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2016 / 2019
Vice-Presidente
Paulo Roberto Dutra Leão
Secretária
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Placenta prévia e acretismo placentário
Descritores
Placenta prévia; Acretismos placentário; Hemorragia terceiro trimestre; Hemorragia
Como citar?
Francisco RP, Martinelli S, Kondo MM. Placenta prévia e acretismo placentário. São Paulo: Federação
Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia (FEBRASGO); 2018. (Protocolo FEBRASGO -
Obstetrícia, no. 26/ Comissão Nacional Especializada em Assistência ao Abortamento, Parto e Puerpério).
Introdução
Apesar dos avanços da medicina, a hemorragia obstétrica ainda
consiste em causa importante de morte materna.(1) A presença de
placenta prévia aumenta o risco de hemorragia no anteparto (RR
9,8), no intraparto (RR 2,5) e também no período pós-parto (RR
1,9). Por isso, mulheres com placenta prévia são mais sujeitas a
receber transfusões sanguíneas, assim como passar por procedi-
mentos cirúrgicos, como histerectomia, ligadura da artéria ilíaca
interna, ou embolização de vasos pélvicos para controlar o sangra-
mento. Além disso, há aumento das complicações neonatais, espe-
cialmente, aquelas relacionadas à prematuridade, anemia, hipoxia
e restrição do crescimento fetal.(2)
*Este protocolo foi validado pelos membros da Comissão Nacional Especializada em Assistência ao
Abortamento, Parto e Puerpério e referendado pela Diretoria Executiva como Documento Oficial da
FEBRASGO. Protocolo FEBRASGO de Obstetrícia nº 26, acesse: https://www.febrasgo.org.br/protocolos
Definição e classificação
A placenta prévia é definida como a presença de tecido placentário
total ou parcialmente inserido no segmento inferior do útero, após
28 semanas de gestação. Pode ser classificada em:
A. Placenta prévia: a placenta recobre total ou parcialmente o
orifício interno do colo uterino (anteriormente denominada
placenta prévia centrototal ou centroparcial).
B. Placenta de inserção baixa: a borda placentária insere-se no seg-
mento inferior do útero, não chega a atingir o orifício interno e
localiza-se em um raio de 2cm de distância desta estrutura ana-
tômica (anteriormente denominada placenta prévia marginal).
Em algumas condições, a relação entre a placenta e o orifício
interno do colo pode modificar-se, como nos casos de placentas
que recobrem o colo no segundo trimestre e durante o trabalho de
parto. No segundo trimestre, o diagnóstico de placenta prévia deve
ser feito com mais cuidado, visto que, no termo, na maioria dos
casos, deixará de sê-lo.(3,4)
Diagnóstico
Qualquer gestante acima de 24 semanas com sangramento vaginal
indolor deve levar à suspeita de placenta prévia.
Diagnóstico clínico
O diagnóstico clínico de placenta prévia deve ser suspeitado diante
de sangramento vaginal indolor de coloração vermelho-viva, imo-
tivado, de início súbito, reincidente, de gravidade progressiva, na
segunda metade da gravidez. Contrações uterinas podem ser en-
contradas durante ou após o episódio hemorrágico, sendo que o
tônus uterino estará normal nos seus intervalos. O exame de toque
vaginal é proscrito pelo risco de ocasionar hemorragia abundante.
Em menos de 10% dos casos de placenta prévia, as gestantes não
apresentarão sintomas e o diagnóstico será realizado por exame
ultrassonográfico de rotina. A rotura prematura de membranas
ovulares e as apresentações fetais anômalas estão associadas à pla-
centa prévia.(3,6)
Diagnóstico ultrassonográfico
A experiência clínica tem demonstrado superioridade e segurança
na realização da ultrassonografia transvaginal nos casos de placen-
ta prévia, sendo considerada, atualmente, o padrão-ouro para esse
diagnóstico. Isso decorre da maior dificuldade daquela em visuali-
zar uma placenta posterior, o segmento inferior do útero pela posi-
ção do feto e também nos casos de obesidade materna. Identifica-se
tecido placentário recobrindo, ou muito próximo, o orifício interno
do colo uterino. O transdutor transvaginal deve ser introduzido
cuidadosamente e acompanhado pelo monitor, permanecendo a
uma distância de aproximadamente 2,0 cm do lábio anterior do
colo do útero. Se a suspeita de placenta prévia ocorrer antes de
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Francisco RP, Martinelli S, Kondo MM
Tratamento
Logo após o diagnóstico de placenta prévia, deve-se fazer o pla-
nejamento do seguimento e tratamento. Mesmo considerando-se
que, em boa parte dos casos, haverá migração placentária, as pa-
cientes devem ser informadas do diagnóstico e dos cuidados a se-
rem seguidos. As gestantes, mesmo que assintomáticas, devem ser
orientadas a procurar o hospital diante de qualquer sinal de san-
gramento, evitar atividade física exagerada, assim como relações
sexuais, principalmente após a 28a semana. O seguimento deve
incluir exames de ultrassonografia transvaginal para a localização
da placenta. Se houver migração placentária e normalização da in-
serção da placenta, a gestante pode retornar ao pré-natal de risco
habitual, caso não possua outras morbidades.(3,7-10)
A conduta nos casos de placenta prévia dependerá principal-
mente da idade gestacional, intensidade da hemorragia e presença
ou não de trabalho de parto.
Na presença de sangramento vaginal ou contrações uterinas
‒ diante da suspeita de placenta prévia ‒, recomenda-se interna-
ção imediata da gestante para controle materno e de vitalidade
fetal. Este diagnóstico deve ser confirmado pela ultrassonografia
transvaginal. Deve-se obter acesso venoso calibroso e manter a es-
tabilidade hemodinâmica e o débito urinário adequado. A pressão
Expectante
Quando o sangramento materno não for intenso (ausência de al-
teração hemodinâmica) em gestações com fetos pré-termo, pode
ser adotada a conduta expectante, desde que seja possível um bom
controle materno e fetal.(11,12) Tal abordagem baseia-se no fato de
que 75% dos episódios de sangramento são autolimitados, sem ris-
co imediato para a mãe ou para o feto. Além disso, em 50% dos
casos, o parto pode ser postergado por pelo menos quatro sema-
nas. Recomenda-se que as gestantes portadoras de placenta prévia
permaneçam em repouso e recebam suplementação de ferro ele-
mentar (60 mg, por via oral, três ou quatro vezes ao dia).
Na prática clínica, a administração de qualquer tocolítico ‒ em
casos de placenta prévia com trabalho de parto prematuro ‒ per-
manece controversa, pois não há estudos prospectivos para me-
lhor avaliação. Os betamiméticos devem ser evitados, pois podem
Ativa
Deve-se indicar imediata resolução da gestação diante de sangra-
mento materno incontrolável (alteração hemodinâmica), vitalida-
de fetal alterada, maturidade fetal comprovada ou idade gestacio-
nal acima de 37 semanas, por cesárea.(10,11) Em casos selecionados
de placentas de inserção baixa, sem complicações, pode-se permitir
o parto por via vaginal.
Cuidados no parto
Para o adequado planejamento cirúrgico, a localização da placenta
deve ser conhecida. Sangue e hemoderivados devem estar dispo-
níveis no intraoperatório, se necessário. Deve-se evitar incisar a
placenta durante a histerotomia. Nas placentas posteriores e nas
anteriores sem acretismo, deve ser realizada uma histerotomia
transversa. Se a placenta ficar à mostra, esta deve ser descolada
manualmente, no sentido da menor área placentária, para que
se possa ter acesso à cavidade uterina. Também é possível, nessa
situação, que a incisão tenha de ser transplacentária, com maior
sangramento local. Nesse caso, a extração podálica do feto costu-
ma ser mais fácil, por isso, deve ser feita o mais rápido possível, e
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Placenta prévia e acretismo placentário
Acretismo placentário
A aderência anormal da placenta ao miométrio ‒ que apresen-
ta ausência parcial ou total da decídua basal e desenvolvimento
anormal da camada fibrinoide ‒ é chamada de acretismo placen-
tário. Pode ocorrer a aderência de todos os cotilédones (acretis-
mo total), de alguns (acretismo parcial) ou de um ou parte de um
deles (acretismo focal). A média estimada de perda sanguínea no
parto com acretismo placentário é de 2,5 L, sendo associada à
transfusão maciça de hemocomponentes, histerectomia, lesão
de bexiga e/ou ureter, intestino e pós-operatório em Unidade de
Terapia Intensiva. Os principais fatores de risco para o acretismo
placentário são a cesárea anterior, curetagem uterina, miomec-
tomia, cirurgia vídeo-histeroscópica, idade materna acima de 35
anos e multiparidade. De todos os fatores de risco, o crescente
aumento das cesarianas é o que contribui para o aumento da
associação placenta prévia e o acretismo. Silver et al. (2006) de-
Quadro clínico
Na presença de placenta prévia que não sangra, deve-se suspeitar
de acretismo. A hemorragia semelhante à placenta prévia pode
ocorrer na presença do acretismo em razão da formação do seg-
mento inferior do útero e da dilatação do orifício interno que leva
ao rompimento da área da placenta que recobre o orifício interno,
com isso, ocasionando o sangramento.
Diagnóstico
No pré-natal, sempre que se associar placenta prévia e cesárea an-
terior, o diagnóstico de acretismo deve ser buscado, sendo muito
importante para planejamento do parto. O obstetra deve solicitar
uma ultrassonografia com equipe experiente para diagnóstico de
acretismo placentário. Quando a ultrassonografia não for esclare-
cedora, nos casos de placenta prévia com predomínio posterior, a
ressonância magnética pode ser solicitada.
Planejamento do parto
O parto deve ser realizado com 36/37 semanas, em centro de refe-
rência com experiência em casos de acretismo e uma equipe mul-
tidisciplinar com obstetra, anestesiologista, radiologista interven-
cionista, neonatologista, urologista, cirurgião geral, intensivista,
hemoterapeuta e enfermagem especializada. Todos os passos a
serem seguidos estão discriminados no quadro 2.(12-14)
Recomendações finais
• As hemorragias maternas são causa importante de morte
materna (A).
• O principal fator de risco para placenta prévia é a cesárea
anterior (A).
• A migração placentária acontece em boa parte dos casos, e o
diagnóstico de placenta prévia e de placenta de inserção baixa
pode modificar durante a gestação (B).
• A ultrassonografia transvaginal é o melhor método para diag-
nóstico de placenta prévia (A).
• O sangramento na placenta prévia costuma aumentar à medi-
da que os episódios se repetem (B).
• Deve-se investigar acretismo placentário sempre que há diagnós-
tico de placenta prévia em pacientes com cesáreas anteriores (B).
• A programação do parto em serviço terciário é imprescindível
para o bom resultado no caso de acretismo placentário (C).
• Não se deve proceder ao descolamento manual da placenta no
caso de suspeita de acretismo placentário (C).
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