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38ª Olimpı́ada de Matemática da Unicamp

Instituto de Matemática, Estatı́stica e Computação Cientı́fica


Universidade Estadual de Campinas

.
Resolução Comentada
Primeira Prova - Nı́vel Beta - 2022

1) (ANNE) Sejam a e b números naturais.

a) Qual é o resultado da divisão de a64 − b64 por (a + b)(a2 + b2 )(a4 + b4 )(a8 + b8 )(a16 + b16 )?
b) Generalize a pergunta do item anterior para o caso da potência 2n , n ∈ N, no lugar de 64 e
resolva a questão neste caso generalizado.

Solução:

a) Usando a identidade A2 − B 2 = (A − B)(A + B) repetidas vezes obtemos que

a64 − b64 = (a32 − b32 )(a32 + b32 ) = (a16 − b16 )(a16 + b16 )(a32 + b32 ) = . . .

= (a − b)(a + b)(a2 + b2 ) . . . (a32 + b32 )

Portanto, o resultado da divisão de a64 − b64 por (a + b)(a2 + b2 )(a4 + b4 )(a8 + b8 )(a16 + b16 )
é igual a (a − b)(a32 + b32 ).
n n
b) Para generalizar a questão vamos decompor o termo a2 − b2 utilizando o mesmo raciocı́nio
de antes:

n n n−1 n−1 n−1 n−1 n−1 n−1


a2 − b2 = (a2 − b2 )(a2 + b2 ) = . . . = (a − b)(a + b)(a2 + b2 ) . . . (a2 + b2 ),

ou seja,
n n n−1 n−1
a2 − b2 = (a − b)(a + b)(a2 + b2 ) . . . (a2 + b2 ).

Vamos provar que a identidade acima é verdadeira usando indução. Para n = 1 a identidade
a2 − b2 = (a − b)(a + b) é verificada. Suponha que a identidade vale para n = k e vejamos
que ela será válida também para n = k + 1:

k+1 k+1 k k k k k−1 k−1 k k


a2 − b2 = (a2 − b2 )(a2 + b2 ) = (a − b)(a + b)(a2 + b2 ) . . . (a2 + b2 )(a2 + b2 ).

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n n
A pergunta generalizada seria “Qual o resultado da divisão de a2 − b2 por (a + b)(a2 +
n−2 n−2 n−1 n−1
b2 )(a4 + b4 ) . . . (a2 + b2 )?” e a resposta é (a − b)(a2 + b2 ).

2) (ANNE) Um piloto decola um avião de São Paulo com destino à Campinas (veja figura abaixo).
Seguindo a rota 333◦ o voo teria a duração de 1 hora. Porém, piloto se confundiu e seguiu pela
rota 33◦ . Após 30 minutos o piloto percebeu o erro e imediatamente alterou o caminho para a
linha reta do ponto em que estava até Campinas. Assumindo que o avião viajou com velocidade
constante durante todo trajeto, determine qual foi o atraso do voo em minutos.

Solução: Assumindo que a velocidade do avião é constante igual a v km/h, temos que a distância
entre São Paulo (ponto A) e Campinas (ponto C) é de v km. Como o avião voou por 30 minutos
temos que ele percorreu uma distância de v2 km para ir do ponto A até o ponto B (veja a figura
abaixo).
O ângulo B ÂC é igual a 360◦ − 333◦ + 33◦ = 60◦ . Logo, pela Lei dos Cossenos temos que

2 2 2
BC = AB + AC − 2AB · AC cos 60◦

2 v2 2 v2 3v 2 3v
BC = +v − = ⇒ BC = .
4 2 4 2
√ √
Com isso, o tempo total de voo foi de 30 minutos somados a 30 3 minutos, ou seja, 30(1 + 3)
√ √
minutos. Portanto, o atraso foi de 30(1 + 3) − 60 = 30( 3 − 1) ∼ 21, 96 minutos.

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3) (MARCELO) Considere dois números de dois algarismos, digamos A = a1 a2 = a1 · 10 + a2 e


B = b1 b2 = b1 · 10 + b2 , onde a1 , a2 , b1 , b2 ∈ {0, 1, 2, . . . , 9}, com a1 , b1 ̸= 0.
Vamos definir uma operação, que chamamos de produto estrela entre A e B, denotada por A ⋆ B.
A operação é feita seguindo-se os seguintes passos:

Produto estrela de números de dois dı́gitos

Passo 1 Multiplicamos os dı́gitos das dezenas de A e B, obtendo o número c = a1 × b1 .


Passo 2 Multiplicamos os dı́gitos da unidades de A e B, obtendo o número u = a2 × b2 .
Passo 3 Somamos os dı́gitos de A, depois os dı́gitos de B e multiplicamos estas duas somas, obtendo
e = (a1 + a2 ) × (b1 + b2 ).
Passo 4 Subtraı́mos deste último produto os produtos obtidos nos passos 1 e 2 e obtemos d = e−u−c.
Passo 5 Definimos o produto estrela de A e B como sendo o número que tem c centenas, d dezenas
e u unidades, ou seja, A ⋆ B = (100 × c) + (10 × d) + u.

Passo A = a1 a2 e B = b 1 b 2 Exemplo: A = 46, B = 75


1 c = a1 × b 1 c = 4 × 7 = 28
2 u = a2 × b 2 u = 6 × 5 = 30
3 e = (a1 + a2 )(b1 + b2 ) e = (4 + 6)(7 + 5) = 120
4 d=e−u−c d = 120 − 28 − 30 = 62
5 A ⋆ B = (100 × c) + (10 × d) + u 46 ⋆ 75 = 100 × 28 + 10 × 62 + 30 = 3450

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a) Usando este algoritmo, determine o produto 35 ⋆ 96. Explicite todos os passos.


b) Mostre que, para A, B números de dois algarismos, o produto estrela é o produto usual, ou
seja, A ⋆ B = A × B.

Vamos considerar agora dois números de 4 dı́gitos, e definir um algoritmo similar para este caso.
Sejam A = a1 a2 a3 a4 , B = b1 b2 b3 b4 números de 4 dı́gitos (considere a1 , b1 ̸= 0).

Produto estrela de números de quatro dı́gitos

Passo 1 Multiplicamos a quantidade de centenas de A e B, obtendo o número c = a1 a2 × b1 b2 .


Passo 2 Multiplicamos a quantidade de unidades de A e B, obtendo o número u = a3 a4 × b3 b4 .
Passo 3 Somamos a quantidade de centenas e unidades de A, depois as de B e multiplicamos estas
duas somas, obtendo e = (a1 a2 + a3 a4 ) × (b1 b2 + b3 b4 ).
Passo 4 Subtraı́mos deste último produto os produtos obtidos nos passos 1 e 2, obtendo d = e − u − c.
Passo 5 Definimos o produto estrela de A e B como sendo o número que tem c dezenas de milhares,
d centenas e u unidades, ou seja, A ⋆ B = (10.000 × c) + (100 × d) + u.

Continuamos agora com mais três itens a serem respondidos:

c) Usando este algoritmo, determine o produto 3345 ⋆ 1732. Explicite todos os passos.
d) Mostre que, para A, B números de quatro algarismos, o produto estrela é o produto usual,
ou seja, A ⋆ B = A × B.
e) Generalize a definição do produto estrela A ⋆ B para A, B dois números naturais quaisquer
com 2n algarismos.

Solução: Neste exercı́cio, a operação ⋆, na realidade nada mais é que um algoritmo diferente
para o produto usual. Este algoritmo é conhecido como Algoritmo de Karatsuba, que é mais
eficiente que o algoritmo usual, no sentido de envolver menos produtos que o algoritmo tradicional,
que aprendemos e ensinamos nas escolas. Quem estiver interessado, pode ver um vı́deo bacana
em https://www.youtube.com/watch?v=cCKOl5li6YM

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a) Neste caso temos: c = 3 × 9 = 27, u = 5 × 6 = 30, e = (3 + 5) × (9 + 6) = 120,


d = 120 − 30 − 27 = 63 e

35 ⋆ 96 = (100 × 27) + (10 × 63) + 30 = 3360.

b) Vamos mostrar a partir da definição, omitindo o sı́mbolo × sempre que isto não causar
confusão. Ressaltamos que, com a nossa notação, ab = 10a + b ̸= a × b.

A ⋆ B = (100c) + (10d) + u
= 100a1 × b1 + 10((a1 + a2 )(b1 + b2 ) − a1 × b1 − a2 b2 ) + a2 × b2
= 100a1 × b1 + 10(
a1×b1 + a1 × b2 + a2 × b1 + X ×XaX2 − 
b2X a1×b1 − X
a2X×XbX2 ) + a2 × b2
= 100a1 × b1 + 10(a1 × b2 + a2 × b1 ) + a2 × b2
= 10a1 × 10b1 + 10a1 × b2 + a2 10 × b1 + a2 b2
= (10a1 + a2 )(10b1 + b2 ) = A × B

c) Neste caso temos: c = 33 × 17 = 561, u = 45 × 32 = 1.440, e = (33 + 45) × (17 + 32) = 3.822,
d = 3.822 − 561 − 1.440 = 1.821 e

3345 ⋆ 1732 = (10.000 × 561) + (100 × 1.821) + 1.140 = 5.793.540.

d) A demonstração segue os passos do item b):

A ⋆ B = (10.000c) + (100d) + u
= 100a1 a2 × b1 b2 + 10((a1 a2 + a3 a4 )(b1 b2 + b3 b4 ) − a1 a2 × b1 b2 − a3 a4 × b3 b4 ) + a3 a4 × b3 b4
= 10.000a1 a2 × b1 b2 + 100(( a2(×(b(
a1( 1 b2 + a1 a2 × b3 b4 + a3 a4
(

× b1 b2 + b3h ×hah
b4 h 3a 4 −
a1
a2 b2 − a3h
b1 a4h×hbh
3b 4 ) + a3 a4 × b 3 b 4
h  h
h h
= 100a1 a2 × 100b1 b2 + 100(a1 a2 × b3 b4 + a3 a4 × b1 b2 ) + a3 a4 × b3 b4
= (100a1 a2 + a3 a4 )(100b1 b2 + b3 b4 ) = A × B.

e) A generalização fica clara se adotarmos uma notação adequada. Estamos considerando

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números com 2n dı́gitos, logo escrevemos

A = (a1 a2 · · · a2n−1 )(a2n−1 +1 a2n−1 +2 · · · a2n )

B = (b1 b2 · · · b2n−1 )(b2n−1 +1 b2n−1 +2 · · · b2n ).

Se denotarmos

A1 = a1 a2 · · · a2n−1 , A2 = a2n−1 +1 a2n−1 +2 · · · a2n


B1 = b1 b2 · · · b2n−1 , B2 = b2n−1 +1 b2n−1 +2 · · · b2n

podemos denotar A = A1 A2 e B = B1 B2 e então definimos:


Passo 1 c = A1 × B1 .
Passo 2 u = A2 × B2 .
Passo 3 e = (A1 + A2 ) × (B1 + B2 ).
Passo 4 d = e − u − c.
n n−1
Passo 5 A ⋆ B = (102 c) + (102 d) + u.
Observação Não foi solicitado na questão, mas não é difı́cil demonstrar que no caso genérico
o produto estrela coincide com o produto usual. De fato,

n n−1
A ⋆ B = (102 c) + (102 d) + u
2n n−1
= 10 A1 × B1 + 102 ((A1 + A2 )(B1 + B2 ) − A1 × B1 − A2 B2 ) + A2 × B2
2n 2n−1
= 10 A1 × B1 + 10 A1×
( B 1 + A1 × B2 + A2 × B1 + B2 ×
XXA
2 −
A1×
B 1 − A2 ×
XXB
2)
  X   X
X
X X
X
+ A2 × B2
n n−1
= 102 A1 × B1 + 102 (A1 × B2 + A2 × B1 ) + A2 × B2
2n−1 2n−1 n−1 n−1
= 10 A1 × 10 B1 + 102 A1 × B2 + A2 102 × B1 + A2 × B2
2n−1 2n−1
= (10 A1 + A2 )(10 B1 + B2 ) = A × B

e temos que A ⋆ B = A × B.

4) (CHICO) Considere que, de um triângulo ABC, sejam dadas as medidas de dois lados, digamos

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a = BC e c = AB, bem como a medida do ângulo oposto a um desses lados, digamos  = B ÂC,
oposto ao lado de medida a.

a) Mostre que é possı́vel construir dois triângulos não congruentes com lados de 10 cm e 14 cm
e com um ângulo de 40◦ oposto ao lado de 10 cm.
b) Supondo que  ≥ 90◦ , mostre que o lado oposto a esse ângulo não pode ser menor que o
outro lado conhecido. O que acontece se as medidas fornecidas para os lados não satisfazem
essa condição?
c) Supondo que  < 90◦ seja agudo, quais condições o lado oposto a esse ângulo deve satisfazer
para que haja um único triângulo com as medidas fornecidas?

Solução:

a) A figura a seguir ilustra um triângulo com as medidas dadas no enunciado. Para determinar
o ângulo Ĉ da figura, aplicamos a lei dos senos ao triângulo, obtendo

10 14 14 sen(40◦ )

= ⇒ sen(Ĉ) = ≈ 0, 9.
sen(40 ) sen(Ĉ) 10

Lembrando que 0 < Ĉ < 180◦ , constatamos que há dois ângulos que satisfazem a equação
sen(Ĉ) = 0, 9. Esses ângulos são

Ĉ1 = arcsen(0, 9) ≈ 64, 15◦ e Ĉ2 = 180◦ − Ĉ1 ≈ 115, 85◦ .

Dessa forma, existem dois triângulos não congruentes com as medidas fornecidas.
Solução alternativa 1:

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Também é possı́vel responder a esse item construindo dois triângulos que possuem as me-
didas apresentadas no enunciado. Para tanto, desenhamos primeiramente o lado de 14 cm,
mostrado em azul no item (a) da figura abaixo. Esse lado define dois vértices do triângulo,
que denominamos A e B. Em seguida, tomando um desses vértices (o ponto A na figura),
desenhamos uma semirreta que forma um ângulo de 40◦ com o lado AB. Finalmente, to-
mando o segundo vértice (o ponto B) traçamos um arco de circunferência com raio de 10
cm. O terceiro vértice do triângulo, C, deve estar na interseção da semirreta com o arco de
circunferência. Notamos, entretanto, que há dois pontos de interseção, C1 e C2 , de modo que
é possı́vel construir os triângulos ABC1 e ABC2 mostrados no item (b) da figura.

Solução alternativa 2:
Suponhamos que o desenho apresentado na Solução alternativa 1 não tenha sido feito com as
medidas exatas. Dito de outra forma, suponhamos que se disponha apenas de um esboço do
problema. Nesse caso, é preciso mostrar que há dois pontos de interseção, C1 e C2 , entre o
arco de circunferência com centro em B e a semirreta vermelha que parte de A, o que tornaria
possı́vel a construção dos triângulos ABC1 e ABC2 mostrados no item (b) da figura.
Para tanto, introduzamos um sistema de coordenadas tal que o ponto A esteja sobre a origem
do sistema e que tenhamos B = (14, 0). Assim, a semirreta que faz um ângulo de 40◦ com o
lado AB tem equação y = mx, em que m = tan(40◦ ).
Considerando que o terceiro vértice do triângulo deve pertencer, ao mesmo tempo, a essa
semirreta e à circunferência com centro em B e raio de 10 cm, concluı́mos que as coordenadas

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(x, y) desse vértice devem corresponder a uma solução do sistema


(
(x − 14)2 + y 2 = 102
y = tan(40◦ )x

além de obedecer y > 0, já que estamos considerando que o terceiro ponto está acima do
segmento AB. Para resolver esse sistema, substituı́mos y = tan(40◦ )x na primeira equação,
o que nos leva a

(x − 14)2 + (tan(40◦ )x)2 = 100 ⇒ (1 + tan2 (40◦ ))x2 − 28x + 96 = 0.

Temos, portanto, uma equação quadrática, que pode ser resolvida com o auxı́lio da fórmula
de Bháskara. O discriminante da equação é

∆ = (−28)2 − 4 · (1 + tan2 (40◦ )) · 96 ≈ 129, 630

e suas soluções são dadas aproximadamente por



−(−28) ± 129, 630 28 ± 11, 386
x= = .
2 · 1, 7041 3, 4082

Logo, temos x1 ≈ 11, 556 e x2 ≈ 4, 875, o que nos leva a y1 ≈ 9, 697 e y2 ≈ 4, 091. Como
y1 > 0 e y2 > 0, podemos construir dois triângulos tomando como terceiro vértice

C1 (11, 556; 9, 697) ou C2 (4, 875; 4, 091).

b) Consideremos um triângulo cujos lados tenham medidas positivas a, b e c. Suponhamos que


sejam conhecidos os lados a e c, bem como o ângulo  ≥ 90◦ , oposto ao lado a. Queremos
provar que a ≥ c. Para tanto, suporemos, por absurdo, que a < c e mostraremos que isso
leva a uma contradição. Comecemos usando a lei dos cossenos para escrever

b 2 + c 2 − a2
a2 = b2 + c2 − 2bc cos(Â) ⇒ cos(Â) = .
2bc

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Supondo, então, que 0 < a < c, deduzimos que

b2 + c2 − a2 = b2 + (c + a)(c − a) > b2 .

Dessa forma, como b > 0, temos


b2
cos(Â) > > 0.
2bc
Entretanto, isso contradiz o fato de que  ≥ 90◦ , já que, nesse caso, cos(Â) ≤ 0. Concluı́mos,
assim, que não existe um triângulo que satisfaça, ao mesmo tempo, a < c e  ≥ 90◦ .
Solução alternativa 1:
Para responder a esse item de forma construtiva, desenhamos em uma folha de papel o lado
c (com qualquer medida) ligando os vértices A e B do triângulo desejado. Em seguida,
partindo do ponto A, traçamos uma semirreta que forma um ângulo  ≥ 90◦ com o lado
AB. Finalmente, supondo, por absurdo, que a condição a < c seja satisfeita, usamos o ponto
B como centro e traçamos um arco de circunferência com raio a tal que a < c, como ilustrado
na figura a seguir.

Note que não há um ponto que pertença, ao mesmo tempo, à semirreta e ao arco, de modo
que não é possı́vel traçar um triângulo com as medidas escolhidas. Observe também que,
para  ≥ 90◦ , a semirreta não tem pontos à direita da reta vertical que passa por A. Por
outro lado, para a < c, todos os pontos do arco de raio a estão à direita da mesma reta
vertical. Sendo assim, ainda que variássemos o ângulo  e o lado a, a semirreta jamais
interceptaria o arco, de modo que, para  ≥ 90◦ , é preciso que a ≥ c. Se essa condição não
for satisfeita, não será possı́vel construir o triângulo.
Solução alternativa 2:
Seja D a projeção do ponto C sobre a reta que contém o segmento AB, cuja medida c é

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conhecida. Se  ≥ 90◦ , então, como ilustrado na figura a seguir, D é exterior ao segmento


ou D ≡ A (se o ângulo for reto).

Nesse caso, pelo Teorema de Pitágoras, temos

2 2 2
a2 = DB + CD = (DA + c)2 + CD ,

Como DA ≥ 0, concluı́mos que a ≥ c, como querı́amos demonstrar.


No caso de essa condição não ser satisfeita, para que a equação apresentada acima permaneça
válida será preciso ter DA < 0, o que é impossı́vel. Portanto, se a < c, não seremos capazes
de construir o triângulo.
Solução alternativa 3:
Seja ABC um triângulo tal que  ≥ 90◦ e suponha que sejam conhecidos os lados AB e
BC. Suponha também, por absurdo, que AB > BC. Nesse caso, existe P ∈ AB tal que
BP = BC = a. Logo, o triângulo P BC é isósceles, com B P̂ C = B ĈP = θ, como sugerido
na figura a seguir.

Uma vez que B P̂ C é suplementar a AP̂ C, que é um ângulo do triângulo P AC, temos
θ = P ĈA + P ÂC. E como P ÂC ≡ Â ≥ 90◦ , concluı́mos que o triângulo BP C possui dois

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ângulos maiores ou iguais a 90◦ , o que é um absurdo. Desse modo, é preciso que BA ≤ BC.
Caso isso não ocorra, não se pode construir o triângulo (motivo pelo qual, na figura anterior,
os lados de medida a e os ângulos de medida θ não pareciam ser idênticos).
c) Consideremos um triângulo ABC como aquele ilustrado na figura a seguir, do qual são
conhecidas as medidas a > 0, c > 0 e  < 90◦ .

Para encontrar a medida do lado desconhecido, b > 0, vamos recorrer à lei dos cossenos:

a2 = b2 + c2 − 2bc cos(Â).

Reescrevendo essa equação como uma equação quadrática na incógnita b, obtemos

b2 + [−2c cos(Â)] · b + [c2 − a2 ] = 0.

O discriminante dessa equação é

∆ = [−2c cos(Â)]2 − 4 · 1 · [c2 − a2 ]


= 4c2 cos2 (Â) − 4c2 + 4a2
= 4c2 [cos2 (Â) − 1] + 4a2
= 4a2 − 4c2 sen2 (Â).

Para que haja um único valor para o lado de medida b, devemos exigir que ∆ = 0 (ou seja,
a equação tenha uma única solução) ou que ∆ > 0 e uma das raı́zes seja menor ou igual
a 0, caso em que haverá apenas um valor positivo de b. Consideremos esses dois casos em
separado.

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(i) Se ∆ = 0, temos

4a2 − 4c2 sen2 (Â) = 0 ⇒ 4a2 = 4c2 sen2 (Â) ⇒ a = c sen(Â).

(ii) Se ∆ > 0 e há um valor de b que é menor ou igual a 0, temos


q
−[−2c cos(Â)] − 4a2 − 4c2 sen2 (Â)
≤0
2·1 q
2c cos(Â) ≤ 4a2 − 4c2 sen2 (Â)
4c2 cos2 (Â) ≤ 4a2 − 4c2 sen2 (Â)
4c2 [sen2 (Â) + cos2 (Â)] ≤ 4a2
c 2 ≤ a2
a ≥ c.

Dessa forma, para que haja um único triângulo com as medidas fornecidas, é preciso que

a = c sen(Â) ou a ≥ c.

Solução alternativa:
Vejamos como construir um triângulo conhecendo o comprimento de dois de seus lados, a e
c, bem como o ângulo  < 90◦ , oposto ao lado a. Para facilitar nossa análise, apresentamos
a seguir uma figura na qual o lado c e o ângulo  estão fixos e, em cada item, consideramos
um valor especı́fico do lado a. Apesar de c e  serem fixos no desenho, suporemos que eles
podem assumir qualquer valor que satisfaça c > 0 e 0 < Â < 90◦ .

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Observe no item (a) da figura que, para valores muito pequenos de a, não é possı́vel construir
um triângulo, pois não há interseção entre a semirreta vermelha e o arco verde.
O menor valor de a para o qual há uma interseção da semirreta com o arco é ilustrado no
item (b). Nesse caso, o ângulo Ĉ entre os lados AC e BC é reto, de modo que

a
sen(Â) = ⇒ a = c sen(Â).
c

À medida que o lado a (ou seja, o raio do arco verde) cresce, passamos a ter dois pontos de
interseção entre a semirreta e o arco, os quais denominamos C1 e C2 no item (c) da figura.
Dessa forma, temos duas soluções, ou dois triângulos.
Observe que o aumento de a faz com que os pontos C1 e C2 se afastem, até que, para a = b,
o ponto A torna-se um dos pontos de interseção. Quando isso ocorre, voltamos a ter um
único triângulo, já que não admitimos que o ângulo B̂ meça 0◦ . Finalmente, para a > c, há
apenas um ponto de interseção entre a semirreta e o arco.
Resumindo essa observações, concluı́mos que
– não há triângulo se a < c sen(Â);
– há dois triângulos se c sen(Â) < a < c; e
– há um único triângulo se a = c sen(Â) ou a ≥ c.

5) (GABRIEL) Em uma escola, na qual estudam 15.000 alunos, a direção decidiu realizar uma
pesquisa para identificar o nı́vel de acompanhamento das aulas durante a pandemia. Em um
primeiro instante a direção pensou em distribuir bilhetes aos estudantes contendo a pergunta:
“Ao assistir as aulas na pandemia, você estava realmente acompanhando as aulas?”

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38ª Olimpı́ada de Matemática da Unicamp
Instituto de Matemática, Estatı́stica e Computação Cientı́fica
Universidade Estadual de Campinas

Entretanto, após pensar um pouco, a diretoria desistiu dessa ideia, uma vez que os alunos poderiam
se sentir constrangidos em responder a pergunta e, portanto, os resultados da pesquisa não seriam
confiáveis.
Para contornar essa situação e deixar os alunos mais a vontade para dar uma resposta sincera a
diretoria desenvolveu, então, uma outra forma de realizar essa pesquisa.
Para cada estudante, foi entregue um bilhete contendo as seguintes instruções:

– Lance um dado.
– Se o resultado for 1, 2 ou 3 responda a pergunta: “Ao assistir as aulas na pandemia, você
estava realmente acompanhando as aulas?”
– Se o resultado for 4, 5 ou 6, lance o dado novamente e responda a pergunta: “O resultado do
segundo lançamento foi maior do que 4?”.
– Deposite sua resposta (Sim ou Não) na urna.

Com esta pesquisa os alunos puderam ser sinceros, já que uma resposta “Sim” não significa
necessariamente que o respectivo respondente não tenha acompanhado as aulas.
Ao final da pesquisa foram contabilizadas 6000 respostas SIM e 9000 respostas NÃO. Sabe-se
também que a porcentagem de pessoas que retirou 1, 2 ou 3 no primeiro lançamento e que acom-
panharam as aulas durante a pandemia é a mesma porcentagem de pessoas que tiraram 4, 5 ou 6
no primeiro lançamento e que acompanharam as aulas durante a pandemia.
Qual é a quantidade esperada de estudantes desta escola que efetivamente acompanhou as aulas
durante a pandemia?

Solução: Consideremos o total de respostas SIM. A probabilidade de uma resposta ser sim é
dada por:
6.000 2
P (resposta = sim) = = .
15.000 5
Agora podemos dividir as respostas “SIM” em duas categorias, as que vieram de respostas da
questão 1 e as que vieram como respostas da questão 2, assim:

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2
= P (resposta = sim) = P (resposta = sim e Questão 1) + P (resposta = sim e Questão 2).
5

Usando agora o conceito de probabilidade condicional podemos escrever:

P (resposta = sim e Questão 1) = P (resposta = sim |Questão 1) · P (Questão 1).

Análogo para a questão 2. Assim, substituindo temos:

2
= P (resposta = sim |Questao 1) · P (Questão 1) + P (resposta = sim |Questão 2) · P (Questão 2).
5

Observe que P (Questão 1) = 21 = P (Questão 2) pois a probabilidade de se obter 1, 2 ou 3 no dado


é a mesma que a probabilidade de se obter 4, 5 ou 6. Assim temos

2 P (resposta = sim |Questão 1) P (resposta = sim |Questão 2)


= + .
5 2 2

Agora, para calcular P (resposta = sim |Questão 2) observe que uma resposta “SIM” para a
questão 2 é obtida com probabilidade 2/6 já que ela só é obtida se o resultado do segundo
lançamento for 5 ou 6. Assim,

2 P (resposta = sim |Questão 1) 1


= + .
5 2 6

Logo,  
2 1 7
P (resposta = sim |Questão 1) = 2 · − = .
5 6 15
Concluı́mos, portanto, que 7/15 dos estudantes do grupo 1 responderam “SIM” e, portanto,
acompanharam as aulas na pandemia. Como sabe-se que a proporção se repete no grupo 2, então
na realidade 7/15 de todos os estudantes acompanharam as aulas na pandemia. Como o total é
de 15000 estudantes então
7
· 15000 = 7000
15
acompanharam e 8000 não acompanharam as aulas na pandemia.

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Solução Alternativa: Observemos primeiramente que a probabilidade de se obter 1, 2 ou 3


no primeiro lançamento de um dado é 1/2, assim é igual a probabilidade de se obter 4, 5 ou 6.
Portanto, o número esperado de pessoas que tiraram 1, 2 ou 3 no primeiro lançamento é:

15000
n1,2,3 = = 7500.
2

Chamaremos o grupo destas pessoas de Grupo 1. Analogamente o número esperado de pessoas


que obtiveram 4, 5 ou 6 no primeiro lançamento é:

15000
n4,5,6 = = 7500.
2

Chamaremos este segundo grupo de Grupo 2.


Agora, dentre os estudantes do Grupo 2 (que obtiveram 4, 5 ou 6), como a probabilidade de se
obter 5 ou 6 em um lançamento de dados é igual a 2/6 = 1/3, concluı́mos que o número esperado
de pessoas que obtiveram 5 ou 6 no segundo lançamento é igual a

1 7500
n4,5,6 · = = 2500.
3 3

Ou seja, o número esperado de respostas “SIM” provenientes de pessoas do Grupo 2 é 2500, pois
todos que obtiveram 5 ou 6 respondem “Sim” à pergunta feita para este grupo.
Como a quantidade total de respostas “SIM” na pesquisa foi 6000 segue que 6000 − 2500 =
3500 destas respostas foram obtidas de pessoas do Grupo 1, ou seja, foi obtida de pessoas que
responderam a pergunta:

“Ao assistir as aulas na pandemia, você estava realmente acompanhando as aulas?”

Como a porcentagem de pessoas que acompanharam as aulas é a mesma em ambos os grupos, e


usando o fato que o número esperado de pessoas em cada um dos grupos é 7500, concluı́mos que
o número esperado de pessoas que tiraram 4, 5 ou 6 no primeiro lançamento e acompanharam as
aulas na pandemia também é 3500.
Portanto, o número esperado de pessoas que efetivamente acompanharam as aulas durante a
pandemia é de 3500 + 3500 = 7000 pessoas.

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