e no modo de fazer as coisas. Cada caso é uma
nova realidade a enfrentar, e a criatura precisa ter a liberdade total para expor sua
criação. Mas sempre, sempre mesmo, a pessoa precisa contar com a inspiração
ou intuição e muito equilíbrio emocional. Não se pode transmitir fraqueza de
espírito ou exprimir tibieza; é preciso ser firme, determinado e incisivo, sem
parecer que a criatura esteja querendo impor a sua vontade.
Há formas sutis de persuadir e só assim se pode delas esperar um bom efeito. É o
caso, por exemplo, que acontece com certas pessoas de destaque social,
políticos, autoridades em geral. Aqui mais vale exprimir nossas idéias, conselhos
e sugestões, e hipotecar-lhes solidariedade em suas ações para encampar o que
desejamos que seja feito. Nisso, a sutileza substitui nossa vontade férrea de
impor idéias. Usando de argúcia, poderemos atingir nossos objetivos, que
poderiam parecer inalcançáveis. Mais vale uma boa conversa ao pé do ouvido,
na hora certa, do que um discurso inteiro ou uma longa carta expositiva.

Uma situação comum que muitas criaturas enfrentam é terem que submeter-se a
entrevistas, seja para conseguir um emprego, seja para difusão de idéias e
opiniões sobre assuntos do cotidiano, pela mídia. Se a entrevista televisiva for ao
vivo, irá requerer redobrado cuidado para não atropelar as palavras, nem ser
inconsistente ou incoerente. Por isso, seja breve e direto. Responda as perguntas
com objetividade e argumente com conceitos válidos ou com fatos
inquestionáveis. Deixe as inovações ou longa argumentação para sessões
especiais, palestras e conferências. Nas entrevistas para conseguir emprego,
procure ficar bastante à vontade, mas não displicentemente; olhe o entrevistador
direto nos olhos, nunca olhe-o de soslaio, nem fique de cabeça baixa; seja claro
nas suas considerações e respostas às suas perguntas. Coloque toda a
concentração que puder na interpretação das perguntas e peça explicação quando
não entender alguma pergunta. Não desvie do assunto. Seja sempre sincero.
Sobretudo, aja e reaja com calma e ponderação. Aqui, também, a sutileza deve
ser evitada, antes cabendo usar argúcia em certos momentos para mostrar a
finura de seu espírito.

É muito importante a maneira como apresentamos nossas idéias. É preciso ser


ordenado, metódico. Cite exemplos, quando couber. Provas e fatos conhecidos
podem ser úteis para sustentar uma argumentação firme, prender a atenção do
ouvinte ou despertar o seu interesse. Estes são fatores que contribuem,
decisivamente, para o sucesso dos bons vendedores de idéias e produtos em
qualquer parte do mundo.

Muitos pregadores e doutrinadores costumam convencer usando a força das


palavras e de exemplos deixados por grandes mestres do saber e do
conhecimento humano. Não estou me referindo aqui à crença e à fé, impostas
pelas religiões e seitas, mas aos conceitos e princípios racionais e científicos, que
têm fundamento na lógica e na razão. Os que sabem persuadir não encontram
dificuldades em inculcá-los nas mentes das pessoas, porque mesmo aquelas que
não são dotadas de grande capacidade de raciocínio os assimilarão facilmente,
sem muito esforço. Basta estimular nos ouvintes o interesse, a sua atenção e a
concentração. Veja tema ‘‘A CONCENTRAÇÃO’‘ em outra parte desta obra.

Em ciência, para se manifestar a certeza, é preciso medir aquilo de que se fala e


exprimi-lo por uma fórmula ou número para se poder afirmar que se conhece
alguma coisa do assunto; do contrário, os seus conhecimentos são incertos e
pouco satisfatórios. Este preceito se aplica perfeitamente em todos os casos em
que se pretende demonstrar alguma coisa de modo a não deixar dúvidas, seja em
que ramo da ciência for, para deixar claro que a precisão é fundamental para
persuadir e convencer os outros. Qualquer que seja o assunto, não cabe iludir ou
alimentar ilusões efêmeras. A formulação de teorias científicas pode consumir
toda a vida de um homem, que terá de convencer o seus pares, mas também,
pode ser destruída, modificada ou relegada ao fundo do baú se não forem
confirmadas pelos fatos ou se vier a ser substituída por outra mais convincente.
Isso aconteceu muitas vezes na criação da teoria cosmogênica e, ainda, não
temos a versão definitiva.

Finalmente, lembre-se de usar um linguajar simples para persuadir pessoas


vulgares e medíocres. Seja sincero, verdadeiro e humilde e, sobretudo, convicto
a respeito do assunto. Em momento algum seja falso ou prepotente para poder
granjear o respeito e a confiança de seus ouvintes.

A prontidão

A prontidão é mais um ato de vontade do que propriamente um sentimento, mas


ela encerra em si mesma forças tão poderosas como a perseverança, decisão e
outras.

Existe um ditado popular que diz: ‘‘O mundo pertence aos que levantam cedo’‘.
É uma grande verdade, pois da decisão de levantar-se cedo, de preferência antes
da sete horas da manhã, poderá a criatura dedicar-se, pelo menos, quinze
minutos aos exercícios físicos e de respiração, trazendo grandes benefícios aos
músculos e ao organismo através da oxigenação dos tecidos. O sangue resultará
purificado e, em conseqüência, o cérebro resultará bem irrigado. Com a saúde
assim revigorada poderá a criatura trabalhar durante todo o dia com mais
intensidade, rapidez e perseverança. E o que é mais importante, ao seguir este
pequeno programa todas as manhãs, sempre às mesmas horas, estará adquirindo
o hábito da constância, sendo pontual e exato, imprimindo no seu inconsciente
uma autodisciplina que será útil e benéfica, também, em todos os outros atos do
seu dia-a-dia. Aqui vale introduzir palavras de auto-sugestão como ‘‘meu
cérebro se tornará mais ativo, devido estar sendo irrigado por um sangue mais
oxigenado e mais puro. A eficiência do meu trabalho hoje depende dessa minha
resolução’‘. Vale a pena repeti-la todos os dias.

É muito importante para firmar o valor da prontidão em todos os nossos atos,


fazer tudo o que pensarmos, após análise rigorosa do nosso raciocínio, que é
poder da inteligência, e de nossas reflexões intuitivas, que é poder receptivo de
idéias e formas de pensamento que vêm de fora, colocando intensidade nos
nossos pensamentos e rapidez na ação. Ao praticar algum ato, faça-o tão rápido
quanto possível, imediatamente se necessário. Procedendo assim, o pensamento
se torna cada vez mais dominante e as ações cada vez mais acertadas, através da
correção de erros que neste aprendizado vamos ter que enfrentar. Nesta forma de
pensar e agir é que se fortifica o valor da prontidão. Estar sempre alerta para
tudo e todas as coisas, eis o lema dos escoteiros de todo o mundo. E eu
acrescento: tenha intensidade no pensamento e rapidez na ação, que o êxito será
sempre garantido.

Se, durante a nossa educação no lar pelos nossos pais ou nas escolas pelos
nossos professores não tivermos o necessário estímulo para agirmos com
prontidão, seja por falta de bons exemplos, seja pela própria natureza das
pessoas que não souberam ser exigentes conosco, ou ainda, seja pela falta de
iniciativa e indecisão, não devemos cruzar os braços e nos considerarmos
derrotados. Sempre será tempo de encetarmos uma mudança mediante auto-
sugestão e reeducação da vontade e de nossas forças interiores. Basta alguns
poucos meses de treinamento se de fato a criatura se dispuser a se modificar para
operar-se uma grande transformação. Existem técnicas e cursos, bons livros, fitas
cassetes e de vídeo que trazem resultados infalíveis sobre centenas de assuntos.
O segredo é querer. Lembre-se que querer é poder, a força de vontade em ação
tudo vence.

É claro que cada indivíduo tem seus próprios limites, devido ao meio em que
nasceu e foi criado, ao estado de saúde, ao ambiente de trabalho, só para citar
algumas limitações. Mas, as grandes limitações estão no grau de instrução que
teve oportunidade de receber e no grau de evolução espiritual. Tudo isso somado
constitui o verdadeiro desafio que cada um tem de enfrentar. Há uma forte
interação de todos esses fatores, mas também existem forças latentes em cada
um de nós como o pensamento, a força de vontade, o raciocínio e tantas outras,
todas atributos espirituais essenciais e positivas, que postas em ação em cada
momento de nossa vida atuam em sentido contrário àquelas limitações,
neutralizando-as, vencendo os obstáculos, solucionando os problemas mais
difíceis. O que é importante é não esmorecer, não desistir nunca da boa luta, não
se julgar um coitadinho e um derrotado. Somando a estas forças positivas o
hábito da prontidão, qualidade importante que deve ser adquirida com
persistência e perseverança, nada será impossível. Aliás, a palavra impossível
não existe no dicionário de todos os grandes vencedores na luta pela vida.
Muitos e muitos grandes homens, a História está cheia de exemplos, vieram do
nada.

Há um outro ditado popular que cabe muito bem, a pretexto do tema ‘‘A
PRONTIDÃO’‘: ‘‘Não deixes para amanhã o que puderes fazer hoje’‘. Assim
procedendo, estará exercitando a prontidão. As pessoas que acumulam tarefas e
mais tarefas, adiando e postergando sua execução por absoluta falta de vontade
ou planejamento, acabam se perdendo no meio do caminho. Tornam-se
extenuadas, nervosas, estressadas, ansiosas por não saberem por onde começar.
Sua eficiência é muito baixa. Chegam a adquirir o péssimo vício de roer unhas.
Só há um caminho para corrigir isso: pense antes de agir e aja sempre com
prontidão. Planeje o seu trabalho, o uso de seu tempo e dê prioridade ao que
deseja e tudo se modificará. Há sempre um tempo para cada coisa. Coloque
ordem e disciplina em seus atos e verá como tudo se modifica para melhor.

Há um outro aspecto muito importante a considerar, que está contido nestas


sentenças de forte sentido popular: ‘‘Não deixe passar a ocasião’‘ ou ‘‘Não deixe
passar a oportunidade’‘, ou ainda, ‘‘A sorte não bate duas vezes na mesma
porta’‘. Cada um de nós deve exercitar-se em identificar as oportunidades e
agarrá-las pelos cabelos tão logo se apresentam. Isto é prontidão, também.
Quantas e quantas vezes lamentamos por não termos tomado determinadas
decisões. Aqui invocamos novamente dois ditados populares de grande
transcendência: ‘‘Águas passadas não movem moinho’‘ e ‘‘Não adianta chorar
sobre o leite derramado’‘. Perdida uma oportunidade, é tirar as lições que deixa
e, de cabeça erguida, olhar para a frente, usando a experiência adquirida para
enfrentar novos desafios. Normalmente, a voz da consciência nos aconselha e,
analisado o problema, tomada a resolução, execute-a incontinente; desse modo, a
criatura adquirirá o hábito da prontidão e reduzirá enormemente seus
arrependimentos por não ter agido. Portanto, não deixe passar a ocasião, não se
deixe assaltar por dúvidas e auto-sugestões negativas. Sobretudo, não protele
nunca o que tiver que fazer!
Termino este tema com outro ditado bastante apropriado: ‘‘Malhe o ferro
enquanto está quente’‘. Se deixar esfriar, será mais difícil ou até mesmo
impossível.

A renúncia

A renúncia é um sentimento positivo de alto valor para as criaturas, que consiste


em libertar-se dos desejos e ilusões desse mundo em proveito de uma causa e em
benefício de seu semelhante e até da humanidade. Pela renúncia, a criatura
submete-se, pacientemente, ao sacrifício e ao sofrimento da vida. Resigna-se aos
prazeres e gozos do mundo, desapega-se, desprende-se das coisas e dos desejos
negativos. Liberta-se principalmente do egoísmo, do ódio, da inveja, do orgulho
e da mentira e cultiva o amor ao próximo, a amizade, o altruísmo e a
fraternidade, dedicando-se aos seus semelhantes espontaneamente, dando tudo
de si sem nada pedir. A renúncia requer alto grau de espiritualidade, desapego
das coisas terrenas, desprendimento daquilo que poderia ter ou conseguir com
sua vontade e seu esforço. A criatura que optou pela renúncia já lapidou o seu
caráter e já tem o seu pensamento e a sua vontade voltados para uma vida
superior, espiritual.

A criatura humana é seduzida pelas ilusões da vida, pelos prazeres mundanos,


pelos desejos malsãos. Centrada em sua individualidade egoística, vale dizer, seu
‘‘ego’‘ vê o mundo segundo a ótica das aparências. O egoísmo, ao qual a criatura
se torna escrava, marca-lhe os seus pensamentos e sua vontade com toda força
para desejar e querer tudo para si e sempre mais e mais. Ao contrário disso,
aquele que conhece a vida como força e matéria, e disso se imbuiu, deu-se conta
de que somente a força, vale dizer, o espírito evolui continuamente. Aquele que
engrandece sempre o seu espírito com bons pensamentos e boas ações, que
penetra e sente a essência das coisas, que entende a globalidade da vida e
domina a si mesmo tem lucidez suficiente para afastar-se de todo desejo. E assim
procedendo, torna-se cada vez mais racional e chega ao estado de renúncia
voluntária. Torna-se um altruísta de verdade, tem tranqüilidade de espírito e
expressa essa atitude na forma de humildade e resignação consciente em prol de
si mesmo, de uma causa ou de seu semelhante. Torna-se, pois, caritativo, na
melhor acepção da palavra, com plena dedicação aos pobres e necessitados,
sacrificando-se, assim, pelos seus semelhantes. A criatura renunciada passa a ver
a si mesmo em todos os seres e a considerar como seus todos os sofrimentos do
mundo. Nesse estado de graça, absorve todas as angústias de que toma
conhecimento, como se ela própria fosse a vítima. Sua visão é a de preencher os
sofrimentos alheios com zelos e cuidados como se fossem destinados a si
mesmo.

O renunciado, mesmo quando privado de toda a alegria que pudesse ter, bem
como de todos os bens materiais que pudera acumular em toda a sua vida,
desfruta de uma ventura quase completa, é uma criatura feliz, desfruta de uma
calma muito grande e de uma paz de espírito inabalável. Nele, todos os desejos
se apaziguaram e sua serenidade íntima transcende o seu semblante e irradia-se
por todos à sua volta. O único desejo que possui é o de prestar ajuda a quem
precisa, espontânea e convincentemente. Ele possui a firmeza de vontade voltada
para o bem comum, e sublima em suas ações, em benefício alheio, todo o vigor
espiritual de que é dotado.

Somente as criaturas dotadas de grande amor ao próximo, a quem ama mais do


que a si mesmo, capazes de se esquivarem ao ódio e às injúrias alheias, podem
se compenetrar do valor da renúncia e praticá-la, no seu dia-a-dia, com
espontaneidade em prol dos mais pobres e sacrificados. Mas também podem e
praticam a renúncia em favor de si mesmas, desapegando-se dos bens materiais e
desprezando toda a vaidade e a vanglória do mundo. Não dão valor algum às
honrarias, por saberem que são efêmeras, embora encerrem e representem um
reconhecimento pelas suas nobilíssimas ações. Carregam no seu íntimo o real
sentido da vida verdadeira, da fraternidade universal. Aguardam com segurança
o fim de sua vida terrena, não temendo a morte, esperando com serenidade,
livrarem-se das ilusões da vida terrena e das peias da matéria.

O renunciado tem uma convicção, uma segurança inabalável em si mesmo e, em


tudo o que faz, faz de alma lavada, sem subterfúgios ou hipocrisia, confiante e,
com o espírito fortificado pela causa que defende ou abraça, não se sente
subjugado por coisa ou força alguma que possa lhe opor resistência e enfrenta
com denodo as mais duras privações para realizar o trabalho a que se propôs.
Banhado de humildade verdadeira, leva uma vida austera, séria e simples.
Dotado assim de tanta força espiritual não lhe faltam seguidores dedicados e
honestos que com ele comungam, apoiam a sua causa e a levam a bom termo.
Essa polarização consagra o renunciado que trabalha pela comunidade, pelas
grandes causas e campanhas, ao mesmo tempo que realimenta as suas forças
para prosseguir sempre e sempre no seu trabalho.

Não se deve confundir o renunciado com a criatura caridosa. Esta, quase sempre,
procura a louvação pela caridade que faz, pede aprovação da sociedade, a quem
faz questão de exibir-se como benevolente ou beneficente. Muitas vezes, o falso
caridoso utiliza recursos amealhados ilicitamente através de rapinagem,
falcatruas, tramóias e corrupção de toda espécie. Pretende, com as migalhas que
distribui, salvar as aparências e até ‘‘salvar’‘ a sua alma. Pensa, assim, comprar o
céu para não ir para o inferno. Esse, é um tolo sem o saber!

Ao longo de toda a História da Humanidade passaram grandes vultos,


respeitados pelo seu espírito de renúncia e abnegação, ficando registradas as
nobres causas por que se bateram. No passado remoto, Buda e Jesus foram
exemplos edificantes que abraçaram grandes causas renovadoras de costumes,
cujos princípios morais perduram até os nossos dias e, certamente, hão de se
projetar para o futuro.

Recentemente, assistimos pela televisão às imagens e cenas comoventes das


honrarias prestadas ‘‘post-mortem’‘ à princesa Diana Spencer, na Inglaterra, que
dedicou a última parte de sua curta vida de trinta e seis anos à luta em prol dos
doentes e desamparados nos hospitais de todo o mundo. Esse símbolo da
filantropia moderna destacou-se, ainda, na luta pela eliminação das mortíferas
minas terrestres, que vêm mutilando cerca de 25000 pessoas por ano, em todo o
mundo, apesar de o mundo estar em tempos de paz. Quase ao mesmo tempo,
com a diferença de uma semana, o mundo perdeu outro grande vulto, na figura
de Madre Teresa de Calcutá, uma grande alma, missionária, que dedicou sua
vida a socorrer os pobres e famintos da Índia, o mais edificante exemplo de
renúncia de nosso tempo, recebendo honras de Estado durante suas exéquias, as
mesmas prestadas a Gandhi, o libertador da Índia, há mais de cinqüenta anos,
pela sua luta contra a fome e pela unificação daquele país.

No Brasil, também recentemente, tivemos a morte do socialista Betinho,


acometido da mais terrível doença do século - a AIDS, contraída durante uma
transfusão de sangue por ser hemofílico. Nos últimos anos de sua vida, jamais
desistindo de viver, organizou e conduziu uma grande cruzada nacional para
sensibilizar todos os brasileiros para o combate a essa doença, desdobrando as
suas ações, também, em auxílio aos pobres e socialmente desamparados.

São três exemplos de renunciados e abnegados de nosso tempo que, também,


passarão às paginas da História para serem reverenciados pelas gerações futuras.
A saudade
A saudade é um sentimento positivo, porque ela nos traz à mente as boas
lembranças do passado. Não se tem saudade do presente e, muito menos, do
futuro. Tudo quanto vivemos no passado ficou registrado em nossa consciência e
constitui a nossa memória atual. Fatos e situações das mais diversas, boas e más
ações ali estão guardadas como se fossem fotogramas de um filme
cinematográfico ou de uma fita de videocassete.

A saudade, quando revela um sentimento muito forte nos comove, trazendo as


mesmas emoções vividas naquele instante passado, provocando prazer ou dor,
conforme a emoção predominante que sustentou o episódio a que estamos nos
religando.

É fato concreto que nossa vida é feita de fragmentos que se sucedem, dando a
impressão de continuidade. Estes fragmentos constituem-se de quadros e cenas
que se completam. Às vezes, basta nos lembrarmos de um único quadro, que
poderia ter ocupado uma fração de segundo, para vir à tona toda a história a ele
associada, reconstituindo cenas e mais cenas. Quanto mais forte for o episódio
vivido, tanto mais forte ele retorna à superfície da mente.

A saudade é o nosso passaporte para o passado de nossa vida atual. Ela nos
transporta às cenas de nossas lembranças que marcaram momentos de nossa vida
com entes queridos ou situações que nos proporcionaram, de alguma forma,
sentimentos de alegria, prazer e êxtase.

É bom ter saudades de alguém. Isso nos religa àquela pessoa que as
circunstâncias da vida afastaram de nosso convívio, seja no espaço, pois ainda
vive, mas em outro local, seja no tempo, se já falecida. Neste último caso, não
devemos concentrar doentiamente nossa atenção na pessoa para evitar que
prejuízos de ordem espiritual nos atinjam. Mesmo no primeiro caso, quando
decorrido muito tempo de nosso último contato e não se sabe se a pessoa ainda
está viva, pela mesma razão antes referida, deve-se evitar concentrar a atenção
na pessoa querida.

Embora a saudade nos traga lembranças queridas e desejadas, não devemos viver
com a mente sempre voltada para o passado. É preciso viver o aqui e agora, isto
é, o presente, de forma adequada, para preparar o nosso futuro, cumprindo com
nossas obrigações morais e espirituais, empenhando-se a criatura no propósito de
sua evolução.

Sentimentos de saudade qualquer que seja a motivação que os deflagrou, são por
natureza espontâneos e não devem ser ‘‘freados’‘ ou controlados, mas deixados
fluir de forma natural até que se completem. O que não se deve é doentiamente
provocá-los a ponto de se transformarem em dor, choro ou outro sentimento
negativo qualquer. Sendo um sentimento elevado e muitas vezes, até sublime,
deve ser entendido como um ‘‘alimento’‘ para o espírito e, como tal, sublimado.

Grandes amores, quando perdidos, suscitam grandes saudades, mas o passado


não se modifica e, portanto, é inútil ficar martelando atos, cenas e presença que
já se foram. O que devemos é tirar lição das falhas cometidas e bem aplicá-las
em nossos atos e atitudes no presente e no futuro.

Há lembranças e reminiscências de nosso passado que nos levam a ter saudades,


como por exemplo de fatos, coisas e lugares de nossa infância e que, às vezes,
retornam a nossa mente em ocasiões de reflexões isoladas ou em grupo, quando
encontramos antigos amigos e companheiros que não víamos há muito tempo.
São as boas lembranças da meninice ou da juventude ou mesmo de lugares
distantes onde vivíamos e que os anos não trazem de volta, tão magnificamente
revelados pelo poeta José Marques Casemiro de Abreu, nesta estrofe que inicia o
seu poema ‘‘Os Meus Oito Anos’‘ [ABREU, 1979, p. 28].

‘‘Oh! que saudades que tenho

Da aurora da minha vida,

Da minha infância querida,

Que os anos não trazem mais!

..............................................’‘

Cada pessoa tem o seu álbum de saudades e aquele que vem vivendo de forma
honesta, cumprindo seus deveres com satisfação, sempre encontrará e se
deliciará com os momentos de saudade que vier a ter. Se forem muitos, é sinal de
bom viver, mas se forem escassos é preciso evoluir...
A serenidade
A serenidade é um atributo do espírito e, portanto, tem um nível superior. Nem
todas as pessoas a conquistam, porque poucas são as que se esforçam na
compreensão e no domínio de si mesmas pela autodisciplina. Sendo uma
qualidade, ela exerce domínio sobre as influências que perturbam a
autoconfiança e o desenvolvimento natural da personalidade. Ela não pode ser
obtida senão pelo exercício contínuo, tendo como suporte as forças morais,
intelectuais e até mesmo físicas de cada um de nós.

É preciso ter vontade e habiidade para repelir grande parte das tendências
impulsivas que nos acometem. A falta de serenidade é visível nas pessoas
agitadas, naquelas que se comunicam com gestos exagerados de impaciência,
gesticulando-se e agitando-se numa fogosidade inoportuna, desperdiçando suas
energias ao invés de manterem o domínio que emana de suas forças mentais.
Essa agitação é o preço alto que pagamos à preguiça, à indisciplina e aos maus
hábitos inconscientes. A serenidade é o sentimento regulador dos ímpetos
instintivos, das emoções passionais e até mesmo dos movimentos automáticos
ou ditos inconscientes. Os indivíduos agitados não persuadem e demonstram
fraqueza, transmitem idéias obscuras, insegurança e irritação nervosa.

A serenidade é adquirida pela inteligência e pela capacidade de se exercitar física


e espiritualmente e obter o necessário equilíbrio na apreciação dos fatos e no
comportamento do indivíduo no convívio com seus semelhantes. Reconhece-se a
superioridade do homem na facilidade com que transforma a intenção do ato
espontâneo em ato voluntário, determinando para este mais realidade e menos
casualidade. Em outras palavras, é preciso bem pensar e dirigir nossos
pensamentos à realização de objetivos e metas que conduzam ao Bem.

Para desfrutar de maior serenidade é preciso deixar nossos músculos em


completa lassidão, isto é, mantê-los descontraídos e bem relaxados, libertando
também, toda e qualquer tensão de nossos nervos. Para afastar qualquer irritação
causada por alguma ocorrência desagradável, devemos respirar profunda e
ritmicamente várias vezes. Não devemos nos vergar sob o peso de recordações
desagradáveis e dolorosas; antes, pensemos em tudo que for agradável e
inspirador. Quanto mais disciplina pudermos manter em nossos atos, menos
estimulado estará o nervosismo. A serenidade é, também, a liberdade do corpo:
quando este está tenso dificilmente poderá a mente escolher as expressões que
dão vigor ao pensamento.

Quantas vezes, diante de situações penosas e indesejáveis, perdemos nossa


calma! O indivíduo que conquistou serenidade nunca perderá a calma, qualquer
que seja o tipo e a intensidade da provocação. Saberá se conduzir sempre altivo,
altaneiro, sem ostentação e, portanto, despido de qualquer sinal de egoísmo ou
vaidade. Por isso, sentir-se-á seguro e aguardará que seu oponente ou provocador
esgote todo o seu palavrório e descarregue todas as suas emoções descontroladas
para, então, compreender, interceder e retrucar com paciência, procurando anular
os destemperos recebidos. Não quero dizer com isso que o indivíduo sereno
aceite ofensas e fique calado, ocasião em que terá que rebater com firmeza os
acintes recebidos. Sua serenidade se imporá, automaticamente, pelo respeito que
causa, desarmando seus detratores e oponentes.

A serenidade impõe respeito em qualquer situação difícil, mesmo nos casos de


altercação dos ânimos, concorrendo favoravelmente para separar uma eventual
briga que, se prosseguisse, poderia causar males maiores.
A simplicidade
A simplicidade é um sentimento muito positivo, vista como uma atitude ou
estado de atuação da criatura, que pode ser temporária ou permanente. Não se
deve confundir criaturas simples com pessoas simplistas e indivíduos simplórios
que nascem e morrem como tais. Os simplistas simplificam tudo, deixando de
considerar elementos importantes na solução de problemas. Já os simplórios
deixam-se enganar com facilidade, são ingênuos, papalvos e tolos. Não há quem
não tenha na vida, pelo menos uma vez, passado por simplório e, disso, lembra-
se normalmente com pesar.

Observe que os simplistas procuram simplificar as soluções dos problemas que


se lhe desafiam. Em geral, são inteligentes, podendo ser mentalmente
preguiçosos. Já os simplórios possuem fracos dotes espirituais e intelectuais.

Os simplórios, de regra geral, apresentam deficiências mentais; seu Q.I.


(coeficiente de inteligência) é baixo, mas não chegam a ser um imbecil ou idiota.
São lentos no raciocínio e, se possuírem bons sentimentos, são trabalhadores
dóceis e aplicados. Já os de índole perversa são impulsivos e até coléricos,
facilmente manipuláveis para o mal. Estes constituem o grupo dos anti-sociais,
delinqüentes incorrigíveis, reacionários, sugestionáveis e criminosos. Não
conseguem formar juízo correto sobre coisas simples, falta-lhes a boa lógica das
idéias e pensamentos, são primitivos ou primários em quase tudo. Não possuem
sentido adequado de ética e mesmo de estética. Não enxergam o verdadeiro
sentido das coisas e, não raro, agem como crianças de dez a quatorze anos.

É difícil aos simplórios penetrar no âmago das coisas e dos fatos; por isso,
normalmente, impressionam-se apenas com a exterioridade, com as aparências.
Daí, serem desprezados ou normalmente enganados por toda espécie de
espertalhões que lhes passam, com freqüência, verdadeiros ‘‘contos do vigário’‘.
São, por isso, presas fáceis dos vigaristas. Basta isso para caracterizar os
simplórios.

Já os simplistas, normalmente inteligentes e dotados de alguma cultura,


pretendem saber de tudo, são verdadeiros ‘‘sabe-tudo’‘ ou sabichões. Pretendem
conhecer de quase tudo: religião, sociologia, política, medicina, direito, música,
dança, artes em geral, ciência e outros ramos do conhecimento, sempre adotando
critério unilateral e pouco profissional. Passam adiante suas idéias e conclusões
sem senso crítico, sem critério algum. Opinam sobre tudo, falam demasiado e
dizem pouco que se possa aproveitar. Vociferam verdadeiras tolices e, raramente,
percebem o ridículo de suas idéias. Mas, são exclusivistas ao apresentá-las, não
tolerando a crítica por serem unilaterais.

Os simplistas não se dando ao bom uso do raciocínio aceitam e acatam quase


tudo que lhes é apresentado, mesmo coisas e fatos triviais sem qualquer análise,
principalmente e sobre tudo que envolva tradição como religião, crenças de
qualquer tipo: religiosas, políticas ou econômicas. Estes tipos são encontrados
em todas as classes sociais e institucionais, entre cientistas, religiosos, políticos e
entre o comum dos mortais. Transformam as coisas e problemas complexos em
simples e, com isso, enganam-se pela aparente singeleza. São arraigados às suas
idéias e, por isso, não as abandonam por outras melhores. Não abrem as janelas
de suas mentes ao avanço e progresso social, científico e espiritual. São
acomodados.

Os simplistas são, de regra geral, introvertidos, por vezes neuróticos e apegam-se


com facilidade a crenças e superstições de todo tipo: não passam debaixo de
escadas, têm medo de gato preto, não toleram o número treze, enfim, têm medo
de quase tudo que na mente de grande parte das pessoas cultas ou não, se
transformou em símbolos da crendice humana tais como: amuletos, talismãs,
duendes, horóscopos, sexta-feira 13, lobisomens, despachos, feitiços, macumbas,
enfim, uma lista enorme, explorada por cartomantes, quiromantes, ciganas,
macumbeiros e pais-de-santo. São preguiçosos mentais.

Outras vezes, os simplistas engrossam as fileiras dos intolerantes e papalvos que,


morbidamente, com paixão, tornam-se partidários de ideologias cretinas,
colocando-se pró ou contra a marcha do progresso das sociedades e civilizações.
É o caso dos pró ou contra o divórcio, pró ou contra determinada medida
política, pró ou contra os sem-terra e assim por diante, sem qualquer lógica ou
análise crítica dos valores envolvidos. Aferram-se às suas idéias e fazem
‘‘marchas’‘ e ‘‘paredões’‘ de protesto nas grandes cidades, muitas vezes até mais
para aparecer na mídia do que pela convicção de suas idéias.

Há, ainda a considerar, a simplicidade dos que acreditam em milagres e nos


santos milagreiros como Santo Antônio, o santo casamenteiro, ou em santas que
choram lágrimas de sangue. São todos, com certeza, enganados em sua ‘‘santa’‘
boa-fé.
Com o progresso da ciência e da tecnologia aplicada a todos os ramos da
mecânica, da medicina, da biologia, da química, da informática, dos vôos
orbitais e espaciais, da robotização industrial, em que cada vez mais se torna
necessário formar especialistas, ainda assim, aparecem aqui e acolá, perniciosos
simplistas que se julgam catedráticos e peritos em quase tudo, aconselhando o
que não sabem, verdadeiros intrujões que, com a sua vã vaidade, pretendem
conhecer de tudo. É comum este tipo de criatura, que, entrevistada pelos meios
de comunicação, principalmente pela televisão, se propõe a dar opinião sobre
questões que jamais estudou a fundo, em ramo do conhecimento que não é o seu,
não sendo, portanto, senhora da matéria apresentada.

É, pois, preciso olhar com muito bom senso, procurar analisar com senso crítico,
debaixo de rigoroso critério de cada um para não se deixar influenciar por esta
‘‘magna caterva’‘, que quase todos os dias estão aí, pela mídia, a vociferar idéias
absurdas, estapafúrdias, a sugerir tendências que trazem proveito a eles próprios
e suas instituições. Vale aqui, ainda, um lembrete contra a propaganda enganosa,
que facilmente atinge a imensa população de simplórios, mesmo com a proteção
da lei e de organizações de proteção ao consumidor, causando-lhes prejuízos
financeiros e problemas de toda ordem.
A ternura
A ternura é um sentimento altamente positivo. Ela está diretamente associada
com os sentimentos de amizade, amor e fraternidade. Ternura é amor, carinho,
meiguice, afago, compreensão e compaixão no trato com o próximo, sentimento
que se traduz numa espécie de conluio, cumplicidade e intimidade entre
criaturas. Sua força provém da pureza dos sentimentos, da franqueza e da
sinceridade com que uma criatura se comunica com outra, não apenas por
palavras, mas também, com gestos delicados, olhares cálidos, toques de mãos,
afagos de solidariedade e de amor. Pela ternura nós nos tornamos íntimos de
outra pessoa. Ter ternura é envolver-se carinhosamente com outras pessoas. A
ternura é um sentimento tão envolvente que normalmente ela é devolvida, no
mesmo instante, dada a sua natural reciprocidade.

Ninguém é uma ilha, está isolado ou sozinho no mundo. Toda pessoa gosta de
ser observada, apreciada, de saber que seus dons são realçados e admirados e,
também, gosta de provocar desejos e sentimentos de amor, de amizade e de
fraternidade. A intimidade, que decorre naturalmente da ternura, é a chave de
ouro que abre corações, e predispõe a criatura às confidências e à entrega.

Há muita ternura nas juras de amor, desde que firmadas na sinceridade de


propósitos e de sentimentos puros, não egoísticos. Há ternura na mãe que
amamenta seu filho, que acode prontamente quando este acorda e chora por
qualquer motivo. Vêmo-la na zelosa enfermeira que cuida com todo o carinho de
pacientes terminais em enfermarias e hospitais de todo o mundo. Há ternura no
sorriso inocente e nas risadas cristalinas das crianças.

Ter ternura por alguém é compartilhar quase tudo do que é seu com outra pessoa,
trocando confidências, caprichos, sucessos, fracassos, tormentos e conflitos, sem
haver segredo entre elas. É o sentimento de ternura, muito profundo no amor,
que leva duas criaturas a se entregarem uma à outra pela confiança mútua e pela
empatia que irradiam entre elas. Há uma admiração das qualidades de modo
afetuoso e romântico. Cada uma tem que se sentir à vontade, desinibida,
responsável para que haja ternura, para que possam falar com franqueza de suas
preocupações, sem condenações, sem censura, sem críticas, mas com
compreensão e aceitação completa.

Duas pessoas são meigas entre si não porque uma preenche e satisfaz as
necessidades da outra, mas sim, porque vibram com as mesmas idéias, pactuam
com os mesmos sentimentos, sentem prazer em estar juntas, partilham dos
mesmos gostos, apreciam as mesmas iguarias, assistem aos mesmos espetáculos,
enfim, porque existe uma identificação de pensamentos, sentimentos e
propósitos compartilhados.

A ternura pede sinceridade e confiança; sem estas, não há ternura, ela não se
consuma. É importante que se observe que pregar a igualdade é uma coisa,
praticá-la é outra e isso faz uma grande diferença no relacionamento entre duas
criaturas, principalmente no amor. Se houver uma tendência, ainda que pequena,
por parte do homem, para o culto do machismo, não haverá como consolidar
uma relação duradoura. O mesmo se pode dizer com relação ao ciúme,
principalmente por parte da mulher, sendo este sentimento a causa que vem
separando milhões de casais em todo o mundo, alterando profundamente a
evolução dos seres pelos efeitos que produz na prole.

É preciso não confundir carinho com carícia; o primeiro é um desdobramento da


ternura, o segundo implica nos procedimentos que precedem ao envolvimento
amoroso, pela manipulação e pelo toque de partes do corpo, com finalidade
erótica. Mas, há certos gestos simples como o afagar de mãos, em que carinho e
carícia se complementam para expressar a força da ternura e da solidariedade,
principalmente entre as mulheres, enquanto que os homens usam o conhecido
tapinha nos ombros ou nas costas para expressar a mesma coisa.

Não se trata de se espelhar nas qualidades de outra pessoa, tentar copiar, imitar
os seus sentimentos, gestos, expressões e ações. Não existem duas pessoas
exatamente iguais, cada uma tem a sua própria vivência, que é o conjunto de
experiências vividas, em que influíram o grau de espiritualidade de cada um, o
seu ambiente familiar, a educação e as amizades. Trata-se da criatura ser ela
mesma e enxergar na outra, no próximo, o mesmo direito, aceitando essa
verdade com toda naturalidade. A ênfase, o foco tem que se deslocar para a
vontade de servir e se dar, para os sentimentos de admiração e confiança para
que a ternura ocorra. Não se trata de sentimento permanente, mas que é
deflagrado em certos momentos muito especiais em que ocorre, mutuamente,
grande transferência de energia, de verdadeira torrente de fluidos, vibrações
essencialmente espirituais.

A pessoa capaz de ser sensível e meiga não tem receio de expor sua ternura por
alguém, porque não conhece o orgulho, já se desvencilhou dele. Não se trata de
exibicionismo, de machismo ou vaidade para alisar o ego das criaturas e
despertar os olhares de curiosos que estão passando ou estão por perto. Um
elogio, por exemplo, pode conter um sentimento de admiração, uma grande dose
de carinho e ternura, se for sincero, e, ainda assim, poderá ser recebido com
desdém se não houver empatia entre ambos.

A ternura brota da alma das criaturas de espiritualidade elevada, desprendida.


Afagos e carinhos não são ações puramente materializadas; ao contrário, provêm
do sentimento e da vontade, estão na compreensão de não estarem sós, firmam-
se no desejo de estarem sempre juntas, de não se afastarem uma da outra, de
precisarem-se mutuamente, de conviverem, de trocarem segredos e confidências,
na certeza de poderem confiar sem o risco de virem a ser traídas. Essa
cumplicidade é deliciosa, porque se desdobra do sentimento de ternura. Já a
carícia é a materialização, a execução da ternura através dos gestos e dos toques.
Pode haver carícia sem ternura, manifestada de forma egoísta por uma ou ambas
as criaturas, mas a verdadeira ternura pode existir e até se manifestar sem a
carícia, de outras formas, como, por exemplo, nos momentos de solidariedade e
compaixão que hipotecamos às pessoas queridas, quando as vemos sofrer a
perda de um ente querido. Aqui, vemos que a ternura está na atitude do gesto,
embora não haja carícia ou afago.

Aqueles que conseguem fazer a ternura brotar de seus corações, que são capazes
de fazer vibrar seus bons sentimentos de bondade, solidariedade, fraternidade e
amor por alguém, tanto na alegria como na dor, são criaturas de sentimentos
elevados, de espiritualidade desenvolvida. Despojaram-se dos baixos desejos
materialistas e dos sentimentos negativos mais nefastos, como o ódio, a inveja, o
ciúme, o egoísmo e o orgulho. São pessoas felizes por comprazerem sua
felicidade com o seu próximo, dando sem nada pedir nem esperar recompensas,
com simples naturalidade, por prazer de viver assim. Não se deve confundir essa
felicidade com a aparente felicidade daqueles que, usufruindo desregradamente
da força do dinheiro e do poder, parecem mas não são felizes, no sentido mais
elevado que o termo felicidade enseja. Veja o tema ‘‘A FELICIDADE’‘ em outra
parte desta obra.

A tolerância

A tolerância é um dos sentimentos mais difíceis de se praticar em toda a sua


inteireza, já que, para tanto, é necessário respeitar o modo de pensar e agir
próprio de cada pessoa, mesmo quando se discorda de suas idéias e
idiossincrasias. Ela é um baluarte do espírito, uma virtude que contribui
fortemente para a evolução espiritual.

Quando um indivíduo age de forma reiteradamente inconsistente e refratária à


boa prática moral e à boa convivência, está criando resistência à tolerância, ou
seja, o indivíduo ou grupo de indivíduos assume uma posição intolerante. Dessa
forma, fica mais prático falar da intolerância e dos intolerantes que grandes
males causam a si mesmos e à sociedade.

A intolerância pode atingir milhões de pessoas que rejeitam opiniões contrárias


às suas; daí, perseguirem qualquer idéia, crença ou doutrina em desacordo com a
sua. Ao longo da História, rios de lágrimas e sangue foram derramados por causa
da intolerância religiosa ou política. Dessa forma, a intolerância tem se mostrado
nociva ao bom entendimento dentro dos lares, ao progresso humano e à paz,
tornando-se motivo de discórdia e acirrados desentendimentos políticos e
religiosos, causando crises e mais crises de convivência entre as nações.

A intolerância é sustentada por algumas distorções do caráter e defeitos de


comportamento, entre eles a ignorância, o egoísmo e a introversão de alguns
sentimentos retrógrados. Aqueles que persistem no desacordo e no egoísmo e se
arvoram como donos da verdade, que fogem de um bom diálogo e não sabem ou
não querem ouvir e raciocinar sobre as novas idéias expostas por seu
interlocutor, praticam a intolerância consciente ou inconscientemente. Também,
os tiranos e donos do poder, que abusam deste para impor suas idéias, métodos e
pontos de vista, sem o devido debate com a opinião pública, praticam a pior
intolerância, já que aqueles que tiverem a ousadia de se lhe oporem, enfrentarão
grandes perseguições e dificuldades para continuarem livres, principalmente em
regimes totalitários.

O ditado popular que diz que ‘‘o pior cego é aquele que não quer ver’‘ aplica-se
perfeitamente à grande maioria dos intolerantes, demonstrando na maioria das
vezes falta de inteligência ou de discernimento, quando não, de má vontade e
caturrice.

Na educação dos filhos, nos lares de todo o mundo, a intolerância dos pais é uma
pedra no caminho para o desenvolvimento da personalidade e da evolução
espiritual das crianças.

Os instintos egoísticos podem insensibilizar os pobres de espírito e a intolerância


deles resultante pode impedir a espontaneidade e o desenvolvimento de muitas
criaturas, principalmente das mais tímidas.

Por não concordarem com as idéias e atos de seus interlocutores falta a muitos
intolerantes a capacidade para suportar as suas opiniões, expansões e atos,
contrapondo-se com teimosia, em vez de fundamentá-las com argumentos
lógicos e fortes. Quando dominados pelo egoísmo, muitos intolerantes só vêm o
próprio interesse, o que lhes apraz. Suas razões são estreitas e mal
fundamentadas, já que são incapazes de um gesto sequer de compreensão e
predisposição para mudar os seus pontos de vista.

Em princípio, o intolerante age em desrespeito ao direito alheio, atropelando até


mesmo aquilo que poderia ser um bom diálogo, falando e atrapalhando o
entendimento, quando deveria ouvir primeiro antes de retrucar. Como julgam
estarem sempre certos e donos da verdade, obstinam-se em não ouvir os que
deles discordam. Freqüentemente, levantam a voz para fazer valer a sua opinião
sobre qualquer outra; enfim, além de tentarem impor suas próprias idéias, tentam
sufocar as idéias alheias. Tais indivíduos só vêem as suas idéias, as suas crenças,
as suas causas, as suas opiniões e utilizam-se de artifícios para ‘‘levarem a
melhor’‘. Em geral, são ranzinzas, mal-humorados, birrentos, manhosos e
turrões. Para poder fazer valer suas opiniões são capazes de perder a cabeça,
para não perderem a razão que julgam ter. O intolerante, incapaz de ser reto, leva
tudo e a todos de roldão, já que a honra ou até mesmo a vida de seus semelhantes
nada valem para ele.

A intolerância e a ignorância são irmãs siamesas, inseparáveis uma da outra.


Renega-se tudo pelo prazer de discordar ou por ignorância mesmo. É preciso
repudiar e rechaçar o misticismo enganoso pregado por grupos católicos e
protestantes que nada contribuem para engendrar a convicção nas criaturas. E o
que isto quer dizer? Nada mais, nada menos que: a preguiça e a falta de
raciocínio levam as criaturas a aceitarem ‘‘verdades’‘ montadas para enganar a
humanidade. Esta passividade dos medíocres, que atravessam a vida como fieis
‘‘cordeiros’‘ e ingênuas ‘‘ovelhinhas’‘, é o caldo de cultura ideal em que
medram, em todo o mundo, mais de 8000 crenças, seitas e religiões exploradoras
de todo tipo de crendices, ‘‘mistérios’‘ e dogmas criados para mantê-las
escravizadas aos seus falsos mandamentos.

É portanto necessário praticar e desenvolver a tolerância. Para isto, basta utilizar


a inteligência e a vontade forte e equilibrada, direcionadas para o bem. O bom
uso da inteligência afasta a criatura da escravização aos preconceitos e ao
misticismo e a vontade forte e equilibrada serve para moderar os seus
pensamentos e respeitar o direito e o pensamento alheios. Para isso, é preciso
resistir aos impulsos de se contrapor, de imediato, às idéias alheias. Evite pois,
reagir ao primeiro impulso; ouça primeiro, raciocine e entenda antes de retrucar
ou criticar.

Mas, em alguns casos muitos especiais, pode-se admitir a intolerância e, até


mesmo, louvá-la. Por exemplo, muitos renovadores e sábios, em todos os
tempos, por insistirem em suas idéias e ensinamentos encontraram a resistência
dos preconceituosos. A insistência e a firmeza com que cientistas e filósofos
defendem suas idéias trazem grandes inovações nos campos das ciências, artes,
música, enfim, em todos os campos do saber humano, levando avante o
progresso do nosso mundo.

Admite-se, ainda, a intolerância para defender o espírito das leis, dos princípios
e fundamentos de nossa sociedade, plasmados na Constituição de cada país
moderno e democrático e assim, formar uma frente única contra a violência, o
terrorismo, o vandalismo e demais iniquidades morais. Juízes, magistrados e
representantes do povo têm, por dever de ofício, de serem intolerantes toda vez
que a integridade daqueles princípios corre um risco de rompimento iminente. É
preciso combater o vício, as drogas, o erro crasso, as arbitrariedades e a
corrupção. Aqui trata-se, na verdade, mais de atos de coragem moral do que de
intolerância.

O termo tolerância tem tão relevante importância que grandes autores trataram
do assunto. Voltaire escreveu Tratado sobre a tolerância (1763), importante obra
em que combateu a rotina, o fanatismo e o despotismo da época. Nesta obra,
ressaltou que a falta de discernimento e deficiência intelectual não permitem que
a criatura analise as razões alheias com isenção de ânimo.

Todo homem deve praticar a tolerância, embora nem todos sejam bem dotados
para este mister. Mas, pelo menos, devem considerar-se advertidos e
‘‘vacinados’‘ contra os grandes males que a prática da intolerância causou e vem
causando ao progresso humano, como aconteceu nas negras noites da História,
na época dos grandes inquisidores Torquemada e Ximenes. Basta citar que, na
noite de São Bartolomeu, em 24/08/1572 e nas que lhe seguiram, a intolerância
religiosa sacrificou, na França, sob a conivência do rei Carlos IX e da rainha
Catarina de Médicis, a vida de mais de 30000 pessoas!
No âmbito individual, há os que se opõem a tudo, verdadeiros ranzinzas,
birrentos e rabugentos, para os quais nenhum esforço de tolerância parece dar
resultado. Se não houver vínculo familiar, que, por razão do amor e do dever
exige dos responsáveis a convivência diária sob rigorosa disciplina com
compreensão e amor no trato das questões, o melhor a fazer é afastar-se de tais
criaturas.

Finalmente, embora tratando-se de casos menos complexos, é doloroso


constatar-se que a intolerância nos lares de todo o mundo, em todas as classes,
bem como nas escolas, nas fábricas e nos escritórios, assume verdadeiros casos
de dissensão e excitação causados pela exaltação dos ânimos, que pode passar da
verborréia às vias de fato.

É óbvio que a convivência familiar exige maior dose de sacrifício de cada um,
em que a prática da tolerância reverte em proveito próprio, para maior evolução
espiritual do ser.
O triunfo
O triunfo não é propriamente uma emoção, mas o resultado do profundo
empenho a que o ser humano se dedica para obter aquilo que veementemente
deseja conquistar na vida. O triunfo é o coroamento do esforço e suprema
dedicação.

O verdadeiro triunfo sempre produz resultados duradouros; é aquele que dota o


homem de maior capacidade para servir e ampliar sua ação benfazeja. Devemos
triunfar sempre como seres superiores, eqüitativos, justos e construtivos. Ele é
mais, muito mais que simples destaque, normalmente de natureza egoística sobre
o seu semelhante, razão por que não devemos nos deixar levar pelo triunfo que
escraviza o triunfador, pisoteia e massacra o seu semelhante. Tal triunfo nos
humilharia e degradaria.

A humanidade atribui muitos sentidos à palavra triunfo: desde o galanteador que


triunfa sobre seus rivais para conquistar sua namorada, outros, na conquista de
grandes honrarias e vitórias conseguidas pelos grandes generais e marechais das
guerras, até os cientistas, cujas descobertas podem trazer e, freqüentemente
trazem, grandes benefícios à humanidade. Esta lista de exemplos de triunfos
poderia se estender exaustivamente.

Ocorre triunfo ilusório quando a criatura oprime seus semelhantes, causando-


lhes aflição e sofrimento para alimentar a vaidade ou o sentimento de poder que
muitos se orgulham egoisticamente de ter. Trata-se, na verdade, de verdadeira
derrota.

O bom triunfo é aquele obtido com esforço, dedicação e garra em quase todas as
atividades da vida, onde a competitividade é regra geral. Assim é num concurso,
numa polêmica, num vestibular, em que triunfa quem consegue superar todos os
outros. Aqui está em jogo, na disputa ou competição, a capacidade de cada um.
Esta é a boa luta, o bom combate, que estimula o vencedor a alcançar novas e
diferentes vitórias. Assim, triunfar é ser vitorioso em seus projetos.

Erra aquele que pensa que triunfar é apenas alcançar uma determinada meta e
nela estacionar, comemorando os louros da vitória. Uma meta nunca é a final;
diante dela há outras e mais outras, isto é, vários degraus que no conjunto estão a
exigir da criatura a continuidade de novos cuidados e esforços. É o caso dos
profissionais liberais que têm que atualizar seus conhecimentos, reciclá-los
constantemente para acompanhar o progresso das ciências e das técnicas,
especializando-se sempre para melhor exercer seus misteres.

Acerta aquele que considera o triunfo como realização do que se propôs a


alcançar, sem arrefecer a disposição e o interesse de continuar triunfando sempre
que as sucessivas metas vão se modificando. Tal ação caracteriza a persistência.
Com este conceito em mente, triunfar é lutar, vencer e progredir.

Para melhor triunfar é preciso conhecermos a nós mesmos, nossa constituição,


nossas potencialidades, nossos atributos, nosso modo de ser e atuar, enfim,
termos plena confiança em nossa capacidade de realização. O triunfo depende da
criteriosa utilização de tudo isso. Nossas reservas são incomensuráveis e a força
espiritual, inesgotável. Para triunfar basta conscientizar-se que as ações que a
criatura empreende são dignas, isto é, que atendem a um propósito elevado, que
o sucesso e a vitória virão com certeza.

Há muitos exemplos na História de muitos povos de pessoas que, depois de


terem passado por fracassos e mais fracassos, reagiram com sua forte força de
vontade, invocaram suas potencialidades latentes e acabaram por triunfar.
Mesmo assim, o triunfo de muitos só é reconhecido muito após a sua morte, por
futuras gerações.

Um triunfo construído apenas sobre coisas e bens materiais é efêmero; o


dinheiro ganho com esforço físico e mental, com persistência, pode nos dar o
pão, mas não alimenta o nosso espírito que continua faminto de conhecimentos e
saber. Ou seja, a personalidade e seus atributos não se desenvolvem apenas com
dinheiro, honrarias e distinções, mas requer a participação da consciência,
vontade e conhecimento.

O desenvolvimento de nossa personalidade, de nosso ‘‘eu consciente’‘, tem que


ser obra de nós mesmos. É preciso moldar o caráter, para que ele seja glorioso e
não humilhante, magnífico e não repulsivo, superior e não inferior. Para isso,
precisamos investigar com seriedade o que somos, o que desejamos, o que
necessitamos, de onde viemos, para onde vamos. É necessário que
estabeleçamos parâmetros de aferição e comparação, onde o pensamento
racional sobreponha-se ao pensamento emocional e místico. É necessário que
corrijamos nossas falhas, que esmiucemos tudo, que analisemos criticamente
cada pormenor, que revigoremos nossas virtudes, enfim, que pautemos nossa
vida segundo os princípios morais e cristãos.

Se assim procedermos, o triunfo e o sucesso serão comuns, naturais, em tudo a


que viermos fazer e empreender. Nossas vidas se enriquecerão e ganharão
sempre mais vigor, mesmo quando na velhice, o corpo começar a dar sinais que
está definhando. E, então, você verá que valeu a pena viver!
O valor
O homem não sabe viver sem dar valor àquilo que criou ou que já tem ou que
ainda vai adquirir. O conceito de valor resulta do conteúdo ou da qualidade de
uma coisa, de um objeto ou de uma idéia e é inato no indivíduo. Já que a palavra
valor se presta a um sentido muito amplo, esclarecemos que estamos tratando
aqui do valor no sentido de valorar, isto é, emitir juízo de valor, ponderar, bem
diferente do valor que denota o caráter e o grau de espiritualidade das criaturas.
O conceito que estamos desdobrando aqui está diretamente ligado ao conceito do
que é útil ou inútil e do que tem ou não qualidade. Embora seja um conceito de
ordem material, ele se aplica, também, ao plano das idéias e pensamentos e ao
próprio plano espiritual, desde que seja mudado o enfoque. Vamos introduzir
também o conceito de autêntico, que é mais direto e fácil de assimilar, mas o
mesmo não pode ser dito sobre o seu conteúdo, pois este implica em saber
distinguir o falso do verdadeiro, o joio do trigo.

Materialmente falando, se desejarmos adquirir um objeto ou um bem, como por


exemplo, uma jóia ou um carro, ambos usados, teríamos que submeter ambos à
avaliação de um profissional especialista, joalheiro ou mecânico, conforme o
caso, para que o seu real estado de conservação, qualidade e outras
características intrínsecas sejam verificadas. Estas avaliações levam em conta,
ainda, a confiança que depositamos nos referidos especialistas. Afastado o grau
de incerteza, criamos coragem e realizamos o negócio. Veja que aqui entrou o
fator confiança, tema tratado em outra parte desta obra.

No plano das idéias não é tão simples assim, devido ao grau diferenciado de
conhecimentos, cultura e espiritualidade de cada criatura. Precisamos usar
discernimento e bom senso para avaliar ou valorizar idéias, sugestões,
comentários, recomendações, conselhos, ensinamentos, propostas, propaganda
difundida pela mídia, notícias e toda a parafernália de informações técnicas as
mais variadas. Precisamos saber avaliar, ou seja, atribuir juízos de valor a tudo o
que se lê, que se fala, que se ouve, para não sermos atropelados por inverdades e
tolices e não sermos enganados pelos espertalhões que pretendem vender gato
por lebre. E por que avaliar ou valorizar? Para sabermos se são autênticos, se
possuem real valor e utilidade, se merecem ser aceitos, se são merecedores de fé
ou confiança, se têm mérito ou demérito. Vamos nos ater, neste tema, na
comunicação das idéias, na divulgação de ensinamentos através da explanação
oral, na persuasão e aceitação da palavra escrita ou falada.

O hábito de elaborar superficial e imperfeitamente as idéias tira-lhes toda a força


e brilho e enfraquece o sentido e o sentimento como são aceitas ou recebidas,
devido ao grau de incerteza que gera na mente do leitor ou do ouvinte. As idéias
e princípios morais e doutrinários precisam ser explanados em seu conceito e
conteúdo, de uma forma autêntica e permanente, realçando o seu valor real e
intrínseco. É preciso mostrar o seu valor definitivo, duradouro, bem diferente das
mensagens levadas aos consumidores, estes mais preocupados com o brilho das
aparências e da ostentação do que com a realidade da vida.

Precisamos nos esforçar mentalmente para evitar o pensamento superficial,


pueril, insignificante, sem importância, que nada pode contribuir para a
formação de idéias persuasivas de real valor. Não se trata de usar recursos
lingüísticos da eloquência dos grandes oradores, mas de exercícios que levam à
simplicidade convincente da linguagem comum. Persuadir é a arte de convencer.
É fazer com que nossos leitores ou ouvintes aceitem o que lhes estivermos
comunicando, de forma transparente e clara. É a clareza que prende a atenção e
estimula o raciocínio do leitor ou do ouvinte. As frases e sentenças podem ter
elegância e esplendor, sem contudo deixarem de ser simples, ao alcance do
entendimento de qualquer criatura.

Para persuadir, é preciso influir na disposição de nossos semelhantes, captar-lhes


o interesse e a confiança e conseguir sua aceitação aos nossos argumentos. Para
que sigam nossas sugestões, nossa exposição precisa ser sincera, fraterna e
verdadeira, além de ser orientadora e de utilidade prática. É preciso elaborar as
idéias com todo cuidado, escolher a palavra adequada a cada caso, não ser
displicente, mas sim ardoroso e polido. Polir as idéias, escolher as expressões
simples e de valor, exprimir nossas intenções com clareza causam admiração e
aplausos. Falar todos sabem, mas poucos são os que pensam e falam o que
pensam aberta e arrebatadoramente. Isso é conseqüência do refrão popular que
diz que ‘‘ninguém pode dar o que não tem’‘, significando que ninguém pode
ensinar o que não sabe. Se houver carência de idéias, incerteza por parte de
quem está falando e repetição desnecessária de expressões, os efeitos no leitor
ou no ouvinte serão negativos. São de autor desconhecido as seguintes palavras
que sintetizam uma grande verdade: ‘‘As grandes mentalidades falam de idéias;
as medíocres discutem coisas; as pequenas ocupam-se em falar da vida alheia’‘.

Tudo na vida tem o seu significado, já que nada acontece por acaso. É preciso
saber decifrá-lo e tirar proveito de seus ensinamentos. É preciso educar e aguçar
a nossa sensibilidade para apreender e ler nas entrelinhas, perceber e penetrar
além das aparências, para captar tudo o que for animador, belo e agradável.
Precisamos nos dar ao hábito de pesquisar e inquirir, fazer perguntas sobre o
porquê das coisas e dos fenômenos, examinar as circunstâncias, verificar o fato
gerador ou a causa de tudo quanto experimentamos. Assim procedendo,
estaremos sempre aprendendo e evoluindo ao mesmo tempo em que estaremos
mantendo o nosso espírito ocupado, aguçado, confiante e vigoroso.

Estará usando os recursos da persuasão quem procurar expressar suas idéias com
sentimento e animação, aquele que tiver certeza de que as suas conclusões estão
bem fundamentadas e procurar dar a elas um cunho de autenticidade e
originalidade. Não se deve tornar-se demasiadamente repetitivo, a não ser para
acentuar pontos essenciais.

Procure desenvolver o seu tema de forma clara, direta e compreensiva. Na


exposição de seus pensamentos procure evitar o sarcasmo e a ironia que tanto
humilham as pessoas. Ao contrário, procure ser simpático e cortês a quem suas
palavras são dirigidas. Lembre-se sempre que as simpatias conquistadas caem
por terra ao menor sinal de humilhação e desdém e as conquistas conseguidas
jamais serão duradouras.

Desperte sempre o interesse e a atenção do leitor ou do ouvinte com o desejo de


beneficiá-lo com sua obra ou preleção, realçando as idéias, os conceitos e seu
conteúdo. Cite exemplos pertinentes, faça comparações, sirva-se de metáforas,
mas interprete tudo. Jamais seja prolixo ou rebuscado. Quanto menos
complicada sua explanação ou texto, mais fácil de prender a atenção. Convença-
se de que não é fácil saber ouvir, escutar com atenção, sem distração. Por isso,
repetimos, a linguagem tem que ser simples, direta e clara, bem concatenada e,
de preferência, usando frases curtas.

O uso de nossa capacidade de persuasão tem, portanto, um cunho todo


individual, próprio de cada criatura, não cabendo imitação. Cada um tem que
achar o seu jeito próprio de expor suas idéias. Mas, sempre cabem
aperfeiçoamentos através de exercícios especiais e técnicas de comunicação. O
que é sempre necessário é usar de toda liberdade para apresentar sua criação.
Para isso, além do que já foi dito acima, precisamos de equilíbrio, bom senso e
muita inspiração ou intuição. Sobretudo é preciso ser sincero. Nunca, sob
qualquer pretexto, enganar alguém, porque a longo prazo estaria enganando a si
mesmo.

O bom leitor e o bom ouvinte não criarão obstáculos se o tema em exposição for
de seu interesse e não exigir atenção muito além do seu alcance, se houver
silêncio e respeito no recinto e o expositor tiver treino suficiente e não for
enfadonho e demasiadamente repetitivo. Uma voz desafinada, estridente, ou no
outro extremo, rouca demais, bem como a repetição exagerada causam
desatenção e sonolência. Aí, nenhuma assimilação poderá ocorrer e a
comunicação não vingará, será um fracasso.

PARTE II - SENTIMENTOS NEGATIVOS

Sumário
PARTE II
SENTIMENTOS NEGATIVOS
A ansiedade

A ansiedade é um sentimento complexo resultante de forças desagregadoras e


perturbadoras do espírito, causadas pelas incertezas ou receios das atitudes que
tomamos para vencer os problemas de nossa vida individual ou de relação com
os nossos semelhantes. Trata-se de um estado aflitivo, caracterizado por um
sentimento de angústia ou sufoco, a que estamos sujeitos face aos
acontecimentos que nos desafiam, de tal modo que não encontramos solução
imediata para eles. Ela resulta da falta de preparo espiritual, da estreiteza de
nossa mente, incapaz de romper limites, ‘‘amarrada’‘ dentro de si mesma,
sufocada, sem encontrar uma saída para os problemas que, afinal, temos que
enfrentar.

Ansiedade é tormento de espírito. É aflição, cujo grito ecoa dentro de nossa alma
e nos deixa pequenos diante da imensidão dos problemas a resolver. Ela atinge,
principalmente, as pessoas que trabalham muito tempo ou em vários lugares
durante longos períodos, sem descanso, com grandes responsabilidades sobre
seus ombros, acumulando pesados encargos muito além de suas forças. São
pessoas que se preocupam e procuram fazer o que é certo, são bem
intencionadas, mas temem falhar nos seus objetivos. Falta-lhes, porém, a força
da autoconfiança por não conhecerem a si mesmas. Por não poderem fazer tudo
no tempo certo e não saberem ou não poderem delegar parte de suas tarefas para
outros, sofrem muito, mas não externam seus sentimentos, seus sofrimentos; ao
contrário, vão acumulando-os até que chega uma hora em que suas aflições não
podem mais ser contidas e explodem a ponto de chegarem a agredir seus amigos
mais íntimos, seu parceiro ou seus familiares. A sobrecarga de trabalho deixa-os
arrasados, com um sentimento de impotência, por tentar abraçar tudo e não
poder.

Outra causa da ansiedade reside no perfeccionismo que acomete muitas pessoas.


As criaturas que se esmeram para fazer o seu trabalho podem perceber que não
conseguem acompanhar o ritmo das tarefas realizadas por outros com os quais
trabalham em equipe ou em grupo. Isso as deixa frustradas, irritadiças e
irrequietas, e acabam recebendo cargas psíquicas negativas difíceis de carregar
ou superar. Essas criaturas precisam mudar de emprego ou se dedicarem a fazer
tarefas ou coisas que não tenham exigências de tempo, mas de qualidade.

Nas grandes cidades, uma das maiores causas de ansiedade está relacionada ao
trânsito caótico e enervante. Todos querem chegar o quanto antes em algum
lugar e, nesses deslocamentos, premidos por uma necessidade, por um
compromisso qualquer de hora marcada, se acontecer de se atrasar, como
normalmente soe acontecer, a pessoa começa a irritar-se, a angustiar-se, para
dizer o menos. Aí, tenta cortar caminho, procura alternativas e não consegue
avançar. Essa situação deixa a criatura aflita, com impotência de nada poder
fazer, mas sua mente não aceita, rebela-se contra esses obstáculos, impacienta-se
e vai acumulando energias negativas. Se acontecer de esbarrar em outro carro ou
nele trombar, aí o mundo vem abaixo, sai do carro já agredindo e culpando a
outra que por sua vez, tem seus próprios problemas e provavelmente estava
também atrasada e já não podia cumprir o seu compromisso a tempo. É uma
situação constrangedora e estressante, sofrida, agoniada, que poderá ser atenuada
se houver algum acompanhante ou alguém por perto, com calma suficiente para
apaziguar as partes e desarmar os espíritos. Não raras vezes, o resultado desses
imprevistos leva a criatura à agressão, às vias de fato e até às tragédias mais
graves.

Outra grande fonte de ansiedade pode ser encontrada no desemprego, que


desarticula a vida da criatura. Políticas econômicas de combate à inflação
causam recessão e esta leva ao desemprego. A globalização da economia, pela
sua inserção no contexto global, fenômeno que surgiu nos últimos quatro anos e
que consiste em praticar a economia de livre mercado entre as nações, traz
maiores vantagens para as que são mais ricas ou para as que dispõem de
tecnologia de ponta para produzir em escala mundial, baixando os preços dos
produtos aos consumidores de todo o mundo. Com a globalização impõe-se
eliminar as barreiras alfandegárias e, eliminadas estas, as indústrias locais mais
obsoletas acabam quebrando e dispensando seus empregados, muitas vezes até
sem cobrir ou pagar-lhes a indenização devida pela dispensa. Disso resulta que
grandes contingentes de pessoas têm que reduzir seu padrão de vida, muitas
vezes não tendo nem como manter suas necessidades básicas mais prementes de
alimentação, moradia, saúde e educação dos filhos, no caso de criaturas casadas.
Criam-se, então, fortes tensões, inquietudes e desesperanças. Amarguradas por
nada poderem fazer, essas criaturas tornam-se irritadiças, angustiadas e ansiosas,
muitas vezes somatizando doenças ditas psicossomáticas, incuráveis pelos meios
convencionais utilizados pela Medicina. A solução atenuante é procurarem
aceitar outras condições de emprego, mesmo quando fora de sua área de
especialização ou, então, enfrentarem novos desafios, trabalhando por iniciativa
própria.

Nos jovens, a ansiedade adquire força quando têm que enfrentar grandes
desafios e competições face aos seus semelhantes. Todos aqueles que
enfrentaram ou passaram por um exame de vestibular para ingressar em uma
escola superior e tiveram que competir na proporção de uma vaga para dez a
vinte candidatos, sabem muito bem as noites maldormidas que tiveram que
passar em situações de muita angústia, quer antes e durante as provas, como
também enquanto aguardavam os resultados de classificação.

Na vida não há quem não tenha passado por grandes momentos de dissabores e
ansiedades, até mesmo diante de momentos que antecedem situações que,
normalmente, deveriam ser de alegria. Na fase de noivado e casamento, por
exemplo, quando o futuro das criaturas vai depender tanto da compreensão e
tolerância mútuas para a adaptação de duas personalidades totalmente diferentes,
cada um com virtudes e defeitos, os consortes terão que se ajustar e se
harmonizar para manter viva a chama da vida em comum. No outro extremo,
muitos enfrentaram outras tantas angústias e inquietudes diante de uma doença,
por mais simples que fora, de um filho, ou que tiveram de chorar diante da morte
de um ente querido. As criaturas precisam aprender a compreender que há coisas
que não podemos mudar e que na vida tudo passa, nada acontece por acaso e
após a tempestade vem a bonança, com a vida seguindo a normalidade de seu
curso. Precisam aceitar o ditado popular que diz: ‘‘não há bem que sempre dure,
nem mal que nunca se acabe’‘. A boa reação da criatura a essas situações de
terrível sofrimento é o melhor remédio, não deixando se abater de forma alguma
para o que não deve prolongar a sua atenção sobre tais fatos.

Os ansiosos e angustiados são, de modo geral, pessimistas, retraídos e


recalcados. Não sendo expansivos, carregam a tristeza na alma. Deformam os
problemas, ampliam-nos, tornando mais difícil a sua solução. Com essa atitude,
praticada seguidamente durante anos a fio, as tensões vão se acumulando e
causando terrível mal-estar, que se não resolvidas logo, instalam-se em suas
mentes, martelando-lhes a cabeça o tempo todo, sem lhes dar um instante sequer
de trégua, calma e paz de espírito.

Para minimizar ou afastar definitivamente a ansiedade de sua mente, a criatura


precisa conscientizar-se que veio ao mundo para evoluir e não para usufruir. A
luta é própria da vida, inseparável da evolução. Enfrentando os desafios com
naturalidade e otimismo, colocando um pensamento positivo em tudo que fizer,
procurando ver em cada outro ser uma alma irmã, também em evolução, a calma
advirá e prevalecerá, e tudo fluirá a seu contento. Compenetre-se que não adianta
represar sentimentos; é preciso expandi-los se forem bons e extirpá-los se forem
ruins.

A autocompaixão

A autocompaixão é um sentimento negativo e muito prejudicial ao


desenvolvimento da personalidade e, portanto, da espiritualidade da criatura.
Nada impede mais que o homem conheça a si mesmo como Força e Matéria do
que o sentimento de autocompaixão.

As primeiras tendências à autocompaixão desenvolvem-se na infância,


provenientes de uma educação defeituosa dos filhos pelos pais, principalmente
pelas mães, quando exageram no costume de cobrir seus filhos com excessos de
atenção e mimos e outras atitudes incorretas. Isto é tanto mais verdade quando o
casal possui filho(a) único(a). Tais excessos dão à criança a impressão de que se
acham desamparadas no mundo, que há forças destrutivas que as perseguem,
incutindo-lhes, desde cedo, sentimentos pessimistas. É comum ouvir a toda hora
as mães rotularem um ou mais de seus filhos de ‘‘coitadinhos’‘, marcando-os
indelevelmente com o estigma de fracos, moleirões e sem sorte na vida. Isto
quebra-lhes a força de vontade latente, a natural curiosidade que toda criança
tem para se desenvolver e, em conseqüência, a sua iniciativa. Essas ações
impróprias vão aparecer somente mais tarde, quando forem criaturas adultas,
afetando o seu caráter na forma de desvios da personalidade, indolência, mau
humor e revolta contra tudo e contra todos.

Assim, podemos definir a autocompaixão como um sentimento que a criatura


carrega como traço de seu caráter, incutido pelos pais durante a sua infância,
consistindo no enfraquecimento da força de vontade para atuar, para conquistar
seu direito à vida e processar sua evolução de forma natural e ativa.

A autocompaixão leva as criaturas a se queixarem das condições precárias, de


graves inconvenientes e, até mesmo, da fatalidade de que se julgam vítimas.
Queixam-se da família em que nasceram, do sistema e da sociedade em geral, do
convívio com as pessoas, da forma de governo, das condições do país, da falta
de apoio, enfim, de todos e de quase tudo. E o pior de todo esse quadro é que
não tomam medidas adequadas para remediar seus males e modificar a sua
conduta, em que a sua força de vontade acha-se ‘‘quebrada’‘ ou enfraquecida
para empenhar-se num esforço decisivo de correção.

O quadro descrito é mais comum do que se poderia imaginar. Basta observar ao


seu redor para ver que há criaturas que nunca cresceram, que continuam uns
meninões ou meninonas, que necessitam sempre de palavras consoladoras, que
se tornam lamurientas e que se julgam perseguidas e marcadas pela adversidade.
Em uma sociedade competitiva, marcada por um desenfreado capitalismo
selvagem que devora os mais fracos, estas criaturas sofrem muito. O pior é que
fazem os outros sofrerem, pois não conseguem carregar a sua cruz sozinhos.
Procuram sempre pôr culpa nos outros quando algo sai errado pelo que fazem,
infernizando a vida de quem com elas convivem, até mesmo das pessoas de
quem mais gostam. Não raro, suas descargas emocionais causam danos
irreparáveis.

A autocompaixão leva as criaturas a esperar um estímulo ou gesto de alguém


para tomarem a iniciativa de fazer o que é preciso fazer e conseguirem o que
desejam. Outras vezes, esperam que uma dada situação ocorra para conseguirem
se mover e agir. São dominados pela passividade; estão sempre esperando serem
alcançados pela iniciativa dos outros, já que a autocompaixão não estimula
ninguém a lutar, a persistir, a se esforçar. Ela envolve a criatura em um círculo
de idéias negativas e perniciosas que acabam por abater o seu ânimo, por terem
força de vontade fraca. Perdem a disposição para a luta e desanimam com
facilidade.

As criaturas dominadas pela autocompaixão não têm ímpeto forte, impulso


criador para conquistar o seu lugar ao sol, sozinhas. Estão sempre precisando de
ajuda, de um empurrão dos mais fortes e bem-sucedidos; se fracassam, o que
mais querem é um refúgio, um porto seguro para abrigar-se e chorar as suas
lágrimas.

É preciso que se lhes diga que tudo depende de si mesmos, que precisam reagir e
afastar as forças negativas com um pensamento vigoroso orientado para a
realização de seus desejos e ambições, que ponham a força de vontade em ação
com determinação e entusiasmo. Só assim, esse quadro se modificará. Pode levar
o tempo que levar, mas é preciso dar o primeiro passo.

Não adianta ficar por aí ‘‘deitado em berço esplendido’‘, gemendo ou


lamuriando-se, à procura de alguém que os anime, que os console e conforte. As
mãos piedosas são poucas e, normalmente conduzem mais à indolência que à
coragem para mudar as posturas das criaturas que sofrem do mal da
autocompaixão. As dádivas, de uma maneira geral, contrariam as leis universais,
desestimulam as criaturas para o trabalho digno, que é luta. Sem luta, não há
conquista, não existe nem o progresso material nem a evolução espiritual. Viver
é lutar com empenho, dignidade e coragem para vencer.

Em um quadro mais grave, a autocompaixão pode levar a criatura ao ódio, tema


que foi tratado em outra parte desta obra. Aí, a criatura estará a mercê das forças
do mal, anestesiada por idéias confusas e contraditórias. Sonham que são vítimas
de perseguições, injustiças e fatalidades, que nada dá certo por mais que
pelejem. Se chegar a este ponto, precisa de muita ajuda espiritual de outras
criaturas bem intencionadas e de pensamento puro, forte e que saibam orientar
com bons conselhos a sua recuperação, para poderem sair dessa situação
constrangedora.

É preciso notar que os sentimentos de autocompaixão não prosperariam se não


houvesse o sentimento de compaixão de outras pessoas, sempre solícitas e
dispostas a fazerem uma falsa caridade, frutos da hipocrisia de muitos,
principalmente de pessoas ricas e afortunadas que ganharam muito dinheiro fácil
lesando os seus semelhantes. Veja em outra parte dessa obra o tema ‘‘A
HIPOCRISIA’‘.
A avidez
A avidez é um sentimento negativo que consiste em desejar imoderadamente
alguma coisa, isto é, prover-se de qualquer coisa com excesso.

A subsistência do homem e a luta pela vida leva-o a procurar alcançar o mais


que puder dos recursos materiais da existência, dentro do critério de posse, já
que, para as criaturas sobejamente materialistas, tudo não passa de dinheiro e
poder para garantir sua prepotência sobre seus semelhantes. Este é o fundamento
da filosofia de Nietzsche, filósofo alemão, para o qual, tudo girava em torno da
posse: ‘‘tudo para o homem gira em torno da posse: a posse sexual, do abrigo e
do alimento’‘ [KEHL, 1951, p. 142].

Diante desse conceito materialista, nada mais natural para a criatura do que
afogar-se no vício da imoderação. Daí, o exagero na comida e na bebida, nos
prazeres sexuais, na acumulação de bens úteis e inúteis, na ostentação da riqueza
e até mesmo na ambição da posse e do poder, seja no trabalho, na política,
enfim, em toda e qualquer atividade social. Para darem largas à sua ambição, ao
desejo de ter, pisoteiam seus semelhantes e chegam a orgulhar-se de acumular
bens de uma maneira insaciável. Neste aspecto, são mais desprezíveis que os
animais, que limitam-se à posse do necessário aos seus instintos e, satisfeitos
estes, descansam e dormem tranqüilos. Muitas criaturas vão além dessas
necessidades, entregando-se aos condenáveis vícios da gula, da cupidez, da
concupiscência e da usura.

Esta inquietação pela posse exagerada, não raro denunciável pela personalidade
da criatura, com atitudes, modos de ser, arrogância e dissimulada humildade, é
encontrada por toda a parte, em todos os tempos, em todas as raças e camadas
sociais. É própria das criaturas insensíveis e desprovidas de um mínimo grau de
espiritualidade.

O problema principal está no controle da vontade e, através dela, dos ímpetos do


indivíduo. Não sabendo controlar seus ímpetos, não os refreando como as
pessoas de bom senso o fazem, querem sempre ser os primeiros, os mais fortes e,
para atingir este objetivo, desrespeitam as convenções sociais, parecendo
prepotentes e mal-educadas. Transgridem sinais de trânsito, furam filas, cobiçam
os melhores lugares, avançam sobre a comida posta à mesa; nos cinemas e
teatros, querem e obtêm a qualquer custo, as melhores poltronas, enfim, são
oportunistas e aproveitadoras, hábitos já adquiridos desde a infância quando
avançavam e se apossavam dos brinquedos, dos doces e das merendas de seus
coleguinhas.

Uma outra característica bem conhecida das criaturas ávidas é julgarem-se


sempre com o direito à preferência: por pensarem serem os melhores, acham que
os outros sempre lhes devem dar preferência. Isso chega a ponto de se tornar
uma obsessão para os indivíduos menos inteligentes. Já os mais inteligentes
discernem o que é conveniente ou inconveniente e sabem aguardar as
oportunidades e, por serem dotados de extrema paciência, esperam a hora certa
para ‘‘dar o bote’‘, como se diz na gíria. Assim o fazendo, assumem atitudes
sociais desprezíveis e, como egocêntricos que são, neles a ganância se acha
exaltada. Daí, encontrar-se esse tipo entre os negociantes desonestos que usam
táticas de açambarcamento de mercadorias para tirar maior lucro, especulação de
preços, armação de esquemas e tramóias comerciais, concessão de empréstimos
a juros escorchantes e outros ardis, muitas vezes mantendo uma aparência
amável, com sorriso nos lábios e trato sociável, parecendo ‘‘bonzinhos’‘.

Vê-se, pois, que a este tipo de criatura se ajusta perfeitamente o ‘‘capitalista’‘


por natureza, isto é, aquele que organiza e lida com grandes negócios financeiros
e, portanto, aí incluídos os financistas e banqueiros. São tipos que têm
verdadeira obsessão por negócios fáceis, principalmente de intermediação e que
levam a grandes lucros. Vistos sob um ponto de vista social, concorrem para
tornar mais miserável a vida dos pobres, porque sugam-lhes o parco dinheirinho
que têm, de todas as maneiras possíveis, através de grandes organizações
atacadistas e varejistas, empresas de capitalização, bancos, fundos de
empréstimos e muitas outras arapucas. Curioso é notar que muitas dessas
criaturas se dizem benfeitoras e caridosas, retirando migalhas de seus
extraordinários ganhos para obras de caridade, devolvendo assim, muito pouco
do muito que tiraram dos desavisados das classes pobre e média. Não raro, assim
procedem em proveito próprio, para economizarem em pagamentos de impostos
sobre a renda por ganhos extraordinários, já que nossas leis, criadas sob pressão
política dos ‘‘lobies’‘ que eles organizam, os protegem. Que verdadeiros
velhacos!

No extremo mais distante, encontram-se os avarentos, cuja principal


característica é guardarem dinheiro e bens para seu sustento e necessidade na
última fase de sua existência. No fundo, trata-se de um comportamento de
defesa, exaltado pelo medo de não terem com o que nem com quem contar
quando se aposentarem, e não mais puderem encontrar trabalho remunerado ou,
quando já estiverem alquebrados pela velhice. Nesses indivíduos, os hormônios
das supra-renais e da tireóide acham-se superativados.

Do ponto de vista psicológico, esses comportamentos são típicos de


personalidades paranóides, grandes impulsionadores do progresso material da
humanidade, mas que, também, têm trazido grandes desigualdades sociais pela
má distribuição da renda.

Convém destacar que estamos nos referindo à personalidade paranóide e não


paranóica. A paranóia é um estado de desajustamento psíquico grave, encontrado
em indivíduos que não possuem bom senso nem se adaptam à realidade,
normalmente incluída na categoria de psicoses. Já a paranóide é um estado mais
brando de desajustamento, normalmente classificada como parapsicose. Isto é
bastante para quem não é psicólogo.

No tratamento que estamos dando à cobiça e avidez estamos sempre nos


referindo aos paranóides, isto é, aos de caráter manso, cuja características
principais são: excessivo amor-próprio e exagerado narcisismo, julgando-se
incomparáveis e irresistíveis. Exibem-se como importantes e com empáfia
inofensiva. Não raro, chegam ao extremo da megalomania ou mania de
grandeza, caracterizando-se pela mania do luxo, da exibição, das honrarias, dos
títulos e das condecorações dos cargos de destaque. Adoram elogios exagerados
e de manifestações de apreço, o que exalta e exulta a sua vaidade. Chegam até
mesmo serem versados no auto-elogio.

Somente para completar estes aspectos psicológicos, ressaltamos que os


paranóicos possuem as seguintes características: excessiva arrogância, orgulho e
despeito; sensibilidade doentia; não fazem concessões e adoram as controvérsias,
não aceitando conciliação; têm especial prazer em encontrar defeito em tudo, a
criticar; chegam a ficar ferozes na discussão de certos temas; finalmente, são
agressivos. Muitas pessoas em posição de mando e autoridade, freqüentemente,
exibem esta personalidade.

O ciúme

O ciúme é um sentimento muito negativo tanto para a criatura que o tem como
para aquela que o induziu, seja ele motivado ou não. É um dos mais nefastos
sentimentos, juntamente com o ódio e a inveja. Ele resulta de pensar que seu
amor por uma criatura está sendo desviado por esta para uma terceira pessoa.
Dessa forma, sendo rompidos os laços de confiança recíproca, a criatura
ciumenta é assaltada por atroz sofrimento.

O sofrimento resultante do ciúme tem raízes no desejo frustrado. O sentimento


de amor vivido através de uma relação profunda é, de repente, deturpado. A
criatura sente-se então mordida pelo ciúme, que é uma reação à perda ou ameaça
de perda do equilíbrio amoroso. Não obstante os laços de ternura que possa
haver, para muitas pessoas o amor é, também, uma forma de posse e, ao perdê-
lo, estas criaturas sentem-se despossuídas. Ela ou ele pensa: se alguém pode
amar outra pessoa ao mesmo tempo que nos ama, é porque não nos ama mais, ou
seja, minhas qualidades não sustentam mais a atração que até então o meu
parceiro tinha por mim. Esta ótica de encarar o amor dessa forma é errônea,
exclusivista. A criatura ciumenta prefere aceitar o ciúme como resultante do
apego a uma pessoa à qual pede pelo menos reciprocidade, uma contrapartida
mínima de certeza, já que é impossível ao ciumento conviver com a incerteza.
Agrava esse quadro o fato de que, por detrás do ciúme atuam, também, o
egoísmo e a inveja, sentimentos supernegativos que conduzem ao ódio e à raiva
incontrolada, às vias de fato e aos crimes passionais. Estas são as grandes
pinceladas sobre o ciúme.

Perder a criatura a confiança e passar a ter desconfiança, ser assaltada pela


dúvida da traição e da infidelidade, não confiar mais na pessoa amada significa,
também, não confiar em si mesma, em seu valor como ser humano, o que lhe
traz grande sentimento de impotência e de frustração, tornando-a deprimida e
arrasada. A criatura começa a se questionar: o que a outra pessoa tem que eu não
tenho? Há muitas respostas a essa pergunta, conforme veremos no
desdobramento desse tema. O certo é que o amor, como sentimento nobre que
deveria ser, decai daí para a frente de uma forma assustadora.

Esse sentimento de desvalor é que invade a criatura e provoca o ciúme. É


próprio das pessoas inseguras que são mais sensíveis ao ciúme. Essas pessoas
não têm ou têm pouca confiança em si mesmas e, por isso, não têm poder ou
capacidade de segurar e manter um amor profundo. Sua baixa auto-estima põem-
nas a esperar que um dia a pessoa amada poderá traí-la. Daí, deflagrado o ciúme,
tudo o que a criatura prezava no outro ou a respeito dele passa a ser posto em
dúvida, a não ter mais valor, como na história da raposa e as uvas.

O medo de perder o amor de alguém traz, como conseqüência, a insegurança de


que o outro ou a outra possua maiores e melhores qualidades a oferecer, capaz de
‘‘virar a cabeça’‘ do seu amor, principalmente se este for, ao contrário, muito
seguro de si, a ponto de arriscar uma nova alternativa, sem desfazer a relação
anterior. Essa é uma situação mais comum do que poderia parecer à primeira
vista e, quando a situação de ambivalência é descoberta irrompe, de forma atroz
e cruel, o ciúme. Daí para a frente, a situação entre os dois se agrava, se deteriora
a ponto de só um amor profundo poder reverter a ruptura iminente.

O ciúme pode levar a um sentimento mais forte e poderosamente destrutivo que


é o ódio. A criatura que se sente traída, dependendo do seu grau de
espiritualidade, pode não se conformar, não se resignar e resolver tirar suas
dúvidas a limpo. Para isso, passa a vigiar obsessivamente o seu parceiro ou, em
casos extremos, a contratar um detetive. Quando menos espera, vê-se
transformada em espião, passa a vasculhar e mexer em tudo, a revirar os bolsos
do terno ou a bolsa, quando o parceiro volta do trabalho, a procurar escutar as
conversas ao telefone, tudo à procura de evidências. E, se encontrar alguma
pista, por menor que seja, a confirmar suas suspeitas, pode armar a maior
confusão, chegar às vias de fato e, em muitos casos, ao exaspero do crime
passional. Isto tudo é muito doloroso, triste e desprezível, porque ninguém é de
ninguém, e para tudo existe solução. E se as dúvidas forem infundadas, criam-se
ressentimentos que abalam a relação para o resto de suas vidas, não podendo a
relação jamais voltar ao que era.

O ciúme é um sentimento possessivo, castrador e dominador. Ele domina as


preocupações da criatura a ponto de infernizar-lhe a vida. No linguajar dos
psicólogos, é um sentimento regressivo, significando que a criatura deixa de
crescer espiritualmente, sua auto-estima decai consideravelmente e parece
encolher-se dentro de si mesma. Enquanto durar o ciúme, a pessoa parece ter um
nó na garganta, uma verdadeira angústia ou sufoco. E tudo chega a esse ponto
porque a criatura não sabe reagir, não sabe pensar com clareza que o ciúme não
leva a nada, não repara nenhum mal, antes o agrava, por ser um sentimento
desagregador que envolve a criatura numa teia ou rede de pessimismo difícil de
se livrar, sem a ajuda de um bom amigo. A raiva que resulta desse pessimismo
pode crescer e consumir todas as forças que ainda possam restar na criatura,
levando-a a uma situação deplorável de estresse, capaz de induzi-la, pela
influência de forças negativas, ao suicídio ou ao crime passional. Deve-se evitar,
a todo custo, como veremos mais adiante, caminhar nessa direção, neste beco
sem saída.
O ciúme ocorre principalmente nas relações mais profundas, quando a relação
intensa de amor é sentida de forma possessiva e não como um sentimento de
respeito mútuo que pede reciprocidade de atenções e carinho. O relacionamento
amoroso profícuo requer maturidade, compreensão mútua, respeito e muita
tolerância de ambas as partes. Se isso ocorrer, não haverá campo propício para o
ciúme.

O ciumento contumaz, que parece ver traição em tudo, até num simples e furtivo
olhar de seu companheiro para admirar a elegância de outra criatura, num
comentário lisonjeiro dirigido a alguém ou, ainda, em uma conversa simples e
despretensiosa com outra pessoa do sexo oposto, sofre sempre e muito. Sofre,
primeiro porque se critica por ser ciumento; em segundo lugar, porque receia que
seu ciúme possa ferir o seu amor; sofre, ainda, porque se deixa dominar pelo
ciúme, isto é, por uma banalidade; finalmente, sofre por ser excluído da relação e
pela agressividade que, em conseqüência, lhe acometerá. É um infeliz que se vê
na contingência de resignar-se e silenciar-se a respeito, ou, na melhor hipótese,
dar a volta por cima e reorientar a sua vida. A outra saída, a reconciliação, exige
muito desprendimento e muita tolerância e, nem sempre, retoma e reconquista os
encantos anteriores.

A insegurança no ciumento é uma constante e começa a agir quando a criatura se


depara, enfrenta uma situação de fato, em que outra pessoa parece estar
ocupando o seu lugar na relação. Quando isso acontece, nada mais poderá
reverter esse processo, a não ser a vontade e o raciocínio que sobrepujam o
desejo, que oferecem outras alternativas sentimentais e lógicas, isto é, lhe aponta
novos rumos. Isso na hipótese de a pessoa procurar dar a volta por cima e
reorientar a sua vida, dar um balanço nos erros e estragos e ver o que sobrou.
Terá que ter muita força de vontade para não se ver novamente jogado no
torvelinho das emoções enganosas, evitando enredar-se nos mesmos erros das
aparências inúteis e traiçoeiras. Mas, também, deve evitar tripudiar ou tratar com
desdém a relação perdida, não procurando desclassificar ou denegrir o parceiro
que não deu certo. Isso de nada adianta. O importante é ter em mira que,
desmerecido o objeto do amor, fica mais fácil carregar o fracasso, o fardo do
insucesso, enquanto não colocar sua vida novamente nos trilhos.

Parece fora de dúvida que o ciúme desponta muito cedo na vida das pessoas.
Tanto é assim que, segundo a psicologia freudiana, o ciúme é considerado um
estado afetivo qualificado de normal. Quem não sentiu ou viu uma criança
ciumenta? Desde a tenra idade, a criança demonstra ciúme motivado pelo desejo
que outras crianças têm pelo seu brinquedo, pela sua bicicleta, pela sua boneca.
Ou o ciúme que ela sente quando a mãe ou o pai a provoca, demonstrando ter
mais carinho pelo seu irmãozinho ou por outra criança. Tais provocações, diga-
se de passagem, nocivas na formação da personalidade da criança, chegam a
deixá-la irrequieta, raivosa e chorosa. Elas alimentam a manha da criança que
pode recalcar estas situações. Tudo o que temos a fazer é atenuar esses arroubos
de ciúme, não estimulá-los de forma alguma, explicando às crianças a
transitoriedade de tudo o que possuímos.

Há que considerar, ainda, as diferenças peculiares ao ciúme masculino e


feminino. Nas relações amorosas, os homens centram sua atenção na beleza e no
erotismo, como machos que são da espécie, refletindo nesta postura o instinto
sexual. Já as mulheres parecem se preocupar mais com os sentimentos afetivos,
com o carinho e a ternura de que esperam poder desfrutar. Assim se explica,
quando o ciúme desponta, a sensação de aniquilamento, de quase-morte, de
sufoco que atinge a grande maioria das mulheres, transformando estas situações
em verdadeiras tragédias e dramas. Já os homens, parecem pouco se importarem,
procurando manter o seu orgulho de macho da espécie, no mais elevado grau,
pretendendo parecerem-se indiferentes, e, mais facilmente saem do problema e,
se feridos, curam suas feridas mais rapidamente.

Embora este livro não pretenda ditar regras ou enumerar conselhos e


recomendações para sair de uma situação criada por ciúme, alinhamos os
seguintes pontos:

01) Reconheça que existe uma situação de ciúme e resolva-a.

02) Resolvida a situação, não fique a remoer visitando os lugares, restaurantes,


etc.

03) Procure sair de férias, viajar, conhecer outros lugares e pessoas.

04) Enturme-se novamente. Converse com os amigos. Desabafe com eles.

05) Relaxe e medite.

06) Dedique-se a atividades envolventes: pesca, esportes, etc.

07) Entregue-se a leituras de bons livros.


08) Não despreze outras oportunidades amorosas.

09) Não se torne um desiludido.

10) Dê a volta por cima. Ao final, tudo vai passar, como tudo passa na vida.

A compulsão

A compulsão é uma excitação que nos atinge para agirmos com base em
estímulos que nos vêm de fora; a impulsão, ao contrário, tem origem em nossas
forças interiores, mediante impulsos derivados do pensamento, que a vontade
põe em ação de acordo com o nosso livre-arbítrio. Trataremos aqui de ambos.

No primeiro caso, quando nossa ação se baseia em exigências e motivação


exteriores, nosso esforço é menor, porque nos sentimos dominados por um
desejo, sem nenhuma participação da vontade. Dessa forma, a compulsão nos
atropela, nos abala, nos invade e nos envolve de tal maneira como se fosse uma
força dominadora que nos priva de exercer as prerrogativas de nossas
faculdades. Estas, não participando do processo que nos foi imposto de fora,
tornar-se-ão fracas e deficientes.

No segundo caso, quando agimos por impulsão, usando nossas forças


conscientes, resulta uma ação mais acertada e produtiva. Sempre que
programamos e planejamos uma ação, mediante previsão e estudo da situação,
estaremos intensificando nosso próprio poder, usando as nossas três faculdades
espirituais: pensamento, vontade e livre-arbítrio. Aqui, estamos juntando
interesse, energia e entusiasmo como substrato de nossa vontade. Estamos
definindo a nossa conduta e modo de proceder de uma forma racional, atuando
com determinação para realizar nossos propósitos e metas e, assim, obter o que
queremos. É fato sabido que o querer resultará fortalecido se, ao planejarmos
nossas ações, fixarmos determinadas metas a serem alcançadas.

Do exposto, é obvio, é fundamental que, sempre que possível, devemos agir por
impulsão através de planos bem orientados e elaborados. Se por detrás da
impulsão, houver uma forte ansiedade de busca e realização, devemos procurar
canalizar estas forças e torná-las conscientes, para dar valor ao que estivermos
realizando. Se sentirmos estes estímulos interiores, conduzir-nos-emos ao seu
controle e a ação resultante será profícua.

Os estímulos interiores apóiam-se diretamente na vontade e se submetem ao


controle desta. Trata-se de ato consciente, amparado na vontade e, portanto, com
maior probabilidade de melhor aplicação e resultados eficazes.
O desespero
O desespero é um sentimento de frustração de quem é infeliz, sendo portanto,
um estado aflitivo muito negativo, ao contrário da esperança que é um
sentimento altamente positivo. É um estado de confusão mental de quem passou
por grandes dores, separação ou perda de entes queridos e busca por amparo e
explicação do desconhecido.

O desespero ou desesperança é a morte em vida de quem despreza a simpatia, o


amor e a amizade dos seus semelhantes

Focalizamos, por exemplo, a fusão que existe (ou deveria existir) no casamento.
Esta fusão de um no outro significa ‘‘estar completo’‘ (aparentemente). Na
verdade, mesmo quando existe uma união muito forte, a unidade, ‘‘unidade
integrada’‘, não é completa, já que antes (e sempre) cada um não se desliga de
seu ‘‘eu’‘, nem poderá dissolvê-lo, não poderá destruí-lo. Portanto, fusão com o
outro é ainda, um estado ‘‘incompleto’‘, sendo uma ilusão pensarmos que nos
tornamos completos com o(a) outro(a). A fusão com outra pessoa é, pois, sempre
frágil, deixa de existir constantemente, freqüentemente e, sendo incompleta, há
sempre um término para o que é incompleto. Então, quem busca a integração
deve primeiro buscá-la dentro de si mesmo; só então, a fusão pode tornar-se
indestrutível.

Embora a felicidade pela fusão ou integração seja relativa (das modinhas de roda
de nossa infância: ‘‘...o amor era pouco e se acabou...’‘) há numerosos casos em
que ela ocorre. Quando essa fusão desaparece (separação, perda de entes
queridos, na morte, etc.), ocorre um grande ‘‘vazio’‘ de infelicidade em nós. A
infelicidade, a insatisfação, cria o futuro, a esperança ou o desespero porque
estamos infelizes. Se estamos infelizes o tempo não existe, o ontem e o amanhã
estão completamente ausentes, não nos preocupamos nem com o passado nem
com o futuro.

Mas, como nascemos com a esperança (sempre pensando no futuro) e levâmo-la


até a morte, não há como viver sem ela. Krishnamurti, o grande filósofo indiano
de nosso tempo, disse: ‘‘A esperança é o amanhã, o futuro, a ânsia de felicidade,
de dias melhores, de progresso pessoal; é o desejo de ter uma casa aprazível, um
piano ou um rádio melhor; é o sonho de uma ordem social melhor, de um mundo
mais feliz’‘ [KRISHNAMURTI, 1972, p. 106].
Pode a esperança estar no passado, ‘‘no que foi’‘ ou só será possível situá-la no
‘‘que será’‘? É um processo regressivo ou progressivo? Se imaginarmos a
esperança como um ‘‘processo do tempo’‘, a resposta é afirmativa. Vamos
buscar no passado o desejo de continuação do que é agradável, do que é
suscetível de melhoria; o seu oposto é a desesperança, o desespero. Mas ela está
principalmente no futuro: dizemos que vivemos porque existe a esperança de
dias melhores para viver com mais segurança, mais otimismo ou, se estamos
numa situação muito mal (de saúde) os médicos dizem, quando perguntados
sobre o estado do doente, ‘‘que ainda resta uma esperança’‘.

Neste ponto, cabe perguntar: é viver quando existe a preocupação do futuro ou


devemos nos preocupar apenas com as nossas ações de cada dia? É porque o
amanhã se tornou tão importante que existe a desesperança, o desespero. Pela
esperança do amanhã, muitos sacrificam o hoje e, como a felicidade só existe no
agora, tornam-se infelizes. Assim, só os infelizes enchem suas vidas com a
preocupação do amanhã, o que chamam esperança. A pessoa que ‘‘se deu’‘ à
esperança não é uma pessoa feliz; ela conhece o desespero e o estado de
desesperança ‘‘projeta’‘ a esperança ou o ressentimento, o futuro feliz ou o
desespero. Então, devemos buscar um estado que não seja nem de esperança
nem de desesperança, mas um estado de contínua felicidade e segurança.

Perseguir um objetivo exige ter-se esperança, e daí, ser infeliz. O caminho da


esperança é o caminho do futuro (denota desejo de ganho, de aquisição, de ‘‘vir
a ser’‘, de chegar, de fazer acontecer, etc.), mas a felicidade é uma questão de
tempo. Quando se é feliz não se pergunta como continuar feliz, o que nos levaria
à preocupação com o futuro, porque esta simples pergunta já nos levaria a provar
o sabor da infelicidade.

Pela falta de compreensão de um problema, criam-se vários outros problemas. O


problema é a infelicidade; para compreendê-la é preciso estar livre de todos os
demais problemas, o que não é tão fácil.

O egoísmo

O egoísmo é um sentimento negativo e consiste na conduta que a criatura tem de


procurar, em todas as suas atividades, dar excessiva preferência ao bem próprio,
sem considerar os interesses alheios. Trata-se de cultivar o exclusivismo e o
egocentrismo, acima de tudo, nas relações interpessoais em todos os estratos da
atividade humana. Pelo egoísmo, a criatura procura subordinar o interesse dos
outros ao seu próprio.

A maior parte dos nossos pensamentos são conseqüência de forças e estímulos


emotivos e instintos egoístas. O mundo exterior nos produz sensações que nos
incitam constantemente a pensar, na maioria dos casos, não de forma
desprendida e construtiva, mas de forma egoísta, visando o nosso próprio
interesse.

Nossas demandas sensuais, resultantes de nossas carências, tendem a ser


solicitadas pelo nosso ‘‘eu’‘ de forma sempre absorvente. Com o tempo, na
tentativa de sempre procurarmos satisfazer nossos gostos e caprichos, nossas
carências se impõem à nossa vontade e se tornam nossa segunda natureza. Nessa
situação, nosso pensamento se rende aos hábitos, quando não aos vícios, sendo
difícil romper com essas coisas tradicionais.

Nós estamos inseridos, primeiramente, no nosso pequeno mundo próprio, mas


também temos de arcar com deveres e responsabilidades com relação a assuntos
e pessoas que nos cercam. O primeiro concerne à esfera da satisfação individual,
que tende a converter-se no eixo de nossa vida, enquanto que o panorama do
mundo de relações nos demanda, a toda hora, com as obrigações que de nós são
esperadas. Nesse contexto, temos de ‘‘dançar conforme a música’‘, elaborando
nossos pensamentos e desencadeando nossas ações, baseando-nos em hipóteses,
suposições, enganos, sofismas e vaidades efêmeras.

Ao darmos continuidade e dinâmica a tudo isso, nosso principal erro consiste em


alimentar a idéia de que tudo deve servir primeiramente a nós mesmos e que fala
mais alto a lei que nos direciona a agradar o nosso ‘‘eu’‘ acima de tudo. O
egoísta não aceita nenhuma idéia que fira a sua vaidade e detesta todo
pensamento que se opõe a isso, isto é, que venha ferir o seu amor-próprio. Por
isso, fecha os olhos diante da realidade e cria a sua própria, isto é, idealiza um
mundo fictício e enganador. Por lastrear seus pensamentos em idéias falsas, os
resultados são duvidosos e isto é realçado mais ainda quando por detrás das
ações está uma criatura de temperamento egoísta.

O egoísmo tem seu fundamento no arraigado sentimento de posse que as pessoas


de todas as idades e níveis sociais têm. Nas crianças já de tenra idade é comum
ver-se desenvolverem sentimentos egoístas pela posse de seus brinquedos, e isto
fica claro quando não desejam compartilhar suas ‘‘coisas’‘, seja o que for que
lhes pertença, com seus amiguinhos e colegas. Tornam-se birrentas e briguentas.
Elas temem perder ou verem usufruídos por eles seus brinquedos, sua bicicleta,
seus livros prediletos, e assim quase tudo. As palavras ‘‘eu’‘, ‘‘meu’‘ e ‘‘minha’‘
são usadas com muita freqüência e têm forte conotação com o egoísmo que se
manifesta dessa forma, às vezes com forte reação de brigas, choros e encenações
de desespero. Muitas vezes, esse sentimento é levado do lar para as escolas.

Nos adultos, o exagerado sentimento de posse desponta com força quando são
contrariados ou obstados por qualquer circunstância, de exercerem seus desejos
e vontades, de forma inteiramente livre, sobre seus objetos de uso pessoal como
o carro, o computador e até de suas conquistas amorosas. De regra, são
voluntariosos, negando-se de forma bruta a qualquer pedido de empréstimo.

Se a criatura ocupa posições de destaque e mando na política, nas empresas, nos


clubes, enfim, em qualquer organização e possui sentimentos egoístas, isto se faz
sentir de modo bem claro em suas atitudes de autoridade excessiva, arrogância e
prepotência. Negam-se a prestar qualquer ajuda a quem está precisando ou,
quando o fazem, externam sem a menor cerimônia aqueles sentimentos. Por isso,
não são polidos nem educados no trato com as pessoas.

O sentimento oposto ao egoísmo é o altruísmo. Este é um sentimento nobre,


próprio das pessoas que desejam ajudar e, nos momentos mais críticos, são
capazes até de atos de desprendimento e heroísmo para salvar seu semelhante de
alguma dificuldade, desastre ou catástrofe, sacrificando às vezes, até a própria
vida.

O altruísta está sempre de bom humor, sempre disposto a cooperar com as


pessoas, presta serviços de assistência sem pedir qualquer remuneração, tomam
iniciativa nos movimentos de solidariedade. Os altruístas são sempre solidários
e, de modo geral, são sempre bons amigos, já que o amor ao próximo e a
amizade são características de seu temperamento e personalidade. Em geral, são
ótimos médicos, enfermeiras, professores, representantes de classe, guias
turísticos, só para citar algumas profissões que lhes são adequadas.

A emulação

A emulação é um sentimento negativo que consiste em não usarmos todo o


poder de nossos atributos essenciais - o pensamento, a vontade, o raciocínio e o
livre-arbítrio - na busca e realização de idéias originais. É o oposto da
originalidade. Ela resulta da inércia e da preguiça mental que nos leva a emular,
imitar o que outros pensam e fazem.

Na nossa vida de relação recebemos influências de muitas pessoas que, de uma


forma ou de outra, admiramos. Seus predicados, seu modo de ser e atuar, suas
realizações e façanhas nos influenciam. Elas exercem um poder sobre nós e
nossa reação consciente ou inconsciente leva-nos à emulação ou imitação.
Muitas de nossas ações resultam desse poder que tem certas pessoas de vontade
muito forte, de influenciar e cativar outras. Assim, na forma passiva, copiamos,
imitamos e adaptamos nossos pensamentos e atos aos de outros. É óbvio que a
prática constante dessa imitação nos prejudica, diminuindo o nosso interesse,
inculcando em nós o receio de fracassar. Em conseqüência, somos induzidos à
passividade, tirando-nos todo o poder de iniciativa e originalidade. Debilitada a
nossa vontade, viramos simples seguidores, ‘‘maria-vai-com-as-outras’‘, meros
imitadores.

A causa da emulação é a falta de educação e fortalecimento de nossa vontade.


Pela passividade acabamos por nos inspirar nos inativos e nos tornarmos
escravos das ações dos outros. Nosso pensamento criador enfraquece e uma vez
debilitado, caímos na indolência, na lei do menor esforço, para tirarmos
vantagens dos outros. Isto não significa que não devemos aprender e seguir os
bons exemplos. Daí a importância, a felicidade mesmo de termos podido
encontrar bons pais de família e bons professores, capazes e dedicados e não
medíocres e ignorantes. Só assim o nosso aprendizado poderá tornar-se profícuo,
eficaz. Já o péssimo exemplo retira, rouba-nos a iniciativa de sermos nós
mesmos, autênticos e progressistas, homens de vontade e ação. Bons professores
em qualquer matéria ou disciplina não fazem o aluno, mas despertam-lhe o
interesse e ajudam muito na sua formação.

Devemos, sim, sermos otimistas e buscar boa inspiração. Temos que nos inspirar
naqueles que edificaram, construíram suas vidas e seu futuro através do trabalho
fecundo, do otimismo, da persistência, da perseverança e da inteligência. Para
buscar incentivo, para adquirir força de vontade, devemos conhecer as biografias
de grandes vultos de nossa História, da cultura e da ciência, das artes e da
música. A boa leitura de obras desse tipo só pode nos enriquecer o espírito e
aumentar o nosso ânimo e entusiasmo, deflagrando em nós forças de que
precisamos. Decisão e esforço próprio são necessários. Investigue, procure saber
a causa do sucesso de muitos homens de negócio que venceram na vida partindo
do nada ou quase nada, que tiveram êxito e ocuparam lugar de destaque na
sociedade, granjeando a admiração de seus contemporâneos. Mas, não se deixe
influenciar demasiadamente pelos excessos, principalmente pelo dinheiro ganho
fácil ou penosamente. Use este para suprir suas necessidades e viver com
parcimônia, mas não avaramente nem perdulariamente. Use-o ainda, para
multiplicar suas ações e beneficiar pessoas, criando novos negócios e empregos
para muitos. Portanto, é preciso adequar necessidade e interesse, distinguindo-se
pelos seus próprios méritos. Jamais se deixar impressionar pelos indolentes e
pobres de espírito que nos tiram a iniciativa para não se tornar um deles,
engrossar suas fileiras. Reaja sempre com muita força de vontade, garra e ação!

Devemos nos convencer de que todo sucesso ou triunfo nasce da luta e isto é
válido no trabalho como nos campos de batalha ou em qualquer atividade útil.
Portanto, para sobrepor-se, virar as costas à emulação é preciso lutar
constantemente contra a adversidade e, sobretudo, não confiar na sorte para não
depender dela.

Existem numerosos exemplos no mundo inteiro de pessoas que foram ou são


bem sucedidas, até famosas, porque deram tudo de si. A grande atriz francesa
Sarah Bernhardt, levava sempre pelas suas ‘‘tournées’‘, pelos palcos do mundo,
um cartaz que dizia: ‘‘apesar de’‘ e somente isso! Com isso, pretendia mostrar, e
de fato conseguia, a sua tenacidade para vencer os obstáculos e triunfar. Esta
artista famosa perdera uma perna e apesar desse rude golpe, apresentava-se com
estrondoso sucesso. Cada vez que esse cartaz subia ou descia punha em
evidência a sua vontade firme e resoluta para, com tanta coragem, enfrentar o
infortúnio.

O que prova isso? Caráter forte, força de vontade firme e indomável, entusiasmo
capaz de atrair a admiração de todos. Nas pessoas de fibra, a vontade sempre
teve a colaboração da sua própria confiança. Veja o tema ‘‘A CONFIANÇA’‘ em
outra parte desta obra.
A frivolidade
A frivolidade e a futilidade são formas de pensar e agir das criaturas que não
levam a nada ou quase nada de útil e sério. Por esses sentimentos as pessoas
procuram dar expansão ao vácuo mental, à sua estreiteza de espírito,
desperdiçando o seu precioso tempo e empatando o de seu semelhante com
ninharias de todo tipo. Embora haja certa semelhança entre o significado dessas
duas palavras, a futilidade tem mais abrangência que a frivolidade. Trataremos
aqui do desenvolvimento de ambos os temas.

Frívolo é o indivíduo dispersivo que não se fixa em nada, que passa a vida em
conversas fiadas, sem conteúdo, improdutivas e até mesmo nocivas, que só se
importa com ninharias e picuinhas. Tem por principal preocupação satisfazer
seus desejos medíocres. Gosta de exibir-se. Vive arquitetando, matutando
alguma coisa vã, sem importância, para fazer. Preocupa-se com a aparência
física: o penteado de seu cabelo, o polimento das unhas, os trajes extravagantes,
alguma particularidade do corpo, mais como um todo, que chame a atenção de
forma ridícula ou acintosa. Gasta horas pensando em devaneios e fantasias ou
em levianas palestras, conversas ou consultas sem significado. Joga conversa
fora, como se diz vulgarmente. Basta observar, no seu convívio diário, que se
encontrará esse tipo de criatura com mais freqüência do que se espera. Ele se
denuncia com facilidade ao bom observador, pela sua maneira de ser, de se
apresentar e até mesmo pelo tom de sua voz.

O frívolo detesta leituras instrutivas, conferências e palestras sérias sobre temas


morais, filosóficos ou instrutivos e, se tiver que comparecer, sente-se impaciente,
irrequieto e entediado o tempo todo que durarem tais eventos. No entanto, gosta
de modas, bailes, festas em geral, corridas de cavalo, jogos em geral, como
futebol, voleibol, basquete e outros. É uma conseqüência da lei da atração que,
nesses ambientes, os frívolos se encontram com outros que lhes são afins,
predominando sua presença. Sua atenção está sempre dirigida para eventos
banais: descreve um acidente qualquer, por mais insignificante que seja, com
minúcias; observa com atenção desmesurada os penteados e os trajes que os
convidados usam em uma festa ou em um casamento; adora espiar e escutar
conversa de outras pessoas. Enfim, atua de maneira banal, leviana. Pensa e fala
coisas de pouca importância e seus cuidados se dirigem a coisas de pouco valor.

O fútil, que também é um tipo vulgar, como o frívolo, tem outras características,
embora algumas sejam comuns ou quase. Ele se denuncia de várias maneiras,
principalmente pela conversa. Detesta tratar as idéias e pensamentos mais
profundos, doutrinários e filosóficos. Tem aversão, é contrário a qualquer
esforço intelectual, ao estudo de coisas sérias e à análise e reflexão. Contudo, é
palrador, gosta de falar com fluência, às vezes com muita eloquência. Fala de
tudo e julga entender de tudo, pretendendo ter competência quando dá sua
opinião sobre questões que desconhece. Sobretudo, detesta ouvir. É comum ver a
criatura fútil se entusiasmar pelos acontecimentos do dia-a-dia, tomando partido
pró ou contra, de forma apaixonada, fazendo questão de deixar claro seu ponto
de vista. A atitude da criatura fútil é sempre baixar o nível de qualquer conversa
ou palestra, banalizando as questões e levando as conversações ao sabor de suas
conveniências vulgares ou de ordem pessoal. Fala muito de si e de seus parentes,
chamando a atenção para a importância que não tem.

Algumas características são comuns aos frívolos e fúteis. Uma delas é a afoiteza
e a ligeireza ou pressa com que julgam os problemas. Desprezam a opinião
alheia e preferem sua própria para tudo, até mesmo para o que não sabem. Têm
estreiteza de espírito, isto é, são vazios, nada é profundo em seus conceitos e
idéias. A teimosia é uma constante em sua atitude. Adoram as discussões e as
polêmicas infindáveis que não levam a nada, sem resultado. Não se rendem às
evidências, isto é, jamais dão o braço a torcer nas discussões, não se deixando
esclarecer, convencer ou apaziguar. Detestam se alguém lhes aponta
contradições, irritando-se ou desviando-se para longas e intermináveis querelas.

Ainda, outras características comuns podem ser lembradas. Não gostam e até
têm acentuada antipatia pelos livros, pela boa leitura: é o caso dos que só
aprendem por intuição ou ouvindo informações, notícias e histórias. São
palradores, falam muito e pensam pouco. São intolerantes em suas crenças.
Enfim, são vulgares e adoram manter longas conversas fiadas, sobre os mais
banais assuntos. Ao observador atento, é fácil identificar estas criaturas em toda
parte, nos ônibus, trens, nos escritórios, onde são considerados indesejáveis, pois
estão sempre procurando quem os ouça, fazendo ‘‘rodinhas’‘ de piadas ou para
conversar banalidades. Procuram distrair a sua e a atenção dos colegas e, por
isso, são constantemente advertidos para melhor cuidarem do que lhes compete.
Dessa forma, acabam sendo despedidos e perdem o emprego.

É óbvio que nem todos os freqüentadores de clubes esportivos são fúteis ou


frívolos. É até recomendável que cada um escolha e pratique o seu lazer de fim
de semana para descarregar as tensões acumuladas no trabalho, que nem sempre
é ameno. A vida poderia tornar-se intolerável sem o trabalho, que é uma
alavanca de progresso e evolução espiritual da criatura. Por isso mesmo, as
distrações e o lazer, gozados e praticados em momentos próprios são uma
necessidade. Assim, ler um romance, ir ao cinema ou assistir em casa a um
vídeo, decifrar palavras cruzadas ou se dedicar a um jogo no computador, tudo
feito com moderação, sem se viciar, constituem práticas normais que servem
para aliviar as tensões e diminuir o estresse mental.

Finalmente, observando que se costuma dividir o dia de 24 horas em três partes


de 8 horas cada, cabendo uma ao trabalho, outra ao repouso, a terceira aos
demais afazeres, nesta devemos incluir, diariamente, algum tipo de recreação ou
lazer ou atividade leve, de preferência que nos ajude a relaxar, a retemperar as
forças para melhorar nossa disposição corporal e mental. A escolha dependerá do
gosto de cada um. O importante é habituar-se a essas práticas, estabelecendo-as
como rotina ou uma segunda natureza benéfica e salutar.
A hipocrisia
A hipocrisia é um dos sentimentos mais baixos, denegrindo a criatura de forma
irremediável, já que toda a sua ação se baseia na falsidade de propósitos que o
hipócrita procura esconder, simulando ser virtuoso quando não o é. É comum
nos temperamentos vulgares, o que lhes permite prosperar na mentira e nos ardis
inescrupulosos que sempre armam, para tirar vantagem de tudo e de todos. Têm
absoluta certeza de que praticam atos indignos, mas jamais confessam isso.

A hipocrisia reveste-se de numerosos matizes ou graus, já que o hipócrita finge


sempre ter o que não tem. Assim, suas virtudes são pseudovirtudes, falsas,
fingidas, simuladas, agindo sempre como um impostor. Para que a criatura de
bons propósitos possa proteger-se da falsidade e dos falsos, vamos, nos
parágrafos seguintes, apresentar alguns desses matizes, artifícios e subterfúgios.

Os hipócritas sempre projetam uma sombra sobre o ambiente em que atuam para
melhor poderem simular as qualidades e aptidões que consideram vantajosas.
Usam artifícios sutis e requintados e armam defesas de todo tipo para não serem
desmascarados. Sua honestidade é indecisa, insípida, camuflada e, assim
também, a sua moralidade. Não sabem ouvir a voz interior de sua consciência,
isto é, procuram cúmplices para melhor facilitar a sua ação nefasta.

Os hipócritas não são movidos por nenhuma firmeza e, ao contrário dos


virtuosos, não têm caráter digno. Esquivam-se à responsabilidade de seus atos,
são ousados na traição e tímidos na lealdade. Sua habilidade de difamar,
conspirar, confabular e agredir, muitas vezes com simulada suavidade, é
ilimitada. Jamais se expõem ou revelam sua personalidade verdadeira,
ostentando uma espécie de armadura, para não deixar visível o seu caráter. Têm
absoluta certeza de que seus atos são indignos, mas não confessam isso nunca.

Procura abafar a dignidade dos simples, emudecer os escrúpulos dos incapazes


de resistir à tentação do mal. Ao hipócrita faltam virtudes para renunciar ao mal
e coragem para assumir a responsabilidade de seus atos. Nesta mesma linha de
raciocínio, procuram destruir os sonhos, planos e projetos dos que têm
entusiasmo, colocando defeitos em tudo.

Gabam-se simploriamente de serem honestos e bajulam os virtuosos, de quem


têm inveja que não confessam. Procuram igualar-se às criaturas superiores, mas
com um pouco de argúcia pode-se perceber esse disfarce. Às vezes, simulam
submissão e até amor àqueles que detestam e carcomem. Sua perversidade os
inquieta com escrúpulos que os envergonha, mas apenas em silêncio, em
segredo. Se desmascarados, descoberta a sua falsidade, sofrem o mais cruel dos
castigos.

O hipócrita tem grande apetite por valores materiais, principalmente pelo


dinheiro, e este o impele a descoberto. Não retrocede diante das artimanhas de
seus adversários e costuma acumpliciar-se para vencê-los. Gosta de ser
reverenciado, bajulado. Sabe farejar o rastro de negócios escusos, vende-se ao
melhor ofertante, prospera através de maracutaias. Assim, parece triunfar sobre
os sinceros e incautos, sempre usando ardis e motivos vis. Se, para obter os seus
inescrupulosos propósitos vier usar a intriga, sua ‘‘honestidade’‘ se macula e se
torna capaz de todos os rancores. Por isso, é preciso tomar muito cuidado para
não se colocar em seu caminho; se o fizer, desmascare-o logo de início, retire a
sua máscara de forma a desestimulá-lo de prosseguir nos seus intentos, embora
sabendo que, daí por diante, será por ele desprezado e odiado.

Em certo sentido, em muitas ocasiões, a hipocrisia pode causar mais mal que o
ódio, embora este seja um dos sentimentos que mais corrói a alma humana. O
homem digno é valoroso, mas o hipócrita é amedrontado. Por isso, o homem
digno desabafa-se, enquanto o hipócrita simula, escamoteia, disfarça; aquele,
sabe cancelar ou anular seu eventual ódio, enquanto este nem sequer admite que
o tenha. Por isso, não abre o seu coração a ninguém e, sempre que necessário,
finge ter ódio.

Com relação às crenças ou religiões, o hipócrita professa a que lhe é mais


vantajosa. Dessa forma, escolhe ou adota uma religião por conveniência, não por
convicções morais, ou seja, sua religião é uma atitude, não um sentimento
interior. Por isso, não raro, costuma exagerá-la, assumindo a posição de fanático.
Assim, nas horas de crise em que a fé agoniza no fanatismo, perde o alento e cai
no exagero materialista de quase todas, senão todas as religiões, mudando de
uma para outra com facilidade, já que não têm um ideal a preservar.

A moral do hipócrita está no fato de tirar vantagens de tudo e de todos; a moral


da criatura virtuosa está nas boas intenções e na finalidade de suas ações, sempre
objetivas, claras, honestas e dignas. O hipócrita é constrangido a manter suas
aparências, enquanto que o virtuoso cuida de seus ideais com entusiasmo e
otimismo.
A hipocrisia é um estado de ser mais profundo do que a mentira, já que esta é
acidental e aquela, permanente. O hipócrita faz o contrário do que diz toda vez
que isto lhe traga benefícios. Por isso, vive traindo a sua própria palavra ou
embaralhando suas promessas quase nunca cumpridas ao pé da letra,
transformando a sua vida interior em uma mentira metódica e organizada. De tão
habituado à mentira, tem dificuldade de falar a verdade. Assim, aqueles que o
ouvem, isto é, suas vítimas são iludidas por acreditarem que ele está dizendo a
verdade. Daí que, o hipócrita, uma vez descoberto, não merece crédito, não se
deve mais nele acreditar, é desleal e desonesto. Para se defender, então, o
hipócrita se torna calculista, já que não consegue mais disfarçar o seu intento.

O hipócrita encontra na mentira o instrumento ideal para servir aos seus


propósitos, já que nele os atos estão sempre em desacordo com as palavras.
Qualquer que seja a sua posição social, o hipócrita está sempre disposto a adular
os poderosos e a enganar os humildes, usando a mentira como sua arma. É uma
postura totalmente oposta à do virtuoso, em que a verdade é condição
fundamental. Enquanto o virtuoso mantém sempre uma condição de respeito e
honestidade, o hipócrita é sempre bajulador. Está inclinado ao mal, mas como
lhe falta ousadia, contenta-se em cultivar as aparências, desdenhando a
realidade, mas não consegue usar o seu disfarce perante todos. Não consegue,
porém, enganar a todos ao mesmo tempo e, quando é desmascarado, o mundo
parece desabar aos seus pés.

O hipócrita detesta os homens retos, pois estes, com sua retidão, humilham os
oblíquos que não confessam a sua covardia. Por isso, repetimos, simula tudo.
Nele, até o sorriso é falso. Difama na surdina e trai sempre que necessário para
atingir seus fins. Só pensa em si mesmo, caracterizando com isso sua acentuada
pobreza de espírito. Com isso, fica-lhe difícil manter uma amizade verdadeira.
Sendo indiferente ao mal do seu semelhante é, freqüentemente, levado à
cumplicidade indigna para ajudá-lo a cumprir seus propósitos.

O hipócrita não hesita em levantar suspeitas se isso lhe interessar, e com sua
palavra, destruir ou separar amigos e amantes, envenenando com sua suspeita
falsa a confiança mútua que ali existia e, portanto, jogando por terra a harmonia
que entre os amigos reinava. Outra vez, a mentira é o seu sustentáculo! Por isso
mesmo, não tem sentimento para com a família, a classe, as raças e a pátria, não
é simpático a qualquer ideal, mas pode simular simpatia mentindo para explorar
melhor esses sentimentos. Dessa forma, o hipócrita só é generoso para obter
vantagens e, como exemplo, podemos notar que só pratica uma ação digna
quando tiver a certeza de que suas ações serão notadas. Tudo o que é seu tem
mais valor, é supervalorizado e o que não lhe pertence, mas é por ele cobiçado, é
subvalorizado.

O hipócrita pratica com freqüência a ingratidão, pois pensa que não deve praticar
o bem só para evitar a ingratidão alheia. Por isso, não aceita a gratidão do seu
semelhante por interpretá-la, a seu modo, como falsa.

Como o hipócrita é indigno da confiança alheia, vive desconfiado de todos até


tornar-se susceptível, o que representa para ele uma verdadeira desgraça. Isso o
deixa em permanente risco de ser desmascarado pelos sinceros. Portanto, a
desconfiança torna susceptível o hipócrita, enquanto o orgulho torna susceptível
o homem de méritos.

O hipócrita acumula dívidas morais e materiais, e esquece que as dívidas


torpemente acumuladas escravizam o homem. Cada dívida não paga ou
resgatada é um ferro em brasa a queimar-lhe a consciência; é como uma cadeia
de elos de uma corrente que cresce e se avoluma, deixando-o impossibilitado de
viver com dignidade. A vergonha, então, o persegue de modo que o faz cruzar
uma rua para não se encontrar com seu desafeto, ou, se não o fizer, desvia o
olhar para não encontrar com o do outro. As dívidas contraídas, seja por vaidade,
seja por vício, obrigam o hipócrita a fingir e a enganar, e aqueles que as
acumulam renunciam a toda sua dignidade.

O hipócrita, sendo utilitário e oportunista, está sempre disposto a trair seus


princípios, se é que os têm, em troca de benefícios imediatos, o que impede de
fazer amizades com pessoas decentes e dignas. Não há reciprocidade de
sentimentos, só possível entre iguais.

Finalmente, as criaturas de espírito superior não podem entregar-se à sua


amizade, pois estarão sujeitas à infâmia do hipócrita que pode ser por ele
deflagrada a qualquer momento. Moliére, o maior comediógrafo francês do
século XVII, retratou este tipo de forma maravilhosa em sua sátira contra a
hipocrisia intitulada Tartufo, nome do personagem central da peça, de onde
provem o termo tartufismo, usado como sinônimo de hipocrisia.

A indiferença

A indiferença é um estado de espírito negativo que acomete as criaturas que não


sabem usar o pensamento e a vontade na forma como é devida, isto é, com força
e determinação para obter bons resultados em tudo que venham fazer. A pessoa
indiferente por natureza desdenha e despreza quase tudo e quase todos. Sua
apatia provém da profunda insensibilidade moral e social, passando pelo descaso
com que trata seus próprios familiares.

Há, na vida, pessoas que só pensam no seu interesse o tempo todo, nele
centralizando as suas ações, agindo com indiferença às realizações e emoções do
seu semelhante. O mundo está cheio de pessoas que se abstraem das coisas e dos
acontecimentos. Concentram-se no puro desfrute de sua existência material. São
incapazes de oferecer solidariedade até a seus próprios amigos e familiares.
Nada conta para elas, a não ser o imediatismo estreito de sua existência
‘‘fechada’‘ ou ‘‘trancada’‘ em si mesmas. Essas pessoas constituem o grupo
imenso dos seres indiferentes e apáticos.

Essas pessoas mal se dão ao trabalho de enxergarem além de seu nariz, onde
termina o seu horizonte; sua visão de vida é estreita e deformada. Mal conhecem
seus vizinhos, os nomes das ruas próximas onde moram, os seus parentes mais
próximos, não se interessam em ampliar os seus conhecimentos sobre o seu país,
o seu povo, a sua história, enfim, estacionam com o conhecimento que têm. Não
se apercebem do que está acontecendo no mundo por puro desinteresse. Se
sabem ler, lêem mal ou não entendem o que lêem porque o seu raciocínio acha-
se embotado. Portanto, nada assimilam através da leitura. Essas pessoas
constituem o grande grupo dos seres rotineiros e medíocres de espírito e se
sentem satisfeitas dentro de sua própria mediocridade.

Os medíocres são egocêntricos e, seja por inércia do raciocínio, seja por


comodismo, gostam de ser iludidos ou iludirem-se. Falta-lhes iniciativa. Na
verdade, não fazendo esforço nenhum para se desenvolverem, conformam-se
com o pouco que sabem. Procuram evitar problemas, para viverem em paz
consigo mesmos. Por isso, isolam-se ou tornam-se indiferentes. Este é o pano de
fundo que explica por que a indiferença abrange um grupo tão grande de
pessoas. Estas não têm opinião própria e se a têm sentem medo de expressá-la
para não se exporem ou serem criticadas. Por falta de convicção sobre suas
idéias, não sabem se defender. Quando possuem alguma cultura procuram
sofismar e, mesmo inconscientemente, estão sempre ‘‘com o pé atrás’‘, como se
diz popularmente. Estão sempre predispostas a encontrar conclusões que lhes
interessam, procurando conciliar a sua realidade com a verdade, sem o
conseguirem. Ao emitirem suas idéias e opiniões abstraem-se da lógica, de cuja
exatidão ninguém duvida, e preferem associá-la aos seus próprios interesses e
prazeres materiais. Criam assim, sua própria ‘‘verdade’‘ e impregnam-se dela.

É sabido que o indivíduo é o produto da hereditariedade, do meio em que vive,


dos compromissos assumidos em grupo, dos laços familiares, da tradição e
outros. Prevalecem, porém, as influências do meio e dos recalques adquiridos.

Os indiferentes não têm força de vontade, falta-lhes coragem para abandonar


muitas das idéias a que se apegaram. Por isso, da indiferença à indolência é um
passo. Seus sentimentos estão endurecidos, empedernidos por sentirem-se
comprometidos apenas com a ‘‘verdade’‘ que eles mesmos introduziram em suas
mentes. Costuma-se dizer que certas pessoas têm ‘‘um coração de pedra’‘ para
significar a imutável sensibilidade que possuem. Esta permanência de atitude
lhes traz um certo conforto e aparente paz de consciência, mas por isso mesmo,
sua evolução é lenta. Mas, a verdadeira paz de espírito que acompanha as
pessoas boas e puras, esta eles não têm.

Vítimas de uma segunda natureza que eles mesmos implantaram em suas mentes
com o correr do tempo, incorporam o que dizem e o que pensam de uma maneira
tão forte, que torna-se-lhes muito penoso romper as suas ‘‘verdades’‘. Tornam-se
indolentes, incapazes de reagir, de mudar a sua ótica de ver as coisas, por mais
simples e clara que seja a lógica que se lhes apresenta. Possuem antolhos para
verem além das aparências.

Pelo fato de firmarem-se em princípios falsos pelos quais se batem, dominados


pelos sentimentos e desprezando a razão e a lógica, defendem suas idéias,
princípios e religiões que professam com unhas e dentes, mas com insegurança e
dubiedade. Muitos chegam a perceber a enrascada em que se meteram, mas
preferem ser insinceros consigo mesmos e carregam esta contradição por muitos
e muitos anos, sem coragem para romper esse conflito de consciência. Nunca
dão ‘‘o braço a torcer’‘, como diz o ditado popular. Estão nesta categoria de
‘‘insatisfeitos da consciência’‘ muitos pregadores, fanáticos, religiosos,
aliciadores, demagogos e maus políticos. Todos eles começaram com um
conflito pessoal, depois familiar e finalmente, social. Sem idealismo algum, a
não ser para servir ao seu próprio interesse material, tornam-se
automistificadores e mistificadores da grande massa de rotineiros e medíocres
que não querem raciocinar, pessoas suscetíveis à credulidade.

Usando a lábia dos grandes embusteiros e espertalhões, pretendem iludir a todos


com suas ‘‘verdades’‘, inoculando nas mentes dos incautos falsas idéias para
delas se aproveitarem materialmente. São os mistificadores de profissão que
utilizam toda sorte de ardis e artifícios. Mas, se chamados ao debate, ao exame
lógico das idéias que expõem, sentem-se dúbios, gaguejam ou procuram
atropelar as razões de seu debatedor e acusam-no de não ter fé.

É preciso romper com a indiferença. Colocar o pensamento e a vontade em ação.


Raciocinar sobre todas as coisas e fenômenos que ocorrem à nossa volta,
lembrando-se que nada acontece por acaso. Se cairmos no erro, ao percebermos,
colocar de lado o orgulho e a vaidade e redirecionar nossa vida de forma lógica e
objetiva. Só assim sacudiremos a poeira dos tempos e evoluiremos mais
rapidamente.
A infidelidade
A infidelidade é um sentimento muito negativo e bastante grave, que consiste na
quebra ou rompimento da confiança e que se manifesta na forma de traição de
um acordo feito entre um homem e uma mulher, qualquer que seja este acordo.
Há acordos de diferentes tipos entre um homem e uma mulher, sendo o mais
comum o nupcial ou casamento legal. A infidelidade não deve ser confundida
com o adultério. Este envolve aspectos legais e religiosos, segundo os quais
certos atos são considerados pecaminosos. O adultério é a infidelidade conjugal
ou prevaricação, cometida fora do casamento, enquanto que a infidelidade é uma
desonestidade de natureza mais ampla, que se configura por um não
cumprimento daquilo a que se obriga ou se obrigou, de natureza emocional e
desleal. A infidelidade, como tal, é uma deslealdade específica.

A infidelidade é uma transgressão moral a tudo o que for aceitável e permitido


entre marido e mulher, casados legalmente ou de fato. Não basta a dúvida que
uma criatura possa ter e perder a sua confiança no comportamento da outra; é
preciso ter certeza que, de fato, está ocorrendo ou ocorreu uma traição, e tenha
disso pleno conhecimento. A traição, então evidenciada, é a consumação da
quebra de um acordo conjugal. Ela revela que necessidades emocionais e outras,
próprias da relação a dois, não foram satisfeitas. Isso não significa que existe
‘‘culpa’‘, sempre argüida ou levantada por um dos cônjuges.

O problema da infidelidade, o seu surgimento, está ligado às expectativas


frustradas, e isso porque, todo e qualquer relacionamento implica em alegrias e
frustrações, sendo difícil e muito penoso para ambos conviverem quando estas
últimas ultrapassam certos limites. É preciso ter claro em mente que nenhum
relacionamento preenche todas as necessidades emocionais e outras dos
cônjuges. Se a criatura não se der conta dessa verdade, poderá se envolver em
sucessivos relacionamentos fora do casamento, todos fadados ao fracasso, além
do deslize moral que essa atitude implica.

Não há dúvida que a infidelidade é um sintoma de que algo na relação a dois não
vai bem, não satisfaz mais a um dos cônjuges ou a ambos e sua existência cria
uma situação intolerável dentro do casamento. As evidências disso são as
desavenças, as brigas violentas e as agressões físicas levando à separação e ao
divórcio e, em alguns casos, a crimes passionais.
A infidelidade tem mais a ver com a fraqueza da criatura que trai, seu
temperamento, seus valores, os momentos difíceis por que passa na vida, mas
decorre principalmente de insatisfações e frustrações para as quais a pessoa não
encontra uma solução ou saída negociada ou honrosa. A causa pode ser falta de
maturidade de um dos cônjuges, pode ser que a pessoa avaliou mal suas
expectativas e, uma vez desfeitas estas, sente-se que tudo vai desmoronar a sua
volta. Sente que a sua vida vai perder sentido e precisa criar uma situação de fato
para tomar coragem e decidir novos rumos.

É óbvio que as dificuldades de cada caso e suas particularidades precisam ser


levadas em conta para se poder fazer uma abordagem realista da situação.
Quando estiver em jogo personalidades fortes, falta de compreensão,
intolerância de um para com o outro, impaciência, falta de esforço de ambos
para encontrar solução para os problemas e, sobretudo, desrespeito moral e
físico, criam-se mágoas e ressentimentos difíceis de serem superados. Aí, se
nenhuma conciliação íntima for possível, através de um minucioso exame de
consciência e muita compreensão e, enquanto não houver decisão para uma
separação ou mesmo o divórcio, a infidelidade pode tornar-se um remédio
amargo para o casamento infeliz. Nesse caso, a infidelidade é o efeito e não a
causa dos problemas.

O relacionamento fora do casamento pode ser de variados tipos ou graus como


casual, emocional leve e íntimo, este último com forte envolvimento emocional
ou paixão.

O envolvimento casual, fora do casamento, tem raízes profundas em criaturas


imaturas, inseguras e volúveis, que não cresceram psicologicamente para
assumir os encargos do casamento. Há homens que têm em si, muito arraigado, o
sentimento de machismo, dando largas à sua imaginação e ao desejo de uma
experiência excitante e ilícita. Fazem isso por pura vaidade, por afirmação
egoística de narcisismo ou pelo prazer da conquista amorosa inconseqüente e
irresponsável. Agarram toda e qualquer oportunidade que ocorre em viagens,
festas, encontros, comemorações de aniversário, bailes para fazer a sua
conquista. As pessoas aceitam porque lhes parece ter pouca ou nenhuma
conseqüência. O conquistador acredita que nenhum mal acarreta e que tais
práticas não vão abalar as suas convicções em relação à família. Muitas vezes,
até pensando que a experiência que vai adquirindo pode enriquecer suas relações
conjugais, acaba caindo em armadilhas difíceis de sair. Isso para não se falar no
risco de adquirir doenças sexualmente transmissíveis, como a AIDS e outras,
bem como, de gravidez indesejável, com todas as suas dolorosas conseqüências.
Essas aventuras extraconjugais amesquinham o potencial do casamento e
contribuem para a sua deterioração, cavando um fosso profundo nas relações
conjugais. Psicologicamente, deixa a criatura cada vez mais vulnerável às
investidas do mal.

O relacionamento sexual leve é a forma mais comum de envolvimento


emocional extraconjugal. Aqui, ele já adquiriu raízes mais profundas; há
encontros periódicos, mas sem criar expectativas que tais encontros prosperem
ou se transformem em algo definitivo e sério para o futuro. Apesar disso, há o
risco de que o envolvimento se torne muito intenso, maior mesmo do que se
pretendia, já que as emoções são imprevisíveis, e nada garante que as pessoas as
manterão sob seu controle. Esse envolvimento pode ser mútuo ou unilateral, mas
qualquer que seja o caso, leva a complicações de ordem psíquica, e a criatura se
vê desdobrada em duas, passando a viver vidas paralelas, criando situações
indesejáveis dentro do casamento, a ponto de se tornarem insustentáveis. Qual a
solução? A solução tem que vir bem antes de começar o problema: é ter força de
vontade para resistir a todas as tentações que a vida se nos impuser, fugindo das
armadilhas com coragem e firmeza.

No envolvimento do tipo caso íntimo, o casamento se deteriora a tal ponto que


não tem mais conserto e, se vier a transformar-se em paixão, fatalmente levará a
criatura ao divórcio. Muitas pessoas chegam a esse ponto porque a paixão é um
poderoso incentivo para o seu ego, principalmente quando a pessoa chegou a um
estado de desânimo muito grande, enfraquecendo-lhe a vontade a tal ponto que
não consegue mais controlar as suas emoções ou, então, tem complicações
familiares insolúveis. Isso pode ocorrer quando a criatura passou muito tempo
resistindo às tentações e não consegue romper a paixão que nela se instalou,
achando que ela compensará os sacrifícios que advirão. Puro engano! As
desvantagens são enormes e a culpa moral abaterá fatalmente sobre a criatura
com efeitos terríveis no presente e no futuro, causando-lhe forte desgaste
emocional e psíquico. A maioria das pessoas não consegue sustentar essa
situação por muito tempo e a certa altura terá que decidir e fazer a sua escolha,
acompanhada de muita confusão e sofrimento.

O que fica ou resta para o casal é muita raiva, mágoas e ressentimentos que
causam grandes males ao seu progresso espiritual, principalmente quando o mal
se torna visível, se transforma de desconfiança em certeza. Pior ainda quando
essa revelação de infidelidade se faz diretamente, quando o marido ou a mulher
revela ao outro a traição, em momentos de briga violenta ou fúria, em que, fora
de si, descontrolados emocionalmente, não medem palavras.

A infidelidade traz seus próprios problemas, mas também, traz a necessidade


urgente de se lhes dar solução, principalmente quando o culpado não admite a
culpa e não deseja ou não procura uma conciliação. Esta nem sempre é uma
solução definitiva e só poderá ser levada a bom êxito se o parceiro traído tiver
muito amor à pessoa que causou a traição, já que não é fácil apagar todas as
amarguras trazidas e inculcadas com o desenrolar dos fatos.

A única e definitiva solução para a infidelidade confessada, admitida ou revelada


por qualquer forma é, infelizmente, a separação do casal, devendo cada um
procurar se refazer e dar novo rumo às suas vidas. Infelizmente, nem sempre isto
é fácil de fazer, devido a outros interesses de ordem material ou relacionados
com a guarda e a educação dos filhos, os maiores perdedores, as maiores vítimas
da infidelidade, qualquer que ela seja.

Somente com a evolução espiritual, que leva a um melhor conhecimento da vida,


da moral cristã, da maturidade antes de se casar, das responsabilidades próprias
ao casamento e dos encargos do lar, da existência do amor verdadeiro, do
autocontrole para vencer as tentações emocionais, da compreensão e da
tolerância poderá a criatura resistir a todas as investidas do mal, e ser feliz no
casamento. Mas este ajuste, esta evolução tem que alcançar ambos os cônjuges,
que precisam ser mais realistas e menos fantasiosos em seus desejos e
pensamentos.
A inveja
A inveja é um dos sentimentos mais negativos, ignóbil mesmo, que atormenta as
pessoas de baixa espiritualidade. Isto porque, aquele que se entrega à inveja,
rebaixa-se sem que o saiba, confessa-se subalterno. Ela traz consigo a marca
psicológica de uma inferioridade humilhante.

Através da inveja sofre-se em função do bem e da felicidade alheias. Este


sofrimento é que caracteriza a inveja, é sua razão de ser, seu cerne moral,
corroendo o coração do invejoso como um ácido corrói o metal. É como a
ferrugem que ataca e destrói o ferro.

O sentimento de inveja é tão negativo que jamais se viu um invejoso confessar


que o é. Existem pessoas de moral duvidosa que podem até alardear alguns de
seus vícios mais infames, mas não têm a coragem de se confessarem invejosas.
De outro lado, não reconhecer a importância da inveja é declarar-se inferior ao
invejoso. Trata-se, portanto, de uma paixão tão nefasta e detestável que ela é
encontrada em todas as camadas sociais, em todas as etnias e em todas as
nações. Ela envergonha até mesmo aos mais impudicos e se torna difícil,
impossível de se ocultá-la.

Muitos psicólogos tratam-na como um caso particular do ciúme, mas isto não é
correto porque, desde a mais conhecida antigüidade, já a mitologia grega
atribuía-lhe origem sobre-humana, das trevas noturnas e, também, porque nos
tempos modernos adquiriu tanta virulência que convém ser tratada independente
do ciúme. Convém assinalar que na mitologia grega a inveja era representada
por uma mulher com a cabeça coberta de víboras, com olhos fundos, dentes
pretos e língua untada, segurando com uma das mãos três serpentes e, com a
outra, uma hidra e, no seu seio, incuba um monstruoso réptil que a devora
continuamente.

O invejoso não suporta o sucesso alheio. Este o aflige e o deixa sempre


angustiado; sofre muito pelo castigo implacável que impõe a si mesmo. Trata-se
de um tormento semelhante ao que se sente quando se tem ciúme.

Há, ainda, os que comparam ou chegam a confundir inveja com ódio. Ambos
nascem da maldade e, quando dão as mãos, tornam-se mais fortes. Tanto aquele
que odeia como o invejoso sofrem em conseqüência do bem e parecem gostar do
mal alheio, mas é só nisso que se parecem. Eis a diferença: o ódio destila o mal
que o indivíduo dirige aos outros; ao contrário, a inveja é estimulada pelo
sucesso e prosperidade alheia, querendo para si o que pertence aos outros.

No dizer de José Ingenieros: ‘‘Pode-se odiar as coisas e os animais; só se pode


invejar os homens. O ódio pode ser justo, motivado; a inveja é sempre injusta,
pois a prosperidade não causa dano a ninguém’‘.

Estas duas paixões são alimentadas e fortificadas por causas equivalentes: o ódio
se dirige aos mais perversos e a inveja aos que mais merecem. Daí Themístocles
ter dito, quando ainda jovem, que não tinha realizado nenhum ato brilhante,
porque ainda ninguém o invejara.

Com freqüência o ódio ofende, inspira e é temível; já a inveja conspira e é


repugnante. O invejoso é ingrato por natureza. Constata-se, também, que se sofre
mais invejando do que odiando. O ódio não teme a verdade e a inveja elabora a
mentira. Ambos atormentam aqueles que lhes dão guarida em suas mentes e
corações. Há quem diga que o ódio pode até ser justo, quando empregado para
derrotar a tirania, a infâmia e a indignidade.

O homem superior jamais será invejoso, já que possuindo seus próprios méritos
não desejará o de outros. Inveja-se o que os outros já têm e o que se desejaria ter;
por isso, no fundo, a inveja é um sentimento de frustração. Ela nasce de um
sentimento de inferioridade que os espíritos fracos estimulam e carregam
consigo. Neste sentido, é uma inclinação de tendência egoística, resultante de
uma incapacidade de competir.

Aquele que já evoluiu a ponto de ver nos outros parcela da Força Universal em
ação, capaz de sentir a beleza em todas as coisas da natureza e nas feitas pela
mão do homem, que admira as artes e cultiva a ciência e que se comove com os
grandes feitos e se deixa arrebatar pelos ímpetos da emoção, enchendo seus
olhos com lágrimas, é um espirito avançado e jamais será invejoso.

A psicologia moderna procura distinguir entre o invejoso passivo e o ativo; o


primeiro é hipócrita, servil, irremediavelmente inferior e não vacila em sacrificar
até seus familiares para atingir seus fins; já o ativo possui uma eloquência
bárbara. Dissimulando suas idéias, pretende desvendar o espírito alheio sem
nunca ter podido desvendar o próprio, é virtualmente traiçoeiro, ardiloso e
intrigante: é uma víbora no ditado popular. O invejoso ativo, não conseguindo
elevar-se, refugia-se em instituições onde o culto da vaidade é alimento a seu
caráter medíocre. É capaz de difamar os seus invejados. Nele a inveja projeta-se
ao passado, chegando a invejar grandes vultos de nossa história.

O invejoso olha para as pessoas com olhares oblíquos, nunca os encarando de


frente.

Alinharemos algumas palavras sobre este vasto tema que é a inveja feminina e
masculina. A inveja feminina é temperada por filigranas de astúcia e, às vezes,
de perversidade e, em geral, utiliza a maledicência no matraquear das conversas
fiadas, remoendo-se sem cessar até atingir sua invejada ou invejado. Seu alvo,
em geral, é a beleza que ela vê, obliquamente, em suas competidoras. Já o
homem vulgar inveja as fortunas e as posições sociais, julgando que a riqueza
seja o supremo ideal dos outros, certo que é o seu. Nisto se explica o fato de o
proletário invejar o burguês, sem renunciar a substituí-lo: na verdade, ele
gostaria de estar no lugar dele. Mas, acima de tudo, o talento em todas as suas
formas é o bem mais invejado entre os homens. Basta o indivíduo sobressair-se,
em qualquer atividade, para arrastar, atrás de si, numerosa fileira de invejosos
que, incompetentes, procuram reunir esforços para destronar seus ídolos.

A maledicência

A maledicência é um sentimento de ordem inferior e bastante nocivo, porque


produz prejuízos em ambas as extremidades, no detrator e no detratado. A
criatura maledicente é sempre uma pessoa sombria, medíocre, que não respeita a
si mesma nem a quem rodeia, sem idéias próprias e sem elevação de espírito.
Destituído dos bons valores morais e dos necessários dotes intelectuais,
prevalecem no maledicente atributos espirituais ainda não lapidados, grosseiros
mesmo. De regra, mantêm-se na superfície, já que lhes falta capacidade de
raciocínio para se aprofundarem em qualquer questão.

Pelo baixo nível de suas idéias e pensamentos poderiam merecer indulgência das
criaturas mais privilegiadas se soubessem se manter simples e humildes.
Infelizmente, isso não acontece e, em geral, são pretensiosas e, por isso, tornam-
se perigosas e nocivas. Como não podem igualar os dotes dos que têm talento e
brilho, os ofendem; já que não podem elevar-se até eles, decidem rebaixá-los,
carcomendo-lhes o mérito com voraz maldade. A reputação dos dignos os
humilham; por isso, cospem todo o seu veneno neles, posto que estão sempre de
mau humor e de má vontade para com o próximo.
As pessoas medíocres são mais inclinadas à hipocrisia do que ao ódio. Por isso,
preferem a maledicência silenciosa, sub-reptícia, não ostensiva à calúnia, que é
violenta e requer ousadia por parte do caluniador. A calúnia é um crime previsto
em artigo no Código Penal Brasileiro e, infringi-lo ou desafiá-lo, leva aos rigores
da lei. Por isso, o caluniador tem que ter coragem para desafiar o castigo penal, o
que o maledicente não tem, porque age na surdina, sutilmente e normalmente se
oculta na cumplicidade de seus iguais.

Encontramos os maledicentes em toda parte: nos lares, nos locais de trabalho,


nos clubes, nas universidades. Eles acometem todos que possuem alguma
originalidade. Embora aparentando recato, embargam a voz sempre que falam;
na verdade, tartamudeiam, assacando contra a felicidade alheia. Semeiam
tempestades em copo d’água, envenenam a vida das criaturas benignas sempre
que invejam suas qualidades luminosas. Não se trata apenas do ignorante injuriar
o sábio ou o domesticado invejar o digno. Em qualquer caso, o maledicente
carrega consigo sempre uma conduta humana vil e abjeta.

O maledicente derrama o seu veneno de forma sutil, bastando, às vezes, um


sorriso ou franzir de testa seu para apontar seu detratado, que pode ser um
homem probo ou uma mulher digna e honesta, comprometendo-lhes a reputação,
não raro, de forma irremediável. Outras vezes, desanda a falar de forma
entrecortada ou mesmo quase em soluços palavras ofensivas, criando situações
embaraçosas para si ou seu parceiro, retumbando, num nervosismo crescente,
suas palavras, principalmente quando se encontrarem diante de uma ‘‘platéia’‘
disposta a ouvir suas sandices ilógicas e atabalhoadas. Desafina-se facilmente de
suas idéias e, como não pode igualar os méritos de seu interlocutor procura
denegri-lo, lançando mão da mentira espontânea que flui fácil de sua mente. Por
ser covarde não afirma nada, apenas insinua, mas chega a desmentir imputações
que lhe são atribuídas para fugir de suas responsabilidades.

Outra característica do maledicente é que ele cala com prudência de todo o bem
que sabe sobre alguém, isto é, ele se omite para melhor realçar todo o mal que
deseja destilar sobre determinada pessoa. Por isso, é fato conhecido que o
maledicente não respeita as virtudes íntimas, nem os segredos do seu lar; nada
lhe escapa quando se trata de falar mal da vida alheia, estiletando seu parceiro na
vista de seus filhos e amigos, sem respeito algum, nem piedade.

É preciso sempre desconfiar dos elogios, principalmente quando provêm de


indivíduos de má índole, interesseiros e sabidamente maledicentes: eles
maldizem elogiando e aplaudindo, mas com reservas, para, com sua baixeza,
praticar o mal da maledicência. São irônicos, malignos, pérfidos, zombadores da
confiança e da ingenuidade alheia, burlando, portanto, qualquer laço mais
estreito de carinho e amizade que pudesse existir em suas relações. Isso porque é
mais fácil para o medíocre ridicularizar uma ação sublime de seu semelhante do
que imitá-lo, seguir-lhe o exemplo.

Os maledicentes têm malignidade perversa devido à falta de dignidade.


Procuram disfarçar seus ressentimentos para acobertar sua inferioridade
humilhada, sempre que descobertos. Caluniam às escondidas, mas sempre
encontram uma enxurrada de cúmplices que lhes dão cobertura ou se omitem.
Isto é muito comum na mídia, onde a fofoca assume o lugar da maledicência por
ser mais elegante pois, não raro, aquela tem o tom bajulador. José Ingenieros, em
sua monumental obra O homem medíocre escreveu: ‘‘O escritor medíocre é pior
pelo seu estilo do que pela sua moral’‘ [INGENIEROS, 1953, p. 87]. Fato é que
muitos escritores e jornalistas, que se enquadram nessa afirmação, conseguem
ser apenas terrivelmente aborrecedores, com páginas recheadas com lugares
comuns, frases feitas, repetitivas ou ambíguas, que bem poderiam terminar no
primeiro parágrafo. Enfim, não têm objetividade, tropeçando nas próprias
palavras.

É preciso muito cuidado para não se envolver com os maledicentes. Eles estão
em toda parte e sua maledicência oral tem eficácia imediata e esta tem sua raiz
na complacência daqueles que os ouvem, sem se indignarem, criando-lhes uma
atmosfera propícia à sua difusão e circulação. Assim, evite-os, protegendo de
antemão a sua reputação.
O medo
De todos os sentimentos negativos, o medo é o que mais se acha arraigado na
mente humana. Ele é criado pelo pensamento, mas tem suas raízes na
insegurança que a pessoa sente em face de várias situações que a vida nos
reserva. E isto desde a mais tenra idade, até mesmo antes de se formar a
consciência no pequenino ser. Por isso, muitas vezes é tratado mais como um
instinto do que como um sentimento.

Toda nossa vida, desde que nascemos até morrermos, é uma luta incessante para
ajustar, transformar e tornarmo-nos úteis enfim, evoluirmos. É dessa luta e
conflitos que surgem as numerosas causas de confusão, embrutecimento da
mente e insensibilização do coração. Vivemos dentro de uma dualidade, de
desejos opostos, com seus temores e contradições.

Os conflitos se manifestam a todo momento entre as atividades do ‘‘eu’‘ (o


observador) e o ‘‘não eu’‘ (a coisa observada, experimentada). O ‘‘eu’‘ está
impregnado de impulsos, ambições, pretensões, prazeres, ódios, ansiedades,
competição e temores de toda espécie; já o ‘‘não eu’‘ constitui o conceito, a
fórmula, o ideal a ser alcançado. Entre estes dois extremos construímos a ‘‘nossa
ponte’‘, tentando ligar ‘‘o que é’‘ ao que ‘‘deveria ser’‘. E é aí que reside o
conflito, a dualidade, porque não conseguimos ficar só de um dos lados da ponte.

Neste contexto, nosso principal desejo é sermos totalmente livres no âmbito


material, político, social e religioso, com o objetivo final de descobrirmos a
realidade no sentido existencial máximo e evoluirmos para a perfeição, isto é,
para algo eterno e intemporal - a Força Criadora de tudo o que existe. O
importante é não deixar esta liberdade naufragar em um processo de auto-
isolamento, sendo necessário mantê-la sempre viva em nossa vida relacional. É
natural que neste desejo de liberdade ocorra o medo, já que o excesso de
liberdade pode gerar a insegurança. Toda criança deseja segurança, e nós
adultos, à medida que envelhecemos, continuamos exigindo segurança e certeza
em todas as nossas relações com coisas, pessoas e idéias.

Ora, é o medo que destrói o amor através do ciúme, que cria a ansiedade, o
apego, o desejo de posse e de domínio, o ciúme em todas as relações; é ele que
gera a violência. E a violência é um dos grandes obstáculos a uma vida mais
saudável e segura, principalmente nas grandes cidades.
Sem querer examinar como surge o medo, o que lhe dá sustentação e duração e
como lhe pôr fim, vamos, no entanto, abordar aspectos a ele inerentes sem deixar
de lado a questão de sua realidade.

Há muitos tipos de medo. Há o medo por instinto, que é uma reação sensorial
face ao perigo ou ameaça iminente, e o medo psicológico, este mais conhecido
como temor ou fobia, como é o caso do medo da morte, medo da escuridão e
outros desse tipo. Para vencer o medo, precisamos desenvolver a coragem, que é
a melhor forma de resistência ao medo, embora muitos prefiram utilizar a fuga
ou até mesmo o lazer para se lhe opor.

No contexto mais acima exposto, o medo é o ‘‘não eu’‘. Mas, a coisa se


complica porque não existe o observador (o ‘‘eu’‘) observando o medo; aqui, o
observador espelha o medo, isto é, o observador se funde na coisa observada, na
realidade concreta que é o medo. Neste caso, há uma interrelação dinâmica entre
o ‘‘eu’‘ e o ‘‘não eu’‘.

A real causa do medo está no pensamento e no tempo. É o tempo que me ‘‘liga’‘


àquilo que eu temo. Tenho, por exemplo, medo que amanhã ou no futuro me
faltem recursos para viver livre, que eu perca a saúde, meus bens, meu amor. Do
mesmo modo, tenho medo de que não receba uma dívida de um amigo a quem
emprestei dinheiro. É fácil observar que nestes exemplos ‘‘a ponte’‘ entre o
‘‘eu’‘ e o ‘‘não eu’‘ é o tempo. E o pensamento, qual o seu papel neste contexto?
O pensamento gera o medo, e bem assim, o prazer, ambos dependentes do
tempo, qualquer tempo - passado, presente ou futuro. É o pensamento que cria
essa moeda de duas faces: o prazer e a dor, esta, conseqüência direta do medo.
Se compreendermos este processo poderemos pôr fim ao medo.

Ora, como o pensamento não cessa nunca, já que ele é o resultado das vibrações
do espírito, e seu estado dinâmico define o nosso ‘‘eu’‘ em dado momento,
voltamos ao mesmo problema do ‘‘eu’‘ (observador) e do ‘‘não eu’‘ (coisa
observada). Portanto, é de se notar que para superar o medo temos que nos valer
da força de vontade para tentar quebrar essa dependência, assumindo o risco
decorrente do bom ou mau uso de nosso livre-arbítrio. E, sendo o medo uma
reação da memória e da experiência acumulada em fracassos e sucessos, torna-se
difícil eliminá-lo somente por controle ou repressão do pensamento. Há que se
recorrer, então, ao autoconhecimento e à busca do silêncio interior, à paz de
espírito, para fazer cessar o medo através de introspeções conscientes. Só pelo
conhecimento de nós mesmos como Força e Matéria é que poderemos terminar
com o sofrimento e o medo.

Quem busca refúgio de uma forma exagerada no prestígio social, no trabalho, no


ato de ganhar dinheiro e no conforto da vida moderna quase sempre o faz como
um processo de fuga, derivado do medo da solidão interior, mesmo quando sob a
aparência do subterfúgio da competição. Em geral, as pessoas se dedicam às
coisas e fatos superficiais e mundanos que depressa se acabam para dar lugar a
novas superficialidades transitórias que, no fundo, nunca preenchem as
aspirações mais elevadas do espírito humano. O mesmo acontece com aqueles
que exercem, de forma fútil, atividades na área da assistência social ou através
de ajuda dita humanitária, quando no fundo estão alimentando um
sentimentalismo egoístico e barato. Não havendo desprendimento e altruísmo no
exercício dessas ações, desaparece o mérito.

De outro lado, há pessoas que se sentem bem e são tomadas de grande alegria
por estarem sós. Isto parece um paradoxo, porque a solidão é uma forma de
retraimento, de isolamento e de refúgio. Mas, essas criaturas podem estar só
exteriormente, simplesmente solitárias, o que é bem diferente da solidão interior.
E, quando inexiste a solidão interior, isto é, quando a pessoa busca o
autoconhecimento imergindo numa meditação criadora, desaparece também o
medo.

Vimos que o medo nasce quando o conhecido (o ‘‘eu’‘) procura apreciar o


desconhecido (‘‘o não eu’‘). Essa atividade é, portanto, a sua causa. Mas,
lembre-se que a palavra medo (interior) é a cortina do medo, já que o termo está
escondendo o fato, ‘‘o que é’‘, e a própria palavra pode até criar o medo. Assim,
‘‘o eu’‘ (o conhecido) não pode absorver o ‘‘não eu’‘ (o desconhecido), por não
poder experimentá-lo. Conhece-se o termo, mas não se conhece o que está
escondido atrás dele. Assim, só se pode pensar ou especular sobre o
desconhecido ou ter-lhe medo, mas o pensamento não pode compreendê-lo,
porque o pensamento é produto do conhecido, da experiência. Haverá medo
enquanto o pensamento desejar experimentar, compreender o desconhecido.

Concluímos, assim, que o medo é uma reação do pensamento diante do


desconhecido. O pensamento não pode atuar sobre o que existe atrás do termo
‘‘solidão interior’‘, mas só pode revelar ‘‘o que é’‘, e este (o conhecido) é
inesgotável e mantém a mente sempre ocupada.

O medo acomete, indistintamente, a todos: ele não tem fronteiras e as criaturas


preferem senti-lo em silêncio, para não parecerem frágeis.
O medo da morte
O medo da morte atinge bilhões de pessoas, por viverem dissociadas da vida
espiritual, só admitindo a vida material, que terminaria definitivamente com a
morte carnal. Mas, o medo da morte é de origem muito mais profunda. O
problema é saber se temos que procurar uma resposta confortante, mas
enganosa, em busca de uma esperança, uma tranqüila continuidade ou o
aniquilamento, ou se desejamos conhecer a Verdade.

A morte é uma realidade inevitável, inexorável. Não importa o que façamos, ela
é irrevogável. Mas, o que mais preocupa à criatura não é a morte em si, é querer
saber o que existe além da morte, isto é, é desconhecer que espécie de
continuidade existe além da morte, e em que dimensão.

Ora, para que surja ‘‘algo novo’‘ é preciso que exista alguma coisa que venha a
findar e que já envelheceu. Isso é verdade para qualquer pessoa, cujo organismo
começou a morrer logo que nasceu, num processo contínuo de renovação celular,
muitas vezes de natureza revitalizante, mas decaindo com o tempo até se
aniquilar por completo. Há uma descontinuidade, já que nosso corpo não dura
para sempre, isto é, corpo e mente não são eternos. Parece desconcertante, mas o
pensamento não cessa, nem mesmo após a morte do corpo. Isto porque o tempo
não é apenas cronológico, mas um movimento contínuo do passado através do
presente em direção ao futuro. É através desse movimento que ocorrem as
transmigrações de memória, de imagens, dos símbolos, etc. que faz com que o
pensamento e a memória tenham existência contínua, por serem faculdades do
espírito, que é eterno.

Mas, o que é o medo?

O medo não é uma mera abstração, mas tem uma existência real, isolada e
independente. Ele surge sempre relacionado com alguma coisa, isto é, não existe
o medo independentemente de uma relação. Ora, como a morte continua sendo
‘‘o desconhecido’‘, ela não pode ser trazida para a esfera do ‘‘conhecido’‘ para
que seja estudada, dissecada, isto é, não se pode tocar o desconhecido com as
mãos.

O problema está em poder ou não poder penetrar além da cortina da morte,


estando-se vivo, com a nossa consciência plena, atenta e desperta. Neste estado,
que chamamos ‘‘vida’‘, desejamos experimentar (conhecer) algo que não se acha
na esfera de nossa consciência. A vida é luta, dor, ódio, todas as sensações
conscientes e inconscientes - e desejamos ‘‘experimentar’‘ algo que representa o
oposto disso. O oposto, neste caso, é o prolongamento do ‘‘que é’‘. Mas, a morte
não é o oposto da vida. Ela é o desconhecido. Se pudéssemos experimentar a
morte enquanto vivo, sem dúvida o medo da morte cessaria por completo.

A morte é o desconhecido e é isso que nós tememos. Ora, pode alguém ter medo
de uma coisa (fenômeno) que desconhece? Na verdade, temos medo não do
desconhecido, mas da perda do conhecido, porque essa perda pode ser dolorosa
ou acabar com nossos prazeres, nossas satisfações. Assim, é o conhecido a causa
do medo e não o desconhecido, isto porque este não é mensurável em termos de
prazer e dor. Assim, podemos afirmar que temos medo do conhecido em relação
com a morte, mas não desta propriamente dita. É que sempre temos o conhecido
como ‘‘coisa garantida’‘, e por isso mesmo, quase não lhe notamos a presença
(do conhecido).

Mas, para terminar, afirmamos: como muitas pessoas têm medo de olhar a si
mesmos, evita-se saber ‘‘o que é’‘, ‘‘o que conta’‘ e, com mais razão ainda,
fogem (processo de fuga) do desconhecido e, procurando não encará-lo de
frente, sofrem com este medo por pura ignorância do ‘‘que é’‘.

E como se libertar desse medo?

Para se libertar do medo de qualquer coisa é preciso conhecê-la. É o desejo de


não ver que faz surgir o medo. O ‘‘que é’‘ tem de ser visto no espelho das
relações, relações estas com todas as coisas. O ‘‘que é’‘ não pode ser
compreendido no retraimento, no isolamento. Só pode ser compreendido num
estado de completa passividade da mente, isto é, quando a mente não está se
atirando sobre ‘‘o que é’‘.
A mentira
A mentira é um sentimento que se fundamenta no hábito, no costume, no desejo
que a criatura tem de enganar e iludir o próximo (mentira consciente ou ativa) ou
que se manifesta pela sua omissão (mentira passiva), ocultando algo que, a seu
critério, irá ajudá-la ou prejudicar o seu semelhante. No primeiro caso, ela se
opõe à verdade e, no segundo, ela omite, oculta a verdade. Trata-se de um
sentimento muito complexo, nocivo, altamente difundido em todas as camadas
sociais e nas sociedades de todo o mundo, como veremos no desdobramento
deste tema.

O quadro de atuação da mentira é muito amplo, dada a natureza complexa do


perfil, das características e dos matizes que ela pode assumir. Guy Durandin,
doutor em Ciências Humanas, em seu livro Os fundamentos da mentira,
[DURANDIN, 1988, p. 154] esboça o seguinte quadro:

MENTIRAS DE ATAQUE

* por interesse: aquelas próprias do comércio.

* por ódio: para enganar pessoas antipáticas.

MENTIRAS DE DEFESA

* por timidez: para evitar agressão.

* por proteção: para proteger a personalidade.

MENTIRAS DE ATAQUE E DEFESA

* como desculpa: uma tentativa de justificar erros.

* como valorização: para parecer superior aos outros.

MENTIRAS ALTRUÍSTAS

* piedosa: para evitar a dor dos outros.

* defensiva: para defender um amigo ou grupo social.


MENTIRAS EXPLORATÓRIAS

* inventar uma historia por meio da qual se consiga chegar à informação


desejada (plantar verde para colher maduro).

MENTIRAS GRATUITAS

* parte-se de dados verdadeiros, aumentando-os ou tornando-os agradáveis


(mentira de pescador, de caçador, etc.).

MENTIRAS INCONSCIENTES

* involuntárias: aquelas que só são percebidas após dizê-las.

Ainda segundo Durandin, o perfil da mentira se esboça em uma dublê de


agressão, uma forma de economizar forças na luta pela vida. Ou ainda, uma
arma de ataque e defesa, já que a essência da mentira se encontra no instinto dos
animais que se escondem para evitar o inimigo ou para surpreender suas vítimas.
É dele: ‘‘Se em vez de usar um pedaço de pau contra o meu adversário e
derrubá-lo, finjo ser frágil para obter o que ele me daria se conhecesse minha
fortaleza, então a mentira está a serviço de meu desejo, da mesma forma que
estaria uma agressão’‘. Aqui, a mentira está centrada no ataque, na agressão, mas
as razões que levam a criatura a mentir são bem mais amplas, como esboçado no
quadro anterior, do mesmo autor. O quadro ainda nos mostra que prevalecem as
mentiras conscientes, sendo mais complicado descobrir-se o verdadeiro intento e
as causas das mentiras inconscientes.

A mentira está tão arraigada na sociedade que para ela foi criado o dia mundial
da mentira ou do logro - o primeiro de abril -, como se ela precisasse ser
homenageada, cultuada de forma universal. Ela está tão infiltrada na vida de
cada um, usada e abusada no dia-a-dia, que poucos se importam com essa data,
que está em descrédito. Pior ainda, escritores e poetas louvam a mentira, sonham
e fogem da realidade e partem para a ficção, que evidentemente é pura mentira.
Mentiras, também, são os contos de fada e as historinhas que fazem a delícia da
garotada. É óbvio que nem todas são inofensivas e muitas vezes fornecem
munição para a criança mentir, quando descobre que mentir por fantasia para
encobrir a realidade de uma admoestação ou pito lhe traz certa proteção. Esta é
uma realidade psicológica que quase todas as crianças usam. Há muitas formas
modernas de educar, e compete aos pais aprender a usá-las para não
comprometer a formação da personalidade de seus filhos.
São atribuídas a Platão as frases: ‘‘A mentira tem pernas curtas’‘ e ‘‘A mentira
enfeia a alma’‘ [DURANDIN, 1988, p. 155]. Ambas encerram grandes verdades
e sobre elas sempre vale a pena meditar e tirar boas lições. Apesar dessas
máximas morais, Platão admitia que os políticos e governantes podiam mentir
para guardar segredos de Estado, que, revelados, enfraqueceriam os governantes.
Assim, vemos que não existe remédio para a mentira dos políticos, porque aqui,
mais do que em qualquer outra situação, trabalham com a moral de que os fins
justificam os meios e alimentam os interesses desenfreados de riqueza e poder,
caminhos abertos para a desenfreada corrupção individual, social e moral.

Há, também, a considerar neste contexto, o problema da meia-verdade e da


meia-mentira. Estas, quando justapostas, encaixadas, viram o que conhecemos
como pretexto. Os pretextos ou desculpas esfarrapadas são muito comuns no
cotidiano das pessoas. Por exemplo, a pessoa pode recusar um convite para um
encontro, um compromisso para jantar e tantos outros com uma desculpa ou
evasiva de que tem outro compromisso, está com dor de cabeça, enfim, qualquer
recusa educada para fugir a um compromisso que a criatura julga chato ou
comprometedor, ou até mesmo feita por inércia ou preguiça. Isso estimula uma
conduta ou conveniência que mexe com a nossa consciência moral. Esse
mecanismo pode tornar-se um hábito a ponto de nos levar a viver uma farsa
permanente, de natureza novelesca. Aliás, os papéis assumidos pelos atores e
atrizes de televisão nas novelas mostram às escâncaras estes tipos de farsas e
mentiras, além, é claro, do destaque dado à hipocrisia. Veja nesta obra o tema ‘‘A
HIPOCRISIA’‘.

Usar a mentira para encobrir faltas ou erros é condenável, como também o é


quando usada para manipular, explorar e alienar o nosso semelhante. Isso, a
despeito de toda a sociedade e suas instituições estarem saturadas de mentira.
Vemo-la imperar no mundo político, econômico, religioso e no comércio. A
mídia televisiva utiliza, com freqüência, o recurso da mentira para veicular
anúncios exaltando qualidades que os produtos ou serviços não possuem,
agressão esta conhecida como propaganda enganosa, o que é crime previsto na
chamada Lei do Consumidor.

A corrente da mentira é tão poderosa, tão inserida está a mentira nas mentes das
pessoas que até parece ser hereditária. Mentimos por medo e por hábito, porque
nossos pais também mentiram para nós e tudo parece se propagar e já não ter
mais remédio. Deixamo-nos contaminar como se a mentira fosse um vírus
desejável. Poucos, muito poucos optam pela lucidez e pela verdade. Ainda,
segundo Durandin, já citado: ‘‘O grande mérito da pessoa lúcida é não ser
escrava do desejo, de poder julgar e frear seus instintos, de dar valor às
dificuldades. O risco é conduzir à cabeça a idéia de que nada valha a pena, nem
sequer a vida’‘.

A mentira pode assumir muitas formas enganosas e até sutis. Por exemplo,
parece ser aceitável por todos os médicos ocultar a proximidade da morte a um
doente terminal ou seu parente mais próximo, numa espécie de mentira piedosa e
autoconsentida. Mente-se, também, e muito, por amor, pois a verdade dói por
dentro e por fora. Aliás, muitas pessoas não suportam a verdade e, de longe,
preferem a mentira, serem enganadas, para não ter que enfrentar traumas
maiores. Não agüentariam sofrer uma decepção amorosa, principalmente entre
as mulheres, que levam tempo para apagar as mágoas e sarar as feridas do
coração. No amor, as pessoas vivem encobrindo situações, representando,
fingindo e mentindo. Até mesmo quando faz um elogio esporádico à mulher, que
lhe estimula e massajeia o ego, o marido pode estar mentindo, parecendo
educado e cheio de ternura. Outras vezes é o silêncio que assusta: quando não se
diz o que se pensa é sinal de que a intimidade é falsa. É o que acontece quando o
casamento vai mal e não queremos admitir, mentindo para nós mesmos.

Mentir para si mesmo, eis outro grande problema. De ilusão também se vive e
esta é uma grande verdade, mas somente para as pessoas tolas. A criatura
procura enganar a si mesmo quando não deseja, não quer enfrentar a realidade
nua e crua. Aquele que tem o hábito de mentir para si mesmo e de iludir-se
perdeu a capacidade de ter prazer nas relações afetivas e suas atitudes
comportamentais normalmente não resolvem os problemas. O resultado disso é o
cansaço, a angústia, a sensação de tédio e a criatura, por ataque ou defesa, acaba
mentindo. No trabalho e no lar julga-se imprescindível, insubstituível e isto é
uma grande mentira que a criatura tenta pregar para si mesma, para se valorizar.
Na prática, pode ocorrer o contrário: quando está ausente, o serviço pode até
andar melhor, porque haverá menos cobrança.

Mentir para si mesmo parece ter suas raízes na infância. Sabe-se que o caráter
das crianças é forjado até os seis anos. Nessa fase, os pais não devem mimar
excessivamente os seus filhos, mas deixá-los assumir maiores responsabilidades
desde cedo. Evita-se, com esse procedimento, que os filhos se sintam frágeis e
incapazes e necessitem fazer um esforço inconsciente enorme para não se
magoarem demais. Se isso não for feito, mais tarde vão tratar os que estão à sua
volta como inválidos, por terem reprimido o desejo de receberem afeto. Na vida,
rejeitarão a retribuição de qualquer coisa que tiverem feito a outrem. Daí, a
ilusão de serem imprescindíveis, de imporem essa mentira a si mesmos. Outros
traumas secundários podem ocorrer que reforçam essa ilusão. É claro que
existem numerosas outras formas de auto-ilusão, em que a pessoa mente para si
mesma, como por exemplo, culpar os outros pelos seus fracassos.

O ódio

O ódio é um dos sentimentos mais negativos e nefastos que uma criatura pode
ter. O pensamento está permanentemente associado ao Bem, como no sentimento
do amor, ou ao Mal, como no sentimento do ódio, seu oposto. Não há meio-
termo. Mas, é preciso notar que quando pensamos em uma pessoa que amamos,
essa pessoa se torna o símbolo de agradáveis sensações e lembranças, mas isso
não é amor. Nesse caso, o pensamento é sensação, e sensação não é amor. O
pensamento está sempre em competição, a buscar um fim, a querer resultados; se
o pensamento for dirigido para o Bem, o resultado será prazeroso, caso contrário
ocorrerá a frustração, que pode se transformar em ódio. Temos de conviver com
este conflito, com este antagonismo, com esta dualidade.

O ciúme, que também é frustração, resultante do medo de perder alguma coisa


muito desejada, acirra o ódio. É quase impossível discorrer sobre o ódio sem
associá-lo ao ciúme. É de notar que muitos dos que se julgam felizes, bem-
aventurados e bem-sucedidos têm ódio, inveja e ciúme. Embora não se deva
confundir o ódio com o ciúme, ressaltamos que ambos estão freqüentemente
interrelacionados.

Na vida nós nos movemos de um substitutivo para outro, num processo pendular
entre o amor e o ódio, mas todos os substitutivos originam-se do pensamento.
Por exemplo, o orgulho é uma forma comum de antagonismo, ora produzindo
alívio, ora dor, num processo contínuo e dinâmico.

É esse processo que dificulta a nossa concentração naquilo que desejamos; por
isso, não basta manter-nos passivamente atentos para o processo e deixar o
pensamento vagueando de um assunto para outro. É preciso ter interesse naquilo
que se pensa e no resultado que se deseja obter.

Esta batalha deriva do fato de que estamos sempre ‘‘projetando’‘ o nosso próprio
desejo e até podemos ser bem-sucedidos, mas o que temos é outra substituição e,
nestas condições, está reiniciada a batalha. É o terreno minado dos opostos, este
desejo de evitar ou ganhar.

São de Krishnamurti estas palavras: ‘‘Vede o falso como falso, e a verdade


aparecerá. Não precisais procurá-la. O que se procura se acha, mas o que se acha
nem sempre é a verdade. É como uma pessoa desconfiada descobrir aquilo que
suspeita, o que é relativamente fácil e estúpido.’‘ [KRISHNAMURTI, 1972, p.
20]

O que fazer, então?

Manter-nos passivamente receptivos e cônscios, apenas, desse processo total do


pensamento, bem como do desejo de nos livrarmos desse processo, pode não
bastar.

Quando a criatura não invoca a sua força de vontade, o ódio sempre se


manifesta, embora algumas vezes de forma disfarçada por leve oposição a
alguma coisa ou a alguém. É, então, um sentimento generalizado, arraigado nas
pessoas. Outras vezes é um antagonismo tão forte contra todos e contra tudo,
virulento, que traz dolorosas conseqüências para quem o pratica e a quem é
dirigido, se este não tiver como se defender com pensamentos valorosos de
amor. É preciso, então, superá-lo, praticar o Bem, em todos os momentos de
nossa vida, não desejando a outrem o que não queremos que nos façam.
A perversidade
A maldade e a perversidade são sentimentos altamente negativos que derivam do
mau uso do livre-arbítrio das criaturas. Do ponto de vista da Psicologia, são
nevroses que se caracterizam por diferentes graus de malignidade, agravadas
com o mau uso do pensamento e da vontade. Os perversos podem ser
classificados em fracos, médios e duros, de acordo com o grau de agressividade
com que atuam. O agravamento de um grau para outro ocorre, de regra, pela
impunidade de nossas leis ou por descaso da sociedade que não lhes impõe a
devida correção, tratamento e recuperação. Mas, de outro lado, muitos são
perversos por temperamento mórbido ou por maus exemplos adquiridos de
outrem, seja de amigos na escola ou fora dela, seja dos pais que, até mesmo por
omissão, podem ser responsabilizados pela má educação transmitida aos filhos.

De regra geral, os perversos são egoístas, invejosos e, na sua forma mais dura,
odeiam o seu semelhante quando não toda a sociedade. Por isso, brutalizam as
pessoas para obter seus fins e alimentar estes três sentimentos negativos:
egoísmo, inveja e ódio. Sua nocividade decorre por serem anti-sociais e,
portanto, desprovidos do menor espírito de ética e por estarem afastados da
moral cristã. O principal traço é que neles nem a consciência nem os escrúpulos
funcionam como nas pessoas normais. Possuem o coração endurecido e a mente
empedernida. São incapazes de amar no sentido melhor dessa palavra ou de
dedicar amizade a alguém. Mas, possuem cúmplices da mesma laia e organizam
bandos e quadrilhas que ocupam as páginas dos noticiários policiais diariamente,
principalmente nas grandes cidades, e criam verdadeiro pandemônio,
desorganizando e infernizando a sociedade.

É pelo traço da falta de escrúpulos, acima mencionado, que se caracterizam os


perversos: os fracos tentam, ainda que sem sucesso, controlar seus ímpetos e
instintos; os médios, aceitando maior influência dos duros, nem sequer tentam
evitar as correntes do mal; e, os duros, totalmente sem escrúpulos, instigam e
obtêm a prática do mal, aliciando as outras classes, organizando quadrilhas e
chefiando-as. O traço comum a todos é que desrespeitam a máxima cristã de
‘‘não faças a outrem o que não queres que te façam’‘.

É óbvio que encontramos a perversidade em pessoas de todas as classes sociais,


não apenas nas baixas camadas das classes desfavorecidas. Nestas, ela é mais
direta, mais primitiva e normalmente mais brutal, devido à própria situação,
educação e penúria em que vivem tais criaturas. Na classe média e na alta
sociedade, de regra, ela se apresenta disfarçada, camuflada. Nestas, a impulsão
para o mal é ardilosa, sendo comum o uso da inteligência e do vil metal para
atingir seus fins. São os corruptores e corruptos de toda espécie operando na
política, no comércio, nas finanças, enfim, corroendo toda a sociedade,
solapando-lhe os alicerces, como no ditado popular ‘‘água mole em pedra dura
tanto dá até que fura’‘. Mas, mesmo nestas classes, nem sempre a simulação e o
disfarce são mantidos e, por vezes, o instinto mórbido se torna explosivo,
violento e até selvagem. Exemplo recente que chocou o mundo foi o índio
Galdino, incendiado brutalmente numa noite tranqüila, em Brasília. Verdadeiras
feras soltas por aí, em feroz desatino!

Em muitas situações, os perversos utilizam um verniz, sob o pretexto de


autodefesa, para encobrir seu ‘‘instinto de segurança’‘ que pode explodir,
mostrando a face cruel da perversidade encontrada em muitos torturadores, que
abusando da autoridade que o cargo lhes confere, humilham, agridem e
brutalizam humildes e, muitas vezes, inocentes para deles colherem duvidosas
confissões. Esta falsa autodefesa instintiva, usada dessa forma, gera um enorme
sentimento de repulsa e revolta na sociedade.

Os perversos não se governam, falta-lhes o autodomínio da vontade e, não raro,


ficam possessos, furiosos e neste estado são altamente perigosos, não medindo o
alcance de seus atos, o que facilmente pode levá-los aos crimes hediondos,
estupros e atos de selvageria. Em permanente estado de indignação íntima e, por
força da inveja que carregam em sua alma, instigam a animosidade, as brigas de
rua, os desentendimentos entre amigos, a intolerância, enfim, estão sempre
dispostos a armar a maior confusão onde se acharem, criando verdadeiros
pandemônios. Promovem, assim, a desorganização nos lares, nas escolas, na
sociedade, desagregando estas instituições.

Muitos perversos agem acintosamente e descarregam o veneno de seu ódio e


inveja até em objetos e animais, mostrando como a perversidade é de natureza
inferior. Ofendem seus inferiores no trabalho, maltratam animais por gosto ou
prazer, chutando cães e gatos, praticando atrocidades, estragando e quebrando
objetos que têm valor para seus donos, destruindo carros no trânsito só para
descarregarem sua raiva. O nosso cotidiano está repleto de exemplos deste tipo;
é só ter olhos para ver e enxergar.

E, o que leva tais criaturas à exaltação da perversidade sob seus diferentes


matizes? As causas podem, também, apresentar diferentes interpretações, mas a
verdadeira e única causa é de natureza psíquica. Ela pode ocorrer em virtude de
crise afetiva ou moral deflagrada por ciúme, amor-próprio ferido, choque de
interesses, ansiedades de toda natureza e outras emoções mórbidas, o que pode
levar a situações episódicas de perversidade. Mas também, há situações mais
permanentes em que a maldade instalada na mente das criaturas já tem um
caráter mórbido, sempre hostil e anti-social. É quando a maldade se torna uma
obsessão de difícil controle, já que descamba para o crime e daí para as malhas
da Justiça, para as prisões, cadeias e penitenciárias que no Brasil têm um aspecto
desolador, angustiante e deprimente, conforme mostram as cenas do noticiário
televisivo a cada noite. É a face da violência assustadora e, até agora, sem
solução para extirpá-la.

Somos daqueles que, espiritualistas por formação de caráter e livres-pensadores,


acreditamos que todas as criaturas quando nascem, são boas, têm a bondade no
coração e na alma. Por isso, não acreditamos no ‘‘perverso nato’‘, isto é, não
acreditamos que a perversidade seja hereditária, que haja um genótipo perverso
como querem muitos psicólogos. Todas as modalidades de perversidade são, a
nosso ver, adquiridas pela má educação e orientação que a criança recebe,
influência do meio e das más amizades e, quando adulto, pelo mau uso que faz
do seu pensamento e do seu livre-arbítrio. Mais que isso, teríamos que nos
estender no campo do espiritualismo, analisando os diferentes graus de
avassalamento espiritual das criaturas, por não conhecerem a si próprios como
Força e Matéria.
A raiva
A raiva ou cólera é um sentimento muito negativo, que consiste na reação ou
explosão do comportamento normal da criatura face a estímulos que se vão
acumulando, até chegar a um ponto de tensão que ela não suporta mais e põe
tudo para fora de forma agressiva, autodestrutiva e ineficaz. Ela atinge todas as
pessoas que não sabem se conter em seus ímpetos. São criaturas de pavio curto,
impetuosas. Trata-se de um sentimento ou emoção difícil de se lidar e que
acomete principalmente as mulheres. Pior que a própria reação de raiva são os
efeitos e as conseqüências oriundas dessa selvagem emoção. No fundo ela é o
resultado de uma ou mais frustrações ou desapontamentos.

Este sentimento atua de forma diferenciada nos homens e nas mulheres. Nestas,
que desde a infância são tratadas como criaturas frágeis e, portanto, preservadas
e protegidas, a raiva as atinge de uma forma mais direta. Elas usam a raiva como
uma reação incontrolada de ataque, tão ajustada à sua índole que, muitas vezes,
as mulheres iradas são chamadas por termos pejorativos como megeras,
ranzinzas, rabugentas, castradoras. Ainda crianças, as meninas são silenciadas e
aprendem a refrear sua própria raiva. Crescem reprimidas e com noções
distorcidas de sua própria feminilidade, dominada pela falsa idéia de que uma
mulher realmente feminina protege as outras, preserva a harmonia e nunca perde
o controle da situação. Isto quer dizer que elas são condicionadas, desde cedo, a
pensar que seu melhor valor e identidade repousa no orgulho de amarem e serem
amadas. Quando se questiona este aspecto de sua personalidade, sua reação pode
tornar-se devastadora. Sua atratividade e feminilidade passam a constituir tabus
de sua intimidade preservada e quase intocável.

A criatura que reprime a raiva tem mais medo de vê-la explodir de forma
inapropriada. Tudo está no autocontrole: se a pessoa o tem enfraquecido ou não
o tem está propensa aos acessos de raiva com mais freqüência do que as que
dominam suas reações. Ela vai consumindo as energias da criatura até explodir.
De tanto isso acontecer, a pessoa se apavora com a feiura e a força da raiva, se
autocondena, mas não consegue controlá-la. Ao final desse tema, apresentamos
algumas sugestões para controlá-la.

A raiva e seu poder é tão velha que há registros de seus estragos na mais remota
antigüidade, entre os egípcios e os fenícios. Os gregos a passaram para a
mitologia e, ainda, muitas crenças e religiões introduziram o sentimento de ira,
de raiva como poder divino para condenar e castigar os renitentes pecadores,
fato somente explicável como fruto de mentes doentias. É difícil, inconcebível
mesmo, imaginar a ira de Deus, um ser de infinita bondade e infinito poder.
Ainda, referindo-nos ao poder da ira e sua relação mais direta com as mulheres,
lembramos que, até bem pouco tempo atrás, todos os furacões, que são forças
destruidoras da natureza, eram batizados com nomes femininos. Na literatura, o
exemplo mais surpreendente está na peça de Shakespeare A megera domada, em
que seu personagem principal, Kate, precisava ser domesticada para que alguém
se dispusesse a casar com ela. Modernamente, podemos observar em muitas
novelas a força cênica que têm os acessos de raiva dos atores e atrizes para
prender a atenção dos telespectadores.

Parece fora de dúvida que, também nos escritórios e nos trabalhos em geral fora
do lar, as mulheres temem expressar sua raiva contra os seus superiores
hierárquicos, já que têm que lidar com chefes que reúnem o poder de promover,
conceder aumentos de salários e de demitir. Se seus maridos trabalham, também,
como chefes ou não e têm salários maiores, resultam discussões intermináveis
sobre a injustiça de que são vítimas e de como se encontram em condições de
dependência sufocante. Trata-se de uma realidade econômica que reforça a
relutância de muitas mulheres em extravasar a sua raiva, nessas circunstâncias.
Como têm que se conter, resulta o dilema: reagir ou ser submissa. Daí, sentirem-
se inferiorizadas é apenas questão de tempo e, quando percebem esta situação,
explodem em acessos de raiva, num sufoco difícil de agüentar, tanto para ela
como para o seu marido ou os que a cercam.

O medo de muitas mulheres em relação à explosão de raiva pode ter suas


justificativas. Uma delas é temer ofuscar os outros ao se afirmar através da raiva
como elemento de imposição aos seus desejos. Alguns homens se sentem
ameaçados por uma mulher que ‘‘estoura’‘ livremente, à toa. Muitos
relacionamentos acabam por isso, sob a desculpa de que ‘‘nossos gênios não se
combinam’‘. Mas também, a raiva pode se tornar positiva quando, ocorrendo
com ambos os cônjuges, um deles tenha autocontrole suficiente para dominar a
situação pelo seu poder apaziguador e conciliador, servindo de saco de pancada
ou válvula de escape para amortecer a ira do outro ou da outra. Assim, contendo
a raiva por muito tempo, ela se acumula e quando explode o faz com muita
força, promovendo estragos materiais e morais difíceis de remover.

A raiva reprimida pode ter conseqüências nefastas, já que a frustração, de onde


parece emanar, pode levar a um sentimento de culpa, bastante danoso para a
auto-estima da criatura. A somatização de certas doenças como dores de cabeça,
certas alergias da pele, certos tipos de enxaqueca e até doenças cardíacas têm sua
causa na raiva, retida à custa de muita tensão psíquica.

A raiva é uma força ameaçadora e arrasadora, a um só tempo. Mas também, é


usada para chamar a atenção para determinadas situações, como poderoso meio
de comunicação. Através dela podemos modificar comportamentos de que não
gostamos em outras pessoas ou fazer acontecer coisas que desejamos sejam
feitas. Expressar raiva pode ser um recurso útil que nem sempre envolve choro,
lágrimas e palavrões. Nesse contexto, a raiva deve ser encarada como válvula de
escape para toda e qualquer explosão violenta de nosso comportamento, se
qualquer outra alternativa for negada.

Para a criatura dominar a raiva sem ‘‘estourar’‘, para dominar esta fera, é preciso
percebê-la antes de ela aparecer ou surgir. Em segundo lugar, é preciso não ter
medo de suas conseqüências. Em terceiro lugar, utilizar e dirigir essa emoção
para o alvo certo e não para si mesma. Finalmente, a criatura precisa ter
autocontrole, para decidir se vai ou não manifestá-la. É preciso, então, aprender
a falar e saber escolher a ocasião apropriada para desabafar, o que normalmente
ocorre quando a criatura se julgar oprimida, ofendida ou menosprezada. Faz-se
mister espantar o medo e não ficar passiva o tempo todo. Em certos casos, ficar
muda ajuda a evitar ou prosseguir na agressão.

Muitas vezes, a raiva se acumula porque ‘‘engolimos’‘ certas respostas ou não


aceitamos certas atitudes. Outras vezes, certas pessoas duras não atendem os
nossos pedidos e sugestões, considerando-nos intrometidos e mandões. Não
reagindo nessas ocasiões, com medo de suas respostas ou com possibilidade de
sermos julgados na hora, estaremos adiando a explosão da raiva. É, portanto,
necessário avaliar a situação e não nos deixarmos inibir, atuando com cautela,
principalmente se à raiva se associa o chilique.

É preciso saber externar a raiva sem explosões, sem fricotes, sem rompantes de
acesso. Para isso, basta que a criatura seja determinada e inflexível nos seus
desejos, com entonação certa na voz para demonstrar e manifestar seu
aborrecimento ou irritação, face a uma pessoa. É indispensável colocar o que se
deseja, o que se quer, com bastante clareza. Parece fácil, mas nem sempre é
assim. É preciso um longo aprendizado para saber usar a raiva como um recurso
de entendimento sem que seja uma explosão apaixonada. Como começar, então?
Fazendo algo oposto à reação habitual, adotando, por exemplo, uma atitude
irônica ou, então, usar um tom de voz mais baixa, na hora da briga. No início
isso é difícil, mas com o tempo estas posturas funcionam e você não vai se sentir
tímido e nervoso. Mas essa é uma transformação radical no seu comportamento.

Outra coisa fundamental: não se deve adiar a manifestação da raiva, pois ela se
acumula com o tempo. Tampouco, não se deve reprimi-la, guardá-la para depois
para não se tornar vítima da explosão. Vale a pena dizer o que se pensa, dar a sua
opinião na hora certa, estabelecer o bom diálogo. Para evitar que a irritação
cresça e o ressentimento aumente, é preciso articular o seu descontentamento de
pronto. Com isso, evitará de culpar os outros e de se distanciar emocionalmente
de quem mais gosta.

Para evitar muitas situações constrangedoras, a pessoa precisa se liberar dos


pensamentos e desejos antes de perder o controle de si mesma. Um exemplo
comum é o da mulher casada que vive reclamando do excesso de trabalho nos
afazeres domésticos, mesmo quando possui empregada ou faxineira. Ela não
quer consolo ou elogio, ela deseja companheirismo, mas não sabe se expressar,
não sabe pedir ajuda, pois o seu orgulho não deixa. Aí, vai ficando tensa, a
mágoa cresce e explode num rompante, porque vê que nada muda. Resmunga,
estrila mas não esclarece exatamente o que a incomoda. Não dá outra: basta o
marido fazer qualquer coisa que a deixa irritada e essa mulher explode, lá vem
tempestade em copo d’água. Isto é irracional e tudo continua igual, para se
repetir muitas e muitas vezes. Nestas explosões, se partem para a discussão, a
violência pode ser o desfecho, quebrando o que se achar à sua frente, ou então,
desacatando o companheiro com gestos grosseiros e palavrões, só para chamar a
atenção para os seus problemas. E como corrigir isso? Procurar não chegar à
discussão, mas usar o diálogo, a conversa racional, amigável, compreensiva. É
preciso despojar-se do orgulho, da teimosia, ser tolerante e, sobretudo, não
explodir por um motivo fútil ou bobo.

É possível usar a raiva como fator de autovalorização, não como fator de


agressão, embora muito melhor seria não ter raiva. Isto equivale a ser
competente, a tomar partido de si mesmo e não descarregar a culpa de seus
problemas nos outros. Muitas pessoas equilibradas pedem um tempo para pensar,
o que pode surtir bons resultados, já que a ira deixa muitas pessoas
desarticuladas, pouco espertas, confusas, impossibilitadas de usar a razão. O seu
autocontrole resulta tolhido.

Como não é possível mudar os outros, temos que mudar a nós mesmos e o nosso
modo de lidar e reagir a esse sentimento tão nefasto, devastador e destruidor.
O ressentimento
O ressentimento é um sentimento complexo, bastante negativo, de sutil e
poderosa influência na conduta da grande maioria das pessoas. Todos os
elementos perturbadores da harmonia social são, de uma forma ou de outra,
atingidos pelo ressentimento. Ele é gerador de desejos contraditórios nos
indivíduos, os quais reagem ou manifestam-se quando mordidos pela mágoa, de
forma exatamente contrária ao que mais almejamos. Assim, por exemplo, uma
criatura feia detesta o belo; o indisciplinado não tolera a disciplina; o pobre
detesta o rico. E os exemplos se multiplicam! Se, então, tratar-se de uma pessoa
medíocre ou vulgar, mais se acentuará o ressentimento por quase tudo,
sobressaindo-se, nessas criaturas, o sentimento de antipatia.

O menosprezo por qualquer coisa de valor que outros possuam, seja material ou
não, como no caso de uma honraria, uma medalha ou título honorífico recebido
por outrem numa conquista esportiva ou intelectual, caracteriza muito bem o
despeitado ou ressentido. Logo se manifestará de forma depreciativa ou
desdenhosa contra todo aquele que lhe é superior moral, intelectual e
socialmente. O mérito dos outros o afronta.

Muitos ressentidos mantêm-se em permanente estado de amuamento e, por


dissimulação, podem mostrar-se até sociáveis e bons camaradas, mas por
debaixo da pele de cordeiro escondem o despeito que sentem. Outros, não
conseguindo dissimular suas mágoas e refrear seus impulsos, podem apresentar-
se mal-humorados, irritados ou zangados, revertendo antipatia e hostilidade a
qualquer pretexto. Nesses, uma mágoa ressentida raramente se extingue e pode
pipocar a qualquer momento com grande ímpeto, sobrepujando até mesmo, em
certos casos, a raiva decorrente dos sentimentos de inveja.

Nós vivemos em uma época de grande progresso material, onde a velocidade dos
acontecimentos, das descobertas, da tecnologia, das comunicações, da mídia
falada, escrita e televisiva deixa as criaturas obcecadas pela posse de bens de
toda espécie, de modo geral inacessíveis à grande maioria dos miseráveis, pobres
e excluídos. Isso lhes perturba os valores morais e sociais, já que não conseguem
obter o mínimo de conforto, tornando-os morbidamente propensos a desordens
afetivas, sentimentais e sociais, surgindo, então, casos crônicos e agudos de
ressentimento e despeito. Esse processo se propaga até a classe média, onde
estão as pessoas que mais desejam progredir e não se conformam em ficar para
trás. E por serem as mais assediadas pelos efeitos da propaganda difundida pela
mídia, podem tornar-se angustiadas e ressentidas, caso não consigam obter o que
desejam. Descomplicar esta situação é muito difícil e penoso, já que o
materialismo impera sobre os sentidos e a espiritualização das criaturas se
processa de forma muito lenta.

Nos indivíduos cultos e inteligentes, o ressentimento pode assumir situações


imprevisíveis, por se julgarem superiores aos seus competidores e por eles
incompreendidos e prejudicados. Isso deriva do sentimento de superestima e não
da incapacidade ou inferioridade intelectual. Aqui nesta seara temos de tudo: os
audaciosos, aventureiros, críticos de cinema, teatro e arte, especuladores do
mercado, invejosos, os que odeiam e até os ciumentos.

O ressentimento manifesta-se, também, a cada passo e sob qualquer pretexto, na


convivência familiar, nas escolas, nos ambientes de trabalho, nas instituições e
repartições, na política, enfim, onde quer que haja competição e, como esta
aparece em toda parte, o ressentido e o despeitado são figuras muito comuns de
ser encontradas. Assim, são observados entre ricos e pobres, brutos e feios,
inferiores e superiores, fortes e fracos e onde quer que haja sentimento de
antipatia e hostilidade. É lógico que os decadentes, os fracos, os degenerados, os
ignorantes, os vaidosos, os sectaristas e todos aqueles que vêem suas ambições
frustradas são os mais propensos, os mais atingidos pelo ressentimento.

Encontramos também os ressentidos na alta sociedade, nos novos-ricos e


figurões ou medalhões freqüentadores de festas, banquetes, chás beneficentes e
cerimônias de caridade, onde se exibem luxo, títulos, posições, roupas e jóias de
valor. Cultivam o dom de agradar e a sociabilidade, onde aparentam a serenidade
que na vida real não possuem. A grande maioria que freqüenta estes meios não
passa de exibicionistas da posição e fortuna que conquistaram de maneira fácil e
até mesmo inescrupulosa e, não raro, são de notória pobreza cultural e
intelectual.

As causas principais do ressentimento, segundo o psicólogo Renato Kehl, no seu


livro Psicologia da personalidade, surgem em decorrência de fatores
predisponentes, incidentais e subsidiários. De modo geral, o hipotireoidismo
ocorre entre as primeiras, causando incapacidade para a apreciação justa dos
valores. As causas incidentais estão ligadas ao complexo de inferioridade ou, no
sentido oposto, ao estado de superestima ou de hipertrofia do ego. As causas
subsidiárias decorrem dos sentimentos provocadores do ressentimento como a
inveja, a vaidade, o ciúme, a rivalidade e outros de ordem física, social e étnica.

Os psicólogos identificam três tipos de ressentimento que atuam diferentemente


segundo a constituição e o temperamento individual, a saber: os fortes ou
‘‘arrivistas’‘, os fracos e os críticos de ambos. Os arrivistas procuram vencer sua
mediocridade lutando e se esforçando com denodo, atirando-se à conquista da
fortuna, de posição e de autoridade, ainda que para isso tenham que se humilhar,
passar pelos maiores dissabores. Compensam, assim, sua notória pobreza
intelectual, bastante comum nos novos-ricos.

Os fracos são incapazes de sobrepujarem-se. Revoltam-se contra tudo e contra


todos, são anti-sociais, arredios, inimigos do conforto, da alegria e do sucesso de
quem quer que seja.

Os críticos dificilmente conseguem alguma coisa que valha a pena. Tudo que os
outros possuem, seja de ordem material, seja de ordem intelectual em forma de
dotes e dons, não tem valor para eles, desprezam o sucesso alheio seja sob que
forma ele se revelar: ninguém presta, ninguém é sério, ninguém é feliz. Vivem
desfazendo de tudo e de todos, porque essa é a forma que encontram de aplacar a
sua inferioridade.

Vemos assim, que por mais benevolentes que possamos ser, não conseguiremos
louvar de forma alguma o ressentimento que marca indelevelmente aqueles que
são vítimas desse complexo e negativo sentimento humano.
O sensualismo
O sensualismo ou sensualidade é um modo de ser e viver dos indivíduos
materialistas que colocam o gozo dos sentidos e os prazeres da carne acima de
qualquer sentimento. É, pois, um sentimento negativo e degradante em que a
vontade da criatura atua sobre os sentidos, normalmente de forma automática e
inconsciente, deturpando-lhes seu verdadeiro valor como faculdades do espírito
humano. O sensualismo constitui verdadeiro obstáculo ao autoconhecimento.
Sua prática vem acompanhada de outros sentimentos negativos como a desilusão
e a depressão.

O sensualista só leva em conta o que é material, isto é, a reação física dos


sentidos. Desconhece a sua face espiritual. Assim, o sensualista é avesso à
espiritualidade, está sempre muito distante das coisas do espírito, do mundo
transcendental, do sublime. A única linguagem que conhece refere-se ao uso dos
sentidos para fins exclusivamente materiais: comer, gozar, experimentar
emoções e prazeres sem limites, que levam à pornografia, seja para ganhar
dinheiro desenfreadamente, ou ainda, para exibir-se, tudo em prol dos prazeres.

A textura espiritual do sensualista é precária: vê pouco, percebe menos ainda e


só enxerga a superfície das realidades. Dessa forma, vive para o momento e,
quando não se corrige a tempo, esbanja uma vida inteira a troco de nada ou
quase nada. Seu progresso espiritual, o que vale dizer sua evolução, entra num
processo de estagnação.

Não podemos negar que os sensualistas possuem emotividade acentuada - seu


único ponto de contato e apoio com a vida - mas, as sensações que se fazem
exageradas e incontroladas se tornam, desde logo, saturadas de excitação. Isso
desnatura os sentimentos que dizem ter como dons principais, acima de
quaisquer outros atributos do caráter e do espírito. Saciam os seus apetites com
tudo que os entretém e os distraem e, com isso, destroem suas esperanças,
surgindo o desespero e o ceticismo. Enfim, perdem a noção do que é racional e
enfraquecem e degradam as emoções, tornando-se, não raro, devassos.

O sensualista inverte a hierarquia do valor do pensamento; torna difícil ou


impossibilita a aquisição de novos conhecimentos mais exatos e verdadeiros.
Isso porque ele só aceita o que deleita os sentidos e, portanto, repele idéias que o
afastam do sensual. Vivendo para os sentidos, torna-se seu escravo, abdica da
soberania do espírito e do pensamento. Nele, a vontade de reagir torna-se
enfraquecida e o pensamento resulta embotado.

Os sensualistas têm forte propensão a adquirir maus hábitos, encaminhando-se


facilmente para os vícios do fumo, da bebida e da libertinagem. Cavam, assim,
sua própria desgraça e no desespero, não raro, terminam como consumidores de
drogas. Aí chegando, o caminho de volta é muito longo e sinuoso e sua
recuperação, quando ocorre, é um terrível processo de sofrimento e dor para si e
para os seus familiares. Esta propensão ao vício é explicada pela natureza do
desejo, que sempre procura exceder seus próprios limites e, na busca do prazer e
da euforia, acreditam que vale tudo para exaltar essas emoções.

É preciso dar ênfase, destacar o verdadeiro valor dos sentidos: estes são
instrumentos especialíssimos do corpo humano para o espírito entrar em contato
com as formas, com o mundo do belo, com as realidades materiais que nos
cercam, com a música, enfim, apreender a realidade física para melhor conseguir
seu plano e objetivo de evolução. E, também, através da linguagem, entrar em
comunicação com outras criaturas e promover as relações interpessoais, sem as
quais a evolução do espírito se torna inoperante, já que não há a difusão das
idéias e conhecimento e, não sendo possível esta difusão, o saber não se propaga.

Visto assim, segundo esta ótica, que é lógica e sensata, chegamos à conclusão de
que nossos sentidos são as sentinelas do espírito, já que eles verdadeiramente
servem como instrumentos de apoio e desenvolvimento de nossa personalidade
e, portanto, de nossa evolução espiritual.

Só quem estiver desprovido de um ou mais desses sentidos é que sabe o quanto é


penosa a vida da criatura. Imagine-se, por exemplo, no caso de um cego-surdo-
mudo, o que não é tão incomum assim, a força redobrada de vontade que uma
criatura tem que ter para não desanimar e prosseguir na luta pela vida. Suas
impressões do mundo resultariam tão diminuídas que tem que fazer um esforço
muito grande para encontrar outras satisfações. Poucos conseguem ultrapassar
essas deficiências como foi o caso de Helen Keller, que desde menina foi privada
desses três sentidos especiais. Apesar disso, utilizando sua prodigiosa força de
vontade, deu exemplos ao mundo de que podia e pôde superar tudo com
grandeza de espírito.

O tédio
O tédio é um sentimento deprimente, depressivo, constante. Há criaturas que se
enfadam com a rotina da vida, com o prazer, a lisonja e tudo o mais. Há pessoas
que passam a maior parte da vida entediadas.

Qual a causa disso? Frustração de algum desejo profundo contrariado? Há que se


conseguir tudo o que se deseja e, ainda assim, manter-se entediado?

O principal remédio contra o tédio é alimentar o interesse profundo por uma ou


muitas coisas como o trabalho, os passatempos e as diversas formas de lazer e
não largá-las facilmente. Isto é, ter garra, mesmo que os interesses sejam
intermitentes. O interesse é fundamental porque sentimos interesse por aquilo
que nos satisfaz, que nos agrada. O interesse mantém-se enquanto se está
adquirindo alguma coisa; esse processo de aquisição, que é outra forma de
encarar o interesse, cessa quando nos desinteressamos. Enfim, o interesse
quando realizado, nos deixa bem conosco mesmos.

Toda aquisição é uma forma de tédio ou fastio ou nele vai se transformar.


Sempre nos animam propósitos de aquisição quando recorremos a alguma coisa;
há aquisição no saber, no prazer, na fama, no poder, na eficácia, no ter filhos,
enfim, em quase tudo. Até uma criança que troca de brinquedo, buscando outro
sempre que perde o interesse em um, está adquirindo. Quando não há mais nada
para adquirir como, por exemplo, em uma religião, perdemos o interesse e
passamos a outra, num processo de busca, de expansão do pensamento, de
progresso, embora haja muitos seres que embotam o raciocínio e nunca mais
despertam, mantendo-se presos aos preconceitos, misticismos e dogmas.

A conclusão é que o interesse é sempre uma aquisição e resulta de uma


estimulação, provocada por estímulos ou alteração de nosso estado mental. Basta
perder o interesse, e não adquirir, e lá vem o tédio. Assim, toda aquisição é um
peso que acaba em tédio. Isso é verdade, quando encarado no seu estrito sentido
material.

E como libertar-se do tédio?

Primeiro, é preciso compreender o processo interesse - aquisição - tédio e


encontrar a liberdade para agir ou deixar de agir. A liberdade não pode ser
adquirida; se for adquirida, muito em breve ela enfadará ou entediará a mente.
Assim que adquirimos e desfrutamos dessa aquisição ou cessado o esforço para
adquirir, perdemos o interesse.
E como compreender esse processo?

A posse faz a mente cansar-se. A aquisição, qualquer que seja, de propriedades,


de bens materiais ou dos prazeres materialistas, de querer desfrutar de tudo,
enfim, de qualquer coisa, leva-nos à insensibilidade. Por esse processo de
natureza aquisitiva, a mente acomoda-se a um padrão de aquisição, criando, por
isso mesmo, o seu próprio tédio. O interesse e a curiosidade dão início e
estimulam a aquisição, que logo que satisfeita se transforma em tédio.

E como ficar livre de adquirir sem fazer outra aquisição?

Somente com a aquisição de valores morais, de virtudes, que se conseguem pelo


raciocínio e sofrimento, usando o seu livre-arbítrio para o bem e não praticando
os sentimentos negativos, a criatura poderá livrar-se desse círculo vicioso e
interminável. Isso não significa que devemos nos abster de adquirir tudo aquilo
que for necessário, de forma comedida, para o nosso progresso material, já que
este é necessário para a nossa evolução espiritual.

Tornarmo-nos não-aquisitivos e completamente desapegados não é possível


neste mundo Terra. Temos que cuidar de nossas necessidades básicas e
essenciais. Assim, não basta compreender verbalmente o que foi acima exposto,
mas temos que experimentar e vivenciar o que for necessário para completar a
nossa evolução, procurando reconhecer o que é efêmero e o que é permanente e
eterno. Assim procedendo, estaremos nos afastando do tédio.

Conhecer a verdade através do reconhecimento do que é falso é o começo da


sabedoria. Para isso, o pensamento tem que estar quieto e sereno, o que é
dificílimo, já que ele está sempre em contínua vibração no espaço-tempo e
dificilmente pode ocorrer um intervalo entre pensamentos. Os pensamentos se
sucedem sem interrupção. A mente, que recebe os reflexos dos nossos
pensamentos e os de outras criaturas neste processo, está a aguçar-se
incessantemente e, portanto, a desgastar-se. Se fizermos ponta em um lápis sem
parar, num instante nada mais resta do lápis; de modo semelhante, a mente
desgasta-se constantemente, até se esgotar pelo envelhecimento natural de tudo o
que é material. Por isso, a criatura materialista sempre teme chegar ao seu fim, o
que não acontece com o espiritualista que se conhece como Força e Matéria e
sabe que a morte do corpo físico não interrompe a vida. Daí, o espiritualista não
se preocupar em adquirir bens materiais além do que lhe for necessário, estando,
portanto, mais preparado para suportar e enfrentar o tédio.
A purificação do espírito decorre deste processo de experimentar e vivenciar. A
tranqüilidade e a perfeição que certamente viremos a adquirir com o decorrer de
nossa evolução advêm dessa compreensão.
A timidez
A timidez é um sentimento de natureza negativa que se manifesta em criaturas
inseguras, incapazes de enfrentar, de pronto, o forte sentimento de medo, e têm
receio de fracassar ao menor esforço.

Os tímidos tentam encontrar a força necessária para parecerem normais e calmos


perante qualquer situação de exposição aos outros. A timidez ocorre
principalmente quando a criatura tem de fazer algo na presença dos outros e lhe
acomete o medo de não fazer igual ou melhor que eles, expondo, então, seus
pontos fracos. Pode-se presumir que este ‘‘algo’‘ que deve ser feito,
normalmente à primeira vez, perante outros, assoma-se-lhe como uma grande
responsabilidade e, portanto, ele não pode falhar.

Os tímidos se colocam em pólo oposto aos ousados. Veja, nesta obra, o tema
sobre ‘‘A OUSADIA’‘. São normalmente inteligentes, mas introspectivos,
voltados para dentro de si mesmos, introvertidos, dotados de alta sensibilidade.
Por isso, são classificados pela Psicologia como hiperestésicos. Possuem elevado
sentimento de auto-estima, são delicados e geralmente são criaturas de boa
índole que trazem a bondade em si mesmos.

Para muitos psicólogos, a timidez é prova de inteligência e de tolice reunidos em


um único comportamento, isto é, é como se o tímido fosse excelente e medíocre
ao mesmo tempo, o que é paradoxal, um contra-senso. Outros tentam ver no
tímido os traços do orgulhoso e do humilde reunidos, o que também parece uma
besteira muito grande. Ainda, segundo eles, estas inclinações ambivalentes e em
desajuste ou desbalanço, que mais parecem uma esquisitice, colocariam o tímido
como uma criatura antipática perante seus semelhantes. Como isso não acontece,
é preciso encarar essas opiniões sob crítica cerrada.

A timidez já aparece na formação das crianças. Compete aos pais criar


circunstâncias e fatores favoráveis para evitar que elas passem a sofrer certos
recalques e deformações da personalidade que tornarão a timidez mais
acentuada, quando adultos. Para isso, é preciso estimular as crianças a reagirem
quando tenderem exageradamente para uma vida interior, isolando-se dos
demais, entregando-se ao amuamento, procurando trazê-las o mais rápido que
puder ao convívio de outras crianças, levando-as às festinhas, ensinando-as a não
terem medo de nada. Evitar, sobretudo, impor-lhes exagerada autoridade que
estimula a timidez nelas; da mesma forma, evitar um ambiente acanhado que
pode ter o mesmo efeito, mas por falta de estímulos. O estímulo é necessário
para vencer o medo aos contatos sociais, aos obstáculos no relacionamento
cotidiano.

A timidez é apreensão exagerada e, mais que isso, é falta de confiança nos


próprios valores e méritos. Veja o tema ‘‘A CONFIANÇA’‘, nesta obra. O tímido
fica ‘‘matutando’‘ como fazer antes de fazer e, quando tem que fazer, não o faz
ou faz de forma defeituosa, nervosa ou incompleta, apesar do seu empenho para
que tudo saia perfeito. Parece que neste processo de apreensão o cérebro deixa
de comandar mecanismos químicos apropriados, deixando de liberar certos
hormônios no organismo que incite o indivíduo à ação. Daí, o rubor facial que
denuncia o tímido quando tem que atuar. Mas, daí inferir que a timidez é uma
manifestação mórbida do psiquismo é um exagero que muitos psicólogos
cometem.

O que é desastrosamente curioso é que a timidez é um fator de repressão interna


da capacidade de pessoas intelectualmente bem dotadas, dificultando-lhes ou até
mesmo anulando sua capacidade de manifestação, já que acomete os inteligentes
de alto espírito crítico, ético e estético. Contudo, muitas vezes, estes indivíduos,
que têm grande dificuldade de expressarem-se verbalmente, escrevem e
argumentam muito bem suas idéias em magistrais artigos de jornais, revistas e
livros.

O tema timidez tem sido objeto de muitos ensaios, artigos de revistas e livros.
Todos acabam reafirmando que o tímido é inteligente, mas tem a inteligência
reprimida em si mesmo, é hiperestésico, com a sensibilidade bastante aflorada,
mas incapaz de pô-la em ação de forma natural, sem tropeços, sem medo. O que
é fora de dúvida é que falta ao tímido a autoconfiança, sendo, todavia, suscetível
de treinamento e aperfeiçoamento individual.

Pelo exposto, observa-se que o tímido tem todas as condições para vencer, já que
possui méritos. O que lhe falta é autoconfiança para por suas qualidades em
ação. Para vencer este único obstáculo é preciso persuadir-se de seus méritos.
Existem muitas técnicas para a correção da timidez. Surte bom efeito ler em voz
alta, gravar suas leituras, observar os erros e corrigi-los. Repetir todo esse
processo, cuidar da entonação da voz, colocar vibração nas palavras. Estes
exercícios melhoram sua autoconfiança e o orgulho exagerado, que pode estar na
base das causas da timidez, é aplainado. Assim, o medo de sofrer humilhação,
chacota, vergonha de apresentar-se em público, o medo de ‘‘fazer feio’‘, de errar,
de tomar a iniciativa desaparecerão ou resultarão atenuados.

O tímido só precisa convencer-se de que tem tudo para dar certo, não duvidar de
sua capacidade, ser moderado e confiante em si mesmo, usando seus
conhecimentos em seu favor. Com esforço próprio, o tímido conseguirá vencer o
inimigo que tem dentro de si, refletindo sadiamente no que vai fazer. De um
lado, procure colocar-se em um plano acima dos estouvados e dos ousados; de
outro, aplique sua sensibilidade com inteligência e galhardia e verá que os
resultados serão positivos.

Se o tímido convencer-se de que ‘‘errar é humano e persistir no erro é


condenável’‘, verá que só não erra quem nada faz e nada produz, não terá medo
de ‘‘fazer feio’‘, porque tem tudo para acertar, para ‘‘fazer bonito’‘. Ser tímido
não é uma doença, pode até ser um mero defeito de comportamento, mas, se
percebido e tratado no tempo certo, a criatura nada receará e tornar-se-á mais
confiante em si mesma, para desempenhar seu verdadeiro papel na vida.
A tristeza
A tristeza é um sentimento negativo que ocorre nas criaturas que perdem algo
que é fortemente desejado e valorizado, estando, portanto, intimamente ligada ao
sentimento de perda. É falta de alegria, seu oposto. É diferente da alegria, cólera
e medo, que se ligam à busca de objetivos ou à fuga de perigos. Enquanto estes
são sentimentos ativos, envolvendo grande tensão psíquica, a tristeza é um
sentimento passivo, que envolve desalento, consternação e pena. Ela revela, nos
casos crônicos, a existência de mágoa ou aflição.

A tristeza se presta a diversos graus, podendo ser intensa e duradoura ou leve. A


intensidade da tristeza depende do valor da perda e de sua duração, podendo ser
leve, profunda ou muito profunda. A tristeza é leve quando se manifesta com um
simples desapontamento ou aborrecimento; é profunda ou muito profunda
quando causada por uma perda irreparável como a morte de um parente muito
próximo ou do cônjuge, quando este(a) é amado(a).

A tristeza é uma emoção passiva que se manifesta mais por uma espécie de
quietude do que pela ação ou atividade da pessoa. Ninguém procura ter tristeza.
Daí, ela ser um estado de espírito que resulta da inação da vontade, da derrota
psíquica diante dos fatos incompreensíveis ou de ocorrências inesperadas que, de
repente, quebram o equilíbrio emocional e as expectativas da criatura. Mas
também, há casos de tristeza ativa que se exprime pelo choro e outras expressões
ativas no semblante e que ocorre diante de fato inesperado ou não desejado,
como, por exemplo, o choro da criança que vê seu brinquedo destruído, de um
torcedor fanático que vê seu time perder ou, mais intensamente, no último adeus
a um ente querido.

A desolação é uma forma aguda de tristeza que se mantém retardada ou incubada


na criatura. Muitas vezes, a criatura se surpreende com um fato entristecedor e
não demonstra tristeza na hora. A tensão vai aumentando, a compreensão toma
uma forma mais clara da perda e, então, irrompe em torrentes de tristeza - é a
desolação. A perda da criatura amada, por exemplo, impede ou rompe para
sempre o gozo, o desfrute de muitas coisas desejadas e necessárias, antes
providas sem dificuldades. Há um torvelinho, uma torrente de pensamentos e
emoções que se converte em saudade, emoção muito forte que se agrega à
tristeza nessas ocasiões, tornando mais difícil de suportar o sofrimento que vem
à tona, à superfície, que se revela assustador.
Para superar a desolação ou a consternação, a criatura tem que assumir uma
postura realista frente aos fatos da vida, às leis universais da evolução espiritual
e saber que a morte não interrompe a vida, apenas a desloca, a transfere para
outro plano. No plano material, para eliminar este flagelo é preciso tirar da vista
as lembranças ligadas à pessoa que partiu, como roupas, objetos de trabalho e de
estimação, livros, certas fotos e até brinquedos, se tratar de criança. Essas coisas
que se ligavam à pessoa perdida são liames que prendem, remoem e reacendem a
memória da criatura, que fica, então, sujeita a renovadas explosões de tristeza.
Se algum objeto foi esquecido e encontrado muito tempo depois, e que faz
irromper a tristeza, afaste-o ou elimine-o. Guarde somente lembranças boas,
nobres e espirituais, mas não fique toda hora a relembrar da pessoa. Uma boa
sugestão é tirar férias, presenciar novos ambientes, retornar à vida que lhe
pertence, fazer ou reencontrar amigos, tudo para reacender o interesse pela sua
própria vida. Dê à sua vida o seu verdadeiro valor.

Nem sempre o simples fato da perda traz tristeza. Existem certas sociedades e
culturas em que a morte é venerada como um renascer. Nessas culturas a perda
de um ente querido é menos sentida e o fator decisivo não é mais a perda, mas o
modo, a maneira de se perceber a perda e o seu contexto é que tem relevância.
Se a criatura antevê ou percebe uma perspectiva mais feliz após a morte, e se
conforma mais facilmente com o evento morte, não tem como ficar triste; se,
ainda, a perspectiva doutrinária é mais ampla e lhe transmite o sentimento de que
vai se encontrar com ele após a morte, então, tudo não passa de uma separação
temporária e não ocorre a sensação de perda. Na doutrina espiritualista, onde a
encarnação e reencarnação fazem parte das leis naturais e de que o espírito se
vale para promover a sua evolução no mundo Terra, existe a convicção, não
paira nenhuma dúvida de que a morte é apenas a morte física do corpo,
ascendendo o espírito ao seu mundo próprio desde que esteja lúcido ou tão logo
adquira a lucidez necessária.

A tristeza é uma emoção primária como o são a alegria, a cólera ou raiva e o


medo, embora de natureza menos elementar que estas. Em alguns animais
domésticos mais chegados ao homem como o cão, o gato e o cavalo, algumas
pessoas pensam perceber indícios de tristeza. Como a tristeza é um sentimento
complexo que depende da avaliação da perda ou da noção de valor, noção de
futuro e suas conseqüências, isto é, depende do raciocínio, para avaliar e
reconhecer uma situação de perda, ela só aparece nas crianças após
desenvolvidas estas capacidades mentais. Por isso, não acreditamos que, nem
mesmo os animais citados possam ficar tristes, no sentido que entendemos.
A tristeza é exteriorizada em função de um evento ou objeto concreto, pela perda
de um valor sentimental ou de um valor real. Ela refere-se a objetos concretos, o
que não ocorre com as demais emoções primárias como a alegria, a raiva e o
medo. Sem a coisa concreta que é valorizada e perdida não existe a tristeza.
Portanto, a motivação para que a tristeza ocorra não é intrínseca, não nasce de
nosso íntimo. Por isso, não existe tristeza indeterminada. Podemos, por exemplo,
ter medo de algo que desconhecemos, mas não podemos ficar tristes sem uma
causa determinada. Tanto é assim que, quando nos dirigimos a uma pessoa,
perguntamos por que ela está triste, esperando que a criatura aponte uma ou mais
causas.

Embora já nos tenhamos referido à tristeza devida à perda de um ente querido e


a dor profunda que isto nos pode causar, o medo da própria morte não nos causa
tristeza, mas outros sentimentos. Veja, nesta obra, o tema sob o título ‘‘O MEDO
DA MORTE’‘.

A nostalgia é uma forma muito especial de tristeza combinada com o sentimento


de saudade que sente a criatura que se afasta, por exemplo, de sua terra natal -
como no caso de exílio -, ou do próprio local de nascimento, como nas
migrações internas. Ela relembra com saudade e melancolia as situações que
então viveu. Já a tristeza situa-se no presente e se projeta às apreensões do
futuro. A melancolia, na sua forma mais aguda, é um estado mórbido, doentio de
tristeza, uma forma de depressão e languidez cuja causa é difusa, aparentemente
indefinida.

Vamos encerrar este tema lembrando o ditado que diz: ‘‘Tristezas não pagam
dívidas’‘, o que significa que esmorecer e entregar-se à tristeza não leva a coisa
alguma, só agrava a situação. É necessário reagir com todas as forças a este
sentimento que nos aniquila, que nos deixa pessimistas e sinistros, se quisermos
superar as nossas fraquezas e apego às perdas materiais e sentimentais. E
lembramos, ainda, o ditado que diz: ‘‘O que não tem remédio, remediado está’‘,
nada adiantando lamentar sobre coisas ou eventos já acontecidos e que não
podemos restaurar ou modificar.
A vaidade
A vaidade é um sentimento mais difundido do que se pensa. É um sentimento
negativo que aparece em indivíduos que julgam ser ou saber mais do que outros,
e o pior é que geralmente sabem disso. É a consolidação do culto do próprio
mérito e do amor-próprio.

O verdadeiro homem coloca a sua honra no próprio mérito que o mantém com
altivez e sem ostentação, posto que respeita a si mesmo; já o homem vaidoso
ostenta seus méritos e os exibe no afã de parecer melhor que todos os outros,
orgulhosamente acima dos demais, o que se transforma em soberba. Em ambos
os casos, estamos diante de um processo de culto ao amor-próprio. É preciso,
contudo, notar esta diferença: o orgulho é uma forma de arrogância originada a
partir de motivos nobres, visando aferir o mérito; já a soberba é uma presunção
desenfreada que procura exaltar o mérito.

E o que é o amor-próprio?

É o desejo de ser elogiado devido a uma exagerada sensibilidade à opinião


alheia. Aquele que exagera no amor-próprio teme a censura alheia. Em outras
palavras, na vida em grupo, na família ou em sociedade, os indivíduos buscam
aquiescência ou opiniões favoráveis a seu modo de ser e atuar, ao seu saber, à
sua cultura, enfim, a todos os seus predicados. Trata-se, no fundo, de um
processo de comparação, favorecido pelo contraste. Veja, em outra parte dessa
obra, o tema ‘‘O AMOR-PRÓPRIO’‘.

Mas, o importante é que nas pessoas dignas, o próprio juízo precede à aprovação
alheia; já as pessoas medíocres jactam-se dos méritos que julgam ter e ficam
desapontadas se não recebem aprovação alheia. Há aqui uma exaltação, uma
exibição do amor-próprio, que se quer sustentar a qualquer custo. Contudo, trata-
se de méritos ilusórios de virtudes que não existem de fato.

Os vaidosos são atores da grande comédia humana, cujo palco é o grande


cenário da vida onde atuam com a constante preocupação do juízo alheio, de se
tornarem ‘‘visíveis’‘ a todos. Consomem as suas vidas na ânsia de cativar a
atenção dos outros por qualquer forma e qualquer meio, não importa de que
maneira.
A vaidade permeia a sociedade em todos os setores: está no estudante que após
tirar as melhores notas, jacta-se disso; no político, que procura e sonha ser um
dia aclamado senador, governador ou presidente; e até mesmo no assassino, que
pretende ver a sua foto nos jornais ou ‘‘flashes’‘ de seu depoimento divulgados
nos noticiários de TV; ou, ainda, no atleta que exibe seus músculos exagerados a
uma platéia boquiaberta. Isso, sem falar na vaidade feminina, onde ela chega a
constituir uma verdadeira arte - a arte da sedução.

Vale, ainda, comparar vaidade e orgulho. O vaidoso está sempre se comparando


com seus semelhantes, com os sentimentos de inveja quando não pode igualar ou
superar a excelência dos dotes e qualidades que vê nos outros; já o orgulhoso
jamais se compara com as pessoas, não se rebaixa ou se nivela a elas, as quais
ele julga inferiores a si próprio e pretende atingir tipos ideais de perfeição, que
estão em patamares acima do seu, colocando neste desejo uma boa dose de
entusiasmo para alcançá-lo.

O orgulho é, pois, uma forma mais elevada que a vaidade e pode se tornar um
degrau indispensável em direção à dignidade que é uma bela virtude, já que
implica em ter alto valor moral.

No dizer de José Ingenieros em sua admirável obra O homem medíocre: ‘‘Tudo é


relativo. Se há méritos, o orgulho é um direito; se não os há, trata-se de vaidade.
O homem que afirma o ideal e se aperfeiçoa até tem o direito de ser orgulhoso;
já o pretensioso, que ostenta uma pseudo-sabedoria, alicerça-se em efetiva
vaidade’‘ [INGENIEROS, 1953, p. 156].
A vulgaridade
Existe na Terra uma enorme diversidade biológica que se insere no nosso
ambiente humano e que faz parte da evolução das espécies. Foi preciso
decorrerem quase dois milhões de anos (os paleontólogos já classificaram fósseis
de antepassados humanos com um milhão e oitocentos e cinqüenta mil anos)
para que Charles Darwin pudesse presentear o mundo civilizado, em 1859, com
a sua monumental obra sobre a evolução das espécies. Portanto, estamos há
apenas um minuto desde este evento na evolução humana, em que o homem
começou a enxergar além das brumas do véu espesso dos tempos.

No Universo infinito, o nosso sistema solar é apenas um minúsculo grão de


areia; o nosso planeta, por sua vez, é um simples pormenor desse sistema. Na
superfície desse pormenor, a vida se desdobra incessantemente de acordo com
leis químicas e físicas próprias, desde a simples célula de um protozoário como a
ameba, até as formas mais complexas da estrutura biológica do homem. Este,
conforme vimos acima, data de um período brevíssimo, considerando que a
Terra tem quatro a cinco bilhões de anos! Na sua constante luta para se adaptar
ao meio hostil, utilizando a inteligência, o pensamento, a vontade, o livre-
arbítrio e muita inspiração ou intuição, o homem acumulou uma vasta
experiência na forma de conhecimentos reutilizáveis, sempre que a situação se
repetia. Esta experiência constitui a imensa bagagem cultural da humanidade nos
tempos atuais. Esta, em rápidas pinceladas, a longa jornada (contada em tempo
humano) já percorrida pelo homem na Terra.

Do mesmo modo como se processou a evolução das espécies, ocorre a evolução


do homem. Neste nível, porém, a evolução se processa através do pensamento e
da experiência, o primeiro se renovando continuamente e a segunda
acumulando-se permanentemente. Isto é muito diferente da evolução das
espécies, que têm por ponto central o instinto. No homem, os conceitos de
‘‘melhor’‘ e ‘‘perfeito’‘ são naturais. O espírito humano, dotado de sentimento e
razão, evolui para a perfeição em tudo que sente e faz, ideal a alcançar na longa
estrada da vida em direção à Inteligência Universal, à qual finalmente irá se
juntar. Neste contexto, existe também uma grande diversidade de caracteres e
temperamentos humanos, já que cada criatura se acha no seu estado próprio de
evolução. Desse caldeamento de pensamento e pessoas, raças e povos, da troca
dessas experiências heterogêneas e do impulso criador que as faz avançar
incessantemente ocorre, materialmente falando, o progresso humano e,
espiritualmente, a lapidação da consciência. É fácil imaginar que este processo
ocorrerá até o momento em que o espírito humano, não tendo mais nada a
aprender ou ensinar, nem que burilar seus atributos próprios do sentimento e da
razão aqui na Terra, prosseguirá sua evolução em outros mundos mais evoluídos,
constituindo, também, cada um deles um pormenor desta ou de outras galáxias,
entre os bilhões de galáxias que existem no Universo.

Todo esse preâmbulo para mostrar que a evolução é o ponto fundamental, a


verdadeira finalidade da vida. Nela, se insere o pequeno grupo dos idealistas,
que faz a humanidade avançar a passos largos, e a grande massa de rotineiros e
medíocres, que acompanha esse movimento para a perfeição, muitas vezes com
muita resistência, criando empecilhos e obstáculos próprios da inércia mental, do
conservadorismo, do obscurantismo, do fanatismo, da mediocridade e da
vulgaridade. Leia, em outra parte deste livro, o tema ‘‘O IDEALISMO’‘.

Sem os idealistas o homem seria apenas mais um ser vivente, um animal entre
tantos outros a emoldurar o cenário da vida neste mundo, e a evolução humana
teria caminhado a passos de tartaruga. Mesmo não havendo privilégios
espirituais, sendo cada criatura dotada dos mesmos recursos espirituais
essenciais que são o pensamento, o raciocínio, a força de vontade e o livre-
arbítrio, umas se distanciam de outras no processo da evolução, o que se faz
pensar serem mais dotadas. O que umas criaturas têm a mais que outras é o grau
de espiritualidade mais elevado pelo mérito do próprio esforço e transformações
que engendraram em sua trajetória evolutiva.

Assim, é mais apropriado considerar a desigualdade humana como uma grande


diversidade de estágios de evolução, de experiência intelectual, moral e ética
diferenciadas que as criaturas acumularam em muitas passagens pela Terra.

Diante desse pano de fundo, podemos compreender melhor os conceitos de


mediocridade e vulgaridade. Não se trata propriamente de sentimentos humanos,
mas efeitos decorrentes de uma série de fatores dinâmicos que norteiam a
evolução de cada ser na Terra. São, porém, próprios para se examinar neste livro.

A mediocridade é a falta, a ausência de características pessoais que permitem


distinguir um indivíduo dos demais. É a falta de mérito no conjunto de suas
faculdades e na forma de atuar entre os demais na família, no grupo, na
sociedade, nas nações. Todos os medíocres carregam um pesado fardo de rotinas
e preconceitos. Não se trata de esperar uma missão transcendental dos seres, mas
que saiam da inércia, ponham-se a pensar e procurem fazer o melhor trabalho
possível dentro da profissão ou atividade que escolheram. Não deixar que os
outros pensem por si, que façam ouvir a sua voz, que saiam da penumbra e da
sombra e venham para a luz; enfim, que enfrentem o trabalho com dignidade e
não continuem a passar pela vida em brancas nuvens como disse o poeta. Saiam
da servidão e tornem-se verdadeiros homens de bem. Se agirem assim, deixarão
de ser medíocres e, em breve tempo, também engrossarão as fileiras daqueles
que abrem novas fronteiras.

A vulgaridade, que aqui é o nosso tema principal, resulta da obstinação, da


teimosia do medíocre. O homem se vulgariza, quando não se esforça para mudar
o seu caráter; sua força de vontade é fraca por indolência ou até mesmo por
docilidade, talvez por estar vivendo em um meio muito acima do seu
desenvolvimento espiritual. Geralmente, dar-se-iam bem se deslocados para um
ambiente menos civilizado, mais primitivo, onde vale o ditado ‘‘na terra de cego,
quem tem um olho é rei’‘.

A vulgaridade é a acentuação dos caracteres primitivos do ser, talvez até mesmo


de forma atávica. As pessoas vulgares são rotineiras e constituem o grande
rebanho da humanidade, destituídas que são de qualquer forma de idealismo.
Seus sentidos e sentimentos estão como que embotados, não se ligam em nada,
têm o olhar vazio e sem brilho, calam-se diante de qualquer provocação, não
percebem a beleza do pôr-do-sol ou do raiar da aurora, não ouvem os pássaros
cantarem ao longe, não sentem o perfume das rosas, enfim, não admiram nada
do que está ao seu redor. Seu discernimento da realidade é baixíssimo.

Geralmente os vulgares estão ligados ao utilitarismo egoísta, mesquinho e


imediato. Seguem os caminhos indicados pelos mais sabidos e mais espertos.
Em sociedade agem como ‘‘maria-vai-com-as-outras’‘, do ditado popular. Por
exemplo: não votam por convicção, mas por indução, por cabresto, como se diz
na gíria política. No dizer de José Ingenieros: ‘‘A baixeza de seus propósitos
rebaixa o mérito de todo esforço e aniquila as coisas elevadas’‘ e ‘‘Ignoram que
toda grandeza de espírito exige cumplicidade do coração’‘.

Os homens sem ideal, vulgares ou medíocres, em qualquer atividade humana, da


mais simples a mais elevada, estão sempre a contar com a sorte: acreditam em
horóscopos, tarôs e toda essa parafernália que induz as criaturas a obterem
alguma coisa sem esforço e sem trabalho honesto. Ficam a esperar para ver o
que acontece: esperam sentados, querem sombra e água fresca como se diz na
gíria. Depois, reclamam da sorte dizendo que o destino conspira contra eles! Não
movem uma palha e querem tudo. Isto é totalmente contrário à lei de causa e
efeito, que é inexorável. Os vulgares têm pouca capacidade para pensar e muitos
até nem sabem pensar. São destituídos de amor sincero e verdadeiro. De regra,
transformam o orgulho em vaidade, a prudência em covardia e o respeito em
servilismo.

Por falta de idéias, a vulgaridade leva os indivíduos à ostentação, avidez, cobiça,


avareza, falsidade, escamoteação e simulação. Tudo, em seu íntimo, conspira
para que assim seja, já que não têm a capacidade ou não querem compreender a
verdadeira realidade da vida, faltando-lhes razão e sentimento.

Bastaria pensar antes de agir, saber por que está pensando e agindo da forma que
o raciocínio lhes ditar e usar o seu livre-arbítrio para o Bem para mudar esse
quadro tão negro que tanto emperra o avanço material e espiritual das criaturas.

PARTE III - SENTIMENTOS AMBIVALENTES

Sumário
PARTE III
SENTIMENTOS AMBIVALENTES
A ambição

A ambição é um sentimento ambivalente: tanto pode ser positivo, como


negativo, dependendo do propósito a que é dirigido. A ambição provêm do
desejo e para se tornar realidade tem que se transformar em projetos, com a
intervenção da força de vontade. É, portanto, um estímulo propulsor que se
consuma na realização, mas não dispensa a vontade e o entusiasmo.

Cada um de nós temos ambições. Elas sobrecarregam nossas mentes,


diariamente, com numerosos projetos que formam um conjunto confuso e
complexo de idéias. Ativando o desejo e abrindo nossas mentes à intuição
captamos idéias e sugestões as mais diversas. Algumas delas ficam a martelar
nossa mente insistentemente e por muito tempo. Em certos casos, aparecem até
em sonhos. O grande desafio é fazermos as nossas escolhas, tomarmos as
decisões corretas no tempo certo e nos fixarmos em uma ou algumas delas. O
que não devemos é ficar mudando de uma para outra sem realizar nenhuma, o
que criará na nossa mente desânimo, frustração e pessimismo. Se pensarmos que
o futuro material é aqui e agora e que a nossa vida terrena passa depressa,
devemos executar nossos sonhos com prontidão e entusiasmo. Veja também,
nesta obra, os temas ‘‘A PRONTIDÃO’‘ e ‘‘O ENTUSIASMO’‘.

Precisamos, para sermos eficazes, deixar de fazer castelos no ar e partir para a


ação, isto é, não basta sonhar grandes projetos, arquitetando-os mentalmente e
no papel sem passarmos à realidade, sem colocarmos mãos à obra. A melhor
maneira de construir definitivamente e realizar qualquer coisa é dar um caráter
ou cunho utilitário e prático aos nossos planos e projetos, verificando se eles
convêm às nossas necessidades e de nossos semelhantes. Isto porque a vontade
torna-se mais ativa e eficaz quando dirigida para coisas práticas e que podem
trazer resultados a curto e médio prazos. Enfim, é preciso realizar um estudo de
viabilidade técnica, econômica e financeira, antes de nos arriscarmos
demasiadamente.

Para transformar uma ambição em realidade são precisos, antes de mais nada,
interesse, vontade firme, disposição para lutar e enfrentar problemas simples e
complexos, ser persistente e perseverante. Em certos casos, até mesmo a
teimosia exercida de forma racional e lógica torna-se necessária. Estes são os
ingredientes que permitem à criatura executar a receita certa. Um pensamento
firme, uma grande intuição, um ‘‘estalo’‘ em nossa mente dirão a hora certa.
Junte tudo isso e ponha mãos à obra. Dessa forma, levamos a efeito nossos
propósitos. É óbvio que estamos falando de uma forma simplificada, mas
determinante para obter sucesso e consumar-se a ambição. Enfim, coloque na
execução todo o entusiasmo que tiver.

Um dos pontos nevrálgicos para se consumar nossas ambições está na seleção de


propósitos, isto é, saber escolher qual ou quais projetos, entre muitos, nos
convém. Outro ponto essencial é conhecer o assunto, pelos menos ter aptidão
relacionada com o mesmo. Feito isso, tome decisões, trace uma estratégia e as
metas a cumprir e realize-as com forte ânimo e determinação de só concentrar-se
no propósito escolhido.

Aqueles que enchem a cabeça com muitas ambições e acumulam propósitos,


perdem, não raro, o seu precioso tempo arquitetando sonhos e ilusões. Estas não
passam além do desejo e nunca constróem sua ponte para a realidade, jamais
mobilizam a vontade para alcançar a meta desejada.

Compreende-se, portanto, que o maior obstáculo à concretização de nossas


ambições reside na grande profusão de idéias, pensamentos e propósitos que
preenchem nossas mentes a um só tempo. Para vencê-lo é preciso, pelo menos,
observar os três pontos seguintes:

1) Adquira o hábito de querer, em primeiro lugar, o que for mais útil e prático, e
que retorne resultados mais imediatos.

2) Concentre-se e coloque suas forças no objetivo a alcançar.

3) Atue somente no que estiver disposto a realizar, não desperdiçando tempo e


dinheiro com coisas fúteis e inconsistentes.

Se soubermos medir a real força de nossos desejos, ambições e propósitos, se


pudermos identificar se são úteis e práticos antes de os realizarmos, estaremos
eliminando sonhos, ilusões e miragens antes que eles nos venham criar muitos
embaraços, trazendo-nos enormes aborrecimentos e enfraquecendo nossa força
de vontade pelos insucessos que teremos que assumir e assimilar.

A conclusão de tudo o que ficou dito é que ter apenas ambição não adianta nada,
não basta, é preciso pô-la em prática com os ingredientes e cuidados expostos
neste tema e no tempo certo. Reúna forças e ponha mãos à obra.

O amor-próprio

O amor-próprio é um sentimento voltado para o próprio indivíduo e é


representado por uma atitude de dignidade pessoal amalgamada de acordo com
exigências morais e sociais. É um sentimento positivo de auto-afirmação.

Durante nossa vida, a mente é invadida por toda sorte de sentimentos positivos e
negativos, dentre os que são tratados nesta obra, tais como, de um lado os
positivos: de amor, alegria, otimismo, felicidade, dignidade, honestidade,
somente para citar alguns; de outro, entre os negativos: de ódio, inveja, ciúme,
maledicência, ansiedade, impaciência e muitos outros.

Devemos nos habituar a captar e exercitar os sentimentos positivos, pois


acolhendo somente estes estaremos pondo em marcha a nossa evolução
espiritual de uma maneira mais rápida e acertada. Para isso, precisamos
desenvolver a nossa personalidade, levando-se em conta o nosso equilíbrio
mental e emocional, agarrando-nos aos sentimentos positivos, lapidando-os no
nosso viver cotidiano. O brio de nossas ações refletirá a dignidade que deve
acompanhá-las, fazendo tudo com sinceridade e procedendo com isenção de
ânimo no trato com nossos semelhantes, sem idéias preconcebidas, procurando
entender o ponto de vista dos outros. Devemos agir com desprendimento, sem
arrogância, com humildade, mas também sem ferir o nosso amor-próprio, nem
deixar que outros o façam. É óbvio que nem sempre encontraremos condições
ideais, sendo mais comum encontrarmos oposição às nossas idéias e à nossa
ótica de encarar o mundo e seus problemas. Cada criatura humana é um ser
único, isto é, não há dois indivíduos iguais, já que cada um tem uma vivência
diferente e é com fundamento nela que cada um reage e atua.

Nesse sentido, o amor-próprio constitui uma espécie de escudo ou couraça que


envolve o indivíduo para protegê-lo de investidas de diversas formas de
agressões tempestivas, para que nada venha sofrer de outras pessoas.

Na convivência diária, todos nós gostaríamos de ser estimados. No entanto, para


podermos obter a estima alheia, devemos antes saber estimar a nós mesmos. E,
como estimar a nós mesmos? Desenvolvendo o nosso caráter, nossa
personalidade, de forma a manter o equilíbrio, a ponderação e o respeito ao
nosso semelhante, sabendo mandar e obedecer, conforme as boas regras da
conduta. Enfim, não querendo para os outros o que não queremos para nós
mesmos. Mas, não basta pensar assim: é preciso colocar estas idéias e princípios
em ação em cada momento de nossas vidas, principalmente nas situações de
relacionamento difíceis, valorizando os atributos superiores que possuímos. É
pela exteriorização desses atributos que nossas qualidades são respeitadas pelos
outros. Precisamos atuar e proceder na certeza de que já possuímos estas
qualidades e devemos nos esforçar para lapidá-las sempre. Precisamos fazer com
que nossas ações sejam agradáveis, justas e boas, ou seja, devemos colocar o
nosso livre-arbítrio para o bem, respaldando, com essa atitude, toda palavra
empenhada e todo ato executado.

Em segundo lugar, para granjear a estima de nossos semelhantes, precisamos


também, saber respeitar a opinião e a liberdade alheias. Não devemos tolher
ninguém. Quando em conversa, não devemos interromper nosso interlocutor até
que ele termine de expor suas idéias e pontos de vista ou venha colocar uma
pergunta para nossa consideração. Não devemos atropelar os argumentos
alheios, colocando muitas perguntas seguidas, a não ser que sejam pertinentes e
bem encadeadas sobre o mesmo assunto. Devemos, sim, respeitar o bom
diálogo, cada um falando à sua vez, de forma natural e sem exaltação, com
respeito mútuo, dentro da melhor harmonia possível, sem levantar a voz para não
transformar a conversa em discussão. Esta é a forma ideal e civilizada de
infundirmos respeito e polir nosso amor-próprio e, reciprocamente, estimularmos
o amor-próprio de nossos semelhantes. Saber ouvir é a regra de ouro, lembrando
o ditado que diz: ‘‘A palavra é de prata, o silêncio é de ouro’‘.

Em terceiro lugar, devemos ter convicção daquilo que falamos ou fazemos. Se


não nos convencermos como é que poderemos convencer nossos ouvintes? É na
convicção, no tom de voz e na forma e estilo de expor que transmitimos o nosso
magnetismo pessoal. Todo bom orador ou palestrante conhece e pratica estes
preceitos. Um bom conselho neste sentido é nunca pronunciar palavras
negativas, deprimentes ou depressoras, principalmente evitar o uso do ‘‘não’‘
como nas frases: ‘‘não sou forte o suficiente’‘, ‘‘não me importo com o que vai
acontecer’‘, ‘‘não sou importante’‘, ‘‘sou uma criatura insignificante’‘,
‘‘coitadinho de mim’‘, ‘‘ninguém me ouve’‘, e por aí afora.

Toda criatura deve afirmar sua vontade, fazer valer seus direitos, mas também,
cumprir seus deveres sem esmorecimento. Deve mostrar-se desejosa na vida e
procurar evoluir; deve crer em si e na sua força de vontade, se quiser que os
outros também creiam. Portanto, para fortalecer a auto-estima é preciso crer em
si mesmo, no poder da sua voz, da razão, da resolução e da convicção. É preciso
não dar muita importância à opinião alheia, ser indiferente e infenso aos
louvores, bem como às censuras descabidas, em desacordo com sua consciência.
Confie sempre na sua opinião pessoal e proceda sempre com muita reflexão.
Para isso, é preciso tornar-se um ser superior, esclarecido, que controle a si
mesmo, que saiba se vestir e se apresentar, que não beba ou coma em excesso,
que não ande em desalinho e que se apresente comedido nas palavras e nas
ações. Não proferir palavras de baixo calão, não injuriar quem quer que seja e,
sobretudo, não se exasperar nunca.

Aquele que deseja ser tido como criatura sensata e, portanto, granjear o respeito
de seus semelhantes, tenha uma vida serena, cultive o bom humor e proceda com
calma em todos os atos de sua vida. Tem que ter largueza de espírito e nobreza
de caráter. Tem que colocar suas faculdades superiores a serviço do Bem. Tem
que ser perseverante e confiante nos resultados de suas ações. Tem que viver
com moderação. Lembre-se que só tem poder sobre outrem quem tiver, primeiro,
poder sobre si mesmo. Enfim, tem que ter caráter forte e limpo e ser uma
criatura de valor.

Estas qualidades ou predicados são inconfundíveis. Nada têm a ver com a


vaidade, presunção e o orgulho que muitos acham necessário para poder mandar
e liderar. Puro engano! Estes sentimentos não enriquecem a criatura, antes a
desgastam permanentemente e, freqüentemente, as destroem como ser civilizado
que deveria ser.
O desejo
O desejo está associado a muitos conflitos exteriores e interiores, estes abrigados
no recôndito mais profundo de nosso ser. Antes de compreendermos como
nasce, se desenvolve e se dissipa o desejo, é preciso conhecer o que é conflito,
sua natureza e localização.

Os conflitos têm natureza variada e se localizam nos dois níveis da mente: no


consciente ou superfície e no inconsciente, isto é, nas camadas mais profundas
da mente. Mantendo-a ocupada com o trabalho intelectual ou manual, os
conflitos quase que desaparecem, o que confirma que a mente ativa diminui os
conflitos. A vontade é o instrumento da realização do desejo. Quando esta é
posta em ação para realizá-lo, surgem os problemas, isto é, os conflitos.

Existe uma vasta gama de desejos, muitos benfazejos, outros maléficos, todos
impulsionados pela vontade de fazer ou não fazer, de agir ou não agir. Por
exemplo, a ambição de galgar o topo de uma carreira ou cargo para cumprir uma
de suas metas na vida, a vontade firme na realização do desejo de um político de
se tornar presidente ou a de um compositor musical ou músico de um dia ser
maestro. Os exemplos encheriam dezenas de páginas.

É o desejo que causa o conflito. O desejo é estimulado pela associação de idéias


e pela lembrança de fatos e ocorrências passadas; daí, a memória desempenhar
papel fundamental na geração e compreensão da natureza do desejo. As
lembranças podem ser agradáveis ou desagradáveis, as primeiras causando
prazer e estas, dor ou sofrimento. Estes desejos opostos nutrem o conflito.

Por causa da alternativa do prazer e da dor, a nossa mente divide ou fraciona o


desejo em diferentes categorias de valores e atividades.

Apesar de se chocarem e se oporem, todos os desejos são um só. É fundamental


compreender esse ponto para evitar que o conflito dos desejos opostos se torne
interminável. Do equilíbrio dos desejos opostos temos a inação; portanto, temos
sempre que passar os desejos opostos por um filtro e depurá-los, para poder
eliminar os conflitos e bem agir. Vemos, assim, que este dualismo é aparente, é
uma ilusão. Não há dualismo no desejo, mas apenas diferentes tipos de desejo.
Aliás, o dualismo é quase sempre uma ilusão em todas as atividades humanas.
Não se deve confundir dualismo com alternativas de problemas para os quais
existem soluções. Só há dualismo perfeito entre o tempo e a eternidade,
porquanto a existência de um elimina a existência do outro.

E por que é ilusório o dualismo no desejo?

Vejamos: o desejo se divide entre querer e não querer algo. Tanto procurar
querer como evitar querer é desejo. Não se pode fugir deste conflito porque é o
próprio desejo que cria oposição a si mesmo. Daí, concluir-se que todos os
desejos são um só e não podemos alterar esse fato. Se compreendermos isto
como verdadeiro, então o desejo tem força para libertar nossa mente da criação
de ilusões!

Estabelecido que o desejo se fraciona em partes distintas e opostas e que


‘‘querer’‘ e ‘‘não querer’‘ são desejos que geram conflitos, nós vivenciamos
estes desejos opostos em conflito, já que o seu fluxo nos puxa em direções
opostas. Vemos, assim, que o desejo só faz multiplicar, ou melhor, repicar o
desejo, numa armadilha cíclica. Por isso, precisamos ter primeiro uma noção
bem nítida do desejo como uma entidade simples e única.

As nossas necessidades orgânicas são moldadas pelos desejos psicológicos, que


se agrupam em dois tipos: potentes ou conscientes, porque evidentes, e ocultos
ou latentes, estes mais importantes porque escondidos no subconsciente. A nossa
mente consciente ou superficial está sempre em estado de agitação. Acalmando-
se os desejos superficiais, torna-se possível sentir os desejos ocultos, ‘‘motivos’‘
e intenções subirem à superfície, isto é, é preciso fazer estes desejos (os latentes)
aflorarem ao consciente para podermos estudá-los, eliminá-los ou dar-lhes livre
curso real.

Ao analisarmos a natureza do desejo, voltamos ao problema do experimentador e


da coisa experimentada, isto é, nós verificamos que não somos separados de
nossos desejos. Então, como experimentá-los sem nos envolvermos diretamente?
Como reprimir um desejo e seguir outro? O que ‘‘freia’‘ um e ‘‘libera’‘ outro? É
a força de vontade.

Se existir esta percepção, sempre que surgir um desejo devemos nos livrar do
experimentador como ‘‘entidade separada’‘ e, então, poderemos (o nosso ‘‘eu’‘)
conferir o desejo sem censura, isto é, precisamos fazer cessar o censor que existe
em nós, momento por momento, passo a passo e, assim, veremos os conflitos
cessarem. Não é fácil seguir este processo, mas adotando-o, sempre que
necessário, veremos que nos aquietamos e nos tornamos cônscios e seguros de
nossas ações.

O desejo se realiza e se consome depressa enquanto o amor é duradouro e


sempre trará alegria; ao contrário, o desejo realizado quase sempre deixa uma
sensação de vazio. O desejo não pode ser detido; tentar cessá-lo pela vontade
leva à decadência e ao sofrimento (processo do sufoco). Só o amor pode dominar
o desejo e o amor não é coisa ou produto mental. O desejo é tão flexível e veloz
que a mente é capaz de ajustá-lo a qualquer coisa, adaptar-se a qualquer
circunstância.

Finalmente, desejar e perseverar faz um homem forte e preparado para lutar com
tenacidade e vencer todos os obstáculos.
O orgulho
O orgulho é um sentimento ambivalente, podendo ora ser negativo, ora positivo,
dependendo da situação específica em que se insere. No primeiro caso, temos o
amor-próprio ou auto-estima exacerbada, assumindo aspectos variados como os
encontrados na presunção, na arrogância, na soberba e na empáfia. No segundo
caso, esse complexo sentimento pode assumir as formas de dignidade pessoal,
brio e altivez que são também conceitos exagerados de si mesmo. No
desdobramento desse tema procuraremos abordar todas essas facetas do orgulho.

Em seus aspectos negativos o orgulho consiste na criatura se julgar acima de


todas as outras, isto é, de considerar os seus semelhantes inferiores. Sua
superioridade aparente é por ela usada como desprezo aos seus semelhantes, de
quem zomba, olha de soslaio ou trata com indiferença e desdém. Nas pessoas
mais cultas, que não conseguem se tornar infensas ao orgulho, este se transforma
em arrogância e, consequentemente, elas acabam ofendendo os mais humildes,
desprezando os seus valores. Trata-se aqui de uma séria deformação do caráter,
já que possuindo conhecimentos, sendo cultas e inteligentes, poderiam, muito
bem, dispensar de usar este sentimento tão desprezível no trato, no convívio com
seus semelhantes. Assim, desprezando os outros e seus valores torna-se difícil
aproximar-se deles e merecer a sua confiança. Seus méritos não conseguem
sobrepor-se ao orgulho que termina por sobressair-se. Trata-se de um orgulho
injustificado, que é grosseria e estupidez.

Os orgulhosos, ainda no seu sentido negativo, não conseguem cativar nem ser
solidários com ninguém, porque é da sua própria natureza procurar se manter
sempre intocáveis. Por isso mesmo, não se preocupam com ninguém. Sua maior
preocupação, quando conseguem, é impor suas idéias e opiniões ao seu próximo.
Procuram colocar a marca de seu orgulho nos gestos, na forma de vestir e,
principalmente, na entonação da voz, quase sempre acompanhada com um
acento de ironia e desdém. Normalmente, esta modalidade de orgulho está
associada ao egoísmo. Veja o tema ‘‘O EGOÍSMO’‘ em outra parte desta obra.

O orgulhoso não sabe respeitar a opinião e a liberdade alheia. Se puder


constranger as pessoas, ele o faz de maneira acintosa e com muita empáfia. Usa
a empáfia para ‘‘arrotar’‘ grandeza. A convivência é difícil porque ele sempre se
coloca acima dos outros. O orgulhoso exaspera-se com facilidade, é insensato,
não tem largueza de espírito e é desprovido de qualquer resquício de humildade.
No orgulhoso, a ingratidão é marcante. Veja o tema ‘‘A GRATIDÃO’‘ em outra
parte desta obra.

Com relação ao relacionamento e ao convívio com o próximo, o orgulho se


interpõe como uma barreira quase intransponível. Sabemos que o que mais
afasta as criaturas entre si são os preconceitos, as suspeitas e as rixas. Lembre-se
que com palavras duras e ásperas não se consegue nada e que a atitude soberba é
a maior causa dos conflitos e das desavenças entre as pessoas. Portanto, é
necessário sempre esforçar-se para não exagerar ou sobrevalorizar o seu amor-
próprio ou auto-estima a ponto de se transformar em orgulho.

É importante não confundir orgulho com vaidade. O vaidoso procura sempre se


comparar com outra pessoa; já o orgulhoso jamais se compara porque ele se
coloca sempre acima dos outros, que julga serem inferiores e têm o dever de lhe
servir. O orgulhoso tem méritos, o vaidoso não. Veja, nesta obra, o tema ‘‘A
VAIDADE’‘. Esta diferença é apresentada ali com uma argumentação mais
ampla. É do Marquês de Maricá esta frase: ‘‘O orgulho é próprio dos homens, a
vaidade das mulheres’‘ [PÂNDU, 1962, p. 176].

Com relação ao aspecto positivo do orgulho, menos freqüente que o negativo,


teceremos algumas considerações. Jovens e adultos que, através de seu esforço
próprio, lutam e vencem concursos e competições, coroando centenas e até
milhares de horas de estudo ou de esforço físico dedicado aos esportes com
empenho e garra, sentem um tipo de orgulho gratificante, do mesmo modo que
seus pais e familiares. É costume ouvir um pai dizer ‘‘meu filho é o orgulho da
família’‘, para demonstrar o prazer que sente por ter, quem sabe, pelo menos um
filho que se destacou. Nos esportes, os fãs e torcidas organizadas têm orgulho
das vitórias de seu time e de seus ídolos. Há mulheres que sentem orgulho de
seus maridos e vice-versa.

A altivez parece, também, ser uma forma positiva do orgulho, porque mais ciosa
de si a criatura não utiliza a arrogância para se impor, mas faz uso de seus
méritos de forma mais natural, sem agredir aqueles a quem deve causar
admiração.

A proeminência encontrada nos homens muito cultos e sábios de todo o mundo é


admirada por todos, desde que não venha envolvida pela soberba. É do Padre
Antonio Vieira esta frase: ‘‘Lograr proeminência e não ser soberbo é
comedimento tão raro, que nem o primeiro anjo o teve no céu, nem o primeiro
homem no paraíso’‘ [PÂNDU, 1962, p. 176]. Aqui fica claro que a virtude está
no meio, no equilíbrio, sem pender para nenhum extremo, mantendo o amor-
próprio sob um desejado e útil controle.
O sofrimento
O sofrimento se manifesta em todas as criaturas sob as mais diferentes formas
físicas e morais e faz parte, como efeito ou conseqüência, da luta pela vida,
sendo o sustentáculo da própria evolução espiritual. É através do sofrimento que
as criaturas acordam, despertam para as realidades da vida e para a necessidade
de evitá-lo através do bom uso de seu livre-arbítrio. Não é uma qualidade ou
atributo do espírito, mas um meio ou necessidade que serve para corrigir o rumo
certo da evolução espiritual. Usaremos neste tema a palavra sofrimento para
abranger a dor física e moral e o vocábulo dor para a dor física. Assim, o
sofrimento é mais amplo e inclui, além da dor física, as dores morais, tais como
a angústia, a mágoa, a amargura, o infortúnio, a aflição, o padecimento, o
tormento, o sufoco e outras mais dessa ordem que atingem diretamente o espírito
e não o corpo.

É impossível a criatura eximir-se totalmente do sofrimento neste mundo. Mas,


constitui obrigação do indivíduo procurar suavizá-lo, amenizá-lo, atenuá-lo tanto
quanto possível através do bom uso que fizer dos atributos essenciais do espírito:
o pensamento, a vontade, o raciocínio e o livre-arbítrio. No mundo de relações
em que vivemos é difícil, senão impossível, fugir às atribulações, às
inquietações, aos fatores adversos, às influências negativas e às imagens duras e
cruéis que acontecem ao nosso redor, todas elas trazendo sofrimento e amarguras
as mais diversas.

Apesar de a criatura normal procurar evitar o sofrimento de todas as maneiras


possíveis, existem pessoas que procuram, propositadamente, fazer os seus
semelhantes sofrerem. São indivíduos excêntricos e obsedados que, por
anomalias mórbidas da personalidade e da conduta, adotam procedimentos
condenáveis pela sociedade de qualquer país civilizado. São práticas paradoxais
mesmo, a fim de extraírem da sua dor ou da de outrem prazer e gozo, na volúpia
de fazer sofrer ou sofrer eles mesmos, o doce-amargo do prazer e da dor
fundidos num único sentimento. Estes são os amantes da dor, verdadeiros casos
de psicologia e psiquiatria clínicas que formam um grande contingente de
degenerados psíquicos que atuam sob as mais diversas formas que nomearemos
a seguir, pedindo a compreensão do leitor para o palavreado técnico. Existem os
algofílicos ou paramasoquistas, que são os amantes passivos da dor, que
procuram submeter-se ou escravizar-se aos caprichos de alguém, humilharem-se;
os algomaníacos ou para-sadistas, que são os amantes ativos da dor, pessoas
com tendência de sentir prazer com o sofrimento alheio e até de animais; os
masoquistas, também agentes passivos da dor, porém em estado mais avançado
que os algofílicos; os sadistas, agentes ativos da dor em estado mais exaltado
que os algomaníacos e, finalmente, os sadomasoquistas que sendo ambivalentes
adoram supliciar ou torturar e serem supliciados ou torturados, isto é, adotam ora
uma, ora outra postura mórbida. Todos esses tipos citados são enfermiços do
espírito e dirigem sua morbidez principalmente para os prazeres do sexo e para a
criminalidade, já que possuem uma morbidez acentuada ou uma tara excêntrica e
exaltada. Os pervertidos erógenos ou sadomasoquistas são casos, na medicina
oficial, para a psicologia e psiquiatria. Todos vivem para sofrer e desfrutam a
vida fazendo outros sofrerem.

A dor física deve ser encarada como um mecanismo de defesa de nosso


organismo, como sentinela para detectar que alguma coisa está errada, não vai
bem, em alguma parte do nosso corpo. Nem sempre o local da dor é seu ponto
gerador, local de sua origem. Por exemplos, uma dor de cabeça ou uma
enxaqueca normalmente têm a sua causa em outra parte do organismo, ou, até
mesmo, é de origem psíquica, somatizada no local da dor. Não vamos nos
alongar nesta área, que faz parte da Medicina oficial e de todas as suas
especialidades e, cujo objetivo principal é diagnosticar e tratar de todas as
disfunções do corpo humano, conhecidas genericamente como doenças.

Outro aspecto da dor, cuidada também pela Medicina ou mais precisamente por
uma de suas especialidades, a geriatria, são as doenças ditas degenerativas. Estas
ocorrem nas pessoas que já atingiram uma certa idade, cujos limites variam de
indivíduo para indivíduo, mas que é comum situarem-se na terceira idade, ou
seja, acima dos sessenta anos. Estas doenças decorrem do desgaste natural do
organismo, seja devido à idade avançada, seja devido aos maus tratos infringidos
ao corpo ao longo dos anos. Nesses casos, o melhor remédio é aprender a
conviver com a dor da melhor maneira possível, ou mais modernamente, através
da terapia ocupacional. Nessa categoria, citamos o reumatismo em suas variadas
modalidades e a osteoporose, esta última mais comum nas mulheres e resulta da
descalcificação da massa óssea do esqueleto, devido à insuficiência hormonal.

Destacamos duas ocorrências muito comuns de comportamento em relação ao


sofrimento que fogem da normalidade. A primeira está em exagerar, ampliar
introvertidamente os efeitos da dor como acontece nos algofílicos ou
paramasoquistas supracitados. Estas criaturas colocam nessa prática um
expediente de chamar a atenção para seus estados de carência emocional e
recalques. Fazem jejuns e ruminam pessimismo o tempo todo. Alguns fazem
penitências ou se entregam a lamentações obsessivas e usam a dor como uma
forma, uma tentativa de compensar os seus recalques. Neste grupo, encontramos
os desencantados da vida, os melancólicos e os inquietos. Fazem de tudo isso um
derrotismo bastante negativo para si e para os com quem convivem. Até mesmo
o amor - o mais nobre dos sentimentos humanos -, não fica de fora, fazendo dele
motivo de dramas, tragédias e amarguras, sentimentos esses cantados por
prosadores e poetas de todos os tempos.

A segunda ocorrência anômala do comportamento em relação à dor é a que tende


a minimizá-la. Este tipo de comportamento pode ser encontrado entre os faquires
e exibicionistas de feira e circo. Eles procuram tornar-se insensíveis à dor física,
dela fazendo exibição e comércio em países de tradição religiosa muito antiga,
como a Índia, China, Tibete e outros países da Ásia. Em alguns casos, chegam a
ter completo domínio do pensamento sobre a dor, o que deixa os passantes e
visitantes estupefatos. Estes são sadomasoquistas, que inflingem a dor em si
mesmos.

O aspecto mais polêmico sobre a dor e o sofrimento recai sobre a sua


necessidade. Para os materialistas a dor e o sofrimento são sempre de natureza
física, têm origem no corpo e no corpo atuam. Mas, não conseguem explicar as
dores e sofrimentos morais que não têm por causa nenhum agente etiológico,
bactéria ou vírus, nem são conseqüências de ferimento ou contusões no corpo. O
sofrimento moral, nas suas numerosas modalidades, é de natureza puramente
espiritual e até muitas dores físicas têm por causa ou são influenciadas pelo mau
uso do pensamento e do livre-arbítrio, somatizando as influências negativas em
diversos pontos do organismo.

Somente a doutrina espiritualista científica explana e explica que o espírito é a


única força capaz de mover e pôr em ação não só o corpo, como também, os seus
atributos, como o pensamento, a vontade, o raciocínio, o livre-arbítrio e todos os
demais que desses atributos essenciais se desdobram. Da ação desses atributos,
especialmente do uso do livre-arbítrio, praticamos o Bem ou o Mal. Assim, a
grande maioria dos males e sofrimentos que atormentam as criaturas são
decorrentes do mau uso que fazem de seu livre-arbítrio, adquirindo-se pelas
faltas e erros que praticarem, numerosos elementos negativos materiais e
energéticos ou astrais, que marcam indelevelmente a alma e a consciência. O
resgate dessas falhas e erros só pode ser feito através do trabalho penoso e do
sofrimento. A crença, ou melhor dizendo, a convicção nesta verdade coloca a
mente em condições de dominar cada vez mais o corpo até se libertar de todos os
sofrimentos e dores.

O ditado ou aforisma latino ‘‘Mens sana in corpore sano’‘ - mente sã em corpo


são -, que leva a crer que toda a saúde mental depende do corpo, conforme
adotada pela medicina oficial, é interpretada pelos espiritualistas no seu sentido
oposto, ou seja, o corpo será são na medida em que a mente for sã, sadia. Nem o
corpo, nem o cérebro, órgão sensível que dele faz parte, pode gerar os
sentimentos, as emoções e as paixões humanas. Estes têm origem na ação dos
atributos do espírito acima mencionados.

Assim, é o espírito que busca a maneira de pôr o corpo em perfeita concordância


e harmonia com suas vibrações, e luta para expelir do corpo todos os elementos
nocivos, causadores da dor e do sofrimento. Esta é a luta da evolução espiritual
do homem, através da qual o espírito procura tornar-se puro e perfeito.

PARTE IV - ATRIBUTOS ESPIRITUAIS

Sumário
PARTE IV
ATRIBUTOS ESPIRITUAIS
A concentração

A concentração consiste no poder que a criatura tem de direcionar a totalidade de


seus pensamentos para um único ponto, objeto ou assunto sem se deixar distrair
por nenhum fato ou qualquer circunstância que se produza ou venha ocorrer ao
seu redor.

A concentração faz convergir todas as idéias para um centro focal, assim como,
usando uma lente, convergimos os raios solares, que são ondas vibratórias, para
o foco luminoso da lente. A energia aí concentrada é tanta que pode acender uma
vela. Isso é fácil de entender porque o pensamento é vibração do espírito e, como
vibração, ele pode convergir ou dispersar-se em muitas direções. A dispersão
ocorre pela distração quando o pensamento vagueia de um assunto para outro
com muita facilidade, não se fixando em nenhum deles.

A concentração emprega simultaneamente pelo menos cinco qualidades ou


predicados do espírito, a saber: interesse, atenção, domínio sobre si mesmo ou
autocontrole, continuidade e persistência.

O interesse é o primeiro requisito. É preciso gostar e se fixar no assunto que se


vai estudar, naquilo que se vai fazer ou em que atuar. O interesse nos leva à
predisposição para extrair os maiores e melhores resultados da concentração. Ele
nos desperta os sentimentos apropriados e nos coloca em sintonia com o objeto
ou assunto da concentração.

Ao interesse segue-se a atenção, que constitui propriamente a base da


concentração. A atenção nos permite fazer a sintonia fina e nos colocar em
harmonia com o objeto ou assunto da concentração. Ela constrói uma ponte
invisível entre o observador (a pessoa que busca se concentrar) e o objeto da
concentração (o assunto a que se dirige a nossa atenção). Através da atenção,
procuramos convergir os nossos pensamentos ao objeto da concentração.

É pelo autocontrole que firmamos os nossos pensamentos no ponto focal do


objeto da concentração. É através dele que imprimimos maior ou menor
intensidade aos nossos pensamentos e os separamos, de modo a selecionarmos,
dentre tantos, aquele que nos interessa no momento da concentração. Ele
governa os pensamentos e é necessário para afastar as idéias estranhas ao
assunto, as quais tendem a nos levar à distração.

A continuidade reforça a atenção e evita interrupção no pensamento, ao mesmo


tempo que estimula a emissão repetitiva do mesmo pensamento. É como um
filtro que canalizasse sempre ondas vibratórias do mesmo tipo e intensidade para
melhor captar o assunto objeto da concentração.

Finalmente, contamos com a persistência, que tem por função obrigar a atenção
a ficar presa ou ligada ao assunto ou objeto escolhido até terminarmos ou
completarmos o processo da concentração que se tinha em vista.

Por isso, quem desejar adquirir e praticar esta preciosa faculdade da


concentração precisa exercitar seus cinco elementos básicos supradescritos em
todos os atos do seu dia-a-dia. Muitos livros foram escritos para ensinar técnicas
de concentração, assim como técnicas de auto-sugestão, visando dotar as
criaturas de melhores ferramentas para vencer na vida. Está fora de dúvida que
todos os grandes vencedores nos esportes de todos os tipos, na indústria, no
comércio, nas ciências, nas artes e praticamente em todas as atividades humanas
têm na concentração a mola mestra de seus sucessos.

Se observarmos na descrição acima, veremos que o autocontrole ou domínio de


nós mesmos é, entre todos os demais pré-requisitos citados, o de maior
importância porque é através dele que impomos vigilância e orientação aos
nossos pensamentos e sentimentos. O meio mais direto de desenvolvermos o
autocontrole é através da introspecção, ou seja, um mergulho em nosso
psiquismo para ativar as nossas forças interiores. A introspecção é uma profunda
reflexão para nos conhecermos como Força e Matéria e dar a cada um desses
elementos o seu devido valor.

Não vamos nos deter ou aprofundarmos aqui nas técnicas para desenvolver a
concentração, mas este tema estaria incompleto se não déssemos, pelo menos,
algumas pinceladas no assunto. Pesquisas feitas por instituições sérias, em vários
setores da atividade humana, revelam que cerca de 90% das criaturas levam uma
existência medíocre por não saberem tirar proveito da concentração, 5% a usam
mal e somente 5% a utilizam verdadeiramente e triunfam. Daí, a importância de
realçarmos alguns pontos fundamentais que constituem os pré-requisitos das
técnicas de concentração. São eles, não necessariamente dispostos nesta mesma
ordem de importância:
01) Organize, planeje e discipline o dia-a-dia de sua vida.

02) Cumpra o que planejou e procure corrigir todos os erros.

03) Mantenha sob controle seus compromissos e interesses.

04) Exerça toda a atenção aos detalhes para aperfeiçoar-se.

05) Dê intensidade e prontidão aos seus pensamentos e atos.

06) Procure novas maneiras de falar ou fazer as coisas certas.

07) Pense antes de agir e use bem o pensamento e o raciocínio.

08) Utilize sua força de vontade e saiba dirigi-la para o bem.

09) Utilize cada momento do seu dia para se tornar cada vez melhor.

10) Seja exigente consigo mesmo e tolerante com o seu semelhante.

11) Procure a companhia de pessoas calmas e evite emoções fortes.

12) Evite grandes concentrações de pessoas e fuja dos tumultos.

13) Ao deitar, faça uma auto-análise sincera dos atos que praticou.

14) Abstenha-se de uma vez de todos os vícios (drogas, álcool e fumo).

15) Procure manter a saúde do corpo, curando-se de todas as doenças.

16) Faça exercícios físicos e ginástica respiratória para oxigenar o sangue.

17) Dê-se ao hábito da boa leitura , diariamente, pelo menos por 15 minutos.

18) Procure tornar-se bem calmo, feche os olhos sem forçar, fique em silêncio.

19) Ao concentrar-se, evite movimentar-se e respire bem lenta e pausadamente.

20) Ao deitar-se, procure relaxar-se e esquecer todos os assuntos do seu dia-a-


dia.
A consciência

A consciência é a faculdade que integra três faculdades essenciais do espírito:


pensamento, força de vontade e livre-arbítrio. É ela que estabelece os princípios,
normas e procedimentos de conduta a seguir, para que a criatura possa discernir
o certo do errado, o bem do mal e fazer a sua evolução espiritual da forma
correta, mais direta, com menos erros e falhas, em direção à Inteligência
Universal, de que é partícula, e para onde voltará após atingir a perfeição e
pureza.

A consciência é a nossa bússola norteadora, o nosso instrumento de navegação,


que nos conduz de acordo com os princípios morais e as leis universais. É ela
que alumia os nossos caminhos, que nos põe em consonância com os princípios
do bem, afastando todo o mal. É através dela que alcançaremos a Perfeição
Absoluta na longa estrada da evolução. Ela, a Consciência, aqui grafada com
letra maiúscula, é o atributo absoluto, que no Universo, confraterniza todos os
espíritos num só pensamento de Amor e Paz.

A consciência é o nosso juízo, a nossa razão e é a ela que nos devemos submeter
em todos os atos de nossa vida. Ela é a Lei Magna de nossa evolução. Não
confundir a consciência com memória. Esta é o nosso repositório de
conhecimentos, experiência e saber de tudo que fizemos, fazemos ou viermos
fazer. O resultado de nossos esforços, pensamentos e ações são gravados nela de
forma indelével, impossível de serem apagados. Podemos compará-la a um
moderno disco ótico de CD-ROM usado em multimídia nos computadores, no
qual são colocadas em código de computação milhões e milhões de informações
como textos que se pode ler, imagens que se pode ver, sons que se podem ouvir,
isolada ou combinadamente. Para isto, basta achar o local onde se acham
armazenadas as informações, em arquivos, e reproduzir no computador o que
desejamos. Cada CD-ROM é único, tem sua identidade. Assim é a nossa
memória. Já a consciência baliza, modela e julga os nossos atos.

A inter-relação ou integração do espírito com o corpo forma o ‘‘eu pessoal’‘, ‘‘eu


consciente’‘ ou simplesmente o ‘‘eu’‘ ou personalidade, na terminologia dos
psicólogos modernos. O ‘‘eu consciente’‘ tem a consciência como atributo
essencial, que dita a conduta ou modela a personalidade da criatura. Ele
exterioriza idéias como ‘‘eu penso, eu sinto, eu quero’‘. Já ‘‘o que eu penso, o
que eu sinto, o que eu quero’‘, isto é, o objeto das idéias tem que passar pelo
crivo da vontade e do livre-arbítrio; todos, por sua vez, devem ser submetidos ao
crivo, ao rigor vigilante da consciência que norteia, que baliza a conduta.
Segundo os psicólogos, a consciência exerce o papel de censor, de ‘‘superego’‘.

A integração dos três atributos essenciais do espírito, pensamento, vontade e


livre-arbítrio pela consciência cria uma unidade harmônica induzida pela
vibração da energia espiritual que atua diretamente no seu instrumento material -
o cérebro humano -, produzindo os efeitos que conhecemos como sendo a vida
humana. O cérebro, por sua vez, conduz as ações e exprime os sentimentos que
queremos transmitir em nossa vida de relação com os nossos semelhantes.

Para ficar bem claro o que acima dissemos, é preciso entender que tudo o que
pensamos nos vem de fora; captamos nossas idéias por intuição - elas não são
elaboradas fisiologicamente pelo nosso cérebro. Grifamos propositadamente o
possessivo nosso. Nós utilizamos o cérebro, nessas circunstâncias, como
instrumento de captação. Mas, nós quem, nosso ‘‘eu’‘? Agora, temos três
palavras grifadas e ainda não definimos quem somos nós, não é verdade? Nós
somos constituídos de Força e Matéria. A Força é a energia espiritual, partícula
da Inteligência Universal, o ‘‘sopro da vida’‘ e a Matéria é o instrumento do
espírito, o nosso corpo, organizado pelo espírito para a sua evolução na Terra
com os elementos químicos próprios da Terra.

Não há nenhuma dualidade no que dissemos; o que existe é uma integração entre
Força e Matéria. A consciência promove esta união entre as duas realidades. As
idéias nos vêm de fora e o pensamento que é vibração do espírito as elabora para
organizá-las e pô-las em ação através da vontade, que é o dínamo do espírito. Se
o pensamento fosse uma elaboração fisiológica do cérebro, não conteria uma
variação quase infinita de idéias e imagens, já que o produto fisiológico de um
órgão tem uma composição aproximadamente constante, como é, por exemplo o
caso da insulina produzida pelo pâncreas ou a bílis, produzida pelo fígado. Sua
composição química é praticamente constante, conforme detectado por análises
clínicas. No processo de integração referido, o livre-arbítrio intervém para que a
plena liberdade de ação seja observada, nada sendo feito por imposição, mas por
deliberação própria. Veja nesta obra os temas ‘‘O PENSAMENTO’‘, ‘‘A
VONTADE’‘ e ‘‘O LIVRE-ARBÍTRIO’‘.

Para cumprir os desígnios da consciência, basta colocar o nosso livre-arbítrio


atuando em perfeita harmonia com os princípios da moral, bom senso e justiça.
Moral e justiça são conceitos natos na criatura desde a mais tenra idade. A
influência do meio e a orientação que vier receber dos pais poderá realçar ou
deturpar estes conceitos. Daí, a importância dessa ação orientadora, a qual deve
ser desempenhada com muita compreensão, ternura e amor.

A obediência que devemos à nossa consciência será sempre cobrada por esta, em
qualquer circunstância e em qualquer tempo ou ocasião. Não se trata de uma
obediência cega, para fazer ou deixar de fazer o que a vontade ditar (isto é
função do livre-arbítrio), mas de uma exigência ao cumprimento do dever,
segundo os princípios da moral e da justiça, o que vale dizer, em consonância
com o Bem. O não cumprimento ou afastamento das diretrizes planejadas pelo
espírito antes de encarnar, em seu mundo de origem, traz conseqüências nefastas,
retardando a evolução espiritual da criatura.

A criatura que se afastar das diretrizes traçadas, praticando o mal consciente ou


inconscientemente, será acometida de arrependimento ou, quando causar mal
maior ou injustiças danosas para os seus semelhantes, pelo remorso. Estes
sentimentos não deixarão a sua consciência em paz, e não serão apagados, senão
pelos sofrimentos pelos quais terá a criatura de passar, segundo a lei de causa e
efeito, inapelavelmente. Se não puder resgatar estas falhas durante sua presente
encarnação, terá que fazê-lo em outras, inexoravelmente.

É muito útil e recomendável fazer diariamente, antes de dormir, em exame de


consciência dos atos praticados durante o dia. Assim procedendo a criatura
poderá detectar deslizes perniciosos e ir fazendo a correção de rumo, sem deixar
acumular pesadas falhas, cujo resgate, mais tarde, será sempre mais doloroso.
Seja, portanto, seu próprio juiz pela ação do pensamento e da vontade corretora
de suas falhas. Somos todos imperfeitos, e esta luta entre as boas e más ações
ressoa em nossa consciência. Teremos que travá-la com nossas forças interiores,
com discernimento e lucidez de raciocínio para separar o joio do trigo.

Para ascender a outros planos espirituais mais elevados, em nossa longa


caminhada para a perfeição, temos que passar por todas as provações, limpar
todas as máculas, afastar todos os erros e males, depurar nosso espírito, adquirir
todos os méritos necessários e desapegar-nos dos bens materiais, isto é,
tornarmo-nos livres do sentimento de posse das coisas terrenas.

É óbvio que acabamos de descrever condições ideais. Mas, a realidade da vida


terrena nos oferece toda sorte de situações que se afastam delas. Encontramos,
nas relações com nossos semelhantes, uma diversidade muito grande de graus de
evolução, de sensibilidade e espiritualidade diferentes da nossa, de necessidades
materiais e espirituais diversas, de afetividades conflitantes sob a forma dos mais
variados sentimentos, emoções e paixões, umas nobres e dignas, outras
desprezíveis e vergonhosas.

Nesse torvelinho de sentimentos e vibrações de toda espécie e gênero,


invocamos a razão, a lógica e o raciocínio para impor a ordem e a disciplina e
finalmente triunfar. Cada um terá que fazer isso por si mesmo, usando seus
recursos espirituais já mencionados, sem contar com a ajuda de quem quer que
seja. Nesse longo processo, que consumirá muitas vidas, muitas encarnações, a
consciência tem um papel relevante, que é o de aferir, sopesar, comparar os
ganhos e as perdas, fazer o balanço de nossas ações passadas e traçar a rota de
nossas ações futuras. Ao julgar nossas ações, age a consciência como juiz de si
própria, um censor; ao traçar novas ações, age como um planejador, balizando a
nossa evolução, impondo-nos desígnios e metas para melhor cumprimento de
nosso dever. O esforço de uns poderá encurtar sua caminhada; a inércia de
outros, poderá estendê-la. Não há outras alternativas.

O livre-arbítrio

Na definição vernácula, o livre-arbítrio é apresentado como um poder abstrato,


isto é, ‘‘um grande poder sem outro motivo que não a existência mesma desse
poder’‘. Mais adiante, ainda sobre o livre-arbítrio diz o dicionário: ‘‘o homem é
dotado de poder de, em determinadas circunstâncias, agir sem motivos ou
finalidades diferentes da própria ação’‘. Dessa forma, nada se esclareceu, não se
definiu coisa alguma e sua descrição é vaga e sem sentido. Isto demonstra que
essa maravilhosa e tão essencial faculdade espiritual é pouco conhecida, por
causa de falsas concepções sobre o que é a vida.

Para entender o livre-arbítrio e o seu importante papel em tudo o que acontece


na vida da criatura e, até mesmo do próprio processo de evolução espiritual do
homem, é preciso invocar os conhecimentos difundidos pelo alto espiritualismo,
por escolas de alto psiquismo, que ensinam não ser a vida lapidada em uma
única passagem pela Terra. Pelos seus fundamentos, a vida é um composto de
Força e Matéria, a primeira tendo evoluído como Força Inteligente até alcançar a
condição de Espírito. Nesta condição, então, encarna em corpo humano para
continuar o processo de evolução, neste estágio não mais das espécies, como
muito bem ensinou Darwin no seu famoso trabalho apresentado no livro A
evolução das espécies, mas como evolução do espírito na espécie humana,
último elo material nesta milenar cadeia evolutiva. Esta evolução se processa no
homem como ser encarnado, passando por numerosas vidas terrenas até atingir o
Espírito níveis de alto valor espiritual e moral, essencialmente puro, lúcido e
omnisciente das verdades fundamentais e das leis universais, quando não mais
volta a encarnar.

Neste contexto, o livre-arbítrio é uma faculdade do espírito, isto é, um dom do


espírito. É o poder de agir com liberdade plena, impulsionado pela vontade e
controlado pelo raciocínio. O processo que precede cada ação da criatura, se
passa de forma resumida, na seqüência que se descreve a seguir. As idéias e
estímulos que nos chegam do meio ambiente, isto é, de fora (em relação ao
indivíduo) são processadas e elaboradas em forma de pensamentos; estes, por
sua vez, são trabalhados pelo raciocínio que os depura até ficarem de acordo
com o que se deseja transmitir ou fazer. Ainda nesta fase, a criatura utiliza a
experiência previamente adquirida e que está disponível em sua memória. Em
seguida, entra em ação a vontade, que também é um atributo do espírito. Esta,
com sua maior ou menor força, dependendo do grau de evolução espiritual de
que se acha dotada a criatura, tem a função de colocar os pensamentos em ação,
usando a faculdade do livre-arbítrio como filtro secundário, isto é, como
sentinela do juízo, orientando a ação desejada para o bem ou para o mal. Neste
processo, o raciocínio age como filtro primário, já que, quando a criatura não
raciocina, os pensamentos são levados à ação sem uma depuração adequada
quanto aos efeitos que pode produzir, induzindo a pessoa a empregar o seu livre-
arbítrio de forma irracional e insensata, na maior parte das vezes causando
danos irreparáveis a terceiros e a si mesma.

A consciência do Bem e do Mal já a possuem as crianças, mesmo em tenra


idade, quando começam a aprender os primeiros ensinamentos dos pais e
preceptores, num processo de aquisição de conhecimentos morais que as
famílias bem formadas procuram, com amor, carinho, dedicação, abnegação e
espírito de renúncia transmitir aos seus descendentes. Aqui, os valores morais
falam mais alto e são os deveres de casa dos pais.

Conhecendo, portanto, o Bem e o Mal e a maneira de distinguir um do outro, o


livre-arbítrio oferece às criaturas duas opções e somente duas: ou empregá-lo
para o Bem ou dirigi-lo para o Mal. Quando o livre-arbítrio é dirigido para o
Bem, os benefícios recaem sobre quem os praticou e sobre aquele ou aqueles a
quem a ação foi dirigida. Caso contrário, quando orientado para o Mal, ele
reverte o mau resultado de sua ação para quem o praticou, além de prejudicar o
seu semelhante. O curso normal da evolução espiritual só se processa no
primeiro caso e é dele que devemos cuidar sempre em nossas ações. Isto é obvio
e intuitivo e vem em favor do preceito cristão que diz: ‘‘quem bem faz para si o
faz’‘.

Pensar elevado e com profundidade, de forma concisa, dedutiva, lógica e de


modo a abranger a essência do assunto, problema ou questão em análise,
raciocinando sobre a validade do pensamento e aplicando-o com a força de
vontade voltada para o Bem, é praticar o livre-arbítrio de forma inequivocamente
correta. Com atos assim, racionalmente pensados, gerados e aplicados
caminharemos mais rápidos e seguros para completar nossa trajetória evolutiva.

Se, ao contrário, titubearmos e fecharmos os nossos olhos para os nossos


problemas, não procurando resolvê-los de forma racional, tornar-nos-emos
propensos a mal usar nossa força de vontade quando formos transformar nossos
pensamentos em ações, disso resultando um mau uso do nosso livre-arbítrio,
com todas as suas funestas conseqüências. A baixa capacidade de raciocínio
encontrada em muitas pessoas, muitas vezes até com boa índole e dóceis no trato
e no relacionamento, pode resultar em miséria, desgraça e muito sofrimento,
tudo em decorrência do mau uso que vierem a fazer do livre-arbítrio.

Basta ter um pouco de percepção para compreender que a somatória das forças
de todas as ações do pensamento e do livre-arbítrio que ocorre em dado
momento, no mundo, tem intensos efeitos opostos de incalculável grandeza e
magnitude. De um lado, os efeitos gerados pelo mau uso do livre-arbítrio
direcionado para o Mal, trazem consigo enorme confusão de opiniões,
desentendimentos entre pessoas, no seio das famílias, entre povos e nações,
levando à incompreensão, ao ódio racial e à intolerância religiosa, à ira, à
violência, à insegurança, à perversidade, enfim, a dezenas de sentimentos
negativos, normalmente divulgados com realce pela mídia moderna. De outro
lado, os efeitos do bom uso do livre-arbítrio para o Bem, são de natureza
construtiva e altruística. Estes conduzem ao bem-estar das pessoas, à
confraternização entre povos e nações, aos sentimentos de amizade, amor, paz,
concórdia e harmonia, além de centenas de outros sentimentos nobres que levam
ao progresso material e espiritual da humanidade.

Do equilíbrio dessas forças ou do seu desequilíbrio resulta progresso ou


estagnação espiritual, avanço na evolução espiritual das criaturas ou retardo no
processo de ascensão do espírito. Por isso, é de transcendental importância
trabalhar e influir cada vez mais para que haja um desequilíbrio nestas forças,
mas em direção ao Bem e não para o Mal. Para conseguir este efeito é
necessário, portanto, que prevaleçam os pensamentos e as ações otimistas e
progressistas voltadas para o bem-estar geral da humanidade, nisso
desempenhando papel preponderante o livre-arbítrio.

Assim como a bondade é um dos mais nobres sentimentos da criatura, levando


ao bem-estar geral e demonstrando espiritualidade elevada, a perversidade é um
sentimento nocivo que leva à inferioridade espiritual, demonstrando que o
espírito ainda precisa vencer muitas etapas, trilhar muitos caminhos em
numerosas encarnações, para completar sua evolução na Terra. E, como esta não
se processa sem sofrimento, precisa a criatura desenvolver mecanismos próprios
de defesa, para que o esforço de progresso que precisa empreender encontre o
mínimo de obstáculos possíveis.

Assim procedendo, pode a criatura desvencilhar-se de suas fraquezas, de seus


maus hábitos e vícios e sempre dar um passo a mais em direção à Luz, à
Inteligência Universal e, assim alcançar sua evolução em prazo mais curto. Não
retardando a sua evolução, pode a criatura, no dia-a-dia de seu viver, em todas as
situações que tiver que passar, não contrair débitos morais e resgatar os que
trouxer do passado de uma forma mais proveitosa, lapidando e limpando a sua
consciência e enriquecendo os atributos morais que lhe são próprios.

Resumindo, o livre-arbítrio, junto com o pensamento, é o melhor instrumento de


que dispõe a criatura para aprender e ensinar as lições da vida com grandeza de
espírito, com humildade e muito amor, abreviando assim, o tempo necessário
para a plena e total evolução espiritual.
O pensamento
O pensamento é a mais importante faculdade espiritual do homem, sendo por
conseguinte uma atividade psíquica que abrange os fenômenos cognitivos,
distinguindo-se dos sentimentos e da vontade.

Embora este livro esteja dirigido ao estudo dos sentimentos, vamos abrir aqui
uma exceção para tratar do pensamento de forma resumida, dada a sua
importância no conjunto dos atributos essenciais: pensamento, raciocínio,
vontade e livre-arbítrio.

Pensar é criar e elaborar idéias, refletir e meditar sobre elas, sendo pois um
processo mental que se concentra nas idéias. O homem precisa pensar para
decidir sobre vários problemas que o afligem no seu dia-a-dia. É fato conhecido
que, quando deixamos de tomar certas decisões, os problemas se enredam cada
vez mais, o que também pode ocorrer quando tomamos decisões mal pensadas.
Portanto, as decisões podem resolver, agravar ou criar mais problemas. Por isso,
por indolência ou por medo, muitas pessoas deixam de tomar certas decisões,
adiando seus deveres, o que pode redundar em mais problemas logo à frente.
Assim, essa aparente comodidade pode complicar a vida da criatura.

A análise para tomada de decisões pode ser feita com base na própria
experiência, na experiência de outros ou na intuição que normalmente captamos
quando pensamos. Agir através de conselhos disparatados ou por imitação é
cômodo, mas quase sempre leva a criatura ao fracasso. Também, as dúvidas,
perplexidades e receios que ocorrem, quando a criatura se acha dominada por
ambições desmedidas, egoísmo, vaidades e tendências puramente instintivas
podem levar, e normalmente levam, a maus resultados. Daí, a necessidade de
pensar bem.

Nossa vida é feita de escolhas, as quais requerem prévio pensamento e


raciocínio. Se os pensamentos são incompletos, deficientes, sem base em um
raciocínio lógico, resultam problemas sobre problemas, os quais levam a criatura
a sentir-se angustiada ou estressada a ter receios e outras fraquezas. É, pois,
preciso bem pensar para orientar a maioria de nossos atos e conduzir nossa vida
adequada e proveitosamente.

Podemos admitir que o pensamento pode ser gerado emotivamente ou de forma


lógica. Vamos tratar de cada uma dessas formas de modo didático, embora a
combinação dessas formas seja mais comum no nosso cotidiano.

1. O PENSAMENTO EMOTIVO

O pensamento emotivo é de natureza instintiva, isto é, ele obedece aos impulsos


dos desejos. Já que somos todos sensíveis, temos emotividade, que é uma
espécie de sentinela dos sentidos, ela influi nos nossos processos de
comunicação utilizando idéias, ensinamentos e hábitos adquiridos. Influenciam,
também, os nossos pensamentos, nossos gostos, preconceitos, superstições,
receios, vaidade, egoísmo, tradição, companheiros e conselheiros de última hora.
A simpatia pode e normalmente desempenha papel importante neste tipo de
pensamento, e, freqüentemente ele nos leva a conclusões erradas, que quando
aplicadas, podem nos trazer grandes problemas, dificuldades e aborrecimentos.

Será sempre conveniente filtrar os impulsos do desejo, já que ele precede ao


pensamento. O nosso sistema nervoso recolhe as mensagens do mundo exterior,
dada a nossa natural emotividade. Por isso, uma pessoa nervosa, mais sensitiva,
mais egoísta e mais preconceituosa duvida e teme, porque sofre mais as
influências do meio e do pensamento de terceiros, apresentando, de regra, um
pensamento confuso e sujeito a toda sorte de problemas nas escolhas e no
embate das idéias com seus semelhantes. As emoções dominam toda a sua
intenção e prejudicam o raciocínio e os resultados finais. A criatura que só
enxerga e pratica pensamentos emotivos, imagina que tudo e todos estão contra
ela, julgando-se perseguida, vítima, princípio e fim de tudo. Enfim, imagina-se
isolada de todos os afetos.

As principais emoções que dirigem o pensamento emotivo são a autocompaixão


e o amor-próprio. Estas forças são devastadoras, deixando a criatura sempre
pronta a reagir com ira e vingança, quando atingida em seu amor-próprio,
podendo cometer danos irreparáveis.

É preciso, ainda, a criatura esforçar-se para não se deixar aprisionar dentro do


círculo de suas paixões, notadamente pelo egoísmo, o que poderá levá-la a
pensar negativa e deprimentemente, convertendo seus pensamentos e as ações
que dele derivam em erros irreparáveis. Isto porque o pensamento emotivo
predispõe a enganos e falsa apreensão da realidade, sendo normalmente falso e
perverso. O uso freqüente do pensamento emotivo é sinal de baixo grau de
espiritualidade, já que não entram em ação a imparcialidade, a lógica e a razão.
As emoções devem ser consideradas como auxiliares da razão, competindo a
esta considerar e analisar os méritos das idéias e pôr em prática escolhas
inteligentes.

2. O PENSAMENTO INTELECTUAL

Para ver com maior clareza, de modo a penetrar o âmago das coisas e pessoas, é
necessário pensar no sentido de elaborar idéias inteligentes, lógicas, justas e
adequadas. É preciso colocar a inteligência e a razão em ação, a fim de poder
medir, pesar, julgar, comparar e penetrar no significado e nas conseqüências que
a ação do pensamento ensejará. Só assim, pode-se chegar à verdade ou próximo
dela, e agir com justiça.

O pensamento intelectual permite ver as coisas através da realidade e de forma


mais equilibrada e eqüitativa, levando a conclusões sábias. É ele que permite
evoluir e alçar vôos mais altos, além da rotina, da inconsciência, da tradição e
dos hábitos arraigados. Seu fundamento é a razão, o que leva a criatura a viver
de forma mais digna e elevada.

Não é difícil intuir que a lógica da razão se processa pela análise, enquanto que a
lógica dos sentimentos, pela síntese. Pode-se afirmar que a lógica dos
sentimentos é mais intuitiva e menos racional, derivando diretamente do grau de
espiritualidade da criatura. Assim, a afetividade opera quase sempre
inconscientemente, sendo puramente afetiva e, portanto, pobre em elementos
intelectuais. Vemos assim que, enquanto o pensamento emotivo vibra com o
calor da emoção, o pensamento intelectual é uma vibração fundada na lógica e
na razão. E, contra uma boa lógica não há argumentos válidos.

Quem pensa intelectualmente usa todas as suas forças mentais e espirituais e


coloca o seu livre-arbítrio em favor da verdade, é verdadeiramente livre no
pensar e agir, sabe arcar com as conseqüências que, dessa forma, só podem
proporcionar bem-estar no relacionamento com seus semelhantes. Será sempre
uma pessoa admirada e respeitada pelas suas boas maneiras e competência.

Este é o pensamento cultivado pelas pessoas que, ainda que simples, são dotadas
de maior espiritualidade, e também, pelos que possuem grande sensibilidade
como os grandes cientistas, escultores, artistas clássicos, os grandes
reformadores da sociedade, enfim, por aqueles que impulsionam o progresso em
todos os campos da atividade humana. Seu trabalho é consciente, reservado e
prudente; consideram as coisas conforme a verdade e seus méritos; dão
preferência a tudo o que for superior, qualquer que seja a sua origem; levam em
conta o valor das idéias, independentemente das instituições a que pertencem.
Esta é a lógica da razão pura a que tanto se dedicou, no século passado, o
filósofo alemão Immanuel Kant.

Podemos afirmar que há três meios de afastar a ignorância e alcançar maior


evolução: pelo estudo, pelo raciocínio e pelo sofrimento, sendo que as criaturas
inteligentes e espiritualizadas devem optar pelos dois primeiros. Só as que
iluminam o seu caminho com a luz de seu pensamento bem fundamentado é que
podem alcançar o conhecimento da verdade; usar os pensamentos alheios é
cercear os seus próprios. É preciso colocar o poder da vontade, aliado às idéias,
para gerar pensamentos próprios, que tenham o seu conteúdo de lógica, razão e
verdade para serem verdadeiramente luminosos.

Para que possamos sempre usar os nossos pensamentos com real proveito,
devemos fazer uso de nossa força mental em primeiro plano, complementada por
emoções positivas e nobres. Precisamos fazer bom uso do livre-arbítrio, ter
suficiente força de vontade para evitar o erro e, sobretudo, que as ações dele
decorrentes tenham real valor moral e ético. Assim procedendo, os nossos
pensamentos serão nossos melhores guias para o bom viver.
A vontade
A vontade é uma das principais faculdades do espírito, que tem a finalidade de
pôr em ação tudo aquilo que pensamos ou que sentimos, conforme ditado pela
razão ou refletido por um impulso. Se estiver baseada no impulso de um
sentimento, ela incita alguém a fazer acontecer um desejo, uma aspiração ou
anseio. Ao contrário, se firmar-se na razão, ela nos leva a deliberar, fazer
escolhas, decidir e por em prática aquilo que foi idealizado mentalmente.
Segundo um renomado filósofo alemão, a vontade é o desejo unificado, conceito
um tanto incompleto por abstrair-se da razão. De qualquer forma, uma vontade
precisa sempre ser levada a agir para produzir efeitos; do contrário, o que temos
não passa de um desejo quimérico. Seus objetivos têm que ser bem definidos
pelo raciocínio, para que a ação seja executada com proveito. A vontade pode ser
orientada para o Bem ou para o Mal; aqui, estamos interessados apenas no
primeiro caso.

É preciso não confundir a vontade com o desejo: enquanto este se acha sempre
associado aos estímulos dos sentimentos, às emoções e às paixões, a vontade
trabalha as idéias nascidas do pensamento criador da criatura, da razão e da
lógica. A vontade age como se fosse um poderoso dínamo que impulsiona
nossos atos para a sua realização. O desejo pede pela sua consumação, a vontade
realiza as idéias e até se opõe aos desejos quando estes se tornam
inconvenientes, perversos e maldosos, comandando o nosso livre-arbítrio.

A vontade será sempre vencedora e fácil de ser realizada quando as idéias e


pensamentos que a geraram estão amparados nos bons ideais ou em decisões
lógicas, voltadas para o Bem.

Planos e projetos são realizados sem vacilação e com êxito, alcançando os


resultados esperados quando amparados nos pensamentos otimistas, na
dignidade e demais valores do caráter humano. Nesses casos, a força de vontade
não encontra obstáculos de qualquer espécie. Não importa o grau de instrução, o
que importa é o ânimo, a força criadora de que a criatura é dotada, desde que o
que se tem a realizar alcance objetivos elevados e nobres. O trabalho, seja ele
manual ou mental quando dirigido para o bem, feito com prazer, é uma poderosa
alavanca que transforma o pensamento e a vontade em praticamente tudo aquilo
que o homem criou através dos tempos, objetivando seu bem-estar material e
espiritual.
De qualquer forma, o segredo de uma vontade otimista e eficiente está em
descobrir o que há a fazer, encontrar o verdadeiro impulso que a move. Para isso,
é preciso considerar como melhorar o nosso modo de proceder, verificar as
condições especiais a alcançar, quais as modificações pessoais necessárias, em
que e onde colocar a ênfase da ação, que atividades mais nos interessam e quais
os efeitos de nossas ações. Os que possuem uma vontade mais poderosa sabem o
que querem e o que fazer, não ficam a espera da sorte, põem mãos à obra e
realizam o que têm que realizar.

Uma vez fixado o que há a fazer, determine um programa de ação; coordene suas
atividades com perseverança em seu trabalho e esforço. Não use a lei do menor
esforço e, tampouco, não desperdice as suas energias. Não tente enganar a si
mesmo, pensando que fazendo o menos conseguirá o mais, pois não poderemos
burlar as leis do progresso, da evolução e da harmonia, em que o mais atrai o
mais e o menos atrai o menos. Portanto, a quantidade do esforço reforça o
resultado.

Qualquer trabalho é penoso e as realizações se tornam difíceis quando só vemos


o seu aspecto material. Procure ver o transcendental, as compensações de prazer
que vêm das grandes realizações, além do seu valor material. Não trabalhe
somente por obrigação, mas olhe o trabalho como instrumento propulsor do seu
progresso material e espiritual. A vontade posta assim em ação será sempre
vitoriosa. Habitue-se a não deixar para depois os seus compromissos e
obrigações, já que assim fazendo estará mostrando ter força de vontade e que
sabe controlá-la.

Procure descobrir em si mesmo e no ambiente que o cerca motivos de renovada


alegria e entusiasmo. Olhe de frente para o futuro. Não esmoreça nunca e, se
houver fracassos e falhas tire sempre delas uma proveitosa lição. Dessa forma, a
criatura ganha cada vez mais confiança em si mesma e se conscientiza da força
que dirige sua vontade e seus atos e assim poderá levar de vencida todas as suas
aspirações.

A inspiração ou intuição, a persistência e a confiança são poderosos suportes


para obter-se da vontade em ação os resultados sempre positivos. Não adianta
acumular vontade se não a põe em prática; ela deve ser estimulada quando for a
ocasião de aplicá-la, senão ela se dissipa, perde-se a oportunidade. Quanto mais
você a puser em prática, maior será o seu poder. Tenha consciência desse poder e
saiba como aplicá-lo, sempre para o bem. A vontade não é como o dinheiro que
se presta à acumulação. Para fortalecer a vontade, é necessário apenas aplicá-la,
mas não retê-la ou tentar acumulá-la. Lembre-se sempre: perseverança,
persistência e confiança em si mesmo reforçam o poder da vontade.

Finalmente, uma consideração que se faz necessária. A maioria das pessoas


deixa para depois ou para outro dia o que deveria ser feito hoje ou agora mesmo.
Nada enfraquece mais a vontade do que adiar seus planos e programas.
Complementando este ponto fraco, está, também, a tarefa que é deixada
incompleta, por terminar. Portanto, termine aquilo que começou com satisfação e
prazer e sua vontade será revigorada. Obviamente, se no decorrer de uma
empreitada puder avaliar, com alto grau de certeza, que não vai haver bom
resultado em terminá-la, então e só então, aborte-a. Aí sim, estará justificada a
sua suspensão, aborto ou cancelamento.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

Sumário
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ABREU, José Marques Casemiro de. Poesia. Rio de Janeiro: Agir Editora, 1979.
5ª ed.

CARNEGIE, Dale. Como fazer amigos e influenciar pessoas. Editora Nacional.


17ª ed., 1970.

CARNEGIE, Dale. Como evitar preocupações e começar a viver. Editora


Nacional. 17ª ed., 1972.

CASTELLO BRANCO, Camilo. Poesias dispersas. Porto, Portugal: Tipografia


Particular de Arthur Duarte e Souza Reys. 1ª ed., 1913, ex. 26. Real Gabinete
Português de Leitura, Rio de Janeiro, Brasil.

DURANDIN, Guy. Os fundamentos da mentira. São Paulo: Editora Abril -


citado pela Revista Cláudia, nº 319, abril 1988, p. 154, em artigo sob o título ‘‘É
pecado mentir?’‘

INGENIEROS, José. O homem medíocre. Rio de Janeiro: Liv. Para Todos, 1953.
9ª ed.

KEHL, Renato. Psicologia da personalidade. Rio de Janeiro: Francisco Alves,


1951. 5ª ed.

KRISHNAMURTI, J. Reflexões sobre a vida. São Paulo: Editora Cultrix, 1972.


2ª ed.

LA FUERZA, N. D. Segredos práticos para vencer na vida. Ed. Universitária.


s.d., 2ª ed.

MARTINS, José da Silva. Sabedoria e Felicidade,São Paulo: Martin


Claret,1990, 3ª ed.

MARTINS, José da Silva. Coletânea de pensamentos. São Paulo: Martin Claret,


s.d. 2ª ed.

PÂNDU, Pandiá. Dicionário de pensamentos da língua portuguesa. São Paulo:


Edições Ouro, 1962.
PASSONI, Célia A. N. Sonetos de Camões. São Paulo: Editora Núcleo. s.d., 1ª
ed.

PAUCHET, Victor. O caminho da felicidade. Rio de Janeiro: Civilização


Brasileira, 1936.

Sumário
Reflexões sobre os sentimentos - Caruso Samel

Desperta nos leitores a compreensão do papel dos sentimentos no


desenvolvimento do caráter, através do aprimoramento das virtudes. 3ª edição -
2003.

Endereço do autor:
e-mail: csamel@uol.com.br
Racionalismo Cristão: Um novo conceito do Universo e da Vida

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