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ISSN 1676-8280

Obstetrícia – parte 1

Editores convidados
Denise L. M. Monteiro
Alexandre J. B. Trajano

Volume 13, número 3, julho/setembro 2014


Rio de Janeiro
CATALOGAÇÃO NA FONTE
UERJ/REDE SIRIUS/CBA

Revista do Hospital Universitário Pedro Ernesto. – V. 1, n. 1 (jan.-


jun.2002) . – Rio de Janeiro: O Hospital, 2002-
v. : il. (algumas color.)

Trimestral.
Semestral 2002-2010.
Disponível em: http://revista.hupe.uerj.br
ISSN (on-line) 1983-2567
ISSN (impressa) 1676-8280

1. Ciências médicas - Periódicos. 2. Saúde - Periódicos. I. Hospital
Universitário Pedro Ernesto.

CDU 61
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Editores convidados
Denise L. M. Monteiro. Universidade do Estado do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro, RJ, Brasil.
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Fernando Jones
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Sumário

Editorial

Tributo a Peter Medawar


Mauricio Younes-Ibrahim....................................................................................................... 7

Apresentação

Denise L. M. Monteiro; Alexandre J. B. Trajano......................................................... 9

Artigos

1. Complicações fetais em gestações tardias


Thayro Van Der Maas do Bem; Thiago S. Sampaio; Denise L. M. Monteiro;
Danielle B. S. Barmpas......................................................................................................... 11

2. Gestação e obesidade: um problema emergente


João Regis I. Carneiro; Fernanda O. Braga; Carolina A. Cabizuca;
Raquel C. Abi-Abib; Roberta A. Cobas; Marília B. Gomes...........................................17

3. Fatores angiogênicos e antiangiogênicos na fisiopatologia da pré-


eclâmpsia e seu uso na prática obstétrica atual
Guilherme R. de Jesús; Nilson R. de Jesús; Flávia C. dos Santos; Camila S. Oliveira;
Roger A. Levy; Luís Cristóvão de M. S. Pôrto; Evandro M. Klumb......................... 25

4. Restrição de crescimento intrauterino


Dailson D. S. Pereira; Alessandra L. C. Magalhães; Nilson R. de Jesús;
Alexandre J. B. Trajano....................................................................................................... 32

5. Diabetes na gestação
Raquel C. Abi-Abib; Carolina A. Cabizuca; João Regis I. Carneiro;
Fernanda O. Braga; Roberta A. Cobas; Marília B. Gomes; Guilherme R. de Jesús;
Fátima R. D. Miranda.......................................................................................................... 40
6. Estimativa do peso fetal por meio de ultrassonografia
Alessandra L. C. Magalhães; Dailson D. S. Pereira; Nilson R. de Jesús;
Alexandre J. B. Trajano....................................................................................................... 48

7. Doença trofoblástica gestacional – atualização


Antônio Braga; Bruna Obeica; Valéria Moraes; Evelise P. da Silva;
Joffre Amim-Junior; Jorge Rezende-Filho....................................................................... 54

8. Síndrome alcoólica fetal – revisão sistematizada


Rogério A. Santana; Leonardo F. J. L. Almeida; Denise L. M. Monteiro.................. 61

9. Câncer de mama na gravidez: diagnóstico e tratamento


Denise L. M. Monteiro; Daniela C. S. Menezes; Camila L. Nunes;
Clara A. Antunes; Erica M. de Almeida; Alexandre J. B. Trajano..............................67

10. Hipertireoidismo na gestação


Bárbara B. G. R. Bártholo; Denise L. M. Monteiro; Alexandre J. B. Trajano..........72

11. Infecção pelo HTLV-1/2 em gestantes brasileiras


Danielle B. Sodré Barmpas; Denise L. M. Monteiro; Stella R. Taquette;
Alexandre J. B. Trajano; Roberta M. Raupp; Fátima R. D. Miranda;
Nadia C. P. Rodrigues.......................................................................................................... 80

12. Sífilis na gravidez


Alessandra B. A. Damasceno; Denise L. M. Monteiro; Luiza B. Rodrigues;
Danielle B. S. Barmpas; Luciane R. P. Cerqueira; Alexandre J. B. Trajano............ 88

Normas da publicação.......................................................................................... 95
Editorial

família Medawar morava na Rua Domingos Fer-


reira, em Copacabana, e tinha uma residência de
verão em Petrópolis. Em 1915, conforme registro
no cartório local, Peter (Pedro) nasceu em Petró-
polis, “cidade de Pedro”, do Imperador Pedro II,
e foi também registrado no consulado britânico
do Rio de Janeiro. A primeira infância de Peter
se desenvolveu entre as duas cidades. Nas suas
memórias, o pesquisador sempre se referiu com
o carinho à doméstica Dina, que cuidava dele e
dos irmãos, preparando pratos da culinária local,
com destaque na preferência das crianças para o
arroz, o feijão e a farofa. Na adolescência, Peter foi
“The human mind treats a new idea the way the body
treats a strange protein: it rejects it.” estudar na Inglaterra onde desde cedo se destacou
Peter Brian Medawar nas ciências biológicas. Na época da maioridade,
para não perder a bolsa de estudos que recebera
do Governo Britânico, o jovem solicitou a inter-
Tributo a Peter Medawar venção de seu padrinho e então Ministro da Ae-
ronáutica, Salgado Filho, para obter a isenção do
Em 28 de fevereiro de 2015, assistiremos ao serviço militar obrigatório. O Ministro da Guerra
centenário de nascimento de Peter Brian Me- do governo Getúlio Vargas, general Eurico Gaspar
dawar, cientista agraciado com o Prêmio Nobel de Dutra, não atendeu o pleito e informou que sem o
Medicina em 1960. Dentre as muitas personalida- serviço militar o jovem perderia a nacionalidade
des que receberam esta honraria, o aniversariante brasileira, restando ao petropolitano apenas a
tem uma ligação peculiar com o Brasil. Peter Me- cidadania britânica.
dawar nasceu em Petrópolis, no estado do Rio de Com destacado brilhantismo, Peter graduou-
Janeiro, e, com base no ius soli (direito do solo), se em zoologia na Universidade de Oxford. Em
seria mais um cidadão brasileiro. Por questões seguida, trabalhou na School of Pathology com Sir
circunstanciais, a sua cidadania teria sido cassada Howard Walter Florey (Prêmio Nobel de Medicina
e a nacionalidade brasileira nunca foi vinculada ao 1945), onde se dedicou às pesquisas biológicas
laureado, ilustrando um episódio curioso ocorrido aplicadas à medicina. Em 1937, casou-se com Jean
no início do século XX, no Brasil. Seu pai, Name Shinglewood Taylor, com quem teve quatro filhos:
Medawar, era um libanês descendente de fenícios Charles, Alexander, Caroline e Louise.
que imigrou para a Inglaterra e tornou-se sócio As pesquisas iniciais de Peter Medawar foram
majoritário da Dental Manufacture and Company, dedicadas à cultura de células e à regeneração
empresa que fabricava e revendia instrumentos de nervos periféricos, com a aplicação de análise
para dentistas e ópticos. Em 1913, já casado com matemática na morfologia do desenvolvimento
a inglesa Edith Muriel Dowling, foi para o Rio celular. Durante a Segunda Guerra Mundial, Me-
de Janeiro instalar uma filial, a Óptica Inglesa. A dawar estudou os enxertos de pele e desenvolveu

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a teoria da imunidade dos transplantes, eviden- (1982) e também fez uma autobiografia, publicada
ciando os mecanismos da tolerância imunológica em 1986, um ano antes de seu falecimento, cujo
adquirida, temas aos quais ele se dedicou ao longo título destaca o contraste entre a sua limitação
de sua vida. Em 1960, recebeu o prêmio Nobel de física pela doença e a lucidez preservada do autor:
Fisiologia e Medicina, juntamente com o austra- Memoir of a Thinking Radish (Memórias de um
liano Frank Burnet, por estabelecer as bases da Rabanete Pensante, tradução livre).
tolerância imunológica para a criação do soro Como habitualmente os países homenageiam
antilinfocitário, que modificou decisivamente a as grandes personalidades? É comum dar seus
história da rejeição pós-transplante de órgãos. nomes a ruas, praças, projetos, escolas, uni-
Em 1962, o cientista foi nomeado chefe do maior versidades, laboratórios etc. e imortalizar esses
laboratório de investigação médica do Reino nomes nas comunidades. Como os conterrâneos
Unido, o National Institute for Medical Research de personalidades mundiais podem homenagear
e em 1965 recebeu o título de Sir, concedido pela estes expoentes? Guardando as suas memórias,
Rainha Elizabeth II. Foi também fundador e pri- através de livros, museus, documentários ou bi-
meiro presidente da Sociedade Internacional de bliotecas, e assim manterem vivos os feitos dos
Transplantes. grandes homens e mulheres nas novas gerações.
Sua brilhante carreira de pesquisa foi inter- Cem anos se passaram e não se tem notícia de
rompida precocemente em 1969, quando teve um alguma homenagem que tenha ocorrido no Bra-
acidente vascular cerebral. Além de literatura sil, nem durante a sua vida nem em memória de
técnica abundante, Medawar escreveu livros que Peter Brian Medawar, compatível com a estatura
até hoje não foram editados em português: The do homenageado. Existe, porém, a esperança
Uniqueness of the Individual (1957), The Future de que um resgate histórico possa minimizar o
of Man (1960), The Art of the Soluble (1967), The débito nacional para com este grande cientista,
Hope of Progress (1972), Life Science (1977), Ad- reescrevendo um desfecho mais justo para este
vice to a Young Scientist (1979), Pluto’s Republic capítulo nebuloso na história do Brasil.

Mauricio Younes-Ibrahim
Departamento de Medicina Interna.
Faculdade de Ciências Médicas.
Universidade do Estado do Rio de Janeiro.
Rio de Janeiro, RJ, Brasil.

8 revista.hupe.uerj.br
Apresentação

Conceber, gestar, parir e amamentar são “Gestação e obesidade”.


condições normais e desejadas pela maioria das Entre as doenças neoplásicas, são discutidos
mulheres e, na maior parte das vezes, evoluem o “Câncer de mama na gravidez”, sobre a doença
sem qualquer comprometimento da saúde da maligna que mais compromete a saúde da mulher,
mulher ou do concepto. Entretanto, a intercor- e a “Doença trofoblástica gestacional”, doença
rência de doenças, assim como complicações própria da gravidez, que apresenta formas be-
próprias da gravidez, podem levar às condições nignas e malignas.
que são genericamente denominadas gestações Uma importante questão de natureza com-
de alto risco. Nesta edição da Revista HUPE são portamental é apresentada no capítulo “Síndrome
apresentados 12 artigos de revisão e atualização alcoólica fetal”, que aborda a mais importante
em que abordamos diversos aspectos da gestação doença congênita capaz de ser prevenida.
de alto risco. No capítulo “Fatores angiogênicos e antian-
Na discussão dessas doenças, é importante giogênicos”, é discutida a importância destes
atentar para a relevância da condição de base, fatores na predição e diagnóstico diferencial da
a sua interação com a gravidez (interferência pré-eclâmpsia, a mais importante complicação
da gravidez na evolução da doença e da doença clínica da gravidez.
na evolução da gravidez) e as peculiaridades e Qualquer que seja a condição de risco pre-
especificidades do tratamento durante o período sente, além da avaliação do comprometimento
gestacional. do bem-estar materno, é importante investigar a
No que tange às doenças infecciosas, é discu- vitalidade fetal. Nesse sentido, são apresentados
tida a associação de “Sífilis e gravidez”, circuns- três capítulos: “Complicações fetais em gestações
tância que, a despeito da simplicidade e efetivida- tardias”, “Restrição de crescimento intrauterino”
de dos recursos diagnósticos e terapêuticos, ainda e “Estimativa do peso fetal por meio da ultrasso-
é um grande problema de saúde pública no Brasil. nografia”, que discutem, em circunstâncias gerais
No capítulo “Infecção pelo HTLV-1/2 em gestantes e específicas, recursos propedêuticos que avaliam
brasileiras”, é apresentada uma condição ainda o bem-estar fetal.
pouco conhecida em grande parte dos sistemas Por fim, agradecemos a todos os autores
de saúde no Brasil. e colaboradores, acreditando que este volume
As grandes alterações hormonais verificadas da revista HUPE possa ser útil para obstetras e
na gravidez interagem com condições endocri- clínicos que se dedicam à gravidez de alto risco e
nológicas, ilustradas nos capítulos “Diabetes à garantia das condições de saúde das gestantes
na gestação”, “Hipertireoidismo na gestação” e e seus filhos.

Denise L. M. Monteiro Alexandre J. B. Trajano


Editora convidada Editor convidado
Departamento de Ginecologia e Obstetrícia. Departamento de Ginecologia e Obstetrícia.
Centro Universitário Serra dos Órgãos (UNIFESO). Faculdade de Ciências Médicas.
Teresópolis, RJ, Brasil. Universidade do Estado do Rio de Janeiro.
Departamento de Ginecologia e Obstetrícia. Rio de Janeiro, RJ, Brasil.
Faculdade de Ciências Médicas. Departamento de Ginecologia e Obstetrícia.
Universidade do Estado do Rio de Janeiro. Faculdade de Medicina. Universidade Unigranrio.
Rio de Janeiro, RJ, Brasil. Rio de Janeiro, RJ, Brasil.

Revista HUPE, Rio de Janeiro, 2014;13(3):9


doi: 10.12957/rhupe.2014.12122 v.13, n. 3, jul/set 2014 9
Complicações fetais em gestações tardias
Fetal complications in late pregnancies

Complicaciones fetales en gestaciones tardias


Thayro Van Der Maas do Bem, Thiago S. Sampaio,
Denise L. M. Monteiro,* Danielle B. S. Barmpas

Resumo
Em virtude de mudanças sociais e no estilo de vida, a incidência de gestação tardia, em mulheres com mais
de 35 anos, aumentou significativamente nas últimas décadas. Tal aumento contribuiu para taxas mais altas
de complicações obstétricas e fetais. Foi realizada uma revisão crítica da literatura com o objetivo de avaliar a
evidência disponível sobre a frequência das principais complicações gestacionais em gestações tardias, assim
como possíveis explicações e controvérsias sobre o tema. A busca detalhada da literatura foi realizada incluindo
as bases de dados: Medline (pelo PubMed), SciELO e LILACS. Os desfechos gestacionais e perinatais avaliados
foram: idade gestacional no parto, baixo peso ao nascer (BPN < 2,5 kg), índice de Apgar < 7 no 1º e no 5º minutos,
aumento na incidência de cesarianas e natimortalidade. Os resultados obtidos foram: idade gestacional no parto
(< 37 sem = de 3,4 a 51,4%; > 42 sem = de 0,4 a 6,9%), natimortalidade (de zero a 3,2%), BPN (de zero a 26,8%),
Apgar < 7 (1º minuto = de 5,6 a 22,9%; 5º minuto = de 0,9 a 5%), taxa de cesarianas (de 31,9 a 72,4%). O impacto
relativo ao aumento da idade materna e doenças crônicas nos desfechos gestacionais requer mais pesquisas.
Profissionais de saúde devem estar em alerta para as particularidades das gestações tardias a fim de identificar
potenciais complicações a tempo. Uma equipe multiprofissional especializada deve estar disponível para garantir
as necessidades específicas em termos de exames e internações. Desta forma, as gestações tardias podem ser
conduzidas de maneira mais segura, reduzindo taxas de complicações e desfechos adversos maternos e perinatais.
Descritores: Idade materna; Lactente; Baixo peso ao nascer; Índice de Apgar; Natimortalidade; Complicações
na gravidez.

Abstract
In view of social and lifestyle changes, the incidence of advanced maternal age pregnancy, i.e. in women over 35
years, has markedly increased in recent decades. Such surge contributed to higher rates of obstetric and fetal
complications. A critical review of the literature was conducted with the objective of assessing the available
evidence on the frequency of the main pregnancy complications in advanced maternal age as well as possible
explanations and controversies about the matter. A detailed search of medical literature was performed including
the databases: Medline (via PubMed), SciELO and LILACS. Gestational and perinatal outcomes assessed were:
gestational age at delivery, low birth weight (LBW < 2.5 kg), Apgar score < 7 at 1 and 5 minutes, increase in the
incidence of cesarean sections and stillbirth. The results retrieved were: gestational age (< 37 weeks = 3.4 to 51.4%;
> 42 weeks = 0.4 to 6.9%), stillbirth (0 to 3.2%), LBW (0 to 26.8%), Apgar score < 7 (1st min = 5.6 to 22.9; 5th min = 0.9
to 5%), cesarean section (31.9 to 72.4%). The relative impact of maternal ageing and chronic diseases on pregnancy
outcomes requires further research. Health professionals must be alert to the peculiarities of advanced maternal
age pregnancy in order to timely identify potential complications. A specialized multiprofessional team should
be available to warrant specific needs regarding exams and admission. Thus, advanced maternal age pregnancy
can be more safely managed, reducing the rate of complications and maternal and perinatal adverse outcomes.
Keywords: Maternal age; Infant; Low birth weight; Apgar score; Stillbirth; Pregnancy complications.

*
Endereço para correspondência:
Núcleo Perinatal, HUPE, UERJ.
Revista HUPE, Rio de Janeiro, 2014;13(3):11-16 Av. Prof. Manoel de Abreu, 500, 1º andar,
Recebido: 24/04/2014 | Revisado: 02/07/2014 | Aprovado: 28/07/2014 Rio de Janeiro, RJ, Brasil. CEP: 20550-170.
doi: 10.12957/rhupe.2014.12123 E-mail: denimonteiro2@yahoo.com.br

v.13, n. 3, jul/set 2014 11


Revista HUPE, Rio de Janeiro, 2014;13(3):11-16

Resumen
El objetivo de este estudio es revisar la literatura en busca de informaciones que permitan identificar las
principales complicaciones fetales de las gestaciones tardías (edad materna superior a 35 años de edad), filtrar
las eventuales pruebas de su ocurrencia y/o confrontar supuestas divergencias en la prevalencia. Se realizó
una amplia investigación en la literatura médica buscando identificar y extraer informaciones de la literatura
nacional e internacional por medio de las siguientes bases de datos: Medline (por medio del PubMed), Scielo y
LILACS. La incidencia del embarazo tardío viene aumentando significativamente en las últimas décadas en todo
el mundo. Ese incremento concurre con altas tasas de complicaciones maternas y fetales. La mayor frecuencia
de enfermedades adquiridas con la edad como artritis, hipertensión arterial crónica, diabetes, depresión, cancer
y enfermedades cardíacas contribuye al mayor riesgo obstétrico, acarreando repercusiones fetales. Para expresar
las complicaciones fetales fueron definidas las siguientes variables de estudio: edad gestacional, bajo peso al
nacer, Apgar < 7 en el 1° y 5° minutos, aumento del número de cesáreas y mortalidad al nacer. El estudio mostró
los siguientes resultados: edad gestacional ( < 37 semanas = 3,4 a 51,4 %; > 42 semanas = 0,4 a 6,9%), mortalidad
al nacer (cero a 3,2%), BPN (cero a 26,8%), Apgar < 7 (1° minuto= 5,6 a 22,9%; 5° minuto= 0,9 a 5%), tasa de
cesárea (31,9 a 72,4%). La relativa contribución del aumento de la edad materna y de las enfermedades crónicas
en los resultados gestacionales necesita de más estudios. Los profesionales de salud deben estar atentos en las
características del embarazo en esta fase de la vida, apuntando a identificar precozmente posibles complicaciones,
debiendo contar con servicio especializado que garantice la tramitación para la internación y realización de
exámenes específicos en los casos necesarios. De esta manera, esta gestación podrá ser acompañada con más
seguridad, reduciendo la posibilidad de complicaciones para el binomio materno-fetal.
Palabras clave: Edad materna; Lactente; Bajo peso al nacer; Índice de Apgar; Mortalidad al nacer; Complicaciones
gestacionales.

Introdução baixa vitalidade e baixo peso do recém-nascido.


A gravidez tardia também se associa a compli-
A ocorrência de gravidez em mulheres com cações fetais como: anomalias cromossômicas,
idade superior a 35 anos é denominada gravidez sofrimento fetal, internação em UTI, restrição
tardia. Sua frequência vem aumentando conside- do crescimento fetal, além de taxa de perda fetal
ravelmente, fato relatado em estudos brasileiros tardia inexplicável.1-3,8,9
e internacionais.1-5 O maior risco obstétrico em gestantes de
No Brasil, entre 2003 e 2012, o número de idade avançada pode ser decorrente da frequência
mulheres que engravidaram entre os 40 e 44 aumentada de doenças crônicas, especialmente
anos passou de 53.016 para 62.371, traduzindo hipertensão arterial, diabetes mellitus e mioma
crescimento de 17,6%. A gravidez entre 35 e 39 uterino.10,11 No entanto, como estas doenças po-
anos aumentou 26,3% neste período (201.077 para dem constituir-se em variáveis de confusão, a
254.011 gestações).6 avaliação de riscos associados à idade materna
De 1970 a 2000, nos Estados Unidos, o nasci- isoladamente pode ser prejudicada.5,12 Os resulta-
mento de filhos de mulheres com 35 anos ou mais dos adversos podem, em parte, estar relacionados
subiu de 5% para 13%.7 Em 2009, atingiu 14,2%, ao aumento da morbidade e complicações obs-
com crescimento de 3% em idades de 40 a 44 anos, tétricas durante a gravidez e o parto.3 Os riscos
demonstrando tendência que se repete em outras são elevados mesmo para uma mulher saudável,
nações, sobretudo nos países industrializados.7,8 sobretudo em relação à prematuridade e ao au-
Os motivos para postergar a gravidez variam, mento na frequência de cesárea.5,12-14
incluindo o desejo das mulheres de investir na O número crescente de gravidezes em idade
carreira educacional e profissional, adiar o casa- tardia justifica a investigação do prejuízo possível
mento, casar de novo, ampla disponibilidade de ao feto e suas consequências no desenvolvimen-
métodos anticoncepcionais e problemas relacio- to. Sendo assim, esse trabalho tem o objetivo de
nados à infertilidade.1 O fato é que em comparação revisar a literatura para identificar as principais
com mulheres mais jovens, aquelas com mais de complicações fetais das gestações tardias, filtrar as
35 anos experimentam mais abortos espontâneos eventuais justificativas de seu acontecimento e/ou
ou induzidos, maior risco de morte perinatal, de confrontar supostas divergências de prevalência.

12 revista.hupe.uerj.br
Complicações fetais em gestações tardias

Quadro 1. Critérios de inclusão e exclusão na revisão crítica sobre complicações fetais de gestações em idade
tardia.
Critérios de inclusão: Critérios de exclusão:

1. Foco em complicações fetais de gestantes com idade


1. Complicações maternas e gemelaridade;
entre 35 e 50 anos;

2. Estudo limitado a gestações espontâneas; 2. Estudos sobre gestação por fertilização assistida;

3. Estudos que relacionam complicações fetais com idade


3. Estudos em idiomas de difícil compreensão;
avançada;

4. Estudos em Português, Inglês, Espanhol e Francês. 4. Estudos anteriores a 2008.

Quadro 2. Variáveis da revisão crítica. Resultados


Variáveis estabelecidas ao parâmetro de prejuízo ao feto:
Foram utilizados 11 estudos que incluíam as
A – baixo peso ao nascer (BPN)
variáveis de interesse para se proceder a análise
B – idade gestacional ao nascer dos resultados. A descrição do desenho de cada
C – tipo de parto um deles, assim como os resultados da idade ges-
tacional, natimortalidade, baixo peso ao nascer,
D – Apgar no 1º e 5º minuto
índice de Apgar < 7 no primeiro e quinto minuto
E – natimortalidade e taxa de cesárea, encontra-se no quadro 1.
A prematuridade (IG < 37 semanas) foi ava-
Métodos liada em todos os 11 estudos, variando entre 3,4 e
51,4%, enquanto a IG > 42 semanas foi analisada
Foi realizada uma revisão crítica com base em
em cinco estudos, mostrando valores entre 0,4
pesquisa bibliográfica na mídia digital nacional e
e 6,9%. O BPN foi referido em 10 dos 11 estudos
internacional. Para a pesquisa do Medline (por
analisados, com índices entre 0 e 26,8%. O índice
meio do Pubmed), utilizou-se a seguinte estraté-
de Apgar menor que 7 no 1º minuto foi avaliado
gia de busca: “Maternal Age”[Majr] e “Pregnancy
em 5 estudos variando de 5,6 a 22,9%, enquanto
Complications”[Mesh], tendo sido encontrados
o índice inferior a 7 no 5º minuto variou de 0,9%
150 artigos. Para a pesquisa realizada nas bases
a 5,0%. A natimortalidade foi avaliada em 8 es-
de dados Lilacs e SciELO, foram utilizados os tudos, variando de 0 a 3,2%. A taxa de cesáreas
termos “advanced maternal age” e “idade ma- mostrou-se heterogênea, sendo descrita em 8
terna avançada”, totalizando 49 artigos. Foram estudos, variando de 31,9 a 72,4%.
selecionados artigos publicados a partir de 2008,
que apresentassem dados epidemiológicos e re-
Discussão
comendações especificamente relacionadas ao
tema, obedecendo-se aos critérios de inclusão e Pesquisas mostram que mulheres com idade
exclusão pré-estabelecidos (Quadro 1) e que apre- superior a 35 anos apresentam maior frequência
sentassem pelo menos uma das variáveis definidas de resultados perinatais adversos, com destaque
como parâmetro de prejuízo ao feto (Quadro 2). para: RN com baixo peso, prematuro, índice de
Essa seleção resultou em 20 artigos, dos quais Apgar menor que 7 no 1º e 5º minutos de vida,
11 foram utilizados para formular os resultados. maior número de partos operatórios, além de
Os artigos restantes forneceram dados para en- óbitos fetais (Quadro 1).1-3,9-11,15-19
riquecer a introdução e a discussão. O aumento da idade materna mostra associa-
O detalhamento da forma de seleção dos ção com resultados obstétricos adversos, suge-
artigos utilizados na confecção deste estudo rindo que o risco aumenta proporcionalmente à
encontra-se no fluxograma (Figura 1). idade da mãe. Em mulheres acima de 40 anos, o

v.13, n. 3, jul/set 2014 13


Revista HUPE, Rio de Janeiro, 2014;13(3):11-16

Foram selecionados 199 resumos de artigos por via eletrônica

Excluídos 110 artigos pelos critérios de inclusão


e exclusão e 52 artigos por duplicidade

Restaram 37 artigos para avaliação

Excluídos 5 artigos por não haver


acesso ao texto completo e 12 após
avaliação dos revisores

Total: 20 fontes bibliográficas

Figura 1. Fluxograma de busca de referências.

risco de mortalidade perinatal foi 2,2 vezes maior de placenta prévia, acretismo placentário, des-
em comparação com gestantes com menos de 35 colamento da placenta e distúrbios hipertensivos
anos.7 Salem e colaboradores encontraram sig- em grávidas de idade avançada, o que pode gerar
nificante associação entre mortalidade perinatal viés de confusão.3,10,16,18 O desenvolvimento dessas
e aumento da idade materna, o que não foi con- complicações pode estar relacionado à vascu-
firmado ao controlar com possíveis variáveis de lopatia úteroplacentária. Hsieh e colaboradores
confusão como crescimento intrauterino restrito evidenciaram que a taxa de lesões por esclerose
e malformações congênitas.17 Entre os estudos nas artérias do miométrio aumentou com a idade,
pesquisados nesta revisão, 45% não descreveram de 11% entre 17-19 anos para 61% entre 30-39 anos
a taxa de natimortalidade, o que pode ser consi- e para 83% após 39 anos.18
derado uma das limitações do estudo.2,3,9,11,19 O índice de Apgar é um bom indicador do
O BPN pode estar relacionado com aumento resultado perinatal, sendo relevante para prog-
na taxa de mortalidade perinatal. Lisonkova e nóstico do nascimento. As gestantes em idade
colaboradores encontraram taxas de BPN e de tardia apresentam 5,7 vezes mais chance de ter
mortalidade fetal e perinatal significativamente filhos com índice de Apgar inferior a 7 no 5º minu-
maiores entre as mães com maior idade, respec- to de vida do que as mais jovens.1 No entanto, os
tivamente 66% e 26%.11 Da mesma forma, Salem resultados desta revisão mostram que a maioria
e colaboradores descreveram alta taxa de BPN dos recém-natos que apresentavam Apgar menor
coincidente com maior taxa de mortalidade fetal, que 7 no 1º minuto recuperaram o índice no 5º
sugerindo relação entre os dois fatos, já que a alta minuto de vida.1,10,15,18
prevalência de BPN na gravidez tardia pode estar O índice de cesáreas na gravidez tardia mos-
relacionada a doenças adquiridas com a idade trou-se superior a 50% na maioria dos estudos.
como: artrite, hipertensão arterial crônica, de- Entre as várias razões que levam à alta taxa de ce-
pressão, câncer e infarto agudo do miocárdio.10,11,17 sáreas, a ineficiência do miométrio envelhecido, a
A comparação entre as idades gestacionais diminuição do número de receptores de ocitocina
evidenciou que tanto a prematuridade quanto o e a distocia estão entre as principais causas.1,20 No
nascimento pós-termo estiveram presentes en- entanto, no Brasil é comum a ocorrência de maior
tre as mulheres em idade avançada,1 sendo mais índice de cesariana em grupos de menor risco
marcante a baixa idade gestacional. No entanto, a obstétrico, como as mulheres de status sociais
taxa de prematuridade mostrou-se extremamente mais elevados, independentemente de critérios
variável, dificultando mais conclusões.1,15 Essa técnicos e obstétricos. Dessa forma, a avaliação
variação pode ser resultado do nível sociocultural desse dado pode estar prejudicada, sendo outra
de cada local, além da maior frequência de casos limitação do estudo.

14 revista.hupe.uerj.br
Complicações fetais em gestações tardias

O parto cesáreo pode contribuir para aumen- gradativamente em todo o mundo. Assim, as
tar a morbidade materna, além de elevar o risco mulheres devem ser alertadas por seus médicos
de mortalidade neonatal, bem como favorecer sobre os riscos da gravidez tardia, considerando
complicações placentárias em gravidezes poste- inclusive que, com o aumento da idade materna,
riores, incluindo a placenta prévia e descolamento eleva-se a prevalência de comorbidades, res-
prematuro da placenta.1 ponsáveis por gerar altas taxas de complicações
As gestantes com 35 anos ou mais apresen- fetais.
tam risco 1,5 vezes maior de complicações na Os profissionais de saúde devem dedicar
gravidez e de 1,6 a 2,6 maior para resultados pe- atenção especial a este grupo etário, estando
rinatais adversos quando comparadas a mulheres alertas para as características da gravidez nesta
de 20 a 34 anos. Após ajuste para variáveis de fase da vida, visando identificar precocemente
confundimento, entre as de 35 a 39 anos perma- possíveis alterações. Ademais, é importante con-
neceu o maior risco de partos operatórios vaginais tar com serviço especializado que garanta o en-
(OR=1,5; IC95% 1,2 a 1,7) e de cesáreas (OR=1,6; caminhamento para internação e a realização de
IC95% 1,5 a 1,7). Entre as mulheres com 40 anos exames específicos nos casos necessários. Desta
ou mais foi confirmado maior risco de parto pre- maneira, essa gestação poderá ser acompanhada
maturo (OR=1,7; IC95% 1,3 a 2,2), parto operatório com mais segurança, reduzindo a possibilidade
vaginal (OR=3,1; IC95% 2,0 a 4,6) e parto cesáreo de complicações para o binômio materno-fetal.
(OR=2,6; IC95% 2,2 a 3,1 ).18
A natimortalidade é tida como multifatorial e, Referências
embora a gravidez em idade tardia contribua para
1. Gravena AAF, Sass A, Marcon SS, Pelloso SM.
o risco de morte fetal em países desenvolvidos, Outcomes in late-age pregnancies. Rev Esc
outros fatores – como infecção, desnutrição, Enferm USP. 2012;46(1):15-21. [periódico na
falta de cuidados pré-natais e pobreza – são Internet]. 2012 Feb [Citado em 03 de jun 2014];
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aumento de morte fetal com a idade materna org/10.1590/S0080-62342012000100002
avançada é incerto, mas pode ser atribuído
2. Kenny LC, Lavender T, McNamee R, O’Neill SM,
a alguns fatores, como doenças crônicas e Mills T, Khashan AS. Advanced maternal age and
complicações médicas ou obstétricas,1,4 sendo que adverse pregnancy outcome: evidence from a large
mulheres mais velhas têm maior risco de sofrer contemporary cohort. PLoS One. 2013;8(2):e56583.
hipertensão induzida pela gravidez ou diabetes http://dx.doi.org/10.1371/journal.pone.0056583
gestacional.18 Soma-se o já descrito efeito direto 3. Delpisheh A, Brabin L, Attia E, Brabin BJ. Pregnancy
do envelhecimento materno, que está relacionado late in life: a hospital-based study of birth outcomes.
com a deficiência de perfusão placentária causada J Womens Health (Larchmt). 2008;17(6):965-70.
http://dx.doi.org/10.1089/jwh.2008.0514
pela baixa vascularização uterina.1
O aumento da idade mostrou associação 4. Huang L, Sauve R, Birkett N, Fergusson D, van
significativa com aborto para mulheres de 35-39 Walraven C. Maternal age and risk of stillbirth: a
systematic review. CMAJ. 2008;178(2):165-72. http://
anos e com 40 ou mais (OR=2,0 e 2,4, respectiva- dx.doi.org/10.1503/cmaj.070150
mente), anormalidades cromossômicas (OR=4,0
5. Andrade PC, Linhares JJ, Martinelli S, Antonini M,
e 9,9), anomalias congênitas (OR=1,4 e 1,7), dia-
Lippi UG, Baracat FF. Resultados perinatais em
betes gestacional (OR=1,8 e 2,4), placenta prévia grávidas com mais de 35 anos: estudo controlado.
(OR=1,8 e 2,8) e taxa de cesarianas (OR=1,6 e 2,0).7 Rev Bras Ginecol Obstet. 2004;26(9):697-702. http://
No entanto, a relativa contribuição do aumento dx.doi.org/10.1590/S0100-72032004000900004
da idade materna e das doenças crônicas nos re- 6. IBGE. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística.
sultados gestacionais necessita de mais estudos.4 Brasil vê crescimento de gravidez após os 40 anos.
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A gravidez em idade tardia tende a aumentar 7. Cleary-Goldman J, Malone FD, Vidaver J, Ball

v.13, n. 3, jul/set 2014 15


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16 revista.hupe.uerj.br
Gestação e obesidade: um problema emergente
Pregnancy and obesity: an emerging problem

Gestación y obesidad: un problema emergente


João Regis I. Carneiro,* Fernanda O. Braga, Carolina A. Cabizuca,
Raquel C. Abi-Abib, Roberta A. Cobas, Marília B. Gomes

Resumo
Diante do crescimento da prevalência de sobrepeso e obesidade na população adulta brasileira, sobretudo nas
mulheres em idade fértil, a gestação neste grupo populacional torna-se merecedora de atenção pelas autoridades
de saúde no nosso país. Esta condição ainda é pouco estudada, e não há centros de referência para o atendimento
das grandes obesas gestantes. Sabemos que grandes obesas têm chance de iniciar a gestação com a saúde com-
prometida por uma variedade de doenças crônicas, entre as quais podemos citar: hipertensão arterial, diabetes
tipo 2, asma brônquica e esteatose hepática. Alguns estudos já mostraram aumento de risco para o binômio mãe/
feto para além do período fetal. A gestação deve ser cuidadosamente planejada, uma vez que os métodos con-
traceptivos podem sofrer perda de sua eficácia pelo excesso ponderal nestas mulheres e em especial nas que se
submeteram à cirurgia bariátrica. O manejo do período pré-natal requer atenção diferenciada, visando controlar o
ganho ponderal materno e minimizar as complicações fetais já conhecidas, como macrossomia, anomalias e defi-
ciências nutricionais. Os achados desta revisão demonstram que o excesso de peso na gestação constitui fator de
risco para a saúde da mãe e do concepto. A pandemia de obesidade, que agora atinge países em desenvolvimento,
afeta de forma especial mulheres em idade fértil. A gestação em grandes obesas gera necessidade aumentada
de exames pré-natais, maior número de partos cesáreos, aumento de infecções em sítio cirúrgico, maior tempo
de internação – o que leva a grande impacto econômico para o sistema de saúde pública. São necessários mais
estudos e investimentos em capacitação de equipes de saúde e materiais específicos para atender estas pacientes.
Descritores: Obesidade mórbida; Obesidade; Cirurgia bariátrica; Gravidez.

Abstract
Because of the increasing prevalence of overweight and obesity in the Brazilian adult population, particularly in
women in reproductive age, pregnancy in this population deserves attention by health authorities. This condition
is still poorly understood, and there are no reference centers for maternal super-obesity care. Obese women
are at an increased risk of chronic comorbid conditions, such as hypertension, type 2 diabetes, asthma and non-
alcoholic fat liver disease. Some studies show that the increased risk to both mother and fetus extends beyond
intrauterine period. Gestation should be planned, as obesity may impair the efficacy of contraceptive methods,
especially in those women who underwent bariatric surgery. Prenatal care requires special attention so as to
control maternal weight gain and to minimize known fetal complications such as macrosomia, anomalies and
nutritional deficiencies. This review demonstrates that excessive weight during pregnancy is an important risk
factor for the health of both mother and fetus. The obesity pandemic has come to afflict developing countries
and affects women in reproductive age in a particular way. Pregnancy in morbid obese women requires a greater
number of prenatal exams, demands more frequent cesarean labors, increases the incidence of surgical infections,
demands longer hospitalization – which leads to greater economical impact on the public health system. Further
studies and investment in training for health personnel are required to assist these patients.
Keywords: Obesity; Obesity, Morbid; Bariatric surgery; Pregnancy.

*
Endereço para correspondência:
Serviço de Diabetes, HUPE, UERJ.
Revista HUPE, Rio de Janeiro, 2014;13(3):17-24 Boulevard 28 de Setembro, 77, 3º andar,
Recebido: 10/03/2014 | Revisado: 02/07/2014 | Aprovado: 28/07/2014 Rio de Janeiro, RJ. CEP: 20551-030.
doi: 10.12957/rhupe.2014.12130 E-mail: endoregis@uol.com.br

v.13, n. 3, jul/set 2014 17


Revista HUPE, Rio de Janeiro, 2014;13(3):17-24

Resumen
Frente al crecimiento de la prevalencia de sobrepeso y obesidad en la población adulta brasilera, sobre todo en las
mujeres en edad fértil, la gestación en este grupo poblacional se vuelve merecedora de atención por parte de las
autoridades de salud en nuestro país. Esta condición todavía es poco estudiada, y no hay centros de referencia para
la atención de las grandes obesas en gestación. Sabemos que éstas tienen predisposición a iniciar una gestación con
la salud comprometida por una variedad de enfermedades crónicas, entre las cuales podemos citar: hipertensión
arterial, diabetes tipo 2, asma bronquial, esteatosis hepática. Algunos estudios ya mostraron aumento de riesgo
para el binomio madre/feto más allá del periodo fetal. La gestación debe ser planeada, una vez que los métodos
contraceptivos pueden sufrir pérdida de su eficacia por el exceso ponderal en estas mujeres; en especial en las
que se sometieron a cirugía bariátrica. El manejo del periodo prenatal requiere atención diferenciada, apuntando a
controlar la ganancia ponderal materna y minimizar las complicaciones fetales ya conocidas, como macrosomías,
anomalías y deficiencias nutricionales. Los hallazgos de esta revisión demuestran que el exceso de peso en la
gestación constituye un factor de riesgo para la salud de la madre y del producto. La pandemia de obesidad, que
ahora alcanza a países en desarrollo, afecta de forma especial a mujeres en edad fértil. La gestación en grandes
obesas genera una mayor necesidad de exámenes prenatales, un mayor número de partos por cesárea, aumento
de infecciones en sitio quirúrgico, mayor tiempo de internación – lo que lleva a un gran impacto económico para
el sistema de salud pública. Son necesarios más estudios e inversiones en capacitación de equipos de salud y
materiales específicos para atender a éstas pacientes.
Palabras clave: Obesidad mórbida; Obesidad; Cirugía bariátrica; Gravidez.

Obesidade – conceitos O conceito de obeso corresponde àqueles


que apresentam excesso de tecido adiposo em
Nos últimos anos, a obesidade vem adquirin- sua composição corporal. O índice de massa
do espaço na mídia e no meio científico. Antes corporal (IMC em kg/m2), apesar de impreciso,
considerada um distúrbio de pouca importância constitui a maneira mais comumente utilizada em
clínica – a própria comunidade científica consi- todo o mundo para se diagnosticar o excesso de
derava a obesidade um distúrbio relacionado a peso e os diferentes graus de obesidade. Indiví-
maus hábitos e pouca determinação –, ela afe- duos com IMC igual ou superior a 25 kg/m2 são
taria então um indivíduo sem força de vontade denominados com excesso de peso. A partir de 30
e totalmente responsável pela própria condição kg/m2, há obesidade de grau I; a partir de 35 kg/
clínica. Hoje, porém, sabe-se que o excesso de m2, obesidade de grau II, e, a partir de 40 kg/m2,
peso é um distúrbio de origem multifatorial.1 Em configura-se um quadro de obesidade mórbida ou
sua gênese, estão fatores genéticos, culturais, de obesidade grau III. O crescimento da epidemia
socioeconômicos, metabólicos e psíquicos. O de obesidade mórbida justificou a necessidade da
excesso ponderal é, portanto, uma condição crô- criação de uma nova classificação. Aqueles com
nica extremamente difícil de tratar, sobretudo se IMCs iguais ou superiores a 50 e 60 kg/m2 são
considerarmos resultados mantidos após longos considerados, respectivamente, superobesos e
períodos de observação.2 supersuperobesos3 (Tabela 1).

Tabela 1. Classificação de sobrepeso e obesidade pelo IMC.

IMC (kg / m2) Classificação

18,5 – 24,99 Normal


25 – 29,99 Sobrepeso
30 – 34,99 Obesidade grau I
35 – 39,99 Obesidade grau II
40 – 49,99 Obesidade grau III (mórbida)
50 – 59,99 Superobesidade
≥ 60 Super superobesidade

18 revista.hupe.uerj.br
Gestação e obesidade: um problema emergente

Seguindo esta classificação, tem se observado a gordura em excesso exerceria sobre o útero e
nas últimas décadas um importante aumento na as trompas.13
prevalência do excesso de peso e da obesidade Paradoxalmente, diversas esculturas da era
em nosso país.4 O crescimento econômico do antiga retratam mulheres obesas, cujas cabeças
país trouxe inúmeros benefícios, entre os quais a e membros minúsculos contrastam com as gene-
redução da mortalidade infantil e da desnutrição. rosas proporções dedicadas ao abdome e à mama.
Entretanto, as mudanças no comportamento De fato, é possível que, no passado, o excesso de
social e alimentar da nossa população justificam peso tenha sido relacionado com a fertilidade, a
plenamente esta variação antropométrica que prosperidade e a fortuna.
tanto nos preocupa. Parodiando o economista Entretanto, em mulheres obesas ou com so-
americano John Kenneth Galbraith, podemos dizer brepeso diagnosticadas com síndrome de ovários
que, no Brasil de hoje, morrem mais pessoas por policísticos, a perda de peso por dieta e atividade
excesso que por falta de alimentos. física é capaz de promover alterações morfológi-
De fato, os obesos têm sua expectativa de vida cas ovarianas, com redução do número de micro-
abreviada por sua condição clínico-metabólica.5 cistos, reestabelecendo a regularidade dos ciclos
São mais propensos ao desenvolvimento de hiper- ovulatórios e a fertilidade.14 Ressalta-se ainda a
tensão arterial, resistência insulínica e diabetes relação inversa entre aumento do IMC e sucesso
do tipo 2 (DM 2),6 assim como de distúrbios res- terapêutico de técnicas de fertilização in vitro.15
piratórios7 e ortopédicos.8 O impacto do excesso
de peso nos níveis de glicemia plasmática já foi
Anticoncepção em mulheres obesas
exaustivamente demonstrado. A obesidade inter- Algumas questões devem ser consideradas
fere sobremaneira na fisiopatologia do diabetes antes da escolha da melhor opção para anticon-
mellitus do tipo 2 (DM 2).5 cepção em mulheres obesas. O uso de métodos
A distribuição da gordura corporal merece contraceptivos uterinos (DIU) parece ser uma
atenção especial, uma vez que a chamada obesi- opção adequada para grandes obesas. Implantes
dade androide (distribuição “central” da gordura) de etonogestrel parecem ter eficácia reduzida
guarda maior relação com o desenvolvimento de em mulheres com IMCs muito elevados, sendo
diabetes, hipertrigliceridemia, redução dos níveis sugerida troca do dispositivo antes dos 3 anos
plasmáticos de colesterol HDL, hipertensão e de permanência, tempo limite estabelecido pelo
doença cardiovascular.9 fabricante. Diversos estudos sugerem discreta
A obesidade associa-se também ao aumento redução na eficácia de anticoncepcionais com-
do risco de neoplasia de endométrio10 e mama.11 binados estrogênio/progestágeno por via oral.
É preocupante a dificuldade que grandes obesas Além de redução na adesão terapêutica observada
encontram, em realizar exames de rastreio para em mulheres obesas, o aumento do IMC parece
estas condições em função das limitações técnicas potencializar o impacto da falta do uso do com-
que a maioria absoluta dos equipamentos dispo- primido na redução da eficácia deste composto.
níveis no sistema de saúde brasileiro apresenta, Da mesma forma, a pílula do dia seguinte, à base
a partir de determinado limite de peso. de levonogestrel, pode ter eficácia reduzida em
grandes obesas.
Obesidade e fertilidade Em resumo, apesar de haver uma discreta re-
dução na eficácia com grandes aumentos do IMC,
A associação entre obesidade e alterações no os diversos métodos de anticoncepção disponíveis
ciclo menstrual foi descrita em 1952 por Rogers no mercado podem ser utilizados com segurança
e Mitchell.12 Neste estudo, 43% das mulheres por mulheres obesas. Atenção especial deve ser
com ciclos menstruais irregulares eram obesas, dedicada ao aumento do risco de desenvolvimento
enquanto apenas 13% daquelas que menstruavam de trombose venosa profunda em usuárias de an-
normalmente estavam acima do peso. ticoncepcionais hormonais combinados. Para as
Na medicina antiga, Hipócrates já notava portadoras de obesidade grau III são necessários
que mulheres obesas tinham mais dificuldade em mais estudos para se estabelecer a segurança e
conceber, e isto era atribuido à compressão que eficácia dos diversos métodos de anticoncepção

v.13, n. 3, jul/set 2014 19


Revista HUPE, Rio de Janeiro, 2014;13(3):17-24

disponíveis no mercado16 (Tabela 2). mos que aproximadamente metade destas pessoas
pode ser constituída de mulheres em idade fértil,
Gestação e obesidade não seria difícil imaginar que qualquer esforço no
sentido de otimizar o atendimento às gestantes
Considerando o crescimento da prevalência obesas deve ser valorizado e estimulado, mesmo
do excesso de peso e da obesidade na população considerando o impacto negativo que o excesso de
adulta brasileira – atualmente aproximadamente peso pode causar na fertilidade. Grandes obesas
50% das mulheres brasileiras em idade fértil es- têm uma chance significativa de iniciar a gestação
tão acima do peso –, não é difícil considerar que, com a saúde comprometida por uma variedade de
apesar de ainda pouco estudada, a gestação em problemas de saúde crônicos.
mulheres obesas surge como uma questão que A hipertensão arterial sistêmica, (HAS) há
merece toda a atenção por parte das autoridades muitos anos, é o fator de maior impacto na
de saúde do nosso país. Torna-se, ainda, neces- avaliação do risco de morte materna durante a
sária a criação de centros de referência para o gestação. A associação entre obesidade, HAS e
atendimento de grandes obesas gestantes. Um doença cardiovascular já foi claramente demons-
recente estudo desenvolvido pelo Serviço de trada. O excesso de tecido adiposo pode promover
Diabetes do HUPE e apresentado no último Con- ativação do sistema renina-angiotensina-aldoste-
gresso Brasileiro de Diabetes17 chamou atenção rona, aumento do tônus simpático, além de estar
para a significativa prevalência de obesas grau III associado à produção de fatores procoagulação e
com diabetes gestacional (DMG) acompanhadas disfunção endotelial.19 A síndrome da apneia obs-
em conjunto pelos Serviços de Obstetrícia e Dia- trutiva do sono, bastante prevalente em grandes
betes da UERJ entre 2011 e 2012. Das 43 pacientes obesas, pode contribuir para o aumento da pres-
estudadas, 58,13% eram obesas, sendo que em são arterial e para o desenvolvimento de arritmias
44% destas o IMC no momento da concepção era através de uma ativação simpática ainda maior.20
superior a 40 kg/m2. A obesidade mórbida cons- A Síndrome de Resistência insulínica rela-
titui, de fato, um problema ainda mais complexo. ciona-se de maneira inequívoca com a obesidade
Nas últimas três décadas houve um incremento de e tem papel fundamental na fisiopatogênese do
285% na prevalência de obesidade grau III na po- DM2, doença bastante prevalente em grandes
pulação adulta do sudeste brasileiro.18 Estima-se obesas. Outrossim, a gestação é condição acom-
que no estado do Rio de Janeiro, em torno de 120 panhada de grande redução fisiológica da ação
mil pessoas possam ser, hoje, classificadas como da insulina em seus tecidos alvo. Destaca-se o
portadores de obesidade mórbida. Se considerar- papel da placenta como sítio de produção de ci-

Tabela 2. Contracepção em mulheres obesas.

Critério de Elegibilidade Médica (CEM) para escolha do método contraceptivo em mulheres obesas
Adaptado de Jeniffer A Robinson & Anne E Burke – Women´s Health (2013) 9 (5), 453-466

Método Contraceptivo Categoria CEM Definição

D.I.U (contracepção intrauterina) 1 Categoria 1: sem restrição ao uso

Implante de progestágeno 1 Categoria 1: sem restrição ao uso

Acetato de medroxiprogesterona (depósito) 1 Categoria 1: sem restrição ao uso

“Minipílulas” (progestágeno isolado) 1 Categoria 1: sem restrição ao uso

Pílulas contraceptivas de emergência (pílula do


1 Categoria 1: sem restrição ao uso
dia seguinte)
Categoria 2: vantagens, em geral, não se sobrepõem
Pílula combinada, adesivo, anel vaginal 2
aos riscos teóricos ou comprovados

20 revista.hupe.uerj.br
Gestação e obesidade: um problema emergente

tocinas inflamatórias que interferem na resposta correspondem à expansão do volume sanguíneo


tissular à ação da insulina.19 Mulheres obesas têm, e do líquido extracelular, ao aumento das mamas
assim, risco aumentado de desenvolver diabetes e do útero e, principalmente, ao aumento dos
gestacional, condição de agravo à saúde da mãe depósitos de tecido adiposo da mãe. O feto con-
e do concepto. tribui com o líquido amniótico, a placenta e seu
A esteatose hepática, presente em mais de próprio peso.19 Recentemente, estabeleceu-se
90% das pacientes com obesidade grau III, pode recomendação para ganho de peso baseada no
tornar mais grave a evolução de doenças hepá- estado nutricional da mãe antes da concepção.
ticas associadas à gestação.21 Grandes obesas Embora acertada, ainda deve passar por revi-
podem apresentar disfunção renal independente sões no futuro, sobretudo por não contemplar a
da presença de hipertensão ou diabetes mellitus. emergente população de gestantes portadoras de
A recém-descrita “nefropatia da obesidade” está obesidade grau III que procuram as maternidades
associada à síndrome da apneia obstrutiva do em todo o mundo (Tabela 3).
sono e pode ser revertida com a perda de peso.22 Há na literatura evidências de que um ganho
Encontra-se associação entre obesidade mórbida total de peso inferior a 5 kg está relacionado a
e asma brônquica, síndrome da apneia obstrutiva uma menor mortalidade perinatal e recém-natos
do sono, infecções cutâneas de repetição e dis- com peso mais apropriado naquelas que iniciam
túrbios osteomusculares. a gestação com elevados índices de massa cor-
Mesmo aquelas que iniciam a gestação livres pórea.24 Sendo assim, a gestação poderia ser um
destas condições, têm risco aumentado de desen- momento oportuno para se investir no controle
volver pré-eclâmpsia e diabetes gestacional. O do peso. Grandes obesas que planejam engravi-
aumento do IMC está relacionado com o aumen- dar deveriam se sensibilizar no sentido de iniciar
to na indicação de cesárea, infecções na ferida um projeto visando perda ponderal e melhora de
cirúrgica, hemorragias e fetos macrossômicos e eventuais comorbidades relacionadas à obesidade
com anomalias.23 Ressalta-se ainda a possibilida- antes da concepção.
de de filhos de mães obesas apresentarem, já na Não menos importante é o impacto econômi-
adolescência, distúrbios relacionados à síndrome co que o excesso de peso pode causar no curso
metabólica.21 da gestação. Este fator torna mais prováveis
a realização de um número maior de exames e
Recomendações de ganho de peso consultas no período pré-natal, a utilização de
na gestação medicamentos para controle da pressão e do
diabetes gestacional, o aumento de indicação de
Em condições normais, aproximadamente cesárea e a incidência de complicações que podem
60% do total do ganho de peso durante a gesta- prolongar o período de internação hospitalar no
ção pode ser atribuído a fatores maternos, que peri/pós parto.25

Tabela 3. Ganho de peso na gestação x IMC materno.


IMC pré gestação Ganho total no Ganho semanal no Ganho total na
(kg/m2) 1º trimestre (kg) 2º e 3º trimestres (kg) gestação (kg)

< 18,5 2,3 0,5 12,5 – 18,0

de 18,5 a 24,9 1,6 0,4 11,5 – 16,0

de 25 a 29,9 0,9 0,4 7,0 – 11,5

> 30 – 0,2 5–9

v.13, n. 3, jul/set 2014 21


Revista HUPE, Rio de Janeiro, 2014;13(3):17-24

Gestação no pós-operatório de que possuem componente malabsortivo (by pass


gastro jejunal com Y de Roux, derivação biliopan-
cirurgia bariátrica creática de Scopinaro), a eficácia destes compos-
tos pode ser bastante reduzida26 (Tabela 4).
Anticoncepção
Considerações sobre acompanhamento
A maioria das pessoas submetidas à cirurgia
pré-natal
bariátrica nos dias de hoje é composta por mu-
lheres, boa parte delas em idade fértil. A perda Gestantes no pós-operatório de cirurgia bari-
de peso decorrente da cirurgia pode restabelecer átrica devem ser acompanhadas com suporte de
ciclos ovulatórios, sobretudo naquelas que apre- equipe multidisciplinar especializada, preferen-
sentavam síndrome de resistência à insulina e/ou cialmente por aquela que participou da fase de
síndrome de ovários policísticos no pré-operató- preparo para a cirurgia. Neste preparo, devem ser
rio. Em função do impacto que algumas técnicas fornecidas recomendações expressas para que se
cirúrgicas podem exercer na absorção e metabo- evite a gestação durante o período de perda rápida
lismo de diversas substâncias, medicamentos etc., de peso que compreende os primeiros 12-18 meses
inclusive anticoncepcionais orais, muita atenção de pós-operatório.
deve ser dedicada ao acompanhamento destas Embora a cirurgia bariátrica reduza signi-
mulheres no período pós-operatório, sobretudo ficativamente o risco de desenvolvimento de
pela recomendação expressa de não engravidar diabetes gestacional, hipertensão, pré-eclâmpsia,
antes de decorridos pelo menos 18 meses da cirur- macrossomia e indicação de cesárea19,27, atenção
gia. O efeito de anticoncepcionais utilizados pela especial deve ser dedicada à monitorização de
via oral parece inalterado nas técnicas cirúrgicas reservas e reposição de nutrientes, principalmen-
classificadas como restritivas (banda gástrica e te vitamina B12, ácido fólico, vitamina A, ferro,
gastroplastia em manga ou sleeve). Nas técnicas cálcio, vitamina D e tiamina.19,27 Nas pacientes

Tabela 4. Contracepção no pós-operatório de cirurgia bariátrica.

Critério de Elegibilidade Médica (CEM) para escolha de métodos contraceptivos em mulheres após cirurgia
bariátrica – Adaptado de Jeniffer A Robinson & Anne E Burke, 2013.

CEM após cirurgia


Tipo CEM após cirurgia restritiva Definição
disabsortiva

D.I.U Categoria 1:
1 1
(contracepção intrauterina) sem restrição ao uso

Categoria 1:
Implante de progestágeno 1 1
sem restrição ao uso

Acetato de medroxiprogesterona Categoria 1:


1 1
(depósito) sem restrição ao uso

“Minipílulas” Categoria 1:
1 1
(progestágeno isolado) sem restrição ao uso

Categoria 3: riscos teóricos


Pílulas contraceptivas de
ou comprovados, frequente-
emergência (pílula do dia 1 3
mente, se sobrepõem às
seguinte)
vantagens do método

Categoria 3: riscos teóricos


Pílula combinada, adesivo, ou comprovados, frequente-
1 3
anel vaginal mente, se sobrepõem às
vantagens do método

22 revista.hupe.uerj.br
Gestação e obesidade: um problema emergente

que apresentam vômito, torna-se necessária a de Crianças, Adolescentes e Adultos no Brasil.


reposição parenteral de tiamina para prevenção Rio de Janeiro: Instituto Brasileiro de Geografia e
Estatística-IBGE, 2010.
da síndrome de Wernicke. A reposição de ácido
fólico também pode ser importante para reduzir 5. Stewart ST, Cutler DM, Rosen AB. Forecasting
o risco de homocisteinemia e eventos vasculares the Effects of Obesity and Smoking on US Life
Expectancy. N Eng J Med, 2009;361(23):2252-60.
em gestantes submetidas à cirurgia bariátrica. Os
obstetras precisam também ficar atentos ao risco 6. DeFronzo RA, Ferrannini E. Insulin Resistance:
A Multifaceted Syndrome Responsible for
de hérnias internas e isquemia de intestino delgado
NIDDM, Obesity, Hypertension, Dyslipidemia and
em gestantes submetidas a técnicas de by pass.27 Atherosclerotic Cardiovascular Disease. Diabetes
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Conclusões 7. Weiss ST, Shore S. Obesity and Asthma. Directions
for Research. Am J Respir Crit Care Med,
A obesidade é um problema de saúde pública 2004;169(8):963-8.
que deve receber atenção especial por parte das
8. Vincent HK, Seay AN, Montero C, Vincent KR.
autoridades de saúde. A verdadeira pandemia Outpatient Rehabilitation Outcomes in Obese
que vem se instalando não respeita fronteiras: é Patients with Orthopedic conditions. Eur J Phys
realidade tanto em países desenvolvidos, como Rehabil Med, 2013;49(3),419-29.
naqueles ditos em desenvolvimento. Como con- 9. Samson SL, Garber AJ. Metabolic Syndrome.
sequência, o número de grandes obesas gestan- Endocrinol Metab Clin North Am, 2014;43(1):1-23.
tes que procuram os serviços de obstetrícia em
10. Schmandt RE, Iglesias DA, Co NN, Lu KH.
nosso país vem crescendo, tornando necessários Understanding Obesity and Endometrial Cancer
investimentos em materiais específicos para Risk: Opportunities for Prevention. Am J Obstet
atendê-las, como macas, instrumentos cirúrgicos Gynecol, 2011;205(6):518-25.
e cadeiras. 11. Calle EE, Kaaks R. Overweight, Obesity and
O excesso de peso na gestação constitui fator Cancer: Epidemiological Evidence and Proposed
de risco para a saúde da mãe e do concepto, e não Mechanisms. Nature Reviews Cancer, 2004;4(8):579-91.
menos importante é o impacto econômico do au- 12. Rogers J, Mitchell GM Jr. The Relationhsip of
mento da realização de exames e procedimentos Obesity to Menstrual Disturbances. N Eng J Med,
e da utilização de medicamentos.25 Com o cres- 1952;247:53-5.
cente número de realização das diversas técnicas 13. On Airs, Waters and Places, Hippocrates, writen 400
cirúrgicas bariátricas, é importante também que o BCE. Translated by Francis Adams. Disponível em:
obstetra tenha conhecimento do impacto destes http://classics.mit.edu/Hippocrates/airwatpl.html.
procedimentos na terapia de anticoncepção e na 14. Crosignani PG, Colombo M, Vegetti W, Somigliana
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v.13, n. 3, jul/set 2014 23


Revista HUPE, Rio de Janeiro, 2014;13(3):17-24

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Disciplina de Diabetes e Metabologia. Departamento
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Obesity Society, and American Society for Metabolic Universidade Estadual do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro, RJ,
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24 revista.hupe.uerj.br
Fatores angiogênicos e antiangiogênicos na fisiopatologia
da pré-eclâmpsia e seu uso na prática obstétrica atual
Angiogenic and antiangiogenic factors in the pathophysiology of
preeclampsia and its use in current obstetrics practice

Factores angiogénicos y antiangiogénicos en la fisiopatología de la


preeclampsia y su uso en la práctica obstétrica actual
Guilherme R. de Jesús,* Nilson R. de Jesús, Flávia C. dos Santos, Camila S. Oliveira,
Roger A. Levy, Luís Cristóvão de M. S. Pôrto, Evandro M. Klumb

Resumo
A pré-eclâmpsia é uma das principais causas de morbimortalidade materna, morte perinatal, parto pré-termo e
restrição de crescimento intrauterino. Apesar de a maioria das gestantes apresentar um bom desfecho, o atraso
no seu diagnóstico pode favorecer a evolução para sua forma mais grave, a eclâmpsia. Um grande número de
pesquisas já foi publicado sobre este assunto, no entanto, a etiologia da pré-eclâmpsia continua desconhecida.
O estudo dos fatores angiogênicos, como o fator de crescimento vascular endotelial (VEGF) e o fator de cres-
cimento placentário (PlGF), e dos fatores antiangiogênicos, como o receptor FMS-like tirosina quinase-1 solúvel
(sFlt-1), permitiu a ampliação do conhecimento sobre a fisiopatologia da pré-eclâmpsia. Pacientes analisadas após
o diagnóstico de pré-eclâmpsia possuíam níveis séricos maiores de sFlt-1 e menores de PlGF e VEGF que o grupo
controle pareado por idade gestacional. O sFlt-1 funciona como antagonista ao se ligar aos fatores angiogênicos e
prevenir a interação com seus receptores de superfície celular. Essas alterações foram mais pronunciadas quando
a paciente apresentou pré-eclâmpsia precoce (< 34 semanas) ou restrição do crescimento intrauterino. Estes
fatores já estão sendo utilizados no rastreamento da doença no primeiro trimestre de gestação, principalmente
para as apresentações precoces da doença, e mostraram-se promissores para o auxílio no diagnóstico diferencial
entre pré-eclâmpsia e doenças que apresentam o quadro clínico similar, como o lúpus eritematoso sistêmico (LES).
Esta doença autoimune acomete principalmente mulheres em idade reprodutiva e está associada a resultados
gestacionais adversos. Poucos estudos avaliaram os fatores angiogênicos e antiangiogênicos em gestantes com
LES. Aparentemente, há um aumento do sFlt-1 em pacientes com LES e pré-eclâmpsia, entretanto, os resultados
ainda não podem ser aplicados na prática clínica considerando a escassez de dados. Estudos prospectivos em
gestantes com LES estão sendo desenvolvidos para o diagnóstico diferencial de síndromes hipertensivas durante
a gestação, podendo influenciar diretamente a assistência prestada às gestantes de alto risco.
Descritores: Pré-eclâmpsia; Lúpus eritematoso sistêmico; Fatores de crescimento do endotélio vascular; Nefrite
lúpica; Hipertensão.

Abstract
Pre-eclampsia is a leading cause of maternal morbidity and mortality, perinatal death, premature birth and
intrauterine growth restriction. Although most of women present a good outcome, the delay in diagnosis may
contribute to the evolution to a more severe form, eclampsia. A large number of studies have been published
on this subject, yet the etiology of pre-eclampsia remains unknown. The study of angiogenic factors, such as
vascular endothelial growth factor (VEGF) and placental growth factor (PlGF), and antiangiogenic factors, such
as soluble FMS-like tyrosine kinase-1 (sFlt-1), allows the expansion of knowledge about the pathophysiology of
pre-eclampsia. Patients analyzed after diagnosis of pre-eclampsia had higher serum levels of sFlt-1 and lower PlGF
and VEGF than the control group matched for gestational age. sFlt-1 acts as antagonist as it binds to angiogenic
factors and prevents their interaction with cell surface receptors. These changes were more pronounced when
the patient developed early pre-eclampsia (< 34 weeks) or intrauterine growth restriction. These factors are

*
Endereço para correspondência:
Núcleo Perinatal, HUPE, UERJ.
Revista HUPE, Rio de Janeiro, 2014;13(3):25-31 Av. Prof. Manoel de Abreu, 500, 1º andar,
Recebido: 24/04/2014 | Revisado: 02/07/2014 | Aprovado: 28/07/2014 Rio de Janeiro, RJ, Brasil. CEP: 20550-170.
doi: 10.12957/rhupe.2014.12134 E-mail: guilhermedejesus@gmail.com

v.13, n. 3, jul/set 2014 25


Revista HUPE, Rio de Janeiro, 2014;13(3):25-31

already being used for prediction of the disease in the first trimester, especially the early presentations of the
disease, and are promising to help in the differential diagnosis between pre-eclampsia and diseases that have
similar clinical picture, such as systemic lupus erythematosus (SLE). This autoimmune disease affects mainly
women of reproductive age and is associated with adverse pregnancy outcomes. Few studies have evaluated the
angiogenic and antiangiogenic factors in women with SLE. Apparently, there is an increased sFlt-1 in patients with
SLE and pre-eclampsia, however the results can not yet be applied in clinical practice considering the paucity
of data. Prospective studies in pregnant women with SLE are being developed for the differential diagnosis of
hypertensive disorders during pregnancy, and may directly influence the support provided to women with high
risk pregnancy.
Keywords: Pre-eclampsia; Lupus erythematosus, systemic; Vascular endothelial growth factors; Lupus nephritis;
Hypertension.

Resumen
La preeclampsia es una de las principales causas de morbimortalidad materna, muerte perinatal, parto pretérmino
y restricción de crecimiento intrauterino. A pesar de que la mayoría de las gestantes llegan a buen término, el
atraso en el diagnóstico puede favorecer la evolución a su forma más grave, la eclampsia. Un gran número de
investigaciones ya fue publicado sobre este asunto, aun así, la etiología de la preeclampsia continua desconocida.
El estudio de los factores angiogénicos, como el factor de crecimiento vascular endotelial (VEGF) y el factor de
crecimiento placentario (P1GF), y dos factores antiangiogénicos, como el receptor fms-like tirosina kinasa-1 soluble
(sFlt-1), permitió la ampliación del conocimiento sobre la fisiopatología de la preeclampsia. Pacientes analizadas
después del diagnóstico de preeclampsia poseían niveles séricos mayores de sFlt-1 y menores de PlGF y VEGF
que el grupo control pareado por edad gestacional. El sFlt-1 funciona como antagonista al unirse a los factores
angiogénicos y prevenir la interacción con sus receptores de superficie celular. Estas alteraciones fueron más
pronunciadas cuando la paciente presentó preeclampsia precoz (< 3 semanas) o restricción del crecimiento
intrauterino. Estos factores ya están siendo utilizados en el seguimiento de la enfermedad en el primer trimestre
de gestación, principalmente para las presentaciones precoces de la enfermedad, y se mostraron alentadores
para el auxilio en el diagnóstico diferencial entre preeclampsia y enfermedades que presentan un cuadro clínico
similar, como el lupus eritematoso sistémico (LES). Esta enfermedad autoinmune afecta principalmente a mujeres
en edad reproductiva y está asociada a resultados gestacionales adversos. Pocos estudios evaluaron los factores
angiogénicos y antiangiogénicos en gestantes con LES y preeclampsia, sin embargo, los resultados todavía no
pueden ser aplicados en la práctica clínica considerando la escasez de datos. Estudios prospectivos en gestantes
con LES están siendo desarrollados para el diagnóstico diferencial de síndromes hipertensivos durante la gesta-
ción, pudiendo influenciar directamente la atención prestada a las gestantes de alto riesgo.
Palabras clave: Preeclampsia; Lupus eritematoso sistémico; Factores de crecimiento del endotelio vascular;
Nefritis lúpica; Hipertensión.

Introdução ocorre próximo ao termo, sem envolvimento fetal


demonstrável, e a pré-eclâmpsia associada com
A pré-eclâmpsia é uma desordem multifun- baixo peso ao nascer e parto prematuro.2
cional de causa desconhecida que é exclusiva da A pré-eclâmpsia é a uma das principais causas
gestação humana. É caracterizada pela resposta de morbimortalidade materna, morte perinatal,
vascular anormal à placentação, levando ao parto pré-termo e restrição de crescimento
aumento da resistência vascular periférica e da intrauterino. Apesar de um bom desfecho para a
agregação plaquetária, à ativação do sistema de maioria das gestantes, o atraso no seu diagnóstico
coagulação e à disfunção endotelial. Os achados pode favorecer a evolução para sua forma mais
clínicos de pré-eclâmpsia podem manifestar-se grave – a eclâmpsia –, caracterizada por uma ou
como uma síndrome materna (hipertensão e mais convulsões sobrepostas aos achados de pré-
proteinúria com ou sem outras anormalidades eclâmpsia. Enquanto nos países desenvolvidos a
multissistêmicas) ou uma síndrome fetal (restrição frequência de eclâmpsia é de 1:2.000 gestações,
do crescimento intrauterino, oligodramnia, oxige- nos países em desenvolvimento pode chegar
nação deficiente).1 Na prática clínica, a síndrome até a 1:100 gestações. Calcula-se que pacientes
materna é provavelmente mais de uma patologia, gestantes em países desenvolvidos apresentam
com grandes diferenças entre a pré-eclâmpsia que um risco médio de mortalidade por causas

26 revista.hupe.uerj.br
Fatores angiogênicos e antiangiogênicos na fisiopatologia da
pré-eclâmpsia e seu uso na prática obstétrica atual

obstétricas durante a vida de 1:4.000 a 1:10.000, growth factor) e o fator de crescimento placen-
enquanto nos países com baixa renda esse risco tário (PlGF, do inglês placental growth factor).
varia entre 1:15 e 1:50, apresentando uma taxa de Concentrações elevadas de VEGF livre também
mortalidade 100 a 200 vezes maior que na Europa são importantes para manter em repouso o endo-
e América do Norte.3 télio, apesar do estresse inflamatório típico que
O presente estudo tem por objetivo revisar o envolve uma gestação normal. Outras funções do
papel dos fatores angiogênicos e antiangiogêni- VEGF incluem induzir a produção de óxido nítrico
cos na fisiopatologia da pré-eclâmpsia e discutir e prostaciclinas vasodilatadoras pelas células en-
propostas de uso destes marcadores na prática doteliais, reduzindo o tônus vascular e a pressão
obstétrica atual, principalmente na predição da arterial; promover a recuperação glomerular de
doença e no diagnóstico diferencial com outras glomerulonefrite e microangiopatia trombótica;
patologias. e aumentar a permeabilidade vascular. Estudos
sobre fatores antiangiogênicos demonstraram
Fatores angiogênicos e que o bloqueio de seus sinalizadores resultou em
hipertensão e proteinúria. Considerando estes
antiangiogênicos na fisiopatologia dados, o VEGF apresenta um papel importante
e no diagnóstico da pré-eclâmpsia não apenas na regulação da pressão sanguínea,
mas também em manter a integridade da barreira
Um grande número de pesquisas já foi publi- de filtração glomerular durante a gestação.5,6
cado sobre este assunto, contudo a etiologia da O PlGF, membro da família VEGF, possui
pré-eclâmpsia continua desconhecida. Existem uma função significativa na neovascularização
duas correntes de pensamento atuais: o modelo em adultos, contribuindo na cicatrização de fe-
isquêmico, no qual a isquemia e a reperfusão le- ridas através da angiogênese, além de promover
vam a um estresse oxidativo e à doença vascular; quimiotaxia de monócitos, crescimento de vasos
e o modelo imunológico, que considera uma má colaterais, mobilização de células precursoras na
adaptação imune maternopaternal, isto é, uma medula óssea e aumento da atividade do VEGF.7
reação aloimune materna disparada pela rejeição O VEGF e PlGF expressam seus efeitos quando
do aloenxerto fetal.1 se ligam aos receptores VEGF Flt-1 da membrana
A disfunção endotelial generalizada pode ser da célula endotelial ou dos monócitos.
responsável por todos os aspectos clínicos en- Maynard e colaboradores estudaram o perfil
contrados na pré-eclâmpsia, e a identificação de genético de tecido placentário em mulheres com
fatores circulantes que servem como mediadores e sem pré-eclâmpsia e constataram que o mRNA
desta disfunção tornou-se assunto de grande do receptor fms-like tirosina quinase-1 solúvel
interesse nas últimas décadas. Diversos grupos (sFlt-1, do inglês soluble FMS-like tyrosine kina-
publicaram alterações em citocinas, fatores de se-1) encontrava-se com expressão aumentada
crescimento e químicos, como fator de necrose nas mulheres com pré-eclâmpsia. O sFlt-1 é uma
tumoral-alfa, Interleucina (IL-6, IL-1 α, IL-1 β), Fas variante do receptor VEGF Flt-1 que não pos­sui
Ligand, produtos lipídicos oxidados, neuroquini- domínios transmembrana e citoplasmáticos. Livre
na-B e dimetil arginina assimétrica (ADMA), que na circulação atua como potente antagonista do
são liberados pela placenta e/ou outras fontes VEGF e PlGF, apresentando, assim, um perfil an-
maternas na pré-eclâmpsia.4 tiangiogênico. Seu papel fisiológico, no entanto,
Independentemente do modelo proposto ainda não está bem estabelecido. Sabemos que
como causa da pré-eclâmpsia, sabe-se que na ges- ele é normalmente encontrado na circulação de
tação normal existe uma interação do trofoblasto homens e mulheres, é produzido por células en-
endovascular e dos leucócitos deciduais, especial- doteliais e monócitos e sua produção é aumentada
mente células natural-killer, resultando na libera- quando estas duas células são ativadas.8
ção de mitógenos responsáveis pela angiogênese Continuando seu estudo, Maynard e cola-
necessária para o desenvolvimento placentário, boradores formularam a hipótese que o sFlt-1
principalmente o fator de crescimento endotelial circulante em excesso secretado pela placenta
vascular (VEGF, do inglês vascular endotelial na pré-eclâmpsia levaria a disfunção endotelial,

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hipertensão e proteinúria ao antagonizar o VEGF níveis de PlGF encontrados foram menores a partir
e PlGF circulantes. Eles demonstraram que os ní- das 13 a 16 semanas e também apresentaram queda
veis séricos de sFlt-1 medidos pelo método ELISA 11 a 9 semanas antes do diagnóstico, com redução
(do inglês Enzyme Linked Immuno Sorbent Assay) substancial nas 5 semanas antes do aparecimento
em pacientes com pré-eclâmpsia era maior que os de hipertensão ou proteinúria. As concentrações
de gestantes com pressão normal, chegando o au- de VEGF mantiveram-se baixas durante toda a
mento a 5 vezes no caso de pré-eclâmpsia grave.5 gestação sem diferença entre os grupos, exceto nos
Este achado foi confirmado por outros autores.9 casos de coleta de material entre 37 e 41 semanas
Considerando que o sFlt-1 funciona como das pacientes que posteriormente desenvolveram
antagonista ao ligar-se aos fatores angiogênicos pré-eclâmpsia e nos casos em que o soro foi colhido
e prevenir a interação com seus receptores de entre 21 e 32 semanas e até 5 semanas antes do
superfície celular, foi demonstrado nesse grupo de aparecimento do quadro. Essas alterações foram
pacientes que os valores séricos das frações livres mais pronunciadas quando a paciente apresentou
de VEGF e PlGF estavam reduzidos proporcional- pré-eclâmpsia precoce (< 34 semanas) ou restrição
mente ao aumento de sFlt-1. Por fim, utilizando do crescimento intrauterino.10
um modelo animal no qual foi administrado um O autor sugere que, fisiologicamente, o estado
adenovírus recombinante produtor de sFlt-1, hou- pró-angiogênico do segundo trimestre (aumento
ve desenvolvimento de hipertensão e proteinúria de PlGF com sFlt-1 baixo) seria convertido para um
em ratas gestantes e não gestantes, inclusive estado antiangiogênico (aumento do sFlt-1 e queda
com análise histopatológica renal evidenciando do PlGF e VEGF), sendo que nas pacientes com
endoteliose glomerular, lesão característica da pré-eclâmpsia esta conversão seria mais precoce
pré-eclâmpsia.5 e abrupta, como um exagero do processo normal
Posteriormente a este estudo, Levine utilizou de controle do crescimento e funcionamento
o banco de soros de um estudo prospectivo rando- placentário.10
mizado anterior (Calcium for Preeclampsia Pre- Alguns autores já relataram a associação do
vention – CPEP) e comparou os valores de sFlt-1, sFlt-1 com disfunção miocárdica em pacientes com
PlGF e VEGF das pacientes com pré-eclâmpsia PE e miocardiopatia periparto. A função cardíaca
pareadas com pacientes normotensas de mesma avaliada de forma não invasiva através do índice
idade gestacional na primeira coleta sérica (120 de performance miocárdica (IPM) demonstrou
casos e 120 controles), utilizando o mesmo pro- uma disfunção diastólica em pacientes com pré-
cedimento de Maynard (método ELISA). O autor eclâmpsia quando comparadas com gestantes
comprovou que as pacientes analisadas após o sem doenças, sendo que esta alteração do IPM
diagnóstico de pré-eclâmpsia possuíam níveis estava correlacionada com os níveis circulantes de
séricos maiores de sFlt-1 e menores de PlGF e sFlt-1. Ratos expostos ao sFlt-1 durante 3 semanas
VEGF que o grupo controle. Depois, em uma apresentaram queda significativa da densidade
análise longitudinal, ele observou que, durante vascular e fração de encurtamento miocárdico
a gestação normal, a concentração de sFlt-1 identificados através de ecocardiografia, resultando
manteve-se constante até 33 a 36 semanas, apre- em insuficiência cardíaca e corroborando a teoria
sentando posterior subida semanal até o parto; a inicialmente proposta. Além disso, pacientes
de PlGF manteve-se constante nos dois primeiros que desenvolveram miocardiopatia periparto
trimestres, apresentou pico entre 29 a 32 semanas apresentaram valores séricos de sFlt-1 maiores
e posterior queda contínua; o VEGF manteve-se que controles quatro a seis semanas após o parto,
baixo durante toda gestação.10 enquanto geralmente há normalização deste
Avaliando o grupo de pacientes com pré- marcador entre 48 a 72 horas após o parto.11 Os
eclâmpsia, Levine relatou que, antes do diagnóstico, resultados expostos sugerem que o sFlt-1 também
houve elevação da concentração de sFlt-1 entre 21 pode apresentar um papel no aumento do risco
e 24 semanas de gestação, sendo esta elevação cardiovascular, especialmente relacionado à
mais rápida de 11 a 9 semanas antes da abertura disfunção cardíaca.
do quadro, chegando ao pico 5 semanas antes e Diversos autores continuaram esta linha de
mantendo-se neste patamar até o diagnóstico. Os pesquisa, estudando fatores angiogênicos e an-

28 revista.hupe.uerj.br
Fatores angiogênicos e antiangiogênicos na fisiopatologia da
pré-eclâmpsia e seu uso na prática obstétrica atual

tiangiogênicos urinários,12,13 a associação dos fa- O tratamento difere entre estas patologias e o
tores séricos com achados ultrassonográficos14-16 diagnóstico incorreto pode levar a uma elevada
e principalmente a possibilidade de utilizar estes morbimortalidade materna e fetal.21
marcadores como preditores da pré-eclâmpsia.17-19 Entre as patologias mencionadas, o LES
Entre estas novas aplicações, sem dúvidas a merece atenção especial. É uma doença autoi-
predição da pré-eclâmpsia no primeiro trimestre mune caracterizada pelo depósito de complexos
da gestação, especialmente a sua forma grave antígeno-anticorpo nos capilares e em diversas
e precoce, é a mais promissora e já está sendo vísceras. A maioria das pacientes com LES está
utilizada na prática clínica em alguns países,20 em idade reprodutiva (entre 26 e 40 anos), e os
inclusive no Brasil. achados clínicos podem ser leves ou graves com
acometimento de múltiplos órgãos, incluindo rim
Fatores angiogênicos e (nefrite), pulmão (pleurite ou pneumonite), fígado
(hepatite) e cérebro.22 Entre as pacientes com
antiangiogênicos na predição da nefrite lúpica, os achados clínicos e laboratoriais
pré-eclâmpsia são semelhantes àquelas com pré-eclâmpsia
grave, apresentando hipertensão, proteinúria e
Em uma série de trabalhos realizados no edema.23 A exacerbação grave do LES pode ocor-
King’s College, em Londres, um grupo de pes- rer em 25-30% das gestantes, inclusive podendo
quisa investigou prospectivamente marcadores ocorrer pela primeira vez durante a gravidez ou
identificados em gestações únicas entre 11 e 13 no período pós-parto. O tratamento inclui o uso
semanas que estariam associados com o futuro de corticosteroides, hidroxicloroquina e outras
desenvolvimento de pré-eclâmpsia. A associação drogas imunossupressoras.22
de características maternas com marcadores bio- Em uma revisão sistemática recente de
físicos, avaliados através da dopplerfluxometria 2751 gestações em 1842 pacientes com LES, foi
das artérias uterinas, e marcadores laboratoriais, encontrada reativação da doença em 25,6% dos
incluindo o PlGF, foi capaz de detectar 91% dos casos, hipertensão em 16,3%, nefrite em 16,1%,
casos de pré-eclâmpsia precoce (antes de 34 pré-eclâmpsia em 7,6%, eclâmpsia em 0,8%
semanas) e 60,9% dos casos de pré-eclâmpsia e prematuridade em 39,4% dos partos. Houve
que ocorrem no termo, com uma taxa de falso associação positiva entre parto prematuro e nefrite
positivo de 5%.20 ativa, assim como entre hipertensão e nefrite ativa
Apesar da queda da taxa de detecção nos ou história de nefrite.24
casos mais tardios, o benefício na identificação A revisão de 76 gestações em 63 pacientes
dos casos precoces é significativo, visto que a com lúpus no Hospital Universitário Pedro Er-
incidência de resultados adversos maternos e nesto encontrou resultados semelhantes. 15%
fetais está inversamente relacionada com a idade das pacientes desenvolveram pré-eclâmpsia, 30%
gestacional do surgimento da doença.20 hipertensão arterial, 27% dos fetos apresentaram
sofrimento fetal crônico e 14 pacientes precisaram
Fatores angiogênicos e aumentar corticoesteroides durante a gestação.
O parto ocorreu numa idade gestacional média
antiangiogênicos no diagnóstico de 35 semanas e foi notado um aumento do óbi-
diferencial da pré-eclâmpsia to fetal em pacientes com nefrite comparados
quando comparado com pacientes sem nefrite
Além da dificuldade de predição e de en- (37% x 12,2%).25
tendimento da fisiopatologia, a pré-eclâmpsia Além dos resultados adversos maternos e
apresenta semelhança clínica e laboratorial com perinatais associadas à pré-eclâmpsia e ao LES,
várias patologias obstétricas, clínicas e cirúrgicas, o diagnóstico diferencial entre as duas condições
como por exemplo o fígado gorduroso agudo da é complexo: ambas podem apresentar aumento
gravidez, a púrpura trombocitopência trombó- de proteinúria, hipertensão, trombocitopenia e
tica, a síndrome hemolítica urêmica, a sepse e a deteriorização da função renal. A queda do com-
reativação do lúpus eritematoso sistêmico (LES). plemento sérico, esperada durante a atividade

v.13, n. 3, jul/set 2014 29


Revista HUPE, Rio de Janeiro, 2014;13(3):25-31

do LES e que poderia auxiliar no diagnóstico para as apresentações precoces da doença, e no


diferencial, pode estar mascarada pelo aumento auxílio ao diagnóstico diferencial com doenças
fisiológico da gestação. Há, portanto, necessidade clinica e laboratorialmente semelhantes.21
de melhorar a acurácia do diagnóstico diferencial Um estudo prospectivo para avaliação dos
entre pré-eclâmpsia e LES com nefrite. A medida fatores angiogênicos e antiangiogênicos em ges-
dos marcadores angiogênicos e antiangiogênicos tantes com LES encontra-se em andamento no Hos-
como sFlt-1 e PlGF torna-se promissora para este pital Universitário Pedro Ernesto, visando utilizar
papel, mas estudos ainda são aguardados.26 estes marcadores no diagnóstico diferencial entre
Até o momento, apenas um estudo caso- pré-eclâmpsia e nefrite lúpica. Os resultados deste
controle contendo pacientes gestantes com LES estudo poderão influenciar diretamente a assistência
estudou as medidas de sFlt-1 em pacientes com prestada a esse grupo de gestantes de alto risco.
diagnóstico de pré-eclâmpsia, encontrando con-
centrações elevadas em comparação às pacientes Referências
com LES sem diagnóstico de pré-eclâmpsia. No
entanto, o estudo é pequeno (18 casos e 34 con- 1. Sibai B, Dekker G, Kupferminc M. Pre-eclampsia.
troles), não avalia pacientes com nefrite lúpica Lancet. 2005;365(9461):785-99.
e não mediu os títulos dos fatores angiogênicos 2. Vatten LJ, Skjaerven R. Is pre-eclampsia more than
VEGF e PlGF.27 one disease? BJOG. 2004;111(4):298-302.
Um relato de caso publicado sugere o possível 3. Duley L. Pre-eclampsia and the hypertensive
uso dos fatores angiogênicos e antiangiogênicos disorders of pregnancy. Br Med Bull. 2003;67:161-76.
como diagnóstico diferencial entre reativação do 4. Davison JM, Homuth V, Jeyabalan A, Conrad KP,
LES e pré-eclâmpsia. Uma gestante com diagnóstico Karumanchi SA, Quaggin S, et al. New aspects in the
pathophysiology of preeclampsia. J Am Soc Nephrol.
prévio de LES e nefrite foi internada com quadro 2004;15(9):2440-8.
de hipertensão progressiva, trombocitopenia e
5. Maynard SE, Min JY, Merchan J, Lim KH, Li J,
piora na proteinúria. Tendo em vista o diagnóstico Mondal S, et al. Excess placental soluble fms-like
inicial de reativação da doença de base, a paciente tyrosine kinase 1 (sFlt1) may contribute to endothelial
foi tratada com corticoesteroides mas não ocorreu dysfunction, hypertension, and proteinuria in
melhora do quadro e houve evolução para o óbito preeclampsia. J Clin Invest. 2003;111(5):649-58.
fetal. Após o parto, a rápida melhora clínica sugeriu 6. Silasi M, Cohen B, Karumanchi SA, Rana S. Abnormal
a hipótese de pré-eclâmpsia e a análise dos fatores placentation, angiogenic factors, and the pathogenesis
of preeclampsia. Obstet Gynecol Clin North Am.
angiogênicos e antiangiogênicos séricos coletados 2010;37(2):239-53.
no momento da internação foi compatível com este
7. Robak E, Kulczycka L, Sysa-Jedrzejowska A,
diagnóstico, revelando o sFlt-1 acima do percentil Wierzbowska A, Robak T. Circulating proangiogenic
95 para a idade gestacional com o PlGF abaixo molecules PIGF, SDF-1 and sVCAM-1 in patients with
do nível de detecção para o exame (menor que o systemic lupus erythematosus. Eur Cytokine Netw.
percentil 1).28 2007;18(4):181-7.
8. Barleon B, Reusch P, Totzke F, Herzog C, Keck C,
Conclusões Martiny-Baron G, et al. Soluble VEGFR-1 secreted
by endothelial cells and monocytes is present in
O estudo dos fatores angiogênicos e antian- human serum and plasma from healthy donors.
giogênicos durante a gestação permitiu um melhor Angiogenesis. 2001;4(2):143-54.
entendimento sobre a fisiopatologia da pré-e- 9. Koga K, Osuga Y, Yoshino O, Hirota Y, Ruimeng
clâmpsia, uma das principais causas de morbimor- X, Hirata T, et al. Elevated serum soluble vascular
talidade materna e de resultado perinatal adverso.1 endothelial growth factor receptor 1 (sVEGFR-1)
levels in women with preeclampsia. J Clin Endocrinol
Nesta doença exclusiva da gestação, a elevação
Metab. 2003;88(5):2348-51.
da citocina antiangiogência sFlt-1 promove o blo-
10. Levine RJ, Maynard SE, Qian C, Lim KH, England LJ,
queio das citocinas angiogênicas VEGF e PlGF,
Yu KF, et al. Circulating angiogenic factors and the risk
resultando em disfunção endotelial, hipertensão of preeclampsia. N Engl J Med. 2004;350(7):672-83.
e proteinúria.5,10 Além de melhorar o diagnóstico 11. Patten IS, Rana S, Shahul S, Rowe GC, Jang C, Liu L, et
da pré-eclâmpsia, estes marcadores estão sendo al. Cardiac angiogenic imbalance leads to peripartum
estudados na predição da doença, principalmente cardiomyopathy. Nature. 2012;485(7398):333-8.

30 revista.hupe.uerj.br
Fatores angiogênicos e antiangiogênicos na fisiopatologia da
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v.13, n. 3, jul/set 2014 31


Restrição de crescimento intrauterino
Intrauterine growth retardation

Restricción de crecimiento intrauterino


Dailson D. S. Pereira,* Alessandra L. C. Magalhães, Nilson R. de Jesús, Alexandre J. B. Trajano

Resumo
São denominados fetos pequenos para a idade gestacional (PIG) aqueles que têm o peso estimado abaixo do per-
centil 10. A Restrição do Crescimento Intrauterino (CIR) é a principal causa de fetos PIG e está associada à alta
taxa de morbimortalidade fetal e neonatal. Seu adequado diagnóstico, além do acompanhamento, tem impacto
como marcador de assistência à mãe e ao feto. Esta revisão tem como objetivo auxiliar o manejo desta grave
condição, tentando auxiliar na diminuição dos efeitos deletérios sobre o feto e o neonato. Atualmente, além do
investimento em tratamento neonatal, tem-se procurado investir no reconhecimento precoce das pacientes com
maior risco de terem fetos com CIR e nas formas terapêuticas de aumentar sua prevenção, diminuindo, assim,
sua incidência e gravidade. As principais causas de CIR são: alterações genéticas, infecções e insuficiência pla-
centária. Reconhecer estas causas ajuda na decisão do momento apropriado do parto. De todas, a insuficiência
placentária é a mais comum e a que apresenta os maiores desafios, por ser paradoxalmente a que tem menor
potencial letal e, ao mesmo tempo, a que mais mata em nosso meio. O adequado manejo de gestações com CIR
causado pela insuficiência placentária impõe a necessidade do pleno conhecimento da sequência das alterações
hemodinâmicas feto-placentárias ao Doppler, para a decisão em relação a necessidade e o momento adequado,
dependendo da idade gestacional (IG), de se antecipar o parto, tendo em vista a ação danosa que a prematuridade
pode somar a estes fetos, com repercussões desfavoráveis que podem ir além do período perinatal.
Descritores: Retardo do Crescimento Fetal, RCIU; Ultrassonografia doppler; Insuficiência placentária.

Abstract
Are called ferns small for gestational age (SGA) those who have the estimated weight percentile below 10.
Intrauterine growth restriction (IUGR) is the leading cause of SGA fetuses and is associated with high rate of fetal
and neonatal morbidity and mortality. Proper diagnosis and monitoring has an impact as a marker of assistance
for the mother and the fetus. This review aims to assist the management of this serious condition, trying to
assist in reducing the deleterious effects on the fetus and the neonate. Currently, in addition to the investment
in neonatal treatment, has sought to invest in the early recognition of patients with higher risk of having fetuses
with IUGR and in therapeutic ways to increase its prevention, thus decreasing its incidence and severity. The
main causes of IUGR are: genetic changes, infections and placental insufficiency. Recognize these causes help in
the decision of the appropriate time of childbirth. Of all, the placental insufficiency is the most common and which
presents the greatest challenges because it is paradoxically the least lethal potential and at the same time the most
kills in our midst. The appropriate management of pregnancies with IUGR caused by placental insufficiency imposes
the necessity of the full knowledge of the sequence of the hemodynamic changes fetus-placental Doppler to, for the
decision about the necessity and the appropriate time, depending on the gestational age (GA), to anticipate the birth
with a view to damaging action that prematurity can sum these ferns, with unfavourable repercussions that may
go beyond the perinatal period.
Keywords: Intrauterine Growth Retardation, IUGR; Ultrasonography, doppler; Placental insufficiency.

*
Endereço para correspondência:
Núcleo Perinatal, HUPE, UERJ.
Revista HUPE, Rio de Janeiro, 2014;13(3):32-39 Av. Prof. Manoel de Abreu, 500, 1º andar,
Recebido: 24/04/2014 | Revisado: 02/07/2014 | Aprovado: 28/07/2014 Rio de Janeiro, RJ, Brasil. CEP: 20550-170.
doi: 10.12957/rhupe.2014.12135 E-mail: dailsondamian@globo.com

32 revista.hupe.uerj.br
Restrição de crescimento intrauterino

Resumen
Son denominados fetos pequeños para la edad gestacional (PEG) aquellos que tienen el peso estimado bajo el
percentil 10. La restricción del crecimiento intrauterino (RCIU) es la principal causa de fetos PEG y está asociada
a la alta tasa de morbimortalidad fetal y neonatal. Su adecuado diagnóstico y acompañamiento tienen impacto
como marcador de asistencia a la madre y al feto. Esta revisión tiene como objetivo ayudar en el manejo de esta
grave condición, intentando disminuir los efectos deletéreos sobre el feto y el neonato. Actualmente, más allá de
la inversión en tratamiento neonatal, se ha buscado invertir en el reconocimiento precoz de las pacientes con
mayor riesgo de tener fetos con RCIU y en las formas terapéuticas de aumentar la prevención, disminuyendo,
así, la incidencia y gravedad. Las principales causas de RCIU son: alteraciones genéticas, infecciones e insufi-
ciencia placentaria. Reconocer estas causas ayuda en la decisión del momento adecuado para el parto. De todas,
la insuficiencia placentaria es la más común y la que presenta los mayores desafíos, por ser paradójicamente
la que tiene menor potencial letal y al mismo tiempo la que más mata en nuestro medio. El adecuado manejo de
gestaciones con RCIU causado por la insuficiencia placentaria exige la necesidad del pleno conocimiento de la
secuencia de las alteraciones hemodinámicas feto-placentarias al Doppler, para la decisión respecto a la necesidad
y el momento adecuado, dependiendo de la edad gestacional (EG), de anticiparse al parto, teniendo en cuenta la
acción dañina que la prematuridad puede sumar a estos fetos, con repercusiones desfavorables que pueden ir
más allá del periodo perinatal.
Palabras clave: Retardo del Crescimiento Intrauterino, RCIU; Ultrasonografía doppler; Insuficiencia placentaria.

Introdução Pode haver fetos PIGs sem que haja a presen-


ça de patologias. São ditos pequenos constitucio-
Restrição de crescimento intrauterino (CIR) é nais e cursam com baixo risco de hipóxia fetal.
associada com morbidade e mortalidade perinatal Geralmente, sua curva de crescimento, embora
aumentada,1 assim como com maior morbidade em abaixo do p10, é paralela a curva normal.
longo prazo e predisposição a doenças crônicas No entanto, também há situações como a
na idade adulta.2 Apesar das opções limitadas de pré-eclâmpsia, infecções, doença do anticorpo
tratamento intra útero, o diagnóstico pré-natal antifosfolipídeo e aneuploidias que vão causar a
é essencial já que foi observado que fetos com CIR e aumentam o risco de hipóxia fetal.
restrição de crescimento não diagnosticados no É importante a diferenciação entre a CIR de
período pré-natal apresentavam um risco quatro início precoce e aquela de início tardio, que têm
vezes maior de desfechos adversos quando com- diferentes características bioquímicas, biofísicas
parados com aqueles diagnosticados durante a e clínicas. Na primeira forma, ocorrida na fase de
gestação.3 Portanto, a vigilância do bem-estar fetal hiperplasia celular fetal, a restrição de crescimen-
é o ponto chave do manejo obstétrico, permitindo to fetal é simétrica e mais comumente associada
a programação do momento ideal do parto. ao uso de drogas, alterações genéticas e infecções
fetais, principalmente pelo TORCHS.7 Neste tipo, é
Definição comum o reconhecimento de alterações estrutu-
rais do feto à ecografia. Outro achado ecográfico
O feto PIG é definido como aquele com um que sugere este tipo é a presença de polidramnia
peso estimado pela ultrassonografia abaixo do junto com o feto simetricamente menor.5 Vale
percentil 10 para idade gestacional.4 Esta definição ressaltar que a maioria dos fetos simetricamente
acarreta na inclusão em um grupo de risco de fetos pequenos são constitucionais e não apresentarão
que não apresentarão nenhum dano futuro. Alguns alterações estruturais ou risco de dano fetal.5
autores recomendam que a classificação mais cor- Depois de instalada a CIR nesta fase, a letalidade
reta deveria incluir medidas seriadas da biometria é alta e possibilidade de manejo médico é pequena.
fetal.5 Quaisquer que sejam os parâmetros de clas- CIR tardio ocorre na fase de hipertrofia
sificação usados, é fundamental a correta datação celular fetal e sua principal causa é a insuficiência
da idade gestacional, a respeito da data da última placentária, estando, portanto, ligada a pré-
menstruação de certeza (DUM) e pela ecografia eclâmpsia e sendo caracterizado por uma assimetria
obstétrica precoce, preferencialmente pela medida do crescimento fetal, com a circunferência
do comprimento cabeçanádega (CCN).6 abdominal menor que o esperado para a IG

v.13, n. 3, jul/set 2014 33


Revista HUPE, Rio de Janeiro, 2014;13(3):32-39

e menor proporcionalmente que o perímetro fisiopatologia da CIR envolve a trombose


cefálico e as medidas de ossos longos. É neste placentária.14
tipo de CIR que o médico pode intervir para Outras causas que podem ser citadas são:
diminuir a morbimortalidade. Geralmente, não há infecções maternas e congênitas, uso de drogas,
malformações fetais. É comum o aparecimento tabagismo e etilismo, desnutrição materna, doen-
de oligodramnia, principalmente em casos mais ças renais, doenças do colágeno, malformações
graves. Outros achados comuns são alterações fetais, cromossomopatias, anomalias placentárias
hemodinâmicas fetais, mais facilmente reconhecidas e do cordão umbilical.14
por meio da dopplerfluxometria. 5 Na maioria Marcadores bioquímicos: diversos mar-
dos casos, a CIR é secundária à insuficiência cadores bioquímicos vêm sendo pesquisados
placentária.8 para o rastreio de pacientes com maior risco de
O tipo misto ocorre na fase concomitante desenvolvimento de CIR. Dentre estes, podemos
de hiperplasia e hipertrofia celular, entre 16 e 32 citar a proteína plasmática A (PAPP-A) e a fração
semanas de gravidez.7 livre do HCG que, quando em níveis baixos no
Vale ressaltar que também podemos encon- primeiro trimestre, têm associação com CIR e
trar o início da instalação da insuficiência pla- pré-eclâmpsia.15,16 No segundo trimestre, temos a
centária de forma precoce, na fase de hiperplasia elevação da alfa fetoproteína sérica ou da inibina
celular, levando a CIR simétrico. Geralmente, o A como marcadores de risco.17-19
desfecho é pior nesta condição. Artérias uterinas: a avaliação das artérias
uterinas foi proposta como método de rastreio
Rastreio/diagnóstico com taxas de detecção variando de 25 a 75% de
acordo com a taxa de falso positivo adotada.20
Anamnese: a identificação de fatores de
Estratégias de utilização de fatores de risco ma-
risco para CIR deve ser realizada rotineiramente
ternos, pressão arterial, marcadores bioquímicos
na 1a consulta pré-natal. Dentre eles, podemos
e Doppler de artérias uterinas no primeiro trimes-
citar:
tre vêm sendo pesquisadas para rastreio de CIR
• História pregressa de CIR ou de natimor- e pré-eclâmpsia.21
to: mulheres que tiveram um feto com CIR em Medida do fundo uterino: a medida da altura
gestação prévia têm risco de recorrência de do fundo uterino (AFU) é mais um método de vigi-
50%.9 Além disso, mais da metade dos óbitos lância do que de rastreio visto que sua força recai
fetais intrauterinos de fetos morfologicamen- na medida seriada.8 Tal vigilância é recomendada
te normais está associado com CIR, princi- pelo Royal College of Obstetrics and Gynaeco-
palmente se ocorrido antes de 32 semanas logists.22 Indicações para investigação adicional
de gravidez.10 incluem medidas abaixo do percentil 10 para
• Diabetes: apresentam risco elevado de idade gestacional e medidas seriadas mostrando
CIR8 assim como importante associação com crescimento abaixo do esperado.8
pré-eclâmpsia, podendo chegar a 50% tal Ultrassonografia de segundo e terceiro tri-
associação. mestres: a efetividade da avaliação biométrica
por esta ultrassonografia para rastreio de CIR e
• Obesidade: aumenta o risco de fetos pe- seu impacto no desfecho perinatal em gestações
quenos para idade gestacional em 50%.11 de baixo risco é incerto.
• Gestação múltipla: a CIR é responsável por Por outro lado, em gestações de alto risco, a
grande parcela da maior taxa de morbidade e avaliação fetal através da estimativa de peso ou
mortalidade na gestação múltipla.12 da medida da circunferência abdominal é o melhor
preditor do crescimento fetal,23 sendo a avaliação
• Pré-eclâmpsia: pode causar CIR e é um
seriada da biometria fetal o padrão-ouro para o
indicador de sua severidade, especialmente
rastreio de CIR.22 Estimativas seriadas devem ser
quando iniciada antes de 37 semanas.13
realizadas em prazo não menor que duas semanas
• Síndrome do anticorpo antifosfolipídeo: a visando evitar a margem de erro inerente ao método.6

34 revista.hupe.uerj.br
Restrição de crescimento intrauterino

Manejo Cardiotocografia: é falha ao demonstrar efei-


to na redução da mortalidade perinatal. A análise
Como há pouco a se fazer no tratamento da microscilação (short term variation) através
intraútero das outras causas de CIR, iremos nos da cardiotocografia computadorizada, no entanto,
ater ao manejo da insuficiência placentária como se correlaciona bem com acidose fetal e hipóxia
causa. severa e se torna anormal coincidentemente com
Doppler fetal (artéria umbilical/artéria o ducto venoso.30
cerebral média-ACM): os índices de resistência Perfil biofísico fetal: a alta taxa de falso
das artérias umbilicais refletem a resistência ao positivo (50%) e a ausência de demonstração de
fluxo do território placentário e se correlaciona benefícios nas gestações de alto risco limitam a
com a condição fetal e o desfecho da gravidez.24 sua utilidade clínica. Além disso, as alterações no
A aplicação da dopplerfluxometria nas gestações tônus, movimentos respiratórios e movimentos
complicadas com CIR levou à diminuição da corporais são muito tardias, em média de 48 a 72
taxa de mortalidade perinatal e admissão na UTI horas após o ducto venoso.28,29
neonatal.25
A progressão fisiopatológica deste vaso Definição do parto
inicia-se com o aumento de sua resistência, pas-
sando pela centralização fetal e podendo chegar Conforme já mencionado, as possibilidades
à diástole zero e diástole reversa. Centralização de tratamento intraútero são limitadas. Logo,
fetal consiste na redistribuição do fluxo fetal em o manejo obstétrico visa o parto de um feto a
situações de hipóxia fetal, priorizando o fluxo tempo de evitar lesão hipóxica e morte intrau-
para órgãos nobres: cérebro, coração e adrenais.26 terina balanceado contra a morbidade potencial
Seu diagnóstico é dado quando a resistência das causada pela prematuridade. Em alguns casos, o
artérias umbilicais, em constante elevação nesta manejo será ditado pelas condições maternas já
patologia, ultrapassa a resistência das ACMs, em que a CIR é frequentemente associada a doenças
queda pela redistribuição.26 maternas com lúpus eritematoso, pré-eclâmpsia
O fluxo diastólico ausente ou reverso é mais e nefropatia.
comumente encontrado na CIR de início precoce Quando a CIR é associada à cromossomopa-
e é relatado que esses padrões se apresentam em tias e malformações fetais, o grau de letalidade
média uma semana antes da deterioração fetal.27 e morbidade relacionado também deve ser le-
Estudos recentes sugerem que esse achado tem vado em consideração no momento da decisão,
valor na predição da morbidade e mortalidade geralmente ocorrendo no termo, para que não
perinatal independente da idade gestacional.28-29 se agregue a prematuridade aos riscos fetais já
Líquido amniótico: estudos longitudinais em existentes.
CIR por insuficiência placentária de início precoce Com relação à via de parto, vale lembrar que
mostraram que o volume de líquido decresce pro- se uma hipóxia fetal relativa está presente antes
gressivamente.30 Em contrapartida, fetos com CIR do início do trabalho de parto, mesmo contrações
com aneuploidias ou malformações apresentam uterinas normais podem ocasionar um quadro
polidramnia. de sofrimento fetal agudo.6 Assim, a cesariana é
Ducto venoso: com a deterioração fetal, a mais frequente em pacientes com restrição do
pressão venosa central aumenta e as velocidades crescimento fetal, principalmente quando há alte-
diastólicas no ducto venoso caem progressiva- ração na dopplerfluxometria. O feto com CIR em
mente levando à onda A (que reflete a contração trabalho de parto, induzido ou espontâneo, deve
atrial no final da diástole) em direção à linha de ser continuamente monitorado já que apresenta
base e tornado-a ausente/negativa. Estas altera- maior risco de sofrimento agudo.6
ções são tardias e indicam falência cardíaca fetal Para definição do momento do parto é im-
iminente.27-29 O ducto venoso está associado à portante o conhecimento adequado do padrão de
acidose fetal. A onda A ausente ou reversa está deterioração clínica destes fetos, o que é determi-
associada com mortalidade perinatal independen- nado pela idade gestacional de início do quadro de
te da idade gestacional no momento do parto.28,29 restrição do crescimento. Na CIR por insuficiência

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Revista HUPE, Rio de Janeiro, 2014;13(3):32-39

Figura 1. Comparação entre a evolução do comprometimento fetal de instalação precoce e tardia. A figura
sumariza a evolução temporal das alterações biofísicas observadas na dopplervelocimetria, volume do líquido
amniótico, na cardiotocografia e no perfil biofísico fetal. Os “índices” se referem aos “Índices de Resistência e de
Pulsatilidade” da dopplervelocimetria. AU, artéria umbilical; ACM, artéria cerebral média; CTG, cardiotocografia;
VLA, volume de líquido amniótico; MR, movimento respiratório. Adaptado de BASCHAT, Ultrasound Obstet
Gynecol, 2011.

placentária diagnosticada antes de 34 semanas gestacional na UTI neonatal. No caso do Núcleo


ocorre aumento progressivo da resistência na Perinatal do Hospital Universitário Pedro Ernesto
artéria umbilical, acompanhada pela centralização (NU-HUPE) este ponto de corte é de 27 semanas,
fetal, diminuição progressiva do fluxo umbilical motivo pelo qual não indicamos a antecipação
diastólico até estar ausente e seguida pela dete- do parto antes desta idade gestacional. Segundo
rioração do ducto venoso, da cardiotocografia e Baschat e colaboradores,28 antes de 27 semanas
do perfil biofísico fetal.29 Tal progressão ocorre o peso da prematuridade é tão grande que mesmo
em média em 4 a 6 semanas, e esta velocidade é o ducto venoso sozinho não fornece suficiente
ditada pela rapidez com que o fluxo diastólico na estratificação de risco.
artéria umbilical se torna ausente/reverso.29 Na Entre 27 e 30 semanas, a conduta no NU-HU-
CIR de início tardio, por sua vez, a resistência da PE é ditada pelo ducto venoso, pois nesta idade
artéria umbilical é pouco aumentada ou mesmo gestacional cada dia do feto in utero aumenta em
normal, podendo ocorrer a dilatação da artéria 2% a sua taxa de sobrevida.28
cerebral média de forma isolada.29 Tal sequência Após 30 a 32 semanas o Doppler de artéria
de eventos é ilustrada na figura 1. umbilical é o mais importante indicador de dano
Na decisão do momento do parto tem papel fetal e é geralmente aceito que um fluxo diastó-
fundamental a idade gestacional do feto visto que lico ausente ou reverso seja uma indicação para
quanto maior a idade gestacional menor o impacto antecipação do parto.6,28
da prematuridade e, portanto maior a influência Com relação à corticoterapia, ela deve ser re-
de parâmetros biofísicos no prognóstico perinatal alizada antes de 34 semanas nestes fetos, visando
e na morbidade de longo prazo.28,29 Vale ressaltar à diminuição das complicações neonatais e deve
a importância de uma equipe neonatal preparada ser dada preferência à betametasona.
e o conhecimento do ponto de corte para idade As figuras de 2 a 4 demonstram um algoritmo

36 revista.hupe.uerj.br
Restrição de crescimento intrauterino

USG = PIG
≥ 34 semanas

resistência doppler da AU normal

oligodramnia normodramnia

USG + doppler da AU propedêutica USG + doppler da AU


semanal anormal a cada 2 semanas
CTG 2x / sem

antecipação aguardar trabalho antecipação parto por indicação


do parto de parto* do parto obstétrica ou
por cesariana por cesariana risco materno

*
Não ultrapassar a 39a semana
Figura 2: Condução dos fetos com restrição de crescimento com trinta e quatro semanas de gravidez ou mais.

USG = PIG
30 ≥ 34 semanas

diástole zero
ou reversa doppler da AU normal

resistência oligodramnia normodramnia


doppler da AU
anormal
seguir conduta
da alteração
USG + doppler
da AU semanal USG + doppler USG + doppler da AU
da AU semanal a cada 2 semanas
CTG
CTG 2x / sem
alterada

doppler inalterado
e normodramnia doppler inalterado doppler normal
e CTG normal
corticosteroide
antecipação antecipação
do parto cesariana com seguir conduta para do parto seguir conduta para
por cesariana 34 semanas* IG ≥ 34 sem por cesariana IG ≥ 34 sem

Figura 3: Condução dos fetos com restrição de crescimento entre trinta e trinta e quatro semanas de gravidez.

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Revista HUPE, Rio de Janeiro, 2014;13(3):32-39

USG = PIG
24 a < 30 semanas

diástole zero
doppler da AU normal
ou reversa

ducto venoso ducto venoso USG + doppler da AU


resistência
alterado normal a cada 2 semanas

USG + doppler USG semanal


semanal doppler da AU
DV 2/2 dias ou 2x / sem
diário, a partir
de 27 semanas
diástole zero
doppler inalterado
ou reversa
seguir conduta
corticosteroide corticosteroide
da alteração
MgSO4 MgSO4
cesariana com cesariana com seguir conduta para
27 semanas 30 semanas IG ≥ 30 sem

Figura 4: Condução dos fetos com restrição de crescimento entre 24 e 30 semanas de gravidez.

com a proposta de condução dos fetos com diag- 8. Figueras F, Gardosi, J. Intrauterine growth
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v.13, n. 3, jul/set 2014 39


Diabetes na gestação
Diabetes in pregnancy

Diabetes en la gestación
Raquel C. Abi-Abib, Carolina A. Cabizuca, João Regis I. Carneiro,* Fernanda O. Braga,
Roberta A. Cobas, Marília B. Gomes, Guilherme R. de Jesús, Fátima R. D. Miranda

Resumo
Devido ao aumento da idade materna e à epidemia de obesidade, a prevalência de gestantes com diabetes tipo 2
ou que desenvolvem diabetes mellitus gestacional (DMG) tem sido cada vez maior. A associação do diabetes com
aumento do risco de complicações materno-fetais é conhecida há muitos anos, mas foi apenas em 2008 que a
forte e contínua relação entre níveis glicêmicos acima do normal e risco de complicações fetais foi confirmada
por meio de um grande ensaio clínico prospectivo. Atualmente, a investigação quanto à presença de diabetes na
gestação é recomendada para todas as gestantes, pela realização de glicemia de jejum na primeira consulta do
pré-natal e de TOTG (Teste Oral de Tolerância à Glicose) entre a 24ª e a 28ª semanas. O tratamento realizado
por equipe multidisciplinar e com objetivo de manter o controle glicêmico o mais próximo possível do normal
possibilita a redução das taxas de morbimortalidade materno-fetais. O objetivo desta revisão é discorrer sobre
epidemiologia, fisiopatologia, diagnóstico, complicações, acompanhamento e tratamento de gestantes portadoras
de diabetes tipo 1 ou 2 e das portadoras de DMG, ressaltando-se as semelhanças e peculiaridades de cada caso,
com base nos principais estudos e consensos mais recentes.
Descritores: Diabetes mellitus; Diabetes gestacional; Gestação.

Abstract
Due to maternal aging and the obesity epidemic, the prevalence of type 2 diabetes mellitus among pregnant women
and gestational diabetes mellitus is increasing. The association of diabetes and increasing risk of maternal and
fetal complications has been known for several years, but only in 2008 the strong and continuous relationship
between high glucose levels and the risk of fetal complications was confirmed in a large prospective clinical
trial. Currently, diabetes screening is warranted in every pregnant woman through the measurement of fasting
plasma glucose in the first pre-natal evaluation and OGTT (Oral Glucose Tolerance Test) between the 24th and 28th
gestational weeks. Treatment is carried out by a multidisciplinary team, aiming at achieving near-normal glucose
levels, leading to the reduction of maternal and fetal morbidity. The purpose of this review article is to discuss
the epidemiology, physiopathology, diagnosis, complications, treatment and follow-up of pregnant women with
pregestational diabetes and gestational diabetes, pointing out the similarities and peculiarities of each condition
based on the most important studies and the most recent consensus.
Keywords: Diabetes mellitus; Diabetes, gestational; Pregnancy.

Resumen
Debido al aumento de la edad materna y a la epidemia de obesidad, la prevalencia de gestantes con diabetes
tipo 2 o que desarrollan diabetes mellitus gestacional (DMG) ha sido cada vez mayor. La asociación de la
diabetes con aumento del riesgo de complicaciones materno-fetales es conocida hace muchos anos, pero fue
apenas el 2008 que la fuerte y continua relación entre niveles glicémicos por encima de lo normal y riesgo
de complicaciones fetales fue confirmada por medio de un gran ensayo clínico prospectivo. Actualmente, la
investigación en cuanto a la presencia de diabetes en la gestación es recomendada para todas las gestantes,
mediante la realización de glicemia de ayuno en la primera consulta del prenatal y el Test de tolerancia oral a

*
Endereço para correspondência:
Serviço de Diabetes, HUPE, UERJ.
Revista HUPE, Rio de Janeiro, 2014;13(3):40-47 Boulevard 28 de Setembro, 77, 3º andar,
Recebido: 24/04/2014 | Revisado: 02/07/2014 | Aprovado: 28/07/2014 Rio de Janeiro, RJ. CEP: 20551-030.
doi: 10.12957/rhupe.2014.12136 E-mail: endoregis@uol.com.br

40 revista.hupe.uerj.br
Diabetes na gestação

la glucosa (TTOG) entre la 24ª y la 28ª semanas. El tratamiento realizado por equipo multidisciplinario, con el
objetivo de mantener control glicémico lo más próximo posible de lo normal posibilita la reducción de las tasas
de morbimortalidad materno-fetales. El objetivo de esta revisión es discurrir sobre la epidemiología, fisiopato-
logía, diagnóstico, complicaciones, acompañamiento y tratamiento de gestantes portadoras de diabetes tipo 1
o 2 y de las portadoras de DMG, resaltándose las semejanzas y peculiaridades de cada caso, con base en los
principales estudios y consensos más recientes.
Palabras clave: Diabetes mellitus; Diabetes gestacional; Gestación.

Introdução de hormônios diabetogênicos, incluindo hormônio


do crescimento, cortisol, hormônio lactogênico
A gestação complicada pelo diabetes, seja placentário e progesterona.
ele pré-gestacional ou gestacional, tem um risco
elevado de morbimortalidade materna e fetal. O Diagnóstico de DMG
planejamento da gestação, rastreamento para o
diabetes mellitus gestacional (DMG) e o acompa- Até março de 2010, com a publicação pela
nhamento com uma equipe multidisciplinar podem IADPSG (International Association of Diabetes
minimizar os riscos. Além disso, gestantes com and Pregnancy Study Groups) dos novos critérios
diabetes pré-gestacional podem apresentar agra- diagnósticos de DMG, existiam várias formas de
vamento das complicações crônicas microvascu- rastreamento, ainda sem um consenso universal,
lares e no controle glicêmico, já que a gravidez é sobre qual o melhor teste a ser utilizado.2
um estado diabetogênico. Com o aumento da epi- Os critérios do IADPSG foram fundamentados
demia de obesidade, cada vez mais mulheres em no maior estudo multicêntrico já realizado em
idade fértil apresentam risco de desenvolvimento gestantes. Publicado em 2008, o objetivo desse
de diabetes tipo 2 e DMG. A prevalência deste estudo era avaliar a associação entre os diversos
último varia de 3 a 14% dependendo da população graus de hiperglicemia materna e o aumento dos
estudada e do método utilizado para sua detecção. riscos de complicações materno-fetais.3 No estu-
Este artigo tem como objetivo rever os principais do HAPO (Hyperglycemia and Adverse Pregnancy
tópicos relacionados à gestação complicada pelo Outcomes), 25.505 gestantes sem diagnóstico
diabetes. de diabetes foram submetidas ao TOTG com 75
g de glicose anidra entre a 24a e 32a semana de
Fisiopatologia gestação. Os pesquisadores concluíram que existe
uma associação direta entre os níveis de glicemia
Durante a gestação, o metabolismo materno maternos abaixo daqueles que eram considerados
se adapta para suprir as necessidades de nu- diagnósticos de diabetes e o aumento do peso fetal
trientes da unidade feto-placentária. No primeiro e dos níveis de peptídeo C no cordão umbilical.
trimestre, a glicose passa para o feto por difusão Tendo em vista os resultados do HAPO, um
facilitada e os aminoácidos são transportados novo consenso foi publicado em 2010 com o ob-
ativamente para a circulação placentária. A jetivo de uniformizar os critérios para diagnóstico
diminuição nos níveis de glicose e a perda de de DMG.2 A recomendação atual é que todas as
substrato para a gliconeogênese (principalmente gestantes realizem uma glicemia de jejum na
do aminoácido alanina) são fatores importantes primeira consulta pré-natal. Se o resultado for
para a hipoglicemia materna no início da gestação. menor que 92 mg/dL, um TOTG com 75 g deverá
Por volta da 18a semana, tem início a resistência à ser realizado entre a 24a e 28a semana de gesta-
ação da insulina que progride no terceiro trimes- ção. Caso a glicemia esteja acima de 126 mg/dL,
tre a níveis semelhantes àqueles observados no o diagnóstico será de diabetes pré-gestacional, e
diabetes mellitus tipo 2 (DM2). A sensibilidade se estiver acima de 92 e menor que 126 mg/dL, o
periférica à insulina no terceiro trimestre cai diagnóstico de DMG está estabelecido. Os resul-
em 50%, e a produção hepática de glicose é 30% tados devem ser confirmados com uma segunda
maior do que no início da gestação.1 A resistência medida da glicemia. Caso seja necessário realizar
insulínica resulta da combinação entre o aumento o TOTG, a dosagem da glicemia deverá ser feita
da adiposidade materna e da produção placentária em jejum, 1 e 2 horas após a sobrecarga de glicose.

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Revista HUPE, Rio de Janeiro, 2014;13(3):40-47

Apenas um valor acima do limite estabelecido é nas também são relevantes, especialmente na
suficiente para o diagnóstico de DMG (Tabela 1). presença de retinopatia e nefropatia, sobretudo
naquelas que já apresentavam tais complicações
Complicações materno-fetais previamente.
Mulheres com DMG têm um risco aumen-
Mulheres com diabetes pré-gestacional dife- tado de desenvolverem pré-eclâmpsia (de 10 a
rem daquelas com DMG porque a hiperglicemia 30%) quando comparadas àquelas com tolerân-
poderá estar presente no momento da organo- cia normal à glicose (de 5 a 7% de risco).32 Além
gênese fetal, aumentando substancialmente o disso, DMG aumenta substancialmente a chance
risco de malformações congênitas. Estas são
de desenvolver diabetes após o parto, de acordo
observadas em 6 a 12% dos filhos de mães diabé-
com alguns estudos mostrando que este risco é
ticas. As anomalias congênitas mais comuns são
de aproximadamente 40% após um período de
as cardíacas, esqueléticas e neurológicas, sendo a
seguimento de 10 anos.10
síndrome de regressão caudal de 250 a 600 vezes
mais frequente em filhos de mães diabéticas.4
A macrossomia fetal, definida quando o peso Aconselhamento pré-natal nas
do recém-nato é maior que 4 kg na gestação a diabéticas prévias
termo ou maior que o percentil 90 para a idade
gestacional, é a manifestação mais característica. A paciente diabética deve ser orientada, desde
É observada em até 30% dos casos e pode predis- a puberdade, sobre os riscos de uma gravidez não
por a traumas obstétricos e distocia de ombro.5 planejada e a importância de um bom controle
A hiperinsulinemia fetal, que resulta do diabetes glicêmico anterior à gestação. Idealmente, os
materno, é um fator importante no crescimento níveis glicêmicos e a hemoglobina glicada devem
fetal excessivo. Outros fatores maternos além da ficar o mais próximo da normalidade. Ela deve
hiperglicemia, como obesidade e concentração ser avaliada também quanto à presença de com-
sérica de aminoácidos e lipídeos, também influen- plicações crônicas como nefropatia, retinopatia,
ciam o peso fetal.6 Filhos hiperinsulinêmicos de neuropatia e cardiopatia. A pressão arterial deve
mães diabéticas possuem um risco aumentado de estar controlada, com valores < 130/80 mmHg, e
hipoglicemia após o parto. Esta complicação se os inibidores da enzima conversora de angioten-
torna menos comum em filhos de gestantes que sina e bloqueadores do receptor da angiotensina
permaneceram euglicêmicas durante o parto e na devem ser descontinuados antes da concepção.
maior parte da gestação.6,7 Nas diabéticas tipo 1, a função tireoidiana deve ser
Outras complicações neonatais relacionadas avaliada com objetivo de manter o TSH entre 1,3 e
ao DMG são hiperbilirrubinemia, a hipocalcemia, o 2,5 µU/L. No quadro 1 estão resumidas as contrain-
retardo de crescimento intrauterino, a policitemia dicações potenciais para gravidez em diabéticas.11
e a síndrome de angústia respiratória.7 Estudos
demonstram que indivíduos expostos ao diabetes Objetivos do tratamento
materno (tipo 1, 2 ou DMG) intraútero têm aumen-
to do risco de obesidade e intolerância à glicose Sabe-se que há uma associação contínua en-
na infância e no início da vida adulta.8 Além dos tre os valores glicêmicos na gestação e a taxa de
resultados adversos fetais, complicações mater- complicações materno-fetais. No entanto, o limiar
Tabela 1. Critérios para o diagnóstico de DMG da International Association of Diabetes and Pregnancy Study
Groups -2010.

Tempo Valor máximo da normalidade


Basal 92 mg/dL

1 hora 180 mg/dL


2 horas 153 mg/dL
Diagnóstico de DMG com 1 ou mais valores ≥ aos acima2

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Diabetes na gestação

Quadro 1. Resumo das contraindicações. a ingesta calórica diária de 30 a 35 kcal/kg/dia


Contraindicações potenciais para gravidez em para gestantes com peso normal e 25 kcal/kg/
diabéticas. dia para aquelas com sobrepeso ou obesidade.
Dietas com menos de 1500 kcal/dia associam-se
Doença cardíaca isquêmica
ao risco de cetoacidose e precisam ser evitadas.14
Hipertensão arterial >140/90 mmHg, apesar do tratamento As recomendações de ganho de peso durante a
gestação e a cada semana do 2° e do 3° trimestres
Gastroparesia
estão descritas na tabela 2.15
Retinopatia proliferativa não tratada O conteúdo calórico total deve ser composto por
40 a 45% de carboidratos, 15 a 20% de proteínas e 30 a
Nefropatia diabética grave: clearance de creatinina < 50
40% de gorduras e dividido em cerca de seis refeições
ml/min e/ou creatinina sérica > 2 mg/dL e/ou proteinúria
> 2 g/24h
leves ao longo do dia. Deve-se optar por carboidratos
complexos e ricos em fibras. Os adoçantes não caló-
ricos aspartame, sucralose e acessulfame podem ser
de glicemia a partir do qual o risco de complica- utilizados na gestação, de forma moderada.13
ções aumenta de forma significativa não é claro.3
Exercícios físicos
Estudos de revisão sugerem que o ponto de corte
para glicemia de jejum de 90 mg/dL seria o mais Exercícios físicos promovem redução da
relacionado à redução do risco de macrossomia; resistência insulínica, levando à melhora do con-
entretanto, metas de glicemia muito rigorosas trole glicêmico, à redução do ganho de peso e à
aumentam o risco de hipoglicemia e podem não diminuição da adiposidade fetal, além de ampliar
ser seguras para a maior parte das gestantes.12 a tolerância ao parto. Na ausência de contraindi-
Com o objetivo de minimizar o risco de com- cações, deve-se recomendar a prática de atividade
plicações materno-fetais, o tratamento do diabetes física por pelo menos 30 minutos, na maior parte
na gestação tem como meta valores de glicemia dos dias da semana, evitando-se exercícios com
pré-prandiais inferiores a 95 mg/dL, 1 hora após risco de queda ou trauma abdominal.13,16
o início da refeição inferior a 140 mg/dL, e 2 horas
pós-prandial abaixo de 120 mg/dL.11,13
Insulinoterapia
Aproximadamente entre 50 e 80% das
Tratamento mulheres com DMG alcançam o controle glicêmico
satisfatório com dieta e exercício. No restante, a
Dieta insulina é a terapia de escolha, já que esta não
A orientação nutricional é parte fundamental atravessa a placenta e tem segurança conhecida. O
do tratamento de toda gestante portadora de controle adequado é obtido com uma dose média
diabetes. O cálculo calórico diário deve ser indi- de 0,5 a 1,0 UI/kg/dia, porém a dose e o esquema
vidualizado de acordo com IMC, nível de atividade terapêutico inicial devem ser individualizados e
física e crescimento fetal. Em geral, calcula-se posteriormente ajustados conforme os resultados
Tabela 2. Recomendações de ganho de peso na gestação.

Estado nutricional inicial Ganho total no 1[º] Ganho semanal no 2[º] e Ganho total na gestação
(IMC) trimestre (kg) 3[º] trimestres (kg) (kg)

Baixo peso 2,3 0,5 12,5 – 18,0

Adequado 1,6 0,4 11,5 – 16,0

Sobrepeso 0,9 0,4 7,0 – 11,5

Obesidade – 0,2 5–9

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Revista HUPE, Rio de Janeiro, 2014;13(3):40-47

da monitoração da glicemia capilar. Pacientes que uma vez que há risco de piora do controle glicê-
apresentem apenas elevação da glicemia pós- mico, cetoacidose e hipoglicemia, no período de
prandial podem ser adequadamente tratadas com início da terapia de infusão contínua.20
o uso de insulina regular ou ultrarrápida, antes das
refeições. Caso tanto a glicemia de jejum quanto Hipoglicemiantes orais
as glicemias pós-prandiais estejam elevadas, o
esquema de múltiplas doses de insulina, em regime A glibenclamida pode ser utilizada, como uma
basal bolus, é a melhor opção de tratamento.13 alternativa à insulina, em mulheres com diabetes
Pacientes portadoras de diabetes tipo 2, mellitus gestacional com mais de 25 semanas
em uso de hipoglicemiantes orais, devem ser de gestação e que apresentem glicemia de jejum
recomendadas a suspender essas medicações e menor do que 110 mg/dL.11,21
iniciar tratamento com insulina quando estive- Ao contrário da glibenclamida, a metformina
rem planejando engravidar, uma vez que não há atravessa a barreira placentária. No entanto,
comprovação de segurança do uso de hipoglice- estudos recentes demonstram segurança no seu
miantes no primeiro trimestre.17 Pacientes com uso em portadoras de diabetes gestacional com
diabetes pré-gestacional que já faziam uso prévio mais de 24 semanas e, em seus filhos, até os dois
de insulina, em geral, necessitam de redução da anos de idade.22,23 As vantagens são praticidade
dose de insulina em 10 a 20% no primeiro trimes- do uso, ausência de hipoglicemia e baixo custo.
tre, devido à maior ocorrência de hipoglicemia A segurança do uso da glibenclamida e da
nesse período. Após a 18a semana, é frequente a metformina na gestação em pacientes com dia-
necessidade de aumento progressivo da dose de betes pré-gestacional ainda não foi estabelecida.
insulina, sendo que, ao final da gestação, a dose Não há dados sobre a eficácia e a segurança de
diária de insulina utilizada é, em média, o dobro outros hipoglicemiantes na gestação.
da dose pré-gestacional.18
As insulinas ultrarrápidas lispro e aspart são Acompanhamento
seguras na gestação e têm a vantagem de pro-
porcionar maior flexibilidade de estilo de vida e As mudanças hormonais que ocorrem ao
melhor controle da glicemia pós-prandial do que longo da gestação interferem no metabolismo
a insulina regular, embora com a desvantagem glicídico de forma dinâmica, de modo que o acom-
do custo mais elevado.11,17,19 A insulina ultrarrápida panhamento de gestantes diabéticas deve ser
glulisina ainda não tem segurança comprovada na feito em consultas frequentes, recomendando-se
gestação e não deve ser utilizada nessas pacientes. intervalos quinzenais até a 30a semana e semanais
Recomenda-se que gestantes diabéticas com a partir de então.13 Como o nível de hemoglobina
alto risco de hipoglicemia façam uso da insulina glicada (HbA1C) reflete o controle glicêmico dos 3
detemir, análogo de insulina de ação longa, cuja meses anteriores, não é o melhor parâmetro para
segurança na gravidez já foi bem estabelecida.11,20,21 guiar o tratamento do diabetes na gestação. A
Estudos com insulina glargina na gestação não monitoração da glicemia capilar é fundamental no
demonstraram efeitos adversos, mas apresentam seguimento dessas pacientes, recomendando-se
limitações que comprometem a interpretação dos aferições diárias antes e 1 hora após o início das
resultados, sendo ainda necessária a realização três principais refeições, mas podendo ser menos
de estudos prospectivos e controlados para que a frequente em portadoras de diabetes gestacional
segurança desse análogo seja de fato estabelecida. em tratamento apenas com dieta.
Pacientes que, antes de engravidar, apresen- Pacientes com diabetes prévio têm risco de
tavam bom controle glicêmico com o uso da te- piora de complicações microvasculares durante
rapia de infusão contínua de insulina subcutânea a gestação e devem realizar exame oftalmológico,
devem manter o tratamento durante a gestação. com fundoscopia, antes ou logo após o diagnós-
Por outro lado, não se recomenda o início do uso tico de gravidez. Caso seja diagnosticada retino-
da bomba de insulina durante a gestação, exceto patia, o exame deve ser repetido a cada trimestre
para pacientes que não obtiveram sucesso tera- e três meses após o parto. Avaliação da função
pêutico com os outros esquemas de insulinização, renal e de proteinúria deve ser realizada a cada

44 revista.hupe.uerj.br
Diabetes na gestação

trimestre. Além da ultrassonografia morfológica dificuldade na obtenção de controle glicêmico,


de rotina, as portadoras de diabetes pré-gesta- deve-se considerar indução do parto com 38
cional devem realizar ecocardiografia fetal entre semanas. Durante o parto, deve-se monitorar
a 24a e a 28a semana (Quadro 2).12 a glicemia a cada hora, objetivando-se manter
O acompanhamento do crescimento fetal e a glicemia entre 72 e 126 mg/dL, podendo
de alterações no líquido amniótico é recomen- ser necessária administração de insulina em
dado para todas as gestantes diabéticas, sendo infusão contínua.12 A cesariana eletiva deve ser
realizado através de ultrassonografias obstétricas considerada apenas na presença de complicações,
mensais a partir da 26a semana. A identificação de como peso fetal estimado pela ultrassonografia
circunferência abdominal acima do percentil 75 ou acima de 4 kg.
peso fetal acima do percentil 90 devem levar à in-
tensificação do tratamento. Os exames realizados Acompanhamento pós-parto
para avaliação fetal estão listados no quadro 3.
A insulina deve ser suspensa após o parto em
Parto mulheres com DMG e estas devem ser orientadas
a realizar um teste oral de tolerância à glicose com
Na ausência de complicações, o parto deve 75 g, com 6 a 12 semanas pós-parto para afastar
ser vaginal e a termo. Nas pacientes em que há a possibilidade de diabetes.
Pacientes com diabetes pré-gestacional de-
Quadro 2. Exames para avaliar as gestantes. vem ter a dose de insulina diminuída para metade
Avaliação em gestantes com diabetes pré-gestacional:
a um terço da dose administrada ao final da gesta-
ção ou, opcionalmente, para a dose utilizada antes
da gravidez.4 Mulheres com diabetes tipo 2 podem
Glicemia e hemoglobina glicada – a cada trimestre fazer uso de metformina ou glibencamida durante
Função renal – ureia, creatinina, clearance da creatinina, a amamentação.12,13 Deve-se orientar as pacientes
proteinúria de 24 horas ou relação proteinúria/creatininúria sobre os possíveis métodos contraceptivos e
em amostra única a cada trimestre aconselhar sobre a importância de planejamento
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Fundoscopia a cada trimestre
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46 revista.hupe.uerj.br
Diabetes na gestação

Raquel C. Abi-Abib Roberta A. Cobas


Disciplina de Diabetes e Metabologia. Departamento Disciplina de Diabetes e Metabologia. Departamento
de Medicina Interna. Faculdade de Ciências Médicas. de Medicina Interna. Faculdade de Ciências Médicas.
Universidade Estadual do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro, RJ, Universidade Estadual do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro, RJ,
Brasil. Brasil.

Carolina A. Cabizuca Marília B. Gomes

Disciplina de Diabetes e Metabologia. Departamento Disciplina de Diabetes e Metabologia. Departamento


de Medicina Interna. Faculdade de Ciências Médicas. de Medicina Interna. Faculdade de Ciências Médicas.
Universidade Estadual do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro, RJ, Universidade Estadual do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro, RJ,
Brasil. Brasil.

João Regis I. Carneiro Guilherme R. de Jesús

Disciplina de Diabetes e Metabologia. Departamento Disciplina de Obstetrícia. Departamento de Ginecologia e


de Medicina Interna. Faculdade de Ciências Médicas. Obstetrícia. Faculdade de Ciências Médicas. Universidade
Universidade Estadual do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro, RJ, do Estado do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro, RJ, Brasil.
Brasil.
Fátima R. D. Miranda
Fernanda O. Braga Disciplina de Obstetrícia. Departamento Ginecologia
Disciplina de Diabetes e Metabologia. Departamento e Obstetrícia. Faculdade de Ciências Médicas.
de Medicina Interna. Faculdade de Ciências Médicas. Universidade do Estado do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro,
Universidade Estadual do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro, RJ, RJ, Brasil.
Brasil.

v.13, n. 3, jul/set 2014 47


Estimativa do peso fetal por meio de ultrassonografia
Fetal weight estimation with ultrasonography

Estimativa del peso fetal a través de la ultrasonografía


Alessandra L. C. Magalhães*, Dailson D. S. Pereira, Nilson R. de Jesús, Alexandre J. B. Trajano

Resumo
Os riscos perinatais das alterações do crescimento fetal já estão bem estabelecidos; o peso ao nascer é, portanto,
um importante parâmetro preditivo da morbidade e da mortalidade perinatal, e sua correta estimativa, uma impor-
tante ferramenta na boa prática obstétrica. Os erros na estimativa do peso fetal na ultrassonografia bidimensional
(USG2D), mesmo em condições ideais, podem variar de 7 a 10 %, podendo chegar a 14%, o que aumenta o risco
de insucesso nas situações extremas, tornando clara a necessidade de melhora na precisão da sua estimativa.
Assim, este estudo tem por objetivo realizar uma revisão da literatura acerca da estimativa ultrassonográfica do
peso fetal, na busca de métodos com melhor acurácia e que possam influenciar positivamente a prática clínica.
Os erros na estimativa de peso fetal na USG2D, notadamente próximo ao termo, se devem, em parte, porque não
é possível medir o compartimento muscular e o tecido celular subcutâneo com essa tecnologia, e as variações
nestes compartimentos são responsáveis por 46% das alterações do peso ao nascer. Atualmente, há evidências
de que a volumetria de membros fetais associada às medidas bidimensionais é o melhor preditor da estimativa
de peso fetal, apresentando margem de erro de 6 a 7%. Vários estudos têm utilizado tais parâmetros, obtendo-
se resultados mais fidedignos que com as fórmulas tradicionais utilizadas pela USG2D. No entanto, a literatura
permanece controversa com relação ao tema, havendo trabalhos que questionem a superioridade do método.
Considerando-se que, no acompanhamento de uma gestação, notadamente as de alto risco, a avaliação do peso
fetal é um importante parâmetro avaliado, ressalta-se a relevância na busca de métodos com melhor acurácia, o
que pode incluir a incorporação de medidas volumétricas.
Descritores: Peso fetal; Coxa/ultrassonografia; Braço/ultrassonografia.

Abstract
The perinatal risks of the changes in fetal growth are well established and the birth weight is therefore an important
predictive parameter of perinatal morbidity and mortality, and its correct evaluation is an important tool to obstetrics
best practice. The margin of errors in estimated fetal weight with bidimensional ultrassonography (USG2D), even
in ideal conditions, may vary 7 to 10%, with a peak of 14%, which increases the risk of failure in extreme situations,
making clear the need to improve the precision of its estimate. Therefore, the aim of this study is to review the
literature about ultrassonographic estimated fetal weight, searching for methods with better accuracy that can
positively influence clinical practice. The errors in estimated fetal weight by USG2D, notedly near term, should
be in part because it’s not possible to measure the muscle compartment and soft tissue with this technology, and
the variations in these compartments are responsible to 46% of the alterations in birth weight. Currently there
is evidence that fetal limbs volumetry associated with bidimensional measures is the best predictor of estimated
fetal weight, with margin of error of 6 to 7%, and several studies have used this parameters, reaching more reliable
results than the traditional formulas used by USG2D. However, the literature remains controversial in the topic,
with studies questioning the advantage of the method. Considering that in pregnancy follow up, notedly high risk,
estimated fetal weight is an important parameter analysed, we emphasize the relevance of the search for methods
with better accuracy, which can include the incorporation of volumetric measures.
Keywords: Fetal weight; Thigh/ultrasonography; Arm/ultrasonography.

*
Endereço para correspondência:
Núcleo Perinatal, HUPE, UERJ.
Revista HUPE, Rio de Janeiro, 2014;13(3):48-53 Av. Prof. Manoel de Abreu, 500,
Recebido: 24/04/2014 | Revisado: 02/07/2014 | Aprovado: 28/07/2014 Rio de Janeiro, RJ, Brasil. CEP: 20550-170.
doi: 10.12957/rhupe.2014.12137 E-mail: alecaputo@globo.com

48 revista.hupe.uerj.br
Estimativa do peso fetal por meio de ultrassonografia

Resumen
Los riesgos perinatales de las alteraciones del crecimiento fetal ya están bien establecidos, y el peso al nacer es,
por lo tanto, un importante parámetro predictivo de la morbilidad y de la mortalidad perinatal; y su correcta es-
timación, una importante herramienta en la buena práctica obstétrica. Los errores en la estimación del peso fetal
en la ultrasonografía bidimensional (USG2D), incluso en condiciones ideales, puede variar de 7 a 10%, pudiendo
llegar a 14% lo que aumenta el riesgo de fracaso en las situaciones extremas, haciéndose clara la necesidad de
mejora en la precisión de su estimación. Así, este estudio tiene por objetivo realizar una revisión de la literatura
acerca de la estimación ultrasonográfica del peso fetal, en la búsqueda de métodos con mejor exactitud y que
puedan influenciar positivamente la práctica clínica. Los errores en la estimación de peso fetal en la USG2D,
especialmente próximo al término se deben, en parte, a que no es posible medir el compartimento muscular y el
tejido celular subcutáneo con esa tecnología, y las variaciones en estos compartimientos son responsables del
46% de las alteraciones del peso al nacer. Actualmente hay evidencias de que la volumetría de miembros fetales
asociada a las medidas bidimensionales son los mejores predictores de la estimación de peso fetal, presentando
un margen de erros del 6 al 7% y varios estudios han utilizado tales parámetros, obteniéndose resultados más
fidedignos que las fórmulas tradicionales utilizadas por el USG2D. Sin embargo, la literatura es aún controversial
con relación al tema, existiendo trabajos cuestionando la superioridad del método. Considerándose que, en el
acompañamiento de una gestación, especialmente las de alto riesgo, la evaluación del peso fetal es un importante
parámetro a valorar, se resalta la relevancia en la búsqueda de métodos con mayor exactitud, lo que puede incluir
la incorporación de medidas volumétricas.
Palabras clave: Peso fetal; Muslo/ultrasonografía; Brazo/ultrasonografía.

Introdução volume de membros fetais, notadamente a coxa


e o braço, associadas às medidas bidimensionais,
Já estão bem estabelecidos os riscos peri- são os melhores preditores da estimativa de peso
natais decorrentes das alterações do peso fetal, fetal,1,8,9 apresentando margem de erro de 6 a 7%,7,8
tanto nos casos de macrossomia, em virtude da e vários estudos têm utilizado a volumetria dos
maior possibilidade de tocotraumatismos,1 como membros na estimativa do peso ao nascimento,
nos casos de restrição do crescimento, onde há obtendo-se resultados mais fidedignos que as
correlação com a hipóxia fetal1 e aneuploidias.2 fórmulas tradicionais utilizadas pelo USG2D.8-15
O peso ao nascer, portanto, é um importante No entanto, a literatura permanece controversa
parâmetro preditivo da morbidade e da morta- com relação ao tema, havendo trabalhos que não
lidade perinatal,3 e sua correta estimativa, uma demonstram melhora da acurácia com a utilização
importante ferramenta na boa prática obstétrica. de volumes fetais na estimativa de peso.16-18
Várias fórmulas foram propostas para a esti- O objetivo deste estudo foi revisar a litera-
mativa do peso fetal, sendo as mais utilizadas as tura relacionada à avaliação ultrassonográfica
de Shepard e colaboradores4 e as de Hadlock e da estimativa do peso fetal, buscando fontes de
colaboradores.5 Os erros na estimativa do peso inacurácia e métodos que possam melhorar tal
fetal na ultrassonografia bidimensional (USG2D), estimativa.
mesmo em condições ideais, são elevados,6 não
havendo método preferível para estimativa de Discussão
peso fetal devido à magnitude dos erros randô-
micos.7 As tentativas iniciais de estimativa do peso
Os erros na estimativa de peso fetal na fetal pela ultrassonografia utilizavam medidas
USG2D, notadamente próximos ao termo, estão realizadas no exame bidimensional, tais como
relacionados, em parte, ao fato de não ser possível distância biparietal (DBP), circunferência cefálica
medir o compartimento muscular e o tecido ce- (CC), circunferência abdominal (CA), comprimen-
lular subcutâneo. Embora estes compartimentos to do fêmur (CF) e comprimento do úmero (CU)19,20
contribuam apenas com 12 a 14% do peso fetal ao e, apesar da variedade de fórmulas para estimar
nascimento, 46% das alterações do peso ao nascer peso fetal, nenhuma delas é completamente aceita
se devem a variações nestes compartimentos.1,6 visto que a margem de erro varia entre 7 a 10%6,
Atualmente, há evidências de que o uso do um percentual crítico e que aumenta o risco de

v.13, n. 3, jul/set 2014 49


Revista HUPE, Rio de Janeiro, 2014;13(3):48-53

insucesso nas situações extremas onde a estima- o volume da coxa como o parâmetro com melhor
tiva de peso fetal é fundamental para a decisão de correlação com marcadores de gordura neonatal.9
interrupção da gestação e da via de parto. A estimativa de peso fetal usando a USG3D
As fórmulas utilizadas na USG2D não são pode ser feita por meio de medidas volumétri-
capazes de avaliar o compartimento muscular e o cas de diferentes partes ou órgãos e criando-se
tecido celular subcutâneo. As observações suge- diferentes fórmulas, que podem incluir ou não
rem que, após a 28a semana de gestação, há maior medidas realizadas pela USG2D. Atualmente há
crescimento do volume destes compartimentos evidências que o uso do volume de membros fe-
do que o crescimento observado no comprimento tais, notadamente a coxa e o braço, associado às
ósseo,11,21 ocorrendo um aumento exponencial na medidas bidimensionais, é os melhor preditor da
deposição de gordura fetal até o parto.21-23 Tais estimativa de peso fetal,1,8,9 apresentando margem
mudanças são refletidas em estudos longitudi- de erro de 6 a 7%.7,8 O uso do volume da coxa e
nais de volume de fração dos membros de fetos do braço já estão bem estabelecidos como mar-
com crescimento normal.8,23 O uso da avaliação cadores de crescimento e nutrição fetais.1,9,11,23 A
volumétrica foi validado por estudos utilizando partir desses conhecimentos, vários estudos têm
a ressonância nuclear magnética, com margem utilizado o volume dos membros como o melhor
de erro de 5%.7 Foram feitas várias tentativas preditor do peso ao nascimento, obtendo-se
de medir volumes fetais usando USG2D, mas a resultados mais fidedignos que em relação às
acurácia dessas avaliações não foi satisfatória fórmulas tradicionais utilizadas pelo USG2D.8-15
e não foi mostrada qualquer vantagem sobre as O conceito de volume de fração da coxa foi
fórmulas convencionais.24 introduzido por Lee e colaboradores15 visando
Os estudos que utilizam a ultrassonografia diminuir as dificuldades técnicas impostas quando
tridimensional (USG3D) foram inicialmente re- é realizada a avaliação de todo o membro fetal.
alizados por Chang e colaboradores12 e Liang e Este parâmetro de avaliação do compartimento
colaboradores,13 que descreveram o uso do volu- muscular e subcutâneo fetal é derivado da porção
me do braço e da coxa para a estimativa do peso central da diáfise do membro, onde os contornos
fetal durante o 30 trimestre de gestação. Schild e são mais fáceis de serem delimitados, evitando-se
colaboradores10 descreveram uma combinação de áreas de sombras acústicas próximas às articula-
parâmetros bidimensionais e tridimensionais para ções. As medidas se mostraram reprodutíveis en-
o cálculo da estimativa de peso fetal. tre examinadores em estudo duplo cego e podem
Atualmente há tabelas com curvas de norma- ser calculadas por bases de dados de volume que
lidade de volume de membros fetais, tendo impor- levam aproximadamente 2 minutos para serem
tante papel na predição do peso ao nascer.22 Com realizadas27 Tal método apresenta margem de erro
o exame 3D pode-se avaliar de forma mais acu- de 4,6%26 a 6,6%,8 significativamente menor que
rada o volume de diversos órgãos fetais e assim a do correspondente modelo de Hadlock, além
obter-se um diagnóstico mais precoce e preciso de melhor acurácia e precisão das estimativas de
dos distúrbios do crescimento e desenvolvimento. peso.8,26,27 Assim, o volume de fração da coxa pode
Os membros fetais espelham o estado nutricional ser acrescentado a medidas bidimensionais para
e de crescimento intrauterino,10-14,21,25 e o acesso aumentar a precisão da estimativa de peso fetal.
deste compartimento muscular e subcutâneo Esta abordagem permite a inclusão da análise dos
fetal, seja por meio de medidas diretas ou como compartimentos muscular e subcutâneo fetais
parte da estimativa de peso, pode favorecer a como parte da estimativa de peso, ligando-se ao
detecção precoce e o monitoramento de fetos mal estado nutricional fetal.
nutridos.22,23,26 Lee e colaboradores demonstraram Da mesma forma, em fetos com desvios do
que o volume da coxa foi o parâmetro pré-natal crescimento, a estimativa do peso encontra me-
com melhor correlação com o percentual de lhor precisão e menor margem de erro quando
gordura corporal do recém-nascido, explicando, utilizada a volumetria da coxa fetal.27 Em fetos
por si só, 46% da variabilidade deste parâmetro cujo peso é menor que 2000 g foi observada
neonatal,23 dado corroborado pelo estudo de uma margem de erro de 7,8%, em oposição aos
Khoury e colaboradores, que também identificou 10% obtidos com a fórmula de Hadlock; ao passo

50 revista.hupe.uerj.br
Estimativa do peso fetal por meio de ultrassonografia

que fetos com mais de 4000 g de peso apresen- de detectar fetos macrossômicos em um grupo
taram margem de 5,8%, comparados com 8,3% de alto risco é maior com a utilização de fórmulas
da fórmula de Hadlock.27 Schild e colaboradores, com parâmetros tridimensionais,30 apresentando
em estudo com fetos que pesam menos de 1600 g, em fetos com peso estimado maior que 4300 g
também mostraram superioridade das fórmulas uma taxa de detecção de 93% com uma taxa de
utilizando medidas volumétricas.28 Com relação falso positivo de 38%.30
à macrossomia, observa-se maior especificidade
na sua predição com a avaliação do volume da Conclusão
fração da coxa do que com a utilização da fórmula
de Hadlock.29 A acurácia da estimativa de peso fetal é com-
Assim, vem surgindo como método promissor prometida pela magnitude dos erros randômicos,
na estimativa do peso fetal a utilização do volume que podem alcançar percentuais de até 14%.7
de fração da coxa. Para tal cálculo, inicialmente Esforços devem ser feitos para minimizar esta
posiciona-se o transdutor no plano padrão para variabilidade, principalmente em situações nas
medida do fêmur. O comprimento do fêmur é defi- quais a estimativa do peso fetal é clinicamente útil
nido como a maior distância entre as extremidades e parte do processo é de tomada de decisão, como
da diáfise óssea. Uma imagem tridimensional mul- ocorre em grande parte dos casos de gestações
tiplanar é utilizada para identificar o ponto médio de alto risco.
da coxa, onde as medidas da circunferência serão Fórmulas que utilizam volumes fetais, nota-
realizadas em torno do contorno externo da pele, damente dos membros, apresentam vantagens
de modo a incluir pele e tecido celular subcutâneo. ao considerar os compartimentos muscular e do
Sendo assim, calipers eletrônicos são posicio- tecido celular subcutâneo em sua avaliação fetal.
nados para medida do comprimento femural e o Desta forma, vem crescendo a pesquisa sobre
software do aparelho automaticamente define um a utilização da ultrassonografia tridimensional
volume da coxa que corresponde a 50% do com- para cálculo da estimativa de peso fetal, método
primento da diáfise femural. Este volume parcial que tem apresentado melhor acurácia na avalia-
da coxa é então dividido em cinco subseções de ção do estado nutricional fetal, diminuindo, como
igual tamanho, permitindo o traçado manual do consequência, os erros randômicos e mostrando
contorno através de um plano axial.8,15 um benefício importante especialmente nas ges-
Apesar dos vários estudos descritos relatan- tações de alto risco.
do melhor acurácia da estimativa de peso com a
ultrassonografia 3D, ainda existem controvérsias Referências
com relação a estes dados. Bennini e colabora-
dores,17 ao estudar 210 pacientes, não relataram 1. Nardozza LMM, Araújo Júnior E, Vieira MF, Rolo LC,
Moron AF. Estimativa do peso ao nascimento utilizando
diferença de acurácia entre a ultrassonografia bi- a ultrassonografia bidimensional e tridimensional.
dimensional e tridimensional. Argumentaram que Rev Assoc Med Bras. 2010;56(2):204-8. http://dx.doi.
as maiores fontes de discrepância na estimativa org/10.1590/S0104-42302010000200020
de peso fetal devem-se às diferenças fenotípicas 2. Baschat AA, Galan HL, Ross MG, Gabbe SG.
entre as populações utilizadas na criação e apli- Intrauterine Growth Restriction. In: Gabbe SG,
cação das fórmulas, e não à melhor precisão entre Niebyl JR, Simpson JL, editors. Obstetrics, Normal
and Problem Pregnancies, 5ª edition. Filadelfia:
os métodos utilizados.17 Nardozza e colaboradores
Elsevier; 2007. p.774.
concluíram que o peso fetal estimado por fór-
mulas que utilizam volumes de coxa e braço não 3. Barker DJP. Long term outcome of retarded fetal
growth. Clin Obstet Gynecol. 1997;40(4):853-63.
apresenta acurácia superior àquele estimado por
fórmulas tradicionais.16 Da mesma forma, Lindell 4. Shepard MJ, Richards VA, Berkowitz RL, Warsof SL,
Hobbins JC. An evaluation of two equations for
e Marsal, em 2009, quando estudaram gestações predicting fetal weight by ultrasound. Am J Obstet
com mais de 41 semanas, não observaram diferen- Gynecol. 1982;142(1):47-54.
ças entre ultrassonografia bidimensional e tridi- 5. Hadlock FP, Harrist RB, Sharman RS, Deter RL, Park
mensional.18 Estes mesmos autores, no entanto, SK. Estimation of fetal weight with the use of head,
em estudo de 2012, mostraram que a habilidade body, and femur measurements-a prospective study.

v.13, n. 3, jul/set 2014 51


Revista HUPE, Rio de Janeiro, 2014;13(3):48-53

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52 revista.hupe.uerj.br
Estimativa do peso fetal por meio de ultrassonografia

Alessandra L. C. Magalhães
Unidade Docente Assistencial de Obstetrícia. Hospital
Universitário Pedro Ernesto. Universidade do Estado do
Rio de Janeiro. Rio de Janeiro, RJ, Brasil.

Dailson D. S. Pereira
Unidade Docente Assistencial de Obstetrícia. Hospital
Universitário Pedro Ernesto. Universidade do Estado do
Rio de Janeiro. Rio de Janeiro, RJ, Brasil.

Nilson R. de Jesús
Disciplina de Obstetrícia. Departamento Ginecologia
e Obstetrícia. Faculdade de Ciências Médicas.
Universidade do Estado do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro,
RJ, Brasil.

Alexandre J. B. Trajano
Departamento de Ginecologia e Obstetrícia. Faculdade
de Ciências Médicas. Universidade do Estado do Rio de
Janeiro. Rio de Janeiro, RJ, Brasil.
Departamento de Ginecologia e Obstetrícia. Faculdade
de Medicina. Universidade Unigranrio. Rio de Janeiro, RJ,
Brasil.

v.13, n. 3, jul/set 2014 53


Doença trofoblástica gestacional – atualização
Gestational trophoblastic disease – update

Enfermedad trofoblástica gestacional – actualización


Antônio Braga,* Bruna Obeica, Valéria Moraes, Evelise P. da Silva,
Joffre Amim-Junior, Jorge Rezende-Filho

Resumo
Doença trofoblástica gestacional é anomalia de gravidez que engloba formas clínicas benignas (mola hidatifor-
me completa e parcial) e malignas (mola invasora, coriocarcinoma, tumor trofoblástico do sítio placentário e
tumor trofoblástico epitelioide). Sua forma mais comum, a mola hidatiforme, acomete 1:200 grávidas brasileiras.
No passado era comum a paciente com mola hidatiforme apresentasse sintomatologia exuberante: hemorragia
copiosa, cistos teca-luteínicos dos ovários, útero aumentado para a idade gestacional, pré-eclâmpsia precoce,
hiperemese e hipertireoidismo. Hoje, com o diagnóstico precoce feito pela ultrassonografia, muitas pacientes
são diagnosticadas com gestação molar ainda em fase assintomática. Todavia, este diagnóstico precoce tem
dificultado a análise histopatológica do material molar, tornando as técnicas imuno-histoquímica e de biologia
molecular importantes para a confirmação diagnóstica. Por seu potencial de evoluir para neoplasia trofoblástica
gestacional, as pacientes acometidas por gravidez molar devem ser atendidas em Centros de Referência, onde são
inicialmente submetidas ao esvaziamento uterino pela técnica de vácuo-aspiração. Nestes serviços especializados,
elas também terão monitorados seus níveis de gonadotrofina coriônica humana a fim de detectar precocemente a
persistência da doença e sua progressão maligna. Vale salientar que o uso rigoroso de contracepção hormonal é
fundamental para manter fidedigno o marcador tumoral dessa doença. Espera-se que cerca de 20% das pacientes
com mola hidatiforme evolvam para neoplasia trofoblástica, cujo tratamento quimioterápico é capaz de curar a
grande maioria das pacientes, preservando sua capacidade reprodutiva que, pelo geral, não se altera. O objetivo
desse artigo é rever aspectos clínicos, genéticos, patológicos e terapêuticos da doença trofoblástica gestacional,
importante causa de hemorragia da gestação.
Descritores: Mola hidatiforme; Gonadotrofina Coriônica Humana; Contracepção.

Abstract
Gestational trophoblastic disease is disorder of pregnancy that encompasses clinical benign forms (complete
and partial hydatidiform mole) and malignant forms (invasive mole, choriocarcinoma, placental site trophoblastic
tumor and epithelioid trophoblastic tumor). Its most common form, hydatidiform mole, affects 1:200 pregnant
in Brazil. In the past it was common for a patient with hydatidiform mole present exuberant symptoms: copious
bleeding, theca lutein cysts of the ovary, enlarged uterus for gestational age, early preeclampsia, hyperemesis
and hyperthyroidism. Nowadays, with early diagnosis made by ultrasound, many patients are still diagnosed
asymptomatic. However, this situation has hindered early diagnosis histopathological analysis of molecular material,
making immunohistochemistry and molecular biology major in the diagnostic. For its potential to develop into
gestational trophoblastic neoplasia, patients affected by molar pregnancy should be followed in the Reference
Centers, where they are initially subjected to uterine vacuum aspiration technique. In these specialized services
they have also monitored levels of human chorionic gonadotropin in order to early detect residual disease and
its malignant progression. It is noteworthy that the rigorous use of hormonal contraception is critical to maintain
reliable tumor marker for this disease. It is expected that about 20 % of patients with hydatidiform mole progress to
gestational trophoblastic neoplasia whose chemotherapy can cure the majority of patients, preserving reproductive
capacity which, generally, does not affected. The purpose of this paper is to review clinical, genetic, pathological
and therapeutic aspects of gestational trophoblastic disease, a major cause of hemorrhage of pregnancy.
Keywords: Hydatidiform mole; Corionic Gonadotropin, Human; Contraception.

*
Endereço para correspondência:
Centro de Doença Trofoblástica, Maternidade Escola, UFRJ.
Revista HUPE, Rio de Janeiro, 2014;13(3):54-60 Rua das Laranjeiras, 180,
Recebido: 24/04/2014 | Revisado: 02/07/2014 | Aprovado: 28/07/2014 Rio de Janeiro, RJ, Brasil. CEP: 22240-003.
doi: 10.12957/rhupe.2014.12124 E-mail: bragamed@yahoo.com.br

54 revista.hupe.uerj.br
Doença trofoblástica gestacional – atualização

Resumen
Enfermedad trofoblástica gestacional es una anomalía del embarazo que engloba formas clínicas benignas (mola
hidatiforme completa y parcial) y malignas (mola invasora, coriocarcinoma, tumor trofoblástico del sitio placen-
tario y tumor trofoblástico epiteloide). Su forma más común, la mola hidatiforme, afecta a 1:200 embarazadas
brasileras. En el pasado era común que la paciente con mola hidatiforme presentase sintomatología abundante:
hemorragia copiosa, quistes tecaluteínicos en ovarios, útero aumentado para la edad gestacional, preeclampsia
precoz, hipéremesis e hipertireoidismo. Hoy, con el diagnóstico precoz hecho por la ultrasonografía, muchas
pacientes son diagnosticadas con gestación molar aún en fase asintomática. Todavía, este diagnóstico precoz ha
dificultado el análisis histopatológico del material molar, volviendo las técnicas inmunohistoquímica y de biología
molecular importantes para la confirmación diagnóstica. Por el potencial de evolucionar a neoplasia trofoblástica
gestacional, las pacientes afectadas por embarazo molar deben ser atendidas en Centros de Referencia, donde
son inicialmente sometidas al vaciamiento uterino por la técnica de aspiración al vacío. En estos servicios espe-
cializados, ellas también tendrán monitoreados sus niveles de gonadotrofina coriónica humana a fin de detectar
precozmente la persistencia de enfermedad y su progresión maligna. Vale destacar que el uso riguroso de contra-
cepción hormonal es fundamental para mantener fidedigno el marcador tumoral de esa enfermedad. Se espera que
cerca del 20% de las pacientes con mola hidatiforme evolucionen para neoplasia trofoblástica, cuyo tratamiento
quimitoterápico es capaz de curar la gran mayoría de las pacientes, preservando su capacidad reproductiva que,
por lo general, no se altera. Este artículo pretende examinar aspectos clínicos, genéticos, patológicos y terapéu-
ticos de la enfermedad trofoblástica gestacional, importante causa de hemorragia de la gestación.
Palabras clave: Mola hidatiforme, Gonadotrofina coriónica humana; Contracepción.

Introdução pectos clínicos e terapêuticos de seu seguimento.

A doença trofoblástica gestacional (DTG) Desenvolvimento


engloba grupo heterogênio de proliferação
celular originada a partir do epitélio trofoblás-
tico placentário, com formas clínicas benignas,
Epidemiologia e fatores de risco
representadas pela mola hidatiforme completa Estima-se que a MH ocorra em 1:200-400
(MHC) e parcial (MHP) e por formas malignas, gestações no Brasil,7,8 cerca de 5 a 10 vezes mais
representadas pela mola invasora, coriocarci- frequente que na América do Norte e Europa.1-3
noma, tumor trofoblástico do sítio placentário Constitui a idade materna avançada impor-
e tumor trofoblástico epitelioide, agrupados sob tante fator de risco que concorre para a ocor-
o epíteto de neoplasia trofoblástica gestacional rência de MHC, onerando as mulheres acima de
(NTG).1-3 O denominador comum da DTG é a 40 anos com chance 5 a 10 vezes maior de desen-
presença da gonadotrofina coriônica humana volver esta doença se comparadas com mulheres
(HCG), marcador biológico de gravidez.1-3 jovens.9 No entanto, devido ao maior número de
Com o surgimento da ultrassonografia (US) gravidezes em mulheres jovens, a maior parte
e a sistematização de quimioterapia para trata- das MH ocorre em gestantes entre 20-30 anos.7,9
mento da NTG, foi possível diagnosticar preco- É importante ressaltar que a idade materna não
cemente as pacientes com DTG, poupando-as de se encontra associada ao risco de desenvolver
manifestações sintomáticas graves4 e preservan- MHP, diferentemente da história pregressa de
do sua função reprodutiva.5-7 abortamento espontâneo ou infertilidade.9 Vale
Todavia, avanços na Medicina trouxeram também salientar que a história obstétrica de MH
muitos desafios para o seguimento e tratamento é importante fator de risco para a ocorrência de
de pacientes com DTG: propedêutica comple- nova MH em gravidez subsequente.10
mentar para diagnóstico; papel da histopatologia
em molas hidatiformes (MH) de idade gestacional
Aspectos clínicos
precoce; nuances do seguimento hormonal com O sangramento transvaginal constitui sinto-
HCG e futuro reprodutivo destas pacientes.8 matologia mais frequente da MH e geralmente
Deste modo, é objetivo dessa revisão ofere- ocorre entre a sexta e décima sexta semana de
cer visão atualizada sobre DTG, enfatizando as- gestação em 80 a 90% dos casos.1-3 Trata-se

v.13, n. 3, jul/set 2014 55


Revista HUPE, Rio de Janeiro, 2014;13(3):54-60

Figura 1. Cisto teca-luteínico bilateral dos ovários. Figura 2. Macroscopia de mola hidatiforme com-
Caso operado pelo professor Antonio Braga no Centro pleta de segundo trimestre. Material obtido por
de Referência do Hospital Universitário Antonio Pedro esvaziamento uterino por vácuo-aspiração feita pelo
da Universidade Federal Fluminense devido rotura e professor Antonio Braga no Centro de Referência da
hemoperitônio. Maternidade Escola da Universidade Federal do Rio de
Janeiro. Notar as vesículas de grandes dimensões e a
ausência de anexos fetais.

de sangramento vermelho-vivo que se alterna e que deve ser tratada de modo rigoroso com
com borra de café, com intensidade variável, anti-hipertensivo e anticonvulsivante nos casos
por vezes de grande monta, excepcionalmente graves, não se devendo postergar o esvaziamento
acompanhado por eliminação de vesículas. Ainda uterino.
assim, apenas 5% das pacientes vão cursar com Determinadas complicações clínicas devem
hemoglobina < 10 g/dL.11 ser consideradas após o procedimento de retirada
Cerca de 50% das pacientes apresentam útero da MH, dentre as quais insuficiência pulmonar,
aumentado para a idade gestacional, que diminui que pode ocorrer em 27% dos casos de MH com
após o sangramento e volta a crescer pela prolife- útero medindo ≥ 16 centímetros.6 Clinicamente es-
ração do trofoblasto remanescente intrauterino.7 sas pacientes apresentam-se obnubiladas, taquip-
Possivelmente pelo reflexo dos elevados neicas e taquicárdicas logo após o esvaziamento
níveis de estrogênio, progesterona e gonadotro- uterino. O caráter multifatorial do acometimento
fina coriônica circulantes, as pacientes com MH pulmonar descrito resulta da embolização do te-
cursam com hiperemese gravídica, não raro ne- cido molar aos vasos pulmonares, determinando
cessitando de internação hospitalar e tratamento as complicações cardiovasculares.6,11 Estes casos
específico. Felizmente, com o diagnóstico da MH tornam-se ainda mais dramáticos quando está
sendo realizado cada vez mais precocemente, associado o hipertireoidismo.1-3
a prevalência da hiperemese gravídica nestas
pacientes, que era de cerca de 30%, hoje não
Aspectos genéticos
chega a 10%.7,11 De modo a analisar as diferenças genéticas
As pacientes com MH podem apresentar entre MHC e MHP, deve-se atenção especial ao
cistos teca-luteínicos dos ovários, encontrados fato de que a MHC é geralmente diploide.12 Há
em cerca de 16% das pacientes.7 Sua regressão de assinalar-se ainda que seus cromossomos
espontânea determina a abstenção cirúrgica, nucleares são de origem paterna, e, desta forma,
exceto nos excepcionais casos de torção anexial é a maioria 46 XX.12 A utilização de marcadores
ou ruptura hemorrágica (Figura 1). polimórficos demonstrou que geralmente a MHC
Da mesma forma, houve redução dos casos caracteriza-se pela monoespermia, surgindo a
de pré-eclâmpsia precoce (menos de 20 semanas partir da fertilização de oócito anucleado por
de gestação), que acometia um terço das pacien- apenas um espermatozoide haploide que então
tes com MH, mas que hoje é raro.7 Ainda assim, se duplica. Ao passo que na MHP o cariótipo é
trata-se de importante intercorrência clínica triploide, havendo duas possibilidades: a primeira

56 revista.hupe.uerj.br
Doença trofoblástica gestacional – atualização

fundamenta-se no fato de haver a possibilidade de


falha na primeira ou segunda divisão meiótica, du-
rante a gametogênese, ou fertilização de um óvulo
normal por 2 espermatozoides – dispermia.12

Patologia
Chama atenção o contraste macroscópico e
microscópico de ambos os tipos de MH. A MHC
apresenta-se, à macroscopia, com vesículas na to-
talidade placentária, vigente ausência de concepto
Figura 3. Macroscopia de mola hidatiforme parcial de
e anexos (cordão / membranas). As vesículas, segundo trimestre. Material obtido por esvaziamento
descritas como “cachos de uva”, são translúcidas, uterino feito pelo professor Antonio Braga no Centro
cheias de líquido claro, com diâmetro de 1 a 1,5 mm de Referência da Santa Casa da Misericórdia do Rio
de Janeiro. Observar malformação fetal grosseira no
no primeiro trimestre e de 1,5 a 3 cm no segundo fechamento da parede abdominal e presença placen-
trimestre (Figura 2). tária focal de vesículas hidatiformes.
Já a MHP caracteriza-se pela presença focal
de vesículas hidatiformes na placenta, associada na atualidade pacientes assintomáticas.5,6
à presença de concepto ou anexos fetais. As ve- Sem dúvida, a dosagem de HCG mostra
sículas são menores (5 mm no primeiro trimestre valores elevados, frequentemente maior que
até 2 cm no segundo trimestre) e menos hidró- 100.00,00 mUI/mL, muitas vezes não compatível
picas e entremeiam área de vilosidades normais com a idade gestacional, auxiliando no diagnós-
(Figura 3). tico. Ainda de valia será a dosagem de HCG nos
A microscopia segue os critérios morfológi- casos em que a histopatologia é inconclusiva
cos exarados por Szulman & Surti.13 A descrição (notadamente em casos de aborto hidrópico) ou
clássica da MHC, válida para os casos de segundo quando não se dispõe de avaliação histopatológica
trimestre, apresenta todas as vilosidades coriais de produto de esvaziamento uterino.
volumosas-gigantes, avasculares, com dilata- O diagnóstico da MH foi revolucionado pelo
ção cística, hidropisia, com cisterna central. Há emprego da US. A MHC é facilmente visualizada
marcada e universal hiperplasia e anaplasia tro- pela US, quando se observa eco endometrial
foblástica. Estão ausentes embrião-feto / anexos. hiperecoico, preenchido por imagens hipo-ane-
Já a MHP apresenta algumas vilosidades coriais cogênicas, irregulares, centrais ou margeando o
volumosas, cisternas centrais menos evidentes, miométrio, na ausência de embrião-feto (Figura 4).
entremeada por vilosidades sem hidropisia. As É frequente o útero encontrar-se aumentado para
membranas ovulares estão sempre presentes e o a idade gestacional e os ovários apresentarem
concepto, por vezes. A hiperplasia trofoblástica policistose (múltiplas formações císticas, de 4 a
é multifocal, com discreta anaplasia, e envolve 8 cm, anecogênicas, bem delimitadas, geralmente
frequentemente só o sinciciotrofoblasto. Há bilaterais - Figura 4). Nesses casos, 80% das MHC
vasos contendo hemácias nucleadas, fetais, a são diagnosticadas a US.15 O impacto da idade
indicar existência de concepto, ainda que seus gestacional nesse diagnóstico é inquestionável.
remanescentes não possam ser evidenciados pela Estima-se que cerca de 25 a 50% das gestações
consequente degeneração do embrião.14 molares não sejam diagnosticadas pela US pela
idade gestacional precoce com que os exames
Diagnóstico da mola hidatiforme são feitos.16
O diagnóstico da MH ocorre geralmente no O diagnóstico da MHP não será difícil após
primeiro trimestre de gravidez. A anamnese e o a 12a semana de gestação, quando a visualização
exame físico deixam entrever situações suspeitas: do feto (pelo geral hidrópico) acompanhado de
hemorragia, útero aumentado para a idade ges- placenta com áreas hiperecogênicas tipo “flocos
tacional, vômitos incoercíveis, massas pélvicas de neve” traz a suspeição dessa anomalia da ges-
anexiais e pré-eclâmpsia precoce; não sendo raro tação (Figura 5). O feto apresenta malformações

v.13, n. 3, jul/set 2014 57


Revista HUPE, Rio de Janeiro, 2014;13(3):54-60

Figura 4. Ultrassonografia sugestiva de mola hidatifor- Figura 5. Ultrassonografia compatível com mola
me completa. São evidentes as formações anecogêni- hidatiforme parcial. Percebe-se a presença embrioná-
cas permeando a cavidade endometrial. Imagem feita ria algo hidrópica diante de área placentária repleta
pela Dra. Valéria Moraes no Centro de Referência do de material amorfo e sonoluscente. Imagem feita
Hospital Universitário Antonio Pedro da Universidade pela Dra. Valéria Moraes no Centro de Referência do
Federal Fluminense. Hospital Universitário Antonio Pedro da Universidade
Federal Fluminense.

grosseiras, melhor vistas no segundo trimestre. A de hemácias deve ser feita para todos os casos.
US reconhecerá 90% das MHP com as alterações Salienta-se que estão proscritos os métodos de
clássicas descritas. Infelizmente, esse não é o ce- esvaziamento uterino por prostaglandinas ou
nário mais frequente.17 Em verdade, o cenário da ocitocina, incriminadas em aumentar o risco de
MHP diagnosticada precocemente é tão inespe- embolização trofoblástica.6 Recomenda-se o uso
cífico que faz com que mais de 70% desses casos de vácuo-aspiração, uma vez que a curetagem
não sejam diagnosticados pela US.18 concorre para maior chance de perfuração uteri-
Tratamento na, amolecidos e aumentados estão estes úteros.
Recomenda-se parcimônia na infusão de ocitocina
Uma vez identificadas as pacientes com sus- durante o esvaziamento uterino, reservada para
peita de DTG, elas deverão ser encaminhadas para os casos de hemorragia.6
Centros de Referência onde serão submetidas ao
esvaziamento uterino da mola hidatiforme.19 No
Estado do Rio de Janeiro estão vinculados à So-
Seguimento pós-molar
ciedade Brasileira de Doença Trofoblástica Ges- Após o esvaziamento uterino inicia-se o segui-
tacional os Ambulatórios de Doença Trofoblástica mento pós-molar, cujo objetivo é monitorar a cur-
da Maternidade Escola da Universidade Federal do va de HCG a fim de detectar evolução para NTG.
Rio de Janeiro (que incorporou o Centro de Doen- A molécula de HCG é complexa e há inúmeros
ças Trofoblásticas da Santa Casa da Misericórdia
testes para sua dosagem, ainda que nenhum deles
do Rio de Janeiro) e do Hospital Universitário An-
tenha sido feito especificamente para o seguimen-
tonio Pedro da Universidade Federal Fluminense.
to da DTG, tão somente para o diagnóstico de
Demais de anamnese minuciosa e exame físico
gravidez.20,21 Para o seguimento pós-molar, reco-
completo, são recomendados os seguintes exames
pré-operatórios: tipo sanguíneo, fator Rh (aplicar menda-se o uso do kit DPC Immulite, pois é capaz
imunoglobulina anti-Rh nas pacientes com MHP de analisar todas as frações de HCG. Quando
que forem Du negativo), hemograma completo, isto não for possível, deve-se dar preferência ao
AST, ALT, EAS, RX de tórax, HCG. Pacientes com uso do mesmo kit a fim de evitar-se variações no
fundo de útero maior que 20 cm deve ter avaliado método de leitura hormonal. Fundamental no se-
ainda os níveis de TSH, T4 livre a fim de diagnosticar guimento pós-molar é a contracepção sistemática
hipertireoidismo e eletrocardiograma para avaliar a fim de evitar-se gravidez, cujo HCG placentário
a função cardíaca.1-3 Reserva de concentrados não permitiria diferençar HCG de origem tumoral.

58 revista.hupe.uerj.br
Doença trofoblástica gestacional – atualização

Diagnóstico da neoplasia serva-se elevada taxa de cura da DTG, com pre-


servação da capacidade reprodutiva – que não se
trofoblástica gestacional mostra prejudicada, antevendo-se prole saudável.
Para os casos em que a remissão não vem
espontaneamente, são utilizados os critérios Referências
exarados pela FIGO22 para o diagnóstico de NTG:
1. Tse KY, Ngan HY. Gestational trophoblastic disease.
4 dosagens semanais de HCG em plateau ou 3 Best Pract Res Clin Obstet Gynaecol. 2012;26(3):357-70.
dosagens semanais ascendentes do HCG; casos
de histopatologia evidenciando coriocarcinoma, 2. Lurain JR. Gestational trophoblastic disease I:
epidemiology, pathology, clinical presentation and
ou presença de metástase no cérebro, fígado, diagnosis of gestational trophoblastic disease, and
sistema gastrointestinal ou massa maior que 2 cm management of hydatifdiform mole. Am J Obstet
no RX de tórax.1-3 Vale salientar que o diagnóstico Gynecol. 2010;203(6):531-9.
da NTG é químico-hormonal,23 prescindindo da 3. Seckl MJ, Sebire NJ, Berkowitz RS. Gestational
histopatologia.24 trophoblastic disease. Lancet. 2010;28(376(9742):717-29.

4. Kingdon SJ, Coleman RE, Ellis L, Hancock BW.


Desempenho reprodutivo futuro Deaths from gestational trophoblastic neoplasia: any
lessons to be learned? J Reprod Med. 2012;57(4):293-6.
Aquelas que tiveram remissão espontânea da
5. Soper JT, Mutch DG, Schink JC. Committee on
MH apresentam 99% de chance de desenvolver Practice Bulletins-Gynecology, American College
gravidez normal. Há risco de 1% de nova MH,9 o of Obstetricians and Gynecologists. ACOG
que, embora pequeno, é cerca de 4 a 50 vezes Practice Bulletin n.53. Diagnosis and treatment of
maior se comparado com a população em geral.10 gestational trophoblastic disease. Obstet Gynecol.
2004;103(6):1365-77.
Assim, diante de uma nova gravidez, devem as
pacientes ser orientadas a ter especial atenção à 6. Tidy J, Hancock BW. The management of gestational
US de primeiro trimestre a fim de detectar pre- trophoblastic disease. Green-top Guideline No. 38.
Royal College of Obstetricians and Gynaecologists.
cocemente MH de repetição. Da mesma forma, Available in: http://www.rcog.org.uk/files/rcog-corp/
ao término de qualquer gravidez, a paciente deve GT38 Management Gestational0210.pdf. Accessed
submeter-se a dosagem de HCG após 42 dias a 20/07/2012.
fim de afastar a possibilidade de NTG.25 7. Belfort P, Braga A. The changing clinical presentation
of molar pregnancy. Rev Bras Ginecol Obstet.
Conclusão 2004;26(6):483-8.

8. Maesta I, Braga A. Challenges of the treatment of


A DTG representa grave complicação obs- patients with gestational trophoblastic disease. Rev
tétrica que, se não tratada em Centros de Refe- Bras Ginecol Obstet. 2012;34(4):143-6.
rências, pode cursar com morte materna. Com 9. Garner EI, Goldstein DP, Feltmate CM, Berkowitz
o avanço da ultrassonografia obstétrica, esta RS. Gestational trophoblastic disease. Clin Obstet
anomalia da gravidez tem sido cada vez mais Gynecol. 2007; 50:112-22.
precocemente diagnosticada, fazendo com que 10. Belfort P, Braga A. Recurrent gestational trophoblastic
métodos diagnósticos mais modernos precisem disease. Rev Bras Ginecol Obstet. 2003;25(1):61-6.
ser incorporados à propedêutica laboratorial des- 11. Soto-Wright V, Bernstein M, Goldstein DP, et al. The
ta doença. Uma vez diagnosticadas com gravidez changing clinical presentation of complete molar
molar, as pacientes devem submeter-se ao esva- pregnancy. Obstet Gynecol. 1995;86:775-79.
ziamento uterino pela técnica de vácuo-aspiração, 12. Ronnett BM, De Scipio C, Murphy KM. Hydatidiform
mais segura e eficaz que a curetagem uterina. moles: ancillary techniques to refine diagnosis. Int J
No seguimento pós-molar é fundamental que ela Gynecol Pathol. 2011;30(2):101-16.
seja seguida por especialistas que conhecem o 13. Szulman A B, Surti U. The syndromes of hydatidiform
comportamento da curva de eliminação de HCG a mole. I. Cytogenetic and morphological correlations.
fim de diagnosticar precocemente a evolução para Am J Obstet Gynecol. 1978;131:665-71.
NTG e iniciar seu tratamento – iminentemente 14. Hoffner L, Surti U. The genetics of gestational
quimioterápico. Tratada de forma adequada, ob- trophoblastic disease: a rare complication of

v.13, n. 3, jul/set 2014 59


Revista HUPE, Rio de Janeiro, 2014;13(3):54-60

pregnancy. Cancer Genet. 2012;205(3):63-77. gestational trophoblastic neoplasm in high-risk


hydatidiform mole: a case-control study. Eur J Obstet
15. Deavers MT, Kalhor N, Silva EG. Diagnostic problems Gynecol Reprod Biol. 2012;160(1):100-5.
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2008;132(2):168-74. 25. Braga A, Maesta I, Michelin OC, Delmanto LRG,
Consonni M, Rudge MVC, Belfort P. Maternal
16. Kani KK, Lee JH, Dighe M, Moshiri M, Kolokythas and perinatal outcomes of first pregnancy after
O, Dubinsky T. Gestatational trophoblastic disease: chemotherapy for gestational trophoblastic neoplasia in
multimodality imaging assessment with special Brazilian women. Gynecol Oncol. 2009;112(3):568-71.
emphasis on spectrum of abnormalities and value of
imaging in staging and management of disease. Curr
Probl Diagn Radiol. 2012;41(1):1-10.

17. Kirk E, Papageorghiou AT, Condous G, Bottomley C,


Bourne T. The accuracy of first trimester ultrasound
in the diagnosis of hydatidiform mole. Ultrasound
Obstet Gynecol. 2007;29(1):70-5.
Antonio Braga
18. Alhamdan D, Bignardi T, Condous G. Recognising
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Medicina. Universidade Federal do Rio de Janeiro. Rio de
Obstet Gynaecol. 2009; 23:565-73.
Janeiro, Brasil.
19. Dantas PRS, Maesta I, Cortés-Charry R, Growdon Departamento de Obstetrícia. Maternidade do Hospital
WB, Braga A, Rudge MVC, Berkowitz RS. Influence Universitário Antonio Pedro. Universidade Federal
of hydatidiform mole follow-up setting on postmolar Fluminense. Niterói, RJ, Brasil.
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cohort study. J Reprod Med. 2012;57(4):305-9. Bruna Obeica

20. Delmanto LRMG, Maestá I, Braga A, Michelin OC, Programa de Pós-graduação em Obstetrícia. Hospital
Passos JRS, Gaiotto FR, Rudge MVC. A curva de Universitário Antonio Pedro. Universidade Federal
Fluminense. Niterói, RJ, Brasil.
regressão da gonadotrofina coriônica humana é útil
no diagnóstico precoce da neoplasia trofoblástica
gestacional pós-molar? Rev Bras Ginecol Obstet. Valéria Moraes
2007;29(10):506-10. Serviço de Obstetrícia. Maternidade do Hospital
Universitário Antonio Pedro. Universidade Federal
21. Cole LA. New discoveries on the biology and Fluminense. Niterói, RJ, Brasil.
detection of human chorionic gonadotropin. Reprod
Biol Endocrinol. 2009;7(1):8. Evelise P. da Silva
22. FIGO Oncology Committee Report. FIGO staging Departamento de Ginecologia e Obstetrícia. Faculdade de
for gestational trophoblastic neoplasia: 2000. Int J Medicina. Universidade Federal do Rio de Janeiro. Rio de
Gynecol Obstet. 2002;77(3):285-7. Janeiro, RJ, Brasil.

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Hancock BH, Seckl MJ, Berkowitz RS, Cole LA editors. 3
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24. Kim BW, Cho H, Kim H, Nam EJ, Kim SW, Kim S, Disciplina de Obstetrícia. Departamento de Ginecologia e
Kim YT, Kim JH. Human chorionic gonadotrophin Obstetrícia. Faculdade de Medicina. Universidade Federal do
regression rate as a predictive factor of postmolar Rio de Janeiro. Rio de Janeiro, RJ, Brasil.

60 revista.hupe.uerj.br
Síndrome alcoólica fetal – revisão sistematizada
Fetal alcohol syndrome – sistematic review

Síndrome alcohólico fetal – revisión sistemática


Rogério A. Santana, Leonardo F. J. L. Almeida, Denise L. M. Monteiro*

Resumo
A ingestão de álcool (etanol) pela mãe durante a gravidez pode resultar em variedade de consequências rela-
cionadas ao neurodesenvolvimento, incluindo retardo mental e deficiências em capacidade cognitiva, atenção,
função executiva, controle motor e comportamento. O conjunto dessas manifestações é conhecido como Sín-
drome Alcóolica Fetal (SAF). O objetivo deste estudo é identificar os possíveis efeitos do uso do etanol durante
a gravidez sobre o embrião humano. Foi realizada ampla pesquisa na literatura médica procurando identificar e
extrair informações da literatura nacional e internacional por meio das seguintes bases de dados: Medline (por
meio do PubMed), SciELO, LILACS e Cochrane. As principais complicações dos fetos, cujas mães fizeram uso
do álcool na gravidez são: baixo peso ao nascer (BPN), crescimento intrauterino restrito (CIUR), prematuridade,
retardo no neurodesenvolvimento e microcefalia. O uso de álcool entre as mulheres em idade fértil é causa evitável
de anomalias congênitas e deficiências de desenvolvimento. Para prevenir a SAF é aconselhável evitar o uso do
álcool na gestação, visto que ainda é difícil definir a dose mínima que irá afetar o desenvolvimento do embrião.
Descritores: Síndrome alcoólica fetal; Alcoolismo; Gestação.

Abstract
The consumption of alcohol (ethanol) by the mother during the pregnancy can result in a range of consequences
related to the neurodevelopment, including mental delay and deficiencies in the cognitive capacity, attention,
executive function, motor control and behavior. The assembly of those manifestations is known like Fetal Alcoholic
Syndrom (SAF). The objective of this study is going to identify the possible effects of the use of the ethanol during
the pregnancy about the human embryonary. It was carried out broad research in the medical literature finding
identify and extract information of the international and national literature by means of the following databases:
Medline (by means of the PubMed), SciELO, LILACS and Cochrane. The main complications of the fetuses,
whose mothers did use of the alcohol in the pregnancy are: low birth weight, intrauterine growth restriction,
prematurity, delay in the neurodevelopment and microcefalia.The use of alcohol between the women in fertile
age is avoidable cause of congenital anomalies and deficiencies of development. To prevent SAF is recommended
to avoid alcohol in the gestation, due to the fact that still difficult to defined the minimum dose that is going to
affect the development of the embryo.
Keywords: Fetal alcohol syndrome; Alcoholism; Pregnancy.

Resumen
La ingestión de alcohol (etanol) por la madre durante el embarazo puede resultar en una variedad de consecuen-
cias relacionadas al neurodesarrollo, incluyendo retardo mental y deficiencias en capacidad cognitiva, atención,
función en la ejecución, control motor y comportamiento. El conjunto de esas manifestaciones es conocido
como síndrome alcohólico fetal (SAF). El objetivo de este estudio es identificar los posibles efectos del uso de
etanol durante el embarazo sobre el embrión humano. Se realizó una amplia investigación en la literatura médica
buscando identificar y extraer informaciones de la literatura nacional e internacional por medio de las siguientes
bases de datos: Medline (por medio del PubMed) SciELO, LILACS y Cochrane. Las principales complicaciones
de los fetos, cuyas madres hicieron uso de alcohol en el embarazo son: bajo peso al nacer (BPN), crecimiento

*
Endereço para correspondência:
Núcleo Perinatal, HUPE, UERJ.
Revista HUPE, Rio de Janeiro, 2014;13(3):61-66 Av. Prof. Manuel de Abreu, 500,
Recebido: 24/04/2014 | Revisado: 02/07/2014 | Aprovado: 28/07/2014 Rio de Janeiro, RJ, Brasil. CEP: 20550-170.
doi: 10.12957/rhupe.2014.12128 E-mail: denimonteiro2@yahoo.com.br

v.13, n. 3, jul/set 2014 61


Revista HUPE, Rio de Janeiro, 2014;13(3):61-66

intrauterino restricto (CIUR), prematuridad, retraso en el neurodesarrollo y microencefalia. El uso de alcohol


entre las mujeres en edad fértil es una factor evitable para anomalías congénitas y deficiencias de desarrollo.
Para prevenir la SAF es aconsejable evitar el uso del alcohol en la gestación, ya que todavía es difícil definir la
dosis mínima que afectará el desarrollo del embrión.
Palabras clave: Síndrome alcohólico fetal; Alcoholismo; Gestación.

Introdução 2,7%. Beber antes da gravidez foi fator preditor


(OR=8,5; IC95%=6,7-10,9). O maior uso de álcool
O relatório da Organização Mundial da Saúde durante a gestação foi associado à idade entre 35
(OMS) de 2002 apontou o alcoolismo como sendo e 44 anos, fumar e não ter planejado a gravidez.5
o principal problema de saúde na América Latina. (B) Os fatores de risco associados ao consumo
No Brasil, a relação é de três homens consumi- de álcool durante a gestação incluem: idade
dores de álcool para cada mulher; porém, esse maior que 25 anos, baixo nível socioeconômico,
número cresce entre as mulheres severa e pre- tabagismo, ser solteira, desempregada, usuária de
cocemente, inclusive entre gestantes.1(D) drogas ilícitas, história de abuso sexual ou físico
A ingestão de álcool (etanol) durante a gra- ou negligência, história de encarceramento, ter
videz pode resultar em várias consequências parceiro ou membro da família que bebe muito e
relacionadas ao neurodesenvolvimento, incluindo apresentar estresse psicológico ou distúrbio da
retardo mental e deficiências em capacidade cog- saúde mental.6, 7 (D)
nitiva, atenção, função executiva, controle motor Neste estudo, discutiremos os possíveis efei-
e comportamento, conhecida como Síndrome tos do uso do etanol durante a gravidez sobre o
Alcóolica Fetal (SAF).2 (A) Embora a maioria das embrião humano e as possíveis repercussões
mulheres reduza ou interrompa o consumo de fetais.
álcool ao descobrir a gravidez, algumas delas con-
tinuam consumindo na mesma ou até em maiores Métodos
quantidades.3 (C) Estima-se que mais de 1 em cada
100 nascidos vivos apresentem manifestações re- Foi realizada uma revisão sistematizada após
lacionadas ao consumo de álcool na gestação.2(A) ampla pesquisa na literatura médica procurando
O Centro de Controle e Prevenção de Doenças identificar e extrair informações das seguintes
(CDC) identificou que 7,6% das mulheres grávidas bases de dados: Medline (por meio do PubMed),
faziam uso de álcool e 1,4% admitiram fazer uso Scielo, LILACS e Cochrane. Para identificação
abusivo durante a gestação.4(B) de publicações no PubMed, foi utilizada a es-
Ethen e colaboradores (2009) observaram tratégia de busca: “Pregnancy”[Mesh]) AND
uso eventual de álcool em 30,3% das gestantes “Alcoholism”[Mesh]) AND “Risk”[Mesh], tendo
e ingestão de álcool durante toda a gestação em sido encontrados 97 artigos. Os descritores da

Quadro 1. Critérios para o diagnóstico de DMG da International Association of Diabetes and Pregnancy Study
Groups – 2010.
Critérios de inclusão Critérios de exclusão
1. Estudos sobre a relação entre uso de álcool na 1. Artigos baseados em estudos com animais.
gestação e a síndrome alcoólica fetal.
2. Textos que não falam da relação entre alcoolismo na
2. Estudos que abordam os efeitos do álcool sobre o gestação e a síndrome alcoólica fetal.
desenvolvimento fetal.
3. Artigos que abordam as consequências maternas do
3. Estudos sobre consequências fetais em gestações uso do álcool na gestação.
nas quais as mães fizeram uso do álcool.
4. Artigos que incluem outras drogas, além do álcool
4. Estudos que falam exclusivamente do uso do álcool (mesmo abordando consequências fetais).
acarretando repercussões fetais.
5. Estudos sobre o prognóstico de bebês com SAF após
5. Artigos em português, inglês, francês e espanhol. intervenção.

6. Estudos publicados entre 2003 e 2013. 6. Artigos em línguas de difícil compreensão.

62 revista.hupe.uerj.br
Síndrome alcoólica fetal – revisão sistematizada

pesquisa usados nas outras bases de dados foram: Resultados


síndrome alcóolica fetal, alcoolismo, gravidez,
etanol, complicações na gravidez, feto, pregnancy Os estudos que abordam as principais compli-
e alcoholism, sendo encontrados mais 21 artigos. cações fetais de gestações de usuárias de álcool
Foram excluídos 78 artigos pelo resumo, obe- estão detalhados na tabela 2.
decendo-se aos critérios de inclusão e exclusão De acordo com os resultados encontrados na
pré-estabelecidos (Quadro 1). Três artigos foram literatura e apresentados nessa tabela, as prin-
excluídos por não ter sido possível o acesso aos cipais complicações da SAF são: prematuridade,
textos completos. Após a análise dos 37 artigos CIUR, BPN e microcefalia.
por dois revisores, foram selecionados 17 artigos.
Ainda foram incluídos sete artigos de revisão para Discussão
auxiliar na confecção da introdução e discussão,
totalizando 24 referências. Vários medicamentos e produtos químicos
O detalhamento da forma de seleção dos são conhecidos por serem teratogênicos para o
artigos utilizados na confecção deste estudo se embrião humano quando administrados durante
encontra no fluxograma (Figura 1). a gravidez, especialmente durante o período de
Para a classificação dos trabalhos citados na organogênese. Estes insultos teratogênicos que
revisão, utilizou-se a classificação proposta pela ocorrem durante a vida embrionária podem estar
Associação Médica Brasileira (Quadro 2). presentes imediatamente após o nascimento, na

Foram selecionados 118 resumos de artigos por via eletrônica

Excluídos 78 artigos pelo resumo. segundo


os critérios de inclusão e exclusão

Excluídos 3 artigos por não haver acesso


ao texto completo

Restaram 37 artigos completos para análise por dois revisores

Após análise, excluídos mais 20 artigos


Incluídos 7 artigos para auxiliar
a introdução e discussão

Fontes bibliográficas utilizadas: 24

Figura 1. Fluxograma de busca de referências.

Quadro 2. Classificação dos estudos proposta pela Sociedade Médica Brasileira.

Grau de recomendação e força de evidência:


Estudos experimentais ou observacionais de melhor consistência (metanálises ou ensaios clínicos
A
randomizados).
Estudos experimentais ou observacionais de menos consistência (outros ensaios clínicos não randomizados
B
ou estudos observacionais ou estudos caso-controle).

C Relatos ou séries de casos (estudos não controlados).

D Opinião desprovida de avaliação crítica, baseada em consensos, estudos fisiológicos ou modelos animais.

v.13, n. 3, jul/set 2014 63


Revista HUPE, Rio de Janeiro, 2014;13(3):61-66

Tabela 2. Principais complicações fetais da Síndrome Alcoólica Fetal (SAF).

Estudo/Ano Desenho de estudo Amostra Resultados


Uso de álcool na gravidez prejudica o trans-
porte de folato para o feto devido à alteração
Hutson Jr. et al
Caso controle (B) 23 casos/24 controles na expressão de proteínas de ligação e trans-
(2012)8
porte, causando defeito na formação tubo
neural e anomalias cardíacas
Uso com 6-12 semanas gestação: microcefalia
Feldman HS
Coorte (A) 992 e BPN. Nº de bebidas (RR=1,25). Redução do
et al (2012)9
comprimento em qualquer trimestre
Silva I et al
Corte transversal (C) 957 Prematuridade e BPN (p<0,03).
(2011)10
Efeitos gênero específicos: retardo no neu-
Manzardo AM
Coorte (B) 448 rodesenvolvimento, crescimento e prematuri-
et al (2011)11
dade (maior no sexo masculino)
O álcool leva à hipóxia fetal causando CIUR
Solonskii AV
Caso controle (B) 23 casos/30 controles e aumento do número de vasos cerebrais,
et al (2008)
porém com lúmen reduzido.
Álcool foi associado a menor número de nas-
Garcia-Algar O
Coorte (B) 353 cimentos pré-termo e permite o aumento da
et al (2008) 13
composição de gordura corporal do feto
BPN – baixo peso ao nascer; CIUR – crescimento intrauterino restrito.

infância ou até mais tarde na vida adulta, espe- mais de 90 g etanol/bebida).16,17 (B)
cialmente se o dano envolve o Sistema Nervoso Quanto às características da síndrome alco-
Central (SNC).14 (B) Além disso, muitos dos efeitos ólica fetal, as principais incluem: atraso no cres-
teratogênicos no SNC podem ocorrer no segun- cimento pré e pós-natal9,11 (A,B), baixa estatura9
do e no terceiro trimestres de gravidez, quando (A), atraso no desenvolvimento11 (B), microcefalia9
a maioria dos outros órgãos já passou da fase (A), BPN,8,9 (B,A) dificuldade na realização de mo-
de organogênese ativa (o córtex cerebral, por vimentos finos e dismorfismo facial. Além disso,
exemplo, continua a se desenvolver ativamente pode haver fenda palatina, anomalias articulares
durante toda a gestação, principalmente ao for- e cardíacas e vincos alterados palmares. O dis-
mar as diferentes camadas corticais, no cresci- morfismo facial descrito acima tende a melhorar
mento neuronal e brotação de formação, sinapse com o avanço da idade dos indivíduos afetados.
e mielinização).14,15 (B) Assim, tal efeito tardio não Hutson e colaboradores (2012)8 mostraram que
será necessariamente manifestado por alterações o uso de álcool na gravidez prejudica o trans-
morfológicas no SNC, mas sim por mudanças porte de folato para o feto devido à alteração na
mais sutis na capacidade intelectual, capacidade expressão de proteínas de ligação e transporte,
de aprendizagem de atenção e comportamento. acarretando defeito na formação do tubo neural
Quanto à quantidade de álcool ingerida neces- e anomalias cardíacas. O álcool pode levar à hi-
sária para afetar o desenvolvimento fetal, parece póxia fetal causando CIUR e aumento do número
haver três categorias de exposição pré-natal ao de vasos cerebrais, porém com lúmen reduzido.12
etanol relacionada com a quantidade de álcool (B) Além disso, a prematuridade é considerada
ingerida. O grau elevado de exposição (mais de importante consequência da Síndrome Alcoólica
48-60 g de etanol/dia) pode causar a síndrome Fetal8,11 (B). No entanto, em um estudo de coorte
alcoólica fetal; exposição moderadamente alta (B), o álcool foi associado a menor número de
ao álcool (entre 24 e 48 g etanol/dia), o que pode nascimentos pré-termo, mas como parcela da
resultar na maior parte em “os efeitos do álcool” população estudada consumia outras drogas
(as diferenças entre estas categorias não são ní- como a maconha e cocaína, este fato pode ter
tidas); e exposições ocasionais ao álcool (no total influenciado esse resultado.

64 revista.hupe.uerj.br
Síndrome alcoólica fetal – revisão sistematizada

O diagnóstico de SAF é baseado em alguns gestantes que fizeram uso do álcool são: baixo
critérios como: deficiência de crescimento, fe- peso ao nascer, CIUR, prematuridade, retardo no
nótipo facial e danos no sistema nervoso central, neurodesenvolvimento e microcefalia.
associados à história de exposição ao álcool na Assim sendo, o ideal é suspender o consumo
gestação. de álcool durante a gestação, já que não existe
Em um estudo de coorte (B), incluindo 24.679 consenso sobre qual é a dose mínima capaz de
gestações, foi observado risco aumentado de afetar o desenvolvimento fetal. Tendo em vista
aborto espontâneo no primeiro trimestre (de 7 a os resultados deste estudo, medidas educativas
11 semanas completas de gestação) para as mu- devem ser aplicadas para mulheres em idade fértil
lheres que consomem ≥ 5 drinques / semana. No usuárias de bebidas alcoólicas visando prevenir a
entanto, não foi encontrada associação entre o instalação da Síndrome Alcoólica Fetal.
consumo de álcool e aborto espontâneo durante
o segundo trimestre.18 (B) Referências
Os principais mecanismos para explicar os
efeitos teratogênicos do álcool sobre o embrião 1. Silva EAF. Alcoolismo e a mulher. Bezerra Informa.
em desenvolvimento incluem: (1) aumento do 2003;11:4-5
estresse oxidativo (formação de radicais livres); 2. Boehm SL 2nd, Moore EM, Walsh CD, Gross CD,
(2) distúrbio no metabolismo da glicose, proteí- Cavelli AM, Gigante E, et al Using drinking in
the dark to model prenatal binge-like exposure
nas, lipídios e DNA; (3) neurogênese diminuída
to ethanol in C57BL/6J mice. Dev Psychobiol.
e aumento da apoptose celular, em particular de 2008;50(6):566-78.
células da crista neural.19-22 (D)
3. Floyd RL, Weber MK, Denny C, O’Connor MJ.
A principal limitação deste estudo foi a
Prevention of fetal alcohol spectrum disorders. Dev
heterogeneidade dos estudos que avaliaram as Disabil Res Rev. 2009;15(3):193-9.
complicações fetais, não apresentando resultados
4. MMWR. Alcohol Use and Binge Drinking Among
idênticos a respeito dos sinais e sintomas da SAF, Women of Childbearing Age – United States,
exceto em relação ao crescimento. Também não 2006-2010. Disponível em: http://www.cdc.gov/
foi possível definir a dose mínima ideal de álcool mmwr/preview/mmwrhtml/mm6128 a4.htm?s_
para consumo durante a gravidez. O ideal, para cid=mm6128a4_e. Acesso em: 19 Jul 2013.
prevenir a SAF, é suspender o consumo de álcool 5. Ethen MK, Ramadhani TA, Scheuerle AE, Canfield
durante a gestação, visto que ainda não existe um MA, Wyszynski DF, Druschel CM, et al. Alcohol
consenso quanto à dose mínima necessária para consumption by women before and during
pregnancy. Matern Child Health J. 2009; 13(2):274-85.
afetar o desenvolvimento do embrião.23 Caso a http://dx.doi: 10.1007/s10995-008-0328-2.
mãe tenha feito uso de álcool durante a gestação
e supondo-se que o estresse oxidativo é uma das 6. Floyd RL, O’Connor MJ, Sokol RJ, Bertrand J, Cordero
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principais vias de danos induzidos pelo etanol, syndrome. Obstet Gynecol. 2005;106(5 Pt 1):1059-64
uma medida que pode ser tomada é a suplemen-
7. Fetal Alcohol Syndrome: Guidelines for referral
tação antioxidante, num esforço para atenuar
and Diagnosis. National Center on Birth Defects
este dano. Os antioxidantes, como a vitamina C, and Developmental Disabilities Centers for Disease
vitamina E, ácido fólico, betacaroteno e os flavo- Control and Prevention Department of Health and
noides podem ser complementados pela ingesta Humam Services. July 2004. Available at www.cdc.
gov/ncbddd/fas/default.htm. Acesso em 10 Jan 2013.
de alimentos.24 (D)
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decreased in pregnancies with chronic alcohol
exposure. PLoS One. 2012;7(5):e38057. http://dx.doi:
A ingestão de álcool durante a gestação pode
10.1371/journal.pone.0038057
ter efeitos deletérios sobre o SNC, crescimento
e desenvolvimento do feto em graus variados, 9. Feldman HS, Jones KL, Lindsay S, Slymen D, Klonoff-
Cohen H, Kao K, et al. Prenatal alcohol exposure
dependendo da duração da exposição e da época
patterns and alcohol-related birth defects and
da gestação. De acordo com os resultados en- growth deficiencies: a prospective study. Alcohol
contrados, as principais complicações fetais em Clin Exp Res. 2012;36(4):670-6. http://dx.doi.

v.13, n. 3, jul/set 2014 65


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66 revista.hupe.uerj.br
Câncer de mama na gravidez: diagnóstico e tratamento
Breast cancer in pregnancy: diagnosis and treatment

Cancer de mama en el embarazo: diagnóstico y tratamiento


Denise L. M. Monteiro,* Daniela C. S. Menezes, Camila L. Nunes,
Clara A. Antunes, Erica M. de Almeida, Alexandre J. B. Trajano

Resumo
O objetivo do estudo é avaliar o diagnóstico e a terapêutica do câncer de mama em gestantes, visto que a gravidez
pode potencialmente gerar retardo na abordagem da doença e, consequentemente, pior prognóstico do que
na mulher não gestante. Associa-se ainda o baixo índice de suspeição da doença neste período e relutância de
médicos e pacientes em realizar testes radiográficos e procedimentos invasivos. O câncer de mama é a neoplasia
maligna feminina mais frequente. Sua incidência na gestação é baixa, variando de 1:3000 a 1:10.000 gravidezes,
apresentando-se geralmente em estágio avançado durante a gravidez. A condução do caso frequentemente gera
dificuldades e angústia para a gestante, sua família e para os profissionais de saúde envolvidos, em função do
dilema criado entre a terapia ideal para a mãe e o bem-estar do feto. O diagnóstico baseia-se no teste triplo que
consiste em exame clínico, imagem e biópsia, visando avaliar a extensão da doença na mama e nos linfonodos,
identificar múltiplos focos ou eventual tumor bilateral, bem como prevenir metástases sistêmicas e controlar
localmente a doença. O adiamento da terapêutica, a fim de proteger o concepto, pode comprometer a saúde
materna. A mastectomia radical modificada e a radical clássica podem ser utilizadas com segurança. Deve-se
realizar o esvaziamento axilar, pois metástases são comumente encontradas na gravidez e o comprometimento
linfonodal influencia na escolha da quimioterapia. Evidências sugerem segurança e eficácia do esquema
5-fluorouracil, doxorrubicina (ou epirrubicina) e ciclofosfamida durante o segundo e o terceiro trimestres da
gestação. A radioterapia deve ser adiada, sempre que possível, para depois do parto. Este estudo visa ainda
incentivar o exame das mamas durante o exame ginecológico de rotina e pré-natal, conscientizando paciente e
equipe de saúde de sua importância no ciclo grávido-puerperal.
Descritores: Câncer de mama; Gravidez; Diagnóstico; Tratamento.

Abstract
The aim of the study is to evaluate diagnosis and treatment of breast cancer in pregnant women, since pregnancy
can potentially generate delay in disease approach and consequently worst prognosis than in non-pregnant women.
There is also a low index of suspicion of the disease in this period and reluctance of patients and physicians to
perform radiographic tests and invasive procedures. Breast cancer is the most common female malignancy. Its
incidence in pregnancy is low, ranging from 1:3000 to 1:10,000 pregnancies, usually presenting at an advanced
stage during pregnancy. The disease management often generates difficulties and distress for the mother, her
family and health professionals involved, depending on the dilemma created between the ideal therapy for the
mother and fetus welfare. Diagnostic approach is based on triple test consisting of clinical, imaging and biopsy
examination to evaluate disease extension in breast and lymph nodes, identify possible multiple foci or bilateral
tumors, and prevent systemic metastasis and manage local disease. Therapy delay in order to protect fetus can
compromise maternal health. Modified radical mastectomy and classic radical mastectomy can be safely used.
Axillary dissection should be performed, since metastases are commonly found in pregnancy and lymph node
involvement defines chemotherapy. Evidence suggests safety and efficacy of 5-fluorouracil, doxorubicin (or
epirubicin) and cyclophosphamide during the second and third trimester of pregnancy. Radiotherapy should
be postponed whenever possible after delivery. This study also aims to encourage breast examination during
routine gynecologic evaluation and prenatal care, making patient and health team aware of its importance during
pregnancy and childbirth.
Keywords: Breast Cancer; Pregnancy; Diagnosis; Treatment.

*
Endereço para correspondência:
Núcleo Perinatal, HUPE, UERJ.
Revista HUPE, Rio de Janeiro, 2014;13(3):67-71 Av. Prof. Manuel de Abreu, 500,
Recebido: 24/04/2014 | Revisado: 02/07/2014 | Aprovado: 28/07/2014 Rio de Janeiro, RJ, Brasil. CEP: 20550-170.
doi: 10.12957/rhupe.2014.12129 E-mail: denimonteiro2@yahoo.com.br

v.13, n. 3, jul/set 2014 67


Revista HUPE, Rio de Janeiro, 2014;13(3):67-71

Resumen
El objetivo del estudio es evaluar el diagnóstico y la terapéutica del cáncer de mama en gestantes, ya que el
embarazo puede potencialmente producir retraso en el abordaje de la enfermedad y, consecuentemente, peor
pronóstico que en la mujer no gestante. Se asocia el bajo índice de sospecha de la enfermedad en este periodo
y la resistencia de médicos y pacientes a realizar tests radiográficos y procedimientos invasivos. El cáncer
de mama es la neoplasia femenina más frecuente. Su incidencia en la gestación es baja, variando de 1:3000 a
1:10.000 embarazos, presentándose generalmente en estadio avanzado durante el embarazo. El manejo del caso
frecuentemente genera dificultades para la gestante, su familia y para los profesionales de salud involucrados en
el dilema creado entre la terapia ideal para la madre y el bien estar del feto. El diagnóstico se basa en el test triple
que consiste en el examen clínico, imagen y biopsia, pretendiendo evaluar la extensión de la enfermedad en la
mama y en los linfonodos, identificar múltiples focos o un eventual tumor bilateral, así como prevenir metástasis
sistémica y controlar localmente la enfermedad. El avance en la terapéutica, a fin de proteger el producto, puede
comprometer la salud materna. La mastectomía radical modificada y la radical clásica pueden ser utilizadas con
seguridad. Se debe realizar el vaciamiento axilar, pues las metástasis son comúnmente encontradas en el embarazo
y el compromiso linfonodal influencia en la elección de la quimioterapia. Evidencias sugieren seguridad y eficacia
del esquema 5-fluorouracil, doxorrubicina (o epirrubicina) y ciclofosfamida durante el segundo y el tercer trimestre
de la gestación. La radioterapia debe ser retrasada para después del parto. Este estudio pretende incentivar el
examen de las mamas durante el examen ginecológico de rutina y prenatal, concientizando a la paciente y equipo
de salud sobre su importancia en el ciclo grávido puerperal.
Palabras clave: Cáncer de mama; Embarazo; Diagnóstico; Tratamiento.

Introdução mamas durante o exame ginecológico de rotina e


pré-natal, conscientizando paciente e equipe de
Câncer de mama associado à gravidez é saúde da importância do exame da mama no ciclo
definido como aquele diagnosticado durante a grávido-puerperal.
gestação, lactação ou no primeiro ano após o
parto. É uma situação clínica rara e desafiadora, Diagnóstico do câncer de mama
com incidência variando de 1:3000 a 1:10.000
gestações.1,2,3
durante a gravidez
No Brasil, as taxas de mortalidade por câncer A abordagem diagnóstica baseia-se no teste
de mama continuam elevadas, provavelmente triplo que consiste em exame clínico, imagem
pelo fato de a doença ainda ser diagnosticada em e biópsia. Qualquer massa suspeita encontrada
estádios avançados. Este retardo no diagnóstico durante a gravidez deve ser investigada.6,8,9
acentua-se ainda mais no período gravídico-puer- O exame clínico das mamas é realizado na
peral, uma vez que as modificações fisiológicas consulta obstétrica no primeiro trimestre. Uma
mamárias dificultam a identificação do nódulo vez identificado o nódulo suspeito, este deve-
suspeito, além do baixo índice de suspeição da rá ser investigado por método de imagem. Na
doença neste período e relutância de médicos e gravidez, o primeiro exame a ser solicitado é a
pacientes em realizar testes radiográficos e pro- ultrassonografia mamária (USG), devido a seu
cedimentos invasivos neste período.2,4,5 baixo custo e capacidade de distinguir lesões
O tratamento precisa ser cuidadosamente císticas de sólidas.6-10 Os nódulos com bordas
instituído, visando a terapia ideal para a mãe por- irregulares, ecos internos heterogêneos, áreas
tadora do câncer e o bem-estar fetal. O adiamento anecoicas, reforço acústico posterior e distorção
da terapêutica, a fim de proteger o concepto, pode da arquitetura mamária merecem estudo anato-
comprometer a saúde materna.3 mopatológico imediato.9,10 Durante a gestação e
O objetivo do estudo é ressaltar a importân- lactação, a identificação de lesões à mamografia
cia do diagnóstico e do tratamento do câncer é dificultada pela maior densidade do parênquima,
de mama na gravidez, visto que está sujeito a intensa vascularização e aumento da celularida-
potenciais causas de retardo e pior prognóstico de.2,6,7 Vale ressaltar que a dose de radiação, com
do que na mulher não gestante. Esta discussão proteção abdominal adequada, fica em torno de
também deve subsidiar o incentivo ao exame das 0,004 cGy, sendo insignificante o risco fetal.2,6,8

68 revista.hupe.uerj.br
Câncer de mama na gravidez: diagnóstico e tratamento

A positividade de 90% em gestantes com câncer encontradas na gravidez e o comprometimento


de mama invasivo demonstra o valor do método. linfonodal influencia na escolha da quimiotera-
A mamografia digital é preferida por apresentar pia.17 A mastectomia elimina a necessidade de
maior sensibilidade em mamas densas e redução radioterapia adjuvante e, consequentemente,
de 75% na dose da radiação.8 O exame é útil para seus riscos para o feto. A biópsia do linfonodo
avaliar a extensão da doença na mama e em lin- sentinela parece ser segura na gestação. A utili-
fonodos, além de identificar múltiplos focos ou zação do radioisótopo (99 m-Tc) não expõe o feto
eventual tumor bilateral, sendo especialmente à quantidade de radiação significativa e, portanto,
relevante na presença de microcalcificações.7,8,11 pode ser utilizada.16,18,19
Em lactantes, está indicado o esvaziamento das A terapia cirúrgica de conservação mamária
mamas imediatamente antes da realização do (tumorectomia) associada à radioterapia ou quimio-
exame.8,11 terapia neoadjuvante é uma opção para mulheres
A biópsia constitui o padrão-ouro para o diagnosticadas em fases avançadas da gestação.3,5
diagnóstico. A punção aspirativa com agulha fina
pode ser utilizada para o diagnóstico da massa Quimioterapia (QT)
mamária, mas a core-biópsia ou a biópsia exci-
sional é necessária para o diagnóstico definitivo A exposição do feto a essa terapia quando
de câncer invasivo.13,14 administrada em mulheres no segundo ou tercei-
Após o estabelecimento do diagnóstico, é ro trimestre, período posterior à organogênese,
necessária pesquisa de metástases ósseas, pul- resulta em nascidos vivos com baixa morbidade
monares, pleurais, hepáticas ou cerebrais, para e não parece causar aumento do risco de malfor-
o correto estadiamento e tratamento. Não há mações congênitas. Contudo, pode ser associado
contraindicações para a realização de radiogra- ao retardo do crescimento intrauterino e baixo
fia de tórax (0,008 cGy), crânio ou ossos longos peso ao nascer.3,17
(0,001 cGy). A ressonância magnética consiste Taxanos – grupo de medicamentos antine-
em potencial ferramenta, sendo ideal para con- oplásicos de ação antimitótica, com dados de
firmar o diagnóstico clínico ou radiológico das segurança e eficácia limitados, necessitando
metástases.6,10 mais estudos que avaliem a farmacocinética e a
passagem transplacentária. Entretanto, parecem
melhorar o prognóstico de mulheres com câncer
Conduta na gravidez
de mama, particularmente as que apresentam
O objetivo do tratamento da gestante com acometimento linfonodal. Os mais usados são o
câncer de mama é o mesmo da paciente não grávi- docetaxel (D) e paclitaxel (P).20
da: prevenção de metástases sistêmicas e controle Trastuzumabe – é um anticorpo monoclonal
local da doença. No entanto, a forma de tratamento dirigido ao receptor do fator de crescimento
precisa ser cuidadosamente avaliada em função epidermal humano 2 (HER2). Contudo, seu uso
dos potenciais efeitos adversos para o feto.3 na gravidez é contraindicado pelos riscos de
oligodramnia ou adramnia, anormalidades esque-
Tratamento cirúrgico léticas, lesão renal, hipoplasia pulmonar e morte
neonatal.19,21
Razoavelmente seguro é o tratamento defi- Lapatinib – afeta tanto HER2/neu (erb B-2)
nitivo do carcinoma de mama em gestantes. Os quanto o receptor do fator de crescimento epi-
riscos da cirurgia durante a gravidez são aborto dérmico (EGFR, também chamado de erbB-1). Foi
espontâneo e parto prematuro, não havendo aprovado para o uso em caso de superexpressão
aumento do risco de malformações congênitas.15 de HER2 em câncer de mama avançados que
A excisão ampla, a mastectomia radical modi- tenham progredido após exposição ao trastuzu-
ficada e a mastectomia radical clássica podem ser mabe. Não é tratamento padrão para câncer de
utilizadas com segurança quando não há doença mama em estágio inicial e seu uso não é indicado
metastática.16 O esvaziamento axilar é prefe- durante a gravidez e a lactação.3
rido, uma vez que metástases são comumente Metotrexato – deve ser evitado em todas as

v.13, n. 3, jul/set 2014 69


Revista HUPE, Rio de Janeiro, 2014;13(3):67-71

fases da gravidez por causa do seu efeito abortivo ambígua, hipertrofia de clitóris e fenda palatina.26
e teratogênico potencial.22
Antraciclinas – o esquema mais utilizado em Lactação
grávidas com câncer de mama é o esquema FAC:
5-fluorouracil, doxorrubicina (ou epirrubicina) e A lactação parece ser segura e possível. O
ciclofosfamida. Evidências sugerem segurança e aleitamento na mama contralateral não é afetado.
eficácia do uso das antraciclinas durante o se- Em casos de cirurgia conservadora e radioterapia,
gundo e o terceiro trimestres da gestação, com a produção de leite na mama tratada poderá ser
nível de evidência 2B (Oxford Level of Evidence menor. Alguns fatores, como incisão próxima a
[LOE] 2B).23 O uso da QT no primeiro trimestre aréola e mamilo, localização do tumor, além de
está associado a malformações em mãos e pés, mi- dose e tipo de radiação, podem alterar a produ-
crognatia e ventriculomegalia entre 10 a 20% dos ção de leite. De qualquer forma, o aleitamento
fetos.24 Portanto, o tratamento quimioterápico não na mama irradiada não é recomendado devido ao
deve ser protelado. No entanto, é recomendável risco da mulher desenvolver mastite, que, caso
evitar a quimioterapia de três a quatro semanas ocorra, será de manejo delicado.27,28
antes do parto para prevenir a mielossupressão A maioria das drogas (principalmente, os
agentes alquilantes) é excretada no leite huma-
transitória neonatal e potenciais complicações da
no. De forma geral, a lactação deve ser evitada
sepse, além da morte.23
durante a quimioterapia, uso de transtuzumab,
lapatinib e terapia endócrina. Não há evidências
Radioterapia de que o aleitamento em mulheres com câncer de
É utilizada para melhorar a sobrevida de mu- mama tratado modifique o prognóstico materno.28
lheres de alto risco tratadas com mastectomia, Apesar de informações fundamentadas em evi-
otimizando o controle local da doença.25 Seu uso dências limitadas, o tratamento de câncer durante a
deve ser adiado sempre que possível para depois gravidez pode ter sucesso, fornecendo para esta po-
do parto, pois o efeito dessa terapia sobre o con- pulação a melhora do prognóstico materno e fetal.
cepto depende tanto da dose empregada quanto
da idade gestacional, podendo variar de morte do Referências
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v.13, n. 3, jul/set 2014 71


Hipertireoidismo na gestação
Hyperthyroidism in Pregnancy

Hipertiroidismo en la gestación
Bárbara B. G. R. Bártholo, Denise L. M. Monteiro,* Alexandre J. B. Trajano

Resumo
O objetivo desta revisão é destacar que a identificação precoce do hipertireoidismo na gestação possibilita início
precoce de tratamento, evitando graves consequências para a saúde materno-fetal. A prevalência de hipertireoi-
dismo na gestação varia entre 0,1 a 0,4% e pode se manifestar clinicamente como hipertireoidismo subclínico,
tireotoxicose e crise tireotóxica. O diagnóstico é suspeitado pela ocorrência de perda de peso, sudorese, ansie-
dade, taquicardia, hipertensão arterial e aumento do volume da tireoide, sendo confirmado por supressão ou não
detecção dos níveis séricos de TSH e por elevação do T4L. O TRAb deverá ser solicitado quando a etiologia for
desconhecida, nas pacientes submetidas a tratamento com iodo radioativo ou tireoidectomia por doença de Graves
(DG) antes da gestação ou com achados clínicos compatíveis com a doença. As gestantes com hipertireoidismo
devem ser acompanhadas com dosagem de TSH, T4L e T3L na primeira consulta de pré-natal e mensalmente.
O tratamento do hipertireoidismo baseia-se no uso de propiltiouracil (PTU) e metimazol (MMZ). No primeiro
trimestre de gestação deve-se usar o PTU devido aos efeitos do MMZ em nível embrionário. Entretanto, o PTU
deverá ser substituído pelo MMZ após este período por sua hepatotoxicidade. Pacientes em uso de PTU devem ter
as enzimas hepáticas monitoradas durante o tratamento a cada quatro semanas assim como a função tireoidiana.
O diagnóstico precoce, a identificação da etiologia e o tratamento precoce e adequado do hipertireoidismo são
importantes para evitar complicações como: crise tireotóxica, abortamento, hipertensão gestacional, baixo peso
ao nascer, restrição de crescimento intrauterino, natimortalidade, disfunção tireoidiana neonatal, parto prematuro
e descolamento prematuro de placenta.
Descritores: Hipertireoidismo; Gravidez; Tratamento.

Abstract
The aim of this review is to highlight that early identification of hyperthyroidism during pregnancy allows
early initiation of treatment, avoiding serious consequences for maternal and fetal health. The prevalence of
hyperthyroidism in pregnancy ranges from 0.1 to 0.4% and may manifest clinically as subclinical hyperthyroidism,
thyrotoxicosis and thyroid storm. The diagnosis is suspected by the occurrence of weight loss, sweating, anxiety,
tachycardia, hypertension and increased thyroid volume, being confirmed by deletion or non-detection of serum
TSH and free T4 (FT4) elevation. The TRAb should be requested when the etiology is unknown, those undergoing
treatment with radioactive iodine or thyroidectomy before pregnancy due to Graves’ disease (GD) or clinical
findings compatible with the disease. Pregnant women with hyperthyroidism should be accompanied with TSH,
FT4 and FT3 at the first prenatal consultation and monthly. The treatment of hyperthyroidism is based on the
use of propylthiouracil (PTU) and methimazole (MMZ). In the first trimester of pregnancy PTU should be used to
from the effects of MMZ embryonic level. However, the PTU should be replaced by MMZ after this period for its
hepatotoxicity. Patients using PTU should have liver enzymes monitored during treatment every four weeks as
well as thyroid function. Early diagnosis and identification of the etiology and early and appropriate treatment of
hyperthyroidism are important to avoid complications such as thyroid storm, miscarriage, gestational hypertension,
low birth weight, intrauterine growth restriction, stillbirth, neonatal thyroid dysfunction, premature birth and
placental abruption.
Keywords: Hyperthyroidism; Pregnancy; Treatment.

*
Endereço para correspondência:
Núcleo Perinatal, HUPE, UERJ.
Revista HUPE, Rio de Janeiro, 2014;13(3):72-79 Av. Prof. Manuel de Abreu, 500,
Recebido: 24/04/2014 | Revisado: 02/07/2014 | Aprovado: 28/07/2014 Rio de Janeiro, RJ, Brasil. CEP: 20550-170.
doi: 10.12957/rhupe.2014.12131 E-mail: denimonteiro2@yahoo.com.br

72 revista.hupe.uerj.br
Hipertireoidismo na gestação

Resumen
El objetivo de esta revisión es destacar que la identificación precoz del hipertiroidismo en la gestación posibilita
el inicio adelantado del tratamiento, evitando graves consecuencias para la salud materno-infantil. La prevalencia
de hipertiroidismo en la gestación varia entre el 0,1 al 0,4% y puede manifestarse clínicamente como hipertiroidis-
mo subclínico, tirotoxicosis y crisis tirotóxica. Se sospecha el diagnóstico por la ocurrencia de perdida de peso,
sudores, ansiedad, taquicardia, hipertensión arterial y aumento del volumen de la tiroides, siendo confirmado por
la supresión o no detección de los niveles séricos de TSH y por elevación del T4L. El TRAb deberá ser solicitado
cuando la etiología fuese desconocida, en aquellas pacientes sometidas al tratamiento con yodo radioactivo o
tiroidectomía antes de la gestación por enfermedad de Graves (DG) o con hallazgos clínicos compatibles con la
enfermedad. Las gestantes con hipertiroidismo deben ser acompañadas con dosificación de TSH, T4L y T3L en la
primera consulta prenatal y mensualmente. El tratamiento del hipertiroidismo se basa en el uso de propiltiouracil
(PTU) y metimazol (MMZ). En el primer trimestre de gestación se debe usar el PTU debido a los efectos del MMZ
en nivel embrionario. Sin embargo, el PTU deberá ser substituido por el MMZ después de este periodo por su
hepatotoxicidad. Pacientes que usan PTU deben tener enzimas hepáticas monitoreadas durante el tratamiento
a cada cuatro semanas, así como la función tiroidea. El diagnóstico precoz, la identificación de la etiología y el
tratamiento precoz y adecuado del hipertiroidismo son importantes para evitar complicaciones como: crisis ti-
rotóxica, aborto, hipertensión gestacional, bajo peso al nacer, restricción de crecimiento intrauterino, mortalidad
al nacer, disfunción tiroidea neonatal, parto prematuro y desprendimiento prematuro de placenta.
Palabras clave: Hipertireoidismo; Embarazo; Tratamiento.

Introdução centa, prematuridade, baixo peso ao nascer, maior


morbidade ou maior mortalidade perinatal.2,5,6,7
Durante a gestação, os níveis de tiroxina O tratamento do hipertireoidismo baseia-se
total (T4) e tri-iodotironina total (T3) aumentam no uso de drogas antitireoidianas, preferencial-
em decorrência da presença da gonadotrofina mente propiltiouracil e metimazol.2,7
coriônica humana (HCG) no primeiro trimestre da O objetivo desta revisão é destacar a impor-
gestação e do aumento da globulina ligadora de tância da identificação precoce do hipertireoidis-
tiroxina (TBG), com consequente queda do hor- mo na gestação, possibilitando iniciar o tratamen-
mônio estimulante da tireoide (TSH). A despeito to, de preferência no primeiro trimestre, visando
dessas modificações, as frações séricas livres de evitar complicações que podem acarretar graves
tiroxina livre (T4L) e tri-iodotironina livre (T3L) consequências para a saúde materna e fetal.
permanecem nos limites da normalidade durante
a gestação. Dessa forma, os baixos níveis séricos Adaptação fisiológica da gestação
de TSH com T4L normal no início da gestação não
indicam função tireoidiana anormal.1,2,3 Durante a gestação, a fisiologia tireoidiana
A prevalência de hipertireoidismo na gestação sofre algumas modificações. O aumento do estro-
é de aproximadamente 0,1 a 0,4%, podendo se gênio na gravidez resulta em aumento da TBG de
manifestar clinicamente como hipertireoidismo duas a três vezes, que reduz a taxa dos hormônios
subclínico (ausência de sintomas), tireotoxicose tireoidianos livres séricos, estimulando o eixo hi-
e crise tireotóxica. A presença de sintomas é potálamo-hipofisário-tireoidiano.6 Os níveis de T4
decorrente do efeito estimulante dos hormônios total e T3 total, quando comparados com valores
tireoidianos sobre o metabolismo e os tecidos.4,5 pré-gestacionais, aumentam desde o início da
As principais causas de hipertireoidismo gestação como resultado da elevação e redução
relacionadas à gestação são: hipertireoidismo da taxa de degradação periférica do TBG. O TBG
gestacional mediado por HCG, doença de Graves atinge um platô com 20 semanas de gestação,
(DG), mutação de receptor de TSH e tireoidite mantendo-se inalterado até o final da gestação.1,2,3
pós-parto, sendo os dois primeiros os de maior Além disso, o HCG e o TSH apresentam su-
prevalência.2,3,4 Nos casos mal conduzidos, podem bunidades idênticas, acarretando a estimulação
ocorrer complicações como doença hipertensiva do receptor de TSH pelo HCG, que estimula a
gestacional, eclâmpsia, insuficiência cardíaca, liberação dos hormônios tireoidianos pela tireoide
abortamento, descolamento prematuro de pla- nas primeiras 8 a 14 semanas da gravidez e gera

v.13, n. 3, jul/set 2014 73


Revista HUPE, Rio de Janeiro, 2014;13(3):72-79

Tabela 1. Valores do TSH. associado a consequências adversas gestacionais


importantes.8,9
Alvo do TSH no período gestacional: Tireotoxicose: a ação inapropriada dos hor-
Primeiro Trimestre 0,1-2,5 mIU/L mônios tireoidianos aumentados nos tecidos leva
a tremor de extremidades, aumento da temperatu-
Segundo Trimestre 0,2-3,0 mIU/L
ra corporal, ansiedade, taquicardia, aumento pres-
Terceiro Trimestre 0,3-3,0 mIU/L sórico principalmente do componente sistólico da
pressão arterial e outros sintomas, podendo ou
feedback negativo no eixo hipotálamo-hipofisário, não estar acompanhado de estigmas da Doença
com redução do TSH nessa fase gestacional.6 A de Graves.
função tireoidiana começa a retornar ao normal Crise tireotóxica: há exacerbação dos sin-
com aproximadamente 20 semanas de gestação. tomas simpaticomiméticos podendo evoluir para
Em situações em que há aumento de HCG, como insuficiência cardíaca congestiva (ICC) e arritmia.
gestação múltipla, mola hidatiforme e hipere- O diagnóstico baseia-se na clínica da paciente e
mese gravídica, pode haver altas concentrações está associado à queda do TSH e ao aumento de
séricas de T4L com supressão transitória do T4L e T3L.4,5,6
TSH podendo evoluir para tireotoxicose. A cada
10.000 mUI/L de HCG há queda aproximada de 0,1 Diagnóstico
mUI/L de TSH. No segundo e terceiro trimestres
há queda do HCG com consequente redução da O diagnóstico do hipertireoidismo é suspei-
estimulação tireoidiana e aumento do TSH. A ta- tado pelos sinais e sintomas mencionados no
bela 1 refere-se aos valores do TSH nos diferentes quadro 1 e confirmado com supressão ou não
períodos gestacionais.2,3,4 detecção dos níveis séricos de TSH e elevação
Outro fator importante associado à fisiologia do T4L. Exames que utilizem iodo radioativo são
tireoidiana na gestação é o suprimento de iodo contraindicados na gestação.2,3
disponível à glândula tireoidiana, sendo fator O teste de função tireoidiana deve ser solicita-
importante em áreas de deficiência de iodo. do nas gestantes com hiperemese gravídica e com
Ocorre aumento na depuração do iodo pelo rim, achados clínicos de hipertireoidismo. Outras situ-
reduzindo o iodo sérico, seguido do aumento da ações em que se deve solicitar o TSH na gestação:
função tireoidiana.3,6 história de abortamento e/ou parto pré-termo,
anticorpos antitireoidianos positivos, diabetes
A glândula tireoidiana aumenta 10% de tama-
mellitus tipo 1 e outras desordens autoimunes,
nho durante a gestação e eleva sua produção em
infertilidade, história de doença familiar tireoi-
50%. A tireoglobulina sérica também aumenta
diana, radioterapia prévia de cabeça e pescoço,
no primeiro trimestre. O T4 sérico aumenta em
hiponatremia, anemia incompatível com os níveis
média 0,1 ng/dL e o TSH diminui 0,1 mUI/L em encontrados na gestação.5,6
gestações normais.2 As gestantes com diagnóstico prévio de hiper-
Gestantes eutireoideais com anticorpos anti- tireoidismo devem ser submetidas à dosagem de
tireoidianos positivos apresentam risco aumenta- TSH, T4L e T3L na primeira consulta de pré-natal
do de abortamento, parto pré-termo e tireoidite e mensalmente.5
pós-parto.2 O TRAb deverá ser solicitado no primeiro
trimestre e entre 22 a 26 semanas de gesta-
Aspectos clínicos ção quando a etiologia do hipertireoidismo for
desconhecida, em pacientes tratadas com iodo
Hipertireoidismo subclínico: não há mani- radioativo ou tireoidectomia prévia por DG ou
festações clínicas que correspondem ao hiper- com achados clínicos compatíveis com a doença.
tireoidismo laboratorial (TSH sérico suprimido Quando os valores são três vezes acima do limite
ou indetectável com T3L e T4L normais). Não superior da normalidade é aconselhável avaliação
há evidências de que o tratamento melhore as do bem-estar fetal e de sinais que denotem alte-
consequências gestacionais nem que possa cau- ração tireoidiana, como bócio fetal, por ultrasso-
sar potenciais efeitos adversos ao feto.5,6 Não é nografia (USG).2,4,5

74 revista.hupe.uerj.br
Hipertireoidismo na gestação

Quadro 1. Sinais e sintomas no hipertireoidismo.2,8

Sinais Sintomas

Tremor de extremidade Palpitações

Perda de peso Ansiedade

Falha de ganho ponderal a despeito de dieta adequada Intolerância ao calor e aumento de temperatura corporal

Taquicardia Náuseas e vômitos

Hipertensão Aumento do apetite

Tremor palpebral Mudança de hábito intestinal

Alargamento de tireoide ou nódulo Irritabilidade

Quadro 2. Características e manejo das principais causas de hipertireoidismo.2,3,5,10

Características Síndrome Hipertireoidismo Gestacional Doença de Graves

Início Primeira metade da gestação Geralmente antes da gestação

Durabilidade da doença Transitório. Melhora com 18-20 semanas Permanente

Marcadores de TRAb positivo-95% casos


Ausente
autoimunidade Anti-TPO pode ser positivo

Etiologia Aumento de HCG Autoimune

Prevalência 1-3% gestações 0,1-1,0% gestações

Bócio
Pode cursar com tireotoxicose e hiperemese gravídica.
Sintomatologia Exoftalmia
Perda ou ausência de ganho ponderal
Tireotoxicose

Só deve ser tratada se:


PTU: 50-300 mg/dia
Doença sintomática severa
MMZ: 5-15 mg/dia
T4L e T3L >50% do valor normal para gestação
Tratamento PPNL: 20-40 mg 6-8h
Suspeita de outra causa de hipertireoidismo
T4L e T3L 4/4 semanas.
Iniciar medicações antitireoidianas.
Sintomas exacerbam no 1º Tri.
Se taquicardia importante: ß-bloqueador

Acompanhamento Exame físico e TSH e T4L 3-4 semanas. Melhora gradual no 2º e 3º Tri.

Etiologia de HCG, hipertireoidismo trofoblástico, mutação


do receptor TSHR e tireoidite pós-parto.
As principais causas de hipertireoidismo na A hiperemese gravídica por aumento de HCG
gestação estão descritas no quadro 2. Outras cau- caracteriza-se por náuseas e vômitos severos no
sas incluem: hiperemese gravídica por aumento início da gestação, com perda ponderal maior que

v.13, n. 3, jul/set 2014 75


Revista HUPE, Rio de Janeiro, 2014;13(3):72-79

5%, desidratação e cetonúria.2 O tratamento é Tratamento


sintomático com antieméticos, hidratação e cor-
reção de distúrbios hidroeletrolíticos.3,5 Se houver O propiltiouracil (PTU) e o metimazol (MMZ)
manifestação clínica de tireotoxicose, administrar inibem a produção de T4L. Além disso, o PTU
drogas antitireoidianas.3 O aumento de HCG ocor- também bloqueia a conversão periférica do T4
re ainda no hipertireoidismo trofoblástico causado em T3, que possui maior atividade celular nos
pela mola hidatiforme e coriocarcinoma, com tecidos periféricos.10
alterações clínicas e ultrassonográficas típicas da O PTU deve ser usado no primeiro trimestre
de gestação (devido aos efeitos do MMZ em nível
doença de base e beta-HCG sérico acima do valor
embrionário) e em pacientes alérgicas ou com
esperado para a idade gestacional.2,3
intolerância ao MMZ. Entretanto, o PTU deverá
Deve-se ainda estar atento à possibilidade
ser descontinuado após o primeiro trimestre e
de disfunção tireoidiana no primeiro ano pós-
substituído pelo MMZ em decorrência de sua he-
parto (tireoidite pós-parto), principal causa de
patotoxicidade, podendo causar necrose hepática
tireotoxicose neste período.2 Entre dois a seis
na gestante e no concepto. As pacientes em uso
meses pós-parto, ocorre o hipertireoidismo de PTU devem ter as enzimas hepáticas e a função
assintomático ou sintomas hipermetabólicos leves tireoidiana monitoradas a cada quatro semanas.
como irritabilidade, intolerância ao calor, fadiga e A hepatotoxicidade induzida pelo PTU pode ser
palpitação.2 O anti-TPO pode estar presente em aguda, de difícil avaliação clínica e rapidamente
alguns casos.3 O tratamento está condicionado à progressiva. Se não reconhecida, pode levar à
presença de sintomas hipermetabólicos, usando- falência hepática e à morte materna.2,11
se propranolol de 10 a 20 mg/dia.2-4 O uso de drogas A exposição ao MMZ pode causar várias
antitireoidianas é ineficaz.2 Se assintomático, malformações congênitas principalmente apla-
repetir o TSH em 4 a 6 semanas.2 Após a paciente sia cutânea congênita, onfalocele, sintomas de
apresentar-se eutireoidea, dosar TSH sérico 2/2 anomalia do ducto onfalomesentérico e síndrome
meses até 1 ano pós-parto.2 A tireoidite pós-parto da embriopatia do metimazol: atresia anal ou
encontra-se associada com diabetes mellitus tipo esofageana e fácies dismórfica. O MMZ pode ser
1, DG em remissão e hepatite viral crônica.5 associado, em menor escala, a fístula traqueoe-
Causas menos comuns de tireotoxicose na sofágica e características dismórficas na pele.12
gestação incluem: bócio tóxico multinodular, Todas as drogas antitireoidianas atravessam a pla-
adenoma tóxico, tireoidite aguda, hipertireoidismo centa. MMZ e PTU possuem a mesma eficácia no
iatrogênico, tumor de pituitária secretor de TSH tratamento de hipertireoidismo na gestação.2,4,5,13
e Struma ovarian, tumor ovariano com tecido A dose de PTU deve ser iniciada com 300 mg/
tireoidiano em mais de 50% da massa (Figura 1).3 dia e reduzida gradativamente de acordo com o

Figura 1. Diagnóstico diferencial de hipertireoidismo na gestante.

76 revista.hupe.uerj.br
Hipertireoidismo na gestação

alvo do T4L ou T4T descritos abaixo. A dose do baseado na dosagem sérica mensal dos hormônios
MMZ é de 5 a 15 mg/dia (300 mg de PTU corres- tireoidianos.4 O T4L deve permanecer no limite
ponde a 10-15 mg MMZ).4 Pode ser necessário superior da normalidade e o T4T até 1,5 vezes do
associar betabloqueadores como propranolol valor normal para gestantes. O TSH não é solici-
20-40 mg 8/8h via oral (VO). tado na monitorização do tratamento porque se
Há ainda o risco de agranulocitose com o uso mantém baixo. A melhora dos sintomas ocorre em
de drogas antitireoidianas, ocorrendo em 0,1% dos 3 a 4 semanas de tratamento, mas a resposta plena
pacientes. Antes de iniciar a terapia medicamento- ocorre por volta de oito semanas pós-tratamento.
sa com essas drogas deve-se solicitar leucograma Pode-se avaliar a suspensão da medicação antiti-
de base. Pacientes com dor de garganta ou febre reoidiana após a paciente manter-se eutireoideia
devem ter hemograma solicitado imediatamente. próxima ao termo.5,6,15
Caso ocorra agranulocitose, todas as medica- Fetos de mães em uso de drogas antitireoidia-
ções antitireoidianas devem ser imediatamente nas devem ser avaliados quanto aos sinais de hi-
descontinuadas.6 potireoidismo por exame clínico para crescimento
Os agentes betabloqueadores, como o pro- e cardiotocografia para avaliação de bradicardia
pranolol e metoprolol, podem ser usados para fetal. Aproximadamente 10% dos expostos a estas
controle de sintomas hipermetabólicos, além drogas desenvolverão hipotireoidismo fetal e ne-
de inibir a conversão de T4 em T3 nos tecidos onatal. A USG deverá ser solicitada para avaliação
periféricos. Na maioria dos casos, a droga pode de biometria fetal e avaliação de sinais de bócio
ser descontinuada em duas a seis semanas. O fetal: presença de massa paratraqueal simétrica,
tratamento por longo período de tempo pode estar hiperextensão do pescoço e polidramnia.6,14
associado com crescimento intrauterino restrito, Caso a mulher seja exposta à terapia ablativa,
bradicardia fetal e hipoglicemia neonatal.2,5 deve manter-se em uso de contraceptivo seguro
Aproximadamente de 20 a 30% das pacientes por, no mínimo, seis meses. Este tratamento é
no último trimestre da gestação têm condições contraindicado durante a gestação e lactação
clínicas de descontinuar a terapia medicamentosa devido ao seu efeito teratogênico.6
na DG, exceto aquelas que se encontram com
altos títulos de TRAb, em que a terapia deve ser Complicações
continuada até o parto. Os sintomas frequente-
mente se agravam após o parto.2 Mulheres com O controle inadequado da tireotoxicose é
DG antes da gestação, adequadamente tratadas responsável pelas seguintes complicações: abor-
e em remissão da doença, apresentam baixo risco tamento, hipertensão gestacional, baixo peso ao
de recorrência durante a gestação.4 nascer, restrição de crescimento intrauterino,
MMZ de 20 a 30 mg/dia é considerada a droga natimortalidade, tempestade tireotóxica, dis-
antitireoidiana de primeira linha a ser utilizada na função tireoidiana neonatal, parto prematuro e
amamentação.2 O PTU também pode ser usado, descolamento prematuro de placenta.2,5,6,7,11
pois não causa alterações na função tireoidiana
nem no desenvolvimento físico e psíquico do Crise tireotóxica
recém-nascido, porém deve ser lembrado o risco
de hepatotoxicidade.14 É evento raro na gestação. O controle ina-
A tireoidectomia deve ser considerada em dequado do hipertireoidismo pode evoluir para
caso de alergia, contraindicações às drogas an- tempestade (crise) tireotóxica com aumento da
titireoidianas, em pacientes que requerem altas mortalidade materno-fetal.16
doses das medicações (MMZ 30 mg/dia e PTU 450 O diagnóstico é clínico com atividade adre-
mg/dia) ou quando não há resposta ao tratamento nérgica exacerbada, taquicardia desproporcional
medicamentoso. O segundo trimestre é o melhor à idade gestacional, aumento da temperatura
momento para realização da cirurgia, pois esta é corporal, agitação ou confusão mental, podendo
fator de risco para parto prematuro (risco entre evoluir para ICC e arritmia cardíaca.6 Pode ocor-
4,5 e 5,5%).4,5,14 rer ainda delirium, psicose, convulsão, diarreia e
O acompanhamento do tratamento deve ser evolução para estado comatoso.10 Durante a crise

v.13, n. 3, jul/set 2014 77


Revista HUPE, Rio de Janeiro, 2014;13(3):72-79

Atividade adrenérgica exarcebada, taquicardia desproporcional à idade gestacional,


aumento da temperatura corporal, agitação ou confusão mental. Sinais e sintomas de ICC.

SOLICITAR
-TSH, T4L, T3L, hemograma completo, transaminases hepáticas e cálcio
- descartar outras causas de síndrome adrenérgica

Aumento de T4L, T3L e queda do TSH. Sem outras causas de síndrome adrenérgica

Internação em Unidade de *dexametasona 8mg/dia ou Propranolol 40-80mg 6/6h ou 8/8h


Terapia Intensiva prednisona 60mg/dia6 Se ICC: furosemida
Reposição Hidroelétrica PTU 200-250MG 6/6h6 Avalizar status da tireoide do
Hidratação Após 1h de PTU: *lugol 8 gotas 6/6h8 feto e bem estar fetal8

*
Iodo e o corticoide podem ser descontinuados após a estabilização clínica.
Figura 2. Conduta mediante diagnóstico de crise tireotóxica.6,8

tireotóxica, pode haver aumento de transaminases American Thyroid Association for the diagnosis and
management of thyroid disease during pregnancy
hepáticas, leucocitose e hipercalcemia. Além dis- and postpartum. Thyroid. 2011;21:1081-125. http://
so, deve-se atentar para fatores desencadeantes dx.doi.org/10.1089/thy.2011.0087.
como infecções, cirurgias, complicações clínicas,
3. Albaar MT, Adam JM. Gestational transient
pré-eclâmpsia e parto. O tratamento deverá ser thyrotoxicosis. Acta Med Indones. 2009;41(2):99-104.
em Unidade de Terapia Intensiva.6,16
4. Bahn RS, Burch HB, Cooper DS, Garber JR, Greenlee
A crise tireotóxica não indica interrupção da
MC, Klein I, et al. Hyperthyroidism and other causes of
gestação. O parto por demais indicações obstétricas thyrotoxicosis: management guidelines of the American
não deverá ocorrer antes da compensação clínica Thyroid Association and American Association of
da paciente, visto que o parto cesáreo ou via vaginal Clinical Endocrinologists. Thyroid. 2011;21(6):593-646.
http://dx.doi.org/10.1089/ thy.2010.0417.
podem exacerbar a crise tireotóxica (Figura 2).16
5. Groot LD, Abalovich M, Alexander EK, Amino N,
Conclusão Barbour L, Cobin RH, et al. Management of thyroid
dysfunction during pregnancy and postpartum: An
O médico obstetra deve estar atento às Endocrine Society clinical practice guideline. J Clin
Endocrinol Metab. 2012;97(8):2543-65. http://dx.doi.
manifestações clínicas compatíveis com hiperti-
org/10.1210/jc.2011-2803.
reoidismo, a fim de diagnosticar e tratar precoce-
mente as pacientes, reduzindo as complicações 6. Fitzpatrick DL, Russell MA. Diagnosis and
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v.13, n. 3, jul/set 2014 79


Infecção pelo HTLV-1/2 em gestantes brasileiras
HTLV-1/2 infection in Brazilian pregnant women

Infección por el HTLV-1/2 en gestantes brasileras


Danielle B. S. Barmpas, Denise L. M. Monteiro,* Stella R. Taquette, Alexandre J. B. Trajano,
Roberta M. Raupp, Fátima R. D. Miranda, Nadia C. P. Rodrigues

Resumo
HTLV-1/2 são retrovírus com três vias de transmissão: sexual, hematogênica e vertical (TV). Em áreas endêmicas,
a TV tem o papel principal na cadeia de transmissão, principalmente pelo aleitamento materno. A infecção é
perene e 90% dos pacientes são portadores assintomáticos, porém existe associação com uma gama de doenças
inflamatórias, de dermatites inespecíficas até patologias graves e de prognóstico reservado, como a leucemia/
linfoma de células T do adulto (LTA) e a mielopatia associada ao HTLV-1, ou paraparesia espástica tropical (MAH).
Até hoje não existem formas de prevenção ou tratamento eficaz para a infecção por HTLV-1/2 nem para as doen-
ças decorrentes da mesma. Os dados sobre a infecção por HTLV-1/2 em gestantes brasileiras ainda são escassos
e isolados, pois a maioria dos artigos estuda doadores de sangue, a infecção não tem notificação compulsória
e o rastreio não faz parte da rotina pré-natal preconizada pelo Ministério da Saúde. O objetivo deste trabalho
é reunir o conhecimento disponível sobre o tema na literatura internacional. Ainda não há estudos publicados
sobre a prevalência da infecção em nosso estado, mas o projeto “Estudo da prevalência e da transmissão verti-
cal de HIV, HTLV e Sífilis em gestantes da Região Metropolitana do Rio de Janeiro”, de professores da UERJ com
financiamento da FAPERJ, identificou prevalência de 0,66% em parturientes na região metropolitana do Rio de
Janeiro. Com base neste resultado, foi proposta a inclusão do exame para o HTLV na rotina pré-natal do HUPE/
UERJ.O melhor conhecimento sobre a prevalência de HTLV-1/2 em gestantes nas diferentes regiões brasileiras é
fundamental para orientar a elaboração de políticas educacionais, sociais e de saúde pública que possam cons-
cientizar a população sobre a doença e reduzir as taxas de transmissão vertical.
Descritores: HTLV; Doenças sexualmente transmissíveis; Prevalência; Gravidez; Transmissão vertical de doença
infecciosa.

Abstract
HTLV-1/2 are retroviruses with three modes of transmission: sexual, blood borne and from mother to child /
vertical (VT). In endemic areas VT plays the major role in the chain of transmission, mainly by breastfeeding.
Infection is lifelong and 90% of the patients are asymptomatic carriers. However, there are associations to a
range of inflammatory conditions, from nonspecific dermatitis to severe diseases with poor prognosis such as
adult T-cell leukemia/lymphoma (ATL) and HTLV-1 associated myelopathy/tropical spastic paraparesis (HAM/
TSP). So far there is no efficient prevention or treatment of HTLV-1/2 infection or the diseases caused by it. Data
on HTLV-1/2 on Brazilian pregnant women is still scarce and isolated because most articles study blood donors,
the infection is not notifiable and screening is not part of the antenatal routine recommended by the Ministry of
Health. The goal of the present work is to gather the knowledge available on the subject in international literature.
There are still no published studies about the prevalence of HTLV-1/2 infection in pregnant women in our State,
however the project “Study of the prevalence and vertical transmission of HIV, HTLV and SYPHILIS in pregnant
women on the metropolitan area of Rio de Janeiro” carried out by UERJ professors and funded by FAPERJ,
identified a prevalence of 0.66% in women admitted for delivery on the metropolitan area of Rio de Janeiro. Based
on this result, the inclusion of HTLV screening in the routine antenatal care of HUPE/UERJ was proposed. Better
knowledge about the prevalence of HTLV-1/2 in pregnant women among the diverse Brazilian regions is crucial to
guide the development of educational, social and public health policies to increase awareness about the condition
and reduce mother to child transmission rates.

*
Endereço para correspondência:
Núcleo Perinatal, HUPE, UERJ.
Revista HUPE, Rio de Janeiro, 2014;13(3):80-87 Av. Prof. Manuel de Abreu, 500,
Recebido: 24/04/2014 | Revisado: 02/07/2014 | Aprovado: 28/07/2014 Rio de Janeiro, RJ, Brasil. CEP: 20550-170.
doi: 10.12957/rhupe.2014.12132 E-mail: denimonteiro2@yahoo.com.br

80 revista.hupe.uerj.br
Infecção pelo HTLV-1/2 em gestantes brasileiras

Keywords: HTLV; Sexually transmitted diseases; Prevalence; Pregnancy; Infectious disease transmission vertical.

Resumen
HTLV-1/2 son retrovirus con tres vías de transmisión: sexual, hematógena y vertical (TV). En áreas endémicas,
la TV tiene el papel principal en la cadena de transmisión, principalmente por el amamantamiento materno. La
infección es perenne y el 90% de los pacientes son portadores asintomáticos, sin embargo existe asociación con
una gama de enfermedades inflamatorias, de dermatitis inespecíficas hasta patologías graves y de pronóstico
reservado, como la leucemia/linfoma de células T del adulto (LTA) y la mielopatía asociada al HTLV-1, o parapa-
resia espástica tropical (MAH). Hasta hoy no existen formas de prevención o tratamiento eficaz para la infección
por HTLV-1/2 ni para las enfermedades derivadas de la misma. Los datos sobre la infección por HTLV-1/2 en
gestantes brasileras todavía son escasos y aislados, pues la mayoría de los artículos estudia donadores de sangre,
la infección no tiene notificación establecida y la detección no hace parte de la rutina prenatal preconizada por
el Ministerio de Salud. El objetivo de este trabajo es reunir el conocimiento disponible sobre el tema en la lite-
ratura internacional. Todavía no hay estudios publicados sobre la prevalencia de la infección en nuestro estado,
pero el proyecto “Estudio de la prevalencia y de la transmisión vertical de HIV, HTLV y Sifilis en gestantes de
la región metropolitana de Rio de Janeiro”, de profesores de la UERJ con financiamiento de la FAPERJ, identificó
prevalencia del 0,66% en parturientas en la región metropolitana de Rio de Janeiro. Con base en este resultado
fue propuesta la inclusión del examen para el HTLV en la rutina prenatal del HUPE/UERJ.Un mejor conocimiento
sobre la prevalencia de HTLV-1/2 en gestantes en las diferentes regiones brasileras es fundamental para orientar
la elaboración de políticas educacionales, sociales y de salud pública que puedan concientizar a la población sobre
la enfermedad y reducir las tasas de transmisión vertical.
Palabras clave: HTLV; Enfermedades sexualmente transmisibles; Prevalencia; Embarazo; Transmisión vertical
de enfermedad infecciosa.

Introdução e mielopatia associada ao HTLV-1/paraparesia


espástica tropical (HAM/TSP). A infecção também
Os vírus HTLV-1 e 2 foram os primeiros retro- pode causar uma série de doenças inflamatórias,
vírus humanos identificados na década de 1980, como uveíte, dermatite e doenças reumatológicas,
e apresentam forte tropismo por linfócitos-T e além de poder cursar com imunodepressão subclí-
transmissão intercelular obrigatória. A infecção nica e patologias oportunistas como estrongiloidí-
causada por eles possui distribuição mundial, ase, hanseníase, escabiose crostosa e tuberculose.
estimando-se entre 15 e 20 milhões de pessoas O HTLV-2 está associado à leucemia de células
infectadas.1,2 pilosas, à eritrodermatite, a polineuropatias e, em
A prevalência varia de acordo com a área ge- coinfectados com HIV, a infecções bacterianas
ográfica, composições sociodemográfica e étnica e micoses fungoides. Em virtude de seu caráter
da população, além de grupos de risco específicos, silencioso, a infecção e suas vias de transmissão
como usuários de drogas injetáveis, profissionais permanecem relativamente desconhecidas até
do sexo e portadores de HIV. O HTLV-1 é endêmico mesmo pelos profissionais de saúde.2
na África Ocidental, sudoeste do Japão e áreas da As publicações sobre HTLV-1/2 em gestantes
América Latina; a soroprevalência é maior no sexo brasileiras ainda são escassas, pois a maioria dos
feminino e aumenta com a idade. Sua epidemiolo- estudos aborda a infecção em doadores de san-
gia é peculiar em virtude da distribuição de polos gue. Adicionalmente, não há dados oficiais sobre
endêmicos adjacentes a áreas de baixa ou média o tema, já que a infecção não tem notificação
prevalência. O HTLV-2 por sua vez está associado compulsória, e o rastreio não faz parte da rotina
a populações “nativas” das Américas e ao uso de pré-natal preconizada pelo Ministério da Saúde.
drogas injetáveis.1,2 Com o objetivo de reunir o conhecimento dispo-
A maioria dos infectados (90%) permanece nível na literatura, foi realizada revisão sistema-
assintomática, mas é reservatório do vírus e sus- tizada que identificou os estados brasileiros em
tenta a cadeia de transmissão. Por outro lado, até que há estudos sobre a prevalência dos vírus em
7% dos portadores desenvolvem manifestações gestantes. Os resultados obtidos foram resumidos
clínicas graves e com prognóstico reservado como e comparados com os dados de prevalência em
leucemia/linfoma de células T do adulto (ATLL) doadores de sangue.

v.13, n. 3, jul/set 2014 81


Revista HUPE, Rio de Janeiro, 2014;13(3):80-87

Transmissão Esta revisão sistematizada utilizou como bases


de dados: Medline (por meio do PubMed), Scielo,
Há três principais vias de transmissão do LILACS e Google Acadêmico. Para identificação
HTLV-1/2: contato sexual, contato com sangue ou de publicações no Medline (por meio do Pubmed)
secreções (transfusão de sangue ou hemoderiva- foi utilizada a seguinte estratégia de busca:
dos celulares, compartilhamento de seringas no (“HTLV-1 Infections”[Mesh]) AND “HTLV-2
uso de drogas injetáveis, em transplantes, exposi- Infections”[Mesh]) AND “Pregnancy” [Mesh])
ção percutânea a sangue ou secreções biológicas AND “Prevalence”[Mesh], tendo sido encontrados
em profissionais de saúde) e por transmissão 20 artigos. Para pesquisa realizada nas demais
vertical (TV). A TV ocorre em cerca de 20% dos bases foram utilizados os termos “HTLV” e
filhos de mães infectadas, sendo sua principal “gravidez”, tendo sido localizados um total de 19
via o aleitamento materno prolongado,3 devido artigos. Após avaliação dos resumos dos artigos
à presença de linfócitos infectados no leite. A por dois revisores, foram excluídos 12 artigos por
eficiência da TV também está associada a títulos estarem em duplicata ou não se enquadrarem nos
elevados de anticorpos e alta carga pró-viral ma- critérios de inclusão e exclusão pré-estabelecidos
terna.4-6 A transmissão intrauterina ou perinatal (Quadro 1). Restaram 27 artigos que, após serem
não tem impacto epidemiológico significativo;7,8 no lidos na íntegra, foram excluídos mais 15 artigos
entanto, sabe-se que 2,5 a 5% dos filhos de mu- pelos critérios adotados. Essa seleção resultou
lheres infectadas serão soroconvertidos, mesmo em 12 artigos que foram utilizados para formular
na ausência de aleitamento materno.3,8 A infecção os resultados. Dentre os 15 estudos excluídos,
intrauterina foi demonstrada através da compro- seis foram reincluídos como fonte de dados para
vação histopatológica de infecção placentária em enriquecer a introdução e a discussão. Outros
gestantes portadoras de HTLV-1 e da identificação 12 artigos novos também foram utilizados com a
de sequências do vírus em células mononucleares mesma finalidade. A pesquisa finalizou com 30
fetais obtidas no sangue do cordão umbilical.9-11 fontes bibliográficas (Figura 1).

Diagnóstico laboratorial A infecção pelo HTLV-1/2 no Brasil


O diagnóstico laboratorial é realizado por O Brasil é um dos países com maior número
meio de testes de triagem pelas técnicas de absoluto de infectados no mundo, com estimativas
imunoensaio ou testes de aglutinação. Os testes variando entre 800.000 e 2,5 milhões de pessoas.1,12,13
de imunoensaio (EIA/ELISA e CMIA) fazem o Esta amplitude nas estimativas deve-se à falta
rastreio para ambos os vírus, enquanto que os de de dados oficiais sobre a doença e à escassez de
aglutinação detectam apenas o HTLV-1. No Brasil, trabalhos avaliando a prevalência da infecção na
predominam os testes de imunoensaio devido à população em geral. O único grande estudo nacional
presença de ambos os vírus na população. Os que abordou uma população não selecionada foi
testes confirmatórios são capazes de discriminar realizado em Salvador (BA) e encontrou a maior
entre HTLV-1 e HTLV-2. Os principais são Western prevalência da infecção pelo HTLV-1 no país (1,76%
blot, imunofluorescência indireta (IFA) e radioimu- na população geral, sendo 1,2% em homens e 2%
noprecipitação (RIPA). Em casos de resultados em mulheres), estimando-se 40.000 infectados.14
indeterminados nos exames confirmatórios ini- Os estudos são realizados mais frequente-
ciais podem ser utilizados testes confirmatórios mente entre doadores de sangue e populações
moleculares qualitativos ou quantitativos de selecionadas como usuários de drogas injetáveis e
reação em cadeia da polimerase (PCR). pacientes com outras doenças sexualmente trans-
missíveis. Deste modo, informações sobre a infec-
Método ção por HTLV-1/2 em gestantes brasileiras ainda
são relativamente recentes e pontuais. Os dados já
Foi realizada ampla pesquisa na literatura publicados sobre o tema evidenciam importantes
médica procurando identificar e extrair variações regionais na prevalência, indo de 0,13%
informações da literatura nacional e internacional. no Mato Grosso do Sul a 0,8% na Bahia.15,16 Apesar

82 revista.hupe.uerj.br
Infecção pelo HTLV-1/2 em gestantes brasileiras

Selecionados 39 resumos de artigos por via eletrônica

Excluídos 12 resumos pelos


critérios de inclusão e exclusão

Restaram 27 artigos para avaliação

Excluídos: 6 artigos pelo critério 1


8 artigos pelo critério 2
1 artigo pelo critério 3

12 artigos para os resultados

Incluídos: 18 artigos para


introdução e discussão

Total: 30 fontes bibliográficas

Figura 1. Fluxograma de busca de referências.

Quadro 1. Critérios para o diagnóstico de DMG da International Association of Diabetes and Pregnancy Study
Groups-2010.

Critérios de inclusão Critérios de exclusão


1. foco em gestantes HTLV-positivo; 1. estudos sobre a prevalência em outros países;

2. estudo limitado ao Brasil; 2. estudos sobre infecção pelo HTLV em outras popu-
lações;
3. estudos que abordam a prevalência da infecção pelo 3. estudos em idiomas de difícil compreensão.
HTLV na gestação ou puerpério;

4. estudos publicados em português, inglês e espanhol.

de ainda não haver dados publicados sobre a pre- diversos países europeus, foi demonstrado que a so-
valência da infecção em nosso estado, o projeto roprevalência para HTLV é proporcional (em média
“Estudo da prevalência e da transmissão vertical de 5 a 10 vezes maior) em gestantes e em doadores
de HIV, HTLV e Sífilis em gestantes da Região Me- de sangue na mesma área.17 Desta forma, a mesma
tropolitana do Rio de Janeiro” – desenvolvido por peculiaridade na distribuição geográfica da infecção
um grupo de pesquisadores da UERJ e aceito para pode ser antecipada em ambas as populações.
publicação no periódico PLOS Neglected Tropical Uma pesquisa detalhada avaliou a preva-
Diseases – identificou prevalência de 0,66% em lência da infecção por HTLV-1/2 em doadores
1204 parturientes na região metropolitana do Rio de sangue das 27 capitais brasileiras (Figura 2).
de Janeiro. O teste de triagem durante a gestação Mais de seis milhões de doações foram avalia-
não é preconizado como rotina no Estado do Rio das, entre 1995 e 2000, por meio dos dados de
de Janeiro, mas, tendo em vista a prevalência bancos de sangue públicos. A heterogeneidade
encontrada, que pode corresponder à segunda entre as regiões foi considerável, variando de
maior do Brasil, os coordenadores do projeto 0,4/1.000 em Florianópolis (SC) a uma taxa 25
propuseram a inclusão do exame para o HTLV na vezes maior (10,0/1.000) em São Luís (MA). É
rotina pré-natal do HUPE/UERJ. importante salientar o padrão de distribuição da
Sabe-se que as gestantes representam melhor a doença, com maior soroprevalência nos estados
população em geral do que os doadores de sangue, Norte e Nordeste (Pará, Pernambuco, Bahia e
porém ambos refletem de alguma forma a ende- Maranhão) e taxas significativamente mais baixas
micidade da infecção. Em um estudo envolvendo nos estados do Sul, como Santa Catarina (Figura

v.13, n. 3, jul/set 2014 83


Revista HUPE, Rio de Janeiro, 2014;13(3):80-87

2).18 Estes achados foram corroborados por uma dos retrovírus humanos. No entanto, mesmo na
publicação mais recente em que a prevalência de África, a soroprevalência para HTLV em gestantes
HTLV-1/2 em doadores de sangue de Pernambuco apresenta significativa variabilidade, indo de 0,2%
foi mais que o dobro da de São Paulo (2,22/1.000 na África do Sul, passando por 0,7% na República
x 1,01/1.000).19 Infelizmente não há um estudo tão do Congo e alcançando 5,5% na Nigéria.1
abrangente e metodologicamente criterioso que
permita a comparação direta dos dados da infec- Impacto da infecção por HTLV-1/2
ção em grávidas com os de doadores de sangue
obtidos por Catalan-Soares.18 no ciclo gravídico-puerperal
A heterogeneidade regional da prevalência Nenhum dos artigos sobre HTLV-1/2 em
de HTLV-1/2 no Brasil pode ser explicada pelas gestantes e puérperas brasileiras abordou espe-
características étnicas da população, pois o cificamente o impacto da infecção no desfecho
Nordeste tem maior proporção de descenden- da gestação, e apenas quatro fazem referência
tes de africanos e ameríndios do que o Sul. A à história obstétrica, mais especificamente de
endemicidade do HTLV-2 foi documentada por abortamento espontâneo (Tabela 1).
estudos epidemiológicos em grupos indígenas da Os estudos conduzidos no Mato Grosso do
Amazônia.20 Por outro lado, evidências filogené- Sul, Pará e Espírito Santo, que juntos contabilizam
ticas demonstraram a introdução das cepas de mais de 130.000 pacientes, relatam incidência
HTLV-1 na Bahia por meio da migração forçada da de abortamento de 26,8%, 29,7% e 22,6% res-
África,14,21 que é a maior área endêmica de HTLV-1 pectivamente,15,22,23 notavelmente maior do que
no mundo, sendo considerada o local de origem a esperada. Por outro lado, a taxa encontrada

Figura 2. Prevalência de HTLV-1/2 em doadores de sangue rastreados no Brasil entre 1995 e 2000. Reproduzido
com permissão dos autores.18

84 revista.hupe.uerj.br
Infecção pelo HTLV-1/2 em gestantes brasileiras

Tabela 1. Estudos da infecção por HTLV-1/2 em gestantes e puérperas no Brasil.

Evolução com História


Autor/Ano Local n Prevalência HTLV* (%)
aborto (%) abortos (%)
Broutet et al, 199625 Fortaleza, CE 814 0,12 NA NA

Bittencourt et al,
Salvador, BA 6.754 0,84 (0,59-1,03) 3,8 9,6
200116

Olbrich Neto et al,


Botucatu, SP 913 0,2 (0,04-0,88) NA NA
200426

Oliveira et al, 200627 Goiás, GO 15.485 0,1 NA NA

Figueiró-Filho et al,
MS 32.512 0,13 (0,08-0,16) NA NA
200728

Dal Fabbro et al,


MS 116.689 0,13 6,7 26,8
200815

Magalhães et al,
Cruz das Almas, BA 408 0,98 NA NA
200821

Ydi et al, 200929 Cuiabá, MT 2.965 0,2 (0,10-0,51) NA NA

Lima et al, 200923 Vitória, ES 534 0,6§ NA 22,6

Ribeiro et al, 201030 MG 55.293 0,076 NA NA

Sequeira et al, 201222 Pará 13.382 0.3 NA 29,7

Guimarães de Souza
São Luís, MA 2.044 0,3 NA NA
et al, 201212

NA = não avaliado; * IC95%;§ resultados de ELISA não confirmados.

por Bittencourt e colaboradores em gestantes vírus. No entanto, o ato de amamentar contempla


de Salvador foi de cerca de 9%, semelhante à da não apenas aspectos biológicos, mas também de-
população em geral.16 Dal Fabbro e colaboradores terminantes culturais, comportamentais e valores
foram os únicos a identificarem mulheres com sociais dominantes de cada época. A imagem da
dois abortamentos ou mais, o que ocorreu em amamentação, de alguma maneira, tem povoado o
0,8% dos casos e foi, portanto, proporcional à mundo das mulheres enquanto símbolo represen-
incidência de abortamentos de repetição (três ou tativo da maternidade, construído social e cultu-
mais) na população.15 ralmente ao longo dos tempos, e paradoxalmente
Não foram encontradas publicações que ava- tido como determinação biológica da espécie.24
liassem a associação da infecção por HTLV-1/2 Neste sentido, torna-se fundamental compreen-
a outros desfechos gestacionais desfavoráveis, der que a mulher, ao ser impedida de amamentar,
como alterações placentárias, mortalidade peri- poderá passar por problemas emocionais, sociais
natal e baixo peso ao nascer, por exemplo. e até mesmo financeiros, devido ao alto custo da
O maior impacto da infecção pelo HTLV em alimentação artificial.
mulheres talvez não ocorra durante a gravidez,
mas sim no puerpério. No Brasil, a recomendação Comentários finais
para as mães HTLV positivo é que não amamentem
seus filhos, nem doem leite para Bancos de Leite A transmissão do HTLV-1/2 pode ocorrer de
Humano (BLH), devido ao risco de transmissão do três formas: contato sexual, contato com sangue

v.13, n. 3, jul/set 2014 85


Revista HUPE, Rio de Janeiro, 2014;13(3):80-87

ou secreções e por transmissão vertical (TV). A Nagata Y. HTLV-1 transmission from mother to fetus
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v.13, n. 3, jul/set 2014 87


Sífilis na gravidez
Syphilis in pregnancy

Sífilis en el embarazo
Alessandra B.A. Damasceno, Denise L. M. Monteiro,* Luiza B. Rodrigues,
Danielle B. S. Barmpas, Luciane R. P. Cerqueira, Alexandre J. B. Trajano

Resumo
A sífilis é causada pelo Treponema pallidum e transmitida por via sexual, hematogênica ou vertical (TV) durante
qualquer período da gravidez. Por orientação do Ministério da Saúde, seu rastreio seu e tratamento são oferecidos
de rotina a todas as gestantes que realizam o pré-natal. No entanto, as taxas de morbidade materna, infecção
congênita e mortalidade perinatal permanecem altas, representando ainda desafio à saúde pública. A persistên-
cia da alta prevalência de sífilis congênita, apesar dos programas específicos de prevenção, é inquietante. Esta
revisão visa contribuir para a divulgação do conhecimento atual no país e a elaboração de medidas que possam
reduzir a transmissão vertical e a morbimortalidade materno-infantil da sífilis. A prevalência de sífilis em ges-
tantes no Brasil é de 1,6%. A região Sudeste possui a maior taxa de notificação de sífilis congênita, e o Estado do
Rio de Janeiro tem as maiores taxas de incidência por nascidos vivos (9,8/1.000), segundo dados do Ministério
da Saúde. O custo da prevenção da infecção congênita, incluindo teste e tratamento, é menor que US$ 1,50 por
pessoa, e o risco de transmissão vertical na gravidez varia de 70 a 100%, nos casos de sífilis recente, e 30 a 40%,
na sífilis tardia. Nesta revisão, apresentamos uma discussão sobre o diagnóstico e o tratamento precoce da sífilis
na gravidez, que, quando realizado adequadamente, pode prevenir resultados gestacionais desfavoráveis para o
binômio mãe-filho. Um melhor entendimento da doença permite buscar formas de melhorar as políticas públicas,
colaborando com a diminuição da prevalência da sífilis e suas complicações no Brasil.
Descritores: Sífilis; Doenças sexualmente transmissíveis; Prevalência, gravidez; Transmissão de doença infec-
ciosa; /prevenção & controle.

Abstract
Syphilis is caused by the Treponema pallidum and its mode of transmission is sexual, blood borne or from
mother-to-child (vertical) throughout the pregnancy. According to the guidance of the brazilian Ministry of
Health, serological screening and treatment are routinely offered to all pregnant women attending antenatal
care, nevertheless rates of maternal morbidity, congenital infection and perinatal mortality remain high and the
disease still represents a challenge for public health. The persistence of the high prevalence of congenital syphilis
despite the targeted prevention programs is unsettling. This review aims to contribute to the spread of the current
knowledge in our country and the elaboration of measures which can reduce vertical transmission and mother
and child morbimortality. The prevalence of syphilis in pregnant women in Brazil is 1.6%. The Southeast region
has the highest rate of congenital syphilis notification, and the State of Rio de Janeiro has the highest incidence
per live births (9.8/1,000), according to data of the Ministry of Health. The cost of preventing congenital syphilis,
testing and therapy included, is lower than U$ 1.50 per person and the risk of mother-to-child transmission during
pregnancy ranges from 70 to 100% in cases of recent syphilis to 30 to 40% in late syphilis. This review presents
a discussion about the diagnosis and early treatment of syphilis in pregnancy, which can prevent unfavourable
pregnancy outcomes for both mother and child when properly administered. A better understanding of the
condition allows the search for improvement in public policies, collaborating to the reduction of the prevalence
of syphilis and its complications in Brazil.
Keywords: Syphilis; Sexually Transmitted Diseases; Prevalence, pregnancy; Disease transmission, infectious; /
prevention & control.

*
Endereço para correspondência:
Núcleo Perinatal, HUPE, UERJ.
Revista HUPE, Rio de Janeiro, 2014;13(3):88-94 Av. Prof. Manuel de Abreu, 500,
Recebido: 24/04/2014 | Revisado: 02/07/2014 | Aprovado: 28/07/2014 Rio de Janeiro, RJ, Brasil. CEP: 20550-170.
doi: 10.12957/rhupe.2014.12133 E-mail: denimonteiro2@yahoo.com.br

88 revista.hupe.uerj.br
Sífilis na gravidez

Resumen
La sífilis es causada por el Treponema pallidum y transmitida por vía sexual, hematógena o vertical (TV) durante
cualquier periodo del embarazo. Por orientación del Ministerio de Salud del Brasil, su detección y tratamiento
son ofrecidos por rutina a todos las gestantes que realizan el prenatal. Sin embargo, las tasas de morbilidad
materna, infección congénita y mortalidad perinatal permanecen altas, representando todavía un desafío para
la salud pública. La persistencia de la alta prevalencia de sífilis en gestantes en el Brasil es del 1,6%. La región
sudeste posee la mayor tasa de notificación de sífilis congénita, y el Estado de Rio de Janeiro tiene las mayores
incidencias por nacidos vivos (9,8/1.000), según datos del Ministerio de Salud. El costo de la prevención con-
génita, incluyendo test y tratamiento, es menor de U$ 1,50 por persona, y el riesgo de transmisión vertical en
el embarazo varia del 70 al 100%, en los casos de sífilis reciente, y 30 al 40%, en la sífilis tardía. En esta revisión
presentamos una discusión sobre el diagnóstico y el tratamiento precoz de la sífilis en el embarazo que, cuando
es realizado adecuadamente puede prevenir resultados gestacionales desfavorables para el binomio madre-hijo.
Un mejor entendimiento de la enfermedad permite buscar formas de mejorar las políticas públicas, colaborando
con la disminución de la prevalencia de la sífilis y sus complicaciones en el Brasil.
Palabras clave: Sífilis; Enfermedades sexualmente transmisibles; Prevalencia, embarazo; Transmisión de enfer-
medad infecciosa; /prevención y control.

Introdução ças sexualmente transmissíveis (DSTs) na mulher


ou no parceiro são fatores de risco associados à
A sífilis, doença sexualmente transmitida cau- infecção congênita.4
sada pela bactéria Treponema pallidum, se apre- Na presença de infecção por sífilis, o rastreio
senta como um desafio à saúde pública em todo o para afastar outras DSTs é preconizado. A sífilis
mundo. É uma doença transmitida por via sexual aumenta cerca de 10 vezes o risco de infecção
(sífilis adquirida) e vertical (sífilis congênita) pela pelo HIV (e em 18 vezes na presença de úlceras
placenta da mãe para o feto. Outras formas de genitais). Deve-se sempre descartar a possibili-
transmissão podem ser por via indireta (objetos dade da coinfecção da sífilis com o HIV pelo risco
contaminados) e por transfusão sanguínea.1 de transmissão vertical.5,6
Apesar de possuir agente etiológico bem Segundo o Ministério da Saúde, entre o ano
definido, formas conhecidas de transmissão e de 1998 e junho de 2012 foram notificados 80.041
tratamentos com excelentes índices de cura, casos de sífilis congênita em menores de um ano
nota-se ainda índices elevados de incidência da de idade, sendo 45,9% desses casos provenientes
doença. Esse fato é a tradução da carência total da região Sudeste, onde o estado do Rio de Janeiro
de aplicação de protocolos, que, se fossem cum- apresentava, em 2011, uma das maiores taxas de
pridos, permitiriam a redução da disseminação incidência (9,8 por mil nascidos vivos). Foram ava-
da doença.2 liados os óbitos notificados por sífilis congênita
No Brasil, a notificação atinge somente 32% no mesmo período, evidenciando 1780 casos no
dos casos de sífilis gestacional e apenas 17,4% de país, sendo 758 óbitos provenientes do Estado do
sífilis congênita. Esses dados reforçam a falta de Rio de Janeiro, correspondendo a 42% dos óbitos
qualidade nos serviços de assistência pré-natal do Brasil.7 A prevalência da sífilis em gestantes no
e para o parto. Como a maioria das gestantes Brasil, segundo o Ministério da Saúde, é de 1,6%.7
encontra-se na fase latente da sífilis, torna-se O custo da prevenção da sífilis congênita é menor
necessária a adoção de testes sorológicos para que U$ 1,50 com teste e tratamento por pessoa.8
o diagnóstico.3 É um contrassenso uma doença de fácil diag-
A não realização de pré-natal, a gravidez na nóstico e terapêutica medicamentosa de tão baixo
adolescência, o uso de drogas ilícitas pela mãe ou custo apresentar incidência tão elevada na nossa
pelo parceiro (principalmente crack/cocaína), a população. As consequências são desastrosas,
ausência de parceiro sexual fixo e/ou a existência principalmente para as pacientes em idade repro-
de múltiplos parceiros, baixa escolaridade e nível dutiva, pelos riscos de transmissão vertical nos
socioeconômico, multiparidade, acesso limitado casos de sífilis congênita. Sendo assim, é de suma
aos serviços de saúde e presença de outras doen- importância um estudo de revisão que poderá ser

v.13, n. 3, jul/set 2014 89


Revista HUPE, Rio de Janeiro, 2014;13(3):88-94

útil para melhor entendimento e aplicabilidade podendo chegar de 70 a 100% nos casos de sífilis
de políticas de saúde que ajudariam no combate recente e 30 a 40% nos casos de sífilis tardia.14
à doença. O quadro clínico do recém-nato variará de
acordo com a fase da gestação em que a infecção
Aspectos clínicos tiver ocorrido. Quando a infecção se instalar no
último trimestre, a criança apresentará maior
A sífilis pode ser classificada como primária, probabilidade de nascer assintomática. A sífilis
secundária, latente, terciária ou congênita. congênita pode se apresentar com quadro clíni-
A sífilis primária ocorre após três semanas co variável: desde rinite hemorrágica, erupção
de exposição; há o aparecimento de úlcera, única, eritematopapulosa, placas mucosas, condiloma
medindo entre 0,3 e 3,0 cm, indolor, no local da plano, fissuras periorificiais radiadas, pênfigo si-
inoculação, com resolução espontânea em três a filítico, microadenopatia e hepatoesplenomegalia,
seis semanas, podendo ocasionalmente aparecer choro intenso e plaquetopenia, entre outras ma-
lesões múltiplas, sendo mais comuns quando nifestações possíveis na sífilis congênita recente,
associadas à coinfecção pelo HIV.9 até ceratite intersticial, tíbia em sabre, gomas,
A sífilis secundária ocorre após seis semanas hidrartrose bilateral de Clutton e ainda outras
a seis meses da infecção primária não tratada, manifestações tardias. Estigmas como os dentes
manifestando-se como rash cutâneo eritematoso de Hutchinson, nódulos de Parrot no crânio, nariz
e simétrico em tronco e extremidades, notada- em sela, fronte olímpica e alterações no exame
mente nas regiões palmar e plantar. Os sintomas de fundo de olho, apresentando aspecto em “sal
gerais mais relatados são mal-estar, cefaleia, e pimenta”, podem estar presentes.15
febre, prurido (42%) e hiporexia. Outros, menos A estimativa da Organização Mundial da
comuns, são dor nos olhos, dor óssea, artralgia, Saúde (OMS), principalmente nos países em
meningismo, irite e rouquidão. O paciente nessa desenvolvimento, é de mais de dois milhões de
fase é muito contagioso.10 gestantes infectadas a cada ano e que quase um
A fase latente da doença inclui os pacientes milhão de recém-natos possuam o diagnóstico de
assintomáticos, sem envolvimento sistêmico da sífilis congênita. Gestantes com sífilis possuem
doença, com sorologia positiva. Pode ser precoce 12 vezes mais chances de terem algum evento
(menos de um ano de evolução) ou tardia (mais de adverso, mesmo após tratamento, do que uma
um ano de evolução). paciente soronegativa. Nas gestantes com sífilis
A sífilis terciária ocorre em 1 a 10 anos, com não tratada ou inadequadamente tratada, a taxa
casos de até 50 anos para que a evolução se ma- de abortamento ou natimortalidade é de 25%,
nifeste. É caracterizada pela formação de gomas prematuridade ou baixo peso ao nascer, de 13%,
sifilíticas, que podem acometer principalmente neomortalidade, de 11%, e 20% dos lactentes são
pele, mucosas, esqueleto. As manifestações mais sintomáticos.16,17
graves da sífilis terciária são o acometimento
neurológico (paralisia geral progressiva, pupilas Diagnóstico
de Argyll Robertson, tabes dorsalis) e cardiovas-
cular (aortite, aneurisma de aorta, regurgitação O diagnóstico da sífilis pode ser realizado
aórtica). Aproximadamente 40% dos pacientes pela visualização direta do treponema em cam-
com complicações cardiovasculares possuem po escuro ou imunofluorescência direta, sendo
acometimento neurológico associado.11 tais técnicas indicadas na sífilis primária, lesões
A sífilis congênita é adquirida usualmente mucocutâneas e na sífilis congênita recente. A
pelo feto no útero materno, quando o Trepone- microscopia em campo escuro é o padrão ouro
ma atravessa a barreira transplacentária, apesar para o diagnóstico da sífilis recente, pois os testes
de excepcionalmente poder ser transmitida no sorológicos podem ser negativos neste estágio.18
nascimento.12,13 As provas sorológicas são as mais utilizadas
O risco de transmissão na gestação varia de no diagnóstico da sífilis e dividem-se em:
acordo com o estágio da infecção materna e da testes não treponêmicos, que são utilizados no
idade gestacional em que ocorre a exposição fetal, diagnóstico e seguimento pós-tratamento, dos

90 revista.hupe.uerj.br
Sífilis na gravidez

quais fazem parte o VDRL (Venereal disease em até 20 minutos.21


research laboratory) e o RPR (Rapid plasma A introdução do teste rápido no arsenal diag-
reagin), e os testes treponêmicos, válidos para nóstico para melhorar a cobertura de triagem para
confirmação da infecção, que incluem o FTA-ABS sífilis na gravidez, permitindo tratamento ime-
(Fluorescent treponemal antibody absorption) diato, é sugestão na literatura internacional e já
e TPHA (Treponema pallidum hemagglutination tem sido discutida para ser adotada em território
assay). Além destes, o imunoensaio enzimático nacional, à semelhança do que se faz com o teste
(EIA) vem se tornando popular nos Estados rápido de HIV. Compõe a proposta de qualifica-
Unidos como exame para rastreamento e poderá ção da atenção pré-natal dentro do projeto Rede
substituir os testes não treponêmicos para esse Cegonha, do Ministério da Saúde. A portaria do
fim. É mais específico que o RPR e mais sensível Ministério da Saúde, de 30 de dezembro de 2011,
que o FTA-ABS para infecções passadas. A técnica estabelece a possibilidade da utilização de teste
de PCR é pouco empregada na prática, porém rápido para diagnóstico de sífilis na gestante e
pode ser aplicada, sobretudo, nas lesões de sífilis no parceiro, por profissionais capacitados, nas
primária, congênita e neurossífilis. O Western-blot unidades de saúde, na etapa I do diagnóstico de
é outro teste ainda sem aplicação rotineira.19 sífilis. O teste rápido seria utilizado quando a
Os testes não treponêmicos são testes de gestante comparece para consulta pré-natal tar-
floculação quantitativa e seus títulos estão rela- diamente ou quando não há acesso ao laboratório
cionados à atividade da doença e são utilizados para realização do teste não-treponêmico (VDRL).
no acompanhamento do tratamento. O VDRL é Nestas situações, seria realizado o teste rápido
o mais utilizado para confirmação diagnóstica, e dada a conduta imediatamente, com aplicação
pois apresenta boa sensibilidade e especificidade, da primeira dose de penicilina, se a amostra for
podendo permanecer reagente mesmo após a reagente. Se possível, deve ser realizada a coleta
cura da infecção (cicatriz sorológica), porém com de sangue por punção venosa para a etapa II.22,23
queda progressiva das titulações. O Ministério da Saúde preconiza que durante
Os testes treponêmicos são qualitativos e a assistência pré-natal toda gestante seja subme-
aferem a presença de anticorpos contra os an- tida a pelo menos dois exames de VDRL, um por
tígenos de superfície do agente etiológico. Esses ocasião da primeira consulta e outro por volta da
testes não se relacionam com a atividade da do- 28a semana gestacional. Deve-se ainda realizar
ença e não são úteis para detectar a reinfecção. novo VDRL no momento do parto para garantir
Permanecem positivos por toda a vida e, quando ao recém-nascido a possibilidade de tratamento
negativos, excluem infecção prévia.20 precoce, caso a gestante não tenha sido tratada
O diagnóstico de sífilis na gestação em ou tenha se reinfectado após o tratamento.24
nosso país pode ser feito utilizando-se teste não O diagnóstico diferencial da sífilis primária
treponêmico de floculação do tipo VDRL, para deve incluir herpes genital, cancro mole, linfogra-
triagem. Em caso de positividade, recomenda-se nuloma venéreo, donovanose, granuloma inguinal,
a confirmação diagnóstica com teste treponêmico erupções medicamentosas, carcinoma, infecções
por aglutinação de partículas (TPHA) ou teste fúngicas superficiais e líquen plano. Na sífilis
fluorescente por absorção de anticorpos (FTA- secundária deve-se fazer diagnóstico diferencial
Abs), entretanto a ausência desses não deve com pitiríase rósea, erupções medicamentosas,
retardar o tratamento. Se o VDRL é reagente, e o psoríase, líquen plano, escabiose, exantemas do
teste treponêmico não reagente, trata-se de falso sarampo e rubéola.25
positivo, fato que ocorre em até 30% dos casos,
após a confirmação por teste treponêmico. 21 Tratamento
Pode-se utilizar também teste rápido por tiras de
imunocromatografia, treponêmico, exame simples O tratamento da gestante infectada pelo Tre-
que pode ser realizado ambulatorialmente, com ponema é igual ao de não gestantes e de acordo
sangue total ou gota obtida da ponta do dedo, com o preconizado: penicilina benzatina IM na
sendo vantajosa a sua utilização em lugares sem dose de 2.400.000 UI (1.200.000 UI em cada glú-
recursos laboratoriais, obtendo-se o diagnóstico teo), com uma aplicação na sífilis primária, duas

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na sífilis secundária e três na sífilis terciária, com com títulos altos de VDRL. O tratamento durante
intervalos semanais entre as aplicações. Qualquer o pré-natal pode resultar em falha em até 14% dos
outro tratamento é considerado inadequado para casos e ainda há a possibilidade de reinfecção,
a prevenção da sífilis congênita. O tratamento com caso o parceiro não tenha sido tratado simulta-
penicilina somente é considerado eficaz, tanto neamente. Por isso, o seguimento pós-tratamento
para a mulher quanto para o feto, se administrado deve ser realizado, segundo o Ministério da Saúde,
com mais de 30 dias antes do parto.26 com repetição da sorologia em 3, 6, 9, 12 e 18 me-
A elevação de títulos do VDRL em quatro ses. Considera-se cura quando há queda de três a
ou mais vezes (por exemplo, de 1:2 para 1:8) em quatro diluições no VDRL em relação à titulação
relação ao último exame realizado, justifica novo inicial no prazo de um ano.29
tratamento. Verificar se o tratamento do parceiro Apesar de a sífilis apresentar recursos diag-
foi realizado. Estes devem ser tratados mesmo nósticos e terapêuticos simples e de baixo custo,
quando apresentam VDRL negativo, com dose seu controle na gestação mostra-se um desafio
única de penicilina benzatina 2.400.000 UI IM; para profissionais de saúde e gestores. Este fato
sendo o VDRL positivo, em qualquer titulação, o ocorre devido aos entraves para a realização do
tratamento deve ser igual ao da sífilis terciária. seu diagnóstico e tratamento, assim como, difi-
A condição de parceiro não tratado caracteriza culdade de abordagem das doenças sexualmente
tratamento materno inadequado e, por conse- transmissíveis, principalmente durante a gestação;
guinte, a criança será considerada caso de sífilis parceiros sexuais que não são diagnosticados e/ou
congênita.27 tratados e provavelmente pelo desconhecimento da
No caso de alergia à penicilina, a gestante magnitude desse agravo e dos danos que ele pode
deverá ser dessensibilizada por meio da adminis- causar à saúde da mulher e do bebê pela população
tração oral de penicilina V em diluições gradati- e até mesmo pelos profissionais de saúde.30
vamente menores e em volumes inversamente
maiores, devendo ser realizada em ambiente Referências
hospitalar para melhor manejo de possíveis re-
ações. A administração da penicilina parenteral 1. Avelleira JCR, Bottino G. Sífilis: diagnóstico, tratamento
deverá ser feita somente 30 minutos após o tér- e controle. An Bras Dermatol. 2006;81(2):111-26.
mino do processo de dessensibilização. Em casos 2. Duarte G. Sífilis e a gravidez… e a história
de reações, a mesma deverá ser interrompida e continua! Rev. Bras. Ginecol Obstet. 2012;34
deverá ser instituído um tratamento alternativo. (2):49-51. http://dx.doi.org/doi.org/10.1590/S0100-
72032012000200001.
O tratamento das gestantes alérgicas com es-
tearato de eritromicina poderá levar à cura da 3. Campos AL, Araújo MA, Melo SP, Gonçalves ML.
gestante, mas não do feto. É feito na dose de 500 Epidemiologia da sífilis gestacional em Fortaleza,
Ceará, Brasil: um agravo sem controle. Cad. Saude
mg a cada 6 horas, por 15 dias na sífilis primária,
Publica. 2010; 26(9):1747-55. http://dx.doi.org/doi.
secundária e latente precoce, ou durante 30 dias org/10.1590/S0102-311X2010000900008.
na sífilis latente tardia. Deve-se ter em mente a
4. Rodrigues CS, Guimarães MD, César CC. Missed
possibilidade de falência terapêutica nos casos de
opportunities for congenital syphilis and HIV
coinfecção pelo HIV.28 perinatal transmission prevention. Rev Saude
Quando o tratamento é feito na fase secun- Publica. 2008;42(5):851-8.
dária da doença, é maior a possibilidade de ocor- 5. Krakauer Y, Pariente G, Sergienko R, Wiznitzer
rência da reação de Jarisch-Herxheimer, devido A, Sheiner E. Perinatal outcome in cases of
à liberação maciça de antígenos treponêmicos latent syphilis during pregnancy. Int J Gynaecol
mortos na circulação. Os sintomas mais comuns Obstet. 2012;118(1):15-7 http://dx.doi.org/10.1016/j.
ijgo.2012.01.026.
são calafrios, febre, dor de cabeça e dores mus-
culares, que, em geral, aparecem 4-6 horas após a 6. Brasil, Ministério da Saúde. Coordenação de Infor-
administração da penicilina benzatina. Na gestan- mações Estratégicas - CIE. Departamento de DST,
Aids e Hepatites Virais. Boletim Epidemiológico -
te, tal reação pode levar à morte fetal, indicando Aids e DST, 2013. Brasília: 2013.http://www.aids.gov.
necessidade de acompanhamento rigoroso no br/publicacao/2013/boletim-epidemiologico-aids-e-
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Ministério da Saúde; 2012. http://www.aids.gov. 05962005000300014. [Acesso em 23 maio 2014]
br/publicacao/2012/boletim-epidemiologico-de-
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Revista HUPE, Rio de Janeiro, 2014;13(3):88-94

Alessandra B. A. Damasceno
Danielle B. S. Barmpas
Divisão de Obstetrícia. Hospital Maternidade Carmela
Dutra. Secretaria Municipal de Saúde e Defesa Civil do Rio Programa de Pós-graduação em Ciências Médicas.
de Janeiro. Rio de Janeiro, RJ, Brasil. Faculdade de Ciências Médicas. Universidade do Estado do
Rio de Janeiro. Rio de Janeiro, RJ, Brasil.
Denise L. M. Monteiro
Luciane R. P. Cerqueira
Disciplina de Obstetrícia. Departamento de Ginecologia
e Obstetrícia. Centro Universitário Serra dos Órgãos Programa de Pós-graduação em Ciências Disciplina de
(UNIFESO). Teresópolis, RJ, Brasil. Obstetrícia. Departamento Ginecologia e Obstetrícia.
Faculdade de Ciências Médicas. Universidade do Estado do
Disciplina de Obstetrícia. Departamento de Ginecologia Rio de Janeiro. Rio de Janeiro, RJ, Brasil.
e Obstetrícia. Faculdade de Ciências Médicas da
Universidade do Estado do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro, Alexandre J. B. Trajano
RJ, Brasil.
Departamento de Ginecologia e Obstetrícia. Faculdade
Luiza B. Rodrigues de Ciências Médicas. Universidade do Estado do Rio de
Janeiro. Rio de Janeiro, RJ, Brasil.
Iniciação Científica, FAPERJ. Faculdade de Ciências
Médicas. Universidade do Estado do Rio de Janeiro. Departamento de Ginecologia e Obstetrícia. Faculdade
Rio de Janeiro, RJ, Brasil. de Medicina. Universidade Unigranrio. Rio de Janeiro, RJ,
Brasil.

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Normas da publicação

Instruções aos autores Deve-se iniciar cada uma das seções em uma
nova página: 1) página de título; 2) resumo, incluin-
A Revista HUPE considera para publicação do descritores; 3) abstract, incluindo keywords;
trabalhos de revisão relacionados às ciências da 4) texto; 5) agradecimentos; 6) referências; 7)
saúde. Cada número versa acerca de um tema. tabelas (completas, com títulos, notas de rodapé
Os artigos dos principais especialistas da área e em páginas separadas); 8) legendas das figuras.
compõem o fascículo após convocação de um Página de título – Deve estar centrado no alto
igualmente experiente editor convidado. da folha, em destaque. Logo abaixo, colocar
Todos os manuscritos serão avaliados por os nomes dos autores (como deverão ser
membros do corpo editorial da revista e sua
publicados) e a afiliação, da seguinte maneira:
aceitação para publicação dependerá de parecer
Disciplina (se aplicável). Departamento (ou
técnico de revisores.
serviço). Faculdade. Universidade (ou institui-
As opiniões expressas serão de exclusiva
ção). Cidade, UF, país. Ao final, deve-se infor-
responsabilidade dos autores.
mar os dados para correspondência do autor
principal (nome, endereço, telefone, e-mail).
Apresentação dos trabalhos
Resumo – Deve conter obrigatoriamente de
Os autores devem seguir rigorosamente as 250 a 300 palavras. Deve ser estruturado
normas editoriais da revista, particularmente no consistindo de três parágrafos. O primeiro
tocante ao número máximo de palavras, tabelas deve descrever o objetivo da revisão, isto é,
e figuras permitidas, bem como as regras para por que a revisão é relevante. O segundo pa-
confecção das referências bibliográficas. É per-
rágrafo descreverá os achados mais recentes
mitida a inserção de, no máximo, seis autores por
e o terceiro será um resumo descrevendo as
manuscrito. A não observância dessas instruções
principais implicações dos achados na pes-
implicará na devolução do manuscrito pela se-
quisa ou prática clínica.
cretaria da revista para que os autores façam as
correções pertinentes antes de submetê-lo aos Abstract – Deve ser uma versão exata do
revisores. resumo original para o idioma inglês.
A transcrição de imagens de outras publica-
Descritores e keywords – Devem ser forne-
ções deverá ter a prévia autorização dos respec-
cidos de três a cinco termos em português
tivos autores para dar cumprimento às normas
(logo abaixo do resumo) e em inglês (logo
que regem os direitos autorais.
abaixo do abstract) que definem o assunto do
A Revista HUPE reserva o direto de efetuar
trabalho. Devem obrigatoriamente ser base-
nos artigos aceitos as adaptações de estilo gra-
ados nos Descritores em Ciências da Saúde
maticais ou outras.
(DeCS), que disponibiliza os termos em três
idiomas (português, inglês e espanhol). Para
Estrutura e preparo do manuscrito
consultar diretamente, acesse o endereço
Os manuscritos devem ser enviados ao editor eletrônico: http://decs.bvs.br.
convidado por via eletrônica. O texto deve ser di-
Texto – O artigo deve conter os seguintes ele-
gitado em espaço duplo em todas as seções, com
mentos, cada um com seu respectivo subtítulo
fonte Times New Roman, tamanho 12, em arquivo
(em folhas separadas):
Word. O texto deve ter entre 2.000 e 2.500 pala-
vras, excluindo referências e tabelas. Deve conter Introdução – Deve conter, resumidamente,
no máximo cinco tabelas e/ou figuras. O número a situação atual dos conhecimentos sobre o
de referências bibliográficas não deve exceder a 30. tópico em estudo e o objetivo do estudo.

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Desenvolvimento – Deve ser dividido em Livros – Jenkins PF. Making sense of the chest
subtítulos conforme a necessidade do traba- X-ray: a handbook. 2nd ed. New York: Oxford
lho. Os dados que forem mostrados em tabe- University Press; 2005. 194 p.
las não surgirão no texto, sendo enfatizados, Capítulos de livro – Meltezer OS, Kallioniemi
no entanto, os mais importantes. Dados novos A, Trent JM. Cromosome alterations in human
encontrados devem ser ressaltados. solid tumors. In: Vogelstein B, Kinzler KW,
Conclusões – Devem sempre estar relacio- editors. The genetic basis of human cancer.
nadas aos objetivos do trabalho. New York: McGraw-Hill; 2002. p. 93-113.

Referências – Devem ser indicadas apenas as Publicações oficiais – World Health Or-
referências utilizadas nos textos. Recomenda- ganization. Global tuberculosis control:
se o sistema sequencial, no qual as citações surveillance, planning, financing. Report No.
são numeradas na ordem de aparecimento WHO/HTM/TB/2006. 362. Geneva: World
no texto e, ao final, listadas nesta mesma Health Organization; 2006.
ordem. O número de cada citação deve Endereços eletrônicos – Cancer-Pain.org
aparecer sobrescrito em fonte do mesmo [homepage on the Internet]. New York: As-
tamanho que o restante do texto, sem sociation of Cancer Online Resources, Inc.;
parênteses e após pontuação, se houver. As c2000-01 [updated 2002 May 16; cited 2002
regras para as referências devem seguir o Jul 9]. Available from: http://www.cancer-pain.
formato Vancouver, conforme definidas pelo org/.
International Committee of Medical Journal
Ilustrações – Todas as ilustrações, exceto
Editors, disponível no site http://www.ncbi.
tabelas e quadros, recebem a designação de
nlm.nih.gov/book-shelf/br.fcgi?book=citmed.
‘Figura’. Esta denominação deverá ser colo-
Os títulos dos periódicos citados devem cada na parte inferior da ilustração seguida
ser abreviados de acordo com o estilo do número de ordem de ocorrência no texto
apresentado pela List of Journal Indexed em algarismos arábicos, do título e legenda,
em Index Medicus da National Library of quando houver. As figuras devem ser envia-
Medicine, disponibilizada no endereço http:// das em arquivos separados (TIFF ou JPG,
www.ncbi.nlm.nih.gov/entrez/journals/ com qualidade superior de 300 dpi), tendo
loftext.noprov.html. Para os artigos listados no corpo do texto sua referência de entrada.
que tiverem registro DOI, o mesmo deve
ser informado ao final de cada referência Tabelas e quadros devem ser colocados após
(conforme exemplo abaixo). Evitar incluir as referências bibliográficas. Recebem nume-
material não publicado e comunicações ração independente em ordem de ocorrência
pessoais. no texto. A designação ‘Tabela’ ou ‘Quadro’,
seguida da numeração correspondente,
Para todas as referências, cite todos os auto-
deverá ser colocada centralmente na parte
res até seis. Acima desse número, cite os seis
superior da ilustração. O título da tabela ou do
primeiros autores seguidos da expressão “, et
quadro será indicado logo abaixo em negrito e
al.”. Seguem alguns exemplos:
centralizado. Legendas deverão ser colocadas
Artigos originais – Cummings SR, Lillington abaixo da tabela. Quando necessário, a fonte
GA, Richard RJ. Estimating the probability of (autor, data e página) deverá ser citada abaixo
malignancy in solitary pulmonary nodules: da legenda.
a Bayesian approach. Am Rev Respir Dis.
1986;134(3):449-52. http://dx.doi.org/10.1111
/j.1600-0757.2011.00418.

96 revista.hupe.uerj.br

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